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Janeiro 2019 Ano I /

A lira - Janeiro (Revista) · pelo poeta mineiro Renan Caíque: “Cristais Partidos”, de Gilka Machado, e “Poesias”, de John Clare. ... Memento Mori Aproxima-te, filho, o sol

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Page 1: A lira - Janeiro (Revista) · pelo poeta mineiro Renan Caíque: “Cristais Partidos”, de Gilka Machado, e “Poesias”, de John Clare. ... Memento Mori Aproxima-te, filho, o sol

Janeiro 2019

Ano I

/

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Aos Leitores

Eis que chega o ano de 2019! E com ele a 2ª edição do nosso livreto “A Lira”, recheado de novidades e, como é sempre bom mencionar, continua disponível gratuitamente para download.

Desta vez o homenageado do mês é o grande poeta simbolista Maranhão Sobrinho. Andarilho e boêmio inveterado, teve prestígio e reconhecimento durante a vida, mas que, a despeito de sua importância no cenário poético nacional e para a língua portuguesa em si (pois em seus versos são encontrados muitos neologismos e construções originais, casos únicos em nossa língua), merece um olhar mais atento sobre sua vida e suas obras. Ainda seguindo o estilo simbolista, apresentamos uma versão do poema Ariettes Oubliées, do poeta francês Paul Verlaine, que ficou a cargo do poeta Ivanes de Freitas.

Trazemos também ao conhecimento de nossos queridos leitores o livro de sonetos “Impuros Lamentos”, escrito por Guilherme Kubiszeski que, de quebra, estreia em “A Lira” com dois poemas de sua autoria.

Na seção “ Forme sua biblioteca” temos dois livros indicados pelo poeta mineiro Renan Caíque: “Cristais Partidos”, de Gilka Machado, e “Poesias”, de John Clare. Renan ainda nos apresenta interessantes fatos do mundo da Literatura na seção de “ Curiosidades e Anedotas”, desta vez citando o bardo Lord Byron.

Colaboram com poemas nesta edição os poetas: Rafael Geber, Maurilo Rezende, Renan Caíque, Quintiniano, Derek Castro, Daniel Fernandes, Kleiton Muniz e Guilherme Kubiszeski.

A equipe “A Lira” deseja a todos um 2019 excelso.

Vale!Equipe A Lira

Brasil, Janeiro de 2019

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Indice´ :

Biografia do Poeta................ III

Versos do Homenageado............. V

Traduções......................... X

Lançamento Especial............... XI

A Lira............................ XIII

Curiosidades...................... XX

Forme sua Biblioteca.............. XXI

Apoiadores........................ XXII

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Maranhão

Sobrinho

Biografia

1879 1915

III

-

Nascido José Américo Augusto Olímpio Cavalcanti dos Albuquerques Maranhão Sobrinho, ou simplesmente Maranhão Sobrinho, foi poeta e jornalista, além de fundador da Academia Maranhense de Letras. Nasceu no município de Barra do Corda, Maranhão, a 25 de dezembro de 1879, faleceu em Manaus, no natal de 1915, com apenas 36 anos de idade.

Nos dizeres de Andrade Murici, Maranhão Sobrinho “foi o mais considerável poeta de seu tempo no extremo norte, e o simbolista ortodoxo, o satanista por excelência do movimento naquela região”.

Diz-se que, quando criança, era dado às estripulias de tão brincalhão e irrequieto. Talvez esse seu temperamento tenha afetado os estudos de alguma forma, pois ele frequentou irregularmente os estudos iniciais no renomado colégio do Dr. Isaac Martins — educador, propagandista republicano e abolicionista.

Em 1899, embarcou para São Luís com auxílio do pai, onde fundou, pouco tempo depois, a “Oficina dos Novos” e matriculou-se na antiga Escola Normal, em meados de 1901, por meio de uma pequena bolsa de estudos (denominada pensão na época), entretanto, por mais uma vez o poeta abandonou os estudos, dessa vez por conta de uma indisposição com algum professor. Desiludido e desempregado, entregou-se à boemia de corpo e alma.

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IV

Já em 1903, empreende nova viagem meio que à força, para Belém do Pará, por parte de alguns de seus amigos mais próximos, preocupados com a vida de excessos que o poeta levava, ao mesmo tempo que alimentavam esperanças de o ver empregado e com meios para poder publicar seus livros. Sua popularidade cresce significativamente quando, já em solo paraense, passa a colaborar com jornais e suplementos locais, como o jornal Notícias e Folha do Norte, paralelamente também passa a atuar em outras publicações em São Luís e outros estados.

O ano de 1908 foi igualmente profícuo para Maranhão Sobrinho: É nessa época que o poeta funda a Academia Maranhense de Letras e muda-se para a Amazônia, mais exatamente Manaus, onde contribui com a imprensa local e publica seus poemas. Nesse mesmo ano, torna-se membro fundador da Academia Amazonense de Letras.

Maranhão Sobrinho é autor de três livros de poemas: Papéis Velhos... Roídos pela Traça do Símbolo (1908); Estatuetas (1909); Vitórias-Régias (1911).

Vale destacar que ele sempre publicou seus livros de modo muito precário, seja pelos parcos recursos que possuía, seja pelo modo despreocupado e até desleixado com que tratava seus escritos. Qualquer ambiente em que se dispusesse de tinta, papel e álcool, era propício para a produção de seus versos coloridos e perturbadores: bares penumbrosos, mesas de botequim, cadernos de venda... O fato foi que esse seu modo de ser fez com que Maranhão Sobrinho deixasse grande parte de seus poemas esparsa, ficando a cargo de amigos e admiradores a árdua tarefa de reunir seus textos.

Embora o poeta tenha sido bastante reconhecido por boa parte de sua vida, um estudo mais aprofundado acerca de sua obra marca os apontamentos da crítica sobre suas principais influências, destacando-se Charles Baudelaire e Paul Verlaine, ao mesmo tempo em que o considera, em termos de relevância para o movimento simbolista brasileiro, entre os maiores, ao lado de Cruz e Sousa e Alphonsus de Guimaraens.

Depois de se fixar por mais uma vez na cidade de Belém, muda-se novamente para Manaus, onde trabalha como funcionário público do Estado. Lá falece, no dia de seu aniversário, na noite de natal de 1915, com somente 36 anos de idade, de cirrose hepática.

Em Barra da Corda, sua cidade natal, o poeta é oficialmente homenageado pela Academia Barra-Cordense de Letras, além de seu nome ter sido dado a uma praça pública.

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V

Versos do

Homenageado

Ma-Tsu

Sobre o leito de seda azul-marinhocom uma paisagem de Youk-San, ridente,

Ma-Tsu dorme e a luz do Sol Nascentevem beijá-la amorosa, de mansinho...

Seu morno sono é o de uma flor olente;não respira tão leve um passarinho!

Sobre o seu leito, que parece um ninho,mais azul se desdobra o céu do Oriente.

As margens do Pei-Ho, verdes, bizarras,douram-se ao sol; das fondes se desata

a música nervosa das cigarras...

E sonha Ma-Tsu horas risonhasQue um par de pombas níveas a arrebata

sobre um lago com lótus e cegonhas...

Soror Teresa

...E um dia as monjas foram dar com elamorta, da cor de um sonho de noivado,

no silêncio cristão da estreita cela,lábios nos lábios de um Crucificado...

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VI

Somente a luz de uma piedosa velaungia, como um óleo derramado,o aposento tristíssimo de aquela

que morrera num sonho, sem pecado...

Todo o mosteiro encheu-se de tristeza,e ninguém soube de que dor escrava

morrera a divinal soror Teresa...

Não creio que, do amor, a morte venha,mas, sei que a vida da soror boiava

dentro dos olhos do Senhor da Penha...

D. Mística

Quando a morte velar os meus olhos e as minhasmãos tremerem nas mãos, que me estendes, nervosas

seja o meu beijo, ó flor, o último! nas rosasdo teu rosto! Sonhei que à minha morte vinhas...

Hei de, em ânsias cruéis, cingir-te e, com as chorosascrenças nalma a emigrar com asas de andorinhas,

dizer-te o meu adeus, o último! nas vinhasouvindo o soluçar das rolas amorosas!

E se dos olhos teus, no sagrado transporte,na agonia, rolar uma lágrima viva,

então verei o céu antes de ver a morte!

Santa, a sombra já vem, nos olhos tenho-a aberta!e uma alma que viveu de uma outra alma cativa,

nem nas nuvens do céu pode viver liberta!

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VII

Eterno Tema

Cai o luar em cheio pela estrada,e tu me esperas, pálida e medrosa,

pois é chegada a hora suspirosada entrevista há dias combinada!

Hoje não vem! murmuras ansiosa,volvendo os olhos à deserta estrada;belisca a brisa as folhas da ramada

e o ninho sonha uma canção saudosa!

Estala um ramo, e dizes, suspirando:é ele! é ele! No entanto, amada,

eu vou minha chegada retardando...

Chego: arrufos, suspiros e desejos...Minhalma toda de paixão banhadavibra a guitarra trêmula dos beijos!

Turris Ebúrnea

Quando meus olhos se cerrarem, quandoa mágoa me cerrar os olhos, certo,

irei aos céus, em lágrimas, sonhandover-te e beijar-te, em lágrimas, de perto...

Oh! mas a morte já me está tardando!no entanto sinto-a no meu passo incerto...E eu quero entrar no teu amor chorando,

no teu amor aos mártires aberto!

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VIII

Quero, deixando os pélagos e abismosdo mundo ver-te, lá nos céus, sagrada

na grande Páscoa azul dos Misticismos!

Dos beijos teus tenho saudade e fome...Minhalma vive, em dor, crucificadanas cinco luas cheias do teu nome!

Maio

Maio! Chegaste. Os lírios dos caminhosabrem-se aos beijos matinais do dia;

os sonhos e as canções sobem dos ninhosfechados nalma em flor de ramaria...

Ó doce mês das rosas que os espinhosnão ferem! mês que os olhos de Maria

estrelam! como os olhos meus sozinhosvieste encontrar cobertos de agonia!

Nunca, uma vez, me viste assim, me vistedo teu amor tão tristemente aéreo,

como hoje, ó Maio de roupagem triste!

Como vieste me encontrar? Num valde dor: uma alma feita um cemitério

e um corpo sobre um leito de hospital...

Sonhos

Sonhos... Asas perdidas no alto, em bando,entre as nuvens azuis e entre as esferas...

Velas abertas, côncavas, inflandoem mastros de trirremes e galeras!

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IX

Interlunar

Entre nuvens cruéis de púrpura e gerânio,rubro como, de sangue, um hoplita messênio

o sol, vencido, desce o planalto de urâniodo ocaso, na mudez de um recolhido essênio...

Veloz como um corcel, voando num mito hircânio,tremente, esvai-se a luz no leve oxigênio

da tarde, que me evoca os olhos de StephanioMallarmé, sob a unção da tristeza e do gênio!

O ônix das sombras cresce ao trágico declíniodo dia que, a lembrar piratas do mar Jônio,

põe, no ocaso, clarões vermelhos de assassínio...

Vem a noite e, lembrando os Montes do Infortúnio,vara o estranho solar da Morte e do Demônio

com as torres medievais as sombras do Interlúnio...

Sonhos de infância: Fadas habitandocastelos mouros guirlandados de eras...

A Gata Borralheira se enfeitandoe a Chapelinho a conversar com feras!

Sonhos da mocidade: O azul dos aresos laranjais de aromas povoando...

Rosas abertas... Velas sobre altares...

Sonhos de velhos: Névoas e Trindadese, sobre elas, em lágrimas, pairandosaudades de saudades de saudades...

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X

Traducoes~~

Ariettes Oubliées

Eu adivinho em um murmúrio, inseguro, O contorno de vozes ancestrais,

E em seus vivos fulgores musicais,Pálido amor, a aurora do futuro.

Coração e alma, em pasmo delirante,São uma dupla vista desdobrada,

Onde treme, atrás duma luz velada,De toda lira, a ária mais distante.

Morrer desta maneira em solidão, Que nela -- oh, caro amor amedrontado! --

Oscila o presente e oscila o passado!Oh, sim! perecer nesta oscilação!

Auriettes Oubliées de “Paul Verlaine”Traduzido por Ivanes Freitas

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XI

Lancamento Especial~

Impuros Lamentos (Editora Penalux, 2018) é o livro de estreia de Guilherme Kubiszeski, poeta de Brasília, Distrito Federal. Trata-se de uma coletânea de seus primeiros sonetos.

Quem tiver interesse, pode adquirir o livro em:

http://www.editorapenalux.com.br/catalogo-titulo/impuros-lamentos.

O e-mail do autor é: [email protected].

Memento Mori

Aproxima-te, filho, o sol já cai.É chegada, pois, a hora da lição:

Vês esse corpo dentro do caixão?Ele era teu avô, meu velho pai!

Sente a frieza lúgubre da mãoQue me acudia quando eu gritava “ai! ”:

Na época eu não sabia que nos traiA vida com a morte e a solidão.

Olha, meu filho! Um dia hei de ser euJazendo sem o dom de Prometeu

A fluir pelos meus sanguíneos vasos.

Um dia hás de ser tu, filho querido,Ali no esquife, após teres vivido

Tantos outros tristíssimos ocasos.

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XII

A Caveira

Vem sorrindo, estrambótica e macabra,A Caveira com seus hediondos dentes...

Balbuciando vem ela o abracadabraQue oprime a língua tonta dos dementes.

A mando vem do velho Pé de CabraPara ceifar as almas inocentes,

E assim será até que aquele lhe abraDe novo o reino dos lixões ardentes.

Percorre toda a face do planetaA escrava do Demiurgo proxeneta

Como a faminta e acinzentada traça.

Dançando a cabalística ciranda,Vem a Caveira gélida e nefanda,

Vem o Crânio pelado da desgraça.

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XIII

As Três Virgens

Nestório da Santa Cruz

Na torre da basílica ressoavaO dobre do sineiro dos finados.

Três virgens em caixões negros, lacrados,Seguiram rumo ao pátio onde aguardava

Um padre, que o velório preparavaCom preces, cruzes, flores e recados;Dizendo: Pobres filhas dos pecados!E, quedo, o sacrossanto soluçava...

E, vendo aqueles corpos das defuntas,As urnas, debruçou-se de mãos juntas,

Achando aquelas moças parecidas;

O pobre caminhando até Jesus,Pregou-se no lugar da velha cruz;As virgens eram santas falecidas.

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XIV

O Quadro Que Não Pintei

Maurilo Rezende

Ao lado o bambuzal reverencia o vento,Acima as nuvens têm aspecto de algodão,

O Sol vagueia pelo azul do firmamento,A vida passa com extrema lentidão...

Do outro lado também um rio segue lento,Eternamente preso à sua direção,

O pássaro que beija a flor faz o momentoParecer, para mim, um sonho, uma ilusão...

Ao fundo uma casinha amarela... bem longe...Habitação, talvez, de algum velho e bom monge

Que o pincel não lembrou de colocar na tela.

No centro e em evidência uma moça caminha,Parece perseguir o horizonte, sozinha,

Como se conhecesse o que há atrás da aquarela...

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XV

O Sol Morto

Quintiniano

A última pá de terra. O sol se some...Cai de um lado a flamífera coroa.

No ar fica um eco de uma dor sem nome,Tinta de um tom tão roxo que magoa...

Os astros de chorar já estão roucos...Ah, o olhar de Esperança! Na ilusãoDe vermos no horizonte um coração

Que vai parando de bater aos poucos...

De pranto, a lua todo o espaço junca;E as estrelas — tão pasmas! — eu bem sei,

Nenhuma nesse tempo todo, nuncaHavia visto o funeral de um rei.

Nênias de luz em febre. RefratadasAs silhuetas das cores. Catedrais

Reduzidas a cacos, e vitraisE tronos e mansões estilhaçadas...

No limiar da noite surge a luaAfinando um violino em Si bemol;Vai de branco remando uma falua,

— Fechar de vez as pálpebras do sol...

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XVI

Livor Mortis

"Mãos de finada, aquelas mãos de neve" Alphonsus Guimaraens

Mãos de Rainha — pálidas alvuras —Transparecendo as veias azul-claras,Trazem as formas nuas, formas raras

De níveas e marfíneas formosuras.

Mãos sacrossantas, cândidas e puras,Relíquias tão pequenas e tão caras;

São como as mãos de Vênus, leves, claras,De ilustres e perfeitas estruturas.

Pureza virginal de lírios santos,Desnudas virgens — lívidos encantos —

Banhadas na palência do luar.

Hei de senti-las, frias e trementes,Cerrando as minhas pálpebras dormentes,

Cerrando para sempre o meu olhar.

Derek Castro

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XVII

Em Meu Coração

Renan Caíque

Não fales muito. Uma palavra basta Murmurada, em segredo, ao pé do ouvido.

Nada, nada de voz — nem um suspiro, Nem um arfar mais forte.”

Junqueira Freire

Enterneço-me apenas em recordar-te!Eu que pensara — em um triste padecer —

Nunca mais sentir o coração bater...Mas, felizmente, só até encontrar-te!

Longe de ti, meu espírito se parte...Perto, no entanto, sinto-me renascer.

Tu és o arquétipo de meu viver,E a mais sacra e angelical obra de arte!

Porém, de que vale um amor que não fala?!Próximo a ti tal sentimento se cala,

Como se nem fosses nada para mim...

Mas, na verdade, em minha vida, és tudo!E se contigo por fora eu fico mudo,

Ressoam por dentro palavras sem fim.

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XVIII

Minha Guerra

Kleiton Muniz

Aqui, em minhas mãos, carrego a armaque tenho utilizado em loucos crimes...

Pobre de mim, que miserável carma,quisera ter intentos mais sublimes...

Mas eis que vago como um mercenárioa serviço talvez da própria sorte

que, sem nenhuma paga, tão precário,a si mesmo se nutre e é duro e forte.

Sim, eis que vou armado em meu intento,sem me importar com a glória do futuro;

vago vazio, envergo vime e ventoe, na guerra que travo, limpo, puro,

verto meu próprio sangue na agonia,transformo minhas dores em poesia...

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XIX

Soneto 3

Daniel Fernandes

Sonhos que povoais meu pensamentoCom tão nítidas cenas de alegria,Um momento cessai vossa porfia,

Deixai-me descansar um só momento.

Se quereis dar remédio ao meu tormentoCom memórias felizes de algum dia,

Sabei que mais alívio lhe traria,Que sua lembrança, o seu esquecimento.

Feliz quem foi na vida sempre triste,Que, tendo sempre por contrário o Fado,

Não sofre a ingrata dor de um bem ausente;

Pois o ser desditoso só consiste Em opor às venturas do passado

Os cruéis infortúnios do presente.

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XX

Curiosidades~

O poeta romântico Lord Byron (1788-1824) tinha um grande amor pelos animais, sobretudo por um cão canadense chamado Boatswain. Quando o animal contraiu raiva, Byron cuidou dele até o fim, sem qualquer pensamento ou medo de ser mordido ou infectado. Quando ele morreu, Byron disse: "...Boatswain está morto! Morreu em um estado de loucura no dia 10, depois de sofrer muito, mas ainda mantendo sua natureza gentil até o final, jamais tentando ferir alguém à sua volta.”

Embora profundamente endividado no momento, Byron organizou um impressionante monumento funerário de mármore para Boatswain em Newstead Abbey, maior que o seu próprio, e o único trabalho de construção alguma vez realizado em sua propriedade. Em 1811, Byron pediu que fosse enterrado com ele.

.Byron também manteve um urso domesticado enquanto era

estudante no Trinity College Cambridge. Não havendo menção sobre a proibição de criar ursos entre os estatutos, as autoridades da universidade não tinham base legal para a queixa. Byron até sugeriu que ele iria candidatar o urso a uma bolsa de estudos da faculdade.

Durante a sua vida, além de inúmeros gatos, cães e cavalos, Byron manteve uma raposa, macacos, uma águia, um corvo, um falcão, pavões, galinhas-d'angola, um gruidae egípcio, texugo, gansos, uma garça-real e uma cabra. Com exceção dos cavalos, todos eles residiam dentro de casa em suas residências na Inglaterra, Suíça, Itália e Grécia.

Diz-se ainda que, por influência do também poeta romântico Shelley, Byron foi vegetariano. Ele acreditava que a carne torna as pessoas agressivas. Em suas obras costumava louvar a natureza e os animais, e criticar os maus tratos que eles sofriam, desde a sua criação para abate até esportes como pesca e testes para pesquisas científicas.

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XXI

Forme Sua

Biblioteca

~

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“ Cristais Partidos” é o primeiro livro da poetisa carioca Gilka Machado e foi publicado em 1915, quando ela tinha apenas 22 anos. Seu estilo literário vagueia pelo Parnasianismo, que fica claro na busca pela perfeição da forma e na preocupação de cada palavra que compõe o seu vocabulário erudito. Mas a autora não se encaixa em só um estilo literário: passeia pelo Simbolismo, através de seus versos por vezes sombrios e metafóricos, trazendo ainda o sentimentalismo do Romantismo em alguns momentos, como no belíssimo soneto “Amei o amor, ansiei o amor. Sonhei-o”. E ainda, os nove sonetos “Reflexões” apresentam várias divagações filosóficas sobre espiritualidade e a vida. Esse é um livro fantástico para quem deseja adentrar no universo poético de Gilka Machado ou simplesmente ler uma boa obra de poesia.

“Cristais Partidos” de Gilka Machado

Poesias de John Clare

“Poesias” foi o único livro com poemas de John Clare a ser publicado no Brasil. Foi primorosamente traduzido por Alexei Bueno e, apesar do autor ter sido renomado em sua época, sendo considerado o “Robert Burns inglês” e um dos principais autores da Segunda Geração Romântica inglesa, junto com Byron, Keats e Shelley, o poeta não é muito conhecido no Brasil. Clare, tendo sido filho de um agricultor, logo tendo uma infância rural, teve a natureza como tema central em seus poemas, sempre a louvando ou lamentando a sua destruição, isso sempre através de versos simples, tanto no linguajar quanto no metro. O seu poema mais conhecido é o “I am” (Eu sou), que apresenta a clássica melancolia e sentimento de incompreensão, inerentes ao Romantismo.

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“Subi talvez às máximas alturas, Mas, se hoje volto assim, com a alma às escuras,

É necessário que inda eu suba mais!”

Augusto dos Anjos