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Introdução Os Alicerces Teóricos da Terapia Comunitária Apresentamos uma síntese da proposta da Terapia Comunitária como instrumento de construção de redes solidárias. 1. Métodos e fundamentos A Terapia Comunitária tem construído sua identidade alicerçada em cinco grandes eixos teóricos: 1.1. O Pensamento Sistêmico 1.2. A Teoria da Comunicação 1.3. A Antropologia Cultura! 1.4. A Pedagogia de Paulo Freire 1.5. A Resiliência 1.1. O Pensamento Sistêmico O pensamento sistêmico nos diz que as crises e os problemas só podem ser entendidos e resolvidos se os percebermos como partes integradas de uma rede complexa, cheia de ramificações, que ligam e relacionam as pessoas num todo que envolve o biológico (corpo), o psicológico (a men te e as emoçõ es) e a sociedade. Tudo está ligado, cada parte depende da outra. Somos um todo, em que cada parte influencia e interfere na outra parte. Para en frentar a vida com pra- zer e buscar a solução para os nossos problemas pessoais, familiares, comunitários e sociais precisamos estar conscientes de que fazemos parte desse todo. Precisamos estar conscientes da globalidade em que estamos inseridos, sem perder de vista a relação entre as várias partes do conjunto a que pertencemos. Só assim, poderemos com- preender os mecanismos de auto regulação, proteção e crescimento dos sistemas sociais, e passaremos a vivenciar a noção de co respon sabilidade.

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  • 5/25/2018 A Barreto Terapia Comunitaria Intro Cap 1 (1)

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    Introduo

    Os Alicerces Tericos da Terapia Comunitria

    Apresentamos uma sntese da proposta da Terapia Comunitriacomo instrumento de construo de redes solidrias.

    1. Mtodos e fundamentos

    A Terapia Comunitria tem construdo sua identidade aliceradaem cinco grandes eixos tericos:

    1.1. O Pensamento Sistmico

    1.2. A Teoria da Comunicao

    1.3. A Antropologia Cultura!

    1.4. A Pedagogia de Paulo Freire

    1.5. A Resilincia

    1.1. O Pensamento Sistmico

    O pensamento sistmico nos diz que as crises e os problemas spodem ser entendidos e resolvidos se os percebermos como partes

    integradas de uma rede complexa, cheia de ramificaes, que ligame relacionam as pessoas num todo que envolve o biolgico (corpo),o psicolgico (a mente e as emoes) e a sociedade. Tudo est ligado,cada parte depende da outra. Somos um todo, em que cada parteinfluencia e interfere na outra parte. Para enfrentar a vida com pra-zer e buscar a soluo para os nossos problemas pessoais, familiares,comunitrios e sociais precisamos estar conscientes de que fazemosparte desse todo. Precisamos estar conscientes da globalidade em

    que estamos inseridos, sem perder de vista a relao entre as vriaspartes do conjunto a que pertencemos. S assim, poderemos com-preender os mecanismos de autoregulao, proteo e crescimentodos sistemas sociais, e passaremos a vivenciar a noo de coresponsabilidade.

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    2 8 * Adatberto Barreto

    1.2. A Teoria da Comunicao

    Essa teoria nos aponta para o tato de que a comunicao entreas pessoas o elemento que une os indivduos, a famlia e a socie-dade. Ela nos permite compreender que todo comportamento, todoato, verba! ou no, individual ou grupa! tem valor de comunicaonum processo, sempre desafiante, de entendimento das mltiplaspossibilidades de significados e sentidos que podem estar ligadosao comportamento humano. A riqueza e a variedade das possibili-dades de comunicao entre as pessoas nos convidam a ir alm daspalavras, para entender a buscadesesperada de cada ser humano

    pela conscincia de existir e per-tencer, de ser confirmado e reco-nhecido como sujeito e cidado.Alm disso, nos alertam para osriscos e efeitos nocivos de umacomunicao usada de forma am-bgua, ensinandonos, assim, a

    valorizar a clareza e a sinceridadeao nos comunicai) ato que podeser um verdadeiro instrumentoda. crescimento e transformaopessoal e coletiva.

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    i t d

    terapia Comunitria * 2 9

    1.3. A Antropologia Cultural

    Os conhecimentos dessa cincia chamam a nossa ateno para aimportncia da cultura, esse grande conjunto de realizaes de umpovo ou de grupos sociais, como o referencial a partir do qual cadamembro de um grupo se baseia,

    retira sua habilidade para pensar,avaliar e discernir valores, e fazersuas opes no cotidiano. Vistadessa maneira, a cultura um demeno & re/i?rHCM? fundamentalna construo de nossa identida-de pessoal e grupai, interferindo,de forma direta, na definio doquem sou eu, quem somos ns.E , a partir dessa referncia, quepodemos nos afirmai) nos aceitare nos amai) para ento podermosamar os outros e assumir nossaidentidade como pessoa e cidado.Dessa forma, podemos romper com a dominao e com a excluso

    social que, muitas vezes, nos impem uma identidade negativa oubaseada nos valores de uma outra cultura que no respeita a nossa.Quando reconhecemos que, mesmo num nico pas, convivem v-rias culturas e aprendemos a respeitlas, descobrimos que a diversi-dade cultural boa para todos e verdadeira fonte de riqueza de umpovo e de uma nao. Se a cultura for vista como um valor, um re-curso que deve ser reconhecido, valorizado, mobilizado e articuladode forma complementar com outros conhecimentos, poderemos verque este recurso nos permitir somai) multiplicar nossos potenciaisde crescimento e de resoluo de nossos problemas sociais e cons-truir uma sociedade mais fraterna e mais justa.

    1.4. A Pedagogia de Paulo Freire

    Paulo Freire nos lembra que ensinar no apenas uma transfe-rncia de conhecimentos acumulados por um educador(a) experien-

    te e que sabe hido para um educando(a) inexperiente que no sabenada. Ensinar o exerccio do dilogo, da troca, da reciprocidade,ou seja, de um tempo para falar e de um tempo para escutai) de umtempo para aprender e um de tempo para ensinar. Freire (1983:95),nesse sentido, afirma que:

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    3 0 * Adatberto Barreto

    T4 aafoSM/id'c?!da c Ntcoaypafw/ com o d;'/ogo. Os /o/acas^ac ao fc?a /!aaa/a&, oa o pcr&ya, ao po&m sc aproirazar& po:?o. No po&ai scr scas cc?7;p?H/K?'ros & pw?;?:cM doa:aado. Sc a/ynda no c capaz & sc?!:'rsc c sa&rsc fo 7:oa:c?a aaafo aos oa^ros, tf ^ac //!Cja/fa aada wnafo yac cama/:a para d;c%ar ao agar & cacoaro com des. Acssc /agar &cnconfro, no M gaoraafcs aso/^fos, acm sadios avo/a^os;/z /anneas

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    L t d Terapia Com unitria * 3 1

    respeito mtuo um ato de dominao, controle. Para Paulo Freire oconhecimento no est separado do contexto de vida. O respeito e aaceitao da diversidade sem discriminao e preconceitos tambmse fazem presentes na teoria de Paulo Freire. E para lidar e aceitara pluralidade cultural, o educador precisa estar aberto ao novo, aodiferente, entendendo o ser humano numa perspectiva de ;naca&H

    ou :nc/MSo. A conscincia de que o ser humano inacabadopossibilita ao educador e ao educando o exerccio do indagar, com-para^ duvidat) do despertar da curiosidade sem invadir a privaci-dade dos outros, da busca de novos conhecimentos, no para cons-tar os erros mas, para ajudar a encontrar solues (o que podemosfazer por esta realidade?) promovendo transformaes no universoem que vivem. Freire (2001:79) afirma: "Ningum nasce feito. Vamos

    nos fazendo aos poucos, na prtica social de que tomamos parte".Um outro ponto a mencionar sobre o mtodo de Paulo Freire

    que nenhum educador pode assumir a prtica da sua misso se notiver por ela um mnimo de carinho, apreo, identificao. Isso vlido tambm no trabalho do terapeuta comunitrio. Se no hou-ver envolvimento e identificao nosso trabalho fica prejudicado.Para educar no basta ter tempo livre fazendo da misso um bico oupassatempo enquanto no chega outro "trabalho" mais rentvel. Damesma forma que o educador no pode jamais esquecer que a suamisso com a formao de seres humanos crianas, adolescentese adultos que tm sonhos, ideais, indagaes, interrogaes acer-ca de si prprio e do mundo que os cerca, o terapeuta comunitriodeve sempre ter uma viso contextua! e compreender que no estl somente para realizar uma tarefa para os outros, mas, sobretu-do, para si mesmo. Portanto, nesse sentido, a natureza do trabalho

    pedaggico poltica, pois envolve valores acerca da cidadania. Epara ser cidado no basta saber reconhecer o mundo das palavrasmas, perceberse como ser humano histrico que produz cultura.Enfim, o mtodo de Paulo Freire um chamado coletivo a todos osmembros da raa humana para criar e recria^ fazer e refazer atra-vs da ao e reflexo. Descobrindo novos conhecimentos e, conse-qentemente, novas formas de intervir na realidade, os indivduostornamse sujeitos da histria e no meros objetos.

    O perfil indicado para o terapeuta comunitrio semelhante aopapel do educador que est muito bem definido na pedagogia dePaulo Freire.

    !ntmduco

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    3 2 * Adalberto Barreto

    1.5. A Resilincia

    Uma outra fonte importante do conhecimento, que contribuipara a construo de nossa proposta de trabalho, nasce da prpriahistria pessoa! e famiar de cada participante. As crises, os sofri-mentos e as vitrias de cada um, expostos ao grupo, so utilizados

    como matriaprima em um trabalho de criao gradua! de consci-ncia social, para que os indivduos descubram as implicaes so-ciais da gnese da misria e do sofrimento humano. O enfrentamento das dificuldades produz um saber que tem permitido aos pobrese oprimidos sobreviverem atravs dos tempos. Tudo isso revela umesprito criativo e construtivo, construdo, historicamente, atravsde uma interao entre o indivduo e seu meio ambiente. Precisa-

    mos encorajlos e estimullos. E evidente que esse esforo coletivono deve substituir as polticas sociais, mas inspirlas e at mesmoreorientlas. No buscamos identificar as fraquezas e as carncias.No tentamos diagnosticar os problemas, nem os meios de compen-slos, pelo contrrio, a meta fundamental da Terapia Comunitria identificar e suscitar as foras e as capacidades dos indivduos, dasfamlias e das comunidades para que, atravs desses recursos, pos-sam encontrar as suas prprias solues e superar as dificuldadesimpostas pelo meio e pela sociedade.

    A formao proposta, baseada nas linhas tericas acima descritase na valorizao das vivncias, permite aos terapeutas comunitriossentiremse mais confiantes em suas competncias e menos depen-dentes de teorias gerais ou especializadas. Eles so orientados paraassumirem as aes bsicas em sade mental comunitria, voltadaspara a preveno, mediao das crises e promoo da insero socialdos indivduos.

    Em nossa proposta de trabalho, procuramos adaptar conceitostericos a uma linguagem coerente com as necessidades e realidadesculturais de nossas comunidades, tornandoos acessveis s lideran-as comunitrias que recebem a formao para se tornarem terapeu-tas comunitrios. Esses elementos tericos que fundamentam nossaproposta definem o espao de interveno em que cada terapeuta

    comunitrio poder, tambm, desenvolver sua criatividade, desco-brir novas tcnicas e produzir novos conhecimentos.

    introduo

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    terapia L.omunuana * j j

    2. Princpios, Conceitos e Metodologia

    A Terapia Comunitria um espao de promoo de encontrosinterpessoais e intercomunitrios, objetivando a valorizao das his-trias de vida dos participantes, o resgate da identidade, a restaura-o da autoestima e da confiana em si, a ampliao da percepo

    dos problemas e possibilidades de resoluo a partir das competn-cias locais. Tem como base de sustentao o estmulo para a constru-o de vnculos solidrios e promoo da vida.

    Esta forma de trabalho permite que se avance do modelo cen-trado na patologia ao modelo da promoo da sade, das redes desolidariedade e da incluso social.

    A Terapia Comunitria no se define como um processo psicoteraputico, mas, sim, como um ato teraputico de grupo que podeser realizado com qualquer nmero de pessoas e de qualquer n-vel socioeconmico. E uma prtica de interveno simples, mas nosimplista, requerendo uma capacitao. Ela dirigida por facilitadores, devidamente treinados, sem nenhuma exigncia de formaoacadmica anterior.

    A interveno se d nas diversas redes que compem o sistemade relaes humanas, incluindo a famlia, os vizinhos, os amigos e

    a coletividade para apoiar os indivduos e as famlias mais vulner-veis da comunidade que esto vivendo uma situao de crise.

    No campo da sua interveno, o terapeuta comunitrio tentaarticular a dimenso biolgica, social e poltica dos problemas. Eletem, como ponto de partida, uma s:'fHaoproMff?:a (alcoolismo, in-snia...), apresentada por algum da comunidade e escolhida pelogrupo. E a partir dessa situao que a equipe teraputica passa aestimular e favorecer o crescimento do indivduo e das pessoas maisprximas a ele, para adquirir um maior grau de autonomia, consci-ncia e coresponsabilidade. Tudo isso acontece atravs de um pro-cesso de questionamentos em todos os nveis: biolgico, psicolgico,social e poltico.

    Ns nos apoiamos na competncia dos indivduos e das famliase, jamais, nas carncias que so prerrogativas dos especialistas.

    introduo

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    3 4 * Adaiberto Barreto

    3. A comunidade

    So pessoas ou grupo de pessoas em relao que tem algo emcomum como exduso, desemprego, sofrimento, migrao...

    4. Popu!aoa!vo

    So os grupos de pessoas que vivem em contexto de desagre-gao e excluso social, muitas vezes, agravado pelas migraesforadas. Nesses contextos, encontramos no somente a pobrezaeconmica, mas a pobreza cultural, a fragilidade de laos sociais, aincapacidade de se organizar de forma mais democrtica e, sobretu-

    do, a autoimagem desvalorizada, a baixa autoestima que, muitasvezes, culmina na perda da prpria identidade e dignidade. Emboraesta proposta teraputica esteja mais voltada para grupos que vi-vem em condio social vulnervel, em termos de sua sade mentale autonomia individual e comunitria, nossa experincia tem mos-trado que ela pode ser aplicada em qualquer grupo de pessoas, per-tencentes s mais diferentes classes sociais, idades, situaes socioe

    conmicas e profissionais.

    introduo

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    5. Orientao

    A Terapia Comunitria parte do pressuposto de que o sofrimen-to humano, decorrente do macrocontexto socioeconmico e social,fere a dignidade da pessoa, atinge seus direitos como cidado, ge-rando extremos de patologia socia! e adoecimento.

    Estamos convencidos de que toda sociedade humana dispe de

    mecanismos teraputicos vlidos e culturalmente relevantes, quereforam e valorizam a trajetria de vida e a identidade de seusmembros.

    As possibilidades de preveno das doenas mentais, bem comoas formas de cura so tantas quantas so as distintas realidades, so-ciedades e culturas presentes na humanidade.

    As sesses de Terapia Comunitria se propem a:

    a) reforar os vnculos entre as pessoas, respeitando a cultura decada um; mobilizar os recursos e competncias culturais locais,para promover a sade mental comunitria; e construir umarede social de proteo e insero, promovendo uma culturade paz.

    A comunidade deve funcionar como agenfg ferap

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    distancilo de sua cuitura e destruir sua identidade, integrado emsua cuitura e em sua comunidade, e!e se torna consciente de seusdireitos e deveres individuais e sociais, o que lhe permite uma exis-tncia cidad, digna e piena. Nesse sentido, prevenir , sobretudo,estimular o grupo a usar a sua criatividade e a construir o seu pre-sente e o seu futuro a partir de seus prprios recursos.

    6. ticaA tica que orienta a proposta da Terapia Comunitria busca:

    a) romper o isolamento entre o saber e o sa&r popdar,fazendo um esforo no sentido de exigir um respeito mtuoentre as duas formas de saber, em uma perspectiva de com-plementaridade, sem rupturas com a tradio, e sem negar ascontribuies da cincia moderna;

    b) alcanar a solidariedade e o respeito ao processo de libertaodo homem que sofre, centrando sua ao no encontro com ou-tras pessoas que vivem na mesma situao, para que vivenciem juntos, na comunidade, o acolhimento, a partilha de suasdescobertas, a cura e a libertao;

    c) considerar a ecologia do esprito que se manifesta em respeito

    diversidade cultural e a seus sistemas de representao.

    lntroduo

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    CAPTULO 1

    A Terapia Comunitria Sistmica Integrativa:definio, objetivos e pressupostos

    1. Por que Terapia Comunitria?Terapia (do grego: therapeia) uma palavra de origem grega que

    significa acolher, ser caloroso, servir, atender. Portanto, o terapeuta aquele que acolhe e cuida dos outros de forma calorosa.

    Comunidade: a palavra comunidade composta de duas outraspalavras: COMUM + UNIDADE, ou seja, o que as pessoas tm em

    comum. Entre outras afinidades tm sofrimentos, excluso, buscamsolues e superao das dificuldades.

    Porque Sistmica? O pensamento sistmico nos diz que as crisese problemas s podem ser entendidos e resolvidos se os perceber-mos como partes integradas de uma rede complexa, que ligam einterligam as pessoas num todo. Somos um todo, em que cada parteinfluencia e interfere na outra parte.

    Portanto, se o sofrimento humano decorrente do macrocontexto socioeconmico poltico e social, as respostas devem ser tam-bm sistmicas, mobilizando recursos da multicultura brasileira.

    Porque Integrativa? Na promoo da sade, todas as foras vi-vas da comunidade devem ter um papel ativo, integrando saberesoriundos dos mais diferentes contextos scioculturais e ampliandoas redes solidrias de promoo da sade e da cidadania. Neste sen-

    tido, a cultura vista como um recurso que deve ser reconhecido,valorizado, mobilizado e articulado de forma complementar comoutros conhecimentos. Somente assim podemos somar, multiplicar

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    nossos potenciais de crescimento e resoluo de nossos problemassociais e construir uma sociedade mais justa e democrtica.

    1.1. Terapia Comunitria

    um espao comunitrio onde se procura partilhar experinciasde vida e sabedorias de forma horizonta! e circular. Cada um torna

    se terapeuta de si mesmo, a partir da escuta das histrias de vidaque ali so relatadas. Todos se tornam coresponsveis na busca desolues e superao dos desafios do cotidiano, em um ambienteacolhedor e caloroso.

    um momento de transformao, transmutao do KAOS, dacrise, do sofrimento para o KYROS, espao sagrado onde cada umreorganiza seu discurso e resignifica seu sofrimento dando origem a

    uma nova leitura dos elementos que o faziam sofrer. esta dimensosagrada de transformar o sofrimento em crescimento, a carncia emcompetncia que faz da Terapia Comunitria um espao sagrado.

    1.2.A ao teraputica da comunidade

    Assim como cada etapa da histria do universo marcada pelainveno do homem de criar uma nova forma, de lutar contra o es-friamento devido a sua expanso, a Terapia Comunitria se propeser um instrumento de aquecimento e fortalecimento das relaeshumanas, na construo de redes de apoio social, em um mundocada vez mais individualista, privatizado e conflitivo.

    A comunidade age onde a famlia e as polticas sociais falham.Ns afirmamos que a soluo est no coletivo e em suas interaes,no compartilhai) nas identificaes com o outro e no respeito s di-ferenas. Os profissionais devem ser parte dessa construo. Ambos

    se beneficiam: a comunidade gerando autonomia e insero social eos profissionais se curando de seu autismo institucional e profissio-nal, bem como de sua alienao universitria.

    2. A terapiaA Terapia Comunitria apresenta trs caractersticas bsicas:

    Primeira. A discusso e a realizao de um trabalho de sademental, preventiva e curativa, procurando engajar todos os elemen-tos culturais e sociais ativos da comunidade: agentes de sade, eduradcres, artistas populares, curandeiros, entre outros.

    ^Terapia Com unitria Sistmica integrativa DefiniAo, Objetivo s e Pressupostos

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    Terapia Com unitria *

    Segunda. A nfase no trabalho de grupo, promovendo a for-mao de grupos de mulheres, jovens, pessoas de terceira idade,para que, juntos, busquem solues para os problemas cotidianos epossam funcionar como escudo protetor para os mais frgeis, sendoinstrumentos de agregao social.

    Terceira. A criao gradual da conscincia social, para que os in-divduos tomem conscincia da origem e das implicaes sociais damisria e do sofrimento humano e, sobretudo, para que descubramsuas potencialidades teraputicas transformadoras.

    3. Os objetivos

    A Terapia Comunitria tem os seguintes objetivos:

    1. Reforar a dinmica interna de cada indivduo, para que estepossa descobrir seus valores, suas potencialidades e tomarse maisautnomo e menos dependente.

    2. Reforar a autoestima individual e coletiva.

    3. Redescobrir e reforar a confiana em cada indivduo, diantede sua capacidade de evoluir e de se desenvolver como pessoa.

    4. Valorizar o pape! da famlia e da rede de relaes que ela esta-

    belece com o seu meio.5. Suscitai) em cada pessoa, famlia e grupo social, seu sentimen-

    to de unio e identificao com seus valores culturais.

    6. Favorecer o desenvolvimento comunitrio, prevenindo e com-batendo as situaes de desintegrao dos indivduos e das famlias,atravs da restaurao e fortalecimento dos laos sociais.

    7. Promover e valorizar as instituies e prticas culturais tradi-

    cionais que so detentoras do saber jazer e guardis da identidadecultural.

    8. Tornar possvel a comunicao entre as diferentes formas dosaber poptdar e saber denffKro.

    9. Estimular a participao como requisito fundamental para di-namizar as relaes sociais, promovendo a conscientizao e estimu-lando o grupo, atravs do dilogo e da reflexo, a tomar iniciativas e

    ser agente de sua prpria transformao.

    CAPTULO ]

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    4 0 * Adalberto Barreto

    4. A construo das teias

    A teia de aranha um smbolo. Os ndios Trememb que habi-tam o Nordeste brasileiro danam o torem, uma dana em ritmo dexote, atravs da qua! invocam e imitam os animais com os quais, nopassado, aprenderam uma

    lio. Dentre os animaisreverenciados temos a ara-nha. Com a dana da ara-nha os ndios nos lembramque ela sem a teia como ondio sem a terra. A aranhasem a teia como uma co-

    munidade sem vnculos.As terapias comunit-

    rias so semelhantes aotrabalho da aranha quetece teias invisveis, po-rm, fortssimas. Esse tipode trabalho teraputico tem se tornado referncia para os excludos

    da sociedade, tem permitido agregar os sewrMwo e perdidos, temaberto um espao de expresso para os que sofrem, tem sido suportee apoio que permite, a muitos, nutriremse do que ali se constri.

    A Terapia Comunitria (abreviada TC) resgata, tambm, a parti-cipao dos valores culturais de um grupo social e dos vnculos in-terpessoais e sociais que unem, fortalecem e fazem o homem dessegrupo descobrir o sentido de pertencimento humanidade.

    A cultura como uma teia invisvel que integra e une os indiv-duos. Portanto, podemos acreditar que a melhor preveno man-ter o indivduo ligado a seu universo cultura! e relacionai, a sua teia,pois atravs de sua identificao com os va!ores culturais de seugrupo que ele se nutre e constri a sua identidade. A cultura para oindivduo como a teia para a aranha.

    5. A escolha do terapeutaPara selecionar os candidatos, sugerimos uma palestra de sen-

    sibilizao aberta ao pblico para apresentar a TC, seus objetivos,ref^encial terico e o papel do terapeuta comunitrio. Esta palestrade sensibilizao permite esclarecer dvidas e uma melhor escolha

    \ T i C it i Si t i I t ti D fi i Ob j ti P t

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    \ Terapia Com unitria Sistmica Integrativa Definio Ob jetivos e Pressupostos

    de quem deseja fazer a formao evitando, assim, desistncias pos-teriores e ma! entendidos. Sugerimos convidar representantes deONG, deranas civis e re!igiosas, profissionais da sade, do serviosocia!, da educao...

    muito importante a etapa da esco!ha do terapeuta comunit-rio. A comunidade deve seguir a!guns parmetros que garantam a

    reazao de um bom trabaiho. Se j existe comunidade organizadae consciente da importncia da Terapia Comunitria, tornase maisfci! a escolha do terapeuta.

    Aqui, apresentamos alguns critrios que devem nortear a esco-lha do terapeuta comunitrio:

    1. Ser escolhido pela comunidade e que haja uma explicao so-bre o trabalho do terapeuta comunitrio. Esse trabalho deve ser dis-

    cutido com as pessoas da comunidade, para que elas sugiram nomesque correspondam ao perfil exigido. O ideal seria promover umavotao, ou seja, uma indicao pelo voto dos futuros terapeutascomunitrios. Esse processo democrtico consolida o papel do tera-peuta comunitrio e nos garante que o eleito seja algum que tem orespeito e a confiana da comunidade.

    2. Ser algum j engajado em trabalho comunitrio, pois a experi-ncia como lder que organiza reunies ser muito til ao trabalho.

    3. Estar consciente de que o trabalho realizado no traz nenhumaremunerao financeira, j que se inscreve dentro de um volunta-riado e exige disponibilidade de, no mnimo, trs horas de trabalhosemanal, a menos que se trate de algum j vinculado a um trabalhoinstitucional, por exemplo, um Agente Comunitrio de Sade, ououtros profissionais inseridos em programas como PSF ( Programade Sade da Famlia).

    4. Ter mente aberta para participar das prticas vivenciadas du-rante o curso. E preciso querer se conhecer, aceitar rever seus esque-mas mentais, para que, de fato, haja crescimento humano e profis-sional.

    5. No ser adolescente, nem pessoa imatura, ou pre-conceituosa.

    6. No ser pessoa com sMcoproMe??;# mal resolvida, uma vez

    que lidar com a formao de pessoas para atuarem como mediado-res sociais do sofrimento humano. O curso para formao do tera-

    CAPTULO t

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    peuta comunitrio no para tratar pessoas complicadas. Exigese,portanto, um mnimo de equilbrio emocional.

    7. No ser pessoa que no possa se dedica^ por j estar envolvidacom outras atividades.

    8. Saber que esta formao exige afastarse de sua famlia e desuas atividades, por perodo de quatro dias, em intervalos de dois atrs meses. (O curso ocorre em quatro mdulos, dos quais, dois sode quatro dias e dois, de trs dias).

    9. Conhecer as diversas atividades que seu municpio desenvol-ve, para que a Terapia Comunitria venha dar apoio s outras ativi-dades, e no funcione de forma isolada das outras aes.

    10. Ter disponibilidade de duas horas semanais para realizar asrodas de Terapia Comunitria. Caso a pessoa faa parte de uma ins-tituio, solicitase que, no ato da inscrio, apresente declaraoconfirmando sua liberao para realizar as TC, conform e planejado.Essa providncia evita contratempos e desistncias por falta de con-dies mnimas que compreendem as prticas.

    11. Em locais onde j existe a TC, propor aos candidatos que par-ticipem de, pelo menos, trs rodas de Terapia Comunitria, isso lhespermitir entender melhor a proposta e observar se se identificamcom ela.

    12. Realizar entrevista individual com os candidatos, para me-lhor compreender a sua motivao para a formao proposta, bemcomo analisar se o(s) interessado(s) atende(m) aos critrios exigidos.Entrevistar os candidatos a melhor maneira de garantir a perma-nncia do grupo de formao e evitar altos ndices de desistncia.

    Devem ainda ser escolhidas duas ou trs pessoas por comuni-dade ou instituio, a fim de que seja constituda uma equipe paracoordenar a Terapia Comunitria.

    No exigida nenhuma capacitao anterior. O mais importante que o escolhido deseje adquirir novos conhecimentos que lhe per-mitam fazer melhor o trabalho que j desenvolve na comunidade.

    O escolhido deve estar a servio da dinmica do grupo, e no o

    contrrio: colocar o grupo a servio de sua dinmica individual, deseu projeto pessoal, querer crescer sozinho ou sozinho realizar, em-preender. Esta a diferena entre o terapeuta comunitrio e outraslideranas polticopartidrias e corporativas.

    A Terapia Com unitria Sistmica integrativa Definio, Objetivo s e P ressupostos

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    terapta omurut na

    6. A capacitao

    Depois da seleo, feita com base nos critrios apontados, os es-colhidos devem fazer a formao. Tratase de um curso de capacita-o profissional com 360 h/a, assim distribudas: 80 h/a so dedica-das aos aspectos tericos; 80 h/a, s vivncias teraputicas, quandosero utilizadas tcnicas de relaxamento e autoconhecimento, e 120h/a dedicadas realizao de prticas em Terapia Comunitria, equi-valentes conduo de quarenta e oito terapias como terapeuta oucoterapeuta realizadas em sua comunidade e ou instituio, com 80h/a de interveno.

    Este curso, geralmente, ocorre em quatro mdulos de 40 h/a cada,sendo dois de quatro dias, com intervalo de dois meses, e outrosdois mdulos de trs dias, com intervalo de trs meses. Sugerese

    que, durante os dias de curso, os participantes fiquem em regime deinternato, pois a convivncia com o grupo, nesses dias, fundamen-tal para a formao, sobretudo para consolidar a rede interpessoal.

    Durante toda a formao, os terapeutas comunitrios seroacompanhados, de perto, por uma equipe de formadores reconhe-cidos pela ABRATECOM (www.abratecom.org.br).

    Aps o primeiro mdulo, os participantes j devem iniciar o es-

    tgio prtico em equipes de duas ou trs pessoas. At o segundomdulo, cada equipe dever ter realizado pelo menos dez rodas te-raputicas.

    No final do curso conferido um certificado, desde que o parti-cipante tenha cumprido as exigncias do curso que ocorre, no mxi-mo, dentro de dois anos.

    7. Os terapeutas comunitrios

    7.1. O perfil do terapeuta

    O terapeuta comunitrio uma pessoa que pode proporcionars mes e aos pais de famlia alvio as suas ansiedades, as suas an-gstias, as suas frustraes, aos seus estresses e aos seus sofrimentos,e tambm possibilita partilharem seus recursos e suas descobertas,atravs da troca de experincias na Terapia Comunitria.

    Embora o sofrimento passe pelo corpo, no uma dor s do cor-po. No diz respeito somente Medicina. Tratase da dor de pessoas

    CAPTULO [

    http://www.abratecom.org.br/http://www.abratecom.org.br/
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    4 4 * A&itbtrto Marreto

    humanas que esto vi-vendo um drama, umadificuldade e precisamde apoio e suporte dacomunidade. So mes e

    pais que precisam ser es-cutados e apoiados.

    A essas pessoas soimpostas obrigaes emais obrigaes, desafiose mais desafios e, muitasvezes, no sabem mais o

    que fazer ou para quemapelar. Faltalhes espaode escuta e de apoio. Tanto precisam ser amadas, como precisamcompreender o comportamento de filhos, familiares e vizinhos.

    Antes no existiam as ameaas que existem hoje, a violncia ur-bana e as drogas. Nossas famlias precisam entender esse quadrosocial e as formas como ele altera suas vidas. Como elas podem com-

    preender, seno refletindo e aprofundando suas observaes sobrea realidade?

    Se queremos transformar as comunidades de excludos, fazendocom que se integrem, que descubram seus valores como pessoas, osvalores que a cultura oferece como recursos que foram destrudospelo colonizador e continuam sendo por outras formas de coloni-zao, temos que ajudlas nesta descoberta; temos que ajudlasa verbalizar suas sensaes e suas emoes, transformandoas empensamento transformador. A partir da, os excludos podero sersujeitos da histria e, no mais, meras vtimas e espectadores.

    Tomemos, para melhor compreenso, o exemplo evanglico damultiplicao dos pes:

    Df M, /fSMs, &? /ngo J GnMtw,

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    A Terapia Comunitria Sistmica tntegrativa Definio Objetivos e Pressupostos

    comer. No &s;vf:-/os cow po&'Wawccr NOcaMn?:/;o". Dfsstvf??;-//;(.' os fsc^N/os.' "ON& ^o&'/?;oscoNS^Nr, NNN: &scr^o, pes so/c^N^s para a//wcN^ar ^a/?^a^ n fc?" D:ssf//!fs /csMs; "Q/an os pfs fcM&s?" R*spoN&rn/?;.' "S ^fwos r?

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    4 6 * Ada!berto Barreto

    sina! de necessidade, de carncia e de ajuda. Ele precisa ter a sensi-bilidade bastante aguada, para poder compreender o outro.

    importante que o terapeuta comunitrio tenha aprendido naescola da vida; que saiba amar o prximo, que saiba situar os proble-mas, escutar o outro com pacincia, que no queira se promover ou

    se autoafirmar apoiado na carncia do outro.

    7.2. O papel do terapeuta

    O terapeuta comunitrio deve estar bem consciente dos objeti-vos da terapia e dos limites de sua interveno para no extrapolarsua funo. A funo da Terapia Comunitria no resolver os pro-blemas das pessoas e, sim, suscitar uma dinmica que possibilite apartilha de experincias e criar uma rede de apoio aos que sofrem.

    O terapeuta comunitrio no deve assumir o papel de especia-listas (psiclogo, psiquiatra), fazendo interpretaes ou anlises. Osespecialistas desenvolvem habilidades e sabem lidar com os traumasprofundos, com as doenas. O terapeuta comunitrio vai trabalhar osofrimento das pessoas, estimular a partilha e possibilitar a constru-o de uma rede de apoio.

    O terapeuta deve trabalhar a competncia das pessoas, procu-rando, sempre atravs de perguntas, garu/wr o saber produzidopela vivncia do outro. Deve, pois, resgatar e valorizar o saber pro-duzido pela experincia, pela vivncia de cada um.

    A Terapia Comunitria Sistmica integrativa Definio, Objetivos e Pressupostos

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    O terapeuta no deve colocar suas idias na terapia, mas suscitaridias do prprio grupo, como por exemplo: "Qaem j twenc:'oM a/goparecido e o

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    um, evitando a busca do consenso, pois ele desencadeia a )uta pe!opoder.

    8. A interveno teraputica

    Podemos exemplificar a interveno do terapeuta comunitrio

    da seguinte forma:Em um grupo teraputico, uma me chega e diz que est com in-

    snia. Tem cinco filhos e o marido morreu. O desespero no a deixadormir. Alm disso, tem medo de perder o emprego, nica fonte dealimento para sua famlia. Teme enlouquecer se no voltar a dormir.Pensa: "O

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    Essa msica, ao mesmo tempo que permite s pessoas trabalha-rem o coniedo do sofrimento, (re)significar sua do!) uma vez que aletra traduz o sentimento de quem j passou por aquela situao,permite tambm trabalhar o confinenfe humano, formado simbo-licamente pela corrente de mos dadas. Esta tem sido uma formaexitosa de consolidar o grupo na hora em que as emoes fortes

    emergem das histrias contadas.Quando se canta, tocase o corao, mexese com a sensibilidade,

    criase um movimento, uma energia que circula, digerese a emoo.A msica cria um espao meditativo e permite ao indivduo entrarem contato consigo mesmo, com suas emoes. A msica permite aecloso da emoo subjacente que permeia o grupo ao ouvir a his-tria de dor do outro.

    A corrente criada com as mos dadas, a msica e o movimentode balano criam um movimento solidrio, partilhado, dando con-fiana, apoio e servindo de suporte para eliminar a ansiedade. As-sim, o recarso masicai jaciiiia a construo & com a a idade.

    No podemos esquecer que o ponto de partida da terapia fa-zer um apelo ao saber que cada pessoa tem: a herana dos ndios, aherana dos africanos ou o saber produzido durante sua vida. Nsfazemos apelo a este saber produzido pela vivncia pessoa! e heran-a ancestral.

    O terapeuta, ento, pergunta ao grupo: "Quem & uocs j uivencioa ama sdaao parecida c o /ae jz pare saperZa?" E poder ouvirrespostas, como:

    'Uh, eu j passei por isso, ea s jifei jicar doida, mas ea jyneiboa da minha insnia, omando o saco do capim sano" (e passa

    a dar a receifa de como preparar), oa "O mea caso jbi errirei.Ea sei o

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    E assim vo surgindo do grupo pistas, idias, solues possveis.Uma senhora com insnia chega com uma demanda especfica quer um remdio e sai com vrias possibilidades. A histria delapermite a cada um falar tambm da sua doi; do seu sofrimento esocializar toda a produo de saber elaborado ao longo da vida.

    A senhora que pede remdio ao doutor comportase como a

    maioria dos presentes: vai terapia em busca de um remdio "mate-rial". Como se s o doutor fosse capaz de trazer solues. Na TerapiaComunitria a comunidade quem oferece alternativas de soluese cura. isso no impede que, no final da terapia, as pessoas queprecisam de uma consulta especializada sejam encaminhadas aosespecialistas.

    medida que a terapia avana, vaise aprofundando a situao

    problema trazida. O problema no ser mais visto de forma isolada,mas fazendo parte de um todo. Algum pode alertar:

    "M5s Jorrnmos MM? n a s p o r q u e nos Jn/fn segurana, /Mzdcfrcn...".

    O que fazer ento?

    A comunidade deve se organizar para reivindicar luz eltrica,mais segurana, mais ruas pavimentadas. A Terapia Comunitria,que se orienta pela abordagem sistmica, busca solues a partir doprprio grupo. Portanto, a Terapia Comunitria permite a constru-o de dilogos, no se trata de querer convencer as pessoas, masapenas comunicar, oferecendo a chance de se fazer uma opo e dese construir laos de afetividade entre as pessoas que reforam a tra-

    jetria identitria de seus membros. E preciso, pois, que o terapeuta

    apie o dinamismo interno do grupo, para que este descubra seusvalores, suas potencialidades, e se torne mais autnomo e menosdependente.

    O modelo que ns experimentamos construdo no cruzamentodos caminhos do tradicional e do moderno. Na terapia tradicional(popular), a cura passa pela pertena aos valores culturais. O proces-so de cura no implica prescrever medicamentos, mas, sobretudo,

    estabelecer laos, no necessariamente com o grupo, mas com osvalores de sua prpria cultura. Toda a sociedade humana dispe deseus mecanismos teraputicos.

    A erapia Comunitria Sistmica Integrativa Definio, Objetivos e Pressupostos

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    Terapia Comun itria * 5 1

    Quando falamos em cura, entendemos que o curar passa pelosuscitar o sentimento de adeso e de pertena aos valores culturais.No somos ns, terapeutas, que definimos o que cura, e, sim, oindivduo integrado no seu tecido cultural e social. A cura recobretantas realidades, quantas sociedades, culturas e subculturas.

    O terapeuta o catalisador que acelera, modera e orquestra otrabalho teraputico do grupo. Sua funo teraputica compreende,apenas, suscitar questionamentos, provocar discusses, trazer ele-mentos clarificadores, para que o grupo desenvolva a sua vocaoteraputica.

    Tratase, sobretudo, de uma terapia com vocao preventiva quepermite ao homem da favela enfrentar a nova realidade que o ame-

    aa, uma terapia que o leva a no se alienar de sua prpria cultura eperderse de sua prpria identidade; que o ajuda a sentirse membrode uma comunidade que tenha reconhecido o seu jeito de existir.

    A Terapia Comunitria muito mais centralizada nos "laos" doque nos "espaos". Lao , sobretudo, a relao estvel e dinmicacom a terra, a religio, os sistemas simblicos e os vizinhos. Com amigrao, os favelados perdem suas razes, perdem seus laos e suasreferncias identitrias. Com a noo de laos, definese uma outraviso do sofrimento e do processo teraputico. A Terapia favorece

    C A P T U L O )

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    5 2 * Adaiberto Barreto

    uma tomada de conscincia das implicaes humanas, na gnesedas crises e conflitos, para que a prpria comunidade possa sentirseimplicada e copartcipe dos acontecimentos.

    Na Terapia Comunitria no existe a diferena provocada petaverticalidade de uma instituio teraputica entre pacientes e tera-

    peutas, mas, sim, uma horizontalidade. Assim, o poder fica diludoe circulante, pois ningum paga a ningum e no se marca con-sulta.

    Na Terapia Comunitria ocorre uma partilha de experincias devida e saberes de forma horizontal e circular. Cada um tornase tera-peuta de si mesmo, a partir da escuta das histrias de vida. Todos socoresponsveis na busca de solues e superao dos desafios do

    cotidiano em um ambiente caloroso. A comunidade tornase espaode acolhimento e cuidado, sempre atenta s regras: fazer silncio,no dar conselhos, no julgar, falar de si, propor msicas, poemasou histrias apropriadas.

    Essa proposta teraputica busca intervir no sentido de criar con-dies para transformar um grupo humano impessoal em uma co-munidade dinmica, solidria, onde o indivduo no sofra apenas

    as injunes punitivas ou discriminativas do grupo, mas que receba,tambm, seu apoio, seu suporte e sua fora. Busca, ainda, aumentaro grau de coeso do grupo, para que ele sirva de escudo, de apoioemocional, e permita, tambm, avaliar, com os ps no cho, as proje-es e introjees de cada um. O grupo teraputico permite, a cadaum, reconstruir uma nova identidade, sem perder a soluo de con-tinuidade de sua histria. Ele passa a ser visto como uma pessoa,

    participando de uma comunidade, que se interessa e se preocupaconsigo. Dessa forma, a comunidade passa a servir de escudo contraas ameaas fragmentrias da nova sociedade.

    9. A importncia da diversidade

    bom que o terapeuta comunitrio no somente tenha viso sis-tmica da sociedade, como tambm a noo de que para ser bem

    sucedido no seu trabalho precisa entender que a diversidade outroelemento importante. Ele deve a SER t/crenffno J;'zcr ser tfoenff e poder afirmar que, na cultura, no existehigjrarquia, pois todo indivduo tem seu lugar e sua contribuio, eque no existe um centro do saber o saber de tal ou qual pas por

    A Tbrapia Comunitria Sistmica Integrativa Definio Objetivos e Pressupostos

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    A Tbrapia Comunitria Sistmica Integrativa Definio Objetivos e Pressupostos

    exemplo, o saber dos Estados Unidos, o saber da Europa uma vezque toda cultura, todas as pessoas tm sua forma de conhecei) fazere celebrar.

    O terapeuta comuni-trio precisa entender quenem toda cultura, nem todo

    saber tm sido valorizadoscomo deveriam. Ele s serum bom terapeuta se conse-guir lidar com a diferena,sem querer "colonizla". Epreciso admitir que a rique-za est na diferena. G?&M?Mc r;'co HHyM/o o oM?roc po?7re.

    A Terapia Comunitria, nessa perspectiva, injeta pensamentospositivos sobre a pessoa e sobre a sua relao com o mundo, revita-lizando sua capacidade de reao e mobilizao das energias vitais,em funo de uma transformao integral (fsica, mental, emocio-nal, espiritual e social), nos aspectos pessoal e social.

    A Ecologia do Esprito permite entender as diversas expresses

    da cultura brasileira, com sua diversidade de crenas e religies. Apessoa pode ser catlica, umbandista, ateu, esprita, curandeira, noimporta. A ela no deve ser imposta nenhuma hierarquia nessa di-versidade, nenhuma excluso. Da porque o terapeuta comunitrioprecisa ser uma pessoa aberta. O prprio nome j est dizendo: erapenf cof7?M?HMno, uma pessoa aberta para a comunidade, para aco-lher as diferenas, como valores dignos de serem levados em consi-derao. Faz parte do crescimento aprender a ver a pessoa humanacomo filho de Deus, como irmo, e no de acordo com uma religio,uma raa, cor ou classe social.

    Tudo isso s ser possvel se o terapeuta tiver f na comunidade,acreditar na comunidade como um sistema, com possibilidades pr-prias de superao e de resoluo dos problemas.

    A conduta do terapeuta deve seguir uma tica que se baseiano respeito ao outro e na importncia de uma escuta que permi-

    te ao outro explicitar suas motivaes profundas, suas dvidas everdades.

    C A P T U L O !

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    A condio de dirigente da terapia o impede de "fazer mdia" oude condenar atitudes contrrias aos seus valores pessoais. O conhe-cimento de que ele dispe deve estar a servio do crescimento dogrupo, e no em benefcio de um poder pessoal. importante quefique claro que o que nos une na terapia o forte desejo de, juntos,

    buscarmos solues para nossos problemas, consolidarmos os vn-culos interpessoais, resgatarmos a capacidade teraputica do grupoe mobilizlo na construo da cidadania.

    10. O reconhecimento do vator de cada participante

    Na Terapia Comunitria, em que se fazem presentes vrios indi-vduos, o cimento da relao grupai a socializao da informao.

    O indivduo que se expe, quando fala de seu sofrimento, revelasuas fantasias e expressa suas emoes, ao mesmo tempo em quese libera daquilo que o oprime. Este indivduo permite ao gruporefletir sobre as razes do sofrimento humano e esboar soluesprticas, curativas e preventivas. Da porque toda terapia deve, nafase de concluso, fazer a conotao positiva, ou seja, agradecer acontribuio do indivduo que se exps, ao falar de seu sofrimento.

    E preciso entender que nas comunidades de baixo poder aquisi-tivo difcil guardar segredo sobre o que acontece no diaadia deuma famlia e de uma comunidade. , exatamente, quando a infor-mao escamoteada, maquiada, negada, escondida que ela vira fo-foca e passa a ser fonte de sofrimento para as pessoas. A informao,nas mos de algumas pessoas, usada para dominar, impor, dene-grir e destruir famlias, alimentar intrigas e dificultar o crescimento

    coletivo.Quando uma pessoa decide falar de seu sofrimento, de suas an-

    gstias, no expressa apenas uma queixa ou informao verbal. Elacomunica, atravs de suas lgrimas, de sua voz embargada, de seusilncio, o sofrimento que a aniquila, a fragilidade que a habita, otemor que a domina.

    Por sua vez, o grupo que a escuta termina por fazer eco do que

    ouviu. Aqueles que se identificam podem, enfim, falar daquilo queos habitava em silncio. A escuta suscita o desejo de solidariedade,desperta a compaixo e, assim, esboamse os primeiros passos daconstruo de uma comunidade solidria. A partir daquele momen-to, o indivduo no se sente s. J tem com quem compartilhar. Com

    A C S f Ob

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    A t i C it i Si t i i t ti D fi i Ob j ti P t

    a conotao positiva no fina!, o terapeuta valoriza a pessoa e suainterveno e permite situar o que foi falado, dentro de uma leituravalorizadora daquele que se expressou.

    aconselhvel que, j no acolhimento, o terapeuta possa lembrarao grupo que a terapia um espao para se falar de preocupaescotidianas e de tudo aquilo que pode ser discutido em grupo. Pode

    lembrar que ningum ali est interessado em grandes segredos, ain-da que todos os tenham. Uma pessoa que no tem segredo umapessoa desinteressante, pobre.

    Em vinte e um anos de nossa experincia, nunca um tema discu-tido virou fofoca. Ao contrrio, no momento em que verbalizadofaz desaparecer o clima de desconfiana e intriga que reinava quan-do esta informao era veiculada, sob a lei do segredo e em clima dedesarmonia.

    evidente que existem pessoas que preferem falar de seus pro-blemas na segurana de uma relao a dois. Nesses casos, acon-selhvel encaminhlas a um psiclogo ou psicoterapeuta e pedirpara falar ao grupo apenas aquilo que pode ser falado, sem riscos econstrangimentos.

    11. As abordagens teraputicas

    Nossa conduta determinada por nossa percepo. a nossapercepo de mundo que define nossa conduta, justifica nossas ati-tudes e determina uma poltica de ao.

    Identificamos, pelo menos, duas grandes linhas de ao, doisgrandes modelos vigentes que norteiam as aes dos cuidadores:

    C A P T U L O )

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    Modelo do "salvador da ptria" X Modelo co-participativo

    I) O modelo do salvador da ptria'Este modelo privilegia as carncias e baseiase num s aspecto da

    tradio crist, que adverte:

    "E Deus &sco&vfo /Mo e Et a /;a:'aw/ prorao do/rt/o pro&o os eA*pM/soMdo paraso."

    fG/!. 3,24)

    Todo o mundo ocidental est impregnado dessa viso que privi-legia o que no funciona, o negativo, as falhas e os erros. Um exem-plo marcante a educao dos nossos filhos. Quando a criana agecorretamente, ns, raramente, elogiamos. Mas basta que ela faaalgo errado para logo ns a repreendermos. Outro exemplo so ospronturios dos mdicos e dos psiclogos que contm toda uma in-

    formao minuciosa do que est errado e do que no funciona equase nunca assinalam o potencial pessoal e familiar do paciente.

    Ainda sofremos influncia da herana judaicocrist que temmarcado, profundamente, o nosso inconsciente, fonte de sensaese sentimentos, pela separao original e pela expulso do parasoceleste. A humanidade e o indivduo tomam conscincia de sua exis-tncia pelo pecado e pela punio.

    O Cristo ressuscitado e glorificado do Novo Testamento, que ce-lebra a vitria da vida sobre o pecado e a morte, muitas vezes, eclipsado pelo Deus do Antigo Testamento.

    A terapia Comunitria Sistmica !ntegrativa Definio, Objetivos e Pressupostos

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    terapia Comunitria * 5 7

    Nesse sentido, temos que ter o cuidado, na Terapia Comunit-ria, de no explorarmos os aspectos negativos, campo reservado aosespecialistas. A valorizao de tais aspectos desperta no indivduoum sentimento de incapacidade, de culpabilidade e de grande in-segurana.

    Uma vez inseguro e culpabilizado, o indivduo tende a buscarapoio e salvao em um indivduo considerado especialista, ilumi-nado e poderoso o suficiente para libertlo daquele sentimento ne-gativo, esquece que ele porta em si suas solues.

    Na Terapia Comunitria, precisamos romper com esse modeloque valoriza o negativo, a falha, o pecado, pois ele nutre o "salva-dor da ptria". Ele gera dependncia, uma vez que o indivduo est

    sempre procura de um iluminado, de um "guru", de um doutorenfim, de um "salvador da ptria" para resolver seu problema.

    Muitas pessoas, no intuito de se identificarem com Cristo, que-rem imitlo, acreditam ser o Salvador da humanidade. Esse sacri-fcio j foi feito por Ele. Ele morreu para nos dar a vida, e vida emabundncia. Se desejarmos imitar Jesus Cristo, o faamos sendo so-lidrios, caridosos, amorosos, disponveis e companheiros.

    As conseqncias desse tipo de conduta, que privilegia a atenono que vai mal, so verdadeiros entraves ao crescimento e autono-mia humana e comunitria. Desencadeiam uma tendncia de cadaum querer ser o "Salvador" do outro, e ento comeam os conse-lhos, os sermes, os discursos, em que cada um quer mudar o outro:esposa quer que o marido mude; pais querem que os filhos mudem.H sempre um querendo mudar o outro, embora saibamos que nin-gum muda ningum.

    Nessa perspectiva, h uma concentrao da informao na mode uma pessoa considerada iluminada, sbia, e a gerao de umailuso que se estabelece na dominao. Por isso, esse tipo de abor-dagem tende a fazer exortaes, agindo como se de fato detivesse asrespostas e as solues para os problemas dos indivduos. A pessoaque age segundo essa perspectiva termina por viver uma iluso acreditar que, de fato, ela tem o poder de comandar os outros.

    O mais dramtico dessa viso negativista que a soluo vistacomo vinda de fora, de longe, e centrada no unitrio, deixandoindivduos, famlias e comunidades na dependncia total de outros

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    5 8 * Adaiberto Barreto

    indivduos polticos, religiosos, cientistas na tentativa de superarseus problemas e dificuldades. Se as respostas para nossos proble-mas dependem de algum, o que o indivduo, sua famlia e a comu-nidade podem fazer? Ser sempre objeto, e, jamais, sujeito de sua

    histria.H) O modelo coparticipativo da terapia comunitria

    Esse modelo se apia na competncia das pessoas. Quem temproblemas tem, tambm, solues. O fato de estarmos todos vivos etermos superado as dificuldades, ao longo da vida, nos mostra quetemos uma grande bagagem de experincias e sabedoria.

    Cada pessoa tem uma experincia de vida e deve ser suscitadaa ser coresponsvel diante do sofrimento do outro. No como um"salvador da ptria", dando conselhos e fazendo exortaes, maspartilhando sua doi) suas dificuldades, suas descobertas, de formasimples, abrindo seu corao, sendo solidrio aos apelos dos ou-tros.

    Nesse tipo de abordagem, sabido que se algum vive hoje umadepresso, outra pessoa j pode ter passado por situao semelhantee convivido com esse mesmo tipo de sofrimento, e, assim, pode falarde suas dificuldades e, sobretudo, de como as superou. Ou ainda, sealgum nunca viveu algo parecido, pode informarse e prevenirse,caso algum dia, conviva com este problema.

    Ao agir dessa forma, promovese uma circulao da informao,pois cada pessoa sempre tem algo a dizer sobre o problema debati-do, como o superou, quais as descobertas que fez. Na Terapia Co-

    munitria, cada pessoa chamada a participai) falando da sua ex-perincia, sem querer colocarse como "salvador", sem querer ser"doutorsabetudo".

    Permitindo que as informaes circulem, a Terapia Comunitriarompe com o modelo que privilegia a informao concentrada numnico indivduo, portador de solues, pois reconhece as competn-cias individuais, evidenciando que se o grupo tem problemas, tem,

    tambm, suas prprias solues. Nesse caso, o terapeuta comunit-rio tem apenas a funo de suscitar essa capacidade teraputica queemerge do prprio grupo.

    * Em nossa experincia de cerca de vinte e um anos, temos teste-munhado o surgimento de autosolues e autoinovaes. Nesse

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    Terapia Comunitria * 5 9

    sentido, a Terapia Comunitria tornase um espao privilegiado parase resgatar e partilhar o conhecimento e a sabedoria produzidos aolongo de uma vida de sofrimentos e vitrias.

    Valorizando as experincias individuais, estamos reconhecendoa contribuio de cada pessoa e reforando a autoestima dos que

    partilham suas competncias. A conscincia que se tem de que cadaum parte do problema e parte da soluo.

    Mudando o olhar

    DH * PARA

    SALVADOR DA PTRIA -* SOLUES PARTICIPATIVAS

    CARNCIAS/DEFICINCIAS -+ COMPETNCIAS/POTENCIAIS

    UNITRIO (TCNICO) + COMUNITRIO

    CONCENTRAO NA

    INFORMAO* CIRCULAO DA INFORMAO

    O OUTRO UM OBJETO

    PASSIVO+ O OUTRO UM PARCEIRO ATIVO

    A SOLUO VEM DE FORA * AS SOLUES VM DAS FAMLIAS

    GERA DEPENDNCIA * SUSCITA CO-RESPONSABILIDADE

    DESCRENA NO OUTRO -+CRENA NA CAPACIDADE DOOUTRO

    CLIENTELISMO + CIDADANIA

    ( A P n H n )

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    6 0 * Ada!berto Barreto

    SNTESE

    TERAPIA COMUNITRIA:

    Entre nesta roda

    A TC um instrumento que nos permite construir redes sociaissolidrias de promoo da vida e mobilizar os recursos e as compe-tncias dos indivduos, das famlias e das comunidades. Procurasesuscitar a dimenso teraputica do prprio grupo valorizando a he-rana cu!tura! dos nossos antepassados indgenas, africanos, orien-tais e europeus, bem como o saber produzido pe!a experincia de

    vida de cada um.E essa diversidade cultural que faz a grandeza deste pas. Possi-bilitar a cada um agregar novos va!ores uma riqueza inestimvelno processo de empoderamento e na construo da cidadania.

    Enquanto muitos modelos centram suas atenes na patologia,nas relaes individuais, privadas, a TC nos convida a uma mudan-a de olhar, de enfoque, sem querer desqualificar as contribuies deoutras abordagens, mas ampliar seu ngulo de ao. Vejamos:

    1. Ir alm do unitrio para atingir o comunitrio.

    Com a globalizao, se avolumaram os desafios: drogas, estresse,violncia, conflitos e insegurana. A superao desses problemas jno pode mais ser obra exclusiva de um indivduo, de um especia-lista, de um lder e, sim, de uma coletividade. A prpria comunida-de que tem problemas, dispe tambm de solues e, por conseq-

    ncia, tornase instncia teraputica no tratamento e preveno deseus males.

    A Terapia Cumunitiha Sistemua integrativa iMinisAo, Objetivos e Preshuposttts

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    2. Sair da dependncia para a autonomia e a co-responsabili-dade.

    Modelos que geram dependncia so entraves a todo desenvolvimento pessoa) e comunitrio. Estimular a autonomia uma formade estimu!ar o crescimento pessoa! e o desenvolvimento familiar ecomunitrio. A conscincia de que as solues para os problemasprovm da prpria comunidade refora a autoconfiana.

    3. Ver alm da carncia para ressaltar a competncia.

    O sofrimento vivenciado uma grande fonte geradora de com-petncia que precisa ser valorizado e resgatado no seio da prpriacomunidade, como uma forma de reconhecer o saber construdopela vida. Poder mobilizlo no sentido da promoo de vnculos

    solidrios uma forma de consolidar a rede de apoio aos que vivemem situaes de conflitos e sofrimento psquico.

    4. Sair da verticalidade das relaes para a horizontalidade.

    Essa circularidade deve permitir acolher, reconhecer e dar o su-porte necessrio a quem vive situaes de sofrimento. Isso propor-ciona maior humanizao nas relaes.

    5. Da descrena na capacidade do outro, passar a acreditar nopotencial de cada um.

    Aprender coletivamente gera uma dinmica de incluso e empoderamento. Precisamos deixar de apenas pedir a adeso do outro snossas propostas, para podermos estar a servio das competnciasdos outros, sem negarmos a contribuio da cincia.

    6. Ir alm do privado para o pblico.

    A reflexo dos problemas sociais que atingem os indivduos saido campo privado para a partilha pblica, coletiva, comunitria. Anfase no trabalho de grupo, para que juntos partilhem problemase solues e possam funcionar como escudo protetor para os maisvulnerveis, sendo instrumentos de agregaes e insero social.Ns afirmamos que a soluo est no coletivo e em suas interaes,no compartilhar, nas identificaes com o outro, no respeito s di-

    ferenas. Os profissionais devem ser parte desta construo. Ambosse beneficiam a comunidade gerando autonomia e insero social eos profissionais se curando do "autismo institucional e profissional",bem como de sua alienao universitria.

    C AP TULO )

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    7. Romper com o clientesmo para chegarmos cidadania.

    O indivduo deixa de ser objeto passivo de interveno para setornar um parceiro ativo e sujeito de sua histria.

    8. Romper com o modelo que concentra informao para faz-lacircular.

    Resgatar o capital sciocultural do grupo e tornlo coautor dasdecises e das polticas pblicas.

    A Terapia Comunitria Sistmica integrativa Definido, Objetivos e Pressupostos