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7_perfil biográfico de Zeca Afonso F 17 - abril 10

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enviar os dois filhos para Moçambique, para junto dos uns tios maternos em Aveiro, pois o pai é colocado em Em 1963 termina o curso e até 1964 mantém-se a Regra. Em Moçambique nasce a sua filha Joana (1965). Marques (Moçambique), onde a família vive entretanto, digressões da Tuna e do Orfeão Académico. Em Maio de casa da tia Avrilete, uma viúva e beata que, segundo o acentuam-se. Entre 1955 e 1958, inicia uma vida errante Conhece ainda Zélia, sua segunda mulher, de quem terá

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Biografia

José Manuel Cerqueira Afonso dos Santos

(Aveiro, 2 de Agosto de 1929 – Setúbal, 23 de Fevereiro de

1987), ou simplesmente Zeca Afonso, é uma figura ímpar

da canção popular portuguesa. Poeta, cantor-trovador e

andarilho tornou-se, quer pela força mobilizadora das suas

canções corporizadas numa voz límpida e poderosamente

modulada, quer pela sua espontaneidade livre e

revolucionária, num dos símbolos da resistência contra a

ditadura salazarista entre as décadas de 50 e 70.

Durante os três primeiros anos de vida, vive com

uns tios maternos em Aveiro, pois o pai é colocado em

Silva Porto (Angola) como delegado do Procurador da

República. Em 1933, parte para Angola para se juntar à

família e aí permanece até 1937, recebendo da mãe,

professora primária, a primeira instrução. Após um breve

retorno a Aveiro, volta a partir, desta vez para Lourenço

Marques (Moçambique), onde a família vive entretanto,

devido a nova transferência do pai. Em 1939, ele e o irmão

regressam a Portugal, enquanto os pais e a irmã partem

para Timor. Desta vez, ficará em Belmonte, a cargo do tio

paterno, Filomeno dos Santos, para terminar a instrução

primária. Em 1940, faz exame de admissão ao Liceu D.

João III, em Coimbra, passando a residir com o irmão, em

casa da tia Avrilete, uma viúva e beata que, segundo o

irmão, “fosse como fosse, queria mandar o rapaz para o

céu”. Experimenta então um ambiente e uma educação

moldados pelo conservadorismo católico, onde a única

vantagem foram os conhecimentos melómanos do tio

Filomeno que terão influenciado e educado o gosto e o

ouvido de José Afonso. No liceu, José Afonso não é bem

visto pelos professores que imita e ridiculariza. Também as

notas não são brilhantes e aos 17 anos, numa carta à irmã,

em vésperas dos exames do 6º ano, descreve-se pouco

esperançado devido à sua “memória de galinha” e

“inteligência de paquiderme”. É por essa altura que

começa a cantar o fado coimbrão.

Em 1949, matricula-se em Histórico-Filosóficas,

na Universidade de Coimbra, onde conciliará os estudos e

a vida boémia do fado. Assim se começa a relacionar com

cantores e guitarristas ligados ao fado coimbrão e a cantar

em festas de aniversário e baptizado com amigos. Em

1950, casa com Mª Amália Oliveira, uma jovem costureira

de 18 anos, com quem viveu até 1955 e de quem teve dois

filhos, José Manuel e Helena. Para sustentar a família, dá

explicações a alunos do liceu e trabalha como revisor para

o Diário de Coimbra. Em 1953, grava os primeiros discos,

ambos intitulados Fados de Coimbra, acompanhado por

famosos guitarristas como, António Brojo e António

Portugal. Ainda em 1953 é chamado para cumprir o serviço

militar obrigatório em Mafra. A crise conjugal e as

dificuldades económicas para sustentar a família

acentuam-se. Entre 1955 e 1958, inicia uma vida errante

de professor em Mangualde, Aljustrel, Lagos, acabando

por ser colocado em Faro.

No Algarve, sua “pátria adoptiva”, já separado de

Mª Amália e com dificuldades económicas (o que o leva a

enviar os dois filhos para Moçambique, para junto dos

avós), iniciará um processo de consciencialização política,

seguindo de perto a candidatura de Humberto Delgado, em

1958. Rompe com a tradição de Coimbra, editando os LPs

Balada de Outono, Coimbra e Baladas de Coimbra.

Conhece ainda Zélia, sua segunda mulher, de quem terá

mais dois filhos, Joana e Pedro, e que o acompanhará até

ao fim da vida. Entre 1961-62, segue de perto a crise

estudantil universitária e realiza várias digressões pela

Europa.

Em 1963 termina o curso e até 1964 mantém-se

ligado à vida académica coimbrã, participando em várias

digressões da Tuna e do Orfeão Académico. Em Maio de

1964, José Afonso actua na Sociedade Musical

Fraternidade Operária Grandolense, onde se inspira para

fazer a canção «Grândola, Vila Morena» que viria a ser, no

dia 25 de Abril de 1974, a senha do Movimento das Forças

Armadas (MFA) para o derrube do regime ditatorial. Entre

1964-1967, vive com Zélia em Moçambique, onde

reencontra os seus dois filhos. Nos últimos dois anos, dá

aulas na Beira. Aqui musicou Brecht na peça A Excepção e

a Regra. Em Moçambique nasce a sua filha Joana (1965).

Em 1967 regressa a Lisboa esgotado pelo sistema

colonial. Deixa o filho mais velho, José Manuel, confiado

aos avós em Moçambique. Colocado como professor em

Setúbal, sofre uma grave crise de saúde que o leva a ser

internado durante 20 dias na Casa de Saúde de Belas.

Quando sai da clínica, tinha sido expulso do ensino oficial.

É publicado o livro Cantares de José Afonso, pela Nova

Realidade. O PCP convida-o a aderir ao partido, mas José

Afonso recusa invocando a sua condição de classe.

Dedica-se então a dar explicações e a cantar com mais

assiduidade nas colectividades da Margem Sul, onde é

nítida a influência do PCP. Pelo Natal de 68, edita o álbum

Cantares do Andarilho. Em 1969, com a Primavera

marcelista, José Afonso participa activamente no

movimento sindical e nas acções estudantis em Coimbra.

Edita o álbum Contos Velhos Rumos Novos e o single

«Menina dos Olhos Tristes» que contém a canção popular

«Canta Camarada». Recebe o prémio da Casa da

Imprensa para o melhor disco, distinção que repete em

1970 e 1971. Pela primeira vez num disco de José Afonso,

aparecem outros instrumentos que não a viola ou a

guitarra. Nasce o seu quarto filho, Pedro.

Em 1970 é editado o álbum Traz Outro Amigo

Também, gravado em Londres, nos estúdios da Pye, o

primeiro sem Rui Pato, impedido pela PIDE de viajar.

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Participa, em Cuba, num Festival Internacional de Música

Popular. Pelo Natal de 1971, é lançado o álbum Cantigas

do Maio, sob a direcção musical de José Mário Branco,

nos estúdios de Herouville, um dos mais caros e afamados

da Europa, que é geralmente considerado o melhor disco

de José Afonso. No ano de 1972, o álbum chama-se Eu

Vou Ser Como a Toupeira, gravado em Madrid, com a

participação de Benedicto, um cantor galego amigo de

Zeca. Em 1973, José Afonso continua a sua

«peregrinação», cantando um pouco em todo o lado.

Muitas sessões foram proibidas pela PIDE/DGS. Em Abril é

preso e fica 20 dias em Caxias até finais de Maio. Na

prisão política, escreve o poema «Era Um Redondo

Vocábulo». Pelo Natal, publica o álbum Venham Mais

Cinco, gravado em Paris, em que José Mário Branco volta

a colaborar musicalmente. A 29 de Março de 1974, o

Coliseu, em Lisboa, enche-se para ouvir José Afonso,

Adriano Correia de Oliveira, José Jorge Letria, Manuel

Freire, José Barata Moura, Fernando Tordo e outros, que

terminam a sessão com «Grândola, Vila Morena». Militares

do MFA estão entre a assistência e escolhem «Grândola»

para senha da Revolução. Um mês depois dá-se o 25 de

Abril. De 1974 a 1975 envolve-se directamente nos

movimentos populares. O PREC (Processo Revolucionário

em Curso) é a sua paixão. Estabelece uma colaboração

estreita com o movimento revolucionário LUAR, através do

seu amigo Camilo Mortágua, dirigente da organização. Em

1976, apoia a candidatura presidencial de Otelo Saraiva de

Carvalho e publica o álbum Com as Minhas

Tamanquinhas. O álbum Enquanto Há Força, (1978) de

novo com Fausto, reflecte as suas preocupações anti-

colonistas e a sua crítica mordaz à Igreja. Em 1979, é

editado o álbum Fura Fura, com a colaboração musical de

Júlio Pereira e dos Trovante.

Em 1981, após dois anos de silêncio, regressa a

Coimbra com o seu álbum Fados de Coimbra e Outras

Canções. Trata-se da mais bela versão do fado de

Coimbra, interpretada por Zeca Afonso em homenagem a

seu pai e a Edmundo Bettencourt, a quem o disco é

dedicado. Actua em Paris, no Théatre de la Ville.

Em 1982 começam a conhecer-se os primeiros sintomas

da doença do cantor, uma esclerose lateral amiotrófica.

Trata-se, aparentemente, de um vírus instalado na espinal

medula que, de uma forma progressiva, destrói o tecido

muscular e, normalmente, conduz à morte por asfixia. Em

29 de Janeiro de 1983, realiza-se o espectáculo no Coliseu

com José Afonso já em dificuldades. Nesse mesmo ano é

reintegrado no ensino oficial, tendo sido destacado para

dar aulas de História e de Português na Escola

Preparatória de Azeitão, cidade onde reside. A doença,

agrava-se.

Em 1985 é editado o último álbum, Galinhas do

Mato. José Afonso já não consegue cantar todos os temas,

sendo substituído por Luís Represas («Agora»), Helena

Vieira («Tu Gitana»), Janita Salomé («Moda do Entrudo»,

«Tarkovsky» e «Alegria da Criação»), José Mário Branco

(«Década de Salomé»), em dueto com Zeca, Né Ladeiras

(«Benditos») e Catarina e Marta Salomé («Galinhas do

Mato»). Arranjos musicais de Júlio Pereira e Fausto.

Em 1986 apoia a candidatura presidencial de Maria

de Lourdes Pintassilgo, católica progressista.

José Afonso morreu no dia 23 de Fevereiro de

1987, no Hospital de Setúbal, às 3 horas da madrugada,

vítima da doença, diagnosticada em 1982. O funeral

realizou-se no dia seguinte, com mais de 30 mil pessoas,

da Escola Secundária de S. Julião para o cemitério da

Senhora da Piedade, em Setúbal.

[F 17 – Abril de 2010]

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