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306 I:-JTI{üD]'ÇAü A SUUOI.()(;IA Capitulo 22 A mudança social 307 QUADRO 22.2 22.4.5 Fatores políticos Uma mudança governamental. com a eleição de uma liderança carisrnática, um golpe militar, ou outras alterações que podem ocorrer no sistema político podem provocar mu- danças significativas na estrutura social. Em janeiro de 1933. Adolf Hitler tornou-se ch.mceler da Alemanha e instituiu um regime extremamente cruel responsável pelo genocídio de milhões de pessoas. Após seis anos no poder deflagrou a Segunda Guerra Mundial, que começou em 1939. Sob suas ordens. 6 mi- lhões de judeus foram exterminados de várias formas - fuzilados. em câmaras de gás ou por trabalhos forçados. Hitler também exterminou um número aproximado a esse de ciga- nos. homossexuais. socialistas. comunistas. eslavos e outros considerados indesejáveis ou de raça inferior. No final, foram 17 milhões de combatentes de guerra e 60 milhões de civis mortos. vel rapidez. Estimativas indicam que em 1500 já circulava pela Europa meio milhão de li- vros. A imprensa de Gutenberg contribuiu para acelerar o Renascimento, para o surgirnento do protestantismo, e para as revoluções políticas e industriais dos séculos seguintes. A leitu- ra - que, anteriormente, era exclusividade de pequenas elites de nobres e sacerdotes - passou a atingir um número impressionante de pessoas. graças à diminuição do custo dos livros, popularizando o saber No momento atual, profundas mudanças S~IOmotivadas pelo avanço da recnologia da infor- mação, como o demonstra o Quadro 22.2. o setor de tecnologia da informação (TI) é o segmento que mais cresce na economia indiana, tanto em números de produção quanto de exportação. Mas o boom que, nos últimos dez anos, cravou o país definitivamente no mapa da tecnologia eletrônica mundial criou um paradoxo: enquanto cidades como Bangalore, no Sul, experimentam um desenvolvimento acelerado e a criação de milhares de empregos, a maior parte do país segue imersa na pobreza. Para alguns estudiosos, o surto tecnológico s6 ampliou as diferenças sociais. O governo diz estar tomando todas as providências para tornar a índia uma "superpotência tec- nológica global" e fez dessa bandeira uma de suas prioridades. "Enquanto a educação e os negócios por meio da TI se expandiram enormemente, a educação primária para as massas pobres ainda é precária em termos de qualidade e oferta", diz o professor de ciência política Manoranjan Mohanty, da Universidade de Déli. "Isso também vale para a saúde nas zonas rurais e tribais e nas favelas em grandes cidades." Saúde e educação, segundo os especialistas, são os dois tópicos mais relegados no país. "O boom de TI e o baixo desempenho em desenvolvimento humano são, em alguns casos, dois lados da mesma moeda", afirma Nagaraj, lembrando que, enquanto o PIB per capita no país dobrou nos últimos 20 anos, o investimento em educação e saúde teve um aumento discreto. "Para cada dólar gasto em educação primária, três são gastos em educação de terceiro grau." Mohanty concorda com a relação. "Os obstáculos vêm da estratégia de desepvolvlrnento, que, nos últimos anos, retirou incentivos de áreas básicas e não adequou a infra-estrutura de desenvolvi- mento nas regiôes pobres." Como é de praxe em momentos de grande transformação econômica, a índia assiste, com o boom da indústria de TI, ao nascimento de um novo grupo de milionários - algo especialmente impactante em um país em que a divisão da sociedade em castas ainda vigora. "Este novo grupo é pequeno, mas deve, no longo prazo, se tornar mais influente", diz o professor Geoff Walsham, da Universidade de Cambridge (Reino Unido), citando a dificuldade da estrutura po- lítica indiana em absorver mudanças como a razão para a demora da nova elite em adquirir maior poder. "Há uma nova classe empreendedora, de espírito competitivo e perfi Iglobal, pronta a transpor as fronteiras culturais do país", acrescenta R. Nagaraj, do Instituto Indira Gandhi de Pesquisa para o Desenvolvimento. Mas a professora Sunanda Sen, da Academia de Estudos do Terceiro Mundo da Universidade Jamia Milia, vê o impacto desse novo grupo na sociedade como pouco relevante: "A reação da so- ciedade vai da curiosidade à apatia". A limitação do poder e mesmo do tamanho do grupo também guarda relação com o fato de mui- tos desses novos milionários e novos talentos acabarem deixando o país - a maior parte dos quais rumo aos EUA, que hoje domina 70% do mercado mundial de TI. "Não há muitas medidas para reduzir a fuga de cérebros nem estímulo para manter essas pessoas no país. Mas a índia acabou se beneficiando", diz Nagaraj. A contramão do fenômeno é que o boom de TI começou exatamente com indianos que, após vi· verem no exterior, retornaram ao país com uma forte rede de contatos, promovendo o investimento. Fonte: COELHO, Luciana. 'Boom tecnológico amplia abismo social na índia'. Jornal Folha de S.Paulo, 21 set. 2003, p. A-27. 22.4.6 Fatores relacionados à saúde Grandes epidemias provocaram mudanças substanciais no desenvolvimento de muitas sociedades, alterando hábitos e costumes das populações atingidas e até mesmo o rumo dos ,Icontecimêntos. A Peste Negra, também chamada peste bubônica, chegou à Europa transmitida por pul- gas de ratos que vinham em navios da Ásia e foi a responsável por eliminar um terço da população da Europa na metade do século XIV. A força de trabalho européia foi destruída, metade elo clero na Alemanha e na Inglaterra morreu. Como não se tinha idéia de onde ela vinha, a doença foi considerada uma punição de Deus aos pecadores. Quando padres tam- bém caíram doentes, o controle da Igreja Católica ficou enfraquecido, e abriu-se uma opor- tunidade para o surgimenro do protestantismo. Os médicos, por sua vez, abandonaram os dogmas e começaram a dissecar os corpos humanos em busca de uma explicação, levando ao aperfeiçoamento do método científico. As pessoas começaram a ver o mundo de modo diferente após a peste, e o caminho para novas descobertas foi aberto. 22.5. TEORIAS DA MUDANÇA SOCIAL Numerosas foram as teorias de mudança social propostas ao longo da história. Para o nosso estudo, porém, citaremos aquelas que, a nosso ver, tiveram maior repercussão nos meios científicos e na sociedade de modo geral e que foram expostas em parte por Botto- more 0978, p. 268-273). A seguir, elas são expostas de forma bastante sucinta. 22.5.1 A teoria de Comte o teórico francês, que criou a palavra sociologia e o pOSltlVISmO, explica a mudança social como o resultado do desenvolvimento intelectual do homem. Esse desenvolvimento é formulado na "lei dos três estágios" como um progresso que parte dos modos de pensa- mento teológico, passa pelo modo meta físico de pensar, e atinge o modo positivo repre- sentado pela ciência atual. Tal progresso intelectual foi acompanhado por mudanças nas instituições sociais e no desenvolvimento moral, com o predomínio do altruísmo sobre o egoísmo. 22.5.2 A teoria de Spencer A teoria de Spencer foi de tal forma influenciada pela teoria da evolução de Darwin, que também é conhecida como social danoirusmo. Ao discutir o curso da evolução social. Spencer considerou como característica importante a crescente diferenciação ele função dentro das sociedades. Para ele, as sociedades evoluíam ele uma homogeneiclade indefinida e instável para uma heterogeneidade definida e estável. Embora propusesse que as socieda-

306 307 I:-JTI{üD]'ÇAü A SUUOI.()(;IA 1500 22.4.5 … - Sociolo… · tos desses novos milionários e novos talentos acabarem deixando o país - a maior parte dos quais rumo aos

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306 I:-JTI{üD]'ÇAü A SUUOI.()(;IA Capitulo 22 A mudança social 307

QUADRO 22.2

22.4.5 Fatores políticosUma mudança governamental. com a eleição de uma liderança carisrnática, um golpe

militar, ou outras alterações que podem ocorrer no sistema político podem provocar mu-danças significativas na estrutura social.

Em janeiro de 1933. Adolf Hitler tornou-se ch.mceler da Alemanha e instituiu um regimeextremamente cruel responsável pelo genocídio de milhões de pessoas. Após seis anos nopoder deflagrou a Segunda Guerra Mundial, que começou em 1939. Sob suas ordens. 6 mi-lhões de judeus foram exterminados de várias formas - fuzilados. em câmaras de gás oupor trabalhos forçados. Hitler também exterminou um número aproximado a esse de ciga-nos. homossexuais. socialistas. comunistas. eslavos e outros considerados indesejáveis oude raça inferior. No final, foram 17 milhões de combatentes de guerra e 60 milhões de civis

mortos.

vel rapidez. Estimativas indicam que em 1500 já circulava pela Europa meio milhão de li-vros. A imprensa de Gutenberg contribuiu para acelerar o Renascimento, para o surgirnentodo protestantismo, e para as revoluções políticas e industriais dos séculos seguintes. A leitu-ra - que, anteriormente, era exclusividade de pequenas elites de nobres e sacerdotes -passou a atingir um número impressionante de pessoas. graças à diminuição do custo doslivros, popularizando o saber

No momento atual, profundas mudanças S~IOmotivadas pelo avanço da recnologia da infor-mação, como o demonstra o Quadro 22.2.

o setor de tecnologia da informação (TI) é o segmento que mais cresce na economia indiana,tanto em números de produção quanto de exportação.

Mas o boom que, nos últimos dez anos, cravou o país definitivamente no mapa da tecnologiaeletrônica mundial criou um paradoxo: enquanto cidades como Bangalore, no Sul, experimentamum desenvolvimento acelerado e a criação de milhares de empregos, a maior parte do país segueimersa na pobreza. Para alguns estudiosos, o surto tecnológico s6 ampliou as diferenças sociais.

O governo diz estar tomando todas as providências para tornar a índia uma "superpotência tec-nológica global" e fez dessa bandeira uma de suas prioridades.

"Enquanto a educação e os negócios por meio da TI se expandiram enormemente, a educaçãoprimária para as massas pobres ainda é precária em termos de qualidade e oferta", diz o professor deciência política Manoranjan Mohanty, da Universidade de Déli. "Isso também vale para a saúde naszonas rurais e tribais e nas favelas em grandes cidades."

Saúde e educação, segundo os especialistas, são os dois tópicos mais relegados no país."O boom de TI e o baixo desempenho em desenvolvimento humano são, em alguns casos, dois

lados da mesma moeda", afirma Nagaraj, lembrando que, enquanto o PIB per capita no país dobrounos últimos 20 anos, o investimento em educação e saúde teve um aumento discreto. "Para cadadólar gasto em educação primária, três são gastos em educação de terceiro grau."

Mohanty concorda com a relação. "Os obstáculos vêm da estratégia de desepvolvlrnento, que,nos últimos anos, retirou incentivos de áreas básicas e não adequou a infra-estrutura de desenvolvi-mento nas regiôes pobres."

Como é de praxe em momentos de grande transformação econômica, a índia assiste, com oboom da indústria de TI, ao nascimento de um novo grupo de milionários - algo especialmenteimpactante em um país em que a divisão da sociedade em castas ainda vigora.

"Este novo grupo é pequeno, mas deve, no longo prazo, se tornar mais influente", diz o professorGeoff Walsham, da Universidade de Cambridge (Reino Unido), citando a dificuldade da estrutura po-lítica indiana em absorver mudanças como a razão para a demora da nova elite em adquirir maiorpoder.

"Há uma nova classe empreendedora, de espírito competitivo e perfi I global, pronta a transpor asfronteiras culturais do país", acrescenta R. Nagaraj, do Instituto Indira Gandhi de Pesquisa para oDesenvolvimento.

Mas a professora Sunanda Sen, da Academia de Estudos do Terceiro Mundo da UniversidadeJamia Milia, vê o impacto desse novo grupo na sociedade como pouco relevante: "A reação da so-ciedade vai da curiosidade à apatia".

A limitação do poder e mesmo do tamanho do grupo também guarda relação com o fato de mui-tos desses novos milionários e novos talentos acabarem deixando o país - a maior parte dos quaisrumo aos EUA, que hoje domina 70% do mercado mundial de TI.

"Não há muitas medidas para reduzir a fuga de cérebros nem estímulo para manter essas pessoasno país. Mas a índia acabou se beneficiando", diz Nagaraj.

A contramão do fenômeno é que o boom de TI começou exatamente com indianos que, após vi·verem no exterior, retornaram ao país com uma forte rede de contatos, promovendo o investimento.

Fonte: COELHO, Luciana. 'Boom tecnológico amplia abismo social na índia'. Jornal Folha de S.Paulo,21 set. 2003, p. A-27.

22.4.6 Fatores relacionados à saúdeGrandes epidemias provocaram mudanças substanciais no desenvolvimento de muitas

sociedades, alterando hábitos e costumes das populações atingidas e até mesmo o rumo

dos ,Icontecimêntos.A Peste Negra, também chamada peste bubônica, chegou à Europa transmitida por pul-

gas de ratos que vinham em navios da Ásia e foi a responsável por eliminar um terço dapopulação da Europa na metade do século XIV. A força de trabalho européia foi destruída,metade elo clero na Alemanha e na Inglaterra morreu. Como não se tinha idéia de onde elavinha, a doença foi considerada uma punição de Deus aos pecadores. Quando padres tam-bém caíram doentes, o controle da Igreja Católica ficou enfraquecido, e abriu-se uma opor-tunidade para o surgimenro do protestantismo. Os médicos, por sua vez, abandonaram osdogmas e começaram a dissecar os corpos humanos em busca de uma explicação, levandoao aperfeiçoamento do método científico. As pessoas começaram a ver o mundo de mododiferente após a peste, e o caminho para novas descobertas foi aberto.

22.5. TEORIAS DA MUDANÇA SOCIALNumerosas foram as teorias de mudança social propostas ao longo da história. Para o

nosso estudo, porém, citaremos aquelas que, a nosso ver, tiveram maior repercussão nosmeios científicos e na sociedade de modo geral e que foram expostas em parte por Botto-more 0978, p. 268-273). A seguir, elas são expostas de forma bastante sucinta.

22.5.1 A teoria de Comteo teórico francês, que criou a palavra sociologia e o pOSltlVISmO, explica a mudança

social como o resultado do desenvolvimento intelectual do homem. Esse desenvolvimentoé formulado na "lei dos três estágios" como um progresso que parte dos modos de pensa-mento teológico, passa pelo modo meta físico de pensar, e atinge o modo positivo repre-sentado pela ciência atual. Tal progresso intelectual foi acompanhado por mudanças nasinstituições sociais e no desenvolvimento moral, com o predomínio do altruísmo sobre o

egoísmo.

22.5.2 A teoria de SpencerA teoria de Spencer foi de tal forma influenciada pela teoria da evolução de Darwin, que

também é conhecida como social danoirusmo. Ao discutir o curso da evolução social.Spencer considerou como característica importante a crescente diferenciação ele funçãodentro das sociedades. Para ele, as sociedades evoluíam ele uma homogeneiclade indefinidae instável para uma heterogeneidade definida e estável. Embora propusesse que as socieda-