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    A n d ré G o rz

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    Metamorfoses do Trabalho'...

    B u sca d o S e n tid o , , , '

    C r í ti c a d a r a z ã o e c o n ô m i c a

    Tradução:

    ,Ana Montoia....

    G 0NOMEP ROF . ° ~V: N{e G o .   R020   P A S T A '   IG '

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    !Metamor foses do Traba lho

    1 . A   ihvenç~o do  t r aba l ho

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    i:   O que chamamos "trahulho"   é  uma invenção da modernidade.   A for- .lh~sob   a   qual o conhecemos e praticamos, aquilo que  é o cerne de nossa~i:stência. individual e social, foi   uma   invenção, mais tarde gen.eraI;zada,

    do!industl'ialismo. O "trabalho", no sentido contemporâneo do termo. não

    se   ~onftindenem com  os,~azeres.  repetidos dia ap6s dia. necessáriós   à

    manutenção e i t

      reprodução da vida de cada um; nem com o labor, por mais peno so que seja, que um indiv iduo reali za para cum prir uma raref .! d a qual

    ele:mesmo e   seus   pr6ximos serão os destinatários e os beneficiAdos; nem

    cOIn   o que empreendemos por conta própria, sem medir   nos sO.   tempo e

    esforço, cuja finalidade   sÓ   interessa a nós mesmos e que ninguém poderiarealizar em nosso lugar. Se   chamamos   a   ess~satividades   utrabalho" _   o

    "trabalho   doméstico",   o   " h "aba lho   do  artlsta'~.o   U t r ahn l J :1o"   de autoprodu-

    ção -, fazêmo-l0 em um sentido   radiCtllmente   diverso do   sentido   que se

    empresta   à  noção de trabalho, fundamento da existllncia da so.cledade, aomesmo tempo sua essência e sua finnlidade última ..

    Pois a característiCa mais importante desse trabalho - aquele que "te-rno s", upl ' o cuí"amos",   Iloferccemos" -   é se r   uma. atividade   q u e 's e rca H za naesfera   plíblic~. solicit~da, definida c reconhecida útil por outros além de

    nós e,  fi   este título, remunerada.

      Épelo trabalho  remunerado   (mais pnrticu-.larmente, pele? trabalho assalariado) que pertencemos   à esfera pdblica, ad-

    qui .r imos uma: exis tBnc ia e uma ident idade soc iais   (isto:é,   uma "prof iss .ão") ,"inserimó-nos   ~emuma. I:eqC de   l 'e l açõe s e   de" intercâmbio s, onde:   8 outros

    somos equiparados e sobre os quais vemos conferidos certos' direitos, em

    troca de certos deveres.   O   traballlO socialme)ltc relllU)lerado c determina-

    do - mesmo para aqueles e aquelas q\le o procuram, para aqueles que a ele

    se preparam ou para aqueles a quem falta trabalho -   é, de longe, o fator mais .impo!'tante da socializaçfto. Por isso, a sociedade).ndustrial pode perceber asi mesma como unia."sociedade de   trabalhadores" , dis t in ta   de   todas   as

    ---------------------~------------ i----"'d"'e"'m"'a"'i::;'"glliUl. .• p",re ",c",e•.d••e

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    A   e s fe ra   privada, aquela da farnflia, confundia-se, pois, com a  e s fCJ ' ada necessidade econÔmica e do trabalbo, ao passo que a esfera pdblica,

     polJtica, aquela da Ilberdade, excluía rlgorosamen!e as atividades necessll.rias ou IÍtcis da esfera dos "assuntos humanos", Cada cidadUo pertenciasimultaneamente a essas duas esferas distintas, passando   cont inuamente   deuma a outra. e esforçava-se   por reduzir   ao mínimo o fardo das necessidadesda existência, transferindo-o aos escravos e às mulhcres, dominando e limi-

    lbdos os fil6sofos gregos, qualquer que fosse Suaoposiçao   à vidana  pólis,   coDsidernvam que a liberdade   sitú8-se   exclusiv8mcnto naesfera política; que o constrangimento li.necessidade 6, sobretudo,um fertOmeno pJ'é..político , característico da organlzaçilo privada da

    família;   c que aforça e  a  vioIênclajustiflcam-se nesta  t1Jt.irrtacsfemporque sfto os tinicos meios de subjugar anecessidade   (por exemplo.dominando   O~escravos) e, assim, alcançar a liberdade. .. A violência6 o ato pré--polftico de   libemr.l~c das necessidades Constrangedoras

    da existência para conquistar a liberdAde no mundo.

    11,

    2 3P r lm a lra P a r to - M aI ,m o r to "s d o T rab a lh o

    encontra-se, portanto, naturalmente além da esfera da produçllo material propriamente dita ... O pleno desenvolvimento das potencialidades huma-nas, cujo próprio fim   é alcançar o reino da liberdadc, só começa além daesfera da produÇão material'','

    , Para Marx, nessa passagem, como para os filósofos gregos, o trabalho

    que consiste   cnl   produzir c reproduzir as bases materiais necessárias   à . exis-tência. não pertence   80reino   da liberdade. Existe.   no entanto.  urna diferen ..ÇII   fundamental entre o trabalho na soeledade eapitallata e o u'abalho no~undo   aritigo: o  primcil'o realiza-se   na  esfera   pública,   enquanto   o segundopermanece confinado   à es fera privada. A maior parte da   economia,   na cida-de antiga, é uma atividade privada que, embora se desenrole à luzdo dia, na

     praça pllblica, limita-se   à esfera familiar.Bm sua organizaçllo e hierarquia,essa esfera era determinada pelas necessidades da subsistência c da repro-dução, "A comunidade natura! da famfiia decorria da necessidade, c a ne-cessidade regia todas as atividadcs".' A liberdade só principiava depois de 'ultrapassada a esfera   econbmica,   privada, da famJlia; a esfera da liberdadeera aquela, pública, da   p6/is.   ''A  p6lis   diferenclava-sc da famllia pelo fatode s6 conhecer 'iguais'. ao passo que   li. famflia era o lugar da mais   dgOroSCl

    desigualdade", Os lares deviam "assumir as necessidadcs da vida" para quea polis pudesse ser o campo da lil)erdade, isto é, da busca desinleressada do

     bem póbUco e da vida boa.

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    !~!

     A n d r é G o r z - M e la m o rf o s e s d o T ra b a l h o

    Basta aqui di7~r que o trabalho sobre o qual se funda a 'coesão e acidadania sociais nihé redutível ao "trabalho" como catcgoria antropoló-gica, como necessidade que tem o homem de produzir sua subsistência como "suor de seu rosto"" Esse trabalho necessário à subsistência, com efeito,

     jamais foi fator de integração sociaL Era, antcs, um principio de exclusão,

    Em   todas   as sociedades pré-modernas, aquelas e aqueles que o realizavnmcr~mconsiderados inferiores: pertenciam ao ,reino   natural,   não ao relnohilmano. Estavam submetidos   à necessidade, incapazes.   pOltanto.   de eleva-ção de esplrito, de desinteressc, de tudo aquilo que habilitava a ocupar-se

    :dos,assuntos da polltica. Como o demonstra Hannah Areadt' , apoiando-senotadamcnte nas obras de Jean-Pieae Vemant, o trabalbo nccessário à satis-faÇão das necessidades vitais era, na AntigUidade, uma ocnpaçllo servil,que'exclufa da cidadania (isto   é ,   d&partiçipaçllo na Cidade) aquelas caqueles que o,reaUzavam. O trabalho era indigno do cidadão, não porquefosse reservado às mulheres e aos escravos, maS, ao cootrátio . er"areseIvado

    às mulheres.c aos escravos porque "trabalhar' era sujeitar-se   à necessidade",E s6 pOdia acei tar o assuje i tamento aquele que" como o escravo, prefer ira avida 11liberdade, dando assim mostra de espJrito scrvil. Platão classifica os

    camponeses ao lado dos escravos e, quanto  80S

     artesãos   (banallSOO, 118medida cm que ,não IrabaJJ1l0!1para 'acoisa pública c na esfera pública, não 'eram cons iderados c idadãos plenos: "o interesse que os movia era seu   ofí-

    cioe nllo a praça pública". O homem livre recll~ava submeter-se 11necessi-dade; dominava seu corpo para não trBnsfol".mál'- sc em escravo de suas ne-

    cessidades materiais,e, caso trabalbasse, era somente com a intenção de nãodepender daquilo que não domina, isto 6, para   assegurar   ou ampliar suaindependência. , "

    A idéia de que a libcrdade (isto é, aquilo que é pr~priainente humano)SÓ começa "além do rcino da necessidade" e de que o homem só surge comosuje1to capaz de conduta moral a partir do momento em que, cessandn deexprimir as necessidades imperiosas do   COlPO   c sua dependência do meiocm quc vive, age movido apenas por sua soberana determinaçllo,   é uma

    idéia constante, de Platão a nossos dia •. Reencontramo-la em Marx, nafamosa passagcm do Livro   IIIde O   Capital   que, em contradição aparentecpm,   outros escritos do' autor, situa o   "reino   da liberdade" em   u m   espaçomais além da racionalidade econômica. Marx observa, nessa   passEÍgem,   queo~'d~envolvimento   das forças   produtivas'~no capItalismo cria "o!germe deum estado dc Coisas" que pennite "reduzir o tcmpo consagrado a

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    At6  o f i m   do   século   passado,  Bproxim,ndamentc-cstc6   pelo m~os'o   caso   de muitos ramos dalndl1sttla   textil   de nosso contlnente_, avida do industr ial que empregava operários em domicfilo era o que

    hoje consideramos uma vida aprnzível. Podemos im"gintí- la mais

    ou menos   assim:   os   camponesc.o;   vinham   à  cidade, onde   lUOrava  Qemprccndedor •.h1l7.£ndo-lhe seus tecidos - no c~so do linho;. 8matéria   primaj4   f ora produ~ida, no t odo o .uem pa rt e , pelo pr6pnocampçnês . Depois   de uui exame   minucioso,   com freqüência   ~.Qcial.da qualidade do produto. recebiam por ele o preço combmado ..Para os mercados mais afastados, os revendedores, em geralintermediários, dirigiam-se no produtor (o sistemR de amostrasainda nfIo fora   generalizado) em busca da qualidade que lhesinteressava; compravam o que  encontravam   em seu estoque,'~menos que tivessem encomendado com grande antecedêncJa as

     peça s - e, n este .cas o, ~s en com enda s {cda m sido  jl i  transmitidasaos camponeses. Os  fregueses   sõ se deslocnva~ pessoalmente..quando o  faziaIi1,   de tempos em tempos. Bastav,a, em gern~,corrcsponder-se: foi assim que lentamente crcsceu o sistema ~eamostras.   O ndmero de horas de trnbalho era bastanle moderado,cinco ou seis por dia, às veles menos; mais, .DOSmOntentos   d eaperto. Os gaphos eram modestos, mos suficientes paro levar umavida decente e guardnr dinheiro nns 6pocna do fartura. Os'

    c'oDtorrentcs maolin.hnIn entre si bons relaçOes, pondo-se de acordosobre os pr1llc(pios essenciais dos neg6cios. Uma visita   prolon~d~

    ao caf6. diariamente, um  crrculo   agradável de amigos -uma vidaaprazCvel c tranqUila.

    Sob todos os aspectos, esta era uma   fonna   de organização'''capitalista'': o empreendedor exercia uma atividade puramentecomercial; o emprego do capital era indispensável; e,  fUlalmente,   oaspecto objetivo do processo econ6mico, 'a contabilidade, eraracional. Contudo, tratava-se de uma atividade econômica

    tradicional, qunndo se considera o   esplrito   que   animava,   oempreendedor. trndiciounl, o modo de vida; tradicionais. as tnxasde lucfO j Rquantidade de trabalho forncclda, 8 maneira decon4uzir o negócio e as relações estabcJec,idas com o trabalho;   fll~~a-mentalmente tradicionais, enfim, o c(rculo da clientela, n mnneJrade buscar novos clieutcs e de' fazer escoar a mercadoria. Emm

    . esses os costumes que dominavam a conduta   lIaS  negócios, eerwnsubjacen tes, se posso me expressar ass im , no  ~thosdçssR categoria

    de empreendedores. . . .Súbito, num dado momento, esta vida tnmqUilachegou ao.f im; nfi?

    ocorreu, de fato, nenhuma transformação cs.~ellcial na forma   .daorgruli7. .l1çRo, como a   passagem pR~a um   espnço circunscrJt~

    [gescll/ossener Bt:lrieb]   ou a utilização de ofIcio rnectlnico, ouqualquer   ouera   coisa do gênero: Em  geral.  o que ocorreu foi apenasO seguinte: urnjovem.   de uma   fa01ma   de  produtores.  vai ao campo;.ali, escolhe cuidados3Inentc os tecc]ões que quer empregar; toma-

    os ainda mais dependentes e aumenta. o rigor do controle sobreseus produtos, tranSfOfIJlUUdo-os

    l assim,   de   camponeses em

    operários de!;pOSSIÚdosda  matéria-prima   O jov em cm pr ee Dd~ or

    P r lm e l r a P a r l e - M e l am o r l o , e s do T r a b a l ho

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    A nd r é G a r I - M . t am O l l o s e s do T r a b a l ho24

    lando seus desejos por meio da disciplilia de uma vida frugal. Nesse COn-texto, era inconcebível a idéia de "tnibalhador": scrvil e restrito ao domés-.tico, o "trabalho", longe de conf-erir Uma "jdcÍ1tidade social", era algo que

     pertencia à exi stência privada c e xclula da esfera pÚblica aquelas e aque lesque a ele se viam assujeitados.

    A idéia contemporânea do trabalho s6 surgeJ

      efetivRlllente.   com ocapitalismo   manufaturei.l'o.   Até então, isto   é,  àté  o século   xvm, o. termo.'trabalho"   (labOUT. Arbeit. lavaro)   designava   fi   labuta dos servos e dos

    trabalhadores por jornada, produtores dos bens de consumo ou dos scrviçosnecessários   à   sobrevivência que,   clia   após. dia, exigem ser renovados e re~

    oslos. Os artesãos, em troca, fabricantes de objetos duradouros, aCUmulá-veis, que seus compradores muitas vezes legavam   à   posteridade, não "ll'a-

     balhavarn", mas "realizavam obres" nas quais podiam utilizar o .'ti'nbalho"de homens de labuta chamados a cumprir as tarefas   mais   penosas, poucoqualifJcadas. S6 os trabalhadores por jornada e os trabalhad;ores manuaiseram   pagos   por seu "trabalho"; os artesãos recebiam pela   "obra",   conformeo parâmetro   fixado   pelos sincUcatos profissiomUs de então, as corporações

    e as guildas. Estas proscreviam severamente qualquer inovação e qualquer forma de concorrência. As novas l,écnicas ou   as .novas máquinas deviam ser aprovadas, na França do século XVII, por um conselho dos antigos, rcunin-do q'uatro comerciantes e quatro tecelões, e depois autorizadas por juízes.Os salários dos diaristas e dos aprendizes eram fixados pela corporação eera impossível qualquer tipo de acordo diverso daquelc costumdro.

    A   'jpro~ução material" ngo e.r~,portanto, em seu conjunto, regida pela racionalidade econômica. Não o se.rá ainda   COm  a extensão do capita-lismo mercantil. Até   1830, na Grll-Brelnnl1a, e até o fim do século XIX. noresto da Europa, o capitalismo munufatureiro,   depois   industrial,   coexistiucom a indÚstria doméstica na prodUÇão têxtil, grande parte assegurada pe-los trabalhadores em domicilio. A tecelagem - bem como, entre os campo-neses, a cultura da terra - era, para os tecelões em domicilio, mais que um

    simples ganha-pão; era um   modo de vida   regido por tradições, respeita-das - embora pareçam irracionais   d o   ponto de vis4l econÔmico _ peloscapitaIiSk"lS.Parte interessada em um sistema de vida que concilia os inte-resses   de uns e de outros, os comerciantes sequer imaginavam poder rncio~nnlizar    O   trabalho   dos tecelões em domic.IIio, inll'oduzir entre eles a con-corrência, buscar raciona! e sistematicwnente maiores Il1cros. Vale a penacitar, a prop6sito,   a descdçllo que faz Max Weber do sistema de produçi'loem domicilio e'slla destruiÇ

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    4. Mnx Webcr.   l..'J1thiqut! Protestante er l'Esprlt du Clll'lraIlGme.   Pnris, Plon/Agol'Q.1985,   pp.   58-n.

    S.   Max W6bcr.   L tthfque Protestallle .... , op. cit.,   p. 80.

    modificatambém os métodqsde venda,buscando o maiapossível

    cantata di reto com os consumidores . ' Ibma int eiramente a s euencargo o comércio de varejo e cuida pessoalmente de seusf regueses ; v i si t a-os regularmente aeada ano c , s obretudo, ajus ta a

    . q u a lid ad e d os p rod u to s ao go st o e às necessid ades d o s c l ien t e s.   A omesmo tempo. 'age segundo o  prindpio  d~ reduzir os preçosfeaumentaro volume dos negócios. A conseqüência hnbítualde  u m

    ta l pr o c es so de r a c io na J i za ç i io nD od~oroua se monifestar .   aquelesque não seguiam os mesmos   passos   fOranl eliminados.   O idaiodesmoronou-se sob n pressão da concorrência;   fortunas   1consideráveis edif icarm.n.se   c n n o   eram util izadas para empréstimos;

    . a juros , mas reinves t idas nos   neg6cíos.   O  antigo   m o d o d e ' vid~.!.COtúortl'ivcl c simples.   csboroavR-sc diante   da  r[&ida sobriedade  d e :algun~.  Foram estes ,11timosque  c r e s c c r a t n ,   pois deixaram   d e  f cO Dsu mirparaad qu i r iJ j o s d ema i s . o s  quedcsejavam perpetuar çs ~antigos costumC8. viram"se obrigados aredilzlr suas despesas.' :No mais das vezes. essa  . r cvo lu çn o [n u.o d ep en deu   do afluxo dedInheiro   DOVO -   sei de casos cm  qll~bastou alguns ttúlhnres de~larcosl t om a d o s d e e m p r és ti m o a p~entC8-,   m a s d e u m   esptriton ovo : "o   espfrito   do capitalismoll en~avae~açfto.4

    :Sohre as ruínas do sistema dc prodbção elu domicílio, só r6.ta agora

    instalar o sistema de fábrica. Não será, veremos, coisa de pouca nlOnta.. Retomw''ei ad iante a questão das lnqt ivaç6es profundas   qu e   levaram

    os comerciantes capitalistas a romper çom   a tradição   e   racionalizar   asativida~es prod,l?tivas com uma   lógica   fr ia   e brutal. Por  enquanto.   bastanota,. que tais   motivaçOe.~  continham,   segundo Max   Webci',  u m   f lelemen_ to irracionalJl,s cuja   fmporUlncla   em   gera;l   subestimamos.   O   interesse   do sprodutores capitalistas em   r~cionaüzar ~ tecei  agem,   dominar os custos,

    tornar este custo rigorosamente calculável c ptevisfvel graças li quantifi-

    cação c 11normatização de todos os seus elemelltos nada tinha de novo.   A

    novidade, à quol antes se   abst iveram.   é   que, em um certo   mom~nto,   os produtores qoiseram impO-Io a seus fornecedores. Max Weber demonstra

    convincenlemente   qu e   8 razão de tal abstenção   não era nem jurídica, nem

    técnicll, nem econ6tnica, mas Ideológica e cultural:   "o. epitáfio mais ade"

    quado a todo estudo sobre a racIonalidade é esse princípio muito simples,freqUentemente esquecido: a vida pode scr racionalizàda segundo pers-

     pectivas e direções extremamente diversas".   A   novidade do "espírito do

    clipitalismo".é sua cstreite7.a unidimensional, indiferente a qualquer ou-

    Ira consideração além da contábil, pela qual o empreendedor capitalista

    leva a.raclonalídade econOmica a suas últimas eonseqüêncins:

    6. Max Weber, L':Éthlque Protestante ....• op. clt.   I  pp.   78~79,83.

    1

    1

    , II

    I

    2 7

    A racionalização   à   base de um cálculo rigoroso   é   uma dascaract erí st i cas fundamentni s da empresa capi tali s t a indiv idual ,

     precavida e circunspectamcntc orientada para o resultado esperado.Que contraste com o cotidiano do camponês. com  3rotina e os

    p d vi Iég i os d o ar te sã o d as n n Ugas corp orações ou com ocn p it a ll s laaventureiro   IContudo. considerada do ponto de vIstadn felicidadep e s s o a L e s s a  racionaIir..nçfio   e x p r e s s a q u ã o   ÍI'racimlal   é ti.  c o n d u t a

    que   f~o homem existir em   f u nçD. o   de seus negócios, e .não oinverso.6

    PrimeiraParle- MelamorfosesdoTrabalho

    p a ra t o d a s a s   ~lassesilldustria.is   anteriores,   con servar . i n tac t o oantigo modo de prodnçAo em condição prévia de sua existência( . . . ) , a burguesia nlio  p o d e   existir semrevolucionarconstantemcntcos meios do produçllo. isto  é. o conjunto das relações sociais ...' Ib das a s re laçO es soc i a i s t radi c ion a i s c e sl á ve is , com seu cor te jo d e

    a n ti g as e ve n er á ve is i d éi as e n o çO c s s :t o de s fe it os ; a s q ue a ss u bs ti tu e m e n ve lh e ce m a n te s m e s m o d e c s cl cr o sa r . T h do q u e e ras6 li ê Io e permanente esvai- s e no ar. tudo que em sagrado agora   éprofanado e os homens vem-se, f inalmente, forçados   a lançar umolhar lúcido sobre suas condições de existellcia   e sobre suasre laçõ es rec íprocas.

    Dito de outro modo, a racionalidade econOmicafoi porloago tempo con-

    tida, não apenos ]leIa trndição, mllS também por outros tipos de racionalidade,

    o u t ra s f i na l id a d e s e o u tro s i n t e re s se s q u e l h e cO n s ig n a v am l i m it c s a n 1( o s e r em

    ultrapassados. O capitali:;mo industrial sÓ p6de desenvolver-se a partir do   IDo..mento em que a racionalidade econOinlca   emancipou~se   de todos os   outro.~

     p,incípios de racionalidade, para submetê-Ios a seu único dooúnio.

    Éo que dizem, aliás, Marx e Engels no  Manifesto Comunista,   embora

    de outra perspectiva: a burguesia, nfirmam, rasgo o enfim o véu que até então

    m a s ca ra ra a  verdade   da' ) relações sociai s: "Todos os cIos , complexos e varia-dos, que uniam o homem feudal a seus superiores, ela os rompeu sem pieda-

    de; não deixou outro laço entre   O  homem e seu próximo além do mo interes-

    se... No lugar da exploração dissimulada das ilusões religiosas c políticas, ela

    introduziu uma exploração aberta, desavergonhado. direta, árida . . .•• .Ela   "ras~gou o véu dos sentimentos e das emoções próprios hs relBçOes fámillares c

    rec1uziu..()s a simples   1-el R ç (S es   monetárias . . . Foi eln quem, primeiro, mostroude que é capaz a ação humana ...••"No espaço que mal cobre um século de

    dominação, a burguesia criou forças produüVllS mais numerosas e mais colos-

    sais do que foram capazes todas as gerações antes dela". Enquanto

    Enfim,'o reducionismo unid imensional da racional idade   econômi~Ca própria ao capitalismo teria um alcance potencialmente cm8Dcipador

    ,

    Andnl60/2- Me l,moriosesdoTrabalho26

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    2 9P r i m e I r a P a l i e M l l t a m o r t o s e s d o T r a b a l h o

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    , A racionaliznção econôinica foi, mais que qualquer outra,   a   tamfainais difícil que o capitalismo industrial precisou cumprir. No livro I de O

    Capital,   Marx rcfcre-se inúmeras vezes   à  vasta   l i terfltura   que descreve asresistências, por muito lempo intransponíveis, que tiveram de enf~cn:ar os ,

     primeiros capitalistas indi.tstriais, O custo d? trabalho, para a, v,l6na da

    e m p r e it ad a , d e v ia s e r d o r ny n n te c a l cu l á v el e n g o r os am e n te   ~revl~(vel,:POlS

    s6 assini   podiam ser calculados o volume e o preço das mercadon •• prudu-ziçJas e previsto o lucro.   S~messa   contabiH?~deca~azda   prcvlSl'IO,.o   Jn"cs~timento   s e r i a   dem.asiado a,]eat6rio e   demasl~do   n IT1E .cndo ,   Ora, pam tomarcaicu1ável o custo do tra~alho, era preciso 'também tornar cal~lável s~

    rendimento, Era preciso pQ  j

    "

    "   11

    "   '.

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    ] O.  .J.- Snlilh. "Memol!'s af Wool", citado por   Stepltnri   Mar8lin   in André 00[7. (cd.),CrlttqllC   d e   ta D/vis/an' du   Travail.   Pruis, Seuil, 1913.   p, 71. .'

    1l'. Andrew Ure,   Phitosophy oJ MalllifaClure,.s,   citado por Mnfx,   O Ca ;Ial. I:

    Marx percebeu tais desdobramentos já nos   Ma~usclilOS de 1844.Ali "o operário"   (Arbeiter,   que seria melhor traduzlI, não fosse o usocOl;sagrado por "trabalhador") e o   "trabal/to"    são apresentados como

    "produtos do  capital"J1t   o   trabalho.   como  Utraba1boo~m gerat'."  t;rabnlb~qualquer. indiferente a suaS   dcternunaçOes. se~pre ncidentoJs e.estra-nhas ao operário. Este, portnn~o, não possui mms um.lugar dctcr~ado,

    "natural", na sociedade, nem é  portador de nenhum lllteresse particular.

    Seu trabalho reflete a "dependência   universal,   esta forma nat~ral dacolaboração universal dos indivíduos", e, segundo Marx, a pr6pna abs-tração desse trabalbo e dos indivíduos que ele define, eo~tém, em ger-me, sua universalidade. A divisão, agora social (e n~o ~alS, na~ural), dotrabalho em uma infinidade de trabalhos intercambIáveIs, lOdlferent~,"aciden,tais",   supdme   a.'

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    32A nd ré G o~ - M a l a m o r t o s a s d o T " , b a l h o ' P r im a i " , P a r l e - M e l a m o r l o , " s d o T r a b a l ho 33

    A  coisa   ébem diversa   ~a1"Ros proletários que. diretamente assujcita-

    dos ao trabalho geral coletivo. têm   um   interesse direlO a  unirem-.se   no traba-lhador coletivo e a submeterem. por essa união, o processo social de produ-

    ção a seu controle comum, substituindo a coJaboraç.ão voluntária p:lo

    trabalhei socinlmente dividido. A prolet¥izaçllo dos produlures anunc,a-se, pois, como o outro lado de uma grandiosa empreitada, potencialmenteemancipadora, de unificação racional   d o   processo social.

    Não se trata, c o n s e q i J e n t e m en t e . d e   nenhum recuo:   Uqu~4nandofá- bricas, não busca rcconquista •. o estatuto perdido do 'artesão da Idade Mé-dia"ls;   trata-se. ao   contrálio.   de perceber   como   os indivíduos, enfim   d e sp (>a

     jad os de suas '"re laçõ es limi tad as" e imed iata men te   en~nndos   no   "com6rc~o

    universal entre os homens'\ podem tornar-se tuc;Jo,pqrque nao são mws   ' Ú J "na~da,podem   tornar~sc sujeitos   uni~c~saisde   ~ma ãti,:,i~ad~total. porque jnl(o se entregam mais a nenhuma atívldade Jll 'lvada pa'11cular. ,

    ' Pouco importam, aqni" o contexto c o percurso filos6ficos que condu-' ,ziram Marx a ta! inversão dialética O que nos interessa   é seu 'conteúdo   ...f\, ,nt6pico; pois   é esta visão lÍt6pica que penetrou o movimento operário.e   \Uainda nutre a ideologia do tÍ'abRlllOcompartilhada pelas esquerdas cláss,- ,.cas..Importa,  pOltanto,   com~reender, primeiro; os contcddos que  a)nCÚlhoje

    sal   entre   OS ,homens", nascem, no lugar dos individuas particulares, osindivíduos   pertencentes   à  histdt:ia   I:lnil'~rsale cmpirj~anlente univer-sais".l3 .

     Nos   Manuscritos de   1844, Marx obsctvllva, seguindo J.-B. Say: ''Adiyisão do trabalho é Um meio   cOmodo e4til,   uma utilização hábil dasforças humanas para a produção dariqucza social, mas ela debilita   as capa-cidades de cada homem   iudividualmente"."   A Ideologia Alemã   radicaliza

    a constatação:

    Em nenhum outro período antes desse, as forças produtivasassumirwn uma forma tão indiferente ao comércio dos individuasentre si, porque seu comércio era ainda limitado. De oulro lado.diante dessas forças produtivas,   ~táa   mniorlados individuos, dos

    quais essas forças separaram-scl

     e que, por conseguinte, foramprivados de qualquer substância viva e lransformarmn~sc em .indivIduas abslratos ...A   I1nicarelação   queelcs aindamantêmcomas forças produtivas e com sua pr6pJ:iaexistência,   o trabalhp,

     perdeu para I!les qualquer aparência de dtividade pessoal   e sócontinuam em vida,   vegetando. l .5

    .

    I   Encontrthnos nos   Grundrisse,   e depois em   O Capital,  ca;acterlzações

    iaindn mais severas a  respeito   da natureza do trabalho industlial e de seucaráter mutilador. Nem por isso, para Marx. o Lrubalho desumnnizantc. mu-

    : ma:dor) idiotizante,   extenuante,   deixa   de  indicRr   um   progresso 'objetivo. na

    i   medida em que ele substinJi os produtores privados, os artesãos, pelos "lTa- balbadores universais", os proletários, dando assim nascimento a uma'clas-se,para a qual   o trabalho   é imediatamente trabalho   social,   determinado emseus contet1dos pelo funcionamento da sociedade   em seu conjunto,  e para aqual, p or conseguinte,   é de interesse vital, imperioso. dominar a totálidadedo processo social de produção.

    Para entender como   Marx.   desde 1846, concebe o proletariado como

    uma classe potencialmente universal. despojada' de  qualquer   interesse par-ticular c, portanto, susceUvel de tomar em suas mãos e racionalizár o pro-cesso social de produção, o melhor   é referirmos primeiro   à passage(n dos

    Grundrisse,16   muito mais explfcita, que Marx consagra   à produção de mer-cadorias como uma atividade   privada.   Aí, ele insiste longamente sobre ofato de que o produto que um individuo fabrica para o mercado não adquirevalor de nuca (nfio representa, portanto, nenhum interesse para seu produ-tor) seofio quando enconlTa um lugar no processo   social   de produção no

    ;!

    ,   .

    interior ,ilo qual pode ser permutado. Ora, acrescenta Marx, se pode ser trocável,   é porque constitui uma concreçl1o pS.r1icular. útil a outros, de um

     trabçlho geral   q u e c o n C O L 1 " Ca o c o n j u n t o   da produção social. O trabalho de

     produção   é  socialmente dividido em uma multiplicidade de produçõesmercantis complementares, dependentes umas das outras, determinadas,cada qual, em sua natureza e conteúdo. pelo funcionamento da sociedade

    em seu conjunto ("gcsellschaftlichen Zusanmmenhang"). Essa divisão dotraballio, contudo. essa coerência das complementaridades, "continua a ser uma cojsa externa. que parece   acidental"   noS indivíduos que se   ~ntnmno mercado. .

    o funcionamento social ("Zusammenhang"), que resulta  ~oafrontamento dos indivíduos   independen tes   e lhes aparece ao

    mesmo lempo como uma necessidade de falo e como   UDlliamecxfetior,   representa precisamente   s u a i l ld . epend€nc i a ,   pela qual  aexistência social. 'embora seja   lUtla necessidade, só o  é  com o um

     meio, c parece   MS   indiv(du(}s,   pO;1anto,   uma coisa exlema aeles,l1 .

    .:  .

    ,

    . , z .

    ,.,

    13. Knrl   Marx,   A Itkologta A/e!,ztl.14.   a   Mar x quem sub tJnhü .15. Sou eu quem sublinho.

    16. Bdiçlio nleml'i, p .   908 e seguIntes.

    17.   ~~C"Ontrn-6ea mesmo análise ~m ámile Durkheim,   D o l a   DMsiOll    du Ira"Oi1   Soda!.'PlIIls, 1930,   pp.   2 42 e  ss.

    18.   ~1'nrx c   Engels.   Manifesto   C~nuI1lJsta.

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    35

    19. A principnl pnssngem de  A Ideologia Alemli  concng[o.da ll.qucgtilo  d a   "neccssárin'"npropriaçllo coletiva c da coJnboTny1io volunlário, vem 80 cobo de umdesenvolvimento pelo qual Marx dcmonslrn que as   roJÇns   produtivas (que incluem'o próprio trabalho)   "pnrecem   nbsolutament'c   :I'1dependcnle£ e seporadns dos

    indivíduos" que, em razlio de   SUf t   dispcrsKo em   séries.   nf io possuem nenhum domínio

    sobre elM, embora sejam. coletivamente. SC11$criadores. "As coisas, portanto,

    chegarcuo   hoje ao ponto.   prossegue Marx.   em que os indivl'duos devem   o.pr0l"rlar-

    s e da l oL ' l 1 . ldn dedas ' . Io rç n s produt ivas , n ão ape n as pn m pode r m an i fe .• •tn r sua at i v jdn de

    p e s s o n l, m a J ; n i n d n p a t a a ! > .' \e g u r ar    SU B   existência ...   A   Apropriação   d e s s a s   forças   n f i o

    é,   em suma, nada mais que o desenvolvimento das capacidndes individuais que

    correspondem aos meios materiais dc produçilo,   A apropriação da totalidade dos

     meios de prodllçlIo   i,  por isso mesrno, o   d~,wl\'olvim~nto da totatidade das aptidiJe.i

    d a s p r óp r io s in d ivld u o .f . ..

    "Todas D8 apropriações revoluclon/ir'ins nnteríofCs conhecinm limites; indivlduos

    cujn ntividnde peSSOAl ern limitada por mn instrumento de produção Iimitndo,

    aproprlando.~cdesse   instrumento   só podiam enconlrn1' novos   Jim.ltes...;  conlinunvllIltf:ubordinndos h divido do trabalho e   fi   scn proprio instrumento .. ,   Na aproprlaç/Jo

     proletdria,   lima   massa de instrumentos deve esta,. subordinada   a   cnda IndivIduo, e

     a propriedade .fIlbordinada a todos:'   É  precisamente porque são "totalmonleexcluídos'de qualquer aUvldade pessoal", que os   " p ro letár io s   do tempo presente

    e s U í o p r o n t o s a   I'ealiza,' sua ativIdade pusoal completa   s e r '   can!leccr mafs   l tmif t !s pela apfopriaçdo da totalidade das .forças prodflfiVQs",   I Ipropr l aÇ ãOque e x i ge um a

    "uni l lo   u n i v e r s t l 1 " . . ,

    ,,~ só nesse nível que   a atividade pessoal coillcide com a vida mLtlu/al.  o que

    'res p o n d e   à   trOllSformaçJ1o dos indivIduas em inl1ivfduos (atais  e ao d esp o jam en to d e

    qunlqucr elemento   noturtll:   entiio,   a tr(!t1sj'oTmnçãodo   'mbaUlo   em   at;vldade pessoal. ..

    correspollde a si mesmn.",  Oetlvres Philosophiqlles.   t.   V l . Pn r i s .   A lfrcd   Co s to s .   1953.pp.   241-243 (Sou eu   quem sublinho) Cf. também   Grundris$~,  p. 505 da ediçfio

    alcml\   (O lmv res Éco n o mJq u e s ,   't ,   lI, La   Pléillde.   p.   289).

    de indivlduos colaborando entre si consciente e metodicameate. Eis aí autopia da autogcstão e do   uconlrole   operário"   (workers' contraI,   que seria

    melhor traduzir por   ~'poder operário");   fi   utopia da união entre lrnbalho e

    vjda, da atividade profissional   transfonnada   em desenvolvimento total do

    individuo, utopia ainda bem vivida em nossOs dias.Resta , loda via , ex amina r a ra cio na liza ção da co la bora ção so cia l, en-

    trevista por Marx, do ângulo de suas possibilidades e, ao mesmo tempo, d.racionalidade dos postulados políticos e existenciais sobre os quais repoll-sa,lSI

    O principal conteddo utópico dessa concepção é que o proletariadoaí é destinado a realizar a unidade do real eomo unidade da Razão: indivi-duas despojados de qualquer interesse e de qualquer ofício particularestermlna rfto po r se unlro m'unlversa lmenle co m o f im de to rna r raciona l e

    voluatária a mútua colaboração e, juntos, produzirem, numa mesma práxiscomum, um mundo que a e les per tence   inteiramente:   nada poderá   existir

    independentemente deles.   O   triunfo da unidade da Razão supõe, evidente-

    P rIm e i ra P o r l e - M elam o r lo s " , d o T rah a lh oA n d ré G o t z - M elam o r to s " , d o T rab a lh o34

    atraem na utopia marxiana e, depois, verificarem que medida esses conted-do,s conservam sua atualidade e seu sentido   Griginai s .

    . Quando 'formula-a pela primeira vez, entre 1845 e 1846, em A Ideolo-gia Alemã,   Marx enfrenta notórias dificuldades pura imprimir a su~ concep-

    . ção utópica , o comunismo ., uma co erência ra cio na lmente irre' fu!tá ve1 . Ao

    contrário dos utopistas, cojas visões da sociedade futura 'expriinem ideais

    deeolTentes de exigencias éticas, Marx pretende demonstrar qUe o comu-nismo não precisa) para se realizar, existir previamente na consci~ncia dos

     proletários: ele é o própri o "movimentO do real". Não são ainda as contra-diçõe., internas do desenvolvimento caPitalista quem funda sna irreversibi.lidade, como se lerá a partir de 1856: funda-a sobre o falo de que a revolu-ção   é   (ou sérá), para os proletáti.os, ~m imperativo de sobrevivência. A"n~ssidade   absoluta, inexorável". n* qual se encontram,   d e   destruir o..antiga sociedade. com o dnico fim de i"garaJit ir   sua existência", serve de

    .algum modo de garantia tra?scendentai a suá vitória final. Tal-concepçãod~ uma revolução comunista necessália; cOITeSponde, em suma, 'a umaépo-ca.onde as massas opCrárias reduzidas à:exlrema miséria sublevavam-se em.nome.do direito   à  vida. : .

    Entre essa s ma ssa s o perá ria s, co ntudo , -existia  a inda

      uma proporção

    significativa de' artesãos arruinados e d e   antigos trabalhadores em domicf-lio'que guardavam a lembrança do sistema de ofícios, da liberdade c dailignidade do  trabalho .   Era preciso, portanto, que n utopia comunista ga-

    ,rnntisse aos operários, não apenas "sua existência material"   J   mas   também   fi

    autononüa e a dignidade das quais a racionalização capitalista dÓSpojou o.trabalho. A autouomia e a dignidade do trabalho n!lo devem, porém, ser 

    restauradas   em nome de uma exigên'cia ética, individual e subjetiva, 0pos.ta à racionalidade econÔmica.   É preciso mostrar, ao contrário, que a ra cio-nalidade capitalista é uma' racionalidade limitada, que inevitavelmenteproduz efeitos globais conu'árias a seus fins, que ela é:incapaz de dominar.

    A verdadeira racionalidade consiste em transformor o trabalho em "ativida-

    de pessoal", mas em um   l1ível   superior, em que  

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    20. Jilrgcn Habctmlls,   Theoric de: komnmnikorlven Hmuislns,   t.   lI. Prnnkfurt, 1981, p,500. Mais adiante, cito   a   obra com a abreviação   TKH,   c sua trnduçno francesa

    Théorie   de   l'agir commllnicafionn.cl,   Pnris. 1987, com a nbrcvillçllo   TAC.

    mente, a ramificaçilo das dimensões existenciais e sociais que a moderni-

    zação diferenciou até torná-las autônomas (o que não quer dizer indepen-

    dentes) umas das outras. Pois. "tornar impossível tudo o que existe inde- pendentemente dos indivíduos", quer dizer abolir no roldão o Estado eomo

    aparelho do Direito e administração, distanciado do poder dos indivIduas,

    da ,totalidade social aulonomizada; abolir a economia política e as leis que

    se impõem aos atores sociais; abolir a divisão e,a especialização sociais dou'abaJho que,   à  metlida que "as sujeitam os indivíduos" a um "insuumento

    limitado",   Cliam   "indivíduos limitados", cerceados cada qual em um.a fUJ1-

    'ção 'limitada, incapazes, portanto, de   pCl'ceber    e dom.inar a   totalid~de da

    produção social por meio de uma união universal na colaboraçDo   vo~untá-rja. A nutogestão' generalizada da produçAo material, supõe-se, torns;indtilnão apeDas um aparelho separado de gestão, de administração e de cóorde-

    nAção, mas também Opróprio político. Supõe, esSAutopiA, que a colnbora-

    ção universal e voluntáriA de "indivíduos unidos" é imediata e trAnsparen~

    te; não requer nem exige nenhuma mediação, pois cada indivíduo assume,

    como "indivíduo tota1", a totalidade da produção social eomo uma sua

    tarefa pessoal. Tal tarefa permite a eada um aceder à dignidade de sujeito

    universnl e desenvolver integralmente todas as suas potencialidades.

    Há dois pressupostos fundamentais nessa utopia. São eles:1. No plano polftico,  supõe que a rjgidez e as coerções físicas damáquina social podem ser suptimidas. Toda regulamentação e codificação

     jurídica das condutas individuais podcm ser abolidas; o conjunto das ações

    e interações individuais pode recobrir uma inteligibilidade e um sentido

    vividos e, portanto, pode repousar sobre a motivação própria dos iadivídu-

    os a entenderem-se mutuamente e a colaborar racionalmente,   É esse pressu.posto- a supressão, na terminologia   de Habermns, das   "coerções sistê111icas

    do processo econômico   autonOlwzado"   e sua   UreíntegraçUo no   mundo da

    vida"1o -   que Marx afinal rejeitará expressan1ciite na  pa~sagem já   citada dolivro DI de  O Capllal.   Volt!U'Cmosa isso mais adiante.

     2. No plano existencial.   a utopia supõe que   a atividade   pessoal autô-noma e o trabalho social cO,lncidem, a ponto de constituírem uma unidade.

    Cada indivíduo deve poder, por meio de seu trabalho, identificar-se pesso-almente com a totalidade indivisa de todos (com o "trabalhador col~tivo

     produtivo") e encontrar, nesta identificação, seu apelfeiçoarnenlo. Em suma,

    a SOCiAlizaçãoIntegral (no sentido de   Vergesellsc1u:lftuIlg  e não de   Sotia-

    lisierullg)   da existência pessoal deve cOlTesponder à personalização lnte-

    3 7PrimeiraPari.- M.lamorlosesdoTrabalho

    o   horror dJante da idolhlria   da  crlaturn e  d e todo   Inço pessoal   com

    outros seres humanos devia dirigir impercepti vclmente [sua]energia para o campb da atividade objetiva (impessoal) ... Ocrislão ... age em função dos fins divinos e esses .são sempreimpe..'\soais. Toda relação pessoal   d e h o m e m n h o m e m , p u r a m en t es~ntimelltal-de.')provida,l'ortanlo. de rncionalidade- pode parecer

    . u r n a   idolatrio da come, sujeito pois à suspeição dessa moralascética ( ...). A seguinte advertência rião é exemplo suficieoteillente

    claro?''é um ato irracional, que não convém a urna criatura dotada

    de   razlJo,   amar alguém. além daquilo a que uos autoriza n   ra'lJ[~(...) Isso, com frcqtH!ncia,domina o  c.o;pírito   dos homens npontode   entl'llval' seu amor a Deus (Daxtcr,   Chlistiall Directory,   VI,. p.253).

    gral da existência social, a sociedade em' seu eonjunto tendo em :cada um

    seu sujeito cop.sciente e cada um   re c o n h e c e n d o n o c o n j u n t o   da sociedade

    sua   unificaçã~ com todos.

    A   utopia   marxiana,   o comunismo,   aparece, assim,   como   a formaacabada da racionalização: triunfo total da Razão e triunfo da razão totai;

    dominação cienUIica da Natur!,za e domlnio cientifico reflexivo do pro-

    cesso dessa dominação. Não apenàs a rcsullanle, coletiva da colaboraçãosoCial (até então "deixada ao acaso" porque essa colaboração não em

    voluntária) será "submetida ao poder dos indivíduos reunidos"; também

    sua união na "colaboração voluntária" será ela própl;a fundada aa vonta-

    de racional   de cada   um e  ns~egurará a unidade   entre   a   vontade de   cada ume   a vontade de   todos   1 fará cóincidir o trnbalhador individual e o trabalha-

    dor coletivo. . .,Tamanho triunfo da Razão supõe, claro, a racionalização integral da

    existência individual: a Ultictadeda Razão e da vida. E essa racionalização

    integral exige, por seu lado, ~ma disciplina ,individual que, por vews, lem-

     bra à ascese puritana: é na qualidade de indivíduo universal, despojado de

    seus~'interesses,  laços e nfeiçbes particulares, que cada um acederá   à  unida-

    de verdadeira entre o ~entid~ de sua vida e a Histótia. '. • f 

    21. Max Wcbcr   L'P,tlli   ue Protestante .... o. cit.   .122.

    Substitua-se, nessa citação de Max Weber, " o "cristilo" pelo "comu- " '

    nista", a "idolatria da carne'" pelo "individualismo pequeno-burguês", "fins  (0 . ) , ( ~""" '  

    divinos" por "sentido da História" etc. e se terá uma boa caracterlzaçflo da

    moral comunista tal como descnvolvcu.se historicamente   no .  stalinismo,no rnnofsmo e mesmo no cnstrismo. Essa semelhança entre a-ética:'puritana

    c  a moral comunista vem,   essencialmente,   do fato de que a racionalização

    1,

    i

    . .",

    AndréGorl- Melamollos esdo Tlabalho3 6

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    22.~ax   Wcbc:r.   Wir lsc1wjt I lJld   C!(!seIlscha/J.   K6Jn.. 1964.   p.   lq48.

    3 . A in t e g ra ç ã o f u n c io n a l o u

    a c is ã o e n t r e o tr a b a l h o e a v id a

    39P r im e i r a P a r t e - M e l a m o r f o s e s d o T r a b a l h o

    23. Cf. Andr6 Gorz,   Adieux au prortlQrlnt.   lê. Partie. Paris,   oatilée.   1980.

    maior complexidade das esferas econÔmica. administrativa. cient!fica. ar-t!stlea e a sua relativa autononúa ..

    À  medida que a economia, a administração, o Estado.   R   ciência dife-renciam-se e dAonascimento a aparelhos complexos. seu desenvolvimentoe seu funcionamento exigem uma subdivisão cada vez mais acill'ada dascompetências c das tarefas, uma   organização   cnda vez mais dlferenciada

    de funções   que. por seu turno. são cada vez mais especializadas.   O funcio-namento de conjunto de cada aparelho ultrapassa a compreensão dos indi-víduos que para ele concorrem e daqueles que (ministros, quadros executi-

    vos, administradores municipais c estAtaiS etc.), formalmente, são por ele

    institucionalmente responsáveis ..

     À  medida que sc.toma mais complexa. a organiZAção das funções,especializadas. em vista de uma tareÍll que ultrapassa e unifica de fora seusagentes. responde cada vez menos às motivações que têm esses Últimos

     para se conduzirem de maneira racional com relação à tarefa prevista. Paraque cooperem a sua realização. não se pode mais apostar em suas disposi-ções. capacidades e boa vontadc pessoais. Sua fiabilldade s6 será assegura-da pela   codificoçf1o   e pela   ,.egulamentaçtlo   formais de suas condutas, de

    suas tarefas e de suas relações. Chamo  funcional   uma conduta que 6 racio-

    nalmente adaptada a um fim. independentemente da intenÇ

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    24. Cf. André Gorz,  Adieux au ProUtariat, op.cit .•  Irra. Parte, cop. 3"b) e 4.2 5. TKH   n, p. 178, 226   e sego (TAC   11,p. 129.130, 165 e ,eg.).

    rior por uma organização pré-estabelecida." No seio dessa esfera da hetero-

    nomia, a natureza e o conteúdo das tarefas. assim como suas relações. sãoheterodetcrnúnados de maneira a fnus funcionar   os   indivíduos e os coleti-vos. eles mesmos complexos, como engrenagens de uma grande máquina(industrial, burocrática, militar) ou, o que dá no mesmo, de lhes fazer cum-

     prir.   à   revelia uns dos outros, as tarefas especializados exigidas pof'uma

    máquina que, em razão de suas dimensões e do número de funcionários que

    requer, retira de seu pessoal qualquer possibilidade de conciliar suas ativi-dades por meio de procedimentos de cooperação autoregulados (pela auto-

    gestão).   Éo  C8S0, por exemplo, das redes postal, ferroviária", aérea, elétricae, também, de toda indtlslria que utiliza diversos estabelecimentos especl-aliwdos. etn sel'a] afostados uns dos outros. para fornecer os componentesde um mesmo produto final .

    O tipo de colaboração e de integração na esfera da heteronomia difere

    radicalmente da cooperação e da integração dos membros de um grupo ou

    de uma comunidade de trabalho. Sem dúvida, a colaboração heterodeter-

    minada, por exemplo do tipo daquela organizada pelo taylorisIIi~, ou "or-

    ganização c ientíf ica do trabalho", comporta sempre, necessariamente. um

    UlÚlimo de cooperação autoregulada, um mínimo de entendimento c decoesão entre   os   membros de pequenas equipes atreladas a uma mesma tare-

    fa e, portanto, um mútimo de integração social. Nada impede, contudo,   que,esta seja apenas um elemento subordinado à integração funcional dos indi-víduos e dos grupos como engrenagens de uma maquinaria que os  ultrapas~saedomina.

    Há um parentesco evidente entre, de um lado, o que chamei esfera da

    heteronomia e integração funcional, e o que Habermas chama "sistema" c

    "integração sistêmica", por oposição ao "mundo da vida" e  à  "integração

    sociaI".25 Esta l1ltima "repousa sobre um consenso assegurado pela adesão

    n normas comUDS ou obtido peja comunicaçllo entro as participantes". AlIintegraçlfo sistémicau, ao contrário, Ué obtida por uma regularncntaçf(onão normativa das decisões individuais, que vai além da consciência dosatores". Habermos insiste sobre o fato de que a sociedade deve ser entendi-

    da como algo que diz respeito, ao mesmo tempo, ao "sistema" e ao "mundo

    da vida", isto é, integrada socialmente   e funcionalmente. sem jamais poder ser   inteiramente   nem uma, nem outra coisa: ela s6 poderia coincidir com o

    "mundo da vida" se "todas as inter-relações sistêmicas das relações [enb:eos indivíduos] pudessem ser integradas a seu saber intuitivo", isto.é, ser 

    autoreguladas em vista de um objeto comum e, portanto, suprimidas, preci-

    26. Ver Jean-Paul Snrtre.   C,./tiqul! dI! la Raisoh Dialecflqlle.  Paris, OallirTmrd, 1960,.t987.

    27. TomO.A noção de empréstimo n Edgar Morin,   Ú.l    V/e de la Vie,   Paris,   Le SeuiJ,1980. .

    1. ,,.,.

    .";

    4. ,

    4 1P rlm O lra P a rto - M o la m o rfo s e s d o T ra b a lo o

    sam~nte,.como imperativos !leterônomos ("sistêUlicos"). Por outro iado, a

    sociedade s6 se confúndiria com o "sistema" se pudesse   f unc i r ; m a r    comouma mecânica,   determinândb   para todos os seus órgãos. um funcionaUlentorigorosamente   heteroregula~o do exterior. "" .

    Se se prefere, a integl'lição autoregulada ("social") diz respeito a uma   _ l v \ ' .c~pacidade de auto-organização de individuas que conciliam   8U;'8  c ond u- ~ . ..

    tas em vista de um resultado a seI' atingido por sua ação coletiva.   Éo caso ~.d~q~.'Bo que Sartre descreveu como "grupo" (não apenas   l l g rupo   em fusão'"   I " . .

    mas~também grupo em vjas de se   difer~nciar  e m   U sub-gm pC ?s   especializa-dqs'{ coordenados por um "terceiro regulador" ?esignOdo para estefiín)." A ~.

    integraçllo heteroregulada, em troca, na qual (CJtoHabermas) "as áções [dosindiyIduos] são coordenadas; não   àbase de um acordo, mns de  i~tercone-xõe.s   funcionais, de  tal modo   que  não  corresponde   a nenhuma intenção   dos ~.

    "atofes   e.   na vida cotidiana,   em geral   ntio 6.percebida", remete   ao quc"Sartrc

    descl'eveu como totalização em exterioridade das ações dc individuos seri- ..

    alizados. . .

    Pode--se, contudo. distinguir   dois tipos   de heleroregulação ou de tota-lização, que no sistema de Habel'mas estão confundidos: aquele que diz

    respeito i\ totalização das açOes seJializadas que ninguém desejou, pensou,

    previu,   pelo  campo   material no   qual se inscrevem; e aquele que  diz respeitoà prograolação   organizada,   a um   org8(1.ogramn elaborado,   cujo fim   é fazercom que indivíduos incapazes de se comunicm e de se entender realizemum obje.to ou ,uma ação coletiva que   nã~inlencionam,   l1em  mesmo, comfreqUência, conhecem.

    O pj'imeil'o tipo de heteroregulação corl'csponde, mals pat1icularmen-

    te, à regulação pelo   mercado.  Écomum considerá-ia como uma autoregula- .ção. De fato, trata-se de um puro "mccanismo sistêmico" (Habermas) que

    impõe suas   l~isdo   e~teriora i~divíduosque dela$ são alvo o. vêem-seconstl'angidos: 11adaptnr'o   'modificar suas condutas e scus   Proj~08 em   fun~çft"ode um resultado externo, estatístico. totalmente involuntárIo. O  met" Caad o   é, p o r tantO,   pGJ'Q.   eles,   u m a   heteroregulaçt1o espontaneamente   de sc . e n -

    t rada. '27 Porém, s6   se  po~ee n x e r g A r    a r  uma autorcgulaçfto  c a so se  considereo ' conjunto social do exleriof, como um  sistema   puramente   material   doqual os que (, constitu.em,   à  maneira dos mo)éculas de um gás ou de um

    liquido inCl1es, mRlltêiIúip.nas rclações de .exterioridade e, desprovidos de.

    toda capacidade de perseguir fins,' não aprcsentam .pois, individualmente,nenhum interesse. "

    A n d ré   G O f l -   M a ta m o rfo s e s d o T ra b a lh o4 0

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    4 2  , ó

    . A n d ré G o ra - M e lá m o rlo se s ;d o T ra b a lh o   P rim e i ra P a rte - M e la m m lo se s d o T ra b a lh o

    A heteroregulação esponUlnea das ações selJalizadas, pelo ;mereadoespecialmente, nfio   apresenta   nenhum   sentido   para   os   indiv(du6s~que   per.seguem seus fins   individuais, independentemente   c   à   revelia uns dos ou-

    tros. Essas ações apresentam, em seu reSultado exterior, uma certa coeren-eia, mas essa coerência   é pura obra do abaso: refere-se a leis estatísticas dogênero daquelas da termodinâmica, e n~o possuem, portanto, nem sentido

    nel!! finalidade: A heteroregulação espo'ntânea não produz; a falar propria-mente,   integraçOo   dos indivíduos: o   qb e   ela   i~tegra, como   S n r t c c   o de.-

    .monstl"OU.  éa  materialidade   externa   das:  a ç õ e s q u e e s c a p a a  seus   au t o r e s c ,longe de   c o r r e s p o n d C l ; ;   fi uma   intençllo prÓpria   nos indivíduos,   ~esi8na~oscomo   Outros.   Nfto há   te m   fUl1cionnlidad~   d e..c ;s n s  açOcs outras   qu e   cada umrealiza,como trm outro. S6 caberia falar:de funcionalidade. quando o resul-tado das ações serializadas fosse Umafinalidade para alguém. Ora, os movi-mentos de Preço quc os compradores e vendedores, perseguindo cada qual.seu'interesse, provocam em um mercado perfeito, não respondem em defi-nitivo à intenção de nenhum deles c suas condutas não são, portahto, fuo-'cionais 'com relação a nada (salvo, se fosse o caso, com relação ao fim dealguém que os manipula contra sua vontade. divulgando falsas'notíciasquet por isso   ~esmo, falseiam o merqado) .   O mercado tampouco   éa .fmali-

    dade de nenhum dos operadores que ncle se confrontam; ele é o espaço queresulta de sua confrontação, assim   c o m o & t otrfinsito" 6:0 resultado   exteriorda conduta de todos aqueles que pegaram seus canos   :i  um momento dado.c vêem-se constrangidos, cada um por todos os demais, a 'uma velocidademé{lia que não correSponde Íl.intenção de nenhum deles.

    ~ir~sc-ia,porém.   que.o   mercado   é ele   também wna   instituição   cujofun~ionnmcnto   exige a observação de  CeIias  regras, como o trânsito, aliás, s6pode'esçoar o melhor possível se as condutas de cada motOJista forem   regu~

    lamentadas por um código rodoviário, limites de velocidade, um sistema desinalização etc? Abnndona~se,então, o tcn-eno.da hcteroregulação   cspon . t f l -

    nea   por aquele da regulamentação ou heteroregulação   programada. Na prática, toda sociedade moderna   é   um sistema complexo no qoal

    sub-sisteinas de   auto~organi,zação   u60municacional" , de heterorcgulaçIio

    espontflnca c de heteroregulBção progmmaC\a interagem. A, racionalidadeeconômica, à medida que fez nascer instalações técnicas' gigantescas e or-ganiznçlSes tentacularcs,   conferiu   um   peso   crescente aos subsistemas de ..heteroregulaçfto programada: isto 6, às maquinarias administrativas e  in~.

    dustriais nas quais os individuas São levados   afuncionar   de maneira   COIn- . plementar, àmaneJra dos órgftos de uma máquina, em vista de fins que, comfreqUência, desconhecem e s.ão diversos daqueles propostos' a sua busca

     pessoal.   Estes fins, que devem   motivar    os indivíduos a trabalharem emvislas 'de objetivos que lhes são estranhos, constituem um dos dois tipos deins~rumentos reguladores   ("Steue-rungsmedicn") que, confundidos em

    Habcrmas,   devem ser   distintos: os mais importantes, no primeIro tipo, são odinheiro, a segurança, o prestigio elou o poder ligndos às funções, segundouma engenhosa gmduação hierárquica. Ao lado desses   reguladores ;ncita-tivos, reguladores prescritivos   constrangem os indivíduos, soh pena desanções, a adotarem as conduras funcionais - o mais freqUentemente regu-lamentadas e formalizadas soh a forma de proccclimentos - exigidas peja

    organização. Os reguladores incitativos asseguram, eles sozinhos, a   inte- gração   funcional, levando os indivíduos a se disporem, de bom grado,   t iinstrumentalização de sua ativii:lade predeterminada.

    A expansão dos grandes apnrelhos de heleroregu1açfto programada produzirá uma cislio cada vez mais profunda do sistema social. De um lado,a massa da população, que fornece um trabalho cada vez mais espcclaliM-do e predeterminado, é motivada por fins ineilativos sem coerência algumacom a finalidade das organizações nas quais é funcionalmente integrada .De outro, uma pequena clite de organizadores tenta assegurar a coordena-çlio, as condições de funcionamento e a regulação das organizações em seuconjunto, determina as finalidades e a estrutura (o organograma) das  admi~lllstrações correspondentes e .define os mecanismos reguladores, indtati.

    vos c prescritivos, mais funcionais. Existe, portanto, uma cisão entre a :soci-

    edade cada vez mais manipulada, cada vez mais funcionnlizoda, e   8'adlninistração pública c privada cada vez mais invasivn; existe um divór-cio entre a esfera civil, autoregulada, cada vez mais reduzida, e um Estadodotado de poderes de heteroregulação cada vez mais extensos que exige o'funeionamento das máquinas administrativas e dos serviços públicos refe-rentes ao próprio Estado.

    A   esta cisão entre a esfera autoregulada da sociedade civil c a esferaheterorcgnlada da megamáquina   induslrial-estatal,   coITCSpondern   duns m-

    cionnlidades;.aquela dos indivíduos perseguindo fins que, mesmo quando

    motivam condutas funcionais, são irrracionais com  relação   às   finalidades

    das organizações nas quais trabaU18m; c aquela das drganizaçõcs, que não

    mantém nenhuma relação sensal1l com as finalidades que motivam os indi-víduos.

    Tal cisão do sistema social c tal divórcio entre racionalidades diver-sas engendram o esfacelamento da vida dos próprios indivíduos: vida pro-fissional e vida privada sãQ dOJ.11inadaspor normas e valores rndicalmente

    diversos, e até   contrarlitórios.   O êxito profissional pede, no interior dasgra.ndes organizaçtses, n vontade de   f;et bem sucedido conforme os critérios

    de eficácia puramente técnica das funções que se ocupa, qualquer que sejaseu conteúdo. Exige um espíritp de competiçl!o, de oportunismo e condes-cendência com os superiores. Será recompensado   e compensado   na esfera

     privada com uma vida confortável, opulenta, hedonista.   Dito  de outro modo,o exilo profissional torna-se o meio   de um conforto e prazeres privados sem

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    28. Max Webcr,   WirlschoJi  UM   Gesellscllaft. ap.cU.;   p.  1060.

    um poder crescente e  f'~almenlcinelutável, sem precedente nahistória . . , Ninguém sabe ainda quem. no  futuro.   se  nbrigar~ nessacarapaça, nem so, ao cabo   d e .c ;sc  desenvotvime~to   desmesurado.

    . .

    .' .

    45

    .. novas profecias ou um  renascimenlo   ilTesistívcl de antigas   idéias   e ' , .de antigo, ideais, surgirá ou, ao contrárip - na ralta deles _ virá.uma petrificaçllo mecanizada. dissimulada em   U J u a   espécie deentorpecimento do espírito. Ncssccaso, os ''últimos homens" desta.civilização poderiam confirmar a f6rmula: "cspcéialislas   s e mespírito. sensualistas   sem coração":   ccstc vazio iJnàginnler  içado  àhumanidade a um nível nunca nntes alcançado",29

    P r i m e i r a P a r l e - M o l a m o r l o so s d o T r a b a l h o

    4 . Da . i n teg ração func iona là   des i~ teg ração soc ia l

    A profeci a de Max Webcr foi ao mesino tempo confirmada e desmen-tida pela hislória: a burocracia tornou-se cada vez mais incômoda,   a   helero-regulação progriunada cada din mnis desumanizada, a "carapaça de servi- .dão". cada vez mais constrangedora e. ao mesmo tempo, confortável. Mas,exatamente por jsso, o sistcmn entrou em cr;se: o fúncionnmentlYda mega-ináquina burocrático-induslrinl e a motivação de seus '~felás" a funciona-rem como engrenngens, coloca1'am-Ihe problemas de reguJaçno cada vezmais :diflcejs de resolver, Nenhuma racionalidade. nenhuma   visfto   lotali-zante: podiam assegurar um sentido. urna coesão, um   fio  condutor   ao COn-

     junto. .

    PÓf muito tempo. o movimento operário revolucionário e os regimessociali~tasacreditaram poder   pvitar   ou inverter tais 9'esenvolvi.mentos. A"aproprinção colctiva dQs meios de produção" deveria reconciliar os trnba.lbadores com SUnfunção - e dão apenas com seu trabalho -'.eincitá-ios a

     assum.ir volruttariamen.te,   "em~nJ]ecjmentode causa, essa função,  A  apro-priação coletiva fatia  coincid.i~   fins individuais e fins coletivos, interessesde cada: um e interesses de   lodos.   A tarefa coletiva tornar-se-in,. para   cadaum, suficientemente motivadora. em razllo das protnessas e d~sesp'erançasque cbntinba para   todos,   para que   os reguladores   incitativos   p~rticllJarC8-os  "eStrluulos   lnatcriais" ou   llRrecompenslls   individuais .....pudessem tornar-se   In 6   i!t\HCIs quanto os reguladores presetitivos.

    Áj"consciência socialista" desenvolver-5c-ia   em   cada um c. traria   ucada um a convicção de que seu interesse coincidia coin o de todos e que,dedieaJfdo-se inteirarnente.à tllrefa que lhe era atribuída, cada um trabalha-va pnl'aSi mesmo através da mediação de todos e; assim, o esforço serviria aseu apéifeiçoBrnento pessoal e, ao mc.'mo tempo, a' sua unificação .com asociedade e com o sentido d~ História.   A   "COnsciência socialista",   em suma,

    29. Max Webel", L'éthiquc   protlJstame ...,   o ,clt..   .223-225 tJ"ad,mod.. '

    A nd r é G o r z - M o l a m o r l o sos d o T r a b a l h o44

    relação alguma com as qualidades profissionais, isentas de virtudes pesso-ais e a vida privada protegida dos imperativos da vida profissional. .

    Éassim que a~ virtudes privadas de bom pai, bom marido, apreciado pelos vizin1JOs, potiem andar de par com a cficácia profissional do funcio-nário, que passa indiferentemente do serviço .da República àquele do Esta-do totalitário e inversamente; o amável colecionador de objetos, de arte e

     protetor dos pássaros trabalhará indiferentemente na fahricação de pestici-das ou de armas químicas e, de uma maneira   IgeraI?   o grande ou   O pequeno

    executivo, ap6s fornecer uma jornada de u'àbalbo a serviço dos valoreseconômicos de compctitividade, de rendimento e de eficáCia técnica, qu"er encontrar depois de Seu trabalho um ninho aconchegante onde os valoreseconômicos são substituídos pelo amor dos filhos, dos animais, das paisa-gens, do hobby elc. Voltaremos a isto mais à frente.

    Muito antes dos contra-utopistas da ficção ci~ntffica contemporânea,Max Weher já pensava que a burocratização   e   n maquinizaçllo progrediri-am até   fazet:em   da sociedade uma s6 megamáquinn, que   Suas  engrcn'agens

     bumanas, "como os felás da antiguidade egípcia, seriam constrangidas aservir impotentes, enquanto o único e supremo valor que decidirá se amaneira pela qual devem ser dirigidos os negócios for a qualidade pura-menle técnica, isto é, racional, de sua administrnção e de sua responsnbiJi-zação pejo Eslado". Porá   110   mesmo plano "o espfrito congulndo"   (gero,,-

     nener Geist)   das  "máquinas   inanimadas" e das  "máquinas   vivas querepresentam as organizações burocráticas, com sua especialização do tea.bolha profissional, !ma dcUm1taç!o das compotências, seus,regulamentos esuas relações de suborclinação hierárquica". Comparará a máquina   indus-trial-burocrática a uma "carapaça de servidão"   (Gehtluse der HiJrigkeit),   anos proteger contra a insegurança e n angdstia, mas ao preço de umn priva-ção de sentido e de liberdade, de uma "desumanização" geral desse "uni-verso colossal que é a ordem econÔmica moderna, fundada sobre as bnseslécnicas e econÔmicas de uma produção maquinista-mecânica que deter-mina hoje   e  continuará a  deternúnDl'   por seus constrangimentos esmagado-res o estilo de vida de todos os indivíduos - c  não   apcnas dos indivíduosativos economicamente - jogados dcsde o nascimento nas engrenagensdessa máquina, até quc o último quintal de combustível fóssil seja consu- .mido".13 Os ubens  exte~:'iores  de..

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    Portarias DETRANde 9-9-2013

    Credenciando:

    - a Psicóloga Maria Conceição Pereira Siqueira, CRP 06/23.819,

    para proceder aos exames de avaliação psicológica nos

    condutores e candidatos   à   obtenção da permissão para conduzir,

    com consultório sito na Avenida Mario Lopes Leão, 529, Bairro:

    . Santo Amaro, São Paulo/SP.

    Estabelecer que o credenciamento   é   realizado sob a forma da

    permissibilidade, a título precário e sem ônus para o Estado,

    podendo haver o cancelamento desde que justificado o interesseda Administração, sendo fixadas as cotas de 10 (dez) exames

    •diários de segunda a sexta-feira e 05 (cinco) exames aos sábados.

    Fixar os honorários dos exames realizados em 3,850 UFESP

    estabelecido na Tabela "C" item 8.4 da Tabela a que se refere o

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