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Ministério Público do Estado de Pernambuco Promotoria de Justiça de Defesa da Cidadania da Capital Excelentíssimo Senhor Juiz de Direito da Vara da Fazenda Pública da Capital. Ministério Público do Estado de Pernambuco, representado pelos Promotores de Justiça que a presente subscrevem, no uso de suas atribuições legais em defesa dos interesses difusos, coletivos e individuais indisponíveis, notadamente do patrimônio público, diante do que consta das peças de informação em anexo (Procedimento de Investigação Preliminar nº 27/07), na forma e com fundamento nos artigos 37, 127 e 129, III, da Constituição da República combinados com os artigos 1º, inciso IV e 5º da Lei nº 7.347, de 24 de julho de 1985 (Lei da Ação Civil Pública); 1º e 25, inciso IV, alínea a da Lei nº 8.625, de 12 de fevereiro de 1993 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público); 1º e 4º, inciso IV, alínea a da Lei Complementar nº 12, de 27 de dezembro de 1994 (Lei Orgânica do Ministério Público do Estado de Pernambuco) e nos dispositivos legais adiante invocados, vem à presença de Vossa Excelência propor a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA em desfavor de João Paulo Lima e Silva, ex-prefeito da Cidade do Recife, brasileiro, técnico em edificações, inscrito no Cadastro de Pessoas Físicas do Ministério da Fazenda sob o número 079.931.374-20; Marcus Tullius Bandeira de Menezes, ex-secretário Municipal de Saneamento, brasileiro, engenheiro, inscrito no Cadastro de Pessoas Físicas do Ministério da Fazenda sob o número 148.661.534-15; Edgard Galvão Raposo Neto, ex- Diretor do Departamento de Administração Setorial da Secretaria de Saneamento, inscrito no Cadastro de Pessoas Físicas do Ministério da Fazenda sob o número 053.240.764-49; Instituto de Pesquisas Sociais Aplicadas, pessoa jurídica de Direito Privado, inscrita no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas do Ministério da Fazenda sob o número 40.818.841/0001-25. pelas razões de fato e de direito adiante aduzidas: Rua 1º de Março nº 100 – Santo Antonio – Recife/PE – CEP: 50010-070 – Fone (81) 3182-7265 1 de 15

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Excelentíssimo Senhor Juiz de Direito da Vara da Fazenda Pública da Capital.

Ministério Público do Estado de Pernambuco, representado pelos Promotores deJustiça que a presente subscrevem, no uso de suas atribuições legais em defesa dosinteresses difusos, coletivos e individuais indisponíveis, notadamente do patrimôniopúblico, diante do que consta das peças de informação em anexo (Procedimento deInvestigação Preliminar nº 27/07), na forma e com fundamento nos artigos 37, 127 e129, III, da Constituição da República combinados com os artigos 1º, inciso IV e 5º daLei nº 7.347, de 24 de julho de 1985 (Lei da Ação Civil Pública); 1º e 25, inciso IV, alíneaa da Lei nº 8.625, de 12 de fevereiro de 1993 (Lei Orgânica Nacional do MinistérioPúblico); 1º e 4º, inciso IV, alínea a da Lei Complementar nº 12, de 27 de dezembro de1994 (Lei Orgânica do Ministério Público do Estado de Pernambuco) e nos dispositivoslegais adiante invocados, vem à presença de Vossa Excelência propor a presenteAÇÃO CIVIL PÚBLICA em desfavor de

João Paulo Lima e Silva, ex-prefeito da Cidade do Recife, brasileiro, técnico emedificações, inscrito no Cadastro de Pessoas Físicas do Ministério da Fazenda sob onúmero 079.931.374-20;

Marcus Tullius Bandeira de Menezes, ex-secretário Municipal de Saneamento,brasileiro, engenheiro, inscrito no Cadastro de Pessoas Físicas do Ministério daFazenda sob o número 148.661.534-15;

Edgard Galvão Raposo Neto, ex- Diretor do Departamento de Administração Setorialda Secretaria de Saneamento, inscrito no Cadastro de Pessoas Físicas do Ministério daFazenda sob o número 053.240.764-49;

Instituto de Pesquisas Sociais Aplicadas, pessoa jurídica de Direito Privado, inscritano Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas do Ministério da Fazenda sob o número40.818.841/0001-25.

pelas razões de fato e de direito adiante aduzidas:

Rua 1º de Março nº 100 – Santo Antonio – Recife/PE – CEP: 50010-070 – Fone (81) 3182-7265 1 de 15

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DOS FATOS

Em face da edição do Termo de Dispensa de Licitação publicado no Diário Oficial doMunicípio em 24 de março de 2005 (Documento 01), a Promotoria de Justiça de Defesada Cidadania – Defesa e Proteção do Patrimônio Público – instaurou o ProtocoloInterno nº 270/05 (Documento 02), posteriormente convertido no Procedimento deInvestigação Preliminar nº 27/07, através do qual buscou apurar a legalidade dacontratação direta do Instituto de Pesquisas Sociais Aplicadas para a realização deserviços de consultoria para desenvolvimento de planos, programas e projetos nossegmentos da Engenharia, da Articulação Social, do Planejamento e do Apoio.

Na instrução do citado procedimento, foi requisitada à Prefeitura da Cidade do Recifecópia do processo de Dispensa de Licitação, bem como foi requisitado ao Tribunal deContas do Estado cópia do Relatório Preliminar (Documento 03), da Defesa (Documento04)e do Voto relativos ao Processo TC nº 0403276-7(Documento 05).

Do conjunto probatório verifica-se que, no exercício financeiro de 2004, a Prefeitura daCidade do Recife, através do Processo de Dispensa nº 03/2004 (Documento 06),contratou diretamente o Instituto de Pesquisas Sociais Aplicadas para a realização dosserviços acima elencados com arrimo no disposto no artigo 24, XIII, da Lei deLicitações.

O Termo de Dispensa foi publicado no Diário Oficial do Município, em 19 de fevereiromarço de 2004, pelo Diretor do Departamento de Administração Setorial da Secretariade Saneamento – Edgard Galvão Raposo Neto – sendo ratificado pelo então secretário– Antonio da Costa Miranda Neto.

Tal contrato teve o valor global de R$ 2.199.000,00 (dois milhões cento e noventa e novemil reais).

Posteriormente, no exercício financeiro de 2005, a Prefeitura da Cidade do Reciferealizou o Processo de Dispensa de Licitação nº 02/05 (Documento 07), findando porcontratar diretamente, mais uma vez, o Instituto de Pesquisas Sociais Aplicadas para arealização dos serviços de consultoria para desenvolvimento de planos, programas eprojetos nos segmentos da Engenharia, da Articulação Social, do Planejamento e doApoio, ainda com arrimo no disposto no artigo 24, XIII, da Lei de Licitações.

Em 21 de março de 2005, a Prefeitura da Cidade do Recife, representado pelo entãoPrefeito – João Paulo Lima e Silva – e os Secretários de Assuntos Jurídicos, Finanças eSaneamento – respectivamente Bruno Ariosto Luna de Hollanda, Elísio Soares deCarvalho Júnior e Marcus Tullius Bandeira de Menezes – firmou o contrato nº 45/2005(Documento 08), sendo a contraparte o dito Instituto de Pesquisas Sociais Aplicadas.

Este segundo contrato teve o valor global de R$ 1.657.000,00 (um milhão, seiscentos ecinqüenta e sete mil reais).

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Em ambos os contratos, o objeto pactuado foi a prestação de serviços de consultoriapara desenvolvimento de planos, programas e projetos nos segmentos da Engenharia,da Articulação Social, do Planejamento e do Apoio, conforme especificações constantesdo Termo de Referência.

Segundo os elementos presentes no Termo de Referência suscitado, a dita consultoriaconsistiria em atividades nas áreas de Engenharia, Articulação Social e Planejamento eApoio.

Na área de Engenharia seria realizado:

− Levantamento topográfico; relatório técnico preliminar; projeto básico de engenharia; planourbanístico; projeto executivo de engenharia; fiscalização de obras cadastro técnico; operaçãoe manutenção de rede e ramais prediais e de esgoto; atendimento ao público nos escritórioslocais.

Na área de Articulação Social as atividades realizadas seriam:

− Articulação com as demais secretarias do município e empresas do setor público e privado;idem com os canais de participação da sociedade civil; planejamento e coordenação das açõesintegradas de mobilização comunitária, educação sanitária e ambiental; convocação esensibilização da população através das lideranças, associações comunitárias e demaisinstituições através dos diversos canais e fóruns de comunicação para definição de um novoarranjo institucional para prestação dos serviços de saneamento na cidade do Recife; essetrabalho se desenvolve através da realização de visitas de campo, reuniões, oficinas eassembléias.

Na área de Planejamento e Apoio administrativo seriam:

− A coordenação, planejamento e concepção geral dos planos, programas e projetos daSESAN; articulação de ações visando à captação de recursos; acompanhamento, avaliação econtrole das ações, projetos e obras da secretaria; acompanhamento e controle orçamentárioe financeiro; gestão e acompanhamento físico-financeiro dos contratos; gestão de informáticano âmbito da SESAN; elaboração de relatórios mensais e da Gestão; execução orçamentáriae financeira e apoio administrativo.

No entanto, o objetivo estatutário do Instituto de Pesquisas Sociais Aplicadas é diversodo contido nos ditos ajustes. Com efeito, o artigo 2º do seu Estatuto estabelece que:

Art. 2º. O IPSA tem por objetivo a prestação de serviços técnicos nas áreasadministrativa, contábil, social e econômica para o desenvolvimento da pesquisacientífica, do ensino e da extensão através de:

I – Colaboração com as Universidades, Fundações, Associações, estabelecimentosisolados de ensino superior, ou quaisquer outros tipos de entidades, público ouprivadas, nacionais ou estrangeiras, em programas de desenvolvimento científicoou tecnológico;

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II – Promoção e realização de seminários, assessorias, consultorias, simpósios,congressos, palestras, e estudos relacionados com os diversos ramosadministrativo-sócio-econômico;III – Promoção da divulgação de conhecimentos científicos e a edição depublicações, didáticas, técnicas e científicas; IV – Promoção e realização de estudos referentes à defesa, preservação econservação do meio ambiente e do desenvolvimento sustentável;V – Capacitação de estudantes e professores universitários por meio da concessãode bolsas de estudo, de pesquisa e de estágio.

Ante tal incompatibilidade, a Técnica de Auditoria das Contas Públicas PatríciaSantoro de Mello, quando da elaboração do Relatório Preliminar do Processo TC nº0403276-7, assinalou:

Confrontando o objeto estatutário do IPSA e o objeto contratual, observamos que:

− A prestação dos serviços a serem contratados não compreendem a pesquisa, oensino ou o desenvolvimento institucional, ou ainda, a recuperação social do preso;

− A finalidade estatutária do IPSA não contempla qualquer parcela da prestação deserviço nos segmentos da engenharia, da articulação social, do planejamento e doapoio.

Na esteira de tal entendimento, a Primeira Câmara do Tribunal de Contas do Estado dePernambuco, proferiu, nos autos do Processo TC nº 0403276-7, a Decisão nº 1.474/2006(Documento 09), julgando irregular a Dispensa de Licitação nº 003/04, na qual consta:

Decidiu a Primeira Câmara do Tribunal de Contas do Estado, à unanimidade, emsessão ordinária realizada no dia 09 de novembro de 2006, considerando que ointeressado não justificou as irregularidades apontadas no Relatório Preliminar, àsfls. 76 a 82 dos autos, julgar IRREGULAR a Dispensa de Licitação nº 003/04objeto da presente Auditoria Especial realizada na Secretaria de Saneamento daPrefeitura da Cidade do Recife, e determinar: 1-Que a Secretaria de Saneamento abstenha-se de proceder a qualquer contrataçãosem licitação com base no disposto no inciso XIII do artigo 24 da Lei nº 8.666/93,quando o objeto pretendido não for conexo com as atividades de pesquisa, ensino oudesenvolvimento institucional precipuamente desenvolvidas pela instituição que sepretenda contratar;

2-Que a dispensa de licitação só deverá ser adotada, em substituição aoprocedimento licitatório, quando for para resguardar interesse público tão relevantequanto os que se busca proteger por meio da licitação.

Por fim, que cópias do Relatório Preliminar (fls. 76 a 82), da Defesa (fls. 95 a 107)e da Proposta de Voto nº 042/06 (fls. 403 a 407) sejam encaminhadas aoMinistério Público do Estado, para as providências cabíveis.

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DO DIREITO

O artigo 37, XXI, da Constituição da República, dispõe que as obras, serviços, compras ealienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade decondições a todos os concorrentes.

O referido instituto, à luz do dispositivo constitucional, é regrado pela Lei nº 8.666/93;a qual, em seu artigo 3º dispõe que a licitação destina-se a garantir a observância doprincípio constitucional da isonomia e a selecionar a proposta mais vantajosa para aAdministração e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos dalegalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidadeadministrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos quelhe são correlatos.

Conforme leciona Lucas Rocha Furtado, além da busca pela proposta mais vantajosa, alicitação deve realizar o princípio da isonomia. É evidente que a Administração deverá buscarnas propostas apresentadas pelos licitantes aquela que melhor realize seus interesses imediatos.Porém, a busca deste fim, isto é, a busca de maiores vantagens, não autoriza a violação dasgarantias individuais ou o tratamento mais favorecido à determinada empresa ou a particularem detrimento dos demais interessados em participar do processo. A lei, ao afirmar que alicitação visa igualmente à realização do princípio da isonomia, procura evitar tratamentodiscriminatório injustificado entre os possíveis interessados1.

Para Marçal Justen Filho2, não só o aspecto econômico deve ser considerado. E comentaque a licitação busca realizar dois fins, igualmente relevantes: o princípio da isonomia e aseleção da proposta mais vantajosa. Se prevalecesse exclusivamente a idéia ‘vantajosa’, a buscada ‘vantagem’ poderia conduzir a Administração Pública a opções arbitrárias ou abusivas.Deverá ser selecionada a proposta mais vantajosa, mas, além disso, tem-se de respeitar osprincípios norteadores do sistema jurídico, em especial, o da isonomia.

Entrementes, ao se confrontar as contratações empreendidas pela Secretaria deSaneamento com as normas pertinentes contidas no Estatuto de Licitações, observa-seo acentuado desvio empreendido por aquele órgão nas referidas contratações.

Tal consideração decorre da elasticidade empregada pelos gestores municipais nomanejo das hipóteses de dispensa previstas no artigo 24 da Lei nº 8.666/93.

Com efeito, os casos de dispensa foram editados de forma taxativa pelo legislador(numerus clausus). Entretanto, em qualquer hipótese, o espectro da dispensa de licitaçãonão passa de exceção à regra, sendo esta prevalecente e garantida a suaobrigatoriedade.

1 Lucas Rocha Furtado, in Curso de Licitações e Contratos Administrativos, Editora Fórum, 2007,página 31

2 Marçal Justen Filho, in Curso de Direito Administrativo, Editora Saraiva, página 311

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Cabe salientar que, consoante a boa hermenêutica, toda exceção deve ser interpretada de modo restrito. Não é cabível ampliá-la, alargando o seu campo de incidência.

Essa é a observação firmada por Adilson Abreu Dallari, no sentido de que é umprincípio fundamental de hermenêutica que as exceções devem ser tratadas de maneira restrita.Quando houver alguma dúvida quanto à exigibilidade ou dispensa de licitação, é preciso nãoesquecer de que a regra geral é a exigibilidade, e de que a exceção é a dispensa3.

Com tais considerações, observa-se que o artigo 24, XIII, dispõe ser dispensável alicitação na contratação de instituição brasileira incumbida regimental ou estatutariamente dapesquisa, do ensino ou do desenvolvimento institucional, ou de instituição dedicada àrecuperação social do preso, desde que a contratada detenha inquestionável reputação ético-profissional e não tenha fins lucrativos; as compras, sempre que possível, deverão submeter-se àscondições de aquisição e pagamento semelhantes às do setor privado.

Sobre a temática, segue, mui apropriadamente, o escólio de Marçal Justen Filho4:

“Um aspecto fundamental reside em que o inc. XIII não representa uma válvula de escape paraa realização de qualquer contratação, sem necessidade de licitação. Seria um despropósitoimaginar que a qualidade subjetiva do particular a ser contratado (instituição) seria suficientepara dispensar a licitação para qualquer contratação buscada pela Administração. Ou seja,somente se configuram os pressupostos do dispositivo quando o objeto da contratação inserir-seno âmbito de atividade inerente e próprio da instituição [...].

[...] não há cabimento de invocar o inc. XIII para produzir a execução de objeto que não éinerente à atividade própria da instituição, no âmbito daquelas funções explicitamente indicadasno texto legislativo. Muito menos cabível é desnaturar o fim da instituição para agregar outrosobjetivos, de exclusivo interesse da Administração, que são encampados pela entidade privadacomo forma de captar recursos para a sua manutenção.

Nesse sentido, o TCU tem proferido inúmeras decisões. Cabe lembrar passagem que se encontrano Acórdão nº. 1.616/2003 – Plenário, no sentido de que ‘a jurisprudência desta Corte jáafirmou que, para a contratação direta com base na norma supra, não basta que a entidadecontratada preencha os requisitos estatutários exigidos pelo dispositivo legal, é necessário,também, que o objeto a ser contratado guarde estreita correlação com as atividades de ensino,pesquisa ou desenvolvimento institucional’ (Rel. Min. Augusto Sherman Cavalcanti).

As considerações acima efetuadas conduzem à necessidade de um vínculo de pertinênciaabsoluta entre a função da instituição e o objeto da avença com a Administração. Isso equivale aafirmar que somente podem ser abrigadas no permissivo do inc. XIII contratações cujo objeto seenquadre no conceito de pesquisa, ensino, desenvolvimento institucional ou recuperação socialde presos.[...]

3 Adilson Abreu Dallari, in Aspectos Jurídicos da Licitação, 3ª Edição, 1992.4 Marçal Justen Filho, in Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos São Paulo,

Editora Dialética, 2005, páginas 254/255

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Mas, ainda quando se configure uma atividade que se enquadre nos aludidos conceitos, éimperioso que o objeto específico da contratação se traduza numa atividade específica dainstituição contratada. Assim, uma instituição voltada à pesquisa não pode ser contratada semlicitação para desempenhar atividades de recuperação social do preso. Mais ainda, deve ter-se emvista a vocação específica e delimitada de atuação da instituição no âmbito dos diversos objetos.O raciocínio é o de que não existem instituições de fins gerais. Uma instituição não se dedica à‘pesquisa’, numa acepção ampla que pudesse abranger todos os setores do conhecimentohumano.

Logo, uma instituição voltada ao ‘desenvolvimento institucional’ apenas poderá ser contratada,sem licitação, para atividade que se configure como desenvolvimento institucional. Mais ainda,seria imperioso verificar se a finalidade e o objetivo de desenvolvimento institucional buscadospela Administração se enquadram na específica atuação desempenhada por dita instituição.[...]

Assinale-se que a Decisão nº. 346/1999, proferida pelo Plenário do TCU e que tem sidoseguidamente invocada pelo Tribunal, aponta a necessidade de existência de ‘nexo entre omencionado dispositivo, a natureza da instituição, e o objeto a ser contratado, além decomprovada razoabilidade do preço cotado’.[...]”.

Trata-se, conforme abalizada Doutrina, de hipótese de dispensa de licitação em razãoda pessoa contratada.

A configuração da hipótese de contratação direta de instituições voltadas à pesquisa,ensino ou desenvolvimento institucional vincula-se obrigatoriamente aos seguintesrequisitos:

a) a instituição a ser contratada necessariamente será brasileira, ou seja, aquelaconstituída sob as leis brasileiras e com sede e administração no país, sendo, portantovedada a contratação, sob esse fundamento legal, com instituições estrangeiras;

b) o ato constitutivo da instituição deve estipular como objetivo a pesquisa, o ensino ouo desenvolvimento institucional, ou, ainda, que a instituição seja dedicada àrecuperação social do preso, esta última, representa da mesma maneira que as outrashipóteses, um incentivo a tais instituições que têm por escopo promover aressocialização dos apenados, que estão sob tutela do Estado;

c) a instituição não poderá ter fins lucrativos, assim considerada se visar a obtenção deproveito financeiro em contrapartida ao desempenho de suas atividades fins. Com isso,evita-se a possibilidade de favorecimento de uns em detrimento de outros, a chamadaconcorrência desleal, ser promovida pelo próprio Estado;

d) a instituição terá necessariamente que deter reputação ético-profissional, queequivaleria ao reconhecimento, pelo mercado, de sua capacitação técnica para execuçãodo objeto do contrato e sua idoneidade, não se confundindo com a notória

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especialização, mencionada na hipótese de inexigibilidade do art. 25, da Lei deLicitações;

e) existência de nexo entre a especialidade de pesquisa, ensino ou finalidade dainstituição com o objeto que a Administração pretende contratar;

f) vinculação personalíssima da instituição contratada com a execução direta do objetodo contrato, vedada a terceirização ou a subcontratação;

g) na hipótese da finalidade de desenvolvimento institucional, este não pode serinterpretado de maneira genérica, mas, sim, de interesse público, que promova o bemestar social tutelado pelo Estado, não se prestando ao atendimento da satisfação deapenas um grupo a ser beneficiado, isto é, deve ser indissociável do interesse públicosob responsabilidade e dever do Estado, constitucionalmente estabelecido.

Conforme consta também entre os fundamentos da Decisão nº 1.474/2006 do Tribunalde Contas do Estado, as contratações diretas empreendidas pela Secretaria deSaneamento não possuem o requisito do nexo entre a especialidade de pesquisa dainstituição e o objeto pretendido pela Administração.

Nesse sentido, Jorge Ulisses Jacoby Fernandes registra, quanto à aplicabilidade danorma em destaque, a necessidade de buscar-se "uma correlação entre as instituições e oobjeto do futuro contrato, embora a Lei expressamente não o exija (...)"5.

Sobre o tema, a orientação jurisprudencial do Tribunal de Contas da União é nosentido contrário à contratação direta fundada no artigo 24, inciso XIII, quando o objetopretendido não for conexo com as atividades de pesquisas, ensino e desenvolvimentoinstitucional precipuamente desenvolvidas pela instituição que se pretenda contratar.

Com efeito, temos as seguintes Decisões:

Decisão nº 30/2000Processo nº 000.728/1998-5

O Tribunal Pleno, ante as razões expostas pelo Relator, DECIDE:8.2. determinar ao INSS que:8.2.1. limite-se a efetuar contratações com dispensa de licitação fundamentada noart. 24, inciso XIII, da Lei nº 8.666/93 quando, comprovadamente, houver nexoentre esse dispositivo, a natureza da instituição contratada e o objeto contratual,este necessariamente relativo a ensino, a pesquisa ou a desenvolvimentoinstitucional, o que não é o caso de serviços de consultoria organizacional;

Decisão nº 346/19998. Decisão: O Tribunal Pleno, diante das razões expostas pelo Relator, decide:

5 Jorge Ulisses Jacoby Fernandes, in Contratação Direta sem Licitação, Brasília Jurídica, 1ª ed., p.225

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8.3 – determinar ao Instituto do Meio Ambiente e dos Recursos NaturaisRenováveis –IBAMA que somente proceda à contratação direta mediante a dispensa de licitação,com base no inciso XIII, do art. 24, da Lei nº 8.666/93, nas hipóteses em quehouver nexo entre o mencionado dispositivo, a natureza da instituição e o objeto aser contratado, além de comprovada a razoabilidade do preço cotado;

Decisão nº 830/1998Processo nº: 001.198/1997-1O Tribunal Pleno, diante das razões expostas pelo Relator, DECIDE,com fundamento nos arts. 1º, incisos II e XVI, 41,43 e 45 da Lei nº 8.443/92 e noart. 234 do Regimento Interno/TCU: c.1) proceda ao devido processo licitatório nas contratações de serviços deinformática, preservando a dispensa nos termos do inciso XIII do art. 24 da Lei8.666/93 para quando, excepcionalmente, houver nexo entre este dispositivo, anatureza da instituição e o objeto a ser contratado;

Acórdão nº 1549/2003Processo nº 004.296/2003-5ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em sessãoPlenária, diante das razões expostas pelo Relator e com fundamento nos arts. 1º, II,43, II, 45 da Lei 8.443/92 e 246 do Regimento Interno, em:9.4. determinar à CPRM que:9.4.2. restrinja as contratações por dispensa de licitação com fulcro no art. 24,inciso XIII, da Lei 8.666/93, aos específicos casos em que esteja comprovado o nexoentre o mencionado dispositivo, a natureza da instituição e o objeto a sercontratado, observando sempre a razoabilidade do preço cotado;

Jorge Ulisses Jacoby Fernandes observa que mais do que isso, é preciso que o objeto que serácontratado seja a causa da reputação da instituição pelo modo diferenciado qualitativamente queexecuta. Por isso não se concebe – e é irregular – que uma instituição seja contratada paraobjetos distintos, diferentes. Há que ser sempre objeto da mesma natureza em todas ascontratações fundadas no art. 24, XIII, da Lei nº 8.666/93. Se uma instituição ora é contratadapara realizar serviço de informática, noutra de pesquisa médica, noutra de treinamento, ficaevidenciado que sua múltipla funcionalidade não é pertinente à reputação ético-profissional.6

Por esta razão que Lucas Rocha Furtado assevera que o entendimento não pode ser outro.Na hipótese de desconsideração do objeto a ser contratado (...) estar-se-ia concedendo àsentidades em questão privilégios totalmente desarrazoados. Ademais, tal prática provocariacompleto desvirtuamento do instituto da licitação, pois qualquer tipo de serviço poderia sercontratado sem licitação, bastando que a contratada possua os requisitos estabelecidos na lei.7

À guisa de arremate, observa-se que, no caso ora em análise, o descumprimento doscomandos do artigo 24, XIII, foi flagrante. O demando Instituto de Pesquisas Sociais

6 Jorge Ulisses Jacoby Fernandes, in Contratação Direta sem Licitação, 6ª Edição, Editora Fórum,Belo Horizonte, 2007, página 500

7 Lucas Rocha Furtado, in Curso de Direito Administrativo, Editora Fórum, 2007, página 439

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Aplicadas possui expertise na área administrativa, contábil, social e econômica. Taisramos do conhecimento não correspondem ao objeto dos contratos firmados:engenharia e articulação social. Deste modo, é de todo inconcebível a sua contrataçãodireta com suporte no permissivo de dispensa da Lei de Licitações. Tal condutaevidencia descumprimento e desrespeito aos preceitos constitucionais e legais atinentesàs licitações e contratações pela Administração Pública.

Da Improbidade Administrativa

O artigo 37, da Constituição Federal dispõe que a administração pública direta, indireta oufundacional de qualquer dos poderes da União, dos Estados e dos Municípios obedecerá aosprincípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e também que (...) § 4º - Osatos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda dafunção pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradaçãoprevistas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.

Regulamentando citado dispositivo constitucional, foi promulgada em 02 de junho de1992, a Lei nº 8.429/92, que, em seu artigo 11 afirma que constitui ato de improbidadeadministrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ouomissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade àsinstituições, e notadamente: I – praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento oudiverso daquele previsto na regra de competência.

O ato de improbidade administrativa previsto no artigo 11, I, da citada lei deve serinterpretado em consonância com o disposto no artigo 24 e seus incisos da Lei nº8.666/93.

Vale reiterar, que as hipóteses nele inseridas são taxativas, não sendo possível que aAdministração Pública dispense o processo licitatório além daqueles casos, sob pena dese configurar uma dispensa indevida e, conseqüentemente, ato de improbidadeadministrativa.

O Superior Tribunal de Justiça, examinando a dita questão através do Recurso Especialnº 685.325 PR, firmou a seguinte decisão:

EMENTA: ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADEADMINISTRATIVA. RESPONSABILIDADE DE PREFEITO. COMPRA DEMATERIAIS. FRACIONAMENTO DE NOTAS FISCAIS. IMPROBIDADE.I - A Lei de Improbidade Administrativa considera ato de improbidade aquele tendente a frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente. Foi exatamente o que ocorreu na hipótese dos autos quandorestou comprovado, de acordo com o circunlóquio fático apresentado no acórdãorecorrido, que houve burla ao procedimento licitatório, atingindo com isso osprincípios da legalidade, da moralidade e da impessoalidade.

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II - O artigo 11 da Lei 8.429⁄92 explicita que constitui ato de improbidade o queatenta contra os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade àsinstituições. Na hipótese presente também se tratou de atentado, ao menos, contraos deveres de imparcialidade e legalidade, em face do afastamento da norma deregência, in casu, a Lei nº 8.666⁄93.III - Recurso especial improvido.

ACÓRDÃO: Vistos e relatados os autos em que são partes as acima indicadas,prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro TEORI ALBINOZAVASCKI, decide a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, porunanimidade, negar provimento ao recurso especial, na forma do relatório e notastaquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presentejulgado. Os Srs. Ministros LUIZ FUX, TEORI ALBINO ZAVASCKI (voto-vista) e DENISE ARRUDA votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausentes,ocasionalmente, os Srs. Ministros Relator e JOSÉ DELGADO. Custas, como delei. Brasília(DF), 13 de dezembro de 2005 (data do julgamento). MINISTROFRANCISCO FALCÃO Relator

No presente caso, observamos que as dispensas indevidas redundaram na realizaçãode serviços de consultoria no montante de R$ 3.856.000,00 (três milhões, oitocentos ecinqüenta e seis mil reais).

A realização, por parte dos demandados, das dispensas de licitação, ora questionadas,atentaram contra os princípios norteadores da Administração Pública, quais sejam, oda legalidade, e impessoalidade, inobservando, desta feita, o art. 4º da Lei nº 8.429/92.

Quanto à legalidade, resume-se ao dever do agente público de atuar em conformidadecom os ditames legais, ou seja, respeitando o ordenamento jurídico vigente,constatando-se sua violação no caso em comento no preciso instante em que foramfeitas dispensas de licitação por parte da Secretaria de Saneamento, em desobediênciaas exceções ao dever de licitar previsto na Lei de Licitações, conforme acimademonstrado.

Segundo Celso Antonio Bandeira de Mello, o princípio da legalidade explicita asubordinação da atividade administrativa à lei e surge como decorrência natural daindisponibilidade do interesse público, noção esta que, conforme foi visto, informa o caráter darelação de administração.

Em outra oportunidade, obtempera: fora da lei, portanto, não há espaço para atuaçãoregular da Administração. Donde, todos os agentes do Executivo, desde o que lhe ocupa acúspede até o mais modesto dos servidores que detenha algum poder decisório, hão de ter perantea lei - para cumprirem corretamente seus misteres - a mesma humildade e a mesma obsequiosareverência para com os desígnios normativos. É que todos exercem função administrativa, adizer, função subalterna à lei, ancilar - que vem de ancilla, serva, escrava8.

8 Celso Antonio Bandeira de Mello, in “Desvio de Poder”, in RDP 89/24, p. 24. e“Discricionariedade e Controle Jurisdicional”, Malheiros Editores, 2ª ed., 1993, p. 50.

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Da mesma forma, também restou violado o princípio da impessoalidade em face danão deflagração do processo licitatório, permitindo assim que a Administraçãoescolhesse diretamente a empresa contratada, sem que fosse dada a oportunidade paraque fossem oferecidas diferentes propostas de preços e dos serviços adquiridos,inviabilizando a concorrência entre os pretensos licitantes e possibilitando a atuaçãoimparcial da Administração.

À vista do relatado, a contratação direta de serviços de e consultoria paradesenvolvimento de planos, programas e projetos nos segmentos da Engenharia, daArticulação Social, do Planejamento e do Apoio, através dos Processos de Dispensa deLicitação nº 03/04 e 02/05, configuram atos de improbidade administrativa, previstono artigo 11, Inciso I, da Lei 8.429/92.

A punição para aqueles que cometem atos de improbidade administrativa como osmencionados acima está definida no artigo 12, inciso III, da Lei nº 8.429/92:

Art. 12. Independentemente das sanções penais, civis e administrativas, previstasna legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade sujeito àsseguintes cominações:

III – na hipótese do art. 11, ressarcimento integral do dano, se houver, perda dafunção pública, suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos, pagamento demulta civil de até cem vezes o valor da remuneração percebida pelo agente eproibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivosfiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoajurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos.

Da Responsabilidade dos Réus

Os três primeiros demandados, na qualidade de agentes públicos, respondem portodos os atos de improbidades administrativas praticados por força dos artigos 1º e 2ºda Lei nº 8.429/92.

Sem embargo, cabe ao administrador público ter o controle de sua própria gestão, sejapor meio de sua equipe técnica ou de sistemas automatizados que lhe desenhe aocorrência dos fatos. Esse controle caracteriza maior zelo com a coisa pública e,principalmente, possibilita a busca imposta ao agente público pela eficiência,economicidade e eficácia.

Na vertente situação, os gestores signatários do contrato tiveram a responsabilidadesob o procedimento licitatório, vez que, muito antes de firmado, caberia ter examinadoos atos praticados, objetivando verificar a conformidade com a lei, para então adotar oque se costuma chamar de juízo de legalidade, onde a autoridade não dispõe decompetência discricionária.

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Assim e considerando tudo que foi apurado, os demandados são responsáveis portodas as ilegalidades cometidas na contratação direta do Instituto de Pesquisas SociaisAplicadas.

O demandado João Paulo Lima e Silva, na qualidade de ordenador de despesa erepresentante da Edilidade, de modo livre e consciente, firmou contratação direta doreferido Instituto, mediante os Processos de Dispensa de Licitação nº 03/04 e 02/05.

O demandado Marcus Tullius Bandeira de Menezes, na qualidade de ordenador dedespesa, de modo livre e consciente, ratificou o Processo de Dispensa de Licitação nº02/05 e firmou o referido contrato.

O demandado Edgard Galvão Raposo Neto, na condição de Diretor do Departamentode Administração Setorial da Secretaria de Saneamento, de modo livre e consciente,conduziu os Processos de Dispensa de Licitação nº 03/04 e 02/05.

O Instituto de Pesquisas Sociais Aplicadas também responde por ato de improbidadeadministrativa ex vi o disposto no artigo 3º da Lei nº 8.429/929, vez que foi beneficiadodiretamente através das contratações empreendidas pela Secretaria de Saneamento.

A responsabilização desse terceiro não é automática. É imperioso que sejademonstrado que este agiu com dolo ou culpa, posto ser necessário proteger do alcancedas sanções previstas na Lei de Improbidade, àquele que se beneficiou do ato ímprobo,que estivesse de boa-fé.

Nesse caso, entretanto, a boa-fé deve ser evidente. Isso porque, como adverte FábioMedina Osório, in Improbidade Administrativa, Edit. Síntese, 1997, p. 73, nesta seara aculpa daqueles que se relacionam com a administração pública e se beneficiam de improbidadeadministrativa, todavia, há de ser analisada com o máximo rigor, adotando-se redobradascautelas quando se analisam as exigências de preparo e conhecimento de quem lida cominteresses públicos e desfruta de efeitos da desonestidade ou incompetência dos agentespúblicos10.

Seguindo a mesma linha de raciocínio, esclarece Wallace Paiva Martins Júnior11 que odireito protege a boa-fé, mas não tolera a posição daquele que se aproveita de ato ilegal ou imoraljustamente para angariar vantagem. Quem age assim, movido por dolo ou por falta dediligência, não exerce direito regularmente, senão pratica abuso de direito, pois tira dividendosde situação jurídica ilegítima. Não é só o administrador público que tem o deve de velar pelaestrita legalidade dos atos administrativos em geral. Fechando a questão, arremata o citadoautor exemplificando que o particular quando contrata com o Poder Público deve sempre (eassim a prudência recomenda) verificar se o ato preenche as formalidades legais, até porque o

9 Art. 3º. As disposições desta Lei são aplicáveis, no que couber, àquele que, mesmo não sendo agentepúblico, induza ou concorra para a prática do ato de improbidade ou dele se beneficie sob qualquerforma direta ou indireta.

10 Fábio Medina Osório, in Improbidade Administrativa, Editora Síntese, 1997, página 7311 Wallace Paiva Martins Júnior, in Probidade Administrativa, São Paulo, Editora Saraiva, 2ª edição,

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procedimento pré-contratual (a licitação) é público e conta com sua participação e controle, alémdo controle público em geral. Esse é um comportamento jurídico.

No evento em exame, cabia ao Instituto de Pesquisas Sociais Aplicadas, ter se cercadode todos os cuidados objetivos antes de aceitar a contratação, com dispensa de licitação(e, até mesmo se resguardando de apresentar proposta), para a realização de serviçosque sabia não guardar nexo de causalidade com o dispositivo legal invocado pelaAdministração. Esse comportamento então, expõe a suportar o ônus da ilegalidadecometida pelos agentes públicos ora demandados, como é o caso em questão.

DOS PEDIDOS

1. Do Pedido de Mérito

Ante todo o exposto, depois de autuada e recebida a presente petição inicial com osdocumentos que a instruem (arts. 282/283 do Código de Processo Civil), requer oMinistério Público a Vossa Excelência seja julgada procedente a presente ação para:

i. Nos termos do art. 12, inciso III, da Lei n. 8.429/92, para condenar:

1. Os demandados João Paulo Lima e Silva, Marcus Tullius Bandeira deMenezes e Edgard Galvão Raposo Neto na suspensão dos direitospolíticos de três a cinco anos, pagamento de multa civil equivalente acem vezes o valor da remuneração percebida pelo agente e proibição decontratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscaisou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio depessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos;

2. O demandado Instituto de Pesquisas Sociais Aplicadas ao pagamentode multa civil e proibição de contratar com o Poder Público ou receberbenefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente,ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sóciomajoritário, pelo prazo de cinco anos;

ii. Sejam os valores relativos às multas civis destinados aos cofres da Fazenda doMunicípio do Recife.

2. Dos Requerimentos Finais

Como medida de ordem processual, requer a notificação e posterior citação para que,querendo, apresentem respostas, no prazo legal, sob pena de presumirem-severdadeiros os fatos ora alegados (art. 17 da Lei n. 8.429/1992) dos demandados:

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João Paulo Lima e Silva, com endereço na Rua Adalberto Camargo, 47, apartamento401, Aflitos, Recife, PE;

Marcus Tullius Bandeira de Menezes, com endereço na Rua Dom José Lopes, 1136,apartamento 201, Boa Viagem, Recife, PE;

Edgard Galvão Raposo Neto, com endereço na rua São Mateus, 1160, Bloco Q,Apartamento 203, Iputinga, Recife, PE ou rua Antonio Valdevino da Costa, 280, Bloco9, apartamento 501, Cordeiro, Recife, PE;

Instituto de Pesquisas Sociais Aplicadas, com endereço na Rua da Aurora, 295, sala502, Boa Vista, Recife, PE;

A intimação do Município do Recife, com sede no Cais do Apolo, 925, Bairro doRecife, nesta cidade, na pessoa do seu Procurador-Chefe, para que, querendo,intervenha nos autos no pólo ativo ou passivo desta ação;

Requer, por derradeiro:

1. O recebimento da presente ação sob o rito ordinário;

2. Isenção de custas, emolumentos, honorários e outras despesas na conformidadedo que dispõe o artigo 18 da LACP;

3. A produção de todos os meios de prova em direito permitidos.

Dá à causa o valor de R$ 1.000,00 (mil reais) para efeitos fiscais.

Nestes Termos P. Deferimento

Recife, 28 de janeiro de 2010.

Charles Hamilton Santos Lima26º Promotor de Justiça de Defesa daCidadania da Capital

Eduardo Luiz Silva Cajueiro27º Promotor de Justiça de Defesa daCidadania da Capital

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