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Janeiro de 2006 • Número 304 Jornal da ABI Órgão oficial da Associação Brasileira de Imprensa PROJETO DE LEI DO GRAMPO ATROPELA A CONSTITUIÇÃO Aldir Blanc homenageia seu amigo Roberto Moura Página 11 A revisão da Lei do Grampo (Lei n° 9.296, de 1996), em estudo nos bastidores do Ministério da Jus- tiça, pode conter asgressões à li- berdade de imprensa que atrope- lam o texto constitucional. Um magistrado analisa mais essa pre- tensão liberticida. Páginas 8, 21 e Editorial na página 2 DEPOIMENTOS Milton Coelho e Nahum Sirotsky com o saber de experiência feito A ciência nossa de cada dia carece de espaço Pesquisas realizadas há quase 20 anos indica- vam que 70% do público urbano gostariam de ter mais informações sobre ciência, que ca- rece de espaço maior na imprensa. Páginas 3, 4, 5 e 6 Uma foto histórica que Luiz Pinto deixou Luiz Pinto partiu. Deixou fotos memoráveis, como esta da campanha Tancredo Já. Páginas 22 e 23. O atentado às Torres Gêmeas de Nova York provocou uma mudan- ça no jornalismo no mundo todo, alterando valores e até a lingua- gem da mídia, denuncia o estudi- oso chinês Li Xinguang, da Uni- versidade de Pequim. Páginas 18 e 19 O 11 de Setembro mudou o jornalismo Melhor que ser repórter é ser pauteiro, diz Mil- ton (à esq. ). Jornalismo e jornalistas têm que ser sempre atuais, diz Nahum (à dir.). Os dois fa- lam do que sabem. Páginas 9, 10, 11 e 14, 15 e 16 RODRIGO CAIXETA JAIRO SHNAIDER

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Janeiro de 2006 • Número 304

Jornal da ABIÓrgão oficial da Associação Brasileira de Imprensa

PROJETO DE LEI DO GRAMPOATROPELA A CONSTITUIÇÃO

Aldir Blanc homenageia seu amigo Roberto MouraPágina 11

A revisão da Lei do Grampo (Lein° 9.296, de 1996), em estudo nosbastidores do Ministério da Jus-tiça, pode conter asgressões à li-berdade de imprensa que atrope-lam o texto constitucional. Ummagistrado analisa mais essa pre-tensão liberticida. Páginas 8, 21 eEditorial na página 2

DEPOIMENTOS

Milton Coelho e NahumSirotsky com o saberde experiência feito

A ciência nossade cada diacarece de espaçoPesquisas realizadas há quase 20 anos indica-vam que 70% do público urbano gostariamde ter mais informações sobre ciência, que ca-rece de espaço maior na imprensa.

Páginas 3, 4, 5 e 6

Uma foto histórica que Luiz Pinto deixouLuiz Pinto partiu. Deixou fotos memoráveis, como esta da campanha Tancredo Já. Páginas 22 e 23.

O atentado às Torres Gêmeas deNova York provocou uma mudan-ça no jornalismo no mundo todo,alterando valores e até a lingua-gem da mídia, denuncia o estudi-oso chinês Li Xinguang, da Uni-versidade de Pequim.

Páginas 18 e 19

O 11 de Setembromudou o jornalismo

Melhor que ser repórter é ser pauteiro, diz Mil-ton (à esq.). Jornalismo e jornalistas têm que sersempre atuais, diz Nahum (à dir.). Os dois fa-lam do que sabem. Páginas 9, 10, 11 e 14, 15 e 16

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Jornal da ABI

2 Janeiro de 2006

NESTA EDIÇÃO

Jornal da ABI

Associação Brasileira de Imprensa

EDITORIAL

Rua Araújo Porto Alegre, 71, 7º andarTelefone: (21) 2220-3222/2282-1292 Cep: 22.030-012Rio de Janeiro - RJ ([email protected])

Editores: Francisco Ucha, Joseti Marques e Maurício AzêdoProjeto gráfico, diagramação eeditoração eletrônica: Francisco UchaDiretor responsável: Maurício AzêdoImpressão: Gráfica LanceRua Santa Maria, 47 - Cidade Nova - Rio de Janeiro, RJ.

As reportagens e artigos assinados não refletemnecessariamente a opinião do Jornal da ABI.

DIRETORIA – MANDATO 2004/2007Presidente: Maurício AzêdoVice-Presidente: Audálio DantasDiretora Administrativa: Ana Maria Costábile SoibelmanDiretor Econômico-Financeiro: Domingos MeirellesDiretor de Cultura e Lazer: Jesus ChediakDiretor de Assistência Social: Paulo Jerônimo de Souza (Pajê)Diretora de Jornalismo: Joseti Marques

CONSELHO CONSULTIVOChico Caruso, Ferreira Gullar, José Aparecido de Oliveira,Miro Teixeira, Teixeira Heizer, Ziraldo e Zuenir Ventura

CONSELHO FISCALJesus Antunes – Presidente, Miro Lopes – Secretário,Adriano Barbosa, Hélio Mathias, Henrique João Cordeiro Filho,Jorge Saldanha e Luiz Carlos Oliveira Chester

CONSELHO DELIBERATIVO (2004-2005)Presidente: Ivan Cavalcanti Proença1º Secretário: Carlos Arthur Pitombeira2º Secretário: Domingos Xisto da Cunha

Conselheiros efetivos (2005-2008)Alberto Dines, Amicucci Gallo, Ana Maria Costábile, AraquémMoura Rouliex, Arthur José Poerner, Audálio Dantas, CarlosArthur Pitombeira, Conrado Pereira, Ely Moreira, FernandoBarbosa Lima, Joseti Marques, Mário Barata, Maurício Azêdo,Milton Coelho da Graça e Ricardo Kotscho

Conselheiros efetivos (2004-2007)Antonieta Vieira dos Santos, Arthur da Távola, Cid Benjamin,Flávio Tavares, Fritz Utzeri, Héris Arnt, Irene Cristina Gurgel doAmaral, Ivan Cavalcanti Proença, José Gomes Talarico, JoséRezende, Marceu Vieira, Paulo Jerônimo, Roberto M. Moura,Sérgio Cabral e Teresinha Santos

Conselheiros efetivos (2003-2006)Antonio Roberto da Cunha, Aristélio Travassos de Andrade,Arnaldo César Ricci Jacob, Carlos Alberto Caó Oliveira dosSantos, Domingos João Meirelles, Fichel Davit Chargel, GlóriaSueli Alvarez Campos, João Máximo, Jorge Roberto Martins,Lênin Novaes de Araújo, Moacir Andrade, Nilo Marques Braga,Octávio Costa, Vitor Iorio e Yolanda Stein

Conselheiros suplentes (2005-2008)Anísio Félix dos Santos, Edgard Catoira, Francisco de PaulaFreitas, Geraldo Lopes, Itamar Guerreiro, Jarbas Domingos Vaz,José Amaral Argolo, José Pereira da Silva, Lêda Acquarone,Manolo Epelbaum, Maria do Perpétuo Socorro Vitarelli, Pedrodo Coutto, Sidney Rezende, Sílvio Paixão e Wilson S. J.Magalhães

Conselheiros suplentes (2004-2007)Adalberto Diniz, Aluísio Maranhão, Ancelmo Gois,André Louzeiro, Jesus Chediak, José Silvestre Gorgulho,José Louzeiro, Lílian Nabuco, Luarlindo Ernesto,Marcos de Castro, Mário Augusto Jakobskind,Marlene Custódio, Maurílio Ferreira e Yaci Nunes

Conselheiros suplentes (2003-2006)Antônio Avellar C. Albuquerque, Antônio Calegari, AntônioHenrique Lago, Antonio Roberto Salgado da Cunha, DomingosAugusto G. Xisto da Cunha, Hildeberto Lopes Aleluia, JoséCarlos Rego, Lorimar Macedo Ferreira, Luiz Carlos de Souza,Marco Aurélio B. Guimarães, Marcus Antônio M. de Miranda,Mauro dos Santos Vianna, Pery de Araújo Cotta, RogérioMarques Gomes, Rosângela Soares de Oliveira e RubemMauro Machado

COMISSÃO DE SINDICÂNCIAEly Moreira – Presidente, Jarbas Domingos Vaz, José ErnestoVianna, Maria Ignez Duque Estrada Bastos e Maurílio CândidoFerreira

COMISSÃO DE ÉTICA DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃOAlberto Dines, Artur José Poerner, Cícero Sandroni, Ivan AlvesFilho e Paulo Totti

COMISSÃO DE LIBERDADE DE IMPRENSA E DIREITOS HUMANOSArthur Cantalice, Arthur Nery Cabral, Daniel de Castro,Germando Oliveira Gonçalves, Gilberto Magalhães, Lucy MaryCarneiro, Maria Cecília Ribas Carneiro, Mário AugustoJakobskind, Martha Arruda de Paiva, Orpheu Santos Salles,Wilson de Carvalho, Wilson S. J. Magalhães e Yaci Nunes

A ciência nossa de cada dia 3

O site da ABI com algo mais 7

Artigo: Não à mordaça da imprensa 8

Artigo: Sob o manto da corrupção 8

“Melhor do que ser repórter é ser pauteiro” 9

Aldir Blanc: Roberto, Memória 11

“Jornalismo é como a notícia: ou se é atual, ou já era” 14

O impacto do 11 de Setembro no jornalismo 17

Uma declaração em defesa do sigilo das fontes 19

Onde mora a liberdade 19

Incendiários condenados 20

Bomba não abala o Mogi News 20

A Vivo errou na Gazeta 20

A ABI contra a nova Lei do Grampo 21

Novas mortes na Cemig 21

Uruguaios agradecem solidariedade 21

Vidas: Luiz Pinto, O fotógrafo 22

Sonho e realidade na imprensa do Rio 24

Bastos e sua biografiaSetores do Governo da República ainda não assimilaram em sua inte-

gridade o teor e o espírito da Constituição de 5 de outubro de 1988,

como demonstra a freqüência com que hierarcas dos altos escalões

imaginam, sugerem ou propõem medidas que ofendem de forma grave

o Estado Democrático de Direito instituído no País após mais de duas

décadas de ditadura e terror. Jejunos de conhecimentos jurídicos, essesnichos influentes do Poder raciocinam e agem como se estivessem num

diretório acadêmico, à frente de uma aventura estudantil, e que podem

fazer o que lhes dá no bestunto, sem consideração nem respeito a qual-

quer mandamento legal ou constitucional.

Não há muito tivemos o rumoroso caso do correspondente do The New

York Times que o Governo queria expulsar do País, como represália e

punição a um texto em que esse profissional não foi feliz nem na forma

nem nas informações que reuniu e divulgou. A medida punitiva, que

certamente seria derrubada pela Justiça, só não foi consumada porque oMinistro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, que se encontrava no exte-

rior quando se cogitou da decisão, retornou a tempo de engendrar uma

solução, sob a forma de um suposto acordo, em que o Governo pôde

recuar de cara limpa da disposição totalitária que manifestara.

É estranho que sob o pálio do Ministério dirigido pelo mesmo Márcio

Thomaz Bastos se avente e se estude a possibilidade de introduzir na

chamada Lei do Grampo, a Lei n° 9.296, de 1996, dispositivo que vise a

conduzir à prisão o jornalista que divulgue informações contidas em

gravações feitas com autorização do Poder Judiciário em investigaçõesrealizadas ou em realização por órgãos competentes. Como a ABI adver-

tiu em declaração divulgada em 18 de janeiro e transcrita integralmente

na página 21 desta edição e como igualmente alerta eminente magistra-

do, Juiz Jansen Fialho de Almeida, em artigo que publicamos na página

8, essa intenção não pode materializar-se em texto legal, porque abalroa

o texto constitucional, especialmente no artigo 220 e seus dois parágra-

fos, que vedam expressamente a possibilidade de se converter em lei

essa pretensão malsã de agentes totalitários enquistados no Governo.Como lembrou a ABI, o Ministro Márcio Thomaz Bastos foi Presi-

dente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil e tem,

portanto, uma biografia a zelar. A ABI espera que ele a respeite, pelo

menos neste assunto.

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3Janeiro de 2006

Jornal da ABI

ESPECIALIZAÇÃO ����� por José Reinaldo Marques

Novas descobertas so-bre a origem da huma-nidade, exploração-dos planetas, os avan-ços na medicina, mu-

danças climáticas, perda da biodi-versidade e meio ambiente são questõesimportantes que ganharam espaço naspáginas dos jornais, revistas, na internete nos noticiosos do rádio e da TV, a par-tir da criação das editorias de Ciência eTecnologia, além é claro das publicaçõesespecializadas, como as revistas Galileue Scientific American Brasil, e diversossites que tratam do assunto.

O jornalista Ulisses Capozzoli, espe-cialista em divulgação científica e dou-tor em Ciências pela Universidade deSão Paulo, atualmente Presidente daAssociação Brasileira de JornalismoCientífico, considera difícil precisar oinício do jornalismo científico no Bra-sil — “Hipólito José da Costa (1774-1823) já escrevia sobre assuntos cien-tíficos no Correio Braziliense”, diz. Se-gundo ele, essas editorias tornaram-semais comuns a partir da segunda me-tade dos anos 80, refletindo uma con-solidação da pesquisa científica no País:

— Em 1948, com a fundação daSociedade Brasileira para o Progressoda Ciência-SBPC, o Professor José Reiscomeçou a tratar desses assuntos naFolha de S. Paulo, através da coluna Pe-riscópio na página que o jornal manti-nha aos sábados sobre ciência e tecno-logia. Em 1983, praticamente apenaso professor mantinha sua coluna naFolha. O Globo produz, há algum tem-po, a página Ciência e Vida e o Jornaldo Brasil, especialmente com Jorge

Luiz Calife, teve um período muitobom de jornalismo científico.

Além de merecer nos diários um es-paço mais relevante, na opinião do jor-nalista espanhol Manuel Calvo Her-nando, Secretário-Geral da AssociaçãoIbero-Americana de Jornalismo Cien-tífico e Presidente da Associação Espa-nhola de Jornalismo Científico, a divul-gação científica tem pela frente outrosgrandes desafios a superar no século,principalmente pelos erros freqüentescometidos pela mídia, cujo papel é in-formar seu público com correção.

Para justificar sua crítica, ele se ba-seou num estudo realizado pela Esco-la de Jornalismo e Meios de Comuni-cação da Universidade de Minnesota,que analisou o noticiário de ciência da

Pesquisa do Instituto Galluprevela que o noticiário científicoatrai 70% do público urbano doPaís e por isso já deveria ter sidocontemplado com cadernosespecíficos nos jornais diários.

imprensa dos Estados Unidos e che-gou a estas conclusões: omissões im-portantes somam 33%; citações trun-cadas ou incompletas, outros 33%; tí-tulos enganosos, 31%; resumo exces-sivo dos assuntos, 25%; análise defei-tuosa entre causa e efeito, 22%; ma-térias mal-apuradas em que a especu-lação se transforma em fato, 20%; tí-tulos imprecisos,14%; dados incorre-tos, 7%; outros erros, 6,2%.

Manuel Hernando diz que esse re-sultado não é novidade, pois semprese soube que há uma relação direta en-tre o grau cultural dos jornalistas e aprecisão da comunicação. Quanto aessas questões, o Presidente da Asso-ciação Brasileira de Jornalismo Cientí-fico tem a seguinte opinião:

— Em que pese toda a contribui-ção que ele deu ao jornalismo científi-co, o Professor José Reis pertencia auma escola preocupada com detalhesque não podem ser desconsiderados,mas não representam as questões maiscruciais. O ritmo de trabalho da im-

prensa condiciona esses erros opera-cionais. Além disso, os erros da im-prensa são os erros mais públicos queexistem.

Uma pauta esquecidaUlisses Capozzoli diz que, como

ocorre em economia e política, a pes-quisa científica é uma pauta que tam-bém tem potencial para render ótimasmanchetes de jornal, mas que por al-guma deficiência essa não é uma prá-tica comum na imprensa. “Quandoisso acontece, é um sinal evidente deque as coisas do mundo já não são asmesmas de antes”, escreveu ele no ar-tigo “Analfabetismo científico namídia”, publicado no portal Jornalis-mo Científico.

O jornalista reclama, também, dafalta de suplementos de ciência nosjornais brasileiros:

— É preciso considerar que os gran-des jornais têm suplemento de turis-mo, informática, agricultura e televi-são, mas não têm um caderno de ciên-

Manuel Calvo Hernando, Secretário-Geralda Associação Ibero-Americana de

Jornalismo Científico: Erros da imprensasão os mais públicos que existem.

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Jornal da ABI

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cia, apesar de o conhecimento ser hojeo bem mais valorizado na sociedade.Há um descompasso de mentalidadesnas redações, pobremente justificadocom a idéia de que temas científicosnão rendem publicidade.

Para que haja mudança nesse qua-dro, Capozzoli acha necessário que seimplemente um processo de sensibili-zação para a perspectiva da ciência queparta do interior das redações e che-gue às agências de publicidade.

Embora concorde em que o espaçodeveria ser ampliado, a editora de Ci-ência do Estado de S. Paulo, VivianeKulczynsky, acha que os veículos dagrande mídia, mesmo fora do eixo Rio-São Paulo, não têm como ignorar oassunto:

— Os grandes e rápidos avançosnesse campo não podem ser ignora-dos. Sempre cito o exemplo do ZeroHora (RS) e o seu caderno Eureka!. Adecisão de lançar um suplemento ta-blóide específico, ainda que semanal,é totalmente louvável.

A morte de Eureka!Quando elogiou o Eureka!, Viviane

não sabia que o suplemento do jornal

gaúcho, lançado em mar-ço de 2001, mudou de no-me e de foco em novem-bro do ano passado. Umdos motivos alegados pa-ra a mudança foi a perdado apoio financeiro daUniversidade de São Leo-poldo, com a qual o ZeroHora mantinha, também,um convênio de suportetécnico.

Com a reformulação, oEureka! passou a se cha-mar Globaltech e as maté-rias de ciência perderamespaço para as de tecnolo-gia, que hoje respondempor cerca de 80% do noti-ciário, corroborando a crí-tica do Presidente da As-sociação Brasileira de Jor-nalismo Científico. Sobrea questão publicitária, dizHelton Werb, editor-chefe do suple-mento:

— Não tenho os números concre-tos sobre o aspecto comercial, mas apolítica do Zero Hora em relação aossuplementos é de que eles tenham al-gum tipo de patrocínio. Como houvedificuldade na renovação do contratocom a Universidade, a decisão da Dire-ção, para conter custos, foi parar a cir-culação e investir num produto maisvoltado para a tecnologia.

Uma das principais estratégias, se-gundo Helton, foi reforçar a marcaGlobaltech, nome de uma feira de tec-nologia que o Grupo RBS (Rede BrasilSul de Comunicação) promove umavez por ano em Porto Alegre:

— O que eu vejo na imprensa bra-sileira é que o jornalismo científico éo patinho feio ou o primo-pobre damídia. A divulgação científica, apesarda sua importância, não é uma áreaque tenha alcançado muito prestígionas redações.

O Eureka! foi duas vezes finalistado Prêmio Esso de Jornalismo Cientí-fico e teve 203 edições. Enquanto suasvedetes eram a Arqueologia e a Paleon-tologia, no Globaltech o grande desta-que são as inovações tecnológicas emtelefonia celular, informática e outrasáreas, o que — Helton não esconde —gerou muita reclamação dos leitoresno início.

— Recebemos muitos e-mails dejovens, estudantes e professores. Co-nheci muita gente que tinha viradocolecionador do suplemento e o seufim foi sentido até pelos jornaleiros,que dizem que as publicações cientí-ficas vendem muito, principalmenteas dirigidas ao público infantil.

Falta calorPara a maioria das pessoas ouvidas

pelo ABI Online, o jornalismo científi-co no Brasil, apesar de ter que enfren-tar o descrédito publicitário, deu umenorme salto de qualidade editorial

nos últimos 20 anos. Isso se deveu, emparte, à variedade das fontes nacionaisde informação, que são consideradasde boa qualidade. Porém, Cláudio Ân-gelo Monteiro, editor de Ciência daFolha de S. Paulo, acha que há mais sal-tos a dar:

— É preciso tornar o noticiário deciência mais “quente” e mais “brasilei-ro”. Há muita divulgação científica,mas pouca investigação e pouca pres-tação de contas sobre o que nossos cien-tistas fazem com o dinheiro do contri-buinte. O jornalismo ambiental, nesseponto, tem se saído melhor, mas tam-bém tem potencial para melhorar mais.

No caso específico do jornalismo ci-entífico, seria mais interessante se osveículos de comunicação parassem dese contentar em fazer coberturas even-tuais, como afirma a experiente Tere-zinha Costa, jornalista especializadaem ciência, tecnologia e meio am-biente e autora do livro Engenhariada transparência: vida e obra de Lobo

Carneiro:— Uma das difi-

culdades que o jor-nalismo científicoenfrenta é a pres-são que o profissio-nal sofre para pro-duzir matérias emcurto prazo, numaárea em que, talvezmais do que nasoutras, é essencialo tempo para dige-rir idéias e infor-mações. Além dis-so, afora algumasexceções, a cober-tura é episódica.Com isso, os jorna-listas têm poucachance de se dedi-car à área e se es-pecializar.

A grande mídia não pode ignorar a importância dos avanços da ciência,diz Viviane Kulczynsky, editora de Ciência do Estadão. Para Helton Werb,

de Zero Hora, a ciência é um patinho feio da imprensa.

O suplemento Eureka! do Zero Hora desapareceu por não conseguir manter o patrocínio. Cedeu lugar aoGlobaltech, em que a tecnologia assume o primeiro plano por atrair mais anúncios do que a ciência.

José Reis: de 1948 a 1983, o único jornalistaa se ocupar de ciência na imprensa.

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5Janeiro de 2006

Jornal da ABI

As universidades e a mídia do Paísprecisam preocupar-se com a melho-ria da capacitação dos jornalistas quedesejam atuar na área de ciência.Quem alerta é o Presidente da Asso-ciação Brasileira de Jornalismo Cien-tífico, Ulisses Capozzoli:

— O assunto se transformou nu-ma certa coqueluche e com isso atraiumuita gente sem qualificação, bus-cando apenas certo prestígio. As fa-culdades e Redações deveriam passarpor uma profunda reformulação, paraque possa emergir um jornalismo in-terpretativo de boa qualidade. E essedesafio é de toda a sociedade, embo-ra possa não parecer à primeira vista.Informação de boa qualidade é um re-flexo de boas condições sociais.

O editor Cláudio Ângelo Monteiro,da Folha, é mais contundente em suascríticas ao mercado de trabalho e sediz cético em relação ao crescimentode oportunidades nocampo da ciência,que, no Brasil, “nãooferece perspectivade crescimento”.

— Vejo-o comoaquilo que os econo-mistas chamam demercado de nicho. Ouseja, toda Redação de-veria ter jornalistas daárea, com sua compe-tência diferenciada,pagando um “prê-mio” ou sobrepreçopor essa competência.

Mesmo assim, eleelogia o esforço departe da nossa imprensa para divul-gar o tema:

— Na Folha, por exemplo, temosuma das poucas páginas diárias dedi-cadas exclusivamente à ciência na im-

prensa mundial. O New York Times, oBoston Globe e o Washington Post não têmisso. Em compensação, contam commuito mais gente para cobrir a área.

A jornalista Terezinha Costa con-sidera que o crescimento e a profissio-nalização das assessorias de imprensatêm ajudado muito a divulgação cien-tífica e os colegas que trabalham como tema. Como há poucos profissionaisespecializados, a competição no setortambém é menos acirrada, o que nãoos livra de ter que entender de assun-tos variados:

— O jornalista precisa gostar de ciên-cia e tecnologia e não ter medo de te-mas que a maioria das pessoas achacomplicados ou técnicos demais. É pre-ciso, porém, levar em conta que esse uni-verso é muito amplo: abarca pratica-mente todas as áreas da ação humana.

Terezinha acha que a curiosidadeintelectual é fundamental, mas conhe-

cimentos profundossobre os temas a se-rem abordados, nemtanto:

— Até porque issoseria impossível. Bas-ta que o jornalista te-nha disposição paraadquirir noções bási-cas que lhe permitampelo menos iniciaruma conversa comum astrônomo, umfísico, um químico,um paleontólogo etc.,e usar cada entrevis-ta para aprender umpouco mais. E se ele

se interessar também por história daciência e um pouco de economia e forcapaz de articular tudo isso em suasmatérias, então irá se destacar.

Para cativar o leitor, Viviane

Kulczynsky, do Estadão, entende queo principal é transformar o tema emalgo acessível a todos:

— Não somos uma revista especia-lizada. Logo, somoslidos por gente comas mais diversas for-mações. Nossa fun-ção é quase que a detraduzir assuntoscomplexos e torná-los legíveis, inteligí-veis e prazerosos, le-vando para o univer-so do leitor questõescomplexas, mas fun-damentais.

No Estado de S.Paulo, assuntos deciência e tecnologiaestão vinculados àGeral, que passou ase chamar Vida& com o novo projetográfico do jornal:

— Nas quartas-feiras, temos sem-pre matérias, notas e um artigo sobreo tema, o que não exclui a publicaçãode reportagens científicas nos demaisdias da semana.

O mais importante, diz a editora, énão ficar na superfície da notícia:

— Temos a preocupação de que aequipe de reportagem seja competen-te para ir além da notícia, com capaci-dade de repercutir, de explicar as im-plicações dos temas abordados.

Formada há doisanos em Jornalismoe, atualmente fazen-do um curso de es-pecialização em ges-tão ambiental, a re-pórter Júlia Kaco-wicz, do Diário dePernambuco, concor-da em que a aptidãopara a pesquisa éfundamental na di-vulgação científica.E como os assuntosdas reportagens sãomuito diversifica-

dos, não há como selecionar uma áreaprincipal de formação:

— Alguns termos técnicos ou cien-tíficos podem ser bastante assustado-

res, por isso é precisobuscar ao menos umconhecimento básicoantes de qualquer en-trevista. Muitos cien-tistas são muito acessí-veis. Outros, no entan-to, não têm interesseem divulgar seu traba-lho ou serem compre-endidos, acham que osjornalistas é que têm aobrigação de saber detudo.

Para estes, Júlia pro-cura esclarecer a impor-tância de transmitir pa-ra o leitor mensagens

sem dúvidas, principalmente porqueo assunto será mostrado num veículonão-especializado:

— Num jornal diário, o ideal é serclaro sem ser superficial, pois o públi-co é muito diversificado. O texto deveser atraente, para causar interesse nosleigos, e informativo, para não desa-pontar os cientistas. Todos gostam deler um texto informativo e de fácil di-gestão. Dessa forma, ainda estaremoscontribuindo para a divulgação cien-tífica, despertando o interesse de umpúblico mais amplo.

Apenas um nicho,de progresso limitado

O Estadão, comsua seção

Vida&, eO Globo, com

Ciência e Vida,ligam a

coberturacientífica àsquestões de

saúde, formade atrair mais

leitores.A Folha,

pioneira nessacobertura,

aperfeiçoou asformas de

apresentaçãodo tema.

Repórter do Diário de Pernanbuco,Júlia Kacowicz diz que há cientistas

acessíveis; outros, nem tanto.

Presidente da Associação Brasileira deJornalismo Científico, Ulisses Copozzoli

defende melhor capacitação dosjornalistas na área de ciência.

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W.SC

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Jornal da ABI

6 Janeiro de 2006

Outro veículo apreciado no meioacadêmico é a revista ScientificAmerican, que no ano passado ga-nhou sua edição Brasil, com cempáginas e tiragem média de 70 milexemplares. Sua Redação é com-posta por editor-chefe, editor-assis-tente, editor e editor-assistente dearte, além de suporte de iconogra-fia e revisão. A maioria das maté-rias é escrita pelos próprios pesqui-sadores; reportagens e tradução sãofeitas por free-lancers.

Laura Knapp, editora responsá-vel pela Scientific American Brasil,diz que a principal característica darevista é falar para um público quetem bastante conhecimento deuma ou mais áreas da ciência. Porisso as matérias publicadas são pro-fundas e de nível acadêmico, ain-da que com linguagem jornalística:

— Mesmo assim, somos uma re-vista de divulgação científica. Onível de nossas matérias não é “fá-cil”, isto é, elas contêm informa-ções sobre o estado-da-arte da pes-quisa mundial, mas não estamosdirecionados somente aos estudio-sos da área. Somos uma revista fei-ta para o público em geral, com cer-

Ciência é um assunto que atrai opovo brasileiro — já no fim dos anos80, de 70% da população urbana doPaís se interessavam pelo tema, se-gundo pesquisa do Instituto Gallup.Embora sejam de 18 anos atrás, osdados apontam que “este percentualsobe para 70% da população adultabrasileira” e que “esses números re-velam a existência de uma grandedemanda potencial pelo jornalismocientífico e por revistas de populari-zação das ciências em geral, inclusi-ve mostrando a necessidade de serempreendido um grande trabalho dedivulgação científica”.

Na visão do professor FernandoRochinha, diretor acadêmico da Co-ordenação do Programas de Pós-Graduação de Engenharia-Coppe,da Universidade Federal do Rio deJaneiro-UFRJ, o único erro das re-vistas especializadas nacionais é nãovalorizar os acadêmicos e pesquisa-dores brasileiros em suas reporta-gens. Mesmo assim, considera queelas cumprem um papel essencial etêm edição e conteúdo de boa qua-lidade:

— Acho até que elas se esforçampara empregar uma linguagem queseja adequada para diversos públi-cos. Gosto muito da linha editorialda Galileu, porque ele tem um viésapropriado para o leitor juvenil, oque estimula o ensino da ciência.

Hélio Santos, editor-chefe daGalileu — lançada em agosto de 93pela Editora Globo —, diz que aqualidade das fontes é o maior patri-mônio conquistado pela revista, que“tem conexões valiosas na Acade-mia Brasileira de Ciências”.

— Também não podemos igno-rar as fontes estrangeiras, em ór-gãos como a Nasa, por exemplo.Basta lembrar que fomos um dospoucos aqui a entrevistar o coreanoHwang Woo Suk, ex-líder mundialnas pesquisas de células-tronco, an-tes que seu trabalho caísse em des-graça por conta de fraudes vergo-nhosas em suas pesquisas.

A Redação da revista conta comeditor-chefe, editor-assistente, edi-tora de arte e quatro repórteres es-pecializados em diferentes áreas:

— Também temos total abertu-ra para trabalhar com free-lancers.Idéias originais, com um temperodiferente do que costumamos tertodos os meses, sempre são bem-vindas — diz Hélio.

ta base sobre os assuntos que pu-blicamos.

Diz Laura que geralmente aspautas são balanceadas entre o quese produz no Brasil e no exterior;em média, são publicadas duas ma-térias escritas por pesquisadoresbrasileiros ou que versem pesqui-sas nacionais. No caso das matéri-as internacionais, é feita uma ava-liação para saber se há necessida-de de complementação com fon-tes locais.

Para o biólogo Mário Moscatelli,professor de Gerenciamento deEcossistemas do Centro Universi-tário da Cidade, a Scientific AmericanBrasil é interessante pelo arco deinformações que oferece:

— A edição nacional trata de as-suntos muito diversificados comprofundidade, principalmente nosartigos científicos. Confesso quemuitas vezes alguma coisa me es-capa à compreensão porque nãoestá no meu universo de estudo,mas a revista me proporciona umaverdadeira viagem pelo mundo daciência. Para quem como eu gostade física quântica e ficção, é umapossibilidade de sonhar mais alto.

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Pesquisadorpede maisvalorização

“Scientific American”,em português

Editor de Galileu, lançada pela Editora Globo em 1993, Hélio Santos salienta um dos pontos de apoio da revista: suas conexõescom a Academia Brasileira de Ciências. Laura Knapp dirige a edição brasileira de Scientific American.

A Scientific American brasileira abordaos temas com profundidade e nívelacadêmico. Galileu recorre a fontes

preciosas, entre elas a poderosa Nasa,que cuida do programa espacial dos

Estados Unidos.

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7Janeiro de 2006

Jornal da ABI

INTERNET ����� por Rodrigo Caixeta

Para quem chegou agora: o site daABI (www.abi.org.br) já disponibilizaum clipping multimídia com as prin-cipais notícias de interesse da comu-nidade jornalística, capturadas de jor-nais, revistas, sites, rádios e emissorasde TV aberta e por assinatura. O pro-jeto faz parte de um convênio firma-do entre a ABI e a Video Clipping Pro-duções, dirigida pelo jornalista HervalFaria, antigo sócio e ex-Diretor daCasa. Foi dele a iniciativa da parceria:

— Era uma idéia que eu já tinha hátempos, mas não era uma coisa fácilde se fazer. Além disso, é umtrabalho que merece ser feitocom qualidade e acabou se tor-nando uma contribuição mi-nha para a ABI.

Herval diz que o Clip naWeb da ABI registra informações de in-teresse para os jornalistas associadosà instituição e sobre o que aconteceno mundo da imprensa:

— É o que chamo de democracia,pela qual tanto brigamos. Como jor-nalista, é gratificante poder servir ànossa categoria. Sabemos das dificul-dades de alguns coleguinhas, às vezesaté mesmo para poder comprar umjornal ou revista, e ali estão disponí-veis pelo menos as matérias referen-tes ao jornalismo. O clipping da ABIfala da situação das empresas, avaliaas transformações no mercado jorna-lístico e o quadro da mídia.

Para a posteridadeUma novidade recente no Clip na

Web da ABI, revela Herval, foi o au-mento em 65% da tela de exibição dosvídeos. Ele explica como é feito o con-trole de qualidade do material “cli-pado”: — Cada segmento da empresatem um coordenador. As matérias deTV, rádio e internet são postas auto-maticamente no ar. Uma parte daequipe faz a sinopse e tem uma jorna-

Assuntos de interesse da comunidade

jornalística, veiculados em qualquer mídia

nacional ou estrangeira e sempre atualizados,

estão disponíveis no ABI Online, graças a

convênio firmado com a Vídeo Clipping.

lista responsável pela supervisão ge-ral do conteúdo, corrigindo erros eadequando informações.

Para Herval, uma das seções de des-taque no clipping da ABI é a dos depo-imentos de personagens da crise polí-tica que atinge o País, reunidos desde oinício das CPIs. Segundo ele, cerca de150 pessoas — incluindo redação, ad-ministração e técnica — são responsá-veis pela produção do conteúdo:

— A atualização é feita diariamen-te e a equipe trabalha 24 horas, a fimde que o noticiário seja disponibilizado

quase que instantaneamente.Fazemos clipping de televisãoao vivo, por exemplo. O Jor-nal Nacional — que começa às20h15 e termina às 21h —tem clipping disponível por

volta das 22h. Assistimos, fazemos oresumo, marcamos o que deve ser digi-talizado e vai tudo ao ar.

Durante o dia, cinco pessoas ouvemas principais rádios do Rio (em termosjornalísticos) — CBN, Band News,Tupi e Globo —, coletam as informa-ções mais importantes, redigem a si-nopse e digitalizam o áudio. No setoronline, a equipe vê, lê e ouve tudo oque sai na rede através de portais eagências nacionais ou internacionais.Para Herval, é preciso considerar a im-portância deste serviço para a posteri-dade, pois o con-teúdo fica perma-nentemente no ar:

— Daqui a dezanos, o clipping daABI vai ter umahistória. Não só ahistória da ABI namídia, mas a histó-ria da mídia noPaís e no mundo.Não que seja com-pleta, mas pelomenos 70% dela. É

um acervo histórico que a internetpermite fazer, pois converge todos osmeios. Será possível pesquisar, porexemplo, como era o rádio nos dias dehoje, como estavam as emissoras,como chegou ao Brasil a TV digital etc.

Como encontrarO Clip na Web da ABI oferece infor-

mações para pesquisa desde junho de2005. Informa Herval que está dispo-nível desde o clipping de “carta de lei-tores” até o programa “Café com oPresidente”:

— O diferencial é que todo o con-teúdo está salvo em nosso servidor,tornando a conexão rápida e eficazpara o internauta. E já estamos do-brando nossa capacidade de armaze-namento de dados. Nunca vamos ti-

O site daABI comalgo mais

rar a seção do ar e temos fé de quevamos conseguir fazê-la por cem anosou mais.

Considerado um portal — que reú-ne notícias veiculadas em todas asmídias —, o Clip na Web tem um refi-nado mecanismo de busca, que permi-te a consulta do material pesquisadoatravés de palavras-chave, assuntos eprogramas, seja com áudio, vídeo oufoto, entre outros recursos. Em suaprimeira página, o Media Center apre-senta uma videoteca e uma audiotecacom os destaques do rádio e da TV,que posteriormente ficam disponíveispara pesquisa e resgate.

Em Jornais & Revistas, as reporta-gens publicadas nos principais veícu-los do País — inclusive nos fins de se-mana e feriados — são disponibili-

zadas em formatoPDF. Na seção Inter-nacional, o visitantepode acompanhar onoticiário mundial,em sua língua de ori-gem e com fotos,além de ser possívelfazer a consulta no si-te em que o assuntofoi originalmente pu-blicado.

Em TV, o internau-ta pode ver o clippingde telejornais, talk-shows, entrevistas oudebates monitoradosao vivo, 24 horas pordia. Em Rádio, são dis-ponibilizados o resu-mo das notícias e o áu-dio de cada uma delas.Internet oferece o con-teúdo veiculado pelos

principais portais e agências de notí-cias brasileiros, também com a possi-bilidade de ser visto no site de origem.

Por tudo isso, clique www.abi.org.br

Com o Clip na Web, diz Herval, a ABI vai armazenar dados sobre a Casa e sobre a história da imprensa.

A ilha da ediçãoda Vídeo Clipping,

sempre de olhono que interessa àABI e à imprensa.Abaixo, a redaçãoda empresa, que

fica ligada nonoticiário 24 horas

por dia, todosanto dia.

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Jornal da ABI

8 Janeiro de 2006

Não se constrói um país ético se oseu povo não possui esse atributo. So-mos omissos, coniventes e manipula-dos. Não reagimos à degradação moralquando deveríamos fazê-lo para con-quistar a nossa tão sonhada liberdade.Por mais miserável que um ser huma-no venha a ser, ele necessita, até comomeio de sobrevivência, de um mínimode dignidade e de amor próprio.

Os registros de nossa História mos-tram a que preço conquistamos nossaaparente liberdade (se é que ela, de fa-to, existe). Só que essa liberdade estáliteralmente condicionada a uma re-lação de total promiscuidade com atoscriminosos. Essas ilicitudes, escanca-radas nos noticiários da imprensa, nosmostra como é inexistente e ineficaza fiscalização que o povo exerce sobreos gestores dos poderes constituídos.Afinal, não basta apenas eleger. É pre-ciso fiscalizar, e de forma rigorosa, ocumprimento das leis, penalizando osseus infratores.

O rombo no erário é gigantesco. Acarga tributária é a maior do planeta.Nossa dívida interna já passa de R$ 1trilhão; quanto mais nos roubam,mais o governo aumenta os impostos.Nunca neste País se arrecadou tanto.Enquanto abastecemos o mundo dealimentos e matéria-prima, nada é fei-to com o resultado da sua comercia-

lização, que não retorna ao povo naforma de benefícios sociais, o que con-dena milhões de excluídos brasileirosa uma vida de miséria.

O País é rico, mas o povo é pobre emiserável. Apenas um e meio por cen-to da população vive nababescamentee nossos governantes e congressistas,eleitos com os nossos votos, não nos

sem nada fazer. Sempercebermos, o Paísagoniza, pede socorroe espera que desperte-mos desse tenebrosopesadelo que nos ar-ranca as vísceras e nosarrasta para a vergo-nha e desqualificaçãomoral. Por isso, preci-samos reagir de formacorajosa e veemente àsações impostas pelasanguinária ditadurada corrupção, ou entãoseremos irremediavel-mente condenados aconviver com um Es-tado Republicano Bra-sileiro em que o Execu-tivo tem no seu co-mando um Presidenteque não ouve e não vê,um Judiciário corpora-tivista, distante do po-

vo, e um Congresso que estimula opovo a exercitar a malandragem e acorrupção e prima por elas.

Infelizmente, o Brasil não passa deum país de mansos conformados, ondeo povo é sempre o último a saber.

Noticia-se nos meios de comunica-ção prenúncio de eventual proposta doGoverno em fase de estudo parareformular a legislação de escuta tele-fônica e, dentre elas, a possibilidade depunição de jornalistas que divulgaremo conteúdo dos grampos, ainda querealizados com autorização judicial.

No entanto, ao se confirmar essainiciativa, padecerá no nascedouro deinconstitucionalidade, provando que osmeios, ao contrário do que alguns pen-sam, comprometem os fins, o que pas-samos a demonstrar. A Lei n° 9.296/96já prescreve que a responsabilidade daguarda do segredo de Justiça está afetaao magistrado, ao Ministério Público,às autoridades policiais, às partes, aosservidores que tiverem acesso aos au-tos e aos técnicos das operadoras dosserviços de telefonia, isto é, todos aque-les que direta ou indiretamente atua-rem ou participarem da investigação.Nada mais lógico e justo.

Assim, se há vazamentos do con-teúdo dos grampos, partiram de algu-

ma das pessoas a que a lei restringe osdados obtidos no procedimento. Apartir daí, enquadrar por via infra-constitucional o jornalista como co-autor do crime, seja por saber, divul-gar os dados ou omitir a fonte, se con-substancia em evidente heresia jurí-dica, data maxima venia.

É imperioso assinalar que a Cons-tituição Federal de 1988 relativizouquase todos os princípios, limitandoaqueles antes denominados de “abso-lutos”, no fundamento da supremaciado interesse público sobre o privado,dentre eles o sigilo das comunicaçõestelefônicas nas hipóteses de inquéritopolicial ou processo penal, sempre comprévia autorização judicial, até porqueassegurado ao acusado a presunção deinocência (art. 5º, XII e LVII).

A par disso, cumpre ter presenteque a novel Carta, no mesmo artigoque excepciona o sigilo, extirpou a cen-sura e assegurou o silêncio da fonteaos veículos de comunicação e jorna-listas (incisos IX e XIV), reforçando

em capítulo específico — “Da Comu-nicação Social” — de expressamentevedar à lei conter qualquer dispositi-vo que possa constituir embaraço àplena liberdade de informação jorna-lística, ratificando no próprio texto asgarantias fundamentais que tantoprotegem o acusado quanto a mídia(art. 220 e §1º).

Como se depreende da interpreta-ção sistemática das referidas normas,a mitigação constitucional da censu-ra e da liberdade de informação dosmeios está na vedação do anonimato,no direito de resposta e eventual con-denação ao pagamento de danos ma-teriais e morais ao ofendido, ou aindaação criminal por ofensa à sua honra,se comprovada judicialmente a nãoveracidade da notícia (incisos IV, V, Xe XIII do art. 5º). Não podemos esque-cer que a divulgação de uma notícianão raras vezes resulta no conheci-mento de outros fatos correlatos, am-pliando a investigação para a realelucidação do caso.

Neste contexto, criminalizar a pes-soa do jornalista pela prática de qual-quer ato no exercício do mister nãoresulta em harmonizar os princípiosconstitucionais pertinentes à espécie,mas notoriamente amordaçar aquelesa quem as normas protegem o direi-to/dever de informar os fatos à socie-dade e resguardar o sigilo da fonte,prerrogativa inerente e essencial à pro-fissão e princípio basilar à própriamanutenção do Estado Democráticode Direito, de modo que qualqueraventura jurídica nesta seara, aindaque sem finalidade instilatória, seráem vão, porquanto nitidamente in-constitucional. Por fim, aqui vale re-memorar adágio do poeta alemãoFriedrich Hebbel: “Há casos em quecumprir o dever é pecar”.

LEGISLAÇÃO ����� Por Jansen Fialho de Almeida

Não à mordaça da imprensa

Jansen Fialho de Almeida é Juiz de Direito daVara Cível de Planaltina, DF, e Juiz Presidenteda 6ª Zona Eleitoral do Tribunal RegionalEleitoral do Distrito Federal.

ÉTICA ����� Por Ângelo Fernandes

Sob o manto da corrupção

Ângelo Fernandes é Presidente da AssociaçãoEspírito-Santense de Imprensa-AEI.

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prestam contas de suas ações, esque-cidos de que são servidores do povo eos mandatos não lhes pertencem. Tu-do isso ocorre por nossa ignorância eomissão por não sabermos exercitarnossas prerrogativas constitucionais,do referendo e do plebiscito.

Adormecidos em berço esplêndido,assistimos a tudo de braços cruzados

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9Janeiro de 2006

Jornal da ABI

Jornal da ABI — Trace um breve per-fil do senhor.Milton Coelho da GraçaMilton Coelho da GraçaMilton Coelho da GraçaMilton Coelho da GraçaMilton Coelho da Graça — Cariocada Gamboa, nascido na seção de in-digentes da Pró-Matre, 75 anos, ca-sado, quatro filhos.

Sua formação inclui Ciências Econô-micas e Direito e até uma pós-gra-duação em Administração de Empre-sas na Suíça. O senhor exerceu algu-ma dessas atividades antes de se tor-nar jornalista? Em caso afirmativo,como foi a experiência? Como sur-giu o interesse pelo jornalismo?MiltonMiltonMiltonMiltonMilton — Fui selecionado num con-curso da General Electric entreformandos de Economia e tinha boaschances de ir para o seu Centro deAltos Estudos em Albany, Nova York.Mas, na hora do almoço, participei deum comício da União Nacional dosEstudantes-Une contra Roberto Cam-pos, bem ali na esquina das Ruas Setede Setembro e Quitanda. Minha foto,preso, saiu na primeira página do Glo-bo e eu nem pude entrar mais na em-presa. No ano seguinte, quando esta-va me formando em Direito, batalheiquase um mês para soltar três vaga-bundos que tinham sido presos emflagrante botando água no leite. Con-segui um habeas corpus e os três semandaram sem me pagar. Como di-zia aquela versão de Caminito que foimuito cantada no Carnaval, fiquei “nooceano da vida como embarcação per-dida”, até que o Maurício Azêdo, hojePresidente da ABI, me levou para serredator da coluna social do DiárioCarioca. E, durante 50 anos, só saí deuma redação para a cadeia.

O senhor passou por grandes jor-nais, como o já citado Diário Cario-ca e a Última Hora, hoje extintos. Aque se deve o desaparecimento des-ses veículos e a conseqüente dimi-nuição do número de periódicos?MiltonMiltonMiltonMiltonMilton — No caso de UH, o jornalfoi destruído pela ditadura militar. ODiário Carioca morreu porque o dononão entendeu as mudanças no mun-do, no País e na indústria da infor-mação — explicação que vale tam-bém para a parte final da pergunta.Mas tenho dúvidas sobre o que vocêchama de “diminuição do número deperiódicos”. Temos hoje sete diáriosno Rio (Globo, Extra, O Dia, O Povo,Jornal dos Sports, Lance e Meia Hora),mais uns três ou quatro na regiãometropolitana. E é preciso levar emconta os jornais de bairro (existemdezenas) ou de grupos políticos esociais (Hora do Povo, Inverta, Jornaldos Aposentados e muitos outros) quenão são diários, mas pesam na for-mação da opinião pública.

Fale um pouco sobre sua passagempelos principais veículos do País.MiltonMiltonMiltonMiltonMilton — Por ordem cronológica fo-ram Diário Carioca (três vezes); Hoje;Shopping News; TV Rio; Última Hora

Com umcurrículo quelhe assegura

o título deprofissonalmultimídia,

Miltonconsidera quebom mesmoé planejarcomo será

cada edição

����� Entrevista a Rodrigo CaixetaDEPOIMENTO

os 75 anos, Milton Coelho da Graça, membro do Conselho Deliberativo

da ABI e colunista do site Comunique-se, acumula no currículo experiência

invejável em grandes publicações brasileiras. Embora não tenha formação

em Jornalismo, ele sabe bem quais são as habilidades que formam um bom repórter.

Entre as mídias, frustrou-se com o rádio, acredita na convergência entre o impresso

e o online, julga correta a cobertura da crise que atinge o País e diz que o nível médio

dos jornais nacionais se equipara ao dos melhores do mundo.

MILTON COELHO

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“Melhor do queser repórteré ser pauteiro”

“Melhor do queser repórteré ser pauteiro”

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Jornal da ABI

10 Janeiro de 2006

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(Rio); Última Hora (Recife); Diário daNoite e Jornal do Commercio (ambosde Pernambuco); Jóia, revista femi-nina da Bloch; sucursal Rio da Edi-tora Abril, nas revistas Realidade,Quatro Rodas, Intervalo, Placar,Playboy e Documento Brasil; Fato Novo,Resistência e Notícias Censuradas, jor-nais clandestinos; Tênis Esporte; Vela& Motor; História do Rock; Arte Hoje;O Globo; Gazeta Mercantil; IstoÉ; TVCorcovado (comprada pela Record);Diário da Manhã (Goiânia); Diário daAmazônia; Grupo Gazeta de Alagoas(jornal, TV e rádios); Jornal doCommercio; Jornal dos Sports; e siteComunique-se.

Quais os momentos mais marcantesdessa trajetória?MiltonMiltonMiltonMiltonMilton — Última Hora, Editora Abril,Gazeta Mercantil, IstoÉ e O Globomarcaram as “viradas” e aprendiza-gens mais importantes de minha vidaprofissional.

Muitos jornalistas dizem que bommesmo é ser repórter. Após ter acu-mulado tantas funções, como reda-tor, chefe de reportagem e editor, oque mais o atrai no jornalismo?MiltonMiltonMiltonMiltonMilton — Melhor do que ser repór-ter é ser pauteiro.

O que faz de alguém um bom re-pórter?MiltonMiltonMiltonMiltonMilton — Compulsão pelo conheci-mento, compromisso ético com o bempúblico, excelente nível de conheci-mento de nossa língua e bom nível

de cultura geral, ou especializada.

Para ficar só em títulos da Abril: Qua-tro Rodas, Placar, Playboy... Como éa experiência de ter trabalhado emeditorias tão diferentes? De que for-ma isso se reflete em sua carreira?MiltonMiltonMiltonMiltonMilton — Eu não sou um “especia-lista”, sempre gostei de jogar nas 11e nunca fui disciplinado na aprendi-zagem. Isso foi determinante na mi-nha carreira “errática”.

Voltando ao tempo dos jornais clan-destinos, o senhor chegou a ser pre-so e torturado. Como foi o períododa ditadura, olhando hoje em retros-pectiva?MiltonMiltonMiltonMiltonMilton — Foram 20 anos de um pro-jeto nacional equivocado, de agrava-mento das desigualdades, de desres-peito à Declaração dos Direitos Hu-manos e — pior — de uma herançainstitucional que ainda não consegui-mos superar. Uma herança que atra-sou e continua atrasando a forma-ção de jovens lideranças; que defor-ma, com o absurdo “pacote de abril”,o Parlamento, a Federação e a repre-sentação democrática da cidadania;e mantém na cultura política a figu-ra do “baixo clero” — a maior banca-da tanto no Senado como na Câma-ra e em quase todas as assembléiasestaduais —, parlamentares queapóiam qualquer Governo em trocade vantagens pessoais.

Recentemente, a Secretaria de Esta-do de Educação do Estado do Rio dis-

tribuiu entre os 150 mil alunos da redepública de ensino médio um folheto– produzido pelo senhor e intituladoUma visão da história para jovens –,com uma biografia do jornalistaVladimir Herzog. Qual era sua relaçãocom ele?Milton — Companheiro, amigo e ad-mirador.

Como foi a experiência de ser cor-respondente internacional em Lon-dres e Nova York?MiltonMiltonMiltonMiltonMilton — Para quem começou naenfermaria de indigentes da Pró-Matre e ficou órfão aos 3 anos, so-breviver tem sido uma experiêncianotável, sempre enriquecida pelomaior prazer no amor e no trabalho.Que mais posso dizer sobre a inclu-são de todos os Estados do Brasil,Suíça, Estados Unidos, Grã-Bretanhae outros 45 países nessa experiência?

O senhor foi Di-retor de Jornalis-mo de jornal, rá-dio e TV no Gru-po Gazeta deAlagoas. Consi-dera-se um pro-fissional multi-mídia?MiltonMiltonMiltonMiltonMilton — Sim,embora não te-nha tido no rádio a oportunidade quegostaria. Acompanho com interesse— e, confesso, inveja — o excelentetrabalho dos companheiros da CBNe da BandNews.

Hoje, a internet configura-se comouma importante mídia jornalística,com coberturas em tempo real. Osenhor é editor e colunista do Comu-nique-se, ou seja, já está familiari-zado com esse ambiente. Como o

avalia? Acredita que a internet podeacabar com a imprensa? Qual o ca-minho a ser seguido?MiltonMiltonMiltonMiltonMilton — Fui editor, mas hoje souapenas colunista e me sinto em casana internet. Hoje — e, nessa área, évital manter-se aberto às possibilida-des que estão sempre surgindo —acho que jornal impresso e onlinetendem a convergir, não a colidir.

O senhor também criou recentemen-te um blog. Com que freqüência oatualiza e quais as temáticas princi-pais abordadas?MiltonMiltonMiltonMiltonMilton — Estou numa fase de dúvi-da sobre o presente e o futuro do blog.

Embora o Presidente Lula acuse aimprensa de irresponsável, não pa-ram de surgir denúncias de corrup-ção em todo o País. Como o senhoranalisa a cobertura da mídia nessecenário de crise política?MiltonMiltonMiltonMiltonMilton — Corretíssima, com os equí-vocos, exageros e deficiências própri-os de uma imprensa democrática elivre. No caso brasileiro, tudo issoagravado pelas dificuldades econômi-cas e o esforço de governos, grandesempresas e políticos, em todos os ní-veis, para suborná-la, enganá-la e/ousubmetê-la.

Concorda com alguns articulistas,que dizem que a imprensa é a me-mória da cidadania?MiltonMiltonMiltonMiltonMilton — Concordo, ressalvandoque ela não é a “única” memória.

Defina o que é ser um membro da“esquerda possível”.MiltonMiltonMiltonMiltonMilton — Possível qualquer esquer-da é, desde que respeite as normasda convivência com outras correntesde pensamento. Mas a condição bá-sica para o sucesso de qualquer polí-tica de esquerda é que ela tenha suainspiração e suas propostas na reali-dade e no conhecimento, não em vi-sões éticas, desejos, utopias — tudo

aquilo que é do-mínio da religião,não da política.Como nos disseGeraldo Vandréem enigmáticacanção do final dadécada de 60,“quem sabe faz ahora, não esperaacontecer”. É umchamado à mili-

tância, mas os jovens interpretarama palavra “sabe” como “quer”. E nãoadianta só querer, é preciso saber.

Recentemente, em sua coluna noComunique-se, o senhor criticou oprocesso seletivo do jornal O Glo-bo, que, apesar de “um severo sis-tema de recrutamento de novos jor-nalistas”, é publicado com freqüen-tes erros de português em todas aseditorias e até mesmo em colunas

“Sinto-meem casa nainternet”, dizMilton,colunista doComunique-se. Ele achaque ojornalismoimpresso e oonline tendema convergir, enão a colidir.

O bom repórter precisa ter ética,domínio da língua e cultura geral

Muitos chefesfogem da buscaincansávelda excelência

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11Janeiro de 2006

Jornal da ABI

Ÿ Imaginem!Navarra,Espanha, éa nova Mecada técnicade jornal

e títulos. Na sua opinião, qual o ní-vel de qualidade dos jornais brasi-leiros atualmente?MiltonMiltonMiltonMiltonMilton — O nível médio dos nossosjornais se equipara ao das melhoresimprensas do mundo — e não apenasdos grandes, também entre médios epequenos, como demonstra o mensá-rio Já, de Porto Alegre, e muitos ou-tros Brasil afora. Mas existem sériaslacunas na formação educacional,pouca gente para muito trabalho nasRedações e, infelizmente, muitos che-fes que fogem de sua principal respon-sabilidade: a busca incansável da ex-celência. Como pode sair no JornalNacional a informação de que a Tur-quia não está na Ásia? Ou como po-dem sair publicados os mesmos errosgramaticais sem que os autores sejamchamados para “uma aulinha parti-cular” com o editor-chefe?

O senhor também escreveu nessemesmo artigo que as empresas ado-tam cada vez mais estratégias eorganogramas elaborados por con-sultores ou adminis-tradores, semprecom uma tônica co-mum: reduzir custosde pessoal, mesmocom queda na quali-dade editorial. Comoo senhor avalia essatendência?MiltonMiltonMiltonMiltonMilton — Nossos jor-nais — pelo menos agrande maioria — fo-ram criados e dirigi-dos durante décadaspor jornalistas em-preendedores, não especialistas emadministração. E muitos de seus her-deiros não são nem uma coisa, nemoutra. A primeira e única empresaque teve a preocupação de, já nosanos 70, mandar editores para estu-dar Administração nos Estados Uni-dos ou na Europa foi a Editora Abril.Quando os herdeiros dos fundado-res começaram a assumir as empre-sas de mídia, optaram por contratarconsultorias internacionais, fortesem gestão financeira e administrati-va, mas sem know-how específico naárea de comunicação. Navarra —imaginem! — passou a ser a Mecada nova geração de comandantes daimprensa. O Diário de São Paulo é umnítido exemplo dessa importação ina-dequada.

Sobre a prisão de Judith Miller, doNew York Times, por se recusar a re-velar a identidade de sua fonte, o

senhor escreveu um artigo levantan-do uma série de questões como aconfidencialidade da informação emoff e a relação de jornalistas e ou-tros cidadãos a respeito de cumpri-mento da lei. Agora repito um dosquestionamentos feito aos leitores:a liberdade de imprensa pode ter ex-ceções?Milton Milton Milton Milton Milton — Vou tomar dos nossos pro-curadores e juízes uma definição queeles repetem sem cessar e que nin-guém contesta: nenhum direito éabsoluto. Acho que a ABI, a ANJ (As-sociação Nacional de Jornais) e ou-tras organizações preocupadas como futuro da imprensa deveriam man-ter um fórum permanente de discus-são sobre este assunto.

O senhor também dá aulas. O que olevou a ingressar no mundo acadê-mico?MiltonMiltonMiltonMiltonMilton — Primeiro, para melhorarminha renda, porque depois de pa-gar INSS durante décadas sobre 20salários-mínimos; recebo pouco mais

de seis. Segundo, por-que quero comparti-lhar minha experiên-cia com jovens dis-postos a aproveitá-la.Terceiro, porque es-tou convencido deque a batalha funda-mental na espécie hu-mana se trava entre abusca do conheci-mento e a ignorância.

Embora não tenhaformação superior

em Jornalismo, profissão que exer-ceu a maior parte da vida, o senhorconcorda com a exigência do diplo-ma? Por quê?MiltonMiltonMiltonMiltonMilton — A prática do jornalismoexige educação de nível superior. Masa juíza nos alertou: todos os cidadãostêm a garantia constitucional da li-berdade de expressão. Não podemosnos confortar com privilégios educa-cionais ou corporativos. Temos delutar para que o preceito constituci-onal seja efetivamente respeitado.

Na atual conjuntura do País, achapossível viver do jornalismo?MiltonMiltonMiltonMiltonMilton — Acho. Mal, é claro, masmarceneiros e cortadores de canatambém têm dificuldade para ganharum salário mais justo. E tudo indicaque a vida do jornalista só ganharáem qualidade se estivermos ao ladode marceneiros e cortadores de canana luta contra a desigualdade.

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A batalha essencial daespécie humana é entre oconhecimento e a ignorância

Escrevo, não por acaso, no dia deSão Sebastião, padroeiro do Rio. Mal-traçadas sobre Roberto M. Moura

não são fáceis. Seu talento multifa-cetado leva aquele que se arrisca a tra-çar um perfil a privilegiar um aspectoem detrimento de outro igualmenteimportante.

O historiador rigoroso(No princípio era a roda éum livro que pode ser cha-mado sem medo de semi-nal, por mais que andemgastando a palavra emmerrecas) merece elogios?E o jornalista ardoroso,consciente das polêmicas emque se envolvia e das má-goas que, inevitavelmen-te, causava? O apaixona-do por nossa cultura po-pular, da simples bola degude à suntuosidade do carna-val, mereceria um livro. O menino queajudou, com outro livro categórico, aimortalizar a Praça Onze, gerará ou-tras tantas teses de seus alunos agra-decidos.

Meio embargado, prefiro escreversobre o amigo que perdi. Eu o conhe-ci, pasmem, meio roqueiro, no finzi-nho dos anos 60, defendendo suas pre-ferências musicais com a paixão quese derramaria mais tarde definitiva-mente sobre nosso povo. Acompanheiseu sofrimento pela morte precoce doirmão querido, pela perda do pai, pelacardiopatia da mãe venerada, seuestremado jeito de amar, de envolver-se – como um certo Mestre-Sala – em

lutas inglórias, em causas perdidas,que fariam São Judas Tadeu balançar,reticente, a cabeça.

Fico fora de mim ao pensar no danoirremediável que um carrapato filho-da-puta causou a toda uma cultura.Roberto era homem de projetos so-

nhadores e nem quero pensar emquantos, importantíssimos paratodos nós, ficaram só esboça-dos em sua mesa de trabalho,em sua prodigiosa memória.

A morte prematura deRoberto passou cerol no vôode muitas pipas cariocas.

Meu único e paupérrimoconsolo é que ele não viu

a volta de Kleber Da-noninho ao Mengo,outra paixão pra Ari

Barroso não gongar –nem viu a estapafúrdia

divisão do Fla em time A eB. Ele morreria...

Numa discussão – e elas eram sem-pre quentes – sobre um show que fa-ríamos juntos, eu o chamei de M.Moura nacional. Ele retrucou dizen-do que eu, com meus acessos de fúria,ia acabar partidário do Eurico Miranda,o Maquiavel ao Zé do Pipo.

Essa última discussão arde em meusolhos.

Roberto é insubstituível. Basta vera quantidade de canalhas defendendoas respectivas quadrilhas nas CPIspara sentir a falta que um único ho-mem de caráter faz ao Brasil.

Rio, 20.01.2006Aldir Blanc

O compositor e poeta de O Bêbado e a Equilibristapresta homenagem ao jornalista, escritor e crítico musical

Roberto Moura, membro do Conselho Deliberativoda ABI, falecido em 26 de outubro passado.

Um artigoespecial de

Aldir Blanc

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Jornal da ABI

14 Janeiro de 2006

“Jornalismoé como anotícia:

ou se é atual,ou já era”

orrespondente em Israel de um jornal diário

e um site, Nahum Sirotsky acaba de

completar 80 anos (em 19 de dezembro),

dos quais mais de 60 dedicados ao

jornalismo, que entrou em sua vida quase por acaso.

De todo esse tempo, sua maior lição para qualquer

um que pretenda se tornar profissional da imprensa

é simples: aprender mais, sempre mais, e acima de

tudo manter-se atualizado, já que compara o

jornalista à própria notícia. Em conversas via

����� Entrevista a Solange NoronhaDEPOIMENTO

NAHUM SIROTSKY

internet, Sirotsky dispensa o tratamento formal e

conta detalhes de sua trajetória, iniciada na redação

da revista Diretrizes, onde era contínuo e, graças ao

curso de datilografia feito em Passo Fundo, RS,

começou a fazer trabalhos de foca para Joel Silveira.

Conheceu, como ele mesmo diz, “o que havia de

melhor nas letras e nas artes”. A desorganização e

as muitas viagens mundo afora, porém, fizeram que

perdesse os souvenirs de tempo tão rico e até mesmo

o contato com muitos dos amigos.

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15Janeiro de 2006

Jornal da ABI

Jornal da ABI — Sua ligação com aABI é especial, não é verdade? FoiHerbert Moses, Presidente que dánome ao edifício-sede da institui-ção, quem lhe arrumou o primeiroemprego.Nahum SirotskNahum SirotskNahum SirotskNahum SirotskNahum Sirotskyyyyy — Minha ligaçãocom o ABI é fundamental. Trabalha-va de contínuo na revista Diretrizes,de Samuel Wainer, onde conheci al-guns dos melhores jornalistas e escri-tores do País. Também era aprovei-tado por saber datilografia. Entre oscolaboradores estava Joel Silveira, re-pórter insuperável, bom colega, boagente, que resolveu me aproveitar emtrabalhos de foca. Fiz amizades paratoda a vida. Trabalhava para pagarmeus últimos anos de secundário.Certa manhã, chego e descubro tudofechado por ordem do Dip (Depar-tamento de Imprensa e Propaganda),da Censura e do Dops (Departamen-to de Ordem Política e Social). Sememprego nem meios, fui procurargente que eu conhecera. Dirceu doNascimento — que, anos depois, eulevaria para a revis-ta Manchete — erasecretário-geral daAgência Meridio-nal, dos Diários As-sociados.Por insistência deJoel, que acredita-va em mim e atéme chamava de“foca zero”, eu ti-nha feito uns tra-balhos para a DomCasmurro, históricapublicação criada edirigida por Bríciode Abreu, que publicou um deles eme encomendou uma entrevistacom o crítico literário do Globo, ElóiPontes, sobre o novo crítico literá-rio do Correio da Manhã, o jornalcarioca de maior prestigio na época.Escrevi um dos piores textos da mi-nha vida, mas uma declaração do en-trevistado me marcou: a de que ocrítico do Correio era “de enciclopé-dica ignorância”. Os dois entraramem briga literária pelos seus jornaise eu fui citado várias vezes.

Como isso o levou a Herbert Moses?NahumNahumNahumNahumNahum — Como fui muito mencio-nado, Dirceu deu a sugestão quemudou a minha vida — e meu so-nho de ser cientista: sugeriu que fos-se ao então Presidente da ABI, Dr.Herbert Moses, e me apresentassedizendo meu nome com ênfase, poisele se gabava de conhecer de nometodos os jornalistas. ”Doutor Moses,sou o Nahum Sirotsky. Como sabe,fecharam Diretrizes e preciso de em-prego para sobreviver“, eu disse. Eleme encarou — era diretor do Globo,jornal dos Marinho —, explicou quenada podia oferecer, mas, após umapausa, acrescentou: ”Precisamos dealguém que fale idiomas.” A todos fui

dizendo sim, até espanhol, apesar deter aprendido apenas palavras de in-glês e francês no ginásio. Mas nadatinha a arriscar, pois pretendia umavaga de boy. Só não entendi, nemquis saber, para que as línguas.Ele escreveu algo num papel e disse:”Vá ao Globo e entregue este bilheteao Pinheiro.” Lá fui eu ao Alves Pi-nheiro, um dos maiores chefes de re-portagem que conheci em toda a mi-nha longa vida profissional, incluin-do anos de exterior. Vasto bigode, cha-ruto na boca, lápis escrevendo semparar e, ao mesmo tempo, falando aotelefone. Leu o bilhete e, com fortesotaque baiano, perguntou: “Verda-de?” E me deu um endereço e umnome: um tal Dr. Peck — jamais vouesquecer —, médico norte-americano.Saí caminhando e imaginando queestava indo buscar algo já pronto, umprimeiro teste de minhas habilidadesde contínuo. No hospital, o diretor,um médico brasileiro, disse que o Dr.Peck estava operando e logo viria meatender. Entendi: era para entrevistá-

lo. Fui logo expli-cando que nada sa-bia de medicina eque talvez fosse me-lhor ele me ajudar eouvi um elogio, deque assim deviamser todos os jorna-listas. Ele fez tudo,peguei um textopronto. Na redação,o Pinheiro leu e foilogo dizendo quenão estava em lin-guagem jornalística,mas tinha todas as

informações: “Deixa comigo que euacerto.” Apontou para uma mesavazia, disse que aquela era a minhamesa de trabalho, e gritou para a re-dação: ”Conheçam o novo foca, oNahum. Ele fala inglês!” Ganhei umemprego que não imaginara. E assimcomecei minha carreira.

Você hoje mora em Tel Aviv e é cor-respondente do Zero Hora e do Úl-timo Segundo. Há quanto tempoestá nessa função?NahumNahumNahumNahumNahum — Há alguns anos sou cor-respondente da RBS (Rede Brasil Sulde Comunicação, à qual pertence ojornal Zero Hora) e do Portal iG (aque pertence o site Último Segundo),mas minha primeira passagem porTel Aviv foi de 1965 a 1972, adido àEmbaixada do Brasil. Depois de dei-xar o Itamarati, voltei a Israel comocorrespondente do Jornal do Brasil edo Estado de S.Paulo. Fiquei lá unsanos, depois voltei ao Brasil.

Quando a internet entrou na suavida? Sentiu diferença entre escre-ver para os veículos tradicionais eum site?NahumNahumNahumNahumNahum — A internet entrou na mi-nha vida logo depois que seu uso foi

viado a vários, mas não há espaçonuma entrevista para lembrar tudo.O mais relevante deles foi político.Em 1947, o Conselho de Segurançadas Nações Unidas reuniu-se paradiscutir uma agenda à qual se opu-nha a então União Soviética, queameaçava se desligar da organizaçãocriada durante a Segunda Guerra porfalta de confiança no então monarcapersa, um Pahlevi simpático aos na-zistas. Os russos passaram a ser a in-fluência dominante. Finda a guerra,norte-americanos e ingleses resolve-ram que o país tinha de ser desfeitoou algo parecido.Tinham ido de Moscou, entre outros,Molotov e Vishinsky, líderes obedien-tes a Stálin. Um norte-americano pre-sidia o Conselho. O salão permitia umpúblico de milhares de espectadores.Lembro-me de o americano abrir areunião e anunciar a questão do Irã,assim se chamava o problema doCurdistão. Molotov, Vice-PrimeiroMinistro e Ministro do Exterior sovi-ético, Vishinsky, poderoso Ministroda Justiça, se não me falha a memó-ria, e os demais membros da delega-ção soviética levantaram-se de seuslugares e lentamente avançaram paraa porta da saída. Nesse momento, umdos 11 do Conselho teve um acessode tosse e se viu cair na mesa sua den-tadura em forma de ferradura.Era grande a tensão. O público ima-ginava que assistia ao que poderia serum primeiro momento de uma guer-ra entre Estados Unidos e União So-viética. Um outro embaixador tirouo lenço branco do bolso, segurou adentadura e a passou a outro, que foipassando o pequeno pacote até seudono. Silêncio, dentadura recolocada.

O público aindaem silêncio. No-vo acesso de tos-se e nova quedados dentes. Al-guém riu, todoscomeçaram a rirde fazer pipi nascalças. Os soviéti-cos nem se vira-ram. Terão enten-dido que se riamdeles? Os jornais

não contaram da dentadura, mas fa-laram da reação do público. O Cur-distão acabou. Reza Pahlevi, filho dorei deposto, assumiu a monarquiaque acabaria derrubada pelos aiato-lás décadas depois. Foram dos primei-ros momentos da “Guerra Fria”.

E mais recentemente? Sei que há al-gum tempo você foi atingido com umapedrada no joelho na Cisjordânia.NahumNahumNahumNahumNahum — O que vi de mais impres-sionante nos últimos tempos foramlocais destruídos por homens-bom-ba, extremistas islâmicos que se fa-zem explodir para matar inimigos.As lembranças viram pesadelos.Acredite, porém, que não há nada de

liberado. Tive de aprender ou nãoteria trabalho. A meu ver, a diferen-ça básica é que é preciso ser mais sin-tético e objetivo, usar frases mais cur-tas. Ler textos extensos no compu-tador cansa demais a vista.

Há muita gente com menos idadeque resistiu (ou resiste) a aderir aocomputador.NahumNahumNahumNahumNahum — Minha idade não impe-diu o aprendizado nem a prática. Porincrível que pareça, fui dos primei-ros a usar máquina de escrever emredações. Passei da mecânica à elé-trica e à eletrônica e desta ao com-putador como necessidade profissi-onal, do mesmo jeito que tive deaprender novos estilos de escrevertextos jornalísticos. Jornalismo ésempre o agora, o hoje. Temos quefazer força para nos mantermosatualizados em tudo. Do contrário,somos ultrapassados pelas mudançasculturais e tecnológicas, ficamos fa-lando sozinhos.

O que não mudou?Nahum Nahum Nahum Nahum Nahum — Quando comecei, a pro-fissão era uma vocação e a escola eraa prática. Mas logo se descobria queos melhores eram os que se preocu-pavam em adquirir cultura, conhe-cimentos gerais e estar atualizadoscomo meio de conseguir as melho-res informações e produzir as melho-res matérias possíveis para os seusveículos. Eram os que sabiam o queperguntar, o que pesquisar, como ex-por. Vocação não bastava muito alémdos primeiros passos. Aqueles quenão procuravam crescer cultural-mente acabavam encostados em fun-ções menores ou tentavam novoscaminhos.Tive asorte de ter umAlves Pinheirocomo primeiromestre e um Ro-berto Marinhocomo primeiroempregador. Pi-nheiro me ensi-nou a importân-cia da pergunta eda dúvida e a sen-tir cada reporta-gem como um desafio nunca enfren-tado. Roberto Marinho acreditou emmim e me fez correspondente doGlobo em Nova York nos meus 20anos de idade. Fui o primeiro jorna-lista brasileiro a se credenciar juntoàs Nações Unidas. Aprendi uma bar-baridade com o jornalismo norte-americano. Acho que foram os meusanos nos Estados Unidos que me en-sinaram a importância da autocríticae a me empenhar em me manter atu-alizado. Continuo empenhado.

Você cobriu muitos conflitos mun-do afora. É possível relembrar quaise quando?NahumNahumNahumNahumNahum — Sim, vi conflitos, fui en-

“O homem émais feroz doque qualqueroutro animal”

“Conheçamo Nahum,o novo foca.Ele falainglês!”

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Jornal da ABI

16 Janeiro de 2006

romântico nem de bonitoem guerras além do medopermanente, do fedor defezes do descontrole queocorre nos bombardeios,da morte e de partes de se-res humanos. De como ohomem é mais feroz doque qualquer outro ani-mal. De como o jornalistade guerra tem de ter pre-paro físico de atleta e se vi-cia com a emoção de sen-tir sua vida em risco e so-breviver. São muitas as se-qüelas físicas, mas as pio-res e incuráveis são as psi-cológicas.

E como é ser mandado deum lugar a outro, semprepara o olho do furacão?Conhece algum caso dejornalista que foi, diga-mos, cobrir os desfiles dacoleção primavera-verãoem Paris e, de repente, se viu emmeio a uma guerra?NahumNahumNahumNahumNahum — O repórter é instrumentodo seu veiculo, vai aonde é mandadoou desiste da profissão. E pode acon-tecer de ir para uma festa, ou outrotipo de evento internacional, e se verno meio de uma guerra civil. Assimfoi com o pequeno grupo encarrega-do da cobertura de uma conferênciainteramericana em Bogotá. Estáva-mos almoçando na residência doembaixador brasileiro, que homena-geava os jornalistas, quando, no meiode um copo de bom vinho, ele rece-beu um telefonema de emergência.Voltou pálido. Mataram Gaitán (Jor-ge Eliecer Gaitán, líder político emembro do Partido Liberal colombi-ano, assassinado em 9 de abril de1948). O povo se revoltou. Tivemosde percorrer a pé uma grande distân-cia para chegar ao centro da confu-são que se espalhava e viria a ser cha-mada de Bogotaço. Boa parte da par-te antiga e bela da cidade foiincendiada e destruída. Éramos JoelSilveira, José de la Peña Jr., AntonioCalado, Barreto Leite Filho e eu. Mi-lhares foram mortos por armas bran-cas. Foi o começo da guerra civil quedura até hoje. Ao longo da minha car-reira, houve outros deslocamentos deemergência. Muitos.

Muitos foram também os veículosnesses mais de 60 anos. Conseguelistá-los?NahumNahumNahumNahumNahum — De foca do Globo, logovirei repórter para todo tipo de con-fusão. Depois, fui repórter do Diárioda Noite, voltei ao Globo, fui chefede reportagem, único repórter e, maistarde, diretor da revista Visão, dire-tor do Diário da Noite, diretor deManchete, imaginador e diretor darevista Senhor, assessor de RobertoCampos na Embaixada em Washing-ton, colunista de Economia do JB,

adido da Embaixada em Israel, cor-respondente do JB e do Estadão emIsrael, e mais e mais. Lembro que fuidiretor do primeiro jornal da RádioGlobo, O Globo no ar, comentarista eentrevistador de programas de TV,redator da AP, da AFP e da Reuters.Em Nova York, estagiei no New YorkDaily News, fui repórter do já desa-parecido PM, único jornal que ima-ginou viver sem aceitar anúncios, ecomentarista da NBC em portuguêsetc. etc. Também cheguei a ter umaassessoria e consultoria de engenha-ria de imagem. Tem sido uma vidainteressante, na qual aprendi muito.Só não aprendi como ficar rico.

Como foi a criação da Senhor, ver-dadeiro marco na história da im-prensa brasileira?NahumNahumNahumNahumNahum — Senhorsurgiu de um im-proviso da minhamulher, a atriz eescritora BeylaGenauer, numa fes-ta de Abrão Kogan,um dos proprietári-os da editora Delta-Larousse. Beylaperguntou a ele porque não me chama-va para fazer umarevista. Na época,eu trabalhava como Alberto Dines na hipótese de umsemanário de política e economia. OKogan me chamou na hora e me su-geriu que fosse falar com seu sócio esobrinho Simão Weizmann, que medisse que vivia sonhando com a idéiade uma revista original, à altura daeditora. Falei que tinha idéia seme-lhante e fui improvisando. Ele quisuma amostra. Na mesma noite, coma Beyla, pedi ajuda ao (Carlos) Scliar,que veio com o Glauco (Rodrigues),cola e tesoura. Criamos uma bone-

ca, mostrando como imaginamosque deveria ser a revista. Weizmanngostou e topou a parada. Deu-mecarta branca.

Como era trabalhar com aquele timede feras que tinha Paulo Francis,Luiz Lobo, Jaguar, Millôr e tantos ou-tros nomes de peso? Conte um pou-co sobre aquele período tão fértilque terminou de forma tão trágica,com o golpe de 64.NahumNahumNahumNahumNahum — Tinha também Newtonde Almeida Rodrigues, Clarice Lis-pector... Transformamos a hipótesenuma realidade. Fiquei na direção deSenhor de 58 a princípio de 61, atéque o controle foi vendido a outrogrupo. Não acompanhei os anos se-guintes e o fim. A equipe inicial erade indivíduos de grande criatividade

e profissionalismo,todos excepcionaisno que faziam. Nãotivemos problemaspessoais: cada umbrigava por suasidéias e Senhor foi asíntese da criativi-dade de todos como dinheiro que Si-mão e Sergio, osdois irmãos sóciosna Delta, ousaraminvestir. Nunca ima-ginamos estar fa-

zendo algo para a História; fazíamoso que achávamos que era o melhorde tudo quanto existia ou existira nocampo de revistas brasileiras, acre-ditando que haveria um público lei-tor. E deu no que deu.

Onde você estava quando a revistaacabou?NahumNahumNahumNahumNahum — Passei a maior parte doperíodo entre 1965 e os anos 70 tra-balhando no exterior. Como repór-ter, fizera boas relações com muitos

dos que seriam importantes nos go-vernos da época, como Roberto Cam-pos, Mário Henrique Simonsen,Dion de Melo Teles, Nei Braga, VascoLeitão da Cunha, Juraci Magalhães,Hélio Beltrão, generais, almirantes...Conheci chefes índios e chefes de Go-verno e políticos estrangeiros, Tito,Che Guevara, Truman, WinstonChurchill... João Neves da Fontourafoi meu padrinho de casamento. Daépoca, voltando de Israel, lembro-mede quando fui convidado a jantar comJK — que eu conhecera quando Pre-feito de Belo Horizonte — e membrosde seu antigo ministério. Ele me disseentão que sairia da cassação, seria elei-to Presidente e eu seria o embaixadordele em Israel. Repórter roda muito econhece muita gente. Se souber pre-servar a confiança de suas fontes, ga-nha delas amizade e informações.Soube fazê-lo. Nada sofri.

Como vê a discussão sobre a neces-sidade de diploma para nossa pro-fissão? Tem idéia da situação do en-sino de Jornalismo no Brasil?NahumNahumNahumNahumNahum — Quis ser cientista, acabeiestudando Economia, fazendo cursosde Ciência Política e de Relações In-ternacionais, nunca terminando fa-culdade alguma. Então, posso meclassificar como autodidata. Poucosei da qualidade das escolas de Jor-nalismo no Brasil. Diria, porém, queé essencial que o jornalista tenhaamplos conhecimentos gerais. Háexcelentes profissionais no jornalis-mo brasileiro de hoje.

Teria algum recado para os futurosjornalistas brasileiros?NahumNahumNahumNahumNahum — Tudo que posso sugeriraos novos colegas é que em tempoalgum imaginem que eventuais su-cessos significam que já se sabe tudo.O jornalismo é como a notícia: ou seé atual ou já não se é mais.

“A revistaSenhor foia síntese dacriatividadede todos”

A partir do emprego de contínuo em Diretrizes, Nahum não parou de aprender, mesmo na era eletrônica. “Só não aprendi a ficar rico”, diz.

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DENÚNCIA

OOOOOtópico ao qual irei me referir su-mariamente aqui é sobre o jorna-lismo no 11 de Setembro e os va-

lores universais a respeito de notícias dig-nas de interesse. Imprensa livre significapluralismo, pontos de vista diversificados,culturas variadas. Imprensa livre tambémsignifica que pessoas serão informadas denotícias relevantes e importantes.

O jornal The Economist descreve os ataquesterroristas no World Trade Center como “odia que o mundo mudou”. Mas o mundo realem que estamos vivendo não mudou porcausa dessa tragédia. Os maiores problemase desafios que a raça humana está enfren-tando, como pobreza, poluição e doenças,estão apenas ficando piores. Na verdade, foio mundo criado e mediado pela indústria damídia que mudou dramaticamente. Os in-teresses públicos, a segurança pública e a saú-de pública de toda a comunidade global nãosão mais o ponto principal do interesse eatenção da mídia altamente comercializadae globalizada. No mesmo dia em que o WorldTrade Center foi atacado e aproximadamen-te 2.500 pessoas foram mortas, 40.000 cri-anças morreram de fome, doenças e pobre-za, sendo 8.000 ao redor do mundo mortaspelo HIV/aids. Mas os números de mortesdessas causas perderam sua importância namídia se comparados aos dramáticos even-tos de 11 de Setembro.

Seguindo a pauta, “lutar contra a primei-ra guerra do século 21”, a indústria da mídiaglobal desde então tem feito uma intensacobertura do 11 de Setembro, da posteriorGuerra no Afeganistão, da campanha con-tra as armas de destruição em massa doIraque e da Guerra do Iraque. Com bombar-deios diariamente na mídia e milhões de re-petições do mesmo tópico, da mesma pau-ta, da mesma linguagem, das mesmas pala-vras-chave, das mesmas fotos e das mesmasseqüências, a mensagem do terrorismo e doanti-terrorismo e a idelogia contida nas in-formações foram tomadas pela audiênciacomo o único discurso jornalístico politica-mente correto e legal.

O mundo mediado pela mídia global temsido aceito pela comunidade internacionalcomo o mundo verdadeiro. A audiência glo-bal não se importa ou até mesmo esquecedos problemas que seu próprio mundo en-frenta e apenas se preocupa com aqueleapresentado pela poderosa mídia mundial.O impacto negativo do 11 de Setembro nosvalores e éticas do jornalismo pode ser re-sumido a seguir:� A pauta antiterrorista suprimiu todas asoutras questões globais. Ela se tornou um

critério para comportamento político apro-priado, onde apenas uma opinião é legal e aoutra é ilegal ou marginalizada;� As fontes estão sendo mais centraliza-das em um governo só. Fontes que contri-buem para ongs e outros governos e pesso-as estão sendo desconsideradas ou até mes-mo tachadas de ilegítimas.� O jornalismo honesto está sendo preju-dicado por falsas coberturas, como aquelasobre as armas de destruição em massa.Conseqüentemente, há um declínio da con-fiança do público na imprensa.

“Nossas notícias” estão sendo ignoradas,enquanto as “notícias deles” estão sendoamplificadas. Notícias relativas a pessoas lo-cais estão sendo ignoradas. Notícias da Áfri-ca, notícias sobre os países em desenvolvi-mento e notícias sobre o desenvolvimentoestão sendo ignoradas. Os leitores, observa-dores e ouvintes locais estão virando espec-

tadores da guerra e violência de outras pes-soas. Eles estão sendo entretidos pelo sofri-mento de outras pessoas enquanto seus pró-prios sofrimentos estão sendo queimadospor essa mesma mídia. Em todos os lugaresdo mundo, a imprensa está contando histó-rias sobre o terrorismo e o antiterrorismo,quando a maioria das famílias está sendomorta pelo HIV, hepatite B, gripe, tubercu-lose; está sendo morta pela pobreza, escas-sez e conflitos locais.

As notícias sobre as causas originárias doterrorismo, que são a desigualdade, a injus-tiça, a pobreza, doenças, a discriminação ra-cial e cultural e abusos universais dos direi-tos humanos, estão sendo ignoradas.

Fontes de propaganda do governo cria-ram um glossário jornalístico sobre o 11 deSetembro, que agora é utilizado como umaBíblia por muitos jornalistas ao redor domundo. Como resultado desse glossário, os

����� por Li Xinguang Tradução de Maria Ilka Azêdo

O atentado às Torres Gêmeas de Nova Yorkmudou o foco, a linguagem, o espaço e o tempodas coberturas da mídia global, que se comoveu

com as 2.500 mortes no World Trade Center e ignorouos 400.000 mortos pela gripe e pela hepatite B na China.

Um desabafo do jornalista chinês Li Xinguang numdos painéis do Congresso do Instituto Internacional

de Imprensa, conhecido pela sigla inglesa IPI.

O impacto do11 de Setembrono jornalismo

“‘Nossasnotícias’estão sendoignoradas,enquantoas ‘notíciasdeles’ estãosendoamplificadas.”

Li Xinguang é Diretor doCentro Internacional deEstudos de Comunicaçãoda Universidade deTsinghua, Pequim.

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Jornal da ABI

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valores das notícias estão sendo redefinidose um novo valor universal para tornar asnotícias interessantes está sendo criado. Porexemplo, para conseguir matérias principaise primeiras páginas, os jornalistas têm deusar a linguagem pós-11 de Setembro. Des-se modo, armas de destruição em massa, terro-rismo, Jihad, fundamentalistas islâmicos, ex-tremistas muçulmanos, Talibã, militantes ira-quianos, exército de coalizão, reféns e decapi-tados, Bin Laden, Saddam Husseim, GeorgeBush, Casa Branca e Pentágono têm-se tor-nado as expressões adequadas para as notí-cias mais importantes do jornalismo emcada parte do mundo.

O impacto do 11 de Setembro no jorna-lismo foi tão intenso que certos vocábulos eterminologias tornaram-se globais, enquan-to outras foram quase extintas e são usadascom o risco de a história contada ser aliena-da pela mídia. O glossário do 11 de Setem-bro está substituindo o glossário jornalísticoque inclui pobreza, carência de água, mor-tes de crianças e mulheres, Sars1, HIV, tu-berculose e hepatite B.

Observando essa mudança no cenário damídia, o que os leitores, ouvintes e espec-tadores esperam dela? Eles querem ver maisviolência, mais guerras, mais infotainment2,mais militainment3.

Devido à natureza do entretenimento edo infotainment, o problema que irá aconte-cer com o público em geral é que quantomais mídia de massa eles consumirem hoje,menos irão saber sobre o mundo à sua vol-ta. O infotainment e o militainment tendema simplificar as notícias tal como preto ebranco, anjo e demônio, bem e mal. O pa-drão de reportagem do jornalismo do 11 deSetembro é:� Mocinhos x bandidos� George Bush x Saddam Husseim� Ou está com a gente ou está contra a gente

A cobertura da Sars é um caso ilustrativopara se demonstrar como a mídia chinesamudou com o contexto do jornalismo do11 de Setembro.

As notícias sobre a Sars chegaram aopovo chinês em Guandong por meio de umacurta mensagem de texto, enviada para ce-lulares de Guandong na tarde do dia 3 defevereiro de 2003. “Há uma gripe fatal emGuangzhou”, dizia. Essa mesma mensagemfoi reenviada 40 milhões de vezes naqueledia, 41 milhões de vezes no dia seguinte e45 milhões de vezes no dia 10 de fevereiro.A agência chinesa de notícias Xinhua só re-portou a Sars no dia 11 de fevereiro, e nodia posterior toda a imprensa da nação davaa notícia. Mas a mídia global não chamoua atenção para a séria epidemia até que a

Guerra do Iraque terminasse, o que acon-teceu exatamente dois meses depois, quan-do a Sars foi noticiada em 11 de abril, umdia após a queda de Bagdá.

Os sistemas de comunicação mundial ea diretoria de marketing do Governo chi-nês trabalharam juntos e não mediram es-forços para impedir a exposição da crise desaúde pública no país. Entre os dias 5 e 15de março, o noticiário noturno oficial denotícias do país, Xinwen lianbo, da Centralde Televisão da China (CTVC), destinadoa noticiar os acontecimentos políticos na-cionais e sua agenda, focou quase que ex-

clusivamente no Congresso Nacional.Após o fechamento do Congresso Nacio-

nal em meados de março, a mídia chinesaimediatamente desviou sua atenção para aiminente Guerra do Iraque. De 20 de mar-ço a 10 de abril, as atenções foram concen-tradas em notícias sobre o Iraque. A mídiaeletrônica chinesa, rigorosamente contro-lada, abriu caminhos em 20 de março parafazer ao vivo reportagem sobre o início daguerra. Dentro dos poucos minutos em queos mísseis americanos atingiam Bagdá, oscanais da televisão estatal e o rádio come-çaram simultaneamente a cobertura doseventos em parceria com a CNN, incluin-do um discurso do Presidente Bush ao vivopara toda a rede nacional.

Os três principais canais de transmissãoda CTVC obtinham suas imagens da CNNno Iraque e as notícias eram acompanha-das e traduzidas para o chinês. Xinhua e oPeople’s Daily também entraram em açãopublicando notícias atualizadas sobre aGuerra e ainda colocaram no ar em seuswebsites um discurso do Presidente Bushcompleto e traduzido. Estações de rádio eTV em todo o país ainda interrompiam suasprogramações normais para exibir a cober-tura com plantões ao vivo.

A decisão do Governo de permitir a livrecobertura sobre a guerra estava mais rela-

UM TEXTO INÉDITOO presente texto foi publicado nas páginas62-63 do Kenya 2005 – IPI Congress Report,editado pelo Instituto Internacional deImprensa com os textos das intervençõesfeitas no Congresso Mundial & 54ªAssembléia-Geral da entidade, realizados emNairóbi de 21 a 24 de maio de 2005. Opainel em que Li Xinguang interveio foidedicado ao tema Terrorismo e LiberdadesCivis e teve também como expositores osjornalistas Simon Li, do Los Angeles Times, ePeter Preston, Diretor da Fundação Guardian,de Londres. É esta a primeira vez que seutexto integral é publicado no Brasil.

“O impacto do11 de Setembro no jornalismofoi tão intensoque certosvocábulos eterminologiasse tornaramglobais,enquantooutras foramquase extintase são usadascom o risco dea históriacontada seralienada pelamídia.”

cionada com as demandas crescentes daaltamente comercializada indústria demídia do país do que com uma decisãopolítica de liberar a imprensa nacional.Como resultado da comercialização eindustrialização da imprensa do país, asorganizações de mídia chinesas estãocada vez mais dependentes dos dólaresprovenientes da propaganda para suasobrevivência. Na batalha de vida oumorte pela sobrevivência e desenvolvi-mento, a mídia chinesa viu-se obrigadaa cobrir esses eventos ao vivo ou entãoperderia audiência.

O que foi feito pela mídia na cober-tura da Guerra do Iraque foi um esfor-

ço bem sucedido para agradar as massas eos anunciantes para conseguir expandir seusmercados. E eles realmente tiveram umaboa interação com seus leitores e especta-dores. Estudos mostram que a média de au-diência da CTVC aumentou 28 vezes des-de que começou a cobertura simultânea daGuerra. Durante a Guerra do Iraque, os lu-cros provenientes de comerciais na TV na-cional aumentaram US$ 12 milhões, umsalto de 30% em relação ao mesmo perío-do do ano anterior.

Muitos críticos de mídia chineses e oci-dentais elogiaram a cobertura chinesa da

guerra como um avanço e progresso para osistema de imprensa do país. Ironicamen-te, a fixação nacional nesse novo fenôme-no da mídia retardou a atenção do Gover-no e da imprensa para o vírus da Sars, umproblema muito mais relevante para o povochinês. Foi apenas após a queda de Bagdáque a história da Sars começou a dominaras manchetes dos jornais e televisões.

Epidemias na China nunca foram umevento merecedor de primeira página namídia global, como por exemplo a hepatiteB, a gripe e a tuberculose, a não ser que fos-sem achados elementos que dramatizassema situação a ponto de a comunidade mun-dial poder prestar atenção. Todos lembramda Sars, que matou 345 pessoas em 2003.Mas nesse mesmo ano 100.000 chinesesforam mortos pela gripe e 300.000 pela he-patite B. A mídia não noticiou isso. Não seadequava ao jornalismo do 11 de Setembro.

1 Sars significa Síndrome Respiratória Aguda Grave(do inglês Severe Acute Respiratory Syndrome),pneumonia atípica causada por razõesdesconhecidas que surgiu na Ásia em 2003.

2 “Infotainment” é um neologismo do idioma norte-americano que deriva da fusão de duas palavras:informação – information, e entretenimento –entertainment.

3 “Militainment” é a fusão de militarismo eentretenimento.

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Jornal da ABI

LIBERDADE DE IMPRENSA

Em 2005, a Classificação Mundialde Liberdade de Imprensa da orga-nização Repórteres sem Frontei-

ras chegou à sua quarta edição. A pes-quisa é feita com a ajuda de institui-ções parceiras e seus correspondentes,além de jornalistas, pesquisadores, ju-ristas e militantes dos direitos huma-nos, que respondem a um questioná-rio de 50 perguntas sobre o panoramada liberdade de imprensa em seu país.

Na última edição, assim como em2004, foram apurados dados de 167nações — o motivo de algumas não fi-gurarem na lista é a ausência de infor-mações. Nas primeiras e me-lhores posições, liderados pelaDinamarca, estão os paísesescandinavos, que garantem,informa a RSF, real e estávelliberdade de imprensa. Nocontinente americano, o desta-que é para Trinidad e Tobago,país que aparece em 12º lugarno ranking, ao lado de Hungria,Nova Zelândia e Suécia.

O Brasil aparece em 63º,tendo subido três posições emrelação à pesquisa anterior. DaAmérica do Sul, a Bolívia é amais bem colocada, ocupandoa 45ª posição, 31 à frente doranking de 2004. Em contra-partida, o Uruguai — 42º noano passado — caiu quatroposições e a Colômbia, que fi-cou em 128º e nas edições an-teriores ocupara o último lugar entreos países latino-americanos, deu a vezao México (135º).

Turcomenistão, Eritréia e Coréia doNorte — os três últimos no ranking, res-pectivamente — são países onde não háimprensa privada e a liberdade de ex-pressão não existe, porque os meios decomunicação oficiais reproduzem ape-nas propaganda de seus governos e qual-quer desvio dessa condição pode renderuma severa punição ao jornalista.

Ainda de acordo com a RSF, na Ásiaoriental e central e no Oriente Médioestão os países onde é mais difícil exer-cer-se a liberdade de imprensa, sejapela repressão das autoridades ou pelaviolência exercida pelos grupos arma-dos, que impedem os meios de comu-nicação de se expressar livremente. OIraque apresenta o quadro mais críti-co, onde mais de 20 jornalistas forammortos desde o começo de 2005. Des-

de o início do último conflito, emmarço de 2003, 72 profissionais e co-laboradores de meios de comunicaçãoforam mortos no país.

Nossa AméricaHá quatro anos, a República de

Trinidad e Tobago preserva-se como oprimeiro país do continente america-no a aparecer na lista. El Salvador, cujademocracia ainda é frágil depois demuitos anos de uma guerra civil, é osegundo, em 28º, seguido pela CostaRica, em 41º.

A Argentina (59º) subiu 20 posiçõesem relação a 2004, principal-mente devido à diminuiçãodas agressões a jornalistas, àgarantia dos meios de comu-nicação em preservar o anoni-mato de suas fontes e à restau-ração da legislação de impren-sa. Na classificação de 2005, aRSF diz que, embora a Lei deImprensa brasileira date do pe-ríodo da ditadura militar —que estabelece penas de cárce-re —, ela não é aplicada. Noentanto, os jornalistas conti-nuam expostos a violentas re-presálias, como a que levou àmorte José Cândido AmorimPinto, diretor de uma rádio co-munitária pernambucana, em1º de julho de 2005.

O relatório aponta aindaque no Peru (116º), embora

não tenha havido nenhum assassina-to de profissionais da imprensa, osatos de violência contra jorna-listas aumentam em propor-ções gigantescas. Já o Haiti(117º), mesmo com a quedade Jean-Bertrand Aristide,continua sendo arriscado parajornalistas — houve um assas-sinato, exílios forçados e ten-tativas de seqüestro de profis-sionais em 2005.

O México desbancou a Co-lômbia em função do que osmeios de comunicação daque-le país chamam de “abril ne-gro”, quando, no espaço deapenas uma semana, dois jor-nalistas foram assassinados eoutro desapareceu. Além dis-so, diz o relatório, a liberdadede imprensa piora nos Estadosque fazem fronteira com os

Estados Unidos. Na Colômbia, um jor-nalista foi assassinado numa região do-minada pelo narcotráfico e pela corrup-ção e as rádios e TVs são alvos constan-tes de atos de sabotagem. A RSF dizainda que sete jornalistas tiveram queabandonar suas cidades, ou mesmo opaís, desde o começo de 2005.

Recuo dos EUAAlguns países ocidentais registra-

ram retrocesso na classificação de2005. Os Estados Unidos (44º), porexemplo, caíram 20 posições. O moti-vo principal apontado foi a prisão darepórter Judith Miller, do New YorkTimes, além de outras medidas judici-ais que puseram em risco o anonima-to das fontes. O Canadá também per-deu posições pela mesma razão, aotomar decisões, segundo a RSF, que

pretendiam trans-formar jornalistasem auxiliares daJustiça. Na França,a queda de sua po-sição foi justifica-da pela prisão dejornalistas e a cri-ação de novos de-litos de imprensa.

Ainda que ospaíses mais bemclassificados sejam

europeus, as diferenças entre os inte-grantes da União Européia têm au-mentado. A Polônia perdeu mais de 20posições por penalizar um jornalistacom uma multa grave devido a decla-rações consideradas ofensivas ao en-tão Papa João Paulo II, enquanto ou-tro quase foi preso por se recusar a re-velar a identidade de sua fonte.

A Espanha (40º) perdeu uma posi-ção, pois, diz o relatório, os jornalis-tas do país são ameaçados pelo Eta —sigla que, em português, significa Pá-tria Basca e Liberdade — por não com-partilharem do ponto de vista políti-co do grupo separatista.

Pobreza & liberdadeA Classificação 2005 da RSF diz ain-

da que alguns países que conquista-ram sua independência ou a retoma-ram em menos de 15 anos mostram-se respeitosos à liberdade de impren-sa, como Eslovênia (9º), Estônia (11º),Letônia (16º), Lituânia (21º), Namíbia(25º), Bósnia-Herzegovina (33º),

Macedônia (43º), Croácia(56º) e Timor Leste (58º).

A RSF afirma que sua clas-sificação rebate a teoria de al-guns líderes de países pobres,que apontam o desenvolvi-mento econômico como con-dição prévia indispensávelpara a democratização e orespeito aos direitos huma-nos. Mesmo que os países ri-cos ocupem o topo da lista,nações como Benin (25º),Máli (37º), Bolívia (45º),Moçambique (49º), Mongó-lia (53º), Nigéria (57º) eTimor Leste (58º) — cujosPIBs, em 2003, não ultrapas-savam os US$ 1 mil por ha-bitante — estão entre as 60primeiras colocadas.

O Congresso do Instituto Inter-nacional de Imprensa-IPI (texto pu-blicado nas páginas 17 e 18 desta edi-ção do Jornal da ABI) aprovou umadeclaração em defesa do sigilo dasfontes.

Seu texto é divulgado a seguir.“No encontro de sua Assembléia-

Geral Anual em 23 de maio de 2005em Nairóbi, no Quênia, os membrosdo IPI unanimemente pediram aosgovernos que respeitem a necessida-de dos jornalistas de proteger suasfontes confidenciais de informação.

Recentemente, nos Estados Uni-dos, houve indícios de que o gover-no federal e alguns governos locaisestavam tentando abafar certas ini-ciativas de jornalistas por meio deataques contra a utilização de fon-tes responsáveis, porém confiden-ciais. No que se revelou como umdesvio da justiça, alguns repórteresnos Estados Unidos e em outroslugares foram presos; outros en-frentam sentenças de prisão.

Como jornalistas, não buscamosprivilégios nem tentamos suprimiro direito das autoridades de reali-zar investigações criminais ou in-terferir na administração da justi-ça. Os jornalistas procuram sempreatribuir a informação às suas fon-tes; no entanto, de acordo com osinteresses da sociedade como umtodo, nós devemos também ser ca-pazes de garantir a proteção paraas fontes de informações que foramfornecidas confidencialmente.

Nesse sentido, reconhecemoscomo importante a idéia de que osjornalistas devem se proteger damanipulação daqueles que acabari-am com a discrição em questão parafins individuais e pedimos que man-tenham suas fontes.

O jornalismo possui funções pa-ralelas às da Justiça, como, entre ou-tras, informar os cidadãos – inclu-indo também os representantes degoverno – sobre as condições e in-teresses das sociedades, para des-mascarar abusos ou traições da con-fiança pública e para promover opi-nião, comentário e análise, bemcomo plataformas para o debate.

O jornalismo independente pro-move a justiça trazendo à tona in-formações importantes para o co-nhecimento dos cidadãos que de al-guma forma poderiam estar ocul-tas. Se a mídia de notícias funcio-na como um cão de guarda da soci-edade, os jornalistas devem ser ca-pazes de reunir informações semtemer punições para si mesmos oupara suas fontes.”

Uma declaraçãoem defesa dosigilo das fontes

ONDE MORAA LIBERDADEOs países da Escandinávia, à frente a Dinamarca,Os países da Escandinávia, à frente a Dinamarca,Os países da Escandinávia, à frente a Dinamarca,Os países da Escandinávia, à frente a Dinamarca,Os países da Escandinávia, à frente a Dinamarca,

lideram a lista da liberdade de imprensa no mundo,lideram a lista da liberdade de imprensa no mundo,lideram a lista da liberdade de imprensa no mundo,lideram a lista da liberdade de imprensa no mundo,lideram a lista da liberdade de imprensa no mundo,

revela a organização Repórteres sem Frevela a organização Repórteres sem Frevela a organização Repórteres sem Frevela a organização Repórteres sem Frevela a organização Repórteres sem Fronteiras. Dentreronteiras. Dentreronteiras. Dentreronteiras. Dentreronteiras. Dentre

167 nações, o Brasil ocupa o 63° lugar167 nações, o Brasil ocupa o 63° lugar167 nações, o Brasil ocupa o 63° lugar167 nações, o Brasil ocupa o 63° lugar167 nações, o Brasil ocupa o 63° lugar, atrás da Bolívia., atrás da Bolívia., atrás da Bolívia., atrás da Bolívia., atrás da Bolívia.

1 Dinamarca2 Finlândia3 Irlanda4 Islândia5 Noruega6 Países-Baixos7 Suíça8 Eslováquia9 República Checa10 Eslovênia11 Estônia12 Hungria13 Nova Zelânda14 Suécia15 Trinidad e Tobago16 Áustria17 Letônia18 Alemanha19 Bélgica20 Grécia

OS 20 MELHORESPAÍSES

148 Maldivas149 Somália150 Paquistão151 Bangladesh152 Bielo-Rússia153 Zimbábue154 Arábia Saudita155 Laos156 Uzbequistão157 Iraque158 Vietnã159 China160 Nepal161 Cuba162 Líbia163 Birmânia164 Irã165 Turcomenistão166 Eritréia167 Coréia do Norte

OS 20 PIORESPAÍSES

58 Timor-Leste59 Argentina60 Botsuana61 Ilhas Fiji62 Albânia63 Brasil64 Tonga65 Sérvia e Montenegro66 Gana67 Panamá68 Nicarágua

OS 10 PAÍSESVIZINHOS DO BRASIL

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Jornal da ABI

20 Janeiro de 2006

LIBERDADE DE IMPRENSA

Criminosos até agora não identi-ficados lançaram uma bomba deefeito moral na porta do periódicoMogi News na madrugada do dia 13de janeiro, mas não atingiram seupropósito de intimidar o jornal, queno dia seguinte publicou editorialsob o título Sem medo, advertindoque não recuará na denúncia dos quetransgridem as leis. A seguir, o tex-to da corajosa tomada de posição doMogi News.

“A Imprensa honesta carrega con-sigo, além da missão de informar, atarefa indelegável de formar opiniões,de interagir com a sociedade, com-prando suas brigas mais legítimas eprestando serviços decentes a ela.

A Imprensa honesta desvenda,desmascara, escancara, desossa, es-miúça e revela bastidores e intenções,inclusive as mais vis e interesseiras.

A Imprensa honesta resiste à ten-tação do dinheiro fácil oriunda dabarganha por sobre a notícia e evitaque a opinião pública se transformeem refém dos maus empresários, dospéssimos políticos, dos enganadorese dos canalhas.

Houve um tempo neste País emque a liberdade de Imprensa chegoua ser esmagada pelos coturnos da di-tadura. Era a época do Regime Mili-tar, e gente de bem, composta in-

A Justiça de São Paulo condenouBruno Gaudêncio Coércio, AmarildoBarbosa e Amauri Delábio Campoy a12 anos de prisão pelo atentado quepraticaram, no dia 8 de setembro doano passado, contra o prédio do jor-nal Diário de Marília, onde funcionamtambém as rádios Diário FM e DirceuAM. Os três foram condenados aindapelo roubo ao porteiro Sérgio Araújo.

Em matéria publicada no dia 25 dejaneiro, o Diário de Marília informouque o Juiz José Roberto Nogueira Nas-cimento condenou os três criminosospor “planejar e executar com excessode violência” o atentado contra o gru-po de comunicação. Além de apontara gravidade do atentado contra a li-berdade de imprensa na cidade, a sen-tença, informou o jornal, “desmontatodas as mentiras da defesa e confir-

INCENDIÁRIOS CONDENADOSJustiça de São Paulo trabalha rápido e condena Bruno Gaudêncio

Coércio, Amarildo Barbosa e Amauri Delábio Campoy a 12 anos deprisão por incêndio contra rádios e jornal.

Bomba não abala o Mogi News

O inquérito policial que apura ocaso do grampo na Rede Gazeta deComunicações, no Espírito Santo,concluiu que houve erro, cometidopor um funcionário da operadorade telefonia celular Vivo. Aautorização de escuta, dadainicialmente pela 4ª Vara Criminalde Vila Velha, fora prorrogada peloDesembargador Pedro Valls FeuRosa, do Tribunal de Justiça doEspírito Santo, durante ainvestigação do assassinato do Juizfederal Alexandre Martins, emmarço de 2003.

O delegado encarregado pelasinvestigações, Joel Lyrio, informouque o empregado da Vivo trocou onúmero de telefone da Telhauto(alvo da investigação) pelo daempresa jornalística. O telefone daRede Gazeta é 9944-6352 e o dafirma que seria investigada, 9944-6362 — portanto, o erro teria sidode um dígito. Disse o delegado queo funcionário da Vivo não soubejustificar tecnicamente o errocometido. Por isso, a partir deentão caberia ao MinistérioPúblico avaliar se sua conduta foidolosa (com intenção) ou culposa(sem intenção).

O site Comunique-se e a Folha deS. Paulo informaram que oDelegado Joel Lyrio afirmou queas investigações vão continuar esolicitou que seja apurado ovazamento de informações sobreo assassinato do Juiz AlexandreMartins, que corre em segredo deJustiça.

Em nota, a operadora telefônicadisse que iria aguardar a conclusãodo caso na Justiça: “Em respeito eobservação às obrigações legais deconfidencialidade e sigilo quecaracterizam sua atividade, a Vivoinforma que não comentará sobreos procedimentos investigatóriosaté que estes estejamdefinitivamente concluídos.”

No ano passado, a Comissão deDefesa da Liberdade de Imprensae Direitos Humanos da ABIaprovou moção de solidariedade àRede Gazeta.

A VIVOERROU NAGAZETAInquérito concluiuque funcionário daoperadora trocou onúmero de firma queseria investigada peloda empresa jornalística

ma que a diretoria das empresas nãoteve qualquer envolvimento no caso”.

O Juiz José Roberto Nogueira Nas-cimento determinou também a trans-ferência dos condenados do Centro deRessocialização de Lins, onde aguar-davam a sentença, para um presídio.A decisão acompanhou a acusação fei-ta pelo Ministério Público e pelos ad-vogados Telêmaco Luiz FernandosJúnior e José Cláudio Bravos na avali-ação sobre o motivo do crime:

— O propósito dos acusados era,inegavelmente, atear fogo no prédioda empresa CMN com o intuito deinutilizar as duas rádios que ali fun-cionavam e também o jornal, impres-so naquele mesmo local — disse ojuiz.

Os réus também foram condenadosao pagamento de 53 dias-multa no va-

lor de um trigésimo do valor de umsalário-mínimo vigente na época dosfatos, o que corresponde a R$ 530,00.A condenação pelo incêndio crimino-so foi de seis anos e oito meses, mas ojuiz avaliou que outras situações jus-tificavam uma pena maior, em espe-cial delas o atentado à liberdade de im-prensa:

— Justifica-se o acréscimo dada amotivação do crime, qual seja destruiro jornal Diário de Marília e as depen-dências de duas rádios da comarca, si-tuação essa que poderia gerar prejuízonão só material a seus proprietários,como alijar de três órgãos de imprensaa população de toda a comarca, que seutiliza das empresas jornalísticas paraobter informações no seu dia-a-dia eveicular anúncios e matérias de inte-resse regional.

clusive por jornalistas, era espiona-da, presa sem ordem judicial, tortu-rada e até morta.

Houve um tempo neste País emque, para frustrar a marcha da liber-dade, quem detinha o poder man-dava forjar atentados, para imputaraos subversivos a culpa e para ter oargumento de que a democracia pre-cisaria ser revogada, até que, em umdia distante, ela pudesse retornar.

Há o tempo atual em Mogi dasCruzes e no Alto Tietê, que é mar-cado firmemente por algumas em-presas de comunicação que fazem ojornalismo ético, vibrante, inovadore revolucionário. Uma dessas empre-sas é o Mogi News.

Diferentemente do que se faziaem outros tempos por aqui, agora,por exemplo, funcionários prejudi-cados por uma empresa que nãocumpre com suas obrigações têm apossibilidade de denunciar a estejornal as injustiças sofridas. O MogiNews ouve — ou pelo menos tentainsistentemente ouvir — todos oslados da notícia.

Diversamente dos tempos do si-lêncio e da omissão, o que se temem Mogi e no Alto Tietê, por meiodos setores honestos da Imprensa,são denúncias francas e abertas, queatacam desde a indústria da multa

até a falta de segurança, desde oburaco da rua até a falta de ônibus,desde a ausência de médicos numaunidade básica de saúde até a quei-xa de um consumidor que se diz le-sado por uma loja.

E é por isso que há quem se sintaameaçado e que, muito provavel-mente acuado, queira calar a bocada Imprensa ou, mais propriamen-te, apagar as matérias, as colunas eos editoriais escritos pelo Mogi News.

Tal intenção abjeta se perde porcompleto na baixeza e no crime deuma tentativa truculenta de intimi-dação, uma bomba de efeito moral— que deveria ser para uso exclusivodo Exército — jogada na porta doMogi News na madrugada de ontem.

Tal ato, uma mistura de banditis-mo e terrorismo, não impedirá queeste jornal prossiga desmascarandoquem transgride as leis, quem, sen-tado no trono falso da impostura,sinta-se ameaçado.

O Mogi News acredita nas políci-as Civil e Militar, no Ministério Pú-blico, no Judiciário e, acima de tudo,na justiça de Deus. Por isso, crê comtranqüilidade que os fatos e as res-ponsabilidades que cercam o aten-tado de ontem de madrugada serãodesvendados e os culpados, punidos,custe o custar, doa a quem doer.”

Bomba de efeito moral (assim impropriamente chamada) é lançadana porta do jornal, de madrugada, tentando intimidá-lo.

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21Janeiro de 2006

Jornal da ABI

LIBERDADE DE IMPRENSA

A ABI encaminhou ofício ao Presidente do Banco do Brasil,Rossano Maranhão Pinto, pedindo que a instituição desista dorecurso que impetrou contra a sentença de primeira instânciaque o condenou a pagar uma indenização ao requerenteEdison Curie Nequete, associado da ABI, devido a lesões

sofridas quando transpunha a porta giratória da Agência. Primeiro de Março, noCentro do Rio de Janeiro.Na justificativa, a ABI destaca que Edison Neguete, atualmente com 79 anos deidade, ainda padece das conseqüências do acidente e, “alquebrado pelosofrimento, teme que o recurso do BB seja apenas uma forma de privá-lo deusufruir da compensação pecuniária a que tem direito”.

Em novo comunicado enviado àABI, o Sindicato Intermunicipal dosTrabalhadores na Indústria Energéticade Minas Gerais-Sindieletro-MGapresentau novas denúncias de aciden-tes fatais envolvendo trabalhadores daCompanhia Energética de Minas Ge-rais- Cemig e pessoal terceirizado, quesomaram dez casos em 2005.

Os dois últimos acidentes registra-dos pelo Sindicato ocorreram em de-zembro do ano passado. No dia 27,morreu o eletricista Lindomar Castilhodos Santos, 31 anos, que trabalhavana empreiteira KPL. O acidente acon-teceu em Divinópolis, quando o tra-balhador realizava substituição deponto de iluminação pública. No dia29, a vítima foi o ajudante de eletri-cista Admar Moreira Rodrigues, 33anos, da RCE, quando fazia o serviçode extensão de rede do Programa Luzpara Todos, no Município de PontoChic, no Norte de Minas.

Desde o início do ano passado oSindieletro-MG vem denunciando osacidentes ocorridos na área da Cemig.A entidade critica também o fato daocorrência dos acidentes num períodoem que a empresa teria gastado milhõesem propaganda, justamente com acampanha “2005 — Acidente Zero”.

Na mensagem encaminhada à ABI,

A ABI recebeu um comunicado deagradecimento da Organização dosTrabalhadores do diário La Juventud eda Rádio CX36, do Uruguai, pela ini-ciativa do Conselheiro Mário AugustoJakobskind de propor ao ConselhoDeliberativo da instituição uma mo-ção de solidariedade à campanha pelalibertação dos jornalistas FiorellaGonzáles, Ignácio Corrales, LílianBogado e Cláudio Piñeyro, que se en-contram presos por motivos políticos.

A ABI divulgou no dia 18 de ja-neiro declaração de repúdio à ten-tativa do Governo Federal de pu-nir com prisão de um a três anosos jornalistas que divulgarem con-teúdo de gravações objeto de escu-ta telefônica. A ABI considera in-constitucional a proposta, que noseu entender viola o artigo 220 daConstituição da República em seusparágrafos 1º e 2º. A declaraçãotem o seguinte teor:

“A Associação Brasileira de Im-prensa manifesta a sua apreensãodiante da informação de que o Go-verno Federal cogita da apresenta-ção de um projeto de lei de revisãoda legislação da chamada escuta te-lefônica, o qual incluiria disposiçãoque tipificaria como crime a divul-gação jornalística do conteúdo degravações telefônicas, mesmo

A ABI CONTRA A NOVA LEI DO GRAMPOÉ inconstitucional o projeto gestado pelo Ministro Márcio Thomaz Bastos, diz a entidade.

quando autorizadas pelo Judiciá-rio, e instituiria a pena de prisãode um a três anos para o jornalistaque promovesse tal divulgação.

A ABI recebeu tal informaçãocom perplexidade, derivada da cir-cunstância de, segundo o noticiá-rio a respeito, o projeto ter sido ide-alizado pelo Ministro MárcioThomaz Bastos, que confiou suaelaboração a uma comissão cons-tituída por cinco advogados. Éadmissível que esses profissionais,conforme a sua formação, imagi-nassem uma legislação com dispo-sições totalitárias, como essas depunição dos jornalistas. É incom-preensível, porém, que o Ministroda Justiça Márcio Thomaz Bastosencampe ou subscreva proposiçãodesse teor, pois tem Sua Excelên-cia o dever de respeitar a sua bio-

grafia, na qual se inclui a sua vigo-rosa participação, como Presiden-te do Conselho Federal da Ordemdos Advogados do Brasil, na lutapela instituição do Estado Demo-crático de Direito no País.

Quanto às disposições do proje-to que visam a apenar jornalistas, aABI considera que não podem seraceitas pelo Governo, que devereexaminar a matéria para fim deexpurgá-las da proposição a ser sub-metida ao Presidente da República,nem acolhidas pelo CongressoNacional, em face do claro teor deinconstitucionalidade de que se re-vestem, à luz do artigo 220, pará-grafo 1º, da Constituição Federal.Esse preceito constitucional estabe-lece que ‘nenhuma lei conterá dis-positivo que possa constituir em-baraço à plena liberdade de infor-

mação jornalística em qualquer ve-ículo de comunicação social’, o quecondena à morte, no nascedouro,esse argumento totalitário que sepretende consumar. Ademais, a dis-posição inquinada constituiria umaforma de censura, instituída préviae abrangentemente, em colisão como parágrafo 2º do citado artigo 220da Constituição, que é nítido aodispor que ‘é vedada toda e qual-quer censura de natureza política,ideológica e artística’.

Dado o risco que a medida cogi-tada oferece à integridade da de-mocracia no País, a ABI exorta osjornalistas, os meios de comunica-ção e as instituições da sociedadecivil à resistência a essa propostaliberticida. Rio de Janeiro, 18 dejaneiro de 2006. (a) MaurícioAzêdo, Presidente da ABI.”

DIREITOS HUMANOS

Jornalistas uruguaiosenviam mensagem àABI, por sua moçãopela libertação dequatro colegas.

ABI apelaao BB porNequete

NOVAS MORTES NA CEMIGSindicato dos Trabalhadoresna Indústria Energética deMinas Gerais-Sindieletro-MGfaz novas denúncias contra aCemig e pede apoio da ABI.

Uruguaiosagradecemsolidariedade

o Sindicato ressalta sua “indignaçãocom os Poderes Executivo, Legislativoe Judiciário”:

“Estes, na maioria dos casos, nãorespondem às nossas denúncias ousimplesmente se dizem incompeten-tes para as diligências cabíveis”.

Como fez anteriormente, a ABI vaiencaminhar as denúncias do Sindiele-tro-MG ao Conselho de Defesa dos Di-reitos da Pessoa Humana, em Brasília,reiterando a primeira denúncia rece-bida. A ABI critica o fato de as denún-cias dos trabalhadores da indústriaenergética de Minas terem sido leva-das apenas à Agência Nacional deEnergia Elétrica-Aneel, que, diz a Casa,“não tem eficácia para apurar um casode extrema relevância”.

Dados apurados pelo Sindieletro-MG mostram que desde 1999 já foramregistrados 51 casos de acidentes fa-tais em obras da Cemig; 16 ocorreramcom funcionários da empresa e 35 compessoal contratado de empreiteiras,que prestam serviços à companhiaenergética mineira.

A moção foi assinada pela Comis-são de Defesa da Liberdade de Impren-sa e Direitos Humanos da ABI e des-taca que a Associação considera “inad-missível que num regime democráti-co alguém seja preso por participar demanifestação pública”.

No comunicado enviado à ABI, osjornalistas uruguaios agradecem a so-lidariedade da instituição para o casodos colegas presos e ressaltam os ide-ais de justiça social e igualdade queunem brasileiros e uruguaios na lutapela democracia.

A moção“Exmo. Sr. Presidente da República

Oriental do UruguaiA Comissão de Defesa da Liberda-

de de Imprensa e Direitos Humanosda Associação Brasileira de Imprensa(ABI) aprovou moção de solidarieda-de aos quatro presos políticos uruguai-os — Fiorella González, IgnácioCorrales, Lílian Bogado, CláudioPiñeyro — e expressou sua adesão àcampanha do povo uruguaio por umNatal sem presos políticos.

A ABI considera inadmissível queem uma democracia alguém vá presopor participar de manifestações, nes-te caso contra a Alca, por considerareste projeto como uma estratégia dedominação de uma potência sobreuma região.

A moção, apresentada pelo inte-grante da Comissão e do ConselhoDeliberativo da ABI Mário AugustoJakobskind, foi aprovada por unanimi-dade.

(a) Mário Augusto Jakobskind, emrepresentação da Comissão de Direi-tos Humanos e Liberdade de Impren-sa da ABI.”

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Jornal da ABI

22 Janeiro de 2006

VIDAS

LUIZ PINTO, O FOTÓGRAFOGrande artísta da imagem, ele manteveaté o fim seu bom humor contagiante

Sócio da ABI havia 38 anos — asso-ciou-se à instituição quando ainda erarepórter-fotográfico da Última Hora,em 1968 —, Luiz Pinto era presençaconstante nos eventos da Casa e con-tagiava a todos com seu bom humor.

Por registrar momentos importan-tes da História do Brasil, Luiz Pinto foihomenageado — ao lado de três outrosfotógrafos —, em dezembro passado,na entrega do Prêmio Embratel. Elemorreu no dia 20 de janeiro, aos 72anos, de complicações pulmonares. Dos

três filhos, um, Guilherme Pinto, seguiusua carreira e é fotógrafo do Extra.

Vencedor do Prêmio Esso de Foto-grafia em 1966, com a foto Subindo efazendo força, que mostrava a dificul-dade do Presidente Castelo Brancopara subir num jipe do Exército, LuizPinto foi o segundo entrevistado daseção Em Foco, do ABI Online, numareportagem em que falou sobre suatrajetória profissional. A seguir, seurelato, atualizado, e as fotografias queele selecionou e legendou.

Castelo (à dir.) fugia ao ver Luiz Pinto, que se especializou em fotos diferentes dele.

Prevendo adificuldade de

Castelo Branco,Luiz Pinto ficou

de tocaia para oclique. A foto lhe

deu o PrêmioEsso de 1966.

Roberto Campos na primeira página da Tribuna, em 1966,publicada sob o título ‘Em terra de cego, quem tem olho é rei’.

Foi tirada no Largo da Carioca e saiu na primeira página da Tribuna, em 1º de abril de 1993.Quis mostrar a realidade brasileira no Dia Mundial da Mentira

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23Janeiro de 2006

Jornal da ABI

Paraense de Belém, filho de fotógra-fo, Luiz Pinto desenvolveu sua artefazendo registros de eventos sociaisem sua cidade. Aos 15 anos, estagiouno jornal A Província do Pará, escolapara cinco de seus 11 irmãos que setornaram profissionais da imprensa.

Para Luiz, o impulso que o levava apôr a máquina em ação é um simples“estalo”: o clique acontece primeiro nacabeça do repórter — A notícia é quefaz o profissional, e não o contrário.O impulso é o mesmo, tanto faz se afotografia é digital ou em chapa devidro, como quando comecei.

Um dos cliques mais importantesda carreira de Luiz foi feito na Vila Mi-litar do Rio de Janeiro, em julho de1966. Luiz ouviu um diálogo entre doisoficiais nos minutos que antecediamao desfile com a presença de CasteloBranco, o primeiro general a assumira Presidência após o golpe militar: —Um dos oficiais informava que o jipetinha um estribo muito alto. O outrosugeriu que trocasse o carro, mas jánão havia mais tempo.

Com a máquina já em posição, LuizPinto fez o registro que lhe renderia o

“O clique acontece primeiro na cabeça”Prêmio Esso de Fotojornalismo daque-le ano. A foto mostrava a dificuldadedo Presidente, de baixa estatura, parasubir no veículo em que participaria daparada militar. Foi publicada em seiscolunas na Tribuna da Imprensa, com otítulo Subindo e fazendo força: — Passeia ser vigiado pelo Exército. Fui presono Rio várias vezes, fichado e espanca-do. Qualquer pretexto servia: uma ma-nifestação de estudantes, uma agitaçãono Centro, qualquer coisa.

“Uma época de ouro”. Assim Luizdefinia o período em que trabalhou naTribuna da Imprensa e na Última Hora,jornais que ousavam afrontar a dita-dura. Quando foi para O Globo, sentiuuma grande diferença, pois o jor-nal não publicava fotos que cri-ticassem o regime. Desse tempoLuiz também destaca que a fo-tografia não era prestigiada pelojornal, realidade que mudou com achegada de Erno Schneider à chefia doDepartamento Fotográfico.

— Erno instituiu o uso da tele-objetiva, da seqüência fotográfica,o uso mínimo do flash. O Globo pas-sou a publicar páginas gráficas.

Como repórter-fotográfico, LuizPinto viajou por todo o Brasil e boaparte do mundo, inclusive a Antárti-ca. Ele próprio foi notícia ao ser presona Argentina durante os distúrbiosque se seguiram à queda de Perón; naVenezuela e na Bolívia, em golpes mi-litares; na França e na Itália, confun-dido com terrorista argelino; e até emBelém do Pará, quando cobria a quedado Governador Aurélio do Carmo, de-posto pelos militares em 1964. Perso-nagem de livros, participou da cober-tura de quatro Copas do Mundo e re-cebeu dezenas de prêmios.

Luiz Pinto orgulhava-se também deter sido o autor da fotografia que cor-reu o mundo como o melhor flagrantedo movimento pelas Diretas Já: a mul-tidão, em Brasília, se abrigando da chu-va sob a bandeira brasileira, em marçode 1985. Aposentado, acompanhavacom orgulho o trabalho do filho Gui-lherme, fotógrafo do jornal Extra. Eleseria personagem de um livro a ser lan-çado em maio: Brasil — 20 anos de ter-ritório antártico, de Marcomede Rangel,que o acompanhou em diversas viagensà Antártica.

Roberto Marinho e Dona Lily, acompanhados de seguranças, em visita ao navio-escola português Sagres. Na foto à direita ele começa a escorregar e os seguranças tentam evitar a queda.

O idílio Bené-Garotinho, na

campanhaestadual de1998. E umJosé Serra

fantasmagórico.

Dias antes do seu passamento, Luiz Pintoesteve na ABI, com seu jeito alegre, seu

otimismo, sua irreverência.

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Jornal da ABI

24 Janeiro de 2006

VEÍCULOS ����� por José Reinaldo Marques

Lançados no ano passado comoduas grandes novidades do mercadoeditorial do Rio de Janeiro, o vesper-tino Q! e o matutino Meia Hora vive-ram realidades diferentes. O primei-ro, por falta de uma boa estratégiacomercial que lhe garantisse anunci-antes, teve uma circulação meteóricae interrompeu sua edição no dia 4 dejaneiro. A notícia da paralisação do Q!foi dada à equipe por e-mail, no qual Ariane Car-valho, mentora e direto-ra do tablóide, informa-va que o jornal deixariade circular temporaria-mente e que a partir dodia 6 uma sexta-feira,somente sua versão on-line seria atualizada.

O Q! foi lançado em7 de novembro do anopassado e tinha uma re-dação com 70 profis-sionais, comandada pe-la jornalista Paula Fer-nandes. Ariane Carva-lho não foi encontra-da para falar sobre ofechamento do tablói-de, mas à época dolançamento, em en-trevista ao ABI Online,disse que não temia ofato de diversas pesquisas apontarempara a queda de circulação que atin-gia todos os jornais. Ela confiava naspesquisas que havia feito e que de-monstravam o interesse do públicopor um vespertino. Também não esta-va preocupada com os riscos de ter lan-çado um produto editorial sem qual-quer tipo de promoção, porque queriatestá-lo.

Resultado: os sócios do empreen-dimento — Mídia 1 e a Foco Investi-mentos — não conseguiram atrair in-vestidores e anunciantes para o proje-to. Em entrevista ao site Comunique-se, o Diretor Financeiro do Q! disseque, durante o mês de janeiro, seriafeita “uma reavaliação do projeto doproduto” e que um dos motivos da pa-ralisação do vespertino é “preservar amarca e o ideal do veículo”.

das Organizações Globo,no mercado dos jornais po-pulares — até a chegada doconcorrente, O Dia liderouo segmento no Rio duran-te muito tempo.

Lançado em 19 de se-tembro do ano passado,o Meia Hora, além de serum produto que visa aaumentar o faturamentodo Grupo O Dia, segun-do Gigi Carvalho, “foicriado para democratizar

a informação”, tanto em matéria depreço quanto de informação descom-plicada.

— É por isso que mantemos um no-ticiário popular, mas sem a apelação dosexo e da violência. Antes de lançar oproduto, identificamos que havia umpúblico que deixou de ler jornais por-que são caros e estão fora do alcancedo seu poder aquisitivo. Além disso,esse leitor reclama da grande varieda-de de cadernos, principalmente nos finsde semana, na maioria dos periódicos.Isso, para essas pessoas, é um dos fato-res de impedimento de leitura — diz oeditor-chefe Humberto Tziolas.

Tiziolas diz que os principais assun-tos do Meia Hora são empregos, cida-de, esportes e informática. A redaçãoconta com 30 profissionais — trata-dores de imagens, repórteres, redato-res, diagramadores e editores — e fun-ciona em parceria com a equipe doDia, aproveitando principalmente asmatérias das editorias de Cidade e Es-portes, que ganham então outro for-mato. De segunda a sexta-feira, o ta-blóide circula com 32 páginas, a R$0,50; aos sábados, com 40 páginas,também a R$ 0,50; e no domingo, com48, em função dos cadernos de TV,Saúde e Esportes, a R$ 1,00:

— Procuramos fazer um jornal sobmedida para o nosso público, que seinteressa somente pelo essencial. Porisso usamos textos curtos, com mui-tas fotos — explica Tziolas.

O preço pesaPara evitar a “canibalização” do Dia,

foi feito um trabalho junto aos jorna-

SONHO E REALIDADENA IMPRENSA DO RIO

Lançados recentemente no Rio, os tablóides Q! e Meia Hora passarampor realidades bem diferentes. O primeiro saiu de circulação,

enquanto o segundo aposta no crescimento e segue em frente.

Popular, sem apelaçãoEnquanto Ariane interrompia um

projeto que acreditava que se trans-formaria num bom negócio, sua irmã,e hoje desafeto e concorrente, GigiCarvalho comemora meses de suces-so do Meia Hora, também em forma-to tablóide.

Segundo a Direção do Grupo O Diade Comunicação, a idéia de lançar ojornal nasceu de uma necessidade deexpansão de negócios a partir de umproduto editorial que eles consideramconsolidado: O Dia. Mas, de acordocom algumas fontes que preferem nãoser identificadas, o Meia Hora foi cria-do para enfrentar o sucesso do Extra,

leiros em todo o Grande Rio, para es-tabelecer qual seria a demanda doMeia Hora. O Superintendente de Cir-culação do Grupo O Dia, Javier Fer-nandez, conta que o resultado foi maisdo que satisfatório:

— Os jornaleiros têm sido nossosparceiros, fizemos um trabalho con-junto e conseguimos minimizar o im-pacto que o lançamento do Meia Horateria sobre O Dia. Devemos muito aosdonos das bancas, pois, graças ao es-forço empreendido, nós, que começa-mos com uma tiragem de 40 mil exem-plares por dia, hoje alcançamos 120mil. E não pára por aí: tivemos umaumento de 45 mil novos leitores e es-tamos vendendo 100 mil exemplaresdiariamente.

Para Simone Boto, Coordenadorade Marketing, o novo jornal se encon-tra numa base segura de leitores eanunciantes. Segundo ela, a partir dosdados apurados numa pesquisa quali-tativa, criou-se um produto editorialque atendesse às necessidades do lei-tor de baixa renda e que tivesse umacomunicação de fácil entendimento:

— O Meia Hora não é um jornal depromoção. É um veículo que veio paraatender um público novo, tanto jovemquanto adulto, de baixo poder aquisi-tivo, que havia deixado de ler jornaispor causa do custo e da linguagem. Porisso optamos por um jornal de leiturarápida e de fácil assimilação, que tam-bém fosse alegre e falasse ao coraçãodo leitor.

Um levantamento realizado peloGrupo O Dia verificou uma grandequeda na circulação dos jornais, queatinge até os mais tradicionais. Pelosnúmeros apurados, desde 2001 deixa-ram de ser vendidos 70 milhões deexemplares anualmente. A questão dopreço também aparece na pesquisacomo fator de exclusão de um enor-me número de leitores:

— É por isso que nossa proposta aolançar o Meia Hora foi de criar um ve-ículo cuja leitura não fosse cara. E nes-ses três meses de circulação temos con-seguido fidelidade com nosso público.Estamos atraindo as pessoas pelo preçoe pelo entretenimento — diz Simone.

As criações das irmãs Gigi e Ariane Carvalho:Meia Hora, que vai de vento em popa,

e Q!, que parou com esperança de voltar