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 ABENO  Associação Brasileira de Ensino Odontológico

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  • ABENOAssociao Brasileira de Ensino Odontolgico

  • Copyright Associao Brasileira de Ensino Odontolgico, 2005Todos os direitos reservados.Proibida a reproduo no todo ou em parte, por qualquer meio, sem autorizao da ABENO.Catalogao-na-publicaoServio de Documentao OdontolgicaFaculdade de Odontologia da Universidade de So PauloRevista da ABENO/Associao Brasileira de Ensino Odontolgico vol. 1, n. 1, (2001). So Paulo : ABENO, 2001-SemestralISSN# 1679-5954A partir de 2005, vol. 5, n. 1 a publicao passa a ser semestral.1. Odontologia Peridicos I. Associao Brasileira de Ensino Superior (So Paulo)II. ABENOCDD 617.6BLACK D05

    Presidente Antonio Cesar Perri de CarvalhoUniversidade Catlica de Braslia - Curso de OdontologiaNova Sede QS 07 Lote 01 - CEP 72030-170guas Claras - Braslia - DFTel.: (61) 356-9611E-mail: [email protected] CientficoJos Luiz Lage-MarquesProduo editorialRicardo Borges Costa

    IMC - Image Maker ComunicaesRua Alice Macuco Alves, 148, cj. 2 - CEP 05453-010So Paulo - SPTel.: (11) 3021-0163Fax: (11) 3023-3165

    Apoio para esta edio:Centro de Pesquisas Odontolgicas So Leopoldo Mandic

    Associao Brasileira deEnsino OdontolgicoABENO

  • Revista da ABENO 5(1):3 3

    A Revista da ABENO umapublicao oficial daAssociao Brasileira de Ensino OdontolgicoPresidente de Honra: Edrzio Barbosa Pinto (PE)Presidente:Antonio Cesar Perri de Carvalho (DF)Vice-presidente:Eduardo Gomes Seabra (RN)Editor Cientfico:Jos Luiz Lage-Marques (FO-USP)([email protected])Editores Adjuntos:Clo Nunes de Souza (UFSC)Lusa Isabel Taveira Rocha (UFG)Nelson Rubens Mendes Loretto (UPE)Vera Lcia Silva Resende (UFMG)Conselho Editorial:lvaro Della Bona (UPFundo)Antonio Carlos Bombana (FO-USP)Carlos de Paula Eduardo (FO-USP)Carlos Eduardo Francischone (FOB-USP)Carlos Estrela (FO-UFG)Clia Marisa Rizzatti Barbosa (UNICAMP)Cinthia Pereira M. Tabchoury (UNICAMP)Cludio Luiz Sendyk (FO-USP)Denise Tostes Oliveira (FOB-USP)Eduardo Batista Franco (FOB-USP)Esther Goldenberg Birman (FO-USP)Eduardo Dias de Andrade (FOP-UNICAMP)Eduardo Saba Chujfi (UNICASTELO)Elaine Bauer Veeck (PUC-RS)lito Arajo (UFSC)Euloir Passanezi (FOB-USP)Fernando Ricardo Xavier da Silveira (FO-USP)Francisco Jos de Souza Filho (FOP-UNICAMP)Izabel Cristina Froner (FORP-USP)Jaime Aparecido Cury (FOP-UNICAMP)Jesus Djalma Pcora (FORP-USP)Joo Humberto Antoniazzi (FO-USP)Jorge Abro (FO-USP)Jos Eduardo de Oliveira Lima (FOB-USP)Jos Ranali (FOP-UNICAMP)Liliane Soares Yurgel (PUC-RS)Luiz Carlos Pardini (FORP-USP)Luiz Clovis Cardoso Vieira (UFSC)Manuel Damio de Sousa Neto (UNAERP)Mrcia Martins Marques (FO-USP)Marcio Fernando de Moraes Grisi (FORP-USP)Marco Antonio Bottino (FOSJC-UNESP)Marco Antonio Campagnoni (FOAR)Maria Aparecida de A. M. Machado (FOB-USP)Maria Celeste Morita (UEL)Maria da Graa Kfouri Lopes (UNICENP)Maria Jos de Carvalho Rocha (UFSC)Maria Regina Sposto (FOA-UNESP)Neusa de Lima Moro (UFPar)Nilza Pereira da Costa (PUC-RS)Roberto Brando Garcia (FOB-USP)Roberto Miranda Esberard (FOAR-UNESP)Rodney Garcia Rocha (FO-USP)Rosemary Sadami Arai ShinkaiSimone Tetu Moyss (UFPar)Sylvio Monteiro Jnior (UFSC)Vania Ditzel Westphallen (PUC-PR)IndexaoA Revista da ABENO - Associao Brasileira de Ensino Odontolgico est indexada na seguinte base de dados: BBO - Bibliografia Brasileira de Odontologia.

    EditorialAo DocenteO processo de ensino-aprendizagem fundamenta-se no trabalho conjunto entre professor e alunos, no qual o professor traa os objetivos que quer alcanar, conduzindo os alunos, estimulando-os a participarem de tarefas e ativi-dades que lhes permitam construir significados cada vez mais prximos aos de habilidades e contedos do currcu-lo.

    O professor tem o papel de guia, mediador e deve saber compartilhar experincia com os alunos; os alunos vo pro-gressivamente sedimentando os sentidos e representaes que constroem de forma ininterrupta no decorrer das ati-vidades planejadas para o curso.

    Todavia, praticamente geral que os professores de cur-sos de Odontologia no tiveram a oportunidade de uma formao pedaggica e apresentam, como decorrncia na-tural, dificuldades no exerccio da ao docente, que requer uma abordagem mltipla e complexa no desenvolvimento do processo ensino-aprendizagem. No basta ser bom pro-fissional, necessrio tambm ser bom professor. Entende-mos que a adequada atividade docente pressupe a capaci-tao didtica e o interesse continuado no aperfeioamento do trabalho.

    O docente consciente de suas responsabilidades pedag-gicas tambm entende melhor a importncia de sua atuao vinculada a um projeto pedaggico do curso.

    Com esse propsito, a Revista da ABENO rene artigos sobre ensino de Odontologia. um espao para a difuso de reflexes, experincias e propostas que gerem intercm-bio, estmulo e apoio ao professor de Odontologia.

    Antonio Cesar Perri de CarvalhoPresidente da ABENO

  • Associao Brasileira de Ensino OdontolgicoDIRETORIA (2002 a 2006)Presidente de Honra Edrzio Barbosa Pinto (PE)

    PresidenteAntonio Cesar Perri de Carvalho (DF)

    Vice-PresidenteEduardo Gomes Seabra (RN)

    Secretria GeralLuciane de Moura Brito (DF)

    1 SecretriaAna Cristina Barreto Bezerra (DF)

    Tesoureiro GeralSrgio de Freitas Pedrosa (DF)

    1 TesoureiraLlian Marly de Paula (DF)

    Conselho FiscalJos Galba de Meneses Gomes (CE)Geza Nemeth (DF)Jos Aparecido Jam de Melo (SP)Nelson Jos Fernandes Graa (RJ)Reinaldo Brito e Dias (SP)

    Assessores do PresidenteAlfredo Jlio Fernandes Neto (UFU-MG)Bruno Frederico Muniz (Fundao Odontolgica Presidente Castello Branco-PE)Carlos Alberto Conrado (UEM-PR)Jos Dilson Vasconcelos de Menezes (UECE-CE)Orlando Airton de Toledo (UnB-DF)Roberto Schimer Wilhelm (UNESA-RJ)

    Comisso de EnsinoLo Kriger (UTP e PUC-PR)

    Cresus Vincius Depes de Gouveia (UFF-RJ)Elaine Bauer Veeck (PUC-RS)Ellen Marise de Oliveira Oleto (UFMG-MG)Maria Celeste Morita (UNOPAR-PR)Miguel Carlos Madeira (UMESP-SP)Omar Zina (UNIVAG-MT)

    Comisso de EspecializaoSigmar de Mello Rode (UNIB-SP)Clio Percinoto (FOA-UNESP-SP)Hilda Maria Montes R. de Souza (UERJ-RJ)Jos Thadeu Pinheiro (UFPE-PE)Ktia Regina Hostilho Cervantes Dias (UFRJ-RJ)Lus Fernando Pegoraro (FOB-USP-SP)

    Comisso de Ps-GraduaoIsabela Almeida Pordeus (UFMG-MG)Adair Luiz Stefanello Busato (ULBRA-RS)Jos Carlos Pereira (FOB-USP-SP)Lino Joo da Costa (UFPB-PB)Nicolau Tortamano (UNIP-SP)Nilza Pereira da Costa (PUC-RS)

    Comisso de Ensino de Nvel Mdio e de Formao de Pessoal AuxiliarVanderlei Luiz Gomes (UFU-MG)ngelo Giuseppe Roncalli da Costa Oliveira (UFRN-RN)Luiza Nakama (UEL-PR)Maria Beatriz Barreto de Souza Cabral (UFBA-BA)Maria das Neves Correia (UPE-PE)Svio Marcelo Leite Moreira da Silva (UFPR-PR)Vilma Azevedo da Silva Pereira (UFRJ-RJ)

    Comisso de ComunicaoJos Luiz Lage-Marques (USP-SP) - Editor da Revista da ABENOVera Lcia Silva Resende (UFMG-MG) - Responsvel pela home page da ABENOClo Nunes de Souza (UFSC-SC)Daniel Rey de Carvalho (UCB-DF)Lusa Isabel Taveira Rocha (UFG-GO)Nelson Rubens Mendes Loretto (UPE-PE)

  • Associao Brasileira deEnsino Odontolgico

    SUMRIOv. 5, n. 1, janeiro/junho - 2005EDITORIAL . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3ARTIGOSO estudante de Odontologia e a educao

    Aline Guerra Aquilante, Nilce Emy Tomita . . . . . . . . . . . . . . . 6Clnicas Integradas antecipadas: limites e possibilidades

    Patrcia Suguri Cristino . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 12Kit radiogrfico para ensino de tcnicas radiogrficas

    Clovis Monteiro Bramante, Ivaldo Gomes de Moraes, Norberti Bernadineli, Roberto Brando Garcia, Alexandre Silva Bramante . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19

    Utilizao da tecnologia de agentes para um ambiente virtual de ensino/aprendizagem em PeriodontiaAnita Maria da Rocha Fernandes, Ana Paula Soares Fernandes, Raphael Luiz Nascimento . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23

    Vivncia da realidade: o rumo da sade para a OdontologiaLucilene Dias Pelissari, Roberta Tarkany Basting, Flvia Marto Flrio . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 32

    Propostas de mudana nos cursos presenciais com a educao on-lineJos Manuel Moran . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 40

    A pesquisa nos critrios de avaliao da CAPES e a formao do professor de Odontologia numa dimenso crticaAdriana de Castro Amde Pret, Maria de Lourdes Rocha de Lima . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 46

    Modalidades educativas e novas demandas por educaoIvnio Barros Nunes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 52

    O ensino na Disciplina de Clnica IntegradaFbio Petroucic, Rubens Ferreira Albuquerque Jnior . . . . . . . 60

    Avaliao qualitativa e quantitativa em EndodontiaRocio Anah Zaragoza, Patrcia Helena Pereira Ferrari, Marcelo dos Santos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 65

    Saber pensarPedro Demo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 75

    A implantao das Diretrizes Curriculares dos Cursos de Graduao em Odontologia no Brasil: algumas reflexesCristiane Lopes Simo Lemos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 80

    ANAIS DA XXXIX REUNIO ANUAL - 2004 - ComplementoRelatrio com base nos resultados dos Grupos de Discusso reunidos na XXXIX Reunio Anual da ABENO, 2004 . . . . . . . 86PROGRAMAO DA XXXX REUNIO ANUAL - 2005 . . . . . . . . . 95APNDICENormas para apresentao de originais . . . . . . . . . . . . . . 96

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    RESUMOO objetivo deste estudo foi contribuir para a refle-

    xo sobre as concepes de educao construdas pelo graduando de Odontologia. O universo da pes-quisa abrangeu 43 estudantes do 1 ano de graduao em Odontologia de uma instituio de ensino supe-rior do interior paulista. Foi realizada uma leitura dramatizada do texto intitulado Final in-feliz, de autor desconhecido, sendo proposto aos estudantes que redigissem o final da estria. As redaes foram digitadas na ntegra e procedeu-se anlise qualitati-va de seus contedos. As idias centrais apontam para dois caminhos: o final infeliz, como reflexo de uma viso desesperanosa advinda de prticas educativas tradicionais; e o final feliz, em que a educao en-tendida como um processo cujo modo reflete no re-sultado do ensino, e educar apresenta-se como um sinnimo de conduzir para a vida.

    DESCRITORESEducao em Sade. Estudantes de Odontologia.

    Pesquisa qualitativa.Apesar das recentes modificaes no currculo de Odontologia, iniciadas na dcada de 1990, obser-va-se ainda uma maior valorizao dos procedimentos tcnicos, de forma apartada das necessidades epide-

    miolgicas e da realidade social da populao brasi-leira. Provavelmente, esse fenmeno tem como re-flexo o modo como os estudantes compreendem a profisso odontolgica desde o incio da graduao, reforado pelo enfoque dado no interior das discipli-nas do curso11.

    A reestruturao do currculo odontolgico ne-cessria para a formao de profissionais que voltem a sua prxis s necessidades requeridas pelo quadro epidemiolgico, em meio historicidade do processo sade-doena-cuidado10. Para tanto, necessrio re-pensar o processo ensino-aprendizagem, tanto sob o aspecto dos contedos programticos (o que ensi-nar) como dos processos de ensino (como ensinar). O modelo de ensino tradicional baseado na memo-rizao de informaes tem mostrado algum esgo-tamento e, via de regra, mostra limitadas possibilida-des na construo do conhecimento de maneira crtica e participativa.

    O Projeto Poltico-Pedaggico de uma instituio de ensino superior do interior paulista refere a impor-tncia de formar o cirurgio-dentista para atuar como agente promotor da sade, com nfase na preveno e na manuteno da sade bucal, promovendo a qua-lidade da assistncia odontolgica comunidade. A indicao de competncias deste Projeto Pedaggico ressalta o papel de educador junto ao paciente, a

    O estudante de Odontologia e a educaoO estudante de Odontologia participa da construo do saber odontolgico como aluno, enquanto as propostas curriculares vigentes objetivam que o mesmo se torne um profissional de Sade que atue como educador.Aline Guerra Aquilante*, Nilce Emy Tomita**

    * Aluna do Curso de Mestrado em Sade Coletiva do Departamento de Odontopediatria, Ortodontia e Sade Coletiva da Faculdade de Odontologia de Bauru da Universidade de So Paulo. E-mail: [email protected].

    ** Professora Doutora do Departamento de Odontopediatria, Ortodontia e Sade Coletiva da Faculdade de Odontologia de Bauru da Universidade de So Paulo.

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    O estudante de Odontologia e a educao Aquilante AG, Tomita NE

    comunidade e a equipe de sade 12.Para Freire5 (1988), na educao tradicional

    baseada na narrao, o educador o sujeito que conduz os educandos memorizao mecnica do contedo nar-rado. (...) Nesta distorcida viso da educao, no h cria-tividade, no h transformao, no h saber. S existe saber na inveno, na reinveno, na busca inquieta, im-paciente, permanente, que os homens fazem no mundo, com o mundo e com os outros.

    Segundo Niskier9 (1992),

    a educao pode ser um instrumento poderoso tanto de emancipao individual como de subservincia a sistemas de governo. Tanto libertao como sujeio do indivduo ao poder e s normas do Estado. No primeiro caso, torna o indivduo reflexivo e crtico; no segundo, transforma-o em parte da massa.

    Struchiner et al.11 (1999) realizaram uma anlise cognitiva com alunos de graduao em Odontologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro com o ob-jetivo de diagnosticar o conhecimento em diversos aspectos relevantes formao cientfica e profissio-nal. Os resultados apontaram que o processo educa-tivo no estimula nem cobra a tomada de conscincia dos fundamentos da matria estudada, o que pode estar relacionado tanto cultura e representao fei-ta sobre o papel e funo desse profissional, como s estratgias de ensino-aprendizagem utilizadas em cur-sos de Odontologia.

    As propostas de reformas curriculares no Brasil, por meio da adoo de mtodos alternativos, foram descritas por Moreira8 (2000). Historicamente, o que sempre se buscou foi a elaborao de currculos com princpios mais integradores baseados em temas ge-radores ou complexos que funcionam como eixos transversais com o objetivo de formar cidados cons-cientes, ticos, autnomos, crticos e transformado-res. O ponto crucial das reformas foi a dificuldade de rompimento com as limitaes impostas pela diviso dos contedos em disciplinas, pois os professores es-to habituados compartimentalizao do ensino, uma vez que foram formados desta maneira.

    Dourado4 (2002) criticou as modificaes advin-das dos Decretos n 2.306/97 e 3.860/2001, que per-mitiram que houvesse o rompimento da indissociabi-lidade entre ensino, pesquisa e extenso como requisitos bsicos educao superior no Brasil. De-vido a influncias socioeconmicas de ordem mun-

    dial, a educao superior ficou restrita funo de ensino, modificando a identidade e a funo social da Universidade, sendo que esta passou a ser alocada no setor de prestao de servios.

    O estudante de Odontologia vivencia, simulta-neamente, dois papis. Se, por um lado, participa da construo do saber odontolgico como aluno, por outro, as propostas curriculares vigentes objetivam que o mesmo se torne um profissional de Sade que atue como educador.

    Sem que se vislumbre a qual educao os proje-tos pedaggicos de instituies de ensino superior fazem referncia, no possvel ter clareza das rela-es que o estudante venha a estabelecer como edu-cador no campo da sade.

    A descrio de uma atividade proposta na Discipli-na de Educao em Sade visa contribuir para a refle-xo sobre as concepes de educao que o gra-duando de Odontologia apresenta.

    MTODOA abordagem inicial do assunto filosofia da educa-

    o consistiu no desenvolvimento de uma dinmica visando estimular os alunos a perceberem como (ou pode ser) a educao.

    Na primeira aula desta disciplina, trs alunos pro-cederam leitura dramatizada do texto intitulado Final in-feliz, de autor desconhecido. A estria era projetada com o auxlio de um retroprojetor enquan-to dois alunos e uma aluna, respectivamente, repre-sentavam os papis de narrador, menininho e professora.

    Este texto relata a situao de uma criana que estuda em uma escola onde a professora, ao realizar uma atividade com os alunos, solicitava que todos fi-zessem juntos e da mesma maneira, mostrando como desenhar: as flores deveriam ser vermelhas e com cau-le verde. O menino, inicialmente, fazia as atividades sua maneira; embora preferisse fazer do seu jeito, ele copiava o que a professora fazia e, assim, passou a no fazer mais as coisas por si prprio. Posteriormen-te, o menino teve que mudar de escola, onde a nova professora props como atividade que os alunos de-senhassem. O menino pensou e esperou que esta pro-fessora dissesse o que fazer, mas ela no disse. O me-nino a indagou sobre o que deveria ser feito e quais cores deveriam ser utilizadas.

    Ao final, a leitura foi interrompida quando da per-gunta feita ao menininho:

    Se todo mundo fizer o mesmo desenho e usar as mesmas

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    O estudante de Odontologia e a educao Aquilante AG, Tomita NE

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    se de 43 respostas.Apenas 7 das redaes apresentadas continham

    finais infelizes.Um final infeliz refere-se mediocridade causa-

    da pela falta de criatividade advinda da forma como a primeira professora havia agido no processo de en-sino. Frente pergunta:

    Se todo mundo fizer o mesmo desenho e usar as mesmas cores, como eu posso saber qual o desenho de cada um?,

    a resposta foi:

    Ah, s colocarmos nosso nmero de chamada na par-te de trs da folha, professora. (...) E perpetuou-se a estu-pidezA.

    Alguns elementos do denominado modelo tradi-cional de ensino formal esto expressos nesta respos-ta. O nmero de chamada que corresponde a cada aluno apresentado como o fator de identificao, em um processo que desconhece a individualidade, a identidade e a originalidade. Esta viso desesperan-osa da educao remete a uma idia de mediocri-dade, sem possibilidade de transformao, em que se vislumbra uma impotente perspectiva de continuida-de.

    Outros finais propostos para a estria referem a falta de criatividade devido insegurana do menino, expressa pela repetio de antigos comportamentos, em que o personagem v-se impelido a fazer cpias.

    Ento pensou: vou copiar do meu vizinho para no errar. A partir da, sua vida foi sempre estar na sombra de algum e sua criatividade foi ofuscada pelo medo de errarB. Mas ele tinha medo de errar e isso o segurava. Naquela aula, o menino no conseguiu desenharC.

    De modo anlogo, Chau3 (1999) considera que

    essa universidade no forma e no cria pensamento, des-poja a linguagem de sentido, densidade e mistrio, destri a curiosidade e a admirao que levam descoberta do novo, anula toda pretenso de transformao histrica como ao consciente dos seres humanos em condies materiais determinadas.

    Nos finais infelizes, a idia central expressa a inibio do personagem representado pelo menini-nho. Assim como o personagem, menininhos cres-

    cores, como eu posso saber qual o desenho de cada um?.

    Foi solicitado aos estudantes que redigissem, de maneira livre, o final da histria.

    Ao trmino da atividade, os alunos receberam a verso original do texto na ntegra, que tinha por fi-nal:

    Eu no sei! E comeou a desenhar uma flor vermelha com um caule verde.

    Assegurando-se o sigilo da autoria das respostas, as redaes foram digitadas na ntegra e procedeu-se anlise de contedo, que parte de uma leitura flu-tuante, para posteriormente alcanar um nvel mais aprofundado que ultrapassa os significados que foram manifestados. Para a anlise das respostas, foi feita a opo pelo mtodo de anlise qualitativa7. Esta anli-se procura relacionar as estruturas semnticas (signi-ficantes) s sociolgicas (significados) dos enuncia-dos, procurando determinar as variveis psicossociais, contexto cultural, e processo de produo da mensa-gem.

    As idias centrais presentes no texto foram eviden-ciadas, bem como a presena simultnea de dois ou mais elementos semelhantes em discursos de indiv-duos diferentes. Em seguida, realizou-se a anlise do discurso, com objetivo proceder a uma reflexo acer-ca das condies de produo e de assimilao do significado dos textos produzidos dentro de contextos variados, visando compreenso do modo de funcio-namento, princpios de organizao e formas de pro-duo social do sentido7.

    A transcrio de algumas expresses feita a se-guir, com objetivo de subsidiar a discusso, utilizando-se letras dispostas aleatoriamente para referenciar as falas dos diferentes sujeitos.

    Este protocolo foi submetido ao Comit de tica em Pesquisa da Faculdade de Odontologia de Bauru da Universidade de So Paulo, atendendo Resoluo 196/96 do Conselho Nacional de Sade.

    DISCUSSOEntre os 44 alunos presentes aula, em uma turma

    de 50 alunos matriculados, observou-se ampla adeso atividade proposta, no havendo recusas, perdas ou respostas em branco. Quando da apresentao da Car-ta de Informao e Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, houve uma recusa em assinar o referido termo. As consideraes a seguir baseiam-se na anli-

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    cem e ingressam em instituies de ensino superior, vivendo um contexto cuja dimenso parece muito superior quela que a chamada educao formal tem ajudado a construir.

    Ento, o menino no sabia mais fazer as coisas por si mesmo, precisava sempre que algum explicasseD. O me-nino cresceu, era um homem, mas continuava a se achar pequeno diante do mundo. No sabia decidir por si mesmo, s sabia fazer o que lhe mandavamE. [Assim, viu-se] limita-do diante dos fatos que o marcaram primeiramente e no conseguiu mais realizar espontaneamente suas aes, espe-rando sempre a iniciativa de outrosF.

    Houve tambm uma reflexo sobre o ensino que, provavelmente, reflete uma experincia pessoal. Como fruto de uma moldagem nas etapas do ensino prvias ao ingresso na universidade, tem-se a limita-o de uma criatividade que o respondente espera ver resgatada durante a vida universitria. Posto como desafio, cabe s instituies de ensino superior desencadear uma reflexo sobre as possibilidades de resposta a esta expectativa do alunado.

    Diante dessa narrativa, das atitudes da primeira professo-ra e tambm da iniciativa da segunda professora, o menino, (...) encontra-se confuso diante de antagnicas situaes. A primeira fez-se presente em sua vida limitando sua cria-tividade, porm dando uma uniformidade e detalhamento de todos os passos a serem efetuados (semelhante ao 1 e 2 grau). A segunda abriu horizontes sem barreiras, porm o mesmo poderia ver-se prejudicado para alar livres e no-vos vos, pois acostumou-se uniformidade e no inova-o e iniciativa (semelhante vida universitria)F.

    As estruturas curriculares que fogem da lgica dis-ciplinar so mais freqentes nos primeiros anos da escola fundamental e no ensino superior. Neste lti-mo, o trabalho pautado na interdisciplinaridade ou transversalidade, desenvolvido por meio de proble-mas, temas ou projetos vivel e conveniente, princi-palmente nos campos aplicados (Educao, Arquite-tura e Cincias da Sade), uma vez que a teoria desvinculada da atividade social e da verificao pr-tica apenas teoria8.

    Numericamente superiores, os finais considerados felizes foram aqueles em que o personagem repre-sentado pelo menininho no surge conformado aos moldes estabelecidos por uma educao pautada na pedagogia bancria 5.

    [O menino] aprendeu (...) que todos eram diferentes, (...) pensavam e analisavam situaes de formas diferentesG. [Dessa maneira, percebeu que] era capaz de criar e devia faz-lo sempre que possvelH. A criatividade existe em cada um de ns. Basta que se abram as portas para podermos mostrar o que a gente pensa e sabe fazer. Ser criativo ter o seu prprio estilo, sair do comum, ser voc mesmoI.

    Algumas respostas tendem a entender o indivi-dualismo como a

    perspectiva segundo a qual o indivduo a unidade bsica da anlise poltica, e os todos sociais so meras construes lgicas, ou maneiras de falar acerca de um certo nmero desses indivduos e das relaes entre eles 2.

    Ele tinha sua prpria personalidadeH e poderia, da mesma forma, construir seu prprio carter, escolher seus desejos e ambies como tambm realizar seus sonhosJ, o que o fez amadurecer e respeitar os seus prprios pensamentos a respeito de tudoK.

    Diante do impasse gerado pela possibilidade de livre expresso, o discurso mostra que o menino re-solve demonstrar sua individualidade.

    Ento o menino pensou: Qual das professoras estava cor-reta? Pela primeira vez faria algo que no teria um padro, seria ele desenhando ele prprio. O tempo passava e o menino nada desenhava. E a professora perguntou: Ainda no desenhou? Temos pouco tempo. Com estas palavras da professora, veio a grande idia do menino: Desenharei o contorno de minhas mos. Em qualquer tempo, poderei mostrar, atravs de gestos, as minhas idiasL.

    Nesta perspectiva, o processo de ensino/aprendizagem no tem como finalidade a transmisso de contedos pron-tos, mas, sim, a formao de sujeitos capazes de construir, de forma autnoma, seus sistemas e valores e, a partir deles, atuarem criticamente na realidade que os cerca1.

    Vrios relatos de finais felizes apontaram que o processo de ensino contribuiu para que o menini-nho se construsse, a partir daquele momento, deli-neando positivamente a sua trajetria.

    Assim sendo, o menino pde desenvolver todo seu poten-cial criativo e se transformou em um pintor muito famoso, apreciado principalmente por sua originalidadeN.

    O menino (...) se transformou em um engenheiro que,

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    com suas idias, mudou a qualidade de vida de muitas ci-dades O.

    E assim o menininho cresceu e evoluiu at se transformar em um renomado cirurgio-dentistaP.

    Paralela construo de que uma importante mu-dana tinha acontecido naquele momento histrico da vida do menininho, foi possvel observar uma idia de felicidade completa, expressa como ideal de sucesso em uma sociedade de consumo. O ser inteli-gente, rico e feliz, como resultado de uma boa edu-cao, expressa inquietaes que podem estar na g-nese da busca de estudantes pela Universidade, tendo o diploma como passaporte ascenso social.

    Esse dia mudou sua vida para sempre. Ele cresceu, se tor-nou um rapaz muito inteligente e rico e felizQ.

    O ingresso em uma instituio de ensino superior, no raro, vem acompanhado pela expectativa de des-vendamento e produo de conhecimentos por meio da pesquisa. Alguns estudantes vem no processo en-sino-aprendizagem uma porta que se abre para o uni-verso da pesquisa, na contramo do movimento des-crito por Dourado4 (2002), que v no processo de

    massificao e privatizao da educao superior no Brasil, uma precarizao e privatizao da agenda cientfica, ne-gligenciando o papel social da educao superior como espao de investigao, discusso e difuso de projetos e modelos de organizao da vida social, tendo por norte a garantia dos direitos sociais.

    A professora (...) explicou para o menininho (que) se todo mundo s fizesse coisas iguais, no existiriam as descober-tas, os cientistasR, era preciso idias novas no mundo, pois seno ns no evoluiramosS. Afinal, como as grandes des-cobertas teriam sido feitas ou desenvolvidas se as pessoas apenas esperassem as ordens do que teria de ser feito?N

    O brainstorm que resultou na livre expresso de idias e pensamentos, aps finalizar esta atividade aca-dmica, mostrou que o objetivo proposto pela Disci-plina foi alcanado.

    As expresses sucintamente descritas no Quadro 1 permitem verificar que o objetivo, mtodos e os resul-tados foram apre(e)ndidos pelos estudantes.

    CONSIDERAES FINAISNo raro, o ato de educar referido como sinni-

    mo de despertar as aptides naturais do indivduo e orient-las seguindo os padres e ideais de determi-nada sociedade, aprimorando-lhes as faculdades inte-lectuais, fsicas e morais, mas tambm domesticar, amestrar, adestrar 6.

    Assim, as consideraes emanadas pelos estudan-tes de graduao de Odontologia, a partir da atividade proposta, evidenciam a importncia de estimular re-flexes no espao da Universidade, um locus privile-giado para que questes centrais, o(s) como(s) e porqu(s) da educao, venham a ser discutidas.

    Esta construo do conhecimento, realizada cole-tivamente, aponta para uma caminhada esperanosa, no sentido de possibilitar construes atuais e futuras. Se o dicionrio descreve prticas ancestrais tidas como modelos de educao, antev-se a possibilidade de (re)escrever novas histrias que envolvam o ensino-aprendizado como um processo transformador e ple-no em desafios.

    ABSTRACTDental students and education

    The purpose of this study was to contribute to an important reflection on the dental students concepts of education. The universe of this study was com-posed of 43 freshman students of a School of Den-tistry in the state of So Paulo. An exercise composed of a dramatic reading of a text called Un-happy end, of unknown author, was proposed. Before the end of the text, the reading was interrupted and the students were asked to write another end to the story. The writ-ings were typed integrally and qualitatively analyzed. The central ideas pointed towards two ways: an un-happy end, as a reflection of poor expectations ob-tained from traditional educative practices, and a happy end, with education being a process which re-flects on the results of teaching and the act of educat-

    Idia central ExpressoFormato Metalinguagem. Apresentao da disciplina.Proposta Momento de reflexo. Pensamento crtico. Discusso de valores.Contedo

    Educar como sinnimo de conduzir para a vida. O modo de educao reflete no resul-tado do ensino. Educao um processo.

    Quadro 1 - Idias representativas da atividade acadmica e respectivas expresses. Bauru - SP, 2003.

  • Revista da ABENO 5(1):6-11 11

    O estudante de Odontologia e a educao Aquilante AG, Tomita NE

    ing being referred as a means of preparing for life.

    DESCRIPTORSHealth education. Students, dental. Qualitative

    research. REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS 1. Belo Horizonte. Secretaria Municipal de Educao. Escola Plu-

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    Aceito para publicao em 12/2004

    no Balnerio Cambori!A 40 Reunio da ABENO ser realizada no Balnerio Cambori, Santa Catarina.

    O tema central para a prxima Reunio :"Universidade promotora de conhecimentos, sade e prestadora de servios".Inscreva j o seu trabalho! Acesse o site http://www.abeno.org.br para obter informaes sobre prazospara inscrio e apresentao de trabalhos.

    Reunio da ABENOReunio da ABENOReunio da ABENOReunio da ABENO

  • Revista da ABENO 5(1):12-812

    RESUMOA introduo das Clnicas Integradas nos cursos

    de Odontologia pode contribuir para o desenvolvi-mento de uma prtica mais integral na ateno sa-de. Esse trabalho procura pontuar e discutir limites e possibilidades encontrados a partir de um estudo re-flexivo de dois anos e meio dessa experincia no cur-so de Odontologia do Univag Centro Universitrio.

    DESCRITORESOdontologia geral. Educao em Odontologia.

    Ensino.Num pas no qual a Odontologia ainda pode ser descrita como tecnicamente elogivel, cientifi-camente discutvel e socialmente catica (Garrafa, Moyss5, 1996), o ensino universitrio tambm pre-cisa tomar para si a responsabilidade na construo de futuros mais fecundos, a partir da formao de um novo perfil profissional: mais humano, mais solidrio, mais atuante politicamente.

    A formao desse novo profissional demanda a construo de novos Projetos Poltico-Pedaggicos que possam prever aes transformadoras, entre ou-tras, do prprio professor, para possibilitar aos ideais tericos lugares diferentes de miragens.

    Imbudos desse desejo, e tambm pressionados por uma realidade de mercado na qual as especializa-es j no garantem o retorno de outros tempos, os cursos de Odontologia vm experimentando novas configuraes curriculares.

    Dentre as vrias propostas para essas reformas cur-riculares, tem-se a introduo antecipada da Clnica

    Integrada. O curso de Odontologia do Univag Centro Universitrio adotou esse caminho, e vem por meio desse trabalho pontuar e discutir sobre limites e pos-sibilidades, a partir da observao atenta e reflexiva de dois anos e meio de experincia. Nosso curso composto por dez semestres, sendo a Clnica Integra-da ministrada a partir do sexto semestre at a sua fi-nalizao.

    O CONCEITO DE INTEGRALIDADE PRESENTE NAS DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS PARA O ENSINO DA ODONTOLOGIAAs Diretrizes Curriculares Nacionais dos Cursos de

    Graduao em Odontologia, aprovadas pelo CNE (Parecer da Cmara de Educao Superior do Conse-lho Nacional de Educao3 CNE/CES n 1.300/01, de 06/11/2001; Resoluo CNE/CES n 3, de 19/02/2002, publicadas no Dirio Oficial da Unio de 04/03/2002) traam o perfil generalista do profis-sional a ser formado. Ao enunciarem as habilidades e competncias a serem desenvolvidas, apontam a ne-cessidade de garantirmos a integralidade da assistn-cia, entendida como conjunto articulado e contnuo das aes e servios preventivos e curativos, individuais e coletivos, exigidos para cada caso em todos os nveis de complexidade do sistema grifos nossos.

    O processo de formao dos nossos alunos precisa, portanto, dar conta desse conjunto articulado e con-tnuo. E isso se torna um grande desafio na medida em que o ensino tradicional segmentado e desarti-culado ainda constitui a matriz curricular na forma-o dos nossos docentes.

    Clnicas Integradas antecipadas: limites e possibilidadesNas Clnicas Integradas, existe a responsabilidade de organizar uma dinmica de trabalho que possa garantir a experincia clnica nos vrios procedimentos bsicos da Odontologia.Patrcia Suguri Cristino*

    * Mestra em Dentstica pela Faculdade de Odontologia de Ribeiro Preto da Universidade de So Paulo. E-mail: [email protected].

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    Clnicas Integradas antecipadas: limites e possibilidades Cristino PS

    Convivemos numa realidade paradoxal e numa conseqente crise paradigmtica na qual somos espe-cialistas tendo que formar generalistas.

    DE ESPECIALISTAS A GENERALISTASPor que queremos formar generalistas?Dificilmente entenderemos a dimenso dos desa-

    fios que temos pela frente se no nos sensibilizarmos sobre o significado da nossa prtica atual. Parece-nos pertinente analisar, ainda que modestamente, o efei-to de contextos polticos e econmicos sobre as pr-ticas do Ensino e da Sade e, conseqentemente, no ensino dos cursos da Sade.

    A dcada de 60 foi marcada por um perodo tec-nocrata, a partir do governo militar, num projeto de-senvolvimentista que buscava acelerar o crescimento econmico e tecnolgico, lanando sobre a Educao um iderio de neutralidade cientfica, inspirada nos princpios de racionalidade, eficincia e produtivida-de.

    Buscou-se a objetivao do trabalho pedaggico da mesma maneira que ocorreu no trabalho fabril. Instalou-se na es-cola a diviso do trabalho sob a justificativa de produtivida-de, propiciando a fragmentao do processo e, com isso, acentuando as distncias entre quem planeja e quem exe-cuta (Veiga10, 1991 destaques nossos).

    Se analisarmos criticamente as nossas posturas diante do Ensino e da Pesquisa, podemos reconhecer o quanto esse cenrio ainda est impregnado nas nos-sas prticas. Basta olharmos para a fragmentao do ensino da Odontologia nas nossas disciplinas clnicas tradicionais de Periodontia, Prtese, Endodontia, Dentstica, Cirurgia etc.

    Geralmente essas disciplinas so ministradas isola-damente, num nvel de articulao beira do inexis-tente, cuja contribuio para a qualidade de vida das pessoas , no mnimo, questionvel. Falamos em tratar o paciente como um todo, quando a nossa prtica ensina a lidar com partes de partes. Na melhor das hipteses, nosso ensino tradicional tem dado conta, quando muito, da boca como um todo, como se esta pudesse representar algum todo de algum. jus-tamente em torno dessa questo que nasce (ou renas-ce?) a necessidade de uma prtica mais integrada, a qual chamamos hoje por Clnica Integrada.

    A formao tradicional em sade, baseada na organizao disciplinar e nas especialidades, conduz ao estudo fragmen-tado dos problemas de sade das pessoas e das sociedades, levando formao de especialistas que no conseguem mais lidar com as totalidades ou com realidades comple-xas.*

    A PESQUISA QUE AJUDA A FORMAR (OU DEFORMAR) OS NOSSOS DOCENTESAcreditando em neutralidade cientfica, podemos

    nos dedicar a estudos que pouco (ou nada) contri-buem para a soluo dos problemas da nossa socieda-de. Seduzidos pelo mundo da produo cientfica, temos dificuldades para discernir que os resultados das pesquisas de outros pases nem sempre podem ser aplicados no nosso contexto social. Somos vrios mun-dos num mesmo planeta, num mesmo pas, numa mesma cidade, numa mesma sociedade, e muitas vezes nos referimos aos seres humanos como ser nico, o ser apenas biolgico, sem nome, sem origem e sem histria.

    Essa abstrao, associada ao perfil afunilado da superespecializao, nos coloca facilmente num cien-tificismo cego, no qual o objeto de estudo pinado do seu contexto. Entram nessa discusso as concep-es do tratamento odontolgico na Clnica Integra-da, uma das nossas maiores dificuldades, principal-mente se o nosso corpo docente estiver formado por superespecialistas esforados em implantar concep-es de tratamento incompatveis com a nossa reali-dade social.

    E de onde vem essa fora cientificista?

    O ensino, desde a implantao do domnio da cincia na universidade, no sculo 18, quando a cincia expulsou a Inquisio, baniu tambm o subjetivo. (...) a cincia ficou com uma tica em funo da verdade e do objetivo, e no em funo do humanismo... (Byington1, 2004 destaques nossos).

    A CONSEQENTE (DES)HUMANIZAO DAS PRTICAS DE SADES8 (2001) faz uma reflexo sobre a crescente ba-

    nalizao da dor e do sofrimento alheio no setor sa-de, destacando algumas prticas facilitadoras para os fenmenos de desvalorizao da vida, tais como: a) a fragmentao do relacionamento profissional/

    paciente as tarefas so divididas em etapas a se-

    * Esta citao foi copiada do arquivo Mudanas dos Cursos de Odontologia e sua interao com o SUS disponvel no site www.abeno.org.br e pertence Poltica de Educao e Desenvolvimento para o SUS - Comisso Intergestores Tripartite, setembro de 2003.

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    Clnicas Integradas antecipadas: limites e possibilidades Cristino PS

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    rem executadas por diferentes profissionais, evitan-do o contato com o paciente como ser integral; b) a despersonalizao ou negao das diferenas individuais os pacientes so referidos no por seus nomes, mas pelo nome da doena ou rgo doente; c) a obscuridade intencional na distribuio das responsabilidades a organizao no define de modo suficientemente claro quem responsvel pelo qu e por quem; d) a resistncia a mudanas.A necessidade de trabalharmos com aes e servi-

    os articulados, dentro de uma prtica mais humani-zada, nos leva, inevitavelmente, a questionar o ensino da atualidade. Podemos continuar acreditando que o conhecimento compartimentado em disciplinas pos-sibilite a visualizao do todo? Que o ensino segmen-tado possa desenvolver habilidades para resolver pro-blemas? Que os contedos cientficos descolados dos contextos possam dar conta do ser humano? Que a questo da resolutividade na ateno Sade seja preocupao apenas das disciplinas de Sade Coleti-va?

    JUNTAR NO SIGNIFICA ARTICULAR, NEM INTEGRARDiscutindo sobre estratgias de integrao disci-

    plinar, Porto, Almeida7 (2002) nos falam sobre trs grandes formas de articulao de disciplinas na pro-duo do conhecimento: a) a multidisciplinaridade como sendo o conjunto

    de disciplinas que se agrupam em torno de um tema desenvolvendo investigaes e anlises isola-das por diferentes especialistas, sem que se estabe-leam relaes conceituais ou metodolgicas entre elas, correspondendo estratgia mais limitada; b) a interdisciplinaridade como sendo a reunio de diferentes disciplinas articuladas em torno de uma mesma temtica com diferentes nveis de in-tegrao, desde uma cooperao de complemen-taridade sem articulaes axiomticas ou prepon-derncia de uma disciplina sobre as demais; c) a transdisciplinaridade articulao de um amplo conjunto de disciplinas em torno de um campo te-rico e operacional particular, sobre a base de uma axiomtica comum (...) cuja aplicao comparti-lhada por diferentes disciplinas e abordagens que atuam num campo terico e operacional desta-ques nossos.Para nosso desencanto, o juntar professores no

    nos garante, nem de longe, a integrao almejada. Ficaramos, quando muito, no nvel da multidiscipli-naridade. A integrao que queremos vai muito alm

    dos difceis acordos para a seleo dos contedos a serem ministrados ao longo dos semestres da Clnica Integrada, ou dos encontros (por vezes conflitantes) entre limas e curetas para saber por onde comeare-mos os planos de tratamento. Implica, entre outras necessidades, o desenvolvimento de habilidades e competncias inclusive do prprio professor para lidar com o todo, sem pretender o tudo das especia-lidades. Isso nos exige imenso desdobramento para focalizar o essencial, o possvel e o desejvel e nem todos temos a sensibilidade necessria para desenvol-ver essa competncia. Entramos, aqui, no perfil do professor de Clnica Integrada.

    A IMPORTNCIA DO PERFIL DOCENTE NA CONSTRUO DE UM PROJETO INTEGRADORMinayo (1994) considera ser um pr-requisito para o su-cesso de empreendimento interdisciplinar a reunio de pesquisadores dispostos ao dilogo, competentes em suas reas disciplinares, que possam articular conceitos comuns e realizar triangulaes metodolgicas, colaborando entre si na anlise dos resultados. Almeida Filho (1997), por sua vez, coloca a necessidade de operadores transdisciplinares da cincia com o perfil anfbio de trans-passarem as fron-teiras e facilitarem o dilogo entre as distintas disciplinas cientficas na construo de campos tericos e operacionais de carter transdisciplinar (Porto, Almeida7, 2002 des-taques nossos).

    O movimento natural do especialista o de se aprofundar cada vez mais no comprido corredor da sua especialidade, apegando-se a complexidades que no atendem formao generalista. Isso no quer dizer que seja impossvel construir uma Clnica Inte-grada com especialistas. Mas preciso reconhecer o desafio e, portanto, os investimentos necessrios nes-sa empreitada. Se a clnica geral no o universo na-tural do especialista, um rduo trabalho pedaggico ter que ser realizado!

    A ORGANIZAO DO CONTEDO PROGRAMTICOAdotamos a definio dos graus de complexidade

    do tratamento odontolgico como ponto de partida para delinear o corpo terico. Procuramos responder seguinte pergunta: quais competncias e habilidades o aluno dever desenvolver em cada semestre? A par-tir da os contedos podem ser selecionados e distri-budos.

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    Clnicas Integradas antecipadas: limites e possibilidades Cristino PS

    Isso demanda discusses coletivas para tentar de-limitar as competncias do clnico geral, na tentativa de se definir o grau mximo de complexidade. Quan-do sabemos at onde vamos na ateno Sade, no nvel da graduao, podemos definir a base terica de suporte, diminuindo as opes por contedos inade-quados. Estamos falando da busca da relao teoria e prtica. Neste caso, delineando o corpo terico a par-tir das demandas da prtica. Sem isso, camos no de-lrio de despejar contedos desnecessrios. Quando isso acontece, nos desviamos do Projeto Poltico-Pe-daggico, e o resultado pode ser desastroso: no dese-jo de ensinar tudo, o que se aprende pode ser mui-to aqum do que se precisa!

    A delimitao dos contedos pelos semestres no deve se configurar num enquadramento intranspon-vel. O ritmo de cada turma pode mostrar a necessida-de de voltarmos ao que j foi trabalhado, ou de avan-armos, e isso precisa ser sinalizado pelos processos de avaliao.

    OS PLANOS DE TRATAMENTOA discusso sobre como devemos construir os pla-

    nos de tratamento demanda lidar com as diferenas conceituais acerca dos processos de sade e doena, bem como sobre as noes dos atores a respeito do mal conhecido e distorcido conceito de promoo de sade, para alm da diversidade das correntes cient-ficas presente no coletivo dos professores.

    No podemos negar a grande riqueza existente nessa diversidade, mas tambm no podemos omitir a grande confuso que isso gera, quando a tnica pas-sa a ser: quem est certo e quem est errado? E isso muito comum entre os superespecialistas!

    Um projeto comum significa a existncia de um sistema de valores compartilhado e suficientemente interiorizado pelo grupo. Este sistema de valores deve estar apoiado num imaginrio social comum, isto , uma forma de represen-tao coletiva sobre o que o grupo, o que deseja ser, o que quer fazer, e em que tipo de sociedade ou organizao deseja intervir (S8, 2001 destaques nossos).

    Os esforos para construir os planos de tratamen-to costumam deixar de lado o ator principal: a prpria pessoa a ser atendida! Essa postura, herdada do mo-delo biomdico, mais um rano que costuma atrasar nossas aes na direo de uma ateno mais huma-nizada.

    A desconsiderao da subjetividade e da experincia de vida do paciente implica tambm uma srie de conseqn-cias negativas para o relacionamento profissional-pacien-te/cliente. De fato, esta relao est quase sempre alicer-ada na crena de que somente o profissional de Sade, e no (ou tambm) o prprio usurio, que sabe a respeito do seu estado de sade ou doena (Traverso-Ypez, Mo-rais9, 2004 destaques nossos).

    A proposta de um tratamento negociado at nos agrada pelo tom democrtico do discurso mas no nos convence facilmente, na medida em que olhamos com certa desconfiana para o tratamento desviante do caminho por ns idealizado. Talvez, por nos jul-garmos sabedores incontestveis diante de tantos anos de estudo. Muitos destes, porm, provavelmente nos impeliram para tentativas reducionistas, no sentido de definir o comportamento das doenas e a ignorar o comportamento das pessoas... Cientificismo cego!

    A principal conseqncia verificada em virtude do distan-ciamento observado na relao entre profissional e pacien-te o denominado baixo comprometimento do paciente com o seu tratamento, imposto, na maioria das vezes, de forma verticalizada. (...) A comprovao de que esse mo-delo de atendimento possui limitaes pode ser percebido, tanto pelas constantes crticas e reclamaes dos usurios, como por sua baixa resolutividade (...) Esse reconhecimen-to vem implicando a necessidade crescente do resgate da subjetividade e da relao dialgica entre o profissional e o usurio do servio (Traverso-Ypez, Morais9, 2004 des-taques nossos).

    Nossa clnica-escola tambm precisa trabalhar pela resolutividade, respeitando as necessidades e as possibilidades do paciente, para alm das nossas exi-gncias tpicas de superespecialistas, sob pena de no desenvolvermos junto aos nossos alunos o senso crti-co para resolver os problemas dentro dos limites que as mais diversas realidades nos impem.

    O tratamento odontolgico, seja em consultrio, seja em clnicas de instituies de ensino, configura uma prestao se servios e como tal regida pelo Cdigo Civil Brasileiro e pelo Cdigo de Defesa do Consumidor. (...) o plano de tratamento deve, obrigatoriamente, incluir as vrias opes de tratamento possveis quele determinado caso e no apenas o tratamento ideal no entender da disciplina. No se deve esquecer que, embora o paciente seja atendido por alunos em fase de aprendizado, ele no perde a sua condi-o de paciente com direitos e deveres, portanto ele tem o

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    direito de saber todas as opes de tratamento e escolher aquela que quer realizar, respeitando-se a autonomia do paciente e tendo em mente a beneficncia, princpios fun-damentais da Biotica (Nmeth et al.6, 2001 destaques nossos).

    Diante disso, nos parece clara a impossibilidade de prescrevermos a receita nica e para todos de como se deve construir os planos de tratamento. A tentativa apenas nossa, de professores e alunos, de estabelecer uma ordem fixa de prioridades, perde o sentido quando nos pautamos pela relao dialgica com as pessoas que atendemos. Isso no invalida nem diminui a importncia dos nossos diagnsticos clni-cos. Pelo contrrio, a partir deles, e numa linguagem acessvel e de negociaes e trocas, que podemos realizar, realmente, um trabalho na direo da pro-moo de sade, no lugar de um tratamento doutri-nador, autoritrio e de baixa resolutividade.

    Na base de tudo isso est o vnculo profissional/paciente modulando uma prtica, que tambm por isso, poder dar conta do conceito de integralidade (Campos2, 2003), no sentido de considerar o pacien-te/usurio, de fato, e no apenas no discurso, como pessoa integral que .

    O TRABALHO DE ORIENTAO DOS ALUNOS NA CLNICASe a maioria dos nossos professores de especia-

    listas, logo vem a pergunta: quem vai orientar o qu? O primeiro e mais evidente desejo de um professor especialista, numa Clnica Integrada, o de se restrin-gir a orientar os procedimentos concernentes sua rea especfica de formao. Seguindo este desejo, professores de Endodontia orientariam apenas os tra-tamentos de canal, os professores de Dentstica fica-riam com as restauraes, e assim sucessivamente. Vale aqui relembrar o significado da diviso do traba-lho:

    A organizao parcelar do trabalho fixa os trabalhadores em uma determinada etapa do processo teraputico. A superespecializao, o trabalho fracionado, fazem com que o profissional de Sade se aliene do prprio objeto de tra-balho. Desta forma, ficam os trabalhadores sem interao com o produto final da sua atividade laboral, mesmo que tenham dele participado, pontualmente. Como no h interao, no haver compromisso com o resultado final do seu trabalho (Franco et al. apud Campos2, 2003 des-taques nossos).

    No nosso curso, cada professor deve orientar inte-gralmente o tratamento dos pacientes dos seus respec-tivos alunos. Estamos hoje numa proporo de oito alunos por professor. E todos orientam tudo? Isso possvel?

    Como somos na maioria especialistas, enfrenta-mos algumas dificuldades. Na medida do possvel to-dos devem orientar todos os tipos de procedimentos, dentro da complexidade definida para o semestre em questo. Como nem sempre isso possvel... as trocas de experincias entre os professores no interior da clnica se tornam fundamentais!

    Voltando ao perfil anfbio, precisamos de pesso-as dispostas a transitar em terrenos diferentes, de pro-fessores com a mente aberta para aprender com seus pares, e mesmo com seus alunos e pacientes, para muito alm de ensinar.

    A PRODUO CLNICA DO ALUNO AO LONGO DAS CLNICAS INTEGRADASA opo por uma Clnica Integrada antecipada

    requer uma cuidadosa organizao do trabalho, sob vrios aspectos. Tendo em vista que o aluno atende os pacientes na inteno de concluir os tratamentos (dentro do possvel e negociado) e uma vez no exis-tindo as disciplinas clnicas especficas, temos a res-ponsabilidade de organizar uma dinmica de trabalho que possa garantir a experincia clnica nos vrios procedimentos bsicos da Odontologia.

    O primeiro cuidado est na triagem. Cada semes-tre da Clnica Integrada trabalha num nvel de com-plexidade. Ou seja, precisamos de pacientes com de-terminadas necessidades de tratamento, ou que estejam numa fase de tratamento compatvel com as habilidades e competncias eleitas para o semestre em questo. Dessa forma, tentamos o quanto possvel, fazer com que os nossos alunos atendam em nveis crescentes de dificuldades.

    Alm de uma cuidadosa triagem, os professores precisam acompanhar, de perto, o fluxo dos pacientes a serem atendidos pelos alunos ao longo de todos os semestres da Clnica Integrada. Mesmo respeitando a uma fila de espera dos pacientes para o atendimento, cada aluno ter que atender aqueles cuja complexi-dade do tratamento seja compatvel ao seu estgio de desenvolvimento e sua necessidade de aprendiza-gem.

    Esse fluxo de pacientes, para cada aluno, durante todos os semestres de Clnica Integrada, precisa ser acompanhado atentamente, sob pena de um fracasso curricular por falta de organizao. A dinmica de

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    Clnicas Integradas antecipadas: limites e possibilidades Cristino PS

    trabalho da Clnica Integrada no deve permitir que um aluno conclua o curso sem ter realizado todos os procedimentos bsicos necessrios para sua formao de clnico geral. Isso envolve a articulao entre o corpo docente, os alunos e o corpo tcnico-adminis-trativo.

    A GESTO ACADMICAImportante destacar que, na fase de criao coletiva, trs perguntas bsicas orientam o processo: a) que tipo de ho-mem se quer formar e com que meios; b) que tipo de so-ciedade se deseja; e c) o que a instituio educacional pode e deve fazer, considerando a realidade em que est inseri-da (Freitas4, 1994 destaques nossos).

    A proposta de antecipao da Clnica Integrada, dentro de uma prtica mais humanizada, tende a en-cher os olhos dos apaixonados pela docncia. E no para menos: ela delineia uma ateno mais integral e menos recortada. Se bem conduzida, ela pode ter um alcance maior na direo da melhoria da qualida-de de vida das pessoas e, conseqentemente, na dire-o de um ensino mais humanista e comprometido com a realidade social.

    Comparando-a ao ensino tradicional das discipli-nas especializadas, no temos, por exemplo, aquelas situaes em que um dente tratado endodonticamen-te vira elemento a ser extrado por falta de tratamen-to restaurador ou prottico. Ao permitirmos situaes como esta, acabamos por ensinar o descaso com o paciente. Paciente no seu sentido mais passivo e inde-feso, de quem no tem ao menos a informao para escolher seu tratamento. Quanto sofrimento para se perder um dente! Como j citado... uma tica em funo do objetivo.... e no do humanismo.

    Encampar o sonho de propostas como a antecipa-o da Clnica Integrada requer a prudncia de se estudar cuidadosamente os meios para conquist-lo.

    No se supera a atual didtica postulando, teoricamente, outra didtica, mas a partir das contradies presentes nas nossas escolas concretas. (...) impossvel continuar a re-fletir sobre a didtica sem levar em conta a organizao do trabalho escolar, como um todo, simultaneamente. Talvez esta seja uma das deficincias mais gritantes dos estudos no campo da didtica (Freitas4, 1994 destaques nossos).

    A construo coletiva do Projeto Poltico-Pedag-gico a condio da sua legitimidade. Prescrev-lo,

    pronto, ao corpo docente, pode ser um grande risco!

    Hoje, o (re)conhecimento de que a dimenso humana presente nos processos organizacionais tambm, ou prin-cipalmente, a dimenso do desejo, da pulso, do afeto, do imaginrio e do simblico me obriga a questionar a crena na possibilidade de construo de projetos coletivos pau-tados no fluir de um processo comunicativo (Riviera, 1995), concebido como um processo que dependa exclusivamen-te da conscincia e da vontade (S8, 2001).

    Quanto ao apoio institucional, parece prudente considerar que projetos mais avanados, que fogem do compartimentado ensino tradicional, requerem o dilogo como base de um trabalho compartilhado. E esse dilogo precisa acontecer num tempo e num es-pao para alm da hora-aula da sala de aula. Estamos falando do investimento institucional necessrio para o planejamento coletivo e cuidadoso diante de proje-tos que dependem da ao coletiva.

    O preparo do professor, ao que parece diante des-ses dois anos e meio de experincia do nosso curso, est na competncia dentro da sua especialidade, alia-da sua capacidade de desenvolver o citado perfil anfbio, com a imprescindvel abertura ao dilogo e o respeito s decises coletivas. Quanto ao seu envol-vimento, este parece depender das motivaes inter-nas (prprias do idealismo dos que abraam a carrei-ra docente como parte da realizao da vida) como tambm das condies de trabalho oferecidas pela IES (instituio de ensino superior) e da capacidade aglu-tinadora da Gesto Acadmica na organizao do tra-balho pedaggico e no estmulo ao desenvolvimento de cada docente para uma condio de sujeito nesse processo.

    Diante da multiplicidade de desejos e de um desa-fio comum, a Gesto Acadmica precisa se colocar como articuladora e facilitadora do trabalho coletivo, para que possa ampliar suas condies de governabi-lidade.

    CONCLUSESOs limites e as possibilidades da antecipao da

    Clnica Integrada parecem estar intimamente ligados nossa capacidade de conviver em grupo, a partir de condies mnimas de trabalho, como a existncia de um corpo docente com perfil adequado para partici-par de projetos integradores (para alm da compe-tncia na rea especfica), e uma organizao do tra-balho pedaggico que permita a construo coletiva e sua prpria transformao e crescimento a partir de

  • Revista da ABENO 5(1):12-8

    Clnicas Integradas antecipadas: limites e possibilidades Cristino PS

    18

    uma postura de permanente auto-avaliao.

    AGRADECIMENTOSAgradeo, imensamente, ao Magnfico Reitor, Dr.

    Druzio Medeiros, pelo incentivo na divulgao desse trabalho na 39 Reunio da ABENO, ao Coordenador do Curso de Odontologia, Prof. Ms. Omar Zina, pelo grande apoio na sua construo, ao Prof. Ms. Narciso Santana da Silva por sua inestimvel ajuda na com-preenso de alguns conceitos essenciais presentes nesse estudo, e a todos os colegas professores, funcio-nrios, alunos e pacientes, que constituem a histria do nosso curso. Agradeo, tambm, aos Profs. Dr. Di-onsio Vinha (FORP-USP) e Profa. Dra. Anna Maria Lunardi Padilha (UNIMEP), preciosos Educadores e meus queridos Mestres!

    ABSTRACTAnticipated Integrated Clinics: limits and possibilities

    The introduction of anticipated Integrated Clinics in the dentistry program can contribute to the devel-opment of a more complete health care practice. This paper aims to highlight and discuss the limits and possibilities found in a reflective two-and-a-half-year study regarding this experience in the dentistry pro-gram at the University Center of Vrzea Grande (Uni-vag).

    DESCRIPTORSGeneral practice, dental. Education, dental.

    Teaching. REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS 1. Byington CAB. Emocionar para ensinar. Entrevista. Rev Viver

    Psicologia 2004;(134):8-11. 2. Campos CEA. O desafio da integralidade segundo as perspec-

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    3. Conselho Nacional de Educao. Cmara de Educao Supe-rior. Resoluo CNE/CES 3/2002, de 19 de fevereiro de 2002. Institui as Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Gra-duao em Odontologia. Dirio Oficial da Unio, Braslia, 04 de maro de 2002. Seo 1, p. 10.

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    Aceito para publicao em 12/2004

  • Revista da ABENO 5(1):19-22 19

    sendo bem assimilado pelo aluno.O objetivo deste trabalho apresentar um kit ra-

    diogrfico que permite demonstrar, de modo bastan-te objetivo, os fundamentos e interpretao das tcni-cas radiogrficas de Clark e de Bramante, Berbert3.

    CONSTITUIO DO KITO kit constitudo de uma caixa plstica, placa

    plstica simulando as posies das razes/canais, ra-zes artificiais e mini lanterna (Figura 1).

    A caixa plstica tem as dimenses de 10,0 cm x 7,0 cm x 2,5 cm, a qual, alm de servir para acondi-cionamento das peas do kit, tem uma tampa desli-

    RESUMOEntre os sistemas de aprendizado muito impor-

    tante que o aluno se familiarize com as tcnicas radio-grficas das quais far uso na clnica, principalmente na Endodontia.

    Neste trabalho apresentado um kit radiogrfico com o qual o aluno pode aprender melhor as tcnicas radiogrficas de Clark e de Bramante, Berbert. Esse kit de fcil confeco, baixo custo e fcil de trans-portar.

    DESCRITORESRadiologia, educao. Ensino. Radiografia dent-

    ria.A Odontologia, em suas diversas especialidades, tem procurado meios de ensino pr-clnico, de modo a permitir ao aluno aprender mais facilmente tcnicas para serem aplicadas aos pacientes. Desse modo, manequins e modelos para o ensino da Endo-dontia, Dentstica, Periodontia, Ortodontia, Cirurgia tm sido preconizados1,2,4-7. A busca de novos modelos de ensino tem sido uma constante por parte dos pro-fessores.

    Na Endodontia a utilizao das tcnicas radiogr-ficas, principalmente a de Clark e de Bramante, Ber-bert de extrema importncia3. Seu ensinamento por meio de slides, multimdia, apesar dos inmeros re-cursos disponveis nos dias atuais, nem sempre acaba

    Kit radiogrfico para ensino de tcnicas radiogrficasO kit radiogrfico um recurso que permite demonstrar, de modo bastante objetivo, os fundamentos e a interpretao das tcnicas radiogrficas de Clark e de Bramante, Berbert, facilitando o aprendizado do aluno.Clovis Monteiro Bramante*, Ivaldo Gomes de Moraes*, Norberti Bernadineli*, Roberto Brando Garcia*, Alexandre Silva Bramante**

    * Professores de Endodontia da Faculdade de Odontologia de Bauru da Universidade de So Paulo. E-mail: [email protected].

    ** Doutor em Endodontia pela Faculdade de Odontologia de Bauru da Universidade de So Paulo.

    Figura 1 - Kit com seus diversos componentes.

  • Revista da ABENO 5(1):19-22

    Kit radiogrfico para ensino de tcnicas radiogrficas Bramante CM, Moraes IG, Bernadineli N, Garcia RB, Bramante AS

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    zante que utilizada para a projeo das imagens (Figura 2).

    A placa mede 6,5 cm x 6,5 cm x 2,5 cm e nela, de um lado, so confeccionadas perfuraes que permi-tem posicionar as diferentes razes para a aplicao da tcnica radiogrfica de Clark (Figura 3) e do outro lado tem-se um grfico para a interpretao da tcni-

    ca radiogrfica de Bramante, Berbert (Figura 4).As razes simuladas so confeccionadas a partir de

    um pino de metal ao redor do qual aplicada resina acrlica dando-lhe uma forma de raiz (Figura 5). Essas razes so em nmero de 5 e que sero utilizadas nas diferentes posies correspondentes s razes do den-te que se pretende analisar. Uma outra raiz simulada confeccionada do mesmo modo, porm um outro pino nela introduzido, simulando uma perfurao e que ser utilizada na tcnica de Bramante, Berbert (Figura 6).

    Uma mini lanterna com luz LED empregada si-mulando a projeo dos feixes dos raios X (Figu-ra 7).

    UTILIZAO DO KITUma vez aberta a caixa e colocada a tampa na par-

    te de trs, monta-se a placa com o esquema para a tcnica radiogrfica de Clark ou de Bramante, Ber-bert. Se a primeira for a escolhida, dispe-se as razes de acordo com o dente no qual se realizar a anlise. Assim por exemplo, se a interpretao for para o pr-molar superior se coloca duas razes correspondentes a vestibular e palatina (Figura 8); se for molar inferior coloca-se as trs razes correspondentes as razes me-siovestibular, mesiolingual e distal (Figura 9) e assim sucessivamente dependendo do dente a ser analisa-do.

    Figura 2 - Componentes do kit dentro da caixa.

    Figuras 5 e 6 - Razes simuladas (5). Raiz simulada com perfurao (6).

    5 6

    Figura 7 - Mini lanterna.

    Figura 8 - Simulao da posio das razes do pr-molar superior.

    Figuras 3 e 4 - Placa com as perfuraes para a tcnica de Clark(3). Placa com o esquema da tcnica de Braman-te, Berbert (4).

    3 4

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    Kit radiogrfico para ensino de tcnicas radiogrficas Bramante CM, Moraes IG, Bernadineli N, Garcia RB, Bramante AS

    Se a tcnica a ser analisada for a de Bramante, Berbert, o dente com a perfurao simulada coloca-do sobre a placa que contm o grfico, colocando-se a perfurao para o lado em que se deseja fazer a anlise (Figura 10).

    Em ambos os casos, com o auxlio da mini lanter-na se efetuar a iluminao pela frente, do lado direi-to ou do lado esquerdo, simulando uma radiografia orto, msio e distorradial (Figuras 11 e 12).

    Com as sombras projetadas possvel transmitir ao aluno o sistema de interpretao para as duas tc-nicas.

    DISCUSSOOs professores tem procurado alternativas de en-

    sino in vitro, daquilo que o aluno realizar in vivo, de tal modo a diminuir as suas dificuldades prticas. Um

    Figura 9 - Simulao da posio das razes do molar in-ferior.

    Figura 10 - Raiz com perfurao simulada para a inter-pretao da tcnica de Bramante, Berbert.

    Figura 11 - Imagem das sombras para interpretao da tcnica radiogrfica de Clark em pr-molar superior.

    Figura 12 - Imagem das sombras para interpretao da tcnica radiogrfica de Clark em molar inferior.

    dos problemas para o aluno, apesar dos recursos au-diovisuais disponveis no dia atual, assimilar o ensi-namento de algumas tcnicas radiogrficas, principal-mente a de Clark e a de Bramante, Berbert.

    A utilizao do kit radiogrfico como ora propos-to tem propiciado esse tipo de ensinamento, uma vez que o aluno pode acompanhar com maior detalhe o que est ocorrendo e conseqentemente facilitar sua compreenso.

    Trata-se de um dispositivo fcil de ser confeccio-nado, leve, fcil de se transportar e que de um modo bastante objetivo facilita o ensinamento ao aluno.

    CONCLUSOO uso do kit radiogrfico propicia maior facilidade

    de aprendizado por parte dos alunos no que diz res-peito a ensino de tcnica radiogrfica. Outras adapta-

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    Kit radiogrfico para ensino de tcnicas radiogrficas Bramante CM, Moraes IG, Bernadineli N, Garcia RB, Bramante AS

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    es podero ser feitas para facilidade de ensino de outras tcnicas.

    ABSTRACTRadiographic kit for teaching radiographic techniques

    It is important that students become acquainted with the radiographic techniques that will be used in clinic, especially in endodontics. This paper presents a radiographic kit a model for teaching radiograph-ic techniques which is easy to make and transport, and enables students to learn radiographic tech-niques.

    DESCRIPTORSRadiology, education. Teaching. Radiography,

    dental. REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS 1. Bramante CM, Mondelli J, Berbert A. Confeco de manequim

    Voc, professor/pesquisador, participeda apresentao da categoria Pesquisa-Ensino na 22 Reunio da SociedadeBrasileira de Pesquisa Odontolgica.

    REUNIODA SBPqOREUNIODA SBPqO

    Informaes no site: www.sbpqo.org.br

    para o ensino da tcnica endodntica. Estomatol Cult 1971; 5(1):94-100.

    2. Bramante CM, Berbert A, Mondelli J. The use of bovine mandibles for teaching endodontic surgical skills. J Endod 1981;7(6):282-3.

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    Aceito para publicao em 12/2004

  • Revista da ABENO 5(1):23-31 23

    RESUMOO sistema educacional, responsvel pela formao

    mais ampla do indivduo, no est preparado para avanar no ritmo das trocas tecnolgicas que ocorrem na sociedade. necessrio buscar novas abordagens para a capacitao de professores, que seja interessan-te, estimulante e que possa propiciar resultados satis-fatrios dentro da nova viso tecnolgica. Como for-ma de amenizar as dificuldades encontradas na formao do cirurgio-dentista, bem como disponibi-lizar aos profissionais da Odontologia um modelo para um ambiente de ensino, treinamento e/ou edu-cao continuada, a baixo custo e de maneira eficien-te, foi proposto um modelo para um ambiente virtual de ensino/aprendizagem via web, tendo como estu-do de caso a Periodontia. Tal modelo baseia-se na tecnologia de agentes.

    DESCRITORESEducao a distncia. Tecnologia educacional.

    Programas de auto-instruo por computador.A globalizao dos mercados e das indstrias de comunicao est conduzindo a uma rpida evoluo da alta performance dos computadores e

    comunicaes. As infra-estruturas de informao re-gional, nacional e global, esto desenvolvendo a melhoria das habilidades para sentir, atuar, e apren-der no processo de aprendizagem, ultrapassando as barreiras de tempo e distncia. A maneira como a informao criada, deliberada e usada nos negcios, no governo e sociedade est mudando rapida-mente2.

    Os educadores tm, continuamente, desenvolvido e aplicado novos tratamentos instrucionais para me-lhorar os resultados da aprendizagem. A utilizao da tecnologia da informao, para aplicao dos princ-pios pedaggicos, tem sido centrada na criao de ferramentas computacionais em que os estudantes possam manipular para completar a sua memria e inteligncia na construo de modelos mentais mais exatos4.

    O uso da tecnologia vem se difundindo de forma muito rpida na educao e na rea da sade. Nesta rea, a educao demorada e continua atravs de anos de prtica. Com o uso intensivo de tecnologias, tem-se procurado propiciar melhores condies e fa-cilidades para o apoio do processo de ensino/apren-dizagem e aquisio de habilidades, atendendo, desta forma, s crescentes demandas por profissionais capa-

    Utilizao da tecnologia de agentes para um ambiente virtual de ensino/aprendizagem em PeriodontiaNa busca por novas abordagens para capacitao de professores, proposto um modelo para ambiente de ensino, treinamento e/ou educao continuada, a baixo custo e de maneira eficiente.Anita Maria da Rocha Fernandes*, Ana Paula Soares Fernandes**, Raphael Luiz Nascimento***

    * Doutora em Engenharia de Produo, rea de concentrao Cincia da Computao, pela Universidade do Vale do Itaja. E-mail: [email protected].

    ** Professora da Disciplina de Periodontia do Departamento de Estomatologia da Universidade Federal de Santa Catarina.

    *** Graduado em Cincia da Computao pelo Centro de Cincias Tecnolgicas da Terra e do Mar da Universidade do Vale do Itaja.

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    Utilizao da tecnologia de agentes para um ambiente virtual de ensino/aprendizagem em Periodontia Fernandes AMR, Fernandes APS, Nascimento RL

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    citados5.Em relao ao aprendizado e treinamento de pro-

    fissionais da rea da sade, principalmente cirurgies, normalmente so requeridos cerca de cinco a sete anos, o que, na rea odontolgica especificamente, acontece na maioria das vezes dentro do prprio con-sultrio, aps a concluso do curso, sem um acompa-nhamento especializado.

    Durante o curso de graduao, o aluno passa por vrias disciplinas correspondentes a clnicas. Porm, a carga horria destas disciplinas varia de universidade para universidade, bem como o tema abordado nas mesmas. Assim, em alguns cursos os alunos ficam res-tritos a uma rea especfica da Odontologia, necessi-tando, assim, de um aperfeioamento ou atualizao em outras reas aps a concluso do curso.

    Mesmo com as disciplinas relativas a clnicas, sejam elas tendenciosas ou no, durante a graduao e cur-sos de especializao, nem sempre possvel fornecer ao aluno situaes complexas e/ou os mais variados tipos de casos clnicos. Isto ocorre porque os pacientes que so triados e atendidos nas clnicas universitrias e/ou de cursos de especializao podem no apresen-tar, e na maioria das vezes no apresentam, todos os casos ideais para o treinamento dos alunos.

    Como forma de amenizar as dificuldades encon-tradas na formao do cirurgio-dentista, no que diz respeito prtica dos conceitos, bem como disponi-bilizar aos profissionais da Odontologia, este artigo apresenta um modelo para um ambiente de ensino, treinamento e/ou educao continuada via web, a baixo custo e de maneira eficiente, baseado em inte-ligncia artificial, mais especificamente na tecnologia de agentes.

    Como a rea de Odontologia muito ampla, o estudo de caso para a elaborao deste modelo foi a rea de Periodontia. A escolha pela disciplina de Pe-riodontia foi feita devido a sua importncia dentro da Odontologia, bem como a grande variao de curr-culos entre as universidades brasileiras para esta dis-ciplina. Em algumas considerada como uma disci-plina especfica e em outras aparece associada a outras disciplinas de uma forma integrada. O atendimento do paciente com quadro clnico de doena periodon-tal pode se tornar um agravante, se o clnico geral no estiver apto a lhe proporcionar um adequado atendi-mento. Nota-se que muito adequado o ensino da Periodontia quando esta uma matria especfica, sendo lecionada em aulas tericas e prticas, onde o aluno participa da clnica realizando procedimentos exclusivamente periodontais.

    Para elaborar este modelo, as seguintes etapas fo-ram cumpridas:

    selecionou-se os contedos a serem abordados pelo ambiente, bem como foi elaborada uma es-tratgia para nivelamento dos alunos;

    realizou-se a modelagem dos componentes cen-trais utilizando uma arquitetura multiagente;

    projetou-se as interfaces; estabeleceu-se os recursos de hardware, software e

    os recursos humanos necessrios; avaliou-se o grau de treinamento a ser fornecido

    aos usurios finais.

    MATERIAIS E MTODOSO ensino da Odontologia ao redor do mundo ain-

    da bastante complexo. Alguns pases adotam as Uni-versidades de Medicina Dentria e conferem o grau de Doutor em Medicina Dentria enquanto outros pases como os EUA oferecem as duas opes. As di-ferenas entre as duas graduaes se aliceram na estrutura curricular, que de essencial importncia para a formao profissional, dificultando a globali-zao do ensino da Odontologia.

    A estrutura curricular dos cursos de Odontologia no Brasil apresenta uma certa variabilidade. Enquan-to em algumas universidades certas disciplinas so oferecidas de forma especfica, em outras, a mesma disciplina est inserida de uma forma integrada com outras disciplinas. Pode-se exemplificar a disciplina de Periodontia I, Periodontia II e Periodontia III. Em outras universidades se apresenta na forma de Clnica Integrada ou ainda pode-se encontrar a disciplina de Periodontia especfica em um semestre e no semestre seguinte de forma integrada.

    Segundo Fernandes4 (2001), esta variedade de currculos leva a uma grande diferena no processo de ensino/aprendizagem. Sendo assim, a formao continuada no presencial de cirurgies-dentistas sur-ge como uma soluo bem interessante. Para isto, al-guns fatores imprescindveis sobre o ensino de Odon-tologia devem ser analisados:

    muitos dos cirurgies-dentistas graduados no buscam os cursos de especializao devido aos al-tos custos e/ou ausncia deste tipo de curso em suas regies e/ou estados;

    durante o curso de especializao, o aluno passa por vrias disciplinas correspondentes a prtica clnica, porm a abordagem destas disciplinas va-ria de universidade para universidade, fazendo com que os alunos fiquem tendenciosos a uma rea especfica da Odontologia, necessitando as-

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    Utilizao da tecnologia de agentes para um ambiente virtual de ensino/aprendizagem em Periodontia Fernandes AMR, Fernandes APS, Nascimento RL

    avaliaes, experincias. Atravs da web, pode-se modificar a forma de ensinar e aprender mais facil-mente tanto em cursos presenciais quanto em cursos a distncia.

    Um computador conectado internet oferece uma nova viso da funo da Informtica na educao, como uma nova mdia educacional, de complemen-tao, de aperfeioamento e de possvel mudana na qualidade do ensino11.

    De acordo com Klering8 (2000), a utilizao da Internet na educao facilita muito processo de ensi-no/aprendizagem e apresenta as seguintes vanta-gens:

    possibilidade de criar ambientes virtuais de apren-dizagem, onde o aluno encontra a matria a ser estudada e as tarefas a serem feitas;

    o processo de aprendizagem pode ocorrer em di-ferentes locais e no s na sala de aula tradicio-nal;

    alunos podem estabelecer seus horrios de estudo de acordo com suas necessidades, podendo gastar mais ou menos tempo que o habitual no aprendi-zado de determinadas matrias;

    possibilidade dos alunos criarem seus programas individuais de estudos e poderem assistir aulas ou palestras em qualquer escola, no havendo distncias;

    o processo de aprendizado deixa de ter um carter passivo e passa a ser mais dinmico e motivador, permitindo que o aprendiz desenvolva mais seu raciocnio, sua autonomia e at a sua capacidade de aprender a aprender e faz com que essas qua-lidades reflitam tanto no seu futuro pessoal quan-to no profissional;

    utilizao de uma gigantesca biblioteca onde encontrada uma infinita variedade de assuntos;

    permite a troca de conhecimentos com outras pes-soas, as quais podem estar at do outro lado do

    sim, de um aperfeioamento aps a concluso do curso;

    apesar das disciplinas relativas s atividades prti-cas nas clnicas, nem sempre possvel fornecer ao aluno situaes complexas e/ou os mais varia-dos tipos de casos clnicos, porque os pacientes que so triados e atendidos nas clnicas universit-rias e/ou cursos de especializao podem no apresentar todos os casos ideais para o treinamen-to dos alunos;

    o aprendizado e treinamento de profissionais da rea da sade, normalmente requerem cerca de cinco a sete anos para se consolidar, o que na rea odontolgica ocorre na maioria das vezes no dia-a-dia no consultrio, aps a concluso do curso, sem um acompanhamento especializado;

    apesar de existir software de apoio ao aprendizado na rea odontolgica, bem como ambientes que disponibilizam vdeos e material didtico, estes foram feitos em pases diversos, principalmente nos Estados Unidos, Inglaterra e Sucia, onde o contedo curricular no semelhante ao das uni-versidades brasileiras.Tendo em vista as dificuldades encontradas no

    processo de educao continuada em Odontologia, enumerou-se os problemas e carncias deste processo, conforme mostra a Tabela 1.

    Como proposta para solucionar estes problemas e diminuir as carncias descritas, um modelo de educa-o a distncia via web foi proposto baseado nas seguintes solues: ambiente web; lgica difusa; agentes inteligentes.

    Ambiente webCada vez mais o computador permite a utilizao

    de recursos poderosos para pesquisar, simular situa-es, testar conhecimentos especficos, descobrir no-vos conceitos, lugares, idias, produzir novos textos,

    Problemas CarnciasCirurgies-dentistas sem especializao Cursos nas regies e/ou locais fora dos grandes centros com custo reduzidoAusncia de padronizao dos currculos das universidades brasileiras Nivelamento dos alunosAtividades prticas com pouca variedade Situaes complexas e/ou os mais variados tipos de casos clnicosAprendizagem e treinamento a longo prazo Falta de acompanhamento especializado a longo prazo para o cirur-gio-dentista recm-formadoSoftware importado que no se adequa a realidade curricular brasileira Ausncia de software e ambientes computacionais que contemplem a realidade curricular brasileira

    Tabela 1 - Relao problemas versus carncias da educao continuada em Odontologia.

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    Utilizao da tecnologia de agentes para um ambiente virtual de ensino/aprendizagem em Periodontia Fernandes AMR, Fernandes APS, Nascimento RL

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    mundo. Nesse caso, a aprendizagem cooperativa possvel atravs da troca de mensagens eletrni-cas (e-mail), vdeo-conferncias e salas de bate-papo (chats);

    maior conhecimento sobre a cultura de outros lugares falando com os prprios habitantes do lo-cal, podendo-se discutir solues de problemas com pessoas de escolas ou universidades diferen-tes, entre outras vantagens.

    Agentes inteligentesUma promissora aplicao de software de apren-

    dizagem o uso da tecnologia de agncia, os chama-dos agentes. Segundo Fernandes4 (2001), um agente uma entidade real ou virtual, imersa num ambiente sobre o qual ela capaz de agir, que dispe de uma capacidade de percepo e de representao parcial deste ambiente, que pode se comunicar com outros agentes, e que possui um comportamento autnomo, conseqncia de suas observaes, de seu conheci-mento e de suas intenes com outros agentes.

    No caso de agentes inteligentes voltados para edu-cao e treinamento, eles so chamados agentes pe-daggicos, os quais interagem com educadores e educandos, de maneira a facilitar o aprendizado7. Os agentes pedaggicos podem adaptar suas interaes instrucionais s necessidades dos estudantes e ao es-tado atual do ambiente de aprendizagem, ajudando os estudantes na superao de suas dificuldades e no aproveitamento das oportunidades de aprendizagem. Eles podem colaborar com os estudantes e com outros agentes integrando ao com instruo. So capazes tambm de fornecer feedback.

    Raciocnio baseado em casosWatson (apud Koslosly9, 1999) define raciocnio

    baseado em casos como um paradigma de resoluo de problemas que envolvem uma aproximao entre o problema atual e um problema resolvido sem suces-so no passado.

    Lee10 (1996) coloca que a filosofia bsica de racio-cnio baseado em casos tentar encontrar a soluo para uma situao atual baseando-se, como compara-tivo, com uma experincia passada semelhante. Seu processo consiste em identificar a situao atual, bus-car na memria a experincia mais semelhante e apli-car seu conhecimento na situao atual.

    Lgica difusaA lgica difusa tem habilidade em criar concluses

    e gerar respostas baseadas em informaes vagas, am-

    bguas e qualitativamente incompletas ou imprecisas. Neste aspecto, sistemas de base difusa tm a habilida-de de raciocinar de forma semelhante a dos humanos. Seu comportamento representado de uma maneira muito mais simples e natural, levando construo de sistemas compreensveis e de fcil manuteno.

    Segundo Bezdec1 (1993), a teoria dos conjuntos difusos uma ampliao da teoria tradicional para resolver paradoxos gerados a partir da classificao tudo ou nada da lgica clssica. Atravs da incorpo-rao deste conceito de graus de verdade, a lgica difusa estende a lgica clssica em dois caminhos. Pri-meiro, os grupos so rotulados qualitativamente (uti-lizando termos lingsticos, tais como: alto, morno, ativo, perto, etc.) e os elementos deste grupo so ca-racterizados variando o grau de pertinncia. Por exemplo, um homem com 1,80 de altura e um homem com 1,75 de altura so membros do grupo alto, em-bora o homem de 1,80 tenha um grau de pertinncia maior neste grupo.

    RESULTADOSO modelo proposto apresenta um ambiente que

    consta basicamente de trs mdulos: mdulo de in-formaes do aluno; mdulo de material instrucional; mdulo de casos virtuais.

    A pessoa que deseja utilizar o ambiente ir acess-lo pela primeira vez fornecendo dados sobre o seu perfil e o seu suposto grau de conhecimento sobre Odontologia. No caso em estudo o conhecimento ser em Periodontia. Aps o cadastro, o ambiente fornece um nivelamento para verificar o real grau de conhe-cimento do usurio. Atravs dos recursos da lgica difusa, o ambiente avalia o contedo curricular que o usurio ir seguir. Por exemplo, caso o usurio j te-nha parado de estudar h mais de dez anos, e o seu nivelamento detectou que o seu conhecimento ficou estagnado, o contedo curricular a ser seguido por ele ser bem diferente do contedo a ser seguido por um usurio que est terminando a graduao agora e deseja se aprofundar em Periodontia.

    O ambiente gerencia o perfil do usurio, o con-tedo instrucional a ele fornecido, bem como os casos do banco de casos virtuais atravs de trs agentes in-teligentes.

    Os agentes inteligentes implementados neste am-biente tm como funo a administrao do ambien-te, realizando tarefas tais como: avaliao do perfil do aluno para estabelecimento das estratgias pedaggi-cas; avaliao das tarefas do usurio; avaliao do grau de conhecimento do usurio e seleo do contedo

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    Utilizao da tecnologia de agentes para um ambiente virtual de ensino/aprendizagem em Periodontia Fernandes AMR, Fernandes APS, Nascimento RL

    instrucional.Um dos agentes avalia as informaes do aluno,

    descobrindo as caractersticas peculiares de cada um a fim de estabelecer as estratgias pedaggicas a serem utilizadas agente de investigao do aluno. Este agente tem a sua estrutura baseada em raciocnio ba-seado em casos e lgica difusa.

    Outro agente fica encarregado da avaliao do contedo instrucional que o aluno deve acessar, com base nas informaes repassadas pelo Agente de In-vestigao do Aluno. Este agente agente de conte-do instrucional recebe o perfil e o desempenho do aluno durante cada etapa do curso e utilizando uma estrutura de sistemas especialistas (sistema baseado em regras3) estabelece o prximo contedo que pode ser acessado pelo aluno de acordo com o seu nvel de conhecimento atual. Este contedo refere-se a aulas, vdeos e testes.

    H ainda um agente encarregado de gerenciar o banco de casos virtuais, interagindo com os outros dois agentes. o agente de casos virtuais. O aluno no tem acesso irrestrito ao banco de casos. Seu acesso depende das informaes sobre o seu perfil e sobre o contedo que est estudando. Dependendo de sua graduao ele pode ter tido mais ou menos tempo de clnica (prtica), sendo assim, este o ponto chave para estipular os tipos de casos a estudar. De acordo com o perfil do aluno, este agente cria grupos de tra-balho para a soluo dos casos.

    O ambiente aqui descrito utilizou o mtodo do vizinho mais prx