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Parte VII Diversidad y Educación

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Parte VII Diversidad y Educación

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Universidade da floresta: um desafio para o diálogo entre os saberes

Anailton Guimarães SALGADO Mestre em Educação

Docente da Universidade Federal do Acre – Campus da Floresta Doutoramento em Pós Colonialismo de Cidadania Global

[email protected] Resumo

Este texto apresenta uma reflexão sobre a criação da Universidade da Floresta em Cruzeiro do Sul/Acre, região da Amazônia brasileira, focalizando em sua proposta matriz o estudo da biodiversidade e o manejo sustentável da floresta, bem como uma formação voltada para o ensino, pesquisa e extensão. Destacaremos a universidade como espaço importante na construção da cidadania, da identidade, da pluralidade de saberes e culturas, considerando que sua estrutura formativa de educação procura integrar os conhecimentos tradicionais dos habitantes da floresta (seringueiros, indígenas, pescadores, dentre outros), ao conhecimento científico, com ênfase na defesa das questões ambientais e de sustentabilidade. Apresentaremos ainda seus componentes estruturais: o Centro de Formação e Tecnologias da Floresta e o Instituto da Biodiversidade e Manejo Sustentável dos Recursos Naturais, que buscam associar e valorizar os conhecimentos produzidos pelas populações ribeirinhas.

Palavras-chave: Universidade da Floresta, cidadania, Saberes, Educação. Abstract University of the Forest: A Challenge for dialogue among knowledges. This paper presents a reflection on the creation of the University Forest in Cruzeiro do Sul, Acre, Brazil's Amazon Region, focusing on its proposed array the study of biodiversity and sustainable forest management, as well as training focused on teaching, research and extension. We will highlight the university as a space in the construction of citizenship, identity, knowledge and the plurality of cultures, whereas its formative structure of education seeks to integrate the traditional knowledge of forest dwellers (rubber tappers, Indians, fishermen and others), knowledge science, with emphasis on protection of environment and sustainability. Still present structural components: the Center for Training and Technology and the Forest Institute of Biodiversity and Sustainable Management of Natural Resources, seeking to involve and use the knowledge produced by the riverside.

Keywords: Forest University, Citizenship, Knowledge, Education.

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Universidade da Floresta: um desafio para o diálogo entre saberes

ara refletir sobre a formação superior com expectativas de um ensino de qualidade, faz-se necessário compreender todo o conjunto de funcionamento das universidades, procurando perceber no desenvolvimento de suas ações, algumas necessidades

básicas dentre muitas outras mais complexas, como a ampliação do acesso, a socialização do conhecimento e a formação de cidadãos. Contudo, é importante destacar que a ação formativa oferecida pelas universidades, possa integrar a pesquisa, o ensino e a extensão, tornando-se potencializadora na proposta de garantia do acesso, essencial para o exercício da cidadania e para a disseminação do conhecimento, gerando assim mudanças que possibilitem um novo olhar institucional.

A dinâmica e a velocidade de tais mudanças consideradas como políticas sociais culturais e econômicas, caracterizam o que se convencionou chamar de “novo milênio”, este identificado como as transformações no mundo moderno, emergido pela informatização, globalização e sociedade do conhecimento, fatores estes que pressionam o status quo da vida atual. Porém, esse panorama evidencia a importância da Educação Superior no Brasil que, indubitavelmente, torna a universidade uma das instituições sociais de grande prestígio, por desempenhar seu papel em diversos setores da sociedade contemporânea, formulando outros modelos educacionais, representando assim importantes valores na sociedade brasileira, mas que precisa rever sua filosofia enquanto fomentadora do conhecimento.

Segundo Santos (2005), é preciso identificar idéias que devem presidir a uma reforma criativa, democrática e emancipatória da universidade pública. No entanto, é necessário definir o sentido político da resposta a tais desafios para estimular os sujeitos, a responder positivamente às demandas sociais pela democratização da universidade, acabando com a exclusão de grupos sociais e saberes dos quais a universidade tem sido protagonista ao longo do tempo, definindo seu papel na resolução coletiva dos problemas sociais, sejam locais ou nacionais.

Nesse sentido, a universidade do século XXI deve ser pensada a partir de novas perspectivas, tornando-se mais aberta às modernas dinâmicas da globalização e de formação continuada, uma vez que a sociedade deixou de ser um nicho estável, como mera espectadora, para se transformar numa autêntica efervescência de constantes mudanças, ambas inseridas no discurso das novas ciências. Como proclama Almeida quanto ao surgimento de um novo estilo de universidade e de ciência:

Um novo estilo de ciência e de universidade está emergindo. E emergindo pelas nossas mãos, pelos nossos corpos e pelas nossas mentes. A julgar pelo fluxo intenso das comunicações no planeta, ela está nascendo simultaneamente no âmbito local, nacional e transnacional. A riqueza dessa ciência nova, imersa em tempos de incerteza, está no fato de que, já à nascença, ela é híbrida em seus pertencimentos, e, quiçá, possa ser polifônica no diálogo. Esse novo estilo de dialogar com o mundo certamente poderá realimentar uma universidade capaz de expressar uma ética da cumplicidade planetária (2002, p. 31).

Em consonância com esse novo olhar e outro estilo de ciência, foi realizado em 2003, na cidade de Cruzeiro do Sul/AC, Amazônia –Brasil, um seminário intitulado de Universidade do Século XXI na Floresta do Alto Juruá, com o objetivo de criar subsídios para implantação de

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um novo projeto de desenvolvimento regional sustentável, baseado na educação superior, na formação e qualificação profissional e na pesquisa. O referido seminário foi um marco histórico para a região e vislumbrou a articulação entre comunidade acadêmica, representantes da sociedade civil, do governo do Estado do Acre e do governo federal, reunindo mais de 500 pessoas distribuídas entre docentes e discentes de diferentes níveis de ensino, mais de 80 organizações governamentais e não-governamentais e demais representantes da sociedade civil de Cruzeiro do Sul e municípios vizinhos.

O envolvimento efetivo da comunidade científica foi fundamental para os estudos, as pesquisas e a implantação de políticas governamentais que visam fortalecer uma educação com sustentabilidade pedagógica e científica. A articulação entre Academia, Estado e Sociedade na busca de soluções para o desenvolvimento regional sustentável é imprescindível.

A construção social desse projeto teve como princípio a edificação de inovações necessárias para a gestão sustentável dos recursos naturais, o bem estar social das populações rurais, ribeirinhas e, principalmente, a implantação de mecanismos de conservação e usufruto econômico da biodiversidade genética, de espécies e paisagens da rica região do Alto Juruá – Acre. Nesse contexto, surge então a Universidade da Floresta, implantada oficialmente em 2006, que assume em sua proposta a importância dos saberes tradicionais e das alternativas para o desenvolvimento sustentável da Amazônia, considerando a proteção à biodiversidade e os conhecimentos da tradição, ao mesmo tempo em que os compreende como o elo e locus entre os acadêmicos e os mestres da floresta, ou seja, uma integração entre ciência, conhecimento da tradição e políticas de governo.

O olhar e as expectativas para a implantação dessa universidade pode ser observado em Lima (2006) através de depoimentos que se seguem:

....Acreditamos que esse conceito novo trará aos trabalhadores extrativistas algo que nunca tiveram: o respeito da universidade às suas tradições e seus costumes. São pessoas que têm uma tradição, uma história. São acadêmicos da floresta, com suas ciências conhecedoras dos animais, dos indicadores de sol e chuva, dos povos indígenas e sua história, dos produtos da floresta. (apud LIMA, 2006, p. 16).

Nosso maior desafio será trazer o conhecimento tradicional do ribeirinho, do caboclo e do indígena para dentro da academia. Elaborar esse conhecimento em associação com a ciência...(apud LIMA, 2006, p. 17).

[...] o momento que vivemos hoje mostra que estamos de fato redescobrindo o valor do Acre, do nosso povo e de nossa floresta. Cada vez mais espero que possamos fazer deste seminário um marco real na nossa história, orientando nosso trabalho com base nos conceitos do diálogo entre o conhecimento científico e o tradicional e nos valores da florestania. (apud LIMA, 2008, p. 16).

Há muitos desafios neste projeto para os quais eu não tenho respostas. Precisamos, mais que tudo, discutir coletivamente estratégias eficientes para encontrarmos respostas satisfatórias ao longo dos próximos anos. (apud LIMA, 2006, p. 17).

Vamos trabalhar para construir um projeto pedagógico diferente dos cursos tradicionais, sem repetir o modelo da sede, para promover uma interação entre o conhecimento acadêmico e

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o conhecimento dos povos tradicionais [...] o objetivo maior é que possamos fazer uma relação mais abrangente [...]. Trabalhar com essa idéia de quebra de paradigma. (apud LIMA, 2006, p. 39).

O reconhecimento dos saberes e das experiências dos indígenas, seringueiros, mateiros, agricultores, ribeirinhos, dentre outros, impulsionou o projeto ousado da Universidade da Floresta, ora estabelecido como fortalecimento e expansão do ensino superior na região acreana. Dessa forma, a proposta de sua criação passa a representar um novo paradigma para o conceito de Universidade, considerando, primordialmente, o convívio diário dos povos e populações tradicionais entre si e com a natureza.

A articulação dos saberes é instituída como um dos grandes desafios da Universidade da Floresta, desencadeando vários debates internos e externos que venham suscitar o entendimento da paridade entre o conhecimento acadêmico e os saberes tradicionais. Esse desafio torna-se ainda maior por ser novo e por buscar a compreensão de que o conhecimento se constrói não só na Academia, mas, também, nas comunidades tradicionais.

Com essa nova perspectiva de universidade, os saberes da tradição, anteriormente compreendidos na constituição acadêmica clássica como um estágio anterior a explicação científica, passam a ser percebidos como uma “ciência primeira” ou “ciência neolítica”, de acordo com expressões utilizadas por Claude Lévi-Strauss (2006), e para Almeida (2004, p. 130) “essa ciência primeira convive lado a lado com o desenvolvimento das tecnociências no mundo planetarizado.” Essa forma de perceber os saberes da tradição ultrapassa a idéia de que esses conhecimentos são apenas objetos de estudos da ciência clássica, que os traduz a partir dos estudos científicos, metodologicamente construídos e validados.

No entanto, fica evidente que a proposta da Universidade da Floresta está pautada em um processo de ruptura com um fazer acadêmico que prioriza o conhecimento científico em detrimento as outras formas de conhecimento. Percebemos que essa instituição de ensino superior atende ao convite de construção de um diálogo entre a cultura científica e as demais formas de saberes, reconhecendo assim que a ciência é uma maneira de explicar o mundo, não a única ou a melhor.

Afinal como nos lembra Almeida (2001, p. 55),

É preciso, de início, dizer que, dada a incomunicabilidade entre os dois tipos de saberes e a necessidade da resolução dos problemas postos, o saber tradicional ainda se constitui como funcional e, neste sentido adequado às populações humanas. Na ausência da ciência é a ele que se recorre para o enfrentamento de problemas técnicos de produção, para o conhecimento dos fenômenos do ecossistema, para a fixação de regras de conduta, para o acesso às idealidades mais amplas e inconscientes.

Nesse sentido, é pertinente que o reconhecimento dos saberes dos povos da floresta, representa um enorme avanço no contexto de uma universidade brasileira, devendo ser visto como um primeiro exercício que deve ser refletido e tomado como exemplo em outros espaços universitários, permitindo assim a construção de uma universidade que possa enfrentar os desafios impostos pelo século XXI.

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Além da dimensão formativa proporcionada pelo ensino acadêmico, a Universidade da Floresta (UNIFLORA) é constituída pelos componentes estruturais: o Centro de Formação e Tecnologias da Floresta (CEFLORA), cujo objetivo é o da qualificação profissional, de modernização e desenvolvimento tecnológico voltadas para a formação humana e a inclusão social; o Instituto da Biodiversidade e Manejo Sustentável dos Recursos Naturais (IB), responsável pela nucleação de projetos de ciência e tecnologia capazes de responder a demandas ecológicas e sócio-econômicas locais; e o próprio Campus Floresta, que trouxe o fortalecimento dos cursos de graduação já existentes à época do Campus UFAC e a oferta de novos cursos, criados a partir da demanda e da realidade local.

Estes componentes tornam-se, portanto, as unidades básicas do novo modelo de se fazer pesquisas científicas sobre a biodiversidade amazônica, com respeito à pluralidade cultural da região e aos direitos das comunidades indígenas, seringueiras e ribeirinhas. Juntos, associam e valorizam os conhecimentos produzidos pelas populações tradicionais, reconhecidos como relevantes na formação e na aplicação dos saberes em outros espaços.

Assim entendida, a Universidade da Floresta constitui um modelo de integração entre a academia, Estado e sociedade na execução de projetos de desenvolvimento regional na Amazônia, cujas missões podem ser assim explicitadas em seu Projeto Executivo:

Fomentar o processo de desenvolvimento na Amazônia Ocidental, tendo como meta o bem-estar humano apoiado no uso sustentável e conservação dos recursos naturais.

Gerar, através da pesquisa e do ensino, um modelo de conservação, manejo e planejamento regional com ampla participação comunitária, no contexto dos sistemas socioculturais e econômicos da região.

Disseminar o conhecimento científico e tecnológico, e incluir do processo de produção e aplicação do conhecimento as populações da floresta, tornando-as parceiras na busca de soluções para o uso sábio, justo e eficiente do potencial do Estado do Acre.

Reconhecer e proteger os direitos intercalares dos povos indígenas e das comunidades tradicionais, contribuir para a justa repartição dos benefícios da biodiversidade.

Interiorizar as atividades de ciência e tecnologia na região, criando novos pólos de ensino, pesquisa e desenvolvimento como início de uma rede de campi avançados de ensino, pesquisa e formação também em outras micro-regiões.

Apoiar experiências positivas que contribuam para o bem-estar humano e para a continuidade de serviços ecossistêmicos e a conservação das riquezas biota do sudoeste amazônico.

Ousar realizar um projeto científico, tecnológico e social que esteja inserido na vanguarda da ciência; consolidando e ampliando a capacidade de pesquisa já desenvolvida no Estado (Universidade, 2004, p. 5-6).

Para melhor compreensão, podemos conhecer algumas estratégias e o impacto que esta Universidade trará para a região:

- A ampliação e interiorização da Universidade Federal do Acre, combinando programa de ensino e pesquisa e formação técnica e com o foco principal na conservação no uso sustentável dos recursos naturais. A Universidade da Floresta estabelecerá também vínculos

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com Parques Nacionais. Reservas Extrativistas e Terras Indígenas; com Associações Indígenas, de Extrativistas e de Agricultores; e com núcleos de pesquisa e extensão da administração federal, estadual e municipal, bem como com organizações não-governamentais, sempre com o fito de promover e apoiar o desenvolvimento sustentável, na forma de conhecimentos básicos e de tecnologias adequadas para o manejo dos recursos e para o monitoramento da qualidade de vida e da integridade dos ecossistemas naturais.

- Um ensino de graduação forte, com o objetivo de preparar alunos para agir como profissionais em diversos ramos de conhecimento com ênfase em experiência de campo, de pesquisa e de ensino. Os graduados do programa UFAC/Universidade da Floresta combinarão a capacidade para agir com autonomia dentro da sua área de conhecimento, com a capacidade de se relacionarem com outros seguimentos da sociedade nas escalas local, regional e global e de contribuir para o desenvolvimento regional. Para que isto aconteça, faz-se necessário: saber como aprender, como fazer pesquisa, como comunicar-se com os outros (por escrito e oralmente), como ensinar e como raciocinar e intervir de maneira interdisciplinar.

- A criação de mecanismos de amparo à pesquisa, articulados a políticas de âmbito regional e estadual, uma Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado do Acre, em combinação com políticas federais de regionalização da pesquisa avançada, é um dos possíveis mecanismos nessa direção. O estabelecimento de um centro de pesquisa do porte do Instituto da Biodiversidade num estado que já conta com um centro emergente de excelência (UFAC) demanda necessariamente a criação de uma Agência que possa canalizar recursos para projetos de pesquisa delineados para amparar a concretização de políticas públicas.

- O estabelecimento de mecanismos de integração de experiências em níveis regional e internacional, construindo um sistema de informação e comunicação para subsidiar decisões coletivas sobre a conservação e uso sustentável da biodiversidade. Para tanto, a Universidade da Floresta buscará, a partir da base formada pela Universidade Federal do Acre e dos projetos de cooperações científicas nacionais e internacionais já existentes, atrair a cooperação técnica de centros de Pesquisa da Amazônia e do País, visando formar recursos humanos e colocar a pesquisa e o ensino nos mais altos padrões internacionais. A pesquisa terá como referência a proteção dos conhecimentos tradicionais de populações indígenas e de comunidades locais, sobretudo àqueles associados ao patrimônio genético, e respeitando ainda os processos tradicionais de produção e difusão desses conhecimentos. Esta rede de campi deverá promover atividades na região sudoeste da Amazônia para estimular o intercâmbio de experiências numa rede internacional de pesquisa dos povos da floresta, fortalecendo as relações culturais e econômicas entre Brasil, Peru e Bolívia (Universidade, 2004, p. 5-7). Conhecendo a estrutura organizacional da Universidade da Floresta:

Centro de Formação e Tecnologias da Floresta-CEFLORA

O CEFLORA é uma unidade descentralizada do Instituto Estadual de Educação Profissional Dom Moacyr Grechi, antiga Gerência de Educação Profissional – GEPRO, elevada à categoria de Autarquia Estadual através da Lei nº 1.695 de 21 de dezembro de 2005 e se associa a estratégia geral da Universidade da Floresta.

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O CEFLORA é criado visando a construção de uma rede de ensino associada à pesquisa e ao planejamento ecológico-econômico local e regional, com a participação de ribeirinhos, seringueiros, agricultores, etnias indígenas e segmentos urbanos e que atuará em interação com as organizações populares que têm potencial para atuar como centros. A implantação deste Centro na cidade de Cruzeiro do Sul converge para a estratégia de criação da Universidade da Floresta, ficando sob a responsabilidade do Governo do Estado do Acre. Fundamenta-se ainda na construção de um programa de desenvolvimento regional capaz de se conservar e utilizar sustentavelmente os abundantes recursos naturais do Estado. A missão do CEFLORA é de mediadora e disseminar o conhecimento científico e tecnológico, levando neste processo de produção e aplicação do conhecimento, as populações da floresta, possibilitando interação entre academia, estado e sociedade. Instituto da Biodiversidade e Manejo Sustentável dos Recursos Naturais - IB

O Instituto da Biodiversidade, vinculado administrativa e regimentalmente a Universidade Federal do Acre, determina a nucleação de projetos de ciência e tecnologia em resposta a demandas ecológicas e sócio-econômicas legais, formando as futuras gerações para assumir a vanguarda do desenvolvimento ecologicamente orientado.

O desenvolvimento de suas pesquisas deverão estar integradas às atividades do CEFLORA e do Campus Floresta, principalmente no fomento de uma interação contínua entre pesquisadores, moradores e planejadores e no apoio a transformação social auto-gerida. Seus pesquisadores deverão apoiar o planejamento participativo da conservação e uso comum de recursos, tanto em aspectos técnicos, como no plano gerencial e político.

Seus projetos temáticos também serão incorporados como ações de pesquisa do Instituto de Biodiversidade, a seguir:

a. Projeto temático 1 – Desenvolvimento de métodos de pesquisam e monitoramento participativo de ecossistemas e da qualidade de vida.

Objetivo: - desenvolver métodos de pesquisa e monitoramento dos ecossistemas e da qualidade de vida na Reserva Extrativista do Alto Juruá, sob a responsabilidade da população local.

b. Projeto temático 2 – Preparação de informações para a gestão da bacia binacional do rio Alto Juruá com base nas experiências na bacia trinacional do rio Acre.

Objetivo: - desenvolver uma base de informações da bacia do rio Alto Juruá que subsidiará pesquisas de biodiversidade e de ecologia de paisagem, além de iniciar uma rede binacional de pesquisa para apoiar a gestão desta bacia.

c. Projeto temático 3 – Manejo de sementes de espécies nativas do vale do Juruá.

Objetivo: - subsidiar programas de manejo de sementes nativas de interesse econômico, com a capacitação local e desenvolvimento de estudo de comportamento ecofisiológico das espécies sob condições naturais.

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d. Projeto temático 4 – Plantas fibrosas com potencial econômico

Objetivo: - investigar a distribuição, uso local, manejo, sistema de beneficiamento, comercialização e potencial mercadológico das plantas com fibras e produtos derivados no mercado regional.

e. Projeto temático 5 – Agrobiodiversidade e conhecimentos tradicionais associados no Alto Juruá.

Objetivo: - entender quais são os processos de construção da diversidade de plantas cultivadas, como se inserem em um referido contexto ecológico, econômico e sociocultural, visando definir indicadores do estado da agrobiodiversidade que poderão ser comparados em nível intra ou inter-regional (Lima, 2006). Campus Floresta

A Universidade da Floresta, já destacada anteriormente, propõe a melhoria da formação graduada e pós-graduada, com a participação de organizações sociais, de seringueiros e grupos indígenas da região, por pesquisadores de várias universidades e centros de pesquisa no desenvolvimento da integração das populações da floresta ao processo de produção do conhecimento e melhoria da qualidade de vida da população em bases sustentáveis.

Com este propósito, o Campus Floresta assume a responsabilidade de promover a integração das experiências em nível regional, construindo um sistema de informação e comunicação para subsidiar decisões coletivas sobre a conservação e uso sustentável da biodiversidade. Um dos focos de ação da Universidade será a formação dos recursos humanos na região. Terá como referência dessa formação, os conhecimentos tradicionais de populações indígenas e de comunidades locais. Os processos tradicionais de produção e difusão de conhecimento serão respeitados e protegidos.

Uma das grandes defesas deste projeto, é que no âmbito da Universidade da Floresta, os moradores locais não serão objetos de estudo ou habitantes das áreas de estudo, mas eles passarão a ser agentes multiplicadores de reflexão e planejamento local, participando diretamente tanto das atividades de pesquisa e manejo como da aplicação das políticas ecológico-econômicas em escala regional. Para tanto, o Campus Floresta será essencial para catalisação e aplicação das verbas federais e estaduais num contexto de diálogo e formação de pensamento crítico, incentivando a conservação e uso sustentável da biodiversidade em contexto legal diverso. (Universidade, 2004).

Vale destacar a importância de adaptar a legislação às necessidades da transversalidade e flexibilidade acadêmica e não limitar esses últimos objetivos por instrumentos superados. Para isso, será necessário um diálogo interdisciplinar que incorpore a Universidade Federal do Acre e todos os setores da sociedade, para propor soluções criativas e viáveis em contextos variados.

Sabemos que a trajetória de implantação de uma universidade suscita a importância do contexto a qual ela se insere dentro da perspectiva do sustentáculo ensino, pesquisa e extensão. Seu fortalecimento se constrói na inter-relação de tais bases, numa perspectiva de

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expansão de ações, onde o conhecimento se torna o meio mobilizador não só de uma cultura diversificada, mas também da atitude do espírito humano para propor e solucionar problemas.

Nesse contexto de mudanças, a reforma da Universidade, segundo Almeida e Carvalho (2005, p. 21) corroborando com as idéias sobre reforma do pensamento de Morin, tem um objetivo vital: uma reforma do pensamento que viabilize e permita o emprego total da inteligência. Trata-se de uma reforma não pragmática, mas paradigmática, concernente à nossa aptidão para organizar o conhecimento.

No surgimento de uma nova universidade, no caso aqui a Universidade da Floresta, é necessário que se defina que tipo de conhecimento se quer buscar, tendo em vista a filosofia de agregar as diferentes culturas que deverão estar sendo desenvolvidas através de sua missão institucional.

O conhecimento, segundo Morin (2005, p. 20), “*...+ torna-se pertinente quando é capaz de situar toda a informação em seu contexto e, se possível, no conjunto global no qual se insere.” É nesse sentido que devem ser vistas as diferentes informações obtidas nos diferentes cursos, onde formarão uma gama de saberes que, compartilhados a outros originários da natureza, darão sentido a uma ciência que mostra uma nova dinâmica de fazer e buscar esses conhecimentos.

É notório que o argumento de que a Universidade da Floresta compreende um esforço coletivo pela construção de um espaço institucional de formação que consiga superar um modelo de universidade departamental, disciplinar e com especialidades não comunicantes, e avance para compreender que, hoje a universidade precisa se reconhecer como um espaço plural de acolhimento das diversidades, afinal como nos ensina Morin (2006, p. 81): “A Universidade conserva, memoriza, ritualiza uma herança cultural de saberes, idéias, valores; regenera essa herança ao reexaminá-la, atualizá-la, transmiti-la; gera saberes, idéias e valores que passam, então, a fazer parte da herança. Assim, ela é conservadora, regeneradora, geradora”.

Assim, a universidade representa um lugar distinto para o diálogo entre diferentes formas de conhecimentos, possibilitando um reprocessamento da cultura e da produção de saberes e assumindo a missão de projetar uma história do futuro pela priorização do presente (Almeida, 2002). É importante também compreendermos que para corresponder ao seu papel esta deverá está integrada de forma produtiva com a sociedade, para que possam desenvolver valores, promovendo suas normas e, principalmente, suprindo e atendendo às necessidades que lhe são postas.

Nesta visão, é importante que estejamos abertos para compreender e conhecer as reais necessidades que levam uma Instituição para um processo de reforma e, principalmente, aceitar as devidas mudanças como desafios de um novo fazer. Mas, nada disso será possível se o pensamento não tiver conectado para problematizar e buscar determinada solução, bem como este seja visto como um pensamento complexo capaz de ligar, contextualizar e globalizar, fortalecido por uma transdisciplinaridade.

Esse mesmo reconhecimento nos é apresentado pelo Seringueiro Antônio de Paula (2008) em entrevista realizada para o propósito desta pesquisa.

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Já era uma oportunidade que aguardávamos com ansiedade: o ingresso na ciência dos saberes e foi uma grande honra participar desse processo. Me senti valorizado e pude contribuir para esse grande projeto de relevância para todos, pois contribuímos para um salto no saber para as comunidades do Alto Juruá. [...] o que esperamos no presente é que as oportunidades sejam dadas para todos: ribeirinhos, seringueiros, agricultores, etc e que no futuro, todos possamos nos deslumbrar com um projeto concreto e consolidado em nossa região. (Paula, 2008).

A Universidade da Floresta, nesse movimento, se efetiva enquanto instância de formação de uma inteligência e criação de cultura científica por meio das populações tradicionais e demais grupos que a cercam. Assim, não basta apenas a estrutura física dessa organização, mas a estrutura intelectiva que a forma, por isso, não é suficiente fazer a reforma, mas trazê-la para o bojo de sua criação. Com isso, todos devem caminhar na mesma direção, absorver no pensamento as transformações geradas, inclusive a relação homem-natureza, para que a Universidade assuma de fato seu papel transformador e, ao mesmo tempo preservador do ecossistema.

Nesse sentido, o indígena Daniel Munduruku (2005, p. 65) ressalta que,

[...] se a natureza evolui para seu criador, o que dirá do ser humano? Só há uma coisa a ser dita: se a natureza faz o seu caminho evolutivo, dele o homem não escapará, pois um depende do outro; um é o equilíbrio do outro; um é a razão de ser do outro. O humano faz parte da teia da vida que é composta por todos os seres vivos de nosso planeta.

Diante do expresso por Munduruku (2005) o homem e a natureza estão interligados, na dependência um do outro e, a Universidade, nesse contexto deve ser concebida como lócus de produção de conhecimento para responder as demandas sociais. Considerações finais com ênfase na defesa das questões ambientais e de sustentabilidade. Apresentaremos ainda seus componentes estruturais: o Centro de Formação e Tecnologias da Floresta e o Instituto da Biodiversidade e Manejo Sustentável dos Recursos Naturais, que buscam associar e valorizar os conhecimentos produzidos pelas populações ribeirinhas.

A dimensão das ações desenvolvidas associada aos discursos voltados fortemente para a participação das populações tradicionais nesta universidade, me permitiram perceber o quanto é ousado promover um diálogo entre ambas, pois com esta interação a identificação dos saberes como ponto de ligação que considere primordialmente as experiências de vida das pessoas termina-se por pensar no alargamento de uma educação pautada na sustentabilidade e na preservação do patrimônio da humanidade.

Cria-se com isto, a persistência no investimento do tripê institucional: ensino, pesquisa e extensão na exata medida em que aproxima o conhecimento dos povos da floresta em diferentes aspectos àquele produzido nos muros da Universidade, pois são especialmente estes muros que o conceito de florestania pretende minar e que para isto, apropria-se da persistência do pensamento abissal. Uma forma de reconhecimento que me levou a considerar uma condição necessária a pensar e agir para além dele, com intencionalidade voltada para o outro lado da linha, ou seja, um pensamento não-abissal. Com ele, posso

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aprender com o Sul utilizando a sua própria epistemologia, aquela que estava oculta, invisível e, através da “copresença radical” (Santos, 2010, p. 53) confrontar a monocultura da ciência moderna com uma ecologia de saberes da floresta e de outros lugares. É esta copresença a condição do pensamento pós-abissal permitindo que os saberes e práticas dos agentes envolvidos, possam ser vistos como contemporâneos em termos igualitários (Santos, 2010).

Além disso, esta copresença proporcionará maior visibilidade às experiências desenvolvidas em determinados espaços sociais, o que pode ser compreendido pela sociologia das ausências e pela sociologia das emergências descritas por Santos (2003), com referência ao domínio das experiências sociais.

Portanto, a compreensão destes espaços sociais são a medida e a extensão para alimentar um cultura cidadã, pautada na sustentabilidade, no respeito à pluralidade cultural e étnica presentes no Juruá.

Referências

ALMEIDA, Maria da Conceição Xavier de (2002) “Reforma do Pensamento e Extensão Universitária e Cidadania”. In: XXVI Forum Regional de Pró-Reitores de Extensão das Universidades Públicas Brasileiras: regional Nordeste, 26. Anais. Natal: EDUFRN.

LÉVI-STRAUSS, Claude (2006) O pensamento selvagem. 6. Ed. Campinas- SP: Papirus.

LIMA, Henrique Afonso Soares de (2006). Memorial da Universidade da Floresta: uma conquista histórica para o Alto Juruá. Brasília: Gráfica da Câmara dos Deputados.

MORIN, Edgar (2005) Educação e Complexidade: os sete saberes e outros ensaios. ALMEIDA, Maria da Conceição de; CARVALHO, Edgar de Assis. (Orgs.) 3 ed. São Paulo: Cortez.

MORIN, Edgar (2006) A cabeça bem-feita. Repensar a reforma, reformar o pensamento. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil.

MUNDURUKU, Daniel (2005) Sobre piolhos e outros afagos – conversas ao pé da fogueira sobre o ato de educar (ser). São Paulo: Inverno.

PAULA, Antônio de (2008) Entrevista concedida a Anailton Guimarães Salgado. Cruzeiro do Sul. 10. fev.

SANTOS, Boaventura de Souza (2005) A universidade no século XXI. São Paulo: Cortez.