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1 REIS, J.R.L.; PINHEIRO, E.S.; MACEDO, M. A.. Evolução do desflorestamento (1990-2006) em Áreas Protegidas da Amazônia Central. In: VIII Seminário de Atualização em Sensoriamento Remoto e Sistemas de Informações Geográficas aplicados a Engenharia Florestal, 2008, Curitiba/PR. Anais do VIII Seminário de Atualização em Sensoriamento Remoto e Sistemas de Informações Geográficas aplicados a Engenharia Florestal. Curitiba/PR : FUPEF, 2008. v. 1 EVOLUÇÃO DO DESFLORESTAMENTO (1990-2006) EM ÁREAS PROTEGIDAS DA AMAZÔNIA CENTRAL EVOLUTION OF DEFORESTATION (1990-2006) IN CENTRAL AMAZON PROTECTED AREAS João Rodrigo Leitão dos Reis 1 , Eduardo da Silva Pinheiro 2 , Mariza Alves de Macedo 3 1 Programa de Pós-graduação em Ciências Florestais e Ambientais, Universidade Federal do Amazonas - UFAM. 2 Departamento de Geografia - UFAM, Campus Universitário, Av. Gen. Rodrigo Octávio Jordão Ramos, 3000, 69077-000, Manaus-AM, Brasil. 3 Sistema de Proteção da Amazônia - SIPAM, Av. do Turismo, 1350, 69049-630, Manaus-AM, Brasil. e-mail: [email protected] ; [email protected] ; [email protected] RESUMO A criação e manejo de unidades de conservação na Amazônia é uma das principais estratégias para evitar a ocupação irregular e controle do desflorestamento. Analisou-se a evolução do desflorestamento na Área de Proteção Ambiental Caverna do Maroaga, Presidente Figueiredo - AM, ao longo de 16 anos, e a integridade ambiental das áreas de preservação permanente (APP). Foram utilizados dados do projeto PRODES/INPE, imagens TM/LANDSAT e expedições de campo. Em 1990, 3,8% da área estavam desflorestadas e em 2006 o desflorestamento chegou a 8,8% da unidade de conservação. Ao longo das rodovias BR-174 e AM-240 verificam-se as áreas com maior desflorestamento. Entre as APP, as margens dos igarapés apresentaram-se mais impactadas. Os principais fatores do desflorestamento na unidade de conservação foram os assentamentos rurais, a formação do lago da usina hidrelétrica de Balbina e a pavimentação da BR-174. Para inibição deste processo, uma iniciativa do poder público vem sendo os incentivos à criação de reservas privadas sobrepostas a unidade de conservação e a criação de instrumentos legais, que apóiam o monitoramento e controle do desflorestamento e proíbem novos assentamentos rurais e a construção de estradas vicinais. Palavras-chaves: Amazônia, Desflorestamento, Área de Proteção Ambiental. ABSTRACT The creation and management of conservation units in the Amazon is one of the main strategies to prevent irregular occupation and control of deforestation. It was analyzed the evolution of deforestation in the Caverna do Maroaga Environmental Protection Area, Presidente Figueiredo, Amazonas State, Brazil along 16 years, and the environmental integrity of the permanent preservation areas. It was used data from the project PRODES/INPE, TM/LANDSAT images and field surveys. In 1990, 3.8% of the area were deforested and in 2006, reached 8.8% of the conservation unit. At the BR-174 and AM-240 roads were detected areas with the greatest deforestation. The stream margins were the most deforested, among permanent preservation areas. The main factors of deforestation in this conservation unit were rural settlements, the creation of Balbina hydroelectric lake and paving of BR-174 road. The government has used the creation of private reserves overlapping the conservation unit and the creation of legal instruments that to support monitoring and control of deforestation, prohibit new rural settlements and building secondary roads. Key words: Amazon, Deforestation, Environmental Protection Area. INTRODUÇÃO O processo de ocupação humana na região Amazônica tem sido associado à concentração da posse de terra, desigualdades sociais, violência e atividades ilegais. O crescimento da demanda regional e externa por carne bovina e o potencial de expansão de colheitas mecanizadas estão entre as principais ameaças à floresta (FEARNSIDE, 2002; BECKER, 2004). Para Gutberlet (2003), o modelo de desenvolvimento adotado na região Amazônica está baseado na extração e exploração insustentável dos recursos naturais, priorizando o lucro imediato, fundado na apropriação do espaço e na exploração das riquezas, por vezes sem considerar culturas locais e dinâmicas naturais dos ecossistemas. Este estilo de desenvolvimento traz à região transformações rápidas, com sérias conseqüências socioambientais de médio e longo prazo e em larga escala (FERREIRA et al., 2005).

Evolução do desflorestamento (1990-2006) em áreas protegidas da Amazônia Central

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1 REIS, J.R.L.; PINHEIRO, E.S.; MACEDO, M. A.. Evolução do desflorestamento (1990-2006) em Áreas Protegidas da Amazônia Central. In: VIII Seminário de Atualização em Sensoriamento Remoto e Sistemas de Informações Geográficas aplicados a Engenharia Florestal, 2008, Curitiba/PR. Anais do VIII Seminário de Atualização em Sensoriamento Remoto e Sistemas de Informações Geográficas aplicados a Engenharia Florestal. Curitiba/PR : FUPEF, 2008. v. 1

EVOLUÇÃO DO DESFLORESTAMENTO (1990-2006) EM ÁREAS PROTEGIDAS DA AMAZÔNIA CENTRAL

EVOLUTION OF DEFORESTATION (1990-2006) IN

CENTRAL AMAZON PROTECTED AREAS

João Rodrigo Leitão dos Reis 1, Eduardo da Silva Pinheiro 2, Mariza Alves de Macedo 3

1 Programa de Pós-graduação em Ciências Florestais e Ambientais, Universidade Federal do Amazonas - UFAM. 2 Departamento de Geografia - UFAM, Campus Universitário, Av. Gen. Rodrigo Octávio Jordão Ramos, 3000, 69077-000, Manaus-AM, Brasil. 3 Sistema de Proteção da Amazônia - SIPAM, Av. do Turismo, 1350, 69049-630, Manaus-AM, Brasil.

e-mail: [email protected]; [email protected]; [email protected]

RESUMO A criação e manejo de unidades de conservação na Amazônia é uma das principais estratégias para evitar a ocupação irregular e controle do desflorestamento. Analisou-se a evolução do desflorestamento na Área de Proteção Ambiental Caverna do Maroaga, Presidente Figueiredo - AM, ao longo de 16 anos, e a integridade ambiental das áreas de preservação permanente (APP). Foram utilizados dados do projeto PRODES/INPE, imagens TM/LANDSAT e expedições de campo. Em 1990, 3,8% da área estavam desflorestadas e em 2006 o desflorestamento chegou a 8,8% da unidade de conservação. Ao longo das rodovias BR-174 e AM-240 verificam-se as áreas com maior desflorestamento. Entre as APP, as margens dos igarapés apresentaram-se mais impactadas. Os principais fatores do desflorestamento na unidade de conservação foram os assentamentos rurais, a formação do lago da usina hidrelétrica de Balbina e a pavimentação da BR-174. Para inibição deste processo, uma iniciativa do poder público vem sendo os incentivos à criação de reservas privadas sobrepostas a unidade de conservação e a criação de instrumentos legais, que apóiam o monitoramento e controle do desflorestamento e proíbem novos assentamentos rurais e a construção de estradas vicinais. Palavras-chaves: Amazônia, Desflorestamento, Área de Proteção Ambiental.

ABSTRACT The creation and management of conservation units in the Amazon is one of the main strategies to prevent irregular occupation and control of deforestation. It was analyzed the evolution of deforestation in the Caverna do Maroaga Environmental Protection Area, Presidente Figueiredo, Amazonas State, Brazil along 16 years, and the environmental integrity of the permanent preservation areas. It was used data from the project PRODES/INPE, TM/LANDSAT images and field surveys. In 1990, 3.8% of the area were deforested and in 2006, reached 8.8% of the conservation unit. At the BR-174 and AM-240 roads were detected areas with the greatest deforestation. The stream margins were the most deforested, among permanent preservation areas. The main factors of deforestation in this conservation unit were rural settlements, the creation of Balbina hydroelectric lake and paving of BR-174 road. The government has used the creation of private reserves overlapping the conservation unit and the creation of legal instruments that to support monitoring and control of deforestation, prohibit new rural settlements and building secondary roads. Key words: Amazon, Deforestation, Environmental Protection Area.

INTRODUÇÃO

O processo de ocupação humana na região Amazônica tem sido associado à concentração da posse de terra, desigualdades sociais, violência e atividades ilegais. O crescimento da demanda regional e externa por carne bovina e o potencial de expansão de colheitas mecanizadas estão entre as principais ameaças à floresta (FEARNSIDE, 2002; BECKER, 2004). Para Gutberlet (2003), o modelo de desenvolvimento adotado na região Amazônica está baseado na extração e exploração insustentável dos recursos naturais, priorizando o lucro imediato, fundado na apropriação do espaço e na exploração das riquezas, por vezes sem considerar culturas locais e dinâmicas naturais dos ecossistemas. Este estilo de desenvolvimento traz à região transformações rápidas, com sérias conseqüências socioambientais de médio e longo prazo e em larga escala (FERREIRA et al., 2005).

2 REIS, J.R.L.; PINHEIRO, E.S.; MACEDO, M. A.. Evolução do desflorestamento (1990-2006) em Áreas Protegidas da Amazônia Central. In: VIII Seminário de Atualização em Sensoriamento Remoto e Sistemas de Informações Geográficas aplicados a Engenharia Florestal, 2008, Curitiba/PR. Anais do VIII Seminário de Atualização em Sensoriamento Remoto e Sistemas de Informações Geográficas aplicados a Engenharia Florestal. Curitiba/PR : FUPEF, 2008. v. 1

Estima-se que o desflorestamento na Amazônia seja responsável pela redução de aproximadamente 17% da floresta original, cerca de 676.600 km² de sua cobertura primária, sendo que, até 1970 cerca de 1% da região havia sido alterada (CELENTANO e VERÍSSIMO, 2007). Além disso, extensas áreas da Amazônia abrigam florestas empobrecidas e degradadas por queimadas e exploração madeireira predatória, afetando a regulação dos grandes equilíbrios físico-químicos da biosfera (HOMMA, 2005). Entre 1990 e 2006 a área desflorestada anualmente se manteve elevada, em média, ocorreu um acréscimo de 16 mil km2 na década de 1990 para aproximadamente 20 mil km2 entre 2000 e 2006 (CELENTANO e VERÍSSIMO, 2007). Uma das iniciativas para detecção de mudanças na cobertura vegetal é o Programa de Cálculo do Desflorestamento da Amazônia (PRODES), desenvolvido e coordenado pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) que desde 1988 utiliza imagens do sensor Thematic Mapper (TM) do Land Remote Sensing Satellite (Landsat) para detecção e cálculo do desflorestamento na Amazônia. A criação e manejo de unidades de conservação na Amazônia é atualmente uma das principais estratégias para evitar a grilagem de terras públicas, a ocupação irregular de áreas de vulnerabilidade ambiental e, principalmente, um mecanismo para ter controle sobre o desflorestamento (VIEIRA, 2005). Nos últimos anos, a proporção de áreas protegidas aumentou consideravelmente na Amazônia, passando de 8,5% em 1990 para 42,1% (2,1 milhões de quilômetros quadrados) em 2006 (CELENTANO e VERÍSSIMO, 2007). No Amazonas, as unidades de conservação estaduais ou federais representam aproximadamente 23% da superfície do estado (AMAZONAS, 2007). As unidades de conservação estaduais abrangem cerca de 10% do estado, compreendidas em nove de Proteção Integral e 25 de Uso Sustentável. O objetivo deste estudo foi analisar as alterações na cobertura florestal da Área de Proteção Ambiental (APA) Caverna do Maroaga, no município de Presidente Figueiredo, AM entre os anos de 1990 a 2006 e identificar os principais fatores determinantes do desflorestamento. Além disso, verificar a integridade das áreas de preservação permanente inseridas na APA.

MATERIAL E MÉTODOS

A Área de Proteção Ambiental Caverna do Maroaga possui 3.747 km2, o que representa cerca de 14% do município de Presidente Figueiredo, AM. A unidade de conservação está localizada entre as coordenadas geográficas 01º11’35” a 02°16’02” de latitude sul e 59º17’24” a 60°25’12” de longitude oeste de Greenwich (Figura 1). A APA foi criada por meio do Decreto Estadual n° 12.836 de 09/03/1990 e retificado pelo Decreto nº 16.354, de 07/12/94 em relação a sua superfície (AMAZONAS, 2007). Possui como limites a BR-174 (Manaus/AM – Boa Vista/RR), a Reserva indígena Waimiri-Atroari, o lago da hidrelétrica de Balbina, o rio Uatumã e rio Urubu. Na sua parte sul é cortada pela rodovia AM-240 que dá acesso a Vila de Balbina. A área está inserida na região, segundo a classificação de Köppen, no tipo Amw, apresentando clima tropical chuvoso, úmido e quente. O volume médio total da precipitação é de 2.075mm. Ao relevo é formado por planícies aluvionares recentes, peneplanos rebaixados, pequenas escarpas de “cuestas” e platô arenítico. Os solos são do tipo Latossolo Amarelo Álico, Latossolo Vermelho-Amarelo Álico e Podzólico Vermelho-Amarelo Álico (IBGE, 1978). Na APA há predominantemente Floresta Ombrófila Densa Submontana que ocupa áreas onde afloram dominantemente rochas Paleozóicas e Pré-Cambrianas, e Floresta de Baixa Altitude localizada nos terrenos mais jovens do Quaternário e alguns platôs do Terciário. Segundo o Censo Demográfico de 2000 (IBGE, 2007), a população de Presidente Figueiredo era de 17.394 habitantes, dividida, em 48,33% dos habitantes na zona urbana, e cerca de 51,67% na zona rural. A maior concentração de população no meio rural explica-se, essencialmente pelos assentamentos rurais. Na área da APA encontram-se 34 comunidades rurais, com cerca de 1.666 famílias e 5.669 habitantes (IPAAM, 2005). Dentre os fatores potencialmente responsáveis pelo crescimento econômico de Presidente Figueiredo, observados nos últimos anos, está pavimentação da rodovia BR-174, que possibilita a maior parte do escoamento via terrestre do estado, as jazidas minerais na região de Pitinga e a Usina Hidrelétrica de Balbina e sua infra-estrutura anexada. A economia municipal está centrada na mineração (extração de cassiterita),

3 REIS, J.R.L.; PINHEIRO, E.S.; MACEDO, M. A.. Evolução do desflorestamento (1990-2006) em Áreas Protegidas da Amazônia Central. In: VIII Seminário de Atualização em Sensoriamento Remoto e Sistemas de Informações Geográficas aplicados a Engenharia Florestal, 2008, Curitiba/PR. Anais do VIII Seminário de Atualização em Sensoriamento Remoto e Sistemas de Informações Geográficas aplicados a Engenharia Florestal. Curitiba/PR : FUPEF, 2008. v. 1

que gera 1.400 empregos diretos e mais 3.000 indiretos (SEMMA/PF, 2006). A agricultura destaca-se no cultivo do cupuaçu, mandioca, cana-de-açúcar, arroz, milho, batata doce, guaraná, laranja, abacaxi, abacate, pupunha, melancia, tucumã e banana. A pecuária é representada por criações de gado bovino, eqüino, caprino e suíno. O extrativismo é praticado através da extração de produtos como madeira, pedras, e pescado, principalmente tucunaré, extraído do lago de Balbina. O setor industrial concentra-se na mina de Pitinga, geração de energia, na transformação de cana-de-açúcar em açúcar mascavo para a Coca-Cola. Vale atentar para a indústria madeireira, moveleira, de vestuário e alimentação. O turismo também contribui com a geração de empregos diretos e indiretos (SEMMA/PF, 2006).

Figura 1. Localização e evolução do desflorestamento (1990-2006) da Área de Proteção Ambiental Caverna do Maroaga, Presidente Figueiredo, AM, Brasil. Figure 1. Location and evolution of deforestation (1990-2006) in the Caverna do Maroaga Environmental Protection Area, Presidente Figueiredo, Amazonas State, Brazil.

Para mapear e analisar o desflorestamento na APA Caverna do Maroaga e as áreas de preservação permanente (APP) foram utilizados os dados de sensoriamento remoto e cartográficos, a saber: base de dados do desflorestamento, disponibilizado pelo PRODIS Digital (INPE, 2007); imagens TM/LANDSAT-5, órbita/ponto, 231/61, 203/62 e 230/61 dos anos de 1990, 2004 e 2006; base dados cartográficos em escala de 1:250.000 referentes aos limites políticos, limite da APA, comunidades, rede hidrográfica, estradas, lavras minerais e assentamentos rurais. O mapeamento do desflorestamento para o ano de 1990, ano de criação da APA, foi realizado a partir da interpretação visual das imagens TM/LANDSAT-5 e digitalização dos polígonos de desflorestamento na tela do computador. Os dados do PRODES para o ano de 1997 e a seqüência temporal 2000 a 2006 foram recortados de acordo com os limites da APA. Posteriormente, foi feita uma análise qualitativa dos dados do PRODES, a partir de sua comparação com as imagens referentes aos anos de 2004 e 2006. Nos meses de agosto e novembro de 2007 foram realizados trabalhos de campo para reconhecimento e confirmação das

4 REIS, J.R.L.; PINHEIRO, E.S.; MACEDO, M. A.. Evolução do desflorestamento (1990-2006) em Áreas Protegidas da Amazônia Central. In: VIII Seminário de Atualização em Sensoriamento Remoto e Sistemas de Informações Geográficas aplicados a Engenharia Florestal, 2008, Curitiba/PR. Anais do VIII Seminário de Atualização em Sensoriamento Remoto e Sistemas de Informações Geográficas aplicados a Engenharia Florestal. Curitiba/PR : FUPEF, 2008. v. 1

áreas desflorestadas observadas nas imagens, além do registro iconográfico, nesta etapa foram adquiridos pontos com GPS nas áreas com alterações da cobertura vegetal. A hidrografia da unidade de conservação foi ordenada conforme o método proposto por Strahler (1952) e identificados as nascentes nos cursos d’água de primeira ordem. As áreas de presenvação permanente foram demarcadas de acordo com os critérios descritos no Novo Código Florestal Federal lei n° 4.771 de 15/09/1965 e na Resolução CONAMA 303 de 20/03/2002, a saber: ao redor de nascente ou olho d’água, ainda que intermitente, com raio de 50m; distâncias das margens de rios de 30m para cursos d’água com menos de 10m de largura (igarapés) e 200m para cursos d’água de 200m a 600m de largura, ou seja, os rios Uatumã e Urubu, os quais possuem largura média de 355m e 202m, respectivamente. Cabe citar que devido a escala da base cartográfica disponível (1:250.000) e o relevo na área ser relativamente suave ondulado não foram identificadas as APP localizadas em encostas ou em partes delas com declividade superior a 45°. Na última etapa do trabalho foram comparadas as áreas com desflorestamento e as áreas de preservação permanente por meio de uma tabulação cruzada.

RESULTADOS E DISCUSSÃO Embora, uma APA permita a existência de propriedades privadas em seus limites esta ocupação deve ocorrer de forma ordenada, de modo a assegurar o uso sustentável dos recursos naturais. O estabelecimento de empreendimentos empresariais ou comunitários deve ser realizado a partir do licenciamento ambiental com a declaração da reserva florestal legal e delimitação de áreas de preservação permanente. Em 1990, ano de criação da APA da Caverna do Maroaga, 14.290,99ha (3,8%) de sua área estavam desflorestados, nos anos seguintes até 1997 ocorreu um elevado incremento chegando a 24.833,13ha (6,6%), aumentando suavemente nos anos posteriores. Em 2006, 32.936,81ha (8,8%) da cobertura florestal da área estavam alterados (Figura 2a).

a b Figura 2. Alterações na cobertura vegetal da APA Caverna do Maroaga; a) evolução do desflorestamento (1990-2006); b) Incremento do desflorestamento (1990-2006). Figure 2. Changes in land cover of the Caverna do Maroaga Environmental Protection Area, Presidente Figueiredo, Amazonas State, Brazil; a) Evolution of deforestation (1990-2006); b) Increase in deforestation (1990-2006). Durante os 16 anos analisados, a série histórica de ampliação do desflorestamento na APA aponta 2001, com 3.060,86ha de incremento e 2003 com 2030,22ha como anos de maiores picos, já os anos de 2000 com 177,16ha e 2006 com 292,03ha como aqueles que apresentaram menor incremento (Figura 2b). No ano de 2001 o desflorestamento na APA chegou a 28.071,15ha e em 2003 30.943,09ha da cobertura florestal estavam alterados. Segundo o relatório sobre a criação da APA Caverna do Maroaga (IMA, 1993), a área alterada até 1987 em Presidente Figueiredo era de 31.276,25ha (1,06%) do município. Entretanto, este percentual sofreu uma elevação significativa, face à formação dos lagos da Usina Hidrelétrica de Balbina e as atividades de mineração para extração de cassiterita, totalizando 10,99% em relação à área do município.

5 REIS, J.R.L.; PINHEIRO, E.S.; MACEDO, M. A.. Evolução do desflorestamento (1990-2006) em Áreas Protegidas da Amazônia Central. In: VIII Seminário de Atualização em Sensoriamento Remoto e Sistemas de Informações Geográficas aplicados a Engenharia Florestal, 2008, Curitiba/PR. Anais do VIII Seminário de Atualização em Sensoriamento Remoto e Sistemas de Informações Geográficas aplicados a Engenharia Florestal. Curitiba/PR : FUPEF, 2008. v. 1

As áreas que sofreram maior desflorestamento estão ao longo das rodovias BR-174 e AM-240 (Figura 1), nestes locais foram observadas instalações de famílias, loteamentos, desflorestamentos associados a pastagens, agricultura, exploração turística, queimadas e abertura de ramais (Figura 3). Um aspecto que contribui para o desflorestamento ao longo das estradas é o fato da população da APA se concentrar as margens das rodovias. A AM-240, estrada de Balbina é mais densamente ocupada que a BR-174, podendo ser observadas cicatrizes na floresta com troncos carbonizados e outros parcialmente queimados. Embora o desflorestamento seja um processo de natureza complexa de ser atribuído apenas a um único fator, a pavimentação de estradas e/ou a construção de vicinais (ramais) representa um dos principais vetores de desflorestamento na Amazônia (LAURANCE et al. 2001; FEARNSIDE, 2005).

a b c

Figura 3. a) Ocupação nas margens da estrada BR-174; b) Queimada nas margens da estrada, dentro da APA Caverna do Maroaga; c) Área de floresta transformada em pastagem. Fotos: Reis e Pinheiro, 2007. Figure 3. a) Occupation of BR-174 road margins; b) Burned areas in the road margins, inside of Caverna do Maroaga Environmental Protection Area; c) Forest area turned into cattle pasture. Apesar da relação entre áreas protegidas públicas ou privadas englobadas por uma APA, as áreas de preservação permanente são as únicas que possuem uma legislação específica e sua delimitação é estabelecida, independente dos processos de licenciamento ambiental. Os resultados obtidos neste estudo demonstram que na APA Caverna do Maroaga, as áreas de preservação permanente representam 16.463,36ha, ou seja, 4,93% da APA, dos quais 1.717,62ha (5,21%) em 2006 estavam com a cobertura florestal alterada (Tabela 1).

Tabela 1. Desflorestamento em áreas de preservação permanente da APA Caverna do Maroaga. Table 1. Deforestation in permanent preservation areas of the Caverna do Maroaga Environmental Protection Area.

Desflorestamento (ha) % Ano Nascentes Igarapés Rio Uatumã Rio Urubu Total 1997 23,35 734,54 461,47 51,33 1.270,68 3,86 2000 0 11,87 0 0 11,87 0,04 2001 1,64 103,78 79,85 4,52 189,79 0,58 2002 2,01 28,95 2,23 0 33,19 0,10 2003 0,63 86,05 26,67 0,08 113,43 0,34 2004 1,18 37,22 1,40 0 39,80 0,12 2005 0,10 39,52 8,61 0 48,24 0,15 2006 0 10,62 0 0 10,62 0,03 Total 28,92 1.052,54 580,23 55,93 1.717,62 5,21 % 0,09 3,20 1,76 0,17 5,21

As áreas de preservação permanente, localizadas ao longo das margens dos cursos d’água de menor porte (igarapés), foram aquelas que sofreram mais intensamente processos de desflorestamento, seguidas pelo rio Uatumã. Os menores impactos foram observados nas margens do rio Urubu e nos locais de nascentes dentro da APA (Tabela 1) (Figura 3). As margens dos igarapés sofrem pressão direta do uso da terra, uma vez que atravessam as rodovias (AM-240 e BR-174), imóveis e empreendimentos rurais. Apesar de a lei indicar que 80% dos imóveis são destinados a reservas legais, a integridade das APP descontadas dos 20% destinados a implantação do empreendimento podem ser comprometidas, por duas razões principais. A primeira depende da atividade a ser implantada pelo proprietário do imóvel, principalmente, nos casos de pecuária e piscicultura. A outra se

6 REIS, J.R.L.; PINHEIRO, E.S.; MACEDO, M. A.. Evolução do desflorestamento (1990-2006) em Áreas Protegidas da Amazônia Central. In: VIII Seminário de Atualização em Sensoriamento Remoto e Sistemas de Informações Geográficas aplicados a Engenharia Florestal, 2008, Curitiba/PR. Anais do VIII Seminário de Atualização em Sensoriamento Remoto e Sistemas de Informações Geográficas aplicados a Engenharia Florestal. Curitiba/PR : FUPEF, 2008. v. 1

associa a característica topográfica do terreno e da quantidade de cursos d’água que banham o imóvel, onde o proprietário desmata as APP para aumentar a área de uso de sua atividade. Um dos fatores que contribuem para isso é ausência do monitoramento e fiscalização das reservas legais declaradas e APP dos locais de uso da propriedade. Ao longo das margens dos rios Uatumã e Urubu observam-se um padrão histórico e cultural de ocupação, uma vez que esses rios são um meio de transporte para população e vetores históricos de colonização da Amazônia. Esse padrão de povoamento provoca o desflorestamento nas APP ao longo desses cursos d’água, o que é incompatível com a legislação ambiental brasileira. Devido a essa característica deve haver discussões para adequar a legislação as peculiaridades amazônicas, a fim de realmente garantir a proteção de recursos florestais ao logo dos cursos d’água da região. Portanto, as leis devem se harmonizar a realidade há tanto tempo executadas pelos habitantes na região Amazônica.

a b c

d e f

Figura 4. a) Ocupação na margem do rio Urubu; b) Propriedade rural na margem do rio Uatumã; c) Área desflorestada por abertura de um ramal; d) Área ao norte da APA Caverna do Maroaga, inundada pelo lago da represa de Balbina; e) Área de nascente com a cobertura vegetal alterada; f) Propriedade rural dentro da APA Caverna do Maroaga. Fotos de Reis e Pinheiro, 2007; “b” e “f” fotos gentilmente cedidas pela Sra. Fernanda Preto e SEMMA Presidente Figueiredo, respectivamente. Figure 4. a) Occupation of Urubu river margin; b) Farm in the Uatumã river margin; c) Deforested area by secondary road; d) Northing of Caverna do Maroaga Environmental Protection Area, land flooded by Balbina hydroelectric lake; e) Changes in land cover of the upstream area; f) Farm insite of Caverna do Maroaga Environmental Protection Area. Comparando-se os rios e rodovias como meio de transporte e vetores de colonização, detecta-se que ambos têm um potencial significativo para irradiar o desflorestamento. Porém, as rodovias são os principais vetores já que possibilitam um maior fluxo e aceleram o transporte de material, carga e pessoas. São matrizes para o surgimento de vicinais (ramais), povoamentos, assentamentos e exploração dos recursos naturais. A abertura e posterior pavimentação da BR-174 propiciaram o surgimento do município Presidente Figueiredo, atraíram um fluxo migratório “dirigido” para assentamentos rurais, trabalhadores para construção da hidrelétrica de Balbina, exploração mineral do rio Pitinga e outro “espontâneo” formado por pequenos agricultores e posseiros que ocupam as margens da BR-174 e AM-240 (OLIVEIRA, 2000). Para Souza (1997), o sistema de uso da terra no município de Presidente Figueiredo consiste basicamente no desflorestamento de pequenas áreas de floresta primária, queima e cultivo de mandioca por dois ou três anos consecutivos. Devido aos solos terem baixos teores de nutrientes e elevada acidez, inviabiliza a manutenção de culturas vegetais sem aplicação de nutrientes (adubos) químicos. Desta forma, a sustentabilidade temporária desse sistema condiciona os produtores a recorrerem a outras alternativas geradoras de renda, como a extração seletiva de madeira, provendo a intensificação do uso dos recursos naturais e desestímulo à produção, resultante da falta de perspectiva de melhoria de sua qualidade de vida. De um modo geral, é

7 REIS, J.R.L.; PINHEIRO, E.S.; MACEDO, M. A.. Evolução do desflorestamento (1990-2006) em Áreas Protegidas da Amazônia Central. In: VIII Seminário de Atualização em Sensoriamento Remoto e Sistemas de Informações Geográficas aplicados a Engenharia Florestal, 2008, Curitiba/PR. Anais do VIII Seminário de Atualização em Sensoriamento Remoto e Sistemas de Informações Geográficas aplicados a Engenharia Florestal. Curitiba/PR : FUPEF, 2008. v. 1

possível elencar alguns condicionantes principais, os quais podem estar associados ao desflorestamento na APA Caverna do Maroaga, a saber:

- Política de ocupação impulsionada desde o final da década de 70, com a implantação de projetos de assentamentos rurais ao longo da BR-174 e AM-240, condicionado pela política de reforma agrária;

- Ocupação das margens das estradas por fazendeiros e empresários do setor imobiliário, turístico e de exploração de minerais;

- Constituição e expansão de loteamentos urbanos na zona de transição urbano-rural e de comunidades rurais com aberturas de ramais;

- Uso das nascentes para retirada de água potável, dos corpos d’água para transporte fluvial e desflorestamentos das margens destes para implantação de empreendimentos empresariais do setor primário (pecuária, agricultura, piscicultura), já que viabilizam o credenciamento da posse da terra, e são encarados como benfeitorias;

- Pressão sobre o uso público de cachoeiras, corredeiras e cavidades subterrâneas; - A extração ilegal e comercialização da madeira bruta ou beneficiada o que atende a perspectiva

empregatícia da população. Uma iniciativa por parte do poder público é o incentivo à criação de reservas privadas sobrepostas a unidade de conservação, o que é um importante elemento para proporcionar uma proteção mais restritiva de uso e uma forma para que os proprietários possam utilizá-la para realização de atividades turísticas e pesquisa científica. Para esse caso também deverá haver regulamentação de uso, a fim de evitar a degradação dos ambientes.

CONSIDERAÇÕES FINAIS A maior parte da cobertura florestal da APA Caverna do Maroaga, cerca de 91%, ainda encontra-se conservada. No entanto, estratégias para gestão e manutenção da integridade ambiental dessa unidade devem ser providenciadas para inibir a extração ilegal de madeira, que atualmente é uma das principais atividades que propiciam os desflorestamentos no seu interior. Os dispositivos legais existentes devem ser aplicados para inibir a expansão das atividades desencadeadoras do desflorestamento. Instrumentos legislativos foram criados pelo poder público, sendo possível citar a nível local a aprovação em 2006 do Decreto municipal nº 645, o qual proibiu a abertura de ramais e instituição de assentamentos rurais por um período de quatro anos no município de Presidente Figueiredo. Sua intenção é limitar e controlar a grande quantidade de invasões e coibir o comércio ilícito de terras públicas na área rural desse município. Impondo prévio licenciamento ambiental para ambos, e acrescentando para assentamentos a consulta pública. Em nível regional está em vigor o Decreto federal nº 6.321 de 21/12/2007, que dispõe sobre as ações relativas à prevenção, monitoramento e controle de desflorestamento na Amazônia e sobre a especificação das sanções aplicáveis às condutas e atividades lesivas praticadas. Estabelece, portanto, ações relativas à proteção de áreas ameaçadas de degradação e à racionalização do uso da terra, de forma a prevenir, monitorar e controlar o desflorestamento ilegal. Essas legislações são o início para tomada de decisão sobre a execução de ações de gestão em áreas protegidas ou não. Para APA Caverna do Maroaga contribuem para proteção, contudo a execução dos dispositivos depende da atenção dada pelos gestores públicos.

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