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DESCRIÇÃO DA COMPARTIMENTAÇÃO DE PROCESSOS DE MOVIMENTO DE
MASSA NA SERRA DA PRATA EM MORRETES – PR.
Alessandro Martins1, Manoella Barros Pedreira Ferreira1, Daniel
Ramos Pontoni2, Araína Hulmann Batista2, Everton Passos3
1 Aluno de mestrado em Geografia, Universidade Federal do Paraná, e-mail:[email protected], [email protected]; 2 Aluno de Doutorado emCiência do Solo, Universidade Federal do Paraná, [email protected],
[email protected]; 3 Professor Associado do Programa de Pós Graduaçãoem Geografia da Universidade Federal do Paraná, [email protected]
RESUMO. Os desastres naturais têm se tornado cada vez mais
freqüentes no Brasil, com graves impactos ambientais, sociais
e econômicos. Como sua explicação é por vezes controversa, é
indispensável, para o melhor entendimento destes processos,
uma densificação de dados e a coleta de informações referentes
ao assunto. Diante desses fatores foram analisados os
processos que desencadearam a corrida de massa na Serra da
Prata, limite dos municípios de Morretes e Paranaguá – PR.
Estes ocorreram por diversas ações naturais, onde as condições
ideais para corrida de lama foram potencializadas pelo excesso
de chuvas, ocasionando entre outras perdas, grandes danos
socioambientais na área de abrangência. Neste sentido, o
objetivo deste trabalho foi a descrição preliminar da
compartimentação do processo de movimento de massa ocorrido no
dia 11 de março de 2011, na Serra da Prata, PR.
Palavras chave: deslizamentos, pluviosidade, desastre
ambiental.
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ABSTRACT. Natural disasters have become increasingly frequent
in Brazil, with serious environmental, social and economic. As
his explanation is sometimes controversial, it is essential to
a better understanding of these processes, a densification of
data and information gathering on the topic. Given these
factors we analyzed the processes that triggered the
landslides in the Serra da Prata, between the cities of
Morretes and Paranagua - PR. These occurred due on several
natural actions, where the ideal conditions for racing mud
were potentiated by excessive rainfall, causing among other
losses, social and environmental damage. In this sense, the
objective of this study was the preliminary description of the
compartimentation of the process of mass movement that
occurred on March 11, 2011, in the Serra da Prata, PR.
Keywords – landslides, rainfall, environmental disasters
1. INTRODUÇÃO
É cada vez mais freqüente o registro de eventos ambientais
que levam a desastres em proporções expressivas em diversos
locais do mundo. O Brasil, apesar de ser um país sem problemas
de maior magnitude, tem sido surpreendido com a ocorrência de
alguns fenômenos naturais. Processos erosivos mais intensos
como deslizamentos têm sido considerados resultados de ações
antrópicas como desmatamentos de encostas e margens de rios, e
até de alterações climáticas, como o aquecimento global.
Todavia, é preciso considerar, além da influência destes
fatores, que os recortes de relevo tais como se vislumbram
3
atualmente, foram formados naturalmente, anteriores à vida
humana na Terra. Alguns trabalhos realizados desde a década de
60 consideram a paisagem natural como resultado de processos
morfogenéticos do Quaternário (Tricart, 1959; Ab’Saber e
Bigarella, 1961; Passos, 1987), que até o presente momento
foram pouco estudados no Brasil.
Neste contexto, na Serra da Prata, entre os municípios de
Morretes e Paranaguá – PR, no dia 11 de março do ano de 2011,
ocorreram intensos movimentos de massa, que causaram
significativa mudança da paisagem, perdas materiais, e
infelizmente, de vidas humanas. Entretanto, chama atenção o
fato de que este evento, a princípio, não ocorreu em áreas
antropizadas. Observa-se no local, que os desprendimentos de
massa ocorreram inicialmente em locais de área de preservação
permanente.
Apesar de muito discutido em outros países, no Brasil e
especialmente em estados como o Paraná, este tema ainda é
pouco conhecido. Faz-se necessário realizar o levantamento dos
fatores locais que influenciaram a ocorrência dos
deslizamentos na Serra da Prata, PR. Desta forma, o presente
trabalho objetivou realizar uma descrição preliminar da
compartimentação do processo de movimento de massa ocorrido no
dia 11 de março de 2011.
2- MATERIAL E MÉTODOS
A área de estudo está inserida na encosta ocidental da
Serra da Prata no Distrito de Floresta, ao longo do vale do
rio Tingidor, localizando-se entre as coordenadas na jusante
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P1. Lat.-25°54’31’’, Long. 48°68’ 52’’ Alt.11m P2. Lat-
25°53’85’’ Long.-48°69’64’’ Alt. 13m e montante P3. Lat
25°58’71’’, Long. 48°67’90’’ Alt. 807m, P4. Lat.25°62’69’’
Long. 48°68’92’’ Alt. 1448m e montante na divisa entre os
municípios de Morretes e Paranaguá - PR.
A metodologia aplicada para descrição da compartimentação
do processo de movimento de massa na Serra da Prata foi
embasada no levantamento e revisão bibliográficos referentes à
temática abordada. Foram avaliados os fatores que contribuíram
para os processos que desencadearam a corrida de lama, através
das características geológicas, climáticas, topográficas,
geomorfológicas, pedológicas, hidrológicas, pluviométrica
concentrada em determinado período antes do evento.
A caracterização geológica litoestratigráfica da Serra da
Prata compreende um complexo Gnáissico-Migmatítico e
Granítico-Gnáissico do período arqueano-proterozóico inferior
2,5 – 1,8 milhões de anos (MINEROPAR, 2001; 2005).
Na região da Serra da Prata ocorre uma transição, onde o
clima é classificado segundo Köppen apud Maack (1981) como Cfa
subtropical superúmido mesotérmico e com verões quentes nas
altitudes até 700 m e Cfb subtropical superúmido mesotérmico,
mas com verões amenos acima dessa altitude. A fisionomia da
vegetação é caracterizada como Floresta Ombrófila Densa
submontana onde o clima é classificado como Cfa e Floresta
Ombrófila Densa Montana no Cfb (Blum et al., 2011).
Para estabelecer o local de estudo, foi realizada análise
da topografia através da carta topográfica (Folha de Alexandra
em escala 1: 25000), produzida pela Diretoria do Serviço
5
Geográfico - DSG do Ministério do Exército. Desta maneira,
foi estabelecido o embasamento teórico à análise científica,
principalmente quanto às características geomorfológicas da
área de estudo.
Posterior a este levantamento foram realizadas pesquisas de
campo visando melhor compreensão do evento. A partir destas
observações foi estabelecida a descrição da compartimentação
dos movimentos de massa que causaram grande impacto na região.
3 - RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os processos geomorfológicos ocorridos na Serra da Prata,
ao longo do vale do rio Tingidor, foram associados à
escorregamentos simultâneos na canaleta central de drenagem
seguidos de corrida de lama que atingiram a planície. Estes
podem ter sido desencadeados pelo excesso de pluviosidade do
mês de março de 2011 nessa região, o qual segundo dados da
estação do INMET foi de 354,6 mm em menos de 48 horas, onde a
média para todo o mês de março fica entre 280 a 300 mm
(Paranaguá, 2011). Associado ao evento climático atípico, a
forma e declividade do relevo, cobertura pedológica, cobertura
florística e forma da bacia hidrográfica também podem ter
contribuído para a grande magnitude do evento.
Corridas de lama se caracterizam pela afluência de grande
quantidade de material viscoso pela vertente em um curto
intervalo de tempo. Devido sua alta densidade, possuem elevado
poder destrutivo com raio de ação extenso, assemelhando-se à
energia das avalanches (Bigarella, 2007; Fernandes e Amaral,
2003).
6
Foi observado aumento da largura do leito do rio em
decorrência do transporte de grande volume de material
detrítico, resultante de escorregamentos na montante. Estes
materiais, como grandes blocos de rochas, troncos, areia,
silte, argila, englobando construções entre outros, fluíram
rapidamente para a linha de talvegue, alterando a morfologia
do fundo de vale que originalmente era em forma de “V”.
A partir da inspeção, avaliação e identificação dos
processos ocorridos, foi possível compartimentar a área
estudada em quatro setores (Figura 1), de montante à jusante,
sendo: 1º cicatrizes de escorregamento; 2º corte e
entulhamento do vale; 3º depósito de blocos (cone detrítico)
em leque na saída do vale; 4º depósito de detritos de menor
densidade e ou diâmetro na planície.
Figura 1. Compartimentação do processo erosivo ocorrido no vale dorio Tingidor, bacia do rio Jacareí, em 4 setores (Pontoni, D. 2012).
1º Setor - As cicatrizes de escorregamento foram formadas por
deslizamento de blocos e deslizamento de solo e colúvio. Em
7
alguns pontos não houve desprendimento de blocos, apenas solo
e troncos, sem atingir todo manto de intemperismo ou expor a
rocha de embasamento. Os limites das cicatrizes de
escorregamento e das corridas se confundem.
As cicatrizes de escorregamento observadas nas encostas do
vale do rio Tingidor foram subdivididas em 2 tipos, sendo
elas: tipo 1 – cicatrizes com solo exposto; e tipo 2 –
cicatrizes com rocha exposta. A caracterização das cicatrizes
é importante para a identificação de áreas de recorrência
(Sestine et al., 2004). Nas cicatrizes visitadas não foi
possível verificar a formação de depósito de tálus logo
abaixo, indicando que tais materiais foram transportados pela
corrida de lama.
Em evento semelhante ocorrido em Caraguatatuba, litoral sul
de São Paulo, Sestine et al. (2004), verificaram a existência
de quatro tipos diferentes de cicatrizes. Além dos dois tipos
citados no presente estudo, eles observaram outros dois tipos
com indícios de regeneração da vegetação. Porém o evento em
estudo é muito recente para propiciar o desenvolvimento da
vegetação nos taludes.
As cicatrizes analisadas nas encostas do rio Tingidor estão
localizadas nas porções de maior elevação e declividade.
Ferreira et al. (2008), trabalhando em encostas em Cubatão-SP
concluíram que a declividade é a principal condicionante para
a ocorrência de escorregamentos translacionais na Serra do
Mar, apresentando maior importância em relação a litologia e
forma da vertente. Contudo, outros fatores devem ser
observados além destes, como a condutividade hidráulica dos
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solos, que em condição de saturação exercem grandes pressões
podendo desencadear processos de movimentos de massa
(Fernandes, 2001).
2º Setor - O entulhamento do vale ocorreu em função da
corrida de detritos e lama, que recortou e formou uma calha,
propiciando a deposição parcial de materiais em platôs em
segmentos do vale (Figura 2A), modificando seu entalhamento e
sua morfologia. A corrida de detritos e lama era composta em
seu maior volume por blocos grandes (maiores que 10m de
diâmetro) e barramentos ocasionados por blocos gigantes com
mais de 30m de diâmetro. Alguns destes facetados apresentaram
fraturas recentes, outros mais arredondados apresentaram
marcas de batidas apenas na face exposta para montante. Isto
indica que estes últimos não foram arrastados, ou muito pouco,
e que provavelmente tenham sido transportados até onde se
encontram atualmente em eventos pretéritos similares, pois a
sua litologia é discordante com a da superfície onde se
encontram. O entulhamento de canais com blocos grandes é
considerado comum em vales da Serra do Mar (Gobbi e Ladeira,
2011).
O vale apresenta estrangulamento em alguns pontos,
especialmente em locais de maior declividade ou com rochas
mais resistentes. A maior parte dos materiais de menor
granulometria (como seixos, calhaus, areia, silte e argila)
foi transportada pela enxurrada e depositada na planície. Em
muitos pontos do vale se observou a exposição do embasamentorochoso, muitas vezes com fraturas recentes, indicando que parte
deste material também foi transportada para jusante.
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2 A 2 B Fonte: Ferreira, M. B. P., Passos, E. ; 2012.
Figura 2. 2 A. Blocos rochosos depositados em platôs ao longo dovale. 2 B. Depósito de blocos em leque na saída do vale.
Em cortes produzidos pelo último evento de corrida de massa
nas encostas ao longo da calha do vale, verificou-se a
presença de material depositado em forma de terraço detrítico,
como pode ser observado na Figura 3A. Nesta seção, o depósito
detrítico foi encontrado sob um neossolo desenvolvido sob a
Floresta, indicando a recorrência de eventos como este neste
mesmo local. Segundo Fernandes (2001), evidências de
recorrência de eventos catastróficos ao longo da Serra do Mar
(como o que ocorreu em março de 2011) são facilmente atestadas
por espessos depósitos encontrados, muitos deles com claras
evidências de várias fases de remanejamento de depósitos de
antigas corridas de massa.
Sinais de lama, cicatrizes de impactos e lascas de cascas
foram observadas em troncos de árvores nas margens, à cerca de
15m de altura em relação ao canal, em platôs ao longo do vale,
indicando a dimensão do volume da corrida de lama (Figura 3B).
Tais cicatrizes são importantes vestígios para o
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dimensionamento da magnitude e riscos associados a movimentos
de massa e enchentes (Jakob, 2005).
3º Setor- O depósito de blocos em leque (cone de dejeção de
detritos) (Figura 2B) ocorreu imediatamente após a saída do
vale, modificando a paisagem e a capacidade de uso do solo
para agricultura, principal atividade econômica da região.
Este compartimento é constituído por depósito gravitacional de
blocos com a presença de material rudáceo mal selecionado,
observado no contato da escarpa com a planície (Figura 2).
Isto é característico de fluxos torrenciais como depósitos de
corrida de lama e depósitos de fluxos de detritos e tem sua
ocorrência limitada pelo relevo e energia de transporte
conforme observado na área de estudo (Ladeira e Santos, 2005;
Pontelli e Paisani, 2005; Gobbi e Ladeira, 2011).
3A 3B
Fonte: Passos, E. ; Pontoni, D., 2012.
Figura 3. 3 A. (0) Matacão com volume de aproximadamente 12m³; (1)bloco retido na borda de um afloramento de rocha metamórfica,pouco e muito intemperizada em sua camada superior; (2) e (3)Material deslocado em aproximadamente 50 cm em decorrência doevento. 3 B. Altura das marcas de lama deixadas nas árvores.
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4º Setor – Depósito de detritos de menor densidade na
planície, composto por sedimentos detríticos orgânicos
(fragmentos de madeira), material arcosiano do tamanho areia,
juntamente com detritos orgânicos de grande porte (como
troncos). Estes sedimentos tiveram transporte de longa
distância, sendo encontrados próximos a BR 277. Foi observado
que quanto maior a distância da área fonte, menor a
granulometria dos sedimentos encontrados. A partir desse
setor, que coincide com a compartimentação do relevo em
planície, não foi verificada a presença de blocos em meio ao
material sedimentado. Gobbi e Ladeira (2011) observaram
processo similar em Ubatuba, SP.
Segundo a classificação de impacto e área afetada proposta
por Jakob (2005), este evento poderia ser enquadrado como
Classe 5 (> 100.000 m3), de grande impacto e magnitude de fluxo
numa escala de 1 a 6, em função do volume de sedimentos e área
afetada. Esta catástrofe ocorrida na Serra da Prata só não
teve mais vítimas em função da baixa densidade populacional na
comunidade atingida.
Os dois primeiros setores podem ser considerados como área
fonte, onde ocorreram escorregamentos e corrida de lama e
detritos. Em função da incisão produzida ao longo do vale é
possível que eventualmente ocorram novas corridas de lama, que
devem persistir por algum tempo até a estabilização, em
processo natural de evolução do vale. Sabe-se que esses
eventos naturais são cíclicos, e que quanto maior a magnitude,
maior é o tempo de intervalo de recorrência (Stoffel, 2010).
4 - CONSIDERAÇÕES FINAIS
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A análise do processo de evolução das vertentes e de sua
geomorfologia é um instrumento importante para a compreensão
da dinâmica da paisagem, bem como dos possíveis impactos
ambientais que podem gerar. Nesse sentido, a descrição
preliminar da compartimentação do processo de movimento de
massa ocorrido na Serra da Prata realizada no presente
trabalho, permitiu o melhor entendimento deste evento de
magnitude catastrófica, bem como, a potencialidade de
possíveis impactos futuros relacionados à dinâmica natural da
vertente.
A compreensão da compartimentação desse evento proposta
nesse trabalho pode servir como base à adoção de algumas
medidas mitigadoras pelos municípios afetados, a fim de
alertar quanto à magnitude do evento, no sentido de haver um
planejamento de uso e ocupação das áreas circunvizinhas
suscetíveis a este processo.
AGRADECIMENTOS
Os autores agradecem aos moradores do Distrito de Floresta,
especialmente ao casal Sr. Serafim e sua esposa Sra.
Castorina, à produtora de olerícolas Sra. Jurema, e ao
professor Elson.
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