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Como citar este artigo: Garcia JBS, et al. A estruturac ¸ão de um servic ¸o de cuidados paliativos no Brasil --- Relato de experiência. Rev Bras Anestesiol. 2013. http://dx.doi.org/10.1016/j.bjan.2013.06.007 ARTICLE IN PRESS +Model BJAN-102; No. of Pages 6 Rev Bras Anestesiol. 2013;xxx(xx):xxx---xxx REVISTA BRASILEIRA DE ANESTESIOLOGIA Official Publication of the Brazilian Society of Anesthesiology www.sba.com.br ARTIGO DIVERSO A estruturac ¸ão de um servic ¸o de cuidados paliativos no Brasil --- Relato de experiência João Batista Santos Garcia a,e,, Rayssa Fiterman Rodrigues b,c e Sara Fiterman Lima d a Disciplina de Anestesiologia, Dor e Cuidados Paliativos da Universidade Federal do Maranhão, São Luís, MA, Brasil b Universidade Federal do Maranhão, São Luís, MA, Brasil c Liga Acadêmica de Dor da Universidade Federal do Maranhão, São Luís, MA, Brasil d Universidade Ceuma, São Luís, MA, Brasil e Programa de Pós-Graduac ¸ão da Universidade Federal do Maranhão, São Luís, MA, Brasil Recebido em 28 de abril de 2013; aceito em 10 de junho de 2013 PALAVRAS-CHAVE Cuidados paliativos; Câncer; Relato Resumo Justificativa e objetivos: no Brasil, os cuidados paliativos (CP) ainda não estão estruturados adequadamente e essa realidade transforma essa temática em um problema de saúde pública e faz com que iniciativas nesse contexto tornem-se relevantes. Este trabalho objetiva comparti- lhar a experiência ocorrida em um hospital de referência em oncologia do Estado do Maranhão e apresentar iniciativas que auxiliaram no desenvolvimento do Servic ¸o de CP. Relato da experiência: no hospital, havia um Servic ¸o de Dor e CP ambulatoriais, porém sem leitos especializados. Os pacientes em fase final de vida ficavam em enfermarias comuns, o que gerava muita inquietac ¸ão. Foi iniciado um processo de sensibilizac ¸ão no hospital, por meio de iniciativas como um concurso de fotografias intitulado Flashes da Vida, e uma enfermaria, intitulada Quarto dos Sonhos, foi projetada em parceria com o curso de arquitetura da Univer- sidade Estadual do Maranhão. O processo culminou com a concessão de enfermarias aos CP e com o compromisso da fundac ¸ão mantenedora do hospital de executar o projeto. Conclusão: essa experiência constituiu uma iniciativa local reprodutível de desenvolvimento dos CP em um hospital oncológico. As iniciativas locais encontram grande valor no Brasil, por favorecer um expressivo número de pacientes e demonstrar, na prática, sua eficácia aos gover- nos e à sociedade. Para estruturac ¸ão de um servic ¸o de CP é imprescindível o estabelecimento de prioridades, que incluem a cessão de fármacos para o controle dos sintomas, a humanizac ¸ão, a multidisciplinaridade e a sensibilizac ¸ão e educac ¸ão dos profissionais. © 2013 Sociedade Brasileira de Anestesiologia. Publicado por Elsevier Editora Ltda. Todos os direitos reservados. Estudo realizado no Instituto Maranhense de Oncologia Aldenora Bello, São Luís, MA, Brasil. Autor para correspondência. E-mail: [email protected] (J.B.S. Garcia). 0034-7094/$ see front matter © 2013 Sociedade Brasileira de Anestesiologia. Publicado por Elsevier Editora Ltda. Todos os direitos reservados. http://dx.doi.org/10.1016/j.bjan.2013.06.007

A estruturação de um serviço de cuidados paliativos no Brasil: relato de experiência

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Rev Bras Anestesiol. 2013;xxx(xx):xxx---xxx

REVISTABRASILEIRA DEANESTESIOLOGIA Official Publication of the Brazilian Society of Anesthesiology

www.sba.com.br

ARTIGO DIVERSO

A estruturacão de um servico de cuidados paliativos noBrasil --- Relato de experiência�

João Batista Santos Garciaa,e,∗, Rayssa Fiterman Rodriguesb,c e Sara Fiterman Limad

a Disciplina de Anestesiologia, Dor e Cuidados Paliativos da Universidade Federal do Maranhão, São Luís, MA, Brasilb Universidade Federal do Maranhão, São Luís, MA, Brasilc Liga Acadêmica de Dor da Universidade Federal do Maranhão, São Luís, MA, Brasild Universidade Ceuma, São Luís, MA, Brasile Programa de Pós-Graduacão da Universidade Federal do Maranhão, São Luís, MA, Brasil

Recebido em 28 de abril de 2013; aceito em 10 de junho de 2013

PALAVRAS-CHAVECuidados paliativos;Câncer;Relato

ResumoJustificativa e objetivos: no Brasil, os cuidados paliativos (CP) ainda não estão estruturadosadequadamente e essa realidade transforma essa temática em um problema de saúde pública efaz com que iniciativas nesse contexto tornem-se relevantes. Este trabalho objetiva comparti-lhar a experiência ocorrida em um hospital de referência em oncologia do Estado do Maranhãoe apresentar iniciativas que auxiliaram no desenvolvimento do Servico de CP.Relato da experiência: no hospital, havia um Servico de Dor e CP ambulatoriais, porém semleitos especializados. Os pacientes em fase final de vida ficavam em enfermarias comuns, oque gerava muita inquietacão. Foi iniciado um processo de sensibilizacão no hospital, por meiode iniciativas como um concurso de fotografias intitulado Flashes da Vida, e uma enfermaria,intitulada Quarto dos Sonhos, foi projetada em parceria com o curso de arquitetura da Univer-sidade Estadual do Maranhão. O processo culminou com a concessão de enfermarias aos CP ecom o compromisso da fundacão mantenedora do hospital de executar o projeto.Conclusão: essa experiência constituiu uma iniciativa local reprodutível de desenvolvimentodos CP em um hospital oncológico. As iniciativas locais encontram grande valor no Brasil, porfavorecer um expressivo número de pacientes e demonstrar, na prática, sua eficácia aos gover-nos e à sociedade. Para estruturacão de um servico de CP é imprescindível o estabelecimentode prioridades, que incluem a cessão de fármacos para o controle dos sintomas, a humanizacão,

a multidisciplinaridade e a sensibilizacão e educacão dos profissionais.

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© 2013 Sociedade Brasileir

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direitos reservados.

� Estudo realizado no Instituto Maranhense de Oncologia Aldenora Bell∗ Autor para correspondência.

E-mail: [email protected] (J.B.S. Garcia).

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ntroducão

s técnicas modernas destinadas a recuperar a saúde doaciente são importantes, mas se tornam incompletas seão houver uma observacão de diferentes paradigmas,specialmente quando as chances de cura são limita-as. Os avancos tecnológicos na medicina devem serroporcionais à necessidade humana de compaixão paraom os pacientes em fase final de vida e seus entesueridos.1

Dentro desse contexto, emergiram os cuidados paliati-os (CP), com a proposta de assistir o paciente até seusltimos momentos e buscar, por meio de uma abordagemultiprofissional, minimizar tanto quanto possível seu des-

onforto e dar suporte emocional e espiritual a seus parentes amigos.2

Os CP constitem uma ciência recente, definida pelarganizacão Mundial de Saúde (OMS) em 2002 --- definicãoais atual --- como ‘‘uma abordagem que promove qualidadee vida de pacientes e seus parentes diante de doencas quemeacam a continuidade da vida, por meio da prevencão

do alívio do sofrimento. Requer identificacão precoce,valiacão e tratamento impecável da dor e outros problemas

-- físicos, psicossociais e espirituais’’.3

Os princípios dos CP, segundo a OMS, são: promover alí-io da dor e de outros sintomas aflitivos; afirmar a vida encarar a morte como processo natural; não apressar nemtrasar a morte; integrar aspectos psicológicos e espirituaiso cuidado do paciente; dar suporte para que os pacien-es vivam ativos, tanto quanto for possível, até a morte;poiar a família durante a doenca do paciente e em suaerda; para satisfazer as necessidades dos pacientes e deeus parentes, usar uma abordagem em equipe que incluaconselhamento na perda, se necessário; proporcionar qua-idade de vida e talvez influenciar positivamente no curso daoenca; ser aplicável no início da doenca, em conjunto comutras terapias que tencionam prolongar a vida; entender eanejar complicacões clínicas aflitivas.3

A OMS considera os CP como uma necessidade urgenteumanitária em todo o mundo para pessoas com câncer eutras doencas fatais. Nos países menos desenvolvidos, os CPssumem uma particular importância, porque uma alta par-ela dos pacientes é diagnosticada em estágios avancadose doenca, quando os tratamentos já não são efetivos.3

No Brasil, o envelhecimento da populacão, o aumentoa incidência de câncer e a emergência da síndrome damunodeficiência adquirida (Aids) geram uma necessidaderescente de que esses cuidados sejam ofertados no país.4

Em relacão ao câncer, dados do Datasus mostram ques neoplasias, em 2010, foram responsáveis por 15,74% dosbitos no Brasil e por 11,22% no Maranhão. Em números abso-utos, isso correspondeu a 178.990 óbitos no Brasil e 2.822 noaranhão.5 Em contrapartida, não há no país uma estruturae CP que corresponda à demanda existente. Há mínimaferta de leitos especializados e restrita às grandes cida-es. Dessa forma, a condicão em que os óbitos por câncercorreram, e continuam a ocorrer, deve ser alvo de reflexão.

Neste trabalho, serão discutidas as necessidades exis-entes para a estruturacão de um servico de CP dentro daealidade brasileira e será mostrada uma experiência de um

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rupo que contribuiu para que elas fossem alcancadas emm servico de oncologia.

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PRESSJ.B.S. Garcia et al.

elato da experiência

escricão geral

studo descritivo, do tipo relato de experiência, ocorrida nonstituto Maranhense de Oncologia Aldenora Bello (Imoab),m São Luís, Maranhão, de maio de 2010 a agosto de 2011.

obre o local do estudo

Imoab é um centro de alta complexidade oncológica, hos-ital de referência para câncer no Estado do Maranhão,esde sua fundacão, em 1966. Figura entre os 65 servicos deor e cuidados paliativos do Brasil apontados pela Associacãorasileira de Cuidados Paliativos (ABCP).

Conta com leitos de enfermaria para adultos e de oncope-iatria, um centro cirúrgico, unidades de terapia intensiva,ervico de Pronto Atendimento Oncológico, de Quimiotera-ia, de Radioterapia, além de atendimentos ambulatoriais.proximadamente 80% dos atendimentos prestados são peloistema Único de Saúde (SUS) e o restante por convênios ouarticulares.

Em 2003, foi estruturado o Servico de Dor e Cuidadosaliativos do Imoab, com consultas ambulatoriais e visitass enfermarias, contudo sem leitos destinados aos CP. Esseervico constitui um campo de atuacão para a Liga Acadê-ica de Dor do Maranhão (LAD-MA), da Universidade Federalo Maranhão (UFMA), a qual desempenhou papel fundamen-al na experiência a ser descrita.

stratégias de trabalho

oncurso de fotografia --- flashes de vidapesar da existência de um servico de CP na instituicão,sse ocorria nos ambulatórios e em enfermarias comuns,ão específicas, onde os pacientes que recebiam tratamentostavam ao lado de outros em momentos finais de vida.sso gerou muita inquietacão e comecou-se a pensar emomo colocar os CP em evidência na instituicão e chamartencão para o problema. Dessa maneira, surgiu o concursoe fotografia Flashes de Vida, uma forma encontrada dencentivar os profissionais do hospital a olhar seus pacientes,ercebê-los nas mais variadas situacões, suas necessidades,eus sofrimentos, suas alegrias, registrar esses olhares eisseminá-los tanto dentro quanto fora do Imoab.

Inicialmente foi elaborado um regulamento com todass informacões do concurso, bem como seus objetivosrimordiais. Esse regulamento foi deixado no Setor deumanizacão do hospital, com as fichas de inscricão, nasãos de profissionais envolvidos com o projeto que sabiamar as informacões e os incentivos necessários.

Para divulgacão foram afixados pôsteres nos flanelógrafoso hospital e distribuídos folhetos. A LAD-MA, junto a repre-entantes do Servico de Humanizacão, ainda fez visitas aosiversos setores do hospital para divulgar o concurso.

O concurso foi aberto a todos os funcionários do Imoab.

um servico de cuidados paliativos no Brasil --- Relato de016/j.bjan.2013.06.007

tinham de ser de pacientes da instituicão e feitas pelosuncionários. Cada paciente fotografado precisava assinar

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A estruturacão de um servico de cuidados paliativos no Bras

um termo de consentimento livre e esclarecido para permitiro uso das imagens pela organizacão.

Com o intuito de incentivar a participacão, os três pri-meiros colocados ganhariam prêmios em dinheiro e os seteseguintes ganhariam mencões honrosas. O concurso con-tou com o apoio da indústria farmacêutica, que garantiu osuporte financeiro para a premiacão.

O julgamento das fotos foi feito por profissionais, que nãotinham vínculo empregatício com o Imoab, de várias áreasde atuacão. A banca julgadora foi composta por um fotó-grafo, um artista plástico, um jornalista, uma enfermeira,uma psicóloga e um médico.

O concurso foi lancado no fim de maio de 2011 e se esten-deu até o início de agosto, data da cerimônia de premiacão.Essa se deu no auditório do Conselho Regional de Medicinae contou com a presenca de convidados, de funcionários eda direcão do hospital e de membros da LAD-MA. Posteri-ormente, foi divulgada em jornal local, que ocupou umapágina inteira com as fotos vencedoras e mensagens dehumanizacão.

As fotos foram usadas na decoracão do estande do labo-ratório que apoiou o projeto no 9◦ Congresso Brasileiro deDor, ocorrido em Fortaleza (CE) em outubro do mesmo ano.Ainda foram usadas na confeccão de calendários, que foramdistribuídos em hospitais e instituicões de ensino da cidade.

A partir do vislumbrado, a diretoria do Imoab anunciouque concederia três enfermarias, duas com dois leitos e umacom um leito, ao Servico de Dor e Cuidados Paliativos dohospital, destinadas a pacientes em fase final de vida.

O estado das enfermarias, contudo, suscitou questiona-mentos e reflexões quanto às condicões ideais de um localque se propõe a abrigar uma pessoa em seus últimos dias devida. Observou-se que para alcancar os princípios dos CP nohospital, e realmente proporcionar bem-estar aos pacientes,seria necessário adequar as enfermarias a esse propósito. E,com esse intento, entrou em cena outro projeto.

Projeto de extensão --- o quarto dos sonhos

O Quarto dos Sonhos foi uma parceria do Servico de Dore CP do IMOAB com o curso de arquitetura da UniversidadeFederal do Maranhão (UEMA). Consistiu em um projeto deextensão em que 11 acadêmicos do curso de arquitetura daUEMA foram inseridos no IMOAB, tiveram contato com a rea-lidade do hospital, com os CP, e foram desafiados a projetaro quarto ideal para um paciente sem perspectiva de cura eem fase final de vida.

Após sua aprovacão como projeto de extensão oficial daUEMA, o Quarto dos Sonhos levou três meses para alcancarseus objetivos iniciais, a saber: 1) criar um ambiente deacolhimento e de humanizacão para indivíduos cujas pers-pectivas de cura não mais existem, mas que almejambem-estar físico, mental, social e espiritual em sua estadano hospital, em muitos casos seus últimos dias antes de mor-rer; 2) inserir o aluno em situacões de projeto nas quais elepossa vivenciar o cotidiano de um hospital como o Imoab earticulá-lo com a prática projetual.

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experiência. Rev Bras Anestesiol. 2013. http://dx.doi.org/10.1

Os acadêmicos de arquitetura conheceram as instalacõesdestinadas aos CP, as demais enfermarias, o Servico de Dore CP e a LAD-MA. Em seguida, fizeram os levantamentosmétrico-arquitetônico e fotográfico das três enfermarias a

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PRESSelato de experiência 3

erem reformadas. Reunindo-se periodicamente com a suarientadora para revisão dos trabalhos, os alunos elabo-aram o projeto, que incluiu leiaute, plantas de reforma,aixa, de pontos, de teto e de piso e pelo menos quatro vis-as e detalhes, além das especificacões dos materiais e dosuantitativos dos servicos.

O projeto dos quartos foi apresentado a um públicoue reunia docentes de arquitetura, membros da LAD-MA,ncluído seu coordenador docente, funcionários e diretoriao Imoab e da fundacão que dá suporte ao hospital.

Os projetos apresentavam leitos confortáveis, comainéis nas cabeceiras, poltronas para os acompanhan-es, mesas para leitura, local para guardar pertences,urais de fotos, papéis de parede, frigobar, televisão, ar-

ondicionado. Os banheiros tiveram as portas alargadas eeceberam assentos sob os chuveiros, para que o pacienteudesse tomar banho ainda que não conseguisse ficar muitoempo de pé, e barras de apoio para evitar quedas. Aqui cabeessaltar que os alunos foram orientados a projetar tudo oue julgassem ser o melhor para os quartos, desde o piso e

iluminacão até os leitos.A apresentacão do projeto deixou os presentes deslum-

rados. A coordenadora do projeto apresentou o orcamento,ue foi aprovado pela presidente da fundacão, a qual assu-iu publicamente o compromisso de fazer dos quartos dos

onhos a nova realidade da instituicão para os pacientes emase final de vida.

iscussão

s CP constituem uma ciência ainda jovem: em 2012,ompletaram-se apenas 45 anos decorridos da fundacão dot. Christopher’s Hospice, por Cicely Saunders, fato quee considera marco inicial dos CP; 25 anos que os CPoram reconhecidos pela primeira vez enquanto especiali-ade médica, no Reino Unido; e 10 anos que a OMS publicouua definicão mais moderna e as novas recomendacões.3,6

Desde o seu nascimento, os CP têm se desenvolvido se disseminado pelo mundo em um ritmo rápido empressionante.6 Algumas razões são apontadas para seuápido crescimento, como o surgimento de defensores dosP, o alívio da dor ser considerado um direito humano, asecessidades decorrentes do envelhecimento da populacão

o desejo de prover um melhor cuidado aos pacientes emase final de vida.6

A despeito do crescimento expressivo, especialmente nosaíses em desenvolvimento, vários fatores atuam para tor-ar as acões de cuidados paliativos menos eficazes. Dentreles, destaca-se a existência de políticas para liberacão tar-ia e restrita de opioides, a falta de qualificacão dos recursosumanos e a escassez de investimentos na área.4

A OMS destaca três medidas fundamentais para o desen-olvimento de CP com uma abordagem de saúde pública:) uma política de governo que assegure a integracão doservicos de CP na estrutura e no financiamento do sistema deaúde nacional; 2) uma política de educacão que sedimente

formacão de profissionais de saúde e voluntários; e 3) uma

um servico de cuidados paliativos no Brasil --- Relato de016/j.bjan.2013.06.007

olítica de fármacos que garanta a oferta de medicamentosara o tratamento da dor e outros sintomas.7

Abordaremos agora esses e outros elementos apontadosa literatura como necessários para o estabelecimento de

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m servico de cuidados paliativos no Brasil e sua relacãoom nossos resultados.

humanizacão

m hospital, para ser adequado aos CP, necessita que o paci-nte seja o foco de atencão, e não sua enfermidade. É nontuito de que o cuidado do ser humano doente e a promocãoa sua saúde, entendida como o bem-estar completo, sejamfetivados que a humanizacão entra em campo. Portanto, aumanizacão é considerada algo indispensável a um localnde se queira praticar os CP.2

Encontramos no concurso de fotografia Flashes de Vidama forma de fortalecer a humanizacão no Imoab. Fazendoom que os funcionários parassem suas atividades cotidia-as, capturassem imagens dos pacientes e ainda difundissemssas imagens dentro e fora do hospital, o Flashes de Vidaolocou o paciente, sua situacão e seus sentimentos em des-aque.

O concurso ainda colocou em evidência o empenho doervico de Dor e CP do Imoab em melhorar o tratamentoos pacientes e sensibilizou a direcão do hospital, a qualestinou leitos de enfermaria exclusivamente aos pacientesm CP.

multidisciplinaridade

roporcionar qualidade de vida a um paciente fora de pos-ibilidade de cura é uma tarefa complexa, que requer umlanejamento interdisciplinar, com atuacão multiprofissi-nal. Dificilmente outra ciência tem uma abordagem tãoarcadamente multidisciplinar como os CP.2 Sua equipee trabalho abrange profissionais, pacientes, parentes e oúblico em geral, dedicados à prestacão contínua deuidados no âmbito mental (psicólogo, psicoterapeuta, psi-analista, psiquiatra), social (assistente social, voluntário),spiritual (padre, pastor, rabino, guru), biológico (médico,nfermeira, fisioterapeuta, terapeuta ocupacional) e emo-ional, tanto para o paciente quanto para seus entesueridos.8 Além desses, na dependência da evolucão clí-ica do caso, outros profissionais e especialistas poderão serhamados a cooperar com a equipe.

Este trabalho vem mostrar outra modalidade de profissio-ais que vem contribuir para a busca da qualidade de vida doaciente fora de possibilidades terapêuticas, os arquitetos.or meio do projeto de extensão Quarto dos Sonhos agrega-os a arquitetura no desenvolvimento dos CP. O resultadoessa parceria foram projetos de ambientes acolhedores,conchegantes, com minimizacão dos elementos hospitala-es, o mais próximo possível do ideal de lugar para alguémassar seus últimos dias de vida.

A parceria do Servico de Dor e CP com a arquitetura cons-ituiu um processo reprodutível que muito tem a acrescentaros CP na sua luta incessante para proporcionar qualidadee vida aos pacientes.

O concurso Flashes de Vida também auxiliou no fortaleci-ento da multidisciplinaridade, ao agregar funcionários do

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ospital em torno de um objetivo comum, o de enxergar oaciente oncológico. Isso despertou o interesse e promoveuontato de profissionais de diversas áreas com o crescimentoo Servico de CP no hospital.

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PRESSJ.B.S. Garcia et al.

educacão

reinamento especializado, conhecimentos básicos e habili-ades em CP são fundamentais para todos os profissionais deaúde que lidam com pacientes em fase final de vida, o queaz da educacão um aspecto crucial para o estabelecimentoesses cuidados.2 Uma maneira de se obterem avancos naifusão de uma prática em CP na área da saúde é preparar

educar futuros profissionais para lidarem com as necessi-ades de pacientes e parentes que enfrentam doencas quemeacam a vida.9

Em 2011, a medicina paliativa foi aceita como área detuacão pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), comempo de formacão de um ano e tendo como requisito oítulo de especialista pela associacão médica em anestesio-ogia, cancerologia, clínica médica, geriatria, medicina deamília e comunidade ou pediatria.10

Isso constituiu um avanco dos CP no país. Contudo, onsino dos CP ainda é precário no Brasil. São raras asaculdades que fornecem alguma informacão sobre a área,eralmente fazendo-o em disciplinas eletivas.11 Há a neces-idade urgente de inclusão da educacão sobre os princípiosos CP nos cursos de graduacão da área da saúde, bemomo na pós-graduacão, na qual também há poucos cursose especializacão nas mais diversas regiões.4

A formacão de ligas acadêmicas na área é algo que ajuda contornar a carência de informacão sobre os CP nos currí-ulos dos cursos da área da saúde. É importante fomentar ariacão de ligas acadêmicas nas instituicões de ensino supe-ior do Brasil, notadamente nos cursos da área da saúde, eferecer suporte teórico e didático.9

A Liga Acadêmica de Dor do Maranhão (LAD-MA) é umaiga multidisciplinar que conta com acadêmicos de enferma-em e medicina, atuantes no Servico de Dor e CP do Imoab.esde sua fundacão, a liga promove cursos, abertos a todoúblico, sobre dor e CP. A Universidade Federal do Mara-hão, à qual a liga está vinculada, tem o ensino dos CP narade curricular do curso de medicina.

A LAD-MA desempenhou papel fundamental em todass etapas da implantacão dos CP no hospital, desde adealizacão até a promocão das estratégias de trabalho aquielatadas.

Um dos desafios para a formacão em CP no país é a exis-ência de poucos centros especializados.4 A estruturacão dem servico de CP em nosso hospital, além de todos os bene-ícios intrínsecos à sua criacão, constituirá um campo detuacão para a LAD-MA e contribuirá, assim, para a educacãoesses futuros profissionais em relacão ao cuidado de paci-ntes em fase final de vida e possibilitará sua ampliacão parama Liga de Dor e Cuidados Paliativos.

Vale ressaltar, ainda, o aprendizado que os alunos dourso de arquitetura da Uema puderam experimentar com

projeto Quarto dos Sonhos, o que mostra a evidenteelacão entre CP e ciências que vão além da área da saúde.

oferta de fármacos

um servico de cuidados paliativos no Brasil --- Relato de016/j.bjan.2013.06.007

uando um paciente se encontra no estágio final de umaoenca incurável, tratamento intensivo da dor e de outrosintomas é frequentemente requerido para preservar suaualidade de vida.12 Uma questão essencial para uma

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A estruturacão de um servico de cuidados paliativos no Bras

estruturacão adequada dos CP na América Latina é a ofertarápida e contínua de opioides.4

Em nosso país, a oferta de analgésicos para o controle dador é limitada, restrita a poucas farmácias e inexistente emalguns municípios.11 O emprego adequado e recomendadopela OMS dos opioides ainda é desconhecido e discriminadopor profissionais de saúde.13 Paralelamente a isso, podemosressaltar ainda a ideia que a populacão tem em relacão àmorfina, como destinada a pacientes em agonia, que podeapressar a morte e que seu uso está sempre associado aovício.11,14

Recentemente, o governo federal lancou uma portariaque amplia o arsenal de analgésicos e adjuvantes para otratamento da dor crônica e contempla esses parâmetros,apesar de algumas limitacões, como o número de medi-camentos opioides, que continua sendo restrito à codeína,morfina e metadona.15

Nossa experiência mostrou a viabilidade de implantacãode CP intra-hospitalar a partir de um servico jáestabelecido de dor e CP ambulatorial, em que as difi-culdades quanto à oferta de fármacos já vinham sendosolucionadas. O Imoab dispõe há alguns anos de umafarmácia estruturada que dispensa aos pacientes medica-mentos para controle de dor, náuseas, vômitos, insônia,constipacão, dentre outros. Esse pano preliminar é degrande importância na sedimentacão dos CP em um hospital.

Apoio dos governos

Um dos maiores obstáculos apontados na literatura2,6 paraviabilizacão de programas de CP nos países em desenvolvi-mento é a falta de compromisso dos governos com a filosofiados CP. Nesses países, e aqui se inclui o Brasil, muitasdas dificuldades ao estabelecimento de servicos deCP decorrem da ausência de estratégias governamentaisconsistentes e de uma política nacional de alívio da dorgerada a partir da escuta e ampla discussão com as soci-edades envolvidas com a dor.

O papel dos governos é tão importante que determina aforma com que os CP se desenvolvem em determinado país.Em âmbito global, são descritos dois cenários de desenvolvi-mento dos CP: as abordagens ‘‘de baixo pra cima’’ (bottomup) e ‘‘de cima pra baixo’’ (top down).6

O modelo bottom up é caracterizado por um enérgicogrupo de ativistas que identificam uma necessidade local einiciam suas atividades para melhorar o cenário. Foi dessaforma que os CP se iniciaram em países como o Zimbá-bue e Myanmar, quando Maureen Butterfield e U Hla Tun,respectivamente, fundaram os primeiros servicos de CP des-ses países, após contato com pacientes oncológicos, ambosdevido ao acometimento de suas filhas pela doenca.6

Já o modelo top down ocorre quando o Ministério daSaúde se envolve nos estágios iniciais, fomentando, legis-lando, criando uma política nacional e incorporando, porfim, os CP ao sistema nacional de saúde do país. Esse foi omodelo adotado pelas Filipinas, pela Mongólia e pelo Caza-

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experiência. Rev Bras Anestesiol. 2013. http://dx.doi.org/10.1

quistão e constituiu característica central do projeto da OMSna África.6

A implementacão de uma rede para CP consistente eorganizada constitui uma tarefa desafiadora. Apesar de

PRESSelato de experiência 5

odas as iniciativas governamentais, a implementacão dosP no sistema de saúde brasileiro é lenta e desarticulada.4

Em nosso país, frente aos obstáculos, foi construída umadentidade comum aos profissionais de CP, a de militantea causa da humanizacão do morrer. Constata-se a existên-ia de servicos criados e mantidos gracas à forca e dedicacãoe pessoas ou grupos que trabalham duramente como advo-ados da causa e enfrentam a burocracia governamentalara criar servicos de cuidados paliativos. Os servicos de CP,o Brasil, têm características próprias e peculiares e nasce-am em sua maioria de servicos de dor dentro dos hospitais.4

A experiência relatada segue a tendência nacional deriacão de servico de CP a partir de servicos de dor. O Servicoe Dor do Imoab foi ganhando espaco e importância den-ro do hospital. Contando com uma farmácia que ofereceedicacões para analgesia adequada dos pacientes oncoló-

icos e com o apoio da direcão do hospital, foi-se criandom ambiente favorável para o desenvolvimento dos CP.

Este trabalho veio mostrar algumas iniciativas locais queodem, como tem acontecido em outros servicos de nossoaís, burlar a carência que existe de políticas nacionais narea e viabilizar a implantacão de um servico de cuidadoaliativo. Foram relatadas ferramentas reprodutíveis queedimentaram a implantacão dos CP a partir de um servicoe dor em um hospital oncológico.

O International Observatory on End of Life Care (Ioelc)firmou que é quando somamos os modelos top down eottom up, ou seja, combinamos energia local com umaolítica nacional, que se tem um alcance máximo deobertura, educacão, recursos, oferta de medicamentos erescimento.6

Muitos governos ainda precisam reconhecer que osP devem ser incluídos nas políticas e nos servicos deaúde e ser persuadidos disso. Para tanto, são necessáriasemonstracões da eficácia dos CP. É sabido que iniciati-as locais não substituem uma política nacional. Mas comlas é favorecido um número cada vez maior de pacientes,

que torna evidente a eficácia dos CP, para que esses seortalecam e encontrem de uma vez por todas o espaco querecisam alcancar.

onclusão

niciativas locais relativas aos CP têm grande valor em nossoaís, ao tornar acessível esse tipo de atencão e demonstrar àociedade sua eficácia. Entretanto, faz-se necessário o esta-elecimento pelo governo federal de uma política nacionale saúde dirigida, que consolide os CP no Brasil.

onflitos de interesse

s autores declaram não haver conflitos de interesse.

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