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A CONTÍNUA FORMAÇÃO DO PROFESSOR QUE ENSINA MATEMÁTICA: PNAIC/2014 Laynara dos Reis Santos Zontini Professora do IFPR Irati e doutoranda do PPGE-UEPG [email protected] Nelem Orlovski Prefeitura Municipal de Curitiba [email protected] Luciane Ferreira Mocrosky Professora da UTFPR e do PPGECM-UFPR [email protected] Resumo: Este artigo expõe aspectos de uma pesquisa que tem se dedicado a investigar a formação do professor que ensina matemática nos anos iniciais, assumindo os modos de proceder da pesquisa qualitativa na abordagem fenomenológica. Em nosso campo de interesse, está a formação continuada desses professores e nesse contexto destacamos o Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa (PNAIC), pela abrangência desse programa. A caminhada percorrida foi em busca das características essenciais que pudessem revelar aspectos formativos movimentados nos cursos de formação que permanecem como marcas do vivido, na ótica de professores que participaram do PNAIC. Pela análise e interpretação dos depoimentos de 27 professores do estado do Paraná, que participaram da formação em matemática, destacaram-se as contribuições do programa para a prática pedagógica, mais especificamente aquelas que instrumentalizam o professor com metodologias de ensino para tópicos específicos do currículo. Com base nas análises realizadas até o momento, um dos aspectos mais enfatizados no que se refere à formação professor no PNAIC, tem se concentrado em torno da ludicidade e da utilização de materiais concretos no ensino da matemática no ciclo de alfabetização. Palavras-chave: Formação de professores. Anos iniciais. PNAIC. Introdução Este estudo teve origem em discussões realizadas no “Grupo de Estudos e Pesquisa em Formação de Professores” (GEForProf-UTFPR), que tem se dedicado a investigar a formação do professor que ensina matemática nos anos iniciais, assumindo os modos de proceder da pesquisa qualitativa na abordagem fenomenológica. Em nosso campo de interesse, está a

A CONTÍNUA FORMAÇÃO DO PROFESSOR QUE ENSINA MATEMÁTICA: PNAIC/2014

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A CONTÍNUA FORMAÇÃO DO PROFESSOR QUE ENSINA

MATEMÁTICA: PNAIC/2014

Laynara dos Reis Santos Zontini

Professora do IFPR – Irati e doutoranda do PPGE-UEPG

[email protected]

Nelem Orlovski

Prefeitura Municipal de Curitiba

[email protected]

Luciane Ferreira Mocrosky

Professora da UTFPR e do PPGECM-UFPR

[email protected]

Resumo: Este artigo expõe aspectos de uma pesquisa que tem se dedicado a investigar a formação do professor

que ensina matemática nos anos iniciais, assumindo os modos de proceder da pesquisa qualitativa na

abordagem fenomenológica. Em nosso campo de interesse, está a formação continuada desses

professores e nesse contexto destacamos o Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa (PNAIC),

pela abrangência desse programa. A caminhada percorrida foi em busca das características essenciais

que pudessem revelar aspectos formativos movimentados nos cursos de formação que permanecem

como marcas do vivido, na ótica de professores que participaram do PNAIC. Pela análise e interpretação

dos depoimentos de 27 professores do estado do Paraná, que participaram da formação em matemática,

destacaram-se as contribuições do programa para a prática pedagógica, mais especificamente aquelas

que instrumentalizam o professor com metodologias de ensino para tópicos específicos do currículo.

Com base nas análises realizadas até o momento, um dos aspectos mais enfatizados no que se refere à

formação professor no PNAIC, tem se concentrado em torno da ludicidade e da utilização de materiais

concretos no ensino da matemática no ciclo de alfabetização.

Palavras-chave: Formação de professores. Anos iniciais. PNAIC.

Introdução

Este estudo teve origem em discussões realizadas no “Grupo de Estudos e Pesquisa em

Formação de Professores” (GEForProf-UTFPR), que tem se dedicado a investigar a formação

do professor que ensina matemática nos anos iniciais, assumindo os modos de proceder da

pesquisa qualitativa na abordagem fenomenológica. Em nosso campo de interesse, está a

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formação continuada e nele vimos destacando o Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade

Certa (PNAIC), pela abrangência desse programa1.

Com o objetivo de assegurar que todas as crianças brasileiras estejam alfabetizadas ao

final do 3º ano do Ensino Fundamental, estabeleceu-se desde 2012 um compromisso formal

entre as três esferas governamentais, federal, estadual e municipal: um Pacto Nacional pela

Alfabetização na Idade Certa (PNAIC). Suas ações estão estruturadas a partir de quatro eixos

de atuação: formação continuada presencial para os professores alfabetizadores e seus

orientadores de estudo; materiais didáticos, obras literárias, obras de apoio pedagógico, jogos e

tecnologias educacionais; avaliações sistemáticas; gestão, mobilização e controle social

(BRASIL, 2012).

De acordo com o “Manual do Pacto”, disponível no portal do MEC

(http://pacto.mec.gov.br/), esse programa preserva algumas características do Pró-letramento,

um programa também governamental voltado à formação de professores. Ou seja, há um

movimento de formação continuada que já está presente na educação brasileira há tempos e que

tem se mostrado contínuo, principalmente em relação ao número de professores que

participaram e que permanecem envolvidos.

No que se refere ao eixo de formação continuada, o PNAIC abrangeu a adesão de

praticamente 100% dos estados e municípios brasileiros e apresenta-se como “a política da vez,

para que as redes de ensino públicas melhorem seu desempenho nos anos iniciais do

fundamental” (MARQUES, 2014, p.01).

Até o momento foram realizadas duas etapas de formação: a primeira dedicada à língua

portuguesa, com 120h, e a segunda, com 160h, focou a alfabetização matemática em 120h de

estudos e nas 40h restantes, retomou conteúdos de língua portuguesa.

Em relação à 2014, em que a alfabetização matemática esteve no centro do programa,

pode-se considerar com base em leituras dos cadernos de formação (material didático

disponível em: http://pacto.mec.gov.br/2012-09-19-19-09-11), que os pressupostos

apresentados, evidenciavam o caráter sociocultural do conhecimento matemático como uma

abordagem para nortear o trabalho pedagógico no que tange ao ensino de matemática,

aproximando-o das necessidades vivenciadas pelas pessoas e ao mesmo tempo possibilitando

colocar em foco a interlocução da matemática com outras áreas do conhecimento. São ações

1 De acordo com dados divulgados pelo MEC, 5.494 municípios – entes federados responsáveis pelos anos iniciais

do Ensino Fundamental e, portanto, pelo ciclo de alfabetização – aderiram ao Pacto até o momento. “O número

equivale a 99% do território brasileiro. Ao todo, cerca de 311 mil professores alfabetizadores já passaram pelos

ciclos de formação” (TPE, 2015, p.01).

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que se dirigem à uma formação que abra possibilidade de, pela problematização, se fazer leitura

crítica do mundo e de seu modo de viver em que a preocupação consigo e com os outros

colocam em destaque o compromisso com a construção do mundo em que se vive. Assim,

considerou-se a importância de se assumir um entendimento de alfabetização matemática na

perspectiva do letramento (BRASIL, 2014). De acordo com Izumi (2015, p.01) isso significa

que no programa “a alfabetização matemática é entendida como um instrumento para a leitura

do mundo, superando a simples decodificação dos números e a resolução das quatro operações

básicas.”

Considerando o andamento desse programa, que iniciou suas ações de formação em

2013 e, em 2014 voltando o foco na formação matemática, perguntamo-nos pelo que tem

permanecido no cotidiano do docente, ou seja, quais aspectos formativos do PNAIC

permanecem como marcas do vivido na ação pedagógica do professor em sala de aula?

Com essa questão iniciamos uma pesquisa que tem por meta conhecer o PNAIC, as

marcas desse programa, pela expressão do professor em forma-ação (Bicudo, 2003), ou seja,

no movimento de ações que se endereçam a dar uma forma para que o “ser” professor que

ensina matemática continue “sendo”.

Trataremos de apresentar o início deste estudo, com os primeiros indícios de como os

professores que ensinam matemática nos anos iniciais estão compreendendo a formação e se

compreendendo professor pelas aberturas ensejadas pelo PNAIC.

Percursos metodológicos

Mesmo que ainda recente, o PNAIC começa a mostrar algumas formas que geram ações

em contínuo movimento de vir a ser na prática docente, e por isso vão deixando em destaque,

marcas - entendidas como identificações, o que sobressai, reconhecimento, percepções e

compreensões deixadas por alguma experiência, neste caso, por uma experiência formativa.

Encerrados os momentos da formação programados do PNAIC em matemática junto às

universidades, mas com a intenção de permanente acontecimento nos municípios, voltamos a

alguns deles retomando alguns pressupostos do PACTO e reforçando o compromisso assumido

com a alfabetização das crianças.

Em uma dessas oportunidades, trabalhamos com 27 professores que atuam nos anos

iniciais do ensino fundamental, 7 de um município do norte do Paraná e 20 da região

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metropolitana de Curitiba2. Ao final de um curso de 8h, que envolveu uma palestra sobre o

PNAIC e outras atividades sobre o ensino de matemática nos anos inicias, solicitamos dos

professores depoimentos sobre a experiência vivida no PACTO. Cada docente entregou registro

escrito com seu depoimento, os quais constituíram dados de pesquisa.

Os depoimentos foram analisados-compreendidos, segundo a abordagem

fenomenológica, tal qual expressa em Bicudo (2011), tendo como norte a interrogação: quais

aspectos formativos movimentados nos cursos de formação permanecem como marcas do

vivido?

Ao atentar para as falas dos docentes sobre o PNAIC, os professores revelaram

espontaneamente seu entendimento, permitindo, pelas suas expressões do vivido, que as

pesquisadoras compreendessem seu mundo-vida e os significados do dito, ou seja, “expressões

claras sobre as percepções que o sujeito tem daquilo que está sendo pesquisado, as quais se

expressam pelo próprio sujeito que as percebe” (MARTINS, BICUDO, 1989, p.93).

A caminhada percorrida foi em busca das características estruturantes que pudessem

revelar aspectos formativos movimentados nos cursos de formação que permanecem como

marcas do vivido na ótica de professores que participaram do PNAIC. Para isso, com os textos

de cada depoimento, iniciou-se o movimento de redução para a análise da experiência vivida.

A redução fenomenológica é o recurso fundamental para garantir a descrição

fiel do fenômeno. A redução põe em evidência a intencionalidade da

consciência voltada para o mundo, ao colocar entre parênteses a realidade

como a concebe o senso comum, e purificar o fenômeno de tudo o que

comporta de “inessencial” e acidental, para fazer aparecer o que é essencial

(SADALA, 2004, p.03).

Com esses relatos em mãos, destacamos alguns trechos significativos ao perguntado,

portanto, que trataram de explicitar as marcas que o PNAIC tem deixado na contínua formação

dos professores. Estamos cientes de que ouvimos um grupo pequeno de professores,

considerando a grande abrangência do programa. Entretanto, consideramos significativo à

pesquisa qualitativa pela possibilidade de fomentar discussões sobre o PNAIC.

O Pacto pela Alfabetização Matemática na formação continuada: o que nos dizem os

professores

2 Para preservar a identidade dos professores, optamos por não divulgar seus nomes e nem o nome do município,

tendo em vista que nosso interesse estava no que foi dito e não em quem disse.

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Ao ouvirmos alguns professores que participaram da formação promovida pelo PNAIC

no ano de 2014, no estado do Paraná, sobre suas experiências com a formação, destacaram-se

nos depoimentos, as contribuições para a prática pedagógica, mais especificamente aqueles que

instrumentalizam o professor com metodologias de ensino para tópicos específicos do

currículo. Sobre modos de ensinar matemática às crianças, as professoras evidenciaram:

P1: Achei bastante interessante e motivador, por se tratar do concreto, no qual

os alunos possam tocá-los. Através de jogos e brincadeiras adquirem o

aprendizado.

P8: Faço atividades com jogos, pois é atrativo e os alunos gostam.

P9: Os jogos são de grande importância para a aprendizagem: a criança

aprende brincando.

Entendemos que o que chamou a atenção do professor em formação revela a valorização

do uso do material concreto, pelas características de se doarem aos sentidos dos alunos, no caso

a visualização e a manipulação que podem favorecer a compreensão do conteúdo estudado em

sala de aula. Além disso, explicitam a importância do lúdico como um aspecto que se destaca

pela possibilidade de mobilizar o interesse e a participação das crianças nas aulas de matemática.

O lúdico, por sua vez, compareceu nos depoimentos ligado ao jogo, compreendido pelos

professores como recurso que promove a aprendizagem das crianças de um modo mais

“prazeroso, divertido”. Tal como é explicitado a seguir:

P4: O que percebo é a grande diversidade de materiais que preparamos e ainda

que quando utilizados percebemos a diferença. Torna-se prazeroso dar aulas

utilizando esses recursos, principalmente em matemática com jogos de

abordagens diferentes. Contribuiu e muito tanto para nós quanto para os

alunos.

P7: Com o curso Pacto foi mais fácil lidar com as atividades. O lúdico sempre

presente fez com que os alunos mostrassem interesse nas atividades e com isso

a sala se interagia todos juntos realizando em equipes e se divertindo.

P10: Uma maneira gostosa, extrovertida e suave de se aprender matemática,

pois defendemos a tese do lúdico como auxilio ou uma ponte entre a disciplina

e o aluno. Fazendo com que os Alunos se interessem pela Matemática e que

possam sentir prazer em praticá-la e mostrar que no dia-a-dia usam a

Matemática sem nem ao mesmo se dar conta que ela está presente no seu

cotidiano.

Uma possível interpretação para o explicitado pode ser realizada com a ajuda da análise

feita por Oliveira e Oliveira (2013) em dissertações e teses brasileiras publicadas entre 2005 e

2010 sobre a formação matemática3 dos professores que atuam nos anos iniciais. Tal análise

explicita que:

3 Essa pesquisa analisou a formação inicial desses professores, considerando prioritariamente os cursos de

pedagogia.

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[...] a prática formadora, por priorizar, em geral, os aspectos metodológicos,

tende a reforçar a ideia de que pode ser “divertido” ensinar ou aprender

Matemática, mas os recursos apresentados não são acompanhados,

normalmente, de uma fundamentação que capacite o professor a utilizá-los

como uma ferramenta de produção de conhecimento (OLIVEIRA e

OLIVEIRA, 2013, p. 11).

Dessa forma, mesmo que o professor tenha conhecimento sobre as metodologias, por

não ter conhecimento matemático “provavelmente não conseguirá extrair delas bons resultados

quando (e se) as utilizar em sala de aula” (OLIVEIRA e OLIVEIRA, 2013, p. 11).

Nesse aspecto, o material do programa mostra preocupação com o conteúdo

matemático, com ênfase no estudo para que o conteúdo matemático em movimento torne-se

formativo ao aluno, por isso a discussão sobre as metodologias. Todavia, os aspectos

metodológicos ainda se mostram muito fortes no discurso dos professores que ensinam

matemática nos anos iniciais.

Nacarato (2005) trata da questão do concreto ter sido incorporado pelos professores,

sem uma reflexão sobre o que seria esse concreto para ensinar matemática. Do mesmo modo

como outros autores alertam para que a ênfase exagerada na ludicidade pode produzir um

esvaziamento do conteúdo matemático escolar. O lúdico é o que tem relação com o jogo e com

a brincadeira, nesse caso, sem o devido foco no conteúdo matemático corremos o risco de

realizar diversas atividades que não cumpram seu papel pedagógico.

O PNAIC propôs uma forma de pensar a educação pela matemática e não para a

matemática, ou seja, não perde de vista o conteúdo matemático a ser ensinado, mas enfatiza

preocupação com a ação social que esse conhecimento pode mobilizar. O alfabetizar letrando

revela essa postura de ter um conteúdo matemático que deve ser ensinado com o objetivo de

auxiliar na formação do indivíduo.

De modo que, nos preocupa perceber que a valorização da matemática divertida pode

se sobrepor ao conteúdo matemático que precisa ser ensinado para a formação de um cidadão

crítico e atuante na sociedade. A busca pela matemática divertida, pelo tornar a aula “prazerosa”

se mostra como uma busca do professor em quebrar o ciclo do não gostar de matemática em

professores e alunos. Mas para além do lúdico, é preciso trabalhar com as relações, sentidos e

significados; daí os conteúdos podem ter sentido.

Em formação continuada os professores têm a oportunidade de refletir também sobre o

modo como aprenderam e, portanto, o como ensinam: matemática trabalhada em aulas

mecânicas, difíceis e consideradas não prazerosas.

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Segundo Nacarato o “mito do uso do material concreto para que as crianças aprendam

matemática” se sobressaiu nos discursos de professores nos anos 1990, mas surgiu nos anos

1920 com o ideário empírico-ativista, o que não faz com que a autora descarte as importantes

contribuições da psicologia à educação matemática, bem como também considera fundamentais

as contribuições de Piaget, no entanto o que a autora nos chama a atenção é que mesmo o foco

de atenção das pesquisas em educação matemática a partir dos anos 1980 tenham aberto

possibilidades para o uso das tecnologias, da resolução de problemas, etc. , e o professor em

sua sala de aula, ainda têm mantido sua atenção ao concreto, sem muitas vezes, compreender o

que eles significam enquanto possibilidade de aprendizagem nas aulas de matemática.

Como se pode observar de mais alguns recortes:

P5: O Pacto veio contribuir muito para com os alunos. Os materiais foram

interessantes e bem diversificados.

P6: Comecei a me preparar mais a cada conteúdo dado e a criar metodologias

diferenciadas de modo a apreender a atenção dos alunos e a ter melhor

resultado na aprendizagem. No começo de cada nova metodologia foi bastante

trabalhoso e difícil para a execução, mas com o comprometimento e o

entusiasmo dos alunos, você percebe que vale a pena planejar e trabalhar num

modo lúdico com as crianças.

O que talvez tenha ficado ocultado em meio a tanta “novidade colorida” com o trabalho

de jogos e ludicidade nas formações do PNAIC seja a questão dos significados e das intenções

pedagógicas que ficaram na margem, quando talvez, precisariam ter se mostrado nucleares.

Diante destas considerações nos perguntamos o que significa concreto em se tratando

do ensino de matemática.

No próprio material de formação do PNAIC (caderno 8) há uma explicitação sobre isso

no artigo escrito por José Lopes Bigode:

Para Freudenthal expõe que a “Educação Matemática Realista”, além de ser

uma ciência fundamentalmente amparada em relações, é essencialmente uma

atividade humana, é deste pressuposto que o autor defende que no ensino de

matemática precisa-se dar ênfase às relações com a realidade vivida pelo

aluno, e não apenas a criação de simulações artificiais com o propósito de

exemplificar a aplicação de um conteúdo matemático (BRASIL, 2014, p. 04).

Para o autor:

os alunos devem começar explorando e problematizando, a partir de contextos

ricos de significado que possam ser matematizados ao invés de começarem

por abstrações e definições prontas. Para este pensador, as tarefas matemáticas

a serem propostas às crianças não deveriam ser um mero jogo de símbolos,

como ocorre quando as crianças têm que resolver uma conta armada,

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mecanicamente, sem pensar na natureza do que está sendo calculado e sem

uma significação para os números envolvidos (BRASIL, 2014, p. 04).

Chama a atenção de que o ensino e a aprendizagem de matemática na escola precisam

se originar da realidade, o que não significa considerar apenas a questão do que é concreto, real,

mas significa pensar no que é realizável, imaginável aos alunos, não apenas o que é

concreto/palpável, mas o que, no pensamento, torna-se uma concretude (“tornar real na

mente”).

Nacarato (2005), nesta mesma direção, explicita que essa tentativa de aproximar a

matemática ao vivido pelo aluno na tentativa de dar concretude ao conceito matemático, esbarra

na simples constatação de que uma situação ou um material pode estar representando para o

professor uma articulação com o acontecimento de um conceito matemático, mas isso não

implica que significará o mesmo para a criança.

A autora alega que há um salto que nem sempre é acompanhado pelos alunos, ou seja,

os professores introduzem uma noção, mas ao se chegar a ela (algoritmo, propriedade, etc.) o

contexto é desconsiderado e salta-se para o trabalho com isso no abstrato. O fato é que para que

isso, o uso de materiais, cumpra seu objetivo, é necessário que haja o envolvimento da criança:

precisa fazer sentido para ela, e não apenas para o professor.

Além do aluno interagir com o material ou situação lógica é necessária uma

interpretação das relações implícitas ao uso do material ou no jogo, como a exemplo do uso de

material dourado, ao pedir que os alunos façam a representação do 10, o que está intencionado?

– neste caso solicita-se que a criança represente o material e não a relação do agrupamento.

Além da interação do aluno com o material é necessário que o professor compreenda

que o seu uso, ou atividades experimentais precisariam ser o ponto de partida para o ensino e

aprendizagem da matemática das crianças e não a finalidade.

Sintetizando algumas compreensões

Com as análises realizadas até o momento, entende-se que um dos aspectos que mais se

destacou no que se refere à formação professor do ciclo de alfabetização no PNAIC, com base

nos depoimentos de um grupo de professores, tem se concentrado em torno da ludicidade e da

utilização de materiais concretos.

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Nesse aspecto, nos preocupa que a excessiva ênfase na ludicidade apenas pela sua

característica de “divertimento” pode acarretar em um esvaziamento do conteúdo matemático

nos anos iniciais.

Pela postura do PNAIC em relação ao alfabetizar letrando, o ensino da matemática nos

anos iniciais tem um papel formativo, temos um conteúdo a ser ensinado e uma preocupação

com a formação do cidadão. O programa enfatiza um ensino pautado no aluno, que precisa

aprender e articular o aprendido para além da sala de aula.

O objetivo, de acordo com o MEC, é formar educadores críticos, que proponham

soluções criativas para os problemas enfrentados pelas crianças em processo de alfabetização

(IZUMI, 2015, p.01).

Entretanto, pelas vozes dos professores atuantes nos anos iniciais e participantes das

formações, o aspecto da ludicidade também se mostrou em uma possível abertura para que o

aluno dos anos iniciais consiga compreender os conteúdos matemáticos escolares, dando

sentido aquilo que foi aprendido pelo professor de forma mecânica. O professor dos anos inicias

tem dificuldade com a matemática, tem medo da matemática (ZONTINI, 2014) e busca superar

isso na formação continuada; procurando perceber para si e ensinar para o seu aluno um

conteúdo matemático significativo, que faça sentido e que contribuía em aspectos formativos.

Se por um lado temos a sinalização de que pode haver um movimento de esvaziamento

de conteúdo, por outro temos a possiblidade de abertura de criação de ações dentro da sala de

aula que venham ao encontro da intenção do professor dos anos iniciais de ensinar matemática

às crianças de um modo que elas compreendam-se aprendendo. De um modo ou de outro o que

se sobressai é a condição de buscar por entendimentos acerca do conteúdo matemático escolar

e seu ensino constantemente.

Isto nos mostra que a formação pretendida pelo PNAIC solicita continuidade

permanente ou ainda uma forma-ação como um movimento que ora é coordenado pela forma

de ser professor, ora pela ação que modela uma (essa) forma, no sentido de que seja possível

ao professor compreender-se formando e se formando.

A formação continuada tem contribuído para a reflexão do professor sobre os seus

saberes matemáticos e sua prática pedagógica, se colocando como um movimento que não para,

que não pode parar. O professor se constitui professor sendo, atuando e refletindo sobre sua

ação; assim o momento de formação continuada tem se mostrado necessário para manter o

movimento de forma-ação do professor.

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