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84 Arteriais | revista do ppgartes | ica | ufpa | n. 04 Jul 2017
A CONCEPÇÃO INTERVALAR NA POÉTICA PÓS-RUPTURA:UMA ANÁLISE DA SONATA N.º 3 DE ALMEIDA PRADO
Edson Hansen Sant‘AnaIFMT-MT
Resumo
Este trabalho demonstra a teorização que venho
desenvolvendo nestes últimos anos (2009-2016)
sobre a póetica de Almeida Prado no pós-ruptura ao
tonalismo. Este texto aborda sobre o espaço multi-
sistêmico do compositor, chamado transtonalismo,
bem como trata da comprovação analítica voltada
para o problema intervalar em uma das obras
utilizadas para uma pesquisa mais abrangente,
que se ampliou e se verificou ocorrente em mais
de 100 obras do compositor. Venho propondo a
superação terminológica do conceito anteriormente
fundado pelo compositor como expressividade intervalar em direção a um novo termo definifo
como intervalo característico. Como estudo e
comprovação pontual, construo uma análise da
Sonata n.03 como uma obra representante da fase
Pós-Tonal, entendendo que todo esse mecanismo
intervalar ocorre em obras de outras duas fases
subsequentes, as fases Síntese e Pós-Moderna.
INTRODUÇÃO
A preocupação central deste trabalho manteve-
se em verificar a importância da concepção intervalar nas fases pós-ruptura da composição
de Almeida Prado. Pretendeu-se constatar se
algumas hipóteses e resultados quantos aos
problemas intervalares configurados a partir da
pesquisa anterior (O AUTOR, 2009c), poderiam ser
validados em outras obras musicais pertencentes
às fases Pós-tonal, Síntese e Pós-Moderna, o que
de fato se configurou nesta obra Sonata n.0 3, nas
Cartas Celestes I e no Noturno n.0 7. É oportuno
mencionar que em outras 119 obras do compositor
de 130 consultadas no Centro de Documentação
Palavras-chave:
Intervalo característico, Transtonalismo, Siste-
mas musicais.
Keywords:
Characteristic Interval, Transtonality, Musical
Systems.
Abstract
This work demonstrates the theorization that I have been developing in recent years (2009-2016) about the poetry of Almeida Prado in the post-rupture to tonalism. This text deals with the multi-systemic space of the composer, called transtonalism, as well as dealing with the analytical evidence focused on the interval problem in one of the works used for a more comprehensive research, which has been expanded and occurred in more than 100 works of the composer. I have proposed the terminological overcoming of the concept previously founded by the composer as interval expressivity towards a new term defining as a characteristic interval. As a study and timely verification, I construct an analysis of Sonata no. 3 as a work representative of the Post-Tonal phase, understanding that all this interval mechanism occurs in works of two subsequent phases, Synthesis and Postmodern phases.
Música Contemporânea da Universidade Estadual
de Campinas (CDMC-UNICAMP) foram detectadas
presença marcante desse fenômeno ora
denominado como intervalo(s) característico(s).
Diante da necessária revisão bibliográfica, que
vem sendo realizada desde 2009, sendo estendida
até ao presente momento (2009-17), e como
consequência desse processo, tem sido possível
firmar um posicionamento discordante quanto aos
enfoques e métodos analíticos aplicados em um
número considerável de pesquisas que trataram
sobre as obras de Almeida Prado. Assim, pretendi
que esta análise e seus resultados, pudessem
ser uma alternativa em relação àquelas análises
85
provenientes das tendências acadêmicas atuais de
se reportarem à macro-média-micro análise de
White (1994), à análise schenkeriana e à Teoria dos
Conjuntos de Forte (1973).
Especificamente procurou-se obter um tipo de
abordagem analítica que fosse mais diretamente
oriunda da composição, ou seja, que fosse
condizente com a poética de Almeida Prado. Uma
análise que pudesse evidenciar a concepção intervalar que o compositor aplicou em cada
uma das três obras escolhidas para a pesquisa
de doutorado. Entretanto, para este específico
texto, apresento somente as abordagens analíticas
aplicadas na Sonata n.0 3. Para tanto, relembre-se
que o compositor formulou suas construções a partir
de conceituações como um “novo espaço sonoro”
(PRADO, 1985, p. 530-539), do que é “pandiatonal”
(MOREIRA, 2002, p. 75), do seu “sistema transtonal
de ressonâncias” (YANSEN, 2005, p. 212), dos
“mecanismos intervalares” (NADAI, 2007, p. 117)
e da “expressividade intervalar” (NADAI, 2007, p.
117), (O AUTOR, 2009c).
A POÉTICA DE ALMEIDA PRADO EM UM ESPAÇO “ENTRE” SISTEMAS
Na entrevista concedida a Adriana Moreira (2002, p.
56), Almeida Prado se autodenomina tendo quatro
fases composicionais: 1a, Nacionalista (1960-65);
2a, Pós-Tonal (1965-73); 3a, Síntese (1974-82);
e 4a, Pós-Moderna (1983-2010). A confirmação
destas fases traz implícita uma preocupação de
indicar as mudanças significativas quanto ao seu
direcionamento estético a partir da 2a. fase. Nesse
sentido, os próprios termos por ele escolhidos
sugerem algum encaminhamento. O prefixo ‘pós’
nas fases segunda e quarta, consecutivamente
referindo-se à superação da tonalidade e da
modernidade, merecem atenção. Quanto à
tonalidade e sua superação, em Almeida Prado
parece ser uma empreitada óbvia, no entanto o termo
da quarta fase que liga ao conceito ‘pós-moderno’ 1
necessita de uma mínima contextualização para as
considerações aqui desenvolvidas e constadas em
notas de rodapé deste texto.
Como professor de Composição na UNICAMP,
somando-se ao fato de ser um compositor produtivo,
as entrevistas realizadas pelos pesquisadores de
suas obras, estabeleceram-se como oportunidades
e consequentes provocações que o estimularam a
um processo de aprofundamentos e teorizações que
ele fez de si próprio, deixando um legado filosófico-
poético de sua composição. Aponto algumas de suas
declarações que ajudam a construir esse conjunto
teórico-composicional:
Declaração 1
“O meu discurso como compositor não é tonal como Beethoven e nem serial como Schoenberg. Eu sou uma fusão disso.” [...] “Eu trabalho com mecanismos intervalares para substituir o tonal e o atonal.” [...] “Estou em nome de uma expressividade intervalar [...]” (PRADO e NADAI, 2007, p. 117).
Declaração 2
“Para exemplificar o que seria essa permutação, imagine uma mesa com objetos colocados de diversas maneiras, e esses mesmos objetos sendo colocados de maneira diferente nesta mesma mesa. Você permutou os objetos. Eu fiz isso, mudei a ordem dos compassos. Uma colagem como fazia Picasso, arte contemporânea, como mudar o verbo para fazer uma mistura, algo que não era permitido na época de Beethoven, e o resultado soa muito bem. O processo de permutação pode também ser comparado à mudança de objetos dentro de uma casa. A casa não muda, o tamanho dos cômodos não muda, o que acontece é um reposicionamento dos objetos.” (PRADO e NADAI, 2007, p.114).
Declaração 3
“E. P. - O senhor acredita que estejamos esgotados de caminhos e ideias?
A.P. - Não, não acredito. Nunca se esgota. Sempre haverá um olhar novo sobre a mesma coisa. O problema é o olhar novo sobre o mesmo objeto. Por exemplo: se você colocar uma cesta de frutas numa sala e abrir esta sala para Picasso, Matisse, Monet, Manet, Di Cavalcanti, Portinari, cada um vai pintar a natureza morta à sua maneira. As mesmas maçãs, peras, uvas... O objeto é o mesmo; o olhar sobre é que é diferente. O compositor pode ter uma fase de cansaço, de esgotamento, onde não tem mais o que dizer, nem no tonal, nem no atonal... É uma fase [...]” (PRADO e PIRES, 2007, p. 78).
Declaração 4
“[...] Almeida Prado é aquela pessoa que quer ficar com um pé no Guarnieri e um pé em Schoenberg. É isso que eu quero, essa síntese, eu não quero ‘ou’ eu quero ‘e’. Desde aquela época eu era ‘e’ e não ‘ou’, branco ou preto, não, ‘preto e branco’ e ‘vermelho e amarelo’ e de tudo eu faço uma grande sopa. Essa foi sempre a minha ideia do que seria música compreensível para o público. Com isso eu fui deixando na minha obra elementos do Camargo Guarnieri, que eu nunca abandonei. Por que eu
Música
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vou deixar uma coisa que é boa? Porque agora eu sou atonal? Eu posso ser o pós-moderno de tudo abarcar, é o que fez Stravinsky, que é o compositor mais completo do século XX, porque ele abarcou tudo.” (ACADEMIA BRASILEIRA DE MÚSICA e
PRADO, 2001, p. 10).
Quadro 1 - Almeida Prado: considerações sobre sua
produção musical.
“Almeida Prado, parte de uma relação básica com
o sistema tonal. Ele funciona como um alicerce,
como pavimentação de fundamentos baseados nos
modelos, regras e rudimentos da harmonia, das
funções harmônicas pensadas como em Riemann”
(O AUTOR, 2009c, p. 29). O interesse do compositor
aqui é subverter e re-processar os conceitos tonais
e formais (O AUTOR, 2013). Uma “formulação que
prevê uma re-interpretação de todo complexo de
notas (alturas individuais), intervalos e estruturas
acórdicas. Estas estruturas modelares estão
numa ordem vertical ou horizontal e vinculados
primariamente ao sistema tonal” (O AUTOR,
2009c, p. 29). Os desvios e quebras das regras do
sistema tonal na composição de Almeida Prado se
configuram como aproximações e distanciamentos
desse sistema em direção a outros espaços. De uma
certa forma, Almeida Prado parece perceber esse
espaço, e trata de operar com seu atonalismo livre,
passeando entre tonalismo e atonalismo, às vezes
convertendo-se em um serialismo livre.
As gradações existentes entre o tonalismo e o
atonalismo oferecem um terreno hábil e amplo
Figura 1 - Espaço “entre”: um lugar entre o sistema tonal e o sistema atonal.
para a construção e organização dos materiais. A
exploração da direção e inversão dessa direção, que
se converte em ato compositivo de gradações do
atonal ao tonal e vice versa.
No sentido poético, o compositor tem uma
intenção de apresentar os materiais sob aspectos
de contraste, ambiguidade e dubiedade. Almeida
Prado ao teorizar sobre si mesmo diz que, ele é
“[...] aquela pessoa que quer ficar com um pé no
Guarnieri e um pé em Schoenberg. É isso que eu
quero, essa síntese, eu não quero ‘ou’ eu quero
‘e’”. O próprio compositor postula “sobre o terreno
sistêmico que pretende fixar-se, se bem que tal
postura, como ele próprio diz, não o impede de
transitar entre o tonal e o atonal. Sua revisitação
ao tonal se dá em outra ordem de construção
pós-moderna” (O AUTOR, 2009c, p. 30). Nesse
mesmo espaço sistêmico ampliado, há uma outra
estratégia que entra como uma espécie de re-
tratamento no posicionamento da altura musical
no princípio da série harmônica, inserindo “o uso
racional dos Harmônicos Superiores2 e Inferiores3
, criando Zonas de Percepção da Ressonância”
(PRADO, 1985, p.559). Essa estratégia é mais,
ou menos intensificada em determinadas
composições e suas fases composicionais (Pós-
Tonal, Síntese e Pós-Moderna). Algumas vezes
também é chamada por Almeida Prado de um
“sistema musical”, onde nele ocorre uma “tentativa
de colocar juntos as experiências atonais com
o uso racional dos Harmônicos Superiores e
Inferiores”. Esse sistema é denominado por ele
como transtonalismo4 5. O compositor diz que
o transtonalismo não é um ‘sistema’ para que
outros possam imitar - como o ‘sistema serial’ de
87
Figura 2 - Segundo Almeida Prado (1985), o espaço “entre” é o sistema transtonal.
Schoenberg. Para ele, não existe uma normativa
ortodoxa, mas sim possibilidades livres.
Sua composição invariavelmente continua utilizando
estruturas de origens dos dois sistemas (tonal e
atonal), e virão restabelecidas e fundidas neste
‘outro sistema’, mas tais estruturas, na fase Pós-
Moderna têm mais intensificadas esse cunho de
grande liberdade, a qual ele, o compositor, chamou
essa ‘liberdade postural’ de “ecletismo total”.
“Em minha tese, tentei racionalizar um pouco. O
transtonal refere-se a uma mistura de serial, com
atonal, e com tonal” (PRADO e MOREIRA, 2002,
p 63). O conceito transtonal aplica-se também à
utilização de notas que pertençam às ressonâncias
da nota fundamental de um acorde (ex. como o
acorde de Messiaen, ou outra estrutura acórdica).
SUPERAÇÃO DO TERMO EXPRESSIVIDADE INTERVALAR EM DIREÇÃO AO INTERVALO CARACTERÍSTICO
Após o processo da análise musical dos Dezesseis Poesilúdios (pesquisa de mestrado) e da Sonata n0 3
(fase Pós-Tonal), as Cartas Celestes I (fase Síntese)
e o Noturno n.0 7 (fase Pós-Moderna) [pesquisa
de doutorado], é possível dizer que as verificações
e os dados obtidos dessas análises oferecem uma
direção plausível para afirmar a existência de uma
lógica e um controle intervalar em Almeida Prado.
Existe uma referência organizada das distâncias,
uma consciência clara de que sua composição é
alimentada pelo cuidado às mínimas constituições do
parâmetro da altura no total cromático: os intervalos
em seus sistemas e seus desvios intencionais.
Como parte do exercício metodológico deste
trabalho, é importante relembrar nossas questões
de pesquisa, recolocando-se uma das indagações
principais que envolve a busca da compreensão da
concepção intervalar como material organizado,
consistente e recorrente, nas bases de uma definição
dos termos. Seria coerente, e não contraditório em
bases epistemológicas, o termo expressividade intervalar? Haveria necessidade de se construir
ou substituir uma classificação/nomeação de um
termo que abarque a concepção, a importância
e a modelagem intervalar que são apontadas no
processo analítico das obras de Almeida Prado?
O termo expressividade intervalar, forjado em
primeira mão pelo compositor, foi ampliado e
organizado em pesquisa anterior (O AUTOR, 2009c),
como conceito explícito acionado e ordenado pelas
preferências de certas distâncias entre as alturas
(diacrônicas, sincrônicas e diagonais) em sua
estruturação harmônica.
A expressividade intervalar perpassa vários
sistemas musicais - tonal, modal, atonal, serialismo
livre e transtonalismo - tal vinculação ocorre por
uma ordem de organizações intervalares, que
fazem tais intervalos estar dentro de um sistema ou
outro, ou na intersecção ou margem dos mesmos
sistemas. Portanto essa ordem de padrões e
recursividade define-se como a expressividade intervalar com sentido ampliado e desenvolvido a
partir do termo cunhado pelo próprio compositor (O
AUTOR, 2009c, p 14).
“No total cromático, o intervalo mínimo é o intervalo
de segunda menor. Os intervalos são classificados
pela quantidade de semitons existentes entre uma
altura e outra” (O AUTOR, 2009c, p. 45). Cada
tipo de intervalo possui capacidades qualitativas
Música
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sonoras que indicam maior ou menor “nível de
tensão” (Persichetti, 1961, p. 11-20). Nesse
sentido, pretendi aproximar as conceituações de
Costére (polaridade) às de Forte, Lester e Straus
(pitch class), no entanto, devo apontar que não
aprofundo os conceitos da Set Theory para os
procedimentos teórico-analíticos que empreendo
nesta pesquisa. Na minha formulação só me refiro
à classe de intervalos de Forte como um conceito
tangente às definições de “polaridade” de Costère
(1954, 1962) e “dissonâncias duras” mencionadas
em Persichetti (1961).
Relacionei vários pontos da construção
argumentativa sobre a questão intervalar construída
na pesquisa anterior (2009). Os excertos abaixo
apresentam os argumentos dizendo que
1. [...] o intervalo deve ser considerado como
modo de organização entre dois pontos sonoros,
assim devem ser contemplados como unidades
elementares das relações dentro das estruturas
acórdicas e sistemas musicais, ressalvando que a
disposição de direção dos materiais deve sempre
ser observada na lógica da verticalidade como na
da horizontalidade (O AUTOR, 2009c, p. 46).
2. O quadro de possibilidades de utilização
intervalar envolve três intervalos. O primeiro deles
considerado não somente a menor medida dos
sistemas musicais baseados nos Doze Tons, mas
de fato a segunda menor, torna-se o intervalo
conceitual do compositor. Descendente do
intervalo de segunda menor, os outros intervalos,
o de sétima maior e o de nona menor fecham o
quadro de relacionamento da segunda menor. O
compositor toma estes intervalos e os coloca em
projeção de valorização através da recorrência
dos mesmos. A sistematização da música atonal
pela “classe de alturas” de Forte e Straus colocam
como categoria 1 os intervalos de segunda menor,
sétima maior e nona menor. A categorização de
Forte e Straus coincide com a eleição dos mesmos
intervalos por Almeida Prado nos Poesilúdios.
Assim, Almeida Prado, apesar de conseguir por
métodos ideológicos diferentes, tais intervalos (2a.
menor e seus correlativos), os reconhece e atribui-
lhes valor e importância de tensão máxima, ou o
intervalo básico de maior tensão - a segunda menor
[Persichetti, 1961, p.13] (O AUTOR, 2009c, p. 49).
3. [...] uma ocorrência de intervalos de segundas
- tantos maiores como menores. É importante
salientar que a compreensão de intervalo se estende
tanto a aspecto vertical (intervalo harmônico) e
horizontal (intervalo melódico, e ou saltos dentro de
uma lógica arpejada de um dado acorde). Observa-
se uma predominância do intervalo de 2a. menor e
de seus correlativos (7a. maior - 8a. diminuta; 8a.
aumentada - 9a. menor). Ainda que todos tenham
recorrência equiparada, o intervalo de 2a. menor
emerge como o extrato desta classe de quatro
intervalos. O intervalo de 2a. menor é a ‘menor
medida’ na gama de sistemas que utilizam os Doze
Tons. A espécie sonora gerada por esse intervalo
é explorada nos planos verticais e horizontais;
arrumados em nota contra nota que ao gerar o
intervalo de segunda (menor) quer-se expandir
o conceito de sobreposições e contraste por essa
ocorrência intervalar.
4. Abaixo é demonstrado um breve quadro de
entendimento de equiparação dos intervalos 2a. m,
7a. M e 9.a m. O quadro ajuda no entendimento dessa
equiparação e na construção do pensamento de
atribuição de valor e importância desses intervalos
no processo de estabelecer a malha que dá unidade
aos Dezesseis Poesilúdios.
Figura 5 - 9a menor e sua equivalência com a 2a. menor
Figura 6 - 8a. aumentada e sua equivalência com
a 2a. menor.
89
Os intervalos de 2a. menor e seus correlativos
(7a. maior, 8a. diminuta, 8a. aumentada e o de 9a.
menor) têm função de estabelecer a unidade da
composição. A ocorrência intervalar sugere que
a repetição de determinados intervalos, como os
apontados acima, esteja em disposição horizontal
ou vertical, vai além de um dispositivo ocasional,
mas se configura como um elemento condutor que
unifica e concede uma ampla gama de timbres (O
AUTOR, 2009c, p. 51).
Reforçando a percepção de Almeida Prado quanto
ao valor e potência de tais intervalos, o relato
de Flo Menezes (2002) a respeito do intervalo
de segunda menor delineia suas características
fenomenológicas nos processos harmônicos da
música nova no repertório composicional do
século XX e XXI:
A emancipação das Segundas menores do plano
sequencial para o plano simultâneo fez com que
um fator de proximidade melódica, essencialmente
horizontal, fosse trazido para a verticalidade,
perdendo, nesse processo, seu claro direcionamento
melódico “sensível”, de proximidade. Ao se
perder a sensibilização melódica, ganha-se aí,
em contrapartida, um equilíbrio ou estabilidade
ambígua, bipolar, entre os dois componentes
do intervalo. A “dualidade de poder” presente
na instabilidade de qualquer intervalo apolar de
maneira antagônica comporta-se, aqui, como
estável, equilibrada, exercendo um apoio acústico
recíproco. Através da simultaneidade de ambos
os componentes de uma Segunda menor, tem-se,
pois a quebra de polarização única em face da dupla
sensibilização simultânea presente no intervalo (em
mais um processo típico de pantonalidade), pois
que um som não mais se direciona melodicamente
ao outro. Qual das duas frequências de uma nona
menor, sétima maior ou segunda menor (e seus
maiores desdobramentos pelas oitavas) se sobressai,
se polariza, quando ambos os sons componentes
do intervalo soam simultaneamente? Tal questão
poderá encontrar resolução somente mediante os
outros tantos fatores do contexto musical, entre
os quais a presença de outras frequências que
determinem a polaridade do aglomerado sonoro
determinado, tendendo mais para uma nota do
que para outra desses intervalos cromáticos
verticalizados (MENEZES, 2002, p. 114).
Almeida Prado que se autodefinia como “[...]
um compositor muito tímbrico” (PRADO e
MOREIRA, 2004, p. 76) pôde vincular sua
produção composicional a um dos aspectos do seu
transtonalismo: obtenção variada do timbre por
meio do controle intervalar. Assim, novamente se
referindo a sistemas, ele diz que “[...] refere-se a
uma mistura de serial, com atonal, com tonal. É o
uso livre das ressonâncias, com alguns harmônicos
usados de maneira consciente [...]” (PRADO e
MOREIRA, 2004, p. 75).
Ao certo é que se é ou não plausível continuar a
adotando o termo expressividade intervalar ou este
atual, abarcando sua concepção intervalar como intervalo(s) característico(s), a questão desse e
outros arquétipos intervalares, em Almeida Prado, é
comprovada e determinante. Ela pode ser reforçada
teoricamente por vários conceitos-analíticos
evidenciados por autores já citados, como: os
intervalos polares (Costère, 1954, 1963) e a classe 1 de intervalos do pitch class (Forte, 1973) (Lester,
1989) (Straus, [1990] [2000] 2013). Ainda sim,
podendo se acrescentar o conceito da harmonia de simultaneidade de Pousseur (POUSSEUR, [2005]
2009), (MENEZES, 2002, 2009).
O uso do(s) intervalo(s) característico(s) é
um processo altamente efetivo que produz na
construção da estrutura composicional de Almeida
Figura 7 - 7a. maior e sua equivalência com a 2a. menor.
Figura 8 - 8a. diminuta e sua equivalência com a 2a. menor.
Música
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Prado uma malha condutora que cumpre um
caráter orgânico. Essa concepção intervalar tanto
materializa a base de uma estrutura condutora de
organicidade como abre caminhos com grande
índice de inovação e possibilidades tímbricas. Nesse
sentido, das possibilidades, o âmbito alargado de
multiplicidades se conforma no gesto poético que
se apropria de novas contemplações sonoras como
em semelhança de um pintor que vai materializando
suas ideias, enveredando por visões inesperadas,
planejamentos e moldagens inéditas nos conjuntos
e expressões cor-som. Tal conjectura teórica
é passível de ser aplicada nesse terreno novo,
virginal e inesgotável das combinações intervalares
de segunda menor, sétima maior e nona menor,
somadas às outras possibilidades intervalares
oriundas das estruturas acórdicas mais ou menos
pertencentes a outros sistemas musicais. Inclusive,
Pousseur fala de uma força atrativa dos referidos
intervalos (2a. m, 7a. M e 9a. m), em conjunto com a
questão primária de dissonância que propicia a eles
as “zonas de contato” ([2005] 2009, p. 58), estas
fortalecidas, tornando tais intervalos em redutos
de energia sonora que tangenciam/contrastam os
outros intervalos inicialmente primordiais da série
harmônica (8a. J, 5a. J, 4a. J, 3a. M, 3a. m, 6a. M, 6a.
m e trítono). Em síntese, Almeida Prado se apropria
dessa possibilidade de “zonas de contato” entre o(s)
intervalo(s) característico(s) e os outros intervalos
(iniciais da série harmônica), que são geralmente
um pano de fundo que representa o pavimento
tonal que é contrastado com os intervalos de
“dissonância dura”. Assim, tanto o(s) intervalo(s) característico(s) como os intervalos iniciais da
série harmônica (e todos os outros seus derivados
mais tangentes ao sistema tonal) convertem-se
entre si próprios como estruturas-camadas sempre
dispostas sob uma forte configuração de fricção
intervalar com grandes possibilidades tímbricas.
Em síntese, como referência teórica-musicológica
à importância ao problema do intervalo, se pode
apontar a partir do que Massimiliano Locanto (2009)
disse em seu texto ‘Composition with Intervals’: Intervall Syntax and Serial Techinique in Late Stravinsk: “Embora todos estes compositores tratem
o componente intervalar de maneiras diferentes,
tornou-se para eles o aspecto fundamental de uma
técnica motívica - isto é, uma utilização com base
em um número restrito de figurações intervalares
que servem a uma função unificadora dentro de
uma obra musical” (LOCANTO, 2009, p. 221, grifo
nosso). Sabendo-se que Lacanto falasse do próprio
Stravinsk, incluindo Schoenberg e seus alunos
Webern e Berg, ainda assim, podemos inserir com
uma afirmação segura que a produção pós-ruptura
de Almeida Prado está atrelada fortemente ao
pensamento de (re)estruturação intervalar.
SONATA N.0 3: ANÁLISE INTERVALAR
1. Intervalo característico em ostinato(I mov.: c. 3-7)
A segunda menor em estado sincrônico segue
com a proposta de um ostinato - uma ideia de
camada. Almeida Prado tem uma predileção por
essa arrumação, construindo camadas, como
estratificações6 de materiais, ampliando a ideia e
manutenção das sobreposições, pois elas podem
alimentar, por contraste de materiais diferentes,
desejavelmente a poética da ambiguidade - uma
ambição persistente em Almeida Prado.
Essa camada, como um acompanhamento para o
material melódico, é estabelecida pela repetição
ostensiva do intervalo de segunda menor em uma
mesma altura.
2. Intervalos de segundas por acumulação(I mov.: c. 7-8; II mov.: c. 33-34)
Ao final do trecho acima, Almeida Prado, utiliza-se
de uma acumulação intervalar por segunda menor.
A partir da referência anterior, o ostinato que
agrega sincronicamente o Si1 e o Do2, ocorre um
Figura 3 - Intervalo característico aplicado com ideia de
camada-acompanhamento para o material melódico.
91
Figura 4 - Segundas menores por processo cumulativo:
uso dos materiais por intervalo característico.
Figura 5 - Segundas menores por acumulação.
Figura 6 - Predominância de um (1) tipo intervalar: a
segunda menor - por uma ordem direcional horizontal
(tematização intervalar por segunda menor).
Figura 7 - Relação diagonal de intervalos característicos
de 9a. m e 8a. aum
empilhamento que vai desse intervalo de segunda
menor ao esquema cumulativo em direção à
tessitura mais grave. Uma técnica de empilhamento
invertido em direção ao grave. O intervalo de
segunda menor vai sendo vez após vez adicionado,
deixando a estrutura acórdica em novidade
constante. Um processo cumulativo de intervalos,
uma ideia somatória.
Nessa construção por empilhamento intervalar,
faz-se rapidamente ocorrer uma transição de
uma estrutura acórdica qualquer para uma
estrutura em cluster.
Nos compassos 33 e 34 do I Movimento, a
construção por acumulação intervalar ocorre de
uma maneira mais ampliada.
3. Tematização por tipo de intervalo característico (I mov.: c. 9-10)
Intencionalmente o compositor estabelece uma
tematização7 8 intervalar fazendo uma repetição
insistente da segunda menor. A manutenção da
ocorrência intensiva do intervalo é mantida desde
o primeiro movimento da peça. Já em terreno do
segundo movimento, o intervalo ainda continua
sendo material composicional para o seguimento
estrutural. Há de se observar que as correlações
de direção, neste trecho, são unicamente de uma
preocupação horizontal. Em certo sentido, uma
ordem melódica, que poderia ser tocada com única
mão (esquerda ou direita: como se queira), sendo uma
espécie de pontuação da estrutura por um trinado.
É interessante notar que a mesma pontuação serve
ao papel de uma ponte que liga a próxima inflexão
sonora. Note-se que a segunda menor segue com
desenvoltura na operação, e comprovadamente
a predominância do tipo intervalar é facilmente
identificada no exemplo abaixo.
4. Relações de direcionalidade diagonal(II mov.: c. 6-7)
Menezes diz que (2013, p. 74): “A música
pode então ser definida como direcionalidades
conscientemente elaboradas”. Em Almeida Prado,
as direcionalidades9 são ordens de organização que
interferem sensivelmente na estrutura harmônica.
É provável que se exija mais cuidado para a
compreensão e detecção da relação diagonal, pois
em sua lógica construtiva pode haver uma maior
complexidade. Geralmente as direcionalidades
horizontais e verticais são mais prontamente
observadas. Portanto, na diagonalidade podem
residir sutilezas e relações mais inesperadas.
Música
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5. Modelo motívico com segunda menorna cabeça da estrutura rítmica(II mov.: c. 71-73; c. 84)
No trecho abaixo, parece haver uma similaridade
rítmica-intervalar com o conceito da tematização
intervalar. Como se vê há um modelo recorrente
de um formato motívico por segunda menor.
Este modelo carrega a padronização rítmica em
conjunto com a já observada tematização intervalar
(repetição do intervalo característico na primeira
nota do conjunto das quatro semicolcheias).
Figura 8 - Modelo intervalar-rítmico com base
no intervalo característico de segunda menor
(primeira aumentada).
Figura 9 - Padronização da ocorrência do(s) intervalo(s)
característico(s).
Figura 10 - A organização intervalar por diagonalidade.Outro caso, no próximo exemplo, com o mesmo
desenho estrutural na forma rítmica de 4
semicolcheias, uma esquematização onde o
compositor coloca a nota mais grave como base
para se estabelecer a relação de intervalo(s) característico(s) nas 2as. e 4as. semicolcheias:
segunda menor e oitava diminuta. Notadamente,
este é um outro caso de tematização intervalar
com direção por diagonalidade. Na figura abaixo, a
amostra do compasso 84 do II Movimento.
6. Outro caso de relação intervalarpor diagonalidade (II mov.: c. 74)
Neste exemplo, há uma outra ocorrência de
intervalos(s) característico(s) por diagonalidade
e uma tematização intervalar. Entretanto,
neste caso são usados dois tipos de intervalos
- nona menor e segunda menor - contando
com a enarmonia da nona menor para a oitava
aumentada (ou vice versa), assim hipoteticamente
contabiliza-se três tipos intervalares (somente
dois sonoros). A enarmonia apesar de trazer
uma dubiedade e sutileza, ainda assim fornece a
possibilidade de se perceber com relativa atenção
o intrínseco planejamento intervalar a partir do
registro gráfico musical.
7. Padronização da ocorrência do intervalo característico dentro de um modelo rítmico(II mov.: c. 94)
Almeida Prado busca uma expansão do trato
intervalar, colocando o intervalo característico
como elemento gerador de outras possíveis
organizações recorrentes - um uso temático do
material. Neste trecho em questão, em termos
temporais, ocorre uma horizontalização da direção,
em contrapartida pode ser pensado também como
uma opção que parte do grave para o agudo,
seguindo os pontos das alturas mais agudas ainda.
Nessa demanda de relação ascendente que busca
intercalar cada tercina (três colcheias na tercina: 1a
figura da tercina: som grave; 2a. figura da tercina:
som médio; e 3a. figura da tercina: som mais agudo)
- verifica-se aí uma direcionalidade diagonal. São
nas figuras extremas da tercina (grave: 1a. figura
da tercina; e a aguda: 3a. figura da tercina) onde
ocorrem a relação do intervalo característico.
Observe-se o compasso 94 do II Movimento:
93
Figura 11 - Ocorrência do intervalo característico em
modelo rítmico: a tercina.
Figura 13 - Sobreposição quartais por uma ordem de
ligação em horizontalidade de segundas menores.
Figura 12 - A variação do intervalo característico a partir
da oitava justa em direcionalidade vertical.
8. Sobreposição intervalar tematizada(II mov.: c. 134-136)
A tematização ou padronização intervalar prossegue
demonstrando possibilidades em um caso baseado
na verticalidade intervalar, seguindo uma ideia de
variar os materiais, um arranjo de soluções novas
no desenvolvimento estrutural - o compositor
propõe a sobreposição intervalar com algumas
possibilidades dentro do eixo da oitava. Parece
ser, nesta passagem, um esforço para algumas
variantes da materialização da polaridade da oitava
(COSTÈRE, 1954, 1962) (POUSSEUR [2005] 2009)
(MENEZES, 2002). Ao certo, algumas variações são
desenvolvidas a partir dessa distância intervalar
básica: a oitava justa. Sendo assim, a sétima maior,
como meio-tom menor que uma oitava justa, e,
em direção contrária, a oitava aumentada como
meio-tom maior que uma oitava justa - como
estruturas conviventes em sobreposição (a oitava
mais as dissonâncias duras [7a. M, 9a. m]) acentuam
a estruturação intervalar por fricção e contraste.
Esse modelo estrutural intervalar é baseado nessa
formação vertical que explora as possibilidades
na cercania da oitava justa: acrescentando aos
intervalos sobrepostos, obviamente o intervalo de
segunda menor.
9. Intervalos ascendentes de segundas menores: com sobreposição de quartas justas (II mov.: c. 147-150)
Esse exemplo, trata-se de uma intensificação
das segundas menores com outras possibilidades
combinatórias de intervalos. Em termos poéticos,
o compositor continua o conceito de tematização
intervalar. Observe-se que no compasso 150,
ocorrem as sobreposições quartais que se
estenderão a posteriori nos compassos 151 ao
154. O exemplo abaixo enfatiza os compassos 147
ao 150:
10. Relação espelhada de segundas menores(II mov.: c. 172-173)
Uma combinação intervalar ainda não ocorrida
nesta obra. Por um tratamento espelhado das
segundas menores, sendo esse procedimento, uma
espécie de alusão semantizada ao serialismo. Em
alguns aspectos, por essa ordem de reutilização
e transformação de sentidos, Almeida Prado
oferece a possibilidade da lembrança e correlação
signicativa da poética das pluralidades e não
ortodoxia serial de Berg.
Entretanto, o serialismo de Almeida Prado é
anunciadamente livre. A própria menção do
espelhamento, mesmo que de forma transformada e
semantizada, torna-se uma concepção continuada
a partir do sistema serial. Entendendo que a forma
retrógrada (RO) e forma inversa do original (IO) no
serialismo dodecafônico, são ideias pertencentes
à organização direcional por espelhamento,
ainda assim convém lembrar que o procedimento
espelhado é largamente utilizado já no período
Barroco, especialmente com J. S. Bach.
Sob os dados teórico-históricos e as informações
autobiográficas que o compositor fez sobre sua
formação no campo tonal, e agora se deparando
com subsídios que também foram utilizados em
música atonal e serial, é perfeitamente plausível
Música
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compreender tais artifícios que declaradamente
fazem com que Almeida Prado transite entre o
tonal e o atonal, sob o fato de tal compreensão, ser
ajustada à perspectiva e aos propósitos do espaço
“entre” sistemas (seu transtonalismo).
Figura 14 - Espelhamento de relações pelo intervalo
característico de segunda menor.
CONCLUSÃO
Através dos excertos analisados na seção anterior,
ficou demonstrado que Almeida Prado, em seu ato
compositivo, faz com que o intervalo transforme-se
em um conteúdo de primeira ordem, configurando-se
como uma das bases substanciais de sua composição.
Os tipos de organizações intervalares determinaram
as tangências e/ou os distanciamentos dos sistemas
musicais, criando um espaço “entre” nos diversos
sistemas (modal, tonal, atonal, serial livre) dando um
aprofundamento à sua transtonalidade.
O sistema da transtonalidade não seria somente
acionado pelas regras do “sistema organizados de
ressonâncias”, mas seria entendido também como o
fluxo da lógica intervalar de um sistema para outro.
Nesse sentido, o intervalo e seus tipos, incluindo
efetivamente o(s) intervalo(s) característico(s), seriam o elo de ligação para a formação de
conglomerados acórdicos com grande gama de
ação e variação dentro dos sistemas. Eles se
conectam e se desconectam a serviço da afirmação
ou não de um determinado sistema. A meta teórica
e composicional de Almeida Prado é a exclusão de
limites ou faixas divisoras entre os sistemas. Pelo
contrário, seu alvo poético é fundir os próprios
sistemas em espaços mutáveis e amplificados. Não
há obrigatoriedade de definição aplicável a partir
de um certo sistema musical, os materiais são
potencialmente vinculados aos vários sistemas por
meio da concepção intervalar sob uma organização
de materiais em camadas, em alongamentos, em
encurtamentos, em deformações, em níveis, em
possibilidades de novas aberturas na composição
NOTAS
1. O AUTOR, X. X. (nota acrescentada para este texto) “Para Villaça (1996, p. 28) o “[...]
pós-moderno não é apenas depois do moderno,
não é somente antimoderno, ou um nada pós-
tudo. É momento de discussão, de multiplicidade
de perspectivas sem queda no relativismo. É
perda, é desagregação, mas também é aposta na
multiplicidade”. Quanto ao dizer quando começaria
ou pudesse terminar a pós-modernidade, Sant’Anna
(2003, p. 155) diz que “Em termos de datas, alguns
se arriscam a dizer que a modernidade é algo que
ocorreu na cultura ocidental entre 1860 e 1950 e
que a pós-modernidade expressou-se a partir de
1950, tendo seu apogeu em torno de 1980. No
entanto datas são discutíveis”.
A pós-modernidade “exime-se da temporalidade
histórica” e está ligada ao “presenteísmo”, à
“razão cínica, à “aparência”, à “fragmentação”,
ao “pastiche”, “deixando se levar pelo mercado”
(SANT’ANNA, 2003, p. 155). É preciso dizer
que Jean-François Lyotard (1924-1998) é
sem contestação a figura mais marcante da
filosofia da pós-modernidade, e para ele a pós-
modernidade é um “movimento ‘anti’ posturas”
(SHINN, 2008, p. 50). As multiplicidades e
as rupturas, na pós-modernidade, parecem
ocorrer combinadas em um só lugar. Kramer
(1996, p. 22), musicalmente falando, anuncia
as “fragmentações e as descontinuidades”, o
“pluralismo e o ecletismo”, o que é “não linear”
quanto aos conteúdos e suas aparições”.
2. O AUTOR (2009c, p. 30-31) diz que “Como o
conceito de “zonas de ressonância” é oriundo da
série harmônica, já por si tal conceito é construído
em bases da série harmônica e dos seus constitutivos
– os harmônicos como base, uma ligação com
próprio sistema tonal. Como Prado se propõe a
trabalhar em um espaço entre o tonal e o atonal,
ele necessariamente cria processos que tramitam
entre as retóricas destes sistemas para ocupar tal
espaço. Mas, tais retóricas que tramitam entre esses
95
sistemas, estão de posse de uma grande liberdade.
“Uma total ausência de ser coerente, um assumir o
incoerente” (PRADO e MOREIRA, 2002, p. 58).
3. RAMIRES (1998, p. 270) diz que “Considerando
entretanto a Série Harmônica Invertida e seu
vínculo com o Modo Menor, Costère apoia-se na
corrente dualística e principalmente nas ideias de
Hugo Riemann (1849-1919), teórico dedicado ao
desenvolvimento de um sistema harmônico baseado
em suas pesquisas sobre a Série Harmônica
Invertida (understones). Para Riemann “todos os
possíveis acordes consonantes por dois sons de
nomes diferentes correspondem a uma das duas
classes de acordes: o ‘acorde superior’ que se
chamava chamar de acorde maior, formado por uma
terça maior e uma quinta justa superior, e o acorde
inferior chamado de acorde menor, formado por
uma terça (maior) inferior e quinta justa inferior”.
4. O AUTOR (2009c, p. 32) acrescenta que: “Almeida
Prado ressaltou o que Yulo Brandão disse de seu
Dó maior “com ressonâncias” sendo o impulso
para o seu transtonalismo que prevê a combinação
dos materiais que vem da lógica de ressonância
(PRADO e MOREIRA, 2002, p. 64). Observa-se que
primariamente para se viabilizar o transtonalismo, a
utilização do mecanismo do pedal de sustentação do
piano é componente básico. O compositor associa o
uso deste artifício técnico como um componente hábil
de reforço da lógica do “sistema de ressonâncias””.
5. “O transtonalismo como sistema de organização
das alturas encontra um dos seus fundamentos no
acorde de ressonância de Messiaen, que se baseia
no emprego da série harmônica”. [...] “Preferimos
descrever o transtonalismo como um sistema
predominantemente atonal de organização acrônica
das alturas, que absorve e amplia o princípio do baixo
fundamental herdado de Rameau [GUBERNIKOFF
1999], e as relações baseadas na série harmônica,
incluindo, sem restrição, as construções forjadas a
partir dos primeiros harmônicos - os que formam as
tríades perfeitas” (GUIGUE & PINHEIRO, 2001, p. 4).
6. CORRÊA (2014, p. 156) “Esse termo é normalmente
entendido como a sobreposição de planos ou camadas,
tendo surgido na geologia, para designar a estrutura
originada pela acumulação progressiva de qualquer
material inorgânico (rochosos, minerais, vulcânicos,
arenosos, cristalinos, causado por preciptação
química ou decantação, entre outros) tendendo a
formar camadas definidas por descontinuidades
físicas e/ou por passagens bruscas ou transicionais
de mudanças de textura, estrutura ou quimismo. […]
As ciências sociais importaram o termo para designar
diferentes classes sociais de determinadas culturas,
ou meios socioeconômicos, fato comprovado na
vasta literatura sobre estratificação social. Mas Cone
refere-se ao termo como justaposição no tempo
de blocos musicais. A condição para a identificação
desses blocos é o corte, já que os blocos normalmente
são introduzidos de forma abrupta”.
7. TATIT (1997, p. 97) “Não há tematização sem
desdobramento, não há refrão sem segunda parte
e não há gradação de alturas sem a intervenção dos
saltos intervalares”.
8. Tematização entedida como repetição, como
padrão, como organização reiterada, como algum
tipo de norma ou alguma razão.
9. MENEZES (2013, p. 41-2). [...] É na harmonia, em
seu mais amplo sentido - relações entre notas ou
frequências em dado contexto, que podem ocorrer
sincronicamente (no plano vertical), diacronicamente
(no plano horizontal), ou em ambos os estados
(no plano diagonal, ou seja, em ambos os planos
simultaneamente) - que agrupamentos de elementos
instituem os mais diversos significados [...]”.
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SOBRE O AUTOR
Edson Hansen Sant ‘ Ana. Professor na disciplina
de Artes/Música no Instituto Federal de Educação,
Ciência e Tecnologia de Mato Grosso (IFMT). Em 1986,
estudou Composição com Sergio Vasconcellos-
Corrêa (UNESP). Bacharel em Música - Composição,
pela UNICAMP (1996), onde foi aluno de Almeida
Prado, Raul do Valle e Damiano Cozzella. Mestre
em Música (Análise) pela Universidade de Brasília
(2007-2009). Pesquisador assistente (2008-2009)
da RIPM (Retrospective Index to Music Periodicals).
Desenvolve pesquisa sobre composição de Almeida
Prado, com ênfase em Teoria, Análise e Musicologia.
Desenvolve trabalhos e práticas convergentes à
Educação Musical (ensino coletivo de instrumento),
harmonia, arranjo e improvisação. Concluindo o
doutorado em Música pela UNESP (São Paulo-SP).
Membro da Associação Brasileira de Teoria e Análise
Musical (TeMA) e editor-chefe do boletim desta
associação (TeMA informativo). Em reconhecimento
às iniciativas desenvolvidas no campo da Música,
em março de 2017 recebeu a distinção honorífica
“Comenda Carlos Gomes” pela SBACE.
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