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V Encontro Nacional da Anppas 4 a 7 de outubro de 2010 Florianópolis - SC – Brasil ______________________________________________________ Políticas de Turismo e Desenvolvimento Socioespacia l nos Municípios
de Soure e Salvaterra, Ilha do Marajó-Pará
Eliane de Jesus Miranda Santana (Universidade Federal do Pará - UFPA)
Geógrafa, mestranda em Geografia no PPGeo - UFPA
lilikmiranda@yahoo.com.br
Bruno Angelim do Rosário (Universidade Federal do Pará - UFPA)
Graduando em Geografia, bolsista Pibic, UFPA
angelim_91@hotmail.com
Resumo
O Estado de um modo geral tem adotado políticas voltadas para o turismo na região amazônica desde os anos 60, entretanto, somente apartir dos anos 2000 que o Pará passa a contar com estes para fomentar a atividade turística em seu território. As estratégias apresentadas nos planos e programas visavam contribuir nesse processo de dinamização do turismo de modo a aproveita a cultura e as paisagens. Dentro desse contexto a região marajoara, especificamente Soure e Salvaterra possuem papel fundamental por se apresentarem como os municípios marajoaras que mais recebem turistas pelo seu fácil acesso, e por seus atrativos naturais. Todavia suas bases econômicas estão nas atividades primárias. Tendo em vista essa potencialidade turística do município e seus problemas de ordem social e econômica o presente estudo tem como objetivo analisar o planejamento e as políticas voltadas para o turismo nos municípios em questão e se atendem as perspectivas de um desenvolvimento socioespacial verificando de que forma os grupos sociais tem sido inseridos em suas formulações. Desse modo tomou-se o conceito de desenvolvimento socioespacial de Souza (1994/1995), como também Rodrigues (2006) para a qual o turismo é antes de tudo, uma prática social e Rita Cruz (2007) que apresenta idéia semelhante, de que o turismo é uma prática social e atividade econômica. Depois da análise de documentos e bibliografias foi desenvolvida pesquisa de campo nos municípios, tendo como sujeitos da pesquisa os representantes dos setores de planejamento das políticas de turismo, representantes das comunidades locais e empresários do setor.
Palavras-chave
Desenvolvimento sociespacial, políticas de turismo, Marajó.
1. Introdução
O presente artigo apresenta como objetivo o estudo da questão das políticas publicas de
turismo e seus desdobramentos nos municípios de Soure e Salvaterra no estado do Pará. A
metodologia adotada na pesquisa contou com análise acerca do fenômeno do turismo e suas
implicações, embasando-se em autores que julgamos importantes para o melhor entendimento
teórico de tal assunto, como Adyr Rodrigues (2006), Rita Cruz (2006) e Marcelo Lopes de Souza
(1996; 1997; 1998; 2000) com suas discussões sobre desenvolvimento sócio-espacial. Para
Rodrigues (1996) o turismo é um fenômeno econômico, político, social e cultural. Assim, cabe
afirmar que o consumo dos espaços com diversidade de formas de utilização estruturantes de
paisagens e de negócios e dá agilidade a processos dotados de grande capacidade e
organização territorial esta apresenta na atividade turística. A autora ressalta ainda que o turismo
é antes de mais nada, uma prática social, que envolve o deslocamento de pessoas pelo território e
que tem no espaço geográfico seu principal objeto de consumo.
Rita Cruz (2007) afirma que o turismo é uma prática social e atividade econômica, ou prática
geradora de atividade econômica e que concorre, no cotidiano, na reprodução da vida nos
lugares, com outras práticas socais e outras atividade econômicas, podendo, portanto, ser um
vetor de desenvolvimento para os municípios.
Esse desenvolvimento não pode ser apenas econômico, já que para ser pleno deve haver
modificações no campo social e político, tendo que ser visto, portanto, como um processo de
transformação ampla, sendo a elevação de padrão de vida do conjunto de toda a sociedade.
Neste estudo trabalhamos com o conceito de desenvolvimento sócio-espacial de Souza
(1996; 1997; 1998; 2000) para o qual o desenvolvimento esta para além do viés econômico,
assim, antes de tudo tem de ser social. Para o autor o desenvolvimento sócio-espacial deve
contemplar a autonomia, justiça social e qualidade de vida, ou seja, essas seriam as três variáveis
que o desenvolvimento deve contemplar para não ser considerado apenas econômico, e sim
sócio-espacial.
Soure e Salvaterra apresentam vários problemas estruturais comum a vários outros
municípios do Marajó. A atividade primária é a base da estrutura econômica dos municípios, os
setores secundário e terciário têm pouca expressão na região. Assim, o turismo se configura como
um dos focos privilegiados para analisar dinâmicas recentes do espaço amazônico. Diante disto e
com o intuito de promover através do turismo o desenvolvimento econômico da região, foram
elaboradas políticas públicas pelo Estado. A partir disso abre-se um leque de questionamentos:
Essas políticas realmente proporcionaram desenvolvimento para o município? De que forma a
população é inserida nessas políticas? - A população é consultada ao se elaborar uma dessas
políticas? - As especificidades da área são levadas em consideração durante a elaboração dessas
políticas? Esses questionamentos são de grande relevância, já que as políticas de turismo não
podem ser reduzidas a meras atividades econômicas. Assim, busca-se, com este trabalho,
analisar as iniciativas no domínio do turismo sobre o espaço amazônico, lançando um olhar sobre
as condições geográficas, sociais e econômicas e a realidade das práticas turísticas, avaliando,
também, o papel das políticas públicas em relação ao planejamento do turismo, com o intuito de
fomentar a ação pública em uma perspectiva de desenvolvimento durável do território. Logo, o
objetivo do trabalho é analisar se o planejamento e as políticas voltadas para o turismo nos
municípios em questão atendem as perspectivas de um desenvolvimento sócio-espacial no
sentido de verificar de que forma os grupos sociais tem sido inseridos em suas formulações.
O artigo está estruturado da seguinte forma: o item 2, turismo e organização do espaço, é
resultado do levantamento bibliográfico, discutindo a produção do espaço através do turismo; o
item 3, Contextualizando os municípios de Soure e Salvaterra dentro das políticas públicas de
turismo, mostra os dois municípios em questão e relaciona-os com as políticas de turismo
voltadas para o Marajó; o item 4, Sobre o conceito de desenvolvimento socioespacial, discute o
conceito de desenvolvimento sociespacial, formulada pelo prof. Marcelo Lopes de Souza (1996;
1997; 1998; 2000), entrelaçando-o ao turismo local; e finaliza com as considerações que se
entendeu com o trabalho proposto.
2. Turismo e organização do espaço
Com a chegada do século XX, exatamente pós Segunda Guerra, com a possibilidade de
deslocamento mais rápido feito através de avião, e com os direitos adquiridos pelos trabalhadores
(aposentadoria, férias), é que ocorre o processo de massificação do turismo, possibilitando as
classes não aristocráticas viajar em busca de lazer.
Oliveira (2001, p.36), fazendo uma adequação ao conceito de turismo desenvolvido pela
Organização Mundial de Turismo, define este como um conjunto de resultados de caráter
econômico, financeiro, político, social e cultural, produzidos numa localidade, decorrentes da
presença temporária de pessoas que se deslocam do seu local habitual de residência para outros,
de forma espontânea e sem fins lucrativos. Citando Mcintosh, Oliveira (2001, p.36) associa ainda
o turismo como sendo uma ciência, arte e atividade capaz de atrair, transportar e alojar visitantes,
com o objetivo de satisfazer suas necessidades e a seus desejos.
Avançando nessa perspectiva Rodrigues (1997) utiliza o termo espaço turístico para
identificar a influência desta atividade no consumo do espaço uma vez que seus elementos são
dotados de territorialidades e intencionalidades. Completa ainda ratificando a importância do
estudo da paisagem ao enquadrá-la como um recurso extraordinário sendo importante à análise
da imagem, como percepção, que esta produz no observador e como este interfere em sua
dinâmica.
Segundo Trigo (1993, p.17), “O turismo nasceu e desenvolveu-se com o capitalismo”. Nesse
sentido, a atividade turística segue a lógica do capital, que objetiva o lucro, diante dessa
perspectiva o fenômeno do turismo vê no espaço geográfico a concretização de produção do seu
espaço turístico que é virtual, fugindo assim da realidade. Assim, a Geografia se torna
fundamental para explicação dessas novas relações socioespaciais produzidas pelo turismo, já
que no campo geográfico, segundo Assis (2003), é muito mais do que um simples deslocamento
de pessoas com fins de lazer; é uma prática multifacetada que interage fixos e fluxos e tem seus
rebatimentos nas suas diferentes esferas da organização socioespacial. No âmbito econômico o
turismo requalifica os espaços através da diversificação, provocando alterações no perfil de
empregos, na renda e na base produtiva; no âmbito cultural esse fenômeno modifica o sistema de
valores, o estilo de vida e os padrões de consumo das populações receptoras; politicamente, (re)
define o papel do Estado como gerenciador da infra-estrutura turística e da ordem;
ideologicamente, articulas estratégias e táticas que permeiam o imaginário do turismo como via de
“salvação do mundo” e como mecanismo de manutenção da ordem; e refere-se ao espaço como
meio de produção, como produto de consumo e como lócus das práticas sócio-espaciais.
No Brasil é na gestão de do presidente Lula, que o turismo ganha pela primeira vez um
ministério e um Plano Nacional de Turismo 2003-2007, ficando patente a importância do turismo
para a referida administração (SANSOLO e CRUZ, 2008). Principalmente pela importância
econômica que a atividade ganha em uma época de desemprego estrutural, pois se tem nele a
possibilidade de movimentar a economia de uma cidade, região ou mesmo de um país.
O turismo no século XXI corresponde a uma atividade de grande relevância econômica,
principalmente para países tropicais em desenvolvimento, cujo apelo paisagístico é muito forte,
representando assim uma alternativa econômica. No entanto, como atividade econômica, o
turismo em países emergentes se expressa não somente, enquanto resultado do investimento de
capital privado, mas também como grande beneficiário de obras e de infra-estrutura patrocinadas
pelo Estado, usufruídas por empresas desse segmento que “obtêm grandes facilidades para a
viabilização dos seus equipamentos, tais com resorts, grandes hotéis, parques temáticos,
aeroportos, marinas, etc.” (RODRIGUES, 2006).
Segundo Rodrigues (2006) esse modelo apresentado no Brasil, a partir da década de 1990,
com PRODETUR-NE, viabilizaria a implantação de empreendimentos como Costa do Sauípe, na
Bahia, trazendo uma nova lógica em que predomina a intervenção de macroatores que
produziram uma valorização seletiva dos lugares, impondo novos valores ambientais,
socioculturais, mudando a vida da população local e refletindo na produção de novas
territorialidades.
Esse modelo de apropriação possui uma articulação local-global, ou seja, não há
desenvolvimento regional como apregoado pelo discurso utilizado. Do ponto de vista econômico
seus investimentos vem de capital externo e nacional, estando mais voltado para atender a
demanda internacional, com isenção de tributos e incentivos à iniciativa privada.
Do ponto de vista técnico, esse tipo de empreendimento necessita de um planejamento em
escala federal, ficando a cargo da esfera pública proporcionar a infra-estrutura necessária,
ofertando as empresas do setor desde incentivos ficais, até a viabilização de rede de transporte,
energia elétrica, abastecimento de água entre outros equipamentos necessários para a
consolidação da atividade a ser desenvolvida. Assim ocorre uma valorização do lugar, que
acabará acarretando em ônus a população local, como por exemplo, o aumento do IPTU,
necessário a manutenção dos equipamentos implementados.
Do ponto de vista social, esse modelo de turismo se caracteriza por sua fórmula excludente
e segregadora, uma vez que a população local não pode usufruir de seus equipamentos, por
possuir menor poder aquisitivo, além de não poder participar do processo integralmente (por não
gozar mão-de-obra qualificada). Ressalta-se ainda a supervalorização dos imóveis, especulação
imobiliária, elevação nos preços dos serviços, sobrecarga da rede esgoto, acúmulo de lixo, entre
outros, como implicações negativas da instalação desse tipo de empreendimento. (RODRIGUES,
1999)
O turismo enquanto atividade econômica exalta o valor de troca do espaço em detrimento do
seu valor de uso, passando a ser compreendido como mercadoria, o espaço fica sujeito assim ao
mesmo processo de “coisificação” e “fetichização” que as mercadorias estão expostas (CRUZ,
2007). Mas é preciso entender o turismo enquanto prática social, já que antes de tudo ele é
praticado por pessoas, provocando mudanças para o turista e para a população residente, visto
que haverá contanto com novos territórios, territorialidades, e cultura, acabando por produzir
mudanças em ambos os atores.
A organização territorial dos lugares turísticos não responde somente à lógica do lugar, do meio, da população local; ela é a reprodução de atributos valorizados nos centros urbanos emissores, sintetizando na materialidade das cidades que se expandem, as novas representações sociais imprimidas ao uso do território (LUCHIARI apud CRUZ 2007 p. 32).
Segundo Ouriques (2003) o território é de grande importância para o entendimento do
turismo, a territorialidade do turismo, já que quando se pensa em "território", emerge a questão do
poder. Raffestin (1993), por exemplo, afirma: "o território se forma a partir do espaço, é o
resultado de uma ação conduzida por um ator sintagmático (ator que realiza um programa) em
qualquer nível. Ao se apropriar de um espaço, concreta ou abstratamente (por exemplo, pela
abstração), o ator territorializa o espaço". O sentido do agir e da apropriação são expressos pelo
autor mais claramente em seguida: "o território é um espaço onde se projetou um trabalho, seja
energia e informação, e que, por conseqüência, revela relações de poder".
Essa complexidade do conceito de território pode ser evidenciada na atividade do turismo,
indutora de profundas alterações nos lugares em que se desenvolve. “A territorialidade sedentária
dos que aí vivem freqüentemente, e a territorialidade nômade dos que só passam, mas que não
têm menos necessidade de se apropriar, mesmo fugidiamente, dos territórios que freqüentam”
(Knafou apud Ouriques, 2003)
O turista traz seus hábitos e costumes, muitas vezes chocantes para a população autóctone, não familiarizada com excessos de consumo e "liberdade". Há, muitas vezes, uma sensação de invasão do lugar, só compensada e/ou tolerada pelos benefícios financeiros oriundos da passagem do turista. Além disso, nos lugares turísticos se encontram duas territorialidades antagônicas: trabalho e turismo (OURIQUES, 2003)
Para Reis (2004), a tecnologia permite uma maior e melhor acesso as informações,
sobretudo, das regiões mais longínquas, porém não tem a preocupação de mostrar a realidade e
especificidade de cada lugar, que deve ser respeitada em seus limites. Contudo o turista se
desloca e o residente recebe e ambos não estão preparados para se adaptarem às realidades tão
diferentes, por esse motivo geram-se conflitos nesse espaço geográfico.
O espaço geográfico é dinâmico, porém segue o movimento particular de cada local, uma vez que esse tem sua especificidade. Entretanto, a atividade turística dos recursos naturais e culturais de determinadas região sem se preocupar com os possíveis impactos causados a comunidades receptoras dessa atividade. Segundo Figueiredo (2001, p. 12) ‘[...] encaramos o turismo (e tudo que esse vocábulo pode representar) como agente externo e que, ao se instalar e se desenvolver, impactua o núcleo receptor em diversas frentes, entre elas a da própria cultura do local. (REIS, 2004, p. 04)
Com todos esses embates de territorialidades é importante ressaltar que a atividade do
turismo não traz necessariamente o desenvolvimento sócio espacial local, o que difere de
desenvolvimento econômico. Essa atividade pode vir a alterar a dinâmica do local e sua estrutura,
porém isso não obrigatoriamente se reflete da mesma forma para a sociedade, provocando uma
espécie de sensação de desenvolvimento, o que Rita Cruz (2006) chama de “pseudo-
desenvolvimento”, visto que apenas algumas regiões do país contam com incentivos para esse
determinado empreendimento, aumentando o processo de periferização dessa área, já que se
torna um fator atrativo para aqueles que estão em busca de oportunidades de empregos.
3. Contextualizando os municípios de Soure e Salvat erra dentro das políticas públicas de turismo
3.1 Soure e Salvaterra e suas potencialidades turís ticas.
Soure assim como seu município vizinho Salvaterra (figura 01) possui papel fundamental
por se apresentar como um dos municípios marajoara de mais fácil acesso, a partir da capital
paraense. Possuidor de longas “praias” (figura 02) de rio como a do Pesqueiro com águas brancas
(barrenta) e calmas, possui ainda fazendas onde se pode praticar ecoturismo, caminhadas, trilhas
ecológicas, além da possibilidade de entrar em contato com ecossistemas diferenciados como os
campos alagados, e manguezal. O município ainda apresenta uma diversidade de rios onde se
pode praticar a pesca.
Figura01: Mapa de localização dos municípios de Soure e SaSalvaterra, Ilha do Marajó-Pará.
Fonte: Quintairos, 2010.
Figura 02: Praia da Barra Velha, Soure - Ilha do Marajó-Pará.
Fonte: Santana, 2009.
A cidade proporciona outros atrativos como cultura, artesanato (figura 03), danças típicas,
comidas regionais, assim com a vivência do modo de vida sourense. O município apresenta
problemas recorrentes à região marajoara, como falta de saneamento básico, déficit educacional,
baixo IDH, fato não muito diferente de Salvaterra como podemos observa no quadro (quadro 01),
além de baixa coleta de lixo, ocorrendo assim em sua maioria à queima desse material. Há
também uma baixa oferta de energia, a água tratada não atende a toda população, onde em
grande parte a água provem de poços perfurados nos quintais das casas, além de ocupação
desordenada e degradação ambiental, inclusive com a presença de casas construídas sobre
dunas, onde também são depositados os dejetos sem nenhum tipo de tratamento (fossa negra)
(SANTANA, 2008).
Assim como as demais cidades do Marajó Soure não foge ao contexto, possui uma alta
taxa de natalidade e infra-estrutura urbana deficitária (figura 04), e apesar de apresentar uma
população urbana de 17.302 habitantes, bem superior a rural que é 2.665 habitantes, dentro de
um contexto geral possui uma densidade demográfica reduzida (PARÁ, 2006)
Salvaterra torna-se interessante para o turismo por apresentar todas as características
semelhantes à de Soure. Segundo Brasil (1993) o clima do Marajó, como o de grande parte da
Amazônia, é do tipo equatorial úmido (quente-chuvoso). A temperatura média anual, muito
constante, quase nunca é superior a 27ºC e a pluviosidade fica em torno de 2.500 mm; em
relação ao clima de Belém, a ilha do Marajó apresenta-se mais ameno, pois a Ilha fica próximo ao
mar aberto.
Figura 03: Artesanato típico Marajoara.
Fonte: Santana, 2009.
Figura 04: Rua 1º Avenida sentido centro – praia da Barra Velha.
Fonte: Santana, 2009.
Quadro 01: Índice de Desenvolvimento Humano municipal (IDHM).
Fonte: Plano de Desenvolvimento Territorial Sustentável do Arquipélago do Marajó, 2006.
Esse clima agradável potencializa a atividade do turismo e vários ramos da mesma: turismo
rural, sol e praia, ecoturismo, turismo de aventura etc., concedendo aos visitantes a oportunidade
de conhecer um pouco da vida marajoara e apreciar os sinais da colonização local, iniciada no
século XVII pelos padres jesuítas, nas ruínas de Igrejas e dos enormes poços comunitários,
alguns deles ainda em uso, como os de Monsarás, vila pertencente à Salvaterra, todo constituído
em pedra.
Um dos pontos turísticos de Salvaterra que mais chamam atenção é a vila de Joanes pelos
seus atrativos naturais, históricos e culturais, assim como também da presença de um grande
fluxo de turistas estrangeiros e brasileiros que se deslocam para a vila. Praias como a de Joanes
(figura 05) e a Praia Grande (figura 06) são recantos que se encontram no litoral da cidade e são
reconhecidamente tratados como atrações turísticas ou mesmo – pelo em potencial – os objetivos
de investimentos daqueles que vislumbram a exploração de Salvaterra.
Salvaterra conta com outros pontos turísticos capazes de atrair um grande contingente de
apreciadores como a praia do “Coqueiro” no Litoral Norte; a praia do “Portinho” no litoral Nordeste
que se caracteriza por ser uma das mais belas paisagens de Salvaterra; e a “Ilha do Farol”, uma
ilhota onde se localiza um farol de sinalização para embarcações, seu destaque é a facilidade do
acesso durante a baixa-mar, quando se pode chegar até ela a pé.
Figura 05: Praia de Joanes, Salvaterra - Ilha do Marajó-Pará.
Fonte: Santana, 2008
Figura 06: Praia Grande, Salvaterra – Ilha do Marajó-Pará.
Fonte: Rosário, 2009
É necessário colocar que a crescente exploração turística nos municípios supracitados não
se deve, apenas, às potencialidades paisagísticas. Outros fatores são relevantes para que se
possa entender melhor esse processo. Apartir de 1990 foi melhorada a pavimentação da PA-1541
e reestruturado o Porto de Câmara que, por sua vez, é o principal alavancador no processo de
intensa visitação ao município tudo isso influenciou o modo de organização espacial. Assim sendo
as cidades conheceram um crescimento repentino em todos os setores. A população flutuante
caracteriza muito bem essa afirmação, houve um crescimento significativo, passando a ocorrer um
aumento no fluxo de visitantes nos finais de semana e, principalmente, nos feriados prolongados,
isso tudo devido à facilitação do acesso.
1 A PA-154 é uma rodovia intermunicipal que liga os municípios de Salvaterra, Cachoeira do Arari e Soure. No trecho localizado
no município de Salvaterra ela recebe o nome de Avenida Alcindo Cacela, mas a grande maioria da população não a conhece por esse nome, mas sim como PA-154.
3.2 Soure e Salvaterra no contexto das políticas pú blicas de turismo
O primeiro plano de turismo para a Amazônia foi elaborado pela Superintendência de
Desenvolvimento da Amazônia – SUDAM, na década de 70, neste plano a atividade seria um
segmento econômico que iria incentivar a desenvolver a região garantindo seu crescimento sócio-
econômico, porém nos últimos 20 anos os planos, projetos de investimentos, diagnósticos e perfis
em âmbito regional que se tem publicado em forma de documentos, não conseguem efetivar uma
política de turismo. O Programa de Desenvolvimento do Ecoturismo (PROECOTUR) para a
Amazônia Legal foi oficializado pelo governo federal em 2002 e é financiado com recursos do
Ministério do Meio Ambiente e do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).
Antes de seguirmos a discussão sobre as políticas pública de turismo nos municípios por
nós estudado é necessário que se coloque a diferença entre plano e políticas pública. Segundo
Cruz (2003) o plano é um documento que reúne um conjunto de decisões sobre determinado
tema/área/ setor e não pode ser confundido com planejamento, que é um processo contínuo de
tomadas de decisões, voltado para o futuro e para a perseguição de um ou mais fins. Desse
modo:
A política pública, por sua vez, é parte do processo de planejamento governamental e envolve tudo aquilo que um governo decide fazer ou não relativamente a um dado setor da vida social. Vista assim de forma tão abrangente, a política pública funde-se ao próprio processo de planejamento, com a diferença de que o planejamento é o processo e a política pública é o posicionamento da administração pública frente a um aspecto da vida social em um dado momento. Este posicionamento pode ser exposto na forma de um documento - tal como o plano - e ter, conseqüentemente, a visibilidade que se espera de uma política pública ou não. (CRUZ, 2003, p.3)
O Plano de Desenvolvimento Turístico do Pará elaborado no ano de 2001, a fim de propor
estratégias para que o turismo se desenvolvesse de maneira a proporcionar uma melhor
qualidade de vida aos paraenses. Essas estratégias visavam contribuir nesse processo de modo a
aproveita a cultura e as paisagens como atrativo. O plano indicou seis pólos2 : Belém, Amazônia -
Atlântica, Araguaia-Tocantins, Tapajós, Xingu e Marajó) a serem trabalhados e dinamizados
(foram escolhidos por apresentarem potencialidade turística e por já disporem de equipamentos
turísticos). (PARÁ, 2001). Entretanto apesar do plano mencionar o aumento da qualidade de vida
a população dos municípios a serem contemplados por ele nem mesmo foram ouvidos, o plano
contou com a colaboração dos empresários da área dos governantes.
Na tentativa de ordenar o território para a atividade turística o Plano Nacional de Turismo,
traz em seu bojo proposições para o desenvolvimento do turismo no Brasil. O PNT esta na
2 Pólos: metodologia utilizada pelo governo para dinamizar áreas turísticas, baseado no modelo de pólo de crescimento de Perroux
segunda versão, a primeira (2003-2007) apresentado e desenvolvido no governo Lula possui
como principais objetivos desenvolver o produto turístico brasileiro com qualidade, contemplando
diversidades regionais, culturais e naturais; estimular e facilitar o consumo do produto turístico
brasileiro nos mercados nacional e internacional.
O PNT (2007-2010) - Uma viagem de inclusão- é como o anterior a formalização das
políticas de turismo para o país apresentando como objetivos centrais, desenvolver o produto
turístico brasileiro com qualidade, contemplando nossas diversidades regionais, culturais e
naturais; promover o turismo com um fator de inclusão social, por meio da geração de trabalho e
renda pela inclusão da atividade na pauta de consumo de todos os brasileiros, fomentando a
competitividade do produto turístico brasileiro nos mercados nacional e internacional, atraindo
desse maneira divisas para o país. Assim, o plano busca contemplar a diversidade regional, com
produtos marcados pela brasilidade, proporcionando o fortalecimento do mercado interno.
As políticas públicas de turismo estão postas, todavia, suas ações e seus desdobramentos
ainda são incipientes se levarmos em consideração todo o território brasileiro e a sua diversidade,
dessa maneira as regiões turísticas não são atendidas do mesmo modo pelas políticas.
O Programa de Regionalização do Turismo – Roteiro do Brasil lançando em abril de 2004
foi criado nesse contexto e possui entre os seus objetivos diminuir as desigualdades regionais, e
ainda nos dias atuais não foi contemplado na sua totalidade, pelo menos não no estado do Pará,
sobretudo na região marajoara que apesar de possui enorme potencial turístico, apresenta
diversos entraves ao seu desenvolvimento pleno.
As dificuldades vão desde a falta de infraestrura, carência de mão de obra qualificada,
chegando até a gestão. E apesar da região estar presente de maneira recorrente na pauta
governamental quando o assunto é turismo, a exemplo: a) O Programa de Desenvolvimento do
Ecoturismo para Amazônia Legal – PROECOTUR, vinculado ao Governo Federal, lançado em
2000, b) O Plano de Desenvolvimento Turístico do Estado do Pará – PDT-PA elaborado no ano de
2001, sobre abrangência do governo estadual, c) o Programa de Regionalização do Turismo –
Roteiros do Brasil - PRT no ano 2005 e d) o Programa de Desenvolvimento do Turismo-
PRODETUR em 2009 (os dois últimos a nível federal) as ações desses planos e programas se
concentram normalmente nos municípios de Soure e Salvaterra, isso apesar do arquipélago
marajoara possuir outros 14 municípios. Todavia, ainda assim os municípios supracitados não
conseguem desenvolver um turismo menos excludente, já que muitos atores acabam incluído de
maneira desigual nesse processo. Assim como não conseguem manter um fluxo constante de
turista o ano todo.
Segundo Tavares (2009) e Santana (2010) o arquipélago apresenta baixo Índice de
Desenvolvimento Humano – IDH, infraestrura e configuração socioeconômica precárias, e as
políticas públicas de turismo são tidas como possibilidade de melhoria da qualidade de vida e
situação socioeconômica da população local. Apesar disso o desenvolvimento regional pretendido
fica apenas nas linhas dos documentos.
O turismo no estado do Pará apesar de “divulgar as suas potencialidades territoriais
atrativas para a dinamização turística, ainda não alcançou o patamar de contribuição efetiva para
o desenvolvimento local” (Tavares, 2009). O turismo como já foi dito é uma prática social, que se
materializa e consome espaços (Cruz, 2007), interfere na dinâmica territorial, costumes, e modo
de vida, e o Marajó, especificamente Soure e Salvaterra, estão incluídos em todo esse processo,
e são tidos por planos e programas de turismo como catalisadores para o desenvolvimento e
fomentação do turismo.
Por fim a atividade turística pode ser dinamizadora da economia na região marajoara,
entretanto, a população local não é incitada a participar ativamente do processo. Desse modo, a
melhoria na qualidade de vida fica comprometida, nem há desenvolvimento sócio-espacial.
Apontamos que o investimento deve ser em conjunto com outros setores econômicos, já
que os municípios apresentam economia essencialmente primária, e que através do ordenamento
territorial seria possível conhecer a particularidades locais, trabalhando-as de modo a valorizá-las,
potencializando seus usos e diminuindo os impactos socioeconômicos.
4. Sobre o conceito de desenvolvimento socioespacia l
A atividade do turismo não deve levar o município somente ao crescimento econômico, já
que o mesmo não significa “desenvolvimento”, pois, segundo SOUZA (1997) aquele resume-se a
uma conjugação de crescimento (expresso através de PIB ou da renda nacional per capita) com
modernização tecnológica, abrangendo assim um aspecto meramente quantitativo e excludente,
já que crescimento e modernização não são garantia de maior justiça social. Se o crescimento vier
a reboque de um progresso tecnológico poupador de mão-de-obra e com desemprego
tecnológico, os empregos novos por eles gerados poderão não compensar, quantitativamente
e/ou qualitativamente os empregos perdidos, e não evitarão o agravamento da situação de
exclusão. Esse desenvolvimento não deve se restringir à conceituação simplista que o termo traz,
limitado ao crescimento econômico e a modernização tecnológica, mas sim um “desenvolvimento
mais amplo”, que satisfaça as necessidades básicas das populações locais e promova a
preservação ambiental num amplo processo de desenvolvimento sócio-espacial.
Com efeito, uma das nossas questões fundamentais refere-se ao papel do turismo como
uma prática sócio-territorial capaz ou não de proporcionar desenvolvimento sócio-espacial nos
municípios de Soure e Salvaterra, compreendendo este desenvolvimento como um processo
sensível não somente à localização e distribuição de objetos no espaço geográfico e à inserção de
pessoas no mercado de trabalho, mas principalmente o desenvolvimento da sociedade e do
espaço, já que o esse espaço é, segundo SOUZA (1996), um produto social, um suporte para vida
em sociedade e, ao mesmo tempo, um condicionador dos projetos humanos; um referencial
simbólico, afetivo e, também, para a organização política: uma arena de luta, uma fonte de
recursos.
Como em Souza (1996, p.18) para se ter desenvolvimento sócio-espacial deve-se
ultrapassar os “parcialismos analíticos ancorados na epistemologia positivista, produtores de
visões monodimensionais do desenvolvimento”, é necessário compreender a sociedade como um
todo indivisível, constituídos de dimensões interdependentes, em que cada dimensão não pode ter
sua própria dinâmica apreendida se a desconectarmos das demais, dimensões essas que podem
ser as relações sociais(econômica, política, cultural etc.), a dimensão espacial da sociedade e a
dimensão histórica.
O conteúdo do desenvolvimento deve ser entendido como atrelado a cada universo cultural e social particular, devendo-se evitar a visão instrumental-economicista conservadora, etnocêntrica e historicista da sociedade da ideologia do desenvolvimento hegemônica poderia ser a seguinte: um movimento cuja esteira uma sociedade torna-se mais justa e aceitável para seus membros (SOUZA, 1997, p. 19)
Ainda na discussão sobre desenvolvimento questiona-se, qual o desenvolvimento seria o
mais benéfico para o município de Soure e Salvaterra? No que concerne as políticas públicas
voltadas para o fomento do turismo, elas estão realmente proporcionando desenvolvimento para
os municípios? De que forma? Essas políticas têm inserido a população local?
Com base nos textos de Souza (1998), acredita-se que o Desenvolvimento Urbano
Alternativo seria o mais oportuno, já que tem como prioridade máxima a busca por justiça social e
qualidade de vida (aspirações, desejos, felicidades etc.), melhorando a distribuição dos
investimentos públicos pela cidade, a fim de minimizar a segregação residencial e empenhar a
participação popular no planejamento.
Uma cidade justa pressupõe uma sociedade justa, a qual, por sua vez, só será se seu nomos e suas instituições garantissem o acesso igualitário à tomada de decisões, ou seja, garantissem a autonomia dos indivíduos (pensados não apenas individualisticamente, mas também como membros de grupos) e da sociedade. Essa é a base a qual poderá, mais adequada e legitimamente, ser pensado e decidido o conteúdo substantivo de palavras como “justiça” e “bem comum”, assim como “desenvolvimento”. (SOUZA, 1998, p. 24)
Segundo Souza (1998) há que se proceder uma avaliação em profundidade da forma como
os instrumentos estão previstos e estão sendo efetivamente implementados nos municípios.
Desenvolvimento pressupõe mudança, transformação - e uma transformação positiva,
desejável ou desejada-, aprimoramento das condições gerais do viver em sociedade, em nome de
uma maior felicidade, baseado no princípio da autonomia individual e coletiva, que propicia uma
base de respeito ao direito de cada coletividade de estabelecer, segundo as particularidades de
sua cultura, o conteúdo concreto do desenvolvimento: as prioridades, os meios e as estratégias,
ou seja, é um princípio ético e político norteador do desenvolvimento.
De acordo com SOUZA (1997) a autonomia é um principio que exige a consideração do
plano interno (a igualdade de chances de participação na tomada decisões relevantes para vida
social), mas igualmente que se leve em conta o plano externo (os interesses legítimos e a
autonomia do outro, não importando o quanto ele seja diferente de nós mesmos), conforme o
princípio da não intervenção.
Autonomia de uma coletividade traz subentendida uma territorialidade autônoma, ou seja, a gestão autônoma, por parte da coletividade em questão, dos recursos contidos em seu território, que é o espaço por ela controlado e influenciado. (SOUZA apud SOUZA, 1996, p.11)
De um ponto de vista operacional, propõe que “autonomia” (SOUZA, 1998) seja entendida
como um parâmetro subordinador. O caminho democraticamente mais legítimo para se alcançar
mais justiça social e mais qualidade de vida é quando os próprios indivíduos e grupos sociais
específicos definem os conteúdos concretos e estabelecem as prioridades com relação a isso. Por
isso é que a defesa da autonomia pode e deve ser tida como princípio básico. No entanto ao
entrarmos em contato com os documentos dos planos e programas voltados para a fomentação
turística em Soure e Salvaterra, percebemos que apesar de terem como finalidade proporcionar
melhoria na qualidade de vida da população local dos municípios, os mesmos não contaram com
a participação popular em suas formulações a exemplo do Plano de Desenvolvimento Turístico do
Estado do Pará – PDT-PA, e quando contaram com essa participação, como foi o caso do
PROECOTUR-PA, não o fizeram de maneira efetiva, então não os mesmo não alcançaram este
objetivo.
Justiça social deriva da autonomia, o mesmo não se pode dizer da qualidade de vida, já que
igualdade política e processo decisório livre e transparente não conduzem necessariamente a
bons resultados. A justiça social está relacionada à esfera pública, esfera do debate e da
deliberação legislativa em torno da administração dos negócios da coletividade. A qualidade de
vida remete a esfera privada, visto que a percepção do que seja qualidade de vida pode variar de
indivíduo para indivíduo. Mas se contarmos apenas com justiça social e qualidade de vida pouco
se pode fazer para conferir ao enfoque autonomista do desenvolvimento urbano maior
operacionalidade, capaz de revelar satisfatoriamente sua utilidade para a análise dos processos
sociais e avaliação de propostas de intervenção.
Podem ser identificados os parâmetros singulares que representam uma singularização,
conforme as circunstâncias temporais e espaciais concretas da justiça social e qualidade de vida
com suas respectivas variáveis.
Existe uma relação hierárquica entre os parâmetros? É possível falar de desenvolvimento
sócio-espacial quando houver ganhos relativos aos parâmetros subordinados (justiça social e
qualidade de vida) sem que haja ganhos quanto aos parâmetros subordinadores (autonomia)?
Segundo SOUZA (2000) seria possível, porém com ressalvas, visto que se trata de um ganho
defensável quando se alargam os horizontes analíticos.
Concorda-se com o autor ainda quando afirma que se deve ter cautela quando se fala em
desenvolvimento sócio espacial pleno, já que, se o melhor desempenho de alguns parâmetros
subordinadores particulares (segregação espacial e satisfação individual), notadamente os
basicamente relativos à esfera privada (satisfação individual), não se faz acompanhar por
melhorias de outros parâmetros subordinados particulares, diretamente do que se passa na esfera
pública (grau de oportunidade para participação para cidadã).
Para que o conceito de desenvolvimento possua concretude e operacionalidade, é
imprescindível não subestimar o espaço social como dimensão de análise, uma vez que a própria
sociedade só é concreta com o espaço, sobre o espaço e no espaço. Espaço multifacetado, sim!
pois só quando pensado como multifacetado pode ser autêntico o desenvolvimento.
O Estado através de seus planos e programas de desenvolvimento turístico no Pará apesar
de passar a idéia de entendimento de espaço múltiplo, e de reconhecer as especificidades de
cada pólo turístico, não consegue efetivar sua ações com eficiência, numa clara demonstração de
desacerto entre as escalas governamentais.
Soure e Salvaterra apresentam inúmeros problemas estruturais em comum a vários outros
municípios do pólo Marajó, com poucos investimentos em saneamento básico, educação, saúde,
distribuição de energia elétrica e de água tratada. A base da estrutura econômica é a atividade
primária, já que as atividades dos setores secundários e terciários têm reduzida expressão, sendo
esses os fatores para sua baixa taxa de urbanização. Por isso, o município ainda detém um
acervo natural muito rico, despertando interesses à exploração turística. É a partir daí que a
preocupação com a exploração dos recursos naturais e os impactos tanto sociais, quanto naturais
que podem ser gerados ganha força.
O turismo coloca-se, muitas vezes, como única possibilidade de desenvolvimento econômico para um lugar, uma cidade, uma região[...] e muitas vezes também submete as populações locais a uma ordem externa, desarticulando culturas tradicionais, como é o caso da maioria das nossas comunidades litorâneas. (LUCHIARI, 2004, p.106)
É evidente que a atividade turística não altera somente o comércio, como também a
tradição cultura e social local, pois o espaço acaba por receber equipamentos esteticamente bem
elaborados, mas que nem sempre se vinculam à realidade sócio-ambiental do local. Todo este
processo decorrente das relações humanas acarreta mudanças sociais no ambiente, portanto é
preciso que haja uma relação menos economicista quanto à exploração da atividade turística.
O que se constatou in loco e através de entrevistas com os atores locais é que as políticas
públicas de turismo implementadas nos municípios não contam com a participação da
comunidade. Em Soure, por exemplo, o conselho Municipal de turismo estava inativo e só foi
ativado em abril de 2009 pela nova administração local, que inclusive conta com um Plano
Estratégico de Desenvolvimento Turístico de Soure para o período de quatros anos (2009-2012).
Já o conselho Municipal de turismo de Salvaterra, se apresenta com deficiência, e importante
ressaltar que o governo atual já esta no seu segundo mandato, e poucas ações voltadas para o
turismo tem sido implementadas no município. Quando se perguntou ao assessor da Secretaria de
Turismo do Município de Salvaterra se a população foi contactada para a elaboração desses
projetos o mesmo responde: “Não, eles não foram contactados, nós vamos marcar uma reunião
pra informar o que está sendo feito, apenas para efeito de informação, pra eles se mexerem
também”(informação verbal, abril de 2009).
Portanto, se não estão chamando a população local para discutir as necessidades e o de
como a comunidade pode ajudar para o fomento do turismo não se tem a autonomia falada por
Marcelo Lopes de Souza. Autonomia é apresentada por (SOUZA, 2002) como um processo de
caráter individual e/ou coletivo, implementado a partir de aspectos como qualidade de vida e
justiça social concebidos em planos de relações diferentes:
[...] a justiça social pode ser vista como derivada da própria autonomia, ou como uma instância dela (...) a qualidade de vida [se mostra diferente], uma vez que a liberdade em que se acha eventualmente embebido um processo decisório não é, por si só, garantia alguma da que essas decisões serão acertadas e se traduzirão em melhor qualidade de vida (SOUZA, 2000, p.66).
Para alguns atores entrevistados o turismo é visto como uma alternativa de fomento da
economia, no entanto, de fato há pouco retorno financeiro, o representante dos moto-taxistas de
Salvaterra (abril, 2009) nos informou que sua maior clientela é da população local, pois muitos
turistas não se sentem a vontade de utilizar o transporte, mesmo não ocorrendo o aumento de
preço no períodos das férias escolares, período de maior fluxo de turistas no município.
Em entrevista informal cedida a nossa equipe pela administração da delegacia de
Salvaterra (abril, 2009), foi informado que o número de roubos aumenta no período de maior fluxo
turístico para o município.
O que se evidenciou no trabalho de campo realizado é que não ocorre uma integração de
fato entre as diversas intenções e ações que envolvem os atores. Ocorre, porém uma mobilização
dos rabeteiros e boteiros3 de Soure e Salvaterra para a fundação de uma cooperativa em parceria
com a ARCON4. Quando perguntado ao presidente dos rabeteiros de Soure e Salvaterra qual
objetivo da associação, obtivemos a seguinte resposta: porque a gente não tem linha, então a
gente tem medo que algum empresário venha fazer uma coisa “milhó”, nós “viemo” trabalhando
muito tempo, era bem pior e hoje graça a Deus ta bem “milhó”, a gente tem medo
disso.(informação verbal, abril de 2009).
Quanto o beneficiamento da associação pelas políticas publica do município. As políticas
dos outros anos, outro governo, quase nada, só contribuição nossa pra lá, mas deles pra gente,
bem piquininhinho, no caso e gente tem um aponte aqui, que tudo isso foi a custo da gente.
(informação verbal, abril de 2009)
Nesse sentido, por parte do poder público não houve nem uma mobilização no sentindo de
atender as necessidades dessa parcela da sociedade, que não foi consultada durante o período
que vigorou o governo antes de 2009. E apesar de haver uma “parceria” com os donos de hotéis,
o fluxo econômico para esses prestadores de serviço só aumenta nas férias.
5. Algumas Considerações
Diante de tudo que foi exposto considera-se que o turismo, tem trazido desenvolvimento
para os municípios, no entanto isso tem ocorrido apenas para uma parcela da população local,
uma vez que é comum para a maioria dos turistas optarem por comprar pacotes turísticos. Isso
impossibilita que haja uma distribuição, melhor dos lucros, assim como impossibilita que de fato se
entre em contato com os costumes locais. Assim entendemos que para ocorrer o desenvolvimento
não só no aspecto econômico, mas como também no aspecto social, é preciso priorizar a
satisfação de algumas necessidades humanas no que diz respeito à saúde, educação, moradia,
lazer, emprego e renda. O que ainda não vem acontecendo efetivamente em Soure e Salvaterra,
pois estas melhorias ainda não chegaram a todos. Esses fatores implicam diretamente no
processo de desenvolvimento do indivíduo, uma vez que o mesmo necessita de autonomia e
habilidades para atuar em grupo, tornando-se protagonista de sua evolução e conseqüentemente
de sua comunidade, já que a participação é considerada um processo de mobilização social e
espacial de construção da cidadania.
No que concerne a este assunto, no entanto o que tem se visto são políticas públicas
formuladas não para atender as demandas sociais locais, mais sim para atender a demandas
exógenas ao local. Além de proporcionar aos municípios alguns agravamentos de problemas
3 Trabalhadores que fazem a travessia entre os municípios de Soure e Salvaterra, os quais conduzem rabetas e botes que são
embarcações pequenas, feitas em madeira, típicas da Amazônia
4 ARCON no estado do Pará é um órgão que tem como objetivo estabelecer normas e fiscalizar a execução dos serviços públicos de competência do Estado.
como, um maior acúmulo de lixo, degradação ambiental e aumento da violência. Desse modo com
esse estudo esperamos contribuir para possíveis discussões acerca de implementação de
políticas publicas voltadas para o fomento do turismo nos municípios de modo a subsidiar a
população local numa busca por um melhor aproveitamento da cultura, natureza e força de
trabalho empregada nesse segmento de entretenimento.
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