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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO OESTE DO PARANÁ – UNIOESTE
CENTRO DE EDUCAÇÃO COMUNICAÇÃO E ARTES – CECA
COLEGIADO DA ESPECIALIZAÇÃO EM HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA
GABRIEL DE ABREU GONÇALVES DE PAIVA
EVOLUÇÃO DAS DESPESAS COM MANUTENÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO GOVERNO REQUIÃO (2003-2006)
CASCAVEL
2010
2GABRIEL DE ABREU GONÇALVES DE PAIVA
EVOLUÇÃO DAS DESPESAS COM MANUTENÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO GOVERNO REQUIÃO (2003-2006)
Monografia apresentada ao Curso de Pós Graduação lato sensu – Especialização em História da Educação Brasileira como parte dos requisitos para obtenção do título de Especialista em História da Educação Brasileira.
Orientador: Luiz Fernando Reis
CASCAVEL
2010
3GABRIEL DE ABREU GONÇALVES DE PAIVA
EVOLUÇÃO DAS DESPESAS COM MANUTENÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO GOVERNO REQUIÃO (2003-2006)
Monografia apresentada para obtenção de título de especialista em História da Educação Brasileira na Universidade Estadual do Oeste do Paraná
Cascavel, 30 de março de 2010.
Prof. Ms. Luiz Fernando Reis – OrientadorMestre em Educação
Universidade Estadual do Oeste do Paraná
Prof. Dr. Gilmar Henrique da ConceiçãoDoutor em Educação
Universidade Estadual do Oeste do Paraná
Prof. Dr. Roberto Antonio DeitosDoutor em Educação
Universidade Estadual do Oeste do Paraná
4LISTA DE ILUSTRAÇÕES E TABELAS
FIGURA 1. LOCALIZAÇÃO DAS UNIVERSIDADES E FACULDADES PÚBLICAS ESTADUAIS PARANAENSES .............................................................................................. 37
TABELA 1. DÍVIDA PÚBLICA X GASTOS SOCIAIS - GASTOS DO GOVERNO FEDERAL – BRASIL (2002-2008).............................................................................................................. 22
TABELA 2. DÍVIDA PÚBLICA X GASTOS COM SAÚDE E EDUCAÇÃO - GASTOS DO GOVERNO FEDERAL – BRASIL (1999-2008)...................................................................... 22
TABELA 3. MATRÍCULAS EM CURSOS DE GRADUAÇÃO PRESENCIAIS POR CATEGORIA ADMINISTRATIVA DAS IEES _ PARANÁ: COMPARATIVO ENTRE OS ANOS DE 1994 E 2002....................................................................................................... 40
TABELA 4. EVOLUÇÃO DA ARRECADAÇÃO DO ICMS – COTA ESTADUAL (2002-2004)........................................................................................................................... 42
TABELA 5. EVOLUÇÃO DA RECEITA ORÇAMENTÁRIA (2002-2004).............................. 42
TABELA 6. NÚMERO DE CURSOS DE GRADUAÇÃO, MATRÍCULAS PRESENCIAIS E DOCENTES EFETIVOS NAS IEES PARANÁ (2002-2006)...................................................47
TABELA 7. PERCENTUAL DE ICMS INVESTIDO NA MANUTENÇÃO DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR - IEES PARANÁ (2003-2006)............. 49
TABELA 8. PERCENTUAL DA RECEITA ORÇAMENTÁRIA DESTINADO À MANUTENÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR – IEES PARANÁ (2003-2006).........49
TABELA 9. RELAÇÃO DESPESAS COM EDUCAÇÃO SUPERIOR/RECEITA DE IMPOSTOS CONSTITUCIONALMENTE VINCULADA À MANUTENÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO - IEES PARANÁ (2003-2006).................................50
TABELA 10. RELAÇÃO MATRÍCULAS/DESPESAS ALUNO – IEES PARANÁ (2003-2006)........................................................................................................................... 50
TABELA 11. RELAÇÃO EDUCAÇÃO SUPERIOR/ DÍVIDAS “PÚBLICAS” - PARANÁ (2003-2006)........................................................................................................................... 51
TABELA 12. DESPESAS DAS IEES PARANAENSES (2003-2006).....................................52
TABELA 13. GASTOS COM EDUCAÇÃO (RECURSOS VINCULADOS) – EXERCÍCIOS DE 1999 A 2006 - IEES PARANÁ.................................................................................................54
TABELA 14. NÚMERO DE MATRÍCULAS - UNIOESTE (2003- 2006)................................ 56
TABELA 15. NÚMERO DE CURSOS - UNIOESTE (2002-2006)........................................ 56
TABELA 16. REPASSE DO TESOURO DESTINADO À UNIOESTE (2003- 2006)............ 57
5LISTA DE SIGLAS
ANEL – Assembléia Nacional dos Estudantes - LivreCONLUTAS – Coordenação Nacional de LutasCONLUTE - Coordenação Nacional de Luta dos EstudantesCOP – Coordenadoria do Orçamento e ProgramaçãoCUT – Central Única dos TrabalhadoresDIEESE - Departamento Intersindical de Estatística e Estudos SócioeconômicosDRU – Desvinculação das Receitas da UniãoEUA – Estados Unidos da AméricaFHC – Fernando Henrique CardosoFMI – Fundo Monetário InternacionalICMS – Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de ServiçosIEES – Institutos Estaduais de Educação SuperiorIFES – Institutos Federais de Educação SuperiorINEP - Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos Anísio TeixeiraIPEA - Instituto de Pesquisa Econômica AplicadaMEC - Ministério da EducaçãoMP – Medida ProvisóriaONU – Organização das Nações UnidasPCdoB – Partido Comunista do BrasilPFL – Partido da Frente LiberalPIB – Produto Interno BrutoPMDB – Partido do Movimento Democrático BrasileiroPPP – Parceria Público PrivadaPROUNI – Programa Universidade para TodosPT – Partido dos TrabalhadoresSEET – Secretaria Extraordinária de Educação Superior, Ciência e TecnologiaSETI - Secretaria de Estado da Ciência, Tecnologia e Educação SuperiorSIAF – Sistema Integrado de Acompanhamentos FinanceirosUBES – União Brasileira dos Estudantes SecundaristasUEL - Universidade Estadual de LondrinaUEM - Universidade Estadual de MaringáUEPG - Universidade Estadual de Ponta GrossaUNE – União Nacional dos EstudantesUNESPAR - Universidade Estadual do Norte do ParanáUNICENTRO - Universidade Estadual do Centro do ParanáUNIOESTE – Universidade Estadual do Oeste do Paraná
6
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ...................................................... .................................................. 7
CAPÍTULO I - CONJUNTURA NACIONAL E AS POLÍTICAS EDUCACIONAIS PARA A EDUCAÇÃO SUPERIOR (2003-2006) ..................................................... 12
1.1 A HERANÇA DE FHC: O PROJETO NEOLIBERAL .........................................12
1.2 GOVERNO LULA E A SUA REFORMA UNIVERSITÁRIA...................................16
CAPÍTULO II - FINANCIAMENTO DAS UNIVERSIDADES ESTADUAIS PARANAENSES NO GOVERNO ROBERTO REQUIÃO (2003-2006).................... 34
2.1 AS IEES PARANAENSES .................................................................................. 35
2.2 O INÍCIO DA GESTÃO DE GOVERNO REQUIÃO E SUA POLÍTICA DE
REESTRUTURAÇÃO DO SISTEMA ESTADUAL DE EDUCAÇÃO SUPERIOR
(2003-2006)............................................................................................................... 40
2.3 O FINANCIAMENTO DAS IEES PARANAENSES DE 2003 A 2006 ...................47
2.4 BREVES APONTAMENTOS SOBRE O FINANCIAMENTO DA UNIOESTE.......55
CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................................................... 58
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ....................................................................... 61
FONTES ................................................................................................................... 64
7
INTRODUÇÃO
No ano de 2007 foram comemorados os 20 anos da conquista da gratuidade
das IEES paranaenses. Apesar de permanecerem gratuitas, graças aos esforços de
movimentos que defendem a universidade pública, os últimos anos vem sendo
marcados por orçamentos apertados, um verdadeiro ataque à autonomia de gestão
financeira e patrimonial das universidades.
Este fato tem relação estreita com as orientações do Banco Mundial que
preconiza uma "reforma" da educação superior, cujo objetivo é a crescente
desobrigação do poder público com o financiamento integral das universidades
públicas. Vale lembrar que estas reformas vêm sendo implementadas em grande
parte do território da América Latina. Os organismos multilaterais, por meio de suas
políticas, definem que os investimentos públicos dos chamados países em
desenvolvimento, devem se destinar prioritariamente para a educação básica e que
a educação superior deve receber apenas parte dos recursos dos cofres públicos e
outra parte deve ser custeada com recursos privados (estudante, família e iniciativa
privada). Altoé relata que,
Para fazer frente às suas necessidades, [os organismos multilaterais] orientam que o sistema busque na iniciativa privada a complementação dos recursos financeiros para a sua manutenção. Em consonância com essas políticas, os países em desenvolvimento buscam, principalmente a partir da década de 1990, realizar reformas em seus sistemas de educação superior com o intuito de atender a essas recomendações.1
A partir destas orientações elaboradas por estes organismos multilaterais, a
autonomia passou a estar vinculada à gradativa desresponsabilização do Estado
com o financiamento da educação superior. Junto a isso a educação superior pública
recebeu sérias críticas, sendo difundida a idéia de que seriam ineficientes e
desvinculadas da sociedade. No que se refere ao financiamento
[...] apesar de continuar a receber recursos do fundo público, eles são cada vez menores. Isso obriga as organizações [IES] a procurar fontes alternativas de recursos financeiros, seja por meio da prestação de serviços à população,
1ALTOÉ, Neusa. As universidades estaduais do Paraná: os caminhos da heteronomia. Tese de doutoramento. Unimep, 2007, p. 14.
8oferecendo cursos de especialização e extensão, consultorias, assessorias etc., seja pela cobrança de taxas, matrículas, serviços de laboratórios e outros. 2
Desta maneira, a autonomia universitária, se torna heteronomia3, na medida
em que para responder as demandas das próprias universidades estas buscam
aumentar a receita orçamentaria por meio da venda de serviços, parcerias público-
privadas, dentre outros artífices. Assim, ao invés do exercício da autonomia, da
autodeterminação político-administrativa em relação aos grupos e interesses
externos, a universidade torna-se heteronôma, ou seja é subordinada, sujeita à
vontade e controle de agentes externos, estranhos ao ambiente e atividades-fim da
universidade.
Compreender as estratégias dos organismos internacionais para a educação
superior, nos permite vislumbrar as tendências de privatização que vem sendo
colocadas em prática pelos governantes. Tal tendência decorre da intervenção
externa e ao mesmo tempo do consentimento interno dos governantes e dos
próprios dirigentes universitários.
Desde o tempo em que iniciei a minha graduação em 2004 e passei a atuar
no movimento estudantil muitas dúvidas vieram à tona, em relação ao financiamento
da educação superior paranaense. Muitos questionamentos surgiram diante das
inúmeras práticas que os dirigentes universitários têm implementado com o objetivo
de ampliar seu orçamento, por meio da busca de fontes privadas de financiamento.
A partir destas inquietações surgiu como proposta de trabalho uma análise do
financiamento das IEES paranaenses e neste sentido verificar o papel que cumpriu o
governo Requião em relação a educação superior, no período de 2003-2006.
A partir destas questões, resolvemos nos aprofundar sobre o financiamento
da educação superior paranaense, no governo Requião (2003 a 2006). Este recorte
se deu por conta, primeiro, do discurso de mudança difundido por Requião ao
assumir o governo e, segundo, pois foi o momento em que comecei a vivenciar o
espaço universitário. Importante frisar que as eleições do ano de 2002, foram
vislumbradas por grande parte da população brasileira, como a real possibilidade da
mudança. Chegava-se ao fim de dois mandatos de FHC, em âmbito federal, e de 2AMARAL, Nelson Cardoso. A vinculação Avaliação/Financiamento na Educação Superior Brasileira. In: Impulso. Piracicaba, vol.16, 2005, p. 81-91, p. 84.3Subordinação ou sujeição à vontade de outrem ou a uma lei exterior. 2 Sujeição da vontade ao controle dos apetites naturais, paixões e desejos, em vez de à lei normal ou da razão. Cf. MICHAELLIS: Moderno dicionário da língua portuguesa. São Paulo, Cia. Melhoramentos, 1998.
9Jaime Lerner, no Estado do Paraná, e com ele a esperança de rompimento com as
políticas neoliberais.
Neste sentido o objetivo geral deste trabalho é analisar a evolução das
despesas, constitucionalmente vinculadas, com a manutenção e desenvolvimento da
educação superior no Governo Requião no período de 2003 a 2006. Para isso se fez
necessário realizar uma compreensão sobre as políticas do governo federal
destinadas à educação superior, para a construção de uma análise comparada; uma
análise sobre os recursos repassados pelo Estado do Paraná para o financiamento
das IEES e buscamos analisar também os impactos destes valores no financiamento
da UNIOESTE. Em suma, o intuito deste trabalho é avançar na discussão sobre
financiamento das IEES paranaenses buscando realizar uma comparação ao
financiamento das IFES (Instituições Federais de Educação Superior) pelo governo
Lula, no período de 2003 a 2006.
Para a realização deste trabalho utilizamos como fontes primárias os
documentos do Governo do Estado do Paraná (Balanços do Estado),documentos do
Tribunal de Contas (Contas do Governador). Para aprofundarmos a análise da
evolução das despesas com a manutenção e desenvolvimento da educação superior
no Paraná utilizamos outros documentos de órgãos do governo federal (MEC e
INEP) e documentos da SETI (Secretaria de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino
Superior) e também artigos que pudessem contribuir para o alcance dos objetivos
propostos neste trabalho.
Estas fontes foram utilizadas para a realização do levantamento do
investimento destinado à educação superior, levantamento do número de matrículas,
entre diversos outros dados que fazem parte deste trabalho. Buscamos comparar os
levantamentos, afinal existem dados divergentes entre os documentos do Estado
(Balanço do Estado e Contas do Governador) e os levantamentos do DIEESE
(Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Sócioeconômicos) são apenas
dados mais gerais, o que resultou em um grande esforço para o levantamento dos
dados expostos neste trabalho.
Foram estes os documentos escolhidos, pois mesmo tendo diferentes
análises - um dos documentos é organizado por assessores do Governo Requião
(Balanço do Governo) e outro pelo Tribunal de Contas (Contas do Governador) –
são documentos que trazem números que não são encontrados em demais
documentos do governo. Primeiramente foi realizado o levantamento dos impostos
10recebidos, o número de matrículas tanto no que se restringe ao conjunto das
universidades brasileiras e no que se restringe ao conjunto das universidades
estaduais paranaenses, o levantamento da receita orçamentária, levantamento das
dívidas públicas e orçamento das IEES paranaenses.
Após o levantamento foram organizadas as tabelas para que, através das
análises das mesmas, conseguíssemos responder a algumas questões
fundamentais que nortearam nosso trabalho. Lula e Requião mantiveram consensos
ou divergências? Ocorreram diferenças em relação a expansão da educação
superior entre Governo Lula e Governo Requião? Em relação as IEES paranaenses:
Ocorreu aumento ou redução dos recursos constitucionalmente vinculados à
manutenção e desenvolvimento das IEES paranaenses? Ocorreu aumento ou
redução do orçamento em relação ao ICMS e mesmo em relação aos impostos
constitucionalmente vinculados à manutenção e desenvolvimento da educação
pública? Antes de responder a tais questões apresentamos um histórico das IEES
paranaenses. Analisamos também as primeiras medidas, da “reforma” universitária,
implementadas pelo Governo Lula.
Importante frisar que existem poucos trabalhos, poucas análises, em relação
ao financiamento das IEES paranaenses. Existem levantamentos do próprio Estado,
do DIEESE e de alguns sindicatos vinculados aos profissionais da educação.
Entretanto, tais levantamentos carecem de um tratamento analítico e de maior
divulgação.
Mais do que um estudo acadêmico, analisar o financiamento das IEES
paranaenses possui seu caráter político, afinal poderá servir de instrumento aos
movimentos sociais, a fim de melhorar a elaboração e intervenção política sobre o
tema. Compreender a realidade da IEES do Paraná e as reformas que vem sendo
implementadas via governo federal e governo estadual é tarefa necessária a todos
que defendem a universidade pública, gratuita e de qualidade. Para tanto é
fundamental compreender como estas vem sendo colocadas em prática pelo
governo Requião.
Para buscar responder todas estas questões apresentadas este trabalho foi
divido em dois capítulos:
No primeiro capítulo abordaremos as políticas educacionais elaboradas pelo
governo Lula para a educação Superior, no período de 2003 a 2006. Para isso se faz
de fundamental importância compreender as orientações dos organismos
11multilaterais para a educação Superior. Esta abordagem é necessária para que
possamos realizar no decorrer de nosso trabalho a comparação entre os recursos
repassados pelo governo Lula às IFES e os recursos repassados pelo governo
Requião às IEES paranaenses no período de 2003-2006.
Após a abordagem sobre a conjuntura nacional e as políticas educacionais
para a educação Superior elaboradas pelo governo Lula, aprofundaremos no
segundo capítulo o financiamento das IEES paranaenses, durante o governo
Requião do ano de 2003 a 2006. Buscaremos realizar neste sentido uma breve
comparação entre o financiamento do Governo Lula e Governo Requião. Importante
frisar que nosso objetivo é discutir o financiamento da educação superior e não
entraremos nas questões relacionadas a produção científica, o que demandaria
outros documentos e outras análises. Para a elaboração deste capítulo elaboramos
um conjunto de quadros baseados em dados do Governo do Estado.
Por fim, elencamos alguns aspectos gerais sobre o tratamento da questão
nas considerações finais.
12
CAPÍTULO ICONJUNTURA NACIONAL E AS POLÍTICAS EDUCACIONAIS PARA A
EDUCAÇÃO SUPERIOR (2003-2006)
É preciso que tudo mude para que tudo permaneça4
Neste primeiro capítulo abordaremos as políticas educacionais elaboradas e
implementadas pelo governo Lula para a educação Superior, no período de 2003 a
2006. Para isso se faz de fundamental importância compreender as orientações dos
organismos multilaterais para a educação Superior. Esta abordagem nos permitirá
realizar no decorrer de nosso trabalho a comparação entre o financiamento da
educação Superior realizado pelo Governo Lula (Governo Federal) e o
financiamento realizado pelo Governo Requião (Governo do Estado do Paraná).
1.1 A HERANÇA DE FHC: O PROJETO NEOLIBERAL5
A partir de 1990, com o governo Collor6, ganhou terreno o projeto neoliberal
no Brasil, tendo como eixo central a privatização do patrimônio público, a
desregulamentação das relações de trabalho e a maior abertura do país ao capital
4DIAS, Edmundo Fernandes. Política Brasileira: embate de projetos hegemônicos. São Paulo: Editora Instituto José Luís e Rosa Sundermann, 2006, p.142.5O neoliberalismo ocorreu como resultado da crise do nacional-populismo e do fim do socialismo real. Para Petras, o neoliberalismo é semelhante ao liberalismo na medida em que defende a idéia de um mercado, e não o Estado, deveria ser o único alocador de salários e capital. Defende a desregulamentação total, a derrubada das barreiras comerciais, a livre circulação de bens, de trabalho e de capital. A diferença entre liberalismo e neoliberalismo se dá no contexto em cada qual foi implementado. De forma sucinta, as políticas neoliberais podem ser resumidas em cinco metas essenciais: estabilização (de preços e de contas nacionais); privatização (dos meios de produção e das empresas estatais); liberalização (do comércio e dos fluxos de capital); desregulamentação (da atividade privada) e austeridade fiscal (restrição aos gastos públicos). PETRAS, Jaime. Os fundamentos do neoliberalismo. In: RAMPINELLI, Weldir (Orgs.). No fio da navalha: crítica das reformas neoliberais de FHC. São Paulo: Xamã, 1997, p. 15-38.6Fernando Afonso Collor de Mello, empossado em 15 de março de 1990, tornou-se o mais jovem presidente do Brasil e o primeiro eleito pelo voto direto depois do regime militar. Entre as primeiras medidas para a economia realizou uma reforma administrativa que extinguiu órgãos e empresas estatais e promoveu as primeiras privatizações, abertura do mercado brasileiro às importações, congelamento de preços e pré-fixação dos salários. Exerceu o mandato até 1992, quando seu irmão, Pedro Collor acusou o tesoureiro da campanha presidencial, o empresário Paulo César Farias de articular um esquema de corrupção de tráfico de influência, loteamento de cargos públicos e cobrança de propina dentro do governo. Foi pedido o impeachment do presidente e Collor renunciou ao cargo, mas com o processo já aberto, teve seus direitos políticos cassados por oito anos. Ver mais em Dicionário Histórico-Biográfico Brasileiro pós 1930. vol.II. Rio de Janeiro: Editora FGV; CPDOC, 2001.
13internacional. Para Paulani,
[...] a gestão neoliberal do Estado implica conduzí-lo como se fosse um negócio, mas o resultado é o inverso do que ocorre quando essa racionalidade é aplicada ao setor privado. Em vez do acúmulo de recursos e da reprodução ampliada do ‘capital público’, temos a dilapidação dos recursos do Estado [...] atrofiamento do espaço econômico público.7
A partir da gestão neoliberal, se fortaleceu uma nova concepção de
universidade. Para Chauí tal modelo de gestão iniciou o processo de
aceitação da idéia de modernização racionalizadora, pela privatização e terceirização da atividade universitária [...] a universidade participando da economia e da sociedade como prestadora de serviços às empresas privadas, com total descaso pela pesquisa fundamental e de longo prazo.8
Para Reis o Banco Mundial9 cumpriu papel fundamental neste processo,
recomendando aos países em desenvolvimento que reformassem os seus sistemas
educacionais. Estas reformas são apresentadas como condição para que esses
países tenham êxito no “novo mundo” resultante das mudanças ocorridas nos
sistemas produtivos.10 Otranto, diz que, segundo o Banco Mundial, o sistema de
educação superior dos países periféricos deveria contar com poucas universidades
de pesquisa, seguido por universidades de formação profissional de quatro anos,
institutos isolados e centros vocacionais e/ou de formação técnica com duração de
dois anos.11
Estes elementos apontam para uma redefinição do papel da educação
superior, fundada, de um lado, na desqualificação do caráter científico e no
alinhamento do trabalho das instituições de educação superior às perspectivas de
mercado, à lógica da proporção entre custos e benefícios, ao redesenho das
7PAULANI, Leda. Brasil Delivery: servidão financeira e estado de emergência econômico. São Paulo: Boitempo, 2008, p.122.8CHAUI, M. A Universidade Pública sob nova perspectiva. Conferência de abertura da ANPed, Poços de Caldas, 05 de outubro de 2003, p13.9Segundo o sítio oficial “[...] o Banco Mundial não é um banco no sentido comum, mas uma organização internacional constituída por 185 países desenvolvidos e em desenvolvimento. [...] o Banco Mundial ajuda governos em países em desenvolvimento a reduzir a pobreza por meio de empréstimos e experiência técnica para projetos em diversas áreas”. Ver mais em http://web.worldbank.org/10REIS, Luiz Fernando. Termo de autonomia: estratégia de desobrigação do Estado quanto ao financiamento integral do ensino superior no Paraná. In: Estado e políticas sociais no Brasil: conferências do Seminário Estado e Políticas Sociais no Brasil. Francis Mary Guimarães Nogueira (org.). Cascavel: Edunioeste, 2003, p. 119-149, p. 124.11OTRANTO, Célia Regina. Desvendando a política da educação superior do governo Lula. In: Universidade e Sociedade, Brasília, nº 38, p. 19-29, jun.2006, p. 20.
14relações e limites entre o setor público e o setor privado.12
As reformas no setor público, realizadas por Fernando Henrique Cardoso
(FHC)13, buscaram criar condições para a produção de um novo paradigma político,
baseado na adaptação e busca do consenso e subordinação da educação à
economia buscando tornar o país competitivo no mercado mundial. Ao redefinir os
setores que compõe o Estado, designou setores como não-exclusivos do mesmo,
sendo alguns destes: a educação, saúde e a cultura. Segundo Chauí com as
reformas implementadas por FHC,
[...] a educação deixou de ser concebida como um direito e passou a ser considerada um serviço; que a educação deixou de ser considerada um serviço publico e passou a ser considerada um serviço que pode ser privado ou privatizado.14
Desta forma, a educação pública brasileira passou também a incorporar em
grande medida a lógica empresarial, na medida em que as instituições tiveram que
buscar recursos de fontes adicionais, ou seja, privadas. Para exemplificar este
processo, nos anos de 1990, o Brasil foi o terceiro país em privatização da educação
superior na América Latina.15
Importante frisar, que durante o governo FHC, o processo de privatização não
foi mais intenso devido a greves e grandes mobilizações realizadas pelos
movimentos sociais. Como por exemplo, as greves realizadas por professores de 51
IFES (Institutos Federais de Educação Superior), técnico-administrativos e com o
apoio de estudantes, que durou 104 dias (31/03 a 13/07 do ano de 1998)16 ; a greve
realizada por professores de 51 IFES, técnico-administrativos e estudantes, com
duração de 108 dias (22/08 a 07/12 do ano de 2001)17; as mobilizações do 12CÊA, Georgia Sobreira dos S. As versões do projeto de lei da reforma da educação superior: princípios, impasses e limites. In: SIQUEIRA, Ângela C.; NEVES, Lúcia Maria W. Educação superior: uma reforma em processo. São Paulo: Xamã, 2006, p. 43-79, p.49.13Fernando Henrique Cardoso foi o primeiro homem perseguido pelo regime militar a assumir o cargo de presidente da República do Brasil. Exerceu o mandato por duas vezes, sendo eles de 1995 a 1998 e de 1999 a 2002. Ver mais em Dicionário Histórico-Biográfico Brasileiro pós 1930. vol.II. Rio de Janeiro: Editora FGV; CPDOC, 2001.14CHAUI. Op.cit, p.1.15TRINDADE, Hélgio. A República em tempos de reforma universitária: O desafio do governo Lula. In: Educação e Sociedade, Campinas, nº88, p. 819-844, out.2004, p. 824.16Esta greve teve entre suas principais reivindicações o Reajuste de 48,65%; recomposição do quadro de docentes das IFES; ampliação de vagas e abertura de concursos para docentes; retirada do PIB. Mesmo após greve de fome de 14 docentes, não houve nenhuma conquista referente aos itens da pauta; o governo não abriu mão de seu projeto excludente e privatizante; substituiu o PID pela GED, que tem em comum as mesmas características; nada foi concedido aos professores de 1º e 2º graus e aposentados. Ver mais em http://www.andes.org.br/greve/quadro_das_greves/default.asp17Esta greve teve entre suas principais reivindicações o Reajuste de 75,58%, manutenção do Regime
15movimento estudantil, como a realizada em 30 de março de 2000 na cidade do Rio
de Janeiro18, entre diversas outras.
Afirmando defender a autonomia, FHC no exercício de dois mandatos
presidenciais reduziu bolsas de pesquisa, arrochou salários, não autorizou a
contração de servidores docentes e técnicos em número suficiente para fazer frente
à ampliação das matrículas ou repor quadros em função da exoneração,
aposentadoria e falecimento de docentes. As iniciativas de FHC tinham como
objetivo conter os gastos do Estado. A autonomia preconizada pelo Banco Mundial,
aplicada por FHC,
[...] constitui instrumento por meio do qual o Estado poderia desonerar-se de seu dever de financiar integralmente as universidades públicas, obrigando essas instituições a diversificarem o seu financiamento com a adoção de diferentes modalidades de financiamento privado, as chamadas fontes adicionais.19
Esta concepção de autonomia se opõe frontalmente à autonomia de gestão
financeira e patrimonial consagrada em nossa Constituição Federal de 1988 e
defendida pelos movimentos sociais. A autonomia de gestão financeira das
universidades deveria consistir, basicamente, no ato de gerir os recursos públicos
(financeiros e materiais) que são postos à sua disposição pelo poder público para o
financiamento integral das atividades de ensino, pesquisa e extensão.
Ao inverso, para o Banco Mundial, a autonomia financeira é um mecanismo
para estimular as instituições públicas a arrecadarem recursos, permitindo que as
mesmas, individualmente, possam conservar e administrar livremente os recursos
arrecadados. Para o Banco Mundial a autonomia resulta num conceito vazio quando
as instituições dependem de uma única fonte de financiamento.20 Neste sentido,
durante o governo FHC, predominou-se a conceituação de autonomia apregoada
pelo Banco Mundial, que resultou em diversos enfrentamentos com os movimentos
sociais. Em geral, a síntese deste processo é o avanço da heteronomia das
universidades em vez de autonomia.
Jurídico Único, abertura de oito mil vagas, incorporação das gratificações. Seu resultado foi a abertura de duas mil vagas, equiparação da GID à GED, manutenção do RJU, reajuste salarial variando entre 8 e 15%. Ver mais em http://www.andes.org.br/greve/quadro_das_greves/default.asp18Esta mobilização teve como pauta o chamado Fora FHC. O protesto foi organizado a fim de denunciar o valor do salário mínimo da época e a denúncia de corrupção.19REIS. Op.cit, p.123.20Idem. Ibidem.
16
1.2 GOVERNO LULA E A SUA REFORMA UNIVERSITÁRIA
As eleições do ano de 2002 foram vislumbradas, por grande parte da
população brasileira, como a real possibilidade da mudança. Chegava-se ao fim de
dois mandatos de FHC e com ele a esperança de rompimento com as políticas
neoliberais, o fim das privatizações, e a possibilidade da implementação de
bandeiras históricas da classe trabalhadora, tais como ampliação dos recursos
públicos para o financiamento da educação e da saúde. Dias explicita que,
Sob a égide da palavra de ordem “a esperança venceu o medo” uma maré vermelha tomou as ruas e as praças. Nunca se vira coisa igual. Manifestações como essa, talvez, só no clima da conquista da Copa do Mundo. O desafio agora era outro: o de governar este país. Cada um parecia ser um governante.21
Muitas dúvidas e crenças foram plantadas naquele momento, porém uma
questão crucial era a de compreender a natureza do governo. A partir da
composição do governo, algumas respostas já vinham à tona. Para Dias
Veio a composição do ministério e logo depois, as primeiras medidas [...]. O ministério contemplou posições políticas muito diversificadas. A agricultura e o desenvolvimento diretamente sob o controle dos empresários. A Fazenda reafirmou e radicalizou o acordo com o FMI. O Banco Central, ao qual o novo governo pretende conceder autonomia, era entregue a um ex-dirigente máximo do Bank of Boston, segundo maior banco credor do Brasil e deputado eleito pelo PSDB.22
As alianças feitas para ganhar a eleição tinham um preço que, desde antes da
posse, começou a ser cobrado. Com a composição do ministério, o governo Lula já
demonstrava a posição de manutenção das políticas neoliberais. O programa
histórico defendido durante parte da trajetória do PT, se distanciava a cada dia. Dias
considera que as alianças revelavam
[...] o postergar para um futuro incerto, dos nossos programas históricos enquanto oposição, sob a capa de garantir a sua governabilidade, a afirmação de que 'agora não é possível' não é apenas um adiamento, mas um afastamento.23
21DIAS. Op.cit, p.144.22Idem, Ibidem, p.144.23Idem, Ibidem, p.145.
17Ao mesmo tempo em que respondia aos grupos aliados com ministérios,
sinalizava à classe trabalhadora que não era possível atender as demandas
históricas da classe. O compromisso do governo, desde seu início, foi o de dar
respostas aos organismos internacionais, como a implementação de suas
orientações, aumento no superávit primário, entre outros. Para Dias, todos os “ex-
inimigos”, de Sarney a Antônio Carlos Magalhães, são agora os “neocompanheiros”,
membros do seleto Clube da Ordem Petista.24
Este afastamento do PT dos compromissos sociais e políticos mais amplos
com a maioria da população já era verificável de forma mais explícita a partir dos
anos de 1990, com a ocupação de cargos em governos municipais e estaduais. No
exercício desses governos municipais e estaduais o PT já dava mostras da sua
adesão à ordem capitalista e o abandono do programa partidário. No ano de 1986,
resoluções do congresso partidário afirmavam que: “[...] é impossível supor alianças
estratégicas com a burguesia e com as forças políticas que sustentam a dominação
e a hegemonia da classe burguesa e a perpetuação do sistema capitalista”25. Dias
analisa que atualmente estas teses são alteradas por aqueles que defendiam este
princípio, sem consultar o próprio partido. Portanto, ao não implementar as
bandeiras históricas do conjunto da classe trabalhadora ao assumir o Governo
Federal, o PT explicitou o que já vinha realizando em outros governos, ou seja, a
adesão à ordem e a implementação de um programa de cunho neoliberal.
Além da posição política assumida, o peso do PT e de partidos aliados, na
direção dos movimentos sociais, serviu para minar a resistência da classe
trabalhadora e colocá-la, em grande medida, como parceira deste capital “mais
humanizado”, ao realizar, por exemplo, a restrição de direitos historicamente
conquistados. Isso fez com que o Brasil cumprisse papel fundamental para o avanço
do imperialismo na América Latina. Através da implementação de políticas de cunho
neoliberal o Brasil passou a ocupar um papel de destaque no cenário internacional.
Exemplo disso foi a confiança depositada pela ONU para que o Brasil se
responsabilizasse em enviar tropas ao Haiti, na denominada “missão de paz”, que
na verdade tem servido para oprimir violentamente o povo haitiano. O Brasil também
foi eleito o interlocutor preferencial do Banco Mundial na América Latina. Neste
24Idem, Ibidem, p.201. Importante relembrar a defesa por parte dos governistas a Sarney, diante da crise que assolou o Senado no ano de 2009.25PARTIDO DOS TRABALHADORES. Resoluções de Encontros e Congressos: 1979–1998. São Paulo: Perseu Abramo, s.d., p. 253.
18sentido,
[...] a contra-revolução preventiva, eufemisticamente chamada de reforma do Estado, moldou um conjunto de relações de poder, redesenhando a vida social, buscando redefinir e dar maior eficácia ao Estado sem, contudo, alterar a sua natureza. O Estado brasileiro não é um país qualquer: ele é central para os destinos do capitalismo.26
Ou seja, era necessário que aparentemente tudo mudasse para que
permanecesse como tal. Como o Brasil passou a ser considerado um país central
aos destinos do capitalismo, Lula, ao assumir os aparelhos de hegemonia em
conjunto com seus aliados, possuía uma tarefa vital: enfrentar a crise que assolava o
sistema capitalista. Para isso,
[...] as políticas macroeconômicas do FMI e de FHC foram não apenas mantidas, mas radicalizadas [...]. Os organismos financeiros internacionais, quando falam das reformas neoliberais, aconselham aos governantes que o façam rapidamente e no início dos seus governos, quando ainda têm sobras de legitimidade. Depois disso, o futuro é incerto e não sabido.27
Mudam-se os governantes, porém o poder permaneceu nas mãos dos
mesmos grupos políticos orientados pelos organismos multilaterais, como Banco
Mundial, FMI e outros. Neste sentido é importante esclarecer as diferenças entre
poder e governo. Ao examinar a questão Dias entende que
O poder é uma relação social e não uma entidade abstrata. Ele expressa, portanto a relação estrutural e contraditória das forças sociais em presença. Os projetos sociais e econômicos – manifestados por esta ou por aquela forma de poder – não são neutros, sabemos todos. As formas institucionais também não [...]. Allende seguramente estava no governo, mas não no poder.28
Como vimos anteriormente, a composição ministerial do governo Lula,
demonstrou a continuidade dos projetos políticos de FHC. Neste sentido Lula
passou a governar, porém o poder permaneceu nas mãos dos mesmos que já
estavam no poder. Para aqueles que acompanham a trajetória do PT apenas nestes
últimos anos, o desencanto com os caminhos assumidos pelo partido é maior.
Porém para aqueles que militaram no PT, ou mesmo acompanham o partido desde
sua fundação, sabem que as mudanças estruturais do partido não foram abruptas. 26DIAS. Op.cit, p.146.27Idem, Ibidem, p.156.28Idem, Ibidem, p.130.
19Tais mudanças tiveram início pelo menos desde os anos de 1990. Lula atualmente
governa com velhos inimigos, hoje amigos de longa data. Antigamente desavenças
atualmente aperto de mão.29
Como vimos com o passar dos primeiros meses do governo Lula a dúvida
sobre a natureza de classe de tal governo já se esclarecia. Para Bosi e Reis, a
dúvida sobre o governo Lula.
Parece ter sido dissipada por ações de caráter pró-imperialista e antipopular, exemplificadas pela determinação carrear mais de uma centena de bilhões de dólares para o FMI somente como pagamento de juros da dívida calculados para o ano de 2003, ou ainda pelo envio de tropas para sufocar a classe trabalhadora no Haiti.30
Durante a campanha eleitoral Lula e os partidos que davam sustentação à
sua candidatura prometeram a resolução de grande parte dos problemas sociais,
com redução do desemprego, da violência, da fome dentre outras promessas. Há
uma grande diferença entre o dito e o feito, ou seja, o acontecido tem demonstrado o
contrário do dito, resultado da posição política assumida pelo Governo Lula.
Segundo Bosi e Reis, as crenças depositadas em um governo de feição
democrático-popular esvaziam-se diante “[...] da aproximação sistemática do
governo Lula com as teses neoliberais de transferência dos serviços públicos para o
mercado e de financeirização da economia por meio do atrelamento ao capital
especulativo.”31 Importante salientar que é via discurso ideológico da mudança que o
governo Lula tem dado continuidade ao projeto neoliberal. Ou seja,
O discurso ideológico é o terreno no qual os projetos políticos são construídos e impostos à totalidade social. Isto não o torna necessariamente verdadeiro. Mesmo que se declare “estamos mudando o país”, basta olhar o cotidiano e perceber o agravamento do desemprego, a miséria crescente, a destruição dos serviços públicos, por um lado, e, por outro, a alegria dos banqueiros, o crescimento sem cessar da desigualdade social.32
Segundo Bosi e Reis, sobre a apropriação das bandeiras históricas dos
movimentos sociais é importante dizer que29Idem, Ibidem, p. 181.30BOSI, A. P.; REIS, L. F. A reforma universitária nas universidades estaduais do Paraná. In: Universidade e Sociedade. Brasília, nº 34, p. 35-47, out. 2004, p. 35.31BOSI, A. P.; REIS, L. F. Banco Mundial, Governo Lula, Governo Requião e a Reforma universitária: uma análise comparativa. In: Educação, políticas sociais e Estado no Brasil. Cascavel: Edunioeste, 2008, p. 174.32DIAS. Op.cit, p. 194.
20
[...] o governo Lula investe fortes práticas ideológicas tentando fazer as bandeiras dos movimentos sociais no Brasil – erguidas durante as décadas de 1980 e 1990 – parecerem com as ações neoliberais de restrição e enxugamento e transferência dos serviços públicos para a iniciativa privada [...]. É também dessa maneira que o governo Lula apresenta em farta campanha publicitária a reforma da educação superior, oferecendo um modelito de desenho neoliberal como reforma que irá ampliar o acesso à educação pública de qualidade.33
Como forma de avançar nas políticas neoliberais ao mesmo tempo em que
aparentemente busca solucionar as demandas sociais, o governo Lula apresentou
propostas de inclusão, diminuindo os problemas, de forma paliativa, porém sem
enfrentar as causas de tais problemas. Segundo Dias
[...] em tempos neoliberais não existe mais miséria, mas, exclusão. Qual a vantagem desta formulação? O problema parece não ser do capitalismo nem do governo, mas dos excluídos. As políticas de “inclusão” são aquelas que permitem focalizadamente, diminuir os problemas sem alterar sua verdadeira causa.34
De forma clara, Dias nos apresenta uma síntese das políticas sociais do
governo Lula. Tais políticas procuram amenizar os problemas sem erradicar as
causas. Diante de tal realidade se enfrentam politicamente os defensores do
governo, que defendem claramente o governo da forma que está, existem aqueles
que retoricamente buscam disputar o governo para a vertente mais centrada na
resolução dos problemas sociais e também aqueles que defendem o governo por
acreditar que qualquer ação além daquelas que vem sendo implementadas é
idealismo. Contra as políticas colocadas em prática pelo governo Lula e defendidas
por seus aliados, grupos no campo na esquerda permanecem denunciando e as
combatendo, como o caso da Conlutas35, Intersindical36, entre outros. 33BOSI, A. P.; REIS, L. F. 2008. Op.cit, p.175.34DIAS. Op.cit, p.195.35Coordenação Nacional de Lutas. Segundo o site oficial “A Conlutas - Coordenação Nacional de Lutas - é, como o próprio nome diz, uma coordenação, composta prioritariamente por entidades sindicais, mas também organizações populares, movimentos sociais e estudantis. Por isso, parte de suas lutas são decorrentes das demandas desses setores, abarcando suas bandeiras e procurando dar um caráter classista a essas mobilizações. Entre elas, a luta dos movimentos sociais e populares, dos estudantes, das mulheres, dos negros e negras e dos homemossexuais, além do estabelecimento de relações internacionais de trabalhadores e de movimentos sociais.[...] A partir das lutas do cotidiano da classe trabalhadora, movimentos sociais e populares e dos estudantes, a estratégia da Conlutas é a luta pelo Socialismo.” A Conlutas surgiu como desdobramento do Encontro Nacional Sindical, que aconteceu em março de 2004 em Luziânia (GO), com o objetivo de organizar as lutas diante dos ataque do Governo Lula. Acessado em 20/03/2010.36Intersindical. A entidade, como a Conlutas, surgiu em oposição ao Governo Lula, porém restrita
21Entre os defensores do governo encontram-se parte dos intelectuais e
tecnocratas que defendem que as políticas emanadas pelo governo não são
neoliberais, e desta forma, não são continuidade dos projetos implementados por
FHC. Bosi e Reis consideram que este discurso não encontra respaldo nos fatos.
Alguns elementos que nos auxiliam na defesa da tese da continuidade são: o
processo de transferência dos serviços púbicos para o mercado; atrelamento da
economia ao capital especulativo; as reformas da Previdência e Universitária. Até
mesmo do ponto de vista da corrupção, o continuísmo permanece presente.
Segundo Bosi e Reis na aprovação do PROUNI e da Lei das PPPs (Parcerias
Público-Privadas), o “valerioduto” construiu uma maioria congressual fácil.37
Importante lembrar que o PROUNI, criado via medida provisória e depois aprovado
como Lei, entrou em vigor por meio da retórica da inclusão.
Como já vimos, com o avanço da reforma do Estado, iniciado no Brasil com
FHC, se instaurou uma política de privatizações e aumento do superávit primário a
fim de aumentar a parte dos recursos para pagamento da dívida externa. Com Lula,
além da continuidade no pagamento da dívida externa, foi implementada a Reforma
da Previdência e via medidas provisórias vem sendo implementada a reforma
universitária. O PROUNI e a Lei das Parcerias Público-Privadas fazem parte do
projeto de reforma universitária. Além destas reformas, vem ocorrendo um processo
de eliminação de direitos históricos e, sob orientação neoliberal, vem ocorrendo a
redução da máquina estatal. Segundo Dias,
[...] sabemos, também, que muitos direitos foram usurpados. Brincar de fazer justiça social rebaixando direitos existentes é uma piada sádica. Já falaram em fazer justiça social cobrando a Universidade pública, ao invés de universalizar a educação de qualidade em todos os níveis. 38
A implementação de reformas e, juntamente a estas, a redução dos gastos do
Estado, fez com que ocorressem cortes no orçamento e assim o aumento do
superávit primário. Em grande parte os recursos arrecadados com o superávit
primário são destinados ao pagamento da dívida interna e externa. Bosi e Reis somente às entidades sindicais. Segundo um dos sites da entidade, a mesma busca construir “com aqueles que ainda militam dentro da CUT, mas que não capitularam a proposta de conciliação de classes e com aqueles que já se distanciaram ou deixaram a Central, que se encontram dispersos, mas com disposição para darem o salto de qualidade na superação da fragmentação.” Acessado em 20/03/2010.37BOSI, A. P.; REIS, L. F 2008. Op.cit, p.177.38DIAS. Op.cit, p.167.
22revelam que o montante da dívida tem aumentado e se aproximando no ano de
2006 a 5,8% do PIB. O resultado deste processo são os cortes no orçamento,
principalmente de áreas coma educação e saúde.39 Vejamos nas tabelas abaixo os
gastos reais com a dívida pública e os gastos a área social.
TABELA 1 - DÍVIDA PÚBLICA X GASTOS SOCIAIS - GASTOS DO GOVERNO FEDERAL – BRASIL (2002-2008)
JUROS EENCARGOSDA DÍVIDA
01. Assistência Social02. Ciência e Tecnologia03. Cultura04. Educação05. Energia06. Gestão Ambiental07. Habitação08. Organização Agrária09. Saneamento10. Saúde11. Segurança Pública12. Transporte13. Urbanismo
2003 R$ 132,5 bi R$ 70,8 bi2004 R$ 139 bi R$ 84 bi2005 R$ 139 bi R$ 99 bi2007 R$ 237 bi R$ 103,2 bi2008 R$ 282 bi R$ 117,5 bi
FONTE: http://www.divida-auditoriacidada.org.br/boletins/ [Quadro organizado por Reis (2009)]
TABELA 2 - DÍVIDA PÚBLICA X GASTOS COM SAÚDE E EDUCAÇÃO - GASTOS DO GOVERNO FEDERAL – BRASIL (1999-2008)
ANOJUROS E
ENCARGOSDA DÍVIDA
Em bilhões de R$
DESPESASCOM SAÚDE
Em bilhões de R$
DESPESASCOM EDUCAÇÃOEm bilhões de R$
1999 9620
(20,83% dos gastos com dívida pública)
11(11,45% dos gastos com dívida
pública)
2003 132,527
(20,38% dos gastos com dívida pública)
14(10,57% dos gastos com dívida
pública)
2007 23740
(16,87% dos gastos com dívida pública)
20(8,44% dos gastos com dívida
pública)
2008 28244
(15,60% dos gastos com dívida pública)
24(8,51% dos gastos com dívida
pública)1999/2008
Crescimento nominal %
293,73% 220% 218%
FONTE: http://www.divida-auditoriacidada.org.br/boletins/ [Quadro organizado por Reis (2009)]
39BOSI, A. P.; REIS, L. F 2008. Op.cit, p.176.
23
Através dos números apresentados percebemos que, do ano de 1999 ao ano
de 2008, ocorreu um crescimento percentual de 293,73%, com gastos com a dívida
pública, porém os gastos com educação e saúde obtiveram redução quando
comparados, ano a ano, percentualmente aos gastos da dívida pública neste mesmo
período. Como consta na tabela acima, no ano de 2003 ao pagar em juros e
despesas da dívida mais de 132 bilhões de reais, investiu 27 bilhões em saúde, o
que significa 20,38% dos gastos com dívida pública.
No ano de 2008 ao pagar em juros e despesas da dívida 282 bilhões de reais,
investiu 44 bilhões em saúde, o que significa 15,60% dos gastos com dívida pública.
Ou seja, mesmo tendo aumentado os valores nominais investidos, em comparação
com os pagamentos da dívida, do ano de 2003 e 2008, ocorreu uma redução de
4,78%.
Como vimos na tabela 1, no ano de 2003, a soma dos gastos sociais foi de
53,43% em comparação aos gastos com a dívida e no ano de 2008 este percentual
cai ainda mais totalizando somente 41,66%. No ano de 2003, o governo Lula, em
seu primeiro ano de gestão, conseguiu reduzir gastos públicos suficientes para
cumprir as metas com o Fundo Monetário Internacional (FMI), alcançando o
superávit primário de R$ 66.173 bilhões, ou seja, 4,32% do PIB, aumentando a meta
do governo FHC, que era equivalente a 3,75% do PIB (Produto Interno Bruto).40
Sobre o assunto, segundo Bosi e Reis,
Com o pagamento da dívida não há dinheiro para a educação, bem como para a manutenção dos demais serviços. Há, neste sentido, relação com as orientações do Banco Mundial inscritas no documento 'A educação Superior e as lições derivadas da experiência', que foi dirigido, na década de 1990, aos governos dos chamados países em desenvolvimento. [...] Num plano mais empírico e prático significou e significa acelerar o crescimento da participação privada na educação superior à medida que os recursos para as universidades públicas são minguados ano a ano e até mesmo transferidos diretamente para a iniciativa privada como propõe o Programa Universidade para Todos. 41
Com o avanço nos cortes orçamentários da educação, as universidades 40SILVA JÚNIOR, João dos Reis. Reforma Universitária: a nova forma histórica das esferas pública e provada no início do século XXI. In: ORSO, Paulino (Org.) Educação: sociedade de classes e reformas universitárias. Campinas-SP: Autores Associados, 2007c, p. 87-120, p. 6.41 BOSI, A. P.; REIS, L. F Op.cit, p. 36-37.
24tornaram-se, a cada período, mais subordinadas ao mercado. Esta subordinação
não é recente. Já nos anos de 1990, as diretrizes do Banco Mundial orientavam e
incentivavam a criação e avanço das ditas “fundações de apoio”, que viabilizavam
cursos e serviços das universidades, naturalizando desta forma a mercantilização da
educação.
No governo Lula tais diretrizes estão sendo operadas através de cortes no
orçamento das verbas destinadas à educação Superior. De acordo com o IPEA, o
governo federal destinou no ano de 2002, 0,76% do PIB a educação superior e no
ano de 2005, este mesmo percentual, alcançou 0,77% do PIB. Entretanto, nesse
mesmo período, a matrícula nas IFES cresceram aproximadamente 11%. No
Governo Lula, no período de 2002 a 2005, o gasto médio das despesas da União
com a educação caiu para 0,74%, sendo que durante o governo FHC (1995-2002) o
gasto médio foi de 0,82%.
Além dos cortes ocorreu a imposição de um modelo mercantil universitário,
porém o diferencial, em relação ao governo FHC é que estas diretrizes estão sendo
implementadas como se fossem iniciativas que visam a democratização do acesso
da população pobre à universidade. A imposição desse modelo mercantil tem se
dado por meio de medidas pontuais, como a Lei de Inovação Tecnológica, as PPPs
(Parcerias Público-Privadas), o PROUNI, entre outros, que articulados fortalecem
este modelo de universidade. Neste sentido ocorre uma articulação cada vez maior
do público e do privado. Lula em cerimônia de assinatura do Projeto de Lei de
Inovação Tecnológica explicitou a articulação das medidas aprovadas como parte da
reforma universitária:
[...] hoje o passaporte para o futuro é a parceria entre o Estado e a sociedade; entre o crédito público e o investimento privado; entre a comunidade científica e o setor produtivo. Para isso, finalizamos as regras das Parcerias Público-Privadas; consolidamos as agências reguladoras; definimos essa política industrial; e avançamos muito com a lei de inovação tecnológica. É para isso, também, que estamos negociando com os fóruns internacionais, sobretudo com o Fundo, mudança no cálculo do superávit primário, para ampliar investimentos públicos em infra-estrutura.42
As políticas econômicas adotadas pelo governo, que de forma mediada
influenciaram na reconfiguração do público e do privado no Estado brasileiro após a
42 BOSI, A. P.; REIS, L. F. 2008. Op.cit, p.179.
25reforma de Bresser Pereira, permaneceram no Governo Lula.43
Sobre a reforma da educação superior, é importante salientar que este é um
processo em curso que se iniciou antes do governo Lula da Silva, muito embora este
se apresente como o principal articulador e estimulador da regulamentação das
medidas provisórias.44 Após três versões de anteprojeto de reforma da educação
superior, a última versão foi encaminhada ao Congresso Nacional em junho de 2006
e tornou-se o Projeto de Lei 7200/2006,45 sendo que cada versão e o anteprojeto
são registros de diferentes momentos não só pelo conteúdo que se difere, mas
também pelos temas que são atenuados ou acrescidos de uma versão para outra.46
Segundo Cêa, isso ocorreu devido ao
[...] esgotamento das tentativas governamentais de estabelecimento de consensos a respeito dos diversos temas [...] embora o consenso seja anunciado pelo governo Lula, como pressuposto para a elaboração da proposta de lei da reforma, o que vem ocorrendo demonstra a inconsistência política de um consenso.47
Serviram de referência para a elaboração da primeira versão do projeto de lei
e se mantiveram atuais nas outras versões os documentos Gasto social do governo
central: 2001 e 2002; Bases para o enfrentamento da crise emergencial das
universidades federais e roteiro para a reforma universitária brasileira e Reforma da
educação superior: reafirmando princípios e consolidando diretrizes da reforma da
educação superior.48
As versões, para Cêa, caracterizam as reformas como responsabilidade
social. Para a autora,
A absorção da idéia de responsabilidade social no âmbito do Estado pressupõe a incapacidade e a desobrigação do Estado em responder as necessidades sociais de caráter universal, seja pela suposição de sua incapacidade técnica, seja pela suposição de sua ilegitimidade para assumir determinadas funções, como, por exemplo, desempenhar as tarefas consideradas próprias do setor privado ou agir como o grande “provedor” social.49
43SILVA JÚNIOR. Op.cit, p. 2.44CÊA. Op.cit, p. 44.45Idem. Ibidem, p. 44.46CÊA. Op.cit, p. 45.47Idem. Ibidem, p. 45.48Idem. Ibidem, p. 48.49Idem. Ibidem, p. 49.
26Em suma, é a disseminação da necessidade de diminuir o tamanho do Estado
e redefinir suas funções sociais na base da aliança entre as idéias de
responsabilidade social e de ação estatal. 50 Trindade, expressando a posição dos
defensores do Governo Lula, afirma que a reforma universitária, realizada pela
primeira vez em um contexto democrático, buscou envolver a comunidade
universitária, suas entidades representativas e os setores da sociedade civil
organizada.51 Em contraposição, Leher, vocalizando o movimento docente
organizado no Andes-Sindicato Nacional, afirma que, apesar da divulgação dos
anteprojetos, os principais marcos da reforma da educação superior já foram criados
e instituídos legalmente, como por exemplo,
[...] a consolidação do eixo privado como vetor do fornecimento da educação superior; a naturalização de que os jovens das classes populares terão acesso ao nível superior de qualidade drasticamente inferior; a transformação da universidade em organização de serviços demandados pelo capital, entre outros. 52
O avanço destes projetos tem se concretizado vide ao famoso “pacto social”,
por meio do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social. Dias considera o
Conselho
[...] uma espécie de câmara setorial a nível social, para promover o “pacto pela produção contra a especulação” implica na articulação de setores cujos antagonismos acabaram por impossibilitar os avanços sociais na medida necessária às classes trabalhadoras permanentemente espoliadas.53
Através da constituição deste "espaço de entendimento" entre governo,
empresários e trabalhadores criava-se a expectativa que o povo pobre seria
escutado, uma mera ilusão. Neste conselho, os empresários possuíam um peso
decisivo, sendo maioria em sua constituição, demonstrando assim a face real do
governo Lula.54 Com este Conselho buscou-se a constituição de um consenso social
50LIMA Kátia; MARTINS, André S. Pressupostos, princípios e estratégias. In: NEVES, Lúcia Maria W. (Org.). A nova pedagogia da hegemonia: estratégias do capital para educar o consenso. São Paulo: Xamã, 2005, p. 43-67.51TRINDADE. Op.cit, p. 819.52OTRANTO. Op.cit, p. 27.53DIAS. Op.cit, p. 132.54Segundo Dias, compunham o Conselho do Pacto cinco representantes do setor agropecuário, sete do setor financeiro, 23 da indústria, 2 do comércio, 4 do setor de serviços, somando-se até então 41 integrantes. A estes se somam mais 10 personalidades, 10 ministros, 13 sindicalistas, 2 da cultura, 3 de entidades de classe, 11 representantes de movimentos sociais (leia-se ONGs) e 2 religiosos. Participavam também o presidente e dois representantes do congresso Nacional. DIAS. Op.cit, p.152.
27para a continuidade da reprodução do capital. Com isso se produziu um novo
paradigma de políticas públicas, executadas em geral por Organizações não
governamentais (ONGs).
A “reforma” universitária segue esta orientação, pois com a reconfiguração do
público e do privado, políticas sociais de inclusão foram criadas a fim de amenizar a
desigualdade educacional, inserindo a juventude em instituições privadas, sendo
muitas delas sem pesquisa e extensão. Quanto aos atos efetivos, que entraram em
vigor via Medida Provisória e que antecederam a divulgação da primeira versão do
anteprojeto, podemos destacar:
a) Redefinição do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes), a partir da revisão do antigo “Provão”, por meio da Lei nº 10.861, de 15 de abril de 2004; b) Regulamentação, pelo Decreto nº 5.205, de 14 de setembro de 2004, das relações entre as Instituições Federais de Educação Superior (Ifes) e as fundações privadas ditas de apoio, previstas desde 1994, quando foi aprovada a Lei nº 8.958, que trata do assunto;c) Proposição do Programa Universidade para Todos (ProUni) – Projeto de Lei nº 3.582, de maio de 2004 – efetivado pela Lei nº 11.096, em 13 de janeiro de 2005.55
Como grande parte da reforma desejada já foi definida no âmbito da
legislação, algumas medidas vêm ocorrendo, como
a) redução do financiamento público, transferência de recursos para IES privadas por meio do PROUNI e aumento da captação de verbas nas IES públicas, viabilizado pelo Decreto 5.205, que regulamenta as fundações ditas de apoio universitário; b) separação das atividades de educação, pesquisa e extensão, condicionando o exercício da primeira à eliminação das duas últimas (conforme reafirmado na MP 208/04, que aprofunda o caráter produtivista do trabalho docente; c) transformação da extensão em prestação de serviço autofinanciável (pagos); vinculação da pesquisa a interesse empresariais por meio da Lei de inovação Tecnológica ou ainda pelo direcionamento dos editais públicos para financiamento de pesquisa [...]; d) precarização das relações de trabalho docente como forma, inclusive, de eliminar o compromisso docente com a instituição em que trabalha. Em regra, se a universidade é subordinada ao mercado por meio dessas ações, a autonomia de produção intelectual, que é base de toda a autonomia universitária, também sucumbe aos interesses de mercado. O desdobramento mais claro desse quadro é o abandono, por parte do Estado e das políticas do governo, de um desenvolvimento socialmente referenciado e nacionalmente soberano.56
O Programa Universidade para Todos (PROUNI), parte integrante da reforma
55CÊA. Op.cit, p.49.56BOSI, A. P.; REIS, L. F. 2008. Op.cit, p. 177-178.
28universitária implementada pelo governo Lula, consiste na troca de bolsas de estudo
(integrais e parciais) em instituições de educação superior privadas, destinadas a
alunos carentes, por isenção de impostos federais. Em suma, consiste na compra de
vagas em instituições privadas usando dinheiro público. Ao apresentar o PROUNI
como grande saída ao problema da falta de vagas nas Instituições de Educação
Superior (IES) públicas, sendo assim a possibilidade do jovem ingressar em um
curso universitário, deixa de explicitar, segundo Paulo R. Cardoso, secretário adjunto
da Receita Federal, que as IEES privadas, até o ano de 2007, acumulavam dívida
superior a 12 bilhões de reais. A dívida pode ser resultado do número de vagas
ociosas em IES privadas, alcançando o percentual de 50%.57
Um dos argumentos utilizados pelo governo a fim de implementar este
programa, é o baixo custo de um aluno do programa em comparação com um aluno
matriculado em uma das IES federais. Porém o cálculo do governo, que equivalia a
R$ 940,54 (2005) o custo médio de um estudante do PROUNI, não abate dos
cálculos o número de bolsas que as IES filantrópicas já teriam obrigação de
oferecer, independentemente do programa.58
Outros problemas: dados de 2005 a 2007 demonstram que apenas 13% das
bolsas pertencem a alunos/as negros/as; 71% das bolsas são destinadas a
estudantes de cursos noturnos; apenas 2,2% do total de bolsistas no ano de 2007
foram beneficiados com a bolsa-permanência.59 Além disso, os bolsistas não têm na
prática, os mesmos direitos que os estudantes pagantes, sendo obrigados a optar
por habilitações menos concorridas e não podem participar de seleção para
programas de iniciação científica.60 Até mesmo a UNE, parceira do MEC fez crítica
em relação ao PROUNI. Gustavo Petta, presidente da UNE no ano de 2006 ,
afirmou que
O Programa Universidade para Todos, uma das bandeiras do presidente Luiz Inácio Lula da Silva na campanha à reeleição, oferece bolsas de estudo a alunos carentes em 237 cursos de educação superior que tiveram os piores conceitos em avaliações realizadas nos últimos anos. Eles representam 48%
57ANDRÉS, Aparecida. O Programa Universidade para Todos. Estudo. Consultoria Legislativa da Câmara dos Deputados, 2008, p. 26.58Idem. Ibidem, p. 19.59Benefício no valor de R$ 300,00 mensais, concedidos a estudantes com bolsa integral do PROUNI em utilização, matriculados em cursos presenciais com no mínimo 6 horas diárias de aula. Ver mais em ANDRÉS, Aparecida. O Programa Universidade para Todos. Estudo. Consultoria Legislativa da Câmara dos Deputados, 2008, p. 26.60Idem. Ibidem, p. 32.
29dos 492 cursos de instituições privadas com notas mais baixas. 61
A UNE, que tem apoiado Lula, desde o processo eleitoral do ano de 2002,
apesar de algumas críticas pontuais, como por exemplo, a alguns aspectos do
Prouni, tem participado ativamente no processo de discussão, defesa e
implementação do projeto global de reforma universitária do Governo Lula “[...] de
punhos erguidos para alterar a cara de nossas universidades: investindo na
educação pública e regulando o setor privado”.62 Assim se demonstra a sintonia
entre entidade e governo, com o objetivo de regular a educação privada.
A UNE desde o início da gestão do governo Lula passou a pressionar o
mesmo para a aprovação de lei da reforma da educação superior. Essa postura da
UNE explica-se, segundo Cêa, por dois aspectos: “[...] a aliança da política do
PCdoB (tendência política majoritária na composição da diretoria da entidade) e o
governo Lula e a inserção no projeto de lei de 'políticas de democratização do
acesso e da assistência estudantil'.” ·.
A adesão da UNE ao Governo Lula, além do fato de ser dirigida
majoritariamente por um partido aliado ao Governo Lula, se explica pelo
financiamento do governo federal a diversos projetos direcionados a entidade.
Como, por exemplo, o projeto Memória do Movimento Estudantil, que para além de
parceria com a fundação Roberto Marinho, solicitou ao governo o valor de
1.586.700,00.63 Outro projeto se chama Pesquisa Cultura na UNE: 1999 a 2007, que
solicitou ao governo o valor de 351.210,00.64 Isso sem contar os investimentos do
governo federal para a reconstrução da sede da UNE no Rio de Janeiro, os
investimentos estatais para a realização de congressos, como o investimento da
Petrobrás de 100 mil reais para a realização do 51º Congresso da entidade (2009),
que contou com a presença de Luís Inácio, da ministra Dilma Roussef, candidata do
presidente Lula à sua sucessão, e outros membros do governo federal, detentores
de cargos nos ministérios. É importante registrar que foi a primeira vez na história da
entidade que houve a presença de um presidente da república na abertura de um
congresso. além disso, tal Congresso transformou-se num evento em defesa do 61Idem. Ibidem, p. 31.62Histórico da UNE. Acessado em 01/07/2009. Disponível no site www.une.gov.br.63Ver mais em http://www.cultura.gov.br/salic4/index.php?pronac=0764352. Consultado em 04/09/2009.64Ver mais em http://www.cultura.gov.br/salic4/index.php?pronac=0714123) Consultado em 04/09/2009.
30Governo Lula e de propaganda da candidata do governo, ovacionada pela imensa
maioria dos delegados presentes.
Com a adesão ao governo Federal, a entidade passou a reivindicar para si os
projetos a serem implementados, como a reforma universitária, pontuando críticas
suaves. Para isso, justificou sua posição ao argumentar que tal projeto visa a
democratização da educação superior brasileira. Através desta reforma universitária,
o governo Lula, tem buscado implementar gradativamente a ampliação da
responsabilidade de seu financiamento para as fundações ditas de apoio, abrindo as
portas das universidades para as empresas privadas, entre outros e mesmo com a
criação de novas universidades, ocorre um processo de redução do financiamento.
Ainda sobre o financiamento, Bosi e Reis argumentam
[...] retomando a questão do financeiro a educação superior pública, é preciso registrar – com base nas evidências emanadas do próprio governo Lula - que, diferentemente do pagamento da dívida, as verbas executadas nas áreas sociais permanecem estagnadas ou até mesmo diminuem. Na prática, a subvinculação proposta no Anteprojeto de Lei que asseguraria a aplicação nas IFES (Instituições Federais de Educação) de 75% dos 18% constitucionais, não alteraria a curva declinante nos últimos 10 anos que tem marcado os gastos com a educação superior federal, dado o fato – inquestionável pelo governo Lula – da DRU (Desvinculação das Receitas da União) que permite retirar até 20% das verbas orçadas.65
A precarização das instituições de educação superior públicas se reflete ao
processo contínuo de redução de verbas destinadas às mesmas, vide a DRU
(Desvinculação das Receitas da União), que abre brechas para a retirada de verbas
destinadas à educação superior demonstrando assim a posição do governo Lula
sobre a educação superior pública e garantindo a implementação das orientações do
Banco Mundial. Para Cêa, “[...] a reforma da educação superior deve ser identificada
como um passo atrás na luta pela implementação qualitativa das oportunidades
educacionais dos trabalhadores.”66
Em suma, para Dias, sobre a educação, o governo buscou seguir a linha de
FHC:
[...] perdendo, assim, de forma cristalina, a perspectiva da universalização dos direitos (exemplarmente pensada no projeto original do SUS, por exemplo) para pensar o conjunto dos riscos como esferas passíveis de mercantilização e criar e legitimar um campo privilegiado de acumulação para
65BOSI, A. P.; REIS, L. F. 2008. Op.cit, p. 180.66CÊA. Op.cit.
31o sistema financeiro [...] A Universidade pública, nesta lógica, não é tratada como deficitária, mas, como onerosa e desnecessária, como luxo.67
O abuso das medidas provisórias, a enorme quantidade e sucessão de
Emendas Constitucionais rasgaram a Constituição e minaram algumas conquistas
sociais prescritas pela Constituição Federal de 1988, resultantes das lutas da classe
trabalhadora.68 Além disso, as reformas apresentadas pelo governo Lula, durante
este período, não vão ao encontro às reivindicações históricas da classe
trabalhadora. Ao mesmo tempo, o governo Lula, durante este período, garantiu o
aumento do superávit primário, com o objetivo de pagar pontualmente a dívida
externa.
Em suma, o governo Lula cumpre o papel de manter a governabilidade num
contexto de crise. Ou seja, significa um governo que avança nas reformas
neoliberais, e simultaneamente consegue ter um grau de rejeição e antagonismo
baixo. Não resta dúvida de que o governo Lula conseguiu avanços muito
significativos sob esta ótica e rigorosamente com um grau de antagonismo bastante
modesto. Logrou avanços muito significativos na mercantilização, como o programa
Universidade Para Todos em que cria uma expectativa na juventude em especial nas
periferias das grandes cidades de que o acesso a educação superior vai ser
praticamente livre, universal, ao mesmo tempo em que se avança em uma política
“pública”, dita para todos, não garantida pelo Estado.
O governo Lula, efetivamente conseguiu implementar seus projetos devido ao
seu prestígio popular e sua vinculação estreita ou mesmo a cooptação de grande
parte dos movimentos sociais. O peso político, o aparato burocrático e a densidade
organizativa de entidades como a CUT, Força Sindical e a UNE tem sido
fundamental para blindar o governo Lula e obstaculizar, em grande medida, a
construção de um amplo movimento social de oposição o governo Lula. Iniciativas,
como é o caso da Conlutas, Intersindical, Conlute69, sucedido pela ANEL70, que 67DIAS. Op.cit, p. 158.68Idem. Ibidem, p. 205.69Coordenação Nacional de Luta dos Estudantes. Segundo o site oficial “[...] é fundada a Coordenação Nacional de Luta dos Estudantes (Conlute) com o objetivo de coordenar as lutas contra os ataques do governo, uma vez que a UNE não cumpria mais esse papel”. Fundada em maio de 2004, quando realizado no Rio de Janeiro o Encontro Nacional contra a Reforma Universitária de Lula/FMI, que reuniu mais de 1.500 estudantes universitários e secundaristas de todo o país. Acessado em 03/10/2008. A Conlute após cinco anos de existência e organização dos estudantes, deixou de existir após a realização do Congresso Nacional dos Estudantes, no Rio de Janeiro, e fundação da Assembléia Nacional dos Estudantes Livre.70A Assembléia Nacional dos Estudantes – Livre é uma nova entidade fundada no Congresso Nacional dos Estudantes, que aconteceu no Rio de Janeiro e contou com 2.000 estudantes. Nasceu como uma alternativa à
32procuram organizar uma oposição classista e independente ao governo Lula, são
importantes mas tem, ainda, pouca densidade organizativa e pouco alcance político.
Como vimos acima, a UNE mantém sua relação próxima ao governo devido à
sua aliança político-eleitoral e ao grande número de projetos financiados pelo
governo. Sobre a reforma universitária, em especial sobre o PROUNI, o ex-ministro
da educação de FHC, Paulo Renato, disse que,
[...] o Partido dos Trabalhadores abandona definitivamente mais uma das bandeiras históricas da esquerda brasileira, e que está muito presente na Constituição de 1988: “Dinheiro público para a Escola Pública”. [...] A surpresa não está na proposta, [PROUNI] está nos autores. Não me espantaria que uma idéia semelhante tivesse partido dos liberais que ocuparam o ministério durante tantos anos antes de 1995. Por outro lado, se em uma noite de verão, como ministro, eu tivesse sonhado em anunciar algo semelhante, certamente eu não teria conseguido chegar ao ministério pela manhã, acossado por raivosos protestos de militantes petistas e da Une.71
Diferentemente do governo FHC, o governo Lula com o seu imenso apoio e a
blindagem política oferecida por gigantescos aparatos burocráticos, como é o caso
da UNE e da CUT, implementou diversos projetos de cunho liberal, que
efetivamente, como diz o ex-ministro Paulo Renato, não conseguiriam ser
implementados sem o apoio das entidades de massas cooptadas pelo governo
federal. Neste sentido, para o avanço na compreensão das políticas aplicadas pelo
governo Lula é fundamental entendê-las a partir de um enfoque classista, afinal
somos parte de uma sociedade capitalista, divididos antagonicamente em duas
classes: burguesia e proletariado.
Neste sentido, as políticas do Banco Mundial, implementadas via "reformas"
nos países em desenvolvimento, como o Brasil, tem por objetivo reduzir o papel do
Estado na organização, oferta e financiamento da educação. As "reformas"
implementadas procuram esconder os problemas estruturais da sociedade brasileira
e latino-americana oferecendo respostas paliativas, cujo objetivo central é amenizar
as tensões sociais. Segundo Sanfelice, o Estado capitalista tem como função
assegurar e conservar a dominação e a exploração da classe. Neste sentido possui
como premissa defender a propriedade privada e a educação está atrelada aos
mesmos objetivos. A partir de então a educação pública não é do interesse comum,
UNE e à UBES, entidades tradicionais do movimento, que conforme a entidade hoje estão atreladas ao governo federal.71ANDRÉS, Aparecida. Op.cit, p. 41.
33mas do privado, assim a educação estatal serve para garantir que a classe
trabalhadora sobreviva e que possa vender sua força de trabalho.72
Neste sentido a educação estatal está mais atrelada aos interesses do Estado
do que aos interesses públicos, entendendo-se interesses públicos como os
diferentes interesses das distintas classes sociais da sociedade capitalista, pois tais
interesses não são universais. Sob esta orientação ocorre a injeção de verbas
públicas nas iniciativas privadas ou isenção de encargos.73
A partir deste balanço inicial, no próximo capítulo, abordaremos o processo de
reestruturação do sistema paranaense de educação superior, no período de 2003 a
2006, tendo como foco principal o financiamento das IEES, a análise da evolução
das despesas, constitucionalmente vinculadas, com a manutenção e
desenvolvimento da educação. A nossa intenção é compreender o financiamento
destinado às IEES paranaenses, executado por Roberto Requião (PMDB), como
parte do projeto de reestruturação da educação superior operada pelo titular da SETI
(Secretaria da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior) Aldair Rizzi, no período de
2003-2006 e a partir deste levantamento responder a seguinte questão: existe
convergência ou divergência entre Lula e Requião sobre o tema financiamento das
universidades?
72SANFELICE, Jose L. A problemática do público e do privado na história da educação do Brasil. In: LOMBARDI, J.C.; JACOMELI, Maria R.M.; SILVA, Tânia M.T. O público e o privado na história da educação brasileira: concepções e práticas educativas. Campinas: Autores Associados/UNISAL, 2005, p. 177-185.73Idem. Ibidem.
34
CAPÍTULO IIFINANCIAMENTO DAS UNIVERSIDADES ESTADUAIS PARANAENSES NO
GOVERNO ROBERTO REQUIÃO (2003-2006)
Após a abordagem sobre a conjuntura nacional e as políticas educacionais
para a educação superior elaboradas pelo governo Lula, aprofundaremos, neste
capítulo, o estudo sobre o financiamento das IEES paranaenses, durante o governo
Requião, do ano de 2003 a 2006. Buscaremos realizar neste sentido uma breve
comparação entre o financiamento do Governo Lula e Governo Requião. Importante
frisar que nosso objetivo é discutir o financiamento da educação superior. Para tanto
trataremos apenas dos recursos constitucionalmente vinculados à manutenção e
desenvolvimento da educação público. 74
Não trataremos neste trabalho dos demais recursos recebidos pelas
universidades e faculdades estaduais de outras fontes constitucionalmente
vinculadas, como por exemplo, os recursos utilizados para a manutenção dos
hospitais universitários, considerados como gastos com saúde75, e dos recursos
transferidos para o financiamento ao desenvolvimento de projetos de pesquisa e as
despesas com pessoal de pesquisa, considerados como gastos com ciência e
tecnologia76. Tais recursos considerados como gastos com saúde e com ciência e
tecnologia não são objeto de investigação no presente trabalho.
Para o desenvolvimento deste capítulo utilizamos como fontes os "Relatórios
e Pareceres Prévios sobre as Contas do Governador", relativos aos exercícios
financeiros de 2003 a 2006, elaborados pelo Tribunal de Contas do Paraná e os
74 No período abrangido pelo estudo a Constituição Estadual do Paraná, em consonância com a Constituição Federal, determinava que o governo estadual deveria aplicar anualmente 25% (vinte e cinco por cento), no mínimo da receita resultante de impostos, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino público.75 De acordo com Reis e Carvalho (2009) a Emenda nº 29 à Constituição Federal, promulgada em 13 de setembro de 2000, estabeleceu a vinculação de receitas da União, Estados, Distrito Federal e Municípios para o financiamento da Saúde. No caso da União a Emenda estabeleceu que o montante empenhado em ações e serviços públicos de saúde, a partir do ano de 2000, deveria ser o valor apurado no ano anterior, corrigido pela variação nominal do Produto Interno Bruto (PIB). No caso dos Estados e do Distrito Federal deveriam investir 12% (doze por cento) e os Municípios, no mínimo 15% (quinze por cento) de seus orçamentos próprios. 76 A Constituição do Estado do Paraná determina, no artigo 205, que "[...] o Estado destinará, anualmente, uma parcela de sua receita tributária, não inferior a dois por cento, para o fomento da pesquisa científica e tecnológica, que será destinada em duodécimos, mensalmente, e será gerida por órgão específico, com representação paritária do Poder Executivo e das comunidades científica, tecnológica, empresarial e trabalhadora, a ser definida em lei".
35"Balanços Gerais do Estado", relativos aos exercícios financeiros de 2003 a 2006,
disponibilizados pelo governo estadual. Utilizamos também informações
disponibilizadas pelo INEP/MEC (Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos Anísio
Teixeira) e pela SETI (Secretária de Estado da Ciência, Tecnologia e Educação
Superior). A partir de tais fontes elaboramos um conjunto de quadros para facilitar o
processo de análise dos recursos, constitucionalmente vinculados à manutenção e
desenvolvimento da educação pública, repassados às IEES paranaenses no
Governo Requião (2003 - 2006). Antes da discussão mais específica da temática
apresentaremos um breve histórico das universidades estaduais paranaenses.
2.1 AS IEES PARANAENSES
O Estado do Paraná foi comarca do Estado de São Paulo até o final do
século XIX (1883), quando ao se desmembrar conseguiu a sua autonomia. Porém o
debate em torno da criação de universidades neste perímetro territorial se iniciou
somente no século XX. A criação de universidades bem sucedidas, consolidadas, no
Brasil foi concretizada somente no ano de 1920, no governo de Epitácio Pessoa, por
meio do decreto 14.343 de 07 de setembro do mesmo ano. 77 Tal decreto criou a
Universidade do Rio de Janeiro. 78 Outras universidades foram criadas
anteriormente, porém tiveram vida curta e não se consolidaram. Conforme Cunha
Em 1909, foi criada a Universidade de Manaus, em 1911, a Universidade de São Paulo e, em 1912, a Universidade do Paraná [...]. Essas tentativas, independentes e até mesmo contrárias à orientação do poder central, embora não vingassem, devem ter provocado uma reação para que o governo da União controlasse a iniciativa de fundar a universidade. 79
Pouco a pouco estas universidades dissolveram-se, sendo novamente
criadas anos mais tarde. No Estado do Paraná, a Universidade do Paraná, diante da
Reforma Carlos Maximiliano80, foi obrigada a dissolver-se, pois a reforma impedia a
77 RANIERI, Nina. Autonomia universitária: as universidades públicas e a Constituição Federal de 1988.São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1994, p.74.78 A Universidade do Rio de Janeiro nasceu da reunião das Escolas Polítécnica e de Medicina e da Faculdade Livre de Direito. Ver mais em FÁVERO, M. L. A. A Universidade do Brasil: um itinerário marcado de lutas. Revista Brasileira de Educação, nº 10. Jan/Fev/Mar/Abr 1999. p. 16 -32, p. 17.79 CUNHA, Luiz Antonio. A universidade temporã:o ensino superior, da Colônia à Era Vargas. São Paulo: Editora UNESP, 2007, p.189.80 A Reforma Carlos Maximiliano foi implantada por meio do decreto federal nº 11.530, de 18 de
36equiparação de escolas superiores em cidades com menos de 100 mil habitantes.
Em 1946, as faculdades isoladas de Direito, Medicina e Engenharia, mais a de
Filosofia vieram a compor novamente a Universidade do Paraná. No ano de 1950 a
universidade foi federalizada. 81
A implementação das universidades estaduais paranaenses percorreu
caminhos mais longos. Para Altoé,
[...] o Estado do Paraná toma a iniciativa de criar suas universidades a partir das faculdades isoladas existentes, principalmente, no interior do Estado. O “sistema” de educação superior público paranaense teve inicio no ano de 1969 com a aprovação da lei 6.034, de 06 de novembro de 1969, que criou numa única lei as três primeiras universidades. São elas: Universidade Estadual de Londrina (UEL), Universidade Estadual de Maringá (UEM) e Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG). 82
Além destas universidades, o Estado mantinha faculdades estaduais em
cidades do interior e duas na capital do Estado. No ano de 1990 foi criada a
Universidade Estadual do Centro-Oeste (Unicentro) e em 1994 foi criada a
Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE). A Universidade Estadual
do Norte do Paraná (UNESPAR) foi criada em 2004. Atualmente o Estado do Paraná
mantém a educação superior público em seis universidades e 7 faculdades
isoladas83. Destas, 5 localizam-se no interior do Estado e 2 na capital, Curitiba.
março de 1915. Tal decreto reorganizou o ensino secundário e superior no Brasil. De acordo com Reis o decreto nº 11.530 trazia uma preocupação contencionista quanto à criação de institutos superiores de educação no Brasil. O decreto estabeleceu barreiras ao processo de equiparação dos institutos. De acordo com o decreto, o instituto que funcionasse em cidades com o número inferior a 100 mil habitantes não poderia solicitar a sua equiparação aos estabelecimentos federais. Cf. REIS, Luiz Fernando. A autonomia universitária: de princípio fundante às orientações do Banco Mundial e sua relação com as reformas atuais da educação superior no Brasil e no estado do Paraná. Maringá, Paraná, 2002. Dissertação Mestrado em Educação) - Universidade Estadual de Maringá. 81 CUNHA. Op.cit, p. 188.82ALTOÉ, Neusa. As universidades estaduais do Paraná: os caminhos da heteronomia. Tese de doutoramento. Unimep, 2007, p. 81.83As universidades são as seguintes: 1) UEL - Universidade Estadual de Londrina; 2) UEM - Universidade Estadual de Maringá; 3) UEPG - Universidade Estadual de Ponta Grossa; 4) UNIOESTE - Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Cascavel, Marechal Rondon, Foz do Iguaçu, Francisco Beltrão e Toledo); 5) UNICENTRO - Universidade Estadual do Centro-Oeste (Guarapuava e Irati); 6) UNESPAR - Universidade Estadual do Norte do Paraná (Bandeirantes, Cornélio Procópio e Jacarezinho). As faculdades são as seguintes: 1) EMBAP - Escola de Música e Belas Artes do Paraná (Curitiba); 2) FAP - Faculdade de Artes do Paraná (Curitiba); 3) FECEA - Faculdade Estadual de Ciências Econômicas de Apucarana; 4) FECILCAM - Faculdade Estadual de Ciências e Letras de Campo Mourão; 5) FAFIPAR - Faculdade Estadual de Filosofia, Ciências e Letras de Paranaguá; 6) FAFIPA - Faculdade Estadual de Educação, Ciências e Letras de Paranavaí; 7) Faculdade Estadual de Filosofia, Ciências e Letras de União da Vitória. Cf. ALTOÉ, Neusa. As universidades estaduais do Paraná: os caminhos da heteronomia. Tese de doutoramento. Unimep, 2007.
37
FIGURA 01. LOCALIZAÇÃO DAS UNIVERSIDADES E FACULDADES PÚBLICAS ESTADUAIS PARANAENSES.
Até março de 1987 a educação superior paranaense esteve sob a
coordenação da Secretaria Estadual de Educação. Pelo decreto 180, de 25 de
março do ano de 1987, foi criada a Secretaria Extraordinária de Educação Superior,
Ciência e Tecnologia (SEET), que tinha como objetivo implementar políticas em
relação à educação superior, à ciência e à tecnologia. Em 8 de janeiro de 1992, a
Secretaria de Estado da Indústria e do Comércio é transformada em Secretaria de
Estado da Indústria e do Comércio, Educação Superior, Ciência e Tecnologia (SETI).
Pela lei 11.066, de 01 de fevereiro de 1995, a secretaria passou a denominar-se
Secretaria de Estado da Ciência, Tecnologia e Educação Superior (SETI), com o
objetivo de definir, coordenar e executar políticas nas áreas da ciência, tecnologia e
educação superior, num processo de contínuo desenvolvimento, em prol da
sociedade paranaense. 84
Segundo Altoé “[...] além da coordenação exercida pela SETI, o subsistema
de educação superior do Paraná é supervisionado diretamente e a qualquer
momento pelo Tribunal de Contas do Estado, independentemente da
84 ALTOÉ. Op.cit, p. 85.
38obrigatoriedade da prestação de contas anual”. 85
Importante frisar, que as universidades estaduais paranaenses tornaram-se
gratuitas somente no ano de 1987, durante governo de Álvaro Dias (1987-1991). A
lei estadual nº 8675, de 21 de Dezembro de 198786, autorizou "[...] o Poder
Executivo a instituir gratuidade da educação em todas as instituições de Educação
Superior mantidas pelo Estado do Paraná". 87 Esta conquista somente foi alcançada
diante da luta organizada da comunidade universitária tendo como principal
protagonista o movimento estudantil.
Mesmo com a gratuidade, na década de 1990, a educação superior pública
paranaense passou a sofrer ações que visavam a desresponsabilização do Estado
sobre as mesmas. Altoé relata,
Na década de 1990 no Estado do Paraná a educação superior público foi alvo de muitas ações por parte do governo do Estado, que visavam desobrigá-lo de seu financiamento. A justificativa para estas ações era a de acompanhar as políticas mundiais, e as mudanças que estavam sendo realizadas pelo governo federal. 88
E concluiu que
O objetivo dos governos paranaenses a partir de 1995 foi abrir o caminho legal para uma progressiva redução das responsabilidades do Estado para com a educação superior, desobrigando-o de investir neste nível de educação. Para os governantes este nível de educação, constitucionalmente, é de competência do governo federal. 89
Iniciou-se então o período de restrição do financiamento estatal às IEES
paranaenses. As Universidades públicas paranaenses foram afetadas pelas
mudanças ocorridas sob as influências das políticas neoliberais emanadas dos
organismos multilaterais, orientadas pela reforma do Estado iniciada no Brasil em
meados dos anos de 1990. Dentre esses organismos internacionais o Banco
Mundial exerceu uma influência marcante nos rumos das políticas educacionais
85 ALTOÉ. Op.cit, p. 8586 Tal lei foi regulamentada posteriormente por meio do decreto estadual nº 2.276, de 11 de janeiro de 1988. O decreto determinava a isenção de cobrança de anuidade escolar aos estudantes dos cursos regulares de graduação das universidades e faculdades estaduais isoladas mantidas pelo Estado do Paraná.87 ALTOÉ. Op.cit, p. 86.88 Idem. Ibidem, p. 86. Durante o período citado, a autora era reitora da Universidade Estadual de Maringá (UEM) e endossou tais políticas, as quais é crítica nesta sua tese de doutorado.89 Idem. Ibidem, p. 83.
39implementadas por governos dos chamados países em desenvolvimento. O Paraná,
sob o Governo Lerner ganhou destaque no cenário nacional por constituir-se numa
espécie de "laboratório" das diretrizes do Banco Mundial para a educação. Segundo
Altoé
A partir da década de 1990 foram criados no Estado do Paraná, seguindo o sistema de acompanhamento financeiro implantado no governo federal, dois sistemas de operacionalização orçamentária: o primeiro denominado de Sistema de Elaboração e controle do Orçamento, através da coordenadoria do Orçamento e Programação (COP) e, o segundo, denominado de Sistema Integrado de Acompanhamentos Financeiros (SIAF), altamente centralizados nos órgãos estaduais, via sistemas on-line que permitem o controle e execução direta do orçamento. A partir deste período, as instituições de educação superior passaram a enfrentar o desafio da transição entre uma forma de gestão financeira baseada no planejamento e elaboração do orçamento realizado por elas próprias, de acordo com suas necessidades, e a nova forma de ação definida e executada pelo Estado, por meio do Sistema de Elaboração e Controle do Orçamento e do Sistema Integrado de Acompanhamento financeiro. No modelo novo, o Estado passa a fixar um teto orçamentário, por ele definido conforme seus próprios critérios, alterando a forma de atuação das instituições na definição do montante dos recursos que deverão ser implantados anualmente em seus orçamentos. 90
Com isso as instituições foram obrigadas a recorrer a novas formas de
arrecadação. Ainda segundo Altoé,
A comunidade universitária passou a ser pressionada a realizar serviços para as empresas privadas, alterar os currículos dos cursos, com o objetivo de tornar as instituições eficientes e eficazes para atender ao mercado de trabalho. Passou a reproduzir no Estado do Paraná as orientações do governo federal que se alinhavam com as orientações dos organismos multilaterais. 91
Peres demonstra que o Estado do Paraná, desde os anos de 1990 tem
praticado as ações de orientação neoliberal. Segundo o autor
Tanto os governos de Álvaro Dias (1987-1990), quanto o primeiro de Roberto Requião (1991-1994) praticaram políticas que tenderam a aceitar e cumprir as orientações do novo modelo liberal, no sentido de esvaziar o conceito de educação superior pública estatal e incentivar o crescimento da educação privada. 92
90 ALTOÉ. Op.cit, p. 92.91 Idem. Ibidem, p. 93.92PERES, Claudio A. O público e o privado no ensino superior do Paraná: um retrato do projeto liberal. In: Educação e história regional: os desafios de sua reconstrução. Cascavel/PR: Coluna do Saber, 2008, 85-100, p. 87.
40Assim a nova orientação sobre público e privado vem sendo implementada
desde o início dos anos de 1990 no Estado do Paraná, garantindo o avanço
exponencial da educação privada.
TABELA 3 - MATRÍCULAS EM CURSOS DE GRADUAÇÃO PRESENCIAIS POR CATEGORIA ADMINISTRATIVA DAS IEES - PARANÁ: COMPARATIVO ENTRE OS ANOS
DE 1994 E 2002
PÚBLICASANO FEDERAIS ESTADUAIS MUNICIPAIS TOTAL PRIVADAS TOTAL GERAL
Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº %1995 17.511 15,82 45.403 41,01 4.297 3,88 67.211 60,71 43.503 39,29 110.714 1002002 26.689 11,20 59.419 24,90 4.166 1,23 90.724 37,90 148.450 62,10 238.724 100
FONTE: BRASIL. MEC/INEP.
O quadro acima demonstra o resultado efetivo da aplicação do receituário
do Banco Mundial como política para a educação superior no Paraná. No início do
governo Lerner o Paraná destacava-se no cenário nacional pelo fato de o número
total de matrículas nas instituições públicas federais, estaduais e municipais
(60,71%) superava o número de matrículas nas instituições privadas (39,29%).
Em 1995, primeiro ano do Governo Lerner, as matrículas nas IEES
paranaenses representava 41,01% do total de matrículas em cursos de graduação
presenciais no Paraná, ao passo que as matrículas nas instituições privadas
representavam 39,29% do total. Em 2002, último ano do Governo Lerner, as
matrículas nas IEES paranaenses passaram a representar apenas 24,90% do total
de matrículas enquanto que as matrículas nas instituições privadas passaram a
representar 62,10% do total.
2.2 O INÍCIO DA GESTÃO DE GOVERNO REQUIÃO E SUA POLÍTICA DE REESTRUTURAÇÃO DO SISTEMA ESTADUAL DE EDUCAÇÃO SUPERIOR (2003-2006)
Roberto Requião (PMDB), durante a sua campanha eleitoral, se apresentou
como o candidato comprometido com as mudanças e afirmava que, por
conseqüência, sua administração seria oposta a administração “neoliberal” de Jaime
Lerner (PFL). Em seu discurso de posse relativamente ao mandato de 2003-2006,
afirmou: “[...] toda a minha campanha e todo o meu programa de governo tiveram
como centro a proposta de mudança. Mudança de prioridades, mudança de estilo”. 93
93 Cf. Discurso de posse do Governador Roberto Requião pronunciado na Assembléia Legislativa do
41Para coordenar a Secretaria de Estado da Ciência, Tecnologia e Educação Superior
Requião escolheu o prof. Aldair Rizzi94, ex-vice-reitor da Universidade Federal do
Paraná.
De acordo com Bosi e Reis, o governo Requião (PMDB), no início de seu
governo, implementou políticas que demonstraram uma grande distância entre o
discurso e a prática governamental. Alegando que recebeu uma “herança maldita do
governo Lerner”, o governo Requião procurava computar suas medidas
antipopulares na conta do governo anterior. Neste sentido, em abril de 2003, o
secretário Rizzi, afirmou que sua gestão havia herdado “[...] um quadro caótico do
ponto de vista administrativo e financeiro. Havia a expansão desorganizada de
cursos, sem a garantia de orçamento e, conseqüentemente, qualidade”. 95 Para
enfrentar a chamada “herança maldita”, o governo Requião, no início de sua gestão,
propôs a redução em 30% das despesas de custeio em todas as secretarias. Rizzi,
manifestando a sua anuência com tal procedimento, declarou que, “[...] devido ao
déficit não será possível expandir cursos e nem investir em novos campi.” 96
Rizzi, afinado com as políticas do Governo Lula, assumiu a SETI e passou a
colocar em prática uma “reforma” da educação superior, denominada por ele de
“política de reestruturação de todo o sistema estadual de educação superior”. Dentre
as medidas deste projeto político, segundo Reis, a SETI implementou, “a suspensão
da implantação de novos cursos de graduação, o 'fechamento' (suspensão da
realização de vestibular) de 43 cursos de graduação já implantados, a imposição de
arrocho salarial aos docentes e a contenção de concurso público para a contratação
de novos servidores.” 97
Na tentativa de justificar a sua política de contenção do crescimento da
educação superior estadual pública e a conseqüente redução dos recursos
destinados às IEES, Requião e o secretário Rizzi passaram a defender tais ações
argumentando que o Estado estava imerso num déficit orçamentário, herança do
governo anterior. Uma breve análise do comportamento da arrecadação do ICMS e
da Receita Orçamentária nos anos de 2003 e 2004 nos permite evidenciar a
Paraná, em 1º de janeiro de 2003.94Aldair Rizzi ocupou o cargo de secretário por três anos e três meses. No dia 3 de abril de 2006 exonerou-se do cargo para candidatar-se a deputado federal pelo PMDB. No seu lugar assumiu a ex-reitora da Universidade Estadual de Londrina (UEL), Lygia Pupatto.95 Cf. Governo vai reduzir despesas em 30% (Agência Estadual de Notícias, 9/4/2003).96 BOSI, A. P.; REIS, L. F. 2008. Op.cit, p. 181.97 BOSI, A. P.; REIS, L. F. 2008. Op.cit, p. 187.
42fragilidade dos argumentos utilizados pelo governador e pelo secretário Rizzi.
TABELA 4 - EVOLUÇÃO DA ARRECADAÇÃO DO ICMS – COTA ESTADUAL (2002-2004)
ICMSCOTA ESTADUAL
CRESCIMENTO NOMINAL EM RELAÇÃO AO ANO ANTERIOR
2002 4.185.516.808,20 -
2003 5.009.756.447,90 19,69%
2004 5.822.927.942,10 16,23%
EVOLUÇÃO NOMINAL 2002 -2004 39,12%Fonte: Paraná. Secretaria de Estado da Fazenda. Balanço Geral do Estado. Exercicio de 2006.
TABELA 5 - EVOLUÇÃO DA RECEITA ORÇAMENTÁRIA (2002-2004)
ANO RECEITA ORÇAMENTÁRIA CRESCIMENTO NOMINAL EM RELAÇÃO AO ANO ANTERIOR
2002 8.513.843.494,70 -
2003 9.366.422.755,80 10,01%
2004 10.977.884.980,10 17,20%
CRESCIMENTO NOMINAL (2002 - 2004) 28,94%Fonte: Paraná. Secretaria de Estado da Fazenda. Balanço Geral do Estado. Exercicio de 2006.
Os quadros acima demonstram cabalmente que não havia nenhuma
sustentação empírica que permitisse ao governador e ao secretário Rizzi utilizar o
déficit orçamentário como justificativa para a implementação de uma política de
contenção de crescimento de matrículas e de arrocho orçamentário em relação às
IEES paranaenses.
Podemos perceber pelos números acima apresentados, que ao invés de
déficit orçamentário ocorreu o crescimento na arrecadação tributária do Estado logo
no início do Governo Requião (2003 a 2004). Materialmente não havia elementos,
nos primeiros anos de seu governo e nem mesmo depois, que respaldassem o
argumento inicialmente utilizado pelo governo Estadual para o arrocho salarial e a
contenção da expansão de cursos. Percebendo a fragilidade do argumento utilizado,
o governo do Estado começou a difundir outra "justificativa" a fim de reduzir os
gastos com a educação Superior. De acordo com Bosi e Reis,
43A SETI, percebendo a fragilidade do argumento baseado no déficit orçamentário, começou a propalar uma outra justificativa não menos ideológica: O Paraná é o Estado que apresenta o maior comprometimento de sua arrecadação tributária com a manutenção da estrutura de educação superior pública. 98 Assim o problema passava a ser o governo federal que, teoricamente – e na visão da SETI -, investia pouco na manutenção da educação superior no Paraná. Na esteira deste argumento o governador Roberto Requião chegou a defender a seguinte idéia: O que precisamos é federalizar algumas de nossas universidades ou, pelo menos, obter um repasse de verbas da União. 99 100
Com esse novo argumento o governador e o secretário Rizzi procuravam
justificar sua ação responsabilizando o governo federal pela falta de investimentos
na educação superior paranaense. Segundo os argumentos propalados pelo
Governo Requião, o Estado do Paraná já comprometia um percentual importante da
arrecadação tributária com o custeio da educação superior.
Juntamente com o discurso de ser um dos Estados em que mais se investia
na educação superior, o governo do Estado buscou justificar a política de contenção
orçamentária alegando pouca racionalidade por parte das universidades na
utilização dos recursos postos a sua disposição pelo Estado. Isto fica explícito
quando o secretário Rizzi, no ano de 2003, revelou, em um artigo sobre a
reestruturação da educação superior do Paraná, os objetivos das políticas do
governo Requião para as universidades paranaenses: “[...] dar maior racionalidade
às atividades acadêmicas e administrativas das instituições de educação superior
públicas.” Este projeto de racionalização administrativa, como veremos adiante,
tinha como objetivo maior procurar impedir o crescimento dos gastos com as IEES
paranaenses e desobrigar o Estado do financiamento integral das mesmas, por meio
da convocação das próprias IEES e da comunidade para que assumissem parte dos
custos da educação superior.
Quanto às ações que vinham sendo desenvolvidas pela SETI o secretário
Rizzi afirmou:
Buscamos reassumir as responsabilidades do Poder público – esquecidas nos últimos anos – e adotar políticas realistas, visando não só ter o aproveitamento responsável dos recursos disponíveis, mas também conquistar a ampla participação das IEES em ações condizentes com a
98 Cf. Scientia – Informativo do Sistema SETI. Outubro de 2003, p. 1.99 Cf. Requião garante ensino gratuito na Faculdade de Bandeirantes. Agência Estadual de Notícias, 11/04/03.100BOSI, A. P.; REIS, L. F. 2008. Op.cit, p.184.
44nossa realidade [grifo nosso]. 101
De acordo com a SETI, para melhorar a qualidade dos cursos já existentes
nas universidades paranaenses, o governo estadual evitaria ampliar sua
participação na educação superior. Ao estancar a expansão de novos cursos,
associada ao arrocho salarial dos servidores docentes e técnicos, o governo
estadual conseguiu reduzir em termos reais o orçamento destinado às IEES para o
ano de 2004.
De acordo com dados disponibilizados pelo Tribunal de Contas do Paraná,
em 2003, para custear as despesas com educação, as IEES receberam R$
310.739.000,00. Esse montante representou 4,64% dos recursos
constitucionalmente vinculados à manutenção e desenvolvimento da educação. Em
2004 as IEES receberam R$ 324.727.392,42. Apesar do crescimento nominal, do
ponto de vista real houve redução dos recursos destinados às IEES. O montante de
recursos repassados pelo Estado às IEES em 2004 foi menor do que em 2003, pois
representou 4,19% dos recursos constitucionalmente vinculados à manutenção e
desenvolvimento da educação.
Segundo Altoé, Requião, no início de seu governo, prometeu reverter o
baixo investimento nas IEES:
A partir de 2003 o governo de Roberto Requião prometeu reverter este quadro. Apesar da campanha e das promessas de que a direção da economia e do financiamento do aparelho do Estado seria alterada, este nível de educação pública não recebeu o tratamento prometido, o que frustrou a esperança de que, no curto e no médio prazo, as instituições de educação superior paranaenses recebessem os recursos para uma contribuição maior no financiamento do desenvolvimento sociocultural e econômico. 102
No início do Governo Requião efetivamente o que ocorreu foi a tentativa de
transferir à comunidade parte da responsabilidade pelo financiamento das IEES
paranaenses. Além disto, o governo estadual procurou implementar outras formas
para conter o crescimento dos recursos destinados às IEES. Segundo Altoé,
Os orçamentos passaram a ser fixados por teto-orçamentário com critérios definidos pelo governo sem discussão prévia com as instituições e desrespeitando as necessidades mínimas de manutenção das IEES-PR. Ocorreu uma perda total de autonomia da gestão administrativa, através de
101 Idem. Ibidem.102 ALTOÉ. Op.cit, p. 119.
45uma série de regulamentações, de Decretos, etc. As administrações e os Conselhos superiores das IEES-PR perderam quase totalmente suas atribuições estatutárias, já que a maioria das decisões administrativas internas depende de autorização governamental. 103
Ao implementar um projeto que fixa os orçamentos das universidades sem o
conhecimento prévio dos gastos das universidades, o governo Requião, repetiu um
velho método implementado no governo anterior, ou seja, a necessidade das IEES
buscarem fontes alternativas de financiamento, além dos recursos do tesouro
estadual, como por exemplo, a venda de cursos e serviços e a busca, por meio de
projetos, de financiamento junto às entidades de fomento. As administrações das
IEES e o próprio governo passaram a estimular que os professores se convertessem
em empreendedores, captadores de recursos junto às agências de fomento.
Isso ficou evidente, quando no ano de 2004, para a reabertura dos 43
cursos suspensos o governo selou um acordo tácito com os reitores. Tal acordo
pressupunha que as próprias IEES, que quisessem viabilizar a reabertura dos
cursos suspensos buscassem na sociedade parte dos recursos necessários à
manutenção de tais cursos. Além desse apoio a ser buscado na comunidade,
caberia aos dirigentes aplicar algumas medidas racionalizadoras para diminuir os
custos de manutenção das IEES para o Estado. Desta forma os 43 cursos fechados
foram "reabertos" e os vestibulares voltaram a ser realizados. Como contrapartida a
comunidade foi convocada a investir recursos tanto para a adequação da estrutura
quanto para a aquisição de materiais e equipamentos. 104
De acordo com o então secretário Rizzi “[...] a regularização da maioria dos
cursos suspensos em tempo recorde deve-se a um esforço conjunto: governo,
universidade e sociedade [...]” 105 Entretanto, a participação da comunidade no
financiamento de parte das despesas com a manutenção da educação superior foi
denunciada como artifício utilizado pelo governo para desresponsabilizar-se do
financiamento integral da educação superior pública.
O envolvimento da comunidade, à medida que ela assume parte do financiamento da educação ou aceita condições precárias na oferta pública da educação, é a tradução das recomendações do Banco Mundial para que os ‘países em desenvolvimento’ diversifiquem as fontes de financiamento da
103 Idem. Ibidem, p. 119.104BOSI, A. P.; REIS, L. F. 2008. Op.cit, p. 188.105Idem. Ibidem, p. 189.
46educação superior. 106
De acordo com Bosi e Reis as próprias universidades foram “estimuladas” a
fazerem ajustes internos de modo a obter a autorização do Governo Requião para o
funcionamento dos cursos suspensos. No caso da Unicentro, de acordo com o
próprio secretário Rizzi, houve “[...] o aumento da carga do professor, de 9,9 para
14,9, horas-aula semanais, sem qualquer ônus para o Tesouro Estadual”. 107 Em
reunião com o secretariado do Governo Requião (“Escola de Governo”), o reitor da
UEM anunciou que assumiria cinco cursos suspensos com recursos próprios. 108
Nessa mesma reunião, o reitor da Unicentro afirmou que “A reorganização
administrativa da Unicentro vai contar com uma comissão permanente de auditoria
interna, revisão dos conselhos superiores e a ampliação da captação de recursos
por meio de convênios”. 109
As orientações que foram implementadas no Governo Lerner na SETI,
permaneceram presentes na gestão de Rizzi (2003-2006) na chamada política de
reestruturação das IEES paranaenses. Manteve-se a desresponsabilização do
Estado de parte do financiamento das universidades, avançando na redução da
autonomia universitária, parte das orientações da reforma universitária do Banco
Mundial, e na aplicação de um ajuste interno com a não autorização de contratação,
por meio de concurso público, de servidores docentes e técnicos em número
suficiente, na precarização das condições de oferta da educação superior e no
arrocho salarial. A política de reestruturação do sistema estadual de educação
superior operada pelo secretário Rizzi em 2004 e 2005 resultou na contenção em
termos reais dos gastos constitucionalmente vinculados com a manutenção e
desenvolvimento da educação superior.
Nos últimos anos, desde o Governo Lerner até 2006, na gestão de Rizzi
frente à SETI, o estrangulamento financeiro das universidades se constituiu na
característica principal das políticas governamentais. De acordo com dados do
Tribunal de Contas, no ano de 1997, o percentual de impostos, constitucionalmente
vinculados à manutenção e desenvolvimento da educação, destinado às IEES, foi de
9,70%, reduzido no ano de 2006 para o percentual de 5,61 %, uma redução de
106REIS. Op.cit, p. 105.107Cf. Unicentro tem nove cursos regularizados (Agência Estadual de Notícias, 29/6/2004).108Cf. Reitores apresentam mudanças nas universidades para atender política estadual de ensino superior (Agência Estadual de Notícias, 15/3/2004).109 Idem.
4742,16% em termos reais.
A partir desta breve análise conjuntural, o nosso objetivo passa a ser uma
análise mais específica dos números relacionados às receitas do governo do Estado
do Paraná e as despesas, constitucionalmente vinculadas, com a manutenção e
desenvolvimento da educação superior.
2.3 O FINANCIAMENTO DAS IEES PARANAENSES DE 2003 A 2006
Como vimos acima, durante os primeiros anos do mandato de Requião
(2003-2004), o secretário da SETI, Aldair Rizzi, desencadeou uma política de
reestruturação do sistema estadual. As ações colocadas em prática e os discursos
que endossaram a defesa de tais ações eram bastante semelhantes às orientações
dos organismos multilaterais, no que tange à contenção de gastos com a educação
superior.
A partir dos dados disponibilizados pelo Tribunal de Contas do Estado do
Paraná elaboramos algumas tabelas que servirão de base à análise mais específica
dos números relacionados às receitas do governo do Estado do Paraná e as
despesas, constitucionalmente vinculadas, com a manutenção de desenvolvimento
da educação superior. Começaremos com algumas tabelas referentes ao número de
cursos de graduação, matrículas e funções docentes em exercício.
TABELA 6. NÚMERO DE CURSOS DE GRADUAÇÃO, MATRÍCULAS PRESENCIAIS E DOCENTES EFETIVOS NAS IEES PARANÁ (2002-2006).
ANONÚMERO DE CURSOS DE
GRADUAÇÃO PRESENCIAIS MATRÍCULAS PRESENCIAIS GRADUAÇÃO DOCENTES EFETIVOS
2003 252 72.621 5.4652004 255 72.255 5.2512005 253 72.359 5.1302006 258 72.851 5.189Fonte: PARANÁ. SETI (Coordenadoria do Ensino Superior).
De acordo com informações disponibilizadas pela SETI, do ano de 2003 a
2006, ocorreu um pequeno crescimento de 2,38 % no número de cursos de
graduação presenciais, o crescimento nominal das matrículas foi de 0,32%, menos
de meio por cento, e uma redução, superior a 5%, do número de professores
efetivos. Esses números evidenciam o resultado concreto da política de
48reestruturação da educação superior implementada pelo secretário Rizzi: contenção
da abertura de cursos, do crescimento de matrículas e da contratação docente via
concurso público.
Quanto a redução do número de professores é importante salientar, como
vimos anteriormente, que Requião procurou evitar a concessão de reajuste salarial
aos docentes e isso fez com que houvesse uma grande evasão. Muitos docentes
titulados, em função do arrocho salarial, preferiram fazer concurso público nas
universidades federais e nas estaduais paulistas. De acordo com Reis:
Como resultado do arrocho salarial, implementado desde o Governo Lerner, tem se verificado uma grande evasão de docentes das universidades estaduais do Paraná que estão se demitindo e buscando melhores condições salariais e de trabalho, principalmente, nas universidades estaduais paulistas e nas federais. No período de janeiro de 2003 a março de 2007 na UEM, UEL UEPG e Unioeste 267 professores pediram exoneração: 144 doutores, 60 mestres e 63 graduados ou especialistas. Se incluídas as aposentadorias, transferências/remoções e falecimentos, nesse período, essas universidades perderam mais de 600 professores. 110
Os docentes que permaneceram nas IEES paranaenses desencadearam
diversas mobilizações com vistas à melhoria das condições salariais e de trabalho.
Pressionado pelas mobilizações do ano de 2004 e 2005, o governo estadual
implantou, em setembro de 2005, reajuste dos salários dos docentes, por meio de
uma revisão da carreira. Entretanto tal reajuste não repôs integralmente as perdas
salariais acumuladas desde março de 1997 e não pôs fim ao processo de
mobilizações desencadeado pelos docentes
Para implementar a sua política de reestruturação do ensino superior o
Governo Requião, além de não repor integralmente as perdas salariais acumuladas,
procurou ampliar a carga horária docente em sala de aula, reduzir o tempo dedicado
à pesquisa e à extensão, buscando com isso a redução na necessidade da
contratação de novos docentes. 111
A política de reestruturação do ensino superior implementada pelo Governo
Requião e Rizzi resultou na redução, em termos reais, do percentual de impostos,
constitucionalmente vinculados, à manutenção e desenvolvimento da educação
110REIS, Luiz Fernando. Políticas do Governo Requião para as universidades paranaenses: a distância entre o discurso de campanha e a prática governamental. Revista da ADUEM (Órgão de divulgação da Associação dos Docentes da Universidade Estadual de Maringá), Maringá, n. 3, p. 13-16, Nov. 2007.111BOSI, A. P.; REIS, L. F. 2008. Op.cit, p. 194.
49superior. Essa conclusão respalda-se na análise dos recursos destinados às IEES
paranaenses no período de 2003-2006 e na comparação de tais recursos destinados
pelo Governo Lerner (1999-2002). Procuraremos fundamentar tal conclusão com os
dados e análises abaixo descritos.
TABELA 7. PERCENTUAL DE ICMS INVESTIDO NA MANUTENÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR - IEES PARANÁ (2003-2006)
ANOICMS
COTA ESTADUAL DESPESAS EDUCAÇÃO SUPERIOR1
% DESPESAS EDUCAÇÃO SUPERIOR/ICMS
2003 5.902.211.000,00 310.739.000,00 5,26%
2004 6.117.804.000,00 324.727.392,42 5,31%
2005 6.777.971.000,00 374.250.184,54 5,52%
2006 6.911.340.000,00 451.548.920,00 6,53%Fonte: Paraná. Tribunal de Contas do Estado do Paraná. Contas do Governador. Exercício de 2006.
Do ano de 2003 a 2005 o aumento, nominal e real, dos recursos para a
educação superior, comparados à arrecadação do ICMS (cota estadual) foi
expressivo. No ano de 2006, comparado ao ano de 2003, o percentual de ICMS
investido na educação superior paranaense cresceu, em termos reais, 24%: de
5,26% para 6,53%. No mesmo período (2003-2006) verificou-se um crescimento
nominal de 17,09% da arrecadação do ICMS.
TABELA 8. PERCENTUAL DA RECEITA ORÇAMENTÁRIA DESTINADA À MANUTENÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR – IEES PARANÁ
(2003-2006)RECEITA
ORÇAMENTÁRIADESPESAS EDUCAÇÃO
SUPERIOR% DESPESAS EDUCAÇÃO SUPERIOR
RECEITA ORÇAMENTÁRIA
2003 10.805.328.000,00 310.739.000,00 2,88%
2004 12.992.822.477,00 324.727.392,42 2,50%
2005 13.701.426.000,00 374.250.184,54 2,73%
2006 14.784.407.000,00 451.548.920,00 3,05%Fonte: Paraná. Tribunal de Contas. Contas do Governador. Exercício de 2006.
Em relação à Receita Orçamentária, os recursos destinados à manutenção
e desenvolvimento da educação Superior, no período de 2003 a 2006, cresceram
em termos reais 5,90%, passando de 2,88%, em 2003, para 3,05%, em 2006. Nesse
mesmo período o crescimento nominal da receita orçamentária foi de 36,82%.
50
TABELA 9. RELAÇÃO DAS DESPESAS COM EDUCAÇÃO SUPERIOR COM A RECEITA DE IMPOSTOS CONSTITUCIONALMENTE VINCULADA À MANUTENÇÃO E
DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO – IEES PARANÁ (2003-2006)RECEITA DE IMPOSTOS
CONSTITUCIONALMENTE VINCULADOS À
EDUCAÇÃO
DESPESAS EDUCAÇÃO SUPERIOR
% DESPESAS EDUCAÇÃO SUPERIOR/RECEITA DE
IMPOSTOS
2003 6.690.879.000,00 310.739.000,00 4.64%
2004 7.757.829.190,00 324.727.392,42 4,19%
2005 8.839.562.066,66 374.250.184,54 4,23%
2006 8.052.339.000,00 451.548.920,00 5,61%Fonte: Paraná. Tribunal de Contas. Contas do Governador. Exercício de 2006.
Em relação à receita de impostos, constitucionalmente vinculados à
manutenção e desenvolvimento da educação, os recursos destinados as IEES
paranaenses cresceram, em termos reais, 20,91%, passando de 4,64%, em 2003,
para 5,61%, em 2006. Nesse mesmo período, o crescimento nominal da receita
tributária foi de 20,35%.
A análise dos números acima apresentados, indica que ao invés de déficit
orçamentário, alegado pelo governo estadual, ocorreu efetivamente o crescimento
na arrecadação tributária do Estado durante todo o primeiro mandato do Governador
Requião (2003 a 2006). Observou-se um crescimento nominal de 17,09% da
arrecadação do ICMS, de 36,82% da receita orçamentária e de 20,35% da receita
de impostos constitucionalmente vinculados à educação. Materialmente não havia
elementos que respaldassem o argumento inicialmente utilizado pelo governo
Estadual para não ampliar significativamente o financiamento das IEES
paranaenses.
TABELA 10. RELAÇÃO MATRÍCULAS/DESPESAS ALUNO – IEES PARANÁ (2003-2006)
Fonte: PARANÁ. SETI e Tribunal de Contas do Estado do Paraná (Contas do Governador 2003-2006)
Diante do aumento nominal e real do orçamento destinados às IEES, no
período de 2003 a 2006, o custo aluno/ano passou de 4.278,91 reais, no ano de
MATRÍCULAS DESPESAS COM EDUCAÇÃO SUPERIOR
CUSTO ALUNO/ANO
CUSTO ALUNO/MÊS
2003 72.621 310.739.000,00 4.278,91 356,58
2004 72.255 324.727.392,42 4.494,19 374,52
2005 72.359 374.250.184,54 5.172,13 431,01
2006 72.851 451.548.920,00 6.198,25 516,52
512003, para 6.198,25 reais, no ano de 2006. Houve um crescimento nominal de
41,29%. São números expressivos. Entretanto, como veremos adiante tal
crescimento foi motivado especialmente pelo reajuste salarial conquistado pelos
docentes, em setembro de 2005, e pelos técnicos em abril de 2006. Mesmo com o
crescimento real dos recursos repassados às IEES paranaenses, especialmente em
2006, o percentual médio de recursos, constitucionalmente vinculados à educação,
no período de 2003-2006, foi menor que o percentual médio dos últimos quatro anos
do Governo Lerner (1999-2002).
O crescimento do custo/aluno anual, expressão do aumento do orçamento
repassado às IEES paranaenses não é suficiente, pois não permite, por exemplo, a
implementação de uma efetiva política de assistência estudantil. Tal política seria um
instrumento importante para garantir a permanência dos estudantes, principalmente
dos filhos da classe trabalhadora, que conseguem ingressar nas IEES mas têm
dificuldades em se manter. Nem todas as IEES possuem Restaurante Universitário e
moradia estudantil. De todas as IEES paranaenses, somente a UEL possui Casa do
Estudante.
O Governo Requião (2003-2006) destinou parte expressiva do orçamento
do Estado para o pagamento das dívidas externa e interna, tanto no que se refere ao
pagamento de juros e encargos, como em amortizações. Tais recursos são
expressivamente superiores aos gastos com a educação superior paranaense.
TABELA 11. RELAÇÃO EDUCAÇÃO SUPERIOR/ DÍVIDA “PÚBLICA” - PARANÁ (2003-2006)
Fonte: Paraná. Tribunal de Contas. Contas do Governador. Exercício de 2006.
A partir do quadro acima podemos perceber que os recursos utilizados para
pagamento de juros, encargos e amortizações no ano de 2003 foram extremamente
superiores aos recursos destinados às IEES paranaenses. Estes somaram apenas
26,13% em relação aos gastos com a dívida.
No ano de 2006, houve um aumento dos recursos destinados às IEES, se
comparados aos recursos destinados ao pagamento da dívida pública. Entretanto,
AMORTIZAÇÕES TOTAL DÍVIDA/IEES
2003 644.408.000,00 544.910.000,00 1.189.318.000,00 310.739.000,00 26,13%
2004 635.800.000,00 536.117.000,00 1.171.917.000,00 324.727.392,42 27,71%
2005 678.955.000,00 562.855.000,00 1.241.810.000,00 374.250.184,54 30,14%
2006 613.210.000,00 490.434.000,00 1.103.644.000,00 451.549.000,00 40,91%
JUROS E ENCARGOS DÍVIDA
DESPESASE. SUPERIOR
52mesmo reduzida, esta disparidade permaneceu. Nestes quatro anos analisados,
tanto no que se refere a juros, encargos e amortizações, os recursos utilizados para
pagamento da dívida pública foram em média 68,78% maiores do que os recursos
do tesouro destinados à educação superior. Vejamos agora o detalhamento das
despesas das IEES paranaenses. Tais despesas são apresentadas na tabela abaixo,
subdivididas em três categorias: despesas com pessoal, com investimentos e com o
custeio.TABELA 12 – DESPESAS DAS IEES PARANAENSES (2003-2006)
Fonte: Paraná. Secretaria de Estado da Fazenda. Balanço Geral do Estado. Exercício de 2006.
Ao analisar a utilização dos recursos do tesouro pelas IEES, percebemos
que, na média dos quatro anos analisados, 90,62% dos recursos foram destinados
às despesas com pessoal. Em 2003 foram 92,02% destinados a este fim; no ano de
2004 foram 89,35%, no ano de 2005 foram 90,10% e no ano de 2006 foram 91%.
Ano Universidades Pessoal Investimento Outras despesas TOTALUEL R$ 130.472.803,00 R$ 1.891.870,00 R$ 7.470.000,00 R$ 139.834.673,00
UEPG R$ 47.048.060,00 R$ 890.000,00 R$ 2.378.000,00 R$ 50.316.060,00UEM R$ 106.344.191,00 R$ 253.160,00 R$ 5.935.907,00 R$ 112.533.258,00
2003 UNICENTRO R$ 20.960.230,00 R$ 268.500,00 R$ 3.099.000,00 R$ 24.327.730,00UNIOESTE R$ 46.573.743,00 R$ 415.000,00 R$ 6.330.931,00 R$ 53.319.674,00UNESPAR R$ 25.522.509,00 R$ 50.000,00 R$ 3.738.000,00 R$ 29.310.509,00
TOTAL R$ 376.921.536,00 R$ 3.768.530,00 R$ 28.951.838,00 R$ 409.641.904,00
UEL R$ 130.691.000,00 R$ 2.700.000,00 R$ 12.672.030,00 R$ 146.063.030,00
UEPG R$ 49.820.000,00 R$ 980.000,00 R$ 2.984.840,00 R$ 53.784.840,00UEM R$ 111.980.000,00 R$ 2.100.000,00 R$ 9.070.240,00 R$ 123.150.240,00
2004 UNICENTRO R$ 20.430.000,00 R$ 840.000,00 R$ 2.750.370,00 R$ 24.020.370,00UNIOESTE R$ 47.120.000,00 R$ 980.000,00 R$ 5.577.680,00 R$ 53.677.680,00UNESPAR R$ 26.837.000,00 R$ 5.411.600,00 R$ 32.248.600,00
TOTAL R$ 386.878.000,00 R$ 7.600.000,00 R$ 38.466.760,00 R$ 432.944.760,00
UEL R$ 135.011.418,00 R$ 227.864,00 R$ 14.017.224,00 R$ 149.256.506,00UEPG R$ 46.117.063,00 R$ 142.480,00 R$ 3.569.675,00 R$ 49.829.218,00UEM R$ 115.504.813,00 R$ 199.368,00 R$ 10.147.072,00 R$ 125.851.253,00
2005 UNICENTRO R$ 22.779.359,00 R$ 120.536,00 R$ 3.254.649,00 R$ 26.154.544,00UNIOESTE R$ 49.884.307,00 R$ 162.552,00 R$ 6.331.946,00 R$ 56.378.805,00UNESPAR R$ 26.743.548,00 R$ 83.200,00 R$ 5.272.196,00 R$ 32.098.944,00
TOTAL R$ 396.040.508,00 R$ 936.000,00 R$ 42.592.762,00 R$ 439.569.270,00
UEL R$ 174.937.911,00 R$ 511.500,00 R$ 13.079.128,00 R$ 188.528.539,00UEPG R$ 57.183.562,00 R$ 1.944.723,00 R$ 4.807.549,00 R$ 63.935.834,00UEM R$ 146.823.927,00 R$ 102.300,00 R$ 9.632.231,00 R$ 156.558.458,00
2006 UNICENTRO R$ 29.707.991,00 R$ 818.400,00 R$ 3.275.994,00 R$ 33.802.385,00UNIOESTE R$ 66.364.916,00 R$ 920.700,00 R$ 9.102.859,00 R$ 76.388.475,00UNESPAR R$ 38.583.244,00 R$ 613.800,00 R$ 6.035.322,00 R$ 45.232.366,00
TOTAL R$ 513.601.551,00 R$ 4.911.423,00 R$ 45.933.083,00 R$ 564.446.057,00
53
Durante estes quatro anos (2003-2006), diante de muitas mobilizações e
algumas paralisações, o governo Requião autorizou o abono salarial aos técnicos-
administrativos no ano de 2004, concedeu reajuste salarial aos docentes em
setembro do ano de 2005. Em abril de 2006 foi aprovado o novo Plano de Carreira,
Cargos e Salários dos técnico-administrativos. O crescimento dos recursos
repassados às IEES, especialmente no ano de 2005 e principalmente 2006, explica-
se, fundamentalmente, em decorrência do impacto da implantação do reajuste
salarial aos docentes e técnicos.
Em suma, o aumento do orçamento destinado às IEES em 2005 e 2006,
não é resultado direto da preocupação do governo e do secretário Rizzi com as
universidades estaduais paranaenses. Podemos afirmar que o crescimento dos
recursos destinados às IEES, em termos reais, ocorreu fundamentalmente em
função do impacto dos reajustes salariais dos servidores docentes e técnicos. Tudo
indica que se não tivesse ocorrido mobilizações e paralisações dos docentes e
técnicos e a conseqüente conquista dos reajustes, os recursos destinados às IEES
permaneceriam em patamares muito próximos a 2003. Entretanto, apesar do
crescimento real do orçamento das universidades no período de 2003-2006, o
percentual médio de recursos, constitucionalmente vinculados à educação,
repassados às IEES paranaenses no período de 2003-2006, foi menor que o
percentual médio repassado nos últimos quatro anos do Governo Lerner
(1999-2002). Essa conclusão está fundamentada nos dados evidenciados na tabela
abaixo.
54
TABELA 13 - GASTOS COM EDUCAÇÃO (RECURSOS VINCULADOS) – EXERCÍCIOS DE 1999 A 2006 – IEES PARANÁ
GOVERNO ANO EDUCAÇÃO BÁSICA EDUCAÇÃO SUPERIOR TOTAL GASTOS COM EDUCAÇÃO
LERNER
1999 869.695.292,00 24,87% 267.607.446,00 7,15% 1.137.302.738,00 32,02%
2000 996.701.137,00 22,07% 283.617.146,00 6,28% 1.280.318.284,00 28,34%
2001 1.075.881.812,00 21,32% 296.268.766,00 5,87% 1.372.150.578,00 27,19%
2002 1.233.726.816,00 21,20% 298.653.202,00 5,13% 1.532.379.328,00 26,33%
GASTO: % MÉDIO 1999-2002 22,37% 6,11% 28,47%
REQUIÃO
2003 1.441.812.000,00 21,55% 310.739.000,00 4,64% 1.752.551.000,00 26,19%
2004 1.776.335.607,58 22,90% 324.727.392,42 4,19% 2.101.062.999,00 27,09%
2005 1.973.893.346,82 22,33% 374.250.184,54 4,23% 2.011.218.361,00 26,56%
2006 1.971.816.000,00 24,49% 451.549.000,00 5,61% 2.423.365.000,00 30,10%
GASTO: % MÉDIO 2003-2006 22,82% 4,67% 27,49%Fonte: Paraná. Tribunal de Contas. Contas do Governador. Exercícios de 2002 e 2006.
Do ano de 1999 a 2002, o governo Lerner destinou em média 28,47% da
receita resultante de impostos, constitucionalmente vinculados, para manutenção e
desenvolvimento da educação pública. Destes recursos, foram destinados em média
6,11% para a educação superior. Especificamente no ano de 1997, segundo dados
do DIEESE, as IEES paranaenses receberam 9,7% das receitas constitucionalmente
vinculadas à manutenção e desenvolvimento da educação pública no Paraná.
No Governo Requião, de 2003 a 2006, foram destinados em média 27,49%
para a manutenção e desenvolvimento da educação. Destes, 4,67% foram
destinados à educação superior. Tomando como referência a vinculação
constitucional que determinava, no período, a aplicação de 25% da receita resultante
de impostos para manutenção e desenvolvimento da educação pública, o Governo
Requião, no período de 2003 a 2006, destinou, em termos reais, menos recursos às
IEES do que o governo Jaime Lerner. Nos últimos quatro anos do Governo Lerner
(1999-2002) destinou-se em média 6,11% às IEES paranaenses, das receitas
vinculadas para a manutenção e desenvolvimento da educação.
Esse dado nos permite concluir que, apesar do crescimento nominal do
orçamento das IEES no que tange aos recursos, constitucionalmente vinculados à
manutenção da educação pública, o Governo Requião, no período analisado
(2003-2006) reduziu em termos reais os investimentos em educação superior,
quando comparados aos quatro últimos anos do Governo Lerner (1999-2002).
55Quando comparado ao ano de 1997, em termos reais as IEES receberam 52% a
mais do que receberam em média de 2003-2006.
O Governo Requião tem orientação política distinta do Governo Lerner que
era um governo tipicamente neoliberal, estreitamente vinculado aos organismos
internacionais, especialmente o Banco Mundial. Lerner, em oito anos de mandato,
defendeu e implementou um processo de crescente privatização dos serviços
públicos, especialmente da educação superior. A reforma da previdência estadual,
implementada por meio da criação de um serviço social autônomo (empresa
privada), denominado de Paraná Previdência, foi adotado pelo Banco Mundial como
modelo de gestão da previdência de servidores públicos. Lerner foi convidado para
participar de um evento, em Washington (EUA), promovido pelo Banco Mundial, para
divulgar o modelo (privado) de gestão previdenciária adotado pelo seu governo no
Paraná.
Requião, do ponto de vista político, guarda enorme distância em relação ao
Governo Lerner. Requião não é declaradamente um privatista, é um nacionalista que
defende a presença do Estado em todos os setores da economia. Entretanto, essa
diferença política, não impediu a implementação de uma reestruturação do ensino
superior no Paraná, comandada pelo secretário Rizzi, cujo resultado concreto, no
período de 2003-2006, foi a redução, em termos reais, do financiamento das IEES
paranaenses em patamares inferiores ao Governo Lerner (1999-2002).
2.4 BREVES APONTAMENTOS SOBRE O FINANCIAMENTO DA UNIOESTE (2003-2006)
Como já vimos, no período de 2003-2006, ocorreu o crescimento nominal
dos recursos para as universidades. No caso da Unioeste tal crescimento também
foi verificado. No que diz respeito ao número de cursos, do ano de 2003 ao ano de
2006 ocorreu o surgimento de apenas 1 curso de graduação, porém mesmo com
este mínimo crescimento, ocorreu o aumento no número de matrículas.
56
TABELA 14. NÚMERO DE MATRÍCULAS - UNIOESTE (2003- 2006)
ANO
GRADUAÇÃO
NÚMERO DE CURSOS MATRÍCULAS EM CURSOS PRESENCIAIS
Total do Estado Unioeste Total do Estado Unioeste
2003 252 33 71.621 9.710
2004 255 35 72.255 10.088
2005 253 34 72.359 10.305
2006 258 34 72.851 10.246
Fonte: PARANÁ. SETI (Coordenadoria do Ensino Superior).
TABELA 15. NÚMERO DE CURSOS - UNIOESTE (2002-2006)
ANO INSTITUIÇÃO
PÓS-GRADUAÇÃO
ESPECIALIZAÇÃO MESTRADO DOUTORADO
Nº CURSOS
Nº MATRIC.
Nº CURSOS
Nº MATRIC. Nº CURSOS Nº MATRIC.
2002 UNIOESTE 24 804 2 51 - -
2003 UNIOESTE 36 999 4 80 - -
2004 UNIOESTE 33 929 4 233 - -
2006 UNIOESTE 53 1597 7 342 1 5
Fonte: PARANÁ. SETI (Coordenadoria do Ensino Superior).
Mesmo com o pequeno crescimento em números de graduação, na Unioeste,
podemos perceber a partir das tabelas acima um crescimento importante em cursos
de pós-graduação stricto-sensu e lato-sensu. Os cursos de pós-graduação lato-
sensu passaram de 24 no ano de 2002 para 53 no ano de 2006. Porém a imensa
maioria destes cursos eram pagos, efetivando a política de desresponsabilização
financeira por parte do Estado e a busca, de parte da universidade, de fontes
adicionais de recursos (privados). Esses cursos pagos desencadeiam um processo
de privatização interna das universidades descaracterizando o papel das
universidades públicas.
57Em relação à pós-graduação stricto-sensu (mestrado e doutorado), na
Unioeste ocorreu de 2002 a 2006 um crescimento também importante. Em 2002
eram 2 programas e em 2006, 8.
A Unioeste vivenciou o conjunto de práticas implementadas pelo governo
Requião do ano de 2003 a 2006. Como já vimos, durante este período ocorreu
crescimento nominal dos recursos destinados às IEES.
TABELA 16. REPASSE DO TESOURO DESTINADO À UNIOESTE (2003- 2006)
ANO PESSOAL % INVESTIMENTOS % CUSTEIO % TOTAL
2003 46.573.743,00 87,35% 415.000,00 0,78% 6.330.931,00 11,87% 53.319.674,00
2004 47.120.000,00 87,78% 980.000,00 1,83% 5.577.680,00 10,39% 53.677.680,00
2005 49.884.307,00 88,01% 162.552,00 0,29% 6.631.946,00 11,70% 56.378.805,00
2006 66.364.916,00 86,88% 920.700,00 1,21% 9.102.859,00 11,92% 76.388.475,00Fonte: Paraná. Secretaria de Estado da Fazenda. Balanço Geral do Estado. Exercicio de 2006.
Do ano de 2003 a 2006, o orçamento nominal da Unioeste aumentou em
43,27%. Esse crescimento nominal, como já vimos anteriormente, é resultado
especialmente do incremento dos gastos com folha de pagamento decorrente do
reajuste salarial conquistado pelos servidores docentes e técnicos, em setembro de
2005 e abril de 2006 respectivamente. Entre 2003 e 2006 houve um crescimento
nominal no orçamento, destinado pelo Estado à Unioeste, de R$ 23.068.801,00.
Deste montante de recursos, R$ 19.791.173,00 (85,79%) resultaram do crescimento
dos gastos com pessoal. Nesse mesmo período o crescimento do custeio e
investimento na Unioeste foi de R$ 3.277.628,00, pouco mais de 14% do
crescimento nominal global orçamento da Unioeste, no período de 2003 a 2006.
58
CONSIDERAÇÕES FINAIS
As universidades brasileiras vem sofrendo transformações diante da
implementação das orientações dos organismos multilaterais, que ocorrem desde os
anos de 1990. Com a vitória de Lula e Requião, nas eleições do ano de 2002,
acreditou-se na possível mudança e com esta uma possível superação da situação
de subfinanciamento vivenciada pelas universidades públicas.
Através das análises presentes neste trabalho podemos considerar que o
governo Lula mantém as diretrizes neoliberais em seus projetos à universidade,
como a reforma universitária, e investiu menos em educação do que FHC. No
período de 2002 a 2005, o gasto médio das despesas da União com a educação
caiu para 0,74%, sendo que durante o governo FHC (1995-2002) o gasto médio foi
de 0,82%. Nos primeiros anos de governo Lula, a fatia do bolo foi duas vezes maior
para o pagamento de juros da dívida que para a educação.
Roberto Requião, em seu mandato do ano de 2003 a 2006, apesar do
discurso que enfatiza o social, da “opção preferencial pelos pobres”112 e na denúncia
ao chamado neoliberalismo, implementou em conjunto com o secretário Rizzi uma
reestruturação do ensino superior estadual que teve como resultado concreto uma
certa identidade de propósitos com o governo federal, ou seja, a contenção do
crescimento dos recursos destinados ao financiamento do ensino superior público.
Como vimos ao assumir o governo buscou implementar seu projeto de
reestruturação da educação superior paranaense e, para isso, se utilizou de diversos
argumentos com o objetivo de congelar o orçamento, apresentando como
“justificativa” o mito do déficit orçamentário, o que de fato revelou-se numa falácia.
Através de seu programa de reestruturação administrativa buscou também
reduzir os gastos com o atual quadro de pessoal. Para isso tentou ampliar a carga
horária dos docentes em sala de aula, postergar de todas as formas a reposição
salarial, e não autorizar a abertura de concurso público para docentes e técnicos em
número suficiente às necessidades administrativas e acadêmicas.
Mesmo diante de todas estas práticas, o financiamento nominal e real foi
ampliado durante o período estudado.
112O argumento da “opção preferencial pelos pobres” começou a ser difundido no Brasil pela Teologia da Libertação, tendo com um dos principais expoentes do movimento Leonardo Boff.
59No período de de 2003 a 2006 houve um crescimento nominal de 17,09%
da arrecadação do ICMS, de 36,82% receita orçamentária e de 20,35% da receita
de impostos constitucionalmente vinculados à educação. Nesse mesmo período
observou-se um crescimento nominal dos recursos do tesouro do Estado
repassados às IEES paranaenses. Entretanto, este crescimento está relacionado,
principalmente ao incremento dos gastos com pessoal, decorrente da revisão da
carreira dos docentes, em setembro de 2005, e dos técnicos, em abril de 2006.
Nestes quatro anos, em média, 90,62% dos recursos destinados à manutenção e
desenvolvimento da educação superior, foram destinados às despesas com pessoal.
Considerando os recursos vinculados da receita de impostos repassados
pelo Estado para custear as despesas com a manutenção e desenvolvimento da
educação pública, o Governo Requião, investiu e repassou menos recursos às IEES
paranaenses do que o Governo Lerner (1999-2002). No período de 1999 a 2002, o
governo Lerner destinou em média, da receita resultante de impostos para
manutenção e desenvolvimento da educação pública, 6,11% para a educação
superior. O Governo Requião e o secretário Rizzi destinaram no período de
2003-2006 em média 4,66%, dos recursos vinculados à educação, para a
manutenção e desenvolvimento das IEES paranaenses. Tomando como referência a
receita de impostos, constitucionalmente vinculados à manutenção e
desenvolvimento da educação pública, em termos reais, no período de 2003-2006,
Requião reduziu em 23,73% os recursos destinados às IEES se comparado aos
últimos quatro anos do governo Lerner (1999-2002).
No que tange ao financiamento das IEES paranaenses, da mesma forma
que o Governo Lula, o Governo Requião, no período de 2003 a 2006, aumentou o
orçamento nominal, mas o reduziu em termos reais, ou seja, investiu menos do que
o Governo Lerner. Apesar das diferenças políticas entre Lerner, declaradamente
privatista, e Requião, nacionalista e defensor da presença do Estado, no que tange
ao financiamento das IEES paranaenses, no período de 2003 a 2006, o resultado
concreto das ações dos Governos Requião e Lerner apresentaram resultados muito
parecidos: a redução dos recursos, constitucionalmente vinculados, para a
manutenção e desenvolvimento das IEES paranaenses.
De fato estamos muito distantes do padrão de investimento do ano de 1997.
Como já vimos, nesse ano as IEES paranaenses receberam 9,70% das receitas
constitucionalmente vinculadas à manutenção e desenvolvimento da educação
60pública no Paraná e em termos reais, no ano de 1997 as IEES paranaenses
receberam 52% a mais do que receberam em média no período de 2003-2006. Esse
número revela a complexidade da tarefa que os movimentos organizados da
comunidade universitária (estudantes, professores e técnicos) terão que realizar
para fazer com que o governo estadual passe a tratar a educação superior pública
como prioridade, destinando conseqüentemente um orçamento adequado ao
financiamento integral do conjunto das atividades desenvolvidas nas IEES (ensino,
pesquisa e extensão).
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