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PREFÁCIO:
Gabriella Depiné PoffoOrganizadora
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO:
Relatos de imigrantes haitianos na região do Litoral Norte de Santa Catarina
Gabriella Depiné PoffoOrganizadora
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO:
Relatos de imigrantes haitianos na região do Litoral Norte de Santa Catarina
Organizadora
Gabriella Depiné Poffo
Autores
André Gobbo
Andreia Martins
Silvia Barcelos
Simone Nunes da Silva
Stefane Layane Gaffuri
Uana Paula Stivan
Revisão
Gabriela Piske
Capa, Projeto Gráfico e Diagramação
Ana Lúcia Dal Pizzol
Av. Marginal Leste, 3600, Bairro dos EstadosBalneário Camboriú (SC)
CEP: 88.339-125www.avantis.edu.br
Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca da Faculdade Avantis Aline M. d’Oliveira CRB 14 – 1063
CDD 21ª ed. 305.8 – Grupos Étnicos-Raciais
305.89697294 - Haitianos
Poffo, Gabriella Depiné P745r Relações étnico-raciais no ambiente de trabalho: relatos de Imigrantes haitianos na região do Litoral de Santa Catarina. Gabriella Depiné Poffo (org.); André Gobbo et. al. Balneário Camboriú: Faculdade Avantis, 2018. 222 p. il.
Inclui Índice ISBN: 978-85-5456-026-3 (versão impressa) ISBN: 978-85-5456-027-0 (versão online)
1. Relações Étnico-raciais – Santa Catarina. 2. Haitianos - imigração. 3. Haitianos – Empresas Brasileiras. 4. Imigrantes Haitianos – Mercado de trabalho – Santa Catarina. I. Faculdade Avantis. II. Título.
PREFÁCIO: SOBRE OS PARADOXOS NAS RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHODra. Gabriella Depiné Poffo
CAPÍTULO 1: A ‘INCLUSÃO’ PROFISSIONAL DOS IMIGRANTES HAITIANOS NA REDE HOTELEIRA DE
BALNEÁRIO CAMBORIÚ (SC)Simone Nunes da Silva • André Gobbo
CAPÍTULO 2: OS IMIGRANTES HAITIANOS NO MERCADO DE TRABALHO DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ E ITAJAÍ (SC)Silvia Barcellos • André Gobbo
CAPÍTULO 3: O PROCESSO DE INTEGRAÇÃO DE FUNCIONÁRIOS HAITIANOS POR EMPRESA BRASILEIRA
Uana Paula Stivan • Andréia Martins
CAPÍTULO 4: UMA LEITURA CONTEMPORÂNEA PARA QUE SE ENTENDA AS RAÍZES DO RACISMO BRASILEIROAndré Gobbo • Stefane Layana Gaffuri
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85
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SUMÁRIO
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PREFÁCIO:
8
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO: Relatos de imigrantes haitianos na região do Litoral Norte de Santa Catarina
PREFÁCIO:
SOBRE OS PARADOXOS NAS RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
Dra. Gabriella Depiné Poffo1
1 Coordenadora do curso de Administração da Faculdade Avantis.
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PREFÁCIO:
No mesmo ano em que a Faculdade Avantis, de Balneário
Camboriú, comemora os seus primeiros 15 anos de atuação e serviços à
região, lembramos os 50 anos do assassinato do líder Martin Luther King
e, com isso, eis que nos surge a oportunidade de lançarmos mais uma
obra que sirva de base para que tanto nossos professores quanto nossos
alunos possam ter conhecimentos, discutirem e se posicionarem frente
às questões das relações étnico-raciais.
Para viabilizarmos mais esta contribuição à nossa comunidade
acadêmica e regional, tratamos de reunir pesquisas desenvolvidas por
nossos alunos do curso de Administração de Empresas, sob a orientação
de seus professores, que versam sobre uma temática relevante e, ao
mesmo tempo, que nos preocupa enquanto educadores: a situação
relatada e sofrida pelos imigrantes haitianos no mercado de trabalho de
nossa região.
Por ora, as pesquisas aqui divulgadas poderão causar espanto
e revolta em cada um daqueles seres humanos que ainda nutrem a
generosidade em seus corações. E esse é justamente o objetivo original
de quando nos reunimos para viabilizarmos essa publicação, vez que
entendemos que, enquanto pesquisadores e, sobretudo, como Instituição
de Ensino Superior (IES), não podemos ‘empurrar para baixo do tapete’
essa realidade que permeou algumas organizações empresariais nos
últimos anos, as quais, de maneira nada humana, contribuíram para
disseminar a intolerância e a xenofobia contra esse povo que por aqui
procurava uma nova chance de recomeçar suas vidas.
O livro está dividido em quatro capítulos os quais, apesar de se
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RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO: Relatos de imigrantes haitianos na região do Litoral Norte de Santa Catarina
complementarem, podem ser lidos sem seguir essa ordem. No primeiro
deles, a aluna Simone Nunes da Silva, juntamente com o seu orientador
Prof. André Gobbo, relata os desafios que o departamento de Gestão de
Pessoas de hotéis localizados no município de Balneário Camboriú (SC)
vem enfrentando: a integração de imigrantes haitianos; os quais, na busca
de uma vida melhor se viram atraídos pelo Brasil devido à escassez na mão
de obra e incentivos econômicos. Os resultados alcançados apontam que
a discriminação contra imigrantes haitianos é constante no município em
estudo, havendo relatos graves de agressão e de funcionários hoteleiros
que se sentem incomodados com a migração haitiana.
Já no segundo capítulo, o professor André Gobbo apresenta o
estudo desenvolvido junto à sua orientanda Sílvia Barcellos, desta vez
relatando a situação dos imigrantes haitianos no mercado de trabalho de
Balneário Camboriú e Itajaí (SC). Com isso, foram capazes de identificar as
dificuldades enfrentadas pelos imigrantes para entrarem e se manterem
no mercado de trabalho na região, bem como verificaram as dificuldades
que possuem em relação ao processo de comunicação dentro e fora das
empresas. Questões de extrema importância para o desenvolvimento dos
imigrantes foram abordadas, dentre eles fatores relacionados à moradia,
às dificuldades em viver em um país de cultura diferente, às dificuldades
financeiras, aos objetivos e às perspectivas para o futuro e como os
mesmos lidam com a invisibilidade humana. Esse estudo evidencia que
questões como o preconceito e a discriminação, apesar de intoleráveis,
ainda persistem.
A seguir, a acadêmica do curso de Administração Uana Paula Stivan,
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PREFÁCIO:
juntamente com sua professora orientadora Andreia Martins, relata o
processo de integração de funcionários haitianos por uma empresa da
região, com o objetivo de verificar a percepção dos gestores brasileiros e
de funcionários haitianos com relação ao processo de integração, sendo
que este é de extrema importância para que a organização apresente
seus objetivos, suas metas, sua visão, sua missão e seus valores que
formam sua cultura. A pesquisa identifica a percepção dos gestores
quanto as fragilidades e às potencialidades no processo de integração dos
funcionários haitianos, bem como a percepção desses ao referido ato. Os
resultados demonstraram que os gestores sentem dificuldades quanto
à comunicação escrita e apontam como principal ponto positivo no
processo de integração o auxílio de um tradutor. No entanto, os haitianos
revelam terem passado por dificuldades em relação ao entendimento dos
valores referente à remuneração.
Por fim, aproveitando-nos da gentileza dos colegas André Gobbo
e Stefani Layana Gaffuri, inserimos um resumo por eles elaborado, do
livro ‘A tolice da inteligência brasileira’, do sociólogo Jessé Souza (2015),
o qual defende a tese de que somos vítimas de uma ‘violência simbólica’,
vez que as instituições que controlam os interesses de uma minoria
(imprensa, partidos políticos, universidades, etc.) são as que selecionam
e distorcem o que os olhos veem, ao mesmo tempo em que se esforçam
para esconder o que não deve ser visto pela população e, por meio dessa
manipulação dos dados, o privilégio passa a ser legitimado e até mesmo
aceito por aqueles que são excluídos de todos os privilégios.
Como organizadora dessa obra, entendo que as reflexões suscitadas
nestes capítulos devem ser discutidas em sala de aula, de forma que
possamos assumir e, consequentemente entender o nosso passado
escravocrata, para que possamos vencer esses tempos de intolerância,
preconceitos de toda ordem e xenofobia, que fazem parte do nosso dia
a dia e que muito bem ficam evidenciados nos trabalhos aqui reunidos.
Faço votos de que, com mais essa obra, a Faculdade Avantis esteja
cumprindo com sua missão maior que é “Desenvolver ensino de qualidade
e disseminar o conhecimento com princípios éticos para a formação de
cidadãos comprometidos com o desenvolvimento sustentável”. Boa
leitura!
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A ‘INCLUSÃO’ PROFISSIONAL DOS IMIGRANTES HAITIANOS NA REDE HOTELEIRA DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ (SC)
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RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO: Relatos de imigrantes haitianos na região do Litoral Norte de Santa Catarina
CAPÍTULO 1
A ‘INCLUSÃO’ PROFISSIONAL DOS IMIGRANTES HAITIANOS NA REDE HOTELEIRA DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ (SC)
Simone Nunes da Silva2
André Gobbo3
2 - Aluna egressa do curso de Administração da Faculdade Avantis.3 - Professor do curso de Administração da Faculdade Avantis.
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A ‘INCLUSÃO’ PROFISSIONAL DOS IMIGRANTES HAITIANOS NA REDE HOTELEIRA DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ (SC)
Em meados da década de 90, surgiram inúmeros questionamentos
sobre o departamento de Recursos Humanos dentro das organizações
empresariais, vez que o mesmo percebia os funcionários como meros
recursos disponíveis para gerarem lucro. Entretanto, nos últimos anos,
essa linha de pensamento mudou e houve uma transição para o que hoje
é denominado como Gestão de Pessoas, sendo que a principal função
dessa área é o reconhecimento e a valorização do ‘capital humano’, tido
como fundamental para o desenvolvimento organizacional.
Entende-se por Gestão de Pessoas a função gerencial que visa a
cooperação das pessoas que atuam nas organizações para o alcance
dos objetivos organizacionais e individuais (GIL, 2012). Atualmente,
esse setor é essencial para uma empresa, afinal, vive-se em mundo de
constantes mudanças, no qual os indivíduos que antes eram tratados
meramente como recursos passam a ser notados como um potencial
diferencial, pois são eles geradores de conhecimento. Diante desta
concepção contemporânea, é importante que esse setor conte com um
gestor devidamente qualificado, ao qual incumbe-se a tarefa de lidar com
questões complexas, como: desafios organizacionais, competitividade,
integração, conduta ética e globalização.
Neste sentido, atualmente nota-se que os profissionais do
departamento de Gestão de Pessoas de muitas empresas brasileiras estão
enfrentando um grande desafio: a integração de imigrantes haitianos,
que para o Brasil migraram em consequência do trágico terremoto
registrado no país, em 2010. De acordo com o jornalista Fulgêncio (2016),
nos últimos quatro anos as embaixadas brasileiras emitiram 38.065
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RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO: Relatos de imigrantes haitianos na região do Litoral Norte de Santa Catarina
vistos permanentes para haitianos; em Santa Catarina, a estimativa é que
há mais de seis mil (BAZZO, 2016).
Mediante a esse contexto, a rede hoteleira de Balneário Camboriú,
município turístico do litoral do Estado de Santa Catarina, sentiu-se
atraída por esses profissionais devido à escassez de mão-de-obra para
ocupar as funções de camareiras, garçons, serviços gerais, entre outros.
Em contrapartida, muitos trabalhadores brasileiros ainda resistem ao
processo de inclusão desses profissionais recém-chegados e, retraídos
pela crise econômica e a alta no índice de desemprego, se veem cada
vez mais disputando vagas com os estrangeiros o que por vezes acirra a
intolerância e aumenta os casos de racismo e xenofobia.
Frente a isso, nos últimos anos registrou-se um elevado número
de denúncias feitas tanto ao Ministério do Trabalho quanto ao Sindicato
dos Empregados com Hoteleiro e Similares de Balneário Camboriú,
que envolvem acusações contra hotéis por tratarem seus funcionários
haitianos como ‘escravos’, por meio da discriminação, do racismo, de
atos xenofóbicos e outros tipos de agressões.
Levando em conta os fatos supracitados é que se originou a
presente pesquisa a qual busca responder a seguinte pergunta problema:
De que maneira os departamentos de Gestão de Pessoas da rede hoteleira
de Balneário Camboriú estão promovendo a inclusão profissional dos
imigrantes haitianos? Frente à essa problemática, objetiva-se com
o presente estudo analisar o processo de inclusão profissional dos
imigrantes haitianos realizado pelo departamento de Gestão de Pessoas
da rede hoteleira de Balneário Camboriú. Para isso propomo-nos
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A ‘INCLUSÃO’ PROFISSIONAL DOS IMIGRANTES HAITIANOS NA REDE HOTELEIRA DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ (SC)
identificar junto ao departamento de Gestão de Pessoas da rede hoteleira
as principais dificuldades nos processos de admissão e integração dos
imigrantes haitianos; narrar os casos relatados por imigrantes haitianos
em relação ao processo de integração em hotéis e, por fim, descrever
a concepção de funcionários brasileiros em relação à contratação de
haitianos.
O interesse em pesquisar sobre o processo de inclusão profissional
dos imigrantes haitianos na rede hotelaria em Balneário Camboriú
surge devido ao número expressivo de contratações em hotéis da região;
neste sentido, é extremamente oportuno pesquisar tal questão para o
aprofundamento desse tema que está no centro das atenções e discussões
contemporâneas.
Deste modo, entende-se que a questão da imigração, alinhada com
a contratação desta mão-de-obra pelo segmento hoteleiro, é considerada
de relevante importância pelos pesquisadores em virtude do expressivo
número de haitianos na região e dos constantes casos de racismo, atos
xenofóbicos e desvalorização de trabalho registrados contra hotéis, tanto
no Sindicato dos Empregados com Hoteleiro e Similares de Balneário
Camboriú, quanto no Ministério do Trabalho.
▯ PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Referente à caracterização da pesquisa quanto ao problema,
a mesma assume características estritamente qualitativas. Diante
deste contexto, esse método é útil para desenvolver e explorar novos
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RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO: Relatos de imigrantes haitianos na região do Litoral Norte de Santa Catarina
conceitos, vez que, segundo Marconi e Lakatos (2011), nessa abordagem
o pesquisador entra em contato direto e prolongado com o informante e
possui a preocupação em analisar e interpretar aspectos mais profundos
na situação que está sendo investigada.
A abordagem empregue para análise em relação aos objetivos
caracteriza a pesquisa como exploratória, uma vez que foi possível
familiariza-se com o assunto pesquisado e analisar o tema sob inúmeros
ângulos e aspectos.
Quanto aos procedimentos técnicos, a pesquisa se caracteriza
como um estudo de campo e bibliográfico. O estudo de campo consistiu
na observação e na análise de um grupo de pessoas em um contexto
social enquanto a pesquisa bibliográfica tem como a principal vantagem
a liberdade do pesquisador, o qual pode investigar em qualquer base de
dados materiais bibliográficos e ampliar o seu próprio conhecimento
sobre o tema estudado.
Neste contexto, o presente estudo buscou analisar a maneira
que está ocorrendo a inclusão profissional dos imigrantes haitianos
na hotelaria de Balneário Camboriú, a partir de uma amostra não
probabilística constituída de 22 pesquisados, em 2016. Ou seja, optamos
em estudar uma parcela da população por meio da amostragem por
acessibilidade ou conveniência devido à inacessibilidade de todos os
indivíduos residentes no município.
A pesquisa utilizou como técnicas e instrumentos de coleta de
dados a entrevista semiestruturada, a qual é tida como essencial para
a obtenção de informação. Partindo-se deste princípio, foi realizada a
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A ‘INCLUSÃO’ PROFISSIONAL DOS IMIGRANTES HAITIANOS NA REDE HOTELEIRA DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ (SC)
confecção de três roteiros para a realização das entrevistas: a primeira foi
aplicada a funcionários do departamento de Gestão de Pessoas; a segunda
com imigrantes haitianos; e a terceira com funcionários brasileiros.
Por conseguinte, a análise dos dados foi caracterizada como de
conteúdo, a qual consiste no estudo da comunicação entre os homens e
de privilegia os dados qualitativos.
▯ INTEGRAÇÃO DE FUNCIONÁRIOS IMIGRANTES
O grupo de trabalho é constituído por dois ou mais indivíduos que
se inter-relacionam por meio da integração e partilham os seus deveres,
tendo em vista as metas da organização (SPECTOR, 2010). A integração
é um processo para agilizar a adaptação do novo funcionário na
organização, sendo que possui várias etapas, a saber: inicialmente deve-
se “quebrar o gelo” com o novo funcionário, ou seja, o setor de recursos
humanos precisa fazer um jogo ou outra atividade para acalmar o recém-
contratado e deixá-lo mais à vontade; em seguida, após diminuir a
ansiedade, deve-se dar início ao processo de integração (PEREIRA, 2014).
A isso Lacombe (2011) compreende que no decorrer do processo
são esclarecidas ao recém-admitido as informações necessárias para
que tenha conhecimento de como funciona a empresa, envolvendo a
sua cultura, as normas, os benefícios, a missão, a visão, os valores, as
políticas, as metas, os padrões, os horários de trabalho e intervalos,
dias de folgas, quem são os seus superiores e qual conduta deve ter
no ambiente de trabalho. Diante disso, Pereira (2014) entende que o
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RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO: Relatos de imigrantes haitianos na região do Litoral Norte de Santa Catarina
processo de integração tem como objetivo familiarizar os novos recém-
contratados com as suas funções e a empresa como um todo.
Barbieri (2016) ressalta que os grupos em uma organização são
formados por meio dos traços externos de uma identidade: nacionalidade,
religião, étnica, idioma e costumes, os quais definem as relações sociais,
bem como quem irá participar do grupo ou quem estará fora da equipe.
Diante disso, para Lacombe (2011), caso a organização acredite ser
necessário, pode fornecer longos treinamentos de integração com
período de vários meses. Já em outras situações, apenas acontece uma
entrevista de poucos minutos. Diante disso, é preciso que o departamento
de Gestão de Pessoas avalie o programa de integração de acordo com cada
perfil contratado.
Em relação à integração de imigrantes no Brasil, o idioma é
considerado o principal obstáculo, sendo que cerca de 16,8% dos
imigrantes afirmam que a língua é a principal barreira na comunicação,
principalmente em instituições públicas (VALE, 2015). Contudo,
enquanto a maior parte dos imigrantes que vêm ao Brasil fala espanhol
ou português, o haitiano acaba encontrando mais dificuldades devido
ao idioma derivado do francês, creole (SANT’ANNA; PRADO, 2016).
Segundo o repórter Vale (2015), além do idioma, os imigrantes enfrentam
dificuldades como documentação, moradia, saúde, trabalho e educação;
frente a isso, Barbieri (2016) acredita que os conflitos entre os povos, os
grupos sociais e as etnias são constantes presenças nas relações sociais.
De acordo o site Portal Brasil (2015), uma parte dos brasileiros trata
os imigrantes como obstáculos, pois acredita que eles estão roubando
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A ‘INCLUSÃO’ PROFISSIONAL DOS IMIGRANTES HAITIANOS NA REDE HOTELEIRA DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ (SC)
seus empregos; entretanto, estatisticamente, ao se comparar o Brasil
com outros países, tem-se apenas a ocupação de imigrantes em 0,5%
do mercado formal de trabalho. O processo de integração de imigrantes
é considerado uma ação muito extensa e demorada, no entanto,
necessária. Com a migração existe a possibilidade no aumento de índices
de denúncias em relação ao racismo e atos xenofóbicos e, diante disso, é
necessário que o Brasil defina leis claras que protejam esses imigrantes
de quaisquer retaliações que possam vir a sofrer (SANTINI, 2014).
Frente a isso, Lacombe (2011) compreende que é preciso ter
atenção no processo de socialização dos novos integrantes, ou seja, o
gestor deve observar a adaptação dos novos funcionários em relação
aos companheiros de trabalho, aos seus superiores e aos costumes da
empresa. Com um aprimorado programa de integração, a empresa pode
diminuir os casos de conflitos e encontrar uma posição adequada para
cada novo funcionário. Além do mais, tendo um bom programa, pode
acelerar o processo de socialização, resultando em um menor índice de
rotatividade.
▯ INCLUSÃO PROFISSIONAL
A socialização em uma organização é uma maneira de influenciar
a conduta de um novo profissional recém-chegado, por meio da
participação de atividades de inclusão para se aproximar e desenvolver um
relacionamento com os outros funcionários e conhecer as suas funções
(SCHERMERHORN JÚNIOR, 2014). De acordo com Gil (2012), antes da
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RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO: Relatos de imigrantes haitianos na região do Litoral Norte de Santa Catarina
contratação o entrevistador inicialmente traça um perfil para o cargo
que necessita de um novo profissional, o qual no decorrer do processo
de recrutamento e seleção escolhe os candidatos mais adequados para
entrevistar e assim opta pelo indivíduo que mais for compatível com o
perfil estabelecido.
No processo de inclusão de um novo membro existe um conflito,
pois os outros funcionários se sentem frustrados ao verem um recém-
chegado, taxando-lhe como um obstáculo, o que pode levar os indivíduos
a reagirem de diferentes formas contra o novo funcionário, inclusive
retaliações (BARBIERI, 2016).
Desse modo, segundo Schermerhorn Júnior (2014), se faz
necessário que a empresa promova o treinamento e o desenvolvimento,
pois são práticas para amparar e auxiliar os novos profissionais a
apreenderem e a aperfeiçoarem as suas competências no ambiente de
trabalho. Outro fator de inclusão para o recém-chegado é o treinamento
no trabalho, que consiste em um rodízio em que os funcionários trocam
de funções para os tornarem proativos, resultando na competência de
todos em diversas funções.
▯ DIFICULDADES NA ADMISSÃO DE IMIGRANTES
Haitianos com diplomas possuem mais dificuldades que outros
imigrantes para conseguirem empregos em sua área profissional no
Brasil. Segundo análises, constatou-se que são poucos os haitianos que
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A ‘INCLUSÃO’ PROFISSIONAL DOS IMIGRANTES HAITIANOS NA REDE HOTELEIRA DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ (SC)
têm emprego na área em que estão qualificados, sendo que no ano de
2014 havia 440 imigrantes haitianos com curso superior trabalhando
legalmente, entretanto, somente 15 (3,4%) exerciam a função conforme o
respectivo diploma (SCHREIBER JÚNIOR, 2015).
Os haitianos estão cada vez mais tendo dificuldades para
encontrarem empregos no Brasil, sofrendo discriminação por parte
de alguns brasileiros. Segundo informações da jornalista Schreiber
Júnior (2015) outro problema que dificulta a conquista de um trabalho
compatível com o diploma é o impasse na revalidação dos diplomas
de estrangeiros no país, sendo que o governo brasileiro estabeleceu
que cada universidade tem autonomia para aceitar ou não o diploma
internacional.
Outra dificuldade que está prejudicando no processo de emissão
dos documentos para haitianos é a burocracia local que criou diversas
classificações para imigrantes, são elas: refugiado, migrante e apátrida;
assim dificulta-se a compreensão para os estrangeiros e brasileiros em
relação a quais documentos são necessários para que o haitiano resida
no Brasil e esteja legalmente adequado para contratação. Frente a isso
os haitianos sugerem que as taxas de emissão de documentos sejam
reduzidas e pedem rapidez no procedimento de legalização, para que
consigam emitir os documentos necessários consigam entrar no mercado
de trabalho (VALE, 2015).
No ano de 2015, havia no Brasil cerca de 50 mil haitianos, no
entanto muitos sofrem com as dificuldades para conseguirem um
emprego devido à crise e somente estão sobrevivendo por meio de
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RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO: Relatos de imigrantes haitianos na região do Litoral Norte de Santa Catarina
doações (G1, 2015). Ademais, os imigrantes haitianos, mesmo sabendo
falar português, possuem muito dificuldade na vivência no país, pois são
constantemente vítimas de preconceito (SCHREIBER JÚNIOR, 2015).
Para que o imigrante seja contratado em uma empresa, é necessário
que tenha toda a documentação regularizada, para isso necessitam de
um protocolo da Polícia Federal e uma certidão emitida pelo Comitê
Nacional para os Refugiados. Somente depois que estiverem com os
documentos em dia podem se cadastrar para uma vaga de emprego no
Sistema Nacional de Emprego (THOMÉ; DIOGO, 2014).
▯ DISCRIMINAÇÃO NO AMBIENTE DE TRABALHO
A discriminação no serviço acontece quando o indivíduo é rejeitado
em um emprego ou função por motivos incompatíveis à função que seria
exercida (SCHERMERHORN JÚNIOR, 2014). Existem leis brasileiras que
relatam que é ilegal praticar condutas de discriminação, sendo proibido
discriminar pelos seguintes motivos: sexo, raça, religião, cor, idade,
deficiência física ou mental, principalmente no ato da contratação do
funcionário (SPECTOR, 2010).
Para Lacombe (2011), em algumas situações a constituição e as
normas de uma organização preveem uma cota de vagas para grupos
étnicos definidos, vez que compreende que não deveria acontecer essas
reservas de vagas, pois, conforme ele, há uma grande miscigenação
em território nacional; nesse caso, as empresas públicas que deveriam
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A ‘INCLUSÃO’ PROFISSIONAL DOS IMIGRANTES HAITIANOS NA REDE HOTELEIRA DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ (SC)
se preocupar em dar oportunidades aos menos privilegiados, e não as
privadas.
Spector (2010) compreende que as decisões no ambiente de
trabalho deveriam ser fundamentadas na performance do empregado e
não outros atributos desnecessários. Nesta perspectiva, as organizações
deveriam praticar como doutrina a igualdade de oportunidades,
ou seja, a seleção e a promoção de um funcionário deveria ser feita
conforme merecimento do candidato (LACOMBE, 2011). Antigamente
a discriminação era normal em relação às minorias étnicas, entretanto
nos dias atuais, é ilegal praticar discriminação contra qualquer indivíduo,
todavia as minorias étnicas fazem partes das classes protegidas, essa
seleção é formada por indivíduos que foram alvos de discriminação,
dentre eles: estrangeiros, negros, índios e mulheres (SPECTOR, 2010).
Atualmente, segundo Pereira (2014), a organização tem como
finalidade criar um bom relacionamento com os seus funcionários e
buscar ações para atender as necessidades dos mesmos, bem como
diminuir os conflitos no ambiente de trabalho. Contudo, de acordo com
Spector (2010), alguns superiores utilizam do poder para maltratar e
humilhar os seus funcionários, por meio do assédio étnico, ou seja,
ordenar que o funcionário faça ações que não sejam apropriadas.
Segundo denúncia de Alves (2015), as trabalhadoras haitianas
vêm sofrendo maus tratos psicológicos e racismo por seus superiores em
hotéis localizados na cidade litorânea de Balneário Camboriú (SC), sendo
expostas a uma carga excessiva de trabalho, bem como não recebem o
pagamento das horas extras e não possuem o horário de descanso
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RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO: Relatos de imigrantes haitianos na região do Litoral Norte de Santa Catarina
adequado; tudo isso devido à falta de conhecimento sobre a legislação
trabalhista brasileira o que as faz serem vítimas destas situações. A isso,
França (2012) assevera que os discursos institucionais de valorização das
pessoas nas empresas estão sendo substituídos por diferentes formas de
abusos de poder hierárquico.
Segundo Spector (2010), também é considerada discriminação as
seguintes situações no exercício da profissão: constrangimento, insulto,
agressão físicas e ofensas praticadas por qualquer pessoa no ambiente
de serviço. Essas ocorrem devido a motivos diversos, dentre os quais
destacam-se: o descontrole dos gestores, irritação no ambiente de
trabalho e ausência de apoio por parte dos superiores e departamento de
Gestão de Pessoas.
▯ IMIGRAÇÃO HAITIANA NO BRASIL
O Haiti, apesar de possuir uma identidade forte, não é formalmente
considerado um país por muitas nações, sendo que sua história é marcada
pelos constantes golpes, repressões e revoltas que resultam na incerteza
política, social e econômica (SCHELP, 2010). Atualmente, é considerada
uma das nações mais pobres da América Latina, sendo que a população
sofre inúmeras violações dos direitos humanos (VEJA, 2010). Conforme
pode-se verificar na Figura 1, o Haiti é um país do Caribe. No dia 12 de
janeiro de 2010 sofreu um terremoto catastrófico que agravou ainda mais
a situação de precariedade vivida pela sociedade haitiana (ESCOSTEGUY,
2010). Acredita-se que esse evento afetou cerca de três milhões de pessoas.
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A ‘INCLUSÃO’ PROFISSIONAL DOS IMIGRANTES HAITIANOS NA REDE HOTELEIRA DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ (SC)
Figura 1: Mapa do HaitiFonte: Google Maps, 2016.
O terremoto sofrido por esta nação, no ano de 2010, foi resultado
da movimentação das placas tectônicas (VEJA, 2010). Este tremor causou
um estado catastrófico deixando a população em situações precárias,
desamparados, carentes de abrigo, luz, comida, água e remédio, o que
resultou em conflitos internos (ESCOSTEGUY, 2010). Foram cerca de 250
mil mortos (RIZZO; MOTTA; PÁDUA, 2014).
Conforme informações da revista Veja (2010), desde 2004 o Brasil
comanda no Haiti uma operação conhecida como Minustah, Missão das
Nações Unidas para a estabilização do país; devido a esse estreitamento
das relações, somado à situação caótica do terremoto, muitos haitianos
vieram para o Brasil em busca de uma vida melhor. Segundo informações
de Santini (2014), a maioria dos haitianos já possui um trajeto
estabelecido, entretanto, outros não têm rumo e desconhecem qualquer
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RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO: Relatos de imigrantes haitianos na região do Litoral Norte de Santa Catarina
informação sobre o Brasil. Diante disso, muitos imigrantes estão sendo
explorados e sofrem violações, por meio de falsas promessas, e acabam
ficando vulneráveis às organizações de tráfico de pessoas e aliciamento
inapropriados.
A Figura 2 apresenta a rota estabelecida pelos imigrantes
haitianos, sendo que percorrem cerca de seis mil quilômetros, iniciando
na capital Porto Príncipe (A), indo de avião até o Equador (B) e percorrem
o Peru para entrar no país com destino à Brasileia, no Estado do Acre (C)
(WROBLESKI, 2014).
Figura 2: Rota de imigração haitiana
Fonte: Wrobleski, 2014
29
A ‘INCLUSÃO’ PROFISSIONAL DOS IMIGRANTES HAITIANOS NA REDE HOTELEIRA DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ (SC)
A Polícia Federal está atendendo em torno de quatro pessoas por
dia, que vem ao país em busca de visto humanitário. Primeiramente,
é emitido um protocolo de entrada no país e depois é necessário que
aguardem a disponibilidade de um agente do Comitê Nacional para os
Refugiados que efetua uma entrevista para verificar e providenciar os
documentos necessários para este indivíduo (ZYLBERKAN, 2014). O
visto humanitário é expedido pelo Ministério das Relações Exteriores e
mencionado no passaporte do imigrante (JUSBRASIL, 2012).
Os imigrantes haitianos não param de chegar em busca de
uma vida melhor, no entanto, acabam se deparando com uma ínfima
infraestrutura para recebê-los e dar o apoio necessário para a inclusão
social (RIZZO; MOTTA; PÁDUA, 2014). O Brasil não estava preparado
para a entrada de tantos imigrantes nos últimos anos, a prova disto é
a emissão descontrolada de vistos humanitários (SANTINI, 2014). De
acordo com o escritor D’Urso (2014), inicialmente os imigrantes haitianos
foram classificados como refugiados, no entanto essa rotulação estava
incorreta pois:
De acordo com a Lei nº 9.474, de 22 de
julho de 1997, estabelece em seu artigo
1º, que “será reconhecido como refugiado
todo indivíduo que: I - devido a fundados
temores de perseguição por motivos
de raça, religião, nacionalidade, grupo
social ou opiniões políticas encontre-se
fora de seu país de nacionalidade e não
possa ou não queira acolher-se à proteção
30
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO: Relatos de imigrantes haitianos na região do Litoral Norte de Santa Catarina
de tal país; II - não tendo nacionalidade
e estando fora do país onde antes teve
sua residência habitual, não possa ou
não queira regressar a ele, em função
das circunstâncias descritas no inciso
anterior; III - devido à grave e generalizada
violação de direitos humanos, é obrigado
a deixar seu país de nacionalidade para
buscar refúgio em outro país.” (D’URSO,
2014).
Frente a isso, segundo o autor supracitado, o Brasil desenvolveu a
emissão do visto humanitário com o intuito de acolher os imigrantes que
sofreram com o catastrófico terremoto em 2010, no qual os imigrantes
que possuírem o visto terão autorização para residir em qualquer local do
território nacional e ter acesso aos serviços básicos de saúde e educação.
De acordo com a jornalista Zylberkan (2014), ao chegarem ao Brasil,
os imigrantes enfrentam a burocracia para conseguirem os documentos
e a infraestrutura para recebê-los. Em alguns casos é necessário que
aguardem em torno de sete meses para serem legalizados e retirarem os
documentos necessários para conseguirem emprego.
Com o crescente índice de imigração, foram estabelecidas cotas
de 1.200 concessões anuais de vistos humanitários que autorizava o
imigrante a permanecer em território brasileiro durante cinco anos.
Entre a catástrofe de 2010 até janeiro de 2012, cerca de dois mil imigrantes
entraram ilegalmente pelo Acre. Depois disso, os haitianos não paravam
de chegar ao país, sendo que até o ano de 2014 já haviam sido concedidos
31
A ‘INCLUSÃO’ PROFISSIONAL DOS IMIGRANTES HAITIANOS NA REDE HOTELEIRA DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ (SC)
26 mil vistos humanitários; número muito além do determinado, quando
a média prevista era de 44 haitianos entrarem no país por dia, vez que
nos primeiros quatro meses de 2014 registraram-se a vinda de 7.305, uma
média de 63 por dia (RIZZO; MOTTA; PÁDUA, 2014).
Estima-se que desde 2010 até setembro de 2014 tenham entrado
no Brasil, através do Acre, 39 mil imigrantes (SANTINI, 2014). Esta
situação fez com que o Governo daquele Estado disponibilizasse um
local improvisado para os imigrantes se instalarem, além de oferecer
conduções gratuitas para os que estão com a documentação em dia para
realocarem e levá-los para outras regiões (RIZZO; MOTTA; PÁDUA, 2014).
Contudo, aqueles que não possuem a documentação ficam à mercê de
ajuda do Governo e da população (SANTINI, 2014).
Devido a certo descontrole do Governo Federal na emissão de vistos
humanitários e à pouca segurança nas divisas territoriais, registrou-se
um alto índice de imigrantes, o que levou, em 2014, a Procuradoria da
República do Acre entrar com uma ação que exigia da União um projeto
para disponibilizar acomodações e auxílio aos mesmos (RIZZO; MOTTA;
PÁDUA, 2014). O local disponibilizado custa em torno de R$ 23 mil/mês
de aluguel para o Governo Estadual do Acre, além disso foram investidos
R$ 6 milhões para a construção de uma estrutura básica que pudesse
abrigar os imigrantes, bem como no transporte para outras regiões
(SANTINI, 2014).
No ano de 2015, o Brasil emitia cerca de 100 vistos por mês para
haitianos, segundo o próprio Ministério da Justiça, entretanto, o país
negocia junto ao Peru, Bolívia e Equador meios de impedir a entrada de
32
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO: Relatos de imigrantes haitianos na região do Litoral Norte de Santa Catarina
imigrantes ilegais que se utilizam de serviços de organizações criminosas
(G1, 2015).
De acordo com o repórter Santini (2014), a infraestrutura do
Ministério do Trabalho e Emprego é precária e devido a isso não tem
equipes suficientes para fiscalizar as contratações e situações de
imigrantes. Além dessas situações, a ausência de comunicação entre
as áreas e os órgãos que estão tentando adaptar os imigrantes dificulta
ainda mais o mapeamento e o diagnóstico das irregularidades nas
contratações. Frente a isso, o Sistema Nacional de Empregos também
não consegue suprir as necessidades de todos os imigrantes, ou seja, está
com dificuldades em integrar os imigrantes nas empresas, sendo cobrado
constantemente para desenvolver um meio para atender especialmente
os imigrantes e para garantir que não sejam alvos de abusos e trabalho
escravo.
O Brasil não possui infraestrutura e nem projeto para acomodar
tantos imigrantes, diante isso surgiram conflitos entre os Estados, sendo
que um dos mais famosos foi a transferência de dois mil haitianos do
Acre para São Paulo. Esse ‘despejo’ financiado pelo Governo do Acre
custou o valor de R$ 1,3 milhão e necessitou de 41 ônibus (RIZZO;
MOTTA; PÁDUA, 2014). Conforme informações do site JusBrasil (2012),
o Ministério de Trabalho e Emprego, em 2012, liberou a emissão de cerca
de 55.009 permissões de trabalhos temporários e permanentes para
imigrantes.
Somente em Santa Catarina, até 2014, foram contratados cerca de
700 haitianos em diversos segmentos. Empresas do Vale do Itajaí devido
33
A ‘INCLUSÃO’ PROFISSIONAL DOS IMIGRANTES HAITIANOS NA REDE HOTELEIRA DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ (SC)
à escassez de mão de obra, buscam esses imigrantes e lhes ajudam a
regularizarem a situação (THOMÉ; DIOGO, 2014). De acordo com a
repórter Duarte (2015), a cidade de Palhoça está se adaptando à migração
e já oferece cursos de língua portuguesa na Faculdade Municipal. Estima-
se que vivam aproximadamente cinco mil haitianos no Estado de Santa
Catarina (MUNDO, 2015). Conforme os escritores Thomé e Diogo (2014)
as cidades mais escolhidas pelos imigrantes que chegam em Santa
Catarina são: Balneário Camboriú, Itajaí e Navegantes.
Segundo informações do site Portal Brasil (2015), o governo
acelerou a emissão de vistos a 43.781 mil imigrantes haitianos, por meio
do Conselho Nacional de Imigração (CNIg); garantindo a autorização de
residência permanente no Brasil, com o direito à carteira de identidade
de estrangeiro para trabalharem regularmente e utilizarem serviços
públicos, entretanto, estes não significam a concessão de nacionalidade
brasileira.
Após quatro anos e um grande índice de haitianos ter entrado
pelas fronteiras brasileiras, tanto de forma legal quanto ilegal, os mesmos
estão se mostrando desencantados com a vida no Brasil (EVANS, 2015).
Segundo a jornalista Gabriela Bazzo (2016), o Ministério da Justiça
informou que está liberando a emissão de mais vistos e vem colocando
em prática projetos de integração entre os Estados e os municípios
brasileiros para os haitianos e outros imigrantes.
A legislação brasileira em relação à imigração é desatualizada e não
é clara em alguns aspectos, vez que a mesma foi elaborada em 1980, época
do regime militar, e a sua última atualização ocorreu em 1997, garantindo
34
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO: Relatos de imigrantes haitianos na região do Litoral Norte de Santa Catarina
a qualquer indivíduo a oportunidade de solicitar asilo no Brasil devido às
perseguições políticas ou fugindo de guerra civil. Contudo, é necessário
que o país desenvolva novas leis de caráter humanitário (ZYLBERKAN,
2014).
Com o intuito de fugir da crise brasileira, segundo Sant’anna e
Prado (2016), os haitianos estão alterando a sua rota e indo para o Chile;
ou seja, estão fazendo o caminho reverso, com o objetivo de conseguirem
trabalho, vez que a taxa de desemprego no Chile está em torno de 5,9%,
enquanto no Brasil dados informam que está cerca de 10,2%. Frente ao
exposto, entre janeiro e abril de 2016, saíram do Brasil cerca de 3.234
haitianos.
No Brasil, residem cerca de 45 mil haitianos e no Chile
aproximadamente 9 mil, entretanto, a saída desses imigrantes do Brasil e
a busca por contatos para residirem no Chile vem aumentando cada vez
mais (NOTÍCIA, 2016). Para que o imigrante entre no Chile, é necessário
que algum empregador ou empresa o convide e pague o seu bilhete de
passagem, além disso o imigrante que for desligado da empresa possui
um prazo de 30 dias para encontrar outro emprego, caso isso não ocorra a
sua residência no país é considerada ilegal (SANT’ANNA; PRADO, 2016).
Entretanto, mesmo assim estima-se que residam em Santa Catarina
cerca de 6.000 haitianos (BAZZO, 2016). Segundo informações do site do
Governo de Santa Catarina (2016) foram emitidas nos primeiros meses
de 2015 o total de 2.259 carteiras de trabalho para imigrantes haitianos,
enquanto em 2014 foram 986.
35
A ‘INCLUSÃO’ PROFISSIONAL DOS IMIGRANTES HAITIANOS NA REDE HOTELEIRA DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ (SC)
▯ ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS RESULTADOS
Nesta seção, são explorados os dados coletados durante as
entrevistas aplicadas a 22 indivíduos que já trabalharam ou trabalham no
segmento hoteleiro. As entrevistas continham sete perguntas no roteiro
de entrevista com imigrantes haitianos, seis perguntas no roteiro para
funcionários brasileiros e 6 com dois responsáveis pelo departamento
de Gestão de Pessoas. Os dados foram coletados durante o período de
agosto a outubro de 2016, no município de Balneário Camboriú (SC).
A análise de dados consiste em averiguar os resultados e interpretar
essas informações, por meio de um diagnóstico; enquanto a interpretação
de dados, de acordo com Gil (2010), compreende-se em utilizar os dados
coletados e equipará-los com os elementos já conhecidos. Além do mais,
ambos processos podem estar ligados em um método de análise, no qual
o explorador, depois de analisar e interpretar as informações coletadas,
constata se a hipótese projetada é autêntica ou não.
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RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO: Relatos de imigrantes haitianos na região do Litoral Norte de Santa Catarina
▯ IDENTIFICAÇÃO JUNTO AO DEPARTAMENTO DE GESTÃO DE PESSOAS DAS PRINCIPAIS DIFICULDADES NOS PROCESSOS DE ADMISSÃO E INTEGRAÇÃO DOS IMIGRANTES HAITIANOS
Nesta divisão, serão apresentadas as informações coletadas
por meio de uma entrevista com seis questões, realizada com dois
funcionários do departamento de Gestão de Pessoas que trabalham em
hotéis localizados no município de Balneário Camboriú (SC). A primeira
pergunta levantou a questão das denúncias feitas em 2015 que acusam
hotéis de Balneário Camboriú de maus-tratos contra haitianos, nos quais
os responsáveis pelo setor de Gestão de Pessoas responderam o porquê
acreditam que situações como esta aconteceram.
E1: Penso que o principal motivo seria a xenofobia;
apesar de trabalharmos em um hotel voltado ao
público turista, sinto que quando contratamos
haitianos e outros estrangeiros alguns funcionários
apresentaram dificuldades em se relacionar com
eles, uma certa antipatia.
E2: Apesar de estarmos em pleno século XXI, ainda
acredito que o preconceito é constante em nosso
país.
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A ‘INCLUSÃO’ PROFISSIONAL DOS IMIGRANTES HAITIANOS NA REDE HOTELEIRA DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ (SC)
Conforme os dados coletados, nota-se que os entrevistados
possuem uma opinião formada sobre a questão abordada, sendo que
o primeiro entrevistado pensa que o principal motivo é a xenofobia
e já percebeu a reação de antipatia de funcionários brasileiros com
contratados estrangeiros. Enquanto o entrevistado 2 informa que o
principal motivo pelas reações de maus tratos é o preconceito.
Diante de possíveis atos xenofóbicos, maus tratos, discriminação e
preconceito, segundo Santini (2014), é necessário que o Brasil reformule
as leis para que esses imigrantes tenham suporte ao realizarem denúncias.
É importante observar que as principais dificuldades na admissão e na
integração dos haitianos, segundo os dois entrevistados, são as seguintes:
E1: Idioma e a documentação. E2: Idioma e realizar a adaptação.
Nota-se que ambos informam que o idioma é um obstáculo na
admissão e integração. A entrevistada 1 também acredita que a burocracia
dificulta esses processos e o entrevistado 2 possui dificuldades em
realizar a adaptação.
Frente ao exposto, segundo Vale (2015), o idioma é a principal
barreira na comunicação; além da linguagem, as empresas também
possuem dificuldades com a burocracia para contratação dos haitianos.
38
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO: Relatos de imigrantes haitianos na região do Litoral Norte de Santa Catarina
O governo criou diversas classificações para esses imigrantes, por meio
das quais são classificados como: refugiado, migrante e apátrida. Essas
catalogações acabam gerando complicações no entendimento dos
haitianos e das empresas em relação a quais documentos são necessários
para que o haitiano seja contratado.
A terceira questão buscou saber qual o papel do departamento de
Gestão de Pessoas no processo de inclusão de contratados haitianos.
E1: É indispensável. O nosso departamento tem
como missão fazer a inclusão do melhor modo
possível não somente com haitianos, mas também
com todos os funcionários.
E2: O setor de Recursos Humanos é necessário para uma boa inclusão profissional, sem este
departamento os funcionários ficariam sem
suporte.
Ambos os entrevistados descreveram a importância do
departamento de Gestão de Pessoas sendo que o primeiro entrevistado
salienta que o setor é “indispensável”, pois busca adaptar os contratados
da melhor maneira possível; enquanto o entrevistado 2 informa que esse
setor é necessário, pois são eles que dão suporte aos funcionários. A isso
entende-se que o departamento de Gestão de Pessoas é responsável por
gerenciar outros indivíduos, independentemente de seu setor, função
39
A ‘INCLUSÃO’ PROFISSIONAL DOS IMIGRANTES HAITIANOS NA REDE HOTELEIRA DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ (SC)
ou cargo (BANOV, 2011).
Na questão 4 buscou-se averiguar se os entrevistados já receberam
alguma denúncia por parte dos contratados haitianos de maus tratos e
que providências tomaram.
E1: Não, nunca.
E2: Não.
É fundamental ressaltar que nenhum dos entrevistados recebeu
denúncias de maus tratos nos hotéis em que trabalham. Entende-se,
deste modo, que mesmo que não tenham recebido nenhuma denúncia
é preciso ter muita atenção, pois diversas foram feitas contra hotéis no
município de Balneário Camboriú, envolvendo maus tratos e racismo
(ALVES, 2015).
Constata-se na pergunta 5 que os entrevistados informaram que
providências tomariam ao receberem denúncias de maus tratos em seus
hotéis.
E1: Bom, nunca passei por isso, não saberia ao
certo como deveria reagir. Primeiramente iria
contatar o meu superior.
40
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO: Relatos de imigrantes haitianos na região do Litoral Norte de Santa Catarina
E2: É delicado este assunto, pois dependeria
muito do que aconteceu com este imigrante.
A primeira entrevistada informa que não saberia como lidar com a
situação, pois nunca passou por isso, enquanto o entrevistado 2 ressalta
que esta situação é delicada e que basearia as suas ações de acordo com
o que ocorreu com o contratado haitiano. Percebe-se que ambos nunca
passaram por esta situação e devido a este motivo possuem dificuldade
para analisar as providências que tomariam ao receber acusações de
maus tratos.
Na última pergunta, foi verificado se os entrevistados acreditam
possuir todas as ferramentas necessárias para realizar uma inclusão
profissional de imigrantes haitianos.
E1: Não, tenho dificuldade em me comunicar e
principalmente de explicar os direitos deles e as
leis trabalhistas.
E2: Apesar das dificuldades que mencionei,
acredito que podemos realizar uma boa integração,
porém precisamos ter muita atenção à reação dos
outros funcionários.
A entrevistada 1 acredita não possuir, pois tem dificuldades com
o idioma e na explicação das leis trabalhistas; entretanto o entrevistado
2 possui as ferramentas necessárias para realizar a integração, porém
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A ‘INCLUSÃO’ PROFISSIONAL DOS IMIGRANTES HAITIANOS NA REDE HOTELEIRA DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ (SC)
precisa ter atenção aos outros funcionários durante o processo de
adaptação deste imigrante.
Nota-se novamente que a questão do idioma e as dificuldades
com as leis trabalhistas são citadas. Também se constata a importância
em dar atenção às reações dos outros funcionários na contratação de
imigrantes haitianos, evitando assim qualquer ato discriminatório. De
acordo com Schermerhorn Júnior (2014), a discriminação ocorre quando
um indivíduo sofre rejeição por justificativas incompatíveis à função que
exerce.
▯ CASOS RELATADOS POR IMIGRANTES HAITIANOS EM RELAÇÃO AO PROCESSO DE INTEGRAÇÃO EM HOTÉIS
Nesta seção, estão apresentadas as informações coletadas
por meio de uma entrevista com sete questões, realizada com dez
imigrantes haitianos em Balneário Camboriú (SC). A primeira pergunta
teve como objetivo identificar se o departamento de Gestão de Pessoas
da referida empresa em que trabalham ou trabalharam desenvolveu
algum procedimento de inclusão profissional. Algumas respostas estão
destacadas a seguir.
E2: Sim. Entregaram o manual do colaborador e
42
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO: Relatos de imigrantes haitianos na região do Litoral Norte de Santa Catarina
conheci os funcionários e os setores.E3: Sim, fui bem recebida.E4: Sim, recebi o manual do colaborador e
conheci todos os funcionários.
E5: Sim, conheci a empresa.
E6: Sim.
E7: Sim.
E10: Sim, tivemos algumas atividades em grupo.
De acordo com a pesquisa, sete imigrantes haitianos entrevistados
relataram terem passado pelo processo de inclusão profissional
na empresa. Destaca-se que os entrevistados E2 e E4 receberam o
manual de colaborador e foram apresentados aos funcionários. Ainda
os entrevistados E2 e E5 também visitaram a empresa durante a
incorporação. O entrevistado E10 ressaltou que participou de algumas
atividades em grupo durante o processo de integração e o funcionário E3
apontou que foi bem recebido no hotel.
Entende-se que o departamento de Gestão de Pessoas possui
diversas funções, dentre elas: motivar, contratar, ensinar e, por meio de
técnicas, desenvolver o capital humano dentro da empresa (MAXIMIANO,
2012). Durante o processo de integração, o novo funcionário receberá
informações sobre a cultura da empresa, as metas, a missão, a visão,
os valores, os princípios, as regras, e todas as informações necessárias
da organização. Além do mais, também será comunicado sobre os dias
de folgas, função a desempenhar, quais são os seus superiores ou/e
subordinados, horário de trabalho e intervalo (LACOMBE, 2011).
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A ‘INCLUSÃO’ PROFISSIONAL DOS IMIGRANTES HAITIANOS NA REDE HOTELEIRA DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ (SC)
À vista disso, o processo de integração tem como objetivo fazer
com que o recém-chegado se familiarize com os outros contratados, suas
funções e em geral com a organização (PEREIRA, 2014).
Todavia, nesta primeira pergunta observa-se que dois imigrantes
informaram não terem passado por nenhum procedimento de inclusão
na sua admissão, conforme os relatos que seguem:
E1: Não, mas me levaram para conhecer os setores e as minhas funções.E8: Não, apenas me levaram na cozinha e me
apresentaram o chef de cozinha, e comecei a
trabalhar.
Frente o exposto, verifica-se que os entrevistados E1 e E8
responderam que não passaram por um processo de integração antes de
iniciarem suas funções. O E1 revelou que apenas conheceu os setores e as
funções do seu cargo. Já E8 tão-somente foi levado para o departamento
que foi contratado, que no caso foi a cozinha, e apresentado ao seu
superior sem conhecer os demais integrantes da equipe e do hotel.
É necessário que ocorra uma integração com o recém-contratado
na empresa, pois segundo Schermerhorn Júnior (2014) a inclusão é o
meio do novo empregado criar ligações com os outros funcionários e de
permitir que esse novo contratado conheça as suas funções. Entretanto,
para que isso ocorra é preciso que o gestor administre atividades de
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RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO: Relatos de imigrantes haitianos na região do Litoral Norte de Santa Catarina
Gestão de Pessoas e desenvolva ações que permitam que cada empregado
desempenhe a função correta, conforme o seu conhecimento e o seu
perfil (LACOMBE, 2011). Apenas quando os funcionários forem tratados
como prioridade pelo administrador, será desenvolvida uma vantagem
competitiva perante à concorrência; ou seja, somente quando os
funcionários passarem por uma inclusão e serem alocados em funções
que condizem com o seu perfil a organização terá uma vantagem. Para
que isso ocorra, é necessário que o departamento de gestão estratégica de
recursos humanos desenvolva um planejamento estratégico para melhor
desempenho do capital humano (SCHERMERHORN JÚNIOR, 2014).
Ademais, ressalta-se que um dos entrevistados não soube
responder esta questão, conforme destacado no depoimento que segue.
E9: Não me lembro direito como foi, porque faz
muito tempo. Comecei a trabalhar em 2013 no hotel
e estou até hoje.
Destaca-se que o entrevistado E9 trabalha há aproximadamente
quatro anos no hotel em que ainda atua e, devido ao tempo, não se lembra
se passou ou não por algum processo de inclusão.
Assim, entende-se que independente do funcionário lembrar ou
não do processo de adaptação, segundo Lacombe (2011), é necessário que
os gestores estejam atentos à socialização desse contratado perante aos
colegas de trabalho, superiores e/ou subordinados, e a também, postura
45
A ‘INCLUSÃO’ PROFISSIONAL DOS IMIGRANTES HAITIANOS NA REDE HOTELEIRA DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ (SC)
do funcionário diante da cultura da organização.
Nas segunda e terceira questões, os entrevistados responderam se
já sofreram no ambiente de trabalho as seguintes práticas: discriminação,
racismo, atos xenofóbicos ou outros tipos de agressões e, caso a resposta
fosse positiva, indagou-se qual foi a postura tomada perante aos atos. Os
relatos que seguem apresentam um retrato dos resultados dessa questão.
E1: Sim, trabalhei na limpeza e tinha uma
funcionária que fazia piadas sobre o meu cabelo.
E1: Nada, precisava do emprego.
E3: Sim. Uma funcionária disse que eu deveria
voltar para o Haiti.E3: Fui na Associação e resolveram com o hotel,
me pediram desculpas e não aconteceu mais.
E4: Sim, de algumas camareiras que não ficavam perto de mim.E4: Não fiz nada.
E5: Sim, faziam algumas piadas sobre vir do Haiti, falava que eu deveria aproveitar aqui, porque
lá eu passava fome, essas coisas.
E5: Procurei o RH e informei.
E6: Sim, uma funcionária sempre esbarrava
quando passava por mim e ficava rindo.
E6: Nada, tive medo que piorasse.
E10: Sim, recebi de hóspedes. Alguns não cumprimentavam ou nem me olhavam.
46
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO: Relatos de imigrantes haitianos na região do Litoral Norte de Santa Catarina
E10: Não fiz nada.
Frente ao exposto, nota-se que seis dos funcionários entrevistados
sofreram algum tipo de preconceito durante o expediente na hotelaria.
A E1 ressalta que tolerou discriminação de uma funcionária que fazia
indelicadamente comentários sobre o seu cabelo; no entanto, a mesma
não tomou nenhuma providência, pois precisava do emprego. Por sua
vez a E3 sofreu um ato xenofóbico, quando uma funcionária disse que a
mesma deveria voltar ao seu país de origem: o Haiti. A imigrante então
procurou a Associação dos Haitianos de Balneário Camboriú, que entrou
em contato com o hotel e que ao saber do ocorrido pediu, juntamente
com a funcionária que a constrangeu, desculpas à imigrante haitiana.
Após o pedido de desculpas o incidente não mais ocorreu.
Constata-se também que a E4 passou por atos de discriminação,
sendo que as camareiras não se aproximavam dela. Porém não teve
nenhuma atitude em relação a essa situação. Entretanto, a funcionária
E5 - assim como a E3 - também relata ter passado por atos xenofóbicos
que consistiam em comentários indevidos sobre o país em que nasceu
e opiniões constrangedoras, como aproveitar a comida que tinha, pois
passava fome no Haiti. A atitude da funcionária estrangeira ao passar
por essa situação foi procurar o departamento de Gestão de Pessoas. Vale
destacar que apenas a E5 dos E6 entrevistados, que revelam ter sofrido
preconceito no ambiente de trabalho, procurou o departamento de
Gestão de Pessoas da referida empresa.
Observa-se também que somente a E6 sofreu agressão, porém
47
A ‘INCLUSÃO’ PROFISSIONAL DOS IMIGRANTES HAITIANOS NA REDE HOTELEIRA DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ (SC)
devido ao medo que a situação piorasse, não denunciou ao seu superior.
Relata a vítima que ao ficar próxima à uma colega de trabalho esta
esbarrava nela propositalmente e ria do ato. Em contrapartida, a E10 não
tomou nenhuma atitude, mesmo percebendo que foi discriminada por
alguns hóspedes que não lhe olhavam e nem sequer a cumprimentavam.
Observa-se que dos seis funcionários haitianos que passaram pelas
experiências negativas citadas acima, apenas E10 sofreu discriminação
dos hóspedes, enquanto os outros relataram preconceito ou agressão por
parte dos próprios funcionários do hotel em que atuavam.
De acordo com Spector (2010), o Brasil possui diversas leis que
mencionam que é ilegal praticar atos de discriminação em relação à raça,
cor, idade, sexo e deficiência. Entretanto, alguns funcionários sentem-
se prejudicados com a chegada de outros empregados, pois acreditam
que os mesmos são obstáculos, agindo de maneira inadequada perante
os novos contratados, inclusive praticando retaliações. Desta forma,
percebe-se que os grupos em uma empresa são formados por vínculos
externos, como: naturalidade, etnia, doutrina, idioma e cultura, no qual
é definido por meio desses traços quem irá ou não participar da equipe
(BARBIERI, 2016). Segundo Lacombe (2011), um programa de integração
aperfeiçoado pode minimizar as ocorrências de desavenças, acelerando o
processo de adaptação e socialização, diminuindo a taxa de rotatividade.
Apesar da maioria dos imigrantes ter sofrido preconceito de
funcionários brasileiros e também de hóspedes em alguns hotéis,
foi identificado que os funcionários haitianos não passaram por
situações semelhantes, conforme se confirma nos comentários abaixo
48
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO: Relatos de imigrantes haitianos na região do Litoral Norte de Santa Catarina
relacionados.
E2: Não, nunca.
E2: Não sofri nenhuma no hotel.
E7: Nenhuma.
E7: Nenhuma, pois não sofri.
E8: Não na minha frente, mas sentia que algumas
das auxiliares de cozinha e garçonetes falavam algo
sobre mim.
E8: Nenhuma.
E9: Não, nunca sofri.
E9: Nada, pois não sofri.
Frente o exposto, verifica-se que os entrevistados E2, E7, E8 e E9 não
sofreram nenhum ato intolerante no ambiente de trabalho, enquanto o
E8 afirmou que mesmo não tendo passado por essa experiência, percebia
que as auxiliares de cozinha e as garçonetes faziam comentários a seu
respeito.
Diante desta questão, observa-se que seis dos entrevistados
sofreram alguma retaliação no ambiente de trabalho, enquanto quatro
foram poupados. Por meio desses dados, nota-se a importância da
existência de um departamento de Gestão de Pessoas bem estruturado
em uma empresa, pois segundo Maximiano (2012) este deve desenvolver
meios para que os funcionários trabalhem em uma empresa com
o ambiente agradável. Afinal de contas, um departamento bem
49
A ‘INCLUSÃO’ PROFISSIONAL DOS IMIGRANTES HAITIANOS NA REDE HOTELEIRA DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ (SC)
planejamento e o bom gerenciamento do capital humano resultará em
um diferencial competitivo para a organização (PEREIRA, 2014).
Por meio da questão quatro, buscou-se saber se os funcionários
haitianos que atuam na rede hoteleira de Balneário Camboriú já passaram
por alguma situação de trabalho escravo. Os relatos abaixo confirmam
esta realidade.
E1: Sim eu e mais uma amiga nesse hotel que
eu trabalhava quando cheguei aqui. Quase não tínhamos horário para comer e me tratavam mal.E4: Sim, trabalhava depois que batia o ponto.E8: Sim, sempre trabalhava mais que as outras na cozinha, enquanto eu estava limpando elas
ficavam no celular ou sentadas no refeitório.
E10: Só uma vez, quando a governanta me fez
limpar mais de 30 apartamentos. Mas depois nunca
mais aconteceu.
Identificou-se que quatro dos dez entrevistados passaram por
experiência de trabalho escravo. Destaca-se a entrevistada E1 que revela
ter sofrido juntamente com uma colega de trabalho com o abuso da
empresa que não respeitava o horário exato obrigatório para repouso
ou alimentação e, desta forma, eram menosprezadas. Ademais, verifica-
50
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO: Relatos de imigrantes haitianos na região do Litoral Norte de Santa Catarina
se que a E4 continuava exercendo as suas funções mesmo após ter
encerrado o expediente ao bater o ponto, neste caso as horas extras não
eram computadas e a funcionária haitiana não recebia pelo trabalho
extra.
Verifica-se também que a E8 se sentia em condição de inferioridade,
pois trabalhava mais que as funcionárias do seu setor. Enquanto estava
limpando a cozinha, as outras contratadas estavam no celular ou no
refeitório. Vale enfatizar que uma das entrevistadas (E10) informou que
passou somente uma vez pela situação, onde teve que fazer a limpeza de
mais de trinta apartamentos.
Frente ao exposto, nota-se que as denúncias de Alves (2015) são
verídicas, pois pelo questionamento verificou-se que trabalhadores
haitianos sofreram maus tratos nos hotéis do município de Balneário
Camboriú (SC). De acordo com Spector (2010), alguns superiores usam a
sua posição para maltratar e menosprezar os funcionários haitianos, por
meio do assédio étnico.
Esses imigrantes, além de sofrerem maus tratos psicológicos e
racismo, conforme observado (principalmente na segunda e terceira
questão da entrevista), são vítimas de trabalho escravo. Em muitos
casos desconhecem a legislação trabalhista, na qual por vezes possuem
uma carga excessiva de trabalho, sem o horário de descanso adequado,
bem como não recebem o pagamento das horas extras que fizeram
(ALVES, 2015). Diante disso, segundo França (2012), alguns discursos
institucionais de valorização de capital humano estão sendo substituídos
por diversas formas de abusos de poder hierárquico.
51
A ‘INCLUSÃO’ PROFISSIONAL DOS IMIGRANTES HAITIANOS NA REDE HOTELEIRA DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ (SC)
Enquanto quatro dos entrevistaram informaram terem passado
por trabalho escravo, seis imigrantes haitianos alegaram que não
passaram pelas mesmas experiências ilegais, conforme destacado nos
relatos a seguir.
E2: Não passei.
E3: Não.
E5: Não, nunca passei por nenhuma situação
parecida.
E6: Não.
E7: Não.
E9: Não, nunca passei ou presenciei algum
trabalho escravo contra haitianos no hotel.
Observa-se que os entrevistados E2, E3, E5, E6, E7 e E9 declararam
não terem sofrido com o trabalho escravo. Ademais, destaca-se o
entrevistado E9 que informou que além de não passar por qualquer
experiência também diz que não presenciou nenhum trabalho escravo
contra haitianos no segmento hoteleiro.
Apesar de seis dos dez entrevistados não terem sofrido maus tratos,
quatro deles foram vítimas e esse índice é preocupante. Em vista disso,
para que os imigrantes não sofram atos intoleráveis de racismo e práticas
xenofóbicas, é preciso que o Brasil defina leis nítidas que protejam esses
imigrantes perante as retaliações que possam vir a sofrer no ambiente de
trabalho e fora dele (SANTINI, 2014).
52
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO: Relatos de imigrantes haitianos na região do Litoral Norte de Santa Catarina
A pergunta cinco tem como objetivo averiguar se os imigrantes
sentiram alguma resistência dos funcionários brasileiros ao serem
contratados nos hotéis. Os relatos a seguir confirmam a percepção de
certa resistência por parte dos emigrantes.
E1: Sim.
E3: De algumas pessoas.
E4: Sim.
E5: Sim, muita.
E6: Sim, inclusive de hóspedes.
E8: Sim, dos funcionários do meu setor de cozinha. Porém fiz amizades com as camareiras.
Observa-se que seis dos entrevistados relataram acreditar que
houve resistências durante a admissão dentre os quais destacam-se os
entrevistados E6 e E8. A E6 revelou que sentiu resistência inclusive de
hóspedes e o E8 do setor em que exercia as suas funções, porém criou
laços de amizades com funcionárias de outro setor, o da governança.
Entretanto se comparado a outros países, no Brasil somente 0,5%
dos imigrantes estão trabalhando no mercado formal de trabalho (PORTAL
BRASIL, 2015). Em vista disso, a empresa precisa amparar e auxiliar
esses novos contratados da melhor maneira possível (SCHERMERHORN
JÚNIOR, 2014).
Contudo, destaca-se também que quatro imigrantes haitianos, ao
53
A ‘INCLUSÃO’ PROFISSIONAL DOS IMIGRANTES HAITIANOS NA REDE HOTELEIRA DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ (SC)
serem contratados, não sentiram resistência no ambiente de trabalho.
E2: Não, mas tem pessoas que não falam comigo.
E7: Não.
E9: Não.
E10: Não.
Frente ao exposto, verifica-se que os entrevistados E2, E7, E9 e
E10 não passaram por oposição devido às suas origens. Vale frisar que
E2 informa que não sofreu resistência, porém ainda tem pessoas em
seu ambiente de trabalham que não conversam com a mesma. A isso,
entende-se que mesmo com apenas quatro dos entrevistados não terem
sofrido resistência, é necessário que o departamento de Gestão de
Pessoas observe de perto a adaptação dos novos funcionários haitianos
(LACOMBE, 2011).
A sexta questão teve como objetivo ver quais as providencias que
os imigrantes acreditam que deveriam ser tomadas pelo departamento
de Gestão de Pessoas com os empregados que praticam discriminação,
racismo, atos xenofóbicos ou outros tipos de agressões contra haitianos.
Abaixo citam-se algumas das respostas obtidas a essa indagação.
54
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO: Relatos de imigrantes haitianos na região do Litoral Norte de Santa Catarina
E1: Não sei; chamar a polícia.
E2: Demitir.
E3: Demissão.
E4: Denúncia à polícia e demitir.
E5: Demissão.
E6: Demissão.
E7: Denunciar e demitir.
E8: Conversar e, se não adiantar, mandar embora.
Viemos apenas para trabalhar e ter uma vida digna. E9: Demissão e denunciar.
E10: Demissão.
Verifica-se que a maioria dos entrevistados haitianos acredita
que a demissão é a melhor opção. Contudo, o E1 não soube opinar,
apenas julga necessário que a polícia seja acionada. Em contrapartida
os entrevistados E4, E7 e E9 pensam que além da demissão é necessário
que o departamento de Gestão de Pessoas acione os órgãos competentes
e denuncie o ocorrido. Já o entrevistado E8, pensa ser necessário
primeiramente uma conversa e, caso não surta efeitos, que ocorra a
demissão, pois estão em busca de trabalho e uma ‘vida digna’.
Compreende-se que antigamente a prática de discriminação era
considerada normal em relação às minorias étnicas, todavia hoje em dia
é considerada ilegal (SPECTOR, 2010). Entretanto, segundo denúncias de
Alves (2015), os imigrantes haitianos estão sendo explorados em hotéis
em Balneário Camboriú.
Em vista disso, o Sindicato dos Empregados com Hoteleiro e
55
A ‘INCLUSÃO’ PROFISSIONAL DOS IMIGRANTES HAITIANOS NA REDE HOTELEIRA DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ (SC)
Similares de Balneário Camboriú (SC) entrou com uma ação contra um
dos hotéis acusados de maus tratos e obteve vitória, sendo que este hotel
teve que assinar um Termo de Ajustamento de Conduta, e caso praticasse
alguma infração estaria sujeito à multa. Além disso, o Sindicato passou a
oferecer aulas de noções sobre leis trabalhistas aos haitianos, para que
os mesmos tenham consciência de seus direitos e de como devem agir ao
serem alvos de discriminação. Este projeto iniciou devido às decorrentes
denúncias de imigrantes haitianos relatando terem sofrido em hotéis
assédio moral, não pagamento das horas extras e salário e maus tratos
(SECHOBAR, 2016). É necessário um bom planejamento no processo de
integração, pois segundo Santini (2014), esse procedimento é uma ação
extensa e demorada, entretanto, necessária.
Por meio da sétima questão, os entrevistados tiveram que
responder quais seriam os melhores procedimentos que o departamento
de Gestão de Pessoas de um hotel deveria ter na inclusão profissional de
haitianos. A seguir, listam-se suas opiniões frente a este questionamento.
E1: Não sei.
E2: Mais programas de treinamento.
E3: Mostrar a nossa história e que não estamos
aqui para roubar o emprego de ninguém.
E4: Não sei.
E5: Queria poder apresentar a nossa cultura, algo
do tipo.
E6: Mais brincadeiras de integração.
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RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO: Relatos de imigrantes haitianos na região do Litoral Norte de Santa Catarina
E7: Não sei, talvez festas de confraternização e treinamento. E8: Não sei, gostaria que tivessem me apresentado aos outros funcionários e conhecido todo hotel.
Apenas conheci a cozinha e áreas de funcionários.
E9: Treinamento, fui contratada para camareira
e não tinha noção de como era trabalhar em
hotel. Apenas trabalhava limpando casas. Com o
tempo conheci as outras funções e consegui ser
promovida a garçonete.
E10: Não sei como deve ser uma inclusão.
Diante dos dados obtidos por meio das entrevistas, percebe-se que
os entrevistados E1, E4 e E10 não conseguem opinar sobre o que deveria
ser feito para uma melhor inclusão de haitianos na hotelaria, entretanto
os entrevistados E7 e E8, apesar de inicialmente informarem também não
saber, fizeram algumas sugestões. O E7, assim como o E2, acredita que
deveria haver mais programas de treinamento. Além disso, o entrevistado
E7 frisa que festas de confraternização poderiam auxiliar na inclusão. Já o
E8 gostaria, durante a integração, os funcionários conhecessem o hotel,
pois o mesmo não teve essa oportunidade e apenas conhece o seu setor
e áreas dos empregados.
Verifica-se que novamente a questão do treinamento é citada para
uma melhor inclusão, sendo que o entrevistado E9 ressalta que ao ser
contratado como camareira não tinha nenhuma noção de como seria
trabalhar em hotel, sendo assim também não tinha conhecimento de
qual postura deveria ter. E mesmo não conhecendo as outras funções
57
A ‘INCLUSÃO’ PROFISSIONAL DOS IMIGRANTES HAITIANOS NA REDE HOTELEIRA DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ (SC)
e não tendo o treinamento adequado, conheceu os outros cargos e foi
promovida à garçonete. Além disso, E6 julga crucial que tenham mais
‘brincadeiras’ de integração durante a adaptação do funcionário haitiano.
A entrevistada E3 gostaria de ter uma oportunidade durante a
inclusão de contar a sua história de vida e passar a mensagem para os
brasileiros de que não quer roubar o emprego de ninguém, apenas quer
trabalhar. Seguindo este pensamento de contar a história, a E5 queria ter
oportunidades para mostrar e contar aos brasileiros a cultura haitiana,
de modo que se evitasse o preconceito.
Frente ao exposto, compreende-se que nos últimos anos muitos
haitianos buscaram abrigo no Brasil em busca de uma vida melhor,
contudo acabaram se deparando com uma infraestrutura para dar
suporte a eles, principalmente para uma inclusão social apropriada
(RIZZO; MOTTA; PÁDUA, 2014). Diante do grande índice de imigração o
Brasil emitiu de maneira descontrolada vistos humanitários, dificultando
ainda mais o processo de imigração (SANTINI, 2014). Apesar disso,
se faz necessário uma maior atenção do departamento de Gestão de
Pessoas ao contratarem imigrantes haitianos, pois de acordo com Vale
(2015), o idioma é considerado o principal obstáculo na integração
desses imigrantes no Brasil. Cerca de 16,8% dos imigrantes afirmam esta
informação e reforçam a dificuldade de se comunicarem em instituições
públicas. Em vista disso, o Sindicato dos Empregados com Hoteleiro e
Similares de Balneário Camboriú disponibiliza aulas de português para
haitianos que trabalham em hotéis no município.
Ainda, para que haja uma melhor integração, de acordo com
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RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO: Relatos de imigrantes haitianos na região do Litoral Norte de Santa Catarina
Lacombe (2011), a empresa pode promover longos períodos de
treinamentos de integração, todavia o departamento de Gestão de
Pessoas deve primeiramente avaliar o programa de integração de acordo
com cada perfil contratado.
▯ CONCEPÇÃO DOS FUNCIONÁRIOS BRASILEIROS EM RELAÇÃO À CONTRATAÇÃO DE HAITIANOS
Nesta seção, reúnem-se os dados obtidos por meio de entrevista
dirigida a dez funcionários hoteleiros do município de Balneário
Camboriú (SC), de nacionalidade brasileira. Por questões éticas, tanto os
nomes dos entrevistados quanto seus respectivos locais de trabalho são
mantidos no anonimato. Tal entrevista é composta por seis perguntas,
sendo que com a primeira delas buscou-se identificar o que pensam
sobre a imigração de haitianos no município. Nesta questão registrou-se
os seguintes posicionamentos favoráveis.
E1: Acredito que é muito válido, pois estão
buscando melhores condições, assim como
muitos brasileiros buscam condições melhores em
outros países. Vivemos em um mundo com muitas
“barreiras imaginárias” e eu acredito que devemos
cada vez mais derrubar este conceito.
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A ‘INCLUSÃO’ PROFISSIONAL DOS IMIGRANTES HAITIANOS NA REDE HOTELEIRA DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ (SC)
E4: Bom, pois são pessoas que buscam empregos
em qualquer área.
E6: Acredito que a imigração não somente em
Balneário Camboriú, mas também em todo litoral
tenha sido positiva, pois a nossa cidade estava
precisando de mão de obra em alguns setores
como: garçom e serviços gerais.E7: Acredito ser importante, precisamos recebê-
los corretamente e incluirmos em nossa sociedade.
Também é necessária uma maior abertura deles para aprenderem nossos hábitos e conseguirmos trabalharmos juntos, porque
temos necessidade de mão de obra comprometida
e qualificada.
Frente ao exposto, observa-se que dos dez entrevistados, apenas
quatro brasileiros manifestarem-se favoráveis a este movimento de
migração dos haitianos. Do E1 destaca-se a expressão ‘muito válido’,
no qual percebe-se o entendimento que se deve derrubar as barreiras
imaginárias para que todos sejam acolhidos, independentemente de
sua pátria de destino. Nesta perspectiva, percebe-se também que a
chegada dos haitianos veio suprir a falta de mão de obra em ocupações
do nível operacional, conforme se verifica nas considerações tanto
do Entrevistado 4 quanto do E6, os quais restringem a ocupação dos
haitianos a garçons e serviços gerais.
Verifica-se também que o Entrevistado 7, apesar de se manifestar
favorável a este movimento migratório, destaca que cabe aos haitianos
60
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO: Relatos de imigrantes haitianos na região do Litoral Norte de Santa Catarina
aprenderem os “nossos hábitos” para que o trabalho em equipe seja
possível.
A isso entende-se que a maioria das oportunidades são para mão de
obra não especializada. Somente no Brasil, de acordo estudos, até 2030 a
escassez de mão de obra chegará a 40,9 milhões de funcionários. Apesar
de estarmos precisando de mão-de-obra muitos brasileiros julgam que
os imigrantes são um problema, pois acreditam que estão roubando-lhes
empregos (SILVA, 2015).
Em contrapartida, quatro funcionários não se mostraram
satisfeitos com a migração de haitianos no município, conforme se
verifica nos diálogos a seguir destacados.
E2: Não acho nem um pouco legal, além de pegar nossos empregos e trazer doenças de fora
ficam incomodando nas ruas tentando vender bugigangas.E5: Acredito que seja ruim, pois a cidade já não
tem vagas suficientes para suprir a demanda de
desemprego dos moradores locais. Isto aumenta
ainda mais estes números, podendo causar a longo
prazo a criminalidade, por falta de recursos
para se manterem aqui.
E8: Desnecessária. O Brasil tem uma péssima
infraestrutura não tem o porquê ficar custeando
imigrantes, devem investir em escolas, creches e
hospitais para os brasileiros.
61
A ‘INCLUSÃO’ PROFISSIONAL DOS IMIGRANTES HAITIANOS NA REDE HOTELEIRA DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ (SC)
E9: Nos primeiros anos, quando começaram a
chegar, achava que seria bom, pois ouvia que eram
bons trabalhadores.
Nota-se que esses brasileiros demonstraram aversão à migração
dos haitianos. E2 frisa que os imigrantes estão tirando a oportunidade
dos brasileiros em relação ao emprego e que estão vindo ao nosso
país trazendo doenças e sendo inconvenientes. Esse pensamento
desfavorável aos haitianos em relação aos empregos também é citado por
E5, que ressalta que a migração é ruim, pois não há “vagas suficientes”
nem mesmo para os moradores locais; também reforça que devido a esse
motivo pode-se aumentar a criminalidade no município.
Os entrevistados E5 e E8 destacam que o país não tem recursos para
custear a imigração haitiana, ademais E8 evidencia que essa migração é
“desnecessária” e que o município deveria investir na infraestrutura, em
escolas, creches e hospitais, destacando que esses recursos deveriam ser
para “brasileiros”. Além disto, E9 somente foi favorável à imigração nos
primeiros anos, entretanto, ao longo do período se mostrou adverso.
Os haitianos vieram ao Brasil em busca de incentivo econômico, ou
seja, de uma vida melhor, entretanto estão sendo vítimas de comentários
xenofóbicos desde que desembarcaram no país. Para que esse cenário
mude é necessário que o Governo invista em reformas na imigração e
que os brasileiros compreendam a importância dos imigrantes para o
crescimento econômico do país (SILVA, 2015).
Observa-se também que alguns funcionários não possuíam uma
62
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO: Relatos de imigrantes haitianos na região do Litoral Norte de Santa Catarina
opinião concreta sobre este questionamento, conforme se verifica nas
respostas a seguir destacadas.
E3: Não sei opinar.
E10: É uma pergunta complicada, porque
quando percebi, a cidade já estava com muitos imigrantes, ou seja, acho que a cidade não foi preparada adequadamente para receber e entender as dificuldades dos haitianos.
Percebe-se que o entrevistado 10 ressalta que a “cidade não foi
preparada adequadamente” para recebê-los e devido a isto é difícil
responder ao questionamento.
O segundo questionamento tem como objetivo identificar
se os funcionários brasileiros praticaram discriminação, racismo,
atos xenofóbicos ou outros tipos de agressões contra os haitianos
especificamente no ambiente de trabalho. Nesta pergunta, alguns
entrevistados demostraram que não praticaram nenhum dos atos
mencionados anteriormente, conforme se verifica nos relatos a seguir
apresentados.
E1: Nunca. Nem no meu trabalho nem em nenhum
63
A ‘INCLUSÃO’ PROFISSIONAL DOS IMIGRANTES HAITIANOS NA REDE HOTELEIRA DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ (SC)
outro local.
E2: Não.
E3: Não, normalmente me dou bem com a equipe
em geral.
E4: Não.
E5: Não.
E7: Não, nunca pratiquei nenhum desses atos.
E8: Não, acho inadmissível qualquer tipo de ato descrito acima, contra qualquer ser humano,
independentemente da situação.
E9: Não.
E10: Nunca pratiquei, não tenho muito contato com o funcionário haitiano de nosso hotel.
O entrevistado 1 destacou que não praticou quaisquer dos atos
descritos acima no trabalho e em “nenhum outro local”. Seguindo essa
afirmação os entrevistados E7 e E9 também não praticaram, destacando-
se que o entrevistado 8 acredita esses atos são “inadmissíveis” contra
qualquer humano, independentemente da situação. Apesar de nove
dos entrevistados informarem não terem praticado nenhum ato de
discriminação, xenofobia, racismo ou alguma agressão, observa-se na
entrevista com os funcionários haitianos que seis deles declararam ter
passado por alguma das ações aqui mencionadas.
É fundamental ressaltar que somente um funcionário brasileiro ao
ser entrevistado assumiu ter praticado discriminação, conforme descrito
na resposta por ele dada, a saber:
64
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO: Relatos de imigrantes haitianos na região do Litoral Norte de Santa Catarina
E6: Inicialmente, quando os haitianos estavam
chegando em nossa cidade, acabei praticando
discriminação por acreditar que eles estavam
disputando empregos com os brasileiros, depois
repensei a minha opinião e percebi que tem espaço para todos.
Cada vez mais, segundo o Portal Brasil (2015), os imigrantes
haitianos estão tendo obstáculos para serem contratados, sendo alvos
de discriminação. Mesmo aqueles que dominam o português acabam
tendo dificuldade na adaptação em solo brasileiro, pois são vítimas de
preconceito (SCHREIBER, 2015). Entretanto, o Departamento de Gestão
de Pessoas deve sempre buscar criar um bom relacionamento entre
os seus funcionários e promover ações para diminuir os conflitos que
surgem no ambiente de trabalho (PEREIRA, 2014).
Na terceira pergunta, os funcionários foram questionados se
sofreram alguma punição pelo departamento de Gestão de Pessoas ao
praticarem algum ato ofensivo contra os haitianos.
E1: Nunca pratiquei.
E2: Não.
E3: Não.
E4: Não.
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A ‘INCLUSÃO’ PROFISSIONAL DOS IMIGRANTES HAITIANOS NA REDE HOTELEIRA DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ (SC)
E5: Não.
E6: Não, pois consegui reparar a injustiça que
tinha cometido antes de se agravar.
E7: Não.
E8: Qualquer ato desta natureza deve ser punido pelo departamento correspondente; além
da punição disciplinar deve ser feito um trabalho
voltado à educação, respeito e solidariedade com
nossos semelhantes.
E9: Não.
E10: Não.
Neste caso, para todos os funcionários a resposta foi não.
Salientando que o E6 havia assumido que praticou discriminação, mesmo
assim não recebeu nenhuma punição administrativa, pois conseguiu
reparar a “injustiça” cometida. Além disso, o entrevistado 8 aponta que
quaisquer um dos atos deve ter “punição” e que deveria existir uma
punição disciplinar voltada a trabalhos voluntários que envolvem os
imigrantes haitianos.
A isso entende-se que dos nove dos funcionários nenhum sofreu
punição, pois alegaram não terem praticado nenhuma ação desumana
contra os imigrantes, assim como o único que assumiu conseguiu reparar
a injustiça em tempo.
Na questão quatro, foi questionado o que os funcionários
brasileiros achavam de os imigrantes estarem sendo contratados no
segmento hoteleiro. A seguir são destacadas algumas das respostas.
66
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO: Relatos de imigrantes haitianos na região do Litoral Norte de Santa Catarina
E1: Acho normal a contratação, desde que não
seja para exploração dos mesmos. Como muitos
aceitam condições piores de trabalho e salários
menores, até mesmo por não falar o idioma,
algumas empresas acabam abusando neste
sentido.
E3: Acho importante que eles sejam contratados,
porém a dificuldade de comunicação com eles
acaba gerando pequenos conflitos e/ou dificuldades
no ambiente de trabalho. Acredito que para uma
inclusão completa, além da contratação devem
ser ofertados cursos de capacitação específicos para os colaboradores haitianos, uma vez que as
questões culturais são distintas e é importante que
eles aprendam não apenas o nosso idioma, mas
também o modo receptivo que o brasileiro tem,
principalmente na hotelaria, onde a receptividade
é fundamental.
E4: Fazem o trabalho que os brasileiros não
querem fazer...
E6: Isso é verdade, somente no hotel em que
trabalho temos dois imigrantes haitianos e são
muito trabalhadores. Essa inclusão é ótima.
E7: Tenho a visão, que por termos cultura diferentes,
nossos hábitos de limpeza são diferentes... estamos
tendo dificuldades de inclusão dessas pessoas
no mercado de trabalho. A dificuldade da língua
também é outro ponto difícil. Mas, podemos com
67
A ‘INCLUSÃO’ PROFISSIONAL DOS IMIGRANTES HAITIANOS NA REDE HOTELEIRA DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ (SC)
o tempo evoluir em termos haitianos qualificados
para as funções que necessitamos.
E8: Não só na hotelaria, mas em todos os
setores a qual eles se enquadram, conforme
suas experiências e conhecimentos. Acho
interessante, mas houve uma certa precipitação em querer ajudá-los sem capacitar a nossa
realidade hoteleira.
Diante dos questionamentos, seis entrevistados apoiaram a
contratação de haitianos em hotéis do município, sendo que o E1 enfatiza
que é a favor desde que não sofram “exploração” das empresas pelas
quais foram contratados.
Frente ao exposto, E3 afirma que os haitianos deveriam ter uma
inclusão completa ao serem contratados e acesso a cursos de capacitação
específicos visto que possuem um idioma e cultura distintos. Essa
questão de capacitação também foi destacada por E8, que acredita que
os haitianos foram contratados de modo precipitado, pois não tinham
conhecimento necessário; bem como confia que os haitianos devem ser
contratados conforme suas experiências e conhecimentos, quebrando
assim o estereótipo de que devem ocupar apenas funções em cargos
inferiores. A dificuldade no idioma também foi mencionada pelo E7,
que reforça que estão com problemas na adaptação dos imigrantes no
ambiente de trabalho, entretanto, acredita que com o tempo pode-se
qualificá-los para os cargos necessários.
Por sua vez, E4 demostrou-se favorável, pois acredita que os
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RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO: Relatos de imigrantes haitianos na região do Litoral Norte de Santa Catarina
imigrantes são necessários vez que são contratados para funções que
os brasileiros não querem exercer. Já E6 demonstrou-se satisfeito com o
trabalho dos haitianos, ressaltando que são “muito trabalhadores” e que
a “inclusão é ótima”.
Contudo, os maiores desafios na contratação de haitianos,
destacados nesta questão foi a “inclusão profissional” e o “idioma”.
A integração é fundamental para um bom processo na adaptação do
contratado na empresa, é preciso que o departamento pessoal faça
uma atividade com o recém-chegado para acalmá-lo, e em seguida, dê
andamento ao processo de integração (PEREIRA, 2014). De acordo com
Vale (2015), a língua portuguesa acaba se tornando uma barreira na busca
de empregos, confirmando assim o argumento apresentado por E7.
Entretanto, nem todos demonstraram-se favoráveis à contratação
dos imigrantes, conforme destacado nas respostas abaixo relacionadas.
E2: Não gosto por roubarem nossos empregos e
fazem trabalho meia boca, principalmente em
relação à limpeza.
E5: Acredito que devem primeiramente dominar
a língua portuguesa, pois isto torna complicada a
comunicação com os clientes.
E9: Atualmente a realidade não é mais essa. Os
haitianos que ainda não voltaram para sua terra, já
não têm um bom rendimento e os hotéis já não
contratam muito.
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A ‘INCLUSÃO’ PROFISSIONAL DOS IMIGRANTES HAITIANOS NA REDE HOTELEIRA DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ (SC)
E10: Como falei antes, acho desnecessário ter
imigrantes no Brasil. Temos muitos brasileiros
precisando de emprego, creio que os hotéis devem
dar prioridade para quem é brasileiro.
Frente ao exposto, verifica-se que o funcionário brasileiro possui
um pensamento hostil ao acreditar que os imigrantes estão “roubando”
os empregos dos brasileiros e julga seus trabalhos de maneira pejorativa.
Da mesma forma E9 ressalta que os haitianos já não têm um bom
rendimento no serviço. Seguindo essa posição de aversão aos imigrantes
no segmento hoteleiro, E10 destaca que é “desnecessária” a contratação
deles, pois há muitos brasileiros desempregados, sendo assim os hotéis
devem dar “prioridade” a esse público.
Na quinta pergunta os funcionários responderam se os hotéis
estão promovendo adequadamente a inclusão profissional de haitianos.
Frente a essa pergunta, a maioria respondeu que não acredita, conforme
assinalado a seguir:
E2: Acredito que não.
E3: Não.
E5: Não. Ainda há casos isolados da adequação, os
demais apenas evitam a contratação.
E7: Não estamos preparados. Precisamos de
mais ações, de treinamentos mais específicos
e um acompanhamento maior. E até mesmo
70
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO: Relatos de imigrantes haitianos na região do Litoral Norte de Santa Catarina
aprendermos a língua deles e melhorarmos a
comunicação.
E8: Não acredito, como já comentei nas questões
anteriores, faltou um preparo em capacitar e
entender as necessitadas dos profissionais haitianos.
Dos dez entrevistados, verifica-se que cinco pensam que os
haitianos não estão sendo adaptados corretamente. Destaca-se que E5
acredita que há poucos casos de inclusão e que muitos hotéis evitam a mão
de obra haitiana. Enquanto isso, E7 e E8 voltam a enfatizar a necessidade
de capacitação. Além disso, E8 frisa a importância de “aprendermos” o
idioma deles, podendo assim ajudá-los na adaptação e ao mesmo tempo
aprender uma nova língua.
A isso entende-se que o encarregado de conduzir o departamento
pessoal de qualquer organização deve possuir o conhecimento necessário
para contratar o funcionário certo para cada função (SCHERMERHORN
JÚNIOR, 2014). Afinal, segundo Spector (2010), as decisões na empresa
deveriam levar em consideração o desempenho do contratado, sendo
que todos deveriam ser tratados de forma igualitárias e possuírem as
mesmas oportunidades conforme o merecimento (LACOMBE, 2011).
Tudo isso com o objetivo de criar uma vantagem competitiva perante
as outras empresas por meio do desenvolvimento do capital humano da
organização (SCHERMERHORN JÚNIOR, 2014).
Adiante, verifica-se que quatro dos entrevistados acreditam que
os treinamentos estão sendo adequados, conforme assim mencionado:
71
A ‘INCLUSÃO’ PROFISSIONAL DOS IMIGRANTES HAITIANOS NA REDE HOTELEIRA DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ (SC)
E4: Sim, acredito que estão sendo tratados como
funcionários da mesma forma que brasileiros em
questão de empregabilidade. E6: É difícil opinar sobre isso, pois não sei direito
como deve ser um processo de inclusão adequado.
Mas especificamente no ambiente em que trabalho,
acredito que sim, pois vejo que estão se esforçando
para que aconteça uma boa inclusão.
E9: Sim.
E10: Provavelmente sim.
Verifica-se que E4 ressalta que na questão trabalhista os haitianos
e brasileiros estão sendo tratados de maneira igualitária; entretanto, E6
demostra não conhecer plenamente como deve ocorrer o processo de
inclusão, porém avalia que em sua empresa esteja correto, pois analisa que
o departamento de gestão está se esforçando no processo de adaptação
dos imigrantes.
Percebe-se que quatro dos entrevistados acreditam que o
departamento de Gestão de Pessoas está fazendo a adaptação do
imigrante de forma correta. Compreende-se que o incumbido desse cargo
está desempenhando um bom trabalho e contribuindo para uma melhor
socialização do imigrante haitiano com os funcionários brasileiros,
afinal, de acordo com Schermerhorn Júnior (2014), a socialização por
meio da integração é uma forma de influenciar os modos de um novo
funcionário e aproximá-lo dos outros contratados.
Por fim, identificou-se que um funcionário não possui um ponto
72
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO: Relatos de imigrantes haitianos na região do Litoral Norte de Santa Catarina
de vista definido, conforme relato abaixo:
E1: Não consigo opinar nesta questão, pois nos
hotéis em que trabalhei não haviam haitianos
contratados, somente estrangeiros de países de
língua espanhola. Acredito que o idioma dificulte
um pouco a contratação na hotelaria.
Frente a isso, o E1 não soube opinar, pois não teve experiências
com haitianos no seu ambiente de trabalho. A isso entende-se que E1
(devido ao não convívio) não possui uma opinião concreta, entretanto,
aborda uma questão importante: a do idioma. O haitiano possui mais
dificuldades na adaptação, pois o seu idioma é originário do francês,
creole (SANT’ANNA; PRADO, 2016).
Além da linguagem, outro fator que atrapalha é a dificuldade
de revalidar os diplomas dos estrangeiros no Brasil. Notou-se que
são pouquíssimos os haitianos que trabalham na área que possuem
qualificação, sendo que em 2014 constava que havia 440 haitianos com
curso superior trabalhando, no entanto, somente 15 deles exerciam as
funções que constavam no diploma (SCHREIBER, 2015).
A última questão abordada foi em relação às medidas que os
funcionários brasileiros acreditam que o departamento de Gestão
de Pessoas deveria proceder ao constatar que os funcionários estão
praticando discriminação, racismo e atos xenofóbicos. Os relatos a seguir
73
A ‘INCLUSÃO’ PROFISSIONAL DOS IMIGRANTES HAITIANOS NA REDE HOTELEIRA DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ (SC)
apresentam os dados coletados.
E1: Desligamento do funcionário e
encaminhamento aos órgãos oficiais, visto que
esses atos são crimes.
E2: Para não haver atritos nem racismos, a empresa
deveria criar uma política de não contratar haitianos ou então advertir os funcionários que
praticam estes atos, mostrando que todos somos
iguais.
E3: Racismo é crime. Acredito que o departamento
de Gestão de Pessoas deve identificar e avaliar a
situação. Caso advertências e/ou conversas não
surtam resultado, o colaborador que praticou o ato
deve ser desligado da empresa por justa causa.
E4: Verbal e em outros casos tirar “férias no sistema penitenciário”.E5: O funcionário deverá ser advertido. Em casos
extremos, considerar o desligamento da empresa.
E6: Caso o indivíduo não se arrependa, demissão por justa causa.
E7: Acredito que nenhuma dessas práticas são
atos a serem repetidos, a nenhuma pessoa,
independente de raça ou cor. Combate-se com
informação, conversa, carinho e atenção. É
necessária informação, para tentarmos diminuir
esse tipo de situação. Caso ocorra, primeiramente
74
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO: Relatos de imigrantes haitianos na região do Litoral Norte de Santa Catarina
é preciso conversar abertamente para que todos
dentro da organização tenham a informação correta,
que todos somos iguais, seres humanos e não
podemos humilhar e ser humilhado por ninguém. E
certamente os líderes tem que ser os primeiros a
darem exemplos, repelindo esse tipo de situação.
E8: Discriminação, racismo e atos xenofóbico
devem ser combatidos rigorosamente, mas também
devem fazer um trabalho de educação, para as
pessoas entenderam que nossas diferenças são o
que nos tornam únicos, respeito ao próximo deve
ser algo normal e não opção.
E9: Advertência verbal, escrita e suspensão de quem pratica.
E10: Demissão.
Em relação a essa pergunta, todos os entrevistados julgam serem
necessárias medidas administrativas como: advertência verbal e escrita,
suspensão e desligamento. Entretanto, E2 ressaltou que para não ocorrer
esses atritos a empresa deveria ter uma política de “não contratar
haitianos” e, caso contratasse, advertisse quem praticasse algum ato
contra os mesmos. Enquanto isso, E4 destaca que se a pessoa que praticou
algum tipo de ofensa ou agressão aos haitianos não se arrependa, deve
tirar “férias no sistema penitenciário”.
Frente a isso, E7 salienta que ninguém deve sofrer nenhum dos
atos descritos na questão, independentemente de raça ou cor, seguindo
do pensamento que para combater esses atritos o que é preciso é a
75
A ‘INCLUSÃO’ PROFISSIONAL DOS IMIGRANTES HAITIANOS NA REDE HOTELEIRA DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ (SC)
“informação” e um bom diálogo no ambiente de trabalho. Dando
sequência a essa reflexão, E8 acredita ser necessária “educação” para
combater esses atos de discriminação, racismo e xenofóbicos.
Independentemente da medida decidida pela empresa, se
faz necessário que a organização tome uma atitude perante esses
atos. Pode ser considerado discriminação qualquer ato que envolva
constrangimento, agressão físicas e insultos contra qualquer um no
ambiente de trabalho. Esses atos desagradáveis e ilegais acontecem por
vários motivos, dentre eles: o descontrole dos gestores e falta de apoio do
departamento de Gestão de Pessoas (SPECTOR, 2010).
▯ CONSIDERAÇÕES FINAIS
A presente pesquisa teve como objetivo geral identificar de
que forma os responsáveis pelo setor de departamento de Gestão
de Pessoas dos hotéis de Balneário Camboriú estão promovendo a
inclusão profissional dos imigrantes haitianos. A coleta de informações
foi realizada por meio de entrevistas semiestruturadas, dirigida a
uma amostra não probabilística composta por 22 pesquisados, sendo
dez funcionários de hotéis brasileiros, dez imigrantes haitianos que
trabalham ou já trabalharam em hotéis no município de Balneário
Camboriú e dois responsáveis pelo departamento de Gestão de Pessoas.
Diante das informações obtidas e analisadas, percebe-se que tanto o
objetivo geral quanto os específicos foram atingidos com êxito.
O primeiro objetivo específico teve como finalidade identificar
76
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO: Relatos de imigrantes haitianos na região do Litoral Norte de Santa Catarina
junto ao departamento de Gestão de Pessoas as principais dificuldades
no processo de admissão e integração de funcionários haitianos. A isso
constatou-se que esses responsáveis percebem a aversão dos funcionários
brasileiros com os imigrantes haitianos, compreendendo que a principal
dificuldade durante a admissão e integração dos haitianos é o idioma,
seguido da adaptação e a documentação devido à burocracia brasileira.
Contudo, os entrevistados não sabem como agir caso recebessem
qualquer denúncia envolvendo preconceito, discriminação, racismo e
atos xenofóbicos contra contratados haitianos.
O segundo objetivo específico buscou averiguar casos relatados
por imigrantes haitianos em relação à integração em hotéis. A respeito da
percepção dos funcionários haitianos, percebe-se que a maioria passou
por um processo de integração, além do mais a maioria dos entrevistados
relatou ter sofrido algum tipo de discriminação no ambiente de trabalho
e que sentiram resistência durante a sua admissão. Num dos casos, vale
ressaltar que o ato intolerante de discriminação foi realizado por um
hóspede. Ademais, além do alto índice de atos inadmissíveis, quatro dos
dez entrevistados declararam terem sido vítimas trabalho escravo em
hotéis do município que se auto intitula ‘Capital do Turismo Catarinense’.
Quando questionados sobre quais procedimentos a Gestão de
Pessoas deveria desenvolver para que os contratados haitianos tivessem
uma melhor adaptação, poucos dos imigrantes entrevistados tinham
noção da função desse departamento e os que tinham o conhecimento
sugeriram melhorias que envolvem a necessidade de mais treinamentos
para uma melhor integração.
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A ‘INCLUSÃO’ PROFISSIONAL DOS IMIGRANTES HAITIANOS NA REDE HOTELEIRA DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ (SC)
O terceiro e último objetivo específico buscou examinar a percepção
de funcionários brasileiros em relação à contratação de imigrantes
haitianos. Quanto à abordagem realizada com os funcionários brasileiros,
apenas quatro dos dez entrevistados se manifestaram favoráveis à
migração haitiana; apesar disso seis deles apoiaram a contratação
desses imigrantes na rede hoteleira. Nove informaram nunca terem
praticado nenhum ato envolvendo discriminação, xenofobia, racismo ou
agressão; em contrapartida, seis funcionários haitianos relataram que
já sofreram pelo menos um dos atos supracitados nas dependências de
hotéis localizados em Balneário Camboriú, nos quais trabalham e/ou
trabalhavam.
Ao atingir dos objetivos específicos, confirmou-se a hipótese
anunciada no início do trabalho, constatando-se que existem funcionários
brasileiros que acreditam que os imigrantes haitianos estão ‘roubando’ as
vagas que seriam destinadas aos brasileiros e, devido a variados motivos
injustificáveis, são hostilizados e discriminados, tratados como inferiores
e vítimas de desagradáveis situações de trabalho escravo.
78
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO: Relatos de imigrantes haitianos na região do Litoral Norte de Santa Catarina
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OS IMIGRANTES HAITIANOS NO MERCADO DE TRABALHO DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ E ITAJAÍ (SC)
86
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
CAPÍTULO 2
OS IMIGRANTES HAITIANOS NO MERCADO DE TRABALHO DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ E ITAJAÍ (SC)
Silvia Barcellos4
André Gobbo5
4 - Aluna egressa do curso de Administração da Faculdade Avantis5 - Professor do curso de Administração da Faculdade Avantis.
87
OS IMIGRANTES HAITIANOS NO MERCADO DE TRABALHO DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ E ITAJAÍ (SC)
Nesse estudo, objetiva-se identificar as dificuldades enfrentadas
pelos imigrantes haitianos para ingressarem e se manterem no mercado
de trabalho na região de Balneário Camboriú e Itajaí, estado de Santa
Catarina, verificando suas percepções de como é aplicada a Gestão de
Pessoas nas empresas em que trabalham; se percebem igualdade de
tratamento perante os seus colegas; e se as mesmas regras são aplicadas
de maneira equitativa, independentemente da nacionalidade. Ademais,
propõe-se verificar como os trabalhadores haitianos lidam com as
diferenças culturais e as maiores dificuldades encontradas; dentre as
quais se podem destacar o processo de comunicação devido ao idioma e
a invisibilidade que sofrem, fruto do racismo.
Sabe-se que o ano de 2010 marcou o início da migração haitiana
no Brasil. O movimento começou a ser notado em fevereiro daquele ano,
na cidade de Tabatinga, no estado do Amazonas, logo após o terremoto
que sacudiu violentamente o Haiti, provocando a morte de mais de 300
mil pessoas e deixando cerca de 300 mil desabrigadas. Consequência
disso é que se percebe, em inúmeras empresas e de diversos segmentos
nas cidades onde esse estudo é aplicado, a presença de trabalhadores
haitianos exercendo as mais variadas funções. Percebe-se também que
eles estão alocados em trabalhos que exigem menor nível de escolaridade,
principalmente na área de prestação de serviços, tais como: redes de
supermercados, construção civil e serviços de limpeza pública.
Em Balneário Camboriú há uma Associação dos Imigrantes
haitianos que, devido a ausência de políticas públicas, ocupa um espaço
que deveria ser dos poderes constituídos. No entanto, ainda se ouvem
88
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
relatos de casos em que os mesmos sofrem preconceito pela cor, raça e
nacionalidade que possuem.
Frente ao exposto, surge a presente pesquisa, a qual se propõe
relatar a realidade vivida por esses profissionais, suas aspirações
profissionais e pessoais dentro do contexto atual, buscando expor à
comunidade científica fragmentos da vida dessas pessoas que, muitas
vezes, passam despercebidas. Para isso, buscar-se-á entender seus
objetivos e perspectivas em relação ao mercado de trabalho em que
estão inseridos. Neste sentido, procura-se responder a seguinte questão-
problema: De que maneira os trabalhadores haitianos de Balneário
Camboriú e Itajaí avaliam o processo de Gestão de Pessoas nas empresas
em que trabalham?
Há de se destacar que com o aumento da população de imigrantes
haitianos no Estado de Santa Catarina, mais especificamente nos
municípios de Balneário Camboriú e Itajaí, percebe-se um número
crescente desses profissionais inseridos no mercado de trabalho; o que
justifica a importância de se conhecer melhor as expectativas dessas
pessoas em relação ao mercado de trabalho e de como estão sendo
incluídas e mantidas nessas organizações.
Ademais, na atual situaçãoem que se encontra a economia
brasileira, muito pouco se sabe sobre a cultura desses imigrantes e,
neste momento, mais do que nunca, é hora de buscar informações sobre
esse público, afinal, é preciso conhecê-los para compreendê-los. Neste
sentido, o tema pesquisado pode servir de base para que se reconheça
melhor as expectativas desses trabalhadores, bem como verificar se
89
OS IMIGRANTES HAITIANOS NO MERCADO DE TRABALHO DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ E ITAJAÍ (SC)
os programas de Gestão de Pessoas aplicados pelos contratantes são
realmente compreendidos pelos imigrantes haitianos.
▯ PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
A pesquisa tem abordagem qualitativa, a qual, conforme Creswell
(2010, p. 43) é definida como sendo “[...] um meio para explorar e para
entender o significado que os indivíduos ou os grupos atribuem a
um problema social ou humano”. Por sua vez, Marconi e Lakatos
(2010) explicam que esse tipo de abordagem se trata de uma pesquisa
que tem como ideia principal analisar e interpretar aspectos mais
profundos, descrevendo o comportamento humano e ainda fornecendo
análises mais detalhadas sobre investigações, atitudes e tendências de
comportamento. Assim, entende-se que a ênfase desse tipo de pesquisa
é nos processos e nos seus significados.
Quanto aos objetivos, caracteriza-se como uma pesquisa
exploratória a qual, segundo Gil (2010), tem por objetivo proporcionar
maior familiaridade com o tema a ser pesquisado, vez que é desenvolvida
no sentido de proporcionar uma visão geral acerca de determinado fato.
Em relação aos procedimentos técnicos, se caracteriza como sendo um
estudo de campo e bibliográfica. Sobre o estudo de campo, Gil (2009,
p. 53) leciona que o mesmo “[...] focaliza uma comunidade que não é
necessariamente geográfica, pode ser uma comunidade de trabalho, de
estudo ou qualquer outra atividade humana”. Neste entendimento, a
pesquisa normalmente é desenvolvida por meio de observação direta das
90
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
atividades do grupo e por entrevistas informais, juntamente com outras
fontes de informações, tais como fotos, documentos e conversas.
Também, há de se constar que foi utilizado o procedimento de
pesquisa bibliográfica que, segundo Marconi e Lakatos (2006), faz um
levantamento sobre os principais trabalhos já realizados sobre o tema
pesquisado, na busca de dados atuais, compreendendo-os como uma
fonte indispensável de informações.
A amostra utilizada na coleta de dados foi definida por métodos
não probabilísticos, por acessibilidade ou conveniência, por meio da
qual, conforme Gil (1999), o pesquisador elege os elementos a que
tem maior facilidade de acesso. A pesquisa foi realizada em 2016 com
trabalhadores haitianos, que atuam em diversos segmentos, entre eles
dois colaboradores terceirizados de uma empresa que presta serviços
gerais em uma multinacional localizada em Itajaí (SC); dois colaboradores
de uma padaria; dois colaboradores de um posto de combustível; e um
colaborador de supermercado atacadista; essas últimas localizadas em
Balneário Camboriú (SC).
A coleta de dados com os sete entrevistados foi por meio de
entrevista semiestruturada. Neste contexto, o roteiro foi composto
por 26 perguntas sobre o processo migratório, a moradia, o trabalho, o
relacionamento, o preconceito e o processo de comunicação dentro e fora
das organizações. A análise dos dados foi feita levando em consideração
todas as informações e problemáticas informadas pelos entrevistados,
utilizando como base a análise do conteúdo obtido por meio das
conversas com os trabalhadores.
91
OS IMIGRANTES HAITIANOS NO MERCADO DE TRABALHO DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ E ITAJAÍ (SC)
▯ DIVERSIDADE NAS ORGANIZAÇÕES E A QUESTÃO DA INVISIBILIDADE
Em um mundo que vive sob a tendência da globalização, a
diversidade representa um valor estratégico para as sociedades, pois
fortalece seu poder de integração ao novo contexto, caracterizado
pelo intenso fluxo de capitais e das comunicações, pelo surgimento
das novas ondas migratórias. O mundo que convive com o acelerado
avanço tecnológico ainda assiste, entretanto, ao crescimento de conflitos
assentados na intolerância étnica, religiosa e cultural, em relação aos
quais a diversidade pode ser um importante instrumento de superação
(INSTITUTO ETHOS, 2000).
No contexto da diversidade, Rothmann e Cooper (2009) relatam
que a diversidade se refere a uma multiplicidade de diferenças e
semelhanças individuais que existem entre as pessoas, incluindo a
mistura de muitas dimensões que fazem das pessoas únicas e diferentes
umas das outras. Segundo Loden (1996, apud ROTHMANN; COOPER,
2009, p. 40), existem as dimensões primárias e secundárias da
diversidade, sendo que as primárias se referem às diferenças humanas
que afetam a socialização dos indivíduos e têm um impacto profundo e
contínuo no decorrer de suas vidas. Entre elas estão a questão de gênero,
etnia, raça, capacidade mental e física, orientação sexual e idade. Por sua
vez, as dimensões secundárias referem-se às características pessoais que
incluem um elemento de escolha pessoal. Estas são menos visíveis para
92
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
os outros e nelas incluem-se a educação, a linguagem, a religião, a renda,
a experiência e o estilo de comunicação, entre outras.
Os autores supracitados também pontuam que existe diferença
entre avaliar a diversidade e administrá-la. Avaliar a diversidade significa
ter consciência, reconhecer, entender e avaliar a diferenças humanas.
Já gerenciá-la significa deixar as pessoas terem desempenho máximo,
mudando a cultura e a infraestrutura de uma organização para permitir
que as pessoas sejam produtivas.
Nesta perspectiva, Flores-Pereira e Eccel (2010) informam que o
termo ‘diversidade’ passou a figurar no vocabulário de gestão a partir da
década de 1990, nos Estados Unidos, com o objetivo de tratar da inserção
de mulheres e negros como uma alternativa empresarial às políticas
públicas de ações afirmativas que garantiam, por lei, oportunidades
para grupos sociais marginalizados. A noção de gestão da diversidade
originou-se em caráter meritocrático, mas de acordo com a lógica da
empresa.
No Brasil, o referido tema surgiu dentro da lógica utilitária,
pois aparece como uma prática importada das políticas de gestão de
multinacionais que começaram a implantar nacionalmente as diretrizes
já utilizadas nas matrizes. A lei brasileira não oferece o mesmo respaldo
que outros países para as ações afirmativas, restringindo-se a uma
cota reservada para pessoas com deficiência que obriga as empresas
com 100 ou mais empregados a contratarem percentuais específicos
de funcionários nessas condições. Especificadamente sobre a questão
da cor de pele, devem-se considerar as especificidades da realidade
93
OS IMIGRANTES HAITIANOS NO MERCADO DE TRABALHO DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ E ITAJAÍ (SC)
brasileira, a qual trata o tema a partir do mito da democracia racial. As
origens históricas de miscigenação e de proximidades físicas entre os
senhores brancos e os escravos negros podem levar a crer que se trata
de uma sociedade não discriminatória, situação essa que não se traduz
na prática; vez que a estrutura social brasileira se apresenta bastante
estratificada, não oferecendo oportunidades igualitárias para indivíduos
de diferentes cores de pele (FLORES-PEREIRA; ECCEL, 2010).
Frente ao exposto, torna-se cada vez mais evidente a importância
de se tratar a diversidade nas organizações empresariais como um
assunto de extrema importância, pois a mesma está diretamente
relacionada com a responsabilidade social e pelo fato de que o tema é
decisivo para o desempenho organizacional. Neste sentido, entende-
se que a diversidade pode tornar-se um sinônimo de qualidade de
vida no trabalho. Nas relações externas - com parceiros, consumidores
e sociedade - a adoção da diversidade como um princípio de atuação
agrega valor à imagem da empresa, demonstrando que ela está alinhada
às expectativas e demandas da sociedade contemporânea e que assume
a sua missão social.
O contexto atual da sociedade brasileira, caracterizado por
profundas diferenças e uma estrutura de oportunidade marcadas
por condutas discriminatórias, revela traços herdados do seu próprio
processo de formação, sendo que o final da escravidão não aboliu as
práticas e valores escravistas da sociedade, visto que após a libertação, os
negros livres permaneceram, de modo geral, ocupando as posições mais
subalternas e não tiveram condições de disputarem as oportunidades
94
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
de trabalho oferecidas pela economia do início da República, na maioria
destinadas às novas levas de imigrantes europeus. Esse foi um fator
determinante para que, no presente, os negros permaneçam como
principal contingente das camadas pobres do país, reafirmando o estigma
de servidão no passado (INSTITUTO ETHOS, 2000).
Frente ao exposto, entende-se que as empresas são também
um importante espaço existencial para seus funcionários, afinal, as
pessoas vivem no ambiente de trabalho grande parte de seu tempo
e nele, além de estabelecerem relações profissionais, também são
gerados vínculos interpessoais e institucionais de grande relevância.
Ao estimular a diversidade e atuar contra a discriminação, a empresa
está fortalecendo o respeito mútuo entre as pessoas, o reconhecimento
de suas particularidades e o estímulo à sua criatividade e cooperação
(INSTITUTO ETHOS, 2000).
▯ A RELEVÂNCIA DA COMUNICAÇÃO PARA A INTEGRAÇÃO DA DIVERSIDADE
Segundo Limongi-França (2012, p. 141) “Os seres humanos são
frutos da sociedade e da cultura em que estão inseridos e é por meio
das relações entre seus semelhantes que o ser humano sobrevive. A
comunicação neste contexto se torna indispensável e essencial”. Neste
sentido, entende-se que dentro das organizações a comunicação entre
95
OS IMIGRANTES HAITIANOS NO MERCADO DE TRABALHO DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ E ITAJAÍ (SC)
os grupos tem o papel de motivação, controle, expressões emocionais
e informações, sendo que é por meio dessas comunicações que as
informações podem ser compreendidas e compartilhadas entre os seus
membros. A motivação, neste contexto, refere-se ao esclarecimento do
que deve ser feito, como está o desempenho individual e como poderia
ser melhorado.
A isso, Lacombe (2011) relata que o processo de comunicação
acontece o tempo todo, seja dentro ou fora das organizações, em todos
os processos diários, seja de modo verbal ou não. Conforme o autor,
comunicação envolve a transmissão de mensagens emocionais e/ou
intelectuais, sendo que boa parte dos problemas vivenciados pelos
indivíduos partem de uma comunicação inadequada, onde o que se
quer transmitir não é compreendido por quem recebe a mensagem,
desta forma gerando distorções entre o que foi comunicado e o que foi
compreendido. Neste sentido, entende-se que no ambiente interno das
organizações a comunicação é de extrema importância, visto que saber
comunicar é uma habilidade preciosa de um bom administrador.
Corroborando com o exposto, Robbins e Decenzo (2014) asseveram
que a comunicação envolve a transferência de significado; logo se
nenhuma informação ou ideia for expressa, a mesma não aconteceu. A
isso, é válido ressaltar que o falante que não é ouvido ou o escritor que
não é lido não se comunica; contudo é válido ressaltar que a comunicação
é a transferência e a compreensão do significado da mensagem.
As barreiras para uma comunicação eficaz, segundo Limongi-
França (2012) são fatores que dificultam este processo por meio de
96
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
distorção das mensagens e dos ruídos e obstáculos. Dentre as barreiras,
destaca-se a atitude defensiva que, conforme a autora supracitada,
trata-se de quando os agentes do processo de comunicação se sentem
ameaçados. Neste caso, a capacidade de compreensão mútua é reduzida
e a mensagem é interpretada como ameaçadora, por conseguinte, a
resposta é confusa impedindo uma comunicação eficaz.
Conforme Robbins e Decenzo (2014), os problemas de
comunicação ocorrem quando há desvios ou obstruções no fluxo de
informações. A mensagem que se quer comunicar depende da habilidade
e do conhecimento de quem a remete para uma correta codificação do
pensamento, sendo que o sucesso comunicativo inclui fala, escuta e
raciocínio lógico. Frente ao exposto, entende-se que a qualidade da
comunicação muitas vezes está restrita ao conhecimento, vez que não
se pode comunicar bem sobre aquilo que não se tem conhecimento
e domínio. Os mesmos autores pontuam sobre as barreiras para uma
comunicação eficaz, sendo que, conforme eles, a maioria das pessoas é
mau ouvinte, ou seja, ouve, mas não escuta. Ouvir é meramente captar
vibrações sonoras, já escutar é dar sentido àquilo que é ouvido e isto
exige atenção, interpretação e lembrança do que foi dito.
E de que forma saber se a mensagem que está sendo passada foi
realmente compreendida? É nesta fase que entra o feedback, o qual é tido
como de extrema importância em todas as avaliações, pois entende-se
que somente desta forma o indivíduo terá a informação de quais pontos
precisam ser melhorados e em quais aspectos está se saindo bem. Faz
parte das características de um bom administrador saber fazer uma boa
97
OS IMIGRANTES HAITIANOS NO MERCADO DE TRABALHO DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ E ITAJAÍ (SC)
avaliação e dar um bom feedback aos seus subordinados, bem como em
conjunto com o mesmo procurar alternativas para desenvolver os seus
pontos fracos, melhorando assim o seu desempenho (LACOMBE, 2011).
O mesmo autor supracitado pontua que a prática constante do
feedback facilita o diálogo, especialmente se for adotado o sistema de
administração por metas, com compromissos recíprocos de resultados
a serem alcançados. Neste caso, ambos os envolvidos devem se preparar
para o feedback, visto que a forma de comunicar é muito importante,
pois há fatores emocionais envolvidos e um feedback mal informado
pode gerar resultados desastrosos.
Sobre o contexto da comunicação, reproduz-se os dados obtidos
em pesquisa divulgada em fevereiro de 2014 e organizada por Fernandes
e Castro (2014), intitulada ‘Estudos sobre a Migração Haitiana ao Brasil
e Diálogo Bilateral’, a qual destaca que o idioma aparece como a maior
fonte de problemas apontados pelos haitianos entrevistados (56,5%).
Importante considerar que, no caso do idioma, 83,2% dos entrevistados
acreditam que o não conhecimento do idioma nativo do país de destino
é uma importante barreira à integração ou mesmo à sobrevivência.
Mas, quando solicitados a avaliar os seus conhecimentos de português,
14,1% dos entrevistados que responderam à questão indicaram ter um
conhecimento muito bom do idioma. Para 55,5% o conhecimento foi
avaliado como bom, e em 30,4% dos casos relatados como ruim.
A pesquisa supracitada relata que a empresa Arbotec, do ramo
da construção civil, situada na cidade de Curitiba (PR), constatou que
uma das grandes dificuldades no relacionamento com os imigrantes
98
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
haitianos é a comunicação. Outro relato, desta vez da coordenadora de
RH da empresa Trombini, situada na mesma cidade, demonstra que os
problemas com comunicação já levaram a demissão de um haitiano e
um brasileiro por desentendimento causado pela falta de comunicação
entre ambos. A empresa acabou por contratar uma estagiária haitiana
(graduada do curso de Administração), para trabalhar junto com os seus
compatriotas com o intuito de traduzir informações disponibilizadas a
eles. Por meio do trabalho dessa estagiária, registraram-se mudanças
significativas no tratamento aos trabalhadores haitianos.
▯ HISTÓRICO DA IMIGRAÇÃO HAITIANA AO BRASIL
Segundo Magalhães (2014), a expansão do capitalismo global pela
América Latina se deu por meio da colocação da divisão internacional
do trabalho pelas mãos do colonialismo, o fenômeno do capitalismo
dependente, que vincula o desenvolvimento econômico e social de um
país periférico às exigências e necessidades dos países centrais. Esse
processo histórico cria riquezas na periferia do sistema capitalista, as
quais são apropriadas pelas empresas dos países centrais. Em outras
palavras, é um desenvolvimento do subdesenvolvimento, fórmula central
para se entender como o Haiti passou de colônia mais próspera do mundo
no século XVIII ao atual país mais pobre das Américas. Suas precárias
condições de vida, mergulhados em extrema pobreza, condicionam,
historicamente, à formação dos fluxos migratórios de saída do país.
99
OS IMIGRANTES HAITIANOS NO MERCADO DE TRABALHO DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ E ITAJAÍ (SC)
Com o terremoto que atingiu o Haiti, em 12 de janeiro de 2010, e que
causou a morte de mais de 200 mil pessoas, deixando mais de 1,5 milhão
de desabrigados, a situação piorou. Hospitais, escolas e prédios públicos
foram destruídos, e se antes desse fenômeno natural as condições de
sobrevivência já eram precárias, a destruição sem precedentes tornou a
existência humana mais difícil, gerando o grande movimento migratório
que colocou o Brasil na rota desses imigrantes.
Dados da Divisão de Imigração do Ministério das Relações
Exteriores apontam que a emissão de vistos a haitianos subiu 1.537%,
entre 2012 e 2015. Esse número demonstra que os imigrantes têm entrado
no país regularizados pelas capitais de São Paulo e Rio de Janeiro, em vez
de fazer a longa e cara viagem para entrar ilegalmente pelo Acre. No ano
de 2015, segundo estimativas do Ministério da Justiça, já existiam 54 mil
haitianos no Brasil, distribuídos entre os Estados como Acre, Amazonas,
Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Paraná, Santa Catarina e São Paulo.
Desse total, mais de 20 mil trabalham legalmente.
Segundo o Ministério do Trabalho e Emprego, em 2013, os
haitianos tornaram-se o grupo de trabalhadores imigrantes em Santa
Catarina de maior presença no mercado formal. Apenas neste Estado,
nos primeiros cinco meses de 2015, foram emitidas 2.259 carteiras de
trabalho para haitianos, mais que o dobro de todo o ano de 2014.
A partir da análise dos dados oficiais do Ministério do Trabalho,
pesquisadores da Fundação Getúlio Vargas (FGV), constataram que uma
parcela muito pequena dos trabalhadores haitianos graduados tem um
emprego compatível com sua qualificação no Brasil. De acordo com os
100
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
números mais recentes da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS),
em 2014, havia 440 imigrantes haitianos com curso superior trabalhando
com carteira assinada no Brasil; desse total, apenas 15 (3,4%) exerciam
funções que exigem diploma universitário. A maioria dos haitianos
graduados ocupava cargos que demandam apenas ensino fundamental
(302) ou médio (58). Esses grupos representam, juntos, 82% dos haitianos
com curso superior empregados no Brasil. Os demais têm empregos
de nível técnico (59) ou sem exigência de qualificação (5). Apenas um
ocupava um emprego com requisito de pós-graduação. Os pesquisadores
ainda destacam que era possível encontrar 30.457 registros de haitianos
com vínculo formais de trabalho na RAIS, mas a maioria não tem
formação universitária (SCHREIBER, 2015).
Segundo o pesquisador Vagner Faria de Oliveira, da diretoria de
Análises Políticas Públicas da FGV, existem alguns fatores que dificultam
o acesso ao trabalho para os imigrantes haitianos se comparados a outros
imigrantes. Um deles é o fato do fluxo de migração ser novo se comparado
com países vizinhos da América do Sul e das nações europeias, como
Portugal, Espanha e Itália. Os imigrantes que seguem fluxos mais antigos
de migração conseguem se integrar melhor no mercado de trabalho, pois
já possuem rede de apoio, comunidades de pessoas conhecidas tornado
o fluxo mais facilidade e o acesso às oportunidades também. Além disso,
destaca que um dos principais fatores que dificulta a integração dos
haitianos é a língua, sendo que enquanto a maioria dos imigrantes que
vem para o Brasil falam português ou espanhol, o haitiano em grande
maioria fala o Créole (SCHREIBER, 2015).
101
OS IMIGRANTES HAITIANOS NO MERCADO DE TRABALHO DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ E ITAJAÍ (SC)
Outra dificuldade apontada pelo mesmo pesquisador é a questão
da revalidação do diploma, uma vez que esse processo ainda não possui
regras unificadas e cada universidade tem autonomia para adotar seu
procedimento; neste conceito o processo se torna lento. O presidente do
Conselho Nacional de Imigração, Paulo Sérgio de Almeida, reconhece
o problema ao afirmar que a discussão sobre facilitar a revalidação do
diploma está engatinhando no Mercosul e, mesmo na União Europeia
onde esta questão está mais adiantada, ainda é um processo recente.
APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS
Nessa seção, são apresentados os resultados da pesquisa realizada
com sete imigrantes haitianos que estão no mercado de trabalho das
cidades de Itajaí e Balneário Camboriú (SC).
O Quadro 1 apresenta o fluxo da imigração haitiana para o Brasil
entre o ano de 2012 e 2016 dos imigrantes entrevistados.
Quando chegou ao Brasil?
2012 2013 2014 2015 2016
1 5 1 - -
Quadro 1: Quando chegou ao Brasil?Fonte: Dados primários, 2016
Verifica-se que a concentração maior da migração para o Brasil foi
no ano de 2013 sendo que o terremoto catastrófico ocorreu em janeiro de
102
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
2010. Esse evento teve grande impacto na imigração dos haitianos para
vários países nos anos seguintes.
Depois do terremoto que atingiu o Haiti em 12 de janeiro de 2010,
causando a morte de mais de 200 mil pessoas e deixando mais de 1,5 milhão
de desabrigados, a situação só piorou. Se antes deste fenômeno natural as
condições de sobrevivência já eram precárias, após a destruição a existência
humana se tornou mais difícil gerando nos anos a seguir o grande movimento
migratório que colocou o Brasil na rota dos imigrantes haitianos.
O Quadro 2 apresenta os principais motivos que levaram os
imigrantes a saírem de seu país.
Por quais motivos saiu do seu país?
E1 Em busca de oportunidade de trabalho.
E2 Emprego, melhores condições de vida.E3 A procura de emprego, para ajudar a família.
E4 A procura de emprego, conseguir sustentar a família que ficou no Haiti.
E5 Por causa do terremoto, falta de trabalho
E6 Porque no Haiti havia pouco emprego
E7 A procura de trabalho, depois do terremoto ficou difícil arrumar emprego.
Quadro 2: Por quais motivos saiu do seu país?Fonte: Dados primários, 2016
Conforme observa-se no Quadro 2, quando questionados sobre
quais os motivos que levaram os imigrantes haitianos a saírem do seu
país o principal informado por eles foi a busca por emprego e melhores
condições de vida. Todos, sem exceção, vieram com a expectativa de
103
OS IMIGRANTES HAITIANOS NO MERCADO DE TRABALHO DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ E ITAJAÍ (SC)
arrumar emprego para poder ajudar a família que permaneceu no país
mergulhado no caos. Alguns revelaram ainda ter o sonho de trazer os
familiares para o Brasil.
Devido à devastação causada pelo terremoto as necessidades
básicas, fisiológicas e de segurança já não existiam mais. As necessidades
de alimento, saúde e emprego, que já eram precárias, se tornaram quase
que inexistentes. Sem suprir essas necessidades básicas, as demais
acabam ficando em segundo plano. A isso os mesmos se sujeitaram em
passar a viver longe de suas famílias e amigos.
No Quadro a seguir serão demonstradas informações referentes à
vinda dos haitianos para o Brasil e se vieram com familiares, amigos ou
sozinhos.
Com quem veio para o Brasil?
E1 Com 3 irmãos.
E2 Familiares: tios e primos.
E3 Esposa.
E4 Com outros imigrantes.
E5 Com um grupo de 30 haitianos.
E6 Sozinho.
E7 Sozinho
Quadro 3: Com quem veio para o Brasil?Fonte: Dados primários, 2016
Entre os entrevistados, verifica-se que a maioria veio com
familiares e conhecidos para o Brasil. Verifica-se que alguns deixaram
104
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
esposas e filhos no país de origem, não por opção, mas pela burocracia da
migração e pelas más condições financeiras.
O Quadro a seguir tem com propósito identificar as dificuldades
encontradas pelos imigrantes nas questões de moradia no Brasil.
Como você vivenciou ou vive a questão de moradia? Onde reside ou já
residiu no Brasil. Divide o aluguel com alguém?
E1 Reside em Itajaí, percebe dificuldade com a locação: “os brasileiros não querem alugar imóveis para haitianos e quando alugam são em lugares ruins com valores maiores que os cobrados para os brasileiros”. Divide aluguel com haitianos
E2 Reside em Itajaí, a questão do aluguel é bem difícil, os lugares são longes e os alugueis muito altos. Divide aluguel com haitianos
E3 Reside em Balneário Camboriú, dificuldades com o aluguel, valores e condições dos imóveis. Não querem alugar para os haitianos. Divide o aluguel com a esposa
E4 Reside em Balneário Camboriú, lugares pequenos, alugueis caros. Divide aluguel com haitianos.
E5 Reside em Balneário Camboriú, casa pequena e tem que dividir.
E6 Reside em Balneário Camboriú. Aluguel caro. Não divide aluguel.
E7 Atualmente reside em Balneário Camboriú. Já residiu em São Paulo, não tem dificuldade com moradia no Brasil. Convidou um colega de trabalho brasileiro para dividir aluguel.
Quadro 4: Como vivenciou ou vive a questão de moradia? Onde reside ou já residiu no Brasil. Divide aluguel com alguém?
Fonte: Dados primários, 2016
Conforme verifica-se no Quadro 4, sobre as questões de moradia,
105
OS IMIGRANTES HAITIANOS NO MERCADO DE TRABALHO DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ E ITAJAÍ (SC)
pode-se verificar os primeiros sinais de insatisfação dos imigrantes,
pois relatam que passam por dificuldades na hora de alugar um imóvel
para residirem. Informam que os valores são altos, porém o que chama
atenção é a questão do preconceito que começa a dar os primeiros sinais
para os imigrantes devido aos valores serem mais altos quando se trata
de aluguel para haitianos; e das condições precárias desses imóveis que
são disponibilizados. A isso o entrevistado 1 afirma:
[...] os brasileiros não querem alugar imóveis para
haitianos e quando alugam são em lugares ruins
com valores maiores que os cobrados para os
brasileiros [...]
Conforme relato, as dificuldades encontradas pelos haitianos
com moradia são grandes, uma vez que, além de existir o preconceito
com a locação, os valores cobrados são mais altos se comparados aos
valores dos ofertados aos brasileiros. Constata-se também que todos os
entrevistados dividem aluguel com familiares ou colegas de trabalho,
dentre esses apenas um divide o aluguel com um brasileiro.
No Quadro 5, apresentam-se as respostas obtidas com o
questionamento sobre o trabalho no Brasil e como conseguiram o
primeiro emprego.
106
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
Como você vivenciou a situação de trabalho no Brasil?
Como conseguiu o primeiro emprego?
E1 Através de currículos em uma empresa de tecidos. Operador de máquinas
E2 Através de currículos em uma empresa de pescados. Carga e descarga.
E3Através de amigos que já estavam no Brasil, frentista em posto de
combustível.
E4 Através de currículos, empresa de coleta seletiva.
E5 Foi contratado com um grupo de haitianos, setor de produção.
E6 Através de currículo, auxiliar de padeiro.
E7Conversando no hotel que estava hospedado, começou a trabalhar na
cozinha do mesmo e depois no setor de limpeza, logo após de garçom.
Quadro 5: Como você vivenciou a situação de trabalho no Brasil? Como conseguiu o primeiro emprego?
Fonte: Dados primários, 2016
O Quadro 5 apresenta informações referentes ao primeiro emprego
dos haitianos no Brasil. Em sua maioria a contratação se deu por meio
de currículos. Observa-se que não tiverem dificuldades para serem
contratados, porém não se mostram satisfeitos com os empregos, mas
como não encontraram melhores oportunidades, os empregos atuais
servem para se manterem até encontrar um melhor.
Conforme dados coletados, percebe-se que no ano de 2016
um número significativo de imigrantes haitianos que estava no Brasil
resolveu voltar para o seu país de origem. A crise no Brasil e a saudade
dos familiares foram fatores determinantes para essa decisão. Muitos
ficaram por um período de três a quatro anos trabalhando em jornadas
107
OS IMIGRANTES HAITIANOS NO MERCADO DE TRABALHO DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ E ITAJAÍ (SC)
duplas para tentar subsidiar os familiares no Haiti, mas com a chegada da
crise financeira a situação dos imigrantes se complicou devido aos altos
valores de alugueis e custo de vida em geral, aliados aos baixos salários
recebidos.
No Quadro a seguir apresentam-se os resultados de quando os
imigrantes foram perguntados sobre as suas qualificações; se o trabalho
que exercem no momento está de acordo com as suas habilidades e
experiências profissionais.
Você acredita que seu trabalho está adequado a sua qualificação?
Sim 3
Não 4
Quadro 6: Você acredita que seu trabalho está adequado a sua qualificação?Fonte: Dados primários, 2016
Por meio do Quadro 6, demonstra-se a percepção dos imigrantes
quanto às atividades desenvolvidas e suas qualificações. Dos
entrevistados, três acreditam estar exercendo funções de acordo com
as suas qualificações e quatro dos imigrantes não estão satisfeitos com a
função exercida. A isso, Gil (2011) destaca a importância de se investir na
Qualidade de Vida no Trabalho (QVT), ou seja, os trabalhadores precisam
ser felizes para serem produtivos; devem perceber que o trabalho que
executam está de acordo com as suas habilidades; precisam sentir-se
valorizados, já que o trabalho constitui uma parte significativa de tempo
e identificação pessoal destas pessoas.
108
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
No Quadro a seguir pode-se analisar a rotatividade dos imigrantes
em seus respectivos empregos.
Quantas vezes trocou de emprego desde a chegada ao Brasil?
Permanece no mesmo emprego 1
1 vez 4
3 vezes ou mais 2
Quadro 7: Quantas vezes você trocou de emprego desde a chegada ao Brasil?Fonte: Dados primários, 2016
O Quadro 7 descreve o perfil dos profissionais haitianos quanto à
rotatividade. Por meio dele observa-se que a maioria dos entrevistados
trocaram de emprego apenas uma vez, desde que aqui chegaram. Frente
ao exposto, recorre-se às palavras de Chiavenato (2010), o qual informa
que a rotatividade não é causa, mas o efeito de algumas variáveis internas
e externas. Dentre as variáveis externas estão a situação de oferta e
procura do mercado de RH, a conjuntura econômica, as oportunidades
de empregos no mercado de trabalho, etc. Dentre as políticas internas,
estão a política salarial e de benefícios que a organização oferece, o
estilo gerencial, as oportunidades de crescimento interno, o desenho dos
cargos, o relacionamento humano, as condições físicas e as psicológicas
de trabalho. A estrutura e a cultura organizacional também são
responsáveis por boa parte dessas variáveis internas
A seguir, o Quadro 8 apresenta a avaliação dos entrevistados
quanto às condições de trabalho no Brasil.
109
OS IMIGRANTES HAITIANOS NO MERCADO DE TRABALHO DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ E ITAJAÍ (SC)
Condições de trabalho no Brasil?Boas 6
Ruins 1
Quadro 8: Condições de trabalho no BrasilFonte: Dados primários, 2016
O Quadro 8 apresenta as impressões dos entrevistados quanto às
condições de trabalho nas empresas da região pesquisada. É possível
verificar que os mesmos estão satisfeitos com as condições de trabalho
nas empresas em que atuam. Neste contexto Limongi-França (2012)
relata que a qualidade de vida, a saúde e a ergonomia estão diretamente
associadas à ética da condição humana. Esta atitude ética compreende
desde a identificação, a eliminação, a neutralização ou o controle de
riscos ocupacionais.
O Quadro a seguir traz informações quanto ao rendimento familiar
dos imigrantes.
Rendimento familiar mensal é suficiente para viver?Sim 0
Não 7
Quadro 9: Rendimento familiar mensal é suficiente para viver?Fonte: Dados primários, 2016
O Quadro 9 demonstra a frustrante realidade dos imigrantes
quanto à remuneração. Quando questionados sobre se o que ganham é
suficiente para viver a resposta é unânime: Não! Informam que o aluguel
110
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
é caro e o que sobra mal dá para a alimentação, conforme relato do
Entrevistado 1:
[...] o que ganho mal dá para pagar o aluguel e para
a comida, preciso comprar produtos de higiene e
não sobra para comprar roupas, para passear. Isto
não é viver bem.
Os imigrantes entrevistados em geral demonstram
descontentamento com a remuneração recebida. Conforme supracitado
os mesmos vieram em busca de um sonho de viver melhor e mal
conseguem suprir suas necessidades básicas.
No Quadro 10, verifica-se se consegue ajudar as famílias que
ficaram no Haiti.
Consegue enviar ajuda para a família?Sim 2
Não 5
Quadro 10: Consegue enviar ajuda para a família?Fonte: Dados primários, 2016
Conforme dados coletados, além de os imigrantes entrevistados
terem apresentado descontentamento quanto à remuneração (Quadro
9), constata-se também que diferentemente do que desejavam ao lançar-
se a um novo país, grande parte deles atualmente está sem condições de
111
OS IMIGRANTES HAITIANOS NO MERCADO DE TRABALHO DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ E ITAJAÍ (SC)
enviar ajuda financeira para seus familiares que continuam vivendo no
Haiti. Há de se destacar que esse era um dos motivos que impulsionaram
a vinda para o Brasil depois do desastre natural sofrido: a procura de
emprego justamente para se manterem e subsidiarem o sustento das
famílias que ficaram no Haiti.
É importante ressaltar que esta ajuda se fez novamente mais
necessária no ano de 2016, quando o Haiti foi atingido pelo furacão
Matthew.
O Quadro 11 traz informações referentes à percepção dos imigrantes
quanto às dificuldades de comunicação encontradas nas empresas em
que trabalham.
Como é a comunicação na empresa em que trabalha, você tem dificuldades de comunicação no ambiente de trabalho?
E1 A comunicação é boa, não deixam conversar com os funcionários da empresa contratante local onde prestam serviço.
E2 Não tem problemas de comunicação. A burocracia da empresa não permite conversar com funcionários da empresa onde prestam serviço.
E3 Comunicação é difícil. Não prestam atenção nas dúvidas que surgem, gerando erros.
E4 Comunicação é razoável. Sente pouca dificuldade com a comunicação.
E5 Considera a comunicação na empresa deficiente. Tem dificuldade de comunicação no ambiente de trabalho.
E6 Considera a comunicação regular. Não tem dificuldade de comunicação no local de trabalho.
E7 Considera a comunicação boa e não tem dificuldades de comunicação no local de trabalho.
Quadro 11: Como é a comunicação na empresa em que trabalha, você tem dificuldades de comunicação no ambiente de trabalho?
Fonte: Dados primários, 2016
112
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
Conforme relatos, a comunicação em algumas empresas é
considerada deficiente e existe burocracia por parte das organizações
empresariais, sendo que os imigrantes que prestam serviços para uma
empresa terceirizada de serviços gerais são proibidos de conversarem com
funcionários da empresa contratante. Os mesmos informam que algumas
vezes são abordados por outros funcionários, pois têm curiosidades em
saber como se fala certa palavra na língua dos haitianos, o “Créole”,
porém nessas ocasiões são advertidos por estarem conversando com os
funcionários.
Também demonstram dúvidas que não são esclarecidas pelos
empregadores brasileiros devido à falta de entendimento da língua
portuguesa; e muitas vezes só é dada atenção quando o problema já
tomou proporções maiores.
Conforme Robbins e Decenzo (2014), a comunicação envolve a
transferência de significado. Logo, se nenhuma informação ou ideia for
expressa, a mesma não aconteceu. Neste sentido, é válido ressaltar que
o falante que não é ouvido ou o escritor que não é lido não se comunica;
uma mensagem ou memorando escrito em outra língua endereçado a
alguém que não conheça o idioma não pode ser considerado comunicação
até ser traduzido. Dessa forma, é válido ressaltar que a comunicação é a
transferência e a compreensão do significado da mensagem.
O Quadro 12 apresenta dados referentes a treinamentos e
avaliações nas empresas em que os imigrantes trabalham atualmente.
113
OS IMIGRANTES HAITIANOS NO MERCADO DE TRABALHO DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ E ITAJAÍ (SC)
Existem treinamentos e avaliações?Sim 6
Não 1
Quadro 12: Existem treinamento e avaliações?Fonte: Dados primários, 2016
O Quadro 12 demonstra que as empresas nas quais os imigrantes
trabalham realizam treinamentos e os mesmos passam por avaliações,
fator determinante para o desempenho de suas tarefas, uma vez que
a maioria está desempenhando atividades diferentes em um país de
cultura e hábitos diferentes. Frente ao exposto, é possível afirmar que os
entrevistados demonstram satisfação com o treinamento recebido.
Ainda é importante ressaltar, segundo Robbins e Decenzo (2014),
que treinamento é uma experiência de aprendizagem que tem como
objetivo a mudança e o aperfeiçoamento contínuo dos funcionários.
Desta maneira envolve desde mudanças de habilidades, conhecimentos,
atitudes e comportamentos, sendo que os conhecimentos mudam, se
aprimoram e suas atitudes em relação ao todo também são aperfeiçoadas.
O fato dos colaboradores passarem por avaliações é de extrema
importância para verificar se o treinamento oferecido está sendo
adequado com as necessidades de todos. Lacombe (2011), relata que
as avaliações são necessárias para verificar de que maneira as pessoas
desempenham o que se espera delas, sendo que a melhor maneira de
manter os seus talentos é conhecê-los melhor do que eles mesmos e
assim elaborar o melhor plano de carreira para eles.
No entanto, deve ficar claro para todos os participantes que o
114
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
objetivo das avaliações é melhorar o desempenho dos avaliados nas
atividades que executam, podendo existir objetivos secundários, como
um feedback
No Quadro a seguir, os imigrantes foram questionados se recebem
retorno sobre o desempenho profissional, ou seja, se os mesmos têm um
feedback dos seus líderes e superiores.
Você recebe retorno sobre o seu desempenho?Sim 4Não 3
Quadro 13: Você recebe retorno sobre o seu desempenho?Fonte: Dados primários, 2016
O Quadro 13 demostra que quanto ao feedback não são todos os
imigrantes que o recebem atualmente nas empresas que trabalham,
demostrando descontentamento por parte daqueles que não recebem
o retorno pelo seu desempenho, uma vez que conforme o Quadro 12 a
maioria passa por avaliações.
O feedback é tido como de extrema importância em todas as
avaliações, pois entende-se que somente desta forma o indivíduo terá
a informação de quais pontos precisam ser melhorados e em quais
aspectos está se saindo bem. Faz parte das características de um bom
administrador saber fazer uma boa avaliação e dar um bom feedback
aos seus subordinados, bem como em conjunto com o mesmo procurar
alternativas para desenvolver os seus pontos fracos melhorando assim o
seu desempenho (LACOMBE, 2011).
115
OS IMIGRANTES HAITIANOS NO MERCADO DE TRABALHO DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ E ITAJAÍ (SC)
Neste contexto, o mesmo autor supracitado pontua que a prática
constante do feedback facilita o diálogo; neste processo, ambos os
envolvidos devem se preparar visto que a forma de comunicar é muito
importante pois há fatores emocionais envolvidos; um feedback mal
informado pode gerar resultados desastrosos.
No próximo Quadro estão informações relacionadas às
perspectivas de crescimento dos imigrantes nas empresas em que
trabalham atualmente.
Existem perspectivas de crescimento?Sim 1Não 6
Quadro 14: Existem perspectivas de crescimento? Fonte: Dados primários, 2016
Quando questionados sobre as perspectivas de crescimento
dos imigrantes nas empresas em que trabalham atualmente, a maioria
informou que não existem.
Para Limongi-França (2012), o propósito da avaliação de
desempenho dentro das empresas é diagnosticar e analisar o desempenho
individual e grupal dos funcionários, promovendo o crescimento
profissional e pessoal dos envolvidos. Já para Gil (2011), as organizações,
enquanto sistemas, tendem a definir o comportamento desejado de
seus empregados no desenvolvimento de suas tarefas. Este é o processo
chamado de descrição de cargos.
Percebe-se certa discrepância nos processos, uma vez que,
116
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
conforme demostrado nos Quadros anteriores, existem os processos de
treinamento e avaliação de desempenho, mas a continuidade do processo
não é mantida, pois não há o feedback e perspectivas de crescimento. A
isso, Robbins e Decenzo (2014) pontuam que a avaliação, além de ser um
ponto determinante para promoções e aumentos salariais, também serve
para localizar as deficiências e elaborar um plano de correção, ajudando
a melhorar o desempenho futuro dos avaliados. Informam ainda
que o ideal é que essas avaliações sejam feitas com maior frequência,
utilizando-as como uma ferramenta profissional.
No Quadro a seguir pode-se verificar em como os imigrantes
avaliam as empresas em todos os seus aspectos.
Como avalia a empresa que trabalha atualmente?Boa 2Regular 3Ruim 2
Quadro 15: Como avalia a empresa que trabalha atualmente?Fonte: Dados primários, 2016
No Quadro 15 é possível perceber que os entrevistados avaliam as
empresas em que trabalham, classificando-as em sua maioria de regular
a ruim. Abaixo destacam-se algumas falas de dois dos entrevistados.
E2: [...] não tenho outro emprego melhor, se tivesse
não estaria aqui. A empresa não é boa, mas é o que
117
OS IMIGRANTES HAITIANOS NO MERCADO DE TRABALHO DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ E ITAJAÍ (SC)
tem agora.
E5: [...] empresa desorganizada.
Conforme relato dos entrevistados E2 e E5, a empresa em que
trabalham atualmente não é boa, mas é o que têm no momento e dependem
de seus salários para se manterem no Brasil e para tentar enviar alguma
ajuda para os seus familiares. Desta maneira, continuam trabalhando na
expectativa de encontrarem um emprego em uma empresa melhor. Pode-
se associar a falta de perspectiva do Quadro anterior à qualificação dada
às empresas, uma vez que os imigrantes se encontram desmotivados
pela falta de feedback e não têm perspectivas de crescimento; logo não
consideram as empresas como “boas” para trabalhar.
Diversas teorias sobre motivação partem do princípio de que
mediante oportunidades e estímulos adequados as pessoas passam
a trabalhar com maior motivação e entusiasmo. É muito mais fácil
encontrar e contratar pessoas competentes do que realmente motivadas,
daí surge a importância de identificar fatores capazes de promover a
motivação dos profissionais (GIL, 2011).
No Quadro a seguir pode-se analisar a percepção dos imigrantes
sobre o processo de Gestão de Pessoas e como é aplicada no ambiente de
trabalho.
Explique o que você entende por gestão de pessoas e como a mesma é aplicada na empresa em que você trabalha?
E1 Existe, mas não é bem clara. Não entende muito bem como funciona.
118
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
E2 Não sabe dizer se tem.E3 Os processos não são bem clarosE4 Os processos não são claros, desorganizada.E5 Não sabe o que é.E6 Existe, mas não é eficiente.
E7 Existe gestão de pessoas e entende que a base é o comportamento, tem que ter o mesmo tratamento para todos.
Quadro 16: Explique o que você entende por gestão de pessoas e como a mesma é aplicada na empresa em que você trabalha?
Fonte: Dados primários, 2016
No Quadro 16, procurou-se saber dos haitianos sobre quais suas
percepções sobre o processo de Gestão de Pessoas. As respostas foram
variadas; aparentemente ficam confusos quando questionados sobre esse
processo. No geral, não percebem esse processo dentro das organizações.
Para Gil (2011), a Gestão de Pessoas é uma função gerencial que
busca a cooperação de todos os colaboradores que atuam dentro de uma
organização para, juntas, alcançarem objetivos tanto organizacionais
quanto pessoais. A expressão que teve origem no final do século XX
substituiu, a rigor, uma evolução das áreas chamadas no passado de
Administração de Pessoal, Relações Industriais e Administração de
Recursos Humanos. Neste contexto, cabe salientar a importância de
selecionar, formar, integrar e aperfeiçoar um determinado grupo de
pessoas para que as mesmas possam desenvolver suas atividades como
uma verdadeira equipe, com objetivos definidos, na qual cada integrante
tenha consciência de seu papel dentro do processo e colabore com os
demais (LACOMBE, 2011).
119
OS IMIGRANTES HAITIANOS NO MERCADO DE TRABALHO DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ E ITAJAÍ (SC)
O Quadro a seguir aborda sobre o preconceito e a discriminação
sofrida pelos imigrantes haitianos no ambiente de trabalho.
Você sofre ou já sofreu algum tipo de discriminação ou preconceito no ambiente de trabalho?
E1 Sim, as pessoas não respondem quando falo bom dia. Passam com a cabeça baixa.
E2 Sim, mas entendo as pessoas, às vezes elas não estão em um bom dia.E3 Sim, o preconceito existe e as pessoas não disfarçam.E4 Sim, mas não dou atenção.E5 Não.E6 Sim.E7 Existe o preconceito, mas ignoro, sou amigo de todos.
Quadro 17: Você já sofreu algum tipo de discriminação ou preconceito no ambiente de trabalho?
Fonte: Dados primários, 2016
O Quadro 17 revela que os imigrantes haitianos sofrem com
questões de preconceito e discriminação em seus ambientes profissionais.
Conforme seus relatos, muitas vezes passam despercebidos pelos
corredores das empresas em que trabalham, algumas vezes até um
simples bom dia lhes é negado. Alguns dizem entender que as pessoas
podem não estar em um “bom dia” e por isso não os cumprimentam.
O Quadro 18 reúne as respostas dos entrevistados sobre como
julgam viver em um país de cultura diferente, ademais avaliam como é
o processo de comunicação não só dentro da empresa, mas também fora
do ambiente de trabalho.
120
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
Como é viver em um país de cultura diferente e como é o processo de comunicação fora do ambiente de trabalho? É mais fácil?
E1 É bom viver no Brasil, a comunicação é melhor no ambiente de trabalho. Vai tentar ver se dá certo morar aqui.
E2 A língua é difícil, teve que aprender sozinho, gosta do Brasil.
E3 O Brasil já foi bom, agora o custo de vida está muito alto; a comunicação fora do trabalho é melhor.
E4 A comunicação fora do trabalho é melhor; gosta do Brasil, mas o custo de vida está muito alto.
E5 É difícil, tudo é diferente.E6 É mais fácil fora,
E7 A cultura diferente é um aprendizado; a comunicação é melhor na empresa, quando convive mais com as pessoas.
Quadro 18: Como é viver em um país de cultura diferente e como é o processo de comu-nicação, fora do ambiente de trabalho? É mais fácil?
Fonte: Dados primários, 2016
O Quadro 18 apresenta a percepção dos imigrantes em um país
de cultura diferente da sua e quanto ao processo de comunicação. Os
imigrantes, em sua maioria, revelam gostar do Brasil e de sua cultura, porém
quanto à comunicação advertem que ainda passam por dificuldades,
sendo que tiveram que aprender a língua portuguesa sozinhos, no dia
a dia. Atualmente, parte dos entrevistados já consegue se comunicar
relativamente bem; alguns relatam que a comunicação fora do ambiente
de trabalho é melhor, o que demonstra certo descontentamento com o
processo de comunicação empresarial.
No Quadro a seguir são apresentadas as perspectivas dos
imigrantes; se pretendem ficar morando no Brasil e qual a imagem que
têm do Brasil.
121
OS IMIGRANTES HAITIANOS NO MERCADO DE TRABALHO DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ E ITAJAÍ (SC)
Você pretende ficar morando no Brasil?O que você acha do Brasil?
E1 Vai tentar ver se dá certo; custo de vida muito alto no Haiti, não paga aluguel e mora com os familiares. Quanto ao Brasil já foi melhor.
E2 Sente falta da família; se ganhar o suficiente para poder visitá-los pretende ficar no Brasil. Gosta do Brasil, é legal; gosta das praias.
E3 Não. Está indo embora em agosto de 2016. O Brasil é um país bonito, mas muito preconceituoso. No Haiti não tratam mal os brasileiros.
E4 Não, está indo embora no próximo mês. O Brasil é um país bom, mas com a crise ficou muito difícil.
E5 Não pretende ficar no Brasil; era bom, agora está ruim.E6 Não sabe ainda se vai ficar. Quanto ao Brasil, tem coisa boas e ruins.
E7 Não é definitivo ficar morando no Brasil. Acha o Brasil um país aberto para todos, para o turismo; Santa Catarina é um lugar tranquilo.
Quadro 19: Você pretende ficar morando no Brasil?Fonte: Dados primários, 2016
Conforme os relatos supracitados, uma parte significativa dos
imigrantes haitianos está indo embora do Brasil, voltando para o seu país
de origem. Devido à crise econômica brasileira a situação dos imigrantes
que já não era das melhores ficou ainda mais difícil. Com salários baixos e
o custo de vida mais alto ficou ainda mais difícil se manter e enviar ajuda
para a família.
A distância da família e a burocracia para trazê-la para o Brasil é
outro fator relevante para que abandonem o sonho de uma vida melhor
e voltem para o Haiti. Por sua vez, o preconceito sofrido pelos imigrantes
também é um fator determinante para que regressem ao seu país, sendo
que a frustação é nítida quando questionados sobre os motivos de
voltarem para o seu país.
122
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
No Quadro 20, o enfoque é sobre as dificuldades encontradas no
Brasil pelos imigrantes, a fim de se saber de que maneira afetam a rotina
desses trabalhadores.
Dificuldades encontradas no BrasilE1 Emprego, moradia.E2 Comunicação, língua portuguesa.E3 Comunicação, moradia e preconceito.
E4 Distância da família, dificuldade em obter informações sobre quase tudo que se precisa.
E5 Idioma, moradia e trabalho.
E6 Crescimento no trabalho, escrita da língua portuguesa, aluguel muito caro.
E7 Mudanças de horários nas empresas.
Quadro 20: Dificuldades encontradas no BrasilFonte: Dados primários, 2016
No Quadro 20, verifica-se que em relação às principais dificuldades
encontradas pelos imigrantes haitianos no Brasil são: comunicação,
moradia, emprego, distância da família e preconceito. Conforme já foi
visto nos Quadros anteriores, esses fatores elencados no Quadro 20 são
importantes para o desenvolvimento humano, evidenciando o porquê
de a maioria dos haitianos estarem abandonando o sonho de uma vida
melhor no Brasil e voltar para o seu país de origem.
123
OS IMIGRANTES HAITIANOS NO MERCADO DE TRABALHO DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ E ITAJAÍ (SC)
▯ CONSIDERAÇÕES FINAIS
Tendo como objetivo geral a percepção dos imigrantes haitianos
quanto ao processo de Gestão de Pessoas e de como ela é aplicada nas
empresas em que trabalham, ficou claro que não têm uma opinião formada
sobre a expressão “Gestão de Pessoas”. Quando questionados sobre
treinamento, avaliações e feedback, respondem com propriedade sobre
os assuntos, diferentemente de quando é a usada a expressão ‘Gestão de
Pessoas’. Neste momento, ficam com o olhar perdido, conversam entre si
no seu idioma nativo, meio que tentando explicar um para o outro sobre
o assunto.
Quanto à dificuldade de os imigrantes haitianos entrarem e se
manterem no mercado de trabalho, pode-se dizer que não passaram por
dificuldade para entrar no mercado de trabalho, porém a maioria informa
que os empregos atuais não condizem com as suas qualificações. Vale
ressaltar que, apesar da manifesta insatisfação com cargos e salários,
têm um nível de rotatividade muito pequeno entre os entrevistados. A
maioria está no Brasil deste o ano de 2013 e trocaram de emprego apenas
uma vez neste período.
A principal dificuldade apontada pelos haitianos no ambiente de
trabalho é a comunicação. Informam que os processos não são claros e,
desta forma, muitas vezes não entendem determinadas orientações; a
dificuldade é ainda maior com a escrita da língua portuguesa. Dentre os
entrevistados, alguns informaram que usam os gestos e o som quando não
124
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
sabem falar determinada palavra. Sendo a comunicação um dos fatores
mais importantes dentro e fora das organizações, pode-se perceber a
dificuldade que têm em entenderem e executarem corretamente as suas
tarefas.
No contexto das diferenças culturais e da invisibilidade humana,
nos deparamos com uma dura realidade: o preconceito e a discriminação
já são observados na hora dos imigrantes procurarem por uma residência.
De forma geral, todos informaram que os brasileiros não querem alugar
casas para haitianos e quando alugam são em locais ruins e com valores
acima dos praticados normalmente para os próprios brasileiros.
Os imigrantes também informam que o racismo existe e que as
pessoas não disfarçam, chegando ao ponto de um simples “Bom dia” ser
ignorado. As pessoas passam por eles de cabeça baixa, desviando-lhes
o olhar, o que evidencia que são vítimas da “invisibilidade humana”.
Alguns se mostraram magoados com essa situação e informaram que
no Haiti não tratam mal os brasileiros; outros por sua vez informam que
entendem que as pessoas passam despercebidas e não os saúdam por não
estarem em um bom dia, como se procurassem justificar o preconceito
sofrido ou como forma de se esconder da agressão que é ser ignorado
pelos seus semelhantes.
Por fim, analisou-se se os imigrantes haitianos têm possibilidades
e perspectivas de desenvolvimento profissional. Por meio da análise dos
dados coletados, mais uma vez o resultado foi negativo, uma vez que
são supostamente treinados e avaliados, mas nem sequer recebem um
feedback sobre o seu desempenho.
125
OS IMIGRANTES HAITIANOS NO MERCADO DE TRABALHO DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ E ITAJAÍ (SC)
No início deste trabalho, partiu-se da hipótese de que as
empresas não possuem programas de Gestão de Pessoas direcionados
para os imigrantes haitianos, não se percebendo muita preocupação
com o desempenho dos mesmos nem com o desenvolvimento desses
profissionais. Ao final desta pesquisa, pode-se afirmar que a hipótese foi
confirmada, sendo que com a análise dos dados coletados evidenciou-
se que não existe nenhum tipo de programa ou projeto voltado para o
desenvolvimento e bem-estar destes imigrantes que estão em meio a
uma multidão e ao mesmo tempo sozinhos, em sua luta pela própria
sobrevivência e envio de subsídios para suas famílias que ficaram em um
país tão distante, castigados por exploração de suas riquezas no passado e
hoje vítimas de incidentes naturais que deixaram uma população inteira
em condições sub-humanas de vida.
Para os autores, o presente trabalho foi de grande aprendizado
tanto profissional quanto pessoal. O contato com pessoas de cultura
diferente e proximidade com a comovente história de vida dos imigrantes,
nos faz repensar alguns hábitos e atitudes que, apesar de pequenos, se
praticados no dia a dia, podem fazer diferença na nossa vida e de quem
está ao nosso redor.
Percebe-se uma grande dificuldade dentro das organizações
de lidar com a diversidade, com o novo e com o diferente; as pessoas
são julgadas pela aparência. Essa realidade faz parte do cotidiano não
somente dos imigrantes, mas de uma maioria que pertence a uma classe
social menos favorecida ou a pessoas com hábitos e atitude julgadas
diferentes do “padrão”, por assim dizer. Vivemos em um país em que o
126
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
preconceito é evidente e o diferente é julgado.
Em tempo: Dos sete entrevistados, sabe-se que três já desistiram
do Brasil e voltaram para o Haiti!
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OS IMIGRANTES HAITIANOS NO MERCADO DE TRABALHO DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ E ITAJAÍ (SC)
▯ REFERÊNCIAS
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129
O PROCESSO DE INTEGRAÇÃO DE FUNCIONÁRIOS HAITIANOS POR EMPRESA BRASILEIRA
130
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
CAPÍTULO 3
O PROCESSO DE INTEGRAÇÃO DE FUNCIONÁRIOS HAITIANOS POR EMPRESA BRASILEIRA
Uana Paula Stivan6
Andréia Martins7
6 - Aluna egressa do curso de Administração da Faculdade Avantis.7 - Professora do curso de Administração da Faculdade Avantis.
131
O PROCESSO DE INTEGRAÇÃO DE FUNCIONÁRIOS HAITIANOS POR EMPRESA BRASILEIRA
Localizado na América Central, o Haiti tem uma faixa territorial
de 27.750 km² e possui mais de 10 milhões de habitantes. Colonizado
pelos franceses, foi fundado em 1.804 por antigos escravos. Assinalado
por uma série de governos ditatoriais e golpes de Estado, sua população
presenciou guerra civil e muitos problemas socioeconômicos. Além
desses agravantes, o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) é de 0,404
(baixo), sendo que aproximadamente 60% da população é subnutrida e
mais da metade vive abaixo da linha de pobreza, ou seja, com menos de
1,25 dólares por dia (FRANCISCO, 2014).
Após o terremoto que atingiu o referido país, em janeiro de 2010,
a situação piorou deixando mais da metade da população desempregada,
sendo que esse contexto favoreceu a imigração para o Brasil. A procura
dos haitianos por emprego veio ao encontro da necessidade de mão de
obra de Santa Catarina que, de acordo com dados do Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística (IBGE), é o Estado com o menor nível de
desemprego no Brasil, apresentando em 2012 uma porcentagem de 3%
de desempregados, praticamente a metade da taxa em nível nacional
(SANTOS, 2013).
Neste sentido, a empresa de limpeza urbana avaliada no presente
estudo aproveitou a oportunidade em que muitos haitianos entraram no
país para contratá-los. A empresa em estudo atua há mais de 40 anos no
ramo da limpeza pública e obras, incluindo a coleta de resíduos sólidos,
saneamento e a disposição final dos resíduos, prestando serviços em nove
cidade do Estado, empregando diretamente mais de 1.800 funcionários,
entre motoristas, operadores, laboratoristas, coletores, varredores,
132
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
encarregados de serviço, gerentes e pessoal técnico e administrativo. A
filial onde esse estudo se realizou, conta com 102 funcionários, entre eles
17 haitianos.
Com dificuldades em contratar mão de obra, em 2014 a empresa em
estudo deslocou uma equipe até o Acre, mais especificadamente numa
cidade chamada Brasiléia, local que se concentrava grande parte dos
haitianos, com o objetivo de recrutar e selecionar profissionais. Frente ao
contexto, registrou problemas com a adaptação desses funcionários, pois
têm dificuldades de se adequarem às regras e às normas da organização.
Assim, a interação dos funcionários haitianos promoveu uma mudança
nos hábitos, nas regras e na própria cultura organizacional, exigindo um
ajuste sobre algumas políticas.
Cabe ressaltar que o processo de integração se inicia com a
ambientação, quando ocorre a apresentação da empresa ao novo
funcionário, com o objetivo que ele conheça onde está iniciando suas
atividades. Normalmente o programa é conduzido pelo líder, o qual
auxilia na aceitação do funcionário pelos demais (RIBEIRO, 2005).
De acordo com Lacombe (2011), a integração consiste em passar as
informações da empresa ao novo funcionário, explicando as normas e as
políticas da cultura de uma forma geral e, principalmente, o seu papel na
organização.
A socialização do funcionário também faz parte da integração,
pois é o processo de sua adaptação ao grupo e ao trabalho. É o momento
em que a organização o treina para realizar suas atividades e ter o melhor
desempenho possível. A partir deste contexto, essa pesquisa tem como
133
O PROCESSO DE INTEGRAÇÃO DE FUNCIONÁRIOS HAITIANOS POR EMPRESA BRASILEIRA
pergunta problema a seguinte questão: Qual é a percepção dos gestores
brasileiros e dos funcionários haitianos com relação ao processo de
integração realizado por uma empresa catarinense de limpeza urbana
e saneamento? Com isso, objetiva-se verificar a percepção desses
imigrantes com relação a esse processo, apontando as suas fragilidades
e potencialidades.
Justifica-se a realização deste estudo estritamente qualitativo
pelas frequentes contratações e demissões de funcionários haitianos
pela empresa em estudo.
▯ PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
A pesquisa foi realizada a partir da abordagem qualitativa, a qual
conforme Banks (2009) procura entender, descrever e talvez explicar os
fenômenos sociais. Já quanto aos objetivos o presente estudo caracteriza-
se como exploratório que, segundo Gil (2010), está diretamente ligado a
conceitos e ideias e são desenvolvidos com o intuito de o pesquisador se
aproximar de um determinado fato. Quanto aos procedimentos técnicos
admite a forma de estudo de campo, utilizado quando a pesquisa busca
interrogar diretamente as pessoas cujo comportamento se deseja
conhecer (GIL, 2010).
A pesquisa foi realizada em 2014 com nove funcionários haitianos
da empresa responsável pela limpeza urbana de um município do
Estado de Santa Catarina, sendo quatro coletores, quatro serventes e
134
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
um tradutor. Também foram entrevistados quatro líderes/gestores, entre
eles um gerente, um técnico de segurança do trabalho, um fiscal do setor
da coleta e um fiscal do setor dos serviços gerais. Convém explicar que
a amostragem é não probabilística, por conveniência, ocorrendo por
decisão dos pesquisadores, não permitindo generalizar os resultados
para o todo.
A coleta de dados foi realizada por meio de duas entrevistas: uma
com roteiro de questões especificamente elaboradas para os gestores/
líderes e a outra para os funcionários haitianos. Para entrevistar os
funcionários haitianos foi necessário o auxílio de um tradutor, o qual
também é funcionário da empresa e tem nacionalidade haitiana. Para
verificar os dados obtidos foi utilizada a análise de conteúdo que de acordo
com Beuren et. al (2008) tem como objetivo interpretar as comunicações
entre as pessoas e, principalmente, o conteúdo das mensagens que eles
liberam.
▯ GESTÃO DE PESSOAS E O PROCESSO DE INTEGRAÇÃO
As organizações são formadas por pessoas as quais dependem
da mesma para atingirem suas realizações pessoais. Em contrapartida,
as organizações também acabam sendo dependentes das pessoas, pois
somente elas têm a capacidade de serem racionais, criativas, enérgicas,
dinâmicas. O resultado disso é a interdependência de ambas as partes:
135
O PROCESSO DE INTEGRAÇÃO DE FUNCIONÁRIOS HAITIANOS POR EMPRESA BRASILEIRA
pessoas e organização, ou seja, a gestão de pessoas é o resultado da união
dessas e uma depende da outra para atingir seus objetivos (CHIAVENATO,
2010).
Nesse sentido, a área de Gestão de Pessoas se preocupa com a
participação e o envolvimento dos funcionários para com a organização.
Gil (2012) define este campo como uma função gerencial que se preocupa
com a cooperação dos funcionários para aos atingir os objetivos tanto
pessoais quanto organizacionais. Deste modo, o autor supracitado
também afirma que essa área está relacionada em praticamente todos os
processos em que há pessoas envolvidas com a organização.
Nesta concepção, entende-se que todos os administradores
são gestores de pessoas a partir do momento em que possuem um
relacionamento com seus subordinados, a fim de promover um bom
clima de trabalho, cabendo ao Departamento de Recursos Humanos (RH)
elaborar políticas que auxiliem a gestão dos funcionários, vinculando-
os aos objetivos empresariais (BITENCOURT et. al, 2010). Neste sentido,
Chiavenato (2010) destaca que cada gestor precisa desempenhar quatro
funções administrativas, a saber: planejar os objetivos e suas estratégias;
organizar como deve ser realizado; dirigir como um líder e controlar o
desempenho das atividades. Frente a este entendimento, os processos de
gestão de pessoas visam atingir as metas das organizações, mas também
vão ao encontro das metas das pessoas que trabalham com a organização,
visto que os resultados obtidos pelas atividades desenvolvidas agregam
valores a ambos.
Há uma diversidade de atividades executadas pelo RH, iniciando
136
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
na identificação das necessidades de pessoal, passando por tarefas
como recrutamento, seleção, treinamento, remunerações, até o controle
do desenvolvimento de cada funcionário. Alguns processos visam a
inserção de pessoas na organização, indivíduos esses que podem ser
de fora (recrutamento externo) ou de dentro da empresa (recrutamento
interno). Para Bitencourt et. al (2010), o recrutamento é um procedimento
que consiste no processo em que a empresa procura pessoas com o perfil
que mais se aproxima dos requisitos esperados. A seleção vem logo em
seguida, pois a partir dos resultados obtidos no recrutamento, cabe o
papel de escolher o perfil mais adequado ao cargo (GIL, 2012). Bitencourt
et. al (2010) afirmam que a seleção tem um papel fundamental para todo
o desenvolvimento, pois nem sempre um treinamento compensa uma
má seleção.
Já os processos de aplicação de pessoas dizem respeito às atividades
de análise e descrição de cargos, planejamento e alocação interna dos
recursos humanos (GIL, 2012). Bitencourt et. al (2010) afirmam que um
mau desempenho não pode ser direcionado a apenas um lado e os únicos
fatores que estão relacionados aos funcionários são as características
pessoais, pois os demais fatores estão no comando dos gestores. Neste
sentido, as organizações, além de fornecerem os meios necessários para
o desempenho das atividades, devem mostrar para o trabalhador o que
esperam do mesmo.
Para Chiavenato (2010), os processos de recompensa, como o
próprio nome já diz, buscam recompensar as pessoas pelo trabalho
realizado ou para incentivá-las a satisfazerem suas necessidades
137
O PROCESSO DE INTEGRAÇÃO DE FUNCIONÁRIOS HAITIANOS POR EMPRESA BRASILEIRA
individuais, podendo ser tanto financeira quanto social. Levando-se em
consideração que atualmente as remunerações tradicionais não atraem
as pessoas qualificadas e o talento humano está escasso, as organizações
obrigam-se a adotarem novas formas de recompensas, sendo que
algumas delas são apresentadas por Gil (2012), a saber: remuneração
por conhecimento e habilidades; remuneração por competências;
remuneração variável, entre outras.
Por sua vez, os processos de manutenção das pessoas têm a
preocupação voltada aos aspectos ambientais e psicológicos, como
cultura, clima, disciplina, higiene, segurança e qualidade de vida.
Caso alguns desses fatores não estejam suprindo as necessidades das
pessoas que fazem parte da organização, as mesmas podem se sentirem
desmotivadas para permanecer na empresa (CHIAVENATO, 2010).
O processo de desenvolvimento busca capacitar os trabalhadores,
profissional e pessoalmente, por meio de treinamentos, sendo que,
atualmente, esses programas não se preocupam apenas com a produção,
mas vão além e trabalham os relacionamentos interpessoais de forma
que auxiliem no alcance das metas organizacionais e do aprimoramento
das relações entre os indivíduos (GIL, 2012). Por fim, os processos
de monitoramento das pessoas são responsáveis por acompanhar e
controlar os resultados, entre as atividades citam-se: bancos de dados e
sistema de informações gerenciais (CHIAVENATO, 2010).
Frente ao exposto, observa-se que a Gestão de Pessoas possui
como objetivo levar a organização ao sucesso, para isso necessita fazer
com que os gestores se atentem cada vez mais às pessoas, tratando-as
138
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
como o principal elemento para a força empresarial.
O processo de integração, foco deste estudo, tem como objetivo
apresentar a organização ao novo funcionário e vice-versa. Bergstein
(1980) diz que este se constitui em um conjunto de atitudes que levam o
funcionário que acabou de ser admitido a ajustar-se à nova organização
e suas normas. A integração de funcionários estrangeiros pode ser
mais difícil para a organização, pois muitas vezes os contratados não
falam o idioma local, dificultando a comunicação e o relacionamento
interpessoal. Neste sentido, Penteado (2001) destaca que a comunicação
tem por objetivo o entendimento entre as pessoas, mas para que exista
é preciso que os indivíduos se compreendam. Por sua vez, Miranda
(1999) complementa afirmando que a comunicação é um instrumento
de trabalho, lazer, prazer, negociação, entre outros; contudo, havendo a
falha neste processo se registrará um equívoco nas informações recebidas
pelo novo funcionário, podendo este não apresentar os resultados que a
empresa espera.
Van Maanen (1992, apud NICKEL, 2001) afirma que a integração
pode ocorrer formal (quando se prepara o novo funcionário para um cargo
de status) ou informalmente (para cargos operacionais), sendo que é no
processo informal que as normas e as atividades a serem desempenhadas
são repassadas sem nenhuma prescrição. Por sua vez, Chiavenato (2009)
apresenta os principais itens de um programa de integração de forma
que os novos colaboradores se adaptem à organização, à sua cultura, à
hierarquia e à estrutura da empresa de forma geral. Os referidos itens
estão expressos no Quadro 1.
139
O PROCESSO DE INTEGRAÇÃO DE FUNCIONÁRIOS HAITIANOS POR EMPRESA BRASILEIRA
Assuntos Organizacionais
A missão e os objetivos básicos da organização.As políticas, isto é, os meios pelos quais os objetivos deverão ser alcançados.Como a organização está estruturada: o que cada unidade ou departamento faz.Arranjo físico das áreas de utilização do novo membro.Os principais produtos e serviços realizados pela organização.Regras e regulamentos internos.Procedimentos de segurança no trabalho.
Benefícios oferecidos pela organização
Horário de trabalho, de descanso e de refeições.Dias de pagamento e de adiantamento salariais.Benefícios sociais oferecidos pela organização.
Apresentações Aos superiores e aos colegas de trabalho
Deveres do cargo
Responsabilidades básicas confiadas ao novo participante.Tarefas do cargo.Objetivos do cargo.Visão geral do cargo.
Quadro 1 – Principais itens de um programa de integração. Fonte: Chiavenato, 2009.
Com base no Quadro 1, verifica-se que em um processo de
integração o novo funcionário deve assimilar a organização como
um todo, pois só assim poderá dar tudo de si para atingir as metas da
empresa. Os programas de integração podem reduzir o período de
adaptação ao trabalho, fornecem ao supervisor oportunidade de orientar
o novo funcionário corretamente, antes que outro o faça da forma errada;
diminuem a necessidade de ações corretivas e penalidades devido ao
desconhecimento dos regulamentos da empresa; provêm subsídios para
o empregado vencer o medo do desconhecido que dificulta o alcance
da produção ideal e diminuem o número de demissões (CHIAVENATO,
140
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
2009).
Neste sentido, entende-se que a cultura organizacional interfere
no processo de integração, pois é a partir dela que surgem as regras e
normas, assim como visão, missão e valores. Assim, se a pessoa não se
adaptar à cultura dificilmente se habituará às atividades exercidas pela
organização.
De acordo com Lacombe (2011), a cultura organizacional é
compatível com o modelo de vida da organização, definindo algumas
normas de comportamentos que administram as decisões da organização.
O autor ainda a define como a união das crenças, dos costumes, dos
sistemas de valor junto com a forma de realizar o negócio, sendo
distinto de empresa para empresa, tornando-se assim um padrão para as
atividades que caracterizam a vida organizacional.
Chiavenato (2010) adverte que a essência da cultura organizacional
é vista na forma como ela trata seus clientes, seus funcionários, a
autonomia e a liberdade que ela dá em sua organização de forma geral,
além da lealdade dos funcionários para com a empresa.
▯ A IMIGRAÇÃO HAITIANA PARA O BRASIL
A imigração se caracteriza pelo ato de sair de um país e ir para outro
se estabelecendo nesse (FERREIRA, 2005). O Brasil é um país multicultural,
o que dá a entender que foi formado por muitos imigrantes desde o seu
141
O PROCESSO DE INTEGRAÇÃO DE FUNCIONÁRIOS HAITIANOS POR EMPRESA BRASILEIRA
descobrimento. Já no século XXI, surgem novos imigrantes, vítimas da
crise que atingiu os Estados Unidos da América (EUA) e a Europa; em
2009, o Brasil foi visto como uma oportunidade para os estrangeiros que
buscavam empregos. Além disso, o terremoto que atingiu o Haiti em
2010 aumentou esse movimento migratório (FAGUNDEZ; GRAVA, 2014).
Avaliando esse caso, Farias (2011) afirma que depois de tanto tempo
é a primeira vez que ocorre um movimento migratório tão grande como
esse para o Brasil, ainda mais vindo de um país que não faz fronteira.
Passos (2011) complementa que o terremoto que atingiu o Haiti, matando
mais de 200 mil pessoas e deixando em torno de 3 milhões desabrigados,
fez com que muitos deixassem seu país devido à miséria em que se
encontravam.
Quando aqui chegam, os haitianos procuram redes humanitárias
para serem recebidos como refugiados, no entanto, não podem ser
classificados como tal, pois essa denominação cabe apenas a imigrantes
que tiveram que deixar seu país por perseguição política ou violação de
direitos humanos. Os que não insistem no visto de refugiados recebem
um visto humanitário para não passarem fome, terem acesso ao Sistema
Único de Saúde (SUS) e o direito de retirar documentos, como carteira de
trabalho e Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) (ROCHA; ARANHA, 2011;
TREZZI, 2011).
O Acre tem sido a porta de entrada dos haitianos ao Brasil, mas
depois de terem as documentações regularizadas, iniciam o processo de
migração para outros Estados do país que fornecem mais oportunidades
de trabalho, dentre eles Santa Catarina (CHAGAS, 2012). A isso,
142
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
Abdelmalek Sayd (apud SILVA, 2014) um dos maiores pensadores das
migrações contemporâneas, segue a lógica que o mercado de trabalho é
a principal razão dos movimentos migratórios. Conforme observado no
contexto geral da história da migração brasileira, o mercado de trabalho
é um dos grandes fatores para o incentivo das imigrações que ocorreram
ao longo da história nacional.
▯ APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS
Nesta seção, são apresentados os resultados das entrevistas
realizadas com os gestores brasileiros e funcionários haitianos com
a finalidade de conhecer suas opiniões sobre o processo de integração
realizado, como também apresentar o contexto que trouxe esses haitianos
ao Brasil, e os motivos que levaram a empresa a contratá-los. Cabe
ressaltar que nos Quadros apresentados nessa seção, a coluna referente
aos respondentes, não corresponde à quantidade de entrevistados e sim
à quantidade de vezes que a subcategoria foi citada pelos mesmos. Os
gestores e funcionários são identificados por números para manter a
integridade e o anonimato; assim, os gestores são identificados de G1 a
G4, e os funcionários haitianos de F1 a F9.
143
O PROCESSO DE INTEGRAÇÃO DE FUNCIONÁRIOS HAITIANOS POR EMPRESA BRASILEIRA
▯ PERCEPÇÃO DOS GESTORES FRENTE AO PROCESSO DE INTEGRAÇÃO DOS FUNCIONÁRIOS HAITIANOS
O Quadro 2 apresenta a percepção dos gestores quanto aos motivos
que levaram a empresa em estudo a contratar funcionários haitianos.
Subcategoria Respondentes
Falta de mão de obra brasileira. 1
Falta de mão de obra na região de Santa Catarina. 2
Mão de obra qualificada 1
Pesquisa dos estados que forneciam mão de obra disponível. 2
Grande quantidade de haitianos no Acre. 2
Haitianos têm o perfil físico que a empresa procura. 2
Devido à falta de mão de obra para a atividade, a empresa busca qualquer outro tipode alternativa. 1
Quadro 2 – Motivos que fizeram a empresa contratar funcionários haitianos, na visão dos gestores.Fonte: Dados primários, 2014.
A primeira pergunta feita aos gestores foi: Qual é sua opinião
referente aos motivos que fizeram a empresa contratar funcionários
haitianos? Conforme o Quadro 2, percebe-se que os quatro respondentes
apresentaram sete motivos diferentes. Destas percepções, houve um
destaque sobre a falta de mão de obra capacitada na região de Santa
144
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
Catarina. Ainda analisando as subcategorias do Quadro, é possível notar
que outros motivos que levaram a empresa a contratar funcionários
haitianos foram as pesquisas nos demais Estados brasileiros onde
dispunham de mão de obra. Os resultados da pesquisa apontaram o alto
número no Acre (principal Estado de entrada dos haitianos), no qual as
pessoas aparentemente tinham o perfil desejado pela empresa; como cita
o Gestor 3:
Então a empresa fez uma pesquisa em quais outros
Estados possuíam mão de obra disponível, e nós
encontramos grande quantidade de haitianos no
Acre. Então a empresa foi lá para verificar se era
o perfil que a empresa necessitava. Constatou que
realmente eles atendiam ao nosso perfil. E daí por
isso nós fizemos a contratação desses haitianos [...]
nós pesquisamos em todos os Estados, [...] pra ver
com os SINEs onde que tem quantidade de pessoal
e descobrimos que lá no Acre tinha quantidade; na
época tinha em torno de 400 haitianos lá [...] Aí foi
lá, fez a entrevista, viu que eles tinham o perfil [...]
e atendiam ao que nós precisávamos.
Pelas citações do entrevistado, é possível notar que a ilusão de uma
grande concentração de pessoas no mesmo local facilitaria a procura pela
mão de obra. A empresa tomou a decisão de preencher a maioria das
vagas disponíveis com profissionais haitianos, assim como muitas outras
145
O PROCESSO DE INTEGRAÇÃO DE FUNCIONÁRIOS HAITIANOS POR EMPRESA BRASILEIRA
empresas do Estado de Santa Catarina. É possível notar na fala do Gestor
3 que além da grande quantidade de mão de obra em um único lugar,
eles tinham um perfil que atraia as empresas, que no geral era composto
das seguintes características: homens, magros e que deixaram a família
no Haiti. O problema é que a dificuldade que as empresas catarinenses
encontram no recrutamento de mão de obra não está apenas em Santa
Catarina, e sim em todo o Brasil, afinal, um funcionário que atende as
necessidades da empresa, reduzindo os problemas e as reclamações, está
cada vez mais escasso.
Com relação ao desempenho dos funcionários e designação
do cargo, existe uma ferramenta básica que auxilia exatamente nesta
questão. É a seleção de pessoas, que atua como um filtro com o objetivo
de escolher os candidatos que contenham os requisitos necessários para
ocupar os cargos dentro da empresa, visando o aumento da eficiência e a
eficácia da organização. Contudo, na seleção de pessoas deve-se levar em
consideração a variabilidade humana tanto em aspectos físicos quanto
psicológicos, visto que essas diferenças são fatores decisivos para o
desempenho das pessoas (CHIAVENATO, 2010).
No Quadro 3, a seguir, apresenta-se a visão dos respondentes
quanto aos aspectos positivos obtidos pela empresa no processo de
integração de funcionários haitianos.
Subcategoria Respondentes
Tradutor. 4
Envolvimento com estrangeiros. 1
146
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
O suprimento da mão de obra que faltava. 1
Os haitianos estão satisfeitos com o trabalho. 2
Grande quantidade de pessoas que atendem ao perfil da empresa. 2
Alguns haitianos entendiam português. 2
Alguns haitianos falavam espanhol. 1
Os haitianos que compreendiam o português repassavam as informações para os demais. 1
A empresa forneceu um lugar onde todos os haitianos pudessem ficar juntos, se sentindo mais seguros. 1
Alguns haitianos estavam acostumados com o trabalho pesado. 1
Não há pontos positivos. 2
Quadro 3 – Aspectos favoráveis no processo de integração aplicado pela empresa em estudo
Fonte: Dados primários, 2014.
O Quadro 3 está relacionado com a segunda pergunta aberta
feita aos gestores: Quais foram os aspectos favoráveis no processo de
integração dos funcionários haitianos? Conforme o Quadro, foram
citadas 10 pontos positivos, no entanto, o que obteve maior destaque foi
a presença de um tradutor, que esteve auxiliando a equipe no processo
de integração de funcionários haitianos. Vale destacar que além de uma
pessoa específica para a função de tradutor, a empresa contava com o
apoio de muitos haitianos que falavam espanhol, compreendiam o
português e repassavam as informações aos demais haitianos, como os
gestores citam nas seguintes falas:
Tem um tradutor que interage junto com a empresa
147
O PROCESSO DE INTEGRAÇÃO DE FUNCIONÁRIOS HAITIANOS POR EMPRESA BRASILEIRA
[...] esse tradutor passa as normas de trabalho
exigidas pela empresa. (G2).
Nós também tivemos alguns haitianos que
entendiam nosso dialeto, [...] falavam espanhol e
compreendiam o português, então isso facilitou,
porque daí então nós fazíamos a explicação para
esses que entendiam e esses repassavam as
informações para os demais, isso facilitou (G3).
[...] como é que eu vou passar uma informação pra
eles se eu não sei me comunicar com eles. Com
exceção de um dia que teve o tradutor. (G4).
Uma das subcategorias que foi citada apenas uma vez foi a questão
da grande concentração de pessoas que atendiam às necessidades da
empresa, visto que na categoria anterior o principal motivo que levou
à contratação de funcionários haitianos foi a falta de mão de obra. Na
época dessa pesquisa, em 2014, a empresa realizava durante o ano
pesquisa nos SINEs (Sistema Nacional de Emprego) de diferentes Estados
brasileiros, procurando onde havia maior número de candidatos para um
menor número de vagas, entendendo que este é o lugar ideal para realizar
a contratação de vários funcionários de uma única vez. A contratação de
muitos funcionários em um único momento foi um fator favorável para
a empresa admitir haitianos, como observa-se em duas citações de um
148
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
dos respondentes:
Favorável, porque tinha uma concentração grande
de pessoas que atendiam as nossas necessidades.
(G3).
[...] na época tinha em torno de 400 haitiano lá...
(G3).
Um dos gestores foi além, nas subcategorias referentes aos
aspectos positivos afirma que os funcionários haitianos supriram a
necessidade de mão de obra que a empresa necessitava. Afirmando que
“Esses haitianos estão suprindo a mão de obra que faltava” (G3).
Um outro aspecto positivo relacionado à mão de obra é o costume
com trabalhos pesados, sendo que isso é observado na seguinte fala:
Os que já faziam lá outras atividades como pedreiro,
foram os que se adaptaram aqui. (G3).
Como as atividades desenvolvidas pela empresa são voltadas à
limpeza urbana e à coleta de resíduos sólidos ou recicláveis, se referem a
atividades pesadas, como a fala do gestor G3; nota-se que os profissionais
que já desempenhavam atividades como pedreiro, são os que se adaptam
149
O PROCESSO DE INTEGRAÇÃO DE FUNCIONÁRIOS HAITIANOS POR EMPRESA BRASILEIRA
às atividades da empresa.
O Ministério do Trabalho e Emprego (BRASIL A, 2013, s/p)
desenvolveu uma pesquisa sobre o perfil dos haitianos, identificando que
de 758 haitianos que recebiam a Carteira de Trabalho, “a maioria (46%)
dos haitianos tem prática em atividades da construção civil – pedreiro,
bombeiro encanador, mestre de obras, pintor e marceneiro. Há também
agricultor (7%), mecânico (6%) e técnico de informática (3%)”.
Outro ponto positivo para a contratação dos haitianos é que eles
atendem ao perfil desejado pela empresa, conforme observa-se nas
seguintes falas:
Aí foi lá, fez a entrevista, viu que eles tinham o perfil
e atendiam ao que a gente precisava [...] constatou
que realmente eles atendiam o nosso perfil. (G3).
Conforme se observa no Quadro 3, o gestor G4 alegou não haver
nenhum ponto positivo na contratação de funcionários haitianos,
contrariando a afirmação dos demais gestores que citaram vários aspectos
favoráveis. O desempenho de todo colaborador, independentemente de
ser funcionário nacional ou estrangeiro, está diretamente ligado ao tipo
de contato com seu gestor. Para Dubrin (2003, p. 186): “A percepção de
uma pessoa sobre alguém, ou alguma coisa, geralmente determina se ela
será um fator positivo ou negativo”. Assim pode-se dizer que o gestor G4
não possui grandes contatos com os profissionais haitianos visto não ter
150
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
notado nenhum aspecto positivo na contratação e nem no processo de
integração, contrário dos demais.
Embora haja discordâncias em relação aos aspectos favoráveis, o
gestor G3 apresentou outros pontos positivos notados na fala: “Facilitou
também, que nós tínhamos um lugar disponível onde todos puderam
ficar juntos. Então eles se sentiram seguros também, por estarem todos
no mesmo local”. Convém destacar que a empresa possui contrato com
uma pousada que hospeda os funcionários que vem de outra região e não
têm condições de pagar o aluguel, cobrando apenas um valor simbólico
de R$ 1,00 por dia, e os funcionários podem ficar alojados durante a
validade do contrato de trabalho. Encerrando o contrato de trabalho
se encerra o direito de moradia. Assim a empresa consegue deixar um
conjunto de pessoas com as mesmas características culturais, fazendo
com que as pessoas se sintam mais à vontade e seguras.
O Quadro a seguir apresenta a percepção dos gestores frente às
fragilidades encontradas no processo de integração dos funcionários
haitianos da empresa em estudo.
Subcategoria RespondentesComunicação 4
Diferenças culturais entre o Brasil e o Haiti. 2
Poucos entendem a língua portuguesa. 3
Sempre que precisa falar algo com os haitianos é necessário chamar um tradutor. 2
Falta de pesquisas sobre os costumes dos haitianos. 1
151
O PROCESSO DE INTEGRAÇÃO DE FUNCIONÁRIOS HAITIANOS POR EMPRESA BRASILEIRA
Adaptação à alimentação regional. 9
Muitos haitianos não trabalhavam em serviços pesados no Haiti. 1
Muitos haitianos faziam curso superior, não se adaptando às atividades realizadas. 3
O tipo de atividades desenvolvidas. 1
Os haitianos entendem apenas o que querem entender. 2
A falta de entendimento de funcionários brasileiros sobre a linguagem haitiana (creole). 2
Falta de documentos em creole. 1
Quadro 4 – Fragilidades no processo de integração na empresa Fonte: Dados primários, 2014.
O Quadro 4 se refere à terceira pergunta aberta feita aos gestores
que era: Quais foram as fragilidades no processo de integração dos
funcionários haitianos? Foram apresentadas doze subcategorias. As
subcategorias “Muitos haitianos não trabalhavam em serviços pesados
no Haiti” e “Muitos haitianos faziam curso superior, não se adaptando
às atividades realizadas”, estão diretamente relacionadas, pois como as
atividades desempenhadas pela empresa em estudo exigem um maior
esforço físico, alguns não se adaptaram, além de que muitos dos haitianos
que vieram para o Brasil tinham um grau de instrução maior, os quais
alguns até graduados eram. Observa-se na fala a seguir:
Mas assim, muitos não trabalhavam/faziam
152
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
serviço pesado lá, então muitos tiveram
dificuldades em se adaptar, porque muitos lá
faziam faculdade, tinham estudo, e daí tiveram
que vir trabalhar no pesado, correndo atrás do
caminhão, e tal. Então eles não se adaptaram
também, começaram a sentir muita dor nas
pernas, não corriam, caminhavam, não tinham
a mesma produção que os brasileiros. Então
muitos desistiram e outros nós tivemos que
encerrar o contrato de trabalho porque vimos
que não se adaptavam, eles queriam continuar,
mas não produziam. (G3).
Como aponta a pesquisa realizada pelo Ministério do Trabalho
e Emprego (BRASIL A, 2013, s/p) “Dentre os 758 haitianos que
receberam carteiras de trabalho, há 16 com curso superior, sendo seis
profissionais de Enfermagem, cinco de Jornalismo, um de Química,
dois de Bioquímica, um de Medicina e um de Hotelaria.” É possível
observar que um dos aspectos positivos é completamente oposto a
um dos aspectos negativos, justamente o fator que envolve a profissão
dos imigrantes haitianos em seu país de origem.
A subcategoria “diferenças culturais entre o Brasil e o Haiti”
foi citada apenas uma vez, pelo gestor G1, o qual cogita a diferença
em ações e leis, como um fator negativo no processo de integração,
apresentado na seguinte fala:
153
O PROCESSO DE INTEGRAÇÃO DE FUNCIONÁRIOS HAITIANOS POR EMPRESA BRASILEIRA
De onde eles vêm, com certeza é muito bem
diferente de nós aqui. Então, quero dizer, certas
coisas que eles podiam fazer que para eles era
normal e aqui não é, tipo leis, essas coisas assim.
(G1).
O entrevistado G1 percebeu que o fato de terem vindo de outro
país com cultura completamente diferente atrapalhou o processo de
integração. Essa subcategoria está diretamente ligada à comunicação e
ao relacionamento dos profissionais haitianos com a sociedade e com os
demais colegas de trabalho brasileiros, se tornando um ponto negativo,
pois há uma diversidade cultural envolvida no processo de integração. Ou
seja, há duas identidades culturais que devem chegar a um acordo. Nesse
sentido, é importante lembrar que a identidade cultural não é “natural”,
nem próprio do indivíduo, ela, no entanto antecede ao indivíduo, levando
em consideração que a cultura é mutável, a identidade cultural não é
permanente. E com o tempo e interferência de outra cultura a identidade
cultural pode mudar (PACHECO, 2007).
Já o entrevistado G3 identificou na subcategoria “falta de pesquisa
sobre os costumes dos haitianos”, ligando à subcategoria relacionada às
dificuldades com a alimentação, a qual foi a que mais se destacou perante
as outras, mesmo sendo citada apenas pelo gestor G3, esse sentiu muita
dificuldade nessa questão dizendo:
154
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
[...] foi bem difícil eles se adaptarem a nossa
alimentação... (G3).
[...] por mais que eles já estivessem morando no
Acre, mas eles estavam se alimentando da mesma
forma que no Haiti. (G3).
Então quando a gente trouxe, nós oferecemos a
alimentação local, e eles tiveram dificuldade para
se adaptar com isso. Então é algo que prejudicou o
processo. (G3).
Nós entregamos feijão, arroz, fizemos uma cesta
básica pra eles, e daí eles não se adaptaram. (G3).
No entanto, o aspecto negativo mais importante no processo de
integração foi a comunicação, que citadas diversas vezes de maneira
diferente, seja devido ao não entendimento do idioma português por
parte dos haitianos como pelo não entendimento do idioma creole pelos
funcionários brasileiros, foram apontadas como sendo um ponto de
fragilidade na visão dos gestores, conforme registra-se em algumas falas:
[...] a comunicação, porque a gente falava uma
coisa, e algumas palavras pra nós é uma coisa e pra
155
O PROCESSO DE INTEGRAÇÃO DE FUNCIONÁRIOS HAITIANOS POR EMPRESA BRASILEIRA
eles significa outras coisas. (G1).
[...] não compreenderem, a maioria, o português
[...] então poucos entendiam o português... (G3).
O não entendimento deles da nossa língua, e nem
nós da deles, essa é uma fragilidade, isso eu sei
que a gente tem. Eles entendem o que eles querem
entender. (G4).
Para Penteado (2001), o objetivo da comunicação é o entendimento
entre as pessoas, mas para que exista esse entendimento é preciso
que os indivíduos se compreendam, caso contrário surge uma falha
na compreensão das informações. Por isso os gestores da empresa
pesquisada julgaram a comunicação como um dos principais pontos
negativos. Por sua vez, Miranda (1999) completa afirmando que a
comunicação é um instrumento de trabalho, lazer, prazer, negociação
entre outros. Havendo a falha na comunicação, haverá certamente um
equívoco nas informações recebidas pelo novo funcionário, podendo
este não atingir aos objetivos que a empresa esperava, como na situação
que os gestores apresentaram.
Vieira (2007) diz que a cultura afeta a comunicação e a relação
entre as pessoas, apresentando que os modos em que exercem alguns
tipos de ações condicionam a comunicação nas residências e no
trabalho. Já Luizari (2010) diz que a comunicação nem sempre atinge
seus objetivos, talvez pelo fato de o idioma português brasileiro utilizar
156
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
um número excessivo de regras e normas. Pode apresentar também o
motivo da dificuldade dos haitianos em se comunicar com os brasileiros.
A autora ainda coloca a importância do feedback, pois sem ele não há
comunicação, o que também justifica a dificuldade de brasileiros e da
empresa em se comunicar com os haitianos, visto que se algum brasileiro
perguntar algo ao haitiano o mesmo não conseguirá dar o feedback, pois
nem ao menos entendeu a pergunta.
Considerando as análises, é possível notar que a maioria das
dificuldades estão relacionadas à comunicação e à cultura. A empresa não
sabia o que eles comiam, porque não conseguia se comunicar e perguntar
o que eles queriam. Os funcionários haitianos não compreendiam as
diferenças culturais, pois não conseguiam se comunicar para aprender
qual era a cultura nacional. Dessa forma, verifica-se a importância da
comunicação na vida das pessoas assim como a comunicação empresarial.
O próximo Quadro apresenta as sugestões dos gestores/líderes da
empresa, para o processo de integração dos funcionários haitianos.
Subcategoria Respondentes
Ter um tradutor na rotina operacional. 1
Treinamento prático, tanto para brasileiros quanto para haitianos. 2
Treinamentos complementares periódicos. 3
Conhecer melhor a cultura dos funcionários que a empresa busca em grande quantidade. 1
Readequação da empresa em relação aos documentos no idioma do novo funcionário. 7
Tradutor fixo na filial de Itapema. 2
157
O PROCESSO DE INTEGRAÇÃO DE FUNCIONÁRIOS HAITIANOS POR EMPRESA BRASILEIRA
Placas de comunicação de segurança em creole. 4
Treinamento de outras línguas para os funcionários brasileiros que estão diretamente ligados ao processo de integração. 3
Utilizar os haitianos que compreendem melhor o português para auxiliar nos treinamentos. 1
Quadro 5 – Sugestões para processo de integração na empresa Fonte: Dados primários, 2014.
No Quadro 5, referente às sugestões para melhorar o processo de
integração na empresa em estudo; os gestores demonstram interesse e
necessidade na readequação da empresa em relação aos documentos no
idioma do novo funcionário, além de placas de comunicação, conforme
nota-se nas falas dos entrevistados, abaixo relacionadas:
E acho que talvez, formulários, a gente já fazer algo
traduzido pra língua deles pra facilitar pra eles
quando a gente tiver alguma explicação, for assinar
algum documento, a gente já ter todos os nossos
formulários em creole, para facilitar pra eles. (G3).
Todas as informações do nosso regulamento
interno, ordem de serviço, toda a documentação
da área da segurança também deveria estar na
linguagem deles. (G4).
Essa placa de comunicação de acidente de trabalho,
158
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
ela deveria estar na língua deles também. (G4).
Tudo que for de comunicação escrita, adesivos de
caminhões, procedimentos de trabalho, toda essa
documentação tem que estar na língua da pessoa
que vai trabalhar conosco. (G4).
Então ele tem que ter um treinamento, um manual
de orientação, voltado para a língua dele para o
entendimento deles. (G4).
Essas falas abordam sucintamente carências existentes na
empresa relacionadas ao processo de integração do funcionário haitiano,
o que de certa forma é algo muito positivo, pois os gestores reconhecem
suas limitações e têm consciência de que há necessidade de aprimorar o
processo, além de apresentarem soluções para as fragilidades encontradas
no processo de integração.
As subcategorias “ter um tradutor nas rotinas operacionais”
e “ter um tradutor fixo na filial” estão diretamente interligadas, pois
implicitamente ambas falam sobre a mesma necessidade, ou seja, ter
alguém que a qualquer momento possa promover a comunicação da
empresa com o funcionário haitiano ou vice-versa, conforme discurso
dos entrevistados, abaixo destacados:
No dia a dia, ter uma pessoa [...] meio que direto
159
O PROCESSO DE INTEGRAÇÃO DE FUNCIONÁRIOS HAITIANOS POR EMPRESA BRASILEIRA
no meio deles, não vou dizer coordenando [...] mas
tirando as dúvidas deles, porque às vezes a gente
explicando eles não entendem direito, e eles têm
vergonha de perguntar, daí eles ficam na dúvida,
[...] até a gente ver que eles estão na dúvida,
algumas coisas a gente consegue explicar, mas
algumas coisas não. Então se tivesse uma pessoa
transitando meio que direto entre eles e nós, seria
um pouquinho melhor. (G1).
Tem um tradutor, beleza. Mas se tiver um
treinamento em filiais diferentes e no mesmo
momento onde esse tradutor vai estar? Em uma das
filiais, nas outras ele não vai estar. (G4).
O gestor G4 também apresenta uma possibilidade em sua fala “Os
próprios haitianos que compreendem um pouco mais o português para
acompanhar as integrações”, está diretamente relacionada à subcategoria
utilizar os haitianos que compreendem melhor o português para auxiliar
nos treinamentos.
Sobre a capacitação para instruir os outros colaboradores para
receberem os funcionários haitianos, o gestor G4 diz que deveria ter:
“Treinamento dos funcionários, os brasileiros, com outros idiomas” e
“Então um ponto que eu acho interessante para a melhoria nessa questão
era capacitar os nossos funcionários para receber essas pessoas”; o que
facilitaria, pois quando surgirem as dúvidas não haveria necessidade
de um tradutor intermediando e proporcionaria maior eficiência na
160
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
comunicação.
Outra sugestão citada foi conhecer melhor a cultura de
profissionais haitianos apresentada pelo gestor G3 com a fala “Eu acho
que para melhorar, da próxima vez a gente conhecer mais as pessoas,
onde a gente vai buscar, conhecer mais os costumes”. Essa sugestão foi
dada referente às dificuldades de adaptação dos funcionários haitianos
em relação à alimentação, à fala e aos costumes em geral.
A última subcategoria aborda a sugestão de dois gestores que falam
sobre treinamentos práticos e periódicos, pois como dizem os gestores:
Eu acho, opinião minha, que ao invés de só aquela
integração que eles fazem com a empresa, que é
bom, ajuda bastante [...] ficar mais um tempo com
eles [...] ao invés de começar a trabalhar logo
assim. Junto com esse treinamento que eles dão,
dar um serviço extra antes de começar direto na
empresa... (G1).
Porque mesmo ensinando o que é nesse
treinamento que eles dão, lá é uma coisa, aqui
é outra bem diferente, tanto é que até os nossos
[brasileiros] quando entram aqui, até se adaptarem
eles levam um tempinho, entendeu?! E ainda mais
eles [haitianos] que são língua diferente, jeito
diferente, cultura diferente...(G1).
161
O PROCESSO DE INTEGRAÇÃO DE FUNCIONÁRIOS HAITIANOS POR EMPRESA BRASILEIRA
E acho que a empresa deveria dar mais treinamento,
porque treinamento nunca é demais, mesmo sendo
a mesma coisa. (G2).
Uma vez, cinco vezes, dez vezes o treinamento é
válido. (G2).
As sugestões acima foram dadas para que os funcionários iniciem
suas atividades plenamente conscientes do tipo de trabalho e para
estarem sempre se atualizando com novas regras ou formas mais eficazes
de executar as mesmas atividades. Os treinamentos são passados a todos
os funcionários da mesma forma, exceto quando há haitianos que a
empresa coloca junto um tradutor, mas como diz o gestor G2 “É passado
os cursos, mas quanto mais passar melhor é.”
Chiavenato (2010) conceitua treinamento como uma fonte de
lucratividade, permitindo que as pessoas contribuam efetivamente para
o crescimento do negócio. No entanto, referido autor apresenta que no
passado o treinamento era uma maneira de adaptar a pessoa ao cargo,
depois passou a ser considerado como o processo de preparação do
indivíduo para desempenhar da melhor forma tarefas específicas de seu
cargo e, atualmente, serve para desenvolver competências, tornando-os
mais produtivos, inovadores e criativos.
O treinamento pode ser considerado como a capacitação das
pessoas para exercerem determinadas atividades e um dos recursos
que tem por objetivo preparar o trabalhador para aperfeiçoar suas
capacidades e para que descubra outras habilidades, incentivando-o
162
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
a buscar oportunidades que contribuam para o desenvolvimento do
trabalho (CARVALHO; NASCIMENTO; SERAFIM, 2012).
Para Antonio Carlos Gil (2012), o treinamento nas empresas
passou a abranger além da capacitação para o desempenho também os
aspectos psicossociais das pessoas, pois são inclusos objetivos voltados
ao relacionamento interpessoal e à integração.
▯ PERCEPÇÃO DOS FUNCIONÁRIOS HAITIANOS FRENTE AO PROCESSO DE INTEGRAÇÃO DA EMPRESA
A segunda parte da pesquisa apresenta os resultados das
entrevistas realizadas com os funcionários haitianos. Após a explanação
dos Quadros, as subcategorias serão analisadas e comentadas. Observa-
se na Tabela 1 o perfil dos funcionários haitianos respondentes.
TABELA 1 – Perfil dos funcionários haitianos entrevistados.
Entrevistados Grau de escolaridade Tempo de atuação na empresa
F1 Ensino médio - completo 1 ano e 4 mesesF2 Ensino médio - completo 1 ano e 6 mesesF3 Ensino médio - incompleto 1 ano e 8 mesesF4 Ensino médio - incompleto 1 ano e 4 mesesF5 Ensino médio - incompleto 1 ano e 4 mesesF6 Ensino médio - completo 1 ano e 5 meses
163
O PROCESSO DE INTEGRAÇÃO DE FUNCIONÁRIOS HAITIANOS POR EMPRESA BRASILEIRA
F7 Ensino fundamental - incompleto 3 mesesF8 Ensino fundamental 1 ano e 5 mesesF9 Ensino fundamental – incompleto 1 ano 5 meses
Fonte: Dados primários, 2014.
A Tabela acima apresenta o perfil dos funcionários haitianos
entrevistados e é possível observar-se que poucos completaram o Ensino
Médio nos estudos; a maioria tem mais de um ano de atuação na empresa;
todos passaram pelo processo de integração da empresa em estudo.
O Quadro 6 apresenta as expectativas dos funcionários haitianos
em relação ao Brasil antes de sair do Haiti.
Subcategoria Respondentes
Perspectiva de trabalho em função da Copa do Mundo. 2
Procurar trabalho em empresa com boas condições. 1
Indicação da empresa por um amigo haitiano que estava no Brasil. 1
Buscar uma vida melhor. 5
Perspectiva de uma economia (salário) melhor. 7
Gostar do Brasil. 2
Facilidades para entrar no país. 1
Facilidades em conseguir o visto. 1
Perspectiva de trabalho. 9
Aprender uma profissão. 1
Buscar empregos ofertados pela presidente quando esteve no Haiti. 1
Quadro 6 – Expectativas frente ao Brasil antes de sair do Haiti.Fonte: Dados primários, 2014.
164
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
Dentro dessa categoria, uma das subcategorias que foi bastante
citada foi a busca por uma vida melhor, que subsidiasse a família que ficou
no Haiti, como pode ser observado na verbalização dos entrevistados:
Saí do Haiti por causa da economia, não há bastante
trabalho, então vim para o Brasil buscando uma
vida melhor [...] (F2).
Depois do terremoto a economia vem reduzindo
bastante, e no Brasil está melhorando. (F2).
[...] vim para o Brasil buscando uma vida melhor.
(F3).
Eu busco uma vida melhor. (F4).
Porque no Haiti tem um problema, eu vim para
buscar comida para a família, para poder dar uma
vida melhor. (F7)
Os entrevistados que vieram para o Brasil na busca de uma vida
melhor estavam passando por necessidades no Haiti, visto que o índice
de desenvolvimento humano é abaixo do normal (FRANCISCO, 2014).
Outra subcategoria apontada pelos entrevistados foi a queda
da economia haitiana, reduzindo também os salários, fazendo com
165
O PROCESSO DE INTEGRAÇÃO DE FUNCIONÁRIOS HAITIANOS POR EMPRESA BRASILEIRA
que muitos viessem ao Brasil com a visão de que o país estava bem
economicamente. Como se percebe nas falas a seguir:
O que passa é que aqui eu pensava que era melhor
para salário... (F1).
Sai do Haiti por causa da Economia... (F2).
Quando saí de Haiti, saí porque estava difícil, em
caso de economia, emprego, terremoto. (F3).
Saí do Haiti buscando onde ficar melhor
economicamente (F3).
Salário do Haiti é pequeno. (F4).
Depois do terremoto salário ficou menor. (F4).
A situação econômica no Haiti nunca foi uma das melhores do
mundo, no entanto, depois do terremoto que atingiu o país, em 2010,
as coisas pioraram e com a queda de muitas construções foi junto o
negócio, a casa e a vida de muitos haitianos que ficaram desamparados
e sem ter como sustentar a família. Com essa situação muitos tomaram
a decisão de procurar um lugar em que tinha emprego e os deixaria bem
economicamente.
Outra categoria apontada pelo funcionário entrevistado F3 foram
166
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
as facilidades em entrar no país e em conseguir o visto. Ele diz: “Brasil
também dá oportunidade para haitiano entrar mais fácil, porque tem
outros países que é difícil”, e completa “O Brasil é mais fácil de conseguir
visto”.
A principal subcategoria é referente à procura de trabalho, seja por
meio da Copa do Mundo, na época, pela oferta da Presidente da República
ou simplesmente buscar um trabalho, visto que as condições no Brasil
estão melhores que no Haiti, conforme respostas dos funcionários
haitianos:
Eu vim para o Brasil porque soube da Copa Mundial,
sobre trabalho também como guia turístico, pra
procurar trabalho muito bom [...] (F1).
[...] e tem um amigo meu que me disse que há uma
empresa muito boa, foi lá e achou trabalho... (F1).
Saí do Haiti por causa da economia, não há bastante
trabalho... (F2).
Depois do terremoto foi caindo, crise. Pouco
trabalho. (F3).
Eu tenho que trabalhar para ajudar minha família.
Porque eu saí para trabalhar, eu saí do Haiti porque
vim trabalhar. (F5).
167
O PROCESSO DE INTEGRAÇÃO DE FUNCIONÁRIOS HAITIANOS POR EMPRESA BRASILEIRA
A presidente Dilma Rousseff foi no Haiti analisar os
casos e ajudar muitos haitianos a vir para cá, para
procurar emprego. (F6).
[...] vim para o Brasil para procurar emprego. (F6)
Trabalhar e aprender uma profissão. (F8).
No Haiti não tem mais trabalho, por isso vim para
Brasil. (F8).
[...] escolhi vir para o Brasil, para buscar um
trabalho melhor. (F9).
Como apresentado nas falas supracitadas, a principal expectativa
dos haitianos pelo Brasil, antes mesmo de sair do Haiti, era a busca de
um trabalho.
Os funcionários também comentaram que além da busca para
reduzir as dificuldades que estavam passando, há também a afeição que
eles têm pelo Brasil. O entrevistado F3 comenta que “haitiano sempre
gosta de Brasil” para justificar a escolha do país. E o entrevistado F8
afirma com as seguintes palavras “Eu gosto do Brasil”.
O Quadro 7 apresenta as expectativas alcançadas pelos haitianos
após se instalarem no Brasil.
168
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
Subcategoria RespondentesNo Brasil, o dinheiro rende mais. 1
Ter dois empregos, para ganhar mais dinheiro. 3
Início de uma vida melhor. 1
Possibilidade de enviar dinheiro para a família. 6
Sim, as expectativas foram alcançadas. 2
Bastante problema para resolver, por causa de ter apenas um emprego 1
Uma vida melhor 1
Quadro 7 – Expectativas alcançadas. Fonte: Dados primários, 2014.
Em relação ao questionamento “Suas expectativas foram
atingidas?” a maioria alega que sim, visto que a principal expectativa
analisada na categoria anterior era conseguir um trabalho para ter uma
vida melhor e ajudar a família, isso percebe-se nas seguintes falas:
Trabalho em dois empregos. (F3).
Eu passar só 1 mês, 15 dias, sem trabalhar. (F4)
Quando cheguei no Brasil depois de dois dias
consegui trabalho. E agora consegui ajudar a
família no Haiti. (F9).
Conforme os relatos supracitados, fica claro que a principal
169
O PROCESSO DE INTEGRAÇÃO DE FUNCIONÁRIOS HAITIANOS POR EMPRESA BRASILEIRA
expectativa foi alcançada, isso porque o Brasil é carente de mão de obra,
como já apresentado pelos gerentes, facilitando os haitianos na conquista
de um emprego.
Outra expectativa almejada pelos entrevistados era a busca por
uma vida melhor, com salários mais condizentes para suprir as principais
necessidades da família que ficou no Haiti, como alimentação e educação,
conforme verifica-se nas falas dos entrevistados:
O salário é parecido, só que aqui o dinheiro rende
mais. (F1)
Mando dinheiro todo mês para a família... (F1).
[...] todo mês envio dinheiro para o Haiti para minha
família, para a escola para minha filha. (F2)
Sim, todo mês que trabalho um pouco de dinheiro
será mandado para eles no Haiti. (F7).
Mas é importante destacar que os funcionários haitianos não
se contentaram com apenas um emprego, podendo-se observar nas
seguintes falas:
[...] para ter uma vida um pouco melhor aqui tem
170
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
que fazer o dobro/dois trabalho, porque um trabalho
só não vale. Tenho bastante problema para resolver
por causa de um só trabalho aqui no Brasil... (F2).
Uma empresa só não dá para mandar dinheiro, para
juntar, para guardar, para visitar não dá. Por isso
tem muito haitiano buscando dois empregos para
poder guardar dinheiro. (F3)
O entrevistado F3 reconhece que trabalhar em dois empregos
é cansativo e que não fazem isso por desejo próprio, mas que se eles
querem dar algo a mais e ainda juntar dinheiro para ir ver ou para trazer
a família é necessário trabalhar em dois lugares, sendo esse o motivo que
leva muitos haitianos a buscarem dois empregos. Como verifica-se na
fala a seguir:
Trabalhar em dois empregos ninguém gosta, porque
não fica boa para a saúde, tem que dormir, tudo,
não fica boa. Porém as pessoas fazem um sacrifício
para buscar a plata [prata/dinheiro], porque temos
que mandar a plata para a família. Há quem junta
plata para voltar de novo a visitar a família, um
salário não dá. (F3)
A terceira categoria aborda como foram os primeiros contatos com
a empresa em estudo. Os resultados constam no Quadro a seguir.
171
O PROCESSO DE INTEGRAÇÃO DE FUNCIONÁRIOS HAITIANOS POR EMPRESA BRASILEIRA
Subcategoria RespondentesIndicação/Apresentação da empresa por um amigo. 6
A empresa foi buscar no Acre. 3
Quadro 8 – Primeiros contatos com a empresa em estudoFonte: Dados primários, 2014.
Com relação aos primeiros contatos dos funcionários haitianos, se
obteve apenas duas respostas: indicação/apresentação da empresa por
um amigo ou a empresa ter ido busca-los no Acre. A maioria encontrou
a empresa por meio de amigos/conhecidos que já se estavam no Brasil,
conforme pode-se observar nas declarações dos funcionários:
Primeiro amigo que trabalhava na, morava junto
comigo em Santo Domingo, quando ele veio pra
cá eu não sabia, sempre conversava com ele pela
internet, e aí eu vim pra casa dele diretamente, aí
ele me levou à empresa... (F1).
Eu saí do Acre por avião e cheguei aqui em Santa
Catarina. Quando cheguei em Santa Catarina um
amigo explicar que tem uma companhia com nome
‘x’ que eu pode trabalhar. (F5).
Depois de dez dias no Brasil, comecei trabalhar
na empresa ‘x’. Estava buscando um trabalho,
me encontrar com essa pessoa (apontou para o
172
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
tradutor), eu falar com ela, ela me ligou: há uma
companhia, vamos ligar para eles para ver se eles
conseguem um trabalho, e quando ele liga, e aqui
diz que há uma vaga aqui, aí essa pessoa trouxe eu
pra cá. (F7)
Acredita-se que o motivo de a maioria ter sido apresentada à
empresa por meio de amigos que já estavam no Brasil pela facilidade de
se comunicar com pessoas do mesmo idioma, que devido ao tempo no
Brasil compreendem melhor o português.
A empresa em estudo, assim como muitas outras, buscaram
haitianos no Acre, conforme apontado no jornal “Empresas de Goiás,
Minas Gerais, Santa Catarina e do Rio de Janeiro já fizeram contatos com
o governo estadual para a contratação dessa leva de haitianos que terão
seus documentos de entrada legalizados” (NO ACRE..., 2012).
O Quadro 9 apresenta a descrição do processo de integração da
empresa pesquisada com os funcionários haitianos, em que poderiam
expressar suas opiniões sobre os pontos positivos e os pontos negativos e
as características do processo.
Subcategoria RespondentesMuitas regras. 1
Muitos papéis para assinar. 2
O processo não é complicado. 1
Facilidade de entender, por compreender espanhol. 2
Fornecem treinamentos sobre a empresa. 2
173
O PROCESSO DE INTEGRAÇÃO DE FUNCIONÁRIOS HAITIANOS POR EMPRESA BRASILEIRA
Descrição da empresa ‘x’ no Acre, antes de trazer os haitianos para Santa Catarina. 2
A empresa descreveu as atividades a serem desempenhadas. 2
Disponibilidade de um tradutor. 4
Fornecimento de alojamento. 2
Fornecimento de comida. 1
Compreensão das regras e normas. 3
O processo é complicado. 2
Pouca explicação sobre remuneração e descontos. 5
Quadro 9 – Descrição do processo de integração da empresa com os funcionários haitianos.Fonte: Dados primários, 2014.
Conforme demonstrado no Quadro acima, foram apresentadas
treze subcategorias do processo de integração dos funcionários haitianos.
Entre elas há características positivas que podem ser aperfeiçoadas e
negativas que devem ser superadas.
Dentre as subcategorias, as mais citadas são as facilidades da
compreensão das normas e do processo devido o domínio da língua
espanhola, conforme nota-se nas falas:
Não é muito complicado, todo país tem sua regra
diferente, é normal e está tudo bem. (F1).
Recebi todo o treinamento normal, quando cheguei
174
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
no Brasil não falava português e entendia só um
pouco de espanhol, então entendi um pouco do
treinamento. (F2).
Eu entendeu todas as normas da empresa. (F5)
Observa-se que o funcionário F2 associa o entendimento do
processo de integração a sua facilidade em compreender o espanhol.
Em contrapartida, dois dos entrevistados falam das diferenças do
processo de integração realizado pela empresa brasileira em comparação
com o mesmo processo no Haiti. “Aqui no Brasil [...] se assina muito papel
também, lá não assinava muito papel, era mais boca a boca, e pouca
regra, aqui é mais regra.” (F1). Outro entrevistado, quando questionado,
completa afirmando que o processo de integração “Foi bem. Não é igual
ao Haiti, é diferente.” (F5). E o funcionário entrevistado F8 frisa que
“Brasil é muito papel”.
Outra subcategoria é o treinamento sobre a empresa, que é um
breve histórico de qual é sua cultura organizacional. Observa-se as falas
dos funcionários haitianos:
A empresa foi lá buscar nós e falar da empresa ‘x’ e
depois confirma e vem para cá. (F3).
A pessoa que foi me buscar no Acre [...] falou da
empresa. (F6).
175
O PROCESSO DE INTEGRAÇÃO DE FUNCIONÁRIOS HAITIANOS POR EMPRESA BRASILEIRA
É nesse momento que eles conhecem as regras e as normas da
empresa e decidem se querem ou não fazer parte daquela cultura.
Chiavenato (2010) aborda a cultura como um termo utilizado para
compreender os hábitos, costumes e que significa o modo de vida de uma
organização.
Lacombe (2011) discorre a cultura organizacional como a união
das crenças, dos costumes, dos sistemas de valor junto com a forma de
realizar o negócio, sendo distinto de empresa para empresa, tornando-
se assim um padrão para as atividades que caracterizam sua vida
organizacional.
Outra subcategoria apresentada pelos funcionários haitianos foi a
descrição que a empresa forneceu a eles sobre os cargos; verifica-se nas
seguintes falas:
E falou que vai trabalhar na varrição na rua... (F4).
E dizer que vai trabalhar em hotéis, na praia... (F6).
Essa descrição de cargos faz parte do sistema de atividades
executadas pela gestão de pessoas. Bitencourt et. al (2010), explica que se
trata de um processo de aplicação de pessoas e um mau desempenho não
pode ser direcionado a apenas um lado. É papel da organização, além de
descrever as atividades a serem desenvolvidas e a forma de executar as
176
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
atividades, apresentar ao trabalhador o que se espera dele.
Alguns funcionários haitianos comentaram sobre as “facilidades”
que a empresa forneceu, como alimentação e moradia’, os quais serviram
de subsídios para iniciarem suas atividades. O funcionário F1 diz:
“Quando cheguei à empresa, me deram facilidades, me deram alojamento,
comida...” e o funcionário F4 também apresenta em sua fala o benefício da
moradia: “e depois deram alojamento, tudo certinho”. O alojamento é um
benefício fornecido pela empresa a todos os funcionários que a empresa
busca de outras cidades e para alguns funcionários que a procuram
solicitando ajuda por estarem desabrigados. Quanto à alimentação, nos
primeiros meses que o funcionário não tem direito ao vale alimentação
(benefício concedido para os funcionários) a empresa fornece uma cesta
básica com os mantimentos necessário para a alimentação e a higiene até
a [primeira remuneração, porém depois o funcionário passa a se manter
por conta.
Já uma das principais subcategorias apontada pelos entrevistados
como um aspecto positivo do processo de integração foi a ajuda de um
tradutor disponibilizado pela empresa, isso nota-se nas seguintes falas:
Tinha uma pessoa [...] que foi lá e traduziu. (F4).
[...] tinha uma pessoa ajudando (traduzindo). Não é
tão fácil, mas quando tem uma pessoa te ajudando
fica mais fácil. (F6)
177
O PROCESSO DE INTEGRAÇÃO DE FUNCIONÁRIOS HAITIANOS POR EMPRESA BRASILEIRA
O [...] traduziu em creole para mim. (F8). Teve o
tradutor ajudando. (F9).
Os funcionários perceberam uma boa receptividade quanto ao
processo de integração devido ao auxílio do tradutor, pois como se tratam
de idiomas muito diferentes a comunicação seria inválida ou complicada,
o que dificultaria a contratação de haitianos pela empresa. Segundo
Prochnow, Leite, e Pilatti (2005, s/p), “[...] a falha de comunicação, ou
simplesmente, a falta dela nos submete a perdas na produtividade. Saber
identificar os motivos e atuar sobre eles é uma das principais formas de
obtenção de ganhos para a empresa e para os funcionários desta.”
Outra subcategoria bem apresentada pelos funcionários haitianos
ao descrever o processo de integração foi a falta de informações sobre
a remuneração e os descontos, pois muitos alegaram receber menos do
que foi combinado, como apresentado nas falas a seguir:
[...] dinheiro que disseram que ia receber não
recebi, recebi pouco, mas não tem grande diferença
[...] (F2).
[...] falou para nós que ia receber um salário mais
maior quando chegou aqui recebi o salário maior
mais o menor. Lá no Acre explicou um salário para
nós, todo falou certo e depois confirma e vem aqui,
178
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
quando chegou aqui o salário não fica igual, fica
menor. E depois explica os descontos. (F3)
A pessoa que foi me buscar no Acre, chegou lá e
falou que ia receber um dinheiro, e não recebi. (F6).
Os funcionários entrevistados apresentaram um descontentamento
com a informação passada referente às remunerações; percebe-se que foi
passado apenas a remuneração base, sem informações sobre os encargos
sociais e os descontos referentes ao vale transporte, ao auxílio moradia,
entre outros que constam no regulamento interno da empresa.
Os encargos sociais podem ser tão diferentes que dependendo da
visão de quem o observa as conclusões podem variar entre 20% até 215%
dos salários, conforme (BRASIL B, 2006)
No Quadro 10 constam os resultados sobre a receptividade que os
funcionários haitianos tiverem em relação aos seus colegas de trabalho.
179
O PROCESSO DE INTEGRAÇÃO DE FUNCIONÁRIOS HAITIANOS POR EMPRESA BRASILEIRA
Subcategoria Respondentes
Existe um respeito recíproco. 2
Não houve discriminação. 1
Bom relacionamento. 10
Normal. 1
Houve discriminação. 1
Alguns nem se relacionam. 1
Mau relacionamento. 1
Quadro 10 – Receptividade dos colegas de trabalho. Fonte: Dados primários, 2014.
Nessa categoria a pergunta abordada foi “Como você percebe o
tratamento de seus colegas de trabalho em relação a você?” Conforme
Quadro 10, a maioria alega ter sido bem recebida e mantém um bom
relacionamento com os demais colegas, apresentado nas falas a seguir:
Até agora não recebi nenhuma discriminação,
porque depende da pessoa; se eu respeito a pessoa
a pessoa me respeita também. (F1).
Nunca tive problema, sempre bem com todos os
amigos, colegas de trabalho. (F2).
Muito bem, brasileiro recebeu muito bem. (F3).
180
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
Trataram bem. Brasileiro tratavam bem. Até agora
trataram bem. (F5). Nenhum brasileiro fala mal
comigo. Eu tranquilo com todos brasileiros. (F5).
Os demais funcionários alegaram terem sido bem recebidos ou
apenas um recebimento normal, exceto um funcionário que afirmou que
além de ter sido mal recebido por alguns colegas de trabalho se sentiu
discriminado com algumas atitudes. Isto se observa na fala a seguir:
Recebi um comportamento 40%. [...] houve
discriminação. [...] Como fui professor, conheço
quem me trata bem e me trata mal. Às vezes
enquanto uma pessoa fala comigo e depois diz
outra coisa. Não são todas as pessoas que me
tratam bem. Quando cheguei na empresa encontrei
muitas pessoas que me tratam bem, mas também
tem algumas pessoas que não conversam (F6).
Observa-se que o funcionário entrevistado F6 se sentiu
discriminado pela falsidade de alguns colegas, que conversavam com ele
e depois quando não estava presente diziam outra coisa. O funcionário
não foi discriminado por suas origens, como vem acontecendo em outras
regiões do Brasil. Em uma empresa de Curitiba (PR) muitos haitianos
estão sofrendo preconceito por sua raça e sua nacionalidade, gerando
agressão física contra funcionários haitianos, que por precisarem do
181
O PROCESSO DE INTEGRAÇÃO DE FUNCIONÁRIOS HAITIANOS POR EMPRESA BRASILEIRA
emprego acabaram suportando as ofensas e as agressões (ANÍBAL, 2014).
O Quadro a seguir aborda se os funcionários haitianos pudessem
sugerir algo para a empresa melhorar o processo de integração, qual seria
a sua sugestão.
Subcategoria RespondentesSem sugestões. 3
Aumentar salário. 2
Colocar as normas e documentos em creole, para facilitar o entendimento. 4
Clareza nos valores referentes à remuneração, antes da contratação. 3
Informar os descontos na folha de pagamento, antes da contratação. 1
Ter sempre um tradutor. 2
Emitir carta de habitação, para trazer a família para o Brasil. 1
Quadro 11 – Sugestões para melhorar o processo de integração da empresa com os funcionários haitianos.
Fonte: Dados primários, 2014.
Segundo demonstrado no Quadro 11, os funcionários haitianos
apresentaram sete sugestões que podem melhorar o processo de
integração da empresa. Uma delas foi dita pelo funcionário F7: “Para
mim, queria que a empresa, se a companhia, podendo me ajudar, tendo
um papel, para que eu traga meu filho e minha mulher para cá, para ficar
comigo”, pois segundo este mesmo funcionário, “para mim se tem mulher
a cá comigo, o filho a cá comigo, e por exemplo eu tenho R$ 20,00, será
182
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
repartido para eles...”.
Outra sugestão apresentada pelos funcionários foi ter sempre um
tradutor, como observa-se nas falas a seguir:
Sempre ter alguém traduzindo... (F4).
Língua portuguesa é um idioma muito complicado,
difícil de falar. Algumas coisas quando está falando
brasileiro não compreende muito bem, sempre ter
uma pessoa que ajuda para compreender melhor a
situação. (F6).
É importante observar que os funcionários acima estão
apresentando sugestões não apenas para melhorar o processo de
integração, visto que a empresa já possui um tradutor para esse processo,
mas também alguém que esteja com eles sempre para auxiliar nas rotinas
diárias.
Outra sugestão apresentada pelos funcionários haitianos, mas que
não fazem parte do processo de integração, é o aumento do salário que foi
sugerido por três funcionários.
Outros três dos funcionários entrevistados não apresentaram
nenhuma sugestão, e ainda se declararam satisfeitos com o atual processo
desenvolvido pela empresa, conforme observa-se nas seguintes falas:
183
O PROCESSO DE INTEGRAÇÃO DE FUNCIONÁRIOS HAITIANOS POR EMPRESA BRASILEIRA
O que a empresa está fazendo está bom... (F1).
Tudo estava bem quando cheguei. (F9).
Conforme observa-se, foi sugerido pelos funcionários imigrantes
maior clareza na remuneração e nos descontos, devido ao fato de não
entendimento dos mesmos quando iniciaram suas atividades na empresa.
Também sugerem um aumento no salário, conforme se apresentam nas
falas a seguir:
Aumentar salário. (F3).
O problema é quando a firma falar que vai aumentar
salário, quando falar para nós que salário aumentar,
todas as pessoas se sentem bem, vai aumentar
salário. Para receber sempre fica igual, porque fala
de muito desconto, desconto. (F3).
Aumentar salário todo ano. (F4).
Explicar o salário, e pagar mais. (F8).
Percebe-se na segunda fala do funcionário F3 que, mesmo sabendo
que existe um desconto em sua remuneração não consegue entender o
184
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
motivo, alegando ser muito desconto. A sugestão deles é aumentar cada
vez mais o salário, no entanto, sempre haverá os descontos que reduzirão
os valores da remuneração.
A subcategoria sobre normas e documentos em creole foi a mais
sugerida pelos funcionários haitianos isso é observado nas seguintes
falas:
É complicado as normas em português, seria
melhor em creole para o entendimento. (F2).
[...] ou documento em creole. (F4).
Se puder qualquer coisa diferente pode fazer, em
nossa língua, ficaria melhor. (F5).
A sugestão de documentos em creole tem o intuito de fornecer
autonomia sobre o entendimento dos documentos da empresa o que
evitaria uma possível desconfiança nos documentos que os funcionários
assinam acreditando que o que o tradutor informa é verdadeiro.
185
O PROCESSO DE INTEGRAÇÃO DE FUNCIONÁRIOS HAITIANOS POR EMPRESA BRASILEIRA
▯ CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este estudo propôs analisar o processo de integração de
funcionários haitianos em uma empresa catarinense que atua no
ramo de limpeza pública, em Santa Catarina. Seguindo essa diretriz,
foi investigada a percepção dos gestores com relação ao processo de
integração dos funcionários haitianos e a percepção dos haitianos sobre
a empresa.
Conforme análise dos resultados obtidos pela pesquisa realizada,
é possível identificar que conseguiu-se alcançar sua finalidade e os
principais resultados serão exibidos a seguir de acordo com os objetivos
específicos.
Sobre a percepção dos gestores no que se refere às fragilidades e
às potencialidades do processo de integração dos funcionários haitianos,
foi identificado que as principais fragilidades dos funcionários haitianos
foram a dificuldade em se adaptarem à alimentação fornecida pela
empresa, as funções realizadas são trabalhos que muitos não estavam
adaptados, e principalmente a comunicação devido à diferença entre os
idiomas.
No entanto, o principal motivo apresentado pelos gestores que
levou a empresa a contratar funcionários haitianos foi a falta de mão de
obra operacional que vem tomando conta do Brasil, principalmente na
região catarinense, mesmo com o índice de menor nível de desocupação
nacional. Desta forma, com o grande número de haitianos que entrou
186
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
no país a empresa avistou a oportunidade de contratar tais pessoas que
atendem ao perfil desejado.
Sobre a percepção dos funcionários haitianos com relação ao
processo de integração desenvolvido pela empresa, os dados revelam
que a maioria dos entrevistados vieram para o Brasil à procura de um
trabalho que pudesse proporcionar uma melhor condição de vida pra si e
para seus familiares; a maioria encontrou a empresa por meio de amigos
que já moravam no país; já outros vieram para Santa Catarina quando a
empresa foi buscá-los no Acre.
Ao contratar tais profissionais, estes passam por um processo de
integração que na visão dos gestores e dos funcionários haitianos teve
como principal ponto positivo o auxílio de um tradutor que possibilita
melhor entendimento sobre as regras e normas exigidas pela empresa.
Foi identificado ainda que o fato de alguns haitianos compreenderem o
espanhol facilita a comunicação com os demais o que também foi citado
pelos funcionários haitianos como um ponto positivo no processo de
integração.
No entanto, a comunicação de uma forma geral é o ponto crítico
no relacionamento da empresa e dos funcionários haitianos, pois ao
mesmo tempo em que têm um tradutor no processo de integração inicial,
não há esse mesmo auxílio no processo de adaptação/socialização; o
que gera dúvidas que dificilmente podem ser sanadas, pois a maioria
não entende seu idioma; além dos documentos que a empresa entrega
contendo o regulamento interno estar escrito apenas em português.
Muitos funcionários haitianos ficaram descontentes com o não
187
O PROCESSO DE INTEGRAÇÃO DE FUNCIONÁRIOS HAITIANOS POR EMPRESA BRASILEIRA
entendimento dos valores referente à remuneração prometida. Quanto
ao questionamento sobre a recepção e o relacionamento com os demais
funcionários, a maioria se sente bem recebida.
As sugestões mais citadas pela inferência dessa pesquisa, na
percepção dos funcionários haitianos e gestores para melhorar o
processo de integração, foi manter um tradutor, mesmo após a integração
inicial e principalmente formular documentos no idioma deles, o
creole, possibilitando um melhor entendimento sobre a empresa e seus
regulamentos.
Contudo, concluímos que o papel do administrador é compreender
perfeitamente o processo de integração e adaptá-lo aos novos
funcionários facilitando a inclusão de diversas pessoas, afinal, preparar
e planejar todas as ações é o caminho mais fácil de obter os resultados
almejados pela empresa.
188
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
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UMA LEITURA CONTEMPORÂNEA PARA QUE SE ENTENDA AS RAÍZES DO RACISMO BRASILEIRO
194
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
CAPÍTULO 4
UMA LEITURA CONTEMPORÂNEA PARA QUE SE ENTENDA AS RAÍZES DO RACISMO BRASILEIRO
André Gobbo8
Stefane Layana Gaffuri
8 - Os autores são alunos do curso de Doutorado do Programa de Pós-Graduação em Educação Científica e Tecnológica da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Referido trabalho foi produzido para a disciplina de Ciência, Tecnologia e Sociedade, ministrada pelo Dr. Walter Antonio Bazzo, e gentilmente cedido à essa publicação.
195
UMA LEITURA CONTEMPORÂNEA PARA QUE SE ENTENDA AS RAÍZES DO RACISMO BRASILEIRO
Em ‘A Tolice da inteligência brasileira’ (2015) Jessé Souza defende
a tese de que somos vítimas de uma ‘violência simbólica’, vez que as
instituições que controlam os interesses de uma minoria (imprensa,
partidos políticos, universidades, etc.) são as que selecionam e distorcem
o que os olhos veem ao mesmo tempo em que se esforçam para esconder
o que não deve ser visto pela população e; por meio dessa manipulação
dos dados, o privilégio passa a ser legitimado e até mesmo aceito por
aqueles que são excluídos de todos os privilégios.
Ao constatar que atualmente, no Brasil, 1% dos mais ricos se
sustenta com o trabalho dos 99% restantes, Jessé Souza denuncia que a
‘violência simbólica’ só é possível pelo sequestro da inteligência brasileira,
o que faz com as classes sejam feitas de ‘tolas’ para que, injustamente,
se reproduzam e se eternizem os privilégios dos mais ricos. Para isso,
intelectuais e especialistas distorcem o mundo a serviço dos poucos que
controlam tudo e a ciência social conservadora operante contribui para
manter essa realidade de legitimação da dominação social vez que no
mundo moderno o trabalho dos intelectuais é produzir “convencimento”.
Frente a esse cenário, o autor coloca que a “inteligência
brasileira”- marcada pelo extremo empobrecimento do debate político
nacional – está alicerçada por dois pilares: o culturalismo conservador
e o economicismo. Pelo ‘culturalismo conservador’ o Estado passa a
ser demonizado, enquanto que o Mercado é tido como virtuoso; já o
‘economicismo’ produz a fragmentação do conhecimento ao focar em
uma leitura superficial e simplificadora da realidade a que estamos
inseridos.
196
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
Nesse sentido, afirma ele, para que possamos enxergar claramente
o nosso lugar no mundo, precisamos compreender como que a elite
intelectual, submissa à elite do dinheiro, construiu uma imagem
distorcida do Brasil de modo que possa disfarçar todos os privilégios
injustos. É aí então que ele trata sobre a ‘falsa ciência’ que se utiliza do
prestígio científico de Max Weber – o qual originou a forma predominante
como o Ocidente moderno se autointerpreta e se legitima – para afirmar
a visão distorcida, conformista e superficial da realidade. Utilizam a
visão de Weber para conferir ‘prestígio científico’ a uma visão de mundo
atrelada a interesses particulares que mascaram com a universidade e a
neutralidade, apanágio do prestígio científico. Essa situação faz com que
a ciência, que herdou o prestígio da religião e assumiu o papel de explicar
o mundo, deixe em evidência o seu caráter bifronte: a) mecanismo de
esclarecimento do mundo; b) mecanismo de encobrimento das relações
de poder que permitem a reprodução de privilégios injustos de toda
espécie. Nesse lado sombrio do racionalismo ocidental evidenciam-se:
“Especialistas sem espírito” que tudo
conhece sobre seu pequeno mundo de
atividade e nada sabe sobre (nem quer
saber) acerca de contextos mais amplos
que determinam seu pequeno mundo,
e, por outro, o “homem do prazer sem
coração”, que tende a amesquinhar seu
mundo sentimental e emotivo à busca
de prazeres momentâneos e imediatos
(SOUZA, 2015, p. 19).
197
UMA LEITURA CONTEMPORÂNEA PARA QUE SE ENTENDA AS RAÍZES DO RACISMO BRASILEIRO
Além disso, o autor denuncia a visível aproximação entre “racismo”
e “ciência”, vez que essa sempre apresenta e defende a superioridade
de certo “estoque cultural” das sociedades do Atlântico Norte como
fundamento da “superioridade” dessas sobre as demais. Esse racismo
velado do “culturalismo científico” influi em dimensões cognitivas e
morais, sendo que os países do Norte são vistos como mais racionais
e superiores; em contrapartida, os do Sul são apresentados como mais
afetivos, passionais e, consequentemente, corruptos, indignos de
confiança.
Frente a essa constatação, o autor indaga: Como essa oposição é
criada e legitimada “cientificamente” e o que isso tem a ver com a obra
weberiana? Ao mesmo tempo oferece a resposta de que é ele [Weber]
quem oferece os conceitos centrais por meio dos quais foram pensados
e tornados vida prática essa divisão racista entre “gente” superior, das
sociedades avançadas, e “subgente” inferior, das sociedades latino-
americanas e periféricas. A dominação desses ideais faz que com ideias
prevaleçam e influenciem o modo de percebermos a sociedade mundial:
superioridade norte-americana em relação a todas as outras sociedades;
Estados Unidos como modelo absoluto e exemplo acabado de perfeição;
legitimação científica da dominação fática dos Estados Unidos.
Dando prosseguimento às suas análises, o autor afirma que
a ciência social brasileira foi construída sobre o mito falso, ao invés
de destruí-lo. Numa análise retrospectiva para explicar a situação
contemporânea, Souza (2015) remete ao ano de 1933, quando o sociólogo
198
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
Gilberto Freyre lançou ‘Casa Grande e Senzala’. por meio da qual realizou
uma interpretação culturalista brasileira em que inverteu a fórmula
“racista científica” que condenava a nação de mestiços a um futuro
sombrio. Por meio de sua máxima ‘Mestiço is beautiful’, Freyre fez com
que a identidade nacional passasse a ser um elemento de extraordinário
sucesso no Brasil. Apresentado como o pai-fundador da concepção
dominante de como o brasileiro se percebe no senso comum, para o
autor, foi Freyre quem construiu o vínculo afetivo do brasileiro com o
Brasil ao tentar jogar com as ambiguidades de ser corpo (juntou raça e
cultura), por meio do qual o brasileiro vai conseguir ver minimamente as
suas virtudes.
Três anos mais tarde, em 1936, com a publicação de ‘Raízes do
Brasil’, Sérgio Buarque de Holanda inverte o diagnóstico positivo de
Freyre, defendendo que essa civilização e seu tipo humano, o homem
cordial, são, na verdade, nosso maior problema social e político. Sobre
essas ideias é que Buarque de Holanda é tido como o pai-fundador das
ciências sociais brasileiras do século XX e autor da forma dominante
de como a sociedade brasileira contemporânea se compreende até hoje
com a chancela e a autoridade científica. Por meio de suas ideias é que
se consolidou a imagem de que o Estado é incompetente e inconfiável
e o mercado capitalista como sinônimo da racionalidade e da virtude.
O sucesso dessa ideologia de Buarque de Holanda é fruto da associação
que o mesmo faz entre o mercado e sociedade, convidando os cidadãos
a serem tão virtuosos, puros e imaculados como o mercado; ao mesmo
tempo que demoniza a intervenção estatal considerando-a, sempre,
199
UMA LEITURA CONTEMPORÂNEA PARA QUE SE ENTENDA AS RAÍZES DO RACISMO BRASILEIRO
como ineficiente e corrupta.
Conforme Jessé Souza, coube a Buarque de Holanda lançar as
bases “filosóficas” e políticas do liberalismo conservador que se tornaria
dominante e a forma ‘naturalizada’ de perceber o Brasil contemporâneo.
Tais bases se alicerçam em cinco pressupostos, a saber:
a) a idealização dos Estados Unidos
como espécie de “paraíso na terra”,
como justiça social e igualdade de
oportunidades;
b) o homem cordial brasileiro como
um ser genérico de todas as classes,
emotivo, prisioneiro das paixões do
corpo e, portanto, moralmente inferior,
indigno de confiança e tendencialmente
corrupto;
c) o amálgama institucional do “homem
cordial” na noção de “patrimonialismo”
apenas estatal, que servirá mais tarde
para a contraposição entre mercado
virtuoso e estado demonizado;
d) a criação de um caminho alternativo
universalizável para toda a nação: um
antiestatismo sob a condução dos
interesses de mercado do estado de São
Paulo; e, por fim,
e) a construção de uma ideologia
antipopular, concebida como uma
crítica ao populismo, que equivale a
200
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
um “racismo de classe” e que perpassa
também toda a sociedade.
Jessé Souza também faz críticas a Raymundo Faoro que, por meio
de ‘Os donos do poder’, busca demonstrar o caráter patrimonialista
do Estado brasileiro, o qual, conforme ele, herdou de Portugal, ‘por
desgraça’, sua singularidade social e política, sendo que o principal
elemento que ‘prova’ essa herança é a estrutura ‘patrimonial’ do Estado
e, por consequência, de toda a vida social. Conforme Faoro, o ‘sucesso’ de
Portugal, sua unificação prematura que o predispôs a grandes conquistas,
é a causa última de seu ‘fracasso’ como sociedade moderna, sendo que a
centralização impede as condições propícias para o desenvolvimento do
capitalismo industrial. Afirma também que sempre que temos Estado,
temos um estamento que o controla em nome de interesses próprios,
impedindo o florescimento de uma sociedade civil livre e empreendedora.
É por meio de Faoro que se funda então a crença liberal clássica de que
a ação estatal acarreta, invariavelmente, o amortecimento das forças
vitais de uma sociedade vez que, entende ele, a predominância do Estado
como estimulador e condutor de vida social é um mal em si que acarreta
o desaparecimento, ou evita o aparecimento, de formas autônomas de
organização social.
Por conseguinte, ao tratar sobre as banalidades da modernização do
culturalismo conservador, Jessé Souza responsabiliza a obra ‘Carnavais,
Malandros e Heróis’, de Roberto DaMatta, que analisa o cotidiano
brasileiro, das décadas de 80 e 90, estuda seus rituais e modelos de ação
201
UMA LEITURA CONTEMPORÂNEA PARA QUE SE ENTENDA AS RAÍZES DO RACISMO BRASILEIRO
que todos nós realizamos sem, conforme DaMatta, ter a consciência
de que assim o fazemos. A tese principal dessa obra é o dualismo entre
indivíduos versus espaços, sendo que o mesmo escrevera:
Se no universo da casa sou um
supercidadão, pois ali só tenho direitos e
nenhum dever, no mundo da rua sou um
subcidadão, já que as regras universais
da cidadania sempre me definem por
minhas determinações negativas: pelos
meus deveres e obrigações, pela lógica
do ‘não pode’ e ‘não deve’.
O que DaMatta não percebe, conforme Jessé Souza, é de que
modo o mundo das instituições comanda nossa vida e nossas escolhas; e
quando diz que o Brasil é o país do “jeitinho”, quer dizer que é o país onde
o acesso às relações pessoais “poderosas” constrói a hierarquia pessoal,
escondendo, dessa forma, as verdadeiras causas da desigualdade e do
privilégio injusto.
Ao se contrapor à tese de DaMatta, Jessé Souza entende que só
existe acesso às “relações pessoais de prestígio” para quem já possui
acesso aos capitais impessoais, e não ao contrário. Para ele é o capital
econômico, social e cultural que pré-decidem nossa sorte, nosso azar,
nosso sucesso ou nosso fracasso, afirmando que:
São os capitais impessoais como o capital
cultural e sua apropriação por meio de
202
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
privilégios injustos que se eternizam no
tempo, que condenam à desclassificação
social e à miséria tantos brasileiros que
se tornam obrigados a vender a força de
trabalho por preço pífio (SOUZA, 2015,
p. 87).
Jessé Souza fundamenta sua tese nos escritos de Norbert Elias,
para o qual o Estado, com o monopólio da violência física da sociedade, é
apenas a ponta mais visível de um desenvolvimento milenar nas formas
de exercício de dominação política, cujo pressuposto é uma complexa
modificação da psique individual. Ao invés do controle externo, a partir
da ameaça do mais forte, o Estado moderno pressupõe controle interno
e competição pelos bens escassos por meios mais ou menos pacíficos.
Em outras palavras, ao contrário do que supõe a dualidade damattiana
(indivíduos x espaços), Jessé entende que os poderes impessoais do
mercado e do Estado não são instituições que exercem efeitos em áreas
circunscritas e depois se ausentam nos contatos face a face da vida
cotidiana. Pelo contrário, eles entram em nossas casas e nos dizem como
devemos agir, o que devemos desejar e como devemos sentir.
Adiante, Jessé Souza também percebe o liberalismo como racismo
de classe em que as classes altas são percebidas como “bastião da
moralidade nacional”. A tese do patrimonialismo também serve para
ocupar um tipo de capitalismo selvagem e voraz em que 70% do PIB
nacional está concentrado nas mãos de banqueiros e industriais e os
outros 30% é distribuído entre a massa salarial. O culpado dessa situação
203
UMA LEITURA CONTEMPORÂNEA PARA QUE SE ENTENDA AS RAÍZES DO RACISMO BRASILEIRO
é pessoalizado e materializado no Estado. Conforme o autor, o golpe de
mestre dessa tese é o ‘ganho afetivo’ conseguido ao tornar a sociedade
tão virtuosa quanto o mercado. O que interessa ao patrimonialismo e aos
seus defensores é justamente dramatizar a falsa oposição entre mercado
divino e Estado diabólico como forma de ocultar as reais distorções de
uma sociedade tão desigual.
Esse ‘racismo culturalista’ é a ordem do dia do mundo prático das
finanças e da política internacional, sendo que uma das justificativas mais
importantes da alta taxa de juros brasileira é a suposta inconfiabilidade
dos brasileiros de honrar seus compromissos; com isso, toda a população
paga um preço alto pela má fama construída e legitimada com recursos
pseudocientíficos. Da mesma forma, a dominação interna das classes
tidas como ‘mais cultas’ (partidos políticos, justiça, universidades e
mídias) sobre as ‘populares’ faz com que se consolide a imagem do Brasil
como uma terra do sexo, do afeto e da emoção; terra da corrupção, do
patrimonialismo e das relações pessoais. Em contraposto, está a imagem
dos Estados Unidos e da Europa, como terras do cálculo, da racionalidade,
da confiança e da moralidade distanciada das emoções.
Porém, segundo Jessé Souza, o culturalismo liberal/conservador
não é o único inimigo para uma compreensão alternativa e crítica da
sociedade brasileira contemporânea. Para ele, em uma sociedade que
confunde ‘reflexão com informação’ e na qual se imagina que “os dados
falam por si” existe uma forma de distorção da realidade que não remete
necessariamente ao racismo latente da teoria dos “estoques culturais”
herdados e que nunca mudam. A cegueira acerca dos componentes
204
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
simbólicos da vida social também ocorre quando se imagina que todo
comportamento humano pode ser reduzido a estímulos econômicos; ou
seja, os números e as quantificações é que dão a ilusão das certezas das
ciências naturais e o que é quantificável passa a ser o que é percebido
como “científico”, sem sequer nos perguntarmos acerca dos pressupostos
dessa “cientificidade”.
Nesse sentido é que o autor percebe o economicismo como ‘cegueira’
da dimensão simbólica do capitalismo. Ele define o ‘economicismo’ como
sendo a crença explícita ou implícita de que o comportamento humano
em sociedade é explicado unicamente por estímulos econômicos.
Nesse ponto, Jessé Souza recorre à obra ‘Economia brasileira:
Crítica à razão dualista”, datada de 1972, de autoria de Francisco
de Oliveira, a qual se apresenta como uma resposta à expansão do
capitalismo brasileiro acompanhada de um modelo de consumo restrito
à classe média. Para referido autor, todo o sistema social capitalista, e
não apenas o “subdesenvolvido”, articula um setor ‘moderno’ e um setor
‘atrasado’, sendo que o moderno se alimenta e explora o atrasado e é
justamente essa exploração que explica e mantém o dinamismo do setor
econômico brasileiro.
Para Oliveira, a regulamentação das leis do trabalho (a partir de
1930), limitada às cidades, criou um denominador comum para todas
as categorias de trabalhadores e acabou por garantir o processo de
acumulação de capital ao invés de prejudicá-lo. A combinação de baixos
salários e alta produtividade pela importação de tecnologias de ponta
materializadas em meios de produção (1930-1970) está na base do tipo
205
UMA LEITURA CONTEMPORÂNEA PARA QUE SE ENTENDA AS RAÍZES DO RACISMO BRASILEIRO
de capitalismo que se instaurou no Brasil com seu padrão altamente
concentrador; o resultado desse processo socioeconômico é uma
concentração sem precedentes de renda, propriedade e poder. Oliveira
vai além ao analisar que a revolução burguesa brasileira (1930-1970) fez
com que a burguesia industrial passasse a ocupar a posição de hegemonia
do novo arranjo das classes dominantes e, com isso, tornou-se necessário
o alargamento do setor de serviços, com pouco capital graças ao recurso
de mão de obra barata.
No entanto, conforme Jessé Souza, por meio de sua obra Oliveira
não conseguiu perceber que os atores, individuais ou coletivos, produzem
e reproduzem consensos sociais que não são mera decorrência de
interesses econômicos. Há, conforme ele, uma complexa inter-relação
entre economia, política e sociedade.
Outra obra citada e analisada por Jessé é ‘A Revolução Burguesa
no Brasil’, de Florestan Fernandes, o qual também não se liberta
completamente do culturalismo ao dissertar sobre a implantação e
consolidação do capitalismo brasileiro. Para o referido autor, mercado e
Estado já reproduzem uma visão de mundo e de ser humano contingente
historicamente produzida, que hierarquiza indivíduos e classes sociais
de acordo com seus imperativos funcionais. É a partir dessa hierarquia
que classificados e desclassificados sociais são produzidos sob uma
aparência de naturalidade e neutralidade pela ação de princípios
supostamente universais e acima de qualquer discussão. Os sujeitos da
modernização brasileira são para Fernandes os fazendeiros do Oeste
paulista, percebidos como herdeiros dos bandeirantes, e os imigrantes
206
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
que chegam ao Brasil nas últimas décadas do século XX, tanto que vê São
Paulo como uma ‘Nova Inglaterra tropical’ que se contraporia ao resto do
país atrasado, personalista e corrupto.
Em outra obra, ‘A integração do negro na sociedade de classes’,
Florestan Fernandes se predispôs a empreender uma análise de como
o “povo” emerge na história brasileira. Conforme ele, com o abandono
do liberto à própria sorte (ou azar?) o mesmo se viu responsável por si
e seus familiares sem que dispusesse de meios materiais e morais para
sobreviver em uma nascente economia competitiva de tipo capitalista e
burguesa. Essa questão leva Jessé Souza a perceber a abolição como uma
revolução social de brancos para brancos, inaugurando-se dessa forma
um abandono secular de uma “ralé” despreparada para enfrentar as
novas condições socioeconômicas.
Para o autor, as dificuldades de adaptação do negro, mulato e dos
estratos despossuídos, transformaram-se na semente da marginalização
continuada que encontrou condições psicossociais de personalidade
para se perpetuar, a saber:
a) inadaptação do negro para o trabalho
livre;
b) sua incapacidade de agir segundo
os modelos de comportamento e
personalidade da sociedade competitiva.
Foram essas condições que levaram essa classe ao que Souza
chama de ‘desespero mudo’ por sofrerem com a pauperização, acarretada
207
UMA LEITURA CONTEMPORÂNEA PARA QUE SE ENTENDA AS RAÍZES DO RACISMO BRASILEIRO
pela inadaptação social; e pela anomia, causada pela organização familiar
disfuncional. Esse desespero os levou a submergirem nas lavouras de
subsistência e a concentração nas nascentes ‘favelas’. A anomia familiar
a que o autor se refere pode ser constatada pela desorganização e
autodestruição a que esses sujeitos foram lançados, sendo que a criação
das favelas facilitou todo tipo de relação incestuosa, o vício em álcool;
o monopólio dos serviços domésticos – única área onde a competição
com o imigrante europeu não era significativa – e a baixa prostituição,
sendo que, nesse caso, negras e mulatas valem bem menos. Foi este
abandono que criou condições perversas de eternização de um ‘habitus
precário’ que constrange esses grupos a uma vida marginal e humilhante
à margem da sociedade incluída.
Do mesmo modo, a marginalização permanente de grupos sociais
inteiros tem a ver com a disseminação efetiva de concepções morais e
políticas, que passam a funcionar como “ideias-força” nessas sociedades.
Complementando o acima exposto o autor escreve:
Não é a continuação do passado no
presente “inercialmente” que está
em jogo, realidade esta destinada a
desaparecer como desenvolvimento
econômico, como parece acreditar até o
grande sociólogo [Florestan Fernandes],
mas a redefiniçao “moderna” do negro
(e do dependente ou agregado brasileiro
rural e urbano de qualquer cor) como
“imprestável” para exercer qualquer
208
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
atividade relevante e produtiva no novo
contexto, que constitui o quadro da nova
situação de marginalidade (SOUZA,
2015, p. 136).
Corroborando com o supracitado, Souza afirma que a ordem
competitiva também tem sua hierarquia e é com base nela, e não
em qualquer “resíduo” de épocas passadas, que tantos brancos sem
qualificação adequada são desclassificados e marginalizados de forma
permanente. Nesse sentido é que condena o “culturalismo racista”,
pois acredita que o mesmo envenena as ciências sociais ao tornar os
mecanismos opacos de classificação e desclassificação social ainda mais
invisíveis.
Ao sugerir caminhos para a reconstrução de uma teoria crítica
da sociedade no Brasil e no mundo de hoje, Jessé de Souza retoma sua
tese de que a ‘inteligência brasileira’ se subdivide em duas tradições de
pensamento: ‘culturalista conservadora’ e ‘economicista’. Nesse sentido,
o seu desafio é tentar reconstruir as bases para uma “teoria crítica de
modernização” a qual não parta da idealização de sociedades concretas,
mas perceba mecanismos simbólicos classificatórios operantes em
qualquer contexto capitalista.
Para ele, pelo fato de que não se percebe uma estrutura simbólica
subjacente a todo o mundo capitalista, imagina-se o mundo dividido
entre sociedades avançadas (com uma estrutura material e simbólica
supostamente própria) e sociedade ‘atrasadas’ (com uma outra estrutura
material e simbólica percebida como peculiar e distinta das avançadas).
209
UMA LEITURA CONTEMPORÂNEA PARA QUE SE ENTENDA AS RAÍZES DO RACISMO BRASILEIRO
Com esse entendimento é que a ‘ciência moderna’ se transformou em
uma espécie de ideologia que ajuda a manipular e legitimar privilégios.
O ‘liberalismo simbólico’ se utiliza do prestígio científico como
mote de justificação de uma ciência que prolonga o senso comum e
suas ilusões e preconceitos para fundamentar privilégios. Para o Brasil,
o desafio para a compreensão de sociedades desse tipo, hoje em dia
chamadas de “emergente” e com crescente influência internacional, é
compreender o amálgama entre inegável dinamismo social e econômico
e padrões de desigualdade permanentes, pobreza e marginalização social
de partes significativas da população.
O tipo de “racismo científico’ a que estamos entregues pretende
demonstrar que existe uma hierarquia meritocrática entre os países e
as classes que hoje monopolizam todos os privilégios. Essas teorias são
utilizadas para mostrar que a corrupção no centro é sempre utópica e
passageira e só na periferia ela é sistêmica e societária.
Ademais, na periferia, essas mesmas teorias são utilizadas pelos
‘teóricos periféricos’ para tornar exóticas suas próprias sociedades
e, quase sempre, mostrar como as classes superiores merecem seus
privilégios. A isso o autor questiona: “Não se está, por baixo do pano e
sem alarde, essencializando o conjunto das sociedades periféricas e
seus habitantes com um tipo de racismo criado, propagado e legitimado
cientificamente?” (p. 150). A isso ele responde que os países periféricos
são estigmatizados e obrigados a pagar um “mais-valor” por pura obra de
preconceitos criados e confirmados com a autoridade da ciência. Imersos
nesse contexto, o ponto central é justamente a idealização das sociedades
210
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
avançadas como reino de competição justa e da efetiva superação de
privilégios permanentes e, de outro lado, a demonização das sociedades
periféricas como reinos de corrupção e do engodo.
Contudo, para Jessé Souza, a naturalização da desigualdade é
possível pela sutil violência da ideologia da meritocracia a qual esconde
sistematicamente a produção social dos desempenhos diferenciais entre
os indivíduos, tornando possível que o desempenho diferencial apareça
como diferença de talentos inatos. Nesse sentido, o acesso privilegiado
a todos os bens e recursos escassos é reforçado pela opacidade teórica
que o torna literalmente invisível e não tematizável. Chamar a atenção
para problemas aparentes ou criar falsas oposições têm sempre o fim de
nos cegar em relação a conflitos reais e mais importantes. A percepção
de países periféricos dinâmicos como se os mesmos funcionassem como
sociedade pré-modernas serve, antes de tudo, para encobrir relações de
poder injustas e desiguais.
A isso é que o autor defende a ideia de que a crítica social tem
que começar demonstrando que a classe perdedora da universalização
do capitalismo por todo globo obedece a uma lógica semelhante nos
países centrais e periféricos. Atualmente, conforme ele, a dita “ciência”
é instância legitimadora de todas as práticas do mundo moderno, onde
os teóricos do centro são percebidos como aqueles que possuem cérebro
e, portanto, apenas veem o dado empírico. Nesse sentido, a ciência
reproduz o esquema de trocas desiguais na esfera econômica dos países
que detém tecnologia e dos que exportam matéria-prima, na medida em
que a “invenção”, a “ideia”, será apanágio dos pensadores do centro.
211
UMA LEITURA CONTEMPORÂNEA PARA QUE SE ENTENDA AS RAÍZES DO RACISMO BRASILEIRO
O resultado disso tudo é uma cegueira global que explica porque os
conceitos centrais são sempre “regionais” – na realidade norte-atlânticos
e não “nacionais” como pensam alguns - e os conceitos “periféricos”
sempre especularmente “reativos” e também regionalizados.
No entanto, o que existe, afinal, de comum e de distinto entre as
sociedades centrais e periféricas? A isso, o autor entende que existem
diferenças essenciais em sociedades como a francesa ou a alemã que se
distinguem de modo claro e perceptível de sociedades como a brasileira ou
a mexicana, diferenças essas como pobreza e marginalização de amplos
setores da população. No entanto, a ciência crítica pode demonstrar que
o mundo não é constituído por indivíduos livres, já que o peso de nossa
socialização nos inclina a escolhas pré-definidas; que nossa racionalidade
é, em grande medida, um mito; e que não existe ‘valores subjetivos’, já
que a sociedade cria todo o pano de fundo cognitivo e moral no qual nos
movimentamos.
É claro que existe um interesse prático para que essas ilusões
sobrevivam. Existe como uma ‘articulação silenciosa’ para a manutenção
dessa fraude por parte de todos os interesses que estão ganhando para se
perpetuarem no poder.
Ademais, o autor critica a forma como percebemos o mundo
moderno e suas relações a partir das características que o dinheiro,
tornado carne e osso, domina nossas emoções e sentimento, nos
inclina a sentir e a pensar. Esse fato implica que adquirimos o ritmo do
dinheiro e nos tornamos ansioso, com pressa, dominados pelo relógio.
Emocionalmente, o dinheiro nos faz reproduzir a atitude distanciada
212
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
e fria que o cálculo monetário exige para sua persecução perfeita.
Torna-nos inferentes e calculistas! Nessa concepção, nossa capacidade
avaliativa tende a assumir a forma quantitativa do dinheiro, o qual reduz
todas as qualidades a quantidades. Dessa forma, como a cultura nacional
reflete os interesses particulares das classes dominantes transformados
em interesses de todo corpo social, estamos nos confrontando tanto
com a distorção da realidade quanto com sua fragmentação e redução ao
elemento ‘material’ na dimensão da comparação entre sociedades.
Outra questão levantada pelo autor é se existe algo de comum
na reprodução simbólica das sociedades modernas e: como perceber
as fontes morais, as quais, paralelamente ao dinheiro e ao poder,
também influenciam de modo importante todas as ações, julgamentos e
comportamentos? Para ele, é a construção de uma hierarquia clara entre
os valores mais e menos importantes que pode nos indicar quais e de
que modo eles interferem na nossa vida prática. No entanto, a tendência
racionalista e intelectualista que temos é o inimigo comum para essa
reconstrução.
Conforme Souza, as ideias têm que ser institucionalizadas para
adquirirem real eficácia prática e social, no entanto, o segredo dessa
nova tecnologia do corpo é a construção de corpos ‘dóceis e criativos’,
sendo que a docilidade só pode ser conseguida se o “corpo não tiver
consciência” de sua própria submissão. Essa docilidade não é apenas
econômica, mas também política, naturalizada e pensada como sendo
exercida em proveito próprio. É a dominação pela disciplinarização que
tem na impessoalidade e universalidade suas características principais.
213
UMA LEITURA CONTEMPORÂNEA PARA QUE SE ENTENDA AS RAÍZES DO RACISMO BRASILEIRO
Nesse processo, segundo Jessé Souza, a escola é ineficiente
porque as crianças já chegam como perdedoras, enquanto as crianças
de classe média já chegam vencedoras pelo exemplo e estímulo paterno
e materno afetivamente construído. A isso, a instituição escolar pública
passa a ser marcada pela má fé institucional, de tal modo que promete a
redenção dessa classe pela educação, enquanto, na verdade, possibilita
transformar, com o carimbo do Estado e a anuência de toda a sociedade,
o abandono social em ‘culpa individual’ de alunos supostamente burros
e preguiçosos.
Adiante, o autor coloca que o crescimento econômico aliado às
políticas redistributivas, como por exemplo Prouni, Bolsa Família, Minha
Casa Minha Vida, etc. comprovam que não existe classe condenada
para sempre e que condições econômicas e políticas favoráveis podem
desempenhar papel decisivo.
Ao destacar as similaridades entre as sociedades do Norte e do Sul, o
autor coloca que essa classe de destituídos não é uma classe social apenas
brasileira, mas, talvez, a classe social mundialmente mais numerosa.
É, para ele, ‘uma classe social’ porque em todo lugar os pressupostos
de sua exclusão social são os mesmos. Até em países europeus ou nos
Estados Unidos essa classe é cada vez mais representativa, sendo que,
nesse contexto, a ideologia da meritocracia procura preservar a ilusão de
justiça e igualdade, transformando constantemente o privilégio social
em um ‘talento individual’.
Nesse sentido, defende a ideia de que, tanto nas nações mais ricas
quanto nas mais pobres, o que importa para a teoria sociológica crítica é
214
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
justamente perceber como a dominação social é construída e legitimada;
afinal, tornar a dor e o sofrimento visíveis é o desafio maior de qualquer
ciência verdadeiramente crítica. Adiante, destaca que se o povo brasileiro
se livrar do complexo de ‘vira-lata’ que o torna servil e colonizado até
o osso, poderá começar a pensar e refletir com suas próprias cabeças e
compreender questões centrais que se veem muito melhor da periferia
do sistema do que no centro.
Na última parte do livro, discorre que a cegueira do economicismo
reside no fato de que a mesma é cega tanto em relação aos aspectos
decisivos que reproduzem todos os privilégios quanto em relação à
falsa justificação social de todos os privilégios. Aqui, o ponto decisivo
a ser entendido é que os indivíduos são constituídos, em seus limites e
possibilidades na competição social, de modo muito distinto dependendo
de seu ponto de partida de classe, o qual envolve basicamente três
capitais: o econômico, o cultural e o social.
Para ele, é a ‘incorporação de capital cultural’ que caracteriza
as classes trabalhadoras modernas. As classes do privilégio exploram
esse exército de pessoas disponíveis a fazer quase de tudo (doméstica,
motoboy, prostituição, etc.). A classe ‘abaixo’ trabalhadora é jogada nas
‘franjas do mercado competitivo’, condenada a exercer todos os trabalhos
mais duros, humilhantes, sujos, pesados e perigosos; é justamente esse
‘tempo roubado’ de outra classe que permite reproduzir e eternizar uma
relação de exploração que condena uma classe inteira ao abandono e
à humilhação, enquanto garante a reprodução no tempo das classes
do privilégio. É, antes de tudo, o exercício silencioso da exploração
215
UMA LEITURA CONTEMPORÂNEA PARA QUE SE ENTENDA AS RAÍZES DO RACISMO BRASILEIRO
construída e consentida socialmente. A isso, entende ele que, ao reduzir
as classes à sua renda, simplesmente esquecemos do principal: as
relações de dominação que fazem com que alguns monopolizem todos
os privilégios enquanto outros são excluídos.
Jessé concorda que ‘ascender socialmente’ só é possível a quem
logra incorporar as precondições que o capitalismo atual pressupõe
para a crescente incorporação de distintas formas de conhecimento e de
capital cultural como ‘porta de entrada’ em qualquer um de seus setores
competitivos. Nesse sentido, a fronteira entre ‘ralé’ e ‘batalhadores’
está situada precisamente na possibilidade da incorporação pelos
batalhadores dos pressupostos para o aprendizado e o trabalho que
faltam à ‘ralé’, afinal, o domínio permanente de classes sobre outras
exige que as classes dominadas se vejam como inferiores, preguiçosas,
menos capazes, menos inteligentes, menos éticas.
Frente ao exposto, entende-se que o economicismo é, portanto,
cego em relação tanto à estrutura social, que implica a consideração
de capitais que não se restringem ao econômico, quanto ao ponto
verdadeiramente decisivo no que diz respeito às classes sociais: a forma
leviana como as classes sociais são produzidas e reproduzidas.
Em seguida, relaciona sua tese às manifestações registradas contra
o Governo, em 2013, sendo que, conforme ele, a classe média que foi
em massa às ruas agiu tanto como ‘tropa de choque’ dos interesses dos
endinheirados quanto em interesses próprios. Essa mesmas classe média
brasileira, que explora os excluídos sociais em serviços domésticos
(o que lhe permitem poupar tempo livre para incorporar ainda mais
216
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
conhecimento e capital cultural para a reprodução indefinida de seus
privilégios, enquanto condena os excluídos à reprodução de sua própria
miséria) posa de humana, corajosa e virtuosa ao sair às ruas para
condenar sempre um ‘outro’ que não nós mesmos. O privilégio precisa
ser justificado ou tornado invisível para se reproduzir.
Este heroísmo é prontamente glorificado por uma grande
imprensa que posa de neutra, como se fosse uma sociedade de fins
públicos e não tivesse proprietários privados ‘endinheirados’ e
interessados em continuar a curtir as benesses da riqueza socialmente
produzida concentrada em suas mãos. Nesse sentido, o que nos afasta
das sociedades ‘moralmente superiores’ é que exploramos, aceitamos
e tornamos fato natural e cotidiano conviver com gente sem qualquer
chance real de vida digna, sem ter nenhuma culpa disso.
Nesse contexto, quem é feito de tolo aqui são partes significativas
das classes médias e trabalhadoras ascendentes; muitas delas que
defendem o Estado mínimo e o mercado máximo e que pagam preços
máximos por produtos e serviços mínimos e de baixa qualidade a
capitalistas que possuem monopólios para produzir mercadorias e
serviços de segunda categoria.
Nesse contexto, é papel da ciência crítica:
a) desmascarar as ideologias que
nos fazem de tolos ao colonizar e
manipular sentimentos e anseios não
compreendidos em nós mesmos;
b) desconstruir a fragmentação míope
217
UMA LEITURA CONTEMPORÂNEA PARA QUE SE ENTENDA AS RAÍZES DO RACISMO BRASILEIRO
que a ótica econômica unilateral cria
para a percepção do mundo como ele é;
c) explicitar a dualidade dialética entre
exploração e justificação, que permite
dotar o cidadão inteligente que foi
feito de otário das armas necessárias,
primeiro, para sua mudança como ser
humano e, depois, como mecanismo de
aprendizado coletivo;
d) dar voz ao sofrimento, à humilhação
e à dor, silenciados pelas interpretações
dominantes daqueles a quem faltam as
armas para expressar e fazer valer sua
indignação e revolta justa;
e) mostrar que as relações entre classes
permitem esclarecer tanto a exploração
de classe escondida sob formas ‘não
econômicas’ quanto sua justificação e
encobrimento.
Contudo, a ciência social crítica não é algo que se deve deixar
às salas de aula dos privilegiados e aos jornais da ínfima oligarquia
dominante. É preciso restituir a reflexão àqueles que foram transformados
em marionetes de um drama que não compreendem e do qual não são os
autores, o sentido e o comando sobre sua própria vida.
Por fim, Souza destaca que o tema da corrupção só pode ser
usado para enganar e manipular porque a definição do que é corrupção
é arbitrária e pode ser aplicada ao bel-prazer de quem realiza o ataque.
218
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO
Quem é feito de tolo aqui são partes significativas das classes
médias e trabalhadoras ascendentes, muitas delas que defendem o
Estado mínimo e o mercado máximo e que pagam preços máximos por
produtos e serviços mínimos e de baixa qualidade a capitalistas que
possuem monopólios para produzir mercadorias e serviços de segunda
categoria.
É essa corrupção organizada do mercado que “aparece” como
milagre do mérito de capitalistas que na verdade herdaram o privilégio e
nunca correram nenhum risco. E é essa visão das coisas que é difundida
na esfera pública. E ainda, com esse dinheiro “extra” dos tolos, compram
partidos políticos que defendem seus privilégios, e jornais e redes
de TVs que repetem todo dia que o problema nacional é a corrupção
apenas no Estado. A lorota do mercado “virtuoso” entre nós só pode ser
compreendida pelo sequestro dos meios de comunicação em favor dos
interesses do 1% mais rico da população.
O capitalismo monopolizado de hoje não só fabrica balanços
falsos de empresas e países com interesse de lucro e cria a ilusão de
que grandes empresas e bancos fraudulentos são “muito grandes para
quebrar”. Os produtores recebem uma ínfima parte do lucro e os grandes
atravessadores ganham até quarenta vezes mais sem qualquer adição ao
valor dos produtos pelo simples fato de controlar monopolisticamente o
mercado. Ou seja, a “corrupção” percebida como engano e falseamento
da “troca justa”, é o dia a dia do mercado em todo lugar ainda que muito
maior em um mercado tão mal regulado como o nosso
Há também de se afirmar que, no Brasil, o superlucro é visto como
219
UMA LEITURA CONTEMPORÂNEA PARA QUE SE ENTENDA AS RAÍZES DO RACISMO BRASILEIRO
“inteligência” e “esperteza” – esquecendo-se que se há um “esperto” é por
que há milhões de “tolos” – e a corrupção é sempre estatal ou tem relação
com o Estado. Ela se presta antes de tudo ao “sequestro da política” pelos
donos do dinheiro. Em fases de crise, como agora, quando a “farofa é
pouca e todo mundo quer o pirão primeiro”, então os mais ricos querem
cortar os investimentos sociais e ficar com o Estado só para eles.
A corrupção e a sua vagueza conceitual é sempre o mote
que galvaniza a solidariedade “emocional” das classes médias, que
se imaginam moralmente superiores às outras classes, e confere
respeitabilidade moral e política a esses assaltos à soberania popular.
A imprensa, segundo o autor, é fundamental neste processo, posto
que é necessário “legitimar” o assalto ao princípio da soberania popular
como única fonte que permite vincular legalidade e legitimidade do
regime democrático e representativo.
Mudam-se as vestes e as fantasias! “Moderniza-se” o golpe,
substitui-se o argumento das armas pelo argumento “pseudo-jurídico”.
Amplia-se a aparência de “neutralidade”, sai de cena a baioneta e entra no
palco da ópera bufa a toga arrogante e arcaica do operador jurídico, mas
preserva-se o principal: Quem continua mandando de verdade em toda
a encenação do teatro de marionetes são os mesmos 1% que controlam
a riqueza, o poder e instrumentalizam a informação a seu bel-prazer. Os
outros 99% ou são manipulados diretamente, como a classe média, ou
assistem de longe, bestializados, a um espetáculo o qual, como sempre,
vão ter que pagar sem participar do banquete.
220
SOUZA, Jessé. A tolice da inteligência brasileira: ou como o país se deixa manipular pela elite. São Paulo : LeYa, 2015
▯ REFERÊNCIA
221
Gabriella Depiné Poffo
Possui Doutorado (2018) e Mestrado em Administração (2012) em Administração
(UNIVALI) - Universidade do Vale do Itajaí, Graduação em Administração pela Faculdade
Avantis. Atualmente é coordenadora do Curso de Administração da Faculdade Avantis de
Itapema. Especialista em Docência no ensino Superior (2014), em gestão financeira (2013) e
em pedagogia gestora (2007). Em 2012 realizou um aperfeiçoamento em Formação Pedagógica
de Docentes. Pelo desenvolvimento do seu trabalho na comunidade recebeu Moção honrosa
na Prefeitura Municipal de Balneário Camboriú em 2015 e em 2016, recebeu da prefeitura
Municipal de Camboriú. Em destaque aos administradores da região, recebeu Moção do
Conselho Regional de Administração de Santa Catarina pelos trabalhos desenvolvidos na
comunidade em comemoração aos 50 anos da profissão regulamentada. Também possui
artigos publicados em eventos nacionais e internacionais, publicação de livros, de capítulos
de livros e periódicos. É membro editorial da revista Científica Sophia. No campo prático
é sócia-proprietária do Instituto AtitudeNow que executa cursos de formação em diversas
áreas de ensino.
ORGANIZADORA
222
AUTORES
André Gobbo
Doutorando em Educação Científica e Tecnológica (UFSC, 2016). Possui graduação
em Comunicação Social, habilitação em Jornalismo, pela Universidade do Vale do Itajaí
(1999), especialista em História, Ensino e Pesquisa em Santa Catarina (2001) e em Ensino
e Docência no Ensino Superior (2014). Mestre em Ciências da Educação (Universidade
Federal da Paraíba, 2010), acumula 15 anos de experiência na docência do Ensino
Superior em diferentes cursos da Faculdade Avantis, de Balneário Camboriú (SC), onde
também coordena o Núcleo de Apoio Técnico e Pedagógico (NATEP), e de quem, em 2018,
recebeu o título de Professor Emérito em reconhecimento por suas contribuições ao
desenvolvimento do ensino superior de qualidade e disseminação do conhecimento com
princípios éticos para a formação de cidadãos comprometidos com o desenvolvimento
sustentável. Autor dos livros Dom José Gomes: escudo dos oprimidos (Paulinas, 2002);
Passaporte para a história: Itapema e sua alma feminina (Arcus, 2009); e organizador de
‘Novas narrativas para o ensino-aprendizagem’ (Pimenta Cultural, 2017); além de artigos
e capítulos de livros.
223
Andreia MartinsDoutorado em Psicologia pela Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC (2018), Mestre
em Gestão de Políticas Públicas (2008), Especialização em Avaliação Psicológica (2005) e
Graduação em Psicologia (2002). Integrante do Núcleo de Estudos Trabalho e Constituição do
Sujeito - NETCOS do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da UFSC. Atua como docente
na Faculdade Avantis de Balneário Camboriú - SC e psicóloga clínica.
Silvia BarcelosSilvia Barcelos é natural de Santa Maria (RS), onde nasceu em 18 de agosto de 1979.
Formada em Bacharel em Administração, da Faculdade Avantis. Atualmente trabalha na área
de crédito e cobrança da empresa BRF.
224
Stefane Layane GaffuriDoutoranda em Educação Científica e Tecnológica (UFSC), Mestre em Ensino de Ciências e
Matemática (UNIFRA), Licenciada em Matemática pela Universidade Paranaense. Professora
e pesquisadora da Universidade Tecnológica do Paraná (UTFPR). Tem experiência Docente na
Educação Básica e no Ensino Superior.
Uana Paula StivanUana Paula Stivan, nasceu em 13 de dezembro de 1992, e graduou-se em Administração
na Faculdade Administração (2014). Desde 2011 trabalha na Empresa Ambiental Limpeza
Urbana e Saneamento LTDA, ondo começou no setor de atendimento ao público, mas devido
a graduação e habilidades hoje atua na área administrativa e auxilia a equipe em todas as
áreas da filial de Itapema (RH, Financeiro, Atendimento, Frota).
225
Simone Nunes da SilvaSimone Nunes da Silva, nascida em 17 de dezembro de 1992, em Itajaí - Santa Catarina.
É bacharel em Administração pela Faculdade Avantis, onde ganhou o mérito estudantil
da turma 2016/2. O interesse em pesquisar sobre o processo de inclusão profissional dos
imigrantes haitianos na rede hotelaria em Balneário Camboriú surgiu devido ao número
expressivo de contratações em hotéis da região do Vale do Itajaí e ao excesso de emissão de
vistos humanitários. Neste sentido, foi extremamente oportuno pesquisar tal questão para o
aprofundamento deste tema que está no centro das atenções e discussões contemporâneas.
Atualmente Simone cursa MBA em Finanças e Controladoria.
226
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO AMBIENTE DE TRABALHO: Relatos de imigrantes haitianos na região do Litoral Norte de Santa Catarina
As pesquisas aqui divulgadas poderão causar
espanto e revolta em cada um daqueles seres
humanos que ainda nutrem a generosidade
em seus corações. E esse é justamente o
objetivo original de quando nos reunimos
para viabilizarmos essa publicação, vez que
entendemos que, enquanto pesquisadores e,
sobretudo, como Instituição de Ensino Superior
(IES), não podemos ‘empurrar para baixo do
tapete’ essa realidade que permeou algumas
organizações empresariais nos últimos anos, as
quais, de maneira nada humana, contribuíram
para disseminar a intolerância e a xenofobia
contra esse povo que por aqui procurava uma
nova chance de recomeçar suas vidas.
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