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O ENSINO DE HISTÓRIA: EDUCAÇÃO PARA AS RELAÇÕES ETNICORRACIAIS
Celso Pedro Scolari1
Marcio Both da Silva2
RESUMO
Este artigo apresenta dados sobre o plano de intervenção pedagógica, apresentado no PDE - Programa de Desenvolvimento Educacional do Estado do Paraná, desenvolvido com professores de História do Colégio Estadual de Marmeleiro. O estudo proporcionou aos professores uma análise reflexiva de suas práticas com relação ao tema História da Cultura Afro-Brasileira e Africana, a partir da Lei Federal nº 10.639 de 09 de janeiro de 2003, que torna obrigatório o ensino da temática etnicorracial na Educação Básica. Em virtude disso, durante o programa, elaborou-se uma ”Unidade Didática”, com o seguinte tema: estratégias metodológicas para trabalhar a História da Cultura Afro-Brasileira e Africana, com os professores da área de História. Tendo claro o objetivo do projeto de pesquisa, que é analisar e problematizar a presença dos conteúdos referentes à História da Cultura Afro-Brasileira na Proposta Pedagógica Curricular, no Projeto Político Pedagógico e no Regimento Escolar e sua inclusão no Plano de Trabalho Docente. Pretende-se, portanto, sensibilizar e incentivar os docentes que a partir da publicação da referida Lei, busquem possibilidades de contemplar efetivamente na sala de aula, atividades referente a temática etnicorracial.
PALAVRAS-CHAVE: Lei 10.639/03; Ensino de História; Etnicorraciais
ABSTRAT
This article presents data on the educational intervention plan, presented at EDP - Educational Development Program of the State of Paraná, developed with the History Teachers College State Marmeleiro. The study provided teachers with a reflective analysis of their practices pertaining to the history of Afro-Brazilian and African, from the Federal Law No. 10639 of January 9, 2003, mandating the teaching of thematic etnicorracial in Basic Education. As a result, during the program was
1 Celso Pedro Scolari – Professor da Rede Estadual de Ensino do Município de Marmeleiro.2 Márcio Both da Silva – Professor Orientador PDE da Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE
drawn up a "Teaching Unit" with the theme: methodological strategies to work the History of Afro-Brazilian and African, with teachers in the field of history. Having a clear objective of the research project, which is to analyze and discuss the presence of contents related to the history of Afro-Brazilian Culture in Motion Educational Curriculum in Political Pedagogical Project and the School Rules and their inclusion in the Work Plan Teaching. The aim is therefore to raise awareness and encourage teachers who are from the publication of that Act, seek opportunities to contemplate effectively in the classroom, activities related to thematic etnicorracial.
KEYWORDS: Law 10.639/03, Teaching History; Etnicorraciais
1 INTRODUÇÃO
A oportunidade de realizar este estudo ocorreu por meio do Programa de
Desenvolvimento Educacional (PDE), desenvolvido pelo governo do estado do
Paraná. Tem como objetivo oferecer aos professores da rede pública de ensino
formação continuada, em parceria com as instituições de ensino superior. Várias
atividades são desenvolvidas durante o andamento do programa, que vai desde
estudos na Universidade com auxílio de orientador até implementação na escola,
que ora está sendo apresentada neste trabalho.
Com a atenção voltada à necessidade de definir e encaminhar atividades e
metas para o comprometimento da prática pedagógica que contemple a História da
Cultura Afro-Brasileira e Africana na formação dos estudantes, o que se propõe é
desenvolver um estudo que estabeleça e proporcione a criação de um conjunto de
ações, tais como, a análise das diretrizes e dos documentos básicos escolares que
norteiam e dão encaminhamento aos conteúdos e à prática docente no Colégio
Estadual de Marmeleiro.
O estudo a que se refere o texto está diretamente relacionado aos
documentos básicos que tratam da temática e incorporam no Plano de Trabalho
Docente, o Ensino da História da Cultura Afro-Brasileira e Africana em todos os
níveis de ensino. Entre eles: a Lei 10.639/03 e demais documentos oficiais da
escola; Projeto Político Pedagógico; Regimento Escolar e Proposta Pedagógica
Curricular.
Entende-se que, para os profissionais da educação esta é uma tarefa difícil.
Primeiro, pela questão cultural e social que até então não era discutida, pelos
professores e a sociedade de um modo geral. Segundo por que, na formação
acadêmica dos professores(as), não foi contemplado tal temática, o que tem gerado
dúvidas e dificuldades, sem contar que a grande maioria dos livros didáticos
permanece com a visão elitista europeia. Como os temas (igualdade de direitos,
valorização das múltiplas raças, a inserção das diferentes raças na formação social
brasileira, o reconhecimento da contribuição nos aspectos de trabalho, cultura,
alimentação, entre outros) tratados, muitas vezes, são polêmicos, o professor tem
dificuldade de inseri-los no Plano de Trabalho Docente.
Portanto, entende-se como fundamental a escola rever também a sua
concepção de currículo, percebido por muitos, ainda, como o rol de disciplinas que a
escola deve ministrar para cumprir determinações do sistema. Isto supõe
homogeneidade na educação, mas sabe-se que esta não está presente quando
entende-se que o processo é contraditório e heterogêneo. Essa concepção,
simplesmente, não dá conta de atender as necessidades da demanda educativa
atual. O currículo, portanto, deve ser entendido como um todo, sendo este o
conjunto de atividades e experiências vividas por todos os envolvidos no processo
educativo. É concreto, histórico, social e determinado pelos seres humanos em
contextos diferenciados.
A pesquisa tem a seguinte problemática: quais as possibilidades de
programar no Plano de Trabalho Docente os conteúdos do Ensino da História da
Cultura Afro-Brasileira e Africana?
Os objetivos foram os seguintes: Analisar a Proposta Pedagógica Curricular, o
Projeto Político Pedagógico e Regimento Escolar, para verificar a presença dos
conteúdos referentes à História da Cultura Afro-Brasileira e Africana e sua inclusão
no Plano de Trabalho Docente; estudar com os professores a Lei 10.639/03;
entender que a escola é um espaço multicultural e que é necessário compreender e
respeitar as diferenças; analisar os cadernos temáticos da SEED, referentes à
temática etnicorracial; discutir atividades que tenham como foco a diversidade étnica
brasileira; elaborar Plano de Trabalho Docente.
Ao se pensar num projeto de trabalho que venha auxiliar aos professores
quanto a discussão e implementação da temática “relações etnicorraciais”, nada
mais emergente do que sugerir práticas possíveis de serem trabalhadas em todos os
níveis de ensino, pois a escola precisa ser um espaço onde todas diversidades
sejam respeitadas e valorizadas, para que se construa uma sociedade mais justa e
igualitária.
2 O ENSINO DE HISTÓRIA: EDUCAÇÃO PARA AS RELAÇÕES
ÉTNICORRACIAIS
A escola recebe no seu cotidiano alunos oriundos de diferentes classes
sociais, onde muitos já vem com histórico de discriminação, exclusão, sofrem
racismo e outros.
E agora o que fazer?
Todos os envolvidos no processo educacional, devem discutir no âmbito
escolar a temática e a partir desse estudo, propor estratégias pedagógicas e
metodológicas que auxiliem no entendimento da implementação da Lei 10.639/03.
O processo pedagógico escolar, ou seja, a práxis educativa, proporcionada
pelos professores os quais são responsáveis pelo ensino e a aprendizagem, tem um
peso essencial na formação de uma sociedade inclusiva, autônoma e crítica,
discurso este presente na maioria das propostas Curriculares e ou nos Projetos
Políticos Pedagógicos das escolas.
Em grau de maior compromisso e especificamente individualizado, encontra-
se o Plano de Trabalho Docente, que é o registro/mapa do caminho a ser percorrido
na execução do trabalho com o recorte dos conteúdos escolhidos para uma
determinada série.
Questiona-se, portanto, quais as possibilidades de elencar no Plano de
Trabalho Docente, e efetivar na prática, os conteúdos do Ensino da História da
Cultura Afro-Brasileira e Africana contemplando as contribuições desta, na formação
da cultura, da arte, da política, da economia, da religiosidade e da sociedade
brasileira com mais profundidade?
A Lei que obriga a inserção dos conteúdos da história afro-brasileira e
africana no currículo escolar está vigente desde 2003. Porém, o que se observa na
maioria das escolas é que a mesma ainda não está sendo colocada em prática
como deveria.
A maioria dos professores que atua no Ensino Fundamental e Médio, no
Colégio Estadual de Marmeleiro, diz não estar preparada para repassar as
informações aos seus alunos. Esses professores alegam não ter recebido formação
no seu curso acadêmico e na escola ocorrem estudos aligeirados, o que dificulta que
os mesmos assumam uma postura diante da Lei e uma ação educativa critica.
Aliado a isso, há certa morosidade por parte da Secretaria de Estado de
Educação, no sentido de capacitar de forma adequada ”todos” os profissionais que
atuam nas escolas, uma vez que o compromisso com a valorização e as mudanças,
passa a ser de todos e não apenas dos profissionais de História. Com isso, percebe-
se um descontentamento em relação à tantas cobranças que são feitas através do
Núcleo Regional de Educação da região a qual pertence a escola, por deixar de
contribuir com práticas aplicadas à sala de aula.
Outro fator muito comum nas escolas, é que nas semanas pedagógicas os
professores acrescentam em seus planejamentos o tema História da Cultura Afro-
Brasileira e Africana, por obrigatoriedade ou por que no currículo foi acrescentado
esse conteúdo simplesmente para se cumprir a Lei. Na opinião de Gomes, a
formação do professor é um dos pilares para que uma ação mais consciente
aconteça, pois segundo ele:
A formação de professores não pode se considerar um domínio autônomo de conhecimento e decisão. Pelo contrário, as orientações adaptadas ao longo da sua história encontram-se profundamente determinadas pelos conceitos de escola, ensino, e currículo prevalecentes em cada época. (GÓMEZ, 1997, p.95)
Neste sentido, a formação de professores tem sido direcionada de acordo
com a história e as concepções de educação presentes em cada época, as quais
norteiam a prática pedagógica desses profissionais.
2.1A LUTA DA POPULAÇÃO AFRODESCENDENTE
O conhecimento e as informações que se tem sobre os diversos aspectos da
história e da cultura que caracterizam a formação da população brasileira,
especialmente da História da África, dos africanos, negros e índios, dão indícios de
que, na prática pedagógica, muitas ações discriminatório-pejorativas são
reproduzidas na escola. Em contrapartida, a sala de aula é um dos espaços sociais
que mais reflete a heterogeneidade e, como tal, o local em que diferentes vozes se
manifestam com toda interferência de seus contextos. Assim, torna-se necessário
cuidar para que algumas das ideologias assumidas pelas crianças no âmbito familiar
ou outros grupos sociais não sejam ainda mais reforçadas na escola.
Neste caso é importante lembrar o preconceito racial, como uma das faces
mais perniciosa das relações étnico-raciais. Segundo Lopes (2006, p. 21):
O preconceito racial, no caso brasileiro, opera fundamentalmente em três dimensões: 1 - a moral; 2 - a intelectual; 3 - a estética. As atribuições, as piadas e as brincadeiras que reforçam o preconceito racial quase sempre revelam conteúdos racistas relacionados a essas três dimensões. Assim, é conhecido o quando não suja na entrada, suja na saída, é preto, mas é inteligente é preto, mas é bonitinho, ou ainda a classificação de cabelo ruim ou cabelo duro, quase sempre acompanhada de risos. (...) O que o preconceito racial expressa é o sentido histórico de inferioridade gestado a partir das relações de dominação e subalternidade entre senhores e escravos durante quase quatrocentos anos de escravidão no Brasil que, como modelo econômico e social, fundou a sociedade brasileira.
Historicamente na sociedade, as vozes dos brancos sobressaem-se à dos
negros, prática na maioria das vezes avalizada pelas Propostas Curriculares,
Projetos Políticos Pedagógicos, Planos Docentes e, consequentemente, pelos
profissionais que atuam na escola, em qualquer dos seus segmentos.
Paulo Freire (1982), na sua obra Pedagogia do Oprimido, atribui ao “oprimido”
um papel importante na história. Isso se dá, pela sua participação política
contrariando os interesses das classes dominantes.
No interior da sociedade brasileira as desigualdades raciais e sociais foram
sendo construídas ao longo do tempo, principalmente com relação à população
negra que sofre pelo racismo e exclusão social.
Pode-se dizer que durante muito tempo ocorreu à exclusão da sociedade de
alunos oriundos de etnias e classes sociais oprimidas, levando-os, muitas vezes, ao
fracasso escolar.
Historiadores concordam que se hoje o negro tem menos oportunidades que outros brasileiros na hora de estudar trabalhar ou quando exerce seu direito de cidadania, isso é resultado de mais de um século de não-reconhecimento da exclusão racial como verdadeiro problema nacional. (MENINO, 2010, p. 1).
Os movimentos negros denunciam a escola como excludente e transmissora
de uma ideologia racista ao desconsiderar aspectos da história e cultura africana e
dos negros brasileiros. Diante dessa situação e das lutas de décadas da população
negra brasileira, a sociedade tomou consciência da exclusão social, desenvolvendo
ações com o intuito de reverter às desigualdades sociais e raciais.
Uma das ações foi a garantia na LDB nº 9394/96 em seu artigo 26, § 1º e 2º,
da inclusão no currículo dos conteúdos referentes à história da cultura afro-
brasileira. A proposta de trabalho apresentada na referida lei representa o começo
do recontar de uma nova história, dando a oportunidade de rever a visão
eurocêntrica com relação aos conteúdos de história, propondo um estudo dos
mesmos de forma ética, política e histórica.
Outra ação conquistada pela luta da população negra, foi a implementação da
Lei nº 10.639/03, que alterou os artigos 26-A e 79-B da LDB 9394/96:
Altera a Lei nº 9394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases de educação nacional, para incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática “História da Cultura Afro-Brasileira”, e dá outras providências. (...) "Art. 26-A. Nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio, oficiais e particulares, torna-se obrigatório o ensino sobre História e Cultura Afro-Brasileira. § 1o O conteúdo programático a que se refere o caput deste artigo incluirá o estudo da História da África e dos Africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional, resgatando a contribuição do povo negro nas áreas social, econômica e política pertinentes à História do Brasil.§ 2o Os conteúdos referentes à História e Cultura Afro-Brasileira serão ministrados no âmbito de todo o currículo escolar, em especial nas áreas de Educação Artística e de Literatura e História Brasileiras. “Art. 79-B. O Calendário escolas incluirá o dia 29 de novembro como ‘Dia Nacional da Consciência Negra’”.
A partir da promulgação da referida Lei, tornou-se obrigatória a inclusão nos
currículos das escolas que ofertam Ensino Fundamental e Médio os conteúdos
relacionados à História da Cultura Afro-Brasileira e Africana, até então praticamente
inexistentes ou inadequadamente trabalhados.
Outra ação conquistada pela luta da população negra, foi a implementação da
Lei número 10.639/03, tornando obrigatório no currículo oficial de ensino da
Educação básica a temática “História e Cultura Africana e Afro-descendente”. A lei
visa fazer uma releitura histórica para que as pessoas conheçam um pouco mais e
melhor sobre sua própria história.
Para Dias (2004 p. 6),
A Lei nº. 10.639/03 apresentada de imediato teve como função precípua responder antigas reivindicações do Movimento Negro ou distraí-lo com novas preocupações, principalmente com a implantação da mesma. Com isso o governo consegue o intento de não ser pressionado de imediato por este segmento da sociedade que a meu ver, poderia causar constrangimentos ao início da gestão Lula. Parece que a estratégia foi acertada, mas não impediu que as pressões internas e externas impedissem a criação do prometido órgão responsável por promoção de igualdade racial no país. Cria-se na estrutura de governo a SEPPIR - Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial no dia 21 de março de 2003, data em que se comemora o dia internacional contra a discriminação racial.
Assim, seguir o que determina a lei, ou seja, a obrigatoriedade do ensino da
História da Cultura Afro-Brasileira e Africana nas escolas brasileiras, traz um novo
significado ao estudo da história dos africanos. Por em prática a referida Lei é
estudar personalidades, revoltas, movimentos, enfim, todas as ações que
contribuíram e que foram relevantes na História do Brasil, cujas origens africanas
foram negadas, omitidas, na tentativa de enaltecer o poder ocidental. Esse novo
pretende investigar uma história que não foi contada e ou estudada e quando foi,
procurou ver de uma forma eurocêntrica.
A concretização da lei na escola está acontecendo de maneira gradativa, já
que muitas questões precisam ser observadas para que se efetive realmente na
prática, dentre as quais: métodos de ensino, material sobre o assunto, formação de
professores, inclusão no plano de trabalho docente como conteúdo e outros.
Para que a lei seja colocada em prática na escola, o primeiro passo é a
formação do professor. É necessária que o estudo desperte no professor a
sensibilização, a criticidade a consciência política, além da compreensão de
conceitos e desenvolvimento de métodos e estratégias de ensino. Quem tem
preconceitos raciais e discrimina o outro pela aparência física, religião, opção
sexual, origem nacional, não pode ensinar a combater o racismo, o preconceito, a
aceitar as diferenças.
Assim, apenas um “amplo programa de formação (...) voltado para o
conhecimento da história e cultura africana descendente”. (MUNANGA, 2005, p. 79-
80), possibilitará o professor coletar materiais para trabalhar a temática na sala de
aula.
Simpósios e outros encontros que já aconteceram têm ajudado, de forma
significativa, o professor a obter subsídios para suas aulas, com apresentação de
documentos que ainda não se tinha acesso. Esses vêm trazendo para a escola uma
nova visão a respeito da grande contribuição dessa cultura na formação da
sociedade brasileira, porém ainda é muito pouco. Por isso, entendemos que apenas
realização de eventos voltados para a transmissão de conhecimentos, onde estes
passam a ser reproduzidos nas escolas, não seja o suficiente. A superação da
questão, passa também pelo comprometimento social, através da participação ativa
na execução de projetos sociais e, principalmente, pelo desenvolvimento de políticas
públicas, que possam dar qualidade de vida, cidadania e dignidade.
O que acontece na grande maioria das escolas é que diante da
obrigatoriedade da lei, a temática História e Cultura Afro-brasileira, apenas foi
incluída no currículo, o que significa que na prática docente ela não está
acontecendo, não apenas por falta de subsídios teóricos, mas também pela conduta
descomprometida recebida na formação histórica nos próprios bancos escolares e
universitários. Por isso se faz necessário também uma ruptura qualitativa na forma
de pensar a questão.
Assim, entende-se que cabe também a cada escola, juntamente com seus
docentes, discentes e comunidade, rever suas práticas, ideias, estratégias, ações e
propostas pedagógicas de trabalho, desenvolvendo práticas e atitudes positivas de
respeito às diferenças, culminando para uma mudança qualitativa de gestão escolar
e pedagógica.
2.2 A INSERÇÃO DO TEMA HISTÓRIA E CULTURA AFRO-BRASILEIRA E
AFRICANA NO CURRÍCULO ESCOLAR
Trabalhar com os conteúdos de História e Cultura Afro-brasileiras e africanas
não é mais só uma questão de vontade e de interesse particular. É uma questão
curricular de caráter obrigatório que envolve as diferentes comunidades: escola,
família e Estado.
O objetivo principal para inserção da Lei é o de divulgar e produzir
conhecimentos, bem como atitudes, posturas e valores que garantam respeito aos
direitos legais e valorização de identidade cultural brasileira e africana, como outras
que direta ou indiretamente contribuíram para a sua formação.
No entanto, o que ainda se percebe é que muitas escolas estão pautadas em
um currículo escolar sustentado numa visão de cultura única, não pontuando as
demais culturas existentes no país, ou seja,
Observa-se que a escola, assim como o seu currículo, reflete os interesses da classe dominante por meio de um currículo arbitrário, que oculta as distâncias culturais e identidades presentes na sala de aula e na sociedade. A instituição do saber continua a desenvolver uma educação monocultural, com postura nada democrática na difusão dos conhecimentos (...). (BARREIROS IN OLIVEIRA, 2002, p. 93)
Não há dúvida que os conteúdos escolares da educação básica mantêm uma
tendência monocultural, deixando de lado muitas culturas existentes no país.
O negro representou a força motriz no Brasil Colônia e em períodos
posteriores a esse, ainda assim continua sofrendo com a exclusão social. Isso por
que a história ensinada não reconhece o papel do negro no desenvolvimento
econômico e cultural do Brasil.
Sabe-se que a nossa formação cultural tem como característica etnias e
culturas diferenciadas, que ocupam as diferentes regiões do território brasileiro.
Mesmo assim, pouco ou quase nada de mudanças ocorreram na educação
brasileira. Continuamos com uma concepção europeia de educação.
O movimento negro continua lutando, para chamar atenção dos órgãos
públicos, que estão frente à educação para que a lei possa ser colocada em prática,
ou seja, que a cultura produzida pelos grupos sociais e étnicos excluídos componha
os temas curriculares das escolas.
Assim, as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações
Etnicorraciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, em
seu Art. 2º § 1º define que,
A educação das relações étnico-raciais tem por objetivo a divulgação e produção de conhecimentos, bem como de atitudes, posturas e valores que eduquem cidadãos quanto à pluralidade étnico-racial, tornando-os capazes de interagir e de negociar objetivos comuns que garantam, a todos, respeito aos direitos legais e valorização de identidade, na busca da consolidação da democracia brasileira. (BRASIL, 2004, p. 31 ).
A Secretaria de Estado da Educação do Paraná – SEED, seguindo as
orientações das Diretrizes Curriculares Nacionais, determina a criação do
Departamento da Diversidade – DEDI. Composto por diversas coordenações entre
elas o Núcleo de Educação das Relações Etnicorraciais e Afrodescendência –
NEREA. Tem como objetivo, reconhecer a identidade histórica e cultural da
população negra paranaense.
A criação do Núcleo de Educação das Relações Etnicorraciais e
Afrodescendência – NEREA, pretende dar formação continuada aos professores,
produção de material didático-pedagógico, bem como manter o diálogo permanente
entre Secretaria Estadual de Educação - SEED, Núcleos Regionais de Educação –
NREs e Escola, através das equipes chamadas Multidisciplinares, compostas por
professores das diversas áreas.
Pode-se dizer que nas escolas paranaenses a Equipe Multidisciplinar já foi
formada, porém as pessoas que fazem parte da mesma, talvez ainda não tenham
entendido o seu verdadeiro significado, ou seja, foi feita somente para cumprir o que
determina a lei.
Por em prática a lei que trata do ensino da História da Cultura Afro-Brasileira
e Africana, vai contribuir para valorizar a cultura afro-brasileira na comunidade
escolar e sociedade. Omitir esses conteúdos é impedir a socialização, que segundo
as Diretrizes Curriculares da Educação Básica no Estado do Paraná é um dos
maiores compromissos da educação escolar.
Nestas diretrizes:
Propõe-se, então, uma abordagem de divisão temporal a partir das histórias locais e nacionais que torna possível analisar os componentes mais complexos das heranças africanas como, por exemplo, a reivindicação dos movimentos negros a respeito da inserção da cultura africana e afro-brasileira no ensino de História. (SEED, 2008, p. 74-75).
Trabalhar na escola com o tema História da Cultura Afro-Brasileira é uma
necessidade cultural e social, já que isto se tornou um espaço privilegiado de
educação, onde é possível por meio de discussões, leituras, depoimentos e outros,
desconstruir ideias negativas que foram disseminadas ao longo do tempo pela
sociedade brasileira.
O desenvolvimento da temática História e Cultura Afro-brasileira ajudará
professores e alunos a perceber a real contribuição dos afrodescendentes na
construção da história do país. Nos permitirá ainda, entender por que,
historicamente, não houve maior espaço na formação educacional para
determinados grupos sociais e, também, um maior estudo sobre estes.
Ao analisarmos os documentos básicos que norteiam os conteúdos
pedagógicos da Unidade Escolar, tais como: a Proposta Curricular, o Projeto Político
Pedagógico, entre outros, ainda nos deparamos com a falta da contemplação de
conteúdos relacionados à História da Cultura Afro-Brasileira e Africana.
No Projeto Político Pedagógico do Colégio Estadual de Marmeleiro, encontra-
se apenas a seguinte referência: “os estudos da Cultura Afro Brasileira e
Africano/indígena [...] estão inseridas em todas as disciplinas”.
Observou-se também que, na Proposta Pedagógica Curricular o tema Ensino
da História da Cultura Afro-Brasileira e Africana diz que:
As disciplinas de acordo com seus conteúdos, fará estudos dos Desafios Educacionais Contemporâneos, [...] Temas da Diversidade, História da Cultura Afro (Lei 10639/03 e Lei 11645/08) e Sexualidade Humana.
Ainda sobre a mesma temática, no Regimento Escolar do Colégio Estadual de
Marmeleiro, no Art. 65 e 67 consta:
Art. 65 - Na organização curricular para os anos finais do Ensino Fundamental consta: III. História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, [...] como temáticas trabalhadas ao longo do ano letivo, em todas as disciplinas; Art. 67 - Na organização curricular do Ensino Médio consta: II. História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, [...] como temáticas trabalhadas ao longo do ano letivo, em todas as disciplinas.
O Regimento Escolar é o documento legal que formaliza e reconhece as
relações dos alunos (as) legalmente matriculados no estabelecimento de ensino.
Nele regulamenta-se o que diz respeito ao cumprimento das normas e
operacionalização do Projeto Político Pedagógico.
Na análise dos documentos legais da escola, verifica-se que os mesmos
contemplam, ainda que de forma superficial, a necessidade de todas as disciplinas
trabalharem a questão da diversidade.
No entanto, para que isso realmente se efetive na prática, é imprescindível
proporcionar ao educador formação para torná-lo um profissional consciente de suas
limitações e sabedor da importância que desempenha em sua ação pedagógica,
rompendo com práticas seletivas ainda existentes nos espaços escolares. Segundo
Santos:
Pensamos que o estabelecimento destas leis foi um avanço no processo de democratização do ensino, bem como na luta anti-racismo. [...] A legislação federal, segundo o nosso entendimento, é bem genérica e não se preocupa com a implementação adequada do ensino sobre História e Cultura Afro-Brasileira. Ela não estabelece metas para implementação da lei, não se refere à necessidade de qualificar os professore dos ensinos fundamental e médio para ministrarem as disciplinas referentes à Lei nº 10.639/03, de 9 de janeiro de 2003, menos ainda, o que é grave segundo nosso entendimento, à necessidade de as universidades reformularem os seus programas de ensino e/ou cursos de graduação, especialmente os de licenciatura, para formarem professores aptos a ministrarem ensino sobre História e Cultura Afro-Brasileira. Ao que parece, a lei federal, indiretamente, joga a responsabilidade do ensino supracitado para os professores. Ou seja, vai depender da vontade e dos esforços destes para o ensino sobre História e Cultura Afro-Brasileira seja ministrado em sala de aula. Essa lei também não indica qual é o órgão responsável pela implementação adequada da mesma, bem como, em certo sentido, limita o ensino da História e Cultura Afro-Brasileira às áreas de Educação Artística e de Literatura Brasileiras (SANTOS, 2005, p. 33)
É interessante que todos os profissionais envolvidos com a educação tomem
conhecimento desta Lei e, na medida do possível, cada um faça a sua parte para a
efetivação da mesma. Cabe ressaltar que, segundo Santos, a Lei coloca uma
grande responsabilidade da aplicabilidade da Lei sobre os professores, o que não é
justo, pois sozinhos não darão conta de aplicá-la. Assim, só pela vontade e
persistência dos docentes não acontecerá a valorização de uma cultura onde a
diversidade seja compromisso de todos para a formação de uma sociedade mais
justa e tolerante.
Mesmo com as falhas presentes na Lei n° 10.639/03, se faz necessário que
os educadores cobrem junto ao Poder Público a aplicação efetiva dessa Lei, para
que a mesma não caia no esquecimento.
Para isso, é necessário que a mantenedora possibilite condições físicas e
materiais aos profissionais da educação, oferecendo formação inicial e continuada
sobre a temática, disponibilizando materiais didáticos pedagógicos para uso na sala
de aula.
Neste aspecto, as Secretarias de Educação (estaduais e municipais) e as
escolas devem, através de seus profissionais e de sua prática, proporcionar
abordagens para valorizar a cultura africana e não banalizá-la, proporcionando
ações que problematizem os conteúdos para que os alunos(as) possam
compreender as relações sociais em seus condicionantes históricos que propiciem o
respeito e a compreensão da diversidade cultural.
A Lei está vigente desde 2003, porém o que se observa na maioria das
escolas é que a mesma ainda não está sendo colocada em prática como deveria,
pois muitos professores(as), que atuam no Ensino Fundamental e Médio, dizem não
estarem preparados para repassar as informações aos discentes.
O que fazer então?
O educador como mediador do processo de transformação na escola deve atuar contra a exclusão e pela promoção da igualdade. Essa é a única forma, no nosso entendimento, de construir uma escola plural e democrática, e, fundamental, trabalhar uma visão de educação voltada para a humanização. Ao olhar a escola, a sala de aula, o educador comprometido na Promoção da Igualdade Racial deverá “desarmar o espírito”, buscar compreender a discriminação e os preconceitos embutidos na postura, linguagem e prática escolar: muitos deles construídos historicamente pela mentalidade escravista que permeia a sociedade. É necessário que os educadores assumam o compromisso com a perspectiva multicultural da educação. Ultrapassar os limites das ações pontuais para fazer com que o cotidiano das escolas as políticas educacionais de combate ao racismo
façam parte da discussão sobre Reorientação Curricular, (re)construção do Projeto Político Pedagógico e Formação Permanente dos Educadores (ROCHA, 2005, p.203).
Ressalta-se aqui a importância desses conteúdos serem aplicados em uma
prática educativa com significado, e não ficarem apenas atrelados a documentos e
teorias. Assim, torna-se cada vez mais urgente apontar a necessidade de se formar
docentes com a consciência de uma educação multicultural, diversa e aberta, livre
de preconceitos e padrões pré estabelecidos.
Pode-se dizer que um dos objetivos da obrigatoriedade dessa lei é fazer com
que tenhamos um novo olhar sobre a diversidade no espaço escolar.
3 IMPLEMENTAÇÃO
A implementação da proposta sobre a aplicabilidade da Lei 10.639/03 foi
realizada com professores da área de História, que atuam no Colégio Estadual de
Marmeleiro. Durante o desenvolvimento do trabalho teve momentos de tomada de
decisão coletiva, debates, leituras e reflexões que permitiram ao grupo de
professores(as) participantes uma sensibilização para possível mudança na prática
pedagógica.
No primeiro encontro, realizou-se uma oficina com duração de quatro horas,
onde a metodologia utilizada apoiou-se na leitura e análise do estudo da legislação:
Lei 10639/03; das Diretrizes Curriculares do Estado do Paraná; Projeto Político
Pedagógico; Regimento Escolar e Proposta Pedagógica Curricular do Colégio
Estadual de Marmeleiro.
A partir da leitura da Lei citada, houve um debate entre os professores e os
mesmos comentaram sobre a forma como está sendo exigido o cumprimento da
referida Lei nas escolas. Os professores argumentaram a falta de uma formação
para que no espaço escolar ocorra a aplicabilidade dessa Lei, não ficando apenas
citado no Diário de Classe, como conteúdo obrigatório.
Quanto ao Projeto Político Pedagógico, trabalhado nessa mesma oficina,
cabe ressaltar que este tem a função de traduzir o cotidiano escolar, apontando o
rumo que a escola deve tomar, possibilitando a busca da inovação de sua prática e
ampliação do nível de participação de todos os segmentos que a compõem.
No entanto, ao analisar o Projeto Político Pedagógico do Colégio Estadual de
Marmeleiro, mesmo sendo reestruturado após a edição da Lei, encontrou-se apenas
a seguinte referência: “os estudos da Cultura Afro Brasileira e Africano/indígena [...]
estão inseridas em todas as disciplinas”. Nesse momento, houve uma discussão
mais acalorada entre os professores, pois sendo este um documento singular para a
escola, não constatou-se nenhuma ênfase para o cumprimento da Lei.
Ao realizar a leitura da Proposta Pedagógica Curricular e do Regimento
Escolar, verificou-se que naquela, as disciplinas trabalhariam o tema diversidade de
acordo com seus conteúdos, e neste as disciplinas trabalhariam a temática durante
o ano letivo. Sendo assim, os professores concluíram que, não havendo
necessidade ou, não tendo espaços entre os outros conteúdos da sua disciplina, não
necessitariam trabalhar com o tema diversidade.
Na segunda e terceira oficinas, com duração de oito horas, estudou-se com o
mesmo grupo de professores os textos: “História Africana para a compreensão da
História do Brasil” (PARANÁ, 2006, p. 85-94) e “Construindo a Lei 10639/03 em sala
de aula: a experiência da Escola Arapongas” (PARANÁ, 2006, p. 67-70).
O primeiro texto discorre sobre a necessidade do reconhecimento dos
diversos fatores da participação dos africanos e afrodescendentes na História do
Brasil. Cita também que, grande parte dos obstáculos encontrados à aplicação da
Lei, está na falta de hábito em contemplar os afrodescendentes como detentores de
história e cultura.
Quanto a esse texto, os professores comentaram que uma das maiores
dificuldades para a efetivação da Lei 10.639/03, diz respeito à resistência de muitos
educadores em reconhecer a importância da diversidade cultural no espaço escolar.
Comentou-se também, que a discussão da temática vem acorrendo durante
reuniões pedagógicas na escola e/ou nos estudos da equipe multidisciplinar. Há por
parte dos docentes certa preocupação e vontade para realizar um trabalho mais
intenso e envolvente, porém encontram dificuldades como fundamentação teórica e
metodologias para desenvolver atividades na sala de aula.
O segundo texto, “Construindo a Lei 10.639/03 em sala de aula: a experiência
da Escola Arapongas” (PARANÁ, 2006, p. 67-70), estudado também nessa oficina,
destaca o trabalho pedagógico desenvolvido na Escola Municipal Arapongas –
Ensino Fundamental, referente a temática da diversidade. Este documento relata
que o estudo partiu de uma necessidade de docentes e discentes, da escola acima
citada, devido as constantes queixas da clientela quanto as práticas discriminatórias
que estavam ocorrendo no ambiente escolar.
No decorrer da leitura, os professores reconheceram a importância da
aplicabilidade da mesma e comentaram que, aos poucos, é possível inserir práticas
pedagógicas nos Planos de Trabalho Docente, assim como mostra o trabalho
realizado pelos professores(as) da Escola Municipal Arapongas – Ensino
Fundamental.
Os professores(as) do Colégio Estadual de Marmeleiro concordaram que a
Secretaria de Estado de Educação e a escola onde atuam têm dado autonomia para
que os docentes desenvolvam atividades dentro da temática, organizando encontros
e discussões para implementação de ações que serão trabalhadas na sala de aula.
Segundo os professores(as), quando ocorre no espaço escolar práticas
discriminatórias, conforme exemplo da Escolas Arapongas, é compromisso de toda
a comunidade escolar discutir e repensar ações na tentativa de reverter atitudes de
comportamento discriminatório.
Destacou-se também que, apesar de um pouco “tímida”, a equipe
multidisciplinar tem contribuído com os demais colegas docentes na indicação de
textos, vídeos e livros para melhorar a prática pedagógica.
No quarto momento da implementação, ou seja, na quarta oficina, foi assistido
ao filme O xadrez das Cores. O mesmo mostra a história de Cida, interpretada por
uma mulher negra, que trabalha para Maria, uma senhora idosa de cor branca, viúva
e sem filhos, extremamente racista. A relação entre as duas mulheres é bastante
difícil, pois Maria menospreza Cida por ela ser negra, Cida por precisar do dinheiro,
suporta a tudo em silêncio.
O jogo de xadrez apresentado no filme é uma metáfora, onde Maria tenta
convencer a empregada que as peças brancas têm superioridade sobre as peças
pretas, assim como na vida. No entanto, ao aprender as regras do jogo, e jogar com
a patroa, Cida mostra a Maria que independentemente das cores das peças, o que
importa é o movimento que é feito com as mesmas para se ganhar o jogo,
mostrando que a rainha nem sempre é branca e o peão nem sempre é preto.
A história do filme é construída mostrando a dificuldade de lidar com a
diversidade, mas, aos poucos, as diferenças vão sendo eliminadas quando a
senhora branca sente falta da pessoa humana que a negra representava. A lição
transmitida pela personagem Cida, é que apesar da forma preconceituosa de como
é tratada, busca a igualdade na forma de tratamento.
Após o término do filme, foi feito uma rodada de conversação onde os
professores demonstraram pensar de forma diferente quanto à aceitação da
igualdade diversidade, citando racismo como crime. Falaram também em grandes
personalidades negras e em tudo o que herdamos dos africanos, ajudando a formar
nossa cultura. Deixaram claro que no filme, o branco se impõe, mas o negro não se
deixa vencer, luta por igualdade.
Também discutiram sobre a relação da pobreza e discriminação racial
apresentada no filme, comentando que, além da questão racial, existe também a
discriminação econômica, sofrida pela personagem Cida, pois a mesma mora em
um bairro pobre e de muita criminalidade.
A maioria concordou que na escola pode-se desenvolver um trabalho
pedagógico comprometido e constante, voltado ao combate de todas as formas de
preconceito. É por meio de frequentes discussões sobre o tema na escola que se
pode contribuir para uma sociedade menos intolerante.
Concluíram, ao final da oficina, que somente pela educação pode-se
combater, no plano das atitudes, a discriminação manifestada em gestos,
comportamentos e palavras, que afasta e estigmatiza grupos sociais.
4 CONCLUSÃO
O presente estudo buscou refletir sobre a diversidade, justificando-se pela
importância de se fazer uma releitura dessa temática e pela necessidade de
desconstruir socialmente o preconceito e a discriminação racial sofrida pela
população negra.
Historicamente, construiu-se um abismo que separa a raça negra da raça
branca, justificado pela crença da inferioridade daquela em relação a esta. Sendo
assim, aceitar a igualdade também se constitui num processo histórico.
Um grande passo foi a aprovação da Lei n° 10.639/03. Esse documento
garante que o tema da diversidade seja conteúdo obrigatório em todas as unidades
escolares brasileiras. No entanto, esta obrigatoriedade não garantiu sua
implementação efetiva, pois a escola teve que viabilizar todos os mecanismos para a
materialização dessa Política Educacional.
O Estado, enquanto poder público, deve viabilizar uma política de formação
continuada, oferecendo aos professores(as) condições necessárias para que se
possa pôr em prática uma nova proposta pedagógica. O Estado não pode deixar de
assumir a parte de responsabilidade que lhe cabe. Ou seja, criar condições materiais
e financeiras, bem como prover as escolas, seus professores e alunos de material
bibliográfico e de outros materiais didáticos necessários para a educação das
Relações Etnicorraciais e o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana.
É necessário e urgente discutir uma reformulação curricular, juntamente com
um programa de formação continuada para docentes e demais profissionais que
trabalham na rede pública de ensino. O professor(a), por estar ligado mais
diretamente ao aluno, precisa estar fundamentado para desenvolver uma
metodologia capaz de trabalhar com igualdade as diferenças que existem na
escola.
Poderíamos dizer que a ideia básica do encaminhamento deste estudo foi
avaliar como estão se desenvolvendo, no Colégio Estadual de Marmeleiro as
práticas pedagógicas que orientam e acompanham a questão das relações
etnicorraciais no ambiente, no cotidiano e na formação da vida dos ainda: crianças,
adolescentes e jovens que estudam nessa escola. Neste sentido, foi também
observado as concordâncias e discordâncias entre o que está “oficialmente” ou
“legalmente” constituído, com aquilo que ocorre na comunidade escolar.
Contudo, é preciso considerar as dificuldades apresentadas pelos (as)
educadores(as) em trabalhar com um tema tão polêmico. Daí a necessidade do
Estado garantir-lhes subsídios teóricos, práticos e metodológicos que lhes permitam
trabalhar com a diversidade cultural na escola.
Destaca-se, então, a necessidade de se formar educadores(as) preparados
para lidar com a diversidade cultural que se apresenta em sala de aula, mas acima
de tudo, preparados para refletir e discutir criticamente o currículo e suas formas de
aplicação.
O professor (a), ao buscar novas práticas pode modificar o ambiente escolar,
a fim de torná-lo mais democrático, menos aleatório e opressor, não esquecendo
que o próprio educador faz parte desse processo, como discorre a reflexão
suscitada por Gonçalves e Silva:
Professores, fazemos parte de uma população culturalmente afro-brasileira, e trabalhamos com ela; portanto, apoiar e valorizar a criança negra não constitui em mero gesto de bondade, mas preocupação com a nossa própria identidade de brasileiros que têm raiz africana. Se insistirmos em desconhecê-la, se não a assumimos, nos mantemos alienados dentro de nossa própria cultura, tentando ser o que nossos antepassados poderão ter sido, mas nós já não somos. (GONÇALVES E SILVA, 1996, p. 175)
Ao pensar uma educação que valorize a diversidade, entende-se que cada
escola deva conhecer sua clientela sociocultural, criando possibilidades para pensar
e executar estratégias que possam corrigir as distorções em relação à história e
cultura africana.
Ressalta-se a importância da escola realizar um trabalho crítico e
comprometido com a diversidade. Ao silenciar, a escola reforça e reproduz o
racismo presente nas relações sociais na sociedade brasileira.
É necessário e urgente pensar na formação docente a partir de um
multiculturalismo, onde as relações raciais são pontos de reflexão do currículo e
parte integrante do Projeto Político Pedagógico, do Regimento Escolar e Proposta
Pedagógica Curricular do Colégio Estadual de Marmeleiro, para que se atenda a
demanda trazida pela Lei 10.639/03.
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