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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Marly Moreira Couto Criales
Nulidade no Auto de Infração
MESTRADO EM DIREITO
SÃO PAULO
2014
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Marly Moreira Couto Criales
Nulidade no Auto de Infração
MESTRADO EM DIREITO
Dissertação apresentada à Banca
Examinadora da Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo, como exigência
parcial para obtenção do título de
MESTRE em Direito Tributário, sob a
orientação da Profa. Dra. Clarice von
Oertzen de Araújo.
SÃO PAULO
2014
Banca Examinadora
______________________________________
______________________________________
______________________________________
Com todo meu amor a José Eimar, Luiz
André e Margarida Maria.
AGRADECIMENTO
Primeiramente, a Deus pela dádiva da vida e a benção nesta produção.
Ao meu marido e melhor amigo, Luiz André, que me apoiou e ajudou na
realização deste sonho.
Aos meus pais, Margarida Maria e José Eimar, pelo amor incondicional e que
sempre me incentivaram a estudar, fazendo nascer o sonho que hoje realizo. Nada
seria sem os seus ensinamentos.
Aos meus irmãos, Beatriz e Rogério, pelas alegrias que seus filhos, Gustavo e
Leonardo, me dão e por compreenderem a minha ausência durante este último ano.
À minha cunhada Gladys e sua família por me ajudarem no abstract.
Aos meus melhores amigos, Taciana, Marcia e Luiz, pelas palavras de apoio
e incentivo.
À minha orientadora, Clarice von Oertzen de Araújo, que não só contribuiu
para a produção deste trabalho com suas orientações, mas proporcionou meu
amadurecimento profissional e intelectual.
À Professora Fabiana Del Padre Tomé e ao Professor Tácio Lacerda Gama
pelas contribuições preciosas no exame de qualificação.
Aos professores de mestrado: Paulo de Barros Carvalho, Charles Willian
Mcnaughton, Estevão Horvath, Roque Antonio Carrazza e Robson Maia Lins, por
todos os ensinamentos e discussões.
Ao Rui e Rafael que sempre foram atenciosos e dispostos a me ajudarem.
A todos que direta ou indiretamente contribuíram para a produção deste
trabalho.
Nulidade no auto de infração
Marly Moreira Couto Criales
RESUMO: O objetivo do trabalho é estudar as invalidades no auto de infração por
desrespeito aos requisitos obrigatórios para a sua lavratura, com a finalidade de
determinar os critérios de classificação das espécies de invalidades, vícios e seus
efeitos, relacionado aos requisitos no art. 10 do Decreto n°. 70.235/72. O estudo tem
início com o entendimento de norma jurídica como uma construção do ser humano
ao interpretar os textos de lei e atribuir-lhes significação. Trabalha a invalidade como
antítese da validade, e analisa os conceitos de validade, existência e eficácia das
normas jurídica. Em seguida, estuda o auto de infração como ato administrativo para
definir que os seus requisitos de lavratura são compostos de elementos intrínsecos e
pressupostos de validade. Por fim, analisa as teorias de invalidade e sua aplicação
no Direito Tributário, para concluir que são duas as espécies de invalidade, nulidade
e anulabilidade, as quais se relacionam com os vícios materiais e formais.
Palavras-chave: Auto de Infração; Nulidade; Anulabilidade; Vícios; Efeitos.
Nullity of Tax Notice
Marly Moreira Couto Criales
ABSTRACT: This paper’s purpose is to study the invalidities on the tax notice for
disrespect of mandatory requirements for its transcription with the purpose of
determining the criteria for the classification of types of invalidities, defects and their
effects, related to the requirements of act 10 of decree 70.235 /72. The study begins
with the understanding of the rules of law as a construction of the human being to
interpret the texts of law and give them meaning. It works invalidity as the antithesis
of validity, and analyzes the concepts of validity, existence and effectiveness of legal
standards. Then, it studies the tax notice as an administrative act to define that their
requirements for transcription are composed of intrinsic elements and assumptions of
validity. Finally, it analyzes the theories of invalidity and its application in Tax Law, to
conclude that there are two types of invalidity, nullity and voidability, which relate to
material and formal defects.
Keywords: Tax notice; Nullity; Voidability; Defects; Effects.
LISTA DE ABREVIATURAS
AgRg Agravo Regimental
ART. Artigo
CARF Conselho Administrativo de Recursos Fiscais
CC Código Civil
CTN Código Tributário Nacional
DCTF Declaração de débitos e créditos tributários federais
DIPJ Declaração de informações econômico-fiscais da Pessoa Jurídica
DIRPF Declaração do Imposto sobre a Renda de Pessoa Física
IRPJ Imposto de Renda de Pessoa Jurídica
LPA Lei n°. 9.784, de 29 de janeiro de 1999
MPF Mandado de Procedimento Fiscal
MS Mandado de Segurança
PAF Decreto n°. 70.235, de 06 de março de 1972
REsp Recurso Especial
RFB Receita Federal do Brasil
RMIT Regra-Matriz de Incidência Tributária
RMS Recurso Ordinário em Mandado de Segurança
STJ Superior Tribunal de Justiça
STF Supremo Tribunal Federal
TDPF Termo de Distribuição de Procedimento Fiscal
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 10
CAPÍTULO I – NORMA JURÍDICA ........................................................................... 16
1. DIREITO: LINGUAGEM E REALIDADE ...................................................................... 16
2. A NORMA JURÍDICA NO CONSTRUCTIVISMO LÓGICO-SEMÂNTICO ............................ 17
2.1. Estrutura Lógica: A → C ........................................................................... 20
2.2. Norma jurídica tributária ............................................................................ 25
3. NORMA JURÍDICA COMPLETA ............................................................................... 27
4. NORMA: ABSTRATA E CONCRETA, GERAL E INDIVIDUAL ........................................... 31
5. PROCESSO DE POSITIVAÇÃO DO DIREITO .............................................................. 33
CAPÍTULO II – EXISTÊNCIA, VALIDADE E EFICÁCIA DA NORMA JURÍDICA .... 38
1. EXISTÊNCIA E VALIDADE DAS NORMAS JURÍDICAS .................................................. 38
1.1. Teoria de Pontes de Miranda .................................................................... 39
1.2. Teoria de Norberto Bobbio ........................................................................ 41
1.3. Teoria de Paulo de Barros Carvalho ......................................................... 44
1.4. Nossa posição .......................................................................................... 46
2. EFICÁCIA DAS NORMAS JURÍDICAS ....................................................................... 49
CAPÍTULO III – AUTO DE INFRAÇÃO .................................................................... 53
1. AUTO DE INFRAÇÃO ............................................................................................ 53
2. AUTO DE INFRAÇÃO E O ATO ADMINISTRATIVO ....................................................... 62
3. AUTO DE INFRAÇÃO E OS ATRIBUTOS DO ATO ADMINISTRATIVO ............................... 66
4. AUTO DE INFRAÇÃO E OS REQUISITOS DO ATO ADMINISTRATIVO .............................. 69
4.1. Elementos intrínsecos ............................................................................... 72
4.2. Pressupostos de validade ......................................................................... 75
CAPÍTULO IV – INVALIDADE DO AUTO DE INFRAÇÃO....................................... 81
1. HISTÓRICO DA TEORIA DA NULIDADE .................................................................... 81
2. INVALIDADE NO DIREITO CIVIL ............................................................................. 83
3. INVALIDADE NO DIREITO ADMINISTRATIVO ............................................................ 87
4. INVALIDADE NO DIREITO TRIBUTÁRIO ................................................................... 94
5. PRINCÍPIO DO PREJUÍZO ...................................................................................... 98
6. ATOS IRREGULARES ......................................................................................... 105
7. VÍCIOS NO AUTO DE INFRAÇÃO........................................................................... 109
CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................... 120
REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 129
10
INTRODUÇÃO
O direito tributário é regido por princípios gerais e específicos. Dentre esses
princípios, destacamos o da estrita legalidade e da tipicidade, inerentes ao sistema
tributário, que preveem que os entes tributantes – União, Estados, Distrito Federal e
Municípios – só têm competência para tributar – consistente em instituir, arrecadar e
fiscalizar os tributos – nos estritos limites das leis em vigor.
Esses princípios garantem aos contribuintes não sofrerem abusos na
tributação, bem como asseguram ao ordenamento jurídico sua necessária
estabilidade junto com o princípio da segurança jurídica.
O desrespeito a esses princípios gera uma ilegalidade no ato de produção
normativa por haver um desajuste entre as disposições legais (norma abstrata e
geral) e a norma jurídica introduzida (norma concreta e individual), que pode
acarretar a expulsão da norma do sistema pela decretação de sua “nulidade”.
Nesse contexto, o presente estudo será realizado, destacando os seguintes
aspectos:
O auto de infração é ato administrativo em que o Fisco, constatando a
ocorrência de um ato ilícito, efetua o lançamento de ofício do tributo, quando for o
caso, e aplica a penalidade ao infrator.
Para a lavratura do auto de infração, a lei prescreve requisitos essenciais de
procedibilidade e de conteúdo. O desrespeito a um desses requisitos pode gerar um
defeito (vício) na norma jurídica introduzida e, consequentemente, uma ilegalidade
que acarrete a decretação de “nulidade” do ato normativo, fazendo cessar a
produção dos efeitos e gerando ao Fisco, a depender do vício o efeito: da extinção
11
do crédito tributário; ou da possibilidade de lavrar novo auto de infração ou
lançamento de ofício para constituir o crédito tributário.
Nesse contexto, realizaremos o nosso estudo na análise dos requisitos legais
para a lavratura do auto de infração e os possíveis desajustes na norma introduzida,
pretendendo sistematizar as “nulidades” para classificar suas espécies; os vícios e
seus efeitos.
Tentaremos responder às seguintes perguntas durante a exposição:
1) Como é regido e aplicado o sistema das “nulidades” no Direito
Tributário? Quais são os seus critérios?
2) Quais são as espécies de “nulidades”?
3) Quais são os vícios e seus efeitos?
4) Na relação com os requisitos de lavratura do auto de infração, como se
processa a sistematização em relação à “nulidade”?
Para tanto, antes de expormos o percurso da pesquisa, fixamos três
premissas que consideramos relevantes à compreensão do assunto com o fim de
garantir coerência à produção científica.
A primeira premissa fixada é que trabalhamos com as normas jurídicas
vigentes. Partimos do conceito de direito positivo como o conjunto de normas
jurídicas válidas em uma determinada sociedade. Tudo, para ser direito, é norma
jurídica, inserida no ordenamento por ato: (i) Poder Legislativo na edição de leis; (ii)
Poder Judiciário nas prolações de sentenças e acórdãos; (iii) Administração Pública,
por meio, especialmente, da edição de atos administrativos, em que destacamos o
auto de infração; e (iv) particular, por exemplo, na emissão do “autolançamento” e do
lançamento por declaração.
12
A segunda premissa fixada é a de que entendemos “nulidade” como a
invalidade1 da norma jurídica. Com isso, trabalhamos a “nulidade” como a antítese
da validade, fixando o entendimento, neste momento, de que o rol do art. 59 do PAF,
que trata das “nulidades”, é exemplificativo2.
Ademais, o termo “nulidade” é ambíguo, sendo utilizado para denotar o
gênero e a espécie. Logo, para assegurar o rigor científico, a partir deste momento,
o denominaremos de invalidade3.
A terceira premissa que fixamos é que analisaremos o auto de infração no
âmbito da competência tributária da União, que é regido pelo Decreto n°. 70.235/72,
que trata do Processo Administrativo Fiscal, e pela Lei n°. 9.784/99, que estabelece
as normas básicas sobre o processo administrativo no âmbito da Administração
Federal.
Além da fixação das premissas, o conhecimento científico requer a aplicação
de um método em que o sujeito cognoscente determina um sistema de referência
para se aproximar do objeto de estudo e construir um discurso científico coerente.
1 Fica superada a corrente que defende que nulidade é a aplicação de uma sanção por desrespeito
ao preceito legal, defendida por: Ada Pellegrini Grinover, Antonio Scarance Fernandes e Antonio
Magalhães Gomes Filho (As nulidades no processo penal. 12. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2011, p. 26); Clovis Bevilaqua (Theoria geral do direito civil. Atualizada por Achilles Bevilaqua. 6. ed.
Rio de Janeiro: Editora Paulo de Azevedo, 1953, p. 3); e Maria Helena Diniz (Curso de direito civil
brasileiro, v. 1: teoria geral do direito civil. 27. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 557).
2 NEDER, Marcos Vinicius; LÓPEZ, Maria Teresa Martinez. Processo administrativo fiscal federal
comentado. 2. ed. São Paulo: Dialética, 2004, p. 478.
3 No capítulo IV empregaremos o termo “teoria da nulidade” ao se referir as correntes que discorrem
sobre a invalidade. Essa expressão se adequará por ser a denominação utilizada pela doutrina no
estudo do tema.
13
Optamos por utilizar no desenvolvimento deste trabalho o método do
Constructivismo Lógico-Semântico, que foi desenvolvido por Lourival Vilanova e
aprofundado por Paulo de Barros Carvalho4.
Esse método tem como referencial filosófico a Filosofia da Linguagem que
entende: (i) a linguagem cria a realidade; (ii) só conhecemos o que é apreendido
pela linguagem; (iii) o ser humano atribui os sentidos (significados) aos termos
linguísticos com base nas suas referências culturais, a fim de criar a realidade; e (iv)
a linguagem é fenômeno comunicacional que precisa ser interpretada para haver
comunicação. Utiliza a Semiótica nesse processo.
Nesse referencial, o direito é concebido como um fenômeno linguístico em
que para ser compreendido (interpretado) é necessária a atribuição de significados
aos enunciados prescritivos, do qual os textos do direito positivo são ambíguos e
vagos, cabendo ao Cientista do Direito, ao interpretá-los, dar coerência à mensagem
legislada.
Assim, o método que trabalharemos tem duas vertentes: a) a atribuição de
sentido é construída (Constructivismo) pelo sujeito ao interpretar os fenômenos
linguísticos; e a interpretação opera no b) plano lógico-semântico (Lógico-
Semântico) com o fim de dar formalismo ao discurso e uma aproximação do objeto.
Não se trata de abandonar o plano pragmático, mas de dar ênfase a esses dois
planos.
Nesse contexto, o Cientista do Direito decompõe o seu objeto de estudo em
uma linguagem formalizada para garantir rigor ao discurso científico, extraindo às
4 TOMÉ, Fabiana Del Padre. Vilém Flusser e o Constructivismo Lógico-Semântico. In.: HARET,
Florence; CARNEIRO, Jerson (Coord.). Vilém Flusser e juristas: comemoração dos 25 anos do grupo
de estudos Paulo de Barros Carvalho. São Paulo: Noeses, 2009, p. 323.
14
ambiguidades e vaguezas com aplicações de conceitos de Lógica Jurídica e de
Semiótica.
Nessa conjuntura, o estudo foi sistematizado em quatro capítulos dos quais
percorremos estudos pela Teoria Geral do Direito, Direito Civil, Direito
Administrativo, Direito Tributário e Direito Processual Tributário.
No primeiro capítulo trataremos da definição de norma jurídica. Iniciamos com
uma breve introdução do direito na metodologia do Constructivismo Lógico-
Semântico. Analisando a Teoria Geral do Direito, discorreremos sobre o conceito de
norma jurídica no método de trabalho e sua estrutura lógica; a norma jurídica
completa; a classificação da norma quanto à estrutura dual; e o processo de
positivação do direito. Durante o capítulo faremos a aplicação dos conceitos gerais
no Direito Tributário.
Fixada a premissa de que a invalidade é a antítese de norma jurídica válida,
que tem como consequência a cessação da produção dos seus efeitos, se faz
necessário discorrer sobre validade e eficácia, que será objeto do segundo capítulo.
Neste capítulo faremos um corte nas teorias da validade da norma jurídica para
trabalharmos com as vertentes de validade e existência, pois o tratamento das
invalidades se relaciona com esses institutos jurídicos, devendo, assim, ser firmada
uma posição para a coerência do discurso científico.
No terceiro capítulo trataremos do conceito de auto de infração e os seus
requisitos de lavratura. Já aproveitamos para afirmar que auto de infração é ato
administrativo e com isso é necessário estudar o seu regime jurídico. Assim, faremos
incursões no Direito Administrativo para discorrer sobre o conceito, atributos e
requisitos dos atos administrativos, relacionando, por todo o capítulo, aos aspectos
do auto de infração.
15
Por fim, no quarto capítulo, discorremos sobre a invalidade aplicada no auto
de infração. Iniciaremos com um breve relato da origem histórica do instituto para,
em seguida, traçarmos a sua aplicação no Direito Civil, no Direito Administrativo e no
Direito Processual Tributário. Delimitaremos as suas espécies e os critérios de
classificação no Direito Tributário, os vícios e seus efeitos, relacionando-os com os
conceitos do capítulo anterior quanto aos requisitos de lavratura do auto de infração.
Ressaltamos que no decorrer do estudo analisaremos, quanto à aplicabilidade
das invalidades no Direito Tributário, para o fim de sua sistematização e resposta às
perguntas formuladas, as decisões dos tribunais administrativos e judiciais, em
especial do CARF, do STJ e do STF, quando houver aplicação.
Não pretendemos com esse estudo esgotar o tema, mas fazer reflexões sobre
a invalidade aplicável ao auto de infração para o fim de analisar as posições
doutrinárias (teoria) e jurisprudenciais (prática), na tentativa de confirmá-las ou
infirmá-las quanto à posição que fixaremos.
16
CAPÍTULO I – NORMA JURÍDICA
1. Direito: linguagem e realidade
O direito consiste em um conjunto de normas jurídicas que tem o fim de
regular as condutas intersubjetivas dos cidadãos em uma sociedade. É o
instrumento do Estado para intervir no meio social5.
Nesse sentido, há a orientação das condutas para os valores que a sociedade
quer ver realizados com o propósito de organizar a vida em sociedade.
Podemos defini-lo: “Direito é um corpo de regras que se voltam para a região
material das condutas intersubjetivas” 6.
Assim, o direito cria a sua própria realidade ao eleger os eventos, que
ocorridos no mundo fenomênico, terão o condão de constituírem o fato jurídico
quando vertidos em linguagem. Isso porque só é possível conhecer a realidade no
momento em que são atribuídos significados aos dados brutos e constituída em
linguagem7.
Nisso podemos afirmar que há dois acontecimentos que retratam a realidade
jurídica: o evento e o fato jurídico. O evento é um acontecimento no mundo
5 CARVALHO, Paulo de Barros. Teoria da Norma Tributária. 5. ed. São Paulo: Quartier Latin, 2009, p.
21.
6 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário – Fundamentos Jurídicos da Incidência. 9. ed. São
Paulo: Saraiva, 2012, p. 216.
7 CARVALHO, Aurora Tomazini de. Interpretação e aplicação do direito. In.: HARET, Florence;
CARNEIRO, Jerson (coord.). Vilém Flusser e juristas: comemoração dos 25 anos do grupo de
estudos Paulo de Barros Carvalho. São Paulo: Noeses, 2009, p. 258.
17
fenomênico. O fato é o relato em linguagem competente do evento ocorrido.
Somente após esse relato é que se torna conhecido o evento e é criada a realidade.
O relato do evento em linguagem é ato realizado pelo ser humano que
constata a sua ocorrência e “fala” dele.
No mais, a linguagem é o veículo que o homem se utiliza para se comunicar,
e o direito positivo, como conjunto de normas jurídicas válidas que tem como
destinatários os cidadãos da sociedade, é um sistema comunicacional.
Assim, entendemos que o direito é um sistema linguístico composto
unicamente de normas voltadas a regular as condutas intersubjetivas8, e que para
conhecê-lo é preciso compreendê-lo, interpretando-o, construindo seu conteúdo,
sentido e alcance. Nesse contexto, trata-se de um fenômeno comunicacional
representado pela linguagem prescritiva de condutas.
Esse é o parâmetro segundo o qual desenvolveremos nosso trabalho.
2. A norma jurídica no Constructivismo Lógico-Semântico
O direito é fenômeno comunicacional representado pela linguagem prescritiva
de condutas no signo simbólico9, composto unicamente de normas jurídicas. Mas, o
que é norma jurídica no contexto da nossa metodologia (o Constructivismo Lógico-
Semântico)?
8 OLIVEIRA, Vivian de Freitas e Rodrigues de. Lançamento Tributário como ato administrativo. São
Paulo: Quartier Latin, 2009, p. 28.
9 Clarice von Oertzen de Araújo descreve que a natureza simbólica do signo é tratamento das normas
abstratas. Na concretude, o signo é indicial por ser afetado pelo objeto dinâmico (op. cit., p. 34).
18
A definição de norma jurídica que utilizamos se diferencia de outras acepções
em que: norma jurídica é o próprio texto de lei (a lei publicada no Diário Oficial)10;
que do texto de lei se extrai o conteúdo da norma11; ou que é o conjunto de textos de
lei como sistema jurídico em sua unidade12.
Partimos do entendimento de que norma jurídica é o mínimo de manifestação
deôntica de sentido completo representada por um antecedente que implica um
consequente e compreende em sua definição: “a significação que obtemos a partir
da leitura dos textos do direito positivo”13. Expliquemos:
O intérprete tem o primeiro contato com as leis (textos de lei). Este é o ponto
de partida para a construção da significação e transmissão da mensagem deôntica
desejada pelo legislador. Contudo, como manifestação em linguagem, para construir
a norma jurídica, o intérprete precisa atribuir valores aos símbolos (signos) por meio
da interpretação pelo percurso gerador de sentidos. Esse é o processo de
interpretação a ser percorrido pelo intérprete para a construção da norma jurídica.
PAULO DE BARROS CARVALHO14 descreve o percurso gerador de sentido
em quatro fases de interpretação: plano da expressão; plano da significação; plano
do conteúdo; e plano da sistematização.
10
João Maurício Adeodato ressalta que para a Escola da Exegese Francesa, norma jurídica é a lei
(Uma teoria retórica da norma jurídica e do direito subjetivo. São Paulo: Noeses, 2011, p. 158).
11 CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7. ed. Almedina:
Coimbra, Portugal, 2003, p. 1218; e GRAU, Eros Roberto. Ensaio e discurso sobre a
interpretação/aplicação do direito. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 28.
12 CARVALHO, Aurora Tomazini de. Curso de Teoria Geral do Direito. 2. ed. São Paulo: Noeses,
2010, p. 278.
13 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 23. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 40.
14 Ibid., 2012, p. 114 e ss.
19
O plano da expressão compreende a análise dos textos de lei em sua
literalidade como frases soltas sem significado. São as marcas de tinta no papel,
como suporte físico, e trata-se do contato sensorial do intérprete, de onde parte para
a construção da significação.
Após esse primeiro contato, o intérprete precisa iniciar a atribuição de
sentidos, passando para o plano da significação, em que começa a adotar “valores
unitários aos vários signos, que encontrou justapostos, selecionando significações e
compondo segmentos portadores de sentido”15. Nesse plano, o intérprete constrói os
enunciados prescritivos por meio do agrupamento das frases soltas em significados
voltados ao objeto do direito: a prescrição das condutas. Começamos a ter uma
mensagem veiculada, mas que ainda não é a norma jurídica.
Construídos os enunciados prescritivos, o intérprete passa ao plano do
conteúdo, em que agrupará esses enunciados para a composição da norma jurídica
em seu esquema de juízo implicacional, ou seja: um antecedente que implica um
consequente. Nesse plano há a norma jurídica, e é transmitida a mensagem
deôntica desejada pelo legislador, com a prescrição da conduta a ser obedecida
pelos seus destinatários.
Por fim, no plano da sistematização, as normas jurídicas são organizadas em
uma estrutura hierárquica por traços de coordenação e de subordinação, formando o
sistema jurídico em sua unidade significativa de escalonamento normativo.
Logo, o texto de lei se diferencia da norma jurídica16. A doutrina17 utiliza para
essa diferenciação dois termos, respectivamente: norma jurídica em sentido amplo e
norma jurídica em sentido estrito.
15
CARVALHO, loc. cit.
16 TOMÉ, 2009, p. 324.
20
Nesse contexto, o intérprete, a partir da leitura do(s) texto(s) de lei constrói a
norma jurídica ao agrupar os enunciados prescritivos no esquema de juízo
implicacional, em que a norma jurídica é uma construção intelectual da mente do
intérprete.
Assim, percorremos do suporte físico, como o texto de lei, para a significação
da norma jurídica, como mensagem deôntica completa.
Mas, qual é a mensagem transmitida pelo legislador ao destinatário da norma,
ou seja, o que é veiculado pela norma jurídica?
O direito é um sistema que regula as condutas intersubjetivas dos cidadãos
durante um lapso de tempo (vigência temporal) e em um determinado espaço
(vigência territorial). As condutas reguladas são: obrigatória, proibida ou permitida.
Assim, a norma jurídica transmite comandos: obrigatórios, permitidos e proibidos na
estrutura lógica representada por um antecedente que implica um consequente. Isso
constitui a articulação lógica da norma jurídica (juízo implicacional) que passamos a
estudar.
2.1. Estrutura Lógica: A → C
A estrutura da norma jurídica é composta de um antecedente que implica um
consequente. Essa é a estrutura lógica de toda e qualquer norma jurídica para ter a
unidade mínima e irredutível de significação deôntica.
17
CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. 4. ed. São Paulo: Noeses,
2011, p. 128; LINS, Robson Maia. O Supremo Tribunal Federal e norma jurídica: aproximações com o
Constructivismo Lógico-Semântico. In.: HARET, Florence; CARNEIRO, Jerson (Coord.). Vilém
Flusser e juristas: comemoração dos 25 anos do grupo de estudos Paulo de Barros Carvalho. São
Paulo: Noeses, 2009, p. 372-373; e OLIVEIRA, op. cit., passim.
21
Nesse sentido, a norma jurídica apresenta homogeneidade sintática, mas é
heterogênea semântica e pragmaticamente, porque cada norma jurídica apresenta
conteúdo e aplicação diferentes18.
A mensagem veiculada na norma jurídica é a previsão de um comportamento
desejado pelo sistema que consiste em uma conduta (obrigatória, proibida ou
permitida) a se manifestar pela ocorrência de um evento relacionado ao surgimento
de uma relação jurídica.
Nesse contexto, o legislador, ao descrever a norma jurídica, seleciona os
eventos que considera importantes para configurarem como fatos jurídicos e que
terão o condão de fazerem surgir os efeitos jurídicos por meio da instauração da
relação jurídica.
Assim, no antecedente da norma jurídica está a descrição do evento e no
consequente a instauração da relação jurídica com a previsão da conduta a ser
obedecida e seus efeitos jurídicos.
Podemos representar por: D (A → C), em que: “D” é dever-ser; “A” é o
antecedente (descrição do “evento”); “C”, o consequente (previsão da relação
jurídica); e “→” (implicação), que é um conectivo condicional que tem a função de
estabelecer um nexo-causal entre a causa (antecedente) e o efeito (consequente), e
se apresenta como functor neutro.
Mas quais os elementos mínimos necessários para a identificação do
antecedente e do consequente?
18
SANTI, Eurico Marcos Diniz de. Lançamento Tributário. 3. ed. São Paulo: Max Limonad, 2010,
p. 34.
22
A doutrina diverge quanto aos elementos mínimos. Portanto, preferimos
trabalhar com a doutrina de PAULO DE BARROS CARVALHO19 que elenca critérios
mínimos para a identificação do fato jurídico e da instauração da relação jurídica.
O antecedente tem a função de descrever um fato (de possível ocorrência ou
jurídico), que nos critérios material, espacial e temporal20 possibilitam a sua
delimitação. É a causa para a implicação dos efeitos jurídicos previstos no
consequente.
O critério material pode ser descrito na projeção para o futuro ou passado. Na
projeção para o futuro, descreve um evento de possível ocorrência no mundo
fenomênico e é composto por um verbo no impessoal, infinito e de predicação
incompleta. No passado, representando a concretude do evento, é o seu relato em
linguagem competente para constituir o fato jurídico.
O critério espacial é a delimitação do local em que deve ocorrer ou ocorreu o
evento, em sua projeção para o futuro ou para o passado, respectivamente. No
futuro, pode estar implícito ou explícito na norma, mas deve ser possível identificá-lo.
O critério temporal tem as informações para determinar o momento da
ocorrência do evento. Explica AURORA TOMAZINI DE CARVALHO21 que o critério
temporal não é para determinar o instante em que se instaura o vínculo jurídico, mas
a delimitação da ocorrência do evento. O vínculo é instaurado, segundo nossa
premissa, quando vertido em linguagem competente, em que é constituído o fato
jurídico.
19
CARVALHO, 2011, p. 255-256.
20 Id., 2012, p. 243.
21 CARVALHO, 2010, p. 398.
23
No mais, o critério temporal tem duas funções: a) direta, de identificar com
exatidão o momento da ocorrência do evento relevante para o direito; e b) indireta,
que é a determinação das regras vigentes a serem aplicadas a partir do momento da
ocorrência do evento.
Já, o consequente tem a função de estabelecer o vínculo relacional entre dois
ou mais sujeitos perante um objeto com a aplicação do efeito jurídico previsto pelo
legislador. Seus critérios de identificação são o pessoal e o quantitativo22, e é
representado pelo functor deôntico para regular as condutas modalizando em
obrigatório, proibido ou permitido.
Há doutrinadores23 que determinam que deve conter no consequente um
critério espacial e um critério temporal para determinar o momento e o local em que
deve ser cumprida a prestação. Entendemos ser desnecessário, posto que o
cumprimento ou não da prescrição normativa é elemento de outra norma jurídica
que descreve o evento do descumprimento ou cumprimento da conduta com os seus
efeitos: aplicação de penalidade ou extinção da obrigação, por exemplo.
O critério pessoal identifica os sujeitos da relação jurídica a ser instaurada e
contém o sujeito ativo e o sujeito passivo. O sujeito ativo tem o direito subjetivo em
relação ao objeto (prestação pecuniária), e o sujeito passivo o dever jurídico.
Necessariamente, um dos sujeitos eleito pelo legislador deve ter relação com o
evento descrito no antecedente24.
22
Já aplicamos a denominação e os elementos do Direito Tributário. Na Teoria Geral do Direito é
denominado de critério prestacional. Esse critério indica a conduta que o sujeito passivo deve prestar
ao sujeito ativo. É o núcleo do direito por regular as condutas intersubjetivas (CARVALHO, 2010, p.
409-410).
23 Luís Cesar de Queiroz tem esse entendimento (CARVALHO, 2010, p. 401).
24 Ibid., p. 403.
24
Segundo PAULO DE BARROS CARVALHO25, direito subjetivo é “[...] a
faculdade que tem o sujeito ativo da relação jurídica de exigir do sujeito passivo o
cumprimento do dever jurídico estipulado na proposição normativa”, e “[...] O dever
jurídico que pode ser exigido pelo titular do direito subjetivo é sempre uma ação ou
omissão do ser humano, e seu descumprimento desencadeia a aplicação de medida
juridicamente sancionadora”.
O critério quantitativo é a conduta que o sujeito passivo deve prestar ao
sujeito ativo, representado pela base de cálculo e pela alíquota. É o núcleo do direito
como regulador de condutas intersubjetivas, e, para fins do nosso estudo, é a
prestação pecuniária de entregar aos cofres públicos a importância devida em
pecúnia constituída no crédito tributário ou na aplicação da penalidade.
Assim, representamos: D [(cm . ct . ce) → (cp . cq], em que se ocorrer o
evento descrito no antecedente (A), então, dever-ser o consequente com a
instauração da relação jurídica (Rj) entre os sujeitos Sa e Sp, na qual uma conduta
será obrigatória, permitida ou proibida entre eles:
[...] (i.a) hipótese, pressuposto ou antecedente (H), cuja função é
descrever uma situação de possível ocorrência (f), que funciona
como causa para o efeito jurídico almejado pelo legislador; e (i.b)
consequente ou tese (C), cuja função é delimitar um vínculo
relacional entre dois sujeitos (S’RS”), que se consubstancia no efeito
almejado; e (ii) conectivo condicional (→), também denominado
vínculo implicacional, cuja função é estabelecer o liame entre a
25
CARVALHO, P. B., 2009, p. 64-65.
25
causa e o efeito ao imputar a relação prescrita no consequente
normativo, caso verificada a situação descrita na hipótese26.
Por fim, aplicamos a estrutura lógica da norma jurídica e seus critérios de
identificação em dois exemplos do Direito Tributário para o fim de confirmar a teoria:
a) RMIT – IRPJ: no antecedente, o critério material é auferir renda, o critério
espacial no Território Nacional, e o critério temporal no período de 1º de janeiro a 31
de dezembro. No consequente, o critério pessoal tem a União como sujeito ativo e o
contribuinte como sujeito passivo; e no critério quantitativo, a base de cálculo é o
valor da renda e a alíquota que varia entre 7%; 15%; 22,5% e 27,5% a depender da
base de cálculo; e
b) Lançamento de ofício por omissão de receita de IRPJ: no antecedente, o
critério material é omitir renda, o critério espacial no Território Nacional, e o critério
temporal no período apurado pelo Fisco. No consequente, no critério pessoal, a
União é o sujeito ativo e o contribuinte o sujeito passivo, e no critério quantitativo a
base de cálculo é o valor da renda omitida e a alíquota que varia entre 7%; 15%;
22,5% e 27,5% a depender da base de cálculo.
2.2. Norma jurídica tributária
Ao atribuirmos o conceito de norma jurídica aplicável ao direito, se faz
necessário determiná-la no campo de nosso estudo: o direito tributário, isto posto, o
direito se apresenta por diversas espécies de normas: constitucional, administrativa,
26
CARVALHO, 2011, p. 289/290.
26
civil, tributária, etc., cada qual com o seu conteúdo, em que se diferenciam no
campo da heterogeneidade semântica27.
O Direito Tributário28 é o ramo do direito que regula, direta ou indiretamente, a
instituição, arrecadação ou fiscalização de tributos. Compreende: os princípios
constitucionais tributários a serem aplicados pelo legislador; e o nascimento, a vida e
a extinção das relações jurídico-tributárias.
Dessa forma, a norma jurídica tributária é a que trata direta ou indiretamente
da instituição, arrecadação e fiscalização dos tributos.
Portanto, há três tipos de relações: a de instituição dos tributos; a de
arrecadação dos tributos e a de fiscalização dos tributos.
Dado essas relações, o CTN, no art. 11329, prevê que há obrigações
tributárias principais e os deveres instrumentais30. Obrigações tributárias principais
são as que surgem da incidência da norma jurídica relacionada à instituição do
27
CAMPILONGO, Paulo Antonio Fernandes. Os limites a revisão no auto de infração no contencioso
administrativo tributário. 2005. 270f. Dissertação (Mestrado em Direito), Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo - PUC/SP, São Paulo, 2005, p. 76; e CARVALHO, 2012, p. 131.
28 Entendemos que o sistema jurídico é uno e indecomponível, mas didaticamente é necessário fazer
o corte para uma melhor análise do objeto (CARVALHO, 2011, p. 46).
29 “Art. 113. A obrigação tributária é principal ou acessória. § 1º A obrigação principal surge com a
ocorrência do fato gerador, tem por objeto o pagamento de tributo ou penalidade pecuniária e
extingue-se juntamente com o crédito dela decorrente. § 2º A obrigação acessória decorre da
legislação tributária e tem por objeto as prestações, positivas ou negativas, nela previstas no
interesse da arrecadação ou da fiscalização dos tributos. § 3º A obrigação acessória, pelo simples
fato da sua inobservância, converte-se em obrigação principal relativamente à penalidade pecuniária”.
30 O CTN no art. 113 emprega a terminologia de “obrigação acessória”. Entendemos inapropriada por
não expressar uma obrigação e não haver laços entre relações tributárias para ser denominada de
acessória. Assim, seguirmos a denominação de Paulo de Barros Carvalho (2011, p. 362 e ss.).
27
tributo, e os deveres instrumentais se apresentam pelas normas que regulam a
forma de arrecadação e fiscalização dos tributos.
Nessa perspectiva, podemos delimitar que as normas jurídicas tributárias são
de duas espécies: as que preveem a forma de instituição do tributo, e as que
preveem a forma de arrecadação e fiscalização; classificando-as, respectivamente,
em norma jurídica em sentido estrito e em sentido amplo31.
Assim, as normas jurídicas tributárias, que devem se apresentar pela
estrutura lógica, são: a) as que têm como objeto a instituição do tributo e se
apresentam pela regra-matriz de incidência tributária, lançamento tributário ou auto
de infração; e b) as que tratam da forma de arrecadação ou fiscalização como, por
exemplo, da obrigatoriedade de emissão de DCTF, DIPJ, DIRF.
3. Norma jurídica completa
A norma jurídica completa é uma estrutura dual que inicialmente compreende:
a norma primária e a norma secundária. Foi desenvolvida por HANS KELSEN32, que
ao analisar a característica de coação do direito, determinou que havia duas normas
para completar o sistema, classificando-as segundo o critério sancionador.
Inicialmente HANS KELSEN33 entendia que a norma primária era a que
prescrevia a sanção a ser aplicada pelo Estado-Juiz, quando houvesse
descumprimento da norma secundária; e a norma secundária a que descrevia o
31
CARVALHO, 2011, p. 297.
32 KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. Tradução de José Cretella Junior e Agnes Cretella. 4. ed.
São Paulo: RT, 2006, p. 69/70.
33 KELSEN, Hans. Teoria geral das normas. Tradução José Florentino Duarte. Porto Alegre: Fabris,
1986, p. IX e 181.
28
comportamento desejado pela ordem jurídica. Contudo, verificando a inconsistência
pelas críticas que recebeu, reviu os conceitos e determinou que: a) norma primária é
a que prescreve o comportamento desejado, e b) a norma secundária é a norma
aplicada pelo Estado-Juiz como coerção à desobediência à norma primária.
Nesse sentido, EURICO MARCOS DINIZ DE SANTI34 descreve a norma
primária e a norma secundária:
A norma primária vincula deonticamente à ocorrência de dado fato a
uma prescrição (relação jurídica); a norma secundária conecta-se
sintaticamente à primeira, prescrevendo: se o fato de a não
ocorrência da prescrição da norma primária se verificar, então deve
ser uma relação jurídica que assegure o cumprimento daquela
primeira, ou seja, dada a não observância de uma prescrição jurídica,
deve ser a sanção.
Assim, a norma primária é a que descreve um evento de direito material de
possível ocorrência que tem o condão de desencadear uma relação jurídica; e a
norma secundária é a que prescreve a aplicação de uma sanção mediante coerção
do Estado-Juiz ao sujeito que não cumpriu com o previsto na norma primária. Dessa
forma, LOURIVAL VILANOVA35 classifica a norma primária de relação jurídica de
cunho material e norma secundária de índole formal (processual).
Seguindo essa sistemática, a norma jurídica completa: “expressa a
mensagem deôntica-jurídica na sua integralidade constitutiva, significando a
34
SANTI, op. cit., p. 36.
35 VILANOVA, Lourival. Estruturas Lógicas e o Sistema no Direito Positivo. 4. ed. São Paulo: Noeses,
2010, p. 74.
29
orientação da conduta, juntamente com a providência coercitiva que o ordenamento
prevê para seu cumprimento”36 e apresenta estrutura lógica interproposicional com
representação simbólica:
Simbologia: D{[H→C] v [H’ (-c) →S]}: A norma primária estatui
direitos e deveres a dois ou mais sujeitos como consequência
jurídica ‘C’, em decorrência da verificação do acontecimento descrito
em sua hipótese ‘H’. A norma secundária estabelece a sanção ‘S’,
mediante o exercício da coação estatal, no caso de não observância
dos direitos e deveres instituídos pela norma primária ‘H’ (-c)37.
Contudo, EURICO MARCOS DINIZ DE SANTI38 constatou que além da
sanção aplicada pelo Estado-Juiz prevista na norma secundária, há a sanção
administrativa aplicada pela Administração, e passa a classificar a norma primária
em dispositiva e sancionadora. A norma primária dispositiva é a que descrevem
relações jurídicas de direito material com a ocorrência de um fato lícito, e a norma
primária sancionadora é a que descreve a sanção a ser aplicada
administrativamente pelo descumprimento do prescrito na norma primária dispositiva
consubstanciada em um fato ilícito.
Assim, teríamos a norma primária dispositiva com o antecedente que
descreve um fato lícito que implica uma consequência; e a norma primária
sancionadora que descreve, no antecedente, o fato ilícito pelo descumprimento do
36
CARVALHO, 2012, p. 276.
37 CARVALHO, 2010, p. 309.
38 SANTI, op. cit., p. 38.
30
dever da norma primária dispositiva e, no consequente, a aplicação da sanção,
como, por exemplo, uma multa. É simbolizada: D {[p → q] v [- q → S]}.
Desse modo, a norma primária sancionadora precisa, para existir, da norma
primária dispositiva, por se tratar da aplicação de uma sanção por seu
descumprimento.
Mas não é necessário para a validade do sistema que exista a norma primária
sancionadora, podendo haver a regulação do sistema pela norma primária
dispositiva e a norma secundária39.
Portanto, a norma jurídica completa, após os estudos desses autores,
compreende: a) a norma primária que é norma de direito material e prescreve o
comportamento desejado pela ordem jurídica. Classifica-se em: a.1) norma primária
dispositiva, que no antecedente descreve um fato lícito, e a.2) norma primária
sancionadora, que no antecedente descreve um comportamento ilícito pelo
descumprimento da norma primária dispositiva; e b) que, se descumpridas, quando
existentes ambas, será aplicada a norma secundária, de natureza processual, pelo
Estado-Juiz.
Aplicando esses conceitos ao Direito Tributário, teremos:
a) Norma primária dispositiva: dada a ocorrência no tempo e no espaço do
evento tributário previsto no antecedente da RMIT (antecedente), dever-ser a
instauração da relação jurídica tributária entre o contribuinte e o Fisco (consequente)
com a lavratura do lançamento de ofício;
b) Norma primária sancionadora: dado que o contribuinte, devidamente
notificado, não pagou o tributo e nem apresentou impugnação (antecedente), dever-
39
QUEIROZ, Luís César Souza de. Sujeição passiva tributária. Rio de Janeiro, Forense, 2002,
p. 37-39.
31
ser a constituição da relação jurídica tributária entre o contribuinte e o Fisco para
efetuar o lançamento de ofício e a aplicar a penalidade (consequente) mediante a
lavratura de auto de infração; e
c) Norma secundária: dado que o contribuinte notificado da lavratura do auto
de infração não recolheu aos cofres públicos a pecúnia e nem impugnou o auto de
infração (antecedente), dever-ser que o Fisco inscreva em Dívida Ativa o crédito
tributário e ingresse com a Execução Fiscal, para que, formando a relação triádica
entre contribuinte, Fisco e o Estado-Juiz, seja expropriado o patrimônio do
contribuinte até a satisfação do débito (consequente).
4. Norma: abstrata e concreta, geral e individual
Trabalhamos com o conceito de norma jurídica como unidade mínima e
irredutível de manifestação do deôntico, em que um antecedente implica um
consequente.
As classes de normas em abstrata e concreta, e geral e individual se referem
aos elementos dessa estrutural lógica: antecedente e consequente.
O antecedente descreve o evento de possível ocorrência ou seu relato em
linguagem competente para constituir o fato jurídico. A descrição de um evento de
possível ocorrência no mundo fenomênico, que quando vertido em linguagem
competente, constitui o fato jurídico, é a representação da norma em sua abstração;
que ganha concretude quando é relatado em linguagem competente e constituído o
fato jurídico. Daí a abstração e a concretude estão no antecedente40 e referem-se
aos elementos fáticos.
40
CARVALHO, 2012, p. 57-58.
32
PAULO ANTONIO FERNANDES CAMPILONGO41 descreve que a abstração
é a descrição de um fato hipotético que não ocorreu e se apresenta com o verbo no
impessoal e de predicação incompleta, tendo como elemento obrigatório o
complemento da indicação de espaço e tempo; e a concretude é a ocorrência do
evento vertido em linguagem competente que constitui o fato jurídico, completado na
indicação do espaço e do tempo, e do verbo no pretérito.
Assim, podemos definir abstração e concretude como: a) abstração é um
conjunto de critérios para se identificar um evento de possível ocorrência no tempo e
no espaço e está projetada para o futuro; e b) concretude é o relato em linguagem
competente do evento ocorrido no tempo e no espaço que constitui o fato jurídico e
está projetado para o passado.
O consequente instaura a relação jurídica entre dois ou mais sujeitos em
relação a uma prestação. Assim, há que prever os sujeitos que compõem a relação
e estão na classe normativa do geral e do individual42. A classe do geral é a que não
determina os sujeitos, ou seja, os sujeitos da relação são indeterminados, e da
individual há a definição dos sujeitos na sua individualização ou identificação no
grupo de pessoas.
Logo, podemos definir geral e individual como: a) geral é a previsão de uma
classe indefinida de sujeitos; e b) individual é a delimitação de uma classe
determinada de sujeitos: ativo e passivo.
Fazendo a relação entre as classes e a estrutura lógica da norma jurídica (A
→ C), teremos: normas abstratas e gerais, normas concretas e gerais, normas
41
CAMPILONGO, op. cit., p. 19.
42 CARVALHO, 2012, p. 57.
33
abstratas e individuais, e normas concretas e individuais; que se aplicam ao Direito
Tributário:
a) Normas abstratas e gerais são as que têm no antecedente a descrição de
um evento de possível ocorrência no tempo e no espaço; e no consequente a
previsão da instauração de uma relação jurídica entre sujeitos indeterminados. Trata
da RMIT que institui o tributo;
b) Normas concretas e gerais são as que no antecedente relatam em
linguagem competente o evento ocorrido no tempo e no espaço para constituir o fato
jurídico tributário; e no consequente há a previsão da instauração de uma relação
jurídica entre sujeitos indeterminados. Trata-se do auto de infração como norma
introdutora43;
c) Normas abstratas e individuais são as que têm no antecedente descrevem
um fato de possível ocorrência a ser delimitado no tempo e no espaço; e no
consequente a previsão da instauração da relação jurídica com a individualização
dos sujeitos da relação. Trata-se da consulta tributária; e
d) Normas concretas e individuais são as que constituem no antecedente o
fato jurídico tributário; e no consequente instaura a relação jurídica entre sujeitos
determinados. Trata-se do lançamento tributário.
5. Processo de positivação do direito
As normas jurídicas têm como objetivo regular as condutas intersubjetivas
para o fim de produzirem os efeitos prescritos pelo legislador. Só é possível atingir a
43
Há autores que atribuem ao auto de infração essa classe de norma. Discordamos desse
entendimento, conforme veremos no capítulo III, item 1.
34
conduta regulada pelo direito com a máxima concretude e individualização da
norma. Assim, passam da abstração à concretude para o fim de atingirem as
condutas intersubjetivas reguladas pelo direito, que, segundo nossas premissas: é a
linguagem do direito positivo projetando-se sobre o campo material das condutas
intersubjetivas para organizá-las deonticamente. A esse processo denominamos de
positivação do direito, que compreende o caminho percorrido da abstração da norma
para chegar a sua concretude.
O processo de positivação do direito se dá em duas etapas: a) com a
ocorrência do evento, pela incidência normativa; e b) com a introdução da norma
jurídica no ordenamento jurídico, no ato de aplicação. Assim, esse processo
compreende o ato de incidência e o de aplicação da norma jurídica44.
Há duas teorias que explicam o processo de positivação do direito: a teoria
tradicional e a teoria do Constructivismo Lógico-Semântico.
A teoria tradicional45 entende que a incidência é automática e infalível, e se
diferencia do ato de aplicação. Entendem que ocorrido o evento no mundo
fenomênico, que tem suporte no antecedente da norma jurídica, esta “cai” sobre ele,
sem necessidade de um relato em linguagem competente ou uma ação humana,
para juridicizá-lo, tornando-o fato jurídico, e fazendo nascerem sozinhos os efeitos
44
GUERRA, Renata Rocha. Auto de Infração Tributário: produção e estrutura. 2004. Dissertação
(Doutorado em Direito) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP, São Paulo, 2004,
p. 28.
45 É defendida por Miguel Reale (CARVALHO, 2010, p. 408); Alfredo Augusto Becker (Teoria geral do
direito tributário. 5. ed. São Paulo: Noeses, 2010, p. 324); e Pontes de Miranda (Tratado de direito
privado. Tomo I – Introdução: pessoas físicas e jurídicas. Atualização Judith Martins-Costa. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p. 70).
35
jurídicos. Esse processo ocorre no plano dos pensamentos46, de forma que a norma
incide “sozinha e por conta própria” sobre os acontecimentos sociais para juridicizá-
los. Após a juridicização dos fatos, a norma poderá ser aplicada pelo homem,
momento em que pode haver falha se for descumprida. Dessa forma, os atos de
incidência e de aplicação se constituem em momentos distintos.
A teoria do Constructivismo Lógico-Semântico só conhece o que é
representado pela linguagem. Entende que os atos de incidência e de aplicação
ocorrem com o relato em linguagem competente do evento que constituí o fato
jurídico e instaura a relação jurídica. Com esse relato nascem os efeitos jurídicos
previstos em lei. Assim, ambos são atos que se formam conjuntamente
representados pelo último ato: de aplicação. Os efeitos da norma só serão
verificáveis quando ingressarem no sistema do direito positivo por seu relato em
linguagem competente. A linguagem competente é das provas.
TÁCIO LACERDA GAMA47 faz críticas sobre a concepção automática e
infalível da incidência, nos termos seguintes:
Uma vez aceita a premissa de que o direito é um conjunto de
normas, que se manifestam em linguagem, não dá para conceber
que acontecimentos sociais, destituídos de uma linguagem
competente, promovam qualquer tipo de alteração a esse conjunto.
46
ARAÚJO, 2011, p. 97; MIRANDA, 2012, t. I, p. 69.
47 GAMA, Tácio Lacerda. Obrigação e crédito tributário: Anotações à margem da teoria de Paulo de
Barros Carvalho. [S.I.]: FISCOSoft, 2003. Disponível em:
<http://www.fiscosoft.com.br/a/2fct/obrigacao-e-credito-tributarioanotacoes-a-margem-da-teoria-de-
paulo-de-barros-carvalho-tacio-lacerda-gama acessado em 24/10/2012>. Acesso em: 24 out. 2012, p.
3 e 4.
36
[...] O ponto a ser destacado aqui é a necessidade de que um sujeito
indicado pelo sistema do direito positivo relate o acontecimento numa
forma juridicamente prevista (linguagem competente). Sem isso, os
acontecimentos sociais não passarão a integrar o sistema de direito
posto, criando obrigações passíveis de serem exigidas
coercitivamente. [...] Para que aconteça a incidência da norma, é
necessária a realização simultânea de duas operações lógicas:
subsunção e imputação. Na primeira, observa-se a pertinência do
fato à norma de superior hierarquia; na segunda, prescreve-se o
efeito que será, necessariamente, uma relação jurídica.
Assim, pela metodologia que adotamos neste trabalho, nos filiamos à
segunda teoria e, nos baseando nela, passamos a discorrer com mais detalhes os
atos de incidência e de aplicação.
A incidência é operação lógica de subsunção e de implicação. A subsunção é
operação em que se constata que um evento ocorrido no mundo fenomênico se
enquadra na classe dos critérios descritos no antecedente da norma. A implicação é
a determinação normativa em que constituído o fato jurídico (com o relato em
linguagem competente do evento subsumido) instaura-se a relação jurídica entre as
partes. Essas operações lógicas se materializam no ato de aplicação realizado pelo
ser humano, que constata a ocorrência do evento que se subsume aos critérios da
norma jurídica e o verte em linguagem competente por meio de provas para
constituir o fato jurídico (antecedente) e instaurar a relação jurídica (consequente).
Nesse sentido, RENATA GUERRA48 explica: “Aplicar o direito nada mais é que criar
48
GUERRA, op. cit., p. 28.
37
o direito, criar normas jurídicas nas suas variadas combinações entre antecedente e
consequente”.
No mais, o ato de aplicação pode ser concretizado pelo Legislativo, ao editar
as leis; pelo Judiciário, ao proferir sentenças ou acórdãos; pela Administração
Pública, na edição do ato administrativo; e pelo particular, ao firmar contratos ou
efetuarem o “autolançamento”.
Por esse enfoque, conclui-se que o processo de positivação do direito
compreende a forma que se criam as normas jurídicas no nosso ordenamento
jurídico, a realizar-se por meio do ato de incidência e de aplicação.
38
CAPÍTULO II – EXISTÊNCIA, VALIDADE E EFICÁCIA DA NORMA JURÍDICA
1. Existência e validade das normas jurídicas
A concepção de validade se relaciona com o conceito de direito49. Nesse
sentido, é termo plurívoco que pode assumir:
[...] a especial forma de existência de uma norma; atributo da norma
compatível com aquela que programou a sua criação; aptidão para
vir a ser aplicada por um tribunal; circunstância de, efetivamente,
disciplinar comportamentos; compatibilidade da norma do direito
positivo com padrões religiosos, racionais ou humanos, em acepção
ampla50.
Para fins do nosso estudo, se destacam as teorias que entendem validade
como atributo ou qualidade da norma jurídica, que se relacionam com a questão de
sua existência51, pois a teoria da validade como atributo da norma a concebe como
49
“Sem validade não há norma, sem norma não há direito, logo sem validade não há que se falar em
sistema do direito positivo” (MOUSSALLEM, Tárek Moysés. Fontes do Direito Tributário. 2. ed. São
Paulo, Editora Noeses, 2006, p. 167).
50 GAMA, Tácio Lacerda. Teoria dialógica da validade: existência, regularidade e efetividade das
normas tributárias. In: SCHOUERI, Luís Eduardo (Coord.). Direito tributário – Homenagem a Paulo de
Barros Carvalho. São Paulo: Quartier Latin, 2008. p. 130.
51 BOBBIO, Norberto. Teoria da norma jurídica. Tradução Fernando Pavan Baptista e Ariani Bueno
Sudatti. 4. ed. São Paulo: EDIPRO, 2008, p. 46.
39
sinônimo de norma jurídica existente, e a teoria da validade como qualidade da
norma como ato de aferição posterior à existência da norma, na sua aplicação.
Essas teorias são pertinentes por se contraporem às teorias de invalidade que
estudaremos e trabalham com as classes: do ato inexistente, do ato nulo e do ato
anulável, além das meras irregularidades.
Assim, se entendemos que o vício na norma acarreta a sua invalidade, que é
a antítese da validade, se faz necessário delimitar os campos de existência e/ou
validade da norma jurídica, que no estudo dessas teorias já serão demarcadas.
Para tanto, discorreremos sobre as acepções de validade e existência nas
teorias: de Pontes de Miranda, de Norberto Bobbio e de Paulo de Barros Carvalho,
para em seguida fixarmos nossa posição.
1.1. Teoria de Pontes de Miranda
Para PONTES DE MIRANDA52, validade é qualidade da norma jurídica.
O autor entende que o ordenamento jurídico é formado por três planos: da
existência, da validade e da eficácia do ato jurídico.
O plano da existência se sobrepõe ao plano da validade, em que o ato jurídico
precisa ingressar no ordenamento para, posteriormente, aferir se é válido ou inválido
no ato de aplicação da norma.
52
MIRANDA, Pontes. Tratado de direito privado. Tomo IV – Validade. Nulidade. Anulabilidade.
Atualização Marcos Bernardes de Mello e Marcos Ehrhardt Junior. 1. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2012, p. 61-62. Também é o entendimento de Clarice von Oertzen de Araújo (Incidência
Jurídica – Teoria e Crítica. São Paulo: Noeses, 2011, p. 64).
40
Assim, se houver um defeito na essência do ato jurídico que torne impossível
o seu ingressar no mundo jurídico, o ato é inexistente, e não há que se falar em
validade ou invalidade, muito menos em “ato jurídico”:
1. EXISTIR E VALER – Para que algo valha é preciso que exista.
Não tem sentido falar-se de validade ou de invalidade a respeito do
que não existe. A questão da existência é questão prévia. Somente
depois de se aferir que existe é possível pensar em validade ou em
invalidade. Nem tudo que existe é suscetível de a seu respeito
discutir-se se vale, ou se não vale. Não se há de afirmar nem de
negar que o nascimento, ou a morte, ou a avulsão, ou o pagamento
valha. Não tem sentido. Tão-pouco, a respeito do que não existe: se
não houver ato jurídico, nada há que possa ser válido ou inválido. Os
conceitos de validade ou de invalidade só se referem a atos jurídicos,
isto é, a atos humanos que entraram (plano da existência) no mundo
jurídico e se tornaram, assim, atos jurídicos53.
Logo, é pressuposto da validade que o ato jurídico exista, ou seja, que tenha
ingressado no ordenamento jurídico, constituindo o fato jurídico suficiente mediante
a incidência da norma no suporte fático.
Ao existir o ato jurídico que se verifica sua validade ou invalidade por meio da
análise da presença dos pressupostos regulados no ordenamento jurídico no ato de
aplicação da norma54, em que:
53
MIRANDA, 2012, t. IV, p. 61-62.
54 MIRANDA, 2012, t. IV, p. 62.
41
A conduta contrária à regra jurídica talvez seja desconhecedora
dessa. Não importa se a pessoa conhece ou não conhece a regra
jurídica: ela, por ser jurídica, incide, com ou sem esse conhecimento.
Se a regra mesmo violou princípio de publicidade, é outra questão e
somente diz respeito à sua validade55.
Nesse contexto para o autor há: a) ato inexistente, que não ingressou no
ordenamento por não preencher o suporte fáctico para a incidência da norma; b) ato
jurídico, que é o ato que ingressou no ordenamento mediante o preenchimento dos
elementos do suporte fáctico, incidindo a norma para constituir o fato jurídico em
que: b.1) é ato válido por os pressupostos essenciais de formação do ato terem
sidos preenchidos e a norma ter sido aplicada; e b.2) é ato inválido, em que há
ausência de algum(s) do(s) pressuposto(s) essencial(is) de formação do ato, e, por
isso, a norma não é aplicada.
1.2. Teoria de Norberto Bobbio
NORBERTO BOBBIO56 entende que a validade é sinônimo de existência da
norma jurídica, ou seja, é um atributo da norma57. Assim, afirmar que a norma
jurídica válida é verificada se é uma norma jurídica ou não, em que:
55
MIRANDA, 2012, t. I, p. 70.
56 BOBBIO, 2008, p. 46-45.
57 QUEIROZ, op. cit., p. 123; e FERRAZ JÚNIOR, Tercio Sampaio. Introdução ao estudo do direito:
técnica, decisão, dominação. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2010, p. 171.
42
O problema da validade é o problema da existência da regra
enquanto tal [...] o problema da validade se resolve com um juízo de
fato, isto é, trata-se de constatar se uma regra jurídica existe ou não,
ou melhor, se tal regra assim determinada é uma regra jurídica.
Validade jurídica de uma norma equivale à existência dessa norma
como regra jurídica.
Com o ingresso da norma jurídica no ordenamento é norma jurídica válida,
pois para a norma ser jurídica tem que ter validade.
Dessa forma, o autor atribui três operações para verificar a validade da norma
jurídica:
Em particular, para decidir se uma norma é válida (isto é, como regra
jurídica pertencente a um determinado sistema), é necessário com
frequência realizar três operações: a) averiguar se a autoridade de
quem ela emanou tinha o poder legítimo para emanar normas
jurídicas, isto é, normas vinculantes naquele determinado
ordenamento jurídico (esta investigação conduz inevitavelmente a
remontar até a norma fundamental, que é o fundamento de validade
de todas as normas de um determinado sistema); 2) averiguar se não
foi ab-rogada, já que uma norma pode ter sido válida, no sentido de
que foi emanada de um poder autorizado para isto, mas não quer
dizer que ainda seja, o que acontece quando uma outra norma
sucessiva no tempo a tenha expressamente ab-rogado ou tenha
regulado a mesma matéria; 3) averiguar se não é incompatível com
outras normas do sistema (o que também se chama ab-rogação
43
implícita), particularmente com uma norma hierarquicamente
superior58.
LUIS CESAR SOUZA DE QUEIROZ59, possuindo o mesmo entendimento do
autor, ainda complementa: “[...] é lógica e juridicamente impossível uma norma ser
jurídica e não ser válida”.
Assim, toda norma que é jurídica é válida, ou seja: ou a norma é válida e
existe no sistema; ou não é válida e não existe no sistema jurídico; do qual, ser
norma jurídica é existir no ordenamento jurídico e, consequentemente, ser válida.
Tem essa posição HANS KELSEN60 defendendo, ainda, que para a garantia
da unidade da ordem jurídica é necessário que exista uma norma fundamental61 de
superior hierarquia que prescreve como as normas jurídicas inferiores devem ser
criadas. No sistema brasileiro, a norma fundamental é a CF, que dá fundamento de
validade às normas inferiores.
Dessa forma, para essa teoria a validade é concebida: a) a norma ingressou
no ordenamento jurídico, é norma jurídica, é existente e é válida, por ter sido
expedida pelo agente competente mediante o procedimento específico; e b) a norma
não ingressou no ordenamento jurídico por desrespeito a um dos pressupostos de
sua constituição, não é norma jurídica, não é existente e é inválida.
58
BOBBIO, 2008, p. 47.
59 QUEIROZ, op. cit., p. 37-123.
60 KELSEN, 1986, p. 3-4.
61 Id., 2006, p. 221.
44
1.3. Teoria de Paulo de Barros Carvalho
A Teoria de PAULO DE BARROS CARVALHO62 tem estreita relação com a
Teoria de Norberto Bobbio, por conceber validade como norma jurídica existente.
Para o autor, validade é relação de pertencialidade da norma com o sistema,
em que norma válida é a norma jurídica existente por ter ingressado mediante o
procedimento estabelecido no sistema:
[...] E ser norma válida quer significar que mantém relação de
pertencialidade com o sistema “S”, ou que nele foi posta por órgão
legitimado a produzi-la, mediante procedimento estabelecido para
esse fim [...] relação é o vínculo que se estabelece entre a
proposição normativa e o sistema do direito posto, de tal sorte que ao
dizermos que u’a norma “N” é válida, estaremos expressando que ela
pertence ao sistema “S”.
Os critérios de pertencialidade são: autoridade competente e procedimento
próprio63. A autoridade competente consiste na pessoa autorizada pela ordem
jurídica a editar a norma jurídica. O procedimento próprio representa a forma a ser
observada na produção da norma jurídica. Assim, o desrespeito a qualquer dos
critérios torna a norma jurídica passível de ser decretada inválida.
62
CARVALHO, 2011, p. 113. Também é o entendimento de Gregorio Robles (O direito como texto:
quatro estudos de teoria comunicacional do direito. Tradução Roberto Barbosa Alves. São Paulo:
Manole, 2005, p. 107); e Lourival Vilanova (2010, p. 51).
63 CARVALHO, 2010, p. 708.
45
A relação da pertinencialidade da norma com o sistema é inerente à norma
jurídica válida. Nessa perspectiva, pode ser questionada e confirmada após o seu
ingresso no ordenamento. Isso posto, a norma jurídica que ingressa no sistema
presume-se válida por ter sido expedida pelo agente competente mediante o
procedimento próprio. Somente com o ingresso de outra norma que reconheça o
desrespeito aos critérios de pertinencialidade e expulse a norma inválida do sistema
que ela perde seu atributo e deixa de pertencer ao sistema.
Nisso, para a garantia do ordenamento, ao existir a norma há a presunção de
validade64, segundo a qual foram observadas as formalidades essenciais no ato de
produção.
Assim, a norma jurídica nasce com presunção de validade, com força para
incidir e ser aplicada, havendo a possibilidade de ser contestada a compatibilidade
ou não da norma com as prescrições jurídicas para a sua criação, decretando-a,
quando houver o seu desrespeito, inválida, e a retirando do sistema65. Somente com
64
Aurora Tomazini de Carvalho descreve a presunção de validade: “Há, na realidade, uma
‘presunção’ posta pelo direito, de que todo o processo enunciativo introdutor de normas se deu nos
moldes das normas que o regulam, até que se constitua o contrário. [...] Se durante o processo
enunciativo não foi alegado qualquer vício, ao seu término, com a produção da norma veículo
introdutor, presume-se que tudo ocorreu nos moldes prescritos pelas normas de produção em vigor,
porque assim diz a linguagem constituída. Presume-se que a autoridade enunciativa é competente e
que o procedimento realizado para enunciação é o próprio, e que a materialidade do documento tem
respaldo em norma de hierarquia superior, porque sem essa presunção torna-se impossível trabalhar
com a linguagem jurídica. [...] A ‘presunção’ é de que a enunciação (constituída juridicamente pela
enunciação-enunciada) e o produto por ela criada encontram-se em conformidade com as normas
que regulam sua criação, está ligada à adequação (formal/material), não à validade da linguagem
jurídica.” (2010, p. 712-713).
65 CARVALHO, 2011, p. 114.
46
este último ato é que a norma perde a sua validade por não ser compatível com os
critérios de pertencialidade.
Logo, para esta corrente: a) norma jurídica válida é norma jurídica existente
que ingressa no ordenamento jurídico com presunção de validade que perdurará até
que a autoridade competente verifique a adequação da norma com o sistema e a
decrete inválida e retire do ordenamento, no caso de desrespeito aos preceitos
legais; e b) norma que é inválida, não é jurídica, mas que pode ter sido “válida” e
apta a incidir e ser aplicada durante o lapso de tempo da sua existência.
1.4. Nossa posição
Antes de expormos nossa posição, TÁCIO LACERDA GAMA66 destaca o
entendimento de que não há contrariedade ou contradição entre as teorias
estudadas, do qual a análise de validade reflete o ponto de vista do observador
(validade é qualidade da norma) e o ponto de vista do participante (validade é
atributo da norma). Trata de uma opção de escolha entre uma ou outra teoria.
Entendemos que validade é relação de pertinencialidade da norma com o
sistema. Seguimos a teoria de PAULO DE BARROS CARVALHO. Essa teoria
consegue explicar a produção de efeitos de normas jurídicas inválidas, bem como se
adequa à metodologia do Constructivismo Lógico-Semântico.
Assim, não aceitamos a teoria de PONTES DE MIRANDA, que se contrapõe
ao nosso entendimento. Para o autor, a norma jurídica deve existir para
posteriormente verificarmos se é válida ou inválida. Esse entendimento, não se
66
GAMA, Tácio Lacerda. Competência Tributária – Fundamentos para uma Teoria da Nulidade. 2. ed.
São Paulo, Editora Noeses, 2011, p. 328.
47
consegue explicar a existência de normas jurídicas inválidas no sistema que são
aplicadas e produzem efeitos.
Já a teoria de NORBERTO BOBBIO tem uma relação com a que adotamos,
mas se distingue. Ambas concebem a validade como norma existente, mas segundo
entendemos, a norma jurídica válida é a que ingressa no sistema, é existente, e se
presume válida, até que outra norma reconheça sua invalidade e a retire do sistema.
Com isso, pode subsistir norma inválida no sistema e produzir efeitos. Mas a teoria
de NORBERTO BOBBIO entende que norma para ser jurídica, válida e existente,
deve ser expedida pelo agente competente e mediante o procedimento, em que o
desrespeito a qualquer dos elementos essenciais torna a norma inexistente, não
jurídica e inválida. Com isso, não existe no sistema norma jurídica inválida para ser
aplicada.
Portanto, confirmamos nossa posição de que a norma jurídica que ingressa
no sistema é válida, podendo incidir e ser aplicada para constituir o fato jurídico e
instaurar a relação jurídica, só perdendo a validade com o reconhecimento pela
autoridade competente do desrespeito aos critérios de pertinencialidade e sua
expulsão. Esse processo é confirmado pela existência de normas jurídicas inválidas
que produzem efeitos no sistema.
Mas a delimitação da validade não se resume a fazer a opção por uma das
teorias. Destaca-se pela análise das teorias estudadas de quão importante é a
delimitação do campo da existência da norma jurídica. Trata-se do ponto matriz para
circunscrever o que ingressa no ordenamento jurídico e é válido, segundo nossa
posição.
48
Nisso, retomamos alguns conceitos iniciais de que norma jurídica é a que se
apresenta por um antecedente, com a descrição de um elemento fático, que implica
um consequente, que prescreve a instauração da relação jurídica e os efeitos.
No processo legislativo o legislador escolhe dentre os diversos eventos do
mundo fenomênico o fato que irá compor o antecedente da norma e terá o condão
de instaurar a relação jurídica e produzir os efeitos. Constitui-se e ingressa no
ordenamento jurídico com a sua promulgação. A publicação é ato de comunicação
aos destinatários do início da vigência da norma para o fim de torná-la apta a incidir
e ser aplicada.
No auto de infração não é diferente. A sua existência é determinada no
momento em que é lavrado, ou seja, em que se relata no antecedente da norma o
fato jurídico ilícito e no consequente se instaura a relação entre o Fisco e o
contribuinte. A intimação do sujeito passivo é ato de ciência, comunicação, da
emissão do documento em favor do contribuinte, para que exerça os seus direitos.
Esse ato não serve para declarar a norma existente, válida, mas somente para
comunicar ao contribuinte da existência do auto de infração.
Assim, a norma jurídica válida é a existente, que ingressa no ordenamento e
pode incidir e ser aplicada, mesmo com o desrespeito a qualquer formalidade
(critérios de pertinencialidade). No processo legislativo, com o ato de promulgação, a
norma torna-se norma jurídica válida, e a publicação no Diário Oficial é ato de
comunicação aos destinatários para cumprirem com suas prescrições, sob pena de
sofrerem as sanções administrativas ou judiciais. No auto de infração, com sua
lavratura, há norma jurídica válida por presunção, que com a notificação do
contribuinte e sem apresentação de impugnação para alegar sua invalidade, produz
49
seus efeitos e pode ser inscrito o crédito tributário em Dívida Ativa para que o Fisco
ingresse com a execução fiscal e exproprie o patrimônio do devedor.
Nesse contexto, lavrado o auto de infração há norma jurídica válida
(existente) por presunção. A impugnação do sujeito passivo confirma ou infirma a
pertinencialidade da norma com o sistema, onde se constata se foram observados
os requisitos legais para a sua lavratura.
2. Eficácia das normas jurídicas
O termo eficácia tem várias acepções: “(i) possibilidade de produzir efeitos; (ii)
a produção dos efeitos propriamente dita; (iii) incidência; (iv) observância por parte
dos destinatários (conformidade às normas)”67. Pela multiplicidade de acepções,
PAULO DE BARROS CARVALHO68 propõe seu estudo em três ângulos: da eficácia
técnica, da eficácia social e da eficácia jurídica.
A eficácia técnica consiste na descrição do antecedente da norma jurídica de
um evento que tenha a possibilidade de ocorrer no mundo fenomênico e produzir os
efeitos jurídicos previstos no consequente. Em contraposição, será ineficaz
tecnicamente a norma que “[...] não puder juridicizar o evento, inibindo-se o
desencadeamento de seus efeitos, tudo (a) pela falta de outras regras de igual ou
inferior hierarquia, consoante sua escala hierárquica, ou, (b) pelo contrário, na
hipótese de existir no ordenamento outra norma inibidora de sua incidência”. Dessa
forma, a eficácia técnica consiste na possibilidade de incidir e ser aplicada a norma
67
MOUSSALLEM, Tárek Moysés. Revogação em matéria tributária. São Paulo: Noeses, 2011, p.
159.
68 CARVALHO, 2011, p. 115.
50
jurídica em razão de o ordenamento prever todas as formas necessárias para a
constituição do fato jurídico e a produção de seus efeitos.
Eficácia social é o comportamento da sociedade perante a norma jurídica
imposta, em que se os destinatários cumprem a conduta prescrita há eficácia social,
e se não houver cumprimento haverá ineficácia social. NORBERTO BOBBIO
conceitua eficácia segundo esse parâmetro, em que é o “problema de ser ou não
seguida pelas pessoas a quem é dirigida”69.
A eficácia jurídica é a produção dos efeitos previstos no consequente da
norma, que nasce do processo de incidência ao constituir o fato jurídico e instaurar a
relação jurídica entre os sujeitos. Trata-se da chamada causalidade jurídica. Desse
modo, a eficácia jurídica é atributo do fato, uma vez que: “[...] é a propriedade de que
está investido o fato jurídico de provocar a irradiação dos efeitos que lhe são
próprios”70.
Nesse sentido, cabe à consideração de CLARICE VON OERTZEN DE
ARAÚJO71 quanto à confusão que pode existir entre o processo de incidência e a
eficácia jurídica:
[...] a eficácia da lei jurídica é a de incidir, criando os fatos jurídicos. A
eficácia jurídica é aquela decorrente da incidência, mas que não é a
incidência em si mesma considerada. Com esta ressalva o jurista
69
BOBBIO, 2008, passim.
70 CARVALHO, 2011, p. 115. Também é o entendimento de Pontes de Miranda (Tratado de direito
privado. Tomo V – Eficácia. Direitos mutilados. Exercício dos direitos, pretensões, ações e exceções.
Prescrição. Atualização Marcos Bernardes de Mello e Marcos Ehrhardt Junior. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2012, p. 59); e Tárek Moysés Moussallem (2011, p. 162).
71 ARAÚJO, 2011, p. 101.
51
estabelece uma diferença entre eficácia da lei, que é a incidência, o
processo de jurisdicização dos fatos, e a eficácia jurídica. Esta
segunda irradia dos fatos jurídicos, em decorrência da causalidade
normativa. Assim, uma eficácia (a jurídica) é interna ao mundo
jurídico, enquanto a outra (a incidência ou eficácia legal) concorre
para a formação desse mundo.
Logo, a eficácia técnica e a jurídica são conceitos importantes para a
dogmática jurídica, já a eficácia social é relevante para a Sociologia do Direito.
Entendemos, para fins deste trabalho, que eficácia é a aptidão do fato jurídico
de produzir os efeitos previstos no consequente da norma72, utilizando a acepção de
eficácia jurídica.
Na lavratura do auto de infração, a eficácia é constituída no crédito tributário,
a partir do momento em que o Fisco tem o direito subjetivo de receber a importância
em pecúnia e o contribuinte o dever jurídico de recolher aos cofres públicos os
valores cobrados. Assim, havendo defeitos na formação do auto de infração pela
inobservância dos requisitos para a sua lavratura, até a desconstituição dessa
relação jurídica, há a produção desses efeitos no ordenamento jurídico, sujeitando o
contribuinte a sofrer uma execução fiscal após a inscrição em Dívida Ativa do crédito
tributário e ter seu patrimônio expropriado.
Nesse contexto, a decretação de invalidade do auto de infração visa cessar a
produção desses efeitos, além de determinar, segundo o tipo de vício e espécie de
invalidade, a possibilidade ou não de o Fisco constituir novamente o crédito tributário
por meio da lavratura de um novo lançamento de ofício ou auto de infração.
72
CARVALHO, 2011, p. 115.
52
Assim, decretada a invalidade do auto de infração poderá haver: a) a extinção
da obrigação tributária; ou b) a possibilidade do Fisco em 5 (cinco) anos lavrar novo
auto de infração regularizando o vício para torná-lo válido e apto à produção dos
efeitos.
Esses são os principais efeitos visados pelo reconhecimento da invalidade do
auto de infração, que retomaremos no capítulo IV.
53
CAPÍTULO III – AUTO DE INFRAÇÃO
1. Auto de infração
Auto de infração é palavra polissêmica73. Das possíveis acepções surgem
quatro correntes doutrinárias para conceituar auto de infração: veículo introdutor de
normas jurídicas74; a norma concreta e individual que documenta uma infração75; o
suporte físico que insere outras normas individuais e concretas76; ou o lançamento
de ofício77.
Antes de discorremos sobre as correntes doutrinárias, destacamos que o auto
de infração pode constituir: a) o crédito tributário no lançamento de ofício e aplicar a
penalidade cabível, denominado de auto de infração lato sensu e subsiste com duas
normas jurídicas: a norma primária dispositiva e a norma primária sancionadora; ou
b) somente aplicar a penalidade cabível, denominado de auto de infração stricto
sensu e subsiste com a norma primária sancionadora78.
73
TOMÉ, Fabiana Del Padre. A prova no Direito Tributário. 3. ed. São Paulo, Editora Noeses,
2011/2012, p. 321.
74 CAMPILONGO, op. cit., p. 114; e GUERRA, op. cit., p. 41.
75 BORGES, José Souto Maior. Lançamento tributário. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 1999, p. 155-156;
e CARVALHO, 2011, p. 324.
76 GONÇALVES, José Artur Lima. Imposto sobre a renda: pressupostos constitucionais. São Paulo:
Malheiros, 2002, p. 101; SANTI, 2010, p. 170; e TOMÉ, 2011/2012, p. 321.
77 MELO, José Eduardo Soares de. Curso de direito tributário. 10. ed. São Paulo: Dialética, 2012,
p. 341.
78 CARVALHO, 2012, p. 326.
54
A aplicação de uma penalidade pressupõe a prática de um ato ilícito
constituído pelo descumprimento de uma norma tributária. Assim, como no auto de
infração lato sensu e no auto de infração stricto sensu podem ser aplicadas
penalidades, denota-se que é pressuposto para a sua lavratura a prática pelo
contribuinte de um ato ilícito no descumprimento de uma norma tributária, que tem
como consequência a aplicação de uma sanção79.
Passamos a discorrer sobre as posições doutrinárias.
A primeira corrente, que entende que auto de infração é veículo introdutor de
norma concreta e individual, parte da concepção de que as normas jurídicas são
inseridas no ordenamento jurídico em pares: norma introdutora e norma introduzida.
A norma introdutora é o veículo introdutor da norma introduzida, em que a primeira é
o auto de infração como norma concreta e geral e, a segunda, o lançamento
tributário e a imposição de penalidade, como normas concretas e individuais. O auto
de infração como norma concreta e geral é composto de um antecedente que
constitui o fato jurídico tributário ilícito e no consequente há a previsão da
instauração da relação jurídica tributária com os sujeitos indeterminados, mas
especificadamente, com o sujeito passivo, pois o sujeito ativo, geralmente, já está
determinado na pessoa do ente competente tributante.
A segunda corrente entende que o auto de infração é a norma concreta e
individual que no antecedente constitui o fato jurídico tributário ilícito e no
consequente instaura a relação jurídica tributária entre o contribuinte como sujeito
passivo e o ente tributante como sujeito ativo, aplicando a sanção cabível.
79
Nosso entendimento concorda com Marcos Vinicius Neder e Maria Teresa Martinez López (2004,
p. 145).
55
A terceira corrente entende que o auto de infração é o suporte físico que: “[...]
veicula os enunciados das várias normas que se instalam na concretude deste
substrato único”, do qual pode conter quatro atos administrativos distintos: “[...] (i)
fato jurídico tributário, (ii) fato jurídico do não pagamento, (iii) fato jurídico da mora e
(iv) fato jurídico sancionador instrumental”80.
Por fim, a quarta corrente entende que o auto de infração é o autêntico
lançamento de ofício, defendendo que no art. 142 do CTN81 há previsão de que o
lançamento tributário pode aplicar a penalidade cabível, quando for o caso, não
havendo problemas de ordem semântica na sua lavratura para constituir o crédito
tributário e aplicar a penalidade. Ademais, defendem que o lançamento tributário é
atividade privativa da Autoridade Administrativa de constituir o crédito tributário e
aplicar a penalidade cabível. O lançamento de ofício regulado no art. 14982 do CTN,
80
SANTI, 2010, p. 171.
81 Art. 142. Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo
lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato
gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo
devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível.
Parágrafo único. A atividade administrativa de lançamento é vinculada e obrigatória, sob pena de
responsabilidade funcional.
82 Art. 149. O lançamento é efetuado e revisto de ofício pela autoridade administrativa nos seguintes
casos: I - quando a lei assim o determine; II - quando a declaração não seja prestada, por quem de
direito, no prazo e na forma da legislação tributária; III - quando a pessoa legalmente obrigada,
embora tenha prestado declaração nos termos do inciso anterior, deixe de atender, no prazo e na
forma da legislação tributária, a pedido de esclarecimento formulado pela autoridade administrativa,
recuse-se a prestá-lo ou não o preste satisfatoriamente, a juízo daquela autoridade; IV - quando se
comprove falsidade, erro ou omissão quanto a qualquer elemento definido na legislação tributária
como sendo de declaração obrigatória; V - quando se comprove omissão ou inexatidão, por parte da
56
é o único, dentre as modalidades descritas no diploma (a saber: o lançamento por
homologação e o lançamento por declaração), que é lavrado pelo Fisco, sem a
participação do contribuinte, sendo o autêntico lançamento tributário.
Primeiramente, defendemos que há uma impropriedade no art. 142 do CTN
quando o legislador previu “[...] sendo o caso, propor a aplicação da penalidade
cabível”83.
O lançamento tributário constitui o fato jurídico tributário lícito advindo da
instituição do tributo, e a aplicação da penalidade é substrato de fato jurídico
tributário ilícito. Pela natureza do fato jurídico constituído, licito e ilícito, essas
normas não podem ser tratadas como de mesma classe. Nesse sentido, o
lançamento tributário é norma primária dispositiva, e a aplicação da penalidade é
norma primária sancionadora, em que a primeira descreve no antecedente um fato
lícito, e a segunda um fato ilícito pelo descumprimento da primeira norma. Vejamos:
pessoa legalmente obrigada, no exercício da atividade a que se refere o artigo seguinte; VI - quando
se comprove ação ou omissão do sujeito passivo, ou de terceiro legalmente obrigado, que dê lugar à
aplicação de penalidade pecuniária; VII - quando se comprove que o sujeito passivo, ou terceiro em
benefício daquele, agiu com dolo, fraude ou simulação; VIII - quando deva ser apreciado fato não
conhecido ou não provado por ocasião do lançamento anterior; IX - quando se comprove que, no
lançamento anterior, ocorreu fraude ou falta funcional da autoridade que o efetuou, ou omissão, pela
mesma autoridade, de ato ou formalidade especial. Parágrafo único. A revisão do lançamento só
pode ser iniciada enquanto não extinto o direito da Fazenda Pública.
83 Coincidem com nosso entendimento: Estevão Horvath (Lançamento Tributário e “Autolançamento”.
2. ed. São Paulo, Editora Quartier Latin, 2010, p. 81); e Fabiana Del Padre Tomé (2011/2012, p. 317).
Discorda do entendimento: Luciano Amaro (Direito tributário brasileiro. 18. ed. São Paulo: Saraiva,
2012, p. 372).
57
o tributo é constituído pelo lançamento tributário. É, conforme o art. 384 do CTN, um
ato “que não constitua sanção de ato ilícito” e consiste na obrigação de pagar
determinada quantia ao Fisco. Constituído o crédito tributário pelo lançamento,
instaura-se a relação jurídica entre o Fisco e o contribuinte que deve recolher aos
cofres públicos a quantia determinada (norma primária dispositiva). Não tendo sido
realizado o pagamento, incide a aplicação da penalidade pelo seu descumprimento
em que o Fisco constitui, além do crédito tributário pelo lançamento, as penalidades
legais pelo descumprimento do pagamento do tributo (norma primária
sancionadora). Assim, não há possibilidade de nos filiarmos à quarta corrente.
Contudo, concordamos pelos seus fundamentos com essa corrente de que o
lançamento de ofício é o autêntico lançamento tributário85.
Discordamos também do conceito de auto de infração da primeira e da
segunda corrente. Vejamos:
O auto de infração tem como pressuposto a prática de um ato ilícito. O ato
ilícito é um evento que ocorreu no tempo e no espaço e se caracteriza por uma
conduta ilegal. Ingressa, segundo as nossas premissas, no ordenamento jurídico,
quando é relatado em linguagem competente, constituindo o fato jurídico tributário
ilícito. Nesse momento, teremos uma norma com antecedente concreto. Ademais,
apurada a prática do ato ilícito, o contribuinte é identificado e o consequente está
individualizado. Logo, o auto de infração é norma concreta e individual. Dessa forma,
84
Art. 3º Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa
exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade
administrativa plenamente vinculada.
85 Nossa posição concorda com: Francisco de Assis Praxedes (Tributo sujeito a lançamento por
homologação e não pago: cabimento de lançamento de ofício. Revista Dialética de Direito Tributário,
São Paulo, n°. 63, p. 63); e CAMPILONGO, op. cit., p. 100.
58
discordamos da primeira corrente que entende que o auto de infração é norma
concreta e geral.
Parece com isso que nos filiamos a segunda corrente. Contudo, como já
transcorrido, o auto de infração é constituído pelo lançamento tributário e pela
aplicação da penalidade, ou só a aplicação da penalidade. Tratam-se de normas
jurídicas distintas: uma norma primária dispositiva e a outra norma primária
sancionadora. Ambas as normas são concretas e individuais, se diferenciando pelo
antecedente, em que na primeira é um fato jurídico tributário lícito e na segunda um
fato jurídico tributário ilícito. Assim, não podem ser tratadas como de mesma classe,
como é na segunda corrente.
Desse modo, nos filiamos à quarta corrente, em que o auto de infração é
suporte físico ou veículo introdutor de outras normas jurídicas.
Como suporte físico, o auto de infração é norma concreta e individual que no
antecedente constitui o fato jurídico tributário ilícito (pressuposto de sua lavratura) e
no consequente instaura a relação jurídica tributária entre o contribuinte e o Fisco.
Veicula a norma primária dispositiva no lançamento tributário e/ou a norma primária
sancionadora na aplicação de penalidade, ambas normas concretas e individuais.
Definido o conceito de auto de infração, entendemos ser pertinente para a
exposição deste trabalho fazer uma breve consideração sobre sua sistematização
legal.
O regime jurídico tributário é constituído por três relações jurídicas: a) a de
recolher aos cofres públicos determinada importância a título de tributo; b) a de
cumprir com deveres instrumentais que têm a função de constituir os fatos jurídicos
tributários e a de auxiliar na ação de arrecadação e fiscalização do Fisco; e c) a de
59
sofrer a aplicação de penalidade legal por descumprir com uma dessas relações
jurídicas: de pagar o tributo ou de praticar um dever instrumental.
Para que o Fisco aplique a penalidade ao infrator, é necessário que tenha
elementos e provas da prática do ato ilícito, que geralmente são colhidos em
procedimentos de fiscalização.
O procedimento de fiscalização está previsto nos arts. 7°86, 8°87 e 9°88 do PAF
e constitui-se pela emissão do MPF89.
86
Art. 7º O procedimento fiscal tem início com: I - o primeiro ato de ofício, escrito, praticado por
servidor competente, cientificado o sujeito passivo da obrigação tributária ou seu preposto; II - a
apreensão de mercadorias, documentos ou livros; III - o começo de despacho aduaneiro de
mercadoria importada. § 1° O início do procedimento exclui a espontaneidade do sujeito passivo em
relação aos atos anteriores e, independentemente de intimação a dos demais envolvidos nas
infrações verificadas. § 2° Para os efeitos do disposto no § 1º, os atos referidos nos incisos I e II
valerão pelo prazo de sessenta dias, prorrogável, sucessivamente, por igual período, com qualquer
outro ato escrito que indique o prosseguimento dos trabalhos.
87 Art. 8º Os termos decorrentes de atividade fiscalizadora serão lavrados, sempre que possível, em
livro fiscal, extraindo-se cópia para anexação ao processo; quando não lavrados em livro, entregar-
se-á cópia autenticada à pessoa sob fiscalização.
88 Art. 9
o A exigência do crédito tributário e a aplicação de penalidade isolada serão formalizados em
autos de infração ou notificações de lançamento, distintos para cada tributo ou penalidade, os quais
deverão estar instruídos com todos os termos, depoimentos, laudos e demais elementos de prova
indispensáveis à comprovação do ilícito. § 1o Os autos de infração e as notificações de lançamento
de que trata o caput deste artigo, formalizados em relação ao mesmo sujeito passivo, podem ser
objeto de um único processo, quando a comprovação dos ilícitos depender dos mesmos elementos
de prova. § 2º Os procedimentos de que tratam este artigo e o art. 7º serão válidos, mesmo que
formalizados por servidor competente de jurisdição diversa da do domicílio tributário do sujeito
passivo. § 3º A formalização da exigência, nos termos do parágrafo anterior, previne a jurisdição e
prorroga a competência da autoridade que dela primeiro conhecer. § 4o O disposto no caput deste
60
O MPF tem por objetivo cientificar o contribuinte do início da ação de
fiscalização.
A ação fiscal é encerrada com a lavratura de Termo de Encerramento de
Ação Fiscal, acompanhado, se for o caso, de Relatório Fiscal e da lavratura do Auto
de Infração, que deve observar os requisitos previstos no art. 10 do PAF, quais
sejam:
Art. 10. O auto de infração será lavrado por servidor competente, no
local da verificação da falta, e conterá obrigatoriamente:
I - a qualificação do autuado;
II - o local, a data e a hora da lavratura;
III - a descrição do fato;
artigo aplica-se também nas hipóteses em que, constatada infração à legislação tributária, dela não
resulte exigência de crédito tributário. § 5o Os autos de infração e as notificações de lançamento de
que trata o caput deste artigo, formalizados em decorrência de fiscalização relacionada a regime
especial unificado de arrecadação de tributos, poderão conter lançamento único para todos os
tributos por eles abrangidos. § 6o O disposto no caput deste artigo não se aplica às contribuições de
que trata o art. 3o da Lei n
o 11.457, de 16 de março de 2007.
89 No dia 04/9/2014 foi publicado o Decreto n°. 8.303/14 que “extinguiu” o MPF. Estabeleceu a norma
que os procedimentos de fiscalização terão inícios com a expedição prévia de TDPF, que ficaram a
cargo dos Auditores-Fiscais da RFB. A Portaria RFB 1.687/14, publicada no dia 18/9/2014,
regulamentou esse novo procedimento de fiscalização. Destacamos que essas alterações
apresentam uma nova sistemática de fiscalização no âmbito interno da Administração, o que não
afeta o nosso estudo diante do corte legislativo que fizemos ao determinar que iríamos fundamentar
no PAF, que não sofreu alterações. Assim, entendemos que não houve a extinção do MPF como o
instrumento de ciência ao contribuinte da instauração de procedimento de fiscalização, mas sim a
alteração de sua denominação para TDPF. Continuaremos denominando de MPF, conforme previsão
legal.
61
IV - a disposição legal infringida e a penalidade aplicável;
V - a determinação da exigência e a intimação para cumpri-la ou
impugná-la no prazo de trinta dias;
VI - a assinatura do autuante e a indicação de seu cargo ou função e
o número de matrícula.
Esse é o procedimento de fiscalização para a constatação da prática de um
ato ilícito pelo contribuinte e a lavratura do auto de infração pelo Fisco.
No mais, entendemos que o Fisco também pode lavrar o auto de infração por
meio da dispensa do MPF, desde que tenha todos os elementos e provas da prática
do ato ilícito.
Contudo, não é pacífico esse entendimento, havendo doutrinadores90 que
defendem que o contribuinte deve ter ciência da existência de um procedimento de
fiscalização, não podendo sofrer fiscalização sem ato de conhecimento.
Já o CARF tem o entendimento de que o Fisco pode dispensar o MPF, que é
procedimento interno da Administração, e sua ausência não afeta a validade do auto
de infração lavrado, confirmando nossa posição. Leia-se:
MANDADO DE PROCEDIMENTO FISCAL MPF. INSTRUMENTO
DE CONTROLE DA ADMINISTRAÇÃO. INEXISTÊNCIA QUE NÃO
CAUSA NULIDADE DO LANÇAMENTO. O Mandado de
Procedimento Fiscal MPF constitui-se em instrumento de controle
90
CARRAZZA, Roque Antonio; BOTTALLO, Eduardo D. Mandado de procedimento fiscal e
espontaneidade. Revista Dialética de Direito Tributário, n°. 80, Dialética, São Paulo, maio de 2002, p.
104; e NEDER, Marcos Vinicius; LÓPEZ, Maria Teresa Martinez. Processo administrativo fiscal
federal comentado. 2. ed. São Paulo: Dialética, 2004, p. 110-111.
62
criado pela Administração Tributária para dar segurança e
transparência à relação fisco-contribuinte, que objetiva assegurar ao
sujeito passivo que o agente fiscal indicado recebeu da
Administração a incumbência para executar a ação fiscal. Pelo MPF
o auditor está autorizado a dar início ou a levar adiante o
procedimento fiscal. (CARF, Recurso Voluntário, 4ª Câmara - 2ª
Turma Ordinária, Acórdão n°. 1402-001.661, Processo n°.
19740.000006/200483, sessão de 06/05/2014, Relator Conselheiro
Carlos Pelá).
O momento da lavratura do auto de infração é o de constituição em linguagem
competente da prática do ato ilícito e do ingresso da norma jurídica no ordenamento,
passando a existir e ter a sua validade presumida.
Lavrado o auto de infração, deve o contribuinte ser intimado para: a) tomar
conhecimento dos fatos relatados pelo Fisco, dando eficácia ao ato; e b) exercer o
seu direito de defesa, ou seja, o contraditório e a ampla defesa, uma vez que até o
presente momento não pode se manifestar quanto aos fatos apurados na
fiscalização. Isso posto, o auto de infração é lavrado com a exclusiva participação e
entendimento do Fisco, como veremos a seguir.
2. Auto de infração e o ato administrativo
A Administração Pública no exercício de suas funções pratica atos regidos por
regime jurídico de direito público e de direito privado. O Fisco é órgão da
Administração Pública.
63
Atos administrativos são os atos praticados pelo regime jurídico de direito
público que se apresentam por prerrogativas próprias.
A doutrina administrativista91 diverge quanto ao conceito de ato administrativo
por ausência de uma definição legal no direito positivo.
MARIA SYLVIA ZANELLA DI PIETRO92 destaca que há três critérios
adotados para a conceituação de ato administrativo: o critério subjetivo, orgânico ou
formal; o critério objetivo, funcional ou material; e o critério de espécie do ato
jurídico.
Pelo critério subjetivo, ato administrativo é o praticado exclusivamente pelos
órgãos administrativos. Esse critério exclui os atos administrativos praticados pelo
Poder Legislativo e Poder Judiciário no exercício de suas funções atípicas.
O critério objetivo determina que ato administrativo é o praticado “no exercício
concreto da função administrativa”93. Por esse critério, os três Poderes detêm
funções típicas inerentes as suas atribuições e funções atípicas, donde exercem, se
não preponderantemente, funções administrativas. Esse critério é insuficiente por
incluir atos da administração regidos por regimes jurídicos diferentes como ato
administrativo94. Dessa forma, há um acréscimo de mais um critério para a
91
Utilizaremos as doutrinas de Celso Antônio Bandeira de Mello (Curso de Direito Administrativo.
27. ed. São Paulo: Malheiros, 2011); Diogenes Gasparini (Direito Administrativo. 17. ed. São Paulo:
Saraiva, 2012); Hely Lopes Meirelles (Direito Administrativo Brasileiro. 36. ed. São Paulo: Malheiros,
2010); Lúcia Valle Figueiredo (Curso de direito administrativo. 9. ed. São Paulo: Malheiros Editores,
2008); e Maria Sylvia Zanella Di Pietro (Direito administrativo. 24. ed. São Paulo: Atlas, 2011).
92 DI PIETRO, op. cit., p. 194 e ss.
93 Id., p. 195.
94 Id., p. 196.
64
determinação de ato administrativo, que pode ser: o regime jurídico administrativo, a
potestade pública ou atos que contenham uma declaração de vontade.
O último critério consiste em determinar o ato administrativo como espécie de
ato jurídico95, utilizando-se de seu conceito com acréscimo de elementos que
integram o ato administrativo para diferenciá-los.
Entendemos que o critério que se mostra mais eficaz para a conceituação de
ato administrativo é o de espécie de ato jurídico96, por ser um ato que cria, modifica
e extingue direitos. Passamos a estudar a doutrina dos adeptos deste critério para
conceituamos ato administrativo.
Para HELY LOPES MEIRELLES97, ato administrativo é espécie de ato jurídico
qualificado pela “finalidade pública”. Entende que ato administrativo são os atos
unilaterais de manifestação de “vontade única da Administração”.
CELSO ANTONIO BANDEIRA DE MELLO98 entende que ato administrativo é
espécie de ato jurídico como declaração do Estado que opera com providências
jurídicas que se complementam na lei e sujeitam-se a controle de legalidade.
Diferencia os atos administrativos dos atos jurídicos: “[...] a) no que concerne às
condições de sua válida produção e b) no que atina à eficácia que lhe é própria”.
95
O CC de 2002 conceituou ato jurídico como negócio jurídico e prevê os seguintes requisitos: “Art.
104. A validade do negócio jurídico requer: I - agente capaz; II - objeto lícito, possível, determinado ou
determinável; III - forma prescrita ou não defesa em lei”.
96 Coincidem com nossa posição: Estevão Horvath (2010, p. 61); Karem Jureidini Dias de Mello
Peixoto (Auto de Infração de natureza tributária: pressuposto e presunção. 2001. 200f. Dissertação
(Mestrado em Direito), Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC/SP, São Paulo, 2001, p.
129); Paulo de Barros Carvalho (2011, p. 464); e Vivian de Freitas e Rodrigues de Oliveira (op. cit., p.
39).
97 MEIRELLES, op. cit., p. 153.
98 MELLO, op. cit., p. 371.
65
MARIA SYLVIA ZANELLA DI PIETRO99, nesse mesmo sentido, define: “[...]
ato administrativo como a declaração do Estado ou de quem o represente, que
produz efeitos jurídicos imediatos, com observância da lei, sob regime jurídico de
direito público e sujeita a controle pelo Poder Judiciário”100.
LÚCIA VALLE FIGUEIREDO101 entende que ato administrativo é a norma
concreta de declaração unilateral do Estado praticado por este ou por “quem esteja
no exercício da função administrativa” que tem a finalidade de criar, extinguir,
modificar ou declarar direitos.
Entendemos ser pertinente para o nosso estudo o conceito de LÚCIA VALLE
FIGUEIRO, no qual o ato administrativo é a) norma concreta de b) manifestação
unilateral do Estado que c) tem a finalidade de criar, modificar, extinguir ou declarar
relações jurídicas entre o Estado e os administrados.
Transportando esses elementos ao auto de infração, teremos: auto de
infração é o suporte físico que se apresenta com a norma concreta e individual (a),
lavrado exclusivamente pelo Fisco no exercício do poder de fiscalização (b), para
instaurar a relação jurídica entre o Fisco, que tem o direito subjetivo de receber a
pecúnia, e o contribuinte que tem o dever de recolher aos cofres públicos a
importância a título de descumprimento da norma jurídica tributária (c). Assim, pela
nossa definição, auto de infração é norma concreta, que se origina de um ato
unilateral do Estado para instaurar a relação jurídico-tributária em que o sujeito
passivo tem a obrigação de recolher aos cofres públicos a importância tributária.
99
DI PIETRO, op. cit., p. 192.
100 Id., p. 198.
101 FIGUEIREDO, op. cit., p. 173.
66
Dessa forma, o auto de infração é ato administrativo, que é norma jurídica, e
veicula outros atos administrativos: de lançamento tributário e de imposição de
penalidade.
Ademais, o ato administrativo tem regramento próprio que passamos a
estudar e aplicar no auto de infração.
3. Auto de infração e os atributos do ato administrativo
O ato administrativo tem um regime jurídico com prerrogativas de Direito
Público, dentre tais: atributos próprios que visam garantir a eficácia desses atos
produzidos unilateralmente pela Administração Pública.
A doutrina não é unânime nos atributos do ato administrativo. DIOGENES
GASPARINI102 elenca como atributos do ato administrativo: a presunção de
legitimidade, a imperatividade, a exigibilidade e a autoexecutoriedade. MARIA
SYLVIA ZANELLA DI PIETRO103 só discorda da exigibilidade, em que designa de
executoriedade, e inclui a tipicidade. HELY LOPES MEIRELLES104 exclui a
exigibilidade, prevendo que são três os atributos: presunção de legitimidade e
veracidade, imperatividade e autoexecutoriedade. E CELSO ANTONIO BANDEIRA
DE MELLO105 atribui a executoriedade em vez da autoexecutoriedade.
Entendemos que são atributos do ato administrativo: a presunção de
legitimidade e de veracidade; a tipicidade; a imperatividade, a exigibilidade e a
executoriedade.
102
Op. cit., p. 125.
103 Op. cit., p. 199.
104 Op. cit., p. 162.
105 Op. cit., p. 419.
67
Presunção de legitimidade e de veracidade se relaciona com o princípio da
legalidade106 inerente à Administração Púbica, segundo o qual só lhe é lícito fazer o
que a lei determina e segundo a forma prescrita, ou seja, o Direito. Assim, os atos
administrativos se presumem verdadeiros e de acordo com o regramento legal107 até
prova em contrário. Trata-se de presunção juris tantum. Contestada a legalidade do
ato administrativo cabe à Administração Pública provar a sua veracidade e
legitimidade108.
A tipicidade consiste em que o ato “deve corresponder à figura definida
previamente pela lei como aptas a produzir determinados resultados”109. Novamente
esse atributo decorre do princípio da legalidade e garante ao administrado que a
Administração não produza atos administrativos sem previsão legal.
A imperatividade se refere à obrigatoriedade de ser respeitado o ato
administrativo por seus destinatários, independentemente de sua concordância ou
consentimento110. Emanado o ato administrativo, se presume verdadeiro e perfeito,
vinculando a todos que ao ato se sujeitam, podendo até terceiros sofrerem as
consequências previstas. Nesse sentido, a Administração Pública detém a
“possibilidade unilateral de constranger terceiros à prática de prestações
106
O princípio da legalidade está previsto na CF: “Art. 37. A administração pública direta e indireta de
qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos
princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao
seguinte”.
107 GASPARINI, op. cit., p. 125.
108 Ibid., p. 125.
109 DI PIETRO, op. cit., p. 203.
110 GASPARINI, op. cit., p. 126.
68
determinadas pela Administração”111. Destaca MARIA SYLVIA ZANELLA DI
PIETRO112 que é um atributo que não existe em todos os atos administrativos, mas
somente nos que determinam obrigações. Nesse sentido, discorre CELSO
ANTONIO BANDEIRA DE MELLO113: “[...] Decorre do que Renato Alessi chama de
‘poder extroverso’, que permite ao Poder Público editar provimentos que vão além
da esfera jurídica do sujeito emitente, ou seja, que interferem na esfera jurídica de
outras pessoas, constituindo-as unilateralmente em obrigações”.
A exigibilidade possibilita à Administração Pública que exija do destinatário a
obediência às obrigações impostas no ato administrativo sem precisar ingressar no
Poder Judiciário. Visa garantir o cumprimento das disposições do ato, mas não tem
o fim de coagir coercitivamente o administrado. Assim, a Administração detém de
prerrogativas para fazer com que o administrado cumpra com as prescrições dos
atos administrativos.
A executoriedade determina que a Administração Pública pode executar o ato
administrativo sem a intervenção do Poder Judiciário. A doutrina114 conclui que para
existir no ato administrativo esse atributo é preciso: a) que esteja estabelecido em
lei; e b) se tratar de medida urgente; devendo ainda ser pautada na
proporcionalidade e razoabilidade.
No auto de infração se aplicam os atributos da presunção de legitimidade e
veracidade, tipicidade, imperatividade e exigibilidade, excluindo a executoriedade115.
111
FIGUEIREDO, op. cit., p. 190.
112 DI PIETRO, op. cit., p. 202.
113 MELLO, op. cit., p. 419.
114 DI PIETRO, op. cit., p. 202; e GASPARINI, op. cit., p. 128.
115 Cf. Fabiana Del Padre Tomé (2011/2012, p. 323); e Karem Jureidini Dias de Mello Peixoto (Op.
cit., p. 129).
69
Nesse contexto, divergimos de PAULO DE BARROS CARVALHO116 que
entende que a imperatividade não é atributo do ato administrativo tributário. O autor
entende o atributo de maneira diversa do exposto, descrevendo-a como a
prerrogativa da Administração em editar atos administrativos unilaterais em
conformidade com suas conveniências. Fundamenta o entendimento de que os atos
administrativos tributários são vinculados à lei, e a Administração não dispõe do
poder de decidir sobre a sua emissão ou não, bem como “agravar a conduta do
administrado”.
Contudo, realmente a executoriedade117 não está presente no ato
administrativo tributário, em que o não cumprimento da obrigação veiculada enseja
ao Fisco o dever de inscrever em Dívida Ativa o crédito tributário para constituir o
título executivo e torná-lo líquido, certo e exigível para propor a execução fiscal.
4. Auto de infração e os requisitos do ato administrativo
Os requisitos do ato administrativo são os elementos que devem estar
presentes ao serem emanados os atos administrativos para que sejam perfeitos e
válidos, aptos a produzirem efeitos118.
No direito administrativo há duas correntes que descrevem os requisitos do
ato administrativo e se utilizam de denominações divergentes119 como requisitos,
elementos e pressupostos.
116
CARVALHO, 2011, p. 486.
117 CARVALHO, 2011, p. 486-487.
118 GASPARINI, op. cit., p, 113.
119 DI PIETRO, op. cit., p. 204.
70
A primeira corrente120, se baseando no disposto no art. 2°121 da Lei n°.
4.717/65, determina que os requisitos do ato administrativo são: competência, forma,
objeto, motivo e finalidade. HELY LOPES MEIRELLES122 acrescenta, ainda, o mérito
administrativo e o procedimento administrativo.
A segunda corrente123 divide os requisitos do ato administrativo em: a)
elementos intrínsecos, que fazem parte de um todo e são internos a este; e b)
pressupostos, que são externos ao ato, e se classificam em: de existência e de
validade. Os elementos são o conteúdo e a forma. Os pressupostos de existência
são: o objeto e a pertinência do ato ao exercício da função administrativa; e os
pressupostos de validade são: 1) pressuposto subjetivo (sujeito); 2) pressupostos
objetivos (motivo e requisitos procedimentais); 3) pressuposto teleológico
120
DI PIETRO; op. cit., p. 204; e GASPARINI, op. cit., p. 113.
121 Art. 2º São nulos os atos lesivos ao patrimônio das entidades mencionadas no artigo anterior, nos
casos de: a) incompetência; b) vício de forma; c) ilegalidade do objeto; d) inexistência dos motivos; e)
desvio de finalidade. Parágrafo único. Para a conceituação dos casos de nulidade observar-se-ão as
seguintes normas: a) a incompetência fica caracterizada quando o ato não se incluir nas atribuições
legais do agente que o praticou; b) o vício de forma consiste na omissão ou na observância
incompleta ou irregular de formalidades indispensáveis à existência ou seriedade do ato; c) a
ilegalidade do objeto ocorre quando o resultado do ato importa em violação de lei, regulamento ou
outro ato normativo; d) a inexistência dos motivos se verifica quando a matéria de fato ou de direito,
em que se fundamenta o ato, é materialmente inexistente ou juridicamente inadequada ao resultado
obtido; e) o desvio de finalidade se verifica quando o agente pratica o ato visando a fim diverso
daquele previsto, explícita ou implicitamente, na regra de competência.
122 MEIRELLES, op. cit., p. 155.
123 MELLO, op. cit., p. 392.
71
(finalidade); 4) pressuposto lógico (causa); e 5) pressuposto formalístico
(formalização)124.
Dentre as correntes, optamos pela segunda, pois concordamos que os
requisitos do ato administrativo compreendem elementos internos e pressupostos
externos que não podem ser tratados como de mesma classe125.
Contudo, discordamos de que haja o pressuposto de existência. Entendemos
que quando a norma passa a existir pertence ao ordenamento jurídico por ter
ingressado neste. Dentro do ordenamento não se discute a existência ou
inexistência da norma, em razão de já pertencer ao sistema, verifica-se a sua
validade ou invalidade como relação de pertinencialidade. A invalidade, quando é
reconhecida, é decretada pela introdução de outra norma no sistema que reconheça
o vício e a retire do ordenamento. Só nesse momento é que deixa de pertencer ao
sistema, não por ser inexistente, mas por ter um defeito que afeta a sua validade.
Dessa forma, não trabalhamos com essa classe.
Ademais, conforme ilustraremos, nos elementos intrínsecos elencamos a
motivação como sua parte integrante126.
Passamos a discorrer sobre os requisitos do ato administrativo, aplicando-os
no auto de infração quanto aos elementos intrínsecos e os pressupostos de
validade.
124
Ibid., p. 392-393.
125 Posição de Paulo de Barros Carvalho (2011, p. 475); Estevão Horvath (2010, p. 61); Vivian de
Freitas e Rodrigues de Oliveira (Op. cit., p. 58); e Fabiana Del Padre Tomé (2011/2012, p. 325).
126 Coincide com nosso entendimento Fabiana Del Padre Tomé (2011/2012, p. 325).
72
4.1. Elementos intrínsecos
Os elementos intrínsecos são o conteúdo, a forma e a motivação.
O auto de infração é norma concreta e individual que se apresenta com um
antecedente que implica um consequente. No antecedente há o relato em linguagem
competente da ocorrência do evento e a constituição do fato jurídico tributário ilícito
identificado pelos critérios material, temporal e espacial; e no consequente a
instauração da relação jurídica tributária entre o contribuinte e o Fisco reconhecida
pelos critérios pessoal e quantitativo.
O conteúdo é o que está prescrito no ato administrativo com a finalidade de
modificar a ordem jurídica. Utilizando-se dos ensinamentos de CELSO ANTONNIO
BANDEIRA DE MELLO: “[...] é o que o ato dispõe, isto é, o que o ato decide,
enuncia, certifica, opina ou modifica na ordem jurídica. É, em suma, a própria
medida que produz a alteração na ordem jurídica”127.
Discorrendo sobre o conteúdo do ato administrativo e do lançamento
tributário, há duas posições doutrinárias no direito tributário: a) entende128 que o
conteúdo no lançamento é a instauração da relação jurídica tributária com a
identificação dos sujeitos e a quantificação do crédito tributário. Está presente no
consequente da norma concreta e individual129; e b) entende130 que é a norma
concreta e individual em sua integralidade, com o antecedente descrevendo o fato
jurídico tributário e o consequente, a instauração da relação jurídica tributária, com a
identificação dos sujeitos e quantificação do objeto.
127
MELLO, op. cit. p. 393-394.
128 HORVATH, 2010, p. 61-62.
129 GUERRA, op. cit., p. 35; e TOMÉ, Fabiana Del Padre, 2011/2012, p. 326.
130 CARVALHO, 2011, p. 476.
73
Temos o entendimento de que o conteúdo do auto de infração é o
consequente da norma jurídica, ou seja, a instauração da relação jurídica tributária e
a quantificação do tributo ou penalidade.
O consequente da norma jurídica prescreve o comportamento que é
determinado pela ordem jurídica e apresenta-se pelos modais deôntico: proibido,
permitido ou obrigatório. Dessa forma, é nesse elemento da estrutura da norma
jurídica que estará presente a enunciação pretendida pelo ato administrativo
emanado, ou seja, o conteúdo.
A forma131 do ato administrativo é o modo que se manifesta sua existência, é
a sua exteriorização. Geralmente os atos administrativos têm forma escrita.
No auto de infração, a forma é escrita para o fim de garantir ao contribuinte o
direito ao contraditório e a ampla defesa.
A motivação consiste na exposição dos motivos que fundamentam a
expedição do ato. É obrigatória nos atos, salvo quando o ato for vinculado e for
possível identificá-lo no motivo do ato, requisito externo do ato administrativo
presente no pressuposto objetivo132.
FABIANA DEL PADRE TOMÉ133 explica que a motivação se aperfeiçoa com o
relato do motivo e a linguagem das provas, visto que pelas provas apresentadas se
constata a ocorrência no espaço-tempo do motivo do ato.
131
Maria Sylvia Zanella Di Pietro entende que a forma tem duas acepções: uma ampla e outra
restrita. Na acepção restrita é a maneira que o ato é exteriorizado, podendo ser escrito ou verbal. Na
acepção ampla é a acepção restrita acrescida das formalidades previstas no processo de formação
do ato (Op. cit., p. 210).
132 MELLO, op. cit., p. 403.
133 TOMÉ, 2011/2012, p. 328.
74
No auto de infração, a motivação está no antecedente da norma que relata
em linguagem competente o evento ilícito praticado pelo contribuinte e constitui o
fato jurídico tributário ilícito134.
Assim, relacionando os conceitos estudados com os requisitos de lavratura do
auto de infração, o conteúdo e a motivação do ato administrativo estão previstos nos
incisos I, II, III, IV, e V do art. 10 do PAF135, sendo:
O inciso I prevê a qualificação do autuado. Essa previsão determina o sujeito
passivo da obrigação. Consiste em elemento do consequente da norma jurídica do
auto de infração, critério pessoal. Trata do conteúdo do ato administrativo.
O inciso II determina que deve conter no auto de infração o local, a data e a
hora de sua lavratura. Esse elemento fixa o critério temporal e espacial, componente
do antecedente da norma jurídica do auto de infração. Trata da motivação do ato
administrativo.
O inciso III e IV determinam que deve haver a descrição dos fatos, a
disposição legal infringida e a penalidade aplicável. O Auditor-Fiscal da RFB relata
os fatos que apurou na fiscalização, elenca as provas que possui e determina a
norma aplicável. Trata-se da motivação, em que se relata em linguagem competente
o evento tributário ilícito, constituindo o fato jurídico tributário. É o antecedente da
norma do auto de infração no critério material.
134
CARVALHO, 2011, p. 477; GUERRA, op. cit., p. 34; PEIXOTO, op. cit., p. 131; SANTI, 2010, p. 83-
84; e TOMÉ, 2011/2012, p. 327.
135 Colabora com o nosso entendimento Marcos Vinicius Neder, só divergindo, quando a
denominação do motivo do ato que entendemos ser a motivação (Nulidades no lançamento. 2013.
Tese (Doutorado em Direito) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP, São Paulo,
2013, p. 146-149).
75
No inciso V está previsto a determinação da exigência e a intimação para
cumpri-la ou impugná-la. A segunda parte se refere à publicidade, que é
pressuposto do ato administrativo e veremos a seguir. Já a determinação da
exigência é elemento do consequente no critério quantitativo, em que se determina o
montante a ser recolhido aos cofres públicos. Trata do conteúdo do ato
administrativo.
Assim, temos no auto de infração na sua estrutura como norma jurídica de um
antecedente implica um consequente compostos pelos: a) critério material – a
descrição dos fatos, a disposição legal infringida e a penalidade aplicável; b) o
critério temporal e espacial: local, data e hora da lavratura do auto de infração; c)
critério pessoal, especialmente o sujeito passivo: qualificação do autuado; e d)
critério quantitativo: determinação da exigência.
Sistematizando:
4.2. Pressupostos de validade
Os pressupostos de validade, que são externos ao ato administrativo,
compreendem os pressupostos: subjetivo, objetivo, teleológico, lógico e formalístico.
76
O pressuposto subjetivo se refere ao sujeito que produz o ato, ou seja, o
agente que tem competência136 para a prática do ato administrativo. Competência se
diferencia de sujeito por ser “o plexo de atribuições outorgadas pela lei ao agente
administrativo para consecução do interesse público postulado pela norma”137.
No auto de infração, o pressuposto subjetivo é a autoridade administrativa a
quem a lei confere a competência legal para fiscalizar e lavrar o auto de infração138,
que conforme a alteração legislativa passa a ser o Auditor-Fiscal da RFB139.
Diferencia-se do sujeito ativo no consequente da norma jurídica, que tem o direito
subjetivo de exigir o cumprimento da obrigação imposta no auto de infração e é o
ente tributante.
Nos requisitos do auto de infração temos esse elemento no caput e no inciso
VI140 do art. 10 do PAF.
No caput do artigo há a previsão de que deve ser lavrado o auto de infração
por servidor competente, e no inciso VI determina-se a qualificação do funcionário
que lavrou o auto de infração para o fim de verificar a legalidade do ato produzido
em conformidade com as atribuições do agente público, ou seja, a sua competência.
Os pressupostos objetivos compreendem os requisitos procedimentais e o
motivo do ato.
Os requisitos procedimentais são os procedimentos, como sequência de atos,
previstos em norma para a formação do ato administrativo.
136
Fabiana Del Padre Tomé denomina de competência, mas preferimos usar sujeito competente
(2011/2012, p. 325).
137 FIGUEIREDO, op. cit., p. 200.
138 CARVALHO, 2011, p. 476; e HORVATH, 2010, p. 62.
139 Decreto n°. 8.303/2014 e Portaria RFB 1.687/2014.
140 NEDER; LÓPEZ, 2004, p. 185.
77
EURICO MARCOS DINIZ DE SANTI141 destaca que o último ato do
procedimento e essencial para a “juridicização do enunciado do ato
administrativo”142 é a publicidade.
Esse pressuposto não é previsto para todos os atos administrativos, mas os
que têm previsão normativa devem ser observados na sua formação.
Na lavratura do auto de infração, o procedimento consiste na emissão de
MPF, que conforme discorremos, pode ser dispensado. Tem previsão nos arts. 7°,
8° e 9°, todos do PAF, não fazendo parte do rol do art. 10 do diploma.
A publicidade, como último ato do procedimento, é no auto de infração a
comunicação ao contribuinte da exigência que lhe é feita. É elemento essencial à
sua lavratura. Com esse ato, o auto de infração se torna inalterável, nos termos do
art. 145 do CTN143. Está previsto no inciso V (segunda parte) do art. 10 do PAF,
quando determina: “intimação para cumpri-la ou impugná-la no prazo de 30 (trinta)
dias” 144.
O motivo do ato consiste no “[...] pressuposto de fato que autoriza ou exige a
prática do ato. É, pois, a situação do mundo empírico que deve ser tomada em conta
para a prática do ato”145.
141
Eurico Marcos Diniz de Santi (2010, p. 81); Karem Jureidini Dias de Mello Peixoto (Op. cit., p. 132);
e Renata Rocha Guerra (Op. cit., p. 33).
142 SANTI, 2010, p. 82.
143 Art. 145. O lançamento regularmente notificado ao sujeito passivo só pode ser alterado em virtude
de: I - impugnação do sujeito passivo; II - recurso de ofício; III - iniciativa de ofício da autoridade
administrativa, nos casos previstos no artigo 149.
144 NEDER; LÓPEZ, 2004, p. 185.
145 MELLO, op. cit., p. 397.
78
No auto de infração, o motivo do ato administrativo é a ocorrência do evento
que dará suporte ao seu relato em linguagem competente para constituir o fato
jurídico tributário ilícito previsto no antecedente da norma concreta e individual. Ou
seja, é o acontecimento no mundo fenomênico que tem previsão no antecedente da
norma abstrata e geral.
O pressuposto teleológico é a finalidade146, e consiste no objetivo que deve
ser alcançado com a expedição do ato administrativo. Vem delimitado em lei.
LÚCIA VALLE FIGUEIREDO147 diferencia finalidade imediata de finalidade
mediata. A finalidade imediata também é chamada de fim, e a mediata é a que “visa
a atuar a vontade normativa, o interesse público que pode estar apenas subjacente
na norma”. Concordamos com essa distinção e no auto de infração há a finalidade
mediata, o interesse público, e a finalidade imediata aplicação da “coação
administrativa”148.
146
Eurico Marcos Diniz de Santi critica esse pressuposto por entender que como só é possível auferi-
lo quando do ato já produzido não pode ser nem elemento e nem pressuposto do ato administrativo.
Determina que a finalidade é: “[...] a finalidade, é nexo lógico internormativo. É dada pelo cotejo entre
a prescrição da finalidade legal que designa a relação intranormativa (o ‘conteúdo’) em abstrato (na
norma jurídica que regula a criação do ato-norma) e o fim concreto, prescrito pela relação jurídica
intranormativa do ato-norma (‘conteúdo do ato’). É a concatenação semântica, entre o ‘conteúdo
legal’ e o ‘conteúdo do ato-norma’, é, pois, a relação hiponímica que se estabelece entre estes
enunciados prescritivos, i.é., relação que ‘intercorre entre expressões com sentido mais específico e
expressões genéricas’” (2010, p. 79).
147 FIGUEIREDO, op. cit., p. 203.
148 CARVALHO, 2011, p. 477; e HORVATH, 2010, p. 63-64.
79
O pressuposto lógico é a causa149. A causa é a relação lógica que deve existir
entre o motivo, a motivação e o conteúdo do ato150. KAREM JUREIDINI DIAS DE
MELLO PEIXOTO151 observa que a causa deve ser analisada sob dois aspectos da
causalidade jurídica: intranormativa e internormativa. A relação intranormativa,
dentro da norma concreta e individual, consiste na relação de adequação entre o
fato jurídico tributário e a obrigação tributária, ou seja, a implicação do antecedente e
o consequente; e a relação internormativa, fora da norma concreta e individual, é a
subsunção, ou seja, a relação entre a norma abstrata e geral e a norma concreta e
individual. Concordamos com o entendimento e o aplicando no auto de infração
entendemos que deve haver relação de adequação entre antecedente e
consequente pela implicação; e na subsunção da norma abstrata e geral com a
norma concreta e individual introduzida.
Por fim, o pressuposto formalístico. É a formalização e compreende a forma
específica prevista em lei para o ato administrativo ser exteriorizado.
No auto de infração, o suporte físico152 é a formalização, ou seja, o próprio
auto de infração em sua essência, conforme nosso entendimento.
Sistematizamos:
149
Eurico Marcos Diniz de Santi critica a causa como pressuposto. Explica que ela é elemento interno
do ato-norma, mas que não pode ser um elemento, posto que os elementos ao ato-norma são as
variáveis e a causa é uma constante lógica (2010, p. 78.).
150 FIGUEIREDO, op. cit., p. 204; GASPARINI, op. cit., p. 120; MELLO, op. cit., p. 408; e OLIVEIRA,
op. cit., p. 61.
151 PEIXOTO, op. cit., p. 135-136.
152 TOMÉ, 2011/2012, p. 324-326.
80
Feitas essas considerações sobre o auto de infração e seus requisitos,
passamos a estudar a invalidade, suas espécies, os vícios e seus efeitos.
81
CAPÍTULO IV – INVALIDADE DO AUTO DE INFRAÇÃO
1. Histórico da teoria da nulidade
A teoria da nulidade teve origem no Direito Privado ao estudar os defeitos dos
atos jurídicos153.
Nos primeiros tempos do Direito Romano154, a nulidade era considerada como
um ato inexistente, que por conter um vício grave que comprometia a sua essência,
não ingressava no ordenamento jurídico. Foi denominado de ato nulo de pleno
direito, porque não produzia efeito jurídico ab initio e era reconhecido nessa
qualidade automaticamente, sem a necessidade de um pronunciamento da
autoridade competente. Assim, nesse momento histórico existiam: a) os atos
jurídicos válidos e existentes; e b) os atos nulos e inexistentes.
Durante o Direito Pretoriano, ainda no Direito Romano, o pretor155 criou o
restitutio in integrum. Tratava de uma espécie de reparação com o fim de reconhecer
a invalidade de atos jurídicos existentes. Essa reparação dependia de propositura de
153
MIRANDA, 2012, t. IV, p. 71; MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil, v. 1: parte
geral. 40. ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 318-319.
154 O Direito Romano é o conjunto de normas aplicadas no território do Império Romano e Império
Romano do Ocidente. Consistiu de um Corpo de Direito Civil que influenciou e continua a influenciar
as legislações. O Direito Romano pode ser divido em quatro fases segundo a evolução das normas
jurídicas, sendo o Direito Pretoriano uma das suas fases.
155 Pretor era um cargo honorário que não tinha poder de legislar ou criar direito novo, mas que
tomava decisões que possuíam proteção legal. Essas decisões influenciaram o Direito Civil, o
complementando e corrigindo, e foram incorporados ao Corpo de Direito Civil.
82
ação judicial declaratória de nulidade. Surgiu, daí, uma nova classe de atos jurídicos:
os existentes que poderiam ser decretados nulos.
Assim, no Direito Romano havia duas espécies de nulidades: a) a de pleno
direito que operava automaticamente e era considerada como um ato inexistente; e
b) a pretoriano que dependia da propositura de uma ação judicial para o seu
reconhecimento.
A evolução nos estudos constatou que essas duas espécies de nulidades se
mostravam inadequadas porque o ato inexistente (nulo de pleno direito) não tinha
relevância jurídica.
Dessa forma, passou a diferenciar a nulidade de inexistência, atribuindo três
classes de atos defeituosos em relação à gravidade do vício: a) o ato inexistente, em
que o defeito no ato estava na sua essência, ou seja, um vício gravíssimo que
comprometia o seu ingresso no ordenamento jurídico, a sua existência jurídica; b) a
nulidade em que o ato jurídico tinha um vício grave que não afetava a sua essência,
mas ofendia a ordem jurídica ou os bons costumes, ou que não tinha sido observada
a forma legal; e c) a anulabilidade em que o ato jurídico tinha um vício de menor
gravidade que afetava a declaração de vontade, a capacidade ou o consentimento.
Dessa evolução se originou a clássica e fundamental divisão das invalidades
em nulidade e anulabilidade156.
156
Há autores que atribuem como sinônimo as denominações de nulidade absoluta para as causas
de nulidades e nulidade relativa para as anulabilidades (DE PASSOS, José Joaquim Calmon. Esboço
de uma teoria das Nulidades aplicada às nulidades processuais. Rio de Janeiro: Forense, 2009;
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, volume 1: teoria geral do direito civil. 27. ed. São
Paulo: Saraiva, 2010, p. 557 e ss.; GRINOVER; FERNANDES; GOMES FILHO, 2011, p. 22.). Pontes
de Miranda faz uma crítica a esses autores, pois esses termos seriam adequados para relacionarem-
se à eficácia do ato e não às causas de invalidade, em que os: “[...] limites subjetivos da eficácia:
83
Nessa perspectiva, ressaltamos que os atos inexistentes, por não chegarem a
ingressarem no ordenamento jurídico, não têm relevância jurídica e,
consequentemente, não interessam ao direito. Ato inexistente é um nada, não
existe, não é regulado pelo direito porque não se regula o “nada”. Logo, não
interessam ao nosso estudo. Entendemos que se não há o relatado em linguagem
competente do evento, o ato não ingressa no sistema, e, consequentemente, não é
ato jurídico. Está no mundo fenomênico e não pertence ao mundo jurídico.
Já a nulidade e a anulabilidade são espécies de invalidade que não
comprometem o ingresso do ato jurídico no ordenamento jurídico. Elas têm
existência jurídica, mas o defeito pode comprometer a sua validade e, em
decorrência, a eficácia jurídica. Esses atos se enquadram na classe dos atos
inválidos e serão o objeto do nosso estudo.
No mais, atualmente, há uma nova classe: das meras irregularidades.
Entendemos que essa classe não se enquadra nos atos inválidos ou inexistentes.
Trataremos delas em um ponto à parte por ser elemento essencial à análise dos
requisitos do auto de infração e suas invalidades.
2. Invalidade no Direito Civil
O legislador civil regulou as causas de invalidades dos atos jurídicos,
trabalhando com a clássica divisão dicotômica: nulidade e anulabilidade. Nesse
sistema não há a classe dos atos inexistentes.
relativa é a eficácia só atinente a um, ou a alguns; absoluta, a eficácia erga omnes” (2012, t. IV, p.
94). Assim, optamos em utilizar a designação de nulidade e de anulabilidade.
84
Ato jurídico nulo é aquele que pode conter um vício: a) na capacidade do
agente que é absolutamente incapaz; b) no objeto, quando for ilícito; c) no
desrespeito à forma prescrita em lei; e d) quando a lei o considerar nulo157.
Já o ato anulável é o que pode conter um vício: a) na capacidade, quando
praticado por relativamente incapaz; b) no resultado pretendido, quando praticado
com erro, dolo, coação, estado de perigo, lesão ou fraude contra credores; e c)
quando a lei expressamente declarar anulável158.
Assim, pode-se perceber que há uma sistematização dos defeitos que geram
a nulidade e a anulabilidade dos atos jurídicos, cabendo à doutrina estabelecer as
diferenças entre as espécies de invalidade segundo a sistematização legal.
Sistematizando a legislação, há cinco critérios diferenciadores da nulidade e
anulabilidade descritos pela doutrina159: a) quanto ao grau do vício; b) quanto aos
efeitos que produz; c) quanto à legitimidade para sua arguição; d) quanto à
possibilidade de sua ratificação; e e) quanto à prescrição. Contudo, o critério do grau
do vício é a matriz de aplicabilidade dos demais critérios. Vejamos a seguir:
Os graus de vícios são: vício grave e vício de menor gravidade. O vício grave
ofende a ordem pública ou afeta elemento essencial de validade do ato. Esse tipo de
157
Art. 166. É nulo o negócio jurídico quando: I - celebrado por pessoa absolutamente incapaz; II - for
ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto; III - o motivo determinante, comum a ambas as
partes, for ilícito; IV - não revestir a forma prescrita em lei; V - for preterida alguma solenidade que a
lei considere essencial para a sua validade; VI - tiver por objetivo fraudar lei imperativa; VII - a lei
taxativamente o declarar nulo, ou proibir-lhe a prática, sem cominar sanção.
158 Art. 171. Além dos casos expressamente declarados na lei, é anulável o negócio jurídico: I - por
incapacidade relativa do agente; II - por vício resultante de erro, dolo, coação, estado de perigo, lesão
ou fraude contra credores.
159 CARVALHO, 2010, p. 697.
85
vício acarreta a nulidade do ato. Os vícios de menor gravidade são os que não
afetam elementos essenciais de validade do ato jurídico e nem a ordem pública. São
considerados como atos anuláveis, acarretando a anulabilidade160.
A produção dos efeitos se relaciona ao grau do vício. O vício grave tem efeito
ex tunc e é invalidado por nulidade. Já vício de menor gravidade tem efeitos ex
nunc, os quais são produzidos até a decretação de invalidade161, e são inválidos por
anulabilidade.
A legitimidade de arguição também se relaciona ao grau do vício. Os atos
nulos têm vícios que ofendem elementos essenciais de validade ou a ordem pública,
e sua arguição pode ser por qualquer das partes, pelo Ministério Público ou
reconhecido de ofício pelo Juiz162. Já os atos anuláveis que têm vícios em elementos
não essenciais de validade do ato dependem, para a sua decretação de invalidade,
de alegação pela parte interessada que não pode ter dado causa ao vício. A
decretação de invalidade gera os seguintes efeitos em relação às partes: atos nulos
têm efeitos erga omnes, e atos anuláveis efeitos inter partes.
Mais uma vez relacionando à gravidade do vício, temos a aplicação do critério
de ratificação do ato jurídico. Os atos nulos com vício grave são irratificável; e os
atos anuláveis com vício de menor gravidade podem ser ratificados.
Quanto à prescritividade163, os atos nulos são imprescritíveis; e os atos
anuláveis são prescritíveis, dos quais decorrido o prazo prescricional, o ato se torna
válido e apto a produzir os efeitos jurídicos164.
160
DINIZ, 2010, p. 558; MIRANDA, 2012, t. IV, p. 82.
161 FERRAZ JÚNIOR, op. cit., p. 183; DE PASSOS, op. cit., p. 127-129; DINIZ, op. cit., p. 558.
162 Pontes de Miranda adverte que é um erro condicionar o ato nulo à decretação de ofício pelo juiz
(2012, t. IV, p. 112).
163 MIRANDA, 2012, t. IV, p. 82; DINIZ, op. cit., p. 568-569.
86
Inegável determinar que o grau do vício é o critério diferenciador e pertinente
entre as espécies de invalidade aplicadas no Direito Civil, em que: a) o vício que
ofende a ordem jurídica e compromete a harmonia e integridade do ordenamento
jurídico é grave e decretado inválido por nulidade; e b) o vício que não é essencial e
não compromete a ordem jurídica é passível de decretação de invalidade por
anulação.
Assim, segundo a exposição, a invalidade aplicada no Direito Civil comporta a
seguinte sistematização:
164
Pontes de Miranda critica a ideia de que ocorrida a prescrição para a ação de anulação do ato
jurídico, o mesmo se torna válido. Esclarece que o que há é a renúncia à prescrição. (Ibid., p. 102).
87
3. Invalidade no Direito Administrativo
Até o presente momento apresentamos considerações sobre a teoria da
nulidade aplicada ao Direito Privado. A transposição dessa teoria ao Direito
Administrativo requer adaptações. O Direito Civil é ramo de direito privado que opera
à vontade das partes, e o Direto Administrativo, ramo do Direito Público, tem
regimento próprio que se diferencia dos regimes de Direito Privado. Por exemplo,
vigora o princípio da legalidade, em que não opera a vontade das partes, mas as
prescrições previstas em lei; e o princípio do interesse público que se sobrepõe ao
interesse privado.
O objeto da teoria da nulidade no Direito Administrativo é o ato administrativo,
que é espécie de ato jurídico165.
Nesse ramo, há três grandes correntes sobre a invalidade.
A primeira corrente166 entende que a invalidade é gênero e que são suas
espécies: os atos inexistentes, atos nulos e anuláveis. A possibilidade de
convalidação do vício é o critério de distinção entre as espécies. Os atos
inexistentes estão no campo do impossível jurídico e se apresentam com um vício
grave que não pode ser objeto de convalidação e não ingressam no ordenamento
jurídico, sendo vedados pelo Direito167. Os atos nulos são os que a lei assim declarar
ou que são insuscetíveis de convalidação, podendo ser reconhecidos de ofício pelo
Juiz. Já os atos anuláveis são os declarados como tais pela lei e os suscetíveis de
convalidação, que somente podem ser reconhecidos por provocação das partes.
165
Ver capítulo III, item 2.
166 MELLO, op. cit., p. 465.
167 Id., p. 473-474.
88
Assim, na classe dos vícios convalidáveis, temos a anulação, e dos inconvalidáveis,
os atos inexistentes e os nulos168.
A segunda corrente169 entende que na classe dos atos administrativos
inválidos só existem os atos nulos. Explicam que o direito privado trabalha com
diferenciação entre ato nulo e ato anulável em relação ao vício afetar ou não à
ordem pública. Havendo violação à ordem pública há a decretação de nulidade, e
não sendo violada de anulabilidade. Como todos os atos administrativos são normas
de ordem pública por aplicação do princípio da legalidade, estão, portanto, na classe
dos atos nulos.
A terceira corrente170 entende que no direito administrativo há os atos nulos e
atos anuláveis. Esclarece que os atos administrativos inválidos se distinguem pela
possibilidade de sua convalidação ou não, em que o vício passível de ser sanado é
ato anulável, e o vício em que é insanável é ato nulo.
Assim, no direito administrativo, há divergências quanto à classe de atos
administrativos inválidos e o critério diferenciador aplicado.
Em que pese a segunda corrente, não podemos aceitá-la. Concordamos que
no Direito Administrativo as normas são de ordem pública, mas entendemos que o
critério da possibilidade de convalidação ou não do vício, quanto aos requisitos do
ato administrativo, é válida e elemento de distinção entre os atos nulos e anuláveis
aplicáveis ao Direito Administrativo.
168
Id., p. 475.
169 GASPARINI, op. cit., p.164; e MEIRELLES, op. cit., p. 176.
170 DI PIETRO, op. cit., p. 247.
89
Esse critério tem previsão legal no art. 55171 da LPA que dispõe que havendo
a possibilidade de convalidação do ato administrativo, não será decretação a
invalidade.
Além do critério da convalidação, o dispositivo determina que para a
invalidade dos atos administrativos deve ser aplicado o princípio do prejuízo172.
Dessa forma, entendemos que a possibilidade ou não de convalidação do ato
administrativo e o princípio do prejuízo são os critérios diferenciadores das espécies
de invalidade aplicáveis no Direito Administrativo. Nossa posição é confirmada pelo
entendimento do STJ. Leia-se:
ADMINISTRATIVO – ANULAÇÃO DE ATO ADMINISTRATIVO –
SERVIDORES INVESTIDOS EM CARGOS PÚBLICOS APÓS
CONCURSO PÚBLICO. TEMPERAMENTOS À SÚMULA 473 DO
STF. A regra enunciada no verbete n° 473 da Súmula do STF deve
ser entendida com algum temperamento: no atual estágio do direito
brasileiro, a Administração pode declarar a nulidade de seus
próprios atos, desde que, além de ilegais, eles tenham causado
lesão ao Estado, sejam insuscetíveis de convalidação e não
tenham servido de fundamento a ato posterior praticado em
outro plano de competência. É vedado ao Estado sob o pretexto de
que houve irregularidades formais desconstituir unilateralmente a
investidura de servidores nomeados mediante concurso público.
(STJ, RMS n°. 407/MA, Relator Ministro Gomes de Barros, Data do
171
Art. 55. Em decisão na qual se evidencie não acarretarem lesão ao interesse público nem prejuízo
a terceiros, os atos que apresentarem defeitos sanáveis poderão ser convalidados pela própria
Administração.
172 MEIRELLES, op. cit., p. 206; e FIGUEIREDO, op. cit., p. 256.
90
Julgamento: 07/08/1991 e Data da Publicação: 02/09/1991). (negrito
próprio)
AGRAVO REGIMENTAL EM MANDADO DE SEGURANÇA.
INDEFERIMENTO DO PEDIDO DE MEDIDA LIMINAR.
PROCURADOR DA FAZENDA NACIONAL. CONCURSO DE
PROMOÇÃO. REQUISITO. CONCLUSÃO DO ESTÁGIO
PROBATÓRIO. PRAZO. TRÊS ANOS. FUMUS BONI JURIS NÃO
CONFIGURADO. 1. O estágio probatório é o período compreendido
entre a nomeação e a aquisição da estabilidade. Após a Emenda
Constitucional n.º 19/98, seu prazo passou a ser de 3 anos,
acompanhando a alteração para aquisição da estabilidade, não
obstante tratar-se de institutos distintos. Precedente da Terceira
Seção. 2. A convalidação de atos administrativos só é permitida,
nos termos do disposto no art. 55 da Lei n. 9.784/99, para os
vícios sanáveis. 3. Para se verificar a possibilidade de incidência do
art. 55 da Lei n. 9.784/99 na hipótese do mandamus é necessária a
análise apurada de fatos e circunstâncias, tarefa essa incompatível
com o exame de pedido liminar, que exige a verificação de plano do
fumus boni juris. 4. Agravo regimental improvido. (STJ, AgRg no MS
nº. 14.396/DF (2009/0109384-5), Relator Ministro Jorge Mussi, Data
de Julgamento: 28/10/2009 e Data de Publicação: 26/11/2009).
(negrito colocado)
Nesse mesmo sentido, DIOGENES GASPARINI173 descreve os requisitos
para a invalidação do ato administrativo:
173
GASPARINI, op. cit., p.163.
91
Embora seja assim, é certo dizer que esse poder da Administração
Pública não é absoluto. Não basta para praticá-lo que o ato seja
inválido (RT, 747:195). Com efeito, para que a invalidação seja legal,
o ato invalidado deve ser ilegal, ter causado um dano à
Administração Pública sua emitente ou a terceiro, ser inconvalidável
e não ter servido de fundamento para a prática de ato em outro plano
de competência, conforme decidiu o Superior Tribunal de Justiça.
Portanto, quanto às duas correntes restantes, a única diferença é a inclusão
dos atos inexistentes na classe de atos inválidos e inconvalidáveis. Ato inexistente
não existe no ordenamento jurídico, não foi constituído em linguagem competente e
não pertence ao sistema. Logo, não tem relevância jurídica. Entendemos que por
estar fora do Direito, não é e não deve ser objeto de estudo. Dessa forma, excluímos
a classe dos atos inexistentes.
Restam os atos nulos e anuláveis com os critérios de distinção: a
possibilidade de convalidação ou não do vício, e o princípio do prejuízo. Nesse
momento destacamos a convalidação. Assim, o que é convalidação?
Convalidação174 é a substituição do ato ilegal por um ato legal que gera
efeitos retroativos. O ato ilegal é um ato com defeito em que não foram observadas
as formalidades previstas em lei. Logo, para torná-lo legal e “válida” a produção dos
174
A convalidação não se confunde com a conversão de atos nulos. A diferença consiste na produção
dos efeitos, em que na convalidação os efeitos são os do “ato ilegal”, e na conversão são efeitos
retroativos, mas próprios do novo ato, como se tivesse sido esse ato expedido ao tempo do ato nulo
(MELLO, op. cit., p. 479). A conversão não é critério de distinção e entendemos que não se aplica no
nosso estudo.
92
efeitos desde o seu nascimento, expede-se um novo ato que o substitui corrigindo o
vício, o tornando, então, ato legal com efeitos retroativos175.
A convalidação só é possível quando o ato puder ser produzido
legitimamente. Nesse sentido, podemos atribuir o vício ser sanável ou insanável e,
portanto, legitimar ou não o “ato ilegal”.
J. J. CALMON DE PASSOS176 faz uma observação importante da
convalidação:
[...] A nulidade não é o pronunciamento do magistrado, é exato, mas
constitui-se com ele, nasce com ele, surge com ele e somente existe
depois dele. Assim sendo, a sanabilidade ou insanabilidade jamais é
da nulidade, sim das repercussões que ela determina. O que tem
relevo, isso sim, e antecede a decretação da nulidade, é o juízo
sobre a repercussão da imperfeição do ato no pertinente ao fim que
lhe destinou o sistema, dele resultando a necessidade ou
desnecessidade da cominação de sua nulidade.
Entretanto, como se aplica a convalidação? A aplicabilidade da convalidação
é no caso concreto. Ela se relaciona com a espécie de invalidade, em que vícios
inconvalidáveis são decretados nulos, e convalidáveis anuláveis. Ela tem como
pressuposto: a) que não haja impugnação do interessado; e b) não haja lesão ao
interesse público ou a terceiros. Aplica-se, ainda, para a decretação da invalidação o
princípio do prejuízo177.
175
DI PIETRO, op. cit., p. 248; FIGUEIREDO, op. cit., p. 247; e MELLO, op. cit., p. 478.
176 DE PASSOS, op. cit., p. 139-140.
177 MELLO, op. cit., p. 478; e NEDER; LÓPEZ, 2004, p. 487.
93
Assim, entendemos que no Direito Administrativo os atos inválidos são: os
atos nulos e os atos anuláveis, trabalhando com a dicotomia: nulidade e
anulabilidade, que têm como critérios de distinção: a convalidação ou inconvalidação
do vício, e o princípio do prejuízo. Sistematizando:
Ademais, a decretação no Direito Administrativo da invalidade dos atos
administrativos e sua a retirada do sistema pode ser realizada: a) pela Administração
no exercício de autotutela, hipótese em que não depende de provocação de parte
interessada, mas precisa de processo administrativo para garantir a ampla defesa e
o contraditório, se houver interesses de terceiros178, ou b) pelo Poder Judiciário no
exercício de suas funções, em que o interessado deve ingressar com medida
judicial179.
178
EMENTA: “DEVIDO PROCESSO LEGAL - ANULAÇÃO DE ATO ADMINISTRATIVO - DIREITO
DE DEFESA. A anulação de ato administrativo, que repercuta no campo de interesses individuais
somente pode ocorrer oportunizando-se o direito de defesa, ou seja, instaurando-se processo
administrativo. AGRAVO – ARTIGO 557, § 2º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL – MULTA. Se o
agravo é manifestamente infundado, impõe-se a aplicação da multa prevista no § 2º do artigo 557 do
Código de Processo Civil, arcando a parte com o ônus decorrente da litigância de má-fé.” (STF, RE
n°. 613.316/MS, Relator Ministro Marco Aurélio, Data de Julgamento: 28/05/2013 e Data da
Publicação: 24/06/2013).
179 Esse entendimento está consolidado nas Súmulas do STF: “Súmula nº 346: A Administração
Pública pode declarar a nulidade dos seus próprios atos”; e “Súmula nº 473: A Administração pode
94
4. Invalidade no Direito Tributário
Descrevemos até o momento a aplicação das invalidades no direito privado e
no direito público. Ambos, segundo fixamos, trabalham com a dicotomia: nulidade e
anulabilidade, diferenciando o critério aplicável, em que para o direito privado, em
linhas gerais, é o grau do vício e seus efeitos, e para o direito público o vício ser
passível de convalidação ou não. Passamos a analisar a sistemática aplicável no
Direito Tributário.
Nas doutrinas estudadas há três correntes.
A primeira corrente180 entende que a única espécie de invalidade aplicada ao
direito tributário é a anulabilidade. Essa corrente parte da concepção de que a
nulidade é ato inexistente que pelo grau do vício não produz efeitos ab initio e seu
reconhecimento opera automaticamente, sem necessidade de impugnação. Assim,
só existe a espécie de anulabilidade, porque o lançamento é ato administrativo que
existe e produz efeitos, que só cessam com a decretação de invalidade. Ademais,
argumentam que o direito positivo tributário não faz distinção entre a nulidade e a
anulabilidade. Dessa forma, até que o lançamento seja anulado, existe e produz
efeitos, e, assim, a classe dos atos nulos não se aplica no Direito Tributário.
Claro pelas premissas que fixamos que essa corrente trabalha com os
critérios de distinção de nulidade e anulabilidade do direito privado. Já manifestamos
nosso entendimento de que nulidade não é ato inexistente, porque o que não existe
anular seus próprios atos, quando eivados de vício que os tornam ilegais, porque deles não se
originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos
adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial”. (DI PIETRO, op. cit., p. 238; e
MELLO, op. cit., p. 466).
180 BORGES, op. cit., p. 250; e HORVATH, 2010, p. 86.
95
não interessa ao direito, é um nada. Assim, como decretar a nulidade do nada? Não
é possível. Entendemos que nulidade é um defeito no ato jurídico (ou ato
administrativo) que ingressou no ordenamento jurídico desrespeitando as normas
que prescrevem sua formação, e somente é retirado dele com a decretação pela
autoridade competente da invalidade do ato por nulidade e a fixação da produção
dos efeitos. Logo, não aceitamos os fundamentos dessa corrente.
As outras duas correntes trabalham com a dicotomia nulidade e anulabilidade
como espécies de invalidade dos atos tributários.
Estas se diferenciam: a) a primeira corrente181 aplica os critérios de distinção
do direito público (Direito Administrativo), que é a possibilidade ou não de
convalidação do vício; e b) na segunda corrente182, os critérios de distinção de
direito privado do grau do vício e seus efeitos, entendendo que são conceitos de
Teoria Geral do Direito e não do direito privado.
181
HARET, Florence Cronemberger. Vícios dos atos jurídicos: reflexões sobre a Teoria dos Atos
Jurídicos e o ato normativo viciado. In: SCHOUERI, Luís Eduardo (Coord.). Direito tributário –
Homenagem a Paulo de Barros Carvalho. São Paulo: Quartier Latin, 2008, p. 237; NEDER, 2013, p.
96 (este autor acrescenta o princípio do prejuízo como critério); RIBAS, Lídia Maria Lopes Rodrigues.
Processo Administrativo Tributário. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 85; TOMÉ, 2011/2012, p.
332; e SANTI, Eurico Marcos Diniz de. Auto de infração e lançamento tributário: elementos,
pressupostos, vícios e anulação. Artigo elaborado no NEF – Núcleo de Estudos Fiscais da Escola de
Direito da Fundação Getúlio Vargas – DIREITO GV. FISCOSoft, 2012. Disponível em:
<http://www.fiscosoft.com.br/a/5rko/auto-de-infracao-e-lancamento-tributario-elementos-pressupostos-
vicios-e-anulacao-eurico-marcos-diniz-de-santi>. Acesso em: 14 maio 2014, p. 7.
182 BARBIERI, Luís Eduardo Garrossino. Lançamento tributário: vícios e seus efeitos. 2013.
Dissertação (Mestrado em Direito) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP, São
Paulo, 2013, p. 142; CARVALHO, 2011, p. 495-496; e MELO, Fábio Soares de. Processo
administrativo tributário: princípios, vícios e efeitos jurídicos. São Paulo: Dialética, 2012, p. 116.
96
Primeiramente, destacamos que os critérios de grau de vício e efeitos
aplicados pela segunda corrente, no nosso entendimento, são de direito privado, em
que opera a vontade das partes, e não de Teoria Geral do Direito. Estão regulados
no CC ao tratar dos negócios jurídicos.
Ademais, o auto de infração é ato administrativo que se subsume ao regime
jurídico de direito administrativo, ramo de direito público183, que aplica para a
decretação de invalidade: a convalidação ou inconvalidação do vício.
Dessa forma, não concordamos com a aplicação de critérios de direito
privado, entendendo que os critérios de distinção são: a convalidação ou
inconvalidação do vício.
Entendemos, ainda, que o princípio do prejuízo previsto no art. 55 da LPA e
no art. 60 do PAF é aplicável ao direito tributário para a decretação de invalidade do
ato administrativo tributário184.
Assim, concordando com a primeira corrente, entendemos que as invalidades
no direito tributário são de duas espécies: nulidade e anulabilidade, e têm como
critério de distinção a aplicação do princípio do prejuízo e a possibilidade de
convalidação ou não do vício185.
Nesse sentido se manifesta o CARF:
183
Ver capítulo III, item 2.
184 BARBIERI, op. cit., p. 142; NEDER, 2013, p. 95-96; PAULSEN, Leandro; ÁVILA, René Bergmann;
SLEWKA, Ingrid Sehroder. Direito processual tributário: processo administrativo fiscal e execução
fiscal à luz da doutrina e jurisprudência. 4. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p. 133; e
RIBAS, op. cit., p. 89.
185 Nosso entendimento concorda com: Marcos Vinicius Neder (2013, p. 96). Discorda por aplicar o
critério do prejuízo e o critério do grau do vício: BARBIERI, op. cit., p. 142.
97
AUTO DE INFRAÇÃO. NULIDADE. Não há nulidade em auto de
infração lavrado por pessoa competente, não tendo havido preterição
do direito de defesa da contribuinte e não tendo sido ferido os artigos
10 e 59 do Decreto n° 70.235/72. (CARF, Recurso Voluntário, 1ª
Câmara - 1ª Turma Ordinária, Acórdão n°. 3101-001.704, Processo
n°. 15868.720033/2013-70, sessão 17/09/2014, Relator Conselheiro
Rodrigo Mineiro Fernandes).
NULIDADE DO AUTO DE INFRAÇÃO. VIOLAÇÃO NÃO PROVADA.
Faltando nos autos a prova da violação às disposições contidas no
art. 142, do CTN, tampouco dos artigos 10 e 59, do Decreto n°
70.235, de 1972, e não se identificando no instrumento de autuação
nenhum vício prejudicial, não há que se falar em nulidade do
lançamento. (CARF, Recurso Voluntário, 1ª Câmara - 1ª Turma
Ordinária, Acórdão n°. 2101-002.425, Processo n°.
13984.000506/2010-14, sessão 19/03/2014, Relator Conselheiro
Francisco Marconi de Oliveira).
LANÇAMENTO VÍCIOS NA CONSTITUIÇÃO. ERRO NA
FUNDAMENTAÇÃO LEGAL E TIPIFICAÇÃO DA PENALIDADE
APLICADA. INOCORRÊNCIA. LANÇAMENTO REGULAR.
REQUISITOS MATERIAIS E FORMAIS. RESPEITADOS.
LEGISLAÇÃO ATENDIDA. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO AO
CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. APLICAÇÃO DA MULTA
MAIS BENÉFICA. (CARF, Recurso Voluntário, 3ª Turma Especial,
Acórdão n°. 2803-003.392, Processo n°. 10980.726434/2011-61,
sessão em 16/07/2014, Relator Conselheiro Eduardo de Oliveira).
98
Desse modo, os atos administrativos tributários inválidos são de duas
espécies: nulidade e anulabilidade. Eles têm como critérios de distinção e
aplicabilidade o princípio do prejuízo e da convalidação do ato, em que temos as
classes de invalidade: a) nulidade para os atos administrativos tributários com vício
inconvalidável (insanável); e b) anulabilidade para os atos administrativos tributários
com vício convalidável (sanável).
5. Princípio do prejuízo
O princípio do prejuízo é inerente ao sistema das invalidades moderno, em
que se valorizam os fins a serem atingidos pelo ato em detrimento do dano que o
defeito causa186, tratando do binômio defeito-prejuízo:
É a viga mestre do sistema das nulidades e decorre da ideia geral de
que as formas processuais representam tão somente um instrumento
para a correta aplicação do direito, sendo assim, a desobediência às
formalidades estabelecidas pelo legislador deve conduzir ao
186
“São três os sistemas segundo os quais pode ser imposta a sanção de nulidade: a) todo e
qualquer vício do ato leva à sua nulidade; b) nulo será o ato se a lei assim expressamente o declarar;
c) o sistema da instrumentalidade das formas, distinguindo-se as irregularidades conforme a
gravidade e segundo o qual não se declara a nulidade se a finalidade do ato foi atingida e se não
houver prejuízo para a parte. Os dois primeiros sistemas estão desautorizados pela moderna ciência
processual” (GRINOVER; FERNANDES; GOMES FILHO, op. cit., p. 26).
99
reconhecimento da invalidade do ato quando a própria finalidade pela
qual a forma foi instituída estiver comprometida pelo vício187.
MARCOS VINICIUS NEDER afirma que o prejuízo é um conceito relacional
entre: “[...] um vício no processo e seus efeitos nocivos ao interesse público e às
partes, em prejuízo ao atingimento de certos objetivos processuais”188.
Os Tribunais reconhecem a aplicação do princípio do prejuízo no sistema das
invalidades, conforme se verifica pelas ementas abaixo:
PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL. De acordo com o princípio
pas de nullité sans grief, que na sua tradução literal significa que não
há nulidade sem prejuízo, não se declarará a nulidade por vício
formal se não causar prejuízo. Podemos, então, estar diante a uma
violação à prescrição legal sem que disso, necessariamente, decorra
a nulidade. Como no presente caso, em que o art. 10, IV do Decreto
n° 70.235/72 prescreve que o auto de infração conterá
obrigatoriamente a disposição legal. Não obstante a existência de
vício formal no lançamento, a sua nulidade não deve ser decretada,
por ausência de efetivo prejuízo por parte do contribuinte em sua
defesa. Não há de se falar em nulidade do lançamento, por não
restar configurado o binômio defeito-prejuízo. Recurso especial
provido. (CARF, Recurso Especial, 2ª Turma, Acórdão n°. 9202-
01.536, Processo n°. 37311.002241/2004-21, sessão de 09/05/2011,
Relator Conselheiro Elias Sampaio Freire).
187
Ibid., p. 27.
188 NEDER, 2013, p. 104.
100
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL.
ADMINISTRATIVO. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO DA SENTENÇA
PROFERIDA EM MANDADO DE SEGURANÇA. POSTERIOR
DECLARAÇÃO DE NULIDADE PELO TRIBUNAL DE ORIGEM.
INEXISTÊNCIA DE PREJUÍZO. IMPOSSIBILIDADE DE SE
RECONHECER A NULIDADE. PRINCÍPIO PAS DE NULLITÉ SANS
GRIEF. 1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme
em aplicar o princípio pas de nullité sans grief, o qual determina que
a declaração de nulidade requer a efetiva comprovação de prejuízo à
parte. Precedentes. 2. Não é cabível a declaração de nulidade por
inexistência de intimação do inteiro teor da sentença, uma vez que o
Tribunal Regional, ao anular a própria sentença, afastou eventual
prejuízo que pudesse ocorrer. 3. Agravo regimental a que se nega
provimento. (STJ, AgRg no REsp n°. 792093/RJ (2005/0178868-4),
Relatora Ministra Alderita Ramos de Oliveira, Data de Julgamento:
21/05/2013 e Data de Publicação: 31/05/2013).
Nesse contexto, o princípio do prejuízo deve ser analisado no caso concreto
para o fim de verificar se a formalidade legal desrespeitada no ato introduzido
causou um dano ao destinatário passível de decretá-lo nulo ou anulável189.
Contudo, algumas cautelas devem ser observadas. Há situações em que a
formalidade prevista é inerente à finalidade do ato e o prejuízo estaria implícito e
previsto pelo legislador, conforme destacam ADA PELLEGRINI GRINOVER,
ANTONIO SCARANCE FERNANDES E ANTONIO MAGALHÃES GOMES FILHO190,
ao manifestarem o entendimento de que nas invalidades por anulabilidade têm
189
NEDER; LÓPEZ, 2004, p. 481.
190 GRINOVER; FERNANDES; GOMES FILHO, op. cit., p. 28-29.
101
presunção relativa de prejuízo, cabendo à parte que o alega provar que a
formalidade é essencial à finalidade do ato e que ficou prejudicada pela sua
inobservância; e na nulidade há a inversão do ônus da prova, e a parte contrária
deve provar que a formalidade do ato não compromete a sua finalidade, não
existindo prejuízo.
Quanto à aplicação do princípio do prejuízo no direito tributário, o art. 60 da
PAF determina que a decretação de invalidade do ato administrativo tributário
depende do contribuinte sofrer um dano (prejuízo)191. Esse pode ser compreendido
como o prejuízo no exercício das garantias constitucionais, do devido processo
legal, da ampla defesa e do contraditório; do princípio da segurança jurídica; do
direito à propriedade; da denúncia espontânea; do princípio da estrita legalidade e
da tipicidade, etc..
Contudo, a jurisprudência ao aplicar o princípio do prejuízo nas relações
jurídicas tributárias o entende como o dano ao contraditório e a ampla defesa do
contribuinte:
PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO
RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO FISCAL. NOMEAÇÃO DE BEM
À PENHORA. ORDEM LEGAL. ART. 11 DA LEF. PENHORA PELO
SISTEMA BACEN-JUD. POSSIBILIDADE. INTIMAÇÃO FEITA EM
NOME DE ADVOGADO DISTINTO AO DO SOLICITADO.
AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. PRINCÍPIO PAS DE NULLITÉ SANS
GRIEF. 1. A jurisprudência desta Corte, em homenagem ao princípio
pas de nullité sans grief, firmou entendimento no sentido de que a
parte, ao requerer o reconhecimento de nulidade, deverá comprovar
191
NEDER; LÓPEZ, 2004, p. 486; e PAULSEN; ÁVILA; SLEWKA, op. cit., p. 133.
102
o efetivo prejuízo sofrido. 2. Na hipótese, ainda que se tenha
admitido ser irregular a intimação, a Corte de origem considerou que
o autor não demonstrou o efetivo prejuízo, tendo em vista que
exerceu efetivamente seu direito de defesa, por meio da interposição
do recurso cabível. 3. A Fazenda Pública não é obrigada a aceitar
bens nomeados à penhora fora da ordem legal insculpida no art. 11
da Lei 6.830/80, pois o princípio da menor onerosidade do devedor,
preceituado no art. 620 do CPC, tem de estar em equilíbrio com a
satisfação do credor. 4. Agravo regimental não provido. (STJ, AgRg
no REsp n°. 1338515/RS (2012/0170154-2), Relator Ministro
Benedito Gonçalves, Data de Julgamento: 20/03/2014 e Data de
Publicação: 28/03/2014).
JULGAMENTO DO AUTO DE INFRAÇÃO EM MOMENTO DIVERSO
DO JULGAMENTO DO ATO ADMINISTRATIVO DE SUSPENSÃO
DE IMUNIDADE. INEXISTÊNCIA DE PREJUÍZO À CONTRIBUINTE.
INOCORRÊNCIA DE NULIDADE. Se o julgamento do Auto de
Infração se der em momento posterior ao julgamento do Ato
Administrativo de Suspensão da Imunidade observando na espécie o
que foi ali decidido, garantindo à contribuinte a segurança jurídica, a
ampla defesa e o contraditório, inexiste motivação para se declarar a
nulidade do lançamento, que foi efetuado sem os vícios previstos no
art. 59 do Decreto 70.235/72. (CARF, Recurso Voluntário, 3ª Câmara
- 2ª Turma Ordinária, Acórdão n°. 3302-002.560, Processo n°.
10746000416/2006-61, sessão de 27/03/2014, Relator Conselheiro
Maria da Conceição Arnaldo Jacó).
103
Desse modo, o prejuízo se consubstancia em um dano a um direito do
contribuinte garantido em lei que afeta a finalidade da emissão do ato administrativo
tributário, em que na sua aplicação tem conotação de prejuízo à defesa do
contribuinte.
Mas, ainda que este seja um dos critérios legais para a decretação da
invalidade, encontramos exceção à aplicação do princípio do prejuízo no CARF,
quando o vício alegado estiver sumulado. O voto do Relator Conselheiro Marcio
Henrique Sales Parada, da sessão de 18/09/2013, no Recurso Voluntário, Acordão
n°. 2801-003.202192, Processo n°. 10768.004366/2001-29, é esclarecedor:
[...] Ante a falta da identificação da autoridade, apontada, incide o
disposto na súmula n° 21 do CARF: É nula, por vício formal, a
notificação de lançamento que não contenha a identificação da
autoridade que a expediu. Entendo no mesmo sentido em que
leciona LEANDRO PAULSEN, de que o reconhecimento de vício
formal depende de se observar eventual prejuízo à defesa. [...] No
caso, conforme relatado, não se verifica que a falta mencionada
tenha impedido o pleno exercício do direito de defesa, como se
observa da SRL, da impugnação e do recurso. Ressalte-se, contudo,
que o artigo 72 do Regimento Interno do CARF prevê que as
decisões consubstanciadas em súmula são de observância
obrigatória pelos membros deste Conselho Administrativo. Assim,
verificada sua aplicação, não pode o Relator silenciar acerca da
192
EMENTA: “NULIDADE DO LANÇAMENTO. APLICAÇÃO DE SÚMULA. É nula, por vício formal, a
notificação de lançamento que não contenha a identificação da autoridade que a expediu, conforme
Súmula CARF n° 21. As decisões reiteradas e uniformes do CARF são consubstanciadas em súmula
de observância obrigatória por seus membros. Recurso Voluntário Provido”.
104
mesma, devendo declará-la a qualquer tempo. No mesmo sentido,
decidiu a Câmara Superior de Recursos Fiscais no julgamento do
Recurso n° 332.440, conforme Acórdão n° 920200.903, datado de 12
maio de 2010, que restou assim emendado: NULIDADE DO
LANÇAMENTO. SÚMULA 21 DO CARF. ARTIGO 72 DO
REGIMENTO INTERNO DO CARF DISPONDO QUE AS DECISÕES
CONSUBSTANCIADAS EM SÚMULAS SÃO DE OBSERVÂNCIA
OBRIGATÓRIA PELOS MEMBROS DO CARF. APLICAÇÃO NO
CASO CONCRETO. Verificado que o auto de infração não contém a
identificação da autoridade que a expediu, incide o disposto na
Súmula n.° 21 do CARF, que prevê que é nula, por vício formal, a
notificação de lançamento que não contenha a identificação da
autoridade que a expediu. Inteligência do artigo 53 da Lei n° 9.784,
de 1996. No caso concreto, em conformidade com o artigo 53 da Lei
n° 9.784, de 1996, e artigo 72 do Regimento Interno do CARF, que
prevê que as decisões consubstanciadas em súmulas são de
observância obrigatória pelos membros do CARF, aplica-se o
disposto em tais normas para reconhecer a nulidade, por vício
formal, do lançamento, resultando prejudicado o recurso da fazenda
nacional. Processo anulado. (itálico próprio)
Assim, a aplicação do prejuízo ao direito tributário, em que pese a
jurisprudência que o interpreta como um dano ao direito de defesa do contribuinte
não se resume a essa situação. Deve ser interpretado como ofensa qualquer direito
do contribuinte em relação ao processo (devido processo legal, ampla defesa e
contraditório), ao direito de propriedade, aos princípios tributários, à legalidade, à
105
denúncia espontânea, à segurança jurídica etc., por fim, à própria estabilidade do
ordenamento jurídico.
Ademais, manifestamos o entendimento de que as invalidades por nulidade
têm o prejuízo implicitamente previsto pelo legislador, e as por anulabilidade o
contribuinte deve demonstrar que o desrespeito à formalidade legal causou-lhe um
dano193. Dessa forma, aceitamos a aplicação de que a nulidade tem o prejuízo
implícito, e a anulabilidade há presunção relativa do prejuízo.
Ressaltamos, mais uma vez, a exceção da aplicação do princípio do prejuízo
no CARF quanto às posições sumuladas.
6. Atos irregulares
Atos irregulares são os que têm um defeito ínfimo que não compromete a sua
validade e eficácia.
Nesse sentido, graduando os vícios, há autores194 que os classificam como
espécies de invalidade. Teríamos as seguintes classes de atos defeituosos: a) atos
inexistentes, fora do direito, em que apresentam vícios gravíssimos; b) atos inválidos
que: b.1) com vícios graves que são os atos nulos, casos de nulidades; b.2) vícios
com menor gravidade, que temos os atos anuláveis, caso de anulabilidade; e b.3)
vícios com defeitos ínfimos que são os atos irregulares.
193
“[...] Mesmo que o interessado ofereça razões em recurso voluntário, em prazo oportuno,
demonstrando conhecer os fundamentos jurídicos da decisão, contingência que exige não ter havido
preterição do direito de defesa, ainda assim é de decretar-se a nulidade do procedimento, por virtude
da inexistência jurídica do ato. Faltou-lhe requisito de essência: o motivo de sua celebração.”
(CARVALHO, 2011, p. 943).
194 Id., 2011, p. 497; e MELLO op. cit., 465.
106
O art. 60 do PAF regula os atos irregulares no âmbito do Direito Processual
Tributário, dispondo:
Art. 60. As irregularidades, incorreções e omissões diferentes das
referidas no artigo anterior não importarão em nulidade e serão
sanadas quando resultarem em prejuízo para o sujeito passivo, salvo
se este lhes houver dado causa, ou quando não influírem na solução
do litígio.
Da disposição legal, os atos irregulares não são casos de decretação de
invalidade por o defeito podem ser sanados. Representam erros de grafia, de
aritmética, que não comprometem a validade e a finalidade do ato.
A manutenção desses atos no sistema se fundamenta no princípio da
economia procedimental195.
Assim, temos o entendimento de que esses erros, por não serem passíveis
de comprometer a validade do ato, não estão na classe dos atos inválidos. Estariam
na classe dos atos válidos com meras irregularidades.
JOSÉ JOAQUIM CALMON DE PASSOS196 os trata como uma imperfeição no
ato, diferenciando-o da nulidade segundo seja atingido ou não o fim pretendido, em
que a mera irregularidade tem um vício que não afeta o ato e este é apto a atingir
sua finalidade. É um ato imperfeito, por conter um vício, que é válido e eficaz.
A jurisprudência do CARF tem esse entendimento ao não decretar a nulidade
ou anulabilidade de defeitos que são meras irregularidades:
195
Ibid., p. 496.
196 DE PASSOS, op. cit., p. 129.
107
ERRO MATERIAL DO FISCO. Constatado o erro, do qual não é
responsável o sujeito passivo, e havendo a possibilidade de ser
sanado sem qualquer prejuízo àquele, não será declarada nulidade
do ato. (CARF, Recurso de Ofício, 3ª Câmara - 2ª Turma Ordinária,
Acórdão n°. 1302-001.100, Processo n°. 18471.002040/2008-71,
sessão de 08/05/2013, Relator Conselheiro Eduardo de Andrade).
MANDADO DE PROCEDIMENTO FISCAL. NULIDADE. Meras
irregularidades no MPF não acarretam na nulidade do procedimento
administrativo quando respeitado os arts. 142 do CTN e 10 do
Decreto n° 70.235/72. (CARF, Recurso Voluntário, 1ª Câmara - 1ª
Turma Ordinária, Acórdão n°. 1101-001.046, Processo n°.
15868.720125/2011-98, sessão de 13/02/2014, Relatora Conselheira
Nara Cristina Takeda Taga).
Ademais, conforme voto do Relator Conselheiro Guilherme Pollastri Gomes
da Silva no Recurso Voluntário, Acórdão n°. 1302-001.393, Processo n°.
10950.001248/2001-00, sessão de 07/05/2014, a lavratura do auto de infração em
local diverso do domicílio do contribuinte não gera a invalidade do auto de infração e
pode ser considerada como uma mera irregularidade:
Além do mais, mesmo se o fato de ter ocorrido a lavratura do auto de
infração nas dependências fiscais configurasse irregularidade, esta
poderia ser sanada, se tivesse prejudicado o Recorrente ou se
influísse na solução do litígio, o que a meu ver evidentemente não
ocorreu pois não prejudicou o Recorrente nem tampouco influiu na
solução da controvérsia.
108
Assim, o CARF editou súmulas sobre arguições de invalidades que são
consideradas como meras irregularidades. Leia-se:
Súmula CARF nº 6: É legítima a lavratura de auto de infração no
local em que foi constatada a infração, ainda que fora do
estabelecimento do contribuinte.
Súmula CARF nº 7: A ausência da indicação da data e da hora de
lavratura do auto de infração não invalida o lançamento de ofício
quando suprida pela data da ciência.
Súmula CARF nº 9: É válida a ciência da notificação por via postal
realizada no domicílio fiscal eleito pelo contribuinte, confirmada com
a assinatura do recebedor da correspondência, ainda que este não
seja o representante legal do destinatário.
Súmula CARF nº 46: O lançamento de ofício pode ser realizado sem
prévia intimação ao sujeito passivo, nos casos em que o Fisco
dispuser de elementos suficientes à constituição do crédito tributário.
Nesse sentido, LUÍS EDUARDO GARROSSINO BARBIERI197 apresenta uma
sistematização de meras irregularidades, elencando: erros de grafia/digitação na
formalização do lançamento; local ou data e hora da lavratura do lançamento de
ofício; descrição dos fatos em termo anexado aos autos e não no próprio corpo do
197
BARBIERI, op. cit., p. 189-201.
109
auto de infração; irregularidades na emissão do MPF ou documentos similares;
ciência do Termo de Início da Ação Fiscal por pessoa sem representação legal; e
recebimento de intimação via Correios, com AR – Aviso de recebimento, por
terceiras pessoas.
Dessa forma, somente na apreciação das arguições de invalidade que é
possível verificar se é uma mera irregularidade o vício ou causa de decretação
nulidade ou anulabilidade.
Assim, até o presente momento e considerando todo estudo já realizado,
podemos sistematizar e classificar os atos válidos e inválidos no direito tributário:
Neste contexto, passamos a aplicar as espécies de invalidade, a nulidade e a
anulabilidade, nos requisitos do auto de infração, analisando os vícios e seus efeitos
para relaciona-los.
7. Vícios no auto de infração
Os vícios são as desconformidades da norma jurídica em relação ao previsto
pelo ordenamento jurídico.
110
Os principais vícios são: de inconstitucionalidade, ilegalidade, vício formal,
vício material, erro de fato198 e erro de direito.
Nesse sentido, JOSÉ JOAQUIM CALMON DE PASSOS199 explica que há
duas espécies de validade e invalidade: a do plano abstrato e a do plano concreto. O
vício de constitucionalidade e inconstitucionalidade e legalidade e ilegalidade opera
no plano abstrato da lei, em que se constata a inadequação da integração da norma
jurídica ao sistema; já os demais vícios operam no plano concreto, em que se
verificam problemas na subsunção e implicação da norma abstrata e geral à
concreta e individual.
Importam para o nosso estudo os vícios no plano concreto, em que passamos
em estudá-los e agrupá-los segundo as classes de invalidades aplicadas no Direito
Tributário.
NORBERTO BOBBIO200 explica que as prescrições jurídicas são limitadas em
relação à matéria e à forma. Denomina a primeira de limite material e a segunda de
limite formal. Os limites materiais se referem ao conteúdo da norma jurídica e os
limites formais aos procedimentos para a expedição da norma. Assim, EURICO
MARCOS DINIZ DE SANTI201 classifica-os em: os primeiros de normas de direito
material, e os segundos de normas de direito formal.
Estudamos que os requisitos do auto de infração compreendem: os
elementos intrínsecos e os pressupostos de validade. Elementos intrínsecos se
referem à estrutura interna da norma jurídica, e os pressupostos de validade os
198
José Souto Maior Borges não reconhece a distinção entre erro de fato e erro de direito, uma vez
que havendo erro há de ser de direito. (op. cit., p. 274).
199 DE PASSOS, op. cit., p. 22-23.
200 BOBBIO, 2006, p. 54.
201 SANTI, 2012, p. 6.
111
externos. Segundo a classificação disposta, os elementos intrínsecos são normas de
direito material, e os pressupostos de validade, normas de direito formal.
Com base nessas classificações que discorremos sobre as espécies de
vícios.
Vício formal e vício material202 se relacionam aos defeitos entre a forma de
produção da norma jurídica e o seu conteúdo. O ordenamento jurídico prescreve
como as normas jurídicas devem ser produzidas, elencando o processo de formação
no procedimento e o sujeito competente para emissão do ato normativo, e o seu
conteúdo. Assim, temos requisitos formais e requisitos materiais de produção de
normas jurídicas, ou seja, norma de direito formal e norma de direito material,
respectivamente. O vício que viola o processo de formação das normas jurídicas é
um vício formal, e o que viola o conteúdo um vício material, ou seja, o vício formal é
defeito na norma de direito formal, nos pressupostos de validade, e o vício material
nas normas de direito material, nos elementos intrínsecos.
Erro de fato e erro de direito203 se relacionam com a violação na edição da
norma concreta e individual. Tratam da classificação dos defeitos com relação à
202
A doutrina não é unânime na designação de vícios materiais e formais. Tácio Lacerda Gama
designa, respectivamente, de nulidade material e nulidade formal (2011, p. 350-351); e Eurico Marcos
Diniz di Santi em nulidade e anulabilidade (2012, p. 6-7). Designaremos de vício formal e vício
material.
203 Erro de direito é diferente de mudança de critério jurídico. A mudança de critério jurídico é a
substituição de uma interpretação do Fisco por outra ou de critério. Esse ato não comporta processo
de revisão e nem a invalidade da norma jurídica, com vista ao princípio da segurança jurídica.
Ademais, o art. 146 do CTN regula a mudança de critério jurídico dispondo: “Art. 146. A modificação
introduzida, de ofício ou em consequência de decisão administrativa ou judicial, nos critérios jurídicos
adotados pela autoridade administrativa no exercício do lançamento somente pode ser efetivada, em
112
análise linguística do fenômeno jurídico. O erro de fato é um defeito que está dentro
da norma jurídica, da qual há um erro linguístico no antecedente, ao constituir o fato
jurídico, ou no consequente, ao instaurar a relação jurídica. Esse erro se relaciona
às provas. O erro de direito é um defeito externo à norma jurídica, em que há um
descompasso entre o enunciado da norma abstrata e geral e o da norma concreta e
individual. Tratam de vícios na implicação, erro de fato, e na subsunção, erro de
direito, na norma que ao aplicar a lei não há simetria. Erro de fato é violação na
norma de direito material, e erro de direito, na norma de direito formal, e,
respectivamente, nos elementos intrínsecos e nos pressupostos de validade.
Nessa perspectiva, PAULO DE BARROS CARVALHO204 traça as seguintes
distinções entre erro de fato e erro de direito:
Posso oferecer algumas conclusões: 1) A linha divisória entre erro de
faro e erro de direito fica bem nítida: sendo desajuste de linguagem
verificar-se no interior de uma única norma, seja no antecedente ou
no consequente, teremos erro de fato. 2) Para que se trata de erro de
fato, essa norma tem de ser individual e concreta. 3) Quando os
desacertos de linguagem envolverem duas ou mais normas, sendo
uma delas, obrigatoriamente, regra individual e concreta, e outra,
também necessariamente, geral e abstrata, teremos erro de direito.
4) Como particularidade das normas jurídicas tributárias, qualquer
desalinho com relação à ‘alíquota’ ou ao ‘sujeito ativo’ será sempre
erro de direito, porquanto são esses os únicos fatores compositivos
relação a um mesmo sujeito passivo, quanto a fato gerador ocorrido posteriormente à sua
introdução”.
204 CARVALHO, 2011, p. 494.
113
da estrutura normativa que não podem ser encontrados na
contextura do fato jurídico tributário. Sua consideração supõe,
necessariamente, o trajeto que vai da norma geral e abstrata à
norma individual e concreta.
No mais, VIVIAN DE FREITAS E RODRIGUES DE OLIVEIRA205 equipara o
erro de fato e o erro de direito, respectivamente, ao vício material e ao vício formal.
Concordamos com a autora. Como já traçamos linhas acima, tanto os vícios
materiais e formais, como os erros de fato e de direito, se referem à violação na
norma introduzida quanto aos elementos intrínsecos e os pressupostos de validade,
ou seja, a norma de direito material e a norma de direito formal. A distinção é que o
erro (de fato e de direito) é uma interpretação linguística do fenômeno
comunicacional do direito, que se adequa à linguagem deste trabalho. Assim,
entendemos que vício material é violação da norma de direito material quanto ao
erro de fato, e vício formal na norma de direito formal quanto ao erro de direito, que,
respectivamente, quanto aos requisitos do auto de infração seriam nos elementos
intrínsecos e nos pressupostos de validade.
Contudo, como se relacionam esses vícios com as espécies de invalidade:
nulidade e anulabilidade?
Para o estudo da classificação das espécies de invalidade e dos vícios,
percorreremos o direito positivo e a jurisprudência.
A sistematização da invalidade está previstas nos arts. 59 ao 61 do PAF.
Neste momento, destacamos o rol do art. 59, que prevê:
205
OLIVEIRA, op. cit., p. 146-148.
114
Art. 59. São nulos:
I - os atos e termos lavrados por pessoa incompetente;
II - os despachos e decisões proferidos por autoridade incompetente
ou com preterição do direito de defesa.
§ 1º A nulidade de qualquer ato só prejudica os posteriores que dele
diretamente dependam ou sejam conseqüência.
§ 2º Na declaração de nulidade, a autoridade dirá os atos
alcançados, e determinará as providências necessárias ao
prosseguimento ou solução do processo.
§ 3º Quando puder decidir do mérito a favor do sujeito passivo a
quem aproveitaria a declaração de nulidade, a autoridade julgadora
não a pronunciará nem mandará repetir o ato ou suprir-lhe a falta.
Ao analisar o dispositivo, percebe-se quão sucinto foi o legislador ao prever
as causas de “nulidade”. Dessa forma, parte da doutrina206 se manifesta que se trata
de um rol exemplificativo, pois há outras situações de invalidade não previstas no
dispositivo. Seguimos esta corrente. Ao analisar o dispositivo, percebe-se que o
objeto do nosso estudo não foi previsto como causa de invalidade do ato
administrativo tributário, ou seja, não há previsão da invalidade pela não observância
das normas procedimentais de lavratura do auto de infração.
Assim, entendemos que o rol é exemplificativo e elenca as causas de
invalidade dos atos administrativos tributários, que podem, a depender do vício, ser
nulos ou anuláveis.
206
NEDER; LÓPEZ, 2004, p. 478; e NUNES, Cleucio Santos. Curso de direito processual tributário.
São Paulo: Dialética, 2010, p. 337.
115
Já o art. 173, II, do CTN prevê que o Fisco tem o prazo de 5 anos para
constituir o crédito tributário: “II – da data em que se tornar definitiva a decisão que
houver anulado, por vício formal, o lançamento anteriormente efetuado”.
Disso se denota que o vício formal é espécie de invalidade por anulação,
sendo, consequentemente, o vício material espécie de nulidade, posição que é
confirmada pela jurisprudência do CARF:
NULIDADE. VÍCIO MATERIAL. O vício material ocorre quando o auto
de infração não preenche os requisitos constantes do art. 142 do
Código Tributário Nacional, havendo equívoco na construção do
lançamento quanto à verificação das condições legais para a
exigência do tributo ou contribuição do crédito tributário, enquanto
que o vício formal ocorre quando o lançamento contiver omissões ou
inobservância de formalidades essenciais, de normas que regem o
procedimento da lavratura do auto, ou seja, da maneira de sua
realização. Recurso Voluntário Provido. (CARF, Recurso Voluntário,
4ª Câmara - 3ª Turma Ordinária, Acórdão n°. 2403-002.525,
Processo n°. 35415.000882/2007-09, sessão de 19/03/2014, Relator
Conselheiro Marcelo Magalhães Peixoto).
LANÇAMENTO DE OFÍCIO CONTRA EMPRESA EXTINTA
REGULARMENTE. ERRO NA IDENTIFICAÇÃO DO SUJEITO
PASSIVO. A extinção regular da pessoa jurídica, e o cancelamento
anterior de sua inscrição no CPNJ tornam inábil lançamento
sobrevindo a tal ato por evidente erro na identificação do sujeito
passivo da obrigação tributária. Trata-se de vício material e não mero
erro formal. Recurso Especial Negado. (CARF, Recurso Especial, 1ª
116
Turma, Acórdão n°. 9101-001.705, Processo n°. 10670.001272/2006-
91, sessão de 18/7/2013, Relator Conselheiro Jorge Celso Freire da
Silva).
LANÇAMENTO ANULADO POR VÍCIO FORMAL. DECISÃO DE
PRIMEIRA INSTÂNCIA. CONSTITUIÇÃO DE NOVO
LANÇAMENTO. INOBSERVÂNCIA DA DEFINIIVIDADE DA
DECISÃO. INOBSERVÂNCIA DO TRÂNSITO EM JULGADO.
PROVOCA ANULABILIDADE DO NOVO LANÇAMENTO POR VÍCIO
FORMAL. Anulado um lançamento por vício formal, a realização de
novo lançamento somente poderá ocorrer quando se tornar definitiva
a decisão que declarou a nulidade do lançamento anterior, sob pena
de ser considerado igualmente nulo o lançamento ulterior. Recurso
de Ofício Negado. (CARF, Recurso de Ofício, 4ª Câmara - 2ª Turma
Ordinária, Acórdão n°. 1402-001.699, Processo n°.
19515.007507/2008-88, sessão de 08/05/2014, Relator Conselheiro
Paulo Roberto Cortez).
Contudo, encontramos decisões no CARF que divergem da aplicação acima
exposta neste trabalho:
AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO LEGAL. A ausência de
fundamento legal é vício formal insanável que torna nulo o
lançamento. Processo anulado. (CARF, Recurso Voluntário, 3ª
Câmara - 2ª Turma Ordinária, Acordão n°. 2302-003.210, Processo
n°. 11040.720465/2012-72, sessão de 16/o7/2014, Relatora
Conselheira Liege Lacroix Thomasi).
117
CONTRIBUIÇÕES DESTINADAS A TERCEIROS. UTILIZAÇÃO
EQUIVOCADA DE CÓDIGO DE TERCEIROS. VÍCIO INSANÁVEL. É
nulo, por vício formal insanável, o lançamento realizado com a
utilização do código de terceiros indevido, que implica na incorreta
distribuição dos valores apurados através da NFLD. Recurso de
Ofício Negado. (CARF, Recurso de Ofício, 4ª Câmara - 2ª Turma
Ordinária, Acórdão n°. 2402-004.264, Processo n°.
10830.009856/2007-14, sessão de 09/09/2014, Relator Conselheiro
Julio Cesar Vieira Gomes).207
Mas cabe destacar o voto do Relator Conselheiro Carlos César Quadros
Pierre do CARF nos Embargos, Acórdão n°. 2801-003.708, Processo n°.
10183.001042/2001-18, da sessão de 10/09/2014, que é esclarecedor quanto à
aplicação do vício formal e a espécies de invalidade:
Neste sentido, o vício formal pode ser entendido como a
desobediência à formalidade que cerca a prática do ato. Abrange,
então, as formalidades essenciais à validade do ato. Desta feita, no
caso de carecer de uma formalidade, o ato poderá ser invalidade
pelo chamado vício de forma. [...] Conclui-se através destes excertos
doutrinários que um lançamento tributário é anulado por vício formal
quando não se obedece às formalidades necessárias ou
207
Neste julgado o Relator se manifesta que como não houve questionamento quanto a natureza do
vício e tratar-se de recurso de ofício, não se manifestará se se trata de vício material ou formal: “O
contribuinte não recorreu contra a natureza do vício, formal ou material. Assim sendo, não seria
objeto nessa instância o exame dessa questão, já que se trata apenas de recurso de ofício”.
118
indispensáveis à existência do ato, isto é, às disposições de ordem
legal para a sua feitura.
Nesse contexto, entendemos que a decretação de invalidade por vício formal
é caso de anulabilidade por afetar os pressupostos de validade; e por vício material
de nulidade208 em que há defeito nos elementos intrínsecos. Sistematizamos:
No mais, em relação aos efeitos jurídicos da decretação de invalidade do auto
de infração temos a considerar.
O art. 173, II, do CTN, determina que a decretação de invalidade do ato
administrativo tributário por vício formal enseja ao Fisco a possibilidade de realizar
novo lançamento do crédito tributário para o fim de regularizar a ilegalidade e torná-
lo exigível. Assim, o efeito da decretação de invalidade por vício formal é a
208
Nossa posição é confirmada por: HARET, op. cit., p. 233; RIBAS, op. cit., p. 85; SANTI, 2012, p. 6;
TOMÉ, 2011/2012, p. 333; e BARBIERI, op. cit., p. 142.
119
possibilidade do Fisco de lavrar novo lançamento de ofício ou auto de infração no
prazo decadencial. Inversamente, o vício material acarreta como efeito a extinção da
obrigação tributária.
Assim, o vício material está presente no defeito em um dos elementos
intrínsecos do auto de infração. É passível de ser decretado inválido por nulidade e
terá como efeito: a extinção do crédito tributário. E o vício formal, defeito em um dos
pressupostos de validade do auto de infração, é decretado inválido por
anulabilidade, e tem o efeito jurídico de o Fisco poder lavrar novo lançamento
tributário ou auto de infração para o fim de regularizar o vício e tornar o crédito
tributário exigível.
Nessa visão e após toda a exposição, a aplicação da invalidade no auto de
infração em relação aos seus requisitos dispostos no art. 10 do PAF é representada:
a) invalidade por nulidade do auto de infração: vício material que acarreta a
extinção da obrigação tributária. Relacionam-se aos incisos do diploma legal: I – a
qualificação do autuado; II – o local, a data e a hora da lavratura; III – a descrição do
fato; IV – a disposição legal infringida e a penalidade aplicável; e V – a determinação
da exigência; e
b) invalidade por anulabilidade do auto de infração: vício formal do que pode
se constituído novo crédito tributário por meio da lavratura de outro lançamento
tributário ou auto de infração. Relacionam-se com o art. 10: caput – o auto de
infração será lavrado por servidor competente, no local da verificação da falta; V – a
intimação para cumpri-la ou impugná-la no prazo de trinta dias; e VI – a assinatura
do autuante e a indicação de seu cargo ou função e o número de matrícula.
120
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Objetivamos sistematizar as invalidades no direito tributário delimitando suas
espécies, vícios e efeitos em relação aos requisitos do auto de infração dispostos no
art. 10 do PAF.
Propusemos, ainda, durante a exposição responder às seguintes questões:
1) Como é regido e aplicado o sistema das “nulidades” no direito
tributário? Quais são os seus critérios?
2) Quais são as espécies de “nulidade”?
3) Quais são os vícios e seus efeitos?
4) Na relação com os requisitos de lavratura do auto de infração, como se
processa a sistematização em relação à “nulidade”?
Assim, diante das considerações e análises feitas ao longo do trabalho,
sintetizamos nossas conclusões:
1. Direito positivo é sistema linguístico composto unicamente de normas
jurídicas que têm a finalidade de regular as condutas intersubjetivas de uma
sociedade. Nesse contexto, para a construção do seu conteúdo, sentido e alcance, o
intérprete atribui valores aos signos para dar-lhes significação.
2. Norma jurídica é uma construção do intérprete que no percurso gerador de
sentidos atribui significação aos textos de lei para obter a mensagem deôntica de
sentido completo, representada pelo antecedente que implica um consequente. É a
estrutura lógica da norma.
121
3. O antecedente tem a função de descrever um fato, de possível ocorrência
ou jurídico, e delimitar o momento e o local de sua ocorrência pelos critérios
material, espacial e temporal.
4. O consequente tem a função de regular a conduta desejada pela ordem
jurídica, prever os efeitos jurídicos e instaurar a relação jurídica entre dois ou mais
sujeitos em relação a um objeto. É representado pelos critérios pessoal e
quantitativo. No critério pessoal há a identificação do sujeito ativo que tem o direito
subjetivo de exigir do sujeito passivo o cumprimento da prestação, e o sujeito
passivo tem o dever jurídico de cumprir com a prestação em relação ao sujeito ativo.
O critério quantitativo aplica a base de cálculo e a alíquota para liquidar o crédito
tributário.
5. Para essa estrutura lógica há uma classificação das normas jurídicas em:
norma abstrata e geral; norma concreta e geral; norma abstrata e individual; e norma
concreta e individual.
6. A norma jurídica tributária é a que trata direta ou indiretamente da
instituição, arrecadação e fiscalização dos tributos. É composta de obrigações
tributárias quanto à instituição dos tributos, e deveres instrumentais nas prestações
de informações pelo contribuinte para a arrecadação e fiscalização destes.
7. A mensagem deôntica completa é representada pela norma jurídica
completa que prescreve a conduta desejada pelo ordenamento e a providência
coercitiva a ser aplicada pelo Estado-Juiz no caso de seu descumprimento. É
composta da norma primária de direito material e a norma secundária de direito
processual.
8. A norma primária se subdivide em norma primária dispositiva, que no
antecedente identifica um fato lítico, e a norma primária sancionadora que no
122
antecedente descreve um fato ilícito, consistente no descumprimento da norma
primária dispositiva e prescreve no consequente a aplicação de uma sanção
administrativa.
9. A norma secundária é a que tem no antecedente o fato ilícito de
descumprimento da norma primária, e no consequente prevê a aplicação da coerção
pelo Estado-Juiz.
10. O processo de positivação do direito visa atingir as condutas
intersubjetivas com a máxima concretude, passando da abstração à concretude da
norma. Ocorre em duas etapas: da incidência e da aplicação da norma.
11. Dentre as teorias estudadas, adotamos a teoria do Constructivismo
Lógico-Semântico de que a incidência e a aplicação são atos simultâneos realizados
pelo ser humano que constata a ocorrência do evento que se subsume aos critérios
da norma abstrata e geral e o relata em linguagem competente (das provas) para
constituir o fato jurídico, instaurar a relação jurídica e introduzir a norma no sistema.
São atos de subsunção e implicação.
12. Validade é relação de pertinencialidade da norma com o sistema. Assim,
validade é sinônimo de existência da norma jurídica no ordenamento jurídico.
13. Norma jurídica que ingressa no sistema presume-se válida em razão de a
ele pertencer até que outra norma reconheça a sua desconformidade com a
prescrição legal e a retire do sistema, prescrevendo os efeitos jurídicos.
14. A lei existe no ordenamento com o ato de promulgação, e o auto de
infração com a sua lavratura. A publicação é ato para dar conhecimento da norma
existente e torná-la obrigatória aos seus destinatários.
15. Eficácia é a aptidão do fato jurídico de produzir os efeitos previstos no
consequente. Assim, a entendemos na acepção de eficácia jurídica.
123
16. A decretação de invalidade do auto de infração tem a eficácia jurídica de:
extinguir a obrigação tributária, ou a possibilidade do Fisco lavrar novo lançamento
tributário ou auto de infração para constituir o crédito tributário e a aplicação de
penalidade, e validar o ato ilegal anterior.
17. Auto de infração é palavra polissêmica que tem várias acepções. Dentre
as estudadas, definimos auto de infração como suporte físico ou veículo introdutor
de outras normas jurídicas de lançamento de ofício e a aplicação da penalidade,
denominado auto de infração lato sensu; ou de aplicação da penalidade,
denominado de auto de infração stricto sensu.
18. A lavratura do auto de infração pressupõe a prática de um ato ilícito pelo
contribuinte no descumprimento de uma norma jurídica tributária. Origina-se de um
procedimento de fiscalização ou de sua dispensa, mas o Fisco deve ter elementos e
provas da prática do ato ilícito para legitimar a lavratura.
19. Assim, o auto de infração é norma concreta e individual que no
antecedente constitui o fato jurídico tributário ilícito e no consequente instaura a
relação jurídica tributária entre o contribuinte e o Fisco, para constituir o crédito
tributário e aplicar a penalidade cabível. Veicula a norma primária dispositiva na
constituição do lançamento de ofício, e a norma primária sancionadora na aplicação
da penalidade.
20. O auto de infração é ato administrativo que se subsume ao regime jurídico
de direito público, dos quais o estudamos nos aspectos de seus atributos e
requisitos.
21. Os atributos dos atos administrativos são um regime jurídico com
prerrogativas próprias. Firmamos o entendimento de que o auto de infração tem os
124
atributos da presunção de legitimidade e veracidade, tipicidade, imperatividade e
exigibilidade, excluindo a executoriedade.
22. Quanto aos requisitos de lavratura do auto de infração, o classificamos em
elementos intrínsecos, que são internos ao ato administrativo, e pressupostos de
validade, que são externos.
23. Entendemos que os pressupostos de existência não fazem parte dos
requisitos do auto de infração, pois é elemento já integrante quando o auto de
infração é lavrado por pertencer ao sistema.
24. Os elementos intrínsecos são o conteúdo, a forma e a motivação na
norma jurídica introdutora do auto de infração.
25. O conteúdo é a prescrição do ato com o fim de modificar a ordem jurídica.
É o que o ato designa. Entendemos que se apresenta no consequente da norma do
auto de infração.
26. A forma é a maneira que é exteriorizado o ato. No auto de infração é a
escrita.
27. A motivação é a exposição dos motivos do ato, ou seja, o relato em
linguagem competente do evento para constituir o fato jurídico tributário ilícito. Esta
representada no antecedente da norma do auto de infração.
28. Os pressupostos de validade se classificam em subjetivo, objetivo,
teleológico, lógico e formalístico.
29. O pressuposto objetivo se refere ao agente competente para lavrar o auto
de infração. Trata do Auditor-Fiscal da RFB.
30. Os pressupostos objetivos compreendem: os requisitos procedimentais e
o motivo do ato. Requisitos procedimentais são as sequências de atos previstos em
lei para a produção da norma. São de observância obrigatória quando houver
125
previsão legal, e a publicidade é seu último ato. O motivo do ato é o evento que
ocorreu no mundo fenomênico e constituirá o relato em linguagem competente do
fato jurídico tributário ilícito na motivação do auto de infração.
31. O pressuposto teleológico é a finalidade do auto de infração. Classifica-se
em mediato, que é o interesse público, e imediato, que é a aplicação ao contribuinte
da coação administrativa pelo descumprimento da norma tributária.
32. O pressuposto lógico é a causa, a relação lógica entre o motivo do ato, a
motivação e o seu conteúdo. É a subsunção e a implicação da norma abstrata e
geral à norma concreta e individual, ou seja, nos requisitos de lavratura do auto de
infração dispostos no art. 10 do PAF e o auto de infração introduzido.
33. O pressuposto formalístico, que é a formalização, representa a forma
específica prevista em lei do ato. No auto de infração é como suporte físico.
34. O estudo das invalidades iniciou-se no Direito Romano.
35. Durante anos que se seguiram, houve evolução nos seus estudos e
atualmente é tratada como: ato inexistente, causa de nulidade ou de anulabilidade.
36. Firmamos o entendimento de que o ato inexistente, que tem um vício que
afeta o seu ingresso no ordenamento jurídico, não interessa ao nosso estudo,
porque não dispõe de relevância jurídica.
37. Assim, entendemos que a invalidade tem duas espécies: nulidade e
anulabilidade.
38. Das correntes doutrinárias de direito tributário que estudam as invalidades
dos atos administrativos tributários, firmamos o entendimento de que se aplicam os
critérios de invalidação do direito administrativo, porque os atos tributários são atos
administrativos que se subsumem a esse regime jurídico.
126
39. O direito positivo tributário sistematiza as invalidades nos arts. 59 a 61 do
PAF e art. 173, II, do CTN. Tem como critérios de aplicação: a convalidação ou
inconvalidação do vício e o princípio do prejuízo.
40. A convalidação é a possibilidade de substituir o ato ilegal por outro legal
com o defeito sanado, com o fim de tornar válido o ato ilegal. Os efeitos são
retroativos ao nascimento do ato ilegal. Relaciona-se com a espécie de invalidade
por anulabilidade.
41. A inconvalidação não possibilita a substituição do ato ilegal em razão de o
vício ser insanável. Relaciona-se com a espécie de invalidade por nulidade.
42. O princípio do prejuízo é inerente ao sistema de invalidade moderno, que
visa valorizar o fim desejado na produção do ato em detrimento do dano que o vício
causa à parte. Trata do binômio defeito-prejuízo.
43. O princípio do prejuízo é conceito relacional entre vício e os seus efeitos
nocivos à finalidade do ato, que é verificável no caso concreto, ao constatar que a
formalidade desrespeita causou um dano passível da decretação de invalidade.
44. Neste sentido, concluímos que a aplicação do princípio do prejuízo gera
conflitos de ordem pragmática e semântica, afetando o princípio da segurança
jurídica, da estrita legalidade e da tipicidade, aplicáveis ao direito tributário.
45. No mais, entendemos que o princípio do prejuízo se relaciona com as
espécies de invalidade, do que: na nulidade é princípio implícito previsto pelo
legislador de que na formalidade é essencial e há a inversão do ônus da prova; e na
anulabilidade tem presunção juris tantum, do qual a parte que a alega deve provar
que a formalidade desrespeitada é essencial à finalidade do ato e causa-lhe um
prejuízo.
127
46. Do estudo, atribuiu-se que o princípio do prejuízo denota um dano a um
direito do contribuinte, garantido em lei, como a ampla defesa, o contraditório, o
direito de propriedade; até a própria estabilidade do ordenamento jurídico.
47. No mais, é dispensada aplicação do princípio do prejuízo quando a
alegação da invalidade estiver sumulada.
48. Meras irregularidades não são causas de invalidade. É ato válido com
defeito que pode ser sanado. Sua análise é no caso concreto.
49. Os vícios na norma jurídica são de constitucionalidade e
inconstitucionalidade, legalidade e ilegalidade, material e formal, erro de fato e erro
de direito.
50. Estudamos os vícios aplicáveis no caso concreto, na subsunção e na
implicação, classificados em formal e material, erro de fato e erro de direito.
51. As normas que fixam o processo de produção normativa são de direito
material, quanto aos limites materiais de conteúdo, e de direito formal, quanto aos
limites de forma pelo procedimento de expedição da norma.
52. Vício formal é relação com a norma de direito formal, que prescreve o
processo de produção normativo. Ocorre nos pressupostos de validade do auto de
infração. É defeito linguístico no erro de direito, que não há subsunção nos critérios
da norma abstrata e geral com a norma concreta e individual introduzida.
Classificamos como espécie de invalidade por anulabilidade que tem efeito jurídico o
possibilitar o Fisco de lavrar novo lançamento de ofício ou auto de infração para
regularizar o vício e tornar o ato administrativo tributário válido.
53. Vício material é na norma de direito material. Está no conteúdo da norma
jurídica introduzida, ou seja, nos elementos intrínsecos, no antecedente e no
consequente da norma. É defeito linguístico no erro de fato, na implicação.
128
Classificamos como espécie de invalidade por nulidade que tem o efeito jurídico da
extinção da obrigação tributária.
54. Tecida essas considerações, podemos relacionar as espécies de
invalidade, os vícios e seus efeitos com os requisitos do auto de infração dispostos
no art. 10 do PAF em: a) defeito na qualificação do autuado (inciso I); no local, data
e hora da lavratura do auto de infração (inciso II); na descrição do fato (inciso III); na
disposição legal infringida e na penalidade aplicável (inciso IV); e na determinação
da exigência (inciso V, primeira parte); são passíveis da decretação de invalidade
por nulidade que contém um vício material e acarreta a extinção da obrigação
tributária; e b) defeito na lavratura por servidor competente e no local da verificação
da falta (caput); na intimação do contribuinte para cumprir ou impugnar o auto de
infração (inciso V, segunda parte); e na assinatura do autuante e na indicação de
seu cargo ou função e o número de matrícula (inciso VI); são passíveis de
decretação de invalidade por anulabilidade que contém um vício formal e tem o
efeito jurídico do possibilitar o Fisco de constituir novo lançamento tributário ou auto
de infração regularizando o vício.
55. Assim, concluímos que apesar da sistematização que acabamos de
descrever, a ausência de normas legais que prescrevem os vícios materiais e
formais, seus efeitos e as espécies de invalidade, afeta a estabilidade do
ordenamento jurídico, pois a decretação da invalidade do auto de infração é feita
pelo julgador, que partindo de um sistema de referência diferente do nosso, pode
chegar a conclusões diversas, que colocam em risco o princípio da segurança
jurídica, da estrita legalidade e da tipicidade, bem como o exercício das garantias
constitucionais do contribuinte. Logo, há a necessidade de uma alteração legislativa
para uma melhor sistematização da invalidade no auto de infração.
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