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UAB – UNIVERSIDADE ABERTA DO BRASILFUESPI – FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE ESTADUAL DO PIAUÍ
NEAD - NÚCLEO DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIALICENCIATURA PLENA EM LETRAS PORTUGUÊS
FUESPI2011
INTRODUÇÃO À LINGUÍSTICA
Iveuta de Abreu LopesNize da Rocha Santos Paraguassu Martins
Raimundo Isídio de Sousa
Lopes, Iveuta de Abreu. Introdução à Linguística / Iveuta de Abreu Lopes, Nize daRocha Santos Paraguassu Martins, Raimundo Isídio de Sousa.– Teresina: UAB/FUESPI/NEAD, 2011.
129 p. (Licenciatura Plena em Letras Português modalidadea distância)
ISBN: 978-85-61946-26-5
1. Linguística – concepções e estudo da linguagem. 2.Linguística – escolas linguísticas no século XX. I. Iveuta deAbreu Lopes. II. Nize da Rocha Santos Paraguassu Martins.III. Raimundo Isídio de Sousa. IV. Título.
CDD: 410
L8641i
Presidente da RepúblicaDilma Vana Rousseff
Vice-presidente da RepúblicaMichel Miguel Elias Temer Lulia
Ministro da EducaçãoFernando Haddad
Secretário de Educação a DistânciaCarlos Eduardo Bielschowsky
Diretor de Educação a Distância CAPES/MECCelso José da Costa
Governador do PiauíWilson Nunes Martins
Secretário Estadual de Educação e Cultura do PiauíÁtila de Freitas Lira
Reitor da FUESPI – Fundação Universidade Estadual do PiauíCarlos Alberto Pereira da Silva
Vice-reitor da FUESPINouga Cardoso Batista
Pró-reitor de Ensino de Graduação – PREGMarcelo de Sousa Neto
Coordenadora da UAB-FUESPIMárcia Percília Moura Parente
Coordenador Adjunto da UAB-FUESPIRaimundo Isídio de Sousa
Pró-reitor de Pesquisa e Pós-graduação – PROPIsânio Vasconcelos de Mesquita
Pró-reitora de Extensão, Assuntos Estudantis e Comunitários – PREXFrancisca Lúcia de Lima
Pró-reitor de Administração e Recursos Humanos – PRADAcelino Vieira de Oliveira
Pró-reitor de Planejamento e Finanças – PROPLANRaimundo da Paz Sobrinho
Coordenadora do curso de Licenciatura Plena em Letras Espanhol – EADMargareth Torres de Alencar Costa
EdiçãoUAB - FNDE - CAPESFUESPI/NEAD
Diretora do NEADMárcia Percília Moura Parente
Diretor AdjuntoRaimundo Isídio de Sousa
Coordenadora do Curso de LicenciaturaPlena em Letras – PortuguêsAlima do Nascimento Silva
Coordenador de T utoriaOmar Mario Albornoz
Coordenadora de Produção de MaterialDidáticoCândida Helena de Alencar Andrade
Autores do LivroElias Maurício da Silva RodriguesSilvana da Silva Ribeiro
RevisãoTeresinha de Jesus Ferreira
DiagramaçãoLuiz Paulo de Araújo Freitas
CapaLuiz Paulo de Araújo FreitasFonte da imagem:
MATERIAL PARA FINS EDUCACIONAISDISTRIBUIÇÃO GRATUITA AOS CURSISTAS UAB/FUESPI
UAB/FUESPI/NEAD
Campus Poeta Torquato Neto (Pirajá),NEAD, Rua João Cabral, 2231, bairroPirajá, Teresina (PI). CEP: 64002-150,Telefones: (86) 3213-5471 / 3213-1182
Web: ead.uespi.brE-mail:eaduespi@hotmail.com
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ........................................................................................ 11
UNIDADE 1
1 A LINGUAGEM: NA TUREZA, CARACTERÍSTICAS E FUNÇÕES ..... 15
1. 1 O QUE É LINGUAGEM? ................................................................... 15
1. 2 A COMUNICAÇÃO ............................................................................ 17
1. 3 FUNÇÕES DA LINGUAGEM ............................................................ 19
RESUMINDO ........................................................................................... 25
LEITURA COMPLEMENTAR ................................................................... 27
ATIVIDADES DE APRENDIZAGEM ........................................................ 30
UNIDADE 2
2 ESTUDOS DA LINGUAGEM: ESTÁGIOS DE DESENVOL VIMENTO E
PERSPECTIVAS .................................................................................... 35
2. 1 DA ANTIGUIDADE AO SÉCULO XIX ................................................ 36
2.2 A LINGUÍSTICA COMPARADA .......................................................... 42
2.3 AS CONTRIBUIÇÕES DE HUMBOLT E WHITNEY ............................ 47
RESUMINDO ........................................................................................... 49
LEITURA COMPLEMENTAR ................................................................... 52
ATIVIDADES DE APRENDIZAGEM ........................................................ 66
UNIDADE 3
3 A LINGUÍSTICA: CIÊNCIA DA LINGUAGEM ..................................... 71
3.1 REFLEXÕES SOBRE CIÊNCIA ........................................................ 71
3.2 A LINGUÍSTICA E SEU OBJETO DE ESTUDO .................................. 75
3.3 LINGUÍSTICA E GRAMÁTICA ............................................................ 79
RESUMINDO ........................................................................................... 82
LEITURA COMPLEMENTAR ................................................................... 84
ATIVIDADES DE APRENDIZAGEM ........................................................ 99
UNIDADE 4
4 AS ESCOLAS LINGUÍSTICAS NO SÉCULO XX: UMA VISÃO
INTRODUTÓRIA ................................................................................... 103
4.1OS ESTRUTURALISMOS LINGUÍSTICOS ........................................ 103
4.2 A LINGUÍSTICA FORMAL ................................................................. 110
4.3 AS ESCOLAS FUNCIONALISTAS................................................... 113
RESUMINDO ......................................................................................... 118
LEITURA COMPLEMENTAR ................................................................. 119
ATIVIDADES DE APRENDIZAGEM ...................................................... 124
REFERÊNCIAS .................................................................................... 125
9
FUESPI/NEAD Letras Português
INTRODUÇÃO
No contexto dos estudos linguísticos, contamos hoje, no Brasil, com
uma produção bastante vasta e diversificada, tanto no que diz respeito à
dimensão teórica quanto aos resultados de pesquisas realizadas na área.
Por que, então, estaríamos trazendo mais um texto sobre Linguística, mais
especificamente, sobre introdução à Linguística?
A justificativa para tanto é muito clara e plausível. Trata-se de atender
a um modelo de Programa de Educação muito específico - a modalidade a
distância - e a uma clientela de estudantes que, por isso, necessita de uma
atenção também particular.
Para atender a esse aspecto, elaboramos este livro com o objetivo
de, numa linguagem científica, mas bastante acessível e didática, trazer aos
estudantes de Letras-Português, na modalidade a distância, uma introdução
aos estudos linguísticos. O nosso propósito, na elaboração deste material, é
fazer com que os estudantes aos quais se destina tenham um primeiro contato
com esse campo de estudo e, assim, preparem-se para leituras futuras, mais
ousadas e aprofundadas.
Tentamos fazer um breve percurso dos estudos da linguagem, desde
os seus primeiros momentos, que remontam à Antiguidade Clássica, época
em que as abordagens filosóficas eram preponderantes até os nossos dias,
quando vislumbramos um terreno fértil em pesquisas, reflexões e conjunção
de esforços acerca dos estudos sobre a linguagem humana, vista como uma
ação, como interação, atualizada em práticas sociais.
O livro encontra-se organizado em quatro Unidades, cada uma delas
se inicia com os objetivos que desejamos alcançar; após, seguem-se os
conteúdos e se encerra com algumas atividades que, certamente, auxiliarão
na consolidação da aprendizagem.
Na primeira Unidade, discutimos especificamente sobre linguagem,
apontamos sua definição, suas características e suas funções na comunicação
humana.
Na segunda Unidade, apresentamos um panorama dos estágios de
desenvolvimento dos estudos da linguagem: da Antiguidade, com suas
abordagens de cunho filosófico, às perspectivas que favoreceram e prepararam
o terreno para que a Linguística se constituísse como uma ciência autônoma.
Na terceira Unidade, dividida em três seções, tratamos do estatuto
da Linguística, enquanto ciência da linguagem. Inicialmente, discutimos como
as próprias noções de ciência e de método científico evoluíram, especialmente,
a partir do início do século XX; em seguida, mostramos a constituição do
objeto de estudo da Linguística – a língua –, considerando-o em todas as
suas manifestações; além disso, apresentamos a caracterização da Linguística
confrontada aos estudos normativos da língua, constituídos na gramática
normativa.
Finalmente, na quarta Unidade, apresentamos a consolidação da
Linguística como um vasto campo de investigação e conhecimento científico,
iniciado com Ferdinand de Saussure, no início do século XX. Enfocamos as
três escolas que orientam os estudos linguísticos: começando pelo
estruturalismo, passando pelas escolas formais, como a proposta por Noam
Chomsky, e finalizando com as escolas funcionalistas, que estão centradas
exclusivamente no uso.
Desejamos que este livro seja, para cada um daqueles que dele se
utilizar, uma fonte de valiosos conhecimentos e que, também, seja uma ponte
e uma abertura para tantos outras leituras.
Iveuta de Abreu Lopes
Nize da Rocha Santos Paraguassu Martins
Raimundo Isídio de Sousa
UNIDADE 1
OBJETIVOS
1. Caracterizar a linguagem.
2. Definir comunicação e apontar seus elementos.
3. Identificar as funções da linguagem.
A LINGUAGEM: NA TUREZA, CARACTERÍSTICASE FUNÇÕES
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FUESPI/NEAD Letras Português
1 A LINGUAGEM: NA TUREZA, CARACTERÍSTICAS E FUNÇÕES
“Os limites da minha linguagem são os limites do meu mundo”
Ludwig Wittgenstein
1.1 O QUE É LINGUAGEM?
O termo linguagem é empregado em vários sentidos. Entretanto, o
mais conhecido é o de que a linguagem é todo e qualquer meio utilizado para
estabelecer comunicação. A linguagem pode ser classificada em dois tipos:
linguagem verbal e linguagem não verbal . A linguagem verbal é o meio
de comunicação, próprio da espécie humana, que utiliza línguas naturais para
transmitir uma mensagem. A linguagem não-verbal é o meio de comunicação
que utiliza outros meios que não línguas naturais para transmitir uma mensagem,
como por exemplo, imagens, movimentos, odores etc.
Como este livro é uma introdução à Linguística, ciência que estuda a
linguagem verbal humana, iremos, de agora em diante, nos restringir ao estudo
desse tipo de linguagem.
Com o desenvolvimento dos estudos lingüísticos, foram surgindo várias
definições de linguagem verbal, próximas em alguns pontos e diversas no
que diz respeito à ênfase dada aos vários recortes feitos por diferentes autores.
Em uma tentativa de apresentar uma visão geral e imparcial em relação a
essas definições, ater-nos-emos, por hora, apenas à caracterização da
linguagem verbal como uma capacidade eminentemente humana.
André Martinet (1978) defende que a linguagem é duplamente
articulada, Isso significa que suas unidades podem ser segmentadas. Para o
autor, a linguagem articula-se em dois planos: o dos morfemas e o dos fonemas.
O plano dos morfemas representa a primeira articulação, é dotado de sentido
e de matéria fônica. O verbo “amava” pode ser segmentado nos seguintes
morfemas: {am-} radical; {-a} morfema que indica que o verbo é de 1ª
14
Introdução à Linguística
conjugação e {-va} desinência modo temporal. O plano dos fonemas representa
a segunda articulação, é dotado apenas de matéria fônica. O radical do verbo
“amava”, {am-}, pode articular-se nos fonemas /a/ e /m/.
A esse respeito, Câmara Júnior (1981, p. 16) afirma:
Petter (2005, p.16), comparando o sistema de comunicação das
abelhas com o sistema de comunicação humano, contrapõe as características
da linguagem não-verbal utilizada pelas abelhas com as da linguagem verbal
humana, como segue:
A articulação da linguagem decorre da divisibilidade: a enunciaçãovocal humana é articulada, porque se presta a uma divisãosistemática, por meio da qual chegamos a elementos sônicossignificativos. E por outro lado, esses elementos existem, porquejuntos a sua significação permanente assegura a suaindividualizada nítida e nos faz reconhecê-los, sempre idênticos asi mesmos nas mais variadas circunstâncias.
a) a mensagem (da abelha) se traduz pela dança exclusivamente, sem intervenção deum aparelho vocal, condição essencial para a linguagem;b) a mensagem da abelha não provoca uma resposta, mas apenas uma conduta, oque significa que não há diálogo;c) a comunicação se refere a um dado objetivo, fruto da experiência. A abelha nãoconstrói uma mensagem a partir de outra mensagem. A linguagem humana caracteriza-se por oferecer um substituto à experiência, apto a ser transmitido infinitamente notempo e no espaço;d) o conteúdo da mensagem é único – o alimento, a única variação possível refere-seà distância e à direção; o conteúdo da linguagem humana é ilimitado; ee) a mensagem das abelhas não se deixa analisar, decompor em elementos menores.
Desse modo, podemos afirmar, sinteticamente, que a linguagem verbal
se caracteriza como eminentemente humana por ser:
a) Transmitida por meio de um aparelho vocal;b) Empregada como meio de interação entre os sujeitos;c) Transmitida infinitamente no tempo e no espaço;d) Apresenta conteúdo ilimitado;e) É perfeitamente analisável;
f) É duplamente articulada.
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FUESPI/NEAD Letras Português
1.2 A COMUNICAÇÃO
A comunicação é o ato de se transmitir uma mensagem. A atividade
comunicativa está presente na vida de todos os animais. Como aponta Borba
(2005), os animais se comunicam seja por necessidades de sobrevivência
seja por imperativos biológicos, como, por exemplo, a preservação da espécie.
Entretanto, é na espécie humana que a comunicação atinge o seu mais alto
grau de desenvolvimento, dado que o homem é um ser social e, como tal,
necessita exprimir emoções, trocar idéias e experiências.
O ato comunicativo é dinâmico e, nessa dinâmica, estão envolvidos
vários elementos. Entre os linguistas, são várias as propostas que especificam
os elementos envolvidos na comunicação, mas a mais difundida é, sem dúvida,
a do linguista Roman Jakobson (2007).
Segundo o autor, a comunicação é um processo em que um remetente
envia uma mensagem a um destinatário que compartilha de um mesmo
contexto , por meio de um canal , utilizando um código comum a ambos. O
esquema que segue nos permite visualizar, sem muitos detalhes, os elementos
da comunicação propostos por Jakobson (2007):
Observando o esquema, não é difícil perceber que cada um desses
elementos exerce um papel essencial no processo de comunicação. O
remetente é quem envia a mensagem, e o destinatário é a quem se destina
a mensagem. A mensagem é a informação que o remetente deseja transmitir
16
Introdução à Linguística
ao destinatário. O contexto é o assunto a que se refere a mensagem. O
contato é o canal, meio físico utilizado para transmitir a mensagem e o código
é o sistema de sinais ou signos convencionais utilizado pelo remetente na
transmissão da mensagem.
Imaginemos, agora, a seguinte situação comunicativa em que a
mensagem é transmitida e entendida pelo destinatário: “Um estudante ao
telefone convidando um colega de faculdade para ir ao cinema assistir ao
filme “Crepúsculo”, no próximo domingo. Nessa situação, o estudante
configura-se como o remetente, o colega de faculdade como o destinatário, o
convite para ir ao cinema como a mensagem, o filme “Crepúsculo” como o
contexto, o telefone como o canal e a língua portuguesa como o código.
Entretanto, se houver qualquer problema com um dos elementos da
comunicação, podendo prejudicar ou invalidar a percepção ideal da
mensagem, chamaremos esse problema de ruído . Assim, se a situação
comunicativa acima sofrer interferência devido à ocorrência de “linha cruzada”,
caracterizaremos esse problema como um ruído. Nesse caso, houve
interferência no canal da comunicação. No entanto, vale ressaltar que há
diversas situações, envolvendo outros elementos da comunicação, em que
pode ocorrer ruído.
Até aqui as informações apresentadas versam sobre um modelo de
teoria da comunicação que trata apenas da transmissão da mensagem do
remetente para o destinatário, sem se preocupar com a reciprocidade
característica da comunicação humana, isto é, com a possibilidade de o
destinatário tornar-se remetente e de realimentar a comunicação.
A partir dos anos de 1950, nos Estados Unidos, surgiu um modelo de
teoria da comunicação que tratava a linguagem não só como meio de
comunicação, mas também como meio de interação social. Barros (2005)
explica que, para esse novo modelo, a comunicação passou a ser pensada
não mais como um fenômeno linear em que importam apenas os efeitos da
comunicação sobre o destinatário, mas como um fenômeno circular, em que
17
FUESPI/NEAD Letras Português
também importam os efeitos que a reação do destinatário produz sobre o
remetente.
Entre os linguistas, o russo Mikhail Bakhtin destacou-se como o
pioneiro nos estudos do diálogo entre os interlocutores. Segundo esse autor,
a interação entre os sujeitos é o princípio fundamental da linguagem. O esquema
que segue nos permite visualizar a interação entre os sujeitos segundo esse
novo modelo de teoria da comunicação.
Nesse esquema, diferentemente do outro, o remetente seleciona um
código apropriado para formular uma mensagem compreensível para os seus
destinatários e o destinatário interpreta e responde a mensagem por meio do
seu pensamento ou por meio de um novo enunciado. É, portanto, a interação
do destinatário com o remetente que torna esse modelo diferente e mais
completo.
1.3 FUNÇÕES DA LINGUAGEM
Entendida como meio de comunicação, a linguagem verbal humana
presta-se a várias funções. Jakobson estipulou seis funções cada uma centrada
em um dos elementos acima citados. Observemos então:
a) Função referencial . É quando a linguagem é utilizada com a
finalidade de transmitir uma informação. Nesse caso, é carregada de
objetividade e realidade. Está centrada no contexto já que reflete uma
18
Introdução à Linguística
preocupação em transmitir objetivamente uma informação. Elaborada em 3ª
pessoa, utiliza, principalmente, frases declarativas e estratégias
argumentativas. Um exemplo de linguagem utilizada com essa função é a
empregada nos jornais e revistas. O texto abaixo, por apresentar uma linguagem
em 3ª pessoa, carregada de frases declarativas e objetivas, veiculando
informações sobre O 2º Festival Nacional de Teatro – Pontos de Cultura –
Troféu Ací Campelo, é predominantemente caracterizado como referencial.
“O 2º Festival Nacional de Teatro – Pontos de Cultura – Troféu Ací Campelo, será
realizado pelo Pontão de Cultura “Cultura Viva ao Alcance de Todos” juntamente
com Grupo Escândalo Legalizado de Teatro. O evento atrai Pontos de Culturas de
todo o país, o mesmo acontecerá no período de 25 a 29 de outubro de 2011.”
(Disponível em http://www.180graus.com/cultura/2o-festival-nacional-de-teatro-
atrai-pontos-de-cultura-de-todo-brasil-433182.html)
b) Função emotiva . É quando a linguagem é usada com a finalidade
de exprimir sentimentos e opiniões. Nesse caso, é carregada de subjetividade
e emoção. Está centrada no emissor já que é a sua emoção que está sendo
considerada na mensagem. Elaborada em 1ª pessoa, emprega frases
exclamativas e recursos como pausas, hesitações e interjeições. Um exemplo
desse tipo de função está em uma situação em que um indivíduo, ao falar,
morde, sem querer, a língua e diz: “Ai!”. O texto que segue ilustra um outro
exemplo de linguagem com função emotiva:
“Luís Fernando V eríssimo : Eu não escrevo exatamente “para” jovens. Sei que
adolescentes leem o que eu escrevo, mas não são o meu “público alvo”. Na verdade
meu público alvo sou eu mesmo. Procuro me satisfazer e espero que o leitor, de
qualquer idade, compartilhe do meu gosto. Mas temos bons autores para o público
jovem.” (COELHO, 2009).
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FUESPI/NEAD Letras Português
O texto acima é um trecho de uma entrevista concedida por Fernando
Veríssimo ao jornalista André Coelho. Emprega a 1ª pessoa (Eu não escrevo...;
Procuro me satisfazer...) e apresenta a opinião de Fernando Veríssimo sobre
o público que lê a sua obra, o que produz efeitos de subjetividade, próprios da
função emotiva.
c) Função conativa ou apelativa . É quando a linguagem é utilizada
com a finalidade de persuadir o receptor. A linguagem é elaborada em 2ª
pessoa, com o uso de frases imperativas, modalizadores deônticos (dever) e
estruturas de pergunta e resposta. Está centrada no receptor, visto que visa
convencê-lo a algo. Um exemplo de linguagem utilizada com essa função é a
empregada nas propagandas. A frase abaixo ilustra essa função:
“Dê ao seu bebê algo que você não teve na infância. Um bumbum seco.” (fraldas
Johnson’s)
‘Não beba só uma, bebavárias.” (Cerveja Bavária)
Nos textos acima, empregam-se a 2ª pessoa e o imperativo (dê e
não beba, respectivamente) para produzir os efeitos de persuasão próprios
da linguagem com função apelativa.
d) Função Fática . É quando a linguagem tem a finalidade de manter
a comunicação. Empregam-se frases curtas, interrogativas e de fácil
compreensão. Está centrada no canal visto que visa testar a todo instante o
contato comunicativo entre os interlocutores. Um exemplo de linguagem
utilizada com essa função é a linguagem empregada nas ligações telefônicas.
A música transcrita abaixo ilustra bem função:
Sinal Fechado
Paulinho da Viola
Composição: Paulinho da Viola
Olá, como vai ?
20
Introdução à Linguística
Eu vou indo e você, tudo bem ?
Tudo bem eu vou indo correndo
Pegar meu lugar no futuro, e você ?
Tudo bem, eu vou indo em busca
De um sono tranquilo, quem sabe ...
Quanto tempo... pois é...
Quanto tempo...
Me perdoe a pressa
É a alma dos nossos negócios
Oh! Não tem de quê
Eu também só ando a cem
Quando é que você telefona ?
Precisamos nos ver por aí
Pra semana, prometo talvez nos vejamos
Quem sabe ?
Quanto tempo... pois é... (pois é... quanto tempo...)
Tanta coisa que eu tinha a dizer
Mas eu sumi na poeira das ruas
Eu também tenho algo a dizer
Mas me foge a lembrança
Por favor, telefone, eu preciso
Beber alguma coisa, rapidamente
Pra semana
O sinal ...
Eu espero você
Vai abrir...
Por favor, não esqueça,
Adeus...
(http://letras.terra.com.br/paulinho-da-viola/48064/)
21
FUESPI/NEAD Letras Português
O texto acima, poema musicado de Paulinho da Viola, constitui-se
em um diálogo em que os interlocutores, a todo instante, testam o canal da
comunicação por meio de frases interrogativas curtas, tornando o texto
predominantemente fático.
e) Função metalinguística . É a função da linguagem que tem a
finalidade de explicar o código linguístico. Está centrada no código, visto que
emprega a linguagem para falar da própria linguagem. A linguagem empregada
é carregada de definições, explicações e conceituações. Os verbetes do dicionário
são exemplos dessa função da linguagem. Observemos, como ilustração, o
significado da palavra “texto”, conforme expresso no dicionário Michaelis on-line:
f) Função poética . É a função da linguagem que tem a finalidade de
valorizar a mensagem, sua forma e seu conteúdo. Está centrada na mensagem,
visto que é predominantemente conotativa. Nesse caso, a linguagem é
carregada de valor artístico e musicalidade, havendo muita recorrência de
figuras de linguagem. Podemos pensar, como exemplo desse tipo de função,
as poesias e textos literários. Entretanto, como aponta Petter, (2005), a função
emotiva também pode ser encontrada em textos publicitários e na fala do dia
a dia, embora nesses casos esteja muitas vezes subordinada a outras funções
da linguagem. Observemos o soneto “Único bem”, de Da Costa e Silva:
tex.to(ês) sm (lat textu) 1 As próprias palavras de um autor, de queconsta algum livro ou escrito. 2 Palavras que se citam para provarqualquer doutrina. 3 Passagem da Escritura que forma o assuntode um sermão. 4 Art Gráf A parte principal de um periódico ou livro,que contém a exposição da matéria. 5 Em propaganda, parteescrita de um anúncio, exceto o título. sm pl Coleções do direitoromano ou canônico. T. de abertura: anúncio a ser lido no início deum programa de rádio. T. de chamada: texto de poucas palavras(5 a 20) com que se anuncia um programa de rádio. T. deencerramento: anúncio destinado ao final do programa radiofônico.T. de fluxo, Inform: texto que, ao ser inserido no formato de umapágina num sistema de editoração eletrônica, preenche todos osespaços ao redor das figuras, e entre as margens.( h t t p : / / m i c h a e l i s . u o l . c o m . b r / m o d e r n o / p o r t u g u e s /index.php?lingua=portugues-portugues&palavra=texto).
22
Introdução à Linguística
Lutei, sonhei, sofri, desde criança,
Nesta inquietude, nesta vã tortura
De quem jamais consegue o que procura
E, se consegue, perde quando alcança.
Já nem me resta ao menos a esperança,
Para a ilusão da glória e da ventura;
Nem a fé, ante a dúvida, perdura,
Desde que o amor, num túmulo descansa.
Tanto alcancei, quanto perdi, de sorte
Que, em suprema renúncia, a alma vencida
Não devera aspirar senão à morte.
Mas, como a sorte me foi tão funesta,
Aprendi muito mais a amar a vida,
Porque é o único bem que ainda me resta.
(http://www.revista.agulha.nom.br/dcosta16p.html)
No poema acima, podemos notar que há uma preocupação formal na
transmissão da mensagem. O poema é um soneto, os versos apresentam
rimas e a linguagem é conotativa. A presença desses recursos demonstra
preocupação com o efeito estético da mensagem, o que caracteriza esse
poema como um bom exemplo de linguagem utilizada com função poética.
Ao estipular as funções da linguagem, Jakobson chamou a atenção
para o fato de que, embora para efeito de análise possamos distinguir essas
seis funções, na prática elas não são exclusivas. Ou seja, uma mesma
mensagem pode apresentar mais de uma função. Desse modo, segundo o
autor, o que vai definir a função que caracteriza a mensagem é a predominância
de uma sobre a outra. Vejamos, agora, o poema de Fernando Pessoa:
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FUESPI/NEAD Letras Português
Hoje de Manhã
Hoje de manhã saí muito cedo,
Por ter acordado ainda mais cedo
E não ter nada que quisesse fazer...
Não sabia por caminho tomar
Mas o vento soprava forte, varria para um lado,
E segui o caminho para onde o vento me soprava nas costas.
Assim tem sido sempre a minha vida, e
assim quero que possa ser sempre —
Vou onde o vento me leva e não me
Sinto pensar.
(Fernando Pessoa)
(http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/pe000003.pdf)
Nesse poema, podemos identificar duas funções da linguagem: a
função emotiva e a função poética. No entanto, a função emotiva é a que
predomina. No poema, o uso da primeira pessoa e a exposição de sentimentos
e emoções causando efeito de subjetividade justificam essa predominância,
na medida em que esses fatos sobressaem em relação ao cuidado com a
forma de elaboração da mensagem, próprio da linguagem poética.
RESUMINDO
1.1 LINGUAGEM
• É todo e qualquer meio utilizado de comunicação. Pode ser
classificada em:
24
Introdução à Linguística
a) Linguagem verbal : meio de comunicação próprio da espécie
humana que utiliza as línguas naturais para transmitir uma mensagem.
b) Linguagem não-verbal : meio de comunicação que utiliza outros
que não as línguas naturais para transmitir uma mensagem, como símbolos,
gestos, movimentos etc.
1.2 COMUNICAÇÃO
• É o ato de se transmitir uma mensagem por meio de uma linguagem.
Segundo Roman Jakobson (2007) são seis os elementos da comunicação:
remetente , destinatário , contexto , mensagem, canal e código .
• Com o desenvolvimento dos estudos sobre a linguagem como meio
de interação, proposto por Mikhail Bakhtin, o destinatário passou a ser não só
receptor da mensagem, mas passou a interpretar e a responde a mensagem
por meio do seu pensamento ou por meio de um novo enunciado.
1.3 FUNÇÕES DA LINGUAGEM
• A linguagem verbal humana pode apresentar várias funções.
Jakobson, com base nos elementos da comunicação, estipulou seis funções
cada uma centrada em um desses elementos.
a) Contexto – função referencial;
b) Remetente – função emotiva;
c) Contato – função fática;
d) Mensagem – função poética;
e) Destinatário – função conativa ou apelativa;
f) Código – função metalinguística.
25
FUESPI/NEAD Letras Português
LEITURA COMPLEMENTAR
Com o objetivo de oferecer ao leitor mais informações acerca da
sociedade e do sistema de comunicação das abelhas, indicamos a leitura do
artigo abaixo:.
Na sociedade da colmeia há rainha, operárias e zangões
Cynthia Santos*
As abelhas são insetos sociais. Os indivíduos que vivem nas colmeias
se dividem em três castas: rainha, operárias e zangões.
Quando pensamos em rainhas, pensamos em alguém com muito
poder, que diz a todo mundo o tempo todo o que fazer, certo? Bem, isso não
acontece com as abelhas. Na sociedade das abelhas não há um posto central de
comando. O poder é disseminado através da colmeia e as decisões diárias são
tomadas consensualmente através de estímulos químicos, visuais, auditivos e táteis.
A incrível cooperação observada entre as abelhas de uma colmeia é
explicada pelo compartilhamento de 75% de seus genes. Para você ter uma
ideia, na espécie humana, irmãos de uma mesma família compartilham 50%
de seus genes.
Nas colmeias, as abelhas se dividem em castas: rainha, operárias e zangões
26
Introdução à Linguística
A maioria das abelhas de uma colmeia é formada por fêmeas: 1 rainha
e cerca de 5.000 a 100.000 operárias. Os machos - os zangões - são
encontrados em um numero máximo de 400 indivíduos.
A rainha
As funções exercidas pela rainha são a postura de ovos e a
manutenção da ordem social na colmeia. Segundo o especialista da
Universidade de Illinois em Urbana-Champaign, Gene E. Robinson, "apesar
de a rainha não dizer a todos o que fazer, ela faz as coisas funcionarem, apenas
por estar presente".
Na verdade, a rainha atinge seu objetivo de manter a ordem social
através da liberação de substâncias químicas chamadas feromônios. Essas
substâncias informam os outros membros da colmeia de que existe uma rainha
presente e em atividade, além de inibirem a produção de outras rainhas.
A rainha é quase duas vezes maior do que as operárias e é a única
fêmea fértil da colmeia, com um sistema reprodutivo bastante desenvolvido.
Ela coloca cerca de 2.500 ovos por dia! Os ovos fertilizados produzem
operárias e rainhas. O que determina se o ovo formará uma rainha ou uma
operária é o alimento oferecido à larva originada do próprio ovo.
As larvas que se alimentam exclusivamente de geléia real se
desenvolvem em rainhas. As que se alimentam de geléia de operária, contendo
menos açúcar do que a geléia real, mais mel e pólen, transformam-se em
operárias. Além da alimentação, o local onde é criada influencia o
desenvolvimento da larva. Um alvéolo maior, chamado de realeira, é usado
para o desenvolvimento da rainha. Ovos não fertilizados se desenvolvem em
zangões.
Operárias e zangões
As operárias realizam todo o trabalho para a manutenção da colmeia,
desde a faxina até a defesa da colmeia. Elas limpam os alvéolos da colmeia
e as abelhas recém-nascidas, coletam néctar e pólen das flores, cuidam da
alimentação das larvas, produzem cera para produção dos favos, elaboram o
27
FUESPI/NEAD Letras Português
mel através da desidratação do néctar, produzem a geléia real, defendem a
colmeia dos inimigos.
Os machos da colmeia têm como única função fecundar a rainha
durante o vôo nupcial. Eles são maiores e mais fortes do que as operárias e
não possuem ferrão. Seus olhos, mais desenvolvidos do que os olhos das
operárias, e suas antenas, com maior capacidade olfativa, os tornam mais
eficientes na localização das rainhas durante o vôo nupcial.
Se você está pensando que vida boa têm esses zangões, pois não
precisam trabalhar mesmo sendo mais fortes e maiores, não fazem nada na
colmeia a não ser fecundar a rainha, espere até ler isso: durante o
acasalamento, o órgão genital do zangão fica preso no corpo da rainha e ele
acaba morrendo!!
Companheiras de colmeia sobre uma fonte rica em néctar ou pólen
encontrada nas proximidades da colmeia, ela inicia uma dança circular.
Esse tipo de dança indica que a fonte de alimento encontra-se
próxima, a menos de 100 metros da colmeia, mas não indica qual direção a
tomar. No entanto, o cheiro específico do pólen grudado no corpo da abelha
que dançou para suas companheiras as informa sobre a planta visitada. Assim,
elas podem procurar pela planta perto da colmeia.
Já quando a fonte de alimento encontra-se a mais de 100 metros de
distância da colmeia, as abelhas utilizam-se de outro tipo de dança, a "dança
do requebrado". Isso mesmo, a abelha requebra para informar a direção e a
distância entre a colmeia e a fonte de alimento. A distância é ensinada pela
abelha dançarina através do número de vibrações (requebrados) realizadas
e pela intensidade do som emitido durante a dança. Quanto menor a distância
entre a colmeia e a fonte, maior o numero de vibrações. A direção é informada
pela relação da posição da dançarina com a posição do sol.
Disponível em: http://educacao.uol.com.br/ciencias/abelhas-2-na-
sociedade-da-colmeia-ha-rainha-operarias-e-zangoes.jhtm
28
Introdução à Linguística
ATIVIDADES DE APRENDIZAGEM
1. Estabeleça a distinção entre linguagem verbal e não-verbal e cite alguns
exemplos.
2. Simule uma situação comunicativa identificando todos os elementos
envolvidos nesse processo.
3. Qual a contribuição das ideias de Bakhtin para a teoria da comunicação?
4. Identifique a função da linguagem predominante nos textos abaixo e aponte
as pistas que conduziram a sua resposta.
a)
b) “Morreu na noite de domingo (19), no Rio de Janeiro, aos 90 anos, o químico
naturalizado brasileiro Otto Richard Gottlieb, conhecido internacionalmente por
seus trabalhos sobre produtos naturais e metabolismo de plantas. Ele foi um
dos primeiros grandes cientistas a chamar atenção para a sustentabilidade e
a preservação de florestas, ainda na década de 1960.”
(Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/ciencia/932761-quimico-que-chegou-mais-
perto-do-nobel-no-pais-morre-aos-90.shtml)
c) O mundo é grande
O mundo é grande e cabe
nesta janela sobre o mar.
O mar é grande e cabe
na cama e no colchão de amar.
O amor é grande e cabe
29
FUESPI/NEAD Letras Português
no breve espaço de beijar.
(Carlos Drummond de Andrade)
(http://www.revista.agulha.nom.br/drumm3.html#omundo)
5. Comente a partir da frase abaixo a importância do contexto, segundo a
teoria das funções da linguagem, para a compreensão da mensagem.
“Não ponha a mão na massa, use o telefone”
UNIDADE 2
OBJETIVOS
1. Resgatar o percurso histórico e os vários estágios de desenvolvimento da
linguagem, ressaltando-se as concepções sobre ela.
2. Identificar as contribuições dos filósofos gregos, dos gramáticos greco-latinos
e dos neogramáticos para o estudo da linguagem.
3. Descrever as categorias gramaticais sistematizadas pelos estoicos.
ESTÁGIOS DE DESENVOLVIMENTO EPERSPECTIVAS
33
FUESPI/NEAD Letras Português
2 ESTUDOS DA LINGUAGEM: ESTÁGIOS DE DESENVOL VIMENTO E
PERSPECTIVAS
Hermógenes - Sócrates, o nosso Crátilo sustenta que cada coisatem por natureza um nome apropriado que não se trata dadenominação que alguns homens convencionaram dar-lhes, comdesigná-las por determinadas vozes de sua língua, mas que, pornatureza, têm sentido certo, sempre o mesmo, tanto entre osHelenos como entre os bárbaros em geral.
Platão. Diálogos – Teeteto e Crátilo, 1988, p.102
Hermógenes - Por minha parte, Sócrates, já conversei várias vezesa esse respeito tanto com ele como com outras pessoas, semque chegasse a convencer-me de que a justeza dos nomes sebaseia em outra coisa que não seja convenção e acordo. Paramim, seja qual for o nome que se dê a uma determinada coisa,esse é o seu nome certo; e mais: se substituirmos esse nome poroutro, vindo a cair em desuso o primitivo, o novo nome não é menoscerto que o primeiro. (...) Nenhum nome é dado por natureza aqualquer coisa, mas pela lei e o costume dos que se habituarama chamá-la dessa maneira.
Platão. Diálogos – Teeteto e Crátilo, 1988, p.103
A linguagem, como já enfocamos na Unidade I, é um meio de
comunicação próprio do homem em sociedade. É inconcebível o homem sem
linguagem e vice-versa. Ela representa um conjunto de signos (verbais e não-
verbais) de um código, um sistema extremamente complexo. Segundo Kristeva
(2007, p. 16),
Em primeiro lugar, e vista do exterior, a linguagem reveste-se deum carácter material diversificado cujos aspectos e relações temosde conhecer: a linguagem é uma cadeia de sons articulados, mastambém uma rede de marcas escritas (uma escrita), ou um jogode gestos (uma gestualidade).
Os estudos da linguagem passaram, ao longo dos tempos, por
diferentes estágios, desenvolvendo-se de acordo com o pensamento
dominante da época. Neste capítulo, iremos refletir sobre eles, numa
perspectiva de evolução, considerando as diferentes bases epistemológicas
que particularizam o campo da ciência da linguagem como objeto de estudo.
34
Introdução à Linguística
A tradição dos estudos da linguagem teve como foco a lógica, a
retórica, a poética e o bom uso da linguagem. Pela primeira vez, foi a Linguística
comparativa e histórica que tratou a linguagem como objeto sistematizado de
estudo, tendo-a em si mesma e por si mesma, conforme veremos mais adiante.
Neste capítulo, abordaremos a linguagem na Antiguidade, passando pela
Idade Média e pela Renascença, até a Modernidade (século XIX), enfocando-se
a Linguística comparada e as contribuições de Humboldt e Whitney.
2.1 DA ANTIGUIDADE AO SÉCULO XIX
Na antiguidade, destacaram-se duas tradições acerca dos estudos
da linguagem: a orient al e a ocident al. A primeira foi representada pelos
trabalhos desenvolvidos pelos hindus, povos que estudaram a língua por
motivos religiosos. O hinduísmo visava à preservação dos escritos, dos textos
sagrados (os hinos, por exemplo) ao longo dos tempos, como forma de não
sofrer modificação ao serem proferidos, cantados durante os ritos. Os textos
foram reunidos no Veda, o primeiro dos quatro livros do Hinduísmo.
A concepção de linguagem dos hindus estava diretamente relacionada
à prática religiosa. O homem era visto como “processo infinito de diferenciação
cósmica”, e a linguagem ocupava ponto de honra. A sua ciência, a gramática,
chamava-se ciência suprema-purificante de todas as ciências, a via real
isenta de desvios, e que visava realizar o supremo objeto do homem
(KRISTEVA, 2007, p. 94). Para os hindus, a reflexão linguística dependia
diretamente da concepção religiosa de que eram testemunhos os textos
sagrados, que tratavam grande parte da linguagem e da significação. Os
elementos da língua obtinham um valor simbólico, e a gramática era um
instrumento que “purificava” o homem.
Os estudos mais antigos remontam o século IV aC. Entre os
gramáticos, destacou-se Pãnini (há quatro séculos antes da nossa era), que
estudou a gramática do sânscrito, “língua dita perfeita” e língua sagrada dos
35
FUESPI/NEAD Letras Português
hindus. Foi esse gramático que introduziu a
noção de gramática como norma e regra de
pronúncia e escrita do Sânscrito Védico para
impedir o falar vulgar dos procráticos. A
gramática de Pãnini era um livro composto
de 4000 sutras ou máximas . Segunda
Kristeva, as formulações desse gramático
mostram a organização da língua sânscrita do
ponto de vista fonológico e morfológico.
Os gramáticos hindus dedicaram-se
ao estudo do valor e do emprego das palavras
e fizeram excelentes transcrições fonéticas, que foram descobertas pelos
sábios ocidentais nos fins do século XVII, o que serviu como ponto de partida
para a criação da gramática comparada, que será discutida na seção 2.2.
Quanto à contribuição dos hindus para a teoria da significação,
Kristeva (2007, p. 100) acentua que:
E, referindo-se a Bhartrhari, acrescenta: “O sentido das falas distingue-
se segundo o contexto verbal, o contexto de situação, o fim visado, a
conveniência, segundo o espaço e o tempo, e não a forma das falas” (p. 100).
Percebemos que a linguagem para os hindus não tem uma concepção
fechada no objeto na língua, mas esboça a significação como princípio da
relação entre o sujeito e o seu exterior.
A segunda, a tradição ocidental , por outro lado, teve como referência
a cultura grega, que, mais tarde, influenciou os romanos. Os gregos trilharam
caminhos no sentido de descobrir a natureza da linguagem humana. Eram um
GLOSSÁRIOSutras
É um conjunto de ensinamentos. “Naliteratura hindu, os Sutras – diferentementedos Vedas, os textos sagrados propriamenteditos – são algo como “tratadoseducacionais”. Existem deles sobre guerra,arquitetura e gramática. Não se filosofavaindependentemente da religião, mas nem porisso a função do filósofo se confundia coma do sacerdote.(http://guiadoestudante.abril.com.br/estudar/historia/kama-sutra-concavo-convexo-435808.shtml)
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
A linguística indiana aproxima-se daquilo a que chamamosactualmente uma teoria da enunciação. Admite cmo elementosindispensáveis para a produção do sentido a função do sujeitofalante, do destinatário, da situação locutória, a posição espácio-temporal do sujeito, etc.
36
Introdução à Linguística
povo que se preocupava em estudar a própria língua nas perspectivas estética
(estilo) e filosófica.
Os gregos não nos legaram informações importantes sobre os falares
das populações com as quais tiveram contato. Aprenderam línguas
estrangeiras, mas os conhecimentos transmitidos pelos intérpretes se
perderam. Os helenos consideravam com desprezo as línguas que não o
grego. Para eles, apenas o grego era importante, e as demais línguas eram
tidas como bárbaras (tal denominação era pejorativa).
A perspectiva filosófica foi ponto de partida para o pensamento
linguístico moderno. Para os gregos, o problema essencial era definir as
relações entre a noção e a palavra que a designa. Platão problematiza o caráter
da origem da linguagem: convencional ou natural? Em outras palavras, os
nomes dados às coisas nascem de um contrato social ou resultam da natureza
das coisas? A partir dessa questão, surgiram duas escolas opostas: os
analogistas e os anomalistas . Os primeiros defendiam o caráter
convencional; já os segundos, a expressão natural da linguagem. Em relação
a essa abordagem, dizemos que não se trata da capacidade de o homem
criar a linguagem, mas da relação natural entre a língua e os seus objetos.
Os primeiros pensadores gregos defendiam que a palavra era a
encarnação das coisas (BORBA, 2005). Platão é um dos filósofos que
estudaram a relação entre a origem do nome das coisas e o conceito que ele
designa: os nomes eram naturais (escolhidos por algum deus ou por força da
natureza) ou convencionais ou puramente remetidos à história? “O
Primeiríssimo texto ocidental sobre a linguagem, o Crátilo de Platão, trata
especificamente desta questão.” (WEEDWOOD, 2002, p. 24).
Segundo Weedwood (2002, p. 25),
Platão (c. 429-347 a.C.) consagrou um de seus diálogos, o Crátilo,a este problema. Dos três interlocutores que ela retrata, Crátilosustenta que a língua espelha exatamente o mundo; Hermógenesdefende a posição contrária, a de que a língua é arbitrária,ressaltando tanto os pontos fortes quanto as fraquezas dos
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FUESPI/NEAD Letras Português
Aristóteles (382-322 a.C.), discípulo de Platão, analisou a linguagem
numa outra abordagem: a da constituição da gramática numa perspectiva
descritiva. Por exemplo, separou as categorias gramaticais: substância,
relação, lugar, tempo, estado etc. Também defendeu a oposição entre língua
(enérgeia) e discurso (érgon). A primeira ou é uma expressão ou é uma obra
sem intencionalidade; já a segunda representa os procedimentos utilizados
para obtermos a argumentação, a persuasão, tendo como referentes o
raciocínio e/ou a razão – podemos dizer que se trata da lógica aristotélica.
Os estoicos nos legaram sistematizações da língua, conforme
vejamos:
a) Nome – significava qualidade, estado, relação, substância.
Classificação: nomes próprios e comuns;
b) Verbo – é incompleto quando não há sujeito. É a categoria que
exprime quatro tempos: presente contínuo, presente realizado, passado
contínuo e passado realizado;
c) Conjunções;
d) Pronomes relativos e artigo;
e) Número, gênero, voz, modo e caso (que compreendiam as
derivações e as flexões verbais). (KRISTEVA, 2007, 122)
Para os estoicos, a linguagem se origina naturalmente na alma dos
homens e a palavra expressa a coisa conforme a natureza dela, suscitando,
do mesmo modo, no ouvinte, uma impressão conforme a dita natureza
(BORBA, 2005).
Após o período clássico da filosofia grega, os estudos acerca do
desenvolvimento da linguagem tiveram mais impulso nos trabalhos dos filósofos
argumentos dos outros dois e levando-os, por fim, a uma soluçãoconciliatória. A afirmação de inicial de Hermógenes de que os nomessão inteiramente arbitrários e podem ser impostos à vontade érefutada por Sócrates, que assinala que as palavras sãoferramentas: assim como uma lançadeira defeituosa não pode serusada para tecer, também as palavras precisam ter propriedadesque as tornem apropriadas ao uso.
38
Introdução à Linguística
e dos gramáticos. Entre os gramáticos, destacaram-se os gregos Dionísio de
Trácia e Apolónio Díscolo e os latinos Donato, Prisciano e Varrão.
a) Dionísio de T rácia (170-90 a.C) - era o mais conhecido professor
de gramática tradicional grega, escreveu a primeira gramática do Ocidente
(Téchné Grammatiké) e a concebia como uma arte, um “saber empírico da
linguagem dos poetas e dos prosadores”. (KRISTEVA, 2007, 123).
Desenvolveu estudos mais voltados à fonética e à fonologia. Na fonética, ele
apresentou uma teoria das letras e das sílabas; já na morfologia, estudou oito
partes do discurso: o verbo, o nome, o particípio, o artigo, o pronome, a
preposição, o advérbio e a conjunção. Desenvolveu a primeira gramática
grega, que tinha dois propósitos: explicar a língua dos clássicos e proteger o
grego contra possível “corrupção”, “erros” por parte dos “ignorantes”.
b) Apolónio Díscolo (século II d.C) - elaborou a primeira sintaxe, tendo
como referência a língua grega.
c) Donato (350 d.C) – Uma obra típica, a Ars maior, era dividida em
três livros: o primeiro trata de vox (voz, som, substância fônica); litterae (o som
da letra, letra); sílaba, pé métrico; acentos e pontuação; o segundo, das partes
do discurso (nome, pronome, advérbio, interjeição, particípio, conjunção,
preposição e verbo) e o terceiro, dos barbarismos (erros na forma das
palavras), solecismos (erro de colocação dos pronomes oblíquos) e várias
figuras da retórica (WEEDWOOD, 2002, p. 38).
d) Prisciano - autor que procedeu a uma descrição quase completa
do latim (e ainda útil), reforçada com um amplo número de citações ilustrativas
de autores literários (WEEDWOOD, 2002, p. 42). Segundo Kristeva (2007, p.
133),
[...] se a morfologia é completada pela sintaxe e a sintaxe não fazmais do que acrescentar-se à morfologia, este conjunto só semantém na medida em que está submetido à lógica [...] A gramáticade Prisciano tornou-se o modelo de todos os gramáticos da IdadeMédia.
39
FUESPI/NEAD Letras Português
e) Varrão (século I a.C) - sistematizou a gramática como estudo da
linguagem. Para o autor, a gramática era "a base de qualquer ciência", como
se fosse "clamar a verdade". Desenvolveu estudos no campo semântico
(relação das palavras com as coisas), morfológico (palavras variáveis e
invariáveis, as flexões) e sintático (relação entre as palavras). Organizou a
primeira gramática latina, e estabeleceu as diferenças entre flexão e derivação.
Os estudos da linguagem pelos latinos foram desenvolvidos
principalmente em Roma e tinham a preocupação em estabelecer certa
universalidade dos aspectos lógicos da língua grega, considerando que a
confluência das línguas estrangeiras era abundante, motivada pelas "tomadas"
territoriais dos romanos.
A Idade Média (476 - 1473 d.C) foi marcada por estudos que
estabeleciam que as línguas possuíam estruturas idênticas e universais, mas,
no final desse período, novos idiomas surgiram, motivados pela transação
dos navegadores mercantis e pelo trabalho de tradução dos livros sagrados,
mesmo que o latim se mantivesse ainda firme no Ocidente. Esse período
também foi marcado pelos estudos sobre o discurso, na perspectiva da filosofia
da linguagem. A língua dominante na Idade Média foi o Latim, que estava
presente nas liturgias religiosas e nas escrituras sagradas. Ele era considerado
como língua universal da erudição, uma vez que os autores clássicos eram a
referência para a gramática.
Em 1660, os franceses Antoine Arnauld e Claude Lancelot, lançam a
Grammaire Générale et raisonnée de Port Royal (Gramática Geral e Racional
de Port Royal). Essa gramática tem sido conhecida como uma gramática
filosófica, geral, universal e especulativa, cujos estudos estavam fundamentados
na lógica, na razão. Pela primeira vez, observou-se a distinção entre língua
(com as características: lógica, racional, perfeita) e discurso (nos quais são
observados defeitos, do ponto de vista da lógica. O discurso é considerado
como prática). Os pensadores de Port Royal eram ligados ao ideário da
Revolução Francesa e defendiam que a gramática tradicional “servia aos
40
Introdução à Linguística
interesses do Estado e à manutenção da dominação, na medida em que era
um dos instrumentos, para controlar a linguagem dos dominados e impor a
visão do dominante” (PAIS, 2011, p. 4).
A Gramática Geral e Racional de Port Royal representa “o primeiro
estudo a demonstrar a linguagem fundamentada na razão e no pensamento
racional, influências do Iluminismo europeu” (www.ricardomoraleida.com).
Preocupa-se em mostrar que há diferenças estruturais entre os idiomas,
embora os princípios de análise das línguas fossem universais. Os signos
servem para exprimir o pensamento do homem, ou seja, a linguagem era
concebida como imagem do pensamento .
A gramática de língua portuguesa que mais evidenciou os princípios
da Gramática de Port Royal foi a Gramática filosófica da língua portuguesa,
escrita em 1803 por Jerônimo Soares Barbosa e publicada em 1822.
Pelo que apresentamos, verificamos que a relação pensamento/
linguagem foi ponto basilar nos estudos gramaticais de Port Royal, tendo
perdurado seus princípios por muito tempo até o século XIX, quando tivemos uma
mudança no interesse dos estudiosos: a referência para as línguas vivas e o estudo
comparativo dos modos de falar. Nesse sentido, construía-se a concepção de
que as línguas, como organismos vivos, modificam-se com e no tempo.
Segundo Orlandi (2007, p. 13), “a contribuição talvez mais interessante
dessas gramáticas gerais para a Linguística foi justamente a de estabelecer
princípios que não se prendiam à descrição de uma língua particular mas
pensar a linguagem em sua generalidade”.
Noutra perspectiva, no entanto, surgiram pensamentos diversos, tais
como o da gramática comparada sobre a qual discutiremos a seguir.
2.2 A LINGUÍSTICA COMPARADA
A Gramática ou a Linguística Histórico-Comparada, como preferem
alguns autores, trouxe um rompimento com a filosofia clássica, que priorizava
41
FUESPI/NEAD Letras Português
“a boa linguagem e a boa literatura”, pois a
tônica dos estudos voltou-se para a diacronia
da língua e para o fato de as línguas
modificarem-se com o tempo. Mesmo a
gramática comparada tendo seu auge no
século XIX, ela se desenvolveu a partir do
século XVII.
No contexto da gramática comparada, o estudo da língua volta-se para
a comparação entre as línguas no intuito de “deduzir princípios gerais de
evolução histórica das suas unidades lexicais, gramaticais e sonoras” (SILVA,
2011, p. 6). As relações de parentesco do latim, das línguas germânicas,
eslavas e célticas eram estabelecidas com as línguas faladas na antiga Índia.
Os indoeuropeístas propuseram um método de estudo denominado histórico-
comparado, tendo como referência a língua-mãe e não a língua ideal
(ORLANDI, 2007).
No século XIX, Franz Bopp (1791-1867), Rasmus Rask (1787-1832),
August Schleicher (1821-1868) e Jacob Grimm (1785-1863) marcaram o
desenvolvimento dos estudos da linguagem, sendo o primeiro deles a figura
mais representativa, por ter legado, em 1816, o nascimento da Linguística
Histórica.
Franz Bopp – reuniu as provas indiscutíveis do parentesco entre as
línguas e fundou a gramática comparada das línguas indoeuropeias (sânscrito,
persa, grego, latim, lituano, gótico e alemão) considerando que elas
apresentavam semelhanças com o sânscrito; daí dizermos que elas pertencem
à mesma família.
Rasmus Rask – demonstrou, com mais rigor do que Bopp, a
identidade original das línguas germânicas, do grego, latim, báltico e eslavo;
Jacob Grimm – introduziu em Linguística a noção de perspectiva
histórica. Dedicou-se ao estudo dos dialetos germânicos e publicou pesquisas
pormenorizadas sobre a história fonética dos falares germânicos. Foi na Lei
GLOSSÁRIO
É o estudo descritivo da língua ao longo dahistória, tendo como base as mudançassofridas nos termos, nas significações e nasrelações entre os termos. SegundoSaussure, é tudo que diz respeito àsevoluções. (Veja Seção 4.1).
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
42
Introdução à Linguística
de Grimm, primeiro modelo das leis fonéticas, que se apoiou a Linguística
Histórica.
August Schleicher – era botânico e amava as plantas, gostava de
opor o linguista ao filólogo, comparando o primeiro ao naturalista, que abarca,
no seu estudo, o conjunto dos organismos vegetais; enquanto o filólogo
assemelha-se ao jardineiro, que só se preocupa com as espécies estimáveis
pelo seu uso prático ou pelo valor estético. Ele considera as línguas como
organismos vivos , uma criação, uma existência fora dos indivíduos, porque,
independentemente da vontade humana, nascem, crescem e se desenvolvem
segundo as regras determinadas e depois envelhecem e morrem, o que
manifesta então uma série de fenômenos que englobamos na palavra VIDA.
Alguns teóricos chamam essa concepção de língua como Mito da
Independência.
Você pode pensar no porquê desse mito? Será que as línguas não
são intercambiáveis? Mesmo o latim não sendo uma língua falada atualmente,
mas utilizada em momentos específicos de liturgia, havendo muitos escritos,
podemos dizer que ela “morreu”? Será que essa língua não legou a gramática
para outras línguas?
Observemos a estrutura
mórfica da palavra lei em latim: Lex,
leg is = lei (radical latino = leg-)
Como podemos, então,
explicar o adjetivo derivado de lei
“legal”? Seria “LEI + AL”? Com
certeza, não. Temos aí uma
retomada ao radical latino, embora
alguns estudiosos da morfologia de
cunho sincronista chamem esse
processo de alomorfia .
GLOSSÁRIO
Sincronia – estudo de um determinadoestado de língua, em função da suaestrutura, sem a perspectiva histórica. Éoposto à diacronia. Podemos dizer que éum recorte temporal na língua paraestudarmos determinados processoslinguísticos. (veja seção 4.1)
Alomorfia – modificação de uma forma ouelemento linguístico sem a alteração dosignificado. Ex. Temos o prefixo de negaçãoIN em “infeliz”, e a forma variante I em “ilegal”,“ilícito”. Dessa forma, dizemos que ocorreuo processo da alomorfia no prefixo IN.
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
43
FUESPI/NEAD Letras Português
Segundo Orlandi (2007, p. 14),
Já Kristeva (2007) resume:
Vemos, na concepção dessas duas autoras, que o estudo da
regularidade e sistematicidade dos fenômenos linguísticos foi a tônica da
Gramática de Port Royal, não com o intuito de tentar explicar cientificamente
as mudanças e variações dos falares, mas, como acrescenta Kristeva para
“adaptar as propriedades de uma língua moderna, o francês, à velha máquina
latina, baseada no par nome-verbo: é preciso inserir nela os artigos, as
preposições, os auxiliares, etc.” (p. 164). Nessa época, a arte de bem falar
torna-se moda na França. Percebemos que a roupagem da língua “moderna” é
fundada nas estruturas da língua de origem, não havendo significativas alterações.
Como exemplo, vejamos, a seguir, o estudo de palavras cognatas pelo
método histórico-comparativo, tendo como base a protolíngua (língua-mãe).
[...] a grande contribuição das gramáticas comparadas foi evidenciarque as mudanças são regulares, têm uma direção. Não sãocaóticas, como se pensava. Podemos observar essa direção, essaregularidade da mudança se tomamos, por exemplo, hoje, um tipode uso como o que se dá em ‘sordado’ por ‘soldado’. Nessa posição,vemos que há possibilidade de mudança, de ‘l’ em ‘r’, mas nuncatemos um ‘l’ se transformando em ‘p’, por exemplo.
Um traço positivo, apesar de tudo: como aumenta o número daslínguas aprendidas, as gramáticas tornam-se polilinguísticas;confronta-se o inglês, o francês, o alemão, o italiano, e os quadrosimpostos pelo latim ficam cada vez mais desacreditados [...]Regularização, sistematização, descoberta de lei de modo a que alíngua francesa possa atingir a perfeição dos falares clássicos, eiso tom dos debates do século.
Latim Francês Italiano Espanhol Português
Caballus cheval cavallo caballo cavalo
Oto huit Otto ocho oito
Vemos que o /b/ em “caballus” (latim) muda-se para /v/ no francês, no
44
Introdução à Linguística
italiano e no português; /us/ em “caballus” (latim) transforma-se em /o/ no italiano,
no Espanhol e no Português. Já em “oto” (latim), observamos uma ditongação
no francês /ui/ e no português /oi/; o /t/ foi dobrado no italiano e modificado
para /ch/ no Espanhol. Nessa perspectiva de análise, notamos que há
semelhanças significativas entre as palavras da protolíngua e as palavras das
línguas dela derivadas.
Outro ponto de destaque na gramática comparada, são os seus princípios.
Os comparativistas postulavam que gramática é a arte de falar, e falar é explicar
os pensamentos através dos signos que os homens inventaram com esse objetivo.
Kristeva (2007, p. 169) destaca que, nessa gramática, há duas
espécies de palavras:
1ª – nomes, artigo, pronomes, particípios, preposições e advérbios e
2ª – verbos, conjuntos e interjeições.
As partes do discurso são os signos, que são os objetos do
pensamento e que pertencem à primeira espécie; já a matéria do nosso
pensamento está representada pelas palavras da segunda.
Quanto à sintaxe, a Gramática de Port Royal tem como base o par
nome/verbo, que representa a relação respectiva sujeito/predicado. Esses
dois termos, nessa relação, formam um juízo denominado proposição . Além
disso, houve também o estudo da sintaxe de concordância.
A partir dos anos 1870, a Gramática Comparada tomou um novo rumo.
Abandonaram-se as concepções românticas sobre a pureza da língua primitiva
e renunciou-se à análise genética das formas gramaticais, sendo reconhecido
que o objetivo não consistia em confrontar as línguas atestadas com um sistema
original ideal.
2.2.1 Os neogramáticos
Os neogramáticos opuseram-se à concepção schleicheriana da
linguagem, e passaram a considerar a língua como um produto coletivo dos
45
FUESPI/NEAD Letras Português
grupos humanos. O método positivo, que aplicaram com rigor, pode ser
ilustrado pela proclamação das leis fonéticas. As obras dessa época revelam
talvez elaboração excessiva, mas nem por isso deixam de ser fecundas e
preciosas. Os pesquisadores estudaram os fatos com precisão e um rigor
até então desconhecidos e estabeleceram cuidadosamente o quadro das
evoluções, elaborando uma doutrina sólida e coerente.
Adotaram o ponto de vista segundo o qual a Linguística, na medida
em que é científica e explicativa, tem que ser necessariamente histórica.
Outros nomes, no entanto, surgiram nesse cenário: Wilhelm Von
Humboldt e William Dwight Whitney, cujas contribuições apresentamos a seguir.
2.3 AS CONTRIBUIÇÕES DE HUMBOLDT E WHITNEY
Segundo Wedwood (2002, p. 107), “um dos linguistas mais originais,
senão o de influência mais marcante, em todo o século XIX foi o erudito e
diplomata alemão Wilhelm V on Humbold t (1767-1835)”. (grifos nossos)
Como já dissemos, o interesse maior dos neogramáticos concentrou-
se nos estudos históricos, entretanto, os de Humboldt não eram exclusivamente
esses, pois ele deu ênfase ao vínculo entre línguas nacionais e caráter nacional.
Foi mais original ao identificar o caráter interno e externo da língua. Para o
autor, o primeiro aspecto seria “o padrão, ou estrutura, de gramática e
significado que é imposto sobre essa matéria bruta e que diferencia uma língua
da outra”; o segundo “seria a matéria bruta (os sons) com base na qual as
diferentes línguas são moldadas.” (WEEDWOOD, 2007, p. 108)
Esse linguista concebia a língua como algo dinâmico, não como um
conjunto de enunciados e frases prontos produzidos pelos falantes. Como todo
sistema, a língua seria regida por princípios ou regras subjacentes que
orientariam os falantes a produzir os enunciados, ou seja, os falantes não
produziriam enunciados de forma aleatória. Com efeito, não temos uma
quantidade finita de enunciados, mas um conjunto infinito.
46
Introdução à Linguística
Ele influenciou Ferdinand de Saussure, criador da Linguística Moderna,
por ter diferenciado as formas interna e externa da língua, e Noam Chomsky, o
pai do gerativismo, por ter retomado essa distinção, ao elaborar as noções
básicas da gramática gerativa. Esses autores serão tratados na Unidade IV.
Os estudos de Humboldt contemplaram mudanças fonéticas, sintáticas
e semânticas. As primeiras, sob os preceitos da Linguística diacrônica,
identificaram elementos de transformação nos sistemas fonéticos das línguas.
Voltando ao quadro da página 45, temos huit e oito: /ui/ modificou-se para /oi/
. As mudanças sintáticas provocaram uma distinção gramatical de uso. Por
exemplo, no Português, substituímos às vezes o presente do subjuntivo pelo
presente do indicativo, quando dizemos: “aquelas pessoas querem que eu
faço o que eles querem”. Já as mudanças semânticas decorrem do uso pelos
falantes diante das transformações econômico-sociais, por exemplo. A palavra
“tratante” designava uma pessoa que firmava um compromisso e o cumpria,
mas sabemos atualmente que uma pessoa tratante é aquela que se
compromete e não honra a “palavra”.
William Dwight Whitney (1827-1894) foi estudioso do sânscrito
(antiga língua indiana), lexicógrafo, professor dessa língua e da Linguística
comparativa. Escreveu “Uma gramática Sânscrita” em 1879 e “O estudo da
linguagem” em 1867. Seus estudos consideravam a língua como uma
instituição social e os conceitos desenvolvidos buscavam “soluções práticas
para o aprendizado das línguas” (MILANI, 2011, p.1). Acreditamos nisso, pelo
fato de ele ser professor de imigrantes e indígenas e teria que alfabetizá-los
em língua inglesa. Dessa forma, podemos dizer que ele se preocupou com as
questões didáticas no sentido de melhorar o ato de ensinar língua.
Ele é considerado um neogramático, estudou as obras dos autores
comparativistas e, especialmente, as de Humboldt. Seus estudos tiveram
repercussão na segunda metade do século XIX.
Entre as suas perspectivas de estudo, defendia que a língua é mutável
e está em constante formação e transformação. Essas modificações ocorrem
47
FUESPI/NEAD Letras Português
sem que os usuários percebam os processos conscientemente. Elas ocorrem
tendo em vista o princípio da regularidade, sobre o qual Whitney apud Milani
(2011, p.6) apresenta três grupos de possibilidades de mudança nas línguas:
1º Alteração dos velhos elementos da linguagem; mudançanas palavras, que se conservaram como substância daexpressão, e mudança de duas maneiras : primeiro, mudançado som articulado; em seguida, mudança de significação: as duas,como veremos, podem se produzir juntas ou separadamente.2º Destruição dos velhos elementos da linguagem;desaparecimento do que estava em uso e isso de duasmaneiras também : então, perda de palavras inteiras; em seguida,perda das formas gramaticais e das distinções.3º Produção de elementos novos; adição aos velhoselementos de uma língua ao lado de nomes novos ou novasformas; expansão externa de recursos da expressão (grifosnossos).
Pelo que percebemos, Whitney preocupou-se com a classificação
das mudanças nas línguas, sistematizando-as nos grupos que enquadrariam
todas as modificações. Também podemos observar, a partir da citação acima,
que Whitney concebia a língua como uma instituição social concreta, capaz
de ser transmitida de geração a geração; por outro lado, a Linguística
Contemporânea concebe que, embora a língua seja transmitida, ela está em
constante movimento, transformações.
Até aqui, vimos que a preocupação em se estudar a linguagem não é
recente. Remonta à antiguidade, passando por diferentes abordagens, como a
perspectiva filosófica, a histórico-comparada e a dos neogramáticos, ainda não
consideradas científicas. Na Unidade a seguir, veremos como a linguagem passou
a ser estudada numa perspectiva científica, surgindo, então, a Linguística.
RESUMINDO
A linguagem é um fenômeno intrínseco ao homem que o caracteriza
como ser social. Os estudos sobre a linguagem humana foram e são foco ao
48
Introdução à Linguística
longo da história da humanidade: desde a antiguidade aos dias atuais.
Vejamos algumas características dela ao longo da história.
1) Na Antiguidade:
• Os hindus : desenvolveram estudos a partir dos textos religiosos
que foram reunidos no livro Veda;
• Os gregos : representantes maiores da tradição ocidental.
Discutiram a respeito da natureza da linguagem, tentando responder se ela é
convencional ou natural, o que representou o surgimento de duas escolas
opostas: os analogistas e os anomalistas.
Entre os filósofos , destacamos Aristóteles e Platão; entre os
gramáticos gregos – Dionísio de Trácia e Apolónio Díscolo e entre os
gramáticos latinos – Donato, Prisciano e Varrão.
2) Na Idade Média:
• Os estudos da linguagem foram marcados pela perspectiva de que
as línguas possuíam estruturas idênticas e universais.
• Língua dominante: o Latim
• Gramática Geral e Racional de Port Royal (1660) – primeiro estudo
que mostrou a linguagem fundamentada na razão e no pensamento. A ideia
maior era de que a linguagem é imagem e expressão do pensamento.
3) No Século XIX:
• Gramáticas comparadas : romperam com a tradição greco-
filosófica e voltaram-se para o estudo diacrônico das línguas. Objetivaram-se
deduzir princípios gerais de evolução histórica das unidades lexicais,
gramaticais e sonoras.
Os estudos sobre a linguagem foram marcados pelos autores: Franz
Bopp, Rasmus Rask, Schleicher e Jacob Grimm.
• Os neogramáticos (1870) : eram chamados os autores que
desenvolveram as gramáticas comparadas. O novo rumo do estudo da
linguagem é conceber a língua como um produto coletivo dos grupos humanos,
na perspectiva histórico-comparativa.
49
FUESPI/NEAD Letras Português
3.1 As contribuições de Humbold t e Whitney
a) Humboldt
• Concebia a língua como algo dinâmico, um sistema regido por
princípios ou regras subjacentes que orientam os falantes a produzirem os
enunciados;
• A língua teria uma forma “interna” (estrutura de gramática e
significado) e “externa” (sons);
• Seus estudos contemplaram as mudanças fonéticas, sintáticas e
semânticas.
• Influenciou: Saussure – distinção entre forma interna e externa e
Chomsky – enfatiza essa distinção novamente, transformando-a em uma das
noções básicas da gramática gerativa
b) Whitney
• concebia a língua como uma instituição social, e os conceitos
desenvolvidos buscavam “soluções práticas para o aprendizado das línguas”,
uma vez que era professor de nativos de imigrantes e indígenas e teria que
alfabetizá-los em língua inglesa.
• Apresentou três grupos de mudança nas línguas:
1º - Alteração dos velhos elementos da linguagem; mudança nas
palavras, que se conservaram como substância da expressão, e mudança de
duas maneiras: : primeiro, mudança do som articulado; em seguida, mudança
de significação: as duas podem produzir-se juntas ou separadamente;
2º - Destruição dos velhos elementos da linguagem; desaparecimento
do que estava em uso e isso de duas maneiras também e
3º - Produção de elementos novos; adição aos velhos elementos de
uma língua ao lado de nomes novos ou novas formas; expansão externa de
recursos da expressão.
50
Introdução à Linguística
LEITURA COMPLEMENTAR
Para aprofundar mais seus conhecimentos sobre os estudos da
linguagem, vamos ler o artigo a seguir, que aborda uma dimensão histórica,
social e filosófica da linguagem, reportando-se à concepção platônica “segundo
a qual a linguagem conduz a alguma coisa que não ela mesma e, portanto, o
discurso pode dizer ou não dizer a verdade.” Este artigo tem como referência
um diálogo de Platão, chamado Crátilo. Para compreender melhor, vamos à
leitura.
HISTÓRIA SOCIAL DA LINGUAGEM
José Gaspar de Oliveira Nascimento (Univ. de Sorocaba)
INTRODUÇÃO
Embora possa parecer simples, a expressão história social da linguagem
implica, na verdade, vários pressupostos que devem ser desenvolvidos. Assim, as
pesquisas que envolvem a história da linguagem exigem o concurso de trabalhos
sociológicos, históricos e, sem dúvida, linguísticos. Por essa razão há de se
distinguir, inicialmente, linguística histórica de história da língua.
Para Lyons (1972: 1), a Linguística se define como o estudo científico da
língua. Entenda-se por estudo científico da língua como sendo a investigação dela
por meio de observações controladas e verificáveis empiricamente e com referência
a uma teoria geral da sua estrutura. A Linguística, como qualquer outra ciência,
constrói sobre o passado; e assim o faz não somente desafiando e refutando
doutrinas tradicionais, mas também desenvolvendo-as e reformulando-as.
Para a compreensão dos princípios e hipóteses que regem a Linguística,
o conhecimento da História da Linguística, que não se confunde com linguística
histórica, pode oferecer sua contribuição. Uma coisa é estudar a história de uma
ciência, recuperando suas origens e seu desenvolvimento no tempo – é o que se
51
FUESPI/NEAD Letras Português
faz na História da Linguística. Outra coisa é estudar as mudanças que ocorrem
nas línguas humanas à medida que o tempo passa, atividade específica da
linguística histórica.
O interesse de uma história social da linguagem está, entre outras coisas,
em constituir uma abordagem necessariamente interdisciplinar. Para tanto um dos
contributos relevantes é a sociolinguística. Assim, a entrada dos conceitos e métodos
da sociolinguística para o campo habitualmente ocupado pela linguística tem vantagens
mútuas: a sociolinguística procura, e encontra, nos estados passados de uma língua,
os dados que podem validar ou invalidar as hipóteses que formulou para explicar uma
mudança atualmente em curso; e a linguística histórica tem a possibilidade, que até
aqui lhe escapava, de ver processarem-se perante os seus olhos mudanças análogas
àquelas que se deram no passado, e que apenas podia conjecturar.
Por outro lado, a história da língua designa uma disciplina, ou um modo
de abordar os fenômenos evolutivos da língua, que tanto pode ser considerada
parte integrante da linguística histórica, como da história propriamente dita. O objeto
da história da língua é uma língua em particular, na sua existência definida temporal
e espacialmente, o que significa que os fatos linguísticos devem ser
permanentemente correlacionados com fatos históricos, que os condicionaram.
O objetivo deste trabalho é apresentar uma leitura da história social da
linguagem focalizando uma concepção platônica segundo a qual a linguagem
conduz a alguma coisa que não ela mesma e, portanto, o discurso pode dizer ou
não dizer a verdade.
O corpus é um dos diálogos de Platão: Crátilo.
Justifica-se a escolha de Crátilo, visto que aí está a linguagem posta em
questão. Platão examina a adequação do que se diz com a a coisa dita, o que, por
si, é um marco fundamental para as reflexões sobre a linguagem. Estabelecendo
as bases do raciocínio moderno, os gregos forneceram também os princípios
fundamentais segundo os quais a linguagem foi pensada até nossos dias. Afinal,
durante muitos séculos, os princípios aperfeiçoados pelos gregos conduziram as
teorias e as sistematizações linguísticas na Europa.
52
Introdução à Linguística
Além dos aspectos especificamente linguísticos, é mister incluir, neste
estudo, outros, tais como sociolinguísticos, históricos e filosóficos. Caracteriza-se
aí a multi e a transdisciplinaridade tão comuns nos estudos atuais das ciências
sociais e, por que não dizer, das chamadas ciências duras (hard sciences).
É verdade que os sociólogos dos anos setenta entendiam que as ciências
duras não poderiam ser estudadas socialmente, já que a sociologia e a história
trabalhavam com aspectos institucionais da ciência, não com o núcleo do
conhecimento. Diziam eles que isso cabia aos filósofos. Shappin (1982), questionando
o caso do cientista que se deixa levar por razões não-científicas (ideológicas, por
exemplo), é um mau cientista. Já, para Kuhn (1962), as ciências duras não são críticas,
são dogmáticas. Questiona-se: a prática científica não é uma prática social? Hoje, os
sociólogos consideram que há interferência do social no trabalho científico.
Se na história social da ciência, a partir de 1930, na Inglaterra, identifica-
se uma história externalista, que contempla os fatores externos como influenciadores
do fazer cientítico – ideologia e ciência entrecruzam-se -, na história social da
linguagem essa dualidade entre externo e interno está presente.
CRÁTILO
A filosofia e a linguagem
O diálogo Crátilo é o texto básico da filosofia helênica sobre a linguagem.
Nele encontram-se grandes questões linguísticas e filosóficas. A filosofia grega
inicia-se precisamente com o conhecimento de que a palavra é apenas nome e,
por isso, não representa o verdadeiro ser. A questão é a seguinte: qual é a relação
entre a palavra e a coisa? Crátilo – o filósofo – procura resolver este problema,
mas o diálogo não chega a uma conclusão a respeito da aporia da diferença
entre a linguagem e a realidade. Mas esta falta de solução no diálogo Crátilo
não é uma deficiência. A ausência de uma resposta explícita decorre das
dificuldades naturais que o paradigma racional de Platão encontra ao investigar
a realidade empírica.
53
FUESPI/NEAD Letras Português
Hoje, uma das questões básicas é a da linguagem. Ricoeur, em Da
Interpretação, assevera que a linguagem é um dos problemas fundamentais da
filosofia contemporânea. Habermas poderia dar igual testemunho. Aliás, nos últimos
cinquenta anos diversas vertentes das ciências têm versado sobre a linguagem: a
fonologia e as teorias linguísticas, os problemas da comunicação e a cibernética,
as matemáticas modernas e a informática, os computadores e suas linguagens,
os problemas de tradução das linguagens e a busca de compatibilidade entre
linguagens-máquina, os problemas de memorização e os bancos de dados...
Como se pode observar, a pesquisa da linguagem é multi, inter e
transdisciplinar: linguística, semântica, pragmática, semiótica, histórica,
sociolinguística, psicológica, antropológica, etc. A própria filosofia, que se manifesta
nos estudos da linguagem em Crátilo, revela múltiplos enfoques: lógico, histórico,
linguístico, ontológico, epistemológico, ético. Na verdade, vivemos um momento
de valorização temática da linguagem.
Eis por que o objetivo deste trabalho procura examinar, desde o surgimento
da filosofia, este problema e suas consequências. Especialmente em Crátilo, na
relação nome-conhecimento-coisa.
Não são propriamente respostas que se deve buscar na leitura do diálogo
platônico. Quem procura uma resposta às questões de Sócrates e de seus
interlocutores não a encontra. O filósofo se põe em condições de igualdade com
seus interlocutores, Ele não se considera um mestre (Só sei que nada sei), apenas
alguém que ajuda descobrir a verdade que está dentro de cada um.
Crátilo possui uma certa força que o conserva sempre atual. O caráter
retórico, dialético e a oralidade fazem parte do debate, da investigação que leva o
diálogo à inconclusão e a Sócrates confessar sua ignorância, cujo ensinamento
não é doutrinal, mas uma lição de método, segundo Koyré(1984):
Ensina-nos o uso e o valor das definições precisas, de conceitosempregados na discussão e a impossibilidade de os chegarmos apossuir sem proceder, previamente, a uma revisão crítica das noçõestradicionais, das concepções ‘vulgares’, recebidas e incorporadasna linguagem.
54
Introdução à Linguística
A leitura de Crátilo exige a participação do leitor à semelhança de uma
obra literária, pois o pensamento de Platão só se dá de modo fragmentário: tudo é
proposto em estado de pergunta e resposta. Afinal, para Platão, a filosofia não é
acessível a todos, embora o diálogo Crátilo, entre os demais, tenha sido escrito
para o público leigo.
Crátilo: estrutura
A obra Crátilo tem o nome do primeiro mestre de Platão. Segundo
Aristóteles, Platão foi provavelmente discípulo de Crátilo, um radical seguidor de
Heráclito, tão radical que exagerava e adulterava o heraclitismo. Se para Heráclito
era impossível entrar duas vezes num mesmo rio, para Crátilo isso não se podia
fazer sequer uma vez. Aliás, Crátilo acabou persuadindo-se de que não devia dizer
nada e, por isso, contentava-se em mover o dedo. Do silêncio de Crátilo e do seu
sentido filosófico encontram-se, como prova, no diálogo de Platão que tem o seu nome.
Até Crátilo pouco fala, apenas um quinto do diálogo; no restante, fazem-no falar. Contudo,
é este Crátilo o interlocutor de Sócrates, o que, por essa razão, dá nome ao diálogo,
que trata sobre a justeza dos nomes e não sobre essa figura histórica a respeito da
qual pouco se sabe.
Crátilo parece ter vindo a lume depois de Eutidemos e estar próximo a
Parmênides e Teeteto, outros diálogos de Platão. Assim, provavelmente, foi escrito
entre os anos 380 e 367 a. C.
Pode ser dividido em duas partes:
a) a primeira, a mais longa, é a conversação entre Sócrates e Hermógenes;
b) a segunda, entre Sócrates e Crátilo.
As conclusões da primeira parte são revistas na segunda, pois, o diálogo,
conduzido especialmente por Sócrates, gira em torno da correção ou da exatidão
dos nomes; nesse sentido, sem caráter conclusivo, são expostas duas teses:
a) a convencionalista, defendida por Hermógenes, que apresenta a justeza
ou correção dos nomes como sendo uma mera convenção e acordo;
55
FUESPI/NEAD Letras Português
b) a naturalista, defendida por Crátilo, que admite haver uma correção
dos nomes por natureza atribuídos a cada um dos seres.
A obra começa de imediato com Hermógenes expondo a Sócrates, com a
permissão de Crátilo, as duas posições sobre a natureza do nome – nomoV / fusiV – e,
ainda na primeira parte, apresenta uma longa exposição etimológica ligada a alguns
problemas da filosofia de Platão. Exposição interessante, pois pode ser de interesse
histórico em relação ao desenvolvimento da fonética, da semântica e da sociolinguística.
Hermógenes conclui pelo convencionalismo na existência dos nomes.
A dificuldade, porém, continua na segunda parte, em que Crátilo defende
seu ponto de vista naturalista. Os nomes parecem possuir, contrariamente à opinião
de Hermógenes, uma certa justeza natural, e também, contra Crátilo, parece que
nem todos os nomes são exatos por natureza. Eles podem ser inexatos, e o uso e
a convenção podem ter uma parte importante na sua formação.
Se Crátilo nada conclui, qual o objetivo de Platão?
Se a obra for levada em conta dentro do conjunto das obras de Platão,
poder-se-á obter uma resposta. As questões sobre o convencionalismo ou
naturalismo do nome – nomoV / fusiV – têm , sem dúvida, importância didática e
servem para apontar a existência de diversos adversários de Platão. Hermógenes
é um filósofo jovem e pouco conhecido, por isso, é pouco provável que Platão
deseje criticá-lo. Por outro lado, a tese de Crátilo não é aceita nas conclusões do
diálogo. Também não são aceitos os ensinamentos de Heráclito e de Demócrito.
E, finalmente, a tese do homem-medida de todas as coisas, de Protágoras, é
diversas vezes refutada.
Fica a questão: o diálogo trata de um problema de linguagem ou de
conhecimento? É possível que a exposição da teoria da justeza dos nomes seja
um elemento de apoio dialético à conhecida Teoria das Formas, observável no
estudo etimológico do diálogo ao mostrar que não é o nome que deve ser
interrogado, mas as próprias coisas. Ora, é a partir das coisas que nasce o
conhecimento, e não pode existir conhecimento quando tudo está em contínua
mudança. O conhecimento exige permanência.
56
Introdução à Linguística
Conclui-se que Crátilo é um diálogo aberto (atinge diversos objetivos) e é
também um diálogo coerente com o sistema geral da filosofia de Platão: pode
procurar nele um esboço de uma filosofia da linguagem e uma parte de uma filosofia,
na qual a linguagem é um elemento filosófico ao lado de outros.
A verdade em crátilo
A dialética está sempre presente na filosofia de Platão. Sua argumentação
não segue os padrões da lógica formal criada por Aristóteles, que investiga a força
ou sentido de certas palavras, sempre a partir de modelos de proposições ou
enunciados. No diálogo de Platão percebe-se uma força argumentativa, uma
preocupação com a verdade que o distingue dos sofistas. A dialética do perguntar
e do responder defende-se de raciocínios falsos, dos sofismas, prestando atenção
não só às palavras, mas principalmente ao problema ou à realidade em debate.
Para Platão, o verdadeiro e o falso têm como critério a correspondência do
enunciados e dos nomes com as coisas.
Isso vale para a leitura de Crátilo. Após a colocação das teses de Crátilo e
Hermógenes sobre a justeza ou correção dos nomes, e tendo se iniciado o diálogo
entre Sócrates e Hermógenes, o que chama a atenção do leitor é o tipo de
argumentação de Sócrates, que mostra que há um discurso verdadeiro – logoV
alhqhV – que diz as coisas como são, e um falso – yeudhV – que diz como as
coisas não são. A questão é dupla: primeiro, a verdade ou a mentira é uma relação
entre a linguagem e a coisa; segundo, a proposição para ser verdadeira precisa
ser verdadeira no todo e nas partes. Isto significa que discurso verdadeiro é igual a
nome verdadeiro, e falso a nome falso. Assim, a verdade é o nome, e a falsidade é
o não-nome, isto é, o som sem significação.
Outro argumento de Sócrates refere-se à essência fixa que as coisas
possuem, independente do sujeito. Ela é por natureza – fusiV . Isso vale também para
os atos. Platão descobre que dizer é um ato, mas não vê no ato de fala as possibilidades
que Austin, Chomsky e outros filósofos e linguistas atuais chamam a atenção.
57
FUESPI/NEAD Letras Português
O ato de dizer tem a finalidade intrínseca de dizer as coisas. A função do
dizer consiste em atribuir a cada coisa sua natureza. Nomear as coisas é possível
graças ao instrumento que é o nome e à ação de nomear, de usar este instrumento.
A finalidade do dizer (ou nomear) consiste no ensinar e no distinguir a essência
das coisas.
Em Crátilo, a argumentação de Sócrates parte do seguinte: há
proposições verdadeiras e falsas e as proposições são compostas de nomes.
Assim, as partes de uma proposição verdadeira devem ser verdadeiras.
A seguir, Sócrates desloca a questão da verdade e da mentira relacionada
à proposição para o exame da função da linguagem. O objetivo do nome é ser
instrumento do falante para um determinado fim. Ao formador de nomes –
nomoqethV , o nomoteta, o legislador – cabe configurá-los com sílabas e letras,
com sons, naturalmente adequados à coisa que nomeia. Ao dialético, porém,
compete distinguir e julgar se uma linguagem está bem ou não. Mas, qual a função
da linguagem? É a de simplesmente nomear esta ou aquela entidade ou uma
maneira de nomear coisas diferentes? Platão esclarece ao dizer que um nome é
correto quando quem o atribui expressa a relação entre a natureza da coisa e a
forma do nome em letras e sílabas. Não importam as sílabas e as letras usadas
desde que a propriedade do objeto seja reproduzida.
Assim sendo, a questão da verdade da exatidão do nome torna-se o problema
da verdade, do conhecimento e do significado da linguagem. É nesta última que Platão
procura o meio eficaz e verdadeiro para dizer a essência das coisas.
O sujeito da linguagem
Em relação ao problema da justeza, da correção dos nomes, a tese de
Crátilo parece predominar no diálogo, diálogo que surpreendentemente se ocupa
do início até o fim com a questão da linguagem. Na primeira parte Sócrates
defende a tese de Crátilo contra a tese convencionalista de Hermógenes. Na
segunda parte Sócrates solicita a Crátilo que a defenda.
58
Introdução à Linguística
Crátilo é uma das peças da filosofia de Platão, um de seus momentos.
Os problemas nele colocados tendem a ser esclarecidos em outras obras de
Platão: Sofista, Parmênides, Teeteto, pois o fato de reduzir a linguagem à questão
do nome, e mais exatamente, o logo, o enunciado, o discurso, à simples frase, e
esta ao nome, e o nome à sílaba, e a sílaba à letra, prejudica a argumentação e a
análise do problema. É por isso que o estudo completo da questão da linguagem,
em Platão, exige a leitura de outros diálogos. Crátilo, porém, é um momento
privilegiado.
Crátilo e Hermógenes têm uma posição clara sobre a justeza natural e
sobre o acordo e convenção dos nomes. Mas qual é a posição de Platão? No início
do diálogo, Sócrates esclarece o objetivo da discussão, que consiste em saber a
verdade sobre a exatidão dos nomes. Para Platão, esta verdade, através de
Sócrates, não tem um objetivo meramente gramatical ou linguístico. A tese de Platão
visa à articulação entre a linguagem e o conhecimento: a linguagem é modalidade
de formação ou articulação do próprio conhecimento. A propósito, NEVES (1987:
54) completa:
Na primeira parte do diálogo, contra a afirmação de Hermógenes de que o
nome justo é aquele que se atribui a cada coisa, distinguem-se dois aspectos: a) a
relação entre a justeza do nome e a natureza da coisa; b) o sujeito que atribui o
nome.
Dê-se atenção ao segundo aspecto. Segundo Hermógenes, o nome que atribui
a cada coisa é o nome de cada coisa. E, conforme ele, tanto os indivíduos – eu e tu –
como os cidadãos podem atribuir nome. O aspecto fundamental do problema está na
O conhecimento é, assim, anterior e superior à imagem e ao logos,que é a expressão linguística dessa imagem. O denominar éposterior ao conhecer, pois há uma maneira de conhecer as coisassem os nomes, por meio das próprias coisas e da relação entreelas. A linguagem já supõe a existência das coisas, de umaessência inteligível e imutável, verdadeira e sempre idêntica a simesma. (...) As palavras são apenas sinais que representam asideias e as coisas.
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FUESPI/NEAD Letras Português
figura do nomoteta ou legislador. Tal figura simbólica vem associada à do dialético, do
gramático ou filósofo, aquele que sabe perguntar e responder e cumpre o papel de juiz
em relação à atividade do legislador. É necessário dizer se os nomes são exatos ou
não, se são verdadeiros ou falsos.
O dialético interpreta e dirige o legislador em relação ao uso dos nomes,
ao uso da linguagem. O nomear do legislador consiste em formar com sons e
letras o nome por natureza apropriado, desde que siga a exigência de uma mesma
forma.
Enfim, a descoberta de que a linguagem tem um sujeito, um legislador e
um dialético, permite deslocar a questão da convenção para o contexto da
linguagem. Embora Platão não tenha tido consciência de que a linguagem,
contextualmente, pode ter uma multiplicidade de usos, a leitura de Crátilo pode ser
feita nesta perspectiva.
Abordagem etimológica em crátilo
No estudo das etimologias, em Crátilo, observa-se uma certa ordem. Inicia-
se com nomes homéricos, depois os nomes divinos e, por último, os nomes
primitivos. Curioso: com as etimologias, tanto se defende a tese naturalista de
Crátilo, como também se mostra a impossibilidade de explicar a origem dos nomes
primitivos.
Platão descobre que os nomes sofrem mudanças com o passar do tempo.
Sob o ponto de vista linguístico-semântico, essas mudanças oferecem algumas
curiosidades. Aparecem, por exemplo, embrionariamente, preocupações fonéticas,
como a distinção entre a letra e o som. Os sons são, em Crátilo, o material com o
qual o nomoteta (= o legislador) institui os nomes. Os sons variam de cultura para
cultura, embora predomine sempre a ideia de que existe uma língua correta. No
diálogo, Sócrates procura estudar as letras, a começar pelas vogais, para depois
classificar por espécies as que carecem de som e ruído e as que, não sendo
vogais, mudas também não são. Essa confusão socrática (= platônica) entre som
60
Introdução à Linguística
e letra corresponde à distinção entre vogais e consoantes. Sem dúvida, esta
abordagem sobre fonética é surpreendentemente positiva.
Ainda, nesses exercícios etimológicos, Crátilo oferece algumas noções
de sociolinguística, quando o texto menciona as diferenças sociais e regionais
relativamente à variação linguística.
Outro aspecto interessante é a diferença de fala do homem e da mulher.
Para Platão, as mulheres conservam com maior justeza a antiga linguagem – são,
lingüisticamente, conservadoras. Tal registro não passou despercebido por aqueles
que estudam as origens dos estudos gramaticais e linguísticos. Cícero, por exemplo,
em De Oratore III, 12, dizia que melhor do que os homens, as mulheres guardam o
acento antigo, porque elas variam pouco de conversação e se mantêm fiéis ao
que aprenderam na infância:
E mais. Sever Pop, in Révue de Linguistique Romane, IX, 47a. 107,
assevera
... facilius enim mulieres incorruptam antiquitatem conservant, quodmultorum sermonis expertes ea tenent semper quae prima dixerunt.
E não faltam exemplos mais recentes. Meringer (1923: 83), referindo-se
às mulheres, diz:
... ellas más bien son las propias conservadoras del idioma, comotambién com la mayor fidelidad conservan la antigua tradición, lacostumbre, el traje, aun cuando el hombre haya abandonado yatodas estas realidades.
... le patois des femmes est presque toujours plus conservateurque celui des hommes de la même localité, ceux-ci étant plussouvent obligés de prendre contact avec des gens de la ville esurtout avec les autorités.
Outro aspecto interessante registrado por Sócrates, em Crátilo: o
empréstimo das palavras:
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Tenho para mim que os Helenos, principalmente os que moramentre os bárbaros receberam destes muitos nomes (409e).
Não é fácil pô-la em relação com a língua helênica, além de ser umfato que os Frígios empregavam esse mesmo termo, com ligeiramodificação (410 a).
Exemplifica-se com a palavra pyr – pur :
Observa-se, a partir do exemplo dado, que Platão tem uma certa
consciência etimológica. Aliás, a origem estrangeira das palavras é perfeitamente
explicada, hoje, pelo parentesco do grego com o sânscrito.
Finalmente, do exame da etimologia, além das contribuições linguístico-
semânticas – primitivas, é verdade -, fica a questão da imitação da própria natureza
da coisa, feita por meio da voz, de cada coisa que se imita e nomeia.
A escrita
Platão fala da escrita, mas não emprega o conceito de texto, menos ainda
de textualidade, conceitos, hoje, em voga, principalmente nos estudos semânticos
da linguagem, em particular pela Análise do Discurso e pela Linguística Textual.
Realmente, nem toda a escrita é texto. Um conjunto de frases ou uma simples
seqüência linguística não identifica o texto e não oferece uma textualidade. São
necessárias outras qualidades, como a coerência, a organização lógica e estética.
Para Guimarães (1995: 77) são necessários dois funcionamentos próprios da
textualidade: coesão e consistência:
A coesão diz respeito às relações que reenviam a interpretação deuma forma à outra, numa seqüência do texto. A consistência dizrespeito às relações que reenviam a interpretação de uma formaao acontecimento enunciativo.
É da essência do texto não se bastar a si mesmo, apesar de sua autonomia
linguística. Há uma produção e uma recepção do texto que perpassa a organização
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Introdução à Linguística
de seus elementos, pois todo texto resulta de um processo dialético ou
simplesmente dialógico. Fávero (1993: 7), a propósito, afirma:
O texto consiste, então, em qualquer passagem falada ou escritaque forma um todo significativo independente de sua extensão.Trata-se, pois, de um contínuo contextual caracterizado pelos fatoresda textualidade: contextualização, coesão, coerência,intencionalidade, informatividade, aceitabilidade, situacionalidadee intertextualidade.
Hoje, ensina-se a tipologia textual, mas ainda não se reflete suficientemente
sobre a questão da verdade. Será que os textos escritos, em tão grande quantidade,
nos jornais e livros, não são simulacros, veículos da ideologia, e não da verdade?
Sem dúvida, a determinação ideológica revela-se, em toda a sua plenitude, no
componente semântico do discurso subjacente ao texto. A Análise do Discurso
procura desfazer a ilusão idealista de que o homem é senhor absoluto de seu
discurso. Ele é, antes, servo da palavra, uma vez que temas, figuras, valores,
juízos provêm das visões de mundo existentes nas formações social, ideológica e
discursiva do homem deste final de século.
Platão não pensava assim. Censura os discursos que não nascem do
próprio espírito do autor, que não verdadeiros escritos da alma, tendo como tema
o justo, o belo, o bom. Paradoxalmente, sabe-se que o próprio filósofo não escreveu
o mais importante de sua doutrina por considerar a escrita instrumento insuficiente
para realizar esta finalidade.
CONCLUSÃO
O diálogo Crátilo só pode ser entendido quando situado na obra de Platão
e no contexto da filosofia grega. Desta maneira, os objetivos do diálogo parecem
adquirir sentido. Assim, os argumentos de Sócrates contra Hermógenes e Crátilo
ganham certa coerência. Assim também a figura do nomoteta (= o legislador) e do
dialético, do conceito do nome como meio de conhecimento das coisas, a partir da
Teoria das Formas, pode ser compreendida.
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FUESPI/NEAD Letras Português
Por outro lado, a questão do nome, no Crátilo, traça o percurso de uma
concepção da linguagem em Platão. Se ele concebe a linguagem como um meio,
um instrumento sensível incapaz de traduzir o mundo inteligível das Formas e do
Bem, por outro lado, a insuficiência da linguagem e da escrita é atenuada através
da articulação da retórica com a dialética, e através do diálogo, pois, o diálogo,
como forma expressiva e comunicativa, possui uma forte dimensão metafórica,
ambígua, dramática, que exige da linguagem uma constante recriação linguística.
A circularidade do diálogo atenua a fixidez da linguagem.
Afirmou-se acima (p. 12) que o homem é servo da palavra, uma vez que
temas, figuras, valores, juízos provêm de sua visão de mundo condicionada à
formação social, ideológica, discursiva. Em outras palavras: na perspectiva da
história das ciências sociais não há linguagem neutra, não há discurso neutro.
E no que diz respeito às ciências duras, pode-se dizer que a ciência é
neutra?
Entre os estudiosos da história da ciência (década de 60/70), alguns
admitiam um discurso que assegurava que o cientista, dentro do laboratório, pode
ser neutro. Seu trabalho, que consiste em produzir conhecimento, por ser objetivo,
estaria isento de influências externas.
Mas será possível deixar de fora o social, quando se entra num laboratório?
Na verdade, assim como a linguagem das ciências sociais é perpassada pela
ideologia, assim também as ciências naturais, segundo os estudos mais recentes,
não estão dissociadas do contexto social, haja vista, por exemplo, a presença de
ideologias racistas em certas produções científicas.
Do exposto se conclui que a linguagem, como manifestação de ideias,
seja das ciências sociais, seja das ciências naturais, não é neutra. Conclui-se
também que o diálogo de Platão – Crátilo -, como escrito básico do pensamento
grego sobre a linguagem, revela questões linguísticas e filosóficas que desafiam a
investigação científica até os dias de hoje.
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Introdução à Linguística
BIBLIOGRAFIA
BURKE, P. & PORTER, R. História Social da Linguagem. Trad. De Álvaro Hattnher.
São Paulo: UNESP, 1997.
FÁVERO, L.L. Coesão e Coerência Textuais. São Paulo: Ática, 1993.
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HAVELOCK, E. A. A Revolução da Escrita na Grécia e suas conseqüências
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KOYRÉ, A. Introdução à Leitura de Platão. Lisboa: Editorial Presença, 1984.
KUHN, T. S. The Structure of Scientific Revolutions. Chicago: Univ. Chicago Press,
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LYONS, J. Introdução à Linguística Teórica. Trad. De Rosa V. M. Silva e Hélio
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the Edimburgh Phrenology Disputes.” In, H. M. COLLINS. Sociology of Scientific
Knowledge – A Source Book, 1982, p. 103-150.
ATIVIDADES DE APRENDIZAGEM
Como forma de rever e consolidar seus conhecimentos acerca dos conteúdos
dessa Unidade, desenvolva os seguintes tópicos de atividades:
1) Construa um texto, apresentando e discutindo as diversas concepções de
linguagem que esta Unidade traz.
2) Pesquise, numa gramática normativa de língua portuguesa, alguns
conceitos e concepções que retratam o pensamento filosófico greco-romano
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acerca de categorias linguísticas, como por exemplo, a noção de sujeito,
predicado, substantivo, verbo, advérbio etc.
UNIDADE 3
OBJETIVOS
1. Reconhecer os critérios que conferem à Linguística o status de ciência.
2. Identificar o conceito e o objeto da Linguística enquanto ciência da
linguagem.
3. Estabelecer a diferença entre Linguística e gramática.
A LINGUÍSTICA: CIÊNCIA DA LINGUAGEM
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3 A LINGUÍSTICA: CIÊNCIA DA LINGUAGEM
A citação acima traduz um dos conceitos mais atuais de língua, nos
nossos dias, e nos leva à reflexão do que hoje representa esse fenômeno no
contexto das discussões científicas. Embora a língua sempre tenha sido objeto
de discussão entre os estudiosos, em todos os tempos, nem sempre os
estudos envolvendo questões linguísticas foram considerados científicos.
Vamos, neste espaço, situar a Linguística enquanto ciência da linguagem mas,
em primeiro lugar, discutiremos a ideia de ciência, no contexto do pensamento
da filosofia moderna.
3.1 REFLEXÕES SOBRE CIÊNCIA
Vejamos, inicialmente, o que está posto nos manuais de Linguística e
nas discussões e reflexões em torno da definição de Linguística enquanto
ciência da linguagem.
O que é Linguística, afinal?
A resposta a essa pergunta é, invariavelmente: Linguística é o
estudo científico da linguagem.
Essa resposta sugere que nem todos os estudos da linguagem podem
ser considerados científicos, pois, para que esses estudos possam estar
incluídos entre aqueles ditos científicos, devem submeter-se a alguns critérios
de cientificidade, indispensáveis. Considerar a Linguística uma ciência sugere
reflexões acerca do próprio conceito de ciência e acerca dos critérios que
conferem a uma área de conhecimento o status de ciência. Nesse sentido,
temos que levar em conta o objeto de estudo da Linguística e a própria noção
A verdadeira substância da língua não é constituída por um sistemaabstrato de formas linguísticas nem pela enunciação monológicaisolada, nem pelo ato psicofisiológico de sua produção, mas pelofenômeno social da interação verbal, realizada através da enunciaçãoou das enunciações. A interação verbal constitui assim a realidadefundamental da língua. (BAKHTIN, 2004, p. 123)
70
Introdução à Linguística
de lingua(gem). Em outros termos, necessitamos refletir sobre o que é ciência,
o que é linguagem e qual o objeto de estudo da Linguística, para podermos
ter segurança quanto à compreensão do que vem a ser a ciência da linguagem.
Vejamos, então, alguns aspectos pontuais dessa discussão,
indispensáveis para que se compreenda como os estudos da língua passaram
a ser considerados científicos.
As noções de ciência e de método científico, embora tenham
suscitado discussões e posicionamentos até controversos, ao longo dos
tempos, evoluíram consideravelmente desde o início do século XX. Essa
evolução deve-se, em parte, à compreensão de que a ciência é um processo
sempre em construção, buscando, a todo instante, renovar-se e reavaliar-se
continuamente sem jamais ser vista como pronta, acabada e definitiva.
Uma forma de compreender a maneira como se pensa a ciência hoje
e as controvérsias envolvidas nesse pensamento, necessária se faz uma rápida
incursão em torno das três grandes correntes da filosofia moderna, espaço
principal do pensamento acerca da constituição da ciência: o racionalismo
cartesiano, o empirismo inglês e o idealismo alemão. Ressalte-se, ainda, o
positivismo, tributária do empirismo.
A corrente de pensamento filosófico conhecida como racionalismo
cartesiano teve o seu início com René Descartes. Predominou no século XVII
e concentrou-se em provar a existência de Deus e em discutir as questões
relacionadas ao tema. Enfatizou a questão do conhecimento e indagou sobre
o papel da mente na aquisição do conhecimento, notadamente buscando
respostas sobre a origem, a essência e o alcance das ideias por meio das
quais o conhecimento se constitui. Para Descartes, as ideias seriam
caracterizadas como sendo adventícias, fictícias e inatas.
O empirismo inglês, que teve Bacon como precursor, Locke como
seu fundador e David Hume como um dos seus continuadores, floresceu no
século XVIII. Ainda no seu início, seguiu o pensamento racionalista e focalizou
a questão do conhecimento, mas se opôs àquele pensamento à medida que
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negou a existência das ideias inatas. Ao se desenvolver, foi-se distanciando
da influência cartesiana, negando a existência das ideias abstratas. Em relação
ao conhecimento, Hume estabeleceu a diferença entre ideias e impressões,
considerando que aquelas são representações mentais, independentes de
vivência sensorial e estas são percepções reais, vivências sensoriais. Chegou
a pôr em dúvida a própria substância espiritual. Nesse contexto filosófico, o
empirismo reduziu o conhecimento às percepções e vivências reais do
indivíduo. A experiência seria, pois, a única fonte válida de conhecimento.
No início do século XIX, surgiu um novo pensamento que orientaria as
ideias filosóficas modernas, o idealismo alemão. Iniciado por Kant, e seguido
por Hegel, teve como característica principal a ideia de que o conhecimento
estaria a serviço da lei moral, ou seja, defendia o pensamento de que o saber
levaria o homem a aperfeiçoar-se moralmente. Dentre os grandes temas
discutidos no contexto do idealismo alemão, temos: a razão e a liberdade; a
autonomia do indivíduo e a organização racional da sociedade e do Estado; e
o sentido da História.
Ainda na primeira metade do século XIX, surgiu uma reação às
preocupações metafísicas das ideias que sedimentavam o racionalismo
cartesiano e o idealismo alemão: seria o positivismo de August Comte. Essa
corrente deu ênfase à experimentação, opondo-se à especulação. Era um
período em que as ciências experimentais floresciam, mas prevalecia, ainda,
a especulação racionalista. Entretanto, pretendia-se uma filosofia que se
propusesse a formular um corpo ordenado de doutrinas gerais, comuns às
diversas ciências particulares, identificado a partir dos resultados alcançados
pelos diferentes ramos do conhecimento. Para Comte, todo estudo científico
deveria ser ao mesmo tempo racional e empírico já que o intelecto humano
escolhe os dados, reelabora-os e os analisa a partir de uma hipótese particular.
Pode-se considerar que o positivismo adota o ponto de vista do empirismo
radical, uma vez que considera que à ciência cabe observar e analisar os
dados da realidade sem, no entanto, fazer indagações do tipo transcendental
72
Introdução à Linguística
ou metafísico e sem considerar entidades que não são físicas. Neste sentido,
o positivismo admite que o método científico é indutivo, é fortemente empirista
e utiliza-se da verificação para validar às suas análises.
Nos nossos dias, põe-se em dúvida o próprio conceito de método
científico, como sendo válido para todas as ciências. O grande questionamento
é se as disciplinas que estudam o comportamento humano, por exemplo,
poderiam ser tratadas a partir dos mesmos métodos e conceitos das ciências
físicas. Diante disso, atualmente, tende-se a aceitar a multiplicidade de métodos
de investigação científica, sendo tais métodos variáveis de ciência para
ciência. Rejeita-se, dessa forma, a unificação de um método científico. Assim
sendo, pergunta-se: Que características fundamentais atribuem cientificidade
ao estudo linguístico?
Embora não haja consenso a esse respeito, algumas exigências como
a comprovação empírica, a ausência de preconceitos e o caráter explicativo
e explícito constituem algumas das características exigidas aos estudos
científicos da linguagem. Chamamos a atenção para o fato de que, para a
Linguística, o caráter empírico diz respeito apenas ao fato de o linguista lidar
com dados suscetíveis de serem comprovados empiricamente, ou seja, pelos
dados da língua. Diante dessas reflexões, na próxima seção trataremos da
constituição desse campo de conhecimento, no que se refere a sua concepção,
definição e objeto de estudo.
Para concluir esta seção, apresentamos o ponto de vista do linguista
brasileiro, Prof. Dr. Francisco Gomes de Matos, sobre a seguinte indagação:
A Linguística é uma ciência?
Sim! Não há dúvida, No momento em que a linguística tem umobjeto de estudo próprio, uma metodologia, um método de estudosrigorosos que podem ser de natureza qualitativa e quantitativa, elareúne as condições ou pré-condições para poder ser consideradaciência. A linguística atende a critérios de cientificidade, tais como:sistematicidade (do conhecimento linguístico), objetividade,relevância (teórica e aplicativa), parcimônia (descritivo-explicativa).Como tal, possui uma terminologia própria, objeto de estudo
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3.2 A LINGUÍSTICA E SEU OBJETO DE ESTUDO
Assinalamos, acima, algumas características dos estudos da
linguagem que contribuíram para que esse campo de conhecimento viesse a
ser considerado uma ciência. Uma delas diz respeito ao caráter empírico das
investigações sobre a linguagem. Nesse ponto, chamamos a atenção para o
fato de que, para a Linguística, o caráter empírico diz respeito apenas à ideia
de o linguista lidar com dados suscetíveis de serem comprovados
empiricamente, ou seja, pelos dados da língua.
Outro ponto diz respeito à ausência de preconceito nas investigações
linguísticas, mostrando um posicionamento oposto àquele adotado pela
gramática normativa, segundo o qual existem variedades linguísticas melhores
que outras, o que revela julgamento de valor.
Já o caráter explicativo da Linguística, uma outra característica
apontada, diz respeito à exigência de verificação empírica. Nas investigações
sobre a linguagem, parte-se de dados sobre a língua, formulam-se hipóteses
teóricas a partir deles. As hipóteses devem ser empiricamente comprovadas,
especializado por terminólogos. Quer dizer: a linguística é umconjunto de saberes sistemáticos do qual têm resultado modelosdiversos, uma infinidade de modelos, alguns até testados, modelosemergentes que estão a serviço das mais diversas áreas dashumanidades em geral.(XAVIER e CORTEZ (Orgs.), 2003, p. 93-94).
74
Introdução à Linguística
daí resultará a validade científica dessas hipóteses. Caso as hipóteses iniciais
não sejam confirmadas, haverá uma reformulação dessas hipóteses até que
se chegue a uma hipótese que alcance todos os fenômenos sob análise.
Finalmente, o caráter explícito da Linguística, por seu turno, refere-se
à exigência de definição clara, precisa e pormenorizada dos pressupostos
teóricos que orientam as análises. Também devem ser explícitos os termos e
conceitos utilizados na argumentação que se apresenta ao realizar um estudo
científico da linguagem.
Considerando o que apresentamos até aqui em termos de reflexão
do que vem a ser considerado ciência, vamos retomar o conceito inicial de
Linguística: estudo científico da linguagem. Vamos, agora, trazer alguns
esclarecimentos acerca do objeto de estudo da Linguística: a linguagem.
No seu Curso de Linguística Geral, Ferdinand de Saussure, o criador
da Linguística moderna, considera, nas páginas iniciais deste livro, que “A
matéria da Linguística é constituída inicialmente por todas as manifestações
da linguagem humana” (p. 13) e no fechamento deste mesmo livro assinala,
textualmente, que a “Linguística tem por único e verdadeiro objeto a língua
considerada em si mesma e por si mesma.” (p. 271).
Para refletir um pouco sobre as considerações saussurianas acerca do
objeto de estudo da Linguística, é interessante que olhemos, rapidamente, as
fases que antecederam a constituição e consolidação desse objeto, quais sejam:
a fase dos estudos gramaticais (relativos à gramática normativa), a fase dos
estudos filológicos e a fase dos estudos comparativistas (Veja Unidade III).
A gramática normativa diz respeito aos estudos da língua que
remontam ao século V a. C. Conforme Lyons (1979), esses estudos gramaticais
eram, para os gregos, uma parte da sua indagação sobre a natureza do mundo
que os cercava e, assim sendo, seria parte da Filosofia. Considera-se que
esses estudos são desprovidos de qualquer critério científico e estão
interessados apenas em formular regras que identificam as formas corretas e
as formas incorretas da língua (retomaremos esta discussão na seção 3.3).
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FUESPI/NEAD Letras Português
A segunda fase, dedicada aos estudos filológicos, ocupou-se em
comparar textos de diferentes épocas e de identificar as peculiaridades
linguísticas dos autores e de épocas específicas. Considera-se que esses
estudos filológicos foram importantes para a constituição da Linguística
histórica.
A terceira fase, reconhecida como a fase dos estudos comparativistas,
foi implementada quando se descobriu que as línguas podiam ser comparadas
entre si. Foram reconhecidas semelhanças entre as línguas, especialmente
no que se refere ao vocabulário e à estrutura gramatical. Nesse contexto de
pesquisas e estudos, argumentou-se em favor do que passou a ser
considerado de parentesco linguístico, equivalendo-se a dizer que duas línguas
são aparentadas se elas evoluíram de alguma língua precedente comum, o
chamado protótipo comum – por exemplo: muitas das línguas da Europa
pertencem à chamada família das línguas indoeuropeias. De acordo com esses
estudos, as línguas mudam no tempo e, assim, podem-se relacionar grupos
de línguas porque elas têm uma demonstrável origem comum, é possível
reconstruir, por comparações e inferências, vários aspectos desses estágios
anteriores.
A escola comparativa, apesar de abrir uma nova frente de estudos,
diferente daquelas anteriores, ainda não constituiu a verdadeira ciência da
linguagem porque não teve a preocupação de identificar o seu objeto de estudo
nem a natureza dele, condição indispensável para que um campo de estudo
constitua-se como ciência. Isso se deve ao fato de que as investigações
comparativistas limitavam-se às línguas indoeuropeias e não determinou a
que levavam as comparações estabelecidas entre as línguas, nem explicitou
o significado das analogias descobertas. Considerou-se, então, que a
comparação é importante para a reconstituição histórica mas, por si só, não
leva a grandes conclusões.
Neste ponto, retomemos o foco inicial da nossa discussão: o objeto
de estudo da Linguística, já apresentado acima, segundo o pensamento de
76
Introdução à Linguística
Ferdinand de Saussure (2008, p. 271) de que a “Linguística tem por único e
verdadeiro objeto a língua considerada em si mesma e por si mesma.” O objeto
de estudo da Linguística seria, então, a língua, considerada em todas as suas
manifestações. Saussure, neste sentido, partindo do ponto de vista da linguagem
como fenômeno unitário, estabelece a dicotomia língua e fala, assinalando que a
língua é um sistema de valores que se opõem uns aos outros e que o sistema
está depositado como produto social na mente dos falantes (CABRAL, 1988), é
o objeto de estudo da ciência que ora inaugura. A fala seria, então, um ato individual
sujeito à interferência de fatores extralinguísticos.
Tomemos, neste espaço, as palavras de Saussure, explicitadas no
Curso.
Qualquer que seja o lado por que se aborda a questão, em nenhumaparte se nos oferece integral o objeto da Linguística. Sempreencontramos o dilema: ou nos aplicamos a um lado apenas decada problema e nos arriscamos a não perceber as dualidadesassinaladas acima, ou, se estudarmos a linguagem sob váriosaspectos ao mesmo tempo, o objeto da Linguística nos parecerácomo um aglomerado confuso de coisas heteróclitas, sem liameentre si. (...)Há, segundo nos parece, uma solução para todas essasdificuldades: é necessário colocar-se primeiramente no terreno dalíngua e torná-la como uma norma de todas as outras manifestaçõesda linguagem. De fato, entre tantas dualidades, somente a línguaparece suscetível duma definição autônoma e fornece um ponto deapoio satisfatório par o espírito.Mas o que é língua? Para nós, ela não se confunde com a linguagem;é somente uma parte determinada, essencial dela, indubitavelmente.É, ao mesmo tempo, um produto social da faculdade de linguageme um conjunto de convenções necessárias, adotadas pelo corposocial para permitir o exercício dessa faculdade nos indivíduos.Tomada em seu todo, a linguagem é multiforme e heteróclita; acavaleiro de diferentes domínios, ao mesmo tempo física, fisiológicae psíquica, ela pertence além disso ao domínio individual e aodomínio social; (...).(...) a língua constitui algo adquirido e convencional, (...).
(SAUSSURE, p. 16-17)
Dessa forma, a língua constituiu-se como o objeto de estudo da
Linguística.
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FUESPI/NEAD Letras Português
Para que a nova maneira de estudar a língua se constituísse numa
ciência, seria necessário, ainda, estabelecer um método de estudo. O método
estabelecido para a proposta descritiva saussuriana foi aquele reconhecido
como método indutivo.
A Linguística, pois, constituiu-se como ciência, com o seu objeto e o
seu método de investigação. Significa que temos uma forma de estudar a
língua bastante diferenciada da tradição dita normativa, aquela que prescreve
as regras do bem falar e, principalmente, do bem escrever. Na próxima seção,
este será o foco da nossa discussão.
3.3 LINGUÍSTICA E GRAMÁTICA
Tomando-se o termo gramática , ocorre-nos, inicialmente, a ideia de
que esse termo refere-se, conforme assinala Possenti (1996, p. 64), a “um
conjunto de regras”, que “devem ser seguidas” ou que “são seguidas”.
Supostamente, esse conjunto de regras traçaria um retrato da estrutura e do
funcionamento da língua.
Em primeiro lugar, devemos esclarecer um pouco a noção de regras .
Quando falamos em regras, ou estamos nos referindo à prescrição,
àquilo que regula coercitivamente, ou estamos falando daquilo que é regular
ou que se faz regularmente. Nisso, repousa a diferença fundamental entre as
ideias de gramática, no seu sentido normativo, e linguística.
A gramática dita normativa, entendida como a “arte de falar e escrever
corretamente”, teve sua origem na Antiguidade e mantém-se até os nossos
dias, com muito vigor, de forma a tentar regular essa arte de falar e,
principalmente, de escrever bem. É uma das abordagens de estudo da língua,
dita não científica por sua própria natureza coercitiva.
De forma mais detalhada, Travaglia (1996) considera que, quando
nos referimos à gramática, estamos, necessariamente, nos reportando ao
termo em uma das seguintes concepções:
78
Introdução à Linguística
1. “conjunto sistemático de normas para bem falar e escrever,
estabelecidas por especialistas, com base no uso da língua consagrado por
bons escritores” e “dizer que alguém sabe gramática significa dizer que esse
alguém conhece essas normas e as domina tanto nocionalmente quanto
operacionalmente” (FRANCHI, 1991:48).
2. “um sistema de noções mediante as quais se descrevem os fatos
de uma língua, permitindo associar a cada expressão dessa língua uma
descrição estrutural e estabelecer suas regras de uso, de modo a separar o
que é gramatical do que não é gramatical” (FRANCHI, 1991: 52-53).
3. “saber linguístico que o falante de uma língua desenvolve dentro de
certos limites impostos pela sua própria dotação genética humana, em
condições apropriadas de natureza social e antropológica” (FRANCHI, 1991,
p. 54).
As três concepções de gramática apresentadas detêm em si sentidos
específicos centrados em diferentes pontos de interesse.
A primeira delas, concebida como “gramática tradicional”, de tradição
secular, considera que a língua é apenas a variedade padrão (culta), sendo as
demais, formas de puros desvios e “erros”. A gramática, assim concebida,
trata somente da descrição da norma culta da língua que é baseada no uso
consagrado de bons escritores, não levando em conta as peculiaridades da
linguagem oral. Tem caráter eminentemente prescritivo.
A segunda concepção de gramática apresentada trata da descrição
da estrutura e funcionamento da língua, observando, assim, sua forma e função.
Essa gramática, por ser descritiva, vê as regras que os falantes seguem quando
elaboram seus enunciados e considera gramatical tudo o que preenche os critérios
de funcionamento da língua no âmbito de uma variedade linguística específica.
As abordagens que fundamentam essa concepção de estudo são as
teorias estruturalistas da linguagem, que privilegiam a descrição do oral, e a
teoria gerativo-transformacional, que lida com enunciados ideais. Essas
correntes, apesar de guardarem profundas diferenças nas suas essências,
79
FUESPI/NEAD Letras Português
em comum têm o fato de proporem uma homogeneidade no sistema linguístico.
Abstraem a língua do seu contexto e trabalham com um sistema formal abstrato
que regula o uso que se tem em cada variedade.
A terceira concepção de gramática apresentada considera a língua
não do ponto de vista normativo, nem do ponto de vista descritivo, mas como
um conjunto de variedades da qual a sociedade se utiliza, levando em conta o
que é adequado para cada situação específica de interação comunicativa. A
gramática seria, então, um conjunto de regras que o falante aprendeu e das
quais se utiliza em diferentes circunstâncias. Essa seria a gramática
internalizada (TRAVAGLIA, 1996), segundo a qual não há erro linguístico, mas
observação do que é adequado de acordo com as diferentes situações de
interação comunicativa, por não atender às normas sociais de uso da língua,
ou por não ser adequado o uso de um determinado recurso linguístico para se
atingir um objetivo específico.
Segundo a concepção de gramática como forma de interação, o que
regula e afeta o uso da linguagem é o contexto sócio-histórico-ideológico,
sendo essa a gramática que constitui a competência comunicativa (HYMES,
1980) do falante, o que lhe permite elaborar seus enunciados e decidir por
sua gramaticalidade no sentido da gramática descritiva.
Dessa forma, temos, acima, três concepções de gramática. A primeira
delas, conforme ressaltado, diz respeito a uma concepção de gramática no
sentido normativo, indubitavelmente. Seria aquela versão que não agrega os
critérios de cientificidade, mas tem um valor sociocultural inestimável, dada a
sua importância enquanto variedade padrão culta da língua. As duas últimas
concepções apresentadas, por sua vez, inscrevem-se entre os estudos
linguísticos considerados científicos. Esses estudos, se não têm a pretensão
de normatizar a forma de falar das pessoas, tal como se propõe a primeira,
qual é, então, a sua utilidade?
No contexto das discussões acerca da Linguística, especialmente
sobre a utilidade desse campo de conhecimento, muitos estudiosos brasileiros
80
Introdução à Linguística
têm marcado suas posições de forma bastante esclarecedora. Nesse sentido,
vejamos o que nos diz um dos maiores linguistas brasileiros de todos os
tempos, o Prof. Dr. Luiz Antonio Marcuschi, ao ser indagado da seguinte forma:
Para que serve a Linguística ?
Uma coisa eu sei: com a linguística você não fica rico, mas semela seu povo é mais pobre. A questão do “para que” serve a linguísticadepende sempre de que estudos linguísticos nós estamos falando.Mas eu tenho a impressão de que a linguística serve basicamentepara fazer com que se compreenda de que forma nós somos sereshumanos. Ou seja, como nós interagimos, como chegamos a nosentender, como conseguimos construir e dar a entender este mundoque nós construímos, como a realidade é sentida e reproduzidapara as pessoas. (...).
(XAVIER e CORTEZ (Orgs.), 2003, p. 137)
A Linguística como ciência, neste século de existência, numa tentativa
de verificar como conseguimos construir e dar a entender este mundo que
nós construímos, como a realidade é sentida e reproduzida para as pessoas,
tem atraído o interesse de muitos estudiosos e se diversificado nos seus pontos
de observação do fenômeno linguístico, traduzido em vertentes que o
contemplam desde o ponto de vista mais estrutural, mais formal possível, até
o ponto de vista do seu uso, mais funcional. O capítulo que segue tratará,
exatamente, dessa expansão e diversificação de interesses da Linguística,
evidenciados nas diferentes maneiras de abordar a língua, em correntes que
revelam interesses também muito diversificados acerca do seu objeto.
RESUMINDO
Neste capítulo, dividido em três seções, tratamos, basicamente, do
estatuto da Linguística enquanto ciência da linguagem. Inicialmente, vimos
que a noção do que vem a ser língua, nas palavras de Bakhtin, hoje está
bastante avançada já que é tida essencialmente como uma forma de interação
entre os homens.
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FUESPI/NEAD Letras Português
1. Reflexões sobre ciência
• As noções sobre ciência e método científico evoluíram,
especialmente, a partir do início do século XX, desde que se chegou à
compreensão de que a ciência é um processo sempre em construção.
• Uma forma de compreendermos a maneira de se pensar a ciência
hoje é fazendo-se uma rápida incursão em torno das três grandes correntes
da filosofia moderna: o racionalismo cartesiano, o empirismo inglês, o
idealismo alemão e o positivismo;
• A Linguística, enquanto ciência da linguagem, é traduzida nas palavras
do Prof. Dr. Francisco Gomes de Matos.
2. A Linguística e seu objeto de estudo
• Caracterização da Linguística como ciência.
• Segundo o pensamento de Ferdinand de Saussure, a “Linguística
tem por único e verdadeiro objeto a língua considerada em si mesma e por si
mesma.” (p.271).
• O objeto de estudo da Linguística seria, então, a língua, considerada
em todas as suas manifestações.
• Saussure, partindo do ponto de vista da linguagem como fenômeno
unitário, estabelece a dicotomia língua e fala, assinalando a língua, sistema
de valores que se opõem uns aos outros e que está depositado como produto
social na mente dos falantes (Cabral, 1988).
• O método estabelecido para a proposta descritiva saussureana foi
o método indutivo. A Linguística constituiu-se como ciência, com o seu objeto
e o seu método de investigação. Significa que temos uma forma de estudar a
língua bastante diferenciada da tradição dita normativa, aquela que prescreve
as regras do bem falar e, principalmente, do bem escrever.
3. Linguística e gramática
• As três concepções de gramática detêm em si sentidos específicos
centrados em diferentes pontos de interesse:
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Introdução à Linguística
• Noção de “gramática tradicional” - considera que a língua é apenas
a variedade padrão (culta). As demais manifestações linguísticas seriam
desvios e “erros”. A gramática, assim concebida, trata somente da descrição
da norma culta da língua que é baseada no uso consagrado de bons escritores.
• Noção de gramática descritiva - focaliza a descrição da estrutura e
funcionamento da língua, observando sua forma e função. Leva em conta as
regras que os falantes seguem quando elaboram seus enunciados e considera
gramatical tudo o que preenche os critérios de funcionamento da língua no
âmbito de uma variedade linguística específica.
• Noção de gramática como forma de interação - considera a língua
não do ponto de vista normativo, nem do ponto de vista descritivo, mas como
um conjunto de variedades da qual a sociedade se utiliza, levando em conta o
que é adequado para cada situação específica de interação comunicativa. A
gramática seria um conjunto de regras que o falante aprendeu e das quais se
utiliza em diferentes circunstâncias.
LEITURA COMPLEMENTAR
Uma compreensão mais aprofundada a respeito dos fenômenos sobre
os quais a linguística volta os seus interesses merece uma reflexão sobre a
própria maneira de se compreender essa ciência, de que maneira ela se
constituiu, a sua abrangência, aonde pretende chegar. Tomando essa trilha,
insistimos na leitura cuja referência é tomada várias vezes neste capítulo e
nos revela um norte bastante esclarecedor a respeito das questões aqui
tratadas. O livro do qual falamos é:
XAVIER, Antonio Carlos; CORTEZ, Suzana, Orgs. (2003). Conversas
com linguistas . São Paulo: Parábola Editorial. ISBN: 85-88456-07-9. 200p.
Além dessa leitura que, certamente, será muito proveitosa, sugerimos,
também, a leitura do texto abaixo, relativo a uma palestra proferida pela Profa.
Sônia Bastos Borba Costa, da Universidade Federal da Bahia, sobre as
83
FUESPI/NEAD Letras Português
entrevistas de grandes linguistas brasileiros, apresentadas no livro referido.
O texto da Profa. Sônia é esclarecedor, também, quanto aos rumos da
linguística
A LINGUÍSTICA E OS ESTUDOS DE LINGUAGEM RUMO AO SÉCULO
XXI[1]
Sônia Bastos Borba Costa
PROHPOR / DLV / IL / UFBA
Inicialmente quero registrar o prazer de estar aqui, conhecendo o DELL
da UESB, oportunidade de que ainda não tinha desfrutado.Confesso que o tema
proposto pela coordenação desta Semana de Letras me surpreendeu, pelo menos
senti-me inibida diante da sua amplitude. Socorri-me, então, de um livro que nos
chegou em março de 2003, Conversas com Linguistas: virtudes e controvérsias
da Linguística (Xavier e Cortez (orgs.) São Paulo: Parábola), coletânea de
entrevistas, de perguntas idênticas, com dezoito linguistas brasileiros, e cuja última
questão é precisamente: Quais os desafios para a Linguística no século XXI?
Para começar a nossa reflexão, acho que primeiramente se coloca a
questão de definir o que são os estudos linguísticos. Afinal, embora estes tempos
chamados pós-modernos estimulem e clamem pela necessidade de
interdisciplinaridade, nossos cursos de Letras costumam distinguir estudos
linguísticos de estudos literários, o que, portanto, afasta dos estudos linguísticos a
literatura das várias línguas, tal como faz a CAPES, que denomina a nossa área
de Letras e Linguística. Mesmo que nos atenhamos a essa distinção (o que não
vejo como taxativo), fatalmente nos perguntamos e nos perguntam: O que é a
Linguística?
Para Eleonora Albano (Xavier e Cortez, op. cit: 30), a Linguística é
um discurso científico que nasceu na virada do século XX, a partirde outros discursos que já havia por aí, que falavam sobre linguageme que realmente eram muito heterogêneos. E Saussure teve o papel
84
Introdução à Linguística
Para Margarida Salomão (id., ibid: 188-9), a Linguística é
de peneirar e de saber puxar um fio lógico: vamos separar issoaqui de tal forma que a gente consiga mapear um certo recortecom métodos claros e possa fazer distinções.
esse campo discursivo que trata da linguagem de uma forma nãonormativa e que procura entendê-lo sob o aspecto social, sob oaspecto cognitivo e sob o aspecto gramatical.[...]. Eu diria paraum aluno da graduação que é o estudo da linguagem que procuraser científico, mas definitivamente não normativo.
Quanto à pergunta, que não consta da citada entrevista, O que são os
estudos linguísticos, fico com a resposta bem-humorada de Ataliba Castilho e a
sua sempre lembrada fábula do elefante (id.ibid.p.55):
Bom, quando eu dou aula na graduação, costumo dizer para osalunos: se você quer entender o que é linguística e o que é o seuobjeto, você precisa pensar um pouco na fábula dos três cegosapalpando o elefante. Cada um apalpava um pedaço do elefante edefinia o elefante por aquele pedaço. Então, o que pegava a pernado elefante, dizia: “o elefante é assim um cilindro muito duro, rígido,é um animal com formato de cilindro e que é estático, parece queesse animal não se mexe e é um animal que ocupa posição verticalno espaço”. O outro, que mexia lá na tromba, naturalmentediscordava, não só quanto à disposição no espaço, quanto à rigidezno tato, tanto quanto à falta de mobilidade. Imagino até que algumdesses cegos, tocando em outros lugares, concebeu a ideia dacategoria vazia.
As primeiras autoras citadas vêem a Linguística como ciência, mas esse
não é ponto pacificamente estabelecido. Uma das perguntas da referida entrevista,
A Linguística é ciência?, propiciou reflexões variadas.
Bernadete Abaurre (Xavier e Cortez, op. cit:16-17) afirma:
eu me sinto mais confortável com uma definição de linguística quea toma como um amplo campo de estudos sobre a linguagem.Esses estudos estão relacionados aos seus mais variadosaspectos: ao seu modo de estruturar-se, de evoluir, aos seus usos,à maneira como ela é aprendida, à maneira como se relacionacom o social, e assim por diante” [...] Assim, para determinadas
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FUESPI/NEAD Letras Português
Ataliba Castilho (id.,ibid.,p. 56) diz:
investigações linguísticas, você tem certos objetos claramenteconstituídos e a exigência de um rigor, de uma sistematicidade naelaboração de teorias, no teste de teorias, procedimentos quecostumam definir as investigações ditas “científicas”[...] Porém nãoacho que se possam reduzir todos os estudos que se fazem dalinguagem a uma perspectiva científica, no sentido estrito do termo[...]
se você está entendendo por ciência a capacidade de problematizaras coisas, fazer perguntas, identificar um objeto de preocupações,criar hipótesee prévias sobre esse objeto e verificar nos dados seessas suas hipóteses encontram guarida, e se depois vocêreformula suas hipóteses numa dialética constante entre teoria eempiria, até o momento em que você vê certa estabilidade nosseus achados, escrevendo ou falando sobre sua descoberta, bem,então você estará fazendo ciência e a ligüística é uma ciência.
Carlos Alberto Faraco (id.,ibid.,p.67) lembra que
alguns, ao fazerem linguística, se acreditam operando com umobjeto matemático, outros com um objeto biológico, outros aindacom um objeto sócio-histórico. Só isso mostra a complexidade donosso objeto e, ao mesmo tempo, certos embates epistemológicosque atravessam os estudos linguísticos.
Luiz Antonio Marcuschi (id.,ibid.,p.137) diz:
Acho que ciência é todo tipo de investigação em que se produzalgum tipo de conhecimento. Eu estou convencido de que o próprioda ciência é investigar e não explicar. A explicação é um dos seusfeitos e não sua essência.
Para João Wanderley Geraldi (id., ibid., p. 82),
Reconhecer os recortes, necessários no fazer científico, é nãofechar-se como uma disciplina orgulhosa dos própriosprocedimentos, pois os resíduos deixados pelo recorte devem alertarpara as parcialidades e inverdades das descobertas.
86
Introdução à Linguística
Sírio Possenti (id.,ibid.,p.167) acha que “há aspectos, pedaços da
linguística que são científicos, são ciência”. Mas esclarece que, para ele, isso não
significa uma vantagem, já que prefere pensar como Michel Foucault que, quando
lhe perguntaram se o marxismo é uma ciência, ele disse, entre outras coisas: “o
marxismo e a psicanálise são muito importantas para ser ciência”.
Kanavillil Rajagopalan, ou simplesmente o colega Raja, afirma (id.,ibid.,
p.179): “Prefiro abdicar do título de cientista para poder pensar a linguagem
livremente”. Não custa lembrar que esse nosso mesmo Raja, segundo Borges
Neto (p. 44), definiu a linguística como “uma paixão pela linguagem”.
Como defendem Dascal e Borges Neto (1991: 45), cada área do
conhecimento pode ser “recortada” por vários objetos teóricos, não há um “objeto
natural”, “prontinho” para uso científico. Por isso é que, no meu entender, muitas
vezes a história de uma ciência não apresenta sucessão linear, progressiva, que
levaria pouco a pouco à completude. A imagem seria, preferencialmente, a de um
mosaico em formação, cujos componentes são, necessariamente,
complementares, mas sujeitos a superposições, lacunas e substituições parciais.
E Rodolfo Ilari (Xavier e Cortez, op. cit.:103-4) alerta para a provisoriedade
do conhecimento científico:
quando se começa a fazer uma ciência, os conceitos de base sãomuito obscuros. E a partir desses conceitos obscuros, que sãoum grande mistério, uma coisa bonita da humanidade é que vocêcria coisas surpreendentemente claras. Chega até um ponto emque você vai encontrar de novo obscuridade, porque a explicação éincapaz de dar conta dos detalhes. Então, a ciência é uma clarezaprensada entre duas obscuridades. Agora, se você pensar no quefoi a história da ciência no passado, é impressionante o tanto decrenças que a humanidade jogou fora, porque de repente pareceramapenas superstições. Tudo aquilo era científico até prova emcontrário, no sentido de que representava o conhecimento controladode uma certa época. Às vezes até funcionava, mas ficou provadoque não funcionava pelas razões alegadas. Então, nós temos queser humildes em relação às ciências que temos hoje, porquepossivelmente nos acostumamos a dizer um monte de besteiras,que por acaso funcionam.
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FUESPI/NEAD Letras Português
Ao meu ver, atribuindo-se ou não caráter científico aos estudos sobre a(s)
língua(s) desde a Antigüidade, certamente não se pode negar esse estatuto aos
estudos desenvolvidos durante o século XIX, pois detentores dos requisitos que se
costumam exigir para reconhecer a cientificidade de uma área do conhecimento:
objeto e metodologia definidos, formulação de hipóteses, procedimentos explícitos
de testagem, conclusões passíveis de fundamentar o avanço da pretendida ciência.
Como afirmam Dascal e Borges Neto (1991:33), no século XIX, “ao invés de se
estudar a linguagem para ‘fazer filosofia’ ou para ‘fazer crítica literária’, como nos
séculos anteriores, passa-se a estudar a linguagem pensando-se um ‘fazer ciência’.
Talvez pudéssemos adotar a postura de que as investigações, os novos
questionamentos produzem resultados, talvez provisórios, mas que, na sua
vigência, configuram saberes, dos quais o saber sobre a linguagem humana,
sobretudo sobre as línguas naturais, que, apenas por economia de referência
significativa, estamos chamando Linguística.
Durante toda a primeira metade do século XX, a aplicação às línguas do
conceito de estrutura, legado de Saussure, produziu muitos trabalhos, mas,
naturalmente, muitos recortes, e fatalmente a descoberta de pontos árduos ou
impossíveis de dar conta por esse modelo. Assim, o estruturalismo saussuriano
acumulou “excluídos” e entreabriu vertentes que não podia explorar. Essa
acumulação, provavelmente, levou o seu modelo à crise e a segunda metade do
século XX explodiu em “novas teorias” ou, ao menos, novas abordagens para o
estudo da língua.
As vertentes foram muitas, não hegemônicas, a maior parte motivada
pelo resgate de um ou alguns dos “excluídos”, o que produziu a atenção também
sobre trabalhos de cunho funcionalista, que já se desenvolviam. Preocupados com
a contextualização da língua na interação social, que, segundo esse ponto de vista,
gera as estruturas, privilegiam o discurso e a semântica, esta em abordagens
mais amplas que aquelas propostas pelo estruturalismo. Assim, o sujeito, a
historicidade, a interação na comunicação humana, a dinamicidade avultam em
muitas tendências, o que aponta, entre outras coisas, para uma mais possível
88
Introdução à Linguística
interdisciplinaridade. Não só a langue, mas o discurso (mais que a parole); quando
não a subjetividade, a pessoalidade (o sujeito, mesmo que não como agente, mas
como operacionalizador); a questão do significado/sentido; as circunstâncias da
efetivação do falar; as seleções de formas linguísticas historicamente consolidadas;
o diálogo como elemento constituinte da língua. Além disso, a chamada revolução
chomskiana trouxe à tona a questão do aparato genético humano, contestando as
teorias de aquisição da linguagem de modelo behaviorista e apelando para uma
interface linguística/biologia, não mais nos moldes deterministas do século XIX,
mas voltada para o estudo do cérebro e da mente.
Enfim, os interessados no fenômeno das línguas começaram o século
XX com a utopia do recorte objetivo, da documentação empírica, do isolamento do
objeto para observações sistemáticas, etc.. O avançar do século evidenciou as
suas limitações. Estamos adentrando o século XXI com a utopia da multi/
interdisciplinaridade que, na verdade, começou na Linguística por volta da década
de 70 do século XX, quando os linguistas se deram conta dos excluídos que a sua
jornada como pretensa ciência “dura” havia colecionado, e começou a se tornar
evidente a necessidade de diálogo, por um lado, com as chamadas ciências da
natureza (a Neurobiologia, a Genética, a Lógica simbólica, por exemplo), e, por
outro lado, com as ciências do homem (a Antropologia, a Sociologia, a História, a
Filosofia da linguagem, as ciências da informação e da comunicação), além da
grande vertente das ciências da mente, sem dúvida propício lugar para o encontro
entre os dois “tipos” de saber. Pense-se na riqueza da interdisciplinaridade entre a
Linguística e a Psicanálise (por exemplo, o conceito de sujeito, as reflexões sobre
o processo de enunciação); a Filosofia da linguagem (por exemplo, as relações
com o conceito de verdade e de motivação); os estudos do cérebro (por exemplo,
a afasia, a aquisição de língua por deficientes auditivos e portadores da síndrome
de Down, as línguas de sinais); os estudos para o processamento das línguas
naturais nos computadores, ou, mais amplamente, os estudos sobre inteligência
artificial. Aliás, como diz Marcuschi (Xavier e Cortez,op. cit.,p.139),
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FUESPI/NEAD Letras Português
Assim, a interdisciplinaridade, apanágio da pós-modernidade, modo de
pensar o mundo que adentra o século XXI, não apresenta, a rigor, qualquer tipo de
dificuldade para o interessado no saber sobre as línguas naturais. A Linguística
está, em decorrência do seu próprio objeto de cogitação, perfeitamente disponível,
mais que para a interdisciplinaridade, para a transdisciplinaridade, entendida essa
como a possibilidade de se conseguirem resultados, não nos limites de cada área,
mas exatamente ali, na interseção – resultados conjuntos, a partir de reflexões
conjugadas.
A esse respeito, Sírio Possenti (Xavier e Cortez, op.cit., p.172) foi muito
feliz ao afirmar sobre a inserção da Linguística na Pós-modernidade:
a interdisciplinaridade, que em outras áreas é complicada e precisaser pensada, na linguística tem que ser até barrada, porque ela émuito natural, ela é muito espontânea. A interação com muitafacilidadde com todas as áreas é um ponto forte e fraco ao mesmotempo que a linguística oferece.
a questão da pós-modernidade [...] não tem afetado as pesquisaslinguísticas naquilo que se poderia chamar de núcleo duro [...] nãohá, eu acho, teorias sintáticas e fonológicas e morfológicas afetadaspor posições ditas pós-modernas. Agora questões como leitura,compreensão, interpretação, [...] aí a pós-modernidade, ou algumasideias da pós-modernidade, afetam determinados campos depesquisa cujo núcleo é de certa forma a linguagem. [...] apragmática, as várias teorias sobre o discurso, os vários modos deabordagem do texto literário, a questão do sentido, se é intrínsecoou se não é intrínseco, se é o leitor que leva o sentido ao texto, seo texto tem alguma relevância no sentido. Essas questões estãoprenhes desse modo de ver as coisas que é meio característico dapós-modernidade.
Talvez possamos tirar dessas reflexões uma conclusão: seja ciência,
rigorosamente falando, ou, modestamente, um saber, provisório como todos, há
muito o que se fazer no âmbito dos estudos linguísticos .
Quem sabe uma boa proposta para termos um rumo, um horizonte daqui
pra frente seja: tentar visualizar os verdadeiros e efetivos lugares que as várias
vertentes dos estudos linguísticos ocuparam no decorrer do século XX, tentando,
se possível, conciliar as propostas das várias teorias ou dos vários programas de
90
Introdução à Linguística
pesquisa, como quer Kato (1997:276), quando vê as várias “teorias” linguísticas
do século XX como estágios de um único programa de investigação, mais do que
“diferentes –ismos”. Seria uma tentativa de visualizar uma espécie de teoria global,
já que, segundo Dillinger (1991: 405), falta à Linguística uma desejável “teoria global
do objeto de estudo – que serve simplesmente para ligar ou estruturar as teorias
‘regionais’[...] conferindo àquela ciência o que chamamos de coerência
metateórica”.
E, sobretudo, como propõe Bernadete Abaurre (XAVIER e CORTEZ. op.
cit., p.22):
seria interessante que conseguíssemos nos desarmar um poucocom relação a teorias que não são aquelas que nós abraçamos,ou com relação a questões sobre linguagem que não são aquelasque nós preferimos investigar. Assim, se nos colocarmos comoquestão maior uma compreensão mais ampla da linguagemenquanto atividade humana, vamos ver que pressupostos podemconviver.
Também Borges Neto (id.,ibid., p.50):
é preciso que os linguistas sejam mais tolerantes uns com osoutros. Acho que esse é um desafio sério. E é um desafio tão maissério na medida em que é preciso tolerar o que o outro diz,compreender o que o outro diz, aceitar o que o outro diz, mascriticar o que o outro diz, porque uma área de conhecimento qualquersó vai se desenvolver coletivamente na medida em que todos ospontos de vista forem debatidos, em que todos os pontos de vistaforem criticados [...] Enfim, acho que um dos desafios do séculoXXI para a linguística é esse desafio da tolerância e da tolerânciacrítica.
Esse tipo de abordagem do nosso objeto de estudo, que configura uma
complementaridade, para nós desejável e necessária, e que vem sendo praticada
pelos mais produtivos linguistas brasileiros, só pode enriquecer em muito o
conhecimento do nosso árduo mas fascinante objeto científico. Talvez essa posssa
ser uma das grandes contribuições desse país multicultural ao mundo científico,
nesse período inter-secular, ameaçado não só pela ótica reducionista da chamada
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FUESPI/NEAD Letras Português
“globalização”, como pelo incremento da mentalidade competitiva no pior sentido,
que só vê valor no hegemônico, necessariamente avesso à alteridade.
Trazendo o foco para mais perto, para aqueles que se dedicam aos
estudos linguísticos na Bahia, há muito de instigante e de necessário a fazer. Como
resultado das respostas contidas no livro em que me baseei e de outras, coletadas
em conversa com colegas lá no meu Instituto, listo algumas das tarefas já iniciadas
e por iniciar, que parecem importantes e promissoras para o futuro próximo da
Linguística, permitindo-me aplicar essas propostas ao português e ao panorama
brasileiros, seguindo, também de perto, a análise e as sugestões de Castilho (2001):
1 Aprofundamento no âmbito da descrição sincrônica – Já dispomos
no Brasil de muitos acervos, como o do PEUL (Programa de Estudos sobre o Uso
da Língua - RJ); o do NURC (SSA, RE, RJ, SP, POA); o do VARSUL (Região sul),
alguns já disponíveis ou em processo de disponibilização pela internet. Dispomos
também de vários atlas linguísticos, inclusive, em curso e a todo vapor, o ALIB,
que, informo a título de motivação, já realizou 124 dos 1100 inquéritos previstos; o
projeto Vestígios de falares crioulos; o projeto PEPP (Projeto de Estudo do Português
Popular de Salvador); o PEPLP (Projeto de Estudo e Pesquisa da Literatura Popular),
que dispõe de grande acervo de contos populares, romances tradicionais,
brincadeiras infantis, cantigas, parlendas e trava-línguas. Impossível seria listar os
trabalhos de análise que têm utilizado esses acervos;
2 Aprofundamento no âmbito da descrição diacrônica – Além de
trabalhos esparsos sobre o português europeu e sobre o português brasileiro, há
os projetos desenvolvidos pelo grupo de pesquisa a que pertenço, o PROHPOR e
pelo PHPB;
3 Abordagem da língua falada – Ataliba Castilho (Xavier e Cortez,
op.cit., p.60-1) lembra que as análises de língua falada tem demonstrado que
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Introdução à Linguística
Neste tópico é importante lembrar o Projeto “Gramática do Português
Falado”, que trabalhou sobre o acervo do NURC.
4 Abordagem e aplicação aos corpora e às descrições do PB dos
conceitos de discurso, texto, conversação – A proposta seria, seguindo o que
propõe Koch (id, ibid: 129):
a gramática do oral é muito mais complexa, muito mais rica doque a gramática da língua escrita [...] Ora, no começo dos anos1960, se achava que a língua falada não dispunha de uma sintaxe![...] Quando foram publicadas as primeiras transcrições dosmateriais do projeto NURC, muita gente vinha conversar comigopara dizer: “vocês não perceberam, mas vocês andaram pegandoinformantes que são afásicos, que têm evidentes problemas delinguagem, ficavam se repetindo, cortavam toda a sentença”. Tratava-se evidentemente de um desconhecimento da língua falada.
ver como é que esse sistema de cada língua se insere nas práticassociais e se modifica através de prática sociais, como é queaparecem esses novos gêneros, como é que a linguagem vai serusada nesses novos gêneros, que tipo de expressão linguística vaiser a mais adequada e inclusive que alterações, em termos dapópria interação, vão acontecer em função dessas alterações.
5 Contribuições para o ensino de língua portuguesa – Como lembra
José Luiz Fiorin (id.,ibid.: 75),
a linguística tem um papel de educar para a democracia, educarpara a cidadania. [...] A democracia é um sistema político em queexiste um respeito à diferença, um respeito à diversidade. Ora, alinguística, ao mostrar que a língua é heterogênea, que a língua édiversa, que a língua é plural, é, de certa forma, uma maneira deeducar para a tolerância e isso é educar para a democracia.
Rodolfo Ilari (id.,ibid.: 109), por sua vez, também afirma
No Brasil, a escola tem sido muito discriminatória. Caberia a elamostrar aos alunos que a língua portuguesa tem variedades, queessas variedades exprimem grupos diferentes, que discriminar alíngua das pessoas é, na realidade, discriminar as pessoas, eassim por diante
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FUESPI/NEAD Letras Português
Ataliba Castilho (2001:277) lembra o quanto a pesquisa acadêmica vem
produzindo bibliografia nesse sentido e cita muitos trabalhos, dos quais vou destacar
aquele desenvolvido pelo Centro de Alfabetização e Leitura da Universidade Federal
de Minas Gerais, fundado por Magda Soares. Uma das consequências do trabalho
de linguistas brasileiros é a incorporação da língua falada nas práticas de ensino,
preconizada pela MEC, através dos Parâmetros Curriculares Nacionais
6 Abordagem das comunidades bilíngües e das minorias linguísticas
– É importante o reconhecimento e a definição de políticas linguísticas para as
comunidades bilíngües existentes no território nacional, atentando-se para as
características decorrentes do contato linguístico e as estratégias de educação
em língua oficial nacional. Quanto às línguas indígenas, além dos trabalhos no
sentido da sua descrição e preservação, destaca-se a defesa e a implementação
da educação bilíngüe e um novo papel para o lingüista, que concorre para a
construção de uma consciência identitária alternativa à que se costuma chamar
nacional (CASTILHO, 2001:282).
7 Atitudes do Est ado brasileiro em relação às línguas estrangeiras –
O governo brasileiro se encarregou de propiciar o ensino de línguas estrangeiras
na escola pública até a década de 1970, mas de lá para cá o que tem ocorrido é a
progressiva transferência desse encargo à iniciativa privada, o que tem enfraquecido
a demanda por qualificação nessas línguas nos cursos de Letras, desestimulando
o desenvolvimento de métodos de ensino e da pesquisa, que não tem podido
beneficiar-se dos avanços da Linguística.
8 Elaboração de obras de referência – Dicionários e glossários, atuais
ou de outras sincronias, monolíngües ou bilíngües; gramáticas descritivas; uma
história mais abrangente da língua portuguesa e do português brasileiro: sem
esquecer as inestimáveis contribuições com que já contamos, esta é uma lacuna
da qual nós, pesquisadores e professores, muito nos ressentimos.
94
Introdução à Linguística
9 Incremento das abordagens cognitivist as – Ataliba Castilho (Xavier
e Cortez, op. cit.:61) entende que
a perspectiva realmente mais suculenta é a da exploração dascategorias cognitivas, do modo como elas se gramaticalizam nalíngua, e do modo como elas aparecem ali.[...] Puxar a linguísticado estudo dos produtos para o estudo dos processos de criaçãodos produtos me parece o grande lance que poderá atrair novospesquisadores. [...] A gramaticalização é apenas um deles, masclaro que a semantização é outro, a discursivização e a lexicalizaçãoserão igualmente outros tantos processos.
Mary Kato (id.,ibid.:115), a esse respeito, questiona:
[...] você pode se perguntar se o desenvolvimento linguístico dacriança acontece em paralelo a seu desenvolvimento cognitivo. Ouum depende do outro? Hoje existe toda uma controvérsia sobreisso. A cognição limita a língua ou a língua limita a cognição?
[...] como se dá conta das formas de pensar? Pensando os aspectoscognitivos ligados a processos de interação que são fundamentais.Eles precisam ser melhor entendidos. No meu entender, a agendacognitiva vai ser muito importante. [...] um cognitivismo social.
Luiz Antonio Marcuschi (id.,ibid.: 140) também questiona:
10 Interface da Linguística com a computação – Fiorin (id.,ibid.:76)
entende que, na agenda linguística do século XXI, um ponto importantíssimo é
essa interface que, para avançar, vai ter de investir na pesquisa do que é e do
como se constitui a faculdade da linguagem humana, inclusive para permitir a
produção de softwares para facilitar o próprio trabalho de pesquisa.
11 Constituição de bancos de dados sincrônicos e diacrônicos –
Hoje já dispomos, no mundo e também no Brasil, de alguns bancos de dados de
grande porte, que inclusive permitem comparações mais precisas, porque são
constituídos a partir dos mesmos princípios teóricos, como ocorre com o acervo
da linguística gerativista (Kato, in Xavier e Cortez, op. cit.:119-120). Kato lembra
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FUESPI/NEAD Letras Português
ainda o banco de dados da história do português a partir do século XVII, denominado
Tycho Brahe, organizado por Charlotte Galves, informatizado e etiquetado para
determinadas abordagens. Lembro também o banco de dados do português escrito
“Usos do Português” (UNESP-Araraquara). Uma equipe do PROHPOR vem também
se empenhando em constituir um banco de textos do português arcaico e moderno.
12 Assessoria ao Est ado no que se refere às questões de ordem
linguística – Castilho (2001:280) lembra que
o Estado vez ou outra decide gerir a língua oficial por meio de leis,e aqui temos desde as “leis que quase pegam”, como as dosacordos ortográficos, até as “leis que não pegam de jeito algum”,como aquelas que pretendem defender a pureza do idioma pátrio...
E acho que o outro grande ponto pragmático e político é fazer comque essa reflexão, sobre a qual eu estava falando, possa transbordarpara áreas interventivas na sociedade brasileira, que é umasociedade que aborda a vergonha insuportável do grau dedesigualdade que há dentro dela. E aquilo que sabemos sobre alinguagem, o fato de a linguagem ser uma condição universal detodo ser humano, pode levar para que nós consigamos conceberpolíticas diminuidoras dessa desigualdade.
O fato é que, por descaso dos governantes para com os linguistas ou por
incúria dos próprios linguistas, não se tem cuidado, no Brasil, de uma atuação
“interventiva”, como qualifica Margarida Salomão (Xavier e Cortez, op. cit., p.192),
frente à sociedade e ao Estado brasileiro. Salomão esclarece:
13 Atenção às possibilidades que se abrem com o Mercosul – Castilho
(2001:283) alerta para a oportunidade que representa para os profissionais de
Letras a criação do Mercosul, que fez crescer a demanda pelo ensino do português
e do espanhol na América Latina e no Brasil, respectivamente. Isso toca a questão
do ensino do português para estrangeiros, área de grande interesse, e que já conta
com centros operosos no Brasil, inclusive no nosso Instituto, com o o PROPEP
(Programa de Pesquisa, Ensino e Extensão de Português).
96
Introdução à Linguística
14 Interface com os estudos literários – Embora os cursos de Letras
abranjam as duas áreas, tem sido mais frequente a interface com áreas mais
distanciadas, como a Medicina, do que com a Literatura. Ora, sendo a literatura a
abordagem artística do material básico das línguas, objeto da Linguística, todas as
reflexões feitas nessa área só podem beneficiar a amplitude de compreensão da
abordagem literária.
Estou certa de que não consegui abordar todas as áreas em que a atuação
dos linguistas é possível e desejável. Mas é hora de finalizar e, como último ponto,
trago um tema difícil de ser abordado, que me parece necessário e urgente. Creio
que precisamos assumir nosso lugar de indivíduos que refletem sobre a linguagem,
sobre as línguas e, em particular, sobre a língua portuguesa, nos meios de
comunicação. Precisamos democratizar, “traduzir” nosso saber para os receptores
da sociedade em geral, simplificando sem banalizar, difundindo sem vulgarizar,
mas assumindo nosso papel social, que tem de se ampliar para além dos limites
das salas de aula, dos centros de pesquisa e estudo. Precisamos assumir nosso
espaço, que está sendo ocupado pelos representantes dos chamados consultórios
gramaticais, partidários do “casamento da gramatiquice com o purismo”, como
qualifica Castilho (2001:276), ocupado pelos sacerdotes da doutrina gramatical,
pelos gurus da auto-ajuda, em termos de uso linguístico. Precisamos desmistificar
a impressão de que somos contra o domínio, pelo povo brasileiro, da norma
prestigiada, convencendo nossos interlocutores de que a catequese nesse sentido
é falaciosa, porque não é possível adquirir-se a norma preconizada, não só pela
inadequação dos meios de “ensino’ ou “treinamento”, mas porque essa norma
preconizada é assistemática, desestruturada, uma colcha de retalhos, que costura
modelos do português europeu, atuais e anacrônicos, com modelos advindos de
usos literários pertencentes a outras sincronias, etc.
E não é só isso. Os que cultivam outras áreas do saber são, por
responsabilidade nossa, muito ignorantes do que fazemos. Precisamos acertar o
tom, falar também a língua da mídia para mostrar a nossa verdadeira cara, para
tornar a linguística atraente. Como afirma Salomão (Xavier e Cortez, op. cit.:191)
“a linguística tem o defeito de ser muito autocentrada”.
97
FUESPI/NEAD Letras Português
Assim, acho que nos falta um tanto de arrojo, sem medo de “dizer
bobagem”. pois, como diz Ilari (id.,ibid.:109)
Nossa linguística é suficientemente rica para poder permitir-se oluxo de uma certa dose de bobagem. Tudo bem. Se você pegar asgrandes disciplinas que se desenvolveram no passado, a botânica,a zoologia, deve ter tido muita bobagem também... O tempo dirá.
Muito obrigada pela sua atenção.
(Disponível em: http://www.prohpor.ufba.br/alinguis.html)
ATIVIDADES DE APRENDIZAGEM
1. Releia o item 3.1 e identifique os pontos em que as três correntes de
pensamento acerca de ciência são divergentes.
2. Considere a resposta do Prof. Dr. Francisco Gomes de Matos, sobre a
indagação: A Linguística é uma ciência?, apresentada na primeira seção. Em
seguida, elabore uma lista dos argumentos dos quais o Professor lança mão
para justificar a inclusão da Linguística no rol das disciplinas que desfrutam o
status de ciência.
3. Considere as três concepções de gramática apresentadas e elabore um
texto no qual você comente essas concepções à luz dos depoimentos de
Abaurre e de Borges Neto, conforme abaixo.
E, sobretudo, como propõe Bernadete Abaurre (XAVIER e CORTEZ.
op. cit., p.22):
[...] seria interessante que conseguíssemos nos desarmar um poucocom relação a teorias que não são aquelas que nós abraçamos,ou com relação a questões sobre linguagem que não são aquelasque nós preferimos investigar. Assim, se nos colocarmos comoquestão maior uma compreensão mais ampla da linguagem enquantoatividade humana, vamos ver que pressupostos podem conviver.
98
Introdução à Linguística
Também Borges Neto (id.,ibid., p.50):
[...] é preciso que os linguistas sejam mais tolerantes uns com osoutros. Acho que esse é um desafio sério. E é um desafio tão maissério na medida em que é preciso tolerar o que o outro diz,compreender o que o outro diz, aceitar o que o outro diz, mascriticar o que o outro diz, porque uma área de conhecimento qualquersó vai se desenvolver coletivamente na medida em que todos ospontos de vista forem debatidos, em que todos os pontos de vistaforem criticados [...] Enfim, acho que um dos desafios do séculoXXI para a linguística é esse desafio da tolerância e da tolerânciacrítica.
UNIDADE 4
OBJETIVO
1. Identificar o conjunto de abordagens teórico-metodológicas que constituem
o vasto campo da Linguística.
AS ESCOLAS LINGUÍSTICAS NO SÉCULO XX:UMA VISÃO INTRODUTÓRIA
101
FUESPI/NEAD Letras Português
4 AS ESCOLAS LINGUÍSTICAS NO SÉCULO XX: UMA VISÃO
INTRODUTÓRIA
A língua é um sistema extremamente complexo. A teoria linguísticatenta reduzir esta imensa complexidade a proporções controláveispela construção de um sistema de níveis linguísticos, cada umdos quais possuindo um certo aparato descritivo para acaracterização da estrutura linguística. (CHOMSKY, 1955c, p. 63)
Com o desenvolvimento dos estudos linguísticos, foram surgindo várias
definições de linguagem humana, próximas em alguns pontos e diversas no
que diz respeito à ênfase dada aos recortes feitos à luz de diferentes
abordagens. Essas definições orientam três teorias gerais da linguagem e
de análise linguística que serão apresentadas a seguir.
4.1OS ESTRUTURALISMOS LINGUÍSTICOS
O estruturalismo linguístico surgiu em oposição à Linguística histórica
e comparativa do século XIX. Para a afirmação dessa teoria, foi fundamental
o pensamento de Ferdinand Saussure, linguista genebrino que teve suas ideias
publicadas três anos após sua morte no livro Curso de Linguística Geral, em
1916. Esse livro não foi escrito por Saussure, mas por dois de seus alunos,
Charles Bally e Albert Sechehaya, que se valeram de algumas anotações de
aulas feitas entre os anos letivos 1907 e 1911. Não se sabe ao certo se o
Curso de Linguística Geral expressa o verdadeiro pensamento de Saussure,
mas, mesmo assim, não há como negar a importância das ideias nele expostas
para o desenvolvimento dos estudos linguísticos.
A proposta de Saussure, de maneira resumida, pode ser representada
por quatro dicotomias básicas: língua versus fala, sincronia versus diacronia,
paradigma versus sintagma e significante versus significado. Segundo Cunha
et al. (2008, p. 16), “o termo dicotomia designa a divisão lógica de um conceito
em dois, de modo que se obtenha um par opositivo”. Para Carvalho (2003, p. 26),
102
Introdução à Linguística
Assim, podemos afirmar que as dicotomias saussurianas representam
o pilar da Linguística estrutural ao mesmo tempo em que fundamentam a
Linguística moderna. A seguir, vamos comentar cada uma delas.
Língua versus fala
A dicotomia língua versus fala é a oposição proposta por Saussure
que determina o objeto de estudo da Linguística.
Para Saussure, a linguagem é um fenômeno que apresenta duas faces:
a língua e a fala. A língua é a parte social da linguagem, que não pode ser
modificada pelo sujeito falante, pois obedece às leis do contrato social
estabelecidas pelos membros de uma comunidade. A fala, por sua vez, é a
parte individual da linguagem, que resulta das combinações feitas entre o
sujeito falante e a língua. A língua e a fala, para o autor, são duas faces que se
correspondem, e uma não vale senão pela outra.
Saussure situou a língua como objeto de estudo da Linguística. Isso
porque é, na língua, conhecimento comum a todos, e não na fala, conhecimento
específico de cada um, que se encontra a verdadeira essência da atividade
comunicativa (CUNHA et al. 2008). Assim, nesse contexto, a língua define-se
como um sistema de signos que obedece a certos princípios de funcionamento e
a fala como a utilização prática e concreta da língua por um determinado falante.
Ao ser definido seu objeto de estudo, a Linguística firmou-se como
ciência, e a língua passou a ser analisada por si mesma e em si mesma,
desconsiderando qualquer relação com a sociedade, com a cultura, com a
O grande mérito de Saussure está em seu caráter metodológico,um prolongamento de sua personalidade perfeccionista. Era precisoem primeiro lugar por ordem nos estudos linguísticos. Para podercriar e postular suas teorias com perfeição científica, impunha-se-lhe, antes, um trabalho metodológico preliminar. Os linguistas atéentão tratavam de coisas diferentes com nomes iguais e vice-versa.A ausência de uma terminologia adequada, precisa e objetiva dealcance universal (e sabemos desde os gregos que só há ciênciado universal) instrumento de trabalho imprescindível a qualquerciência digna do nome, tolhia-lhe a expressão das ideias.
103
FUESPI/NEAD Letras Português
literatura ou com qualquer outro fator não relacionado com a organização
estrutural do sistema linguístico.
Sincronia versus diacronia
Essa dicotomia relaciona-se com o método de investigação adotado
por Saussure em suas pesquisas.
Para Saussure, os fatos linguísticos podem ser investigados sob dois
pontos de vista: o sincrônico e o diacrônico. O ponto de visto sincrônico
descreve os fatos linguísticos em um dado momento e lugar. Sua característica
básica é a simultaneidade dos fatos, por isso diz-se que esse ponto de vista
prende-se a um estado de língua. O ponto de vista diacrônico descreve os
fatos linguísticos no decorrer do tempo. Não se trata aqui de descobrir como
a língua funciona através do tempo, mas de descrever estados sucessivos,
compará-los e verificar como a língua chegou a ser o que é e quais são os
traços básicos de sua evolução.
A análise da variação entre o uso de ‘a gente’ e ‘nós’ no português,
falado atualmente em Teresina, é um exemplo de estudo de caráter sincrônico,
já que o termo ‘variação’ implica a consistência de duas ou mais formas em
uma mesma época. Por outro lado, a análise da trajetória da mudança delere
> to delete > deletar do latim ao inglês ao português, caracteriza-se como
uma abordagem diacrônica.
Apesar de apontar essas duas diferenças, Saussure prioriza o ponto
de vista sincrônico. Para o autor, o linguista deve estudar o funcionamento da
língua observando como se configuram as relações internas entre seus
elementos em um determinado momento do tempo.
Segundo Borba (2005, p.69), uma descrição sincrônica é mais fácil
do que uma descrição diacrônica, pois “enquanto a análise de fatos atuais
pode ser testada por meio de falantes nativos, a de estágios mais distantes
no tempo depende do grau de confiança que se tem na documentação
disponível.” Entretanto, apesar disso e da especificidade de cada ponto de
104
Introdução à Linguística
vista, os dois não devem ser considerados independentes um do outro, visto
que o próprio Saussure adverte (2008, p. 16) "A cada instante a linguagem
implica ao mesmo tempo um sistema estabelecido e uma evolução: a cada
instante ela é uma instituição atual e um produto do passado".
Significante versus significado
Essa dicotomia fundamenta o conceito de signo linguístico.
Para Saussure, o signo é a união de um conceito e uma imagem acústica.
Ao conceito, Saussure denominou significado, à imagem acústica, significante.
O conceito não deve ser confundido com a realidade que ele designa
nem o significante deve ser confundido com o som material, pois, se assim
fosse, a língua seria entendida como uma nomenclatura, em que cada palavra
se refere a uma coisa e, como afirma Pietroforte (2005), essa concepção
está completamente errada.
Para Pietroforte (2005), a língua é um sistema de signos em que, de
essencial, só existe a união entre a impressão psíquica do som e a realidade
que ela designa, ou seja, entre o significante e o significado, podendo o
significante ser entendido como o veículo do significado.
Saussure caracteriza o signo linguístico como arbitrário e linear. É
arbitrário porque não é motivado, ou seja, não há nenhuma relação necessária
que motive a união do significante com o significado. No signo “amar”, por
exemplo, nada há na imagem acústica representada pela sequência de
vogais e consoantes /amah/ que leve a uma relação direta com o conceito
de amar.
A arbitrariedade do signo linguístico pode ser mais bem compreendida
quando observamos a diversidade das línguas. Costa (2008, p. 120) explica
que “cada língua apresenta um modo particular de expressar os conceitos:
ninguém discute, por exemplo, se “livro” ou “book” se aproximam mais ou menos
do conceito apresentado anteriormente. No entanto, vale ressaltar que, essa
arbitrariedade não significa dizer que o significado depende da livre escolha
105
FUESPI/NEAD Letras Português
do falante, pois como já foi visto, anteriormente, a língua é social e, como tal,
obedece às leis estabelecidas pelos membros da comunidade.
O signo é linear porque uma vez produzido, dispõe-se um depois do
outro numa sucessão temporal e espacial, fato que se justifica pela
impossibilidade de dois signos não poderem ser emitidos ao mesmo tempo.
Relação paradigmática versus relação sintagmática
Essa dicotomia define a forma como os elementos se relacionam no
sistema linguístico.
Para Saussure, as relações entre os elementos linguísticos podem
ser de dois tipos: paradigmática e sintagmática. A relação sintagmática baseia-
se no caráter linear do significante que exclui a possibilidade de pronunciar
dois elementos ao mesmo tempo. Quando dizemos, por exemplo, “Eu gosto
de estudar” os signos linguísticos são apresentados em linha no tempo, um
após o outro. Essa combinação de signos que fazemos quando falamos é
chamada de sintagma. Na cadeia sintagmática, um termo passa a ser
compreendido em virtude do contraste que estabelece com outro. Nela, os
elementos não se combinam de maneira aleatória, mas obedecem a um
padrão definido pelo sistema. Por exemplo, no português, é possível a
combinação “o livro”, mas não é possível a combinação “livro o”.
Por outro lado, a relação paradigmática baseia-se em um conjunto
de unidades suscetíveis de aparecer em um mesmo contexto. Na sentença
“Eu gosto de estudar”, por exemplo, se optarmos por outro significado há vários
signos linguísticos que podem figurar no lugar do signo ‘eu’ no enunciado,
como ‘João’, ‘ele’, ‘tu’ etc. Como não é difícil de perceber, nessa cadeia,
diferentemente da cadeia sintagmática, os termos se opõem, pois um exclui
o outro, pois as relações caracterizam-se pela associação entre um termo
que está presente no enunciado com outros que estão ausentes.
As relações sintagmáticas e paradigmáticas apesar de apresentarem
características específicas, a presença de uma não exclui a presença da outra,
106
Introdução à Linguística
muito pelo contrário, elas ocorrem concomitantemente. No enunciado “Eu gosto
de estudar” ao mesmo tempo em que o signo ‘eu’ encontra-se em relação
sintagmática com ‘gosto’, ‘de’ e ‘estudar’, também mantém relação
sintagmática com ‘ele’, ‘você’, ‘João’ etc.
São duas as vertentes estruturalistas que influenciam a Linguística
moderna: o Estruturalismo europeu e o Estruturalismo norte-
americano . A primeira privilegia diferentes aspectos das ideias de
Saussure e a segunda privilegia as ideias do norte-americano Leonard
Bloomfield desenvolvidas sob o rótulo de Distribucionalismo ou
Linguística Distribucional .
O Estruturalismo europeu desenvolveu-se na Europa durante a
primeira metade do século XX e dele derivaram três importantes grupos de
estudos linguísticos: a Escola de Genebra , a Escola de Praga e a Escola
de Copenhague .
A Escola de Genebra e a Escola de Praga focalizaram os estudos
sobre as língua em seu aspecto funcional, no sentido em que elas são utilizadas
como meio de comunicação. Por outro lado, a Escola de Copenhague focalizou
a língua em seu aspecto formal, reduzindo o aspecto funcional a um plano
secundário (COSTA 2008).
A Escola de Praga teve como seus principais representantes Roman
Jakobson, Nikolai Troubetzkoy e Wilhem Mathesius. Esses estudiosos
diferenciaram a Fonética da Fonologia, pois, até então, as duas nomenclaturas
se referiam a uma mesma ciência. Assim, a fonologia passou a ser entendida
como a ciência que estuda as funções linguísticas dos sons e a fonética passou
a ser entendida como a ciência que estuda a produção e as características
dos sons da fala. A Escola de Copenhague, por sua vez, teve como principais
representantes Luis Hjelmslev e Viggo Bröndal, que propuseram a
Glossemática, escola de linguística que, ao estudar a forma e a estrutura das
línguas, aplicou exaustivamente a tese de Saussure de que as línguas se
constituem como sistemas de oposições.
107
FUESPI/NEAD Letras Português
O Distribucionalismo desenvolveu-se nos Estados Unidos entre as
décadas de 1920 e 1950. Essa vertente representa, de maneira independente,
uma proposta semelhante à de Saussure no que diz respeito à maneira com
que ele define a língua e divergente no que diz respeito ao seu caráter
mecanicista. Segundo a Linguística distribucional, para que se possa estudar
uma língua, faz-se necessária a constituição de um corpus para, a partir dele,
elaborar-se um inventário em que se possam determinar as unidades
elementares em cada nível de análise e as classes que agrupam tais unidades.
Leonard Bloomfield, uma das figuras mais representativas do estruturalismo
americano, desenvolveu uma linguística essencialmente formal. Priorizou as
análises fonológicas, morfológicas e sintáticas das línguas e deixou, em
segundo plano, a análise semântica.
No Brasil, o estruturalismo desenvolveu-se, durante os anos 1960.
Nesse período, destacaram-se os trabalhos de Mattoso Câmara Jr. Segundo
Ilari (2004), por volta de 1970, o
estruturalismo já era, no Brasil, a orientação
mais importante nos estudos da linguagem.
Essa teoria serviu, nesse momento, para
criar um novo tipo de pesquisador, o linguista,
em face do gramático e do filólogo .
No Brasil, o estruturalismo se
difundiu por meio de dois focos: um
localizado no Rio de Janeiro e outro, em São Paulo. No Rio de Janeiro, os
trabalhos que se destacaram foram os do linguista Joaquim Mattoso
Câmara Jr., que se declarou até o fim da vida um discípulo do estruturalismo
de Praga. Seu livro Princípios de Linguística Geral (1941), foi o primeiro
manual de Linguística publicado na América do sul e teve importância
decisiva para a afirmação da Linguística no Brasil como disciplina autônoma
(ILARI, 2008).
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
GLOSSÁRIO
Gramático : interessa-se pelasitematização da língua segundoa variedade padrão.Filólogo : interessa-se no estudodas fases antigas da língua.
108
Introdução à Linguística
4.2 A LINGUÍSTICA FORMAL
Segundo Pires de Oliveira (2004), o termo formal implica, na Linguística
contemporânea, várias linhas de pensamento. Formal pode ser entendido
como equivalente a científico, formal pode ser sinônimo de autonomia e formal
pode remeter a cálculo.
A primeira tendência relaciona-se ao fato de que toda teoria linguística
tem a obrigação de ser formalizável. Esse pensamento é que situa a Linguística
como ciência. A Linguística, independentemente de sua opção teórica,
submete-se a uma série de procedimentos que garantem a possibilidade de
sua teoria ser corroborada ou refutada, como, por exemplo, a utilização de
uma linguagem técnica ou formal, para garantir a precisão das informações.
Essa posição determina a primeira acepção do termo formal.
A segunda tendência relaciona-se às crenças quanto à linguagem
humana: a sintaxe das línguas é um sistema autônomo ou a sintaxe é resultado
dos usos e funções da língua? A primeira concepção é defendida pelo
programa teórico gerativista e a segunda pelo programa funcionalista.
O gerativismo defende que a sintaxe é como se fosse uma máquina
que gera sentenças bem formadas, com modo de operar característico. O
funcionalismo, por outro lado, defende que a sintaxe resulta dos usos e funções
a que a língua serve. Os primeiros, portanto, por serem mais “mecanicistas”
são comumente considerados pela literatura de formalistas. O que determina
a segunda acepção do termo formal.
A diferença entre esses dois programas tem sido tratada como uma
questão antagônica que determina dois extremos de análise linguística: o
formalista e o funcionalista. No entanto, Pires de Oliveira (2004, p. 229) ressalta
que:
[...] a segunda acepção do termo formal – aquela que equiparaformal a tese de autonomia da sintaxe - não precisanecessariamente excluir os funcionalistas. Há, pois, um espaço
109
FUESPI/NEAD Letras Português
A terceira tendência relaciona-se ao fato de que as línguas naturais
são cálculos. Nessa tendência, Aristóteles, ao criar o silogismo, talvez tenha
sido o primeiro formalista a mostrar que o raciocínio linguístico pode ser
interpretado como um cálculo de forma:
Vejamos o exemplo:
(A) Todos os homens são mortais
(B) Sócrates é homem
(C) Logo, Sócrates é mortal.
O silogismo de Aristóteles define-se como o conjunto de três termos,
no qual o último, a conclusão, contém uma verdade a que se chega através
dos outros dois, isto é, se (A) e (B) forem verdadeiras, então
a conclusão (C) se segue necessariamente.
Segundo Pires de Oliveira (2004), usamos o tempo
inteiro raciocínios inferenciais, por isso, podemos dizer que
calculamos quando falamos. A autora aponta duas
posições teóricas sobre cálculo nas línguas: a de que
cálculo é específico à linguagem humana e a de que cálculo
é o mesmo que linguagens formais e linguagens naturais.
A primeira é a posição adotada pelos gerativistas e a
segunda, pela gramática categorial . Essa última é que
determina a terceira acepção do termo formal.
A partir dessa discussão, podemos afirmar que não
é pertinente restringir o termo formalismo aos gerativistas,
pois como aponta Pires de Oliveira (2004, p. 229):
para um trabalho conjunto entre gerativistas e funcionalistas semque nenhum dos dois tenha que abandonar sua “metafísica.
GLOSSÁRIO
A Gramática Categorial é umconjunto de teorias deinvestigação linguística debase lexicalista, queseguindo essencialmente opensamento de RichardMontague, prever que aslínguas naturais podem serentendidas formalmente erepresentativamente tal qualas linguagens artificiais, deforma a possibilitar análisescombinatórias ecomposicionais sintático-semânticas das estruturassentenciais.
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
Gerativistas são formalistas porque utilizam uma metalinguagemtécnica quase lógica (formal na primeira acepção), porque privilegiama forma gramatical como autônoma (formal na segunda acepção) e
110
Introdução à Linguística
Entre as teorias formalistas, não há como negar a importância das
contribuições da teoria gerativa para a Linguística. A seguir, aprofundaremos
nossos estudos acerca dessa teoria.
A teoria Gerativa
Essa teoria linguística teve início nos Estados Unidos no final da década
de 1950, a partir dos trabalhos do linguista norte-americano Noam Chomsky,
professor do Instituto de Tecnologia de Massachussets, MIT. Chomsky publicou
seu primeiro livro “Estruturas Sintáticas”, em 1957.
Motivado pelo fato de que um indivíduo utiliza a linguagem de maneira
criativa, isto é, a todo o momento ele constrói frases novas e inéditas, Chomsky
defendeu a ideia de que a linguagem humana resulta de uma capacidade
genética específica da espécie humana localizada na mente/cérebro a qual
ele denomina de faculdade da linguagem .
Partindo dessa concepção, Chomsky definiu que o papel do gerativista
é construir um modelo teórico capaz de descrever e explicar a natureza e o
funcionamento dessa faculdade da linguagem. Mas, como acreditar na
existência da faculdade da linguagem diante da existência de tantas línguas
no mundo?
Para dar conta dessa aparente contradição, Chomsky precisou ainda
mais o objeto de estudo da teoria gerativa distinguindo competência de
desempenho . A competência linguística é a capacidade que o falante tem
de produzir as sentenças de sua língua. O desempenho linguístico corresponde
ao comportamento linguístico que resulta da competência linguística e de
fatores não linguísticos (PETTER, 2005). Por exemplo, se você, em vez de
dizer “O cachorro saiu”, você acaba dizendo “O cachorro taiu”, você cometeu
porque admitem que as línguas naturais são cálculos (terceiraacepção). Mas, há, como já dissemos, formalistas que não estãode acordo com o gerativismo com relação à forma como se dá arelação entre sintaxe e semântica , negando portanto, a segundaacepção de formal.
111
FUESPI/NEAD Letras Português
um erro de execução, de desempenho, o que não significa dizer que você não
tem competência linguística. Chomsky elegeu a competência como objeto de
estudo do gerativismo, passando o gerativista a ter o papel de descrever e
explicar a competência linguística do falante.
Com o desenvolvimento da teoria gerativista, no início dos anos 1980,
a ideia da competência linguística cede lugar à hipótese da Gramática
Universal (GU). Segundo Mioto et al. (2005), a GU é o estágio inicial de um
falante que está adquirindo uma língua. Assim, com a introdução dessa nova
noção, a tarefa do linguista passou a ser descrever e explicar o funcionamento
da GU.
De forma bem resumida, o gerativismo caracteriza-se pelo estudo das
propriedades internas à língua, tais como a natureza dos constituintes e a
relação que se estabelece entre eles, sem se voltar para as relações entre a
língua e o seu contexto de uso tal concebem as abordagens funcionalistas.
4.3 AS ESCOLAS FUNCIONALIST AS
Embora frequentemente contrastado ao estruturalismo, o funcionalismo
surgiu como um movimento particular dentro do estruturalismo. Os primeiros
trabalhos de análise funcionalista foram desenvolvidos pelos membros da
Escola de Praga, que se originou no Círculo Linguístico de Praga, fundado
em 1926 pelo linguista tcheco Vilém Mathesius.
Concebendo a linguagem como meio de comunicação e interação
social, o funcionalismo é uma teoria linguística que tem como objeto de estudo
o uso interativo da língua. Em outras palavras, a teoria funcionalista analisa a
língua, procurando explicar suas regularidades, nos diferentes contextos
comunicativos. Vejamos um exemplo que reflete um fenômeno comum no dia-
a-dia do teresinense:
(1) Tchau, tô chegando!
(2) Tchau, tô indo!
112
Introdução à Linguística
Que tipo de análise daria conta de explicar por que o teresinense utiliza
com mais frequência a sentença (1) do que (2)? Ambas as sentenças
relacionam-se a uma situação comunicativa de despedida. Ocorre que, em
Teresina, a sentença (1) é mais utilizada pelo simples fato de que o teresinense,
ao empregar “tô chegando”, prefere enfatizar o destino, o que não é comum
entre a maioria dos falantes que, ao empregar, na mesma situação, a sentença
(2), dá mais ênfase à origem. Esse exemplo mostra como se processa uma
análise de cunho funcionalista. Os enunciados e os textos são analisados
considerando a função que eles desempenham em situações efetivas de
comunicação.
Para os funcionalistas, como bem acentua Cunha (2008, p. 158), “a
língua não constitui um conhecimento autônomo, independente do
comportamento social, ao contrário, reflete uma adaptação, pelo falante, às
diferentes situações comunicativas.” Essa proposta, portanto, opõe o
funcionalismo às abordagens estruturalistas e gerativistas que não se
interessam pela atuação de fenômenos externos à estrutura das línguas.
Quanto ao processo de aquisição da linguagem, os funcionalistas defendem
que a linguagem faz parte do desenvolvimento cognitivo da criança, assim
como qualquer outro tipo de aprendizagem. A criança constrói a gramática de
sua língua, com base nos dados linguísticos aos quais ela é exposta em
situações de interação com os membros de sua comunidade de fala.
Os estudos funcionalistas classificam-se em dois grupos: o
funcionalismo europeu e o funcionalismo americano . O primeiro estuda
as funções que a linguagem pode desempenhar nas situações comunicativas,
focalizando a organização interna do sistema linguístico. Foi com os estudos
fonológicos, desenvolvidos na Escola de Praga, que esse modelo obteve maior
projeção. Entre seus principais representantes, destacam-se os russos Nikolaj
Trubetzkoy e Roman Jakobson.
O segundo estuda as funções que a linguagem pode desempenhar
nas situações comunicativas focalizando os aspectos cognitivos relacionados
113
FUESPI/NEAD Letras Português
à comunicação. Entre os representantes dessa tendência, destacaram-se os
linguistas: Franz Boas, Edward Sapir e Benjamin Lee Whorf. Segundo Cunha
(2008), o texto pioneiro no desenvolvimento das ideias dessa tendência é
“The Origins of Syntax in Discourse” publicado em 1976 por Gillian Sankoff e
Penelope Brown. Nesse texto, as autoras
fornecem evidências das motivações discursivas
geradoras das estruturas sintáticas do tok pisin,
língua de origem pidgin de Papua- Nova Guiné,
ilha ao norte da Austrália.
No Brasil, os estudos funcionalistas ganharam impulso a partir da
década de 1980. Segundo Cunha (2008), o texto pioneiro foi “Perspectiva
funcional da frase portuguesa” publicado em 1987, pelo linguista brasileiro
Rodolfo Ilari, que trata do dinamismo comunicativo em termos de tema e rema,
na linha dos estudos da Escola de Praga. De lá para cá, foram surgindo vários
grupos de pesquisa nessa área. Entre eles destacam-se o Projeto de Estudo
do Uso (Peul) da Língua da Universidade Federal do Rio de Janeiro, que
focaliza a variação linguística sob a perspectiva da função discursiva das
variantes selecionadas, e o Grupo de Estudos Discurso & Gramática sediado
em várias universidades, que focaliza o estudo dos processos de
gramaticalização.
A teoria funcionalista possui vários temas relevantes, dentre eles, os
mais representativos para essa fase introdutória dos estudos linguísticos são:
informatividade e gramaticalização.
Informatividade
Focaliza o conhecimento que os interlocutores compartilham ou supõem
que compartilham na interação verbal que se manifesta por meio do status
informacional dos referentes nominais na situação comunicativa. Um referente
pode ser novo , dado , disponível ou inferível . É novo quando é introduzido
pela primeira vez no discurso. É dado ou velho, se já tiver ocorrido no texto. É
GLOSSÁRIOPidgin é uma língua que surgepara suprir uma necessidadeextrema de barreira àcomunicação.○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
114
Introdução à Linguística
disponível se em um dado contexto o referente é único e está na mente de
ouvinte. É inferível quando é identificado por meio de outras referências dadas.
Vejamos um exemplo de cada caso, respectivamente, nas situações
hipotéticas abaixo:
(3) Quando chegou na descida da ladeira do Uruguai o carro atropelou um
ciclista que atravessou a sua frente.
(4) O professor adiou a prova porque os alunos disseram que ainda (os alunos)
tinham muitas dúvidas sobre o conteúdo.
(5) Eu fui a Pedro II com uma amiga que nunca tinha ido ao Festival de Inverno.
(6) Quando ele viu o táxi passar, começou a gritar, gritar chamando o motorista,
mas ele não ouvia...
Em (3) ‘carro’ e ‘ciclista’ são referentes novos porque no texto não
encontramos nenhuma referência a essas expressões feitas anteriormente.
Em (4) ‘alunos’ não aparece porque se trata de uma referência dado,
mencionada anteriormente. Em (5) Pedro II é uma referência disponível que o
ouvinte já conhece. E, finalmente em (6), apesar de ‘motorista’ ser uma
referência que não foi mencionada antes e como táxi implica a existência de
um motorista, não é problema para o ouvinte recuperar a referência e entender
a mensagem. Nesse caso, há, pois de uma referência inferível.
Gramaticalização
É o processo pelo qual itens lexicais e construções sintáticas em
determinados contextos passam a assumir funções gramaticais diferentes das
que originalmente assumem. A esse processo, pode associar-se outro que
determina alterações fonéticas na expressão original. Uma vez
gramaticalizados, esses termos continuam sujeitos a desenvolver novas
funções gramaticais. Vejamos alguns exemplos de gramaticalização!
A conjunção alternativa “quer...quer”, em “Quer chova, quer faça sol,
estarei lá”, constitui um exemplo de gramaticalização do item lexical “querer”.
A conjunção e o advérbio “embora” empregados respectivamente em “Ria,
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FUESPI/NEAD Letras Português
embora quisesse chorar” e “Eu vou embora à 22h”, constituem outro exemplo
de gramaticalização. Tal expressão originou-se da construção sintática “em
boa hora”.
A partir dos estudos funcionalistas, originaram-se vários outros estudos,
entre os quais vale destacar: a Sociolinguística, a Análise do Discurso e a
Linguística textual.
A Sociolinguística é o estudo da língua em seu uso real considerando
os aspetos resultantes da relação entre a língua e a sociedade. Seu principal
objetivo é investigar quais são os principais fatores que motivam a variação
linguística e qual o papel de cada um deles na configuração do quadro que se
apresenta variável. Desenvolveu-se na década de 60 nos Estados Unidos
sob a liderança do linguista William Labov.
A Análise do Discurso é uma abordagem linguística que tem como
objeto de estudo o discurso. Seu principal objetivo é estudar as condições de
produção de sentido de um anunciado, considerando o quadro das instituições
em que o discurso é produzido; os embates históricos e sociais e o espaço
próprio em que cada discurso configura para si. Desenvolveu-se, na década
de 60, na França, sob a liderança de Michel Pêcheux.
A linguística Textual é a abordagem linguística que tem como objeto de
estudo o texto. Seu principal objetivo é entender os aspectos relacionados à
produção, recepção e interpretação do texto, considerando suas condições
de uso. Desenvolveu-se, na década de 60, na Europa, mais especificamente,
na Alemanha.
Diante do exposto, vale ressaltar que tais teorias não analisam objetos
de estudo diferentes, apenas elegem fenômenos diferentes de um mesmo
objeto: a linguagem verbal humana. Portanto, é importante que fique claro que,
embora um tanto distintos os enfoques, a escolha de uma não implica a rejeição
da outra. Uma aborda a língua como sistema (estruturalismo); a outra, como
capacidade inata do falante (gerativismo) e, por fim, as outras abordagens
estudam a língua em seu contexto de uso (teorias funcionalistas).
116
Introdução à Linguística
RESUMINDO
Com o desenvolvimento dos estudos lingüísticos, foram surgindo várias
definições de linguagem humana que orientam três teorias gerais da linguagem
e de análise linguística, a saber:
1. ESTRUTURALISMO
• Teoria herdeira das ideias do linguista genebrino Ferdinando
Saussure;
• Tem como seu objeto de estudo a língua em oposição a fala;
• A língua é entendida como um sistema, um conjunto de unidades em
que cada unidade tem um valor funcional;
• Seu principal objetivo é descrever a língua em si mesma e por si
mesma.
2. GERATIVISMO
• Teoria herdeira das ideias do linguista norte-americano Noan
Chomsky;
• Tem como objeto de estudo a competência linguística em oposição
ao desempenho;
• A competência linguística do falante é entendida como uma
capacidade inata da espécie humana;
• Seu principal objetivo é a construção de um mecanismo
computacional capaz de reproduzir o conhecimento linguístico de um falante.
3. FUNCIONALISMO
• É herdeira das ideias de Roman Jakobson;
• Seu objeto de estudo é a língua em usos;
• A língua é entendida como meio de comunicação e interação social;
• Seu objetivo é descrever a língua como um requisito pragmático de
interação verbal.
Tais teorias não analisam objetos de estudo diferentes, apenas elegem
fenômenos diferentes de um mesmo objeto: a linguagem verbal humana.
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FUESPI/NEAD Letras Português
LEITURA COMPLEMENTAR
Para que possamos consolidar um pouco mais algumas das questões
relativas aos conteúdos apresentados neste capítulo, recomendamos a leitura
de uma resenha do livro Conversas com linguistas: virtudes e controvérsias
da linguística, elaborada pelo Prof. Adail Ubirajara Sobral, publicada na revista
D.E.L.T.A.
DELTA: Documentação de Estudos em Linguística Teórica Aplicada
Print version ISSN 0102-4450
DELTA vol.19 no.2 São Paulo 2003
Resenhado por/by: Adail Ubirajara Sobral
LAEL/PUC-SP – Doutorando adails@terra.com.br
Palavras-chave : Linguistas brasileiros; Abordagens.
Key-words : Brazilian linguista; Approaches.
XAVIER, Antonio Carlos; CORTEZ, Suzana, Orgs. (2003). Conversas com
linguistas . São Paulo: Parábola Editorial. ISBN: 85-88456-07-9. 200p.
As virtudes e controvérsias da linguística, subtítulo de Conversas com
linguistas, saíram finalmente dos muros acadêmicos. O livro apresenta entrevistas
feitas pelos organizadores com alguns dos principais estudiosos da linguagem do
país, todos com mais de 20 anos de experiência acadêmica. Essa primeira amostra
traz de estudiosos da semântica formal a analistas de discurso, de profissionais
que se ocupam dos aspectos cognitivos a teóricos do texto, de semioticistas
greimasianos a chomskyanos, de linguistas da paz a estudiosos bakhtinianos, de
estudiosos da fonética a pesquisadores da área da pragmática, de estudiosos dos
usos do português a praticantes da análise da conversação, entre outros. A primeira
contribuição do livro reside em mostrar, como o pretendiam os autores, a
diversidade e a maturidade da reflexão e da prática dos estudos da linguagem
118
Introdução à Linguística
no Brasil. Não faltam às respostas questionamentos acerca da própria adequação
das designações "linguista" e "linguística", bem como a ideia, louvável em todos os
aspectos, de que definir esse campo de estudos depende do ponto de vista que se
assume para fazê-lo. Devem-se mencionar ainda as excelentes discussões acerca
do que é "servir para alguma coisa" quando se trata de ciência, e as interessantes
reações sobre as relações da linguística com a pós-modernidade, essa expressão-
valise tão em voga em nossos dias. Precede cada depoimento um minicurrículo
de cada entrevistado.
Os 18 entrevistados, que trabalham em diversos estados brasileiros (com
grande concentração em São Paulo), são apresentados em ordem alfabética de
sobrenomes. São eles: Maria Bernadete M. Abaurre; Eleonora C. Albano; José
Borges Neto; Ataliba de Castilho; Carlos Alberto Faraco; José Luiz Fiorin; João
Wanderley Geraldi; Francisco C. Gomes de Matos; Rodolfo llari; Mary Kato; Ingedore
G. Villaça Koch; Luiz Antonio Marcuschi; Maria Cecília Mollica; Diana Luz P. de
Barros; Sírio Possenti; Kanavilill Rajagopalan; Margarida Salomão e Carlos Vogt,
este último igualmente autor do Prefácio. As perguntas feitas abarcam um largo
espectro de questões relevantes para a compreensão dos do estudos linguísticos.
São elas: "Que é língua? Qual a relação entre língua, linguagem e sociedade? Há
vínculos necessários entre língua, pensamento e cultura? Linguagem tem sujeito? Que
é linguística? Linguística é ciência? Para que serve a linguística? Linguística teria algum
compromisso necessário com a educação? Como a linguística se insere na pós-
modernidade? Quais os desafios para a linguística no século XXI?" As respostas
oferecem um quadro amplo e profundo que vai por certo servir para balizar os estudos
linguísticos e dar início a um amplo diálogo intradisciplinar e interdisciplinar que vários
entrevistados apontaram como desafio para a linguística no século XXI.
A pergunta sobre o que é língua fez grande parte dos entrevistados remeter
à distinção entre língua e linguagem, em alguns casos mantida e em outros
contestada, havendo ainda alusões à distinção saussuriana entre língua e fala, o
que traz relevantes informações acerca das concepções que circulam no meio
acadêmico especializado. A língua é definida das mais diversas maneiras. São
119
FUESPI/NEAD Letras Português
arroladas aqui, resumidamente, essas várias definições, que se acham detalhadas
no livro, porque a leitura do livro revela que elas nortearam a reflexão acerca dos
outros temas propostos: língua é atividade, trabalho; gesto que é parte integrante
de muitas outras atividades humanas; abreviação para designar os idioletos, que,
esses sim, seriam objetos empíricos; um fenômeno multissistêmico gerido por
um dispositivo sociocognitivo; complexidade estruturada, estruturante e estruturável;
condensação de um homem historicamente situado; instrumento e produto do
trabalho; sistema de comunicação intra/interpessoal e intra/intercultural; um tipo
de competência que nós temos; um fenômeno a um só tempo biológico e produzido
num contexto; simultaneamente um sistema e uma prática social; domínio público de
construção simbólica e interativa do mundo; sistema organizado de relações entre
processamento verbal e significado necessariamente presente em ações
sociointeracionais; um fenômeno desdobrado nos domínios língua e fala, entendidos
como integrados em vez de dicotômicos; ao mesmo tempo sistema formal e objeto de
inscrição social e subjetiva; algo que a gente cria e molda à medida que se vai falando,
um abstrato a posteriori; produção da capacidade da linguagem, uma produção histórica
socialmente demarcada que envolve herança histórica, herança biológica e história
pessoal, não só como condição, mas como demarcação da expressão; um fenômeno
social por excelência que envolve um aspecto estrutural e as condições político-sociais
e econômicas da constituição de um fenômeno de comunicação como língua.
O que une essas várias definições, em meio à aparente diversidade, é o
reconhecimento da complexidade do objeto da linguística. Nenhuma das definições
deixa de levar em conta, ainda que os desenvolvimentos variem, aspectos formais
e não formais, domínios da repetibilidade e da irrepetibilidade, elementos sociais e
pessoais, cognitivos e interacionais, biológicos e políticos, etc. Vê-se que a
linguística é, como disse um dos entrevistados, essencialmente pós-moderna, se
por isso se entender que o campo se desenvolve num ambiente de indefinição
e fluidez com relação ao seu próprio objeto. Ainda que alguns tenham defendido
a linguística como ciência de uma maneira que a aproxima da concepção clássica
e mesmo positivista de ciência, outros como ciência num sentido não clássico e
120
Introdução à Linguística
outros ainda como uma reflexão que não tem porque impor a si um estatuto de
cientificidade do tipo que por muito tempo foi dominante na epistemologia tradicional,
todos reconhecem ter ela hoje objetos delimitados, mesmo que não definidos no
sentido formal tradicional; metodologias reconhecíveis e reproduzíveis e outras
características que fazem dela uma espécie de estudo a um só tempo experimental
e hermenêutico, descritivo e interpretativo, sem pretensões de explicar os
fenômenos no sentido estrito de "explicar".
Se há questionamentos acerca do próprio estatuto de cientificidade das
ciências paradigmáticas, como a física, sente-se a falta de uma descrição que a
diferencie das ciências não-humanas naquilo que ela compartilha com as outras
ciências humanas: o fato de não envolver sujeitos que estudam e objetos de estudo,
mas sujeitos que estudam e sujeitos estudados. Falta também um questionamento
mais aprofundado dos pilares da epistemologia tradicional, o sujeito desprendido
cartesiano, o sujeito idealmente pronto, ser livre e racional, bem como a ideia,
decorrente dessa concepção de sujeito, da sociedade como agregado de sujeitos
atomizados em vez de constituída pelas interações entre esses sujeitos, que ao
mesmo tempo nela encontram as bases de sua subjetivação/socialização, sendo,
portanto mediadores de sua constituição simbólica. Não que esses aspectos não
tenham sido abordados direta ou indiretamente por vários entrevistados quando
de suas respostas, por exemplo, à questão da existência de um sujeito da
linguagem (ou da língua, como sugeriram alguns), nem que não tenha havido
reflexões que envolveram a questão da epistemologia; a falta em questão é da
aplicação mais sistemática desses elementos ao problema da cientificidade
dos estudos da linguagem, o que parece indicar que, embora os linguistas
comecem a questionar o modelo epistemológico vindo das ciências ditas exatas,
ainda não atingiram esse campo as intensas discussões travadas em outros
campos do conhecimento quanto à validade de uma concepção de cientificidade
positivista que concebe o pesquisador como alguém capaz de transcender sua
própria condição e vê-la a partir de um ciberespaço científico, de uma virtualidade
a-histórica e a-social.
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FUESPI/NEAD Letras Português
No tocante ao sujeito, verifica-se haver certa oscilação nas respostas entre
o sujeito da língua/da linguagem tomado em seu aspecto formal e o sujeito da
língua/da linguagem tomado em seu aspecto de atividade. Isso não se deve às
diferenças de pressupostos dos entrevistados, mas ao reconhecimento da própria
complexidade do objeto da linguística, um sistema ciberneticamente aberto, ou
seja, sujeito a influências de outros sistemas e que igualmente influencia esses
sistemas com que interage. É contudo, motivo de satisfação ver que as reflexões
desses profissionais caminham na direção de um monismo conceitual e prático
na linha de Espinoza e de Vygotsky, dado que reconhecem, tomadas em conjunto,
a imbricação entre os aspectos psico-fisiológicos e sócio-históricos do fenômeno
da linguagem verbal. Outro importante aspecto é a refutação do utilitarismo
mercadológico como critério de determinação da validade e da importância dos estudos
linguisticos; vê-se aí uma grande maturidade, pois essa recusa em momento algum
envolve uma separação entre estudos puros e estudos aplicados, mas a defesa do
empreendimento linguístico como valioso por contribuir para a compreensão dos seres
humanos, a par da plena aceitação de que estudos voltados para fins mais práticos
têm o mesmo valor que os estudos que não estão especificamente voltados para isso.
Por outro lado, há a defesa da ética da pesquisa como valor fundamental; os
entrevistados revelam plena consciência de sua responsabilidade social como antes
de tudo cidadãos, recusando a imagem do cientista alienado que nada conhece além
de experimentos, axiomas, postulados e coisas do gênero.
O tema dos desafios da linguística traz um espectro tão grande de
possibilidades e necessidades que constitui por si só uma proposta de mudança
de paradigma. Porque envolve desde o aprofundamento do conhecimento do
aspecto cognitivo da linguagem como a proposta de uma linguística voltada para a
promoção da paz, passando pelo desenvolvimento de propostas voltadas para as
mais diversas áreas, teóricas e práticas. Há a ênfase na necessidade de um estudo
mais aprofundado da "produção" da linguagem, sem desprezo do "produto"
linguístico, o apelo para que se levem em conta as descontinuidades ligadas à
linguagem verbal, para que se reconheça que o próprio ser da linguagem, é antes
da ordem do fluido do que do organizado.
122
Introdução à Linguística
Os autores e a editora prometem lançar dentro em breve um novo volume,
Conversas com (mais) linguistas, que trará as ideias de alguns outros estudiosos
brasileiros da linguagem. É de esperar que esse novo livro contemple estudiosos
das várias novas áreas da chamada linguística aplicada, como as que se dedicam
à questão da linguagem do trabalho, sobre o trabalho e no trabalho, às
especificidades do letramento, da relação entre linguagem e pensamento de linha
vygotskyana e aos estudos transdisciplinares baseados nas propostas do círculo
de Bakhtin, bem como alguns importantes praticantes da linguística sistêmico-
funcional. A reflexão a que nos levam e o conhecimento que nos trazem as
contribuições de Conversas com linguistas não somente revelam o
amadurecimento cada vez maior das concepções, dos estudos, das aplicações
da ciência da linguagem no Brasil, bem como de seus praticantes, como permitem
ao leitor, seja leigo ou especializado, ter uma excelente visão de conjunto da
linguística, da língua, da linguagem e de temas conexos. Um livro indispensável!
ATIVIDADES DE APRENDIZAGEM
1. Comente a afirmativa saussuriana:
“... a linguística tem por único e verdadeiro objeto a língua considerada em si
mesma e por si mesma”.
2. Explique a dicotomia saussuriana língua/fala, comparando com a oposição
chomysquiana competência/performance.
3. Como explicar a capacidade linguística de um falante para formular frases
complexas como “Não sei quando vou poder tirar férias” se considerarmos
que ela não decorre de um aprendizado específico?
4. Defina signo linguístico e exemplifique. Fale da arbitrariedade que
caracteriza o signo.
5. A escola funcionalista da linguagem não corresponde a uma teoria particular,
mas a vários modelos teóricos. Qual o princípio que rege essa escola?
123
FUESPI/NEAD Letras Português
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AVALIAÇÃO DO LIVRO
Prezado(a) cursista:
Visando melhorar a qualidade do material didático, gostaríamos querespondesse aos questionamentos abaixo, com presteza e discernimento.Após, entregue a seu tutor esta avaliação. Não é necessário identificar-se.
Unidade:____________ Município: _________________
Disciplina:___________ Data: ____________________
1. No que se refere a este material, a qualidade gráfica está visualmente
clara e atraente
( ) ÓTIMO ( ) BOM ( ) RAZOÁVEL ( ) RUIM
2. Quanto ao conteúdo, está coerente, contextualizado à sua prática de
estudos
( ) ÓTIMO ( ) BOM ( ) RAZOÁVEL ( ) RUIM
3. Quanto às atividades do material, estão relacionadas aos conteúdos
estudados e compreensíveis para possíveis respostas.
( ) ÓTIMO ( ) BOM ( ) RAZOÁVEL ( ) RUIM
4. Coloque abaixo suas sugestões para melhorar a qualidade deste e de
outros materiais.
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