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http://6cieta.org São Paulo, 8 a 12 de setembro de 2014.ISBN: 978-85-7506-232-6
FORMAÇÃO TERRITORIAL DE FEIRA DESANTANA: UMA RELAÇÃO ENTRE SERTÃO E
LITORAL1
Nacelice Barbosa Freitas2
Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS)
Universidade Federal de Sergipe (UFS)
nacegeografic@hotmail.com
INTRODUÇÃO
O texto tem por objetivo analisar a formação territorial da Bahia, evidenciando
o discurso da depreciação do sertão em relação ao litoral como resultado da valorização do
espaço sob as bases da desigualdade combinada para a reprodução ampliada do capital. A
explicação da relação sertão-litoral busca na leitura escalar o recurso metodológico para
explicar a territorialização do capital.
O sertão dimensionado pela teoria da escala geográfica, não se configura como
um mero recorte a ser decifrado, mas o espaço/território eleito para o aprofundamento da
busca porque além de procurar corrigir o silêncio sobre o tema específico, pretendeu-se,
através do materialismo histórico dialético, explicar a dimensão territorial.
A análise escalar sobre a desigualdade entre o sertão e o litoral, portanto, busca
clarificar, ou seja, abrir caminhos elucidativos dos elementos que conduzem a depreciação
do primeiro em relação ao segundo, tendo como objetivo básico entender a produção
espaço/territorial sob o viés da totalidade: tanto as diferenças fruto da formação territorial,
quanto as relações sociais e políticas que contribuem para perpetuação. Nessa perspectiva,
o tema proposto relaciona-se à formação territorial do sertão, e o texto, pretende oferecer
1 O Texto faz parte das reflexões que integram a tese de doutorado intitulada, O Descoroamento da Princesa doSertão: de “chão” a Território, o “vazio” no processo de valorização do espaço, sob orientação da Profa. Dra.Alexandrina Luz Conceição (NPGEO/UFS).
2 Professora Assistente do Curso de Licenciatura e Bacharelado em Geografia e do Mestrado Profissional emPlanejamento Territorial da Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS). Mestre em Arquitetura e Urbanismo(UFBA), e Doutora em Geografia (UFS). Integra o Grupo de Pesquisa Estado, Capital X Trabalho e as Políticas deReordenamento Territoriais (NPGEO/UFS), o Núcleo de Pesquisa e Análise Sobre o Território (NUPAT/UEFS), o Grupode Pesquisa em Natureza, Sociedade e Ordenamento Territorial (GEONAT) e coordena o Laboratório emPlanejamento Territorial (UEFS).
2008
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uma explicação sobre o alicerce político-econômico que confere a valorização do espaço,
tendo o processo da colonização, de base mercantilista, como veículo principal da
acumulação primitiva do capital.
Feira de Santana é o município da Bahia escolhido para a realização de uma
análise mais específica, embora seja compreendida como expressão da totalidade
espacial/territorial brasileira. O sertão, nessa perspectiva, foi cartografado enquanto
território, no sentido de um novo posicionamento geográfico/espacial, porque, a partir do
mesmo é possível mostrar como o processo de ocupação transforma uma área
essencialmente rural dedicada predominantemente à pecuária, em espaço urbano de
significativa importância nacional.
A necessidade de explicar as origens da formação territorial deste município
torna patente a compreensão sobre o sertão, espaço que não é, na visão de Moraes
(2002-2003), produto da natureza, um espaço determinado pelas peculiaridades naturais, o
lócus da reprodução sertaneja, mas fundamentalmente, o território onde o econômico se
sobrepõe ao natural, porque se configura como fronteira da acumulação primitiva,
enquanto manifestação dos prolegômenos que indicam os limites/extensão do capital
financeiro na Bahia.
A discussão, entretanto, considera a produção do território, como resultado das
relações sociais e econômicas, pois a reprodução ampliada do capital transforma o sertão
de origem rural em densa área urbana de representatividade nacional.
Abordar o sertão como território aponta para um desafio, porque a discussão
deste conceito coloca o investigador diante da complexidade imposta, entre a dificuldade de
explicá-lo tendo por referência o arcabouço antropológico para responder sobre a questão
cultural, e o da ciência política que se inclina a definir as relações de poder. Dessa forma, o
território, analisado sob o viés geográfico se apresenta como problemática epistemológica
há muito tempo colocando os estudiosos que tratam da questão numa situação complexa,
porquanto se trata das transformações territoriais.
SERTÃO E LITORAL: UMA QUESTÃO ESCALAR
O objeto do estudo é a formação territorial do sertão, sob o viés do
desenvolvimento territorial, mediante um exame minudenciado das diferenças com que se
pode manifestar em âmbitos espaciais variados, isto é, como o poder sobre o território
tramita em direção à valorização do espaço para a reprodução ampliada do capital. Não se
2009
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trata, portanto de que a análise dos antagonismos no campo do desenvolvimento revele
alguma síntese que seja esclarecedora sobre o tema, mas explicar como a colonização abriu
as fendas da reprodução ampliada do capital, concretizando no território a desigualdade
combinada.
O sertão é analisado por diversos teóricos, descrito em roteiros de viagem e
delineado em romances, mas observa-se, nestes textos a predominância da visão histórica,
sempre privilegiando o processo de ocupação. Quando se trata da preocupação dos
geógrafos, esta direciona-se para a definição da Região, das condições e classificações
climáticas, evidenciando as respeitáveis consequências das adversidades da natureza para
os habitantes do lugar. Todavia, nota-se um significativo silêncio sobre as bases da
formação territorial, tornando-se necessário explicá-lo enquanto espaço da acumulação
primitiva do capital para a sobrevalorização do litoral.
Feira de Santana o sertão, e Salvador o litoral, são escalas locais, em que as
fronteiras econômicas são definidoras das relações de poder, estruturante da produção do
espaço geográfico nacional. Passíveis de serem separadas, seja pelas especificidades
naturais – clima, solo, vegetação – ou pelo desempenho das atividades econômicas –
cana-de-açúcar, fumo, e pecuária, mineração – são constructos espaciais necessários que
culminam com a formação da Nação. Não se quer dizer que as escalas se desvinculam dos
componentes naturais, mas não são fixas, estanques e se modificam perpetuamente.
O sertão é subjugado aos dissimules do capital que se concentra no litoral. O
lastro cultural da valorização direciona a apropriação simbólica do espaço, expressa na ideia
do “sertanejo” percebido como uma representação e não como sujeito da história: produção
do espaço que se realiza alicerçada em pré-ideações, reverberando os interesses fundados
na acumulação capitalista, que no aprofundamento das desigualdades delimita espaços a
serem dominados.
Examinar a totalidade, todavia, implica em entrever as particularidades
escalares, quando cada uma, apresenta conteúdo responsável pela realização de processos
específicos, isto é, as diferenças geográficas. Entender esse detalhe, teórico pressupõe
certificar-se da essência da escala, localizar cada movimento no âmbito político, econômico,
cultural, etc., e revelar que a leitura da totalidade não deve negligenciar as particularidades
em decorrência da diferença geográfica.
Smith (2000) indica a questão da escala como caminho para o entendimento da
2010
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diferenciação e da diferença espacial, no sentido de observar o significado político da
produção do espaço. Para Lima e Conceição (2012, p. 1), “A produção espacial, inserida no
bojo do conteúdo das relações sociais de um determinado período é, portanto, ontológica
ao ser social”. Os autores asseguram que:
A estrutura geográfica de interações sociais sob o capitalismo produz uma
interpenetração hierárquica entre as escalas por onde transita o capital. A
produção escalar também passa a deter um novo propósito com o
desenvolvimento da sociedade, mediado pelos interesses do capital. (LIMA e
CONCEIÇÃO, 2012, p. 2).
Sertão que é o outro do litoral e não espaço estruturante da divisão territorial
do trabalho no capitalismo escala espacial produzida social, política e economicamente,
dualidade que pressupõe separação e hierarquização, partes inversas, lugares
complementares, fragmentado e fracionado. Analisado dessa forma, impõe afirmar que, ao
estar dentro do sertão significa estar fora do litoral - e vice-versa – encontrar-se no espaço a
priori adaptado à rotina mercantilista dos colonizadores. Escamoteia-se a realidade da
organização espacial que se institui como resultado da expansão geográfica que tinha por
meta a construção de objetos que servissem de base para o processo de acumulação,
produzido para atender as demandas do mercado. Em consequência pode-se testemunhar
a luta constante entre os espaços devido às relações de poder que se estabelecem nas
diferentes escalas: local, regional, nacional e internacional, tendo o solo como a base física
para a divisão social do trabalho. O capital mercantil no período colonial e posteriormente a
consolidação do capital monopolista amplia estes espaços, aprofundam a interpenetração e
diferenciação espacial entre o sertão e o litoral e impõe-se uma estrutura espacial edificada
na desigualdade. Cada especificidade se transforma em escala de análise, permitindo a
reflexão sobre a intensidade da ação em nível local, regional, nacional, etc. concluindo-se
que estas se apresentam de forma diferenciada, mas não significa dicotomia, separação.
O espaço nivelado, visto em camadas, sob gradação, um de mosaico criado e
valorizado pelo desenvolvimento econômico - este como elemento essencial para classificar,
demonstrar o poder de um sobre o outro. Nesse constructo espacial Feira de Santana se
insere numa posição hierarquicamente subjugada ao litoral.
Desconsiderada está a ligação com o Recôncavo, o fato se ser o espaço que foi
produzido como sua extensão, sendo assim, não o integra e se constitui em separado. Então
diferenciação e igualização não são entendidas à luz do materialismo histórico, condição
2011
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necessária para entender que
É a síntese dialética entre diferenciação e igualização do espaço geográfico
promovida pela expansão do capital, que desenvolve o entendimento do
desenvolvimento desigual e combinado da sociedade capitalista. Esse par
dialético não se verifica atuando separadamente sobre o espaço, mas
representam partes do processo contraditório da reprodução do capital. (LIMA e
CONCEIÇÃO, 2012, p. 2).
As relações sociais comprovam que cada escala é construída socialmente,
implicando em tênues e complexas relações de poder. A leitura escalar, entretanto, impede
toda e qualquer possibilidade de entendimento das particularidades como uma ruptura, a
valorização das diferenças de modo hierarquizado, e se impõe como um recurso inigualável
para fortalecer a análise espacial na perspectiva geográfica da formação territorial do Brasil.
A contradição é resposta à própria produção do espaço, porquanto
diferenciações construídas pela sociedade e são passíveis de serem vistas tanto no plano
interno quanto externo: sertão das terras d’ além Paraguaçu e sertão do São Francisco,
litoral e Recôncavo, diferença espacial repletas de especificidades que são produção e
reprodução contínuas de escalas, ao tempo em que cada lugar se diferencia do outro, mas
se unifica, como uma determinação geográfica da contradição inerente à sociedade
capitalista. A luta pelo poder, entre/intra espaços confere a essência da realidade política,
fragilizando o estabelecimento das fronteiras e limites entre sertão e litoral na medida em
que a escala se impõe enquanto critério de diferença. Estas pressupõem a formação da
nação, onde as relações sociais mercantilistas precursoras das relações capitalistas se
sucedem mediante a luta permanente entre os distintos modos de produção do espaço.
Sertão-litoral, singularidade e generalidade do lastro formador da nação, homogeneização
alardeada pelo território forjado no século XVI, para se estabelecer no Estado-Nação: não é
relação espacial, divisão de lugares, e Feira de Santana, nesse aspecto, é escala espacial em
que a formação se dá subjugada ao capital, é espaço de acumulação primitiva, enquanto
sertão.
FEIRA DE SANTANA E A TOTALIDADE SERTÃO-LITORAL
Feira de Santana é o lugar sertanejo onde emerge os elementos que permitem a
compreensão sobre o desenvolvimento desigual. O local da pecuária, semiárido, caatinga,
população dispersa, situado distante do caminho das caravelas que singravam os mares
2012
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levando “ouro” – metal e açúcar – era representativo do atraso. No lado oposto
encontrava-se o lócus litorâneo da cana-de-açúcar, úmido, florestas densas, maior
concentração populacional.
Sempre definido como lugar rude, áspero, caracterizado pelo atraso, miséria,
pobreza infertilidade, esterilidade, improdutividade é completado/complementado pelo seu
oposto, que é privilegiado pelas condições naturais: clima solo abertos à produção e
produtividade, simbolicamente máscara da modernização. É o litoral da umidade, indício da
certeza do retirante:
Bem me diziam que a terra
se faz mais branda e macia
quanto mais ao litoral
a viagem se aproxima.
Agora afinal cheguei
nessa terra que diziam.
Como ela é uma terra doce
para os pés e para a vista. (MELO NETO, 1994, p.40).
Terra adoçada pela cana-de-açúcar produzida por homens e mulheres que
socialmente se diferenciam daqueles, que através dela acumulam capital, numa doçura que
compõe a amargura da exploração de uma sociedade que se origina na Colônia e
consolida-se posteriormente. Mas é terra fértil, produtiva, terra que concede conforto aos
pés, ao pisotear dos bandeirantes, maciez fundante da riqueza do engenho. A umidade, no
entanto, impossibilita a fragmentação da secura, a separação dos contrários, porquanto
diferenciação espacial, escalas de produção social de estruturas geográficas que interagem
no clima da luta política constante. É a síntese dialética, a unidade dos contrários
provocadora da surpresa do viajante que ao se indagar sobre a Geografia do Nordeste só
tem uma resposta;
Mas não senti diferença
entre o Agreste e a Caatinga,
e entre a Caatinga e aqui a Mata
2013
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a diferença é a mais mínima. (MELO NETO, 1994, p.45).
Espaço geográfico, relação Sociedade-Natureza no sertão-litoral, diferenciação
espacial determinada pelo econômico: sertão, agreste e mata, na permanente unidade
dialética, escala, lugares que se diferenciam, se unificam, permitindo a visão do inigualável
colorido inerentemente espacial.
A separação é dada por uma linha demarcada mediante Decreto Real no início
do século XVIII, tornando-se um limite na unidade espacial/territorial, conquanto separação
do litoral testemunhando a impressão da diferenciação que deve ser entendida na
perspectiva da escala; é a Gênese da desigualdade espacial brasileira, demarcação do
desenvolvimento desigual sob a égide do mercantilismo, contorna, dá forma, impõe a lógica
de concretização do espaço traspassado pela história.
Esta é uma delimitação espacialterritorial que se estabelece enquanto espaço de
concretização da contradição, texto e contexto abrem os dutos que permitem a leitura da
totalidade espacial sobre a formação territorial de Feira de Santana que está respaldada na
separação entre o sertão e o litoral, como condição única para a consolidação do
capitalismo nascente. Lugar de passagem, ponto de comercialização, transforma-se em
marco, local, referência da fixidez do capital.
O modo de produção que emerge do mercantilismo tem como atributo único a
contradição e o seu movimento se realiza em dupla direção: uma segue ao nexo da
expansão e mobilidade e, a outra, se encaminha para atender a necessidade de fixação no
espaço, este como requisito para concepção da acumulação: adsorve no espaço real para a
construção de objetos concretos enquanto meios de produção. O engenho, as vias de
circulação, o espaço da feira de gado no período colonial e atualmente as indústrias, os
portos, aeroportos as rodovias, etc. são pontos para a realização do encrave do capital.
Para González (2005) a produção se configura em parte integrante do regime de
acumulação, se instituindo enquanto poder do espaço. No momento em que ocorre a
fixação dos processos de acumulação a escala se apresenta com o espaço capaz de
manifestar com exatidão e objetividade os limites e as fronteiras espaciais. A escala de
produção da pecuária e da cana-de-açúcar cumpre esse papel definidor dos enclaves,
constatando a importância dos estudos espaciais que indicam os aspectos do
desenvolvimento desigual e combinado inerente ao capitalismo. Sendo assim:
Las narrativas escalares son las historias que justifican, enmarcan y dan
2014
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coherencia a la emergencia de uma escala como um ámbitode movilización
política. Em este contexto de globalización, por lo general, estas narrativas son
discursos relativamente simples, que presentan la realidade en términos
dicotómicos: antes/después, industrial/post/industrial, local/global, etc. y la
organizan mediante uma estrutura lógica entre sus diferentes momentos.
(GONZÁLEZ, 2005, p. 105).
A escala não oferece condições de compreensão da completude das trocas
espaciais no âmbito do capitalismo, mas permite identificar a manifestação das feições que
a compõem. A discussão sobre as narrativas escalares evidencia, portanto a importância dos
aspectos discursivos na produção social da escala.
Compreender o sertão numa perspectiva escalar significa explicar a existência
de diferentes sertões, desigualdade combinada da realidade inerente ao modo de produção
capitalista. Isso impossibilita a sua separação do litoral, porquanto formam especificidades
da totalidade do processo que estabelece a essência da sua própria reprodução. Há
diferentes sertões também sob o ponto de vista da identificação dos espaços na escala
nacional à regional e local, assim como, aquele que é delimitado tendo por base a
reprodução ampliada do capital. São diferenciações que indicam a necessidade de delimitar
o objeto de análise e isso não significa que as escalas sejam determinadas pelas fronteiras
naturais, pois a demarcação de onde inicia ou termina cada lugar desafia aos que veem o
espaço de forma fragmentada, deslocado do contexto histórico, desvinculado do conteúdo
geográfico.
João Guimarães Rosa em Grande Sertão Veredas propõe delimitações bem
próximas dessa dimensão ao definir o sertão diante das diferenciações internas, seja de
ordem cultural, social, politica, natural, etc.
O senhor tolere, isto é o sertão. Uns querem que não seja: que situado sertão é
por os campos-gerais e fora a dentro, eles dizem, fim de rumo, terras altas,
demais do Urucúia. (...). lugar sertão se divulga: é onde os pastos carecem de
fechos; onde um pode torar dez, quinze léguas, sem topar com casa de morador;
e onde criminoso vive seu cristo-jesus, arredado do arrocho de autoridade. (...).
O sertão está em toda a parte. (ROSA, 2006, p. 7 e 8).
Euclides da Cunha apresenta a necessidade da caracterização minuciosa da
Natureza do sertão, uma preocupação perceptível em delimitá-lo, defini-lo, indicar fronteiras
que fixassem o poder no espaço específico: “Nenhum pioneiro da ciência suportou ainda as
agruras daquele rincão sertanejo, em prazo suficiente para o definir.” (CUNHA, 2007, p.36).
2015
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Sertão e litoral são colocados como espaços caracterizados, definidos, pela
manifestação da natureza, e na tentativa de impor a dualidade, o esforço de expor os
elementos naturais como opostos. Uma oposição onde se tem: sertão seco, litoral úmido,
sertão da caatinga - mata rala, espinhosa e cinzenta – e litoral da mata atlântica, frondosa,
úmida e colorida, sertão dos rios intermitentes, litoral dos rios caudalosos. Diferenciar
hierarquizando, colocando em oposição, impede qualquer possibilidade de entendimento
da unidade dos contrários, inviabiliza a explicação do conteúdo específico de cada lugar que
compõe o todo.
De acordo com Gomez (2006, p. 237) as “escalas são tipos de espaços que
possuem características diferenciadas”, havendo uma estreita relação entre escala e
diferença espacial. No Estado da Bahia, por exemplo, o sertão do Oeste baiano, não pode
ser explicado com os mesmo critérios do sertão do São Francisco, ou do Sudoeste que se
diferencia do sertão das terras d’Além Paraguaçu, além disso, um evento que ocorre nesta
escala difere em diversos aspectos se acontecer na escala regional ou nacional. São espaços
que se diferenciam, mas se unificam porque é produção do espaço, só entendidos na
perspectiva escalar.
A grandeza do sertão é condição para dificultar a definição da escala de análise.
Feira de Santana: a fronteira é o sertão das terras d’além Paraguaçu, mas começa no litoral
na foz deste rio, onde também é extensão dos limites de Salvador, comandando a
reprodução do interior, que tem a porta de entrada de Nossa Senhora do Rosário do Porto
da Cachoeira. Delimitação comandada pelo capital é prova cabal da capacidade que tem o
mesmo na produção espacial. Encerra-se o sertão na ascensão econômica através da feira
que serviu de instrumento para recuar às entradas e alargar o espaço, talvez, fazendo Feira
de Santana ser “menos” sertão, ou seja, o Agreste que é Portal do Sertão e Princesa do
Sertão estando, ideologicamente, mais perto do litoral. (FIGURA 1).
Tais determinações conferem poder, aprofundados pelo desenvolvimento dos
transportes e comunicação que a partir da década de 1960 com a duplicação da BR 324,
aproxima o tempo-espaço, consolidando a contradição que subsiste a relação de poder
entre os dois lugares que estão em constante competição e cooperação, alicerçados na
disputa pelo melhor local de valorização.
Estando vinculadas às relações de poder a escala é um importante instrumento
para expor as desigualdades espaciais/territoriais. Confirmando esta assertiva Smith (2000,
p.142) assegura que:
2016
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É possível conceber a escala como uma resolução geográfica de processos
sociais contraditórios de competição e cooperação. A produção e reprodução
contínuas da escala expressa tanto a disputa social quanto a geográfica para
estabelecer fronteiras entre diferentes lugares, localizações sítios de experiência.
A construção do lugar está diretamente vinculada à produção da escala na visão
do autor, pois se estes se diferenciam, contem especificidades, é a escala que se estabelece
enquanto “critério de diferença”: igualização e diferenciação determinada pela produção
capitalista do espaço. Assim, tanto interna, quanto externamente, sobrepõe-se a divisão do
trabalho como base para a diferenciação espacial, e, segundo Smith (1988) o capital será o
nivelador, porque em todos os níveis da produção deve haver igualdade nas formas de
exploração do trabalho, porque:
Inerente à produção global do espaço relativo está uma tendência para
igualização das condições de produção e do nível de desenvolvimento das forças produtivas.
(...) Em constante oposição à tendência para diferenciação, a tendência para igualização e a
contradição resultante são os fatores determinantes mais concretos do desenvolvimento
desigual. (SMITH, 1988, p. 170).
2017
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Figura 1: Limite entre sertão e litoral – demarcação da carta régia (1701)
2018
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Significa que, se a tendência do capital é ser universal, este opera em condições
para produção da contradição, isto é, o espaço geográfico global é “produzido como espaço
relativo”, resultante da circulação de mercadorias, estabelecendo o mercado em toda parte
na visão de Marx e Engels (2007), a essência do capitalismo. Smith (1988, p. 127) afirma que
a “diferenciação territorial e a universalização do mercado mundial efetuam-se como um
processo único.” Perpetua-se a expansão geográfica que é ao mesmo tempo expansão
social, espaço geográfico sob o lastro da diferenciação e igualização, implantando o que o
autor denomina de ‘lei universal da história humana’ qual seja, o “desenvolvimento
desigual”.
Feira de Santana nesse ínterim se estabelece enquanto vereda do capital, porta
de entrada para o território ao mesmo tempo em que garante o escoamento da produção,
entendida e explicada como representativo da totalidade. Porta de entrada do sertão - ou
agreste - e sertão porque localiza-se no interior diferencia-se e igualiza-se, expande-se,
refletindo a divisão do trabalho na “geografia do capitalismo, expondo os alicerces da
diferenciação espacial e os diferentes níveis de desenvolvimento. (SMITH, 1988, p. 127 e
151). Sertão e litoral é o espaço em que a grandeza é definida pela reprodução do capital,
escalas geográficas que se diferenciam pelas especificidades seja sob o ponto de vista social,
cultural, econômico ou pela formação territorial determinadas por processos sociais
específicos, não apenas materialidade espacial.
Índios e portugueses em conflito escrevendo no solo da terra brasilis a
diferenciação espacial lastreada nas disputas sociais/territoriais, produzindo dois espaços
específicos da totalidade que se estabeleceram para atender as demandas do capital
mercantil: o litoral considerado espaço da produção direta, o sertão reserva de valor para
fortalecimento da reprodução capitalista: conflitantes e conflitados na produção da
mais-valia, porquanto as diferenças se manifestam tanto no plano interno quanto externo.
A escala nesse sentido se apresenta como “possibilidade política de resistência”. Não é
separação rígida, é diferença espacial, especificidade da totalidade, porque “a escala
geográfica é hierarquicamente produzida como parte das paisagens sociais e culturais,
econômicas e políticas do capitalismo e do patriarcalismo contemporâneos”. (SMITH, 2000,
p. 144).
La cuestión substancial es que el concepto de diferencia es teórica y
politicamente abrumado como um concepto agudamente contestatário, y por
conseguinte susceptible de apropiación y representación ideológica. (...)
2019
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(...) Fundamentalmente, quiero explorar estas cuestiones sobre la diferencia
espacial como um medio para conseguir ir más allá de las categorías existentes –
específicamente para introducir uma conceptualización sobre la producción de
la escala geográfica. (SMITH, 2002, p. 134-135).
Tratando de questões referentes ao poder econômico e político no capitalismo a
questão espacial torna-se fundamentalmente importante para compreensão da distribuição
no lugar, compondo esferas diferenciadas que se combinam estruturando diferenciações
que permitem a análise da realidade mediante as especificidades. Tomando como
referência o sertão e o litoral, pode-se afirmar que o capitalismo se desenvolve
desigualmente, tanto no plano interno quanto externo, constituindo espaços desiguais a
partir dos padrões de acumulação, porque o capital tem como essência a contradição de
revestir-se de dupla tendência, isto é, universalização e a necessidade de fixação em um
local. O desafio está em imprimir um discurso geográfico tendo como reflexo das narrativas
escalares.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Colocou-se o objeto de estudo o sertão e o litoral, escolhendo Feira de Santana
como limite territorial, contorno espacial que permite estabelecer demarcação de fronteiras
sertanejo-litorâneas. A escolha do materialismo dialético como método visou à aproximação
entre a teoria e a realidade investigada, no sentido de fundamentar a explicação sobre o
espaço estudado, e localizá-lo no sertão, não para colocá-lo como diferente do litoral na
perspectiva da separação, mas constituindo especificidade sob o viés da totalidade espacial,
que é a síntese, desigualdade combinada e condição essencial do modo de produção
capitalista.
A construção/criação do sertão baiano antecede ao capitalismo, mas,
permanecendo no capital, porque reproduzido no interior deste o modo de produção.
Instituiu-se um desafio: pensar a importância econômica e política da localização geográfica
de Feira de Santana. Esta situação não inviabiliza a compreensão sobre a sua localização no
sertão, seja como porta de entrada/saída, ou dividindo a sua posição como segundo maior
município do Estado da Bahia em tamanho populacional, denotando que estes termos
visibilizam uma hierarquia socioespacial. Sendo assim, sub-reptício ao significado está a
relação com Salvador, a capital, mas também, como representação do litoral.
Feira de Santana, realidade concreta no século XVII, município fundado em bases
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espaciais sertanejas, nesse sentido, espaço criado para a acumulação do capital,
respondendo ao nome que recebeu em 16 de junho de 1873: Cidade Comercial de Feira de
Santana, um mercado, lugar simbolicamente definido pela compra e venda do gado,
inserido, portanto, na trama do capital comercial fundante do território.
Espaço/sertão, produzido nos primórdios da colonização, teve destruída as
relações não-capitalistas de produção ao mesmo tempo em que foi utilizado para fundar os
alicerces do capitalismo. Espaço para a circulação do capital mercantil, transmutou-se em
lócus da expansão geográfica para novas regiões, fortalecendo o comércio exterior, com a
exportação de mercadorias, o que Marx e Engels (2007, p. 43) denominam de “mercado
mundial”, porque o capital é mundial.
Impelida pela necessidade de mercados sempre novos, a burguesia invade todo
o globo terrestre. Necessita estabelecer-se em toda parte, explorar em toda
parte, criar vínculos em toda parte.
Pela exploração do mercado mundial, a burguesia imprime um caráter
cosmopolita à produção e ao consumo em todos os países.
(...)
Ao invés de antigas necessidades, satisfeitas pelos produtos nacionais, surgem
novas demandas, que reclamam para a sua satisfação os produtos das regiões
mais longínquas e de clima mais diversos. No lugar do antigo isolamento de
regiões e nações auto-suficientes, desenvolvem-se um intercâmbio universal e
uma universal interdependência das nações.
O estudo apontou para a certeza que Feira de Santana não pode mais ser
definida como espaço isolado, lugar longínquo, distante do litoral porque é sertão: é valor
do espaço, lócus de reprodução do capital, Geografia e História alicerçada na produção do
espaço que se projetou no sertão, (des)configurando a ideia de atraso.
Nesse espaço, diferenças foram construídas, enquanto história e geografia,
registro das contradições socioespaciais, sendo assim, buscou-se exprimir como o
sertão/litoral se estabeleceu enquanto escala de análise para explicar o valor do espaço no
contexto do modo de produção capitalista. Vistos e assimilados sempre de forma separada,
espaços paralelos, dois lugares juntos, mas seguindo cada um a sua própria trilha em busca
do mar, da porta de saída/entrada, dos pontos de escoamento da produção. A leitura da
totalidade permitiu reconhecer que Feira de Santana, esta porta do sertão é espaço
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contíguo do litoral, difere dele, mas se iguala abrindo as possibilidades de sua chegada ao
interior, separação que é tão somente produção da diferença geográfica, ou seja, produção
de escala espacial.
As diferenças geográficas então situadas, tanto no nível interno, quanto externo,
são consideradas, desde quando se busca a compreensão do local à dimensão regional,
nacional e internacional, formando um mosaico geográfico.
Esse mosaico é ele mesmo um ‘palimpsesto’ – composto de acréscimos
históricos de legados parciais sobrepostos em múltiplas camadas uns sobre os
outros (...) algumas camadas têm maior saliência que outras (...) Esse mosaico
geográfico é uma criação, aprofundada pelo tempo, de múltiplas atividades
humanas. (HARVEY, 2006, p. 111).
Espaços que se transformam através do tempo-espaço: sobre o sertão da
pecuária, a escrita do litoral da cana-de-açúcar, ao mesmo tempo recebendo a fixação
gráfica da linguagem representativa da plantation que produz ouro doce, enquanto as patas
das boiadas superpõem aos rabiscos, escrevendo novo texto para compor o capítulo da
formação territorial, tergiversado por combinações, arranjos e imagens, uma mnemônica,
registrando as mensagens redigidas pela sociedade que fixam à memória acontecimentos
do passado-presente.
Ler o espaço numa perspectiva dialética é uma tarefa de profunda complexidade
uma vez que na totalidade, visualizam-se as diversidades geográficas, enquanto respostas
aos/dos processos sociais, políticos, econômicos e históricos em constante movimento de
transformação escalar, tanto no plano interno, quanto externo. A velocidade destas
transformações segue o ritmo da História concomitante construção da Geografia, e se no
período colonial esta se projetava de forma lenta, no contexto da mundialização do capital
as transformações são mais rápidas devido ao desenvolvimento das forças produtivas e
elevação permanente do nível tecnológico, impactando o sertão-litoral que às vezes não se
reconhecem, porquanto a aproximação dos espaços, e a diminuição do tempo, interferem
na localização das fronteiras entre ambos.
Constatou-se que sertão e litoral são escalas espaciais que denunciam o
desenvolvimento geográfico desigual, totalidade contraditória, e compreender as
diferenças/desigualdades é o melhor atalho para entender o desenvolvimento geográfico
desigual na esfera do capitalismo.
A escala entendida como categoria de análise para explicação da diferenciação
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espacial tornou possível, através da mesma, imprimir uma nova linguagem para a
compreensão das diferenças que são resultantes da forma como a sociedade produz
espaço. Espaço e sociedade imbricados numa totalidade repleta de especificidades que são
construídas historicamente – passado-presente materializados em cada lugar. Nesse
sentido, “a produção da escala é um lugar de luta política”.
Mas as diferenças geográficas são bem mais do que legados
histórico-geográficos. Elas estão sendo perpetuamente reproduzidas,
sustentadas, solapadas e reconfiguradas por meio de processos
político-econômicos e socioecológicos que ocorrem no momento presente.
(HARVEY, 2006, P.111).
A leitura da relação espacial do sertão-litoral foi utilizada para compreensão do
termo no contexto atual, observando-se que é tão somente uma atualização sobre a
definição de diferenciação. Novos conteúdos políticos e econômicos são inscritos no espaço,
objetivando o aprofundamento do processo.
Conclui-se que as diferenciações eram abordadas sob o viés da fragmentação e
separação, pedaços do espaço separados, isolados e não analisados como especificidade de
uma totalidade espacial.
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FORMAÇÃO TERRITORIAL DE FEIRA DE SANTANA: UMA RELAÇÃO ENTRE SERTÃO E LITORALEIXO 1 – Transformações territoriais em perspectiva histórica: processos, escalas e contradições
RESUMOO texto tem por objetivo analisar a formação territorial do sertão no Estado da Bahia,evidenciando o discurso da depreciação em relação ao litoral como resultado da valorização doespaço sob as bases da desigualdade combinada para a reprodução ampliada do capital. Aexplicação da relação sertão e litoral busca na leitura escalar o recurso metodológico para explicara territorialização do capital. O sertão dimensionado pela teoria da escala geográfica, não seconfigura como um mero recorte a ser decifrado, mas o espaço/território eleito para oaprofundamento da busca porque além de procurar corrigir o silêncio sobre o tema específico,pretendeu-se, através do materialismo histórico dialético, explicar a dimensão territorial. A análiseescalar sobre a desigualdade entre o sertão e o litoral, portanto, busca clarificar, ou seja, abrircaminhos elucidativos dos elementos que conduzem a depreciação do primeiro em relação aosegundo, tendo como objetivo básico entender a produção espaço/territorial sob o viés datotalidade: tanto as diferenças fruto da formação territorial, quanto as relações sociais e políticasque contribuem para perpetuação. Nessa perspectiva, o tema proposto relaciona-se à formaçãoterritorial do sertão, e o texto, pretende oferecer uma explicação sobre o alicercepolítico-econômico que confere a valorização do espaço para o capital, tendo o processo dacolonização, de base mercantilista, como veículo principal da acumulação primitiva do capital.Feira de Santana é o município da Bahia escolhido para a realização de uma análise maisespecífica, embora seja compreendida como expressão da totalidade espacial/territorial brasileira.O sertão, nessa perspectiva, foi cartografado enquanto território, no sentido de um novoposicionamento geográfico/espacial, porque, a partir do mesmo é possível mostrar como oprocesso de ocupação transforma uma área essencialmente rural dedicada predominantemente àpecuária, em espaço urbano de significativa importância nacional. A necessidade de explicar asorigens da formação territorial deste município torna patente a compreensão sobre o sertão,espaço que não é, na visão de Moraes (2002-2003), produto da natureza, um espaçodeterminado pelas peculiaridades naturais, o lócus da reprodução sertaneja, masfundamentalmente, o território onde o econômico se sobrepõe ao natural, porque se configuracomo fronteira da acumulação primitiva, enquanto manifestação dos prolegômenos que indicamos limites/extensão do capital financeiro na Bahia. A discussão, entretanto, considera a produçãodo território, como resultado das relações sociais e econômicas, pois a reprodução ampliada docapital transforma o sertão de origem rural em densa área urbana de representatividade nacional.Conclui-se que abordar o sertão como território aponta para um desafio, porque a discussão desteconceito coloca o investigador diante da complexidade imposta, entre a dificuldade de explicá-lotendo por referência o arcabouço antropológico para responder sobre a questão cultural, e o daciência política que se inclina a definir as relações de poder. Dessa forma, o território, analisadosob o viés geográfico se apresenta como problemática epistemológica há muito tempo colocandoos estudiosos que tratam da questão numa situação complexa, porquanto se trata dastransformações territoriais.
Palavras-chave: assentamentos precários; favelas; estatística textual.
2025
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