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CURITIBA: Sociedades Operárias da Virada do Século XIX
BRENNER, GISLENE T. (1); NOGUEIRA, CÍNTIA N. (2)
1. Universidade Tecnológica Federal do Paraná. Departamento de Construção Civil
Rua Samuel Cezar, 1454. ap. 4A - 80620-220 - Água Verde gislenebrenner@gmail.com
2. Universidade Tecnológica Federal do Paraná. Departamento de Construção Civil
Rua Manoel dos Santos Barreto, 158 ap. 33 - 80530-250 - Juvevê cnnogueira@outlook.com
RESUMO
Este trabalho visa catalogar as Sociedades Operárias surgidas em Curitiba no período de 1880-1930, estudar seus usos e estados atuais de conservação, bem como analisar a influência que tiveram, cada uma em seu contexto, no processo de surgimento do movimento operário no Paraná, que tinham nas sedes destas Sociedades importantes espaços de organização livre e autônoma dos trabalhadores da época, na busca e construção de direitos sociais que vieram a ser garantidos posteriormente com a Consolidação das Leis do Trabalho, em 1943. A base da economia estadual nessa época era a in-dustrialização do pinheiro e da erva mate. Em 1902 o mate representava ainda 31% do orçamento do estado. A indústria de manufaturas dava seus primeiros passos. A par deste desenvolvimento, a cidade se consolidava em uma sociedade de base operária que não possuía assistência social, fazendo necessária a organização dessa classe para fazer frente aos problemas advindos dessa falta de as-sistência. Nesse contexto surge a classe operária paranaense, que não tarda a começar a se organizar em sociedades beneficentes, algumas formadas de acordo com as profissões que exerciam, pela nacionalidade e outras pelo local de residência. As finalidades das sociedades iam além do caráter recreativo, angariavam fundos entre os associados e em atividades sociais para fins de pecúlio, es-pecialmente auxilio doença e auxilio funeral.
Palavras-chave: Sociedades Operárias; Patrimônio Cultural.
3° COLÓQUIO IBERO-AMERICANO PAISAGEM CULTURAL, PATRIMÔNIO E PROJETO - DESAFIOS E PERSPECTIVAS Belo Horizonte, de 15 a 17 de setembro
Contexto histórico
Na década de 1900, o mundo vivia intenso desenvolvimento industrial, capitaneado especi-
almente por Inglaterra, Estados Unidos e Alemanha. O Brasil também começava a aumentar a
sua indústria, desenvolvendo entre outras coisas, a rede telegráfica, que unia os pontos mais
afastados do território aos centros industriais e intelectuais do mundo. Possuía mais de 20 mil
quilômetros de estradas de ferro, navegação costeira e fluvial, serviço postal aperfeiçoado.
Em novembro de 1902, a República se consolidava no Brasil, e assumia um governo com-
posto pelo presidente Rodrigues Alves e o vice-presidente Dr. Afonso Pena (República Café
com Leite). O Paraná nessa época era governado pelo Dr. Vicente Machado da Silva Lima e
pelo vice governador João Cândido Ferreira.
Nessa época, a base da economia do Estado era a industrialização do pinheiro e da erva
mate, apesar das crises sucessivas que enfrentava no seu instável mercado. Em 1902 o mate
representava ainda 31% do orçamento do estado. Outrossim, a indústria de manufaturas dava
seus primeiros passos para o desenvolvimento. As maiores fábricas do estado eram de fós-
foros, sabão, velas massas alimentícias e cerâmica nos arredores da capital.
Mais do que os equipamentos, técnicas e costumes em transformação pelo capitalismo em
ascensão, o esteio deste processo de desenvolvimento, seus principais promotores foram as
pessoas, os trabalhadores brasileiros e os muitos imigrantes, italianos, espanhóis, alemães,
ucranianos, poloneses, que aportaram no Sul do Brasil e em Curitiba nesta época. Esta imi-
gração ocorreu primeiramente em função da demanda e incentivos adotados pelo governo
brasileiro com o fim do tráfico internacional de escravos (1850), sendo ampliado depois pela
expansão da economia.
Junto com a força de trabalho, estes imigrantes trouxeram também seus hábitos e costumes,
sua cultura e arquitetura, e junto com ela os princípios de associativismo e organização cole-
tiva, fosse para a melhoria da qualidade de vida em comum, fosse para a luta e conquista de
direitos sociais e políticos.
Surgimento das primeiras sociedades
Com esse desenvolvimento industrial no Paraná temos o surgimento da classe operária, que
não tarda a começar a se organizar em sociedades beneficentes organizadas civil e juridi-
3° COLÓQUIO IBERO-AMERICANO PAISAGEM CULTURAL, PATRIMÔNIO E PROJETO - DESAFIOS E PERSPECTIVAS Belo Horizonte, de 15 a 17 de setembro
camente, algumas de acordo com as profissões que exercem, pela nacionalidade e outras
ainda formadas pelo mesmo local onde residem.
Os fundadores, sempre provenientes da classe operária, mostravam ali o espirito visionário de
seus organizadores, que davam um salto e propiciavam ali além de benefícios financeiros em
momentos difíceis uma vida social e cultural que integrava e concedia o pertencimento a
população local.
As finalidades das sociedades iam muito além do caráter recreativo, angariavam fundos entre
os associados e em atividades sociais para fins de pecúlio, especialmente auxilio doença e
auxilio funeral aos seus associados.
Ao contar a trajetória da cada uma delas, também é contada a história da formação da cidade
de Curitiba, sua relevância arquitetônica e cultural é indiscutível, elas permeiam a história do
povo e da cidade, cada curitibano guarda uma história de relação com as sociedades, com o
seu aspecto urbano, social, cultural e histórico.
As Sociedades Operárias, que existiram em grande número na capital paranaense, refe-
rem-se à história do povo que, através do Movimento Operário, despontou como ator principal
das lutas e das conquistas obtidas pelos trabalhadores, a partir do final do século XIX. As
sedes ainda existentes constituem-se, portanto, em um patrimônio histórico e arquitetônico
cujo valor precisa ser resgatado e destacado. Entretanto, devido ao formato exclusivo da
legislação municipal, que prevê como mecanismo de conservação histórico apenas Unidades
de Interesse de Preservação (UIP) muitas delas não são tombadas e algumas padecem no
esquecimento e indiferença. Muitas já ruíram, e delas apenas são guardadas as memórias.
Felizmente outras traçaram caminhos mais felizes, e comportam uma vida agitada, especi-
almente dentro da agenda cultural.
Círculo Operário
Situado já fora dos limites urbanos da cidade, o círculo operário agrupava uma grande quan-
tidade de entidades representativas da classe trabalhadora, fosse por nacionalidade de ori-
gem ou por categoria de trabalho. Essa proximidade geográfica e de ideais garantiu a força
necessária para questionar e ousar mudar a tendência segregadora do progresso e inclui-las
como classe social.
3° COLÓQUIO IBERO-AMERICANO PAISAGEM CULTURAL, PATRIMÔNIO E PROJETO - DESAFIOS E PERSPECTIVAS Belo Horizonte, de 15 a 17 de setembro
Hoje, quem passa pela Sociedade Garibaldi ou pela Sociedade Beneficente
Protetora dos Operários certamente ignora completamente que elas foram
alguns dos palcos de uma guerra (nada surda) para sufocar os trabalhadores,
seus anseios e reivindicações. (CAMARGO, 20013)
Desse modo, é pela necessidade de resistir a este modelo de desenvolvimento que a massa
operária ocupou um espaço de debate e formação significativo. Tratavam-se de ações en-
gajadas que se desenvolviam a partir da união e da organização dos operários. Este discurso,
que denunciava o confronto entre as classes e as relações sociais nas primeiras décadas do
século XX, constituía uma forma de fazer política que tinha nas sociedades um importante
espaço para expressão das ideias de militantes anarquistas e socialistas, entidades operárias
e de militantes aliados da classe.
Sociedade Operária e Beneficente Protetora dos Operários
Foi a primeira das sociedades criadas na capital paranaense, já em 1883 tinha o objetivo de
amparar e mobilizar os operários. A edificação imponente reforçou o Alto São Francisco como
endereço das lutas do operariado, sendo ponto de partida de inúmeras passeatas e greves
que marcaram a história da cidade. O movimento organizado teve início entre as paredes
idealizadas e construídas pelo pedreiro Benedito Marques, e dela ganhou a cidade, como na
greve geral de 17, esta greve mostrou não só a capacidade de organização dos trabalhado-
res, mas também que uma greve geral era possível, especialmente em uma época em que as
reivindicações trabalhistas eram tratadas como caso de polícia esta greve paralisou a força de
trabalho na capital exigindo melhores condições.
A partir deste momento a classe operária seguiu lentamente acumulando forças, sem nunca
deixar de prestar o auxílio de pecúlio e doença aos trabalhadores além de manter aulas no-
turnas para a qualificação dos seus associados.
Foi no final do século XX que o velho prédio encontrou um destino mais festivo, quando
passou de seus bailes familiares para os não tão familiares carnavais (Figura 1). Mas foi quase
por acaso, do lado de fora dos seus disputados salões que nasceu uma de suas marcas mais
particulares, quando num desfile improvisado três travestis receberam faixas de rainha, 1ª e
2ª princesas. Ali nasceu o “Gala Gay” baile popular e desfile democrático, que recebia can-
didatos do Brasil inteiro durante o Carnaval e que lhe valeu o apelido de "Ópera Rio".
3° COLÓQUIO IBERO-AMERICANO PAISAGEM CULTURAL, PATRIMÔNIO E PROJETO - DESAFIOS E PERSPECTIVAS Belo Horizonte, de 15 a 17 de setembro
Figura 1 - Foto publicada pelo jornal Estado do Paraná em janeiro de 1986
Após um incêndio em 2000, teve sua estrutura e grande parte do seu acervo destruído e hoje
constitui um dos mais frágeis elementos deste estudo. Situado numa área nobre da cidade,
mantém pouco mais que a sua fachada ainda como relato deste tempo de luta e de glórias de
muitas gerações de curitibanos.
Sociedade Operária e Beneficente Giuseppe Garibaldi
A imigração italiana, de forma ordenada, tem início a partir de 1875 no Paraná, constituindo a
princípio algumas colônia no Litoral paranaense, como a Colônia Alexandra, Maria Luiza e
Nova Itália, mas sofreram dificuldades de aclimatação com a terra e o clima, e foram gradu-
almente subindo ao planalto e para regiões mais ao sul. Em 1882, quando morre na Itália
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Giuseppe Garibaldi1 Curitiba já contava com uma numerosa comunidade italiana, que aspirou
construir um monumento à Garibaldi, o herói dos dois mundos. A iniciativa foi proibida por
ordem do império, cuja família era alvo da luta de Garibaldi na Europa.
Surge então a ideia de construir uma escola ou sociedade que perpetuasse o nome do grande
líder e ao mesmo tempo atendesse às necessidades dos colonos, influindo na permanência
dos colonos na capital, em lugares que já vinham ocupando no Pilarzinho, em Santa Felici-
dade, na Água Verde e outros. A Sociedade teve grande apoio de figuras influentes da so-
ciedade curitibana, pois todos entendiam a necessidade da permanência dos imigrantes como
fato primordial à política desenvolvimentista.
O terreno para a construção foi doado pela Câmara Municipal, fora do perímetro urbano e a
sede já foi planejada em estilo grandioso, para se tornar uma construção marcante da colo-
nização italiana no Estado do Paraná. Sua pedra fundamental foi lançada em julho de 1887 e
a construção contou com a participação de todos os associados, tanto na contribuição fi-
nanceira como em dias de trabalho. A fachada monumental, projeto do arquiteto João de Mio
só foi concluída no ano de 1932.
1 Giuseppe Garibaldi (Nice, 4 de julho de 1807 - Caprera, 2 de junho de 1882) foi um ídolo para os italianos e
também para os brasileiros pela sua grande influência na Revolução Farroupilha, de 1835, onde conheceu Ana
Ribeiro da Silva, com quem depois se casou, ficando conhecida como Anita Garibaldi.
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Figura 2 - Sociedade Giuseppe Garibaldi após restauro realizado na década de 90.
A sociedade sempre participou ativamente dos acontecimentos cívico-sociais de nossa terra.
Além do ideal republicano, expresso pela escolha do seu patrono, ela foi filiada à federação
Abolicionista do Paraná e comemorou o 13 de maio com uma grande festa. Colaborou com
campanhas durante a 1ª Grande Guerra, fazendo festas em benefício da Cruz Vermelha. Mas
foi sem dúvida, em 1906, ao sediar o I Congresso Operário Paranaense, gerador da Fede-
ração Operária Paranaense, o momento em que a Garibaldi mais contribuiu à classe operária
de maneira mais ampla e expressiva.
Em 1942. Durante a 2ª Guerra, devido ao rompimento entre o Brasil e os chamados Países do
Eixo teve sua sede tomada e depredada depois de uma grande manifestação popular. Muitos
de seus arquivos foram queimados e seus vidros e móveis destruídos. Após essa desordem, a
polícia tomou conta da sede, e assim como as demais sedes de sociedades de origem itali-
anas e alemãs foram ocupadas por novas entidades. À Garibaldi coube acolher a Liga de
Defesa Nacional, o Centro de Letras do Paraná, o Centro Feminino de Cultura e a Academia
Paranaense de Letras, assumindo o nome de Casa de Olavo Bilac. Mas estas também per-
deram o direito de utilizar a edificação a partir de 43 quando ela foi declarada de Utilidade
Pública, pois o Governo do Estado pretendia instalar ali o Tribunal de Justiça do Estado.
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Apenas em 62, depois de 20 anos de trabalho junto às autoridades é que o direito à sede foi
devolvida para a Sociedade Garibaldi, depois de construído o Palácio da Justiça no Centro
Cívico. Começou então o árduo trabalho de restauração e readaptação das finalidades da
Sociedade, voltando ainda que tardiamente ao intuito de prestar auxílio material, cultural, além
de atividades recreativas, esportivas e festivas aos seus associados.
Seu tombamento se deu em 1988, pelo Patrimônio Histórico e Artístico do Paraná, mas isso
não lhe garantiu vida segura, durante os primeiros anos da década de 90 tiveram início várias
campanhas de auxílio ao Palácio Garibaldi, como agora é conhecido, apelando especialmente
aos muitos descendentes de imigrantes italianos. Em 93, quando ingressou no rol de Unidade
de preservação obteve o direito de vender seu potencial construtivo, garantindo assim o seu
restauro (Figura 2), até hoje se mantém com recursos próprios, sendo um lugar nobre e re-
quisitado para realização de eventos.
Sociedade Operária e Beneficente 13 de Maio
A “Sociedade 13 de Maio”, como era denominada na época de sua fundação, teve origem
simultânea ao ato de assinatura da Lei Áurea, sancionada no dia 13 de maio de 1888, com a
iniciativa dos cidadãos, que tinham em mente edificar um local, onde poderiam reunir-se e
traçar planos sobre as novas possibilidades e desafios relativas à nova maneira de agir, pois a
partir de então seriam considerados homens livres e isso demandava uma atitude coletiva,
unificada e forte. A 13 de Maio nasceu com a marca da liberdade e da busca por igualdade, da
luta dos que acreditavam que agregar os ex-escravos era a única maneira de ajudá-los.
A sessão de formação, apesar do nome, se deu dez dias antes da data oficial da abolição, já
tida como certa e próxima, onde foi nomeada uma diretoria provisória. Começou operar ainda
com uma sede rusticamente construída, mas já no local em que se encontra atualmente, na
Rua Clotário Portugal, no bairro São Francisco.
Apesar do valor histórico e de ser considerada Unidade de Interesse de Preservação, a en-
tidade passa por uma série de dificuldades de manutenção do espaço, além de um processo
pedindo de anistia de dívida pública, referente ao acumulado de impostos com os quais nunca
pode arcar.
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Difusão das Sociedades Operárias
Não tardou e a necessidade de colaboração mútua reverberou por cada agrupamento de
trabalhadores, fossem esses da indústria ou rurais. As condições minimamente alcançadas
pelas sociedades contribuíam para uma estabilidade proporcionada pela associação entre
famílias.
Muitos foram os grupos que fundaram suas próprias Sociedades Beneficentes, que congre-
gavam os moradores em ações sociais e festivas. Dentre as que mais se destacaram, cabe
ressaltar:
Sociedade Operária Beneficente e Recreativa “Vila Morgenau”
Fundada em 1918 por imigrantes italianos, o nome “Morgenau” é uma homenagem a uma
família francesa que residia no bairro, inicialmente funcionou em uma casa de madeira e
apenas em 1951 a atual sede foi construída.
Procurando beneficiar os seus associados com um amparo que não era ideal para a época,
mas que buscava amenizar os problemas do operariado a sociedade foi fundamental para o
desenvolvimento do bairro Cristo Rei que na sua fundação ainda contava com um pequeno
número de residências.
Com o clube, nasceu também o primeiro cinema de Curitiba, o “Cine Morgenau”, a mais antiga
casa de espetáculo de Curitiba, que mais tarde, apesar de manter o nome original, passou a
funcionar em lugar mais central.
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Figura 3 - Sede histórica da Sociedade Morgenau.
Relevante também no cenário político da capital, foi nos salões do Clube que o Senador
Souza Naves recebeu suas últimas homenagens, e onde o presidente Getúlio Vargas
acompanhando Manoel Ribas, o interventor do Paraná ainda hoje é palco de convenções
partidárias e reuniões de repercussão estadual. Hoje mantém, além da sede histórica (Figura
3), com uma ampla agenda de eventos, atividades e instalações para seu quadro associados.
Sociedade Operária e Beneficente Mercês
Nasceu da uma reunião de cerca de 30 famílias do “quarteirão das Mercês” no ano de 1919,
funcionando primeiramente em uma casa alugada, e com terreno doado por um de seus
membros ergue sua primeira edificação na Avenida Cruzeiro, hoje Avenida Manoel Ribas.
Ponto de referência para a sociedade à época, realizava mais de dez bailes por ano, além de
muitas festas ao ar livre. Apesar de continuar funcionando, a sociedade vendeu a sua sede
histórica por não poder arcar com a sua manutenção, e depois de muitos anos fechada em
degradação, devido às dificuldades das negociações para a restauração, e segundo Hilário
Linero, o presidente da Sociedade em 1999, “Havia um projeto acertado com a prefeitura para
a desapropriação e transformação do local em centro cultural do bairro, mas não foi executado
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nessa gestão”. Devido ás dificuldades de negociar com o poder público, a sociedade foi
vendida para o proprietário dos terrenos do entorno, que em 2000 o novo proprietário investiu
em um amplo trabalho de restauro, e hoje a sede abriga uma instalação bancária.
Sociedade Operária e Beneficente Abranches
Fundada em 1910 por imigrantes de origem polonesa residentes no bairro Abranches que
pretendiam além dos fundos de pecúlio comuns a todas as sociedades estabelecer também
um vínculo entre os imigrantes e suas origens, tendo a princípio um nome na língua pátria
“Towarzystwo Polskie Dobrockynne Robotnecze Krola Wladyslava Jagielly” que em tradução
para o português significa Sociedade Polonesa Operária Beneficente Rei Ladislau Jagielo. Já
na primeira etapa da sociedade, os bailes faziam grande sucesso, era onde os colonos po-
diam dançar suas valsas e mazurcas.
A sede atual foi construída e m 1935, e já foi inaugurada com a completa nacionalização da
sociedade, recebendo o nome de Sociedade Operária Beneficente Abranches. Hoje a Soci-
edade abriga uma casa de eventos, além de um restaurante que atende durante toda a se-
mana, o que lhe garante uma manutenção adequada e uma participação cultural ainda re-
levante aos moradores da cidade.
Sociedade Beneficente dos Operários Batel
Hoje tido como um dos bairros mais nobre de Curitiba, o Batel teve em sua origem uma
grande concentração industrial, trazendo consigo um proeminente agrupamento de operários
que não tardou se organizar em uma sociedade, fundada em 1905, funcionou em uma pri-
meira edificação feita em madeira até fevereiro de 1932, quando se deu a inauguração da
sede que se tornou um dos mais populares clubes da cidade.
Os seus saraus e matinês de domingo tornaram-se muito reconhecidas e abrigaram muita
gente famosa e personalidades do mundo político estadual e nacional. O “Batelzinho” como
era carinhosamente chamado, abrigou a partir da segunda metade da década de sessenta um
dos mais populares bailes de carnaval da cidade. Mas foi só em 69 que surgiu a ideia que
marcaria definitivamente a sua história, o concurso das “Bem Boladas”, uma ousadia de seus
diretores à época o concurso levou à uma passarela improvisada oito moças escolhidas na
noite curitibana, o sucesso foi imediato e tamanho que o clube passou a contar por muitos
3° COLÓQUIO IBERO-AMERICANO PAISAGEM CULTURAL, PATRIMÔNIO E PROJETO - DESAFIOS E PERSPECTIVAS Belo Horizonte, de 15 a 17 de setembro
anos com uma grande massa de foliões muito acima dos padrões da “capital que não pula
carnaval”.
Figura 4 - Foto de divulgação da empresa proprietária e responsável pelo restauro da edificação.
Depois de muitos anos de sucesso a Operários do Batel fechou suas portas e passou por uma
fase de abandono até sem comprada por uma empresa de coworking2 que investiu em uma
grande obra de restauro (Figura 4), tornando o ambiente que antes fora idealizado pelos tra-
balhadores do século passado em um ambiente inovador e característico dos trabalhadores
do presente e futuro.
2 Coworking é um termo inglês usado para definir um modelo de trabalho que consiste em um lugar no qual vários
profissionais, de diversas áreas, alugam espaços para desenvolverem os seus trabalhos, reunindo pessoas que
trabalham não necessariamente para a mesma empresa ou na mesma área de atuação.
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Conclusão
Na cidade se consolidava uma sociedade de base operária que não possuía assistência
social, daí nasce a necessidade de organização dessa classe para fazer frente aos múltiplos
problemas que advém da falta de amparo. As Sociedades Operárias Beneficentes surgiram
com o principal objetivo de auxiliar os operários em todos os setores, especialmente em caso
de doença ou falecimento, para isso se organizavam caixas baseados em mensalidades e em
eventos sociais.
Muitas delas sucumbiram ao tempo e ao descaso; outras tantas lutam para se manter na
história, como a Sociedade Beneficente Protetora dos Operários (1883) o local onde o mo-
vimento operário organizado teve início, no chamado “Círculo Operário”. Neste Circulo es-
tavam, além da Protetora dos Operários a Associação Giuseppe Garibaldi, que congregava os
imigrantes italianos e sediou, em 1906, o I Congresso Estadual que gerou a Federação
Operária no Paraná. Tombada em 1988 pelo Patrimônio Histórico e Artístico do Paraná, a
sede desta Associação é hoje dos mais bem conservados objetos deste estudo.
A preservação desta memória, bem como do patrimônio arquitetônico, encontra-se conti-
nuamente ameaçada pela modernização que se expande pelo país, erodindo pouco a pouco a
identidade histórica de toda uma população em benefício dos interesses efêmeros do mer-
cado imobiliário. A relativização da memória no senso comum segundo o qual o Patrimônio é
composto apenas por residências de personalidades famosas ou edifícios de relevância ar-
quitetônica é questionável no aspecto histórico, e devastadora em relação ao patrimônio de
origem popular, levando a uma elitização da história. Compreender que um bem transcende o
seu valor histórico comprovado ou reconhecido oficialmente é entender que este bem é parte
de uma complexa cadeia de domínios e valores que envolvem os processos de apropriação e
de pertencimento da população como agente principal da história.
As Sociedades seguem vivas no imaginário da população Curitibana, pois fizeram parte da
história de muitas famílias que vivenciaram estes espaços ao longo das décadas. Elas car-
regam partes da constituição de Curitiba como capital e da construção do povo curitibano, e é
através da biografia do seu povo que a história precisa ser contada.
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