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A cultura religiosa e a escrita identitária árabe nas lápides do cemitério municipal de
Marechal Cândido Rondon, Paraná
Clarice Nadir von Borstel (Unioeste)•
Resumo: O presente estudo tem como objetivo apresentar a cultura religiosa e a língua
identitária de um pequeno grupo que veio dos países árabes (da Palestina), na década de
sessenta, para Marechal Cândido Rondon, Paraná, observando a escrita árabe e a simbologia
religiosa utilizada nas lápides do Cemitério Municipal. Para tanto, pretende-se analisar e
interpretar a linguagem utilizada de forma linguística discursiva, tomando o discurso em um
quadro mais amplo, cultural e eventualmente intercultural, o que permite situar a escrita árabe
e os símbolos nas lápides sob o enfoque linguístico, sociocultural e histórico de forma
identitária. Apresentam-se, assim, os fatores de imigração deste grupo para essa comunidade,
a simbologia religiosa no uso de enunciados semióticos para mostrar esses dados utilizados na
e pela linguagem discursiva de memória no tempo e no espaço, desse pequeno grupo de cultura
étnica árabe. O intuito é mostrar o uso situacional e identitário desses recursos linguísticos e
semióticos, em situações discursivas, utilizadas pelos familiares quando do uso da escrita árabe
e de símbolos religiosos nas lápides do cemitério de seus entes familiares.
Palavras-chave: Cultura étnico-religiosa; memória sócio-histórica; escrita árabe em lápides.
Resumen: El presente estudio tiene como objetivo presentar la cultura religiosa y la lengua
identitaria de un pequeño grupo que vino de los países árabes (de Palestina), en la década de
los sesenta, a Marechal Cándido Rondon, Paraná, observando la escritura árabe y la simbología
religiosa utilizada en las lápidas del Cementerio Municipal. Para ello, se pretende analizar,
describir e interpretar el lenguaje utilizado de forma lingüística discursiva, tomando el discurso
en un marco más amplio, cultural y eventualmente intercultural, lo que permite situar la
escritura árabe y los símbolos en las lápidas bajo el enfoque lingüístico, sociocultural e
histórico de forma identitaria. Se presentan, así, los factores de inmigración de este grupo para
esta comunidad, la simbología religiosa en el uso de enunciados semióticos para mostrar esos
datos utilizados en y por el lenguaje discursivo de memoria en el tiempo y en el espacio, de ese
pequeño grupo de cultura étnica árabe. La intención es mostrar el uso situacional e identitario
de esos recursos lingüísticos y semióticos, en situaciones discursivas, utilizadas por los
familiares cuando el uso de la escritura árabe y de símbolos religiosos en las lápidas del
cementerio de sus entes familiares.
Palabras-clave: Cultura étnico-religiosa; memoria socio-histórica; escritura árabe en lápidas.
• Professora Sênior da Pós-Graduação (Programa de Mestrado e Doutorado) em Letras da Universidade Estadual
do Oeste do Paraná – Unioeste. E-mail clavonborstel@gmail.com .
Introdução
Nesse texto, procura-se apresentar estudos sobre situações da simbologia religiosa e da
escrita árabe em lápides, nas sepulturas de imigrantes de países árabes no Cemitério Municipal
de Marechal Cândido Rondon, Paraná.
Em estudos de comunidades bilíngues sobre as semelhanças e as diferenças de traços
linguísticos da identidade histórica, social e cultural do falante. Podendo esses fatores
determinar a existência de normas e aspirações comuns que tem a origem da cultura étnica na
interação comunicativa/semiótica e na solidariedade do grupo. Em suma, “a história, as forças
econômicas e os próprios processos interativos combinam-se para criar ou eliminar as
distinções sociais” (GUMPERZ, 1982, p. 29).
Dessa forma, quando o pesquisador descreve, analisa e interpreta traços de línguas em
e de contato orais e/ou escritos, como Estudo de Caso, sobre a escrita em lápides nas sepulturas
do Cemitério Municipal, é necessário caracterizar o contexto para poder entender as questões
da língua de herança étnica, numa perspectiva histórico-religiosa, social, cultural de uma
identidade funcional de origem na comunidade. Assim como, apresentar uma descrição sobre
os aspectos geográficos, econômicos, educacionais que podem influenciar a utilização da
língua de herança de cultura étnica/religiosa, como forma de hibridização cultural e identitária
nesta região do país, nas lápides do Cemitério Municipal.
Assim, retomam-se considerações resultantes de pesquisas sobre contato linguístico e
a utilização funcional de línguas e da identidade de herança sociocultural étnica, nesta
comunidade, desde 1960.
A metodologia da pesquisa de dados investigados nesse Estudo de Caso, abordam- se a
partir de estudos da Iconográfica: fotografia (KOSSOY, 2001), documentos oficiais e o
enfoque qualitativo-interpretativista, a partir de um olhar da etnografia social (Hymes, 1972,
Bortoni-Ricardo, 2008)) de entrevistas com agente funerário, amigos e familiares dos mortos,
por tratar das múltiplas relações entre o documento fotográfico e as informações que nela pode
estar inscritas e circunscritas através de símbolos, da imagem e da escrita nas lápides e a
contribuição de fatores no tempo histórico e nos espaços geográficos.
Para Kossoy (2001) toda fotografia é um resíduo do passado, uma fonte histórica para
múltiplas significações. Apesar das informações contidas na Iconografia, não substitui a
realidade de mesma forma como se deu no passado. Apenas traz informações visuais de um
fragmento do real, ou seja, a fotografia selecionada e organizada estética e ideologicamente.
Para tanto, ao observar a escrita em imagem de fotografia, deve-se estar consciente de que a
compreensão do real é forçosamente influenciada por uma ou por várias interpretações
anteriores sobre o tempo e o espaço histórico de documentos escritos.
O estudo metodológico de acordo com Kossoy (2001), de uma investigação
Iconográfica: fotografia quando a forma descritiva fornecerá elementos linguísticos seguros e
objetivos para poder interpretar os dados inscritos e/ou circunscritos, como no caso a
investigação de dados gerados em lápides de cemitério, confrontando esses dados com
documentos históricos no tempo e no espaço dessa forma de escrita discursiva e de seus valores
socioculturais através de entrevistas.
Para tanto nessa pesquisa, apresenta-se a reflexo e a discussão sobre a língua dos países
árabes; os fatores religiosos, culturais e identitários desse pequeno grupo étnico de países
árabes de imigrantes e descendente palestinos, vindos na década de sessenta, para Marechal
Cândido Rondon, Paraná; a análise, a descrição e a interpretação de símbolos religiosos, da
língua árabe nas lápides das sepulturas, conjugando os dados no espaço geográfico e no tempo
histórico identitário, desse Estudo de Caso, de dois imigrantes palestinos que vieram viver e
formaram novas famílias com casamentos interétnicos, aqui na comunidade, e às vezes, mais
tarde trouxeram seus familiares de origem étnica da região da Paletina, falecendo e sendo
enterrados no Cemitério Municipal, seguindo os trâmites de sepultamento sociocultural
brasileiro e não dos países árabes.
1. A língua dos países árabes
Na discussão desse estudo sobre língua/linguagem de uma forma discursiva, quando se
utilizam as variáveis em comunidades de falas, ou seja, a língua padrão, a língua de dialeto
regional de suas variantes linguísticas e diglóssicas.
Para poder discutir o contado das línguas e dos dialetos árabes, referenciou-se os estudo
sobre essa situação de acordo com os livros As políticas lingüísticas e a Sociolinguística: uma
introdução crítica de Louis-Jean Calvet (nascido em 1942, em Bizert, Tunísia, é atualmente
professor na Universidade de Provence).
De acordo com os estudos de Cavet (2002, 2007), ao tratar sobre línguas em contato do
árabe e do alcorão, reitera-se também a abordagem precursora de Ferguson (1974), quando
trata sobre o bilinguismo, abordando a diglossia, como no caso citado pelo autor, quando em
Bagdá os cristãos árabes falavam a língua do cristão-árabe (o alcorão) nas mesquitas e nas
interlocuções entre familiares e amigos, porém utilizavam a língua muçulmana em dado país
de sua origem, de língua árabe como no caso da língua turca, a língua dos sírios, a língua dos
libaneses, a língua dos palestinos, entre outros países árabes, em interlocuções com um grupo
misto em seus países de origem étnica linguística, semiótica e sociocultural.
Assim, de acordo com os estudos de Kloss (1986), há uma preocupação com a
padronização de uma dada língua isso de forma geral, em suma, um tipo particular de
padronização quando duas variantes coexistem em uma dada comunidade de fala, cada uma
dela desempenhando um papel definido.
A diglossia sobre a língua árabe teve origem em uma época tão distante quanto o
conhecimento que se tem sobre o árabe clássico, língua que tem origem no Alcorão, texto
religioso, sacramentado como fator identitário pelos países árabes, como língua de variante
superposta relativamente estável, as línguas e os dialetos de cada região dos países árabes.
Posteriormente, aos estudos de Charles Ferguson, Fishman, em 1967, ampliou esse estudo
sobre diglossia, considerando que essa se evidencia cada vez que há um bilinguismo funcional
de uso entre duas línguas ou entre duas variantes de uma mesma língua, desta forma sempre
houve nos países árabes a diglossia entre a língua do árabe clássico e as línguas do árabe
dialetal.
De acordo com Ferguson (1974), a situação linguística, no caso da educação formal,
como no caso as conferências formais são proferidas no árabe clássico (variante padrão),
porém, as atividades exemplificadas, explanações e seminários nas universidades, em grande
parte são conduzidos na língua de variante dialetal árabe. Mesmo que em muitas escolas
secundárias seja proibido por lei utilizar a língua do dialeto árabe, para tanto, nesta era moderna
já houve mudanças, pois os docentes, frequentemente, apresentam a explicação na língua de
variante dialetal e os textos ou os livros na língua de variante padrão no país.
Portanto, é bastante difícil analisar a escrita da língua árabe, visto que houve um forte
processo das políticas linguísticas de arabização nos países de línguas árabes, com fronteira
geográfica européia. Mas, mesmo assim, nesse Estudo de Caso pretende-se analisar, descrever
e interpretar a escrita utilizada em duas lápides, visto que, são de dois árabes nascidos na
Palestina e falecidos nesta comunidade, conforme registro encontrado nas lápides fotografadas,
no Cemitério Municipal de Marechal Cândido Rondon, Paraná.
No momento atual, de acordo com o professor Abd Al-Rahman Mar’i, da Faculdade
Beit Berl, do norte de Tel Aviv, aborda que o árabe palestino vem as ser um subgrupo de
dialetos levantino falado pelos palestinos e pelos árabes israelenses. Ou seja, são significativas
as diferenças entre o árabe palestino e as demais formas de árabe do Levante (origem do árabe
clássico, como o árabe sírio e o árabe libanês) Essas diferenças de traços linguísticos são,
porém, variáveis, considerando as diferenças linguísticas que há entre os dialetos do próprio
árabe palestino que utilizam traços linguísticos do árabe egípcio e do hebraico idioma dos
judeus israelenses. Em seu livro Walla Beseder, o professor analisa o fenômeno linguístido de
alternância de código de duas línguas, sob a abordagem sociocultural, como no caso a palavra
em árabe Walla significando “de verdade”e a palavra em hebraico Beseder que significa “tudo
bem”.
Para tanto, de acordo com Abd Al-Rahman Mar’i, são três os grupos dialetais
palestinos. O Palestino Urbano, o Palestino Rural e o Palestino Beduíno. O dialeto palestino
urbano apresenta traços linguísticos mais próximos da variável do levantino do norte, ou seja,
do árabe sírio e do árabe libanês. O dialeto palestino beduíno apresenta traços linguísticos do
árabe (o falar próprio da Arábia Saudita). Os Beduínos, propriamente, da Península Arábica
têm sua etnia (cultura, idioma e costumes) do árabe de um longo processo de arabização
cultural e linguística, durante muitos séculos. Porém, o dialeto do Palestino Rural apresenta
muitas características e traços linguísticos do hebraico clássico.
2. Os fatores religiosos, culturais e identitários de um pequeno grupo étnico de países
árabes
A partir da pesquisa Iconografia-fotografia, de documentos oficiais históricos e de
entrevistas com agente funerário, amigos e familiares dos mortos, sobre o Cemitério Municipal,
percebeu-se através da escrita nas lápides o valor identitário e cultural de uma tradição da
cultura étnica dos imigrantes e descendentes palestinos na comunidade.
Ao discutir sobre a vida social e a inserção da cultura enquanto fatos históricos
apresentam-se as perspectivas de Certeau citadas por Giard na abertura do livro A cultura no
plural, citando os estudos sobre cultura, que “para que haja verdadeiramente cultura, não basta
ser autor de práticas sociais; é preciso que essas práticas sociais tenham significado para aquele
que as realiza” (CERTEAU, 2001, p. 9). Ainda, para o autor “um comportamento cultural
inicia-se e exprime-se com o papel atribuído à língua escrita e à oral ao conteúdo de ensino”
(CERTEAU, 2001, p. 126-127).
É nesse sentido que se pretende descrever os fatores sócio-histórico-religioso, quanto à
diversidade linguística, cultural (símbolos) e a escrita identitária que estão registradas nas
lápides das sepulturas dos imigrantes palestinos no Cemitério Municipal, quando a maioria
desses e seus filhos não tinham uma escolarização no português, quando vieram para Marechal
Cândido Rondon.
De acordo com estudos de Barth (1998), as tradições para que sejam mantidas, recriadas
ou inventadas pelo grupo precisam reforçar os laços que congregam e agregam as diferenças
internas e externas linguísticas e culturalmente, identificando-se e criando representações do
próprio indivíduo e de seus pares, quanto aos cemitérios, muitas vezes, constituem-se em
espaços de interação e conflito, podendo tornar-se geradores e campos prolíferos de
identificação de cultura étnica.
Isso quer dizer que segundo Hall (2006), na construção da identidade de um indivíduo
ou de um grupo emerge nos fatos de narrativização da memória do indivíduo, aqui nesse caso
nas inscrições no árabe clássico, língua que tem origem no Alcorão nas lápides das sepulturas
e, que a natureza muitas vezes ficcional desse processo não afeta a eficácia discursiva material
ou política das mesmas. As identidades constroem-se na e pela linguagem, em lugares
históricos e institucionais específicos, em formação das práticas sociais e discursivas
específicas, por estratégias enunciativas precisas, como pode se observar sobre a língua do
árabe clássico (o alcorão) escrita nas lápides das sepulturas.
No Cemitério Municipal, o universo material e simbólico trazem traços fundamentais
para poder investigar a origem de ascendência e das identidades étnicas ao relacionar se com o
intangível e o inexorável: a morte. Os materiais epigráficos e iconográficos são artefatos que
estão presentes na sepultura, revelando atitudes que os vivos constroem para poder dar
sequência às suas vidas, pautando-as pela finitude. Muitas dessas pessoas pensam que é lá
naquele lugar (o cemitério) que estão os seus mortos, mesmo que são poucos visitados e
lembrados, mas as informações contidas no túmulo expressam a forma de vida que tiveram
com relação à religiosidade, suas formações identitárias e visões de mundo.
Determinadas condições históricas e de memória contribuíram para a concretização de
certas expectativas já existentes por parte dos imigrantes e seus descendentes na comunidade
de Marechal Cândido Rondon, como tudo começou. Por volta de 1940, a empresa inglesa com
sede em Buenos Aires, Argentina a Compañia de Maderas del Alto Paraná, proprietária da
Fazenda Britânia, a maior concessionária de terras na Região Oeste Paranaense, entra em
decadência. Um grupo de comerciantes de Porto Alegre comprou esta área para fins comerciais,
fundando a Companhia Industrial Madeireira Colonizadora Rio Paraná S.A. – MARIPÁ, que
executou a colonização do município. As primeiras famílias vieram do Rio Grande do Sul para
Marechal Cândido Rondon em 1950. O Distrito foi criado oficialmente em 06 de julho de 1953,
pela Lei Municipal n° 17/53, o município em 25 de julho de 1960, pela Lei Estadual n°
4.245/60.
De acordo com os dados do IX Recenseamento Geral de 1980 do Paraná, dos 56.210
habitantes de Marechal Cândido Rondon, 55.853 eram brasileiros natos, 138 brasileiros
naturalizados e 219 estrangeiros. Entre os estrangeiros havia 80 alemães, 47 paraguaios, 22
russos, 07 poloneses, 06 argentinos, 06 uruguaios, 05 espanhóis, 04 japoneses, 04 libaneses,
03 romenos, 17 de outras nacionalidades e 18 sem declaração.
Como pode se verificar de acordo com os dados do IX Recenseamento Geral, de 1980,
há o registro de 04 libaneses que vieram dos países árabes, para este município paranaense.
Na entrada do Cemitério as duas Alas até o Cruzeiro e a Capela são arborizadas por
ciprestes. O cipreste vem a ser um símbolo recorrente à tristeza, à melancolia e da morte ou
vida eterna. As “orígenes faz do cipreste um símbolo das virtudes espirituais, porque o cipreste
tem muito bom odor, o da santidade” (CHEVALIER E CHEERBRANT, 2001, p. 250, grifos
dos autores).
Nesse período, nas duas Alas quanto às formas, os túmulos se classificam em: a) lápide-
epitáfio é ocupada pela inscrição em forma de despedida ou oração, essas inscrições são
encontradas nas lápides de imigrantes dos países árabes, situados no lado esquerdo da entrada
do cemitério – o túmulo vertical tem origem nos túmulos paleocristãos, essa forma de túmulo
com jazigo, ocorrendo em casos que combinam a lápide vertical com a horizontal. Um dos
túmulos em estelas (colunas de granito o símbolo religioso árabe na lápide do túmulo) e sobre
o solo também em granito em forma vertical, e o outro como um pequeno túmulo-casa com o
símbolo religoso árabe - no mesmo local do túmulo, normalmente, decorado com flores, a
fotografia do morto e a escrita árabe, os mortos são sepultados em uma cave ou carneiros
subterrâneos.
As lápides nas sepulturas podem representar uma forma de memória, podendo passar à
categoria de documentos, quando despertam interesses pela representatividade das pessoas
sepultadas, por episódios e períodos nos quais estão relacionados no tempo. As inscrições nas
lápides indicam o nome, a data de nascimento e da morte. As inscrições costumam muitas vezes
virem acompanhadas de uma fotografia policromada do morto. Nas duas Alas do Cemitério
Municipal, além da ficha de identidade, há vários epitáfios cujo texto é a manifestação do
sentimento de despedida dos familiares na língua portuguesa, alemã (cf. VON BORSTEL,
2011, 2015) e, no presente estudo, sobre a língua e cultura árabe. Assim, em termos de
religiosidade católica, luterana, protestante, islâmica/muçulmana e outras no Cemitério
Municipal de Marechal Cândido Rondon, a comunidade passou a partir dos anos de 1970 a
vivenciá-las de uma maneira peculiar, não constituindo uma comunidade religiosa luterana ou
protestante, mas sim vivenciando a sua religiosidade de uma forma simples a construção das
sepulturas através de vestígios que podem ser observados da mesma forma na arquitetura
cultural e material nas duas Alas do Cemitério Municipal até esse período do final da década
de setenta e, podendo, ser localizadas em outras localidades de ascendências étnicas no país.
Ou, ainda, há uma variação cultural material sepulcral nas duas Alas do Cemitério
encontrados em outros cemitérios do Paraná, Santa Catarina, do Rio Grande do Sul e de outras
regiões e países, agregando outros valores, visões de mundo e vivências, em uma série de
interconexões que permitem apontar a existência da religiosidade, permitindo dimensionar essa
presença na localidade, uma vez que ela, com o passar dos anos, fortaleceram as relações
através de casamentos interétnicos, inter-religiosos, culturais e econômicos.
Neste mesmo período, essa dimensão de religiosidade no Cemitério Municipal, muitas
vezes, ajudou a delimitar uma diferenciação entre a religiosidade e os (i)migrantes que vieram
de regiões da Europa (alemães, italianos e poloneses), os sulinos (principalmente de base rural)
e os outros (i)migrantes que vieram de outros países (Países Árabes e Paraguaios), como
também de outras regiões do Brasil.
3. Os símbolos religiosos e a língua árabe nas lápides das sepulturas
Nos estudos, aqui referenciados sobre o bilinguismo relativo e/ou funcional em
situações da socais, culturais e identitárias de imigrantes de países árabes e descendentes que,
em suas interações reais utilizam na comunicação verbal (oral e escrita) uma forma discursiva
e de variação linguística: a língua de herança materna vernácula étnico-cultural-religiosa.
As questões relativas à alternância linguísticas de seus antepassados sempre se
manifestaram quando se estabelece um fator linguístico de herança em situações de natureza
histórica, política e sociocultural, esses elementos peculiares a uma língua serão transferidos
para o local que imigram ou migram, onde estes itens lexicais não existem. Aos fenômenos de
interferência ou transferências linguísticas, nos estudos de von Borstel (2011) foi denominado
de alternâncias linguísticas, podendo essas transferências de dois códigos ocorrerem a partir de
itens lexicais fonológicos, morfológicos, sintáticos, semânticos de uma forma sociolinguística,
discursiva, resultantes de traços linguístico-culturais de línguas e da semiótica de origem ético-
religiosos em relação ao indivíduo em outra sociedade para marcar a sua identidade.
A seguir, descrevem-se e analisa a língua escrita em árabe em duas lápides dos túmulos
da Ala Esquerda do Cemitério, de religião Islâmica de países árabes nesse Estudo de Caso, de
imigrantes árabes palestinos.
Figura 01 – Sepultura na Ala Esquerda de religião Católica e outras do Cemitério Municipal.
Fonte: Clarice Nadir von Borstel, mês agosto/2011.
Como pode ser observado, a seguir, nessa Figura 01, há uma sepultura de Mahmud
Ismail Shehadeh, morador nascido em 1931, que veio da Palestina no início da década de
sessenta. Instalou-se no município como comerciante, com vários imóveis construídos no
centro da cidade e uma Indústria Madeireira no Distrito de Novo Horizonte. Foi assassinado
em 1970, em sua casa, no centro de Marechal Cândido Rondon, quando foi abrir a porta da
frente. Os seus familiares registraram na lápide o símbolo religioso do Islamismo: a Lua – (na
religiosidade do Islamismo o Sol caracteriza a natureza feminina e a Lua a natureza masculina).
A Lua simboliza a noite apaziguante e repousante. O símbolo na lápide tem o significado da
fase oculta: a Lua Minguante que simboliza a passagem da vida para a morte. A inscrição
epigrafada é uma oração de despedida da vida para a morte, no árabe clássico do alcorão.
No início da epígrafe, na Figura 01, está registrado na língua do alcorão Fatah
significando o início da leitura do Alcorão. Citando que Os anjos recebem os mortos os quais
fizeram o bem na terra. Eles conversam com a alma ou o espírito das pessoas que morrem ou
morrerão. Você está de volta para o teu criador (Deus) satisfeito e feliz. Você volta para as
almas, que estão te esperando, para que possa entrar no paraíso.
Na figura 02, pode se verificar a sepultura de Yaser Kasem, nascido em 1931, veio no
início da década de setenta para Marechal Cândido Rondon, de Jerusalém, Palestina. Sofreu
um acidente de carro na região e faleceu com 44 anos de idade, em 1975.
Figura 02 – Sepultura na Ala Esquerda de religião Católica e outras do Cemitério Municipal.
Fonte: Clarice Nadir von Borstel, mês agosto/2011.
Nessa figura 02, um pequeno túmulo-casa com o símbolo religioso árabe - no mesmo
local do túmulo, o símbolo na lápide tem o mesmo significado, nesse túmulo da Figura 02,
também há o símbolo da fase oculta: a Lua Minguante que simboliza a passagem da vida para
a morte. A cor verde: é uma das cores da bandeira da Palestina, que significa A Dinastia
Fatimid (909-1171), África do Norte - A Dinasta Fatimid foi fundada em Marrocos, por
Abdullah Al-Mahdi que governou todo o Norte da África. Tinham o verde como a cor para
simbolizar a lealdade a Ali, ou seja, quando um primo do Profeta foi coberto por um lençol
verde para dificultar uma tentativa de assassinato ao Profeta Ali.
Na epígrafe da Figura 02, há a mesma oração de despedida no árabe clássico (o alcorão)
que está registrado na lápide: Fatah significando o início da leitura do Alcorão. Citando que
Os anjos recebem os mortos os quais fizeram o bem na terra. Eles conversam com a alma ou
o espírito das pessoas que morrem ou morrerão. Você está de volta para o teu criador (Deus)
satisfeito e feliz. Você volta para as almas, que estão te esperando, para que possa entrar no
paraíso.
Segundo, os dois entrevistados e tradutores das duas epígrafes são imigrantes palestinos
falantes do árabe clássico e da língua dos dialetos palestinos. De acordo com os entrevistados
e tradutores não há nenhum traço linguístico do falar palestino na inscrição das lápides.
Portanto, as inscrições epigrafadas nas duas lápides do cemitério vêm a ser a mesma
oração de despedida no árabe clássico, o alcorão - a língua sagrada dos povos árabes.
O primeiro entrevistado palestino veio no final da década de cinqüenta para o Brasil,
em seu passaporte o registro profissional é agricultor, sempre trabalhou como “mascate”
(vendedor de roupas) no Mato Grosso, onde constituiu família com uma mulher nascida em
Poxoréu, MT. O entrevistado e tradutor das lápides residi a muitos anos em Balneário
Camboriú, com a esposa, filhos e netos, trabalhando com vendas em Santa Catarina e Rio
Grande do Sul. Todo o ano viaja para a Palestina para visitar a filha que foi morar com a sua
família, na terra herdada dos seus antepassados.
O segundo entrevistado palestino mora em Marechal Cândido Rondon, PR, veio para o
Brasil como turista, no final da década de oitenta, onde constituiu família com uma rondonense,
desde que veio para a comunidade tem uma lanchonete-restaurante, servindo comida típica
árabe. Todo ano faz parte dos Eventos Culinários Típicos da comunidade para angariar fundos
para as Associações Sociais Carentes do Município. O Entrevistado, seus familiares e um
pequeno grupo de imigrantes dos países árabes representam os costumes e as comidas de
origem árabe, na comunidade.
Considerações finais
Nessa pesquisa, focalizam-se neste espaço físico quando se percebem nas lápides dos
túmulos as informações que nela estão inscritas ou circunscritas através da imagem e/ou da
escrita, um valor importante sobre a religiosidade e a identidade étnica, uma vez que pelos
símbolos e pela escrita podem-se narrar às pessoas, tanto na sua ancestralidade como nas
maneiras de identificar-se e de filiar-se a elas.
De acordo com a forma escrita nas lápides, a morte pode assumir um papel de marcador
religioso, cultural e étnico, pois não apenas sua cultura material aponta aspectos da
religiosidade, mas também os símbolos e ritos fúnebres e os dados necrológicos demonstram a
vinculação dos familiares, pelas suas atitudes religiosas, pelas crenças e mesmo pelas suas
vivências sociais, de uma forma de familiaridade com a identidade de cultura étnica religiosa.
A investigação desenvolvida nesse estudo vem a ser uma parte final, sobre o Projeto de
Pesquisa Institucional da Unioeste “A escrita alemã nas lápides de cemitério”, sob a minha
coordenação. Portanto, nesse artigo, destacaram-se as variações sepulcrais diferenciadas, como
a identificação religiosa e a despedida na escrita árabe inscritas nas lápides das sepulturas, da
Ala Esquerda do Cemitério Municipal, observando os símbolos religiosos utilizados nas
lápides das sepulturas, além de oferecerem dados para poder analisar a estrutura linguística
utilizada sobre a escrita clássica da língua árabe, mostrando pistas para o estudo da
religiosidade e dos símbolos utilizados pelos familiares.
Acredita-se que para poder investigar dados sobre a iconográfica-fotografia, é
necessário auxílio de ferramentas da pesquisa genealógica, para poder detectar a presença de
símbolos e traços da linguagem utilizada de forma discursiva, aqui nesse texto sobre a língua
árabe, em suas interações endógenas e exógenas, sendo imigrantes de países árabes que vieram
de vários países para o Brasil, aqui nesse estudo da Palestina, quando esses imigrantes vieram
para esta comunidade, trazendo a língua com traços linguísticos, o ato de cozinhar, símbolos
religiosos que tinham em comum nas regiões de origem.
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