O segredo de Aziza

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O segredo de AzizaSalim AlafenischDieter Konsek

L longe, num osis da Arbia, vivia um sheik do deserto com a sua famlia. Nada lhe faltava: o seu rebanho contava inmeros camelos e carneiros, e morava em lindas tendas negras de pele de cabra.

Aziza, a filha do sheik, no gostava de ruminantes.Impossvel t-los como amigos dizia ela. Preferia de longe a sua rechonchuda galinha branca. Com frequncia, galinha e menina abrigavam-se do sol sombra de uma tenda, e Aziza acariciava com ternura a plumagem brilhante da sua companheira.

s a galinha mais linda do acampamento murmurava ela.

Nada lhe dava mais prazer do que ouvir a galinha cacarejar alegremente ao romper do dia: era sinal seguro de que havia um ovo fresquinho no poleiro. Aziza desatava a correr e segurava com cuidado o precioso trofu, que ia cozer nas cinzas ainda quentes da fogueira. Uma vez cozido, metia o ovo num po e saboreava-o, de olhos fechados. No trocaria aquele pequeno-almoo por nada deste mundo!

Com o decorrer do tempo, Aziza fez-se uma linda rapariga. Os seus cabelos eram longos e negros, e todas as manhs os penteava em duas grossas tranas. E, nos dias de festa, usava com alegria uns lindos brincos de ouro e um vestido de seda.Ao contrrio da deslumbrante Aziza, a galinha branca ia ficando com um aspeto cada vez mais envelhecido: emagrecia a olhos vistos, as suas plumas outrora luzidias iam ficando baas, empalideciam de dia para dia e, pior ainda, j no punha ovos! Em suma, estava velha. A tua galinha j no presta para nada! acabou por resmungar o sheik. Qualquer dia vai parar panela!

Aziza tentou por todos os meios que a sua galinha conseguisse pr nem que fosse um s ovo... Mas isso era como fazer um camelo ladrar!Porm, uma manh, surgiu-lhe uma ideia: se a sua galinha j no voltava a pr, pelo menos seria capaz de chocar ovos! Aziza correu logo a apanhar todos os ovos que havia espalhados pelo campo. Voltou com o cesto cheio e um grande sorriso nos lbios. Instalou o seu tesouro num canto do poleiro: dez ovos, tantos quantos os dedos das suas mos! Agora vou fazer-te um ninho de palha disse a menina. Quando o meu pai vir os teus dotes de chocadeira, vai logo esquecer a canja de galinha!E logo ps mos obra. Num abrir e fechar de olhos tinha escavado um buraco, encheu-o de palha e nele colocou os ovos.

No longe daqui, uma velha me-serpente seguia atentamente as manobras de Aziza. Tantos ovos para aquela preguiosa? disse ela assobiando. E para mim no h nada? Quem me dera voltar a chocarReinava um silncio absoluto. O sol brilhava acima da linha do horizonte, redondo como uma bolacha, e a brisa da tarde soprava suavemente sobre o acampamento. A velha me-serpente encontrou uma das suas jovens primas aninhada sobre os seus ovos. Todas chocam, s eu que no! resmungou ela entre dentes. Porque ests to mal humorada? perguntou a jovem me. Deixaste escapar algum rato? Nada disso retorquiu a outra. Simplesmente gostava de voltar a chocar, mas j estou demasiado idosa para pr ovos. E acrescentou, de olhos a brilhar de tanto desejo: No ters por acaso um ovo a mais que me pudesses dispensar? Ests maluca? exclamou a outra horrorizada. a minha primeira ninhada e levo muito a srio esta tarefa de chocar! Est bem disse a velha me-serpente. No preciso irritares-te. E dirigiu-se para o acampamento.

O dia tinha chegado ao fim. Aziza foi dar as boas-noites sua galinha. Choca bem, minha linda disse ela. Mas toma cuidado: os ladres aproveitam-se da noite.

Ao passar diante da tenda, a velha me-serpente viu a galinha de Aziza, orgulhosamente aninhada, qual rainha em seu trono. Cacarejava sem parar. Est calada! assobiou o rptil. So horas de dormir. Eu, aqui, estou em minha casa! replicou a galinha, de ar altivo. Quando se choca os ovos das outras era melhor estar de bico calado! disse maliciosamente a velha me-serpente , que deslizou em direo ao ninho.Depois pediu: No queres deixar-me chocar um bocadinho os teus ovos? Achas que sou palerma? Sei muito bem que o que tu queres com-los! respondeu a galinha. Sua velha galincea! resmungou a serpente. Esta manh engoli um rato e j me basta para o dia de hoje. S quero chocar um bocadinho, nada mais. Enquanto falava, o rptil foi-se aproximando do ninho, com um ar ameaador. Aterrorizada, a galinha fugiu a cacarejar como uma desalmada.

E a velha me-serpente enrolou-se no ninho em cima dos ovos. Hmmm... assobiou ela de satisfeita. Ainda esto quentinhos!Entretanto, a galinha esvoaava por todo o lado como louca, e lanava gritos espalhafatosos. V l se te calas! repreende a serpente. Vais acordar toda a gente!Era mesmo isso o que a galinha pretendia. Mas Aziza dormia como uma pedra, a sonhar com um bonito livro que o pai prometera trazer-lhe da cidade. Aziza gostava muito de ler, e um livro era um presente precioso.

A luz prateada da lua cheia envolvia agora o acampamento. Camelos, carneiros e cabras pastavam no longe das tendas onde dormia o sheik e a sua famlia. No meio daquela zaragata, a velha me-serpente e a galinha no se aperceberam que uma raposa do deserto estava a aproximar-se em bicos de ps, de orelha em riste. Que bela receo disse ela com ironia. Mal pus o focinho neste acampamento, estas queridas galinhas comearam a cantar de alegria por me verem.Sem fazer o menor barulho, esgueirou-se por entre as tendas. Crescia-lhe gua na boca s de pensar no banquete que a esperava.

Ser que o seu estmago fizera demasiado barulho? O certo que a galinha a ouviu a aproximar-se! E, de um salto, empoleirou-se no telhado da tenda como se tivesse sido picada por um escorpio. Ah, galinha tonta! ralhou a velha me-serpente. Eu bem te disse para te calares!A raposa aproximou-se do ninho. Se ds mais um passo, mordo-te disse-lhe o rptil, todo fanfarro.A raposa nem podia acreditar no que os seus olhos viam. O que faz uma serpente metida num galinheiro? perguntou. Estou a chocar os meus ovos. Tretas! troou a raposa do deserto. Os ovos de serpente no so maiores do que caganitas de camelo! Julgas que me enganas? No tens nada a ver com isto replicou a velha me-serpente. Vou chocar estes ovos at deles sarem pequenas serpentes. J h serpentes dessas que cheguem! murmurou a raposa.O rptil comeou furiosamente a sibilar. Queres luta?

A tenso entre ambos estava ao rubro. A quem pensas que metes medo? disse a raposa, mostrando os dentes afiados. Cuidado! ameaou a velha serpente. Um passo mais e mordo-te! Eu no quero saber dos teus ovos retorquiu a outra. Tenho fome de galinha! Deixa-me passar.Empoleirada no telhado, a galinha branca dava graas por no estar no lugar da serpente. s mesmo ruim resmungou a velha me-serpente . Mas diz-me: se comeres as galinhas, quem vai pr os ovos? Estou cansada de tanta pergunta respondeu a raposa. J no como h vrios dias e no vou deixar escapar esta oportunidade. V l, sai da!

Mas, como resposta, a velha me-serpente atirou-se raposa e mordeu-a na cauda. O combate prometia! Felizmente, o sheik acordou com aquela algazarra. Chegou com os ces, e a raposa teve de fugir e ir comer a outro lado. Quem brinca com o fogo queima-se! riu brava a velha me-serpente .

Restabelecida a calma, a galinha desceu do poleiro. Viste como eu te salvei a ti e tua ninhada? lanou-lhe a velha me-serpente . verdade! respondeu a galinha. Deixemo-nos de brigas e faamos um acordo: tu passas a chocar de noite e eu de dia. Assim os ovos estaro em segurana e eu escapo de ir parar panela!

E assim sucedeu, sem que ningum soubesse. O sheik ficou contente, Aziza mais ainda, e as duas velhas mes chocavam vez, em completa paz.Mas o que iria sair daqueles ovos? Pintainhos ou serpentes? Acontecem coisas to curiosas no deserto