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TECHNICAL BOOKS EDITORA um manual para o estudo do comportamento animal COMPORTAMENTAL ECOLOGIA INTRODUÇÃO À Kleber Del-Claro

Livro Introdução à ecologia comportamental

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TECHNICAL BOOKS EDITORA

um manual para o estudo do comportamento animal

COMPORTAMENTALECOLOGIA

INTRODUÇÃO À

Kleber Del-Claro

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um manual para o estudo do comportamento animal

COMPORTAMENTALECOLOGIA

INTRODUÇÃO À

Kleber Del-Claro

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um manual para o estudo do comportamento animal

COMPORTAMENTALECOLOGIA

INTRODUÇÃO À

Kleber Del-Claro

T B

Rio de Janeiro2010

Technical Book s ediTor a

1ª edição

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Introdução à Ecologia Comportamental:um manual para o estudo do comportamento animal

Copyright © 2010Technical Books Editora Ltda.

Rua Gonçalves Dias, 89 - 2º andar - Sala 208Centro - Rio de Janeiro - RJ - CEP: 20.050-030

Tel/Fax: (21) 2252-5318vendas@tbedi tora.com.br

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vendas@tbl ivrar ia.com.brwww.tbl ivrar ia.com.br

T B

Technical Book s ediTor a

Dados internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP)

D331 Del-Claro, Kleber. Introdução à Ecologia Comportamental : um ma- nual para o estudo do comportamento animal / Kle ber Del-Claro. ─ 1. ed. ─ Rio de Janeiro : Tech- nical Books, 2010. 128 p. : il. color. ; 21 cm. Inclui bibliografia. ISBN 978-85-61368-12-8 1. Ecologia Animal. 2. Animais – Comportamento. I. Título. CDD 591.51

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Dedicado aos meus amores,

Maura, Vergílio, Augusto e Túlio,

fontes de minha felicidade, paz

e segurança de um mundo melhor.

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Agradeço a todos que, direta ou indiretamente, colabora-ram para minha formação profissional. Em especial, agradeço a Ângela Helena Torezan Silingardi, Gerson Augusto Ribeiro Sil-veira, Newton Goulart Madeira, João Vasconcellos Neto (meu orientador de mestrado), Fernando Antônio Frieiro Costa, Rogé-rio Parentoni Martins, Robert J. Marquis e Paulo Sérgio Moreira Carvalho de Oliveira (meu orientador de doutorado).

Agradeço à Universidade Estadual de Campinas (Uni-camp), onde me formei, e à Universidade Federal de Uberlândia, onde trabalho, desde 1992.

Agradeço imensamente ao Conselho Nacional de Pesquisa, Ciência e Tecnologia (CNPq), que me apoia formalmente como pesquisador, desde 1996.

À Fundação de Amparo à Ciência do Estado de Minas Ge-rais (Fapemig), agradeço pelos diversos apoios e recursos rece-bidos.

Quero agradecer também aos programas de pós-graduação que muito me ajudaram e aos quais tenho correspondido com meu trabalho e dedicação. Sou especialmente grato aos progra-mas de Ecologia da UFU, UFMS e de Zoologia da USP (FFCLRP), UFJF e UFPR. Nos últimos anos, tenho recebido um imenso apoio da diretoria do Instituto de Biologia da UFU, a cujo diretor e colega, Jimi Naoki Nakajima, agradeço por sempre fazer valer a verdade e a justiça, no trato do bem público.

Não poderia deixar de agradecer aos muitos colegas e alu-nos que me enviam fotos, trabalhos e teses, para compartilhar

Agradecimentos

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ou corrigir, e aos que me convidam a participar de palestras e visitas científicas. Vocês são todos muito especiais e grande fonte de minha felicidade profissional.

Quero agradecer aos meus principais colaboradores cien-tíficos: Paulo S. Oliveira, Helena Maura Torezan Silingardi, Lu-célia Nobre Carvalho, Everton Tizo Pedroso, Jean Carlos Santos, Marina Farcic Mineo, Graziela Diógenes Vieira Marques, Jonas Byk e a todos os outros com os quais já publiquei ou estamos publicando em conjunto. Sou muito grato por seu apoio e con-fiança.

Agradeço a Artur Andriolo e Jean Carlos Santos por algu-mas fotos cedidas, que foram usadas neste livro.

A Everton Tizo Pedroso agradeço pelo tempo dedicado à leitura crítica dos originais do livro.

Quero agradecer também aos meus editores e àqueles que auxiliam na distribuição dos meus livros. Agradeço muito por sua compreensão para com minhas constantes solicitações de re-dução de custos e margens de lucro, a fim de que os livros che-guem aos alunos o mais barato possível.

Agradeço à Sociedade Brasileira de Etologia, à Sociedade Portuguesa de Etologia, ao CNPq e aos nossos incríveis estudan-tes, por seu apoio e empenho na divulgação de nossos estudos e livros.

Não poderia esquecer de agradecer a minha família – minha esposa e meus filhos –, pela paciência, carinho e dedicação que têm comigo. Muitas vezes discutindo e dando atenção a um “maluco” que fala do incrível comportamento de uma estranha e diminuta formiguinha que carrega sementes ou suga gotículas em folhas de plantas com nomes estranhíssimos. Tenham a cer-teza de que vocês são o que amo com mais ardor.

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“O comportamento [...] orientado para uma meta está extrema-mente disseminado pelo mundo orgânico; por exemplo, a maioria das atividades relacionadas a migração, obtenção de alimento, corte, ontoge-nia e todas as fases da reprodução é caracterizada por tal orientação por uma meta. A ocorrência de processos orientados por uma meta talvez seja o traço mais característico do mundo dos organismos vivos.”

Ernest Mayr (1988)

“A literatura sobre comportamento animal está cheia de descri-ções de comportamento animal claramente proposital, revelando pla-nejamento cuidadoso. [...]. Nesse planejamento proposital não há, em princípio, diferença entre seres humanos e animais pensantes.”

Ernest Mayr (2005)

As formigas-correição são nômades e constantemente mudam seus ninhos para lugares onde poderão obter mais alimento e segurança, onde possam au-mentar ou manter alto seu valor adaptativo. Crescer, se desenvolver, sobrevi-ver e reproduzir, deixar descendência viável: eis a meta final.

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“O sonho e a vida são dois galhos gêmeos;são dois irmãos que um laço amigo aperta.

A noite é o laço.”

Gonçalves Dias

Toda utopia, quando boa, é mais sonho do que pesadelo. O meu sonho, ao escrever este livro, é que eu consiga lhe transmitir o mesmo prazer que sinto, quando estou livre para estudar com-portamento animal. Parar calmamente no campo e sentar sobre uma pedra, sob uma grande e maravilhosa árvore, com respin-gos da água gelada das corredeiras da Floresta Atlântica Brasilei-ra batendo no meu rosto, enquanto observo uma simples formi-guinha se alimentando das excreções açucaradas de um nectário extrafloral. E o melhor: ainda ser pago para fazer isso, para tentar entender os mistérios da natureza e do comportamento animal – ser pago para viver um sonho!

Este livro não tem, portanto, a menor pretensão de ser uma obra completa sobre Ecologia Comportamental e/ou Comporta-mento Animal, para isto há livros excelentes, didáticos, cheios de exemplos enriquecedores, escritos numa linguagem científi-ca padronizada. O que eu quero aqui é estimulá-lo, instigá-lo, aguçar sua curiosidade para o estudo do comportamento e da ecologia, de modo integrado. Quero lhe mostrar o quanto isto pode ser bonito, agradável e recompensador. Ao mesmo tempo, sonho em lhe fornecer as ferramentas básicas para que possa se iniciar no estudo do comportamento e da ecologia comporta-mental. O que quero é que você pegue gosto pela coisa.

Prefácio

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Ao longo de minha vida acadêmica, procurei afastar de minha mente idéias dogmáticas, finalistas. Por isso sou biólogo. Biologia é uma ciência única, na medida em que se transforma, pois modifica nossa forma de encarar o mundo e é modifica-da por esse mesmo mundo, a cada dia. Mas algumas pequenas verdades parecem perdurar em meu caminho e uma delas é a identificação de que nossa ciência, globalmente e em todas as áreas do conhecimento, carece de bons e dedicados orientadores. Não estou dizendo que não existam, pelo contrário, há muitos e muito bons. O problema é que, perante o universo de estudantes que temos hoje, esses bons orientadores são poucos e, portan-to, encontram-se sobrecarregados. Assim, a cada dia, encontro novos alunos com velhos problemas, como falta de leitura, pou-co senso crítico, conhecimento técnico limitado, sem paciência, muitas vezes sem objetivo de vida, desorientados. O sonho aqui é, simplesmente, lhe propiciar alguma orientação na área da ci-ência onde tenho um pouco mais de conhecimento.

Assim sendo, este livro será dividido em etapas e peço que você não salte nenhuma, pois da sua boa compreensão depende a sequência de seu aprendizado. Partiremos de uma introdução básica, definiremos comportamento, ecologia comportamental, suas origens e diferenças. Através de exemplos, vamos procu-rar entender hipóteses, pressupostos, metodologias, buscando capacitá-lo para elaborar um projeto nesta interessante área do conhecimento. Então, seja bem vindo! Vamos sonhar juntos, pois como nos ensinou Marcel Proust:

“Se sonhar um pouco é perigoso,a solução para isso não é sonhar menos,

é sonhar mais”.

Aos sonhadores,com estima,

Kleber

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Parte 1 ♦ História e Definições Básicas ........................................... 17

1.1. Uma breve história da ecologia comportamental .............................. 181.2. Definindo comportamento .......................................................................... 241.3. Quatro termos básicos para iniciar uma descrição ........................... 25

Parte 2 ♦ Guia Introdutório ao Comportamento Animal ............. 29

2.1. Uma linha de pesquisa motivadora ........................................................ 302.2. Ferramentas básicas ....................................................................................... 332.3. Conhecendo o objeto de estudo ................................................................ 462.4. Familiarizando-se com o animal e com o ambiente ......................... 482.5. Métodos clássicos de observação de comportamento ...................... 522.6. Dicas para estudar o comportamento de invertebrados ................. 572.7. Dicas para estudar o comportamento de vertebrados ..................... 622.8. Marcando seus animais para estudo ...................................................... 662.9. Cuidados pessoais para ter no campo e no laboratório ................... 742.10. Como planejar um estudo em comportamento animal? ............... 782.11. O que são etogramas? ................................................................................. 90

Parte 3 ♦ Guia Introdutório à Ecologia Comportamental ............. 95

3.1. A questão funcional e a questão evolutiva ........................................... 963.2. A questão da ecologia comportamental ................................................ 993.3. O teste de hipóteses na ecologia comportamental .......................... 1013.4. Um exemplo do uso da ecologia comportamental na ecologia

de interações (populações e comunidades) ........................................ 1063.5. Como encontro meu caminho? ................................................................ 110

Parte 4 ♦ Bibliografia ........................................................................ 113

4.1. Literatura citada ............................................................................................. 1144.2. Literatura recomendada ............................................................................. 114

Parte 5 ♦ Glossário ........................................................................... 119

Sumário

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um manual para o estudo do comportamento animal

COMPORTAMENTALECOLOGIA

INTRODUÇÃO À

Kleber Del-Claro

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História edefinições básicas

Parte 1

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Introdução à Ecologia Comportamental ♦ um manual para o estudo do comportamento animal

1.1. Uma breve história da Ecologia Comportamental

Nosso interesse pelos animais está enraizado em nossas origens. Arte, pintura ou gravura rupestre é o nome que se dá às mais antigas representa-ções pictóricas conhecidas (figura 1.1). Mais de 40.000 a.C., milhares dessas gravuras rupestres foram gravadas nas paredes ou nos tetos de cavernas ou abrigos da África, Ásia, Europa e Américas. Na caverna espanhola de Alta-mira, também conhecida como “Capela Sistina da Pré-história”, a pintura rupestre de um bisão impressiona pelo tamanho e pelo volume conseguido com o uso da técnica do claro-escuro. Em diversas outras cavernas espalha-das pelo mundo todo, há inúmeras outras pinturas de animais, inclusive de alguns flechados ou encurralados por humanos. Essas gravuras rupestres representam os primeiros registros do interesse humano pelo comportamen-to animal.

Figura 1.1. Pinturas rupestres em caverna de Serranópolis, GO, no centro-oeste brasileiro, datada de 12.000 a.C., aproximadamente.

Cerca de 4.000 a.C., os egípcios usavam as fibras do caule de uma planta chamada Cyperus papyrus para confeccionar o precursor do papel. Essa planta

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era esmagada, prensada e secada para dar origem ao papiro, que era usado para documentar negócios do Estado, em grande parte, relacionados com a comercialização de animais. Nos documentos antigos das mais diversas re-ligiões, há inúmeros relatos sobre o comportamento e características de ani-mais domésticos e selvagens. Esse interesse pelos animais e seu comporta-mento pode ser, em grande parte, explicado também pela zoolatria, isto é, adoração aos animais, que era comum à grande maioria das religiões polite-ístas. Os próprios egípcios tinham um vasto panteão de divindades antropo-zoomórficas, ou seja, parcialmente humanas, parcialmente animais.

Assim, se você pensa que foi um pioneiro, ao observar um pardal no seu quintal, está muito enganado. Nós, humanos, observamos o comporta-mento animal desde que surgimos. Mas uma coisa não mudou desde o prin-cípio e, provavelmente, é a grande razão de nosso enorme desenvolvimento científico e intelectual. Observamos o comportamento dos animais para saber como, quando e do que podemos nos alimentar; para domesticar os animais; para evitar a ação de predadores; para aprendizado; mas, principalmente, por curiosidade. A curiosidade é uma característica peculiar que ressalta a inteli-gência humana. Em sendo curioso sobre tudo a sua volta e, em especial, sobre a natureza, o homem se tornou o ser dominante que hoje é.

A tradição oral, ou seja, a transmisão do conhecimento de uma geração a outra através da fala, contação de histórias, lendas e músicas, foi durante muito tempo o principal modo de perpetuação do conhecimento adquirido a partir da observação animal para o grande público. Este modo simples de transmisão do conhecimento, foi muito útil e eficaz, principalmente se consi-derarmos que, ainda hoje, grande parte da população mundial é analfabeta ou tem pouco domínio da leitura. A partir do século XVI, com as grandes navegações e a descoberta das rotas marítmas para África e Ásia, assim como a redescoberta do Novo Mundo, o ser humano passou a experimentar uma explosão de informações sobre a vida e o comportamento animal. Médicos e pintores de bordo, missionários, cartógrafos e um, pouco mais tarde, os pri-meiros naturalistas, passaram a descrever, primeiramente em suas cartas e depois em livros e artigos científicos, o comportamento de espécies nunca antes vistas. Um dos documentos mais preciosos desse período data de 1526 e foi escrito por Gonzalo Fernández de Oviedo y Valdés, intitulado Sumario de la Natural Historia de las Indias. Enviado ao Novo Mundo pelo rei Fernando da Espanha, Valdés fez a primeira descrição elaborada, rica em exemplos e detalhes específicos da flora e fauna da América Espanhola, principalmente da região do México. O documento continha não apenas a descrição de com-portamento animal, mas também humano, o que atraía muito a atenção do público europeu ávido em conhecer as novas terras, sua gente, seus costumes, novos alimentos e possíveis medicamentos.

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Introdução à Ecologia Comportamental ♦ um manual para o estudo do comportamento animal

Ao longo dos dois séculos seguintes, inúmeras outras contribuições fo-ram sendo feitas ao estudo do comportamento animal, mas de forma pontual e anedótica. Até que, entre o final do século XVIII e início do século XIX, os cientistas viajantes, denominados naturalistas, principalmente ingleses, ale-mães, holandeses, franceses e já alguns americanos, começaram a divulgar os resultados de suas expedições pelo mundo afora. Dentre eles, destacou-se o inglês Charles Robert Darwin, que publicou uma série de artigos e li-vros, como seus volumes de Zoologia, dentre os quais podemos citar extensas monografias sobre a biologia e taxonomia de cracas vivas e fósseis. Em 1859, Darwin publicou seu mais famoso livro: A Origem das Espécies, estabelecendo um dos mais importantes pilares no estudo da ecologia comportamental até os dias atuais, o conceito da evolução por meio da Teoria da Seleção Natural. Em 1871, Darwin publicou A Descendência do Homem, que, embora não fosse um livro especificamente sobre comportamento, estabeleceu importantes ba-ses para as futuras discussões que viriam nos anos seguintes sobre a origem do homem e das similaridades entre comportamentos sociais de humanos e outros primatas. Porém, em 1873, mais uma vez, Darwin ousou ao publicar A Expressão das Emoções no Homem e nos Animais, talvez inaugurando o que, mais tarde, viria a ser a Psicologia Comparada.

O comportamento animal e humano, também conhecido como Etolo-gia – do grego ethos, que significa “costume”, “hábito” – é uma área do conhe-cimento multidisciplinar, pois envolve aspectos da biologia desenvolvimental dos organismos, fisiologia, genética, evolução, psicologia e também da sua zo-ologia e ecologia. O termo etologia apareceu na França, no século XVIII, para designar a descrição de estilos de vida, em muito se confundindo com nossa definição atual de nicho ecológico. No sentido de se referir especificamente ao estudo do comportamento animal, o termo etologia foi empregado pela primeira vez no século XX, mais precisamente em 1950, pelo holandês Niko Timbergen. Devido aos trabalhos pioneiros no estudo do comportamento em condições naturais, com atenção voltada para padrões espécie-específicos de comportamentos, o alemão Oskar Heinroth e o americano Charles Whitman são também apontados por muitos como cofundadores da etologia moderna.

Depois de um longo início descritivo, seguindo a tradição de histó-ria natural empregada à etologia pelos naturalistas do século XIX, o estu-do do comportamento ingressou em uma nova fase, mais experimental, buscando entender as causas evolutivas dos comportamentos. Do meio da década de 1950 até o final dos anos 60, três pesquisadores europeus se destacaram nesta nova abordagem: os austríacos Konrad Zacharias Lorenz e Karl von Frish, e o holandês Niko Timbergen. Em conjunto, por “seus estudos voltados para a compreensão da organização e elicitação dos comportamentos individuais e sociais”, em 1973, esses cientistas receberam

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Parte 1 ♦ História e Definições Básicas

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o Prêmio Nobel de Medicina e Fisiologia, inaugurando uma nova era na etologia, que nos levaria à ecologia comportamental.

Em uma definição clássica, o comportamento animal em seu sensu stricto, inicialmente, apresentou três grandes áreas:

a) Psicologia Comparada – Inicialmente centrada nos Estados Unidos da América, esta é a área mais descritiva e que dá pouca importância às causas evolutivas dos comportamentos. O foco é o aprendizado associativo, especialmente em humanos. Nesses estudos, é comum o uso de animais como cães, pombos e ratos, como modelos experi-mentais, visando entender os processos cognitivos e perceptuais em humanos.

b) Neurobiologia – A partir de uma base biológica, esta abordagem vol-tou-se, durante muito tempo, para o entendimento dos mecanismos de funcionamento do sistema nervoso e suas respostas comporta-mentais, em detrimento de considerações evolucionárias. Atualmen-te, apresenta linhas com interesse filogenético, buscando entender as origens da formação e funcionamentos dos sistemas neurais e suas respostas comportamentais. É um dos campos mais promissores, no que se refere aos estudos do comportamento humano, no século XXI.

c) Etologia – O estudo descritivo do comportamento animal caracteriza a etologia clássica, que abordava principalmente as bases fisiológi-cas dos comportamentos, incluindo os mecanismos causais e fun-cionais, deixando para segundo plano as bases evolutivas (funções adaptativas) dos comportamentos.

Devido à formação acadêmica dos primeiros estudiosos do compor-tamento, a etologia no século XX se desenvolveu inicialmente na Psicologia. Durante muito tempo, esses primeiros etólogos contemporâneos se preocupa-ram com padrões estereotipados de comportamentos, os também chamados padrões fixos de ação (PFA).

Um PFA é todo e qualquer comportamento que pode ser elicitado por um estímulo sempre muito característico, denominado estímulo sinal ou liberador. Por exemplo, no ninho, quando um filhote de ave abre seu bico, exibindo para a mãe as cores fortes de sua mucosa (amarela, laranja ou verme-lha), faz com que esta regurgite o alimento para ele. Com o passar do tempo e a descoberta de que a maioria dos comportamentos não são de fato tão este-riotipados quanto se propunha no início da etologia moderna, os PFAs foram recentemente renomeados como padrões modais de ação (PMA).

Paralelamente a esses estudos, outros psicólogos direcionavam seus trabalhos para a investigação de atos comportamentais que pudessem ser cla-

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Introdução à Ecologia Comportamental ♦ um manual para o estudo do comportamento animal

ramente quantificados, dando origem a estudos sobre aprendizado e sobre as bases fisiológicas dos comportamentos. Nesta linha, um fisiologista russo, Ivan Pavlov, trabalhando principalmente com cães e estudando sua capacida-de de adestramento para a execução de pequenas tarefas, desenvolveu a ideia de condicionamento clássico, ou seja, condicionar um animal a desempe-nhar uma determinada função.

A metodologia desenvolvida por Pavlov, criou as bases para que uma nova escola da psicologia fosse inaugurada, o Behaviorismo. Um dos mais importantes nomes nessa nova linha de pesquisa foi o americano Burrhus Frederic Skinner, que propôs que o estudo do comportamento animal fosse limitado às ações que pudessem efetivamente ser observadas. Skinner de-monstrou que padrões de comportamento que pudessem ser recompensados, tenderiam a ser reforçados e aumentariam em frequência. Os clássicos exem-plos – e os mais lembrados – são as caixas de Skinner, gaiolas contendo rati-nhos que utilizam as patas dianteiras para abaixar uma barra, fazendo com que um grão de ração ou uma gota d’água (recompensa) seja liberada a sua frente. Os experimentos de Skinner mostraram que o controle do comporta-mento pode ser muito influenciado por ação reforçada.

Entre o final da década de 1960 e o início dos anos 70, William D. Hamilton deu uma abordagem totalmente nova à etologia. Apoiado nas ideias de manipulação experimental (e.g. alteração de uma característica do ambien-te para se testar a função de um ato comportamental) inicialmente propos-tas nos estudos de Tinbergen, von Frish e Lorenz, este biólogo evolucionista britânico propôs, pela primeira vez, que os comportamentos exibidos pelos animais deveriam ser estudados no sentido de entendermos seu real impacto sobre o valor adaptativo das espécies, traduzido pela sobrevivência desses animais e de seus parentes. Assim, Hamilton propunha a aplicação da seleção natural como ferramenta para entendermos as bases genéticas que moldavam os comportamentos. De suas ideias e das do entomologista e biólogo america-no Edward Osborne Wilson, emergiu uma nova ciência, a Sociobiologia, que busca entender as bases evolutivas da existência e a perpetuação dos compor-tamentos sociais.

No somatório desses esforços, o que, de fato, se via nascer era um novo modo de se estudar e entender o comportamento animal. Esse novo modo era um resgate e um aperfeiçoamento do método hipotético-dedutivo (a ser detalhado, mais à frente), inicialmente empregado pelos darwinistas, apoia-do na ideia de seleção natural, revigorada pelos conhecimentos modernos da genética e da evolução. Através da manipulação experimental e também do uso de ferramentas estatísticas e matemáticas, procurava-se entender não so-mente como um animal exibia um determinado comportamento, mas princi-palmente quais seriam as causas evolutivas que mantinham esse comporta-

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mento vivo, em termos de alelos presentes em uma população, ou seja, o valor adaptativo dos comportamentos. Assim, o Comportamento Animal se transfor-mava em Ecologia Comportamental.

Hamilton desenvolveu parte de seus estudos no Brasil, em discussões com o agrônomo e geneticista brasileiro Warwick Estevan Kerr. Através de seus estudos com abelhas sociais, Hamilton conseguiu demonstrar que o va-lor adaptativo de um comportamento pode ser medido pela quantidade de prole (filhos) viável, com chance de sucesso reprodutivo futuro e que o com-portamento permite que o indivíduo que o exibe produza ao longo de sua vida. Deste ponto em diante, as portas do estudo do comportamento animal foram gradualmente arrombadas pelos ecólogos, que passaram a tentar en-tender não apenas como um determinado comportamento influía na sobre-vivência e reprodução de um indivíduo, mas também os reflexos disso sobre as populações desses consumidores (herbívoros e carnívoros). E mais: o que isso representa em termos de impacto sobre os produtores (plantas), sobre as interações ecológicas e sobre a estrutura das comunidades.

Hoje, o Comportamento Animal, mais do que uma linha de investiga-ção científica, transformou-se em uma das mais poderosas ferramentas no universo multidisciplinar da ecologia comportamental. Nos nossos dias, uma grande profusão de cientistas se dedica ao estudo da ecologia comportamen-tal, em maior ou menor escala. Eles estão espalhados pelo mundo todo – ho-mens e mulheres, alguns mais velhos outros mais jovens, como você!

Seria um absurdo querer listar aqui a ordem de importância do estudo desses colegas e de suas contribuições. Nesse novo e tão dinâmico universo, o nome do americano John Alcock1 merece destaque. Sua publicação, Compor-tamento Animal: Uma Perspeciva Evolutiva, hoje na oitava edição, talvez seja a obra contemporânea que mais influenciou o desenvolvimento do estudo do comportamento animal, nas últimas duas décadas, entre jovens biólogos e ecólogos. Entre o final do século XX e o início do século XXI, o surgimento da internet, dos PDFs eletrônicos (Portable Document Format), têm disseminado, de forma cada vez mais rápida e em maior quantidade, os estudos publicados em todas as áreas do conhecimento. Não apenas textos, mas fotos e filmes so-bre comportamento são hoje veiculados por famosos e anônimos, na tentativa de divulgar suas descobertas. Seja, portanto, cauteloso, prudente e criterioso em suas pesquisas na internet, pois quantidade nem sempre é sinônimo de qualidade.

Ernest Mary definiu ciência como sendo “um pequeno passo no esforço humano para entender melhor o mundo por observação, comparação, experimentação, análise, síntese e contextualização”. Se, nesse sentido, a Biologia é uma ciência única, pois é mutável e se adapta às transformações impostas pelo tempo, a Ecologia Comportamental pode ser considerada uma das filhas rebeldes da

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Introdução à Ecologia Comportamental ♦ um manual para o estudo do comportamento animal

Biologia – aquela xereta que entra em toda festa, e que, sem cerimônia nenhu-ma, põe o dedo no glacê do bolo. O ecólogo comportamental de hoje equi-vale ao naturalista do século XIX, porém revestido de todo o conhecimento acumulado pela Biologia, nos últimos dois séculos, da genética à ecologia, passando pela fisiologia, zoologia e botânica. Hoje, ele utiliza os mais moder-nos equipamentos eletrônicos para documentação e análise, incluindo aí tudo que é pacote estatístico, mas... sem dispensar uma boa cadernetinha, lápis e borracha, além de uma confortável roupa de campo e um boné.

1.2. Definindo comportamento

Há muitas definições para Comportamento Animal. Como toda gran-de área dentro da Biologia, as definições de comportamento também sofrem alterações, adaptações, aperfeiçoamentos, de tempos em tempos. Talvez a de-finição mais simples e precisa seja aquela que define o comportamento como sendo tudo aquilo que um animal faz ou... deixa de fazer.

Quando vemos um animal correndo, pulando, se lambendo ou predan-do um outro animal, fica muito claro que esse animal está exibindo algum tipo de comportamento (figura 1.2A). Entretanto, é bom lembrar que os ani-mais podem exibir comportamentos nos quais deixam de realizar atividades que envolvem movimentações ou deslocamentos. Ao nosso olhar, parece que não estão fazendo nada. Por exemplo, dormir, hibernar, congelar-se ou fingir-se de morto, o que denominamos tanatose (figura 1.2B). Mesmo quando um animal aparentemente não está fazendo nada, esse “não fazer nada”, também representa um tipo de comportamento e tem sua função. Assim sendo, pode-mos sim entender comportamento como sendo o conjunto de todos os atos que um animal realiza ou deixa de realizar.

A B

Figura 1.2. A. Zebra (Equus burchelli) pastando em uma área de savana. B. Pe-rereca (Hyla geografica) fingindo-se de morta (tanatose) nas mãos de um pesquisador.

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Parte 1 ♦ História e Definições Básicas

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1.3. Quatro termos básicos para iniciar uma descrição

O comportamento é hoje uma linha de pesquisa muito difundida não somente entre biólogos, incluindo-se aí ecólogos, zoólogos, geneticistas, para-sitologistas e até mesmo alguns botânicos, mas também entre psicólogos, ve-terinários, zootecnistas, médicos e alguns agrônomos. Portanto, é necessário que, logo de início, façamos algumas padronizações para um melhor entendi-mento do estudo do Comportamento Animal e de suas aplicações na Ecologia Comportamental. Em muitos congressos da área e até mesmo em textos de revistas científicas que leio ou recebo para revisar ou editorar, com frequência encontramos alguns enganos no uso de termos descritivos de comportamen-tos animais. Vejamos alguns exemplos.

Na figura abaixo, como você descreveria a postura e a posição do ani-mal? Observe, pense e tente escrever em uma folha de papel, antes de conti-nuar a leitura.

Figura 1.3. Beija-flor (Eupetomena macroura), em Uberlândia, Minas Gerais, Brasil.

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Introdução à Ecologia Comportamental ♦ um manual para o estudo do comportamento animal

1) Postura – Quando falamos em postura, estamos nos referindo às par-tes do corpo de um animal, em relação a ele mesmo. Assim sendo, o beija-flor apresenta postura normal de pouso, ou seja, está apoiado sobre um substrato (normalmente um ramo), com as asas fechadas, o corpo perpendicular ao substrato (postura “ereta”), com a cabeça direcionada para sua frente e o bico fechado.

2) Posição – Quanto à posição, podemos dizer que o animal está apoia-do, ou pousado, sobre o ramo de uma árvore. Na descrição da posi-ção, procuramos indicar agora a relação entre as partes do animal e o habitat, o substrato mais próximo, um referencial do meio.

Obviamente, é difícil separar postura de posição na descrição de um comportamento e o modo mais simples, geralmente o mais correto para des-crever o animal da foto. Seria simplesmente: “o beija-flor está pousado sobre um ramo vegetal”, sendo o termo “pousado” referente à postura e a expressão “sobre um ramo” relativa à posição do mesmo.

Isto pode lhe parecer uma grande bobagem, mas é realmente comum encontrarmos em textos científicos, ou em painéis de congressos, confusões como: “o beija-flor está posicionado com as asas fechadas, numa postura frontal a uma árvore com flores”, o que constitui uma inversão total do correto uso dos termos descritivos básicos do comportamento.

Vejamos agora outros dois termos de uso muito comum. Analise a foto abaixo e tente descrever o comportamento do animal, não apenas quanto à pos-tura e posição, mas também, quanto ao movimento e deslocamento executados.

A B

Figura 1.4. Gavião caracará (Caracara plancus) pousado (A) e levantando voo (B) a partir de um termiteiro na Serra da Canastra, Minas Gerais, Brasil.

3) Movimento – A palavra movimento deve ser empregada no sentido de descrever mudanças de postura, ou seja, das partes do corpo de

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Parte 1 ♦ História e Definições Básicas

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um animal, em relação a ele mesmo. Assim, se o gavião mexe o pes-coço, abre e fecha suas asas, ele está se movimentando. Mas, se o ga-vião levanta voo a partir o termiteiro, ele não apenas se movimenta, mas também se desloca.

4) Deslocamento – O deslocamento considera as mudanças de posição, ou seja, do animal em relação aos substratos ambientais. Esses dois termos costumam ser usados de modo trocado, com muito mais fre-quência do que você imagina. Muitas pessoas, erroneamente, des-creveriam este comportamento como, “o gavião se movimentou em voo para longe do termiteiro”, por exemplo.

Algumas pessoas consideram um preciosismo de nossa parte quando insistimos no correto uso dos termos etológicos. Aprenda uma coisa: o capri-cho em uma descrição, o uso de uma linguagem correta e a precisão da re-dação são elementos decisivos, que irão aumentar as chances de seu texto ser bem entendido, do sucesso na transmissão de sua mensagem e, finalmente, de um trabalho seu ser aceito para publicação. Se, no passado, alguém se deu ao trabalho de padronizar uma linguagem científica, em qualquer que seja a área do conhecimento, nós devemos, por respeito e responsabilidade, acatar e utilizar essa linguagem, ou questioná-la e apresentar uma nova proposta.

Essas padronizações costumam contribuir de modo positivo para um melhor entendimento entre pesquisadores, para uma melhor compreensão dos estudos científicos e para evitar que um mesmo comportamento, comum ou estereotipado, seja descrito diversas vezes, por diferentes pesquisadores, tomando um enorme espaço editorial e, muitas vezes, causando grande con-fusão. Vamos dar um exemplo de uma grande vantagem da padronização de alguns termos.

Na figura 1.2B, eu usei o termo tanatose. Para quem já estuda comporta-mento eu não precisaria dizer mais nada, pois a pessoa já saberia que o animal estava se fingindo de morto, ou em imobilidade tônica. Em se tratando de um anfíbio, a mais comum das tanatoses ocorre em decúbito dorsal, com mem-bros retraídos, boca e olhos fechados. Trata-se, portanto, de uma descrição de cinco a seis linhas de texto, que podem ser resumidas em uma única e precisa palavra. Mais adiante, vamos tratar de repertórios comportamentais ou eto-gramas, nos quais a importância desses termos será ainda mais evidenciada.

Nos capítulos seguintes, vamos chamar sua atenção para as facilidades e os problemas em se trabalhar com comportamento animal, quais os cuida-dos que devemos ter, enfim, vamos tentar lhe mostrar como o comportamento pode ser uma ferramenta útil, não apenas nos estudos da ecologia do compor-tamento, mas também em outros estudos como na polinização, dispersão de sementes e na ecologia de interações.

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Guia introdutório ao comportamento animal

parte 2

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Introdução à Ecologia Comportamental ♦ um manual para o estudo do comportamento animal

2.1. Uma motivadora linha de pesquisa

Animais podem fazer coisas extremamente interessantes, às vezes sim-ples e alegres, outras vezes chocantes, mas coisas que chamam nossa aten-ção e aguçam nossa curiosidade. Neste ponto, reside principalmente nosso imenso interesse pelo estudo do comportamento. Quem, por exemplo, não ficaria intrigado se soubesse que, nas Filipinas, existem pequenas aranhas Salticidae (Myrmarachne assimilis) que mimetizam formigas tecelãs muito agressivas (Oecophylla smaragdina), ou seja, imitam perfeitamente essas formi-gas, juntando-se a elas em ninhos formados por folhas de plantas unidas por fios de seda2? Como este complexo interativo poderia ter se estabelecido? Com quais propósitos? Será que você já pensou em formigas que podem se orientar pela formação do céu à noite? Isto mesmo! Olhar para cima ao sair do ninho e ao invés de marcar o terreno com uma longa trilha química (de cheiro), simplesmente memorizar o contraste entre as copas das árvores, as estrelas, a luz da lua e se guiar por este mapa visual? (figura 2.1). Veja bem, não estamos falando de veados, coelhos e aves, mas de formigas!

Figura 2.1. Contraste entre o céu noturno e a sombra das copas das árvores.

Paulo Oliveira e Bert Holldöbler, dois colegas trabalhando num labo-ratório de Harvard, observando o comportamento de formigas Odontomachus

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Parte 2 ♦ Guia introdutório ao comportamento animal

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bauri (Ponerinae), notaram que toda vez que uma operária saía do ninho pa-recia parar e olhar para o alto, na direção do observador. Intrigados com isso, eles tiveram a ideia de testar esta hipótese e conseguiram comprová-la3.

Outro exemplo. Diga que você não ficaria assustado ao observar ou tomar conhecimento de casos de infanticídio entre mamíferos? Em 1977, a pesquisadora Sarah Hrdy4 publicou os resultados de seus estudos pioneiros feitos na Índia com macacos langurs (gênero Presbytis). O estudo se iniciou quando ela evidenciou que após as disputas entre machos pelos haréns, que os vencedores matavam todos os jovens filhotes do bando. Intrigada com suas observações iniciais, Sarah Hrdy passou a uma longa fase de estudos obser-vacionais de campo, testando diferentes hipóteses para explicar o fenômeno, o qual acabou relacionando com seleção sexual, embora seja um assunto con-troverso até hoje.

Exemplos como estes que acabo de comentar aguçam sua curiosidade? Mexem com você? Você se sente motivado a estudar este tipo de assunto?

Se você se sente inseguro em responder a essas questões é bom saber que um conhecimento básico sobre Zoologia, Botânica, Ecologia e Evolução pode ajudar muito quando a gente quer decidir se vai gostar ou não de estu-dar comportamento. É importante que você tenha muita capacidade de leitu-ra, que goste de estudar, que goste de ir ao campo e seja capaz de observar, com muita paciência e calma, detalhes mínimos, muitas vezes ocultos pela própria natureza. Veja, por exemplo, as fotos da figura 2.2.

A B C

Figura 2.2. A. Uma serpente Leptodeira engolindo sua presa, um sapi-nho Eleuterodactilidae. B. Um ninho de pássaro joão-de-barro (Furnarius rufus) é feito pouco a pouco, com bocados de barro. C. Um casal de libéluas (Libelulidae) em cópula.

Estas imagens são exemplos distintos de oportunidades de observação ímpares, simples, mas que só vê quem vai ao campo e, além disso, com muita paciência. Conheço muita gente que, quando em um ambiente natural, é ca-paz de olhar apenas para a paisagem. Geralmente, esse tipo de observador se cansa logo e já diz: “Pronto! Já vimos tudo por aqui. Vamos em frente?”. Ima-

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Introdução à Ecologia Comportamental ♦ um manual para o estudo do comportamento animal

gine só, se a pessoa não tem paciência, não tem a curiosidade de olhar dentro de uma flor, de escutar um barulhinho, de respirar os diferentes aromas... Imagine se, no campo ou no laboratório, essa pessoa vai conseguir encontrar algo realmente estimulante, que seja capaz de fazer com que ela se apaixone pelo estudo da Zoologia, Botânica ou Ecologia?

A primeira foto (figura 2.2A) foi feita na transição entre o Pantanal e a Amazônia, na fronteira entre Brasil e Bolívia. Foi uma tremenda sorte obser-var e fotografar este evento de predação na natureza. Esta observação surgiu de um barulho. Na floresta, sempre caminho lentamente, quase em câmera lenta, tentando ouvir, cheirar, perceber o que acontece a minha volta. Esta serpente estava na beira de um riacho, no meio de folhas amareladas caídas no chão da floresta, e foi o barulho de seu bote sobre o sapinho que revelou sua presença.

O ninho de joão-de-barro (figura 2.2B) é comum no Brasil, mas a maio-ria das pessoas quando a ele “apresentadas”, costumam mostrar surpresa. Será que é porque não olham para cima? Dê vez em quando, é bom nos preo-cuparmos com as coisas que vem do alto.

As libélulas fotografadas na Mata Atlântica (figura 2.2C) pareciam que estavam brigando. Se enrolavam uma na outra, subiam alto e sumiam entre as árvores, na beira de um pequeno lago natural. O grupo que estava comigo foi todo à frente. Eu e alguns alunos paramos e, dois minutos depois, elas pousaram a nossa frente e ali ficaram por alguns minutos, permitindo que observássemos, detalhadamente, o bombeamento do esperma do macho para a fêmea.

O que quero dizer a você é que existem inúmeros exemplos e situações estimulantes para se estudar comportamento animal. No mundo todo isto se repete – na floresta tropical, na tundra, no deserto, nos recifes de corais – e oportunidades não irão faltar, mas você tem que gostar do que faz, tem que sentir prazer e felicidade fazendo isto.

Uma coisa que chama a atenção nesses casos é que os estudos anterior-mente citados e relatados podem ter começado com uma simples observação na natureza ou em laboratório, anotada com lápis em uma caderneta de cam-po, fazendo as devidas correções com uma mera borrachinha branca. Este é outro fator muito relevante no estudo do comportamento animal. Você não precisa de grandes e caros materiais para se tornar um ótimo etólogo. Isto motiva muito, especialmente no início da carreira, ou para um leigo que quer ter esta atividade como uma simples forma de lazer. Então, quais seriam as ferramentas básicas, mínimas, para se estudar comportamento? Como posso evitar um investimento financeiro grande em um tipo de estudo que ainda não tenho certeza se vou gostar de fazer? Quais os cuidados iniciais que todo

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Parte 2 ♦ Guia introdutório ao comportamento animal

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pesquisador deveria ter? Como saber se o que eu escolhi estudar é interessan-te para a ciência? Será que eu estou no caminho certo? Quando e a quem devo pedir ajuda?

Neste e no próximo capítulo, vou tentar ajudar você a encontrar o cami-nho para estas respostas, para esclarecer suas dúvidas iniciais e para que sua motivação seja cada vez maior.

2.2. Ferramentas básicas

As ferramentas que vou apresentar aqui serão comentadas em outras partes deste livro, falando sobre seu uso, importância e utilidade. Muitas de-las você já deve conhecer, outras apresentam variação em tamanho, forma e aspecto, dependendo da utilização. Vou dar maior destaque aos materiais mais simples, mais baratos e que você pode obter facilmente. Nas observações sobre cada item comentarei sobre as novidades, equipamentos eletrônicos etc. Vamos lá, vamos listar o que seria bom ter em nossa mochila de campo.

Material de Registro:

a) Caderno de campo ou de laboratório – Sim, isto mesmo: caderno, lápis e borracha!Você deve estar achando que estou maluco, pois na era do computa-dor que cabe na palma da mão, eu venho falar de... caderno!Olha, não conheço lugar melhor para fazer as anotações iniciais e elas devem ser feitas com um lápis preto, macio. Assim, não apaga com a água, caso seu caderno tome chuva, ou caia numa poça d’água ou mesmo num riacho. Já pensou no seu computadorzinho dentro de um aquário? Iiiiih! Escorregou da mão! Pois é. Lá se foram seus dados. Nos trópicos, chuvas torrenciais podem cair a qualquer momento e não há aparelho eletrônico totalmente seguro contra as forças da natureza. Uma rápida inversão térmica, comum na base de muitas montanhas europeias, pode simplesmente inutilizar muitos equipa-mentos eletrônicos, temporária ou permanentemente. Assim como, o calor escaldante dos desertos ou das savanas africanas.Eu gosto muito de cadernos com arame espiral, pois dá para reti-rar mais facilmente páginas com anotações erradas. Além disso, são mais fáceis de virar as folhas e permitir a transcrição das informa-ções para as planilhas eletrônicas no laboratório. Pranchetas com folhas e tabelas de campo podem substituir o caderno. Para quem

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trabalha diretamente na água, uma placa de PVC branca também pode servir de caderno e você pode escrever nela com lápis comum.

Dicas importantes:

► Se você tem boas condições econômicas e sabe fazer uso de equi-pamentos eletrônicos, pode substituir o caderno de campo por um palm-top, notebook ou similar. Mas fique atento às circuns-tâncias da natureza (rios, lagos, poças, intempéries) e aos impre-vistos (possibilidade de quedas, tombos).

► Ter cópias é fundamental. Por isso, grave sempre seus dados de campo, tabelas, fotos e planilhas, num pen-drive ou dois (pen-drives costumam falhar). Sempre faça cópias de seus dados de campo e guarde-as em lugares diferentes.

► Baterias novas (carregadas, obviamente) são equipamentos bási-cos.

► Outra informação interessante: já há no mercado papéis à prova d’água e canetas que escrevem até embaixo d’água.

► Ah! Dinheiro também é um bom equipamento.

b) Gravador – Um gravador portátil pode ajudar muito, inclusive substituindo o caderno de campo algumas vezes, embora exista o inconveniente de obrigá-lo a transcrever as informações e o risco de algum barulho confundir o que foi dito por você.O gravador pode ser muito útil para captar sons dos animais tam-bém. Hoje em dia, há inúmeros modelos, de vários tamanhos e pre-ços. Escolha o mais preciso, com melhor tempo de duração da bate-ria, de menor tamanho e mais silencioso.

Dicas importantes:

► Hoje, muitos aparelhos de MP3, MP4, telefones celulares etc., per-mitem gravar sons, mas existem equipamentos específicos para a gravação de sons de aves, anfíbios e animais aquáticos, por exem-plo. Muitas vezes você vai precisar acoplar ao equipamento um microfone direcional ou um hidrofone (microfone subaquático).

► Esses equipamentos são bem mais caros e, quando o uso for even-tual ou esporádico, é sempre bom buscar a parceria com colegas que já os tem. Não desperdice recursos financeiros, adquirindo bens materiais supérfluos ou cujo uso não será extensivo. Apren-da a compartilhar com os colegas.

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c) Câmera fotográfica e filmadora – Há uns dez anos atrás, uma boa câmera fotográfica, com conjunto de lentes macro (para fo-tografar animais pequenos, detalhes de flores, por exemplo) e teleobjetiva (para animais e objetos distantes), além de muito dis-pendiosa ainda tinha os custos dos filmes e de revelação. Atual-mente, com a revolução tecnológica da última década, tudo ficou muito mais fácil. As câmeras profissionais não são mais tão caras e podem ser encontradas com facilidade na maioria dos países. Você coloca as fotos num pen-drive, vai a um supermercado e você mesmo as imprime. O mesmo é válido para filmadoras que inclusive se tornaram muito mais compactas, práticas e de fácil manuseio. Entretanto, uma gama enorme de câmeras amadoras, com excelente resolução, muitas com zoom e outras que permi-tem uma boa aproximação para flores e objetos pequenos podem, muitas vezes, substituir as câmeras profissionais, além de pro-duzirem pequenos filmes. Isto proporcionou uma verdadeira re-volução na documentação de comportamentos, tanto de animais como humanos.Um detalhe importante é que as fotos e filmes podem ser armazena-dos, reconfigurados e eletronicamente manipulados com um grande número de programas de computador que surgem a cada dia.

Dicas importantes:

► A leitura dos manuais é de fundamental importância, pois a infi-nidade de recursos presentes nesses novos equipamentos requer treino para seu uso e manipulação. Um excelente equipamento nas mãos de uma pessoa destreinada pode trazer resultados frus-trantes. É muito comum que, por inépcia, o usuário apague as imagens, sem antes salvá-las.

► Os programas de computador permitem aumentar ou diminuir o brilho, a nitidez etc. Mas tome cuidado com o seu uso, para não alterar artificialmente a realidade da documentação fotográfica ou da filmagem. Preserve sempre sua credibilidade.

Material de Observação:

d) Binóculo e lupa manual – Para se observar animais à distância, um binóculo, ou até mesmo uma luneta, é muito útil e importante. Há binóculos de todos os tamanhos, potências e preços. Se você for um ornitólogo (ou mesmo observador amador de aves) ou um mastozoó-

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logo, recomendo que, logo de cara, já adquira um bom binóculo, pois vai valer a pena o investimento.Um bom binóculo também pode ser útil para entomólogos, espe-cialmente para quem estuda borboletas, abelhas e libélulas, e tem a vantagem adicional de ainda poder ser usado em eventos esportivos, shows, para ver a lua etc., mesmo se você desistir de estudar compor-tamento animal. Portanto, não será um dinheiro jogado fora.Uma lupa manual é excelente para quem trabalha com pequenos ani-mais no campo, ou para quem precisa examinar detalhes em partes específicas de animais capturados ou de vegetais que são utilizados ou consumidos por esses animais. Existem lupas com uma pequena lâmpada adaptada e uma alça para prender na testa, que são muito boas para quem estuda Biologia da Polinização.

e) Lanterna – É mais um equipamento com extrema variação de preço e tamanho. Pode ser usada tanto em ambiente seco quanto úmido, ou mesmo debaixo d’água. É um equipamento obrigatório mesmo para quem não vai ao campo à noite. Você pode precisar iluminar um oco de árvore, por exemplo, ou seu carro pode quebrar e você ter que passar a noite no mato.Para quem lida com invertebrados, ter um pedaço de papel celofane vermelho para colocar na frente da lanterna é essencial. Insetos e ara-nhas não enxergam a luz vermelha e você irá perturbar muito menos o comportamento desses animais se os observar à luz vermelha.Uma boa lanterna também é um equipamento básico de segurança. Certa vez, eu estava trabalhando sozinho em uma savana, durante a noite, o que é uma tolice! De repente, percebi que estava sendo seguido por alguém que não se identificou. Caminhei um pouco na direção da pessoa, que se afastou e se escondeu. Prendi minha lan-terna num galho de árvore, direcionando o foco para o último ponto em que vi o vulto, e me afastei na direção oposta, fazendo o contorno pelo mato, até alcançar a segurança do meu veículo novamente. A lanterna foi de fundamental ajuda, neste caso.

Material de Orientação:

f) Bússola ou GPS – A velha e boa bússola ajuda muito, mas o GPS é um equipamento cada dia mais acessível, devido à queda em seu preço de venda. Atualmente, o GPS (Global Positioning System) é um equipamento básico para marcação de localidades, medição de dis-tância e para esquadrinhar áreas naturais. Hoje, muitos telefones ce-lulares já vêm com as funções de GPS acopladas. São equipamentos

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de fácil uso e manuseio e com enorme confiabilidade dos dados que captam, armazenam e podem transmitir. Para quem trabalha nos trópicos, como a Amazônia, as savanas tropicais e as florestas chu-vosas do Sul da Ásia, ou ainda em regiões remotas, como desertos quentes ou frios, o GPS é um equipamento obrigatório em qualquer kit de sobrevivência.

Dicas importantes:

► Considero o telefone celular um equipamento básico de orienta-ção e segurança.

► Sem um carregador adaptado à bateria do veículo, o telefone celu-lar não serve para nada. Dica de quem já ficou na mão!

Material de Coleta de Informação:

g) Trena – Serve para a medição de distâncias e alturas, sendo um dos mais úteis equipamentos para registro de trabalhos de campo.

h) Paquímetro – Este instrumento, que consta de uma escala graduada fixa, duas garras e um cursor, permite a medição precisa de animais, partes de seus corpos e partes florais, por exemplo.

i) Cronômetro – É um instrumento indispensável para o registro de comportamentos, para quantificação da duração de atos comporta-mentais.

j) Termômetro e termo-higrômetro – Desnecessário dizer que um termômetro serve para medir a temperatura, mas há muitas varia-ções deste instrumento, desde os comuns, aos mais complexos, que marcam a temperatura máxima e mínima. Já um termo-higrômetro, além de medir a temperatura, também afere a umidade do ar.

k) Oxímetro e pHmetro de mão – O oxímetro é o instrumento que de-termina, fotoeletricamente, a saturação de oxigênio na água. O pH-metro é o aparelho usado para medição do pH da água. Medir a oxi-genação e o pH da água pode ser necessário para ictiólogos, herpe-tólogos e limnólogos, em seus estudos associados a comportamento.

l) Refratômetro – O instrumento utilizado na medição do índice de refração de uma dada substância permite medir as quantidades de açúcares (geralmente frutose) presentes em nectários e exsudações vegetais.

m) Balança e pesola – Uma balança e uma pesola (balança vertical manual) são equipamentos básicos, quando se pretende capturar pe-quenos animais para conhecer seu peso.

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Dica importante:

► Em alguns países, é bom andar com uma declaração com o objeti-vo da pesola, para não ser confundido com traficantes de drogas, que fazem muito uso deste equipamento.Não se assuste com esta lista, pois você não vai precisar de tudo isso. O tamanho de sua mochila de campo vai depender das res-postas que você quer obter. Tem gente que jamais vai usar um medidor de pH, outros que nunca usarão um refratômetro e as-sim por diante.

Material para Coleta:

n) Luvas – São muito úteis no manuseio de invertebrados e também na manipulação de aves e mamíferos (especialmente roedores e mor-cegos).

o) Pinças – Há pinças dos mais variados tamanhos e formatos. Aquelas que estarão em sua mochila deverão atender as suas necessidades. Por exemplo, uma pinça fina, do tipo de relojoeiro, é útil para quem vai trabalhar com animais bem pequenos, ou para quem vai precisar fazer manipulações em flores e botões. Pinças médias, com borda rombuda, é apropriada para quem quer capturar pequenos insetos e aranhas, sem ferir os animais. Pinças grandes, com mais de 30cm, são indicadas para quem vai manipular animais perigosos como aranhas, escorpiões e morcegos. O bom senso do pesquisador deve prevalecer sempre.

p) Redes de captura e puçá – Em muitos lugares, especialmente nos países tropicais, estes importantes apetrechos são vendidos apenas com autorização oficial do governo.Um puçá feito de filó, ou melhor, de organza, é um equipamento de campo básico para todo entomólogo. Na verdade, o puçá nada mais é que um enorme coador de café (figura 2.3). Com ele, você pode capturar pequenos espécimes: borboletas, abelhas, vespas, libélulas etc., com o objetivo de atender às necessidades de seu estudo: sexar o animal (examinar o sexo), marcá-lo, medi-lo e pesá-lo.Na figura 2.3, apresento algumas dicas de como fabricar seu próprio puçá. Você vai precisar de um cabo de vassoura, um pedaço de ara-me resistente (pode ser um cabide de roupas) e um pedaço de tecido, o qual recomendo que seja organza branca ou azul-claro. Algumas vezes, seu puçá pode ser um pequeno frasco coletor (Figura 2.8).

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Figura 2.3. Para construir um puçá, pegue um cabo de vassoura (1) e um peda-ço de arame firme (2). Dobre o arame para formar um aro com ele, com um diâmetro (x) de 20 a 25cm. Recorte o tecido nas dimensões e formato indicados na figura. Faça uma dobra no meio (linha pon-tilhada) e costure (A + B), a fim de formar um saco. Ponha a boca do saco sobre o arame e costure novamente para prender o saco ao arame. Agora é só amarrar o arame no cabo de vassoura e está pronto o seu puçá.

q) Potes para coleta – Se você trabalha com invertebrados, como inse-tos diminutos, como apanhá-los sem esmagá-los, ou sem que fujam? Potes coletores, de plástico ou de vidro, de diferentes tamanhos, são muito úteis para isto. Esses potes precisam ter dois furos. Você suga de um lado, criando um vácuo e o animal é puxado para dentro do pote. Veja como fazer o seu na figura 2.4.

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Figura 2.4. Para fazer seu frasco coletor ou aspirador basta pegar um pote de vidro com uma tampa ou rolha. Faça dois furos na tampa ou ro-lha. Passe um tubo flexível por cada furo. Ponha uma pequena tela sobre o furo no qual você vai por sua boca, a fim de impedir que engula os insetos. Está pronto! Agora é só "chupar" os bichinhos para dentro do vidro.

r) Tesouras – Podem ser necessárias, tanto para o corte de pequenos pedaços de vegetais, quanto para a preparação de materiais de iden-tificação no campo.

s) Material de herborização – Muitas vezes, você vai precisar saber a espécie vegetal sobre a qual seu modelo de estudo foi observado fazendo alguma coisa (pousado, comendo, repousando etc.). Então, você vai ter que saber como coletar e prensar o material, para fu-tura análise. Assim sendo, é bom saber como montar uma prensa de campo e como herborizar corretamente o material. Uma prensa simples de campo consiste de duas placas de madeira, fazendo um

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sanduíche com duas placas de zinco (opcionais), folhas de papelão e, por fim, jornal contento o material vegetal no meio (figura 2.5). Tudo isso amarrado por cordões ou barbantes.

Figura 2.5. Esquema de prensa para material vegetal (herborizador).

Dica importante:

► Para diferentes tipos de invertebrados há diferentes tipos de equi-pamentos, muitas vezes específicos para um determinado grupo. Procure informações na internet, em publicações específicas ou com colegas.

Vestuário:

t) Roupas – Este é um dos itens mais importantes para quem trabalha com comportamento. As roupas devem ser confortáveis (nem quen-tes, nem frias); devem proteger as partes expostas da excessiva ra-diação solar e de animais e plantas que podem lhe causar injúrias.

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Por exemplo, formigas, aranhas, escorpiões, pernilongos, plantas urticantes etc.

Dica importante:

► Sugiro sempre cobrir a boca da calça com a meia ou apertá-la com um elástico. Pense como um escorpião que está no solo, vendo um tênis e uma calça comprida acima dele: “Oba! Um morrinho para subir e entrar num túnel escuro, úmido e quentinho... Que beleza!”. Pois foi exatamente isso que aconteceu com minha espo-sa, quando estávamos no campo. Por sorte, ela não foi picada. De fato, foi muita sorte, pois estávamos a mais de 100 quilômetros de distância de um hospital razoável.As cores das roupas usadas pelos pesquisadores, no campo, tam-bém são de grande importância, pois, como veremos mais à fren-te, elas podem influenciar no comportamento do animal observa-do, estimulando ou inibindo comportamentos.

u) Calçados – A importância deste item deve-se ao fato de que, no campo, o pesquisador é obrigado a caminhar grandes distâncias e a permanecer muito tempo em pé. No laboratório, o pesquisador per-manecer parado por um longo tempo. Por isso, é muito importante que você perceba como os calçados ou as roupas influem em sua circulação sanguínea.

Dicas importantes:

► Botas e perneiras são importantes proteções contra serpentes.► Talco mentolado nas botas afasta carrapatos.

v) Proteção para a cabeça e para a pele – Chapéu, boné ou mesmo um guarda-sol pode ser necessário, dependendo do grau de exposição à luz ao qual você estiver sujeito durante seu estudo.

Dica importante:

► Embora isto nada tenha a ver com o vestuário, se você for traba-lhar nos trópicos, é bom reservar dinheiro para comprar muito protetor solar (FPS de 30 para cima).

w) Traje de mergulho – Aqueles que vão trabalhar em ambiente aquá-tico provavelmente precisarão de trajes de mergulho feitos de neo-

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prene com, pelo menos 4 milímetros de espessura, pois os riachos tropicais são muito frios. Dê preferência ao traje azul-escuro ou pre-to, pois essas cores apresentam menor influência no comportamento dos peixes.

Materiais Diversos e Equipamentos de Laboratório:

Há uma grande diversidade de materiais que podem lhe ser úteis, des-de produtos químicos até pequenos utensílios domésticos.

x) Produtos químicos – Álcool etílico, éter sulfúrico, água oxigenada, acetona, formol, ágar-ágar e detergente são produtos muito usados em comportamento, principalmente com a função de acondiciona-mento e preservação de materiais coletados.

y) Recipintes – Potes de vidro e/ou plástico, desde diminutos tubos eppendorf, potes coletores para exames laboratoriais de urina e fe-zes, até grandes sacos de plástico e pano podem ser úteis para acon-dicionar e transportar animais do campo para o laboratório.Mais uma vez o bom senso deve imperar. Como o que mais coleto são pequenos artrópodes, prefiro potes plásticos de acrílico transpa-rente com tampa de pressão, pois são muito duráveis, leves, de fácil manuseio e permitem um exame detalhado do animal em seu inte-rior. Muitas vezes, podemos fotografar partes do corpo do animal, através do pote.

z) Utensílios de laboratório – Placas ou discos de Petri, bandejas plás-ticas, lâminas de vidro, algodão hidrofílico, algodão hidrofóbico, al-finetes entomológicos, etiquetas, papel vegetal, papel de filtro, placas de isopor e canetas especiais (para escrita em plástico, vidro e metal) são coisas básicas que sempre me ocorrem na montagem de um la-boratório, ou quando tenho que comprar material de consumo para manutenção.Alguns equipamentos podem ser fundamentais para a realização de um bom trabalho.

● Estereomicroscópio – Ter um bom estereomicroscópio (lupa de mesa) é de fundamental importância para a observação de detalhes de partes dos corpos dos animais, ou do comporta-mento de animais pequenos, como formigas e pseudoescor-piões. Este equipamento, assim como o microscópio óptico, é imprescindível para a fase de identificação de material animal e vegetal. Para você identificar a espécie com a qual trabalha,

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ou alguma espécie de interesse para o seu estudo, você terá que lidar com chaves de identificação que vão de ordens e fa-mílias, até gêneros, espécies e, algumas vezes, subespécies.As estruturas que separam os animais podem ser muito pe-quenas, como um detalhe na asa de um besouro, ou um pelo diferente no dorso de uma abelhinha. Como estes equipamen-tos costumam ser muito caros, os pesquisadores só conseguem adquiri-los através da ajuda de órgãos governamentais de fo-mento à pesquisa. Se você não tem, mas precisa de um deter-minado equipamento, peça a ajuda de colegas de um laborató-rio que tem o equipamento e ofereça sua colaboração. Lembre-se de que uma mão lava a outra e é dando que se recebe.

● Balança analítica de precisão – Ter uma balança analítica de precisão, com até três casas decimais abaixo do zero, é sempre bom. Mesmo para quem for trabalhar com ursos, pode haver a necessidade de se pesar e quantificar pequenas sementes de gramíneas, eventualmente encontradas em suas fezes. No caso de pequenos peixes, anfíbios, passarinhos, artrópodes, dife-renças mínimas no peso dos animais podem trazer importan-tes informações sobre seu comportamento.Há ainda alguns outros equipamentos que eu gosto de ter sem-pre à disposição, pois eles podem apresentar usos diversos.

● Aquário / terrário – Além de servir para acondicionamento de peixes, um aquário pode ser facilmente convertido em um terrário. É um recipiente barato, portanto não entre nessa de pagar caro e prefira o “faça você mesmo”. A vida é para ser divertida. Veja bem: o que é um aquário além de cinco lâminas de vidro e um tubo de cola de silicone unidos com muita paci-ência e capricho?O mais importante é como você vai montar o aquário. Há mui-tas dicas sobre isso em revistas e livros de aquariofilia. Eu sem-pre montei aquários muito simples e que quase não me dão trabalho com manutenção:

1) Uma placa perfurada no fundo, com um tubo plástico, onde entra uma bomba submersa (o chamado filtro bio-lógico) vai puxar a sujeira para o fundo.

2) Cubra a placa com uma camada de lã de vidro ou manta acrílica, depois cascalho fino, areia fina e lavada, casca-lho fino e cascalho grosso, nessa ordem, de baixo para cima. Coloque plantas verdadeiras – nada de plástico.

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Parte 2 ♦ Guia introdutório ao comportamento animal

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Vallisneria spiralis é uma ótima opção, por ser uma plan-ta muito resistente. Está pronto o seu aquário (figura 2.6).

Dicas importantes:

► Muito barulho de bomba de ar e muita iluminação podem causar estresse excessivo nos animais. Por isso, a bomba e a iluminação devem ser ligadas por pouco tempo, o suficiente para puxar a sujeira para o meio das pedrinhas.

► Dois banhos de luz, de duas horas por dia, costumam ser sufi-cientes.Se você pegar este mesmo aquário e, em vez de enchê-lo de água, colocar nele folhas secas, algumas pedras e galhos e um pouco de areia fina no fundo, poderá transformá-lo em um terrário para lagartos e aranhas, por exemplo. Esse terrário pode ainda ser um excelente microestúdio fotográfico para fazer registros de insetos e outros animais que, no campo, fugiriam.

iluminação

Cascalho fino e grosso

areia

Cascalho fino

Manta acrílica

Placa perfurada - base do filtro

Figura 2.6. Esquema geral para montagem de um aquário simples, básico. Mo-delo para estudos com água doce.

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Introdução à Ecologia Comportamental ♦ um manual para o estudo do comportamento animal

Se, de alguma maneira, insetos estiverem envolvidos em seu estudo, montar uma coleção de insetos é muito bom. Há inúmeros livros de entomo-logia, escritos ou traduzidos para as mais diversas línguas ensinando como fazer isso5. É bem simples: basta uma caixa de madeira (30cm de largura, 45cm de comprimento, 7cm de altura) com uma tampa de vidro. No interior, uma placa de isopor (1cm) que cubra todo o fundo servirá para o iniciante fixar os animais coletados, que devem ser montados da forma correta5. Visite uma coleção de insetos em um museu de zoologia perto de você, quando tiver a oportunidade. É muito interessante.

Muitos outros utensílios e equipamentos poderiam ser descritos aqui como ferramentas básicas para o estudo do comportamento animal. Como já foi dito, use seu bom senso: não adquira todos os materiais de uma só vez. Veja antes o que você vai precisar e peça dicas a colegas mais experientes.

Há ainda uma ferramenta que, sem ela, você não fará nada. Ela se cha-ma curiosidade! Ser curioso é fundamental para ser um bom biólogo, um ex-celente etólogo e um ecólogo comportamental de primeira linha. Curiosidade pode ser treinada, portanto treine essa sua capacidade. Como? Saia da frente da televisão, de seu amado computador, fuja dos convites de páginas de bate-papo. Leia mais, converse mais com os colegas. Vá bater papo de verdade com amigos, cara a cara e preste atenção nos movimentos, nos detalhes, nos dife-rentes sorrisos, nas nuances. Vá ao campo, a um parque, a um quintal florido. Feche os olhos e tente ouvir, tape os ouvidos e tente enxergar mais longe, tente sentir os cheiros das flores à distância. Se você quer ser um ecólogo compor-tamental do primeiro time, você precisa ser uma pessoa curiosa, atenta aos detalhes e paciente. Isto vai inclusive aumentar suas percepções humanas.

2.3. Conhecendo o objeto de estudo

Muito bem, estamos caminhando em nosso aprendizado. Até aqui, já vimos:

þ um pouco da história do Comportamento Animal, da Etologia e da Ecologia Comportamental;

þ que é muito importante ser curioso e gostar do que se vai estudar;þ que existem algumas regrinhas básicas, tais como o uso correto de

alguns termos;þ que há um monte de materiais simples, baratos que podem ser muito

úteis;þ que uma pessoa comum, curiosa, estudiosa e dedicada pode se ani-

mar a fazer um bom trabalho de pesquisa em comportamento.

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Parte 2 ♦ Guia introdutório ao comportamento animal

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Neste capítulo, vou continuar chamando sua atenção para alguns pon-tos muito básicos, mas que muita gente esquece e acaba, desnecessariamente, passando por dificuldades, quando vai realmente iniciar seu estudo. Um des-ses pontos básicos é que, após escolher qual será seu objeto de estudo, animal ou grupo de animais, você precisa se familiarizar com a anatomia e também com comportamentos comuns do grupo a ser estudado. Como você pretende descrever o comportamento de um animal se você não sabe os nomes corretos das diferentes partes do corpo desse animal? Vejamos a seguinte descrição: “Um Diptera, Sepsidae, pousou sobre o ramo mais apical da planta, tocando com os tarsos do primeiro par de pernas nos nectários extraflorais. A seguir, o animal dobrou as tíbias anteriores e apoiou o clípeo sobre a base do nec-tário”. Muito bem, o problema já começa se eu não sei o que é um Diptera (moscas, mosquitos, pernilongos). Se não sei como é um espécime da família Sepsidae, pode complicar, pois há moscas enormes, de mais de 7 centímetros de comprimento, e um Sepsidae pode ser menor que um pernilongo. Tenho que saber também o que é um trocanter, uma tíbia, um tarso, um clípeo etc. Tenho que estar familiarizado com os nomes das partes do corpo do animal, para poder descrevê-lo (figura 2.7).

Figura 2.7. Desenho esquemático de um Diptera: Sepsidae com os nomes de algumas das partes de seu corpo.

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Introdução à Ecologia Comportamental ♦ um manual para o estudo do comportamento animal

Dependendo do estudo que você está fazendo, não apenas os nomes das partes do corpo do animal que você estuda serão suficientes. Se esse ani-mal vive em plantas (dentro de uma flor, por exemplo), você precisará saber os nomes das diferentes estruturas florais.

Se você estiver no campo ou no laboratório, observando e descrevendo um comportamento e, num determinado momento, não se lembrar do nome de alguma estrutura necessária para sua descrição, faça um desenho esque-mático do animal e marque a estrutura em questão. Saber desenhar é uma arte, um dom que pode ser aprimorado. Mesmo que você não tenha esse dom, nada o impede de fazer um esquema, um esboço que lhe permita lembrar a forma e localização de uma estrutura, para depois registrá-la adequadamen-te na sua descrição. Conheço algumas pessoas que desenham relativamente bem, mas não sabiam disso, simplesmente por nunca antes terem tentado. Tente! Quem sabe, você não é uma dessas pessoas?

Qual o horário de atividade do animal que você pretende estudar? Esta é outra importante questão. Você precisa saber disso para saber em que horas irá para o campo e para ter uma ideia mais clara do tipo de material que vai precisar.

O animal que você pretende estudar apresenta algum tipo de sazona-lidade? Ou seja, ele fica mais ativo em um determinado horário do dia, mais do que em outros? O tipo de alimento preferido varia com a época do ano? Quanto tempo ele vive? Quanto tempo ele demora para atingir a vida adulta? Qual a razão sexual (machos x fêmeas) da espécie? Ele tem um período espe-cífico para se reproduzir? Há muita diferença entre o tipo de vida dos jovens e dos adultos? Ele pode migrar?

Imagine uma lagarta de borboleta e uma borboleta adulta... Quanta di-ferença!

Dessa forma, toda e qualquer informação disponível na literatura existente vai ser importante, mas algumas delas você mesmo terá que des-cobrir.

Quando, onde e o que estudar!

2.4. Familiarizando-se com o animal e com o ambiente

Entre estudar no campo e em laboratório, há quem prefira mil vezes o campo, quem não queira sair do laboratório por nada deste mundo e quem se dá bem nos dois ambientes. Nos estudos de comportamento, mesmo que você não goste, que não se sinta muito bem em um ou outro ambiente, tan-to o laboratório, quanto o campo, poderão trazer respostas complementares

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Parte 2 ♦ Guia introdutório ao comportamento animal

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ou confirmações definitivas para suas questões. Por isso, é bom ter a men-te aberta para a possibilidade de explorar um local de trabalho no qual, a princípio, não se sinta muito confortável. Muitos alunos que já foram para excursões de campo comigo abominando a ideia de ir ao campo, acabaram gostando. Muitas vezes, esqueceram as dificuldades e se admiraram com as belezas a sua volta (figura 2.8). Mas o oposto também ocorre e até com certa frequência.

A B C

D E F

Figura 2.8. No alto, pesquisadores em um barco observando botos, trabalhan-do com biologia de polinizadores e escavando um ninho de formi-ga. Abaixo, a paisagem à frente dos pesquisadores, no momento em que executavam seu estudo de campo.

Uma coisa muito importante é você não trabalhar com limitações pes-soais. Se não gosta mesmo de trabalho de campo, ajuste seu interesse às con-dições de estudos manipulativos em laboratório. Se não tolera ir ao campo à noite, fica com sono, ou tem receio, fobias, não lute contra suas limitações individuais, se elas forem fortes. Isso só lhe trará sofrimento e problemas para seu estudo (possivelmente falhas). Se não sabe nadar, evite os rios, lagos e o alto mar.

As mesmas ponderações que faço em relação ao ambiente de trabalho também valem, ainda com mais propriedade, para o objeto de estudo. Veja as fotos a seguir (figura 2.9).

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Introdução à Ecologia Comportamental ♦ um manual para o estudo do comportamento animal

A B C

Figura 2.9. A. Lagarta de borboleta se alimentando em folha de Polteria ramiflora (Sapotaceae). B. Aranha migalomorfa. C. Cascavel (gê-nero Crotalus).

Você imagina que tem gente que morre de paixão pela caranguejeira da foto central? Pois é, tem maluco pra tudo nesse mundo, não tem? Mas se você é como eu, e tem medo só de olhar para a foto, porque vai inventar de trabalhar justamente com o comportamento dessas aranhas? Esta aí era maior que a minha mão! Tirei a foto para um aluno que queria muito. Ao me deitar ao lado da aranha, pedi que ele ficasse com um pedaço de pau na mão, pronto para evitar que ela se virasse para mim. Eu disse a ele: “Se ela pular em mim, eu mato você depois!”.

Não lute contra suas limitações individuais, quando elas são muito for-tes – não vai dar certo. Você vai ter medo, receio, ou nojo e não vai conseguir registrar os dados com a mesma facilidade, paciência e determinação que fa-ria com um animal que não lhe causa nenhum transtorno, ou pelo contrário, que lhe cause prazer. Isto é o que você deve procurar. Se você sente atração ou curiosidade pelas cascavéis (figura 2.9), vá em frente! Devem ser animais fan-tásticos. O importante é que você se sinta bem, confiante, que goste do animal e do ambiente no qual estuda. Isto é fundamental para o desenvolvimento de um bom estudo.

Problemas físicos e limitações pessoais também têm que ser bem tra-balhados. Se você tem problemas na coluna, como vai ficar sentado por muito tempo, em uma mesma posição? Você deve procurar um trabalho de campo ou laboratório que não tenha esta exigência, ou que, de tempo em tempo, per-mita uma pausa. Se você não enxerga bem, ou não escuta bem, vá ao médico, procure resolver o assunto antes de iniciar seu estudo. Em geral, para tudo há uma saída, na maioria das vezes, mais simples do que imaginamos. Seja flexível em suas escolhas: a vara que verga mas não se parte é a que perdura.

Para poder fazer um bom estudo, você deve examinar previamente as condições climáticas do ambiente natural onde vai trabalhar. Procure saber se há condições que exijam algum cuidado especial. Características simples do clima, comuns, como uma brusca virada de tempo, com queda de tempe-

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Parte 2 ♦ Guia introdutório ao comportamento animal

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ratura acentuada, ou com pancadas de chuva, já podem prejudicar muito seu esforço de campo. Uma ida ao campo mal planejada pode resultar em frus-tração, em gasto financeiro desnecessário e mesmo em acidentes. Eu sempre procuro saber se há possibilidade de chuvas fortes, a que horas o sol vai nas-cer e se pôr, quais são as características fenológicas da vegetação, no período do estudo. Vou explicar: na savana tropical, por exemplo, na estação seca, há poucas plantas disponíveis para consumo pelos herbívoros, há poucos insetos no campo, os mamíferos e aves ficam mais expostos e você consegue enxergar longe na vegetação, pois ela fica aberta. Podem também ocorrer incêndios, o que é um grande problema e perigo. No sul da Austrália, os meses de janeiro e fevereiro têm sido terríveis, nesse sentido. Na estação chuvosa, a paisagem muda completamente nas savanas. No Brasil, dentro de uma savana típica, fica quase impossível você enxergar além de três ou quatro metros. As plan-tas ficam cheias de folhas verdes, há muitos insetos, o calor é intenso e você ouve, mas não vê as aves. Enfim, ao longo das estações, sua área de estudo vai mudar, portanto esteja atento a isto.

Assim como o ambiente se transforma, o comportamento do seu ani-mal de estudo, ou algumas de suas características anatômicas também podem mudar. Muitos passarinhos trocam de plumagem entre as estações, mudam o tipo de canto e podem migrar. Às vezes, a mudança é drástica dentro de um mesmo dia. Os jacarés (Caiman crocodilus), por exemplo, passam a maior parte do dia repousando e caçando por espreita, economizando energia e aprovei-tando qualquer oportunidade de alimento fácil. Mas, durante a noite, ficam muito ativos, ocupam todo o leito dos rios e passam a perseguir suas presas, peixes, na maioria das vezes, com grande voracidade (figura 2.10).

Figura 2.10. Jacarés (Caiman crocodilus) em um rio do Pantanal matogrossen-se, repousando durante o dia (à esquerda). Durante a noite (à di-reita), podem ser vistos através do brilho dos olhos refletindo à luz de lanternas, se deslocando constantemente por todo o leito do rio.

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Introdução à Ecologia Comportamental ♦ um manual para o estudo do comportamento animal

Antes de começar um estudo, procure aprender tudo que puder sobre o seu objeto de estudo. Procure saber também sobre os outros animais com os quais ele interage e sobre animais que podem representar algum perigo ou incômodo a você, na área de estudo. Já vi gente enlouquecer, literalmente, no pantanal Paraguai-Brasil, com a infinidade de pernilongos que atacam nos finais de tarde. Algumas pessoas se desesperam, ou simplesmente caem no sono, com trabalhos noturnos, outras não aguentam o calor ou o frio intenso. Somos animais muito vulneráveis e limitados em muitos aspectos, por isso devemos respeitar nossos limites, assim como aqueles impostos pela natu-reza.

Parte do conhecimento animal é também reconhecer que o universo sensorial dos animais é diferente do nosso. Assim sendo, apresentamos dife-renças em percepção nos cinco sentidos: visão, audição, olfato, paladar e tato. A compreensão desses aspectos vai evitar que você cometa muitos erros em seu estudo, como veremos mais à frente.

2.5. Métodos clássicos de observação de comportamento

Agora, vamos começar a entrar em uma fase mais técnica do livro. Da-qui para frente, vamos começar a orientá-lo no sentido de aprender a como elaborar um projeto de pesquisa em comportamento e ecologia comporta-mental.

Ao longo de todo o desenvolvimento do estudo do Comportamento Animal, biólogos, psicólogos, naturalistas, veterinários e médicos têm buscado por métodos e técnicas comuns que permitam principalmente a padronização e a comparação entre estudos. Na sequência, vou descre-ver e exemplificar as quatro técnicas de amostragem de comportamento mais comumente indicadas6: amostragem de todas as ocorrências, amos-tragem de sequências, amostragem instantânea e amostragem do animal focal.

a) Amostragem de todas as ocorrências – Em inglês, você irá encontrar o termo all occurrence sampling, o que, na verdade, significa realizar uma amostragem de comportamento à vontade, ad libitum. Nesse caso, você registra tudo que você está observando. Nesse momento, tudo que o animal faz ou deixa de fazer é parte de seu interesse. Este método é vantajoso em várias situações, por exemplo, no início do projeto, na fase de familiarização com seu objeto de estudo. É bom também na padronização da metodologia que você vai usar e no estabelecimento da confiabilidade intra e interobservadores.

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Parte 2 ♦ Guia introdutório ao comportamento animal

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Considero este método básico, na fase de qualificação dos compor-tamentos para a elaboração de um repertório comportamental ou etograma. Aguente firme, pois, um pouco mais à frente, explicarei como planejar uma proposta de estudo e falarei de etogramas. Não ponha a carroça na frente dos bois! É importante que você siga a sequência dessa leitura para que este livro realmente o ajude a se orientar.Esta técnica de amostragem à vontade é também muito interessante para o registro de comportamentos fortuitos, raros ou inesperados. Já pensou se você está no campo, observando um casal de urso-de-óculos (Tremarctos ornatus), uma rara espécie que vive nos Andes, e tem a oportunidade de observar todo o seu comportamento de corte e cópula? Anote tudo, pois pode ser que ninguém nunca mais veja isso novamente!

b) Amostragem de sequências – Este é o tipo de amostragem na qual a ordem dos eventos é o que importa. Você está observando um evento que ocorre em etapas, e cada detalhe é importante. Então, você não pode perder o animal de vista, o que torna difícil regis-trar tempo, frequência e o comportamento de outros indivíduos (se for um grupo) e, até mesmo, fazer as anotações fica compli-cado. Se for possível usar um gravador ou uma filmadora, essa é uma daquelas situações onde esses equipamentos podem fazer a diferença.Mas quais são as situações para o emprego da sequence sampling? Por exemplo, na descrição de um evento de corte e cópula. Como o ma-cho reage ao perceber a presença da fêmea e o que ele faz a seguir? Como se dá a aproximação, a corte, a subjugação da fêmea e, por fim, a cópula? Algumas dessas etapas certamente serão subdivididas em outras sequências mais detalhadas que exigirão toda a sua atenção (figura 2.11).Em algumas situações, o mesmo evento poderá ser observado várias vezes, o que o auxiliará na definição das sequências de amostragem. Em outras situações, você poderá estar lidando com um evento não tão frequente, ou mesmo raro, que exigirá de você a capacidade de perceber isso e mudar de método rapidamente. Nesse caso, recorra à amostragem de todas as ocorrências, ao menos em um primeiro momento. Neste tipo de situação, a quantificação de tempo com cro-nômetro, anotações de mudanças de movimentos, deslocamentos e posturas, podem ser necessárias.

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Introdução à Ecologia Comportamental ♦ um manual para o estudo do comportamento animal

Figura 2.11. Exemplo da importância da amostragem de sequências. Corte e cópula em Zelus leucogrammus (Hemiptera: Reduviidae)7. O ma-cho, à esquerda e menor (A), se aproxima frontalmente da fêmea. Com toques usando suas pernas anteriores, o macho se aproxi-ma (B) e vai se posicionando lateralmente (C) à fêmea, fazendo a monta (D), durante a qual toca a cabeça da fêmea com seu rostro. Na fase seguinte, ocorre a cópula (E). Reduvídeos são insetos co-muns em toda a região Neotropical e apresentam comportamen-tos muito interessantes.

c) Amostragem instantânea – Os snapshots, instantaneous samplings ou fotografias de uma situação, são muito utilizados, principalmente, para comportamentos lentos.Já pensou em registrar o comportamento de deslocamento de uma anêmona? A incrível distância de dois centímetros pode levar uma

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Parte 2 ♦ Guia introdutório ao comportamento animal

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semana para ser percorrida. Outra situação interessante é quando você deseja anotar o comportamento de um grande grupo de indi-víduos, por exemplo, uma colônia de formigas. Você tanto pode re-correr ao método da amostragem de todas as ocorrências, quanto, em intervalos regulares de tempo, fazer uma “fotografia”, ou seja, um censo da situação, anotando os atos comportamentais exibidos pelos indivíduos em um minuto, ou no tempo mais adequado para isto. Você também pode ter uma lista de comportamentos e, durante alguns minutos, checar, através de snapshots, quantos indivíduos es-tão executando cada comportamento da sua lista, seguindo item por item da lista. Ao final da primeira checagem, você terá um intervalo de tempo fixo para o início do próximo censo, dentro da mesma ses-são de observação. Em uma amostragem instantânea, os intervalos de tempo devem ser um pouco maiores que os intervalos de tempo em uma amostragem de todas as ocorrências. Isso, porque, na amostragem instantânea, muitas vezes você trabalha com listas de comportamen-tos e, geralmente, com grandes grupos de indivíduos. Além disso, uma amostragem muito rápida pode supervalorizar comportamen-tos mais demorados e desvalorizar comportamentos mais rápidos ou raros.

d) Amostragem do animal focal – Este tipo de amostragem deve ser usado para animais ou grupo de animais que podem ser “facilmen-te” observados. Quando digo “facilmente”, quero que o leitor enten-da isso como uma referência àqueles grupos de animais que per-mitem uma boa aproximação do observador, que se habituam com sua presença. Nesse tipo de amostragem, um indivíduo do grupo é observado em intervalos definidos de tempo, anotando-se seu com-portamento no momento da observação.Quando aplicada em um grupo, a técnica do focal animal sampling pode, na prática, se assemelhar muito a uma sequência de snapshots feitos um a um, sobre cada um dos membros desse grupo. Por exem-plo, imagine um grupo de cinco macacos com o qual você já está familiarizado e é capaz de identificar cada membro do grupo. Você pode construir uma tabela de campo que lhe permita anotar durante cinco minutos o comportamento de cada um dos indivíduos. Como fazer isso? No primeiro minuto, você anota tudo que o “Bocão” está fazendo, ao final desse tempo você passa a anotar os comportamen-tos da “Margarida”, ignorando os outros membros do grupo, exce-to durante as interações. Depois, passa para a “Tica”, o “Lelé” e o “Topete”. Ao final dos cinco minutos, você retorna ao primeiro in-divíduo de sua sequência e vai repetindo esse procedimento até o

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Introdução à Ecologia Comportamental ♦ um manual para o estudo do comportamento animal

término de uma sessão de observação. O “Animal Focal” é uma das técnicas mais empregadas em estudos de comportamento, especial-mente de primatas e em condições de cativeiro.Como você notou pelas descrições desses quatro métodos, que são os mais empregados em etologia (tabela 2.1), pode haver muita sobreposição entre eles. Isso é comum. Portanto, procure definir claramente a metodologia empregada para, nos seus resultados, apontar com clareza qual foi o método predominante em seu es-tudo.Mais uma vez, chamo sua atenção para a importância da leitura. Os artigos científicos já publicados, seguidos pelas teses e dissertações e, por fim, pelos livros didáticos, serão as principais fontes de refe-rência a orientá-lo em sua escolha do melhor método de amostra-gem.

Tabela 2.1. Quadro resumido dos tipos de amostragem e seu uso mais comum em Comportamento Animal.

Tipo de amostragem Situação em que pode ser usada

Todas as ocorrências

● Início de um estudo;● Fase de familiarização com o animal;● Para qualificação de comportamentos;● Para comportamentos raros ou fortuitos;● Para padronização de metodologia

interobservadores.

Sequências● Quando interessa a sequência do comportamento;● Quando um comportamento pode ser dividido

em fases ou etapas.

Instantânea● Para estudo de animais muito lentos;● Para estudo de animais em grandes populações;● Para etogramas de insetos sociais em laboratório.

Animal focal

● Para grupos, quando se pode identificar cada um dos membros do grupo;

● Animais que podem ser individualmente observados com pouca dificuldade na natureza e/ou no laboratório.

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Parte 2 ♦ Guia introdutório ao comportamento animal

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2.6. Dicas para estudar o comportamento de invertebrados

Onde quer que você esteja, a maioria dos animais será formada por invertebrados e mais de dois terços dos animais existentes serão artrópodes. Esta é uma estimativa que, a cada dia mais, se torna confiável. Devido a esta enorme abundância, há inúmeras espécies e muitos gêneros e famílias, to-talmente, ou quase completamente, desconhecidas da ciência. A diversidade representada pelo número de espécies irá refletir em uma diversidade pro-porcional de diferentes tipos de comportamentos exibidos por esses animais, com a finalidade de solucionar os três problemas básicos de todo organismo: crescer e se desenvolver (figura 2.12A), sobreviver (figura 2.12) e se reproduzir (figura 2.12C).

A B C

Figura 2.12. As lagartas de borboleta (A) em fase de crescimento e desenvol-vimento precisam se alimentar, além de fugir de seus predadores, pois tanto as borboletas jovens quanto as adultas (B) são alimento de muitos consumidores secundários e terciários da cadeia trófi-ca. A maioria das borboletas coloca seus ovos em folhas, botões florais (C) e flores de angiospermas.

Sendo assim, tanto as formas jovens quanto os invertebrados adultos representam uma excelente oportunidade de estudo para naturalistas e etó-logos em todos os níveis, desde leigos até os profissionais mais graduados. Há desde pesquisadores que estudam o comportamento de protozoários do rúmen de bovinos e equinos8 até aqueles que estudam os complexos compor-tamentos sociais em artrópodes9 – as possibilidades são infinitas. Como em tudo, há vantagens e desvantagens para se escolher um invertebrado como modelo de estudo. Na tabela 2.2, tentei listar as principais características po-sitivas e negativas para o estudo desse grupo, em especial dos artrópodes, quando comparados à maioria dos vertebrados.

Minha história com os invertebrados, em especial com os insetos e aracnídeos, é uma história de coincidências, acasos e oportunidades. Como

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Introdução à Ecologia Comportamental ♦ um manual para o estudo do comportamento animal

todo jovem biólogo ou amante da natureza, a princípio, também fui seduzido pelas maravilhas do mundo dos vertebrados: as baleias cantantes, o golfinho Flipper, o cachorro Rin-tin-tin, Elza, a leoa africana, os gorilas das montanhas, Chita, a macaca que acompanhava o Tarzan... enfim, toda a bicharada dos filmes de nossa infância – a minha certamente mais antiga que a da maioria dos leitores. Como dizem meus filhos, minha infância deve estar num tempo muito, muito distante! E não podemos esquecer os primeiros documentários da vida selvagem que nos encantavam, na década de 1970. Hoje, há inúmeros programas de TV aberta e por assinatura que usam e abusam do mundo na-tural e são ainda mais cativantes. Mais recentemente, para nossa surpresa, fil-mes sobre escorpiões, formigas e invertebrados marinhos também começam fazer parte desse repertório. Mas o fato é que a maioria dos estudantes que nos procura está atrás de golfinhos, primatas, outros mamíferos e aves. Em geral, são animais mais difíceis de serem estudados e cujos estudos demoram bem mais para surtirem os resultados esperados: apresentações robustas em congressos e publicações científicas.

Com o tempo, aprendi a não desestimular nenhum tipo de estudo, ne-nhum tipo de vontade louca de um jovem estudante. A gente nunca sabe onde pode estar um novo Darwin, Wallace, Bates, Müller, Timbergen ou Mayr – quem sabe? Procuro ajudar, dosando a ansiedade do aluno, orientando sua leitura, mostrando os custos e benefícios de sua decisão. Gosto de mostrar aos estudantes as enormes possibilidades e o amplo e desconhecido universo que existe no mundo escondido dos invertebrados. Se você procura por sangue e glória, olhe bem para as formigas e aranhas (figura 2.13), pois elas têm tudo isso em seu repertório comportamental.

Tabela 2.2. Principais vantagens e desvantagens para se ter um invertebrado, em especial um artrópode, como modelo de estudo em comportamento. As características foram descritas para os grupos mais comuns e abundan-tes, tanto em ambientes tropicais, quanto temperados.

Vantagens Desvantages

● São muito abundantes e muito diversos. Há sempre um perto de você.

● Devido à grande diversidade, há muitos problemas taxonômicos, muitas espécies novas com caracte-rísticas totalmente desconhecidas.

● Há maiores chances de encon-trar novos comportamentos, coisas diferentes e estimulan-tes para estudar.

● A maioria dos invertebrados possui hábitos crípticos.

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Parte 2 ♦ Guia introdutório ao comportamento animal

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Continuação Tabela 2.2

● Seu curto ciclo vital permite acompanhar toda a vida do animal em estudo, no inter-valo de semanas ou alguns meses.

● Seu curto ciclo de vida permite pou-cos – ou não permite – erros no estu-do, pois pode não haver tempo para mudanças.

● Muitos são de fácil captura, marcação e manutenção em condições laboratoriais.

● Por serem pequenos, podem fugir mais facilmente.

● O fato de serem pequenos facilita seu acondicionamento, transporte e manutenção.

● Por serem pequenos, os detalhes de seus comportamentos são mais difí-ceis de serem observados.

● Permitem manipulações. ● Muitos são agressivos, peçonhentos, urticantes, ou vetores de doenças.

● Há menores restrições legais para coleta e manipulações experimentais.

● A sazonalidade de muitas espécies pode permitir con-centrar seus estudos de campo em uma determinada época do ano.

● A sazonalidade de muitas espécies, com período curto de presença visí-vel no campo, limita muito as chan-ces de sucesso do estudo.

● Podem se reproduzir com fa-cilidade, mesmo em condições laboratoriais.

● Podem ser muito susceptíveis a parasitoides (insetos que parasitam matando o hospedeiro).

● Muitas espécies não apresen-tam inibição de seus princi-pais comportamentos, mesmo em condições laboratoriais, ou na presença do observador.

● Apresentam um universo sensorial totalmente distinto do nosso. Fica difícil saber se as condições labora-toriais, ou se nossa simples presença no campo, realmente não interfere no comportamento dos animais ob-servados.

*Há inúmeras exceções que se aplicam a ambas as colunas.

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Introdução à Ecologia Comportamental ♦ um manual para o estudo do comportamento animal

A B C

Figura 2.13. A. Uma trilha de formigas-correição (army-ants), predando tudo que encontra pela frente, no chão de savanas e florestas. B. Uma formiga Ponerinae (Pachycondyla), predando um besouro (Staphilinidae) sobre uma planta. C. Uma aranha Lycosidae com um pequeno gafanhoto em suas quelíceras.

Se você quer um pouco de romance, intriga, sexo e drogas, a vida sexu-al das abelhas e as flores que visitam, cheias de óleos, resinas, odores e outros produtos químicos de origem vegetal, pode ser exatamente o que procura (fi-gura 2.14A). Mas se mistério, perseguições implacáveis, estratégias ousadas e agressivas deixam você excitado, as disputas entre vespas e aranhas são uma excelente oportunidade (figura 2.14B).

A B

Figura 2.14. A. Abelha Halictidae inspecionando flores de Malpiguiaceae (Byrsonima intermedia), de onde retirará óleos essenciais para a criação e o desenvolvimento de suas larvas. B. Vespa Pompilidae capturando e paralisando uma aranha (Araneidae), a qual levará para um abrigo subterrâneo, onde depositará seu único ovo, do qual sairá uma larva que, lentamente, devorará a aranha, parte por parte.

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Tudo que eu pensava ser possível encontrar apenas em estudos com grandes animais: emoção, entusiasmo, excitação, para minha enorme surpre-sa, acabei encontrando, com muito mais facilidade e abundância, no mara-vilhoso mundo das pequenas criaturas que nos rodeiam, o qual eu estimulo fortemente que você explore, ao longo de sua decisão sobre o que estudar.

Para trabalhar com invertebrados, a primeira coisa a se decidir é se o estudo envolverá campo, laboratório ou ambos. Na sessão de Ecologia Com-portamental, você verá que este é um dos grandes trunfos de se trabalhar com invertebrados. Você pode combinar estudos de campo e laboratório para responder a perguntas mais complexas, que lhe permitam testar a função adaptativa de comportamentos. Em sua maioria, são estudos complementa-res, que podem ser multidisciplinares. Por exemplo, para entender o que uma formiga faz com a semente que carrega entre as mandíbulas, experimentos de laboratório podem mostrar se ela consome toda a estrutura ou se auxilia na germinação da semente.

Outro ponto importante a decidir será o horário de trabalho. Eu, por exemplo, prefiro imensamente trabalhar durante o dia, com luz natural, de forma a enxergar melhor o que acontece, embora muitas das coisas mais in-críveis que já observei no campo, eu tenha observado durante a madrugada. Então, escolha um animal diurno, ou noturno, ou crepuscular, e veja como o estudo se adéqua aos seus interesses ou possibilidades. O importante é você se sentir bem no horário que escolheu para trabalhar.

Em geral, no campo, precisamos de um maior número de equipamen-tos e utensílios para trabalhar com invertebrados do que com vertebrados. Pelo simples motivo de que podemos capturá-los, medi-los, pesá-los e marcá-los. Assim sendo, lembre-se de levar tudo que poderá necessitar, em uma boa e prática caixa ou mochila de campo: linhas, tesouras, pinças, canetas, tintas de marcação, papel celofane vermelho, lanterna, potinhos de vários tama-nhos para coleta, puçá, lupas etc. Uma vantagem é que, apesar de ser em nú-mero maior, os utensílios para trabalhos com invertebrados, geralmente, são baratos, mais leves e, muitas vezes, podem ser improvisados.

Esteja sempre atento a tudo que ocorrer à volta de seu objeto de estudo: insetos, aranhas, caranguejos e camarões podem, com facilidade, estar intera-gindo com algum aspecto biótico ou abiótico do meio, sem que você perceba isso. Mesmo que seja um animal desconhecido, deve haver alguma literatura disponível sobre um animal próximo, procure ler essas informações antes de ir ao campo ou de iniciar seus estudos de laboratório. Para manter o animal em condição de cativeiro, essas informações são ainda mais preciosas: de que temperatura e umidade ele gosta? Do que e quanto se alimenta? É básico sa-ber essas coisas.

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Na manutenção em laboratório, alguns animais são incapazes de voar e subir em paredes de vidro, o que facilita muito na prevenção das indesejá-veis fugas. Quando os bichos são bons escaladores, há algumas substâncias químicas que podem ser passadas nas paredes ou nas bordas do recipiente, para impedir sua fuga. Se você não quiser usar nenhum produto químico, um recipiente menor, dentro de outro maior com água, muitas vezes resolve.

A maioria dos invertebrados sobrevive bem em condições ambientais normais, mas em regiões muito quentes, ou muito frias, ou muito secas, em algumas épocas do ano, o uso de câmaras climatizadas pode ser adequado. Algumas dessas câmaras são do tamanho de uma geladeira grande normal (de 220 a 370 litros) e possuem controle de fotoperíodo, temperatura e umida-de – não são muito caras e podem ser obtidas nas principais universidades.

Na maioria das vezes, principalmente para o iniciante, materiais sim-ples e questões que podem ser respondidas no campo são mais adequadas no estudo do comportamento de invertebrados. Devido a sua abundância, facilidade de localização e observação na natureza e possibilidades de ma-nipulação, esses intrigantes animais costumam cativar e estimular os novos naturalistas, com respostas claras e, muitas vezes, rápidas de questões envol-vendo os mais variados assuntos, como reprodução, predação e socialidade.

Em seus estudos iniciais, priorize escolher um animal comum, vistoso, diurno, de fácil localização, captura e observação, como borboleta, besouro, abelha ou formiga. Com esses animais, você poderá aprender mais rapida-mente a dominar a metodologia da área. Isto é valido! Mesmo para quem está mais interessado em trabalhar com vertebrados. Aprenda os métodos, tendo um inseto como modelo!

2.7. Dicas para estudar o comportamento de vertebrados

Peixes, raias, sapos, lagartos, serpentes, tartarugas, passarinhos, ratos, cachorros, golfinhos, macacos e muitos outros são, sem dúvida alguma, ani-mais fascinantes. Especialmente, os que apresentam algum grau de sociali-dade, como canídeos, felinos, primatas, são ainda mais cativantes para nós humanos, justamente por sermos também animais sociais. Por isso, muitas pessoas ficam até mesmo emocionadas quando estão realizando um estudo de comportamento com vertebrados. Há alguns anos, assisti à filmagem de um estudo de condicionamento operante voltado para o bem-estar animal, com enriquecimento ambiental. O estudo foi feito em zoológico por uma cole-ga que conseguiu retirar um gorila adulto de uma situação de total estresse. A colega deixava uma câmera ligada enquanto trabalhava e, numa das últimas filmagens, em um dado momento, ela se distraiu e encostou a cabeça na jaula. O gorila se aproximou sem que ela percebesse e, num suspense terrível para

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a plateia, que imaginava que algo ruim fosse ocorrer, o animal simplesmente acariciou os cabelos da pesquisadora, que ficou paralisada. Metade da plateia de etólogos que assistia a esta palestra caiu em lágrimas de emoção.

Pois é, não espere isso de uma borboleta! Mas, por outro lado, embora esta cena seja realmente emocionante, ela não faz parte do cotidiano de nosso trabalho, infelizmente. Muito poucos zoológicos dão condições ideais para trabalhos de observação e menos ainda para manipulações. Em situação de campo, avistar o objeto de estudo pode demorar horas, dias, ou meses como é o caso de colegas que trabalham com baleias jubartes. Inúmeras teses co-meçam com a Ecologia do comportamento do macaco fulano de tal e terminam com Fenologia das plantas utilizadas pelo macaco fulano de tal ou Germinação das sementes encontradas nas fezes do macaco Tião e assim por diante. Não quero desanimá-lo, mas quero apenas alertá-lo para a realidade de que seus estudos não serão mil maravilhas. Mas os persistentes, os estudiosos, os verdadeiros amantes da história natural terão sua recompensa (figura 2.15).

Figura 2.15. Cópula de golfinhos-rotadores (Stenella longirostris), de Fernando de Noronha. Fotografia feita por José Martins da Silva Jr., depois de muitas e muitas horas de mergulho.

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Introdução à Ecologia Comportamental ♦ um manual para o estudo do comportamento animal

No geral, para aumentar o sucesso de iniciantes em estudos com ver-tebrados, sugiro que se escolha um animal diurno, de fácil visualização, que permita uma boa aproximação e que tenha boa tolerância quanto à presença do observador. É imprescindível que o pesquisador seja calmo, paciente e es-teja preparado para o fracasso. São tantos os problemas que podem surgir em um estudo com alguns grupos de vertebrados que muitas pessoas rapida-mente se desestimulam e desistem do estudo. Outros atropelam os métodos, querem resultados a qualquer custo e acabam por comprometer todo o traba-lho e o pior: sua credibilidade.

Problemas que podem surgir e que costumam desestimular os pes-quisadores:

1) Embora o objeto de seu estudo seja interessante – o animal de seus sonhos – ele foge de sua presença, e você só consegue saber um pou-co de seu comportamento através de vestígios deixados, marcas de sua atuação no ambiente, como galhos partidos, pegadas e fezes, o que é muito é comum para canídeos, felinos, golfinhos e muito ou-tros mamíferos.

2) Inibido pela sua presença, o animal fica tímido e não se habitua. Mesmo em cativeiro (animais de zoológico), ele não faz nada, o que é comum para primatas e felinos.

3) O animal é muito rápido, não fica parado o tempo suficiente para que você compreenda um pouco do que ele está fazendo, o que é comum para aves.

4) Como os grupos são muito grandes, você não consegue focar em algum ou alguns indivíduos e o trabalho não se desenvolve, o que é comum para aves e peixes.

5) O ambiente do seu animal de estudo é diferente do seu ambiente na-tural e você simplesmente não consegue se adequar, ou não se sente satisfeito com as limitações impostas pelo estudo. O pesquisador fica frustrado, o que é comum para animais aquáticos e também para animais noturnos.

Dicas para minimizar problemas e aumentar suas chances de su-cesso:

1) Procure se familiarizar ao máximo com seu objeto de estudo, leia sobre ele, a fim de aprender sobre sua anatomia, capacidades per-ceptivas, forma de vida, alimentação, reprodução, se é territorial etc. Enfim, aprenda tudo que for possível.

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2) Antes de iniciar o estudo, faça observações preliminares. Anote tudo que vir o animal fazendo, anote livremente, sem preocupações.

3) Sabendo do horário de atividade do animal, chegue antes ao local de trabalho e prepare-se para já estar com tudo pronto quando ele entrar em atividade.

4) Use roupas discretas, de cores camufladas, pois cores chamativas podem inibir ou afugentar o animal.

5) O cheiro do pesquisador pode elicitar ou inibir comportamentos, portanto evite desodorantes perfumados. É melhor usar antitrans-pirante inodoro. O mesmo é válido para protetor solar e repelente de insetos.

6) Não faça barulhos, caminhe com suavidade, evite conversas e equi-pamentos que produzem ruídos, músicas e sons (principalmente os agudos).

7) Se conhecer alguém que já trabalhou com o “seu” animal, ou algum parecido, converse bastante, peça dicas e opiniões, faça isso sem re-ceio de parecer idiota. No começo, todo mundo faz perguntas idio-tas. Pior é quem pensa que já nasceu sabendo!

8) Escolha um animal que esteja dentro de suas capacidades físicas para acompanhá-lo no campo. Por exemplo, se você não sabe nadar, como vai mergulhar para ver peixes em corredeiras? Se você está comple-tamente sem preparo físico, como vai seguir muriquis (Brachyteles arachnoides, macacos também conhecidos como monos-carvoeiros), por quinze horas seguidas, na mata fechada? Ou estudar os carnei-ros das montanhas? Tenha bom senso e humildade nessa escolha.

9) O seu primeiro animal deve ser abundante, atrevido (não se inibe com humanos), conspícuo (vistoso e não se incomoda com isso), diurno, de anatomia bem conhecida e descrita, já ter uma boa ba-gagem de conhecimento existente sobre ele ou sobre algum parente próximo.

Bom, pela dica número 9, você pode estar pensando agora: “Poxa, esse cara quer que eu trabalhe com gato, galinha, cachorro!”. Não é má ideia para treinar, antes de escolher um animal silvestre. Mas acredite em mim, há muitos animais silvestres, especialmente nos trópicos, que vivem dentro dos ambientes das cidades, que atendem a todos os pré-requisitos do item 9 e são praticamente desconhecidos da ciência, no que diz respeito a ecologia e comportamento. Aqui no Brasil, há desde sapos, até serpentes, lagartos, aves e mesmo alguns macacos que se encaixam nestas exigências.

Eu aconselho muito que você faça um curso de fotografia, básico, pelo menos para aprender a usar direito os recursos de sua câmera ou filmadora.

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Quem trabalha com vertebrados vai ter a chance de fazer fotos incríveis e, até mesmo, ganhar algum dinheiro com isso. Então, esteja preparado para não falhar na hora certa. É muito bom também fazer parte de uma equipe, poder se revezar nas observações ou ter companhia de campo. Além disso, um mesmo animal pode fornecer material para diversas dissertações e teses distintas. Muitas vezes, os dados podem ser colhidos simultaneamente. Esta é uma das grandes, ou melhor, uma das enormes vantagens de trabalhar com vertebrados. Devido à convivência de campo entre os colegas, amizades de uma vida inteira podem surgir. Um pode querer matar o outro também, mas nem é bom falar nisso! Pense positivo!

2.8. Marcando seus animais para estudo

Em muitos estudos com invertebrados ou vertebrados, é importante que o pesquisador saiba exatamente “quem” é o animal que está observando, medindo, pesando etc. Nesta parte do nosso pequeno guia ao estudo do com-portamento, vou dar algumas dicas práticas para você poder marcar, possi-velmente com sucesso, seu animal de estudo.

Bom, aqui começam outros problemas, você vai por as mãos no animal. Se você vai capturar algum animal para identificação, para coleção científica como material testemunho, trate de obter uma licença do orgão governamen-tal responsável. Cuide-se, pois as leis de proteção à fauna e flora silvestres estão cada vez mais rigorosas e a fiscalização está cada vez mais atuante, prin-cipalmente nos países de grande biodiversidade. A preocupação maior é com traficantes de animais e biopiratas. Infelizmente, mesmo alguns colegas de profissão sacrificam desnecessariamente animais de estudo. Por esse motivo, também somos constantes alvos de fiscalização.

O melhor, na etapa de marcação, é procurar por sinais pré-existentes nos animais, evitando sua manipulação ou alteração de suas características naturais. Cicatrizes, defeitos físicos, manchas, variações em um padrão de coloração, dimensões, sexo, idade e, até mesmo, alguma peculiaridade com-portamental, pode e deve ser usada, sempre que possível. Tenho alunos que estudam aranhas de teia no campo, que marcam as animais pela posição, tamanho ou idade, numerando as teias na vegetação próxima, sem perturbar os indivíduos. Outros utilizam marcas em bugios, como um defeito na boca e o sexo para identificá-los como Bocão, Topete (um tufo de pelos acima do olho esquerdo), Mãozinha (pelos claros na mão direita de uma fêmea adulta) e assim por diante.

Muitas vezes, não há outra opção a não ser capturar e marcar os ani-mais. A seguir, vamos listar alguns grupos animais e sugerir modos de mar-cação.

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2.8.1. Insetos e outros artrópodes

As borboletas são, talvez, o grupo de invertebrados nos quais mais se empregam técnicas de marcação e recaptura, especialmente em estudos de ecologia de populações e de comportamento animal. Na maioria das vezes elas podem ser numeradas, com caneta especial, ou com caneta de retroproje-tor, pode-se escrever o número na face inferior das asas do animal. Essa mar-ca costuma persistir por várias semanas, tempo suficiente para a finalização do estudo. Fazemos o mesmo com libélulas (figura 2.16). Quando capturamos os Coeagrionidae com os quais trabalhamos, os aspectos de dinâmica po-pulacional, territorialidade e seleção sexual, além de sexar o animal (figura 2.16A) e medi-lo (figura 2.16B), aproveitamos para marcá-los e depois soltá-los (figura 2.16C e D).

A B

C D

Figura 2.16. Após capturar uma libélula (A), podemos verificar seu sexo e me-di-la com um paquímetro (B), além de marcá-la com uma caneta para escrita em plástico, vidro ou tecido (C, D).

O uso de pintura em insetos é muito difundido. Em geral, uma com-binação de pontos irá dizer ao pesquisador qual a identidade do animal em estudo. Dependendo do grupo em questão, das especificidades anatômicas,

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podemos estabelecer diferentes tipos de códigos numéricos através de pin-tas produzidas com tinta (acrílica, esmalte, de tecidos, ou para aeromodelos). Tomando um besouro ou uma barata como exemplo, podemos ver como isso é feito. Na primeira ilustração abaixo, mostro a posição e o número que equi-valeria a cada ponto no élitro, ou no pronoto de um besouro. Combinações de pontos, tendo como base os números 1, 2, 3 e 6, assim como suas dezenas e centenas, nos permitem individualizar centenas de animais. Se você puder usar mais de uma cor diferente, isso pode ficar ainda mais fácil, pois apenas com as marcações 1, 2, 3 e 6, alternando duas cores, você pode produzir uni-dades e dezenas. Com três cores, você pode produzir centenas.

Nas três ilustrações que se seguem, exemplifico como seria a marcação dos animais 136, 27 e 10, usando apenas uma cor de tinta. Sempre procuro escolher a cor que menos modifique as características originais do animal.

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Os colegas que estudam abelhas podem adquirir, por importação, car-telas de pequenas calotas plásticas numeradas, com 1 milímetro de diâmetro. Quando capturam as abelhas, eles as colocam dentro de um tubo semelhante a uma seringa e, com o êmbolo, empurram as abelhas, de modo que fiquem com o tórax preso contra uma tela. A calota numerada é colada no tórax da abelha com uma resina especial. Esse tipo de marcação também pode ser usa-do para vespas e outros insetos, funcionando bem naqueles mais robustos e com mais de um centímetro de comprimento.

Artrópodes permitem muitas possibilidades de marcação, em geral, to-das delicadas e muito variáveis, dependendo das especificidades de cada ani-mal e de cada estudo. Mas uma coisa muito importante pode ser dita, desde já, sendo válida para todos os animais: na marcação com cores, seja ela de que tipo for, tem-se que tomar um cuidado enorme para que essa marca não altere as características morfológicas do animal em estudo. Na natureza, use marcas discretas, mesmo que isso dificulte um pouco a identificação. Alterando a co-loração de um animal, você pode transformar um animal camuflado em um animal conspícuo. Você pode quebrar sua cripticidade, expondo-o à ação de predadores. Você pode quebrar uma relação mimética, alterar um comporta-mento de seleção sexual e assim por diante. Uma marcação equivocada pode comprometer todo seu estudo e a vida do modelo experimental.

2.8.2. Peixes

Bem, você não vai poder pintá-los não é? O que fazer então? Uma técni-ca barata, de sucesso garantido e comprovado, consiste em ampolas plásticas, contendo um pedaço de papel com a identificação do animal em seu interior. Essas ampolas podem variar de tamanho, dependendo do peixe, mas, geral-mente, são um pouco maiores do que uma cápsula de remédio. Cada uma dessas “etiquetas” é presa na nadadeira dorsal do animal capturado, usando para isso uma agulha com linha de náilon. O animal não fica retido por muito tempo, toda a manipulação demora um ou dois minutos, sendo o peixe devol-vido ao seu habitat em boas condições.

Embora essa técnica tenha alguns inconvenientes (por exemplo, não pode ser empregada em animais pequenos), ela pode ser muito eficiente na medida em que, nas etiquetas, você pode fazer constar um número de telefo-ne. O ecólogo José Sabino testou, com relativo sucesso, uma técnica baseada em fotografar uma folha com números, recortar os números do negativo e implantá-los sob as escamas de peixes. O tecido parece não rejeitar o filme, que permanece por um bom tempo no animal. Este colega e alguns outros têm me informado que estão em teste alguns tipos especiais de tintas e outros

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tipos de papéis e filmes que podem ser implantados nos animais. Pesquisa-se, até mesmo, o uso de microchips para um futuro próximo.

2.8.3. Anfíbios

Como marcar um animal que não pode ser pintado nem etiquetado e que apresenta poucas marcas naturais notáveis? Pobres rãs, sapinhos e pe-rerecas. O leitor pode imaginar o que é ter pedaços de seus dedos (artelhos) cortados, em diferentes porções, para indicar o seu número através de uma combinação? Pois é, essa técnica de mutilação é muito usada em anfíbios e, até mesmo, em roedores. E pior: por incrível que pareça, esta é a única técnica que realmente permite ao pesquisador ter certeza do animal marcado e a que dura mais tempo (toda a vida do animal), na maioria dos casos.

No meu primeiro livro (Uma Orientação ao Estudo do Comportamento Ani-mal), critiquei esta técnica, provocando nossos colegas a fornecerem outra so-lução. O Prof. Dr. José Peres Pombal Jr., do Museu Nacional no Rio de Janeiro, referência internacional em anfíbios, me procurou e me garantiu que esta, além de ser a melhor saída, é a técnica que causa menor sofrimento e risco aos animais. O professor Pombal conta também que, segundos após terem os artelhos cortados, os machos já voltam a coaxar, como se nada houvesse ocorrido. Bom sinal?

A opção menos agressiva para este grupo consiste em prender, entre os membros anteriores e posteriores do anuro, uma fita de tecido macio conten-do as informações necessárias. Sugere-se usar fitas parecidas com a coloração da pele do animal para não afetar drasticamente a história de vida de seu objeto de estudo. Porém, essas fitas não podem ficar nem folgadas, nem aper-tadas. Sempre que recapturar o animal, troque a fita. Uma fita folgada pode se prender em algum objeto do meio e provocar a morte do animal. Uma fita apertada e que não se desfaça com o tempo pode estrangular a cintura do sa-pinho, provocando sua morte. Se for fita de algodão, ela logo se desfaz e você perde o animal. Se for de material sintético, vai ferir a pele do sapinho, cau-sando infecções por bactérias e fungos. Linhas com miçangas têm os mesmos problemas. Assim sendo, parece que o melhor mesmo é evitar experimentos que exijam a marcação individual desses animais. Mas se tiver que recorrer a isso, lembre-se que, nesse caso, o que parece ser pior, na verdade, pode ser o caminho “menos ruim”.

2.8.4. Répteis

Dependendo das suas características morfológicas e do uso do habitat, esses animais podem ser marcados de modo similar aos peixes e, em alguns

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casos (lagartos, por exemplo), da mesma forma que os anfíbios. Jacarés e cro-codilos podem receber plaquetas ou etiquetas costuradas nas escamas. Ser-pentes podem ser identificadas através de muitas marcas naturais, incluindo variações em seu padrão de coloração. Jararacas podem ser reconhecidas in-dividualmente através de fotografias. Esses animais são extremamente poli-mórficos – o padrão de cores de um indivíduo jamais se repete. Minha amiga Christine Strüsmann, no pantanal, identificava sucuris através de cicatrizes, tais como dentadas de jacarés. Nesse caso, o inconveniente é a troca de pele, que pode modificar as características dessas cicatrizes. Cágados e tartarugas podem receber placas de identificação em suas carapaças ou serem pintados com números, como fazemos para insetos (figura 2.17). Mais recentemente, tenho recebido informações sobre tintas especiais, subcutâneas, ou implantes plásticos, que talvez possam vir a ser utilizados em breve.

Figura 2.17. Tartaruga de água-doce marcada com numeração feita com tinta automotiva de secagem rápida.

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2.8.5. Aves

Em geral, as aves são anilhadas. Anilhas são pequenas argolas plásti-cas ou metálicas, similares a anéis ou pulseiras, que podem ser colocadas na região dos tarsos (pernas) das aves. Essas anilhas podem conter numerações, códigos ou cores para serem identificadas à distância, como mostra a figura 2.18.

Figura 2.18. Anilhas metálicas de vários diâmetros usadas pelo Centro Nacio-nal de Pesquisa para Conservação das Aves Silvestres (CEMAVE).

Manipular aves não é um trabalho muito fácil, na verdade é muito de-licado, pois elas podem se machucar facilmente quando caem em redes ou armadilhas de captura. Algumas espécies podem morrer simplesmente com o estresse causado pela captura e manipulação.

O CEMAVE, originalmente denominado Centro de Migração de Aves no Brasil e, mais recentemente, rebatizado como Centro Nacional de Pesqui-sas para a Conservação das Aves Silvestres, vinculado ao IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente), fornece cursos que são requisito necessário para receber autorização para trabalhar com captura e marcação de aves, no Brasil. O endereço eletrônico do CEMAVE é: www2.ibama.gov.Br/cemave/. Em outros países, onde há uma regulamentação específica para essa ativi-dade, também existem cursos semelhantes, muitas vezes, ligados a ONGs, institutos de pesquisa e universidades.

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2.8.6. Mamíferos

Para identificar mamíferos, tudo é possível, até mesmo nada, ou seja, apenas marcas naturais. Além disso, há uma enorme variedade de opções de identificação para quem estuda os mamíferos: pintura ou descoloração dos pelos, tatuagens, brincos, colares com sinalizador eletrônico. Vai depender de com qual espécie você trabalha. Por exemplo, roedores aceitam tudo, até furinhos nas orelhas. Já baleias e golfinhos você poderá acompanhar por si-nalizadores implantados sob a pele, ou por marcas naturais, como desenhos das nadadeiras, coloração e combinações de informações.

A marcação eletrônica, com microchips, colares sinalizadores de di-ferentes frequências, que podem ser localizados por rádios ou radares, têm sido uma técnica cada vez mais difundida entre etólogos. Chegamos a ponto de estudar focas, na Antártida, sem nunca irmos lá. Através de um satélite da NASA, o colega Artur Andriolo da UFJF, estudou comportamento de um grupo de focas, obtendo informações diárias, tais como localização, se sobre o gelo ou na água e profundidade dos mergulhos, dentre outras coisas. Atu-almente, seu grupo de pesquisas utiliza varas para implantar radiotransmis-sores em baleias, no litoral brasileiro (figura 2.19).

Figura 2.19. Radiotransmissor implantável, sendo introduzido com vara na camada de gordura dorsal de uma baleia jubarte (Megaptera novaeangliae), no litoral brasileiro. Foto cedida por Artur Andrio-lo.

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Quando falei em mamífero, você pensou em macaco, não é mesmo? Conheço tantos estudantes que gostam de primatologia – pelo menos no início da carreira – que acho que eles deveriam formar um grupo taxo-nômico à parte. Marcas naturais, idade, coloração da pelagem, constitui-ção do grupo e dedicação, muita dedicação, vão fazer você saber quem é quem no seu grupo de estudo. Como diria a Laiena, uma primatóloga muito dedicada que conheço, quinze horas por dia são “quase” suficien-tes.

Seja qual for o grupo, sejam quantos forem os animais, você dará um jeito! Lembre-se sempre de respeitar seu objeto de estudo, de não estressá-lo, de não alterar seu padrão de coloração de forma a comprometer suas atividades vitais. Não use de crueldade na forma de marcação ou de trata-mento de seu objeto de estudo. Lamente cada perda, pois cada uma significa uma vida. Há princípios éticos para tudo na vida, inclusive para o trata-mento com outros animais e com humanos, seja em pesquisas, seja no dia a dia. Se você não sabe, há regras de conduta que, se não forem respeitadas, o impedirão de publicar seus resultados e poderão resultar, até mesmo, em processos criminais sérios. Fique atento e seja responsável! Trate todo ani-mal com respeito!

2.9. Cuidados pessoais para ter no campo e no laboratório

Há algumas regras básicas que são de extrema utilidade (muitas delas seus pais já lhe ensinaram). Talvez seja bom dividirmos algumas dessas re-gras em alguns poucos itens.

þ Ao manipular animais - Esteja absolutamente certo do que, quando, como e onde está realizando um procedimento que re-queira a manipulação de seu objeto de estudo. Se for um animal peçonhento (serpente ou aracnídeo) ou um animal que morda (morcego, cachorro etc.), tenha à mão os equipamentos básicos necessários, tais como luvas, pinças, redes, sacos de pano, gan-chos etc. Não brinque, não abuse da confiança, isto é, não seja arrogante. Peça ajuda sempre que possível – evite estar sozinho ao manipular um animal que ofereça algum risco ou perigo. Prepare-se antes, fazendo cursos, acompanhando o pessoal téc-nico que está acostumado a dominar e manipular seu objeto de estudo ou algum animal semelhante. Tome as vacinas necessá-rias, se for o caso, como a antirrábica e a antitetânica. Certifique-

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se de saber como procurar ajuda o mais rapidamente possível, caso precise.Seja qual for o animal, após a manipulação, lave bem as mãos, os pulsos e braços, antes de tocar novamente a boca, os olhos, o rosto ou suas partes íntimas. Por mais bonitinhos que sejam, animais são fontes de várias bactérias, fungos, parasitos e outros agentes patogê-nicos, além de, em alguns casos, possuírem toxinas próprias, muitas vezes liberadas por glândulas cutâneas. Pelos de aracnídeos e, até mesmo, escamas das asas de borboletas podem causar sérias irrita-ções nos olhos e nas mucosas do nariz e da boca. O mesmo é válido para muitas espécies de plantas que podem estar presentes no am-biente no qual você estuda.Assim sendo, nunca trate higiene como se fosse “frescura”, não faça pouco desses cuidados básicos de saúde, pois você pode se arrepen-der enormemente. Imagine estar bem longe de casa, num lugar de difícil acesso, após uma viagem dispendiosa que requereu grande planejamento e, por ter colocado as mãos sujas nos olhos, ser obri-gado a retornar às pressas para procurar atendimento médico de emergência. Exija os mesmos cuidados de outros membros de sua equipe, pois, se viagens de campo já são muito desgastantes com tudo correndo bem, imagine com problemas.

þ No laboratório - Os mesmos cuidados de higiene são válidos para as situações em laboratório e, não apenas quando se lida com um animal, mas também quando se lida com reagentes químicos, fogo e gases. Use todo o material de segurança, estabeleça e res-peite os protocolos. Se alguém elaborou um protocolo para uma determinada manipulação química, siga os passos preestabeleci-dos. Eu garanto que eles não estão ali porque alguém simples-mente resolveu complicar as coisas. Alguns reagentes só podem ser usados embaixo de uma capela, com o exaustor ligado. Não improvise. Muitos reagentes que normalmente usamos, como o formol, são reconhecidamente cancerígenos. Outros não são, ain-da! Além disso, pouco sabermos sobre as combinações de gases. Então, seja prudente.

þ No campo - Sempre use roupas adequadas: calça, bota ou tênis, ca-misa de mangas compridas, chapéu ou boné. O tipo de roupa a ser usada vai depender da situação e da experiência a serem enfrenta-das. Ouça os mais experientes, quem já esteve no local. Esteja atento às variações climáticas de cada estação.

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Mesmo que você vá para o deserto, é bom saber nadar. Isto é sem-pre útil e vai lhe dar grande segurança. Tenha bom preparo físico. Você não precisa ser um atleta, correr dois quilômetros em dez mi-nutos. Nada disso! Mas precisa aguentar, sem problemas, uma boa caminhada de cinco a dez quilômetros.Esteja preparado para eventualidades. Leve água, alimentos leves e de grande durabilidade, como barras de cereais. Se você for para algum lugar muito distante, não deixe de levar um vidrinho com cloro para pingar algumas gotinhas em cada litro de água (espere um pouco antes de beber). Se sua água acabar, evite remansos – dê preferência à água corrente e cristalina. Se for possível, ferva a água antes de beber.Leve material para produzir luz e fogo. Há muito tempo, as lan-ternas são ferramentas básicas de campo, assim como um GPS, nos dias de hoje – saiba como usá-lo. Para produzir fogo, isquei-ros, fósforos ou uma pederneira podem ser muito úteis. Filtro so-lar e repelente de insetos são garantia de tranquilidade. Porém, há ainda uma coisa básica, fundamental: não se esqueça de levar consigo seu bom senso! Evite fazer movimentos desnecessários: saltar sobre pedras e riachos, correr pela floresta..., pois você pode facilmente se acidentar. Uma simples torção de tornozelo pode por tudo a perder. Não se pendure em galhos nem balance cipós – um amigo meu fez isso e lançou toda uma colmeia de abelhas africanizadas sobre nós. Os galhos também podem cair e ferir gravemente alguém da equipe. Evite revirar troncos e pedras sem os equipamentos próprios para isso, como ganchos e bastões, pois uma serpente pode saltar de lá e picar você. Muito cuidado ao tocar em folhas de plantas e em insetos. Muitos me perguntam o que eu mais temo na floresta. Se temo encontrar uma onça, ser picado por cobra etc. Obviamente, tudo isso é preocupante, mas acredite em mim, é muito mais fácil você se complicar sendo pi-cado por abelhas ou vespas, ou tocando em plantas urticantes e lagartas de borboletas. Fuja, a todo custo, do contato com lagartas de mariposas, como as Megalopigidae. Algumas são tão tóxicas que podem até matar (figura 2.20).

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Figura 2.20. Lagartas de borboleta (Megalopigidae) possuem pelos urticantes e são um enorme perigo para todos os naturalistas.

Um ponto muito importante para quem vai executar um estudo dire-tamente no campo é a companhia. Nunca vá sozinho ao campo! Imprevistos podem acontecer e você pode precisar de ajuda. Não quer dizer necessaria-mente que você tenha que trabalhar em dupla, mas você pode trabalhar numa mesma área que outras pessoas trabalham e combinar os horários de estarem juntos no campo. Com um rádio intercomunicador, ou mesmo com o celular, onde ele funcione, você terá uma garantia de auxílio, caso precise. Atualmen-te, muitos estudos são realizado em parques, reservas e fragmentos florestais próximos a áreas urbanas e o risco de encontrar com indivíduos seres indese-jáveis de nossa própria espécie, infelizmente, são grandes.Escolha bem suas companhias de campo e, quando tiver um bom grupo, ou dupla montada, valorize isto, preserve essa amizade e seja cooperativo, pois uma mão lava a outra! As pessoas egoístas, em geral, acabam sem apoio de campo e com seus estudos comprometidos.

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Introdução à Ecologia Comportamental ♦ um manual para o estudo do comportamento animal

2.10. Como planejar um estudo em Comportamento Animal

Deste ponto em diante, vamos começar efetivamente a aprender como estudar comportamento animal, para depois entrarmos no universo da ecolo-gia comportamental e suas nuances. A primeira coisa para começar é você ter uma questão! Uma pergunta que o estimule a buscar por uma resposta. Veja a foto da figura 2.21.

Figura 2.21. Abelha Centridini (Apidae) pairando em frente a flores de uma Malpighiaceae (Peixotoa tomentosa).

Diga! Que tipo de estímulo esta imagem lhe traz! Olhe para ela nova-mente e pense em algumas questões que gostaria de responder. (...) Pensou? (...) Mais um tempinho? (...) Talvez a primeira questão que nos venha à mente seja:

● Esta abelha é um polinizador desta planta?

Para responder a uma questão como esta, teremos necessariamente que responder questões relacionadas com o comportamento animal, por exemplo:

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● Esta abelha pousa na planta?● Se pousa, por qual recurso ela está sendo atraída? Pólen? Néctar?

Óleos?● Como a abelha coleta o recurso floral?● Durante sua visita às flores, esta abelha contata os estames (parte

masculina das flores) e os estigmas (parte feminina das flores), trans-ferindo pólen dos estames para os estigmas, possibilitando assim a polinização da planta?

Mas outras questões podem surgir e bem diferentes:

● Como esta abelha faz para pairar na frente das flores?● Como ela faz para coletar e transportar o recurso floral que utiliza?

Assim sendo, diversos tipos de questões podem surgir a partir de uma mesma observação. Uma coisa importante a se notar é que você pode se in-teressar por questões mais relacionadas a um determinado assunto, como a primeira questão: polinização. Mas também pode se interessar mais por questões diretamente relacionadas ao seu objeto de estudo, como as outras questões que buscam responder como ocorre um comportamento específico do animal que você estuda. Independentemente do seu interesse principal, há um roteiro a seguir para que você tenha sucesso na busca pela resposta as suas questões. Vamos a ele!

Após ter definido uma pergunta, a primeira coisa que você precisa sa-ber é se realmente viu o que pensa que viu, ou seja, o problema que você observou se repete? Você viu direito? Tem certeza? Neste sentido, o melhor a se fazer é ir novamente observar o animal para confirmar sua questão e tentar entender um pouco mais sobre o que está acontecendo. Esta fase é chamada de observações preliminares.

Juntamente a estas primeiras e mais detalhadas observações sobre o corpo de fatos que caracterizam o comportamento em questão, é muito im-portante que você já elabore o primeiro levantamento bibliográfico sobre o assunto. Atualmente, para fazer um levantamento bibliográfico, basta ir a uma biblioteca universitária e solicitar ao funcionário responsável uma con-sulta eletrônica ao Biological Abstracts ou outra base de dados, como o Current Contents. Essa consulta é indispensável para um bom levantamento biblio-gráfico. Em algumas universidades, o próprio pesquisador faz o seu levan-tamento.

Outros modos de consulta estão disponíveis através da internet e são bem práticos e eficientes, principalmente o site Web of Science, mas há outros, como Scielo e Google Schollar. Atualmente, em vários países, os governos

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oferecem portais de acesso a periódicos, através de suas agências educacio-nais e de pesquisa, com milhares de revistas de acesso eletrônico. Para poder fazer uso dessas modernas maravilhas – se você tem menos de 40 anos, não faz ideia do inferno que era, nos últimos dez anos, fazer, manualmente, um levantamento bibliográfico nos abstracts – basta saber listar palavras-chave, principalmente em inglês.

Palavras-chave (keywords) são termos ou expressões que o ajuda-rão a encontrar a bibliografia desejada. Uma palavra-chave obrigatória é o gênero do animal que você estuda, a família, ou até o nome popular do animal. Se for uma pesquisa por assunto, use o termo próprio, por exem-plo: predação. Podemos também fazer um levantamento através do nome de algum autor, quando sabemos que aquela pessoa publica muito no as-sunto que desejamos trabalhar. Neste caso, o nome do autor se torna uma palavra-chave. Vou dar um exemplo. Se você quer trabalhar com seleção sexual em insetos, um conjunto de palavras-chave muito importante se-ria: sexual selection, insects, reproductive behavior, sexual behavior, mate choice, mating behavior.

Para que tenhamos certeza de que nada de importante tenha esca-pado, existem artigos (publicações científicas) que costumam ajudar muito em levantamentos bibliográficos: são as revisões (reviews). Através do le-vantamento bibliográfico dos artigos de revisão, você pode checar e com-plementar seu próprio levantamento. Assim sendo, sugiro valorizar buscas em periódicos cujos títulos se iniciem assim: Annual Review of... Em alguns casos, a literatura citada em livros também pode auxiliá-lo a encontrar os artigos mais gerais e os “clássicos” no assunto em que se concentra sua pesquisa.

A maior parte da literatura disponível em comportamento animal é escrita em inglês, e a maioria dos periódicos que você vai utilizar só aceita artigos em inglês. Muitas revistas importantes, mesmo de países onde não é falada a língua inglesa, já são totalmente em inglês. Assim sendo, você preci-sa, pelo menos, ler inglês, ou está perdido... e mal pago. É claro que ninguém vai estudar Comportamento Animal pensando em ficar rico, mas saiba que, sem o inglês, você não terá a mínima chance de se tornar um especialista em Ecologia Comportamental.

Para iniciar uma leitura de textos em inglês, sugiro que você se ins-creva em cursos de inglês instrumental, que são comuns nas universidades e menos caros. Outra opção é pedir o auxílio de colegas que sabem o idioma, para conhecer a estrutura gramatical básica da língua. Depois, basta com-prar um bom dicionário e gastar, pelo menos, meia hora por dia, tentando traduzir os textos. No tempo das vacas magras, essa estratégia foi muito útil para mim. Alguns amigos me deram uma força danada e eu pude me tornar

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independente na leitura em inglês “pilotando” o dicionário. Inglês é vocabu-lário! Com dedicação, você logo estará apto a ler textos técnicos com destreza. Confie sempre no seu potencial.

Uma pergunta que costuma surgir quando você tem uma pilha de artigos em suas mãos, ou melhor, um monte de PDFs em seu pen-drive é: “Tenho que ler todo o artigo?” Mas é claro! O mais difícil você já conseguiu, que foi obter o artigo, ou livro, ou tese que você precisava. Agora, você pensa em ler apenas pedaços? Tome muito cuidado com isso. É comum que pessoas leiam apenas os resumos (abstracts) dos artigos e tirem conclusões apressadas. Há casos na literatura, de hipóteses que foram embasadas em artigos que, na verdade, contrariavam o que se es-tava propondo, sendo que o erro, provavelmente, ocorreu devido a uma leitura errada ou incompleta do artigo original. Ler é uma coisa maravi-lhosa, especialmente na fase inicial de uma pesquisa, pois a leitura vai lhe abrir os olhos, vai gerar novas e mais interessantes questões. Você acaba se tornando fã de alguns colegas de profissão, falando deles com carinho e com a intimidade de um amigo. De outros, você já fica des-confiado, duvida de suas hipóteses e começa a pensar em como provar que ele está errado. Quando isso acontece, é porque você está realmente lendo com vontade.

Comece lendo o resumo do artigo. Em muitos casos, a leitura do resu-mo já vai deixar claro para você se o artigo é ou não relevante para seu estu-do. Se você estiver apertado de tempo, leia a introdução, procurando sempre entender os objetivos do estudo. Dê uma passada na discussão, veja como o autor amarra objetivos, metodologia e resultados com outros estudos existen-tes. Assim, você já poderá classificar os artigos que selecionou entre os que têm prioridade máxima na leitura e aqueles que poderá deixar para quando sobrar um tempinho.

Fichar o artigo é sempre uma boa ideia. Antigamente, eu anexava aos artigos que já tinha lido um cartão com números, indicando partes impor-tantes do texto para que pudesse me recordar facilmente delas. Estas fichas com numeração e dicas eram muito úteis na hora de redigir um texto, pois as ideias para a discussão vinham mais facilmente e permitia uma releitura mais dinâmica dos estudos selecionados. Hoje tudo está mudado para melhor e mais fácil! Além de economizar papel, o que as árvores agradecem muito! Atualmente, tenho um programa de armazenamento eletrônico de PDFs que me permite catalogar todos os arquivos que uso, com resumo, abstract, pala-vras-chave, autores, nome da revista e, até mesmo, um link eletrônico direto para minha pasta de PDFs ou para o site do artigo na internet. Hoje em dia, existem vários desses programa de armazenamento. O que eu uso – e acho muito bom – chama-se EndNote.

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Pois bem, definida a questão de seu estudo, feito um primeiro le-vantamento bibliográfico e observações preliminares, o iniciante ainda vai sentir muita insegurança no início do estudo. Isso é absolutamente normal e bom, pois mostra que você não é uma pessoa arrogante, que sabe que pode errar e que é humilde o suficiente para pedir a ajuda de alguém, um orientador. Aqui, vou comentar um pouco sobre orientadores e orientação, pois, muitas vezes, os jovens cientistas acreditam que um orientador é a solução para seus problemas. Quando era aluno de graduação eu imagina-va isso, que todos os meus problemas se resolveriam se eu encontrasse um bom orientador. Sem dúvida, um bom orientador ajuda muito, mas toda e qualquer atividade de pesquisa, dependerá principalmente de você. É pre-ciso que você goste do que está fazendo, que se dedique e que leia muito. Nenhum orientador faz milagres, por melhor que ele seja. Tive orienta-dores que me queriam apenas como técnico especializado, um piloto de centrífuga. Outros me queriam apenas para dizer aos colegas que, enfim, tinham conseguido alguém para orientar. Tive um que era uma mãe super-protetora, não me deixava fazer nada, fazia tudo por mim. Só me ensinou a ser inseguro.

Na minha peregrinação por um bom orientador, tive grandes lições com João Vasconcellos Neto e Fernando Antonio Frieiro Costa, que me ensi-naram a olhar a natureza sem pressa, a procurar pelos detalhes importantes em cada relação e, pela primeira vez, me mostraram como observar compor-tamento animal no campo. Observar com olhos de naturalista. Juntos, desco-brimos que orientador e orientado podem se tornar amigos, desde que saibam que os assuntos profissionais não podem ficar em segundo plano. A outra grande lição que tirei do convívio que tive com mais de uma dúzia de orien-tadores foi descobrir que um dos melhores tutores é aquele que indica, com precisão, o que o orientado deve ler. Aprendi isto com Paulo Sérgio Moreira Carvalho de Oliveira, que me ensinou também a vibrar com os resultados de uma pesquisa, a pular de alegria com um paper publicado na mão. Isso é fundamental!

Estou comentando essas coisas porque a relação entre orientador e orientado é parte essencial do bom andamento de um estudo e acredito que muitos dos leitores ainda dependam de seus orientadores. Então, sugiro que evite se indispor com qualquer orientador. Se a relação não estiver legal, con-verse, tente acertar as coisas, ou mude de orientador. Faça isso sempre deixan-do uma porta aberta. Como a cobra é quem engole o sapo, muitas vezes, para termos um bom orientador, temos que aprender a engolir nossos sapinhos. Um bom orientador pode fazer a diferença. Mas não se fie a isso, lute para ser independente, pois muitos colegas passam a vida toda engolindo sapo, sem nunca virar cobra.

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A orientação que pode vir de um tutor, de um professor, ou de um pesquisador; pode vir também de um colega mais experiente e, certamente, ser comprovada e aperfeiçoada com a literatura, com a leitura. Este conjunto de dados vai levar você a ter sucesso no próximo passo, a definição da meto-dologia.

Para entender o que é metodologia, vamos voltar ao exemplo. ini-cial desta sessão. Olhe novamente para a abelha em frente a uma flor (figura 2.21) e imagine que sua questão fosse: qual recurso floral esta abelha usa e de que maneira? Certamente você teria que recorrer a uma literatura especializada em polinização e reprodução vegetal, teria que ler algo sobre a anatomia floral da família em questão. Os colegas mais experientes ou seu orientador lhe indicariam os materiais indispensáveis para esse estudo: lupas manuais (para observação das estruturas florais e de partes específicas do animal), puçá (para captura das abelhas), um vidro com álcool 70% (para coleta de material vegetal), um frasco seco com tampa (para coleta das abelhas visitantes), uma máquina fotográfica e/ou uma filmadora (para registrar cada detalhe), enfim, tudo que pu-desse ajudar na compreensão, caracterização e descrição dos processos observados.

A detalhada, cuidadosa e criteriosa observação preliminar de campo e o levantamento bibliográfico serão sempre fundamentais. Neste exemplo em particular, óleos vegetais produzidos por glândulas na base das sépalas (figura 2.22) são o principal recurso que as abelhas procuram nestas plantas, seguidos pelo pólen. Os recursos são colhidos nos estames (pólen) e nas glân-dulas (óleo) e armazenados nas escopas (parte pilosa das tíbias do último par de pernas) da abelha visitante.

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A B

Figura 2.22. Detalhe (seta) das glândulas de óleo pares das sépalas (A) de Peixotoa tomentosa (Malpighiaceae), do cerrado, e da escopa de uma abelha Centridini (B).

Detalhe cuidadosamente os métodos e prepare todo o material neces-sário para seu estudo. Depois de definida e iniciada esta fase, se houver al-gum erro, uma mudança necessária irá invalidar todo o conjunto de dados previamente colhidos. Fundamente bem o modo como vai observar o com-portamento do animal, quantas sessões serão necessárias e quanto tempo deve durar cada sessão de observação. Antes, treine como fará seus registros. Nunca se acanhe em pedir ajuda. Sempre haverá alguém disposto a ajudar. Muitas vezes, não será o primeiro, nem o segundo a quem você pediu ajuda, mas sempre haverá alguém disposto a ajudar. Lembre-se de agradecer, pois a gratidão sempre abre portas.

Muito bem, uma vez definida a metodologia, o que vem depois?

Questão

ObservaçõesPreliminares

Levantamento Bibliográfico

Material&

Métodos

Bom, agora é hora de pôr as mãos na massa, ir para o campo ou labo-ratório e iniciar seu estudo, com as primeiras coletas de dados. Nas partes anteriores do livro, já dei várias dicas de como registrar e coletar dados. Nes-ta fase, a maior dúvida será responder a questão: qual deve ser o tamanho

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amostral? Ou seja, quantas sessões de observação terei que fazer? Se for um experimento, quantas repetições devo fazer? Como terei certeza que estou coletando os dados da forma correta e na quantidade necessária? Recorrendo novamente ao exemplo das abelhas de Malpighiaceae em savanas, surgirão dúvidas que nos servem bem de exemplo, tais como:

● Quantas sessões – e de quantos minutos cada uma – eu terei que fa-zer para ter certeza de que cobri a maior parte dos comportamentos executados pelas abelhas?

● Quantas abelhas eu terei que coletar e verificar as escopas, à procura de grãos de pólen ou óleos impregnados?

● Quantos estigmas de flores de plantas distintas eu tenho que verificar e manipular para saber se as abelhas polinizam ou não as plantas?

● Quanto tempo eu tenho que observar as plantas, em cada horário do dia, para saber qual é o pico de visitação diária das abelhas nas flores?

Tudo isto será melhor compreendido, mais uma vez, recorrendo à lite-ratura específica. Lembra-se do levantamento bibliográfico inicial? Ele será importante em todas as fazes de seu estudo. Os livros, os trabalhos já publi-cados e uma boa orientação vão ajudá-lo a definir seus números amostrais, a sanar muitas das dúvidas, como as exemplificadas acima.

Mas, para ter confiança no que está fazendo, para aumentar a con-fiabilidade intraobservador, ou seja, aquela confiança em si mesmo... Ah! Somente o treino, o exercício, a familiarização com o animal, com o am-biente de estudo, o bom conhecimento e o domínio da maior parte possí-vel de variáveis é que lhe darão essa confiança. Estude, estude e estude! Lembre-se de que, segundo Albert Einstein: “Um gênio é, na verdade, o resultado de muita paciência e dedicação; um gênio é uma enorme paciên-cia!”. Então, na busca da autoconfiabilidade, podemos lembrar de seguir alguns passos:

þ Aprofunde seus conhecimentos teóricos sobre o assunto ou animal em questão.

þ Domine a metodologia. Treine!þ Domine o uso dos equipamentos de amostragem, registro e experi-

mentação.þ Repita observações e amostragens sempre que tiver dúvidas de que

possa ter falhado.þ Não lute contra limitações individuais e não faça observações com-

portamentais estando com necessidades fisiológicas insatisfeitas.

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þ Não seja apressado, mas seja humilde. Peça ajuda, sempre que neces-sário. Lembre-se de zelar pelo seu nome. Em ciência, ele tem muito valor ou valor nenhum! Depende de você!

“Você não pode ensinar nada a um homem. Você pode apenas ajudá-lo a encontrar as respostas dentro dele mesmo.” Galileu Galilei

Tendo os dados de campo ou laboratório coletados, agora vem o próxi-mo passo, a análise dos dados, certo? Errado! Entre as fases de coleta de da-dos e a seguinte, que é a análise dos dados coletados, há uma fase contínua e intermediária, que sempre permanece nublada, como se não fosse necessária, mas que talvez seja uma das mais importantes de todo e qualquer estudo, a organização dos dados.

Organize criteriosa e cuidadosamente seus dados. Faça isso metodi-camente, tomando o cuidado de ter cópias de seus dados coletados e organi-zados, mantidas em lugares seguros e diferentes. Cadernos são de papel e se molham ou pegam fogo. Discos rígidos de computador podem ser atacados por inúmeros vírus que geram uma enorme ciranda financeira a sua volta, e também podem ser inutilizados por uma descarga elétrica. Os pen-drives po-dem simplesmente parar de funcionar. Enfim, há mil e uma maneiras de você se dar mal. Acredite! Os escritos daquela camiseta engraçadinha estão certos: Shit happens! Essas coisas acontecem mesmo e o tempo todo, às vezes, num simples clique! Então, seja previdente. Quem se previne passa por menos pro-blemas, sofre menos. Quando coletei os dados de minha tese de doutorado, eu tinha cópias de todos os dados mantidas em dois locais diferentes. No meu caso, por uma peculiaridade da minha vida profissional, naquele momento, as cópias eram mantidas 500 quilômetros distantes uma da outra. Sei de pes-

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soas que foram assaltadas e os bandidos levaram os cadernos de campo que estavam na bolsa. Também soube de um casal de namorados que, quando a menina descobriu uma traição do rapaz, num ataque de fúria, destruiu todos os dados de campo do namorado infiel. Ela dava risadas, com a porta do apar-tamento fechada! Assim sendo, cuide-se!

Para a análise dos dados, você vai ter que recorrer novamente à lite-ratura, ver como os outros fizeram, para ter uma boa ideia do que pode fazer com seus dados. Com experiência e tempo, na fase de planejamento, você já vai saber, com uma boa certeza, o que vai usar. Um colega bom em estatística também vai ajudá-lo muito, além do seu orientador, obviamente (Mais uma vez! Viu como é bom escolher direito?) Quem sabe se você pode precisar da ajuda de um estatístico profissional? Na análise dos dados, você saberá definitivamente se seu conjunto amostral foi ou não suficiente. Muitas vezes, haverá a necessidade de complementações. Faça isso! Não se chateie! E faça bem feito!

Hoje em dia, há muitos pacotes estatísticos de fácil manuseio em com-putadores, que vão obrigá-lo a treinar também o modo de inserir os dados nessas novas ferramentas. Tenha cuidado com pontos, vírgulas, se está colo-cando os dados certos nas colunas e linhas corretas. Olha... algumas vezes, é um longo aprendizado! Mas tendo dominado um programa, você verá que os avanços são incomparáveis com o que tínhamos disponível para trabalhar, há alguns anos atrás. Os programas que mais usamos atualmente são o Statistica, o Systat e o BioEstat. Na maior parte das vezes, você vai testar a normalidade dos dados, comparar médias, fazer algumas correlações e análises de variân-cia. Vai ter que saber fazer histogramas de barras, tabelas – nada que alguém com dedicação e um pouco de ajuda não consiga fazer. Seja confiante! Não se assuste com a matemática, pois ela pode ser uma boa amiga.

A fase final é a que denominamos interpretação dos resultados. Esta fase nos leva à redação do trabalho científico, ou seja, ao final de uma etapa em pesquisa. Para interpretar o significado dos dados que você coletou, os re-sultados dos experimentos que fez, você dependerá diretamente de, ao longo de todo o estudo, ter efetivamente lido, lido muito! Ter estudado bastante o grupo ou assunto em questão. Quem não domina a parte teórica do estudo, não passa de um coletor de dados, não é um cientista de verdade. Você dever ser tão capaz de observar, experimentar, comparar e analisar, quanto de ela-borar uma síntese e conceitualização, a partir dos resultados que obteve. Se fizer isso, você estará fazendo ciência! Eu tenho certeza que você consegue! Dedique-se! Leia bastante, para dominar a teoria que está por trás de suas questões.

Em comportamento animal, nós devemos tomar muito cuidado com alguns fatores que podem nos levar a uma interpretação equivocada

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dos resultados obtidos, ou do modo como ocorre ou para que serve o comportamento observado. Por exemplo, imagine uma veterinária ob-servando o comportamento de um grupo de vacas que, por algum mo-tivo, não aceitam bem sua presença (figura 2.23). Essa rejeição pode ser motivada pelo uso do avental branco! A veterinária não percebe que as vacas mudaram o comportamento inicialmente observado e continua anotando. Este é, portanto, um erro de registro. Ele pode ocorrer também pela simples anotação de um dado em uma coluna errada, de um “x” no quadradinho impróprio. Bem, seja como for, o erro de observação leva ao erro de registro. O erro de registro leva ao erro de análise, que leva ao erro de interpretação.

Figura 2.23. Erros comumente cometidos em observação animal.

Então, você diz: “Ah! Eu não vou errar!” Doce ilusão... todo mundo erra! Devemos fazer todo o possível para minimizar nossos erros, mas todos nós erramos. Sendo assim, descarte os dados ruins, aqueles com possíveis erros, repita observações para as quais tem dúvida. Manter a atenção na hora das observações comportamentais, evitar conversas paralelas e estar realmente focado em seu trabalho são as melhores formas de reduzir erros.

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Geralmente, uma pesquisa termina com um monte de novas questões. Aprenda a controlar seu ímpeto de responder outra, outra e mais outra ques-tão. Antes de continuar no mesmo assunto, procure ser objetivo, ou seja, pu-blique seus resultados. Você pode desvendar a vida amorosa das baleias nas profundezas dos oceanos mas, antes, terá que responder como elas nadam, o que comem, onde se reproduzem... Cada uma dessas questões pode se tornar um importante trabalho publicado, um tijolinho que vai formando as bases da sua linha de pesquisa. Uma linha de pesquisa pode surgir de uma retroa-limentação positiva, deste seu roteiro de pesquisa (Figura 27).

Figura 2.24. Roteiro para o desenvolvimento de um projeto de pesquisa. Uma linha de pesquisa, geralmente, surge a partir da realimentação do sistema, com novas e boas questões e a publicação dos resultados de cada etapa.

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2.11. O que é etograma?

Etograma ou repertório comportamental é um tipo de ferramenta muito interessante para que possamos conhecer todas as possibilidades de um determinado animal e para que possamos orientar o planejamento de nossos estudos. O etograma é especialmente importante e interessante nas fases iniciais de uma pesquisa, quando ainda se define a pergunta, pois ajuda a responder questões básicas como:

● Quais as principais atividades do animal em estudo?● Qual seu horário de pico?● Que tipo de interações apresenta?● Como divide seu tempo ao longo do dia?

É através deste modo simples de observação de comportamento que surgem muitas questões e hipóteses interessantes para se testar com manipu-lação experimental, como veremos na sequência do livro. Etogramas são, de fato, um ótimo caminho para se ter ideias. Para elaborar um repertório com-portamental de uma espécie, ou seja, para descrever tudo que ela faz ou deixa de fazer, eu recomendo que você divida seu estudo em três etapas.

● Primeira etapa: observações preliminares – Você fará as observa-ções preliminares com levantamento bibliográfico. O principal ob-jetivo é definir, entre outras coisas, o horário de pico de atividade da espécie. Você pode, por exemplo, anotar o número de comporta-mentos exibido pelo animal ou animais em estudo, durante os dez primeiros minutos de cada hora do dia. Fazendo três repetições, em dias com condições meteorológicas semelhantes (se for um estudo no campo), você irá definir os horários de maior atividade para seu objeto de estudo.

● Segunda etapa: qualificação dos comportamentos – Você irá quali-ficar todos os comportamentos observados. Utilizando o método da amostragem de todas as ocorrências, vá anotando tudo que o ani-mal faz ou deixa de fazer. Procure já ir dividindo esses atos compor-tamentais observados em tipos e padrões. Cabe esclarecer que Tipo, ou Categoria, como preferem alguns colegas, se refere a categorias de comportamento que podem ser subdivididas em Padrões e Atos, com suas partes componentes. Por exemplo, “voar” se encaixa no Tipo lo-comoção, que inclui: caminhar, andar, nadar, voar etc. O Padrão é referente ao Tipo. No caso, o Ato comportamental seria denominado “voar” ou “voando”, “levantar voo”, “pousar” etc. O Ato comporta-

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mental, por sua vez, se refere ao Padrão. A descrição de cada um dos movimentos desse padrão caracteriza as Partes componentes do comportamento (tabela 2.3). Artigos já publicados, com a mesma es-pécie ou com animais próximos podem ajudar muito, principalmen-te, na definição dos tipos de comportamento.Nesta fase, o número de sessões necessárias irá depender da espécie em questão e do que lhe indicar a bibliografia e sua vivência. Para for-migas, uma boa fase de qualificação pode demorar de 30 a 40 horas, aproximadamente. Nesse tempo, para este tipo de animal, nós sabe-mos que já temos em mãos uma quantidade representativa de atos comportamentais, quando chegamos a qualificar mais de 35 atos. Esse número mágico, quem nos diz é, novamente, a literatura e nosso esforço de coleta, ao longo de vários anos.Feita a qualificação, passamos à terceira etapa.

● Terceira etapa: quantificação – É hora de quantificar, de anotar quantas vezes em cada sessão os animais exibem cada um dos com-portamentos observados. Você fará isso seguindo um dos métodos de observação e registro previamente indicados. Nesta fase, seja rigo-roso e disciplinado consigo mesmo. A seguir, apresento um exemplo de etograma e, nas referências bibliográficas, cito dois estudos que podem ajudar muito na sua compreensão.

Tabela 2.3. Etograma ou repertório comportamental de soldados da formiga Cephalotes pusillus (Klug, 1824; Formicidae), em condições de cativeiro (n = 4 colônias, 100 horas de observação).

Categorias comportamentais Colônias

Atos comportamentais 1 2 3 4 TOTAL

EXPLORAÇÃO 24,090 16,800 15,440 5,780 9,154

Parado fora do ninho 10,850 2,440 3,110 1,160 2,170

Andando dentro do ninho 5,330 11,490 8,070 3,020 4,540

Andando (explorando) fora do ninho 7,910 2,880 4,250 1,600 2,000

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Continuação Tabela 2.3

DEFESA 35,600 20,610 12,970 21,450 21,420

Parado na entrada do ninho 35,090 20,530 12,710 21,440 21,410

Agitado na entrada do ninho 0,510 0,074 0,260 0,010 0,080

ALIMENTAÇÃO 4,310 4,062 8,270 5,390 5,498

Antenando cupins — — — — —

Trofalaxis com operária 2,280 2,510 3,340 3,750 3,480

Trofalaxis com soldado 1,120 1,220 3,470 1,380 1,570

Trofalaxis com rainha — 0,110 — — 0,010

Alimentando-se de dieta (papa) — 0,140 0,840 0,260 0,290

Alimentando-se de solução de mel e água 0,910 0,074 0,620 0,005 0,140

COMUNICAÇÃO 5,730 6,170 10,440 18,640 15,640

Antenando operária 2,790 2,440 3,696 6,750 5,730

Antenando soldado 1,170 1,180 3,664 2,240 2,220

Antenando na entrada do ninho 1,780 2,550 3,080 9,640 7,696

LIMPEZA 1,620 1,630 1,300 1,060 1,175

Limpando antena (1o par de pernas) 1,370 1,290 0,810 0,990 1,027

Limpando soldado — — — 0,010 0,007

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Parte 2 ♦ Guia introdutório ao comportamento animal

93

Continuação Tabela 2.3

Carregando formiga morta 0,250 0,330 0,490 0,050 0,140

Carregando lixo — — — — —

REPOUSO 28,650 50,740 51,590 47,680 47,040

Soldado parado no ninho 28,650 50,740 51,590 47,680 47,040

TOTAL 100 100 100 100 100

Del-Claro, Durães e Santos, 2002.

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Guia introdutório àecoloGia comportamental

parte 3

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Introdução à Ecologia Comportamental ♦ um manual para o estudo do comportamento animal

3.1. A questão funcional e a questão evolutiva

No verão de 1997, caminhando pela Mata Atlântica do sudeste do Bra-sil, me deparei com um estranho animal. À primeira vista, me assustei, pen-sando ser uma vespa caçadora de aranhas, um pouco mais colorida e con-fiante, pois o animal não se abalou na minha presença. Ao contrário, abriu o primeiro par de asas, emitiu o som característico do zumbir de vespas e curvou o abdome, como se fosse ferroar (figura 3.1). O que, à primeira vista, me pareceu ser uma vespa, na verdade, era um Scaphura nigra (Orthoptera: Tetigoniidae), um gafanhoto do grupo das esperanças, mimético de vespas Pompilidae.

Figura 3.1. Scaphura nigra (Orthoptera: Tetigoniidae), um gafanhoto do gru-po das esperanças, mimético de vespas Pompilidae. Foto de J. C. Santos.

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Parte 3 ♦ Guia introdutório à ecologia comportamental

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A primeira coisa que me veio à mente foi me aproximar do animal e procurar observar, exatamente, como ele fazia para imitar o comportamento das vespas. Esta é a questão que todo etólogo faria inicialmente, observar como o animal faz determinada coisa e tentar descrever seu comportamento, o que é característico da biologia funcional e do comportamento animal. Foi este tipo de questão que abordamos em todo o capítulo anterior, mas vou ser ainda mais claro.

Na busca de respostas para a questão: “Como um comportamento ocorre?”, ou seja, “Quais são os mecanismos intrínsecos do indivíduo?”, podemos investigar desde seus mecanismos genético-desenvolvimen-tais até seu sistema neurofisiológico. Estas questões nos respondem, por exemplo, como os gafanhotos se orientam, como enxergam e como abrem as asas, ou seja, quais seriam as causas imediatas de um compor-tamento.

Você ainda não entendeu? Então, vamos lá! Imagine que você esteja sentado em um gramado, comendo um doce muito cremoso, com muito recheio – um bolo de chocolate com creme. É tanto recheio que um pouco do creme cai no seu colo e na grama abaixo de você. Após uns quinze minutos, haverá dezenas de pequenas formigas subindo em você e se ali-mentando do doce. Como tantas formigas apareceram tão repentinamen-te em um local onde antes, aparentemente, não havia nenhuma? Como essas formigas encontraram o creme tão facilmente? Muitas espécies de formigas têm um senso de orientação química bastante apurado. Sendo espécies sociais, algumas formigas têm a capacidade de deixar pistas no substrato. Essas pistas são substâncias secretadas por glândulas presen-tes no abdome da formiga que orientam as companheiras durante o for-rageio. Assim sendo, o que ocorre é que uma “operária exploradora”, ca-sualmente, encontra o creme, ingere um pouco dele e volta para o ninho. No caminho para casa, essa operária deixa pistas químicas (gotinhas de secreções), que outras operárias seguirão, até encontrar a fonte de alimen-to. As próximas operárias reforçarão a trilha química e logo uma carreira de formigas se formará até a fonte de alimento, num ir e vir intenso para o ninho, até que o alimento se acabe.

Este tipo de questão que responde apenas “como” ocorre um deter-minado comportamento foi predominante no estudo do comportamento animal e humano, até a metade do século XX. Estas questões descritivas são básicas, iniciais, em qualquer estudo etológico, pois buscam respon-der as causas da existência de um dado comportamento. O nível de deta-

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Introdução à Ecologia Comportamental ♦ um manual para o estudo do comportamento animal

lhamento para respostas a questões descritivas irá depender do interesse do pesquisador, ou do tipo de pesquisa que se está desenvolvendo. Em geral, as perguntas do tipo “como?” nos levam a estudar muitos aspec-tos da biologia e da história natural das espécies com as quais trabalha-mos, sendo uma importante ponte com outras áreas do conhecimento. Por exemplo, voltando às formigas e ao creme: como os mirmecologistas descobriram que as substâncias deixadas pelas formigas no solo, mar-cando o caminho do alimento ao ninho para outras operárias seguirem, eram secreções glandulares? Eles tiveram que recorrer a extensos pro-cedimentos multidisciplinares que incluíram o apoio da histologia e da bioquímica.

Buscando mais informações sobre o gafanhoto-vespa (figura 3.1), tive o enorme prazer de encontrar uma citação sobre esse animal, no livro A Origem das Espécies por Meio da Seleção Natural, no qual Darwin, em sua passagem pelo Brasil, mais de 150 anos antes, tinha visto a mesma coisa que eu e também tinha comparado esses gafanhotos com vespas (figura 3.2), isto numa época em que nada se sabia de genética mendeliana e a seleção natural ainda era uma idéia marginal na mente do naturalista inglês.

A B

Figura 3.2. Vespa Pompilidae, Pepsis sp (a), modelo aposemático de Scaphura nigra (Orthoptera: Tetigoniidae), um gafanhoto do grupo das espe-ranças (b), mimético de vespas Pompilidae.

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Parte 3 ♦ Guia introdutório à ecologia comportamental

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Darwin não se contentou em ficar somente no “como” o animal faz, mas já começava a se questionar “por que” o animal executava este tipo de comportamento. Mais tarde, ele criou as bases para que pudéssemos ter as respostas para este tipo de questão, a questão histórica da existên-cia de um determinado tipo de comportamento. Estas novas perguntas e respostas abriram os caminhos para a biologia evolutiva. É aí que reside uma das grandes diferenças entre etologia e/ou comportamento animal e ecologia comportamental.

3.2. A questão da ecologia comportamental

Ecologia pode ser entendida como o estudo das relações dos or-ganismos vivos entre si e com o ambiente. Entendendo-se estas relações como de duplo sentido, ou seja, organismos afetam e são afetados uns pelos outros, assim como afetam o ambiente e são por ele afetados. É uma verdadeira negociação, cheia de trocas, de pressões seletivas, o que, em 1870, Ernest Haeckel chamou de a “economia da natureza”. A Ecologia Comportamental aplica esta visão ao comportamento animal, buscando as causas evolutivas para a existência de cada comportamento. Assim sen-do, com ela, vemos o impacto de um comportamento sobre populações, comunidades e espécies (figura Quadro 3.1).

A Ecologia Comportamental é um tipo de abordagem que revela as bases ecológicas e evolutivas dos comportamentos, demonstrando expe-rimentalmente a ação de um determinado ato sobre o valor adaptativo de um indivíduo. Assim, passamos a questionar as vantagens adaptativas dos gafanhotos em imitar as vespas, ou das formigas em construir trilhas de cheiro, mas tudo isso fazendo uso de manipulação experimental no campo e em laboratório para testar predições, corroborando ou não nos-sas hipóteses. Certamente, você poderá compreender isso melhor através de um exemplo onde ficam claras as hipóteses e premissas, também de-nominadas pressupostos, previsões ou predições.

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Introdução à Ecologia Comportamental ♦ um manual para o estudo do comportamento animal

Interações com oambiente e outros

organismos

Comportamentos(Mecanismos Psicológicos)

Aptidão individual(sucesso reprodutivo)

Contribuição aoPool gênico da

próxima geração

Populações

Indivíduo

Espécie

Modelam os mecanismosfisiológicos do organismo

Carga Genética Individual

Define os mecanismos dedesenvolvimento e crescimento

do organismo

Figura 3.3. Toda espécie é composta por um conjunto de populações que, por sua vez, se dividem nas suas unidades básicas funcionais: os orga-nismos ou indivíduos. Cada indivíduo tem sua própria carga gené-tica, modeladora de seu desenvolvimento, fisiologia e psicologia. O modo como um animal se comporta e interage no ambiente natural dirá muito de seu sucesso reprodutivo individual. Desse sucesso, ou seja, do valor adaptativo individual (prole viável) resul-tará a composição final do pool gênico da próxima geração.

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Parte 3 ♦ Guia introdutório à ecologia comportamental

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3.3. O teste de hipóteses na ecologia comportamental

Aspectos da forma e coloração dos animais sempre chamaram muito minha atenção. Coisas como camuflagem, ou seja, quando um animal se en-contra críptico, isto é, quando passa despercebido à visão de um predador visualmente orientado (figura 3.4a), quando apresenta aposematismo por co-loração de advertência, ou seja, quando demonstra impalatabilidade (gosto ruim) através de suas cores (figura 3.4b) e mimetismo (figura 3.2). Você pode perceber isto através do exemplo anterior, dos gafanhotos e vespas, que foi assunto de minha dissertação de mestrado. De fato, minha primeira publica-ção foi com mimetismo, um estudo totalmente intuitivo de ecologia compor-tamental.

A B

Figura 3.4. (a) Uma aranha Thomisidae (Epicrates heterogaster) se camufla em meio às flores para capturar suas presas e escapar de seus predado-res. (b) Uma borboleta Heliconius erato (Heliconiinae) ostenta um típi-co padrão de cores aposemático (vermelho, preto e amarelo).

Antes de prosseguirmos, cabe aqui um alerta. A coloração animal pode ter várias funções, a defesa é apenas uma delas, mas há ainda seleção sexu-al, termorregulação, comunicação intra e interespecífica, dentre outras10. Mas vamos ao nosso exemplo com mimetismo. Em 1991, publiquei meu primei-ro estudo: um caso de mimetismo entre um besouro Alticinae (Homophoeta octoguttata, popularmente denominado besouro-saltador) e seu mímico, um besouro Cerambycidae (Adesmus colligatus, popularmente conhecido como serra-pau), mostrados na figura 3.4.

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Introdução à Ecologia Comportamental ♦ um manual para o estudo do comportamento animal

A B

Figura 3.5. (a) Homophoeta octoguttata (modelo de besouro aposemático). (b) Adesmus colligatus (besouro mimético).

Observando esses animais no campo, pude perceber que eram muito semelhantes em coloração e morfologia (ovalados e pequenos, com 4 milí-metros), ocorriam nos mesmos ambientes, horários e época do ano. O alti-cíneo apresentava o terceiro par de pernas modificado para o salto, o que dificultava sua captura por predadores visualmente orientados. Estudos de outros colegas indicavam que esses besouros-saltadores eram animais im-palatáveis, tinham substâncias tóxicas em seu corpo (alcaloides). Portanto, eram bons modelos para algum outro inseto que os quisesse imitar, apro-veitando-se da semelhança com um animal ruim para enganar predadores em comum.

Imaginei que fosse um caso de mimetismo batesiano, semelhante ao da vespa e do gafanhoto. Este tipo de relação mimética foi descrito, pela primeira vez em 1862, pelo naturalista inglês Henry Walter Bates, após dez anos estudando borboletas na bacia amazônica. Nesta relação, um animal “ruim”, ou seja, que tenha alguma característica desagradável para seus predadores, tais como a presença de veneno, espinhos ou ferrão, enfim, qualquer característica que dificulte sua captura, ingestão ou deglutição, de-monstra isso para seus predadores, através da coloração, do comportamento ou de outra característica saliente. Segundo Bates, esse animal impalatável seria um modelo a ser imitado por outros animais que nada têm de ruim ou desagradável para seus predadores. O imitador, que se assemelharia em coloração, morfologia e comportamento ao modelo, seria conhecido como mímico.

Pois bem, uma simples comparação visual entre os dois besouros (figu-ra 3.4), o modelo (Alticinae) e o possível mímico (Cerambycidae), analisando

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Parte 3 ♦ Guia introdutório à ecologia comportamental

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cor, forma e tamanho, indicava a semelhança. A sobreposição de habitat, ho-rário de atividade e predadores potenciais sugeriam ainda mais que poderia realmente se tratar de um caso de mimetismo. Mas, em ciência, não basta que digamos o que imaginamos, embora isto tenha sido feito pelos primei-ros naturalistas, que tiveram seu mérito, pois nos ensinaram a descrever fatos da natureza. Nós, os novos naturalistas temos que provar nossas idéias, e é aí que entram as hipóteses e previsões (Método Hipotético Dedutivo), que norteiam as metodologias experimentais da Ecologia Comportamental. A hi-pótese levantada nesse experimento foi:

Adesmus colligatus é um mímico de Homophoeta octoguttata, e a semelhança em morfologia, coloração e comportamento, aumenta as chan-ces de sobrevivência do mímico.

Para testar esta hipótese, tive que imaginar as previsões, também de-nominadas premissas, que fortaleceriam a suposição, no caso de serem con-firmadas, ou que a enfraqueceriam, no caso de serem rejeitadas. Eis a primei-ra premissa:

Há, na área de estudo, um predador de besouros visualmente orientado que frequenta os mesmos ambientes que mímicos e modelos, nos mesmos horários.

Pois bem, havia dezenas de aves que podiam ser incluídas nessa categoria, porém a maioria de difícil captura e manipulação em cativeiro. Indo ao campo, pude notar que lagartos também poderiam ser importan-tes predadores de besouros, na área de ocorrência dos animais. Na lite-ratura e em conversas com colegas, descobri que lagartos Tropiduridae, como Tropidurus itambere, eram comuns na área de estudo e se alimenta-vam de insetos, tais como besouros e formigas; eram de fácil captura e ma-nipulação em laboratório, condição ímpar para a execução de uma bateria experimental. O primeiro passo foi, então, vencido: eu tinha um predador, conhecido e capturado. O segundo passo seria demonstrar a impalatabili-dade, ou seja, o gosto ruim do modelo. Assim, surgiu a segunda previsão ou premissa:

Os modelos são, realmente, impalatáveis.Alticinae foram coletados e oferecidos a pintinhos (Gallus gallus) de sete

dias e aos lagartos, mas foram rejeitados. A seguir, os predadores receberam larvas de besouros Tenebrio molitor, reconhecidamente palatáveis, as quais co-meram imediatamente, comprovando a impalatabilidade do alticíneo. Então, passei para a terceira premissa:

Os mímicos são palatáveis e, portanto, podem ser predados pelos lagartos.Alguns dos serra-paus, besouros supostamente miméticos dos alticí-

neos “ruins”, foram oferecidos a pintinhos e lagartos que não tinham tido nenhum contato prévio com o modelo. Os serra-paus foram prontamente ata-cados e predados, comprovando sua palatabilidade (gosto bom).

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Introdução à Ecologia Comportamental ♦ um manual para o estudo do comportamento animal

Assim, três importantes etapas foram vencidas para a confirmação da hipótese mimética:

1) Os modelos são ruins (impalatáveis).2) Os mímicos são bons para comer (palatáveis).3) Há predadores interessados nos dois e que sabem reconhecer a dife-

rença no sabor.

Agora, vem o experimento-chave: comprovar a quarta premissa:“Predadores visualmente orientados confundem os mímicos com os modelos e

os rejeitam”.Para tanto, imaginei a seguinte sequência experimental (Manipulação

Experimental):

1) Os lagartos receberiam uma larva de besouro palatável (T. molitor).2) Após um intervalo de 5 minutos, os mesmos lagartos receberiam um

besouro modelo.3) Após outro intervalo de 5 minutos, os mesmos lagartos agora recebe-

riam um besouro mímico.4) Por fim, após mais um intervalo de 5 minutos, eu ofereceria uma

larva de besouro palatável (T. molitor) aos mesmos lagartos.

Para que a previsão fortalecesse a hipótese mimética, os lagartos te-riam que comer a larva palatável antes e depois do contato com modelos e mímicos, o que demonstraria que não estavam nem com fome e nem já saciados, respectivamente. Além disso, os lagartos teriam, fundamental-mente, que rejeitar tanto o modelo quanto o mímico, o que demonstraria que uma “escolha” foi feita. E foi exatamente isto que ocorreu. Os lagartos inexperientes, ao tentarem capturar os modelos (besouro-saltador), os cus-piam e passavam a boca várias vezes na areia do fundo do terrário, não se aproximando mais da presa. Quando os Tropidurus viam os mímicos (serra-paus), se aproximavam, os examinavam e recuavam, rejeitando, portanto, os mímicos, o que confirmou que, realmente, confundiam os mímicos com os modelos.

Na figura 3.6, cada etapa do processo foi didaticamente separada, de modo a permitir uma melhor compreensão da importância de cada premissa para a confirmação da hipótese.

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Parte 3 ♦ Guia introdutório à ecologia comportamental

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Figura 3.6. Teste de uma hipótese em ecologia comportamental, com uso de manipulação experimental.

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Introdução à Ecologia Comportamental ♦ um manual para o estudo do comportamento animal

Com este exemplo, espero ter esclarecido o que são hipóteses e premis-sas, além de sua importância. Também espero que você tenha compreendido o que é Ecologia Comportamental:

Uma parte da ciência do comportamento animal que busca as cau-sas evolutivas (históricas) dos comportamentos, fazendo uso de mani-pulação experimental, para testar premissas que comprovem ou refutem hipóteses.

E por falar em comportamento, no exemplo descrito, a análise do comportamento dos dois besouros foi fundamental para a comprovação da hipótese mimética. Os besouros-modelo (Alticinae saltadores) têm, no salto, uma importante defesa contra predadores visualmente orientados, como aves, por exemplo. Quando perturbados, os serra-paus não podem saltar das plantas e cair por entre a vegetação, como fazem os modelos saltadores, pois não têm o terceiro par de pernas modificado para pular. Mas, como bons mímicos, eles imitam este comportamento. Quando per-turbados, esses besouros levantam vôo e fecham as asas em pleno ar, si-mulando um salto, caindo por entre a vegetação, exatamente como fazem seus modelos. Na natureza, toda ação passa por uma análise de custo e benefício, sendo que, em geral, os animais tomam decisões nas quais os benefícios sobrepujam os custos da ação, caso contrário há uma perda em valor adaptativo. Assim sendo, tentar pegar uma presa pequena, de baixo valor energético e difícil captura, pode não ser economicamente viável. Há um gasto energético em algo que simplesmente não traz um retorno satisfatório.

Vamos a outro exemplo, um pouco mais elaborado.

3.4. Exemplo do uso da Ecologia Comportamental na Ecologia de Interações (populações e comunidades)

Em seu princípio, a ecologia foi definida como um termo que des-creveria as constantes e dinâmicas relações de troca que ocorrem entre os or-ganismos vivos na natureza, incluindo o modo como afetam e são afetados pelo mundo inanimado a sua volta. Ernest Haeckel, o naturalista alemão que, em 1870, cunhou o termo ecologia, a entendia como sendo uma espécie de economia da natureza, um toma lá da cá, ou seja, tudo tem um cus-

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Parte 3 ♦ Guia introdutório à ecologia comportamental

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to e seu benefício. Mais de um século se passou, demos voltas e mais voltas, e hoje nos deparamos com um cenário não muito diferente do visualizado pelos naturalistas do final do século XIX. As interações eco-lógicas se apresentam cada vez mais como as grandes ferramentas para que possamos entender como são estruturadas as comunidades naturais e, assim, compreender como e o que fazer para manter comunidades naturais ainda viáveis, preservadas. A chave para a sobrevivência da biodiversidade na Terra parece realmente estar na compreensão da eco-logia de interações.

No entanto, para entender como um animal, planta, ou qualquer organismo reage às mudanças do planeta, temos que conhecer os aspec-tos básicos de sua existência, sua história natural, sua biologia, ontoge-nia ou fenologia, enfim, sua completa história de vida. Neste cenário, para os animais, o comportamento e a ecologia comportamental são fer-ramentas básicas para a correta interpretação da funcionalidade, dos custos e benefícios, dos resultados das relações ecológicas nas quais se envolvem.

Este trabalho de relacionar a ecologia comportamental com a ecolo-gia de interações não é fácil, pois é cheio de detalhes e problemas meto-dológicos. Ele tanto pode trazer resultados mais rápidos do que imagina-mos, como, algumas vezes, demorar anos para que se chegue a qualquer conclusão. Você dependerá de ter uma enorme bagagem científica, uma visão ampla e aberta das coisas, estar propenso a receber e assimilar as críticas e a reconhecer seus próprios erros, mais comumente do que está acostumado. Também dependerá da ajuda de colegas mais experientes, do bom senso e da compreensão de revisores, estatísticos e taxonomistas, além de um ótimo revisor de inglês. Mas, para os persistentes, para os dedicados, para aqueles que amam esta arte, vale a pena, pois nós somos os naturalistas de hoje! Estamos nas caravelas que desembarcarão no conhecimento que nos fará saber como preservar a vida no planeta. Isto é até romântico! Não é mesmo? Mas, na realidade, no dia a dia, a coisa é dura! Como diz o povo: rapadura é doce mas não é mole. Vou dar um exemplo: veja a figura 3.7.

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Introdução à Ecologia Comportamental ♦ um manual para o estudo do comportamento animal

C

A B

D

Figura 3.7. (a) Fêmea de Guayaquila xiphias (Hemiptera: Membracidae) so-bre massa de ovos. (b) Ninfa expelindo gota de exsudação pelo ânus. (c) Agrupamento da fêmea com sua progênie. (d) Formiga Camponotus rufipes (Formicinae) antenando e coletando gota de exsudato do ânus de uma ninfa.

Por dois anos, estudei no campo semanalmente e, em alguns períodos, durante dia e noite, a interação entre Guayaquila xiphias, uma espécie de inseto sugador de seiva de plantas (figura 3.7), e Camponotus rufipes, formigas que se alimentam das excreções daquele inseto. Também investiguei o efeito dessa relação sobre as plantas. Você pode ver esses estudos, detalhadamente, no site www.leci.ib.ufu.br.

Quando vi isto no campo, pela primeira vez, fiquei me perguntando: “Por que a formiga suga o líquido dos homópteros – estavam assim classi-ficados na época! Acostume-se! Nomes e classificações mudam todo dia! –; o que há de especial nisto? Quais serão as formigas que fazem isso?” Após ler um pouco, descobri que esse líquido era uma exsudação rica em água, açúcares, lipídios e alguns aminoácidos. Portanto, tratava-se de um rico re-

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Parte 3 ♦ Guia introdutório à ecologia comportamental

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curso para as formigas, previsível no tempo e no espaço. Ainda no campo, verifiquei que isto era mesmo verdade, pois esses membracídeos ocorriam numa única espécie de planta, uma Araliaceae da savana tropical brasileira, e ficavam ali dia e noite, até se tornarem adultos, quando então voavam, se dispersando. Para conhecer bem o sistema, passei um ano observando o comportamento dos membracídeos (inclusive sua biologia básica) e das formigas. Em todos os meses do ano, eu ia ao campo e, no primeiro dia, marcava todas as plantas que tinham a relação. Feito isto, durante 24 horas, ininterruptamente, de duas em duas horas, em cada planta com a interação, eu registrava quantos membracídeos havia nas plantas (adultos, ninfas e massas de ovos), quem eram as formigas (espécie) e número delas nas plan-tas. Este trabalho inicial me proporcionou um grande conhecimento sobre a espécie. Descobri que mais de 21 espécies de formigas se relacionavam com esta única espécie de inseto sugador, numa única espécie de planta; que ha-via formigas diurnas, noturnas, crepusculares e aquelas que ficavam, dia e noite, cuidando dos membracídeos. Isto mesmo! Cuidando! Percebi que for-migas atacavam aranhas, hemípteros predadores, mantódeos, parasitoides, enfim, todos os inimigos naturais que pudessem prejudicar sua rica fonte de alimento: os membracídeos. Pude perceber também que as formigas, como bons carnívoros, removiam herbívoros da planta hospedeira. Assim sendo, depois de um ano estudando estes animais e lendo, lendo muito e discutin-do muito com meu orientador, pude elaborar hipóteses ecológicas (ecologia comportamental e de interações) que pudessem me ajudar a compreender como funcionava este sistema único e como eu poderia fazer um estudo que servisse de exemplo para o conhecimento de outros sistemas similares. A intenção era ajudar na compreensão de redes tróficas e na preservação das comunidades naturais, a partir dos estudos de interações ecológicas. Pensamos, então, nas seguintes hipóteses e elaboramos metodologias para testá-las no campo:

● Os membracídeos se beneficiam da relação com as formigas e esse benefício se traduz em maior sobrevivência e reprodução quando os membracídeos são atendidos e cuidados pelas formigas.

● As plantas se beneficiarão da relação, se os custos da manutenção da interação membracídeo-formiga sobre elas for menor que o benefício conferido pela remoção de outros herbívoros pelas formigas.

● Essas relações são dinâmicas e condicionais, ou seja, seus resultados finais irão variar, dependendo das espécies de formigas associadas (pois variam em comportamento e morfologia) e das condições do meio (principalmente o clima).

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Introdução à Ecologia Comportamental ♦ um manual para o estudo do comportamento animal

Uma série de testes de manipulação experimental, comparando plan-tas onde mantínhamos e removíamos as formigas, durante dois anos, nos permitiram testar as previsões que acabaram por corroborar as três hipóte-ses. A relação pode ser benéfica para todos os envolvidos, mas depende das espécies de formigas associadas, das condições climáticas (especialmente de variações na temperatura) e da diversidade e abundância de herbívoros e inimigos naturais dos membracídeos presentes no campo. Este estudo, com pano de fundo comportamental, nos permitiu verificar e publicar, ou seja, compartilhar nossa teoria com outros colegas, a idéia de que, nas cadeias tróficas, as forças que vêm da base para o topo (como a planta e seus her-bívoros) também são afetadas pelas forças que vem do topo para a base (a ação de predadores). Deste choque de interesses, surgem novas interações e resultados que afetam não apenas esta cadeia trófica, mas também outras, criando laços que podem envolver toda a comunidade, estruturando a bio-diversidade.

3.5. Como encontro meu caminho?

Sinceramente, espero que este livro tenha deixado você intrigado(a), cheio(a) de expectativas e ainda com muitas dúvidas. Isto vai fazer você ler! Ir adiante! Você tem que ir além de onde nós já fomos, pois, só assim, progre-diremos. Lendo os trabalhos dos outros, a gente fica sempre se perguntando: “Ah! Será que eu encontro uma pergunta bonita, um assunto legal para es-tudar? Será que eu encontro algo novo, que chame a atenção?” Vai encontrar sim! Vá com calma, seja persistente e estude, abra seus olhos – muitas vezes, é nos pequenos detalhes, nos animaizinhos menos chamativos do mundo, que encontramos enormes novidades. Já pensou em estudar pseudoescorpi-ões? Pois é, nem eu tinha pensado nisso, até aparecer um excelente aluno na minha porta. Juntos, descobrimos que a espécie que ele tinha em mãos talvez seja o aracnídeo com o maior desenvolvimento social que existe! Esses pseudoescorpiões formam colônias e vivem de um modo que rivaliza com a organização das formigas.

As coisas não serão fáceis; seu trabalho não será reconhecido da noite para o dia; haverá muitos revezes, mas não caia em tentação! Mantenha-se fiel a sua dignidade como pesquisador, tenha sempre dados confiáveis em mãos, esforce-se para isso. Pense sempre assim: “Minha hora vai chegar!” Mas quando será? Passo a passo, você descobrirá que a melhor hora será aquela na qual seu trabalho lhe rendeu um sorriso, um momento de prazer, de felicidade.

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Parte 3 ♦ Guia introdutório à ecologia comportamental

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Boa sorte na sua jornada!

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BiBliografia

ParTE 4

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Introdução à Ecologia Comportamental ♦ um manual para o estudo do comportamento animal

4.1. Literatura citada

1. Alcock, J. Animal behavior: an evolutionary approach, 8th edition. Sinauer Associates, 2005.

2. Oliveira, P.S. & Holldöbler, B. Orientation and communication in the neotropical ant Odontomachus-Bauri Emery (Hymenoptera, Formicidae, Ponerinae). Ethology 83:154-166, 1989.

3. Nelson, J.X. & Jackson, R.R. Anti-predator crèches and aggregations of ant-mimicking jumping spiders (Araneae: Salticidae). Biological Journal of Linnean Society 94:475-481, 2008.

4. Hrdy, S.B. Infanticide as a primate reproductive strategy. American Scientist 65:40-49, 1977.

5. Triplehorn, C.A. & Johnson, N.F. Borror & DeLong’s introduction to the study of insects, 7th edition. Thomson Brooks/Cole, 2005.

6. Altmann, J. Observational study of behavior: sampling methods. Behaviour 69:227-263, 1974.

7. Paro, C.M., Oliveira, F.R. & Del-Claro, K. Comportamento reprodutivo de Zelus leucogrammus, Perty 1834 (Reduviidae). Revista de Etologia 3(1) p. 231-245, 2001.

8. Martinele, I. & D’Agosto, M. Predation and cannibalism among ciliate protozoans (Ciliophora: Entodiniomorphida: Ophryoscolecidae) in the rumen of sheep (Ovis aries). Revista Brasileira de Zoologia 25(3): 451-455, 2008.

9. Tizo-Pedroso, E. & Del-Claro, K. Cooperation in the neotropical pseudoscorpion, Paratemnoides nidificator (Balzan, 1888): feeding and dispersal behavior. Insectes Sociaux 54(2):124-131, 2007.

10. Endler, J.A. A predator’s view of animal color patterns. Evolutionary Biology 11:319-364, 1978.

4.2. Literatura recomendada

A seguir, cito alguns livros e artigos que podem ser úteis para esquentar os motores em seu aprendizado.

Alcock, J. Animal behavior: an evolutionary approach, 8th edition. Sinauer Associates, Sunderland, Massachusetts, 2005.● Livro básico e introdutório para o estudo do comportamento animal

e da ecologia comportamental. Por sua linguagem clara, é o melhor texto para um iniciante. Introduz muito bem o aluno à ecologia comportamental.

Page 117: Livro Introdução à ecologia comportamental

Parte 4 ♦ Bibliografia

115

Altmann, J. Observational study of behavior: sampling methods. Behaviour 49: 227-267, 1974.● Artigo clássico que trouxe as diretrizes básicas para a observação do

comportamento animal usadas por todos nós, etólogos.Appleby, M.C. & Hughes, B.O. Animal welfare. CAB International,

Wallinford, 1997.● Obra de referência no estudo do bem-estar animal, cuidado que todos

devemos ter.Bergallo, H.G., Rocha, C.F.D., Alves, M.A.S. & Sluys, M.V. A fauna ameaçada

de extinção no Estado do Rio de Janeiro. EDUERJ, 2000.● Livro muito interessante para conhecermos um pouco dos problemas

que ameaçam a fauna no Brasil. Um exemplo a ser seguido em outras regiões do país, pois faz um retrato claro do que existe.

Cuthill, I. Field experiments in animal behaviour: methods and ethics. Animal Behaviour 42:1007-1012, 1991.● Uma discussão sobre a ética no estudo do comportamento.

Del-Claro, K. & Oliveira, P.S. Honeydew flicking by treehoppers provides cues to potential tending ants. Animal Behavior 51:1071-1075, 1996.● Traz os artigos das pistas para as formigas encontrarem homópteros.

Veja também...Del-Claro, K. & Oliveira, P.S. Ant-homoptera interaction: do alternative

sugar source distract tending ants? OIKOS 68:202-206, 1993.Del-Claro, K., Prezoto, F. & Sabino, J. As distintas faces do comportamento

animal, 2a edição. Editora Anhanguera, São Paulo, 2008.● Obra mais completa existente em português sobre as distintas linhas

de pesquisa existentes em etologia no Brasil. Del-Claro, K. Uma orientação ao estudo do Comportamento Animal. Edição

do autor. 90 p., 2004. Disponível gratuitamente em PDF: www.leci.ib.ufu.br ou www.cnpq.br.

Del-Claro, K. Notes on mimicry between two tropical beetles in South-eastern Brazil. Journal of Tropical Ecology 7:407-410, 1991. ● Meu primeiro artigo científico.

Doria Filho, U. Introdução à bioestatística para simples mortais. Negócio Editora, São Paulo, 1999.● Recomendo por ser simples, básico e ótimo para quem ainda está se

introduzindo na biostatística.Eberhard, W.G. Behavioral characters for the higher classification of orb-

weaving spiders. Evolution 36:1067-1095, 1982.● Um artigo que mostra, claramente, a ampla utilização das ferramentas

da etologia na biologia, sistemática e ecologia. Um ótimo exemplo a ser seguido.

Page 118: Livro Introdução à ecologia comportamental

116

Introdução à Ecologia Comportamental ♦ um manual para o estudo do comportamento animal

Gonzaga, M.O., Santos, A.J. & Japyassu, H.F. Ecologia e comportamento de aranhas, 2007. Interciência, Rio de Janeiro, 2007● Trata-se de um bom livro para quem aprecia os aracnídeos, pois, cada

capítulo une o útil (ecologia) ao agradável (comportamento).Hölldobler, B. & Wilson, E.O. The Ants. Harvard University Press, 1990.

● É a bíblia do estudo do comportamento das formigas. Foi ganhador do prêmio Pulitzer de 1991.

Krebs, J.R. & Davies, N.B. Introdução à ecologia comportamental. Atheneu Editora São Paulo, 1996.● Um bom livro, embora muito pesado para iniciantes.

Lehner, P.N. Handbook of ethological methods. Cambridge University Press, 1996.● Excelente livro de metologia em estudos de campo e laboratório.

Lorenz, K.Z. Innate bases of learning. In: On the biology of learning. K.H. Pribram (ed.). Harcourt Brace Jovanovich, New York, 1969.● Um dos artigos clássicos no estudo do comportamento, escrito

por um dos homens que deram a grande arrancada na ecologia comportamental, no século XX. Ver também Tinbergen e von Frisch.

Martin, P. & Bateson, P. Measuring behaviour. an introductory guide, 2nd edition. Cambridge University Press, 1993.● Talvez o melhor livro já publicado sobre métodos de estudo em

comportamento animal.Mayr, E. Cause and effect in biology. Science 134:1501-1506, 1961.

● Artigo instigante. Um clássico do maior evolucionista do século XX.Mayr, E. Populações, espécies e evolução. EDUSP/Nacional, São Paulo, 1977.

● Um livro imperdível para biólogos que, realmente, queiram compreender as bases da genética de populações.

Novaes e Silva, V. & Araújo, A.F.B. Ecologia dos lagartos brasileiros, Technical Books, Rio de Janeiro, 2008. ● Livro estimulante, que abre as portas para o universo da herpetologia

no Brasil.Paro, C.M., Oliveira, F.R. & Del-Claro, K. Comportamento reprodutivo de

Zelus leucogrammus, Perty 1834 (Reduviidae). Revista de Etologia 3 (1):47-57, 2001.● Um ótimo artigo sobre como se faz um etograma.

Pontes, J.A.L. & Rocha, C.F.D. Serpentes da Serra do Mendanha, Rio de Janeiro, RJ: ecologia e conservação, Technical Books, Rio de Janeiro, 2008. ● Excelente e utilíssimo catálogo das serpentes da Mata Atlântica.

Page 119: Livro Introdução à ecologia comportamental

Parte 4 ♦ Bibliografia

117

Reis, N.R., Peracchi, A.L. & Santos, G.A.S.D. Ecologia de morcegos, Technical Books, Rio de Janeiro, 2008. ● Livro introdutório, porém muito interessante. Embora trate

basicamente de ecologia, abre o caminho para quem quer estudar o comportamento e a ecologia comportamental dos quirópteros.

Ross, K.G. & Mathews, R.W. The social biology of wasps. Cornell University Press, New York, 1991.● Livro interessante para quem quer estudar comportamento de vespas

e abelhas. Tinbergen, N. The study of instinct. Oxford University Press, New York, 1951.Tinbergen, N. Curious naturalists. Doubleday, Garden City, New York, 1958.

● Acima, dois artigos clássicos no estudo do comportamento, escritos por um dos homens que deram a grande arrancada na ecologia comportamental, no século XX. Ver também Lorenz e von Frisch.

Trivers, R. Social evolution, Benjamin Cummings, Menlo Park, 1985.● Uma clara, estimulante e instigante discussão sobre sociobiologia.

von Frisch, K. The dance language and orientation of bees. Harvard University Press, Cambridge, 1967.● Um dos artigos clássicos no estudo do comportamento, escrito

por um dos homens que deram a grande arrancada na ecologia comportamental, no século XX. Ver também Lorenz e Tinbergen.

von Matter, S. et al. Ornitologia e conservação: ciência aplicada, técnicas de pesquisa e levantamento, 2010. ● Excelente livro para quem quer se iniciar no estudo da ornitologia e

do comportamento de aves. Básico, essencial.Zar, J.H. Bioestatical analysis, 2nd edition. Prentice-Hall, Englewood Cliffs,

New Jersey, 1984.● Um clássico da bioestatística mundial, que traz tudo bem explicado,

claro, com desenvolvimentos etc.

Há muitas e muitas outras obras que poderiam e deveriam ser citadas aqui, mas estas são apenas para você aquecer os motores, ter por onde começar. Não se esqueça de periódicos, como Animal Behaviour, Behaviour, Ethology, American Naturalist, Journal of Natural History e outros. Não se esqueça também das obras gerais sobre ecossistemas, que têm se tornado mundialmente importantes, nos últimos anos.

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Glossário

PArTE 5

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Introdução à Ecologia Comportamental ♦ um manual para o estudo do comportamento animal

abordagem comparativa (comparative method) ♦ também denominada méto-do comparativo; procedimento utilizado para testar hipóteses evolu-tivas baseado em comparações disciplinadas (previsões) entre espé-cies com relações evolutivas conhecidas.

adaptação (adaptation) ♦ qualquer mudança na estrutura ou na função de um organismo ou de uma de suas partes, que o torna mais adequado ao seu ambiente e/ou às funções que nele executa.

agonístico (agonistic) ♦ relativo a luta, conflito, combate; comportamento agressivo que inclui reações como ameaça, ataque e fuga, observado em encontros entre dois indivíduos.

altruísmo (altruism) ♦ comportamento cuja ação prejudica o próprio indiví-duo mas beneficia outros, geralmente seus parentes.

amostragem de sequências (sequence sampling) ♦ técnica de registro de atos comportamentais na qual se realiza a observação de uma sequência de eventos em um intervalo de tempo definido; normalmente se utili-za esta técnica para estudar um determinado evento comportamental, como uma cópula, por exemplo.

amostragem de todas as ocorrências (all occurrence sampling) ♦ técnica de registro na qual se realiza uma amostragem à vontade (ad libitum) do comportamento animal, anotando-se todos os atos comportamentais que o animal executa.

amostragem do animal focal (focal sampling; focal animal sampling) ♦ técnica utilizada na observação de um único indivíduo ou grupo de indivídu-os (grupo focal), que, de maneira semelhante aos “snapshots”, permite realizar censos de comportamento dos indivíduos em intervalos regu-lares de tempo; também permite que, em um determinado grupo de animais, o pesquisador mude de indivíduo focal a cada minuto, por exemplo.

amostragem instantânea (instantaneous sampling) ♦ também conhecida como snapshots ou “fotografias”; técnica de registro de comportamento na qual se realiza a observação dos comportamentos de um ou mais indi-víduos em intervalos regulares de tempo; como exemplo, pode-se citar a aplicação desta técnica na observação de uma colônia de vespas so-ciais, ou de formigas, na qual o comportamento de todos os indivíduos é registrado em intervalos de cinco minutos.

aposematismo (aposematism) ♦ comportamentos, padrões, cores ou mesmo sons notáveis adotados por organismos nocivos para advertir os preda-dores sobre seu perigo potencial.

aprendizagem (learning) ♦ mudança durável e normalmente adaptável no comportamento de um indivíduo, fruto de uma experiência de vida.

Page 123: Livro Introdução à ecologia comportamental

Parte 5 ♦ Glossário

121

ato egoísta (selfish act) ♦ também denominado comportamento egoísta (selfish behavior); ação comportamental que beneficia quem a executa mas pre-judica quem a recebe ou está sujeito a seus efeitos.

behaviorismo (behaviorism) ♦ escola da psicologia que propõe que o estudo do comportamento só possa ser feito através de ações que possam ser observadas.

bem-estar animal (animal welfare) ♦ ramo da etologia que estuda como me-lhorar as condições de vida de animais em cativeiro.

benefício (benefit) ♦ aperfeiçoamento na sobrevivência e no sucesso reprodu-tivo (ganho), como resultado de um determinado comportamento.

catálogo comportamental (behavioral repertory) ♦ também denominado re-pertório comportamental e etograma; listagem de parte dos comporta-mentos conhecidos de um animal.

categoria comportamental (behavioral category) ♦ categoria de um etograma.coevolução (coevolution) ♦ ocorrência de características geneticamente deter-

minadas (adaptações) em duas ou mais espécies, sendo essas caracte-rísticas moldadas pelas interações entre os organismos envolvidos, su-jeitos à ação de seleção natural.

coloração críptica (cryptic coloration) ♦ também denominada camuflagem (camouflage); semelhança de um animal com alguma parte de seu am-biente; quando o padrão de coloração de um animal o confunde com o pano de fundo ambiental no qual se encontra.

coloração de advertência (warning coloration) ♦ também denominada colo-ração aposemática (aposematic coloration); coloração ostentada por um animal, que adverte sobre seu perigo, toxidez, impalatabilidade ou aposematismo.

coloração disruptiva (disruptive coloration) ♦ coloração que quebra os contor-nos do corpo do animal.

competição (competition) ♦ disputa de um mesmo recurso por duas ou mais espécies, quando o recurso, geralmente, é insuficiente para as neces-sidades combinadas dessas espécies.

competição interespecífica (interespecific competition) ♦ competição entre indi-víduos de duas ou mais espécies.

competição intraespecífica (intraspecific competition) ♦ competição entre membros de uma mesma espécie.

comportamento animal (animal behavior, nos EUA; animal behaviour, na Grã-Bretanha) ♦ todo e qualquer ato executado por um animal, seja este ato perceptível ou não ao universo sensorial humano; tudo que um animal faz ou deixa de fazer.

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122

Introdução à Ecologia Comportamental ♦ um manual para o estudo do comportamento animal

comportamento social (social behavior) ♦ qualquer interação direta entre in-divíduos da mesma espécie, geralmente aparentados e vivendo em um grupo.

comunicação (communication) ♦ sinal de um organismo que altera o padrão de comportamento de outro organismo.

conspicuidade (conspicuity) ♦ também denominada vistosidade; qualidade ou condição do que é conspícuo, muito visível, chamativo; adjetivo: conspicuamente (conspicuously).

cópula (copulation) ♦ também denominada acasalamento (mating); comporta-mento reprodutivo que resulta na deposição de esperma do macho no trato reprodutivo da fêmea.

cronobiologia (chronobiology) ♦ estudo científico do relógio biológico dos or-ganismos, ou seja, de como reagem, fisiológica e psicologicamente, ao longo de um intervalo de tempo regular.

Darwin, Charles Robert ♦ pai da teoria da seleção natural; biólogo, natura-lista, geólogo e evolucionista que mudou radicalmente a maneira da humanidade entender a ciência e de como o ser humano se encaixa na ecologia global.

dimorfismo sexual (sexual dimorphism) ♦ conjunto de diferenças notáveis pela qual os machos e as fêmeas de uma mesma espécie se diferenciam na aparência.

display ♦ exibição, ostentação; ação estereotipada usada como um sinal de comunicação por indivíduos.

ecologia (ecology) ♦ ciência que estuda as relações dos organismos com seu ambiente biótico e abiótico; ciência que estuda como os organismos afe-tam e são afetados pelo ambiente; a economia da natureza, segundo Ernest Haeckel.

ecologia comportamental (behavioral ecology) ♦ ciência que estuda o compor-tamento animal, considerando suas bases ecológicas e evolutivas; ciên-cia que, através de experimentação, busca evidenciar as causas evoluti-vas ou adaptativas dos comportamentos.

escolha de parceiros (mate choice) ♦ seleção de um parceiro baseada nas ca-racterísticas de seu fenótipo ou de seu território.

esforço reprodutivo (reproductive worth) ♦ também denominado investimento reprodutivo (reproductive investment); alocação de tempo ou recursos, ou o ato de assumir risco, de modo a aumentar a fecundidade.

especiação (speciation) ♦ processo evolutivo que divide uma população em duas, reprodutivamente isoladas uma da outra.

especialização (specialization) ♦ adaptação de forma ou função que favorece, particularmente bem, a um indivíduo, em um conjunto restrito de ha-bitats, recursos ou condições ambientais.

Page 125: Livro Introdução à ecologia comportamental

Parte 5 ♦ Glossário

123

estímulo (stimulus) ♦ alguma característica do ambiente biótico ou abiótico que induz uma resposta em um receptor.

estímulo liberador (liberation stimulus; stimulus release) ♦ estímulo sensorial que provoca um padrão fixo de ação.

estímulo-sinal (sign stimulus) ♦ também denominado estímulo liberador; es-tímulo que desencadeia um padrão fixo de ação.

estratégia evolutivamente estável (EEE) (evolutionary stable strategy) ♦ estra-tégia que, se todos os membros de uma população a adotassem, nenhu-ma estratégia alternativa poderia ocorrer no sistema.

etograma (ethogram) ♦ conjunto de descrições das características básicas do padrão de comportamento de uma espécie; o mesmo que catálogo com-portamental e repertório comportamental.

etologia (ethology) ♦ ciência que estuda o comportamento animal, inclusive o humano.

eussocial (eusocial) ♦ também denominado social verdadeiro; termo aplicado a insetos sociais, nos quais os indivíduos que, geralmente, vivem em um mesmo ninho, apresentam as seguintes características: cooperação no cuidado com a prole, sobreposição de gerações e divisão reproduti-va do trabalho; substantivo: eussocialidade.

evolução (evolution) ♦ mudança nos atributos herdáveis, através da substitui-ção dos genótipos numa população; em geral, essa mudança resulta de seleção natural, mutação ou deriva genética; não deve ser entendida como sinônimo de progresso, mas apenas como sinônimo de mudança ou modificação.

filogenia (filogeny) ♦ história evolutiva de um grupo específico de organis-mos, que mostra as ligações genéticas entre ancestrais e descendentes.

fitness (valor adaptativo) ♦ uma medida dos genes passados por um indiví-duo para a próxima geração, frequentemente mensurado através do número de descendentes produzidos que sobrevivem em condições de se reproduzir.

fitness adaptativo (adaptive fitness) ♦ também denominado valor adaptati-vo (adaptive value), valor seletivo (selective value) ou fitness darwiniano (Darwinian fitness); medida dos genes transmitidos por um indivíduo para a próxima geração, frequentemente mensurado através do núme-ro de descendentes produzidos que sobrevivem em condições de se reproduzir.

fitness direto (direct fitness) ♦ genes transmitidos por um indivíduo para a próxima geração, através de sua reprodução pessoal, manifestada nos seus descendentes.

fitness inclusivo (inclusive fitness) ♦ soma do valores adaptativos direto e in-direto de um indivíduo.

Page 126: Livro Introdução à ecologia comportamental

124

Introdução à Ecologia Comportamental ♦ um manual para o estudo do comportamento animal

fitness indireto (indirect fitness) ♦ genes indiretamente transmitidos por um indivíduo para a próxima geração, principalmente, pela ajuda na cria-ção da prole de parentes.

forrageamento ótimo (optimal foraging) ♦ conjunto de ações, incluindo au-mento ou diminuição na amplitude da dieta, através das quais um or-ganismo maximiza a assimilação de alimentos por unidade de tempo ou minimiza o tempo necessário para obter o alimento; atualmente, admite-se forragear por outros recursos, como local de nidificação, par-ceiro sexual, local de caça etc.

fotoperíodo (photoperiod) ♦ intervalo de tempo decorrido entre o nascer e o pôr do sol, no qual a luz do dia está presente, durante o qual um ve-getal ou um animal precisa ficar exposto à luz solar para realizar seus processos fisiológicos e ter seu desenvolvimento normal.

generalista (generalist) ♦ espécie com uma ampla preferência de alimentos ou habitats.

habitat ♦ espaço ou lugar onde uma planta ou um animal normalmente vive, frequentemente caracterizado por uma forma vegetal ou característica física dominante.

habituação (habituation) ♦ a mais simples forma de aprendizado, na qual um animal é submetido a um estímulo sem recompensa ou punição para, subsequentemente, responder, de alguma maneira, ao estímulo.

herbívoro (herbivore) ♦ organismo que consome as plantas vivas ou partes delas.

hierarquia de dominância (dominance hierarchy) ♦ classificação ordenada de indivíduos em um grupo, baseada, principalmente, no resultado de en-contros agressivos.

hospedeiro (host) ♦ organismo vivo sobre o qual, ou dentro do qual, um pa-rasito ou comensal reside.

imagem de procura (searching image) ♦ mecanismo de percepção usado por um predador visualmente orientado para procurar uma presa; quan-do um predador é capaz de discernir entre dois ou mais padrões de coloração de presas, procurando diferencialmente por um deles no ambiente, diz-se que o predador formou uma imagem de procura da presa.

imprinting ♦ estampagem; rápida forma de aprendizagem, na qual um ani-mal aprende uma resposta particular, que é mantida por toda a vida.

inglês (English) ♦ língua que você tem que aprender a falar, se quiser ser cientista.

instinto (instinct) ♦ padrão comportamental desenvolvido na maioria dos indivíduos, que promove uma resposta funcional na primeira vez em que uma ação é executada.

Page 127: Livro Introdução à ecologia comportamental

Parte 5 ♦ Glossário

125

investimento parental (parental investiment) ♦ investimento dos pais em uma descendência ou grupo de descendências, que reduz a capacida-de de assistirem outros descendentes.

macroevolução (macroevolution) ♦ conjunto de alterações evolutivas que ocor-rem em longos períodos de tempo e, geralmente, envolvem mudanças em muitas características.

matemática (mathematics) ♦ em um futuro breve, um novo modo de se escre-ver biologia; ver biomatemática.

microevolução (microevolution) ♦ pequenas mudanças evolutivas que ocor-rem em curtos períodos de tempo.

mimetismo (mimetism; mimicry) ♦ semelhança de um organismo (animal) com algum outro organismo animal (modelo) desenvolvida para en-ganar predadores ou presas, confundindo o organismo mimético com seu modelo. ou

mimetismo batesiano (Batesian mimicry) ♦ mimetismo de uma espécie im-palatável (modelo) por uma espécie palatável (mímico), que serve para enganar os predadores.

mimetismo mülleriano (Müllerian mimicry) ♦ semelhança mútua de duas ou mais espécies impalatáveis, que serve para intensificar a rejeição dos predadores.

mímico (mimic) ♦ organismo adaptado para se assemelhar a um outro orga-nismo.

modelo (model) ♦ em mimetismo, organismo, normalmente impalatável ou nocivo aos predadores, imitado pelo mímico.

monogamia (monogamy) ♦ sistema de acasalamento no qual cada indivíduo se acasala apenas com um indivíduo do sexo oposto, geralmente envol-vendo uma ligação de parceria forte e duradoura.

mutação (mutation) ♦ mudança tipicamente aleatória na estrutura de um gene ou conjunto de cromossomos, que pode levar a variações herdadas.

mutualismo (mutualism) ♦ relação entre duas espécies que beneficia a ambas; pode ser obrigatório ou facultativo (protocooperação).

neurobiologia (neurobiology) ♦ ciência que estuda o comportamento, com es-pecial atenção aos mecanismos do sistema nervoso, em detrimento de aspectos evolutivos.

nicho (niche) ♦ papel funcional de uma espécie em relação a outras espécies e seu ambiente físico.

objeto de estudo (model) ♦ modelo; animal sobre o qual se centra a pesquisa.observações preliminares (initial observations; preliminary observations) ♦ ob-

servações iniciais sobre um determinado objeto de estudo.

Page 128: Livro Introdução à ecologia comportamental

126

Introdução à Ecologia Comportamental ♦ um manual para o estudo do comportamento animal

onívoro (onivorous) ♦ organismo cuja dieta é ampla, incluindo tanto plantas quanto animais; especificamente, um organismo que se alimenta em mais de um nível trófico.

... ótimo (optimum, optimal) ♦ estreito intervalo de condições ambientais, nas quais o organismo está ajustado em melhores condições.

padrão fixo de ação (PFA) ( fixed action pattern; FAP) ♦ também denomi-nado comportamento estereotipado; comportamento geneticamen-te programado, normalmente desencadeado por um estímulo (es-tímulo sinal); recentemente, passou a ser renomeado como padrão modal de ação (PMA).

paleoetologia (paleoethology) ♦ estudo do comportamento através de fósseis.período crítico (critic period) ♦ idade durante a qual algum tipo particular de

aprendizado deve acontecer ou durante a qual esse aprendizado ocorre muito mais facilmente do que em outro momento.

poliandria (poliandry) ♦ padrão de acasalamento no qual uma fêmea se aca-sala com mais de um macho ao mesmo tempo ou em rápida sucessão.

poligamia (poligamy) ♦ sistema de acasalamento no qual um macho se acasala com mais de uma fêmea, ou vice-versa, ao mesmo tempo ou em um curto tempo.

poliginia (poliginy) ♦ padrão de acasalamento no qual um macho se acasala com mais de uma fêmea ao mesmo tempo ou em um curto tempo.

polimorfismo (polimorphism) ♦ ocorrência de mais de uma forma distinta de indivíduos ou genótipos em uma população.

predador (predator) ♦ animal que mata e come outros animais; também se refere, raramente, a uma planta.

presa (prey) ♦ organismo animal consumido como fonte de energia.promiscuidade (promiscuity) ♦ acasalamento com muitos indivíduos em uma

população.psicologia comparada (comparative psycology) ♦ ramo da psicologia que mini-

miza a perspectiva evolucionária, tendo como foco principal o apren-dizado associativo.

razão sexual (sexual ratio; sex ratio) ♦ razão do número de indivíduos de um sexo em relação ao outro sexo, em uma população.

reciprocidade (reciprocity) ♦ altruísmo recíproco no qual um indivíduo retri-bui uma ação útil recebida anteriormente do outro indivíduo.

recurso (resource; source) ♦ aquilo que existe no ambiente e é requerido por um organismo para sua manutenção e crescimento, sendo consumido no processo de sua utilização.

refúgio (refuge; shelter) ♦ lugar onde uma espécie ou comunidade pode persis-tir em face de mudança ambiental sobre o restante de sua distribuição.

Page 129: Livro Introdução à ecologia comportamental

Parte 5 ♦ Glossário

127

repertório comportamental (behavioral repertory) ♦ descrição de todos os comportamentos que um animal é capaz de realizar; o mesmo que eto-grama e catálogo comportamental.

reprodução assexuada (asexual reproduction) ♦ reprodução sem o benefício da união sexual de gametas (fertilização).

reprodução sexuada (sexual reproduction) ♦ reprodução por meio da união de dois gametas (fertilização) para formar o zigoto.

retro-orientação (retro-orientation) ♦ característica apresentada por alguns animais que dá a impressão de que a cabeça é do lado oposto (na cau-da, por exemplo).

seleção de parentesco (parental selection) ♦ reprodução diferencial entre li-nhagens aparentadas, baseada em variação genética e comportamento social.

seleção natural (natural selection) ♦ variação na frequência gênica de uma população através da sobrevivência e reprodução diferenciada de in-divíduos que portam determinados alelos em uma população, em de-trimento de seus pares.

seleção sexual (sexual selection) ♦ seleção de indivíduos de um sexo por um indivíduo do sexo oposto, baseada em características fenotípicas (geral-mente aparência ou comportamento).

simbiose (symbiosis) ♦ qualquer relação entre dois organismos de espécies distintas.

sinal de alarme (alarm signal) ♦ sinal que indica a presença de perigo.sociedade (society) ♦ grupo de indivíduos pertencentes à mesma espécie e

organizados de maneira cooperativa.taxonomia (taxonomy) ♦ ciência que trata da descrição, identificação e classifi-

cação dos organismos, individualmente ou em grupo.tanatose (thanatosis) ♦ imobilidade tônica; capacidade que o animal tem de

fingir-se de morto para afastar predadores.teia alimentar (food net; food web) ♦ representação de várias vias de fluxo de

energia através das populações na comunidade, levando-se em consi-deração o fato de cada população compartilhar recursos com outras populações.

teoria dos jogos (game theory) ♦ análise das decisões comportamentais, na qual os resultados dependem do comportamento dos outros indivídu-os interagindo.

território (territory) ♦ qualquer área defendida por um ou mais indivíduos contra a invasão por outros indivíduos da mesma espécie ou de espé-cies diferentes.

trófico (trophic) ♦ relativo a nutrição; relativo a ou próprio de alimento ou do processo de alimentação.

Page 130: Livro Introdução à ecologia comportamental

128

Introdução à Ecologia Comportamental ♦ um manual para o estudo do comportamento animal

valor adaptativo individual (adaptative value) ♦ também denominado fitness; contribuição futura ao pool gênico da próxima geração, que pode ser medida pela prole (número de descendentes viáveis deixados pelo in-divíduo na população).

variação (variation) ♦ diferença entre indivíduos dentro de uma mesma es-pécie.

Page 131: Livro Introdução à ecologia comportamental

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ISBN 978-85-61368-12-8

9 788561 368128

Esta é a primeira obra a abordar em um mesmo volume a história, metodologia básica, modo de pensar e agir no estudo do comporta-mento e de suas variações. Através de uma linguagem franca, clara e acessível, enriquecida por lindas ilustrações e exemplos, o autor estabe-lece uma ligação direta com o leitor o orientando em cada passo para o desenvolvimento de um projeto de pesquisa em comportamento animal e/ou ecologia comportamental. Este livro capacita o leitor a entender as origens e processos do estudo do comportamento, assim como a planejar um projeto de pesquisa em seus diferentes níveis, da iniciação ao douto-ramento. Escrita por um dos nossos mais experientes e renomados cientis-tas, esta é uma obra básica não apenas para estudantes, mas também para os mestres interessados em lecionar as disciplinas etológicas, tanto o comportamento animal, quanto a ecologia comportamental.

Kleber Del Claro é professor no Instituto de Biologia da Universida-de Federal de Uberlândia desde 1992, é também pesquisador do CNPq (1B) desde 1996. Formado em Biologia pela Unicamp, onde também se doutorou em Ecologia, atua em diversos programas de pós-graduação do Brasil tendo orientado mais de 40 alunos de mestrado e doutorado. Coordenador de convênios internacionais na área de Ecologia organizou a Enciclopédia Internacional de Biologia Tropical da Unesco (Nações Uni-das para Educação, Ciência e Cultura), com mais de 120 capítulos. Presi-dente da Sociedade Brasileira de Etologia por dois mandatos é autor de diversos livros na área de comportamento animal, usados em cursos de graduação e pós-graduação do Brasil e do exterior. Visite a homepage do autor: www.leci.ib.ufu.br