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EXPOSIÇÃO SUMÁRIA DA DOUTRINA DA

NOVA JERUSALÉM

Entendida no Apocalipse pela NOVA JERUSALÉM

Por Emanuel Swedenborg

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Depois de ter publicado, no espaço de alguns anos, várias obras e livrinhos sobre a

NOVA JERUSALÉM, pela qual se entende A NOVA IGREJA que vai ser instaurada

pelo Senhor, e depois que o Apocalipse foi revelado, decidi trazer à luz a Doutrina

dessa Igreja em sua plenitude, e assim a doutrina inteira. Como, porém, é um

trabalho de alguns anos, resolvi apresentar um esquema desta obra, para que

primeiro se conceba uma idéia geral dessa igreja e de sua doutrina. Pois então as

idéias gerais precedem, e depois todas e cada uma das coisas, em sua extensão,

aparecem na luz, pois entram nas idéias gerais como coisas homogêneas em seus

receptáculos. Contudo, este Resumo não é submetido aos pareceres, para ser

discutido, mas é somente apresentado como um anúncio da doutrina, visto que seu

conteúdo será plenamente demonstrado na obra mesma (*). Como, porém, no que

se segue, se tratará das discordâncias entre os dogmas da igreja de hoje e os da

Nova Igreja, primeiramente serão apresentadas as doutrinas de hoje a respeito da

justificação.

(*) Swedenborg publicou este Resumo em 1769. A obra que se fala aqui, a saber A

VERDADEIRA RELIGIÃO CRISTA, contendo a Teologia Universal da Nova Igreja,

foi posta no prelo cerca de dois anos depois. Uma tradução portuguesa desta obra

foi publicada em 1964.

Doutrina dos Católicos Romanos sobre a Justificação, segundo o Concílio de Trento

2. Na Bula dada por Pio IV, pontífice romano, em 1564, nos Idos de Novembro,

lêem-se estas palavras: "Abraço e recebo todas e cada uma das coisas que foram

decididas e declaradas a respeito do PECADO ORIGINAL e da JUSTIFICAÇÃO, no

S.S. Concílio de Trento".

3. Decisões do Concílio de Trento sobre o Pecado Original:

(a) Adão, pela ofensa de sua prevaricação, ficou inteiramente deteriorado quanto ao

corpo e à alma;, a prevaricação de Adão prejudicou não só a Adão, como também à

sua posteridade; ,e essa prevaricação transmitiu a todo o gênero humano não só a

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morte e as penas do corpo, como também o pecado, que à a morte da alma.

(Sessão V, 1, 2);

(b) Esse pecado de Adão, que é um por origem, e que à transmitido por propagação

e não por imitação, é em cada ,homem o seu próprio e não pode ser arrebatado por

nenhum outro meio, exceto pelo Mérito do único Salvador Nosso Senhor Jesus

Cristo, que nos reconciliou com Deus em seu sangue, tendo-se tornado para nós a

JUSTIÇA, a SANTIFICAÇÃO o a REDENÇÃO. (Sessão V, 3);

(c) Todos os homens, na prevaricação de Adão, perderam a inocência e se tornaram

impuros, e por natureza filhos da ira. (Sessão VI, Capítulo 1).

4. Sobre a Justificação:

(a) 0 Pai Celeste, Pai das misericórdias, enviou aos homens o Cristo Jesus, Seu

Filho, quando chegou à bendita plenitude do tempo, não somente para redimir os

Judeus, que estavam sob a lei, mas também para que os gentios, que não seguiam

a justiça, a aprendessem, e para que todos recebessem a adoção de filhos. Daí

Deus 0 ofereceu para ser um Propiciador dos pecados pela fé em Seu sangue, e isto

não só pelos nossos pecados, como pelos pecados de todo o mundo. (Sessão VI,

Capítulo 2);

(b) Entretanto, não são todos os que recebem o benefício de Sua morte, mas

somente aqueles aos quais o Mérito de Sua paixão é comunicado; assim, se não se

renascer em Cristo, não é possível ser justificado. (Sessão VI, Capítulo 3).

(c) 0 princípio da Justificação deve ser tirado da graça de, Deus, vindo além disso

por Jesus Cristo, isto é, de sua vocação. (Sessão VI, Capítulo 5);

(d) Os homens estão dispostos à justiça quando, estimulados pela graça Divina e

recebendo a fé pelo ouvido, eles são livremente movidos em Deus, crendo

verdadeiro tudo o que foi Divinamente revelado e prometido, e principalmente este

ponto, que Deus justifica o ímpio por Sua graça, pela Redenção que está em Cristo

Jesus; quando compreendendo que são pecadores pelo temor da justiça Divina,

temor com que são utilmente alcançados, eles são elevados à esperança, tendo a

confiança em que Deus lhes será propício por causa do Cristo. (Sessão VI, Capítulo

6);

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(e) Essa disposição e essa, preparação são seguidas da própria Justificação, que é

não somente a remissão dos pecados,, mas também a santificação e a renovação

do homem interior pela recepção da graça e dos dons, por cuja conseqüência o

homem, de injusto, se torna justo, e de inimigo, amigo, para ser, segundo a sua

esperança, herdeiro da vida eterna. (Sessão VI, Capítulo 7);

(f) A Causa Final da Justificação é a glória de Deus e do Cristo, assim como a vida

eterna. A Causa eficiente é Deus, que purifica e santifica gratuitamente. A Causa

meritória é o Bem Amado Filho único de Deus, Nosso Senhor Jesus Cristo, o qual,

quando éramos inimigos, na excessiva Caridade com que nos amou, mereceu por

nós a Justificação e satisfaz a Deus Pai por nós, por Sua Santíssima paixão sobre a

madeira da cruz. A Causa Instrumental é o Sacramento do batismo, que é o

sacramento da fé, sem a qual ninguém pode alcançar a justificação. A Causa Formal

é a justiça de Deus, não a justiça pela qual Ele próprio é justo, mas a justiça pela

qual Ele nos faz justos, isto é, a justiça com que Ele nos gratifica e pela qual somos

renovados pelo espírito de nossa mente, e não só somos reputados justos, como

temos verdadeiramente o nome e realmente o somos, cada um segundo à medida

que o Espírito Santo repartiu como Ele o quer. (Sessão VI, Capítulo 7, § 2);

(g) A justificação é a translação desse estado, em que o homem nasce do filho do

primeiro Adão, no estado de graça e na adoração dos filhos de Deus pelo segundo

Adão, nosso Salvador Jesus Cristo. (Sessão VI, Capítulo 4).

5. Sobre a Fé a Caridade, as Boas Obras e os Méritos:

(a) Quando o Apóstolo diz que o homem é justificado pela fé gratuitamente, estas

palavras devem ser entendidas no sentido de que o começo perpétuo da Igreja

Católica manteve e exprimiu, a saber, que nós devemos ser justificados pela fé

,porque a Fé é o começo da salvação humana, fundamento e raiz de toda

justificação, sem a qual é impossível agradar a Deus e chegar à sociedade de seus

filhos; mas nós dizemos justificados gratuitamente, porque coisa alguma do que

precede a justificação, seja a fé, sejam as obras, não merece a graça mesma da

justificação. Pois, se é uma graça, ela não provém das obras e a graça não seria

uma graça. (Sessão VI, Capítulo 8);

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(b) Ainda que ninguém possa ser justo, senão aquele a quem os Méritos da paixão

de nosso Senhor Jesus Cristo são comunicados, entretanto isso é feito na

justificação, quando, pelo Mérito dessa santíssima paixão, a caridade de Deus,

derramada pelo Espírito Santo nos corações dos que são justificados -é ali inerente.

Aí, na própria justificação, com a remissão dos pecados o homem recebe todas as

coisas ao mesmo tempo infusas por Jesus Cristo, ao qual Ele é inserido pela fé, pela

esperança e pela caridade; pois a fé, se a caridade não se aproximar dela, não une

perfeitamente com o Cristo, e não faz o homem membro vivo de Seu corpo. (Sessão

VI, Capítulo 7, § 3);

(c) 0 Cristo é não só o Redentor no qual se deve confiar, mas também o Legislador

ao qual se deve obedecer. (Sessão VI, Capítulo 16, Cap. 21);

(d) A Fé sem as obras é morta e inútil, porque em Jesus Cristo não é a, circuncisão

nem o prepúcio que têm valor, mas é a fé que opera pela caridade, pois a fé, sem a

esperança e ti caridade, não pode dar a vida eterna; daí logo se ouve esta Palavra

do Cristo: "Se queres entrar na vida, guarda os mandamentos." Aqueles, que são

renascidos neste instante, recebendo a justiça verdadeira e Cristã, são mandados

conservá-Ia branca e imaculada,como uma primeira vestimenta que lhes foi dada

por Jesus Cristo, em lugar da que Adão, por sua desobediência, perdeu para ele e

para nós, para que eles a apresentem perante o tribunal de Nosso Senhor Jesus

Cristo, para que tenham a vida eterna. (Sessão VI, Capítulo 7 § 4);

(e) Jesus Cristo como a Cabeça nos membros, e como a cepa nos sarmentos, influi

continuamente por uma virtude nos que foram justificados; essa virtude precede

sempre as suas boas obras, as acompanha e as segue, e sem ela não poderiam ser

de modo algum agradáveis a Deus nem meritórios; é por isso que se deve crer que

não falta mais nada nos que foram justificados, tanto menos que por essas mesmas

obras que foram em Deus eles são tidos como havendo merecido a vida eterna, que

eles devem conseguir em seu tempo. (Sessão VI, Capítulo 16);

(f) Nossa própria justiça não é estabelecida como sendo própria por nós; pois a que

se diz nossa justiça é de Deus, porque Deus a infunde em nós pelo mérito de Cristo;

o homem: portanto, como um Cristão deve abster-se de se glorificar ou confiar em si

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próprio, mas sim no Senhor, cuja bondade para, conosco, os homens, é tão grande

que e Ele quer que as coisas que são dons, d'Ele sejam méritos para nós, (Sessão

VI, Capítulo 16);

(g) Por nós próprios nada podemos como vindo de nós mesmos, mas com Ele, que

nos conforta cooperando, tudo podemos; assim o homem nada tem de que possa se

glorificar, mas toda nossa glória está no Cristo, no qual vivemos, no qual

merecemos, no qual nos satisfazemos, fazendo frutos, dignos de penitência, que por

Ele têm força, por Ele são oferecidos ao: Pai, e através d'Ele são aceitos pelo Pai.

(Sessão XIV, Capítulo 8);

(h) Se alguém disser que o homem pode ser justificado diante de Deus por suas

obras, que são feitas, ou pelas forças dá natureza humana, ou pela doutrina da Lei,

sem. a graça Divina por Jesus Cristo, que ele seja condenado. (Sessão VI, Cap. 1);

(i) Se alguém disser que, sem que haja antes uma inspiração e. um auxílio do

Espírito Santo, o homem pode crer, esperar e amar (isto é, ter a fé, a esperança e a

caridade) como é necessário, para que a graça da justificação lhe seja conferida,

que seja condenado. (Sessão VI, Cap. 2);

(j) Se alguém disser que o homem pode ser justificado sem a justiça do Cristo, pela

qual Ele mereceu para nós, que seja condenado. (Sessão VI, Cap. 10).

E além disso, há muitos outros artigos, principalmente sobre a conjunção da fé à

caridade ou às boas obras, sobre a condenação de sua separação.

6. Sobre o Livre Arbítrio:

(a) 0 Livre Arbítrio não foi de modo algum destruído pelo pecado de Adão, ainda que

ele tenha sido atenuado e diminuído em forças. (Sessão VI, Capítulo 1);

(b) Se alguém disser que o Livre Arbítrio do homem, movido e excitado por Deus,

em nada pode cooperar dando o seu assentimento a Deus que o excita e o chama,

para que ele se disponha e se prepare para alcançar a graça da justificação, e :que

ele não pode recusar o seu assentimento, se o quiser, mas que, semelhante a

alguma coisa inanimada, ele nada faz absolutamente e é meramente passivo, seja

ele condenado. (Sessão VI, Cap. 4).

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7. As Doutrinas dos Católicos Romanos sobre a justificação tiradas dos Decretos do

Concílio de Trento, são em resumo e em série as seguintes: 65

Que aqui pelos bodes e pelas ovelhas não se entendem outros senão os que são

designados em Daniel pelo bode e pelo carneiro, é manifestamente claro. Pelos

bodes se entendem os que estão na fé justificante de hoje. Isso é evidente pelo fato

de que para as ovelhas há enumeração das obras da caridade e que se diz que elas

as fizeram e que para os bodes há enumeração das mesmas obras da caridade, e

que se diz que eles não as fizeram, e que, por esta razão, eles são danados. Pois,

nos que estão na fé justificante de hoje, há omissão das obras, pois eles negam que

haja nelas alguma coisa da salvação e da igreja. Quando a caridade é assim

afastada, as boas obras, que pertencem à caridade, escapam-se da mente, e se

apagam dela de tal modo que elas não ocorrem jamais à lembrança, ou que se não

faz mais esforço algum para se lembrar delas pela Lei do Decálogo.

Uma regra comum da religião é que quanto mais alguém não quer os bens e por

conseguinte não os faz, tanto mais ele quer os males e por conseguinte os faz. E

também, de modo inverso, quanto mais alguém não quer os males e por

conseguinte os não faz, tanto mais ele quer os bens e por conseguinte os faz. Estes

são as ovelhas e aqueles são os bodes. Se todos os maus tivesem sido entendidos

pelos bodes, teria havido enumeração, não das obras da caridade que eles não

fizeram, mas dos males que eles fizeram.

85. Que pelos bodes não se entendem outros senão aqueles, é o que me foi

provado pela experiência no Mundo Espiritual. Nesse mundo aparecem todas as

coisas que existem no mundo natural. Aparecem casas e palácios; aparecem

paraísos e jardins nos quais há árvores de toda espécie; aparecem campos e terras

cultivadas, planícies e prados. Vêem-se também rebanhos de gado grosso e miúdo.

E todas essas coisas se assemelham às que estão em nossa terra, sem qualquer

diferença, senão que estas são de uma origem natural, mas aquelas de uma origem

espiritual. Vi lá muitas vezes ovelhas e bodes, e também combates entre eles,

semelhantes a esse combate que é descrito em Daniel, Capítulo 8. Vi bodes com

chifres curvados para frente e para trás e que se lançavam com, furor sobre ovelhas.

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Vi bodes com dois e com quatro chifres, com que eles atacavam com ímpeto as

ovelhas. E quando examinei o que era, vi alguns espíritos que disputavam entre si

sobre a fé conjunta à caridade e a fé separada da caridade. Isso me provou que a fé

justificante de hoje, que, considerada em si mesma, é a fé separada da caridade, é o

bode, e que a fé conjunta à caridade é a ovelha.

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86. Pessoas semelhantes são entendidas pelos bodes em Zacarias

(Cap. 10, 3): "A minha ira se ateou contra os pastores e farei visita

sobre os bodes.".

E em Ezequiel (Cap. 34: 17, 18, 21, 22 e seguintes): "Eis, Eu julgo entre gado e

gado, entre os carneiros e os bodes. É pouco para vós que fazeis o bom pasto, e

calqueis com os vossos pés o resto das pastagens. Feris com os vossos chifres

todas as ovelhas debilitadas, até dispersá-las. Por isso salvarei o Meu rebanho, para

que ele não seja mais saqueado.".

(XX) 87. Os que se confirmaram na Fé justificante de hoje se entendem

no Apocalipse pelo dragão, pelas suas duas bestas e pelos gafanhotos.

E essa fé mesma confirmada é ali entendida pela grande cidade,

chamada espiritualmente Sodoma e Egito, onde as duas testemunhas

foram mortas, bem como pelo poço do abismo de onde saíram os

gafanhotos.

BREVE ANÁLISE

88. Em sete capítulos do Apocalipse se trata do estado pervertido da igreja entre os

reformados, e em dois, do estado pervertido da igreja entre os católicos romanos, e

esses estados de uma e outra igreja, quais eles são hoje, são condenados. Isso é,

mostrado na explicação, que é chamado Apocalipse Revelado, não por conjecturas

vãs, mas por provas convincentes e plenas. Pelo dragão, de que se trata no capítulo

12 do Apocalipse, são entendidos aqueles que, na igreja dos reformados, fazem de

um Deus três Deuses e de um Senhor dois Senhores, e que separam a caridade da

fé, fazendo a sua fé espiritual e salvífica, e não a caridade, (Veja-se Apocalipse

Revelado, 532 a 565, e Memorável, 566) . Eles são descritos, além disso, pelas

duas bestas saindo uma do mar e a outra da terra, (Apoc. 13, 567 a 610, e

Memorável 611). São também descritos pelos gafanhotos que saíram do poço do

abismo. (Apoc. 9, 419 a 442) Essa mesma fé confirmada se entende pela grande

cidade, chamada espiritualmente Sodoma e Egito, onde as duas fiéis testemunhas

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foram mortas, (Apoc. 11, 485 a 530, especialmente n 500 a 508, e Memorável 531)

Essa fé é tam

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bém entendida pelo poço do abismo, de onde saiu uma fumaça como de uma

grande fornalha, a qual escureceu o sol e o ar, e de onde, depois saíram gafanhotos,

(Apoc. 9: 421 a 424).

89. Para que eu fosse confirmado e plenamente convencido de que o poço do

abismo não significa outra coisa senão essa fé draconiana, que é uma fé que brotou

de uma idéia de três Deuses e não de idéia alguma da Divindade a respeito da

Natureza Humana de Cristo, e que é chamada a única fé justificante, regenerante,

vivificante, santificante e salvante, foi-ma permitido olhar nesse abismo, depois falar

com os que lá estavam, e também ver os gafanhotos que dele saíram. Por este

exame o poço com o abismo é descrito no Apocalipse Revelado. E como uma

descrição por exame é um testemunho certo, vou transcrevê-lo aqui: "Esse poço,

que é como a abertura de uma fornalha, aparece na região do sul, e o abismo que

está por baixo tem uma grande extensão para o leste. Lá, eles têm uma luz, mas se

a luz vinda do céu ali penetra, se torna trevas. Por isso esse poço é fechado por

cima. No abismo aparecem cabanas apaineladas como em tijolos, que são divididas

em pequenas celas, e em cada uma há uma mesa sobre a qual há papéis e alguns

livros. Cada um dos que lá se acham está assentado diante de sua mesa, e são eles

que, no mundo, tinham confirmado a justificação e a salvação pela fé só,

considerando a caridade como um ato meramente natural, moral e as obras da

caridade somente como as obras da vida civil, pelas quais os homens podem

recolher recompensas no mundo. Se, porém, elas são feitas para a salvação, eles

as condenam rigorosamente, porque há nelas a razão e a vontade humanas.

Todos os que estão nesse abismo tinham sido instruídos e eram eruditos no mundo,

e alguns dentre eles metafisicos e escolásticos, que lá são mais estimados do que

todos os outros. Ora, eis qual é a sua sorte. Quando, primeiramente são lançados lá,

eles entram nas primeiras celas. Mas, conforme eles confirmam a fé excluindo as

obras da caridade, eles deixam as primeiras moradas, e entram nas celas que estão

mais perto do leste, e assim sucessivamente até que vão para o fim, onde estão os

que confirmam esses dogmas pela Palavra. E como então, eles não podem: deixar

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de falsificar a Palavra, as suas cabanas se dissipam, e eles se vêem no deserto. Há

também, por baixo desse abismo um outro abismo onde se acham os que

igualmente confirmaram a justificação e a salvação pela fé só, mas que em seu

espírito negaram Deus, e escarneceram em seus corações das coisas da igreja. Lá

eles somente disputam entre si, rasgam as suas roupas, sobem sobre as, mesas,

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batem com os pés e brigam encontrando defeitos nos outros. E, como não se lhes

permite fazer mal a alguém, eles se ameaçam com a boca e o punho." (Apoc. Rev.

421).

90. Para que também eu fosse confirmado e convencido de que os que se

confirmaram na fé justificante de hoje são igualmente significados pelo dragão,

foi-me dado ver muitos milhares deles reunidos em assembléias. E então de longe

eles pareciam como um dragão com uma longa cauda, que parecia coberta de

pontas como as de um espinheiro, as quais significavam as falsidades. Uma vez

também vi um dragão ainda maior que, erguendo as costas, dirigia a sua cauda para

o céu, procurando arrastar as estrelas dali; essas estrelas significam as verdades.

(XXI) 91. Se a Nova Igreja não é instaurada pelo Senhor, ninguém

pode ser salvo. Isso se entende por estas palavras: "Se esses dias

não fossem abreviados, nenhuma carne se salvaria!" (Mat. 24:22).

BREVE ANÁLISE

92. Por abreviar esses dias, entende-se pôr fim à igreja de hoje e instaurar a Nova

Igreja. Pois, no capítulo 24 de Mateus, como acima se disse, trata-se da decadência

e da perversão sucessivas da Igreja Cristã, até à sua consumação e ao seu fim, e

então da vinda do Senhor. Que nenhuma carne poderia ser salva se esses dias não

fossem abreviados é porque a fé da igreja de hoje é fundada sobre a idéia de três

Deuses, e ninguém pode entrar no céu com essa idéia, nem por conseguinte

salvar-se. Porque tal idéia está em todas e cada uma das coisas dessa fé, e além

disso, não está nessa fé coisa alguma da vida que vem das obras da caridade. Que

essa fé não pode também ser conjunta à caridade, nem produzir algum dos frutos

que são as boas obras se mostrou acima nos n 47 a 50.

Há duas coisas que estabelecem o céu no homem, verdades da fé e os bens da

caridade. As verdades da fé fazem a presença do Senhor, e mostram o caminho do

céu, e os bens da caridade fazem a conjunção com o Senhor e introduzem no céu. E

cada um é introduzido na luz do céu segundo a afeição da verdade, e no calor do

céu segundo a afeição do bem. Que a afeição da verdade seja a fé em sua

essência, e que a afeição do bem seja a caridade em sua essência, e 0 pecado de

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Adão foi transmitido a todo o gênero humano; dali o seu estado, e por ele o estado

de todos os homens, foi pervertido e afastado de Deus, e assim eles se tornaram

inimigos e filhos da ira. Por isso, Deus Pai por sua graça enviou Seu Filho, para que

Ele reconciliasse, expiasse, fosse propício, satisfizesse, e por conseguinte

resgatasse, e que por esse modo fosse feita justiça. Cristo realizou e cumpriu tudo

isso, tendo se oferecido a Deus Pai em sacrifício sobre o madeiro da cruz, assim por

Sua paixão e por Seu sangue. Somente Cristo mereceu, e o Seu mérito é imputado,

atribuído, aplicado e transferido, segundo a graça por Deus Pai, por meio do Espírito

Santo, ao homem que o recebe, e o pecado de Adão é assim removido do homem,

ficando ainda nele a cobiça que o excita a pecar. A Justificação é a remissão dos

pecados, e por conseguinte faz-se uma renovação do homem interior, pelo que o

homem de inimigo se torna amigo, e de filho da ira se torna filho da graça; e assim

se faz uma união com o Cristo, e o renascido se torna membro vivo no Corpo d'Ele.

8. A fé vem pelo ouvido, quando o homem crê ser Verdadeiro o que foi divinamente

revelado e crê nas promessas de Deus. A fé é o começo da salvação humana, o

fundamento e a raiz de toda a justificação, sem a qual é impossível agradar a Deus,

vir na sociedade de Seus filhos. A Justificação se faz pela fé, a esperança e a

caridade. E a fé, a menos que a esperança e a caridade se aproximem dela, não é

uma fé viva, mas é uma fé morta que não une com Cristo. 0 homem deve cooperar;

ele pode aproximar-se ou afastar-se; de outro modo nada lhe poderia ser dado, pois

seria como um corpo inanimado. Porque a recepção da justificação renova o

homem, e porque isso se faz pela aplicação do mérito do Cristo nele, cooperando o

homem, segue-se que as obras são meritórias. Mas, porque estas obras se fazem

pela graça e pelo, Espírito Santo, e porque o Cristo mereceu, Deus faz com que os

Seus dons sejam meritórios no homem; daí resulta, que ninguém pode atribuir a si

coisa alguma do mérito.

Doutrinas dos Protestantes sobre a Justificação, segundo a Fórmula de Concórdia.

9. O livro do qual as 'passagens seguintes foram extraídas é chamado Fórmula de

Concórdia, que foi escrito por homens aprovados pela Confissão de Augsburg e

porque as páginas são citadas desse livro, onde se acham as passagens que vão

ser dadas, aviso que me servi da edição de Leipzig, no ano de 1756.

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10. Segundo a Fórmula de Concórdia, sobre o Pecado Original:

(a) Depois da queda de Adão, todos os homens, propagados segundo a natureza,

nasceram dele com o pecado que condena e traz a morte eterna aos que não

renascem, e o Mérito do Cristo é o meio único pelo qual renascem, assim o único

remédio pelo qual eles são curados. (Pág. 9, 10, 52, 53, 55, 317, 641, 644; e

Apêndice, pág. 138, 139);

(b) 0 pecado original é uma corrupção de uma natureza tão profunda, que nada é

espiritualmente são no corpo e na alma do homem, nem em suas forças. (Pág. 574);

(c) Ele é a fonte de todos os pecados ativos. (Pág. 317, 577, 639, 640, 942;

Apêndice, pág. 139);

(d) Ele é uma falta total ou uma privação total da imagem de Deus. (Pág. 640);

(e) Deve-se manter uma distinção entre a natureza, tal qual ela foi criada por Deus, e

o pecado original que habita em nossa natureza. (Pág. 645);

(f) Além disso, o pecado original é ali chamado obra do diabo, veneno espiritual, raiz

de todos os males, acidente (*) e qualidade (*); e a natureza é ali chamada obra e

criatura de Deus, pessoa, substância e essência do homem; e entre a natureza e o

pecado há uma distinção como entre o homem infectado de doença e a doença em

si.

(*) Termos filosóficos significando propriedades secundárias.

11. Doutrinas Gerais Sobre a Justificação pela Fé:

(a) Pela Palavra e pelos Sacramentos, aqueles que escutam o Evangelho são

gratificados com o Espírito Santo, que produz a fé onde e quando convém;

(b) A contribuição, a justificação pela fé, a invocação e as boas obras seguem em

ordem; estas coisas devem ser bem distinguidas; a contribuição e as boas obras

nada fazem para, salvação, mas a fé só faz tudo;

(c) A justificação pela fé só é a remissão dos pecados, a libertação da danação, a

reconciliação do Pai, adoção como filhos, e isso se faz pela imputação do, mérito ou

da justiça do Cristo;

(d) Dali a fé mesmo é essa justiça, pela qual somos reputados justos perante Deus,

e ela é uma segurança na graça e uma confiança;

(e) A renovação que segue é a vivificação, a regeneração e a santificação;

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(f) Depois dessa renovação vêm as boas obras, que são os, frutos da fé, sendo em

si obras do Espírito;

(g) Essa fé é perdida por males graves.

As Doutrinas Gerais sobre a Lei o Evangelho:

(h) Deve-se bem distinguir entre atei e o Evangelho, e entre' obras da Lei e as obras

do Espírito que são os Frutos da fé;

(i) A Lei é a doutrina que mostra que o homem está nos pecados, e assim na

danação e ira de Deus; por isso é uma doutrina que traz terror, e o Evangelho é a

doutrina sobre a expiação, pelo Cristo, dos pecados e da danação, e assim unia

doutrina de consolação;

(j) Há três usos da Lei; reprimir os ímpios, levar os homens ao reconhecimento dos

pecados e ensinar as regras da vida aos que renasceram;

(k) Os Renascidos estão na Lei e não sob a Lei, mas sob a graça;

(l) Os Renascidos devem agir dentro da Lei, porque, enquanto viverem no mundo,

eles são pela carne excitados ao pecado, mas depois da morte eles se tornam puros

e perfeitos;

(m) Os Renascidos são também repreendidos pelo Espírito Santo, e são levados,

por diversos modos, a lutarem, mas, contudo, seguem a Lei voluntariamente, e

assim eles vivem filhos de Deus na Lei;

(n) Nos que não são renascidos, o véu de Moisés permanece ainda diante dos

olhos, e o velho Adão domina, mas nos que são Renascidos, o véu de Moisés é

retirado, e o velho Adão é mortificado.

12. Sobre a Justificação pela Fé sem as Obras da Lei, Doutrinas Particulares tiradas

da Fórmula de Concórdia:

(a) A fé é imputada em justiça sem as obras, por causa do Mérito do Cristo, de que a

fé se apodera (Pág. 78, 79, 80, 584, 689);

(b) A Caridade segue a Fé que justifica, mas a fé não justifica, enquanto ela foi

formada pela caridade, como os Católicos Romanos falam (Pág. 81, 89, 94, 117,

688, 691; Apêndice 169);

(c) Nem a contrição que precede nem a renovação e a santificação que seguem,

nem as boas obras, pertencem à justiça da fé (Pág. 688, 689);

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(d) É uma loucura imaginar que as obras da Segunda Tábua do Decálogo justificam

perante Deus, porque por essa segunda Tábua agimos com os homens, e não

propriamente com Deus, e na justificação se deve agir com Deus e apaziguar a ira

dele (Pág. 102);

(e) Se, por conseguinte, alguém crer conseguir a remissão dos pecados, porque tem

a caridade, ele faz injúria ao Cristo, porque é uma confiança ímpia e vazia à própria

justiça (Pág. 87, 89);

(f) As boas obras devem ser inteiramente excluídas, quando se trata da justificação e

da vida eterna (Pág. 589);

(g) As boas obras não são necessárias como causa meritória da salvação, e não

entram no ato da justificação (Pág. 589, 590, 702, 704; Apêndice, 173);

(h) Deve-se rejeitar a proposição, segundo a qual as boas, obras são necessárias à

salvação, porque isso tira a consolação do Evangelho, fornece uma ocasião de

duvidar da graça de Deus e apresenta uma opinião sobre a própria justiça, 6 porque

as boas obras são aceitas pelos Papistas para sustentarem uma má causa, (Pág.

704);

(i) Este modo de se exprimir "As boas obras são necessárias à salvação% é

rejeitado e condenado, (Pág. 591);

(j) Os modos de se exprimirem a respeito das boas obras necessárias à salvação

não devem ser ensinados nem defendidos, mas devem ser antes condenados e

rejeitados como falsos pelas Igrejas, (Pág. 705);

(k) As obras que não partem da verdadeira fé são, na realidade, pecados perante

Deus, isto é, são manchados de pecados, pois uma árvore má não pode produzir

bons frutos, (Pág. 700);

(l) A fé e a salvação não são conservadas nem retiradas pelas boas obras, porque

são somente testemunhos de que o Espírito Santo está presente e habita em nós,

(Pág. 590, 705; Apêndice, 174);

(m) Deve-se, com razão, rejeitar o decreto do Concílio de Trento, de que as boas

obras conservam a salvação e a justiça da fé é alcançada por nossas obras ou a

própria fé é retida e conservada por essas obras, em totalidade ou em parte, (Pág.

707).

Page 18: Exposição Sumária

113. Sobre os Frutos da Fé, Doutrinas Particulares tirados da Fórmula de

Concórdia:

(a) Deve-se observar uma distinção entre as Obras da Lei e as Obras do Espírito. As

obras que o Renascido faz pelo Espírito livremente e espontaneamente são, não

obras da Lei, mas obras do Espírito; são frutos da fé, porque os Renascidos estão,

não sob a lei, mas sob a graça, (Pág. 589, 590, 721, 722);

b) As boas obras são frutos da penitência, (Pág. 12);

(c) Os Renascidos pela fé recebem uma vida nova, novas afeições e novas obras, e

estas coisas procedem da fé na penitência, (Pág. 134);

(d) 0 homem depois da sua conversão e da sua justificação começa a ser renovado

pela mente, e finalmente pelo entendimento, e então a sua vontade nos exercícios

diários da penitência não é ociosa, (Pág. 582, 673, 700);

(e) A penitência deve ser feita tanto para o pecado original como para os pecados

ativos, (Pág. 321; Apêndice, 159);

(f) A penitência nos cristãos dura até a morte porque eles lutam com o pecado que

fica na carne durante toda a vida, (Pág. 327);

(g) É necessário que a Lei do Decálogo seja começada em nós e que seja cumprida

cada vez mais, (Pág. 85, 86);

(h) Ainda que os Renascidos tenham sido libertados da maldição da lei, eles devem,

contudo, se exercitar na Lei Divina, (Pág. 718);

(i) Os Renascidos não estão sem a lei e, entretanto, não estão sob a lei, pois eles

vivem segundo a Lei do Senhor, (Pág. 722);

(j) A lei para os Renascidos deve ser a regra da religião, (Pág. 596, 717; Apêndice,

156);

(k) Os Renascidos fazem as boas obras, não por constrangimento, mas voluntária e

livremente como se não tivessem recebido preceito algum, ouvido ameaça alguma,

e nem esperado recompensa alguma, (Pág. 596, 701);

(l) A fé nestes, quando eles agem, está sempre ocupada, e quem assim não faz as

boas obras, não tem verdadeira fé, pois onde está a fé, ali estão as boas obras,

(Pág. 701);

Page 19: Exposição Sumária

(m) A caridade e bons frutos seguem a fé e a regeneração, (Pág. 121, 122, 171, 188,

692);

(n) A fé e as obras estão bem de acordo e estão inseparavelmente ligadas, mas a fé

sozinha alcança a bênção sem as obras, e entretanto ela não está só; daí vem que a

fé sem as obras é morta, (Pág. 692, 693);

(o) Depois que o homem é justificado pela fé, essa fé verdadeira e viva é eficaz pela

caridade, porque as boas obras seguem sempre a fé justificante, e são tomadas com

certeza com ela; pois a fé nunca está só, sem ter consigo a caridade e a esperança,

(Pág. 586);

(p) Reconhecemos que a fé é falsa e não verdadeira, aí onde as boas obras não

seguem, (Pág. 336);

(q) È tão impossível separar as boas obras de junto da fe, como separar o calor e a

luz do fogo, (Pág. 701);

(r) Porque o velho Adão está sempre ligado à própria natureza, os Renascidos

precisam de um contínuo aviso da lei, de doutrina, de ameaças, e também de

correção; pois eles são repreendidos e corrigidos pelo Espírito Santo por meio da lei,

(Pág. 719, 720, 721);

(s) Os Renascidos devem lutar com o velho Adão, e a parte da carne deve ser

reprimida pelas exortações, ameaças e punições, por isso é que a renovação da

vida pela fé é somente começada nesta vida, (Pág. 595, 596, 724);

(t) Perdura uma luta perpétua entre a carne e o espírito nos eleitos e nos verdadeiros

Renascidos, (Pág. 675, 679);

(u) Que o Cristo anuncia a remissão dos pecados nas boas obras, é porque elas

seguem a reconciliação, e também porque os bons frutos devem necessariamente

seguir, e porque eles são os sinais da promessa, (Pág. 116, 117);

(v) A fé que salva não está naqueles em que não há caridade, pois a caridade é o

fruto que se segue certamente e necessariamente a verdadeira fé, (Pág. 688);

(x) As boas obras são necessárias de muitos modos, mas não como causa meritória,

(Pág. 11, 17, 64, 95, 133, 589, 590, 702; Apêndice, 172).

Page 20: Exposição Sumária

(aa) 0 Renascido deve cooperar com o Espírito Santo, segundo as novas forças e os

novos dons que ele recebeu, mas de um certo modo, (Pág. 582, 583, 674, 675;

Apêndice, 144);

(bb) Na Confissão das Igrejas Belgas, que foi recebida no Sínodo de Dordrecht,

lê-se o seguinte: "A fé santa não pode estar ociosa no homem, porque a fé é eficaz

pela caridade, e as obras que partem da boa raiz da fé são boas perante Deus e são

aceitas, como os frutos de uma boa árvore; pois por Deus estamos ligados às boas

obras, mas não Deus a nós se todavia Deus as faz em nós."

14. Sobre os Méritos, segundo a Fórmula de Concórdia:

(a) É falso que as nossas obras mereçam a remissão dos' pecados; é falso que os

homens sejam reputados justos pela justiça da razão; e é falso que a razão por suas

próprias forças possa amar a Deus acima de todas as coisas, e fazer a lei de Deus,

(Pág. 64);

(b) A fé não justifica pelo fato de ser ela mesma uma boa obra e uma virtude

excelente, mas pelo fato de alcançar o Mérito de Cristo na promessa do Evangelho,

(Pág. 76, 684);

(c) A promessa da remissão dos pecados e da justificação por causa do Cristo não

contém a condição dos méritos, pois é oferecida gratuitamente, (Pág. 67);

(d) 0 homem pecador perante Deus é justificado ou absolvido de seus pecados e do

juízo de uma justíssima danação, o é adotado entre o número dos filhos de Deus,

sem nenhum mérito de nossa parte, nem de nenhuma de nossas obras passadas,

presentes ou futuras, mas por mera graça, somente por causa do mérito único do

Cristo, que nos é imputado em justiça, (Pág. 684);

(e) As boas obras seguem a fé, a remissão dos pecados e a regeneração, e o que

há nelas que é impuro e imperfeito não é reputado pecado, nem defeito, e isso, por

causa do Cristo, e assim o homem inteiro, tanto quanto à pessoa como quanto às

obras, é justo e santo e nomeado tal, pela mera graça a misericórdia no Cristo,

derramadas, estendidas e engrandecidas sobre nós, por isso é que não nos

podemos glorificar pelos méritos, (Pág. 74, 92, 93, 336);

Page 21: Exposição Sumária

(f) Quem confia no mérito de suas obras despreza o mérito e a graça do Cristo, e

busca o caminho dos céus por suas próprias forças sem o Cristo, (Pág. 16, 17, 18,

19);

(g) Se alguém quiser misturar as boas obras ao Artigo da justificação e merecer por

elas a graça de Deus, as obras de tal homem lhe serão não só inúteis, mas também

perniciosas, (Pág. 708);

(h) São inúmeras as obras do Decálogo e muitas outras que devem ser feitas e que

Deus embelezou por recompensas, (Pág. 176, 198);

(i) Ensinamos que as boas obras são meritórias, não da remissão dos pecados, nem

da graça, nem da justificação, mas das outras recompensas corpóreas, assim como

das recompensas espirituais nesta vida e depois desta vida, porque Paulo diz: "Cada

um receberá uma recompensa segundo o seu trabalho, e o Cristo será a vossa

grande recompensa nos Céus;" e muitas vezes se diz que será dado a cada um

segundo as suas obras; por isso confessamos que a vida eterna é uma recompensa,

porque é uma coisa devida por causa da promessa, e porque Deus coroa os seus

dons; não, porém, por causa de nossos méritos, (Pág. 96, 133, 134, 135, 136, 137,

138);

(j) Quando as boas obras, nos que crêem, são feitas para as verdadeiras causas e

se referem aos verdadeiros fins, como Deus exige dos Renascidos, elas são os

indícios da salvação eterna; e Deus Pai as aceita e as tem por agradáveis por causa

do Cristo; e Ele promete àqueles as brilhantes recompensas desta vida e da vida

futura, (Pág. 708);

(k) Ainda que as boas obras mereçam recompensas, elas não merecem a remissão

dos pecados ou a glória da vida eterna, porque não são dignas disso, nem são

convenientes, (Pág. 96, 135, 139 etc; Apêndice, 174)

(l) 0 Cristo no juízo final vai trazer uma sentença sobre as boas ou más obras, como

sendo efeitos próprios e testemunhos da fé dos homens, (Pág. 134; Apêndice, 187);

(m) Deus recompensa as boas obras, mas é por graça que Ele coroa Seus próprios

dons, (Confissão das Igrejas Belgas).

15. Do Livre Arbítrio, segundo a Fórmula de Concórdia:

Page 22: Exposição Sumária

(a) 0 homem está em impotência total nas coisas espirituais, (Pág. 15, 18, 219, 318,

579, 656 e seg; Apêndice, 141);

(b) 0 homem pela queda de nossos primeiros pais ficou inteiramente corrompido, ao

ponto de nas coisas espirituais que se referem à conversão e à salvação, ele ser

cego por natureza e julgar a Palavra de Deus como uma coisa insensata, e de ficar

um inimigo de Deus, até que, pela virtude do Espírito Santo, por meio da Palavra

pregada e ouvida, ele seja convertido, gratificado da fé, regenerado e renovado, por

mera graça, sem nenhuma cooperação de sua parte, (Pág. 656, 657);

(e) 0 homem está inteiramente corrompido e morto, para o bem, ao ponto que, na

natureza do homem depois, da queda antes da regeneração, não ficou ou não

permanece até, uma, simples centelha de torças espirituais, pelas quais possa por si

mesmo ser preparado para a graça de Deus, ou receber uma graça oferecida, ou ser

por si mesmo e de si mesmo capaz de receber essa graça, ou, nas coisas

espirituais, possa por si mesmo compreender, crer, abraçar, pensar, querer, iniciar,

aperfeiçoar, agir, operar, cooperar, aplicar-se ou acomodar-se à graça, ou fazer

alguma coisa para a sua conservação, quer em tudo, quer por metade, quer na

mínima parte, (Pág. 656, 658);

(d) 0 homem nas coisas espirituais e Divinas, que se referem à salvação da alma, é

como a estátua de sal da mulher de Lot, e semelhante a um tronco de árvore e a

uma pedra privados de vida, os quais não têm o uso dos olhos, da boca ou de

nenhum outro sentido, (Pág. 661, 662);

(e) 0 homem tem porém, o poder de se mover ou de dirigir os seus membros

externos, de assistir a assembléias públicas, e pode ouvir a Palavra e o Evangelho;

contudo, em seus pensamentos silentes ele os despreza como coisas insensatas,. e

nisso ele é pior do que um tronco de árvore, se o Espírito Santo não for eficaz nele,

(Pág. 662, 671, 672, 673);

(f) Contudo, não sucede com o homem na conversão como quando uma estátua é

formada com uma pedra, ou quando u m sinete é impresso no lacre, os quais não

têm conhecimento, nem sentido, nem vontade, (Pág. 662, 681);

(g) 0 homem na conversão é um sujeito meramente passivo e não ativo , (Pág. 662,

681);

Page 23: Exposição Sumária

(h) O homem na conversão não coopera de modo algum com o Espírito Santo, (Pág.

219, 579, 583, 672, 676; Apêndice, 143, 144);

0 homem depois da queda reteve e possui o poder de conhecer as coisas naturais,

assim como o livre arbítrio de escolher de algum modo o bem natural e civil, (Pág.

14, 218, 641, 664; Apêndice 142);

(i) As asserções de alguns Padres e de alguns Doutores de teorias modernas, que

Deus atrai o homem voluntariamente na parte do homem, não são conformes às

palavras sagradas, (Pág. 582, 583);

(j) 0 homem renascido pela virtude do Espírito Santo, coopera, apesar de muito

fracamente por meio de novas forças e novos dons, que o Espírito Santo iniciou na

conversão, e não por constrangimento, mas voluntariamente, (Pág. 582 e seg., 673,

674, 675; Apêndice, 144);

(k) Nos renascidos, não somente os dons de Deus estão, mas também o Cristo pela

fé neles habita, como nos Seus templos, (Pág. 695, 697, 698; Apêndice, 130);

(l) Há uma grande diferença entre os homens batizados e os que não são batizados,

porque é conforme a doutrina de Paulo que todos os que foram batizados revestiram

o Cristo e na realidade renasceram; estes têm o arbítrio já livre, isto é, eles foram

novamente libertados, como Cristo o afirma; daí não somente eles escutam a

Palavra de Deus, mas também, embora com muita fraqueza, podem dar-lhe o seu

assentimento, e afeiçoar-se a ela pela fé, (Pág. 675).

Deve-se observar bem que as proposições precedentes foram tiradas do livro

chamado Fórmula de Concórdia, escrito por homens aprovados pela Confissão de

Augsburg. Contudo, proposições semelhantes sobre a Justificação pela Fé Só são

publicadas e ensinadas pelos Reformados na Inglaterra e na Holanda. Por isso o

que vem a seguir diz respeito a todas as igrejas reformadas, (Ver também os Pár.

17, e 18).

ESQUEMA DA DOUTRINA DA NOVA IGREJA

16. Agora se segue a exposição sumária da doutrina da Nova Igreja, que se entende

pela Nova Jerusalém no Apocalipse 21 e 22. Esta doutrina, que é não só a doutrina

da fé, mas também a doutrina da vida, será dividida na obra mesma em três partes.

A Primeira Parte tratará:

Page 24: Exposição Sumária

I. Do Senhor Deus Salvador e da Divina Trindade n'Ele;

II. Da Escritura Santa, de seus dois sentidos, o natural e o espiritual e da

santidade resultante;

III. Do amor a Deus e do amor para com o próximo, e da concordância desses

dois amores;

IV. Da fé e de sua conjunção com esses dois amores;

V. Da doutrina da vida, segundo os preceitos do decálogo;

Vi. Da reforma e da regeneração;

Vil. Do livre arbítrio e da cooperação do homem com o Senhor pelo livre arbítrio;

VIII. Do batismo;

IX. Da Santa ceia;

X. Do céu e do inferno;

XI. Da conjunção dos homens com o céu e o inferno, e de seu estado de vida

depois da morte segundo a conjunção;

XII. Da vida eterna.

A Segunda Parte tratará:

I. Da consumação do século, ou o fim da igreja de hoje;

II. Da Vinda do Senhor;

III. Do Juízo Final;

IV. Da Nova Igreja, que é a Nova Jerusalém;

A Terceira Parte mostrará as discordâncias entre os dogmas da igreja de hoje e os

da Nova Igreja. Mas aqui nós nos deteremos bastante sobre essas discordâncias.

Isso, porque o sacerdote e o leigo crêem que a igreja de hoje está na própria luz do

Evangelho, e em suas verdades, que não podem ser invalidadas, abaladas, nem

atacadas, até mesmo por um anjo. se descesse do céu. A igreja de hoje não vê

outra coisa, porque pôs o entendimento sob a fé, e também confirmou os dogmas

por uma certa visão abaixo do entendimento, onde as falsidades podem ser

confirmadas ao ponto de parecerem como verdades. E as falsidades que foram

confirmadas ali se revestem de uma luz enganadora, diante da qual a luz das

verdades parece como trevas. E por esta razão que nos deteremos aqui bastante,

apresentando as discordâncias e as ilustrando com breve notas, para que, diante do

Page 25: Exposição Sumária

entendimento que não é fechado por uma fé cega, elas sejam vistas como na luz do

crepúsculo, e depois como na luz da aurora, e finalmente, na obra mesma, como na

luz do dia.

As discordâncias em geral são estas:

(I) 17. As igrejas separadas da Igreja Católica Romana pela Reforma estão em

desacordo sobre vários pontos, mas todas estão de acordo sobre estes artigos: A

Trindade de pessoas na Divindade: a origem do pecado por Adão: a imputação do

mérito do Cristo: e a justificação pela fé só.

BREVE ANALISE

18. As igrejas separadas da Igreja Católica Romana pela Reforma se compõem dos

que se chamam evangélicos e reformados, ao mesmo tempo protestantes, ou dos

chefes, Luteranos e Calvinistas. Entre elas a Igreja Anglicana fica no meio. (Aqui não

se trata da Igreja Grega, que desde os tempos antigos foi separada da Igreja

Católica Romana).

Que as Igrejas dos protestantes estão em desacordo sobre vários pontos,

principalmente sobre a santa ceia, o batismo, a eleição, e a Pessoa do Cristo, é

sabido por muitos. Mas que todos estão de acordo sobre os artigos que tratam da

Trindade de pessoas na Divindade, do pecado original, da imputação do mérito do

Cristo, e da justificação pela fé só, não é geralmente conhecido. Isto é porque

poucas pessoas se aplicam a pesquisar os dogmas que diferem entre as igrejas, e

por conseguinte os que concordam. Os eclesiásticos investigam somente as coisas

dogmáticas de sua igreja, e os leigos raramente as examinam quanto aos interiores,

e por conseguinte não as examinam quanto às diferenças. Que eles estão,

entretanto, de acordo sobre esses quatro artigos, nos gerais e na maioria dos

particulares, é evidente por seus livros quando examinados e por seus sermões

quando escutados. Mas isto é posto primeiro no conhecimento por causa das coisas

que seguem.

(II) 19. Os Católicos Romanos, antes da Reforma, ensinaram sobre os quatro artigos

nomeados acima coisas absolutamente semelhantes às que os reformados

ensinaram depois da Reforma, isto é, coisas semelhantes sobre a Trindade de

pessoas na Divindade, coisas semelhantes sobre o pecado original, coisas

Page 26: Exposição Sumária

semelhantes sobre a imputação do mérito do Cristo, e coisas semelhantes sobre a

justificação pela fé nessa imputação, com a única diferença, que os Católicos

Romanos conjuntaram a mesma fé com a caridade ou as boas obras.

BREVE ANÁLISE

20. Quase ninguém sabe que há entre os Católicos Romanos e os Protestantes

sobre esses quatro artigos uma tal conformidade, que não existe uma diferença de

alguma importância, exceto que os primeiros conjuntam a fé e a caridade, e os

segundos as separam. Isto é de tal modo ignorado, que mesmo os doutos, vão ficar

surpresos com esta declaração. A razão desta ignorância é que os católicos

romanos se dirigem a Deus nosso Salvador raramente, mas em seu lugar ao Papa

como vigário, e também aos santos. Por isso eles fizeram com que os seus dogmas

sobre a imputação do mérito do Cristo e sobre a justificação pela fé ficassem

profundamente adormecidos.

Que essa imputação e essa justificação estejam, porém, nos dogmas recebidos e

reconhecidos por eles, é evidente pelos decretos do Concílio de Trento (ver n 3 a 8),

e confirmados pelo Papa Pio IV (ver nº 2). E se eles forem comparados com os

dogmas da Confissão de Augsburgo, e referidos segundo a Fórmula de Concórdia (n

9 a 12), pode ser visto que as diferenças que existem entre eles são mais verbais do

que reais.

Os doutores da igreja, lendo-os e comparando-os, podem ver, na verdade, coisas

conformes, mas não com plena evidência. Mas, a fim de que estes e os que são

menos doutos, e também os leigos, vejam essa conformidade, serão agregadas

algumas Ilustrações nas páginas que se seguem.

(III) 21. Os reformadores principais, Lutero, Malancton e Calvino, retiveram todos os

dogmas sobre a Trindade das Pessoas na Divindade, sobra o pecado original, sobre

a imputação do mérito do Cristo, e sobre a justificação pela fé, tal como esses

dogmas estavam então, e tinham estado entre os católicos romanos. Mas eles

separaram, a caridade ou as boas obras de junto dessa fé, e declararam que elas

não eram conjuntamente salvificas, a fim de romperem com os católicos romanos

quanto aos essenciais mesmos da igreja, que são a fé e a caridade.

BREVE ANÁLISE

Page 27: Exposição Sumária

22. Os quatro artigos acima nomeados tal como são ensinados hoje nas igrejas

reformadas, não foram novos nem forjados por esses três reformadores, mas datam

da época do Concílio de Nicéia. E depois deste concílio, estes artigos foram

transmitidos pelos escritores, e por conseguinte foram conservados na igreja dos

católicos romanos. Isso se vê claramente pelos livros da história eclesiástica.

Os católicos romanos e os reformados estão de acordo sobre o artigo da Trindade

das Pessoas na Divindade, porque uns e outros reconhecem os três símbolos

(credos) em que se ensina a Trindade, a saber, o símbolo apostólico, o de Nicéia e o

de Atanásio. Que eles concordam sobre o artigo da imputação do mérito do Cristo, é

claro pelas passagens extraídas do Concílio de Trento (nº 3 a 8), comparadas às

passagens da Fórmula de Concórdia (nº 10 a 15). Que eles concordam também

sobre o artigo da justificação, é o que vai ser agora submetido a exame.

23. 0 Concílio de Trento ensina assim sobre a fé justificante: "0 consenso perpétuo

da Igreja Católica foi que a fé é o começo da salvação humana, o fundamento e a

raiz de toda justificação, sem a qual é impossível agradar a Deus e chegar à

sociedade de Seus filhos." (Ver nº 5a) Diz-se também que a fé vem pela audição da

Palavra de Deus,(nº 4c). Mas que esse concílio católico romano conjuntou a fé e a

caridade, ou a fé e as boas obras, pode ser visto plenamente pelas passagens

acima mencionadas. (nºs 4, 5, 7, 8)

As igrejas reformadas, porém, a partir de seus chefes, as têm separado, declarando

que o salvifico está na fé, e não ao mesmo tempo na caridade ou nas obras, a fim de

romperem com os católicos romanos quanto aos essenciais mesmos da igreja, que

são a fé e a caridade. Isto eu tenho, às vezes, ouvido dizer por esses chefes

mesmos, acima nomeados, como também que eles tinham fortalecido essa

separação por estes princípios: "Que ninguém pode por si mesmo fazer o bem que

contribui a salvação; que ninguém pode cumprir a Lei; e, por isso, que o mérito do

homem não entra na fé".

Que por esses princípios e por causa desse fim, eles tenham separado os bens da

caridade de junto da fé, e também por conseguinte de junto da salvação, é claro

pelos extratos da Fórmula de Concórdia, (nº 12). Entre os extratos estão estes: "A fé

não justifica tanto quanto foi formada pela caridade, como dizem os católicos

Page 28: Exposição Sumária

romanos." (nº 12b) "Deve-se rejeitar a proposição de que as boas obras são

necessárias à salvação, por muitas causas, e também, porque elas são aceitas

pelos papistas para sustentarem uma má coisa." (nº 12h). "Deve-se rejeitar o

decreto do Concílio de Trento, que as boas obras conservam e retêm a salvação e a

fé." (nº 12n) E, além disso, estão muitos outros. Que os reformados unem,

entretanto, a fé e a caridade conjuntamente em um só salvifico, com a única

diferença da qualidade das obras, será visto na proposição seguinte.

(IV) 24. Entretanto os reformadores principais ajuntaram a sua fé às boas obras e

também as conjuntaram, mas no homem como um sujeito passivo; enquanto os

católicos romanos as conjuntam no homem com um sujeito ativo. E, entretanto,

entre uns e outros, há realmente conformidade quanto a fé, as' obras e aos méritos.

BREVE ANÁLISE

25. Os reformadores principais, apesar de terem separado a fé e a caridade,

entretanto as ajuntaram, e finalmente as conjuntaram. Mas não quiseram que

formassem um só salvifico ou um salvifico simultâneo. Isto se vê por seus livros,

sermões e discursos. Pois depois de as terem separado, eles as conjuntam, e até

exprimem a conjunção por palavras expressas e não susceptíveis de um duplo

sentido, a saber, por estas: "A fé depois da justificação nunca está só, sem ter

consigo a caridade ou as boas obras, e que, se for de outro modo, a fé não é viva,

mas morta." (nº 13 o, p, q, r, y, bb). E até mesmo, "as boas obras seguem

necessariamente a fé." (nº 13 x, y, z). E finalmente, "o renascido pelas novas forças

e novos dons coopera com o Espírito Santo." (nº 13 aa). Que coisas, absolutamente

semelhantes sejam ensinadas pelos católicos romanos, é claro pelas passagens

extraídas do Concílio de Trento. (nº 4 a 8).

26. Sobre os méritos das obras os reformados ensinam coisas quase semelhantes

às que os católicos romanos ensinam. Isso é evidente pelas passagens tiradas da

Fórmula de Concórdia:' "As boas obras são retribuídas segundo a força dá promessa

e segundo a graça, e por esse modo elas merecem as recompensas corpóreas e

também espirituais." (nº 14 i, k, l, n). E, "Deus coroa com uma recompensa os Seus

dons." (nº 14 h, n).

Page 29: Exposição Sumária

Coisas semelhantes são ditas no Concílio de Trento, a saber: "Deus pela graça faz

com que Seus dons sejam méritos." (nº 5f) E, além disso, "a salvação vem, não das

obras, mas da promessa e da graça, porque Deus as opera pelo Espírito Santo." (nº

5 e, f, g, h, i, k).

27. Parece, segundo uns e outros, que há, à primeira vista, uma inteira

conformidade entre eles. Mas para que esta não exista, os reformadores

distinguiram entre as obras da Lei, provenientes da intenção e da vontade, e as

obras do Espírito provenientes da fé como de uma fonte livre e espontânea, e estas

obras eles as chamaram os frutos da fé, (ver acima nº 11 h, 1 e nº 13 a, i, 1 e nº 15

k).

Por estas coisas bem examinadas e comparadas, não se vê nelas a diferença das

obras mesmas, mas unicamente a diferença da sua qualidade, a saber, que as

obras da fé provêm do homem como de um sujeito passivo, mas as obras da lei

como de um sujeito ativo.

Por conseguinte as obras da fé são espontâneas porque provêm do entendimento

do homem, e não ao mesmo tempo da sua vontade.

Isso é dito porque o homem não pode ser inconsciente de suas obras quando eles

se fazem, pois ele as faz, e pelo entendimento ele tem consciência delas.

Entretanto, porque os reformados pregam também os exercícios da penitência e as

lutas com a carne (nº 13 d, e, f, g, h, k), e que essas coisas não podem ser feitas

pelo homem exceto pela sua intenção e pela sua vontade, e assim por ele como por

si mesmo, segue-se que há, contudo, realmente uma conformidade.

28. No que se refere ao livre arbítrio na conversão ou no ato da justificação, parece

que há oposição completa entre eles. Contudo, pode-se ver que eles concordam,

quando se considerar com cuidado e se comparar o que foi extraído o Concílio de

Trento (nº 6 a, b), com o que foi tirado da Fórmula de Concórdia (nº 15m). Com

efeito, no Cristianismo todos são batizados, e estão por este fato no arbítrio

libertado, de sorte que eles podem não somente ouvir a Palavra de Deus, mas

também dar-lhe o seu assentimento, e abraçá-la pela fé; por conseguinte ninguém

no Cristianismo é como tronco de árvore.

Page 30: Exposição Sumária

29. Por estas coisas, vêem-se agora com clareza as verdades afirmadas nos

números 19 e 21, que os reformados receberam dos católicos romanos os seus

dogmas sobre a Trindade de pessoas na Divindade, sobre o pecado original, sobre a

imputação do mérito do Cristo e sobre a justificação pela fé. Essas coisas foram

referidas para mostrar a origem de seus dogmas, principalmente a origem da

separação da fé de junto das boas obras, ou da doutrina sobre a fé só, e para

mostrar que eles só agiram assim para romperem inteiramente com os católicos

romanos, e que entretanto a diferença é mais verbal do que real. Pelas coisas ditas

acima vê-se muito claramente sobre que fundamento foi construída a fé nas igrejas

reformadas, e a que inspiração elas devem a sua origem.

(V) 30. A teologia universal, no mundo cristão de hoje, é fundada sobre a idéia de

Três Deuses, oriundo da doutrina da Trindade das Pessoas.

BREVE ANALISE

31. Primeiramente se dirá alguma coisa sobre a origem, ou sobre a fonte, de onde

provém a idéia da Trindade das Pessoas na Divindade, e por conseguinte a idéia de

três Deuses.

Há três símbolos (credos), que são chamados: Símbolo Apostólico, Símbolo de

Nicéia, e Símbolo de Atanásio; os quais ensinam especialmente a Trindade. Os dois

primeiros ensinam a Trindade mesma, e o de Atanásio ensina a Trindade de

pessoas. Esses três símbolos se acham em muitas liturgias, o Símbolo Apostólico

no salmo cantado, e de Nicéia depois do Decálogo, e de Atanásio à parte.

0 Símbolo Apostólico foi escrito depois dos tempos dos apóstolos. 0 Símbolo de

Nicéia foi escrito no concílio havido em Nicéia, cidade da Bithynia, ao qual foram

convocados pelo Imperador Constantino todos os bispos da Ásia, África e Europa no

ano 318. Mas o Símbolo de Atanásio foi composto depois desse concílio, por uma ou

várias pessoas, para derrubar inteiramente os arianos, e depois foi também aceito

petas igrejas como ecumênico.

Pelos dois primeiros símbolos brilhou a confissão da Trindade, mas pelo terceiro ou

pelo Símbolo de Atanásio, propagou-se a idéia da Trindade de pessoas. Que dali

provém a idéia de três Deuses, será visto no que segue agora.

Page 31: Exposição Sumária

32. Que há uma Divina Trindade, é coisa muito evidente pelas palavras do Senhor

em Mateus: "Jesus disse: lde, fazei de todas as nações discípulos, batizando-as no

nome do Pai, do Filho, e do Espírito Santo." (Mateus 28; 19).

E por estas palavras no mesmo: "Jesus tendo sido batizado, eis, os céus se abriram,

e, Ele viu o Espírito Santo descendo como uma pomba, e vindo sobre Ele. E eis,

uma voz do céu: Este é o Meu Filho amado em Quem Me comprazo." (Mateus

3;16,17).

O Senhor enviou os discípulos para que batizassem no nome do Pai, do Filho e do

Espírito Santo, porque n'Ele, então glorificado, havia a Divina Trindade. Pois Ele

disse no vers. 18 que precede, "Todo poder Me foi dado no céu e na terra." E no

vers. 20 que segue Ele disse, "Eis, estou convosco, até a consumação do século."

Assim, Ele fala d'Ele só, e não de Três. E em João é dito, "0 Espírito Santo não era

ainda, porque Jesus ainda não estava glorificado." (João 7; 39) E Jesus disse essas

palavras em Mateus depois da glorificação, e a glorificação foi a união plena com

Seu Pai que era o Divino Mesmo n'Ele pela concepção. E o Espírito Santo era o

Divino procedente d'Ele glorificado. (João 20; 22).

33. A idéia de Três Deuses proveio sobretudo do símbolo de Atanásio, em que a

Trindade de pessoas é ensinada, porque a palavra "pessoa" gera essa idéia, e

também porque as palavras seguintes desse símbolo a implantam. "Outra é a

Pessoa do Pai, outra a do Filho, outra a do Espírito Santo." E depois, "0 Pai é Deus

e Senhor, o Filho é Deus e Senhor, e o Espírito Santo é Deus e Senhor". Mas essa

idéia é principalmente implantada pelas palavras seguintes: "Como somos forçados

pela verdade cristã de confessar que cada Pessoa individualmente é Deus e Senhor,

assim também nos é proibido pela religião católica (universal) dizer três Deuses ou

três Senhores." Resulta dessas palavras que, pela verdade cristã, é necessário

confessar e reconhecer três Deuses e três Senhores, mas que pela religião católica

não é permitido dizer ou nomear três Deuses e três Senhores. Assim, deve-se ter a

idéia de três Deuses e de três Senhores, mas não confessá-la de boca.

Contudo, a doutrina da Trindade no Símbolo de Atanásio concorda sempre com a

verdade, contanto que para a Trindade de pessoas substitua-se ali a Trindade de

Pessoa, que está em Deus Salvador Jesus Cristo, como se vê na Doutrina da Nova

Page 32: Exposição Sumária

Jerusalém sobre o Senhor, nº 55 a 61, publicada em Amsterdã 1763 (primeira

edição em Latim).

34. Deve-se compreender o que se diz no Símbolo Apostólico: "Creio em Deus Pai,

em Jesus Cristo e no Espírito Santo", assim unicamente em um só Deus. Mas é

diferente no símbolo de Atanásio: "Creio em Deus Pai, em Deus Filho, e em Deus

Espírito Santo", assim em três Deuses. Como, porém, os autores e os partidários

desse último símbolo viram claramente que a idéia de três Deuses resultaria

inevitavelmente dessas expressões, em conseqüência, para se remediar isso, eles

disseram que os Três têm uma só essência. Mas daí não resultou outra idéia senão

que há Três Deuses unânimes e de acordo. Pois quando uma substância ou

essência só e indivisível se diz de Três, ela não tira a idéia de Três, mas a põe em

confusão, porque é uma expressão metafísica. E esta ciência com toda a sua arte

não pode de três Pessoas, cada uma das quais sendo Deus, fazer um Deus. Ela

pode fazer um na boca, mas nunca na idéia.

35. Que toda teologia cristã hoje está fundada sobre a idéia de Três Deuses, é

manifestamente claro pela doutrina da justificação, que é a cabeça das doutrinas da

igreja entre os cristãos, tanto católicos romanos como protestantes. Essa doutrina

ensina que Deus Pai enviou o Filho para resgatar e salvar os homens, e que Ele dá

o Espírito Santo para operar essas coisas. Todo homem, que ouve, lê ou diz isso,

não pode em pensamento, isto é, em sua idéia, fazer outra coisa senão dividir Deus

em Três, e perceber que um Deus enviou um Outro, e que a operação é feita por um

Terceiro.

Que o mesmo pensamento sobre a Trindade Divina distinta em Pessoas, das quais

cada uma é Deus, se difunda em todas as outras doutrinas da igreja de hoje, será

demonstrado em seu lugar. No entanto, consulte o que precede a respeito da

justificação, consulte em geral e em particular os tratados da teologia, e ao mesmo

tempo consulte-se a si mesmo, e veja, quando nos templos escuta os sermões, ou

quando em casa ora, se percebe e por conseguinte pensa outra coisa senão em

Três Deuses, e principalmente quando, em suas orações ou nos cânticos, se dirigir

separadamente a um e separadamente aos dois outros, como acontece muitas

Page 33: Exposição Sumária

vezes. Por estas coisas se acha confirmada a verdade da proposição, que toda a

teologia hoje no mundo cristão é fundada sobre a idéia de Três Deuses.

36. Que a Trindade de Deuses é contrária à Escritura Santa, é notório, pois nela se

lê: "Não sou Jehovah? E há outro Deus além de Mim? Não há Deus justo e Salvador

além de Mim." (Is 45;21,22); "Eu sou Jehovah o teu Deus, e não reconhecerás outro

Deus além de Mim, e não há outro Salvador além de Mim." (Os. 13,4); "Assim disse

Jehovah, o Rei de Israel e o seu Redentor: Eu, sou o Primeiro e o último, e além de

Mim não há Deus." (Is44;6);"Jehovah Zebaoth é o Seu nome, e o Teu Redentor é o

Santo de Israel, Ele será chamado o Deus de toda a terra." (Is 54;5); "Nesse dia

Jehovah será Rei sobre toda a terra; nesse dia Jehovah será um e o Nome d'Ele

um." (Zac 14;9).

E além destas muitas outras passagens.

37. Que a Trindade de Deuses é contrária à razão iluminada, é evidente por muitas

considerações. Qual é o homem, com uma razão sã, que pode ouvir que Três

Deuses criaram o mundo, ou pode ouvir dizer que a criação e a conservação, a

redenção e a salvação, a reforma e a regeneração são obras de três Deuses e não

de um só Deus? E reciprocamente qual é o homem, com uma razão sã, que não

queira ouvir dizer que o Deus que nos criou, também nos resgatou, nos regenera e

nos salva? Como esta última idéia entra na razão e não a outra, não há uma nação,

em todo o universo, que, tendo uma religião e uma razão sã, não reconheça um só

Deus.

Sabe-se que os maometanos e algumas nações da Ásia e da África têm horror ao

Cristianismo, porque crêem que nele: há o culto de três Deuses. E a essa censura

os Cristãos respondem unicamente que os Três Deuses têm uma só essência, e

que assim eles são um só Deus. Posso afirmar que, pela razão que mo foi dada,

posso ver que nem o mundo, nem o céu angélico, nem a igreja, nem coisa alguma

que está neles, pode existir e pode subsistir exceto por um só Deus.

38. A isso seja acrescentada esta passagem da Confissão das Igrejas Belgas

recebidas no Sínodo de Dordrecht: "Creio em um só Deus, que é uma única

Essência, na qual estão três Pessoas em propriedades comunicáveis, de toda

eternidade realmente e efetivamente distintas, a saber, o Pai, o Filho, e o Espírito

Page 34: Exposição Sumária

Santo. 0 Pai é a Causa, a Origem e o princípio de todas coisas tanto visíveis como

invisíveis. 0 Filho é a Palavra, a Sabedoria, e a Imagem do Pai. 0 Espírito Santo é a

Virtude e o Poder eterno procedendo do Pai e do Filho. Contudo deve-se confessar

que essa doutrina excede em muito a concepção do entendimento humano, mas

esperamos o seu conhecimento perfeito nos céus."

(IV) 39. Os dogmas dessa teologia mostram-se errôneos depois da rejeição da idéia

da Trindade das Pessoas e por conseguinte da idéia de três Deuses, e depois que a

idéia de Um Só Deus, em Quem está a Divina Trindade, é recebida em seu lugar.

BREVE ANALISE

40. Os dogmas da igreja de hoje, que são fundados sobre a idéia de três Deuses,

tirada da doutrina da Trindade das Pessoas, entendida segundo o sentido que ela

apresenta, mostram-se errôneos, depois que se substitui essa idéia pela idéia de um

só Deus em Quem está a Divina Trindade, porque o que é errôneo não pode ser

visto antes. Com efeito, é como um homem que, durante a noite, na luz de algumas

estrelas, vê diversas coisas, principalmente imagens, e as toma por homens vivos.

Ou é como um homem em sua cama na alvorada, antes do levantar do sol, vê no ar

espécies de fantasmas e os toma por anjos. Ou é como um homem na luz

enganadora de fantasia que vê muitas coisas e as toma por seres reais. Sabe-se

que tais objetos não se mostram e não são percebidos tais quais eles são

realmente, antes de o homem entrar na luz do dia, isto é, na luz do entendimento

bem despertado.

É semelhante com as coisas espirituais da igreja, que foram percebidas e também

confirmadas de um modo errôneo a falso, quando as verdades mesmas são

apresentadas em sua luz, que é a luz do céu. Qual é o homem que não possa com

prender que todos os dogmas fundados sobre a idéia de três Deuses são

interiormente errôneos e falsos? Diz-se interiormente, porque a idéia de Deus entra

em todas as coisas da igreja, da religião e do culto. E as coisas teológicas residem

nas mentes humanas acima de todas as outras, e aí nos supremos está a idéia de

Deus. Por isso, se essa idéia for falsa, todas as que seguem tiram do princípio, de

onde elas provêm, as coisas falsas e falsificadas. Com efeito, o supremo, que é

também o íntimo, faz a essência mesma das coisas que seguem, e a essência, do

Page 35: Exposição Sumária

mesmo modo que a alma, as forma em corpo a sua imagem. E quando em sua

descida ela cai sobre as verdades, ela as infecta com a sua mancha e o seu erro.

A idéia de três Deuses nas coisas teológicas pode ser comparada a uma

enfermidade inerente ao coração ou ao pulmão, da qual o enfermo crê estar são,

porque o médico que não a conhece lhe persuade. Quando, porém, o médico a

conhece e com tudo lhe persuade que ele está são, ele deve com razão ser tachado

de culpado de uma malignidade além da medida.

(VII) 41. Então a fé verdadeiramente salvifica, que está em um só Deus, unida às

boas obras, é reconhecida e recebida.

BREVE ANALISE

42. Esta fé em um só Deus é reconhecida e recebida como verdadeiramente

salvifica, quando a fé precedente em três Deuses é rejeitada, porque ela não pode

ser vista anteriormente em sua face. Com efeito, a fé de hoje é pregada como tendo

a única que salva porque ela é em um só Deus e porque ela é no Salvador. Mas a

verdade é que essa fé tem duas faces, uma interna e a outra externa. A face interna

é formada pela percepção de três Deuses. Quem percebe ou pensa de outro modo?

Consulte-se cada um a si mesmo. Mas a face externa é formada pela confissão de

um só Deus. Quem confessa ou fala de outro modo? Consulte-se cada um a si

mesmo. Essas duas faces são absolutamente discordantes entre si, ao ponto que a

externa não é reconhecida pela interna, e que a interna não é conhecida da externa.

Por causa dessa discordância e da separação de uma da presença da outra, foi

concebida e nasceu uma idéia confusa sobre as coisas que proporcionam a

salvação na igreja.

É diferente quando as faces interna e externa concordam, se vêem mutuamente

como um todo unânime e se conhecem. É evidente por si mesmo que isso acontece

quando um só Deus, em Quem está a Divina Trindade, não somente é percebida

pela mente, mas também reconhecida pela boca. Então será abolido o dogma do

afastamento do Pai do gênero humano, bem como o dogma de Sua reconciliação. E

então sairá uma doutrina absolutamente diferente sobre a imputação, a remissão

dos pecados, a regeneração, e assim a salvação. Isso, na obra mesma, se verá

distintamente na luz da razão ilustrada pelas Divinas verdades segundo a, Escritura

Page 36: Exposição Sumária

Santa. Diz-se a fé unida às boas obras, porque a fé em um só Deus sem a união

com, as boas obras não existe.

(VIII) 43. E essa fé no Deus Salvador Jesus Cristo é a seguinte:

I. Há um só Deus, em Quem está a Divina Trindade, e esse Deus é o Senhor Jesus

Cristo;

II. A fé salvifica é de crer n'Ele;

III. Deve-se fugir dos males, porque eles são do diabo e vêm do diabo;

IV. Deve-se fazer os bens, porque eles são de Deus e vêm de Deus;

V. E estas coisas devem ser feitas pelo homem como por si mesmo, mas o homem

deve crer que os bens, que estão dentro dele e são feitos por meio dele, vêm do

Senhor.

BREVE ANALISE

44. Esta é a fé da Nova Igreja na forma simples, que será vista mais amplamente no

apêndice deste livro. E ela será vista na sua amplitude na primeira parte da obra

mesma, onde se tratará do Senhor Deus Salvador e da Trindade n'Ele, do amor a

Deus e do amor para com o próximo, e da fé e da conjunção da fé com esses dois

amores, e também nos outros artigos que alise seguem em ordem. É, porém,

importante que este preliminar sobre essa fé seja aqui ilustrado com algumas

palavras.

O Primeiro Ponto: "Há um só Deus, em Quem está a Divina Trindade, e esse Deus é

o Senhor Jesus Cristo." Isto é sumariamente ilustrado pelo que segue. Uma verdade

certa e constante é que Deus é um, e a Sua Essência é indivisível, e que há uma

Trindade. Portanto, porque Deus é um e a Sua Essência é indivisível, segue-se que

Deus é uma só Pessoa. E porque Ele é uma só Pessoa, a Trindade está nessa

Pessoa. Que essa Pessoa é o Senhor Jesus Cristo, é claro por estas palavras: Ele

foi concebido de Deus Pai, (Lucas 1; 34,35) e assim Ele é Deus quanto à Alma e à

Vida mesma.

E por conseguinte, como Ele Mesmo o disse: o Pai e Ele são um. (João 10; 30); Ele

Mesmo está no Pai e o Pai está n'Ele. (João 14; 10,11); Quem 0 vê e 0 conhece vê e

conhece o Pai. (João 14; 7, 9); Ninguém vê e conhece o Pai, senão Ele que está no

seio do Pai. (João 1; 18); Tudo que pertence ao Pai é d'Ele. (João 3; 35 e 16; 15);

Page 37: Exposição Sumária

Ele é o Caminho, a Verdade e a Vida, e ninguém vem ao Pai senão por Ele. (João

14; 6).

Assim por Ele, porque o Pai está n'Ele, e por conseguinte é Ele Mesmo.

E segundo Paulo: "Toda a plenitude da Divindade habita corporalmente n'Ele."

(Colos. 2, 9).

E segundo lsaías: "Um Menino nos nasceu, um Filho nos foi dado, cujo nome é

Deus, Pai de Eternidade" (Is 9; 5).

E também: Ele tem o poder sobre toda a carne. (João 17;2); Ele tem todo poder no

céu e na terra. (Mat 28;18); Destas palavras se segue que Ele é o Deus do céu e da

terra.

0 Segundo Ponto: "A fé salvifica é crer n'Ele." Isso, é ilustrado por estas passagens:

"Jesus disse: quem crê em Mim, não morrerá durante a eternidade, mas viverá."

(João 11;25,26); "Esta é a vontade do Pai, que todo aquele que crê no Filho tenha a

vida eterna." (João 6;40); "Deus de tal modo amou o mundo, que Ele deu Seu Filho

único, para que todo aquele que crer n'Ele não pereça,mas tenha a vida eterna."

(João 3; 15,16); "Quem crê no Filho tem a vida eterna, mas quem não crê no Filho

não verá a vida, mas a ira de Deus permanece sobre ele." (João 3;36).

Os Três Outros Pontos: "Deve-se fugir dos males porque eles são do diabo e vêm

do diabo; deve-se fazer os bens porque eles são de Deus e vêm de Deus; e o

homem deve crer que é pelo Senhor que estes bens estão nele e são feitos por meio

dele." Estes pontos não necessitam ser ilustrados nem demonstrados, porque toda a

Escritura Santa desde o começo até ao fim os confirma. Neta não se ensina outra

coisa senão fugir dos males, fazer os bens, e crer no Senhor Deus. E, ainda mais,

sem esses três pontos, não há religião, pois a religião pertence à vida, e a vida é

fugir dos males e fazer os bens, e o homem não pode fazer os bens nem fugir dos

males exceto como por si mesmo. Por conseguinte, se alguém repelir da igreja

esses três pontos, repelirá a Escritura Santa, e repelirá também a religião; e se elas

forem repelidas, a igreja não será a igreja.

Além disso, o que se diz respeito a fé da Nova Igreja na forma universal e na forma

particular, será visto abaixo, nos nºs 116 e 117. E tudo o que eles encerram será

demonstrado na obra mesma.

Page 38: Exposição Sumária

(IX) 45. A fé de hoje separou da igreja a religião a qual consiste no reconhecimento

de um só Deus e no culto d'Ele pela fé da caridade.

BREVE ANALISE

46. Qual é, em todo o globo, a nação que, tendo uma religião e uma razão sã, não

saiba e creia que há um só Deus, que fazer os males é ser contra Ele, e fazer os

bens é estar com Ele; que o homem deve fugir dos males e praticar, os bens com

toda sua alma, com todo o seu coração, e com todas as suas forças, ainda que

estas forças influam de Deus; e que são essas coisas que constituem a religião?

Quem não vê, portanto, que confessar três pessoas na Divindade, e declarar que

nas boas obras nada há da salvação, é separar a religião de junto da igreja? Pois é

declarado que nas boas obras nada há da salvação por estas asserções que a fé

justifica sem as boas obras (nº 12 a, b) que as obras não são necessárias à

salvação nem à fé, porque a salvação e a fé não são conservadas nem retiradas

pelas boas obras (nº 12 g, h, m, n), e por conseguinte, que não há vínculo de

conjunção da fé com as boas obras. Se diz, como um recuo, que as boas obras

seguem sempre espontaneamente a fé, como os frutos procedem da árvore (nº 13 l,

n). Mas quem as faz, e até quem pensa nelas, e quem é conduzido

espontaneamente a fazê-las, quando se pensa e crê que elas nada fazem para a

salvação, e ainda mais, que ninguém pode por si mesmo fazer algum bem para sua

salvação, etc.? Se diz que eles sempre uniram a fé com as boas obras, mas essa

conjunção examinada a fundo, não é uma conjunção, mas é uma adjunção, como

uma espécie de acessório que não coere nem adere de outro modo senão como

uma sombra que se acrescenta a um quadro de pintura, pela qual o quadro parece

mais vivo. E como a religião pertence a vida, e a,vida consiste nas boas obras feitas

segundo as verdades da fé, é claro que a religião mesma é essa vida, e não um tal

acessório. Além disso, entre muitos, a religião é como uma cauda de, cavalo que se

corta à vontade porque não tem valor.

Quem conclui de outro modo, segundo a razão, quando percebe segundo seu

sentido estas palavras? "É uma loucura imaginar que as obras da segunda tábua do

Decálogo justificam perante Deus." (nº 12 d) Depois estas: "Se alguém crê que

assim alcança a salvação, porque ele tem a caridade, ele faz injúria ao Cristo." (nº

Page 39: Exposição Sumária

12e) Como também estas: "As boas obras devem ser inteiramente excluídas,

quando se trata da justificação e da vida eterna;" (nº 12 f) e muitas outras ali. Quem,

portanto, quando lê depois que "as boas obras seguem necessariamente a fé", e que

se não a seguem, a fé é falsa e não verdadeira”, (nº 13 p, q, y, etc.) vai prestar

atenção a isto? E se prestar atenção, fará isto com percepção? E o bem que provém

do homem sem a percepção é inanimado como se viesse de uma estátua.

Mas penetrando mais profundamente na causa dessa doutrina, tornar-se-á evidente

que os chefes da Reforma tomaram a fé só por sua regra no princípio, a fim de

romperem com os católicos romanos, como acima se disse. (nºs 21, 22, 23) E depois

ajuntaram as obras da caridade, para que a sua doutrina não seja contrária a

Escritura Santa, e para que ela pareça como uma religião, e que assim se torna sã.

(X) 47. A fé da igreja de hoje não pode ser conjunta à caridade, nem produzir alguns

frutos que são as boas obras.

BREVE ANÃLISE

48. Antes de se demonstrar este ponto, deve-se primeiro desvendar, perante o

entendimento, de onde vem a caridade e o que é a caridade, e de onde vem a fé e o

que é a fé, e assim de onde vêm as boas obras que são chamadas frutos, e o que

são tais obras. A fé é a verdade, por isso a doutrina da fé é a doutrina da verdade.

Ora, a doutrina da verdade pertence ao entendimento, e por conseguinte ao

pensamento, e pelo pensamento à linguagem. Por isso, essa doutrina ensina o que

se deve querer e o que se deve fazer. Assim ela ensina que se deve fugir dos males

e quais os males de que se deve fugir, e ensina que se deve fazer os bens, e quais

os bens que devem ser feitos. Quando o homem faz os bens segundo esta doutrina,

então os bens se conjungem às verdades, porque a vontade se conjunge ao

entendimento, e o bem pertence à vontade e a verdade pertence ao entendimento.

Por essa conjunção existe a afeição do bem, a qual na sua essência é a caridade, e

a afeição da verdade, a qual na sua essência é a fé, e essas duas unidades fazem

um casamento. Deste casamento nascem as boas obras, como da árvore nascem

os frutos. E por conseguinte elas são os frutos do bem e os frutos da verdade. Na

Palavra os frutos da verdade são significados pelas uvas, e os frutos do bem pelas

azeitonas.

Page 40: Exposição Sumária

Por essa geração das boas obras, é claro que a fé só não pode de modo algum

produzir ou gerar obras que sejam denominadas frutos, exatamente como uma

mulher não pode produzir ou gerar filhos por si só sem o homem. Por isso a

expressão "os frutos da fé" é uma expressão e palavra vã. Além disso, no mundo

universal, jamais coisa alguma foi produzida, nem é produzida, exceto por um

casamento entre dois, do qual um se refere ao bem e o outro à verdade; ou, no

sentido oposto, um se refere ao mal e outro à falsidade. Por conseguinte, nenhuma

obra pode ser concebida, nem com mais forte razão nascer, senão do casamento de

dois, a saber, as boas obras, do casamento do bem e da verdade, e as más obras,

do casamento do mal e da falsidade.

50. A caridade não pode ser conjunta com a fé da igreja de hoje, e por conseguinte

uma boa obra não pode nascer de algum casamento com, esta fé, porque a

imputação enche todas as coisas. Ela remete as transgressões, justifica, regenera,

santifica e dá a vida do céu e assim a salvação, e isso gratuitamente sem nenhuma

obra do homem. Que seria então a caridade, cujo casamento deve ter lugar com a

fé, senão uma coisa supérflua e vã, senão um acessório e um, penhor dá imputação

e da justificação, que, entretanto, nada de valor tem. Ainda mais, a fé fundada sobre

a idéia de três Deuses é errônea, (como se mostrou nºs 39, 40) e a caridade, que em

si é a caridade, não pode ser ligada a uma fé errônea.

Crê-se que não existe laço entre essa fé e a caridade por duas razões. A primeira:

porque eles tornam a sua fé espiritual, enquanto eles tornam a caridade

natural-moral, pensando que não existe conjunção alguma do espiritual com o

natural. A segunda razão: porque eles temem que, em sua fé unicamente salvifica,

influa alguma coisa do homem, e por conseguinte alguma coisa do mérito. Além

disso, não existe laço da caridade com essa fé; mas existe um com a fé nova, que

será exposta no apêndice deste livro, (nºs 116, 117).

(XI) 51. Da fé da igreja de hoje resulta um culto de boca a não um culto de vida,

quando, entretanto, o culto de bocal aceito pelo Senhor segundo o culto de vida.

BREVE ANÁLISE

52. Isto é testificado pela experiência: quantos hoje vivem pela religião segundo os

preceitos do Decálogo e os outros mandamentos do Senhor? E quantos hoje

Page 41: Exposição Sumária

querem ver de frente os seus males, fazer penitência real, e entrar assim no culto de

vida? E qual é o homem que, entregando-se a piedade, faça outra penitência senão

de boca e de orações, confessando-se pecador, e orando segundo a doutrina da

igreja, que Deus Pai (por misericórdia por causa de Seu Filho, que padeceu na cruz

pelos pecados dos homens, arrebatou a danação deles e fez expiação por Seu

sangue) lhe perdoe suas transgressões, para que ele apareça sem mancha diante

do trono do Seu julgamento? Quem não vê que esse culto pertence aos pulmões

somente, e não ao coração, que assim e externo e não interno? Pois tal homem ora

para a remissão dos pecados, e contudo não conhece um pecado dentro de si. E se

conhecesse um pecado dentro de si, ele o cobriria pelo favor e pela indulgência, ou

pela fé que purifica e que o absolve sem as obras.

Mas isso é semelhante a um servo, com o rosto e a roupa enlameados e sujos,

aproximando de seu patrão e dizendo: "Senhor, limpa-me." 0 patrão não lhe diria:

"Que estás a dizer, servo insensato? Eis aí água, sabão e pano. Não tens mãos e

não podes usá-las? Lava-te tu mesmo."? Assim o Senhor Deus dirá: "Há os meios

de purificação que vêm de Mim, e há teu querer e também teu poder que vêm de

Mim. Usa pois os Meus presentes e os Meus dons como se eles te pertencessem, e

serás purificado".

Outro exemplo para ilustrar: Se mil vezes orasses em tua casa e nos templos, que

Deus Pai por causa do Seu Filho te preserva do diabo, e tu mesmo, pela liberdade

em que estás continuamente mantido pelo Senhor, não te preservares do mal, por

conseguinte do diabo, tu não poderias ser preservado dele pelas legiões de anjos

enviadas pelo Senhor. Pois o Senhor não pode agir contra a Sua ordem Divina, e a

Sua ordem é que o homem se examine, veja seus males e lhes resista, e isso como

por si mesmo, ainda que seja pelo Senhor. É verdade que isso hoje não parece

conforme ao Evangelho, mas isso é conforme ao Evangelho, pois o Evangelho é ser

salvo pelo Senhor.

O culto de boca é aceito pelo Senhor segundo o culto de vida, porque perante Deus

e os anjos a fala do homem ressoa pela afeição de seu amor e de sua fé, e o amor e

a fé estão no homem segundo a vida. Por isso, se o amor e a fé de Deus estão em

tua vida, o som de tua fala é como o som da pomba. Mas se em tua vida há o amor

Page 42: Exposição Sumária

de si e confiança em si mesmo, o som da tua fala é como o som da coruja, de

qualquer maneira que modifiques a tua voz para imitar a voz da rolinha. 0 espiritual,

que está interiormente no som, é o que produz isso.

(XII) 53. A doutrina da igreja de hoje é atada em um feixe por meio de muitos

paradoxos, que devem ser abraçados pela fé; e por isso os dogmas dessa doutrina

entram somente na memória, e não em algum entendimento acima da memória,

mas unicamente em confirmações abaixo da memória.

BREVE ANÁLISE

54. Os chefes da igreja insistem em que o entendimento esteja submetido à

obediência da fé. Ainda mais, eles dizem que a fé do desconhecido, que é uma fé

cega ou noturna, é propriamente a fé. Esse é o primeiro paradoxo, pois a fé pertence

à verdade e esta pertence à fé. E a verdade, para que pertença à fé, deve estar na

luz e ser vista, pois de outro modo à falsidade pode ser crida.

Os paradoxos que provêm de uma tal fé são em grande número. Por exemplo: que

Deus Pai gerou um Filho de toda eternidade; que o Espírito Santo procede de um e

de outro, e que cada um é uma Pessoa por si mesmo, e é Deus; que o Senhor, tanto

quanto a alma como quanto ao corpo, saiu de uma mãe; que essas três Pessoas,

assim esses três Deuses, criaram o universo; que um deles desceu e tomou o

Humano, para reconciliar os homens com o Pai, e assim para os salvar; que há

salvação pela imputação, aplicação e translação da justiça do Filho nos que pela

graça adquirem a fé e crêem em tais paradoxos; que o homem na primeira recepção

dessa fé, é como uma estátua, um tronco de árvore ou uma pedra, e que a fé influi

somente pela audição da Palavra; que é a fé só que dá a salvação sem as obras da

Lei, e sem ter sido formada pela caridade; que ela opera a remissão dos pecados,

sem ter sido precedida da penitência; que por essa única remissão dos pecados, o

impenitente é justificado, regenerado e santificado, e que depois a caridade, as boas

obras e o arrependimento seguem por si mesmos; além de muitos paradoxos

semelhantes. Todos esses paradoxos provêm da doutrina fundada sobre a idéia de

três Deuses, como a prole que é propagada por uma união ilegítima.

55. Qual é o homem sábio que não vê que tais dogmas entram somente na

memória, e não no entendimento acima da memória, embora possam ser

Page 43: Exposição Sumária

confirmados pelos raciocínios tirados das aparências e das ilusões por baixo da

memória? Pois há para o entendimento humano duas luzes, uma vindo do céu, e a

outra vindo do mundo. A luz do céu, que é espiritual, influi nas mentes humanas

acima da memória. Mas a luz do mundo, que é natural, influi abaixo da memória. 0

homem por essa luz natural pode confirmar tudo que lhe apraz, tanto as falsidades

como as verdades, e depois da confirmação, ele vê as falsidades absolutamente

como as verdades. Isso foi mostrado no memorável que é inserto na obra

ultimamente publicada sobre o Amor Conjugal (*) nº 233.

56. Ao que precede será agregado este arcano do céu: Todos esses

paradoxos segundo as suas confirmações aderem às mentes humanas, estando

ligados como em um só feixe, ou enrolados como em um só novelo, e eles entram

ao mesmo tempo em cada palavra que se enuncia da doutrina da igreja. Por

exemplo, eles entram em cada palavra quando se fala da fé, ou da caridade, ou da

penitência, e mais ainda, se for da imputação ou da justificação. 0 homem mesmo

não vê esse acervo ou conglomeração desses paradoxos, mas os anjos presentes

com o homem a vêem, e eles a chamam MALUA, isto é, confusão e escuridão.

(*) O livro Amor Conjugal foi publicado por Swedenborg em 1768, um ano antes de

que ele publicou Sumária Exposição. Amor Conjugal foi publicado em

Português em 1963 em Rio de Janeiro.

57. Prevejo que hoje muitos homens, impregnados pelos paradoxos dessa fé, vão

dizer: Como as coisas teológicas podem ser percebidas pelo entendimento, quando

são coisas espirituais que transcendem o entendimento? Abre, pois, se podes, o

mistério da redenção e da justificação para que a razão o veja e dê-lhe

assentimento."

Este mistério, portanto, será aberto assim: Quem não sabe que Deus é um, e que

não há outro além d'Ele Mesmo, e que Deus é o Amor Mesmo e a Sabedoria

Mesma, ou que Ele é o Bem Mesmo e a Verdade Mesma. E que esse Deus quanto

à Divina Verdade que é a Palavra, desceu e tomou o Humano para afastar do

homem os infernos, e assim a danação. E que fez isso por combates e vitórias

contra o diabo, isto é, contra todos os infernos, que então infestavam e matavam

espiritualmente todo homem vindo ao mundo. E que depois Ele glorificou o Seu

Page 44: Exposição Sumária

Humano, por haver unido n'Ele a Divina Verdade ao Divino Bem, e assim voltou ao

Pai de Quem Ele tinha saldo.

Estas coisas sendo percebidas compreende-se esta passagem em João (1; 1,14): A

Palavra estava com Deus, a Palavra era Deus, e a Palavra se fez Carne.

E também esta passagem no mesmo (16; 28): Saí do Pai, e vim ao mundo, e de

novo deixo o mundo e vou para o Pai.

Por essas coisas é também claro que, sem, a Vinda do Senhor ao mundo, nenhum

mortal teria podido ser salvo, e que os que crêem n'Ele e vivem bem são salvos.

Esta face da fé diante da vista ilustrada pela Palavra se mostra na luz do dia, e esta

é a face da fé da Nova Igreja. Ver a FÉ DO NOVO CÉU E DA NOVA IGREJA, NA

FORMA UNIVERSAL, E NA FORMA PARTICULAR, (nºs 116 e 117).

(XIII) 58. Os dogmas da Igreja de hoje não podem ser apreendidos sem muita

dificuldade, nem ser retidos sem que eles escapem, e não podem ser pregados e

ensinados senão com muita reserva e cuidado, para que a sua nudez não apareça,

a isso, porque a verdadeira razão não os percebe e não os recebe.

BREVE ANÁLISE

59. A proposição que o entendimento deve estar sujeito à obediência da fé, é como

um cartaz posto diante dos dogmas da igreja de hoje, para indicar que os interiores

são coisas místicas ou arcanas, que, por causa de sua transcendência, não podem

influir na região superior do entendimento, nem podem ser percebidos. (ver nº 54)

Os ministros da igreja que ambicionam elevar-se por uma reputação de sabedoria e

serem tidos por oráculos nas coisas espirituais, se aplicam nas escolas teológicas

principalmente as coisas que estão acima da concepção das outras, e as engolem

com avidez, embora com dificuldade. E como, por essas coisas, eles são reputados

sábios, e são distinguidos com os gorros doutorais ou com os mantos episcopais,

quando se tornarem ilustres e opulentos por tão preciosas obscuridades, eles

ponderam nas idéias do seu pensamento e ensinam em seu púlpito poucas coisas

além das coisas místicas sobre justificação pela fé só, e sobre as boas obras como

escravas da fé. E pela erudição sobra estas coisas, eles ora separam

admiravelmente a fé e as boas obras, e ora as conjuntam. E eles fazem isso como

se tivessem em uma das mãos e fé descoberta, e na outra as obras da caridade, e

Page 45: Exposição Sumária

que ora estendendo os braços, eles as separassem, e ora juntando as mãos, eles as

conjuntassem.

Outros exemplos ilustrarão: eles ensinam que as boas obras não são necessárias à

salvação, porque se são feitas pelo homem elas são meritórias; e ao mesmo tempo,

que estas seguem necessariamente a fé que é, para eles, uma com a salvação. Eles

ensinam que a fé sem as boas obras, sendo viva, justifica; e ao mesmo tempo, que

a fé sem as boas obras, sendo morta, não justifica. Eles ensinam que a fé não é

conservada nem retida pelas boas obras; e ao mesmo tempo, que estas boas obras

procedem da fé, como os frutos procedem da árvore, como a luz procede do sol,

como o calor procede do fogo. Eles ensinam que as boas obras juntadas com a fé

completam a fé; e ao mesmo tempo, que essas obras, conjuntas como por um

casamento ou em uma só forma, privam a fé da sua essência salvifica. Eles

ensinam que o cristão não está sob a Lei; e ao mesmo tempo, que ele está nos

exercícios diários da Lei.

Eles ensinam que se as boas obras são misturadas com as coisas da salvação pela

fé, como a remissão dos pecados, a justificação, a regeneração, a vivificação, e a

salvação, elas são nocivas; mas que se elas não são misturadas, elas são

proveitosas. Eles ensinam que Deus coroa Seus dons, que são as boas obras, por

galardões, mesmo espirituais, mas não pela salvação nem pela vida eterna, porque

Deus coroa somente a fé por estás. Eles ensinam que essa fé é como uma rainha

que anda com pompa, tendo atrás de si as boas obras como servas, e que se estas

se conjungem a ela e lhes dá um beijo, ela é expulsa do trono e chamada cortesã.

Principalmente, quando eles ensinam a fé e ao mesmo tempo as boas obras, eles

consideram o mérito de um lado e o não mérito do outro, e eles escolhem os seus

termos e os arranjam de modo que formam dois sentidos, um para os leigos e outro

para o clero; para os leigos a fim de que a nudez da fé não se mostre, e para o clero

a fim de que ela se, mostre. Julgai, se alguém, escutando tal ensino, pode tirar

alguma coisa da doutrina que conduza à salvação. Não ficará, pois, cego em

presença das contradições que esse ensino encerra. E depois não apalpará os

objetivos da salvação como um homem que anda de noite? Haverá alguém que

saiba se ele tem alguma fé pelo testemunho das obras? Será melhor para ele

Page 46: Exposição Sumária

fazê-las com o medo do mérito, ou omiti-ias com o medo de perder a fé? Mas, meu

amigo, tira-te de um tal ensino, e foge dos males como pecados, pratica os bens e

crê no Senhor, e a justificação que salva-te será dada.

(XIV) 60. A doutrina da fé da igreja de hoje atribui a Deus propriedades humanas,

como sejam: que Ele olhou os homens com ira, que Ele quis ser reconciliado, que

Ele é reconciliado por amor ao Filho e pela intercessão, que Elo quis ser apaziguado

pela visão do sofrimento do Filho, e ser assim reconduzido à misericórdia e que Ele

imputa a justiça do Filho ao injusto que suplica pela fé só, e que Ele faz, assim, de

inimigo um amigo, e de filho da ira, um filho da graça.

BREVE ANALISE

61. Quem não sabe que Deus é Misericórdia Mesma e a Clemência Mesma, porque

Ele é o Amor Mesmo e o Bem Mesmo, e que estas constituem o Seu Ser ou a Sua

Essência? E sendo assim, quem não vê que há contradição em dizer que a

Misericórdia Mesma ou o Bem Mesmo possa olhar o homem com ira, tornar-se seu

inimigo, desviar-se dele, decidir sua danação, e apesar de tudo isso permanecer Ser

Divino ou Deus? Tais coisas não são aplicadas ao homem virtuoso, mas sim ao

homem perverso. Elas também não podem ser aplicadas ao anjo do céu, mas sim

ao do inferno. Por isso é abominável atribuir essas coisas a Deus.

Mas tais propriedades foram atribuídas a Deus, como é evidente pelas palavras dos

muitos pais da igreja, dos concílios e posteriormente pelas palavras das igrejas,

desde os primeiros séculos até ao dia de hoje. Isso também é evidente pelas

induções que necessariamente se seguiram do princípio nas coisas derivadas, ou da

causa principal nos efeitos, como as coisas da cabeça nos membros. Exemplos

dessas induções são os seguintes: Deus quer ser reconciliado; Ele é reconciliado

por amor ao Filho e pela intercessão ou mediação; Ele quer ser apaziguado pela

visão do extremo sofrimento do Filho, e ser assim reconduzido e, por assim dizer,

constrangido à misericórdia, para que Ele Se torne um amigo de um inimigo e adote

os filhos de ira como filhos de graça. Será visto na última análise deste livro que,

imputar a justiça e os méritos de Seu Filho ao injusto que suplica pela fé só, é

também uma propriedade meramente humana.

Page 47: Exposição Sumária

62. Aqueles que viram propriedades meramente humanas indignas de Deus, e

entretanto atribuídas a Deus, para defender o sistema da justificação, uma vez

concebida, e para velá-lo com uma aparência, disseram que a ira, a vingança, a

danação e outras coisas semelhantes são atribuídas a Sua justiça, e que é por isso

que na Palavra tais expressões são muitas vezes empregadas e como apropriadas a

Deus.

Mas pela ira de Deus, na Palavra, é significado o mal no homem. E, como esse mal

é contra Deus, ele é chamado a ira de Deus, não porque Deus se irrita contra o

homem, mas porque o homem por seu mal se irrita contra Deus. E, porque o mal

traz consigo a sua pena, como o bem traz a sua recompensa, por isso quando o mal

pune o homem parece lhe que é Deus que o pune. É, com efeito, como se um

malfeitor censurasse a lei pelo fato de ter sido punido, ou como se alguém

censurasse o fogo pelo fato de ter sido queimado quando pôs sua mão nele, ou

como se censurasse uma espada nua na mão de um defensor quando se precipita

sobre a ponta. Tal é a justiça de Deus.

Mas sobre isto é possível ver muitas coisas no Apocalipse Revelado. Sobre a justiça

e o juízo em Deus e por Deus veja nº 668. Porque a ira é atribuída a Deus, ver nº

635, e também a vingança, nº 658. Mas isso no sentido da letra, porque este sentido

foi escrito por aparências e correspondências. Mas não se atribui a Deus ira e

vingança no sentido espiritual. Neste sentido a verdade está em sua luz.

Posso afirmar que os anjos, quando ouvem alguém dizer que Deus por ira decidiu a

danação do gênero humano, e que sendo inimigo Ele é reconciliado pelo Filho como

outro Deus gerado d'Ele, eles se tornam como os que são excitados a evacuação

por uma comoção das vísceras e ao mesmo tempo do estômago. Eles dizem: "Que

mais de abominável pode ser dito sobre Deus?".

63. Foram atribuídas a Deus propriedades humanas, porque toda a percepção e

iluminação espiritual vêm do Senhor Só. Pois o Senhor é a Palavra ou a Divina

Verdade, e Ele é a verdadeira luz que ilumina todo homem. (João 1; 1,9) E Ele diz:

"Eu, a Luz, vim ao mundo, para que todo aquele que crê em Mim não fique nas

trevas." (João 12; 46) E essa Luz, e a percepção que vem dela, influem somente nos

que reconhecem o Senhor como Deus do céu e da terra, e se dirigem a Ele só, e

Page 48: Exposição Sumária

não nos que abraçam a idéia de três Deuses, o que foi feito desde o começo da

instauração da Igreja Cristã. Esta idéia, porque é meramente natural, não recebe

outra luz senão a luz natural, e não pode ser aberta ao influxo nem a recepção da luz

espiritual. Daí vem, que eles somente viram em Deus propriedades naturais.

Além, disso, se as tivessem visto incompatíveis com a Divina Essência, e se as

tivessem removido do Artigo da Justificação, eles teriam sido privados inteiramente

da religião, que foi fundada desde o começo sobre o culto de três Deuses, assim

antes do tempo fixado de antemão para a Nova Igreja, quando há plenitude e a

restauração.

(XV) 64. De fé da igreja de hoje nasceram, e podem nascer ainda, filhotes

monstruosos; como sejam: a salvação instantânea pela misericórdia imediata; a

predestinação; nenhuma atenção de Deus dirigida aos atos do homem, mas

somente à fé; que não existe um laço entre a caridade e a fé; que o homem na

conversão é como um tronco de árvore e muitos outros. Também sobre os

sacramentos do batismo e da santa ceia quanto aos princípios do raciocínio sobre

seu benefício tirado da doutrina da justificação pela fé só; como também sobre a

Pessoa do Cristo. As heresias desde os primeiros séculos até hoje não jorram de

outra origem senão da doutrina fundada sobre a idéia de três Deuses.

BREVE ANÁLISE

65. Hoje não se crê em outra salvação exceto na salvação instantânea pela

misericórdia imediata. Isso é claro pela crença que toda a obra da salvação se

cumpre pela fé só da boca e ao mesmo tempo por uma confiança dos pulmões, e

não ao mesmo tempo pela caridade segundo a qual a fé oral se torna real e a

confiança dos pulmões se torna a confiança do coração. Se, com efeito, a

cooperação que o homem traz como por si mesmo pelos exercícios da caridade é

tirada, a cooperação espontânea, que segue por si mesma a fé, se torna uma ação

passiva, que é uma palavra frívola. Pois então que necessidade existe além deste

meio instantâneo e imediato: "Salva-me, 6 Deus, em consideração da paixão do Teu

Filho, que me lavou de meus pecados por Seu sangue, e me apresenta puro, justo e

santo diante de Teu trono", essa expressão da boca tendo valor como a semente da

justificação, mesmo na última hora da morte, se não foi dito antes? Mas tal salvação

Page 49: Exposição Sumária

instantânea pela misericórdia imediata é hoje uma serpente voando na igreja, e tal

dogma destrói a religião, introduz a segurança, e imputa ao Senhor a danação, como

se pode ver na obra A Divina Providência, nº 340, publicada em Amsterdã, 1764.

(também em Português, Rio de Janeiro, 1969).

66. A predestinação é um filhote da fé da igreja de hoje, porque ela nasceu da fé na

salvação instantânea pela misericórdia imediata, e da fé em uma impotência

absoluta e nenhuma liberdade nas coisas espirituais nos homens, sobre o que se

verá adiante nº 68. Que este dogma seja produzido por esses princípios, como uma

serpente é produzida por outra serpente, e uma aranha por outra aranha, pode ser

visto acima. Desses princípios e também da conversão do homem como inanimada,

resulta que o homem é como um tronco de árvore, e que depois ele não saiba por

consciência alguma. se o tronco mesmo foi vivificado pela graça, ou não. Pois é dito

"que Deus, pela audição da Palavra, dá a fé quando Ele ,quer e onde quer," (nº 11a)

assim pelo Seu beneplácito. E também é dito que a eleição se faz pela mera graça

de Deus, excluindo a ação do homem, quer esta provenha das forças da natureza,

quer das forças da graça. (Fórmula de Concórdia, pág. 821, Apêndice pág. 182). As

obras que seguem a fé 'como testemunhos, são, quando bem consideradas,

semelhantes às obras da carne, e o Espírito que as opera, não manifesta de que

origem elas são, mas faz com que elas pertençam à graça, e assim ao beneplácito,

como a fé mesma.

Por estas considerações é claro que o dogma da predestinação saiu da fé da igreja

de hoje, como um rebento sai de uma raiz. E posso dizer que ele proveio dessa fé

como uma conseqüência apenas evitável. Este dogma foi feito entre os

predestinatarianos, por Godeschalk, depois por Calvino e os seus partidários, e

finalmente foi fortemente estabelecido pelo Sínodo de Dordrecht. Daí foi

transportado pelos supralapsários e pelos infralapsários em sua igreja, como o

paládio da religião, ou, mais propriamente, como a cabeça de Górgona ou de

Medusa gravada sobre o escudo de Pallas.

Mas que se pode imaginar de mais pernicioso, e que se pode crer de mais cruel a

respeito de Deus, do que a suposição de que alguns, no gênero humano, são

danados pela predestinação? Com efeito, não seria uma fé cruel crer que o Senhor,

Page 50: Exposição Sumária

que é o Amor Mesmo e a Misericórdia Mesma, quer que uma multidão de pessoas

nasçam para o inferno, ou que miríades e miríades nasçam amaldiçoados, isto é,

nasçam diabos e satanases; e que por Sua Divina Sabedoria, que é infinita, Ele não

proveu e não provê para que os que vivem bem e reconhecem Deus, não sejam

lançados em um fogo e um tormento eternos? 0 Senhor é sempre Criador e

Salvador de todos. Só Ele guia todos os homens e não quer a morte de nenhum. E,

portanto, o que mais horrível pode ser crido e pensado do que reuniões de nações e

povos sob os auspícios e os olhares do Senhor, serem por predestinação entregues

ao diabo, como uma presa, para saciarem a sua voracidade? Mas esse dogma é um

filhote da fé da igreja de hoje. Mas a fé da Nova Igreja tem horror a esse dogma

como a um monstro.

67. Nenhuma atenção de Deus às ações do homem, mas somente à fé, é uma nova

heresia produzida pelas duas precedentes, sobre que já acima se falou (n 64, 65) E

o que espanta, ela foi tirada da mãe loba ou da predestinação como terceiro filhote,

segundo a fé só examinada a fundo e desenvolvida; o que foi feito pelos mais

astutos deste século. Mas, porque essa heresia é insana, ímpia e maquiavélica, ela

é ainda mentias como encerrada nas túnicas do útero, desprendidas de sua madre

depois do parto, ou nas secundinas, para que a sua monstruosidade não apareça.

Mas a sua insanidade e impiedade são descritas e repelidas no Apocalipse

Revelado, nº 463.

68. Que não há um laço entre a caridade e a fé é uma conseqüência das

proposições seguintes em sua doutrina da justificação. A fé é imputada por justiça

sem as obras, (nº 12a). A fé não justifica enquanto é formada pela caridade, (nº

12b). As boas obras devem ser inteiramente excluídas quando se trata da

justificação e da vida eterna, (nº 12f). As boas obras não são necessárias à

salvação, e a asserção de sua necessidade deve ser inteiramente rejeitada da igreja,

(nº 12g, h, i, k). A salvação e a fé não são conservadas nem retidas pela caridade

nem pelas obras da caridade, (nº 12m, n). As boas obras misturadas ao assunto da

justificação são perniciosas, (nº 14g). As obras do espírito ou da graça, que seguem

a fé como seus frutos, também não conferem coisa alguma para a salvação, (nº 14d

e em outras partes). Dessas proposições, se segue inevitavelmente que não há laço

Page 51: Exposição Sumária

algum entre essa fé e a caridade, e que, se houvesse um, ele seria pernicioso para a

salvação, porque ele agiria contra a fé, que assim não seria a única encarregada da

salvação.

Que efetivamente não possa haver um laço entre a caridade e essa fé foi mostrado

em nºs 47, 48, 49 e 50. Por isso pode-se dizer que é, pelo previsto e pelo

predestinado, que os reformadores lançaram para longe da sua fé a caridade e as

boas obras. Pois se as tivessem conjuntado, seria como se tivessem conjuntado um

leopardo e uma ovelha, um lobo e um cordeiro, um gavião e uma rola. Essa fé é

também descrita por um leopardo no Apocalipse 13; 2. (ver explicação em

Apocalipse Revelado nº 572) Mas quanto ao que é a igreja sem a fé, e a fé sem a

caridade, e assim a igreja sem o casamento da fé e da caridade, veja no nº 48. Esse

casamento é a igreja mesma, e é a Nova Igreja que agora é instaurada pelo Senhor.

69. Que o homem na conversão seja como um tronco da árvore é um filhote que a fé

da igreja de hoje reconhece plenamente como seu filhote fraternal por estas

palavras: 0 homem está em uma impotência completa nas coisas espirituais, (nº

15a, b, c). Na conversão ele é como um tronco de árvore, uma pedra e uma estátua

e nem sequer ele pode se adaptar nem se aplicar a receber a graça; e ele é como o

que não tem o uso de sentido algum. (nº 15c, d) 0 homem tem somente o poder

locomotor para se dirigir as assembléias, onde ele pode ouvir a Palavra e o

Evangelho. (nº 15e) Mas o homem, renascido pela virtude do Espírito Santo,

coopera de um certo modo com novas forças e novos dons, (nº 15k) além de muitas

outras proposições.

Que o homem é chamado tal em si quando ele se converte e faz penitência das más

obras, é também um filhote que saiu do mesmo ovo ou do mesmo útero, isto é, da fé

só justificante. E isso foi feito a fim de que as obras do homem fossem inteiramente

exterminadas e não se conjugassem à fé.

Mas, porque essas proposições sobre a conversão e a penitência do homem

repugnam a comum percepção de todos os homens, isto é ajuntado: "Há uma

grande diferença entre os homens batizados e os que não são batizados, porque é

conforme a doutrina de Paulo, que todos que foram batizados; revestiram o Cristo e

na verdade são renascidos. Estes têm já o arbítrio em liberdade, por isso eles não só

Page 52: Exposição Sumária

escutam a Palavra de Deus, mas também podem dar-lhe o seu assentimento e se

lhe afeiçoar pela fé." (nº 15m e na Fórmula de Concórdia, pág. 675).

Apelo para os homens sábios, a fim de que eles examinem se essa proposição é

coerente em um modo qualquer com as precedentes, ou se não há contradição

quando se diz que todo cristão no estado de conversão é como um tronco de árvore

e como uma pedra, ao ponto que não pode se adaptar para receber a graça,

quando, entretanto, todo cristão é batizado, e que pelo batismo ele alcança o poder

de não só escutar a Palavra de Deus, mas também o poder de lhe dar seu

assentimento e afeiçoar-se-lhe pela fé. Por isso a similitude do homem cristão com

um tronco de árvore e com uma pedra, deve ser rejeitada da igreja no mundo

cristão, e deve ser dissipada como o meteoro visto em sonho por um homem se

dissipa quando ele é despertado. Haverá alguma coisa que mais repugne a razão?

Mas para dar um esclarecimento sobre o modo como a Nova Igreja ensina a

conversão do homem, vou transcrever aqui uma passagem tirada de um memorável

do Apocalipse Revelado: "Quem não vê que todo homem tem a liberdade de pensar

em Deus e de não pensar n'Ele, e que assim cada um tem a liberdade nas coisas

espirituais do mesmo modo que nas coisas civis e morais. 0 Senhor dá

continuamente essa liberdade a todos os homens. Por isso o homem se torna réu e

culpado segundo seu pensamento. 0 homem é homem porque ele pode pensar em

Deus, e o bruto é bruto porque ele não tem este poder. Por isso o homem pode

reformar-se e regenerar-se como por si mesmo, contanto que ele reconheça de

coração que é pelo Senhor. Todo homem que faz penitência é reformado e

regenerado. 0 homem deve fazer uma e outra coisa como por si mesmo. Agir como

por si mesmo é também agir pelo Senhor, porque o Senhor dá o querer e o poder e

nunca priva pessoa alguma deles.

"É verdade que o homem não pode contribuir para isso em coisa alguma, entretanto

ele não foi criado estátua, mas foi criado homem para fazer isso pelo Senhor como

por si mesmo. Isto é o único recíproco do amor e da fé, e assim da conjunção, que o

Senhor quer absolutamente que o homem cumpra para com, Ele. Em uma palavra,

fazei por vós mesmos, e crede que é pelo Senhor, assim fazei como por vós

mesmos.

Page 53: Exposição Sumária

Contudo não foi atribuído ao homem por criação fazer assim, porque pertence ao

Senhor só fazer por Si Mesmo, mas isso é dado continuamente ao homem. E então,

enquanto o homem faz o bem e aprende a verdade como por si mesmo, ele é um

anjo do céu. Mas enquanto ele faz o mal e, por conseguinte confirma a falsidade, o

que também é feito como por si mesmo, ele é um espírito do inferno. Que isso

também seja como por si mesmo, é claro pelas preces para ser preservado do

diabo, para que ele não seduza o homem e não o leve a seu mal. Todo aquele que

crê que age por si mesmo, quer faça o bem quer faça o mal, torna-se culpado. Pois

tudo que o homem crê que ele faz por si mesmo, ele o apropria a si. Se é o bem, ele

apropria a si e o faz seu, quando entretanto o bem pertence a Deus e vem de Deus.

Se é o mal, ele o apropria a si igualmente e o faz seu, quando entretanto o mal

pertence ao diabo e vem do diabo." (Apocalipse Revelado, nº 224)

Muitos outros filhotes monstruosos também produzidos da doutrina da justificação

pela fé só, como sobre os sacramentos, batismo e santa ceia, quanto aos princípios

da razão a respeito dos seus benefícios, como também sobre a Pessoa do Cristo. E

as heresias desde os primeiros séculos até hoje não têm tido outra origem senão na

doutrina fundada sobre a idéia de três Deuses. Não convém demonstrar isso neste

resumo, mas isso será exposto e demonstrado na obra mesma.

(XVI) 70. 0 último estado da igreja de hoje, quando está no seu fim, se entende pela

consumação do século, e pela Vinda do Senhor que então se realiza. (Mateus 24; 3).

BREVE ANÁLISE

71. Lê-se em Mateus: "Os discípulos se aproximaram de Jesus, e Lhe mostraram a

estrutura do templo. E Jesus disse-lhes: Na verdade, digo-vos que não ficará aqui

pedra sobre pedra que não seja derrubada. E os discípulos Lhe disseram: Dize-nos

quando essas coisas acontecerão especialmente qual será o sinal da Tua Vinda e

da consumação do século." (Mat. 24; 1, 2, 3).

Hoje, pela destruição do templo os eclesiásticos instruídos e os leigos eruditos

entendem a sua destruição por Vespasiano; e pela Vinda do Senhor e a

consumação do século, eles entendem o fim e a destruição do mundo. Mas pela

destruição do templo se entende não só a sua destruição pelos romanos, mas

também a destruição da igreja de hoje. E pela consumação do século e a Vinda do

Page 54: Exposição Sumária

Senhor, se entende o fim dessa igreja, e a instauração da Nova Igreja pelo Senhor.

Que seja isso o que se entende, é claro por todo esse capítulo de Mateus, desde o

começo até ao fim, onde somente se trata da decadência e corrupção sucessivas da

Igreja Cristã até à sua destruição quando chegou ao seu fim.

Pelo templo no sentido restrito se entende o templo de Jerusalém, em um sentido

amplo a igreja do Senhor, em um sentido mais amplo o céu angélico, e no sentido

mais amplo de todos o Senhor quanto ao Seu Humano. (veja no Apocalipse

Revelado, nº 529) Pela consumação do século se entende o fim da igreja, que

acontece quando não fica verdade alguma da doutrina que vem da Palavra, que não

tenha sido falsificada e assim consumada. (veja no Apocalipse Revelado, n 658,

676, 750) Pela Vinda do Senhor se entende a Sua Vinda na Palavra, e então a

instauração da Nova Igreja em lugar da precedente que tem sido consumada. Isso

pode ser visto pelas palavras do Senhor nesse mesmo capítulo 24 de Mateus,

versículos 30 a 34, e nos dois últimos capítulos, 21 e 22, do Apocalipse, onde

também estão estas palavras.

"Eu, Jesus, sou a Raiz e o Rebento de Davi, a brilhante Estrela da manhã. E o

Espírito e a noiva dizem: Vem. E quem ouve, diga: Vem. E quem tem sede, venha.

Também venho em breve, amém. Ora vem Senhor Jesus." (Apoc. 22; 16, 17, 20).

72. Que há o fim da igreja, quando não há mais verdades da fé, nem por

conseguinte bens da caridade, é claro por si mesmo. As falsidades da fé extinguem

as verdades da doutrina, e os males da vida consomem os bens da caridade. E

onde estão as falsidades da fé há também os males da vida, e onde estão os males

da vida há também as falsidades da fé.

Isso será demonstrado especificamente em seu lugar.

Até hoje foi oculto que pela consumação do século se entende o fim da igreja,

porque lá onde as falsidades são ensinadas, e onde a doutrina que vem dessas

falsidades é crida e honrada como ortodoxa, não é possível de modo algum saber

que a igreja vai ser consumada. Pois as falsidades são consideradas como

verdades, e as verdades como falsidades; e então a falsidade repele a verdade e a

enegrece, como a tinta enegrece uma água límpida, ou a fuligem um papel branco.

Pois é crido, e proclamado pelos doutores deste século, que eles estão na luz mais

Page 55: Exposição Sumária

clara do Evangelho, apesar de estarem, quanto a toda face, nas trevas. Assim, uma

catarata cobriu a pupila dos seus olhos.

73. Em Mateus, cap. 24, em Marcos, cap. 13, e em Lucas cap. 21, onde são

relatadas coisas semelhantes, não é descrita a destruição do templo de Jerusalém,

mas são preditas as mudanças sucessivas do estado da Igreja Cristã em sua ordem

até o seu último estado quando chega o fim. Isso se verá na obra mesma, onde

esses capítulos serão explicados (*). Mas, no entanto, pode se vê-lo por estas

palavras nos Evangelistas.

"Então aparecerá o sinal do Filho do Homem, e então lamentarão todas as tribos da

terra, e verão o Filho do Homem vindo nas nuvens do céu com poder e glória. E

enviará os seus anjos com uma grande voz de trombeta, e juntarão os Seus eleitos

desde uma extremidade dos céus até a sua extremidade." (Mateus 24;30,31, Marcos

13;26,27, Lucas 21;27).

É conhecido que essas coisas não têm sido vistas nem ouvidas em Jerusalém

quando foi destruída, e hoje se crê que elas vão suceder no tempo do Juízo Final.

Lêem-se também coisas semelhantes no Apocalipse, no qual, desde o começo até

ao fim, só se trata do último estado da igreja. Ali se acham estas palavras: "Eis,

Jesus Cristo vem nas nuvens, e todas as tribos da terra lamentarão sobre Ele."

(Apoc. 1; 5,7).

Isso é explicado palavra por palavra no Apocalipse Revelado, n.Os 24 a 28. E sobre

a significação das tribos da terra e da sua lamentação, veja n 27, 348, 439.

(XVII) 74. Pela grande aflição, tal que não tem havido desde o começo do mundo,

nem haverá, Mateus 24; 21, se entende a infestação pelas falsidades, e por

conseguinte a consumação de toda a verdade, ou a desolação, nas igrejas cristãs

hoje.

(*) Uma explicação de Mateus, cap. 24, foi publicada por Swedenborg nos Arcanos

Celestes, entre as explicações dos capítulos 26 a 40 de Gênesis.

BREVE ANÁLISE

75. Que a decadência e a corrupção sucessivas da Igreja Cristã foram preditas e

descritas pelo Senhor em Mateus, cap. 24, vê-se acima, nº 73. Depois que o Senhor

falou dos falsos profetas que apareceriam e da abominação da desolação que elas

Page 56: Exposição Sumária

produziriam, vers. 11, 15, Ele disse: "Haverá então uma grande aflição, tal que não

tem havido desde o começo do mundo até agora, nem haverá." (Mat. 24; 21).

Desta passagem é claro que, pela grande aflição, como também, aqui e ali em

outros lugares da Palavra, se entende a infestação da verdade pelas falsidades, até

não ficar uma verdade genuína tirada da Palavra, que não tenha sido falsificada, e

assim consumada.

Isto é o que sucedeu, porque as igrejas não reconheceram, a Unidade de Deus na

Trindade e a Trindade de Deus na Unidade em uma só Pessoa, mas em três

Pessoas. E por conseguinte fundaram a igreja na mente sobre a idéia de três

Deuses, e na boca sobre a confissão de um só Deus. Portanto, por esse modo, se

separaram do Senhor, ao ponto que finalmente não tiveram idéia alguma

remanescente da Divindade em Sua Natureza Humana. (ver Apocalipse Revelado,

nº 294). Entretanto, o Senhor quanto ao Seu Humano é a Divina Verdade Mesma e

a Divina Luz Mesma, como Ele plenamente o ensina em Sua Palavra. Dessa

separação vem hoje uma tão grande aflição. Que essa aflição foi introduzida

principalmente pela doutrina da justificação e da imputação por meio da sua fé só.

será visto posteriormente.

76. Tratou-se dessa aflição, ou da infestação da verdade pelas falsidades, em sete

capítulos do Apocalipse. É ela que se entende pelo cavalo preto, e pelo cavalo

pálido, que saem do livro cujos selos o Cordeiro abriu, (Apoc. 6;5 a 8). E depois pela

besta subindo do abismo, que fez a guerra contra as duas testemunhas e as matou,

(Apoc. 11; 7 e seg.). Como também pelo dragão que esteve diante da mulher

prestes a dar a luz para devorar seu filho, e que a perseguiu no deserto, e aí lançou

da sua boca água como um rio, a fim de engoli-Ia, (Apoc. 12). E também pela besta

subindo do mar, que se assemelhava pelo corpo a um leopardo, pelos pés a um

urso, e pela boca a um leão, (Apoc. 13; 2). Também pelos três espíritos que

pareciam rãs e que saíram da boca do dragão, da boca da besta e da boca do falso

profeta, (Apoc. 16; 13).

Além disso, essa aflição é entendida por estas coisas. Depois de que os anjos

derramaram as taças de ira de Deus, nas quais estavam as sete pragas, na terra, no

mar, nos rios e nas fontes,no sol, no trono da besta, no Eufrates, e finalmente no ar,

Page 57: Exposição Sumária

houve um grande terremoto, tal como não tinha havido desde que os homens foram

feitos na terra, (Apoc. 16) . 0 terremoto significa a inversão da igreja que se faz pelas

falsidades e pelas falsificações da verdade.

Coisas semelhantes se entendem por estas palavras: "0 anjo lançou a foice, e

vindimou a vinha da terra, e a lançou no grande lagar da ira de Deus. E o lagar foi

pisado e saiu sangue até aos freios dos cavalos por mil seiscentos estádios." (Apoc.

14;19,20).

0 sangue significa a verdade falsificada. Há também muitas outras significações

nesses sete capítulos do Apocalipse. Vê-de, se vos agradar, as explicações, e os

memoráveis colocados depois desses capítulos no Apocalipse Revelado.

(XVIII) 77. Na Igreja Cristã no último tempo, quando seu fim está iminente, não há o

amor, nem a fé, nem os conhecimentos do bem e da verdade. isso se entende por

estas palavras no capítulo 24 de Mateus: "Após a aflição desses dias, o sol se

escurecerá e a lua não dará a sua luz, e as estrelas cairão do ,céu, e os poderes dos

céus serão abalados" (ver. 29).

BREVE ANÁLISE

78. Na Palavra Profética encontram-se expressões semelhantes às que estão aqui

em Mateus 24;29, sobre o sol, a lua e as estrelas.

Por exemplo, em lsaías: "Eis, o dia de Jehovah vem, feroz. As estrelas dos céus e

as suas constelações não alumiarão com a sua luz, o sol se escurecerá ao seu

levantar, e a lua não fará brilhar a sua luz." (13;9,10).

Em Ezequiel: "Quando te tiver apagado, cobrirei os céus, e enegrecerei as suas

estrelas. Cobrirei o sol com uma nuvem, e a lua não fará luzir a sua luz, e porei

trevas na terra." (32;7,8).

Em Joel (2;2,10): "Vem o dia de Jehovah, dia de trevas, o sol e a lua não farão luzir

a sua luz, e as estrelas retiraram o seu esplendor."; (3; 4) "0 sol se mudará em

trevas, e a lua em sangue, antes que venha o grande dia de Jehovah."; (4;14,15)

"Está próximo o dia de Jehovah no vale da decisão, e o sol e a lua se enegreceram."

.

No Apocalipse (8; 12): "0 quarto anjo tocou a trombeta, e a terceira parte do sol foi

ferida, e a terceira parte da lua, e a terceira parte das estrelas, e o dia não luzia na

Page 58: Exposição Sumária

sua terceira parte."; (6;12) "0 sol tornou-se preto como um saco de cilício, e a lua

tornou-se como sangue.".

Em todas essas passagens trata-se do último tempo da Igreja Judaica, quando o

Senhor velo ao mundo. Semelhantemente em Mateus e no Apocalipse, mas nestas

passagens se trata do último tempo da Igreja Cristã quando o Senhor vem de novo,

mas na Palavra, a qual é Ele Mesmo, e na qual Ele Mesmo está. Por isso,

imediatamente depois dessas palavras, Mateus 24; 19, acham-se estas: "E então

aparecerá o sinal do Filho do Homem vindo nas nuvens dos céus." (Mateus 24;30).

Nesses lugares pelo sol se entende o amor, pela lua a fé, e pelas estrelas os

conhecimentos do bem e da verdade. E pelos poderes dos céus se entendem essas

três coisas como apoios e fundamentos dos céus, onde estão os anjos, e das

igrejas, onde estão os homens. E assim, por essas palavras, reunidas em um só

sentido, entende-se que na Igreja Cristã, rio último tempo, quando seu fim está

iminente, não resta o amor, nem a fé, nem os conhecimentos do bem e da verdade.

No Apocalipse Revelado, mostrou-se que o sol significa o amor (nºs 53, 54, 413, 796,

831, 961); que a lua significa a fé (n 53, 332, 413, 423, 533); e que as estrelas

significam os conhecimentos do bem e da verdade (n 51, 74, 333, 408, 419, 954).

79. Nas igrejas cristãs, segundo a predição, há hoje uma tal escuridão, que não

existe luz do sol durante o dia, nem luz da lua e das estrelas durante a noite. Isso

vem unicamente da Doutrina da Justificação pela Fé Só. Pois essa doutrina ensina

que a fé é o único meio da salvação, de cujo influxo, progresso, habitação, operação

e eficácia, ninguém tem visto sinal algum. E nesta fé não entram e não se

encontram de modo algum a Lei do Decálogo, a caridade, as boas obras, a

penitência, e o estudo de uma nova vida. É afirmado que essas coisas seguem,

espontaneamente, não sendo úteis para manter a fé ou para adquirir a salvação.

A Doutrina da Justificação pela Fé Só ensina também que essa fé gratifica com a

liberdade os que são renascidos ou os que adquiriram a fé, para que eles não

estejam sob a Lei. E ela ensina que o Cristo cobre os pecados deles diante de Deus

Pai, que os remete como se Ele os não tivesse visto, e que coroa aqueles que têm

essa fé pela renovação, santidade e vida eterna.

Page 59: Exposição Sumária

Essas coisas e muitas outras semelhantes são os interiores dessa doutrina. Os

exteriores, que não entram nela, são coisas preciosas sobre a caridade, as boas

obras, os atos da penitência, os exercícios da Lei. Mas estas coisas são como

escravos e criados que seguem, a Fé sua soberana sem dela se aproximar.

Contudo, porque aqueles que ensinam sabem que os leigos consideram essas

coisas como salvificas em conjunto com a fé, eles as ajuntam com zelo em seus

sermões e em suas conversas, e fingem uni-Ias e aplicá-las à justificação, mas

unicamente com o fim de lisonjear os ouvidos do vulgo e pôr em seguro os seus

oráculos para que não pareçam enigmáticos, ou como coisas pitônicas.

80. Para confirmar as coisas que são ditas acima, citarei, da Fórmula de Concórdia,

de que se falou em nº 09, as passagens seguintes, para que ninguém creia que eles

fossem acusados de tais coisas injustamente. As passagens são estas: As obras da

segunda tábua do Decálogo são coisas civis e do culto externo que o homem pode

fazer por si mesmo, e é uma loucura imaginar que essas obras justificam, (pág. 84,

85, 102). As boas obras devem ser inteiramente excluídas do assunto da justificação

pela fé, (pág. 589, 590, 591, 704 a 708). As boas obras não entram de modo algum

na justificação, (páginas 589, 702, Apêndice 62, 173). As boas obras não conservam

a salvação nem a fé, (pág. 590, 705, Ap. 174). A penitência também não entra na

justificação da fé, (pág. 165, 320, Ap. 158). A Penitência consiste somente em

invocar a Deus, confessar o Evangelho, em dar graças, obedecer ao magistrado, em

exercer a sua vocação, (pág. 12, 198, Ap. 158, 159, 172, 266). A Renovação da vida

não pertence também à justificação, (pág. 585, 685, 688, 689, Ap. 170). O estudo da

nova obediência também não entra na fé e não justifica, (pág. 90, 91, 690, Ap. 167).

Os renascidos não estão sob a lei, mas foram libertados de sua servidão, e estão

somente na lei; eles também estão sob a graça, (pág. 722 e em outros lugares). Os

pecados, dos renascidos são cobertos pelo mérito do Cristo, (Pág. 641, 686, 687,

719, 720). Além de muitas passagens semelhantes. Deve ser sabido que todos os

Protestantes, tanto Evangélicos como Reformados, ensinam do mesmo modo a

justificação pela fé só, (ver n 17, 18).

81. O que causa surpresa, e que a Doutrina da Justificação pela Fé Só alcança hoje

todos os votos em todo o mundo da Cristandade reformada, isto é, que ela reina ali

Page 60: Exposição Sumária

quase como o único dogma de teologia na ordem sacra. É ela que todos os jovens

noviços do clero aprendem e recebem avidamente nas universidades. E depois,

como se fossem inspirados pela sabedoria celeste, eles a ensinam nos templos, a

propagam em escritos, e por ela procuram a reputação de uma erudição superior e a

glória do nome. É também, por causa dessa doutrina, que eles adquirem diplomas,

prerrogativas e recompensas. E estas coisas são feitas, embora por essa doutrina o

sol fosse escurecido, a lua fosse privada de sua luz, e as estrelas dos céus caíssem,

isto é, perecessem.

A doutrina sobre a fé na justiça imputativa tem cegado hoje as mentes, ao ponto que

elas não querem ver a verdade, e quase não podem ver alguma verdade Divina, a

luz do sol, nem a luz da lua, mas unicamente a luz de uma fogueira durante a noite.

Isso foi mostrado a mim como um testemunho. Por isso posso predizer que se as

Divinas Verdades sobre a conjunção da caridade e da fé, sobre o céu, sobre o

Senhor, e sobre a felicidade eterna conseqüente, fossem enviadas do céu escritas

em letras de prata, os secretários dessa justificação não as julgariam dignas de

serem lidas. Mas coisa completamente diferente sucederia se fosse tirado dos

infernos um papel sobre a justificação pela fé só.

Lê-se também, na Fórmula de Concórdia, que o artigo da justificação pela fé só, ou

da justiça da fé, é o principal em toda a doutrina cristã; e que as obras da Lei devem

ser inteiramente excluídas desse artigo, (Pág. 17, 61, 62, 73, 89, 684; Ap. 164).

(XIX) Pelos bodes, em Daniel e em Mateus, se entendem os que estão na fé

justificante de hoje.

BREVE ANÁLISE

Lemos em Daniel (Cap. 8, 2 a 14) estas palavras: "Em visão vi um carneiro que tinha

dois chifres altos, mas o mais alto subia para trás; e ele feria com chifres para o

Oeste, para o Norte e para o Sul; e ele se engrandecia. Depois vi um bode que vinha

do Oeste sobre as faces de toda a terra, o qual tinha um chifre entre os olhos. E

correu para o carneiro com o furor de sua força, e quebrou os seus dois chifres e o

lançou por terra, e o pisou. Mas o grande chifre do bode foi quebrado, e em seu

lugar subiram quatro chifres. E de um deles saiu um chifre pequeno, que cresceu

muito para o Sul, para o Oriente e para o esplendor, e até ao exército dos céus, e

Page 61: Exposição Sumária

lançou sobre a terra o exército e as estrelas, e os pisou. E ele se elevou mesmo até

ao Príncipe do exército, e o sacrifício perpétuo Lhe foi tirado, e o habitáculo de Seu

santuário foi derrubado, porque lançou a verdade na terra. E ouvi um santo dizendo:

Até quando essa visão, o sacrifício perpétuo e a prevaricação devastadora para

deixar o santo e o exército serem pisados? E ele disse: até à tarde, de manhã, então

o Santo será justificado.".

Que essa visão prediz os estados futuros da igreja, é manifestamente claro. Pois se

diz que o sacrifício perpétuo foi tirado do Príncipe do exército, que o habitáculo de

Seu santuário foi derrubado, e que o bode lançou a verdade na terra. E também se

diz que, então, um santo disse: Até quando essa visão para deixar o santo e o

exército serem pisados; e que seria até a tarde, de manhã, quando o que é santo

será justificado. Com efeito, pela tarde, de manhã, se entende o fim da Velha Igreja,

quando começa a Nova Igreja.

84. Lê-se em Mateus (Cap. 25: 41 a 43, 46): "Então o Filho do homem dirá aos

bodes que estarão à Sua esquerda: Retirai-vos de Mim, pois tive fome e não Me

destes de comer; tive sede, e não Me destes de beber; era viajante, e não Me

recolhestes; estava nu, e não Me vestistes; estava enfermo e na prisão, e não Me

visitastes; e estes irão para a pena eterna".

Que aqui pelos bodes e pelas ovelhas não se entendem outros senão os que são

designados em Daniel pelo bode e pelo carneiro, é manifestamente claro. Pelos

bodes se entendem os que estão na fé justificante de hoje. Isso é evidente pelo fato

de que para as ovelhas há enumeração das obras da caridade e que se diz que elas

as fizeram e que para os bodes há enumeração das mesmas obras da caridade, e

que se diz que eles não as fizeram, e que, por esta razão, eles são danados. Pois,

nos que estão na fé justificante de hoje, há omissão das obras, pois eles negam que

haja nelas alguma coisa da salvação e da igreja. Quando a caridade é assim

afastada, as boas obras, que pertencem à caridade, escapam-se da mente, e se

apagam dela de tal modo que elas não ocorrem jamais à lembrança, ou que se não

faz mais esforço algum para se lembrar delas pela Lei do Decálogo.

Uma regra comum da religião é que quanto mais alguém não quer os bens e, por

conseguinte não os faz, tanto mais ele quer os males e, por conseguinte os faz. E

Page 62: Exposição Sumária

também, de modo inverso, quanto mais alguém não quer os males e, por

conseguinte os não faz, tanto mais ele quer os bens e por conseguinte os faz. Estes

são as ovelhas e aqueles são os bodes. Se todos os maus tivessem sido entendidos

pelos bodes, teria havido enumeração, não das obras da caridade que eles não

fizeram, mas dos males que eles fizeram.

85. Que pelos bodes não se entendem outros senão aqueles, é o que me foi

provado pela experiência no Mundo Espiritual. Nesse mundo aparecem todas as

coisas que existem no mundo natural. Aparecem casas e palácios; aparecem

paraísos e jardins nos quais há árvores de toda espécie; aparecem campos e terras

cultivadas, planícies e prados. Vêem-se também rebanhos de gado grosso e miúdo.

E todas essas coisas se assemelham às que estão em nossa terra, sem qualquer

diferença, senão que estas são de uma origem natural, mas aquelas de uma origem

espiritual. Vi lá muitas vezes ovelhas e bodes, e também combates, entre eles,

semelhantes a esse combate que é descrito em Daniel, Capítulo 8. Vi bodes com

chifres curvados para frente e para trás e que se lançavam com, furor sobre ovelhas.

Vi bodes com dois e com quatro chifres, com que eles atacavam com ímpeto as

ovelhas. E quando examinei o que era, vi alguns espíritos que disputavam entre si

sobre a fé conjunta à caridade e a fé separada da caridade. Isso me provou que a fé

justificante, de hoje, que, considerada em si mesma, é a fé separada da caridade, é

o bode, e que a fé conjunta à caridade é a ovelha.

86. Pessoas semelhantes são entendidas pelos bodes em Zacarias: "A minha ira se

ateou contra os pastores e farei visita sobre os bodes" (Cap. 11; 3).

E em Ezequiel: "Eis, Eu julgo entre gado e gado, entre os carneiros e os bodes. É

pouco para vós que fazeis o bom pasto, e calqueis com os vossos pés o resto das

pastagens. Feris com os vossos chifres todas as ovelhas debilitadas, até

dispersá-las. Por isso salvarei o Meu rebanho, para que, ele não seja mais

saqueado. (Cap. 34: 17, 18, 21, 22 e seguintes).

(XX) 87. Os que se confirmaram na Fé justificante de hoje se entendem no

Apocalipse pelo dragão, pelas suas duas bestas e pelos gafanhotos. E essa fé

mesma confirmada é ali entendida pela grande cidade, chamada espiritualmente

Page 63: Exposição Sumária

Sodoma e Egito, onde as duas testemunhas foram mortas, bem como pelo poço do

abismo de onde saíram os gafanhotos.

BREVE ANÁLISE

88. Em sete capítulos do Apocalipse se trata do estado pervertido da igreja entre os

reformados, e em dois, do estado pervertido da igreja entre os católicos romanos, e

esses estados de uma e outra igreja, quais eles são hoje, são condenados. Isso é,

mostrado na explicação, que é chamado Apocalipse Revelado, não por conjecturas

vãs, mas por provas convincentes e plenas. Pelo dragão, de que se trata no capítulo

12 do Apocalipse, são entendidos aqueles que, na igreja dos reformados, fazem de

um Deus três Deuses e de um Senhor dois Senhores, e que separam a caridade da

fé, fazendo a sua fé espiritual e salvífica, e não a caridade. (Veja-se Apocalipse

Revelado, 532 a 565, e Memorável, 566) Eles são descritos, além disso, pelas duas

bestas saindo uma do mar e a outra da terra. (Apoc. 13: 567 a 610, e Memorável,

611) São também descritos pelos gafanhotos que saíram do poço do abismo. (Apoc.

9: 419 a 442) Essa mesma fé confirmada se entende pela grande cidade, chamada

espiritualmente Sodoma e Egito, onde as duas, fiéis testemunhas foram mortas.

(Apoc. 11: 485 a 530, especialmente n 500 a 508, e Memorável, 531) Essa fé é

também entendida pelo poço do abismo, de onde saiu uma fumaça como de uma

grande fornalha, a qual escureceu o sol e o ar, e de onde, depois saíram gafanhotos.

(Apoc. 9: 421 a 424).

89. Para que eu fosse confirmado e plenamente convencido de que o poço do

abismo não significa outra coisa senão essa fé draconiana, que é uma fé que brotou

de uma idéia de três Deuses e não de idéia alguma da Divindade a respeito da

Natureza Humana de Cristo, e que é chamada a única fé justificante, regenerante,

vivificante, santificante e salvante, foi-me permitido olhar nesse abismo, depois falar

com os que lá estavam, e também ver os gafanhotos que dele saíram. Por este

exame o poço com o abismo é descrito no Apocalipse Revelado. E como uma

descrição por exame é um testemunho certo, vou transcrevê-lo aqui: "Esse poço,

que é como a abertura de uma fornalha, aparece na região do sul, e o abismo que

está por baixo tem uma grande extensão para o leste. Lá, eles têm uma luz, mas se

a luz vinda do céu ali penetra, se torna trevas. Por isso esse poço é fechado por

Page 64: Exposição Sumária

cima. No abismo aparecem cabanas apaineladas como em tijolos, que são divididas

em pequenas celas, e em cada uma há uma mesa sobre a qual há papéis e alguns

livros. Cada um dos que lá se acham está assentado diante de sua mesa, e são eles

que, no mundo, tinham confirmado a justificação e a salvação pela fé só,

considerando a caridade como um ato meramente natural, moral e as obras da

caridade somente como as obras da vida civil, pelas quais os homens podem

recolher recompensas no mundo. Se, porém, elas são feitas para a salvação, eles

as condenam rigorosamente, porque há nelas a razão e a vontade humanas.

Todos os que estão nesse abismo tinham sido instruídos e eram eruditos no mundo,

e alguns dentre eles metafísicos e escolásticos, que lá são mais estimados do que

todos os outros. Ora, eis qual é a sua sorte. Quando, primeiramente são lançados lá,

eles entram nas primeiras celas. Mas, conforme eles confirmam a fé excluindo as

obras da caridade, eles deixam as primeiras moradas, e entram nas celas que estão

mais perto do leste, e assim sucessivamente até que vão para o fim, onde estão os

que confirmam esses dogmas pela Palavra. E como então, eles não podem: deixar

de falsificar a Palavra, as suas cabanas se dissipam, e eles se vêem no deserto. Há

também, por baixo desse abismo um outro abismo onde se acham os que

igualmente confirmaram a justificação e a salvação pela fé só, mas que em seu

espírito negaram, Deus, e escarneceram em seus corações das coisas da igreja. Lá

eles somente disputam entre si, rasgam as suas roupas, sobem sobre as mesas,

batem com os pés e brigam encontrando defeitos nos outros. E, como não se lhes

permite fazer mal a alguém, eles se ameaçam com a boca e o punho" (Apoc. Rev.

421).

90. Para que também eu fosse confirmado e convencido de que os que se

confirmaram na fé justificante de hoje são igualmente significados pelo dragão,

foi-me dado ver muitos milhares deles reunidos em assembléias. E então de longe

eles pareciam como um dragão com uma longa cauda, que parecia coberta de

pontas como as de um espinheiro, as quais significavam as falsidades. Uma vez

também vi um dragão ainda maior que, erguendo as costas, dirigia a sua cauda para

o céu, procurando arrastar as estrelas dali; essas estrelas significam as verdades.

Page 65: Exposição Sumária

(XXI) 91. Se a Nova Igreja não é instaurada pelo Senhor, ninguém pode ser salvo.

Isso se entende por estas palavras: "Se esses dias não fossem abreviados,

nenhuma carne se salvaria" (Mat 24: 22).

BREVE ANÁLISE

92. Por abreviar esses dias, entende-se pôr fim à igreja de hoje e instaurar a Nova

Igreja. Pois, no capítulo 24 de Mateus, como acima se disse, trata-se da decadência

e da perversão sucessivas da Igreja Cristã, até à sua consumação e ao seu fim, e

então da vinda do Senhor. Que nenhuma carne poderia ser salva se esses dias não

fossem abreviados é porque a fé da igreja de hoje é fundada sobre a idéia de três

Deuses, e ninguém pode entrar no céu com essa idéia, nem, por conseguinte

salvar-se. Porque tal idéia está em todas e cada uma das coisas dessa fé, e além

disso, não está nessa fé coisa alguma da vida que vem das obras da caridade. Que

essa fé não pode também ser conjunta à caridade, nem produzir algum dos frutos

que são as boas obras se mostrou acima nos nº 47 a 50.

Há duas coisas que estabelecem o céu no homem, verdades da fé e os bens da

caridade. As verdades da fé fazem a presença do Senhor, e mostram o caminho do

céu, e os bens da caridade fazem a conjunção com o Senhor e introduzem no céu. E

cada um é introduzido na luz do céu segundo a afeição da verdade, e no calor do

céu segundo a afeição do bem. Que a afeição da verdade seja a fé em sua

essência, e que a afeição do bem seja a caridade em sua essência, e que o seu

casamento seja a Igreja, vê-se no nº 48; e a igreja e o céu fazem um. Que essas três

coisas não estejam hoje nas igrejas edificadas sobre a fé só, foi plenamente

demonstrado nos artigos precedentes.

93. Falei algumas vezes no mundo espiritual com os justificadores do homem pela fé

só, e lhes disse que a sua doutrina era errônea, e mais ainda contrária ao bom

senso, pois ela introduz a segurança, a cegueira, o sono e a noite nas coisas

espirituais e, por conseguinte o falecimento da alma, exortando-os a que desistissem

dela.

Mas responderam: "Por que desistirmos dela? A proeminência da erudição dos

eclesiásticos sobre os leigos não depende dela?".

Page 66: Exposição Sumária

Então repliquei, que sendo assim, eles consideram não a salvação das almas mas a

sua própria proeminência. Repliquei também que, pelo fato deles terem aplicado,

aos seus princípios falsos, as verdades da Palavra, e assim as terem adulterado,

eles são os anjos do abismo, chamados “Abadons e Apolions", (Apoc. 9:11) Por

estes são significados os destruidores da igreja pela falsificação total da Palavra,

como se vê no Apocalipse Revelado nº 440 e no Memorável, nº 566.

Eles, porém, responderam: "Que é isso? Não somos oráculos pelo conhecimento

dos mistérios dessa doutrina? Não é desse conhecimento como de um santuário,

que tiramos as respostas que damos? Por isso não somos Apolions, mas Apolos".

Indignado com essas palavras, disse-lhes: "Se sois Apolos, sais também Leviatãs.

Os primeiros dentre vós são Leviatãs tortuosos, e os segundos Leviatãs alongados,

que Deus visitará com; a sua dura e grande espada. (lsaías, 27; 1). Mas a estas

palavras eles se puseram a rir. (Ver no Apocalipse Revelado, nº 52, sobre o que

significa ser visitado e perecer pela espada).

94. O grande arcano, "porque nenhuma carne pode ser salva, se a Nova Igreja não é

instaurada pelo Senhor é este: Enquanto o dragão com a sua tropa ficar no mundo

dos espíritos, onde ele foi precipitado do céu, nenhuma Divina verdade unida ao

Divino bem pode chegar do Senhor aos homens da terra sem ser aniquilada ou

pervertida, de onde resulta que não, há salvação. É isto o que se entende no

Apocalipse por, estas palavras: "E o dragão foi precipitado sobre a terra e os seus

anjos foram precipitados com ele: Ai dos habitantes da terra e do mar, porque o

diabo desceu para eles tendo uma grande ira. E ele perseguiu a mulher que tinha

dado a luz um filho." (Apoc. 12; 9, 12, 13).

Mas depois que o dragão foi lançado no inferno (Cap. 20: 10), João viu o novo céu e

a nova terra, e ele viu a cidade santa, a Nova Jerusalém descendo de Deus pelo

céu. (Apoc. 21; 1, 2, e seguintes) 0 que é o dragão e quais são os dragões, ver nº

87.

(XXII) 95. Por estas palavras do Apocalipse: "Aquele que estava assentado sobre o

trono, disse: Eis, faço novas todas às coisas. E disse: Escreve, porque estas

palavras são verdadeiras e fiéis," (Apoc. 21:5) se entende a abertura e a rejeição dos

Page 67: Exposição Sumária

dogmas da fé da igreja de hoje, e a revelação e a recepção dos dogmas da fé da

Nova Igreja.

BREVE ANÁLISE

96. Aquele que estava assentado sobre o trono, isto é, o Senhor, disse a João estas

palavras, quando este viu a Nova Jerusalém descendo de Deus pelo céu. Na

proposição seguinte, se demonstrará que pela Nova Jerusalém se entende a Nova

Igreja.

As falsidades dos dogmas da fé da igreja de hoje devem primeiro ser postas a

descoberto e rejeitadas antes que as verdades dos dogmas da Nova Igreja sejam

reveladas e recebidas, porque eles não concordam em um só ponto ou em uma só

parte. Pois, os dogmas da igreja de hoje estão fundados sobre uma fé, na qual se

ignora se há algum essencial da igreja. Os essenciais da igreja, que se conjungern

com a fé em um só Deus, são a caridade, as boas obras, a penitência, a vida

segundo as leis Divinas. E como essas coisas unidas com a fé afetam e movem a

vontade e o pensamento do homem, eles conjungern o homem ao Senhor, e o

Senhor ao homem.

Ora, como nenhum desses essenciais entra na fé da igreja de hoje no seu começo,

que eles chamam o ato da justificação, não é possível se ver de modo algum se

essa fé está no homem, ou não, por conseguinte se é alguma coisa, ou somente

uma idéia. Eles dizem, com efeito, que o homem nesse ato é como um tronco de

árvore ou uma pedra, e que quanto à sua recepção ele não pode na menor coisa

querer, nem pensar, nem cooperar nela, nem até dispor-se a ela e preparar-se para

ela. (Ver nº 15, c, d). Portanto, como ninguém pode conjecturar, nem, com mais forte

razão, saber se essa fé está nele, e assim se ela está pele como uma flor pintada ou

como uma flor do campo, ou se ela é como um pássaro que voa além dele! Ou

como um pássaro, que faz seu ninho nele, pergunta-se, por quais, indícios ou por

quais sinais ele a conhecerá? Se se responde que é segundo a caridade, as boas

obras, a penitência e as práticas da lei, que sequem a fé depois da justificação, e

que, entretanto, essa fé não tem vínculo algum com, essas coisas, em tal caso devia

a gente sagaz inquirir se o que não tem vínculo com a fé pode ser um sinal que a

Page 68: Exposição Sumária

manifeste. Pois essa fé não pode ser conservada nem retida pelas coisas acima

nomeadas, (Ver nº 12, m, n).

Dali se tira esta conclusão: que na fé de hoje nada há que pertença à Igreja, e que

assim essa fé não é coisa alguma, mas somente uma idéia que existe. Ora, como tal

é essa fé, com razão que ela deve ser rejeitada, até mesmo ela se rejeita como uma

coisa em que não há atributo algum da igreja.

9 7. Mas é diferente com os dogmas ou doutrinas da Nova Igreja. Todos são

essenciais, em cada um dos quais há o céu e a Igreja, e eles têm por fim que o

homem esteja no Senhor e o Senhor no homem, segundo as palavras do Senhor em

João, capítulo 14: 20, e capítulo 15: 4, 5 e 6. E a Igreja Cristã não é outra coisa

senão essa conjunção. Por essas poucas palavras, pode-se ver claramente o que

significam estas palavras do Senhor: "Aquele que estava assentado no trono,

disse:Eis faço novas todas as coisas. E Ele disse: Escreve, porque estás palavras

são verdadeiras e fiéis" (Apoc. 21: 5).

98. Que o mundo Cristão caiu na fé, que afastou de junto de si todas as verdades e

todos os bens do céu e da igreja, até separar-se deles, é unicamente porque eles

distinguiram Deus em três, e não creram que o Senhor Deus Salvador faz uni com,

Deus Pai, e que assim eles não se dirigiram imediatamente a Ele quando,

entretanto, Ele só quanto ao Seu Humano é a Divina Verdade Mesma, isto é, a

Palavra que era Deus, em Deus, e a Verdadeira Luz que esclarece todo homem, e

se fez carne. (João 1: 1, 2, 9, 14) Que o Senhor é a Verdade Mesma e assim a Luz

Mesma, Ele também atesta em outra parte, pois diz: "Eu sou a Luz do mundo."

(João 2: 12, e 9:5).

E em outro lugar: "Enquanto tendes a Luz, crede na Luz, para que sejais filhos da

Luz. Eu, Luz, ao mundo vim, para que aquele que. crê em Mim não permaneça nas

trevas" (João 12:36,46).

No Apocalipse: "Eu sou o Alpha e o Ômega, o Princípio e o Fim, o Primeiro e o

último, e a Estrela Brilhante da Manhã." (Apoc, 22: 13, 16).

E em Mateus: "Quando Jesus se transfigurou, Sua face resplandeceu como o sol, e

as Suas vestimentas tornaram-se como a luz (17:2).

Page 69: Exposição Sumária

Por estas coisas se vê a razão pela qual essa fé imaginária se introduziu no mundo

cristão, a saber, porque eles não se dirigiram ao Senhor. E posso, por toda sorte de

experiências e de testemunhos do céu, declarar como certo que é impossível tirar de

outra parte, senão do Senhor Só, uma única verdade teológica, que seja genuína.

(XXIII) 99. A Nova Igreja que vai ser instaurada pelo Senhor, é a Nova Jerusalém, de

que se trata no Apocalipse, capítulos 21 e 22, e que a! é chamada a Noiva e a

Esposa do Cordeiro.

BREVE ANÁLISE

100. A Nova Igreja é entendida pela Nova Jerusalém descendo de Deus pelo céu,

Apocalipse 21, porque Jerusalém era a metrópole da terra de Canaã, e porque lá

havia o templo, o altar, e lá se faziam os sacrifícios, por conseguinte o culto Divino

mesmo, ao qual cada varão de toda essa terra era obrigado a comparecer três vezes

por ano. Também, porque o Senhor esteve em Jerusalém, ensinou no templo e

depois ali glorificou o Seu Humano, a Igreja é significada por Jerusalém.

Que por Jerusalém se entende a Igreja, é claramente evidente pelas passagens

proféticas do Antigo Testamento sobro a Igreja Nova que devia ser instaurada pelo

Senhor e que é chamada Jerusalém.

Só serão referidas as próprias passagens pelas quais toda pessoa dotada de uma

razão interior pode ver que por Jerusalém se entende a Igreja. Sejam somente

estas: "Eis que crio um novo céu e uma nova terra", e não mais se recordará dos

precedentes. Eis, Eu vou criar Jerusalém, um, júbilo e seu povo uma alegria, para

que tenha regozijo sobre Jerusalém e alegria sobre o Meu Povo.

Então o lobo e o cordeiro pastarão juntos; não se fará mal em toda a montanha da

Minha Santidade (lsaías 65: 17, 18, 19, 25).

Por causa de Sião não me calarei, e por causa de Jerusalém não Me aquietarei até

que a sua justiça saia como um resplendor, e que a sua salvação se acenda como

uma lâmpada. Então as nações verão a tua justiça, e todos os reis a tua glória. E

chamar-te-ão com um nome novo, que a boca de Jehovah anunciará. E serás a

coroa do ornato e o diadema do reino na mão de teu Deus Jehovah se agradará em

ti, e tua terra será casada. Eis, tua salvação virá, eis a Sua recompensa com Ele. E

Page 70: Exposição Sumária

serão chamados o povo da santidade, os remidos de Jehovah. E tu serás chamada

a cidade procurada, não deserta (lsaías 62: 1 a 4, 11, 12).

"Desperta-te, desperta-te, reveste-te de tua força, Sião; reveste-te das vestes tuas

de ornato, Jerusalém, a cidade de santidade, porque o incircunciso e o imundo não

mais continuarão a vir a ti. Sacode o pó de cima de ti, levanta-te, assenta-te,

Jerusalém. Meu povo conhecerá o Meu nome nesse dia, porque Eu sou Aquele que

diz: Eis-Me. Jehovah consolou o Seu povo e resgatou Jerusalém" (lsaías 52: 11, 2,

6, 9).

"Regozija-te, filha de Sião, sê na alegria de todo coração, filha de Jerusalém, O Rei

de Israel está no meio de ti, não temas mais mal. Ele se alegrará com júbilo por

causa de ti, descansará em teu amor, exultará de júbilo por causa de ti. Vos porei

em renome e em louvor entre todos os povos da terra" (Sofonias 3: 14 a 17, 20).

"Assim disse Jehovah o teu Redentor, dizendo a Jerusalém, serás habitada" (]salas

44: 24, 26).

"Assim disse Jehovah: Voltarei a Sião e habitarei no meio de Jerusalém. Dali

Jerusalém será chamada a cidade da verdade, e a montanha de Jehovah Zebaoth, a

montanha de santidade" (Zacarias 8: 3; 20 a 23).

"Então conhecereis que Eu, Jehovah, o vosso Deus, habito em Sião, montanha da

santidade e Jerusalém será santidade. E acontecerá que nesse dia, as montanhas

destilarão o vinho doce, e as colinas correrão com leite, e Jerusalém subsistirá na

geração e geração" (Joel 3: 17 a 21); "Nesse dia o germe de Jehovah será em

beleza e glória. E acontecerá que o remanescente em Sião e aquele que ficar de

resto em Jerusalém serão chamados santos, todo aquele que foi escrito para a vida

em Jerusalém" (lsaías 4: 2 e 3); "Na extremidade dos dias, a montanha da casa de

Jehovah será fortificada no cume das montanhas, porque de Sião sairá a doutrina, e

a Palavra de Jehovah de Jerusalém" (Miquéias 4: 1, 2, 8); "Nesse tempo,

chamar-se-á Jerusalém o trono de Jehovah, e todas as nações se reunirão para o

nome de Jehovah em Jerusalém, e elas não irão mais após a confirmação de seu

mau coração." (Jeremias 3:17); "A Sião, a cidade de nossa festa solene vejam os

teus olhos Jerusalém, o habitáculo tranqüilo, o tabernáculo ,que não será deslocado.

Page 71: Exposição Sumária

Os seus esteios não serão tirados perpetuamente, e as suas cordas não serão rotas.

(lsaías 33:20).

E, além disso, em outras passagens, por exemplo: Is. 24:3; 37: 32; 66:10-14; Zac.

12:3, 6 a 10; 14: 8, 11, 12, 21; Mal. 3: 2, 4; Salmos 122:1 a 7; 137:4, 5, 6.

Aí por Jerusalém se entende a igreja que deve ser instaurada pelo Senhor e não a

Jerusalém habitada pelos judeus. Isso é claro por cada uma das partes de sua

descrição nas passagens referidas. Por exemplo: que Jehovah Deus vai criar um

novo céu e uma nova terra, e também ao mesmo tempo Jerusalém; que ela será a

coroa de ornato e o diadema do reino; que ela vai ser chamada a santidade e a

cidade da verdade, o trono de Jehovah, o habitáculo tranqüilo, o tabernáculo que

não será deslocado que o lobo e o cordeiro lá pastarão juntos. E se diz que as

montanhas lá destilarão o vinho doce e que ar, colinas correrão com leite; que ela

subsistirá de geração e geração; além de muitas outras coisas. Também a respeito

do povo, se diz que o povo dali será santo, todos escritos para a vida e chamados os

remidos de Jehovah. Além disso, em todas essas passagens, trata-se da vinda do

Senhor, mormente de Sua Segunda Vinda, quando Jerusalém for tal qual ela é ali

descrita, porque antes disso ela não estava casada, isto é, ela não se tornara a

noiva e a esposa do Cordeiro, como se diz da Nova Jerusalém no Apocalipse.

A igreja precedente ou a igreja de hoje se entende por Jerusalém em Daniel e o seu

começo é ali descrito por estas palavras: "Saiba e perceba que desde a saída da

Palavra para restabelecer e edificar Jerusalém até ao Príncipe Messias, há sete

semanas. Depois de sessenta e duas semanas ela será restabelecida, e a praça e o

fosso serão edificados, mas na angústia dos tempos" (9:25).

Mas o seu fim aí descrito por estas palavras: "Enfim sobre a ave das abominações

será a desolação, e até a consumação e a decisão ela se derramará sobre a

devastação" (9: 27).

Estas últimas coisas são as que se entendem por estas palavras do Senhor em

Mateus: "Quando virdes a abominação da desolação predita por Daniel o Profeta,

estabelecida no lugar santo, que aquele que lê preste muita atenção" (24:15).

Que por Jerusalém, nas passagens supra referidas não se entende a Jerusalém

habitada pelos judeus, é evidente na Palavra pelas passagens em que se diz dessa

Page 72: Exposição Sumária

cidade que ela ficou inteiramente perdida e que ela deve ser destruída. (Como em

Jer. 5: 1; 6: 6, 7; 7:17, 18 e seguintes; 8:6, 7, 8 e seguintes; 9:10, 11, 13 e seguintes;

13: 9, 10, 14; 14:16; Lament. 1: 13, 9, 17; Ez. 4: 1 a 17; 5:9 ao fim; 12:18, 19; 15:6, 7,

8; 16:1 a 63; 23:1 a 40; Mat. 23:37, 38; Lucas 19: 41 a 44; 21: 20 a 22; 23:28 a 30; e

além destes, em muitos outros lugares; e também, nos em que ela é chamada

Sodoma, lsaías 3:9; Jer. 23:14; Ez. 16:46, 48 e em outras partes).

101. A igreja pertence ao Senhor e por causa do casamento espiritual, que é o

casamento do bem e da verdade, o Senhor é chamado Noivo e Marido e a Igreja

noiva e esposa. Isso os cristãos conhecem pela Palavra, mormente por estas

passagens: João diz do Senhor: "Quem tem a Noiva é o Noivo, mas o amigo do

Noivo é aquele que está de pé e 0 escuta, e se regozija por causa da voz do Noivo"

(João 3:29).

"Jesus disse: Os filhos das bodas não podem jejuar, enquanto o Noivo está com

eles." (Mat 9:15; Marcos 2:19, 20; Lucas, 5:34, 35); "Vi a cidade santa, a Nova

Jerusalém, descendo de Deus pelo céu, preparada como uma noiva que está

adornada para seu Marido" (Apoc. 21: 2); "0 anjo disse a João: Vem, e mostrar-te-ei

a noiva, a esposa do Cordeiro; e da montanha ele lhe mostrou a cidade, a Santa

Jerusalém" (Apoc 21:9, 10); "0 tempo das bodas do Cordeiro veio, e a esposa d'Ele

se preparou. Bem-aventurados os que foram chamados à ceia das bodas do

Cordeiro" (Apoc. 19:7, 9); "Eu sou a Raiz e o Rebento de Davi, a Estrela Brilhante da

Manhã; e o Espírito e a noiva dizem: Vem! E aquele que escuta diga: vem; e aquele

que tem sede venha; e aquele que quiser tome da água da vida gratuitamente"

(Apoc 22:16, 17).

(XXIV) 102. A fé da Nova Igreja não pode estar junta de modo algum com a fé da

Igreja anterior, e se elas estiverem juntas, acontecerá tal colisão e conflito, que tudo

o que é da igreja no homem perecerá.

BREVE ANÁLISE

103. A fé da Nova Igreja não pode estar junta de modo algum com a fé da igreja

anterior, isto é, da igreja de hoje, porque elas não concordaram em um só terço,

nem mesmo em, um só décimo. A fé da igreja anterior é descrita no Apocalipse,

capítulo 12, pelo dragão, e a fé da Nova Igreja pela Mulher envolta pelo sol, e sobre

Page 73: Exposição Sumária

cuja cabeça estava uma coroa com doze estrelas, a qual é perseguida pelo dragão,

e sobre a qual ele lança água, como um rio, a fim de engolí-Ia, (Ver, nº 87 a 90). A

mulher e o dragão não podem estar juntos em uma mesma cidade, nem com mais

forte razão em uma mesma casa, nem por conseguinte em uma só mente ao

mesmo tempo. E se estiverem juntos não pode acontecer outra coisa senão que a

mulher seja continuamente exposta à ira e insanidade do dragão, e ao temor dele

devorar o seu filho. Porque no Apocalipse 12, se diz que o dragão estava diante da

mulher que ia dar a luz, para devorar o seu filho, e que a mulher, depois de ter

dado a luz, fugiu para o deserto. (Apoc. 12: 1, 4, 6, 14 a 17).

A fé da igreja anterior é uma fé da noite, porque a razão humana nada percebe dela,

por isso eles dizem que o entendimento deve estar sujeito à obediência da fé. E

ainda mais, não se sabe se essa fé está no homem ou fora dele, porque nela não

entra. coisa alguma da vontade nem da razão do homem, até mesmo não entra nela

a caridade, nem boas obras, nem penitência, nem Lei do Decálogo, nem muitas

outras coisas que existem realmente na mente do homem. (Que tal seja assim,

vê-se nos nºs 79, 80, 96, 97, 98) Mas a fé da Nova Igreja entra em uma aliança

conjugal e se conjunge com todas essas coisas, e porque esta fé está assim no

calor do céu, e também está na luz do céu, é uma fé da luz. Ora, a fé da noite e a fé

da luz não podem estar juntas senão como uma coruja e uma pomba no mesmo

ninho; e assim a coruja e a pomba depositariam os seus ovos e quando, depois da

incubação, os filhotes saíssem, a coruja despedaçaria os filhotes da pomba e os

daria como pasto aos seus, porque a coruja é um pássaro voraz.

A fé da igreja anterior e a fé da Nova Igreja, também, não podem estar juntas,

porque elas são heterogêneas. Pois a fé da igreja anterior nasce da idéia de três

Deuses (ver nº 30 a 38), enquanto a fé da Nova Igreja nasce da idéia de Um só

Deus. E como daí há entre elas heterogeneidade, seria impossível evitar, se elas

estivessem juntas, uma tal colisão e um tal conflito, de modo que tudo da igreja

pereceria, isto é, de modo que nas coisas espirituais o homem cairia ou em um

delírio ou em um delíquio ao ponto de que ele dificilmente saberia o que é a Igreja ou

que a igreja existe.

Page 74: Exposição Sumária

De tudo isso resulta que os que confirmaram consigo a fé da velha igreja não podem

abraçar a fé da Nova Igreja sem perigo de sua vida espiritual, se principalmente, não

rejeitarem cada coisa desta fé e assim extirpar essas coisas, como a, seus filhotes

ou os seus ovos, isto é, os seus dogmas cujas qualidades foram mostradas no que

precede, e principalmente nº 64 a 69.

104. Uma coisa semelhante sucederia, se alguém abraçasse a fé da Nova Igreja, e

conservasse a fé da velha igreja sobre a imputação da justiça ou do mérito do

Senhor, pois desse dogma como raiz saíram todos os outros dogmas como

rebentos. Se tal acontecesse, seria como se um homem se desprendesse de três

cabeças de dragão e se emaranhasse nas outras quatro. Ou seria como se um

indivíduo fugisse de um leopardo e caísse nas garras de um leão; ou como se

alguém saísse de uma cova onde não há água para cair em uma cheia d’água e na

qual se afogasse. Que isso seja assim, será visto depois da exposição da

proposição seguinte, quando se falar da imputação.

(XXV) 105. Os católicos romanos nada sabem hoje sobre a imputação do mérito do

Cristo nem sobre a justificação pela fé nesta imputação, nas quais a sua igreja foi

iniciada, porque elas estão inteiramente escondidas pelos externos do culto, que são

em grande número. E por isso, se eles se afastarem em parte dos externos do seu

culto, se dirigirem imediatamente a Deus Salvador Jesus Cristo, e também tomarem

os dois elementos na Santa Eucaristia, eles podem ser introduzidos, antes dos

reformados, na Nova Jerusalém, isto é, na Nova Igreja do Senhor.

BREVE ANÁLISE

106. Que os prelados e os chefes da Igreja Romana, ,quando são inaugurados no

ministério, juram sobre os decretos do Concílio de Trento, é evidente pela bula do

pontífice romano Pio IV, outorgada nos idos de Novembro de 1564, referente à

forma do juramento de profissão de fé. Nela estão estas palavras: "Creio com uma

firme fé e professo tudo que em geral e em particular está contido no símbolo de fé

de ,que se serve a Santa Igreja Romana; e recebo sem nenhuma dúvida o que foi

transmitido e declarado nos santos cânones e nos concílios ecumênicos, e

principalmente pelo Santíssima Concílio de Trento; assim que Deus me ajude."

Page 75: Exposição Sumária

Eles também se comprometem por juramento a crer e a professar o que o Concílio

de Trento decretou sobre a imputação do mérito do Cristo e sobre a justificação pela

fé nesta imputação. Isso é evidente por estas palavras na mesma 'bula: "Abraço e

recebo tudo o que, em geral e em particular, foi resolvido e declarado sobre o

pecado original e sobre a justificação no santíssimo Concílio de Trento.".

Quais são esses dogmas pode-se vê-lo nos nºs 3, 4, 5, 6, 7, 8, segundo os extratos

desse Concílio.

Desses dogmas postos como princípios nesse Concílio são tiradas estas

conseqüências, a saber:

1.0) Os católico-romanos, antes da Reforma, ensinaram coisas inteiramente

semelhantes àquelas que os reformados ensinaram, depois da Reforma, sobre a

imputação do mérito do Cristo e sobre a justificação pela fé nessa imputação, com a

única diferença que eles conjuntaram a mesma fé com a caridade e as boas obras"

(nº 19, 20);

2.0) "Os reformadores principais, Lutero, Melancton e Calvino, retiveram todos os

dogmas sobre a imputação do mérito do Cristo e sobre a justificação pela fé, tais

quais eles eram então e tinham sido entre os católicos romanos, mas eles

separaram a caridade e as boas obras de junto dessa fé, e declararam que elas não

eram salvíficas, a fim de se separarem completamente dos católico-romanos quanto

aos essenciais mesmos da igreja, que são a fé e a caridade", (nº 21 a 23).

3.0) "Entretanto, os reformadores principais ajuntaram as boas obras à sua fé, e

também as conjungiram, mas no homem como em um sujeito passivo, enquanto

que os católico-romanos as conjungem no homem como em um sujeito ativo.

Contudo entre uns e outros há, realmente, conformidade quanto à fé, quanto às

obras e quanto aos méritos" (nº 24 a 29).

Segundo o que foi mostrado é também claro que, essa fé é a fé que se afirma por

juramento entre os católico-romanos igualmente como entre os reformados.

107. Entretanto, essa fé hoje entre os católico-romanos foi de tal modo obliterada

que quase nada sabem sobre ela. Não porque tenha sido reprovada por algum

decreto dos Papas, mas porque ficou escondida pelos externos do culto, que são em

geral, a adoração do vigário do Cristo, a invocação dos santos, e a veneração das

Page 76: Exposição Sumária

imagens. E, além disso, há todas as coisas que afetam os sentidos como santos,

tais como as missas em uma língua que não é compreendida, as vestimentas, as

luzes, o incenso, a pompa das procissões, e depois os mistérios sobre a Eucaristia.

Por tais coisas e muitas outras semelhantes à fé justificante, pela imputação do

mérito do Cristo, ainda que estabelecida desde o princípio da Igreja Romana, foi

assim afastada dos olhares e da memória, como uma coisa enterrada na terra e

recoberta com uma pedra, perto da qual monges estão colocados como sentinelas,

para que essa fé não seja desenterrada e recordada. Porque, se fosse recordada, a

fé no poder sobrenatural dos eclesiásticos de perdoar os pecados, e por conseguinte

de justificar e salvar, decairia ao mesmo tempo que sua santidade, sobreeminência,

e os seus ricos proveitos.

108. Os católico-romanos podem ser introduzidos, antes dos reformados, na Nova

Jerusalém, isto é, na Nova Igreja. A primeira causa disto é porque a fé da

justificação pela imputação do mérito do Cristo, é uma fé errônea que não pode

estar junta com a fé da Nova Igreja (nº 102 a 104). E esta fé é obliterada entre os

católico-romanos, e até deve ser obliterada inteiramente, mas tal fé está como que

gravada entre os reformados, porque é a coisa principal de sua igreja.

A segunda causa é porque a idéia da Divina majestade no Humano do Senhor está

mais entre os católico-romanos do que entre os reformados, como é muito claro pela

santíssima veneração das hóstias.

A terceira causa é porque entre os católico-romanos a caridade, as boas obras, a

penitência, o estudo de uma nova vida, são os essenciais da salvação e essas

coisas são também os essenciais da Nova Igreja. Mas é diferente entre os

reformados que se confirmaram na fé só. Entre estes, essas mesmas coisas não

entram como essenciais, nem como coisas formais, na fé, e, por conseguinte em

nada conferem a salvação. Essas são as três causas que fazem com que, se os

católico-romanos se dirigem a Deus Salvador Mesmo, não indiretamente, mas

diretamente, e se além disso eles tomam os dois elementos na Santa Eucaristia,

eles recebem mais facilmente do que os reformados a fé viva em vez da fé morta, e

são levados pelo Senhor, por meio dos anjos, às portas da Nova Jerusalém ou da

Nova Igreja, e introduzidos com alegria e júbilo.

Page 77: Exposição Sumária

A IMPUTAÇÃO

109. A imputação da justiça ou do mérito do Cristo entra hoje, como alma, em toda a

teologia no mundo cristão reformado. A fé, pela imputação, que é o único meio de

salvação ali, é chamada justiça perante Deus (ver nº 11 d), e o homem, pela

imputação por meio dessa fé, reveste os dons da justiça, como um rei reveste as

suas insígnias quando é eleito.

Contudo, a imputação somente pela denominação que uma pessoa é justa, não

produz efeito. Pois ela influi somente nos ouvidos, e não opera no homem, exceto se

a imputação da justiça for também à aplicação da justiça por comunicação e assim

por introdução. Isso é uma conseqüência de seus efeitos que se afirma ser a

remissão dos pecados, a regeneração, a renovação, a santificação, e assim a

salvação. E há mais ainda, porque se diz que por meio dessa fé o Cristo habita no

homem e que o Espírito Santo nele opera, e que, por conseguinte os homens não

somente são nomeados justos, mas também são justos. "Não somente os dons de

Deus, mas também o Cristo e até toda a Santa Trindade, habitam pela fé, nos que

são renascidos, como em seus templos." (Ver nº 15 1). E "o homem, tanto quanto à

pessoa como quanto às obras, é justo e chamado justo." (nº 14 e).

Daí resulta indubitavelmente que pela imputação da justiça do Cristo entende-se a

aplicação, e por ela a introdução dessa justiça, pela qual o homem vem a ser

participante. Ora, como a imputação é a raiz, o princípio e o fundamento da fé e de

todas as operações da fé para a salvação, e como, por conseguinte ela é hoje nos

templos cristãos como o santuário e o lugar santo, importa acrescentar aqui sobre a

imputação, alguma coisa mais, em forma de corolário, mas isso será feito por,

artigos na ordem seguinte:

I. A cada um depois da morte é imputado o mal em que está, e

semelhantemente o bem;

II. A introdução do bem de um no outro é impossível;

III. A fé da imputação ou da aplicação da justiça ou do mérito do Cristo, sendo

impossível, é uma fé imaginária.

110. A cada um depois da morte é imputado o mal em que está e semelhantemente

o bem.

Page 78: Exposição Sumária

Para que este artigo seja apresentado com evidência, ele será examinado por

subdivisão nesta ordem:

1.Cada um tem uma vida que lhe é própria;

2.Depois da morte a vida de cada um lhe resta;

3. Então ao mal é imputado o mal de sua vida, e ao bom é imputado o bem de

sua vida.

PRIMEIRAMENTE: Cada um tem uma vida que lhe é própria, por conseguinte

distinta da vida de um outro; isso é sabido. Existe, pois uma variedade perpétua, e

não há coisa alguma que seja a mesma que uma outra. Daí cada um tem o seu

próprio. Isso é muito claro pelos rostos dos homens. Pois não há rosto que seja

absolutamente semelhante a um outro rosto, e isto nunca poderá acontecer em toda

a eternidade, porque não há dois caracteres (animi) que sejam iguais, e dos

caracteres os rostos dependem. O rosto, com efeito, é, como se diz, o tipo do

caráter, e o caráter tira a sua origem e a sua forma da vida.

Se o homem não tivesse uma vida que lhe fosse própria, como ele tem um caráter e

um rosto que lhe são próprios, ela não teria depois da morte uma vida distinta de um

outro. Ainda mais, não haveria também o céu, pois o céu consiste em seres

perpetuamente diferentes. A sua forma é unicamente composta de variedades de

almas e de mentes dispostas em tal ordem, que elas fazem um. E elas fazem um

pelo Ser único cuja Vida está em todas e em cada uma dessas variedades, como a

alma está no homem. Se assim não fosse, o céu se dissiparia, porque a forma seria

dissolvida. O Ser único, pelo Qual a vida está em todas e em cada uma das

variedades, e pelo Qual a forma tem coerência, é o Senhor.

SEGUNDO LUGAR: Depois da morte, a vida de cada um lhe resta. Isso é conhecido

na Igreja pela Palavra, e por estas passagens da Palavra: "0 Filho do Homem virá e

então dará a cada um segundo as suas obras" (Mat. 16:27); "Vi os livros abertos e

todos foram julgados segundo as obras suas" (Apoc. 20:12, 13); "No dia do juízo,

Deus dará a cada um segundo as suas obras" (Rom 2: 6 e 11 Cor. 5:10).

As obras, segundo as quais se dará a cada um, são a vida, porque a vida as faz, e

elas são segundo a vida.

Page 79: Exposição Sumária

Como me foi permitido, durante muitos anos, estar junto com os anjos e falar, no

mundo dos espíritos, com os que chegam de nosso mundo, posso atestar com

certeza que cada um é lá examinado para que se saiba qual foi a sua vida, e que a

vida, que ele contraiu no mundo, lhe resta para sempre. Falei com aqueles que

tinham vivido em nosso mundo há séculos, e cuja vida foi conhecida a mim pelas

coisas históricas, e achei que eles são semelhantes à descrição histórica. Ouvi

também, dos anjos, que a vida de cada um não pode ser mudada depois da morte,

porque ela foi organizada segundo o seu amor e a sua fé, e por conseguinte

segundo as suas obras. E se ela fosse mudada, a organização se dissolveria, o que

nunca pode acontecer. Finalmente, que a mudança de organização somente se

realiza no corpo material e é inteiramente impossível no corpo espiritual, depois que

o corpo material foi separado dele.

TERCEIRO LUGAR: Então ao mal é imputado o mal de sua vida, e ao bom é

imputado o bem de sua vida. A imputação do mal depois da morte não é uma

acusação, nem uma censura, nem uma inculpação, nem um julgamento, como no

mundo; mas é o mal mesmo que faz isso. Com efeito, os maus se separam, por sua

própria escolha, de junto dos bons, pois não podem estar juntos. Os prazeres do

amor do mal têm aversão aos prazeres do amor do bem, e os prazeres emanam de

cada um, como os cheiros emanam de todo vegetal na terra. Pois eles não são

absorvidos nem escondidos pelo corpo material como antes, mas fluem livremente

de seus amores na aura espiritual. E como o mal lá é sentido como em seu cheiro, é

esse mal que acusa, censura, inculpa e julga, não perante algum juiz, mas diante de

alguém que está no bem; e é isso o que entende por imputação.

A imputação do bem se faz do mesmo modo, e isso se faz para os que, no mundo,

reconheceram que todo o bem, no qual eles estiveram e estão, vem do Senhor, e

que nada vem deles mesmos. Depois que estes são preparados, eles são

introduzidos nos prazeres interiores de seu bem e, então, lhes é aberto um caminho

no céu para a sociedade onde os prazeres são da mesma natureza que os deles.

Isso é feito pelo Senhor.

111. II. A introdução do bem de um no outro é impossível. A evidência deste artigo

pode também ser vista por subdivisão nesta ordem:

Page 80: Exposição Sumária

1. Cada homem nasce no mal;

2. Ele é introduzido no bem pelo Senhor por meio da regeneração;

3. Isso se faz por meio da fé no Senhor, e por meio da vida segundo os Seus

mandamentos;

4. Por isso, o bem de um não pode, por aplicação, ser introduzido em outro, e

assim lhe ser imputado.

PRIMEIRO: Cada homem nasce no mal. Isso é conhecido na igreja. Diz-se que esse

mal vem de Adão por herança; mas ele vem dos pais. É de seus pais que cada um

tira a sua índole, que é uma inclinação. Que seja assim, é o que provam a

experiência e a razão, pois existe, quanto aos rostos, gênios e costumes,

semelhanças entre os pais e seus filhos imediatos e os descendentes destes. E por

esse modo muitas pessoas reconhecem as famílias, e julgam também de seus

caracteres. Por isso os males que os próprios pais contraíram são transmitidos à sua

posteridade sob forma de inclinação a esses males. Daí vêm os males nos quais

nascem os homens.

SEGUNDO: Ele é introduzido no bem pelo Senhor por meio da regeneração. Que há

uma regeneração, e que ninguém possa entrar no céu, exceto se for regenerado, é

muito claro pelas palavras do Senhor em João 3:3, 5. Que a regeneração seja a

purificação dos males e assim a renovação da vida não pode ser escondida no

mundo cristão, porque a razão também o vê, quando ela reconhece que cada um

nasce no mal, e que o mal não pode ser lavado nem apagado, como uma sujeira,

pelo sabão e pela água, mas sim pelo arrependimento.

TERCEIRO: Isso se faz por meio da fé no Senhor, e por meio da vida segundo os

Seus mandamentos. Há cinco mandamentos da regeneração, que estão expressos

nos nºs 43, 44, entre os quais são estes: Deve-se fugir dos males porque são do

diabo e vêm do diabo. Deve-se fazer os bens porque eles são de Deus e vêm de

Deus. E deve-se dirigir ao Senhor para que Ele nos guie a fazer assim. Que cada

um se consulte e examine se o bem pode vir ao homem de outra parte; e se não há

o bem não há para ele salvação.

QUARTO: Por isso o bem de, um não pode, por aplicação, ser introduzido em um

outro, e assim lhe ser imputado. É uma conseqüência do que foi dito acima que o

Page 81: Exposição Sumária

homem por meio da regeneração é renovado quanto ao espírito, e que isso se faz

por meio da fé no Senhor, e ao mesmo tempo por meio da vida segundo os Seus

mandamentos. Quem não vê que essa renovação não pode fazer-se senão pela

sucessão de tempo? Apenas difere de uma árvore que pela semente se enraíza,

cresce e chega à sua perfeição sucessivamente. Os que percebem de outro modo a

regeneração e a renovação nada sabem sobre o estado do homem, nem, coisa

alguma sobre o mal e o bem. Eles ignoram que essas duas coisas são

absolutamente opostas, e que o bem não pode ser implantado no homem senão

tanto quanto o mal for removido dele. Eles também não sabem que, enquanto o

homem estiver no mal, ele tem aversão ao bem que em si é o bem. Por isso se o

bem de um fosse aplicado, e assim introduzido em um outro que está no mal, seria

como se um cordeiro fosse lançado diante de um, lobo, ou como se uma pérola

fosse atada ao focinho de um porco. Por estas coisas é claro que a introdução do

bem de um em um outro é impossível.

112. III. A fé da imputação ou da aplicação da justiça ou do mérito do Cristo, porque

é impossível, é uma fé imaginária.

No nº 110 é demonstrado que a cada um depois da morte é imputado o mal em que

está, e semelhantemente o bem. Daí é evidente que, se pela imputação se entende

a aplicação e, por conseguinte a introdução do bem de um em outro, ela é um

pensamento imaginário.

No mundo, os méritos podem ser, por assim dizer transmitidos pelos homens, isto é,

se pode fazer bem aos filhos por causa de seus pais, ou aos amigos de alguém em

favor a este. Mas o bem do mérito não pode ser gravado em suas almas, mas

unicamente ajuntado de fora. Semelhante coisa não pode ter lugar nos homens

quanto à sua vida espiritual. Esta, como foi mostrado acima, deve ser implantada, e

se não for implantada por meio de uma vida segundo os mandamentos do Senhor,

acima mencionados, o homem permanece no mal em que nasceu. Antes que isso

tenha sido feito, nenhum bem pode alcançar o homem, ou se o alcança, é logo

repercutido e ressalta, como uma bola elástica que cai sobre a pedra, ou é tragado

como um diamante lançado em um pântano.

Page 82: Exposição Sumária

0 homem não reformado, quanto ao espírito, é como uma pantera ou como uma

coruja, e pode ser comparado a um arbusto espinhoso ou urtiga. Mas o homem

regenerado é como uma ovelha ou como uma pomba, e pode ser comparado à

oliveira e à videira. Peço ao leitor para pensar se é possível que um homem pantera

seja convertido em homem ovelha, ou uma coruja em pomba ou o arbusto

espinhoso em oliveira, ou a urtiga em videira, por alguma imputação, se por

imputação se entende uma transmissão. Para que a conversão tenha lugar, não é

necessário que antes disso a ferocidade da pantera ou da coruja, o nocivo do

arbusto espinhoso e da urtiga sejam tirados, e que assim o que é verdadeiramente

humano e o não nocivo sejam implantados? Quanto ao modo como isso se faz, o

Senhor ensina também em João 15:1 a 7.

113. A estas palavras será acrescentado isto: Na igreja se diz que ninguém pode

cumprir a lei, especialmente porque aquele que prevarica contra um só dos

mandamentos do Decálogo, prevarica contra todos. Mas essa fórmula de linguagem

não significa o que ela parece significar, porque é assim que ela deve ser entendida:

Aquele que por alguma resolução ou confirmação age contra um só mandamento,

age contra todos os outros, como agir por propósito ou confirmação, é negar

inteiramente que seja um pecado agir assim e quem nega que seja pecado,

considera como nada agir contra todos os outros mandamentos. Ora, quem não

sabe que quem é devasso, não é - por esse fato homicida, ladrão, falsa testemunha,

nem quer sê-lo? Mas quem é adúltero resoluto ou confirmado considera como nada

tudo que é proibido pela religião, assim também os homicídios, os roubos e os falsos

testemunhos, e que ele não se abstém deles porque sejam pecados, mas porque

teme a lei e a desonra. É semelhante se alguém age por propósito ou confirmação

contra um outro mandamento do Decálogo, ele também age contra todos os outros,

porque ele não considera coisa alguma como pecado.

Acontece uma coisa semelhante aos que estão no bem pelo Senhor; se estes pela

vontade e pelo entendimento, ou propósito e confirmação, se abstêm de um só mal,

porque é um pecado, eles se abstêm de todos; e isto mais ainda se eles se abstêm

de muitos males. Pois, desde que o homem, por propósito ou confirmação se

abstém de algum mal porque é um pecado, ele é conservado pelo Senhor na

Page 83: Exposição Sumária

resolução de se abster de todos os outros. Por isso, se, por ignorância, ou porque

alguma cobiça do corpo o vence, ele faz o mal, esse mal ainda não lhe é imputado,

porque ele não se propôs praticá-lo e não o confirma em si. 0 homem entra nessa

resolução, se ele se examina uma ou duas vezes por ano e se arrepende do mal que

ele descobre em si. É diferente com aquele que nunca se examina.

É permitido confirmar isso por esta experiência. Encontrei no mundo espiritual

muitos espíritos que tinham vindo com outros do mundo natural, vestindo-se com

esplendor, banqueteando-se suntuosamente, negociando com os outros com lucro,

freqüentando os espetáculos, gracejando sobre as coisas do amor lascivamente, e

fazendo muitas outras coisas semelhantes. Entretanto, os anjos inculpavam a uns

essas ações como males do pecado, e aos outros eles não as imputavam como

males, e declaravam inocentes estes e culpados aqueles. Interrogados por causa

dessa diferença, pois uns e outros tinham feito às mesmas coisas, respondiam que

eles examinam todos pela resolução, pela intenção e pelo fim, e estes exames

fazem a distinção. Em conseqüência, eles desculpam ou condenam aqueles que o

fim desculpa ou condena, pois todos que estão no céu têm por fim o bem, e todos

que estão no inferno têm por fim o mal. Por estas coisas é claro agora qual é aquele

a que o pecado é imputado, e qual é aquele a quem ele não é imputado.

114. Aqui são acrescentados dois memoráveis tirados do Apocalipse Revelado. O

primeiro é este: Fui subitamente acometido por uma doença quase mortal. Toda a

minha cabeça estava pesada; uma fumaça pestilencial foi solta da grande cidade,

que é espiritualmente chamada Sodoma e Egito, Apoc. XI: 8. Estava moribundo,

sofrendo cruelmente, e esperava a minha última hora. Fiquei assim deitado na cama

durante três dias e meio, tal se tornara meu espírito e, por conseguinte, meu corpo.

Então ouvi em torno de mim vozes de pessoas que diziam: Eis deitado morto na

praça de nossa cidade, aquele que pregava a penitência para a remissão dos

pecados e pregava o homem Cristo só. E perguntaram a alguns eclesiásticos, se ele

era digno da sepultura, como se diz das duas testemunhas assassinadas nessa

cidade, (Apoc. 11: 8 - 10) e estes responderam: "Não, que ele fique deitado e sirva

de espetáculo." Eles iam e vinham e escarneciam. Na verdade isto aconteceu a mim

assim, quando eu explicava esse capítulo do Apocalipse.

Page 84: Exposição Sumária

Ouviam-se as palavras graves destas pessoas, mormente estas: "Como é possível

fazer penitência sem a fé? Como o Cristo homem pode ser adorado como Deus?

Não somos, pois, salvos gratuitamente sem mérito algum de nossa parte, e que

necessidade há de outra coisa além dessa fé só, que Deus Pai enviou Seu Filho,

para retirar a danação da lei, imputar-nos o mérito do Filho, e assim diante d'Ele nos

justificar, nos absolver de nossos pecados, e nos dar então o Espírito Santo, que

opera todo o bem em nós? Não são essas coisas segundo a Escritura e além disso

conforme a razão?" A multidão dos assistentes aplaudia essas palavras.

Eu as ouvia e não podia responder, porque estava deitado quase morto. Mas depois

de três dias e meio meu espírito recobrou as forças, e saí, quanto ao meu espírito,

da praça para a cidade e disse novamente: "Fazei penitência e crede no Cristo, e

vossos pecados serão remidos e sereis salvos; senão perecereis. O Senhor Mesmo

não pregou a penitência para a remissão dos pecados e que se deve crer n'Ele?

Não ordenou aos discípulos que pregassem a mesma coisa? Uma completa

segurança da vida não é a conseqüência do dogma de vossa fé?".

Eles, porém, disseram: "Que significa todo esse palavrório? O Filho não satisfez? O

Pai não imputou essa satisfação do Filho, e não justificou a nós que cremos nisso?

Não somos assim guiados pelo Espírito de graça? Então, o que é o pecado em nós?

Então o que a morte tem conosco? Compreendes tu este Evangelho, ó pregador do

pecado e da penitência?

Mas então saiu uma voz do céu, que disse: "Que é a fé do impenitente, senão uma

fé morta? O fim vem, o fim vem sobre vós, que estais em segurança, que sois, sem

culpa aos vossos olhos, justificados em vossa fé, e, entretanto sois diabos."

E então, de repente, um abismo se abria no meio daquela cidade, e cresceu, e as

casas caíram umas sobre as outras e eles foram tragados; e logo água fervente de

um vasto sorvedouro saiu e inundou essa devastação.

Quando eles ficaram submersos e foram vistos inundados, desejei saber qual era a

sua sorte no abismo, e do céu me foi dito: Vais ver e ouvir. E então, as águas com

que eles foram inundados, desapareceram diante de meus olhos, porque as águas

no mundo espiritual são correspondências, e, por conseguinte aparecem ao redor

dos que estão nos falsos. E então os vi em um fundo arenoso, onde havia montões

Page 85: Exposição Sumária

de pedras, entre os quais eles corriam, e se lamentavam de terem sido precipitados

da sua grande cidade. E diziam vociferando e gritando: "Por que nos sucedeu isto?

Não somos por vossa fé limpos, puros, justos, santos?" Outros diziam: "Por nossa

fé, não fomos limpos, purificados, justificados e santificados?" E outros diziam: "Por

nossa fé não nos tornamos tais, que somos perante Deus Pai, e perante toda a

Trindade, reputados e considerados, e, perante os anjos declarados como limpos,

puros, justos e santos? Não obtivemos a reconciliação, a propiciação, a expiação, e

por esse modo não fomos absolvidos, lavados e limpos dos pecados? A danação da

lei não foi abolida pelo Cristo? Por que fomos lançados aqui como danados?

Ouvimos bradar em nossa grande cidade por um audacioso pregador do pecado:

"Crede no Cristo e farei penitência;" mas não temos crido no Cristo quando cremos,

em Seu mérito, e não temos feito penitência, quando confessamos que éramos

pecadores? Por que então isto veio sobre nós?"

Mas, então, ouviu-se de um lado uma voz que lhes disse. "Conheceis um só dos

pecados em que estais? Acaso vós vos tendes examinado? Fugistes, por

conseguinte de algum mal como pecado contra Deus? E quem não foge de um mal,

está no mal. O pecado não é o diabo? Vós estais portanto entre aqueles de que o

Senhor diz: "Então começareis a dizer: Comemos diante de Ti, e bebemos, e

ensinaste em nossas praças. Mas Ele dirá: Digo-vos que não sei de onde sois,

retirar-vos de Mim, vós todos, que praticais a iniqüidade." (Lucas 13:26, 27. Como

também em Mateus 7: 22, 23); ''Ide, pois, cada um para o seu lugar. Estais vendo

antros nestas cavernas, entra! aí e se dará a cada um de vós o seu trabalho para

cumprir. E então cada um receberá comida à proporção do trabalho, se não, a fome

forçar-vos-á a entrar".

Depois uma voz do céu se fez ouvir, sobre a terra ali, a alguns que tinham estado

fora da cidade, dos quais se fala no vers. 13 do Capítulo 11 do Apocalipse. E lhes foi

dito em voz alta: "Acautelai-vos da associação com pessoas semelhantes. Não

podeis compreender que os males, que são chamados pecados e iniqüidades,

fazem o homem imundo e impuro? Como pode o homem ser lavado e purificado

deles de outro mo,do senão pela penitência real e pela fé no Senhor Deus Salvador?

A penitência real consiste em examinar-se, em conhecer e reconhecer os seus

Page 86: Exposição Sumária

pecados, em se confessar culpado, em confessá-los perante o Senhor, em implorar

auxílio e o poder para lhes resistir, e assim abster-se deles, e ter uma vida nova e

em fazer tudo isso como por vós mesmos. Fazei ,assim uma ou duas vezes no ano,

quando vos aproximardes; da Santa Comunhão. E depois, quando os pecados de

que vos confessastes culpados voltarem, dizei a vós mesmos: "Não queremos fazer

tais coisas, porque são pecados contra Deus." Isto é a penitência real.

Quem não pode entender que quem não se examina, e não vê os seus pecados,

permanece em seus pecados? Pois, todo mal por nascimento é um prazer, pois é

um prazer vingar-se, entregar-se à devassidão, roubar, blasfemar. Não é o prazer

que faz com que não se veja mal nessas ações? E se for dito que são pecados, não

é por causa do prazer deles que vós os desculpais? Mais ainda, pelas falsidades vos

confirmais e vos persuadis de que não são pecados. E assim permaneceis nesses

pecados, e depois os praticais mais do que antes ao ponto de não saber o que é o

pecado nem até mesmo se o pecado existe.

"Mas é muito diferente com aquele que faz penitência real. Os seus males, que ele

conhece e reconhece, ele os chama pecados, e por essa razão ele começa a fugir

deles, a tê-los em aversão, e a achar desagradável o prazer de tais ,males. E quanto

mais isso é feito, tanto mais ele vê e ama os bens, e finalmente ele sente os seus

prazeres, que são os prazeres do céu. Em uma palavra, quanto mais o homem

rejeita o diabo, tanto mais ele é adotado pelo Senhor e é por Ele instruído,

conduzido, desviado dos males e mantido nos bens. Isto é o caminho, e não há

outro, para ir do inferno ao céu."

É uma coisa que espanta: os reformados sentem, para fazer penitência real, uma

sorte de repugnância, recusa e aversão, que é tão grande, que não podem

compelir-se a se examinarem, verem os seus pecados e confessá-los perante Deus.

Uma sorte de horror os invade quando eles têm a intenção de fazê-lo. Interroguei

muitos a esse respeito no mundo espiritual, e todos me disseram que isso estava

acima de suas forças. Quando ouviram que, entretanto, os católico-romanos o

fazem, isto é, que eles se examinam e confessam francamente os seus pecados

perante um padre, ficaram em extremo admirados, e tanto mais quanto os

reformados não podem fazê-lo secretamente diante de Deus, ainda que isso lhes

Page 87: Exposição Sumária

seja igualmente recomendado antes de aproximarem da Santa Ceia. E alguns dos

que estavam presentes, tendo procurado a razão do fato, acharam que a fé só era a

causa de tal estado de impenitência e de tal disposição do coração. Então se lhes

permitiu verem que os católico-romanos que se dirigem ao Cristo e O adoram, e que

não adoram, mas somente honram, os prelados e os chefes de sua Igreja, são

salvos.

Depois disso, ouviu-se como um trovão, e uma voz falando do céu dizendo:

“Estamos espantados. Dize às assembléias dos reformados: Crede no Cristo e fazei

penitência, e sereis salvos." Eu disse, acrescentando: "O batismo não é um

sacramento de penitência, e por conseguinte a introdução na igreja? Que prometem

os padrinhos para aquele que vai ser batizado, senão, de renunciar ao diabo e às

suas obras? A Santa Ceia não é um sacramento de penitência e por conseguinte a

introdução no céu? Não se diz aos comungantes para fazerem inteiramente

penitência antes de se aproximarem dela? Não é o Decálogo a doutrina universal da

Igreja Cristã que ensina a penitência? Nele não se diz nos seis mandamentos da

segunda tábua: Não farás tal e tal mal? E não se diz: Farás tal e tal bem. Por tudo

isso podeis saber que, quanto mais alguém foge do mal, tanto mais ele ama o bem;

e que antes disso não sabeis o que é o bem, nem o que é o mal." (Apoc. Rev. nº

531).

115. O segundo Memorável é este: Disse-me um dia um anjo: "Queres ver

claramente o que é a fé e a caridade, assim o que é a fé separada da caridade e o

que é a fé unida com a caridade? Demonstrá-lo-ei à vista.".

Respondi: "Mostra."

E ele disse: "Em vez de pensar na fé e na caridade, pensa na luz e no calor, e verás

claramente, pois a fé em sua essência é a verdade que pertence à sabedoria, e a

caridade em sua essência é a afeição que pertence ao amor. Ora, a verdade da

sabedoria no céu é luz, e a afeição do amor no céu é calor. A luz e o calor em que

estão os anjos não é outra coisa. Daí podes ver claramente o que é a fé separada da

caridade, e o que é a fé unida com a caridade.

A fé separada da caridade é como a luz do inverno, e a fé unida com a caridade é

como a luz da primavera. A luz do inverno, que é a luz separada do calor, estando

Page 88: Exposição Sumária

unida ao frio, despoja inteiramente as árvores, até mesmo de suas folhas, faz morrer

a grama, endurece a terra e congela as águas. Mas a luz da primavera, que é a luz

conjunta ao calor, faz brotar as árvores, primeiro em folhas, depois em flores e

finalmente em frutos. Ela abre e amolece a terra para que esta produza a grama, as

ervas, as flores, e os arbustos. Ela derrete também o gelo para que as águas

emanem das nascentes. É inteiramente semelhante com a fé e a caridade, a fé

separada da caridade faz tudo morrer e a fé conjunta à caridade vivifica tudo. Essa

vivificação e essa ação mortífera podem ser vistas ao vivo em nosso mundo

espiritual, porque aqui a fé é luz e a caridade é calor. Onde a fé é unida à caridade,

aí existem jardins paradisíacos, canteiros de flores, lugares cobertos de verduras,

com sua beleza de acordo com a conjunção. Lá, porém, onde a fé é separada da

caridade, não há mesmo grama e se há ali alguma verdura, não é senão a verdura

dos espinheiros e das sarças.

Não longe de nós havia então alguns eclesiásticos que o anjo chamava

Justificadores e santificadores dos homens pela fé só, e também arcanistas.

Dissemos-lhes; as mesmas coisas, e as demonstramos até lhes fazermos ver que

era assim. E quando lhes perguntamos se isso não era assim, eles se desviaram e

disseram: "Não ouvimos." Nós, porém, lhes dissemos: "Escutai-nos ainda." Então

eles puseram as duas mãos diante dos ouvidos, e gritaram: "Não queremos

escutar." (Apoc. Rev. nº 875).

CONCLUSÃO

Jeremias, Capítulo 7:2, 3, 4, 9, 10, 11.

Põe-te de pé à porta da casa de Jehovah, e aí proclama esta palavra: Assim disse

Jehovah Zebaoth, o Deus, de Israel. Melhorai os vossos caminhos e as vossas

obras, não vos fiéis em palavras de mentira dizendo: O Templo de Jehovah, o

Templo de Jehovah, o Templo de Jehovah, aqui (isto é, a Igreja). Não é roubando,

matando, cometendo adultério, jurando falsamente, que vireis depois e estareis

diante de Mim, nesta Casa sobre a qual está nomeado Meu Nome e que direis:

"fomos libertados," enquanto fazeis todas essas abominações? Esta casa não se

tornou uma caverna. de ladrões? Mesmo Eu, eis, vi, diz Jehovah.

COROAMENTO

Page 89: Exposição Sumária

(APÊNDICE)

116. A Fé do Novo Céu o da Nova Igreja na Forma Universal é esta:

O Senhor de toda eternidade, Que é Jehovah, veio ao mundo, para subjugar os

infernos e glorificar o Seu Humano; sem isso nenhum mortal teria podido ser salvo, e

são salvos os que, crêem n'Ele.

Diz-se, na forma universal, porque esse é o universal da fé, e o universal da fé é o

que deve estar em todas e em cada uma das coisas da fé. É um universal da fé que

Deus é um em Essência e em Pessoa, no Qual está a Trindade, e que o Senhor

Deus Salvador Jesus Cristo é esse Deus. É um universal da fé, que nenhum mortal

teria podido ser salvo, se o Senhor não tivesse vindo ao mundo. É um universal da

fé, que Ele veio ao mundo, para remover o inferno do homem e que Ele removeu,

por combates contra ele e por vitórias alcançadas sobre ele; assim Ele o subjugou e

o repôs na ordem e sob a Sua obediência. É um universal da fé, que Ele veio ao

mundo para glorificar o Humano que Ele tomou no mundo, isto é, para 0 unir ao

Divino a Quo (de Que ele procedia); assim Ele mantém pela eternidade na ordem e

sob a Sua obediência, o inferno subjugado por Ele. Isso não podia ser feito senão

por tentações admitidas em Seu Humano até a última dessas tentações, e esta

última era a paixão na cruz, por isso Ele a suportou. Esses são os universais da fé a

respeito do Senhor.

Da parte do homem, o universal da fé cristã é que ele creia no Senhor, pois por crer

no Senhor faz-se com Ele uma conjunção, pela qual há salvação. Crer n'Ele, é ter

confiança que Ele salva; e como ninguém pode ter essa confiança, senão aquele

que vive bem, resulta que por crer n'Ele entende-se também viver bem.

117. A Fé do Novo Céu e da Nova Igreja na Forma Particular é esta:

Jehovah Deus é o Amor Mesmo e a Sabedoria Mesma, ou Ele é o Bem Mesmo e a

Verdade Mesma. E Ele Mesmo, quanto à Divina Verdade, que é a Palavra, e que foi

Deus com Deus, desceu e tomou o Humano, com o fim de repor na ordem todas as

coisas que estavam no céu, todas as que estavam no inferno, e todas que estavam

na igreja. Pois então o poder do diabo, isto é, do inferno, prevalecia sobre o poder do

céu, e que nas terras o poder do mal prevalecia sobre o poder do bem, e que em

conseqüência uma danação total estava à porta e estava iminente. Jehovah Deus,

Page 90: Exposição Sumária

por Seu Humano que era a Divina Verdade, arrebatou essa danação que ia suceder

e assim Ele resgatou os anjos e os homens. E depois Ele uniu em Seu Humano a

Divina Verdade ao Divino Bem, e assim Ele voltou, com o Humano Glorificado ao

Seu Divino, no Qual Ele tem estado desde toda a eternidade.

Isto se entende por esta passagem em João: "A Palavra estava com Deus, e a

Palavra era Deus; e a Palavra se fez Carne" (1: 1,14).

E por esta passagem no mesmo: "Saí do Pai, e vim ao mundo, de novo deixo o

mundo e vou ao Pai" (16:28).

Sendo assim é evidente que sem a Vinda do Senhor ao mundo, ninguém teria

podido ser salvo. O mesmo sucede hoje; por isso, se o Senhor não vier de novo ao

mundo, na Divina Verdade, que é a Palavra, ninguém também pode ser salvo.

Da parte do homem, os particulares da fé são:

I. Deus é Um, em Quem está a Divina Trindade, e Ele é o Senhor Deus Salvador

Jesus Cristo;

II. A Fé salvífica é crer n'Ele;

III. Deve-se fugir dos males, porque eles são do diabo e vêm do diabo;

IV.Deve-se fazer os bens, porque eles são de Deus e vêm de Deus;

V. E essas coisas devem ser feitas pelo homem como por si mesmo, mas ele

deve crer que estas coisas, que estão nele e são feitas por meio dele, vêm

do Senhor.

Os dois primeiros pertencem à fé, os dois seguintes à caridade e o quinto pertence à

conjunção da caridade e da fé, assim como a conjunção do Senhor e do homem,

(Ver nº 44).

SEGUEM TRÊS MEMORÁVEIS TIRADOS DO APOCALIPSE REVELADO

118. Primeiro Memorável: Quando eu estava na explicação do Capítulo 20 do

Apocalipse, meditando sobre o dragão, a besta e o falso profeta, apareceu-me um

espírito angélico e me perguntou: "Em que meditas?"

E eu disse: "No falso profeta."

Então disse-me ele: "Levar-te-ei ao lugar onde moram os que se entendem pelo

Falso Profeta." Ele disse que são os mesmos que, no Capítulo 13, se entendem pela

Page 91: Exposição Sumária

besta subindo da terra, a qual tinha dois chifres semelhantes aos de um cordeiro, e

que falava como o dragão.

Eu o segui, e eis que vi uma turba em cujo meio estavam chefes da igreja, que

tinham ensinado que não há outra coisa que salve o homem, senão a fé no mérito

do Cristo, e que as obras são boas, mas não para a salvação, e que elas devem,

contudo ser ensinadas segundo a Palavra, para que os leigos, especialmente os

simples, se mantenham mais rigorosamente rios vínculos da obediência para com

os magistrados, e sejam impelidos para exercerem a caridade moral como pela

religião, assim interiormente.

E então vendo-me um deles disse: "Queres ver nosso Templo, no qual está a

imagem representativa de nossa fé?"

Aproximei-me e vi, e eis que ele era magnífico, e no meio dele havia a imagem de

uma mulher que estava vestida com um vestido escarlate, tendo na mão direita uma

moeda de ouro, e na esquerda uma cadeia de pérolas grandes. Mas eram uma

imagem e um templo induzidos por fantasias, pois os espíritos infernais podem por

fantasias representar coisas magníficas, fechando os interiores da mente e abrindo

unicamente os seus exteriores.

Mas quando observei que esses objetos eram imposturas, orei ao Senhor, e de

repente se abriram os interiores de minha mente. E vi então, em vez do Templo

magnífico, uma casa cheia de fendas desde o telhado até às fundações, na qual

nada estava ligado entre si. E em vez da mulher vi nessa casa uma representação

suspensa, cuja cabeça era semelhante à do dragão, o corpo semelhante ao de um

leopardo, os pés como os de uma ursa e a boca como a de um leão; assim

inteiramente como a besta que sobe do mar é descrita. (Apoc. 13: 2) E em vez da

terra havia um pântano no qual havia uma multidão de rãs. E me foi dito que,

debaixo do pântano havia uma grande pedra talhada, sob a qual a Palavra jazia

profundamente escondida.

Depois de ter visto isso, eu disse ao impostor: "Então esse é o vosso templo? E ele

disse: "Sim". Mas, de repente a sua vista interior também foi aberta, pela qual viu as

mesmas coisas que eu.

A essa vista, ele exclamou a toda voz: "Que é isso e de onde vem isso?"

Page 92: Exposição Sumária

E eu disse: Isso vem da luz do céu, que descobre a qualidade de cada forma, e aqui

a qualidade da vossa fé separada da caridade espiritual".

E logo o vento oriental soprou e arrebatou o Templo com a imagem, e também

secou o pântano e descobriu a pedra, debaixo da qual estava a Palavra. E depois

disso, fez-se sentir do céu um calor tal qual o da primavera; e eis que se viu então

nesse mesmo lugar um tabernáculo, simples quanto à forma externa.

E os anjos que estavam comigo, disseram: "Eis o tabernáculo de Abraão, tal qual

era, quando os três anjos vieram, a ele e lhe anunciaram o nascimento próximo de

lsaac. Ele aparece simples diante dos olhos, mas se torna cada vez mal$ magnífico

segundo o influxo da luz do céu.".

E foi-lhes dada permissão para abrir o Céu onde estavam os anjos espirituais que

estão na sabedoria. E então, pela luz fluindo dali, esse tabernáculo aparecia como

um templo, semelhante ao de Jerusalém. Quando eu o examinei, vi a pedra no

fundo, debaixo da qual tinha sido depositada a Palavra, coberta de todos os lados de

pedras preciosas, cujo brilho se refletia sobre as paredes onde estavam formas de

querubins e fazia-os brilhar por uma variedade de belíssimas cores.

Enquanto eu admirava essas coisas, os anjos disseram: "Verás coisas ainda mais

admiráveis", e foi-lhes dada permissão para abrirem o Terceiro Céu, onde estavam

os anjos celestes que estão no amor. E então, pela luz fluindo daí, todo esse templo

se dissipou, e em seu lugar foi visto o Senhor Só de pé sobre a Pedra do fundo, que

era a Palavra, e tal qual Ele apareceu a João, no Cap. 1 do Apocalipse.

Como então, porém, os interiores da mente dos anjos se encheram de uma

santidade, que os levava a se prostrarem sobre as suas faces, o Senhor fechou logo

o caminho da luz que vinha do terceiro céu, e abriu o caminho da luz do segundo

céu, pela qual o aspecto precedente do Templo voltou, e também do tabernáculo,

mas no templo.

Por estas coisas é ilustrado o que se entende no Cap. 21: 3 do Apocalipse, por estas

palavras: "Eis, o Tabernáculo de Deus está com os homens, e Ele habitará com

eles."

E por estas: "Não vi templo em a Nova Jerusalém, porque o Senhor Deus

Todo-poderoso e o Cordeiro é o seu Templo", (Vers. 22)

Page 93: Exposição Sumária

119. Segundo Memorável tirado do Apocalipse Revelado.

Um dia, ao despertar-me do sono, entrei em uma profunda meditação sobre Deus,

e quando olhei para o alto, vi acima de mim no céu, uma luz de um branco

brilhantíssimo em forma oval.E quando fixava a minha vista sobre essa luz, ela se

retirava para os lados e entrava nas periferias. E então, eis que se me abriu o céu, e

vi coisas magníficas, e anjos que estavam de pé em forma de círculo do lado

meridional da abertura, e que conversavam entre si. E porque ardi de desejo de

ouvir o que diziam, foi-me concedido primeiro ouvir o som de sua voz, que estava

cheia do amor celeste, e depois a sua linguagem, que estava cheia da sabedoria

procedente desse amor.

Entre si falavam de Um só Deus, da Conjunção com Ele, e daí da Salvação. Diziam

coisas inefáveis, cuja maior parte não podia ser transmitida em palavras de

nenhuma língua natural. Como, porém, estivera algumas vezes em consorciação

com os anjos do céu mesmo, e então falasse a mesma linguagem que eles, porque

estava no mesmo estado, pude, por conseguinte compreendê-los, e tirar dos seus

discursos algumas idéias que podem ser expressas racionalmente pelas palavras de

uma língua natural.

Eles diziam que o Divino Ser é Um, o Mesmo, o Si Mesmo, o Indivisível; assim

também é a Divina Essência, porque o Divino Ser é a Divina Essência; e assim é

Deus, porque a Divina Essência, que é também o Divino Ser, é Deus. Eles

ilustravam isso por idéias espirituais, dizendo que o Divino Ser não pode distribuir-se

em muitos, cada um dos quais sendo o Divino Ser, e continuar, contudo, a ser Um, o

Mesmo, o Si Mesmo, o Indivisível. Pois, cada um deles pensaria do Seu Ser

conforme a si e por si. Então, se fosse também e ao mesmo tempo com

unanimidade, conforme aos outros e pelos outros, haveria muitos Deuses unânimes,

e não um só Deus. Pois a unanimidade, sendo o consentimento de muitos e ao

mesmo tempo de cada um conforme a si e por si, não concorda com a unidade de

Deus, mas com uma pluralidade. Mas elas não disseram de Deuses, porque não

puderam pois a luz do céu da qual provinha o seu pensamento, e em que se

propagava o seu, discurso, opunha-se a isso. Eles também diziam que quando

Page 94: Exposição Sumária

querem pronunciar Deuses e falar de cada um como uma Pessoa por si mesmo, o

esforço para pronunciar cal logo sobre Um Só, e até sobre um Deus único.

A estas explicações eles acrescentavam que o Divino Ser é o Divino Ser em Si (in

Se) e não que vem de Si (a Se) porque vir de SI, supõe o Ser em Si (procedente) de

um Outro assim supõe Deus que vem de Deus (Deus a Deo), o que não é

admissível 0 que vem de Deus não é chamado Deus, mas é chamado Divino. Pois o

que é Deus que vem de Deus, ou o que é Deus nascido de toda eternidade de Deus,

e o que é Deus procedendo de Deus por meio de Deus nascido de toda a

eternidade, senão palavras em que não há coisa alguma da luz que procede do céu?

Ainda mais, eles diziam que o Divino Ser, que em Si é Deus, é o Mesmo (Idem); não

o Mesmo simples, mas infinito, isto é, o Mesmo de toda eternidade até toda

eternidade. Ele é o Mesmo em todos os lugares e o Mesmo com cada um e em cada

um, mas tudo é variado e variável no recipiente. É o estado do recipiente que faz

isso.

Que o Divino Ser, que é Deus em Si, é o Si Mesmo (Ipsum), eles ilustravam assim:

Deus é o Si Mesmo, porque Ele é o Amor Mesmo e a Sabedoria Mesma ou, o que é

semelhante, Ele é o Bem Mesmo e a Verdade Mesma, e, por conseguinte a Vida

Mesma. Se essas coisas não fossem o Si Mesmo em Deus, elas nada seriam no

Céu nem no Mundo, porque não teriam relação alguma com o Si Mesmo. Toda

qualidade tira a sua qualidade disto, que há em Si mesmo pelo qual ela é, e ao qual

ela se refere para que seja tal. Esse Si Mesmo, que é o Ser Divino, não está em um

lugar, mas está segundo a recepção com aquele e naqueles que estão em um lugar.

Pois o lugar e a progressão de um lugar para outro não podem se dizer do Amor e

da Sabedoria, ou do Bem e da Verdade, nem, por conseguinte da Vida, que são o Si

Mesmo em Deus, ou antes Deus Mesmo, mas essas coisas são sem lugar, daí a

Onipresença. Por isso o Senhor diz, que Ele está no meio deles; e que Ele Mesmo

está neles, e que estão n'Ele.

Como, porém, Ele não pode ser recebido por criatura alguma tal qual Ele é em Si,

Ele aparece tal qual Ele é em Si como um Sol acima dos céus angélicos. 0 que

procede desse Sol como luz é Ele Mesmo quanto à Sabedoria, e o que dele procede

como calor é Ele Mesmo quanto ao Amor. Ele Mesmo não é esse Sol. Mas o Divino

Page 95: Exposição Sumária

Amor e a Divina Sabedoria saindo d'Ele, aparecem diante dos, Anjos como um Sol

em torno d'Ele. Ele no Sol é Homem, é Nosso Senhor Jesus Cristo, tanto quanto ao

Divino a Quo (de Quem tudo procede), como quanto ao Divino Humano. Pois o Si

Mesmo, que é o Amor Mesmo e a Sabedoria Mesma, foi a Alma que Ela tinha do

Pai, assim a Divina Vida, que é a Vida em Si. É diferente em qualquer homem, pois

nele a alma não é a vida, mas um recipiente da vida. O Senhor ensina também isso,

dizendo: "Eu Sou o Caminho, a Verdade e a Vida" (João 14:6).

E em outro lugar: "Como o Pai tem a Vida em Si Mesmo, assim Ele também deu ao

Filho ter a Vida em Si Mesmo" (João 5:26).

A Vida em Si Mesma é Deus.

A estas coisas eles acrescentaram que os que estão em alguma luz espiritual

podem perceber por essas coisas, que o Divino Ser, que é também a Divina

Essência, sendo Um, o Mesmo, o Si Mesmo, e, por conseguinte Indivisível, não

pode existir em muitos; e que se se dissesse que Ele pode, haveria contradições

manifestas nas conclusões (in adjectis).

Depois que ouvi essas explicações, os anjos perceberam em meu pensamento as

idéias comuns da Igreja Cristã sobre a Trindade das Pessoas na Unidade, e sobre a

Unidade das Pessoas na Trindade de Deus; e também sobre o nascimento de um

Filho de Deus de toda eternidade. E então disseram: "Que estás pensando? Não

pensastes essas coisas segundo a luz natural com a qual a nossa luz espiritual não

concorda? Por isso, se não afastares as idéias desse pensamento, nós te fechamos

o véu e nos vamos.".

Mas então eu lhes disse: "Entrai, peço-vos, mais profundamente em meu

pensamento, e talvez vejais nele uma concordância?" E fizeram assim, e viram que

pelas Três Pessoas eu entendia os Três Atributos Divinos procedentes, que são a

Criação, a Redenção e a Regeneração, e que esses atributos pertencem a um só

Deus; e que pelo nascimento de um Filho de Deus de toda eternidade, eu entendia o

Seu nascimento previsto de toda eternidade e provido no tempo. Então eu lhes

contei que o meu pensamento natural sobre a Trindade e a Unidade das Pessoas, e

sobre o nascimento do Filho de Deus de toda eternidade, me viera da doutrina da fé

da Igreja, que tem o nome de Atanásio; e que essa doutrina é sã contanto que a

Page 96: Exposição Sumária

Trindade das Pessoas seja substituída, pela Trindade de Pessoa, que existe

unicamente no Senhor Jesus Cristo; e que em vez do nascimento do Filho de Deus

de toda eternidade, percebe-se o Seu nascimento previsto de toda eternidade e

provido no tempo, porque, quanto ao Humano que Ele tomou, Ele é abertamente

chamado o Filho de Deus.

Então os Anjos disseram: "Bem, Bem", e me pediram para que eu dissesse, como

vindo de sua boca: que se o homem não se dirigir ao Deus Mesmo do céu e da terra,

ele não pode ir para o céu, porque o céu é céu por esse Deus único, e que esse

Deus é Jesus Cristo, que é Jehovah o Senhor, de toda eternidade Criador, no tempo

Redentor, e para a eternidade Regenerador, que é assim ao mesmo tempo o Pai, o

Filho e o Espírito Santo, e que esse é o Evangelho que deve ser pregado.

Depois destas coisas, a luz celeste que a princípio eu vira, voltou para a abertura, e,

pouco a pouco, baixou dali, encheu os interiores de minha mente, e iluminou as

minhas idéias sobre a Unidade e a Trindade de Deus. E então as idéias tomadas no

começo sobre este assunto, as quais tinham sido meramente naturais, eu as vi

separadas, como a palha é separada do trigo pela debulha, e levadas como pelo

vento para o norte do céu e dispersas, (Apoc. Rev. nº 962).

120. Terceiro Memorável tirado do Apocalipse Revelado. Como me foi concedido

pelo Senhor ver as coisas maravilhosas que estão nos céus e debaixo dos céus, por

ordem cumpre-me, relatar o que vi.

Vi um palácio magnífico, e em seu interior um templo. No meio deste havia uma

mesa de ouro sobre a qual estava a Palavra, dois Anjos estando de pé perto da

Palavra. Ao redor da mesa havia três filas de assentos. Os assentos da primeira fila

eram cobertos com um tecido de seda de cor de púrpura; os assentos da segunda

fila, com um tecido de seda de cor azul, e os assentos da terceira fila com um tecido

branco. Sob o teto, em uma grande elevação acima da mesa, apareceu um pálio

estendido que resplandecia pelas pedras preciosas, cujo brilho era como o da íris

quando, depois da chuva, o céu se torna sereno.

Então, de repente, os assentos foram ocupados por outros tantos membros do

Clero, todos trajando as suas vestimentas sacerdotais. Em um dos lados estava a

Page 97: Exposição Sumária

sala do Tesouro, guardado por um anjo que estava de pé; e ali estavam estendidas,

na mais bela ordem, vestimentas magníficas. Era o Concílio convocado pelo Senhor.

Ouvi uma voz do céu, dizendo: "Deliberai M as d disseram: "Sobre que?" E foi dito:

"Sobre o Senhor Salvador e sobre o Espírito Santo."

Mas, quando refletiram sobre esse assunto, eles não estavam na ilustração. Por isso

eles suplicaram, e então veio do céu uma luz que iluminou primeiramente o seu

occipício, depois as suas têmporas e, finalmente, as suas faces, e então começaram

a deliberar; primeiramente sobre o Senhor Salvador, como fora ordenado.

A primeira Proposição posta em discussão foi esta: Quem é que tomou o Humano

na Virgem Maria? E um anjo que estava de pé perto da mesa, sobre a qual estava a

Palavra, leu diante deles estas palavras em Lucas:

"O anjo disse a Maria: Eis, conceberás no útero, e darás à luz um Filho, e chamarás

seu nome Jesus. Este será Grande, e será chamado Filho do Altíssimo. E Maria

disse ao anjo: Como se fará isso, pois que não conheço homem? E o anjo

respondendo lhe disse: 0 Espírito Santo virá sobre ti e a Virtude do Altíssimo te

cobrirá com sua sombra, por isso o Santo que nascer de ti será chamado Filho de

Deus" (Lucas 1:31, 32, 34, 35).

Ele leu também as palavras que estão em Mateus, 1:20 a 25, e em alta voz as

palavras do versículo 25. Além destas, ele leu muitas passagens tiradas dos

Evangelistas, por exemplo: Mateus 3:17; 17: 5; João 20:31, e outra passagem em

que o Senhor, quanto ao Seu Humano, é chamado Filho de Deus, e onde Ele

Mesmo por Seu Humano chama Jehovah Seu Pai.

Ele leu também passagens tiradas dos Profetas, onde se prediz que Jehovah

Mesmo viria ao mundo. Entre estas as duas seguintes em lsaías: "Será dito nesse

dia: Eis, Este é nosso Deus Que temos esperado para que Ele nos livre; Este é

Jehovah Que temos esperado; regozijemo-nos e alegremo-nos em Sua Salvação"

(25: 9).

"A voz daquele que clama no deserto. Preparai o caminho de Jehovah, aplainai na

solidão uma vereda a nosso Deus. Pois será revelada a glória de Jehovah, e toda

carne verá ao mesmo tempo. Eis, o Senhor Jehovah vem com força, como Pastor

apascentará Seu rebanho" (40:3, 5, 10, 11). E o anjo disse: Como Jehovah Mesmo

Page 98: Exposição Sumária

velo ao mundo, tornou o Humano e por este modo resgatou e salvou os homens, é

por isso que nos Profetas Ele Mesmo se chama Salvador o Redentor. E então ele

leu perante eles as passagens seguintes: "Somente em Ti está Deus, e não há outro

Deus. Certamente Tu és o Deus em coberto, 6 Deus de Israel, o Salvador" (lsaías

45:14, 15); "Não sou Eu Jehovah e há outro Deus além de Mim? E há outro Deus

justo e Salvador além de Mim?" (lsaías 45:21, 22); "Eu sou Jehovah, e não há outro

Salvador além de Mim" (lsaías 43:11); "Eu sou Jehovah teu Deus, e não

reconhecerás outro Deus além de Mim, e não há outro Salvador além de Mim"

(Hosias 13:4); "Para que toda carne saiba que Eu sou Jehovah teu Salvador e teu

Redentor" (lsaías 49:26; 60:16); "Quanto ao Redentor nosso, Jehovah Zebaoth é o

Nome Seu" (lsaías 47:4); "0 Redentor deles é Forte, Jehovah Zebaoth é o Nome

d'Ele" (Jerem. 50:34); "Jehovah! Rocha minha e Redentor meu" (Sal. 19:14); "Assim

disse Jehovah o Redentor teu, o Santo de Israel, Eu Sou Jehovah o Deus teu" (Is.

48:17; 43:14; 49: 7; 54:8); "Tu, Jehovah, és nosso Pai, o Redentor nosso, é esse de

toda eternidade o Nome Teu" (Is. 63:16); "Assim disse Jehovah, o Redentor teu: Eu,

Jehovah, faço todas coisas, e Só por Mim Mesmo" (Is. 44:24); "Assim disse

Jehovah, o Rei de Israel, e Seu Redentor Zebaoth: Eu sou o Primeiro e o último, e

além de Mim não há Deus" (Is. 44:6); "Jehovah Zebaoth é o Nome Seu, e Redentor

teu o Santo de Israel, será chamado o Deus de toda a terra" (lsaías 54:5); "Eis, dias

virão, em que suscitarei a David um germem justo que reinará Rei, e eis o Nome

d'Ele Jehovah a Justiça nossa" (Jerem. 23:5, 6; 33:15, 16); "Nesse dia Jehovah será

Rei em toda a terra; nesse dia Jehovah será um e o Nome d'Ele um" (Zac. 14: 9).

Os que estavam assentados, tendo sido confirmados por todos essas passagens,

disseram unanimemente, que Jehovah Mesmo tinha tomado o Humano para

resgatar e salvar os homens.

Mas, então, de um grupo de católicos romanos, que tinham ficado escondidos atrás

do altar, fez-se ouvir uma voz que disse: "Como Jehovah Pai pode tornar-se

Homem? Não é Ele o Criador do universo?".

E um dos que estavam assentados na segunda fila, voltou-se e disse: "Quem, então,

se fez Homem?

Page 99: Exposição Sumária

Aquele que estava atrás do Altar, pondo-se perto do Altar, respondeu: "0 Filho de

toda eternidade."

Mas recebeu como resposta: "O Filho de toda eternidade não é também, segundo a

vossa confissão, o Criador do universo? E que é um Filho ou um Deus nascido de

toda eternidade? E como pode a Essência Divina, que é Uma e Indivisível, ser

separada? Como é que uma de suas partes pode descer e não o todo ao mesmo

tempo?"

A segunda proposição posta em discussão sobre o Senhor foi a seguinte: Não são o

Pai e Ele um como a Alma e o Corpo são um? Eles disseram que isto é uma

conseqüência do fato de que a Alma vem do Pai.

Então um dos que estavam nos assentos da terceira fila, leu estas passagens da fé

do credo, que é, chamado Atanasiano: "Ainda que nossa Senhor Jesus Cristo, Filho

de Deus, seja Deus e Homem, Ele é, entretanto, não dois, mas um só Cristo; Ele é

mesmo absolutamente Um, Ele é uma Só Pessoa; pois do mesmo modo que a Alma

e o Corpo fazem um só homem, assim também Deus e o Homem é um Só Cristo."

Aquele que lia disse que essa fé é recebida em todo o mundo cristão, até mesmo

pelos católico-romanos. Então eles disseram: "Que necessidade há de mais exame?

Deus Pai e o Senhor são um como a Alma e o Corpo são um." E eles continuaram:

"Sendo isso assim, vemos que o Humano do Senhor é Divino, porque é o Humano

de Jehovah, e que devemos dirigir-nos ao Senhor quanto ao Divino Humano, e quê

é assim e não de outro modo que se pode dirigir ao Divino que é chamado Pai."

O Anjo confirmou a sua conclusão por muitas passagens da Palavra, entre as quais

estavam estas, em lsaías: "Um Menino nos nasceu, um Filho nos é dado, Cujo

Nome é Admirável, Conselheiro, Deus Herói, Pai de Eternidade, Príncipe da Paz"

(lsaías 9:6); "Abraão não nos conhece, e Israel não nos reconhece; Tu, Jehovah, és

nosso Pai; nosso Redentor, e este de toda eternidade o Nome Teu" (lsaías 63:16).

E em João: "Jesus disse: Quem crê em Mim, crê em Quem Me enviou; e quem Me

vê, vê Aquele que Me enviou" (12: 44, 45);

"Philipe disse a Jesus: Mostra-nos o Pai. Jesus disse-lhe: Quem Me viu, viu o Pai,

como pois dizes: Mostra-nos o Pai? Não crês que Eu estou no Pai e que o Pai está

em Mim? Crede-Me, que Eu estou no Pai e que o Pai está em Mim" (14:8 a 11);

Page 100: Exposição Sumária

"Jesus disse: Eu e o Pai somos um" (10:30); "Tudo que o Pai tem é Meu e tudo que

é Meu é do Pai" (16:15; 17:10).

Enfim: "Jesus disse: Eu Sou o caminho, a Verdade e a Vida, ninguém vem ao Pai

senão por Mim" (14:6).

Depois de terem ouvido essas passagens, todos disseram de uma só boca e de um

só coração que o Humano do Senhor é Divino, e que é a esse Humano que se deve,

dirigir para se dirigir ao Pai. Pois Jehovah Deus, que é o Senhor de toda eternidade,

enviou-Se por esse Humano ao Mundo, e se tornou visível aos olhos dos homens e

por conseguinte acessível. Ele igualmente Se tornara visível e assim acessível, sob

a Forma Humana, aos antigos, mas então pelo meio de um anjo.

Depois disso se segue a deliberação sobre o Espírito Santo, e primeiro foi exposta a

idéia de muitos sobre Deus Pai, o Filho e o Espírito Santo, a qual era que Deus Pai

estava as sentado em um lugar elevado, tendo o Filho à Sua direita, e que enviavam

de junto d'Eles o Espírito Santo, para iluminar e ensinar os homens.

Mas então se fez ouvir uma voz do céu, dizendo: "Não podemos suportar essa idéia

de pensamento. Quem não sabe que Jehovah Deus é Onipresente? Ora, quem o

sabe e o reconhece, reconhecerá também que é Ele Mesmo que ilumina e ensina, e

que não é um Deus intermediário distinto d'Ele como uma pessoa é distinta de outra

pessoa, nem, com mais forte razão, um Deus distinto de dois outros. Afaste-se, pois,

a primeira idéia, que é vã, e receba-se esta que é justa e vereis isso claramente."

Mas então, uma voz do grupo dos católico-romanos, escondidos atrás do Altar do

Templo, foi ouvida de novo, dizendo: "Quem é então o Espírito Santo, que é

nomeado na Palavra dos Evangelistas, e em Paulo, e por Quem tantos sábios

eclesiásticos, sobretudo em nosso clero, se dizem ser, guiados? Quem, hoje, no

mundo cristão nega o Espírito Santo e as suas operações?"

A estas palavras, um dos que estavam assentados, na segunda fila voltou-se, e

disse: "Vós dizeis que o Espírito Santo é uma Pessoa, por Si, e um Deus por Si. Mas

que é uma pessoa saindo e procedendo de uma pessoa, senão uma operação que

sai e procede? Uma pessoa não pode sair nem proceder de uma pessoa por meio

de outra pessoa, mas o que pode sair e proceder de uma pessoa, é uma operação.

Ou, que é um Deus saindo e procedendo de um Deus, senão o Divino que sai e

Page 101: Exposição Sumária

procede? Um Deus não pode sair nem proceder de outro Deus por meio de outro

Deus, mas o que pode sair e proceder de Deus, é o Divino. A Divina Essência não é

uma e indivisível? E como a Divina Essência, ou o Divino Ser, é Deus, não é Ele um

e indivisível?"

Depois de terem ouvido essas palavras, os que estavam assentados nos bancos

concluíram, unanimemente, que o Espírito Santo não é uma Pessoa por si, nem, por

conseguinte Deus por si, mas que é o Santo Divino saindo e procedendo do único

Deus Onipresente, Que é o Senhor.

A esta conclusão, os anjos que estavam de pé perto da mesa de ouro, sobre a qual

estava a Palavra, disseram: "Bem! Não se lê em parte alguma da Antiga Aliança,

que os Profetas tenham, falado a Palavra pelo Espírito Santo, mas era por Jehovah

o Senhor. E quando é dito Espírito Santo em a Nova Aliança, se entende o Divino

procedente, que é o Divino ilustrando, ensinando, vivificando, reformando e

regenerando.

Depois ventilou-se um outro assunto de discussão sobre o Espírito Santo, a saber:

De Quem procede o Divino que é chamado Espírito Santo? É do Divino que é

chamado Pai, ou do Divino Humano que é chamado Filho?

E enquanto eles discutiam esse assunto, uma luz vinda do Céu brilhou, e por ela

viram que o Santo Divino, que se entende pelo Espírito Santo, procede do Divino no

Senhor por Seu Humano glorificado, que é o Divino Humano, comparativamente

como toda ação procede da alma pelo corpo em um homem.

O Anjo que estava de pé perto da Mesa, confirmou isso por estas passagens:

"Aquele que o Pai enviou fala as palavras de Deus, porque Deus não lhe deu o

Espírito por medida; o Pai ama o Filho, e lhe deu todas coisas em Sua mão" (João

3:34, 35); "Sairá um ramo do tronco de lischai; sobre Ele descansará o Espírito de

Jehovah, o Espírito de Sabedoria e de Inteligência, o Espírito de Conselho e de

Força" (lsaías 11: 1, 2); "0 Espírito de Jehovah Lhe foi dado e estava n'Ele" ([saías

42: 1; 59:19, 24; 61: 1; Lucas 4:18); "Quando vier o Espírito Santo, que vos enviarei

da parte do Pai, ele testificará de Mim" (João 15:26); "E Ele Me glorificará, porque

receberá do que é Meu, e vô-lo anunciará; tudo que o Pai tem é Meu; por isso disse

que Ele receberá do que é Meu e vô-lo anunciará" (João 16:14, 15); "Se Eu for,

Page 102: Exposição Sumária

enviar-vos-ei o Paracleto" (João 16:7); "0 Paracleto é o Espírito Santo" (João 14:26);

"0 Espírito Santo não era ainda porque Jesus ainda não estava glorificado" (João

7:39).

Depois da glorificação, porém: "Jesus soprou sobre os discípulos e disse-lhes:

Recebei o Espírito Santo" (João 20: 22).

E no Apocalipse: "Quem não glorificará o Nome Teu, Senhor, porque Só Tu és

Santo" (15:4).

Como a Divina operação o do Senhor, por Sua Divina Onipresença, se entende pelo

Espírito Santo, o Senhor, quando falou aos Seus discípulos do Espírito Santo que

Ele enviaria de Deus Pai, Ele disse também: "Não vos deixarei órfãos; Eu vou e

venho a vós, e nesse dia conhecereis que Eu estou em Meu Pai, e vós em Mim, e

Eu em vós" (João 14:18, 28, 20).

E pouco tempo antes de deixar o mundo, Ele lhes disse: "Eis, Eu convosco estou

todos os dias até a consumação da era" (Mateus 28: 20).

Essas passagens tendo sido lidas perante eles, o Anjo disse: "Por essas passagens

e por muitas outras tiradas da Palavra, é claro que o Divino, que é chamado Espírito

Santo, procede do Divino do Senhor por Seu Divino Humano.

A estas palavras, os que estavam assentados, disseram: "Isto é a Divina Verdade."

Finalmente decretou-se o que segue: "Pelas deliberações feitas neste concílio,

vemos claramente, e, por conseguinte reconhecemos por uma Santa Verdade, que,

no Senhor Deus Salvador Jesus Cristo, há uma Divina Trindade, a qual é o Divino a

Quo (de Quem tudo procede) que é chamado o Pai, o Divino Humano que é o Filho,

e o Divino Procedente que é o Espírito Santo." E todos declaram, com aclamação,

que: "Em Jesus Cristo toda a plenitude da Divindade habita corporalmente" (Coloss.

2: 9).

Assim, há um só Deus na Igreja.

Depois que estas coisas tinham sido concluídas nesse magnífico concílio, eles se

levantaram, e o anjo guardador veio da sala do Tesouro e trouxe a cada um dos que

estavam assentados, vestimentas esplêndidas tecidas aqui e ali com fios de ouro, e

disse: "Recebei as Vestimentas Núpcias". E eles foram conduzidos com glória para

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o Novo Céu Cristão, com o qual será conjunta a Igreja do Senhor nas Terras, que é

a Nova Jerusalém, (Apoc. Rev. 963).

ZACHARIAS Cap. 14; 7, 8, 9: "Haverá um dia, que é conhecido de Jehovah; não

será um dia nem uma noite, porque para o tempo da tarde haverá a luz. Sucederá

nesse dia, que águas vivas sairão de Jerusalém. E Jehovah será Rei sobre toda a

terra: Nesse Dia Jehovah será Um e o Nome d'Ele Um".

Fim


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