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[REVISTA CONTEMPORÂNEA DOSSIÊ 1964-2014: 50 ANOS DEPOIS, A CULTURA AUTORITÁRIA EM QUESTÃO] Ano 4, n° 5 | 2014, vol.1 ISSN [2236-4846] 1 1 Sousândrade em 3D Indianismo Romântico, Política Indigenista e Sujeitos Indígenas Ramon Castellano Resumo Neste artigo, tratamos da produção poética de Joaquim de Sousandrade tendo como parâmetro as três dimensões citadas acima. Demonstramos como que, diferentemente das interpretações correntes sobre a obra do poeta maranhense que professaram as tão almejadas antecipações, autonomia e visualização da realidade, a obra poética de Sousândrade estava pautada numa perspectiva muito própria aos intelectuais de meados para fins do século XIX que acabavam por defender a invisibilidade dos indígenas que, pensavam eles, só poderiam ser vistos como fadados à desintegração étnica e social ou à integração no seio do Estado-Nação. Palavras-chave: Sousândrade; Índios; Romantismo; Nação Abstract In this article, we deal with Joaquim de Sousandrade’s poetic production having as a yarostick the three dimensions mentioned above. We demonstrate thus, differently from the currents interpretations of his work which profess the creaty anticipaded, autonomy and visualization of reality, his oeuvre is characterized by a typical perspective from the intelectuais of middle to late nineteenth century, which ended up defending the invisibility of indigenous people who, or so they thought, could only be seen destined to ethnic and social desintegration or to the integration to the Nation-State. Keywords: Sousândrade; Indigenous; Romanticism; Nation-state.

Sousândrade em 3D: Indianismo Romântico, Política Indigenista e

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Ano 4, n° 5 | 2014, vol.1 ISSN [2236-4846]

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Sousândrade em 3D

Indianismo Romântico, Política Indigenista e Sujeitos Indígenas

Ramon Castellano

Resumo

Neste artigo, tratamos da produção poética de Joaquim de Sousandrade tendo como

parâmetro as três dimensões citadas acima. Demonstramos como que, diferentemente das

interpretações correntes sobre a obra do poeta maranhense que professaram as tão

almejadas antecipações, autonomia e visualização da realidade, a obra poética de

Sousândrade estava pautada numa perspectiva muito própria aos intelectuais de meados

para fins do século XIX que acabavam por defender a invisibilidade dos indígenas que,

pensavam eles, só poderiam ser vistos como fadados à desintegração étnica e social ou à

integração no seio do Estado-Nação.

Palavras-chave: Sousândrade; Índios; Romantismo; Nação

Abstract

In this article, we deal with Joaquim de Sousandrade’s poetic production having as a

yarostick the three dimensions mentioned above. We demonstrate thus, differently from

the currents interpretations of his work which profess the creaty anticipaded, autonomy and

visualization of reality, his oeuvre is characterized by a typical perspective from the

intelectuais of middle to late nineteenth century, which ended up defending the invisibility

of indigenous people who, or so they thought, could only be seen destined to ethnic and

social desintegration or to the integration to the Nation-State.

Keywords: Sousândrade; Indigenous; Romanticism; Nation-state.

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Apresentação

Joaquim de Sousandrade nasceu no Maranhão em 1832 e aí faleceu em 1902. Filho

de uma família aristocrática em decadência, o poeta e escritor republicano teve uma vida

atribulada e andou por diferentes paragens, o que não obstou o seu trânsito entre a elite

maranhense da época. Sua principal obra poética, O Guesa1, escrita entre as décadas de 50

e 80, é um épico romântico no qual a temática indígena é tratada de modo crítico, mas não

isenta de certos veios ocidentalizantes próprios da intelectualidade de meados para o fim

do século XIX. Sousândrade ainda escreveu outros poemas e vários artigos jornalísticos,

mas para a finalidade deste estudo só iremos nos utilizar2 do canto elegíaco à República, O

Novo Éden de 1893, e da carta-artigo O Estado dos Índios de 18723.

Antes de elencarmos quais os objetivos da presente análise, cabem algumas

considerações sobre a recepção de sua obra. O Guesa, em especial, teve uma ótima

acolhida entre os pares letrados (temos que ter em mente que o mercado editorial da época

ficava restrito à elite intelectualizada ainda que alguns folhetins nacionais e estrangeiros

fizessem um certo sucesso). Olhando por este prisma, podemos perceber que a obra poética

de Sousândrade seguiu o mesmo caminho da maioria dos seus contemporâneos, sobretudo

daqueles poetas que optaram por escrever épicos, não sendo correto afirmar como alguns

dos intérpretes de sua obra que a sua produção poética ficou totalmente desconhecida em

seu tempo. Depois disso, sua obra permaneceu no limbo por algumas décadas até ser

julgada em 1964 no livro Re Visão de Sousândrade dos irmãos Campos que

desentranharam a obra do poeta maranhense, sobretudo os dois cantos infernais d’O Guesa

(II e X), e erigiram, através de uma concepção vanguardista, o principal estereótipo com o

1 Neste artigo será utilizada a versão atualizada pela professora da UFRJ Luiza Lobo que saiu pela editora

Ponteio em 2012. Neste épico, Sousândrade utilizou o mito de origem pré-colombiano dos Muíscas da

Colômbia. Segundo a tradição, o Guesa era uma vítima fadada ao sacrifício que era oferecida a Bochica, filho

do Deus Sol. Menino educado no templo de Sogamoso, aos quinze anos o jovem percorria o Suna, estrada na

qual, ao final, era entregue aos Xeques (sacerdotes). Segundo os estudos sobre o poema, o poeta maranhense

retirou este mito dos estudos de Ferdinand Denis, estudioso francês precursor do movimento romântico

brasileiro, e da obra do naturalista alemão Alexander von Humboldt. 2 Neste artigo, iremos também utilizar em termos de comparação o estudo Os Selvagens de Couto de

Magalhães, O Guarani de José de Alencar e o poema Deprecação de Gonçalves Dias. 3 O poema O Novo Éden assim como a carta-artigo O Estado dos índios foram reunidos por Frederick G.

Williams e Jomar Moraes no livro Poesia e Prosa Reunidas de Sousândrade em 2003, Edições Academia

Maranhense de Letras.

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qual ficou marcada a obra de Sousândrade, qual seja: a de que sua poesia estava marcada

por antecipamentos, como que fora do seu tempo, à frente dele.

Em contraposição a este estereótipo, o presente artigo tem como principal objetivo

analisar a produção poética de Joaquim de Sousandrade em consonância com as questões

que eram discutidas em seu tempo, para ser mais exato, sobre o lugar do ameríndio na

construção de uma determinada nacionalidade, aí ententida enquanto produção de uma

memória histórica e literária. Em um texto de 2002 que foi reunido posteriormente no livro

Maranhão-Manhattan, Librandi Rocha falou o seguinte sobre o poeta:

Se pensarmos que o poeta não antecipou, mas que percebeu o que era

possível perceber e realizar em seu tempo, isso não lhe tira, ao contrário,

aumenta o mérito de sua sensibilidade poética que foi capaz de configurar

ou capturar o movimento que estava lá em circulação, mas não recebera

ainda sua forma poética correspondente e que portanto a sua concepção e

prática literária estava sintonizada no seu próprio tempo com outras

possibilidades que a historiografia literária unificadora não poderia

registrar, pois seus parâmetros eram outros e Sousândrade escapava

certamente a esses parâmetros (2009, p. 184).

Assim, no presente trabalho, discutiremos a produção poética (O Guesa e O Novo

Éden) do poeta maranhense assim como a sua carta-artigo O Estado dos índios, tendo por

base os três vetores elencados no subtítulo do artigo: Indianismo Romântico, Política

Indigenista e Sujeitos Indígenas. Pretendemos demonstrar como a construção do

pensamento de Sousândrade no contexto de perda de poder simbólico do Reinado de Pedro

II e implantação da República no Brasil se pautou muitas vezes por parâmetros diferentes

dos poetas e escritores que cercavam o imperador, mas que nem por isso estava isento dos

padrões homogeneizadores e hierarquizantes da elite ilustrada que, ao fim e ao cabo,

acabavam por preconizar a invisibilidade dos ameríndios. Para a consecução deste

objetivo, no próximo bloco, vamos fazer uma discussão bibliográfica da obra do poeta,

onde iremos propor questões que servirão como base para a argumentação deste artigo.

Interpretações e propostas de trabalho

A maior parte dos trabalhos sobre a obra e a vida de Sousândrade é proveniente do

universo literário, sejam os estudos ensaísticos ou as teses de mestrado e doutorado. Entre

estes trabalhos podemos visualizar, grosso modo, duas linhas interpretativas: de um lado

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dá-se ênfase ao caráter antecipador da obra do poeta maranhense, alguns chegando a

defender o total apartamento, desterritorialização, de sua produção poética; por outro,

chega-se às limitações impostas por estruturas mentais ou sociais sem, no entanto, serem

devidamente aprofundadas as questões que balizavam a discussão sobre o índio de meados

para o fim do século XIX. Vale lembrar que muitas vezes estes dois caminhos se

interpenetram. Vamos às interpretações e propostas de trabalho.

Depois da retomada pelos irmãos Campos na década de 60, o primeiro trabalho

sobre Sousândrade data de 1976. Fruto de sua tese de doutorado, no livro Sousândrade:

Vida e Obra, o Prof. Frederick Williams4 empreendeu um grande trabalho de pesquisa

onde utilizou entrevistas de pessoas que de algum modo tiveram contato com o poeta.

Embora tenha levantado muitos dados biográficos interessantes, sobretudo sobre a

participação de Sousândrade na campanha republicana assim como sua ação na política

maranhense depois da queda da monarquia, muitas vezes o tom laudatório prepondera e o

autor parece querer mais elencar fatos dignos de memória do que empreender uma análise

crítica. Nesse passo, outro estereótipo foi erigido, qual seja: a dicotomia entre o idealismo

romântico e o suposto realismo avant la lettre presente na poética de Joaquim de

Sousandrade.

Aqui cabe abrir um parêntese. Não duvidamos que o poeta maranhense tenha

ressignificado e pensado o ameríndio no seu poema épico O Guesa dentro de outros

parâmetros, republicano e humanitário. Isso é fato e iremos esmiuçar este dado mais à

frente. No entanto, é muito simplista ver aí somente uma dicotomia. As discussões acerca

do tratamento adequado dado aos índios eram complexas e muitos outros intelectuais

também preconizaram um viés humanitário nesse quesito; as críticas feitas à colonização

enquanto fator deletério para as comunidades indígenas não eram totalmente novas; e o

pensamento do poeta maranhense não estava isento do que a historiadora Mónica Quijada5

(2000) chamou de “sistema de integração hierarquizada”.

4 Frederick Williams, norte-americano especialista em estudos luso-brasileiros, ainda publicou em 2003 o

livro Poesia e Prosa Reunidas de Sousândrade, importante fonte de pesquisa deste trabalho. Este livro foi

organizado pelo historiador maranhense Jomar Moraes e contém farto manancial para pesquisa, pois há nele

toda a produção de Sousândrade voltada para imprensa. 5 No livro Homogeneidad y Nación (2000), a historiadora latinoamericanista analisou o processo de

construção da nação argentina em fins do século XIX. No segundo capítulo, ao falar da problemática do

tratamento dado à diversidade étnica em solo portenho, a autora defendeu a ideia de que essa construção se

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Passemos agora aos estudos da professora da Universidade Federal do Rio de

Janeiro (UFRJ) Luiza Lobo, grande pesquisadora da obra do poeta. Não vamos aqui entrar

na discussão acerca das interpretações que a autora faz dos elementos estruturais

constitutivos do épico O Guesa. No livro Tradição e Ruptura: O Guesa de Sousândrade de

1979, não há qualquer tipo de aprofundamento das questões aqui propostas. Muito pelo

contrário, assim como nos artigos reunidos no livro Crítica sem Juízo de 1993, o

estereótipo da antecipação é reforçado ainda que a autora também cite os limites dessas

transgressões no que diz respeito à estética romântica. Num desses artigos, A Poética de

Gonçalves Dias e de Sousândrade, Lobo chega a aventar a ideia de uma possível

autonomia literária conquistada por Sousândrade, defendendo, inclusive, que o poeta teria

abandonado a temática nacional, diríamos, nacionalista. Vamos ao último parágrafo deste

texto:

Foi talvez Sousândrade o primeiro poeta brasileiro a conseguir a

verdadeira autonomia literária na poética brasileira, exatamente quando

se desligou da ideia de nacionalismo e, incorporando tradições

românticas europeias, sul-americanas e norte-americanas, buscou

enfatizar antes o espírito do narrador que a descrição do narrado.

Portanto, para e se quisermos captar o verdadeiro espírito revolucionário

do Romantismo brasileiro autônomo, é em Sousândrade e não em

Gonçalves Dias que encontraremos este protótipo, assim como é em

Machado e não em Alencar. E pouco importam os desequilíbrios de seu

estilo (p. 145).

Antecipação, visualização da realidade em contraposição à estética romântica e

autonomia. É preciso trazer algumas questões à baila antes de continuarmos a análise da

obra de Lobo. No livro Vanguardas em Retrocesso, Miceli alcunha este tipo de

interpretação de “literatura de exaltação” que tenta “apagar as constrições sociais de sua

trajetória” (2012, p. 45). Perguntamos: até que ponto um sujeito que atuou ferrenhamente

na propaganda republicana na imprensa, que foi prefeito da cidade de São Luís, que

presidiu a comissão que redigiu a Constituição do Estado do Maranhão, pode ser

considerado apartado de determinadas estruturas sociais? Não se trata aqui de um simples

produziu a partir do princípio de inferiorização através do qual procurava-se legitimar ideologicamente o

projeto de integração do Estado-Nação. Cabe ressaltar, como muito bem demonstrou a autora, que este

Estado Nacional era visto pela intelectualidade argentina como essencialmente branco, criando-se, por

conseguinte, a invisibilidade das outros componentes étnicos, sobretudo das comunidades indígenas, dos

negros e dos mestiços, que deveriam ocupar, quando muito, um lugar inferior na escala hierárquica dessa

Nação pretensamente coesa.

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reducionismo sociológico, apenas pensamos não ser possível separar a vivência do poeta

de sua produção poética. Entretanto, nos livros posteriores que tratou da obra de

Sousândrade, Épica e Modernidade em Sousândrade (2005) e a edição atualizada d’O

Guesa (2012), Lobo reviu alguns destes pontos, classificando o poeta de patriótico.

No livro Épica e Modernidade, a autora traz dados sobre a tradição épica,

esmiuçando O Guesa e discutindo suas possíveis fontes de inspiração. Somando-se a isso,

faz uma comparação entre a épica romântica europeia e a engendrada no Brasil, assim

como analisa as partes tragicômicas do poema sem deixar de citar a herança romântica

nestes fragmentos. Porém, a conclusão já aparece dada no primeiro capítulo, e, como um

fado insistentemente tocado, descamba para a antecipação modernista tão preconizada em

interpretações anteriores. É assim que Sousândrade aparece como “rebelde e marginal às

instituições políticas”6, errando pelo mundo, sem trabalhar e criar vínculos sólidos, um

bólide solto no espaço, enfim7.

Na introdução da edição atualizada d’O Guesa, trabalho de fôlego da autora,

também aparecem alguns problemas para o presente artigo. Ainda na esteira da inovação,

Lobo classifica o épico como “híbrido, mesclado e multicultural”, sem fazer nenhuma

análise mais acurada destas supostas qualidades. Nesse compasso, Alfredo Bosi disse que

Sousândrade escreveu um “poema inspirado na utopia de uma América Latina

multirracial” (2012, p. 54). Antes de continuarmos nossa discussão, é preciso fazer uma

parada para que não coloquemos “o carro na frente dos bois”, incorrendo assim em falso

anacronismo. Em nosso entendimento, esses autores tentam dar à obra de Sousândrade um

6 Em relação a essa marginalidade, podemos relativizá-la já que, se Sousândrade não pertencia ao grupo que

cercava o imperador, não deixou, no entanto, de fazer parte da elite maranhense, onde gozava de grande

prestígio social. 7 Em alguns casos, essa autonomia é levada ao exagero. Por exemplo, na dissertação de mestrado

Sousândrade-Guesa em “O Inferno de Wall Street”: poéticas políticas (2008), Ana C. Cernicchiaro assume a

perspectiva que vê o poeta como excluído, miserável, deslocado, onde se torna impossível qualquer tipo de

representação. Neste texto, Cernicchiaro dá ênfase à linguagem e analisa somente os dois cantos infernais

d’O Guesa. Não questionamos aqui o fato de Sousândrade ter sido inovador na questão do léxico e até de

algumas temáticas. Certamente, nos dois cantos infernais, O Tatuturema e o Inferno de Wall Street, o poeta

rompeu com o cânone literário da época no que diz respeito à violência linguística aí presente. No entanto,

estes cantos representam uma pequena parte da obra poética do maranhense, sendo arriscado tomar esta parte

pelo todo.

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caráter que foge à realidade e ao contexto no qual o poeta viveu8. Não queremos dizer com

isso que Joaquim de Sousandrade foi mero reprodutor das estruturas sociais, mentais e

políticas de seu tempo. Não é isso. No entanto, se o poeta pôde elaborar uma visão muito

própria das questões que foram discutidas na sociedade do seu tempo, é por que ele estava

imerso neste contexto, elaborando as suas ideias poéticas e políticas a partir de sua

vivência e das problemáticas que lá estavam em circulação.

Desse modo, passemos ao livro A Visão do Ameríndio na Obra de Sousândrade

(2004) do estudioso italiano Claudio Cuccagna, último deste rosário que já vai longe, o

qual possui superficialmente pontos de contato com a nossa análise. Cuccagna, diferente

das interpretações citadas anteriormente, foi capaz de captar a historicidade da obra e da

vivência do poeta maranhense, indicando as limitações do pensamento do intelectual no

que diz respeito à questão indígena. Porém, os termos em que discutiu o Indianismo

Romântico, a Política Indigenista e os Sujeitos Indígenas são bem diferentes da proposta

do presente trabalho.

No que diz respeito ao Indianismo Romântico, o autor parece explorar a fácil

dicotomia entre o que chama de idealismo dos precursores românticos e o suposto realismo

presente na obra poética de Sousândrade. É assim que opõe a obra do poeta ao do seu

conterrâneo Gonçalves Dias. Ora, se há uma oposição aí, ela não pode ser vista em relação

ao tratamento dado à colonização, tendo em vista que Gonçalves Dias criticou acerbamente

a política colonizadora portuguesa. Nas palavras de Treece:

Gonçalves Dias escreveu algumas das denúncias mais apaixonadas da

escravidão negra e do genocídio dos índios, e vinculou a elas uma

acusação cáustica da marginalização social sob o Império. Mas ele

jamais contestou a mitologia nacionalista integracionista da qual

dependia a continuidade do status quo imperial (2008, p. 150).

Denunciando a empresa colonizadora, no poema Deprecação, Gonçalves Dias assim

cantou:

Tupã, ó Deus grande! Cobriste o teu rosto

Com denso velâmen de penas gentis;

E jazem teus filhos clamando vingança

8 Sousândrade, assim como José de Alencar, Gonçalves Dias e outros intelectuais do período, vai pensar sim

a sociedade em termos híbridos. No entanto, está constatação não pode ser levada tão longe, pois este

hibridismo era pensado dentro de uma lógica hierarquizante.

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Dos bens que lhes deste da perda infeliz!

Tupã, ó Deus grande! Teu rosto descobre:

Bastante sofremos com tua vingança!

Já lágrimas tristes choraram teus filhos,

Teus filhos que choram tão grande mudança.

Anhangá impiedoso nos trouxe de longe

Os homens que o raio manejam cruentos

Que vivem sem pátria, que vagam sem tino

Trás do ouro correndo, voraces, sedentos.

(Deprecação, Gonçalves Dias)

Ou seja, ambos os maranhenses viram a empresa colonizadora de modo crítico, mas só

Sousândrade foi capaz de relacioná-la a uma propaganda antimonárquica. Parece que a

interpretação do estudioso italiano carece de contextualização mais aprofundada, e, como

mostraremos mais à frente, é só a partir da década de 60 que o Reinado de Pedro II começa

a sofrer críticas mais contundentes em várias frentes. Assim foi que Sousândrade, imerso

neste novo contexto, ressignificou o ameríndio para fins republicanos e denunciou a

política indigenista levada a cabo pelo Estado Imperial.

Em relação à Política Indigenista, ainda pautado numa trama de oposições,

Cuccagna ressalta o viés humanitário presente na obra de Joaquim de Sousandrade e o seu

componente realístico. Para o autor, Sousândrade inovou ao trabalhar no Canto II d’O

Guesa com o índio amazônico contemporâneo. Sobre o tratamento estético dado ao

ameríndio “decrépito” visto pelo poeta em sua viagem fluvial amazônica (1858-1860),

assim diz:

Nenhum outro indianista brasileiro, e em primeiro lugar Gonçalves Dias

– que, mesmo, mais do que todos, em seguida à sua nomeação de chefe

da seção de Etnografia da Comissão Científica de Exploração (1856-

1862), conheceu o análogo estado de crise do mundo indígena -,

denunciou essa situação em criação literária permeada por um forte

realismo como, ao contrário, soube fazer Sousândrade no Canto II da sua

obra-prima. No âmbito da literatura indianista brasileira da segunda

metade do século XIX, a operação desenvolvida por Sousândrade assume

um caráter decididamente único (2004, p. 127).

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Ou seja, Cuccagna9 opõe o índio mestiço e degradado d’O Guesa ao seu oponente ideal,

guerreiro e brioso, o ameríndio do passado exaltado pelos poetas românticos10. Porém, é

preciso destacar que nas discussões científicas, intelectuais e políticas de meados para o

fim do século XIX, muitas vezes classificar os índios como mestiços e degradados (isto é,

negar a sua identidade) foi como que uma desculpa que tinha por fim legitimar ações

pedagógicas e colonizadoras. Tais classificações só conseguiam visualizar os ameríndios

contemporâneos como vítimas redimíveis, selvagens a quem era preciso levar progresso e

civilização. Daí perguntamos: até que ponto o personagem Guesa, fadado que estava à

imolação, estava pautado neste pensamento que só conseguia enxergar os índios como

vítimas? Havia uma relação de aproximação ou distanciamento entre as criações e as ideias

políticas de Sousândrade e a realidade dos Sujeitos Indígenas com suas demandas e ações?

Pensamos que trabalhar a relação entre Sousândrade, intelectual e poeta, e os

sujeitos indígenas traz a profundidade necessária ao nosso trabalho. Uma vez que já não é

possível pensar o indianismo romântico e a política indigenista sem levar em consideração

a ação destes agentes históricos, propomos, em vez das oposições binárias e das

antecipações e hibridismos almejados, uma análise que abarque “um tangenciamento de

diferentes planos, um encontro em que a tênue junção não elimina necessariamente a

diversidade de perspectivas” (OLIVEIRA, 1999, p. 23). Desse modo, pretendemos mostrar

no próximo bloco como Joaquim de Sousandrade foi capaz de construir uma visão muito

9 Como já tínhamos mencionado antes, Cuccagna apontou as limitações do pensamento integracionista do

poeta maranhense, indicando em que termos o mesmo tinha sido desenvolvido. No entanto, ao tratar da

relação entre um intelectual pautado por uma ideal ocidental e as comunidades indígenas, o autor só

conseguiu interpretá-la enquanto desconsideração por parte do poeta em relação a uma total autonomia

cultural autóctone, quando na verdade esta situação ainda nem estava posta. Não nos interessa discutir aqui

esta questão nestes termos, mas sim perceber como que os sujeitos indígenas foram capazes de agir e se

posicionar dentro desta situação específica de implementação do Regulamento das Missões e Catequese

(1845) e da legislação correlata que postulava, grosso modo, a “igualdade”, e “oferecia” o estatuto de cidadão

àqueles ameríndios que se encontravam, pelo menos assim pensavam os políticos e intelectuais da época

(inclusive Sousândrade), desintegrados do seu mundo cultural e dispersos pelas vilas e freguesias, isto é,

desprovidos de suas identidades étnicas. 10 Temos que indicar aqui que Cuccagna não deixou de apontar que o épico O Guesa abarcava em si uma

tensão contraditória. Embora dê mais ênfase ao caráter “realista” e às questões críticas do poema, o autor

assinalou muito bem que em várias partes do épico a idealização do índio se faz presente. Como mostrou o

estudioso italiano, mesmo no Tatuturema o poeta oscilou entre os pólos do bom selvagem e inocente do

passado e o ameríndio degradado contemporâneo. O que nos parece estranho é que Cuccagna não tenha saído

dos próprios termos em que essa polarização foi construída, repetindo assim em sua interpretação a

construção poética do poeta maranhense.

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peculiar sobre as questões indígenas que estavam sendo discutidas em seu tempo, ora se

aproximando, ora se distanciando da lógica romântica, mas sempre tendo por base o veio

integrativo que ao fim acabava por preconizar o apagamento dos sujeitos indígenas dentro

de uma certa concepção de Estado-Nação muito própria aos intelectuais de meados para o

fim do século XIX. Vejamos as três dimensões que compõem este trabalho.

Joaquim de Sousândrade e o Indianismo Romântico

Nicolau Sevcenko, no livro Literatura como missão, incluiu o romantismo num

tempo inelástico, estanque. Dando-lhe a palavra:

O romantismo representou bem um modelo de sociedade estável,

mantida sob um sistema homogêneo de autoridade, como o do Segundo

Reinado no Brasil. Supunha por isso, um sistema de valores e uma

perspectiva de contemplação social privilegiada e também exclusiva, que

é que se orienta do topo em direção à base da pirâmide (2003, p. 275).

Esta passagem do autor surge como um incômodo para os fins deste artigo. O plano

de construção do Estado moderno brasileiro no século XIX se assentou em bases

contraditórias. A partir da década de 60, o Segundo Reinado começou a perder

legitimidade junto às classes que o sustentavam. Desde o final da década anterior, viera à

tona a instabilidade no que se convencionou chamar período de conciliação11. Época da

expansão cafeeira, esse foi um período de intensas lutas pela apropriação de terras, aí

envolvidas as comunidades indígenas, assim como foram intensas as insurreições negras e

as lutas entre os setores dominantes do Estado Imperial. Na década de 70, após a Guerra do

Paraguai, o Reinado de Pedro II estava profundamente debilitado. Desse período em

diante, dois movimentos importantes ganharam força: o abolicionista e o republicano.

Assim como o movimento republicano não foi mero reflexo de uma classe senhorial

ressentida, mas também fruto de anseios democráticos, a aprovação da lei de 28 de

setembro de 1871 não pode ser interpretada como uma dádiva, mas sim como

desdobramento de uma “crise social e de debates políticos intensos” (CHALHOUB, 2003,

p. 19).

11 Para esse recorte temporal como marco do fim do período da política de conciliação perpetrada pelo

Império, utilizaremos a interpretação de Sérgio Buarque de Holanda. No seu livro póstumo Capítulos de

história do Império, o autor aponta que já no final da década de 50 estariam se acumulando desajustes

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De mais a mais, outras questões se relacionavam a esse momento em que o

consenso político em torno do Segundo Reinado começava a se desmanchar. Na América

Latina, as turbulentas repúblicas ainda significavam fragmentação política, ideológica e

territorial; na América do Norte, a Guerra de Secessão descortinava o problema da

escravidão em relação ao progresso industrial e à ideia de civilização; além disso, havia

pressões externas pelo fim da escravidão e o haitianismo ainda pairava como espectro a

assombrar a elite política da Corte; na Europa, revoluções liberais questionavam o poder

dos governos autocráticos. No entanto, nem tudo eram bolores: como salientou Alencastro,

“o estabelecimento do Segundo Reinado na França (1852-70) deu ao Segundo Reinado um

novo tom de modernidade e confirmou o francesismo das elites brasileiras” (1997, p.43).

Desse modo, neste espaço permeável, dado a continuidades e rupturas, forjaram-se

novas concepções de se pensar a nação. No bojo deste processo particular, novas ideias

foram ganhando corpo, e a contraditória modernidade em que se assentou a construção do

Estado Imperial brasileiro no Oitocentos foi perdendo paulatinamente a legitimidade que

antes gozara. O Indianismo Romântico, antes um importante suporte simbólico da

Monarquia, se voltou contra ela dentro deste processo que culminou na queda do Império

em 1889. Como afirmou Treece: “O final do Império produziu , pois, um breve eco do

Indianismo trágico e ultrajado dos primeiros românticos, na medida em que abolicionistas

e republicanos lutaram para romper com a herança colonial que o Império havia

preservado” (2008, p. 16).

Porém, é preciso voltarmos um pouco no tempo. Depois das duas primeiras décadas

que seguiram o processo de independência e da consolidação problemática do Estado

moderno no Brasil, forjou-se um programa sistemático de construção identitária que visava

à conquista de autonomia cultural em relação à antiga metrópole. Encabeçada por uma elite

ilustrada interiorizada na província fluminense, na Corte, esse plano de autonomização foi

complexo e contraditório. Se por um lado proclamava as particularidades locais, por outro,

almejava estar a par da civilização europeia. Somando-se a isso, tendo em vista o caráter

que assumiu o processo de independência no país, a rejeição ao legado colonial, pelo

partidários e políticos antes dissimulados pelo esforço conciliatório centralizado na figura política de D.

Pedro II (2010).

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menos a princípio, foi bem pequena, principalmente quando comparada aos outros países

latino-americanos.

Dentro dessa diretriz de conformação identitária, o Instituto Histórico e Geográfico

Brasileiro (IHGB) ocupou lugar de destaque, importante centro de debate das questões

nacionais. Fundado em 1838, seus membros faziam parte da elite literária e política

fluminense. Propulsora do projeto cultural oficial, palaciano, a instituição se pautou, grosso

modo, pela tradição iluminista, no ideal de civilização e progresso. A partir da década de

50 se tornou polo ativo de discussão do conhecimento, recendendo ares de cientificidade.

Foi também a partir desse momento que D. Pedro II passou a participar ativamente do

instituto e da vida política e cultural do país. Nas palavras de Schwarcz:

Dessa data em diante, o Instituto Histórico funcionará como uma espécie

de porto seguro, um estabelecimento oficial para as experiências do

jovem monarca, crescentemente empenhado em imprimir um ‘nítido

caráter brasileiro’ à nossa cultura. A participação do imperador não era,

portanto, a partir dos anos 50, apenas financeira (1998, p. 127).

Atrelado a essa trama em torno da afirmação de uma cultura autônoma e de

constituição de uma memória nacional estava o romantismo. Esse “movimento” congregou

poetas, dramaturgos, historiadores, publicistas e romancistas. Importante instrumento de

positivação da jovem nação, através da estética romântica, fatos históricos foram narrados,

mitos e lendas, criados. A maioria dos membros do grupo, pelo menos até a década de 60,

pertencia ao IHGB e aos altos escalões do governo imperial, o que endossa o seu caráter

oficial (GUIMARÃES, 1998).

Dentro desse contexto de criação de uma literatura independente e de uma memória

e história nacionais, foram ressaltadas as particularidades locais, a fauna e a flora, a

natureza brasílica. Nesse quadro, o índio ocupou lugar de destaque. Para Afrânio Coutinho,

“o nacionalismo romântico assumiu um caráter muito próprio no Brasil, sob a forma do

indianismo” (2002, p. 24). O índio assumiu assim um importante papel nessa comunidade

imaginada. Presente na iconografia oficial e nos rituais do Império, se no Instituto

Histórico ele foi incluído na história oficial que se forjou, na literatura romântica o

ameríndio foi elevado ao patamar de mito nacional, de herói fundador da nação. No

entanto, a literatura nacional exaltou o índio extinto ao passo que o contemporâneo foi

visto como degradado e decadente. Segundo Carneiro da Cunha: “Até por uma questão de

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orgulho nacional, a humanidade dos índios era afirmada oficialmente, mas privadamente

ou para uso interno do país, a ideia de bestialidade, de fereza, de animalidade dos índios,

era comumente expressa” (1992, p. 134).

Assim, o Indianismo Romântico desenvolvido no momento de consolidação do

Reinado de D. Pedro II tomou um viés preponderantemente conservador. Dentro da

política de consenso das primeiras décadas do Segundo Reinado, exaltou o índio guerreiro

aliado dos portugueses, capaz do auto-sacrifício em nome do colonizador. Nesse caminho,

estavam as obras de José de Alencar e Gonçalves de Magalhães, sendo que este teve o seu

épico A Confederação dos Tamoios patrocinado pelo imperador. Vejamos um trecho de O

Guarani do romancista José de Alencar:

O fidalgo não sabia mais o que admirar, se a força do heroísmo com que

ele salvara a sua filha, se o milagre de agilidade com que se livrara a si

próprio da morte.

Quanto ao sentimento que ditara esse proceder, D. Antônio se admirava;

conhecia o caráter dos nossos selvagens, tão injustamente caluniados

pelos historiadores; sabia que fora da guerra e da vingança eram

generosos, capazes de uma ação grande, e de um estímulo nobre.

Por muito tempo reinou silêncio expressivo nesse grupo, que se acabava

de transformar de modo tão imprevisto.

D. Lauriana e Isabel de joelhos oravam a Deus, rendendo-lhe graças;

Cecília ainda assustada apoiava-se ao peito de seu pai e beijava-lhe a

mão com ternura; o índio humilde e submisso fitava um olhar profundo

de admiração sobre a moça que tinha salvado (1857, p. 102).

Nesse romance de 1857, a história gira em torno da família do fidalgo D. Antônio

de Mariz. Peri, o invencível goytacaz, nega a própria identidade étnica em defesa da

branca e bela Ceci. Ficam muito claras aí as intenções de Alencar ao qualificar o índio

como guerreiro que “também voluntária e lealmente empregava seus poderes especiais a

serviço da comunidade colonial e contra aquelas forças internas e externas que ameaçavam

a sua sobrevivência” (TREECE, 2008, p. 213). Para o romancista, Peri representava o

escravo ideal capaz do sacrifício em nome da lógica de dominação senhorial que

sustentava a contraditória modernidade em que assentou o Segundo Reinado no Brasil12.

12 No entanto, a construção do obra do romancista sofreu mudanças no decorrer do tempo. Por exemplo, os

livros O Tronco do Ipê e Til já não representavam mais o mito da conciliação. Escritos no início da década de

70, “quando as bases políticas e econômicas da ordem imperial estavam sendo seriamente abaladas”

(TREECE, 2008, p. 282), nestes romances os personagens principais já não eram mais o modelo ideal tal

qual Peri, mas antes eram figuras degeneradas e destrutivas que deixavam à mostra as contradições do

domínio senhorial e da sociedade aristocrática.

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No entanto, ainda que sem questionar a legitimidade do regime monárquico, vozes

dissonantes como a de Gonçalves Dias denunciaram o processo colonizador, enquanto

violento e desleal, e fizeram uma defesa humanitária do índio. Nas décadas seguintes, mais

independentes da órbita em que giravam os asseclas do Estado Imperial, escritores e poetas

parodiaram, satirizaram e criticaram de modo ácido o Reinado de Pedro II e seu projeto de

nação.

Pode-se inferir daí que essa elaboração cultural e política da Nação não foi estática.

Se durante as décadas de 40 e 50 gozou de uma aparente estabilidade, a partir da década de

60, com o amadurecimento de uma classe intelectual menos atrelada aos ditames

palacianos (inclusive nas províncias mais afastadas da Corte) e com a gradativa perda de

poder simbólico do Segundo Reinado, surgiram grupos menos dependentes do Estado

monárquico sediado na Corte e de suas instituições, e, por isso mesmo, mais críticos.

Segundo Treece:

É quase como se, ao revisitar mais uma vez a história genocida dos anos

coloniais, esta última geração estivesse, à sua própria maneira,

desmascarando o idealismo conservador da mitologia alencariana de

Conciliação que ajudara a sustentar a auto-imagem e legitimidade do

Império (2008, p. 292).

O Guesa foi elaborado entre as décadas de 50 e 80. Durante este período,

Sousândrade andou por diferentes países. Entre 1854 e 1856, andou pelo continente

europeu, tendo estudado engenharia na Sourbone em Paris. No final da década de 50, fez

uma viagem pelo rio Amazonas. Em 1871, partiu junto de sua filha para Nova Iorque,

retornando ao Brasil em 1878, de onde saiu para visitar a América Hispânica (Peru e

Chile). Depois desta viagem, o poeta retornou aos Estados Unidos, onde trabalhou como

redator do periódico de linha positivista O Novo Mundo até 188513. O Guesa, obra de nítido

caráter biográfico, representou um importante ataque simbólico à Monarquia. A estética

romântica, antes um veículo utilizado para a consolidação da imagem do Império, foi

13 A maior parte dos estudos sobre a obra do poeta maranhense credita a esta “errância” pelo mundo as

antecipações tão almejadas em suas obras. Entendemos não ser este o centro da questão. Fosse assim,

Gonçalves de Magalhães (epígono dos poetas que cercavam Pedro II), que também viajou pelo mundo

inteiro, teria criado uma obra excepcional, o que não foi o caso segundo os próprios críticos que o opõe a

Sousândrade. Pensamos que esses dados biográficos são de suma importância já que certamente

influenciaram a visão que poeta tinha das questões de seu tempo, a composição de sua obra. Porém, enxergar

aí mera conexão de causa (périplo) e consequência (antecipações) nos parece demasiado simplista.

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usada para criticá-lo. Sousândrade se valeu do principal aporte da invenção simbólica da

nação, o índio, para atacar o Reinado de Pedro II e sua Política Indigenista. Através da

sátira, do antidiscurso, da quebra da convenção romântica, em alguns fragmentos do

poema, o poeta maranhense inverteu o signo do indianismo, instrumentalizando o

ameríndio para fins republicanos. Vamos a uns trechos do Canto II do poema, o qual ficou

conhecido como Tatuturema, uma espécie de ritual ameríndio corrompido onde aparecem

diversas personalidades, inclusive, o imperador:

(Ministro português vendendo títulos de honra a brasileiros que não têm:)

- Quem de coito danado

Não dirá que vens tu?

Moeda falsa és, esturro

Caturro,

D’excelência tatu!

(Moral educação prática:)

- A mulher, é Jovita;

O homem, Bennettetão:

Oh! Faz Hudson-manbusiness,

Freeloves;

Amazonas, Poltrão!

(CUNHAMBEBE rugindo:)

- Missionário barbado

Que vens lá da missão,

Tu não vais à taberna,

Que interna

Tens-na em teu coração!

(2o Patriarca:)

- Brônzeo está no cavalo

Pedro, que é fundador;

Ê! ê! ê! Tiradentes,

Sem dentes,

Não tem onde se pôr!

(O GUESA, rodando:)

- Eu nasci no deserto,

Sob o sol do equador;

As saudades do mundo,

Do mundo...

Diabos levem tal dor!

Das guardas nacionais os comandantes,

O nobre escravocrata, que é barão,

Os poetas do amor, mimos de amantes,

Ali rendiam preitos à função.

(O Guesa, Sousândrade)

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Nestes versos, satirizando a figura do imperador, dos missionários e, por

conseguinte, da política indigenista imperial, Sousândrade alterou o estado adocicado em

que pairavam os arautos do Segundo Reinado. Ao jogar com a sátira e a crítica, o poeta

maranhense atomizou a estética romântica. No entanto, pensamos não ser possível afirmar

que o poeta tenha adotado uma postura simplesmente antirromântica, realista. Em nosso

entendimento, O Guesa é essencialmente romântico, representando os dois fragmentos

infernais apenas uma ínfima parte do poema. E mais: Sousândrade viveu, diferentemente

de muitos poetas românticos, setenta anos e atravessou um período de grandes mudanças

culturais, sociais e políticas, e, como dissemos um pouco atrás, O Guesa foi escrito e

reescrito entre as décadas de 50 e 80, ou seja, sofreu inúmeras modificações.

No que diz respeito ao tratamento poético dado ao índio neste épico, entendemos

que Sousândrade inovou sim ao trabalhar com o índio contemporâneo, mas o fez dentro

dos parâmetros da estética romântica e dos padrões hierarquizantes da época que só

conseguiam ver o ameríndio ou como o guerreiro ideal do passado ou como vítima passiva

dentro dos processos de integração e colonização. Vejamos ainda alguns versos do Canto II

que antecedem a entrada no ritual indígena degradado:

Oh! doce enlevo! oh! bem-aventurança!

Paradíseas manhãs! riso dos céus!

Inocência do amor e da esperança

Da natureza estremecida em Deus!

Mas, o egoísmo, a indiferença, estendem

As eras do gentio; e dos passados

Perdendo a origem cara estes coitados,

Restos de um mundo, os dias tristes rendem.

Quanta degradação! Razão tiveram

Vendo, os filhos de Roma, todos bárbaros

Os que na pátria os olhos não ergueram,

Nem marcharam à sombra dos seus lábaros.

Mas, que danças! não são mais as da guerra,

Sacras danças dos fortes, rodeando

A fogueira que estala e a, que inda aterra,

Vitória os hinos triunfais cantando:

Selvagens – mas tão belos, que se sente

Um bárbaro prazer nessa memória

Dos grandes tempos, recordando a história

Dos formosos guerreiros reluzentes:

Vão e vêm os caboclos vagabundos,

Bêbados riem-se diante das fogueiras

Ou balançam-se em lúbricas maqueiras,

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Nestes odores podres-nauseabundos.

(O Guesa, Sousândrade)

Ficam patentes nestes versos muitas questões próprias da estética romântica, quais sejam: a

exaltação da natureza, o seu estado idílico, o índio do passado num estado de puro éden e o

índio contemporâneo como um fóssil vivo. Para que não pareça exagerada a nossa

afirmação, vamos a um trecho do poema de Gonçalves Dias chamado Deprecação:

E a terra em que pisam, e os campos e os rios

Que assaltam, são nossos; tu és nosso Deus:

Por que lhes concedes tão alta pujança,

Se os raios da morte, que vibram, são teus?

Teus filhos valentes, temidos na guerra,

No albor da manhã quão fortes os vi!

A morte pousava nas plumas da frecha,

No gume da maça, no arco tupi!

E hoje em que apenas a enchente do rio

Cem vezes hei visto crescer e baixar...

Já restam bem poucos dos teus, qu’inda possam

Dos seus, que já dormem, os ossos levar.

(Deprecação, Gonçalves Dias)

Portanto, no que tange ao Indianismo Romântico, pensamos não ser possível

visualizar n’O Guesa de Sousândrade um realismo avant la lettre como muitos dos seus

intérpretes defenderam. Não queremos dizer com isso que o poeta maranhense não tenha

inovado ao trazer para o seu épico indianista o índio contemporâneo, o ideal republicano e

democrático e inovações linguísticas. Em nosso entendimento, Joaquim de Sousandrade foi

capaz de elaborar uma visão muito peculiar em sua composição poética. Criada num

momento histórico minado por graves contradições, a utopia nela intrínseca de uma

democracia republicana e cristã pautada nas noções de civilização e progresso certamente

abarcou uma tensão interna muito própria aos intelectuais de meados para fins do século

XIX que não conseguiam se desvencilhar de seu arcabouço teórico ocidental e que ao fim

acabavam por defender a invisibilidade dos Sujeitos Indígenas. Vamos, utilizando os

conceitos de civilização e progresso, à segunda dimensão que compõe este artigo.

Política Indigenista, O Guesa e O Estado dos Índios

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A questão da humanidade dos índios e de sua capacidade para a

civilização não era, conforme se poderia imaginar, puramente teórica:

tinha implicações para a política indigenista, e singularmente sobre se se

deviam exterminar sumariamente os índios ou se se os devia atrair,

educar e tentar incluir na sociedade civil (CUNHA, 1992, p. 6).

A política indigenista imperial pode ser entendida nesse contexto de construção de

uma determinada nacionalidade como um meio pelo qual era possível redimir e integrar os

Sujeitos Indígenas no Estado-Nação, pelo menos assim afirmaram muitos intelectuais e

políticos da época. Pensamos ser interessante olharmos para o desenvolvimento um tanto

cambaleante da política assimilacionista que remonta à segunda metade do século XVIII.

Ancorada no pensamento ilustrado, a ideologia que embasou tal política “baseava-se nos

valores europeus de civilização e progresso” (ALMEIDA, 2007, p. 199). O Diretório dos

Índios, política pombalina que tinha como principal objetivo integrar os indígenas à

sociedade colonial, transformá-los em súditos da Coroa, incentivou a miscigenação dos

ameríndios com os demais atores da sociedade colonial, tentou coibir o abandono de

costumes tidos como não-civilizados e tornou a utilização da língua portuguesa

obrigatória. Dentro do contexto da política de centralização do Império português, esta

diretriz apontou, grosso modo, para a tentativa de associação das populações indígenas à

administração colonial.

No início do século XIX, D. João VI, sob o eufemismo de guerra justa,

desencadeou uma ofensiva violenta contra os botocudos (termo genérico). Mas em 1823,

influenciado pelo pensamento ilustrado pombalino, José Bonifácio em Apontamentos para

a civilização dos índios bravos, projeto apresentado à Assembleia Constituinte, retornou

aos termos em que foram discutidas as questões sobre as populações indígenas em meados

do século XVIII. Para o intelectual, o Estado recém-independente deveria pois:

(...) imitar, e aperfeiçoar os métodos de que usaram os jesuítas. Eles por

meio de brandura, e benefícios aldearam infinidade de índios bravos, e o

que mais é, até os governadores de Goiás imitando-os, fizeram o nossos

amigos os acroás, os javoés, os indômitos caiapós, e os cruéis xavantes. E

como conseguiram? Dando liberdade aos prisioneiros, vestindo-os, e

persuadindo-lhes a que viessem viver debaixo das santas leis do

envangelho. Apesar de sua barbaridade, reconheceram eles os obséquios

feitos, e não foram insensíveis às atenções com que os tratavam os

grandes caciques dos brancos, como eles chamavam aqueles generais (In

DOLHNIKOFF, 1998, p. 101).

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Porém, este projeto acabou derrotado, e, após a abdicação de D. Pedro I em 1831, o

Ato Adicional de 1834, na esteira da descentralização política, delegou às Assembleias

Legislativas Provinciais o poder de legislar sobre a catequese e civilização das

comunidades indígenas. Nesse passo, não foram poucas as províncias que optaram por

políticas antiindígenas, com a utilização de métodos violentos e desumanos (CUNHA,

1992). Só em 1845, com a promulgação do Decreto n. 426, o qual continha o Regulamento

acerca das Missões de Catequese e Civilização dos Índios, foi que o Império passou a ter

uma legislação de âmbito nacional. Neste decreto, pode-se visualizar o retorno ao

tratamento humano dispensado aos índios com fins estritamente utilitários. Vejamos dois

parágrafos do primeiro artigo da lei:

§ 19. Empregar todos os meios lícitos, brandos, e suaves, para atrair

índios às Aldeias; e promover casamentos entre os mesmos, e entre eles,

e pessoas de outra raça.

§ 20. Esmerar-se em que lhes sejam explicadas as máximas da Religião

Católica, e ensinada a Doutrina Cristã, sem que se empregue nunca a

força, e violência; e em que não sejam os pais violentados a fazer batizar

seus filhos, convido atrai-los à Religião por meios brandos, e suasórios

(In CUNHA, 1992, p. 193).

De acordo com estes parágrafos e com o que foi dito antes, a questão de qual

tratamento deveria ser dado aos ameríndios parece bem controversa. No entanto, em nosso

entendimento, o tratamento humanitário, pelo menos publicamente, parecia ser a regra e

não a exceção. Assim, discordamos daqueles intérpretes da obra de Joaquim de

Sousandrade que afirmaram que o poeta maranhense inovou completamente ao “mostrar a

realidade” dos índios contemporâneos e defender o tratamento humano dos mesmos.

Para elucidarmos melhor esta questão, iremos criar um pequeno caso entre o nosso

poeta e Couto de Magalhães o qual foi Conselheiro de Estado, Presidente das Províncias de

Goiás e Pará. Em 1876, Magalhães apresentou à Comissão Superior da Quarta Exposição

Nacional (espécie de entrada para a Exposição Universal14 que neste ano aconteceria nos

EUA, Filadélfia) um estudo chamado Os Selvagens, no qual defendeu a conquista pacífica

das comunidades indígenas com fins civilizatórios pautados na noção de progresso. De

14 As exposições universais consistiam em feiras onde países do mundo inteiro expunham produtos

industriais, exóticos, estudos e tudo o que pudesse representar progresso e/ou possibilidade de progresso.

Criadas em meados do século XIX no contexto do desenvolvimento do capitalismo industrial, segundo

Schwarcz estas festas “(...) eram a melhor expressão da força e da utopia modernistas” (1998, p.388).

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acordo com o político, o conhecimento da língua ameríndia seria o principal meio para a

“domesticação de nossos selvagens”. Vejamos uma parte deste texto em que fica patente

que para Couto de Magalhães o tratamento humanitário dispensado ao índio tinha um

caráter meramente utilitário e otimizador. Ao dirigir-se ao leitor, assim diz:

Domesticar os selvagens ou fazer com que eles nos entendam, o que é a

mesma coisa, equivale a fazermos a conquista pacífica de um território

quase do tamanho da Europa, e mais rico do que ela.

Só essa conquista vale milhões; feita ela, porém, não conseguiremos

somente a posse real da maior parte do território do império;

conseguiríamos também um milhão de braços aclimados, e os únicos que

se prestam às indústrias, que por muitos anos serão as únicas possíveis no

interior – as extrativas e pastoris (p.11).

Sousândrade, por sua vez, zombou da participação do Brasil na exposição da

Filadélfia. No Canto X d’O Guesa, o qual ficou conhecido como Inferno de Wall Street, o

poeta assim cantou:

(Comissários em Filadélfia expondo a CARIOCA

de PEDRO AMÉRICO; QUACKERS admirados)

- Antediluvio ‘plesiosaurus’,

Indústria nossa na Exposição...

= Oh Ponza! Que coxas!

Que Trouxas!

De azul vidro és o sol patagão!

(O Guesa, Sousândrade)

No entanto, na carta-artigo O Estado dos índios que foi publicada em 1872 no periódico de

linha positivista O Novo Mundo, Joaquim de Sousandrade, guardadas algumas diferenças,

discutiu a questão indigenista nos mesmos termos em que Couto de Magalhães. Ao criticar

o resultado da colonização e catequese dos índios sob os auspícios do Império, o poeta

defendeu um tratamento cristão e humano (a praticidade aí explícita) o qual, segundo ele, a

Monarquia não tinha conseguindo levar a cabo:

Mas, o Governo que hoje pensa, e tem razão de pensar, na colonização do

País, em desenvolver a população do Brasil, quererá criar colônias de

índios? Com os elementos que possui, é impossível! – ou acabará de

destruir esses restos deixados dos primeiros exploradores; porque terá de

escravizá-los, embora os salários, os filhos da natureza, e da absoluta

liberdade. Eles são os infantes da Criação – que entretanto uma vez

presos às virtudes morais, dão por elas a vida.

Portanto do apóstolo moderno do cristianismo é de que carece para

chamar à sociedade brasileira os seus esquecidos índios: o apóstolo

moderno, não com santos lenhos e leites de Nossa Senhora, mas com o

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exemplo vivo e prático os seduzindo pela escola e o templo, e tudo lá, lá

mesmo onde estão, na sua tribo, donde o amor do lugar não os deixa

separarem-se e onde os ferro-carris depois irão buscando as formosas

cidades. Porém o apóstolo! o apóstolo de alma forte e das crenças do

futuro! (In Willians, 2003, p. 497).

Portanto, através deste caso que criamos, pensamos ser possível tirar algumas

conclusões sobre o que falamos na primeira parte a respeito da tão defendida “visualização

da realidade” encontrada na obra de Sousândrade. Primeiro, o tratamento humanitário a ela

atrelado não pode ser entendido como algo novo, pois esta discussão já estava posta nos

mais diversos âmbitos. Segundo, se o poeta maranhense trouxe algo diferente para esta

discussão, o viés republicano e democrático pode ser entendido enquanto tal, ele não pôde

considerar a capacidade dos Sujeitos Indígenas de lidarem ativamente com as mais

diversas situações concretas, imbuído que estava do seu cabedal teórico típico de um

intelectual do século XIX. Para Joaquim de Sousandrade as populações indígenas só

poderiam ser consideradas enquanto fadadas à entrada no concerto do progresso e da

civilização que o Estado nacional (no caso, republicano) poderia lhes proporcionar. Bom, o

leitor já deve estar se perguntando: e os índios, quais eram suas demandas e ações? Qual a

relação entre os seus posicionamentos e a ideologia dos intelectuais do século XIX? Para

tentar responder a tais questionamentos, na próxima parte iremos fazer alguns

apontamentos sobre questões da historiografia atual que trouxe à baila os Sujeitos

Indígenas. Vejamos a terceira dimensão do nosso artigo.

Sujeitos Indígenas, Sousândrade e O Novo Éden

Inúmeras e diferenciadas populações indígenas presentes no território

brasileiro no século XIX não foram incluídas na história nacional que

então se construía. Os intelectuais encarregados desta tarefa

comungavam, grosso modo, com a política indigenista do Estado no

sentido de promover a assimilação dos índios integrando-os como

cidadãos ao novo Império em formação. Intelectuais e políticos

apagavam, através de seus discursos, inúmeras identidades indígenas de

grupos que, embora muito presentes no novo Estado, deviam desaparecer

enquanto etnias diferenciadas, conforme os ideais políticos vigentes.

Predominou, então, entre as elites intelectuais e políticas uma cultura

histórica que valorizava alguns índios do passado, enquanto

desconsiderava os grupos coevos presentes e atuantes nas sociedades nas

quais se inseriam. Isso teve significativa influência sobre nossa

historiografia e sobre o ensino de história do Brasil, na qual os índios,

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tradicionalmente, têm ocupado lugar irrelevante (ALMEIDA, 2009, p.

207).

Durante muito tempo os índios foram como que esquecidos pela historiografia

tradicional. Quando muito, eram vistos como meras vítimas dos processos nos quais

estavam inseridos. O resultado deste tipo de interpretação acabou “(...) por somar à

eliminação física e étnica dos índios sua eliminação como sujeitos históricos” (CUNHA,

2012, p. 22). No entanto, nas duas últimas décadas, com o ressurgimento e fortalecimento

de grupos indígenas que reivindicam seus direitos e reafirmam suas identidades, muitos

dos paradigmas que sustentaram por longo tempo essas interpretações mais tradicionais

caíram por terra.

A partir do final do século XX, com a reaproximação15 entre antropologia e

história16, os Sujeitos Indígenas passaram a ser pensados como “agentes sociais cujas ações

também são consideradas importantes para explicar os processos históricos por eles

vividos” (ALMEIDA, 2010, p. 10). Nesse compasso, longe das generalizações e

simplificações que os viam como “sujeitos sem história” parados no tempo, os índios

passaram a ser vistos enquanto sujeitos ativos capazes de lidar com as mais diversas

situações mesmo que sob regimes violentos e desfavoráveis.

Não cabe no espaço deste artigo discutir a produção acadêmica voltada para esta

questão. Por ora, fica a indicação desta mudança de paradigma que fez com que fosse

repensada a relação entre a criação de memórias literárias e históricas por intelectuais e

15 Digo reaproximação, pois a relação entre as ciências socias e a história não é algo totalmente novo. Na

França, os Annales, através de Marc Bloch e Lucien Febvre, já tinham dado este pontapé inicial, preocupados

que estavam com os processos de longa duração. No entanto, ainda que tenhamos aqui no Brasil a obra

Caminhos e fronteiras do historiador Sergio Buarque de Holanda (obra que trata da contribuição indígena no

processo de colonização), é só a partir das últimas duas décadas do século XX) que essa relação vai se dar de

modo mais profundo e sistemático. 16 Alguns exemplos que ilustram esta nova possibilidade: Cristina Pompa, Religião como tradução:

missionários, Tupi e Tapuia no Brasil colonial (2002); Ronaldo Vainfas, A Heresia dos índios (1995); Maria

Regina Celestino de Almeida, Metamorfoses Indígenas (2003), Comunidades indígenas e Estado nacional:

histórias, memórias e identidades em construção (2007), Índios na história do Brasil (2010), O lugar dos

índios na história entre múltiplos usos do passado (2009); Mônica Quijada, Homogeneidad y Nación,

(2000); Manuela Carneiro da Cunha, Índios no Brasil: História, Direitos e Cidadania (2012), História dos

Índios na Brasil (1992); João Pacheco de Oliveira, Ensaios em Antropologia Histórica (1999); Elisa Frühauf

Garcia, O projeto pombalino de imposição da língua portuguesa aos índios e a sua aplicação na América

meridional (2007); Patrícia Maria Melo Sampaio, “Vossa Excelência mandará o que for servido...” :

políticas indígenas e indigenistas na Amazônia Portuguesa do final do século XVIII (2007); Maria Leônia

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políticos no século XIX e o modo como os Sujeitos Indígenas estavam se posicionando e

agindo dentro deste contexto. Em nosso entendimento, é deste modo que conseguiremos

trazer a devida profundidade ao nosso estudo na medida em que a entrada dos agentes

sociais indígenas neste processo torna possível o alargamento de nossa perspectiva

interpretativa. Sobretudo em relação à produção poética de Sousândrade, esta questão se

torna muito importante já que sua obra parece estar marcada com alguns estereótipos

“antecipatórios” e “realísticos” que ao serem analisados em consonância com estes novos

pressupostos podem ser confrontados e aprofundados.

Em meados do século XIX, no contexto de construção de uma determinada

identidade nacional levada a cabo no âmbito do Segundo Reinado no Brasil, do

recrudescimento das políticas indigenistas assimilacionistas então em voga, várias foram as

formas que os índios adotaram para resistir a tais questões. Para os intelectuais da época

que tentavam valorizar as coisas americanas e nacionais, as comunidades indígenas

representavam como que uma “pedra no sapato” na medida em que carregavam consigo o

símbolo do atraso, óbice a ser retirado para deixar livre o caminho que levaria ao progresso

e à civilização ocidental. Foi assim que, enquanto idealizavam os índios do passado, estas

autoridades intelectuais e políticas depreciavam os ameríndios coevos. Através da

dicotomia entre o índio puro do passado e o índio aculturado fadado ao apagamento e à

inclusão como cidadão honorário no seio do Estado nacional, estes intelectuais acabaram

por preconizar a invisibilidade dos Sujeitos Indígenas. No entanto, os ameríndios, como

muito bem mostrou Celestino de Almeida ao comparar México e Brasil dentro deste

processo:

Não construíam uma história como faziam os intelectuais, mas nas

reivindicações apresentadas para garantir seus direitos seculares

afirmavam a identidade a partir da aldeia ou do pueblo no qual se

inseriam e valorizavam a conquista e aliança com os colonizadores.

Construíram, portanto, um discurso que ia na direção inversa da dos

intelectuais americanos (2007, p. 198).

Ou seja, para a autora, em muitos casos, os índios adotaram uma postura que ia de

encontro à ideologia então predominante aos intelectuais e políticos da época. Para os

ameríndios, ser considerado cidadão e ser integrado ao Estado, podia significar a perda de

Chaves de Resende e Hal Langfur, Minas Gerais indígena: a resistência dos índios nos sertões e nas vilas de

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direitos seculares, tais como: o acesso à terra, o tratamento diferenciado que lhes

proporcionava a condição de índios aldeados, e muitos foram os que afirmaram sua

identidade étnica a fim de garantir antigos privilégios e vantagens.

Para os fins deste artigo, ficam as seguintes questões: Sousândrade foi mesmo

capaz de ver a realidade destes sujeitos? Havia algum tipo de aproximação entre a sua

denúncia da política indigenista imperial, o índio degradado do épico O Guesa, e a

vivência dos ameríndios contemporâneos, com suas demandas e ações? Em nosso

entendimento, a ideologia que pautava a posição do poeta no que diz respeito a estas

discussões, como já mostramos mais atrás, não era muito diferente dos seus

contemporâneos. E mais: Sousândrade em 1893, com a publicação do seu poema elegíaco

à República O Novo Éden, parece ter optado pelo total apagamento dos índios de sua

produção poética.

E rindo áureo o cantar:

Formas, século vinte, além do dezenove

Dos telefones, sons em que Eddison nos ouve!

Dos relâmpagos-luz, bela eletricidade,

Pestanejar de Jove, em fixa claridade!

Do animal-magnetismo e o Deus-vivo ocultismo!

Do telescópio, olhar para os céus com Flammarion

E os admirar como Kant qual à moral, e vezes

Chorá-los mortalmente – ai Vesper de Phaon!

Do esbrazeiamento Eiffel, torre-hinos marselheses!

Do sino de São Paulo, orgulho dos ingleses,

Liberty-Bell rachado ao incêndio d’Albion!

Qual Brasil ao cruzeiro, adíssechens serpentes

Contra Libertas, Deus! e o eterno Tiradentes

Que noite secular desperta com o meteoro,

Do exército senhor, que envia em bem, Deodoro

O grande braço, unido à sublimada fronte

De Benjamin, (o ideal d’América ao horizonte),

De paz guerreiro maior que o marcio Napoleão

Que onde há revoluções há flores, liberdade

Proclama à luz social, inverso da vaidade

Que em livre principiando, acaba em Waterloo!

Oh! da humana erupção riram, a Tempestade,

Orco-Vesúvio, o Etna, e só não riu-se Job

Cidadão vitorioso! E ao fruto da República,

A virgem que há cem anos espera-o d’entre arcanos,

E em glória o Novembral, o seu novo Éden fez:

Prometida Cannã – da nova pátria a rúbrica

El-Rei (2007).

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Assina e entra, na fé, qual não entrou Moysés:

Supremos campos de ouro, Íris formosa e pudica

E os céus cerúleo-azuis manhãs.

(O Novo Éden, Sousândrade)

Neste poema, o que é exaltado é a ciência, elementos representativos do progresso, a

república cristã e branca, em suma. O índio aí não aparece, afinal cabia aos intelectuais

(assim pensava Sousândrade), pautados que estavam nas noções de progresso e civilização,

a construção da nova Nação republicana.

Desse modo, analisando o processo de construção do pensamento e da poética de

Joaquim de Sousandrade em consonância com as questões de seu tempo, podemos afirmar

que o poeta maranhense estava mais perto dos intelectuais e políticos da sua época do que

dos ameríndios que, através de suas ações e reivindicações, contestavam os valores então

vigentes na sociedade dita civilizada e afirmavam suas identidades étnicas.

Considerações Finais

O período em que o consenso político do Império e suas bases econômicas

começaram a desmoronar, também foi o momento em que o Reinado de Pedro Segundo

passou a sofrer os primeiros ataques simbólicos. Em 1889, a Monarquia ruiu, fruto de um

processo que durou no mínimo três décadas. Foi neste cadinho cultural e político que

Joaquim de Sousandrade construiu sua obra poética e defendeu suas ideias.

Segundo Pesavento, “reduto da sensibilidade e de investimento primário na

significação do mundo” (2008, p. 82), a literatura pode responder às questões feitas pelo

historiador quando trabalhada em suas mediações possíveis com a realidade, com as

questões de seu tempo. No entanto, não se tratou aqui de ver a produção poética de

Sousândrade como mera reprodução das estruturas sociais e culturais de seu tempo nem

tampouco de inclui-la numa simples sucessão de sistemas. Antes, relacionando-a a poemas

e textos de outros poetas e intelectuais, demonstramos como se deu a construção de sua

poética no decorrer de meados para o fim do século XIX, momento em que as questões

indígenas foram intensamente debatidas nos círculos intelectuais e políticos.

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Portanto, através das três dimensões discutidas em nosso artigo, revelamos como

que Joaquim de Sousandrade, guardadas todas as inovações temáticas e linguísticas

presentes em sua obra, longe ou perto da realidade (depende do ponto de vista, se dos

intelectuais ou dos índios), estava pautado numa visão de mundo que acabava por defender

o total apagamento dos Sujeitos Indígenas. Para o nosso poeta, só havia uma saída para os

ameríndios: a entrada no cortejo triunfal da civilização que, assim pensavam ele e muitos

outros intelectuais, só poderia se dar através de sua integração ao seio do Estado-Nação.

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