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1 PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC/SP LUCIANA PATROCÍNIO DE BRITTO SCIPIONE DI PIERRO NETO E SUA PROPOSTA PARA O ENSINO DA GEOMETRIA NA COLEÇÃO CURSO COLEGIAL MODERNO MESTRADO PROFISSIONAL EM ENSINO DE MATEMÁTICA São Paulo 2008

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC/SP

LUCIANA PATROCÍNIO DE BRITTO

SCIPIONE DI PIERRO NETO E SUA PROPOSTA PARA O

ENSINO DA GEOMETRIA NA COLEÇÃO CURSO COLEGIAL

MODERNO

MESTRADO PROFISSIONAL EM ENSINO DE MATEMÁTICA

São Paulo

2008

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC/SP

LUCIANA PATROCÍNIO DE BRITTO

SCIPIONE DI PIERRO NETO E SUA PROPOSTA PARA O

ENSINO DA GEOMETRIA NA COLEÇÃO CURSO COLEGIAL

MODERNO

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia

Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial

para obtenção do título de MESTRE PROFISSIONAL EM

ENSINO DE MATEMÁTICA , sob a orientação da

Professora Doutora Ana Lúcia Manrique

PUC / SP

São Paulo

2008

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Banca Examinadora

____________________________________

____________________________________

____________________________________

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Autorizo, exclusivamente para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total ou parcial desta

Dissertação por processos de fotocopiadoras ou eletrônicos.

Assinatura: _______________________________________ Local e Data: ______________

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Ao meu marido Alexandre, por todo

amor, companheirismo e

compreensão a mim dedicado

durante a realização desse trabalho.

E a minha filhinha Gabriela que

está chegando. Minha eterna

gratidão e amor. Dedico-lhes o

título de Mestra.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, pelo dom da vida, por tudo que sou e por tudo que

conquisto.

Aos Professores do Programa de Estudos Pós-Graduados em

Educação Matemática da PUC/SP, pela dedicação e orientação

prestada durante todo o curso, em especial ao professor Saddo Ag

Almouloud, com quem pude contar na fase mais difícil da

conclusão deste trabalho; à Ana Lúcia Manrique que acompanhou

a finalização da minha pesquisa; ao professores Vincenzo

Bongiovanni, Célia Maria Carolino Pires e Bárbara Lutaif

Bianchini que ministraram inesquecíveis aulas e muito

contribuíram nesta minha trajetória.

Aos colegas do mestrado, Cristiane, Givanildo, Rogério, com

quem dividi os momentos mais difíceis dessa trajetória e

especialmente, a Emily com quem pude contar em todos os

momentos do curso, o que sem dúvida criou um forte e eterno laço

de amizade.

À Secretaria da Educação do Estado de São Paulo, por conceder a

bolsa de estudos para a realização deste trabalho.

Aos colegas de trabalho da Oficina Pedagógica da Diretoria

Regional de Ensino Guarulhos-Sul, pelo auxílio e amizade que

demonstraram ao longo desta caminhada.

Aos meus pais, João Nunes Patrocínio e Maria de Lourdes Silva

Patrocínio, por me darem a vida, por me apoiarem e se dedicarem

totalmente à educação de seus filhos, com certeza esses são os

grandes mestres que tenho na vida.

Aos meus irmãos Sandra, Roberto e João Carlos meus eternos

amigos e por quem devo deixar registrado que tenho grande amor.

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Aos meus familiares, Bárbara, José Raimundo, Maria Aparecida,

Francisnete, Antonio Carlos, Lucas, André, Marcelo, Ana Paula e

Isabela por acreditarem e incentivarem minha caminhada.

A todos do Colégio Júlio Mesquita, em especial à professora Tina,

com quem pude contar para correções do texto e ao professor

André que concedeu sua preciosa colaboração em inglês.

Ao meu amigo André Figueiredo Rodrigues, que deu grandes

contribuições ao meu trabalho, por meio de suas leituras críticas e

construtivas.

Enfim, agradeço a todos aqueles que de forma direta ou indireta

contribuíram para a realização e a conclusão deste trabalho.

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RESUMO

O presente trabalho teve como objetivo estudar a Coleção Curso Colegial

Moderno, de autoria do professor Scipione Di Pierro Neto em parceria com Ruy

Madsen Barbosa e Luiz Mauro Rocha, publicada em tempos de Matemática

Moderna. Essa coleção foi considerada como referência na época por ser uma

das primeiras publicadas neste período. Foram consultados documentos do

professor Scipione Di Pierro Neto, tais como: sua tese de doutorado e entrevistas

relacionadas ao período da Matemática Moderna no Brasil. As análises dos

documentos foram baseadas na teoria de Le Goff (1992), que analisa as

diferentes formas de produção da história, e a análise da Coleção de livros no

texto de Choppin (2000), que considera a crítica ideológica e cultural de livros e

seus conteúdos segundo uma perspectiva epistemológica ou didática. As

tendências para o ensino da Geometria, no Movimento da Matemática Moderna,

eram voltadas para as transformações geométricas, estudos dos espaços

vetoriais e modificações nos axiomas de Euclides. Essa pesquisa visa analisar

quais dessas tendências foram seguidas na Coleção Curso Colegial Moderno. E

foi constatado que os autores acompanharam algumas tendências do Movimento,

como a utilização da linguagem dos conjuntos para introdução da geometria plana

no primeiro volume, e as transformações geométricas no segundo volume. Notou-

se também que os livros tinham um visual diferente dos livros didáticos da época,

pois apresentavam muitas figuras ilustrativas bem feitas e textos explicativos

muito bem escritos, com uma linguagem acessível aos alunos.

Palavras-chave : Movimento da Matemática Moderna, Scipione Di Pierro Neto,

Geometria, Curso Colegial Moderno.

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ABSTRACT

The present research is aimed to study “Coleção Curso Colegial

Moderno”, by the professor Scipione Di Pierro Neto with Ruy Madsen Barbosa and

Luiz Mauro Rocha as partners, has come out during Modern Mathematics. This

collection was considered as a reference at this period for being one of the first to

be published at that time. Scipione Di Pierro Neto´s documents were consulted

such as: his doctorate thesis and some interviews related to Modern Mathematics

Movement in Brazil. These document analysis were based on Le Goff´s theory,

that analyzes the many different ways of history production, and on the book

collection in Choppin´s text (2000), that considers the ideological and cultural

critics from books and its contents according to a epistemological or educational

perspective. The Geometry teaching tendencies, at Modern Mathematics

Movement, were to geometric changings, vectorials studies of spaces and also

axioms Euclides´s changings. This research is aimed to analyze which of these

tendencies were followed according to “Coleção Curso Colegial Moderno”. It was

known that the authors followed some of its tendencies such as the use of the

language set to introduce plane geometry at the first volume, and the geometric

information at the second volume. It was also noticed that the books had a

different look from the educational ones at that period; they used to have many

well designed and illustrative pictures as well as very clear explanations with an

easy language that could be understood by any student.

Key words: Modern Mathematics Movement, Scipione Di Pierro Neto, Geometry, Curso Colegial Moderno”.

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LISTA DE ABREVIATURAS

APSPN - Arquivo Pessoal Scipione Di Pierro Neto

CADES - Campanha de Aperfeiçoamento e Difusão do Ensino Secundário.

CIEM - Commission Internationale de L’Enseignemente Mathématique

ECA – Escola de Comunicação e Artes da USP

EUA – Estados Unidos

FEI - Faculdade de Engenharia Industrial

FFCL - Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras

GEEM - Grupo de Estudo do Ensino da Matemática.

GEEMPA – Grupo de Estudos de Ensino de Matemática Moderna de Porto Alegre

GEPEM – Grupo de Estudos e Pesquisas e Educação Matemática do Rio de Janeiro

GHEMAT – Grupo de Pesquisa de História da Educação Matemática.

IMPA – Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada

MEC - Ministério da Educação e da Cultura

MMM – Movimento da Matemática Moderna.

NEDEM – Núcleo de Estudos e Difusão do Ensino da Matemática de Curitiba

NSF – Nacional Science Foundation

OECE- Organização Européia de Cooperação Econômica

PUC – Pontifícia Universidade Católica.

SMSG – Scholl Mathematics Study Group

UNESCO – Organização das Nações Unidas para a educação, a ciência ea cultura

URGS – Universidade Federal do Rio Grande do Sul, atualmente UFRGS

USP - Universidade de São Paulo

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LISTA DE FIGURAS

Capítulo 3 Página

3.1.1 - Foto do Professor Scipione Di Pierro Neto .................................... 46

Capítulo 4 Página

4.1.1 – Ilustração do quinto postulado de Euclides .................................. 67

Capítulo 5 Página

5.1.1 – Capa do volume 1 da Coleção Curso Colegial Moderno.................. 82

5.1.2 – Apresentação de pontos retas e planos............................................ 85

5.1.3 – Definição de planos .......................................................................... 85

5.1.4 – Postulado de Euclides , Intersecções e Inclusões (I)....................... 87

5.1.5 – Intersecções e Inclusões (II) ............................................................ 88

5.1.6 –Teorema 1 .........................................................................................

90

5.1.7 – Outros Teoremas ............................................................................. 91

5.2.1 - Capa do volume 2 da Coleção Curso Colegial Moderno ................. 92

5.2.2 – Segmentos orientados e vetores ..................................................... 94

5.2.3 – Transformações Geométricas .......................................................... 95

5.2.4 – Exercícios propostos ........................................................................ 96

5.2.5 - Exercícios propostos ........................................................................ 97

5.2.6 – Superfícies cilíndricas (I)................................................................... 98

5.2.7 – Superfícies cilíndricas (II).................................................................. 99

5.2.8 – Exercícios propostos ........................................................................

100 5.2.9 – Definição para os problemas de superfície esférica ........................ 101

5.2.10 – Prismas .......................................................................................... 102

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5.2.11 – Teorema das diagonais de um paralelepípedo .............................. 103

5.2.12 – Pirâmides Regulares ..................................................................... 104

5.2.13 – Fórmulas para lados, apótemas e áreas de polígonos regulares... 105

5.2.14 – Exercícios propostos ...................................................................... 106

5.2.15 – Volume de paralelepípedos ........................................................... 107

5.2.16 – O princípio de Cavalieri .................................................................. 108

5.2.17 – Exercícios propostos ..................................................................... 108

5.2.18 – Cilindro ........................................................................................... 109

5.2.19 – Superfície Cilíndrica ....................................................................... 110

5.2.20 – Cilindros e Prismas equivalentes ................................................... 111

5.2.21 – Esferas e Cilindros equivalentes .................................................... 112

5.2.22 – Demonstração do volume da esfera .............................................. 113

5.3.1 - Capa do volume 3 da Coleção Curso Colegial Moderno ............. .... 115

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ........................................................................................... 14

1. CONSIDERAÇÕES TEÓRICO-METODOLÓGICAS ............................. 19

2. MOVIMENTO DA MATEMÁTICA MODERNA .......................................

2.1. Reformas internacionais no ensino da Matemática .....................

2.2. Reformas no ensino da Matemática no Brasil .............................

26

26

31

3. PROFESSOR SCIPIONE DI PIERRO NETO ........................................

3.1. Biografia...... .................................................................................................

3.2. A participação e o olhar do Professor Scipione Di Pierro Neto para o Movimento da Matemática Moderna .......................................

3.2. A sua Tese de Doutorado ............................................................

3.3. Produções didáticas .....................................................................

46

46

48

55

63

4. O ENSINO DA GEOMETRIA ................................................................

4.1. O ensino da Geometria antes do Movimento da Matemática Moderna de acordo com a análise de Scipione em sua Tese de Doutorado ..........................................................................................

4.2. Algumas discussões sobre o ensino da Geometria durante o Movimento da Matemática Moderna ...............................................

66

66

70

5. A PROPOSTA DO PROFESSOR SCIPIONE PARA O ENSINO DA GEOMETRIA EM TEMPOS DE MATEMÁTICA MODERNA......................

5.1. Volume 1 ......................................................................................

5.2. Volume 2......................................................................................

5.3. Volume 3.......................................................................................

81

82

92

115

CONSIDERAÇÕES FINAIS........................................................................ 116

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................... 121

ANEXOS .................................................................................................... 123

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INTRODUÇÃO

Em razão de sempre ter tido intenção de ser professora e a preferência

pela Matemática, optei por este curso na graduação. Desde o seu início, em 1997,

passei a ministrar aulas de Geometria, numa escola particular de Guarulhos e

esta disciplina passou a me despertar maior interesse e curiosidade, inclusive por

não compartilhar da mesma preferência com colegas de curso e de trabalho, uma

vez que estes na maioria das vezes preferiam a Álgebra. Concluí a graduação em

2000.

Ingressei no Mestrado Profissional em Ensino de Matemática, na PUC-

SP, no início de 2006, após o término de um Curso de Aperfeiçoamento nesta

mesma instituição, a fim de melhorar minha prática pedagógica, já que pude

confirmar durante minha trajetória como professora que fiz a escolha certa.

Escolhi como disciplina inicial Tópicos de Geometria, cujas aulas eram

ministradas pelo Prof. Dr. Vincenzo Bongiovani, por quem tenho grande

admiração. No semestre seguinte cursei História da Matemática, também com o

professor Vincenzo, que me sugeriu que fizesse parte do grupo de pesquisa em

História da Educação Matemática, desde então passei a freqüentar as discussões

do projeto Movimento da Matemática Moderna e a Geometria Escolar no Brasil,

que investiga a História da Educação Matemática no Brasil, em especial o

Movimento da Matemática Moderna (MMM), conhecido como o período de

modernização do ensino da Matemática, nas décadas de 1960-70. O ponto

principal da investigação refere-se às propostas para o ensino de Geometria pelo

Movimento da Matemática Moderna. O projeto articula-se em subprojetos de

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pesquisa, este é um deles. Este trabalho reuniu o meu interesse pela Geometria

com a curiosidade de descobrir como ela foi abordada nos livros e nas práticas

escolares em outros tempos.

Esta pesquisa teve como objetivo analisar a proposta da Coleção Curso

Colegial Moderno de Scipione Di Pierro Neto, para o ensino da Geometria no

antigo Colegial.

Os trabalhos existentes sobre o Movimento da Matemática Moderna no

Brasil, em sua maior parte, preocuparam-se em explicar o significado da

Matemática Moderna com a identificação dos grupos que a introduziram no país e

com a análise dos textos que abordaram seu fracasso. Boa parte deles teve uma

contribuição significativa para esta pesquisa e aparecem em diversos momentos

deste texto. Os trabalhos não apresentaram, de um modo geral, preocupações

com a análise das práticas pedagógicas e não deram ênfase a maneira como a

Geometria foi proposta. Sendo assim, este trabalho visa contribuir com a análise

das transformações que ocorreram nas culturas escolares e com as

conseqüências que esse Movimento deixou nas práticas pedagógicas e,

principalmente, no que diz respeito ao ensino da Geometria nas escolas

brasileiras, sob o olhar do professor Scipione, autor de livros didáticos desse

período.

O professor Scipione foi autor de livros didáticos e uma pessoa

importante no Movimento da Matemática Moderna, pois no período atuou como

professor universitário em cursos de Licenciatura em Matemática, coordenador do

Colégio de Aplicação da USP e ministrou cursos preparatórios para a introdução

dessa abordagem para a Matemática escolar no sistema de ensino brasileiro.

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A pesquisa possibilita um melhor conhecimento dos problemas da

educação brasileira, pois retrata parte de um Movimento que ocorreu diante de

crises políticas e que foi iniciada por aqueles que se preocupavam com o ensino

de Matemática.

Nessa pesquisa procurou-se responder à seguinte questão: Algumas

análises feitas sobre o ensino da Geometria durante o Movimento da Matemática

Moderna indicam que existiam três posicionamentos distintos nas discussões

presentes no ideário internacional do Movimento: um que propõe o

desenvolvimento pelo estudo das transformações geométricas, outro pelo estudo

dos espaços vetoriais e um terceiro que propõe modificações nos axiomas de

Euclides. Como as produções didáticas do Professor Scipione abordaram a

Geometria? Seguiram esses posicionamentos? Quais?

Durante o Movimento da Matemática Moderna deu-se destaque às

estruturas algébricas no ensino da Matemática, modificando o que era ministrado

na época como problemas envolvendo cálculos e algoritmos das operações. As

aulas de Matemática eram ministradas por professores que nem sempre eram

licenciados nessa disciplina e, para que estes pudessem acompanhar as

tendências do Movimento da Matemática Moderna, foram oferecidos cursos,

organizados pelo Grupo de Estudos do Ensino da Matemática (GEEM). O eixo

desses cursos focava-se nas estruturas algébricas, sendo poucas as análises

direcionadas para a Geometria.

A proposta para o ensino de Geometria, geralmente apresentada nos

capítulos finais dos livros didáticos, era praticamente esquecida no decorrer do

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ano letivo e durante o Movimento da Matemática Moderna parece não ter sido

diferente.

A pesquisa investigou, portanto, a proposta da Coleção Curso Colegial

Moderno do professor Scipione Di Pierro Neto para o ensino da Geometria, no

antigo colegial, durante o período do Movimento da Matemática Moderna, pois

seus livros foram considerados referência na época.

Pretende-se também permitir uma reflexão sobre as questões que ainda

se encontram em aberto quanto ao papel assumido pela Geometria no Movimento

da Matemática Moderna, como a dificuldade por partes dos docentes em trabalhar

com essa disciplina.

As fontes utilizadas para a realização da pesquisa contaram com a

análise da Coleção Curso Colegial Moderno, publicada pelo professor Scipione

durante o Movimento da Matemática Moderna. Essa pesquisa fundamentou-se

em documentos do Arquivo Pessoal de Scipione Di Pierro Neto (APSPN), doados

pela família ao Grupo de Pesquisa em História da Educação Matemática no Brasil

(GHEMAT), e por depoimentos prestados por este professor à Prof ª. Dra.

Elizabete Z. Burigo.

Esta dissertação está dividida em cinco capítulos: No primeiro será

apresentado o referencial teórico e a metodologia concernente a esta pesquisa. O

referencial teórico está fundamentado nas idéias de Alain Choppin, em seu artigo

História dos livros e das edições didáticas: sobre o estado da arte, e nas

discussões de Jacques Le Goff sobre documento / monumento.

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No segundo capítulo serão relatadas as reformas internacionais ocorridas

no ensino de Matemática e, também, as ocorridas no Brasil, destacando-se o

Movimento da Matemática Moderna.

O terceiro capítulo apresenta o professor Scipione Di Pierro Neto como

um importante personagem e autor de livros didáticos durante o Movimento da

Matemática Moderna, procurando-se discutir sua participação e seu olhar diante

dessa nova abordagem que aparecia para o ensino da Matemática.

O ensino da Geometria será abordado no quarto capítulo, que se divide

em duas partes: o antes e o durante o Movimento da Matemática Moderna.

No quinto capítulo se analisa a Geometria na coleção Curso Colegial

Moderno, escrita pelo professor Scipione Di Pierro Neto, em parceria com Luiz

Mauro Rocha e Ruy Madsen Barbosa.

Nas considerações finais buscou-se reunir as informações coletadas em

cada capítulo a fim de analisar a Coleção Curso Colegial Moderno.

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CAPÍTULO 1

CONSIDERAÇÕES TEÓRICO - METODOLÓGICAS

Para se realizar uma pesquisa que envolve História é necessário e pode

ser difícil encontrar fontes, que são rastros deixados pelas atividades humanas.

As fontes podem ser de vários tipos: materiais, escritas ou orais e devem ser

estudadas a fim de se verificar sua veracidade, autenticidade, credibilidade e

interpretação. Nesse capítulo alguns autores que trataram sobre o trabalho com

as diferentes fontes de pesquisa auxiliaram na utilização das mesmas para o

desenvolvimento dessa pesquisa.

Alguns estudos em História da Educação Matemática, realizados pelo

GHEMAT, têm revelado a importância em se pesquisar as práticas pedagógicas

realizadas durante o Movimento da Matemática Moderna.

Com uma análise de teses e dissertações sobre o Movimento da

Matemática Moderna no Brasil, Valente (2006), no artigo A Matemática Moderna

nas escolas do Brasil: um tema para estudos históricos comparativos, afirmou

que:

é possível concluir que os trabalhos, em grande medida, atêm-se à análise do ideário modernista. Preocupações em explicitar o significado da Matemática Moderna, de situar os grupos que a difundiram no Brasil e analisar textos que discutem o seu fracasso internacional, dominam essa literatura. Em boa dose descritivos, os textos quase não incluem preocupações com a análise de práticas pedagógicas (VALENTE, 2006, p. 30).

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Ainda de acordo com Valente (2006), as práticas pedagógicas e as

produções didáticas feitas durante o Movimento da Matemática Moderna no Brasil

precisam ser analisadas a partir das transformações que aconteceram nas

culturas escolares, que passaram pela ação de um movimento internacional de

reforma do ensino de Matemática. Scipione Di Pierro Neto foi um dos que atuou

como professor e autor de livros didáticos durante esse Movimento, tornando-se

um importante personagem nessa história.

Os documentos existentes no Arquivo Pessoal de Scipione Di Pierro Neto

(ASPN) doado pela família, em 2007, ao GHEMAT, contam com certificados de

cursos que o professor Scipione freqüentou, com anotações e apontamentos de

suas aulas e de seus livros; além de alguns dos livros que utilizou para escrever

suas produções didáticas e artigos, ao longo de sua trajetória como professor,

autor de livros didáticos e pesquisador.

A utilização dos documentos deste arquivo como fonte de pesquisa, será

apoiada no artigo Documento / Monumento, do historiador Jacques Le Goff, que

analisa as diferentes formas de produção da História ao longo dos tempos.

Segundo esse autor, define-se documento como algo que:

não é inócuo. Antes de qualquer coisa resulta uma montagem consciente ou inconsciente, da História da época, da sociedade que o produziram, mas também das épocas sucessivas durante as quais continuou a viver, talvez esquecido, durante as quais continuou a ser manipulado, ainda que pelo silêncio. O documento é uma coisa que fica, que dura e o testemunho, o ensinamento que ele traz devem ser em primeiro lugar analisados desmistificando-lhe o seu significado aparente. O documento é monumento (LE GOFF, 1992, p. 537-538).

Para Le Goff, o monumento é mascarado, é uma montagem, a qual o

historiador deve desmontar e analisar as condições de produção dos

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documentos-monumentos. Segundo o autor não existe um documento-verdade,

todo documento é uma mentira, pode deixar enganar aquele que o observa. Cabe

ao historiador não estar endurecido e seguir os vestígios, pesquisar, indagar os

documentos que utiliza como fontes de pesquisa. Neste caso, o arquivo pessoal

do professor Scipione é um monumento porque está, antes de tudo, revestido,

pois não retrata, a primeira vista, quais as intenções e propostas do autor, têm

uma aparência enganadora, que pode iludir.

O estudo dos documentos e anotações do professor pode contribuir para

a compreensão das escolhas feitas em suas produções didáticas. O papel do

historiador, neste caso, seria o de buscar as verdadeiras razões das escolhas,

pois, talvez, o simples olhar para os livros didáticos não seria suficiente para uma

boa compreensão. Estes nem sempre apresentam de forma explícita todas as

intenções do autor.

Com a análise dos documentos do arquivo APSPN e da entrevista que o

professor Scipione concedeu a Burigo (s.d.), buscou-se o que não estava claro e

explorou-se todo seu conteúdo, sem acréscimos. Pretendeu-se, também realizar

críticas, interpretações e confrontá-las com outros documentos.

De acordo com Valente, quaisquer meio de comunicação: escritos,

imagens, ilustrações, transmissões sonoras, descrevem uma fonte de pesquisa

com muita informação, com fatos históricos. “Os fatos históricos são constituídos

a partir de traços, de rastros deixados no presente pelo passado. [...] um fato não

é outra coisa que o resultado de uma elaboração, de um raciocínio, a partir das

marcas do passado segundo as regras de uma crítica” (VALENTE, 2007, p. 31).

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Os fatos históricos são os principais elementos para a produção de uma

pesquisa histórica, porém é necessário esclarecê-los, compreendê-los. Os

vestígios que constituem os fatos históricos devem ser trabalhados pelo

historiador, que deve questioná-los com o intuito de confirmar ou não as

conjecturas levantadas quando teve o primeiro contato com as fontes, os

documentos. Segundo Valente, “não existem fatos históricos sem questões

postas pelo historiador” (2007, p.31). As questões impostas pelo historiador visam

a completar os espaços vazios do conhecimento histórico. Porém, o historiador

pode elaborar perguntas sobre algo pronto, existente.

O trabalho com os documentos, utilizados pelo historiador como fonte,

tem o objetivo de argumentar sobre sua origem, sua conservação, sua

veracidade, sua utilidade e sua implicação. Essas argumentações devem ser

questionadas de duas formas: “a da crítica da sinceridade, concernente às

intenções de produção do documento; e a crítica de exatidão, sobre a situação

objetiva do documento. A primeira está atenta às mentiras; a segunda, aos erros.”

(VALENTE, 2007, p. 33)

Cada fonte deverá ter sua autenticidade comprovada, ou seja, deve-se

verificar sobre a validade do documento, e até mesmo se é original ou uma

cópia. A autoria deverá ser determinada, o mesmo ocorrendo em relação ao

local e a data de sua redação, se houver erros ou falhas de transcrição, nesse

caso, caberá uma reconstituição. A veracidade das informações contidas deve

ser feita por meio da interpretação, da capacidade do autor de conhecer e

entender os fatos de que se trata, do rigor que deve detectar os erros

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involuntários nos fatos descritos e da investigação dos testemunhos, sendo

necessário comparar a informação com outras sobre o mesmo fato.

A produção histórica não é apenas uma exposição dos fatos pelo

historiador, ela engloba uma obra de identificação e construção de fontes que

sofrerão processos interpretativos e que darão firmeza ao objeto histórico em

construção.

A intenção de quem não têm formação específica em História, porém faz

uma pesquisa histórica, é buscar o diálogo com os historiadores, com a intenção

de ampliar o entendimento de como se dá, na História, o processo de

escolarização dos saberes e, em particular, da Matemática, a partir de um

instrumental teórico-metodológico utilizado por historiadores (VALENTE, 2007,

p.47).

A produção didática do professor Scipione Di Pierro Neto, em parceria

com Ruy Madsen Barbosa e Luiz Mauro Rocha, a partir de 1967, tem, neste

estudo, a análise da abordagem dos conteúdos de Geometria, feita a partir das

definições de Choppin (2004). Para essa análise é considerada a crítica

ideológica e cultural dos livros didáticos e seu conteúdo didático, de acordo com

uma perspectiva epistemológica ou didática:

Os autores de livros didáticos não são simples espectadores de seu tempo: eles reivindicam um outro status, o de agente. O livro didático não é um simples espelho: ele modifica a realidade para educar as novas gerações, fornecendo uma imagem deformada, esquematizada, modelada, freqüentemente de forma favorável: as ações contrárias à moral são quase sempre punidas exemplarmente; os conflitos sociais, os atos delituosos ou a violência cotidiana são sistematicamente silenciados. (CHOPPIN, 2004, p. 557)

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Segundo Choppin, o livro didático exerce quatro funções fundamentais

que podem ter variação de acordo com o ambiente sociocultural, a época, as

disciplinas, os níveis de ensino, os métodos e suas formas de utilização. São elas:

1. Função referencial, também chamada de curricular ou programática, desde que existam programas de ensino: o livro didático é então apenas a fiel tradução do programa ou, quando se exerce o livre jogo da concorrência, uma de suas possíveis interpretações. Mas, em todo o caso, ele constitui o suporte privilegiado dos conteúdos educativos, o depositário dos conhecimentos, técnicas ou habilidades que um grupo social acredita que seja necessário transmitir às novas gerações.

2. Função instrumental: o livro didático põe em prática métodos de aprendizagem, propõe exercícios ou atividades que, segundo o contexto, visam a facilitar a memorização dos conhecimentos, favorecer a aquisição de competências disciplinares ou transversais, a apropriação de habilidades, de métodos de análise ou de resolução de problemas, etc.

3. Função ideológica e cultural: é a função mais antiga. A partir do século XIX, com a constituição dos estados nacionais e com o desenvolvimento, nesse contexto, dos principais sistemas educativos, o livro didático se afirmou como um dos vetores essenciais da língua, da cultura e dos valores das classes dirigentes. Instrumento privilegiado de construção de identidade, geralmente ele é reconhecido, assim como a moeda e a bandeira, como um símbolo da soberania nacional e, nesse sentido, assume um importante papel político. Essa função, que tende a aculturar - e, em certos casos, a doutrinar - as jovens gerações, pode se exercer de maneira explícita, até mesmo sistemática e ostensiva, ou, ainda, de maneira dissimulada, sub-reptícia, implícita, mas não menos eficaz.

4. Função documental: acredita-se que o livro didático pode fornecer, sem que sua leitura seja dirigida, um conjunto de documentos, textuais ou icônicos, cuja observação ou confrontação podem vir a desenvolver o espírito crítico do aluno. Essa função surgiu muito recentemente na literatura escolar e não é universal: só é encontrada — afirmação que pode ser feita com muitas reservas — em ambientes pedagógicos que privilegiam a iniciativa pessoal da criança e visam a favorecer sua autonomia; supõe, também, um nível de formação elevado dos professores. (CHOPPIN, 2001, p. 553)

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As interpretações realizadas com a análise dos conteúdos de Geometria,

abordados nos livros didáticos do professor Scipione, serão comparadas com os

outros documentos, fontes desta pesquisa, pois segundo Choppin “não é

suficiente, no entanto, deter-se nas questões que se referem aos autores e ao

que eles escrevem; é necessário também prestar atenção àquilo que eles

silenciam, pois se o livro didático é um espelho, pode ser também uma tela.

(CHOPPIN, 2004, p. 557)

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CAPÍTULO 2

MOVIMENTO DA MATEMÁTICA MODERNA

Este capítulo permite uma compreensão das idéias defendidas durante o

Movimento da Matemática Moderna. Entender essas idéias e a maneira como

surgiram é fundamental para a análise das escolhas feitas pelo professor Scipione

em suas produções didáticas publicadas no mesmo período em que ocorreu o

Movimento no Brasil.

2.1. Reformas Internacionais no Ensino da Matemátic a

O ensino de Matemática, por volta dos anos de 1950, começou a ser

discutido na Europa e em outros países, como os Estados Unidos. Esta década

contou com muitas iniciativas e realizações com objetivos diversos, mas com um

foco comum, mudar os currículos dessa disciplina, a fim de atualizar os temas

matemáticos ensinados e os métodos de ensino. (GUIMARÃES, 2007, p. 21)

Para as escolas elementares, a discussão foi feita por filósofos suíços e

matemáticos franceses, alguns destes eram integrantes do grupo Bourbaki, nome

fictício escolhido por um grupo de matemáticos, a maioria franceses, dentre eles

Cartan, Chavalley, Dieudonné e Weil, que tinha a intenção de apresentar toda a

Matemática de seu tempo em uma obra intitulada Éléments de mathématique.

Seu primeiro volume foi publicado em 1939. Gustave Choquet e Willy Servais

fizeram intervenções que completaram esse trabalho (GUIMARÃES, 2007).

Gustave Choquet revelou que os professores de Matemática mostravam coisas

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que não interessavam à maioria das pessoas (Charlot. Apud PIRES, 2000, p. 9).

A obra elaborada pelo Grupo Bourbaki pretendia integrar de maneira coerente e

rigorosa os principais desenvolvimentos da Matemática: as “Estruturas

Fundamentais da Análise”, com os subtítulos: Teoria dos Conjuntos, Álgebra,

Topologia Geral, Funções de Variável Real, Espaços Vetoriais, Topologia e

Integração. Os trabalhos de Bourbaki caracterizavam-se por uma adesão

completa ao tratamento axiomático, a uma forma abstrata e geral, retratando uma

estrutura lógica.

Os integrantes do grupo Bourbaki faziam parte da Comission

Internationale pour l’Enseignement des Mathématiques (CIEM) . Em 1955, o

CIEM publicou, na França, um livro intitulado La didactique des mathématiques.

Um dos textos foi escrito pelo epistemólogo Jean Piaget. A obra teve repercussão

internacional e sua divulgação no Brasil aconteceu durante o II Congresso

Nacional de Ensino de Matemática, ocorrido em 1957.

Embora Piaget nunca tenha direcionado suas pesquisas para o processo

de ensino, o movimento de modernização da Matemática buscou,

convenientemente, uma relação entre as estruturas fundamentais de tal proposta

– algébrica, topológica e de ordem – e as estruturas elementares da inteligência,

que era o objeto de estudo de Piaget. Ele, entretanto, alertou sobre as

conseqüências de um ensino fundamentado numa linguagem excessivamente

formal e utilizado de maneira precoce no ensino elementar e secundário: “Nada

prova que colocando o formalismo a princípio o encontraremos no final em suas

formas autênticas, e os estragos de um pseudo-formalismo ou um formalismo

puramente verbal demasiado precoce mostram, pelo contrário, os perigos de um

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método que ignora as leis do desenvolvimento mental.” (PIAGET, 1955, Apud

BURIGO, 1989, p. 87).

Nos Estados Unidos foram iniciados diversos projetos sobre as mudanças

no ensino de Matemática nos anos de 1950. O trabalho de maior repercussão foi

o da School Mathematics Study Group (SMSG), em 1958, dirigido por E. G.

Beagle, criado a partir de conferências do Nacional Science Foundation (NSF),

que subsidiava cursos para professores de vários países para difusão das

propostas acerca da modernização do ensino da Matemática. Esses projetos

eram financiados por agências como a NSF, a Carnegie Corporation e o United

States Office of Education. O SMSG foi criado a partir de duas conferências, uma

delas promovida pela NSF, em que a qualidade baixa de ensino elementar e

secundário foi apontada como um dos elementos responsáveis pela escassez de

matemáticos-pesquisadores e teve a assistência do National Council of Teachers

of Mathematics. O SMSG produziu textos para todos os graus do ensino

elementar e secundário, no qual vários tópicos novos eram introduzidos, textos

para professores e várias monografias destinadas aos alunos mais bem “dotados”

do final do curso secundário (BURIGO, 1989, p.71).

Em 1958, a Organização Européia de Cooperação Econômica (OECE)

formou um setor com o intuito de que o ensino de Ciências e Matemática se

tornasse mais eficiente. No ano seguinte promoveu um levantamento sobre a

situação do ensino da Matemática nos países-membros do grupo e realizou

trabalhos fundamentados nos resultados, com o objetivo de promover mudanças

no currículo da disciplina. Os trabalhos foram realizados no Cercle Culturel de

Royaumont, em Asnières-sur-Oise, França, em 1959, numa reunião que ficou

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conhecida como Seminário de Royaumont e tornou-se o maior símbolo de todo o

movimento reformador de grande influência internacional, o Movimento da

Matemática Moderna, e também uma das mais conhecidas na História da

evolução curricular recente do ensino da Matemática (GUIMARÃES, 2007, p.22).

Em 1960 foi realizado o Seminário de Dubrovnik, na Iuguslávia. As idéias

estruturalistas dominantes na época, em particular às que se referem à

Matemática e à Psicologia, influenciaram na elaboração de “Um Programa

Moderno de Matemática para o Ensino Secundário”. Em relação à Psicologia, o

trabalho de Jean Piaget assumiu uma significativa visibilidade no Seminário de

Royamount, e foi indício do que mencionou Marshal Stone que presidiu aos

trabalhos do seminário, às pesquisas de Piaget, destacando-as entre as que

deram origem a possibilidades desconhecidas em pedagogia, assim como a

intervenção de Gustave Choquet sobre o ensino dos números e das operações

que seguiu de perto as idéias de Jean Piaget sobre a gênese do número na

criança. (GUIMARÃES, 2007, p. 22)

O Movimento da Matemática Moderna, uma das reformas mais

conhecidas na História da evolução curricular recente do ensino da Matemática,

após esses dois seminários, despertou mudanças nos currículos educacionais em

diversos países, entre eles França, Inglaterra, Estados Unidos, Rússia (antiga

União Soviética), Bélgica e Brasil, entre outros. Em Royamont, foram

estabelecidas as bases do Movimento da Matemática Moderna e a necessidade

da modernização foi justificada por Jean Dieudonné (.Apud. Miorim,1998, p. 109):

Já no século passado se considerava a passagem das Matemáticas da escola secundária às da universidade como um salto a um mundo diferente. Com a introdução das Matemáticas

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modernas, esse fosso tem aumentado muito [...] Recentemente, têm sido introduzidos nos últimos programas dos três anos da escola secundária superior (das escolas francesas) os elementos de cálculo diferencial e integral, de álgebra vetorial e de Geometria analítica, mas esses temas não são sempre relegados a um segundo plano, e o interesse se concentra em primeiro lugar na Geometria pura ensinada, mais ou menos, à maneira de Euclides, com um pouco de álgebra e de teoria de números. Estou convencido que o tempo deste “trabalho remediado” já passou e que deveríamos pensar em uma reforma muito mais profunda, a menos que se deixe piorar a situação até o ponto de comprometer seriamente cada progresso científico ulterior. Se eu quiser resumir em uma frase todo o programa que tenho em mente, tenho de pronunciar o slogan: Abaixo Euclides!

As palavras pronunciadas por Dieudonné permitem perceber que a

proposta de modernização procurava “revolucionar” o ensino de Matemática.

A Matemática Moderna foi uma reforma que aconteceu em paralelo com

a de uma política de formação que objetivava a modernização econômica. A

reforma industrial foi a pioneira, trazida pelo pós-guerra, após a Rússia lançar o

Sputinik, em outubro de 1957, o que possivelmente também influenciou

mudanças a fim de preparar jovens, melhorando o ensino de Ciências. No caso

da Matemática o grupo Bourbaki fez parte dessas mudanças. De acordo com

Guimarães, a questão central que o grupo deveria pensar era “O que ensinar em

Matemática”, sua resposta então foi que deveria se ensinar Matemática Moderna,

que na concepção bourbakista, existe três idéias que ocupam lugar chave: a

unidade da Matemática, o método axiomático e o conceito de estrutura

Matemática. (GUIMARÃES, 2007, p. 23)

Os estudos matemáticos direcionaram as propostas do Movimento da

Matemática Moderna e tinham como principal objetivo apresentar a Matemática

de maneira axiomática e unificada, em que os elementos de unificação seriam as

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relações, as estruturas e os conjuntos. As propostas trazidas pelo Movimento

adquiriram força pelas idéias defendidas por Jean Piaget.

O Movimento avançou internacionalmente em 1969, quando a CIEM

organizou seu primeiro Congresso Internacional para o Ensino de Matemática,

cuja idéia era obter uma Matemática que pudesse contribuir mais diretamente

com a ciência, a técnica e a economia moderna. Isso poderia diminuir o

descompasso, ou seja, as divergências entre a Matemática exigida nos estudos

científicos e tecnológicos e a Matemática ensinada nas escolas de nível médio.

No Brasil, diversas informações sobre o Movimento da Matemática

Moderna foram divulgadas com o apoio do Ministério da Educação e Cultura do

Brasil. Assim, as novas tendências apareceram com o Movimento e quem não

aderisse ou se interessasse por elas era considerado desatualizado. A seguir, são

apresentadas as influências desse movimento para o ensino de Matemática no

Brasil.

2.2. Reformas no Ensino da Matemática no Brasil

Para uma melhor compreensão do Movimento da Matemática Moderna

no Brasil, é apresentada a estrutura de reformas anteriores a esse período no

país.

No sistema de ensino brasileiro, duas importantes reformas curriculares

aconteceram na primeira metade do século XX: de Francisco Campos (1931) e a

proposta por Gustavo Capanema (1942).

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O primeiro programa de ensino da disciplina Matemática no Brasil

desenvolveu-se a partir da Reforma Francisco Campos, “uma primeira tentativa

de estruturar todo o curso secundário nacional e de introduzir nele os princípios

modernizadores da educação” (MIORIM, 1998, p. 93). A discussão da reforma do

ensino secundário iniciou na gestão de Francisco Campos no Ministério da

Educação. O argumento do ministro era que o mundo vivia sob o sinal do

econômico, como já viveu em outros tempos sob o sinal do religioso e do político.

Daí a necessidade de uma reformulação do ensino de forma que os indivíduos se

preparassem técnica e profissionalmente para uma sociedade das profissões.

Segundo Pires (2003), a Reforma Francisco Campos pretendia realizar a

fusão de três campos matemáticos (Aritmética, Álgebra e Geometria) numa única

disciplina, com o objetivo de trabalhá-las de forma articulada e inter-relacionada,

uma vez que os três eram abordados de forma independente e desarticulados,

além de defender a idéia de que o ensino da Geometria dedutiva deveria ser

antecedido de uma abordagem prática da Geometria. O principal protagonista

desse processo foi o educador Euclides Roxo, então professor e diretor do

Colégio Pedro II, no Rio de Janeiro - considerado um colégio modelo na época -

que compôs o programa pioneiro para a Matemática no Brasil, a partir de suas

leituras do movimento internacional de renovação da disciplina e das experiências

didáticas norte-americanas.

Nesta Reforma, a concepção de currículo foi ampliada para além de uma

listagem de conteúdos a serem ensinados, sem maiores conexões com a

realidade dos estudantes, originando, ainda, uma discussão de âmbito nacional

acerca das orientações didáticas.

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Mas, foi na gestão do ministro Gustavo Capanema que se promulgou em

9 de abril de 1942, a Lei Orgânica do Ensino Secundário, também conhecida

como Reforma Capanema. Por esta lei foi instituído, no ensino secundário, um

primeiro ciclo de quatro anos de duração, denominado ginasial, e um segundo

ciclo de três anos, denominado colegial. Este último ciclo, que na Reforma

planejada por Francisco Campos apresentava três opções, passou a ter apenas

duas, o curso Clássico e o Científico. Segundo Pavanello (1989) os novos

currículos previstos na Lei Orgânica caracterizavam-se pela predominância do

enciclopedismo, com valorização da cultura geral e humanística.

O ensino de Matemática nos anos 1950 era formulado de acordo com a

proposta de ensino do Colégio Pedro II. O programa era fragmentado, sem

articulação entre os tópicos e muito extenso. As aulas eram fundamentalmente

expositivas, as resoluções de exercícios eram de acordo com modelos e as

demonstrações eram decoradas pelos alunos. Os recursos didáticos eram

limitados.

O currículo privilegiava as disciplinas da área de ciências humanas,

sendo dedicado ao ensino da Matemática, no máximo, três horas semanais. A

maioria dos professores não tinha formação em nível superior. Os licenciados em

Pedagogia, Ciências Sociais, História Natural e Química poderiam lecionar a

disciplina de Matemática.

No Brasil, algumas questões sobre o Ensino de Matemática surgiram a

partir da década de 1950, quando ocorreram os primeiros congressos nacionais

de ensino de Matemática. Em 1955, aconteceu o I Congresso Nacional de Ensino

de Matemática, realizado em Salvador, Bahia, sob uma iniciativa da Faculdade de

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Filosofia da Universidade da Bahia. Teve como objetivo discutir problemas

relacionados ao ensino da Matemática e contou com a participação de

aproximadamente 100 professores, em grande parte do estado da Bahia, de São

Paulo, Rio Grande do Sul, Espírito Santo, Pernambuco e Rio Grande do Norte.

Foi aprovada uma proposta que buscava unir as várias áreas da Matemática e

extinguir alguns tópicos julgados dispensáveis. As idéias presentes ainda foram

as impostas pelo movimento de modernização do início do século, não

evidenciaram de temas da Matemática Moderna. Os pontos considerados

“modernos” eram os que se referiam ao uso do estudo dirigido em Matemática,

recomendados devido aos bons resultados que vinham apresentando em colégios

de aplicação (MIORIM, 1998, p. 111).

Nesse Congresso, nas conclusões votadas em plenário, foram sugeridos

programas que não fossem rígidos, que pudessem ser adaptados de acordo com

as circunstâncias, condenado-se o que era considerado ensino “excessivamente

abstrato e teórico”, propondo um ensino que enfatizasse as aplicações, “a

conexão entre a Matemática e as outras Ciências” e a “revolução histórica da

Matemática”. A necessidade de uma maior valorização do ensino da Matemática

no secundário expressava-se na resolução aprovada, que propunha a ampliação

da carga horária semanal para quatro aulas no ginásio e cinco no colégio e era

justificada, de um lado, pelo caráter disciplinador do espírito inerente à disciplina

e, de outro pela influência da Matemática no progresso científico em geral

(BURIGO, 1989, p.43).

A Secretaria da Educação, em convênio com a Faculdade de Filosofia da

USP, criou, em 1957, o Colégio de Aplicação, destinado à prática docente dos

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alunos da Faculdade, permitindo experiências de renovação pedagógica e

pesquisas educacionais. No ano seguinte à criação do colégio, Scipione Di Pierro

Neto foi aprovado em concurso para Coordenador do curso de Matemática do

mesmo.

O II Congresso Nacional foi realizado em 1957, na cidade de Porto Alegre

(RS), e contou com uma maior participação de docentes, comparada ao do I

Congresso. Desta vez estiveram presentes 240 professores. Odila Barros Xavier,

professora de didática e metodologia da Matemática do Instituto Educacional de

Porto Alegre, e Aurora U. P. de Azevedo, professora Fiscal da Escola Nossa

Senhora da Glória, apresentaram o trabalho intitulado “Sugestões para

Programas em Cursos de Aperfeiçoamento de Professores Primários”, baseadas

nas experiências que desenvolveram em cursos de especialização para

professores primários com a proposta de um programa, embasado em Piaget e

Gattegno, que incluía teoria dos conjuntos, correspondência biunívoca,

propriedades dos conjuntos e diferentes sistemas de numeração, que seriam

estudados por meio de sua evolução histórica. Estas seriam as primeiras

sugestões para introduzir temas da Matemática Moderna no primário.

A introdução do estudo das propriedades de diferentes conjuntos

numéricos e estruturas algébricas é sugestão de Ubiratan D´Ambrosio, hoje

mestre e doutor em Matemática, professor emérito da Unicamp e consultor da

UNESCO, que apesar de não ter comparecido ao congresso teve suas idéias

apresentadas pelo professor Benedito Castrucci, autor de vários livros didáticos,

doutor em Ciências Matemáticas pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras

da USP e um dos fundadores da Sociedade Brasileira de Matemática.

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O professor Osvaldo Sangiorgi, licenciado em Física pela USP, em 1943,

mestre em Lógica pela Universidade de Kansas, nos Estados Unidos, em 1961;

doutor em Matemática pela USP em 1973; e livre-docente pela Escola de

Comunicação e Artes da USP, publicou 84 livros, entre 1954 e 2000, sendo um

dos maiores autores do Movimento da Matemática Moderna. Ele apresentou no II

Congresso Nacional a tese que foi iniciada com a questão “Matemática Clássica

ou Matemática Moderna na elaboração dos programas do ensino secundário?”

Para o professor Sangiorgi, a diferença entre a Matemática Clássica e a Matemática Moderna residia, sobretudo no fator de uma “ter por base os elementos simples” e a segunda um “sistema operatório, isto é, uma série de estruturas (Bourbaki) sobre as quais se assenta o edifício matemático”. (BURIGO, 1989 p. 46)

Na tese do Major Prof. José Emanuel Barbosa foi defendida que era

fundamental a atualização do ensino. O ensino secundário deveria contribuir para

a aproximação do estudo das ciências com estudante por meio das técnicas e

métodos produtivos e fortes do momento.

Na cidade do Rio de Janeiro, em 1959, foi realizado o III Congresso

Brasileiro do Ensino da Matemática, no qual foram aprovadas propostas que

recomendavam cursos de aperfeiçoamento para os professores do secundário, a

fim de prepará-los para a Matemática Moderna. No evento também dr propôs a

divulgação do movimento nas Faculdades de Filosofia, além de sugerir práticas

no ensino secundário que introduzissem as idéias da Matemática Moderna.

Esses dois últimos congressos, apesar de apresentarem, mesmo que

timidamente, algumas idéias do Movimento da Matemática Moderna, não foram

os responsáveis oficiais para que o Movimento começasse no Brasil.

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Em 1960, Osvaldo Sangiorgi, entre outros professores da América Latina,

participou de um curso na Universidade de Kansas, nos Estados Unidos, que

buscava difundir as propostas do Movimento da Matemática Moderna.

Fui convidado a participar dessas reuniões, fiquei lá quatro meses, sabendo que aquele pessoal estava realizando, verificando que o governo americano tinha uma preocupação que nós aqui quase nunca temos que é de reciclar os professores (SANGIORGI- depoimento oral para BURIGO, 1989, p. 104).

Ao retornar ao Brasil, Sangiorgi organizou o primeiro curso de

aperfeiçoamento para professores, no Instituto Mackenzie, em 1961. O objetivo

era iniciar a divulgação das propostas sobre o movimento, que entrara em contato

durante os cursos em que participou nos Estados Unidos. Também participou da

organização desse curso o professor George Springer, renomado matemático

americano da Universidade do Kansas, que teve sua vinda garantida por meio de

um acordo com a NSF. O curso, composto por quatro disciplinas, foi ministrado

por professores da USP, do Mackenzie e também pelo professor George

Springer. Alguns desses alunos foram os primeiros professores a desenvolverem

experiências em termos de Matemática Moderna. (BURIGO, 1989, p. 105)

Ainda neste mesmo ano, ao término do curso, foi fundado o Grupo de

Estudos do Ensino de Matemática (GEEM), em São Paulo. Faziam parte deste

grupo alguns professores do ensino elementar e do secundário, e seu fundador e

presidente foi Osvaldo Sangiorgi. O GEEM tinha como objetivo realizar a

divulgação das propostas do movimento da Matemática Moderna entre um maior

número de professores, por meio de cursos de aperfeiçoamento realizados em

diversas cidades brasileiras, organizados e ministrados pelos seus membros.

(BURIGO,1989, p. 106)

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O grande impulso, entretanto, o marco decisivo para a constituição do Movimento da Matemática Moderna no Brasil, que permitiu a divulgação ampla da nova proposta para além de círculos restritos de educadores e a realização de experiências apoiadas numa discussão articulada foi, sem dúvida, a criação do GEEM (Grupo de Estudos do Ensino da Matemática), em São Paulo. (BURIGO, 1989, p. 104)

O IV Congresso Nacional de Ensino da Matemática, realizado em 1962,

em Belém, no estado do Pará, apresentou em sua pauta a “Introdução da

Matemática Moderna na Escola Secundária”, cujas propostas apresentadas pelo

GEEM, com trabalhos que tiveram sucesso e propuseram um programa para a

escola secundária, norteados por planos modernizadores que sugeriam temas

que se aproximassem da teoria dos conjuntos e das estruturas algébricas. Maior

ênfase foi dada ao estudo das propriedades das operações, o estudo de

diferentes sistemas numéricos foi recomendado, assim como o estudo das

funções. (BURIGO, 1989, p. 108)

O GEEM coordenou, em 1966, o V Congresso Nacional, no Centro

Técnico da Aeronáutica em São José dos Campos, em São Paulo, voltado para a

Matemática Moderna na escola secundária, unida com os ensinos primário e

universitário, tendo como tema “Matemática Moderna na Escola Secundária:

articulações com o ensino primário e com o ensino secundário”.

Foram realizadas sessões de estudos sobre vários aspectos relacionados à Matemática Moderna e a seu ensino, aulas-demonstração sobre temas específicos de primeiro e segundo graus, comunicações – em sua maior parte de experiências realizadas com a Matemática Moderna -, exibição de filmes sobre temas relacionados ao ensino de primeiro e segundo graus e exposição de material didático para o ensino moderno de Matemática (MIORIM, 1998, p. 114).

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O V Congresso foi o primeiro que contou com a presença de matemáticos

estrangeiros: Marshall Stone, dos Estados Unidos, Hector Merklen, do Uruguai,

Helmuth Völker, da Argentina, e George Papy, da Bélgica. Este último,

matemático e professor da Universidade de Bruxelas, Bélgica (BURIGO, 1989, p.

156). A conferência no V Congresso deste renomado representante belga

enfatizou a importância da teoria de conjunto e da escolha adequada de situações

didáticas para sua aprendizagem. A escolha de situações é de grande

importância; elas precisam genuinamente ilustrar os conceitos introduzidos sem

limitar o seu alcance por serem indevidamente especiais. Elas precisam ser

atraentes e interessantes e deixar lugar para elaboração. É dever do professor

introduzir essas situações de modo que os alunos possam responder a elas. Elas

devem ser apresentadas de tal modo que os alunos venham a perceber um fato

essencial a respeito da matemática – que ela tem unidade e estrutura

(MEC/CADES: Anais do V Congresso Brasileiro de Ensino de Matemática, p. 84).

O processo do Movimento ficou mais evidente, devido a sua divulgação

na imprensa que publicava e comentava sobre os cursos oferecidos pelo GEEM,

que sem dúvida foi um dos resultados positivos do Movimento da Matemática

Moderna no Brasil, pois foi o primeiro grupo formado com o objetivo de discutir

Matemática, realizando reuniões que contribuíram com a formação dos

professores daquela época.

O apoio da mídia impressa atuou como força propulsora do Movimento da Matemática Moderna , incentivando, divulgando e principalmente levando ao conhecimento do leitor as mudanças que estavam ocorrendo nos métodos de ensino da Matemática Moderna liderado pelo GEEM. Aproveitando-se desse apoio, o GEEM, representado pelo professor Osvaldo Sangiorgi, difundiu os ideários do Movimento na tentativa de demonstrar para os leitores que essa reforma no ensino de Matemática era necessária

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para a melhoria do ensino, impondo mudanças na cultura escolar (NAKASHIMA, 2007 p. 143).

Apesar de este não ser único, foi o primeiro grupo formado a partir do

evento, outros surgiram, como o Grupo de Estudos de Ensino de Matemática de

Porto Alegre (GEEMPA), o Núcleo de Estudos e Difusão do Ensino da

Matemática de Curitiba (NEDEM) e o Grupo de Estudos e Pesquisas em

Educação Matemática do Rio de Janeiro (GEPEM).

Os livros didáticos publicados a partir da divulgação do Movimento

estavam de acordo com as orientações que foram sugeridas, provocaram a

implantação da Matemática Moderna nas escolas brasileiras. O professor Osvaldo

Sangiorgi publicou, em 1963, o primeiro livro didático para a primeira série

ginasial: “Matemática Curso Moderno” (BURIGO, 1989, p. 109).

A organização da Matemática Moderna baseava-se na teoria dos conjuntos, nas estruturas Matemáticas e na lógica Matemática. Esses três elementos foram responsáveis pela “unificação” dos campos matemáticos, um dos maiores objetivos do movimento. Para isso enfatizou-se o uso de uma linguagem Matemática precisa e de justificações Matemáticas rigorosas. Os alunos não precisam “saber fazer”, mas sim, saber justificar por que faziam. A teoria dos conjuntos, as propriedades estruturais dos conjuntos, as relações e funções, tornaram-se temas básicos para o desenvolvimento dessa proposta. (MIORIM, 1998, p. 114)

A implantação da Matemática Moderna nas escolas, tanto no Brasil

quanto em outros países, foi motivo de grande controvérsia, a começar pelos

cursos do GEEM que, até 1970, apresentavam formalmente os conteúdos da

Matemática Moderna.

As propostas dos cursos do GEEM consistiam em uma iniciativa que mostrava preocupação com a formação dos professores, porém não demonstrava tanta atenção à maneira como os docentes deveriam aplicá-los, sendo, uma proposta baseada na

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racionalidade técnica, visando ao treinamento. (LIMA, 2006, p. 121).

O trabalho desenvolvido pelo GEEM foi influenciado por Zoltan Dienes,

nascido na Hungria, que fez os seus estudos primários e secundários na França,

e passou depois para a Inglaterra, onde Doutorou em Matemática e em

Psicologia. Ele interessou-se profundamente pelo estudo da formação de

conceitos e os processos do pensamento abstrato envolvendo principalmente o

ensino da Matemática. Tomou parte ativa nas reuniões de Royaumont e

Dubrovnick, que desencadearam o movimento de renovação dos programas de

Matemática no ensino secundário. Porém, ele ultrapassou as recomendações e

sugeriu caminhos para a renovação do ensino da Matemática já nas primeiras

idades escolares, e até nas pré-escolares. Dienes não propôs mudança nos

conteúdos dos programas de ensino, mas na forma como os professores

ensinavam seus alunos, principalmente, nas séries elementares. Ele preocupava-

se com o “como” o conteúdo era ministrado ao aluno (BONAFÈ, s.d., p. 4).

No GEEM, Dienes fez a divulgação de sua metodologia e dos ‘blocos

lógicos’, por meio dos cursos para professores. Seu trabalho foi o esforço mais

importante de desenvolvimento de uma proposta pedagógica consistente com as

descobertas da psicologia piagetiana (BURIGO, 1989, p. 171).

Dienes esteve em São Paulo, em 1971, convidado pelo GEEM. Durante

uma semana participou de cursos para professores primários e secundários. Os

trabalhos desenvolvidos por Dienes foram vistos como uma alternativa contra os

“exageros” cometidos em razão do Movimento da Matemática Moderna.

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As produções de Papy e de Dienes influenciaram alterações na ênfase

dada ao conteúdo para destacar a Metodologia. Isso contribuiu para uma divisão

no GEEM, acarretando o encerramento das atividades no ano de 1976 e sua total

extinção em 1978. (LIMA, 2006, p. 111-114) Outros motivos que colaboraram

para a divisão do grupo se deram devido às visões políticas e pedagógicas

diferenciadas em seu interior e, até mesmo, pela própria idealização de seus

cursos. Um exemplo dessa divergência voltada à proposta dos materiais de

Zoltan Dienes para o primário foi observada por Soares:

...alguns membros apoiavam estas idéias e outros, apesar de não rejeitar o trabalho desenvolvido por ele, não via possibilidade, do ponto de vista prático, de introduzir sua metodologia nas escolas públicas brasileiras. [...] Sendo que Dienes não propunha nenhuma mudança radical de conteúdo, mas sim na forma como esse conteúdo era apresentado aos alunos. Com o desgaste do Movimento da Matemática Moderna e a divisão no interior do grupo, o GEEM encerrou suas atividades em 1976, sendo extinto em 1978. (SOARES, 2001, p.88)

Por volta de 1973, após a publicação do livro de Morris Kline, O Fracasso

da Matemática Moderna, surgiram as mais claras críticas em relação à

Matemática Moderna no Brasil. Os professores da época se sentiram amparados

pelo autor e mostraram seu ponto de vista referente a esse Movimento da

Matemática Moderna.

As críticas multiplicaram-se a partir de 1970, ao se constatar que o colocado em prática não era um ensino renovado e democrático de Matemática, preparando para a compreensão da ciência, mas um ensino formalizado ao extremo, decepado de todo suporte intuitivo, apresentado a partir de situações artificiais além de ser bastante seletivo (PIRES, 2000, p. 14).

O professor Elon Lages Lima do IMPA, de acordo com Soares (2001)

afirmou que o uso excessivo da teoria dos conjuntos levaram a uma “conjuntivite”

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e está sendo prejudicial pelo exagerado desligamento da realidade e por ser

excessivamente moderno” .

Gustave Choquet fez a seguinte declaração:

Estou estarrecido com o que constato no ensino da escola primária e da secundária. Fui um dos promotores da reforma de ensino da Matemática, mas o que eu preconizava era simplesmente uma poda de galhos mortos, atravancadores, e a introdução de um pouco de álgebra. Pois bem, em suma, os novos programas e as instruções correspondentes são mais satisfatórios que os antigos, em que pesem erros do seu desenvolvimento. Em particular, um ataque contra a Geometria e contra os recursos da intuição: foi dito aos professores que seria lastimável que eles estudassem triângulos e que a álgebra linear substituiria toda a velha Geometria... o resultado é tal que, sem uma forte reação de base, eu penso que a geração atual de nossa escola receberá uma formação Matemática que não a prepara nem para a pesquisa, nem para a utilização da Matemática em técnicas ou ciências experimentais. (CHOQUET. Apud. SOARES, 2001, p.112)

O professor Sangiorgi também, em artigo publicado no jornal O Estado de

São Paulo, em 1975, reconheceu os erros que foram cometidos e apontou quais

foram os principais efeitos da Matemática Moderna no ensino:

1. Abandono paulatino do salutar hábito de calcular (não sabendo mais tabuada em plena 5ª. e 6ª. séries!) porque as operações sobre conjuntos (principalmente com os vazios!) prevalecem acima de tudo; acrescenta-se ainda o exclusivo e prematuro uso das maquininhas de calcular, que se tornaram populares do mesmo modo que brinquedos eletrônicos.

2. Deixa-se de ensinar frações ordinárias e sistema métrico decimal – de grande importância para toda a vida – para se aprender, na maioria das vezes incorretamente, a teoria dos conjuntos, que é extremamente abstrata para a idade que se encontra o aluno.

3. Não se sabe mais calcular áreas de figuras geométricas planas muito menos dos corpos sólidos que nos cercam, em troca da exibição de um rico vocabulário de efeito exterior, como por exemplo, “transformações geométricas”.

4. Não se resolvem mais problemas elementares – da vida quotidiana – por causa da invasão de novos símbolos e de

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abstrações completamente fora da realidade, como: “O conjunto das partes de um conjunto vazio é um conjunto vazio?”, proposto em livro de 5ª série (SANGIORGI. Apud. SOARES, 2001, p. 116).

Anterior às críticas citadas acima, o professor Scipione, no final da

década de 1960, publicou no jornal O Estado de São Paulo, artigo no qual relata o

uso exagerado da simbologia da Lógica Matemática e dos elementos da Teoria

de Conjunto no ensino da Matemática Moderna (NAKASHIMA, 2007, p.135). Este

artigo será explorado no capítulo 3, para contribuir com a análise da visão do

professor Scipione frente ao Movimento da Matemática Moderna.

O modo como se deu o esgotamento do Movimento da Matemática

Moderna, em meados da década de 1970, ainda é escasso na documentação, a

não ser pelos artigos citados anteriormente e pela idéia de que uma das vertentes

desse esgotamento é de caráter interno ao movimento: a fragmentação do

GEEM, fato que não foi documentado. As conjecturas sobre essa fragmentação

foram formadas a partir de depoimentos de membros do grupo, que muitas vezes,

não se aprofundam em seus relatos. Há, também, algumas evidências sobre os

questionamentos de professores sobre a eficiência da proposta do movimento

influenciaram essa divisão no interior do GEEM.

O último texto, publicado nos jornais sobre o Movimento da Matemática

Moderna, foi intitulado “Denunciada na USP a falência da Matemática Moderna”,

editado em O Estado de São Paulo, na data de 12 de abril de 1980. Trata-se de

uma entrevista concedida pela professora Elza Furtado Gomide, do Departamento

de Matemática Pura do Instituto de Matemática da USP, na qual ela afirmou que,

embora a pretensão da Matemática Moderna tenha sido razoável, na tentativa de

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curar os defeitos da escola tradicional, que dava ênfase aos cálculos

complicados, com perda de tempo na manipulação das frações, expressões

algébricas, entre outros, ocorreu um exagero desastroso nos critérios da adoção,

excesso de entusiasmo “acompanhado de pouco discernimento do que era

realmente importante ministrar, para o real aprendizado dos alunos”

(NAKASHIMA, 2007, p. 108).

Neste capítulo foi apontado, portanto, os principais fatos ocorridos

durante o Movimento da Matemática Moderna, destacando-se os importantes

personagens importantes dessa história. As informações aqui obtidas contribuirão

com o capítulo seguinte, que apresentará o professor Scipione, sua trajetória

didática e editorial e as idéias que defendeu durante esse importante período da

História da Educação Matemática. Compreender o Movimento da Matemática

Moderna auxiliará na análise das escolhas feitas por Scipione como autor de

livros didáticos na mesma época e permitirá que se verifique se ele seguiu alguma

tendência dessa reforma.

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CAPÍTULO 3

SCIPIONE DI PIERRO NETO

Este terceiro capítulo apresenta o professor Scipione Di Pierro Neto,

algumas de suas realizações profissionais e sua participação no Movimento da

Matemática Moderna. As idéias contidas nesse capítulo devem conduzir a uma

melhor compreensão das escolhas que este professor fez em suas produções

didáticas analisadas nessa pesquisa.

3.1. Biografia

Scipione Di Pierro Neto, nascido em

São Paulo, em 5 de junho de 1926, filho de

Francisco José Di Pierro e Felícia Bifulco Di

Pierrô, cursou o primário no Grupo Escolar

Rocca Dordal – Brás – SP, o ginásio no Colégio

Paulistano até 1944, e no Colégio Anglo Latino,

estudou o Colegial, concluído em 1947.1

Começou sua vida na Matemática na

antiga Faculdade de Filosofia, Ciência e Letras

da USP, onde estudou os dois primeiros anos

do Curso de Matemática até 1951,

1 A biografia do Professor Scipione Di Pierro Neto foi concedida pela Editora Scipione, por e-mail encaminhado pela funcionária Danyela Silveira em fevereiro de 2008.

Figura 3.1

Professor Scipione Di Pierro Neto, foto publicada na Educação Matemática em Revista, número 9, ano 8, abr. 2001, p.5

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interrompendo o curso, que era diurno e período integral, para se casar e

ministrar de 50 a 60 aulas semanais. Em 1954, retomou o curso de licenciatura

na Pontifícia Universidade Católica onde foi aluno de Abraão de Moraes,

Fernando Furquim de Almeida, Edson Farah, Elza Furtado Gomide e Benedito

Castrucci.

No magistério do estado de São Paulo ingressou em 1955, por meio de

concurso e foi designado, por outro concurso, para dirigir a área de Matemática

do Colégio de Aplicação da USP, criado em 1957, por um convêncio entre a

Secretaria de Educação e a Faculdade de Filosofia da USP. Scipione

permaneceu no Colégio até o final da década de 1970. Esse cargo foi seu

passaporte para a entrada na Universidade de São Paulo, onde passou a

ministrar aulas de Metodologia de Ensino de Matemática para os cursos de

licenciatura.

Scipione foi um importante personagem no Movimento da Matemática

Moderna no Brasil, por ser autor de livros didáticos na época e, também, por

ministrar cursos organizados pelo GEEM, como o que aconteceu em 4 de

outubro de 1971, na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Rio Claro,

quando falou sobre o “Trabalho dirigido no ensino da Matemática”. (LIMA, 2006,

p. 94)

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3.2. A participação e o olhar do Professor Scipione Di Pierro

Neto para o Movimento da Matemática Moderna

O professor Scipione concedeu entrevista para Elizabete Zardo Burigo,

que fez parte de sua dissertação de mestrado. A fita que contém essa entrevista

foi cedida por Burigo ao GHEMAT e serviu como fonte para a presente pesquisa,

que contém trechos do depoimento oral dado.

Em 1959 foi desenvolvida uma experiência no Colégio de Aplicação da

USP, coordenado pelo Professor Scipione Di Pierro Neto. A proposta de tal

experiência mantinha o currículo e os programas oficiais da época, a renovação

da proposta era basicamente a dos métodos e processos de ensino com o

objetivo de buscar a integração das disciplinas, tanto nas aulas comuns como

em trabalhos desenvolvidos pelos alunos fora das aulas (BURIGO, 1989, p.

143).

As “classes integradas” foi uma experiência desenvolvida em 1962, de

acordo com o professor Scipione, havia em cada série uma disciplina que era

defendida como o “centro de interesse”. O planejamento das outras disciplinas

partia da elaboração inicial dessa disciplina adotada como a central.

Segundo o professor Scipione, em Matemática, o planejamento era feito

em dois níveis:

Os outros professores faziam um planejamento para atender a todas as unidades que esse centro de interesses tinha feito. Como a Matemática sofre muito com isso, é difícil compatibilizar capitanias hereditárias com o mínimo múltiplo comum (...) então não foi só por títulos que se fez a integração, se fazia uma integração por objetivos. Qual era o objetivo? Movimentar esse tipo de oração mental. Então a gente fazia dois planejamentos;

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um para atender a esse centro de interesses e um planejamento de conteúdos de Matemática. E nós nos reunimos uma vez por semana, os professores de Matemática para auxiliar um ao outro na coordenação vertical. (DI PIERRO NETO, depoimento oral, s.d.)

Ainda de acordo com o autor, dentre as idéias propostas pelo

Movimento da Matemática Moderna, o Colégio de Aplicação deu mais destaque

ao uso da linguagem dos conjuntos (DI PIERRO NETO, depoimento oral, 1988).

Foi apresentado que o GEEM foi elemento fundamental para a

introdução do Movimento da Matemática Moderna no Brasil. Os trabalhos

desenvolvidos no Colégio de Aplicação da USP não repercutiram no GEEM, pois

o professor Scipione, que fazia o elo de ligação entre o Colégio de Aplicação e

as atividades desenvolvidas pelo grupo, não era muito ativo no GEEM. E, talvez

por isso, as experiências desenvolvidas no Colégio tenham apresentado as

idéias do Movimento de maneira discreta.

Nós fizemos as coisas com muita moderação. (...) O que fizemos foi usar um pouco da teoria dos conjuntos, que não tem nada a ver com o que se pretendeu fazer, por exemplo, (...) você algebrizar a Geometria. (DI PIERRO NETO, depoimento oral, s.d.)

Segundo o professor, as idéias que acompanhavam o Movimento eram

“experimentadas” no Colégio de Aplicação, com a intenção de verificar o que

realmente tinha significado para o aluno.

Certa vez nós quisemos saber se aquela conversa de estrutura Matemática de grupo, se as crianças aprendiam. E, segunda etapa, se isso tinha algum sentido. Nós chegamos à conclusão de que eles aprendiam. (...). Então os alunos decoravam a sigla ANIC (associatividade, elemento neutro, elemento inverso, comutatividade). (...). Mas isso não significava nada, depois de

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dois meses aquilo não tinha nenhum significado. Então nós abandonamos. (...). Nós experimentávamos: não tinha significado, nós abandonávamos. (DI PIERRO NETO, depoimento oral, s.d.)

Em 1969, as experiências do Colégio de Aplicação foram interrompidas

em decorrência de conflitos internos, ocasionados basicamente em

conseqüência da repressão ao movimento estudantil da época (BURIGO, 1989,

p. 145).

A participação do professor Scipione no Movimento da Matemática

Moderna no Brasil pode ser confirmada em artigos que publicou e notícias nas

quais apareceu em jornais da época.

Em 1969, Scipione escreveu texto para o jornal O Estado de São Paulo

intitulado “A Matemática na Escola Moderna”. No texto, o autor apresenta as

dificuldades dos pais dos alunos em entender a Matemática ensinada aos seus

filhos nos ensinos primário e secundário e apresenta o depoimento do pai de um

aluno:

O senhor sabe professor, eu acompanho as lições do meu filho em Português, Geografia, História e até em Ciências, mas de “Matemática Moderna” eu não entendo. No meu tempo, tudo era diferente. Hoje está tudo diferente. Hoje está tão mudado; conjuntos e mais conjuntos, estruturas e não sei o quê. Eu não consigo acompanhar mais. Eu acho que meu filho não entende bem essa Matemática porque na Escola Primária ensinaram-lhe a “antiga”. Já minha filhinha menor que está no primário sabe tudo sobre os conjuntos. É bem verdade que outro dia ela não sabia fazer uma continha de dividir, mas acho que é porque ela não sabe tabuada. De resto ela vai indo muito bem em Matemática. Tem notas ótimas. (DI PIERRO NETO, 1969)

A partir deste depoimento, o professor Scipione afirmou, em 1969, que

todo professor, embora já tenha ouvido esse discurso, não tem uma boa

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explicação para o problema da Matemática atual. O autor disse também que não

pretendia responder sobre esse problema para os pais ou para os responsáveis

pela escola, pois sua intenção era levantar para análise alguns problemas que

estavam diretamente ligados ao assunto, ensinar Matemática Moderna, e iniciou

falando sobre a interpretação dada a esse termo:

Fala-se em ‘Matemática Moderna’ como se existisse uma ‘nova’ Matemática que superou a ‘antiga’ e que por isso deixou de lado como imprestável e obsoleta. Os leigos (e entre eles permitam-me colocar aqueles que apenas estudaram há algum tempo na escola secundária ou talvez um pouco mais) formaram a idéia de que esta ‘Matemática Moderna’ é contingente essencial e indispensável às modernas conquistas da civilização, (cibernética, computadores astronáutica, etc) e que uma simbologia de flechas simples, flechas duplas, contra flechas, letras AA viradas de cabeça para baixo, letras EE de marcha à ré, cortadas ou não por um traço, são os legítimos representantes da ‘Matemática Moderna’, e pior do que isso, que um quadradinho, uma cebolinha ou um rabanete devem estar no lugar onde deveria estar a incógnita, senão a Matemática é ‘antiga’ (DI PIERRO NETO, 1969) .

O autor continuou sua análise, afirmando que é lamentável que alguns

excelentes professores, talvez despreparados, sentiram-se obrigados a ensinar a

Matemática chamada Moderna, para não serem considerados desatualizados e

enfatizou os riscos que isso poderia causar:

O lamentável da História é que alguns autodidatas – via de regra excelentes professores de Matemática – e parte dos professores primários, ficaram sujeitos a essas idéias sem possuírem os elementos necessários para a triagem indispensável e se viram face a opção muitas vezes dolorosa: ou adotar os procedimentos sob a forma que os conseguir entender, ou correr o risco de ser considerado ultrapassado. Apenas o esforço sério e honesto destes mesmos professores, freqüentando cursos de férias, estudando, lendo, tem superado dificuldades maiores, mas também não se pode afirmar que essas dificuldades estão totalmente superadas (DI PIERRO NETO, 1969).

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Para Scipione, a modernização da Matemática poderia acontecer, mas

seria em longuíssimo prazo. Destacou que o estudo de algumas operações com

conjuntos e o uso de alguns símbolos da Lógica Matemática devem servir como

ferramentas auxiliares para o professor de Matemática do ensino secundário e

atentou que os alunos deveriam compreender que o uso desses elementos eram

auxiliares importantes na comunicação com a Matemática e não a própria

Matemática.

Em seu texto apontou, ainda, o risco de se ensinar “Matemática

Moderna” no ensino primário ao dizer que nesta fase a criança está ingressando

no estágio das operações concretas, um conceito da fase lógico formal, segundo

Piaget, e ensinar o conteúdo matemático de modo formal, pode estar acima do

nível mental da criança.

Penso que se deve verificar o que importa antes aos objetivos da Escola Primária: respeitar as estruturas mentais das crianças ou os rigores dos conceitos matemáticos. A mim não padece dúvida que será sempre piagetiano realizar o aperfeiçoamento dos conceitos que a criança adquire nas experiências naturais, até que, no momento oportuno, se formará o conceito matemático rigoroso (DI PIERRO NETO, 1969).

O autor considera como um encargo de sua profissão – professor –

encontrar em Piaget uma razão plausível para fundamentar o emprego das

estruturas algébricas na escola secundária, principalmente no primeiro ciclo.

Observa que a idade mental do aluno é quem vai determinar qual o aprendizado

que lhe deve ser proporcionado e as estruturas Matemáticas só terão sentido

para o estudante, como visão de conjunto, a partir do conhecimento ao menos

razoável dos campos numéricos e das operações que podem definí-los.

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Destacou, ainda, que durante seu trabalho, o professor busca a

sensibilidade sobre a noção de conjuntos numéricos e que as ampliações

sucessivas dos campos numéricos, a partir da necessidade de realizar outras

operações, constituem inclusive objetivo específico no ensino da Matemática. Tal

objetivo, se atingido, ocorrerá no final do curso colegial e será raro o aluno

adquirir essa sensibilidade sobre o campo real (DI PIERRO NETO, 1969). É

provável que muitos dos argumentos usados pelo professor Scipione nesse

artigo sejam baseados nas experiências realizadas no Colégio de Aplicação da

USP.

Em seu depoimento à Burigo, o professor Scipione fez, de certa

maneira, uma avaliação sobre o que teria sido o Movimento da Matemática

Moderna. Apontou que algumas das idéias foram mal interpretadas e a

amplitude com que era divulgado o Movimento pode ter provocado um

“modismo”: “O que aconteceu? Era moda. E quem não seguisse ou quem não se

entusiasmasse era considerado ultrapassado”. (DI PIERRO NETO, depoimento

oral, s.d.)

O professor ousou, ainda, chamar o Movimento da Matemática Moderna

de trator, que privilegiava a Álgebra e relegava a um segundo plano a exploração

do espaço segundo a tradição euclidiana e a omissão de cursos ministrados

experimentalmente por F. Papy em alguns estados brasileiros, onde a

algebrização da geometria através de idéias que eram fundamentas numa

álgebra vetorial foi publicada e recomendada.

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Scipione não conseguiu esclarecer porque o Movimento não vingou,

pois ficou em dúvida se por inconsistência dos próprios cursos ou pela falta de

adequação e preparação dos professores para tanto. Talvez se houvesse um

programa oficial que orientasse de maneira pontual o seguimento dos cursos

ginasiais e colegiais e situassem os professores sobre o papel que deveriam

desempenhar em sala de aula, as idéias propostas pelo Movimento poderiam ser

melhor implementadas, o que poderia facilitar a avaliação desse Movimento para

o ensino de Matemática.

Um dos pontos positivos do Movimento, segundo o professor Scipione,

foi a formação de grupos de estudos para o Ensino de Matemática e o

entusiasmo dos professores em buscar formação: “Os professores se

entusiasmaram. Muitos estudaram mais. Muitos se dedicaram a fazer pós-

graduação, com o desenvolvimento dos cursos de pós-graduação”. (DI PIERRO

NETO, depoimento oral, s.d.)

O que certamente incomodou Scipione nas propostas do Movimento da

Matemática Moderna, de acordo com seus depoimentos, foi o abandono da

descoberta ou redescoberta do conhecimento matemático, pelos processos

indutivos do reconhecimento da realidade e a resolução de novos problemas em

que a participação do aprendiz deve ter posição privilegiada, pois trata da

essência do pensamento matemático produtivo.

Avaliou, também, que não houve dosagem entre o os conteúdos

acessíveis aos professores e às crianças:

E nós chegamos à conclusão de que essas coisas eram bobagens porque o que se podia utilizar nas atividades de Matemática

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aquelas propriedades que faziam parte da estrutura de grupo, mas falar em estrutura matemática de grupo, a estrutura matemática pra nós, professores e falar para as crianças tem uma distância enorme. (DI PIERRO NETO, depoimento oral, s.d.)

Essa observação de Scipione está de acordo com uma que aparece nos

Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), publicado em 1998, onde se faz uma

breve análise da trajetória das reformas curriculares, principalmente ao

Movimento da Matemática Moderna, como uma via de acesso vantajosa para o

pensamento científico e tecnológico, por meio da aproximação da Matemática

desenvolvida na escola com a vista pelos estudiosos e pesquisadores. É

avaliado como o maior problema do Movimento que: “o que se propunha estava

fora do alcance dos alunos, em especial das séries iniciais do ensino

fundamental”. (BRASIL, 1998, p. 19)

3.3. A sua Tese de Doutorado

Um dos primeiros trabalhos sobre Educação Matemática defendido no

Brasil foi a tese de doutorado do professor Scipione, concluída na USP, em

1973, sob o título de Contribuição ao ensino da Geometria elementar. O tema

escolhido foi o das deficiências no ensino de Geometria, que tradicionalmente,

seguiu o modelo axiomático euclidiano, segundo análise feita pelo próprio autor

em algumas obras didáticas, nos trechos em que introduziu a Geometria ao nível

dos 12,5 – 13 anos de idade. As questões de pesquisa são levantadas para

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verificar o nível de aprendizagem de Geometria atingido pelo aluno ao final do 1º

grau.2

1) Quais os objetivos do ensino da Geometria?

2) Que conteúdos devem ser desenvolvidos para se atingir aqueles

objetivos?

3) Quando os conteúdos elencados anteriormente devem ser

introduzidos?

Para responder a estas questões, Scipione analisou a evolução da

aprendizagem da Geometria na escola fundamental, sob a visão das estruturas

operatórias da inteligência, baseadas em Piaget e orientada pela Dra. Amélia

Americano Domingues de Castro. Para a formulação dos objetivos do ensino da

Geometria realizou cinco levantamentos que denominou de pesquisas.

A primeira pesquisa dos prováveis objetivos foi levantada junto a 13

professores de Matemática do Colégio de Aplicação da USP, coordenados pelo

autor. O instrumento número 1o para a realização do trabalho foi considerado

pelo grupo como provisório e deveria ou poderia servir como base para

posteriores investigações. A relação provisória dos prováveis objetivos da

geometria, ao nível do curso ginasial foi:

1. Desenvolver a capacidade de pensar e o raciocínio lógico do aluno.

2. Familiarizá-lo com o estudo das figuras geométricas.

2 De acordo com a legislação vigente na época, o aluno devia concluir o 1º grau com 14 anos de idade.

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3. Possibilitar a aquisição de técnicas e habilidades fundamentais com as figuras geométricas.

4. Possibilitar o entendimento e a fixação de conceitos.

5. Levá-lo a entender o que seja um modelo matemático.

6. Movimentar e desenvolver operações mentais.

7. Desenvolver a capacidade de transferir aprendizagens.

8. Construir as etapas da abstração.

9. Desenvolver e aperfeiçoar a visão espacial do aluno

10. Mostrar que a Matemática é vital e suas aplicações estão ligadas aos problemas do cotidiano. (DI PIERRO NETO, 1973, p. 28)

A segunda pesquisa foi obtida através de estudos realizados por quatro

grupos de licenciandos em Matemática, os grupos foram divididos da seguinte

maneira:

1º Grupo: Alunos do 4º ano da seção de Matemática da USP – diurno;

2º Grupo: Alunos do 4º ano da seção de Matemática da USP – noturno;

3º Grupo: Alunos do 4º ano da seção de Matemática da FFCL – São

Bento da PUC.

Cada grupo foi dividido em equipes com 4 ou 5 componentes, sendo que

em cada equipe deveria ter pelo menos dois componentes que exercessem o

magistério de Matemática há no mínimo dois anos.

O instrumento número 2 foi resultado dessa segunda pesquisa:

PROVÁVEIS OBJETIVOS DA GEOMETRIA AO NÍVEL DAS CLASSES TERMINAIS DO CURSO DE 1º GRAU.

A) Estudo sistemático das propriedades das figuras geométricas.

B) Aquisição de técnicas e habilidades fundamentais com as figuras geométricas.

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C) Desenvolvimento da capacidade de raciocínio lógico.

D) Fornecer elementos teóricos para estudos posteriores.

E) Dar ao aluno a noção de dimensão.

F) Desenvolvimento de um senso de organização.

G) Desenvolvimento da capacidade de transferir aprendizagens (aplicação de conhecimentos adquiridos na solução de situações problema).

H) Fixação de conceitos.

I) Organização do raciocínio lógico do aluno.

J) Mostrar, ao aluno, uma sistematização lógica na Matemática.

K) Mostrar, rudimentarmente, ao aluno, aplicações da Matemática à resolução de problemas do cotidiano.

L) Não tem um fim em si mesmo, sendo apenas um instrumento para outros campos da Matemática.

M) Movimentar e desenvolver operações mentais (observar, reconhecer, relacionar, comparar, levantar hipóteses, sintetizar, analisar, concluir,...).

N) Proporcionar ao aluno a construção das etapas de abstração.

O) Mostrar que a linguagem matemática é tradução fiel do pensamento.

P) Dar idéia de um modelo matemático.

Q) Desenvolver a capacidade de expressão lógica. (DI PIERRO NETO, 1973, p. 29-30)

A terceira pesquisa foi obtida a partir da segunda, por meio da opinião

de 300 professores de Matemática de São Paulo que os apresentaram numa

ordem crescente de importância. Os objetivos que, segundo o autor,

prevaleceram foram, em ordem:

C) Desenvolvimento da capacidade de raciocínio lógico.

M) Movimentar e desenvolver operações mentais.

I) Organização do raciocínio lógico do aluno.

B) Aquisição de técnicas e habilidades fundamentais com as figuras geométricas.

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G) Desenvolvimento da capacidade de transferir aprendizagens. (DI PIERRO NETO, 1973, p. 32).

A quarta pesquisa consistiu no levantamento dos conhecimentos e

comportamentos necessários para atingir os objetivos os quais foram traduzidos

em testes. A elaboração dos testes deveria fornecer um diagnóstico para análise

e deveria obedecer aos seguintes critérios: nível e grau de dificuldade (fácil,

média e difícil), e deveria ainda verificar: 1) conceitos, 2) conceitos e técnicas, 3)

raciocínio lógico e operações mentais, 4) raciocínio lógico, operações mentais e

transferências de aprendizagem.

O último estudo consistiu na aplicação dos testes para se verificar o

alcance dos objetivos por parte dos alunos concluintes do 1º grau e foram

aplicados em alunos de 8ª séries dos cursos de 1º grau, em outubro de 1972, e

em alunos de 1ª série dos cursos de 2º grau, na mesma época, a fim de verificar

os conhecimentos essenciais que os alunos adquiriram até aquela data, ou até o

término da 8ª série do 1º Grau.

Quanto à finalização da pesquisa, esta revelou que o aluno pouco ou

quase nada sabia de Geometria ao concluir o 1º grau. O menor desempenho se

deu em termos de domínio de técnicas e habilidades; o pior, a transferência de

conhecimentos.

Para o autor não se poderia introduzir a Geometria a partir da 7ª série,

como era proposta na época, nas séries anteriores teriam suportes eficientes

para uma melhor compreensão da disciplina por parte dos alunos. E sugeriu que

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fossem oferecidas novas opções aos agentes desse trabalho, uma vez que

considerou deficiente a preparação acadêmica.

As conclusões do autor sobre os resultados obtidos foram:

Primeira Conclusão

- O rendimento da aprendizagem da Geometria nas escolas do primeiro grau se situa em níveis muito insatisfatórios. Pode-se bem afirmar que esses níveis são irrisórios.

Segunda Conclusão

- Mesmo sob a pressão das exigências do curso de segundo grau, o conhecimento da Geometria é irrisório ao final do primeiro ano colegial.

Terceira Conclusão

- Partes essenciais de uma programação bem modesta em cursos de Geometria não são aprendidas pelos alunos e provavelmente nem mesmo são examinadas.

(DI PIERRO NETO, 1973, p. 54, 55)

A pesquisa mostrou o que ocorria com o ensino da Geometria, na

época, mas não apontou quais os elementos determinantes das causas de tais

ocorrências.

O autor conjecturou como causas para a produção de resultados

decepcionantes a falta de estrutura das escolas, a deficiência dos currículos

escolares, o despreparo dos professores, os desinteresses dos alunos, os

métodos desenvolvidos e provavelmente outras. Para Scipione, se os problemas

dos métodos e das técnicas fossem resolvidos, modificar-se-iam o interesse dos

alunos e o preparo dos professores poderia ser dirigido segundo uma motivação

eficiente, vinda de especialistas em currículos. Porém, o autor diz não poder

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afirmar que a melhora das técnicas e dos métodos melhoraria a estrutura das

escolas. (DI PIERRO NETO, 1973, p. 55)

Apesar de o autor deixar claro que o objetivo de sua pesquisa era o de

identificar o problema no ensino da Geometria e não o de apresentar soluções,

ele julgou correto apresentar sugestões implícitas às considerações feitas:

Quando nos deparamos com resultados tão pobres como os que foram obtidos na pesquisa, a serem eles verdadeiros ou mesmo que apenas se aproximem da verdade, parece-nos que se devem procurar alternativas.

Quando os estragos do pseudo formalismo arrefecem o ânimo dos professores e alunos, conduzindo a tão pouco, somos obrigados a rever tímidas incursões no campo indicado por Piaget e reestruturado por Gattegno, para propor modificações maiores do que as incipientemente tentadas até aqui eliminando algumas demonstrações, no capítulo, das congruências, em favor da intuição e da redescoberta, para, uma visão atual que atenda às etapas do desenvolvimento mental, oferecer ao pré adolescente a oportunidade de desenvolver a capacidade de criar e descobrir (...)

Desse modo, longe de oferecer soluções prontas e acabadas, estaremos possibilitando a aprendizagem através de ações reversíveis, isto é, de operações, possibilitando a assimilação e a acomodação dos novos objetos aos esquemas do sujeito. (DI PIERRO NETO, 1973, p. 58-59)

A escola primária antiga trabalhou em Geometria, quase que

exclusivamente com problemas métricos, os quais segundo Di Pierro Neto

(1973), tem pouco ou nenhum valor do ponto de vista da construção da base

necessária para a Geometria, além da maneira como são apresentados esses

problemas, que não destacam a noção de relação entre duas grandezas.

O autor afirmou que:

Se o aluno for levado a trabalhar eficientemente com figuras, construindo conceitos por semelhanças e diferenças, estabelecendo relações no campo da Geometria, no período dos 7 ao 11 anos, terá eliminado um fator altamente desfavorável

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para enfrentar a matéria, isto é, a violenta sucessão de fatos novos – ainda hoje apresentados por volta dos 12 – 13 anos de idade – que se superpõem um ao outro em um curto intervalo de tempo, para um indivíduo sem prontidão para o problema....

... A segunda parte da escola de primeiro grau, a que recebe o nome de pré-adolescente, mal saído da fase das operações concretas, aos 12 anos de idade, terá elementos para iniciar a construção do rigor lógico, mesmo que não o imponha a princípio.

O estudo da Geometria não deve sofrer solução de continuidade. Se é certo que não existem obstáculos separando a etapa das operações concretas das formais, será lógico que não se estabeleça um compartimento para o estudo da Geometria, definido pela idade cronológica como tem acontecido. O que se deve respeitar são os níveis de tratamento do problema em função dos níveis da idade mental. (DI PIERRO NETO, 1973, p. 62)

Para o autor esta era uma questão importante, na qual se desejava

obter o rigor lógico esperado pelos psicólogos e exigido pelos matemáticos, cuja

solução devia ser proposta pelos responsáveis pela Matemática e pela didática

da Matemática.

As conclusões do autor sobre o conhecimento geométrico dos alunos,

ao concluírem o 1º grau, serão levadas em conta para analisar a abordagem

dada a Geometria em sua coleção para o Ensino Médio, que o aluno pouco ou

quase nada sabia de Geometria ao concluir o 1º grau, mesmo a coleção

analisada sendo anterior à data de sua tese, o autor pode ter feito o livro

procurando atender algumas de suas preocupações que são melhor exploradas

no trabalho de doutorado. Em algumas manifestações, como a do artigo

publicado no jornal O Estado de São Paulo, o professor Scipione mostra-se

preocupado com os métodos de ensino e com as implicações do Movimento da

Matemática Moderna estava chegando nas práticas de sala de aula, o autor cita

inclusive uma preocupação com o privilégio dado à Àlgebra e um provável

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esquecimento da exploração do espaço e do uso de atividades experimentais.

Teria o autor em seus livros para o colegial deixado sinais dessa preocupação?

A forma como a geometria foi abordada em seus livros permitiria ao professor

que pensasse nos métodos de ensino que estava utilizando? Apesar destas não

serem as questões centrais dessa pesquisa, acredita-se que o estudo

apresentado possa contribuir para as possíveis respostas.

3.3. Sobre suas produções didáticas

As produções didáticas sobre Matemática do professor Scipione

começaram em 1968, com quatro volumes para os atuais 6º ao 9º ano do Ensino

Fundamental, alunos dos 11 aos 14 anos de idade. A Coleção Curso Colegial

Moderno sucedeu essa primeira talvez com o objetivo de dar continuidade, no

colegial, a forma como abordou os conteúdos nas séries anteriores. Seguiram-se

muitos outros trabalhos na mesma linha.

A Editora Scipione foi fundada por ele na década de 1970, com o nome

SCIPIONE AUTORES E EDITORES, que dirigiu por 10 anos e editou seus próprios

livros. A editora, mais tarde, foi comprada pelo Grupo Ática. Em 2005, o

professor Di Pierro Neto era um dos mais antigos autores em atividade. Na PUC

de São Paulo foi professor titular, aprovado em concurso do Departamento de

Matemática, onde lecionou até 2005, ano de seu falecimento.

As obras que produziu e foram publicadas são:

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1) Matemática Para a Escola Moderna – IBEP (Instituto Brasileiro de Edições

Pedagógicas) 4 volumes: 1ª, 2ª, 3ª e 4ª séries do Curso Ginasial – 1968 –

São Paulo;

2) Curso Colegial Moderno – IBEP (Instituto Brasileiro de Edições

Pedagógicas) 3 volumes: 1ª, 2ª, 3ª séries do Curso Colegial – 1968 – São

Paulo (co-autores: Luiz Mauro Rocha e Ruy Madsen Barbosa);

3) Matemática na Escola Renovada – Saraiva Livreiros e Editores S/A – 4

volumes: 1ª, 2ª, 3ª e 4ª séries do Curso Ginasial – 1970 – São Paulo;

4) Matemática Passo a Passo – Scipione Autores Editores Ltda – 4

volumes: 1ª, 2ª, 3ª e 4ª séries do 1º grau – 1974 – São Paulo (co-autora:

Maria Cândida Di Pierro);

5) Matemática na Escola Renovada – Saraiva Livreiros e Editores S/A – 3

volumes: 1º, 2º e 3º anos do Curso Colegial – 1975 – São Paulo (co-

autora: Célia Contin Góes);

6) Matemática – Saraiva Livreiros e Editores S/A – 4 volumes: 5ª, 6ª, 7ª e 8ª

séries do 1º grau (co-autores: Magda Teresinha Angelo, Edson do Carmo

e Lilia Maria Faccio) – 1979;

7) Matemática, Conceitos e Operações – Saraiva Livreiros Editores S/A – 4

volumes: 5ª, 6ª, 7ª e 8ª séries do 1º grau – 1982 – São Paulo;

8) Módulos Instrucionais de Matemática – Scipione Autores Editores Ltda –

24 fascículos para os Cursos Supletivos de 1º grau do Ministério de

Educação e Cultura – 1982;

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9) Desenho Geométrico – Editora Scipione Ltda – 4 volumes: 5ª, 6ª, 7ª e 8ª

séries do 1º grau – 1990 – São Paulo (co-autoras: Cecília Fujiko Karregai

e Elisabeth Teixeira Lopes);

10) Matemática – Curso Fundamental – Editora Scipione Ltda – 3 volumes: 1º,

2º e 3º Colegial – 2º grau – 1990 – São Paulo (co-autora: Nilze Silveira de

Almeida);

11) Matemática, Conceitos & Histórias (I) – Editora Scipione Ltda – 4 volumes:

5ª, 6ª, 7ª e 8ª séries do 1º grau – 1992 – São Paulo;

12) Matemática, Conceitos & Histórias (II) – Editora Scipione Ltda – 4

volumes: 5ª, 6ª, 7ª e 8ª séries do 1º grau – 1995 – São Paulo.

A segunda obra da lista das produções do professor Scipione foi a

escolhida para ser analisada neste trabalho. Isto se deveu por se tratar da

primeira coleção publicada para o ensino colegial editado após a divulgação das

idéias do Movimento da Matemática Moderna.

O estudo sobre a trajetória do professor Scipione, durante a Matemática

Moderna e seus trabalhos envolvendo a Geometria são importantes por oferecer

subsídio à análise do ensino da Geometria no Movimento, exposto no capítulo

seguinte, inclusive contando com pesquisas realizadas pelo próprio Scipione e

visa a fechar os aspectos metodológicos que conduzirão à conclusão deste

estudo que analisa a Geometria abordada na Coleção Curso Colegial Moderno.

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CAPÍTULO 4

O ENSINO DA GEOMETRIA

4.1) O ensino da Geometria antes do Movimento da Ma temática

Moderna, de acordo com a análise de Scipione em sua tese de

doutorado

O professor Scipione em sua tese de doutorado, explicitada no capítulo

anterior, analisou alguns dos livros didáticos que, até a década de 1960,

abordaram a Geometria como um conjunto de axiomas com a pretensão de

fundamentar o curso de Geometria (DI PIERRO NETO, 1973).

O Ensino da Geometria, antes de se falar em reformas no Ensino de

Matemática, era de acordo com Os Elementos de Euclides, que apresentava a

Geometria de modo dedutivo. A maneira como o sistema geométrico foi

apresentado por Euclides nos livros que formam os Elementos, foi considerado "a

própria" Geometria. Não havia outra maneira disponível e podia ser usada no

cotidiano sem objeções visíveis.

Os Elementos de Euclides foram os fundamentos utilizados no ensino de

Geometria até o início do século XX, propiciando sua primeira discussão

sistemática. Também tiveram influência na história, tanto pelo seu método quanto

pelo seu conteúdo matemático. O método euclidiano consiste em assumir um

pequeno conjunto de axiomas intuitivos e, então, provar várias outras proposições

(teoremas) a partir desses axiomas.

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Neste capítulo, as proposições de Euclides são apresentadas conforme

análise feita pelo professor Scipione, em sua tese e, posteriormente, as

tendências deixadas pelo Movimento da Matemática Moderna no ensino da

Geometria.

As propriedades dos objetos matemáticos eram deduzidas por Euclides a

partir de um conjunto de axiomas, os quais o professor Scipione (1973) destaca

em sua tese, justificando que os Elementos de Euclides utilizam o termo

“produzida” ao invés de traçada ou determinada, assim como “produzida” ao

invés de prolongada”. (DI PIERRO NETO, 1973, p. 19)

I. “Uma linha reta pode ser produzida de um ponto qualquer a outro ponto qualquer”.

II. “Uma linha reta finita pode ser produzida de qualquer tamanho em uma linha reta.”

III. “Um círculo pode ser descrito com qualquer centro a qualquer distância daquele centro.”

IV. “Todos os ângulos retos são iguais.”

V. “Se uma linha reta (t) encontra duas outras linhas retas (r e s), de modo a fazer dois ângulos internos (α e β) de um lado da reta menores que dois ângulos retos, as outras linhas (r e s), se encontrarão, se produzidas no lado no qual os ângulos são menores que dois ângulos retos”.

Figura 4.1. Ilustração do Postulado V de Euclides

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Este axioma ficou conhecido como “Postulado de Euclides” ou “Postulado

das paralelas” e foi causa de muita discussão para os matemáticos:

O postulado de Euclides é uma evidência de tipo diferente de outras evidências geométricas e impõe-se com menor força de convicção, razão pela qual o genial Euclides, conforme se verifica procurou se utilizar deste postulado o menos possível demonstrando o maior número de propriedades sem o seu apoio.

Durante mais de dois mil anos inúmeros matemáticos tentaram a demonstração desse postulado e os insucessos começaram a tornar claro que o mesmo deve ser indemonstrável concluiu-se que é necessário aceita-lo sem demonstração ou admitir um postulado equivalente. Gauss em 1793, e outros matemáticos famosos provaram a impossibilidade da demonstração do postulado de Euclides. (GALANTE. Apud. DI PIERRO NETO, 1973, p. 12.)

Os postulados, de maneira geral, tinham seus enunciados em diversos

livros didáticos como no de Osvaldo Marcondes:

Postulados da reta

1º) A reta é ilimitada nos dois sentidos, isto é, não tem origem e nem extremidades.

2º) A reta tem infinitos pontos.

3º.) Dois pontos distintos determinam uma única reta.

Postulados do plano

1º) O plano é uma superfície ilimitada que divide o espaço em duas regiões opostas.

2º) Se uma reta tem dois pontos situados num plano ela está inteiramente contida nesse plano.

3º) Três pontos não alinhados determinam um único plano.

4º) Toda reta de um plano divide-o em duas regiões opostas denominadas semi-planos.

(MARCONDES. Apud. DI PIERRO NETO, 1973, p. 317)

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A tradição euclidiana conduziu diversos autores a formas axiomáticas, o

que gerou o risco de não se aproveitar os recursos disponíveis aos professores e

alunos: o poder criador e descobridor dos jovens que ingressam na etapa das

operações formais, que segundo Piaget esta unidade de conduta se encontra no

período de 11-12 a 14-15 anos, onde o sujeito começa a se desligar do concreto e

a situar o real num conjunto de transformações possíveis. Esta última

descentralização fundamental, que se cumpre ao término da infância prepara o

adolescente, onde o caráter principal é, sem dúvida, a liberação do concreto em

proveito de interesses orientados. (DI PIERRO NETO, 1973, p. 13)

De acordo com o professor Scipione na idade dos 11 aos 15 anos, o aluno

deveria ser conduzido à etapa das operações formais, a partir de estratégias que

despertassem sua critativdade e curiosidade, porém como os livros didáticos

seguiam os axiomas de Euclides, tal processo criativo e descobridor poderia ser

ignorado.

A seguir a apresentação das discussões sobre o ensino da Geometria

durante o Movimento da Matemática Moderna pretende contribuir para a análise

das escolhas do professor Scipione, levando-se em conta as preocupações

apresentadas em sua tese.

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4.2) Algumas discussões sobre o ensino da Geometria durante o

Movimento da Matemática Moderna

As idéias defendidas pelo Movimento da Matemática Moderna

valorizavam a Álgebra, pois, em linhas gerais, a proposta era a unificação da

Matemática a partir das estruturas, em particular, das algébricas. Assim, a

abordagem para a Geometria e para o ensino da Geometria seria por meio das

estruturas algébricas.

Durante o Movimento da Matemática Moderna, em relação ao ensino da

Geometria, identificou-se nas discussões nos Congressos Internacionais, de

acordo com a análise dos textos componentes de seus três posicionamentos

distintos: um que propõe o desenvolvimento pelo estudo das transformações

geométricas, outro pelo estudo dos espaços vetoriais e, um terceiro, que propõe

modificações nos axiomas de Euclides. É a partir desses posicionamentos que se

pretende verificar qual a escolha do professor Scipione e co-autores para a

Coleção Curso Colegial Moderno.

O primeiro posicionamento sugere que o ensino da Geometria seja

desenvolvido por meio das transformações geométricas. É uma abordagem que

possibilita que a Geometria fosse abordada pelas estruturas algébricas, idéia

central do Movimento da Matemática Moderna. As transformações geométricas

teriam o papel de inserir a Geometria na estrutura matemática como um todo, o

que encerraria, por exemplo, a separação da Álgebra e da Geometria.

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O estudo da Geometria pelos espaços vetoriais é ligado a ênfase do rigor

e à linguagem de conjuntos e das estruturas matemáticas, como base para a

unidade Matemática.

O I Congresso Nacional não apresentou discussão específica sobre o

ensino da Geometria. Na ocasião, aprovou-se um Programa de Matemática no

Curso Secundário, sendo que a Geometria constante da terceira e quarta séries

do curso ginasial e da segunda e terceiras séries do curso colegial. A proposta do

ensino essa disciplina baseava-se na Geometria Euclidiana, e no ginásio

desenvolvia-se a Geometria Plana, e no colégio, a Espacial e a Analítica. Esta

divisão não apresentou mudança significativa em relação à proposta anterior.

Algumas discussões, que serão apresentadas a seguir, sobre o ensino da

Geometria aconteceram no II Congresso Nacional, realizado em Porto Alegre, Rio

Grande do Sul, em 1957. Neste Congresso, a subcomissão do Ensino Secundário,

presidida por Roberto Peixoto, apresentou duas teses: A primeira foi dividida em

dois capítulos: “O ensino da Geometria Dedutiva”, do professor Antônio Rodrigues,

e “O Ensino da Geometria Dedutiva na Escola Secundária”, da professora Martha

Blauth Menezes. O professor Benedito Castrucci apresentou a segunda tese com

o título “Sobre o Ensino da Geometria no Ensino Secundário”.

A argumentação do professor Antônio Rodrigues, catedrático de

Geometria da Faculdade de Filosofia da URGS, apresentou os problemas do

ensino da Geometria dedutiva no ensino secundário, na qual destacou que a

demonstração de teoremas feita pelos alunos é sem significado, uma vez que os

estudantes decoravam a demonstração para a realização dos exames. O

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professor Rodrigues não se mostrou contrário a aceitação de um teorema sem

demonstração, uma vez que muitos eram intuitivos, sugeriu a diminuição dos

teoremas demonstrados e que estes sejam selecionados e apresentados num

esquema com os teoremas, que a seu ver, deviam ser aceitos sem demonstração

e, a partir de cada um deles, quais os teoremas que podiam ser demonstrados.

É interessante, tem sido os malfadados teoremas a tabula de salvação dos alunos medíocres que, nos exames, conseguem a nota mínima graças a uma demonstração decorada, usualmente pedida como questão. Domina, também na realização dos trabalhos escolares a preocupação de provar todos os teoremas que aparecem nos livros, sem contudo atender a idade de 12 a 15 anos e a capacidade de raciocínio dos alunos. (...) Deixando de lado o espírito tradicional de apresentar a Geometria como ciência dedutiva por excelência, procura-se selecionar um conjunto de teoremas fundamentais e suas conseqüências principais, que constituem um ótimo material para o treinamento do aluno nas demonstrações. Neste sentido a Geometria dedutiva é encarada mais como iniciação aos métodos demonstrativos do que propriamente o desenvolvimento integral de uma teoria. (CONGRESSO, 1957, p. 341-342)

O segundo capítulo da primeira tese, apresentado pela professora Martha

Blauth Menezes, instrutora de Ensino da Cadeira de Geometria e professora de

Didática Especial da Matemática da Faculdade de Filosofia da URGS, refere-se a

uma experiência baseada na proposta de Rodrigues, realizada no Colégio de

Aplicação da mesma faculdade, com a 3ª série ginasial, em 1956.

Em sua apresentação, Menezes destacou os objetivos do ensino da

Geometria, além de selecionar e ordenar a matéria em três partes:

A) Geometria Intuitiva: importância destacada pela professora, que

enfatiza que seu estudo deve ser amplo e rígido pois é suporte

necessário para aprender Geometria Dedutiva;

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B) Introdução a Geometria Dedutiva: apresentação de postulados

necessários, de axiomas e teoremas com demonstrações intuitivas;

C) Geometria Dedutiva: seleção dos teoremas fundamentais e

estudos dos teoremas neles apoiados.

Essa divisão, segundo a professora, apresentou uma unidade de

pensamento, a Geometria ficou bem definida em unidades didáticas. Menezes

reafirmou a desvantagem e o dano causado ao se introduzir a Geometria

dedutiva com teoremas de demonstrações intuitivas e mostrando-se favorável à

proposta de Rodrigues para resolver a questão:

a apresentação de teoremas de demonstração intuitiva que inicialmente se desenvolve em aula por serem, aparentemente, os mais fáceis, desorientam e confundem todo o aluno. O seu estudo a nada leva já que não exige raciocínio lógico, enquanto se procura encobrir ou disfarçar o conhecimento intuitivo. A solução para essa dificuldade, apresentada pelo professor Rodrigues em sua proposição é interessante e correta, tanto sob o ponto de vista psicológico como do pedagógico: Postulados, axiomas e teoremas de demonstração são todos estudados como axiomas . (CONGRESSO, 1957, p. 357)

Finalmente, apresentou os resultados individuais que obteve com a

aplicação da proposta em uma turma, com a qual realizou a experiência.

Considera boa a aprendizagem da Geometria Dedutiva apesar de a turma ser

heterogênea, ”o que revelaram as observações completas feitas durante os dois

últimos semestres: a aquisição do pensamento lógico efetivo ou nascente, pela

maior parte dos alunos e acentuado gosto pela Geometria Dedutiva que

revelaram”. (CONGRESSO, 1957, p. 366)

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A Geometria Dedutiva foi novamente discutida na apresentação da tese

do professor Benedito Castrucci. O objetivo do ensino da Geometria, para

Castrucci, era fazer com que a demonstração tenha significado para o aluno e que

este gostasse de descobrir uma verdade, a precisão Matemática. A intenção de

sua apresentação foi destacar o cunho formativo do ensino da Geometria e não a

seleção de um programa para essa matéria.

Como a Geometria objetiva o ensino do pensamento dedutivo, então, deve ela ser desenvolvida numa seqüência lógica, mas isto não significa que se devam demonstrar rigorosamente todas as proposições, pois não podemos olvidar o aspecto psicológico e conseqüentemente pedagógico do aprendizado. (CONGRESSO, 1957, p.369)

Castrucci admitiu que a beleza da Geometria estava em aceitar um

mínimo de proposições intuitivas, mas argumenta que esse mínimo não tem

sentido didático e, assim, torna-se desnecessário demonstrar o maior número

possível de propriedades, que seria importante demonstrar apenas as

propriedades compatíveis com a idade dos alunos para que exista a possibilidade

de compreensão por parte deles. Em três itens, Castrucci resume seu

pensamento:

a) Na seqüência dedutiva da Geometria, no curso secundário, o uso da demonstração experimental deve ser feito com oportunidade, para atenuar as dificuldades inerentes à idade dos alunos;

b) Não deve haver confusão nos tipos de demonstração a fim de que o aluno pouco a pouco perceba claramente a diferença.

c) Não devem ser provadas dedutivamente. (CONGRESSO, 1957, p. 371-372).

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Pode-se perceber nas três apresentações semelhanças entre as idéias

defendidas a redução do número de demonstrações de teoremas e a inclusão da

geometria experimental ou intuitiva. Estas idéias podem levar a crer que o

problema que o ensino da Geometria apresentava era a necessidade, talvez

desnecessária, de demonstrar todos os teoremas rigorosamente. As sugestões

apresentadas foram para diminuir a demonstração dedutiva de teoremas e incluir a

Geometria experimental e demonstração intuitiva, tais sugestões visavam a

eliminar que os alunos decorassem a demonstração dos teoremas, que não

tinham significado nenhum para eles.

O III Congresso Nacional realizado, em julho de 1959, na cidade do Rio de

Janeiro, apresentou em relação à Geometria, relatos do Ensino Secundário e

Primário nos quais pode ser destacada a tese de título “O ensino intuitivo da

Geometria”, da professora Martha Blauth Menezes, a mesma que relatou sua

experiência no Congresso anterior. Nos Anais desse congresso, a tese não foi

descrita, porém na sua conclusão é afirmado que: “Deve ser incluída a Geometria

intuitiva na 1ª série do Curso Ginasial, complementando o sistema legal de

unidades”. (CONGRESSO, 1959, p. 44) Acredita-se que a inclusão desta proposta

de Menezes possa ser uma extensão de seu trabalho no Congresso anterior, pois

não é possível saber mais detalhes sobre o ensino da Geometria ou sobre as

razões que levaram a aprovação dessa proposta no plenário.

Nos Anais dos três primeiros Congressos Nacionais de Ensino de

Matemática podem-se destacar o ensino da Geometria nas teses do II Congresso,

nas quais se apresentam com a intenção de construir práticas pedagógicas que

permitam que os objetivos da Geometria dedutiva, proposta na legislação, sejam

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atingidos. Os professores responsáveis pela apresentação mostraram-se

preocupados com essa prática e sugeriram uma proposta para que os alunos

compreendam o significado da demonstração de um teorema. A proposta foi

aplicada e os resultados foram considerados bons.

Apesar de existir notória insatisfação com o rumo do ensino da Geometria,

a Geometria euclidiana, que consta na legislação vigente, não foi questionada. O

que foi discutido foram os procedimentos que podem contribuir para que a

Geometria dedutiva seja entendida e não decorada pelos alunos.

Segundo Soares (2001), algumas frases, talvez mal interpretadas que se

mostraram contra a Geometria Euclidiana, como a de Dieudeonné com “Abaixo

Euclides”, podem ter contribuído para deixar mais crítico o ensino da Geometria no

Brasil, e afirmando-se que mesmo antes das idéias do Movimento da Matemática

Moderna tomarem forma no Brasil, já havia um descaso com o ensino da

Geometria.

Além de sua participação e apresentação de tese no II Congresso

Nacional, pode-se dizer que o professor Benedito Castrucci teve um importante

papel na “modernização do ensino da Geometria”:

Se nós estávamos fazendo um movimento em que tudo tinha que nascer da teoria dos conjuntos e das teorias de estrutura, que era um princípio geral (...) a única coisa que a gente podia dizer em Geometria é que o plano é um conjunto de pontos; o espaço um conjunto de pontos, a reta é um subconjunto do plano, mas depois como é que eu vou dizer, axiomas teoremas e tudo o mais? (...) Então o processo foi sair uma Geometria também por meio de uma estrutura algébrica. Daí fizeram um estudo de Geometria já no ginásio por meio de espaços vetoriais, que é uma estrutura algébrica. (...) E outro caminho foi pelos grupos de transformações, uma estrutura algébrica, uma

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idéia do (Félix) Kline, mas agora passada a limpo para poder funcionar. (CASTRUCCI, Apud BURIGO, 1989, p.171)

O depoimento de Castrucci sugere alguma aproximação do ensino da

Geometria com as principais idéias do Movimento da Matemática Moderna.

Alguns cursos do GEEM, voltados para a Geometria, foram ministrados pelo

professor Castrucci.

Em seu livro, Geometria Curso Moderno, que substituiu “Lições de

Geometria Elementar”, Castrucci justificou as mudanças ocorridas devido ao

Movimento da Matemática Moderna:

Este curso de Geometria substitui as nossas “LIÇÕES DE GEOMETRIA ELEMENTAR”, que durante muitos anos mereceram a preferência dos estudantes, o que nos foi provado pelas sucessivas edições.

Entretanto, em face do movimento irreversível de renovação de conteúdo e de adaptação a novas bases que atingiu a Matemática em grande número de países, sentimo-nos, como participantes que somos dessas idéias no Brasil, de trazer a público uma nova apresentação do curso, precedendo-o das noções indispensáveis de Lógica e de Teoria dos Conjuntos. (CASTRUCCI, s.d., prefácio)

O autor considerou o Movimento da Matemática como uma evolução do

Ensino de Matemática e ponderou quanto às mudanças que deveriam realmente

ocorrer no Ensino da Geometria:

O nosso trabalho na chamada Matemática Moderna tem sido no sentido de uma evolução e não de uma revolução, por isso, achamos conveniente e útil não alterar a seqüência dos assuntos e teoremas da Geometria, tratando-os apenas numa nova linguagem, com base na Teoria dos Conjuntos, pondo em relevo certos aspectos que constituem uma nova atitude e que nos livros tradicionais não eram ressaltados. (CASTRUCCI, s.d., prefácio).

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A proposta de Castrucci, para o colegial, era a retirada de diversos

assuntos de Geometria que considerava desnecessários, porém afirma que as

mudanças deveriam ser sutis para não se tornassem ousadas:

Nos cursos colegiais, aconselhamos a eliminação de diversos tópicos de Geometria que são desnecessários para uma formação inicial geométrica.

Há um movimento para a substituição do conteúdo geométrico no curso colegial e, talvez, no ginasial, por uma algebrização da Geometria, tratando-a como um capítulo de Álgebra Linear.

Acreditamos que esta inovação preconizada por grandes matemáticos não possa ser feita imediatamente, pois a nosso ver seria, no momento, um passo ousado. (CASTRUCCI, s.d., prefácio)

Os dois capítulos iniciais da obra de Castrucci expõem as Noções de

Lógica e da Teoria dos Conjuntos, com o objetivo de situar o estudante com os

novos símbolos e termos apresentados no capítulo subseqüente que aborda a

Geometria, da mesma maneira, como o autor mencionou em depoimento

concedido a Burigo (1989): “Começaremos, então, pela consideração de um

conjunto E de elementos denominados pontos, dotado de subconjuntos chamados

retas e subconjuntos que têm nome de planos.” (CASTRUCCI, s.d., p. 73, grifo do

autor)

No Brasil, a experiência da introdução de novos conceitos de Geometria,

como os de transformação geométrica, isometria e homotetia, foi desenvolvida, em

1965, no Ginásio do Brooklin. Em 1967, o Serviço de Ensino Vocacional da

Secretaria de Educação, coordenado por Lucilla Bechara, Renate Watanabe e

Dorival Antonio de Mello, foi responsável pela iniciativa da realização de um curso

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na área de Geometria. Dois anos mais tarde, em 1969, o GEEM organizou um

curso sobre medidas e Geometria; e vários outros cursos, organizados pelos

GEEM, incluíram a disciplina de Transformações Geométricas. No curso do

Vocacional, a Geometria do plano e do espaço era abordada a partir do conceito

de espaço vetorial, com influência do trabalho de Papy e do grupo da Universidade

de Illinois. As Geometrias não-euclidianas também eram apresentadas na tentativa

de mostrar mais nitidamente os limites da Geometria euclidiana e o tratamento

tradicional dado a Geometria no secundário. O novo tratamento da Geometria era

justificado com a necessidade da atualização do ensino (BURIGO, 1989, p. 170).

Na Metodologia do ensino da Geometria, durante o Movimento da

Matemática Moderna, a maior influência foi de Dienes, com proposta que insistia

que a idade em que a aprendizagem de um dado conceito é possível seria

determinada somente por experimentos. Segundo Burigo, o trabalho de Dienes foi

importante para desenvolver uma sólida proposta pedagógica com as descobertas

piagetianas. Sua proposta era a organização de múltiplas experiências concretas

como ponto de partida para aprendizagem de novos conceitos, baseadas na

importância do pensamento pré-verbal. Em acordo com Piaget, Dienes indicou que

na época a aprendizagem artificial, sem muito significado para o aluno, era

predominante, pois manipular simbolismos não significava um aprendizado real

das estruturas, e não recomendava o esquema formal apresentado em alguns

projetos de Matemática Moderna. (BURIGO, 1989, p. 171)

Soares (2001), na conclusão de sua dissertação, afirmou que o Ensino da

Geometria, via estudo das transformações e espaços vetoriais não chegaou a

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acontecer de fato nas práticas de sala de aula, pois se continuo a ensinar a

Geometria Euclidiana tradicional, utilizando a linguagem dos conjuntos.

A maneira como o ensino da Geometria era discutido durante o

Movimento da Matemática Moderna, os posicionamentos que foram identificados

nos Congressos Internacionais e a proposta sugerida por Rodrigues e Menezes no

II Congresso, para selecionar e ordenar a Geometria em três partes possibilitam

direcionar a análise da proposta para a disciplina na Coleção Curso Colegial

Moderno.

No capítulo seguinte, pretende-se verificar se a conclusão de Soares pode

ser aplicada à produção do professor Scipione na coleção Curso Colegial

Moderno.

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CAPÍTULO 5

A PROPOSTA DO PROFESSOR SCIPIONE PARA O ENSINO DA

GEOMETRIA EM TEMPOS DE MATEMÁTICA MODERNA

Para essa pesquisa foi selecionada a coleção Curso Colegial Moderno,

publicada na década de 1960, pela editora IBEP, cujos autores são Luiz Mauro

Rocha que, em 1968, era Professor de Cálculo Infinitesimal da FEI e da FFCL da

Fundação Santo André, instrutor de Cálculo Infinetesimal da Escola Politécnica da

USP e professor do Colégio Estadual de São Paulo; Ruy Madsen Barbosa, doutor

em Matemática pela Universidade Católica de Campinas, Livre-docente de

Matemática da FFCL de Araraquara e professor do ensino secundário oficial do

Estado de São Paulo, e Scipione Di Pierro Neto, que na época da publicação da

coleção atuava como professor titular de Matemática do Colégio de Aplicação da

FFCL da USP, instrutor de Prática de Ensino da FFCL da USP e da FFCL de São

Bento, da PUC de São Paulo e professor do Colégio Rio Branco.

O objetivo da pesquisa é verificar qual a abordagem dada ao ensino da

Geometria nessa coleção, por ter sido publicada em tempos de Matemática

Moderna.

Para a verificação serão levadas em conta as pesquisas feitas nos

capítulos anteriores, como forma de justificar as escolhas que os autores fizeram

para abordar a Geometria. Pode-se contar, também, com depoimento recente de

Ruy Madsen que, em relação a esta coleção comentou, em depoimento oral, que

o professor Scipione foi o que teve maior influência na editora para a publicação

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dos livros, por ser autor atuante na Editora IBEP, tendo, porém, participado da

elaboração dos dois primeiros volumes.

Os conteúdos que constam nessa Coleção estão de acordo com as

Sugestões para um roteiro de Programa para a cadeira de Matemática, publicado

no Diário Oficial do Estado de São Paulo, em 19 de janeiro 1965, para o curso

secundário (1º Ciclo, 2º Ciclo e Normal), do qual o professor Luiz Mauro Rocha

fez parte da elaboração.

Dessa forma, segundo Choppin (2004), a Coleção Curso Colegial

Moderno estaria exercendo a função referencial, uma vez que existia um

programa de ensino, publicado em 1965 e o livro didático seria o suporte para a

aplicação dos conhecimentos, técnicas ou habilidades que um grupo social

acreditou como necessário para transmitir aos estudantes.

5.1) O primeiro volume

O primeiro volume da coleção foi

apresentado pelos autores como uma

sucessão da série “Matemática para a Escola

Moderna”, do professor Scipione Di Pierro

Neto, cuja idéia surgiu após o V Congresso,

em São José dos Campos, em 1966,

organizado pelo GEEM, que contou com

aulas-demonstração sobre temas específicos

Figura 5.1.1. Capa do volume 1

DI PIERRO NETO, S.; ROCHA, L.M.; BARBOSA, R.M, Curso Colegial Moderno: Matemática. 1ª edição, São Paulo: IBEP, 1967, v.1.

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de Matemática Moderna para o primeiro e o segundo grau. Os autores notaram a

dificuldade de professores de diversos estados em se atualizar no ensino de

Matemática e preocupados com a situação decidiram publicar a obra “Curso

Colegial Moderno”, a fim de minimizar essa dificuldade:

em contato com professores de quase todos os Estados, sentimos bem de perto a angústia com que os nossos colegas se referiam à dificuldade que encontravam para a atualização do ensino da matemática no colégio, dada a inexistência, ao seu alcance, de obras nacionais e estrangeiras.

De fato, só as livrarias especializadas das grandes capitais costumam receber as novidades bibliográficas que vêm sendo publicadas nos países mais desenvolvidos.

Diante desta realidade, resolvemos adotar, em princípio, as seguintes normas para a redação dos três volumes destinados ao colégio:

1. Apresentar, no início do primeiro volume, um capítulo

de FUNDAMENTOS, destinado aos professores ainda não iniciados na “Matemática Moderna”, redigido em linguagem fácil e nível elementar – de modo a que possa ser aprendido e ao mesmo tempo ensinado, no todo ou em parte, aos alunos.

2. Estabelecer um programa global para o colégio, visando a introdução paulatina dos conceitos modernos de funções, relações, matrizes, estruturas algébricas, etc., através de exemplos simples e de numerosos exercícios. Só no terceiro ano, reunindo a experiência adquirida, o aluno terá a formulação exata dos conceitos de grupo, anel, corpo, espaço vetorial, etc, cuja utilidade irá sentir logo no início do curso superior.

3. Reduzir a extensão com que eram anteriormente

tratados alguns assuntos de escasso interesse, em benefício de outros mais exigidos pela ciência moderna. (DI PIERRO NETO; ROCHA; BARBOSA, 1967, p. 9).

A análise da apresentação de uma obra é importante, pois é por meio

dela que se pode considerar como os autores mostraram o que viram no seu

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trabalho e quais as características que nela identificaram. Segundo Choppin, é na

apresentação que os autores podem revelar o que vão aplicar em sua obra:

os prefácios foram considerados dignos de interesse, na medida em que, nos limites de uma exploração sucinta, elaborada e refletida, tais prefácios permitem discernir os projetos conscientes – confessados ou confessáveis – dos autores e medir a clivagem entre os princípios alegados e a aplicação que deles é feita no livro. (CHOPPIN, 2004, p. 559)

Ainda, de acordo com Choppin (2004), os autores de livros didáticos, além

de espectadores de seu tempo, também querem ser agentes, fazendo com que o

livro didático não seja apenas um espelho, mas que ele modifique a realidade

para educar as novas gerações. Na apresentação dessa coleção, os autores

mostraram que tiveram essa preocupação.

No primeiro volume da Coleção Curso Colegial Moderno, a Geometria é

abordada no último capítulo, “Introdução à Geometria no Espaço”, e contou com

as seguintes divisões: Conceitos Primitivos e Axiomas, Ângulos e Diedros,

Perpendicularidade e Paralelismo, Projeções e Triedros.

Nas considerações preliminares desse capítulo, os autores citaram

Euclides como elaborador de uma teoria lógica, na forma axiomática da evolução

de processos práticos e intuitivos da Geometria. A princípio isso pode nos

conduzir à Geometria. Em seguida apresentaram os conceitos primitivos da

Geometria: ponto, reta e plano, os quais disseram serem aceitos sem definição, e

as respectivas representações de cada um deles. Todos os exemplos foram

acompanhados de figuras justificadas em nota.

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Figura 5.1.2. Apresentação de pontos e retas

Fonte: DI PIERRO NETO, S.; ROCHA, L.M.; BARBOSA, R.M, Curso Colegial Moderno: Matemática. São Paulo: IBEP, 1968, p.221, v.1.

Figura 5.1.33. Definição de planos

Fonte: DI PIERRO NETO, S.; ROCHA, L.M.; BARBOSA, R.M, Curso Colegial Moderno: Matemática. São Paulo: IBEP, 1968, p.222, v.1.

3 A figura apresentada é cópia do livro e mantém a ortografia original, sendo a palavra pontos escrita no lugar de planos.

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As definições e os axiomas apresentados foram os de Euclides, porém

nota-se uma adequação de cada um deles com o Estudo da Teoria dos

Conjuntos: “Definição 1: Chama-se ESPAÇO o conjunto-universo da geometria,

isto é, o conjunto E que possui todos os pontos, retas e planos.” (DI PIERRO

NETO; ROCHA; BARBOSA, 1967, p.222). Essa adequação vai de encontro com

a observação de Castrucci, na página 74 deste trabalho.

Em item chamado Intersecções e Inclusões, os autores contaram com a

intuição do leitor para que estes obtivessem todas as relações de igualdade, de

inclusão e os conjuntos de intersecções de dois conjuntos, sejam eles duas retas,

dois planos ou uma reta e um plano. E destacaram a análise dos diversos casos,

visando a apresentação da terminologia usual na geometria, que nem sempre era

a mesma da teoria dos conjuntos, desta última pode-se notar a representações

utilizando símbolos da Teoria dos Conjuntos. (DI PIERRO NETO; ROCHA;

BARBOSA, 1967, p.226). Nota-se, neste item, idéia semelhante à proposta por

Menezes no II Congresso Nacional, quando apresentou a Introdução a Geometria

Dedutiva, que contava com demonstrações intuitivas.

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Fig

Figura 5.1.4. Postulado de Euclides e Intersecções e Inclusões (I)

Fonte: DI PIERRO NETO, S.; ROCHA, L.M.; BARBOSA, R.M, Curso Colegial Moderno: Matemática. São Paulo: IBEP, 1968, p.226, v.1.

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Figura 5.1.5. Intersecções e Inclusões (II)

Fonte: DI PIERRO NETO, S.; ROCHA, L.M.; BARBOSA, R.M, Curso Colegial Moderno: Matemática. São Paulo: IBEP, 1968, p.227, v.1.

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A definição de ângulos e diedros partiu do axioma: “Cada reta r de um

plano α o divide em duas figuras ou regiões α1 e α2 e tais que: (a) as duas regiões

são convexas; (b) a intersecção delas é a reta r; (c) Se X e Y são dois pontos de

α, forma de r, pertencentes um a cada região, a intersecção do segmento XY com

a reta r é um conjunto unitário {P}. Então ângulo é a intersecção de um semi-

plano de origem r com um semi-plano de origem XY”.

Alguns teoremas foram apresentados contando com a sua prova em duas

partes: a existência e a unicidade, outros que os autores consideraram

fundamentais têm sua demonstração apresentada de maneira formal, outros

teoremas foram sugeridos para que os alunos fizessem a demonstração. Desse

modo, pode-se perceber que os autores fizeram essa escolha de acordo, com

sugestões do II Congresso Nacional, onde o professor Benedito Castrucci propôs

que fossem demonstrados apenas teoremas compatíveis com a idade dos alunos,

usando, se possível, demonstrações experimentais que pudessem atenuar as

dificuldades dos alunos e os aproximassem mais do verdadeiro significado de tais

provas.

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Figura 5.1.6. Teorema 1

Fonte: DI PIERRO NETO, S.; ROCHA, L.M.; BARBOSA, R.M, Curso Colegial Moderno: Matemática. São Paulo: IBEP, 1968, p.240-241, v.1.

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Figura 5.1.7. Outros Teoremas

Fonte: DI PIERRO NETO, S.; ROCHA, L.M.; BARBOSA, R.M, Curso Colegial Moderno: Matemática. São Paulo: IBEP, 1968, p.244, v.1.

As projeções apresentadas foram apenas as perpendiculares,

provavelmente, consideradas pelos autores como um subsídio importante

oferecido pela Matemática ao estudante colegial, principalmente aos que

pretendiam freqüentar os cursos técnicos, pois a estes ofereceriam os

fundamentos iniciais da Geometria Descritiva.

A maneira escolhida pelos autores para a abordagem das projeções foi

pela demonstração dos teoremas, o que vai de encontro ao estudo apresentado

no capítulo 3, no qual o professor Scipione afirmou que a teoria dos conjuntos foi

usada numa tentativa de “algebrizar a Geometria”.

Nesse primeiro volume é possível notar a introdução de alguns elementos

da Teoria dos Conjuntos na representação e até mesmo na demonstração de

teoremas, porém conforme pôde ser constatado nos Anais do II Congresso, não

houve um abandono da Geometria Euclidiana, além disso pode-se observar o que

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Figura 5.2.1. Capa do volume 2

DI PIERRO NETO, S.; ROCHA, L.M.; BARBOSA, R.M, Curso Colegial Moderno: Matemática. 1ª edição, São Paulo: IBEP, 1968, v.2.

foi apresentado neste mesmo Congresso por Menezes: A Introdução a Geometria

Dedutiva com a apresentação dos postulados que os autores julgaram

necessários, de axiomas e teoremas com demonstrações intuitivas. E a própria

Geometria Dedutiva com a seleção dos teoremas fundamentais e estudos dos

teoremas neles apoiados.

Foram propostas aos alunos demonstrações de teoremas acompanhadas

por sugestões, com o objetivo de eliminar uma demonstração que fosse decorada

ou que não fizesse nenhum significado para eles, como também aparece em

sugestões da apresentação do Professor Castrucci, no II Congresso Nacional.

5.2) O segundo volume

No segundo volume,

publicado em 1968, os autores

destacam na apresentação que a

parte de Geometria foi introduzida as

primeiras noções de transformações

geométricas e, na parte métrica,

usam o princípio de Cavalieri,

justificaram que essas escolhas se

devem às tendências de outros

países, que iniciaram a busca para a

renovação do Ensino da Matemática.

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Neste segundo volume do nosso curso colegial, damos prosseguimento ao plano didático, de acordo com as modernas técnicas e tendências observadas em países e autores pioneiros na renovação no ensino da Matemática. (...) Na parte de Geometria, introduzimos as primeiras noções de transformações geométricas e na parte métrica, usamos o princípio de Cavalieri. (...) Esperamos dos estudantes e professores a mesma acolhida que dedicaram ao 1º. Volume. As críticas, favoráveis ou contrárias, nos serão igualmente valiosas, para futura orientação.

OS AUTORES São Paulo, Janeiro de 1968.

(DI PIERRO NETO, S.; ROCHA, L.M.; BARBOSA, R.M, 1968, p.6)

Os conteúdos do livro estão divididos em quatro partes, totalizando doze

capítulos. A Geometria é abordada na última parte do livro e seu conteúdo foi

dividido em cinco capítulos: “Segmentos Orientados e Vetores”, “Transformações

Geométricas”; “Superfícies”; “Prismas e Pirâmides”; “Corpos Redondos e

Poliedros”.

A seguir, pretende-se identificar como os conteúdos de Geometria foram

introduzidos e abordados nesse segundo volume. Para isso será feito um

comentário da abordagem do conteúdo no livro seguido de uma relação com os

estudos feitos nos capítulos anteriores.

No Capítulo VIII é abordado: Segmentos orientados e vetores /

transformações geométricas abrange: Translação, Simetria. Rotação, Homotetia e

Produto escalar de vetores, este último aparece como assunto optativo. Os

conteúdos são apresentados utilizando-se a forma vetorial, e contém

demonstração de teoremas.

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Figura 5.2.2. Segmentos orientados e vetores

Fonte: DI PIERRO NETO, S.; ROCHA, L.M.; BARBOSA, R.M, Curso Colegial Moderno: Matemática. São Paulo: IBEP, 1968, v.2, p. 190

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A definição de transformações geométricas é feita de maneira formal, ou

seja, utilizando a linguagem matemática acompanhada de símbolos que sejam

influências das tendências do Movimento da Matemática Moderna.

Figura 5.2.3. Transformações Geométricas

Fonte: DI PIERRO NETO, S.; ROCHA, L.M.; BARBOSA, R.M, Curso Colegial Moderno: Matemática. São Paulo: IBEP, 1968, v.2, p. 203

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Os exercícios propostos foram todos de demonstração e tiveram seus

enunciados destacados por: prove que, mostre que, verifique que. Porém notou-

se na apresentação dos conteúdos que não era feito nenhum exemplo das provas

que são pedidas nos exercícios. No final dos enunciados de alguns exercícios

propostos aparece uma nota com alguma informação que não está contida na

apresentação do conteúdo ou uma sugestão para orientar o aluno no

desenvolvimento da demonstração, o que leva a crer que os autores não

definiram neste volume um padrão que deveria ser seguido na demonstração de

um teorema, acreditando que, para os autores, o rigor matemático não era

objetivo dessas questões.

Figura 5.2.4. Exercícios propostos

Fonte: DI PIERRO NETO, S.; ROCHA, L.M.; BARBOSA, R.M, Curso Colegial Moderno: Matemática. São Paulo: IBEP, 1968, v.2, p. 209.

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Figura 5.2.5. Exercícios propostos

Fonte: DI PIERRO NETO, S.; ROCHA, L.M.; BARBOSA, R.M, Curso Colegial Moderno: Matemática. São Paulo: IBEP, 1968, v.2, p. 211.

O Capítulo IX “Superfícies”, tem sua introdução com o que vai ser

considerado no livro como curvas, e informa que as definições de linha, curvas ou

superfícies no espaço são dadas apenas no ensino superior, no estudo das

funções de uma ou mais variáveis independentes. As linhas consideradas como

curvas nesse capítulo seriam as que os autores consideram usuais como a reta,

as poligonais, a circunferência, a elipse, a hipérbole, a parábola, etc.. E

completaram limitando a definição de apenas algumas superfícies espaciais. (DI

PIERRO NETO; ROCHA; BARBOSA, 1968, p. 221).

Notou-se que houve uma preocupação com a apresentação dos

assuntos, principalmente das figuras, que são bem desenhadas e acompanhadas

de textos explicativos, o que poderia contribuir para uma melhor compreensão por

parte dos alunos, o que para o período era significativo, pois as editoras não

dispunham como hoje, de recursos tecnológicos para a construção e

apresentação de figuras geométricas.

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A definição de superfície cilíndrica foi dada utilizando-se termos da Teoria

dos Conjuntos e seguiu a linha das transformações geométricas e é

acompanhada de ilustração:

Figura 5.2.6. Superfícies cilíndricas (I)

Fonte: DI PIERRO NETO, S.; ROCHA, L.M.; BARBOSA, R.M, Curso Colegial Moderno: Matemática. São Paulo: IBEP, 1968, v.2, p. 221.

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Figura 5.2.7. Superfícies cilíndricas (II)

Fonte: DI PIERRO NETO, S.; ROCHA, L.M.; BARBOSA, R.M, Curso Colegial Moderno: Matemática. São Paulo: IBEP, 1968, v.2, p. 222.

As Superfícies Cônicas seguem o molde anterior para definição:

Seja dada uma curva (C) e um ponto 0, não pertencente a (C). Ao conjunto S de todas as retas que possuem o ponto 0 e são concorrentes com (C), damos o nome de superfície cônica. (DI PIERRO NETO; ROCHA; BARBOSA, 1968, p. 221 – grifo nosso).

Para Superfícies de rotação foi definido:

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Sejam dados: uma reta y, um plano β que contém y e, num dos semi-planos de β, de origem y, uma curva (C). Chama-se superfície de rotação de eixo y e geratriz (C) o conjunto dos transformados dos pontos de (C) por todas as rotações de eixo y e amplitudes θ, com 0 ≤ θ < 2π . DI PIERRO NETO; ROCHA; BARBOSA, 1968, p. 224 – grifo nosso).

Os exercícios desse capítulo pedem algumas construções (exemplo 1) e

provas (exemplo 2):

Exemplo 1: Construir uma superfície cilíndrica dadas três geratrizes. –

(Determinar y. Traçar um plano perpendicular às geratrizes dadas a, b e c.

Determinar o circuncentro do triângulo ABC). (p. 226)

Exemplo 2: Prove que todas as retas tangentes a uma superfície esférica S em

um ponto P∈S estão contidas no mesmo plano. – (Este plano se denomina plano

tangente) (p. 229)

Figura 5.2.8. Exercício proposto

Fonte: DI PIERRO NETO, S.; ROCHA, L.M.; BARBOSA, R.M, Curso Colegial Moderno: Matemática. São Paulo: IBEP, 1968, v.2, p. 229.

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Para os exercícios sobre superfície esférica foram apresentadas

definições, conforme ilustração:

Figura 5.2.9. Definições para os problemas de superfície esférica

Fonte: DI PIERRO NETO, S.; ROCHA, L.M.; BARBOSA, R.M, Curso Colegial Moderno: Matemática. São Paulo: IBEP, 1968, v.2, p. 228.

Os exercícios propostos neste capítulo poderiam despertar nos alunos

um caráter investigativo, uma vez que na apresentação dos conteúdos não foi

feito nenhum exemplo no qual poderiam se basear para solucionar a atividade. As

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questões que envolvem construções conduziriam a uma Geometria Experimental,

acredita-se que a concretização dessas observações só seriam possíveis de

acordo com a sua aplicabilidade em sala de aula, dependendo do trabalho

desenvolvido pelo professor, o que não será discutido neste trabalho.

No Capítulo X, “Prismas e Pirâmides”, os poliedros foram definidos com

base nas transformações geométricas e algumas de suas propriedades

apresentadas por teoremas, seguidos de suas respectivas provas.

Figura 5.2.10. Prismas

Fonte: DI PIERRO NETO, S.; ROCHA, L.M.; BARBOSA, R.M, Curso Colegial Moderno: Matemática. São Paulo: IBEP, 1968, v.2, p. 232.

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Figura 5.2.11. Teorema: Diagonais de um paralelepípedo

Fonte: DI PIERRO NETO, S.; ROCHA, L.M.; BARBOSA, R.M, Curso Colegial Moderno: Matemática. São Paulo: IBEP, 1968, v.2, p. 236.

Para calcular elementos dos poliedros como apótemas e alturas das

pirâmides foram apresentadas as relações a serem utilizadas, porém estas não

foram demonstradas, apenas justificou-se com o Teorema de Pitágoras.

Certamente, os autores consideraram que nesta fase o aluno já teve contato com

o assunto em Geometria Plana, nas séries anteriores.

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Figura 5.2.12. Pirâmide regular

Fonte: DI PIERRO NETO, S.; ROCHA, L.M.; BARBOSA, R.M, Curso Colegial Moderno: Matemática. São Paulo: IBEP, 1968, v.2, p. 238

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Figura 5.2.13. Fórmulas para lados, apótemas e áreas de polígonos regulares

Fonte: DI PIERRO NETO, S.; ROCHA, L.M.; BARBOSA, R.M, Curso Colegial Moderno: Matemática. São Paulo: IBEP, 1968, v.2, p. 239.

Algumas relações entre a base de uma pirâmide e uma seção paralela à

base, que os autores julgaram importantes, foram deduzidas.

Para as áreas laterais e totais das faces de prismas, pirâmides e troncos

de pirâmides, foram apresentadas as respectivas expressões algébricas, levando-

se em consideração que o assunto foi estudado Geometria plana.

As primeiras seqüências de questões propostas neste capítulo são, em

sua maior parte, de cálculos a serem resolvidos usando as expressões algébricas

apresentadas, e muitos deles vêem acompanhadas de sugestões e figuras que

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destacam os elementos dos poliedros a serem considerados na resolução de

cada questão:

Figura 5.2.14. Exercícios propostos

Fonte: DI PIERRO NETO, S.; ROCHA, L.M.; BARBOSA, R.M, Curso Colegial Moderno: Matemática. São Paulo: IBEP, 1968, v.2, p. 245.

Para volumes de poliedros foi usado o conceito de equivalências,

acompanhado das transformações geométicas, de polígonos e de prismas.

Foi apresentada a dedução da fórmula para o cálculo do volume do

paralelepípedo retângulo.

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Figura 5.2.15. Volume do paralelepípedo

Fonte: DI PIERRO NETO, S.; ROCHA, L.M.; BARBOSA, R.M, Curso Colegial Moderno: Matemática. São Paulo: IBEP, 1968, v.2, p. 254-255.

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A extensão da fórmula para outros prisma foi feita por meio do Princípio

de Cavalieri, anteriormente apresentado:

Figura 5.2.16. Princípio de Cavalieri

Fonte: DI PIERRO NETO, S.; ROCHA, L.M.; BARBOSA, R.M, Curso Colegial Moderno: Matemática. São Paulo: IBEP, 1968, v.2, p. 255.

Para a resolução dos exercícios propostos sobre volumes foi possível

utilizar as fórmulas apresentadas, mesmo aqueles que envolveram alguma

demonstração.

Figura 5.2.17. Exercícios propostos

Fonte: DI PIERRO NETO, S.; ROCHA, L.M.; BARBOSA, R.M, Curso Colegial Moderno: Matemática. São Paulo: IBEP, 1968, v.2, p. 264.

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O penúltimo capítulo do volume 2, Capítulo XI, trata dos corpos redondos,

cilindros, cones e esferas, que também, foram definidos a partir das

transformações geométricas.

Figura 5.2.18. Cilindro

Fonte: DI PIERRO NETO, S.; ROCHA, L.M.; BARBOSA, R.M, Curso Colegial Moderno: Matemática. São Paulo: IBEP, 1968, v.2, p. 267.

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As fórmulas das áreas de cilindros e cones foram apresentadas, levando-

se em consideração o que foi estudado em geometria plana:

Figura 5.2.19. Área da superfície cilíndrica

Fonte: DI PIERRO NETO, S.; ROCHA, L.M.; BARBOSA, R.M, Curso Colegial Moderno: Matemática. São Paulo: IBEP, 1968, v.2, p. 268.

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O cálculo de volume desses sólidos foi apresentado pelo Princípio de

Cavalieri:

Figura 5.2.20. Cilindros e prismas equivalentes

Fonte: DI PIERRO NETO, S.; ROCHA, L.M.; BARBOSA, R.M, Curso Colegial Moderno: Matemática. São Paulo: IBEP, 1968, v.2, p. 268-269.

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O volume da esfera foi deduzido a partir da equivalência da mesma com

uma anticlepsidra, definida como sendo a parte do cilindro externa à clepsidra,

que é a reunião dos dois cones.

Figura 5.2.21. Esferas e cilindros equivalentes

Fonte: DI PIERRO NETO, S.; ROCHA, L.M.; BARBOSA, R.M, Curso Colegial Moderno: Matemática. São Paulo: IBEP, 1968, v.2, p. 278.

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Figura 5.2.22. Demonstração: volume da esfera

Fonte: DI PIERRO NETO, S.; ROCHA, L.M.; BARBOSA, R.M, Curso Colegial Moderno: Matemática. São Paulo: IBEP, 1968, v.2, p. 279.

A expressão algébrica para o cálculo da área da superfície esférica parte

do cálculo de volume, porém não foi apresentada de maneira precisa e a

justificativa para isto deveu-se a necessidade de se conhecer Cálculo Integral.

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No final desse capítulo foram apresentadas as partes da superfície

esférica e da esfera e suas respectivas fórmulas para cálculos de áreas e

volumes.

Os exercícios desse capítulo podem ser resolvidos com as informações

apresentadas, embora não se tenha nenhum exemplo com a aplicação das

fórmulas. A maneira como foram apresentados os conteúdos, com ilustrações

bem feitas e textos explicativos, acredita-se que contribuiriam para uma boa

compreensão por parte dos alunos.

O último capítulo apresenta os poliedros, as superfícies poliédricas, o

teorema de Descartes-Euler, os poliedros de Platão e os poliedros regulares. Seu

objetivo foi definir poliedros, poliedros de Platão e os regulares e destacar seus

elementos: vértices, faces e arestas e a relação existente entre os números de

cada um deles. Os exercícios propostos são de demonstrações e de cálculo do

número de elementos, seguindo a relação de Euler.

Este segundo volume apresentou a Geometria Espacial, seguindo

algumas idéias do Movimento da Matemática Moderna, como definições dos

sólidos por meio das transformações geométricas, o que mostra que o professor

Scipione confirma em sua produção, a afirmação que dizia que quem não

aderisse ao movimento seria considerado desatualizado. Porém, não foi

apresentado um modelo inovador para o ensino da Geometria, como nos

exercícios propostos, talvez porque como afirmou Castrucci, poderia ser um

passo um tanto ousado. O estudo da Geometria pelos espaços vetoriais voltou-se

para o rigor da linguagem de conjuntos e das estruturas matemáticas e não foram

muito evidenciados neste volume.

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Figura 5.3.1. Capa vaolume 3

DI PIERRO NETO, S.; ROCHA, L.M.; BARBOSA, R.M, Curso Colegial Moderno: Matemática. 1ª edição, São Paulo: IBEP, 1968, v.2.

5.3) O terceiro volume

No terceiro volume da coleção, o nome do Professor Scipione não

apareceu e de acordo com o Professor Ruy Madsen, em depoimento oral,

Scipione não teria participado da elaboração desse último volume. Como a

proposta foi estudar as produções didáticas desse professor, não analisamos esta

obra.

Contudo, vale informar

que os outros dois autores

afirmaram acreditar que os

objetivos propostos desde o

início da coleção haviam sido

alcançados. Apresentam o

estudo de Geometria Analítica e

Transformações Geométricas

como uma continuidade ao

primeiro volume apoiada na

Teoria das Matrizes,

apresentada no segundo

volume.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

O objetivo deste trabalho foi identificar a proposta para o ensino da

Geometria, na Coleção Curso Colegial Moderno do Professor Scipione Di Pierro

Neto, publicada no auge do Movimento da Matemática Moderna no Brasil.

O estudo sobre o Movimento da Matemática Moderna permitiu conhecer as

idéias que o acompanharam, que de início foi abordado no exterior e chegou no

Brasil na década de 1960. Antes de sua divulgação, alguns Congressos sobre o

Ensino de Matemática foram realizados com a mesma idéia central do

Movimento: modernizar o ensino dessa disciplina, adequando-a aos avanços

tecnológicos.

O professor Scipione foi um importante personagem desse Movimento, pois

foi professor em cursos de licenciatura e autor de livros didáticos. Em suas

entrevistas e em artigos que escreveu, registrados em documentos de seu

arquivo pessoal, como em “rascunhos” de suas propostas didáticas e em sua

tese de doutorado, defendida durante o Movimento, o autor permitiu uma

compreensão de sua visão frente às propostas de mudanças do ensino de

Matemática. Mostrou-se satisfeito com a mobilização dos professores em pensar

como melhorar o ensino da disciplina, apresentando uma postura de cautela

frente às mudanças que poderiam ser radicais e precipitadas. Sua preocupação

com o ensino da Geometria ficou evidenciada em sua tese de doutorado, na qual

buscou, com docentes de diferentes níveis de formação, os objetivos

concernentes à disciplina e baseados nisso, ele e seus colegas, realizaram a

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aplicação de testes em alunos que concluíram o 1o. grau e que iniciavam o 2o

grau. Concluiu que estes não foram preparados para receber a geometria formal

que se iniciaria nessa nova etapa de estudos. A análise dessa tese permitiu

compreender quais as intenções do autor para o ensino da Geometria, sendo uma

delas a de que o aluno, a partir dos 7 anos de idade deveria ser levado a trabalhar

de maneira eficiente com figuras, para então construir conceitos por semelhanças

e diferenças aprendendo relacionar em Geometria a partir de experimentos e

assim depois dos 12 anos teria elementos para iniciarem a construção do rigor

lógico.

O ensino da Geometria, no período do Movimento da Matemática Moderna,

foi direcionado para as transformações geométricas, o estudo dos espaços

vetorias e modificações nos axiomas de Euclides, sendo este último até então

considerado como referência para o estudo da Geometria, levando-se em conta a

idéia central proposta pelo Movimento, que era a Matemática Unificada, abordada

pelas estruturas algébricas e a linguagem dos conjuntos.

Um dos problemas abordados nas discussões dos Congressos Nacionais,

como, por exemplo, as ocorridas no II Congresso, realizado em Porto Alegre, foi

relativo às demonstrações de teoremas feitas pelos alunos, que ocorria sem que

fossem atribuídos significados para eles, pois, na maioria das vezes, decoravam

as fórmulas matemáticas. Ainda neste Congresso, na apresentação da professora

Martha Blatuh Menezes foram destacados objetivos para o ensino da Geometria,

ordenando-a em três partes: i) a geometria intuitiva, cujo estudo deveria ser amplo

e rígido por ser suporte necessário para o aprendizado da Geometria dedutiva; ii)

Introdução a Geometria Dedutiva: com apresentação apenas dos postulados,

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axiomas e teoremas necessários com demonstrações intuitivas; iii) Geometria

dedutiva: seleção dos teoremas fundamentais e dos estudos que neles se

apóiam.

Esta última, a Geometria Dedutiva também foi apresentada pelo professor

Benedito Castrucci, neste mesmo Congresso, onde defendeu que o objetivo da

disciplina era desenvolver uma seqüência lógica, aceitando um mínimo de

proposições intuitivas. As demonstrações deveriam ser feitas de acordo com a

idade dos alunos para que possa existir uma compreensão por parte deles.

Durante o Movimento da Matemática Moderna, a metodologia para o ensino

da Geometria foi influenciada por Dienes, com uma proposta na qual defendia que

a idade da aprendizagem de um conceito deveria ser feita por experimentos.

No primeiro volume da coleção notou-se que na apresentação da Geometria

foi utilizada a linguagem dos conjuntos, uma das fortes tendências do Movimento

da Matemática Moderna, porém a Geometria Euclidiana não foi esquecida e

foram apresentadas e solicitadas como exercícios algumas demonstrações de

teoremas.

No segundo volume, que aborda a Geometria Espacial, os sólidos

geométricos foram definidos a partir das transformações geométricas e, também,

foram apresentadas as demonstrações de alguns teoremas, apenas os

fundamentais para o estudo de cada tópico, como sugerido no II Congresso

Nacional, nas apresentações da professora Menezes e do professor Benedito

Castrucci, quando destacaram a Geometria Dedutiva. Os exercícios propostos

neste volume envolveram cálculos nos quais deveriam ser aplicados as fórmulas

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119

apresentadas e poucos são de demonstrações a serem realizadas pelos alunos, o

que levou os autores a propor que o professor escolhesse a melhor forma de

trabalhar com essas questões, que foram sempre seguidas de figuras ou

sugestões para os alunos.

A maneira como estas questões foram apresentadas estão de acordo com o

que os autores apresentaram no prefácio, quando afirmaram que seria possível

desenvolver a Geometria apenas com símbolos e proposições, porém gráficos e

figuras geométricas ligam à origem prática da Geometria e evita que se afaste de

suas aplicações concretas. Essa foi uma das preocupações que o professor

Scipione apresentou sobre o Movimento da Matemática Moderna.

De acordo com Choppin (2004), que afirma que o livro didático exerce quatro

funções fundamentais: i) função referencial; ii) função instrumental, iii) função

ideológica e cultural e iv) função documental, observou-se que a Coleção Curso

Colegial Moderno exerceu a função referencial, pois os conteúdos constantes

nessa produção estão de acordo com as sugestões publicadas na época. Assim,

os volumes da Coleção foram considerados como suporte dos conteúdos que

durante o período da Matemática Moderna, julgados como necessários.

O professor Scipione, em depoimento oral, denominou o Movimento da

Matemática Moderna de trator, por privilegiar a Álgebra, deixando em segundo

plano a exploração do espaço, de acordo com a tradição euclidiana e a não

divulgação de cursos experimentais ministrados por Papy e Dienes em alguns

estados brasileiros, nos quais a algebrização da Geometria por meio de idéias

que eram fundamentais numa Álgebra Vetorial havia sido publicada e

recomendada. Apesar disso, nos dois volumes da Coleção e, que o professor

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Scipione participou como colaborador foram seguidas as sugestões trazidas pelo

Movimento da Matemática Moderna.

Algumas observações que puderam ser feitas sobre as idéias do professor

Scipione Di Pierro Neto referentes ao Movimento da Matemática Moderna,

permitiram inquirir sobre as escolhas orientadas por ele para sua produção

didática. O autor, segundo constatou-se, apresentou-se cauteloso no que se

refere às mudanças trazidas por essa reforma, como pôde ser verificado no artigo

que escreveu para o jornal O Estado de São Paulo, em 1969. Em sua tese de

doutorado, defendida em 1973, na época do Movimento da Matemática Moderna

não mencionou o Movimento em momento algum do texto. Nas entrevistas que

foram concedidas, relacionadas ao Movimento da Matemática Moderna, mostrou-

se receoso com os exageros do rigor matemático e das formalidades exigidas

pelas tendências trazidas por essa reforma. Porém, na Coleção Curso Colegial

Moderno, observou-se que muitas das propostas do Movimento da Matemática

Moderna foram seguidas. Esse estudo permitiu refletir sobre nossa questão de

pesquisa, que procuramos responder ao longo deste nosso trabalho. Entretanto,

mais que responder perguntas, esta investigação favoreceu o surgimento de

novas questões, tais como: Teria o professor Scipione participado da elaboração

da Coleção, colocando em prática todas as idéias que defendia? A preocupação

que apresentou em relação ao ensino da Geometria, em sua tese de doutorado,

bem como os resultados obtidos, contribuíram para a produção dos tópicos de

Geometria dos seus demais livros didáticos?

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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BONAFÉ, M. Zoltan Dienes e o movimento da Matemática moderna no ensino primário, s.d.

BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: Matemática. Brasília, 1998.

BÜRIGO, E. Z. Movimento da Matemática moderna no Brasil: estudo da ação e do pensamento de educadores matemáticos nos anos 60. Porto Alegre, 1989. Dissertação (Mestrado em Educação) – Faculdade de Educação, Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

CASTRUCCI, B. Geometria curso moderno Lições de Geometria no Espaço, precedidas de noções de Lógica e de Teoria dos Conjunstos. São Paulo: Nobel, s.d.. v. 1.

CHOPPIN, A. História dos livros e das edições didáticas: sobre o estado da arte. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 30, n. 3, p. 579-566, 2004.

CONGRESSO NACIONAL DE ENSINO DA MATEMÁTICA. I, 1955, Salvador. Salvador 1957. Anais do I CBEM. Universidade da Bahia 1955.

______. II, 1957, Porto Alegre. Porto Alegre 1959. Anais do II CBEM. Universidade do Rio Grande do Sul 1957.

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GUIMARÃES, H. M. Por uma Matemática nova nas escolas secundárias: perspectivas e orientações curriculares da Matemática Moderna. In: A Matemática Moderna nas escolas do Brasil e de Portugal: primeiros estudos. São Paulo, 2007, p. 21-45.

JULIA, D. A cultura escolar como objeto histórico. Revista Brasileira de História da Educação, Campinas, SP: SBHE; Autores Associados, n. 1, jan./jun. 2001.

LE GOFF, J. Documento/monumento. In: História e Memória. Campinas: Editora da UNICAMP, 1992, p. 535-549.

LIMA, R. F. GEEM. Grupo de estudos do ensino da Matemática e a formação de professores durante o Movimento da Matemática Moderna no Brasil. São Paulo,

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2006. Dissertação (Mestrado em Educação Matemática) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.

MIORIN, M. A. Introdução à História da Educação Matemática. São Paulo: Atual, 1998

NAKASHIMA, M. N. O papel da imprensa no Movimento da Matemática Moderna. São Paulo, 2007. Dissertação (Mestrado em Educação Matemática) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.

PAVANELLO, R.M. O abandono do ensino da Geometria: uma visão histórica. Campinas, 1989.

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______ . Entrevista concedida a E. Z. Bürigo. São Paulo, s.d.

______ . A Matemática na escola moderna. O Estado de São Paulo, 1º jun. 1969.

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PIRES, C. M. C. Currículos de Matemática: da organização linear à idéia de rede. São Paulo: FTD, 2000.

______ . O que o Exame Nacional de Cursos de Matemática está avaliando? Analisando alguns aspectos das cinco primeiras edições do ENEM. Educação em Revista, São Paulo, v. 14, p. 11-18, 2003.

SILVA, M. C. L. Abaixo Euclides e acima quem? Uma análise do ensino de Geometria nas teses e dissertações sobre o Movimento da Matemática Moderna no Brasil. [S.l: s.n], 2007.

SOARES, F. Movimento da Matemática Moderna no Brasil: Avanço ou Retrocesso? Rio de Janeiro, 2001. Dissertação (Mestrado em Matemática Aplicada) – Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro.

VALENTE, W. R. História da Educação Matemática: interrogações metodológicas. Revista Eletrônica de Educação Matemática, Santa Catarina: UFSC, v. 2, p. 28-49, 2007.

______ . A Matemática Moderna nas escolas do Brasil: um tema para estudos históricos comparativos. Revista Diálogo Educacional, Curitiba, v. 6, n. 18, p. 19-34, 2006.

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ANEXOS

Anexo A

Sugestões para um roteiro de Programa para a cadeir a de Matemática

Publicado no Diário Oficial do Estado de São Paulo

Ano LXXV – Nº 11 – TERÇA-FEIRA, 19 DE JANEIRO DE 1965

Curso secundário – 1º Ciclo, 2º Ciclo e Normal.

Considerando:

1. As possíveis transformações oriundas da aplicação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, relativas aos assuntos que devem compor as disciplinas do curriculum do Curso Secundário;

2. As inúmeras solicitações recebidas pelo Departamento de Educação, provindas de Estabelecimentos de Ensino Secundário do Estado de São Paulo, bem como pais de alunos, no sentido de ser seguido um roteiro para o desenvolvimento das diversas disciplinas, face ao problema da transferência de alunos e professores;

3. A necessidade de ser estudada uma certa ordem nos assuntos, que devem compor a cadeira de Matemática, a serem ensinados nos estabelecimentos que integram a rede do Estado, a fim de que sejam evitadas orientações diametralmente opostas;

4. A importância que deve representar a matemática na formação dos atuais professores primários; a) no atendimento do aspecto de profundidade mais do que o de quantidade; b) na divulgação correta da legislação brasileira de medidas, inclusive as últimas inovações sobre a grafia do cruzeiro;

5. Que além do caráter estrutural do conteúdo da matemática a ser programado para o 2º Ciclo, devem ser atendidas, na medida do possível, as exigências dos exames vestibulares às diversas Faculdades;

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Esta Comissão, designada pelo Departamento de Educação, depois de cuidadosos estudos louvados, principalmente nos resultados aprovados nos Congressos nacionais de Ensino de matemática – que vêm refletindo a solução dada ao mesmo problema, existente em outros países, por Centros Experimentais de Estudos – propõe o seguinte roteiro para os assuntos que deverão constituir os diversos programas de Matemática; no 1º Ciclo, do 2º Ciclo, e do Curso Normal, dos Estabelecimentos Oficiais do Estado de São Paulo, como base para possíveis discussões que outros professores e demais educadores queiram participara por intermédio de sugestões que serão aceitas até o próximo dia 31 de janeiro de 1965.

Prof. Benedito Castrucci – Presidente.

Prof. Osvaldo Sangiorgi – Secretário.

Prof. Luiz Mauro Rocha – Membro.

Profa. Renate G. Watanabe – Membro.

Prof. Alcides Bóscolo – Membro.

São Paulo, 13 de janeiro de 1.965.

PRIMEIRO ANO GINASIAL

1. Conjunto dos números inteiros:

a) representação e sistema de numeração;

b) adição e operação inversa, propriedades;

c) multiplicação e operação inversa, propriedades;

d) potenciação e operação inversa, propriedades;

e) prática da extração de raiz quadrada.

2. Divisibilidade:

a) múltiplos e divisores;

b) números primos;

c) máximo divisor comum e mínimo múltiplo comum.

3. Conjunto dos números racionais (inteiros e fracionários):

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a) representação (fracionária e decimal);

b) adição e operação inversa, propriedades;

c) multiplicação e operação inversa, propriedades;

d) potenciação e operação inversa, propriedades.

4. Estudo intuitivo das principais figuras geométricas.

5. Sistemas de medidas:

a) sistema de medidas;

b) noções sobre outros sistemas, não decimais, em uso.

Observação: Tal programação deverá ser atendida pelo 6º ano primário, que vier a ser criado nos estabelecimentos de Ensino Primário do Estado.

SEGUNDO ANO GINASIAL

1. Razões e Proporções:

a) razões, propriedades;

b) proporções, propriedades;

c) conjuntos de números direta e inversamente proporcionais;

d) regra de três, porcentagem, juros, câmbio.

2. Conjunto de números racionais relativos:

a) inteiros relativos, operações, propriedades;

b) racionais relativos, operações, propriedades;

c) relação de ordem (desigualdade).

3. Equações e inequações do primeiro grau:

a) noção de variável, tradução de sentenças com uma variável da linguagem corrente para a linguagem matemática;

b) resolução de equações simples do primeiro grau com uma variável no conjunto dos racionais relativos, usando as propriedades das operações;

c) resolução de inequações simples do primeiro grau com uma variável no conjunto dos racionais relativos, usando as propriedades.

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4. Sistema de inequações simultâneas com uma variável.

5. Sistemas de duas equações simultâneas com duas variáveis;

a) tradução de sentenças com duas variáveis da linguagem corrente para a linguagem matemática;

b) técnicas de resolução, substituição.

Observação: Tal programação deverá atender inclusive aos alunos que tendo terminado normalmente o 6º Ano Primário, queiram continuar o Ginásio, ingressando na 2ª série.

TERCEIRO ANO GINASIAL

1. Cálculo Algébrico:

a) polinômios, operações, propriedades;

b) frações algébricas, operações, propriedades.

2. Complementação do estudo das equações e sistemas:

a) equações e inequações do 1º grau com uma variável;

b) sistemas de equações simultâneas do 1º grau.

3. Introdução à Geometria Dedutiva:

a) elementos fundamentais: ponto, reta, semi-reta, segmento, semi-reta, segmento, semi-plano, ângulo;

b) polígonos, generalidades, estudo dos triângulos: congruência, propriedades e aplicações.

4. Paralelismo e perpendicularismo:

a) Propriedades fundamentais, postulado de Euclides, conseqüências;

b) Quadriláteros, principais propriedades.

5. Circunferência e Círculo:

a) generalidades, arcos e cordas, propriedades;

b) medida de arcos e ângulo.

6. Construções Geométricas e Transformações:

a) construção com régua e compasso;

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b) transformações geométricas elementares: translação, rotação e simetria.

Observação: Deverá constar ainda deste programa – a título precário os assuntos: razões e proporções, que deverão ser ensinados aos alunos provindo de 2as séries que não tenham dado tais assuntos por circunstâncias de adaptação.

QUARTO ANO GINASIAL

1. Conjunto de números reais;

a) primeiras noções de número real e sua representação na reta;

b) radicais: potências com expoente racional relativo, operações e propriedades.

2. Equações do Segundo Grau:

a) generalidades, resolução;

b) equações biquadradas, equações irracionais;

c) sistemas simples do 2º grau de duas equações com duas variáveis.

3. Funções:

a) função linear e sua representação gráfica cartesiana;

b) resolução gráfica de sistemas de equações;

c) função trinômio do 2º grau, representação gráfica.

4. Semelhança:

a) razão e proporcionalidade de segmentos;

b) teorema de Tales, semelhança de triângulos, semelhança de polígonos;

c) noção de seno e co-seno.

5. Relações métricas:

a) num triângulo retângulo;

b) num triângulo qualquer, lei dos senos e lei dos co-senos;

c) num círculo.

6. Polígonos regulares e medida da circunferência:

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a) polígonos regulares inscritíveis e circunscritíveis no círculo;

b) construção e relação métrica entre os elementos do quadrado, do triângulo eqüilátero, hexágono e decágono regulares;

c) noção sobre medida da circunferência e o número PI.

7. Áreas das principais figuras planas.

PRIMEIRO ANO COLEGIAL

1. Funções:

a) noções gerais;

b) função linear, representação gráfica, estudo da reta;

c) função trinômio do 2º grau, variação, representação gráfica, inequações do 2º grau;

d) função exponencial e logarítmica, uso das tábuas.

2. Seqüências:

a) exemplos de seqüências, princípios da indução;

b) progressões aritméticas e geométricas.

3. Funções trigonométricas:

a) estudo das funções trigonométricas, periocidade, simetria, representação gráfica;

b) relações fundamentais, funções trigonométricas de a (mais ou menos) b, 2ª, a/2, onde a e b representam medidas de arcos;

c) transformação de sen a (mais ou menos) sen b, cos a (mais ou menos) cos b em produto;

d) equações trigonométricas e resolução de triângulos.

4. Introdução à Geometria do Espaço:

a) axiomas e teoremas fundamentais;

b) perpendicularismo e paralelismo, projeção e distância;

c) diedros.

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SEGUNDO ANO COLEGIAL

1. Análise Combinatória e Binômio de Newton:

a) análise combinatória simples;

b) noção de probabilidade;

c) binômio de Newton.

2. Sistemas de Equações lineares:

a) matrizes e determinantes;

b) resolução de sistemas lineares.

3. Ângulos Poliédricos e Poliedros:

a) triedros e ângulos poliédricos;

b) poliedros regulares;

c) prismas e pirâmides.

4. Superfícies e Sólidos Redondos:

a) superfícies elementares: cilíndricas, cônicas e de rotação.

b) Cilindro, cone e esfera.

5. Áreas e Volumes dos principais sólidos.

TERCEIRO ANO COLEGIAL

1. Conjunto dos números complexos:

a) conceito, representação, operações, propriedades;

b) raízes da unidade, equações binômias.

2. Polinômios e Equações Algébricas:

a) polinômios, operações, propriedades.

b) resolução de equações algébricas.

3. Geometria Analítica:

a) estudo da reta;

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b) estudo da circunferência;

c) noções sobre cônicas.

4. Introdução ao Cálculo Infinitesimal:

a) noção de limite e continuidade de funções reais de variável real;

b) derivada de funções racionais e trigonométricas;

c) propriedades das derivadas e aplicação no estudo da variação das funções.

5. Transformações Geométricas:

a) translação, rotação e simetria, propriedades;

b) semelhança, homotetia, propriedades.

CURSO NORMAL

Matemática e Estatística

(Programa destinado às Escolas Normais e Institutos de Educação)

Matemática

1. Conjunto de números inteiros:

a) número inteiro e sua representação; sucessão dos números inteiros;

b) relação de ordem: propriedades;

c) adição e subtração; multiplicação e divisão; potenciação e radiciação; conceito, propriedades, justificação da técnicas operatórias, prova real.

d) numeração; conceito, generalidades (bases modernas), numeração decimal; Princípio da posição decimal; decomposição de um número inteiro numa soma de potencias de 10;

e) divisibilidade; múltiplos e divisores; conceito e propriedades, critérios; números primos; números primos entre si; m.d.c. e m.m.c.; conceito e propriedades, técnicas.

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2. Conjunto dos números racionais (inteiros e fracionários)

a) fração: conceito e generalidades; frações equivalentes; transformações;

b) operações com os números racionais; conceito e propriedades; técnicas;

c) representação decimal dos números racionais (números decimais); operações, técnicas;

d) transformações exata e aproximada; dízimas periódicas.

3. Sistemas de medidas

a) Sistema Métrico Decimal e sestemas não decimais de uso permitido no Brasil.

b) uso correto da legislação brasileira de medidas, inclusive as relativas à moeda nacional.

4. Proporcionalidade e aplicações no comércio:

a) razões e proporções; conceito e propriedades;

b) grandezas proporcionais; porcentagem, regras de três;

c) juros simples; desconto; moeda e câmbio.

5. Geometria intuitiva

a) precisão dos conceitos fundamentais de ponto, reta, plano; semi-reta, segmento, semi-plano; superfície; ângulos; poligonal, polígono; triângulos, quadriláteros; circunferência, círculo;

b) noção de equivalência entre figuras geométricas planas; áreas das principais figuras planas;

c) noção de equivalência entre figuras geométricas sólidas; generalidades sobre os principais sólidos geométricos; áreas das superfícies lateral e total; volumes respectivos.

6. Prática de resolução de problemas:

a) apresentação das diversas estruturas que participam dos problemas do ensino primário; uso de sentenças matemáticas e das propriedades das operações estudadas;

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b) aplicações algébricas: resolução de equações do 1° grau com uma variável e de sistemas simultâneos de duas equações do 1° grau co m duas variáveis, no conjunto dos números reais relativos, usando linguagem de sentenças matemáticas; prática de gráficos (coordenadas cartesianas).

Estatística

(aplicada à Educação)

1. Origem e natureza dos dados estatísticos.

2. Levantamento estatístico; conceito, fases, conclusão.

3. Representações gráficas; gráficos de informação, de análise, de distribuição.

4. Medidas de posição: a média aritmética simples e ponderada; mediana e separatrizes; a moda.

5. Medidas de dispersão e de variabilidade.

6. Curva Normal; construção e interpretação.

7. Amostra e população; considerações gerais.

8. Testes psicológicos e pedagógicos; problemas de elaboração, tradução, padronização e aplicação.

Observação

Dada a importância que representa a formação matemática para o futuro professor primário, sugere-se a distribuição da programação proposta de Matemática e Estatística, pelas três séries das atuais Escolas Normais e Institutos de Educação, na seguinte ordem:

1ª Série:

Matemática: unidades 1 e 2

Estatística: unidades 1, 2 e 3

2ª Série:

Matemática: unidades 3, 4 e 5

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Estatística: unidades 4 e 5

3ª Série:

Matemática: unidade 6

Estatística: unidades 6, 7 e 8.

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Anexo B

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Anexo C

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