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REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO VILA VELHA VILA VELHA (ES) v. 8, n. 1, JANEIRO/JUNHO 2007 ISSN 1518-2975 Scientia: Rev. Cent. Univ. Vila Velha, Vila Velha (ES), v. 8, n. 1, p. 1-170, jan./jun. 2007

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REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO VILA VELHA

VILA VELHA (ES) v. 8, n. 1, JANEIRO/JUNHO 2007

ISSN 1518-2975Scientia: Rev. Cent. Univ. Vila Velha, Vila Velha (ES), v. 8, n. 1, p. 1-170, jan./jun. 2007

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SCIENTIA: REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO VILA VELHA© 2007 Centro Universitário Vila Velha (UVV)

É permitida a reprodução total ou parcial desta obra desde que seja feita sua identificação.

Editores:Danièlle de Oliveira Bresciani Luciana Dantas da S. Pinheiro Renata Diniz Ferreira

Conselho Editorial:Danièlle de Oliveira BrescianiDenise Maria Simões MottaMarlene Elias PozzattoPatrícia Pacheco de BarrosRenata Diniz Ferreira

Consultores ad hoc:Isabel Cristina Louzada CarvalhoJosé Guilherme Pinheiro PiresRachel Diniz Ferreira

Revisão:Tânia Canabarro

Normalização:Gestão.Info Consultoria Ltda

Capa:Juan Carlos Piñeiro Cañellas

Impressão:Grafitusa

Catalogação na publicação elaborada pela Biblioteca Central/UVVScientia : revista do Centro Universitário Vila Velha / Sociedade Educa-

cional do Espírito Santo, Centro Universitário Vila Velha.− Vol. 1, n. 1, (jan./jun. 2000)- . − Vila Velha : O Centro, 2000- .

v. : il.

Semestral. ISSN 1518-2975.

1. Generalidades – Periódicos. I. Sociedade Educacional do Espírito Santo. Centro Universitário Vila Velha.

CDD 000

Revista interdisciplinar semestral

Tiragem: 1.000 exemplares

Indexada na base de dados:• IRESIE, gerenciada pela Universidad

Nacional Autónoma de México (UNAM)

Depósito legal na Biblioteca Nacional (Lei nº 10.944/2004)

Registro no CCN/IBICT

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Endereço: Rua Comissário José Dantas de Melo, 2129102-770 - Vila Velha - ES (Brasil)Tel: (27) 3421-2097E-mail: [email protected] e [email protected] page: www.uvv.br

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SUMÁRIO

EDITORIAL .............................................................................................................. 5

DINÂMICA RECENTE DA ECONOMIA CAPIXABARecent dynamics of the economy of Espírito Santo stateFernando Cézar de Macedo ....................................................................................... 7

AS REPRESENTAÇÕES DO HOMEM CONTEMPORÂNEO SOB A PERSPECTIVA DO CONSUMORepresentations of the contemporary man under the perspective of consumeLúcio Cesar Loyola ..................................................................................................... 29

BY-CATCH OF SOTALIA FLUVIATILIS (GERVAIS, 1853) AND CARETTA CARETTA (LINNAEUS, 1758) IN GILLNETS OVER SOUTH REGION OF ESPÍRITO SANTO STATE – SOUTHEASTERN BRAZILCaptura acidental de sotalia fluviatilis (GERVAIS, 1853) e caretta caretta (LINAEUS, 1758) em redes de pesca na região sul do estado do Espírito SantoRicardo Freitas Netto; Renata Wolfgram Badke ....................................................... 41

A FORMAÇÃO PROFISSIONAL E AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DO CURSO DE EDUCAÇÃO FÍSICA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO VILA VELHA: O BICHO DA GOIABA E O PROCESSO ENSINO-APRENDIZAGEMThe professional formation and the social representations of course of physical education of the Centro Universitário Vila Velha: the education processPriscila Sousa Charpinel; Marcello Pereira Nunes ..................................................... 53

A (IN)CONSTITUCIONALIDADE DO PRAZO PARA IMPETRAÇÃO DO MANDADO DE SEGURANÇAThe constitutionality of the period for impetration the mandamusDaniel Roberto Hertel ................................................................................................. 69

APOIO PSICOLÓGICO AO EDUCANDO:UMA ABORDAGEM HUMANISTA-EXISTENCIALPsychological support for learner: a human-existential approachClaudia Balestriro Pepino ........................................................................................... 95

GLOBALIZAÇÃO E GOVERNANÇA GLOBAL: DESAFIOS E POSSIBILIDADESGlobalization and global governance: challenges and probabilitiesFlávia Nico Vasconcelos; Carolina Avelar de Oliveira; Gustavo Nunes Rodrigues .... 105

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INCLUSÃO DE LEVEDURA DESIDRATADA DE CANA-DE-AÇÚCAR EM RAÇÕES PARA FRANGOS DE CORTEInclusion of sugar cane driet yeast in broiler chickens rationJoão Luís Kill; Marcelo Gomes Martins; José de Assis Belisário; Geraldo Luiz Colnago; Francisco Carlos de Oliveira Silva ......................................... 123

COMPOSIÇÃO QUÍMICA E ATIVIDADE FUNGICIDA DO ÓLEO ESSENCIAL DE SYZYGIUM AROMATICUM (CRAVO-DA-ÍNDIA) NA ONICOMICOSEChemical composition and fungicidal activity of essential oil of syzygium aromaticum (cravo-da-índia) in nychomycosisBertha Batista Venturim; José Luiz Mello Ferreira Neto; Rene Zorzal Vargas; Eduardo Roberto Cole; João Damasceno Lopes Martins; Reginaldo Bezerra dos Santos ................................................................................... 143

INSTRUÇÕES EDITORIAIS AOS AUTORES .......................................... 157

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EDITORIAL

A constante busca pelo conhecimento é uma característica inerente ao ser humano. No entanto boas idéias normalmente não surgem espon-taneamente. A pesquisa, leitura, desafios e a busca de novas idéias devem permear a vida e o cotidiano de cientistas e pesquisadores de todas as áreas do conhecimento. Afinal conhecendo o passado, podemos tomar ações no presente que irão influenciar nosso futuro. O mesmo acontece com o conhecimento científico que é produzido e passado à diante. Estudos pretéritos fornecem importantes ferramentas para a elaboração de novos objetivos e hipóteses, facilitando a trajetória rumo a novas descobertas.

A atual edição da revista Scientia conta com contribuições nas áreas de Meio Ambiente, Saúde e Ciências Humanas, compreendendo os eixos de pesquisa Saúde e Responsabilidade Social, Meio Ambiente, Lazer e Sociedade e Desenvolvimento Socioeconômico Regional e Global, em consonância com o programa de pesquisa institucional em vigor.

O propósito da revista é contribuir e incentivar os nossos leitores a es-tarem imbuídos do espírito científico no desenvolvimento de trabalhos que contribuam para a melhoria do ensino através da consolidação do princípio da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão. Neste sentido, desejamos a todos uma leitura reflexiva e proveitosa que seja elemento de novas investigações científicas.

Professora Danièlle de Oliveira BrescianiPró-reitora de Pós-graduação, Pesquisa e Extensão da UVV

Mestre em Relações Internacionais pela PUC/RJ Doutoranda em Relações Internacionais pela PUC/SP

Professor Werther KrohlingMestre em Biociências e Biotecnologia pela UENF

Doutorando em Ecologia e Recursos Naturais pela UENF

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DINÂMICA RECENTE DA ECONOMIA CAPIXABA1

Fernando Cézar de Macedo2

RESUMO

Analisa o desempenho recente da economia capixaba (1960-2002), tendo como referencial o aproveitamento das oportunidades das polí-ticas de desenvolvimento regional no país, a partir da constituição do Fundo de Recuperação Econômica do Espírito Santo (FUNRES), pois seu primeiro momento de crescimento industrial foi influenciado por esse instrumento. Esgotadas as políticas regionais, o estado capixaba foi beneficiado novamente pelas ações do governo federal que estimulou as exportações brasileiras. Isto beneficiou grandes empresas industriais localizadas no espírito Santo desde metade da década de 70.

Palavras-chave: Economia - Espírito Santo (Estado). Planejamento regional - Espírito Santo (Estado).

1 INTRODUÇÃO

A trajetória da economia capixaba nas últimas quatro décadas foi marcada por especificidades que a tornam um caso interessante no

1 Artigo preparado para o VI Congresso Brasileiro de História Econômica, realizado em Conservatória (RJ), em 2005 e promovido pela Associação Brasileira de História Econômica.

2 Doutor em Economia Aplicada pela Universidade Estadual de Campinas. Professor do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas. E-mail: [email protected].

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estudo regional no país. Primeiro, pelo aproveitamento das políticas de desenvolvimento de corte regionalizado, quando estas ainda estavam na agenda federal (1960-1980). Posteriormente (1980-2003), esvaziados os instrumentos de planejamento e subordinadas as diversas políticas à lógica do ajuste macroeconômico dos anos oitenta e às políticas ne-oliberais dos noventa, este estado continuaria sua trajetória de cresci-mento, impulsionado pelos incentivos às exportações que beneficiariam as grandes empresas produtoras de semi-elaborados que, a partir de meados dos anos setenta, localizaram-se em seu território atraídas pelas boas condições de infra-estrutura e de logística derivadas da atuação da então estatal Companhia Vale do Rio Doce (CVRD).

Da mesma forma, a abertura comercial da última década transformou o Espírito Santo em uma das principais entradas das importações bra-sileiras, em decorrência de incentivo fiscal, com base na renúncia do Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), para que importadores operassem pelo porto de Vitória. Esse conjunto de fatores influenciou sua economia, redefinindo suas relações com os mercados interno e externo.

No entanto, se o crescimento – medido pelos principais indicadores – foi a marca do Espírito Santo ao longo desse período, sua lógica é bas-tante distinta em um e em outro momento, refletindo as acomodações regionais na trajetória da economia brasileira. Como demonstrando na literatura pertinente, em um contexto de baixo crescimento e de enfraquecimento do Estado nacional, o desempenho das economias regionais tornou-se menos solidário, marcado pela inserção de pontos dinâmicos do território na economia internacional, criando verdadeiras ilhas de produtividade (PACHECO, 1996 e 1999). Não parece exagero afirmar, com base em dados que mostraremos a seguir, que parte da economia capixaba se insere nesse grupo restrito que logrou algum dinamismo, especialmente nas últimas duas décadas.

O objetivo desse artigo é analisar e qualificar a trajetória da economia capixaba entre 1970-2003, apontando suas possibilidades e limites a partir dos determinantes mais gerais das economias brasileira e inter-nacional. Nesse sentido, busca-se identificar como esta economia foi afetada pelas alterações na dinâmica regional do País, tornando-se muito mais heterogênea do ponto de vista estrutural em decorrência dos efeitos das mudanças significativas na trajetória da economia nacional ao longo do período em questão.

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2 DA INTEGRAÇÃO AO MERCADO NACIONAL À INSERÇÃO EXTERNA

Nesta seção, serão apresentados os dois vetores que impulsionaram, a partir dos anos setenta, o crescimento industrial no Espírito Santo rompendo com mais de um século de dependência da produção primário-exportadora de café: (1) o sistema de incentivos fiscais e (2) os investi-mentos – principalmente estatais – de grande porte direcionados para a implantação de empresas produtoras de semi-elaborados. O primeiro incentivou o crescimento de pequenas e médias empresas produtoras de bens-salário que se direcionaram prioritariamente para o atendimento ao mercado interno, ampliando a integração da economia capixaba à brasileira, especialmente ao seu núcleo dinâmico. O segundo, ao instalar grandes empresas produtoras de comoditties destinadas ao mercado internacional, aumentou significativamente a participação estadual no comércio externo do país. Essa estrutura industrial heterogênea seria afetada de forma bastante diferenciada quando, a partir da década de oitenta, grandes mudanças marcariam a economia brasileira.

Entender a constituição dessa estrutura industrial dual e a dinâmica de suas partes constitutivas é fundamental para qualificar a trajetória re-cente da economia capixaba que aumentou sua participação no Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro crescendo de 1,2%, em 1970, para 2,0%, em 2000. Sua renda per capita passou de 32% abaixo da média nacio-nal para 7,0% acima, em igual período, o mesmo se verificando com a indústria de transformação que passa de 0,4% em 1970 para 1,6% do total da indústria de transformação brasileira em 2000.

Esse desempenho acima da média nacional esconde grandes diferenças em sua estrutura produtiva que precisa ser mais bem interpretada. É isto que faremos a seguir.

2.1 POLÍTICA DE DESENVOLVIMENTO REGIONAL E CRESCIMENTO REGIONAL NO ES

A nosso juízo, o estado do Espírito Santo foi um caso paradigmático de aproveitamento das oportunidades geradas pela integração do mercado nacional, embora tenha se inserido tardiamente nela, quando a industriali-zação nacional promovia a integração produtiva – forma mais avançada de soldagem do mercado interno. A estrutura produtiva no estado, até a década de sessenta, não possibilitou a concentração do capital e a divisão do tra-

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balho de forma a promover uma maior diferenciação em sua economia, o que inviabilizou o início de um processo de substituição de importações.

Essa demora em promover o crescimento industrial confirma o alerta de Cano (1998a e 1998b): as estruturas produtivas pretéritas e as heranças demográficas da periferia determinariam o ritmo de suas industrializa-ções. Reside nisto o porquê da cafeicultura capixaba não ter criado condições para sua diversificação como demonstraram Cano (1985), Macedo (2002) e Rocha e Cosseti (1983).

Como o processo de acumulação ficava parcialmente obliterado, por um lado, pela presença de grande número de pequenos produtores in-capazes de concentrar capital de forma a dar um salto industrializante, e, de outro, como a apropriação da riqueza se dava principalmente na órbita da circulação com o capital comercial ficando com a maior parte do excedente gerado, o café não gestou condições para o aprofunda-mento da divisão do trabalho.

Ademais, parcela da renda cafeeira foi capturada durante muito tempo pela praça do Rio de Janeiro, estado com o qual o Espírito Santo pio-neiramente se integrou. Em resumo, o potencial de acumulação de sua cafeicultura não acenava para a constituição de processos tipicamente capitalistas que lhe permitissem dar um salto em suas estruturas, es-pecialmente a constituição de uma base industrial.

Esse quadro demonstrava que a possibilidade de diversificação não poderia ser efetivada pelo livre jogo de mercado. Daí a urgência identifi-cada nos anos cinqüenta em se construir uma articulação com o governo federal que incorporasse efetivamente o Espírito Santo à economia nacional que se integrava com maior vigor na fase de industrialização pesada (1956/1980).

A montagem de um aparato institucional com esse objetivo, na segunda metade dos anos sessenta, quando o planejamento regional ainda estava na agenda oficial, permitiu essa integração retardatária, marcando o início de seu crescimento industrial. É nesse sentido que o caso capixaba é paradigmático, afinal, dessas articulações resultou a criação de um ins-trumento singular de desenvolvimento regional, capitalizado com recursos federais e estaduais e direcionado para um único estado: o FUNRES, criado em 1969, com o objetivo de estimular a indústria, compensando os efeitos negativos da desorganização da tradicional economia cafeeira

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assentada em pequenas propriedades que entra em crise ao final dos anos cinqüenta (BUFFON, 1992; MACEDO, 2002; MORANDI; ROCHA, 1991; ROCHA; COSSETI, 1983). Iniciava-se ali a transição de uma eco-nomia primário-exportadora para uma de base urbano-industrial, mais complexa e relativamente mais diversificada e promotora de uma urba-nização acelerada que, em pouco mais de duas décadas, concentraria mais de 40,0% da população do estado no entorno da capital.

A montagem de uma estrutura com vistas a reduzir os desequilíbrios do estado frente às áreas mais desenvolvidas do país foi, em boa medida, favorecida pelo fato de as políticas regionais encontrarem margem e apoio suficientes para serem implementadas pelos governos subnacio-nais. Nesse ínterim, foi possível articular as demandas dos empresários locais às políticas federais. Isto permitiu ao grupo de interesses, que começava a se organizar mais sistematicamente a partir da criação da Federação das Indústrias do Espírito Santo (1958), impor seu projeto político com apoio do governo federal,3 constituindo, na segunda metade dos anos sessenta, um sistema de planejamento para orientar o finan-ciamento de atividades industriais com base nos incentivos criados.

Entre 1970 e 1980, o FUNRES foi importante para o crescimento dos segmentos mais tradicionais: produtos alimentares, vestuários e têxtil, metalurgia4 e minerais não metálicos e madeira e seus deriva-dos, majoritariamente constituídos por pequenas e médias empresas produtoras de bens-salários que se destinam ao mercado interno. O termo tradicionais não deve ser interpretado em contraposição a se-tores modernos tecnologicamente. Ao contrário, entre 1970 e 1990 a indústria capixaba apresentou crescimento relativo de produtividade, aproximando-se e em alguns ramos superando a média da indústria brasileira. Ele é utilizado tão somente para enfatizar que os principais segmentos de sua indústria encontravam-se nos gêneros que já eram os mais expressivos da incipiente e pouco desenvolvida base industrial da fase primário-exportadora. O crescimento industrial no estado, não seria, nesse sentido, acompanhado de diversificação que só viria, e apenas parcialmente, com o conjunto de investimentos conhecidos como Grandes Projetos.

Como o crescimento industrial ocorreu, inicialmente, sobre uma base já existente, ainda que pouco expressiva, herdada da fase primário-exportadora, é possível deduzir que a industrialização e a integração do mercado nacional geraram efeitos de estímulos nesses setores e de

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bloqueio em outros. Ademais, como a estrutura produtiva não se altera significativamente, é possível imaginar que os efeitos de destruição foram menos acentuados (CANO, 1998a).

A Tabela 1 apresenta a distribuição dos incentivos por gênero da in-dústria de transformação entre 1970-1980. Foi com o conjunto de pe-quenas e médias empresas nesses gêneros que a economia capixaba se integrou à brasileira, fornecendo, principalmente para o Sudeste e a Bahia, um conjunto de bens-salário cuja produção foi estimulada (i) pela política industrial em torno do FUNRES e do sistema Grupo Exe-cutivo para Recuperação Econômica do Espírito Santo (GERES)/Banco de Desenvolvimento do Espírito Santo (BANDES); (ii) pela acelerada urbanização da capital e de seu entorno; (iii) pelo processo de urba-nização crescente em todo país a partir dos anos sessenta que abriu oportunidades para a indústria na periferia e (iv) pela industrialização paulista e seus desdobramentos, promovendo efeitos de estímulo para as demais economias.

Tabela 1 – FUNRES: distribuição dos incentivos fiscais por gêneros da indústria – 1970-1980

Gênero %Produtos alimentícios 31,2Metalurgia 20,0Minerais não metálicos 15,5Química 9,5Têxtil 5,2Madeira 4,5Couros, peles e assemelhados 4,4Vestuário, calçados e artefatos de tecido 2,1Material elétrico e de comunicação 1,9Material de transporte 1,8Mobiliário 1,7Papel e papelão 1,4Produtos de matéria plástica 0,3Indústrias diversas 0,1

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A industrialização paulista foi importante porque resultou em crescimento do mercado interno e, portanto, aumento do comércio inter-regional, no qual São Paulo passava a desempenhar pólo de convergência. É nesse sentido que consideramos a integração do mercado interno o mais im-portante efeito da industrialização no desenvolvimento regional brasileiro, estimulando a constituição de uma estrutura produtiva complementar à paulista. O alargamento do mercado nacional favoreceu indústrias de bens-salário da periferia, normalmente formadas por empresas de pequeno e médio porte, que puderam ganhar mercados extra-regionais com a urbanização brasileira. Nesse sentido, o FUNRES, através do sistema GERES/BANDES, cumpriu papel importante.

2.2 AÇÃO ESTATAL, GRANDE CAPITAL E INSERÇÃO EXTERNA DA ECONOMIA CAPIXABA

Apesar do pleno funcionamento do sistema estadual de fomento, a dé-cada de setenta seria marcada, também, pela tentativa de atrair para o estado grandes plantas industriais, especialmente uma usina siderúrgica – antiga demanda local, aproveitando as vantagens locacionais derivadas do Porto de Vitória e da CVRD. Esta empresa já havia diversificado suas atividades no estado com a construção do Porto de Tubarão (1966), e a implantação de cinco usinas de pelotização de minério de ferro, entre 1969 e 1979,5 consorciadas aos capitais japonês, italiano e espanhol, o que representou um crescimento significativo da indústria extrativa mi-neral no estado, que contava ainda com o início das operações da usina de pelotização da Samarco (1978), de capital canadense, no município de Anchieta, com uma moderna infra-estrutura de transporte, com des-taque para as construções do Porto de Ubu e de um mineroduto. Estes investimentos, mais a implantação da Aracruz Celulose (1979) e da Companhia Siderúrgica de Tubarão (CST) (1983), além da melhoria no sistema de transportes, incluindo a infra-estrutura portuária, representam o que na literatura do estado ficou conhecido por Grandes Projetos. Na verdade, trata-se de empresas industriais de grande porte cujas estraté-gias voltadas para o mercado externo diferem do conjunto de empresas financiadas pelo sistema estadual de incentivos.

Duas observações devem ser inicialmente colocadas para entender as razões da localização dessas empresas no Espírito Santo. A primeira questão a se destacar, como já comentado, é a presença da CVRD, que viabilizou a implantação da siderúrgica de Tubarão, tanto pela mon-tagem de uma logística que há muito já vinha se expandindo sob sua

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liderança, como pela integração que seria possível estabelecer entre a CST e a indústria de pelotização no estado, formando um complexo minero-metalúrgico com consideráveis vantagens locacionais (MO-RANDI, 1997, p. 147). Em segundo lugar, merecem registro as ações governamentais que estavam sendo implementadas com vistas à redu-ção das disparidades regionais e que ganharam dimensão importante com a elaboração do II Plano Nacional de Desenvolvimento (II PND), no qual se verificava a preocupação explícita com a questão regional e que culminou com a elaboração do capítulo 5 daquele documento intitulado Integração Nacional e Ocupação do Universo Brasileiro, não obstante a nítida preocupação militar que envolvia o tema.

O II PND localizou na periferia nacional um conjunto de empreendimen-tos intensivos em recursos naturais sustentados por boas condições de infra-estrutura, promovendo desconcentração industrial no país. Esta nos parece uma questão decisiva para entender tanto a dinâmica regional brasileira como a própria integração do Espírito Santo aos mercados nacional e internacional a partir dos ajustes macroeconômicos dos anos oitenta e noventa e das políticas neoliberais da última década.

As ações governamentais – seja por meio dos investimentos diretos das estatais, seja por meio do sistema de incentivos – parecem confirmar uma tendência que há muito vinha se manifestando na economia ca-pixaba: a forte influência do setor público (federal, principalmente, mas também estadual) como importante agente de mudança da economia espírito-santense.

2.3 INDICADORES DA ECONOMIA CAPIXABA ENTRE 1970 E 1985

Ao contrário dos argumentos majoritários que atribuem ao advento do grande capital a razão do crescimento industrial, o sistema de incentivos fiscais teve importância expressiva para a indústria de transformação capixaba, pelo menos até meados da década de oitenta. Seguindo a metodologia sugerida por Pereira (1998), que divide a indústria ca-pixaba em dois segmentos – um formado pelos setores tradicionais6 (sob os quais atuaram o sistema de incentivos, conforme Tabela 1) e outro formado pelo que ele denomina de gêneros exógenos (no qual é marcante a presença do grande capital), é possível aferir que a política industrial conseguiu êxito no que se refere ao crescimento da indústria de transformação.

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Pela Tabela 2, observa-se o crescimento da participação do Valor da Transformação Industrial (VTI) estadual no total Brasil, passando de 0,46% em 1970 para cerca de 1,2% em 1985. Apesar do maior cres-cimento dos gêneros ligados ao grande capital, basicamente Papel e papelão, Química e Metalurgia, os setores tradicionais também apresentaram crescimento. Se separarmos os investimentos estimula-dos pelo governo federal (celulose, aço e Pró-Alcóol7), sobre os quais a política do sistema GERES/BANDES não teria poder de atuação, observa-se que até 1978 os setores tradicionais responderam por parcela não desprezível do crescimento do VTI estadual. A década de 1970 seria o período de atuação mais efetiva do sistema de fomento, quando as empresas incentivadas contribuíram mais fortemente para o crescimento da indústria.

Tabela 2 – ES: participação da indústria de transformação no total da indústria de transformação do Brasil

Ano ES/BR Grande Capital Setores tradicionais1970 0,5 0,04 0,421973 0,5 0,07 0,421974 0,6 0,09 0,461975 0,6 0,12 0,521976 0,6 0,11 0,521977 0,7 0,10 0,611978 0,8 0,13 0,621979 0,8 0,26 0,581980 0,8 0,25 0,581981 0,8 0,26 0,501985 1,2 0,60 0,61

Fonte: Pereira (1998)

Já na década de 1980, com o início de funcionamento da Aracruz Celulo-se e da CST, os setores tradicionais apenas acompanham o crescimento industrial do estado que, a partir desse momento, fica dividido, de um lado, entre a dinâmica das grandes plantas voltadas para o mercado externo e, de outro, um grupo importante de empresas de menor porte ligadas às atividades mais tradicionais, cuja produção se destina, prin-

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cipalmente, para o mercado interno e sobre o qual foi possível exercer alguma ação de política econômica.

No período 1970 a 1985, portanto, a participação dos setores incentiva-dos no crescimento da indústria não pode ser considerada inexpressiva. Essa situação se modificaria a partir da segunda metade dos anos noventa, como será discutido na seção 3.

Se o sistema de incentivos integrou a economia capixaba à nacio-nal, as grandes plantas industriais aumentariam sua inserção no mercado externo. As exportações capixabas representavam apenas 0,9% do total Brasil em 1970, saltando para 3,6% em 1980, 4,5% em 1990 e 5,1% em 2000. Em 2003, essa participação ficou em torno de 4,8%. As importações também crescem: representavam 2,7% do total Brasil em 1970; 3,0% em 1980; 2,9% em 1990; 4,5% em 2000, mesma participação de 2003. Contribuiu significativamente para o crescimento das importações no estado o Fundo de Desenvolvimento das Atividades Portuárias (FUNDAP), instrumento de renúncia fiscal criado em 1970 para incentivar as importações pelo Porto de Vitória e investimentos em atividades industriais. Na década de noventa, com a abertura comercial e a guerra fiscal desenfreadas, o estado beneficiou-se largamente desse instrumento para ampliar sua parti-cipação no total das importações brasileiras atraindo uma série de tradings companies que se instalaram na Região Metropolitana da Grande Vitória.

O resultado foi aumento do grau de abertura externa da economia ca-pixaba acima da média nacional: seu coeficiente de exportação passa de 6,5% do PIB estadual em 1970 para 23,9% em 2000, enquanto o coeficiente de importação, no mesmo período, era respectivamente 16,9% e 21,5%, números muito superiores aos coeficientes do Brasil que eram 8,5% em 1970 e 9,2% em 2000, para as exportações e 7,7% e 9,3% para as importações.

A constituição de uma estrutura bastante diferenciada no que se refe-re ao porte das empresas – Pesquisa Mensal de Empregos (PME’s) de um lado e grande capital de outro –, e aos mercados de destino – interno para as primeiras e externo para as segundas – implicaria em impactos distintos na indústria capixaba a partir dos ajustes conservadores decorrentes da crise dos anos oitenta e das políticas neoliberais dos noventa.

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Essa dualidade exige uma qualificação mais acurada na interpretação dos dados que apontam para o bom desempenho da indústria capixaba na última década, mas que encobre o aumento das heterogeneidades no setor. A próxima seção tratará desse tema.

3 AJUSTE CONSERVADOR E INSERÇÃO COMPETITIVA DA ECONOMIA CAPIXABA

Apesar da crise da década de oitenta, parte da periferia continuaria crescendo acima da média brasileira em decorrência da maturação dos investimentos do II PND, do avanço da fronteira agrícola e pelo maior impacto da crise sobre a economia paulista, o que possibilitou a continuidade ao processo de desconcentração econômica que vinha se manifestando desde os anos setenta.

O estado do Espírito Santo foi uma dessas regiões que continua-ram a crescer ao longo dos anos oitenta e noventa.8 Se os ajustes macroeconômicos que ampliaram o grau de abertura da economia brasileira não consolidaram um novo padrão de acumulação capaz de promover o crescimento sustentado, seus efeitos regionais foram bastante distintos, beneficiando regiões com maiores coeficientes de exportação, cuja estrutura produtiva estava fortemente atrelada ao mercado externo.

Em decorrência dos investimentos nas indústrias extrativa, metalúrgica e de papel e celulose, todas com produções prioritariamente voltadas para o mercado internacional, a economia capixaba pode beneficiar-se do ajuste exportador dos anos oitenta e que continuaria na década seguinte. Vale destacar que das 40 maiores empresas exportadoras em 2003, 4 localizam-se no estado: CST (8ª), Aracruz Celulose (9ª), SAMARCO (23ª) e COIMEX (39ª). Além delas, a CVRD (3ª) tem importância crucial nas exportações capixabas pela localização de um moderno complexo de usinas de pelotização em Vitória, constituído por sete unidades, com capacidade total de produção de 25 milhões de toneladas de pelotas/ano. Essas empresas realizaram importantes investimentos na década de noventa, ampliando a capacidade de produção e de exportação. Destacam-se a implantação da Fábrica C pela Aracruz Celulose (2002), o laminador de tiras a quente da CST (2002) e a usina de pelotização KOBRASCO (1995), joint venture entre o capital sul-coreano (50%) e a CVRD (50%).

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Juntas, esse conjunto de empresas respondeu por cerca de 78,6% da pauta exportadora capixaba em 2003. Se agregarmos o café em grãos e o mármore e granito, cujas maiores reservas encontram-se no esta-do, um grupo de poucas mercadorias responde por mais de 96% das exportações capixabas. Tamanha concentração demonstra claramente que a quase totalidade das empresas estaduais dependem fundamen-talmente do mercado interno para seu crescimento, muito distantes dos imperativos de inserção global defendidos por importantes teorias do desenvolvimento regional e do comércio internacional.

Se, por um lado, o esforço exportador beneficiou o conjunto de grandes empresas industriais, a abertura comercial e o concomitante aumento das importações brasileiras favoreceram empresas importadoras que passariam a se localizar no estado para beneficiar-se do incentivo fiscal do FUNDAP. Emborariado em 1970, esse instrumento ganhou proporções consideráveis na década de noventa, ampliando o número de importadoras que passam a utilizá-lo, resultando no aumento de tradings companies com domicílio fiscal em Vitória. Em 1971, o número de empresas fundapeanas era de 21, em 1980, 38, em 1990, 134, e praticamente dobra, passando para 257, em 2000, segundo dados da Secretaria Estadual da Fazenda.

O peso do ICMS gerado nas operações do FUNDAP atinge uma média de 33,1% do total arrecadado na década de 1990 contra uma média 8,9% na década anterior. Gomes (1998) relaciona com propriedade a crise fiscal no estado ao uso indiscriminado deste instrumento, além do esvaziamento que isto provocou na estrutura de planejamento e de financiamento do setor público estadual.

O resultado desse movimento capixaba na guerra fiscal foi a atração de um série de tradings, que localizaram sua sede na cidade de Vitória. Isso lhes conferiu, nos anos noventa, importância crescente no cenário estadual. Prova dessa evolução é sua maior participação no quadro das maiores empresas localizadas no Espírito Santo, a partir do Plano Real.

Vale destacar que em 1975, no conjunto das 10 maiores empresas, não se verifica a presença de nenhuma ligada ao comércio externo. No geral, a predominância era das empresas públicas, sejam as ligadas à infra-estrutura ESCELSA (energia) e a TELEST (telecomunicações), ao financiamento – BANESTES e BANDES – ou à produção – COFAVI

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(metalurgia), Chocolates Garoto (alimentos), Atlantic Venner (madeira), Itabira Agro-Industrial (cimento), além da Viação Itapemirim (transporte) e da FLONIBRA (silvicultura). Em 1985, a presença maior era do grande capital: CVRD, CST, Aracruz Celulose, SAMARCO e NIBRASCO, em 1º, 2º, 8º, 9º e 10º lugares respectivamente. O BANESTES (banco co-mercial) e BANESTES Crédito Imobiliário ocupam a 4ª e a 6ª posições, respectivamente, enquanto a Chocolates Vitória aparecia em 7º. Duas empresas de exportação de café completam a lista: UNICAFÉ (3º) e Rio Doce Café (5º).

Se nos anos 70 prevaleciam empresas públicas necessárias ao financiamento e à infra-estrutura para o desenvolvimento, e algum espaço havia para as empresas de capital local; se nos anos 80 prevaleceram as grandes empresas exportadoras, originariamente de capital estatal e/ou estrangeiro; o destaque nos anos noventa seria a presença das tradings no quadro das 10 maiores empresas localizadas no Espírito Santo, a ponto de duas delas, em 1999, CO-TIA TRADING e COIMEX Internacional, ocuparem, respectivamente, o 1º e o 2º lugares, superando, inclusive, a CVRD (3º), a CST (4º), a Aracruz Celulose (5º), a ESCELSA (7º) e a SAMARCO (8º). De capital estadual, havia apenas a Chocolates Garoto (10º). Na lista aparece ainda outra empresa de importação COIMEX Importação e Exportação (6º) e a UNISYS (9º), também uma empresa fundapeana, o que demonstra claramente a ascensão política e econômica do grupo de interesses ligados ao comércio exterior que se beneficiou da conjugação guerra fiscal/abertura comercial da última década. No início década seguinte, com os investimentos realizados pelas grandes indústrias e com a acomodação das importações que cres-cem a taxas menores, as empresas ligadas aos Grandes Projetos retomam a liderança na lista das 10 maiores, embora as importado-ras continuem com posição de destaque na lista das 100 maiores empresas.

Por outro lado, reproduzindo o que se verificou no restante do país, os instrumentos de política regional foram perdendo importância, con-firmando a retirada do estado das funções de planejamento. Dessa forma, o sistema GERES/BANDES passaria por um processo de es-vaziamento. Basta lembrar que o governo estadual deixou de repassar sua quota-parte ao Fundo a partir da segunda metade da década de noventa, sem gerar maiores reações na sociedade local. A principal função do Banco, a partir de então, foi operacionalizar o mecanismo

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FUNDAP, não cumprindo seu papel de apoio ao desenvolvimento, em-bora continuasse funcionando como banco de investimento, ainda que com menor relevância.

Como conseqüência dos efeitos do movimento da economia brasileira nas últimas duas décadas, observar-se um nítido aumento da heteroge-neidade da economia capixaba. Por um lado, o conjunto das empresas exportadoras e das companhias importadoras – as tradings, atrelando-se ao processo de globalização e de maior internacionalização da economia brasileira. Por outro, o parque de pequenas e médias empresas, por ter seu dinamismo atrelado ao mercado interno, portanto dependente da renda das famílias, foi negativamente afetado pelo baixo crescimento do País e pela inoperância do sistema estadual de fomento. Como re-sultado, apresentaram crescimento muito abaixo das empresas ligadas ao mercado externo.

Vale ressaltar que até metade dos anos noventa os segmentos tradicio-nais conseguiram manter participação no VTI da indústria capixaba. Po-rém, os efeitos da política macroeconômica restritiva que provocou uma retração no mercado interno e os investimentos das grandes indústrias que aumentaram sua capacidade produtiva a partir da segunda metade da década de noventa ampliaram significativamente a participação dos segmentos exportadores na indústria de transformação do estado.

Em 1996, com base nos dados da Pesquisa Industrial Anual (PIA) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), os gêneros Metalurgia, Papel e papelão e Química – aqueles que Pereira (1998) classificou como exógenos - respondiam por 49,1% do VTI da indústria de transformação capixaba. No entanto, em 2002, essa participação salta para 65,4%, resultado da ampliação da capacidade produtiva, especialmente no gênero Papel e papelão que passa de 17,4% para 30,0% do total da indústria de transformação estadual. Além disso, a desvalorização cambial de 1999 e o aumento das ex-portações no período subseqüente tiveram efeitos positivos sobre esses segmentos.

Em contrapartida, há uma nítida redução na participação dos setores voltados para o mercado interno, especialmente Produtos alimentícios que cai de 25,0% em 1996 para 10,0% do VTI da indústria capixaba em 2002. Da mesma forma, observa-se reduções em Produtos têxteis (2,7% para 0,4%) e Confecções (2,6% para 1,7%). Dos segmentos

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tradicionais, apenas Minerais não metálicos e Móveis não perdem posição relativa, mantendo, em 2002, a mesma participação de 1996, que era, respectivamente, 10,8% e 1,4%.

Embora as mudanças na participação relativa dentro da indústria de transformação possam ser interpretadas como resultado dos investimentos das grandes empresas, o que poderia significar que os demais gêneros não tiveram mau desempenho, apenas cresce-ram a um ritmo abaixo daquelas, o fato é que, durante a década de noventa, o comportamento da indústria capixaba foi bastante distinto por gênero, com claro predomínio dos segmentos atrelados ao mercado externo.

Tabela 3 – Brasil, grandes regiões e UF’ selecionadas: produção física

Gêneros Taxa média de crescimento 1991-2002 (1991=100)

BR NE SUL CE PE BA MG ES RJ SP PR SC RSIndústria geral 2,2 0,7 2,8 1,4 -1,6 1,4 2,3 3,9 3,5 1,5 2,4 2,4 3,4Extrativa mineral 6,1 -0,5 -1,0 - -4,7 -1,7 1,5 5,1 9,4 0,3 -6,2 -3,6 -0,5Transformação 1,8 1,0 2,8 1,4 -1,6 2,1 2,4 3,5 -0,7 1,5 2,4 2,5 3,4

Fonte: IBGE (acesso em 15 fev. 2005)

Entre 1991 e 2002, a indústria capixaba apresentou as maiores taxas de crescimento entre os estados para os quais há cálculo da Pesquisa Industrial Mensal – Produção Física (PIM-PF). O crescimento da extrativa mineral, como já mencionado, deve-se aos investimentos nas usinas de pelotização, além da exploração das reservas de rochas ornamentais e do aumento da extração de petróleo nos anos iniciais do século XXI.

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Tabela 4 – Brasil e Espírito Santo: PIM

Gêneros

Taxa anual média de crescimento

1991-2000 1996-2002ES BR ES BR

Transformação de produtos de minerais não-metálicos 3,2 1,1 1,9 0,5

Metalúrgica 4,5 2,4 6,7 2,0Papel e papelão 6,5 2,0 7,4 2,6Química 2,4 2,3 3,9 2,1Têxtil -8,0 -2,1 -18,7 -2,0Produtos alimentícios 0,8 2,4 -1,5 2,1

Fonte: IBGE (acesso em 15 fev. 2005)

Sua indústria de transformação, com a maior taxa de crescimento entre todas as unidades federativas, apresentou desempenho bastante dife-renciado, conforme Tabela 4, sendo fortemente puxada pelos gêneros exportadores. A Química, apesar de não ser um gênero exportador, beneficiou-se da integração com a Aracruz Celulose, aumentando sua participação na indústria de transformação. Os gêneros voltados para o mercado interno, por sua vez, apresentaram resultado abaixo da média, especialmente a partir da segunda metade dos anos noventa, período no qual o desempenho dos segmentos exportadores foi mais expressivo pelas razões já apontadas e quando os efeitos do Plano Real foram mais evidentes, retraindo a demanda interna.

Observa-se pelos dados da Tabela 4, como os segmentos direciona-dos para o mercado interno tiveram desempenho medíocre vis-à-vis os demais, sobretudo a partir de 1996, demonstrando claramente os efeitos negativos da política econômica e da abertura comercial sobre eles. Isso explica sua redução no VTI da indústria de transformação estadual. A exceção do gênero Transformação de produtos minerais não-metálicos, sustentado por uma grande base de recursos naturais, os outros dois apresentaram desempenho abaixo da média brasileira, especialmente entre 1996-2002. Há de se destacar, que as taxas cres-cimento da indústria brasileira durante a década de noventa estiveram muito abaixo das médias históricas do período de integração do mer-cado nacional, o que torna o desempenho desses gêneros da indústria capixaba ainda mais sofríveis.

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As altas taxas anuais dos gêneros voltados para o mercado externo entre 1991-2002 (Metalurgia com 4,5%, Papel e papelão, 7,4% e Indústria extrativa, 5,1%) confirmam a tese de que a orientação da política macroeconômica, apesar de não garantir taxas sustentadas de crescimento para a economia brasileira, possibilitou crescimentos pon-tuais da periferia, ampliando seus vínculos com o mercado externo.

4 OBSERVAÇÕES FINAIS

Consideramos o estado capixaba um caso interessante de investigação do desenvolvimento regional do país, a despeito de sua pequena partici-pação na economia brasileira (cerca de 2,0% do PIB). Primeiro, porque em sua fase primário-exportadora o café não gestou condições para a diversificação de sua base produtiva, diferentemente do que acontecera em São Paulo. Posteriormente, pelo aproveitamento das oportunidades derivadas do processo de integração do mercado nacional, benefician-do-se da política industrial em torno do sistema GERES/BANDES e da ação do governo federal, quando a questão regional ainda se encontrava em sua agenda.

Naquele contexto, foi possível implementar uma política de desenvol-vimento regional que integrou a economia capixaba à nacional pelo crescimento de indústrias de pequeno e médio porte produtoras, princi-palmente, de bens-salário. Da mesma forma, a ação federal localizou no estado grandes empreendimentos industriais produtores de comoditties destinadas ao mercado externo, resultando na maior participação do estado no PIB brasileiro, especialmente na indústria nacional, benefi-ciando-se, assim, do processo de desconcentração econômica que se verificava desde os anos setenta.

Até o início da década de noventa, tanto o segmento voltado para o mercado interno quanto às empresas de maior porte integradas ao mercado externo responderam pelo crescimento da indústria capixaba. No entanto, o ambiente macroeconômico dos anos oitenta e noventa, inibindo os investimentos produtivos e retirando a questão regional da agenda oficial, resultou num movimento muito menos sincrônico das economias regionais do que o verificado na fase de integração nacional, resultado de uma perda de dinamismo do mercado interno.

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Como conseqüência, observa-se um aumento das heterogeneidades estruturais das economias regionais cujos dinamismos pontuais estiveram ligados – em maior ou menor medida – à inserção competitiva no mercado externo ou aos resultados de saídas isoladas do tipo guerra fiscal. Esses movimentos garantiram a continuidade do processo de desconcentração econômica no pós-1985, beneficiando principalmente a periferia nacional, sem, no entanto, apresentar as mesmas características da desconcen-tração virtuosa do período anterior, comandada pela ação estatal que mantinha, ainda que de forma controversa, uma nítida concepção de integração do território nacional e de crescimento do mercado interno.

O Espírito Santo beneficiou-se dos ajustes restritivos que marcaram a trajetória da política econômica nas últimas duas décadas, tanto pela capacidade de suas maiores empresas inserirem-se competitivamente no mercado internacional produzindo comoditties intensivas em recursos naturais quanto pela guerra fiscal. O resultado, no entanto, foi o aumento da heterogeneidade estrutural de sua economia com os resultados do ajuste conservador, atingindo negativamente o conjunto de pequenas e médias empresas que dependem do crescimento da demanda interna.

Mesmo apresentando desempenho acima da média nacional, o caráter seletivo e concentrador desse dinamismo assentado no binômio inserção competitiva/guerra fiscal manifesta-se na incapacidade dos segmentos beneficiados de aumentar o nível de emprego da economia. Ao contrário, tanto as grandes empresas industriais quanto as tradings companies exercem impacto muito menor no mercado de trabalho do que o aporte de recursos que movimentam. As primeiras, em decorrência da eficiência produtiva e dos ajustes organizacionais, ampliaram a participação no VTI estadual, mas reduziram a participação no total do pessoal ocupado na indústria de transformação: em 1996, o gênero Fabricação de celulose, papel e produtos de papel respondia por 4,3% do total do emprego da indústria de transformação enquanto a Metalurgia básica por 7,9%. Em 2002, após a realização dos investimentos mencionados, esses núme-ros eram, respectivamente, 2,3% e 7,1%. O total de pessoal empregado nesses dois gêneros praticamente não se altera entre 1996 e 2002: 7.721 neste ano e 7.600 naquele. As segundas, apesar das externalidades criadas pela transferência das sedes das empresas para Vitória, que pro-porcionou crescimento na construção de estações aduaneiras e terminais portuários, possui altíssima relação faturamento/pessoal empregado, não gerando emprego na proporção dos recursos fiscais que utiliza.

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Ou seja, mesmo crescendo acima da média, o desemprego no estado aumentou, seguindo a trajetória nacional. Pelos microdados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), a taxa de desemprego aber-to no Espírito Santo passou de 2,0% em 1986 para 8,5% em 1999 e 8,9% em 2001. Por essa mesma fonte, o grau de informalidade aumentou: era de 48% da população economicamente ativa em 1986, e já estava em 54,1% em 1999 (MACEDO; SABADINI, 2004). Portanto, o crescimento da economia capixaba na década de noventa, especialmente de sua indústria, não se refletiu em condições sociais mais favoráveis.

A escalada da violência e do crime organizado no estado, que ganhou notoriedade nacional, demonstra como as ilhas de produtividade são insuficientes para garantir crescimento sustentado dentro de um padrão de acumulação que incorpore a população nos benefícios da moderni-dade. Aliás, a economia capixaba sintetiza, nesse início de século, um retrato do que o Brasil está se tornando um neo-primário exportador, com células modernas e dinâmicas ligadas ao mercado externo, mas com uma pesada dívida social que se agrava com a retração vigorosa de seu mercado interno.

Paradoxalmente, portanto, o mesmo modelo que garantiu o crescimento capixaba acima da média nacional ampliou suas heterogeneidades estru-turais e sociais, demonstrando o quanto é limitado para se constituir um projeto de país que resgate a centralidade do mercado interno, condição indispensável para geração de um dinamismo virtuoso para as diversas economias regionais e, portanto, para a construção da Nação.

RECENT DYNAMICS OF THE ECONOMY OF ESPÍRITO SANTO STATE

ABSTRACT

This article deals with the recent performance of the economy of Espírito Santo state, Brazil (1960-2002). Initially, it analyzes how the aforesaid economy took advantage of the Brazilian regional development policies starting from the constitution of Fundo de Recuperação Econômica do Espírito Santo (FUNRES). The first stage of Espirito Santo industrial growth (1970-1980) was benefitted by this fund. As soon as the regional policies were exhausted, Espírito Santo state was benefitted again by the federal government’s actions driven to the increasing of the Brazilian

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exports. As a consequence, since the second period of the seventies, great exporters of industrial products, located in Espírito Santo, have broadened their activities. By other hand, “capixaba” economy was deeply integrated in the international economy

Keywords: Economics – Espírito Santo (State). Regional planning – Espírito Santo (State).

NOTAS EXPLICATIVAS

3 Não por acaso o ex-governador Francisco Lacerda de Aguiar – o Chiquinho – ligado aos interesses rurais, seria cassado em 1966, abrindo caminho para que Dias Lopes assumisse o governo do esta-do, assessorado pelos técnicos da Federação das Indústrias, entre os quais Arthur Gerardt Santos que seria seu sucessor.

4 O gênero Metalurgia pré-implantação da CST tem características distintas das que assumiria posteriormente.

5 Foram as seguintes usinas com seus anos respectivos de início de operação: CVRD I (1969), CVRD II (1973), ITABRASCO (1976), NI-BRASCO (1978) e HISPANOBRAS (1979).

6 O autor usa a expressão gêneros locais.

7 Embora todas as usinas de álcool implantadas no estado no bojo do Pró-Álcool tenham recebido recursos do sistema GERES/BANDES.

8 O estado capixaba aumentou sua participação no PIB brasileiro entre 1970 e 2000, passando de 1,2% em 1970 para 1,0% em 1975, 1,5% em 1980, 1,7% em 1985, 1,7% em 1990, 2,0% em 1995, mesma participação em 2000. No entanto, o crescimento acima da média nacional entre 1980 e 2000 deve ser relativizado, pois o desempenho da economia brasileira neste período foi bastante limitado.

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Correspondência para/reprint request to:Fernando Cézar de MacedoRua José Martins, 1715, Vila Santa IzabelDistrito de São Geraldo13084-635 - Campinas – SP (Brasil)

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RESUMO

Levanta a hipótese de que as alterações de comportamento no gênero masculino e as suas novas denominações como: metro, reto e übersexu-al, estão profundamente ligadas às necessidades de expansão e susten-tação dos mercados vigentes, bem como aos acontecimentos ocorridos no século XX. Ao longo do século, mais avanços tecnológicos foram feitos do que em toda a história precedente. Computadores, Internet e outras tecnologias alteraram radicalmente o cotidiano e influenciaram diretamente na relação como os produtos e serviços eram produzidos e consumidos em larga escala. Fato que provocou o surgimento de novas formas de identidade e comportamento, principalmente no que tange aos homens e a sua tradicional ótica machista.

Palavras-chave: Comportamento - Modificação. Comportamento hu-mano. Comportamento do consumidor. Consumo (Economia).

1 INTRODUÇÃO

Ao longo de várias décadas, as mulheres e as crianças dominaram a atenção dos publicitários e foram considerados o público-alvo da comuni-cação e da cultura de massa. Enquanto isso, o público masculino passou

1 Especialista em Novas Tecnologias na Educação pela Escola Superior Aberta do Brasil. Professor da UNILINHARES. E-mail: [email protected].

AS REPRESENTAÇÕES DO HOMEM CONTEMPORÂNEO SOB A

PERSPECTIVA DO CONSUMO

Lúcio Cesar Loyola1

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quase que despercebido pelo mercado e foi praticamente ignorado na maioria das categorias. À medida que a mulheres conquistavam novos espaços na sociedade, os homens pareciam permanecer estáticos em seu retrato padrão, emoldurados por futebol, sexo e mulheres. Exceto por nomenclaturas surgidas nos últimos anos, como o metrossexual, pouco se falava, debatia ou estudava sobre os homens e a sua relação com o consumo. Hoje, o cenário começa a mudar e o modelo machista cede lugar a novas representações masculinas na sociedade.

Ao que tudo indica, os homens vêm se transformando e incorporando hábitos que em outros tempos seriam vistos como coisa de mulher. Até o início deste século, o excesso de vaidade não era comum à maioria dos homens. Agora, o uso do creme hidratante para a pele e a incorporação do protetor solar aos seus cuidados são dois exemplos de mudança na atitude masculina. Acredita-se que a propagação destes fatores vem desestruturando a identidade fixa dos homens de uma tal forma que, se as mulheres ainda têm como referencial as mães, os homens já não têm mais referencial nenhum.

No entanto, se no movimento social feminista (HALL, 2002) havia uma atitude de protesto e reivindicação por direitos iguais aos dos homens, no atual movimento social masculino a hipótese é de que os homens estariam se entregando fragilmente aos interesses do mercado de con-sumo. Pressupõe-se que não foram os homens insatisfeitos com a sua aparência que começaram a reivindicar mais cuidados estéticos, mas a necessidade do mercado de se expandir é que vem criando novas representações do consumo na comunicação e na cultura. Através da mídia, foram criadas e vendidas diferentes identidades masculinas. A indústria cultural colocou o homem diante de um novo repertório de idéias e práticas, antes não imagináveis, que foram repetidamente vei-culados nos meios de comunicação de massa, até a sua progressiva assimilação.

2 DISCUSSÃO

Ao que tudo leva a crer, o homem estaria cedendo a uma verdadeira mudança em seus hábitos e atitudes. Mas, ao contrário do movimento social feminista, em que as mulheres queimaram sutiãs em praça pú-blica numa atitude de protesto e de reivindicação por direitos iguais, as representações do homem parecem ser mais um produto da mídia do

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que um apelo íntimo da ala masculina por atributos antes permitidos exclusivamente às mulheres. O estereótipo do homem forte e viril vem cedendo fragilmente aos apelos da indústria cultural e tornando-se um alvo fácil para os novos mecanismos midiáticos de consumo, que criam novas representações masculinas a partir das necessidades de expan-são e sustentação dos mercados vigentes e não de uma reivindicação sociocultural do homem.

Pressupõe-se que, na sociedade atual, os meios de comunicação ocu-pam uma fração cada vez maior da atenção coletiva, veiculando os novos padrões no campo ético e estético e propondo ao público momentos de consciência pré-fabricados, partilháveis e reprodutíveis à vontade. Com o imaginário guiado e canalizado dentro dos contornos da máquina comunicadora, as grandes potências industriais e financeiras já não pro-duzem apenas mercadorias, mas também subjetividades. Desta forma, o que está em jogo é a posição do homem no mundo, como ele percebe e de que modo ele percebe, uma vez que os mecanismos de persuasão trabalham com o emocional do consumidor e objetos simbólicos que desconstroem e reconstroem toda a sua sinalização fixa.

Pressupõe-se ainda que o homem contemporâneo cria o seu território existencial a partir de outros territórios dos quais se apropria, mistu-rando-os. Ele agencia o masculino e feminino em novos mecanismos socioeconômicos, informacionais e culturais. Se anteriormente o sen-sível designava uma pessoa que portasse uma conduta homossexual, no século XXI toda uma cultura heterossexual masculina começa a se reconhecer como sensível. O sensível passou a significar uma nova postura social, transformando-se não só numa estratégia de afirmação da vaidade masculina, como também num rompimento com o modelo machista. O sensível, o sutil, a vaidade não é mais o outro, o feminino, mas um eu secreto do homem, um local sobre o qual estão sendo construídas as novas identidades sociais e individuais do homem con-temporâneo.

No passado, o homem padrão tinha o papel de chefe do domicílio, de provedor, aquele que sustentava o lar com seu trabalho, enquanto a mu-lher cuidava da casa e dos filhos. Hoje, as tarefas da casa são divididas em partes quase iguais. E como as mulheres também colaboram com o orçamento doméstico, os homens estariam se sentindo mais livres para gastar e consumir. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estátistica (IBGE) mostra que a mulher está entrando cada vez mais no mercado de

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trabalho. Nos últimos cinco anos a mão-de-obra feminina cresceu 11%, enquanto a masculina, apenas 5%. Já entre os representantes do sexo masculino, o que mais cresceu nos últimos cinco anos foi o consumo de produtos de beleza e higiene pessoal. Dentre eles o xampu (21%), cremes e loções (36%), fixadores e modeladores (75%) e perfumes (90%) (MEIO & Mensagem, 2005).

Se não para a maioria dos homens, pelo menos para uma parcela nada desprezível, fazer compras no shopping para espantar o estresse tornou-se uma atitude comum. Uma pesquisa da IPSOS, realizada em nove centros urbanos brasileiros, apurou que 61% dos homens, entre 18 e 39 anos, gostam de comer ou passear no shopping e 38% deles acreditam que fazer compras serve para relaxar (MEIO & Mensagem, 2005). Um dado bem curioso, afinal é a mulher que leva a fama de gostar de fazer compras. Historicamente, sempre houve aqueles que pintavam e aparavam bigode, andavam com roupas bem cortadas e usavam gel, mas, antes o policiamento sobre as atitudes por demais femininas era maior e não existiam tantas opções de produtos para atendê-los. Mas, na medida em que a concorrência aumentou, a indústria em geral foi se segmentando e, na busca por novos mercados, encontrou no homem desprovido de vaidades um alvo fácil para os seus interesses. Tanto que, nas últimas décadas, os hábitos e os estilos de vida que foram diversificados em função do público feminino passam a ser diagnostica-dos também no que tange aos homens. É cada vez maior o número de homens que tomam decisões de compra livres da influência de mães, namoradas ou esposas, gastando dinheiro em áreas nunca antes ima-ginadas e curtindo prazeres antes exclusivos das mulheres. A lista vai de cirurgias plásticas, aulas de ginástica, roupas de grife, apetrechos de cozinha a salão de beleza.

Acredita-se que o outro pode servir para regular o idêntico, funcionan-do como seu parâmetro (TUCHERMAN, 1999). Neste sentido, os ho-mens precisariam do parâmetro feminino para se reconhecerem como homens. Seria preciso manter distância de tudo o que é de diferente natureza, pois a hibridação comprometeria a masculinidade do homem. No entanto, atualmente, o que está em questão é a própria definição de homem, com as suas várias representações socioculturais, como por exemplo: metro, retro e übersexual. Essa é a principal diferença entre a identidade moderna fechada e a identidade contemporânea, mutante e aberta. “O sujeito, previamente vivido como tendo uma identidade unificada e estável, está se tornando fragmentado; composto não de

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uma única, mas de várias identidades, algumas vezes contraditórias ou não–resolvidas” (HALL, 2002, p. 12).

De acordo com alguns autores, a sociedade atual seria uma sociedade de consumo. Quando falamos em sociedade de consumo, temos em mente algo mais que a observação trivial de que todos os membros desta sociedade consomem. O que temos em mente é que a sociedade dos nossos predecessores, na sua fase industrial, era uma sociedade de produtores (BAUMAN, 1999). Mas, no seu estágio atual, a sociedade teria pouca necessidade de mão-de-obra industrial e precisaria engajar seus membros pela condição de consumidores. Fato que nos leva a concluir que o surgimento desses novos perfis masculinos tem profunda implica-ção com as transformações econômicas e sociais pelas quais estamos passando. “Os consumidores sócio-conscientes querem ser tratados como indivíduos e não como parte da massa” (ORTIZ, 2000, p. 208).

No modo de produção taylorista/fordista, o consumidor podia escolher entre um Ford T5 preto e outro Ford T5 preto. Hoje, ele tem a sua dispo-sição uma imensa variedade de modelos, marcas e cores que podem ser combinados e reordenados, numa infinidade de opções, de acordo com as suas necessidades ou preferências. A mercadoria padrão parece não gerar mais lucro. Para a maioria das empresas, a sobrevivência passa pela pesquisa permanente de novas aberturas comerciais (LAZZARATO; NEGRI, 2001). Se no passado dividíamos a sociedade em sexo, faixa etária e classe econômica, tudo assim bem simples, no cenário pós-fordista a análise de mercado passa pela segmentação. Já não basta dizer que o público-alvo em questão são os bebedores de cerveja, por exemplo. Com a necessidade de ampliação dos mercados existentes, desenvolveram-se diversos tipos de cerveja: ideal para ser consumida no inverno; para quem gosta de tradição; para os mais jovens; para quem gosta de beber, mas não quer engordar; para os que não podem ingerir álcool; para os que preferem um sabor mais suave etc.

Desta forma, assim como aconteceu com outros nichos de mercado, que foram diversificados e segmentados em função das necessidades das empresas pós-fordistas, acredita-se que o próprio homem-padrão vem cedendo lugar a novas categorias, que atendam às novas exigências do mercado atual. A cada ciclo econômico, um novo perfil de consumidor apareceu. Foram os yuppies nos 80 e os BoBos, os burgueses boêmios, no auge da exuberância irracional norte-americana. E, agora, são os metrossexuais, homens heterossexuais que exibem traços tradicio-

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nalmente associados aos gays; os retrossexuais, homens que fazem questão de afirmar a sua virilidade rejeitando qualquer comportamento que o aproxime do universo feminino; e os übersexuais, homens cujas qualidades são paixão e estilo, que habitam a paisagem mental do homem contemporâneo.

O termo metrossexual foi o primeiro desta nova safra de estereótipos a aparecer na mídia. Surgiu da junção das palavras metropolitano e hete-rossexual e foi usado pela primeira vez em 1994 pelo jornalista britânico Mark Simpson no artigo “Lá vêm os homens do espelho”, publicado pelo jornal britânico “The Independent”. Mas o novo termo para o bom e velho narciso só ganhou força nos últimos três anos, com uma infinidade de pesquisas, matérias, reportagens e anúncios de publicidade que tinham como temática a força e o poder de compra da vaidade masculina. Daí, para o surgimento de outros termos, foi um pulo. A impressão que essa variedade de termos passa é que o estereótipo do sexo forte anda mais fraco do que nunca. Afinal, mulher não tem todas essas subdivisões, elas são simplesmente hetero, homo ou bissexuais, exatamente da forma como os homens eram classificados até bem pouco tempo atrás.

No entanto, parece pertinente argumentar que, se as mulheres não pre-cisam de novos estereótipos é justamente pelo fato que, historicamente, elas sempre foram tidas como uma faixa de público extremamente consumista. Já os homens, não. Como a sobrevivência da empresa pós-fordista passava pela abertura de novos mercados, ela precisava despertar nos homens o mesmo espírito consumidor que há tempos habitava o universo feminino. Não que o termo metrossexual tenha sido cunhado precisamente com esse propósito. Mas bastou ele aparecer na mídia para que as políticas de consumo se apropriassem dele, diversi-ficando-o e utilizando-o da forma que melhor lhe convém e de acordo com as suas necessidades, interesses e intenções. Na verdade, ao que tudo leva a crer, um foi o deflagrador do outro, numa estreita simbiose onde não se sabe ao certo quem determina o surgimento de quem.

Como na nossa Sociedade da Informação empacotam-se e vendem-se informações, as novas políticas de consumo não ficaram restritas ao âmbito dos bens materiais. Elas movimentaram e beneficiaram toda uma Indústria Cultural, que criou e vendeu em larga escala matérias, reportagens, revistas, livros e jornais, que facilitaram o processo de criação dos novos ambientes ideológicos e cultuais do homem atual. Sem a presença deste forte mercado cultural, acredita-se que seria pra-

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ticamente impossível estabelecer e consolidar tantos estereótipos para um mesmo tipo de homem: hétero, urbano e muito bem informado.

Ao que tudo leva a crer, as demandas de mercado ainda continuam se valendo dos mecanismos midiáticos para divulgar as novas tendências de consumo, uma vez que é a Indústria Cultural que realiza uma função mediadora na relação estabelecida entre a oferta e a procura de bens e serviços. A diferença é que, agora, ela precisa sair na frente e criar uma verdadeira abundância de novos perfis de consumidores. Atualmente, um produto precisa ser vendido antes de ser fabricado. Visto que “já não é mais a produção de massa que orienta a estratégia comercial das grandes empresas, mas a exploração de mercados segmentados” (ORTIZ, 2000, p. 14). Daí tantas reportagens, matérias e anúncios voltados para criar e consolidar novos modelos de comportamento que geram novos hábitos de consumo e, conseqüentemente, uma grande variedade de novos produtos e serviços a serem comercializados. Ao realizar um estudo sobre a produção simbólica dos meios de comuni-cação, percebe-se que “as representações de imagens que habitam o nosso imaginário, formam uma espécie de texto ou roteiro com o qual encenamos a experiência cotidiana” (ROCHA, 2001, p. 17).

Neste contexto, a particularidade da mercadoria produzida pela empresa pós-fordista está no fato de que ela não se destrói no ato de consumo, mas se alarga, transforma e cria o ambiente ideológico e cultural do consumidor. “Estas ações, políticas, pelas quais os consumidores as-cendem à condição de cidadãos, implicam uma concepção do mercado não como simples lugar de troca de mercadorias, mas como interações socioculturais mais complexas” (CANCLINI, 2005, p. 70). O valor da mercadoria não está mais no seu uso, mas na informação social que ela carrega. “Produzem-se agora desejos na forma de signos e não de objetos materiais. O consumo é menos alguma coisa real e mais propriamente um signo, porque é o signo que se deseja” (VILLAÇA; GÓES, 1998, p. 50).

Como atualmente o poder mediador não é mais exercido somente pela escola, igreja, família e outras instituições disciplinares, mas pelos meios de comunicação que constroem novas escalas de valores, acredita-se que a síntese do espaço social é estabelecida, agora, dentro do espaço das mídias, uma vez que as massas de hoje não se reúnem mais de forma física, mas se observam por meio de símbolos da comunicação de massa (SLOTERDIJK, 2002). Sendo assim, acredita-se que a tomada

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de mercado não é realizada mais por repressão, mas por estimulação, através de formas mais sutis e disseminadas de controle. Segundo Braudrillard, citado por Ortiz (2000, p. 135), o consumo é “uma conduta ativa e coletiva, uma imposição moral, uma instituição. Ele é todo um sistema de valores, com tudo o que esse termo implica, isto é, sua função de integração grupal e de controle social”.

O próprio perfil do consumidor mudou bastante nos últimos anos. Hoje, a população economicamente ativa é constituída normalmente por pessoas mais bem informadas e familiarizadas com a mídia do que qualquer outra geração de consumidores. O fato de o seu pai ter preferência por uma determinada marca não significa que você usará a mesma marca. Aliás, este muito provavelmente será o fator primordial para você não usar a mesma marca. Ao que tudo indica, as transformações masculinas em curso estariam colocando em xe-que os papéis de gênero tradicionais e criando novos paradigmas de comportamento. Os homens comuns estariam, inclusive, começando a apresentar qualidades antes ligadas ao universo feminino, mesmo sem saber. Segundo a pesquisa: “Metro vs. Retro – entre um e outro, onde está o homem hoje em dia?”, conduzida pela Leo Burnet em 13 países, no Brasil 53% dos homens entrevistados afirmam que já não sabem que função desempenhar ou o que a sociedade espera deles. No entanto, parece pertinente argumentar que esta não seria a cau-sa, mas sim um efeito pensado, fabricado e vendido pelos meios de comunicação e consumido em larga escala pelos homens. Os estudos realizados até agora apontam para um homem que, lançando mão de diferentes formas de produção de sua subjetividade, possui, afinal, uma identidade instável, plural e fragmentada. Um complexo universo ideológico, composto por representações sociais, criadas a partir de uma Indústria Cultural que o coloca diante de um amplo repertório de idéias, emoções, sensações, escolhas e imposições.

Pense se a famosa guerra dos sexos fosse decidida numa partida de futebol. De um lado, de camisa azul, estariam os homens e as suas representações masculinas do sexo forte: trocar pneu de carro, consertar o encanamento, prover o lar, defender a honra da família etc. Do outro, de camisa rosa, estariam as mulheres e as suas repre-sentações do sexo frágil: usar produtos de beleza, ir ao cabeleireiro, fazer compras, cozinhar etc. Iniciada a partida, as mulheres saíram na frente e partiram para o ataque. Enquanto os homens permaneceram acuados e preocupados com a defesa do seu território. Logo no primei-

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ro tempo, as mulheres não só invadiram a pequena área masculina, como tomaram e ocuparam várias de suas posições, tais como: o direito ao voto, transar sem compromisso, independência financeira, cargos de chefia e a liderança de grandes nações. Sendo assim, quando o time de camisa rosa invadiu o campo do time de camisa azul e passou a competir de igual para igual com ele, os papéis dos gêneros se misturaram e as identidades estanques e separadas em partes opostas do mesmo campo de batalha se viram, pela primeira vez, diluídas e misturadas. Foi aí que, só agora, no segundo tempo, incentivados pela indústria pós-fordista, os homens resolveram partir para o ataque. Se as mulheres invadiram o seu território e disputaram com eles o cargo de chefe do escritório, os homens estariam, agora, invadindo o território feminino e disputando, hoje, com elas, o título de chefe de cozinha.

3 CONCLUSÃO

Como a cultura não é um processo nato e inerente a um gênero, a uma raça ou a uma nação, mas sim uma representação coletiva, que preexiste a sua existência e vai continuar existindo depois da sua morte. Se você acredita que determinados valores e compor-tamentos pertencem ao gênero masculino é porque existe todo um processo de construção coletiva que o leva a pensar desta forma. Caso você seja extraído deste processo e inserido em outro, as suas percepções mudam, os seus valores se alteram e você terá uma nova distinção do que é certo ou errado, a partir da construção de novas categorias de pertencimento. O homossexualismo, por exemplo, era comum na Antigüidade Clássica Grega e é punido com pena de morte no Oriente Médio dos tempos atuais. Deste modo, ao que tudo indica, essa fragmentação dos processos identidários masculinos nada tem a ver com o processo de evolução da humanidade. Aliás, este processo, pouco ou nada tem a ver com a sexualidade do ho-mem. O homem hétero não diversificou a sua sexualidade, mas a sua identidade e o processo como ele se vê encaixado na complexa malha social contemporânea.

Quando se propõe a ler ou ver os traços enunciativos da identidade, é por meio do corpo e das suas representações que esses traços se anunciam. O corpo fala por si próprio, até mesmo aquilo o que os lábios calam. E por meio de gestos, roupas, atitudes e incursões

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cirúrgicas na pele, nos revela, através de uma linguagem não-ver-bal, quem você é e que lugar você ocupa ou gostaria de ocupar na sociedade. Segundo Canclini (2005, p. 35), “Ser cidadão não tem a ver apenas com os direitos reconhecidos pelos aparelhos estatais para os que nascem em um território, mas também com as práticas sociais e culturais que dão sentido de pertencimento”. A leitura das paisagens visuais do corpo pode revelar informações para a construção de novos targets de público-alvo e o desenvol-vimento de novos produtos a serem comercializados. No entanto, como nem mesmo a Nike ou a Coca-Cola conhecem os seus mais íntimos desejos, a criação de novas categorias de produtos passa por um processo de elaboração coletiva. Ou seja, “elabora-se em comum os produtos, o que será a oferta e o que será a demanda, mas também quais serão os papéis desempenhados por cada um na concepção, na produção e na distribuição dos bens e dos serviços” (CALLON, 2004, p. 75).

Deste modo, tendo como princípio que hoje o capitalismo não é mais um capitalismo de produção, mas de consumo, verifica-se que as novas representações do homem na comunicação vêm causando uma verda-deira mudança nos hábitos e consumos masculinos. No entanto, nos parece pertinente argumentar que estes processos não seriam cons-truídos a partir de uma reivindicação masculina pela quebra de tabus e conceitos pré-estabelecidos, mas sim de uma estratégia do mercado para ampliar o seu público-alvo e aumentar a demanda do consumo, otimizando, desta forma, o lucro das empresas.

O que nos leva a crer que, o debate aqui proposto é um tema atual, complexo e que envolve questões como subjetividades, represen-tações e identidades, fundadas sobre uma discussão a respeito da interação entre o ser e o ter que inaugurou novos comportamentos e atitudes sociais no gênero masculino. Sendo assim, “é fundamental que esses materiais sejam sistematicamente analisados como uma forma de entender como a cultura contemporânea classifica diferentes grupos sociais através do consumo” (ROCHA; PETTERLE, 2005, p. 15). E, é exatamente este o objetivo aqui proposto: levantar novas hipóteses que contribuam para o debate científico e, desta forma, permitir um diálogo, interdisciplinar, sobre a cultura de massa e as suas novas representações sociais.

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REPRESENTATIONS OF THE CONTEMPORARY MAN UNDER THE PERSPECTIVE OF CONSUME

ABSTRACT

An hypothesis is raised: some changes considering masculine behavior and its new vocabulary such as metro, retro and übersexual and deeply linked to the necessities of expansion and support of actual marketing; these changes are also linked to recent events of the 20th century. The most advanced technology has been produced along this century it we compare et to the whole precedent history. Computers, the Internet and other technologies have firmly altered everyday life and they have also directly influenced the relation between production and services, and their consume at large scale. This fact led to new patterns of identity and behavior, specially in regard to men and their traditional male chauvinist point of view.

Keywords: Behavior – Modification. Human behavior. Consumer beha-vior. Consumption (Economics).

REFERÊNCIAS

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CALLON, M. Por uma nova abordagem da inovação e do mercado: o papel das redes sócio-técnicas. In: PARENTE, A. Tramas da rede. Porto Alegre: Sulina, 2004.

CANCLINI, N. G. Consumidores e cidadãos. Rio de Janeiro: UFRJ, 2005.

HALL, S. A identidade cultural na pós-modernidade. Rio de Janeiro: DP&A, 2002.

LAZZARATO, M.; NEGRI, A. Trabalho imaterial. Rio de Janeiro: DP&A, 2001.

MEIO & Mensagem: Especial homem, São Paulo, out. 2005.

ORTIZ, R. Mundialização e cultura. São Paulo: Brasiliense, 2000.

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ROCHA, E. P. G. A mulher, o corpo e o silêncio: a identidade feminina nos anúncios publicitários. 2001. Disponível em: <http://publique.rdc.puc-rio.br/revistaalceu/media/alceu_n3_Everardo.pdf>. Acesso em: 23 out. 2005.

ROCHA, E. P. G.; PETTERLE, A. Veneno hipnótico: representações publicitárias e sociabilidade feminina. 2005. Disponível em: <http://publique.rdc.puc-rio.br/revistaalceu/media/alceu_n9_petterle.pdf>. Acesso em: 23 out. 2005.

SLOTERDIJK, P. O desprezo das massas. São Paulo: Estação Liberdade, 2002.

TUCHERMAN, I. Breve história do corpo e seus monstros. Lisboa: Vega, 1999.

VILLAÇA, N.; GÓES, F. Em nome do corpo. Rio de Janeiro: Rocco, 1998.

Correspondência para/reprint request to:Lúcio César LoyolaRua Euzira Viváqua, 375/203Jardim Camburi29090-350 - Vitória – ES (Brasil)

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ABSTRACT

In Brazil, fishery could be considered artisanal and an important commercial activity. In Espírito Santo State, it represents 97.5% of vessels and besides the target species, others species without commercial value are also captured, as small cetaceans and marine turtles. This study was carried out in Piúma harbor (20º51’S, 40º43’W), south coast of Espírito Santo State, southeastern Brazil, during 2003 in the dry season, when gillnets are used. The fishery of this region; its interaction with cetaceans and marine turtles, including mortality rates, represents the most important subject of this study. Questionnaires were applied every week, to all vessels. It raised up information about fishing operations and interactions with the studied species. Fishing effort with gillnets achieved 1,720km. Pescadinha and Tresmalho were most used, followed by Caída and Lagosta. For cetaceans, Caída gillnet represents a big impact over the species as entanglement and collisions; while for marine turtles, Lagosta gillnet. In Piúma, the activity with gillnets really represents a negative impact to cetaceans and marine turtles, however, abundance estimative of these species must be surveyed to evaluate the real impact of fishery over these species in the region.

Keywords: Sea turtles – Espírito Santo (State). Cetacea – Espírito Santo (State). Fisheries – Espírito Santo (State).

BY-CATCH OF SOTALIA FLUVIATILIS (GERVAIS, 1853) AND CARETTA CARETTA (LINNAEUS, 1758) IN GILLNETS OVER SOUTH REGION OF ESPÍRITO

SANTO STATE – SOUTHEASTERN BRAZIL

Ricardo Freitas Netto1

Renata Wolfgram Badke2

1 Doutorando em Ecologia e Recursos Naturais pela Universidade Estadual do Norte Fluminense. Presidente do Centro de Estudos em Ecossistemas Marinhos e Costeiros do Espírito Santo. E-mail: [email protected].

2 Graduada em Ciências Biológicas pelo Educandário Seráfico São Francisco de Assis.

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1 INTRODUCTION

Along more than 8,500km coast line, Brazilian marine fishery is an important commercial activity (INSTITUTO DE ESTUDOS DO MAR ALMIRANTE PAULO MOREIRA, 2002). It is responsible for 800 thousand direct jobs and 300 companies between capture and fish processing (GEO BRASIL…, 2002). Fishery can be considered artisanal with fishing tackles such as gillnets, lines and traps (DI BENEDITTO; RAMOS; LIMA, 1998). Brazilian artisanal fishery counts with about 25,000 boats that represents 90% of total vessel crew operating (INSTITUTO DE ESTUDOS DO MAR ALMIRANTE PAULO MOREIRA, 2002). Usually the target species are fishes, clams and crustaceans; however, other organisms with no commercial value are captured, such as cetaceans and marine turtles (DI BENEDITTO, 2001; NYBAKKEN, 1997). According to McCaughran (1992), these organisms can be classified as by-catches, defined by the capture portion that is returned to the ocean dead or incapable to survive.

Intentional and acidental captures of cetaceans in fishery activities are responsible, in part, for the declination of these populations. Nowadays, by-catch in passive fishing tackles represents a big threat to these animals. It is estimated that about 100,000 specimens of cetaceans interact with fishery every year around the world, resulting frequently in death (PERRIN; DONOVAN; BARLOW, 1994). Among the most seen cetaceans occurring in Brazilian coast, Pontoporia blainvillei and Sotalia fluviatilis are considered the most threatened by interactions with fishery (INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS E RENOVÁVEIS, 2001). The typical coastal distributions of these species overlap gillnet fishing grounds, increasing the potential of by-catches (DI BENEDITTO; RAMOS; LIMA, 1998; MONTEIRO-NETO et al., 2000; OTT et al., 2002; SICILIANO, 1994). In the same way, fishery is responsible for by-catches of marine turtles along the Brazilian coast. Until 70’s, the Brazilian coast hadn’t presented any information about these species (MARCOVALDI; MARCOVALDI, 1999). According to Wyneken et al. (1988), fishery is responsible for one of the many impacts that reduce marine turtle population, especially in feeding and nesting areas. Sotalia fluviatilis (GERVAIS, 1853) and Caretta caretta (LINNAEUS, 1758) are species included in the Official List of Fauna and Flora Threatened Species (INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS E RENOVÁVEIS, 1989). This study intends to identify and evaluate interactions of fishery with

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cetaceans and marine turtles, including mortality rates through by-catches per fishing effort.

2 METHODOLOGY

Espírito Santo State is located in the Southeastern of Brazil, occupying 45,597km2 of area with 251km of coastline. The south coast has the greatest vessel crew and Piúma harbor (20º51’S 40º43’W) presents 140 boats, but only 20 of them operate with gillnets (FREITAS NETTO, 2003) (Figure 1).

Figure 1 – Map of the fishing grounds of Piúma fleetLegenda: 1 - Ponta de Ubu harbour; 2 - Piúma harbour; 3 - Barra de Itapemirim harbour; 4 - Marataízes harbour.

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During dry season (april to october) gillnets are used often, therefore, fishery activity and by-catches were surveyed in 2003 during this period. Questionnaires were applied every week, to all operating boats, rising up the following information: gillnet characteristics; fishing ground and by-catches.

S. fluviatilis and C. caretta mortality rates through by-catches in gillnet were done by means of calculating the capture per unit effort (CPUE), which is the reason between specimens captured number and fishery effort with gillnets. Fishery effort considers: (Kilometers of net x days of fishery x number of vessels)-1 (CORCUERA, 1994).

3 RESULTS

During this study, fishing grounds from Ubu (20º48’S 40º36’W) to Marataízes (21º01’S 40º48’W), with the following main fishing spots: Ubu, Piúma, Franceses Island, Barra do Itapemirim and Marataízes. Fishery with gillnets in Piúma harbor presented 1,720km of fishing effort. According to gillnet types, Pescadinha and Caída net presented a bigger effort in this region, followed by Tresmalho and Lagosta nets (Figure 2). Among these nets, variations were found in the size, number of gillnets per vessel, height, line thickness and mesh size (Table 1).

Figure 2 – Total fishing effort (km) of each net type during dry season in Piúma, south coast of Espírito Santo State, southeastern Brazil

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Table 1 – Net characteristics in Piúma harbor

Net Type → Pescadinha Caída Tresmalho LagostaNet size (m) 50 – 825 30 – 800 50 – 800 30 – 100Number of nets 2 – 60 3 – 60 8 – 15 8 – 50Height (m) 20 – 50 3 – 50 7 – 65 2 – 20Line thickness (mm) 0,50 0,50 – 0,70 0,60 – 0,70 0,40 – 0,50Mesh size (cm) 4 – 6 4 – 7 4 – 6 4 – 6Net material Polyamide

Pescadinha net presentes bigger effort especially in Piúma region (93% in Cabritos Island) and Franceses Island (20º54’S 40º45’W). Tresmalho and Caída net had a bigger effort in Marataízes (21º03’S 40º49’W), while Lagosta net presented a bigger effort in Piúma region (88,9% in Cabritos Island). Rio Doce (19º40’S 39º50’W) and Guarapari (20º40’S 40º30’W) represent sporadic cases (Figure 3).

Figure 3 – Fishing effort (km) of each net type per locality (fishing grounds)

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By-catches of five specimens of S. fluviatilis were registered during Piúma fishery activities, caled in the region by boto. For C. caretta, 33 by-catches were registered. All net types represent risk to these animals, however, Caída net presented a bigger impact to S. fluviatilis, while Lagosta net to C. caretta (Table 2).

Table 2 – Number of specimens involved with fishery activity in Piúma.

Specimens By-catches Net Type

S. fluviatilis 05(n= 2) Pescadinha

(n= 3) Caída

C. caretta 33

(n= 6) Pescadinha(n= 4) Tresmalho

(n= 2) Caída(n= 21) Lagosta

Capture per unit effort (CPUE) was calculated for S. fluviatilis (2.9) and C. caretta (19.18), considering total net effort (Figure 4). Caída net was the fishing tackle with higher CPUE for S. fluviatilis, while Lagosta net to C. caretta (Figure 5).

Figure 4 – Capture per unit effort (CPUE) (x 1.000) for S. fluviatilis and C. caretta in gillnets

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Figure 5 – Capture per unit effort (CPUE) (x 1.000) for S. fluviatilis and C. caretta in each net type

4 DISCUSSION

Total gillnet effort in Piúma presents a low value when compared to the North of Rio de Janeiro State (12,421km/year) (DI BENEDITTO, 2001). Even considering dry and wet season in Piúma, the value probably will not exceed or get even, because in wet seasons lines are used instead of gillnets (FREITAS NETTO; BARBOSA, 2003). Pescadinha net is the most used gillnet in Piúma region as in Espírito Santo coast (FREITAS NETTO, 2003). The same author, affirms that in the south region of this state, Lagosta net is increasing the fishing effort, but Piúma, stands with a lower effort. Pescadinha net also represents the main fishing gear in Praia Grande, São Paulo State (BERTOZZI; ZERBINI, 2002); while in the North of Rio de Janeiro State, Caída net presented bigger effort (DI BENEDITTO, 2001).

Pescadinha and Lagosta were most used in Piúma and Franceses Island, due to shallow waters and also presence of small islands, which are Croakers and Lobsters favorite habitats, the respective target species. Tresmalho and Caída nets were most used in deep waters due to the same reason. Usually, gillnets are not expressive in Espírito Santo coast. The fishery production is commercialized among small local markets, running out of fishery statistics. The Lines are

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the most important fishing gear of Piúma, as in great part of the State (FREITAS NETTO, 2003).

According to Freitas Netto (2003), along Espírito Santo coast, nine species of small cetaceans occur (Pontoporia blainvillei, S. fluviatilis, Steno bredanensis, Tursiops truncatus and five species of Stenella). In Piúma fishing grounds, only S. fluviatilis was registered in by-catches, probably because of the coastal fishery, that does not exceed 20 meters of deepness. Among the species that occur in this State, S. fluviatilis and P. blainvillei are seen only in coastal areas. The inexistence of the last one may corroborate the hypothesis of a distribution gap between the North of Rio de Janeiro State and the North of Espírito Santo State (DI BENEDITTO; RAMOS, 2001; SICILIANO; DI BENEDITTO; RAMOS et al., 2002). The distribution of C. caretta in Piúma matches with current data, that is well known along all Brazilian coast through 20 monitoring spots (MARCOVALDI; MARCOVALDI, 1999).

The impact of nets over the animals is directly proportional to thickness and mesh size (DI BENEDITTO; RAMOS; LIMA, 2001). According to Freitas Netto (2003), Espírito Santo nets that could affect these animals have line thickness and mesh size over 0,7mm and 10cm, respectively. However, in Piúma, these values are lower than 0,4mm and 4cm, respectively, it indicates that a thinner line and smaller mesh size can either represent risks to Cetaceans or Chelonians.

Capture per unit effort (CPUE) for S. fluviatilis in Piúma did not present similar values as in North of Rio de Janeiro State, that range from 2.7 to 7.7 (DI BENEDITTO; RAMOS; LIMA, 2001), and it can not be compared due to only five specimens were captured. By-catches of C. caretta presented smaller number of animals when compared to Malaysia, that in two years has registered 128 by-catches (CHAN; LIEW; MAZLAN, 1988). In North Carolina and Texas (USA), the number was even higher, when 1,500 marine turtles were captured only in one year (LIPSKE, 1980).

5 CONCLUSION

Fishery activity of Piúma harbor presents an impact level over cetaceans and marine turtles population, specially Lagosta net for C. caretta.

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However, abundance estimative of these species is important to evaluate the real impact of it. The continuing monitoring of fishery and by-catches in Piúma, and also surveys of cetaceans and chelonians abundance estimative, will provide consistent data to implement conservation strategies appropriated to local reality. In the same way, development of studies in other regions of Brazil, using similar methodology, certainly will increase information of these species and help evaluating the impact of fisheries by-catch.

CAPTURA ACIDENTAL DE SOTALIA FLUVIATILIS (GERVAIS, 1853) E CARETTA CARETTA (LINAEUS, 1758) EM REDES DE PESCA NA REGIÃO SUL DO

ESTADO DO ESPÍRITO SANTO

RESUMO

No Brasil, a pesca é uma importante atividade comercial e pode ser considerada predominantemente artesanal. No Estado do Espírito Santo, representa 97,5% da frota pesqueira e além das espécies-alvo, outras espécies sem valor comercial são capturadas, como cetáceos e tartarugas marinhas. O presente estudo foi realizados em Piúma (20º51’S, 40º43’W), litoral sul do Estado do Espírito Santo, sudeste do Brasil, durante a estação chuvosa quando as redes de espera são utilizadas. O objetivo do estudo foi descrever a atividade de pesca da região, suas interações com cetáceos e tartarugas marinhas, incluindo estimativas de mortalidade. Questionários foram aplicados semanalmente a todas as embarcações em operação, levantando informações a respeito da atividade pesqueira e interações com as espécies estudadas. O esforço de pesca total com redes de espera foi de 1.720km. As redes mais usadas foram as de Pescadinha e Tresmalho, seguidas de Caída e Lagosta. Para os cetáceos, a rede de Caída representou o maior impacto na forma de emalhes e colisões, já para as tartarugas marinhas a rede de Lagosta. Na região de Piúma, a atividade de pesca com redes de espera representa impacto negativo para os cetáceos e tartarugas marinhas, entretanto, estimativas de abundância dessas espécies necessitam ser levantadas para avaliar o real impacto das redes de espera sobre essas espécies na região.

Palavras-chave: Tartaruga marinha – Espírito Santo (Estado). Cetáceo – Espírito Santo (Estado). Pesca – Espírito Santo (Estado).

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ACKNOWLEDGMENTS

To Financial Support of Cetacean Society International.

To Raquel Ramos Gomes and Dra. Ana Paula Madeira Di Beneditto – Universidade Estadual do Norte Fluminense (UENF) and Escola de Pesca de Piúma (ESCOPESCA).

REFERÊNCIAS

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Correspondência para/reprint request to:Ricardo Freitas NettoRua Celso Calmon, 445/801Praia do Canto29055-590 - Vitória – ES (Brasil)

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RESUMO

A metáfora, (o bicho da goiaba), utilizada no tema deste estudo, trata-se de uma proposta para entender as relações do processo ensino-apren-dizagem do curso de Educação Física “por dentro”. O fenômeno das representações sociais é estudado a partir dos conceitos e discursos construído historicamente por determinados grupos a fim de explicar alguns fatos da realidade. Desse modo, esta pesquisa tem como objetivo conhecer quais representações sociais os alunos do curso de graduação em Educação Física do Centro Universitário Vila Velha possuem em re-lação à sua formação profissional. A partir de entrevistas e questionário aberto, analisamos que existem paradoxos entre os conceitos que os alunos trazem e as propostas dos cursos de graduação em Educação Física e as Diretrizes Curriculares Nacionais. Entendemos que o pro-cesso de formação profissional traz a possibilidade de refletir de forma crítica em diferentes realidades.

Palavras-chave: Aprendizagem – Educação Física. Educação Física – Estudo e ensino. Professores – Ensino – Aprendizagem.

A FORMAÇÃO PROFISSIONAL E AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DO CURSO DE

EDUCAÇÃO FÍSICA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO VILA VELHA: O BICHO DA GOIABA E O PROCESSO

ENSINO-APRENDIZAGEM

Priscila Sousa Charpinel1Marcello Pereira Nunes2

1 Graduada em Educação Física pelo Centro Universitário Vila Velha. E-mail: [email protected].

2 Mestre em Educação Física pela Universidade Gama Filho. Professor do Centro Universitário Vila Velha. E-mail: [email protected].

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1 INTRODUÇÃO

A idéia em estudar a formação profissional surgiu, mediante a partici-pação em grupos de estudos do Curso de Educação Física do Centro Universitário Vila Velha (UVV) e leituras sobre o tema. Durante esse tempo, tivemos contato direto com alunos em momentos distintos da graduação. Pudemos perceber diferenciados posicionamentos apresen-tados pelos graduandos sobre os valores e conceitos socializados pelos professores e a proposta curricular do Curso de Educação Física Centro Universitário Vila Velha. A inquietação para esse estudo se atenuou ao observarmos a necessidade de pensar as questões relacionadas ao Curso de Educação Física deste Centro Universitário sob a ótica do graduando.

Apesar de compreendermos o importante papel que a universidade exerce na formação da carreira profissional, muitas propostas, que são oferecidas por tendências e metodologias de ensino, assumem um caráter paradoxal quando se deparam com os conceitos e explicações que os alunos trazem antes de ingressar no curso.

Quando o aluno ingressa na universidade ele tem uma visão acerca do que é o curso que deseja seguir. No caso do Curso de Educação Física, essa visão pode ser resultante da histórica prática no período escolar ou até mesmo de uma precoce atuação profissional nesse campo das atividades corporais. Nessa etapa inicial, o aluno já pode se deparar com as primeiras contradições devido ao fato de encontrar disciplinas no curso de caráter extremamente teórico. Durante os períodos da graduação, mais conhecimentos vão sendo propostos e a imagem pro-fissional vai se construindo e também passando por transformações. Nessa fase, o conflito pode ser gerado pela discussão proveniente de uma experiência empírica que pode estar sendo questionada a partir de embasamentos teóricos. Ao alcançar a formação, o profissional que chega ao mercado de trabalho expressa uma identidade que pode ser resultante das diversas reflexões advindas dos conflitos e apropriações ou da resistência aos questionamentos que foram propostos durante o curso. O que de fato reproduzirá a atuação profissional vigente.

Durante a pesquisa, analisaremos os valores discursados pelos alunos em toda a sua subjetividade. Consideraremos que os indivíduos partem de diversos contextos e que possuem um tempo pedagógico diferente para a aquisição dos saberes. O que nos faz justificar as diversas visões

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em relação à proposta do curso, bem como as diferentes formas de apropriação do conhecimento por parte do aluno.

Estamos entendendo representações sociais a partir de Minayo (1993, p. 158), que se expressa da seguinte maneira:

Representações sociais é um termo filosófico que significa a reprodução de uma percepção anterior ou do conteúdo do pen-samento. Nas ciências sociais são definidas como categorias de pensamento, de ação e de sentimento que expressam a realidade, explicam-na, justificando-a ou questionando-a enquanto material de estudo. Essas percepções são consideradas consensualmente importantes, atravessando a história e as mais diferentes corren-tes de pensamento sobre o social.

As representações sociais são um conjunto de conceitos e valores que se constroem socialmente. Elas buscam compreender e justificar de-terminados fatos da realidade, transformando aquilo que não era bem conhecido em familiar. São elas que determinam o comportamento e as ações dos indivíduos. Cada pessoa age a partir daquilo que tem como idéia pré-estabelecida. No âmbito das atividades físicas, os indivíduos praticam o que foi socializado como bom, assim como deixam de fazer o que ainda não se tornou próprio de seus significados.

A partir do conceito de representações sociais, começamos a refletir sobre as formas como os alunos representam sua formação, o que eles querem aprender, como definem o mercado de trabalho, quais os conte-údos que julgam necessários, entre muitos outros questionamentos.

Desta forma, pensando na relação existente entre o que o professor busca transmitir a partir da missão do curso e aquilo que o aluno se apropria, queremos levantar dados que nos permitam analisar a forma como o curso influencia na formação da imagem profissional identificada por meio da intencionalidade dos alunos e quais são os instrumentos utilizados para esse fim. Partindo do princípio que:

Qualquer processo de apropriação do saber se dá a partir de relações que se estabelecem entre o que se está ensinando e aprendendo – em um “já-sabido”. Estas relações não são apenas intelectivas, mas envolvem o indivíduo como um todo. Apropriação do saber não é sinônimo de memorização, nem de reprodução mecânica. Também não é uma simples operação mental de abs-

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tração intelectual. É síntese, progressiva e sempre provisória, que se faz no vivido a partir do que, na relação com o outro, saberes vão se organizando de forma a permitir ao indivíduo interpretar o mundo objetivado no que o cerca, e nele intervir. Logo, para que exista, este vivido é o ponto de partida e o pano de fundo (MADEIRA, 2000, p. 247).

2 AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS

Segundo Abric (1994), uma representação social é constituída de um ou alguns elementos estáveis que dão sentido a ela e por outros menos estáveis e flexíveis, responsáveis pelo processo adaptativo. O primeiro é chamado de núcleo central, é o ponto mais forte de uma representação e vai caracterizar a sua especificidade, sem ele é impossível identificar a representação. O núcleo central resiste a mudanças, pois é composto de elementos historicamente determinados. O segundo são os esquemas periféricos. Esses já são mais sensíveis à mudança e são determinados pelo contexto imediato, absorvendo novas informações ou eventos. Dessa forma, identificados os conteúdos e a estrutura da representação social caracterizada nesta pesquisa, será possível analisar como esses conceitos podem intervir no período da graduação.

A partir das referências estudadas, destacamos a base para a nossa pesquisa. Madeira (2000, p. 25), acreditando no homem enquanto ser social que se expressa na relação com o outro, portanto sujeito dentro dos diversos sistemas que regem os processos educativos, expõe o seguinte texto:

Tal característica nos torna, a todos, a um tempo, aprendizes e ensinantes, pois, frente ao outro, reciprocamente, passamos e recebemos o que somos, as representações que temos, sem que disto nos apercebamos com clareza. Note-se que, o que somos, ou seja, as representações que temos constroem-se na história de uma dada formação social, num processo de relações familiares, grupais e intergrupais, que se estende ao longo da vida e, em meio ao qual, afetos, necessidades, valores, normas, estereóti-pos, imagens, símbolos, demandas e interesses articulam-se em palavras proferidas ou silenciadas, palavra entendida ou negada. (Trans) forma-se enquanto sínteses complexas, num dinamismo subjetivamente e objetivamente que, em sua provisoriedade necessária, circunscreve continuamente espaços e delimita

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condições. Nesta perspectiva, a educação articula-se à própria condição de homem, cujo movimento potencial de educabilidade só encontra termo na morte.

3 SOMOS TODOS APRENDIZES E ENSINANTES: A RELAÇÃO PROFESSOR-ALUNO

A construção do homem social está ligada à inter-relação com outros homens. Esta troca é permeada pelo processo educativo que é veri-ficado na formação de conceitos e representações resultantes destas diversas relações que os indivíduos estabelecem entre si. “A educação, portanto, não se restringe à escola”. As representações construídas e apropriadas pelos indivíduos caracterizam-no como um ser de múltiplas relações, logo, vivendo em sua totalidade nos diversos contextos em que estão inseridos.

[...] Somos todos aprendizes e ensinantes, numa interlocução com o outro, presente ou suposto, pela qual, no concreto, saber e fazer integram-se à dinâmica do viver como apropriação e expressão. A cada momento, no gesto aparentemente banal ou na conduta organizada, nos encontros ou desencontros, vitórias ou fracassos, tanto quanto no que vemos, lemos, ouvimos ou sentimos, vai sendo viabilizado um longo proces-so educativo, um tempo pessoal e social, um aprender em aprenderes (MADEIRA, 2000, p. 27).

Dessa forma, pensar o homem enquanto sujeito concreto e histórico implica considerar todas as suas construções, os seus inacabados e infindáveis processos educativos que envolvem esse homem holístico. O que se sabe é que muitos conceitos são apropriados de forma incons-ciente pelo aprendiz. Fato normal se pensarmos no cotidiano informal que a escola da vida nos oferece. Porém, muitas destas experiências vivenciadas fora do ambiente escolar são contrariadas dentro das salas de aula a fim de impedir qualquer tipo de influência que possa interferir no imutável plano de aula.

O que nos dispomos a pensar é: como deveria ser a relação profes-sor-aluno dentro desse contexto onde o aluno chega com conceitos do senso-comum e se depara com o professor dotado de conhecimentos científicos?

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Na tentativa de eliminar as certezas cristalizadas destacamos que de nada adianta aplicar saberes e habilidades julgados eficazes, mas que não condizem com o contexto histórico e cultural dos alunos. Para Freire (1996, p. 53), “[...] não há docência sem discência, as duas se explicam e seus sujeitos apesar das diferenças que os conotam, não se reduzem à condição de objeto, um do outro. Quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender.”

Dessa forma, nos posicionamos de modo a acreditar que a Educação Física como área pedagógica também necessita de se preocupar em formar profissionais transformadores e que irão intervir contra a manu-tenção de uma educação dominadora que apenas reproduz o sistema político vigente. Portanto, a relação professor-aluno passa por estas questões, visto que a maior forma de dominação é a postura de supe-rioridade de um sob o outro, seja ela racial, econômica ou cultural.

Para Santos (2001, p. 63) “[...] é a interação entre o professor e o aluno que vai dirigir o processo educativo. Conforme a maneira pela qual esta interação se dá, a aprendizagem do aluno pode ser mais ou menos facilitada e orientada para uma ou outra direção.”

Ao objetivar uma relação que pensa a aprendizagem a partir do aluno, Abreu e Masetto, citados por Santos (2001), relatam que independente-mente da tendência incorporada pela instituição ou pelo professor, exis-tem princípios que são essenciais para a aprendizagem. São estes:

• Toda aprendizagem precisa ser significativa para o aluno (não mecanizada), ou seja, deve estar relacionada com conhecimentos, experiências e vivências do aluno.

• Toda aprendizagem é pessoal.

• Toda aprendizagem precisa visar objetivos realísticos.

• Toda aprendizagem precisa ser acompanhada de feedback ime-diato (ser um processo contínuo).

• Toda aprendizagem precisa estar embasada em um bom relacio-namento entre os elementos que participam do processo: aluno, professor e colegas de turma.

Algumas destas relações, que são de aspecto sócio-emocional e jul-gamos positivas ao processo ensino-aprendizagem, caracterizam um

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relacionamento de liberdade entre as partes. Neste caso, o aluno irá se sentir próximo ao professor a ponto de haver uma combinação entre severidade e respeito entre as partes.

Outro aspecto da relação professor-aluno está ligado à metodologia aplicada. Neste sentido, o professor relaciona-se com o aluno com o ob-jetivo de reconhecer as potencialidades do aluno e para não ultrapassar seus limites de expressão e autonomia. Sendo negada mais uma vez, por meio dessas relações, o trabalho unidirecional que muitas vezes o professor estabelece.

Aprender não é um processo que se efetive sem rotinas ou ocorra de forma espontânea ou mágica. Ao contrário, exige, exatamente em virtude da intencionalidade contida no conceito de ensinagem, a escolha e execução de uma metodologia adequada aos obje-tivos e conteúdos do objeto de ensino e aos alunos (PIMENTA; ANASTASIOU, 2002, p. 35).

Assim, o problema central em sala de aula está na opção que o professor faz, seja pelo ensino que ministra ao aluno, seja pela aprendizagem que o aluno adquire – perspectivas diferentes que trazem resultados também diferentes (SANTOS, 2001, p. 22).

Essa metodologia, que pensa em trazer conteúdos relacionados à re-alidade do aluno, que respeita o tempo pedagógico de cada indivíduo e incentiva a aprendizagem ativa, caracteriza uma dialética entre estes dois pólos que por muito tempo estiveram distantes, mas que já se percebe que são indissociáveis, portanto, complementares no processo ensino-aprendizagem: professor e aluno.

Pensar a relação professor-aluno no contexto desta pesquisa vem for-talecer a idéia da valorização do pensar do aluno. Quando buscamos descobrir as representações que os alunos trazem e constroem durante o período de graduação, nos baseamos justamente no princípio de que o professor qualifica o seu trabalho a partir de um aluno ativo, histórico e em constante transformação.

Nesse sentido, tomar o senso comum como objeto de análise e a visão dos alunos como ponto de partida é considerar que o seu pensamento e a sua fala revelam aspectos metodológicos a serem considerados no trabalho conjunto, deles com os pro-fessores, nas situações de ensino, com a finalidade de romper

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com a evidência do senso comum mediante um novo código de leitura da realidade, construindo um novo universo conceitual e aceitando o desafio de confrontar e transformar o senso comum, e de transformar-se nesse processo (PIMENTA; ANASTASIOU, 2002, p. 41).

Portanto, acreditamos que a preocupação em intervir, de modo a contribuir para que o aluno vá além do senso-comum, passa primeiro pelas relações que este professor vai estabelecer com o aluno. A esse profissional consciente é que colocamos o desafio, como diria Freire (1996), de ensinar aprendendo. Isto nos leva a ousar com ações dialógicas dentro de um universo educacional onde ainda se há tanto o que descobrir.

4 ANÁLISE DOS DADOS: UMA RELAÇÃO ENTRE OS PERÍODOS

Todo material discursivo expresso durante as falas compuseram este processo de análise. A interpretação qualitativa dos dados obteve como material as respostas específicas e diretas das questões abordadas e as leituras, que seriam as falas aparentemente descontextualizadas das questões e os comportamentos e reações durante o período de entrevista, favorecendo para que a pesquisa adquirisse maior validade e fidelidade quanto às representações sociais.

Dessa forma, estaremos, nesse momento, realizando uma análise com-parativa entre os dados obtidos nos diferentes períodos entrevistados. Juntamente, faremos uma breve discussão sob a luz da proposta da instituição de ensino superior tomada como referência e das propostas curriculares nacionais para os cursos de graduação em Educação Física aprovada em 18 de fevereiro de 2004.

Iremos, por fins didáticos, separar as discussões propostas nessa fase por subtópicos, diretamente relacionados às questões elaboradas nas entrevistas. Cada um desses subtópicos será analisado a partir da comparação entre os três períodos pesquisados e confrontados com as vertentes citadas anteriormente. Como veremos a seguir.

a) as motivaçõesQuando pensamos nas motivações que levam os alunos a ingressarem no curso superior de Educação Física, percebemos que a vivência prática

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da atividade física, seja ela qual for, é o primeiro fator que incentiva a maior parte dos alunos em sua escolha profissional, com base na fala dos alunos mostrada no capítulo anterior. Desse modo, não é pouco comum que alguns alunos ao ingressarem no curso esperem disciplinas de caráter predominante prático e se decepcionem com os múltiplos conteúdos teóricos presentes na grade curricular. Esta questão se justifica à medida que consideramos o contexto histórico da Educação Física para a maioria dos alunos formados. Para grande parte destes, o período escolar caracterizou uma Educação Física centrada exclu-sivamente na prática, sem muitas discussões, nem teorias. Esse fato pode ser observado a partir das entrevistas realizadas nesta pesquisa, e compreendido em todos os períodos investigados. Na verdade, essa questão expressa a representação que, por diversos motivos, a socie-dade construiu ao longo dos anos acerca da Educação Física e que os alunos trazem ao ingressarem no curso.

b) os conceitosQuanto ao conceito, encontramos duas vertentes. A primeira, associada diretamente à questão relatada no tópico anterior, diz respeito a uma conceituação da Educação Física a partir das suas manifestações prá-ticas. Essa vertente foi verificada principalmente no primeiro período e representa a Educação Física enquanto atividade prática que contribui na promoção e manutenção da saúde. Estes termos, na última déca-da, obtiveram grande destaque em nossa sociedade. São diversas as revistas e programas de televisão que abordam questões relacionadas à saúde e indicam às atividades físicas como fator essencial para esse fim. A partir de então, não é estranho que os alunos de primeiro perí-odo identifiquem a Educação Física apenas com essa função. Visto que o conhecimento que eles trazem são pautados no senso comum das comunicações interpessoais (relacionamento consensual). Porém, destacamos que a Educação Física assume outros papéis dentro da sua responsabilidade perante à sociedade. As Diretrizes Curriculares Nacionais para os cursos de graduação declaram que a Educação Física deve possibilitar à sociedade a ampliação e o enriquecimento cultural como direito de todo cidadão, a estimulação à adoção de um estilo de vida fisicamente ativo e saudável, a contribuição à formação cidadã crítica a partir da realidade social, dentre outras funções (CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO, 2004).

O que nos preocupa são os alunos de quinto período que representam a Educação Física a partir da prática. Estes são os fortes candidatos a

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contribuírem no fortalecimento da sub-imagem que a sociedade tem da Educação Física, como sendo uma área impensada que cuida apenas do físico, enquanto outras se preocupam com o intelecto. Dos dezoito alunos entrevistados nos três períodos, apenas dois se preocupam em exercer a função que a Educação Física assume na formação da cidadania e na emancipação social.

A segunda vertente conceitua a Educação Física como área de conhe-cimento, ora como ciência, ora como uma disciplina e alguns alunos do quinto período e a maioria do oitavo período pensam uma Educação Física formada por diferentes conhecimentos relacionados ao corpo. Esta evidência se fortaleceu nessas fases, pois foi somente a partir do quinto período que se tornou notória a preocupação dos alunos com a corporeidade.

Sabemos que muitas das respostas quanto a estas questões estão ligadas às influências atuais em relação aos professores e às disciplinas que estão sendo cursadas no momento. No caso do quinto período, as disciplinas de lazer, psicologia e didática incentivam uma discussão maior do corpo, pensando-o a partir de uma visão holística. Percebemos, então, como o ambiente acadêmico, a partir da comunicação, influencia o discurso dos alunos ainda que em início de formação.

c) o papel da formação profissional universitáriaAo questionar o papel de graduação e os principais conhecimentos ad-quiridos nesse período, mais uma vez é notória, na maioria da população entrevistada, a prioridade dada à análise física e prática do movimento. Mais da metade dos alunos entrevistados resume a importância da graduação, a partir dos conhecimentos anatômicos e fisiológicos, e sua posterior atuação centrada no ensinamento correto de determinado exercício. Apesar de notar que esta visão um tanto reducionista da Edu-cação Física está pautada principalmente nos períodos iniciais (quase em sua totalidade), ainda encontramos discursos bastante fortalecidos nos períodos finais.

Quando levamos esta questão à proposta das Diretrizes Curriculares Nacionais, percebemos que esta direciona às seguintes dimensões do conhecimento para a formação profissional: relação entre ser humano e sociedade, biologia do corpo humano, produção do conhecimento científico e tecnológico e cultural do movimento humano, técnico-instru-mentais e didático-pedagógicas. Isso significa que, para uma atuação

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generalista que pensa na competência profissional, todas essas dimen-sões assumem um valor comum, o que, de fato, contrapõe qualquer especialização precoce.

d) o profissional competenteAo analisarmos que mais da metade dos alunos representam a Educação Física, literalmente, como educação do físico, já temos indícios do perfil do profissional competente que se pensa. O primeiro e o quinto período não apresentam grande diferença quanto a esse discurso, categorizam o profissional competente com aquele que possui principalmente conhe-cimento da área biológica e realiza a transmissão dita ideal da atividade, pensando na não-lesão. O que difere o oitavo período dos demais é a presença de discursos que valorizam a relação didática entre professor e aluno como dimensão fundamental para a atuação competente no mercado de trabalho, destacando-se o papel da universidade exercido neste contexto, em relação à formação de uma identidade profissional mais refletida nos alunos egressos.

Estas representações que os alunos têm em relação aos conhecimen-tos expressos como mais importantes refletem-se em seus interesses de atuação. Ou acontece o contrário, a vivência em determinada área desperta uma maior dedicação por conteúdos mais específicos. Porém, o que identificamos e entendemos como reflexos das representações sociais de grande parte dos alunos em relação às questões discutidas até então, é que nenhum dos alunos entrevistados manifesta interesse pela área escolar, nem no primeiro nem no quinto período. No entanto, no oitavo período, a maioria dos alunos têm interesse em trabalhar na escola e parte deles apontam o estágio supervisionado como agente motivador. E é percebido que grande parte dos formados desta institui-ção, ao terminarem a graduação, ingressam rapidamente neste mercado escolar, seja pela maior probabilidade de encontrar emprego ou pelo novo interesse.

e) a imagem profissional Quanto à representação do profissional que está hoje no mercado de trabalho da Educação Física, muitos alunos alegam a questão do professor só jogar a bola. Em quase todas as entrevistas, pelo menos uma vez, muitos alunos falaram sobre a atuação de um profissional descomprometido ou irresponsável. Esse fato é percebível em todos os períodos que participam da entrevista, porém, somente alguns alunos expressaram possíveis soluções para esta problemática. Os que se

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pronunciaram em relação a esta questão sugeriram maior atenção na explicação da importância da atividade física e da execução correta de movimentos a fim de se evitar lesões. É o que relembramos por meio da fala de um aluno no atual mercado de trabalho:

Muitos que já estão no mercado só ‘jogam a bola’ para os alunos se divertirem. Tem que aprender o movimento, praticar o esporte corretamente para não sofrer lesão. É o profissional que cuida da saúde e vai orientar a pessoa a praticar a atividade física da forma correta (primeiro período, aluno 3).

O que vemos, portanto, é que os alunos em sua maioria identificam e relatam a presença de maus profissionais no mercado, assim como a presença da sub-imagem da profissão por parte da sociedade e ma-nifestam o desejo de mudar a realidade na busca do conhecimento a partir da representação que fazem do bom profissional.

Algumas dessas falas são bem caracterizadas de discussões estimula-das durante o curso por certos professores. O que notamos é que exis-tem alunos que simplesmente reproduzem o discurso, não encontrando embasamento quando comparamos as questões respondidas por eles, e existem aqueles que, pelo menos em seus discursos, parecem ter incorporado certas propostas.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Após esta pesquisa, podemos afirmar que são notórias as represen-tações que os alunos trazem quando ingressam na universidade. São também identificáveis alguns discursos que vão sendo formados ao longo do curso e outros que foram modificados por meio da comunicação dos alunos, uns com os outros e com os professores. De fato, também é visível a manutenção de certas representações que foram construídas durante determinada história de vida, muitas destas são geradoras de conflitos no meio acadêmico. Não piores, estes discursos consensuais também contribuem para a construção do conhecimento e para a for-mação de uma identidade profissional. O que não se sabe ao certo é como o professor tem percebido o que o aluno traz, talvez muitos desses profissionais ainda cristalizam discursos teóricos bem fundamentados, porém, distantes da realidade prática dos alunos, que, por sua vez, trazem uma prática que não concorda com o discurso teórico. Por que

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não discutir a associação dos pólos, em vez de fortalecer conceitos descontextualizados da realidade?

Com esta pesquisa, identificamos um conjunto de sujeitos em todos os períodos entrevistados que, a partir de uma representação prática da Educação Física, fizeram a escolha do curso. Percebemos também no primeiro período do curso e parte do quinto e oitavo uma visão estritamente biológica e fundamental da área, destacando essa dimen-são como a mais importante na prática profissional. Observamos um grande número de alunos que identificam a imagem deturpada que a sociedade tem da profissão, e boa parte dos entrevistados destacaram a questão da má atuação do próprio profissional como principal causa deste preconceito social. Principalmente o primeiro e o quinto período, alegam a necessidade do profissional ensinar a execução correta do movimento, para romper, de certa forma, com a imagem que se tem da Educação Física.

Quanto à formação das representações sociais acerca das temáticas abordadas, identificamos que os alunos entrevistados do primeiro período trazem uma representação do senso-comum construída na sociedade, seja por meio da mídia e/ou pela formação escolar que se teve. Quando buscamos identificar o que acontece com este discurso inicial durante o restante dos períodos, descobrimos alguns pontos nor-teados. À medida que se confronta este conhecimento com os saberes que a universidade se propõe a construir fica notório que o aluno pode escolher diferentes caminhos a trilhar.

O primeiro deles que se caracteriza pela postura imutável frente aos novos conhecimentos. Neste caso, o aluno ignora o que pode produzir de generalista na graduação e, em contrapartida, supervaloriza a sua motivação ao iniciar o curso.

O segundo caminho é aquele aluno que reproduz tudo o que o professor diz, mas não encontra coerência lógica para discursar seguramente so-bre aquilo que se diz pensar. Para este, talvez a teoria seja desvinculada da prática, o que notamos quando confrontamos algumas respostas deste mesmo aluno que percorre a segunda trilha. São alunos que se limitam a freqüentar a sala de aula.

O terceiro caminho, que também identificamos nesta pesquisa, diz respeito ao aluno que construiu uma identidade profissional própria.

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Ele conscientemente conseguiu aliar o conhecimento verificado na graduação às experiências vivenciadas por ele. Estes alunos estão comprometidos com o conhecimento adquirido em sala de aula e, na sua maioria, são participantes ou freqüentam os núcleos de aprofundamento oferecidos pela instituição.

Assim, identificamos nos perfis dos alunos entrevistados a chance de construir novas representações ou optar pela manutenção de sua vi-são. No nosso entendimento, cabe ao aluno representar o seu papel a partir de sua formação e ao professor rever sua atenção frente a esses direcionamentos que o aluno estabelece durante o curso.

No que tange às representações dos alunos com a proposta do curso, verificamos que sua visão muitas vezes se torna reducionista quando comparada à proposta curricular dos cursos de graduação em Educa-ção Física. Grande parte deles não conhece as Diretrizes Curriculares que regem o curso e determinam comportamentos aliados a nenhuma orientação pedagógica. Alguns se especializam em apenas uma área da Educação Física, outros supervalorizam apenas um tipo de conhe-cimento, mas ainda existem aqueles que passam pelo despertar do conhecimento.

De fato, fica notório o papel da universidade, ao percebemos que os alunos do oitavo período incorporam bem mais a proposta do curso. Desta forma, incentivamos o estudo destas questões pelo corpo do-cente a fim analisar, de forma reflexiva, o seu papel enquanto educa-dor e rever possíveis metodologias que não se mostrem adequadas à realidade dos alunos, criando neste espaço pedagógico um ambiente de constantes relações e mútuo respeito entre professores, alunos e alunos, e alunos.

A possível resistência do professor, por exemplo, em respeitar a leitura de mundo com que o aluno chega à Universidade, condicionada por sua cultura e revelada em sua linguagem, se constitui um obstáculo a ser transposto. Como temos insistido neste e em outros trabalhos, o saber escutar significa respeitar a leitura de mundo do educando tomando como ponto de partida e, de forma crítica, interagir com o mundo e suas transformações.

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THE PROFESSIONAL FORMATION AND THE SOCIAL REPRESENTATIONS OF COURSE OF PHYSICAL

EDUCATION OF THE CENTRO UNIVERSITÁRIO VILA VELHA: THE EDUCATION PROCESS

ABSTRACT

The subject of this study is about a proposal for the agreement of the re-lations of the process teach-learning of the course of Physical Education “on the inside”. The phenomenon of the social representations is studied from the concepts and speeches constructed historicamente for determi-ned groups in order to explain some facts of the reality. In this manner, this research has as objective to know which social representations the pupils of the course of graduation in Physical Education of the Centro Universitário Vila Velha possess in relation to its professional formation. From interviews and opened questionnaire, we analyze that paradoxes between the concepts that the pupils bring and the National proposals of the courses of graduation in Physical Education and Curricular Lines of direction exist. We understand that the process of professional formation brings the possibility to reflect of critical form in different realities.

Keywords: Learning – Physical Education. Physical Education – Study and teaching. Teachers – Learning.

REFERÊNCIAS

CENTRO UNIVERSITÁRIO VILA VELHA. Projeto pedagógico do Curso de Educação Física, Esporte e Lazer. Vila Velha, 1999.

CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO (Brasil). Diretrizes curricu-lares nacionais para os cursos de graduação em Educação Física. Brasília, 2004.

FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996.

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MADEIRA, M. C. Um aprender do viver: educação e representação social. In: MOREIRA, A. S. P.; OLIVEIRA, D. C. de O. Estudos interdis-ciplinares de representação social. 2. ed. Belo Horizonte: AB, 2000. cap. 7, p. 239-250.

PIMENTA, S. G.; ANASTASIOU, L. das G. C. Docência no ensino su-perior. In: ______. Do ensinar à ensinagem. São Paulo: Cortez, 2002. p. 201-226.

SANTOS, S. C. O processo de ensino-aprendizagem e a relação profes-sor-aluno: aplicação dos “sete princípios para a boa prática na educação de ensino superior”. Caderno de Pesquisa em Administração, São Paulo, v. 8, n. 1, p. 69-82, jan./mar. 2001.

Correspondência para/reprint request to:Marcello Pereira NunesAvenida São Paulo, 2514/101Itapoã29101-508 - Vila Velha – ES (Brasil)

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RESUMO

Trata da inconstitucionalidade do prazo decadencial para impetração do mandado de segurança e da nova súmula 632 do Supremo Tribunal Federal (STF). Aborda, primeiramente, o efeito do tempo em relação aos direitos, diferenciando os prazos de prescrição e decadência e sua respectiva relevância. Em seguida, trata do prazo para impetração do mandamus. Primeiramente, destaca a sua previsão legal para, após, analisar a sua natureza jurídica. Todas as correntes sobre a natureza jurídica do prazo para impetração são analisadas, inclinando-se pela orientação que o considera como decadencial. Analisa, em seguida, de modo meticuloso, a (in)constitucionalidade do prazo para impetração, concluindo, ao final, de maneira circunstanciada.

Palavras-chave: Mandado de segurança. Prazos (Direito).

1 INTRODUÇÃO

O Direito é um instrumento de controle social. Na verdade, a relação entre a sociedade e o fenômeno jurídico é de mútua dependência: onde há sociedade, há direito e vice-versa – ubi societas ibi jus, nisi societas nec jus. Direito e sociedade, portanto, são fenômenos indissociáveis e

A (IN)CONSTITUCIONALIDADE DO PRAZO PARA IMPETRAÇÃO DO MANDADO DE SEGURANÇA

Daniel Roberto Hertel1

1 Mestre em Garantias Constitucionais pelas Faculdades Integradas de Vitória. Professor do Centro Universitário Vila Velha. E-mail: [email protected].

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interconexos. Isso decorre, quiçá, da função reguladora que o Direito exerce na sociedade.

Se analisado sob o prisma ontológico, o Direito constitui-se em um ins-trumento social. Como tal, não poderia deixar de absorver as aspirações e anseios daqueles para os quais ele foi estabelecido. Como fenômeno cultural, não é regido por leis naturais, mas sim por leis criadas pelo próprio homem de acordo com as suas necessidades. E ao homem, ou melhor, à sociedade, não interessa que os conflitos entre as pessoas sejam eternizados. Muito pelo contrário: o que se busca é exatamente a rápida solução dos estorvos para que a paz social seja restabelecida da maneira mais simples e célere possível.

O decurso dos anos, assim, não pode ser desprezado pelo Direito, por não interessar à sociedade que os conflitos se arrastem por muito tempo. Como dito, este é um instrumento que está a serviço daquela. Enquanto fenômeno conexo às relações sociais, o Direito encampa essas diretrizes através de dois institutos: a prescrição e a decadência. Regra geral, portanto, os direitos e as ações2 apresentam prazos extintivos.

O mandado de segurança, garantia constitucional prevista no art. 5º, inc. LXIX, da Constituição Federal, promulgada em 1988 (CF/1988), também possui um prazo para o seu exercício. Esse prazo, contudo, não está previsto no texto constitucional, mas sim na legislação infraconstitucio-nal. A Lei nº 1.533/1951 estabelece que o prazo para impetração do mandado de segurança é de 120 dias.

O que se pretende neste estudo é analisar e problematizar algumas questões que decorrem do prazo para impetração do mandado de segurança. Para tanto, destacou-se, num primeiro momento, o efeito do tempo em relação aos direitos, abordando-se os institutos da prescrição e da decadência. Em seguida, o prazo para impetração do mandado de segurança foi analisado, destacando-se a sua natu-reza jurídica, assim como a (in)constitucionalidade da sua previsão. Concedeu-se, outrossim, especial enfoque para a recente súmula do Supremo Tribunal Federal (STF): a de número 632, que reafirmou a orientação dominante daquele Tribunal, estabelecendo que é “cons-titucional a lei que fixa o prazo de decadência para a impetração de mandado de segurança”.

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2 EFEITO DO TEMPO EM RELAÇÃO AOS DIREITOS

2.1 NOÇÕES GERAIS

O tempo exerce notável influência na composição dos conflitos sociais. O passar dos anos pode mesmo sedimentar determinado desfecho para um estorvo. À sociedade não interessa que os conflitos sejam eternizados, pois eles criam instabilidades. Por isso, a solução de um conflito deve ser buscada em tempo razoável, sob pena de o próprio tempo apresentá-la.

Assim, se ao direito material compete a criação dos direitos ob-jetivos, que se investem da pretensão e da ação na medida em que são subjetivados, ao direito material compete igualmente enumerar as causas da respectiva extinção, dentre elas as que decorrem da inatividade do titular durante um certo lapso de tempo [...] (CAHALL, 1979, p. 5).

A extinção de um direito pelo decurso de um prazo justifica-se tanto pelo critério da segurança jurídica como pela necessidade de pacificação so-cial. Ademais, a inexistência de prazos extintivos, tanto do direito material como da ação, implicaria na submissão eterna de um dos envolvidos no conflito de interesses em relação ao outro. Os males da perpetuidade são ressaltados pela doutrina: “Em decorrência dessa perpetuidade, a parte adversa, contra a qual prevaleceria a ação imprescritível, teria de ficar à disposição daquele titular para sempre, o que seria a implantação do caos” (ZENUN, 1993, p. 3).

Outro aspecto que destaca a importância do tempo para a solução dos conflitos está relacionado às provas. É de extrema dificuldade a ma-nutenção de provas por lapsos temporais longos. A extinção do direito ou da ação pelo decurso de um prazo (através da prescrição ou da decadência) afasta o encargo dos interessados quanto à guarda das provas por períodos indefinidos.

Sendo reconhecida por todas as legislações a impossibilidade de se conservarem provas indefinidamente, há um limite de tempo, além do qual desaparece a obrigatoriedade de se resguardarem até mesmo as provas por escrito – e não podem ter outra sorte as provas testemunhais, facilmente perecíveis diante dos mais variados fatores, as quais se apagam facilmente da memória (ZENUN, 1993, p. 3).

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2.2 A PRESCRIÇÃO E A DECADÊNCIA

O vocábulo prescrição significa literalmente um escrito posto antes (prae-scriptio) (MONTEIRO, 1997, p. 292). Pode ser conceituado como sendo a perda da ação3 atribuída a um direito e de toda a sua capacidade defensiva, em conseqüência do não uso dela durante um determinado prazo (BEVILAQUA, apud RODRIGUES, 1998, p. 318). A prescrição, assim, extingue o direito de ação e não o direito material subjacente.4

De outro lado, pode-se conceituar a decadência como a perda do direito material. Na decadência, o direito é outorgado para ser exercido dentro de determinado prazo; não o sendo, extinguir-se-á. O direito de ação, assim, apenas indiretamente é perdido. Na doutrina, pode-se encontrar a seguinte conceituação da decadência:

Instituto de direito material que supõe a extinção do direito po-testativo e por via indireta também da ação judicial tendente à modificação de um estado jurídico contrário ao direito, pelo seu não exercício no prazo constante da lei ou do contrato (VALÉRIO, 1999, p. 73).

2.2.1 Critérios distintivos

A dificuldade em se encontrar critérios seguros para diferenciar a prescri-ção da decadência é ressaltada por quase toda a doutrina. Na verdade, há inúmeras teorias que procuraram estabelecer as distinções entre a prescrição e a decadência. Até mesmo hoje, não se pode dizer que há uma teoria, ou um critério seguro para distinguir os dois institutos. Como lembra Guimarães (1980, p. 1): “O problema da fundamentação dogmática da diferença entre prescrição e decadência continua em aberto, não tendo a maioria da doutrina chegado a um acordo a respeito da solução a lhe ser dada.”

De qualquer sorte, há alguns critérios que são clássicos quanto à dife-renciação entre prescrição e decadência. O critério que foi dominante durante muito tempo é aquele que sustenta que a prescrição ocorre em relação à ação, enquanto a decadência se dá em relação ao direito. Nesse sentido, pode-se trazer à ribalta os seguintes escólios:

Segundo a doutrina dominante no Brasil, o elemento diferencia-dor reside no campo de incidência de cada um dos institutos:

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a prescrição atinge diretamente a ação e por via oblíqua faz desaparecer o direito por ela tutelado; a decadência, ao inverso, atinge diretamente o direito e por via oblíqua, ou reflexa, extingue a ação (CAHALI, 1979, p. 12). 5

Câmara Leal, que influenciou a doutrina majoritária no Brasil, diz que segue o critério da escola alemã, a qual firma o entendimento de que a prescrição extingue diretamente as ações e indireta-mente o direito e a decadência extingue diretamente o direito e indiretamente a ação. Seria a decadência a causa imediata da extinção de direitos e a prescrição, ao contrário, opera neles tão só de forma mediata e indireta (VALÉRIO, 1999, p. 54).

Essa teoria, contudo, não resistiu às críticas que lhe foram endereçadas por parte daqueles que defendem a teoria autonomista da ação. Com efeito, ainda que haja decorrido o prazo de prescrição, será possível a utilização da ação, já que esta representa um meio de provocação da atividade jurisdicional. Assim, mesmo estando prescrita a ação, será pos-sível que o jurisdicionado a utilize, tendo em vista que, modernamente, a ação é considerada como um instrumento através do qual retira-se da inércia o órgão jurisdicional. Nesse sentido:

Demais disso colocam erroneamente a ação como objeto da prescrição e não especificam quais os direitos atingidos pela decadência. A concepção de que o direito de ação fenece jun-tamente com o direito material, não se coaduna com o moderno direito processual. Depois dos estudos de Wach e Degenkolb, a ação não pode mais ser considerada como um mero tegumento protetor do direito privado ou simples reação deste, quando vio-lado. Segundo a doutrina hoje dominante, a ação é o direito de movimentar a máquina jurisdicional do Estado, em face de um caso concreto (ERTHAL, apud CAHALL, 1979, p. 13).

Para evitar essa incongruência, o legislador do novo código civil adotou conceituação diversa para a prescrição.6 Esta, na verdade, deixou de ser conceituada como a perda do direito de ação,7 para ser considerada como a perda da pretensão. Com efeito, o art. 189 do Código Civil de 2002 (CC/2002) reza o seguinte: “Violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206”. Nesse mesmo sentido, inclusive, pode-se colacionar o seguinte: “[...] Para evitar a discussão sobre se ação prescreve, ou não, adotou-se a tese da prescrição da pretensão, por ser considerada

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a mais condizente com o Direito Processual contemporâneo (GONÇAL-VES, 2003, p. 464).8

Outro critério distintivo da prescrição e da decadência é o legal. Na ver-dade, por esse critério, a própria lei definirá se o prazo é de prescrição ou de decadência. Esse, inclusive, foi o critério adotado pelo legislador do novo código civil, que optou por esclarecer qual a natureza do res-pectivo prazo extintivo.

Para distinguir prescrição de decadência, o atual Código Civil optou por uma fórmula que espanca qualquer dúvida. Prazos de prescrição são, apenas e exclusivamente, os taxativamente discri-minados na Parte Geral, nos arts. 205 (regra geral) e 206 (regras especiais), sendo de decadência todos os demais, estabelecidos como complemento de cada artigo que rege a matéria, tanto na Parte Geral como na Especial [...] (GONÇALVES, 2003, p. 464).

Por fim, cabe fazer menção ao chamado critério científico de distinção entre prescrição e decadência de Agnelo Amorim Filho,9 também relati-vamente difundido na doutrina. Tal teoria parte da distinção entre direitos subjetivos e potestativos, assim como da classificação das ações em condenatórias, constitutivas e declaratórias. Para o mencionado autor, são sujeitas à prescrição somente as ações condenatórias, através das quais se pretende o cumprimento por parte do requerido de uma determinada prestação. A ação condenatória é uma forma de exercício de uma pretensão.10 E o instituto da prescrição refere-se exatamente à extinção de uma determinada pretensão;11 por outras palavras: refere-se à extinção do direito de exigir uma determinada prestação.

De outro lado, a decadência está relacionada ao exercício dos chamados direitos potestativos. Nessa classe de direitos, não há uma prestação a ser exigida de outra pessoa, ou seja, não há uma pretensão a ser deduzida. Quando há um prazo fixado em lei para o exercício do direito potestativo, esse será de decadência; quando não houver, o direito será imprescritível. Os direitos potestativos são exercidos através de ações de natureza constitutiva (positiva ou negativa). Logo, essa classe de ações pode apresentar ou não prazo de decadência, dependendo de expressa previsão legal. Destaque-se, ainda, que as ações de natureza declaratória são imprescritíveis pois visam à obtenção de certeza, não estando sujeitas a quaisquer tipos de prazos. Sobre o exposto, pode-se colacionar o seguinte:

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A afirmação de que a prescrição extingue a ação e a deca-dência extingue o direito é insuficiente para distinguir os dois institutos. A demonstração feita por Agnelo Amorim Filho deve ser acolhida para o sistema CPC, como o foi, expressamente, pelo CDC 26 e 27 e pelo novo CC (l. 10406/02) (arts. 189 a 211). Por esse critério, somente as pretensões exercitáveis por meio de ação condenatória é que estariam sujeitas, sempre, à prescrição, porque somente os direitos à prestação é que podem ser violados.[...] Os direitos potestativos, isto é, aqueles que podem ser exercidos independentemente de haverem sido lesados, são exercitáveis em juízo por meio de ação constitutiva (positiva ou negativa). Quando a lei estabelecer prazo expresso para o exercício da pretensão constitutiva, esse prazo é de decadência. Quanto as pretensões constitutivas sem prazo de exercício previsto em lei, bem como quanto às pretensões declaratórias, não existe possibilidade de se extinguirem, razão pela qual se fala que são imprescritíveis [...] (NERY JUNIOR; NERY, 2003, p. 640).

Consigne-se, por fim, que o prazo decadencial, quando existente, inicia o seu curso juntamente com o nascimento do direito potestativo. De outro lado, o prazo prescricional somente inicia o seu curso com a violação do direito subjetivo, quando, então, nasce a pretensão.

2.2.2 Relevância da distinção

A relevância da distinção entre a prescrição e a decadência é digna de nota. Na verdade, embora prescrição e decadência sejam manifestações do tempo em relação aos direitos, os seus regimes são, de certa forma, diferenciados. Isso destaca a importância em se distinguir, com precisão, os prazos que são de decadência dos que são de prescrição.

Na verdade, os prazos de prescrição não podem ser alterados pelas partes, consoante o disposto no art. 192 do CC/2002, enquanto os de decadência podem ser convencionados pelas partes, como se dessu-me do art. 211 do citado codex. Assim, a decadência pode ser legal ou convencional, enquanto a prescrição somente pode ser legal. Os prazos de prescrição apresentam causas de impedimento, suspensão e interrupção.12 A decadência, por outro lado, salvo expressa disposição legal em contrário, não se suspende e nem se interrompe. A existência de prescrição não poderá ser reconhecida ex officio, salvo se favorecer a absolutamente incapaz, nos termos do art. 194 do CC/2002. A deca-

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dência, a seu turno, poderá ser reconhecida de ofício pelo magistrado de acordo com o disposto no art. 210 do citado codex.

Nota-se, assim, a relevância do exato reconhecimento da natureza do prazo de extinção de um determinado direito. Nesse particular, des-ponta a importância da caracterização ontológica do prazo de extinção do mandado de segurança previsto no art. 18 da Lei do Mandado de Segurança (LMS).

3 O PRAZO PARA IMPETRAÇÃO DO MANDADO DE SEGURANÇA

3.1 A REGRA DO ART. 18 DA LEI Nº 1.533/1951

A Lei nº 1.533/1951 preceitua em seu art. 18 o seguinte: “O direito de requerer mandado de segurança extinguir-se-á decorridos cento e vinte dias, contados da ciência, pelo interessado, do ato impugnado”. Assim, a lei, encampando os efeitos do tempo sobre os direitos, estabelece um prazo limite para impetração do mandamus. Esse prazo de cento e vinte dias para impetração do mandado de segurança, embora não previsto no texto da Constituição Federal de 1988, já constava do art. 3º da Lei nº 191, de 16 de janeiro de 1936,13 bem como do art. 331 do Código de Processo Civil (CPC) de 1939.14 Assim a Lei nº 1.533/1951 apenas repetiu um prazo que estava previsto nas leis anteriores que trataram do mandado de segurança.

3.2 NATUREZA JURÍDICA DO PRAZO

A primeira questão a ser indagada sobre o prazo para impetração do mandado de segurança refere-se à sua natureza jurídica. Na verdade, a compreensão ontológica desse prazo apresenta profusa relevân-cia, tendo em vista que os regimes da decadência e prescrição são diferenciados.

A adequada identificação da natureza desse prazo, contudo, é relevante, na medida em que, se concluir que se trata de prazo de natureza decadencial, aplicar-se-ão ao mesmo as regras próprias desse instituto, entre as quais a não-possibilidade de suspensão ou de interrupção, uma vez deflagrado (ALVIM, 1998, p. 111).

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A LMS, no art. 18, faz menção à extinção do direito de requerer mandado de segurança. Na doutrina encontram-se diversas orientações sobre a natureza jurídica desse prazo. Daí a relevância das considerações desenvolvidas na primeira parte desse estudo.

Pontes de Miranda (apud BUZAID, 1989, p. 155), por exemplo, considera que o prazo para impetração do mandado de segurança é de preclu-são.15 O prazo estaria relacionado não à perda do direito de exercício da pretensão, mas sim à perda do exercício dessa pretensão por uma ação especial.

Autores há, como Pontes de Miranda, que falam em prazo preclusivo, denominação que nos parece inadequada, dado que a preclusão não diz respeito à “existência ou inexistência de um direito subjetivo, mas sim, às faculdades e aos poderes processuais, embutidos nos ônus que lhes sejam respectivos” (ALVIM, 1998, p. 112).

O equívoco da orientação de Pontes de Miranda é evidente. Na verdade, os prazos preclusivos estão relacionados ao procedimento e à relação processual. Por outras palavras: só há falar-se em preclusão quando há um processo inaugurado. No caso do mandado de segurança, não há ainda um processo inaugurado, o que permite concluir que o prazo para sua impetração não é preclusivo.

A preclusão, [...], é verdadeiramente imanente à teoria dos pra-zos, porque é ela que permite a superação contínua dos diversos estágios procedimentais. Ora, se o transcurso do prazo de 120 (cento e vinte) dias inibe a utilização do mandado de segurança, é anterior ao processo, não tem sentido qualificá-lo de prazo preclusivo (ALVIM, 1998, p. 113).

Outra orientação encontrada na doutrina é no sentido de que o prazo para impetração do mandado de segurança é simplesmente um prazo extintivo. Essa orientação pugna pela existência de um direito à propo-situra do mandamus, o qual estaria sujeito a um prazo extintivo. Nesse sentido, pode-se citar o seguinte:

[...] O prazo para impetrar mandado de segurança não é prazo pre-clusivo, porque ele não se verifica no curso do processo, tampouco é de prescrição ou de decadência, porque não fere mortalmente o direito material, que remanesce imprejudicado, podendo ser

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pleiteado por via ordinária. O prazo é extintivo de uma faculdade pelo seu não exercício dentro de cento e vinte dias, contados da ciência do ato a ser impugnado. Não se justifica, pois, recorrer aos conceitos de prescrição, de decadência e de preclusão, para explicar a natureza do prazo, quando a própria lei subministra a idéia correta, que é a de extinção do direito de requerer mandado de segurança (BUZAID, 1989, p. 159-160).

[...] A doutrina, em geral, atribui ao prazo em referência o caráter de prazo decadencial. Mais adequado se nos afigu-ra, no entanto, a classificação que lhe dá o Prof. ALFREDO BUZAID, ao concebê-lo como simples prazo extintivo, atento à circunstância de que o decurso desse lapso de tempo não impede o interessado de deduzir a pretensão pelas vias or-dinárias (MEDINA, 2003, p. 152).

Essa orientação é minoritária na doutrina. Na verdade, não se justifica recorrer a uma terceira categoria jurídica – tertium genus – para ana-lisar-se a natureza jurídica do prazo para impetração do mandado de segurança. A expressão prazo extintivo é vaga e imprecisa; além disso, a prescrição, a decadência e a preclusão,16 por si só, já correspondem a prazos extintivos. Registre-se, ademais, que considerar o prazo para impetração do mandamus como extintivo, não elucida qual o regime que deverá ser aplicado ao mesmo – se de decadência ou de prescrição. E tal reconhecimento, como já visto, é por demais relevante, tendo em vista a diversidade de regimes dos institutos.

Há que se analisar, por fim, a possibilidade de o prazo para impetração do mandado de segurança ser de natureza prescricional ou decaden-cial. A rigor, a verificação da natureza jurídica desse prazo dependerá do conceito que for adotado para os institutos da prescrição e da de-cadência. Se se considerar que a prescrição é a perda do direito de ação e a decadência a perda do direito material, o prazo do art. 18 da LMS deverá ser considerado de prescrição, tendo em vista que, com o decurso do prazo, não se perde o direito material,17 mas sim a ação de mandado de segurança.

Contudo, esse último critério não se afina com a moderna concepção de prescrição e decadência e nem mesmo com os preceptivos do novo C/C. Os prazos de prescrição, na verdade, implicam na perda da pretensão e não da ação. Nesse sentido, inclusive, pode-se destacar novamente o texto do art. 189 do CC/2002 que reza o seguinte: “Violado o direito,

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nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206”.

Assim, não havendo perda da pretensão com o decurso do prazo do mandado de segurança, não há que se falar em prazo prescricional, mas sim em prazo decadencial. Ressalte-se, ainda, que o que se per-de com o decurso do prazo é o direito de impetrar-se o mandado de segurança; e não o direito de ação, já que a via ordinária estará aberta para eventual análise da pretensão18. Nesse sentido, inclusive, pode-se colacionar o seguinte:

Doutrina e jurisprudência não hesitam em reconhecer neste um prazo decadencial e não meramente prescricional. Trata-se de prazo cuja consumação acarreta a perda de um direito. Aqui se trata da perda do direito de impetrar o mandado de segurança (BUENO, 2002, p. 144).

O prazo para impetrar mandado de segurança é de cento e vinte dias, a contar da data em que o interessado tiver conhecimento oficial do ato a ser impugnado. Este prazo é de decadência do direito à impetração, e, como tal, não se suspende nem se inter-rompe desde que iniciado (MEIRELLES, 2000, p. 50).

O prazo assentou-se, na doutrina e na jurisprudência, como de decadência. Há opiniões no sentido de que é de prescrição. Sendo de decadência, iniciado não se interrompe, nem se suspende (VELLOSO, 1986, p. 62).

3.3 TERMO INICIAL

O prazo para impetração do mandado de segurança, como visto, é de cento e vinte dias, por força do art. 18 da LMS. Trata-se de prazo de na-tureza decadencial, não havendo, portanto, possibilidade de suspensão ou interrupção no seu curso. Conta-se de acordo com a regra prevista no art. 184 do CPC, excluindo-se o dia do começo e incluindo-se o do final (BARBI, 2000, p. 136). Cumpre, agora, analisar o termo inicial de fluência do citado prazo. Para Bueno (2002, p. 146), é necessário, nesse passo, distinguir-se três situações possíveis: a) mandados de segurança impetrados contra atos positivos; b) mandado de segurança impetrados contra atos omissivos; c) por fim, mandados de segurança preventivos.

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No primeiro caso, o prazo para impetração do mandado de segurança passa a fluir desde o dia em que o impetrante tenha ciência do ato com sua força executiva. Deve-se ressaltar que a LMS, em seu art. 18, exige a ciência do ato.19 Não basta considerar-se, apenas, a sua executoriedade. Nesse sentido, pode-se trazer à baila o seguinte escólio:

[...] Não basta, embora haja julgados nesse sentido, que o ato tenha força executória (o que, de resto, é ínsito a qualquer ato regido pelo direito público) para que tenha início a contagem do prazo decadencial. Necessário – e fundamental – que o impetrante tenha ciência da força executória do ato, o que se impõe, até mesmo, por força do princípio da publicidade a que se refere o caput do art. 37 da Constituição Federal. Caso contrário, o prazo referido no art. 18 da Lei 1533/51 estaria sendo reduzido, o que é inadmissível, até porque se trata de norma restritiva de direito (BUENO, 2002, p. 146).

No segundo caso, isto é, nas hipóteses de omissão do agente público, não há prazo para impetração do mandamus. Na verdade, não sendo perpetrado o ato ilegal, não se pode iniciar o cômputo do prazo para a sua impugnação. É bem verdade que, havendo um prazo legal para realização do ato, decorrido este, o prazo para a propositura do writ se iniciará. Nesse sentido, pode-se citar o seguinte:

Quando a lei fixar prazo para a autoridade praticar o ato e a rea-lização deste não depender de pedido do interessado, devendo ser praticado ex officio, o prazo para o requerimento do mandado começará a correr do dia em que terminar aquele prazo fixado na lei, pois aí começará o ato lesivo (BARBI, 2000, p. 137).

Por fim, a terceira hipótese refere-se ao mandado de segurança pre-ventivo. Nesses casos, também não há possibilidade de fluência de prazo decadencial. Como o writ será impetrado antes da realização de um determinado ato, não há como haver transcurso do prazo decadencial.

3.4 A (IN)CONSTITUCIONALIDADE DO PRAZO

O mandado de segurança, como visto, apresenta prazo decadencial de 120 dias, por força do art. 18 da Lei nº 1.533/1951. Contudo, essa previsão quanto ao prazo inexiste no texto da Constituição Federal,

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que, ao dispor sobre o mandado de segurança no art. 5º, inc. LXIX, assim o fez:

Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público.

Nota-se, assim, que, embora inexistindo qualquer restrição quanto ao prazo para sua impetração, o legislador ordinário optou por restringir o exercício da garantia constitucional do mandamus ao prazo de 120 dias. Indaga-se, então, sobre a constitucionalidade,20 isto é, sobre a recepção dessa limitação ao exercício do writ pelo texto constitucional vigente. Na doutrina, realmente, encontram-se orientações tanto no sentido da inconstitucionalidade do preceptivo como no sentido da sua constitucionalidade.

Defendem, por exemplo, a inconstitucionalidade do prazo de cento e vinte dias para impetração do mandado de segurança: Alfredo Guima-rães Chaves, Cândido de Oliveira Neto, João Oliveira Filho e Sampaio Dória, como lembra Ferraz (1993, p. 98-99). O argumento central des-sa orientação oscila em torno do fato de que a Constituição Federal, ao prever o mandado de segurança, não restringiu o seu exercício ao decurso de qualquer prazo. Assim, não poderia o legislador ordinário fazê-lo, tendo em vista, inclusive, que o mandado de segurança é uma garantia constitucional, robustecida pela condição de cláusula pétrea.21 Nesse sentido, pode-se colacionar o seguinte:

Tais autores, em síntese muito apertada, entendem que o man-dado de segurança, enquanto garantia constitucional, não pode ser empedido por lei infraconstitucional, como é o caso do art. 18 da Lei 1533/51. No caso, a fixação de prazo, para a utiliza-ção dessa garantia constitucional, levaria a um atrofiamento do instituto, desnaturando o que concebera o legislador constituinte (ALVIM, 1998, p. 114).

A previsão de um prazo para exercício da garantia constitucional do mandado de segurança, portanto, para esses autores, estaria em dissonância em relação ao texto da Constituição Federal, não sendo recepcionada por esta. Na doutrina, essa orientação não é isolada,

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havendo considerável número de autores que se inclinam por ela. É o que se dessume dos seguintes escólios:

Esse writ foi encartado na Lei Magna com pressupostos estritos e claros, com vistas à realização de objetivos também claros e estritos. Com admitir, cientificamente, que uma garantia dessa magnitude possa ser ignorada pelo decurso de um prazo criado em lei ordinária, sem qualquer indicação constitucional a ele conducente? (FERRAZ, 1993, p. 99)

A LMS 18 é inconstitucional. O MS, sendo ação constitucio-nal, tem seus requisitos e limites estabelecidos apenas no texto constitucional (CF 5º, LXIX e LXX), que não remeteu seu regime jurídico à lei federal. Ao legislador ordinário é reservado somente o poder regulamentar, fixando contornos procedimentais para seu exercício. Não pode criar requisitos e limites não previstos na CF. A norma sob comentário, porque restringe o exercício de direito fundamental previsto na CF, é inconstitucional. O impetrante pode impetrar MS mesmo depois de passado o prazo mencionado na LMS 18 (NERY JUNIOR; NERY, 2003, p. 1605).

A questão que se põe, no entanto, é que a Constituição Federal não limitou temporalmente a possibilidade de exercício do manda-do de segurança. Muito pelo contrário. Embora tenha fixado uns tantos pressupostos e requisitos para sua impetração, quedou-se silente quanto a seu exercício vincular-se ou poder vincular-se a um prazo certo. [...] É certo que, para o sistema de 1988, o prazo de 120 dias limita, minimiza, impõe condição que o texto consti-tucional não prevê e não autoriza. Daí sua inconstitucionalidade patente (BUENO, 2002, p. 143).

James Marins (apud ALVIM, 1998, p. 115), ao aludir ao prazo do art. 18 da Lei 1533/51, afirma peremptoriamente: “Aqui, cla-ramente, a lei extrapola os muros técnicos de sua competência em face da Constituição”.

Creio que chegou o tempo de se rever esta questão, que parece que ficou pacífica na jurisprudência, quando o Supremo anunciou a Súmula 430 a respeito da decadência. Hoje nós, os juízes, temos reconhecido a decadência com tranqüilidade, mas acho que é em momentos como este que devemos suscitar as discussões. Acho que devíamos voltar a discutir o tema. Realmente, não sei por que se entendeu de fixar este prazo.

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No que me toca, nunca suscitei o problema da inconstitucionali-dade apesar de ter dúvidas a respeito dele. [...] Mas quem sabe, reexaminando esse tema, juristas de porte poderiam sensibilizar os tribunais e prestar obséquio à Constituição, e tornar inócua esta disposição que, na verdade, tem, no segundo plano, uma ação que não deve ser encarada tão só sob o ponto de vista processual? É muito mais do que isso. É remédio de Direito Constitucional. É garantia constitucional (VELLOSO, 1986, p. 64).

Registre-se que, como garantia constitucional, isto é, como um instru-mento constitucional de defesa do cidadão frente às arbitrariedades do Estado, o mandado de segurança, de fato, não poderia ter o seu exercício limitado no tempo. Na verdade, a interpretação do texto constitucional deve ser no sentido de maximizar as garantias constitucionais. Ora, não havendo previsão no texto constitucional quanto à existência de prazo decadencial, não poderia, efetivamente, o legislador infraconstitucional estabelecê-la.

Estranhamente, em relação ao habeas corpus, também garantia consti-tucional, não há qualquer limitação de prazo. Dir-se-á que tal se dá em decorrência do fato de que o habeas corpus tutela o direito de liberdade. Mas, tal argumento não deve prosperar, tendo em vista que o mandado de segurança, de uma forma ou de outra, também tutela o direito de liberdade; não se trata, contudo, do direito de liberdade de locomoção, mas sim daquilo que se pode considerar como uma liberdade pública, ou seja, um direito de liberdade frente às arbitrariedades do Estado.

Admitir-se a possibilidade de prazo decadencial para o mandado de segurança e não admiti-lo para o habeas corpus é contra-senso dema-siado. Na verdade, como ambos os writs são garantias constitucionais, isto é, são ações com assento na Constituição Federal, não podem ser limitados pelo legislador infraconstitucional. Nesse sentido, pode-se citar o seguinte:

Em quarto lugar, nada há de estranhável em que o mandado de segurança não esteja sujeito a prazos de impetração: tal é o que sempre aconteceu com o habeas corpus e, já agora, também com o habeas data, sem falar na ação direta de inconstitucionalidade (FERRAZ, 1993, p.101).

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Mas, há forte orientação em sentido contrário,22 pugnando pela cons-titucionalidade da limitação do prazo para impetração do mandamus. Nesse sentido, pode-se colacionar o seguinte:

[...] temos que o legislador infraconstitucional, ao editar a regra insculpida no art. 18 da Lei 1533/51, não fez senão disciplinar o instituto, dentro dos contornos da regra constitucional, não ofen-dendo o Texto Maior. [...] Contudo ninguém nega, em nome desse direito fundamental, ao legislador ordinário o direito de ação. Não se vê, com o devido respeito àqueles que ao contrário pensam, diferença ontológica entre a fixação de prazo prescricional pelo legislador ordinário e a fixação de prazo extintivo de 120 (cento e vinte) dias, pelo art. 18 da Lei 1533/51 (ALVIM, 1998, p. 117).

Data venia em relação àqueles que defendem essa tese, mas há diferença sim entre a fixação de prazo para exercício da ação de mandado de segurança e de outras ações. Na verdade, o mandamus tem previsão constitucional específica, o que o difere das demais ações. Ademais, há ações não previstas expressamente23 na Cons-tituição Federal que são imprescritíveis,24 ou seja, que não tem prazo estabelecido para sua propositura. Considerar-se, portanto, que o mandamus não pode ser imprescritível seria verdadeiro contra-senso. Nesse sentido:

[...] Dir-se-á que ao Congresso é permitido, mediante leis proces-suais, estabelecer prazos de decadência e prazos de prescrição. Em linha de princípio, concordo com a objeção. Tenho minhas dúvidas, entretanto, quando se trata de uma ação constitucional, como é o caso do mandado de segurança, remédio constitucional, garantia constitucional [...]. O prazo mencionado é, na verdade, arbitrário. Fixado, na doutrina e na jurisprudência, o conceito de direito líquido e certo que autoriza o ajuizamento do writ – incon-troversos os fatos ou provados estes documentalmente, é possível o aforamento da segurança – o prazo de 120 dias não se justifica. Figuremos um exemplo que demonstra que esse prazo é arbitrário: o indivíduo pode comprovar, de plano, os fatores que dariam nas-cimento ao seu direito. Impetra, então, o mandado de segurança, fazendo-o no 125º dia. Reconhecendo a decadência, o juiz vai mandá-lo para as vias ordinárias. Na via ordinária, entretanto, vai-se repetir tudo o que se fez, já que nem haveria necessidade de audiência, pois seria caso de julgamento antecipado da lide (CPC, art. 330, I). O absurdo desmerece o princípio da economia processual, que domina todo processo.25

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Ademais, não se deve olvidar que, sendo encartado no texto constitu-cional, o mandado de segurança tem objetivos claros e específicos. Não é admissível, pois, que uma garantia constitucional dessa magnitude possa ser ignorada pelo decurso de um prazo criado em lei ordinária, sem qualquer indicação constitucional (FERRAZ, 1993, p. 100).

Por fim, nem se argumente que o mandado de segurança, uma vez decorrido o seu prazo decadencial, não impede a utilização da via ordinária para defesa do direito subjetivo. Na verdade, a celeridade ínsita do mandamus, assim como a ausência de qualquer limitação constitucional temporal quanto ao seu exercício, obstam o argumento legitimador da constitucionalidade do prazo decadencial estabelecido pelo legislador infraconstitucional. É oportuno, ainda, colacionar o que segue:

[...] Doutra parte (e ainda com Sidou), que o prazo legal seja, in casu, apenas simples disciplina do “modo, o processo, a forma de defender esse direito, que tanto pode ser a via privilegiada, como outros caminhos judiciais mais lentos”, nada mais inexato. E assim não é: I – a uma, porque ser apenas simples disciplina processual não se compatibiliza com a natureza extintiva do prazo sob exame, como consagrado no prefalado art. 18; II – a duas, porque o mandado de segurança não é apenas uma via judicial privilegiada de defender direitos. Ele é em si um direito fundamen-tal, uma garantia tutelar básica (FERRAZ, 1993, p. 100).

3.4.1 A nova súmula 632 do STF

A despeito de respeitável setor da doutrina sustentar a inconstitucio-nalidade do prazo para impetração do mandado de segurança, o STF, acolhendo o entendimento dominante,26 editou recentemente a súmula 632, para consignar que “é constitucional a lei que fixa o prazo de de-cadência para impetração de mandado de segurança”. Considerou-se, assim, que o prazo previsto no art. 18 da Lei nº 1.533/1951 foi recep-cionado pelo texto constitucional.

A súmula, da forma como foi redigida, permite que o legislador ordinário estabeleça qualquer prazo para impetração do mandado de segurança. Na verdade, ela não fez qualquer menção específica ao prazo de 120 dias. Apenas destacou que é constitucional a lei que fixa prazo para a impetração do mandado de segurança. Assim, à luz da súmula, poderá

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o prazo ser alterado pelo legislador infraconstitucional, até mesmo para ser reduzido.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O tempo exerce notável influência no Direito. Na verdade, constitui-se em um meio de solidificação de soluções de conflitos sociais. A prescrição e a decadência são institutos que refletem a manifestação do tempo no Direito. A diferença entre prescrição e decadência é de suma importância, vez que os regimes dos institutos são diferen-ciados. Há ações e direitos, contudo, que não apresentam qualquer espécie de prazo para exercício. De qualquer forma, a exceção não infirma a regra.

O mandado de segurança, nesse contexto, apresenta prazo decadencial para sua impetração de 120 dias, por força da legislação infraconstitucio-nal. Contudo, o constituinte não estabeleceu qualquer restrição temporal quanto ao seu exercício. Daí alguns autores, como visto, sustentarem a inconstitucionalidade, ou seja, a não recepção dessa limitação esta-belecida pelo legislador ordinário.

Não resta dúvidas de que a interpretação de dispositivos constitucio-nais que estabelecem garantias deve ser maximizada. O mandado de segurança, nesse contexto, não deve ter o seu exercício limitado no tempo, vez que se destina, mormente, à tutela do cidadão frente às arbitrariedades do Estado. Mecanismos de limitação do poder, efeti-vamente, não podem ser limitados, restringidos, até mesmo pela sua previsão constitucional.

De qualquer sorte, o Supremo Tribunal Federal entendeu por bem su-mular que a lei que estabelece prazo de decadência para impetração do mandado de segurança não é inconstitucional. Nesse particular, a Excelsa Corte, a quem compete dar a última palavra sobre o texto constitucional, minimizou um instrumento de defesa e de limitação de poder da mais alta relevância.

Em tempos de abuso quanto à edição de medidas provisórias, de reiteradas ilegalidades e atos de improbidade por parte de agentes públicos, de crise da Jurisdição quanto à sua efetividade, efica-

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ciedade e celeridade, não parece ser razoável e oportuno limitar o exercício, no tempo, de um instrumento da envergadura e proe-minência do mandado de segurança. Como lembra Amir José Sarti (apud FERRAZ, 1993, p. 101), de nada valeria erigir um instrumento jurídico à magnitude de garantia constitucional se uma simples lei ordinária tivesse o poder de fulminá-lo, literalmente, pelo decurso de um lapso temporal.

THE CONSTITUTIONALITY OF THE PERIOD FOR IMPETRATION THE MANDAMUS

ABSTRACT

Treats of the (un)constitutionality of the period for impetration of the injunction. Approaches, firstly, the effect of the time in relation to the rights, differentiating the prescription periods and decadence and your respective relevance. Soon afterwards, treats of the period for impetration of the mandamus. Firstly, it detaches legal forecast for, after, to analyze the juridical nature. All the currents on the juridical nature of the period for impetration are analyzed. Analyzes, soon afterwards, in a meticulous way, the constitutionality of the period for impetration.

Keywords: Writs. Time (Law).

NOTAS EXPLICATIVAS

2 Não se ignora que a ação é um direito. De qualquer forma, a ação não se confunde com o direito material. Na verdade, a ação é o direito de provocar a manifestação da atividade jurisdicional para que esta se pronuncie acerca da lide deduzida; é, portanto, um direito que instrumentaliza a realização de um outro direito.

3 É bem verdade que, tecnicamente, não é possível que o direito de ação seja perdido. A ação, como direito público, subjetivo, abstrato e autônomo, constitui-se em meio de provocação do Judiciário. Será sempre procedente, vez que o seu fim é retirar da inércia a atividade jurisdicional. Ainda que haja prescrição ou decadência, o direito de ação não restará perdido. Por outras palavras: ainda que exista a possibilidade de reconhecimento da prescrição ou da decadência,

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será possível que o jurisdicionado utilize-se do direito de provocar a atividade jurisdicional, mediante propositura de uma ação.

4 Pereira (2002, p. 435), contudo, entende que a prescrição é o modo pelo qual se extingue um direito (não apenas a ação) pela inércia do titular durante certo lapso de tempo.

5 Deve-se ressaltar que esse critério é admitido no direito civil. No direito penal, a orientação prevalecente é diametralmente contrária. Com efeito, nesta seara do direito, decadência é a perda do direito de ação, enquanto a prescrição é a perda do direito material. Nesse sentido, pode-se citar o seguinte: “Conceito de decadência – é a perda do direito de ação do ofendido em face do decurso do tem-po”; “Conceito de prescrição – é a perda da pretensão punitiva ou executória do Estado pelo decurso do tempo sem o seu exercício” (JESUS, 1999, p. 292 e 313).

6 O legislador do CC/1916 não adotou expressamente nenhuma dis-tinção entre prescrição e decadência. No texto da lei revogada havia menção apenas à prescrição. Os prazos de decadência, contudo, eram identificados a partir de critérios dogmáticos e jurisprudenciais. Nesse sentido: “O Código Civil não fala em decadência ou caduci-dade de direitos, só se referindo à prescrição; mas, é unânime a doutrina e torrencial a jurisprudência, no admitir que vários dos casos disciplinados no Código Civil sob aquela rubrica são de caducidade (RODRIGUES, 1998, p. 323).

7 Registre-se que o direito de ação poderá ser perdido somente atra-vés da perempção, prevista no art. 268, parágrafo único do CPC. De qualquer forma, mesmo nesse caso, tecnicamente será possível que o direito de ação, isto é, o direito de provocação da atividade jurisdicional, seja exercido, embora com o reconhecimento posterior da perempção.

8 Essa orientação do legislador do CC/2002, inclusive, justifica a natureza decadencial do prazo do mandado de segurança, previsto no art. 18 da Lei nº 1.533/1951. Com efeito, escoado o prazo para a impetração do mandamus, não se perde a pretensão, a qual poderá ser exercida em outra via processual. Perde-se apenas o direito de impetração do mandado de segurança, mas não a pretensão. Tal prazo, portanto, é de natureza decadencial.

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9 Revista dos Tribunais, São Paulo, v. 86, n. 736, p. 7, fev. 1997; e v. 86, n. 744, p. 300, out. 1997.

10 Pretensão é a exigência de subordinação de um interesse de outrem ao próprio (SANTOS, 1998, p. 9).

11 O legislador do CC/2002 encampou esse entendimento ao estabele-cer no art. 189 que “violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue pela prescrição [...]”.

12 As causas de impedimento do prazo prescricional obstam o início

deste; as de suspensão, implicam na paralisação do prazo e, quan-do reiniciado, implicam no respectivo cômputo do lapso temporal já transcorrido. De acordo com o novo código civil, art. 202, a suspensão da prescrição somente poderá ocorrer uma única vez; por fim, as causas de interrupção do prazo prescricional implicam no reinício do prazo por inteiro (art. 202, parágrafo único do CC/2002).

13 O citado preceito tinha o seguinte texto: “O direito de requerer man-dado de segurança extingue-se depois de cento e vinte dias contados da ciência do ato impugnado”.

14 Era o seguinte o texto da lei revogada: “O direito de requerer mandado de segurança extinguir-se-á depois de cento e vinte dias contados da ciência do ato impugnado”.

15 No mesmo sentido, considerando, pelo menos em parte, que o prazo para propositura do mandamus é preclusão, pode-se citar o seguinte: “O prazo preclusivo para impetração do mandado de segurança foi sempre, e continua sendo, o de cento e vinte dias” [...] (CRETELLA JÚNIOR, 1999, p. 286).

16 Refiro-me, aqui, especificamente à preclusão temporal. A preclusão, contudo, pode ser temporal, lógica ou consumativa. A primeira ocor-re pelo decurso de um prazo para a prática de determinado ato; a segunda, decorre da prática de um ato incompatível com outro; e, por fim, a terceira relaciona-se à prática em si do ato.

17 Tal se dá em virtude do disposto no art. 15 da LMS, in verbis: “A decisão do mandado de segurança não impedirá que o reque-

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rente, por ação própria, pleiteie os seus direitos e os respectivos efeitos patrimoniais. Há quem recorra, inclusive, à classificação do prazo do mandado de segurança como extintivo para justi-ficar a possibilidade de utilização das vias ordinárias no caso de decurso do prazo de impetração”. Nesse sentido ver Medina (2003, p. 152).

18 O que se perde, na verdade, com o decurso do prazo de 120 dias da LMS, é o interesse adequação para propositura do mandado de segurança. Isso não significa dizer que a pretensão não possa ser analisada em outras vias processuais, em sede de ação de rito comum, por exemplo. A via estreita do mandamus, contudo, uma vez decorrido o prazo legal, deixa de ser adequada para análise da pretensão.

19 Registre-se que essa ciência poderá ser obtida até mesmo através da consulta aos autos, com a respectiva aposição do ciente. Nesse sentido ver Alvim (1998, p. 119).

20 Desde já registre-se que não se trata, tecnicamente, de investigar a constitucionalidade, ou não do dispositivo. Na verdade, sendo a Lei nº 1.533/51 anterior à Constituição Federal de 1988 não há sentido em perquirir-se a sua compatibilidade com esta. Com efei-to, à época de sua edição inexistia o texto constitucional vigente, pelo que não há que se falar em inconstitucionalidade. Deveras, o fenômeno que está sendo investigado é o da recepção ou não da norma. Nesse sentido, inclusive, pode-se citar o seguinte: “Como ensinado por Paulo Brossard, é por esta singelíssima razão que as leis anteriores à Constituição não podem ser inconstitucionais em relação a ela, que veio a ter existência mais tarde. Se entre ambas houver inconciliabilidade, ocorrerá revogação, dado que a lei posterior revoga a lei anterior com ela incompatível, e a lei constitucional, como lei que é, revoga as leis anteriores que se lhe oponham” (MORAES, 2002, p. 612).

21 As cláusulas pétreas constituem um núcleo imutável da Constituição Federal, estando previstas no art. 60, § 4º.

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22 A tese da constitucionalidade do prazo decadencial do mandado de segurança é a dominante no Supremo Tribunal Federal, como se dessume da recente súmula 632, que será analisada adiante.

23 Diz-se “especificamente”, pois, na verdade, todas as ações têm previsão constitucional no art. 5º, inc. XXXV da CF/1988.

24 Basta citar a ação reivindicatória, o habeas corpus, a ação de inves-tigação de paternidade etc.

25 Voto do Exmo. Sr. Dr. Ministro do STF Carlos Velloso em agravo regimental interposto no mandado de segurança n.º 21.356-6-RJ.

26 É bem verdade que a corrente doutrinária que sustenta a inconstitucio-nalidade do prazo vem recebendo grande número de adeptos. Nesse sentido, é oportuno colacionar o seguinte: “E, não obstante afirmar-se sempre majoritária a linha doutrinária pela validade da limitação tem-poral, bem como não obstante o predominante silêncio dos tribunais quanto ao assunto (silêncio esse que, objetivamente, importa em acatamento ao prazo), a realidade é que se vêm acumulando, ano a ano, as vozes doutorais irresignadas com o cerceamento, no tempo, do ajuizamento da ação de segurança” (FERRAZ, 1993, p. 98).

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Correspondência para/reprint request to:Daniel Roberto HertelRua Comissário Dantas de Melo, 21Boa Vista29102-770 - Vila Velha – ES (Brasil)

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RESUMO

Versa sobre o apoio psicológico oferecido pelo Serviço de Orientação ao Aluno (SOA) ao corpo discente do Centro Universitário Vila Velha. Propõe explanar, sucintamente, a intervenção psicológica de curta duração e abordagem teórica adotada neste serviço, com opção pelo enfoque humanista-existencial, pressupondo ser o mais indicado neste modelo de ajuda. O serviço consiste em triagem, aconselhamento psi-cológico breve e encaminhamento para especialista externo, quando necessário. Os objetivos do apoio psicológico oferecido centram-se na potencialização do sujeito para lidar melhor com suas dificuldades emocionais e cognitivas.

Palavras-chave: Psicologia social. Aconselhamentos – Aspectos psi-cológicos. Humanismo. Existencialismo.

1 INTRODUÇÃO

Versa sobre a intervenção e abordagem psicológica adotada no Ser-viço de Orientação ao Aluno (SOA) do Centro Universitário Vila Velha. Objetiva-se explanar, sucintamente, o apoio psicopedagógico realizado neste serviço. Quais aspectos pedagógicos estão envolvidos? Trata-se

APOIO PSICOLÓGICO AO EDUCANDO: UMA ABORDAGEM HUMANISTA-EXISTENCIAL

Claudia Balestriro Pepino1

1 Mestre em Psicologia pela Universidade Federal do Espírito Santo. Professora do Centro Universitário Vila Velha. E-mail: [email protected].

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de psicoterapia ou aconselhamento? Eis algumas questões a serem discutidas neste trabalho.

Muitas vezes a exigência das atividades acadêmicas acrescida das cobranças familiares pode comprometer o equilíbrio psicológico do alu-no, levando-o a não se perceber capaz de atender a tais expectativas, acarretando desmotivação para o estudo, relacionamento precário com os colegas e abandono do curso. É comum alguns alunos apresentarem dificuldades de aprendizagem, problemas de ajustamento ao ambiente universitário e dificuldades psicoemocionais específicas como baixa auto-estima e baixa autoconfiança.

A partir destas constatações, o SOA desenvolve ações de orientação e acompanhamento psicológico ao corpo discente do Centro Universitário Vila Velha. Busca-se, assim, contribuir para o desempenho acadêmico e bem-estar do aluno, na medida em que este tem suas dificuldades emocionais e cognitivas atendidas.

O acompanhamento psicológico realizado pelo SOA caracteriza-se por intervenções breves, diferenciando-se da clínica psicoterapêutica tradicional. O atendimento clínico de curta duração tem sido aponta-do, na área da Psicologia, como um modelo de ajuda alternativa às demandas psicológicas atuais no contexto institucional. O enfoque humanista-existencial é adotado neste modelo de ajuda, pressupondo-se como o mais efetivo em trabalhos psicológicos breves. Acredita-se que a ênfase na presentificação do momento, a ausência de privilégio no sintoma, a postura do psicólogo como facilitador e a compreensão de que o sujeito é capaz de assumir a responsabilidade por si mesmo – características desta abordagem – são indicados para a clientela e proposta do SOA.

2 O APOIO PSICOLÓGICO BREVE

O apoio psicológico breve distingue-se da psicoterapia quanto ao tempo, à intervenção e aos objetivos. São formas distintas de atuação, o que não faz de uma ou outra mais eficaz. Caso a res-posta-padrão do psicólogo seja psicoterapia, como tem sido sua especialização no consultório, parece não haver como responder à demanda que lhe é feita naquele preciso momento e por aquela pessoa no contexto institucional. Em síntese, o apoio psicológico

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breve e focal é um modelo de apoio alternativo no âmbito das ins-tituições.

A proposta da clínica breve denomina-se de diferentes formas: psicote-rapia breve, psicoterapia focal, psicoterapia de apoio, psicoterapia de intervenção em crise e/ou aconselhamento psicológico. Cada denomi-nação tem especificidades próprias, modelos, concepções e realidades diferentes.

A prática do acompanhamento psicológico breve, na sua vasta literatura, indica entre 10 e 20 sessões de acompanhamento individual como um número pragmático e ideal. O caráter breve desta intervenção não se deve a impossibilidades de tempo e investimentos. Trata-se de questão técnica e de concepção de uma intervenção.

As psicoterapias breves têm uma nítida definição dos objetivos a serem alcançados num certo intervalo de tempo. No acompanhamento breve, criam-se condições para que a pessoa lide com suas dificuldades espe-cíficas no momento presente. Desta forma, existe um tema em questão, um contrato de trabalho e uma atenção especificamente voltada para tal. Isso não significa o abandono de outras questões que podem ser introduzidas, quando ligadas ao tema. A elaboração do foco configura-se assim, como ponto fundamental neste enfoque.

Diante de uma ansiedade circunstancial, normalmente o sujeito não encontra um espaço para ser acolhido e ajudado a lidar melhor com suas limitações, utilizando seus recursos internos na resolução de seus conflitos psíquicos. A escuta empática possibilita ao sujeito ver o problema com mais clareza, entender as coisas em suas proporções corretas e explorar possíveis respostas, aprendendo como superar as causas das vivências angustiantes.

É importante assinalar que algumas pessoas são mais beneficiadas com a intervenção breve do que outras. Para Ribeiro (1999), existem condições específicas, cuja incidência faz com que a indicação para uma psicoterapia de breve duração esteja certamente prejudicada, como pessoas com pouca capacidade egóica, em estado de muita confusão mental, com dificuldade de se perceber individualizadas. Em casos de psicopatologias graves, pouca afetividade e limita-ção intelectual grave, o trabalho psicológico breve torna-se pouco efetivo.

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Existem pessoas que estão diretamente indicadas para intervenção de curta duração: pessoas com percepção clara de que precisam mudar, com dificuldade de decisão e não sabem que caminho seguir; pessoas que sofreram mudanças rápidas em suas vidas e não sabem como se organizar; pessoas com planos inadiáveis e que se encontram indecisas; pessoas que se encontram em situação de estresse, de culpa acentuada, de impotência, cujas vidas estão sofrendo prejuízo considerável e não têm recursos internos para se livrar sozinhas de suas crises.

Quando há indicação para o apoio psicológico de curta duração, o sujeito apresenta um problema específico a ser abordado. Há uma situação concreta que pede urgência de solução, um sintoma que se revela in-tenso e a vontade explícita de alguém que necessita de ajuda. A partir daí, propõe-se apoio psicológico para lidar com uma questão específica que envolve tempo delimitado e disponibilidade do sujeito.

3 ABORGAGEM CENTRADA NA PESSOA

As teorias humanistas opõem-se ao pessimismo psicanalítico e ao mecanicismo comportamental, já que acreditam no potencial criativo e saudável de cada pessoa (HALL, 1984; MIRANDA, 1999; RUDIO, 1999). Ressalta-se que a orientação humanista não faz classificações psicológi-cas – diagnósticos – como pré-requisito para atendimento psicológico.

Pode-se afirmar que a máxima desta abordagem é ajudar o sujeito a se ajudar. A atitude do profissional não é de impingir suas teorias e terapia. É um convite! O convite para que o indivíduo aceite o primeiro passo: conscientizar-se da necessidade da ajuda psicológica. Tal necessidade não diz respeito apenas a tratamento para um sujeito doente, e sim, ao desenvolvimento pessoal. Nesta abordagem, não por acaso, o psicólogo é denominado facilitador ou ajudador em vez de (psico) terapeuta.

Para Rogers (1987), a escuta empática tem o efeito de facilitar o cres-cimento pessoal e propiciar mudanças. O psicólogo facilita o processo psicológico na medida em que o próprio sujeito possa lidar com sua problemática existencial. Trata-se, assim, de uma relação de ajuda. O crescimento pessoal do ajudado não decorre da abordagem teórica utilizada na psicoterapia, mas sim de determinadas atitudes assumidas pelo psicoterapeuta no processo de ajuda: empatia, aceitação incondi-cional e congruência.

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O uso do termo pessoa por Rogers era proposital e designava uma postura contra o entendimento da pessoa que procura ajuda psicológica como sendo doente, paciente, analisando ou aconselhado. A expressão pessoa não implica passividade, mas alguém que ativa e voluntaria-mente busca ajuda para resolver um problema, sem renunciar à própria responsabilidade da situação.

Vale assinalar, contudo, que Rogers sabia que qualquer forma de psicoterapia tinha condições potenciais de ser bem sucedida. Esta conclusão de Rogers reside no fato de que o sucesso de qualquer inter-venção psicológica não estava tanto em seus diferentes pressupostos teóricos, mas na habilidade do psicoterapeuta em seguir os caminhos mais apropriados para a condução do processo que emanavam da própria pessoa.

A Abordagem Centrada na Pessoa acredita que um número pequeno de encontros, ou até mesmo um único, tem função terapêutica, permi-tindo que o cliente se organize internamente (ROSEMBERG, 1987). A presença facilitadora e empática do ajudador é a condição para isso. O sucesso deste atendimento depende prioritariamente do encontro dialógico entre cliente e ajudador.

A Abordagem Centrada na Pessoa posiciona-se contra métodos diretivos em psicologia, como a prática de dar conselhos, por exemplo. Quando o psicólogo define os rumos de uma sessão psicológica está inibindo a expressão livre. Por isso a Abordagem Centrada na Pessoa é forte-mente não-diretiva; deixando que o foco do processo parta do ajudado. Podemos perceber a postura da orientação humanista-existencial na fala do psicoterapeuta Ribeiro (1999, p. 20):

Estamos pensando um sistema de psicoterapia no qual, de um lado, a pessoa possa se sentir inteira, co-participando de seu processo, usufruindo de sua liberdade de ação e de decisão, e, do outro, que o psicoterapeuta esteja inteiro na relação sem perder seus referenciais teóricos sendo ativo sem ser intruso, sendo direto sem ser autoritário, sendo presente sem ser sufo-cante, estando atento à experiência imediata sem impor nada, confrontando sem tirar a liberdade do outro de decidir.

O acompanhamento psicológico não se pauta em dizer ao cliente o que fazer, mas em ajudar a descobrir por si mesmo a melhor forma de

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lidar com as próprias dificuldades. O psicólogo facilita a compreensão do sujeito como se ele estivesse se vendo através de um espelho. A tomada de consciência permite ao sujeito reformular pensamentos e sentimentos.

4 SERVIÇO DE ORIENTAÇÃO AO ALUNO

O apoio psicológico do SOA adota a proposta humanista-existencial de Rogers – Abordagem Centrada na Pessoa. O aluno pode procurar o SOA espontaneamente ou por encaminhamento de professores e co-ordenadores. O espaço oferecido possibilita ao discente expressar um sintoma, uma dificuldade específica que deseja compreender e superar. Assim, o psicólogo acolhe as dificuldades psicoafetivas do aluno a fim de minimizar ansiedades e angústias vividas.

Considerando que o SOA não formula um contrato psicoterapêutico, a entrevista de triagem é necessária para indicar aqueles que melhor se adaptam ao processo psicológico de curta duração. A demanda específica da pessoa é determinante para o tipo de acompanhamento profissional mais indicado (fonoaudiólogo, psiquiatra, psicoterapeuta ou outros). Assim, quando necessário, o aluno é encaminhado para atendimento especializado externo.

A indicação para o acompanhamento realizado pelo SOA surge da análise do engajamento, da viabilidade de afetação das causas do problema, da disponibilidade da pessoa para o processo de mudança e das condições psicoemocionais. O psicólogo analisa o caso específico e propõe o número de sessões: entre dez e vinte. Contudo, havendo necessidade, o tempo será revisto e discutido com o aluno.

A condução do processo busca atingir objetivos específicos e pon-tuais na medida em que o psicólogo lida com tempo delimitado. No apoio psicológico breve, o profissional tem uma visão abrangente das possibilidades de propiciar ajuda psicológica. De tal forma, o profissional-facilitador propõe alternativas de ajuda; incluindo informação, orientação, aconselhamento psicológico breve e en-caminhamento.

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O objetivo do aconselhamento psicológico tem sido no intuito de valorização do educando, oportunizando-lhe acolhida e escuta. Busca-se oferecer um espaço para a compreensão reflexão/tema-tização da experiência vivida. Um corte no cotidiano, nos aspectos práticos do mundo do trabalho e do estudo, das funções e tarefas a serem cumpridas, um momento para reflexão, para encontro com o outro, para falar de si e da vida, para estar em companhia de alguém interessado na sua formação, para partilhar descobertas, para for-mular questões e para intrigar-se com elas, para não ter pressa nas respostas, para deixá-las calar no interior de cada um, para estar em silêncio. A atitude de consideração positiva pela experiência do aluno propicia-lhe condições para uma progressiva reorganização da sua auto-imagem.

Dentre as queixas apresentadas pelos alunos estão: falta de auto-confiança e auto-estima, dificuldades cognitivas para o desempenho acadêmico; ansiedade para apresentação de trabalhos orais e realiza-ção de avaliações escritas; crise na escolha profissional e dificuldades emocionais mais profundas, relacionadas à história de vida.

No caso de crise de escolha profissional, realiza-se orientação vocacional vivencial, em que o aluno problematiza suas dificuldades e conflitos na escolha. A partir dos encontros, o aluno poderá formular sua decisão.

É importante observar que é freqüente o encaminhamento para psicoterapia externa diante de quadros clínicos como síndrome do pânico, fobia ou depressão severa. Tais quadros requerem atenção e acompanhamento diferenciado, podendo necessitar avaliação psiquiátrica seguida de medicação. Nestes casos, o psicotera-peuta acompanha intensamente e trabalha junto ao psiquiatra. O profissional do SOA solicita ao aluno retorno posterior a fim de acompanhar o progresso na resolução das suas dificuldades psicoemocionais.

O apoio psicológico oferecido pelo SOA pode ser avaliado positivamente, a partir do aumentado número de alunos atendidos desde a implantação do serviço. As Tabelas 1 e 2 informam o número de alunos atendidos do período de fevereiro de 2003 a dezembro de 2004, sendo que cada aluno é atendido em média de 6 a 8 sessões, num tempo de 50min por sessão.

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Tabela 1 - Alunos atendidos pelo SOA no período de fevereiro a dezembro de 2003

CURSOS ALUNOS ATENDIDOSAdministração 6Enfermagem 8Engenharia de Produção 3Farmácia 1Fisioterapia 3Marketing 2Nutrição 1Sistema de Informação 3Veterinária 2TOTAL 9 29

Tabela 2 - Alunos atendidos pelo SOA no período de fevereiro a dezembro de 2004

CURSOS ALUNOS ATENDIDOSAdministração 6Enfermagem 16Engenharia de Produção 4Farmácia 1Fisioterapia 10Marketing 2Nutrição 4Sistema de Informação 5Veterinária 8Ciência da Computação 5Engenharia Metalúrgica 1Psicologia 5Recursos Humanos (seqüencial) 3Publicidade 2Direito 2Ciências Biológicas 2TOTAL 16 74

Observação: Neste período foram realizados em média de 24 a 32 atendimentos por mês.

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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Abordagem Humanista-Existencial Centrada na Pessoa não se limita a um aporte teórico-técnico. Esta abordagem refere-se a uma atitude do psicólogo diante do cliente e da vida: reconhecimento e confirmação do outro, consciente e em devir, diferente e autônomo. Trata-se em parti-cular do interesse vivencial de pôr-se em relação dialógica com a sua diferença e autonomia. Afinal, o facilitador é seu próprio instrumento de trabalho. Antes de mais nada, refere-se a um encontro autêntico entre ajudado e ajudador. Assim, a prática clínica nos deixa desnudos em frente aos nossos sentimentos e aos dos outros.

O serviço oferecido pelo SOA não visa ao aconselhamento no sentido da palavra – dar conselhos. Caso o aluno vá buscar o conselho para a resolução de seu problema, sem disponibilidade interna de um contato maior consigo-mesmo, poderá ficar decepcionado, e o pisicólogo-facili-tador fica sem poder contribuir, mesmo querendo.

É importante ressaltar que a proposta não se limita a atender casos mais urgentes e sintomáticos. Significa, ainda, um trabalho preventivo, na medida em que o aluno busque desenvolvimento pessoal a partir da ampliação de consciência sobre si e deseje lançar luz sobre áreas importantes da sua vida. Em síntese, a clínica psicológica configura-se num instrumento valioso para crescimento e mudanças, a partir do engajamento ajudador e ajudado no processo psicológico.

No SOA, o aluno é levado a refletir e rever seu modo de funcionamento psíquico e comportamental; é encorajado a encontrar recursos internos para manejar dificuldades e limitações pessoais. Ele precisa desenvolver suas potencialidades de atuação no mundo. Não há crescimento pessoal quando o sujeito obedece ao psicoterapeuta.

PSYCHOLOGICAL SUPPORT FOR LEARNER: A HUMAN-EXISTENTIAL APPROACH

ABSTRACT

The present paper is about psychological support offered by Counseling Service for Student from University Center Vila Velha. This article intends to present and discuss the short duration psychological and

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theoretical approach adopted in this Service. The choice was for the human-existential approach, that is the most indicated mode of help. This service consists in selection, counseling psychology and indication for expert outside institution, in case it is necessary. The goals of this sort of treatment revolve around the increase of the creative potentials to cope with emotions and cognitive difficulties.

Keywords: Social psychology. Counseling - Psychological aspects. Humanism. Existentialism.

REFERÊNCIAS

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Correspondência para/reprint request to:Claudia Balestreiro PepinoRua Milton Manoel dos Santos, 370/901Jardim Camburi29090-110 - Vitória – ES (Brasil)

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RESUMO

Explora a relação entre globalização e governança global. Parte do pressuposto de que a globalização contemporânea aumenta a demanda por mecanismos de governança global, bem como pode ter seus efeitos afetados por tais mecanismos de governança. Inicialmente, define a globalização da segunda metade do século XX demonstrando como o mundo globalizado promove novas necessidades por mecanismos que atuem na governança global. Posteriormente, no caminho inverso, apresenta os mecanismos que vêm sendo criados para lidar com o ambiente internacional marcado pelos efeitos da globalização.

Palavras-chave: Globalização. Governança global. Relações interna-cionais.

GLOBALIZAÇÃO E GOVERNANÇA GLOBAL: DESAFIOS E POSSIBILIDADES

Flávia Nico Vasconcelos1

Carolina Avelar de Oliveira2

Gustavo Nunes Rodrigues3

1 Doutoranda em Ciências Sociais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e da Universidade Técnica de Lisboa. Coordenadora do Curso de Relações Internacionais do Centro Universitário Vila Velha. E-mail: [email protected].

2 Graduanda do Curso de Relações Internacionais do Centro Universitário Vila Velha. E-mail: [email protected].

3 Graduando do Curso de Relações Internacionais do Centro Universitário Vila Velha. E-mail: [email protected].

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1 INTRODUÇÃO

A globalização foi um dos temas mais debatidos nos estudos de rela-ções internacionais da década de 1990. Os questionamentos acerca do assunto perpassaram, sobretudo, os negativos reflexos sociais visíveis no agravamento da pobreza em muitos países do mundo em desenvolvimento e nas crises financeiras que se alastraram por todo o globo. Da própria dificuldade em se chegar a um consenso sobre suas origens e sua definição, apreendemos a problemática que se desenrola quando a questão que se coloca é sobre as possibilidades de regulá-la ou governá-la.

Processo que promove mudanças, contexto onde as relações interna-cionais devem ser interpretadas ou realidade que interfere na própria dinâmica do sistema internacional, a globalização é elemento central com o qual devemos lidar ao pensarmos as possibilidades de gover-nança global.

Este trabalho se propõe a identificar os desafios que a globalização contemporânea coloca às relações entre os estados exigindo destes maior eficiência na cooperação internacional. Ainda, pretende mostrar quais mecanismos formais de governança global têm sido criados para lidar com os efeitos e desdobramentos do processo globalizante.

2 A GLOBALIZAÇÃO CONTEMPORÂNEA

Versa o ditado popular que quando a Ásia espirra, a América Latina pega um resfriado. A noção contida nesse pensamento é a de que o mundo encolheu e, se os territórios não estão fisicamente mais próximos, suas fronteiras não parecem oferecer barreiras de fato. A esta percepção está associado o processo da globalização.

Muitas vezes utilizada como chavão para todos os tipos de perguntas, a globalização foi debatida intensamente a partir da década de 90. Dentre as definições apontadas por diferentes autores, ressaltamos a perspectiva de Scholte (1997, p. 14) que “[...] globalization refers to processes whereby social relations acquire relatively distanceless and borderless qualities, so that human lives are increasingly played out in the world as a single place”.4 Ou seja, trata-se de um desenvolvimento de cunho histórico associado às percepções de compartilhamento do

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espaço social por forças econômicas e tecnológicas e de que desen-volvimentos em uma parte do mundo têm efeitos em outros lugares (HELD et al., 1999).

Questões conceituais emergem dos debates sobre o que seja a globali-zação. Dentre eles, destacamos Nye e Donahue (2000) que entendem a globalização como o aumento do globalismo – o que significa que, no sentido oposto, a desglobalização seria a redução do globalismo. Globalismo está diretamente relacionado a redes de conexões ou múltiplos relacionamentos, não se tratando de simples elos. Para tais redes serem globais e caracterizarem a globalização, é pré-condição envolverem distâncias multicontinentais.

O globalismo atinge de maneiras diferentes diversas dimensões (economia, segurança, meio ambiente etc.) e não é uma novidade do século XX. O que muda no tempo é a intensidade e extensão do globalismo, isto é, se é thin ou thick. Atualmente o que presenciamos é um globalismo cada vez mais thick – ou globalização –, já que en-volve redes de conexões que são intensas e extensas e fluxos que são longos e contínuos e que atingem a vida de muitas pessoas (NYE; DONAHUE, 2000).

Existiria também uma diferença semântica entre interdependência e globalização. Interdependência refere-se a um determinado estado do mundo, enquanto globalização é uma tendência de crescimento dos fluxos transnacionais e das redes de interdependência (thick networks) (NYE; DONAHUE, 2000).

De acordo com Held e outros (1999), a globalização se manifestou his-toricamente variando em quatro dimensões espaço-territoriais: extensão de redes globais, intensidade das interconexões globais, velocidade dos fluxos globais e propensão do impacto das interconexões globais. A globalização contemporânea distingue-se das formas anteriores pela magnitude, complexidade e velocidade.

O aumento do caráter thick do globalismo indica não apenas uma diferença de grau da atual globalização mas, mais importante, aponta para as relações de interdependência que se estabelecem com maior profundidade e que envolvem diferentes áreas temáticas (issue areas). É esse o ponto de partida para compreendermos a importância da globa-lização para o estabelecimento de mecanismos de governança global.

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3 A GLOBALIZAÇÃO E OS DESAFIOS À GOVERNANÇA GLOBAL

A globalização não tem sido experimentada em todos os lugares da mesma forma, tampouco tem provocado a homogenização cultural ou a união do mundo em uma aldeia global sem fronteiras. Ao contrário, trouxe novos desafios e apresentou questionamentos à forma como vêm sendo conduzidas as relações internacionais.

Apesar de na maioria das vezes o lado escuro da globalização ser sua faceta mais lembrada, este é um processo que oferece riscos e opor-tunidades (WOODS, 2002) e que tem significado coisas diferentes em diferentes lugares (STIGLITZ, 2003a). Independente da qualificação positiva ou negativa de suas conseqüências, a globalização se reflete nos níveis nacional e internacional de maneira a atingir a todos. En-contramos em suas conseqüências um dos motivos de acirramento da demanda internacional por mecanismos de cooperação internacionais eficientes.

Um dos efeitos mais visíveis da globalização se deu na forma de atuação do Estado-nação. O argumento central das três principais linhas de interpretação da globalização perpassa esse ponto: para os hiperglobalistas, chegamos a era do fim do Estado-nação; os céticos reconhecem apenas uma fase de intensa internacionalização que de-pende da condução e aquiescência dos Estados; finalmente, para os transformistas, a globalização transforma o poder do Estado bem como a política mundial (HELD et al., 1999). Concordamos que o Estado con-tinua sendo peça central do sistema internacional, mas sua estrutura interna vem sendo adaptada à globalização.

Duas questões são relevantes nesse ponto. Qual o efeito que a globaliza-ção tem na estrutura interna dos Estados? A primeira vista, indicaríamos o enfraquecimento das instituições nacionais. No entanto, observamos que no caso brasileiro a condução do processo de abertura comercial realizada na década de 90 foi marcada pela concentração do poder no Executivo. Ou seja, o fortalecimento dessa instância decisória como um dos desdobramentos da globalização (VASCONCELOS, 2001). Por outro lado, essa não é a regra. Países mais fracos receberam a intervenção direta ou indireta de organizações internacionais para adequá-los ao que lhes fora apresentado como “medidas saudáveis”. Esse é o caso de Gana, que recebeu o aconselhamento técnico direto do Banco Mun-

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dial para reestruturação do governo nacional (MOSLEY; HARRIGAN; TOYE, 1991). Como lembra Nye e Donahue (2000), as implicações da globalização variam muito de acordo com o tamanho, poder e cultura política doméstica de cada país.

A segunda questão que se coloca é sobre o papel ou lugar do Estado no sistema internacional. Dentre as mudanças que remetem ao ques-tionamento da perenidade dos Estados destacam-se a porosidade das fronteiras nacionais e a noção de territorialidade (HELD et al., 1999; MURPHY, 1996), as reflexões acerca do conceito de soberania (CA-MILLERI, 1992; KRASNER, 1999), a complexificação e intensificação dos elos transnacionais (SASSEN, 1999), a autonomia conquistada por instâncias sub-governamentais e o surgimento de novos atores inter-nacionais relevantes (LUBBERS; KOOREVAAR, 1999). Todas essas são questões com as quais os Estados têm que lidar e que se adaptar. Mediante à nova realidade internacional, não podemos esperar a antiga autonomia estatal – se é que existira. Também não é mais possível man-termos as mesmas expectativas das tradicionais funções estatais.

O atual cenário internacional, composto por novos atores e novas rela-ções e processos, impõe uma nova realidade aos Estados, mudando a forma como atuavam. No entanto, não implica necessariamente sua superposição por uma nova conformação política. Em outros termos, a expectativa é de que os Estados continuem sendo cruciais.

The world system of the twenty-first century is not merely a system of unitary states interacting with one another through diplomacy, public international law, and international organizations. In that model, states as agents interact, constituting an international system. […] We can think of this international system as the skeleton of the contemporary world system – essential to the functioning of the whole system – but not as a whole system (NYE; DONAHUE, 2000, p. 19).5

A globalização provoca mudanças no próprio âmago do sistema inter-nacional. Na medida em que a internacionalização se aprofunda e o globalismo se torna mais thick, as relações entre as diferentes redes geram efeitos de caráter sistêmico. Por exemplo, acordos comerciais poderão gerar retornos econômicos na medida em que estimulam a produção industrial; por outro lado, também podem provocar a criação de políticas públicas de proteção ambiental ou de caráter social por

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força das interconexões das diferentes áreas temáticas (issue areas). A interdependência das diversas áreas temáticas dificulta a condução das temáticas por ilhas de governança,6 provocando novas respostas dos governos às formas de governança global através de grupos de áreas temáticas (clusters of issues).

A mudança sistêmica envolve ainda novos padrões de cooperação multilateral àquele padrão que prevalece desde a segunda metade do século XX. As negociações internacionais que assumiam a forma de pequenos clubes de ministros de áreas específicas oriundos de países desenvolvidos deverão ser repensados para atenderem às demandas de maior accountability e transparência. Tal demanda resulta de dois novos aspectos trazidos pela globalização: os novos agentes que pas-sam a compor ativamente o cenário internacional, como as redes cor-porativas internacionais, as organizações não-governamentais (ONGs) ou terceiro setor e as sub-unidades dos governos e as normas globais que mudam rapidamente, resultantes das interações e agenciamento desses novos agentes.

Nye e Donahue (2000) lembram que a crescente relevância dada ao aumento de transparência nas organizações internacionais e nas ONGs e os questionamentos a quem devem accountability demonstram, na realidade, uma tentativa de democratização do ambiente internacional. Isto é, uma tentativa de incursão de normas domésticas no sistema internacional.

[...] a idéia de governança global traduz a exigência de uma re-flexão sobre as relações de autoridade e poder, isto é, sobre as novas formas de organização e desregulação política nos planos mundial e nacional – o que inclui, necessariamente, uma discus-são sobre democracia – assim como reflete a necessidade de se examinar o papel das organizações e de outros atores estatais e não estatais nos mecanismos de regulação política, gerando uma reflexão mais adaptada às transformações do mundo con-temporâneo (CAMARGO, 1999, p. 9).

Finalmente, uma última consideração a ser feita sobre os efeitos da globalização são os problemas ou déficits de natureza iminente-mente internacional. O primeiro déficit é o da segurança. Por um lado, presenciamos conflitos internacionais – Ruanda, Timor Leste, Haiti – que atestam a incapacidade de alguns Estados, ditos estados

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falidos, de cuidarem da sua própria segurança requerendo o apoio da comunidade internacional. Esta, por sua vez, nem sempre encontra-se preparada. Em outro extremo, verificamos a dispersão do crime inter-nacional, associado sobretudo às redes terroristas ou ao narcotráfico. Citando Keohane (2002, p. 17), “Global governance during the next decades will have to deal with threats of force as well as with economic interdependence”.7

O déficit social está associado ao último caso citado. As oportuni-dades da globalização não chegam a todos, e se alguns lembram do gap que se acentua entre países ricos e pobres, outros reforçam a polarização que provoca dentro dos próprios estados. O déficit ambiental, resultante do crescimento demográfico e dos rumos da economia industrial, é área de difícil tratamento dada a dificuldade de convergência de opiniões e de interesses entre os Estados. No entanto, apenas políticas de natureza iminentemente global são eficazes. Lubbers e Koorevaar (1999) aponta um último déficit, o democrático. Para o autor, tanto as democracias nacionais estão enfraquecidas quanto os mecanismos democráticos dos processos políticos internacionais estão enviesados.

Em suma, podemos apontar quatro reflexos principais da globalização que provocam novas necessidades e clamam por mecanismos mais eficazes de governança global: revisão da estrutura institucional interna do Estado e de seu lugar no sistema internacional, complexificação das relações entre áreas temáticas (issues areas), surgimento de novos agentes e normas internacionais que demandam novos padrões de cooperação multilateral e aparecimento de déficits globais que devem ser lidados internacionalmente.

4 COMPREENDENDO A GOVERNANÇA GLOBAL

Os efeitos da globalização apresentados anteriormente não são exclu-dentes tampouco os únicos. Na realidade, são apenas uma pequena amostra das transformações em curso na arena internacional e apontam para o fato de que a globalização traz problemas que perpassam o Es-tado e que requerem coordenação, cooperação e regulação na arena internacional. Para além dos porquês de se tentar conduzir ou governar a globalização, apresenta-se a questão de como fazê-lo?

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Foi essa a problemática com a qual lidou Rosenau (2000) ao estudar as possibilidades de existência de governança na ausência de um governo central. Enquanto governo pressupõe a existência de institui-ções formais, governança é um termo mais amplo que “[…] refere-se a atividades apoiadas em objetivos comuns, que podem ou não derivar de responsabilidades legais e formalmente prescritas e não dependem, necessariamente, do poder de política para que sejam aceitas e vençam resistências” (ROSENAU, 2000, p. 16). Ou seja, envolve mecanismos formais, como organizações internacionais, mas também informais, de caráter não-governamental, como redes entre agentes, normas e regimes internacionais.

A idéia é de construir caminhos visando facilitar a convivência dos povos, organizar a economia mundial e fortalecer a lei universal (LOHBAUER, 1999, p. 42). Contudo, na concepção de uma governança sem gover-no, podemos falar da busca de mecanismos eficazes de governança internacional sem que isto implique a existência de um governo mundial. “[...] in the current process of globalization, we have a system of what I call global governance without global government” (STIGLITZ, 2003a, p. 204).8

O que seria, então, a governança global? A definição provém da Comis-são da Governança Global, grupo de acadêmicos e policy makers que se uniram para estudar a questão:

Governance is the sum of the many ways individuals and insti-tutions, public and private, manage their common affairs. It is a continuing process through which conflicting or diverse interests may be accommodated and cooperative action may be taken. It includes formal institutions and regimes empowered to enforce compliance, as well as informal arrangements that people and institutions either have agreed to or perceive to be in their interest (COMISSION ON GLOBAL GOVERNANCE, 1995, apud MATHIA-SON, acesso em 20 out. 2004).9

Ao final da Guerra Fria ganha luz a visão de governança global seguin-do o modelo anglo-saxão; isto é, pouco governo e alta participação de atores não-governamentais (SANTOS NEVES, 1999). No centro dessa governança global – e do processo globalizante – estão os EUA. É ao redor desse centro que o mundo se organiza, redefinindo o sentido de governo, o tipo de cultura e modo de atuação internacional em padrões

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do que seja certo e aceitável. Em outras palavras, esse centro de irra-diação é fundamental para a compreensão da reorganização que se processa no mundo hoje.

Existem aspectos tanto internacionalistas como unilateralistas na ação internacional norte-americana, sendo aceitável interpretarmos sua ação internacional tanto em termos de liderança internacional quanto como hegemonia auto-interessada. Como nos lembra Woods (2002), os EUA têm poder desproporcional em qualquer organização internacional a qual pertençam. Além disso, têm demonstrado grande capacidade de realiza-rem acordos bilaterais sem grande comprometimento. Uma governança global construída nesses moldes faz da maioria dos países rule-takers e não rule-makers. No entanto, como não nos deixa esquecer os eventos terroristas de 11 de setembro, os EUA estão longe de poderem virar as costas para iniciativas multilaterais.

O multilateralismo é a forma moderna como os Estados têm respon-dido aos dilemas da cooperação internacional. Um multilateralismo complexo emerge no final do último século marcado pela dispersão da autoridade e das fontes de poder decisório. Tais desenvolvimentos fazem parte da formação de um sistema frágil de governança global que vem a suplementar ou substituir modos tradicionais de regular a ordem mundial – como hegemonias e a balança de poder (HELD; McGREW, 2002).

Para Held e McGrew (2002), a arquitetura institucional da gover-nança global tem muitas camadas – ou infraestruturas – principais: as Nações Unidas como supraestatal; os blocos regionais no nível regional; a sociedade civil, as redes de negócios e as ONGs no nível transnacional e entre esses níveis os governos nacionais. Fazem parte de suas características a poliarquia, as diferentes capacidades regulatórias desses níveis, que variam tanto entre as infraestrutu-ras como acerca das diferentes áreas temáticas; a complexidade resultante da sobreposição de recursos e competências de poder e o papel estratégico dos governos nacionais como elo entre as diferentes infraestruturas.

Uma variedade de estruturas de governança podem ser encontradas no sistema internacional, as quais podem ser expressas de diferentes formas institucionais (KOENIG-ARCHIBUGI, 2002).10 Dentre as prin-cipais manifestações de mecanismos formais, estão as organizações

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internacionais, as ONGs e novas formas que juntam governança pública e privada. E são esses os mecanismos centrais da teia de governança global que tentarão lidar com os efeitos da globalização.

5 GOVERNANDO A GLOBALIZAÇÃO

A institucionalização do sistema internacional pode ser observada pela criação de instituições internacionais – como a Organização das Nações Unidas (ONU), o Fundo Monetário Internacional (FMI), a Organização Mundial do Comércio (OMC), dentre muitas outras. Tais instituições são representativas de todos os países, já que estes participam como estados-membros com direito a voto, e também são accountable, uma vez que os governos é que controlam orçamentos, mandatos e operações. São importantes também porque servem como fóruns de debates e de cooperação.

Apresentam, contudo, um conjunto de problemas. Um deles é que nem todos os Estados reconhecem que seu interesse esteja sendo efetiva-mente buscado e realizado por essas instituições. Percebem que tais instituições funcionam como clube dos ricos, onde os Estados mais fortes são privilegiados. Os indivíduos que sofrem os impactos das medi-das recomendadas ou promovidas por essas instituições em seus países também reclamam que estão excluídos. Como tais instituições passaram a agir em áreas antes de domínio apenas dos governos nacionais, ga-nharam o estigma de serem intrusas e acabaram chamando a atenção da sociedade civil e recebendo críticas diversas (WOODS, 2002).

De fato, é notável o enviesamento do FMI na defesa dos interesses da comunidade financeira internacional. Como aponta Stiglitz (2003a), a visão de mundo da comunidade financeira predomina no âmbito do FMI. Ou seja, as regras do jogo representam determinada ideologia. A desi-gualdade na representatividade dos interesses dos países também pode ser observada no campo do comércio internacional, onde verificamos que a agenda de liberalização comercial da OMC reproduz interesses de grupos específicos do Norte.

É na área econômica que a globalização tem revelado seus aspectos mais sombrios e tem se mostrado mais problemática. São três as insti-tuições que governam a globalização econômica e pretendem promover a estabilidade econômica global: FMI, Banco Mundial e OMC.

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A mais nova delas, a OMC, não dita regras e funciona mais como um fórum onde os países negociam medidas de liberalização comercial. Da atuação do FMI e do Banco Mundial, lembramos que se reportam aos Ministros dos países membros – e não aos seus povos. A partir da década de 1980, tornam-se missionários da ideologia neoliberal associada ao Consenso de Washington. Guiados pelas diretrizes definidas pelo G7, acumulam críticas e chegam ao final do século lembrados por aplicarem e recomendarem medidas que não funcionam. A própria concepção do FMI partiu de uma necessidade de ação global, mas hoje é consensual que os gêmeos de Bretton Woods precisam ser reformados. As principais linhas de debate sobre a reforma dessas instituições tocam o centro dos debates de governança global: quem deve tomar as decisões e como tais decisões são tomadas?

Três estudos principais11 debateram a necessidade de uma coopera-ção internacional mais efetiva e coordenada no início do século XX. Chegaram à conclusão de que é necessário que sejam criadas novas instituições, que as atuais instituições sejam reformadas e que maior atenção seja despendida com a questão da governança global.

Para além do papel de governança que as instituições internacionais têm cumprido, surge uma nova forma de organização política que mis-tura governança pública e privada. As corporações transnacionais têm criado seus próprios mecanismos de governança nos espaços onde os estados não querem agir ou em áreas onde são apoiados pelos estados a gerarem seus próprios regimes. Os mecanismos criados são do tipo de acordos de padrões, códigos de boas práticas ou auto-regulação, como o Comitê Internacional de Padrões de Contabilidade e a Câmara Internacional de Comércio (WOODS, 2002).

Em algumas instâncias, iniciativas desse tipo unem governos, setor privado e terceiro setor para o monitoramento tanto do setor privado como das políticas e ações governamentais. Cria-se, assim, uma rede de padrões, princípios e políticas geradas e monitoradas pelo setor privado que podem contar com o apoio dos governos e de instituições internacionais.

Uma iniciativa ambiciosa foi proposta por Kofi Annan na forma do Global Compact, cujo objetivo é juntar governos, trabalhadores, organizações da sociedade civil e a própria ONU para promulgar princípios oriundos de acordos internacionais. “[...] the Compact reflects the degree to

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which international organizations and large multinational private actors today perceive a need to respond not just to global markets but to global social and political pressures [...] (WOODS, 2002, p. 33).12 Ou seja, as multinacionais incorporaram em suas ações atividades de cunho social, tornando-se mais accountable aos consumidores e acionistas.

Na esteira dos novos atores internacionais que junto do Estado coope-ram para a governança global estão o chamado terceiro setor ou so-ciedade civil global. Podemos classificar as ONGs como sendo de dois tipos: transnacionais e locais. As ONGs transnacionais geralmente têm sede nos países industrializados e fazem lobby para causas de cunho internacional, como dívida externa, meio-ambiente, direitos humanos. Seu papel é de trazer princípios e valores ao debate internacional e monitorar a globalização através de discussões, críticas e divulgação de informações. As ONGs locais geralmente têm sua sede em países em desenvolvimento, representam constituencies locais e agem nos vácuos deixados pelos seus próprios governos.

A experiência mostra que, se por um lado, os novos atores interna-cionais e os mecanismos engendrados por estes para a condução da problemática trazida pela globalização têm sido providenciais para a governança global, por outro, os Estados que mantiveram papel ativo na condução dos efeitos da globalização em território doméstico tiveram experiências mais gloriosas do que aqueles que sucumbiram à ajuda das organizações internacionais.

O Leste Asiático é exemplar de que, usando a expressão de Stiglitz (2003b), a globalização não é boa nem má, pois tem o poder para fazer as duas coisas. Num primeiro momento, os governos asiáticos condu-ziram a evolução da economia frente à globalização através de intensa ação governamental. Aproveitaram as exportações para promoverem o crescimento econômico, aumentarem sua participação no mercado global e reduzirem o gap de teconologia que os afastava dos países industrializados. Alguns abriram as portas para multinacionais, outros criaram suas próprias empresas. Mas todos conduziram sua própria mudança, distribuindo benefícios de maneira igualitária e rejeitando os princípios básicos do Consenso de Washington (STIGLITZ, 2003a).

Mantiveram o crescimento rápido, mas associado à estabilidade du-rante as décadas de 1960, 1970 e 1980. Esse modelo alternativo de desenvolvimento ficou conhecido como Modelo Asiático: os governos

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assumiram papel central em criar, moldar e guiar os mercados, incluindo a promoção de novas tecnologias e contaram com firmas que assumiram a responsabilidade pelo bem-estar de seus empregados. Ao sucumbi-rem às pressões externas, promoveram uma rápida liberalização nos mercados financeiro e de capital, sem ainda contarem com condições de gerenciar a volatilidade do mercado de capitais e sem instrumentos para lidarem com a vulnerabilidade a qual passaram a estar submetidos. Os tigres asiáticos conheceram a outra face da globalização na conhecida Crise Asiática de 1997.

Concluindo, o gerenciamento mais eficaz dos efeitos da globalização pode ser resultante do aumento da cooperação internacional na forma de mecanismos de governança global, como as organizações interna-cionais. No entanto, a institucionalização internacional não pressupõe a redução de um ativo papel dos estados. Ao contrário, tais mecanismos de governança global pressupõem governos nacionais atuantes que encontrem nos novos atores internacionais elementos de colaboração para uma finalidade comum.

6 CONCLUSÃO

Num sistema internacional onde a analogia doméstica não é possível, observamos que não há um governo central – ou governo mundial – que conduza a globalização. Nesse ambiente, instituições internacionais são criadas e reformadas, novos atores se aproximam para coordena-rem suas ações em prol de problemas comuns, regimes e normas são elaborados para auxiliarem na regulação das relações intergoverna-mentais e na condução das temáticas de cunho iminentemente global. São todos mecanismos que auxiliam na cooperação internacional entre os Estados e ajudam a amenizar ou conduzir os efeitos negativos da globalização.

Domesticamente, entretanto, os governos nacionais continuam a ter papel central na condução dos efeitos da globalização. Tendo que lidar com novos desafios, os próprios Estados precisam ser repensados e adaptados. Na teia da governança global, contudo, continuam em seu centro conduzindo os demais mecanismos.

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GLOBALIZATION AND GLOBAL GOVERNANCE: CHALLENGES AND PROBABILITIES

ABSTRACT

The main objective of this article is to study the relation between globalization and global governance. It supposes that modern globalization increases the demand for mechanisms of global governance, and can also be affected by them. Initially, it defines the globalization of the second half of the 20th century showing how the globalized world introduces new demands for mechanisms of global governance. Latter, on the other way, it studies the mechanisms that have been created to deal with this international globalized world.

Keywords: Global governance. Globalization. International relations.

NOTAS EXPLICATIVAS

4 “[...] globalização refere-se a processos onde as relações sociais adquirem qualidades relativas de distância e de fronteiras, de forma que as atividades humanas são crescentemente realizadas no mundo como se fosse um único lugar” (tradução nossa).

5 O sistema mundial do século XXI não é meramente um sistema de estados unitários interagindo uns com os outros através da diploma-cia, do direito público internacional e de organizações internacionais. Nesse modelo, os Estados interagem como agentes, constituindo um sistema internacional. [...] Nós podemos pensar nesse sistema internacional como o esqueleto do sistema mundial contermporâneo – essencial para o funcionamento do sistema mundial – mas não como todo o sistema (tradução nossa).

6 O termo “ilhas de governança” é utilizado por Nye e Donahe (2000) indicando a existência de regimes de normas, regras e instituições que governam grande número de temas (issues) na política mundial.

7 Governança global durante as próximas décadas terá que lidar com ameaças de força bem como com a interdependência econômica.

8 “[…] no processo corrente de globalização nós temos um sistema que chamo de governança global sem governo global” (tradução nossa).

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9 “Governança é a soma de muitas formas que indivíduos e instituições, públicos e privados, gerenciam suas questões em comum. É um pro-cesso contínuo através do qual interesses conflituosos ou divergentes podem ser acomodados e uma ação cooperativa pode ser tomada. Inclui instituições formais e regimes fortalecidos para complacência (submissão) forçada, bem como arranjos informais que tanto povos e instituições concordaram ou perceberam ser de seu comum interesse” (tradução nossa).

10 Sobre diferentes arranjos de governança, ver também Khagram e Drier (2002).

11 São eles: Zedillo Panel, apresentado pelo Secretario Geral da ONU, em 2001; Meltzer Comission, apresentado pelo Congresso dos EUA, em 2000; Emergents Markets Eminent Persons Group, estudo con-duzido para a Fundação Ford, em 2001. Ver Woods (2002).

12 “[...] o Compacto reflete o grau que as organizações internacionais e os grandes atores privados multinacionais percebem hoje a neces-sidade de responderem não só aos mercados globais mas também às pressões sociais e políticas” (tradução nossa).

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Correspondência para/reprint request to:Flávia Nico VasconcelosRua Fortunato Ramos, 433/1602Praia do Canto29055-290 - Vitória – ES (Brasil)

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RESUMO

Um experimento utilizando 560 pintos, machos e fêmeas, de um dia de idade, da linhagem COBB, foi conduzido com o objetivo de estudar o efeito da inclusão da levedura de cana-de-açúcar (Saccharomyces cerevisiae), proveniente da indústria de álcool, em dietas para frangos de corte. As aves foram distribuídas em um delineamento inteiramente casualizado, constituído de quatro tratamentos com 140 aves/tratamento, sendo sete repetições por tratamento com 20 aves cada. Os tratamentos constaram de quatro dietas isoprotéicas (21,4 e 19,3% de proteína para as fases inicial e de engorda, respectivamente) e isocalóricas (3000 e 3100kcal EM/kg, para as fases inicial e de engorda, respectivamente) formuladas à base de milho e farelo de soja e com níveis crescentes de inclusão de levedura de cana-de-açúcar (LCA). Os tratamentos utiliza-dos foram os seguintes: T1 = Dieta basal (DB); T2 = DB + 4,0% LCA; T3 = DB + 8,0% LCA; T4 = DB + 12% LCA, totalizando quatro níveis

1 Pesquisa financiada pelo Centro Universitário Vila Velha e pela DUMILHO S.A.2 Doutor em Zootecnia pela Universidade Federal de Viçosa. Professor da Universidade

Federal de de Viçosa. E-mail: [email protected] Médico Veterinário.4 Mestre em Zootecnia pela Universidade Federal de Viçosa. Professor do Centro

Universitário Vila Velha. E-mail: [email protected] Doutor em Poultry Science pela University of Georgia. Professor da Universidade Federal

Fluminense. E-mail: [email protected] Doutor em Zootecnia pela Universidade Federal de Viçosa. Pesquisador da Empresa

de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais. E-mail: [email protected].

INCLUSÃO DE LEVEDURA DESIDRATADA DE CANA-DE-AÇÚCAR EM RAÇÕES PARA

FRANGOS DE CORTE1

João Luís Kill2Marcelo Gomes Martins3

José de Assis Belisário4

Geraldo Luiz Colnago5

Francisco Carlos de Oliveira Silva6

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de inclusão de levedura. Não foi verificada diferença significativa entre os tratamentos para as variáveis, ganho de peso, consumo de ração e conversão alimentar no período total (1 a 42 dias de idade) de criação das aves. No entanto, o nível de 8% de LCA obteve melhor ganho de peso no período inicial (1 a 21 dias de idade). Pode-se concluir que é possível a inclusão de até 8% de LCA em dietas para frangos de corte, sem afetar o seu desempenho.

Palavras–chave: Frango de corte – Alimentação e rações. Cana-de-açúcar – Nutrição.

1 INTRODUÇÃO

O crescimento da avicultura de corte e de postura, no Brasil tem sofrido uma série de entraves, sendo um deles o alto custo da alimentação que representa cerca de 60 a 70% do custo total de produção (TOGASHI et al., 2002). Neste sentido, torna-se imprescindível o estudo de fontes alternativas de alimentos para que a avicultura se mantenha economi-camente viável em nosso país.

Em virtude de oscilações de preços do milho e farelo de soja, ingredientes que mais oneram os custos com alimentação das aves, tem-se observa-do um crescente interesse por alimentos alternativos (BUTOLO, 1997), principalmente os subprodutos agroindustriais, que são ingredientes de baixo custo e encontrados facilmente em certas regiões e em algumas épocas do ano (GRANGEIRO et al., 2001). O termo subproduto serve para designar materiais resultantes de um processamento industrial, onde o produto final era outro.

Um volume muito grande de subprodutos agroindustriais é produzido anualmente no Brasil. No entanto, a utilização bem sucedida destes subprodutos é muitas vezes limitada pelo escasso conhecimento de suas características nutricionais e valor econômico como ingredientes da ração, bem como de dados de desempenho de animais alimentados com este tipo de produto.

A levedura é um subproduto do processamento da cana-de-açúcar, uti-lizado na alimentação animal como fonte protéica e de outros nutrientes (BOTELHO; SERAFINI; BUTOLO, 1998; LIMA et al., 1998).

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Portanto, em busca do objetivo de maior rentabilidade numa granja de frangos de corte, parte-se para o estabelecimento de um programa de alimentação destes frangos com produtos que podem substituir os alimentos protéicos convencionais utilizados na alimentação animal, destacando-se os microorganismos, tais como algas e leveduras (BUTOLO, 1997).

A levedura é utilizada nos processos de fermentação do caldo extraído da cana-de-açúcar, para que este fermente e se torne um vinho de onde se extrai a aguardente ou álcool. Contudo, torna-se necessária cultura in vivo destes microorganismos pelas usinas beneficiadoras. Nas indústrias de álcool, devido à rápida velocidade de crescimento destes microorganismos, ocorre sempre o excesso de produção de levedura, que pode ser usada para os mais diversos fins depois de desidratada, como por exemplo, na alimentação animal (GRANGEIRO et al., 2001).

Segundo Yokota e outros (apud MAIA et al., 2002), a levedura de des-tilaria de álcool de cana-de-açúcar é um alimento rico em proteína de alto valor biológico.

A levedura foi estudada por diversos pesquisadores como uma fonte alternativa de proteína na alimentação de aves, visando à produção de carne e ovos (BUTOLO, 1997; MAIA et al., 2002).

Os primeiros trabalhos foram produzidos por Latrille e outros (1976), que realizaram três ensaios com levedura seca como fonte protéica para frangos de corte, em níveis de 10, 20 e 30%, e observou-se que a incorporação de 25% ou mais de levedura na ração tende a piorar o desempenho das aves (BUTOLO, 1997).

Almeida, Fonseca e Soares (2000) observaram que a inclusão de até 12% de levedura seca não prejudica o desempenho na criação de aves para corte, e que o tratamento com 18% de inclusão diminuiu significativamente o ganho de peso quando comparado com os outros tratamentos. Por outro lado, Pezzato e outros (1982) verificaram que, em níveis acima de 20%, ocorreu redução no ganho de peso das aves no mesmo período.

Butolo e outros (1997b) determinaram que a levedura pode ser utili-zada até o nível de 5% na ração de frangos de corte sem prejudicar

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o desempenho. Porém, outra pesquisa realizada por Butolo (1997) concluiu que o melhor nível de substituição foi de 10% em relação ao desempenho, e o de 15% foi o pior, evidenciando que a energia metabolizável utilizada (2250kcal/kg) para a levedura seca disponí-vel no período poderia estar super estimada. Resultado semelhante foi encontrado por Grangeiro e outros (2001), que observaram que até 7,5% pode ser usado sem afetar significativamente o desem-penho.

Além dos experimentos com frangos de corte, Maia e outros (2002) utilizaram a levedura seca para poedeiras, avaliando-se a qualidade dos ovos, e observaram que para esta categoria a inclusão de até 28% de levedura seca intensifica a cor amarelada da gema.

Por outro lado, Butolo e outros (1997a), avaliando o desempenho de poedeiras comerciais, observaram que é viável a utilização até o nível de 7,5% de levedura seca de cana-de-açúcar.

2 OBJETIVO

Avaliar as características de desempenho (ganho de peso, consumo de ração, conversão alimentar) de frangos de corte alimentados com diferentes níveis de inclusão de levedura seca de álcool de cana-de-açúcar.

3 MATERIAL E MÉTODOS

O experimento foi realizado no centro de pesquisa da Granja Santa Marta, de propriedade da empresa Dumilho S.A., localizada na BR 262, Km 34,5 (município de Domingos Martins – ES).

Foram utilizados 560 frangos de corte, machos e fêmeas, da marca comercial Cobb, com peso médio inicial de 50,0 ± 0,7g, alojados com um dia de idade, por um período de 42 dias, em galpão convencional, dividido em boxes de 3,4m2, forrados com cama tipo maravalha, com cobertura de amianto, lanternim e sistema de ventiladores/exaus-

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tores, piso de concreto e paredes laterais de alvenaria com 0,50m de altura, alongadas com tela de arame até o telhado e protegidas com cortinas.

O registro diário da temperatura ambiente (mínima e máxima) durante o período experimental, foi feito sempre às 8h, utilizando-se um termô-metro de máxima e mínima.

As aves foram distribuídas em delineamento experimental inteiramente casualizado, com quatro tratamentos (0; 4; 8; 12% de inclusão de leve-dura) e sete repetições, com 20 aves por boxe, considerado a unidade experimental.

As rações experimentais, representando os tratamentos, foram formuladas à base de milho e farelo de soja, suplementadas com vitaminas e minerais, atendendo às exigências nutricionais, segundo Rostagno e outros (2000), para cada período de crescimento (1 a 21 e 22 a 42 dias de idade), de forma que fossem isoprotéicas, isocaló-ricas, isoaminoacídicas para metionina+cistina e lisina, isocálcicas e isofosfóricas.

A composição das rações com 0 e 12% de inclusão de levedura estão apresentadas na Tabela 1. As demais rações (tratamentos com 4 e 8% de inclusão de levedura) foram obtidas por meio de diluições entre as rações com 0 e 12% de levedura, da seguinte forma: T2: 66,6% T1 + 33,4% T4, e T3: 33,4% T1 + 66,4% T4.

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Tabela 1 - Composição centesimal e valores calculados das rações experimentais

Ingredientes

Ração experimental

1 a 21 dias de idade 22 a 42 dias de idade

T1 (0%) T4 (12%) T1 (0%) T4 (12%)Milho moído 57,87 55,25 63,40 60,78Soja farelo 45% 35,44 26,26 29,71 20,53Levedura de álcool de cana-de-açúcar 0,00 12,00 0,00 12,00

Óleo de soja 2,80 2,71 3,29 3,20Fosfato bicálcico 1,82 1,73 1,62 1,53Calcário calcítico 0,99 1,03 0,94 0,98Sal comum 0,45 0,41 0,39 0,34DL-metionina 99% 0,24 0,27 0,22 0,25L-lisina 78% 0,17 0,11 0,22 0,16Bacitracina de zinco 0,05 0,05 0,05 0,05Coxistac 0,05 0,05 0,05 0,05Suplemento Mineral 0,05 0,05 0,05 0,05Cloreto de Colina 60% 0,04 0,04 0,04 0,04Suplemento Vitamínico 0,02 0,02 0,02 0,02B H T (antioxidante) 0,01 0,01 0,01 0,01Olaquindox 0,005 0,005 0,005 0,005Total 100,00 100,00 100,00 100,00Composição calculadaEnergia metabolizável, kcal/kg 3.000 3.000 3.100 3.100

Proteína bruta, % 21,40 21,40 19,30 19,30Cálcio, % 0,96 0,96 0,87 0,87Fósforo disponível, % 0,45 0,45 0,41 0,41Metionina + cistina total, % 0,90 0,90 0,83 0,83Lisina total, % 1,26 1,26 1,16 1,16

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A levedura seca de cana-de-açúcar foi adquirida de uma usina de pro-dução de álcool, Destilaria Itaúnas S.A. (DISA), localizada à BR 101 norte, Km 39,2 (Conceição da Barra – ES).

As aves receberam ração e água à vontade durante todo o período experimental. As características avaliadas: ganho de peso, consumo de ração e conversão alimentar foram analisadas, estatisticamente, utilizando-se o programa computacional SAEG 8.0 (Sistema de Análise Estatísticas e Genéticas), desenvolvido pela Universidade Federal de Viçosa (2000).

4 RESULTADOS E DISCUSSÃO

As medidas de temperatura, mínima e máxima, registradas em todo o período experimental foram de 20,3 e 23°C, respectivamente. Estes valores estão próximos à faixa de conforto térmico de frangos de corte com idade entre 22 e 41 dias de idade, sendo de 22 a 24°C (FERREIRA, 2005). Portanto, é possível inferir que o ambiente térmico, em termos absolutos, provavelmente não causou estresse aos animais.

Os resultados de desempenho dos frangos de corte, durante o período inicial de 1 a 21 dias de idade, encontram-se na Tabela 2.

Tabela 2 - Dados médios de desempenho dos frangos de corte aos 21 dias de idade submetidos a dieta contendo níveis crescentes de inclusão de levedura de cana-de-açúcar

Níveis de levedura, %Período 0 4 8 12 CV, %1 a 21 dias de idadeConsumo de ração, g/ave 1107a 1216b 1266b 1270b “Q” 4,16Ganho de peso, g/ave 881a 974b 951b 933ab “Q” 4,11Conversão alimentar, g/g 1,26a 1,25a 1,33b 1,36b “L” 2,99

Legenda: Q – efeito quadrático (p<0,01); L – efeito linear; CV – Coeficiente de variação.

Médias seguidas de letras comuns, nas linhas, não diferem entre si, pelo teste de Tuckey a 5%.

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Foram observados efeitos significativos (p<0,01) para as variáveis, consumo de ração, ganho de peso e conversão alimentar.

Observou-se que o consumo de ração diário foi menor para o tratamento com 0% de inclusão de levedura em relação aos tratamentos com 4, 8 e 12% de inclusão, os quais não diferiram entre si. Resultado semelhante foi obtido por Butolo (1997) ao utilizar níveis crescentes de levedura de cana-de-açúcar (0, 5, 10 e 15%) na ração de frangos de corte de 1 a 21 dias de idade, constatando menor consumo de ração para os animais que não receberam levedura. Similarmente, Almeida, Fonseca e Soares (2000), estudando o efeito de diferentes níveis de levedura (0; 4; 8; 12 e 18%) na ração sobre o desempenho de frangos de corte até o abate, observaram uma tendência (p>0,05) de redução no consumo de ração para o tratamento com 0% de inclusão de levedura em relação aos outros tratamentos. Por outro lado, Butolo e outros (1997b), trabalhando com frangos de corte, no período de 1 a 21 dias de idade, não observaram diferenças significativas entre os níveis de levedura estudados (0; 2,5; 5; 7,5% de inclusão). Da mesma forma, Almeida, Fonseca e Soares (2000), Latrille e outros (1976), Oliveira e outros (1998) e Samanta e Mondal (1988) também não registraram efeito significativo do uso de levedura sobre o consumo de ração em frangos de corte.

O consumo de ração diário foi influenciado de forma quadrática (p<0,01) pelo nível de levedura da ração, tendo aumentado até o nível estimado de 10% (Figura 1). Este resultado foi semelhante ao obtido por Butolo (1997) que observou aumento no consumo de ração de frangos de corte, de 1 a 21 dias de idade, até o nível de 9% de levedura na ração.

Segundo Waldroup, Hillard e Mitchell (1971), citado por Grangeiro e outros (2001), grande parte dos problemas de ordem nutricional, relacio-nados com o uso de proteína microbiana, diz respeito à palatabilidade. De acordo com os autores, altos níveis de levedura na ração podem diminuir a palatabilidade, principalmente devido à pulverulência. Entre-tanto, como no presente trabalho utilizou-se óleo de soja em todas as rações (tratamentos), provavelmente, tal fato não tenha ocorrido.

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Figura 1 - Efeito do nível de levedura sobre o consumo de ração diário de frangos de corte no período de 1 a 21 dias de idade

Os níveis de inclusão de levedura influenciaram significativamente (p<0,01) o ganho de peso diário, que variou de forma quadrática, tendo aumentado até o nível de 7% (Figura 2). Níveis inferiores foram determi-nados por Butolo (1997) e Butolo e outros (1998), que estimaram, res-pectivamente, nível de inclusão de 5 e 2,5% (calculado pela derivada da equação) de levedura de cana-de-açúcar para melhor resposta de ganho de peso de frangos de corte, no período de 1 a 21 dias de idade.

Trabalho realizado por Latrille e outros (1976) com frangos de corte recebendo rações contendo levedura seca (Torula utilis), como fonte protéica, constatou que, a partir de 20% de inclusão de levedura, houve redução do ganho de peso das aves no período de 1 a 20 dias. Butolo (1997), por sua vez, observou queda no ganho de peso de frangos de corte de 1 a 21 dias de idade, com o nível de 10 e 15% de inclusão de levedura de cana-de-açúcar na ração dos frangos.

A queda no desempenho dos frangos deste experimento, a partir de 10% de inclusão de levedura de cana-de-açúcar (saccharomyces cerevisiae) na ração, pode estar associada à baixa digestibilidade da parede celular, que reduz a digestibilidade dos nutrientes (BUTOLO, 1997).

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Figura 2 - Efeito do nível de levedura sobre o ganho de peso diário de frangos de corte no período de 1 a 21 dias de idade

A conversão alimentar piorou linearmente (p<0,01) com o aumento do nível de inclusão de levedura de cana-de-açúcar (Figura 3), cor-roborando os resultados de Butolo e outros (1997b), que também verificaram piora na conversão alimentar de frangos de corte (1 a 21 dias de idade) à medida que foram aumentando o nível de levedura de cana-de-açúcar até 15% na ração. Em outro experimento, Butolo e outros (1998), avaliando diferentes níveis de inclusão (0; 2,5; 5 e 7,5%) de levedura de cana-de-açúcar para frangos de corte na fase inicial (1 a 21 dias), não obtiveram diferenças significativas na con-versão alimentar das aves.

Realizando experimentos com frangos de corte de 1 a 28 dias e utili-zando como fonte protéica das rações a levedura seca (Torula utilis), Latrille e outros, citado por Grangeiro e outros (2001) registraram pior conversão alimentar quando o nível de inclusão de levedura foi de 25% ou mais.

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Figura 3 - Efeito do nível de levedura sobre a conversão alimentar de frangos de corte no período de 1 a 21 dias de idade

A Tabela 3 apresenta os resultados de desempenho de frangos de corte no período de 22 a 42 dias de idade.

Tabela 3 - Dados médios de desempenho de frangos de corte aos 42 dias de idade submetidos a dietas contendo níveis crescentes de inclusão de levedura de cana-de-açúcar

Níveis de Levedura, %

Período 0 4 8 12 CV, %22 a 42 dias de idadeConsumo de ração, g/ave 2876 3111 2994 3137 “L” 4,67Ganho de peso, g/ave 1602 1615 1611 1599 “ns” 7,41Conversão alimentar, g/g 1,81 1,94 1,86 1,96 “L” 6,41

Legenda: Q – efeito quadrático (p<0,01). L – efeito linear. CV – Coeficiente de variação.

Médias seguidas de letras comuns, nas linhas, não diferem entre si, pelo teste de Tuckey a 5%.

Foi observado efeito linear crescente (p<0,05) no consumo de ração diário em função do aumento no nível de inclusão de levedura de cana-de-açúcar na ração. Adversamente, Butolo (1997) relatou efeito linear

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decrescente (p<0,05) sobre o consumo de ração de frangos de corte de 22 a 35 dias de idade ao utilizarem níveis de levedura de cana-de-açúcar entre 0 e 15%. Ainda neste mesmo trabalho, agora no período entre 36 e 42 dias de experimentação, a inclusão de levedura proporcionou efeito quadrático (p<0,05) para o consumo de ração, que foi estimado em 5% de inclusão.

O ganho de peso diário não foi influenciado pelos níveis de levedura de cana-de-açúcar na ração. Ao contrário da conversão alimentar, que piorou linearmente (p<0,05) com o aumento da inclusão de levedura na ração (Figura 4).

Figura 4 - Efeito do nível de levedura sobre a conversão alimentar de frangos de corte no período de 22 a 42 dias de idade

Para o período total (1 a 42 dias), constatou-se variação significativa no consumo de ração e na conversão alimentar. O ganho de peso não foi influenciado pelos tratamentos, conforme mostrado na Tabela 4.

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Tabela 4 - Dados médios de desempenho de frangos de corte aos 42 dias de idade submetidos a dietas contendo níveis crescentes de inclusão de levedura de cana-de-açúcar

Níveis de Levedura, %

Período 0 4 8 12 CV, %1 a 42 dias de idadeConsumo de ração, g/ave 4054a 4322b 4336b 4439b “L” 3,67Ganho de peso, g/ave 2418 2501 2448 2392 “ns” 3,85Conversão alimentar, g/g 1,68a 1,73ab 1,77b 1,86c “L” 2,46

Legenda: Q – efeito quadrático (p<0,01). L – efeito linear.

Médias seguidas de letras comuns, nas linhas, não diferem entre si, pelo teste de Tuckey a 5%.

O consumo de ração das aves que receberam rações sem levedura foi menor do que aquelas que receberam rações com os níveis de 4, 8 e 12%, que por sua vez não variaram entre si. Resultado semelhante foi obtido por Almeida, Fonseca e Soares (2000) que não encontraram diferença significativa entre os níveis de inclusão (0; 6; 12 e 18%) de levedura de cana-de-açúcar na alimentação de frangos de corte durante o período de 45 dias. Entretanto, as aves que não receberam levedura tiverem redução (não significativa) de 13% no consumo de ração, em relação às aves que receberam ração com 12% de levedura. Neste trabalho, a redução no consumo de ração entre os níveis de 0 e 12% de levedura foi de 9%.

Na análise de regressão, os níveis de inclusão de levedura influenciaram (p<0,01) o consumo de ração de forma linear crescente (Figura 5).

Pesquisas realizadas por Samanta e Mondal (1988), citados por Butolo e outros (1998), Grangeiro e outros (2001) e Oliveira e outros (1998), trabalhando com levedura de álcool de cana-de-açúcar, não registraram efeito significativo do uso de levedura sobre o consumo de ração de frangos de corte. Já Butolo (1997) verificou efeito linear decrescente para o consumo de ração, com o aumento do nível (0 a 15%) de levedura na ração de frangos de corte (1 a 42 dias de idade).

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Figura 5 - Efeito do nível de levedura sobre o consumo de ração diário de frangos de corte no período de 1 a 42 dias de idade

Todavia, o ganho de peso diário das aves, obtido neste experimento, não foi afetado pelos tratamentos. Similarmente, Almeida, Fonseca e Soares (2000), estudando o efeito da levedura de cana-de-açúcar na alimentação de frangos de corte, observaram que a inclusão de até 12% de levedura na ração não afetou o ganho de peso das aves. Porém, com o nível de 18%, houve redução significativa no ganho de peso quando comparado aos outros tratamentos (0, 6 e 12% de inclusão de levedura). Da mesma forma, resultados obtidos por Butolo (1991), avaliando o valor biológico da levedura de cana-de-açúcar (Saccharomyces cerevisiae) para frangos de corte, relataram que a substituição do farelo de soja pela levedura até o nível de 10% não influenciou significativamente o ganho de peso das aves.

Contrariando os resultados acima, com relação ao ganho de peso, Pezzato e outros (1982) concluíram que a inclusão de levedura poderia chegar a 20% na ração de frangos de corte, utilizando aves da linhagem Ross, sem prejudicar o desempenho. No entanto, tal fato não foi con-firmado por Murakami e outros (1993), utilizando levedura de vinhaça, pois concluíram que rações contendo níveis acima de 10% de inclusão prejudicam o ganho de peso e a conversão alimentar.

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Verificou-se neste trabalho piora linear (p<0,01) na conversão alimentar, com o aumento dos níveis de inclusão de levedura (Figura 6). Porém, constatou-se que a conversão alimentar das aves que receberam rações com 0 e 4% de levedura não variaram entre si. A partir daí, a conversão alimentar foi piorando à medida que se elevou o nível de levedura para 8 e 12%. Corroborando este resultado, Almeida, Fonseca e Soares (2000) não observaram diferença significativa na conversão alimentar dos frangos de corte (1 a 45 dias de idade) alimentados com ração sem e com (6%) levedura de cana-de-açúcar.

Figura 6 - Efeito do nível de levedura sobre a conversão alimentar de frangos de corte no período de 1 a 42 dias de idade

Grangeiro e outros (2001), utilizando níveis de inclusão de levedura que variavam de 0 a 7,5%, não encontraram efeito significativo sobre a conversão alimentar de frangos de corte, no período de 1 a 42 dias, concordando com os resultados encontrados por Surdzhiiska e outros (1987), citado por Grangeiro e outros (2001).

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5 CONCLUSÃO

Conclui-se que, baseado no ganho de peso, utilizando a equação da LRP, o melhor nível de proteína bruta foi de 25,6%, para o período de 1 a 21 dias de idade, correspondendo a um consumo de 84,28g de proteína. Para o período total, 1 a 45 dias de idade, o melhor resultado para ganho de peso foi o plano de nutrição 3 – PN-3 (27 – 22% de PB).

AGRADECIMENTOS

À empresa DUMILHO S.A. por ter cedido o galpão e a fábrica de ração para realização dessa pesquisa.

INCLUSION OF SUGAR CANE DRIET YEAST IN BROILER CHICKENS RATION

ABSTRACT

An experiment was carried out to evaluate the effect of the inclusion of sugar cane yeast (Saccharomyces cerevisiae), produced in the alcohol distillery, in broiler chickens diets. Five hundred and sixty with one day old male broiler chicks, COBB line, were alloted to a completely randomized design with four treatments and one hundred and forty birds per treatment, being four replicates of twenty birds per treatment. Treatments consisted of four isoproteic (21.4 and 19.3% of crude protein for initial and growing perio-ds, respectively) and isocaloric (3,000 and 3,100 kcal ME/kg for initial and growing periods, respectively) diets. These diets were formulated based on corn, soybean meal and different inclusion levels of yeast of sugar cane (YSC). The treatments were: T1 = Basal Diet (BD); T2 = BD + 4.0% YSC; T3 = BD + 8.0% YSC; T4 = BD + 12.0% YSC, resulting in four inclusion levels of YSC. Statistical analysis did not show any significant difference among the treatments for weight gain, feed intake and feed conversion in total period (1 to 42 days of age). Nevertheles the 8% level obtained a better acquisition of weight from the 1 to 21 day of age. According to the results, it can be concluded that it is possible the inclusion of up to 8.0% YSC in broiler diets without affecting their performance.

Keywords: Broilers (Poultry) – Feedings and feeds. Sugarcane – Nutrition.

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Correspondência para/reprint request to:João Luis KillAvenida Hugo Viola, 211/ 504Jardim da Penha29060-420 - Vitória – ES (Brasil)

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RESUMO

As onicomicoses atualmente figuram entre as principais causas de onicopatias em todo o mundo. Existem inúmeras opções para o trata-mento da patologia, de drogas de uso tópico e sistêmico às cirurgias. Entretanto, o alto custo do tratamento e o crescente problema de resis-tência fúngica dos medicamentos tradicionais surgem como importantes fatores limitantes à terapia. O óleo essencial de Syzygium aromaticum (cravo-da-índia), é empregado no tratamento de onicomicoses. Um estudo da composição química e da atividade fungicida do óleo foi efe-tuado com o intuito de fornecer subsídios que respaldem esta utilização. O óleo teve sua composição química determinada por Cromatografia Gasosa (CG). O monoterpeno Eugenol foi o componente principal do óleo, representando 100% da composição volátil. O potencial fungicida do óleo na onicomicose foi avaliado contra as principais espécies de

COMPOSIÇÃO QUÍMICA E ATIVIDADE FUNGICIDA DO ÓLEO ESSENCIAL DE SYZYGIUM AROMATICUM

(CRAVO-DA-ÍNDIA) NA ONICOMICOSE

Bertha Batista Venturim1

José Luiz Mello Ferreira Neto2

Rene Zorzal Vargas3

Eduardo Roberto Cole4

João Damasceno Lopes Martins5

Reginaldo Bezerra dos Santos6

1 Graduada em Farmácia pelo Centro Universi tár io Vi la Velha. E-mai l : [email protected].

2 Graduado em Farmácia pelo Centro Universitário Vila Velha. E-mail: [email protected].

3 Graduada em Farmácia pelo Centro Universitário Vila Velha. E-mail: [email protected].

4 Especialista em Homeopatia pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro. Professor do Centro Universitário Vila Velha. E-mail: [email protected].

5 Especialista em Microbiologia pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Professor do Centro Universitário Vila Velha. E-mail: [email protected].

6 Doutor em Química Orgânica pela Universidade Federal de São Carlos. Professor da Universidade Federal do Espírito Santo. E-mail: [email protected].

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fungos relacionadas a essa patologia: Trichophyton mentagrophytes e Candida sp. Os resultados mostraram que o óleo apresenta atividade biológica significativa contra estes fungos, sendo capaz de matar 100% das cepas fúngicas numa concentração mínima de 250 µg/mL e 500 µg/mL, respectivamente.

Palavras-chave: Óleos e gorduras. Cravo-da-índia.

1 INTRODUÇÃO

A onicomicose, uma infecção fúngica ungueal, representa 20% das doenças das unhas, sendo uma das mais freqüentes causas de onico-patias em todo o mundo. Na Austrália, Inglaterra e Estados Unidos, a prevalência é estimada em torno de 3% do total da população em ge-ral, elevando-se para 5% com o aumento da idade acima dos 55 anos (ARAÚJO et al., 2003b). Nos países desenvolvidos a prevalência de onicomicose é pouco freqüente, diferentemente da América Latina onde a ocorrência é habitual (ARENA; RUIZ-ESMENJAUD, 2004). No estado do Rio de Janeiro (Brasil) estima-se que cerca de 19,34% da população é acometida por essa doença (ARAÚJO et al., 2003a).

Trata-se de uma doença de aparecimento insidioso e avanço implacável, não desaparecendo espontaneamente. A partir de um pé infeccionado o fungo se aloja (normalmente o dedão do pé é o primeiro a ser afetado) e a doença evolui, atingindo outros dedos do pé e, em alguns casos (cerca de 20%), atinge também as unhas dos dedos das mãos. Estudos demonstram que cerca de 5 a 10% da população ocidental é afetada pela onicomicose e o tratamento destes pacientes envolve um custo financeiro considerável (ROBERTS; BISLAND, 2004).

Existem várias formas de onicomicose, dentre as quais podem ser cita-das: 1. Onicomicose subungueal distal e lateral; 2. Onicomicose branca superficial; 3. Onicomicose subungueal proximal; 4. Onicomicose por Candidíase e 5. Onicomicose distrófica total (MARTELOZO; GUILHER-METTI; SVIDZINSKI, 2005).

A doença tem início no hiponíquio, geralmente numa localização lateral, avançando proximalmente, formando uma onicólise, causando mudança de cor e hiperceratose subungueal. Finalmente, a unha fica visivelmente distrófica e friável (ROBERTS; BISLAND, 2004).

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Os dermatófitos causais da onicomicose são do gênero Trichophyton e Epidermophyton, raramente Microsporum (SAMPAIO; RIVITTI, 2001), e Candida sp. (ROBERTS; BISLAND, 2004).

As onicomicoses são consideradas as micoses superficiais mais difíceis de diagnosticar e tratar. A forma clínica mais freqüente da onicomicose por fungos filamentosos não-dermatófitos é a proximal, associada à inflamação da dobra proximal, podendo ser limitada à região da lúnula ou afetar a totalidade da unha. A presença de inflamação sugere oni-comicose por fungo não-dermatófito, o que quase nunca é visto com onicomicose por dermatófito (ARAÚJO et al., 2003b).

O tratamento da patologia não deve se basear apenas na impressão clínica. Os exames micológicos devem ser repetidos quantas vezes forem necessários, a fim de se obter um diagnóstico correto. A defici-ência imunológica celular dos pacientes afeta diretamente o sucesso terapêutico das onicomicoses causadas por fungos dermatófitos (KEDE; SABATOVICH, 2004).

A terapêutica atual da onicomicose é bastante diversificada, podendo ser local, sistêmica, combinada ou cirúrgica. A avaliação para se deter-minar o tratamento a ser utilizado deve levar em consideração o estado biológico do fungo, se este se encontra na fase de crescimento invasivo dos filamentos ou na forma qüiescente de artroconídios, esporos ou cé-lulas leveduriformes. É importante a determinação da espécie do fungo, pois o espectro antifúngico dos medicamentos difere entre si (KEDE; SABATOVICH, 2004).

Os antifúngicos possuem vários alvos terapêuticos diferentes, podendo atuar na síntese de parede celular, biossíntese de esterol na membrana, síntese de ácidos nucléicos, inibição metabólica ou biossíntese macro-molecular. Por serem os fungos eucarióticos e o hospedeiro também, a terapêutica antifúngica oral acarreta problemas potenciais de toxicidade para o paciente, porém, nos casos de acometimento da matriz ungueal, são imprescindíveis para o tratamento (KEDE; SABATOVICH, 2004). Entretanto, embora exista a opção pelas preparações tópicas, o trata-mento sistêmico é o que apresenta excelentes percentagens de cura (ROBERTS; BISLAND, 2004).

A procura por novos agentes antifúngicos é crescente, motivada pela busca de produtos mais seguros e eficazes, capazes de reduzir a zero as

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chances de recidivas da doença. O problema da resistência aos produtos sintéticos que alguns microorganismos patogênicos têm apresentado nos últimos tempos é, sem dúvida, outro importante motivador destas pesquisas (PEREIRA et al., 2006).

Uma alternativa para as drogas sintéticas convencionalmente empregadas é a utilização de extratos vegetais e substâncias naturais efetivas no con-trole fúngico que sejam isentas de toxicidade para o meio ambiente. Atu-almente, vários óleos e extratos com alta atividade bactericida e fungicida, extraídos de plantas, têm sido utilizados em hospitais e, particularmente, em salas de cirurgia, no processo de desinfecção (PEREIRA et al., 2006).

Os óleos essenciais já vêm sendo utilizados pela medicina há milhares de anos. Registros pictóricos egípcios de seis mil anos atrás relatam práticas religiosas associadas à cura de males, às unções da realeza e à busca de bem-estar físico, através dos aromas obtidos de partes específicas de certos vegetais, como resinas, folhas, flores e sementes. Na China e na Índia, as substâncias aromáticas já eram populares a cen-tenas de anos antes da era cristã, quando eram utilizadas em incensos, poções e vários tipos de acessórios, usados diretamente sobre o corpo. Entretanto, a real comercialização de materiais aromáticos só se iniciou a partir da Idade Média, quando cientistas muçulmanos introduziram o processo de destilação para a extração de óleos oriundos de diversas partes das plantas (SIANI et al., 2000).

Os óleos essenciais são substâncias voláteis, geralmente constituídos por misturas complexas de vários componentes, usualmente com odores agradáveis, extraídos de fontes vegetais. Eles são encontrados pratica-mente em todo tecido vivo de plantas. Quimicamente são constituídos por hidrocarbonetos, álcoois e compostos carbonílicos (aldeídos e cetonas). As substâncias mais freqüentemente encontradas nos óleos essenciais pertencem a um grupo de compostos conhecidos como monoterpenos (ISMAN, 2000). Possuem um importantíssimo papel na proteção contra microrganismos e estão vinculados à sobrevivência vegetal, devido às suas diversas funções. Estudos científicos estabelecem que cerca de 60% dos óleos essenciais possuem atividade antifúngica e 35% possuem atividade antibacteriana (LIMA et al., 2006).

Dentre os diferentes óleos essenciais com atividade antifúngica, vale ressaltar o óleo de Syzygium aromaticum, que já vem sendo estudado há algum tempo no que se refere a essa propriedade específica.

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O Syzygium aromaticum, popularmente conhecido como cravo-da-índia, membro da família Myrtaceae, é uma árvore de grande porte, chegan-do a atingir de 12 a 15 metros de altura, cujo ciclo vegetativo alcança mais de cem anos. É abusivamente encontrada nas Molucas do Norte (Arquipélago de Molucas – Indonésia), onde foi difundido pelos alemães durante a colonização pelas outras ilhas do arquipélago. Atualmente os principais produtores de cravo-da-índia são Zanzibar e Madagascar, seguidos pela Indonésia (MAZZAFERA, 2003).

A gema floral seca do cravo-da-índia vem sendo utilizada principalmente como condimento na culinária, devido ao eugenol, um composto fenólico volátil que confere um poder aromatizante e saboroso. Nas folhas, o eugenol chega a representar aproximadamente 95% do óleo extraído, sendo também o principal componente do óleo de cravo, variando de 70 a 85%. Somando-se os outros componentes dessa fração, que são acetato de eugenila (15%) e â-cariofileno (5 a 12%), juntamente com eugenol totalizam 99% do óleo. Uma vez que o óleo no cravo pode exceder 15%, conclui-se que a quantidade de eugenol no cravo pode chegar próxima a esse valor (MAZZAFERA, 2003).

Neste contexto, este trabalho visa agregar à terapia da onicomicose a utilização de um óleo essencial, com propriedade fungicida, que não cause agressão ao meio ambiente e seja relativamente isento de toxi-cidade para o ser humano.

2 MATERIAIS E MÉTODOS

O presente trabalho foi desenvolvido no Laboratório do Complexo Bio-agrárias do Centro Universitário Vila Velha (UVV), localizado no muni-cípio de Vila Velha, no Espírito Santo, e a cromatografia foi realizada no Laboratório de Química Orgânica da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), no período de março a novembro de 2006.

2.1 OBTENÇÃO DO ÓLEO

O óleo essencial de Syzygium aromaticum foi adquirido da empresa Ins-tituto de Manipulação Farmacêutica Ltda. (Imafar), situada à Rua Gama Rosa, 174 – Centro – Vitória – ES – CNPJ 27.574.359/0001-29.

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2.2 ANÁLISE DA COMPOSIÇÃO QUÍMICA

A amostra foi analisada no Cromatógrafo a Gás Varian Star 3600 CX, utilizando o seguinte método: * Coluna: DB-1 (dimetilpolissiloxano) 30 metros, I. D. 0,32mm e filme 5µm. * Gás de arraste: N2. * Temperatura do injetor: 200ºC. * Temperatura do detector: 250ºC. * Detector: FID. *Programa de temperatura: Temperatura inicial – 70ºC (1 minuto). Tempe-ratura final – 220ºC (15 minutos). * Rampa de temperatura: 15ºC/min.

Uma pequena quantidade do óleo essencial foi transferida através de um capilar para um recipiente limpo e seco onde foi diluído com diclo-rometano P.A. Com o auxílio de uma microsseringa mediu-se 1 µL e a amostra foi injetada no cromatógrafo a gás.

Os compostos foram identificados usando a biblioteca de tempos de retenção para padrões de monoterpeno, disponível no Laboratório de Química Orgânica da UFES.

2.3 BIOENSAIO FUNGICIDA

2.3.1 Microorganismos utilizados

Como culturas de teste foram utilizadas as espécies de fungo Trichophyton mentagrophytes e Candida sp. obtidos da micoteca do Complexo Bioagrá-rias da UVV e do Hospital da Polícia Militar do Espírito Santo (HPM/ES), respectivamente.

2.3.2 Avaliação da atividade fungicida por difusão em Ágar

Para o Trichophyton mentagrophytes o método utilizado foi o bio-analítico in vitro, observando o desenvolvimento ou inibição dos microorganismos em diferentes concentrações do óleo, usando o meio de cultura BDA (Batata – Dextrose e Ágar), apropriado para o desenvolvimento desses fungos. Ao meio de cultura autoclavado por 20 minutos a 120ºC, após o resfriamento, foi adicionado o óleo essencial de Syzygium aromaticum, que foi diluído diretamente no meio de cultura, nas concentrações de 62,5 - 125 - 250 - 500 - 1000 - 2000 µg/mL de meio, preparando-se para cada concentração 200 mL de meio acrescido do óleo essencial, operações essas realizadas sob condições assépticas (Capela de Fluxo Laminar modelo PA410) (PEREIRA et al., 2006).

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Posteriormente, o meio contendo as diferentes concentrações do óleo essencial foi vertido em placas de Petri com 9cm de diâmetro e o inóculo, constituído por um disco de micélio de 10mm de diâmetro contendo os fungos em estudo, foi transferido para o centro das placas. A incubação ocorreu em temperatura ambiente de 25ºC, na ausência de luz, durante 7 dias em aerobiose. Após este período de desenvolvimento, foram efetuadas medições ortogonais do diâmetro das colônias, tendo como referência o desenvolvimento da placa-controle contendo apenas os fungos desenvolvidos sob o meio de cultura sem adição do óleo essencial. O esquema fatorial adotado foi com três repetições, em delineamento inteiramente casualizado, obtendo, assim, a taxa de desenvolvimento micelial (PEREIRA et al., 2006).

Para a Candida sp., o método utilizado foi o turbidimétrico, observando o desenvolvimento ou inibição dos microorganismos em diferentes con-centrações do óleo, usando o meio de cultura BDA. Ao meio de cultura autoclavado por 20 minutos a 120ºC, após o resfriamento, foi adicionado o óleo essencial de Syzygium aromaticum que foi diluído diretamente no meio de cultura nas concentrações de 62,5 - 125 - 250 - 500 - 1000 - 2000 µg/mL de meio, preparando-se para cada concentração 200 mL de meio acrescido do óleo essencial, operações essas realizadas sob condições assépticas (capela de Fluxo Laminar modelo PA410) (PEREIRA et al., 2006).

Posteriormente, o meio contendo as diferentes concentrações do óleo essencial foi vertido em placas de Petri com 9cm de diâmetro e a inoculação ocorreu na escala de Mac Farland, correspondente a 1,5 x 108 microorganismos/mL (SILVA; JUNQUEIRA; SILVEIRA, 2001). O esquema fatorial adotado foi com três repetições, em delineamento inteiramente casualizado.

A incubação ocorreu em estufa de cultura (modelo 347CDG), em aero-biose, com temperatura de 37ºC, por 48 horas. Após este período de desenvolvimento, foi verificado se houve ou não crescimento ou inibição por parte do óleo de Syzigium aromaticum.

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3 RESULTADOS E DISCUSSÃO

3.1 COMPOSIÇÃO QUÍMICA DO ÓLEO ESSENCIAL

A Tabela 1 apresenta os resultados da análise da composição química, feita por Cromatografia Gasosa, do óleo essencial de Syzygium aromaticum utilizado. A CG revelou como composto majoritário o monoterpeno Eugenol (Figura 1).

Tabela 1 - Composição química majoritária da amostra de óleo essencial de Syzygium aromaticum

Compostos Tempo de Retenção (minutos) Área Relativa

Eugenol 20,768 100%Total 100%

Figura 1 - Estrutura química do monoterpeno Eugenol, encontrado no óleo essencial de Syzygium aromaticum

Fonte: Eugenol (2006, p. 1).

A análise cromatográfica pode ser vista na Figura 2.

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Figura 2 - Cromatograma do óleo essencial de Syzygium aromaticum (cravo-da-índia)

3.2 AVALIAÇÃO DA ATIVIDADE FUNGICIDA

A Tabela 2 apresenta os valores dos halos de inibição (expressos em milímetros) observados para as amostras do óleo essencial de S. aromaticum frente ao microrganismo Trichophyton mentagrophytes (onde o controle cresceu como esperado, atingindo um halo de 37mm) (Figura 3).

Tabela 2 - Resultados da análise das diferentes concentrações de óleo de cravo-da-índia frente ao microorganismo Trichophyton mentagrophytes

Concentrações Amostra 1 Amostra 2 Amostra 362,5 µg/mL R (21mm) R (21mm) R (22mm)125 µg/mL R (14mm) R (13mm) R (13mm)250 µg/mL S S S500 µg/mL S S S

1000 µg/mL S S S2000 µg/mL S S S

Nota: R e S significam, respectivamente, Resistente (houve crescimento) e Sensível (não houve crescimento) à concentração de óleo de cravo a qual os microorganismos foram submetidos.

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Figura 3 - Testes biológicos de inibição de crescimento de halo para Trichophyton mentagrophytes pelo óleo de cravo, em ordem crescente

de concentração (62,5 – 2000pg/ml). A última placa representa o controle. Na primeira seqüência de placas estão representados os inóculos;

a segunda seqüência expõe os resultados do teste.

Para o microorganismo Candida sp., foi verificado apenas se houve ou não o crescimento, pois ficaria inviável analisar, como feito para o microorganismo do gênero Trichophyton, o crescimento do halo, pois a Candida, por ser uma levedura, não possui crescimento expansivo. A Tabela 3 apresenta os resultados obtidos pelo método turbidimétrico (uma vez que o controle cresceu o esperado) (Figura 4).

Tabela 3 - Resultados da análise das diferentes concentrações de óleo de cravo-da-índia frente ao microorganismo Candida sp.

Concentrações Amostra 1 Amostra 2 Amostra 362,5 µg/mL R R R125 µg/mL R R R250 µg/mL R R R500 µg/mL S S S

1000 µg/mL S S S2000 µg/mL S S S

Nota: R e S significam, respectivamente, Resistente (houve crescimento) e Sensível (não houve crescimento) à concentração de óleo de cravo a qual os microorganismos foram submetidos.

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Figura 4- Testes biológicos de inibição de crescimento de halo para Candida sp. pelo óleo de cravo, em ordem crescente de concentração (62,5 – 2000pg/ml). A última placa representa o controle. Na primeira sequência de placas estão

representados os inóculos; a segunda sequência expõe os resultados do teste.

O óleo de cravo demonstrou 100% de inibição sobre o crescimento dos fungos, Candida sp. e Trichophyton mentagrophytes, com concentrações mínimas inibitórias de 500 µg/mL e 250 µg/mL, respectivamente. Esta atividade fungicida se deve à presença do monoterpeno Eugenol, com-posto majoritário presente no óleo, cujo mecanismo de ação envolve, possivelmente, atividade sobre a parede celular do fungo (AMARAL; BARA, 2005).

4 CONCLUSÃO

Os experimentos in vitro evidenciam a eficácia do óleo essencial de Syzygium aromaticum (cravo-da-índia) comercial contra dois dos principais fungos causadores de onicomicose, Candida sp. e Trichophyton mentagrophytes. Os resultados de concentração mínima inibitória obtidos demonstram uma maior potência do óleo contra o Trichophyton, não inviabilizando, no entanto, o seu uso contra a Candida.

O uso de óleos essenciais em terapias deste tipo ilustra uma alter-nativa aos convencionais compostos químicos utilizados, além de constituir-se em uma terapia de baixo custo, baixa toxicidade para o meio ambiente e relativamente segura para o paciente. O problema de resistência fúngica é outra questão de extrema importância a ser considerada, uma vez que se torna cada vez mais freqüente junto à população.

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CHEMICAL COMPOSITION AND FUNGICIDAL ACTIVITY OF ESSENTIAL OIL OF SYZYGIUM

AROMATICUM (CRAVO-DA-ÍNDIA) IN NYCHOMYCOSIS

ABSTRACT

Onychomycosis currently appears between the main causes of onychopaties in the whole world. There are innumerable options for the treatment of the pathology, since drugs of topical and sistemic use to the surgeries. However, the high cost of the treatment and the increasing problem of fungic resistance of traditional medicines appear as important limiting factors to the therapy. The essential oil of Syzygium aromaticum (cravo-da-índia) is used in the treatment of onychomycosis. A study of the chemical composition and the fungicidal activity of the oil was made with intention to supply subsidies that endorse this use. The oil had its chemical composition determined by gas chromatography (GC). The monoterpene Eugenol was the main component of the oil, representing 100% of the volatile composition. The oil’s fungicidal potential in onychomycosis was evaluated against the main fungus species related to this pathology: Trichophyton mentagrophytes and Candida sp. The results had shown that the oil represents a considerable biological activity against these funguses, being able to kill 100% of the mould strains in a minimal concentration of 250 µg/mL e 500 µg/mL.

Keywords: Oils and fats. Clove (Spice).

REFERÊNCIAS

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ARAÚJO, A. J. G. et al. Onicomicoses por fungos emergentes: análise clínica, diagnóstico laboratorial e revisão. Anais Brasileiros de Der-matologia, Rio de Janeiro, v. 78, n. 4, jun./ago. 2003b.

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SILVA, S.; JUNQUEIRA, V. C. A.; SILVEIRA, N. F. A. Manual de mé-todos de análise microbiológica de alimentos. 2. ed. São Paulo: Varela, 2001.

Correspondência para/reprint request to:Eduardo Roberto ColeRua Castelo, 680Jardim Limoeiro29164-030 - Serra – ES (Brasil)

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INSTRUÇÕES EDITORIAIS AOS AUTORES1

1 PROPOSTA EDITORIAL

Neste momento em que a acessibilidade à informação se tornou uma questão central no ambiente científico e acadêmico é fundamental que professores, pesquisadores, alunos e demais profissionais disponham de canais de informação adequados que viabilizem e estimulem a difusão de questões vinculadas ao saber científico.

Nessa perspectiva, Scientia: Revista do Centro Universitário Vila Velha é uma publicação interdisciplinar editada pela Pró-Reitoria de Pós-Gradu-ação, Pesquisa e Extensão do Centro Universitário Vila Velha, instituição de ensino superior mantida pela Sociedade Educacional do Espírito Santo, com vistas à divulgação semestral de produções científicas e acadêmicas inéditas nos formatos: editorial, artigo original, artigo de revisão, relato de experiência ou de técnica, resenha e/ou resumo de tese, de dissertação e de monografia de pós-graduação.

Na avaliação dos originais é adotada a prática do peer review, conjugada com o blind review, com a submissão a dois ou mais membros do Conselho Editorial e/ou a assessores ad hoc, especialistas na temática da contribui-ção recebida, procurando assegurar isenção, agilidade e objetividade no processo de julgamento dos originais.

A visibilidade da produção científica publicada na revista Scientia tem se consolidado a partir da indexação de seu conteúdo na base de dados IRESIE (UNAM/México) e da disponibilidade no site do Centro Universitário Vila Velha (<www.uvv.br>).

2 PÚBLICO-ALVO REAL E POTENCIAL

Pesquisadores, professores, alunos de graduação e pós-graduação e demais profissionais do Centro Universitário Vila Velha, da Faculdade de Vitória, da Faculdade Guaçuí e de outras instituições de ensino superior do Brasil e do exterior, associações de estudantes e de profissionais de

1 Versão aprovada em 10 de outubro de 2005.

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ensino e pesquisa, além de dirigentes de agências de fomento e de política em Ciência e Tecnologia.

Com uma tiragem de 1.000 exemplares, Scientia é distribuída como doação para parte do público interno do Centro Universitário Vila Velha e como permuta para instituições de ensino superior, inclusive bibliotecas, do Brasil e de outros países.

3 ORIENTAÇÕES GERAIS

As contribuições para publicação, redigidas em português, espanhol ou inglês, com a devida revisão lingüística, podem ser enviadas por pes-quisadores, professores e alunos do Centro Universitário Vila Velha e de outras instituições de ensino superior, bem como por outros profissionais, independente de vinculação institucional, do Brasil e do exterior.

Os conceitos e opiniões expressos nas contribuições publicadas são de total responsabilidade dos autores (Anexo B), que deverão providenciar permissão, por escrito, para uso de qualquer tipo de ilustração publicada em outras fontes.

Os autores poderão retirar o original enviado, segundo seus critérios de conveniência, a qualquer momento antes de ser selecionado pelo Conselho Editorial.

Os originais aprovados poderão sofrer alterações de ordem normativa, ortográfica e/ou lingüística, a serem executadas pela equipe da revista, com vistas a manter o padrão culto do idioma e adequação às normas ado-tadas por Scientia, respeitando, porém, o estilo dos autores. Os originais publicados não serão devolvidos aos autores nem as provas finais serão reapresentadas, exceto em caso de extrema necessidade.

As contribuições recusadas ficarão à disposição do autor responsável pelo contato com Scientia pelo prazo de 90 dias, a contar da data de comuni-cação do resultado da avaliação. Após esse prazo, as contribuições serão eliminadas, garantindo-se nesse processo a total destruição do suporte (papel, disquete, CD-ROM, etc.)

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As contribuições publicadas passam a ser propriedade de Scientia (Anexo C), ficando sua reimpressão, total ou parcial, sujeita à autorização expressa dos Editores da revista. A transferência de direitos autorais mencionada refere-se, única e exclusivamente, à contribuição encaminhada para pu-blicação na revista Scientia.

Cada autor receberá, gratuitamente, dois exemplares do fascículo que inclui sua contribuição.

As contribuições enviadas deverão se enquadrar em uma das seguintes seções:

• Editorial: comentário crítico e aprofundado dos editores ou profissionais convidados com reconhecido domínio sobre o tema.

• Artigos originais: relatos inéditos e completos de estudos e pesquisas científicas, representando 60% das contribuições publicadas.

• Artigos de revisão: estudos que fornecem visão sistematizada e crítica de avanços do conhecimento em determinadas áreas/temáticas, a partir da literatura disponível.

• Relatos de experiência ou de técnica: descrições criteriosas de práti-cas de intervenções e vivências profissionais que possam interessar à atuação de outros profissionais.

• Resenhas: revisões críticas de livros, artigos, teses ou dissertações, com opiniões que possam nortear interesse para leitura ou não da publicação na íntegra.

• Resumos: descrições sucintas e de caráter informativo do conteúdo de teses, dissertações ou monografias de pós-graduação.

Dentre as tipologias anteriormente descritas, exceto para os artigos origi-nais, as contribuições podem ser produzidas por pesquisadores/profissio-nais de renome, a convite da UVV.

Excepcionalmente serão aceitas contribuições que já tenham sido publi-cadas em periódicos estrangeiros, condicionadas aos mesmos critérios de avaliação dos trabalhos inéditos e à apresentação, por parte do autor, da autorização por escrito do editor da revista em que o texto tenha sido publicado como original.

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A critério do Conselho Editorial de Scientia, poderão ser publicados números especiais e/ou temáticos com objetivo de atender à demanda das linhas de pesquisa implantadas nos cursos oferecidos pelo Centro Universitário Vila Velha.

4 CORPO EDITORIAL

A estrutura editorial de Scientia está constituída pelos editores, conselho editorial e assessores científicos ad hoc com as seguintes responsabilidades e representatividade:

4.1 EDITORES

Responsáveis pelo gerenciamento da revista, incluindo seus aspectos admi-nistrativos, financeiros e controle de qualidade. Sua representatividade envolve o Vice-Reitor, o Pró-Reitor de Pós-Graduação, Pesquisa e Extensão, o Co-ordenador de Pesquisa – todos do Centro Universitário Vila Velha –, além de um profissional, a convite da UVV, que possa contribuir para o aprimoramento das variáveis intrínsecas e extrínsecas da publicação.

4.2 CONSELHO EDITORIAL

Sua constituição evidencia a participação de colaboradores do Centro Universitário Vila Velha e da comunidade científica nacional e, dentro do possível, estrangeira, a saber:

• Pró-Reitor de Pós-Graduação, Pesquisa e Extensão, membro nato e seu presidente;

• Coordenador de Pós-Graduação Lato Sensu, membro nato;

• Coordenador de Pesquisa, membro nato; e

• Diretor da Biblioteca Central, membro nato.

• Cinco membros da comunidade acadêmica, representando diferentes áreas do saber com, no mínimo, o título de mestre. Tais representan-tes, com mandato de dois anos, devem ser indicados pelos membros natos do Conselho Editorial.

Suas responsabilidades envolvem a discussão da política editorial de Scientia; a avaliação da adequação das contribuições ao escopo e ao

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formato da revista, o que envolverá o parecer de dois a três membros; e a indicação dos assessores científicos ad hoc.

4.3 ASSESSORES CIENTÍFICOS AD HOC

A adequação da contribuição, além de ser atestada pelo Conselho Edi-torial, pode ser comprovada por um processo de avaliação realizado por assessores científicos ad hoc, especialistas na área de conhecimento das contribuições recebidas, que desempenham a função de emitir pareceres elucidativos das questões e/ou pareceres conflitantes que possam ter emergido no processo de avaliação dos membros do Conselho Editorial, bem como de avaliar as contribuições que não sejam de pleno domínio daquele Conselho.

5 ACEITAÇÃO E PUBLICAÇÃO DAS CONTRIBUIÇÕES

A publicação da contribuição está condicionada ao parecer favorável do Conselho Editorial e/ou dos assessores científicos ad hoc.

Do resultado da avaliação podem derivar três situações, a saber:

• contribuição aceita, sem restrições;

• contribuição aceita, com restrições passíveis de revisão, que deverão ser atendidas/cumpridas pelo autor;

• contribuição recusada, o que não impede sua reapresentação para nova avaliação, exceto se a recusa tiver ocorrido por duas vezes.

6 ENCAMINHAMENTO

A contribuição deve atender ao disposto no item 7 destas Instruções (Estrutura das contribuições) e ser encaminhada aos editores da revista, acompanhada de:

• Carta de encaminhamento (Anexo A) assinada por todos os autores, explicitando: a concordância com as condições e normas adotadas pela revista; e a indicação de apenas um autor como responsável pelo contato com Scientia, incluindo seu endereço completo, inclusive telefones e endereço eletrônico;

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• Declaração de Responsabilidade (Anexo B);

• Termo de Transferência de Direitos Autorais (Anexo C);

• Procedência do artigo com entidade financiadora;

Considerando sua periodicidade semestral, far-se-á o esforço para que as contribuições recebidas, depois de submetidas ao processo de avaliação, revisão e de possíveis adaptações, sejam publicadas com base no seguinte cronograma:

• Contribuições recebidas até setembro de cada ano – publicação no 1º número do ano seguinte;

• Contribuições recebidas até abril de cada ano – publicação no 2º número do ano.

Essa proposta de cronograma poderá ser modificada levando-se em conta a necessidade de alterações pelos editores e/ou autores.

Endereço para envio das contribuições:

Centro Universitário Vila Velha – Scientia

Pró-Reitoria de Pós-Graduação, Pesquisa e Extensão

Rua Comissário José Dantas de Melo, 21

CEP 29102-770 - Vila Velha - ES (Brasil)

Telefone: (27) 3421-2097

E-mail: [email protected] ou [email protected]

7 ESTRUTURA DAS CONTRIBUIÇÕES

É recomendável que a contribuição enviada esteja de acordo com as normas da ABNT referentes a artigos em publicação periódica científica impressa (NBR 6022:2003); citações em documentos (NBR 10520:2002); numeração progressiva de documentos (NBR 6024:2003) e resumo (NBR 6028:2003), bem como com a norma de apresentação tabular do IBGE, publicada em 1993 (última edição).

A contribuição deve ser redigida em português, espanhol ou inglês, com estilo de redação claro e coerente na exposição das idéias, observando o

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uso adequado da linguagem. Deve ser digitada em extensão “.doc” (Word, versão 6.0 ou superior) ou “.rtf” (Rich Text Format), impressa em três vias e gravada em disquete (3½) ou CD-ROM. Na etiqueta do disquete ou CD-ROM deverão constar: título do trabalho, autoria e versão do software.

O texto deve estar configurado para papel A4, digitado em fonte Arial 11, com margens superior, inferior, direita e esquerda de 3cm, folhas devidamente numeradas no canto superior direito, alinhamento justificado, parágrafo em bloco e entrelinha com espaço 1,5.

Na primeira lauda do texto devem ser informados:

a) título, em português e inglês, expressando de forma concisa, clara e precisa o conteúdo da contribuição. O título deve ser centralizado, em negrito e todo em letras maiúsculas;

b) nome completo dos autores, titulação e vinculação institucional (so-mente um título acadêmico e uma afiliação por autor);

c) endereço postal completo, telefones e endereço eletrônico dos auto-res;

d) resumo, em português e inglês (abstract), explicitando objetivo(s), metodologia, resultados e conclusões, mesmo que parciais, deve ser redigido com o verbo na voz ativa e terceira pessoa do singular, com um mínimo de 150 e um máximo de 250 palavras. Não será permitido o uso de expressões tais como “Este artigo apresenta...”; “O objetivo deste estudo foi...” e similares (Anexo D);

e) palavras-chave, em português e inglês (keywords), que representem o conteúdo da contribuição. Apresentar de três a cinco palavras-chave. A Biblioteca Central do Centro Universitário Vila Velha (tel.: (27) 3320-2022; e-mail: [email protected]) deve ser consultada para orientar a adoção das palavras-chave. O autor deve entrar em contato com a Biblioteca com antecedência e enviar uma cópia do trabalho, juntamente com sugestões de palavras-chave. O prazo para entrega é de 48 horas a contar da data de solicitação.

Na segunda lauda deverá ser iniciado o texto da contribuição propriamen-te dita, com identificação apenas do título, o que garantirá a prática do blind review.

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A estrutura das contribuições deverá atender aos seguintes requisitos:

• Artigos originais deverão apresentar introdução, objetivos, metodo-logia, resultados, discussão e conclusão (ou seções similares) e sua extensão estará limitada, no máximo, a 30 laudas.

• Artigos de revisão, com exceção da introdução, discussão e conclusão, terão sua estrutura a critério do autor. Sua extensão estará limitada, no máximo, a 30 laudas.

• Relatos de experiência ou de técnica terão sua organização a critério do autor, mas deles deverão constar, no mínimo, introdução, descri-ção da experiência ou da técnica e discussão. Sua extensão estará limitada, no máximo, a 10 laudas.

• Resenhas devem ser breves, ter título próprio e diferente do da obra resenhada, sendo desnecessária a apresentação do resumo na primei-ra lauda. Sua extensão não deve ultrapassar 4 laudas e é obrigatória a inclusão da referência completa da obra objeto da resenha, como cabeçalho.

• Resumos devem ser iniciados com a referência completa da obra na estrutura de cabeçalho e ter, no máximo, 1 lauda de extensão.

Os artigos encomendados deverão, de acordo com sua tipologia, atender a uma das estruturas definidas anteriormente.

Nas citações diretas devem ser observados os seguintes critérios de estrutura:

• com até 3 linhas, devem estar incluídas no corpo do texto, respeitando o tamanho da fonte do texto e entre aspas;

• com mais de três linhas, devem vir em parágrafo isolado, recuado da margem esquerda em 2cm, fonte tamanho 9, sem aspas e com entrelinha espaço simples.

Na identificação da fonte da qual foram retiradas as citações diretas ou indiretas deve ser adotado o sistema de chamada autor-data (sobre-nome do autor, seguido do ano de publicação da obra e paginação, se for o caso), que poderá estar incluída no texto (ex.: Segundo Severino (2000, p. 23) ou no final da frase (SEVERINO, 2000, p. 23).

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As notas de rodapé ou notas no final do texto devem ser evitadas. Somen-te na primeira lauda recomenda-se o uso de nota de rodapé para indicar origem de apoio financeiro ou logístico e indicação de apresentação em eventos, quando necessários. Não é permitido o uso de notas de rodapé de referências.

As ilustrações devem ser numeradas consecutivamente com algarismos arábicos, na ordem de citação no texto e de acordo com sua tipologia (tabelas, gráficos, quadros, desenhos, etc.) e apresentar título conciso. Devem ser utilizadas somente quando indispensáveis à compreensão e clareza do texto e na sua legenda deve ser usada fonte Arial tamanho 9 e entrelinha simples.

A lista de referências deve ser estruturada atendendo às regras da NBR 6023:2002, sendo de inteira responsabilidade do autor sua exatidão e adequação, devendo constar da lista apenas as obras que foram citadas no corpo do texto.

Na indicação de autoria das obras citadas, o sobrenome dos autores deve ser em caixa-alta, com os nomes e prenomes apresentados de forma abreviada.

As referências poderão sofrer alterações de ordem normativa, com vistas a manter o padrão mínimo exigido pela NBR 6023:2002 e deverão estar à dis-posição da revista para caso de consulta pela equipe de normalização.

Exemplos de referências:

a) Livros QUINET, A. Um olhar a mais: ver e ser visto na psicanálise. Rio de

Janeiro: J. Zahar, 2002.

b) Capítulos de livro ou partes de coletânea CARVALHO, I. C. L. A tecnologia e sua expansão no espaço-tempo.

In: ____. A socialização do conhecimento no espaço das biblio-tecas universitárias. Niterói: Intertexto, 2004. p. 45-76.

WEFFORT, F. Nordestinos em São Paulo: notas para um estudo sobre cultura nacional e classes populares. In: VALLE, E.; QUEIROZ, J. J. (Org.). A cultura do povo. 3. ed. São Paulo: Cortez, 1984. p. 12-23.

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c) Artigos em periódicos CHAUÍ, M. Ética e universidade. Universidade e Sociedade, São

Paulo, ano 5, n. 8, p. 82-87, fev. 1995.

d) Textos da Internet CHANDLER, D. An introduction to genre theory. Disponível

em:<http://www. aber.ac.uk/~dgc/intgenre.html>. Acesso em: 23 ago. 2000.

Para acessar o site da Biblioteca, digitar <http://www.uvv.br/biblioteca/>, e em seguida, clicar em: Normalização de Trabalhos Acadêmicos.

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AosEditores de Scientia: Revista do Centro Universitário Vila Velha

Encaminhamos, em anexo, o artigo intitulado (indicar o título do artigo), por nós produzido, ao mesmo tempo que declaramos nossa concordância com as condições e normas adotadas por essa revista, e indi-camos o(a) Sr(a). (nome do indicado) como responsável pelo contato com Scientia.

, de de .

Nome e assinatura do autor 1 Nome e assinatura do autor 2

Nome e assinatura do autor 3 Nome e assinatura do autor 4

Endereço do representante dos autores:

Rua/Av.

nº - complemento - Bairro

CEP: - - Município

Estado/País

Telefones: E-mail:

Anexo A – Carta de Encaminhamento e Declaração de Concordância

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Título da contribuição:

Autores: (informar o nome de todos os autores)

Certificamos a participação na concepção do trabalho a ser publicado por Scientia para tornar pública nossa responsabilidade pelo seu conteúdo, pela não-omissão de quaisquer ligações ou acordos de financiamento entre os autores e empresas que possam ter interesse na publicação deste artigo.

Certificamos ainda que a contribuição é original e que seu conteúdo, em parte ou na íntegra, não foi enviado a outra publicação e não o será en-quanto estiver sendo avaliado por Scientia, quer no formato impresso quer no eletrônico.

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Assinatura(s):

Anexo B – Declaração de Responsabilidade

Título da contribuição: Autores: (informar o nome de todos os autores)

Declaramos que caso o trabalho em anexo seja aceito para publicação, Scientia passa a ter os direitos autorais a ele referentes, tornando-se sua propriedade exclusiva.

Sua reprodução, total ou parcial, em qualquer outra fonte ou meio de divul-gação impressa ou eletrônica dependerá de prévia e necessária autorização por escrito dos editores de Scientia. Nesse caso, deverá ser consignada a fonte original, com identificação da edição, respectiva data de publicação e devidos agradecimentos.

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Assinatura(s):

Anexo C – Termo de Transferência de Direitos Autorais

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Anexo D – Exemplo de um Resumo

Investiga se as bibliotecas universitárias têm contribuído para o pro-cesso de socialização do conhecimento. Alicerça sua metodologia no enfoque qualitativo e emprega o questionário como instrumento de coleta de dados. Resgata o caminho percorrido pela tecnologia, inclusive a ampliação de seu conceito e reflexos em nosso cotidia-no. Evidencia a biblioteca universitária como instituição partícipe do processo que concebe a escola e a universidade em uma postura crítico-reflexiva e focaliza o conhecimento e os espaços para sua socialização, destacando a biblioteca como fórum de interatuação e comunicação do saber e como espaço de múltipla comunicação com a missão de buscar alternativas para compartilhar informações e contribuir para que, nas comunidades de troca (salas de aula e laboratórios), haja realmente produção e socialização do conheci-mento. Numa perspectiva que procura evidenciar os campos de possibilidades sugeridos pela temática, toma como referencial teórico as concepções de Pierre Lévy, Michel Authier e Manuel Castells para articular discussões nas categorias socialização do conhecimento e tecnologias da informação; e de Gilles Deleuze e Félix Guattari para construir a imagem de rizoma como forma de organização mais apropriada às bibliotecas no enfrentamento das transformações que emergem e modelam a Sociedade da Informação. Sintetiza os resul-tados reconhecendo que as bibliotecas universitárias brasileiras de-vem se revestir como catalisadoras, como espaços de comunicação pedagógica para promover a cooperação entre pessoas e grupos, canalizando o potencial das tecnologias da informação e comunica-ção no sentido de acelerar a socialização do conhecimento estocado em seus ambientes, quer no tradicional, quer no virtual.

Palavras-chave: Socialização do conhecimento. Bibliotecas univer-sitárias – automação.

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