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1 ANO I - edição 1 Abr 2014 - GAZETA DO ADVOGADO: A REVISTA DE QUEM PENSA DIREITO

Revista Gazeta do Advogado - 1º Edição

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ANO I - edição 1

Abr 2014 - GAZETA DO ADVOGADO: A REVISTA DE QUEM PENSA DIREITO

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Capa

2 Abr 2014 - GAZETA DO ADVOGADO: A REVISTA DE QUEM PENSA DIREITO

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ANO I - edição 1

Abr 2014 - GAZETA DO ADVOGADO: A REVISTA DE QUEM PENSA DIREITO

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Sumário

4 Abr 2014 - GAZETA DO ADVOGADO: A REVISTA DE QUEM PENSA DIREITO

ENTREVISTA.........................................................06Eliana Calmon: “Eu costumo botar o dedo na ferida”.

GAZETA ONLINE...........................................12Conheça nosso portal na Internet

FÓRUM DE IDEIAS...............................................14Uma arma no combate à corrupção

PARLATÓRIO.................................................17

CAPA.......................................................................18Incerteza na academia do descaso

ENSAIO............................................................24Passeio pela Justiça

CARREIRA......................................................26De olho na Rede

PERFIL.............................................................28Técio Lins e Silva

OPINIÃO..........................................................32Os dilemas do Processo Judicial Eletrônico

CHARGE E FRASES.......................................34

CARTA DOS LEITORES

ANUNCIE!

Para a satisfação de nossos leitores,

a Gazeta do Advogado abrirá espaço,

a partir da próxima edição, para que

você, possa sugerir, criticar e comentar as

publicações anteriores. Envie um e-mail [email protected]

Comunique-se diretamente com o mundo jurídico e ofereça seu produto. Ligue para (21) 3172-8980 ou envie um e-mail [email protected]

Design:Natalia Sttrazzeri

GAZETA DO ADVOGADOPublicação Mensal

Envie Sugestões:[email protected]

Foto da Capa:Mailson Santana

Os artigos e conteúdos publicados são de inteira responsabilidade dos autores, não representando, necessariamente, a opinião da revista.

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Carta ao Leitor

5Abr 2014 - GAZETA DO ADVOGADO: A REVISTA DE QUEM PENSA DIREITO

CHEGAMOS!

A Gazeta do Advogado traz ao mercado um novo conceito

de informação para a área jurídica, com a abordagem

contextualizada dos assuntos de interesse de advogados e

demais operadores do Direito. A proposta é lançar um olhar crítico

sobre o fato, mas sem abandonar os princípios básicos que regem o bom

jornalismo, tais como objetividade e isenção.

O desafio é grande. A importância do advogado para a sociedade é

tamanha que a própria Constituição o considera “indispensável”. Sem

ele, não há Justiça. Por outro lado, a mesma Carta Magna estabelece o

acesso à informação como direito fundamental do cidadão. A publicação

que você tem em mãos é norteada por estes dois princípios.

A partir desta edição, mensalmente, vamos trazer à pauta questões que,

de alguma forma, sejam pertinentes ao exercício profissional daqueles

que pensam o Direito. Os debates serão sempre fundamentados na

opinião de especialistas e personagens que, de fato, tenham algo a dizer.

As próximas páginas são um exemplo disso.

Mostramos o que provocou o fechamento de duas das mais tradicionais

instituições de ensino superior do Rio de Janeiro, frustrando sonhos de

mais de 12 mil universitários. Mais que fatos e números, falamos do

drama individual dos acadêmicos de Direito, abandonados à própria

sorte por aqueles que deveriam defendê-los. O problema lança foco sobre

a qualidade do ensino superior do Brasil, também criticado pelo advogado

criminalista Técio Lins e Silva, escolhido para a estreia da nossa sessão Perfil.

Histórias não faltam ao jurista, que viveu de perto os anos mais

sombrios da ditadura, atuando na defesa de perseguidos pelo regime. Com

a propriedade de quem a conhece intimamente, também faz um passeio

pela Justiça no Brasil. O Judiciário, aliás, é um velho conhecido da sempre

contundente Eliana Calmon, ministra aposentada do Superior Tribunal de

Justiça, que abre a nossa edição. Em entrevista exclusiva, a ex-corregedora

fala das mazelas do Poder, do cenário político e da delicada relação entre

magistrados e advogados. Todos, sem dúvida, têm algo a lhe dizer. Boa leitura!

A EDITORA

Gazeta do Advogado Ltda.

CNPJ 10.992.108/0001-61

Fone: (21) 3172-8980 [email protected]

www.gazetadoadvogado.adv.br

EDIÇÃODébora Diniz

[email protected]

REPORTAGEMNádia Mendes

[email protected]

SUPERVISÃO DE LOGÍSTICALeonardo Alves

[email protected]

[email protected]

DIREÇÃO DE ARTENatalia Sttrazzeri

PROJETO WEBAlan Quidornne

TIRAGEM20.000 exemplares

©É proibida a reprodução total ouparcial desta publicaçãosem autorização prévia

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Entrevista: Eliana Calmon

6 Abr 2014 - GAZETA DO ADVOGADO: A REVISTA DE QUEM PENSA DIREITO

Fotos: Gláucio Dettmar/ Agência CNJ

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ANO I - edição 1

Abr 2014 - GAZETA DO ADVOGADO: A REVISTA DE QUEM PENSA DIREITO

Eu costumo botar o dedona ferida

O Judiciário brasileiro sempre foi visto como sinônimo de corporativismo. No imaginário

do cidadão comum, o Poder é tido como ineficiente, moroso e, muitas vezes, corrupto. Mas essa visão começa a mudar, diante de medidas moralizadoras e de aperfeiçoamento, campo em que se destaca a criação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Nunca, porém, as mazelas da toga foram tão expostas quanto na passagem de Eliana Calmon pela Corregedoria Nacional de Justiça, de 2010 a 2012. Mais de 10 mil processos foram abertos, com cerca de 9 mil solucionados. Foram instauradas 50 sindicâncias, algumas destinadas a investigar o patrimônio de magistrados. A ministra propôs a abertura de 40 Processos Administrativos Disciplinares (PAD)

contra juízes e desembargadores, que culminaram no afastamento preventivo de oito deles. Só com a suspensão do pagamento de um único precatório na Justiça de Trabalho de Rondônia, R$ 2 bilhões deixaram de sangrar dos cofres públicos. O movimento, é claro, desagradou setores mais conservadores da magistratura, fazendo com que a ex-corregedora - uma baiana de 70 anos, graduada em Direito pela Universidade Federal da Bahia e primeira mulher a ocupar uma cadeira no Superior Tribunal de Justiça – se tornasse colecionadora de notas de repúdio, uma delas do próprio CNJ, capitaneado à época por Cezar Peluso. O então presidente do STF não gostou quando a corregedora disse em entrevista que a magistratura tinha problemas com “bandidos que estão

escondidos atrás da toga”. A carreira na magistratura se encerrou com a aposentadoria compulsória, mas a luta pela moralização vai continuar, agora em outra frente. “Descobri que o Legislativo é o Poder mais forte da República”, diz. Pré-candidata ao Senado pelo PSB, Eliana conversou com a Gazeta do Advogado sobre as bandeiras que pretende defender. Também comentou a delicada relação entre advogados e magistrados, criticando duramente uma prática que considera deletéria para o Judiciário: parentes de ministros que se valem dos laços familiares para vender prestígio e atrair clientes. “É uma prática que precisa ser criminalizada!” Caso as urnas coloquem um mandato

legislativo em suas mãos, é bom que se

comece a considerar essa possibilidade.

Por Débora [email protected]

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Entrevista: Eliana Calmon

8 Abr 2014 - GAZETA DO ADVOGADO: A REVISTA DE QUEM PENSA DIREITO

Qual a sua avaliação do atual cenário político brasileiro? Muito confuso, em todos os poderes.

Isso porque a sucessão começou muito

cedo, o que acabou fazendo com que a

gestão pública ficasse comprometida em

razão da reeleição da presidente Dilma,

o que vem causando um grande mal ao

nosso país. Aliás, a preocupação com a

reeleição antecede um ano atrás. Até o

desenvolvimento da Copa do Mundo

ocorreu em função das questões eleito-

rais, para que coincidisse com o ano de

eleições. Este açodamento do PT ter-

minou deixando a gestão em uma situ-

ação muito dificultosa. Veja o que toda

imprensa vem falando sobre a questão

da energia elétrica: faltou gestão para

decisões político-eleitorais.

A contenção da violência nas cidades

com medidas analgésicas também é uma

forma de não criar dificuldade na eleição.

E esse ano ainda temos como complicador

o julgamento do mensalão, em que o STF

(Supremo Tribunal Federal), depois de

uma decisão histórica, voltou atrás, e

deu um novo conceito a alguns crimes,

como a formação de quadrilha, que foi

totalmente revista em menos de seis

meses. Havia um conceito de quadrilha

no processo de (Natan) Donadon, aí

veio todo um conceito novo no processo

de mensalão. A nação brasileira ficou

em perplexidade e essa perplexidade

causa muita insegurança: insegurança

jurídica, psicológica e pública também.

O momento é delicado, como todo que

antecede às eleições, porque é quando

os partidos estão fazendo as coligações,

junções, conversando, enfim. Mas esse

está ainda mais complicado por conta

desses fatores.

Esse clima de perplexidade da população terá reflexo nas urnas? Eu não sei dizer. Posso dizer que o

brasileiro está querendo que haja

mudanças. Todos os indicativos, as

pesquisas que eu venho lendo nos

jornais mostram que a sociedade

brasileira anseia por mudança. Ela não

está satisfeita com a gerência da coisa

pública. Isso é uma verdade. Nessa

gerência da coisa pública, o fiel da

balança é o Poder Judiciário, porque

quando nada mais dá certo, o cidadão

busca justiça no Poder Judiciário. E

quando esse Poder toma alguma atitude

que faz com que a população fique

descrente, desconfiada, naturalmente

há um desgaste muito grande para a

segurança geral da sociedade.

Daí porque eu acho que esse vai e volta

do STF, sem dúvida alguma, causou um

prejuízo para a credibilidade da Justiça.

Isso aí é uma contabilidade que já se

pode afirmar. Em relação ao reflexo nas

urnas, me parece que é mais um fator

de desagregação.

No caso do Judiciário, o desgaste ocasionado pela decisão do STF se soma a uma imagem já desa-creditada do Poder. Sua gestão à frente da Corregedoria foi um marco em direção à moralização. Houve avanços reais?Acho que houve um avanço. Um avanço

no sentido de que a imprensa brasileira

perdeu o medo de falar do Judiciário.

A imprensa falava com certo acanha-

mento. A partir do momento em que o

próprio CNJ abre as suas entranhas para

mostrar o que está errado – e eu me colo-

co como uma contribuinte disto, porque

acredito que na democracia tudo tem que

ser transparente – entendo que houve

um avanço. Aquele poder fechado, her-

mético, que guardava os seus pecados

sem fazer publicamente um mea culpa,

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ANO I - edição 1

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vem à tona e passa a ser também fis-

calizado pela sociedade. Nesse sentido,

houve um avanço.

O segundo ponto é que os magistrados

começam a ter um pouco mais de receio

dos órgãos de controle porque passam a

ver atuação desses órgãos, que, histori-

camente, nunca fizeram nada. Começa

a haver temor do CNJ e das correge-

dorias locais. Em nível satisfatório?

Não, é um começo! Mas eu entendo que

tudo começa assim. Começamos deva-

gar, mas quebramos um paradigma. E

é importante essa quebra de paradigma

para seguirmos adiante. Estamos longe

de ter o ideal, mas já começamos a mudar.

O corporativismo no Poder Judi-ciário ainda é uma barreira que precisa ser transposta?Sim. Toda carreira que é formada den-

tro de degraus onde temos vida funcio-

nal longa, onde existe uma progressão

e onde essa progressão ocorre a partir

dos votos dos próprios pares, tende a ser

corporativista. Tende a se fechar. Mas o

Judiciário é interessantíssimo: esse cor-

porativismo existe em uma ponta, mas

não existe em outra ponta. Por exemplo,

nós nos protegemos mutuamente, e dize-

mos que essa proteção é institucional.

Dizemos que estamos querendo prote-

ger a instituição quando, na realidade,

sabemos que a proteção maior é para

os membros da carreira, que inclusive

não tiveram a perspectiva da mudança

da sociedade brasileira, que chegou à

constituição de 1988 com um discurso

ainda de defesa de prerrogativas, e não

da instituição. Então é uma instituição

que tradicionalmente é corporativista e

isso é muito difícil mudar. Só se muda

com cultura, só se muda com o tempo,

só se muda com práticas democráticas

e o Poder Judiciário não é democrático.

Internamente ele é ditatorial.

Os membros de cúpula são eleitos pelos

próprios pares. Então, não existe de-

mocracia, porque a primeira instância

ou o juiz de piso que chega ao Judiciário

por escolha, vocação ou concurso, não

participa da eleição dos seus chefes. E

toda a vida do magistrado é ditada por

esta cúpula do Poder Judiciário. Mas no

momento em que o Judiciário começa a

discutir ingresso da magistratura pelo

Quinto Constitucional, perde um pou-

co desse corporativismo e passa a de-

fender os interesses da própria OAB.

É uma coisa muito sintomática, mas o

corporativismo ainda é um traço bem

marcante dentro do Judiciário.

“Os magistrados começam a ter um pouco mais de receio dos órgãos de controle porque passam a ver atuação desses órgãos, que, historicamente, nunca fizeram nada. Começa a haver temor do CNJ e das corregedorias locais”

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Entrevista: Eliana Calmon

10 Abr 2014 - GAZETA DO ADVOGADO: A REVISTA DE QUEM PENSA DIREITO

A senhora é favorável às eleições diretas para presidente dos Tribunais, como propõe campanha da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB)?Eu acho extremamente positiva. É um

passo muito importante que está sendo

dado. E eu vejo com muito bons olhos

a atual gestão da AMB em razão dessa

política de democratização interna que

está empreendendo. Não tenho a menor

dúvida de que trará reflexos positivos para

a sociedade, porque na medida em que te-

mos instituições saneadas e democratiza-

das, a sociedade brasileira só pode ganhar.

Qual a sua avaliação do processo eletrônico?Acho que foi um avanço grande, mas

ainda estamos muito atrasados. Tive-

mos que começar do fim para o começo,

porque do contrário, não começaríamos.

Tivemos que informatizar a Justiça

de cima para baixo quando o ideal se-

ria de baixo para cima, continuarmos

os processos físicos e, à medida que

fossem subindo aos tribunais, seriam

substituídos pelo processo eletrônico.

Mas fizemos o contrário, por causa de

estratégia de ataque a uma situação

de poucos recursos. De forma que nós

estamos ainda no meio do caminho. O

STJ já está todo informatizado, o STF

também. Mas alguns tribunais inter-

mediários ainda dependem de muita

coisa, e a base, a primeira instância, em

alguns estados está apenas engatinhando.

Existe algum planejamento no CNJ para unificar os sistemas dos tribunais?Sim. O CNJ está desenvolvendo um

projeto ambicioso e fantástico, que eu

entendo como o projeto mais importante

do CNJ atualmente em termos de gestão,

que é o chamado PJe (Processo Judicial

Eletrônico), onde o sistema é único

para toda a Justiça e gerado dentro do

CNJ. Por que é importante? Porque

hoje os tribunais pagam verdadeiras

fortunas a empresas particulares que

desenvolvem projetos e vendem ao

Judiciário. Na Bahia, que era um caos,

com três sistemas diferentes, há duas

gestões foi comprado um sistema

caríssimo, sem consultar o CNJ, e

quando o atual presidente assumiu,

verificou que o Tribunal, que já tem

recursos bastante abalados, pagava R$

1 milhão a uma empresa particular para gerir esse sistema que os juízes todos consideravam pífio. Vários tribunais fizeram a mesma coisa. Então, esse projeto vai dar a carta de alforria da Justiça em termos de processo eletrônico.

O modelo adotado para acom-panhamento dos processos eletrôni-cos não se tornou extremamente personalizado, fazendo com que grandes escritórios passem por dificuldades do ponto de vista operacional no acesso e controle das informações?Minha avaliação é que o mercado particular se queixa porque perdeu grandes clientes, que viviam prati-camente à mercê dessas empresas, porque sem o aval delas o sistema não funcionava. Não podemos ter isso nos estados, uma situação tão irregular. Se para haver gerência de uma Justiça que é imensa eu tenho que ter um siste-ma único, então, esse sistema tem que partir da própria Justiça. Advogo, sim, essa questão do PJe. Mas os grandes es-critórios não têm do que reclamar. Va-mos passar por algumas dificuldades, que não são pequenas, para ao final ter-mos um grande projeto.

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ANO I - edição 1

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Sei que no Senado são 81 senadores e eu preciso de maioria para aprovar

qualquer projeto. Acho que está na

hora de o cidadão brasileiro começar a

mudar o cenário político dessa terra. É

um pouco “sonhático”? É sim. Toda vez

que nós queremos mudar alguma coisa, é

“sonhático”. Mas esse sonho é bastante ra-

zoável e possível. De forma que estou me

lançando candidata nesse sonho. Acredito

em mudança, em quebra de paradigma.

“As pessoas buscam advogados pela proximidade que têm com julgadores. Isso é deletério! É você não acreditar na isenção da magistratura. Essa venda de ilusão precisa ser criminalizada”

Qual a sua avaliação a respeito da relação entre a magistratura e os advogados?Acho que é um relacionamento bom, não vejo como sendo estressante, mas acho que há também um relacionamen-to promíscuo, em diversos pontos e em diversos tribunais. Quando a gente bota o dedo na ferida dói. E eu costumo botar dedo na ferida. Acho que está muito embaraçada porque hoje, no momento em que nós do Judiciário começamos a combater o nepotismo, criamos um problema que talvez seja ainda maior. Tiramos os filhos e os parentes de den-tro do Poder Judiciário, estes que eram pagos pelos cofres públicos, e criamos no lugar um sistema de parentesco que está hoje na advocacia. E isso tem cau-sado um grande desgaste para a Justiça. Isto precisa ser combatido com bastante

urgência, porque está se alastrando de

uma forma extraordinária. É a advoca-

cia de filhos, mulheres e parentes que

estão fazendo prospecção de clientes

vendendo a imagem de magistrados

muitas vezes honrados, sem ter absolu-

tamente nada a ver com isso.

É uma venda velada de prestígio, uma

venda de ilusão. Eles iludem dizendo

o seguinte “eu tenho influência no

Tribunal, porque eu sou filho de A, B ou

C”. As pessoas, que já não acreditam no Judiciário, são iludidas a nomear aquele advogado. Eu digo isso porque, como magistrada, muitas vezes fui consultada por instituições ou pessoas ingênuas a respeito. Uma vez, recebi uns dirigentes muito simples, de uma associação de vinhos do Rio Grande do Sul, que me perguntaram o que eu achava deles contratarem o filho de um ministro, porque tinham sido orientados dessa forma. Se eles me consultaram e eu não tenho nenhum filho advogado, é porque

eram ingênuos. Primeiro porque eles não sabiam o que eu andava falando sobre isto. Em segundo lugar, se fossem de “esquema”, não falariam isso pra mim. Mas me deu a dimensão de como as coisas estão hoje. As pessoas buscam

advogados pela proximidade que têm com

julgadores. Isso é deletério! É você não

acreditar na isenção da magistratura. Essa

venda de ilusão precisa ser criminalizada.

A senhora se filiou ao PSB no fi-nal do ano passado e é pré-candi-data ao Senado. O que a motivou para esta guinada em direção ao Congresso?No Judiciário, eu tive uma vivência política – entendendo-se política como a arte de governar, não política par-tidária. A partir daí, eu descobri que o poder mais forte da República é o Legis-lativo, que é onde as coisas começam. É onde você começa a discutir ideias que vão se transformar em Projetos de Lei. Não é fácil. Uma andorinha só não faz verão. Mas se não tivermos a primeira andorinha para chegar a segunda, ter-ceira, quarta e formar-se um exército de andorinhas, não vamos transfor-mar esse país. Eu não estou iludida.

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Gazeta Online

12 Abr 2014 - GAZETA DO ADVOGADO: A REVISTA DE QUEM PENSA DIREITO

Nessa edição, a Gazeta traz um ensaio fotográfico do Palácio da

Justiça, antiga sede do Poder Judiciário do Rio de Janeiro. Lança-

mos aqui o desafio para que o leitor mande ‘cliques’ de outros

tribunais ou espaços que remetam à Justiça, no Brasil ou fora.

As melhores fotos serão publicadas no nosso portal e na versão

impressa. Mande para [email protected]

Vamos sortear em 28 de abril o livro “Do Outro Lado da Tribuna”, do advogado Técio Lins e Silva, perfil da nossa edição.

Para participar, basta curtir a página da Gazeta do Advogado

no Facebook. www.facebook.com/GazetaDoAdvogado

Além de ter a edição impressa na íntegra para você poder ler onde estiver, o nosso portal é atualizado diariamente com conteúdo multimídia exclusivo. Fotos, vídeos, áudios e reportagens para você se manter informado de tudo que acontece no meio jurídico.

Complemente a leitura da edição no nosso portal. Leia a íntegra do Marco Civil da Internet, aprovado pela Câmara dos Deputados e que agora segue para votação no Senado. O inteiro teor da Lei Anticorrupção, que entrou em vigor no final de janeiro, também está disponível. Ouça um trecho da entrevista exclusiva e reveladora que a ex-corregedora do CNJ Eliana Calmon concedeu à Gazeta. Acesse www.gazetadoadvogado.adv.br

Ensaio

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13Abr 2014 - GAZETA DO ADVOGADO: A REVISTA DE QUEM PENSA DIREITO

ANO I - edição 1

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Fórum de Ideias

14 Abr 2014 - GAZETA DO ADVOGADO: A REVISTA DE QUEM PENSA DIREITO

ANO I - edição 1

Abr 2014 - GAZETA DO ADVOGADO: A REVISTA DE QUEM PENSA DIREITO

Foto: Mailson Santana

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15Abr 2014 - GAZETA DO ADVOGADO: A REVISTA DE QUEM PENSA DIREITO

ANO I - edição 1

Abr 2014 - GAZETA DO ADVOGADO: A REVISTA DE QUEM PENSA DIREITO

Uma armano combate àcorrupçãoEm vigor há três meses, Lei 2.846/2013 sacode o mundo corporativo ao responsabilizar e punir empresas envolvidas em atos ilícitos

Apontado por muitos como o

principal desafio a ser vencido

pelo Brasil, o combate à

corrupção ganhou uma importante

aliada logo nos primeiros dias de 2014.

Cinco meses depois de sancionada pela

presidente Dilma Rousseff, entrou em

vigor a Lei 2.846/2013 – a chamada

Lei Anticorrupção, que responsabiliza

e pune empresas envolvidas em atos

de corrupção contra a administração

pública nacional.

Até então, em caso de flagrante em

prática ilícita, a empresa podia atribuir a

culpa à ação isolada de um empregado ou

servidor público. Diante da dificuldade de

comprovar o envolvimento da companhia

ou de seu funcionário, na prática, apenas

o servidor costumava ser punido.

A Lei muda tudo isso. Empresas en-

volvidas podem ter que desembolsar de

0,1% a 20% do faturamento anual bruto

apenas para pagar multa. Não sendo

possível calcular esse valor, a Justiça

pode determinar a quantia, que vai variar

de R$ 6 mil a R$ 60 milhões. Dependendo

do caso, a caneta do juiz pode determinar

o fechamento da empresa.

“Pela primeira vez, temos no país

uma lei voltada para sancionar a

pessoa jurídica como autora. Não

tínhamos isso. Tínhamos apenas a

possibilidade de punir a pessoa física,

mas o patrimônio da pessoa jurídica

não tinha como ser alcançado, a não

ser por um caminho muito tortuoso

e indireto, nas ações de improbidade

administrativa”, compara Jorge Hage,

ministro da Controladoria Geral da

União (CGU), berço da nova Lei.

Responsabilidade objetivaOutra inovação é a responsabilização

objetiva do acusado. Com isso, a punição

não depende mais da comprovação de

dolo ou culpa. “Basta que o fato ocorra

e que eu consiga relacioná-lo à busca de

benefício por aquela empresa que ela

responderá com seu patrimônio. A lei

vem preencher uma série de lacunas no

ordenamento jurídico brasileiro nessa

matéria”, diz o ministro.

A expectativa é que a severidade da nova

legislação mude a cultura e promova um

avanço nas boas práticas de governança

corporativa. Ao mesmo tempo em

que pune procedimentos ilícitos, a Lei

pretende estimular as boas empresas,

oferecendo atenuantes nas hipóteses

em que estas forem envolvidas em

corrupção. Caso comprovem a existência

de um programa de compliance, as penas

podem ser reduzidas drasticamente.

“Ou seja, bons códigos de ética, códi-

gos de conduta, estímulo ao empre-

gado denunciante, transparência nas

doações políticas e outras espécies

de boas práticas passam a ser atenu-

antes”, explica Hage. Na prática, a mu-

dança cultural já começa a ser sentida.

Page 16: Revista Gazeta do Advogado - 1º Edição

Fórum de Ideias

16 Abr 2014 - GAZETA DO ADVOGADO: A REVISTA DE QUEM PENSA DIREITO

“Ao mesmo tempo em que pune procedimentos ilícitos, a Lei pretende estimular as boas empresas, oferecendo atenuantes nas hipóteses em que estas forem envolvidas em corrupção”

Desde que a lei foi publicada, antes

mesmo de entrar em vigor, percebe-se

uma corrida aos escritórios especializa-

dos em compliance.

Alguns pontos ainda carecem de

regulamentação. O decreto, afirma

Hage, está pronto, aguardando apenas

definições por parte da Casa Civil, mas

sem nenhuma grande questão pendente.

O alcance será limitado ao Executivo

Federal, com exceção dos parâmetros

de atenuantes e agravantes, que terão

efeito sobre todas as esferas. Além

de ter elaborado a lei e coordenado o

decreto, a CGU vai ter competência

exclusiva para os processos que

envolvam suborno internacional.

Providências pendentesA lei torna o Brasil mais bem equipado

para o combate à corrupção, mas não

completa o quadro normativo. “Ainda

faltam duas providências fundamentais.

A primeira é a reforma política, para

que as coalizões de sustentação do

governo não precisem ser tão amplas e

diversificadas como são hoje, com o

pagamento de preços políticos altos

como os atuais. E, principalmente,

com a reforma do financiamento de

campanhas”, defende Hage.

O chefe da CGU advoga o financiamen-

to público exclusivo ou, no máximo,

combinado com pessoa física, com teto

de contribuição individual limitado a

algo em torno de R$ 1 mil a R$ 2 mil. “O

que não é possível é continuarmos com

financiamento pesado empresarial, que

significa admitir a prevalência do poder

econômico sobre o voto individual do

cidadão. Ou seja, a influência que você

exerce numa eleição e que eu exerço

é infinitamente menor que a de uma

grande empresa, de uma empreiteira

ou de um grande banco. Isso, obvia-

mente, é incompatível com o princípio

democrático de que cada homem e cada

mulher valem um voto.”

Opinião avalizada pelo juiz maranhense

Márlon Reis, diretor do Movimento de

Combate à Corrupção Eleitoral, que

motivou a criação da chamada Lei da

Ficha Limpa. Para o magistrado, enquan-

to as doações empresariais não forem

proibidas, providência que considera “ur-

gente e insuperável”, pode-se encontrar na

nova Lei Anticorrupção mecanismos para

se alcançar a punição de pessoas jurídicas

que se valerem do financiamento de cam-

panhas para atingir fins inidôneos, como

obter emendas dirigidas e fraudar proces-

sos licitatórios. “A depender-se da efetiva

aplicação dessa lei, toda a Administração

Pública será beneficiada, pois ela tende

a possibilitar a celebração de negócios

com o governo sem o comprometimento

dessa relação por vias ilícitas.”

A segunda providência ainda necessária

elencada pelo chefe da CGU é a

reforma dos códigos de Processo Penal

e de Processo Civil. “Talvez até com

alterações constitucionais, que retirem

o efeito suspensivo dos recursos

especial e extraordinário, eliminando

o excesso de recursos”, argumenta Hage.

“Hoje o advogado é até obrigado a

utilizá-los, sob risco de prevaricação na

defesa do cliente. A culpa (da protelação),

portanto, não é do advogado nem do juiz.

É de uma lei absurda, que permite tantas

possibilidades de protelação. (DD)

Foto: DL Photo/CGU

Jorge Hage, ministro-chefe da CGU: agora faltam reformas processuais e política

Page 17: Revista Gazeta do Advogado - 1º Edição

Parlatório

17Abr 2014 - GAZETA DO ADVOGADO: A REVISTA DE QUEM PENSA DIREITO

Néfi Cordeiro é o novoministro do STJOcupando a vaga deixada pelo ministro Castro Meira, que se aposentou em setem-bro de 2013, Néfi Cordeiro integra desde 3 de abril o corpo de ministros do Superior Tribunal de Justiça. Indicado pela presidente Dilma Rousseff, o ex-desembargador do Tribunal Regional Federal da 4ª Região foi sabatinado pela Comissão de Constituição de Justiça do Senado e aprovado para o cargo.

Néfi Cordeiro é natural de Curitiba, formou-se em Direito e Engenharia Civil e tem Mestrado e Doutorado em Direito pela Universidade Federal do Paraná.

Foto

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s/A

lep

Interesse na CopaAndrew Bellingall, do escritório Daniel Advogados, participou de encontro

do Institute of Trademark Attorneys (ITMA), em Londres, no mês de

março. Especialista em propriedade intelectual, o advogado falou sobre

marketing de emboscada. O interesse da discussão na Inglaterra é a Copa

do Mundo que acontece em junho no Brasil.

A propósitoRobert Daniel-Shores, também do Daniel Advogados, está na Inglaterra

para uma temporada de intercâmbio no escritório Boult Wade Tennant.

Formado pela PUC do Rio, ele tem pós-Graduação em Direitos Autorais,

do Entretenimento e da Propriedade Industrial pela Escola Superior da

Advocacia. Ao retornar de Londres, seguirá atuando na área de PI como

sócio do Daniel Advogados.

HeadhunterA Barreto Advogados & Consultores Associados, especializada em Direito do

Trabalho com foco no setor de petróleo e gás, acaba de reforçar a equipe com

a entrada do advogado José Luis Campos Xavier, que possui mais de 25 anos

de experiência na área trabalhista. Xavier foi presidente da Associação Carioca

dos Advogados Trabalhistas (ACAT), com dois mandatos de dois anos que se

encerraram em 2013 e, atualmente, é diretor da Associação Brasileira de Advo-

gados Trabalhistas (ABRAT) e membro da Comissão Permanente de Direito do

trabalho do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB).

E os negócios se expandem...O advogado chega num ótimo momento para o escritório, que teve crescimento

de 30% em 2013, conquistou grandes clientes e inaugurou uma nova filial em

Macaé, com o objetivo estratégico de agilizar os trâmites de causas trabalhistas

e de negociações coletivas na Bacia de Campos. Desde o início do ano, o es-

critório do Rio de Janeiro, que acaba de passar por uma expansão para receber

novos sócios e clientes, teve o quadro de associados dobrado.

O melhor em patentes A Revista Managing Intellectual Property (MIP) elegeu o Dannemann

Siemsen como melhor escritório de marcas e patentes do Brasil. A

cerimônia de entrega do prêmio foi realizada em março, em Londres,

Inglaterra. O escritório Dannemann Siemsen recebe esse prêmio

desde a sua primeira edição, em 1997. Criada em 1990, a Managing

Intellectual Property é uma publicação de grande prestígio que conta

com mais de 10 mil leitores ao redor do mundo, entre profissionais de

marcas, patentes e direitos autorais.

Prêmio InnovareEstão abertas as inscrições para participar do XI Prêmio Innovare. Este

ano as categorias Juiz, Tribunal, Ministério Público, Defensoria Pública

e Advocacia estão com o tema livre. Para concorrer na categoria Prêmio

Especial, profissionais graduados de qualquer área deverão encaminhar

iniciativas que já estejam em prática. O tema será “Sistema Penitenciário

Justo e Eficaz”. O objetivo é estimular contribuições válidas para o aprimo-

ramento da Justiça no Brasil, que sejam produto do exercício profissional

dos participantes.

Gostou? Participe!As inscrições podem ser feitas no site http://www.premioinnovare.com.br/

até 31 de maio. Criado em 2004, o Innovare é uma das premiações mais

respeitadas da justiça brasileira. O objetivo principal é identificar, premiar

e disseminar iniciativas inovadoras realizadas por magistrados, membros

do Ministério Público estadual e federal, defensores públicos e advogados

públicos e privados de todo Brasil, além de profissionais graduados em

qualquer área, que estejam aumentando a qualidade da prestação jurisdi-

cional e contribuindo com a modernização da Justiça Brasileira.

Page 18: Revista Gazeta do Advogado - 1º Edição

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18 Abr 2014 - GAZETA DO ADVOGADO: A REVISTA DE QUEM PENSA DIREITO

Foto: Mailson Santana

Egressa da UniverCidade, Tatiana Gomes ainda sonha

com a festa de formatura

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ANO I - edição 1

Abr 2014 - GAZETA DO ADVOGADO: A REVISTA DE QUEM PENSA DIREITO

Descredenciamento da UniverCidade e da Gama Filho adia sonhos e frustra estudantes que apostaram no apoio de instituições como o MEC e a OAB

Incertezana academiado descasoPor Nádia Mendes e Débora [email protected]

Tatiana Gomes estava no décimo período de Direito no Centro Universitário da Cidade

(UniverCidade) e já planejava a vida como advogada quando recebeu a notícia de que a instituição, juntamente com a Universidade Gama Filho (UGF), tinha sido descredenciada pelo Ministério da Educação (MEC). Com todas as disciplinas cursadas e a monografia entregue, ela aguardava apenas o lançamento das notas no sistema para obter o diploma de bacharel. A decisão do governo adiou o sonho de uma família inteira. Com emprego certo no escritório de advocacia em que estagiava e muitos planos para a esperada festa de formatura, a universitária se viu, da noite para o dia, sem trabalho, sem curso e sem apoio daqueles que, por dever, deveriam apoiá-la.

O drama de Tatiana é o mesmo de outros cerca de 12 mil estudantes

atingidos pela decisão do MEC. Em maior ou menor grau, todos reclamam do descaso com que foram tratados. Os dias que se seguiram ao descredenciamento foram um retrato de como ainda é longo o caminho da educação brasileira até que se alcance o patamar que todos esperam. No caso dos formandos do curso de Direito, o drama ganhou contornos de tragédia. Sem diploma e, consequentemente, impedidos de obter o registro na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), documento que lhes serviria de passaporte para o exercício da profissão, foram jogados no limbo.

“Queríamos muito que a OAB nos aju-dasse, que tivesse uma posição a nosso favor. Tentamos diversas vezes uma reunião com o presidente da OAB/RJ (Felipe Santa Cruz) e não tivemos uma resposta. Os alunos de Direito nos co-bram muito isso. Os conselhos regionais

de Administração, Contabilidade e Me-dicina, entre outras entidades, se mani-festaram em solidariedade à nossa luta. Já o presidente da OAB Nacional (Mar-cus Vinicius Furtado) disse que o des-credenciamento foi o melhor. Isso sem ouvir os estudantes, simplesmente baseado nas notícias divulgadas!”, indigna-se Vanessa Silva, diretora do DCE da UniverCidade.

A universitária conta que teve reunião com o presidente da Comissão de Educação da entidade, mas nenhuma medida concreta foi feita. “Nem sequer uma nota. A nossa situação é desesperadora, pois afeta a vida não só da comunidade acadêmica, mas também a dos comerciantes de Madureira, Piedade. Os funcionários estão tendo que se virar como podem, tem gente perdendo estágio. Logo a OAB, sempre tão atuante na defesa do direito alheio, mostrou-se indiferente

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20 Abr 2014 - GAZETA DO ADVOGADO: A REVISTA DE QUEM PENSA DIREITO

“Depois de estudar cinco anos para ser advogada, tive que voltar a fazer artesanato e procurar um emprego de nível médio.”

na defesa da própria categoria. Afinal, cedo ou tarde, todos serão também advogados. Alguns, inclusive, já possuem documento provisório para poder estagiar.”

Tatiana, que abre essa reportagem, é um desses casos. A universitária esta-giava em um grande escritório de advo-cacia carioca e já estava confiante que seria contratada como auxiliar jurídi-co administrativo quando soube que, sem o diploma, não poderia continuar trabalhando. Com o término do contrato de estágio, no final de fevereiro, perdeu o emprego e teve que recorrer a modos alternativos para ter uma fonte de renda.

“Depois de estudar cinco anos para ser advogada, tive que voltar a fazer arte-sanato e procurar um emprego de nível médio. Fora ter que enfrentar o precon-ceito que o aluno da UniverCidade vem sofrendo, já fui rejeitada em entrevis-tas de emprego por ser oriunda de lá. O escritório onde eu estagiava deixou as portas abertas para eu voltar quando tiver passado no exame da Ordem, mas eu gostaria de não ter tido meu trabalho interrompido. Se o certificado tivesse

saído no tempo certo, agora eu estaria trabalhando na minha área”.

No final de março, Tatiana recebeu da UniverCidade um certificado de con-clusão de curso provisório, que trouxe al-gum alívio, mas não substitui o documen-to mais importante para quem dedicou cinco anos da vida ao estudo do Direito: o diploma. “Eu sonho com a minha co-lação de grau, sou a única da família que conseguiu cursar ensino superior. Abri mão de muita coisa para me for-mar e dói ver meu filho dizendo para os amiguinhos que a mãe dele é advogada. Fui muito prejudicada e ninguém me ajudou. Merecemos pelo menos uma colação simbólica, mas queria ter uma festa igual a todos que se formaram an-tes de mim”, lamenta.

Longo processoO descredenciamento que gerou todo esse transtorno na vida de Tatiana decorre de um processo que se iniciou em 2011, quando o Grupo Galileo Educacional assumiu a mantença das duas instituições. Em maio de 2012 os alunos se organizaram e ocuparam a reitoria da UniverCidade para que as

aulas, paralisadas desde 14 de março, fossem retomadas. O pagamento de salário de professores e funcionários da instituição estava irregular desde o final de 2011 e eles só receberam o salário de março dois meses depois, quando decidiram voltar às salas de aula confiando na promessa de que os pagamentos seriam regularizados.

Além dos problemas salariais, as duas instituições enfrentavam problemas de manutenção nas instalações e escassez de materiais básicos, como papel. Logo após assumir a mantença das

Manifestação no Centro do Rio pede a federalização das

universidades descredenciadas

Foto

: Mai

lson

San

tana

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ANO I - edição 1

Abr 2014 - GAZETA DO ADVOGADO: A REVISTA DE QUEM PENSA DIREITO

FederalizaçãoNão existe qualquer amparo constitucional e legal para a contratação dos cerca de 1.600 professores e aproximadamente mil técnicos-administrativos das instituições sem concurso público. Não reconhecemos base jurídica para que cerca de 12 mil estudantes da Gama Filho e UniverCidade possam ingressar em qualquer universidade pública desconsiderando o processo seletivo em curso, o Sisu, que teve mais de 2,5 milhões de inscritos no Brasil, sendo 479.496 nas universidades públicas do Rio de Janeiro. Considerando ainda que em todas as instituições públicas do Rio de Janeiro foram oferecidas 16.740 vagas.

FiscalizaçãoA ação do MEC, por meio da Seres, estrutura-se em três funções: avaliação, regulação e supervisão das instituições e dos cursos superiores. Essas três funções estão conectadas entre si, de modo que a avaliação passa a ser o referencial básico da regulação e da supervisão. Isso significa que o MEC utiliza indicadores de qualidade das instituições e de seus cursos, gerados a partir de resultados no Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade), para subsidiar as atividades de regulação, por meio das quais o Ministério credencia e recredencia instituições de educação superior, e autoriza, reconhece e renova o reconhecimento de cursos.

Antecedentes do Grupo GalileoO MEC não tem instrumentos legais atualmente para realizar a análise previa de aquisições, fusões e alterações de controle das mantenedoras. As operações entre empresas ocorrem sem a participação ou ciência do MEC. Somente após a conclusão do negocio é que o MEC é informado para fins de registro e verificação formal da documentação. No caso, o MEC somente recebeu o pedido da Sociedade Unificada Gama Filho – mantenedora anterior – de transferência de mantença para a Galileo em novembro de 2011, sendo que o novo grupo já havia assumido a gestão da Universidade desde dezembro de 2010. Vale ressaltar que o Governo Federal apresentou projeto de lei, que tramita no Congresso Nacional desde agosto de 2012 (PL 4372/2012), que cria o Instituto Nacional de Supervisão e Avaliação da Educação Superior (INSAES) e diversos instrumentos legais, dentre eles destaca-se a previsão de necessária análise prévia de fusões e aquisições entre mantenedoras.

DescredenciamentoEm março de 2013, despacho do MEC impôs o cumprimento de uma série de obrigações pela Galileo Administração de Recursos Educacionais S/A. Na ocasião, o processo de supervisão nº 23000.017107/2011-53 foi instaurado por conta de denúncias de

irregularidades praticadas desde o início da gestão do grupo Galileo à frente da UGF e da UniverCidade. O MEC notificou a mantenedora em dezembro de 2013, mas a situação não foi regularizada. Por essa razão, foi imposta medida cautelar administrativa de suspensão das prerrogativas de autonomia das duas instituições do grupo. Foi instaurada, por iniciativa da Secretaria de Regulação e Supervisão da Educação Superior (Seres), uma Comissão Paritária composta por representantes do MEC, dos reitores das instituições, de representantes da mantenedora, do Sindicato dos Professores do Rio de Janeiro, das associações de docentes das duas instituições, da associação de pais, funcionários e alunos para a deliberação de alternativas com vistas à regularidade acadêmica da Universidade Gama Filho e Centro Universitário da Cidade. Após uma série de medidas, o MEC descredenciou em janeiro deste ano, as duas instituições.

Transferência AssistidaA Política de Transferência Assistida, insti-tuída em 2013 pelo MEC, visa assegurar para os alunos as melhores condições na continui-dade de seus estudos. A PTA é utilizada no caso de descredenciamento de instituições ou desativação de cursos. No caso da Gama Filho e UniverCidade, os editais de transferência as-sistida contemplavam a manutenção das bol-sas das antigas instituições.

Procurado pela Gazeta do Advogado, o Ministério da Educação (MEC) se pronunciou por e-mail a respeito do descredenciamento da Gama Filho e da UniverCidade. Veja os pontos principais.

AS RESPOSTAS DO MEC

universidades, o Grupo Galileo começou a fechar unidades das instituições. Na ocasião do descredenciamento, restavam apenas três campi da UniverCidade: Madureira, Ipanema e Centro e dois da Gama Filho, o tradicional campus em Piedade e um do Centro.

A primeira ação do MEC para resolver o caso veio em dezembro de 2013. Os vestibulares das duas instituições foram suspensos. Poucos dias depois, em 13 de janeiro deste ano, veio a notícia do

descredenciamento, deixando milhares

de alunos desamparados. O edital de

transferência assistida foi lançado em 23

de janeiro, mas o processo só começou

um mês depois, em 24 de fevereiro.

Sem nenhuma ajuda das entidades que

deveriam representá-lo, como o MEC e

a OAB/RJ, o estudante do 10º semestre

de Direito da UniverCidade Guilherme

Pereira resolveu agir por conta própria.

Procurou a Universidade Santa Úrsula

(USU) e realizou a transferência para

a instituição portando documentos

extraoficiais, que estavam sendo aceitos pela USU. Com a mudança, ele teve que repetir um semestre e ainda corre mais um risco: a Santa Úrsula chegou a fechar as portas em 2011 e está em processo de recuperação financeira. A instituição foi citada no Relatório Final da CPI do Ensino Superior Privado, feito pela Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj), no final de 2013. No relatório, há o pedido de que os Ministérios Públicos Estadual, Federal e do Trabalho investiguem o acordo de recuperação financeira da instituição e se o pagamento

dos funcionários está regularizado.

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22 Abr 2014 - GAZETA DO ADVOGADO: A REVISTA DE QUEM PENSA DIREITO

Guilherme está ciente dessa situação. “É uma escolha de Sofia, estou indo pelo que vai me acarretar o menor dano. Não pude esperar a transferência as-sistida do MEC. Eu tenho urgência em me formar e corria o risco de não con-seguir estudar no primeiro semestre, caso esperasse”, resigna-se. Guilherme chegou a pagar a mensalidade de ja-neiro na UniverCidade para conseguir a transferência. Ele já tem monografia publicada e precisa cursar apenas cin-co matérias para concluir a graduação. “Procurei a OAB e não obtive respostas. Como colega de profissão, estou decep-cionado com esse abandono”, reclama.

A presidente da Comissão de Ensino Jurídico da OAB/RJ, Ana Luisa Palmisciano, explica que quando soube do descredenciamento entrou com um ofício junto ao Grupo Galileo para que os documentos dos alunos fossem disponibilizados e eles conseguissem fazer a transferência. Segundo ela, não obteve nenhuma resposta das instituições. Ana Luisa também esclarece que a OAB/RJ atuou junto

ao MEC no processo de transferência assistida, iniciado em 24 de fevereiro. “A ação da OAB/RJ foi coletiva, englobou diversas comissões. Recomendo aos alunos que tenham algum problema que formalizem as demandas perante a Ordem que, na medida do possível, mediaremos os conflitos”.

Thiago Valentim já deveria estar ad-vogando, se não fosse pelo descre-denciamento. Aprovado no X Exame de Ordem, quando ainda cursava o 9º semestre na Gama Filho, ele obteve uma documentação errada da universidade e com isso não conseguiu se inscrever na OAB. Com duas disciplinas pendentes para serem lançadas no sistema, ele está sem saber o que fazer. “Não sei se terei que me matricular na Estácio, vencedora do Processo de Transferência Assistida, e voltar alguns semestres ou aguardar a emissão de documentos pela Gama Filho, o que é incerto”, desabafa.

Ainda segundo Ana Luisa Palmisciano, a OAB/RJ realizou uma audiência pública no ano passado sobre o Ensino Jurídico

Em reunião com representantes do Núcleo de Defesa do Consumidor (Nudecon) da Defensoria Pública do Rio de Janeiro; do MEC; da comissão de estudantes da UGF e da UniverCidade e dos vice-reitores da Universidade Estácio de Sá e da Universidade Veiga de Almeida, ganhadoras do PTA, ficou decidido que os alunos graduados pelas instituições descredenciadas e que não conseguem retirar o diploma por meio do Grupo Galileo poderão receber o diploma pelas duas universidades. O MEC deve editar uma portaria autorizando a Estácio e a Veiga de Almeida a entregar os diplomas e colar grau dos alunos.

Mais pertodo diploma

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ANO I - edição 1

Abr 2014 - GAZETA DO ADVOGADO: A REVISTA DE QUEM PENSA DIREITO

GALILEO CONTRA-ATACA E QUER INDENIZAÇÃO

O Grupo Galileo Educacional refuta decisão do MEC de descredenciar as duas instituições e reivindica na Justiça R$ 6,91 bilhões em reparação por danos materiais. Por meio da assessoria, o grupo contestou o argumento de baixa qualidade de ensino, alegando que a Gama Filho recebeu conceito 3 no Índice Geral de Cursos em 2012. Além disso, uma proposta de reestruturação já estaria sob análise do Ministério.

A ação na 5ª Vara de Justiça Federal tem como réus a União, os ministros José Henrique Paim Fernandes (Educação) e Aloizio Mercadante (Casa Civil) e o secretário de Regulação e Supervisão da Educação Superior do MEC, Jorge Rodrigo Araújo Messias. A Galileo sustenta que o MEC, por meio de julgamento sumário, de natureza discricionária, em menos de 30 dias da abertura de processo administrativo, proferiu “decisão desproporcional e demasiadamente gravosa” contra a UGF e a UniverCidade. O descredenciamento foi anunciado em janeiro, com o semestre ainda em curso.

“O cálculo da indenização foi feito com base nas mensalidades dos cursos, considerando uma projeção futura de 15 anos de perda de receitas. O ato de descredenciamento destruiu duas instituições de ensino superiores históricas e provocou o desemprego de 2.600 pessoas”, sustenta a Galileo, lembrando que a Gama Filho tem 75 anos de existência. A causa é defendida pelo escritório MCP Peixinho, Cacau & Pires Consultores e Advogados Associados.

no Rio de Janeiro. Na ocasião, profes-

sores de diversas instituições de ensino

superior privadas reclamaram de recor-

rentes atrasos de salário. “Recomen-

damos ao MEC que no momento da

renovação dos cursos de Direito que a

regularidade de pagamento dos profes-

sores fosse levada em conta”.

Dúvidas sem fimA transferência assistida foi a maneira encontrada pelo MEC para acomodar os estudantes prejudicados pelo descredenciamento. Mas, segundo

Vanessa Silva, do DCE da UniverCidade,

os alunos não ficaram satisfeitos com

essa medida. Vanessa relata que

apenas as bolsas subsidiadas pelo

governo federal, como Prouni e Fies,

estão garantidas. As bolsas que eram

oferecidas pela Gama Filho e pela

UniverCidade precisam ser aceitas

pela instituição de destino. “E como

ficou quem era filho de funcionário?

Ou funcionário? Quem tinha bolsa de comunidade? Essas pessoas terão que pagar a mensalidade da nova instituição ou parar de estudar, se não possuírem condições de arcar com a mensalidade da Veiga de Almeida ou da Estácio”, ressalta.

Além disso, outro problema apontado pelos alunos na transferência assistida diz respeito à análise da grade curricular. Alguns estudantes de final de curso que já tinham sido aprovados na monografia foram obrigados pela nova instituição a refazer matérias e, até, a própria monografia. “Algumas mensalidades não foram mantidas e a análise da grade nada mais é do que uma forma de nos fazer pagar mais mensalidades. Apesar de não ser uma obrigação da instituição aceitar a nossa grade e manter a mensalidade, seria o mínimo que o Ministério poderia fazer para ‘justificar’ a sua incompetência”, reclama Vanessa.

Desde que tomaram ciência do descre-

denciamento, os alunos das duas insti-

tuições fizeram diversas manifestações

pedindo um posicionamento do MEC.

Eles chegaram, inclusive, a ir a Brasília,

de onde foram expulsos do gramado

do Senado Federal pela Polícia Militar

do DF, embora trabalhadores rurais

sem-terra estivessem acampados a

poucos metros dali. Eles clamavam por

soluções rápidas para que não ficassem

sem frequentar aulas e atrasassem mais

ainda o curso.

Outra pauta defendida pelos estudantes

é a federalização, que consiste em que o

Centro Federal de Educação Tecnológica

Celso Suckow da Fonseca (Cefet-RJ),

instituição que possui cursos de graduação

mas não é considerada uma universidade

federal, se torne a Universidade de

Ciências Aplicadas do Rio de Janeiro

e encampe os alunos, professores e

funcionários da UniverCidade e da Gama

Filho. O projeto da Ufcarj foi apoiado pelos

reitores das universidades federais do Rio

de Janeiro, pela bancada dos deputados

do estado na Câmara e, claro, pelos

estudantes. Mas o Ministério rejeitou a

proposta e concentrou todos os esforços

na transferência assistida.

Foto: Valter Campanato/Agência Brasil

Em Brasília, universitários são expulsos do gramado do Congresso

Nacional em protesto contra o descredenciamento

Page 24: Revista Gazeta do Advogado - 1º Edição

Ensaio

24 Abr 2014 - GAZETA DO ADVOGADO: A REVISTA DE QUEM PENSA DIREITO

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ANO I - edição 1

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Passeiopela JustiçaInaugurado em 1926 para abrigar a sede do Poder Judiciário do Rio de Janeiro, enquanto Distrito Federal do país, o Palácio da Justiça foi totalmente reformado em 2010 e hoje abriga o Museu da Justiça. Situado no centro da cidade, o imponente prédio chama a atenção por sua grandiosidade e também pelos detalhes. Fotos: Mailson Santana

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Carreira

26 Abr 2014 - GAZETA DO ADVOGADO: A REVISTA DE QUEM PENSA DIREITO

De olho na RedeCresce a procura por especialista emDireito Digital, que deve aumentar como recém-aprovado Marco Civil

Por Nádia [email protected]

Foto: Mailson Santana

Sites de relacionamento, compras coletivas, e-commerce, aplica-tivos. A presença da internet

na vida do brasileiro é constante. Se-gundo pesquisa divulgada em 2013 pela Federação Brasileira de Bancos (Febraban), 39% das transações bancárias são feitas pela Rede, o que faz da modal-idade a preferida dos brasileiros; diversos cursos, tanto de graduação quanto de especialização, em instituições brasilei-ras e estrangeiras são oferecidos on-line. Para atender essa sociedade tão inserida no ambiente virtual, o estudo do Direito precisou se adaptar. A área Digital vive uma constante expansão e o advogado especialista se torna indispensável.

Apesar de todos os avanços, a inter-net ainda não é considerada um ambi-ente totalmente confiável. A Secretaria de Comunicação da Presidência da República (Secom) apresentou uma pesquisa sobre os hábitos de con-sumo de mídia pelos brasileiros, e a internet foi considerada por 53% como a fonte de informação menos confiável. Em relação aos jornais im-pressos esse número cai para 39%, sendo estes considerados a fonte de informação mais confiável.

Esse ambiente ainda pouco conhecido e em constante mutação faz com que o advogado especialista seja cada vez

mais procurado por pessoas e empre-sas que querem assessoria. Segundo a especialista em Direito Digital Patrícia Peck Pinheiro, o campo de atuação é vasto. “Alcança quase tudo do dia-a-dia de instituições e indivíduos já inseridos neste contexto de realidade de vida dig-ital. Vai do internet banking às eleições digitais, passando pelas questões sobre direitos de transmissão dos jogos da Copa na internet”, explica.

O advogado que deseja se especializar em Direito Digital tem que ter uma visão de mundo sem fronteiras. “É o up-grade do Direito como um todo, é trans-versal e multidisciplinar, e não uma área do Direito apenas. Abrange todas as áreas do Direito Civil, Criminal, Constitucional, Trabalhista, Tributário, Ambiental, etc.”, esclarece Patrícia. São poucas as graduações que têm em suas grades disciplinas específicas de Direito Digital ou que inserem essa discussão nos cursos. Para Patrícia, é preciso que o conteúdo programático da graduação seja revisto. “Hoje o aluno formado em Direito já sai da faculdade desatualizado. Como o advogado tem aula de Medici-na Legal, mas não de como coletar uma prova eletrônica da forma correta para garantir integridade, autenticidade e valor legal no Judiciário?”, indaga.

“O advogado que deseja se especializar em Direito Digital tem que ter uma visão de mundo sem fronteiras.”

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ANO I - edição 1

Abr 2014 - GAZETA DO ADVOGADO: A REVISTA DE QUEM PENSA DIREITO

Como é uma área relativamente nova, ainda não existem muitas leis espe-cíficas. A Lei 12.737/2012 sobre crimes na internet, a chamada Lei Carolina Dieckmann, é pioneira. O Código Penal foi alterado para que condutas no am-biente digital fossem classificadas como infrações e tivessem penas atribuídas. Mas, ela abrange apenas uma parte do vasto ambiente compreendido pelo Di-reito Digital, pontos sobre privacidade, roubo de conteúdo e invasão de com-putadores, principalmente. “Aplicamos muito a legislação em vigor não ape-nas no Brasil, mas em outros países, princípios de Direito Internacional Pú-blico e Privado, Tratados e Convenções Internacionais. Mas em geral, a Socie-dade tem resolvido muitas questões aplicando mais contratos, ou seja, re-grando as condutas nos casos práticos de forma mais direta, em conformidade com princípios gerais de Direito e de Ética”, acrescenta Patrícia.

Para o profissional que deseja ingressar

na área o conselho é um só: estude.

“Foco, foco, foco! Tem que estudar

muito e ter determinação”, aconselha

Patrícia, que traça as dificuldades e

desafios de quem deseja se tornar um

advogado especialista. “O primeiro é

conseguir trabalhar em um escritório de Direito Digital, que são poucos. Segundo, o desafio cultural, onde ainda parece que a área seria um modismo. Mas é um mercado em expansão. Eu abri o escritório há 10 anos, em 2004, hoje já somos 25 profissionais com mais de 900 clientes. Tem bastante espaço para gente jovem, inovadora, com vontade de quebrar paradigmas, que tenha profundos conhecimentos técnicos e jurídicos.”

Há 30 anos, Sonia Ferraz trabalha com

Direito Autoral, 15 dos quais com

Direito Digital. Ela se especializou

em Direito Eletrônico pela Fundação

Getúlio Vargas (FGV) e em Relações de

Consumo pela PUC-Rio, há mais de dez

anos. “Minha tese foi sobre o Tribunal

Digital, um tribunal que resolva os

conflitos de direitos autorais no próprio

ambiente da internet. Quando eu falava

disso há dez anos, meus colegas falavam

que eu era louca, mas o futuro será

esse. O comportamento de consumo

mudou. Antes de comprar alguma

coisa, o consumidor checa na internet

e vai direto ao produto. E ainda existe

o e-commerce, um segmento que está se

multiplicando todos os anos”, ressalta.

Sônia acredita que o mercado tende a

se expandir cada vez mais, principal-

mente com a aprovação do Marco Civil

da Internet pela Câmara dos Deputa-

dos e que agora segue para o Senado.

“Sou a favor dos três pilares na internet:

neutralidade, privacidade e liberdade

de expressão. É preciso que os direitos

autorais sejam respeitados na internet.

É preciso que haja esse controle. Quando

uma pessoa publica algo pejorativo sobre

outra, ela pode acabar com a vida de al-

guém. Ela precisa ser responsabilizada

pelos atos na internet na mesma forma

que é na vida real“. Sônia ressalta a im-

portância da consultoria de um advo-

gado especialista em Direito Digital

para as empresas.

“Atendi um cliente em um caso de vio-

lação do direito da imagem e a empresa

que utilizou a imagem dele indevida-

mente teve que pagar R$ 100 mil reais.

Isso pode quebrar uma empresa. Por isso

é preciso que exista um advogado espe-

cialista acompanhando as empresas, para

que elas não acabem indo à falência por

conta de processo de violação de direito à

imagem. É muito sério isso”.

Pós-graduação em Direito Digital: Universidade Estácio de Sá | Carga Horária: 380h/a (360h/a, à distância + 20h/a presenciais)

Inscrições em: www.posestacio.com.br/

Extensão em Direito Eletrônico: Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro | Carga Horária: 48 h/a, presencial, iniciado em

1º de abril | Curso ministrado no Rio de Janeiro, às terças e quintas-feiras, das 18h30min as 21h30min

Informações: www.emerj.tjrj.jus.br/

Extensão em Direito Digital: Escola Paulista de Direito | Carga Horária: 32h/a. | Curso ministrado em São Paulo

Informações: [email protected]

Especialização em Direito Digital e das Telecomunicações: Universidade Presbiteriana Mackenzie | Carga Horária: 416 h/a

(384 h/a presenciais em três semestres + 32h/a à distância) | Curso ministrado em São Paulo, às terças e quintas-feiras, das 19h às 22h30

Informações: [email protected]

ESPECIALIZE-SE

Page 28: Revista Gazeta do Advogado - 1º Edição

Perfil: Técio Lins e Silva

28 Abr 2014 - GAZETA DO ADVOGADO: A REVISTA DE QUEM PENSA DIREITO

A trajetória de uma carreira marcada pelos anos de chumbo

Era 1964 e, na cabeça do jovem

filho de uma família de grandes

juristas, seria apenas o ano do

ingresso na Faculdade Nacional de

Direito, com aquele vigor que todo

calouro já experimentou algum dia. Um

mês após do início das aulas, porém,

o diretório acadêmico foi fechado;

seus dirigentes, perseguidos e vários

professores, cassados. Era o início do

golpe militar, que marcaria para sempre

a história do Brasil e do jovem Técio

Lins e Silva, que anos depois se tornaria

um dos mais respeitados advogados

criminalistas do país.

“Foram tempos muito difíceis. Tivemos que recorrer a Mandado de Segurança, munidos de medida liminar concedida pela Justiça para estudar”, recorda Lins e Silva, que recebeu a Gazeta do Advogado

no elegante escritório instalado há 80 anos no coração do Rio de Janeiro pelos irmãos Raul, Evandro e Haroldo Lins e Silva – respectivamente, pai e tios do advogado.

Quase 50 anos após sua estreia no júri – a primeira vez foi em 1965, ainda como acadêmico – Lins e Silva demonstra a mesma paixão ao falar de sua atuação profissional. Ainda na época do vestibular, começou a trabalhar com o pai. Com o golpe, passou a auxiliá-lo na defesa dos perseguidos políticos. Foi nessa condição que começou a percorrer presídios, a polícia política, as auditorias militares e os tribunais. A morte prematura do pai, aos 54 anos, durante cirurgia cardíaca em 1968, o lançou de vez no mercado de trabalho. Em um movimento natural, o jovem acadêmico herdou a clientela de perseguidos.

De volta a 1964, no dia 1º de abril, o advogado estava defendendo o célebre Centro Acadêmico Cândido de Oliveira (Caco) da ameaça de invasão, a exemplo do que acabara de acontecer com a União Nacional dos Estudantes (Une). Os alunos mantinham-se em vigília cívica para defender o prédio, o mesmo que abrigou o Senado no tempo do Império, até que este fosse transferido para o Palácio Monroe, derrubado pela ditadura para que por ali passasse o metrô. “Algo inimaginável hoje em dia”, ressalta, com a indignação de quem via na construção algo “magnífico”.

“Fomos salvos por tropas legalistas do exército. Um tanque dirigido por um tenente fiel ao governo instituído nos salvou. Obviamente ele foi punido com cadeia depois”, recorda. O Caco acabou fechado e os estudantes que dirigiam o centro acadêmico foram denunciados como autores de crimes contra a segurança nacional, inicialmente numa vara criminal do Rio. Depois, com o Ato Institucional 2, foi deslocado para a auditoria militar, que funcionava em frente à faculdade. Os estudantes acabaram sendo beneficiados por um habeas corpus do Tribunal Militar, o Caco foi reaberto e Lins e Silva, alçado um pouco mais tarde à vice-presidência do centro. Até que, em 1968, o AI-5 inaugurou o período mais sombrio da ditadura e fechou as portas do Caco outra vez.

Durante 20 anos, o advogado atuou em quase todos os processos políti-cos do Rio de Janeiro. Destes, um dos mais espetaculares foi o do congres-so “clandestino” de Imbiúna, com 800 réus. “Tinha que fazer no Maracanã, no Municipal!”, brinca. “Oitocentos meninos fazem um congresso numa ci-dadezinha do interior e chamam isso de

Foto: Assessoria IAB

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clandestino”, ironiza. O processo aca-bou desmembrado e nunca se encerrou. Mesmo destino teve o IPM da UNE, com 2 mil indiciados. “Era tão volumoso que não podia subir para o STM, porque se subisse, o prédio cairia. Então, ficava no Arsenal de Marinha”, conta.

Fora isso, lembra, houve outras centenas de processos, “quase todos com muita dor”. “A partir de 1968, todos os réus foram torturados.” Foi o caso de um cliente que integrava a Aliança Libertadora Nacional (ALN) capturado pelo temido delegado Sérgio Fleury, chefe do Dops. Depois de ficar preso em uma casa em São Conrado, foi levado para a Ilha das Flores. “Ele foi torturadíssimo. Não morreu por milagre.” Na época, a pena mínima para preso político era a prisão perpétua; a máxima, a morte. “Eu ganhei, porque ele foi condenado à prisão perpétua!”

Lins e Silva considera que o papel da advocacia do Rio de Janeiro foi fundamental para que o Tribunal Militar agisse de uma forma garantista. A Justiça Militar, aliás, é apontada pelo advogado como um freio para os desmandos da farda, contendo a violência por meio de habeas corpus. Não por acaso, o remédio jurídico foi suspenso depois do AI-5.

Apesar de toda truculência dos militares, ele afirma que os advogados eram mais respeitados que hoje. “Era inimaginável não ser recebido por um oficial general, ministro do Tribunal Militar, para en-tregar um memorial. Hoje, o presiden-te do STF não recebe advogado! Ele e outros.” Uma postura que ele atribui ao preconceito e ao que chama de entulho ideológico ainda existente no inconsci-ente do Judiciário. “Essa coisa de ter ódio da liberdade, de ter medo do cidadão. Por

Em 1970, na posse deNelson Barbosa Sampaio, no STM

Ao lado de Sobral Pinto, o Sr. Justiça.

Foto: Arquivo Pessoal

Foto: Arquivo Pessoal

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Perfil: Técio Lins e Silva

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pode ficar solto. Mas a Justiça Brasileira usa como elixir paregórico, como remé-dio para todos os males.”

Lins e Silva também não poupa o julga-mento da ação penal 470 – o processo do mensalão. Para ele, o STF feriu um princípio básico, que é o do juiz natu-ral, ao avocar o julgamento de réus sem prerrogativa de foro. “O juiz natural existe para evitar o julgamento casuísti-co. O Supremo violou esse princípio. Mas a quem reclamar? Só se for ao Papa”, brinca. Sem economizar adjetivos, criti-ca a espetacularização dos julgamentos, especialmente depois que a TV Justiça passou a transmiti-los ao vivo.

Para falar da experiência como membro do Conselho Nacional de Justiça, que considera magnífica, parafraseia o líder cubano José Martí, que viveu nos Estados Unidos. “Agora posso dizer que ‘conheço o monstro por dentro, vivi em suas entranhas’”, diz, em uma

referência ao Poder Judiciário.

Recém-eleito presidente do Instituto dos

Advogados Brasileiros (IAB), Lins e Silva

quer que a Casa atue em parceria com o

Congresso, especialmente em uma legis-

latura que vai debater grandes questões,

como a reforma dos códigos. “O IAB é

a academia da advocacia. Lá está o que

há de melhor na cultura jurídica do país.

Caberá a mim fazer com que essa in-

teligência e essa cultura sejam colocadas

à disposição da nação. Se eu conseguir

isso, posso me aposentar.”

que a advocacia é forte? Porque temos o monopólio da representação. Para chegar à Justiça, o cidadão tem que ter um advogado. Não sei se não gos-tam do povo, se não gostam do ci-dadão...”, provoca.

Preconceito que passa pela discussão a respeito do próprio acesso à Justiça e, também, do despreparo de parte da magistratura. A ditadura – novamente ela – abriu cursos indiscriminada-mente. Hoje o que se vê é uma quantidade enorme de instituições sem biblioteca ou de professores sem boa formação. Por isso, Lins e Silva é um defensor do exame da OAB, que acaba funcionando como um filtro. A magistratura, porém, não tem a obrigação de passar por ele, já que o con-curso público exime juízes da necessidade de ter registro como advogado.

Outra queixa aos novos tempos é a dificuldade de acesso ao preso. “Eu visitei preso na Vila Militar, nos

presídios do Exército, na fortaleza de Santa Cruz. Hoje você não fala com o preso pessoalmente, de forma reservada. Hoje tem um telefone, que é passível de interceptação.” Sobre o argumento de que a medida existe para coibir a associação de advogados com o crime organizado, é taxativo. “Então ele precisa ser investigado, denunciado e a OAB que casse sua carteirinha.”

Ex-secretário de Justiça do Rio de Janeiro, Lins e Silva não poupa críticas ao sistema carcerário. “O ministro da Justiça (José Eduardo Cardozo) diz que é medieval. Eu diria que ele está sendo condescendente: é da idade da pedra. É produto de um descaso cultural da sociedade que acha que bandido tem que morrer.” A má vontade política, argumenta, teria como razão o fato de que condenados perdem seus direitos políticos. Em outras palavras, preso não dá voto. “Com um eleitorado de meio milhão de pessoas, se houvesse uma emenda constitucional dizendo que todo preso deve votar, talvez houvesse alguma reforma.”

Apelo MidiáticoSobre as reformas, aliás, Lins e Silva critica as alterações feitas no projeto de Reforma do Código de Processo Penal pelo Senado. Integrante da comissão que elaborou a proposta, ele lamenta a retirada da diminuição da pena para o furto simples do texto. “Se soltássemos 60% dos presos, não haveria qualquer reflexo na segurança da sociedade. É um contingente gigantesco de pobres, desvalidos, miseráveis que comentem furtos sem violência”. Mas o Congres-so, pondera, estaria agindo sob ape-lo midiático. O mesmo acontece em relação à maioridade penal. “A privação da liberdade deveria ser para quem não

Ouça o áudio e conheça a íntegrada entrevista no nosso portalwww.gazetadoadvogado.adv.br

Instalação do STM, em plena ditadura

Foto: Arquivo Pessoal

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Opinião: Fernando Fragoso

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Opinião: Fernando Fragoso

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Os dilemasdo Processo JudicialEletrônico

O acesso à justiça é um dos mais importantes direitos conferidos à cidadania pela Constituição

Brasileira. No entanto, ele deve ser com-preendido não somente como um direito do cidadão submeter um lití-gio à apreciação do Poder Judiciário, mas, principalmente, como o direito de que sua questão seja julgada com eficiência, qualidade e rapidez.

A crise do Poder Judiciário tem sido tema de inúmeros encontros técnicos realizados nos últimos vinte anos. Lembro-me bem de ter promovido, em 1987, a VIII Conferência da OAB do Rio de Janeiro, quando exercia o cargo de vice-presidente do Conselho Seccional. O tema central era “Justiça e Injustiça”, e tratava da Reforma do Poder Judiciário logo em seu primeiro painel. Pois a crise subsiste, e hoje está acrescida de novos e terríveis componentes: o Processo Eletrônico e o peticionamento eletrônico. Não é de hoje que a população e a advocacia que a representa demonstram

descontentamento com o Judiciário

brasileiro. Além da morosidade, o

alto custo das despesas processuais

dificulta e, até impede, que a justiça

seja acionada. Os tribunais estaduais

têm crescido significativamente o

número de seus magistrados, enquanto

que os Regionais Federais e o Superior

Tribunal de Justiça resistem em crescer,

permanecendo com um quadro de 30

juízes cada um, preferindo aumentar o

número de funcionários e assessores do

que ampliar a quantidade de julgadores.

Com isso, obviamente, a Justiça Federal,

os cinco Tribunais Regionais Federais e

o STJ estão inviáveis.

Nesse contexto, surgiu a lei federal

que instituiu o Processo Eletrônico

(L. 11419/2006). Os anos se passaram

e pouco se fez para que os tribunais

brasileiros adotassem equipamentos

e programas de computador capazes

de administrar o processo eletrônico.

Os advogados deveriam aprender a

lidar com um programa de processo

eletrônico distinto em cada corte, o que dá a dimensão do problema causado à cidadania para o simples exercício do direito de peticionar e estar em juízo. O sistema cai, os sites ficam indisponíveis e a recepção de petições e documentos através da internet sempre enfrenta problemas. Em certo momento, vários tribunais passaram a exigir que todas as petições sejam apresentadas pelo sistema de pe-ticionamento eletrônico. Uma autêntica e legítima revolta eclodiu na advocacia brasileira, iniciando uma campanha junto ao Conselho Nacional de Justiça, no sentido da unificação dos sistemas de todos os tribunais.

É evidente que advogados idosos e profissionais mais pobres da capital e do interior vêm sofrendo enorme obstáculo ao exercício profissional, não apenas pela insuperável dificuldade de aprender cada um dos sistemas dos mais de 50 tribunais do país, como ainda adotarem equipamentos e conexões com a internet hábeis.

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Abr 2014 - GAZETA DO ADVOGADO: A REVISTA DE QUEM PENSA DIREITO

“Informatização do sistema é inevitável, mas ainda é muito cedo para avaliar se será a solução para os problemas”

No último dia 3 de fevereiro, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) passou a tratar exclusivamente do sistema que se denominou Processo Judicial Eletrônico (PJe) concebido no âmbito da Justiça do Trabalho como paradigma para o país, buscando enfim o objetivo de dar maior agilidade aos atuais 90 milhões de processos em andamento.

O sistema está sendo utilizado em 37 tribunais e seções judiciárias. Em alguns locais os resultados começam a animar, reduzindo o tempo de tramitação em até sete vezes. Segundo o Tribunal Superior do Trabalho, onde atualmente 75% dos processos tramitam pela via eletrônica, o tempo de duração de uma demanda caiu 14% nos últimos três anos.

O problema é que, ao que tudo indica, o sistema não funciona da mesma forma em todas as regiões. O Rio de Janeiro é o Estado que concentra o maior volume de processos trabalhistas instaurados. São 130 mil processos digitalizados. Com esse volume, os problemas no sistema opera-cional são constantes.

Mas essas não são as únicas polêmicas. O acesso ao sistema também representa um problema. A decisão do CNJ obriga os cerca de 700 mil advogados brasileiros a terem certificação digital, mesmo permanecendo os diferentes sistemas dos tribunais do país. A meu ver, essas são exigências preocupantes e que extrapolam a previsão legal.Se por um lado, o objetivo é buscar uma solução única e gratuita, por outro, ela pode ser considerada mais um obstáculo ao acesso à justiça, já que muitas regiões não estão aptas a receber o processo eletrônico, pela própria falta de infraestrutura de serviços de internet, que na maioria das vezes são lentos e instáveis. Em algumas cidades brasileiras,

não há sequer banda larga. Os sites dos tribunais também sofrem constantes

panes, motivo que faz imaginar o pânico

em que se encontra um advogado

precisando peticionar no último dia do

prazo processual. As petições impressas,

no entanto, não são aceitas.

Impossível defender que a exigência de

habilidades técnicas seja juridicamente

correta. O cidadão brasileiro é o

verdadeiro usuário da Justiça, tendo, em

seu advogado, o principal recurso para

chegar até ela. Apesar de o processo

digital ser um caminho importante, o

universo jurídico brasileiro continua

analógico. Justamente por isso, acredito

que o avanço do processo eletrônico

deva ser progressivo, respeitando

as peculiaridades de cada região.

Exigir que um habeas corpus que

busca liberdade de uma pessoa deva

ser inevitavelmente interposto por

peticionamento eletrônico é algo que

agride a consciência.

É inadmissível que se exija exclusividade

de acesso por meio eletrônico, sem

que o Poder Judiciário ainda tenha

implantado a harmonização dos

sistemas em uso. Diversos organismos

da advocacia, inclusive o Instituto

dos Advogados Brasileiros, têm se

manifestado nessa direção. Para

alcançarmos uma utilização eficiente

do sistema é preciso que o Judiciário

adote regras padronizadas para todos

os segmentos de justiça e elabore um

modelo operacional único nos tribunais

de todo o país. Ano passado encaminhei

um ofício ao presidente do Tribunal

Superior do Trabalho protestando contra

a distribuição de ações trabalhistas

exclusivamente por meio eletrônico.

Buscando a união de forças com o

Conselho Federal da Ordem e a OAB/RJ,

apresentamos nossa posição em relação à

dificuldade de acesso.

A informatização do sistema é inevitável,

mas ainda é muito cedo para avaliar se será

a solução para os problemas enfrentados

pelo Judiciário brasileiro. Não é possível

implantá-la de forma imediata e sem

preparação prévia, como está sendo feito

e exigido da advocacia. Há que se cumprir

fase experimental para que os advogados

possam se preparar para a nova realidade.

Não adianta dizer que a lei existe há oito

anos, se os tribunais ainda não estão em

condições de exigir conduta processual

eletrônica. Como serviço público

destinado à solução de conflitos entre os

cidadãos, o acesso deve ser amplo, como

garante a Constituição Federal. O processo

eletrônico precisa ser uma ferramenta

acessível, e não mais um obstáculo no

caminho para a justiça.

Fernando Fragoso,presidente do Instituto dosAdvogados Brasileiros (IAB)

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Charge

34 Abr 2014 - GAZETA DO ADVOGADO: A REVISTA DE QUEM PENSA DIREITO

Frases“A dor que nós sofremos, as cicatrizes visíveis e invisíveis que ficaram nesses anos podem ser suportadas e superadas porque hoje temos uma democracia sólida e podemos contar nossa historia.”

“Havia um conceito de quadrilha no processo de (Natan) Donadon, aí veio todo um conceito novo no processo do mensalão. A nação brasileira ficou em perplexidade e essa perplexidade causa muita insegurança.”

Dilma Rousseff, ao comentar o período da Ditadura Militar em evento no Palácio do Planalto

Eliana Calmon, ex-corregedora nacional de Justiça

“A influência que você exerce numa eleição e que eu exerço é infinitamente menor que a de uma grande empresa, de uma empreiteira ou de um grande banco.Isso, obviamente, é incompatível com o princípio democrático de que cada homem e cada mulher vale um voto.”

Fernando Fragoso, ex-presidente do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB)

“O processo eletrônico precisa ser uma ferramenta acessível, e não mais um obstáculo no caminho para a Justiça.”

Jorge Hage, ministro-chefe da Controladoria Geral da União (CGU), ao justificar a necessidade de reforma política

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