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A totalidade dos homens Um serviço de comunicação universal é possível? Por Jorge Pereira Filho Público x Governamental Conselheira Ana Fleck fala sobre o ”valor-notícia” da EBC Curadoria Crônica de Felipe Berlim narra a vida de um homem sem imaginação O desafio das diferentes vozes para a comunicação pública Edição nº 6 - Fevereiro 2016 Reportagem PESO DA DIVERSIDADE

Revista do Conselho Curador - 6ª edição

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Publicação semestral do Conselho Curador da Empresa Brasil de Comunicação (EBC)

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A totalidade dos homensUm serviço de comunicação universal é possível? Por Jorge Pereira Filho

Público x GovernamentalConselheira Ana Fleck fala sobre o ”valor-notícia” da EBC

CuradoriaCrônica de Felipe Berlim narra a vida de um homem sem imaginação

O desafio das

diferentes vozes para a comunicação pública

Ediçã

o nº

6 -

Feve

reiro

201

6

Reportagem

PESO DA DIVERSIDADE

2 Empresa brasil de comunicação

editorial

Diferença, diversidade, pluralismo - são termos sempre presentes quando o tema é garantir uma comunicação pública que reflita a sociedade brasileira. Se a priori é simples entender a importância de contemplar estes conceitos em nosso dia a dia, na prática de produção de conteúdos e de gestão de pessoas, refletir a sociedade é um pouco mais complexo.

Dar voz a quem não tem voz, ou, buscar ouvir uma quantidade de fontes que equilibre o discurso propagado? É simples definir qual deve ser a prioridade da Empresa Brasil de Comunicação enquanto empresa responsável por gerir duas emissoras de televisão, noves de rádio, duas agências de notícias e um Portal web?

Nosso (des)conhecimento e a amplitude do potencial inexplorado quando o tema é diversidade será o tema da matéria principal desta 6ª Edição da Revista do Conselho Curador. A repórter Priscila Crispi ao longo da reportagem se debruça na multiplicidade de características dos produtos da EBC, a partir de uma abordagem sobre a representação social e cultural nos veículos de comunicação e o papel da comunicação pública e seu jornalismo. A matéria traz entrevistas com a diretora de jornalismo da BBC World Service, Nikki Clarke, com o pesquisador Muniz Sodré, com a secretária da Diversidade Cultural, do MinC, Ivana Bentes, além de representantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, MST, do Coletivo Intervozes, de funcionários da casa e diretores da EBC. Temas como diversidade e minorias, metas para representação, pluralidade no jornalismo, disputas sociais pelo simbólico e diversidade no corpo funcional trazem a reflexão de quais caminhos a empresa pública de comunicação pode buscar para garantir uma identidade diversa em sua produção de informação.

Ainda nessa edição, uma retrospectiva dos trabalhos do Conselho Curador em 2015; na coluna dos trabalhadores, a descrição de um episó-dio de racismo já sofrido por um empregado dentro da própria empresa; na editoria “Programação em Debate” o tema é flexibilização, ou não, da “Voz do Brasil”; na “Coluna Acadêmica” uma retrospectiva dos trabalhos da Ouvidoria no ano; na coluna “Fala, conselheira” um artigo sobre o “valor-notícia” da comunicação pública; e na Curadoria, uma crônica sobre os padrões da sociedade e a diversidade.

Desfrute dessa edição!

Rita FreirePresidenta do Conselho Curador da EBC

EDITORA-EXECUTIVAPriscila Crispi

EDITORESMariana Martins e Guilherme Strozi

REPORTAGENS E ARTIGOSAna FleckDilmar DurãesFelipe Berlim Guilherme StroziJorge Pereira FilhoJoseti MarquesLuiz Henrique RomagnoliMariana MartinsPriscila CrispiRafael dos SantosRita Freire

FOTOGRAFIAAntonio Cruz/Agência BrasilMagno Romero/EBCMarcelo Camargo/ABrMarcello Casal/ABrValter Campanato/ABrYago Fernandes

CONSELHO CURADOR | EBCRita de Cássia Freire Rosa (presidenta)Evelin Maciel (vice-presidenta)Aloizio MercadanteAna Luiza Fleck SaibroAna Maria da Conceição VelosoAkemi NitaharaCláudio Salvador LemboCelso PanseraEdinho SilvaEnderson Araújo de Jesus SantosHeloisa Maria Murgel StarlingIma Célia Guimarães VieiraIsaias DiasJoel Zito AraújoJuca FerreiraLetícia Luiza YawanawáMário Augusto JakobskindPaulo Ramos DerengoskiRosane Maria BertottiTakashi TomeVenício Arthur de LimaWagner TisoWagner Tiso

SECRETARIA EXECUTIVA DO CONSELHO CURADORGuilherme StroziMariana MartinsPriscila CrispiRaquel Fiquene

DIRETORIA-EXECUTIVA | EBCDiretor-PresidenteAmérico MartinsDiretor Vice-Presidente de Gestão e RelacionamentoMário MauriciDiretor-GeralAsdrúbal FigueiróProcurador-GeralMarco Antônio FioravanteDiretor de JornalismoRicardo MeloDiretora de ProduçãoMyriam PortoDiretor de Conteúdo e ProgramaçãoAsdrúbal Figueiró Júnior Diretor de Administração, Finanças e PessoasMarcos Isidoro da SilvaDiretora de ServiçosKátia GuimarãesOuvidora-GeralJoseti MarquesSecretária-ExecutivaRegina Silverio

Abundância de coisas distintas

ConselhoRevista do

Curador

Índice

09Notas do Conselho Curador

Dia a dia do Conselho 06

Matéria de capa 10 Programação

em debate 19

20Coluna acadêmica

Palavra da Ouvidoria 22

24Fala, conselheira!

Trabalhadores e Trabalhadoras 04

27Curadoria

Conheça oConselho

Curador

Cique e saiba +

Conheça quem somos, o que fazemos e faça parte!

4 Empresa brasil de comunicação

Trabalhadores e Trabalhadoras

e a diversidadeO administrador negro

Dilmar Durães e Rafael dos Santos - Coletivo Elementos Pretos

iStock

5Revista do Conselho Curador

das diferenças, como ocorreu com

um homem negro em uma empresa

pública, em Brasília, recentemente.

Nesse episódio, a empresa pública

possuía uma rica fala sobre a diversi-

dade, mas a realidade era outra. Ocorre

que um administrador de empresas

negro, após prévia aprovação em

concurso público de provas e títulos,

assumiu o cargo de administrador de

empresa e foi preterido pelo setor de

auditoria. Um homem negro em um

dos setores mais privilegiados da

empresa não seria aceito, e sofreria

com o racismo cotidianamente.

O concurso previa uma formação

interna, que só ocorreu seis meses após

terem tirado o administrador negro

do referido do setor, durante esse

tempo, ele sofreu assédio moral, com

acusações de incompetência, que sua

presença incomodava o setor, de que

macaco era um bicho tão bonito, e o

clássico das ofensas de cunho racial,

a afirmação de que não se enquadrava

no quesito boa aparência. Ao tentar se

defender com o democrático argumento

de que estava ali por merecimento,

já que conseguiu ser aprovado no

concurso público, teve que ouvir que

para o setor de auditoria, deveriam

ter cobrado “algo a mais”.

Em seguida, o adminis-

trador negro foi encaminhado para o

setor de protocolo para desempenhar

funções de técnico, onde permaneceu

até ser encaminhados para o setor de

gestão de pessoas, onde continua

sendo exotizado apesar do discurso

oficialesco de respeito à diversidade o

que leva a refletir que a diversidade

necessita de gente que suporta gente.

N o discurso oficial

d e e m p r e s a s

p ú b l i c a s e

privadas diversidade é inclusão e

valorização das diferenças raciais

e de gênero, com o compromisso

de promover políticas na tentativa

de equilibrar as relações de poder.

Especialmente empresas públicas que

se auto classificam como inclusivas e

cidadãs proferem discursos oficiais em

favor de grupos raciais historicamente

discriminados.

Na realidade das empresas pú-

blicas e privadas, a diversidade se

transforma em um discurso inoperante

de construção da equidade. Uma vez,

que continuam sendo ambientes onde

os empregados brancos se concentram

nas áreas de mais prestígio e maiores

salários e os empregados negros, ainda

que concursados, são segregados a

espaços desvalorizados.

O tema diversidade incomoda

quando tratado pelas instituições,

porque possui uma gama de signi-

ficados e o que gera na realidade é

uma tentativa de homogeneidade que

exotiza o chamado “diverso” forjando

estratégias falaciosas de compreensão

O tema diversidade incomoda quando tratado pelas instituições, porque possui uma gama de significados e o que gera na realidade é uma tentativa de homogeneidade que exotiza o chamado “diverso”

6 Empresa brasil de comunicação

terminar o ano dizendo que conseguimos alguns avanços na participação da sociedade neste processo.Tomaram posse, em agosto, como novos membros do colegiado Enderson Araújo, Isaías Dias, Joel Zito, Letícia Yawanawá e Venício Lima. Os novos conselheiros e conselheira, representantes da sociedade civil, substituíram Daniel Aarão, João Jorge Rodrigues,

J unto com a Empresa Brasil de Comunicação, o Conselho Curador completou oito anos de existência no ano de 2015. Sem deixar

de valorizar as conquistas obtidas neste percurso, são os desafios para tornar a comunicação pública de fato relevante para toda a população brasileira que movem os trabalhos do colegiado nesta caminhada. E podemos

se

em 2016

Rita Freire e Evelin Maciel, novas presidenta e vice do Conselho, com o troféu de Pró-Equidade de Genero e Raça ganho pela EBC

Texto: Guilherme Strozi

o fortalecimento

Conselho Curadorrenova

e aponta caminhos

da EBC

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Dia a dia do Conselho

para

7Revista do Conselho Curador

José Martins, Maria da Penha e Murilo Ramos, em um mandato de quatro anos, prorrogável por igual período. Todos foram designados após Consulta Pública feita diretamente com a sociedade.E após quatro anos de trabalho frente a presidência do Conselho Curador, a conselheira Ana Luiza Fleck Saibro passou a presidência para a conselheira Rita Freire, representante da sociedade civil no colegiado. Ela e a representante da Câmara dos Deputados no colegiado, Evelin Maciel (vice-presidenta) foram eleitas por maioria absoluta de votos entre os conselheiros e conselheiras e vão presidir o colegiado até dezembro de 2017, podendo ser reeleitas uma única vez. Para completar as mudanças no quadro do Conselho, neste ano terminou o mandato da representante dos empregados, Eliane Gonçalves. Em seu lugar, foi eleita pelos empregados da empresa a jornalista Akemi Nitahara, com mandato de dois anos, sem a possibilidade de reeleição. Um importante passo na história do Conselho Curador realizado este ano foi o Seminário Modelo Institucional da EBC. O evento reuniu, em agosto, cerca de 100 pessoas, em Brasília, para discutir a estrutura e o funcionamento

Conselho Curador delibera sobre demandas vinda do Seminário Modelo Institucional da EBC

da empresa, abordando temas como autonomia em relação ao Governo Federal, participação da sociedade civil, formas de sustentabilidade e o modelo de financiamento e produção de conteúdos da casa.Entre os participantes estavam representantes de entidades da sociedade civil, produtores de conteúdo, acadêmicos, ministros de Estado, parlamentares, diretores e funcionários da EBC. Com base nas discussões, foi elaborado um documento que sintetizou as demandas que foram deliberadas pelo Conselho e podem ser usadas como ferramenta política pela sociedade civil. Os encaminhamentos foram de mudanças na gestão da empresa à proposta de alteração na Lei que rege o funcionamento da EBC.Este ano também contou com a apresentação de pesquisas encomendadas pela Ouvidoria da EBC para analisar a programação das Rádios da EBC e da TV Brasil. Em abril, a Universidade de Brasília apresentou o resultado da pesquisa sobre as produções jornalísticas e programação musical das rádios Nacional e MEC de Brasília. O colegiado elogiou o trabalho e sugeriu que este fosse debatido com os funcionários das

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Rádios EBC e que fosse produzido um relatório de soluções para ser encaminhado ao Conselho. Em seguida, foi a vez da Universidade Federal do Rio Grande do Sul apresentar sua pesquisa sobre a qualidade dos programas da TV Brasil. Mais uma vez os conselheiros elogiaram o trabalho e marcaram uma reunião das Câmaras Temáticas para dar encaminhamento às sugestões da pesquisa e poder promover as devidas transformações na grade de programação da emissora.Uma demanda antiga do Conselho Curador foi finalmente implantada pela Direção da EBC: a Cartilha de Participação da Sociedade, que entrou no ar pelo Portal EBC dia 30 de julho. O objetivo do colegiado é fazer com que a população tenha de maneira facilitada todas as informações sobre como participar dos veículos da EBC, seja como produtora de conteúdos ou para fazer críticas e elogios. Segundo a Diretoria da EBC, os próximos passos do projeto serão garantir a acessibilidade do site e produzir um material impresso a partir das informações disponibilizadas nele.E a partir de 2015 todas as reuniões do Conselho Curador que são transmitidas pela internet passaram a

8 Empresa brasil de comunicação

ter tradução em Libras – Linguagem Brasileira de Sinais. Essa foi uma conquista da população surda obtida após participação da TV Ines em reunião do colegiado . A TV Ines é a primeira webTV em Libras do Brasil. Após uma visita de representantes do Conselho na sede da emissora, a EBC está em busca de estabelecer parcerias para compra de produtos e capacitação para produção de conteúdo acessível. A emissora é veiculada pela internet e via parabólica, disponibiliza 11 programas, de temáticas diversificadas, todos apresentados por pessoas surdas. Outra importante atuação do colegiado em 2015 foi junto a greve dos trabalhadores da EBC, que ocorreu no mês de novembro. Após reunião com o comando da greve dos empregados, o colegiado aprovou recomendações à Direção da EBC no sentido de cumprir com uma determinação do Ministério do Planejamento para a ocupação de 70% dos cargos de confiança da empresa por empregados do quadro efetivo da EBC. Essa foi uma das principais reivindicações dos empregados que entraram em greve após impasse nas negociações do

Acordo Coletivo de Trabalho com a direção da empresa. Ao longo do ano, mudanças no organograma da empresa foram anunciados pela Direção da EBC ao Conselho. Uma nova estrutura, que se chama Superintendência de Agências e Novas Mídias, substituiu a superintendência do Norte e Centro-Oeste, e ficou ligada diretamente à Diretoria-Geral, gerindo a Agência Brasil e o Portal EBC. O Conselho também tomou conhecimento da atual situação de debates junto ao Grupo de Implantação do Processo de Redistribuição e Digitalização de Canais de TV e RTV, o Gired. O órgão é responsável pela transição do atual sistema analógico de televisão aberta para o sistema de TV Digital.Houve ainda participação internacional do Conselho Curador este ano. Em janeiro, a conselheira Eliane Gonçalves representou o colegiado no Fórum Social Mundial, realizado na Turquia. A conselheira falou sobre a importância do controle social em empresas de comunicação pública como forma de manter a linha editorial dos veículos em constante fiscalização da sociedade civil.

Empregados em greve da EBC acompanham reunião do Conselho Curador em novembro

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Dia a dia do Conselho

9Revista do Conselho Curador

Notas do Conselho Curador

Texto: Mariana Martins

Conselho Curador da EBC e entidades da sociedade

civil pedem anulação de nova composição do Conselho

de Comunicação do Congresso Nacional ao Supremo

O Conselho Curador da Empresa Brasil de Comunicação

(EBC), entidades da sociedade civil e dez parlamentares,

deram entrada, em 14 de julho, em um Mandado de Segurança

no Supremo Tribunal Federal (STF) para anular o ato que

nomeou novos integrantes ao Conselho de Comunicação

Social (CSS) do Congresso Nacional. Os autores da ação

defenderam que o processo que levou à homologação da

nova composição do CCS foi ilegítimo, inconstitucional e

antirregimental. A ação ainda aguarda julgamento do Tribunal.

Colegiado lança nota pública sobre renovação da

Diretoria da EBC

O Conselho publicou no dia 30 de julho uma nota sobre

a renovação da Diretoria Executiva da empresa, que à época,

esperava designação. Na visão do colegiado, entre os maiores

desafios para a empresa avançar está a necessidade de garantir

um caráter autônomo em relação ao Governo Federal, o que

passaria pela composição de uma diretoria com perfis que

tenham experiência na área da comunicação pública e da

administração pública. O texto reforça que a intenção do

Conselho não era criticar os nomes indicados para ocupação

dos cargos, mas, sim, os vínculos estabelecidos nos processos

de designação e troca de quadros, que deveriam se revelar

cada vez mais democráticos e participativos. A nota sugere

o estabelecimento de critérios como o respeito à equidade

de gênero e raça, consultas à sociedade e outros mecanismos

de controle na escolha dos diretores.

Conselho participa de campanha para a inclusão

de estudos sobre comunicação pública em cursos

superiores

No dia 13 de outubro o Conselho Curador publicou uma

moção de apoio à campanha Inclui Comunicação Pública,

que pede a inclusão da disciplina de comunicação pública nos

cursos superiores de comunicação do país. A iniciativa é do

Observatório Latino-Americano das Indústrias de Conteúdos

Digitais (OLAICD). O documento foi encaminhado ao ministro

da Educação, e membro do colegiado, Aloísio Mercadante,

e ao presidente do Conselho dos Reitores das Universidades

Brasileiras (CRUB), reitor Benedito Guimarães Aguiar Neto.

Conselho participa de reuniões sobre administração

da EBC

Em dezembro de 2015, a presidenta do Conselho, Rita

Freire, e a vice-presidenta, Evelin Maciel, se reuniram com

funcionários da Secretaria-Executiva da EBC para tratar

do processo de construção do Plano de Trabalho da EBC

de 2016 e para dar início ao planejamento das etapas de

fiscalização e monitoramento do Plano para o ano de 2017.

A previsão é que reuniões periódicas para fiscalização

do planejamento da EBC aconteçam durante todo o ano.

A presidenta participou também, ainda em dezembro, de

reunião ordinária do Conselho de Administração da EBC

(Consad). Esta foi a primeira vez que o Conselho Curador

esteve presente na reunião do Consad. O evento deu início

a um processo de intercâmbios de informações entre os

dois conselhos, aproximando questões de conteúdos das

ações de gestão.

10 Empresa brasil de comunicação

DisputaSimbólico

Texto: Priscila Crispi

Como garantir a representação da diferença em veículos de

comunicação inseridos em uma sociedade desigual

Falar de diversidade é tocar em paradoxos sociais. Ao mesmo tempo em que este conceito está ligado à luta pela preservação de heranças e valores culturais, envolve a disputa pelo simbólico na construção cons-tante de novos modelos de sociedade. Preservar e refazer – valorizar as raízes identitárias e quebrar velhas estruturas – aparecem, igualmente, nas falas de cidadãos e organizações que se debruçam sobre o tema do direito humano à diversidade.

Outras disputas se revelam na análise aprofundada dessa agenda, como a ênfase no todo, na fauna hu-mana completa, versus a valorização de grupos minoritários. Promover a diversidade significa expressar a todos, em sua singularidade, ou trazer visibilidade para aqueles que se encontram sub-representados no tecido social? E qual a necessidade dessa promoção para que essa diver-sidade possa existir?

Na visão de Muniz Sodré, pro-fessor da Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro, existe uma distinção entre diferença e diversidade: a diversi-dade pressupõe a união de todas as diferenças existentes na sociedade em níveis de valorização desiguais. “Diferença é o complemento lógico de uma identidade (por exemplo, negro como complemento lógico e negativo de branco), enquanto diversidade é a pluralidade quantitativa e espacial das diferenças, ou seja, as diferenças em lugares ‘diversos’ e com potências variadas”, pontua.

É nessa balança de pesos das diferenças sociais que a diversidade e sua representação tornam-se assuntos indissociáveis. Isso porque quem define os espaços e a predominância de um grupo social sobre o outro é a expressividade que eles apresentam. Em função de seu papel de principal janela de visibili-dade na sociedade da informação, os veículos de comunicação são, por isso, disputados por muitos desses grupos a fim de afirmar e defender sua existência e visões de mundo. (Confira o box “discutindo definições” na página 12).

“Aquele que não é visto, não é lembrado. Quando a gente fala de exer-cício do direito à comunicação, a ONU e outras organizações internacionais entendem que a representação nos veículos de comunicação é necessária para a subsistência da diversidade. Como vou construir uma sociedade igualitária, onde não haja discriminação, se eu invisibilizo alguns de seus segmentos, se eu não mostro sua cultura, reivindicações, etc? Isso vai ter consequência na construção da democracia”, defende Bia Barbosa, representante do Intervozes - Coletivo Brasil de Comunicação Social.

Sodré explica que essa exposição das variadas classes sociais em veículos de comunicação, ao longo da história brasileira, aconteceu pela criação de jornais impressos que tinham como objetivo expressar as posições classistas de grupos como dos cafeicultores, da construção naval, do comércio e assim por diante. “Na década de 60, tanto no Rio como em São Paulo, podia-se mapear a diversidade na imprensa pelos posicionamentos de classe. Essa diversidade me parece ter chegado ao fim”, diz.

pelo

Pesquisador Muniz Sodré acredita que Estado brasileiro ainda não tem “maturidade” para entender a comunicação pública

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matéria de capa

11Revista do Conselho Curador

acesso aos meios de comunicação de massa, que se encontram concentrados por alguns grupos econômicos, familiares, políticos, religiosos, entre outros, tornando-se grandes monopólios ou oligopólios, a divulgação das pautas dos movimentos sociais populares pela comunicação pública se torna fundamental para garantir a visibilidade nas demandas desses grupos sociais populares, que de forma geral, são marginalizados ou que têm suas demandas tratadas de forma pejorativa”.

Bia Barbosa defende, porém, que o simples fato de veículos darem cobertura e visibilidade para ações da sociedade civil já é uma maneira de divulgar suas pautas. “Não precisa ser uma emissora militante e engajada, mas mostrar os diferentes aspectos da realidade social, mostrar que esses movimentos exis-tem, que eles têm demandas, justificativas – o que não acontece nos veículos comerciais. A gente não precisa editorialmente ter a mesma posições que os movimentos sociais têm, mas, jornalisticamente, precisa dar voz a eles”, diz.

Bia lembra, ainda, que promover o contraponto às notícias divulgadas pela imprensa comercial não garante a diversidade de informação. “Eu não posso partir do princípio que o público viu uma coisa lá e outra aqui e aí ele vai ficar com os dois aspectos da realidade. No jornalismo, a gente precisa necessariamente contextualizar e trazer diferentes visões e não só o contra-ponto. Precisa haver um equilíbrio interno, se queremos respeitar o direito ao acesso à informação”.

Modelo britânico de comunicação pública

Mostrar o plural sem assumir bandeiras é o que faz a BBC, segundo Nikki Clarke, diretora de Jornalismo da BBC World Service. “A BBC não promove as pautas de nenhum grupo. Nosso papel é expor uma amplitude e diversi-dade de opiniões que reflita a própria diversidade do povo do Reino Unido, através de cada um dos nossos veículos. A BBC segue sua própria agenda na cobertura de qualquer assunto, controverso ou não, tentando garantir que sejam dados o devido peso e importância a uma ampla gama de pontos de vista e perspectivas significativas, distinguindo claramente entre opinião e fato”.

Para ele, com o predomínio da comunicação eletrônica, a diversidade aconteceria se ingressassem no espaço público frações de classes sociais que até agora mais escutam do que falam. “A diversidade supõe potência de fala por parte dos diferentes lugares da malha social, e isso foi tentado décadas atrás com o movimento das ‘rádios livres’, de pequenos jornais alternativos etc. Nada disso teve continuidade. Emergiu depois o movimento das ‘rádios comunitárias’, mas o Estado, atendendo às pressões dos grandes empresários da mídia, tratou o assunto como caso de polícia”, conta. O pesquisador acredita que o contexto das redes sociais ainda não favorece a democratização do acesso ao debate público dada sua superficialidade.

Ivana Bentes, secretária da Cidadania e da Diversidade Cultural do Ministério da Cultura, discorda: “temos hoje uma mídia feita por novos sujeitos do dis-curso - uma mídia-negra, mídia-índio, mídia quilombola, periférica, que expressa essas diferenças culturais e sociais. Podemos perceber uma nova ecologia da mídia, um ambiente muito diverso de produção de comunicação, feita pelos muitos e em linguagens muito distintas”.

Ivana acredita que apesar de a internet ter dado a esses grupos a possibilidade de falarem por si pró-prios, é preciso que os veículos de comunicação que pretendem atender ao interesse público defendam as bandeiras levantadas por essas fatias sub-representadas da sociedade. “Ser republicano hoje é buscar corrigir assimetrias”, fala.

Solange Engelmann é coordenadora nacional do setor de comunicação do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST e concorda com a secretária: “como atualmente o Brasil possui uma relação desigual de

Empresa britânica divulga em site sua estratégia voltada à diversidade para produção de conteúdos e gestão de pessoas

12 Empresa brasil de comunicação

Para entender quem é esse público e como refletir sua diversidade, a empresa formatou uma estratégia para os anos de 2011 a 2015, The BBC’s Diversity Strategy, baseada em pesquisas de audiência publicadas por seu conselho popular, o BBC Trust, e divulgada no site bbc.co.uk/diversity.

Entre os princípios estabelecidos pelo documento estão a promoção da igualdade de oportunidades para diversificar e desenvolver a força de trabalho da empresa de forma a melhor refletir seu público; oferecer programação de alta qualidade, que reflete com precisão e autenticidade o Reino Unido contemporâneo; se conectar com os públicos, incluindo aqueles ainda não contemplados, para informar a direção de seu conteúdo;

construir a acessibilidade em todas as etapas do desenvolvimento de produtos e serviços, e garantir sua sustentabilidade e permanência; alcançar o equilíbrio sistemático e consistente de representação da igualdade e diversidade nos processos de planejamento e revisão da BBC.

Segundo o texto, o desafio de representar a grande diversidade do Reino Unido oferece uma oportunidade criativa para a BBC entregar uma programação original e distinta, que pode surpreender e envolver o público. “Nosso público está se tornando cada vez mais diversificado e em cons-tante mudança - tanto em aparência como em expectativas. Devemos nos esforçar para permanecer relevante para todos eles”.

A partir da assinatura de um ato público pela equidade, em 2010, a empresa assumiu o compromisso de, por meio de seus conteúdos, con-tribuir para o fim da discriminação, assédio e vitimização de pessoas com base em características como idade, deficiência, gênero, união e parceria civil, gravidez e maternidade, raça, religião ou crença, e orientação sexual.

Na visão de Muniz Sodré, me-todologias como a que estruturou a estratégia de diversidade da empresa britânica – que partam de estudos, discussões e deliberações de grupos específicos – são inerentes a uma co-municação diferenciada, que possa ser considerada pública ou republicana.

matéria de capa

Diversidade na representação: é a expressão da pluralidade social nas imagens veiculadas pela mídia, em sua programação. Acontece quando a emissora mostra mulheres, deficientes, LGBTs, ne-gros, indígenas e diversos grupos sociais nas suas reportagens ou programas, mas também se reflete na própria possibilidade de participação – não só nas telas, mas no processo de construção da linha editorial do veículo. “A verdadeira representação da diversidade é quando as pessoas não são apenas o assunto, mas o produtor daquele conteúdo. A gente não quer que falem da gente, a gente quer falar. Eu posso falar de um problema de educação ouvindo uma pessoa com deficiência e não só em matérias sobre deficiência”, diz.

Diversidade de opinião: outra vertente da ex-pressão da diversidade na mídia é a diversidade de opiniões, visões e lugares de fala. É possível, por exemplo, garantir a representação de grupos como LGBTs, mulheres, negros, jovens, etc e não ter ne-nhuma diversidade em opiniões – estarem todos

alinhados a uma escolha editorial que não preza pela pluralidade. Além disso, refletir a diversidade de opiniões presentes na sociedade brasileira não significa legitimar preconceitos. “Ser um reflexo da sociedade não significa replicar na tela todas as opiniões de forma acrítica. Não é porque a gente tem racismo na sociedade que eu vou transmiti-lo na tela. Quando essa diversidade viola direitos humanos ou estigmatiza, a gente até precisa mostrar isso, mas de forma crítica”, afirma.

Diversidade interna: acontece quando uma emissora visa garantir a diversidade de toda a socie-dade para a qual está falando dentro de sua própria programação.

Diversidade externa: prima pela busca de um equilíbrio de representação a partir de uma análise de todo o sistema de comunicação do país. “Diver-sidade externa é olhar pra toda grade da TV aberta e ver o que está fora, que não tem espaço, para fazer disso o conteúdo do meu canal”, define.

Discutindo DefiniçõesBia Barbosa, representante do Intervozes - Coletivo Brasil de Comunicação Social, sugere conceitos de diversidade e sua expressão em veículos de comunicação

13Revista do Conselho Curador

Porém, para o pesquisador, isso ainda não acontece no Brasil porque o Estado não possui um projeto político que contemple esse tipo de comunicação. “Mais do que em qualquer empreendimento privado no âmbito da comunicação, uma instituição que se chame de ‘pública’ deveria dispor de um conselho tipo ‘ombudsman’ forte e ativo. Na prática, vigora aquilo que o diretor episódico está pensando naquele momento, geralmente em sinto-nia com o que o ministro tal está pensando, e assim por diante. Em vez de verbo criador, verba criativa de órgãos e cargos”, critica. Ele afirma que os veículos públicos não alcançam influência na construção do imaginário brasi-leiro com relação à diversidade e pluralidade de visões, com a exceção de episódios promissores na história da TV Cultura de SP.

A EBCA Lei que cria a Empresa Brasil de Comunicação

(EBC), Lei nº 11.652/2008, não traz em seu texto a palavra “diversidade”, porém afirma que a prestação dos serviços de radiodifusão pública deve promover o acesso à informação por meio da pluralidade de fontes de produção e distribuição do conteúdo; promover a cultura nacional, com estímulo à produção regional e à produção independente; não deve veicular conteúdos de discriminação religiosa, político partidária, filosófica, étnica, de gênero ou de opção sexual; e deve contar com a participação da sociedade civil no controle da aplica-ção desses princípios, respeitando-se a pluralidade da sociedade brasileira.

Já seu Manual de Jornalismo, define que a empresa deve garantir a expressão da diversidade social, cultural, regional e étnica e da pluralidade de ideias e percepções da realidade e dos fatos que são objeto de cobertura do jornalismo da EBC.

Segundo Lucas Krauss, repórter da TV Brasil em Brasília, esse caminho vem sendo percorrido. “Há uma predisposição da EBC em abordar temas relacionados à diversidade. Comparando com outros veículos da mídia privada, não tenho dúvidas de que abordamos mais a ques-tão da homossexualidade e da homofobia, do preconceito racial, da intolerância religiosa, das diferentes formas de ser. O desafio é aprimorar essas pautas, aprofundar, fazer investigações jornalísticas”, conta.

Aline Scarso, repórter da TV Brasil em São Paulo, endossa a avaliação: “acredito que faz parte da nossa rotina de produção a cobertura de temas como da mulher, da população LGBT, dos negros (esse, porém, com menor ênfase). Acredito que fazemos um bom trabalho nesse sentido, sim”. A jornalista pondera, porém, que problemas de estrutura e até editoriais impedem, de fato, o aprofundamento desses temas.

O diretor de Jornalismo da EBC, Ricardo Melo, con-corda com os funcionários. Em sua visão, a empresa ainda não cobre a contento temas ligados à diversidade: “todas as minorias precisam encontrar aqui espaço para lutar pelo seu lugar e disputar a opinião do cidadão. Porém, para isso, precisamos de mais visibilidade, de uma mudança de cultura, que é minha também, pois somos viciados em pautas tradicionais, e de mais recursos”.

EBC esteve presente com apenas uma equipe de TV na cobertura dos Jogos Mundiais Indígenas

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14 Empresa brasil de comunicação

Designada para cobertura dos Jogos Mundiais Indígenas, Aline conta que, apesar de tratar o tema com mais respeito, a cobertura da EBC teve problemas com a falta de equipes e de um plano editorial para o evento. “O Comitê organizador dos Jogos Mundiais teve um aporte de dinheiro muito grande, principalmente do Governos Federal via Ministério de Esportes e do Governo Municipal de Palmas, mas isso não se refletiu na estrutura montada. No terceiro dia de Jogos, por exemplo, o teto da Okara, que era residência dos indígenas das etnias brasileiras, desabou, ferindo uma pessoa. Nós citamos isso no jornal por meio de nota, mas enquanto equipe fomos desencorajados a cobrir esse problema e outros relatados pelos indígenas como falta de água, inclusive. Chegamos a pegar sonoras nesse sentido e estávamos construindo uma matéria sobre a infraestrutura dos Jogos, mas fomos orientados a focar nossa reportagem no espetáculo das competições. Isso me parece que não atende aos princípios da comunicação pública, nem respeita o nosso público”, relembra.

Lucas explica que o desafio fun-damental da empresa é ter autonomia editorial em relação ao Governo Federal, principalmente no que se refere a coberturas que demandam pluralidade de posições políticas. “O telejornal Repórter Brasil cumpre o papel de ouvir os que historicamente nunca foram ouvidos. Por exemplo, destinar repórter pra Comissão que vai falar do extermínio da juventude negra nas periferias e não para ficar especulando ou abordando exage-radamente o vai e vêm dos boatos políticos no Congresso, como a mídia privada faz, é um papel importante que cumprimos. No entanto, só seremos respeitados pela sociedade brasileira se a diretoria da EBC (contando com

a ajuda dos sindicatos e da sociedade) fizer a presidenta da República e o ministro da Secretaria de Comunicação Social enxergarem o papel, a missão e o porquê da existência da EBC”, cobra. Para ele, é responsabilidade do Estado esclarecer a população da diferença entre mídia pública e governamental.

Ricardo admite a confusão e afirma que muitas fontes e convidados dos programas jornalísticos da casa não aceitam conceder entrevista porque en-xergam os veículos da empresa como governamentais. Contudo, ele defende que isso se deve à vinculação da EBC ao Governo Federal e não à orienta-ções editoriais. “Temos preocupação de dar a informação isenta, plural, não favorecemos opinião porque é do Governo ou contrária”, fala. O diretor diz que as fontes da EBC precisam oferecer um painel da sociedade brasileira e que isso está no radar de sua equipe, sem virar um “fetiche” a ser perseguido.

Uma pesquisa realizada pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul sobre a programação da TV Brasil mostrou que, em 2015, de 608 entrevistados para os jornais da emissora, 178 eram representantes do poder público, entre Executivo, Legislativo, Judiciário, Autarquias, etc. Os aproximadamente 70% restantes correspondiam a cidadãos, especialistas, comentaristas e outros atores sociais. Entre os temas mais abordados estão cidadania, política, segurança e esportes, nessa ordem.

“De forma geral, a EBC tem feito uma boa cobertura sobre as ações e pautas do MST, esperamos que essa cobertura permaneça, dando visibilidade à luta pela terra e se aprofunde, na medida do possível, em torno de pautas acerca da origem do problema da concentração da terra no país, bem como as consequências desse processo”, avalia Solange Engelmann.

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Militantes de movimentos sociais querem cobertura aprofundada de suas pautas pela comunicação pública

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15Revista do Conselho Curador

MetasMedir o sucesso de uma política de diversidade é um

desafio para a EBC e empresas de comunicação pública, em geral. Não existem definições acadêmicas ou expe-riências já fechadas em torno deste conceito. Para Bia Barbosa, este é um problema que não pode ser revolvido com metas ou critérios numéricos. “Essa questão não pode ser automatizada porque ela é muito mais simbólica. Uma quantidade não resolve, por exemplo, a questão da diversidade de opinião”, pontua.

Ricardo Mello diz que, em sua gestão, ainda não chegou a uma conclusão de como fazer essa medição de uma forma que se justifique jornalisticamente. “O que eu tenho que ter são parâmetros gerais e periodicamente a gente vai checando se estamos os respeitando, com a ajuda da Ouvidoria e do Conselho Curador, além de mecanismos diários, como nossas reuniões de pauta”, fala.

Nikki Clarke conta que, na BBC, as equipes discutem regularmente como conferir pluralidade à sua produção, tanto em reuniões diárias editoriais e de planejamento, como em encontros pós publicação. “Como a diversi-dade é uma questão que está no coração do jornalismo da BBC, é muito importante que as equipes tenham isso em mente todos os dias, para que seja refletida em nossa programação”, afirma.

Além disso, a empresa investe na diversificação de seus quadros como frente para garantir conteúdos que reflitam vários pontos de vista e experiências. Para essa política de diversidade interna, a multinacional possui metas quantificáveis, publicadas no endereço http://www.bbc.co.uk/diversit. “A BBC acredita que quanto mais diversificada for nossa força de trabalho, mais capazes seremos de responder e refletir o nosso público em toda a sua diversidade. Como uma organização que é financiada

por um imposto, é importante refletirmos todos os nossos contribuintes em nossos veículos”, defende.

Um dos objetivos da estratégia de diversidade da casa é promover a igualdade de oportunidades para atrair perfis diferenciados de profissionais, inclusive de gestores. “Oferecemos formação adequada para que as chefias façam um recrutamento que leve isso em conta, em todos os níveis hierárquicos”, assegura a executiva.

Na opinião de Bia Barbosa, a estratégia da empresa britânica é ideal para enfrentar a sub-representação da sociedade pelos veículos da EBC. “Se você tem pessoas diferentes, de setores diferentes, em um espaço que vai definir a linha editorial da emissora, você já começa de um bom lugar. Ter uma direção formada só por homens brancos do Sudeste do país, como é hoje, com certeza vai violar a diversidade que estamos buscando”, critica.

Atualmente, segundo relatório produzido pela empresa, 62% dos cargos comissionados da EBC são ocupados por homens. No que diz respeito à autodeclaração de raça, 53% dos ocupantes desses mesmos cargos são brancos e apenas 3% são negros.

“Sonho (e somos muitos na EBC) com o dia em que haverá eleições para a composição da diretoria, com profissionais concursados. Uma lista tríplice para pre-sidente da EBC que seria escolhido pela Presidência da República”, sugere o jornalista Lucas Krauss.

O diretor Ricardo Mello afirma que é a favor da realização de novos concursos públicos que reservem vagas para negros, mas que não tem posição fechada sobre a implementação de políticas afirmativas em Pro-cessos Seletivos Internos. “Se eu tiver profissionais que correspondam ao nível esperado e tragam diversidade para a tela, eu vou fazer opção pela diversidade. Porém,

Apresentadores do programa de rádio “No Mundo da Bola”: maioria masculina e branca para falar sobre futebol

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Empregadas da EBC participam de programação realizada pelo Comitê de Pró-Equidade de Gênero e Raça, no Rio de Janeiro

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16 Empresa brasil de comunicação

O Conselho CuradorDos 22 membros do Conselho,

atualmente, o pleno é composto por 13 homens e nove mulheres. Nas 15 vagas da sociedade civil, a predominância masculina se mantém: nove homens para seis mulheres. Do total das 22 vagas, apenas três se autodeclaram negros e uma, indígena.

Uma vez que, entre os critérios previstos por Lei para renovação do colegiado está apenas a exigência de proporcionalidade na representação das regiões do país, coube ao próprio Conselho estabelecer metas para sua composição ao longo dos anos.

Inicialmente, todos seus membros foram indicados pelo então presidente Luis Inácio Lula da Silva, em 2007. Com o fim dos primeiros mandatos, duas consultas públicas foram realiza-das para recolher candidaturas para o preenchimento das vagas destinadas à sociedade, a partir de critérios esta-belecidos pelo próprio pleno. Só em 2013, após debates, que o Conselho começou a realizar audiências e

o quadro de funcionários da casa hoje não reflete a diversidade da sociedade brasileira”. Segundo o diretor, “ainda não temos um âncora negro por uma circunstância, não temos no quadro uma pessoa que se encaixe nos padrões da função”, sustenta.

No Plano de Trabalho da EBC para 2016, porém, estão descritas ações afirmativas para promoção de uma Política de Pró-equidade de Gênero e Raça. Entre as medidas estão a realização de um censo com os empregados da casa, a contrata-ção de pesquisas junto a empresas e intuições de referência na temática, a definição de indicadores de paridade de gênero e raça e a capacitação de gestores para conhecer e fazer a gestão dessas temáticas junto às suas equipes. O programa será executado no escopo do Comitê Pró-Equidade de Gênero e Raça, grupo criado a partir de uma demanda dos empregados para acompanhar as questões institucionais relacionadas a essas temáticas.

“O principal papel do comitê

é mudar a cultura organizacional da EBC, promovendo a ascensão profissional das mulheres, e das todas as etnias, além de promover a tolerância e respeito à diversidade. O comitê também ajuda nos casos de denúncias, orientando e acompanhando os casos”, explica Tiago Martins, componente do comitê.

Segundo ele, após a criação do grupo e da entrada da EBC no programa Pró-Equidade de Gênero e Raça da Secretaria de Política para Mulheres do Governo Federal, houve avanços como a criação de uma sala de amamentação na empresa, o aumento do tempo da Licença Paternidade e a comemoração de datas importantes de lutas e conquistas sociais, como Dia da Consciência Negra e o Dia Internacional do Orgulho LGBTI. “Nós lutamos pelo estabelecimento de cotas e metas. Até que se alcance um equilíbrio, o comitê promove ações afirmativas e busca a criação de políticas de ascensão das mulheres, negros, indígenas, etc na empresa”, esclarece.

Letícia Yawanawá, única representação indígena no Conselho Curador da EBC

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matéria de capa

17Revista do Conselho Curador

consultas públicas específicas para ouvir os cidadãos sobre o processo de seleção de conselheiros.

A partir das contribuições recolhi-das, formatou-se, em 2014, um edital que buscou garantir a representação de jovens, indígenas e pessoas com deficiência, a equidade de gênero e a reserva de 40% de vagas para negros (as), do total das 15 cadei-ras da sociedade civil no órgão. O processo se encerrou na posse de Enderson Araújo de Jesus Santos, representante jovem, Isaías Dias, pessoa com deficiência, Joel Zito Almeida de Araújo, autodeclarado negro, Letícia Luiza Yawanawá, indígena, e Venício Artur de Lima, representante do Centro-Oeste.

Durante a produção desta Revista, estava em aberto uma consulta pública para recebimento de contribuições sobre o modelo de renovação do

Conselho. As sugestões recebidas balizarão, mais uma vez, o processo de substituição de cinco conselhei-ros e conselheiras: Claudio Lembo, Heloisa Starling, Ima Vieira, Paulo Derengoski e Wagner Tiso.

Durante audiência pública reali-zada na cidade de São Paulo no dia 27 de janeiro deste ano, para tratar do mesmo assunto, a conselheira Rosane Bertotti afirmou: “não podemos fazer do Conselho um espaço dos amigos dos conselheiros. A grande riqueza do Conselho Curador da EBC é a representatividade da pluralidade da sociedade brasileira. Temos que olhar com cuidado para que o processo de participação favoreça essa diversi-dade”. Segundo ela, o órgão ainda não consegue envolver a sociedade de maneira mais ampla no debate da comunicação pública, o que faz com que um grupo restrito se aproprie

desse espaço de participação.Letícia Yawanawá, também con-

selheira, reforçou a importância de pessoas com representações e origens diversas para o colegiado. “Me sinto honrada de participar desse Conselho porque ele já representa os povos brasileiros”, defendeu.

“Somente a partir da garantia da representação dos atores sociais dos diversos grupos sociais que integram a sociedade nos conselhos dos veícu-los de comunicação públicos, como a EBC, é possível tentar garantir a veiculação de abordagens de co-municação mais diversa e plural”, acredita Solange Engelmann, do MST. A militante pondera, porém, que esses representantes precisam ter legitimidade perante os grupos sociais que representam e participar de forma ativa no levantamento e proposição de abordagens e visões de mundos deles.

Criança participa de lançamento na TV Brasil do desenho “Guilhermina e Candelário”, sobre questões étnicas

18 Empresa brasil de comunicação

Para 2016O Plano de Trabalho da EBC para a programação dos veículos da casa neste ano apresenta projetos com foco na diversidade cultural, de raça e de gênero. Fique por dentro dos compromissos assumidos pela empresa:

•Parceria com a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) – projeto CPLP do Audiovi-sual – que dará acesso às obras que estão sendo produzidas via Programa de Apoio ao Desenvolvi-mento do Audiovisual Brasileiro – PRODAV das TVs Públicas. O projeto promete entregar para a TV Brasil, até o fim deste ano, quatro telefilmes de ficção produzidos em Angola, Brasil, Moçam-bique e Portugal e nove documentários, cada um de um dos países da Comunidade de Língua Por-tuguesa.

•Nova faixa de programação semanal Nossa Lín-gua. Com 60 minutos de duração, a nova faixa será voltada à exibição de documentários sobre cultura e sociedade nos países de língua portuguesa e será composta inicialmente por 28 documentários sen-do 04 de cada país da CPLP.

•Exibição da série África da Sorte, também produ-zida via Prodav das TVs Públicas, que aprofunda as relações entre África e Brasil a partir da ficção.

•Exibição de conteúdos africanos e latino-ameri-canos licenciados a partir do apoio da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial – Seppir.

•Estreia do programa Estação Plural, que contará com três apresentadores fixos, ligados ao universo LGBT. Eles receberão um convidado por episódio para discutir assuntos sobre comportamento a par-tir de suas óticas sobre orientação sexual, questões de gênero e de raça, entre outros temas.

•Estreia da coprodução SOS Fada Manu, uma animação infantil que narra as aventuras de uma aprendiz de fada, trabalhando as questões de raça e gênero para o público infantil.

•Exibição do documentário Raça, de Joel Zito Araújo e Megan Mylan, que conta a história de três pessoas na linha de frente da batalha contemporâ-nea pela igualdade.

•Reexibição de Windeck, telenovela angolana com 99% do elenco negro e falada em português an-golano.

•Estreia de mais uma novela angolana, dos mesmos produtores de Windeck, a Jikulumessu. A produ-ção conta com elenco igualmente negro e aborda questões de orientação sexual.

•Projeto de coprodução de nova temporada da série de animação infantil Guilhermina e Candelário. A ideia é que os novos episódios da série colombiana também abordem a diversidade social e cultural brasileira incluindo personagens e cenários brasi-leiros.

•Exibição do documentário Cavalo de Santo, que retrata protagonistas das religiões afro-gaúchas: o Batuque, a Umbanda e a Quimbanda ou Linhas Cruzadas.

•Exibição das séries com temáticas indígenas: Feliz Forca Nova, produção sobre duas nações indíge-nas que vivem sob ameaça: Guarani–Kaiowá de Mato Grosso (MS) e o povo Iny (Karajá, Javaé e Xambioá); e a série Índio Presente, que visa des-construir preconceitos e atenuar o distanciamento em relação a estas populações.

•Estreia da série Diários sobre o corpo, que anali-sa como a aparência física impacta o cotidiano de pessoas afetadas pelos padrões estéticos vigentes, instituindo-lhes novos hábitos, valores, práticas, e modos de ser e estar no mundo.

•Exibição da série documental Gleba – chão de Ma-rias, que mostra a história de cinco mulheres, de diferentes origens e idades, que construíram suas casas em terrenos invadidos e agora vivem sob ameaça de desapropriação.

•Exibição do documentário Periferia Trans – meu corpo é político, que discute temas LGBT a partir do humor e é voltado para jovens da periferia.

matéria de capa

19Revista do Conselho Curador

instantânea e abrangente, as notícias eram importantes e vinham em primeira mão; adequada, porque as 19 horas, a família já estava reunida e jantada na frente dos imensos aparelhos, “assistindo” ao rádio; enfim, fundamental para o governo e poderes. Era lá o horário nobre, plataforma de lançamento de programas, políticas e diretrizes, muitas vezes na voz do ditador/presidente. Claro, há que se discutir o uso político da “Voz”, mas não nestas linhas.

Hoje, o octogenário programa claudica sobre uma audiência ainda polpuda em números absolutos, mas irrelevante para uma rede obrigatória. Porque o horário ficou ruim, a duração ficou errada e a linguagem trata igual públicos muitos diferentes.

Por paralelo, o “Café com o Presidente” conseguiu audiência, repercussão e credibilidade porque foi pensado e executado especialmente para o rádio, convenceu emissoras e público de que não era propaganda e tinha conteúdo fresquinho e importante, claro, temperado pela impressionante capacidade de comunicação do Presidente Lula.

A “Voz” precisa vibrar junto com o rádio, trazer as informações e visões que as emissoras comerciais não tem tempo ou interesse de transmitir, para uma audiência maciça, porém segmentada em regiões, linguagens e tempos.

Uma hora inteira pode seguir sendo adequada em rádios pequenas onde a “Voz” é um programa melhor do que o restante da programação. Mas que em FMs que tocam 24 horas de músicas, se espalhe em programetes que não espantem o ouvinte. E produzida com edições regionais, nas quais falar de uma obra, serviço ou mesmo efeméride no Oiapoque seja notícia, pela proximidade na edição do Norte, e não ruído no Chuí, pela irrelevância.

E ser sim, obrigatória, pelo menos enquanto os nossos índices de educação e desenvolvimento não forem suficientes para mostrar que temos cidadãos com plenas condições de escolher como querem se informar.

Programação em debate

A Voz Brasil:dinossauro

Luiz Henrique Romagnoli, radialista

N a época da Radiobrás, ainda no começo deste século, tive o desafiante prazer de lidar com seus dois campeões de audiência: “A Voz do

Brasil’ e o “Café com o Presidente” com o presidente Lula. Cada um com sua história, função e formato. Do “Café” figuro orgulhoso como um dos pai ao lado do ex-presidente Eugenio Bucci. Na veneranda “Voz do Brasil” estive na coordenação da reforma editorial e plástica de 2003.

Na “Voz”, para mudar a cara pesada e a imagem de porta-voz preguiçoso do governo, vestimos uma nova abertura, chacoalhando a protofonia de “O Guarani” com guitarras e berimbaus, novas vinhetas, atuais e brasileiras, e locução mais informal. Mas a grande tarefa foi virar o foco do conteúdo para o cidadão. Plano tão simples quanto difícil de executar com a emperrada máquina de clonar releases oficiais da Radiobrás: comunicar a ação, serviço ou benefício para o cidadão e deixar o “abre aspas” oficial, e só se for necessário, para o parágrafo debaixo.

“A Voz” remodelada nasceu e melhorou um pouco a relação com os ouvintes em geral, mas ainda atrai ódios, protestos e está na linha de tiro de um projeto de flexibilização que pode empurrá-la para a meia noite, de acordo com a vontade da rádio.

É um raro caso de acordo que vai ficar ruim para todos as partes: as emissoras tentarão reanimar o horário morto das sete da noite, mas continuam com um trambolho de uma hora, obrigatório e inadequado. Aos três poderes restará um fiapo de audiência nas grandes praças e um silêncio ensurdecedor dos rádios desligados nos rincões onde se dorme com as galinhas. E o cidadão que se lasque e cate o conteúdo na contramão do seu horário e hábito de ouvir rádio. Ou seja, a comunicação não vai comunicar.

Isso porque amarrando o dinossauro ao rádio tem a legislação que ignora solenemente o passar do tempo. Quando nasceu, nos anos 30, a “Hora”, depois “Voz” era relevante, porque o rádio era fonte de informação

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tem umno rádio

20 Empresa brasil de comunicação

N o conto “O congresso”, Jorge Luis Borges relata a árdua tarefa de um colegiado de argentinos então empenhados em criar

uma entidade que representasse nada mais, nada menos que a totalidade dos homens, de todos os lugares e nações. Seria o “Congresso do Mundo”, que a ninguém excluiria, tendo como sede um sótão empoeirado numa Buenos Aires europeizada de 1899. Como alertava um dos personagens, Twirl, esse desafio ambicioso remetia a um problema filosófico: “Planejar uma assembleia que representasse a todos era como fixar um número exato dos arquétipos platônicos, enigma que durante séculos ocupou a perplexidade dos pensadores”.

As dificuldades daqueles congressistas eram imensas. Não sabiam se deveriam discutir se a Bolívia tinha direito a uma saída para o mar ou se a classe dos engenheiros estava devidamente representada naquele espaço. E uma das questões mais imediatas referia-se à definição de uma biblioteca básica, que reunisse as obras clássicas de todos os países e línguas. Dois integrantes foram incumbidos de viajar ao Velho Mundo para, assim, localizar tais referências imprescindíveis. Um ano mais tarde, eles retornam – com a missão incompleta, evidentemente – e encontram um congresso envolto em antagonismos e deserções, ainda mais distante de seu projeto universal. Pouco tempo

Jorge Pereira Filho, mestre em comunicação

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Coluna acadêmica

21Revista do Conselho Curador

depois, assistem ao idealizador do congresso concluir que aquilo tudo era impossível, registrando: “A tarefa que empreendemos é tão vasta que abarca, agora sei, o mundo inteiro. [...] O Congresso do Mundo começou no primeiro instante do mundo e prosseguirá quando formos pó. Não existe um lugar em que não esteja”.

Certamente, o desafio de uma empresa pública de comunicação é bem menor do que aquele que se impôs o bravo grupo de argentinos. Mesmo com essa ressalva, porém, é de se duvidar se tal tarefa não seria igualmente exasperante: afinal, como prestar um serviço de comunicação universal, que represente a pluralidade da população e responda ainda aos imperativos da imparcialidade, da transparência e da independência?

Essa ambição, que animou ao menos do ponto de vista ideal os mais diversos projetos de comunicação pública ao longo do tempo, está diante hoje de novos desafios. O mundo conectado pelas tecnologias digitais assiste à transformação do ecossistema midiático e à redefinição do próprio sentido de público. Abre-se um novo horizonte de riscos e possibilidades.

Há uma pressão por mudanças em várias frentes e o pano de fundo desse processo não se limita a conjunturas locais. Conglomerados privados, por exemplo, têm atuado em diversas escalas de poder com o objetivo de forçar governos a limitar a atuação da mídia pública. Na Bélgica, por exemplo, a associação patronal dos jornais, com uma decisão de um tribunal da União Europeia, conseguiu fazer que a RTBF reduzisse sua atuação no meio digital, sobretudo na veiculação de notícias.

O enfraquecimento dos Estados nacionais e as políticas de orientação neoliberal sinalizam dificuldades para o financiamento dessas empresas. Na

Inglaterra discute-se o fim da taxa que desde o início do século XX responde pela maior parte do orçamento da emblemática BBC. Na Grécia, em 2013, uma das primeiras medidas do governo alinhado com o Banco Central Europeu foi o fechamento da TV pública local, a Hellenic Broadcasting Corporation (ERT), depois de 75 anos de existência, com a demissão de mais de dois mil funcionários.

É de forte conteúdo simbólico, porém, que a ERT tenha sido reativada logo na chegada do Syriza ao poder, com forte apoio de forças sociais que se opunham ao ajuste fiscal e à redução do papel do Estado na sociedade. E eis aqui a questão das oportunidades.

Alguns pesquisadores internacionais da mídia pública, como Karol Jakubowicz e Michal Glowacki, vêm defendendo que as transformações tecnológicas oferecem uma janela de oportunidade para essas empresas ampliarem o relacionamento com seu público. Eles não se referem às ferramentas genéricas de interação, como a seção de “comentários” ou o “fale conosco”, mas sim de novos padrões de envolvimento e participação.

O desafio de renovar essas iniciativas envolveria, entre outros aspectos, o comprometimento com a própria articulação de seu público, estabelecendo uma dinâmica de participação ampliada do cidadão na sua gestão e no seu conteúdo. A missão da mídia pública, assim, abarcaria um papel não apenas vanguardista, de “educar as massas”, mas também cooperativo, de associar-se às mais diversas iniciativas sociais que apontam para a manutenção e ampliação das conquistas cidadãs.

A EBC, nesse aspecto, tem um ponto de partida privilegiado. Em que pesem suas amarras institucionais, conta com um Conselho Curador como principal mecanismo de participação da sociedade em sua gestão. Mesmo que sua criação tenha tido a inspiração de modelos internacionais, sua prática reflete de alguma maneira um caldo de cultura com contornos bem específicos. Está envolta em um movimento mais amplo de setores da sociedade brasileira que, após a ditadura civil-militar, conquistaram uma série de espaços que extrapolavam as possibilidades tradicionais de participação política, em conselhos de políticas públicas, conferências etc.

É preciso reconhecer que os governos e a administração pública, no geral, não costumam entender tais mecanismos de gestão participativa como parceiros. Muitas vezes, os conselhos acabam desprestigiados, desnutridos, boicotados, relegados a um papel decorativo. Podem eles também serem instrumentalizados, direcionados a não provocar desgastes indesejáveis. Há outras ocasiões em que esses próprios mecanismos sucumbem às suas contradições, desvirtuando-se de seu comprometimento de viabilizar o diálogo com o cidadão. São falhos tanto em prestar contas de suas atividades, como também se mostram incapazes de articular a energia social que os legitima.

De fato, os desafios da ampliação da participação substantiva numa gestão democrática são imensos. No caso da mídia pública, essa questão é ainda mais relevante, pois tudo indica que o caminho para repactuar-se com a sociedade passa inevitavelmente pelo fortalecimento de seus laços com o usuário. De qualquer forma, está claro que os velhos paradigmas já não são mais suficientes. E colocar-se ao lado do campo social comprometido com os valores democráticos, contribuindo para animá-lo, parece ser uma saída bem mais promissora do que esperar respostas vindas de sótãos empoeirados, distantes da turbulenta vida cotidiana.

22 Empresa brasil de comunicação

Ouvidora

Joseti Marques, ouvidora-geral da EBC

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faz

N esta primeira edição

do ano da Revista do

Conselho Curador,

fazemos uma prestação de contas

resumida do trabalho da Ouvidoria

e da participação do público ao

longo do ano que passou. Em 2015,

a Ouvidoria recebeu um total de

7.517 manifestações referentes a

todos os veículos da EBC – foram

reclamações, elogios, comentários,

pedidos diversos de informação. Os

elogios, embora em menor número

do que as reclamações, guardam

uma justificativa que nos faz pensar

que os usuários do sistema de mídia

pública – leitores, ouvintes, internautas,

Palavra da Ouvidoria

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23Revista do Conselho Curador

telespectadores – estão muito mais satisfeitos do que

possa parecer quando comparamos os números: são

1.307 reclamações contra 443 elogios. É que, em geral,

quem está satisfeito raramente dedica algum tempo para

enviar uma mensagem atestando satisfação, enquanto

a indignação dos que não se sentem contemplados em

suas expectativas é o motor que leva o usuário a registrar

uma queixa.

Além disso, entendemos que somente reclama quem se

importa e quer ver o problema resolvido, porque valoriza

aquilo de que está se ocupando. E é essa percepção

que faz com que a Ouvidoria receba elogios e críticas

com a mesma satisfação. Os elogios alegram a todos

os envolvidos na realização do trabalho, que devolvem

a aprovação com palavras gentis de agradecimento.

Temos a certeza de que os elogios também estimulam,

nos profissionais da EBC, a busca pelo aprimoramento e

pela melhoria da qualidade. Mas são as reclamações que

mais mobilizam a Ouvidoria. Consideramos que a crítica

é um importante instrumento de gestão para a qualidade

e um norteador para o aprimoramento. A Ouvidoria não

se exclui dessa oportunidade, pois também busca ouvir

críticas ao trabalho que realiza.

No final de 2015, a Ouvidoria fez uma pesquisa de

satisfação sobre o serviço que prestamos ao longo do

ano. Enviamos 541 formulários às pessoas que entraram

em contato com a Ouvidoria para fazer críticas, elogios,

comentários ou simplesmente pedir uma informação.

Tivemos retorno a pouco mais de 21% dos questionários

enviados. Uma pequena amostra, mas com elementos

sugestivos sobre a percepção dos usuários do sistema

público sobre o serviço de Ouvidoria e, como acréscimo,

sobre os veículos da EBC.

A faixa etária predominante entre os que nos retornaram

vai de 41 anos a mais de 60, com 66,9% dos entrevistados.

O grau de escolaridade da maioria, 67%, é de nível

superior. O estado da federação que mais se comunica com

a Ouvidoria é o Rio de Janeiro, com 27% das demandas,

seguido pelo Distrito Federal, com 20%; São Paulo, com

10,4%; Paraná, com 6,1%, e Minas gerais, com 4,3%. Os

estados que, durante o ano de 2015, não tiveram registro

de manifestações de usuários foram Alagoas, Maranhão,

Piauí, Rio Grande do Norte, Roraima e Tocantins.

Além das respostas objetivas às questões específicas

de atendimentos de Ouvidoria, os respondentes fizeram

comentários em espaço reservado às manifestações livres.

Quase todos que avaliaram a Ouvidoria fizeram também

comentários sobre os veículos aos quais direcionaram suas

primeiras manifestações. Tivemos elogios, mesclados com

sugestões e críticas, mas o resultado geral foi animador:

82% dos usuários dos serviços de Ouvidoria marcaram que

estão “muito satisfeitos” ou “satisfeitos”, enquanto 17,9%

declararam estar “muito insatisfeitos” ou “insatisfeitos”.

Um dos elogios mais enfáticos: “Gostaria de parabenizar

a equipe da Ouvidoria da EBC pelo excelente relatório de

prestação de contas. Um material que deveria ser usado

em sala de aula, nos cursos de Comunicação Social.

Reflexivo, profundo e abrangente, o texto marca uma

firme posição naquilo que acredito serem os principais

marcos da comunicação pública no país. Não fugiu de

temas espinhosos, inclusive, tratando sobre greve na

própria empresa. Parabéns e um ótimo 2016 de muito

trabalho e jornalismo de boa qualidade”.

Uma das críticas mais enfáticas: “As respostas que

a empresa dá para a Ouvidoria deixam muito a desejar.

Sinto que falta uma análise crítica da Ouvidoria sobre as

questões, funcionando como mera repassadora de recados. É

preciso que a Ouvidoria tenha um papel ativo, contestando

as respostas da empresa e apresentando soluções.”

Realimentados pelos calorosos elogios, nos debruçamos

agora sobre as valiosas considerações feitas ao nosso

trabalho. E àqueles que nos contemplaram com sua

crítica, o nosso renovado compromisso de continuar

aprimorando a prestação de serviço que realizamos na

sua Ouvidoria da EBC.

24 Empresa brasil de comunicação

Fala, conselheira!

construção da notícia

N o contexto das Teorias

da Comunicação, os

estudos sobre news

making se desenvolvem segundo o

pressuposto de que o processo de

apuração, edição e divulgação de uma

notícia obedece a critérios que permitem

determinar se um acontecimento merece

relato e/ou investigação jornalísticos, ou

seja, se é justificável sua entrada na pauta

do veículo de comunicação.

A noticiabilidade corresponde, portan-

to, ao conjunto de critérios, operações e

instrumentos com os quais os veículos de

informação enfrentam a tarefa de escolher

cotidianamente, de um número imprevisível

e indefinido de acontecimentos, aquilo

que será notícia. Em resumo, os meios

Ana Luiza Fleck Saibro, conselheira

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EBC

Empresa Brasil de Comunicaçãojornalismo no

A da

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25Revista do Conselho Curador

de comunicação atribuem valores-notícia (news values)

aos fatos como critérios de seleção de notícias.

Juízos de valor baseados na experiência, atitudes e

expectativas nas redações acabam por influenciar o que será

apurado e veiculado. Igualmente, exigências organizativas

e estruturais, além de características técnico-expressivas

próprias de cada meio de comunicação de massa são ele-

mentos fundamentais nesse processo. É preciso destacar

que os valores-notícia podem variar ao longo do tempo,

inclusive como consequência de inovações tecnológicas.

Nas mídias privadas, o que vai

ser notícia ou não, o que define a

inclusão de determinadas pautas

e a divulgação de certos fatos ou

eventos em detrimento de outros,

depende, por certo, dos interesses

comerciais envolvidos nesse pro-

cesso de construção da notícia. Os

veículos de informação enfrentam

a concorrência com outras mídias e

outros campos de conteúdo como o

entretenimento. Para sua viabilização

econômica, constroem estratégias

para a manutenção do interesse pelo

noticiário que oferecem ao público.

O sistema estatal (ou gover-

namental) de comunicação, por

óbvio, tem sua narrativa calcada

em valores-notícia que se coadunam com as funções

principais de prover informação oficial sobre os atos

do governo, além de divulgar campanhas sanitárias,

educativas e outras de utilidade pública. Os jornalistas

atuam quase como assessores de imprensa ou image

-makers responsáveis pela política de comunicação do

governo, da construção da imagem pública do governo e

do governante, sempre com a perspectiva de conquistar

a legitimação de suas ações.

E que critérios de noticiabilidade, que valores-notícia,

orientam o jornalismo praticado nos veículos do sistema

público de radiodifusão? Mais especificamente, para os

fins deste artigo, como é construída a notícia no âmbito

da Empresa Brasil de Comunicação (EBC)? Que fatores

representam, ou podem representar condicionamentos

ou sujeições, ou, a que tipo de constrangimentos estão

submetidos os jornalistas das emissoras da empresa em

suas rotinas diárias?

Evidentemente, os valores-

notícia aí adotados devem se

diferenciar daqueles adotados

pelos veículos comerciais,

onde a seleção do que é no-

tícia ou não tem como filtro

fundamentalmente os interes-

ses econômicos da empresa

jornalística. Tampouco podem

replicar os critérios que orien-

tam a construção da notícia

nas redações dos veículos

estatais (ou governamentais)

de comunicação, destinados a

propagar mensagens oficiais

do Poder Executivo.

O jornalismo na comuni-

cação pública deve se caracterizar pela autonomia política

perante os governos, ser livre das pressões dos poderes

econômicos, ser imparcial e independente, embora seja

forçoso admitir a impossibilidade real da existência de

uma prática jornalística profissional verdadeiramente

independente, objetiva e isenta, totalmente livre de

constrangimentos.

Se é verdade que o jornalismo da EBC tem conseguido, em certa medida, diferenciar-se do agendamento e da tematização das pautas propostas pela mídia privada, ainda precisa demonstrar seu distanciamento definitivo dos traços distintivos da comunicação estatal.

26 Empresa brasil de comunicação26

Fala, conselheirA!

Se é verdade que o jornalismo

da EBC tem conseguido, em certa

medida, diferenciar-se do agenda-

mento e da tematização das pautas

propostas pela mídia privada, ainda

precisa demonstrar seu distanciamento

definitivo dos traços distintivos da

comunicação estatal.

O modelo de gestão que deter-

minou o atrelamento da empresa à

Secretaria de Comunicação Social da

Presidência da República (SECOM) e

a dupla missão de gerir a comunicação

pública e a tarefa de operar os canais

e serviços de divulgação do Governo

Federal, cria um ambiente pouco

favorável à liberdade jornalística.

Isso não quer dizer que a empresa

seja cotidianamente instrumentalizada

pelo Planalto, mas neste quadro de

ambiguidade não é preciso interfe-

rência governamental direta: basta a

inevitável autocensura dos jornalistas,

algo natural em um modelo marcado

pela presença do Executivo Federal.

E a face mais visível dessa presença

no ambiente da EBC, também com

efeitos danosos para o jornalismo

e para a própria programação das

emissoras, é a constante nomeação de

profissionais da Secom para exercerem

cargos na EBC e vice versa, num

movimento análogo ao fenômeno

das “portas giratórias”, usualmente

aplicado pela teoria às relações entre

agentes públicos e privados.

A organização Transparência

Internacional, dedicada ao combate à

corrupção, caracteriza o fenômeno da

porta giratória como um movimento

de pessoas entre posições no serviço

público e cargos no setor privado, nas

duas direções, que invariavelmente

gera conflito de interesses.

Não é difícil fazer uma analogia

entre essas situações e o contexto das

relações entre a Secom e a EBC. Esse

movimento de pessoas entre os dois

órgãos também pode criar situações

de conflito de interesses com reflexos

indesejáveis para a missão da empresa.

De fato, uma pessoa oriunda da Secom

pode permitir que a agenda do seu

trabalho anterior influencie suas ações

e funções na EBC; do mesmo modo,

a transferência de altos funcionários

da empresa diretamente para cargos

de assessoria direta da Presidência da

República pode ensejar no mínimo um

questionamento sobre a autonomia e a

independência possíveis no ambiente

de trabalho da empresa.

De outra parte, é preciso estancar

a prática deletéria de ocupação de

significativo número de cargos de

direção e de gerência da EBC por

indicação política, quando deveriam

ser preenchidos exclusivamente com

base em qualificação, desempenho e

perfil profissional. O aparelhamento

das ferramentas da comunicação

pública compromete sobremaneira

a independência e a autonomia do

sistema. Experiência na área da

comunicação e da administração

pública, somados à desejável isenção

partidária, são requisitos necessários

para todos quantos assumam cargos

na empresa.

O enfrentamento e o equacio-

namento desses vícios parecem ser

o caminho para a afirmação de um

jornalismo equilibrado, que prime

pelo contraditório, pelo aprofunda-

mento de questões e, principalmente,

que evidencie a diferença entre os

objetivos da comunicação pública

e os objetivos da comunicação

governamental. Basta, para tanto,

colocar em prática, materializar, os

critérios de noticiabilidade previstos

no próprio Manual de Jornalismo

da empresa, que assim estabelece:

a transmissão das informações na

EBC “devem ser mediadas por um

processo ético, rigoroso, criterioso,

isento, imparcial, sem preconceito

e independente – na sua apuração,

organização, hierarquização, aferição

e difusão dos acontecimentos”.

27Revista do Conselho Curador

Curadoria

Felipe Berlim, trabalhador da EBC

J á quando era criança,

dona Gerusa, sua mãe,

percebia que Gervásio

era diferente das outras crianças. O

primeiro susto foi quando completou

um ano de idade. Em vez de dizer

“mamãe”, a primeira palavra de

Gervásio foi “não”.

Sua mãe parou de levá-lo ao

parquinho do bairro, pois as outras

mães não gostavam de Gervásio. As

crianças saíam do parque chorando

quando ele estava perto. Dizia para

elas que não eram astronautas, ca-

valeiros, ou super-heróis. Pisava em

tudo, espalhava os brinquedos, pois

só via areia e plástico sem serventia.

Sua mãe o levou a vários médicos.

Deficit de atenção, autismo, quem sabe

algum retardo no desenvolvimento.

Até que um médico chegou por fim

a uma conclusão:

- Seu filho é perfeitamente normal.

Ele só não tem imaginação.

Gervásio ia bem no colégio, como

qualquer criança de sua idade. Mas

nas aulas de desenho, ele riscava o

papel sem propósito. Às vezes, pintava

uma folha inteira de uma cor só. A

professora tentava dar uma forcinha:

- Que lindo pôr do sol você fez

aqui, Gervásio!

- Não, é só uma folha de papel

pintada de vermelho.

Foi assim até chegar ao Ensino

Médio. Ele ia bem em Física, Química,

Matemática. Mesmo em História e

Geografia ele ia bem. O problema

era a aula de redação. Gervásio en-

tregava sempre uma folha em branco.

A professora conversou com Gerusa

na reunião de pais:

- Algum problema em casa?

- Nenhum. O Gervásio só não

tem imaginação.

Quando Gervásio foi prestar o

vestibular, Gerusa sugeriu que seu

filho fizesse matemática, pois acre-

ditava que a falta de imaginação não

ia ser um problema. Ledo engano.

Gervásio fez o curso até o fim, com

ótimas notas. Só precisava fazer o

trabalho final para pegar o diploma.

Mas desapontou. Gervásio tinha uma

ótima memória, mas não a imaginação

para encontrar um assunto, ou criar

uma solução nova para um problema

antigo. Gervásio era uma rua sem

saída, e nunca conseguiu se formar.

Gervásio conseguiu um emprego

numa firma. Porém nunca saiu do

mesmo trabalho. Era muito eficiente,

mas nas primeiras reuniões, sempre

que perguntado, não sabia o que

dizer para aumentar as vendas. Logo

começaram a não mais chamá-lo. E

enquanto seus colegas angariavam

novas posições, Gervásio continuava

na mesma mesa, em seu trabalho

organizado e metódico.

Gervásio não tinha uma música

favorita, não lia romances, não tinha

namoradas. Seus gostos se resumiam

àquilo que lia nas revistas ou ao que

as pessoas lhe diziam que era bom.

Gervásio não tinha time de futebol,

nem discutia sobre política. Ia à missa

por que diziam que era importante

ter uma religião. Mas ali se sentava,

repetia o que escutava sem entender,

e no final dizia “amém”.

Nunca foi a uma passeata, não era

a favor nem contra a revolução de

costumes. Só gostava de algo quando

todos já concordavam com ela.

Pagava todos os seus impostos,

era um bom cidadão. Nunca amou.

Mas também nunca odiou ninguém.

Sempre com a maioria, Gervásio

era a favor do direito das mulheres

quando todos já eram, e contra um

beijo gay na televisão, já que todos

se enojavam. Mas dava bom dia para

o casal de homens vizinho do seu

apartamento, já que todos também

davam bom dia.

Um belo dia, Gervásio se foi.

Gervásio já estava velhinho. O casal

gay foi no seu enterro. Pobre Gervá-

sio. As nuvens, nas quais nunca vira

castelos, encobriam o cemitério neste

dia. Jogaram algumas rosas em seu

túmulo. As mesmas rosas que Gervásio

nunca oferecera a alguém, pois via

nelas somente flores, e não paixões.

Voltando para casa, o casal se

perguntava se alguma vez Gervásio

havia vivido.

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