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Entrevista com Bernardo Kucinski: O Homem que lia os jornais para o presidente Marx e a Nova Gazeta Renana – sobre a liberdade de imprensa A mobilidade e a hiperconexão como tecnologias de vigilância na sociedade de controle Comunicação, mito e televisão: o herói entregou o coração a Jesus Fotojornalismo: entre a premiação da morte e a face ridícula do poder Razão versus emoção: a narrativa romântica na gravura de Louise Bourgeois Sob o signo da saturação: os sentidos corporais na e para comunicação humana São Paulo – século XXI – eventos e turismo - momento de (re) pensar a hospitalidade A distopia no enredo de filmes publicitários da marca O Boticário Reflexões sobre o papel comunicacional da marca no contexto das organizações Resenhas: A música no cinema brasileiro: os inovadores anos sessenta, de Irineu Guerrini Júnior Walter Smetak: o alquimista dos sons, de Marco Scarassatti Empreintes de Roland Barthes, de Daniel Bougnoux. communicare Revista do Centro Interdisciplinar de Pesquisa — Faculdade Cásper Líbero Volume 9 Edição 2 2º Semestre de 2009 www.facasper.com.br/cip iSSN 1676-3475 Nesta edição:

Revista Communicare (Sample)

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Exemplo do novo Projeto Gráfico da Revista Communicare (Faculdade Cásper Líbero)

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Entrevista com Bernardo Kucinski: O Homem que lia os jornais para

o presidente • Marx e a Nova Gazeta Renana – sobre a liberdade

de imprensa • A mobilidade e a hiperconexão como tecnologias

de vigilância na sociedade de controle • Comunicação, mito e

televisão: o herói entregou o coração a Jesus • Fotojornalismo: entre

a premiação da morte e a face ridícula do poder • Razão versus

emoção: a narrativa romântica na gravura de Louise Bourgeois •

Sob o signo da saturação: os sentidos corporais na e para

comunicação humana • São Paulo – século XXI – eventos e turismo -

momento de (re) pensar a hospitalidade • A distopia no enredo

de � lmes publicitários da marca O Boticário • Re� exões sobre o

papel comunicacional da marca no contexto das organizações •

Resenhas: A música no cinema brasileiro: os inovadores anos

sessenta, de Irineu Guerrini Júnior • Walter Smetak: o alquimista

dos sons, de Marco Scarassatti • Empreintes de Roland Barthes,

de Daniel Bougnoux.

communicareRevista do Centro Interdisciplinar de Pesquisa — Faculdade Cásper Líbero

Volume 9Edição 2

2º Semestre de 2009

www.facasper.com.br/cip

iSSN 1676-3475

Nesta edição:

revi

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– 2º

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estre

de

2009

Faculdade Cásper LíberoAv. Paulista, 900 - 6º Andar

01310-940 - São Paulo (SP) - BrasilTel.: (0xx11) [email protected]

01 e 196 - Capa.indd 196 13/1/2010 17:38:18

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revista

communicare

Volume 9 – Edição 22º Semestre de 2009iSSN 1676-3475www.facasper.com.br/cip

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Communicare: revista de pesquisa / Centro Interdisciplinar de Pesquisa, Faculdade Cásper Líbero. —v. 9, nº2 (2009). — São Paulo: Faculdade Cásper Líbero, 2009.

SemestralISSN 1976-3475

1. Comunicação social peroódicos I. Centro Interdisciplinar de Pesquisa da Faculdade Cásper Líbero

CDD 302.2

04-05 Expediente.indd 4 13/1/2010 17:44:00

revista

communicare

Faculdade Cásper LíberoFundação Cásper Líbero

Presidente da Fundação Cásper Líbero: Paulo CamaradaSuperintendente Geral: Sérgio Felipe dos SantosDiretora da Faculdade: Tereza Cristina Vitali

Centro Interdisciplinar de PesquisaCoordenador Geral do CIP: Maria Goreti Juvêncio Sobrinho FrizzariniMonitoria do CIP: : Bruna de Campos Lima Xavier, Cauê Fernandez Fagerstron Fabiano, Juliana Regina Machado, Mariana Rodrigues, Priscilla Coradete de Almeida.

Revista CommunicareFaculdade Cásper Líbero

Editor: Heitor Ferraz de Mello

Conselho ConsultivoAdriano Duarte Rodrigues (Universidade Nova de Lisboa) / Alberto Efendy Maldonado (Unisinos) / Ana Maria Camargo Figueiredo (FCL)

/ Andréa Florentino Barletta (FCL) / Antônio Roberto Chiachiri Filho (FCL) / Cláudio Novaes Pinto Coelho (FCL) / Daniela Osvald Ramos

(FCL) / Dimas Antonio Künsch (FCL) / Guilhermo Orozco Gómez (Universidad de Guadalajara) / Heloíza Gomes de Matos (FCL) / Irineu

Guerrini Júnior (FCL) / Ivone Lourdes de Oliveira (PUC-MG) / Joana Puntel (Sepac) / Juremir Machado da Silva (PUC-RS) / Liana Gottlieb

(FCL) / Luiz Carlos Assis Iasbeck (UPIS-DF e UCB-DF) / Magda Rodrigues da Cunha (PUC-RS) / Malena Segura Contrera (UNIP) / Maria

Aparecida Baccega (USP e ESPM) / Mauro de Souza Ventura (UNESP)/ Monica Rebecca Nunes (FAAP) / Newton Duarte Molon (FCL) / Nilda

Jacks (UFRGS) / Teresinha Maria de Carvalho Cruz Pirez (PUC-MG) / Roberta Cesarino Iahn (FCL) / Rosangela Petta (FCL) / Sabina Reggiani

Anzuategui (FCL) / Wilson da Costa Bueno (UMESP)

Versão para o inglês: Cauê Fabiano, Igor Fuser, Newton Duarte Molon, Sabina Reggiani Anzuategui.Versão para o espanhol: Antón Castro Míguez, Igor Fuser, Newton Duarte Molon, Pedro Henrique Falco Ortiz.Revisão: Cauê Fernandez Fagerstron Fabiano, Juliana Regina Machado, Priscilla Coradete de Almeida.Projeto grá� co: Danilo BragaArte e editoração: Núcleo Editorial da Faculdade Cásper Líbero, Danilo Braga e Natalia JunqueiraTiragem: 1.000 exemplares.

RedaçãoFaculdade Cásper LíberoAv. Paulista, 900 – 6º Andar – São Paulo – SP – CEP: 01310-940Telefone: (11) 3170-5878Email: [email protected]

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revista

communicare

Faculdade Cásper LíberoFundação Cásper Líbero

Presidente da Fundação Cásper Líbero: Paulo CamaradaSuperintendente Geral: Sérgio Felipe dos SantosDiretora da Faculdade: Tereza Cristina Vitali

Centro Interdisciplinar de PesquisaCoordenador Geral do CIP: Maria Goreti Juvêncio Sobrinho FrizzariniMonitoria do CIP: : Bruna de Campos Lima Xavier, Cauê Fernandez Fagerstron Fabiano, Juliana Regina Machado, Mariana Rodrigues, Priscilla Coradete de Almeida.

Revista CommunicareFaculdade Cásper Líbero

Editor: Heitor Ferraz de Mello

Conselho ConsultivoAdriano Duarte Rodrigues (Universidade Nova de Lisboa) / Alberto Efendy Maldonado (Unisinos) / Ana Maria Camargo Figueiredo (FCL)

/ Andréa Florentino Barletta (FCL) / Antônio Roberto Chiachiri Filho (FCL) / Cláudio Novaes Pinto Coelho (FCL) / Daniela Osvald Ramos

(FCL) / Dimas Antonio Künsch (FCL) / Guilhermo Orozco Gómez (Universidad de Guadalajara) / Heloíza Gomes de Matos (FCL) / Irineu

Guerrini Júnior (FCL) / Ivone Lourdes de Oliveira (PUC-MG) / Joana Puntel (Sepac) / Juremir Machado da Silva (PUC-RS) / Liana Gottlieb

(FCL) / Luiz Carlos Assis Iasbeck (UPIS-DF e UCB-DF) / Magda Rodrigues da Cunha (PUC-RS) / Malena Segura Contrera (UNIP) / Maria

Aparecida Baccega (USP e ESPM) / Mauro de Souza Ventura (UNESP)/ Monica Rebecca Nunes (FAAP) / Newton Duarte Molon (FCL) / Nilda

Jacks (UFRGS) / Teresinha Maria de Carvalho Cruz Pirez (PUC-MG) / Roberta Cesarino Iahn (FCL) / Rosangela Petta (FCL) / Sabina Reggiani

Anzuategui (FCL) / Wilson da Costa Bueno (UMESP)

Versão para o inglês: Cauê Fabiano, Igor Fuser, Newton Duarte Molon, Sabina Reggiani Anzuategui.Versão para o espanhol: Antón Castro Míguez, Igor Fuser, Newton Duarte Molon, Pedro Henrique Falco Ortiz.Revisão: Cauê Fernandez Fagerstron Fabiano, Juliana Regina Machado, Priscilla Coradete de Almeida.Projeto grá� co: Danilo BragaArte e editoração: Núcleo Editorial da Faculdade Cásper Líbero, Danilo Braga e Natalia JunqueiraTiragem: 1.000 exemplares.

RedaçãoFaculdade Cásper LíberoAv. Paulista, 900 – 6º Andar – São Paulo – SP – CEP: 01310-940Telefone: (11) 3170-5878Email: [email protected]

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Sumário

Apresentação09 Editorial

Heitor Ferraz Mello

Bernardo Kucinski: O Homem que lia os jornais para o presidente Carlos Costa & Dulcília Buitoni

Entrevista13

ArtigosComunicação, tecnologia e política

Marx e a Nova Gazeta Renana – sobre a liberdade de imprensa Marx and Neue Rheinische Zeitung - On the Press Freedom Lívia Cotrim

A mobilidade e a hiperconexão como tecnologias de vigilância na sociedade de controle The Mobility and the Hyperconnection as Surveillance Technologies in the Society of Control Gustavo da Silva Motta

Comunicação, mito e televisão: o herói entregou o coração a JesusCommunication, myth and television: the hero gives his heart to Jesus Dimas A. Künsch & Celso A, Malheiros

Comunicação, meios e mensagens

Fotojornalismo: entre a premiação da morte e a face ridícula do poder Photojournalism: between the death awarding and the ridiculous face of power Thaís Montenegro Chinellato

Razão versus emoção: a narrativa romântica na gravura de Louise Bourgeois Reason versus emotion: the romantic narrative in the engraving of Louise Bourgeois Maria Cristina Mendes

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Sob o signo da saturação: os sentidos corporais na e para comunicação humana Under the sign of saturation: the body senses in and for the human communication

Rodrigo Fontanari

São Paulo – século XXI – eventos e turismo - momento de (re) pensar a hospitalidade

São Paulo – XXI century – Events and Tourism – moment to (re)think the hospitality

Celia Maria de Moraes Dias & Reinaldo Miranda de Sá Teles

A distopia no enredo de filmes publicitários da marca O Boticário The dystopia in the plot of the O Boticário brand advertising films

Renato Vercesi Mader & Viviane Rangel

Reflexões sobre o papel comunicacional da marca no contexto das organizações Reflections on the role communication brand in organizational context

Hérica Luzia Maimoni

Comunicação e mercado

Resenhas

A inovação musical no cinema GUERRINI, JÚNIOR, Irineu. A música no cinema brasileiro: os inovadores anos sessenta

Marco Vale

Multimídia desplugada SCARASSATTI, Marco. Walter Smetak: o alquimista dos sons

Giuliano Obici

As marcas de Barthes BOUGNOUX, Daniel; et. all. Empreintes de Roland Barthes

Rodrigo Fontanari

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Normas para o envio de originais 193

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Pesquisadores docentes no 1º semestre de 2009 e pesquisas em desenvolvimento

Pesquisadores discentes no 1º semestre de 2009 e pesquisas em desenvolvimento

Ana Maria Camargo Figueiredo A teledramaturgia como lócus de intersecção da Comunicação e das Ciências Sociais

Andréia Florentino Barletta Signos da publicidade: uma abordagem histórico-visual.

Claudinei Benitez Luque Nakasone A fotografia no cartaz: um estudo sobre a relação da imagem fotográfica no cartaz da Cia. De Dança Grupo Corpo.

Daniela Osvald Ramos Usabilidade e edição de informação no site da Faculdade Cásper Libero.

Débora Burini TV BRASIL: uma nova alternativa no ar? Um estudo sobre a grade de programação

Eliany Salvatierra Machado Práticas e teorias educomunicacionais – um estudo dos trabalhos apresentados na Intercom de 2000 a 2007.

Elisa Moura Marconi Bicudo PereiraA faixa Jornalística do FM paulistano: surgimento e consolidação de um novo segmento e um novo público.

Ethel Shiraishi Pereira Isso não tem importância: eventos e sustentabilidade na Sociedade do Espetáculo

Gilberto Maringoni de Oliveira Comunicações na América Latina: avanço técnico, difusão e concentra-ção de capital (1870-2008).

Igor Fuser Os diários de São Paulo e a pluralidade política nos meios de comunica-ção: o caso do Destak

Irineu Guerrini Júnior Loucos por diálogo: um estudo comparativo de programas de rádio pro-duzidos por pessoas com transtornos mentais no Estado de São Paulo

Liráucio Girardi Júnior A metáfora da conversação e as trocas simbólicas no ciberespaço.

Newton Duarte Molon Redes sociais, novo lócus político.Pedro Henrique Falco Ortiz Mais do Mesmo? Desafios contemporâneos na construção do sistema de TV Pública no Brasil.

Regina da Graça Soler Simões Notícias em cambalhotas: Um telejornalismo produzido especialmente para o público infanto-juvenil.

Roberta Cesarino Iahn As redes de criação publicitária – Os processos de criação e a formação profissional na contemporaneidade.

Rodney de Souza Nascimento Das estratégias globais ao formato local. O discurso publicitário adap-tado às necessidades de cada público.

Rosangela Petta Enredos: quando o relato jornalístico leva ao exercício estilístico e chega à literatura de não-ficção.

Sabina Reggiani AnzuateguiHistória da Telenovela Brasileira – questões de método.

Sérgio José Andreucci Júnior A formação acadêmica e o novo perfil do profissional de Relações Públicas no mercado brasileiro.

Sílvio Henrique Vieira Barbosa Telenovela, Merchandising Social e Cidadania.

Alexandre Corrêa FacciollaA capacidade narrativa da fotografia de fotojornalismo.Orientador: Profa. Dra. Ducília Buitoni

Alexandre Vieira da Rocha de AragãoAs vozes e Vargas: O Globo e Ultima Hora em agosto de 1954Orientador: Prof. Dr. Cláudio Pinto

André Tito de AguiarO pensamento comunicacional na América Latina e os Estudos Cult-urais.Orientador: Prof. Ms. Newton Molon

Fernanda de Araujo PatrocínioTraços da cultura heróico-mítica no jornalismo contemporâneo: as re-portagens da FSP e da CBN a respeito dos conflitos entre Rússia e Geór-gia em 2008Orientador: Prof. Dr. José Eugênio de Oliveira Menezes

Gabriel Henrique de Paula CarneiroO diálogo metalingüístico no cinema de Guilherme de Almeida Prado.Orientador: Prof. Dr. Gilberto Maringoni

Gabriela Silva do NascimentoAtravés da cultura pop e o que Alice encontrou lá.Orientador: Prof. Dr.Welington Andrade.

Juliana Mara de Freitas DiasO sistema do cordel: a literatura da comunicação Orientador: Profa. Dra. Ana Maria Camargo Figueiredo

Juliana Silva FaddulA imagem e o invisível do discurso jornalístico - análise de sites de parti-dos políticos: DEM e PSOL.Orientador: Prof. Dr. Sérgio Amadeu

Karina Gomes da SilvaO repórter e o signo da relação: um estudo de caso do Projeto São Paulo de Perfil”Orientador: Prof. Dr. Liraucio Girardi Júnior

Laisa Beatris Silva PereiraOs novos rumos do fotojornalismo na era digital. Um estudo de caso do Foto Repórter.Orientador: Prof. Ms. Ari Vicentini.

Lídia Rogatto e SilvaJornalismo Investigativo: ética e condições de prática.Orientador: Prof. Dr. Luís Mauro Sá Martino

Lidia Zuin de MouraWired Protocol 7: um estudo sobre Serial Experiments Lain e a alucina-ção consensual do ciberespaço. Orientador: Prof. Dr. Walter Teixeira Lima Júnior

Maitê Oliveira FreitasUma nova ordem pós-racial? A apresentação de Barack Obama nas re-vistas Veja e Carta Capital.Orientador: Prof. Dr. Pedro Ortiz

Mariana Guimarães TeixeiraA publicidade é melomaníaca.Orientador: Profa. Ms. Andréa Florentino

Nathalia Garcia D. da CostaA mídia internacional e o conflito Árabe-Israelense. Análise de três pub-licações: O Estado de S. Paulo, Al Jazeera English e The New York Times Orientador: Prof. Ms. Igor Fuser.

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EditorialHeitor Ferraz Mello

A revista Communicare surgiu em 2001. Sua vocação, desde o iní-cio, é a de compartilhar com seus leitores o conhecimento produzido pelo CIP (Centro Interdisciplinar de Pesquisa) da Faculdade Cásper Líbero, como também os trabalhos realizados por pesquisadores que atuam em outras instituições de ensino e pesquisa. A revista, assim, procura ampliar a reflexão e a investigação contemporânea sobre a Co-municação Social.

Com este número, ela passa por sua primeira mudança no aspecto gráfico. Optou-se por um desenho mais simples, com apenas uma colu-na por página, como grande parte das revistas acadêmicas, deixando de lado o modelo anterior, das duas colunas abauladas. Procurou-se, com isso, um maior aproveitamento do papel e também uma maior leveza visual chamando atenção, em primeiro lugar, para o texto dos artigos aqui reunidos.

Claro que uma mudança dessas não pode ser concluída em ape-nas um número. Adaptações futuras certamente ocorrerão e serão bem vindas, desde que o objetivo seja ressaltar o caráter ensaístico e in-terdisciplinar da revista. Uma mudança futura será a criação de uma nova seção, com o título provisório de Dossiê, reunindo artigos sobre um tema específico, com abordagens diferentes e plurais. É uma forma de ampliar a reflexão no campo da Comunicação Social, instigando o debate e o confronto de ideias.

As atuais seções “Comunicação, tecnologia e política”, “Comuni-cação, meio e mensagem”, “Comunicação e mercado”, além das entre-vistas e das resenhas de livros, serão mantidas, seguindo as linhas de pesquisa do próprio CIP. A intenção do dossiê temático é dinamizar a própria revista, assumindo academicamente a responsabilidade de manter o debate intelectual de forma ativa.

A vocação da Communicare para a discussão interdisciplinar, no entanto, está claramente exposta nas páginas desse número. Um fato interessante e que logo chama a atenção do leitor é o núcleo central de

Apresentação

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10 Communicare

Editorial

artigos que aborda o mundo da imagem e seus desdobramentos ideo-lógicos na vida contemporânea. Coincidência? Acaso? Não é possível apontar uma resposta assertiva, mas pelos artigos percebe-se a premên-cia de uma discussão sobre o uso simbólico das imagens nos programas televisivos, no fotojornalismo e nas artes plásticas. Estas análises se encontram reunidas na seção “Comunicação, meio e mensagem”.

Os quatro artigos da seção abordam, de alguma forma, a cons-trução da cena no mundo da informação e da arte: em “Comunicação, mito e televisão”, Dimas A. Künsch e Celso A. Malheiros falam sobre o ritual de conversão à fé cristã neopentecostal em programas televi-sivos; em “Fotojornalismo: entre a premiação da morte e face ridícula do poder”, Thais Montenegro Chinellato desarma o discurso ambíguo do fotojornalismo contemporâneo; em “Razão versus emoção”, Maria Cristina Mendes empreende um leitura da série de gravuras The Puri-tan, da artista Louise Bourgeois; e, por fim, seguindo por outra via, o pesquisador Rodrigo Fontanari analisa, em “Sob o signo da saturação”, o que ele chama de “império da visão”, que estaria ligado aos sentidos da distância, em detrimento aos sentidos de proximidade: o olfato e o paladar.

Esta revista, no entanto, começa com uma entrevista: uma longa e franca conversa com o jornalista Bernardo Kucinski, professor da Es-cola de Comunicações e Artes da USP, e autor de vários livros, como Diálogos da perplexidade, lançado recentemente. Nessa conversa, con-duzida pelos professores Carlos Costa e Dulcília Buitoni, após a defesa de tese de sua última orientanda, Kucinski – que não pretende orientar mais – falou de sua trajetória: de estudante de Física a um dos mais res-peitados jornalistas brasileiros, passando pelos bastidores do período em que esteve trabalhando em Brasília, na Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República. Uma trajetória sempre pautada por uma efetiva participação na vida política do país, não se restringindo ao cômodo universo da notícia pela notícia.

Na seção “Comunicação, tecnologia e política”, Lívia Cotrim apresenta, num belo estudo, a atividade jornalística de Karl Marx, entre 1848 e 1849, na Nova Gazeta Renana, que, como diz a autora, consti-tui-se “como instrumento de organização da classe trabalhadora, pela divulgação de instruções, fundamentadas em informações e análises abrangentes de todos os acontecimentos importantes da revolução ale-mã e européia, no desmascaramento e combate às posições reacionárias

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Volume 9 – Nº 2 – 2º Semestre de 2009 11

Heitor Ferraz Mello

dos junkers e da burguesia”. No artigo seguinte, o pesquisador Gustavo da Silva Motta mergulha na nossa sociedade, altamente informatizada e conectada, para ver os mecanismos de vigilância e controle atuais e a relação de conluio entre Estado e setor privado.

Em “Comunicação e mercado”, a revista apresenta três artigos: “São Paulo – século XXI – eventos e turismo – momento de (re) pensar a hospitalidade”, de Célia Maria de Moraes Dias e Reinaldo Miranda de Sá Teles, no qual os autores avaliam as possibilidades e limitações de São Paulo “no movimento de negócios e de eventos enquanto geradores da modalidade de turismo urbano”. Os dois outros artigos da mesma seção – “Reflexões sobre o papel comunicacional da marca no contexto das organizações”, de Hérica Luzia Moimoni, e “A distopia no enredo de filmes publicitários da marca O Boticário”, de Renato Vercesi Mader e Viviane Rangel, tratam da constituição de marcas de produtos e o seu reflexo na vida contemporânea.

A revista Communicare, desta forma, procura continuar con-tribuindo ativamente para a indissociabilidade entre ensino e pesquisa. A Faculdade Cásper Liberto, o CIP e a Communicare estão abertos a sugestões e propostas da comunidade acadêmica e ao intercâmbio com as diversas áreas do conhecimento, visto que concebem essas ações como meio incontornável para a construção do movimento de idéias e a transformação social no país.

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ARTIGOS29 - 30 Artigos.indd 29 13/1/2010 17:46:23

Marx e a Nova Gazeta Renana – sobre a liberdade de imprensa Marx and Neue Rheinische Zeitung - On the Press Freedom Lívia Cotrim

A mobilidade e a hiperconexão como tecnologias de vigilância na sociedade de controle The Mobility and the Hyperconnection as Surveillance Technologies in the Society of Control Gustavo da Silva Motta

Comunicação, mito e televisão: o herói entregou o coração a JesusCommunication, myth and television: the hero gives his heart to Jesus Dimas A. Künsch & Celso A, Malheiros

Fotojornalismo: entre a premiação da morte e a face ridícula do poder Photojournalism: between the death awarding and the ridiculous face of power Thaís Montenegro Chinellato

Razão versus emoção: a narrativa romântica na gravura de Louise Bourgeois Reason versus emotion: the romantic narrative in the engraving of Louise Bourgeois Maria Cristina Mendes

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Sob o signo da saturação: os sentidos corporais na e para comunicação humana Under the sign of saturation: the body senses in and for the human communication Rodrigo Fontanari

São Paulo – século XXI – eventos e turismo - momento de (re) pensar a hospitalidade São Paulo – XXI century – Events and Tourism – moment to (re)think the hospitality Celia Maria de Moraes Dias & Reinaldo Miranda de Sá Teles

A distopia no enredo de filmes publicitários da marca O Boticário The dystopia in the plot of the O Boticário brand advertising films Renato Vercesi Mader & Viviane Rangel

Reflexões sobre o papel comunicacional da marca no contexto das organizações Reflections on the role communication brand in organizational context Hérica Luzia Maimoni

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Marx e a Nova Gazeta Renana – sobre a liberdade de imprensa Marx and Neue Rheinische Zeitung - On the Press Freedom Lívia Cotrim

A mobilidade e a hiperconexão como tecnologias de vigilância na sociedade de controle The Mobility and the Hyperconnection as Surveillance Technologies in the Society of Control Gustavo da Silva Motta

Comunicação, mito e televisão: o herói entregou o coração a JesusCommunication, myth and television: the hero gives his heart to Jesus Dimas A. Künsch & Celso A, Malheiros

Fotojornalismo: entre a premiação da morte e a face ridícula do poder Photojournalism: between the death awarding and the ridiculous face of power Thaís Montenegro Chinellato

Razão versus emoção: a narrativa romântica na gravura de Louise Bourgeois Reason versus emotion: the romantic narrative in the engraving of Louise Bourgeois Maria Cristina Mendes

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Sob o signo da saturação: os sentidos corporais na e para comunicação humana Under the sign of saturation: the body senses in and for the human communication Rodrigo Fontanari

São Paulo – século XXI – eventos e turismo - momento de (re) pensar a hospitalidade São Paulo – XXI century – Events and Tourism – moment to (re)think the hospitality Celia Maria de Moraes Dias & Reinaldo Miranda de Sá Teles

A distopia no enredo de filmes publicitários da marca O Boticário The dystopia in the plot of the O Boticário brand advertising films Renato Vercesi Mader & Viviane Rangel

Reflexões sobre o papel comunicacional da marca no contexto das organizações Reflections on the role communication brand in organizational context Hérica Luzia Maimoni

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Marx e a Nova Gazeta Renana – sobre a liberdade de imprensa

Lívia CotrimDoutora em Ciências Sociais pela PUC-SP; professora do Centro Universitário Fundação Santo André[email protected]

O artigo aborda a atividade jornalística de Karl Marx em 1848-1849, à frente da Nova Gazeta Renana, diário constituído como arma de ação revolucionária, em cujas páginas a liberdade de imprensa é defendida e discutida em seus elos com as relações sociais, jurídicas e as transfor-mações políticas em curso.Palavras-chave: liberdade de imprensa, revo-lução, marxismo.

AbstractTh e article focuses the journalistic activity of Karl

Marx in 1848-1849, ahead of the Neue Rheinische

Zeitung, daily up as a weapon of revolutionary action

in the pages of which press freedom is defended and

discussed in their links with social, legal and the

political changes underway.

Keywords: press freedom, revolution, Marxism.

ResumenEl artículo examina la actividad periodística de Karl Marx en 1848-1849, delante del Neue Rheinische Zeitung, diario constituído como arma de la acción revolucionaria, en cuyas páginas, la libertad de prensa es defendida y discutida en sus vínculos con las relaciones sociales, jurídicas y los cambios políticos em curso. Palabras clave: libertad de prensa, revolución, Marxismo.

Comunicação, tecnologia e política

Marx and Neue Rheinische Zeitung – On the Press Freedom

31-46 Marx e a Nova Gazeta Renan31 31 13/1/2010 17:46:46

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32 Communicare

Marx e a Nova Gazeta Renana – sobre a liberdade de imprensa

Não são muitos os estudos que se ocupam da produção jornalística de Marx. No entanto, esta é bastante volumosa. Marx produziu contribuições esporádicas para os mais diversos veículos, colaborou ao longo de mais de uma década com o New York Daily Tribune e, em situações distintas, envolveu-se mais diretamente com dois periódicos: a Gazeta Renana e a Nova Gazeta Renana. Para esta última, que, nas conhecidas palavras de Lênin, foi “o melhor, insuperável órgão do proleta-riado revolucionário”, Marx produziu mais de uma centena de artigos.1 É dela que trataremos aqui, concordando com a avaliação de que os artigos da Nova Gazeta Renana “não perderam nada de sua atualidade, de seu ardor revolucionário, de sua agudeza na análise dos acontecimentos. Ao lê-los, sobretudo os de Marx, acredita-mos assistir à história da revolução alemã, da revolução francesa, contada por elas mesmas, tão vivo é o estilo, como profundo é o sentido” (Riazanov, 1983:80-81).

Ao tempo da Nova Gazeta Renana, a imprensa gozava de um ambiente de maior liberdade em comparação aos anos da velha Gazeta Renana. Entretanto, a posição contra-revolucionária da burguesia alemã abrange também a imprensa, de sorte que tanto a utilização das leis existentes quanto os projetos de lei relativos à imprensa propostos pelos representantes daquela classe primam pelo intuito de a restringir. Assim, se entre os artigos de Marx para a Gazeta Renana destacam-se os relativos à defesa da liberdade de imprensa e consequente luta contra a censura, também os textos da Nova Gazeta Renana contemplam o mesmo combate. No entanto, ainda que possam ser identificados traços comuns, saltam à vista as dife-renças de posição.

A participação de Marx na Gazeta Renana,2 primeiro como articulista, logo assumindo o posto de redator-chefe, a partir de outubro de 1842, deu-se antes da afirmação de sua posição própria. Assumindo à época uma filosofia da autocons-ciência, circunscrita pela democracia e pela determinação ontopositiva da politi-cidade3, Marx defendeu com firmeza essa posição, que incluía uma luta cotidiana contra a censura (Eidt, 2001). Em conformidade com suas concepções, Marx en-tendia a imprensa “como lugar privilegiado para as lutas políticas da época”, como portadora “das condições para promover o progresso e o ‘amadurecimento’ do

1. Esses materiais mantêm-se quase totalmente inéditos até o presente momento. Excetuam-se a edição dos quatro artigos que compõem “A Burguesia e a Contra-Revolução”, pela Editora Ensaio, em 1987, com reedição em 1989 (tradução de J. Chasin, Márcia V. M. Aguiar e M. Dolores Prades), e uma pequena seleção de cerca de uma dúzia de artigos, publicada pela revista Margem, nº 16, São Paulo, Educ, 2003 (tradução nossa). A Educ está preparando a publicação da totalidade dos artigos escritos por Marx para a Nova Gazeta Renana, acrescidos daqueles textos acerca dos quais não foi possível identificar se procediam de seu punho ou de Engels.2. Jornal criado em 1842 por representantes da burguesia liberal renana em luta contra o absolutismo prussiano, fechado em 1/04/1843 por decreto deste último.3. Assim se designam as diferentes concepções, presentes desde a Antiguidade, que eternizam a política e o estado e identificam neles “a própria realização do humano e de sua...

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‘espírito político’ do povo” (Eidt, 2001:82). A liberdade de imprensa se efetivaria, não na imprensa conservadora, oficial ou semi-oficial, mas na popular, isto é, aque-la que incorpora o espírito popular, o qual precisaria da imprensa livre para se de-senvolver. Nesse quadro, a imprensa teria “como função mediar a relação entre ad-ministradores e administrados. Ela é, portanto, o lugar necessário para a resolução do conflito entre o governo e o povo” (Eidt, 2001:86). Nas palavras de Marx: “Este elemento complementar, com cabeça de cidadão do estado e coração burguês, é a imprensa livre” (apud Eidt, 2001:86). A liberdade de imprensa aparece, pois, para Marx, como pressuposto da liberdade política. É esta que se põe como horizonte a ser buscado; é nas instituições políticas, no estado político pleno, que a liberdade e a racionalidade humanas poderiam se efetivar.

Além de ser fonte importante para o entendimento das concepções marxia-nas juvenis, foi no decorrer da atividade jornalística na Gazeta Renana que Marx se deparou com a necessidade de reavaliar suas concepções, cujas insuficiências aflora-ram diante da “obrigação embaraçosa de dar a minha opinião sobre o que é costume chamar-se os interesses materiais”, como relata no “Prefácio” de 1859 à Contribuição à crítica da economia política (1973:27). De acordo com a especulação e a determi-nação ontopositiva da politicidade, marcas de seu pensamento juvenil, a instauração do estado político pleno, ainda inexistente numa Alemanha sequer unificada, seria necessária e suficiente para a resolução dos problemas em tela (Eidt, 2001). A obri-gação de tratar dos interesses materiais, mais precisamente de questões decisivas relacionadas à objetivação das relações capitalistas na Alemanha, cujo caráter tardio resumiu mais tarde sob a denominação de “miséria alemã”, impõe a revisão da rela-ção entre estado e sociedade civil e põe em xeque aquele pensamento. Desse itinerá-rio resultará a conquista de uma posição inteiramente nova em relação à filosofia, à ciência e à prática de seu tempo, alcançada pela efetivação de uma tríplice crítica de talhe ontológico à especulação, à politicidade e à economia política.4

Esse autoquestionamento não derivou de problemas de ordem gnoseológica ou metodológica, passíveis de solução pela criação ou uso de um novo método ou de uma nova teoria do conhecimento. A viragem de seu pensamento assumiu caráter ontológico: foi determinada pelo reconhecimento e crítica de modos de ser, não pela recusa unilateral de modos de pensar. “A crítica da filosofia do direito de

...racionalidade. Em outros termos, estado e liberdade ou universalidade e civilização ou hominização se manifestam em determinações recíprocas, de tal forma que a politicidade é tomada como predicado intrínseco ao ser social /.../ positivamente indissociável da autêntica entificação humana, portanto constitutiva do gênero, de sorte que orgânica e essencial em todas as suas manifestações” (Chasin, 2000:132). Ver também, a esse respeito, J. Chasin, 2009. 4. A gênese do pensamento próprio de Marx pelas críticas ontológicas à especulação, à politicidade e à economia política foi amplamente analisada por J. Chasin (2009), o qual, em seu reconhecimento do estatuto ontológico do pensamento marxiano, apóia-se no pioneirismo do filósofo húngaro Georg Lukács, cuja obra de maturidade culmina com a Ontologia do Ser Social.

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Hegel” (1843, texto que restou inacabado) e sua “Introdução”, e “Sobre a questão judaica”, publicados no número único dos Anais Franco-Alemães, bem como “Glo-sas críticas ao artigo ‘O Rei da Prússia e a Reforma Social’”, a respeito da insurreição dos tecelões da Silésia, publicado no Vorwärts!, em 1844, expõem o trajeto dessa ruptura com a especulação e com a determinação ontopositiva da politicidade à luz da apreensão de nexos objetivos, marca da nova posição conquistada – a ana-lítica das coisas.5

Esse trajeto, que parte da ruptura com a noção de estado como instituição racional e determinante da sociedade civil, passando pela crítica da razão política e pela contraposição da emancipação humana à emancipação política, desemboca na configuração da determinação ontonegativa da politicidade (Chasin, 2000b)6 e na decorrente afirmação da “participação política como médium de uma virtual efetivação social, que é posta para além dos marcos da política e do estado político” (Chasin, 1989:17). Nos mesmos anos, os Cadernos de Paris, de 1843, e os Manus-critos econômico-filosóficos, de 1844, ambos publicados postumamente, estampam os primeiros passos na crítica à economia política. Entre 1844 e 1848 Marx des-dobra essa nova posição. Ainda em 1844, redige, em conjunto com Engels, A sa-grada família, publicado em 1845, data da elaboração das Teses ad Feuerbach, que evidenciam a instauração do “novo materialismo”; em fins deste ano e inícios de 1846, escreve A ideologia alemã, também em colaboração com Engels. Em 1847 é publicada a Miséria da filosofia, obra que, apesar da ausência da distinção essencial entre trabalho e força de trabalho, jamais foi desclassificada por seu autor, como demonstra o mencionado Prefácio de 1859. Do mesmo ano data a redação do Ma-nifesto do Partido Comunista (publicado em fevereiro de 1848), o Discurso sobre o livre-comércio e Trabalho assalariado e capital, publicado em 1849 nas páginas da Nova Gazeta Renana.

De sorte que, quando o turbilhão revolucionário eclode quase simultanea-mente em diversas regiões europeias, em fevereiro e março de 1848, Marx já alcan-çara sua fisionomia adulta (Chasin, 1989:23). É nessa condição que, pela primeira e única vez, terá oportunidade de se envolver diretamente num processo revolu-cionário. E a arma que escolhe para travar a batalha é um jornal, a Nova Gazeta Renana, título que marcava a um tempo o elo e a descontinuidade com o periódico que combatera o absolutismo anos antes. Alterado o horizonte a ser perseguido

5. Termo cunhado por Chasin a partir da afirmação, contida na Crítica de Kreuznach, de que o que importa é a lógica da coisa, e não, como em Hegel, a coisa da lógica (Chasin, 2009).6. Expressão que assinala a nova posição alcançada por Marx acerca da política e do estado: a apreensão de que decorrem e expressam, não as melhores qualidades humanas, mas sim as fraquezas da sociabilidade, bem como de que, longe de serem inerentes ao gênero humano como tal, são inerentes apenas ao longo período que Marx denominou de pré-história da humanidade: aquele em que a produção e reprodução da vida ainda se efetiva sobre a base da divisão social do trabalho.

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– a emancipação política cede lugar à emancipação humana, a revolução política é substituída pela revolução radical ou social – modificam-se a avaliação da imprensa e da liberdade de imprensa, sem reduzir seu peso. A escolha de um jornal como arma principal na revolução alemã remete à importância atribuída à difusão e combate de idéias para a organização dos trabalhadores, já explícita na relação entre combate te-órico e prático exposta na Crítica à filosofia do direito de Hegel - Introdução: “É certo que a arma da crítica não pode substituir a crítica das armas, que o poder material tem que ser derrocado pelo poder material, mas também a teoria se transforma em poder material logo que se apodera das massas” (1977). Nessa direção, Marx for-mara, em 1846, o Comitê de Correspondência de Bruxelas, ponto de partida do que deveria ser uma rede de comitês comunistas de correspondência com o fito de rela-cionar e informar alemães, franceses e ingleses, de modo a “chegar a um intercâmbio de ideias e a uma crítica imparcial”. Em 30 de março daquele ano, em uma reunião do Comitê, Marx externou a opinião de que “Em particular, dirigir-se na Alemanha aos operários sem possuir idéias rigorosamente científicas e uma doutrina concreta equivaleria a levar a cabo um jogo desonesto e inútil, uma propaganda em que estaria suposto, de um lado, um entusiasmo apoteótico e, doutro, simples imbecis escutan-do de boca aberta” (Chasin, 1989:19.). Contestado com o argumento de que eram pouco proveitosas análises de gabinete de doutrinas distantes do mundo sofredor e das misérias do povo, pôs-se de pé, deu um murro na mesa e gritou: “A ignorância nunca serviu para nada” (Claudin, 1985:51).

Atesta a mesma preocupação o debate rigoroso e teoricamente intransigen-te que caracterizou a transformação, por influência sua e de Engels, da Liga dos Justos em Liga dos Comunistas. Desse dif ícil processo, que não cabe tratar aqui, resultou um programa – o Manifesto do Partido Comunista – e um novo estatu-to, que, além de outras significativas alterações no funcionamento da organização, liquidava qualquer veleidade conspirativa e convertia a Liga em uma sociedade exclusivamente de propaganda.

Nesse ínterim, Marx escreve para a Deutsche-Brüsseler Zeitung; inicialmente epi-sódica, tal colaboração torna-se permanente de 12/09/1847 a 21/02/1848, data da últi-ma edição desse periódico, que se tornara órgão não-oficial da Liga dos Comunistas.

Em março de 1848, após a derrubada da monarquia e instituição da república pela revolução parisiense, Marx traslada-se para Paris, e de lá para Colônia, na Ale-manha, que sediará a Nova Gazeta Renana. Esta, no entanto, apesar da presença de membros da Liga dos Comunistas em sua redação, não se constituiu como um órgão dela, mas mais propriamente como seu substituto. De acordo com o depoi-mento de um dos dirigentes da Liga, em reunião do Comitê Central realizada em maio ou junho de 1848, Marx propôs sua dissolução, argumentando que era uma

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organização de propaganda, não de conspiração, e nas condições atuais a difusão podia ser feita abertamente, sem necessidade de organização secreta, já que havia liberdade de imprensa e propaganda. Essa versão é corroborada por manifestações posteriores de Marx e Engels. Em 1860, Marx dirá que a atividade da Liga na Ale-manha se interrompeu por si mesma, pois haviam surgido vias mais efetivas para a realização de seus objetivos (Claudin, 1985:89-90). Em 1885, Engels explica que a Liga era uma alavanca demasiado débil para impulsionar o movimento das massas; três quartos de seus filiados, ao voltar para a Alemanha, haviam se dispersado e perdido contato com a organização. Além disso, as condições de cada pequeno estado alemão eram muito diferentes entre si, de modo que a Liga só poderia dar instruções gerais, e estas poderiam ser passadas pela imprensa; e reitera que, desde que haviam cessado as causas que faziam necessária uma Liga secreta, esta perdera sua significação (Engels, 1976).

A NGR constituiu-se, assim, como instrumento de organização da classe tra-balhadora, pela divulgação de instruções, fundamentadas em informações e aná-lises abrangentes de todos os acontecimentos importantes da revolução alemã e europeia, no desmascaramento e combate às posições reacionárias dos junkers e da burguesia e às debilidades e hesitações do partido democrático.

Como Engels relata, quando Marx e ele chegam a Colônia já haviam sido feitos preparativos para a fundação de um periódico; entretanto, “A intenção dos organizadores era dar ao jornal um caráter estritamente local e desterrar-nos para Berlim. Em 24 horas, porém, graças principalmente a Marx, conquistamos o terre-no e nos tornamos donos do jornal” (Engels, 1976:173). A decisão acerca da loca-lização não era ociosa. Dada a fragmentação característica da Alemanha à época,7 em Berlim vigorava ainda o velho Landrecht,8 muito mais conservador e coerciti-vo, particularmente quanto à imprensa, do que o Código de Napoleão , em vigor em Colônia, centro da Renânia. Era esta “a província que passara pela Revolução Francesa, que, com o Código de Napoleão,9 tinha assimilado concepções jurídicas mo-dernas, que mais havia desenvolvido a grande indústria e que constituía, em todos os aspectos, naquela época, a mais progressista região da Alemanha” (Engels, 1976:173).

Nessas condições um pouco menos estreitas, a NGR se constitui como um jornal de “caráter proletário” (Engels). Em seu último número, denunciando o tru-que policial adotado para suprimi-la,10 diz Marx: “As últimas edições da N[ova]

7. A unificação nacional era bandeira central da revolução de 1848, e envolvia a luta contra a monarquia absoluta e propriedade rural feudal.8. O Landrecht de 1794 (Allgemeine Landrecht für die Preussischen Staaten von 1794) era uma súmula do direito civil, do direito de comércio, de troca, marítimo e de segurança, além do direito penal, religioso, público e administrativo; ele consolidava o caráter reacionário da Prússia feudal no âmbito jurídico e vigorou em partes essenciais até a introdução do Código Civil em 1900.9. Código de Napoleão – nome pelo qual ficou conhecida a reformulação, de 1807, do...

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G[azeta] R[enana] não se diferenciam nem por uma vírgula, em tendência e lin-guagem, de suas primeiras ‘amostras’ ”; sua tendência era conhecida, pois “Não declaramos perante os jurados que agora seria ‘tarefa da imprensa minar todos os fundamentos do existente?’ ” (nº 301) Tal tarefa em nada se assemelha à que Marx atribuíra à imprensa em seus artigos da Gazeta Renana. Longe de contribuir para o amadurecimento do espírito, “rumo à encarnação nas instituições políticas” (Eidt, 2001:99), Marx, recusando a hipocrisia daquele pretexto, lembra que a república social fora sempre proclamada: “Para os obtusos que não viram, em toda a nossa avaliação e apresentação do movimento europeu, o fio ‘vermelho’ entretecido – não lhes falamos com palavras francas, inconfundíveis?” – ao que se seguem diversas citações de artigos em que a revolução social é claramente defendida, pois o jornal sempre considerara supérfluo ocultar sua posição: “Não lestes nosso artigo sobre a revolução de junho, e a alma da revolução de junho não era a alma de nosso jor-nal?” A “alma da revolução de junho”, exposta em artigo do nº 27, é a revolução do trabalho contra o capital – a revolução social, e não a revolução política, burguesa, cuja impossibilidade na Alemanha fora afirmada pela NGR, como Marx também prova com outra citação. Em outras palavras, a determinação ontonegativa da po-liticidade é reexplicitada na análise das jornadas de junho como revolução contra o capital e o estado em geral, e na apreensão da revolução política como uma media-ção para a revolução social, mediação impossível no caso alemão.

Coerentemente com o entendimento do atraso da burguesia alemã e sua in-disposição e receio de uma revolução, bem como do baixo desenvolvimento do proletariado, que se posiciona como ala esquerda da burguesia, a Nova Gazeta Renana assumiu o subtítulo “Órgão da Democracia”. Nas palavras de Engels, “Se não tivéssemos procedido assim, se nos tivéssemos negado a aderir ao movimento, incorporando-nos à ala que já existia, que era a mais progressista e, no fundo, era uma ala proletária, com o objetivo de assim levar à frente o movimento, só nos teria restado, como remédio, fazer propaganda do comunismo em qualquer jor-nalzinho local, fundar, em vez de um grande partido de ação, uma pequena seita” (Engels, 1976:173).

Tratava-se, pois, de criar um jornal que alcançasse ampla difusão entre os trabalhadores, tendo por objetivo desenvolver e difundir “ideias rigorosamente científicas e uma doutrina clara”, portanto participar da luta revolucionária com a “arma da crítica”, esforçando-se para transformá-la em “poder material” por sua

...Code civil des Français, de 1804. Este código civil foi introduzido pela França nas regiões conquistadas do oeste e sudoeste da Alemanha. Na Renânia, continuou em vigor mesmo depois da união com a Prússia. O Code Napoléon mantinha no essencial as conquistas da Revolução Francesa e se fundava sobre o terreno da igualdade civil formal.10. O governo alegara que, em seus últimos números, o jornal teria incitado à revolução e à república social, e por isso Marx, seu redator-chefe, deveria abandonar a Prússia.

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assunção pelo proletariado. Tendo Marx como redator-chefe e Friedrich Engels, Heinrich Bürgers, Ernst Dronke, Georg Weerth, Ferdinand Sollf, Wilhelm Wolff e Ferdinand Freiligrath como redatores, a NGR alcançou a tiragem de cinco mil exemplares diários, bastante expressiva para a época; além disso, eram publicados frequentemente edições extras e suplementos, na forma de panfletos. Obrigada a suspender a edição de 26 de setembro a 12 de outubro de 1848, graças à vigência do estado de sítio, atinge seis mil exemplares após a retomada.

No editorial do segundo número, Marx expõe alguns dos princípios que nortearam a NGR: “Espera-se geralmente de todo novo órgão da opinião pública: entusiasmo pelo partido cujos princípios professa, confiança incondicional na sua força, contínua disposição, seja para recobrir os princípios com a força efetiva, seja para embelezar com o brilho dos princípios a fraqueza efetiva. Não corresponde-remos a esta exigência. Não procuraremos dourar derrotas sofridas com ilusões enganosas. (...) Importa-nos que o partido democrático tome consciência de sua situação. Perguntarão por que nos voltamos para um partido, por que não temos em vista preferencialmente o objetivo dos esforços democráticos, o bem-estar do povo, a felicidade de todos sem distinção? Tal é o direito e o hábito da luta, e apenas da luta dos partidos pode resultar a felicidade do novo tempo, não de compromis-sos aparentemente sagazes, de uma hipócrita aliança entre opiniões, interesses e fins antagônicos. Exigimos do partido democrático que tome consciência de sua posição” (nº 2).11

A NGR se põe como um órgão da opinião pública, mas vinculado a determi-nados princípios, ligado a um partido. Não se propõe a ser “imparcial” – entenden-do que todo conhecimento tem a sociabilidade por condição necessária e é sempre interessado –, mas sim objetiva,12 recusando-se a encobrir debilidades do partido ao qual se vincula, e exigindo que este tome consciência tanto de suas condições reais quanto de seus princípios. Essa postura crítica se comprova pela explicitação das debilidades, hesitações e erros do movimento revolucionário, apreendidos em seu enraizamento sócio-histórico, envolvendo as diferentes classes, suas represen-tações parlamentares e jornalísticas e suas manifestações práticas.

Assim, proclamando sua adesão à perspectiva e interesses do povo, a NGR não se dispõe a assumir ou contemporizar com suas ilusões, apoiando “os repre-sentantes de um partido apenas enquanto e na medida em que ele se comporta re-volucionariamente” (nº 105). Marx desdobra essa postura do jornal lembrando que

11. As citações dos artigos de Marx para a Nova Gazeta Renana são extraídas de MARX, K. Nova Gazeta Renana, São Paulo: Educ (no prelo). Entre parênteses, o número da edição em que o artigo foi publicado.12. Marx reconhece que a objetividade depende da posição social do sujeito (bem como da presença histórica do objeto). A respeito da determinação social do pensamento, (ver Marx, 2007, entre outros; Chasin, 2009).

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“não somos uma folha ‘parlamentar’, e por isso não receamos atrair sobre nossas cabeças, de tempos em tempos, a fúria até mesmo da extrema-esquerda de Berlim e Frankfurt. Clamamos aos senhores de Frankfurt que aderissem ao povo, jamais clamamos ao povo que aderisse aos senhores de Frankfurt” (nº 129).13 Em outra oportunidade, acrescenta que a NGR “sempre se diferenciou dos patriotas não só em geral, como especificamente por nunca haver considerado os movimentos po-líticos como um ramo industrial ou uma fonte de sustentação” (nº 243).

Afirmando-se como órgão de combate revolucionário, a NGR traz análises de alto padrão de elaboração teórica, expostas em linguagem contundente, e conclusi-vas. O andamento da particularidade da objetivação do capitalismo na Alemanha, naquele momento crítico em que estava aberta a possibilidade de inflexão; as ilusões que tanto a burguesia quanto o povo entretinham; as relações econômicas entre tra-balho e capital; a diferença entre revolução política e revolução social; a primeira revolução do trabalho contra o capital – as jornadas de junho parisienses; o corpo do estado, particularmente o direito e as forças armadas, sua necessidade e limites históricos; o debate com outros http://www.adobe.com/cfusion/tdrc/handraiser.cfm?product=indesign órgãos de imprensa, de diferentes posições políticas – todos esses temas são abordados no quadro do acompanhamento cotidiano das lutas de classes, que então se desenvolviam “em formas políticas colossais” (nº 264).

Consciente de que para isso era imprescindível à liberdade de imprensa, aproveitada “até a última gota”, Marx denunciou e combateu as propostas de mu-danças legislativas que a limitariam, bem como a tentativa de usar para o mesmo fim as leis existentes, particularmente nos processos movidos contra o periódico. A análise de leis específicas permite avançar no exame da posição do direito no interior do estado e de seu caráter classista, seja quanto ao conteúdo das leis, seja quanto àqueles que a aplicam.

Defendendo o jornal da acusação de calúnia e ofensa a um procurador que era também representante do povo, por haver denunciado as ilegalidades e bruta-lidades cometidas durante a prisão de lideranças de trabalhadores,14 Marx declara que “a imprensa não tem só o direito, tem o dever de fiscalizar rigorosamente os senhores representantes do povo”. A abertura de um inquérito judicial contra a NGR expunha o intuito de “privar a imprensa do direito de julgar a atividade de um representante do povo”, diante do que pergunta: “Para que então a imprensa?” (nº 37). Enumerando atitudes semelhantes tomadas por jornais de outros países sem que os respectivos governos se houvessem contraposto, inclusive no perío-do da Restauração francesa, Marx exibe a medida do reacionarismo do ministério

13. Referências às Assembléias Constituintes de Berlim e Frankfurt, eleitas após a insurreição de 18 de março.14. Extensamente expostas no artigo “Prisões”, nº 35.

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então vigente, no entanto encabeçado por Hansemann, um expoente econômico e político da burguesia renana, que, alçada ao poder pela insurreição de março, pro-cura aí manter-se conciliando com os junkers e a monarquia. Os artigos do Code Pénal referentes à calúnia e injúria, nos quais se baseava o inquérito, são esmiuça-dos, evidenciando-se seu “refinado despotismo”: a aplicação daqueles parágrafos à imprensa torna impossível denunciar qualquer ilegalidade, de sorte que, sob sua proteção, funcionários e deputados tornam-se invulneráveis: “Estes senhores po-dem cometer tantos fatos ‘que os exponham ao ódio e ao desprezo dos cidadãos’ quantos quiserem, mas estes fatos não podem ser declarados, escritos, impressos, sob pena de perda dos direitos civis, acrescida da indefectível prisão e multa” (nº 41). Expõe-se o fundamento classista do direito, pois não se trata da invulnerabili-dade de funcionários e deputados quaisquer, mas dos que representam a burguesia ou os junkers com os quais ela se aliou, nem são quaisquer os atos que se pretende resguardar da crítica, mas sim os cometidos contra os trabalhadores: “Como se a aplicação dos parágrafos 367, 368, 370 a discursos e escritos políticos não fosse a eliminação definitiva do 19 de Março, dos clubes e da liberdade de imprensa! O que é um clube sem liberdade de expressão? E o que é a liberdade de expressão com os parágrafos 367, 368 e 370 do Código Penal? E o que é o 19 de Março sem clubes e liberdade de expressão?” (nº 41) São as classes subalternas que se organizam, ma-nifestam e expressam nos clubes e na imprensa democrática, contra a qual se as-sestam aqueles parágrafos. Defender a liberdade de imprensa, estreitamente unida à liberdade de organização, é defender condições mais adequadas para a atividade revolucionária, em particular a classe trabalhadora. O processo contra a NGR com base nesse código punha, pois, em questão “as conquistas da Revolução de Março. Eis o alto patamar alcançado pela contra-revolução, eis a ousadia com que a buro-cracia saca e consegue fazer valer contra a nova vida política as armas que ainda restam no arsenal da velha legislação” (nº 41). A persistência da “velha legislação” e dos funcionários burocráticos e judiciais do período pré-março resulta da entente da burguesia com a coroa, de sorte que, se esta ousa utilizá-los contra a “nova vida política”, faz com o beneplácito daquela.

A imprensa popular, alvo do ataque governamental e da defesa marxiana, toma parte na “nova vida política” enquanto arma do povo; restringindo a liberda-de de manifestação e expressão, os junkers e a burguesia alemã buscavam reduzi-lo à impotência diante da contra-revolução.

Em julho de 1848, Hansemann apresenta à Assembléia de Berlim uma lei de imprensa provisória, para a qual haviam sido transpostas de forma ainda mais rígida as disposições dos artigos 367 e 368 do Código Penal, “em flagrante contra-dição com a liberdade de imprensa” (nº 50), estabelecendo, em relação ao período

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pré-março, uma situação pior para o povo e mais confortável para todos os velhos funcionários do estado. De acordo com tal projeto, a imprensa seria impedida de denunciar qualquer arbitrariedade cometida pelos funcionários públicos; sob pena de prisão, proíbe-se “acusar alguém por um fato que seja legalmente passível de pu-nição, ou somente o expor ao desprezo público”, assim como “comprovar a verdade dos fatos, a não ser por meio de ‘documento legal conclusivo’”. A imprensa restaria aniquilada – “o que resta da liberdade de imprensa quando não se pode expor ao desprezo público aquilo que merece o desprezo público?” (nº 50) – e a burocracia, fortalecida: “os funcionários poderão cometer impunemente qualquer arbitrarieda-de, qualquer tirania, qualquer ilegalidade”, pois “o único controle eficaz, a imprensa, terá se tornado ineficaz. No dia em que esta lei entrar em vigor, a burocracia poderá celebrar uma festa: ela se tornará mais poderosa, livre e forte do que era antes de março”. Os funcionários públicos (administrativos, policiais, membros do exército, do judiciário) cuja “tranquilidade” é assim garantida constituem o corpo do estado – e, de fato, do velho estado, erigido sobre relações sociais pré-modernas, contra o que se batera a revolução de março. Marx insiste na necessidade de combater cada um desses funcionários, apesar de sua insignificância diante dos grandes confrontos em tela, lembrando que a revolução de março fora vencida por deixar intocadas as bases do cume político – a burocracia, o exército, os juízes etc. Estes são os meios efetivos do poder, ou melhor, são estes que exercem de fato o poder. E o “dever da im-prensa” é “apresentar-se em favor dos oprimidos em seu ambiente próximo. E além do mais, meus senhores, a estrutura da servidão tem seu mais verdadeiro apoio nos poderes políticos e sociais subordinados, que confrontam imediatamente a vida pri-vada da pessoa, o indivíduo vivendo. Não é suficiente combater as relações gerais e os poderes mais altos. A imprensa deve decidir-se a entrar na liça contra este gendarme, este procurador, este conselheiro provincial” (nº 221).

Colidindo com o parágrafo do projeto de constituição então em debate, se-gundo o qual “A censura jamais poderá ser restabelecida” (nº 50), o projeto de lei a reintroduzia: “o promotor público não apenas pode requerer a apreensão de impressos prontos, como pode confiscar até os manuscritos recém-entregues para impressão, se o conteúdo constituir um delito ou crime passível de processo ex-of ício!” (nº 50), o que significa que a qualquer momento a redação de um jornal poderia ser invadida e seus manuscritos submetidos à inspeção e confiscados.

Tanto o processo movido contra o jornal quanto este projeto de lei de imprensa exibem as formas concretas da conciliação da burguesia com os junkers e seu resultado: o fortalecimento da contra-revolução feudal. E, de fato, a vitória des-ta não se fez esperar. Marx pronunciou seu discurso de defesa, no âmbito do pro-cesso mencionado, perante o tribunal do júri de Colônia em 12/02/1849, quando o

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pré-março, uma situação pior para o povo e mais confortável para todos os velhos funcionários do estado. De acordo com tal projeto, a imprensa seria impedida de denunciar qualquer arbitrariedade cometida pelos funcionários públicos; sob pena de prisão, proíbe-se “acusar alguém por um fato que seja legalmente passível de pu-nição, ou somente o expor ao desprezo público”, assim como “comprovar a verdade dos fatos, a não ser por meio de ‘documento legal conclusivo’”. A imprensa restaria aniquilada – “o que resta da liberdade de imprensa quando não se pode expor ao desprezo público aquilo que merece o desprezo público?” (nº 50) – e a burocracia, fortalecida: “os funcionários poderão cometer impunemente qualquer arbitrarieda-de, qualquer tirania, qualquer ilegalidade”, pois “o único controle eficaz, a imprensa, terá se tornado ineficaz. No dia em que esta lei entrar em vigor, a burocracia poderá celebrar uma festa: ela se tornará mais poderosa, livre e forte do que era antes de março”. Os funcionários públicos (administrativos, policiais, membros do exército, do judiciário) cuja “tranquilidade” é assim garantida constituem o corpo do estado – e, de fato, do velho estado, erigido sobre relações sociais pré-modernas, contra o que se batera a revolução de março. Marx insiste na necessidade de combater cada um desses funcionários, apesar de sua insignificância diante dos grandes confrontos em tela, lembrando que a revolução de março fora vencida por deixar intocadas as bases do cume político – a burocracia, o exército, os juízes etc. Estes são os meios efetivos do poder, ou melhor, são estes que exercem de fato o poder. E o “dever da im-prensa” é “apresentar-se em favor dos oprimidos em seu ambiente próximo. E além do mais, meus senhores, a estrutura da servidão tem seu mais verdadeiro apoio nos poderes políticos e sociais subordinados, que confrontam imediatamente a vida pri-vada da pessoa, o indivíduo vivendo. Não é suficiente combater as relações gerais e os poderes mais altos. A imprensa deve decidir-se a entrar na liça contra este gendarme, este procurador, este conselheiro provincial” (nº 221).

Colidindo com o parágrafo do projeto de constituição então em debate, se-gundo o qual “A censura jamais poderá ser restabelecida” (nº 50), o projeto de lei a reintroduzia: “o promotor público não apenas pode requerer a apreensão de impressos prontos, como pode confiscar até os manuscritos recém-entregues para impressão, se o conteúdo constituir um delito ou crime passível de processo ex-of ício!” (nº 50), o que significa que a qualquer momento a redação de um jornal poderia ser invadida e seus manuscritos submetidos à inspeção e confiscados.

Tanto o processo movido contra o jornal quanto este projeto de lei de imprensa exibem as formas concretas da conciliação da burguesia com os junkers e seu resultado: o fortalecimento da contra-revolução feudal. E, de fato, a vitória des-ta não se fez esperar. Marx pronunciou seu discurso de defesa, no âmbito do pro-cesso mencionado, perante o tribunal do júri de Colônia em 12/02/1849, quando o

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ministério já passara às mãos de Brandenburg (representante da velha Prússia), as Assembléias de Berlim e Frankfurt haviam sido dissolvidas pela força e fora outorga-da uma constituição de talhe absolutista. Esse discurso, além de demonstrar a ilega-lidade do enquadramento do jornal no parágrafo do Code Pénal sobre o qual se fun-dava a acusação,15 explicita que esse código supõe condições ausentes na Alemanha contra-revolucionária: “Finalmente, meus senhores jurados, os ‘citoyens’, os cidadãos a cujo ódio ou desprezo me expõe a incriminação de um fato para, de acordo com o art. 367, ser uma calúnia, estes citoyens, estes cidadãos não existem absolutamente mais nos assuntos políticos. Existem apenas partidários. O que me expõe ao ódio e ao desprezo dos membros de um partido, me expõe ao amor e à admiração dos membros do outro partido”. Distinção que Marx julga basilar, não exclusivamente para o julgamento da NGR, “mas para todos os casos em que o Ministério Público pretenda aplicar o art. 367 a polêmicas políticas”. Nesse quadro, o vínculo de classe dos funcionários judiciários vem à tona. Voltando contra a imprensa esse artigo, os jurados “abolirão a liberdade de imprensa por meio da legislação penal, embora a tenham reconhecido por uma constituição e lutado por ela por uma revolução”, pois aos jornais seria interditado denunciar a arbitrariedade e a vileza oficiais. Relatando um conjunto de fatos relacionados às prisões de que trata o artigo pelo qual a NGR estava sendo processada – outras prisões, restrições diversas à liberdade de manifes-tação e expressão –, ilumina o apoio explícito à traição do governo contra o povo pela promotoria, que, assim, agia partidariamente, e não imparcialmente. Procuradores, promotores e juízes revolucionários decerto não interpretariam nem aplicariam a lei desse modo. E Marx conclama os jurados a interpretá-la no sentido das necessidades sociais presentes, enquanto o legislador não a atualiza: “Se leis existentes entram em contradição aberta com o nível recém-conquistado de desenvolvimento social, en-tão, meus senhores jurados, cabe-lhes diretamente interporem-se entre os preceitos mortos da lei e as exigências vivas da sociedade. Então cabe-lhes adiantarem-se ao legislador (...). Os senhores têm apenas de interpretá-la no sentido de nossa época, de nossos direitos políticos, de nossas necessidades sociais” (nº 221).

Em síntese, os jurados deveriam decidir entre aplicar o art. 367 à imprensa no sentido proposto pelo Ministério Público, abolindo assim a liberdade de imprensa, ou reinterpretar à luz da liberdade de imprensa uma lei produzida na ausência dela e que não foi pensada para ser-lhe infligida. O júri é chamado a amparar não

15. Analisando-o, mostra que mesmo a tradução do texto original francês para o alemão, e mais ainda a interpretação dele, distorcem-lhe a letra e o espírito. O Ministério Público ateve-se a tal parágrafo, diz Marx, porque “é muito mais indeterminado e permite muito mais facilmente granjear uma condenação (...). A violação da ‘délicatesse et honneur’, da delicadeza e da honra, esquiva-se a qualquer medida. (...) Não resta qualquer outra medida além do noli me tangere de uma imensa, incomparavelmente arrogante vaidade de funcionário” (nº 221).

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apenas um periódico, mas a liberdade de associação e de imprensa em geral. Mas, não sendo a lei e sua imposição nem autônomas, nem determinantes, nem de-pendentes apenas da vontade do legislador, mesmo aquela defesa seria vã: “se a contra-revolução prussiana não for destroçada rapidamente por uma revolução popular prussiana, a liberdade de associação e de imprensa será totalmente aniqui-lada também na Prússia” (nº 221).

O júri absolveu Marx, mas a contra-revolução não foi barrada, e o ministério Brandenburg não tardou a elaborar novos projetos de lei de associação e imprensa, ainda mais restritivos.

A “Lei dos clubes”, regulando o direito de associação e reunião, exige que as as-sembléias sejam comunicadas com 24 horas de antecedência, o que impede “Assem-bléias convocadas com urgência em função de acontecimentos importantes ocor-ridos subitamente”; proíbe cobrar entrada para cobrir os custos (os locais onde se realizavam as assembléias eram alugados), e exige que se deixe ¼ do recinto livre para não-membros, encarecendo aqueles custos e criando condições para que “agentes policiais pagos possam perturbar qualquer reunião, impossibilitar qualquer assem-bléia com desordem, gritos e tumultos”; além disso, “os ‘representantes da autoridade policial’ têm o direito de ‘dissolver imediatamente’ qualquer assembléia sob o primei-ro bom pretexto”, e dispersar seus participantes sob baionetas. Ainda de acordo com essa lei, os clubes não precisam de “autorização prévia” para funcionar, mas devem cumprir um conjunto excessivo de avisos e formalidades, dificultando sua existência; já as “assembléias públicas ao ar livre, passeatas etc. etc., precisam da autorização prévia da polícia” (nº 244), e são proibidos os símbolos vermelhos.

A “Lei dos cartazes”, referente ao direito de expressão, proíbe a exibição de cartazes de conteúdo político, bem como “a venda ou distribuição de impressos nas vias públicas”.

A “Lei de imprensa” conjuga “em nosso proveito, ao mesmo tempo, as van-tagens da servidão feudal, do governo policial burocrático e da brutalidade legal burguesa moderna”, isto é, “nos presenteia com uma insuperável fusão 1. do Code Napoléon, 2. das Leis de Setembro francesas, 3. e principalmente do louvável Lan-drecht prussiano” (nº 244). Nas províncias onde vigorava o Landrecht, acrescen-tam-se as punições do Código Napoleônico. Incorporam-se as “Leis de Setembro francesas: Quem atacar a propriedade ou a família, os fundamentos sobre as quais descansa a sociedade burguesa, ou provocar os cidadãos ao ódio ou ao desprezo uns contra os outros incorrerá em até dois anos de prisão”. O Landrecht é aplicado ao Reno, introduzindo-se crimes inexistentes na legislação renana: provocação ao descontentamento e ofensa religiosa, ofensa à majestade, às Câmaras, a uma re-partição, a funcionários ou soldados. A alegação de fatos verdadeiros, se houver

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apenas um periódico, mas a liberdade de associação e de imprensa em geral. Mas, não sendo a lei e sua imposição nem autônomas, nem determinantes, nem de-pendentes apenas da vontade do legislador, mesmo aquela defesa seria vã: “se a contra-revolução prussiana não for destroçada rapidamente por uma revolução popular prussiana, a liberdade de associação e de imprensa será totalmente aniqui-lada também na Prússia” (nº 221).

O júri absolveu Marx, mas a contra-revolução não foi barrada, e o ministério Brandenburg não tardou a elaborar novos projetos de lei de associação e imprensa, ainda mais restritivos.

A “Lei dos clubes”, regulando o direito de associação e reunião, exige que as as-sembléias sejam comunicadas com 24 horas de antecedência, o que impede “Assem-bléias convocadas com urgência em função de acontecimentos importantes ocor-ridos subitamente”; proíbe cobrar entrada para cobrir os custos (os locais onde se realizavam as assembléias eram alugados), e exige que se deixe ¼ do recinto livre para não-membros, encarecendo aqueles custos e criando condições para que “agentes policiais pagos possam perturbar qualquer reunião, impossibilitar qualquer assem-bléia com desordem, gritos e tumultos”; além disso, “os ‘representantes da autoridade policial’ têm o direito de ‘dissolver imediatamente’ qualquer assembléia sob o primei-ro bom pretexto”, e dispersar seus participantes sob baionetas. Ainda de acordo com essa lei, os clubes não precisam de “autorização prévia” para funcionar, mas devem cumprir um conjunto excessivo de avisos e formalidades, dificultando sua existência; já as “assembléias públicas ao ar livre, passeatas etc. etc., precisam da autorização prévia da polícia” (nº 244), e são proibidos os símbolos vermelhos.

A “Lei dos cartazes”, referente ao direito de expressão, proíbe a exibição de cartazes de conteúdo político, bem como “a venda ou distribuição de impressos nas vias públicas”.

A “Lei de imprensa” conjuga “em nosso proveito, ao mesmo tempo, as van-tagens da servidão feudal, do governo policial burocrático e da brutalidade legal burguesa moderna”, isto é, “nos presenteia com uma insuperável fusão 1. do Code Napoléon, 2. das Leis de Setembro francesas, 3. e principalmente do louvável Lan-drecht prussiano” (nº 244). Nas províncias onde vigorava o Landrecht, acrescen-tam-se as punições do Código Napoleônico. Incorporam-se as “Leis de Setembro francesas: Quem atacar a propriedade ou a família, os fundamentos sobre as quais descansa a sociedade burguesa, ou provocar os cidadãos ao ódio ou ao desprezo uns contra os outros incorrerá em até dois anos de prisão”. O Landrecht é aplicado ao Reno, introduzindo-se crimes inexistentes na legislação renana: provocação ao descontentamento e ofensa religiosa, ofensa à majestade, às Câmaras, a uma re-partição, a funcionários ou soldados. A alegação de fatos verdadeiros, se houver

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intenção de ofensa, é punida como tal. Declara ainda passíveis de punição “todas as declarações feitas em conversas privadas, na própria casa, no seio da família, em cartas privadas”, o que significa “organizar a mais infame e generalizada espiona-gem” (nº 244).

Essas leis voltam-se todas, como Marx deixa claro, contra o ataque revolucio-nário à sociedade burguesa. A legislação emanada desta, longe de ser positivamente destacada em relação à servidão feudal ou ao governo policial burocrático, é reduzi-da ao mesmo nível destes pela indicação de sua brutalidade. Como as demais formas de manifestação e expressão, a imprensa a ser silenciada é a que se configura como arma em tais atividades revolucionárias. Razão pela qual a fúria da coroa se volta principalmente contra a Renânia, foco da resistência, buscando impor-lhe o Landre-cht e eliminar “a única coisa que ainda nos resta dos resultados da assim-chamada revolução de 1848: a vigência irrestrita de nosso próprio direito” (nº 244).

A prática conciliadora da burguesia tornara possível impor à Renânia o des-potismo tipicamente velho-prussiano. Embora estrangule seu próprio desenvolvi-mento e a expila do poder político, a contra-revolução feudal sufoca o movimento popular que a assusta. Tal simbiose se comprova nessa “Complementação das três legislações mais brutais uma pela outra, para atingir um extremo de brutalidade e perf ídia até agora inaudito”. As legislações repressivas mais modernas e a mais ar-caica são combinadas aproveitando-se de cada uma o que tinha de mais restritivo, de mais repressor aos trabalhadores ou ao movimento popular em geral, de modo a resguardar as classes dominantes de ataques teóricos ou práticos. Tal como Marx denunciara em 1844, o governo alemão continua a “combinar os defeitos civilizados do mundo dos estados modernos, cujas vantagens não possuímos, com os defeitos bárbaros do ancien régime, que possuímos em sua totalidade” (Marx, 1978).

O projeto de lei concede ainda o poder de confiscar qualquer impresso, antes ou depois de iniciada sua distribuição, onde forem encontrados, sempre que seu conteúdo fundamente crime ou delito que possa ser perseguido pela polícia; ou seja, explicita Marx: pode confiscar qualquer coisa que for de seu agrado e inte-resse, e isso em qualquer lugar, público ou privado, inclusive na casa das pessoas, mesmo sem estado de sítio.

Com essas leis, a repressão, exercida até então ao arrepio da lei, é institucio-nalizada: “o estado de sítio extraordinário será suspenso assim que o estado de sítio ordinário for outorgado a todo o reino mediante leis e introduzido em nossos costumes constitucionais. A ciranda destas leis ‘fortes’ será aberta com as Leis de Setembro sobre as associações e a imprensa” (nº 234). A exigência da Coroa de que a Câmara legislativa as aprove como condição para levantar o estado de sítio em Berlim confirma essa asserção.

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Entretanto, a própria imprensa não denuncia esse ataque, essa “reintrodu-ção da censura, o aperfeiçoamento da censura comum pela militar”; assimila-o tranquila, passiva e covardemente. Repete-se a situação que Marx já denunciara à época da Gazeta Renana: a maior parte dos jornais recua, submete-se sem luta à censura e demais restrições. “A imprensa diária alemã é a mais irresoluta, sonolen-ta e covarde instituição existente sob o sol!” (nº 246)

A Nova Gazeta Renana resistiu até o momento em que todas as tentativas de barrar a contra-revolução haviam sido derrotadas. Embora obrigados a entre-gar a fortaleza, “fizemos nossa retirada com armas e bagagens, com música e com a bandeira desfraldada do último número, impresso em tinta vermelha” (Engels, 1976:178). Em sua proclamação de despedida aos trabalhadores de Colônia, os re-datores declararam que “sua última palavra será sempre e em todos os lugares: Emancipação da classe trabalhadora! ” (nº 301, de 19 de maio de 1849).

Referências

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_________, “Marx - A Determinação Ontonegativa da Politicidade”, in Ensaios Ad Hominem 1 - Tomo III – Política. Santo André: Ad Hominem, 2000.

________ “Marx no tempo da Nova Gazeta Renana”, in MARX, K. A Burguesia e a Contra-Revolução. São Paulo: Ensaio, 1989.

CLAUDIN, F. Marx, Engels y la Revolucion de 1848. Madri: Siglo Veintiuno, 1985.EIDT, C. “A Razão como Tribunal da Crítica: Marx e a Gazeta Renana”, in Ensaios

Ad Hominem 1 – Tomo IV: Dossiê Marx. Santo André: Ad Hominem, 2001.

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LUKÁCS, G. Ontologia dell’Essere Sociale. 2 vols. Roma: Editori Riuniti, 1976.__________ Ontologia del Ser Social. El Trabajo. Buenos Aires: Herramienta,

2004.__________Ontologia do Ser Social. Os Princípios Ontológicos Fundamentais de

Marx. São Paulo: Ciências Humanas, 1979.MARX, K. Nova Gazeta Renana. São Paulo: Educ (no prelo). ___________ “Crítica da Filosofia do Direito de Hegel – Introdução”, in Temas de

Ciências Humanas nº 2. São Paulo: Grijalbo, 1977.

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46 Communicare

Marx e a Nova Gazeta Renana – sobre a liberdade de imprensa

__________“Teses ad Feuerbach”, in K. MARX, F. ENGELS, A Ideologia Alemã. São Paulo: Boitempo, 2007.

___________ A Ideologia Alemã . São Paulo: Boitempo, 2007.___________ Contribuição para a Crítica da Economia Política. Lisboa: Estampa,

1973. RIAZANOV, D. Marx, Engels e a história do movimento operário. São Paulo:

Global, 1983.

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Entrevista com Bernardo Kucinski: O Homem que lia os jornais para

o presidente • Marx e a Nova Gazeta Renana – sobre a liberdade

de imprensa • A mobilidade e a hiperconexão como tecnologias

de vigilância na sociedade de controle • Comunicação, mito e

televisão: o herói entregou o coração a Jesus • Fotojornalismo: entre

a premiação da morte e a face ridícula do poder • Razão versus

emoção: a narrativa romântica na gravura de Louise Bourgeois •

Sob o signo da saturação: os sentidos corporais na e para

comunicação humana • São Paulo – século XXI – eventos e turismo -

momento de (re) pensar a hospitalidade • A distopia no enredo

de � lmes publicitários da marca O Boticário • Re� exões sobre o

papel comunicacional da marca no contexto das organizações •

Resenhas: A música no cinema brasileiro: os inovadores anos

sessenta, de Irineu Guerrini Júnior • Walter Smetak: o alquimista

dos sons, de Marco Scarassatti • Empreintes de Roland Barthes,

de Daniel Bougnoux.

communicareRevista do Centro Interdisciplinar de Pesquisa — Faculdade Cásper Líbero

Volume 9Edição 2

2º Semestre de 2009

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Nesta edição:

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2009

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