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Projeto Gráfico: Autor Montagem e Impressão: Editora Universitária Revisão ortográfica: Ângela Santos Imagem da cobertura: 5-Minute Gridded Global Relief Data Collection (ETOPO5). Globo terrestre mostrando o relevo continental e a batimetria do assoalho oceânico. As feições fisiográficas mais marcantes são: o sistema de cadeias de montanhas Himalaia-Tibete (centro); o rifte proto-oceânico entre a África e a Arábia (Golfo de Aden e Mar Vermelho; esquerda); os traços de hotspots Reunião e Ninetyeast, no oceano Índico (abaixo); e os arcos de ilhas e fossas oceânicas relacionados com subducção das placas do Pacífico e das Filipinas (direita). Este material não é sujeito à proteção de direitos autorais e pode ser acessado através do site www.ngdc.noaa.gov

Petrologia Ígnea

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Apostila com conceitos básicos de petrologia e petrografia ígnea

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  • Projeto Grfico: Autor

    Montagem e Impresso: Editora Universitria

    Reviso ortogrfica: ngela Santos

    Imagem da cobertura: 5-Minute Gridded Global Relief Data Collection (ETOPO5).

    Globo terrestre mostrando o relevo continental e a batimetria do assoalho ocenico. As feies fisiogrficas mais marcantes so: o sistema de cadeias de montanhas Himalaia-Tibete (centro); o

    rifte proto-ocenico entre a frica e a Arbia (Golfo de Aden e Mar Vermelho; esquerda); os traos de hotspots Reunio e Ninetyeast, no oceano ndico (abaixo); e os arcos de ilhas e fossas

    ocenicas relacionados com subduco das placas do Pacfico e das Filipinas (direita). Este material no sujeito proteo de direitos autorais e pode ser acessado atravs do site

    www.ngdc.noaa.gov

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    Dedicado Jandira e Olga

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    Sumrio

    Prefcio .........................................................................................................................................ix 1. Petrologia e Geoqumica: Reviso de Alguns Conceitos

    1.1. Introduo ...........................................................................................................................................1 1.2. Elementos maiores e trao ..................................................................................................................1 1.3. Fuso parcial, compatibilidade e incompatibilidade ..........................................................................1 1.4. Empobrecimento e enriquecimento; fertilidade e infertilidade ..........................................................2 1.5. Minerais e rochas ................................................................................................................................3 1.6. Classificao de rochas gneas e sries magmticas ..........................................................................3 1.7. Rochas e fcies metamrficas ............................................................................................................4 Referncias selecionadas ...........................................................................................................................5

    2. Geocronologia

    2.1. Introduo ...........................................................................................................................................7 2.2. Conceitos bsicos ...............................................................................................................................7 2.3. Mtodo Rb-Sr .....................................................................................................................................8 2.4. Mtodo Sm-Nd ...................................................................................................................................9 2.5. Mtodo U-Pb .................................................................................................................................... 11

    2.5.1. Generalidades ............................................................................................................................ 11 2.5.2. Curva concrdia ........................................................................................................................ 11 2.5.3. Mtodos ..................................................................................................................................... 12 2.5.4. Aplicaes ................................................................................................................................. 13

    2.6. Termocronologia .............................................................................................................................. 14 2.6.1. Mtodo 40Ar 39Ar .................................................................................................................... 14 2.6.2. Datao por traos de fisso ...................................................................................................... 15 2.6.3. Aplicaes ................................................................................................................................. 15

    2.7. A escala do tempo geolgico ............................................................................................................ 15 Referncias Selecionadas ........................................................................................................................ 16

    3. Estrutura e Composio do Interior da Terra

    3.1. Introduo ......................................................................................................................................... 17 3.2. Ondas ssmicas ................................................................................................................................. 17 3.3 Caractersticas ssmicas das camadas da Terra ................................................................................. 18 3.4. Composio da crosta ....................................................................................................................... 20

    3.4.1. Crosta continental ...................................................................................................................... 20

  • iv

    3.4.2. Crosta ocenica .......................................................................................................................... 21 3.5. Tipos e provncias crustais ............................................................................................................... 21

    3.5.1. Tipos crustais ............................................................................................................................. 21 3.5.2. Provncias crustais ..................................................................................................................... 23

    3.6. Composio do manto ...................................................................................................................... 24 3.6.1. Manto superior .......................................................................................................................... 25 3.6.2. Zona de baixa velocidade .......................................................................................................... 25 3.6.3. Zona de transio e manto inferior ............................................................................................ 26 3.6.4. Camada D ............................................................................................................................... 27

    3.7. Composio do ncleo ..................................................................................................................... 27 Referncias selecionadas ......................................................................................................................... 28

    4. Conveco Mantlica e Tectnica de Placas

    4.1. Introduo ......................................................................................................................................... 31 4.2. Caractersticas trmicas e mecnicas da litosfera ............................................................................. 31 4.3. Tectnica de Placas .......................................................................................................................... 32 4.4. Evidncias indicando atuao da tectnica de placas ....................................................................... 34

    4.4.1. Distribuio de hipocentros de terremotos ................................................................................ 35 4.4.2. Terremotos e mecanismos focais............................................................................................... 36 4.4.3. Tomografia ssmica ................................................................................................................... 37 4.4.4. Reverses do campo magntico e faixas de anomalias magnticas no assoalho ocenico ....... 40 4.4.5. Idades do assoalho ocenico ...................................................................................................... 44 4.4.6. Paleomagnetismo ....................................................................................................................... 44 4.4.7. Sedimentos ocenicos, fluxo trmico e batimetria do assoalho ocenico ................................. 45 4.4.8. Movimento de placas no presente ............................................................................................. 46

    4.5. Descrevendo o movimento das placas tectnicas ............................................................................. 46 4.6. Foras responsveis pela tectnica de placas ................................................................................... 48 4.7. Simulaes numricas ...................................................................................................................... 49 Referncias selecionadas ......................................................................................................................... 50

    5. Conveco Mantlica, Plumas e Hotspots

    5.1. Introduo ......................................................................................................................................... 53 5.2. Evidncias indicando a existncia de plumas ................................................................................... 54

    5.2.1. Tomografia ssmica ................................................................................................................... 54 5.2.2. Anisotropia ssmica ................................................................................................................... 55 5.2.3. Superdomos e anomalias do geide .......................................................................................... 55 5.2.4. Argumentos petrolgicos .......................................................................................................... 56 5.2.5. Argumentos geoqumicos .......................................................................................................... 58 5.2.6. Argumentos isotpicos .............................................................................................................. 58

  • v

    5.3. Hotspots sem relao com plumas ................................................................................................... 59 5.4. Traos de hotspots e velocidades absolutas de placas ...................................................................... 60 5.5. Plumas e tectnica de placas ............................................................................................................ 60 5.6. Uma viso global da dinmica e evoluo do manto ....................................................................... 62 Referncias selecionadas ......................................................................................................................... 63

    6. Ambientes Tectnicos: Estrutura e Associaes Petrotectnicas Caractersticas

    6.1. Introduo ......................................................................................................................................... 65 6.2. Riftes continentais ............................................................................................................................ 65

    6.2.1. Caractersticas gerais e mecanismos de formao ..................................................................... 65 6.2.2. Controles na formao e evoluo de riftes continentais .......................................................... 67 6.2.3. Associaes petrotectnicas ...................................................................................................... 68

    6.3. Margens passivas e assoalho ocenico ............................................................................................. 68 6.4. Dorsais ocenicas ............................................................................................................................. 69

    6.4.1. Classificao e morfologia ........................................................................................................ 69 6.4.2. Magmatismo .............................................................................................................................. 70 6.4.3. Petrologia e geoqumica ............................................................................................................ 71 6.4.4. Hidrotermalismo e metamorfismo ............................................................................................. 72

    6.5. Margens ativas e arcos de ilhas ........................................................................................................ 73 6.5.1. Caractersticas gerais ................................................................................................................. 73 6.5.2. Incio do processo de subduco ............................................................................................... 74 6.5.3. Vulcanismo ................................................................................................................................ 75 6.5.4. Petrologia e geoqumica ............................................................................................................ 76 6.5.5. Deformao e metamorfismo .................................................................................................... 77 6.5.6. Associaes petrotectnicas em arcos: sntese .......................................................................... 78

    Referncias selecionadas ......................................................................................................................... 78

    7. Orognese

    7.1. Introduo ......................................................................................................................................... 81 7.2. Tipos de orgenos ............................................................................................................................ 82 7.3. Ofiolitos ............................................................................................................................................ 83 7.4. Orgenos relacionados a zonas de subduco .................................................................................. 84

    7.4.1. Orgenos acrescionrios ............................................................................................................ 84 7.4.2. Orgenos do tipo Andino .......................................................................................................... 85 7.4.3. Orgenos do tipo Laramide ....................................................................................................... 85 7.4.4. Orgenos extensionais-contracionais ........................................................................................ 86 7.4.5. Convergncia oblqua e transpresso ........................................................................................ 86

    7.5. Orgenos colisionais ........................................................................................................................ 87

  • vi

    7.5.1. Fatores que tornam complexo o fenmeno da coliso continental ............................................ 87 7.5.2. Subduco continental, metamorfismo de presso alta e ultra-alta e slab break-off ................. 88 7.5.3. Domnios em um orgeno colisional maduro ........................................................................... 89 7.5.4. Plats orognicos, fluxo canalizado e extruso ......................................................................... 90 7.5.5. Escape lateral ............................................................................................................................. 91

    7.6. Orgenos intracontinentais ............................................................................................................... 92 7.7. Extenso sin- a ps-orognica .......................................................................................................... 93

    7.7.1. Colapso orognico ..................................................................................................................... 93 7.7.2. Complexos de ncleo metamrfico ........................................................................................... 94 7.7.3. Domos gnaissicos ...................................................................................................................... 95 7.7.4. Vulcanismo ................................................................................................................................ 95

    7.8. Plutonismo sinorognico .................................................................................................................. 96 7.9. Metamorfismo regional .................................................................................................................... 97

    7.9.1. Tipos de metamorfismo e ambientes tectnicos ........................................................................ 97 7.9.2. Trajetrias P-T-t ........................................................................................................................ 98

    7.10. Distino entre os diferentes tipos de orgenos: sntese ................................................................ 98 Referncias selecionadas ......................................................................................................................... 99

    8. Origem e Diferenciao da Terra

    8.1. Introduo ....................................................................................................................................... 103 8.2 Meteoritos e a formao do sistema Solar ....................................................................................... 103

    8.2.1. Tipos de meteoritos ................................................................................................................. 103 8.2.2. Formao do Sistema Solar ..................................................................................................... 104

    8.3. Diferenciao primria da Terra ..................................................................................................... 105 8.4. Formao do Sistema Terra-Lua .................................................................................................... 106 8.5. Formao da atmosfera e hidrosfera ............................................................................................... 106

    8.5.1. Origem da atmosfera ............................................................................................................... 106 8.5.2. Origem da hidrosfera ............................................................................................................... 108 8.5.3. Atmosfera rica em oxignio .................................................................................................... 108

    8.6. Formao e crescimento da crosta continental ............................................................................... 109 8.6.1. A crosta e o manto primitivos ................................................................................................. 109 8.6.2. Crescimento da crosta continental ........................................................................................... 111

    8.7. Os primeiros 700 Ma: sntese ......................................................................................................... 112 Referncias selecionadas ....................................................................................................................... 113

    9. O Arqueano: Geologia e Regimes Tectnicos

    9.1. Introduo ....................................................................................................................................... 115 9.2. Distribuio dos terrenos arqueanos ............................................................................................... 116 9.3. Geologia dos terrenos arqueanos .................................................................................................... 117

  • vii

    9.3.1. Terrenos de alto grau ............................................................................................................... 117 9.3.2. Terrenos granito-greenstone .................................................................................................... 118

    9.4. Regimes tectnicos arqueanos ........................................................................................................ 119 9.4.1. Evoluo trmica do manto ..................................................................................................... 119 9.4.2. Tectnica de placas no Arqueano? .......................................................................................... 119 9.4.3. Ausncia de tectnica de placas no Arqueano? ....................................................................... 120 9.4.4. Regimes mistos, avalanches no manto, crescimento continental episdico ............................ 121

    9.5. TTGs e greenstone belts: ambientes tectnicos .............................................................................. 122 9.5.1. TTGs ........................................................................................................................................ 122 9.5.2. Greenstones ............................................................................................................................. 122 9.5.3. Associaes TTG/greenstone .................................................................................................. 123

    9.6. Cratonizao ................................................................................................................................... 123 Referncias selecionadas ....................................................................................................................... 124

    10. Cintures Orognicos Proterozicos, Supercontinentes e Superplumas

    10.1. Introduo ..................................................................................................................................... 127 10.2. A transio Arqueano-Proterozico e os primeiros continentes .................................................. 127 10.3. Distribuio e geologia de provncias orognicas proterozicas .................................................. 128 10.4. Eventos orognicos proterozicos ................................................................................................ 129

    10.4.1. Paleoproterozico .................................................................................................................. 130 10.4.2. Mesoproterozico .................................................................................................................. 132 10.4.3. Neoproterozico .................................................................................................................... 132

    10.5. Reconstituies paleogeogrficas ................................................................................................. 133 10.6. Magmatismo anorognico ............................................................................................................ 135 10.7. Superplumas e supercontinentes................................................................................................... 136 Referncias selecionadas ....................................................................................................................... 137

    11. Cintures Orognicos Fanerozicos e o Supercontinente Pangia

    11.1. Introduo ..................................................................................................................................... 139 11.2. Reconstrues paleogeogrficas para o Paleozico ..................................................................... 139 11.3. Cintures orognicos paleozicos ................................................................................................ 141

    11.3.1. Orgenos colisionais ............................................................................................................. 141 11.3.2. Orgenos relacionados a zonas de subduco ....................................................................... 143 11.3.3. Orgenos intracontinentais .................................................................................................... 143

    11.4. Reconstrues paleogeogrficas para o Meso-Cenozico ............................................................ 144 11.5. Cintures orognicos mesozicos ................................................................................................ 144

    11.5.1. Orgenos colisionais ............................................................................................................. 144 11.5.2. Orgenos relacionados a zonas de subduco ....................................................................... 144 11.5.3. Orgenos intracontinentais .................................................................................................... 147

  • viii

    11.6. Cintures orognicos cenozicos ................................................................................................. 147 11.6.1. Orgenos colisionais ............................................................................................................. 147 11.6.2. Orgenos relacionados a zonas de subduco ....................................................................... 150 11.6.3. Orgenos intracontinentais .................................................................................................... 152

    11.7. O futuro ........................................................................................................................................ 152 Referncias selecionadas ....................................................................................................................... 153

    Fontes das Figuras .................................................................................................................................... 157

    ndice remissivo ..........................................................................................................................163

  • ix

    Prefcio

    O rpido esgotamento da primeira edio deste livro tornou patente o anseio da comunidade geolgica pela publicao de textos didticos de Geologia. Embora a estruturao geral da edio original tenha sido mantida, de certa forma este outro livro: o texto foi totalmente reescrito, a maioria das figuras substituda ou redesenhada e outras figuras e tabelas adicionadas. Como inevitvel, isto resultou em um volume com um nmero maior de pginas que o original. De qualquer maneira, acredita-se que os assuntos abordados possam ser cobertos numa disciplina normal de graduao com 45 ou 60 horas de aula. O livro foi escrito tendo em mente o estudante de graduao, embora possa servir como introduo para cursos mais avanados. Para tornar a leitura o mais simples possvel, optou-se pela no citao de referncias bibliogrficas no texto, como usual em livros mais avanados ou artigos em peridicos cientficos. Ao invs disto, ao final de cada captulo, uma srie de artigos ou livros listada. As referncias selecionadas obedeceram a dois critrios: (1) livros, captulos de livros ou artigos de reviso foram escolhidos para proporcionar uma viso mais abrangente dos tpicos tratados no captulo e/ou fornecerem um histrico da evoluo das idias que levaram ao desenvolvimento dos modelos mais aceitos atualmente; (2) artigos recentes (a maioria publicados nos ltimos dez anos) foram selecionados para ilustrar o estado da arte de um tema particular. A partir dessas fontes, o estudante poder complementar ou avanar no estudo de tpicos especficos. O livro tem como objetivo apresentar, de maneira sucinta, as idias atuais sobre a dinmica interna da Terra, correlacionando a formao de cintures orognicos com o mecanismo mais geral de conveco mantlica, do qual o movimento relativo das placas tectnicas apenas a expresso superficial. Ele est dividido em onze captulos. Os dois primeiros apresentam uma reviso breve de alguns conceitos de Geoqumica e Petrologia (Captulo 1) e dos principais mtodos de datao geocronolgicos (Captulo 2), conhecimento prvio requerido para a compreenso dos captulos subseqentes. As informaes contidas nos captulos 3 a 5 refletem o conhecimento atual sobre a estrutura (Captulo 3) e a dinmica da Terra, enfocando a tectnica de placas (Captulo 4) e a formao de plumas mantlicas (Captulo 5) no contexto da atuao de conveco no manto. Os dois captulos seguintes so devotados dinmica da litosfera. O Captulo 6 descreve as principais caractersticas dos diferentes ambientes relacionados com a tectnica de placas e o Captulo 7 dedicado descrio e discusso dos processos que levam formao de cadeias de montanhas orognicas. A formao da Terra, sua diferenciao primria em manto e ncleo, a origem da hidrosfera e da atmosfera, e o debate sobre a existncia ou no de continentes no perodo pr-Arqueano constituem o objeto do Captulo 8. Os captulos finais so dedicados evoluo dos continentes no decorrer do tempo. No Captulo 8, so descritas as principais caractersticas geolgicas dos terrenos arqueanos. Com base nestes dados e em modelos tericos e numricos, so discutidos os possveis regimes tectnicos vigentes no Arqueano e a questo da formao e preservao da crosta continental. O Captulo 10 comea apresentando os principais fatores que diferenciam o Arqueano do Proterozico e prossegue com a descrio dos principais eventos orognicos proterozicos. No final do captulo, so discutidas a existncia de supercontinentes proterozicos, suas possveis configuraes e as causas do magmatismo anorognico que caracteriza o Mesoproterozico. O leitor deve ter em mente, ao ler os captulos 8-10, a ausncia de registro geolgico para os primeiros 500

  • x

    milhes de anos da Terra e as incertezas quanto interpretao de eventos precambrianos. Estes fatores fazem com que modelos para a evoluo dos continentes ou de orgenos individuais contenham uma boa dose de especulao. Assim, modelos consensuais ou quase consensuais no presente podem vir a ser descartados no futuro. Finalmente, o Captulo 11 apresenta e discute, com base em reconstituies paleogeogrficas, os eventos orognicos paleozicos que resultaram na formao do supercontinente Pangia, a fragmentao do supercontinente e a formao de cintures orognicos meso/cenozicos. O autor grato aos colegas Gorki Mariano, Jos Maurcio Rangel da Silva, Otaciel de Oliveira Melo, Ignez de Pinho Guimares, Adejardo Francisco da Silva Filho e Hermanilton Azevedo Gomes por sugestes ao manuscrito original, pela leitura critica de partes do texto atual e/ou pelo constante encorajamento. Agradecimentos so tambm devidos ao CNPq porque, ao rejeitar sistematicamente todos os projetos de pesquisa submetidos nos ltimos dez anos, permitiu que parte do tempo e energia requerida para a execuo dos mesmos fosse canalizada para esta obra.

  • 1. Petrologia e Geoqumica: Reviso de Alguns Conceitos 1.1. Introduo Os deslocamentos e deformaes sofridos pela crosta e pela poro mais superior do manto terrestre, bem como fenmenos superficiais (vulcanismo, terremotos, formao de cadeias de montanhas, etc.), esto relacionados com processos que ocorrem em profundidade. Um conhecimento sobre a estrutura, o estado fsico e a composio do interior da Terra fundamental para a compreenso dos mecanismos responsveis por esses processos. Para tanto, uma abordagem multidisciplinar se faz necessria, combinando-se as ferramentas das disciplinas clssicas da Geologia (Sedimentologia, Estratigrafia, Geologia Estrutural, Tectnica, Petrologia) com o uso de mtodos geofsicos (particularmente sismolgicos), geodsicos, geoqumicos e da fsica dos minerais. Igualmente importante quantificar as diferentes escalas de tempo nas quais os processos geolgicos ocorrem, o que possvel atravs dos diversos mtodos geocronolgicos atualmente disponveis. Adicionalmente, modelos analgicos e simulaes em computador (Geodinmica) permitem a investigao dos processos dinmicos em atuao no interior da Terra.

    Este captulo introduz alguns termos e conceitos de Petrologia e Geoqumica que sero necessrios para a compreenso dos captulos subseqentes. As tcnicas de datao mais comuns so descritas no captulo 2. Mtodos geofsicos, modelos geodinmicos e experimentos sob condies elevadas de presso e temperatura so abordados nos captulos 3, 4 e 5. 1.2. Elementos maiores e trao Elementos maiores so aqueles que constituem os principais minerais formadores de rochas. Os demais elementos (chamados de trao) tm de se ajustar estrutura desses minerais ou formar minerais acessrios.

    Elementos maiores so medidos em percentagem enquanto os elementos-trao normalmente so expressos em partes por milho (ppm). Os elementos maiores so O, Si, Al, Fe, Mg, Ca, Na e K, embora este ltimo seja um elemento trao no manto. Como o oxignio o elemento mais abundante na crosta e no manto, a composio qumica das rochas normalmente expressa em forma de xidos de elementos maiores (SiO2, Al2O3, FeO, MgO, etc.). Uma maneira usual de representar graficamente a composio qumica de um grupo de rochas atravs dos diagramas de Harker, nos quais a porcentagem dos xidos dos elementos maiores e a concentrao dos elementos-trao so projetadas versus o teor de slica (Fig. 1.1). 1.3. Fuso parcial, compatibilidade e incompatibilidade Uma vez que a maioria dos minerais formadores de rocha so solues slidas, a fuso de uma rocha se d em um intervalo de temperatura. Isto significa que rochas no interior da Terra sofrem apenas fuso parcial, j que a temperatura exigida para fuso total muito elevada para ser atingida durante processos geolgicos normais. A temperatura necessria para que uma rocha comece a sofrer fuso parcial depende da presso. O solidus de uma rocha a curva, em um diagrama presso-temperatura, unindo todos os pontos que marcam o inicio da fuso parcial (Fig. 1.2). Da mesma maneira, outra curva (chamada de liquidus) marca o inicio da cristalizao de um magma.

    Fuso parcial pode resultar de trs mecanismos (Fig. 1.2): (a) diminuio de presso (descompresso), (b) elevao de temperatura, e (c) rebaixamento do solidus (o que pode ser causado pela adio de fluidos). Processos geolgicos que podem acarretar uma (ou mais de uma) dessas situaes so discutidos no Captulo 6.

  • 2

    Um elemento trao incompatvel se

    sua tendncia entrar na fase lquida durante eventos de fuso parcial, enquanto que os elementos compatveis tendem a permanecer no resduo da fuso. A partio de um elemento entre as fases slida e lquida depende de seu grau de ajustamento estrutura cristalina dos minerais, o que, em boa parte, condicionado pelo raio e carga inica do elemento. Elementos com raio inico grande so incompatveis. Eles so chamados de elementos litfilos de raio inico grande (ou LILE, da sigla em ingls para large ion lithophile element). Estes incluem Cs, Rb, Th, U e os elementos terras raras leves. Elementos compatveis que tm

    afinidade com o ferro so chamados siderfilos (p.ex., Ni, Co, Au).

    1.4. Empobrecimento e enriquecimento; fertilidade e infertilidade Uma rocha dita empobrecida quando apresenta uma pequena concentrao de elementos incompatveis. Isto pode ser devido extrao desses elementos durante processos de fuso parcial ou migrao de uma fase fluida. Uma rocha enriquecida obviamente o contrrio.

    O empobrecimento ou enriquecimento expresso relativamente a um padro e representado em diagramas chamados aranhagramas (spiderdiagrams, em ingls). Nestes diagramas os elementos-trao so colocados na abscissa em ordem decrescente de incompatibilidade (da esquerda para a direita) e suas concentraes normalizadas na ordenada (Fig. 1.3). Um caso particular o dos elementos terras raras (Fig. 1.4). Padres comumente utilizados so o condrito (um tipo de meteorito ptreo; ver Captulo 8), o manto primitivo (manto superior+crosta continental; ver Captulo 6) e basaltos ocenicos (N-MORB na figura 1.3; ver Capitulo 6).

    Figura 1.2. Solidus e liquidus. O solidus a curva que marca o incio da fuso parcial de uma rocha, enquanto o liquidus corresponde a uma fuso completa. No caso de um magma, o liquidus representa o incio da cristalizao e o solidus uma cristalizao completa. Para que haja fuso parcial, uma rocha situada a uma determinada profundidade deve ser levada a uma profundidade menor, ter sua temperatura elevada, ou ter seu solidus rebaixado (linha tracejada).

    Figura 1.1. Diagramas de Harker para rochas granticas (crculos) e diorticas (quadrados) do batlito Caruaru-Arcoverde, Pernambuco.

  • 3

    A fertilidade de uma rocha sua

    capacidade de produzir magmas por fuso parcial e depende dos elementos maiores. Uma rocha pode ser empobrecida e frtil ao mesmo tempo. Uma pequena percentagem de fuso parcial pode deixar um resduo bastante empobrecido em elementos incompatveis, mas esta rocha mantm sua capacidade de produzir magmas se for sujeita a uma temperatura suficientemente alta em um evento futuro. Por outro lado, rochas que passaram por episdios de fuso parcial elevadas podem ser posteriormente enriquecidas em elementos incompatveis pela percolao de fluidos. Casos especficos

    onde estas situaes podem ocorrer so discutidos no Captulo 6. 1.5. Minerais e rochas Os principais minerais formadores de rocha so silicatos (olivina, piroxnios, anfiblios, feldspatos, quartzo). Minerais mficos ou ferromagnesianos so escuros. Eles so os principais constituintes das rochas mficas (gabros, anortositos, etc.) e ultramficas (dunito, peridotito, etc.). Rochas flsicas (granitos, granodioritos, etc.), por outro lado, so formadas dominantemente por minerais claros (quartzo, feldspatos). Rochas formadas prximas superfcie da Terra (sedimentares, vulcnicas e subvulcnicas) so chamadas de supracrustais. Este termo empregado mesmo no caso de elas terem sido metamorfizadas. Rochas supracrutais compostas por argilas so chamadas de pelitos e por quartzo e/ou feldspatos de psamitos. Os termos metapelito e metapsamito so empregados para os equivalentes metamrficos. Rochas paraderivadas e ortoderivadas so aquelas resultantes do metamorfismo de rochas sedimentares e gneas, respectivamente (p.ex., paragnaisse, ortoanfibolito). 1.6. Classificao de rochas gneas e sries magmticas Rochas gneas podem ser classificadas de acordo com sua mineralogia ou composio qumica. Esta ltima abordagem particularmente til no caso de rochas vulcnicas. Como todos os minerais formadores de rocha so silicatos (com raras excees, como em carbonatitos) o principal componente destas rochas SiO2. Assim, uma primeira classificao baseada no teor de slica. Rochas cidas, intermedirias, bsicas e ultrabsicas tm teores de SiO2, respectivamente: acima de 66%; entre 52% e 66%; entre 45% e 52%; e abaixo de 45%. Exemplos de cada uma destas categorias so riolito, andesito, basalto e komatiito.

    Basaltos constituem o tipo de lava mais abundante na Terra e so subdivididos

    Figura 1.4. Padro de elementos terras raras para dioritos do batlito Caruaru-Arcoverde, Estado de Pernambuco.

    Figura 1.3. Aranhagrama ilustrando a variao composicional de granitides do batlito Caruaru-Arcoverde, Estado de Pernambuco.

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    em quartzo toletos, olivina toletos e lcali-olivina basaltos de acordo com seus minerais normativos. A composio normativa de uma rocha (ou norma CIPW, acrnimo formado pelas iniciais do sobrenome dos petrlogos que propuseram o procedimento de clculo) derivada a partir da composio qumica. Ela fornece os minerais que a rocha teria caso tivesse sido completamente cristalizada sob condies anidras. Quartzo toletos, olivina toletos e lcali-olivina basaltos tm como minerais normativos, respectivamente: quartzo+hiperstnio; olivina+hiperstnio; e nefelina. Na maioria das rochas, o xido mais abundante, depois de SiO2, Al2O3. Uma classificao muito empregada, principalmente para rochas granticas, utiliza as razes Al2O3/(Na2O+K2O+CaO), chamado ndice de saturao em alumina, e Al2O3/(Na2O+K2O): Rochas peraluminosas Al2O3/(Na2O+K2O+CaO)>1 Rochas metaluminosas Al2O3/(Na2O+K2O+CaO)

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    para condies de temperatura e presso de moderadas a altas (>300C e >200 MPa) so xisto-verde, anfibolito e granulito. As fcies xisto-azul (ou glaucofana-lawsonita) e eclogito so tpicas de presso elevada (>1 GPa). Rochas mficas metamorfizadas sob condies das fcies anfibolito e eclogito consistem, dominantemente, de anfiblio e plagioclsio, no primeiro caso, e de clinopiroxnio e granada, no segundo. Estas rochas recebem a mesma denominao das fcies que elas caracterizam, isto , anfibolito e eclogito, respectivamente. A rocha metamrfica da fcies granulito tambm recebe este nome, podendo ser paraderivada ou ortoderivada, mfica ou flsica. A associao caracterstica ortopiroxnio, clinopiroxnio, plagioclsio granada.

    Rochas formadas a presses ou temperaturas extremamente elevadas tm sido descritas com cada vez mais freqncia e estendem o campo do metamorfismo para presses superiores a 2 GPa e temperaturas de at 1150C. Rochas de presso ultra-alta so caracterizadas pela presena de coesita e/ou diamante. As associaes minerais em granulitos de temperatura ultra-alta incluem ortopiroxnio aluminoso-sillimanita-quartzo, safirina-quartzo e espinlio-quartzo. Referncias selecionadas Best, M.G., 2003. Igneous and Metamorphic

    Petrology, Blackwell Publishing, 2 Ed. Philpotts, A.R., 1990. Principles of Igneus and

    Metamorphic Petrology, Prentice-Hall. Winter, J.D., 2001. An Introduction to Igneus and

    Metamorphic Petrology. Prentice-Hall. (disponvel gratuitamente on-line na pgina do autor: http://people.whitman.edu/~winterj/).

    Figura 1.6. Diagrama P-T esquemtico mostrando as principais fcies do metamorfismo regional, ressaltando em sombreado os campos para metamorfismo de presso e temperatura ultra-altas. Linhas tracejadas correspondem a condies no-metamrficas (esquerda) e ao incio de fuso parcial em sistemas granticos na presena de gua (direita). Tambm so mostradas as curvas de reao quartzo-coesita e grafita-diamante.

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    2. Geocronologia 2.1. Introduo O princpio da datao de rochas por mtodos geocronolgicos reside no fato de alguns elementos possurem um ou mais istopos instveis. Estes istopos, chamados de radioativos, sofrem desintegrao para gerar istopos radiognicos pela emisso de partculas , ou . A taxa de desintegrao radioativa () caracterstica para cada istopo e, geralmente, expressa em termos de sua meia-vida (t1/2), definida como o tempo necessrio para que o nmero de tomos do istopo radioativo originalmente presente seja reduzido metade.

    Os mtodos de datao geocronolgicos podem ser utilizados para: (a) determinar idades de cristalizao de minerais e rochas; (b) estudar a histria trmica de rochas (mtodos termocronolgicos); (c) estabelecer a idade de exposio de superfcies; (d) determinar a idade de morte de organismos.

    No primeiro grupo, incluem-se os mtodos Rb-Sr, Sm-Nd e U-Pb. Conhecendo-se o tempo de meia-vida e as concentraes dos istopos radiognico e radioativo em uma rocha ou mineral teoricamente possvel calcular a idade de sua formao. Quando a idade obtida corresponde idade de cristalizao de rochas ou minerais a partir de um magma, esta uma idade gnea. Quando os minerais em uma rocha so produtos de cristalizao ou recristalizao no estado slido, obtm-se uma idade metamrfica.

    Os mtodos termocronolgicos baseiam-se no fato de que, a temperaturas elevadas, o sistema pode ser aberto com respeito ao istopo radiognico. Nestas situaes, a idade obtida corresponde ao tempo decorrido aps os minerais ou rochas terem resfriado at uma temperatura suficientemente baixa para permitir a reteno do istopo radiognico na estrutura cristalina dos minerais. Neste grupo incluem-

    se os mtodos Ar-Ar e de traos de fisso em apatita.

    Os dois ltimos grupos diferem dos dois primeiros porque resultam da produo de istopos radioativos pela interao de raios csmicos com a atmosfera ou a superfcie da Terra (sendo, por isso, igualmente referidos como mtodos de datao por nucldeos cosmognicos). A idade de exposio de superfcies a raios csmicos pode ser estimada pela quantidade dos istopos cosmognicos 26Al, 10Be e 36Cl produzidos in situ. Um exemplo do quarto caso a coliso de raios csmicos com ncleos de nitrognio para produzir carbono atravs de uma reao (n, p), onde n um nutron e p um prton:

    14N + n 14C + p

    O 14C produzido decai para o 14N com uma meia vida de cerca de 5700 anos. A quantidade de 14C na atmosfera o resultado de um equilbrio entre produo cosmognica e decaimento radioativo. Cada organismo mantm um equilbrio com a atmosfera ou o oceano enquanto vivo, mas aps sua morte esta troca cessa e o 14C comea a diminuir. Assim, a idade da morte pode ser determinada pela quantidade de 14C remanescente.

    Os istopos com tempos de meia vida longos, representados pelos dois primeiros grupos, so os de maior utilidade em estudos tectnicos e de evoluo crustal. Os istopos mais comuns empregados, com suas respectivas constantes de decaimento e tempos de meia-vida, so mostrados na Tabela 2.1. 2.2. Conceitos bsicos A taxa de desintegrao de um elemento radioativo dada por:

    dN/dt = -N dN/N = -dt

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    onde N o nmero de tomos do elemento radioativo no tempo t. Por integrao, obtm-se:

    lnN = - t + c

    Para t = 0, c = lnN0, onde N0 o nmero de tomos do istopo radioativo originalmente presente. Substituindo-se c por lnN0 na equao acima, tem-se:

    lnN-lnN0 = -t lnN/N0 = -t N0 = Net

    Se, depois de decorrido um tempo t,

    o nmero de tomos do istopo radiognico produzido F, o nmero de tomos do istopo radioativo restante N = N0 F. Logo:

    F = N0 N F = Net N, ou

    F = N (et 1)

    A equao acima a frmula geral que permite a datao de rochas e/ou minerais. A partir dela, pode-se ver que o tempo de meia vida (isto , quando F = N) dado por:

    1 = (et1/2 1) et1/2 = 2 t1/2 = ln2/

    2.3. Mtodo Rb-Sr No caso do decaimento de 87Rb para 87Sr, a equao fundamental da geocronologia se torna:

    87Sr = 87Rb (et 1)

    87Sr ocorre naturalmente em rochas independentemente do Rb. Portanto, o nmero de tomos de 87Sr inicialmente presente [(87Sr)o] tem de ser adicionado ao nmero de istopos produzidos por decaimento radioativo. Assim, o nmero total de tomos de 87Sr dado por:

    87Sr = (87Sr)o + 87Rb (et 1)

    Esta equao pode ser modificada dividindo-se cada termo pelo nmero de tomos de 86Sr, o qual constante, uma vez que este istopo estvel e no resulta do decaimento de istopos de outros elementos. A razo deste procedimento que a determinao das razes isotpicas de elementos por espectrometria de massa mais precisa que suas concentraes absolutas. Fazendo-se isto, obtm-se: 87Sr/ 86Sr = (87Sr/ 86Sr)o + 87Rb/ 86Sr (et 1)

    A equao acima constitui a base da determinao de idades pelo mtodo Rb-Sr. Ela uma equao da linha reta da forma Y = Ro + mX, onde m (o declive da reta ) igual a (et 1). Esta reta chamada de iscrona e o valor de Ro de razo inicial (Fig. 2.1).

    Considere um grupo de rochas gneas cogenticas ou minerais comagmticos (1, 2 e 3 na Fig. 2.1). Na poca de formao, a razo 87Sr/ 86Sr deveria ser a mesma para todas as rochas (ou minerais) porque a cristalizao de um magma no fraciona os istopos de Sr, j que a diferena de massa entre eles muito pequena. As razes Rb/Sr (e, portanto 87Rb/86Sr), por outro lado, podem variar devido diferena de

    Tabela 2.1. Sistemas de decaimentos radioativos mais comuns usados na datao de rochas e minerais. Istopo radioativo Istopo radiognico (a-1) Meia vida

    87Rb 87Sr 1,42 X 10-11 48,8 Ga 238U 206Pb 1,55 X 10-10 4,47 Ga 235U 207Pb 9,85 X 10-10 0,70 Ga

    232Th 208Pb 4,95 X 10-11 14,0 Ga 147Sm 143Nd 6,54 X 10-12 106 Ga

    40K 40Ar 5,81 X 10-11 11,93 Ga

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    comportamento geoqumico entre o Rb e o Sr. Como o Rb mais incompatvel que o Sr, devido ao seu maior raio inico, amostras mais cidas normalmente tm valores mais elevados da razo 87Rb/86Sr. Igualmente, a razo Rb/Sr diferente em diferentes minerais (por exemplo, bem mais baixa em plagioclsio que em ortoclsio). Aps a cristalizao e resfriamento do magma, a razo 87Rb/86Sr nas amostras ou minerais comea a diminuir enquanto a razo 87Sr/86Sr aumenta na mesma proporo (Fig. 2.1). Assim, se as razes 87Sr/86Sr e 87Rb/ 86Sr forem projetadas umas contra as outras, o tempo t e a razo inicial podem ser determinados pelo declive da reta de melhor ajuste aos pontos e pela interseo com o eixo das ordenadas, respectivamente. Um exemplo de datao por rocha total mostrado na Figura 2.2.

    A razo inicial um indicador da derivao crustal ou mantlica de uma rocha. Rb extrado preferencialmente do manto e incorporado na crosta durante episdios de fuso parcial. Assim, razes iniciais elevadas refletem protlitos crustais. Por exemplo, enquanto muitos basaltos recentes tm razes iniciais no intervalo

    0,702-0,705, granitos crustais podem apresentar valores superiores a 0,710-0,720.

    O 87Sr resultante do decaimento de 87Rb ocupa posies instveis na rede cristalina de minerais ricos em Rb, como ortoclsio e biotita, e tende a ser expulso desses minerais durante eventos trmicos. Por esta razo, eventos metamrficos podem perturbar o sistema Rb-Sr e, assim, este mtodo cada vez menos empregado para obter idades de cristalizao. No entanto, em circunstncias favorveis, o sistema pode ser aberto na escala do mineral, mas fechado na escala de amostra de mo. Nestes casos, o Sr liberado pelas fases ricas em Rb ser incorporado nas fases minerais vizinhas ricas em Sr, como plagioclsio e apatita. Uma iscrona construda com minerais pobres e ricos em Rb pode, portanto, fornecer a idade do metamorfismo. Nos casos mais favorveis, tanto a idade de cristalizao quanto a do metamorfismo podem ser determinadas. 2.4. Mtodo Sm-Nd

    Figura 2.1. Ilustrao do princpio de aplicao do mtodo Rb-Sr usando a mesma escala para os eixos x e y. Amostras cogenticas ou minerais comagmticos (1, 2, 3) movem-se ao longo de linhas retas com declividade -1. A idade de cristalizao ser tanto mais antiga quanto maior o declive da iscrona. Na prtica, como o decaimento do Rb87 muito lento, o eixo y expandido para poder mostrar o declive da iscrona num formato adequado.

    Figura 2.2. Iscrona Rb-Sr (rocha total) para o plton Queimadas (Estado da Paraba). Notar que a escala vertical expandida em relao escala horizontal. Sem este exagero, a iscrona seria quase horizontal. MSWD (mean squared weighted deviates) representa a disperso dos pontos com respeito linha de regresso calculada pela tcnica dos mnimos quadrados. Em princpio, quanto menor este valor mais confivel a idade obtida.

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    A equao para o clculo de idades pelo mtodo Sm-Nd similar empregada para o mtodo Rb-Sr, utilizando-se o istopo estvel 144Nd como istopo de referncia:

    143Nd/144Nd = (143Nd/144Nd)o + 147Sm/144Nd (et 1)

    Ao contrrio do Rb e Sr, que exibem comportamento geoqumico contrastantes, Sm e Nd tm propriedades qumicas similares. Isto torna difcil a obteno de amostras de rocha total com variaes significativas na razo Sm/Nd, impossibilitando uma aplicao ampla do mtodo. No entanto, ele muito til para rochas que tm baixas concentraes de Rb e/ou no contm zirco, no podendo ser datadas pelos mtodos Rb-Sr ou U-Pb. Este o caso de algumas classes de meteoritos e de rochas mficas. Alm disso, Sm e Nd so imveis durante eventos metamrficos que podem perturbar mesmo o sistema U-Pb. Nesses casos, o mtodo Sm-Nd pode ser o nico a fornecer a idade de cristalizao de rochas metamorfizadas em alto grau. Um exemplo mostrado na Figura 2.3.

    Como no caso do mtodo Rb-Sr, a

    razo inicial 143Nd/144Nd tambm indica a origem crustal ou mantlica de uma rocha. Porm, como a variao desta razo muito

    pequena em rochas terrestres, o parmetro epsilon Nd (Nd) mais utilizado para comparar rochas com diferentes razes iniciais. Esta notao definida matematicamente como:

    Nd = {[(143Nd/144Nd)0/(143Nd/144Nd)CHUR] - 1} x 104 onde (143Nd/144Nd)CHUR corresponde ao valor da razo 143Nd/144Nd em meteoritos condrticos para a idade considerada (CHUR = chondritic uniform reservoir).

    Como se assume que a Terra foi formada por material semelhante ao de meteoritos condrticos, rochas com valores Nd prximos a zero teriam sido derivadas do manto primitivo. No entanto, como a crosta continental cresceu custa do manto (ver Cap. 8) e o Nd mais incompatvel que o Sm, por ter raio inico um pouco maior, com o decorrer do tempo o manto adquire razes Sm/Nd maiores que o CHUR (Fig. 2.4). Este manto chamado empobrecido devido perda de elementos litfilos. Razes Sm/Nd (e, portanto, 143Nd/144Nd) mais elevadas que o CHUR implicam valores Nd positivos. Assim, rochas com Nd positivo so interpretadas como derivadas do manto empobrecido. A crosta continental, por outro lado, tem valores Sm/Nd menores que o CHUR e, assim, magmas formados por sua fuso parcial tm valores negativos de Nd. A idade modelo de uma rocha (TDM, DM = depleted mantle) corresponde ao tempo no qual seu Nd era igual ao do manto empobrecido. Por exemplo, a Fig. 2.4 mostra que as rochas do Complexo Itapetim e do Batlito Fazenda Nova tm idades-modelo, respectivamente, em torno de 1,4 Ga e entre 1,8 e 2,0 Ga. Estas idades so consideravelmente mais velhas que as idades de cristalizao dos pltons (em torno de 0,6 Ga).

    Apenas rochas crustais derivadas do manto (ou de protlitos derivados do manto) tm idades-modelo idnticas sua idade de cristalizao (esta ltima normalmente

    0,5133

    0,5131

    0,5129

    0,5127

    0,5125

    0,5123

    147 144Sm/ Nd

    143 144Nd/ Nd

    Idade = 782 +/- 100 MaMSWD = 5,2

    0,10 0,14 0,18 0,22 0,24

    Figura 2.3. Iscrona Sm-Nd (rocha total) para anfibolitos da seqncia metavulcanossedimentar Mara Rosa, Gois.

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    obtida pelo mtodo U-Pb em zirco). Estas rochas so chamadas de juvenis e suas idades correspondem a eventos de formao crustal.

    Rochas derivadas de fontes

    exclusivamente crustais ou de fontes hbridas tm idades-modelo sempre mais antigas que sua idade de formao, podendo, ou no, ter um componente juvenil. Isto ilustrado na Figura 2.5. Granitides arqueanos e proterozicos, derivados direta ou indiretamente do manto, tm valores Nd

    positivos e idades-modelo idnticas idade de cristalizao. Como essas rochas tm razes Sm/Nd menores que o CHUR, com o passar do tempo, elas adquirem Nd negativo. Fuso parcial dessas rochas, num evento posterior, vai gerar granitos com valores Nd negativos e TDM arqueano ou proterozico. Se o magma gerado contiver um componente juvenil por mistura com magmas mficos (caso a), os valores Nd podem ser positivos ou negativos e o TDM ser intermedirio entre a idade de cristalizao da rocha e a idade do protlito grantico. Se houver mistura com magmas de origem crustal (caso b), o Nd ser negativo. 2.5. Mtodo U-Pb 2.5.1. Generalidades Para o decaimento do 238U para 206Pb e do 235U para 207Pb, tem-se as seguintes equaes:

    206Pb = 206Pb0 + 238U (et 1) 207Pb = 207Pb0 + 235U (et 1)

    Em princpio, essas equaes podem

    ser utilizadas para construir iscronas U-Pb, como nos mtodos Rb-Sr e Sm-Nd, utilizando-se 204Pb como istopo de referncia. Esta abordagem tem sido empregada no caso de carbonatos marinhos, os quais so de difcil datao por outros mtodos. No entanto, como urnio um elemento extremamente mvel, iscronas construdas com amostra de rocha total so pouco confiveis.

    Minerais acessrios que contenham U, mas no Pb, na sua estrutura (como o caso de zirco, monazita e titanita) so ideais para datao pelo mtodo U-Pb. Nestes casos, a razo inicial igual a zero e as equaes acima so simplificadas para:

    206Pb = 238U (et 1) 207Pb = 235U (et 1)

    2.5.2. Curva concrdia

    Figura 2.5. Diagrama ilustrando como idades modelo podem no corresponder a eventos de formao crustal. Granitos arqueanos e proterozicos tm TDM igual idade de cristalizao, mas granitos de fontes hbridas (crosta+manto; caso a) ou inteiramente crustais (caso b) tm TDM mais antigo que a idade de cristalizao.

    Figura 2.4. Diagrama de evoluo isotpica de Nd para amostras do Complexo Itapetim (IG) e do Batlito Fazenda Nova (FN) (Provncia Borborema, NE Brasil).

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    A vantagem do mtodo U-Pb sobre os demais mtodos de datao reside no fato de o urnio possuir dois istopos radioativos, o que permite o clculo de idades pelas duas expresses seguintes:

    t = 1/238 ln (206Pb/238U + 1) t = 1/235 ln (207Pb/235U + 1)

    Projetando-se as razes 206Pb/238U

    versus 207Pb/235U para diferentes valores de t, obtm-se uma curva chamada concrdia (Fig. 2.6). Minerais que se comportam como um sistema fechado para U e Pb desde a sua formao devem fornecer idades 238U-206Pb e 235U-207Pb idnticas e, portanto, cair sobre a concrdia. Estas idades so chamadas de concordantes.

    Em alguns casos, anlises isotpicas

    de zirces derivados de uma mesma amostra definem uma linha, ao invs de se projetarem sobre a concrdia. Esta linha chamada de discrdia e as idades obtidas de discordantes. Apesar disso, os interceptos superior e inferior da discrdia com a concrdia podem fornecer informaes geolgicas importantes. 2.5.3. Mtodos O mtodo mais comum para determinao de idades U-Pb em minerais acessrios (usualmente chamado mtodo convencional) envolve a dissoluo de gros de zirco por mtodos qumicos. A determinao das abundncias isotpicas de urnio e chumbo feita por ionizao

    trmica em um espectrmetro de massa. O acrnimo TIMS (das iniciais em ingls para espectrometria de massa por ionizao trmica) tambm frequentemente empregado para descrever este mtodo. Atualmente, possvel obter idades pela dissoluo de apenas um ou de uns poucos gros de zirco.

    Datao in situ de domnios no interior de gros individuais de zirco pode ser realizada com o uso de microssonda inica, cujo instrumento mais sensvel denominado SHRIMP (de Sensitive High Resolution Ion Microprobe), e por espectrometria de massa com plasma indutivamente acoplado com ablaso a laser (LA-ICP-MS, das iniciais de laser ablation inductively coupled plasma mass spectrometry). Com estes dois equipamentos, em combinao com imagens obtidas por microscopia eletrnica de varredura ou catoluminescncia, possvel determinar a idade de domnios no interior de gros complexos. Nestes casos, idades diferentes podem estar presentes (Fig. 2.7) e datao pelo mtodo convencional forneceria uma mdia das idades.

    Uma tcnica distinta das descritas acima a chamada datao qumica de Pb. Assumindo-se que todo o chumbo presente em um mineral seja radiognico, a concentrao total do chumbo (CPb) relacionada s concentraes de urnio (CU) e de trio (CTh). Essas concentraes podem

    Figura 2.6. Diagrama concrdia U-Pb mostrando a linha concrdia calibrada em milhes de anos.

    Figura 2.7. Idades U-Pb por LA-ICP-MS no interior de um gro de zirco de uma amostra de paragnaisse peltico do Complexo Surubim, Estado de Pernambuco.

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    ser determinadas por microssonda eletrnica (em ppm) e utilizadas para a obteno de uma idade aproximada pela equao:

    CPb ~ 0,897 CTh(e232t 1) + 0,006 CU(e235t 1) + 0,589 CU(e238t 1)

    onde 232, 235 e 238 so as taxas de decaimento radioativo de 232Th, 235U e 238U, respectivamente. 2.5.4. Aplicaes

    Se um mineral fechado com respeito perda ou ganho dos istopos radioativos e radiognicos desde sua formao, as idades obtidas devem ser concordantes e correspondem a idades de cristalizao. No caso de rochas gneas, isto permite a datao de eventos magmticos (Fig. 2.8).

    Em rochas metamrficas

    ortoderivadas, os zirces presentes comumente so zirces gneos e fornecem a idade de cristalizao do protlito. No entanto, zirces metamrficos tambm podem ser encontrados em rochas metamrficas (tanto paraderivadas como ortoderivadas) ou como sobrecrescimentos em torno de cristais gneos. Zirces gneos podem ser distinguidos de zirces metamrficos pela presena de faces

    cristalinas, zonao oscilatria (Fig. 2.7) e razo Th/U > 0,1. Monazita mais comum como mineral metamrfico que zirco e est se tornando o mineral padro para a determinao de idades de metamorfismo pela tcnica de datao qumica de Pb.

    Idades discordantes, normalmente, resultam da perda de Pb durante eventos metamrficos. Neste caso, anlises de zirces (ou outros minerais apropriados) derivados de uma mesma amostra caem sobre a discrdia. Os interceptos superior e inferior da discrdia so interpretados como as idades de cristalizao e do evento metamrfico, respectivamente (Fig. 2.9).

    Discrdias tambm podem resultar

    da presena de zirces herdados da fonte ou de perda contnua de Pb. No primeiro caso, o intercepto inferior fornece a idade da rocha e o superior d a indicao da idade de seu protlito (Fig. 2.10). No segundo caso, o intercepto superior corresponde idade da rocha e o inferior forado para zero. Um grande nmero de anlises pode ser realizado em tempo relativamente curto por SHRIMP e LA-ICP-MS. Isto tem feito com que estes mtodos sejam cada vez mais utilizados em estudos de provenincia de seqncias supracrustais, permitindo inferir as possveis reas fontes que forneceram

    Figura 2.9. Idades discordantes resultantes de perda de Pb durante a orognese brasiliana em ortognaisse paleoproterozico. Idades obtidas por LA-ICP-MS.

    Figura 2.8. Diagrama concrdia U-Pb para zirces do plton Cachoeirinha, Estado de Pernambuco. Idades obtidas por LA-ICP-MS.

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    detritos para a bacia sedimentar (Fig. 2.11). Estes estudos tambm fornecem a idade mxima de deposio, que deve ser mais jovem que a do zirco mais novo analisado.

    2.6. Termocronologia 2.6.1. Mtodo 40Ar 39Ar

    Os trs istopos naturais do argnio so 36Ar, 38Ar e 40Ar. Este ltimo o mais abundante (99,6%) e resulta do decaimento do 40K:

    40Ar = 40K (et 1) O 40K tambm produz 40Ca por decaimento radioativo e a equao acima deve ser corrigida para levar este fato em considerao. No entanto, sendo a meia vida do 40Ca muito menor que a do 40Ar, a equao vlida como uma primeira aproximao e constitui a base do clculo de idades pelo mtodo K-Ar. O problema com este mtodo reside no fato do Ar ser um gs e, assim, facilmente perdido do sistema, fazendo com que as idades obtidas sejam, em geral, imprecisas. Atualmente, o mtodo K-Ar s empregado para rochas relativamente jovens e inalteradas, tendo sido suplantado pelo mtodo Ar-Ar. O mtodo de datao Ar-Ar depende do bombardeamento de 39K por nutrons em um reator nuclear para produzir 39Ar. A reao :

    39K + n 39Ar + p

    Onde n um nutron e p um prton. A proporo de 39Ar produzido proporcional quantidade de 39K presente na amostra antes da irradiao:

    39Ar = c39K

    Combinando-se esta equao com a primeira obtm-se:

    40Ar/39Ar = 40K/c39K (et 1) = (et 1)/D

    Se uma amostra de idade conhecida tS for irradiada juntamente com a amostra estudada, o termo D pode ser determinado:

    D = (ets 1) 39Ars/40Ars

    Logo:

    40Ar/39Ar = (et 1)/(ets 1) 40Ars/39Ars

    Figura 2.10. Discrdia resultante da presena de gros de zirco herdados da fonte no Granito Cabanas, Estado de Pernambuco. Idades obtidas por LA-ICP-MS.

    Figura 2.11. Diagrama mostrando a distribuio de idades concordantes de zirces (obtidas por LA-ICP-MS) de um paragnaisse peltico do Complexo Surubim, Pernambuco. As anlises mostram que o gnaisse foi derivado de fontes com idades paleoproterozicas, mesoproterozicas e neoproterozicas e que a deposio da seqncia ocorreu aps 665 Ma.

  • 15

    Uma idade t pode ser obtida a partir da equao acima para diferentes temperaturas. Para datar uma rocha ou mineral pelo mtodo Ar-Ar, a amostra aquecida passo a passo a diferentes temperaturas. A razo 40Ar/39Ar do gs liberado em cada etapa medido em um espectrmetro de massa. Os resultados so apresentados em um grfico, onde as idades calculadas so projetadas contra a percentagem de gs liberado (Fig. 2.12). Idealmente, as idades determinadas a cada temperatura deveriam ser idnticas, mas considera-se que o resultado satisfatrio se as idades forem coincidentes para trs ou mais passos correspondendo a mais de 70% do gs liberado. Esta idade chamada idade plat. Na tcnica 40Ar/39Ar clssica utilizada uma populao de numerosos gros de um mineral, os quais so aquecidos em um forno. O mtodo 40Ar/39Ar por sonda laser, introduzido mais recentemente, permite a datao de gros individuais (Fig. 2.12) e mesmo de zonas locais no interior do gro.

    O argnio no pode ser retido no interior de um mineral at que uma temperatura suficientemente baixa, chamada temperatura de fechamento, tenha sido atingida. A temperatura de fechamento depende de vrios fatores, dentre os quais os mais importantes so a estrutura do mineral,

    a granulao e a taxa do resfriamento. As temperaturas de fechamento para hornblenda, muscovita e biotita (minerais mais comumente utilizados para datao pelo mtodo Ar-Ar) so, respectivamente, da ordem de 530, 380 e 300C. 2.6.2. Datao por traos de fisso A fisso espontnea do 238U produz nucldeos que se movimentam em direes opostas. Isto causa um dano na estrutura cristalina do mineral, deixando um trao que pode ser observado ao microscpio. Se a temperatura elevada, este trao rapidamente cicatrizado. No caso da apatita, os traos de fisso tm cerce de 14 m e podem ser, em boa parte, preservados para temperaturas abaixo de cerca de 100C. Assim, a densidade de traos de fisso em um cristal proporcional ao tempo decorrido aps a rocha ter atingido essa temperatura. 2.6.3. Aplicaes

    O mtodo Ar-Ar pode ser utilizado para obter idades de cristalizao de rochas gneas que tenham resfriado rapidamente ou de rochas metamrficas de baixo grau. No caso de rochas gneas e metamrficas de alto grau que sofreram resfriamento lento, a idade (ou idades) 40Ar/39Ar no corresponde idade de cristalizao, mas sim ao tempo que a rocha foi resfriada abaixo da temperatura de fechamento do mineral analisado (note a diferena de idade entre gros de anfiblio e biotita na Fig. 2.12). Em combinao com o mtodo U-Pb e/ou de traos de fisso em apatita, isto permite que estimativas de taxas de resfriamento crustal sejam feitas, o que muito importante em estudos metamrficos. O mtodo de traos de fisso ainda empregado em estudos de denudao e eroso. 2.7. A escala do tempo geolgico Para o Fanerozico, as subdivises da escala do tempo geolgico so baseadas em critrios paleontolgicos e estratigrficos. Ela numericamente

    Figura 2.12. Espectro de idades aparentes 40Ar/39Ar para gros de anfiblio e biotita de um ortognaisse diortico na regio de Taquaritinga do Norte, Estado de Pernambuco. P = idade plat.

  • 16

    calibrada pela datao de rochas apropriadas e tem sido continuamente refinada medida que progressos nas tcnicas geocronolgicas permitem a obteno de idades com preciso e exatido cada vez maior.

    Para o Precambriano, a subdiviso do tempo geolgico puramente cronolgica. O limite entre os ons Arqueano e Proterozico colocado a 2,5 Ga e eles correspondem, respectivamente, a mais de um tero e quase metade da histria geolgica da Terra. O Arqueano subdividido em Paleoarqueano, Mesoarqueano e Neoarqueano, e o Proterozico, em Paleoproterozico, Mesoproterozico e Neoproterozico. O on pr-arqueano conhecido como Hadeano.

    Uma diviso das eras do

    Proterozico em perodos foi proposta pela Unio Internacional das Cincias Geolgicas

    (International Union of Geological Sciences; IUGS), mas no tem sido amplamente empregada e no ser utilizada neste livro. Quando necessrio, termos informais como Paleoproterozico inferior e Mesoproterozico superior, por exemplo, sero utilizados e no os perodos equivalentes propostos pela IUGS (Sideriano, Esteniano). Uma escala do tempo geolgico simplificada mostrada na Figura 2.13. Referncias Selecionadas Dickin, A.P., 2005. Radiogenic Isotope Geology, 2

    Ed., Cambridge University Press. Faure, G., 1986. Principles of Isotope Geology, 2

    Ed., Wiley. Foster, G., Parrish, R.R., Horstwood, M.S.A.,

    Chenery, S., Pyle, J.Gibson, H.D., 2004. The generation of prograde P-T-t points and paths: a textural, compositional, and chronological study of metamorphic monazite. Earth and Planetary Science Letters 228, 125-142.

    Hanchar, J.M., Hoskin, P.W.O. (eds.), 2003. Zircon. Reviews in Mineralogy and Geochemistry 59, 469-500.

    Hodges, K.V., 2005. Geochronology and thermochronology in orogenic systems. In: Rudnick, R.L. (ed.) The Crust. Treatise on Geochemistry 3, 263-292, Elsevier.

    Jackson, S.E., Pearson, N.J., Griffin, W.L., Belousova, E.A., 2004. The application of laser ablation-inductively coupled plasma-mass spectrometry to in situ U-Pb zircon geochronology. Chemical Geology 211, 47-69.

    Patchett, P.J., Samson, S.D., 2005. Ages and growth of the continental crust from radiogenic isotopes. In: Rudnick, R.L. (ed.) The Crust. Treatise on Geochemistry 3, 321-348, Elsevier.

    Silva, L.C., 2006. Geocronologia aplicada ao mapeamento regional, com nfase na tcnica U-Pb SHRIMP e ilustrada com exemplos brasileiros. Publicaes Especiais do Servio Geolgico do Brasil 1, 1-132.

    Figura 2.13. Esquema mostrando as principais subdivises do tempo geolgico.

  • 17

    3. Estrutura e Composio do Interior da Terra 3.1. Introduo O principal mtodo para determinar a estrutura interna da Terra o estudo da propagao de ondas elsticas atravs do seu interior. O ramo da geofsica que se ocupa desse estudo chamado de Sismologia. A determinao da composio das diferentes camadas da terra revelada pela sismologia feita por uma combinao de mtodos. Dentre estes, destacam-se estudos geoqumicos e petrolgicos de rochas presentes na superfcie ou transportadas para a superfcie durante eventos magmticos ou tectnicos, e a determinao das propriedades fsicas dos minerais em laboratrio sob condies variveis de presso e temperatura. 3.2. Ondas ssmicas Uma rocha submetida a um esforo sofre, inicialmente, uma deformao elstica. Terremotos so gerados quando o esforo aplicado supera a resistncia da rocha, levando sua ruptura. Quando isto ocorre, a energia elstica armazenada subitamente liberada e se propaga em todas as direes por meio de ondas ssmicas. Existem vrios tipos de ondas ssmicas. As mais importantes para o estudo da estrutura do interior da Terra so as ondas P e S (Fig. 3.1). As ondas P so chamadas primrias, porque sua velocidade de propagao maior que a das ondas S (secundrias) e, assim, elas chegam mais rapidamente a uma estao de registro sismolgico. A direo de propagao das ondas P paralela direo de vibrao, como no caso das ondas sonoras. Por isso, elas so tambm conhecidas como ondas longitudinais ou compressionais (Fig. 3.1). Nas ondas S, a direo de vibrao perpendicular direo de propagao, sendo elas, tambm, chamadas de transversais ou cisalhantes (Fig. 3.1).

    As ondas P podem se propagar em meios slidos, lquidos ou gasosos. As ondas S s se propagam em meios slidos porque lquidos no apresentam resistncia se submetidos a esforos cisalhantes. Quando uma onda em propagao passa de um meio para outro com propriedades fsicas diferentes, ela pode sofrer refrao e/ou reflexo e aumentar ou diminuir a velocidade. So essas variaes de direo e de velocidade que permitem a determinao da estrutura interna da Terra. Regies caracterizadas por um aumento ou diminuio brusca na velocidade de propagao das ondas ssmicas so chamadas de descontinuidades ssmicas.

    Os estudos sismolgicos podem utilizar ondas ssmicas produzidas por fontes passivas ou ativas. No primeiro caso, as ondas ssmicas so provenientes de terremotos naturais distantes e registradas em estaes sismolgicas. No segundo caso, as fontes de energia so geradas artificialmente e medidas em receptores espalhados ao longo de linhas ssmicas. Os tremores podem ser causados por exploses com tempo controlado ou por vibraes produzidas por caminhes especialmente equipados para este fim.

    Figura 3.1. Diagrama em duas dimenses ilustrando a diferena entre ondas P e S.

  • 18

    3.3 Caractersticas ssmicas das camadas da Terra

    A Figura 3.2 mostra um modelo da variao das velocidades ssmicas com o aumento da profundidade obtido a partir da anlise de um grande nmero de medidas. A partir dela, infere-se que as principais divises sismolgicas da Terra so a crosta, o manto e o ncleo, sendo o manto subdividido em trs camadas e o ncleo em duas (Fig. 3.3). A crosta separada do manto pela descontinuidade de Mohorovicic (ou simplesmente Moho), a qual se situa, tipicamente, entre 30 e 50 km de profundidade, em regies continentais, e a 10 km de profundidade, em regies ocenicas. A espessura da crosta to pequena quando comparada com raio da Terra, que ela quase no visvel na Figura 3.2. O manto separado do ncleo por uma descontinuidade que ocorre a 2890 km de profundidade, a qual , s vezes, chamada descontinuidade de Gutenberg. Ondas S no se propagam atravs do ncleo externo, indicando que o mesmo lquido.

    A diviso da camada mais externa da Terra em crosta continental e crosta ocenica baseada, primariamente, na profundidade da Moho, com a espessura da primeira

    variando de 14 a 80 km e, a da segunda, tipicamente de 6 a 8 km. Em algumas regies continentais, observado um contato gradual, ocorrendo a profundidades entre 12 e 20 km, dependendo do local, chamado descontinuidade de Conrad, que separa a crosta superior da crosta mdia/inferior. Na maioria das regies, porm, a crosta continental mais bem descrita como constituda por uma estrutura com trs camadas. Um exemplo mostrado na Figura 3.4. Na crosta superior (

  • 19

    aumento de velocidade das ondas P de 7,2-7,3 km/s na base da crosta para 8,0-8,1 km/s

    no manto.

    Duas descontinuidades bem marcadas ocorrem dentro do manto a profundidades de 410 e 660 km (Figs. 3.2 e 3.3). A regio acima da descontinuidade de 410 km corresponde ao manto superior. Neste, uma zona de atenuao das ondas ssmicas, estendendo-se de profundidades entre 50-100 km at 150-200 km, observada em muitas regies ocenicas, mas nem sempre encontrada abaixo de regies continentais, especialmente de suas partes mais antigas. Esta regio chamada zona de baixa velocidade ou simplesmente LVZ (das iniciais em ingls para low velocity zone). A regio entre as descontinuidades de 410 e 660 km chamada zona de transio e, abaixo dela, tem-se o manto inferior. Os gradientes de velocidades na poro inferior do manto indicam que esta regio, chamada de camada D, lateral e verticalmente heterognea, com espessuras variando de menos de 150 km at mais de 300 km. Na base do manto, a velocidade das ondas P decresce bruscamente de 14 km/s para 8 km/s e as ondas S deixam de se

    Figura 3.4. Perfis de velocidades de ondas P e S (acima) e modelo 2D de velocidades de ondas P (abaixo) para a Faixa Braslia e poro ocidental do crton So Francisco ao longo da linha ssmica mostrada no mapa da esquerda.

    Figura 3.5. Correlao entre a estrutura ssmica da crosta ocenica e os tipos litolgicos presentes a diferentes profundidades em uma seqncia ofioltica completa.

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    propagar. Uma descontinuidade a 5150 km de profundidade separa o ncleo externo lquido do ncleo interno slido. Alguns autores intitulam esta descontinuidade de Lehmann, mas outros utilizam este termo para a base da LVZ. 3.4. Composio da crosta 3.4.1. Crosta continental A composio da crosta continental superior bem conhecida, porque sees representando nveis crustais diferentes esto expostas na superfcie, podendo ser estudadas diretamente no campo. Galerias e furos de sonda estendem a observao direta das rochas at 13 km de profundidade. Estes estudos mostram que a crosta continental superior constituda predominantemente de rochas gneas e metamrficas capeadas por uma cobertura de rochas sedimentares que representam apenas uma pequena frao de seu volume. Os seguintes mtodos so empregados para estimar a composio qumica da crosta continental superior: (a) determinao de mdias ponderadas da composio de rochas expostas na superfcie; (b) determinao das composies mdias de elementos insolveis em sedimentos clsticos finos (argilitos); (c) determinao da composio qumica mdia de depsitos glaciais e loess. Diferentes estimativas mostram que a composio mdia aproxima-se da de um granodiorito (Tabela 3.1). A composio da crosta continental mais profunda inferida a partir de dados ssmicos e daqueles provenientes da petrologia experimental e do estudo de xenlitos encontrados em algumas rochas vulcnicas. Embora existam discrepncias entre diferentes estimativas, a combinao dos resultados provenientes desses diferentes campos mostra que, em geral, a crosta continental torna-se mais mfica com o aumento da profundidade. A crosta inferior consiste de rochas na fcies granulito e quimicamente equivalente a gabro, enquanto a crosta mdia composta de rochas na fcies anfibolito e tem composio intermediria (Tabela 3.1).

    Tabela 3.1. Estimativa para a composio qumica da crosta continental (Rudnick e Gao, 2005). xidos em %; elementos em ppm.

    xido/ Elemento

    Crosta superior

    Crosta mdia

    Crosta inferior

    Crosta total

    SiO2 66,6 63,5 53,4 60,6 TiO2 0,64 0,69 0,82 0,72 Al2O3 15,4 15,0 16,9 15,9 FeOT 5,04 6,02 8,57 6,71 MnO 0,10 0,10 0,10 0,10 MgO 2,48 3,59 7,24 4,66 CaO 3,59 5,25 9,59 6,41 Na2O 3,27 3,39 2,65 3,07 K2O 2,80 2,30 0,61 1,81 P2O5 0,15 0,15 0,10 0,13 Sc 14,0 19 31 21,9 V 97 107 196 138 Cr 92 76 215 135 Co 17,3 22 38 26,6 Ni 47 33,5 88 59 Cu 28 26 26 27 Zn 67 69,5 78 72 Ga 17,5 17,5 13 16 Rb 82 65 11 49 Sr 320 282 348 320 Y 21 20 16 19 Zr 193 149 68 132 Nb 12 10 5 8 Ag 53 48 65 56 Sn 2,1 1,30 1,7 1,7 Sb 0,4 0,28 0,10 0,2 Ba 628 532 259 456 La 31 24 8 20 Ce 63 53 20 43 Pr 7,1 5,8 2,4 4,9 Nd 27 25 11 20 Sm 4,7 4,6 2,8 3,9 Eu 1,0 1,4 1,1 1,1 Gd 4,0 4,0 3,1 3,7 Tb 0,7 0,7 0,48 0,6 Dy 3,9 3,8 3,1 3,6 Ho 0,83 0,82 0,68 0,77 Er 2,3 2,3 1,9 2,1 Tm 0,30 0,32 0,24 0,28 Yb 2,0 2,2 1,5 1,9 Lu 0,31 0,4 0,25 0,30 Hf 5,3 4,4 1,9 3,7 Ta 0,9 0,6 0,6 0,7 W 1,9 0,60 0,60 1 Re 0,198 0,18 0,188 Os 0,031 0,05 0,041 Ir 0,022 0,05 0,037 Pt 0,5 0,85 2,7 1,5 Au 1,5 0,66 1,6 1,3 Hg 0,05 0,0079 0,014 0,03 Pb 17 15,2 4 11 Th 10,5 6,5 1,2 5,6 U 2,7 1,3 0,2 1,3

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    As velocidades das ondas ssmicas em rochas flsicas, intermedirias e mficas, medidas em laboratrio sob condies de presso e temperatura apropriadas para a crosta continental, coincidem, respectivamente, com aquelas determinadas pela sismologia para a crosta superior, mdia e inferior. Assim, existe uma boa correspondncia entre as estimativas da composio da crosta, obtidas pela geoqumica, com os resultados experimentais e sismolgicos. Em vista disto, amplamente aceito que a composio global da crosta continental andestica (diortica). Embora o volume da crosta continental corresponda a, apenas, cerca de 0,6 % do volume total da Terra, ela concentra uma proporo significativa dos elementos-trao incompatveis (35-55% de Rb, Ba, K, Th e U). 3.4.2. Crosta ocenica A composio da crosta ocenica estimada a partir de amostras dragadas do assoalho ocenico; de testemunhos colhidos atravs de perfuraes; de amostras obtidas com o uso de submersveis em zonas de fratura, onde pores mais profundas da crosta podem ser observadas; e por comparao com a composio de ofiolitos. Ofiolitos so seqncias interpretadas como fragmentos da crosta ocenica e da poro mais superior do manto, posicionadas nos continentes como resultado de esforos tectnicos (ver Captulo 7).

    A combinao desses mtodos mostra que as trs camadas definidas pelo estudo das ondas ssmicas consistem de (Fig. 3.5): (a) sedimentos inconsolidados (chert, argila vermelha e calcreo) ricos em microorganismos planctnicos (Camada 1); (b) derrames de basaltos toleticos com estruturas em almofada (pillow lavas), na posio superior, e enxames de diques de diabsio verticais (interpretados como os condutos para os basaltos sobrejacentes), na poro inferior (Camada 2); (c) gabros e metagabros com intercalaes de plagiogranito, serpentinito e cumulados

    ultramficos (Camada 3). Assim, a composio qumica mdia da crosta ocenica mfica, similar, portanto, da crosta continental inferior. 3.5. Tipos e provncias crustais 3.5.1. Tipos crustais Um tipo crustal um segmento contnuo da crosta com caractersticas geolgicas e geofsicas similares. Os principais parmetros utilizados para diferenciar tipos crustais so a espessura e estrutura ssmica (Fig. 3.7), mas tipos crustais geralmente coincidem com feies fisiogrficas maiores na superfcie da Terra (Fig. 3.6). O tipo crustal mais extenso representado pelas bacias ocenicas, cuja estrutura mostrada na Figura 3.5. Bacias ocenicas tm 6 a 8 km de espessura, superfcie aplainada, e uma cobertura de lmina dgua com 5 a 7 km (Fig. 3.6). Cadeias ou dorsais ocenicas so cadeias de montanhas submarinas que se elevam 2 a 3 km acima do fundo ocenico, podendo, eventualmente, emergir, a exemplo da Islndia. Seu comprimento total superior a 65.000 km (Fig. 3.6) e espessuras entre 3 e 6 km. A Camada 1 ausente ou muito delgada nas dorsais ocenicas e aumenta de espessura em direo aos continentes. Tambm presentes em regies ocenicas so os arcos de ilhas, cadeias de ilhas vulcnicas com formas arqueadas. A espessura da crosta em arcos de ilhas varia de 10 a 40 km (Fig. 3.7). Alm da espessura maior, arcos de ilhas podem ser distinguidos das dorsais ocenicas por serem margeados, de um lado, por fossas ocenicas, sulcos profundos no assoalho que podem atingir at 11 km de profundidade, e, do lado oposto, por bacias marginais ou retro-arco (Fig. 3.6). A crosta ocenica nas bacias retro-arco mais espessa que nas bacias ocenicas (10 km, em mdia) devido a uma maior espessura da camada sedimentar. Em contraste com os arcos de ilhas, ilhas ocenicas marcam a terminao de cadeias lineares de vulces extintos. Finalmente, so, ainda, encontradas nos oceanos feies no

  • 22

    lineares representadas por plats submarinos (ou ocenicos). A estrutura, bem como a origem, desses diferentes tipos crustais

    ocenicos discutida com mais detalhes nos captulos 5 e 6.

    Figura 3.7. Estrutura ssmica de diferentes tipos crustais continentais e de arcos de ilhas.

    Figura 3.6. Topografia da Terra mostrando as feies principais abaixo dos oceanos e nos continentes.

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    Quatro tipos crustais principais so reconhecidos nos continentes. Escudos e plataformas so regies estveis compostas de rochas precambrianas. Escudos possuem pouca ou nenhuma cobertura sedimentar, enquanto as plataformas tm uma cobertura de rochas supracrustais, tipicamente com 1 a 3 km de espessura. Escudos e plataformas tm relevo pouco acentuado e espessura mdia de 42 km (Fig. 3.7). Uma plataforma pode envolver vrios escudos. Por exemplo, na plataforma Sul-Americana, ou seja, na regio a leste dos Andes, so reconhecidos os escudos Atlntico, Brasil Central e da Guiana. Cintures orognicos paleozicos so cintures alongados e curvilineares formados por deformao e metamorfismo durante o Paleozco. Exemplos incluem os Apalaches, no leste da Amrica do Norte, e os Pirineus, entre a Espanha e a Frana. A espessura desse tipo crustal um pouco menor que a de escudos e plataformas, variando de 30 a 40 km (Fig. 3.7), e sua expresso superficial o de cadeias de montanhas erodidas, geralmente com 1 a 2 km de altitude. Cintures orognicos meso-cenozicos, por outro lado, formam cadeias de montanhas com relevo bastante acentuado e podem apresentar espessuras de at 70-80 km (Fig. 3.7). Exemplos incluem os Andes, no oeste da Amrica do Sul; o Himalaia, na ndia e Paquisto; e os Alpes, na Europa. Riftes continentais so regies caracterizadas pela presena de um vale (tipicamente com 30-75 km de largura) limitado por falhas extensionais, comumente com 25 a 35 km de espessura (Fig. 3.7). Embora presentes em regies de crosta continental atenuada, como resultado de deformao extensional, as altitudes no so necessariamente baixas. Por exemplo, altitudes acima de 3 km so comuns ao longo do sistema de riftes do leste da frica, o mais extenso sistema de riftes continentais, com um comprimento de 6.500 km (Fig. 6.2). Espessuras similares de

    riftes continentais so observadas ao longo de margens rifte ou margens continentais passivas. Apesar de situadas abaixo do nvel do mar, a estrutura e composio das margens rifte indicam que elas so formadas por crosta continental. A passagem de uma margem passiva para a crosta ocenica tpica pode ser gradual ou relativamente brusca. 3.5.2. Provncias crustais Provncias crustais so segmentos da crosta que possuem o mesmo intervalo de idades geocronolgicas e histrias geolgicas similares. Os limites entre provncias podem ser marcados por falhas ou zonas de cisalhamento, inconformidades, rpidas mudanas no grau metamrfico ou por contatos intrusivos. Provncias crustais podem ser orognicas ou anorognicas. Estas ltimas podem ser gneas ou sedimentares, como exemplificados, respectivamente, pelas bacias do Paran e Parnaba e por grandes derrames baslticos. Provncias orognicas so resultantes de deformao e metamorfismo. Exemplos, com idades variando do Arqueano at o presente, so discutidos nos captulos 9 a 11. O termo crton normalmente empregado para provncias orognicas tectonicamente estabilizadas pelo menos desde o incio do Neoproterozico, mas alguns autores preferem restringir o termo para escudos ou plataformas de idade arqueana. Provncias orognicas so, tambm, chamadas cintures orognicos ou faixas mveis.

    Os termos tipo crustal e provncia crustal no so sinnimos, embora possam coincidir em algumas situaes, como no caso de cintures orognicos fanerozicos. No entanto, uma provncia pode apresentar variaes de espessura e no necessariamente consiste de um segmento de crosta contnuo. Por exemplo, vulces de mesma idade distribudos em uma regio relativamente grande compem uma provncia crustal, como o caso da provncia alcalina de Poos de Caldas. Por outro lado, um tipo crustal pode englobar

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    vrios segmentos de crosta com idades diferentes, isto , vrias provncias. Por exemplo, um escudo pode englobar um ou mais crtons e faixas mveis proterozicas, como no caso do escudo canadense. 3.6. Composio do manto Vrias linhas de evidncia so utilizadas para a determinao da composio qumica e mineralgica do manto. Evidncias diretas provem de exposies do manto superior no assoalho ocenico, de xenlitos em magmas kimberlticos e baslticos, e da seo basal de seqncias ofiolticas. A parte mais superficial do manto pode aflorar no assoalho ocenico como resultado de exumao por falhas normais ou transformantes ou devido ausncia de crosta ocenica. Se as rochas se soerguem acima do nvel do mar, como o caso das ilhas de So Paulo e So Pedro, uma observao direta possvel. Caso contrrio, amostras podem ser obtidas por dragagem ou perfuraes. Estudos termobaromtricos indicam a extrao de xenlitos mantlicos de fontes situadas at cerca de 250 km, permitindo a caracterizao das rochas presentes at esta profundidade.

    A parte acessvel do manto tem composio qumica comparvel de certos tipos de meteoritos. Assumindo-se que esses meteoritos so remanescentes do material a partir do qual a Terra foi formada, sua composio qumica reflete a composio global da Terra. As composies do manto e do ncleo podem, ento, ser calculadas a partir da composio global levando-se em considerao seus volumes relativos. A composio do manto derivada dessa forma corresponde do manto primitivo, isto , antes da formao da crosta continental (ver captulos 2, 6 e 8).

    Finalmente, a composio qumica das rochas requerida para fornecer os magmas baslticos erupcionados na superfcie da Terra pode ser calculada por modelagem geoqumica. A rocha hipottica

    derivada por este procedimento chamada de pirlito.

    A Tabela 3.2 mostra estimativas da composio qumica do manto, utilizando diferentes metodologias. Os resultados so similares e mostram que os xidos SiO2, MgO e FeO representam mais de 90% de seu peso.

    Tabela 3.2. Estimativas para a composio qumica do manto segundo diferentes metodologias (xidos em %; elementos em ppm). (1) Pirlito (McDonough, 1995); (2) xenlitos em vulces continentais intraplaca (Pearson et al., 2005); (3) Manto empobrecido (Salters e Stracke, 2004); (4) Manto primitivo (Palme e ONeil, 2005).

    xido/ Elemento

    (1) (2) (3) (4)

    SiO2 45,0 44,33 44,87 45,4 TiO2 0,20 0,10 0,20 0,16 Al2O3 4,45 2,41 4,33 4,49 FeO 8,05 8,07 8,09 8,1 MnO 0,13 0,13 0,15 0,14 MgO 37,8 41,84 38,13 36,77 CaO 3,55 4,85 3,52 3,65 Na2O 0,36 0,29 0,42 K2O 0,03 0,01 0,02 P2O5 0,02 0,03 0,01 Sc 16,2 12 16,3 16,5 V 82 59 79 86 Cr 2625 2819 2500 2520 Co 105 102 106 102 Ni 1960 2147 1960 1860 Cu 30 30 20 Zn 5