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O ESPÍRITO ESTE DESCONHECIDO JEAN E. CHARON

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Ciencia

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PAGE 153

O ESPRITO

ESTE

DESCONHECIDO

JEAN E. CHARON

1O ESPRITO ESTE DESCONHECIDO

2INTRODUO

2Prefcio

5CAPITULO I

5Fsica e Metafisica

12CAPITULO II

120 espao e o tempo do Esprito

16CAPITULO III

16As linguagens de descrio na Fsica

22CAPITULO IV

220 espao-tempo complexo

28CAPITULO V

280 eltron portador do Esprito

35CAPITULO VI

35Uma evoluo neoteilhardiana

39CAPITULO VII

39Observao do Esprito dentro da Matria

52CAPITULO VIII

52As ramificaes eternas de nosso Esprito

56CAPITULO IX

56Mecanismos do Esprito e parapsicologia

61CAPITULO X

610 funcionamento do Esprito como fenmeno da Fsica

70CAPITULO XI

70Reflexo, Conhecimento, Amor e Ao

76CAPITULO X11

76Reivindicao para uma o evoluo copernicana

79CAPITULO X111

79Uma Cosmologia neognstica: evoluo da Matria

89CAPITULO XIV

89Uma Cosmologia neognstica: evoluo do Esprito

96CAPITULO XV

960 Matricialismo

104CAPITULO XVI

1040 Futuro desconhecido

110Fim

DEDICATORIAEsta obra dedicada a todas as pessoas que refletem sobre o mistrio do nosso corpo e de nossa conscincia e, mais amplamente, sobre as relaes do Esprito com a Matria, na escala do Universo inteiro.

Pela primeira vez, encontra-se sustentadas, de maneira cientfica, as numerosas manifestaes do Esprito como os fenmenos parapsicolgicos ou as intervenes do inconsciente.

O Esprito, este desconhecido um convite para se descobrir a essncia do Homem e do Universo.

INTRODUO

"Devemos libertar o homem do cosmo criado pelo gnio dos fsicos e dos astrnomos, cosmo esse no qual est mergulhado desde a Renascena. Apesar de sua beleza e de seu tamanho, o mundo da matria inerte muito estreito para ele. Da mesma forma, o nosso meio econmico e social no feito nossa medida. No podemos aderir ao dogma de sua realidade exclusiva. Sabemos que no estamos inteiramente confinados, que nos estendemos em outras dimenses alm do continuum fsico... O esprito do homem se estende, alm do espao e do tempo, em um outro mundo. E deste mundo, que ele mesmo, ele pode, se tiver vontade, percorrer os ciclos infinitos. O ciclo da Beleza, que contemplam os sbios, os artistas e os poetas. 0 ciclo do Amor, inspirador do sacrifcio, do herosmo, da renncia. 0 ciclo da Graa, suprema recompensa daqueles que buscaram com paixo o princpio de todas as coisas ... necessrio nos levantar e nos colocar em marcha. Nos libertar da tecnologia cega. Realizar, em sua complexidade e em sua riqueza, todas as nossas potencialidades.

Alexis Carrel

"Chegou o momento de nos darmos conta de que uma interpretao, mesmo positivista, do Uni- verso deve, para ser satisfatria, cobrir o interior e o exterior das coisas o Esprito assim como a Matria. A verdadeira Fsica a que conseguir, qualquer dia, integrar o Homem total em uma representao coerente do mundo."

Pierre Teilhard de Chardin

PREFCIOSou o que chamam de um fsico terico; isto quer dizer que me interesso pela descrio das leis que governam a natureza. Minhas pesquisas esto dirigidas s teorias ditas "unitrias", que so as teorias que se esforam para unificar as diferentes leis observadas, demonstrando que elas formam casos particulares de uma lei mais geral, vlida para todos os fenmenos, e que designaremos, em razo do nome, de lei unitria.

Esse tipo de pesquisa leva a analisar o menor tanto como o maior, as partculas ditas "elementares" tanto como o cosmo em seu conjunto, pois, se tal lei unitria existe, ela deve ser vlida, isto verificvel, em todas as escalas dimensionais.

Quando olho meu trabalho e minhas publicaes desses ltimos vinte anos, no tenho certeza, entretanto, de ter sido um fsico, ou em todo caso, um fsico no sentido que se d a este termo no contexto cientfico contemporneo. Supese que o fsico tradicional, em princpio, se interesse exclusivamente, durante sua pesquisa cientfica, pelas propriedades da matria considerada "inerte". Realmente, ele reconhece, como todo mundo, que existem fenmenos onde o "fsico" no atua sozinho, fenmenos onde intervm tambm o que chamamos de psiquismo, ou a conscincia, ou o pensamento. Mas estes fenmenos so da competncia dos psiclogos, ou a rigor, dos biologistas.

A Fsica, tal como se define neste fim do sculo XX, parece considerar um "ponto de honra" no misturar o psicolgico ao fsico, o que (pelo menos o que ela acredita) lhe permite se vangloriar de ser uma cincia "exata".

Ora, refletindo, sempre estive, no curso de minhas pesquisas sobre esta matria chamada "inerte", em busca dos primeiros traos de fenmenos psquicos, isto , procurando o Esprito dissimulado sob a matria. Alis, sempre me senti pouco vontade diante do Programa "Reducionista" dos fsicos de nossa poca, que se esforam voluntariamente para construir uma Fsica deixando o Esprito de fora.

E creio ter tido razo. Explico nesta obra como, no curso destes ltimos anos, pude enfim mostrar que, para perceber de modo completo e satisfatrio a estrutura e as propriedades de certas partculas elementares, necessrio fazer intervir um espaotempo particular, apresentando todas as caractersticas de um espaotempo do Esprito, ladeando o da matria bruta. Exponho, aqui, os diferentes aspectos e as conseqncias desta Fsica neognstica.

Por que chamamos a esta Fsica de "neognstica"? No fui eu quem a designou assim e, alm disso, j havia escrito aproximadamente metade deste livro quando descobri que, contrariamente ao que pensava, esta tendncia de no mais separar completamente Matria e Esprito na descrio cientfica do Universo j existia e estava se aprofundando h alguns anos. Este "movimento", se se pode qualificar assim esta nova orientao das idias cientficas, parece ter nascido principalmente em Princeton e em Pasadena nos Estados Unidos nos anos de 1970 1. Os mais eminentes fsicos e astrnomos estiveram presentes nesta origem. A eles se uniram biologistas, mdicos e psiclogos. E, mais recentemente ainda, telogos.

A Gnose foi, no primeiro sculo de nossa era, um sistema filosfico onde os participantes (os gnsticos) pretendiam ter um conhecimento direto de Deus. Esta atitude se caracterizava pelo fato de que ela queria apoiar tal doutrina, no sobre simples crendices, mas sobre os dados cientficos da poca. Nesta filosofia existiam notadamente seres portadores de Esprito, intervindo no comportamento da matria, chamados eons.Os novos gnsticos de Princeton e Pasadena guardaram da antiga filosofia, a idia de que aquilo que chamamos Esprito indissocivel de todos os fenmenos que vemos no Universo, sejam fsicos sejam psquicos. Devemos, portanto, ao menos em principio, ser capazes de ter um conhecimento "cientfico" do Esprito, isto , de fornecer uma descrio em termos cientficos com o risco de, se necessrio, renovar a prpria linguagem cientfica. Mas, precisamente por permitir ao Esprito ascender condio de fenmeno "cientfico", os neognsticos recusam, desde o principio, colocar o Homem no centro do fenmeno pensante; quando o Homem afirma "eu penso", enfatizam eles, ele deveria dizer, de forma mais correta, "ele pensa", ou "ele domina um pensamento no espao", do mesmo modo que o fsico diz "ele domina um campo magntico no espao" ou que o homem da rua anuncia "chove". Em outros termos existe uma realidade profunda, presente em todo o Universo, que capaz de fazer "nascer" o pensamento no espao, no mesmo sentido em que um eltron capaz de fazer nascer em torno de si um campo eltrico no espao. Desde ento, o pensamento est presente em toda parte, tanto no mineral, no vegetal, no animal como no Homem. ele, notadamente, que transparece no comportamento dos organismos vivos, mesmo que se trate apenas de uma simples bactria.

De fato, enquanto esta concepo neognstica no der prova, de acordo com a linguagem cientfica, de que ela corresponde a uma realidade "ajustada" aos fenmenos cientficos observados e descritos, ela ser apenas uma aproximao para chegar ao Conhecimento.

Mas isto, por si mesmo, j fundamental; pois, mesmo que no seja suficiente abrir uma janela para descobrir imediatamente todos os detalhes da paisagem, se a janela permanecer fechada, jamais veremos alguma coisa. Ora, a atitude atual dos neognsticos exatamente esta, e ela no ambiciona, no momento, ser outra coisa: ser uma nova janela para considerar o Universo do Esprito e da Matria, e tentar descrevlo em linguagem cientfica sem deixar de considerar ao mesmo tempo um e outro. Ou, exprimindo de outra forma, ser uma nova linguagem cientfica para formular o Conhecimento; ser um esforo de "Psicossintese", diro ainda os neognsticos.

Esta nova atitude em relao ao Conhecimento apresenta alguns outros aspectos, que vale a pena enfatizar.

H, primeiro, a adoo de um ponto de vista relativamente "modesto" para considerar o que chamamos o saber humano. Dentro de cada homem, h individualidades microscpicas que pensam, que sabem, que transportam o Esprito dentro do Universo, e que podemos chamar, segundo os antigos gnsticos, de eons2. Estes conhecem o saber humano, visto que so eles que "pensam" este saber. Mas este saber ultrapassa largamente o saber humano, tal como somos capazes, por exemplo, de o formalizar em uma linguagem qualquer; os eons sabem, notadamente, como criar a vida. 0 saber humano atual somente esta parte minscula do saber total dos eons que pode ser expresso atravs da linguagem humana, levando em conta as numerosas convenes prprias das sociedades humanas.

Outra conseqncia, alis em relao com a precedente: absurdo e inexato crer que nosso irmo humano que no fez o que chamamos de "estudos", ou ainda nosso irmo animal ou vegetal, "seja um ignorante". Afirmlo um pouco como se, considerando dois cientistas de alto nvel, dissssemos que um ignorante porque, ao contrrio do outro, no sabe jogar bridge. Em relao ao conjunto do saber dos eons, esta uma atitude antropocentrista e inaceitvel: querer de todo modo que nosso parco saber humano individual possa nos tornar, de alguma maneira, superior ao outro. 0 Homem deve guardar, no mundo, seu modesto lugar de "macaco sem plo", no tanto porque no saiba mais do que o macaco no reino das sociedades animais, mas principalmente porque, no reino do Universo cosmolgico, no h certeza de que os eons do macaco no saibam mais do que os seus prprios eons. Portanto, nada de tentativas de hierarquia degradante a respeito do saber e, tampouco, nada de Mestre.

A noo de "Mestre", com efeito, ainda mais proscrita entre os neognsticos que entre os prprios eons; estas individualidades imortais que vivem a aventura espiritual do Universo, no conhecem de maneira absoluta os objetivos e as "regras do jogo" do Universo; eles somente so capazes, como veremos, de aumentar, sem cessar, "a ordem" 3 do Universo, inventando regras do jogo cada vez mais complexas, sem saber jamais se novas regras no faro entrever um novo objetivo. Os neognsticos, que conseguiram de uma maneira geral salvaguardar sua alma de criana, ilustram esta inveno de regras para um novo jogo de cartas, que parece expandirse rapidamente nos campus do Oeste americano. 0 jogo se chama "Elusis"; cada jogador, por sua vez, inventa regras do jogo, que escreve, para verificao, em um papel escondido dos outros jogadores. Depois coloca uma carta sobre a mesa; os outros jogadores respondem escolhendo cuidadosamente uma carta de sua mo. 0 vencedor de cada partida designado por aquele que inventou a regra, e este vencedor recolhe, ento, todas as cartas da rodada. No fim, contase o nmero de pontos das cartas recolhidas por cada um, segundo uma tabela conhecida somente pelo inventor do jogo. Aquele que primeiro "compreendeu" as regras do jogo (geralmente) o que possui o maior nmero de pontos e declarado o vencedor. particularmente instrutivo notar que muitos jogadores ganham tendo "imaginado" regras diferentes daquelas que constituem o regulamento "oficial" editado pelo inventor do jogo. 0 mesmo se d ao nvel do Esprito na Natureza: os eons no so obrigados a falar uma linguagem "oficial" para evoluir em um sentido que marque um progresso no plano do psiquismo. E, inversamente, os "oficiais" no so, entre os humanos, os mais capazes de fazer progredir o psiquismo.

Ainda outra conseqncia da atitude neognstica: se ningum deve procurar para si um Mestre, muito menos ningum deve se considerar um Mestre; portanto, nada de "proselitismo',,'. Somos todos pesquisadores, ningum conhece, desde o principio, a regra que prefervel para fazer o Esprito progredir, e nenhum "nvel psquico" do Esprito permite descobrir o objetivo definitivo da aventura espiritual do Mundo. Portanto ainda, nada de religio "humanista", pretendendo conhecer onde se encontra "o Bem" do Homem. Como observa Raymond Ruer4: "para os neognsticos , no fundo, uma questo de honestidade. Eles acham leviano, e mesmo criminoso, fazer experimentaes na pele humana. Podese permitir ensaios e erros na sua prpria vida. No se tem o direito de aparentar saber o que convm aos outros, que sabem melhor do que ns".

0 que convm enfatizar que a atitude neognstica, que busca organizar em torno de um "imenso povo de eons", e no em torno do Homem, a aventura espiritual do Universo, no consiste em concluir que o Homem , com todo o resto do mundo, de alguma forma "manipulado" no plano do Esprito por este povo de eons, com a conseqncia de no participar verdadeiramente de seu prprio destino. No so os eons que "pilotam" meu prprio esprito "Eu" sou estes prprios eons, no sentido de que em cada um dos eons que entram no meu corpo est presente o que eu chamo de meu "Eu", isto minha pessoa. A atitude neognstica no faz do Homem um "fantoche" cujos cordes outros puxariam, mas sugere que nossa pessoa participe diretamente de toda a aventura espiritual do mundo, uma aventura que tem suas razes na origem de nosso Universo, e que terminar com ele ... caso o Universo deva terminar um dia (o que os eons que tm a sabedoria de saber que o futuro ser aquilo que eles tiverem escolhido fazer no segredaram, parece, a ouvido algum).

0 presente trabalho se dirige a todos que refletem sobre o mistrio de nosso corpo e de nossa conscincia, e mais globalmente s relaes do Esprito com a Matria, na escala do Universo inteiro. Creio profundamente que nossas civilizaes humanas esto procura porque tm extrema necessidade dela de uma atitude que permita a cada um melhor se situar na imensa aventura cosmolgica, colocando em harmonia o que elas sabem com o que sentem.

A Nova Gnose, nasceu de uma reunio de aspiraes to diversas quanto as que encontramos nos campus ou nas comunidades hippies de Berkeley, nos astrnomos e astrofsicos dos montes Palomar e Wilson, nos fsicos de Princeton; a qual hoje interessou um grande nmero de biologistas e mdicos e, mais recentemente ainda, um nmero crescente de pessoas da Igreja; e que, depois dos dois ltimos anos, comea a se expandir progressivamente para fora dos Estados Unidos; a Nova Gnose, como eu dizia, talvez seja uma atitude digna de ser explorada.

De resto, como sempre, nosso companheiro inseparvel, o Tempo, ser o nico juiz.

Jean E. Charon

CAPITULO I

Fsica e Metafisica

0 Espirito inseparvel das pesquisas na Fsica. Newton, o alquimista. Voltaire e Valry: ateus espiritualistas. Cincia criativa e cincia de descoberta. A pesquisa cientfica e o "grande pblico". As diversas linguagens para descrever a Natureza.

"Eis que ele me antecedeu, novamente, deixando este mundo estranho. Isto no significa nada. Para ns, fsicos crentes, esta separao entre passado, presente e futuro guarda somente o valor de uma iluso, por mais tenaz que ela seja."

Quando Albert Einstein, em 21 de maro de 1955, escreveu esta carta irm e ao filho de seu amigo de sempre Michele Besso, falecido alguns dias antes, para ele tambm restava um pouco menos de um ms de vida para dizer adeus a este "mundo estranho".

Talvez, de uma maneira disfarada, o problema da Morte esteja no centro desta obra. Pois a Morte no , pensando bem, quem nos revela o Espirito sob a Matria? E se acabo de citar Einstein no limiar de sua prpria morte porque, creio, a linguagem da Fsica atualmente apropriada para encetar um dilogo com a Morte, para procurar situla no quadro da evoluo geral do nosso imenso universo.

Por que a Fisica, e no a Biologia, ou ainda a Teologia? Porque a Morte, como todos os grandes problemas da Metafisica, somente pode ser situada em relao aos limites daquilo que constitui o nosso Universo, na escala do maior e na escala do mais pequeno. E a Fisica que se prope a nos fornecer um conhecimento do cosmo em seu conjunto assim como do tomo. Mas, paradoxalmente, enquanto a Fsica sem dvida a mais apta para esclarecer os problemas metafsicos, os fsicos se recusam, h perto de trs sculos, a ver a Metafsica penetrar em sua linguagem e em seu campo de experincia; como se estes problemas fossem indigitos do conhecimento "cientfico"; ou ainda, como se as questes que formam os temas da Metafsica no fossem, finalmente, aquelas para as quais o Homem deseja mais ardentemente obter elementos de resposta.

Direi, mais adiante, como os trabalhos de Albert Einstein o levaram ao limiar de um dos problemas essenciais apresentados ao Homem: o da natureza daquilo que chamamos "nosso espirito", em oposio matria de nosso corpo. E direi, tambm, como minhas prprias pesquisas em Fisica, em prosseguimento aos trabalhos de Einstein, me permitiram continuar esta anlise do Espirito, para mostrar, finalmente, que a aventura do nosso Espirito to "eterna" quanto o prprio Universo, no passado assim como no futuro.

Mas, como me disponho a falar aqui de um problema fundamental da Metafisica na linguagem da Fsica, espero primeiro, exprimir sem desvios, o que penso da atitude geralmente hostil dos fisicos diante dos temas da Metafisica.

Antes, podemos questionar se os principais temas da Metafisica tm alguma relao com os problemas estudados pela Fisica. 0 Conhecimento, a existncia do mundo exterior, a substncia e a forma, o problema da vida e da morte, a alma e o corpo, o problema de Deus, todos estes objetos de investigao tradicionais da Metafisica so susceptiveis de entrar no campo das pesquisas da Fisica? A resposta a esta questo ser afirmativa ou no, se aceitarmos ou no considerar a anlise do Esprito como objeto de estudo da Fsica. 0 problema da natureza e dos mecanismos do Espirito , com efeito, sem nenhuma dvida, o problema central de toda a Metafisica, do qual derivam todos os outros objetos de reflexo (o Conhecimento, a vida, a morte, a Matria, Deus ... ). A Fisica e a Metafisica formam, portanto, duas disciplinas complementares, encarregadas de aumentar nosso conhecimento do Universo se, e somente se, Matria e Espirito so inseparveis nos mtodos de pesquisa e nas linguagens destes dois ramos do Conhecimento.

Ora, como poderiamos racionalmente impedir que a Fisica progredisse atravs de uma anlise no s da Matria mas tambm do Espirito? Desde que as investigaes dos fisicos se voltam para o mais pequeno, ou ainda para o maior, para estas particulas misteriosas que formam a essncia da Matria, ou ainda para nosso Universo em seu conjunto, ento as palavras de Santo Agostinho se tornam hoje sempre mais verdadeiras: "0 mundo tal como ele nos parece, feito de coisas que no aparecem". E Teilhard de Chardin observava igualmente que "atingindo o extremo de suas anlises, os fisicos no sabem mais se a estrutura que eles alcanaram a essncia da Matria que eles estudam ou, ento, reflexo de seu prprio pensamento".

Neste caso, como no reconhecer como uma evidncia atual que o Esprito , com efeito, parte integrante do domnio de investigao da Fsica, do mesmo modo que a Matria, visto que no h descrio possvel da Matria que no faa intervir, em primeiro plano, os mecanismos estruturais do nosso prprio Esprito?

Esta importncia dada ao Esprito no estudo dos fenmenos "fsicos que acontecem no Universo, na verdade, nunca foi contestada na Antiguidade e mesmo at o fim do sculo XVII. Para se convencer, suficiente lembrar Descartes que nos declara em suas Meditaes: "Assim, toda a Filosofia como uma rvore cujas raizes so a Metafsica, o tronco a Fsica e os galhos que saem deste tronco so todas as outras cincias". E Newton, de quem se quis fazer o modelo do ,cientista", isto , do sbio apenas preocupado com as certezas associadas aos fatos observveis, na verdade (corno demonstram belos estudos recentes sobre Newton ) orientou toda sua vida para os problemas do Esprito: ele escreveu mais pginas sobre a alquimia e sobre o que hoje chamaramos de parapsicologia do que sobre a ptica e a gravidade.

Observemos, um instante, os conceitos de Newton, cujos escritos, se os analisarmos no buscando "ver somente o que queremos ver", so a prova de que o pai da teoria da gravidade sempre defendeu conceitos de essncia espiritualista, bem longe das idias puramente mecanicistaspositivistas que quiseram lhe atribuir. Uma aproximao surpreendente (compreenderemos melhor este aspecto quando discutirmos a anlise moderna sobre a natureza do Esprito) a que Newtori faz entre o Esprito e a luz. "No seria possvel, escreve Newton em sua ptica, que os corpos e a luz se transformem uns nos outros? E no sera possvel que os corpos recebam a maior parte de seus princpios ativos das partculas de luz que entram em sua composio? Admitido isto, visto que a luz o mais ativo de todos os corpos que conhecemos, e visto que esta luz faz parte de todos os corpos compostos pela natureza, por que no seria ela o principio regente de todas as suas atividades?" E Newton distingue, ento, dois tipos de luz: uma luz fenorrinica, que seria a que se entende pelo sentido comum do termo, isto , a que vemos; e uma luz nuninica, que seria uma luz virtual, intervindo mais particularmente nos mecanismos do ser vivo, e portadora do que chamamos Esprito. Veremos, no decorrer desta obra, que se trata de uma intuio extraordinria de Newton sobre o aspecto "espiritual" da Matria, aspecto que se confirmar como repousando sobre trocas "virtuais" de ftons de luz. Segundo observa P. M. Rattensi : "as reflexes de Newton parecem indicar que no fim de sua vida ele concebeu que o objetivo da pesquisa alquimista consistia no restabelecimento do corpo de luz e pensou que isto poderia ser demonstrado atravs de operaes realizadas em laboratrio". Assim, Newton, durante toda sua vida, considerou o Esprito como de natureza diretamente acessvel experincia, e portanto, do domnio das investigaes da Fsica. Por outro lado, ele viu na luz, que sem dvida alguma um fenmeno bem fsico, a direo privilegiada para a qual, lhe parecia, deviam se orientar estas investigaes.

Alm disso, necessrio enfatizar que Deus (igualmente no centro da reflexo metafisica) est sempre presente na obra de Newton. Certamente, Newton ir propor suas clebres leis sobre o movimento dos astros, o que permitir, por volta dos meados do sculo XIX, ao matemtico Pierre-Simon de Laplace mostrar que os astros podiam, de acordo com estas leis, se mover de modo estvel, sem nenhuma interferncia de Deus. Mas o prprio Newton nunca formulou, ou mesmo sequer sugeriu, tal possibilidade; pelo contrrio, defendia o ponto de vista da necessidade constante da presena de Deus no Universo. Para Newton, Deus intervinha na natureza por intermdio do Esprito (a luz nuninica). Esta natureza, escreveu Newton, "age sempre sem trgua, at o seu ltimo termo, e depois cessa; pois, desde o comeo, era para ele coisa certa que ela poderia se aperfeioar no seu curso e que chegaria, enfim, a um repouso slido e total, ao qual, para este efeito, ela tendia com todo o seu poder". Assim, Newton tem tambm a convico de um sentido definido da evoluo do Universo, de uma "flecha" do tempo, como alvo desta evoluo, com um estado do Universo que nos lembra o "ponto mega" de Teilhard de Chardin. Mas voltaremos a falar sobre isto.

Apesar desta profunda complementaridade entre Fsica e Metafisica na obra de Newton, paradoxalmente, a partir de Newton que se produzir uma clivagem cada vez mais profunda entre Fsica e Metafisica, isto , entre as pesquisas sobre a Matria e as pesquisas sobre o Esprito.

Para isto, como relembra muito propriamente a anlise de Jean Zefiropulo e Catherine Monod, far-se- "Newton oscilar entre o que ele foi e o que dele fizeram, ocultando algumas de suas pesquisas e mesmo dispersando uma grande parte de sua obra".

Os argumentos so bastante complexos, mas pode-se, entretanto, distinguir algumas correntes principais.

Primeiro, h a enrgica reao da Renascena contra o aristotelismo, reinando sobre o pensamento intelectual h dois mil anos. Ora, lutar contra Aristteles e seu sistema do mundo seria restabelecer o beliocentrismo de Aristarco, perfeitamente demonstrado agora, pelas leis da atrao de Newton; e seria, tambm, restabelecer o velho atomismo de Demcrito, segundo o qual "nada mais existe a no ser o tomo e o espao vazio, tudo o mais apenas comentrio". Finalmente, seria explicar todo o nosso Universo atravs de movimentos de tomos se deslocando segundo leis imutveis, explicadas matematicamente.

Assim, no teramos necessidade de Deus, nern do Esprito para tomar conhecimento do que se passa no mundo. 0 prprio pensamento seria "segredado" por certos movimentos dos tomos, somente a Matria sendo a substncia essencial. Propositalmente esqueceramos que, entretanto, Demcrito havia proposto seus tomos como conservando uma existncia independente do Esprito, visto que tambm "a alma constituida de tomos particulares, finos e unidos". Mas teramos necessidade de eliminar da Cincia tudo o que no se manifestasse na Natureza atravs do movimento de partculas puramente materiais segundo leis conheciveis (seno conhecidas). E acaso poderamos escolher um porta-bandeira deste novo enfoque cientfico melhor do que Newton, pois foi ele quem descobriu, depois de Kepler, as leis fundamentais que explicam a trajetria das estrelas, dos planetas ... e das mas?

No podemos negligenciar a parte benfica que provocou este retorno ao positivismo puramente materialista para aumentar nosso conhecimento das coisas. Depois dos desnorteios do perodo da Idade Mdia, seria til que o conhecimento se esforasse para progredir psquisando leis confirmveis experimentalmente. Mas seria, sem dvida, ir muito longe ao se esquecer da presena do Esprito nesta evoluo da natureza; no seria simplesmente porque, apesar de tudo, e como o notava to propriamente o filsofo Georges Berkeiey desde Newton, "as coisas s existem na medida em que so percebidas"; e por que outros meios poderiam elas ser percebidas, em ltima anlise, seno pelo Esprito, pelo nosso esprito?

Dentre as circunstncias que contriburam para deturpar o processo de pensamento verdadeiro que presidiu s leis e s descobertas newtonianas, necessrio ver tambm o fato de que, no principio, aqueles que eram os mais ardorosos defensores de Newton (contra as teses cartesianas mais em voga, ento, entre os cientistas) foram principalmente ateus que, para melhor afastar Deus das explicaes da Cincia, no hesitaram em expulsar igualmente tudo o que se referia ao Esprito.

Entre estes estava Laplace, que ns j mencionamos anteriormente; tambm, especialmente na Frana, Voltaire e um pouco mais tarde Auguste Conite e seu positivismo; igualmente, no nosso sculo, Paul Valry e as teses marxistas. Todos se ocuparam em "refutar Deus", e mais amplamente em minar a credibilidade da Metafisica, julgando suas especulaes como "logomaquias vazias e estreis".

Voltaire foi a Londres em 1727 assistir aos funerais de Newton e trouxe um exemplar, em ingls, de seus Principia. Ficou imediatamente seduzido pelo sistema do mundo newtoniano, e foi o primeiro a difundir, na Frana, a obra de Newton . Mas difundiu o pensamento newtoniano insistindo, como Laplace, sobre a abertura que ele oferecia para uma compreenso de um mundo puramente mecanicista, sem nenhuma necessidade de uma interveno divina. Isto foi compreendido como se a noo do Espirito fosse suprflua e pudesse ser, em todo caso, definitivamente afastada das concepes da Fisica: estava ai uma deformao do pensamento de Voltaire, pois se ele desejava a "morte de Deus", por outro lado, no preconizava a morte do Espirito. Com efeito, no afirmou ele, como conseqncia lgica de seu racionalismo, a existncia de uma "sensibilidade" da Matria, que no muito diferente da "psique elementar", com que Theilhard propor, em nossa poca, dotar cada corpsculo de Matria, visando a apoiar sua concepo espiritualista do Mundo?

0 caso de Paul Valry mais particular. Ele nos exibe sarcasmos, algumas vezes extremamente violentos, contra a Metafisica, e mais amplamente contra qualquer tese de natureza espiritualista. "Os espiritos com suas mesas e seus ectoplasmas, escreveu, tm o mrito imenso de colocarem sob sua verdadeira forma grosseira, clara e insensata, o que os espiritualistas, as pessoas com alma, dissimulam para si prprios sob um vu de palavras, metforas e expresses ambiguas". Mas, nas 6.000 pginas manuscritas de seus Cadernos, que redigia no dia-a-dia, e que atualmente comeam a ser objeto de publicaes, descobrimos que Valry esteve toda sua vida preocupado com a estrutura e com o funcionamento do Espirito, cuja descrio desejava compreender na linguagem da Fisica e das Matemticas. 0 estudo do Esprito no , portanto, especificamente do dominio tradicional da Metafisica? E haveria uma descrio "no espiritualista" do que chamamos Espirito? A leitura mais atenta dos Cadernos nos explica, entretanto, esta aparente contradio. Valry se recusa a reconhecer que existe uma realidade independente da Matria que se chama Esprito; sua pesquisa sobre mecanismos do esprito est orientada para a descoberta de uma estrutura particular das partculas de matria, assim como para as transformaes no tempo desta estrutura; estas explicariam um fenmeno fsico de essncia puramente material e mecanicista, que seria a funo-espirito ligada ao comportamento da Matria. Apostemos, entretanto, que, desde que se torne possvel falar do Espirito na linguagem da Fsica, todos os grandes problemas tradicionais da Metafisica se apresentaro com uma acuidade aumentada, e que ser necessrio dizer o que se tornam, nesta nova linguagem, a Vida, a Morte, o mundo exterior, Deus. Em resumo, apesar do que pensa Valry, conseguir falar do Esprito na linguagem da Fsica, como ele o deseja, introduzir em p de igualdade todos os temas da Metafisica no campo das pesquisas da Fsica. Em uma anlise posterior, Valry e eu estamos, portanto, de acordo; mas, primeira leitura, os ataques de Valry Metafisica, sem dvida, contriburam para retardar o nascimento de uma Fsica interdisciplinar.

Sejam Laplace, Voltaire, Conite, Valry ou os marxistas, o mais grave reparo que se lhes pode fazer sua posio dogmtica, que consiste em recusar ao Esprito de ser objeto de pesquisa... simplesmente porque no existiria "alguma coisa" chamada Esprito que fosse possvel descrever independentemente desta outra coisa chamada Matria. "Pobre presunoso, voc v uma planta que vegeta e diz vegetao, ou mesmo alma vegetativa, escreve Voltaire; mas, por favor, o que voc entende por estas palavras? Esta flor vegeta, mas h um ser real que se chama vegetao?"

E Valry se excede: "seria interessante vaguear pelo crebro, ali no encontrariamos um estado de alma".

Quanto aos marxistas, recusando a evidncia, ao mesmo tempo lgica e experimental, segundo a qual nossa nica prova irrefutvel da existncia do mundo a percepo espiritual que temos dele (como enfatizava Berkeley), eles afirmam, ao contrrio, que percebemos o mundo porque ele existe. Como estes marxistas, to apaixonados por razes "cientficas", poderiam fazer a prova cientfica de sua afirmao, visto que toda experincia que temos do mundo exterior, em ltima anlise, se apresenta como pensamentos, isto , Esprito?

Para os positivistas, a Matria , portanto, principal, e o Esprito somente uma "emergncia" da Matria, sem existncia independente. Neste caso, como o notou Auguste Comte, resta Metafisica ser reduzida a uma "reflexo sobre as cincias da Matria" - ou no ser.

Entretanto, toda a Histria nos mostra que os dogmas tiveram uma existncia apenas provisria. E poder-se-ia verificar que o Esprito aparece finalmente como uma realidade to "tangivel" quanto a Matria; do mesmo modo que as pedras no cu, isto , os meteoritos, se tornaram realidade, contrariamente advertncia dogmtica de Laplace, segundo a qual "no poderiam cair do cu ... visto que no havia pedras no cu".

Em todo caso, isto o que a presente obra pretende demonstrar, a fim de tirar um certo nmero de conseqncias das respostas atuais s questes fundamentais que so objeto da Metafisica.

Entretanto, penso que existem outras razes alm das que foram retiradas do contexto histrico que, ainda na nossa poca, fazem com que parea dificil aceitar como objetos cientficos de pesquisa os grandes temas da Metafisica.

Rivaud, um historiador da filosofia, escrevia em 1948: "Os nicos filsofos verdadeiramente qualificados da idade moderna so os fsicos, os qumicos ... que, partindo do estudo minucioso dos fatos particulares, ousaram formular hipteses de carter geral".

verdade. Em todo caso, para os fsicos, no se trata unicamente de formular hipteses de mbito geral para serem qualificados de filsofos, e ainda menos de metafisicos. A Metafisica exige muito mais do que um esforo de pesquisa: ela exige qualidades de criao, e posso afirmar, por freqent-los de longa data, que bem poucos fsicos de nossa poca so o que chamamos de criadores; em sua maioria, porque so "especialistas" em assunto determinado, so apenas simples analistas.

Retomemos o que considero uma das melhores definies da Metafisica, para percebermos quanto poder criador exige esta disciplina do Conhecimento:

"A Metafisica existe desde que o espirito, em busca de uma unidade total, se decide a encher as lacunas que o quadro 'cientfico' do Universo oferece, graas a uma 'flexibilidade' tirada de sua prpria essencia, a um 'principio' (tomado por emprstimo de sua experincia interna ou externa), que ele considera verdadeiramente bsico".

A Metafisica aparece, atravs desta definio, enfatizando suas estreitas relaes no somente com o enfoque cientfico, mas tambm com o enfoque artistico e ainda com o pensamento religioso. Certamente, o fisico pode formular princpios gerais, ou leis, que do a aparncia de universalidade s suas descobertas. Mas no faz, necessariamente, ainda, uma obra metafisica. Ele faz, precisamente, algumas "descobertas"; isto , descobre o mundo como se levantasse um vu, como se este mundo preexistisse a seu esforo, e que seu ato de fsico no tivesse mudado nada nele, nada lhe tivesse acrescentado. Ora, no , de modo algum, que neste ato de "descoberta" vemos, ao mesmo tempo, o esprito do fsico e o esprito do metafisico, reunidos ambos para alcanar um progresso no conhecimento profundo das coisas. Na simples descoberta h apenas uma generalizao de um certo nmero de fatos de experincia para um nmero maior de fatos de experincia (ou de fatos sobre os quais ser possvel experimentar). No ato metafisico de criao, o pensador, ao contrrio, age por si mesmo, ele vai buscar no fundo do seu inconsciente uma "flexibilidade" ainda no formulada, como observa Franois Grgoire na sua definio da Metafisica; e somente em seguida que considera a maneira pela qual esta flexibilidade chegou a completar harmoniosamente a viso que ele possua da Natureza. Este um enfoque que se aproxima bastante do enfoque do artista ou do religioso, cada um metamorfoseando" nossa viso do Universo e, atravs de sua criao, executando um passo novo para o conhecimento do mundo. Esta sensao bastante forte de que existe uma distino fundamental entre o ato criador e o ato de descoberta, somente pode ser, creio eu, verdadeiramente percebida sob seu aspecto autntico por aqueles que experimentaram na vivncia um e outro destes dois atos. Albert Einstein descreveu esta situao em uma frmula que embaraou alguns fisicos: "Uma teoria pode ser verificada pela experincia, mas no existe nenhum caminho que leve da experincia para a criao de uma teoria". Um pintor ou um msico compreendem isto perfeitamente. Mas ento vocs iro dizer comunidade cientfica que a teoria que lhes oferecem uma obra de artista! Sero logo relegados ao rol de fantasistas! Sero tratados de "metafisicos" e, creiam-me, um qualificativo que no os deixar mais ... e, pouco a pouco, todas as portas "oficiais" lhes sero fechadas. Mas no ser porque necessrio ser-se bem pequeno para saber transpor estas portas?Seja como for, fazer Metafisica tambm ser capaz de dar prova de um esprito de criao, e no somente de um esprito de descoberta, no sentido que acabamos de indicar. E os cientistas que conheci, no decurso destes ltimos vinte anos, raramente me pareceram possuir uma imaginao suficiente para serem capazes de "criar". A maioria deles so bons "funcionrios" da Cincia. Esta observao levou Albert Einstein a afirmar que "o templo da Cincia ficaria bem vazio se dele retirssemos todos os que no fazem verdadeiramente Cincia".

De minha parte estou convencido de que, se os cientistas contemporaneos recusam, instintivamente, a penetrao dos temas da Metafisica nas suas pesquisas, apesar de serem to fundamentais para o Homem, em parte porque so "incapazes de filosofar"; porque so incapazes de imaginar e de criar; e, finalmente, porque a reflexo metafisica lhes inacessivel.

A primeira vez que estive na televiso francesa foi h cerca de quinze anos, por ocasio da publicao de trabalhos sobre teoria fisica. Eu me recordo de ter ficado chocado com o fato de o jornalista cientista que me interrogava orientar nossa entrevista muito mais para as conseqncias metafisicas dos meus trabalhos do que para o seu contedo propriamente do dominio da Fisica, que era o objeto de minhas publicaes. Tendo ele percebido que minhas pesquisas abordavam o problema do Universo, em seu conjunto, vi-me interrogado sobre a criao do nosso Universo, seu destino no futuro, sobre a existncia de Deus ...

Este jornalista, como todo bom colaborador da televiso, durante toda a entrevista, tinha a preocupao de me fazer falar sobre o que interessava ao pblico. E tinha razo: naturalmente, no era o aspecto altamente tcnico e especializado dos meus trabalhos que interessava ao pblico, mas a parte metafisica associada a eles. De que serviria um programa de televiso usando uma linguagem hermtica e, portanto, sem interesse para o telespectador?

Naturalmente, o meu propsito aqui no discutir qual a melhor utilizao para um veculo de comunicao como a televiso. Este episdio tem o sentido de insistir no fato de que o "grande pblico" se interessa pela Cincia sobretudo atravs de suas conseqncias "metafisicas". Para ele pouco, ou quase nada, importam as tcnicas usadas para atingir a Lua ou Marte, o que lhe interessa saber "se a vida existe l". Os mecanismos biolgicos do crebro no o deixam indiferente, mas ele gostaria mais de saber at onde chegaram os estudos dos fenmenos parapsicolgicos, isto , a possibilidade (com evidentes conseqncias metafisicas) de crebros se comunicarem a distancia, sem o apoio dos mtodos tradicionais de comunicao. Andrmeda est a dois milhes de anos-luz; bem, mas isto no diz grande coisa ao pblico; ele desejaria, ao contrrio, saber se as particularidades da teoria da Relatividade, que fazem "envelhecer" menos depressa quando se vai muito depressa, permitiro ao Homem alcanar os planetas habitados da galxia de Andrmeda, e, mais amplamente, se este enorme Universo, que percebemos volta de ns, ou no acessvel ao Homem (ao menos em seu principio, com tcnicas de propulso melhoradas). A descoberta dos vestgios dos primeiros hominideos, h algumas centenas de milhares de anos, interessa ao nosso "grande pblico"; mas a possvel existncia de civilizaes to evoluidas quanto as nossas em um passado distante, vindas talvez de outros lugares", que o fascina e ele gostaria que os cientistas o esclarecessem sobre isso.

Ora, os "cientistas" raramente falaro ao pblico sobre tais assuntos "metafisicos", simplesmente porque suas pesquisas no so autorizadas pelos donos da cincia "oficial" a serem orientadas para tais assuntos metafisicos. Ainda uma vez, os grandes temas metafisicos no podem ser objeto de pesquisa cientfica.

Pessoalmente, acho esta atitude escandalosa. Primeiro, porque o "grande pblico", que deseja legitimamente esclarecimentos (seno respostas) sobre as questes metafisicas, , na verdade, quem financa, com seu prprio trabalho, a pesquisa cientfica. Alm disso, o grande pblico no tem o direito de ver inscritos, nos programas de pesquisa, os temas que mais lhe interessam? Portanto, quem pode estar autorizado a considerar esse pblico como uma criana incapaz de saber o que gosta de comer? E antes de tudo, com que direito decidiramos priv-lo do conhecimento que gostaria de receber?

Que me compreendam bem: no pretendo que no deva haver pesquisas tericas ou aplicadas sobre assuntos especializados, escolhidos por cientistas "srios e oficiais", cujos resultados, por natureza, permanecero incompreensveis para a maior parte do meu querido "grande pblico". Mas pretendo que o que interessa a esse pblico deveria tambm ser considerado por aqueles que comandam os programas da pesquisa cientfica. Muitos pesquisadores, e mesmo alguns dos melhores, estariam dispostos a enfrentar tais ternas metafisicos em bases cientificas. Solicitem ao meu amigo Rmy Chauvin, professor na Faculdade de Cincias de Estrasburgo, para colocar em ao uma equipe de jovens pesquisadores sobre a parapsicologia; ou a Gurin, astrnomo em Meudon, para organizar, em bases cientficas, uma pesquisa sobre a possibilidade de visitantes extraterrestres; rapidamente, eles utilizaro os crditos que vocs colocarem disposio deles, com prudncia e "cientificamente".

Se olhamos esse problema de um outro ngulo, reconhecemos que os cientistas se prejudicam a si prprios recusando a "colaborao" do grande pblico soberano em suas pesquisas. "Soberano", ele o sempre, esse pblico, e eu diria por construo: pois, mais uma vez, ele quem deve pagar de seu bolso todas as despesas do Estado, inclusive a pesquisa cientfica. Sneca j havia enfatizado que "nada de importante e de durvel pode ser realizado sem o apoio da populao". E no so os cientistas do projeto Apolo, que necessitaram de enormes somas de dinheiro para colocar o Homem na Lua, que desmentiro Sneca; pois sabem que foi o esforo de propaganda para fazer o pblico americano participar desse projeto que proporcionou N.A.S.A. os crditos necessrios a este maravilhoso empreendimento, marcando urna etapa na histria da humanidade terrestre.

Esta advertncia de Sneca mais verdadeira do que nunca em relao Cincia contempornea. Se nossos ministros, nossos deputados e nossas comisses cientficas oficiais atualmente decidem, na maioria das vezes, limitar os crditos para as pesquisas aplicadas, em detrimento das pesquisas tericas, , em parte, porque nosso grande pblico no est, na verdade, interessado diretamente na pesquisa terica, pois no lhe mostram as ramificaes metafisicas. A pesquisa aplicada far de ns, portanto, apenas simples consumidores de bens materiais, e pacincia se a principal caracteristica e a vocao essencial do Homem na evoluo , entretanto, como j observava Pascal, ser um animal pensante".

Abrir para a Metafisica as portas da Fisica , primeiro, exigir dos fisicos que sejam capazes de refletir filosoficamente; dar curso livre imaginao e criao na pesquisa; e , tambm, saber que os problemas verdadeiramente "importantes" para o Homem devem ser igualmente enumerados pelo "Senhor Todo o Pblico".

H j bastante tempo nossos fsicos se preocupam um pouco mais, sem precisar esconderse, com o aspecto "espiritual" da matria que estudam.

CAPITULO II

0 espao e o tempo do Esprito

Um espaotempo novo: o do Esprito. A memria. um espao em neguentropia no decrescente. As partculas "eternas" portadoras do Esprito. Morte, eis a sua derrota! nosso "Eu" tem suas razes em um eterno passado e se prolongar em um eterno futuro.

J lembrei que sou um fsico terico. Isto significa que procuro definir as leis bsicas dos fenmenos psquicos e elaborar o que habitualmente chamamos "modelos" destes fenmenos. Isto implica principalmente a pesquisa de modelos do que chamamos as partculas elementares: que so os "tijolos" menores que constituem toda a matria de nosso Universo; so os "tomos" de que nos falava Demcrito cinco sculos antes da nossa era. Um modelo dessas partculas uma descrio da substncia, da forma, das dimenses, dos mecanismos internos e das propriedades externas dessas partculas.

No outro extremo da escala das dimenses, o fsico terico se interessa, tambm, por um modelo mais amplo: o do nosso Universo no seu conjunto; qual a sua forma, quando comeou, para onde evolui, quais so suas dimenses no espao e no tempo...

Como vemos, no to estranho que esse tipo de objeto de pesquisa conduza diretamente e de maneira natural a reflexes metafsicas: por exemplo, qual o lugar do Esprito nesse modelo do Universo em seu conjunto? Pois, um modelo do mundo incapaz de nos dizer o que quer que seja sobre este lugar do Esprito, entretanto to presente e de maneira to evidente no comportamento animal ou humano, no seria bastante incompleto (para no dizer bastante imperfeito)? E visto que este Esprito se manifesta especialmente na regio do espao ocupada pelo nosso prprio corpo, no deveramos fornecer igualmente um modelo das partculas elementares (que constituem o nosso corpo) que seja capaz de mostrar como o Esprito se situa em face desta matria elementar?

Eu me proponho explicar aqui como as minhas pesquisas em Fsica, em continuao aos trabalhos de Albert Einstein, sobre a Relatividade geral, me permitiram propor modelos de partculas elementares que respondem a questes interessando no somente a Fsica, mas tambm a Metafsica, no sentido de que descrevero, na linguagem da Fsica, a estrutura de uma matria "contendo" um espao do Esprito.

No principio, meus trabalhos para precisar a estrutura das partculas elementares no estavam, de modo algum, orientados para a Metafsica. Mas, no decorrer dos anos de 19751976, pude mostrar que algumas das partculas elementares, portanto partculas estveis (isto , com durao de vida praticamente indefinida), continham, como envolvido por uma carapaa de matria (explicaremos tudo isso), um espaotempo novo, diferente do espao que estamos habituados a considerar. A primeira imagem grosseira que podemos propor aqui (e no me privarei, nestas pginas, de fornecer imagens para que os no iniciados na Fsica compreendam o que quero dizer, no desagradando aos "senhores de preto "), a imagem, como dizia, que me parece ser conveniente aqui a das partculas comparveis a bolhas de sabo que flutuariam em nosso espaotempo ordinrio; mas, no interior destas minsculas bolhas de sabo, existiria um espaotempo de natureza especial.

Antes de retornarmos mais detalhadamente sobre este novo espaotempo, desejo dar rapidamente suas propriedades essenciais, para demonstrar o interesse "metafsico" que ele apresenta.

Enquanto nosso tempo ordinrio progride, de maneira irreversvel, do passado para o futuro: o novo tempo, fechado nas nossas "bolhas de sabo", um tempo cclico com perodo muito curto. Isto quer dizer que se o espao desta bolha registrou um fato no tempo t, o mesmo fato tornar a ser presente no espao da bolha dentro de um tempo ligeiramente posterior t + T2. Este tempo novo , portanto, idntico ao que prevalece nos fenmenos onde a memria intervm. Com efeito, quando nos lembramos por um instante de um fato passado, que este fato, gravado em alguma parte do que chamamos nossa memria, volta a aparecer novamente no presente do nosso esprito, neste instante. 0 tempo particular de nossas bolhas de sabo, que por esta razo chamarei de tempo do Esprito (por oposio ao nosso tempo ordinrio, que chamarei de tempo da Matria) continuamente traz de volta os fatos passados para o instante presente, colocandoos nossa disposio para transforinlos em um ato de memria do passado.

Isto no tudo. 0 espao de nossas bolhas de sabo, e no apenas o seu tempo, igualmente apresenta uma grande analogia com o que se espera de um espao prprio dos fenmenos espirituais. Com efeito, todos sabem que os fatos que acontecem no nosso espao ordinrio, o espao da Matria, obedecem a um famoso principio chamado "segundo principio da termo dinmica", pelo qual os fenmenos fsicos no podem se desenvolver fazendo decrescer sua entropia. Explicando sucintamente, isto quer dizer que a energia utilizvel no espao do nosso Universo diminui continuamente medida que o tempo passa e que, em um dado momento, teremos consumido toda a energia disponvel no Universo (o qual ter, ento, uma temperatura uniforme em todos os seus pontos). Em outras palavras, se convencionamos dizer que um objeto qualquer est "morto" quando no podemos de ele retirar mais nenhuma energia, ns diremos que nosso Universo da Matria est fadado, cedo ou tarde, a uma morte certa. Pois bem, nossas bolhas de sabo encerram um espao onde as coisas se passam ao contrrio: neste espao, a quantidade de informaes acumuladas s pode aumentar. Como, por outro lado, existe uma equivalncia entre informao e entropia negativa (ou neguentropia), podemos afirmar que, no espao de nossas bolhas de sabo, a entropia s diminui (isto , a neguentropia s aumenta), contrariamente ao que acontece no espao ordinrio, o espao da Matria. Mas, ento, este espao no especificamente um espao do Esprito? Pois isto o que notamos, desde que se pode diagnosticar a presena do Esprito em um fenmeno da natureza, principalmente entre as estruturas vivas ou pensantes. Em resumo, desde que ela portadora do que chamamos Esprito, a estrutura "se instrui pela experincia", e de maneira irreversvel, dada a irreversibilidade da memria. Este fenmeno de instruo crescente, ou em todo caso nunca decrescente, no devido presena, na estrutura viva ou pensante, destas "bolhas de sabo" contendo este espao do Esprito particular, onde a informao cresce medida que o tempo decorre?

Em resumo, meu trabalho sobre as partculas elementares em Fsica me mostrou que algumas destas partculas encerram um espao e um tempo do Esprito, coexistindo com o espao e o tempo no qual toda a Fsica, desde Aristteles, tem se esforado para descrever a Matria e sua evoluo. Ento, at agora, sempre acreditamos na existncia de um espao-tempo "simples", mas eis que se descobre um espao-tempo onde cada uma das dimenses "dupla": existe um espao-tempo do Esprito ao lado do espao-tempo tradicional da Matria.

Albert Einstein, no princpio do nosso sculo (1905), j havia acrescentado um progresso considervel Fsica, mostrando que o espao e o tempo eram intimamente solidrios um com o outro, a ponto de se comportarem verdadeiramente como se eles pudessem se transformar um no outro. Tal transformao pode ser ilustrada pelo fato de que, depois de Einstein, a Fsica teve de afirmar (e pudemos verificar experimentalmente) que se envelhecia menos depressa quando se atravessava mais rpido uma dada distncia de espao.

Mas eis que surge, atualmente sobre a noo de espao-tempo, uma nova revoluo necessria para se ir mais longe no conhecimento, no dissociando mais como antes os aspectos fsicos e espirituais dos fenmenos naturais. Desta vez se trata de constatar que o espao-tempo no de natureza "simples", mas de natureza "complexa". E este novo espao-tempo pode ser, ento, decomposto em um espao-tempo do Esprito e um espao-tempo da Matria, justapostos um ao outro. 0 espao-tempo do Esprito, at agora, passara desapercebido dos fsicos, pois s se descobre sua existncia no interior de certas minsculas partculas elementares que entram na constituio da Matria.

Estas partculas espirituais so "estveis", isto , a Fsica constata que (salvo "acidente" excepcional que provoque sua desintegrao) a durao da vida destas partculas comparvel durao da prpria vida inteira do Universo. Isto extremamente importante pelas suas conseqncias metafsicas. Pois se, por um lado, estas partculas encerram um espao que no pode jamais perder seu contedo informacional, visto que, como j dissemos, a neguentropia do espao do Esprito s pode evoluir crescendo; e se, por outro lado, estas partculas tm uma durao de vida praticamente "eterna", ento todas as informaes que, durante nossa vida humana, armazenamos nestas partculas espirituais entram na constituio de nosso corpo vo subsistir alm de nossa morte corporal, praticamente pela eternidade. Se convencionamos chamar Deus o principio de eternidade, ento o que acabamos de dizer nos permite afirmar que Deus, enquanto Esprito ligado ao princpio de eternidade, "existe" e, de resto, que cada um de ns "consubstancial" com Deus.

Outras conseqncias, tambm fundamentais "metafisicamente", surgem luz das idias precedentes. Como nosso corpo , com efeito, construdo de partculas que, por serem eternas, datam praticamente do "comeo do mundo", o nosso prprio esprito se enraza em toda a Histria passada do mundo. Este esprito que chamamos "nosso" vive o que vive o prprio Universo, cada um de ns possui um "Eu" coextensivo eternidade do tempo, no passado assim como no futuro.

Este "Eu", escrevi: aqui um ponto primordial sobre o qual voltaremos longamente. Pois, no h dvida, segundo o que estes estudos no campo da Fsica terica nos sugerem para o "modelo" do espao tempo do Esprito, em se dizer que o que chamamos de nossa pessoa, isto o nosso esprito, se encontra "disseminado", esfarelado, diremos, entre os bilhes de partculas elementares que formam nosso corpo. Esta era, dela nos lembramos, a tese de Pierre Teilhard de Chardin. Minhas pesquisas sobre o plano da Fsica demonstram que no lgico sustentar como plausvel esta concepo teilhardiana. 0 que devemos dizer, ao contrrio, que cada uma das partculas que formam nosso corpo possui em si mesma o conjunto da informao que caracteriza, por seu contedo, o que chamamos de "nosso" esprito, nossa pessoa, nosso "Eu". Em resumo, reencontraramos aqui, mas no plano do Esprito, o que os biologistas puderam experimentalmente constatar no que concerne "bagagem gentica". Sabemos que cada uma das clulas de nosso corpo possui os mesmos cromossomos, que esta clula pertence ponta de nosso dedo ou ao nosso encfalo. No parece haver nenhuma dvida, na biologia moderna, que os cromossomos so portadores da maior parte da informao manifestada, atravs do seu comportamento, pelo ser vivo ou pensante.

0 que os meus trabalhos parecem ter demonstrado que seria necessrio ir ainda mais longe no plano do elementar... e ir, na verdade, at s partculas chamadas precisamente de "elementares" (isto indivisveis), tais como a Fsica as estuda. cada uma destas partculas fsicas compondo os cromossomos que conteria a totalidade da informao que associamos habitualmente ao conjunto do jogo cromossmico, em um dado indivduo. mesmo possvel (seno provvel) que esta informao esteja contida, igualmente, em sua totalidade, em cada uma das partculas que formam a substncia inteira da clula (ncleo, citoplasma, membrana) e no somente nos cromossomos.

Isto no significa, bem entendido, que cada partcula de nosso corpo no se diferencia de sua vizinha, sob o ponto de vista de seu contedo informacional. Com efeito, j dissemos, cada partcula possui uma "histria" que remonta a todo o passado do Universo; isto significa que cada partcula viveu uma experincia diferente da de sua vizinha, antes de participar com ela da mesma estrutura complexa viva ou pensante,

Morte, eis a sua derrota! Desde que situamos nossa pessoa, nosso "Eu", no lugar que parece caber-lhe aps uma investigao suficientemente avanada sobre as partculas elementares da Fsica, ento no h mais para ns verdadeira Morte, do mesmo modo que no h verdadeiro Nascimento. Ns vivemos no plano espiritual aquilo que vive o prprio Universo. Portanto, ser atravs dos "modelos cosmolgicos" da Fsica, descrevendo a evoluo do conjunto do nosso Universo no tempo e no espao, que ns seremos informados (ao menos em parte) sobre a aventura do invlucro material que encerra o Esprito, nosso esprito. Em seguida, restar procurar saber o sentido e a direo da aventura do prprio Esprito; e no apenas do seu invlucro material. Ns nos esforaremos para explicar isto nas pginas seguintes.

Primeiro quis dar uma viso de conjunto das implicaes metafsicas de minhas pesquisas em Fsica. Proponho-me retornar sobre estas pesquisas, mais detalhadamente, nos prximos captulos, a fim de demonstrar melhor, justificando-os "cientificamente", os mecanismos e as propriedades do Esprito.

Entretanto, no se trata de empregar neste livro a linguagem do fsico. 0 domnio no qual trabalho comporta um formalismo matemtico extremamente rduo, que suplantaria o conhecimento dos meus leitores, mesmo que eles tivessem uma formao cientfica. Isto o digo sem nenhuma pretenso, a razo disso simplesmente porque este formalismo matemtico bastante especializado e, de fato, pouco utilizado pelos prprios fsicos contemporneos. Este formalismo essencialmente uma extenso daquele de que se serviu Einstein para a Relatividade geral. Mas necessrio relembrar que esta teoria apenas esboada no mbito das Faculdades e Universidades. Esta situao mais especialmente verdadeira na Frana. Enquanto existem centenas de manuais franceses associados ao ensino da Mecnica quntica, podemos contar nos dedos de uma s mo os cursos bsicos escritos sobre a Relatividade geral. Einstein sempre lastimou, enfaticamente, durante sua vida, esta desafeio dos "grandes mestres" para com a Relatividade geral, pouco ensinada comparativamente Mecnica quntical. Nestes ltimos quinze anos, um grande esforo de recuperao foi, entretanto, feito no estrangeiro, onde os cientistas tm conscincia de que os progressos em Fsica se realizaro atravs de um "cerrar fileiras" sobre a obra de Einstein. Na Frana, espera-se ainda ... e creio que no poderia encontrar no nosso pas mais do que cem leitores capazes de compreender completamente o formalismo da Relatividade complexa.

Portanto, nesta obra, vou exprimir-me em uma linguagem que os cientistas, pejorativamente, qualificam de "vulgarizao". Eu o farei, entretanto, com bastante cuidado para no deformar o esprito (seno a forma) dos resultados tais como so expressos na linguagem puramente cientfica.

Alis, meu editor Albin Michel aceita publicar, simultaneamente com esta obra, meu prprio trabalho cientfico (Thorie de Ia Relativit complexe), dirigido somente aos especialistas da Fsica terica. Assim, os leitores que desejarem podero encontrar nele as bases cientficas das concepes e dos resultados que exporei mais simplesmente aqui.

CAPITULO III

As linguagens de descrio na Fsica

Descartes e a descrio por "figuras e movimentos". - A relatividade einsteiniana do tempo e do espao. - A geometrizao da Fsica. - 0 probabilismo incompatvel com uma geometrizao completa da Fsica? - Uma nova revoluo necessria sobre os conceitos de espao e de tempo, para neles incorporar o Esprito.

Demonstrar que h um certo "Esprito" associado s partculas elementares da Fsica, reconhecer este "Esprito" na descrio que propomos quer do contedo, quer do comportamento da partcula. Como o comportamento da partcula no pode ser motivado ou justificado a no ser pela interao de seu contedo com o mundo exterior, finalmente este contedo que devemos procurar descrever em primeiro lugar. Ento necessrio que, para esclarecer este problema da eventual natureza espiritual das partculas, forneamos uma descrio da estrutura das partculas. Diremos, por exemplo, que a densidade da matria ou a temperatura da radiao esto distribudas de tal ou qual modo no volume de espao ocupado pelo "corpo" da partcula.

Mas a Fsica est agora, desde h um pouco mais de meio sculo, diante de uma dificuldade fundamental no que concerne a qualquer tentativa de descrio da estrutura de uma partcula. Com efeito, a Fsica declara desde 1925 que a "descrio" da partcula, no sentido que acabamos de definir, simplesmente impossvel por princpio. No possvel estabelecer um "rosto" para a partcula, exprimindo-nos da mesma forma como o faramos, por exemplo, para o rosto humano. Para descrev-lo poderamos dizer "que ele tem um nariz, uma boca situada no meio e sob dois olhos, que sua forma oval e enfeitada por duas orelhas, uma de cada lado, etc.". Para um fsico contemporneo no tem mais sentido uma descrio geomtrica semelhante para falar do aspecto e do contedo de uma partcula. Em contraposio, podemos descrever a partcula atribuindo-lhe caractersticas de tipo "subjetivo", isto , sob forma de opinies motivadas relativas observao, opinies baseadas em grande parte em convenes de linguagem imaginadas pelo observador humano. Diremos, por exemplo, que esta partcula "estranha", que ela no tem "cor" mas que tem "encanto", etc. Estes termos no foram inventados aqui para ilustrar a minha afirmao; os termos estranho, cor, encanto so efetivamente qualidades dadas pelos fsicos modernos s partculas elementares; e estes termos substituem a "descrio" dos fsicos.

Como ento fomos obrigados, parece-nos, a dar descrio cientfica esta forma to distanciada da que sempre foi, at o comeo deste sculo? o que desejamos explicar primeiro, para demonstrar claramente como seremos em seguida conduzidos, de maneira natural, a introduzir a existncia de um espao-tempo do Esprito, justaposto ao espao-tempo tradicional, o da Matria.

Desde que o Homem capaz de pensar, parece que ele sempre considerou possvel descrever o mundo em torno de si como uma "substncia" presente no espao e evoluindo no tempo. Podemos representar geometricamente esta distribuio da substncia no espao e no tempo. Assim, a arte pr-histrica nos mostra, sobre os muros das cavernas de Lascaux, por exemplo, representaes de animais traadas pelo Homem, h muitas dezenas de milhares de anos: a "substncia" representada aqui a carne do animal e o desenho simboliza a maneira pela qual esta carne repartida no espao; algumas vezes, muitas posies sucessivas dos passos no tempo so igualmente representadas no mesmo desenho, o que demonstra bem a idia de poder representar geometricamente as coisas como formas evoluindo no tempo.

No princpio do sculo XVII, Ren Descartes confirmava ainda esta possvel descrio "geomtrica" da natureza. Para Descartes, o mundo capaz de ser inteiramente representado por "figuras e movimentos"; por outro lado, ele introduz a noo de "sistema de referncia", ao qual relacionaremos, para melhor descrev-lo, o fenmeno geomtrico. Suponhamos, por exemplo, um objeto com a forma de um pio girando sobre si mesmo no cho de um quarto. Escolheremos, como sistema de referncia, as trs arestas concorrentes obtidas pelo encontro de duas paredes do quarto e do cho. Poderemos, em seguida, descrever de maneira precisa o movimento do pio indicando como variam, no decurso do tempo, as distncias de cada ponto do pio at s trs arestas das paredes e do cho, que chamaremos eixos do sistema de referncia escolhido. Poderemos descrever desta maneira, por exemplo, o balano bastante conhecido do pio enquanto ele gira, e tambm a queda ao cho no momento em que pra de girar. Resumindo, como o desejava Descartes, o fenmeno "rotao do pio" pode ser, graas a este sistema de referncia, descrito de maneira precisa em termos de "figuras e movimentos".

Albert Einstein, no princpio do nosso sculo, apresentar dois melhoramentos sucessivos a esta descrio dos fenmenos fsicos.

Primeiro, em 1905, ele mostra que no suficiente escolher um referencial para descrever corretamente o fenmeno; tambm necessrio prestar ateno ao fato de que as dimenses da forma representada dependem da velocidade desta forma, tal como a avaliamos no referencial. Esta forma tem, com efeito, tendncia a se "deformar" na direo de sua velocidade. Assim, uma rgua de cem centmetros de comprimento, deslocando-se na direo de sua maior dimenso, no sistema de referncia escolhido, mede um pouco menos de 1 metro. Este efeito, curioso primeira vista, no sensvel a pequenas velocidades; mas se torna importante quando nos aproximamos da velocidade da luz (300.000 quilmetros por segundo). Julguemos: nossa rgua de 100 cm no tem mais do que 43,6 cm quando ela se desloca na direo do seu comprimento a 90% da velocidade da luz; a mesma rgua mede somente 14,1 cm a 99% da velocidade da luz; e esta rgua teria dimenses nulas se ela pudesse deslocar-se veloci;dade exata da luz.

A que se deve este efeito de "encurtamento"? Einstein nos explica, na sua Relatividade restrita de 1905, que devido ao fato de que o tempo e o espao no so independentes um do outro, como os homens sempre pensaram at ento. Esta interdependncia aparece desde que interfiram velocidades, pois uma velocidade um espao percorrido por unidade de tempo. Se acreditamos, at 1905, em um espao e um tempo "absolutos", e, portanto independentes um do outro, que o efeito do "encurtamento" no se manifesta de maneira aprecivel observao, a no ser para as velocidades prximas da luz. E o princpio do nosso sculo XX precisamente a poca em que as experincias sobre objetos viajando no espao a velocidades prximas da luz se tornaram possveis e se foram desenvolvendo. relativamente "coMUM93, por exemplo, chegar a fazer medies experimentais na Fsica sobre eltrons circulando a 90 por cento da velocidade da luz; ora, este efeito de esmagamento do espao na direo da velocidade da luz, como acabamos de ver, tem por conseqncia a reduo dos comprimentos para menos da metade a uma tal velocidade. Desde 1905, pudemos verificar milhes de vezes que este efeito de encurtamento previsto por Einstein aconteceu, e temos, portanto, certeza de que no se trata de nenhuma especulao do nosso grande fsico, mas sim de um efeito real.

Notaremos que este efeito tem profundas implicaes filosficas. Assim, quem ainda no se perguntou se o Homem ser capaz um dia, com o progresso da tcnica, de chegar a planetas de estrelas bem afastadas do nosso Sol? A galxia de Andrmeda, por exemplo, comporta bilhes de sis, e tambm bilhes de planetas girando em torno destes sis. Mas infelizmente, estes planetas de Andrmeda esto terrivelmente longe, e so necessrios perto de dois milhes de anos para que a luz sada da Terra chegue l. Se o espao fosse absoluto, isto , se nossa distncia at Andrmeda no dependesse da velocidade com a qual se chega l, ento deveramos concluir que o Homem no poder jamais visitar nossos eventuais irmos pensantes que habitam estas terras longnquas, quaisquer que sejam os progressos da tcnica; com efeito, mesmo velocidade da luz, seriam necessrios dois milhes de anos para chegar at Andrmeda, o que incompatvel com as simples dezenas de anos da vida humana. Mas o espao, e portanto as distncias, no so absolutos, como o sabemos desde 1905. E um clculo simples mostra que, a 99 por cento da velocidade da luz, somente seriam necessrios 28.000 anos para chegarmos Andrmeda: 283 anos a 99,999999 por cento da velocidade da luz ... e somente 2,8 anos se conseguirmos, um dia, construir um foguete (por que no?) que se desloque a 99,9999999999 por cento da velocidade da luz. Notemos que tal velocidade no to inacessvel como, primeira vista, parece: acelerando continuamente, no decorrer da viagem, na acelerao qual somos constantemente submetidos pela gravidade terrestre quando estamos na Terra, ser necessrio perto de um ano para nos aproximarmos muito perto da velocidade da luz. Quem pode predizer onde se deter a tcnica humana? 0 "encurtamento" das distncias com a velocidade leva a afirmar que no existe nenhuma razo de princpio nos impedindo de esperar que todo nosso imenso Universo ser, um dia, acessvel s viagens do Homem no cosmo. Aqui, ainda, vemos a Metafsica invadindo a Fsica, para desagrado de alguns "cientistas"!

Dez anos depois de ter mostrado que tempo e espao eram to dependentes um do outro, Albert Einstein "recomeava" sua contestao das idias admitidas h milnios sobre o tempo e o espao. Defendia, em 1915, com a sua Relatividade geral, que o espao no era de modo algum este quadro "vazio" que se imaginava simplesmente como contendo os fenmenos fsicos; o espao era a prpria "substncia" que constitui a essncia dos fenmenos.

Pode-se fazer uma idia da modificao de perspectiva que isto implicava, comparando-se os fenmenos fsicos com atores representando no palco de um teatro. At aqui estvamos persuadidos de que estes atores eram seres de carne e osso tendo uma existncia independente do espao do palco no qual se movimentavam e declamavam seus papis. Ora, com Einstein, aprendemos rpido que estes personagens so produzidos por uma radiao laser e por alto-falantes distribudos no palco, e no tm portanto nenhuma existncia independente de todos os dispositivos audiovisuais que so parte integrante do palco.

Na Relatividade geral, de maneira semelhante, os fenmenos no tm nenhuma existncia independente do espao, pois eles so constitudos com o prprio espao, e sua "substncia" do espao. Mas, continua Einstein, o espao capaz de possuir "curvaturas", isto , formas, e so estas formas que desenham a aparncia que conhecemos dos fenmenos fsicos.

Em resumo, vemos com Einstein o desejo de Descartes completamente satisfeito: tudo feito com a forma da extenso. Assim, uma partcula elementar, por exemplo, ser apenas uma regio do espao particularmente curva na minscula regio onde esta partcula se localiza. As ondas eletromagnticas, a gravitao e, mais amplamente, todos os fenmenos fsicos conhecidos seriam, do mesmo modo, regies curvas e em movimento do espao, um pouco como as ondas do oceano. Portanto, com Einstein, temos o triunfo da geometria na Fsica; todo nosso Universo apenas constitudo por formas geomtricas de uma substncia nica chamada espao; ou, mais precisamente, espaotempo visto que, desde a Relatividade restrita de 1905, tempo e espao no eram mais independentes um do outro.

Seria isto uma simples viso do esprito? De modo algum; e todas as experincias feitas desde 1915 para confirmar a Relatividade geral jamais contradisseram a interpretao einsteiniana dos fenmenos fsicos considerados como do espao com curvas em movimento (isto , do espao-tempo com curvas). No decurso destes ltimos quinze anos, as aplicaes deste ponto de vista foram particularmente produtivas em astrofsica, permitindo especialmente explicar a estrutura das estrelas muito densas: pulsares, quasares, buracos negros. Teremos ocasio de voltar a estes resultados.

necessrio notar que, ainda aqui, as implicaes filosficas, ou melhor dizendo metafsicas, da descoberta de Einstein so extremamente fundamentais. Com efeito, graas Relatividade geral tornou-se possvel falar em termos cientficos do nosso Universo como um todo. A idia admitida atualmente, em astrofsica, que o espao do nosso Universo "fechado". 0 espao em seu conjunto, com efeito, seria ligeiramente curvo, de tal modo que, se tivssemos a possibilidade de nos deslocar no Universo sempre "em linha reta" (isto , segundo uma trajetria sem nenhuma "curvatura", por menor que ela seja), acabaramos por retornar ao ponto de partida. Em resumo, esta descoberta da curvatura de conjunto do nosso Universo assemelha-se a que foi feita na poca de Cristvo Colombo no fim do sculo XV, segundo a qual nossa Terra, tambm, era curva em seu conjunto e possua uma forma geral de aparncia esfrica. Na Terra, como em todo o Universo, retornamos ao ponto de partida caminhando continuamente para frente, em linha reta. Certamente, a idia de um Universo fechado sobre si mesmo requer reflexo, e os argumentos contra Einstein para tentar desacreditar seu ponto de vista foram numerosos. Contra a Terra esfrica, tambm se dizia que era absurdo, visto que neste caso os humanos deveriam andar "de cabea para baixo" em relao aos antpodas, e cairiam portanto no vazio do espao que circunda a Terra. Os argumentos contra o Universo em curvatura traduzem aproximadamente o mesmo esprito ou, mais exatamente, a mesma ignorncia.

Voltaremos longamente sobre esta propriedade do espao de poder se curvar, a ponto de se fechar sobre si mesmo, como acontece para o conjunto de nosso Universo. Veremos, com efeito, que algumas partculas da Fsica, os eltrons, so minsculos microuniversos formados de um espao-tempo particular, fechado ele tambm em torno de si mesmo. Este espao-tempo ser o do Esprito.

Mas, antes disso, devemos falar ainda um pouco sobre o "drama" da Fsica, em 1925, quando foi introduzida a noo de "probabilismo". 0 probabilismo induzia a pr de alto a baixo todo o belo edifcio einsteiniano, propondo "geometrizar" completamente a Fsica. Vejamos isto mais de perto.

Em 1925, os fsicos se baseavam tanto em trabalhos tericos (Schrdinger, de Broglie, Heisenberg... ) corno em experimentais (difrao dos eltrons), para constatar que era impossvel obter, de uma partcula, informaes precisas concernentes sua posio e sua velocidade, de uma s vez. No til retornarmos aqui, detalhadamente, sobre esta etapa importante do conhecimento em Fsica; indicaremos, simplesmente, o essencial das concluses a que chegaram os fsicos.

Se se obtinham, no decurso de uma experincia em Fsica, informaes para localizar exatamente, em um instante dado, a posio de um eltron, por exemplo, ento no se podia saber nada de sua velocidade neste mesmo instante; esta velocidade poderia ter qualquer valor entre zero e a velocidade da luz. Inversamente, se se conseguia medir exatamente, em um instante dado, a velocidade de um eltron, ento no se podia saber nada mais sobre sua posio no espao, que podia muito bem ser aqui ou a centenas de lugares daqui. Resumindo, tornava-se impossvel falar da "trajetria" de uma partcula como um eltron, isto , proibido tentar uma representao exata de sua posio e de sua velocidade em um sistema de referncia dado (ou, de uma outra maneira, de falar de suas posies sucessivas no espao em funo do tempo).

Isto era muito grave para a esperana de "geometrizao" completa da Fsica preconizada por Einstein; pois, com efeito, geometrizar a Fsica , precisamente, poder descrever exatamente, em cada momento, a forma geomtrica do espao. Um eltron em movimento, por exemplo, est na Relatividade geral de Einstein descrito num referencial dado como uma forte curvatura bem localizada do espao (uma minscula "salincia" do espao) se deslocando no correr do tempo. Portanto, considera-se que esta "salincia" vai percorrer uma trajetria precisa: o que est em flagrante contradio com as concluses dos fsicos de 1925, que declaram que no h mais nenhum sentido em se falar da "trajetria" de um microobjeto como um eltron, pois esta trajetria no pode, em nenhum caso, qualquer que seja o dispositivo experimental escolhido, ser um fenmeno "observvel". E, naturalmente, necessrio construir as teorias fsicas com o auxlio de conceitos que permitam verificar a teoria, isto , que levem experincia, ao observvel.

Portanto, quais so os novos conceitos que os fsicos de 1925 vo propor para construir a Fsica? Primeiro, vo proscrever, como acabamos de notar, a possibilidade de descrever a estrutura de uma partcula como descreveramos, por exemplo, o rosto e o corpo humano. Tal descrio supe, com efeito, um conhecimento preciso da situao dos pontos que constituem a estrutura da partcula no decorrer do tempo, isto , supe a possvel existncia de uma "trajetria" de cada um dos pontos da estrutura; e isto est proibido daqui por diante. Os defensores da teoria quntica (como chamaremos a seguir este novo enfoque em Fsica), entretanto, admitiro que a partcula, um eltron, por exemplo, possa ser um objeto mnimo corpuscular, visto que ele se manifesta como um corpsculo nas observaes (o choque de um eltron sobre a tela da televiso, por exemplo, localizado como um "ponto" sobre a tela). Os tericos qunticos recusaro com energia que se d um "rosto" a este eltron, isto , que se tente dizer como ele feito. Em outras palavras, mais uma vez, nada de descrio "geomtrica" para falar dos fenmenos fsicos.

A propsito, os tericos qunticos vo introduzir, em Fsica, um elemento extremamente novo, totalmente desconhecido at ento: proporo uma onda puramente subjetiva (a famosa onda psi), que no ser mais representante do prprio objetivo fsico estudado, mas sero as informaes que se capaz de conhecer, a todo instante, sobre este objeto fsico. Estas informaes, pelas razes que acabamos de dar, no so nunca dados precisos que contm, ao mesmo tempo, a posio e a velocidade de uma partcula. Estas informaes exprimem somente a probabilidade de encontrar, em um dado momento, a partcula neste ou naquele ponto do espao.

Dizamos, e necessrio insistir, que esta onda psi, portadora das informaes "probabilsticas" que temos sobre o fenmeno estudado, subjetiva, no sentido de que ela no pode e no deve, em nenhum momento, ser considerada um fenmeno "objetivo" que ocupa lugar no espao e no tempo onde se movimenta o que chamamos a Matria. A onda psi comparvel a um registro de informaes que se distribuiria aos automobilistas para lhes indicar a quantidade provvel de veculos nas diferentes estradas em tais e tais horas do dia. A densidade real dos veculos, em tal lugar e em tal momento, constitui o fenmeno objetivo que se localiza no espao e no tempo; as probabilidades contidas no registro de informaes, ao contrrio, no tm nenhum carter objetivo; elas se referem a avaliaes estatsticas estabelecidas pelo esprito desse observador que o Homem. Em outros termos, se a onda psi com caracterstica probabilstica dos fsicos devesse ter um carter "objetivo" qualquer, certamente isto no poderia ser, em todo caso, no espao-tempo onde evolui a Matria (os automveis neste caso acima), mas em um espao-tempo diferente, que poderamos chamar de espao-tempo das informaes probabilsticas, ou melhor ainda, de espao-tempo do Esprito. Naturalmente, voltaremos a este ponto de vista.

Entretanto, Einstein no abandonaria, to facilmente, sua esperana de "georn etriz ao" da Fsica. Todo o resto de sua existncia, entre 1925 e 1955, ser consagrado a lutar contra o enfoque puramente probabilstico da Fsica. Einstein pensar sempre que se trata l de uma descrio incompleta, no sentido em que uma probabilidade de observao uma descrio menos completa do que a que consiste em dar s coisas, a cada instante, uma forma geomtrica e um movimento preciso. E, para Enstein, o objetivo da Fsica dever ser o de descrever em termos de formas e de movimentos.

Mas, contra Einstein, os fsicos qunticos se tornaram sempre mais numerosos. Com a morte do grande fsico, em 1955, quase todos os pesquisadores em Fsica estimavam que, apesar do seu enfoque considervel no domnio da Relatividade, Einstein teria, finalmente, se enganado nos ltimos trinta anos de sua vida, desejando desesperadamente agarrar-se a uma Fsica determinista, tendo como objetivo a geometrizao completa dos fenmenos do espao-tempo.

Tendo a causa sido entendida, a Fsica permanecer probabilstica? No h certeza nenhuma; nestes ltimos vinte anos, pudemos assistir a esforos renovados, em todos os pases do mundo, para tentar completar a descrio probabilstica, ou pelo menos, para tentar retomar um verdadeiro ponto de vista determinista, como antes de 1925.

No meu entender, o progresso deve hoje realizar-se muito menos por uma contestao do probabilismo do que por um esforo de discernir por que, em um referencial de espao-tempo, somos incapazes de representar com uma exatido total, isto , sem indeterminao, ao mesmo tempo a posio e a velocidade de uma partcula. Esta tentativa no deve ser feita, no esprito, com a pretenso de mostrar que podemos num tal referencial contornar a dificuldade e obter as informaes exatas e simultneas que desejamos. Isto seria desconhecer as bases extremamente slidas sobre as quais se apia a Teoria Quntica. Em revide, no proibido questionar se o referencial espao-tempo escolhido para descrever todos os fenmenos fsicos bem apropriado para nos fornecer a totalidade das informaes possveis e simultneas sobre os fenmenos observados.

Para ilustrar este ponto, suponhamos que o espao comporta uma outra dimenso alm das trs (altura, largura e comprimento) tradicionalmente atribudas ao nosso espao fsico. Para perceber suas conseqncias, suponhamos que escolheramos somente referenciais com duas dimenses para descrever os objetos de nosso espao fsico, que possui, como sabemos, trs dimenses. Isto significaria que deveramos nos limitar a descries de objetos tridimensionais sob a forma de "cortes", atravs de superfcies bidimensionais. Certamente, multiplicando os cortes, poderamos ainda, sem dvida, fazer uma idia do objeto tridimensional: mas com que riscos de dificuldades na linguagem! Por exemplo, se o objeto um cilindro, um corte plano poder nos fornecer um crculo, um outro corte plano um retngulo: como um objeto pode ser, perguntaremos, ao mesmo tempo crculo e retngulo? 0 problema de um objeto ao mesmo tempo onda e corpsculo no se parece com o precedente?

E as coisas seriam mais ambguas ainda se a dimenso que falta no fosse do tipo espao, mas do tipo tempo. Assim, suponhamos que o tempo fsico no seja inteiramente constitudo pelo tempo t ,,ordinrio", aquele que nos serve para avaliarmos os movimentos da matria, mas tambm de um outro tempo V, justaposto ao tempo ordinrio t. Ento, nada permitiria pensar que o movimento real de um objeto no espao pudesse ser descrito como uma trajetria contnua em funo do nico tempo t. Se, no mesmo instante t, o objeto igualmente capaz de se deslocar em funo de V, ento se torna impossvel prever exatamente o movimento deste objeto no espao fsico, dando-se somente sua posio e sua velocidade iniciais em funo do tempo t; naturalmente faltam os mesmos dados iniciais em funo do tempo t.

Resumindo, devemos nos perguntar se no uma estrutura do espao-tempo mais complexa do que a imaginada at ento pelos nossos cientistas que justificar o probabilismo estrito da Fsica atual, isto , um probabilismo que no possvel considerar como de origem estatstica.

E esta estrutura mais complexa, a Teoria Quntica no nos coloca no caminho para descobri-Ia? No necessrio pesquisar em que espao-tempo (mais "complexo" que o de Einstein e tambm que o da Teoria Quntica) a onda psi ter uma existncia "objetiva"? Visto que a onda psi portadora de informaoes para o esprito humano, este espao-tempo complementar do espao-tempo "ordinrio" no deve ser um espao-tempo do esprito?Em outras palavras, questionando novamente, depois de Einstein, o problema da natureza e da estrutura do espao e do tempo que, talvez, pudssemos realizar um novo passo em Fsica. Mas, pelo que acabamos de ver, tal passo s poderia ser dado com a condio de termos, desde o incio, conscincia de que ser necessrio fazer constar na descrio dos fenmenos fsicos tanto o Esprito quanto a Matria.

o que vamos examinar, agora, mais detalhadamente.

CAPITULO IV

0 espao-tempo complexo

Matria e Esprito unificados em um espao-tempo complexo. - 0 "ponto" do espao-tempo tradicional um domnio extenso. - Os "buracos negros" como prova da complexidade do espao e do tempo. - Dirio de viagem atravs de um buraco negro. - 0 espaotempo dos buracos negros memoriza e ordena os acontecimentos, assim como faz o Esprito.

Devo confessar entretanto aos meus leitores que, pessoalmente, no me propus, no incio das minhas pesquisas, alcanar um progresso em Fsica, buscando deliberadamente fazer participar o Esprito nas minhas descries dos fenmenos ao lado da Matria.

0 problema que me havia proposto inicialmente, como um fsico-terico, era construir uma teoria unitria dos fenmenos fsicos, isto , uma teoria unificando o conjunto dos fenmenos fsicos observados, mostrando que cada um deles constitua apenas um caso particular de uma grande lei geral (a lei unitria). Mas, entretanto, no havia excludo, a priori, a possibilidade de que, se conseguisse formular uma tal lei unitria, ento uma das conseqncias desta lei seria a de nos fornecer alguma luz sobre a natureza e os mecanismos do Esprito. Pois, finalmente, no o prprio Esprito o princpio unificante de todos os fenmenos observados? Pois bem, na verdade, foi o que aconteceu.

No decorrer dos meus anos de pesquisa, convenci-me, pouco a pouco, de que o meio mais lgico para tentar uma unificao dos fenmenos fsicos era "ampliar" de alguma forma o quadro de referncia habitual do espao e do tempo. Alis, esta idia, luz da reflexo, era tambm, sem dvida, a mais "natural": quando queremos fazer uma sntese entre fenmenos aparentemente sem relao direta um com o outro, necessrio preencher o "nada" que os separa com alguma coisa; um mtodo criar um espao-tempo mais largo, capaz de conter os diversos fenmenos considerados, colocando-os em relao.. com tais exemplos que percebemos claramente o sentido profundo da afirmao de Einstein, j citada, segundo a qual "uma teoria pode ser verificada Pela experincia, mas no existe nenhum caminho que leve da experincia criao de uma teoria". 0 fsico deve, ao menos nas suas diligncias iniciais, fazer uma verdadeira criao, isto , retirar as premissas da sua teoria de sua prpria intuio e no dos fatos experimentais, que no permitiro ao Conhecimento avanar um passo, se tomarmos estes fatos pelo que acreditvamos que eram na origem das pesquisas. Estou intimamente persuadido de que a Fsica alcanou seus maiores progressos, contrariamente ao que pretendem em geral, renegando os fatos experimentais (que no so jamais "fatos" no absoluto, mas interpretaes baseadas somente numa parte dos dados que a Natureza coloca ao alcance dos nossos sentidos).

Portanto admiti que, para caminhar para a unificao dos fenmenos, era necessrio postular que existiam dois espaos-tempos justapostos, constituindo um espao-tempo mais geral, no qual, ento, os fenmenos apareceriam unificados. Guiado pelos trabalhos de Einstein sobre a Relatividade geral, que faziam intervir o tempo como uma dimenso "imaginria", admiti que as quatro dimenses (trs de espao e uma de tempo) de meu espao-tempo generalizado eram, cada uma, desdobradas entre uma parte "real" e uma parte "imaginria". Em Matemtica, quando falamos de nmeros "desdobrados", chamamolos de nmeros complexos. As dimenses do meu espao-tempo generalizado so, portanto, no sentido matemtico, dimenses complexas; da o nome de Relatividade complexa que dei teoria que desenvolvi explorando as propriedades deste espao-tempo generalizado.

No tenho inteno de abordar aqui os detalhes da teoria matemtica das grandezas ditas "complexas". No objeto desta obra. Mas, para que o leitor no-iniciado possa fazer uma idia do que necessrio entender por "complexo", fornecerei uma imagem.

Tomemos uma moeda deitada sobre uma mesa. S percebemos o lado da "cara" da moeda. Podemos traduzir este fato dizendo que o lado da face "real", posto que visvel. Um garotinho (seis a doze meses segundo as experincias do psiclogo Piaget) pensar, na maioria das vezes, que esta pea tem um s lado, visto que s um lado apreendido diretamente pelos seus sentidos. Entretanto, como adultos, podemos fazer um esforo de imaginao e declarar que esta pea possui igualmente um lado "coroa", escondido pelo contato com a mesa. Entretanto, como no o vemos, podemos qualific-lo de "imaginrio". Isto no impede que, mesmo que ele no seja visvel, sua existncia parea certa para a maioria dos observadores. Se, portanto, admitimos a existncia destes dois lados da pea, um lado coroa e um lado cara, a despeito de vermos apenas um, poderemos caracterizar esta opinio anunciando que a pea tem um anverso e um reverso, ou ainda dizendo que a pea complexa.

Dizer que as dimenses do tempo e do espao so complexas anlogo (mas, bem entendido, no idntico) a dizer que o tempo e o espao tm um direito e um avesso. Portanto, no seria realmente exato dizer que com um espao-tempo "complexo" teremos "dobrado" as dimenses do espao-tempo "ordinrio" (que seriam ento oito em vez de quatro): o que correto dizer que iremos construir uma teoria fsica em um espao-tempo, onde o direito e o avesso desempenharo ao mesmo tempo o papel das trs dimenses do espao e da dimenso do tempo.

Mas existem indcios na Fsica atual que permitiriam entrever os primeiros sinais de uma tal "complexidade" do espao-tempo apreendida pelos nossos sentidos?

De repente, como j disse, a existncia de uma tal complexidade me parece muito evidente, considerando as duas "faces" do nosso Mundo sensvel que so a Matria e o Esprito. Mas, "antes disso", isto , antes do incio da teoria, foram razes muito mais prosaicas que me apareceram como indcios de uma complexidade do espao-tempo. Selecionarei aqui duas dessas razes, que so, talvez, as principais.

Primeiro, o fato de que a Fsica contempornea, desde a Teoria Quntica de 1925, muitas vezes levada a dar um contedo fsico a um ponto de espao-tempo; ou antes, a um ponto-acontecimento de espao-tempo, visto que tal ponto feito de um ponto "matemtico" de espao (isto , de volume nulo) associado a uni instante do tempo (isto , de durao nula). Tal "contedo fsico" atribudo ao ponto-acontecimento aparece principalmente no que chamamos Teoria Quntica dos campos, onde cada ponto do campo considerado como um pequeno oscilador independente, possuindo certa quantidade no nula de uma grandeza chamada ao 1. Como possvel "manter" uma quantidade fsica que, por sua prpria definio, deve necessariamente ocupar um volume no nulo de espao, em um ponto matemtico que, igualmente por definio, sem volume? Problema anlogo para algumas partculas, como o eltron, por exemplo: colocamo-nos em dificuldades para interpretar as observaes se admitimos que o eltron no assimilvel a um ponto matemtico, ocupando, portanto