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Nos Bastidores dos espíritos – Caio Fábio D’Araújo Filho Página | 1 Nos Bastidores dos Espíritos Caio Fábio D’Araújo Filho BETÂNIA Descrição: A história de Héber Soares, um médium que fazia operações, e curava pessoas com doenças que a medicina dizia não ter. Mas que deixou de operar e abandonou a mediunidade quando teve um encontro com Jesus.

Nos Bastidores dos Espíritos

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Livro de Caio Fábio

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Nos Bastidores dos espíritos – Caio Fábio D’Araújo Filho

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Nos Bastidores dos Espíritos Caio Fábio D’Araújo Filho BETÂNIA

Descrição: A história de Héber Soares, um médium que fazia operações, e curava pessoas com doenças que a medicina dizia não ter. Mas que deixou de operar e abandonou a mediunidade quando teve um encontro com Jesus.

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CAPÍTULO I

(...) Filho de pais católicos, pessoas respeitáveis e estimadas, ele teve uma infância aparentemente normal, correndo e brincando, como os outros garotos de sua época, sob as frondosas mangueiras que marcavam a paisagem do centro da cidade, considerado um verdadeiro paraíso para as crianças. As noites, porém, revelavam que algo de estranho acontecia com aquele menino. Seu sono era sempre agitado. Mexia-se. Remexia-se muito. Rangia os dentes, gritava e gemia. Mas antes de ele atingir a idade de 17 anos desconhecia-se, por completo, a causa dessa agitação.

Então, Héber já era um rapaz e seu pai costumava emprestar-lhe o carro para algumas aventuras juvenis, desde que não se excedesse. Foi numa dessas saídas que ele atropelou uma garota. A menina surgiu de repente na frente do carro e o acidente foi inevitável.

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Logo havia um grupo em volta do carro, enquanto um outro corria para socorrer a criança.

— Será que ela ainda está viva? Héber ouviu alguém perguntar.

— Não sei...Tem tanto sangue.

Os olhos de Héber ficaram parados por um momento sobre o corpinho da menina sangrando no asfalto. “Estaria morta?” pensou aflito. Não recuperado do primeiro choque, prontificou-se a levá-la ao hospital onde verificaram que a menina sobreviveria. Foi um alívio!

Esse afrouxamento de tensão, no entanto, não foi suficiente para silenciar as vozes que começaram a se fazer ouvir na sua mente. A cena do acidente, o impacto do corpo sobre o carro, o vozerio da multidão e seu próprio medo se misturavam em imagens e sons que ele não conseguia esquecer.

Foi para casa. A noite chegou e ele se recolheu aos seus aposentos. Tentou dormir, mas não conseguiu. Tinha a sensação de estar sendo vigiado. Haveria alguém no quarto? Um calafrio lhe correu pelas costas. Respirou fundo e resolveu encarar de frente fosse quem fosse. Virou e viu: era uma menina. Seria a mesma que ele atropelara, ou tratava-se de uma terrível alucinação? Havia ainda a possibilidade de ser uma manifestação espiritual...Não teve tempo para discernir: começou a debater-se no chão. Fora de si, mordia seu próprio corpo e gritava horrendamente. Tais gritos acordaram os pais que, apavorados, invadiram o quarto.

A cena que viram os deixou pasmados. Lá estava o filho grunhindo como um semi-homem. Pensaram imediatamente na cruz — não na cruz do Calvário na qual Jesus morreu pelos pecados da humanidade, mas num crucifixo que lhes estava ao alcance da mão. E fizeram uso dele: colocaram-no, com as mãos trêmulas, diante do rosto enrijecido e bestializado do filho que continuava a morder-se no chão. E qual não foi a surpresa dos dois ao verem que o jovem pegava o crucifixo e o lançava contra a parede.

— Vamos chamar um padre! Disse a mãe do rapaz. Um padre!

— Não seria melhor um médico? Pode ser muito grave e a gente não pode perder tempo, argumentou o pai sem muita certeza do que deviam fazer.

O barulho era infernal e não demorou para que um dos vizinhos, acordado pelos ruídos anormais que se faziam ouvir na casa, entrasse no quarto de Héber.

— Que é que ele tem? Perguntou.

— Como é que eu vou saber? Eu não sei!

E a voz do pai saía quase aos gritos.

Observando um pouco mais, o vizinho sugeriu:

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— Tenho a impressão de que ele precisa da ajuda de um médium. Se o senhor quiser, posso levá-lo a um homem que o deixará bom. Quer ir comigo?

A essa altura, os pais de Héber fariam qualquer coisa para vê-lo curado e livre daquela coisa horrorosa. Entraram no carro e dirigiram-se para a casa de um médium conhecido como o velho Castro. Pararam na porta. O homem foi acordado como um médico no meio da noite. Ao ser indagado se podia atender o rapaz, respondeu afirmativamente. Tiraram Héber do carro com dificuldade e iam entrando na casa quando o médium, lá de dentro, estendeu a mão e disse:

— Não entre. Você está mal-acompanhado.

O pânico dominava os visitantes. A casa estava às escuras e o velho falava com voz pausada. O ambiente chegava a ser macabro. Depois de algum tempo, o velho médium voltou-se para o pai do rapaz, dizendo:

— Seu filho tem uma bela missão de cura.

Mas o pai, aflito e desesperado, somente respondeu:

— Isso não me interessa. Eu só quero é que você tire esta coisa do meu filho!

O velho retrucou:

— Não posso. Essa missão vem de Deus. E eu não posso tirar o que Deus deu.

A esta altura, Héber já estava voltando a si. Sentiu que havia algo estranho e amedrontador no ambiente. “O que será que me aconteceu?” pensou.

Ao despedir-se, o velho Castro, com voz solene, falou aos pais de Héber:

— Seu filho tem três alternativas: ou ele segue essa bela missão e ajuda a milhares de pessoas, ou acabará louco, ou ainda porá fim à vida através de um suicídio.

Que bela missão seria essa que o colocava entre a obrigação, a loucura e a morte? Que alternativa teria?

A Héber, tudo isso parecia pavoroso.

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CAPÍTULO II

Nos quatro anos que se seguiram não apareceu mais nenhuma outra manifestação espiritual nele. Durante esse tempo ele se sentiu estranha e profundamente atraído pelos prazeres sexuais. Entregou-se a toda a sorte de devassidão e passou a consumir uma quantidade enorme de bebida alcoólica. E foi freqüentando prostíbulos diariamente que algo anormal começou a se fazer evidente: apesar de ingerir toda espécie de bebida alcoólica, Héber jamais se embriagava.

Logo que seus amigos descobriram o fato, começaram a fazer apostas. Uma, duas, três, dez garrafas de cerveja e...nada. Ele simplesmente não se embebedava. Era estranho e divertido ao mesmo tempo. A quem não sabia que não havia bebida no mundo que o derrubasse, ele propunha uma aposta. E quantas fossem as apostas, tantas lhe seriam as vitórias. Estava para nascer o “veterano” que pudesse competir com ele.

Muitas pessoas se mostravam curiosas e alguns amigos, observadores de fenômenos espíritas, sugeriam que, na certa, era um espírito que tomava a bebida dele. Mas como? Se um espírito difere, em essência e maneira de existir, dos componentes energéticos de uma bebida! Ou será que, em vez disso, Héber, sutil e imperceptivelmente, estaria sendo possuído e dominado por entidades espirituais que, milagrosamente, o sustentavam de pé, apesar dos litros e litros de álcool por ele ingeridos?

Ele não tinha a resposta, mas de uma coisa sabia: havia nele um desejo subconsciente de morrer. Sentia-se fortemente atormentado e, quando se entregava a devaneios e prostituição, estava apenas manifestando seu desejo mórbido de gastar-se, como se o uso do seu corpo pelas prostitutas fosse capaz de consumir-lhe a vida, à semelhança de uma pedra-pomes que, pelo muito atritar, desgasta e desaparece.

Nesse mesmo tempo, ele revelou um enorme apetite por corrida de carros em estradas desertas. Dirigir em alta velocidade e realizar piruetas automobilísticas lhe proporcionavam um prazer sem medida. E foi numa dessas corridas que ele se deu conta de um intenso desejo de fazer da experiência algo semelhante a uma última viagem. Sentia um verdadeiro êxtase no fato de seus pés apertarem fundo o acelerador. Havia acabado de sair de um prostíbulo e talvez o álcool estivesse produzindo um efeito mais forte do que das outras vezes. E o pé direito obedecia ao comando da mente inebriada que ordenava: “Aperte mais. Não afrouxe. Mais fundo”.

Héber só percebeu que rodopiava, ora de cabeça para baixo, ora para cima. As três vezes que o carro capotou lhe pareciam mil voltas, como se, de repente, tivesse sido tomado por um redemoinho, até que o carro se arrebentou contra uma parede.

Estava todo amassado e os estilhaços dos vidros feitos em picadilho pintaram parte do asfalto de branco. Rostos pálidos e aflitos chegaram de todas as direções com intenção de socorrer a vítima. Mas aquele ainda não era o fim do homem que os espíritos haviam escolhido para uma missão de paz e a pequena multidão que se juntou ficou ainda mais assustada ao ver

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Héber de pé, ileso, sem nenhum arranhão ou dor de cabeça. Alguém do grupo arriscou:

— Bem que já me disseram que este rapaz é um predestinado.

Já refeito do susto, Héber passou a incluir a narração do acidente como mais uma das suas façanhas. Afinal, não é qualquer pessoa que bebe ilimitadamente sem embriagar-se ou que inutiliza um carro sem sofrer sequer um arranhão. Entretanto, o acidente não serviu apenas para ilustrar as prosas dele; funcionou também como um aviso de cautela para tamanha irresponsabilidade.

Aos poucos, ele começou a aquietar-se. Tornou-se mais caseiro e, conseqüentemente, diminuiu aquele ritmo de dissolução. Seu círculo de relacionamento mudou e seus hábitos tornaram-se mais sociais. Em vez de “pegas” de carro, passou a preferir um jogo de bingo com alguns conhecidos.

Numa dessas noites, Héber tagarelava em volta de uma mesa de bingo, entre alguns amigos, quando adormeceu repentina e misteriosamente.

— Joga, Héber. É sua vez, cutucou o vizinho de mesa.

Ele continuou parado como se não tivesse ouvido.

— Ei, rapaz, é melhor encontrar logo uma caminha.

— Que sono! Disse um outro.

— Espera aí, gente. Esse negócio está me parecendo estranho. O Héber não é de dormir cedo. E parecia tão animado ainda agora...

O rapaz continuou sentado na cadeira sem se mexer e os outros começaram a sentir um certo temor. Um silêncio pesado substituiu o falatório. Os lábios de Héber começaram então a mover-se e uma voz se elevou no meio da sala. O timbre, entretanto, não era o dele. Quem estaria se utilizando da boca do rapaz para dizer aquelas coisas?

Não demorou muito e o espírito identificou-se como sendo de um preto velho que se manifestou pedindo imediatamente cigarro e cachaça. As pessoas presentes conheciam a explicação que os espíritos dão para tal fenômeno: um espírito de um escravo estava-se servindo do médium para expressar-se, doutrinando e purificando o médium e, ao mesmo tempo, desenvolvendo-se espiritualmente a fim de alcançar melhor lugar na evolução espiritual.

Todos na sala encontravam-se estupefatos.

— Diante de uma realidade tão nitidamente espiritual, qualquer homem que não tenha sido atingido pelo vírus do materialismo tem que ficar boquiaberto, disse alguém como que pensando alto.

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O preto velho tragou o cigarro algumas vezes e soprou a fumaça para o teto. Depois, voltou-se para o grupo e anunciou com o sotaque característico:

— Este rapaz tem uma missão maravilhosa. Ele vai curar milhares de pessoas. Pouca gente há no mundo com uma missão tão bonita. Só que quando falarem isso pra ele, vai recusar.

Em seguida, cantou alguns pontos de Umbanda que Héber jamais havia aprendido. De olhos arregalados, o grupo mal podia acreditar no que via e ouvia. E, antes de ir embora, o preto velho deixou uma solene advertência:

— Digam ao rapaz que o meu conselho é que ele não rejeite a missão.

Héber não demorou a acordar. Não sabia de nada do que se passara, mas notou que havia um misto de reverência e pavor no ar. Impressionado com o assombro estampado no rosto dos amigos, perguntou:

— O que foi? O que foi que aconteceu?

E, à medida que ouvia a narrativa, o rapaz sentia um arrepio esquisito alastrar-se no corpo e seu rosto revelava uma expressão de medo e nojo de si mesmo. Ele não queria sujeitar-se a missão que os espíritos lhe determinavam, mas pensava consigo mesmo: “Como poderei eu fugir de mim? A casa mal-assombrada onde terei de viver sou eu mesmo. Esta é uma luta desigual. Como pode um homem se confrontar com os espíritos? O que é físico se confrontar com o que é espiritual? Como vou lutar contra os exus?” Apesar de toda essa pressão, ele determinou diante dos amigos:

— Eu rejeito ser médium. Não quero essa missão que pretendem me impor.

No entanto, não pôde evitar que, a partir daquele dia, coisas e vozes estranhas passassem a fazer parte do seu mundo. Nada podia fazer para impedir que seus olhos vissem e seus ouvidos ouvissem. Como das vezes, em que subia distraído a escada que o levava ao quarto, pensando em coisas absolutamente opostas a tudo o que é místico ou fantasmagórico e, de repente, ao abrir a porta, lá estava um homem enforcado bem em cima de sua cama, balançando na ponta de uma corda. Héber tinha certeza de que ia enlouquecer e gritava mais de raiva que de pavor. Tanto de dia como de noite via-se perseguido e observado por vultos. Sombras estranhas moviam-se em sua direção. Ouvia nitidamente vozes e gargalhadas. Era um inferno.

Héber questionava se seria realmente alguém atormentado por espíritos ou se poderia ser diagnosticado como um caso de esquizofrenia. Algumas pessoas que conheciam o fato achavam mais razoável dizer que o moço estava doente da mente e rotulavam o caso como o fazem alguns médicos do atendimento psiquiátrico num convênio do INPS: “Você sofre dos nervos, meu filho.” Mas Héber não tinha certeza se sofrer dos nervos seria a causa de tais pertubações ou apenas o efeito.

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Certa noite, logo que entrou no quarto, deu conta da presença de um homem idoso, com longas barbas brancas. Percebeu que o ancião era de estatura alta e que tinha olhos azuis. Ele se intimidou, mas não podia negar que era o tipo de visão que se pode chamar de cativantemente assustadora.

Com um ar de sabedoria e paciência, o homem explicou:

— Meu filho, eu vim até aqui para conversar com você. Ouça-me por um pouco. Você já imaginou quantos milhares de pessoas poderiam se beneficiar com a sua missão? Elas são pobres. Não podem pagar os médicos. Você poderá curá-las, tão-somente se entregue à missão que lhe está determinada cumpri. Filho, no Astral há médicos que podem fazer uso de você para curar toda sorte de enfermidades. Entregue-se, filho.

No rosto de Héber se desenhou uma expressão de cansaço. Já não agüentava viver sob tanta pressão. A passar os dias oprimido daquele jeito, seria melhor morrer ou entregar-se logo à determinação dos espíritos. E, não fosse a sua teimosia e, mais que isso, o seu forte desejo de viver a vida que escolhesse, teria desistido. E mais uma vez ele recusou a missão:

— Não adianta. Não me renderei. Quero ter livre arbítrio e escolher o meu destino.

Mas ele reconhecia que não suportaria aquilo por muito mais tempo e imaginava que, do ponto de vista dos espíritos, a questão seria: “até quando esse rapaz vai ser desobediente?”

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CAPÍTULO III

A luta continuou. A cada dia os vultos se tornavam mais concretos. Atrás de cada porta, ao dobrar cada esquina, ou simplesmente ao voltar-se para o lado ou para trás, a realidade era a mesma: lá estavam eles. Até a casa de Héber passou a ser um lugar mal-assombrado e tão objetivas eram as aparições que chegavam a ser confundidas com assaltos ou visitas de ladrões. Tantas quantas fossem as pessoas que estivessem na casa ouviriam os ruídos, os passos, as vozes e o arrastar dos móveis. Ninguém tinha paz.

Certa noite, alguém da família garantiu que um ladrão havia entrado em casa e, em razão disso, algumas pessoas se dispuseram a montar uma guarda para vigiar a casa. Entre eles estava o próprio Héber. Alguns amigos vieram ajudar, mas foi desnecessário pois nada aconteceu. Ou melhor, nada aconteceu enquanto Héber permaneceu acordado, pois tão logo o rapaz resolveu dormir, os vigilantes começaram a ouvir ruídos, passos e móveis que se arrastavam pela casa. Resolveram verificar e não demorou muito a que alguém constatasse:

— Olhe, aquela mesa, ela não estava ali!

E outro:

— Nem estas cadeiras. Estou certo de que as deixamos perto da janela!

Tal fenômeno passou a ser notado: sempre que Héber estava acordado, nada acontecia, todavia, bastava que ele se retirasse para dormir, e coisas estranhas começavam a suceder. A hipótese de que seria um ladrão já havia sido descartada.

Héber veio a tomar conhecimento de que, diante desses fenômenos, tanto os parapsicólogos quanto os espíritas cientilizados surgiram com a teoria do médium de efeitos físicos. Isto queria dizer que ele era uma pessoa evoluída espiritualmente, com condições psíquicas de influir sobre os elementos da matéria através de uma intensa descarga desprendida da mente. Visto sob este aspecto, Héber era um médium de efeitos físicos ou, como chamavam outros, de poderes psicofísicos.

Mas ao próprio interessado não importava o nome que dessem ao fenômeno. Farto de ouvir aquelas histórias de portas e janelas que se abriam automaticamente, de móveis que saíam do lugar e de passos que se dirigiam para a terra de ninguém, ele queria simplesmente um pouco de paz. Entendia que esse tranqüilo estado de espírito significava a possibilidade de viver de maneira normal, sem as despóticas investidas do outro mundo.

O desespero era tanto que ele nem conseguia mais dormir sozinho. Todas as noites, duas ou três pessoas se revezavam dormindo ao lado da sua cama. Só aí se pode perceber que não há nada mais concreto neste mundo do que o medo do abstrato. E naquela luta ele sofria a dor de perder o seu eu, pois a cada dia crescia a sensação de que alguém estava

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querendo ocupar o seu lugar dentro do próprio corpo. Ele experimentava a mais real de todas as formas de medo: o medo do misterioso.

Quando o homem passa do temor físico ao espanto e ao pavor está dando uma demonstração de autopreservação. A maioria dos intentos de explicar o misterioso pressupõe a coisa como já explicada — como quando os antropólogos fazem derivar o misterioso do temor dos mortos sem explicar porque justamente os mortos, seguramente a classe menos perigosa de homens, tem que provocar esse peculiar sentimento. É mais correto dizer que o medo do mundo invisível é simplesmente a manifestação da instintiva consciência de que se trata de um mundo real. Portanto, não é o mítico que se deriva do medo, mas é o medo que se deriva do mítico.

Com acuidade, qualquer pessoa perceberá que os mitos dos povos nada mais são que uma deturpação de realidades espirituais. E Héber começou a discernir isso. Na verdade, ele estava confrontando com um mundo tão real quanto aquele no qual vivia, andava e comia. Só que a dimensão desse mundo era espiritual.

Essas sensações faziam com que cada nascer de sol significasse um alívio que ia esmorecendo à medida que a noite se aproximava e o coração do rapaz se enchia de sombras e pavor. O que o aguardaria naquela noite? Era a pergunta de todos os pôr-de-sóis.

Ao abrir os olhos no meio de uma daquelas noites macabras, Héber verificou apavorado que estava sentado no parapeito de uma das janelas do segundo andar. Ficou gelado e prendeu a respiração por um momento, como se o simples fato de inflar as narinas pudesse derrubá-lo lá em baixo. “Será que eu me atiraria, caso não tivesse acordado a tempo?” pensou. “Ou será que iam me empurrar?” Ele chegou à conclusão de que preferiria acreditar que se tratava de sonambulismo a crer que havia sido vítima, mais uma vez, da manifestação do mundo espiritual enraivecido com sua recalcitrante insubmissão. Mas esta segunda alternativa se definia como a mais plausível diante do contexto de todos os acontecimentos ocorridos até aquela noite.

A essa altura, o sofrimento dele era compartilhado pelos pais e amigos que, sensibilizados com tamanho conflito, lhe demonstravam intensa solidariedade. Ao verem-no sofrer, eles também agonizavam. Os pais o aconselharam a ceder:

— É melhor você obedecer, meu filho. Nós nunca ouvimos falar de uma coisa assim. Estamos preocupados com o seu estado e, se você se tornar um médium como eles querem, pode ser que tudo isso passe.

O último suporte de Héber havia-se rompido. Nem mais nos parentes encontrava forças para continuar lutando. Ele entrou em pânico. O medo ganhou tal dimensão que o rapaz começou a pensar em suicídio. As noites eram longas e cheias de pavor. Dormir para sempre apavorava menos que sentir-se à mercê dos espíritos.

Por aqueles dias, ele amanheceu com febre. Ninguém sabia o que era aquilo, e o rapaz não podia deixar o leito. Estava terrivelmente abatido. Quando o levaram ao hospital, o diagnóstico acusou apêndice supurado. Foi um corre-corre. Como o médico garantiu a urgência da operação, os

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preparativos começaram imediatamente. Em pouco tempo aprontaram tudo e ele apenas aguardava a ordem médica para ser levado à sala de cirurgia, quando algo inesperado aconteceu. Os que estavam com ele no quarto perceberam que o rapaz havia entrado em transe. Fazia m verdadeiro discurso em inglês, língua que nunca aprendera. Logo após esta fluente manifestação de um inglês castiço, surgiu uma outra voz que se identificou como sendo de um falecido médico brasileiro chamado Adolfo Bezerra de Menezes que, em seguida, fez um aviso:

— Não permitirei que um médium meu passe pelas mãos de um médico terreno.

O doutor do astral prometeu que faria ele mesmo o tratamento necessário e pediu que lhe dessem uma faca, álcool, algodão e mercúrio. Para espanto de todos, Héber fez em si mesmo um pequeno corte do qual não saiu uma gota de sangue e, usando uma mecha de algodão, aplicou o mercúrio no talho. Enquanto agia, instava com os presentes no sentido de que orassem, a fim de que forças fossem dadas àquele que tinha tão magnífica missão.

No dia seguinte Héber estava completamente curado e, com o seu restabelecimento, um profundo sentimento de gratidão lhe invadiu o coração. Veio-lhe uma total ausência de forças para continuar lutando, e o fato é que o rapaz deixou de ter medo daqueles fenômenos. Não só o apêndice havia sofrido uma cirurgia, mas concomitantemente, operou-se uma mudança em sua mente. “Espero que esta mudança modifique também o meu coração e eu tenha a paz e felicidade que desejo”, pensava ele. Mas, no íntimo, sabia que só o futuro poderia lhe oferecer a resposta para este anseio.

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CAPÍTULO IV

Com a ausência do medo e da sensação de estar sempre perseguido — coisas estas que desapareceram completamente após a plena rendição aos desígnios do além — Héber passou a receber de maneira pacífica, diárias manifestações dos espíritos. Tais entidades se identificavam como espíritos de crianças, índios, pretos velhos, caboclos e exus. Eram espíritos rudes e com hábitos bastante grotescos.

Quando os exus baixavam sempre pediam que animais fossem sacrificados e ainda exigiam que Héber se banhasse em pólvora e sangue, à meia-noite, em um cemitério. Criado no catolicismo, ele achava que esse era um modo um tanto sinistro de expressar gratidão, todavia, conformava-se em realizar o que lhe era pedido.

Os exus manifestavam-se com personalidades diferentes. Os mais freqüentes identificavam-se com os nomes de Tupinambá, Tranca-Rua, Caveira, Sete-Flechas e Sete-Capas. Os pretos velhos também passaram a reivindicar participação no prato mediúnico e Héber os recebia de bom grado. Além de sua especialidade em defumar a casa, os pretos Angola e Pai Joaquim mandavam que o médium receitasse banhos de ervas e medicasse os doentes com plantas. Quanto aos índios, limitavam-se a seguir a linha farmacológica dos pretos velhos.

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Durante oito meses o médium esteve nas mãos desses espíritos afro-ameríndios aos quais se dedicava com toda sinceridade. Uma pequena multidão começava a afluir par investigar esses fenômenos demonstrados de maneira ingênua e sincera através de Héber. Alguns eram apenas curiosos, enquanto outros, doentes que iam em busca de cura.

Terminado esse período, as entidades revelaram a Héber que havia chegado a hora de se afastarem. Isso trouxe um novo alento para o rapaz que, acreditando ter chegado ao fim da sua missão, respirou aliviado diante do pensamento de que poderia voltar a ser aquilo que desejasse. Mas, qual não foi a sua surpresa quando os espíritos declararam que o afastamento se daria para que novas e superiores entidades passassem a usá-lo. Cederiam a vez, a grandes e importantes médicos do Astral. Para Héber, essa era uma honra sem a qual ele poderia passar perfeitamente. Mas, que fazer diante de tão elevados desígnios?

Foram-se os exus, pretos velhos, índios e crianças. Vieram os médicos do Astral. Primeiramente manifestou-se uma entidade que se identificou como Denner, um pediatra americano falecido num desastre automobilístico em uma estrada dos Estados Unidos. Este Dr. Denner afirmou também ser o mentor de Héber, e tal situação implicava em que nenhum outro espírito poderia possuir o seu médium sem sua expressa autorização. Como pediatra, cuidaria de todos os casos pertinentes à área de tratamento infantil e também pulmonar.

Não demorou muito a manifestar-se outro médico (certamente com a permissão do Dr. Denner, e é de se supor que o referido doutor tenha resolvido não fazer nenhuma restrição). Desta vez a entidade dizia-se Adolfo Bezerra de Menezes, famoso espírita já falecido — o mesmo da operação de apendicite, quando da conversão de Héber ao espiritismo.

— Eu ficarei encarregado de todos os casos de cirurgia geral, disse.

Para completar a equipe médica, veio ainda um oftalmologista chamado Dr. Luiz, o otorrinolaringologista Raul Menezes, e o Dr. Andrew Stonner, disposto a resolver os problemas mentais. Para tornar mais eclético o grupo, foi introduzido ainda — sob os auspícios da piedade sacerdotal — o Frei Fabiano, espírito que apenas recitava orações. Dentre os enfermeiros, destacou-se um, que se dizia chamar Conde da Macedônia, que curava qualquer mal ao simples toque das mãos do médium por ele usado. Sem dúvida, os espíritos estavam dispostos a usar o jovem Héber e, por isso, novas entidades continuaram se manifestando. Ao todo, formaram uma equipe de 45 médicos e enfermeiros do Astral.

Coisas tremendas e miraculosas começaram a acontecer fazendo afluir multidões num verdadeiro frenesi de cura. Todas as noites, cerca de 200 pessoas ajuntavam-se à porta da casa de Héber que, em transe, atendia uma por uma. Tão logo a pessoa entrava na sala de atendimento, a entidade revelava qual a doença ou o motivo que havia levado aquela pessoa até aquele lugar. Isso, sem que o paciente sequer tivesse aberto a boca para falar do mal que o atormentava.

Os transes passaram a ser coisa rotineira na vida de Héber. Ele se desenvolvera a ponto de entrar no transe mediúnico tão somente desejasse. Bastava concentrar-se e invocar as entidades do Astral e, quando isso acontecia, o rapaz ficava completamente fora de si.

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A sensação que sentia quando estava prestes a receber a entidade era uma espécie de calor de fogo que começava nas pernas e subia até a cabeça. Quando o calor chegava à altura da nuca, já estava fora de si.

Certa noite, ele consagrou-se como santo urbano diante da alta sociedade amazonense. Estava ele numa festa de carnaval quando, de repente, ao seu lado, uma jovem torceu fortemente o tornozelo e caiu no chão. De pronto os espíritos o possuíram e ele naturalmente saiu da mesa e ajoelhou-se ao lado da moça que se contorcia de dor. Ao simples toque dos dedos do médium ela viu-se curada. Este acontecimento conquistou a desconfiada e cautelosa alta sociedade manauara.

Tão impressionante eram os fenômenos, que a opinião pública e a imprensa começaram a cultivar forte simpatia pelo médium, conforme demonstra uma reportagem do jornal Tribuna Democrática, de Manaus, de 3 de julho de 1967:

JOVEM MÉDIUM AMAZONENSE EMOCIONA MANAUS

Centenas de pessoas buscam e obtêm diariamente na casa de Héber Soares a cura que a ciência humana lhes negou — Médicos do Astral vêm à terra para salvar os que sofrem, executando intervenções cirúrgicas em olhos, pulmões e estômagos.

Diariamente, das 15 às 23h, centenas de pessoas de todas as classes sociais formam extensa fila na Avenida Getúlio Vargas, trecho compreendido entre as ruas Rotary e Ramos Ferreira, à espera de um encontro com um jovem de pouco mais de 20 anos, cujo poder mediúnico, posto ao gratuito e desinteressado serviço do próximo, tem proporcionado um sem-número de curas que a ciência humana não explica e feito a paz e a felicidade voltarem a lares antes dominados pela dor e pela desesperança.

Esse jovem, contra quem já se volta a incompreensão de certos descrentes do amor ao próximo, é Héber Soares, filho de tradicional família do município de Coari, aqui radicado, e que, há alguns meses, ao imperativo de inequívocas forças espirituais, decidiu, juntamente com sua jovem esposa, colocar seus extraordinários dons à disposição dos que sofrem males corporais. E o mais comovente e impressionante, em toda essa cansativa atividade diária, é que Héber — nem ninguém por ele — aceita um centavo sequer pelas curas que faz.

COMO TRABALHA

Héber trabalha assistido por uma mesa auxiliar integrada pelos médiuns Waldemar Ramos e esposa, Isaac Mehil e esposa, Abraão Mehil e esposa, Cid Cabral e esposa — todos igualmente devotados à causa espiritista que tem como lema a comovente certeza de que fora da caridade não há salvação. Trata-se de um grupo de cidadãos honrados e

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trabalhadores, de profissões diversas, que subtraem, diariamente, várias horas de seus labores, para dedicá-las à seara presidida por Héber.

ENTIDADES

As entidades, isto é, os espíritos que se incorporam em Héber e, que por seu intermédio, estão realizando as curas que o povo já qualificou de milagres, são os seguintes: Dr. Denner, americano; Drs. Raul Menezes e Bezerra de Menezes, brasileiros; Andrew Stonne, inglês; e Dr. Kiriaki, japonês. Formam eles uma equipe no Astral e se incorporam, alternadamente, no médium Héber Soares, conforme o caso que surge, ou seja, conforme a doença da pessoa em exame. Pois cada uma das aludidas entidades tem uma especialidade, sendo, por exemplo, o Dr. Denner, especialista em doenças do pulmão.

INÍCIO

Héber é espírita há alguns anos. Só, no entanto, a partir de 1966, ou mais precisamente, no dia 15 de julho do ano passado, é que passou a incorporar aquelas entidades e a atender doentes que o procuravam.Há casos em que os doentes sofrem intervenções cirúrgicas, levadas a efeito pelos espíritos dos Drs. Denner, Bezerra de Menezes, Andrew Stonne, Raul Menezes e Kiriaki, em locais distantes daquele em que, no momento da operação se encontra o médium. Tal circunstância põe em realce, mais ainda, o fenômeno objeto desta reportagem. Os doentes são anestesiados e sofrem a competente incisão, sem a menor interferência física do médium — o que prova não se tratar de prática irregular da medicina por Héber Soares, a não ser que a possa, por fanatismo, ignorância ou má fé de outrem, ser acusado de ato que não se pratica.

UM CASO IMPRESSIONANTE

O Sr. Waldemar Ramos, por exemplo, residente na Avenida Getúlio Vargas, 767, e que foi a primeira pessoa operada através do médium Héber, há cinco anos sofria de úlcera no estômago e a despeito da via-crucis por vários consultórios médicos, jamais conseguiu curar-se. Ele próprio narra ao repórter a operação astral que sofreu por intermédio de Héber. Diz ele: “Há cinco anos sofria horrivelmente do estômago, recorrendo a diversos médicos da terra, sem obter grande resultado; indo a Belém, sem também obter resultado, voltei e encontrei, mandado por Deus, um servo para amenizar um pouco o sofrimento dos filhos, e o primeiro a obter cura fui eu, operando-me, astralmente, do estômago. Hoje sinto-me totalmente recuperado. Que Deus” — conclui o Sr. Waldemar Ramos — “continue a iluminar o caminho do médium Héber Soares.”

A esposa do Sr. Waldemar Ramos, Sra. Alice de Queiroz Oliveira, foi também operada pelo médium Héber, em um dos pulmões. Seu estado era grave. A intervenção astral recuperou-a para a vida e hoje, ao lado do

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esposo, não cessa de dar graças a Deus e pedir a sua proteção para o jovem médium.

OUTROS CASOS

O menor Carlos, filho do Sr. Gilson Cabral, tinha uma carne crescida no olho esquerdo. Seu pai levou-o a Héber. A equipe médica do Astral operou-o e hoje não mais exibe a excrescência ocular.

O Sr. Carlos Fernandes Prata, residente na Avenida Getúlio Vargas, 760, é outro que foi operado no estômago pelos bondosos médicos do espaço. Sofria de dores atrozes. Depois da intervenção, encontra-se inteiramente curado.

CAMPANHA

O êxito das intervenções que entidades espirituais vêm realizando através de Héber parece que já começou a provocar mal-estar em certos incrédulos. E não é impossível que venham a transformar o jovem e desprendido médium amazonense num outro Zé Arigó, o admirável médium mineiro que, a cada processo que lhe é movido, tem aumentado os seus dons espirituais, numa como que eloqüente e definitiva resposta dos espíritos superiores à incompreensão e à inveja dos descrentes do espiritismo.

Durante os cinco primeiros anos de trabalho Héber atendeu gratuitamente 85 mil pessoas em seu consultório. As filas aumentavam diariamente e o jovem médium crescia em popularidade. Afinal, diante de tão grande demonstração de bondade, poderia alguém imaginar que aquelas manifestações tinham a possibilidade de não vir de Deus?

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CAPÍTULO V

As notícias sobre o jovem médium começaram a romper as fronteiras locais e corriam o país inteiro. Já havia quem o chamasse de o Arigó de Manaus. Com a publicidade que recebia, as sessões de Héber eram motivo para que as pessoas se amontoassem a sua volta. Mas não era só a multidão que crescia, os milagres aumentavam na mesma medida.

De maneira espantosa, centenas de úlceras foram curadas: o médium entrava em transe, pedia uma faca, fazia um pequeno corte no estômago do paciente, do qual não saía sangue, mas somente um forte mau-cheiro. Tudo isso sem dor. Frenqüentemente, a cicatrização era quase imediata.

Não foram poucos os casos de câncer nos quais os médicos do Astral obtiveram sucesso, e sempre usando o mesmo método simples, utilizando na cura das úlceras. O mesmo não acontecia nas operações realizadas pelo oftalmologista do Astral: o médium entrava em transe, deslocava o globo ocular do paciente e o trazia para fora da órbita, removendo, então, o mal. Apesar de provocar grande agonia nos espectadores, tal cirurgia não causava a menor sensação de dor ou desconforto no paciente.

Nos casos de catarata, a operação era de aparência deveras grotesca: o médium deslocava a catarata com a unha e a removia com um algodão.

Mas foi o caso de uma criança surda-muda que despertou em Héber uma emoção especial. Durante um período de trinta dias, o menino compareceu ao consultório do médium duas vezes por semana. Na consulta, apenas era ministrada à criança uma prece com as mãos do médium sobre a cabeça do paciente. No fim daquele mês o garoto estava bom.

O insólito de tais fenômenos despertou a curiosidade de pesquisadores espíritas em todo o país. Tal era o interesse que a mediunidade de Héber estimulava que as pessoas não mediam distância para serem atendidas por ele. De todas as grandes capitais brasileiras chegavam doentes que desejavam a cura dos seus males. Finalmente, a Federação Espírita do Amazonas propôs ao médium algumas experiências espirituais que seriam de grande valia para suas pesquisas. Héber aceitou.

Na primeira tentativa de testar seus poderes mediúnicos, ele se deixou encerrar num estúdio à prova de som, completamente fechado, onde ligaram um gravador com uma fita virgem. Absolutamente sozinho dentro da sala, o jovem médium concentrou-se e entrou em transe imediatamente. Permaneceu nesse estado durante cerca de uma hora e, tão logo despertou, os técnicos da Federação Espírita se apressaram em ouvir a gravação. Não foi pequena a surpresa deles quando ouviram a música e os sons de pássaros cantando na floresta. Que poder seria

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aquele? Qual seria a sua fonte? Eram perguntas que ficavam no ar sem nenhuma resposta.

Ansiosos por descobrirem qual a energia potencial da capacidade mediúnica de Héber, os curiosos pesquisadores sugeriram uma nova experiência: desta vez, tentariam materializar algumas das entidades do além. Ele aceitou a segunda proposta e submeteu-se diligentemente a uma indispensável dieta de preparação. Tal preparação implicava em abstinência de carne, álcool e sexo. Durante 15 dias comeria apenas vegetais.

Terminado este período de jejum, ele foi trancado em uma sala acompanhado de mais outras quinze pessoas. Toadas deveriam concentrar-se fortemente na idéia da materialização de alguma entidade.

Dez minutos depois de intensa concentração dos quinze companheiros, e já em transe, Héber começou a expelir pela boca, nariz, ouvidos e até pelo umbigo uma espécie de fumaça, que se costuma chamar de ectoplasma. A substância flutuava na sala indo concentrar-se gradualmente num único ponto do ambiente e não demorou a que tomasse forma. Lentamente uma figura de mulher apareceu. Uma vez concluída a materialização, a substância com forma humana andou até uma cadeira disponível, onde assentou-se.

Apresentou-se como Irmão Angélica, uma freira, e trouxe o seguinte recado:

“A finalidade desta experiência é preparar o jovem Héber para ser o médium mais desenvolvido do planeta. Em breve, os médicos deste mundo se levantarão, tomados de inveja, e tentarão destruir o seu trabalho, proibindo-o de atender a curar. No entanto, é intenção dos espíritos que ele desenvolva a sua capacidade de materialização a fim de que possa, mesmo distante, permanecer em transe enquanto a substância plasmática atenderá aos pacientes. E assim, ninguém duvidará da genuidade das manifestações.”

Na verdade, não muito depois deste dia, o Conselho Regional de Medicina do Amazonas levantou-se ferozmente contra a prática da medicina nas sessões de Héber. Chegaram mesmo a processá-lo e mandar prendê-lo. Entretanto, quando o chefe de polícia deu a ordem de prisão ao médium, seu sobrinho adoeceu misteriosamente. Não havia médico ou remédio que desse solução ao caso do garoto até que Héber se propôs a ajudá-lo. Uma vez estabelecido o contato entre eles, o menino foi imediatamente curado. Diante de tão forte evidência de que o sobrenatural atuava na vida daquele homem, o chefe de polícia recusou-se a prendê-lo.

Depois desse incidente com o Conselho Regional de Medicina, Héber tentou desenvolver sua aptidão para a materialização. Conseguiu repetir o fato três vezes, sempre por pouco tempo e apenas no ambiente da substância plasmática.

A essa altura, os seus guias começaram a avisar-lhe que o seu tempo no Amazonas havia terminado. Era hora do médium tornar-se um fenômeno nacional. O rapaz arrumou as malas e partiu para o sul do País.

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O sucesso das suas realizações continuou em São Paulo, no Rio Grande do Sul e na Bahia, onde também curou uma quantidade enorme de enfermos. Seu poder mediúnico se comprovava onde quer que ele estivesse. No entanto, os guias afirmavam que o seu lugar era no Rio de Janeiro. E foi exatamente para lá que ele se dirigiu.

CAPÍTULO VI

“Médium amazonense que já curou 85 mil pessoas está no Rio de Janeiro”. Foi assim que o jornal O Dia, de 29 de março de 1968, anunciou em primeira página a visita de Héber à Cidade Maravilhosa.

Na realidade, o jovem médium já era um nome nacional, pelo menos no conceito geral dos espíritas. Mantinha contato com Zé Arigó, Chico Xavier e com o baiano Divaldo Franco, indubitavelmente três celebridades do espiritismo no mundo.

Desde os primeiros dias na cidade, Héber teve ocasiões de manifestar os poderes espirituais que o acompanhavam. A imprensa não poupou espaço para divulgar sua missão no Rio (na época, Guanabara). Até mesmo na Argentina, a conceituada revista espírita La Idea, órgão da Confederação Espírita Argentina (nº 491— fevereiro de 1968) publicou interessante artigo sobre sua capacidade mediúnica.

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Deixou de ser surpresa para Héber o fato de ler seu nome nos jornais cariocas, muitas vezes em grandes manchetes de primeira página. Uma delas tinha o seu lado engraçado apenas por causa de um detalhe que o jornalista não deixou de registrar: é que o paciente tinha alguns escudos do Vasco incrustados nos dentes. Foi assim que O Dia documentou a cura do torcedor vascaíno:

MÉDIUM CUROU TORCEDOR DO VASCO QUE ESTAVA MAL

Após ter sido desenganado por três médicos, que não conseguiam diagnosticar seu mal, João Ferreira da Silva, o Cartola, torcedor fervoroso do Vasco da Gama, procurou o parapsicólogo amazonense Héber Almeida Soares e obteve cura conforme nos disse ontem.

Abrindo um largo sorriso e mostrando escudos do Vasco incrustados nos dentes, Cartola afirmou que há cinco anos sofria do mal e que nenhum médico conseguia descobrir sua origem.

“Foi um amigo” — contou — “que me indicou o espírita de Manaus, conhecido como Arigozinho. Fui a ele e expliquei meu caso: uma tosse noturna que não me deixava dormir há cinco anos. Começava como o chiado dos asmáticos e vinha subindo, até formar um bolo na garganta. Ele pegou minhas mãos e acabou por indicar-me determinado remédio. Tomei a poção e nunca mais tossi.”

Agora, feliz porque seu Vasco é líder absoluto do campeonato e porque ficou livre da tosse incômoda, Cartola veio até nós para endereçar seu agradecimento ao médium.

Mas a grande popularidade que Héber conseguira como médium não o poupou da necessidade de trabalhar, já que os médicos do Astral não lhe permitiam cobrar consulta, pois diziam que ele “havia recebido de graça e de graça tinha que dar”. E, naqueles dias de intenso trabalho nos centros, mas de real escassez na despensa do médium, um antigo amigo apareceu em sua vida. Tratava-se de um repórter que ele conhecera em Manaus, numa das entrevistas que concedeu à imprensa.

Esse velho conhecido empregara-se como repórter num dos jornais do Rio de Janeiro e Héber solicitou-lhe uma ajuda no sentido de encontrar trabalho nesse jornal. Conseguiu o lugar de vendedor de publicidade.

O dono do jornal não demorou a perceber que, além de médium, aquele moço era um ótimo negociante e, após seu nítido destaque na venda de anúncios, o amazonense foi promovido a Chefe de Publicidade. Mas a conquista de Héber não se deu somente no campo profissional, pois ele ganhou também o coração do dono do jornal, um iminente político, forte candidato ao governo do Estado — como de fato o foi.

A mística da pessoa de Héber, associada ao seu gênio comercial, fazia dele um desigual concorrente a promoções. Além disso, era dotado de uma fantástica capacidade para fazer novas amizades.

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Certo dia, um colega o abordou, comentando o insucesso de alguns vendedores que tentaram vender um espaço no jornal para uma importante companhia de refrigerantes.

— Ninguém tem conseguido a menor chance, Héber. E é uma pena. Uma empresa tão rica... Não sei o que têm contra nós...

Héber se sentiu desafiado. Não podia admitir tamanha falta de êxito e tratou de estudar um plano de ataque que lhe possibilitasse convencer os diretores da empresa a anunciar no seu jornal. Após verificar como abordar os responsáveis pelo departamento de marketing daquela gigantesca companhia, estabeleceu o primeiro contato. Além de ter-se tornado uma questão de honra, a venda do anúncio marcaria um importante tento para futuras promoções. E havia ainda o considerável lucro da comissão...

Para o dia do primeiro encontro com o diretor de publicidade, Héber não dispensou roupa e sapatos novos. Mesmo assim, foi com uma certa insegurança que ele atravessou a sala, passando diante da elegante secretária. Consciente de que o poder de decisão estava nas mãos do outro e de que uma resposta negativa lhe seria demasiadamente frustrante, ele expôs suas intenções entre nervosos movimentos de trocar de pernas. O outro o fitava, inabalável, como se as maiores novidades sobre as formas de pagamento a ele apresentadas fossem coisas tão pouco interessantes como o é para um ancião moribundo a chegada do verão.

Não houve necessidade de que a palavra não fosse pronunciada. Estava estampada no rosto do homem que ele mantinha a conversa somente por uma questão de educação. Agradecido pela atenção, mas pigarreando nervosamente, Héber deixou a sala, passando pela secretária sem a mesma cortesia anterior.

Saiu chutando pedras. Ah, que raiva! Foi somente em casa, depois de muita reflexão, que resolveu criar novo ânimo e não se render ao primeiro obstáculo. “Essas coisas têm que ser resolvidas mesmo é com o dono da companhia. Falar com subordinado é o mesmo que nada. E eu não me chamo Héber se não conseguir chegar ao mandão lá de dentro”, decidiu com veemência.

Durante as próximas semanas, ele se pôs a vigiar os portões da companhia. Engendrava estratégias. Formulava planos. Precisou contar com algumas informações importantes e praticamente subornou um guarda a quem presenteou com alguns exemplares do seu jornal. E foi dessa maneira que descobriu quem era o dono da empresa, onde morava, e qual o dia e a hora em que viria ao Rio de Janeiro para o próximo encontro com a diretoria.

De posse desses dados, só lhe restava esperar. E, no dia marcado, lá estava Héber vigiando o portão da empresa. Ficou lá, de pé, até que, finalmente um luxuoso carro dobrou a esquina, avisando com o sinal luminoso que entraria. Logo o vigia subornado a troco de jornais fez um OK com a mão. Era o homem.

O carro aproximou-se macia e lentamente. Um guarda, cioso em demonstrar toda solicitude, apressou-se em abrir o portão da fábrica. Mas, tão logo o carro começou a entrar, Héber correu do seu posto do outro lado

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da rua e, rompendo a vigilância, entrou juntamente com ele. Antes que alguém pudesse impedi-lo de abordar o presidente da empresa, o rapaz bateu no vidro da janela com alguns toc-toc-toc, despertando tanto a curiosidade como o temor do empresário.

Alguém se aproximou e pediu ao rapaz que se retirasse. Sem dar a menor atenção ao braço que o circundava, dando demonstração do quanto ele era indesejável naquele lugar, começou a dizer em tom de súplica:

— Por favor, senhor, eu preciso da sua ajuda!

Perturbado com o apelo, e sem entender direito o que se passava, o velho fez um gesto com a mão que deveria ser interpretado como uma ordem para que o rapaz se aproximasse. Livre dos braços do guarda, Héber, trêmulo, achegou-se ao carro.

— Que é que você deseja? Indagou o empresário.

— Eu sou vendedor de anúncios e quero vender um espaço para a sua indústria, explicou Héber, sem se deixar desconcertar pelo tom direto do homem e muito menos pelo ridículo da situação.

A resposta foi tão objetiva quanto a pergunta:

— Então, o senhor deve dirigir-se ao diretor de Marketing e Publicidade. Não a mim.

— Eu já fui. Ele não se interessou.

Diante disso, o empresário soltou um “lamento muito”, e afastou-se sem se despedir, andando em direção à portaria. Mas, antes que ele desaparecesse de vista, Héber ainda gritou, numa última tentativa:

— É o meu ganha-pão. O senhor poderia ao menos me ouvir!

O homem voltou-se, girando rapidamente sobre o calcanhar, e esbravejou:

— Você é um insistente! Teimoso! Um chato!

Mesmo assim, qualquer coisa naquele moço fez com que o velho retrocedesse.

— Vou dar cinco minutos a você.

Vitória! Ele sonhara com essa possibilidade, mas agora... mal podia acreditar! Com um gesto, ao mesmo tempo forte e íntimo, o experiente e bem sucedido empresário fez sinal ao rapaz para que o seguisse.

Uma vez introduzido na ante-sala do presidente, as próximas duas horas foram ocupadas na observação dos inúmeros diplomas e condecorações pendurados na parede. Primeiro, olhou-os todos de relance, mas o tempo de espera se alongava e o remédio era reparar cada um em todos os detalhes. Seu pensamento se perdeu olhando as fotografias da

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fábrica, ainda pequena, quando esta era apenas o ideal de um homem tão sonhador quanto ele.

Uma a uma, as revistas da sala de espera foram sendo folheadas e postas de lado, até que, após um rápido atendimento telefônico na linha interna, a secretária lhe disse:

— O senhor pode entrar.

CAPÍTULO VII

Todo homem ousado tem um quê de timidez, pois assim como a valentia de certos indivíduos está no pavor que o perigo lhes apresenta, também a ousadia de muitos tem a sua origem num certo tipo de timidez. A timidez mórbida mergulha o homem nas regiões abissais da introversão, mas a timidez não-mórbida por vezes o desafia a afirmar-se como pessoa, num violento salto comportamental que pode ser rotulado de ousadia. Pois foi nesse misto de timidez e ousadia que Héber entrou no gabinete do presidente.

A conversa iniciou meio reticente, mas logo os dois estavam à vontade e, inexplicavelmente, o velho empresário pôs a falar de si mesmo, de seus ideais e até de alguns problemas.

— Eu gosto de gente como você, rapaz, que acredita no que faz e no que vende, confessou o industrial.

Héber não sabia se devia dizer qualquer coisa ou se, simplesmente, ouvia. Se falava, logo percebia que o seu assunto era tão desinteressante quanto o é para um homem-pássaro, acostumado à sua asa-delta, ouvir um garoto falar da sensação que se tem quando se brinca com uma pipa ao vento. Por isso, preferiu se limitar apenas a concordar afirmativamente com a cabeça na hora certa ou soltar um hum-hum de vez em quando.

Na verdade, ele quase não ouvia o discurso do homem à sua frente, pois a dúvida sobre como se comportar convenientemente naquela situação o perturbava tanto que ele resolveu deixar as respostas a cargo da sua intuição.

De repente, o homem deve ter-se lembrado de que a maior luta do executivo é contra o tempo porque cortou a conversa e perguntou à queima-roupa:

— O que você quer mesmo, rapaz?

Pego de surpresa, Héber respondeu sem rodeios, pois viu que não tinha mais tempo para encompridar aquela prosa:

— Bom, eu desejo vender um espaço para anúncio no jornal para o qual eu trabalho. Já falei com seu Diretor de Marketing, mas ela mostrou-se totalmente desinteressado.

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— Não se trata disso. Ele simplesmente cumpriu ordens vindas de S. Paulo, já que decidimos não investir, por enquanto, em publicidade. Entretanto, vá a S. Paulo e eu verei o que posso fazer por você. Aliás, eu só farei isso porque gosto de gente como você, disse o velho.

— Bem... eu fico muito agradecido. Mas acho que seria difícil para mim. O senhor sabe, eu não tenho nenhuma ajuda do jornal para viajar até lá, e mesmo que eu diga que já falei com o senhor, quem vai acreditar nessa história?

Antes que ele terminasse esta série de queixas, o presidente meteu a mão no bolso e tirou a quantia correspondente a uma passagem de ida e volta a S. Paulo pela ponte aérea, e a entregou ao rapaz.

Héber não contava com tamanha solidariedade e foi emocionado que conseguiu dizer:

— Puxa! Eu não tenho como agradecer... eu não sei mesmo o que dizer... Muito obrigado.

Saiu da sala apertando o dinheiro dentro do bolso. Desceu as escadas, atravessou o estacionamento, acenou com a cabeça para o guarda que o havia ajudado, e apanhou o primeiro ônibus para a sede do jornal. Mal podia esperar para contar a notícia aos amigos, apesar de saber que não seria levado a sério até que aparecesse com o contrato na mão. Talvez, por isso, antes mesmo de chegar ao jornal, ocorreu-lhe uma nova idéia. Na realidade, não parecia muito brilhante, mas ele se convenceu da possibilidade de vê-la executada.

Na manhã seguinte, rumou bem cedo para o Aeroporto Santos Dumont, pois descobriu que o executivo pernoitaria no Rio e iria para S. Paulo no dia imediato. Sabendo disso, ele se assentou num dos bancos do hall de espera do aeroporto e resolveu que viajaria no mesmo avião que o empresário.

Foi uma longa espera até que ele visse o mesmo carro que entrara na fábrica parar diante do aeroporto. Viu quando o velho desceu acompanhado do secretário que lhe carregava as malas. Com um ar despreocupado, o homem esperou que seu secretário se desvencilhasse das bagagens e dos bilhetes. Feito isto, o industrial entrou para a sala de espera. Héber tratou de marcar o seu bilhete imediatamente, mas achou melhor não entrar na sala. E, uma vez vinda a ordem do embarque, foi propositadamente, o último a entrar no avião.

Cinco minutos após a decolagem, Héber levantou do seu lugar e se sentou ao lado do executivo, esbarrando levemente no seu braço. O velho tirou dos olhos uma dessas tapadeiras escuras que se usa para dormir durante o dia e, fitando rapidamente o rapaz, disse:

— Você é mesmo insistente, moço. Mas é assim que se chega lá.

Trocaram rápidas palavras durante o vôo, e, já em S. Paulo, Héber aproveitou a carona para a fábrica. Na recepção, o presidente recomendou que ele fosse encaminhado ao Diretor de Publicidade e Marketing.

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A resposta do homem foi ainda mais direta do que a do seu colega do Rio de Janeiro: “Nós não temos verbas para esse tipo de anúncio”. Mas dessa vez Héber não perdeu o controle. Algo dentro dele dizia que sua chance de ganhar continuava de pé e, tranqüilamente, aguardou que o presidente terminasse sua reunião de diretoria para fazer a última tentativa. Logo que o viu o empresário perguntou:

— E então, já fechou o negócio?

— Não, respondeu Héber, ele me disse que não há verbas.

O presidente resmungou alguma coisa entre os dentes, mas Héber só ouviu a última frase: “...é um absurdo!” E, num movimento rápido, pegou o telefone e disse à secretária para chamar toda a diretoria de volta à sua sala.

Héber teve que retornar mais uma vez à sala de espera e, só depois de duas horas, foi convidado a entrar no gabinete da presidência. E, diante do mesmo diretor que há pouco o desiludira, o velho lhe disse:

— Nossa diretoria acaba de votar uma verba para colocar um anúncio diário no seu jornal.

O próprio Héber teve a sensação de estar sendo iludido — da mesma maneira como se sentia ao ver filmes de espionagem, onde tudo termina num final feliz. Mas o sorriso respeitoso dos cavalheiros assegurava a sua vitória. Os cumprimentos se seguiram, mas o mais caloroso deles foi o do velho presidente que parecia satisfeito em ter premiado a perseverança daquele jovem.

Somente quando já estava no avião, sentado confortavelmente e rememorando os acontecimentos dos últimos dias, é que ele se deu conta que esse capítulo da sua vida fora vivido, pensado e executado sem as interferências do Astral. Achou interessante essa observação, ainda mais porque o sucesso do seu empreendimento o havia deixado com uma suave sensação de bem-estar. E foi desse modo que ele, deixando o aeroporto no Rio, foi direto para a sede do jornal.

Essa conquista serviu para aproximá-lo do dono do jornal, pessoa que tinha, na ocasião, muita chance de ser indicada ao governo do Estado do Rio de Janeiro. Seu prestígio também cresceu no jornal. No entanto, isso não impediu que, durante esse período de intenso trabalho publicitário, ele deixasse de atender a muitos doentes todas as noites em várias sessões espíritas da cidade.

Para a mente do médium não havia cansaço, pois o transe anulava totalmente a sua consciência.

Entretanto, o corpo movimentava-se horas seguidas durante cada sessão: falava, operava, receitava, fazia preces, etc... Daí, no dia seguinte, ele sentir-se um pouco fatigado. Isso começou a afastá-lo das sessões, mas o afastamento durou pouco. Logo os guias o advertiram de que ele deveria procurar um jeito de conciliar as coisas. Precisava trabalha durante o dia e atender nas sessões, à noite. Tratava-se de sacrifício.

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Nesse meio-tempo, Héber encontrou-se amistosamente com o presidente da companhia de refrigerantes em alguns restaurantes, quando das visitas do empresário ao Rio de Janeiro. E foi num desses encontros que o rapaz revelou sua identidade de médium e narrou os fatos e fenômenos que envolviam sua vida. Isto fez com que o velho industrial, além de admirar sua ousadia, passasse a respeitá-lo também pelos seus poderes paranormais. À medida que crescia o bom relacionamento com o cliente, também aumentava o seu prestígio no jornal.

Num daqueles dias, ele foi chamado ao telefone pela secretária do empresário. Este contato não foi demorado pois o recado somente dizia que Héber fosse encontrar o industrial num determinado restaurante à hora do almoço. Sua ansiedade tornou-se visível. “Nunca se sabe o que um pedido tão lacônico pode encerrar: se uma demonstração de intimidade e amizade ou se um aborrecimento cujo desabafo será feito pessoalmente”, pensava.

Héber foi o primeiro a chegar no restaurante, o que era de se esperar, tal a quantidade de vezes que olhara para o relógio naquela manhã. Excitado, beliscava os frios que estavam sobre a mesa entremeando com rodelinhas de torradas. Mas nem para passar a manteiga sobre as fatias desviava os olhos da porta de entrada.

Finalmente o empresário chegou no mesmo carro que, para Héber, deixava de ser apenas um veículo. Era um símbolo e, naquele momento, uma incógnita. O velho assentou-se descontraído numa cadeira diante dele que foi se sentindo aliviado pela maneira amistosa como estava sendo tratado. O tema da conversa variava, mas não chegaram a tratar nada sério. Somente após escolher o cardápio é que o industrial começou a falar como homem de negócios. E foi num tom discreto e baixo que disse:

— Recentemente, tive um desgosto muito grande na fábrica aqui no Rio.

— Que foi que aconteceu? Perguntou Héber para demonstrar sua solidariedade.

O velho refrescou a garganta com um pouco de água mineral, e disse:

Eu tinha aqui um homem de muita confiança e foi justamente por isso que o fiz meu gerente de compras. Mas descobri que ele estava roubando a empresa e o despedi.

Héber não podia ver onde é que ele entrava nesta história toda, já que não conhecia nada na área de administração de empresas. O que teria ela a ver com uma dificuldade como aquela? Por acaso, o velho pretenderia recorrer aos seus poderes mediúnicos para escolher um novo gerente? Ou será que essa confissão veio da necessidade que aquele homem de elevada posição tinha de compartilhar seus sofrimentos e perdas? A Héber era impossível avaliar as razões daquele velho e experiente empresário. E foi realmente muito assustado que ouviu aquela frase à queima-roupa.

— Eu preciso de um homem como você para ocupar o lugar.

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— De mim?

— É, de você, respondeu o homem. Preciso de você para ser meu gerente de compras. Nesse caso, o crédito de confiança é ainda mais importante do que a competência.

— Eu lhe fico muitíssimo grato. Mas... o senhor sabe, eu preciso de um tempo para pensar... ouvir opiniões de amigos... Afinal, eu não entendo nada desse assunto, disse Héber.

Ficou acertado que ele teria o tempo necessário para refletir. E, no jornal, ele dirigiu-se imediatamente para a sala do proprietário. Falou-lhe da proposta do presidente da fábrica de refrigerantes e da sua dívida de gratidão para com o homem. Após toda a explicação, o dono do jornal disse:

— Héber, provavelmente eu serei indicado pelo Presidente da República para ser governador do Estado do Rio de Janeiro. Se você continuar comigo, penso que suas chances serão bem maiores. Pense nisso.

Para ele, a palavra do seu patrão soava como infalível profecia e, por isso, decidiu não pensar mais no assunto. “Eu não tenho porque sair daqui. O melhor mesmo é acabar com todo esse sentimentalismo”. E esperou a próxima visita do dono da fábrica ao Rio para dar-lhe sua resposta.

Desta vez, Héber estava ainda mais nervoso do que no primeiro encontro à porta da fábrica. É difícil para um homem honesto e grato dizer não a alguém a quem se deve favor. Mais difícil do que enfrentar a vergonha pública. “Se eu resolver dizer sim não terei que enfrentar esse terrível embaraço. Basta dar uma resposta positiva. Bem... mas, infelizmente, há horas na vida de um homem que, por mais honesto que ele seja, manifesta-se o fato de que o universo tem tantos centros quantos homens nele existem. A preocupação com a minha prosperidade é muito natural”, justificava-se.

Novamente o conhecido carro apontou e, como sempre, causou o mesmo impacto sobre o rapaz. Após uma breve e gentil saudação, resolveram sentar-se numa mesa bem no canto, onde poderiam conversar mais tranqüilos.

Com muito cuidado, Héber enumerou os motivos pelos quais não poderia aceitar o honroso convite. Mas o velho empresário, colocando a mão sobre o braço do rapaz, disse:

— Você se lembra do nosso primeiro encontro? Naquele dia eu também não poderia ter atendido o seu pedido. Mas o fiz. Sabe por quê? Simplesmente porque você disse que precisava da minha ajuda. Pois bem, desta vez, sou eu que preciso de você. Preciso, não da sua competência, mas da sua honestidade.

Para um jovem de trinta anos de idade, uma declaração como essa tem o valor da mais elevada condecoração. Foi por isso que ele não pôde

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recusar o pedido. Transferiu-se para a indústria de bebidas, assumindo o cargo de Gerente de Compras.

CAPÍTULO VIII

No início foi difícil habituar-se ao movimento de compras da fábrica, mas não demorou para que ele se mostrasse plenamente familiarizado com o ritmo das coisas no seu novo dia-a-dia. Começou a demonstrar suas habilidades e logo se podia notar que, além de ser uma pessoa digna de toda confiança, ele era ágil, esperto e ótimo negociante. E, fruto desse trabalho, recebeu sua primeira promoção. Fizeram-no Subgerente da fábrica. Mas o crescimento da produção foi tão sensível que logo passou a Gerente Geral.

Assim, num espaço de aproximadamente três anos de empresa. Héber logrou realizar façanhas que poucos têm conseguido. Passou rapidamente de Gerente-Geral no Rio, a Delegado Especial da Diretoria de São Paulo e, em seguida, foi eleito Diretor da Fábrica em São Paulo e Presidente no Rio de Janeiro.

A esta altura dos acontecimentos, ele já era até um dos nomes colunáveis da página de Ibraim Sued e sua casa, na Ilha do Governador, além de luxuosa, era muito bem freqüentada. Esta conquista de prestígio social e sua rápida ascenção na empresa o impediam de freqüentar, como de costume, os antigos centros espíritas. Não era apenas uma questão de status. Acontece que suas noites encontravam-se quase sempre tomadas por inúmeros compromissos.

Foi aí que Héber ouviu falar de uma sessões realizadas no bairro carioca de Botafogo, onde elevadas patentes das Forças Armadas costumavam procurar orientação. Tal revelação não provocou a menor admiração. Ele sabia que por trás de estrelas e condecorações de um uniforme militar, existe um homem com todas as necessidades espirituais peculiares à criatura, em cujo coração Deus colocou o espaço da eternidade.

Apesar de a referida sessão ser extremamente fechada e de, quase literalmente, só ter acesso a ela as pessoas que conheciam a senha do lugar, ele foi convidado a ministrar doutrina, sabedoria e cura àqueles homens. O convite o deixou feliz. Ele acreditava que deveria cumprir sua missão onde quer que se apresentasse uma oportunidade e via a boa intenção e seriedade com que as pessoas buscavam a doutrina kardecista naquelas reuniões.

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Nessas sessões, em Botafogo, Héber mostrou todo o poder dos médicos do Astral e isto fez com que sua fama crescesse ainda mais entre as altas camadas do Governo. E não demorou muito a que fosse chamado à Presidência da República para atender ao chefe maior da Nação, que estava sofrendo de uma enfermidade na perna. É claro que este fato nunca veio ao conhecimento público.

Não foram poucos os serviços que os médicos do Astral prestaram em Brasília a eminentes autoridades do Governo. A influência de Héber era tal que, em determinado momento de escolha de governadores no país, havia em um dos estados três nomes com possibilidades de serem escolhidos e o médium foi solicitado. Hospedado num excelente hotel, ele deveria, em transe, receber dos espíritos a indicação de qual dos nomes era o mais viável em face do nevrálgico momento político daquela região.

Também, na fábrica de refrigerantes, sua influência aumentava. Aliás, cresceu tanto que ele começou a ter liberdade para deixar as autoridades do Astral opinarem nos encontros da diretoria. Não raras vezes, diante de problemas difíceis, foram os guias que orientaram a empresa sobre como encontrar a melhor saída. Finalmente ele recebeu um documento da Direção-Geral que lhe dava autorização para comprar ou vender qualquer bem ou propriedade para a empresa, dentro do País.

Era o auge. Ele tinha conseguido ser um invejável empresário e, ao mesmo tempo, manter suas práticas espirituais. A sessão em Botafogo o mantinha em atividade, pelo menos uma vez por semana.

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CAPÍTULO IX

Foi com sincera tristeza que Héber recebeu a notícia de que o velho empresário havia adoecido. Ele habituara-se a vê-lo forte e decidido na cabeceira da mesa de reuniões da diretoria. Gostava de almoçar com ele e aprender com a sua experiência. Enfim, o velho era um verdadeiro amigo. A morte do industrial veio como um golpe. Ao contrário do que se imaginava, aquele foi um tempo de grande dor e sofrimento para o rapaz.

Alguns suspeitavam que, com a morte do proprietário da empresa, Héber seria fatalmente o herdeiro, já que o velho não tinha filhos. No dia do enterro, alguns diretores chegaram a lhe dar os parabéns, dizendo: “Muito bem, rapaz. Você mereceu”. Entretanto, o testamento do empresário nunca foi achado. Um parente próximo assumiu a direção da empresa.

Para Héber era o fim. Ele sabia quanta inveja lhe consagravam os demais diretores. O ambiente se tornou hostil. Uma noite, vendo que não havia mais lugar para ele na fábrica, redigiu uma carta demitindo-se da companhia.

Em meio a tudo isso, uma outra notícia veio abalar seus nervos: a mulher com a qual ele vivia também o traíra e abandonara. Sua renúncia formal da diretoria da empresa mais o afastamento da mulher fizeram dele um homem desiludido e angustiado. Viu-se presa de uma terrível tensão nervosa. Com a separação da mulher, perdeu grande parte dos seus bens, pois o seu gênio comercial não conseguiu fazer dele um machão.

Sem rumo, deixou-se conduzir pelas influências. Desejava ardentemente ver o Rio de Janeiro pelas costas, na esperança de virar aquela página triste e tumultuada da sua vida. E foi em meio à dor, ao vazio, à humilhação e à incerteza que ele partiu para a Argentina. Entregou-se à boêmia enquanto gastava altas quantias nas boates e casas de tango. Deixou-se consumir pelos prazeres, ao mesmo tempo em que via o dinheiro que lhe restara desaparecer como areia fina entre seus dedos. Só voltou quando nada mais lhe restava.

Quando um homem foi humilhado profissionalmente e traído pela mulher do seu amor, não há no mundo ambiente mais terapêutico e acolhedor do que a casa paterna. E Héber achou o caminho do lar desiludido, infeliz.

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De volta a Manaus, não mais como o Arigó do Amazonas, como lhe chamavam antes, nem como Dr. Héber, o importante executivo, que surpreendeu o povo da sua cidade ao assinar um cheque de vultosa quantia para adquirir a fábrica que a companhia comprou naquele Estado, os dias foram difíceis. Chegou sem pompa e sem comitiva. Foi obrigado a trabalhar como médium à noite e a procurar emprego durante o dia. Ninguém lhe oferecia nada.

Por esse tempo, ele apaixonou-se. Rita lhe parecia doce a amiga. Os dois descobriram um ponto comum que os aproximou de imediato: o desemprego. Rita era formada em Direito mas, como ele, não conseguia encontrar trabalho. Através daqueles primeiros contatos, nasceu uma grande amizade. Ele sentia um suave bem-estar nos momentos em que Rita estava por perto.

O namoro começou e a presença constante de Rita passou a ser o maior desejo dele. A moça também sabia que seu coração já pertencia àquele rapaz. E, apesar das dificuldades financeiras, os dois resolveram logo marcar a data do casamento.

Enquanto Héber não conseguia um emprego fixo, viviam das pequenas quantias que o jovem conseguia através de pequenos e incertos negócios comerciais. Até que, de repente, teve um estalo. Lembrou-se de um amigo que morava em Belém, a quem prestara alguns serviços espirituais. Tinha a impressão e que havia um parente daquele homem em Manaus que dirigia uma grande companhia. E foi nessa esperança que telefonou para Belém e contou sua situação ao amigo. Héber quase pulou quando ouviu a voz que vinha do outro lado da linha:

— Não se preocupe mais. Seu problema já está resolvido. Vá amanhã à Companhia de Águas e procure o Sr. V.B. Tenho certeza de que vai conseguir uma colocação. No dia seguinte, ele estava empregado. O salário era muito pequeno, mas era melhor do que nada.

Até então, Rita não tinha tido sequer a sorte do marido. Continuava desempregada. E foi motivada pelo desespero que começou apelar para a macumba. Havia chegado à conclusão de que os espíritos que atuavam no marido não podiam fazer absolutamente nada por ela. Afinal, por que razão o esposo teria ficado tanto tempo sem trabalho. Os espíritos podiam ou não podiam? Ou será que não queriam?

Apesar dos rituais macabros e da invocação dos espíritos, nada melhorou em relação a ela. Simultaneamente à crise do desemprego, Rita foi acometida por uma outra muito mais séria, uma intensa crise existencial. Sua alma queria paz e seu espírito ansiava por um lugar de refrigério. Nem a macumba nem o espiritismo kardecista lhe tinham proporcionado isso. Algumas questões começara a surgir no coração da moça. Dentre elas, uma especialmente lhe pertubava: “Por que os espíritos podem curar e fazer o bem ao corpo das pessoas, mas não lhes podem dar paz?”

Na verdade, ela achava que havia uma total ausência de paz nos olhos sempre inquietos do marido. Ou então, era exatamente o oposto: quando estava em transe, seu olhar era mórbido e gelado, parecido com o que vira numa foto do médium Chico Xavier.

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A tal ponto esses conflitos lhe cresceram no coração que acabaram por minar e, finalmente, destruir sua fé no espiritualismo. Agora, quando ia ao cemitério, às segundas-feiras, o fazia apenas para acompanhar o marido que resolvera apelar para a linha forte dos espíritos. Héber chegara à conclusão que estes decidiam mais pragmática e urgentemente os problemas das pessoas. Mas nem assim conseguiu melhorar sua situação econômica. Tampouco foi atenuada a crise de existência no coração de Rita.

CAPÍTULO X

Num crescendo, as angústias se avolumaram na alma da moça. Sem saber por onde começar, de uma coisa Rita tinha certeza: precisava de ajuda. Mas onde buscar? Em que porta bater? Em que sessão ou igreja? Com quem, afinal, poderia conversar e expor suas ansiedades? Quem

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desejaria ouvi-la com paciência e, ainda por cima, teria uma palavra de Deus para ela?

Alguém lhe falou de um homem que poderia ajudá-la. Tratava-se de um advogado que deixara a carreira para ser pastor. Rita guardou a informação e nem mesmo teve coragem de compartilhá-la com o marido. Enfiou na bolsa o nome e o endereço, mas não se atrevia a procurar o homem. Justamente um pastor? Mas não iria agüentar por muito tempo. Sua capacidade de conviver com tamanha angústia estava no fim e, um dia, sentada ao lado do marido, dentro do carro, Rita sentia sua alma gemer. Parecia que havia borboletas voando no seu estômago. Uma sensação terrivelmente forte de desassossego. Pediu num fio de voz:

— Héber, eu não agüento mais. Leve-me a um homem na Rua Urucará, 880, na Cachoeirinha...

— È padre ou espírita? Indagou Héber.

— Não, disse Rita. É um pastor.

— Pastor ?! O que é que você quer com um pastor? Indagou ele tomado de surpresa.

— Você não pode compreender... mas, não me impeça, por favor, disse.

Héber manobrou o carro e tomou o caminho do endereço indicado pela mulher. Parou diante da casa.

— Vou ficar no carro. Vá sozinha. Acho até melhor: você ficará mais à vontade.

Rita bateu palmas. Uma senhora atendeu e Rita lhe perguntou se poderia falar ao Pastor Caio Fábio.

— Sente-se por um momento, convidou a mulher, ele virá num instante.

Apreensiva, Rita imaginava o que seria uma conversa com um pastor. “Que será que ele vai fazer?”

Seus pensamentos foram interrompidos pela chegada do pastor, que a saudou com mansidão. Conversaram, a princípio, superficialmente. Até que Rita começou a sentir que poderia confiar naquele homem. E ao abrir o coração pôs-se a chorar copiosamente, compartilhando com ele a sua dor.

A conversa durou aproximadamente uma hora. Depois de ouvi-la sem a menor interrupção, o pastor lhe falou sobre a paz de Cristo e do seu perdão manifestado a nosso favor na cruz do Calvário. Para Rita, o conjunto de palavras não era novo, mas a maneira compassiva, amorosa e convicta com que lhe foram apresentadas pelo pastor, encheram seu coração de conforto e alegria. Nada, entretanto, sobre o seu envolvimento com o espiritismo e com a macumba fora mencionado nesse primeiro

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encontro. Sua aflição era tão grande que Rita esqueceu de mencionar esses fatos. Apenas falou da sua profunda angústia.

Ao se despedirem, o Pastor Caio disse à moça:

— Minha filha, eu gostaria muito que você conversasse com o meu filho que também é pastor. Nós temos o mesmo nome, só que o nome dele tem Filho no final. No momento, ele está na Europa, mas voltará dentro de alguns dias. Se você quiser ter um contato com ele, basta procurá-lo na igreja. Ele está sempre lá durante a parte da manhã, fazendo aconselhamento pastoral.

Para Rita, a conversa foi verdadeiramente terapêutica. E, antes que ela saísse, o pastor ainda lhe fez outro convite:

— Olhe, assista o programa que meu filho apresenta na televisão todos os domingos às doze e trinta. Ele tem sempre uma mensagem para as pessoas que estão como você.

Já tranqüilizada e de coração leve, a moça entrou no carro. Héber foi logo perguntando:

— O que é que você tem?

— Achei! Gritou Rita euforicamente.

— Achou o que, menina? Insistiu o marido.

— Achei paz. Achei amor. Achei verdade, Héber. É disso que você também está precisando, meu querido. É disso! Falou.

Rita não se esqueceu de que o filho do pastor estava para chegar de viagem por aqueles dias. E, após o tempo que julgou ser suficiente para o seu retorno, resolveu ir procurá-lo na igreja. Só que, dessa vez, Héber estava decidido a entrar com ela. Queria ver o que havia de tão especial numa simples conversa.

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CAPÍTULO XI

Eu estava dentro do templo naquela manhã de quinta-feira, quando os vi pela primeira vez.

O casal entrou e assentou-se num dos bancos enquanto eu terminava de atender alguém. Tão logo ficou concluída essa conversa, fiz sinal para que se aproximassem. Saudei-os em nome de Jesus, perguntei pelos seus nomes e em que eu lhes poderia ser útil. Rita explicou sobre o encontro com papai e falou do que sentira depois daquele dia.

À medida que ela falava, minha atenção se voltava constantemente para Héber. Intrigantemente, eu sentia que o grande problema daquelas vidas estava mais enraizado nele. Nos primeiros minutos, a conversa foi apenas uma retrospectiva da conversa de Rita com papai. Em seguida, comecei a falar para eles sobre a maneira como Deus havia entrado na minha vida.

Contei-lhes da minha adolescência envolvida com as drogas e de como minha vida fora terrivelmente angustiada a partir de então. Compartilhei com eles minhas antigas experiências existenciais e o vazio que havia no meu coração. Falei-lhes do clímax tanto no abuso das drogas quanto no desespero que eu já não podia suportar. Disse-lhes de quando pensei em suicidar-me. Mas não somente isso. Relatei-lhes a maneira maravilhosa como Jesus manifestou-se a mim, salvando-me da morte e libertando-me do vício e da prostituição. Quando acabei esta narrativa, Héber chorava muito.

Depois de se refazer do impacto que as minhas palavras causaram aos seus sentimentos, ele disse:

— Até hoje, o que mais me perturba é um terrível vazio que sinto no coração. Até hoje, nada o preencheu... Eu não agüento mais viver desse jeito.

Foi então que lhes falei da doutrina da salvação pela fé única e exclusiva em Cristo. E orei com eles.

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Marcamos um próximo encontro para daí a alguns dias.

Ao sair do templo naquela manhã, o casal cruzou com um presbítero da igreja que vinha chegando. De longe, pude notar que se cumprimentaram, mas nada mais pude perceber além disso. O presbítero se aproximou de mim e perguntou:

— Mas... o que é que eles estavam fazendo aqui?

— Eles estão muito aflitos e vieram à procura de uma palavra de conforto, respondi.

— Pastor, mas então você não sabe com quem estava falando? Aquele homem é uma das maiores autoridades em fenomenologia espírita no Brasil, disse o presbítero.

E foi assim que eu fiquei sabendo quem era Héber. A informação me foi útil. Ter mais esse dado me permitiria ajudá-lo de uma forma mais eficaz da próxima vez.

Na semana seguinte, ele e a esposa apareceram novamente na igreja. Trocamos algumas idéias sobre a desintegração familiar, tema que ele mesmo abordou. Fiz referência a um dos nossos programas de televisão que havia tratado do assunto e, após essa introdução discutida descontraidamente, eu perguntei que tipo de doutrina eles tinham com respeito ao mundo dos espíritos.

— Era precisamente sobre isso que nós queremos conversar com você hoje, disse Héber.

— Pois bem, eu gostaria que vocês falassem o que pensam sobre o assunto, disse.

Rita tomou a iniciativa:

— O Héber diz que uns espíritos do além tomaram conta dele e que, quando eles se manifestam, ele não se lembra de nada. Só que eu, a essa altura do campeonato, nem sei mais se acredito. Veja só: se são reais, nunca nos ajudaram a sair dos nossos problemas.

Héber, então, narrou minuciosamente a sua história desde o começo até aquele dia.

Rita concluiu:

— A história é tão fantástica que, no início, eu não sabia se acreditava. Depois, verifiquei que tudo era verdade. Exceto a questão dos espíritos, porque, para mim, ainda há a chance de tudo ter sido produzido na mente dele.

O marido retrucou, dizendo que havia coisas que excediam em muito a capacidade da mente mais desenvolvida. Garantiu ainda que ele não tinha dúvidas de que entrava em contato com outro mundo, e que as imagens que vira no início não tinham nada de mera ilusão.

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— Elas eram quase palpáveis, disse.

Eu tentava não mostrar nenhuma expressão facial. No meu rosto não se podia ler aprovação ou censura. Não podia tolher a possibilidade de que eles se sentissem absolutamente à vontade. E, só depois de ouvir toda a narrativa, foi que me animei a fazer comentários.

Comecei a arrazoar com eles a respeito da ressurreição de Cristo. Expliquei-lhes que Jesus era uma pessoa histórica e que isso poderia ser provado. Depois de assentar a pedra fundamental da historicidade de Cristo, falei-lhe da sua ressurreição. Narrei os acontecimentos que o Novo Testamento registra sobre as aparições de Jesus. Expliquei-os um a um. E, depois, eu lhes disse que Jesus, com a sua ressurreição, ganhara para si o direito de ser a pessoa mais respeitada dentre todas as conhecidas, pois ele realizara uma proeza que nenhuma outra pessoa havia conseguido.

— Bom, disse, este mesmo Jesus, cuja palavra tem que ser respeitada e crida, ele mesmo afirmou que a Bíblia é a Palavra de Deus.

Após colocar esses três fundamentos, a saber, que Jesus é histórico, que ele ressuscitou e que a Bíblia é a Palavra de Deus, pedi que lessem comigo o que a Bíblia diz sobre o espiritualismo.

Primeiramente, li Deuteronômio 18:9 até 12. Está escrito:

“Quando entrares na terra que o Senhor teu Deus te der, não aprenderás a fazer conforme as abominações daqueles povos.

Não se achará entre ti quem faça passar pelo fogo o seu filho ou a sua filha, nem adivinhador, nem prognosticador, nem agoureiro, nem feiticeiro; nem encantador, nem necromante, nem mágico, nem quem consulte os mortos; pois todo aquele que faz tal coisa é abominação ao Senhor; e por estas abominações o Senhor teu Deus os lança de diante de ti.”

Mal eu acabei de pronunciar esta última frase, Héber se apressou em explicar:

— Mas eu não sou bruxo ou macumbeiro. O meu espiritismo é kardecista. É de mesa branca. Só faz o bem.

Eu lhe pedi que lesse novamente o começo do texto. Ele leu:

— “Não se achará entre ti quem faça passar pelo fogo o seu filho ou a sua filha”.

— Isso é magia negra, disse eu.

Ele continuou, até que leu:

— “... nem quem consulte os mortos.”

Fiz sinal com a mão, e perguntei:

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— Que tipo de espiritualismo se dedica à doutrina da mediunidade e da reencarnação?

— O espiritismo kardecista, respondeu.

— Então, por favor, prossiga a leitura, e veja se Deus faz alguma diferença entre a magia negra e o espiritismo kardecista, pedi.

Ele concluiu a leitura na parte que diz: “... pois todo aquele que faz tal coisa é abominação ao Senhor.”

— De que nome Deus chama o espiritismo?

— De abominação, respondeu Rita. Meu Deus! Eu estou com medo e muito arrependida!...

Então, eu prossegui na minha tarefa de mostrar o que a Bíblia dizia sobre o assunto.

No capítulo 19 do livro de Levítico, esta prática é chamada de contaminação. Vejamos: “Não agourareis nem adivinhareis” (v.26); “Pelos mortos não ferireis a vossa carne; nem fareis marca nenhuma sobre vós” (v.28); “Não vos voltareis para os necromantes, nem para os adivinhos; não os procureis para serdes contaminados por eles: eu sou o Senhor vosso Deus” (v.31).

Em Isaías 2:3, o espiritualismo é chamado de corrupção do Oriente: “Pois tu, ó Senhor, desamparaste o teu povo, a casa de Jacó, porque os seus se encheram da corrupção do Oriente e são agoureiros como os filisteus, e se associam com os filhos dos estranhos.”

No texto de Isaías 8:19, Deus faz uma irônica interrogação sobre a consulta aos mortos. “Quando vos disserem: Consultai os necromantes e os adivinhos, que chilreiam e murmuram, acaso não consultará o povo ao seu Deus? A favor dos vivos se consultarão os mortos?”

Zacarias, o profeta, chama o espiritualismo de consolação vazia: “Porque os ídolos do lar falam coisas vãs, e os adivinhos vêem mentiras, contam sonhos enganadores, e oferecem consolações vazias; por isso, anda o povo como ovelhas, aflito, porque não há pastor” (Zc 10:2).

Em Malaquias 3:5, o Senhor diz que será testemunha veloz contra os espiritualistas: “Chegar-me-ei a vós outros para juízo; serei testemunha veloz contra os feiticeiros, contra os adúlteros, contra os que juram falsamente, contra os que defraudam o salário do jornaleiro e oprimem a viúva e o órfão, e torcem o direito do estrangeiro, e não me temem, diz o Senhor dos Exércitos.”

No livro dos Atos 8:9, Lucas chama de ilusão a prática da mágica: “Ora, havia certo homem, chamado Simão, que ali praticava a mágica, iludindo o povo de Samaria, insinuando ser ele grande vulto.”

Em Atos 16:16, a adivinhação é considerada fonte de lucro: “Aconteceu que, indo nós para o lugar de oração, nos saiu ao encontro uma

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jovem possessa de espírito adivinhador, a qual adivinhando, dava grande lucro aos seus senhores.”

Na cidade de Éfeso, a queima do material espiritualista é recebida como o prevalecer da Palavra do Senhor: “Também muitos dos que haviam praticado artes mágicas, reunindo os seus livros, os queimaram diante de todos. Calculados os seus preços, achou-se que montavam a cinqüenta mil denários. Assim, a palavra do Senhor crescia e prevalecia poderosamente.” (At 19:19-20).

Em Gálatas 5:19-21, a feitiçaria é incluída nas obras das trevas: “Ora as obras da carne são conhecidas, e são: prostituição, impureza, lascívia, idolatria, feitiçarias, inimizades, porfias, ciúmes, iras, discórdias, dissenções, facções, invejas, bebedices, glutonarias, e coisas semelhantes a estas, a respeito das quais eu vos declaro, como já outrora vos preveni, que não herdarão o reino de Deus os que tais coisas praticam.”

E, finalmente, o livro de Apocalipse traz consigo duas terríveis advertências para os espiritualistas: “Quanto, porém, aos covardes, aos incrédulos, aos abomináveis, aos assassinos, aos impuros, aos feiticeiros, aos idólatras, e a todos os mentirosos, a parte que lhes cabe será no lago que arde com fogo e enxofre, a saber a segunda morte.” E também: “Fora ficam os cães, os feiticeiros, os impuros, os assassinos, os idólatras, e todo aquele que ama e pratica a mentira.” (Ap. 21:8 e 22:15).

Após a explicação da Palavra de Deus, eu perguntei se eles queriam rejeitar definitivamente o espiritismo. Héber perguntou:

— Mas, quem são esses espíritos que me possuem?

— São anjos caídos que se disfarçam e jamais seres humanos desencarnados, respondi.

Héber não ficou contente com esta resposta. Argumentou que “tudo o que os espíritos diziam e faziam eram coisas que só entidades falecidas é que poderiam saber”. Tomei novamente a palavra e disse:

— Imaginem um ser invisível que existe há milênios e que é muito mais inteligente do que Einstein. Além disso, imaginem que esse ser desenvolveu uma cultura científica, sendo, portanto, um sábio milenar. Em relação aos homens, ele poderia ser chamado ainda de um psicólogo milenar. Assim são os demônios. Por serem invisíveis, eles podem ver e estudar as pessoas sem serem vistos. Podem obter conhecimento durante anos e anos, já que não morrem. Podem guardar e computar dados e informações sobre qualquer homem, conhecendo detalhes de sua vida, talvez até melhor que os próprios homens. E, por isso, não é difícil entender como conseguem parecer-se tanto com os seres humanos falecidos.

Contei também como papai e eu já nos havíamos confrontado com centenas de casos de possessão. E que, em alguns deles, essas pseudo-entidades do Astral, ora dizendo-se médicos, ora, parentes de suas vítimas, tinham sido obrigadas a confessar as suas verdadeiras identidades quando nós lhes dizíamos: “Em nome de Jesus Cristo, dize o teu nome para

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que todos saibam quem tu és.” Depois dessa ordem, os espíritos do além diziam: “Eu sou demônio e estou aqui para enganar.”

Expliquei ainda que esses espíritos do Astral não conseguem dizer que Jesus Cristo é o próprio Deus que se fez carne para destruir as obras do diabo. Contei como, diversas vezes, eu já confrontei os espíritos com essa confissão teológica e como eles não conseguem terminar a frase sem que caiam para trás espumando. Mostrei-lhes, então, 1 João 4:2, texto que revela que quem não pode confessar essa doutrina, não procede de Deus, e sim, do diabo.

Aí, Héber me interrompeu:

— Mas qual o interesse dos espíritos nesse engano?

— Há fortes razões para que os espíritos enganem, fazendo o bem. A primeira delas é para que a pessoa seja desviada da cruz de Cristo e da salvação pela fé. Veja bem; se uma pessoa se convence de que aqueles que se manifestam em uma sessão espírita são espíritos humanos desencarnados, ela deixará de buscar a sua salvação em Cristo pela fé, pois a salvação não se dará mediante o arrependimento e a fé em Jesus, como a Bíblia ensina, e sim mediante a reencarnação e a mediunidade, dando-se prosseguimento ao processo de evolução espiritual. E, se esta última hipótese fosse verdadeira, nós teríamos que tirar duas conclusões: a primeira, é que o sacrifício de Cristo foi inútil, pois há outras chances de salvação. A segunda, é que o espiritismo vive uma grande contradição, porque afirma que Jesus foi o maior e o mais evoluído espírito de luz que já passou pelo planeta. Nesse caso, a contradição é que esse espírito de luz esteve enganado com relação à parte mais fundamental da sua doutrina, ou seja, que os homens salvar-se-iam dos seus pecados, crendo na sua morte vicária na cruz do Calvário, quando na verdade, bastaria que, para obter a salvação, os homens praticassem boas obras e encarnassem algumas vezes.

E eu levei Héber a concluir comigo:

— Se essa contradição é admitida, tem-se que, em nome da coerência, admitir mais uma coisa: é impossível saber se o que os espíritos ensinam é verdade. Se o maior espírito de luz, Jesus, se enganou com relação à parte fundamental da sua doutrina, por que, então, os espíritos de menos luz, como Kardec, estariam certos? Se Kardec estava certo e Cristo, errado, então, Kardec tinha mais luz do que Cristo. Você acha que Kardec tinha mais luz do que Cristo?

— Mas é claro que não, respondeu Héber.

— Então, continuei, tem que admitir que é impossível saber a verdade sobre a verdade, pois o mais elevado dos espíritos de luz, Jesus, enganou-se. E, se ele se enganou, é justo pensarmos que os de menos luz possam estar enganados também.

Eu disse que havia ainda outra razão para os espíritos enganarem com a ilusão das curas:

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— Imaginem o que pensaria um pequeno peru logo que eu o levasse para o meu quintal no princípio do ano. Certamente que, no começo, ele ficaria arisco, mas, depois que visse o meu interesse em vê-lo engordar, passaria a me admirar. Por volta de julho, já estaria gordo e também muito grato a mim. Em novembro, ele diria, se pudesse: “Que homem bom, esse pastor. Ele só me faz o bem”. Pobre peru! Mal sabia que na noite de 24 de dezembro, totalmente depenado, ele estaria bem assado na minha mesa de Natal. Olhe, Héber, me perdoe essa grotesca comparação, mas essa é a estratégia do diabo. Ele faz o bem para ceifar uma alma agradecida e zombar da sua ingenuidade.

Concluí, dizendo ao casal:

— A única razão porque penso que os espíritos ensinam e fazem o bem nas sessões de mesa branca é porque, assim, eles podem envenenar os homens bons que amam a vida e a sinceridade. Observem: se um homem quer suicidar-se e eu o odeio, eu dou a ele veneno e ele o tomará. Mas, se eu odeio e quero matar um homem que ama a vida, então não posso lhe dar veneno, pois ele não o tomará. Nesse caso, precisarei armar uma estratégia para matá-lo. Terei que atraí-lo, fazendo-lhe o bem. Talvez até eu pudesse lhe oferecer um maravilhoso jantar e, aí, sim, colocar veneno na sua comida sem que ele percebesse.

A macumba é o veneno para os que querem morrer, pois quem a ela recorre não está enganado. Lá não se faz sigilo sobre o mal que se tenciona fazer. Todavia, o espiritismo kardecista é o jantar gostoso que se serve ao homem que ama a vida e que não deseja morrer. Ambas são estratégias do diabo para atingir pessoas diferentes. Com a macumba, ele oferece veneno aos desesperados. Com o espiritismo, um jantar envenenado aos bem-intencionados.

Deus deu graça a Héber e a Rita. Eles compreenderam o que eu lhes estava querendo dizer. Após perceber que eles haviam entendido, eu lhes perguntei:

— Vocês estão dispostos a renunciar ao espiritismo e virem a Jesus? Eu posso lhes garantir que ele perdoará os seus pecados; que encherá os seus corações de paz, e que não permitirá que os espíritos atormentem as suas vidas. Nunca mais.

O casal unanimemente afirmou que gostaria de ser de Jesus. Eu, então, orei com eles, entregando aquelas vidas ao Senhor.

Antes que se fossem, eu recomendei que não deveriam voltar, por nenhum motivo, a qualquer sessão espírita. E garanti, em nome de Jesus, que Héber jamais se tornaria a receber nenhum espírito, tão somente se agarrasse a Cristo.

Eles creram na Palavra que eu lhes dissera e partiram em paz.

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CAPÍTULO XII

Héber não apareceu na igreja no domingo seguinte. No meio da semana, tivemos uma rápida conversa pelo telefone. Ele me contou que havia se preparado para ir ao culto mas que, inexplicavelmente, foi acometido de um frio irremediável. Agasalhou-se como pode, mas nada foi suficiente. E, ainda por cima, havia o ridículo de sair agasalhado em uma noite de calor intenso. Disse-lhe que teríamos no domingo seguinte, às oito horas da noite, um alegre culto de louvor. Aconselhei-o a ir.

Na referida noite, percorri o auditório com os olhos algumas vezes na esperança de encontrá-lo. Foi inútil. Ele não estava lá. Logo cedo, na segunda-feira, tivemos um outro contato por telefone e a explicação foi semelhante à primeira:

— Ah, pastor! Imagine que eu estava de saída para o culto quando comecei a sentir um calor terrível, horroroso. Não houve chuveiro que me aliviasse. Que coisa! Eu fico sem saber o que fazer.

— Não desanime, Héber. Eles vão tentar resistir. Não vão entregar os pontos facilmente. Mas você não deve temer. A Bíblia diz, em Tiago 4:7, o seguinte: “resisti ao diabo e ele fugirá de vós”.

Em seguida, orei por ele, e repreendi aquela obra maligna em nome de Jesus.

Aquela foi a última investida objetiva dos demônios sobre Héber. A partir daquele dia, todas as ações dos espíritos contra ele foram subjetivas ou circunstanciais.

Paradoxalmente, as mais terríveis lutas que ele teve de enfrentar vieram da parte da sua família. Seus parentes não podiam admitir que ele deixasse o espiritismo. Justamente aqueles que, no princípio, o apoiaram

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na sua luta contra os demônios, agora o pressionavam enormemente para voltar às sessões.

Héber, no entanto, permaneceu firme. Quase rompeu relações com alguns parentes por causa desse seu engajamento com Jesus. Chegou mesmo a ser ameaçado por alguns, que olharam para sua atitude como heresia contra os autênticos e belos princípios kardecistas. Nas ruas, ele não tinha sossego. Gentilmente se esquivava dos freqüentes convites para as sessões. Quando explicava sua nova posição, via diante de si os olhos estupefatos dos seus antigos admiradores. Alguns arriscavam: “É uma fase. Logo passa”.

Seus conflitos com o kardecismo aumentaram especialmente depois que ele deu um testemunho de libertação através do nosso programa Pare e Pense na televisão. O vídeo-tape foi distribuído para nove estados do País e produziu um tremendo impacto. A enorme quantidade de cartas que recebemos mostrou a intensidade da reação. Todavia, o maior choque que o programa produziu foi mesmo em Manaus, onde Héber, ainda hoje é conhecido de toda a população.

Ele passou a ser cercado na rua. Alguém lhe disse:

— Foi por sua causa que eu me tornei espírita. Como é que você me abandona?

Outros tentavam lhe convencer de que “ser crente não tá com nada”. Havia ainda aqueles que lhe chamavam de vira-casaca. Os mais carinhosos preferiam uma forma mais cativante:

— Meu filho, você trouxe luz ao nosso caminho. Não nos deixe sozinhos.

Embora percebesse e se sensibilizasse com a acusação, esses confrontos não mais conseguiam perturbar o rapaz. Então, o diabo usou uma nova estratégia para tentar dissuadi-lo a abandonar a fé em Jesus: atingiu o coração de Rita. Ela, que tanto o havia estimulado no começo, passou a ser o maior tropeço em sua caminhada de fé. E o inexplicável é que ela não desejava atrapalhá-lo, só que não conseguia deixar de fazê-lo.

De repente, Rita se viu possuída por um febril e exacerbado ciúme do marido. Sentia-se rival de tudo e de todos, principalmente do trabalho dele. É bem verdade que, naqueles dias, ele exagerou um pouco, a fim de resolver alguns problemas da fábrica de sabão onde ocupava o cargo de Gerente. Andou trabalhando aos sábados e atendendo chamados aos domingos. Mas esse ativismo não merecia ser vingado com as ameaças e agressões que Rita lhe atirava tão logo botava os pés em casa. Não foram poucas as vezes que eu e papai o socorremos depois de um forte desentendimento com a esposa.

A separação acabou por acontecer. Ele estava arrasado com a determinação de Rita de não mais viver com ele. Papai e eu interferimos. Conversamos com o casal. Oramos com eles e por eles. Até que, finalmente, veio a libertação.

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Estávamos numa semana especial de louvor na igreja. O Pastor Paulo Brito era nosso convidado especial e o ambiente era de sincera adoração ao Senhor. Foram reuniões verdadeiramente celestializadas pela ação do Espírito Santo.

Lembro-me perfeitamente da reunião de domingo de manhã, quando o Espírito Santo invadiu o coração de Rita com a maravilhosa manifestação de alívio e cura interior. Recordo-me de que, no final daquela reunião, seu rosto estava tranqüilo e descontraído.

A partir daquele dia, Deus começou a trabalhar no temperamento dela. A cada dia, a mudança tornava-se mais visível. A amargura começou a ser retirada do seu coração. E, ainda que sempre haja no caráter humano o que ser extirpado, uma substancial cura divina foi operada no caráter e no temperamento dela.

Héber sentia-se aliviado. Era como se um pesado fardo houvesse sido retirado dos seus ombros. O casal começou a ajustar-se. Estavam felizes. Quer dizer, quase felizes. Só faltava uma coisa: eles queriam um filho. Apesar de nada fazerem para evitar, Rita não engravidava. E aquela tristeza pairava como uma nova ameaça ao casamento.

Foi por isso que, certa noite, após uma reunião de oração na casa de meu pai, eles manifestaram o desejo de receber uma oração específica sobre a esterilidade de Rita. Meu pai impôs as mãos sobre ela, pedindo ao Senhor que, assim como fizera a Ana (de acordo com a narrativa do primeiro capítulo do primeiro livro de Samuel), também operasse a sua graça sobre Rita.

Passados apenas dois meses, Héber entrou um dia lá em casa, sem caber em si mesmo, tamanha era a alegria do seu coração. Rita engravidara.

O nascimento de Héber Júnior veio solidificar o ajustamento do casal, que o Senhor havia começado naquela manhã de louvor na igreja.

Depois desse livramento que Jesus lhe suscitou e à sua casa, a vida do casal passou a correr tranqüila e sem maiores turbulências. O período convulsivo havia terminado. Era como se o mar tivesse cessado o seu rugido. Passou a tormenta e as ondas se acalmaram. A superfície atormentada cedera a vez à bonança. O Senhor “assim os levou ao desejado porto”.

Percebi que o momento era de discipulado cristão. Héber necessitava de uma aprendizagem mais profunda e, foi por isso que pedi ao presbítero João José — hoje pastor — que se encarregasse de programar encontros de estudos bíblicos com o casal. João José teve um importante papel no crescimento espiritual dos dois e, depois que a Palavra de Deus começou a produzir efeito na vida de Héber, logo seus dons espirituais começaram a se manifestar.

É fácil constatar-se que ele não é um pregador. Ele se exprime de maneira prática e objetiva, mas esta sua capacidade é tão grande que, se fosse ele o autor desta narrativa, ela, por certo, ficaria reduzida a um décimo do que o que aqui está. E nos seriam roubados ricos detalhes da

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sua história. Por isso, ele não é um pregador. Ele simplifica demais os fatos. No entanto, ele tem outros dons. Um deles ocupa, na minha opinião, importantíssimo lugar na Igreja de Cristo. Trata-se da intercessão. Héber é um homem que se deleita na oração. Às vezes, chega às raias do pragmatismo e reduz toda e qualquer situação a um momento de oração.

Seu coração descobriu na oração o soro da vida. Ele se sente desafiado a orar e consegue levar o povo de Deus a curvar os joelhos diante do Senhor em preces constantes. Também o jejum é parte importante em todo o exercício espiritual que ele pratique. Já tem vencido quatro e até cinco dias em abstinência de qualquer alimento. E todo esse esforço espiritual é feito de maneira espontânea, ingênua e, às vezes, quase infantil. Mas Deus tem recompensado esse imenso investimento de amor, abençoando sua vida, inclusive na área financeira.

Hoje Héber é conhecido na Igreja Presbiteriana Central de Manaus pelos célebres jejuns de vinte e quatro horas que ele tem desafiado a igreja a realizar. Sua vida é um testemunho vivo e eficaz de que o espiritismo é uma fraude sutil e cativante. Mas, de maneira mais forte ainda, a experiência dele serve para comprovar que Jesus é o grande libertador dessas almas enclausuradas nas trevas.

Para falar a verdade, um dos grandes sonhos que eu acalento no meu coração é o de, um dia, poder ter um programa de televisão, em horário nobre e rede nacional, onde eu possa apresentar testemunhos fortes como esse de Héber, a fim de despertar o nosso país para a realidade. Mostrar o que o espiritismo representa para uma nação.

O profeta Miquéias (5:15) diz que Deus “tomará vingança” dos corações que se envolvem com médiuns e feiticeiros. Por isso, nossa alma arde de desejo de anunciar, como amor, inteligência e intrepidez, essas verdades ao povo brasileiro.

Minha profunda oração, enquanto escrevo este capítulo, é que o Espírito Santo esteja dando testemunho da verdade ao coração do leitor. Nestes não numerosos, porém intensos, anos de pastorado, Deus tem-me permitido a confrontação com centenas de pessoas envolvidas pelo mesmo drama de Héber. Pessoas presas pelas mesmas amarras. E sempre tenho tido o privilégio de ver Deus libertar essas pessoas.

Já tem havido casos nos quais temos estado, meu pai e eu, diante desses espíritos ilustrados e, presumidamente de luz. Estes, geralmente, se apresentam como um ser humano desencarnado que aqui estão tentando ajudar e doutrinar os fiéis, além de estarem trabalhando no desenvolvimento do médium. Acontece que, quando nós entramos no lugar onde estão e perguntamos: “Qual é o teu nome? Fala, em nome de Jesus”, a resposta que ouvimos é sempre a seguinte: “Eu sou demônio e aqui estou para enganar”.

Portanto, ao escrever esse livro, não tive a intenção de agredir os espíritas e, sim, um forte desejo de desferir um golpe no espiritismo. Não há no meu coração qualquer direcionamento inquisitivo com relação aos espíritas. Há, sim, uma grande abertura e um forte amor.

Olho para o espiritismo como olho para o diabo sutilmente disfarçado. Considero-o mais perigoso do que a macumba mais satânica,

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justamente por causa da sua sutileza. Através do espiritismo as almas humanas são submetidas a um terrível logro. E como eu gostaria de ver o Chico Xavier salvo e lavado no sangue de Jesus! Ele precisa da mesma libertação que Héber recebeu.

CAPÍTULO XIII

Sinto-me completamente à vontade para falar de todas estas coisas. Não temo a nenhum dos males que qualquer espécie de feitiçaria ameace fazer. Isto porque eu creio nas promessas de Jesus que garantem segurança aos crentes no confronto com essas forças hostis. Vejamos algumas dessas maravilhosas promessas:

1. O Crente é santuário do Espírito Santo. “Acaso não sabeis que o vosso corpo é santuário do Espírito Santo que está em vós, o qual tendes da parte de Deus, e que não sois de vós mesmos? Porque fostes comprados por preço. Agora, pois, glorificai a Deus no vosso corpo” (1 Co 6: 19-20)

O Espírito Santo não é um visitante esporádico na vida do crente. É morador definitivo e não se ausenta de sua morada. Paulo garante que não há possibilidade de convivência entre Cristo e o Maligno (Rm 8:9 e Ef 2.2). “Que harmonia entre Cristo e o Maligno?” (2 Co 6:15a).

2. O Espírito Santo é zeloso pelo seu santuário. “Ou supondes que em vão afirma a Escritura: É com ciúme que por nós anseia o Espírito que ele fez habitar em nós?” (Tg 4:5)

O Espírito Santo é a pessoa da trindade santa para a qual mais Jesus reivindicou o nosso cuidado, seja na análise de fatos ou no evitar palavras precipitadas. “Por isso vos declaro: Todo pecado e blasfêmia serão perdoados aos homens; mas a blasfêmia contra o Espírito Santo não será perdoada. Se alguém proferir alguma palavra contra o Filho do Homem, ser-lhe-á isso perdoado; mas se alguém falar contra o Espírito Santo, não lhe será perdoado nem neste mundo nem no porvir” (Mt 12: 31-32).

Atribuir as obras de Jesus ao poder de Belzebu, o maioral dos demônios, já era pecado e blasfêmia contra o Espírito Santo que estava sobre Jesus (Lc 4: 18-19), pois o Espírito Santo não pode ser veículo usado por Satanás. Diante de tal santidade e zelo, será possível admitirmos que o Espírito Santo permitiria a entrada de força maligna em seu santuário? Louvado seja o seu nome porque ele não o permite.

3. O Crente é propriedade de Deus. É maravilhosa a declaração de Paulo em Efésios 1.13-14: “Em quem também vós, depois que ouvistes a palavra da verdade, o evangelho da vossa salvação, tendo nele também crido, fostes selados com o Espírito Santo da promessa; o qual é penhor da nossa herança até ao resgate da

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sua propriedade em louvor da sua glória”. No verso 14, os crentes são chamados de “propriedade de Deus”. O sublime em tudo isto é que o Espírito Santo é o “penhor” da nossa ressurreição futura, ou seja, a garantia de que não estamos órfãos (Jô 14: 16) e de que seremos transformados na ressurreição (1 Co 15:52). A presença do Espírito Santo em nós é a garantia de que somos propriedade de Deus.

“Vós, porém, sois raça eleita, sacerdócio real, nação santa, povo de propriedade exclusiva de Deus, a fim de proclamardes as virtudes daquele que vos chamou das trevas para a sua maravilhosa luz” (1 Pe 2:9). A propriedade é exclusiva. Ela não será loteada e vendida ao diabo.

4. Jesus é o valente que tomou posse da propriedade. “Quando o valente, bem armado, guarda a sua própria casa, ficam em segurança todos os seus bens. Sobrevindo, porém, um mais valente do que ele, vence-o, tira-lhe a armadura em que confiava e lhe divide os despojos” (Lc 11:21-22).

O Senhor Jesus veio ao mundo para “destruir as obras do diabo” (1Jo3:8). Jesus Cristo fascina pela sua valentia e coragem diante da cruz. Essa valentia é a mesma no que diz respeito a guardar os seus filhos das investidas do diabo na tentativa de possuí-los. Jesus é o Senhor absoluto de sua casa (1 Pe 2:5) e de seu tabernáculo (2 Co5:1); que são os nossos corpos.

5. O Espírito Santo intercede pelos crentes em suas fraquezas. “Também o Espírito, semelhantemente, nos assiste em nossa fraqueza; porque não sabemos orar como convém, mas o mesmo Espírito intercede por nós sobremaneira com gemidos inexpremíveis” (Rm 8:26).

É porque o Espírito Santo perscruta até mesmo as profundezas de Deus que Ele pode interceder por nós de acordo com a vontade perfeita do profundo e humanamente insondável coração de Deus. “Porque, qual dos homens sabe as coisas do homem, senão o seu próprio espírito que nele está?Assim também as coisas de Deus ninguém as conhece, senão o Espírito de Deus” (1 Co 2:11).

Davi invocava o Espírito Santo para ajudá-lo a viver na perfeita vontade de Deus. “Ensina-me a fazer a tua vontade, pois tu és o meu Deus: guie-me o teu bom Espírito por terreno plano” (Sl 143:10).

O cristão não é um super-homem, mas é super-protegido, graças a intercessão do Espírito Santo nas horas de maior fraqueza e necessidade.

6. O imutável amor de Cristo garante a segurança. “Em todas estas coisas, porém, somos mais que vencedores, por meio daquele que nos amou. Porque eu estou bem certo de que nem morte, nem vida, nem anjos, nem principados, nem coisas do presente, nem do porvir, nem poderes, nem altura, nem profundidade, nem qualquer outra criatura poderá separar-nos do amor de Deus, que está em Cristo Jesus nosso Senhor” (Rm 8: 37-39).

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O que nos dá segurança é o amor de Cristo Jesus. Seu amor é sublime e leal, “é forte como a morte” (Ct 8:66) e a sua fidelidade está para além da fidelidade do crente. “Se somos infiéis, ele permanece fiel, pois de maneira nenhuma pode negar-se a si mesmo” (2 Tm 2:13).

Bem-aventurado é o homem que confia no amor de Cristo. A promessa para ele é: “O Senhor é quem te guarda; o Senhor é a tua sombra à tua direita. De dia não te molestará o sol, nem de noite a lua. O Senhor te guardará de todo o mal; guardará a tua alma. O Senhor guardará a tua saída e a tua entrada, desde agora e para sempre” (Sl 121:5-7).

O crente jamais será esquecido pelo amado Senhor Jesus, pois o seu nome está nas palmas de sua mão. “Acaso pode uma mulher esquecer-se do filho que ainda mama, de sorte que não se compadeça do filho do seu ventre? Mas ainda que esta viesse a se esquecer dele, eu, todavia, não me esquecerei de ti. Eis que nas palmas das minhas mãos te gravei; os teus muros estão continuamente perante mim” (Is 49:15-16).

O crente pode reivindicar todas as promessas da Palavra de Deus, “porque quantas são as promessas de Deus tantas têm nele o sim; porquanto também por ele é o amém para a glória de Deus, por nosso intermédio” (2 Co 1:20).

Um filho de Deus jamais ficará possesso por espíritos malignos. Esta é a confiança.

Se você chegou a ler este livro até o ponto em que nos encontramos, eu quero fazer um convite a você: Venha a Jesus e dê o seu coração a ele.

Não tema os espíritos. Se você quiser deixar o espiritismo, Jesus o tomará nas suas mãos.

Na verdade, eu quero me comprometer a ajudar você, seja respondendo a uma carta que você me envie ou atendendo-o pessoalmente, a fim de invocar sobre você o nome de Jesus.

Caso lhe seja impossível escrever-me ou visitar-me, procure uma igreja evangélica perto da sua casa. Certamente você receberá ajuda.

Ah! Como eu desejo que esta semente caia numa boa terra e frutifique!

Permita-me o Senhor ver os frutos dessa humilde tentativa de compartilhar o evangelho libertador de Jesus com seres humanos sinceros e bem-intencionados, que têm tentado se abrigar à sombra do espiritismo.

Tenho a certeza de que o seu coração já está sob profundo impacto da Verdade em Jesus. Resta-lhe agora dizer: Senhor Jesus, eu entrego a minha vida a ti. Liberta-me das garras dos espíritos e lava-me com o sangue que derramaste na cruz do calvário para a remissão dos meus pecados.

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Se você já fez esta oração de todo o coração, eu já posso chamá-lo de irmão em Cristo e garantir a você a plena e total libertação das obras do diabo.

Deus o abençoe!