Lei 10819 - Artigo Publicado Vol97

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Fundo de Reserva para Garantia de Depósitos Judiciais

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A disciplinadaLei10.819/2003 e a suaconstitucionalidade EMERSONVIEIRAREIS LL.M.emDireito ComparadopelaUniversity of SanDiego Schoolof Law.Advogado. READO DIREITO:Tributrio; Administrativo RESUMO:Aps sete anos,a Lei10.819/2003 ainda grandementeignorada.Elafacultaa governos locaisodireitodequitardespesasespecficas comparcelasdedepsitos judiciais emdinheiro. Trata-sedeumainovaolegaldeimpactopo-sitivonapreservaodoequilibrio oramentrio no mbito municipal semameaar gastos sociais. Porm,a lei raramente lembrada quando o ges-torpblico instado a encontrarnovasreceitas. Esteestudoirtratardosbenefciospotenciais daleipeloesclarecimentodeseusdetalhesmais obscuros. PALAVRAS-CHAVE:Lei10.819/2003- Municipali-dade- Depsito judicialemdinheiro - Fundode ReservaparaGarantiadeDepsitosJudiciais-Levantamentode70%. ASSTRACT:After sevenyears,Statute 10.189/2003 isstillbeinglargelyignored.It grantslocalgov-ernmentstheright tohandoverspecificexpen-ditures withportions of judicialcashdeposits.It isa legalinnovationofpositiveimpacttoup-holdbalancedbudgetsatthecityleveiwithout jeopardizingsocialexpenditures.However,the statuteisrarelytakeninto accountwhenpublic managersareurgedtofindnewrevenue.This studywilladdressthepotentialbenefitsofthe statutebysheddinglightonitsmoreobscure details. KEYWORDS:Statute10.819/2003- Municipality - Judicialcashdeposit- ReserveFundforthe GuarantyofJudicialDeposits- Withdrawalof 70%. :1I:1100REVISTATRIBUTRIAE DEFINANASPBLICAS2011RTRIB97 SUMR.IO:1.Introduo - 2.A difcil situao fiscaldos municpios brasileiros - 3.A inovao daLei10.819/2003- 4.Requisitosparao repassedos70%:4.1Autorizaodofundode reservaporleimunicipal;4.2Termodecompromisso;4.3Competnciamunicipalparao tributo discutido- 5.Requisitosparasaquedofundo:5.1Existnciade50depsitoscom valoresdestinados aofundo;5.2Saldosuperior aos50maiores depsitos e a 30% dototal dedepsitospatrocinadoresdofundo- 6.Destinaodosrecursossacados- 7.A consti-tucionalidadedaLei10.819/2003- 8.Concluso- 9.Bibliografia. 1.INTRODUO Quemcostumaviajar j deveternotadoqueemcadamunicpiohuma construo paralisada, uma estrada pela metade ou uma ponte snos pilares. No se trata daquela velha e condenvel prtica poltica de se iniciar uma obra, capitalizar osdividendoseleitorais e,depois,engavetar oprojetooradoape-nas para sair do papel.Asgestes municipais melhoraram muitode uns anos para c, em parte porque novas regras, como a Lei de Responsabilidade Fiscal,l passaram a exigir muito maior disciplina notrato da coisa pblica, induzindo mais profissionalismoe maiscomprometimento dos governos locais.Masem parte tambm porque o Brasil evoluiu, reduziu as disparidades sociais e passou afazermelhoresescolhasnahoradevotar.Ento,qualomotivodetantas obras paradas? A resposta para essa pergunta no passa pela traquinagem poltica de mui-tospolticosdeontem.Oproblemabem maissrio.Sefosseumaquesto demeradegeneraomoral,bastariaaleipenal paraquetudoseresolvesse. Porm, na raiz de todos os males est um problema de ordem estrutural:mais e mais responsabilidades contra menos e menos receitas. Por exemplo,quando um municpio assina um contrato de parceria com a Uniopara aconstruodeum portal naentrada dacidade,ooramentoda obra j esttododesenhado,nohavendoum nicocentavoqueescapeaos relatrios de fluxo de caixa. Porm, no avanar da obra, as verbas do ministrio envolvido so glosadas,os repasses suspensos e a municipalidade foradaa se virarsozinha.Nessemeiotempo,chegaaogabinetedoprefeitoumaordem para que a prefeitura pague otratamento mdicode algum que invocou um dosinmerosdireitossociaisgarantidosconstitucionalmente.Assim,deum lado,o ministriocontratante noconsegue depositar oquinhocombinado; de outro, a receita municipal onerada por despesas inesperadas.Concluso: obra paralisada. 1.LC101, de 04.05.2000. \..ItNlIAUA:> rlNAN\;A:> Cientedadificuldadeporquepassammuitosmunicpiosbrasileiros,o legislador nacional editou a Lei10.819,de16.12.2003.Elaestipula a facul-dadedeselevantarpartedosdepsitos judiciaisemdinheiro,subjacentes ademandasdenaturezatributria.Casoomunicpiotenhainstitudoum fundode reserva para garantia de depsitos judiciais, ele pode levantar 70% doquedisponvelemcontasdedepsitojudicial,destinando30%parao fundoeficandocomos40%remanescentesdisponveisparadeterminadas despesas.A norma determina que os 40% sejam empregados na quitaode precatrios judiciais e dadvida fundada.Mas,se houver previsooramen-triaparatudoisso,entoalgumacoisapodeserendereadaquelaobra paralisada por faltade verbas.. Para m sorte de muitos que tanto precisam de um apoio da prefeitura local, a Lei 10.819/2003 amplamente desconhecida pelos gestores do nico ente da federao que tem de estar no nome da rua e no nmero da casa de cada um dos brasileiros.Alis,a lei nos ignorada por poderes executivos locais,como ela tambm largamente incompreendida pelos magistrados estaduais. Sempre que um juiz sedepara com um inusitado pedido de levantamento de recurso, vem logo sua mente a consagrada liode que depsitono pagamento: garantia do juzo, no pode ser levantado antes do trnsito em julgado. Com o intuito de estudar os detalhes tcnicos da Lei10.819/2003, sem dei-xar de esclarecer parte desses problemas que margeiam a implantao de seus institutos,preparou-seo presente artigo.Espera-seque,com a leituradele,o administradorpblicomunicipalvolteapensarnaquelobradelongadata paralisada. 2.A DIFCilSITUAOFISCALDOSMUNiCPIOSBRASilEIROS Osmunicpiosbrasileirosassumiram um novostatuscomaConstituio Federalde1988.Governoslocaisadquiriramnoapenasmaiorautonomia administrativa, mas tambm uma maior participao no bolotributrio,espe-cialmente por meio de transferncias constitucionais. A proposta do legislador constituinte era ade que osmunicpiosassumissem um papel demaiorrele-vncia na prestao dos servios de interesse local.De fato,eles assumiramc, com isso,atraram tambm novas responsabilidades.Porm,"no quedizres-peitosresponsabilidadesdos municpios,estasacabaram aumentandomais doque proporcionalmente aoacrscimoderecursos, j que,aolongodopc rodo entre1989 e1995, astransferncias cresceram, em termos reais,lI11'IHh que as receitas tributrias municipais e os recursos oriundos de outras fOll!I'"'' (BREMAEKER,1998. p.187), IVI 102REVISTATRIBUTRIAE DE FINANASPBLICAS2011RTRIB97 Naprtica,desdeapromulgaodaCartaRepublicana,aUniotemem-pregado o seu poder de tributar sempre no sentido de boicotar a participao dos municpios.No ,portanto, com surpresa que se recebe a informao de que astransferncias constitucionais no cresceram na proporo das receitas prpriasedasoriundas deoutrasfontes.notria aprefernciadogoverno federalpor contribuies,que no se submetem repartio com Estadose o Distrito Federal? Do mesmo modo, indisfarvel a preferncia do legislador infraconstitucional pelo instrumental tributrio da Unio,em detrimento dos Estados, do Distrito Federal e,especialmente, dos Municpios. Note-se, por exemplo, o que ocorreu em relao a um dos mais importantes tributos municipais,oImposto sobre Servios deQualquer Natureza(ISS).A listade serviosque hojedefineosfatosgeradoresdoimposto sfoieditada 15anos apsa promulgao daConstituio Federal de1988.Trata-se daLC 116,de3l.07.2003.AtasuapublicaovigeuaanacrnicalistadaLC56, de15.12.1987,anteriorprpriaCartadaRepblica.Suasenilidadenos deuazoaestreisevariadosembatesjudiciais,mastambmexcetuoupor dcadaemeiaasinstituiesfinanceirasdoISSqueincidiriasobreosseus serviosmaisrentveis:administraodefundos.Oitem 44 dalistaanexa LC56/1987 excetuava da incidncia dotributo municipal a administrao de fundossemprequerealizadapor"instituiesautorizadasafuncionarpelo BancoCentral". To generoso privilgio a essa parcela de contribuintes, prova-velmente,encabeando oranking dos de grande capacidade econmica, sfoi revistaquando oitem 15dalista veiculadapela LC116/2003deixoude lado qualquerdvida.Juntoinformaodequetodososseussubitensseapli-cavamaosserviosbancrios,foramincludososdizeres:"inclusiveaqueles prestadosporinstituiesfinanceirasautorizadasafuncionarpelaUnioou por quem de direito". Seolegisladorinfraconstitucionallevou15anosparacorrigirdistores no instrumental tributrio dos municpios, ento a mesma "pressa" deveria ter dado cadncia das modificaes legislativas no mbito da tributao federal. Ocorre que, apenas na dcada e meia que se seguiu constatao feita por Bre-maekerCopocit., p.187), ogoverno federalcriou quase duas dzias de novos tributosCZANLUCA,2006).Deduz-se do averiguado por Bremaeker que,no pe-rodo de1988 a1995, marcado pelo caos econmico, os municpios estiveram entregues prpria sorte, tendo de viver principalmente de receitas prprias, 2.Deacordocom oart.157, II,daCF/1988,20%da arrecadao dos impostos criados pela Uniono exercciodesua competncia tributria residual pertencem aosEsta-dos e aoDistrito Federal. CiNCIADASFINANAS mngua detransfernciasconstitucionais condizentes com suas necessidades. Mas,nos15anosqueseseguiram,caracterizadospeloequilbriomacroeco-nmicoepelocontroledainflao,ogovernofederalseocupouquaseque exclusivamente de suas prprias receitas, descuidando ascoisas municipais. 103 Nesse contexto, l se vo mais de duas dcadas de Constituio e pouco foi feitoparaqueostesourosmunicipaisestivessemalturadoscompromissos constitucionais assumidos.verdadequehouveavanosnadireocorreta. OImposto sobre aPropriedadePrediale TerritorialUrbana(IPTU)passoua admitir progressividadedealquota;3aContribuioparaCusteiodo Servio deIluminaoPblicaCCosip)foiintroduzida;4euma nova listadeservios sujeitosaoISSfoieditada.Noentanto,issomuitopoucodiantedopreo atrelado dezena de direitos sociais garantidos constitucionalmente Cart.6.), cujo custeio sempre resvala no cofre da municipalidade onde residente otitu-lar do direito. prtica comum dos juzes brasileiros conceder liminares contra autorida-des municipais que refutam o alto custo de tratamentos mdicos daqueles que se dizem incapazes de pag-los,deixam deatender a um pedido dematrcula formulado justamente para escola sem vaga ou, simplesmente, do seguimento construo deaterrosanitrio sobprotestodosmoradores vizinhos.Ora,o altopreodeumtratamento,ocustomaiordeuma vaganoprogramadae oprejuzopor uma obraparalisada podem ser interpretadoscomopequenos inconvenientes secomparados afliodo desamparado e urgncia de uma providnciaestatal.Porm,esseinconvenientepodeadquiriroutraspropor-esquando,para atender uns,oresponsvel pela prestaoestatal inadivel tem de suprimir o investimento essencial para outros.Eis asituaodos mu-nicpios.Para atender ordem do pague-o-preo-do-direito-social, os gestores municipais tm de tesourar o sade-educao-e-desenvolvimento-s-se-alcan-am-com-investimento. possvel queosgovernos locaisaindatoleremessasituaodecobertor curtopormaisalgunsanos,masoenvelhecimentonaturaldapopulao,o ingresso de crianas na escola cada vez mais cedo e a crescente politizao dos muncipescertamentelevarooschefesdosexecutivoslocaisaumimpasse crtico:ou cumprem a ordem judicial ou atendem aoint:eressedapopulao. Separa atender ordem judicial tm de contrariar ointeresse popular,ento cairo em desgraa poltica. Se para preservar o interesse popular tm de deso-3.EC29, de 13.09.2000. 4.EC 39, de19.12.2002. 104REVISTATRIBUTRIAE DEFINANASPBLICAS2011RTRIB97 bedecer aocomandodo juiz,entotero sobre si opesoda pena corporal.O que pior,a desgraa poltica ou a consequncia penal? Obviamente, esse impasse surge da fossaque se formouentre asexpectati-vas da populao e as obrigaes sociais, de um lado, e a capacidade financeira parafazeroessencialecumprircomoinadivel,deoutro.Eisasntesedo dilema fiscaldosmunicpios brasileiros,desamparados por repassesconstitu-cionais e sufocados pela incapacidade de gerar novos recursos. 3.A INOVAODALEI10.819/2003 Dentro dessecontextode dificuldades,nose pode dizer queolegislador nacionaltenhaestadodetodoomisso.Em12.08.2003,odeputadoRodrigo MaiaapresentouoPL1.661/2003,paradisporsobreosdepsitos judiciaise extrajudiciaisdetributosnombitomunicipal.Na justificaodoprojeto,o congressista fezquesto de destacar um inquietante paradoxo: "A absoluta indisponibilidade destas receitas contrasta com a grave situao financeirados municpios, legtimos credores detais quantias, na maior parte dos casos.No h mais espao para a ociosidade detamanho montante de re-cursos,enquanto processos judiciais tramitam por anosafiopelas instncias judiciais do Pas"(BRASIL,2003,com adaptaes). NaCmara de Deputados, o projeto foiaprovadona formado substitutivo deplenriosubscritopelodeputadoCarlosWillianeml3.11.2003.Oteor dosubstitutivo foibem mais rigorosocom os municpios.Na medida em que oprojetooriginal previaorepasseautomticodedepsitos judiciaiseextra-judiciaiscontanicadecadamunicpio,independentementedequalquer formalidade,oprojetoaprovadolimitouorepasseaosdepsitos judiciais eo condicionou apresentao de termo de compromisso assinado pelo chefe do executivo lo caP Tamanhorigor noseverificaquantoaosrepasses aque faz jus a Unio. A Lei 9.703, de 17.11.1998, aplicvel aos depsitos da Unio, assim dispe: "Art.1.0Osdepsitosjudiciaiseextrajudiciais,emdinheiro,devalores referentes atributos e contribuies federais,inclusive seus acessrios,admi-nistradospelaSecretariadaReceitaFederaldoMinistriodaFazenda,sero efetuados na Caixa Econmica Federal, mediante Documento de Arrecadao deReceitas Federais - Darf,especfico para essa finalidade. (...) 5.Essas auestes de cunho mais tcnico sero mais bem detalhadas no prximo tpico. CINCIADASFINANAS 2.0 OsdepsitosserorepassadospelaCaixaEconmicaFederal paraa Conta nica do TesouroNacional, independentemente dequalquer formalidade, nomesmoprazofixadopararecolhimentodostributosedascontribuies federais"(grifo nosso). Obviamente,o legislador nacional tem uma preocupao acentuada com a responsabilidade dos prefeitos para lidar com os recursos em contas de depsi-to judicial. Tal preocupao se estende tambm idoneidade dos governadores para empregar os repassesde seus prprios depsitos.Bem verdade que a Lei 10.482,de03.07.2002,quetratavadosdepsitos judiciais e extrajudiciais de tributos estaduais, no impunha condies para o repasse automtico conta nica do Estado ou do Distrito Federal.Porm, ela foicompletamente revoga-dapela Lei11.429, de 26.12.2006,cujocontedo muito parecidocom o da lei aplicvel aos depsitos judiciais dos municpios(Lei10.819/2003). O aspecto mais intrigante da Lei 9.703/1998 a previso de penalidade para osadministradoresdainstituiofinanceiradepositria6 quedesatenderem transfernciaautomtica.Trata-sedodispostono pargrafonicodo art.2.0_A,introduzido norma pela Lei12.058, del3.1O.2009,e depois renumerado para 3.0 do mesmo artigo pela Lei12.099, de 27.11.2009. Isso mostra a mag-nitude da preocupao do legislador federal com a ociosidade dos depsitos de tributos federais e contribuies sociais. ,alis, notria a enorme necessidade derecursospara que a Unioconsigamanter ofluxode seu caixa sem osso-bressaltostofrequentesnos momentos decriseeconmica.Masserqueos demais entes da federaono enfrentam a mesma dificuldade? Sim,osdemaispassampelasmesmasdificuldades.Emverdade,ascrises econmicassobrecarregamcommuitomaisintensidadeoscaixasestaduais e municipais doque oda Unio.Desde a introduodoPlanoReal,?a Unio tomou o cuidado de promover reparos em seu instrumental tributrio de modo a se proteger dos frequentes altos e baixos na arrecadao. Tributos foram cria-dos,alquotasmajoradaselegislaesaperfeioadas.Porm,nombitodos Estados e municpioso que se v uma evoluo nosentido contrrio. A Lei KandirB suprimiuumaexpressivafontedereceitaestadual,aodesoneraras exportaes de semielaborados do Imposto sobre Operaes Relativas Circu-6.At a publicao da Lei 9.703/1998, os depsitos subjacentes a discusses tributrias emfacedaUniotambmpodiamserfeitosnoBancodoBrasil.Aps,apenasna Caixa Econmica Federal. 7.Lei 9.069, de29.06.1995. 8.LC87, de13.09.1996. 105 IVU II1IOU tUt UtlLlCA)L.U II1"\ llilti:;, I laodeMercadoriasesobrePrestaesdeServiosdeTransporteInteresta-dual e Intermunicipal e de Comunicao (ICMS).Os municpios, por sua vez, abrirammoderendasprpriascomaintroduodoSistemaIntegradode Pagamento de Impostos e Contribuies das Microempresas e das Empresas de Pequeno Porte (Simples)9 e,mais recentemente, do Supersimples.lO Fica, assim, clara a preocupao do legislador nacional em preservar as ren-dasfederaisaopromover alteraesna legislaotributria,que sempre vm em detrimentode Estadose municpios,destinatrios usuaisdamaior frao de perdas.E nem se pode dizer que Estados e municpios sejam onerados por igual.OsEstadostm melhorescondies de sedefender,por contarem com uma base muito mais ampla de contribuintes e repasses federais bem mais ge-nerosos. Restam, ento, os municpios que, embora do lado mais vulnervel da correlao menos-imposto menos-gasto, ainda por cima assumiram inmeras responsabilidades - e,com elas,despesas - a partir da promulgaodaCons-tituio Federal de198B. Nessecenrio,aediodaLei10.819/2003representouumabem-vin-dainovaojurdica,muitoemboraprivadadagenerosidadecomqueaLei 9.703/1998 tratou a Unio.No se discute a ociosidade dos recursos deposita-dos em juzo para se suspender a exigibilidade do crdito tributrioYPorm, porvezes,taisrecursosnosomesmodevidosaoentetributante.Se,por hiptese,elesnoestivessem maisdisponveisquandotransitadaem julgado a sentena que reconhece odireito docontribuinte, haveria inegvel prejuzo para este.Ocorre que, na maior parte das vezes, o fiscoque sai vitorioso.Por meroespritodeemulao,muitoscontribuintes - em especial,osdemaior porte - disputam oslanamentos formulados pelorgo lanador atmesmo nos centavos. Preferem custear uma longa desavena judicial a pagar o tributo, pois assim mantm ntegra a poltica de somente recolher oque reputado de-vido,capitaneando a decadncia em seu favor.Afinal, aps o encerramento de uma auditoria pelo fiscoso remotas aschances de que outra venha suced-la no intervalo de cinco anos.12 Deregra,um contribuinte de grande porte fis-9.Lei9.317,de05.12.1996(revogadapelaLC123,de14.12.2006,paraapartirde 0l.07.2007). 10.LC123/2006, republicadanoDirioOficialdaUnio(DOU)de3l.0l.2009, com as alteraes da LC127, de 14.08.2007, e da LC128, de 19.12.2008. 1l.Segundooart.151,II,doCTN(Lei5.172,de25.10.1966),odepsitointegraldo crdito tributrio suspende a sua exigibilidade. 12.Pelasregrasdoart.150,4.,doCTN,aplicvelaostributoscujolanamentose d por homologao,olanamento fiscalse reputahomologado apscinco anosda calizado uma vez a cada 10 anos; h tambm os que o so em intervalos ainda maiores e osque s sero fiscalizados quando encerrarem as suas atividades. Por isso, do ponto de vista exclusivamente operacional, se torna interessan-tepatrocinar tesestributrias, mesmoque issosignifique disputar por anos a fioum lanamento fiscal.contra essatergiversaodos institutos, direitos e garantias da legislao tributria brasileira que a Lei 10.819/2003 veio instituir a possibilidade de os governos locais levantarem parcela dos valores deposita-dos em juzo.Consideradas, ento, as dificuldades de caixa da maior parte dos municpiosbrasileiros,constata-sequealeirepresentouumalentomaisdo que desejado.Trata-se de uma novidade legislativa politicamente conveniente e administrativamente oportuna. Vistoisso,cabeanalis-lapeloaspectoeminentemente jurdico,oquese passa a fazer. 4.REQUISITOSPARAO REPASSEDOS70% Deincio,precisodistinguirorepasseoulevantamentodeparcelados recursos em depsitos judiciais de natureza tributria (70%)e o saque ou em-prego desses recursos no pagamento de despesas autorizadas por lei.O repasse ou levantamento, por si s, no autoriza o Poder Pblico a aplicar os recursos. Note-seque o repasse regrado pelo 2.doart.l.0 da Lei10.819/2003, que assim estipula: "Art.l. C.. ) C.. ) 2.0 Ao municpio que instituir o fundo de reserva de que trata o l.0, ser repassada pela instituio financeirareferida no caputa parcela correspondente a 70%(setenta por cento)do valor dosdepsitosde natureza tributria nela realiza-dos a partir da vigncia desta Lei"(grifo nosso). ocorrnciadoseufatogerador.Como,em regra,ostributoscujo lanamento se d porhomologaotmrecolhimentomensal,essescincoanosdevemsercontados ms a ms.Noentanto,se constatada ausncia de recolhimentoem auditoria fiscal, nose falamaisem lanamento por homologao,poisnada havia para o fiscoho-mologar.Fala-se em lanamento de ofcio substitutivo. Nessecaso,a decadncia deve seguir a regra do art.173,I,doCTN,ou seja, os cinco anos so contados do primeiro dia do exerccio seguinte. Emsntese, os cinco anos que se contavam ms a ms(lanamento por homologao)passam a ser contados anoa ano(lanamento deofcio),de tal sorte que o exame do fisconunca retroage mais de cinco anos, onze meses e trinta dias (auditoria concluda no dia 31de dezembro). 108REVISTATRIBUTRIAE DE FINANASPBLICAS2011RTRIB97 o saqueou empregodosrecursosrepassados reguladopor outro dispo-sitivo.Trata-sedoart.3.,quefacultaopagamentode precatrios judiciais e da dvidafundadacom a fraodosdepsitos que exceder aomontante a ser obrigatoriamentedestinadoaofundodereserva.Portanto,osimplesfatode a instituio financeirarepassar70%de um determinadodepsito judicial ao municpio no significa que ele possa usar esses recursos no pagamento de pre-catrios ou da dvidafundada.Na prtica,a instituio financeiradepositria apenas transfere 70%de cada depsito judicial recebido a uma conta corrente ou conta deinvestimento na prpria instituio,criada por elacom o intuito de gerir o fundode reserva em nome do municpio. Essatransferncia representa o primeiro passo para que o municpio possa empregar parte dos recursos depositados no adimplemento de despesas autori-zadas por lei.Para que a transferncia possa ento ocorrer, h trs requisitos a serem atendidos.Primeiro, h um requisito de ordem constitucional: o de que o fundode reservatenha sido autorizado ou institudo por lei local.Segundo, h um requisito de ordem legal:o de que o chefe do poder executivo (prefeito) apresente um termo de compromisso perante o rgo jurisdicional responsvel pelo julgamento dos litgios.Terceiro,h um requisito de ordem jurispruden-cial:o de que otributo discutido esteja na esfera de competncias municipais. Inicia-se,assim, o exame de cada um desses requisitos individualmente. 4.1Autorizao dofundo de reserva por lei municipal No poder haver repasseou levantamento de 70%dos depsitos judiciais seofundodereservanotiversidoautorizadoouinstitudoporleilocal. Trata-sede um requisitodeordem constitucional,na medida em queaCarta daRepblicavedaainstituiode fundossem prviaautorizaolegislativa. Note-se,por oportuno,oqueestexpressoemdispositivoconstitucional in-serido no captulo destinado sfinanaspblicas,dentro do ttulo dedicado tributao e aooramento: "Art.167.So vedados:C.. ) C.. ) IX- a instituiode fundosde qualquer natureza,sem prvia autorizao legislativa. " Poder-se-iaargumentarqueaLei10.819/2003supreanecessidadedelei para os municpios institurem o fundode reserva.Por se tratar de instrumen-tolegislativo,a regradoart.167,IX,daCF/1988teria sido satisfeita.Ocorre, noentanto,queaLei10.819/2003leinacional,aplicvelaosmilharesde municpios brasileiros.Elanotemocondodeinterferirnarelao jurdi-ClENCIADASrlNANASI caque cada municpioestabelecer com os seusadministrados.OCongresso Nacional,no desempenho da funode legislador nacional, apenas disciplina a relaodaRepblica Federativa do Brasil para com os demais sujeitos de di-reitos e obrigaes, entre os quais os prprios municpios. No pode, portanto, a lei nacional pretender regular a relao que cada municpio manter com os seus muncipes. Do contrrio, o Congresso Nacional estaria usurpando a com-petncia das cmaras municipais para legislar sobre questes de interesse local. Lembre-sequeaprpriaCartadaRepblicatraaoscontornosdarela-o jurdica a seformarno mbitodatributao municipal.Aoestipular que compete aos municpios legislar sobre assuntos de interesse local (art. 30, I) e aplicar as rendas dos tributos de sua competncia (art.30, III), aConstituio deixaclaroque tosomente ascmaras municipais podem exercer funole-gislativa no tocante relao jurdica existente entre o municpio, sujeito ati-vo,e o muncipe, sujeito passivo da obrigao tributria. Admitir a instituio dofundo de reserva por meio de decreto executivo, pois existente autorizao daLei10.819/2003,seriaomesmoqueatribuircompetnciaaoCongresso Nacionalparaproblemasdeinteresseexclusivamentelocal,emverdadeiro atropelo aoart.30 da CF/1988.Enfim,como a Repblica Federativa do Brasil estparaoCongressoNacional,quandoesteexerceafunodelegislador nacional, o municpio est para a cmara municipal, quando esta legisla sobre problemas 10cais.13Nesse ponto, urge lembrar queoCongressoNacional,quer comocasa le-gislativa da Repblica, quer da Unio, na condio de ente poltico, no parti-cipa da relao jurdico-tributria que d azoaodepsito judicial. a cmara municipalquemparticipa,poisaprovoualeiinstituidoradotributo,traou regras especficas para o seu recolhimento e qualificou as penalidades pelo des-cumprimento daobrigaotributria.Portanto, somente acasalegislativa do municpio pode autorizar o chefe doexecutivo a instituir o fundode reserva, cujopropsito viabilizar o saque e oempregodos recursosdepositados por contribuintes. Se porventura o fundoestivesse sendo institudo por decreto do 13.Domesmo modoque ascmaras municipais legislam sobre questes domunicpio. oCongressoNacionaltambmlegislasobrecausasdointeressedaUnio.Porm. nesses casos em que existente uma relao de simetria entre o Congresso e as cmaL\', municipais,nosefalaem UniocomoRepblicaFederativado Brasil,masUlll;\" comoentepoltico.Assim,quandooCongressoeditaleiaplicveln.! rbita dogovernofederal,nosefalaem lei nacional.Trata-sede leifederal,v;\ltd,. to somente para as relaes jurdicas que a Unio estabelecer com os seus adlllll'h trados. 110REVISTATRIBUTRIAE DE FINANASPBLICAS2011RTRIB97 prefeito,sem amparonaleilocal,estar-se-iadiantedeum ato juridicamente inexistente. derigornotarqueainstituiodofundodereservatrazumasriede obrigaes instituiofinanceiradepositria.Elatem de repassar os70%de cada depsito (2. do art.1.0 da Lei 10.819/2003), escriturar cada depsito de modo individualizado(2. do art.2.), colocar disposio do depositante o depsito no caso de este ganhar a causa(art.4.,caput), notificar o municpio quando o saldo do fundo cair abaixo do limite legal (1.0 do art. 4.), notificar a autoridade judiciria para o casodeo saldo no fundoser insuficiente para a restituiododepsito(3. doart.4.)e transferir para a municipalidade o valor do depsito que tiver sido mantido na instituio sempre que a demanda for julgada em favordo fisco(art.6.,caput).Essa srie de obrigaes s pode ser introduzida por meio de lei disciplinadora do interesse local. Alguns poderiam argumentar que o decreto desguarnecido de lei local ato administrativoinquinadodeirregularidadesuprveloumesmodenulidade relativa,para usar asexpressesde ]usten Filho(2010.p.367).Porm,para rebater osargumentosdosqueenxergam uma irregularidade suprvel por lei posterior, sempre bom lembrar quaisosinteresses jurdicos envolvidos.No caso, o bem jurdico a prpria hierarquia de normas, o respeito ordem jur-dica posta e aos preceitos constitucionais. Portanto, um decreto em desacordo comumbemdetamanhamagnitudenopode,sobqualquerhiptese,ser convalidado.Domesmomodo,nosepodefalaremnulidaderelativa,caso em queodefeitoprejudicatosomente interessesdisponveisde sujeitoses-pecficos.Comoo decretogeraasbases para que se proceda aolevantamento de recursos depositados por sujeitos indeterminados, estar-se-ia diante de uma nulidade absoluta - e no relativa. Masnem denulidadeabsolutasepode cogitar.Seriamelhor falarem ine-xistncia jurdica: "Ainexistncia jurdica se verifica quando noexistem os requisitos mni-mos necessrios qualificao de um ato como jurdico. No obstante, podem existir algunseventos"nomundo dos fatos.Masesseseventossototalmente desconformes aos modelos jurdicos. O grau de desconformidade to intenso que nem cabe aludir a um 'ato jurdico defeituoso' - existe apenas ato material, destitudo de qualquer carga jurdica"QUSTENFILHO,op.cit., p.368). Portanto, o decreto que institui o fundo,sem prvia autorizao da cmara municipal, carece de autoridade para tantoe,comotal, ato sem os mnimos requisitos para ser qualificado como jurdico. Trata-se de ato inexistente. De todo modo, basta que atentemos para o texto da Lei10.819/2003, seno vejamos: l 1 CINCIADASFINANAS111 "Art.1.0(...) 1.0 Os municpios podero instituir fundo de reserva, destinado a garantir a restituio da parcela dos depsitos referidos no caput que lhes seja repassada nos termos desta Lei." ALei10.819/2003tosimplesmenteautorizaquemunicpiosinstituam fundosdereserva.Por sis,elanopoderia institu-los,nem tampoucopo-deriaautorizarquepoderesexecutivosmunicipaisosinstitussem.Ademais, sea instituiodofundodependedeautorizaolegislativa(art.167,IX,da CF/1988), ento essa autorizao deve vir das cmaras municipais.Por isso, obrigatrio haver lei municipal que autorize a constituio do fundo de reserva para garantia de depsitos judiciais ou que o institua ela prpria.14 4.2Termode compromisso Outrorequisito,agoradecunhoeminentemente legal,aapresentaodo termodecompromissofirmadopeloprefeitomunicipal.Essetermodeveser apresentado aorgo responsvel pelo julgamento do litgio a que diga respeito o depsito. Por meio dele, o prefeito municipal se compromete a manter o fundo de reserva na instituio financeira responsvel pelo repasse, a destinar automa-ticamente 30 dos70%recebidos(42,86% do montante repassado)para o fundo dereserva,manterosaldomnimolegal,autorizarainstituiodepositriaa movimentar ofundoem casodexito judicial docontribuinte ou necessidade de restabelecimento do saldo mnimo e recompor o fundoem 48 horas sempre queosaldoestiverinferioraomnimolegal.Paraum melhoresclarecimento, apresenta-se o inteiro teor do dispositivo que trata do termo de compromisso: "Art.2.A habilitaodo municpio aorecebimentodastransfernciasre-feridasno2.doart.1.0ficacondicionada apresentao,perante orgo jurisdicional responsvel pelo julgamento doslitgiosaosquaisserefiramos depsitos,determode compromisso firmadopeloChefe doPoder Executivo Municipal, que preveja: I - a manuteno do fundode reserva na instituio financeira responsvel pelo repasse das parcelas referidas no 2. do art.1.0e seus incisos; l4.NoAgRgnoREsp913.114,relatadopeloMin.MauroCampbell Marques,oSTJse depara justamente com situao em que o fundo de reserva foiinstitudo sem autori-zao da lei municipal.Como a questo central no recurso era a instituio do fundo em desacordo com art.167, IX,daCF/1988, o STJdeclinou sua competncia para o exame da matria, vez que somente ao STFcabe analisar questo de constitucionali-dade em sede de exame jurisdicional nas instncias extraordinrias. IILritVI::'IAIKltsUIAKIAtUtrlNANI,:A::'rUtsLlCA::'LUII- nlKI/j ::11 II - a destinao automtica aofundode reserva do valor correspondente parcela dos depsitos judiciais mantida na. instituio financeira nos termos do 3. do art.l.0, condio esta a ser observada a cada transferncia recebida na forma do2. do art.1.; III- amanutenonofundodereservade saldo jamais inferioraomaior dos seguintes valores: a)o montante equivalente parcela dos depsitos judiciais mantida na ins-tituiofinanceiranostermosdo3.doart.l.0,acrescidadaremunerao que lhe foioriginalmente atribuda; b)a diferena entre a soma dos 50 (cinquenta) maiores depsitos efetuados nos termos do art.l. e a soma das parcelas desses depsitos mantidas na ins-tituiofinanceiranaformado3.domesmoart.l.0,ambasacrescidasda remunerao que lhes foioriginalmente atribuda; IV - a autorizao para a movimentao do fundo de reserva para os fins do disposto nos arts.4. e 6.desta Lei;e V - arecomposiodofundodereservapeloMunicpio,em at48(qua-renta e oito)horas, aps comunicao da instituio financeira,sempre que o seu saldo estiver abaixo dos limites estabelecidos no inciso IIIdeste artigo." Um aspecto interessante do termo de compromisso aquele que diz respei-to aos seus efeitos processuais. De acordo com o art.158 do CPC (Lei 5.869, de 11.0l.1973), "os atos das partes, consistentes em declaraes unilaterais ou bi-laterais de vontade, produzem imediatamente a constituio, a modificao ou a extinodedireitosprocessuais".Otermode compromisso atounilateral da parte no processo,no caso,amunicipalidade; portanto,ofiscomunicipal, nacondioderuemaomovidapelocontribuinteoudeembargadoem ao de embargos execuo, estar, de regra,constituindo direitos processu-aiscom a apresentao do termo. Por exemplo, pelas regrasdosincs.I e IIdoart.2.da Lei10.819/2003, a municipalidadesecomprometeamanternainstituiodepositriaofundo dereservae a sempre destinar aele 30%decada parcela de 70%recebidaem repasse.Se,entretanto, a municipalidade deixar de cumprir com essas obriga-es,issodar azono srestituio conta de depsitooriginal detudo o que levantado, como tambm ao eventual bloqueio das contas municipais para a recomposio do depsito. Outraobrigaoquenascecomessetermoaveiculadapeloinc.IIIao art.2.daLei10.819/2003. A municipalidade secompromete amanter saldo mnimo jamais inferior ao valor das parcelas de depsitos mantidas na institui-o depositria (30%do somatrio de todos os depsitos judiciais que tenham patrocinado o fundo),caso haja mais de 50 contas de depsito.ls Porm,essecompromissodemanter saldo mnimo nopode ser interpre-tadocomorigordosdoisprimeirosdeveresassumidos,poisaprpriaLei 10.819/2003 prev situaoem que o saldo poder ultrapassar o seu patamar mnimo (art.4.,l.0). A norma prev, inclusive, o que deve ser feitono caso de o saldo do fundo ficar zerado (art. 4.,2. e 3.). Em tais situaes, o mu-nicpio tem at 48 horas para recompor o saldo do fundo(art.2., V). Portanto, no se deve deduzir que a outra parte no processo passe ater qualquer direito em face da municipalidade apenas porque o saldo do fundoatingiu valor infe-rior ao mnimo legal. O interesse da parte est limitado ao quantum levantado pela municipalida-dedesua conta dedepsito.Se,por hiptese,osaldonofundo inferior ao mnimo legal, mas suficiente para recompor o valor do depsito, a parte carece dequalquer interessenoque setratadecompelir omunicpioarecomporo saldo do fundo.Na realidade, a obrigao de recompor o fundo de reserva tem como polo ativo o prprio Poder judicirio, e no a parte no processo. Comoodepsito judicial visagarantiado juzo, apenas a autoridade ju-dicantepodeavaliarqualosaldomnimoasermantidonofundo,poisest em jogotosomenteointeressedo judiciriopeloprontoressarcimentodo contribuinte vitorioso na lide.Nesse sentido, a eventual manuteno de saldo inferior aomnimo legal nogeraqualquer direito para aoutra parte no pro-cesso, mas apenas as bases para que o municpio seja notificado para recompor o saldo do fundo(art.2.,V)ou impedido de receber novos repasses(art.5., caput). Alis,eisumadascrticasque sepode fazeraodiploma legal.Domodo em que redigido,d aentender que aprpria instituiodepositriatenha de notificar o municpio e que ela possa inclusive sustar o repasse de recur-sos.Porm,primeiro,a instituiodepositria noparte noprocesso,ela apenasatuacomoauxiliardo judicirio;segundo,odepsito judicial est sobguardado judicirio;terceiro,arelaosubjacenteentremunicpioe depositrio no pode escapar aocontrole judicial, pois do contrrio restaria ameaada a prpria autoridade do judicirio - enfim,por todos esses moti-vos,qualquermedidaasertomadapelainstituiodeveantespassar pelo crivo judicial. 15.A questo ser mais bem estudada no item 5,dedicado aosrequisitos para saque do fundo. 11"1" ntVDIf\1t\IOUIf\t\If\t.ue111"1"\1"\-1"\;) IUDLlLtDLU II- Illruo;:)/ Assim,oinc.IVaoart.2.deveserlidonocomoumaautorizaopara queainstituiodepositriamovimenteofundodereservapor sua prpria conta, mas como um consentimento para que o faasempre dentro dos limites e nas condies impostos pelo Poder judicirio. Do mesmo modo, o dever que nasce para a municipalidade, por foradoinc.V,no tem comotermo inicial o recebimento de comunicao encaminhada pela instituio depositria, mas odaordem judicialparatanto,desencadeadapor provocaodainstituio depositria. 4.3Competncia municipal para o tributo discutido o ltimorequisitoparaqueomunicpio possa proceder aolevantamento dos 70%dos depsitos judiciais em dinheiro de natureza tributria o de que a lide a que ele subjaz diga respeito a tributo da competncia municipal. Trata--se de uma condio introduzida pela jurisprudncia. Sehouver dvida sobre acompetnciadomunicpioparaotributoouseexistir orientao jurispru-dencial no sentido da sua incompetncia, ento no se deve admitir o levanta-mento.Em casos assim,h uma baixa probabilidade de que oente federativo reste vencedor na demanda judicial, detal sorte que o levantamento seria,no mnimo, temerrio e,na mais provvel das hipteses, um passo certeiro para a insolvncia do fundode reserva. Porexemplo,o judicirio tem semanifestadosobre anoincidncia do ISSnasobrigaesdedar.Sabe-sequeservioconsiste numaobrigaode fazer - e no de dar.Desse modo, s pode ser gravada com o imposto a ativi-da de que no derive de uma obrigao de dar.Se,por hiptese,o municpio iniciasse uma execuo fiscalem facede uma locadora de veculos,por falta de recolhimento do ISSno prazo regulamentar, estar-se-ia diante de um caso emqueotributodiscutidonoestnaesferadecompetnciastributrias municipais.Supondo-se,ento,quealocadoradeveculostenhadeposita-doomontanteexigidoparaooferecimentodeembargosexecuo,seria temerrioqueo judicirio autorizasseo levantamentodos70%.Nessecaso especfico,aschancesde vitriadamunicipalidadesobaixas,paranose dizer desprezveis. Situaode certomodosemelhante j foienfrentada pelo STj.Trata-sedo caso do leasing.Quando o STF, em sede recurso extraordinrio, reconheceu ha-ver matria de direito constitucional nas alegaes de uma empresa de leasing que contestava a autuao feita por um municpio brasileiro, o STJpassou a se posicionar contra o levantamento dos 70%.Pela importncia do caso examina-do pelo STj,cabe trazer a sua ementa: "Processual civil e tributrio - Agravo regimental- Recurso especial- Exe-cuofiscal- ISS- Arrendamentomercantil- Lei10.819/2003- Levanta-mento, pelo municpio,de70%do valordodepsito judicial- Competncia tributria que constitui questo prejudicial de natureza constitucional. 1.O art.1.0da Lei10.819/2003 pressupe que ostributos sejam da 'com-petncia dos Municpios', para os finsde levantamentos com compromisso de reversibilidade dos depsitos aos contribuintes. 2.SucedequeessacompetnciatributriarestaquestionadaperanteoE. STF,sendo certo que o E.STJconsiderou a questo, incasu,prejudicial de na-tureza constitucional (REsp 805.317/RS, j. 17.08.2006). 3.Consectariamente, inocorre a prova inequvoca que autorizaria o levan-tamento(art.273 do CPC), consoante acertadamente decidiu o aresto a quo. 4.Agravo regimental da empresa provido para negar provimento ao recurso especial do Municpio, divergindo-se do voto do e.Ministro relator"(AgRg no REsp819.703, reI.Min.Luiz Fux, DJ23.11.2006). Hoje aquestoest superada.OSTFse manifestou pela incidncia doISS na hiptese.16 Masmesmo assim o casoserve bem para ilustrar ascircunstn-ciasem queo levantamentodeveser desautorizado.Ata pronncia doSTF, haviadvida sobre aincidnciadoISSnoleasing,quecertamente notem a natureza de obrigao de fazer. Domesmomodo,nosepodedizerqueconsistaemobrigaodedar. Porm,comoostribunais estavam caminhando na direodecircunscrever a incidncia do ISSsobrigaes de fazer,no se afigurava presente a probabili-dade de xito do municpio na disputa. 5.REQUISITOSPARASAQUEDOFUNDO Ataqui,foram vistos os requisitos para levantamentodos70%dosdep-sitos judiciais em dinheiroque tenham naturezatributria.Lembre-se,ento, que deve haver um fundodereserva para garantiadedepsitos judiciais.Tal fundo tem de ser constitudo por lei municipal ou por ela autorizado, o prefei-tomunicipaltemdeapresentartermodecompromisso perante aautoridade judiciria e o tributo tem de ser da competncia municipal. Porm, esses requi-sitos no bastam para que o municpio possa ver qualquer centavo ingressando nacontanicadotesouromunicipal.H,ainda,necessidadedequeoutros requisitos sejam satisfeitos.Para diferenciar tais requisitos dos requisitos para 16.REsp592.905. .....- -- . .... "'T"- .~ - ~ . _..- - ....... levantamentoourepasse,possvel denomin-losrequisitosdeordemdin-mica. Aocontrrio dos requisitos anteriores - que bem vestem a denominao derequisitosdeordem esttica -, irocondicionar oempregodosrecursos a circunstncias conjunturais e que,portanto,ora autorizaroo saque devalo-res,ora no. Parafacilitaroentendimento,faz-seadiferenciaoentre requisitosdin-micos e requisitos estticos denominando-os, respectivamente, requisitos para saque e requisitos para levantamento ou repasse. No tpico anterior foram exa-minadososrequisitospara levantamentoourepasse,oraidentificadoscomo requisitosestticos.Assim,admitindo-sequetodoselestenham sidosatisfei-tos,oexamepassaaseconcentrarnosrequisitosparasaqueourequisitos dinmicos. I? Por serem dinmicos, tais requisitos devem ser permanentemente averigua-dos por algum, antes do saque. A instituio depositria no tem legitimidade para tanto, pois atua como mera auxiliar do Judicirio.Somente o magistrado temautoridadeparasupervisionarocumprimentodosrequisitosdinmicos pela municipalidade.Portanto, o juiz dacausaquem temde analisar asol-vabilidade dofundode reserva para garantia de depsitos judiciaisI8para,em seguida,autorizarosaquepelomunicpio.19 Afimdefacilitaroexamedo magistrado,seriaconvenienteque,acadasolicitaoderepasse,omunic-pio instrusse o pedido no apenas com termo de compromisso subscrito pelo prefeito,mastambmcominformaessobreofundodereservaecom um relatrio de como ir empregar os recursos. Nesseponto,algunspoderiam questionarseoempregodosrecursosno estrestritorbitadecompetnciasdaAdministrao.Afinal,aleinod 17.Tecnicamente, o Judicirio pode autorizar o levantamento ou repasse,o que implicaria na transferncia dos 70%para a conta de depsito ou de investimento atrelada aofun-do de reserva para garantia de depsitos judiciais.Isso,no entanto, insuficiente para que o municpio possa empregar os recursos. Da o porqu de se fazer a distino entre requisitospara levantamentoourepasse(requisitosestticos)e requisitos para saque (requisitosdinmicos).Oempregodosrecursoss admissvel quando satisfeitosos requisitos para saque, uma vez satisfeitos os requisitos para levantamento ou repasse. 18.Oexamedevese limitar suficincia dosrecursosnofundopara honrar eventuais restituies de valores aodepositante.Consideraes acerca da convenincia e opor-tunidade do saque escapam aocontrole judicial. 19.Casoojuizqueira,essatarefapodeserdelegadaprpriainstituiodepositria. Porm, a delegao no automtica, como fazsupor a linguagem empregada na Lei 10.819/2003. H necessidade de que a delegao venha de uma ordem judicial, e no do mero comando legal. T I! $. ' I .......... ~ _..._ ..- . .... "'r"-poder de fiscalizao ao juiz e o controle judicial da destinao dos recursos re-presentaria ingerncia do Poder Judicirio nas questes internas do municpio. Entende-se que no.Como a lei d destinao especfica para o que repassado nosseustermos,estipulandoanecessidadedeapresentaodeum termode compromisso ao juiz, conclui-se que, subjacente ao termo, tem de haver algum mecanismo que assegure o seu cumprimento. Do contrrio, ter-se-ia uma mera carta de intenes; no um termo de compromisso. Dentreasobrigaesassumidaspeloexecutivomunicipal com aapresen-taodotermoest a de manuteno dosaldo mnimo no fundo.Trata-sede uma condio de ordem objetiva e que deve ser avaliada pelo juiz antes que o municpiopossaefetuarqualquer saque dacontaem quedepositadososre-cursos repassados.Essacondiode saldomnimo pode ser divididaem dois requisitos,asaber:(a)existnciade50 depsitose(b)saldo superior aos50 maiores depsitos e a 30% do total de depsitos.Passa-se, portanto, aoexame de cada um desses requisitos. 5.1Existncia de 50 depsitos com valores destinados ao fundo De incio, cabe trazer o que dispe a Lei 10.819/2003 acerca do saldo mni-mo dofundode reserva para garantia de depsitos judiciais: "Art.2. A habilitaodo municpioaorecebimentodastransferncias re-feridasno2.doart.1.0[repassedos70%1ficacondicionadaapresenta-o, perante o rgo jurisdicional responsvel pelo julgamento dos litgios aos quais se refiram os depsitos, de termo de compromisso firmado pelo Chefe do Poder Executivo Municipal, que preveja: (. .. ) III- amanutenonofundodereservade saldo jamais inferioraomaior dos seguintes valores: a)o montante equivalente parcela dos depsitos judiciais mantida na ins-tituio financeira nos termos do3. do art.1.0[30%dototal de depsitos], acrescida da remunerao que lhe foioriginalmente atribuda; b)a diferena entre a soma dos 50 (cinquenta) maiores depsitos efetuados nostermosdoart.1. [total de depsitos judiciais que geraram repasses 1 ea soma das parcelas desses depsitos mantidas na instituio financeira na forma do3.domesmoarL1.0[30%dototaldedepsitos],ambasacrescidasda remunerao que lhes foioriginalmente atribuda." A redaododispositivoacimano facilitaa sua compreenso.Quando a alnea b do inc. IIIao art.2. coloca como um dos pisos para saldo no fundo"a 118REVISTATRIBUTRIAE DE FINANASPBLICAS2011RTRIB97 diferena entre a soma dos 50(cinquenta) maiores depsitos c. .. ) e a soma das parcelas dessesdepsitos mantidas na instituio financeira",est na verdade dizendoqueofundospode ser movimentadoquandotivermaisde50de-psitos. claro que est dizendo mais do que isso, pois o legislador empregou como parmetro os 50 maiores depsitos.Porm, para haver 50 maiores dep-sitos preciso haver,primeiro, 50 depsitos de qualquer valor. Somente a partir do quinquagsimo primeiro depsito o municpio se habili-ta a sacar valores do fundo. Se esse depsito a mais for de valor inferior a todos os depsitos precedentes, ento o municpio estar apto a empregar 40% dele como determina a lei. Isso quer dizer que 40% desse quinquagsimo primeiro depsito entram no caixa municipal e 30 ficam no fundo.Porm, se esse quinquagsimo primeiro depsitoforde valor superior a qualquer dos 50 depsitos anteriores, ento o municpioter direito de sacar 40%domenor dos 50 depsitos j exis-tentes. Aparentemente, o legislador federal quis preservar os 50 maiores depsi-tos,de tal sorte que sempre houvesse saldo no fundopara honr-los. 5.2Saldo superior aos 50 maiores depsitos e a 30% dototal de depsitos patrocinadores dofundo Semprequeofundoestivergarantindomaisde50depsitosjudiciais,o municpioterdireitodeefetuarsaquesemmontantesqueserocondicio-nadospelamanutenodosaldomnimo.Osaldotemdesersuperioraos 50maioresdepsitosetambma30%dosomatriodosdepsitos judiciais quegeraramrepassesparaofundo.Matematicamente,issoquerdizerquea quantidade dedepsitos judiciais e adispersode seus valores serocruciais para determinar qual dessesparmetros ser maisrelevante:seos 50 maiores depsitos ou se o saldo de 30%. Paraexemplificar,pode-secriarumasituaohipottica.Ummunicpio contacom238depsitos judiciaisem dinheiro.Cadadepsitosuperior ao anterioremR$0,01 eoprimeirodepsitovaleR$1,00.Nessasituao,o somatriodosdepsitos judiciaisemdinheiroserdeR$520,03.Somando--seos50 maioresdepsitos,obtm-se R$156,25;e calculando-se 30%deR$ 520,03(total de depsitos judiciais em dinheiro),se chega aR$156,01.Por-tanto,nessasituao,os50maioresdepsitosserodeterminantesdosaldo mnimo.Porm,casohajaum depsitoamais,oresultadodiferente.Com 239 depsitos, os 50 maiores depsitos totalizam R$156,75, enquanto 30% do total do R$157,02. Desse modo, o saldo mnimo passa a ser controlado pelos 30%e nomais pelos 50 maiores depsitos.Obviamente,tais nmeros foram escolhidos de propsito, para demonstrar que, com uma pequena disperso de CiNCIADASFINANAS valores(diferena mdia entre os valores dos depsitos), so necessrios mais de238 depsitos para que o saldo mnimo no fundoseja regulado pela alnea a do inc.III ao art.2.(30%do total de depsitos). Agora,cabeconsiderarumasituaobem diferente.Cadadepsitosu-perior aoanterioremR$100,00eoprimeirodepsito,comonocasoante-rior, vale R$1,00, porm agora o municpio conta com 306 depsitos judiciais em dinheiro.Nessasituao hipottica,o somatriototal dedepsitosdR$ 4.666.806,00 e a soma dos 50 maiores depsitos,R$1.402.550,00.Constata--se facilmenteque 30% dototal de depsitos perfazem R$1.400.041,80, valor inferior aos 50 maiores depsitos.Porm, se o municpio contar com mais um nico depsito extra, superior ao de nmero 306 em R$100,00, o resultado diferente. Nessa outra situao, o somatrio dos depsitos d R$4.697.407,00; os50maioresdepsitosdoR$1.407.550,00;eos30%,R$1.409.222,10. Constata-se, assim,que a alnea a do inc.IIIsser relevante quando houver 307 depsitos ou mais, nos casos de grande disperso de valores. Dos exemplos acimaconclui-se que os 30% dototal de depsitos(alnea a do inc.III)dificilmente sero relevantes nos casos em que o municpio contar com menos de 239 depsitos.O que determinar o saldo mnimo o somat-riodos 50 maiores depsitos. j, para os municpios com mais de 238 depsi-tose menos de307,oque serdeterminante nocontrole dosaldomnimo a dispersode valores dos depsitos judiciais, ora sendo relevantes os 30%do totaldedepsitos(alnea a),oraos50 maioresdepsitos(alneab).Por fim, para os municpios com mais de 306 depsitos,h uma grande probabilidade de que o saldo mnimo do fundo seja controlado pelos 30% do total de depsi-tos(alnea a), tornando-se irrelevantes os 50 maiores depsitos. Para simplificar, o municpio s deve se preocupar com a alnea a do inc. III quando o fundo de reserva tiver o patrocnio de algo entre 238 e 307 depsitos judiciais em dinheiro.Com mais de 50 depsitos e menos de 239, o municpio deve se preocupar apenas com o somatrio dos 50 maiores depsitos, isto ,a alnea b do inc.III. SegundodadosdoConselhoNacional de justia(BRASIL,2010.p.390),os municpiosdetodososEstadosdafederao,excetoDistritoFederal,Minas Gerais, Paraba, Riode janeiro e SoPaulo - os dados noestavam disponveis -, figuraram como autores de 2.594.879 demandas judiciais novas e pendentes nas instncias de primeiro grau doPas durante o anode 2009.20 Dividindo-se 20.Soconsideradas asdemandas em queosmunicpios figuramnopoloativoporque boa parte delas aoexecutiva fiscal,que s pode ser embargada aps depsito ju-dicial do valor correspondente aocrdito tributrio discutido. 119 20KEVISTAI RIBUTARIAE DErlNANASt"UBLlCASLU I In I KI/j::J I essaquantidade de aes pelototal demunicpios(3.750)em todosessesEs-tadoscom dadosdisponveis,obtm-se uma mdia nacional de692 demandas por municpio.Sabidoque mais da metade dessas demandas execuo fiscal, pode-se afirmar com segurana que uma nova execuo fiscalsurge a cada dia do ano. Assim, num horizonte de dois meses, um municpio j conta com mais de 50 execues em curso.E se,a cada10 aes,uma resultar em depsito ju-dicialem dinheiro,ento,na mdia,um municpiocontar com 50depsitos no fundode reserva para garantia de depsitos judiciais no prazo de 20 meses. Isso indica que esse municpio passa a ter condies de sacar dinheiro do fundo aps2 anos de sua instituio.Porm, para passar a se preocupar com o saldo mnimo de 30% dos depsitos que geraram repasses (alnea a do inc. lll), o mu-nicpio gastaria algoem torno de 8 anos (cerca de duas gestes consecutivas). Obviamente, os clculos apresentados acima so rudimentares e podem va-riar muito, conforme o tamanho do municpio, a pujana da economia local e a organizao da procuradoria municipal. Porm, uma concluso certa: mesmo que institua o fundode reserva para garantia de depsitos judiciais, o munic-pio contar com resultadosde caixanomdioe longoprazos.Mesmoassim, o emprego dofundosignifica um passo positivo no sentido da preservao do equilbrio nos oramentos municipais.Seuma execuo fiscalpode durar d-cadas e mais dcadas sem que se alcance qualquer resultado prtico, ento uma medida que,como essa,pode antecipar ingressos futurosdeve ser festejada. No entanto, essa comemorao h de ser modesta. Asrendas no ingressam no tesouromunicipal livres de vinculao.Hdestinaoespecfica,o que se passar a estudar no tpico seguinte. 6.DESTINAODOSRECURSOSSACADOS EisodispositivodaLei10.819/2003quetrata da destinaodosrecursos sacados pelas municipalidades: "Art.3. Os recursos repassados na formadesta Lei aos Municpios, ressal-vadosos destinados aofundode reservade que trata o1.0doart.1.0,sero aplicados, exclusivamente, no pagamento: I - de precatrios judiciais de qualquer natureza; II - da dvida fundadado Municpio. Pargrafo nico.Na hiptese de previso na lei oramentria municipal de dotaes suficientes para o pagamento da totalidade das despesas referidas nos incisos I e II exigveis no exerccio, o valor excedente dos repasses de que trata o caput poder ser utilizado para a realizao de despesas de capital." Os precatrios judiciais surgem de sentenas judiciais que condenam a Fa-zenda Pblica a pagar determinada quantia em dinheiro. Para Osvaldo Maldo-nadoSanches(1997.p.200),trata-sede"despesasdecorrentesdesentenas judiciais, de pagamento obrigatrio desde que regularmente inscritas no prazo (at1.0de julho)econdiesestabelecidasnoart.100daConstituio,nos casos em que osujeito passivoda obrigao seja a Fazenda Federal,Estadual ou Municipal (dbitos da administrao direta e autrquica)". A despesa correspondente a um precatrio informada ao Poder Executivo por meio de um ofciorequisitrio.O ofciorequisitrio o documento judi-cial por meio doqual a autoridade judiciria competente solicita, aochefe do PoderExecutivodesua reade jurisdio,queincluanooramentodoano seguinte o valor correspondente condenao transitada em julgado. Para ge-rar um precatrioaser adimplidono exerccioseguinte,o ofciorequisitrio precisa ser recebido pela Administrao antes de 1.0 de julho do ano em curso. Docontrrio,a Administrao somente estarobrigada a inclu-lo na lista de precatrios a serem pagos no ciclo oramentrio seguinte. importante notar que os precatrios sempre dizem respeito a dvidas ven-cidas."Asobrigaesvincendas,acontardasentena,podemedevemser pagas imediatamente, o que acontece, sobretudo, em matria de pessoal"(TOR-RES,1995.p.188).Dessemodo,quandoo juiz condenar a Administraoao pagamentodedeterminadaquantiaemcarterpermanente,somenteaspar-celasvencidasenopagasatotrnsitoem julgadoentraronoregimedos precatrios e, consequentemente, da Lei10.81912003. No pode a Administra-osacar recursosdosdepsitos judiciais para quitar prestaes vencidasou vincendas a partir domomento dotrnsitoem julgado.Essasparcelas devem ser pagas de imediato, ou na medida em que vencerem, com os recursos dispo-nveis no caixa dotesouro municipal. Embora a lei empregue a expresso "precatrios judiciais de qualquer natu-reza",cabeadvertir o administrador pblicoacercadapossibilidade de que o precatrio seja objeto de ao rescisria ou qualquer outro gravame judicial ou extrajudicial.Nessascircunstncias,quando no setrata deprecatrio limpo, recomendvel que o pagamento com dinheiro sacado do fundo de reserva so-mente ocorra aps autorizao do rgo judicial em que tramita a rescisria ou do juzo competente para conhecer do gravame judicial ou extrajudicial.Com essaprtica,o gestor pblico evitar problemasdecorrentes domau emprego dos recursos gerados por meio da Lei10.819/2003. Quanto dvida fundada,tambm pode ser adimplida com os recursos ge-radospor meiode saquesdofundodereservapara garantiadedepsitos ju-diciais em dinheiro.Porm, antes de prosseguir, cabe definir o que seja dvida fundada. Ela"corresponde quela dvida que contrada pelo Tesouro(da Unio, de Estadoou deMunicpio),mediante aemissodettulosou contrataocom instituiesfinanceiras,paraatenderacompromissosdeexigibilidadesupe-riora12mesesedestinadosaoequacionamentodedesequilbriosoramen-triosou aofinanciamento(custeio)deobras,programasdemdiaou longa durao, e/ou de servios pblicos cuja natureza viabilize a tomada de recursos junto a terceiros"(SANCHES,1997. p.88-89). Nos termos do art. 52, VII, da CF/1988, compete privativamente ao Senado Federal dispor sobre limites globaisecondies para asoperaes de crdito externo e interno dos municpios e de suas autarquias. Com base em suas reso-lues, o Senado Federal tem editado regras que, ao longo dos anos, enrijece-ram sobremaneira ascondies para a emisso municipal dettulos pblicos. Alis, h tempos, o art.167, III, da CF/1988 veda "a realizao de operaes de crditos que excedam o montante das despesas de capital, ressalvadas as auto-rizadasmediante crditos suplementares ou especiaiscom finalidadeprecisa, aprovados pelo Poder Legislativo por maioria absoluta". Hojeadvidafundadanochegaaconstituirumproblemadeprimeira magnitude para qualquer municpio brasileiro. Detodo modo, caso existentes prestaes dadvidafundadaa vencer,omunicpiopode adimpli-Iascom os recursos sacados dofundode reserva.Lembre-se,aqui,a importncia atribu-dapelolegisladorconstituintequitaotempestivadadvidafundada.O inadimplemento da dvida fundada por mais de dois anos consecutivos consti-tui motivo para a interveno do Estado no municpio, caso inexistente motivo de fora maior (art. 35, I,da CF/1988). Porfim,sehouverdotaesoramentriasbastantesparacobriropaga-mento de todos os precatrios judiciais correspondentes ao ciclo oramentrio em cursoe para aquitaodasparcelasdadvidafundadaa vencer no mes-mociclo,21entoamunicipalidadepodeempregarosrecursossacadospara fazerfrentead e s p e ~ a sdecapital.Cabe,noentanto,notarquearealizao dessasdespesasestcondicionadaaoscrditosoramentriosouadicionais correspondentes, por fora da vedao do art.167, II, da CF/1988. Mesmo que 21.Desnecessrio dizer que asparcelas eventualmente vencidas e no pagas tm priori-dade, observada sempre a antiguidade de vencimento. Diferentemente do que ocorre em relaoaosprecatrios, a destinao dosrecursos sacados para o adimplemento da dvida fundada tem como objeto principal as prestaes vincendas, pois o legisla-dor assume que a dvida esteja sendo paga tempestivamente. atendidos todos osrequisitos da Lei10.819/2003, no pode a municipalidade empregar os recursos oriundos de saques no fundo de reserva para fazer frente a despesas de capital que excedam s constantes na previso oramentria. 7.A CONSTITUCIONALIDADEDALEI10.819/2003 Umaspectoquenopoderiaescaparaopresenteestudoodaconstitu-cionalidade da Lei10.819/2003.Como se sabe, os operadores do direito esto sempre preocupados em classificar,definir edistinguirosdiversosinstitutos jurdicos, como estratgia para identificar a conformidade de uma nova norma sque lhe precedem.Ecom odireitopbliconoseriadiferente.Quandoa Lei9.703/1998 veiotona,noforampoucos os que apontaram dvidas em relao sua constitucionalidade.22 A leifoiacusadade violarosprincpiosconstitucionaisdasegurana ju-rdica,daisonomia,dodevidoprocessolegal,daseparaodepoderes,en-treoutros.MarileneRodrigues(1999.p.48)notouqueodepsitojudicial garantia do juzo e nodocredor,que conta com outros meios processuais paraasseguraroseucrdito.Porisso,oseulevantamentosignificariauma apropriaodevaloresemlitgio,numdisfaradoemprstimocompulsrio institudo por lei ordinria. E, para Hugo de Brito Machado (1999. p.16), a Lei 9.703/1998 havia reinstitudo a regra dosolve etrepete,de longa data repelida pela jurisprudncia. Aoinvestigaroconceito jurdico subjacente aotermodepsito,Machado (op. cit., p. 13) lembrou que o instituto do direito processual civil "no transfe-re a propriedade do dinheiro depositado para a Fazenda Pblica. Depsito no pagamento.garantia deque este serfeito.Apenas uma garantia.Suaca-racterstica essencial, em se tratando de depsito para garantia do juzo, como ocorrenocasodequesecuida,odepermanecer em mosdeterceiros.O depsito medida preparatria,preventivaoude segurana,queconsiste na entrega de coisa apreendida guarda ou vigilncia de terceiro". 22.OConselhoFederal da OABingressou,em 11.12.1998, com aodireta de incons-titucionalidadecontra aLei9.703/1998,alegando,entreoutrascoisas,"invasoda esfera de atuao do Poder Judicirio perpetrada pelo Poder Executivo"(f.da ADIn). O processo foi autuado como ADIn 1.933, examinado no mrito pelo pleno do Pret-rioExcelso em 14.04.2010.Por unanimidade, a Corte julgou a ADIn improcedente. Naementadoacrdoprolatadoficouconsignadoinexistirviolaoaoprincpio da harmonia entre os poderes,vezque"a recepoe a administrao dos depsitos judiciais no consubstanciam atividade jurisdicional". Todas essas crticas inovao da Lei 9.703/1998 se encaixam com preciso no repertrio de objees oponveis Lei 10.819/2003, que trata dos depsitos judiciais no mbito municipal.Porm,tantolquantocnoh violaoao direito posto. A Lei10.819/2003 no padece dos vcios antes apontados. Primeiramente, elano viola oprincpioda segurana jurdica, por alterar asregrasaplicveisaosdepsitos j existentes quandodesua edio.Aoefe-tuar o depsito, o contribuinte no adquiriu direito sua intocabilidade. Pelas regrasdoinstitutoprocessualcivil,olitigantetemtosomente agarantiade que o valor correspondente lhe ser prontamente devolvido, se restar vencedor nalide.Portanto,anovadestinaodovalordepositadonoalteraessaga-rantia,razo por que no h infrao aoprincpio da estabilidade das relaes jurdicas. Com relao aoprincpio daisonomia, no seconstatam quaisquer preju-zos.A Lei10.819/2003 no suprime qualquer faculdade processual do litigan-te,no lhe impe gravame jurdico nem tampouco institui favorexclusivo da Fazenda Municipal.O objeto da lide no o depsito,mas to somente o cr-ditotributrio a que ele subjaz.Por isso,o emprego do depsito no interfere na paridade de armas.O litigantecontra afazendaainda conta comtodosos instrumentos de lei para fazer valer a sua pretenso. Noque dizrespeito ao devido processo legal,a norma federal at mesmo mais inofensiva.Sob a premissa de que o levantamento s poderia vir ao final, quando dotrnsito em julgado dasentena favorvelaofisco,h quem tenha sustentadoomaltratododueprocessoi lawpelaLei9.703/1998.Nodireito norte-americano,odueprocessdivide-seemdevidoprocessolegalprocedi-mental(proceduraldueprocess)edevidoprocessolegal substantivo(substan-tivedueprocess).Oprimeirodizrespeitoaoprocedimentoaserempregado quando sevaiprivar o indivduode sua vida,liberdade ou propriedade;o se-gundo, ao exame meritrio da turbao ou esbulho estatal a direito substantivo doadministrado.Sendoocasodedevidoprocessoprocedimental,oEstado devesopesara relevnciadobem paraoindivduo,empregar procedimentos que assegurem a fidelidadedas provas e,por fim,ponderar o interesse pblico tutelado.Seforo casode devidoprocesso legal substantivo, otestea ser em-pregado variar em sintonia com otipode direito envolvido. 2323.Em funodo tipo de direito investigado luz dodevido processo legal substantivo, ooperadordodireitonorte-americanoempregatestesdetrsdiferentesrigores:o exameminucioso(strictscrutiny),otestedonusexcessivo(undueburdentesOe arevisoembasesracionais(rationalbasisreview).Paraexemplificar,osdireitos fundamentaisquasesempredesencadeiamstrictscrutiny.Porseremfundamentais, Nocasododepsito judicial,odireitoenvolvidonoodepropriedade, maso de incolumidade do depsito efetuado pelo contribuinte. Sendo, ento, umdireitonofundamental,elereivindicaromenosrigorosodostestes paraexamedeeventualviolaoaosubstantivedueprocessoi law.Trata-se dorationalbasistest,queem sntese resultarnainvestigaod a ~razespor trsdasmedidassupostamente violadorasdaproteoconstitucionaL Tinha ogovernoumbommotivoparaconstringirodireitoindividualinvocado? Sesim,ento nohouve violao.E aqui o legislador nacional tinha um bom motivopara editar a Lei10.819/2003: afastar a ociosidade de recursos muitas vezesdevidos aos tesouros municipais. Noatinenteclusuladeseparaodospoderes,aleiqueddestinao especficaa recursosdepositadosem juzonointerferenaprestao jurisdi-cional,nemtampoucodesequilibraarelaoestabelecidaentreaspartesno processo e o magistrado. O legislador no atinge qualquer bem sob domnio do juiz, mesmo porque os depsitos judiciais carecem denatureza judicial.Seo recebimento do depsito e a penhora subsequente so atos judiciais interlocu-trios com carga jurisdicional, o mesmo no se pode dizer da destinao dada aovalor penhorado, ato exclusivamente administrativo. Por isso,o diploma legal que institui a possibilidade de levantamento est regulandoomododeadministraodomontantedepositado.Nosetrata devalor pertencente ao Judicirio, vezque no integrante doseuoramento. Ademais,nem sepode dizer que o legislador estivesse impedidode ditar nor-masquanto aoprocedimento de depsito,pois docontrrio estaria impedido exigem um cuidado muito maior do aplicador do direito. Sofundamentais os direi-tos privacidade, aomatrimnio, paternidade, custdia dos filhos, manuteno da famlia,de criar os filhos,de usar contraceptivos, de se locomover livremente, de votar, bem como as liberdades de expresso, de associao e de culto religioso. Quanto ao aborto, embora vinculado ao direito de privacidade da mulher, no suscita origor do strictyscrutiny;odireitodeabortar se submete aoundue burdentest.Isso quer dizer que o aplicador do direito deve se perguntar se a lei que veda o aborto pe umnusexcessivonodireitodeprivacidadedamulher.Trata-sedeumtestecom rigor intermedirioentreostrictscrutinyeorationalbasisreview.Por ltimo,vm osdireitosquesesubmetemaomenosrigorosodostestes,orationalbasisreview. Submetem-seaessetipodetestetodososdireitosnofundamentais,taiscomoo direitodeexercer uma profisso,odireitoao suicdio assistido,odireito educao (nosEstadosUnidos,educaonodireitofundamental)etudoomaisquediga respeito s liberdades econmicas. H ainda os direitos para os quais no se definiu a intensidade do exame a ser empre-gado.Por exemplo, as cortes divergem bastante quando se trata do direito de manter relao ntima homossexual ou dodireito de recusar tratamento mdico. delegislarsobrematriaprocessual.Portodasessasrazes,nosubsistea alegao de invaso seara de competncias do magistrado, no havendo, por conseguinte, qualquer ofensa separao dos poderes. A ideia nuclear da mais promissora linha de argumentao contra a higidez daLei9.703/1998 - ideia,nocaso,vlidatambm quanto Lei10.819/2003 - a descaracterizaodoinstituto dedepsito.Afinal,se o governo pode le-vantar oque depositado,ento no h depsito,e sim pagamento.Masno bem assim. A transferncia dos recursos para o Poder Executivo no induz pa-gamento porque o crdito tributrio somente estar extinto quando o depsito subjacente for convertido em renda, nos termos do inc. VIao art.156 do CTN, ou quando passar em julgado a deciso anulatria do lanamento que ocons-tituiu, conforme inc. X do mesmo dispositivo. Ademais, se o depositante restar vencedordalide,ser-Ihe-devolvidoemtrsdiasteisovalordodepsito mais os seus acrscimos(art.4. da Lei10.819/2003). Alis,como ofundode reserva deve ser remunerado taxa referencial do Sistema Especial de Liquida-o e Custdia (Selic), segundo art.2.,l.0, da Lei10.819/2003 - do fundo que sairoos recursos para restituiodaparcela sacada pela municipalidade (40%)-,tem-sequeos70%(os40%sacadosmais30deixadosnofundo) doque devolvidoaodepositante estarocom correoda Selic,cujos valores superam com folgaos da correo ordinria para a conta de depsito judicial. Tambm nose pode dizerqueosaque de 40%decadadepsito judicial constituareceitamunicipal.Receitapblica,segundoBaleeiro(198l.p.116 apud MACHADO,1999. p.13), " a entrada que, integrando-se no patrimnio p-blicosem quaisquer reservas,condiesou correspondncia no passivo,vem acrescero seu vulto,comoelementonovoe positivo".H,portanto,necessi-dade de que a entrada ingresse sem reservas e sem condies. Porm, isso no ocorre com relao Lei10.819/2003. Asentradas se destinam ao pagamento de precatrios e da dvida fundada e, em casos excepcionais, ao adimplemento de despesas de capital, conforme inteleco do art. 3., incisos e pargrafo ni-co.Alm disso, a condio para que tais entradas se tornem renda municipal a instituio do fundo de reserva(art.l.0,2.), bem como a recomposio de seu saldo mnimo, sempre que necessrio(art.5.).Desse modo,a destinao especfica,mais ascondiesdelei,noconferem aflexibilidadeoperacional tpica da receita pblica aos saques da municipalidade. ,defato,difcildefiniranaturezadessessaques.Poder-se-iadefini-los como operaes de crdito em relao aos valores levantados. Porm, o crdito socorreriaquantoaosdepsitospatrocinadosporaquelesquetmdireito oponvel pretenso tributria municipal. Nos demais casos, estaria ocorrendo ummeroadimplementocontemporneodetributosdevidosporquem,por mera emulao,contesta aautoridadedoEstado;por avareza,distorce o pro-psito de suas leis;por esprito ldico, aposta na vitria inesperada. No se est a defender presuno absoluta de legitimidade na conduta esta-tal. Porm, no se pode negar que a rgua a dar a extenso do direito individual doquetem capacidadecontributivatambm dar a dimensodoindispens-vel para oque nem sabe o significadodetributo, porque, miservel,nem tem comoentend-lo.Para esclarecer,ocontribuinte que emparelha armas com o Estadonooque deleextraiomnimoexistencial.Muito pelocontrrio, justamente aquele que contabilizou ganho monetrio com a ordem financiada peladespesapblica ecapitalizou benefcioeconmicocom oprogressores-guardado pelas instituies estatais. Detodomodo,essasconsideraesdesbordamaocampodacincia jur-dica.Mas sempre bom recordar que a boa aplicaododireito s possvel quandobemcompreendidaarealidadeaqueodireitoseaplica.Oqueera justoontem nonecessariamente justo hoje.O justo dehoje pode nem se-quer fazerparte dodireito de amanh.E osdireitos que esto por vir podem, inclusive,desviar anossacompreenso do justo para quadrantes hoje inima-ginveis.Realidade e direito se conformam, progredindo ambos, sempre que a boa compreenso da realidade alicera a melhor aplicaodo direito. Atpor isso,para se buscar o melhor entendimento dodireito, preciso re-tornar scrticas de parte da doutrina Lei 9.703/1998 e,aqui, redirecionadas Lei10.819/2003.Castro(1999.p.35), que se lanou em defesada lei,sustenta queolevantamentoderecursosem contasdedepsito judicial noassumea forma de emprstimo compulsrio porque, no depsito, "no existe a obrigao, odever,a imposio"de serealiz-lo.Contudo,na dicodeMachado(1994. p.91-93), o depsito judicial pode ser de trs modalidades: depsito voluntrio, depsito como contracautela e depsito na execuo fiscal. Ser voluntrio quan-doocontribuinte pretender a suspensodaexigibilidade docrditotributrio; ter natureza contracautelar quando o juiz exigi-lo para deferimento de medida liminar; e estar atrelado ao executivo fiscal quando feitocomo garantia do juzo nos autos do processo correspondente.Portanto, oargumento que afasta atese de emprstimo compulsrio institudo por lei ordinria s valeria em relao ao depsito voluntrio, pois no se pode negar o carter compulsrio dos demais. Detoda sorte,o melhor contra-argumento no parece perpassar o problema davoluntariedadeounododepsito.Mesmoporque,aindaquevoluntrio, nada impede que a Unio venha a instituir um emprstimocompulsrio sobre valores depositados em juzo. A questo deve ser resolvida noutra seara. Emprs-timocompulsriotemopropsitodefazerfrente"adespesasextraordinrias, decorrentes de calamidade pblica,de guerra externa ou sua iminncia"Cinc.I 128 REVISTATRIBUTRIAE DE FINANASPBLICAS2011RTRIB97 do art.148 daCF/1988).Tambm pode ser institudo "no caso de investimento pblico de carter urgente e derelevante interesse nacional"(inc.IIdo mesmo dispositivo).No o caso aqui,pois inexistente calamidade pblica, guerra ex-ternaounecessidadedeinvestimento urgentee relevante.Ademais,o valor na conta de depsito judicial no constitui recurso novo, mas simplesmente quantia subjacente a crdito tributrio em aberto, inquinado de desavena concernente lei, s suas disposies regulamentares ou ao lanamento do fisco. Ento, no parece adequado emprestar aolevantamento ou repasse de 70% dodepsitojudicialumadesignaodistintadadotributoqueooriginou. Comoesselevantamento sempre seoriginadeuma lidedecunhotributrio, h por detrs dadisputa sempre um imposto,umataxa,uma contribuio de melhoria,umacontribuio especial ou um emprstimo compulsrio.24O le-vantamento dodepsito,portanto,nada mais doque a realizaodareceita oramentriaestimadaparaotributodiscutido.Nosetratadeoperaode crdito contra o depositante, emprstimo a custa do Judicirio ou apropriao dopatrimnioprivado.A leidefiniuahiptesede incidncia,ocontribuinte praticouofatoimponvele,comisso,surgiuofatogeradorque,pelolana-mento,deuazoaocrditotributriodiscutido.Nessacadncia,mesmoque maistardeo Judicirioviesseaanularolanamento,issonomodificariaa espcie tributria cujo crdito deu origem ao depsito judicial. Mesmo nos ca-sos de inconstitucionalidade da norma que descreveu a hiptese de incidncia, no se pode negar que a exigncia do tributo gozou da presuno de legalidade at o trnsito em julgado da decisocontrria aofisco. Poressasrazes,aLei10.819/2003noofendeosprincpiosconstitucio-nais da segurana jurdica, da isonomia, do devido processo legal, da separao de poderes, nem tampouco desfigura o instituto do depsito ou faznascer em-prstimo compulsrio por meio de lei ordinria. A Lei 10.819/2003 hgida, se ajusta aodireito posto, e o seu ncleo(levantamento pelos municpios de 70% dos depsitos judiciais em dinheiro) legitimado pelo interesse pblico de se evitar a ociosidade derecursos muitas vezes devidos aomunicpio. 8.CONCLUSO A faculdadedaLei10.819/2003pode servirdealentoparaasmunicipali-dadesquepelejamcontraaexiguidadedosrecursosemcaixa,ascrescentes 24.Emprega-seaquiaclassificaopentapartitedostributos:Ca)osimpostos,Cb)as taxaseCc)ascontribuiesdemelhoria,todoselencadosnoart.145daCF/1988, maisCd)osemprstimoscompulsriosdoart.148eCe)ascontribuiesespeciais discriminadas em dispositivos diversos da Constituio. CiNCIADASFINANAS demandas dos muncipes e os custos que acompanham direitos sociais, por ve-zes,garantidos por ordem judicial. Porm, por si s, a lei no resolve problema algum. Ela s ter algum impacto positivo no caixa se a municipalidade cuidar dafiscalizaoecobranadeseusprpriostributos.Osdepsitosjudiciais em dinheiro no surgem apenas porque o legislador nacional resolveu mudar algumasde suas regras.Elesnascem porque algum estdisputando uma co-brana,que sempre resulta dos esforos domunicpio para cobrar os tributos que lhe competem. Viu-sequeomunicpioaatenderostrsrequisitospara levantamentoou repassededepsitosjudiciaisemdinheiro(leilocalautorizandoouconsti-tuindo o fundo,apresentao do termo de compromisso e competncia para o tributo discutido) passa a ter direito ao repasse dos 70%, 30% ficam na prpria contadedepsito.Dos70levantados,outros30%devemserdestinadosao fundode reserva,que na prtica outra conta, mantida na prpria instituio depositriaeremuneradapelaSelic.Osaldodessefundodevesermantido em, no mnimo, 30% do montante total de depsitos empregados na sua com-posio.Masissosomente seessesaldosuperar osomatriodos50m a i ~ r e s depsitos.Em decorrnciadessaregra,aexpectativamdia adequesejam necessrios de 238 a 307 depsitos para que o saldo mnimo dofundo passe a sercontrolado pelaregrados30%;docontrrio,os50 maioresdepsitosde-terminaro o quantum a permanecer no fundo. Essas questes relativasaosaldo mnimo,deregra,nocondicionam o le-vantamento ou repasse dos 70%, montante a ser de incio integralmente depo-sitado na conta do fundode reserva.O saldo mnimo ir condicionar o saque dos 40% a serem empregados no pagamento de precatrios, da dvida fundada ou, excepcionalmente, de despesas de capital.Por isso, fez-se a distino entre requisitos para levantamento ou repasse (requisitos estticos) e requisitos para saque(requisitosdinmicos).Estesestosempreligadosaocomportamento dosaldodofundodereservaparagarantiadedepsitosjudiciais;aqueles formadeinstituio,aocompromissoassumidopeloprefeitoeaomritoda disputa judicial subjacente aodepsito. Emseguida,passou-seanlisedomodocomoosrecursosdevemser empregados.A Lei10.819/2003foibemclara:precatriosedvidafundada. Porm,havendodotaooramentriasuficienteparaessasrubricas,amu-nicipalidadepodeempregarosrecursosemdespesasdecapital.Ocorreque taisdespesasesto limitadas aoscrditosoramentrios ou adicionaiscorres-pondentes,demodo querestoupouca margemde flexibilidadepara ogestor pblico.Oempregoderecursosoriundosdedepsitos judiciaisquaseque completamente vinculado. 129 I.jUIKIJ:lUIAKIAtUt rUtKILA)LVII- n/tflo ::JI Porderradeiro,foramexaminadasascrticasquevieramtonaquando daediodaLei9.703/1998, que trata de questo similar, porm na rbita de competncias da Unio. A Lei10.819/2003, aplicvel aos municpios, embora bem menos generosa doque a daUnio,ainda assim serve de destinatria de todas asobjees doutrinrias Lei9.703/1998. Apsa anlise dos argumen-tos mais frequentes(violao aoprincpio da segurana jurdica, aoprincpio daisonomia,aodevidoprocessolegal,clusuladeseparaodospoderes; desconstituio do instituto do depsito; e instituio de emprstimo compul-srioporleiordinria),concluiu-sequenenhumadessasalegaesmerecia prosperar. Deduz-se agora que a Lei 10.819/2003 mesmo constitucional. Em facedoexposto,infere-seque a Lei10.819/2003 representa um pode-rosoinstrumento para arecomposiodoscaixas municipais.Mas,por si s, a lei noresolveo problema de ningum.Elaapenas abreespao para que os administradores municipais arregacem as suas mangas e se ponham a cobrar o que do municpio. A natural demora dos processos judiciais no servir mais dedesestmulopara osprogramasdecombatesonegao.Afinal,oesforo ser recompensadocom parte dosrecursos que descansam por anos a fionas contas de depsito judicial. 9.BIBLIOGRAFIA BALEEIRO,Aliomar.Uma introduo cincia das finanas,1986. 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Acessoem:14.11.2010. ) vol.97mar.-abr./2011 Coordenao-geral EDVALDOPEREIRADEBRITO Coordenao de Jurisprudncia MARCELOCAMPOS :LHOEDITORIALNACIONAL- Agostinho ToffoliTavolaro,AndrKollerdiFrancescoLongo,AntonioCarlosRodriguesdo I, AntonioCludioMariz de Oliveira, Arnoldo Wald,AiresFernandinoBarreto,CarlosMrioda Silva Velloso,Cludio Santos, loArrudaAlvim,EduardoJardim,EdvaldoPereiradeBrito,FtimaFernandesdeSouzaGarcia,GilmarF. Mendes,Gustavo z deMello,HamiltonDiasdeSouza,Ivan TauilRodrigues,IvesGandradaSilvaMartins, JosCarlosMoreiraAlves,Joaquim deCerqueira Cesar, JosEduardo SoaresdeMello, LeoKrakowiack, LeonFrejda Szklarowsky,Manoel Gonalves FerreiraFilho, loCampos,MarceloMagalhesPeixoto,Marilene TalaricoMartinsRodrigues,MisabelDersi,NelsonJobim,Paulode Barros ho,PedroGuilherme AccorsiLunardelli,Plnio JosMarafon,RobertoRosas, Rogrio VidalGandraMartins, Sydney Sanches, SampaioFerraz,WagnerBalera,WilliamRobertoGrapellae ZelmoDenari. :LHOEDITORIAL INTERNACIONAL - Alberto Tarsitano (Argentina), Alberto Xavier (Portugal), Alfredo Bentez Rivas(Bolvia), ValleBilinghurst(Peru),AugustoFantozzi(Itlia),DiogoLeitedeCampos(Portugal),EusbioGonzalez(Espanha),Israel 1des Morales (CostaRica), JosLuizShaw(Uruguai), JosMariaMelndez Garcia(Guatemala),Klaus Vogel(Alemanha),Luiz I GomesSjoberg(Colmbia),ManoelPires(Portugal),PabloEgas Reyes (Equador),PieroAdonnino(Itlia),RubnCandeia ; (Espanha), Victor Uckmar (Itlia). ft1IY Academia Brasileira de Direito Tributrio www.abdt.org.br Av. 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