Juizados Especiais Federais

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Direito

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  • UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJA UNIVALI

    PR-REITORIA DE PESQUISA, PS-GRADUAO, EXTENSO E CULTURA PROPPEC

    CENTRO DE EDUCAO DE CINCIAS SOCIAIS E JURDICAS CEJURPS

    PROGRAMA DE PS-GRADUAO STRICTO SENSU EM CINCIA JURDICA PPCJ

    CURSO DE DOUTORADO EM CINCIA JURDICA CDCJ

    REA DE CONCENTRAO: CONSTITUCIONALIDADE, TRANSNACIONALIDADE E

    PRODUO DO DIREITO

    JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS:

    uma anlise crtico-propositiva para maior Efetividade no

    Acesso Justia e para a obteno de um Processo Justo.

    JOO BATISTA LAZZARI

    Itaja-SC

    2014

  • UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJA UNIVALI

    PR-REITORIA DE PESQUISA, PS-GRADUAO, EXTENSO E CULTURA PROPPEC

    CENTRO DE EDUCAO DE CINCIAS SOCIAIS E JURDICAS CEJURPS

    PROGRAMA DE PS-GRADUAO STRICTO SENSU EM CINCIA JURDICA PPCJ

    CURSO DE DOUTORADO EM CINCIA JURDICA CDCJ

    REA DE CONCENTRAO: CONSTITUCIONALIDADE, TRANSNACIONALIDADE E

    PRODUO DO DIREITO

    JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS:

    uma anlise crtico-propositiva para maior Efetividade no

    Acesso Justia e para a obteno de um Processo Justo.

    JOO BATISTA LAZZARI

    Tese submetida ao Curso de Doutorado em Cincia

    Jurdica da Universidade do Vale do Itaja

    UNIVALI, como requisito parcial obteno do ttulo

    de Doutor em Cincia Jurdica.

    Orientador: Professor Doutor Jos Antonio Savaris

    Co-orientador: Professor Doutor Daniele Porena

    Itaja-SC

    2014

  • AGRADECIMENTOS

    Professor Doutor Jos Antonio Savaris,

    pela confiana, amizade e competente orientao na realizao deste estudo.

    Professor Doutor Daniele Porena,

    pela co-orientao e apoio prestado na realizao de pesquisas

    junto Universit Degli Studi Di Perugia UNIPG.

    Conselho Nacional de Justia,

    por ter desenvolvido o Projeto CNJ Acadmico.

    Tribunal Regional Federal da 4 Regio,

    pelo incentivo e apoio na realizao deste projeto.

    Universidade do Vale do Itaja - UNIVALI e

    Universit Degli Studi Di Perugia UNIPG,

    pelas condies disponibilizadas para a realizao desta pesquisa.

    Professores e funcionrios do Curso de Ps-

    Graduao Stricto Sensu em Cincia Jurdica da Univali,

    pela ateno e presteza no atendimento.

  • DEDICO ESTE TRABALHO

    minha esposa Patrcia e s minhas filhas Nicole e Natlia,

    pelo amor, pela inspirao e pela compreenso em todos os

    momentos de ausncia em virtude dos estudos e do trabalho.

    Ao meu pai Fermino (in memoriam) e minha me Dozolina,

    pela educao e ensinamentos de vida.

    Ao amigo Gilson Jacobsen, colega de magistratura

    e de doutorado, pela parceria durante o Curso.

    s demais pessoas que colaboraram na realizao desta pesquisa,

    em especial, Lilian Rose Cunha Mota,

    Isabel Cristina Lima Selau

    Brbara Cristina Medeiros Costa,

    ao Luis Antnio Sba Salomo,

    e aos bibliotecrios da Justia Federal.

  • TERMO DE ISENO DE RESPONSABILIDADE

    Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte

    ideolgico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do

    Itaja, a Coordenao do Curso de Doutorado em Cincia Jurdica, a Banca

    Examinadora e o Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

    Itaja-SC, setembro de 2014.

    Joo Batista Lazzari Doutorando

  • PGINA DE APROVAO

    (A SER ENTREGUE PELA SECRETARIA DO PPCJ/UNIVALI)

  • ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS

    ACP Ao Civil Pblica

    ADIN Ao Direta de Inconstitucionalidade

    AGU Advocacia Geral da Unio

    AI Agravo de Instrumento

    AJG Assistncia Judiciria Gratuita

    AJUFE Associao dos Juzes Federais do Brasil

    ARE Recurso Extraordinrio com Agravo

    ART. Artigo

    CAPES Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior

    CCJC Comisso de Constituio e Justia e de Cidadania

    CEBEPEJ Centro Brasileiro de Estudos e Pesquisas Judiciais

    CEJ Centro de Estudos Judicirios

    CF Constituio Federal

    CJF Conselho da Justia Federal

    CNJ Conselho Nacional de Justia

    COJEF Coordenadoria dos Juizados Especiais Federais

    COORD Coordenador

    CPC Cdigo de Processo Civil

    CRFB/CF Constituio da Repblica Federativa do Brasil de 1988

    DE Dirio Eletrnico

    DIEST Diretoria de Polticas e Estudos do Estado, das Instituies e da

    Democracia

    DJ Dirio da Justia

    DJe Dirio da Justia Eletrnico

  • DJU Dirio da Justia da Unio

    DOU Dirio Oficial da Unio

    EC Emenda Constitucional

    EMAGIS Escola da Magistratura Federal da 4 Regio

    FGTS Fundo de Garantia por Tempo de Servio

    INSS Instituto Nacional do Seguro Social

    IPEA Instituto de Pesquisas Econmicas Aplicadas

    IRSM ndice de Reajuste do Salrio Mnimo

    FONAJEF Frum Nacional dos Juizados Especiais Federais

    JEC Juizado Especial Cvel

    JEFs Juizados Especiais Federais

    JEFTIs Juizados Especiais Federais Itinerantes

    MP Medida Provisria

    MPS Ministrio da Previdncia Social

    OAB Ordem dos Advogados do Brasil

    PEC Proposta de Emenda Constitucional

    PEDILEF Pedido de Uniformizao de Interpretao de Lei Federal

    PL Projeto de Lei

    PLS Projeto de Lei do Senado

    PJe Processo Judicial Eletrnico

    QO Questo de Ordem

    RAE Reunies de Anlise da Estratgia

    RE Recurso Extraordinrio

    REsp Recurso Especial

    RMS Recurso em Mandado de Segurana

    RPV Requisio de Pequeno Valor

  • TCJE Taxa de Congestionamento nos Juizados Especiais

    RE Recurso Extraordinrio

    REsp. Recurso Especial

    RI Regimento Interno

    SICOPP Sistema de Conciliao Pr-Processual

    SICOPREV Sistema de Percias Mdicas e de Conciliaes Pr-Processuais

    STF Supremo Tribunal Federal

    STJ Superior Tribunal de Justia

    TJ Tribunal de Justia

    TJSP Tribunal de Justia de So Paulo

    TNU Turma Nacional de Uniformizao dos Juizados Especiais

    Federais

    TR Turma Recursal dos Juizados Especiais Federais

    TRF Tribunal Regional Federal

    TRU Turma Regional de Uniformizao dos Juizados Especiais

    Federais

    UAA Unidade Avanada de Atendimento

    UNIPG Universit Degli Studi Di Perugia

    UNISINOS Universidade do Vale do Rio dos Sinos

    UNIVALI Universidade do Vale do Itaja

  • ROL DE CATEGORIAS

    Acesso Justia: Serve para determinar duas finalidades bsicas do sistema

    jurdico o sistema pelo qual as pessoas podem reivindicar seus direitos e/ou

    resolver seus litgios sob os auspcios do Estado. Primeiro, o sistema deve ser

    igualmente acessvel a todos; segundo, ele deve produzir resultados que sejam

    individual e socialmente justos.1

    Decises Judiciais: Solues oferecidas pelos rgos jurisdicionais por meio de

    despachos, sentenas e acrdos frente aos pedidos apresentados pelas partes em

    juzo.

    Decises dos Juizados Especiais Federais: Solues dadas por meio de

    despachos, sentenas e acrdos proferidos por Juzes e Turmas Recursais e de

    Uniformizao que integram a estrutura dos Juizados Especiais Federais.

    Direitos Humanos: Guarda relao com os documentos de direito internacional,

    por se referir quelas posies jurdicas que se reconhecem ao ser humano como

    tal, independentemente de sua vinculao com determinada ordem constitucional,

    aspirando dessa forma, validade universal, para todos os povos e tempos,

    revelando um inquestionvel carter supranacional (internacional).2

    Direitos Fundamentais: Direitos do ser humano reconhecidos e positivados na

    esfera do direito constitucional estatal.3

    Efetividade: um dos objetivos da moderna cincia processual apregoada nos

    ordenamentos jurdicos da atualidade com a finalidade de diminuir os conflitos e

    realizar a justia.

    Expectativa: Utilizada no sentido de expectativa jurdica que significa direito

    subjetivo sempre que existir um interesse juridicamente protegido.4

    Garantia Constitucional: Denominao dada aos mltiplos direitos assegurados

    1 CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso justia. Porto Alegre: Fabris, 1988. p. 8. 2 SCHFER, Jairo Gilberto. Direitos fundamentais: proteo e restries. Porto Alegre: Livraria do

    Advogado, 2001. p. 26. 3 Ibidem, p. 26. 4 FERRAJOLI, Luigi. Principia Iuris. Teoria do direito e da democracia. Bari (Italia): Laterza, 2007.

    p. 641.

  • ou outorgados aos cidados de um pas pelo texto constitucional.5

    Globalizao: Significa a experincia cotidiana da ao sem fronteiras nas

    dimenses da economia, da informao, da ecologia, da tcnica, dos conflitos

    transculturais e da sociedade civil, (...) que transforma o cotidiano com uma violncia

    inegvel e obriga todos a se acomodarem a sua presena e a fornecer respostas.6

    Juizados Especiais Cveis: Sistema processual com instncia recursal prpria,

    criado pela Lei n. 9.099, de 26 de setembro de 1995, para processar, conciliar e

    julgar causas de competncia da Justia dos Estados e do Distrito Federal at o

    valor de quarenta salrios mnimos e as de menor complexidade, bem como

    executar as suas sentenas.

    Juizados Especiais Federais: Sistema processual com instncia recursal prpria,

    criado pela Lei n. 10.259, de 12 de julho de 2001, para processar, conciliar e julgar

    as causas cveis de competncia da Justia Federal cujo valor da causa no

    ultrapasse os sessenta salrios mnimos, e os feitos criminais relativos s infraes

    de menor potencial ofensivo.

    Modelo: Conjunto de caractersticas de um Sistema de Justia.

    Pactos Republicanos: Conjunto de medidas adotadas por consenso entre os

    Poderes Executivo, Legislativo e Judicirio para a modernizao do Poder Judicirio

    no Brasil com vistas a facilitar o Acesso Justia, reduzir a lentido dos processos

    judiciais e a baixa eficcia de suas decises.

    Pequenas Causas: Processos judiciais que possuem pouca complexidade ou cujo

    valor demandado seja de baixa expresso econmica.

    Poder Judicirio: Poder que tem a atribuio de prestar jurisdio, garantido os

    direitos individuais e coletivos e resolvendo os conflitos sociais.

    Princpios Constitucionais: O ponto de partida do intrprete h que ser os

    princpios constitucionais, que so o conjunto de normas que espelham a ideologia

    da Constituio, seus postulados bsicos e seus fins. Dito de forma sumria, os

    princpios constitucionais so as normas eleitas pelo constituinte como fundamentos

    5 SILVA, De Plcido e. Vocabulrio Jurdico. Rio de Janeiro: Forense. 2003. p. 651. 6 BECK, Ulrich. O que globalizao? Equvocos do globalismo e respostas globalizao. So

    Paulo: Paz e Terra, 1999. p. 47.

  • ou qualificaes essenciais da ordem jurdica que institui.7

    Processo Judicial: Instrumento pelo qual se presta a jurisdio, podendo ser fsico

    ou eletrnico.

    Processo Justo: o processo judicial que cumpre as garantias do devido processo

    legal em sua dimenso substancial, sendo acessvel, adequado, clere e efetivo,

    com vistas a proteger os direitos demandados em juzo.

    Processo de Reviso: Sistema utilizado para processamento e julgamento dos

    recursos e impugnaes das decises proferidas no mbito dos Juizados Especiais

    Federais.

    Racionalidade: Utilizao adequada dos recursos para tornar mais eficaz e menos

    dispendioso o processo judicial.

    Razovel Durao do Processo: concebida como corolrio do acesso Justia

    qualificado, elemento do processo efetivo e, ainda, desdobramento do devido

    processo legal.8

    Reviso: A modificao total ou parcial de uma deciso judicial mediante

    provocao das partes.

    Sistema: Todo conjunto ordenado de tcnicas, normas e conceitos que venha a

    constituir-se num modelo.9

    Turma Recursal: Colegiado de juzes com competncia para processar e julgar os

    recursos contra decises dos Juizados Especiais Federais.

    Turma de Uniformizao: Colegiado de juzes com competncia para uniformizar a

    interpretao do direito material no mbito dos Juizados Especiais Federais.

    Tutela Jurisdicional Efetiva: Prestao jurisdicional que alcana sua finalidade,

    que realizar a justia no tempo e no modo esperado.

    7 BARROSO, Lus Roberto. Interpretao e aplicao da constituio. 2. ed. So Paulo: Saraiva,

    1998. p. 141. 8 FERRAZ, Leslie Shrida. Acesso Justia: uma anlise dos Juizados Especiais Cveis no Brasil.

    Rio de Janeiro: Editora FGV, 2010. p. 178. 9 MELO, Osvaldo Ferreira de. Dicionrio de Poltica Jurdica. Florianpolis: OAB-SC Editora, 2000.

    p. 88.

  • SUMRIO

    RESUMO 16

    ABSTRACT 17

    RIASSUNTO 18

    INTRODUO 19

    1 OS JUIZADOS ESPECIAIS COMO INSTRUMENTO DE ACESSO JUSTIA

    E A EXPECTATIVA DE UM PROCESSO JUSTO 28

    1.1 O ACESSO JUSTIA COMO DIREITO HUMANO E FUNDAMENTAL 29

    1.1.1 Abrangncia do Direito de Acesso Justia 29

    1.1.2 O Acesso Justia nos instrumentos internacionais de proteo dos

    Direitos Humanos e na Constituio da Repblica Federativa do Brasil de 1988 31

    1.1.3 Obstculos que dificultam o Direito de Acesso Justia 36

    1.2 O DIREITO FUNDAMENTAL AO PROCESSO JUSTO 41

    1.2.1 Garantias Fundamentais do Processo: o Processo Justo 41

    1.2.2 A Busca pela Celeridade e Efetividade do Processo 45

    1.2.3 A reforma do Poder Judicirio no Brasil: Emenda Constitucional n. 45/2004

    e os Pactos Republicanos por um Sistema de Justia mais Acessvel, gil e

    Efetivo 50

    1.3 OS JUIZADOS ESPECIAIS COMO INSTRUMENTO DE ACESSO

    JUSTIA 56

    1.3.1 A adoo de procedimentos especiais para as Pequenas Causas 56

    1.3.2 O Projeto de Florena e o tratamento das Pequenas Causas em

    Ordenamentos Jurdicos Diversos 58

    1.3.3 Os Juizados Especiais no Brasil: a facilidade de Acesso Justia e a

    Expectativa de um Processo Justo 65

    2 OS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS: ASPECTOS DESTACADOS

    DESSE NOVO MODELO DE TUTELA JURISDICIONAL 75

    2.1 O SISTEMA DE JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS 75

    2.1.1 A Estruturao dos Juizados Especiais Federais e das Turmas Recursais 75

    2.1.2 Competncia absoluta dos Juizados Especiais Federais com base no valor

  • da causa 81

    2.1.3 Princpios Processuais Norteadores dos Juizados Especiais Federais 85

    2.2 PROCEDIMENTOS DAS AES NO MBITO DOS JUIZADOS

    ESPECIAIS FEDERAIS 87

    2.2.1 A dispensa da representao por advogado e do pagamento de custas

    para o ajuizamento de aes 89

    2.2.2 A utilizao do Processo Eletrnico 92

    2.2.3 As regras de produo de provas e a realizao das pericias judiciais 96

    2.3 O PROCESSO DE REVISO DAS DECISES DOS JUIZADOS

    ESPECIAIS FEDERAIS 101

    2.3.1 Caractersticas gerais do Sistema Recursal dos Juizados Especiais

    Federais 101

    2.3.2 Espcies de Recursos e outros meios de impugnao das Decises

    dos Juizados Especiais Federais 107

    2.3.3 Recursos no previstos nos Juizados Especiais Federais 119

    3 A EFETIVIDADE NO ACESSO JUSTIA NOS JUIZADOS ESPECIAIS

    FEDERAIS: DESAFIOS E POSSVEIS SOLUES PROCESSUAIS

    E GERENCIAIS 124

    3.1 DESAFIOS EFETIVIDADE NO ACESSO JUSTIA NOS

    JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS 125

    3.1.1 Aspectos relacionados Efetividade no Acesso Justia 125

    3.1.2 O excesso de demanda e a crise do Poder Judicirio 128

    3.1.3 Desafios a serem superados para o aumento da Efetividade no acesso

    Justia nos Juizados Especiais Federais 131

    3.2 SOLUES RELACIONADAS EFETIVIDADE NO ACESSO JUSTIA 133

    3.2.1 A resoluo de conflitos na esfera administrativa e o alinhamento

    da administrao jurisprudncia iterativa dos Tribunais Superiores 134

    3.2.2 A criao de rgos multidisciplinares para resolver impasses

    relacionados com as demandas judiciais 149

    3.2.3 A necessidade de um Modelo de Tutela Coletiva que evite demandas

    individuais 151

    3.3 A UTILIZAO DE REGRAS DE ADMINISTRAO JUDICIRIA E

  • GESTO DE RECURSOS PARA AUMENTO DA EFETIVIDADE NO

    MBITO DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS 158

    3.3.1 O Gerenciamento dos Recursos Humanos e Materiais 159

    3.3.2 A realizao de Planejamento Estratgico pelo Poder Judicirio 163

    3.3.3 A necessria redefinio das metas do Conselho Nacional de Justia

    em relao aos Juizados Especiais Federais 168

    4 O PROCESSO JUSTO E SUA DIMENSO PROCESSUAL NO MBITO

    DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS 173

    4.1 A NECESSIDADE DA REDEFINIO DA COMPETNCIA DOS

    JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS PARA A OBTENO DE UM PROCESSO

    JUSTO 174

    4.1.1 O excesso de competncia dos Juizados Especiais Federais 175

    4.1.2 Alternativas de redefinio da competncia dos Juizados Especiais

    Federais para a garantia de uma tutela jurisdicional de qualidade 179

    4.1.3 A possvel extino da competncia delegada e seus efeitos nos

    Juizados Especiais Federais 188

    4.2 INSTRUO PROCESSUAL E PROCESSO JUSTO NOS JUIZADOS

    ESPECIAIS FEDERAIS 195

    4.2.1 A Instruo Processual Nos Juizados Especiais Federais 195

    4.2.2 Incremento da soluo dos litgios pela Conciliao: pr-processual ou

    aps a distribuio do processo 198

    4.2.3 A importncia da padronizao de procedimentos e da cooperao

    para a obteno de um Processo Justo no mbito dos Juizados Especiais

    Federais 206

    4.3 O PROCESSO JUSTO E O DEVER DE FUNDAMENTAR AS

    DECISES PROFERIDAS PELOS JUIZADOS ESPECIAIS 210

    4.3.1 O dever de fundamentar as decises como um dos componentes do

    Processo Justo 211

    4.3.2 A soluo dos casos fceis e difceis nos Juizados Especiais

    Federais e o princpio da celeridade processual 213

    4.3.3 A necessria busca da Deciso Justa e Equnime pelos magistrados que

    atuam nos Juizados Especiais 219

  • 5 PROCESSO JUSTO NO MBITO RECURSAL DOS JUIZADOS

    ESPECIAIS FEDERAIS 222

    5.1 ALTERNATIVAS PARA SUPERAR O EXCESSO DE FORMALISMO

    E A BUROCRATIZAO DO PROCESSO DE REVISO DAS DECISES

    DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS 223

    5.1.1 Possibilidades procedimentais para gerar maior celeridade e

    informalidade na esfera recursal dos Juizados Especiais Federais 224

    5.1.2 Medidas para enfrentar a proliferao de recursos decorrentes da

    instabilidade jurisprudencial e da falta de observncia dos precedentes 233

    5.1.3 O suposto excesso de Instncias Uniformizadoras de Jurisprudncia 238

    5.2 LIMITES IMPOSTOS POSSIBILIDADE DE REVISO DAS DECISES

    NO MBITO DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS 243

    5.2.1 A necessria regulamentao legislativa do Processo de Reviso das

    Decises dos Juizados Especiais Federais 244

    5.2.2 A (des)necessidade de uniformizao de jurisprudncia das Turmas

    Recursais com os Tribunais Regionais Federais 246

    5.2.3 A incluso da Ao Rescisria para Reviso da Coisa Julgada no

    mbito dos Juizados Especiais Federais 248

    5.3 PROPOSIES FINAIS PARA A GARANTIA DE UM PROCESSO

    JUSTO NO MBITO RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS 254

    5.3.1 Por uma maior Racionalidade do Modelo Recursal dos Juizados

    Especiais Federais 254

    5.3.2 Alteraes na forma de julgamento dos Leading Case de Repercusso

    Geral pelo Supremo Tribunal Federal 260

    5.3.3 Propostas legislativas de inovao quanto ao Processo de Reviso

    das Decises dos Juizados Especiais Federais 265

    CONSIDERAES FINAIS 272

    REFERNCIA DAS FONTES CITADAS 288

  • 16

    RESUMO

    A presente Tese de Doutorado em Cincia Jurdica est inserida na linha de pesquisa Principiologia Constitucional e Poltica do Direito e tem por objetivo cientfico analisar o funcionamento e propor uma reformulao do Modelo adotado para os Juizados Especiais Federais no Brasil em face dos desafios que impedem a consecuo dos princpios bsicos que ensejaram sua criao. A Tese est em que esse Modelo de prestao jurisdicional deve atingir as exigncias da Efetividade no Acesso Justia e a Expectativa de um Processo Justo em sua dimenso processual. A originalidade e o ineditismo esto presentes nas proposies apresentadas para atingir o fim almejado. O problema desta pesquisa caracterizado pela seguinte indagao: Diante do movimento universal da democratizao do Direito de Acesso Justia, quais so os desafios a serem superados para que os Juizados Especiais Federais prestem uma Tutela Jurisdicional Efetiva e proporcionem um Processo Justo? A partir da comprovao das hipteses levantadas, chegou-se concluso de que a falta de Efetividade no Acesso Justia nos Juizados Especiais Federais decorre especialmente do excesso de demanda, sendo preciso, entre outras medidas, privilegiar a soluo administrativa das pretenses, adotar um Modelo de tutela coletiva que evite demandas individuais e utilizar regras de administrao judiciria e gesto de recursos. A Expectativa de um Processo Justo em sua dimenso processual encontra seus principais pontos crticos nos procedimentos excessivamente formais e burocratizados. Em razo disso, as principais proposies apresentadas esto voltadas a dar maior Racionalidade ao Sistema, a fixar novos critrios para definio da competncia, ao incremento da soluo dos litgios pela conciliao, a sistematizar e regulamentar o Processo de Reviso das Decises dos Juizados Especiais Federais, a estabelecer novas formas de organizao e funcionamento das instncias revisoras, a criar mecanismos para limitar o acesso s Turmas Recursais e alterao dos mecanismos de uniformizao de jurisprudncia. Concluiu-se pela Expectativa de que as medidas sugeridas possam viabilizar melhorias na prestao jurisdicional dos Juizados Especiais Federais com vistas a atender de forma digna e justa as demandas sociais.

    Palavras-chave: Acesso Justia. Efetividade. Juizados Especiais Federais. Processo Justo.

  • 17

    ABSTRACT

    This doctoral thesis in Juridical Science subscribes to the line of research Study of Constitutional Principles and Politics of Law. It aims to analyze the Model of judicial services adopted by Brazilian Federal Special Courts, and to propose its reformulation, in view of the challenges that currently hinder the implementation of the basic principles that prompted its creation. The basic assumption is that this Model must meet the requirements of Effectiveness in Access to Justice, and the expectation of a Fair Trial in its procedural dimension. The originality and novelty of the research is in the proposed means of achieving the desired results. The research problem is addressed by means of the following question: Considering the global movement for democratizing Access to Justice, what challenges need to be overcome so that Federal Special Courts can provide an Effective Judicial Protection and a Fair Trial? Verification of the hypotheses made led to the conclusion that the lack of effective Access to Justice in the Federal Special Courts is mainly due to excess demand, requiring, among other measures: privileging of the administrative resolution of disputes, the adoption of a Model of collective protection that avoid individual claims, and the application of rules for judicial administration and the management of resources. Excessively formal and bureaucratized procedures place the expectation of procedural fairness at risk. Thus, the main propositions made aim to make the System more Rational; to establish new criteria for defining competence; to increase the number of disputes settled through reconciliation; to systematize and regulate the Process of Reviewing decisions in the Federal Special Courts; to establish new ways of organizing and operating the reviewing instances; and to create mechanisms for restricting access to the Appeals Panels and the instruments for the standardization of jurisprudence. The thesis concludes with the expectation that the proposed measures may enable improvements in the judicial services provided by the Federal Special Courts, so that they can meet the social demands in a dignified and fair way.

    Keywords: Access to Justice. Effectiveness. Federal Special Courts. Fair Trial.

  • 18

    RIASSUNTO

    Questa Tesi di dottorato di ricerca in Scienze Giuridiche inserita nella linea di ricerca Principiologia Costituzionale e Politica del Diritto e ha come obiettivo scientifico lanalisi del funzionamento nonch la proposta di riformulazione del modello adottato per le Corti Federali Speciali in Brasile a fronte delle sfide che ostacolano il raggiungimento dei principi fondamentali che ne giustificano la creazione. La tesi si basa nel fatto che questo modello di disposizione giurisdizionale deve soddisfare i requisiti di efficacia nell'accesso alla giustizia e all'attesa di un equo processo nella sua dimensione processuale. L'originalit e le novit sono rintracciabili nelle proposizioni qui destinate a raggiungere lo scopo finale. Il problema di questa ricerca pu essere caratterizzato in base alla seguente questione: a fronte del movimento universale della democratizzazione del diritto di accesso alla giustizia, quali sono le sfide da superare affinch i tribunali federali speciali forniscano una tutela giurisdizionale effettiva e promuovano un processo equo? Dalla verifica delle ipotesi, si concluso che la mancanza di efficacia per l'accesso alla giustizia presso i Tribunali Speciali deriva soprattutto dall'eccesso di domanda, essendo necessario, tra le altre misure, dare priorit alla soluzione amministrativa delle pretensioni, adottare un modello di tutela collettiva che eviti domande individuali e utilizzare regole di gestione di amministrazione giudiziaria e gestione di ricorsi. L'aspettativa di un equo processo nella sua dimensione procedurale trova i suoi principali punti critici nelle procedure eccessivamente formali e burocratiche. Di conseguenza, le proposizioni principali presentate sono destinate a dare una maggiore razionalit al sistema, all'impostazione di nuovi criteri per la definizione della giurisdizione, all'aumento della soluzione delle controversie tramite conciliazione, alla sistematizzazione e regolamentazione del processo di revisione delle decisioni di Tribunali Speciali, a stabilire nuove forme di organizzazione e funzionamento delle istanze revisioniste, a introdurre meccanismi per limitare l'accesso alle Corti dAppello e alla modifica dei meccanismi dell'uniformit di giurisprudenza. Si concluso con l'aspettativa che le misure suggerite possano apportare miglioramenti nella prestazione di giurisdizione dei tribunali federali speciali al fine di rispondere in maniera dignitosa e giusta alle richieste sociali.

    Parole chiave: Tribunali Federali Speciali. Accesso alla Giustizia. Efficacia. Equo Processo.

  • 19

    INTRODUO

    A presente Tese tem por objetivo cientfico analisar o funcionamento e

    propor uma reformulao do Modelo adotado para os Juizados Especiais Federais

    (JEFs) no Brasil em face dos desafios que impedem a consecuo dos princpios

    bsicos que ensejaram sua criao. A Tese est em que esse Modelo de prestao

    jurisdicional deve atingir as exigncias da Efetividade no Acesso Justia e a

    Expectativa de um Processo Justo em sua dimenso processual. A originalidade e o

    ineditismo esto presentes em grande parte das proposies apresentadas para

    atingir o fim almejado.

    O objetivo institucional da presente Tese a obteno do ttulo de Doutor

    em Cincia Jurdica pelo Curso de Doutorado em Cincia Jurdica da Univali, com

    Programa de Dupla Titulao com a Universit Degli Studi di Perugia Itlia.

    A Tese est relacionada rea de Concentrao em Constitucionalidade,

    Transnacionalidade e Produo do Direito e inserida na Linha de Pesquisa

    denominada Principiologia Constitucional e Poltica do Direito.

    A pesquisa faz parte tambm do Projeto CNJ Acadmico, divulgado pelo

    Edital n. 020/2010/CAPES/CNJ, que tem por principal objetivo promover e fomentar

    a realizao e divulgao de pesquisas cientficas em reas de interesse prioritrio

    para o Poder Judicirio nas universidades brasileiras.10

    O tema investigado compreende a rea temtica: Principais problemas

    no Processo de Reviso das decises nos Juizados Especiais Federais do Edital

    CNJ Acadmico. Contempla tambm parte dos objetivos do Projeto de Pesquisa

    apresentado pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos UNISINOS e pela

    Universidade do Vale do Itaja UNIVALI, que foi aprovado pela CAPES: Juizados

    Especiais e Turmas Recursais da Justia Federal: Diagnsticos e prognsticos para

    os principais problemas no processo de reviso das decises judiciais.

    O problema desta pesquisa pode ser caracterizado com base na seguinte 10 O Projeto CNJ Acadmico foi lanado, em 2010, pelo Conselho Nacional Justia (CNJ) em parceria

    com a Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior (CAPES), envolvendo universidades pblicas e privadas brasileiras. Contempla projetos de pesquisa nos temas direcionados ao sistema de justia criminal, anlise do desempenho dos rgos do Poder Judicirio, ao aprimoramento dos instrumentos para uma prestao jurisdicional mais eficiente, atuao do Conselho Nacional de Justia e suas interfaces com outros rgos, e, por ltimo, utilizao da tecnologia da informao para o aprimoramento da Justia.

  • 20

    indagao: Diante do movimento universal da democratizao do Direito de Acesso

    Justia, quais so os desafios a serem superados para que os Juizados Especiais

    Federais prestem uma Tutela Jurisdicional Efetiva e proporcionem um Processo

    Justo?

    Para o equacionamento do problema foram levantadas as seguintes

    hipteses:

    a) A falta de efetividade no Acesso Justia nos JEFs decorre: - do

    excesso de demanda advinda: da denegao sistemtica de direitos na esfera

    administrativa; da ausncia de vinculao da Administrao Pblica ao entendimento

    jurisprudencial uniformizado; e, da pouca utilizao dos meios de defesa coletivos

    para as demandas repetitivas ou de massa; - da forma de processamento e soluo

    dos litgios; - de aspectos relacionados com a Administrao Judiciria e Gesto de

    Recursos nos Juizados Especiais Federais.

    b) A Expectativa de um Processo Justo em sua dimenso processual no

    mbito dos JEFs encontra seus pontos crticos: - nos critrios de definio da

    competncia; - na instruo dos feitos e na produo de provas; - na precria

    fundamentao das decises; - na forma de atuao de magistrados; - na falta de

    Racionalidade recursal; - nos limites impostos possibilidade de Reviso das

    Decises; - na demora na entrega da Tutela Jurisdicional.

    Os resultados do trabalho de exame das hipteses esto expostos em

    cinco captulos, que so aqui sintetizados da seguinte forma:

    Principia-se, no Captulo 1, com uma abordagem terica com o objetivo

    de demonstrar que os Juizados Especiais caracterizam-se como o mais importante

    instrumento de Acesso Justia no mundo contemporneo e alimentam a

    Expectativa de obteno de um Processo Justo.

    Com base na doutrina de Cappelletti e Garth, o Acesso Justia

    desenvolvido como sendo um Direito Humano e Fundamental presente nos

    instrumentos internacionais de proteo da pessoa e nos textos constitucionais dos

    pases democrticos. Busca-se, desde logo, identificar os obstculos enfrentados

    para a efetivao do Acesso Justia e sua repercusso poltica e social a exigir

    normas processuais compatveis e adequadas resoluo de conflitos e no apenas

    facilidade de ingresso de aes em juzo.

  • 21

    Segue-se com a anlise do Direito Fundamental ao Processo Justo, o

    qual envolve o devido processo legal em sua dimenso substancial. Mostra-se a

    necessidade de uma prestao jurisdicional clere, adequada e efetiva. Insere-se,

    nesse contexto, a reforma do Poder Judicirio no Brasil decorrente da Emenda

    Constitucional n. 45/2004 e os Pactos Republicanos por um Sistema de Justia mais

    Acessvel, gil e Efetivo.

    Como decorrncia lgica da democratizao do Acesso Justia,

    evidencia-se a adoo de procedimentos especiais para solucionar as Pequenas

    Causas em ordenamentos jurdicos distintos, com nfase para as transformaes

    advindas do Projeto de Florena. Ao cabo, dessa primeira parte da Tese,

    destacado o surgimento dos Juizados Especiais no Brasil. Esse novo Modelo de

    jurisdio, inserido na chamada terceira onda do universo cappalletiano, nasceu

    com a finalidade de universalizar o acesso a uma Justia rpida, de menor custo e

    sem formalismos. No entanto, a facilidade de acesso e a Expectativa de soluo

    justa dos litgios acabaram por gerar novos desafios relacionados ao excesso de

    demanda e falta de capacidade de processamento das aes de forma adequada

    e idealizada nesse novo Modelo de Justia.

    No Captulo 2, o estudo est voltado a examinar o regramento dos

    Juizados Especiais Federais, criado pela Lei n. 10.259, de 2001, com objetivo de

    demonstrar suas caractersticas e particularidades, muitas das quais merecedoras

    de crticas.

    Parte-se de uma anlise da estruturao dos JEFs e das Turmas

    Recursais com a indicao da evoluo, das carncias existentes e das medidas

    adotadas para suprir as deficincias de recursos humanos e materiais. Em seguida,

    so apresentados os critrios de definio de competncia e os dados da

    litigiosidade e taxas de congestionamento que demonstram que os JEFs cumpriram

    seu papel de atender a uma demanda reprimida de parte da populao, mas que,

    devido ao excesso de processos, perderam parte das vantagens inicialmente

    apregoadas.

    Na continuidade, so perquiridos os princpios processuais norteadores

    dos JEFs por serem essenciais para a compreenso da dinmica e dos

    procedimentos que devem ser adotados para se obter uma Tutela Jurisdicional

    Efetiva e um Processo Justo. A base principiolgica, advinda do art. 2 da Lei n.

  • 22

    9.099/1995, prima pela oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual,

    celeridade e consensualidade.

    Na avaliao do procedimento colocada em foco a dispensa da

    representao por advogados e do pagamento de custas, a utilizao do Processo

    Eletrnico e as regras de produo de provas, as quais, quando mal aplicadas,

    comprometem garantias processuais inerentes ao Processo Justo.

    O Processo de Reviso das Decises objeto de anlise detalhada com

    especificao das caractersticas gerais, das espcies de recursos e impugnaes

    cabveis e daquelas no previstas nesse Modelo de Justia. Nesse momento so

    indicadas algumas das disfunes do Sistema Recursal que merecerem alterao e

    que sero reexaminadas sob o vis do Processo Justo no Captulo 5 desta Tese.

    No Captulo 3, passa-se para a anlise dos desafios e possveis solues

    processuais e gerenciais para uma maior Efetividade no Acesso Justia nos

    Juizados Especiais Federais. A partir do embasamento terico desenvolvido nos

    Captulos 1 e 2 e com base nas hipteses levantadas, so identificados os principais

    entraves a serem superados, entre os quais esto o excesso de demanda e a crise

    do Poder Judicirio.

    Acredita-se que o Acesso Justia foi suficientemente ampliado em

    termos quantitativos, no entanto, so necessrias estratgias para garantir qualidade

    prestao jurisdicional nos JEFs. A partir desse diagnstico so desenvolvidas

    alternativas para conter o ajuizamento de novos litgios, entre as quais: - a

    ampliao da resoluo de conflitos na esfera administrativa mediante a

    obrigatoriedade do prvio requerimento administrativo e o alinhamento da

    administrao jurisprudncia iterativa dos Tribunais Superiores; - a criao de

    rgos multidisciplinares para dialogar e criar condies para evitar os conflitos ou

    resolv-los sem a judicializao das demandas; - a necessidade de um Modelo de

    Tutela Coletiva que seja capaz de evitar as demandas individuais.

    Sem olvidar que a busca da Efetividade deve tambm encontrar solues

    nos mecanismos de respostas que caracterizam os Juizados Especiais,

    desenvolvendo em larga escala seu potencial conciliatrio, informal e com alto grau

    de automao para ter maior produtividade, mas desde que seja com qualidade.

    Na finalizao desse captulo, so apresentadas proposies

  • 23

    relacionadas com a Administrao Judiciria e a gesto de recursos nos JEFs,

    temas vinculados organizao do trabalho, ao planejamento estratgico e ao

    cumprimento de metas institucionais. Essa preocupao reside na constatao de

    que a criao de novas varas no o nico remdio para as dificuldades de acesso

    aos JEFs. So evidenciadas, assim, as estratgias para a realizao de um

    Planejamento Estratgico e a imprescindibilidade de redefinio das metas do

    Conselho Nacional de Justia para dar maior Efetividade aos JEFs.

    No Captulo 4, partindo-se do conceito operacional adotado nesta Tese

    para Processo Justo e, observadas as garantias fundamentais do processo do

    ordenamento jurdico brasileiro e italiano, so apresentadas proposies voltadas a

    corrigir imperfeies na tramitao dos feitos junto aos JEFs.

    Diante do constatado excesso de competncia e do constante

    crescimento do volume de processos so verificadas as alternativas para mudana

    dos critrios de Acesso aos JEFs, bem como os impactos da eventual extino da

    competncia delegada prevista no art. 109, 3, da Constituio brasileira. Feitas as

    devidas ponderaes, a alternativa que surge como mais apropriada a reduo da

    competncia reservada aos JEFs e a atribuio do carter facultativo dessa

    jurisdio, tal como ocorre nos Juizados Especiais da Justia Estadual, propondo-se,

    dessa forma, um tratamento uniforme entre ambos.

    Quanto instruo processual, defende-se que os litgios devem receber

    um tratamento diferenciado e simplificado com vistas a abreviar o tempo de

    tramitao, deixando-se de lado atos que possam criar embaraos ou que

    estabeleam formalidades prprias do rito ordinrio. Ressalta-se, na sequncia, que

    o direito prova um dos elementos do Processo Justo e a percia caracteriza-se

    como o principal ponto crtico na tramitao das aes, especialmente as que

    buscam a concesso de benefcios previdencirios e assistenciais relacionados com

    a incapacidade laboral.

    O incremento da soluo dos litgios pela conciliao pr-processual ou

    aps a distribuio do processo, atende plenamente ao princpio da

    consensualidade que inspirou os Juizados Especiais. Aps exame do Modelo de

    mediao utilizado na Itlia, so elencadas propostas relacionadas conciliao no

    Brasil que so dignas de destaque.

    Trabalha-se tambm a importncia da padronizao de determinados

  • 24

    procedimentos para gerar maior segurana jurdica e, a relevncia da cooperao

    entre os atores processuais, em prol de um Processo Justo no mbito dos JEFs.

    Nesse sentido, o estilo de trabalho tradicional e formalista do magistrado deve ser

    substitudo pela postura ativa e voltada justa soluo das demandas.

    Para finalizar esse captulo, defende-se o dever do magistrado em proferir

    decises com a devida fundamentao, garantia constante nos textos

    constitucionais, em especial do Brasil e da Itlia. Objetiva-se tambm analisar a

    necessria busca da deciso justa e equnime nos Juizados Especiais, consoante

    previso contida no art. 6 da Lei n. 9.099, de 1995, e que tem sido pouco utilizada

    nos JEFs.

    No quinto e ltimo Captulo, almeja-se promover um olhar crtico e

    propositivo em relao ao Processo de Reviso das Decises dos JEFs, cujas

    caractersticas gerais foram apresentadas no Captulo 2 desta Tese.

    De incio, so apresentadas alternativas para superar o excesso de

    formalismos e a burocratizao no processamento dos recursos. So identificadas

    as possibilidades procedimentais que podem gerar maior celeridade e informalidade

    na esfera recursal. E, com originalidade, so sugeridas novas formas de

    organizao e funcionamento das Turmas Recursais desvinculadas das amarras do

    rito ordinrio. Procura-se tambm oferecer alternativas para ampliar a divulgao

    das decises das Turmas Recursais e para superar o excessivo rigor processual na

    anlise dos pressupostos de admissibilidade dos pedidos de uniformizao de

    jurisprudncia. So defendidas ainda medidas para enfrentar a proliferao de

    recursos decorrentes da instabilidade jurisprudencial e da falta de observncia dos

    precedentes. Alm disso, analisado o suposto excesso de instncias

    uniformizadoras de jurisprudncia, diante da possibilidade de extino das Turmas

    Regionais de Uniformizao.

    No que diz respeito aos limites impostos possibilidade de Reviso das

    Decises no mbito dos JEFs, examinam-se as restries que envolvem a

    incompletude na regulamentao dos recursos, a convenincia de uniformizao de

    entendimentos entre Turmas Recursais e Tribunais Regionais Federais e o no

    cabimento da ao rescisria. Tais aspectos provocam questionamentos doutrinrios

    e so considerados pontos crticos segundo o Projeto de Pesquisa CNJ Acadmico

    Edital n. 020/2010/CAPES/CNJ.

  • 25

    Por derradeiro, so perquiridos aspectos relacionados com a

    Racionalidade do Modelo Recursal, a forma de julgamento dos Leading Case de

    Repercusso Geral pelo Supremo Tribunal Federal e algumas das propostas

    legislativas que buscam inovar o Processo de Reviso das Decises dos JEFs.

    Todos esses temas esto inseridos na Tese desenvolvida e servem para gerar a

    concluso da anlise crtica e propositiva com o objetivo de favorecer a solidificao

    dos JEFs como um Modelo de jurisdio adequado, clere e justo.

    A presente Tese se encerra com as Consideraes Finais nas quais so

    apresentados pontos conclusivos destacados dos estudos e das reflexes

    realizadas, procurando demonstrar a necessidade de reformulao do Modelo

    adotado para os Juizados Especiais Federais no Brasil. Por essa razo, so

    sintetizadas as principais crticas efetuadas e as proposies elaboradas com vistas

    a fortalecer os Juizados Especiais Federais como Modelo de prestao jurisdicional

    que cumpre as exigncias da Efetividade no Acesso Justia e a Expectativa de um

    Processo Justo em sua dimenso processual.

    Considerando que a pesquisa procura fazer uma correlao dos Juizados

    Especiais Federais com o Direito de Acesso Justia efetivo e com a busca de um

    Processo Justo na sua dimenso processual, buscou-se ao longo do trabalho

    apresentar referncias ao Direito italiano, com indicao de normas legislativas e de

    doutrina, justificando a opo pelo Programa de Dupla Titulao.

    Por conta disso, foi possvel identificar semelhanas com relao aos

    obstculos enfrentados pela Itlia e tambm pelo Brasil, os quais possuem normas

    processuais semelhantes e pouco eficientes.

    O Sistema processual brasileiro recebeu grande influncia do processo

    civil italiano. Isso pode ser explicado pelo fato de que na elaborao do atual Cdigo

    de Processo Civil, datado de 1973, os processualistas italianos Enrico Tullio

    Liebman11, Francesco Carnelutti e Giuseppe Chiovenda, que lecionavam no Brasil

    11

    "Lecionou na Faculdade de Direito da Universidade de So Paulo, onde apresentou ideias extremamente revolucionrias para a poca. Seu pensamento influenciou inmeros juristas brasileiros, tais como Alfredo Buzaid, Moacir Amaral dos Santos, Jos Frederico Marques, Cndido Rangel Dinamarco e Kazuo Watanabe. Em virtude disso, costuma-se dizer que Liebman fundou uma verdadeira Escola - a Escola Processual de So Paulo. Tal Escola, por meio de um de seus mais destacados integrantes, o Prof. Alfredo Buzaid, foi a maior motivadora da substituio do Cdigo de Processo Civil de 1939 por um novo.

  • 26

    poca, colaboraram decisivamente no processo legislativo.

    A semelhana de normas processuais explica os desafios comuns que

    so enfrentados pela Itlia e pelo Brasil, legitimando a busca de solues

    compartilhadas, com o intercmbio de experincias e ideias entre pesquisadores e

    autoridades judicirias.

    No que concerne metodologia utilizada, registra-se que, na fase de

    investigao, foi empregado o mtodo indutivo12; na fase de tratamento dos dados, o

    cartesiano13; e o texto final foi composto na base lgica indutiva.

    Nas diversas fases da pesquisa foram acionadas as tcnicas do

    referente14, a de categorias15 e de conceitos operacionais16, o fichamento de obras e

    consultas na rede mundial de computadores. Cabe consignar que as categorias

    principais esto grafadas com a letra inicial em maiscula e os seus conceitos

    Alfredo Buzaid, discpulo direto de Liebman, buscou na obra e no pensamento de seu mestre o amparo para reformular institutos mal disciplinados no Cdigo de 1939, assim como para introduzir institutos ou solues at ento estranhas ao sistema brasileiro. A prevalncia do pensamento liebmaniano pode ser claramente percebida no Cdigo de Processo Civil de 1973, em diversos momentos, como, por exemplo, na disciplina do julgamento antecipado do mrito (art. 330 do CPC), na equiparao da eficcia dos ttulos executivos extrajudiciais dos ttulos judiciais, no conceito que o Cdigo fornece para a coisa julgada, definindo-a como imutabilidade da sentena, e no como seu efeito (art. 468 do CPC), bem como na adoo das trs condies da ao propostas por Liebman (interesse de agir, legitimidade ad causam e possibilidade jurdica do pedido). Comentando a influncia das teorias de Liebman sobre processo civil brasileiro, o processualista Cndido Rangel Dinamarco afirma que os pensamentos e escritos de Liebman, notadamente aqueles voltados ao direito brasileiro, vieram a projetar-se intensamente na cultura processualstica de nosso pas, com intensa repercusso, desde logo, na doutrina dos que com ele conviveram e, ao longo de todas essas dcadas, no pensamento formado entre os discpulos de seus discpulos (...). J passadas mais de seis dcadas de sua chegada, ainda hoje possvel sentir o peso das propostas que trouxe e, sobretudo, das grandes premissas que plantou entre ns, como verdadeiras razes da formao do pensamento cientfico brasileiro do processo civil." Portal da Academia Brasileira de Direito Processual Civil. Disponvel em: . Acesso em: 23 jan. 2014.

    12 MTODO INDUTIVO: base lgica da dinmica da pesquisa Cientfica que consiste em pesquisar e identificar as partes de um fenmeno e colecion-las de modo a ter uma percepo ou concluso geral. (PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da Pesquisa Jurdica: Teoria e Prtica. 12 ed. rev. So Paulo: Conceito Editorial, 2011. p. 205).

    13 MTODO CARTESIANO: base lgico-comportamental proposta por Descartes, muito apropriada para a fase de Tratamento dos Dados Colhidos, e que pode ser sintetizada em quatro regras: 1. duvidar; 2. decompor; 3. ordenar; 4. classificar e revisar. Em seguida, realizar o Juzo de Valor. (Ibidem, p. 205).

    14 REFERENTE: explicao prvia do motivo, objetivo e produto desejado, delimitando o alcance temtico e de abordagem para uma atividade intelectual, especialmente para uma pesquisa. (Ibidem, p. 209).

    15 CATEGORIA: palavra ou expresso estratgica elaborao e/ou expresso de uma ideia. (Ibidem, p. 197).

    16 CONCEITO OPERACIONAL [COP]: definio estabelecida ou proposta para uma palavra ou expresso, com o propsito de que tal definio seja aceita para os efeitos das ideias expostas. (Ibidem, p. 198).

  • 27

    operacionais so apresentados em Rol de Categorias.

    Registra-se, por fim, que na elaborao dos captulos desta Tese foram

    transcritos trechos, sem referncia das fontes citadas, de artigos cientficos e

    captulos de livros publicados por este Doutorando como requisito para cumprimento

    dos crditos das disciplinas do Programa de Doutorado em Cincia Jurdica da

    Univali.17

    Aps essas consideraes propeduticas, passa-se ao desenvolvimento

    da Tese nos captulos que seguem.

    17 LAZZARI, Joo Batista. A argumentao jurdica e a fundamentao das decises proferidas no

    mbito dos Juizados Especiais. Revista Brasileira de Direito, IMED, vol. 9, n 2, p. 165-183, jul-dez 2013. Disponvel em: . Acesso em: 19 ago. 2014. LAZZARI, Joo Batista. Obstculos e solues para tornar o sistema de justia brasileiro mais acessvel, gil e efetivo e a morosidade do Supremo Tribunal Federal no julgamento dos leading case de repercusso geral. Revista Forense (Impresso). Rio de Janeiro: Forense, v. 417, p. 97-115, 2013. LAZZARI, Joo Batista. Princpios constitucionais do acesso justia e da razovel durao do processo: uma anlise da efetivao dessas garantias no mbito dos Juizados Especiais Cveis. Revista Eletrnica Direito e Poltica. Programa de Ps-Graduao Stricto Sensu em Cincia Jurdica da UNIVALI, Itaja, v.8, n.1, 1 quadrimestre de 2013. Disponvel em: . Acesso em: 17 jul. 2014. LAZZARI, Joo Batista; JACOBSEN, Gilson. Meio ambiente e processo eletrnico: um breve panorama do direito ambiental e seu encontro com a era virtual. Revista Eletrnica Direito e Poltica. Programa de Ps-Graduao Stricto Sensu em Cincia Jurdica da UNIVALI, Itaja, v.7, n.3, 3 quadrimestre de 2012. Disponvel em: . Acesso em: 17 jul. 2014. LAZZARI, Joo Batista; JACOBSEN, Gilson. Procedimentos para a soluo das pequenas causas no direito comparado e no Brasil. Revista da UNIFEBE (Online). Brusque, v. 11, p. 115-127, 2012. Disponvel em: . Acesso em: 17 jul. 2014. LAZZARI, Joo Batista. Sistema de Reviso das Decises dos Juizados Especiais Federais e seus Entraves. In SAVARIS, Jos Antonio; STAFFEN, Mrcio Ricardo; BODNAR, Zenildo. Juizados Especiais Federais, volume 1 [recurso eletrnico]: contributos para uma releitura. Itaja: Univali, 2014. Disponvel em: . Acesso em: 18 ago. 2014. LAZZARI, Joo Batista; SAVARIS, Jos Antonio; PORENA, Daniele. O ACESSO JUSTIA NOS JUIZADOS ESPECIAIS: Uma anlise crtico-propositiva ao modelo dos juizados especiais federais para obteno de um processo justo. In CRUZ, Paulo Mrcio; DANTAS, Marcelo Buzaglo. Direito e transnacionalizao [recurso eletrnico]: contributos para uma releitura. Itaja: Univali, 2013. Disponvel em: . Acesso em: 21 ago. 2014.

  • 28

    CAPTULO 1

    OS JUIZADOS ESPECIAIS COMO INSTRUMENTO DE ACESSO

    JUSTIA E A EXPECTATIVA DE UM PROCESSO JUSTO

    Este primeiro Captulo objetiva alicerar a pesquisa em consideraes de

    ordem jurdico doutrinria para a compreenso terica do Direito de Acesso Justia

    e ao Processo Justo e sua correlao com os Juizados Especiais.

    Na anlise do Acesso Justia como um Direito Humano e Fundamental

    so apresentados vrios enfoques envolvendo a abrangncia e delimitao do tema,

    sua insero nos instrumentos internacionais de proteo da pessoa e nos textos

    constitucionais e ainda os obstculos enfrentados para sua efetivao.

    Quanto ao Direito ao Processo Justo procura-se enfatizar as suas

    caractersticas, os princpios voltados concretizao dessa Garantia Constitucional

    e os bices enfrentados tanto pelo Brasil, como pela Itlia. Aborda-se tambm a

    Reforma do Poder Judicirio no Brasil, ocorrida em 2004, e os Pactos firmados pelos

    Poderes da Repblica para dar seguimento s modificaes necessrias com vistas

    a um Sistema de Justia mais Acessvel, gil e Efetivo.

    A ltima parte deste Captulo tem por objeto os procedimentos especiais

    empregados para as Pequenas Causas, sendo descritas experincias de outros

    pases como comparativos vlidos soluo dessas demandas. Por fim

    demonstrada a experincia brasileira em matria de Juizados Especiais e a

    Expectativa18 depositada nesse Modelo como via de fcil Acesso Justia e de um

    Processo Justo. Concluiu-se evidenciado os pontos positivos e as barreiras a serem

    superadas pelos Juizados Especiais para proporcionar um Processo Justo.

    18 Cademartori e Strapazzon ao comentarem a obra Principia Iuris, de Luigi Ferrajoli, constataram

    que a expectativa foi elevada ao primeiro nvel de importncia, enquanto categoria da teoria do direito, por desempenhar um papel central para a anlise crtica da fenomenologia do dever ser constitucional atual. (CADEMARTORI, Srgio Urquhart de; STRAPAZZON, Carlos Luiz. Principia Iuris: uma teoria normativa do direito e da democracia. Revista Pensar, Fortaleza: Unifor, v. 15, n. 1, p. 278-302, jan./jun. 2010. Disponvel em:. Acesso em: 15 ago. 2014).

  • 29

    1.1 O ACESSO JUSTIA COMO DIREITO HUMANO E

    FUNDAMENTAL

    Inicia-se a presente pesquisa com a anlise do Direito de Acesso

    Justia, tema recorrente nas discusses em todos os segmentos da sociedade

    contempornea e nas abordagens doutrinrias e jurisprudenciais, que se reveste e

    se renova de importncia quando se pretende lanar um olhar crtico e propositivo

    ao Sistema Judicial. caracterizado como um dos principais Direitos Humanos e

    est presente como Garantia Constitucional nos ordenamentos jurdicos dos pases

    democrticos, mas sua efetivao enfrenta obstculos de diversas ordens, os quais

    sero examinados neste estudo.

    1.1.1 Abrangncia do Direito de Acesso Justia

    O Acesso Justia caracteriza-se como um direito individual e social, cuja

    delimitao e abrangncia constituem-se de extrema importncia para que possa ser

    exigido e garantido em sua plenitude.

    O termo Acesso Justia de difcil definio e possui vrias acepes,

    mas para o presente estudo ser adotada a conceituao e a delimitao

    apresentada por Cappelletti e Garth, cuja obra doutrinria de reconhecida

    importncia no meio acadmico, por melhor refletir o enfoque que se pretende

    alcanar neste trabalho.

    Para os referidos autores, o Acesso Justia serve para determinar duas

    finalidades bsicas do Sistema jurdico: o Sistema deve ser igualmente acessvel a

    todos e deve produzir resultados que sejam individual e socialmente justos.19 E mais

    adiante afirmam que o acesso no apenas um direito social fundamental; ele ,

    tambm, necessariamente, o ponto central da moderna processualstica.20

    Em complemento, utilizada a delimitao oferecida por Boaventura de

    Souza Santos, por valorizar o aspecto social que extremamente marcante no

    mbito dos Juizados Especiais. Para o autor portugus, o tema do Acesso Justia

    o que mais diretamente resolve as relaes entre o processo civil e a justia social,

    19 CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso justia. Porto Alegre: Fabris, 1988. p. 8. 20 Ibidem, p. 12-13.

  • 30

    entre igualdade jurdico-formal e desigualdade socioeconmica.21

    Tambm na viso de Mario Grynszpan o tema comporta ao mesmo tempo

    enfoque sociolgico e social, constituindo-se em objeto privilegiado de reflexo do

    direito. O que se discute por seu intermdio a prpria questo da cidadania e da

    democratizao do Judicirio.22

    Luiz Guilherme Marinoni afirma que o direito de ao no Estado

    Constitucional passou a ser pensado sob o slogan de Direito de Acesso Justia,

    perdendo a caracterstica de instituto indiferente realidade social. Para o autor, a

    questo do Acesso Justia foi o tema-ponte que fez a ligao do processo civil

    com a justia social. Defende que a realizao do Direito de Acesso Justia

    indispensvel prpria configurao do Estado.23

    Ainda, segundo o italiano Francesco Francioni, o uso normal do termo

    Acesso Justia sinnimo de tutela jurisdicional. Do ponto de vista do indivduo,

    o termo refere-se ao direito de buscar um remdio diante de um tribunal

    estabelecido por lei e capaz de garantir a independncia e imparcialidade do juiz.24

    Sobre o campo de aplicao da expresso Acesso Justia, Pedro

    Manoel Abreu, citando Antnio Herman Benjamin, indica trs enfoques bsicos, com

    os quais tambm concordamos:

    (...) num sentido restrito, refere-se apenas a acesso tutela jurisdicional. Em sentido mais amplo, quer significar acesso tutela de direitos ou interesses violados, atravs de mecanismos jurdicos variados, jurisdicionais ou no. Numa acepo integral, acesso ao direito, ou seja, a uma ordem jurdica justa.25 Em sntese, o Direito de Acesso Justia deve atender a todas essas

    vertentes para proporcionar uma tutela jurisdicional adequada e socialmente justa.

    Possui repercusso poltica e social e exige normas processuais compatveis e

    adequadas resoluo de conflitos e no apenas facilidade de ingresso de aes

    21 SANTOS, Boaventura de Sousa. Pela mo de Alice: o social e o poltico na ps-modernidade. So

    Paulo: Cortez, 1999. p. 167. 22 GRYNSZPAN, Mario. Acesso e recurso justia no Brasil: algumas questes. In PANDOLFI, Dulce

    et al (Org.). Cidadania, Justia e Violncia. Rio de Janeiro: FGV, 1999. p. 99. 23 MARINONI, Luiz Guilherme. Curso de Processo Civil V. 1: Teoria Geral do Processo. 3 ed. So

    Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 186. 24 FRANCIONI, Francesco. Il Diritto di Accesso alla Giustizia nel Diritto Internazionale Generale. In

    FRANCIONI, Francesco et al. Accesso alla Giustizia dellindividuo nel Diritto Internazionale e dellUnione Europea. Milano: Giuffr Editore, 2008. p. 3-4.

    25 ABREU. Pedro Manoel. Acesso Justia e Juizados Especiais: o desafio histrico da consolidao de uma justia cidad no Brasil. Florianpolis: Conceito Editorial, 2009. p. 39.

  • 31

    em juzo.

    A ttulo de proposio, a ser tratada no Captulo 3 desta pesquisa,

    defende-se a adoo de polticas pblicas voltadas ampliao do reconhecimento

    de direitos na esfera administrativa e a soluo no contenciosa dos litgios como

    formas de dar maior Efetividade ao Acesso Justia.

    1.1.2 O Acesso Justia nos instrumentos internacionais de

    proteo dos Direitos Humanos e na Constituio da Repblica Federativa do

    Brasil de 1988

    A busca pelos direitos individuais e sociais histrica, passando por

    momentos conflituosos e de difcil acesso diante da ausncia de normas de

    proteo. A ecloso de lutas de classes e de guerras entre povos levou a uma

    evoluo nos instrumentos de proteo dos Direitos Humanos viabilizando o acesso

    e a garantia aos Direitos Fundamentais da pessoa.

    Segundo Alexandre Moraes, os Direitos Humanos fundamentais, ou

    simplesmente Direitos Fundamentais, em sua concepo moderna, surgiram como

    produto da fuso de vrias fontes, desde tradies arraigadas nas diversas

    civilizaes, at a conjugao dos pensamentos filosfico-jurdicos, das ideias

    surgidas com o cristianismo e o direito natural.26

    Osvaldo Ferreira de Melo, ao definir o que so os Direitos Humanos,

    tambm aponta a necessidade de sua positivao nos textos constitucionais e a sua

    regulamentao para torn-los exigveis e objetivamente garantidos. 27 E, Alexy,

    elucida as caractersticas dos Direitos Humanos como sendo: a universalidade, a

    fundamentalidade de seu objeto, a abstrao, a validez e a moralidade.28

    A concepo de igualdade entre os homens est atrelada existncia de

    uma lei escrita, regra geral e uniforme, igualmente aplicada a todos que vivem em

    26 MORAES, Alexandre. Direitos Humanos Fundamentais: teoria geral. 8 ed. So Paulo: Atlas,

    2007. p. 34-35. 27 MELO, Osvaldo Ferreira de. Dicionrio de poltica jurdica, Florianpolis: OAB-SC Editora, 2000.

    p. 31. 28 ALEXY, Robert. La institucionalizacin de la justicia. 2 ed. Granada: Editorial Comares, 2010. p.

    80-81.

  • 32

    sociedade.29

    A origem, natureza e evoluo dos Sistemas Internacionais de Proteo

    dos Direitos Humanos iniciaram sua fase da constitucionalizao com a

    primeira declarao dos Direitos Humanos da poca moderna (Declarao dos

    Direitos da Virgnia, de 12/06/1776).

    Por sua vez, estudos defendem que o marco fundamental do Acesso

    Justia pode ser verificado na Magna Carta inglesa, de 15/06/1215, cujo art. 49

    mencionava que a administrao da justia no seria recusada, dilatada ou vendida

    a ningum, consagrando nesse dispositivo a garantia da inafastabilidade da garantia

    da justia.30

    Entre os principais instrumentos normativos da proteo universal dos

    Direitos Humanos esto tambm a Carta das Naes Unidas, de 1945, a Declarao

    Universal dos Direitos Humanos, de 1948, o Pacto Internacional dos Direitos Civis e

    Polticos e o Pacto Internacional dos Direitos Econmicos, Sociais e Culturais,

    ambos de 1966, e a Conveno Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de So

    Jos da Costa Rica), de 1969.

    Cabe destacar a previso contida na Declarao Universal dos Direitos do

    Homem, aprovada pela Assembleia Geral das Naes Unidas, em 10/12/1948, no

    sentido de que: VIII. Todo homem tem direito a receber, dos tribunais nacionais

    competentes, remdio efetivo para os atos que violem os direitos fundamentais que

    lhe sejam reconhecidos pela constituio ou pela lei.31

    Por sua vez, a Conveno Americana sobre Direitos Humanos vai mais

    alm ao estabelecer como garantias judiciais que:

    1. Toda pessoa tem direito a ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razovel, por um juiz ou tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na apurao de qualquer acusao penal formulada contra ela, ou para que se determinem seus direitos ou obrigaes de natureza civil, trabalhista,

    29 NEME, Eliana Franco; MOREIRA, Jos Cludio Domingues. O Acesso Justia como instrumento

    de efetivao dos Direitos Fundamentais: possibilidades do sistema interamericano de proteo dos direitos do homem. Argumenta: Revista do Programa de Mestrado em Cincia Jurdica UENP, Jacarezinho, n. 14, janeiro/junho/2011. p. 14.

    30 DUTRA, Qusia Falco de. Novas Perspectivas na interpretao da garantia de Acesso Justia. Revista CEJ, Braslia, Ano XIV, n. 53, p 26-30, abr./jun. 2011.

    31 ONU - ORGANIZAO DAS NAES UNIDAS. Declarao universal dos direitos humanos. Adotada e proclamada pela resoluo 217 A (III), da Assembleia Geral das Naes Unidas em 10 de dezembro de 1948. Disponvel em: . Acesso em: 18 ago. 2014.

  • 33

    fiscal ou de qualquer outra natureza (art. 8).32 Esse Pacto garante tambm o direito da proteo judicial com ingresso de

    recurso perante juzes ou tribunais competentes (art. 25).33

    Juan Carlos Hitters, ao tratar do direito processual transnacional, ressalta

    a influncia e autonomia do direito de ao, reconhecendo-o como direito humano

    justia. Defende que o direito de ao considerado como um direito constitucional

    autnomo sob a posio dos grandes processualistas modernos, como Carnelutti,

    Alcal Zamora e Castillo, Couture, Fix Zamudio, etc. No entanto, nos ltimos

    tempos, devido influncia social na rea jurdica, passou por uma grande

    transformao que deixou de contar com uma base individualista, tornando-se um

    direito dos governados. Ento, como disse Fix Zamudio, a ao processual um

    direito humano justia, e vrias Constituies modernas a consideram como um

    direito autnomo e, portanto, independente do direito clssico de petio. Esta

    concluso pode ser vista claramente nos atuais documentos internacionais, como o

    Pacto de So Jos de Costa Rica, que tipifica um processo supranacional. Pode-se

    dizer, em suma, atualmente, o direito de ao considerado como um direito

    constitucional autnomo, que muitas Cartas Magnas modernas incorporaram, e nos

    ltimos tempos tem sido socializado, ao invs de ter uma perspectiva puramente

    individualista para tornar-se o que tem sido chamado de a dimenso social do

    direito.34

    Na Espanha, segundo Joan Pic Junoy, o art. 24 da Constituio de 1978

    indica que: Todas as pessoas tm o direito proteo efetiva dos juzes e tribunais

    no exerccio dos seus direitos e interesses legtimos, sem que em nenhum caso

    fique sem julgamento. Alm disso, todos tm direito a um juiz ordinrio pr-

    determinado por lei, defesa e assistncia judiciria, a ser informado das

    acusaes contra si, a um julgamento pblico sem dilaes indevidas e com todas

    as garantias, a utilizar os meios de provas pertinentes para a sua defesa, a no se

    32 BRASIL. DECRETO n. 678, de 6 de novembro de 1992. Promulga a Conveno Americana sobre

    Direitos Humanos (Pacto de So Jos da Costa Rica), de 22 de novembro de 1969. Disponvel em: . Acesso em: 26 nov. 2013.

    33 Ibidem. 34 HITTERS, Juan Carlos. El debido proceso y la responsabilidad internacional de Estado y em

    particular la de los jueces. In SOTELO, Jos Luis Vzquez (Liber amicorum). Rigor Doctrinal y prtica forense. Barcelona: Atelier, 2009. p. 541-542.

  • 34

    autoincriminar, a no confessar culpa e presuno de inocncia.35

    A partir da demonstrao da relevncia dos instrumentos normativos

    sustentadores da proteo universal dos Direitos Humanos e da imprescindibilidade

    dos textos constitucionais disporem sobre o tema em questo, sero analisadas as

    normas contidas na Constituio da Repblica Federativa do Brasil de 1988, com

    nfase na efetivao do Acesso Justia como Direito Fundamental baseado na

    igualdade, agilidade e Efetividade.

    O prembulo da Constituio do Brasil, promulgada em 05/10/1988, fixou

    como enunciado a instituio de um Estado Democrtico, o qual deve estar

    destinado a assegurar o exerccio dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a

    segurana, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justia como valores

    supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na

    harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a soluo

    pacfica das controvrsias.

    A nova Ordem Constitucional representou uma verdadeira ruptura com os

    critrios at ento vigentes, cujas garantias constantes da Constituio de 1967

    eram meramente formais, em face do quadro poltico de represso social implantado

    pela Ditadura Militar que surgiu com o Golpe de Estado de 1964.

    Com a redemocratizao do Brasil houve a retomada da funo do

    Estado Contemporneo e o compromisso com o bem comum. Acentua Cesar Luiz

    Pasold que no h sentido na criao e na existncia continuada do Estado, seno

    na condio, inarredvel, de instrumento em favor do Bem Comum ou Interesse

    Coletivo.36

    Sobre a igualdade, um dos alicerces da Constituio de 1988, leciona

    Eros Roberto Grau que ela se expressa em isonomia e na vedao de privilgios.

    Reunidos os dois princpios, igualdade e universalidade das leis, assim se traduzem:

    a lei igual para todos e todos so iguais perante a lei.37

    Essa premissa est disposta no art. 5 do Texto Constitucional, o qual

    35 JUNOY, Joan Pic I. Las Garantas Constitucionales del Proceso. Barcelona: Jos Maria Bosch

    Editor, 1997. p. 20. 36 PASOLD, Cesar Luiz. Funo Social do Estado Contemporneo. 3 ed. Florianpolis: OAB/SC

    Editora coedio Editora Diploma Legal, 2003. p. 47. 37 GRAU, Eros Roberto. O direito posto e o direito pressuposto. 8 ed. So Paulo: Malheiros, 2011.

    p. 158.

  • 35

    definiu que todos so iguais perante a lei, sem distino de qualquer natureza,

    garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Pas a inviolabilidade

    do direito vida, liberdade, igualdade, segurana e propriedade.

    Esse preceito se relaciona de forma direta com o Direito de Acesso

    Justia, o qual visa a garantir um dos princpios bsicos do Estado democrtico de

    Direito, qual seja, a isonomia. Todos so iguais perante a lei e assim devem ser

    tratados pelos responsveis pela administrao e na aplicao da justia. Essa regra

    carrega importncia mpar para a diminuio da desigualdade entre os cidados,

    que um dos obstculos mais gravosos a ser superado para a materializao do

    Acesso Justia.

    Outro aspecto a ser ressaltado na nova Carta Poltica a ampliao da

    garantia do Direito de Acesso Justia, chamado tambm de princpio da

    inafastabilidade da apreciao judicial, previsto no citado art. 5, XXXV, para

    compreender no apenas a leso, mas tambm a ameaa a direito.

    Segundo Jos Afonso da Silva, acrescentou-se a ameaa a direito, o que

    no sem consequncia, pois possibilita o ingresso em juzo para assegurar direitos

    simplesmente ameaados, at ento admitido nas leis processuais somente em

    determinados casos.38

    A dimenso formal do Acesso Justia no ordenamento brasileiro,

    especialmente na Constituio de 1988, serve, segundo Qusia Falco de Dutra,

    como uma diretriz ao legislador na criao de novas leis, que s podero ser

    formuladas com a inteno de ampliar o acesso ao Poder Judicirio.39

    Para Rosanne Gay Cunha, deve o Estado, por meio de seus poderes,

    outorgar aos jurisdicionados um instrumental que seja adequado s necessidades

    de seu direito material com efetiva aplicao do princpio da vedao de

    insuficincia. Atualmente, diz-se que o Acesso Justia um direito de primeira

    dimenso (defesa), que reclama uma absteno do Estado, sendo visto igualmente

    como um direito de segunda gerao (prestacional). o direito de acesso ao

    38 SILVA, Jos Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. 33 ed. So Paulo: Malheiros,

    2010. p. 432. 39 DUTRA, Qusia Falco de. Novas Perspectivas na interpretao da garantia de Acesso Justia.

    Revista CEJ, Braslia, Ano XIV, n. 53, p 26-30, abr./jun. 2011.

  • 36

    Judicirio e, ao mesmo tempo, a uma ordem jurdica digna (justa, adequada e

    tempestiva).40

    Objetivando proporcionar maior Efetividade ao Acesso Justia, o Texto

    Constitucional de 1988 assegurou tambm que o Estado prestar assistncia

    jurdica integral e gratuita aos que comprovarem insuficincia de recursos (art. 5,

    LXXIV) e, ainda, a gratuidade nas aes de "habeas-corpus" e "habeas-data", e, na

    forma da lei, os atos necessrios ao exerccio da cidadania (art. 5, LXXVII).

    A respeito da efetivao do Acesso Justia, Cintra, Grinover e

    Dinamarco consideram que a Constituio no apenas se preocupou com a

    assistncia judiciria aos que comprovarem insuficincia de recursos, mas a

    estendeu assistncia jurdica pr-processual. Assim consideradas, cabe ao Estado

    organizar a carreira jurdica dos defensores pblicos, cercada de muitas garantias

    reconhecidas ao Ministrio Pblico (art. 5, inc. LXXIV, c/c art. 134, 2, red. EC n.

    45, de 8/12/2004). 41 Lamentavelmente, passado longo perodo de tempo da

    existncia da norma, o quantitativo de defensores pblicos ainda muito aqum da

    necessidade da populao.

    Esses meios de amparo ao cidado so fundamentais para a defesa de

    direitos em juzo, sem os quais a populao mais carente estaria desatendida. Pode-

    se dizer que houve verdadeira universalizao do Acesso Justia, porm as

    deficincias na prestao desses servios representam obstculos a serem

    superados.

    Os obstculos efetivao do Direito ao Acesso Justia e as garantias

    processuais ao Processo Justo sero objeto de anlise dos tpicos que seguem.

    1.1.3 Obstculos que dificultam o Direito de Acesso Justia

    O Direito de Acesso Justia tem vrias acepes que vo desde o

    direito de ao, o devido processo legal, o julgamento em tempo razovel e deciso

    justa e exequvel (garantias que integram o conceito de Processo Justo).

    40 CUNHA, Rosane Gay. O princpio da vedao de insuficincia: uma viso garantista positiva do

    processo civil. Revista de Doutrina da 4 Regio. Porto Alegre, n. 11, mar. 2006. Disponvel em: . Acesso em: 02 jan. 2013.

    41 CINTRA, Antonio Carlos de Arajo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cndido Rangel. Teoria Geral do Processo. 28 ed. So Paulo: Malheiros Editores, 2012. p.91.

  • 37

    Para a concretizao desses objetivos existem vrios obstculos que so

    definidos por Cappelletti e Garth, da seguinte forma:

    Embora o acesso efetivo justia venha sendo crescentemente aceito como um direito social bsico nas modernas sociedades, o conceito de efetividade , por si s, algo vago. A efetividade perfeita, contexto de um dado direito substantivo, poderia ser expressa como a completa igualdade de armas a garantia de que a concluso final depende apenas dos mritos jurdicos relativos das partes antagnicas, sem relao com diferenas que sejam estranhas ao Direito e que, no entanto, afetam a afirmao e reivindicao dos direitos. Essa perfeita igualdade, naturalmente, utpica. As diferenas entre as partes no podem jamais ser completamente erradicadas. A questo saber at onde avanar na direo do objetivo utpico e a que custo. Em outras palavras, quantos dos obstculos ao acesso efetivo justia podem e devem ser atacados? A identificao desses obstculos, consequentemente, a primeira tarefa a ser cumprida.42

    As barreiras ao Acesso, segundo Cappelletti, so mais presentes nas

    Pequenas Causas e atingem geralmente os autores individuais, especialmente os

    pobres, ao mesmo tempo, as vantagens pertencem de modo especial aos litigantes

    organizacionais, adeptos do uso do sistema judicial para obterem seus prprios

    interesses.43

    Segundo Luiz Guilherme Marinoni para se garantir a participao dos

    cidados na sociedade, e desta forma a igualdade, imprescindvel que o exerccio

    da ao no seja obstaculizado, at porque ter direitos e no poder tutel-los

    certamente o mesmo que no os ter.44 Para esse processualista os principais

    problemas dizem respeito ao custo do processo e demora processual.

    Os entraves ao pleno Acesso Justia no Brasil podem ser classificados

    como de ordem econmica, cultural e social. Relacionamos na sequncia alguns

    desses fatores, sem a pretenso de exaurir o tema.

    Os empecilhos de ordem econmica dizem respeito ao pagamento de

    custas, honorrios advocatcios e s demais despesas processuais. Da a razo de

    ser da garantia prestao de assistncia jurdica integral e gratuita aos que

    comprovarem insuficincia de recursos (CF, art. 5, LXXIV).

    O valor das taxas judicirias e das custas um grave problema no Brasil,

    42 CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso justia. Porto Alegre: Fabris. 1988. p. 15. 43 Ibidem, p. 28. 44 MARINONI, Luiz Guilherme. Curso de Processo Civil V. 1: Teoria Geral do Processo. 3 ed. So

    Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 186.

  • 38

    pois muitos Tribunais fixam percentuais elevados sem margens mnima e mxima

    compatveis com os custos dos servios. Sobre o tema, o Supremo Tribunal Federal

    editou a Smula n. 667: Viola a garantia constitucional de acesso jurisdio a taxa

    judiciria calculada sem limite sobre o valor da causa.

    Em face das disparidades de critrios entre os Estados para definio do

    valor das custas judiciais, o Conselho Nacional de Justia (CNJ), rgo voltado

    reformulao de quadros e meios no Judicirio, sobretudo no que diz respeito ao

    controle e transparncia administrativa e processual, preparou estudo para

    elaborao de uma proposta de anteprojeto de lei que ir regular a matria, evitando

    os abusos cometidos por muitos Tribunais de Justia.

    Consoante notcia publicada no Portal do CNJ, o texto prev percentuais

    e valores mximos para a cobrana das custas judiciais, que poder ser feita em

    trs momentos processuais: o primeiro, na distribuio; o segundo, no preparo de

    apelao, agravo, recurso adesivo, embargos infringentes e nos processos de

    competncia originria do tribunal; e, por fim, ao ser proposta a execuo. De

    acordo com a proposta, no primeiro e no terceiro momentos de cobrana, o

    percentual em cada uma das fases no poder exceder a 2% do valor da causa. J

    na segunda fase, de preparao de recurso, no poder exceder a 4%. A soma dos

    percentuais no poder ultrapassar a 6% do valor da causa. Caso o projeto de lei

    sobre a matria venha a ser aprovado pelo Congresso Nacional, as leis estaduais

    devero passar a observar os critrios e limites fixados na lei nacional.45

    Quanto concesso da assistncia judiciria gratuita cabe referir que

    muitos juzes esto dificultando ao mximo o deferimento desse benefcio. Alguns

    magistrados, de ofcio, exigem uma srie de documentos para comprovar a

    impossibilidade de arcar com os nus do processo. Em muitos casos as partes no

    tm condies de produzir essas provas e os processos acabam extintos pela

    ausncia de pagamentos das custas.

    Esse fato foi realado com a aprovao do Enunciado n. 2, pelo Frum

    Interinstitucional Previdencirio do Rio Grande do Sul, dispondo que a mera

    declarao de impossibilidade de pagamento das despesas processuais sem

    prejuzo da subsistncia suficiente para a concesso do benefcio da AJG,

    45 Notcia colhida do Portal do CNJ. Disponvel em: . Acesso em: 13 jun. 2013.

  • 39

    cabendo parte contrria a impugnao. Pode o juiz, nos casos excepcionais, com

    base em razes fundadas, exigir a comprovao.46

    A assistncia gratuita a ser prestada a todas as pessoas que dela

    necessitam deve incluir orientao e defesa jurdica, divulgao de informaes

    sobre direitos e deveres, preveno da violncia e patrocnio de causas perante o

    Poder Judicirio, desde o juiz de primeiro grau at as instncias superiores. Essa

    atribuio cabe primordialmente s Defensorias Pblicas da Unio e dos Estados,

    mas diante do pequeno nmero de defensores pblicos e da ausncia de

    defensorias, na grande parte dos municpios brasileiros o servio prestado de

    forma precria. No mbito federal, os defensores pblicos esto concentrados nas

    Capitais e em poucas cidades do interior.

    A dispensa do advogado na propositura das demandas em casos

    autorizados em lei, como nos juizados especiais e em aes trabalhistas, representa

    uma alternativa diante da falta de defensores pblicos e viabiliza o Acesso Justia

    em inmeras situaes, contornando parte do problema.

    A regra, criticada pelas entidades de classe da advocacia, foi considerada

    constitucional pelo Supremo Tribunal Federal, justamente por facilitar o Acesso

    Justia em procedimentos simplificados e de baixo valor (AO 1.531-AgR, Plenrio,

    Relatora Min. Crmen Lcia, DJe de 1/7/2009). No mesmo sentido em relao

    previso de dispensa de advogado nos Juizados Especiais Federais (ADI 3.168,

    Plenrio, Relator Min. Joaquim Barbosa, DJ de 3/8/2007).

    As dificuldades de ordem cultural dizem respeito ao baixo nvel de

    educao no nosso Pas responsvel pela excluso social de muitos cidados que

    no tm acesso informao, que no conhecem seus direitos e a forma de exigi-

    los. Problema que pode ser amenizado pela melhoria dos servios de assistncia

    judiciria por parte das Defensorias Pblicas, Universidades e OAB. Cabe tambm

    s escolas, aos movimentos sociais e comunidade como um todo colaborar nesse

    46 O Frum Institucional Previdencirio uma iniciativa do Tribunal Regional Federal da 4 Regio,

    que envolve os Estados do Rio Grande do Sul, Paran e Santa Catarina, cuja finalidade ampliar a discusso sobre o aperfeioamento e padronizao das prticas e procedimentos nas demandas previdencirias da Justia Federal, facilitando a interlocuo, fomentando a postura de colaborao e promovendo a democratizao do dilogo entre as partes envolvidas. E com vistas clere e efetiva resoluo dos processos que lhe so afetos, incentivando a permanente necessidade de ampliao das vias de acesso ao Judicirio Federal. Disponvel em: . Acesso em: 13 jan. 2014.

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    trabalho na medida de suas possibilidades.

    Vale lembrar que no Brasil corriqueira a violao de direitos por normas

    consideradas inconstitucionais e um nmero considervel de pessoas prejudicadas

    sequer toma conhecimento. Por outras vezes, ficam impedidas de postular em juzo

    pela fluncia dos prazos de decadncia ou de prescrio. Exemplos desses fatos

    esto nos emprstimos compulsrios dos combustveis 47 , nos expurgos

    inflacionrios decorrentes dos planos econmicos (Bresser, Vero e Collor) que

    geraram perdas para as cadernetas de poupana48 e no FGTS49, e na forma de

    clculo dos benefcios previdencirios50.

    Pode-se estabelecer como obstculos de ordem social a forma como os

    diferentes segmentos buscam a soluo de suas demandas. A populao de baixa

    renda, em virtude do desconhecimento das formas de Acesso Justia, procura

    resolver conflitos por outros meios, sem a garantia estatal, e quando busca o Poder

    Judicirio enfrenta as dificuldades referidas. Por outro lado, as classes mais altas

    tm condies de contratar bons advogados, de pagar custas e de ter a chamada

    igualdade de armas.

    Aos obstculos referidos acrescentam-se outros de grande impacto, quais

    sejam: a morosidade; a inadequao de leis e institutos jurdicos; a carncia de

    recursos humanos (juzes e servidores); o excesso de demandas; a imagem

    negativa do Poder Judicirio; a deficincia de infraestrutura e a inadequao de

    rotinas e procedimentos, dentre outros.51

    As medidas prticas adotadas pelos pases do Mundo Ocidental para

    melhorar o Acesso Justia so enumeradas por Cappelletti e Garth em formas de

    ondas:

    1 onda: assistncia judiciria para os pobres;

    2 onda: representao jurdica para os interesses difusos, especialmente nas reas de proteo ambiental e do consumidor;

    47 Nesse sentido: STF, RE 586436 AgR/MG, 2 Turma, Relator Ministro Cezar Peluso, DJe

    18/09/2009. 48 Nesse sentido: STF, AI 722834 RG/SP, Tribunal Pleno, Relator Ministro Dias Toffoli, DJe

    30/04/2010. 49 Nesse sentido: STF, RE 226855/RS, Tribunal Pleno, Relator Ministro Moreira Alves, DJ 13/10/2000. 50 Nesse sentido: STF, RE 664317 AgR/PR, Tribunal Pleno, Relator Ministro Ricardo Lewandowski,

    DJe 03/05/2012. 51 Essas mazelas sero analisadas com nfase nos Captulos seguintes desta Tese com o objetivo de

    se obter alternativas para o aprimoramento em especial dos JEFs.

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    3 onda: enfoque de acesso justia porque incluiu os posicionamentos anteriores e ainda tenta atacar as barreiras ao acesso de modo mais articulado e compreensivo.52

    Essas medidas retratadas nas trs ondas so extramente importantes,

    mas no suficientes para a superao dos graves obstculos ao Acesso Justia.

    Devem ser acrescentadas aes que implicam mudanas legislativas e de ordem

    procedimental relacionadas com a organizao judiciria, a disciplina do processo, a

    reduo dos recursos processuais, dentre outras. De modo geral, tornando menos

    burocrticos os ritos processuais, modernizando a estrutura e especializando os

    rgos da justia, em especial de 1 grau.

    Dentro desse contexto, mostra-se relevante analisar neste trabalho o

    funcionamento dos Juizados Especiais Cveis no Brasil tendo em vista que foram

    idealizados com o objetivo de tornar o Processo Judicial mais simples e clere,

    ampliando o Acesso Justia, com nfase nas pessoas menos favorecidas

    economicamente.

    1.2 O DIREITO FUNDAMENTAL AO PROCESSO JUSTO

    Neste tpico so abordados aspectos relacionados com o direito

    fundamental ao Processo Justo o qual envolve o devido processo legal em sua

    dimenso substancial, como inerente ao Direito de Acesso Justia. Neste conceito

    est tambm a necessidade de uma prestao jurisdicional clere, adequada e

    efetiva.

    1.2.1 Garantias Fundamentais do Processo: o Processo Justo

    Os mecanismos que viabilizam o ingresso facilitado de aes judiciais no

    so suficientes para garantir um Acesso Justia qualificado. O cidado tem direito

    tambm a um Processo Justo, que lhe assegure uma adequada e concreta

    prestao jurisdicional. Somente um processo efetivo, real, garante a segurana

    jurdica e a soluo do litgio entre as partes.

    Dada sua relevncia e necessidade de ser observado pelas naes

    democrticas que o Direito a um Processo Justo ou Equitativo hoje est presente 52 CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso justia. Porto Alegre: Fabris, 1988. p. 31.

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    em Convenes Internacionais e em diversos ordenamentos jurdicos.53

    Francesco Luiso afirma que alm das regras contidas na Constituio

    Italina, devemos tomar hoje como regras essenciais de princpios de origem

    supranacional: a Conveno Europeia para a Proteo dos Direitos do Homem e

    com importncia sempre maior as normas de direito comunitrio. Em primeiro lugar,

    a Conveno Europeia para a Proteo dos Direitos do Homem e das Liberdades

    Fundamentais, ratificada pela Itlia, em 1955, contm uma disposio de interesse

    especfico para a proteo dos direitos. O art. 6, intitulado como um direito a um

    julgamento justo, estipula que toda pessoa tem o direito a uma audincia justa e

    pblica dentro de um prazo razovel por um tribunal independente e imparcial,

    estabelecido por lei.54

    A garantia do Processo Justo consta do art. 111 da Constituio da Itlia,

    o qual faz meno tambm ao devido processo e a sua razovel durao. Mauro

    Bove, ao comentar esse dispositivo, assinala que cabe ao Estado cumprir um duplo

    dever: preparar o sistema de proteo judicial e regular a mquina processual com

    respeito a certas garantias fundamentais.55

    Para Jos Manuel Bandrs Snchez-Cluzat, o art. 6.1 da Conveno

    Europeia para a Proteo dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais,

    adaptado em Roma, em 4 de novembro de 1950, garante o direito a um julgamento

    equitativo como um direito humano, que condensa todas as disposies contidas no

    referido preceito. Entre outras garantias processuais especficas, o aludido artigo

    reconhece o direito a um julgamento justo e pblico, de