Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

Embed Size (px)

Citation preview

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    1/58

    J. Herculano Pires

    EvoluoEspiritual

    do HomemNa Perspectiva da Doutrina Esprita

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    2/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 2

    Ttulo: Evoluo Espiritual do Homem

    (na perspectiva da Doutrina Esprita)

    Autor: J. Herculano Pires

    1 Edio - maio de 2005 2000 exemplares

    Coordenao Editorial: Herculano Ferraz PiresCapa: Andrei PolessiDiagramao: Adriana Cury PiresLaser Film: Srgio A. FrancoReviso: Tatiana Cury Pires / Flvia Cury PiresISBN85-88849-38-0

    Todos os direitos desta edio reservados Editora Paidia LtdaRua Dr. Bacelar, 505 - V. ClementinoCEP: 04026-001 - So PauloTel. (11) 5549-3053 - Fax (11) 5182-5836Site: www.editorapaideia.com.br

    Apoio:

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    3/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 3

    Contracapa (esquerda)

    A Genialidade escasseou no mundo, porque acivilizao atual perdeu-se na subalternidade dasaspiraes inferiores. Por toda parte as atividades

    humanas se aviltam na busca do pragmtico. Asmentes se fecham nos limites do interesse imedia-tista da sobrevivncia corporal. Reduzido imper-feio das funes orgnicas, o esprito s agora es-t voltando a ser considerado real e digno de aten-o das cincias.

    As ltimas descobertas da Cincia revelaram,

    mau grado a obstinao materialista, que o esprito o elemento estruturador da matria, confirmandoo princpio esprita da disperso da matria no es-pao e sua aglutinao pelo poder estruturador doesprito. A teoria de fora e matria do sculoXVIII agora substituda pelo princpio cientifica-mente provado de esprito e matria.

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    4/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 4

    Contracapa (direita)

    Jos Herculano Pires foi o que podemos cha-mar homem mltiplo. Em todas as reas do conhe-cimento em que desenvolveu atividades dentro e

    fora do movimento doutrinrio sua intelignciasuperior iluminada pela doutrina esprita e pela cul-tura humanstica brilhava com grande magnitude,fazendo o povo crescer espiritualmente. HerculanoPires foi mestre em Filosofia da Educao na Fa-culdade de Filosofia de Araraquara e membro daSociedade Brasileira de Filosofia. Presidente doSindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado deSo Paulo e fundador do Clube dos Jornalistas Es-pritas de So Paulo, que presidiu por longos anos.Diretor da Unio Brasileira de Escritores e vice-presidente do Sindicato dos Escritores de So Pau-lo. Presidente do Instituto Paulista de Parapsicolo-gia (...). E, o que mais importante: esprita desdeos vinte e dois anos de idade, ningum no Brasil e

    no estrangeiro mergulhou to fundo nas guas cris-talinas da Codificao Kardeciana e ningum de-fendeu mais e com mais competncia do que ele apureza doutrinria (...)

    (Do livroJ. Herculano Pires, o Apstolo de Kardec,

    de Jorge Rizzini)

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    5/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 5

    ndice

    O homem no mundo como ser na existncia.........................6

    As tentativas de fuga para o espao sideral.........................15

    Pureza e impureza, na concepo espiritual da vida ........... 24

    O Panpsiquismo e a unidade espiritual do homem..............32A fase intermediria da moralidade subjetiva.....................40

    Importncia das manifestaes medinicas ........................50

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    6/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 6

    O homem no mundocomo ser na existncia

    A Teoria da Evoluo das Espcies, de Darwin, foi rejei-tada pela Igreja e pela maioria das escolas espiritualistas

    como absurda e humilhante para a Humanidade. Evidente-mente chocante era, para a criatura humana, que pudssemosdescender das formas hominides do reino animal. Feriu asuscetibilidade do homem, milenarmente cultivada no estudodas culturas religiosas, que nos apresentavam como criao parte no Universo, a nica dotada de capacidade de abstraoe capacidade de discernimento suficiente, para reconhecer asua superioridade ante todos os demais seres. A idia bblica

    e de outras escrituras sagradas, segundo a qual fomos criadospor Deus sua imagem e semelhana, conferia-nos umaposio privilegiada, muito grata do nosso orgulho, e nonos permitia aceitar a proposio atrevida e insolente deDarwin, que profanava a nossa natureza divina. Nem mesmoaceitamos a teoria conciliatria de Roussell Wallace, mulode Darwin, que admitia o elemento espiritual no processoevolucionista.

    O prprio mestre francs da Universidade de Frana,Professor Denizard Rivail, de tradicional famlia lionesa, aopublicar O Livro dos Espritos, em que compendiava a Dou-trina Esprita, sob o pseudnimo de Allan Kardec ocultan-do os nomes das mdiuns que atuaram nas suas pesquisas ,evitou aprofundar a questo e definir claramente a sua posi-o no assunto, preservando as mdiuns, as meninas Boudin,

    e evitando empecilhos maiores para a divulgao da Nova

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    7/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 7

    Doutrina. S no quinto e ltimo volume da Codificao doEspiritismo, seu livroA Gnese - os milagres e as prediessegundo o Espiritismo, tornou clara e precisa a sua posioevolucionista quanto ao problema da evoluo das espcies.

    Na verdade, ele j havia antecipado a sua posio em v-rias passagens dos quatro livros anteriores e livros acess-rios. Mas a declarao chocante de que o ser animal no se

    humanizava sem haver passado pela fieira devidamente fataldos seres inferiores, constante de uma comunicao de Gali-leu pela mediunidade do astrnomo Camille Flammarion, sento foi includa na Codificao. Isso revela, ao mesmotempo, o cuidado cartesiano de Kardec e as dificuldades comque ele teve de lutar para sustentar a batalha esprita nacultura europia do sculo XIX. Como Descartes, seu prede-cessor na viso dos novos tempos, Kardec inscreveu, no no

    seu braso, que no tinha, mas na sua mente, a palavra Cris-to. Apesar disso, o Bispo de Barcelona ateou uma fogueiraem praa pblica para incinerar os seus livros, pois o homemno estava ao seu alcance e na Frana a Inquisio j nomais existia.

    O religiosismo popular, na Frana como em toda parte,foi abalado pela resistncia e a insistncia de Kardec, absor-

    vendo os seus princpios bsicos. Foi ento que ele se entre-gou elaborao secreta de O Evangelho Segundo o Espiri-tismo, proporcionando ao povo os esclarecimentos espritas.Nesse livro ele amparava e estimulava a religio do povo,mas sustentando essa religiosidade em termos racionais.Apoiava-se ento no princpio doutrinrio da lei de adorao lei universal que s ele descobriu e explicou , reativandoa religio nos coraes abalados. Ainda hoje h espritas, no

    raro ocupando posies de direo em instituies doutrin-

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    8/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 8

    rias, que no compreendem a necessidade e o valor desselivro orientador da intuio religiosa popular. No compre-endem que o aspecto religioso do Espiritismo constitui abase inabalvel do movimento esprita no mundo. Outroschegam a criticar Kardec por essa capitulao e outros, maisingnuos, chegam ao cmulo de alegar que essa tarefa cabiaa Roustaing, o infeliz fascinado de Bordeaux, que lanou aobra de evidente mistificao Os Quatro Evangelhos, emque os evangelistas se contradizem a si mesmos e tentamforar um retrocesso catlico do religiosismo popular. A teseespria, levantada pela Federao Esprita Brasileira, de queRoustaing estava incumbido do problema da f simples-mente alucinante. O pobre fascinado no foi discpulo deKardec, jamais militou ao seu lado e teve sua obra rejeitadapelo mestre. A f de Roustaing no podia entrosar-se na obra

    de Kardec, pois era a f catlica medieval, enquanto a fesprita, definida por Kardec como f racional, no precisavade nenhum assessor mstico e fantico para se implantar naconscincia dos novos tempos.

    O Espiritismo rejeita toda mitologia de ontem, de hoje ede amanh. Sua funo de transformar os erros em verda-des, como se l em Kardec, e no em remendar as mitologias

    antigas com novos e ridculos mitos, como Roustaing tentoufazer em sua obra mistificadora, em que a obra kardeciana deformada por um trabalho de plgio vergonhoso e de re-mendos adulteradores que denunciam a debilidade mental doautor. Por sinal que este mesmo declara, na introduo desua obra, que a obteve mediunicamente (por uma mdium,que foi a primeira a rejeitar a mistificao) aps haver sadode um internamento em hospital de doentes mentais.

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    9/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 9

    Feito esse prembulo necessrio, convm lembrar que areligiosidade popular nada tem a ver com as religies dostelogos e, portanto, das igrejas. A religio pura e natural dopovo nasce da lei de adorao e no das sacristias. umimpulso instintivo do homem, que busca Deus na natureza.Expusemos esse processo, como base em pesquisas antropo-lgicas, em nosso livro O Esprito e o Tempo. O Espiritismoreconhece a legitimidade desse processo, a naturalidadedesse impulso. A lei de adorao hoje plenamente reconhe-cida pelas Filosofias da Existncia, com a designao deimpulso de transcendncia. Esse impulso disciplinado pelarazo, na medida do desenvolvimento cultural da humanida-de.

    O conceito de Deus se aprimora e refina na mente hu-mana, acompanhando o desenvolvimento da Civilizao. O

    refinamento intelectual gera ilaes atrevidas que o homemvaidoso e entusiasmado com o seu progresso transforma emafirmaes definitivas, desencadeando o processo das dog-mticas asfixiantes e intocveis, porque sagradas. As revela-es sutis de entidades espirituais, que o homem capta comopercepes extra-sensoriais, acabam cercadas de aparatosmateriais imaginrios, que reforam os dogmatismos exclu-

    sivistas. Os fatos da selva, pragmticos e funcionais, provin-dos dos ritos necessrios da vida animal, complicam-se comos adendos da imaginao e a vontade de potncia, o anseiode poder dos homens e das organizaes religiosas natural-mente absorventes. Instaura-se o poder como conquistahumana e desencadeiam-se aes repressivas dos possveiscismas e gerados por opinies contrrias. Acendem-se asfogueiras inquisitrias e borbulham em sangue os massacres

    das dissidncias audaciosas e as Noites de So Bartolomeu.

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    10/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 10

    Todo esse processo, contraditrio em si mesmo, revela acondio espiritual do homem no mundo. Desde o instanteem que o ser espiritual se lana na realidade material, a suaestrutura ntica, a estrutura espiritual do ser, inverteu todo oseu sistema direcional e seus vetores psquicos se voltarampara os alvos terrenos. No se trata de uma queda, mas deuma experincia necessria, em que dominam as forasmateriais e prevalecem os instintos animais; o ser est sub-metido ao desafio do no-ser. Esta expresso filosoficamen-te to discutida no se refere a uma possvel entidade mito-lgica (como a do Anti-Cristo, por exemplo), mas a umarealidade inversa que corresponde natureza do ser.

    Ningum explicou melhor essa inverso do que FredericMyers em sua teoria das duas mentes, a subliminare a su-praliminar. O ser como ser fica soterrado em si mesmo,

    guardando suas conquistas da filognese evolutiva no in-consciente, e o homem se define na mente consciente, nive-lado no plano dos interesses terrenos imediatistas. A Religi-o do Homem, para usarmos essa expresso de Tagore,define-se ento como um sistema prxico, ou seja, integradona prxis de cada conquista do mundo. Historicamente essaviso decepcionante. Tem-se a impresso de que a evolu-

    o humana faliu, voltando ao seu marco zero.Os poderes religiosos nada tm de divino, so exclusi-vamente humanos. A recente tragdia do Iran, deflagradafriamente pelo Aiatol Comeine, num retrocesso brusco eviolento poca das Civilizaes Teolgicas, com toda abrutalidade dos processos inquisitoriais, mostra-nos o poderde reverso dos vetores ou cargas de fora da gravidadeterrena. Comeine o Gro Sacerdote da Era Teocrtica, de

    Israel, da Mesopotmia e do Egito ou da antiga Catai, a

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    11/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 11

    China Arcaica, das religies do homem, ansiosas pela domi-nao material do mundo. Apoiado no Coro, esse Evange-lho s avessas, ele ressurge na abertura dos despotismosdesencadeados pelas conflagraes mundiais do sculo,numa tentativa perigosa de repetir as audcias islmicas dopassado.

    A atitude agressiva da China invadindo o Vietn de ma-

    neira brutal, depois de prudente reatamento de relaes comos Estados Unidos, mostra que os telricos do mandarinatono estavam extintos, mas apenas ressonando em seus es-conderijos subterrneos. Por outro lado, a reao russa deapoio ao Vietn corresponde s exigncias do determinismohistrico do restabelecimento do Imprio de Tamerlo. evidente que esses fatos atuais se revestem de aparnciascomo se fossem determinados apenas por circunstncias do

    nosso tempo. Mas so as molas secretas dessa situao,como no caso dos totalitarismos europeus que romperam ofalso equilbrio do sculo com as exploses da barbriegermnica do passado.

    Temos, assim, a demonstrao flagrante, no panoramaatual do mundo, da sobrevivncia do passado histrico naconjuntura contempornea. O princpio esprita do encadea-

    mento de todos os fatos e todas as coisas no sistema univer-sal nos permite ver, por trs da roupagem moderna dos con-flitos atuais, a continuidade inevitvel da lei de ao e rea-o. A lei grega da palingenesia determinava a repetiocontnua dos ciclos histricos em todas as suas mincias.Nos perodos de destruio as civilizaes desapareciam,mas nos perodos de reconstruo tudo se repetia, minucio-samente: renovavam-se as figuras do passado em suas posi-es antigas, as cidades renasciam das cinzas com todos os

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    12/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 12

    seus atributos, as situaes arcaicas se restabeleciam, asaldeias ressurgiam em seus antigos lugares e at mesmo as

    estradas e os trilhos dos campos eram restabelecidos. evidente o exagero absurdo dessa concepo, mas no menosevidente a intuio das repeties histricas, necessrias aoencadeamento dos tempos no processo evolutivo. A repeti-o no nem poderia ser escrita, pois com isso se anularia asua finalidade evolutiva.

    Levada por Pitgoras, do Egito Grcia, a lei da palin-genesia adaptou-se a vrias concepes das diversas escolasfilosficas. Hoje o astrnomo J. Opiki sustenta a teoria doUniverso Oscilante, baseada nas observaes dos movimen-tos das galxias. De milhes em milhes de anos o Universose expande no infinito e depois retorna sobre si mesmo, numritmo de sstoles e distoles. Nesse abrir e fechar o universo

    se destri e se recompe, marcando o ritmo assombroso dastransformaes evolutivas. A repetio histrica apenas umdetalhe desse eterno retorno no qual se abre, humlima efragmentria, a teoria esprita da reencarnao, hoje subme-tida a pesquisas cientficas nos grandes centros universitriosdo mundo, desde os trabalhos do prof. Wladmir Raikov, naUniversidade de Moscou, aos de Ian Stevenson, na Universi-

    dade da Califrnia e aos de Hamendras Nat Barnejee, naUniversidade de Rajast, na ndia. O problema pitagrico,egpcio e grego retorna s cogitaes filosficas e s pesqui-sas cientficas na nossa civilizao.

    O processo evolutivo adquire assim dimenses csmi-cas, segundo a proposio esprita: Tudo se encadeia nouniverso. Vemos assim que a evoluo espiritual do homemno um caso especfico de transformao individual, de

    santificao cannica ou de reforma ntima de modelagem

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    13/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 13

    catlica. O homem evolui espiritualmente na medida em que,amalgamado na experincia csmica, levado por essaexperincia incontrolvel por curas e pastores. Por isso Jesusno ensinou nem aprovou as formalidades do templo deJerusalm, nem submeteu os seus discpulos s exignciaspretensiosas do rabinato judeu. Sua lio a respeito se resu-me na advertncia: O que se apega sua vida, perd-la-,mas o que a perder por amor de mim, esse a encontrar.Quem vive debruado sobre si mesmo, cuidando apenas doseu umbigo, no pode perceber e muito menos compreendera grandeza espiritual que a sua imperecvel herana defilho de Deus.

    Essa a razo porque o Espiritismo rejeita a alienao dohomem no culto externo, em que os mitos supostamentesagrados servem apenas aos espritos em fase primria de

    evoluo. A lei de adorao no nos obriga a adorar mitos dequalquer espcie. uma lei natural que leva o homem aadorar a Deus em esprito e verdade. O impulso de transcen-dncia que marca a natureza humana no comporta aparatosde cultos, nem sacramentos inventados pelas igrejas para ocomrcio da simonia. Os vendilhes do templo, condenadospelo Messias, encontraram mil maneiras de continuar na

    venda de suas ovelhas inocentes. Substituram os animaissacrificiais por palavras, gestos e cerimnias, evitando com-plicaes fiscais. Transformaram-se em mascates de palavr-rios eletrnicos, vendendo palavras vazias como faziam emseu tempo os sofistas gregos que Scrates desmascarou. Issomostra que o espiritual caiu num ciclo vicioso, exibindo orefluir do passado na geena de fogo do Vale do Kidron, dolixo acumulado na Porta do Monturo. Estamos queimando os

    resduos que impedem o fluxo natural da evoluo. Nossa

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    14/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 14

    atualidade trgica brota ameaadora da fermentao do lixohistrico s portas de Jerusalm. No Deus quem noscastiga, mas ns mesmos que nos asfixiamos em nossa inca-pacidade de compreender, amar e perdoar. Apegados aosinteresses terrenos, no conseguimos ainda abrir os olhos,doentes de ganncia e violncia, para a realidade de nossosprprios impulsos de transcendncia.

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    15/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 15

    As tentativas de fugapara o espao sideral

    A inverso dos vetores nticos, portanto psquicos, rea-lizada no momento da encarnao, no de precipitao do ser

    na existncia, segundo a Teoria das Filosofias da Existncia,forma tpica do pensamento contemporneo, ao invs deavanar na direo do alvo natural da morte, para super-la,desviou-se para vcios da rotina. O Ser feito homem, imanta-do ao magnetismo das sensaes carnais (portanto animais),perdeu-se a si mesmo na atrao de fatores humanos, contra-ditrios entre si e contrrios aos objetivos existenciais. Veri-ficando esse fato com sua aguda percepo dos processos

    materiais, Sartre cria a teoria da frustrao do homem essapaixo intil na morte. Ento os existencialistas espiritua-lizados, como o prprio Kierkegaard, Cassirer, Jaspers,Heidegger, Garrilr Marcel (catlico) se opuseram teoria dafrustrao do homem na morte, antes de Sartre fazer sucesso,demonstrando a preponderncia da gravidade terrena namentalidade do nosso tempo. Evidenciava-se o teor materia-lista do homem atual, que prefere a sua frustrao na morte,a sua nadificao, segundo a linguagem sartreana, continu-idade da vida aps a morte. De nada se precisaria para diag-nosticar o fracasso do pro-jeto humano lanado na existn-cia; e, como conseqncia, a necessidade de prosseguimentodas dolorosas experincias do passado.

    Nesse episdio filosfico evidenciava-se a condenaodo mundo contemporneo repetio dos descalabros do

    passado. E isso no como castigo divino, mas como inevit-

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    16/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 16

    vel reparao das falhas do processo evolutivo, na pauta dalei de ao e reao. Nossa humanidade se condenava, porsua leviandade inconseqente, a repetir o curso doloroso dasexperincias inteis. O livre-arbtrio do homem, que o levaraa preferir o caminho mais longo e doloroso, dera o seu pr-prio veredicto no tribunal de sua prpria conscincia. Osmonstros no domados no passado voltam a assediar-nos,repontando ferozes no trgico panorama da atual realidade.As leis se cumprem na mecnica inexorvel da estrutura vitale contnua da histria, mestra dos homens, como queriaCcero.

    As duas conflagraes mundiais, de 1914 e 1939, trou-xeram tona, na atualidade mundial, a ferocidade aparente-mente soterrada e as ambies desmedidas das tribos germ-nicas que, no passado, esmagaram o predomnio romano da

    Europa. Os romanos, por sua vez, tiveram de pagar, porassim dizer, as atrocidades cometidas contra os celtas, onico povo filsofo do mundo, segundo Aristteles. A sabe-doria drudica, da religio pura dos celtas, teve o seu heriem Vercingetridix, o grande e generoso chefe celta, queCsar arrastou pelas ruas de Roma, cego e humilhado, comoum brbaro sem entranhas. O druidismo, religio medinica

    e potica dos sacerdotes poetas e cantores, fazia parte dapreparao do advento do Cristianismo. Kardec explicariamais tarde, em comunicao medinica a Lon Denis (queConan Doyle chama de o Druda de Lorena), a importnciados bardos celtas e o sentido profundo das trades drudicasnas Glias, para a libertao humana, imantao telrica queinvertera os vetores do ser em sua projeo na existncia.

    O plano divino foi frustrado pelo arbtrio dos homens. A

    hierarquia espiritual foi sacrificada em favor das necessida-

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    17/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 17

    des da experincia livre do homem em seu processo evoluti-vo. As ambies nazi-fascistas de Hitler e Mussolini consti-turam a prova do crculo na repetio das experinciasfrustradas. O homem teve de voltar barbrie, rompendo ofrgil equilbrio daBelle Epoque europia que mergulhou nocaos da evoluo material, no horror de suas conquistastecnolgicas. Milhares de criaturas sensveis, como no casodoloroso de Stefan Zweig, tentaram escapar do caos pelosuicdio. Os indivduos, ligados naturalmente s suas comu-nidades intelectuais, no dispunham de meios para escapar presso das foras crmicas desencadeadas no plano social.

    Em seu livro O Mundo que eu vi, Zweig estabeleceu ocontraste da Viena de seu tempo, paraso musical de harmo-nia e beleza, centro intelectual e artstico da ustria fervi-lhante de idias elevadas com a avalanche de brutalidades,

    sujeira moral e ferocidade selvagem que se despencou sobrea cidade, o pas e o mundo. De onde vinha toda essa misriahumana, esse retrocesso histrico, arrasador, seno das ca-madas temporais subterrneas, onde os monstros do passadodespertavam de sua catalepsia providencial? Ainda hojepodemos ver em Viena uma imagem de bronze de NossaSenhora, aparente objeto de culto religioso, mas provido por

    dentro de um sistema de espadas de ao. Os infelizes queeram ali encerrados morriam trespassados pelas espadas, aofechar da imagem. As espadas simblicas do martrio deMaria de Nazar, ante a crucificao do filho, transforma-vam-se em espadas cruis de morte sangrenta, e isso aindanos tempos imperiais da grandeza austraca. O sadismoinfernal dessa forma de execuo prova o estado real daevoluo moral da Europa, que escondia suas garras de fera

    sob o manto piedoso da Virgem. Era inevitvel a ecloso do

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    18/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 18

    Novo Terror, mil vezes pior que o da Revoluo Francesa,na proporo em que a frgil camada de civilizao fossesendo rompida, ao despertar dos monstros subterrneos. Esserompimento verificou-se em escala mundial, como vimos emnossa contemporaneidade, pois tudo se encadeia no universo.

    A Tecnologia da guerra ameaou o mundo inteiro. Dasbombas voadoras de Hitler sairiam mais tarde, como borbo-

    letas csmicas do futuro, os foguetes da pesquisa espacialque romperam as barreiras da gravidade terrena. Premidapela presso do ambiente catico do mundo, a conscinciahumana gerou a angstia existencial, com o apelo desespera-do aos txicos, o aumento da criminalidade mundial, ossurtos de criminalidade infantil e o anseio de fuga do plane-ta, nas tentativas de fuga pelo espao sideral. A Astronuti-ca, nascida das entranhas da tecnologia de matana, trans-

    formou-se em esperana, embora remota, de libertao cs-mica do homem. Fugir da Terra infestada de monstros dopassado e devastada, poluda, aviltada pela raa humana,esse o objetivo do homem contemporneo. Mas como asbarreiras das distncias csmicas parecem invencveis, sur-gem os projetos lricos de construo de cidades csmicas noespao sideral, nos pontos neutros de gravidade entre a Terra

    e a Lua, bem como os projetos de revitalizao da prpriaLua, com arborizao artificial para restabelecimento de suaatmosfera. Delrios de uma fase histrica de pesadelo, queno passar com essas invenes, mas apenas com o proces-so purgatorial em marcha dolorosa.

    Os desgastes da natureza foram o homem a despertarpara as exigncias da sua prpria transformao, no desen-volvimento de suas potencialidades espirituais. Antes da

    transcendncia artificial na conquista do espao csmico,

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    19/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 19

    cabe-lhe atentar para a transcendncia natural de suas possi-bilidades nticas. Cabe-lhe ainda o dever moral de restabele-cer a ordem terrena, harmonia e sua beleza primitiva. Osmundos superiores do Cosmos no podem receber os dem-nios da Terra, a no ser pela ordem de graduao evolutivados que conseguirem elevar-se acima do nvel moral negati-vo do nosso planeta.

    Em seu livro O Jogo de Avelrios, Herman Hesse obser-va que as fases da decadncia do mundo so precedidas defases musicais em que a estridncia supera a harmonia.Nosso mundo atual chegou ao mximo da estridncia namsica. E essa estridncia se reflete em todas as demaisatividades artsticas. Voltamos ao primitivismo com tcnicasinteis de disfarce; resposta desses artifcios, no o desejo deprogresso, mas a conscincia da fragilidade humana, da

    impotncia do homem atual para manter-se no equilbrio dosgnios do passado, quanto mais para super-los.

    A genialidade escasseou no mundo, porque a civilizaoatual perdeu-se na subalternidade das aspiraes inferiores.Por toda parte as atividades humanas se aviltaram na buscado pragmtico. As mentes se fecham nos limites do interesseimediatista da sobrevivncia corporal. Reduzido imperfei-

    o das funes orgnicas, o esprito s agora est voltando aser considerado real e digno de ateno das cincias.

    As ltimas descobertas da Cincia revelaram, mau gradoa obstinao materialista, que o esprito o elemento estrutu-rador da matria, confirmando o princpio esprita da disper-so da matria no espao e sua aglutinao pelo poder estru-turador do esprito. A teoria de fora e matria do sculo

    XVIII agora substituda pelo princpio cientificamente

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    20/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 20

    provado de esprito e matria. Nas cincias biolgicas asexperincias com embries de animais provaram que oscentros padronizadores do organismo dominam a estrutura-o dos corpos. No tocante ao homem, as pesquisas russas dauniversidade de Kirov revelaram que a formao do corpohumano e seu funcionamento so determinados pelo corpobioplsmico, constitudo de plasma fsico, correspondente aocorpo espiritual da tradio crist, que no Espiritismo apare-ce com a denominao kardeciana deperisprito. O materia-lismo oficial e ideolgico do Estado Sovitico reagiu contraessa descoberta, mas as provas em contrrio no foram fei-tas. Esses avanos da Cincia, mau grado a teimosia materia-lista e religiosa, reparam no campo cientfico atual os erros edistores intencionais do passado, geralmente feitas emdefesa de posies dogmticas interesseiras.

    H uma enxurrada de crimes materiais, intencionais,morais e de toda espcie submetidos a revises penosas daatualidade. Mas a disposio de regresso posio certapoder atenuar a violncia das reaes crmicas j desenca-deadas em nosso tempo. Para essa atenuao muito poderocontribuir os homens de boa-vontade, em todas as circuns-tncias em que se encontrarem. Volta assim responsabili-

    dade do livre-arbtrio humano a correo e a superao deseus desmandos no passado.

    natural o anseio atual do homem, de fuga para outrosmundos. Ao se projetar na existncia, o ser traz consigo,fixada em sua sensibilidade ntica, o esquema de sua desti-nao csmica. No homem, segundo a teoria genial de Fre-deric Myers, esse esquema secreto permanece em sua mentesubliminar, influindo sutilmente em sua mundividncia.

    Depende da maior ou menor permeabilidade do limiar sobre

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    21/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 21

    o qual se assenta, por assim dizer, a conscincia supralimi-nar, a percepo mais ativa ou mais imprecisa do futuroexistencial do homem. Kardec esboou, em O Livro dosEspritos, a sua famosa Escala Esprita, com a caracterizaoadmiravelmente precisa dos quadros superpostos dos grausde evoluo espiritual do homem. Essa escala marca o rotei-ro csmico do homem na direo dos mundos superiores doInfinito. A Terra figura nesse esquema como base de lana-mento espacial dos grupos humanos devidamente preparadospara a transferncia a mundos mais elevados. A condiopara integrar esses grupos apenas uma: haver superado onvel moral do planeta. Uma vez superado esse nvel, ohomem est apto a viver num mundo de regenerao, deonde partir, completado o seu estgio regenerador, paramundos superiores, sempre na medida exata de suas possibi-

    lidades. Dessa maneira, todos ns sentimos o anseio da fugasideral, em menor ou maior grau.

    Desejamos todos viver num mundo diferente do nosso,que, segundo Kardec, o Purgatrio que os telogos e osvidentes nunca souberam onde colocar. aqui, na Terra dosHomens, segundo a expresso acertada de Saint Exupry,que temos de aprender a lutar contra a nossa fragilidade

    carnal, conquistando a invulnerabilidade do esprito. Naproporo em que o homem progride na sua evoluo, maisvivas se tornam em sua memria subliminar e mais fortes deprojetam em sua mente supraliminar as esperanas da esca-lada csmica. No h tcnicas especficas para essa prepara-o do homem, pois a evoluo de cada existente, ou seja, decada criatura humana na Terra, se faz unicamente atravs dasexperincias vivenciais. As regras morais, as religiosas, as

    mentais no passam de arranjos criados por criaturas imagi-

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    22/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 22

    nosas e sistemticas, que nem a si mesmas conseguem me-lhorar. O nico manual possvel de evoluo espiritual o Evangelho de Jesus compreendido em esprito e verdade,sem as interpretaes dogmticas do sectarismo religioso. Sa vida guarda o segredo da preparao especfica de cadaexistente para o colocar em condies de partir para os mun-dos do espao sideral.

    O Espiritismo nos mostra e prova, desde as pesquisas deKardec at as atuais, que antes de nos libertarmos do planetatemos de passar pelos estgios progressivos da prpria esferaespiritual da Terra. No devemos, pois, olhar com muitoanseio e pretenso para as estrelas distantes, esquecidos denossas contas finais com a prpria Terra. Para pisar no pri-meiro degrau dos mundos superiores, precisamos antesprovar as escadinhas internas da nossa morada atual. No h

    milagres na evoluo, h leis.Algumas instituies espritas inventaram ou adotaram

    sistemas de santificao, maneira dos usados no Catolicis-mo e no Protestantismo. Ao invs de ensinarem doutrinaesprita, passaram a dar cursos de boas maneiras, de impos-tao de voz e assim por diante; cometem um grande erro,pois na verdade as pessoas se revestem de hipocrisia, lo-

    grando-se a si mesmas. Perdem a naturalidade, a espontanei-dade e com esta a virtude preciosa da sinceridade. Jogamfora o que tm de melhor, que a capacidade de no mentir eno fingir. s vezes, em mensagens medinicas de espritosainda apegados ao rano clerical das sacristias, aparecemrecomendaes desse teor. natural que uma criatura queiradominar e controlar o seu comportamento na medida dasexigncias da sociabilidade. Mas da a entregar-se defor-

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    23/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 23

    mao de si mesma para aparentar angelitude vai grandedistncia.

    A evoluo humana no se faz por meio desses artifciosridculos. No vem de fora, mas de dentro, das profundezasdo ser. A experincia vital o corretivo natural dos espritosindisciplinados. Na Terra podemos fingir e mentir vontade,mas ao deix-la nos defrontaremos com a realidade nua e

    crua do que somos. O que nos interessa, portanto, no aprender regras padronizadas de comportamento fingido,mas refinar-nos na medida do possvel, cultivando o respeitoaos outros, o amor aos semelhantes, a humildade que nasceda compreenso de nossas imperfeies. O fingimento logopercebido por todos os que no se utilizam dele.

    O Espiritismo nos ensina que temos em ns mesmos, emnossa natureza especfica, os recursos de que a vida se servepara nos tornar mais aptos a viver com dignidade e nobrezaespiritual legtima. No podemos instalar em nossas institui-es esses modelos falidos que modelaram os carrascos dasinquisies, cobrindo a astcia de serpentes venenosas.Ningum pode atingir o cu com as asas de cera de caro, emuito menos com asas de papel de seda dos anjos de procis-ses. Temos de enfrent-la como ela , com a nossa prpria

    realidade, para podermos amadurecer ao sol da verdade,longe das sombras da mentira.

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    24/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 24

    Pureza e impureza, naconcepo espiritual da vida

    O conceito de pureza nasce das relaes sensoriais e,portanto, epidrmicas do homem com as coisas e os seres. A

    sensao desagradvel ou repugnante determina a naturezaimpura da coisa. Ao contrrio, a sensao agradvel delimpeza. Na gama infinita das sensaes e em suas diversifi-caes influem tambm as condies ambientais, mesolgi-cas, ecolgicas, os usos e costumes, as tradies e assim pordiante. Mas o que interessa ao nosso estudo pode resumir-seno primeiro contraste, que o desencadeante do processo. Ainfluncia racional aparece tardiamente, no conseguindo

    modificar os esquemas estabelecidos. O critrio religioso dopuro e do impuro uma conseqncia refinada e racionali-zada do processo natural e instintivo, geralmente determina-do por processos intelectuais e pelas exigncias do conceitodo sagrado e os preceitos de santificao.

    Para os judeus a vida era pura e a morte impura. Bastavauma pessoa cair morta entre pessoas puras e todas elas fica-

    vam impuras e tinham de submeter-se no Templo aos ritosde purificao. Lzaro, morto e ressuscitado por Jesus, torna-ra-se impuro. Para os gregos a impureza vinha das derrotasem lutas fsicas ou na escravido. Para os romanos, a impu-reza vinha dos espritos malignos que deviam ser afastadosdas cidades pelas procisses dos ancestrais, carregados emesfinge como santos ou pelas festas dedicadas aos deuses.Mas em todos os casos a impureza era aviltante e exigia ritos

    de purificao. Para os indianos a impureza era atributo dos

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    25/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 25

    prias e contagiava as castas superiores, nascidas da cabea edo esprito de Brama. Para todos os povos antigos a relaosexual era impura, mas os deuses podiam purific-la. Noobstante, as criaturas superiores no podiam nascer dessarelao, mas apenas de mes virgens fecundadas por umdeus, como no caso de Pitgoras. A virgindade era pura esagrada, mas a esterilidade feminina denunciava a maldiodos deuses para a mulher. As virgens mes eram puras egeravam messias e profetas. No culto de Vesta, introduzidoem Roma, as vestais deviam ser puras e manter-se virgensat os 30 anos de idade, sendo enterradas vivas se tivessemrelao sexual antes daquela idade. No obstante, o cultoflico se propagava entre todos os povos. E a prostituiosagrada oficialmente nos tempos de Vnus dignificava asprostitutas. Dessa situao confusa nasceram as regras de

    pureza e impureza do mundo cristo primitivo, ligado umbi-licalmente s prescries judaicas. Afrodite era cultuada enos templos da Sumria havia cpulas sagradas nos altares,sob as bnos dos sacerdotes.

    De todo esse panorama confuso, as bacanais e as satur-nais eram festas gloriosas, que agradavam os deuses. Todasas religies atuais esto ainda carregadas dos resduos dessa

    fase. Esse prolongamento da confuso ertica ao nossotempo revela a predominncia, no homem pretensioso dehoje, de sua instintividade animalesca, acrescida de um falsorefinamento produzido pelo progresso material. A imensamaioria das criaturas humanas, s vsperas da Era Csmica,vive o dia-a-dia das sensaes primrias da espcie. O de-senvolvimento do princpio inteligente foi atrofiado na civi-lizao tecnolgica pela importncia dada, de maneira quase

    absoluta, aos problemas do bem-estar, das comodidades e da

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    26/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 26

    elegncia do suprfluo. Em geral, somos ainda macacos no os que atriburam a Darwin, mas os posteriores maisinteressados a cuidar da barriga do que da cabea.

    Nossa civilizao uma caricatura, em traos grotescos,daquela com que Augusto Comte sonhou, confiante no seulema ingnuo de ordem e progresso. Com a ordem tecnol-gica s conseguimos o progresso das devastaes ecolgicas,

    do enriquecimento de minorias inteis e desprovidas domnimo senso de equilbrio social, corrodas pela febre dasambies alucinantes, em contraste aterrador com a prolife-rao das maiorias depauperadas, das multides esfarrapa-das, famintas e doentes. Destrumos a inocncia das crianas,que se transformaram em assaltantes e assassinas. Nossofracasso total. Os avanos cientficos do sculo compen-sam em parte o atraso moral e espiritual, mas ao mesmo

    tempo fazem ressaltar os descalabros das geraes levianas,viciosas, pedantes e insolentes, que desprezam os valoressignificativos da civilizao terrena.

    Superando os condicionamentos multimilenares do pas-sado, o Espiritismo superou tambm os formalismos e assistemticas da era moderna, estabelecendo, s vsperas doadvento do sculo XX, as diretrizes de uma nova mundivi-

    dncia. Kardec, culturalmente filiado chamada era dasluzes, no se prendeu aos excessos do cientifismo acadmi-co. A nova cultura surgia sobre os antemas da Igreja e asameaas dos sabiches, como diria Richet. Sbios, filsofose cientistas temiam os fantasmas das supersties populares.Levantava-se assim uma nova barreira ao avano livre dascincias. Repelindo o temor infantil, Kardec resolveu enfren-tar os fantasmas. Lembrando o episdio da revolta de Des-

    cartes contra a cultura mumificada dos jesutas de La Fleche,

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    27/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 27

    reao de Rousseau ao tradicionalismo educacional e, maisespecificamente, o estudo de Galvani sobre a dana das rs,no vacilou em verificar o que se passava nos sales parisi-enses com a dana das mesas. Cauteloso e audacioso aomesmo tempo, descobriu o mecanismo do fenmeno e apro-fundou-se na sua pesquisa. Foi assim, como um cientista eno como um mstico (que nunca havia sido), que ele afu-gentou da mentalidade do tempo os fantasmas das supersti-es, substituindo-os pelos fantasmas reais dos espritosmanifestantes. Provou de maneira irrefutvel a sobrevivnciado homem aps a morte corporal e que os sobreviventes noviravam anjos nem demnios, mas guardavam a dimensoespiritual da realidade terrena, no no cu nem no inferno,mas aqui mesmo, na Terra dos homens, a sua condio hu-mana.

    Hoje, as pesquisas da Fsica moderna e da Parapsicolo-gia comprovaram inteiramente o acerto do mestre francs.Revelada a face oculta do planeta, em que a vida prosseguevitoriosa e livre, houve pnico nas cincias e profunda modi-ficao nos conceitos da prpria modernidade dominante. Osconceitos relativos de pureza e impureza romperam suasligaes umbilicais com o passado e abriram-se em novas

    dimenses de uma realidade surpreendente. A pureza deixoude ser um tabu para se transformar num conceito real, debases cientficas. Passou-se a entender por pureza a naturali-dade das coisas e, conseqentemente, por impureza as de-formaes das realidades sistemticas imaginrias dos clri-gos, dos telogos e tambm dos positivistas e materialistas,todos eles mais amigos de Plato do que da verdade. Kardecmudava o sentido dos conceitos fundamentais do bem e do

    mal, mostrando atravs de suas pesquisas psicolgicas, na

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    28/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 28

    Sociedade Parisiense de Estudos Espritas, que mal e bemso conceitos relativos ligados ao processo universal daevoluo. O mal a estagnao, o atraso, a ignorncia, e obem o progresso, o fluxo das coisas e dos seres, a trans-cendncia. Morrer um mal, pois a morte corta o fluxo vitaldo homem que se imobiliza no cadver. Mas da prpriamorte resulta o bem da ressurreio, em que a essncia dohomem, que o esprito, entra no fluxo superior da vidaespiritual. A morte como nadificao do homem, segundoSartre, um contra-senso filosfico e cientfico, pois o nadano existe, um conceito vazio, como Kant j o verificara.Na plenitude do Universo, hoje comprovada pelas pesquisasastronuticas, no h lugar para o nada, essa abstrao semsentido.

    O estudo da doutrina esprita nos mostra que ela repre-

    senta uma reformulao total do conhecimento humano. Masas implicaes religiosas da doutrina embora Kardec ja-mais a tivesse apresentado como religio, e sim como cin-cia, moveram as foras estacionrias das religies contraKardec e a doutrina, tentando sufoc-los e elimin-los darealidade cultural do planeta. No o conseguiram, mas apoi-ados na ignorncia, de populares e sbios (os sabiches de

    Richet), conseguiram confundir os fatos espritas com amagia das religies primitivas das tribos selvagens, afastan-do do estudo da doutrina muitas pessoas supostamente cul-tas. Instalado numa casa pobre da Rua dos Mrtires, emParis, Kardec fez jus ao nome da rua, pois ali se transformouno mrtir da cincia admirvel, de que falava Descartes.Ainda hoje o Espiritismo encarado, por medo e preguiamental, pela maioria das criaturas humanas, to necessitadas

    do seu socorro, como uma cincia suspeita. E isso no obs-

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    29/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 29

    tante as comprovaes cientficas das verdades espritas,feitas pelos cientistas eminentes em todos os grandes centrosuniversitrios do mundo.

    Lon Denis, discpulo e continuador de Kardec, percor-reu toda a Europa, em meados e fins do sculo passado,pronunciando conferncias sobre o Espiritismo, na esperanade superar as barreiras levantadas pelas religies e pelas

    cincias contra a doutrina. Uma das suas principais confe-rncias, que abalaram a Europa, intitulava-se A Misso doSculo XX. Denis previa o avano das pesquisas espritas nosmeios cientficos e culturais em geral, anunciando o reco-nhecimento cientfico do Espiritismo pelas cincias. J nofinal do nosso sculo podemos constatar o acerto de Denis.Se no houve um reconhecimento fora da Cincia Esprita,houve o reconhecimento de fatos pelas comprovaes cient-

    ficas, no interesse do prprio desenvolvimento das cincias.A Cincia Esprita apresenta-se hoje como a pedra enjei-

    tada da parbola evanglica, que teve de ser colocada como apedra angular da cultura do nosso tempo. Sua abertura gene-rosa, jamais se fechando em dogmas e sistemas fechados, um desafio constante ao mundo convencional da cultura quetenta desprez-la e no consegue libertar-se dos rumos teri-

    cos e metodolgicos por ela traados, sem outra imposiode sua realidade do que a prpria realidade dos fatos em quese fundamenta. Cassirer, filsofo alemo contemporneo,condenou os sistemas, considerando-os como leito de Pro-custo, em que os fatos empricos das pesquisas tm de adap-tar-se, deformados, a uma sistemtica prvia. Ao elaborar aCincia Esprita, Kardec, muito antes dessa opinio do fil-sofo, declarou que o Espiritismo oferecia, ao mesmo tempo,

    uma filosofia e uma cincia livres dos prejuzos do esprito

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    30/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 30

    de sistema. A palavra grega dogma equivale apenas a opini-o, mas as religies lhe deram o sentido de veredicto intoc-vel. Kardec se refere ao dogma da reencarnao, mas nocom o sentido religioso, esclarecendo que no se trata dedogma de f, mas de razo. Todos os princpios da doutrinaesto sujeitos crtica e reformulao, desde que umaprova cientfica, prova comprovada, seja reconhecida comotal pelo consenso universal dos sbios.

    Assim como, na lei universal de ao e reao, os fra-cassos existenciais das civilizaes acarretam conseqnciasdesastrosas no futuro, tambm os sucessos resultam emconseqncias benficas. Equilibram-se os pratos da balanano processo da evoluo humana. s situaes conflitivas dehoje, em nosso mundo, essa lei ope as situaes favorveisda cultura. Ao mesmo tempo em que os drages do passado

    acordam em seus esconderijos, acendem-se as luzes de espe-rana nas conquistas atuais da Humanidade. A influnciadessas conquistas sobre os povos abranda os mitos negativosdo passado, predispondo o presente para os avanos necess-rios, na elaborao universal de um mundo melhor.

    John Dewey considera como experincia no apenas osensaios humanos, mas tambm os ensaios da natureza. Todo

    o Universo, segundo a concepo esprita, uma gigantescaexperincia nos rumos das realizaes arquetpicas, baseadasna elaborao de novos tipos da realidade para o futuro.Deus opera e experimenta em plano maior, enquanto oshomens realizam suas experincias infantis nas dimensespossveis de sua condio presente. O conceito de Deus,formulado constantemente pelos homens, nunca pode ex-pressar essa realidade csmica, mas na evoluo espiritual

    do homem esse conceito avana em dinmica progressiva.

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    31/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 31

    Tanto podemos fazer de Deus uma imagem humana como aimagem de um poder sem forma, semelhante ao fogo, comoqueria Zoroastro na antiga prsia. O importante compreen-dermos que no h ordem sem poder disciplinador e que aordem do Universo no poderia surgir do acaso, a menos queconsideremos o acaso como um poder inteligente.

    Kant, que considerou o nada como um conceito vazio,

    considerou tambm o conceito de Deus como a mais altaexpresso do pensamento humano, um conceito pleno, emque toda a realidade universal se expressa numa s palavrade poucas letras.

    As transformaes conceptuais que o Espiritismo acarre-ta em nossa viso do mundo seria suficiente, por si s, paracaracteriz-lo como a maior e mais completa revoluocultural do planeta, em todos os tempos. Por isso necess-rio que os estudiosos do Espiritismo procurem definir bemos seus conceitos doutrinrios.

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    32/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 32

    O Panpsiquismo e aunidade espiritual do homem

    Gustave Geley, em seu livro Do Inconsciente ao Cons-ciente, lanou a teoria do panpsiquismo, segundo a qual

    todas as coisas e seres encerram em si mesmos um dnamo-psiquismo inconsciente que se desenvolve na temporalidade.Apsique, ou alma, constituiria assim a essncia dinmica detodas as coisas. Do minrio humanidade se processariaincessantemente o desenvolvimento psquico universal. MasKardec, muito antes de Geley, explicara, em O livro dosEspritos, obra bsica do Espiritismo, que o esprito se apre-senta no Cosmos como um elemento fundamental de toda a

    realidade conhecida. O Universo inteiro se constitui de doiselementos fundamentais, o esprito e a matria, de cujainterao resultam, num processo dialtico hegeliano, todasas coisas e todos os seres, conhecidos e desconhecidos.

    Os gregos j haviam sustentado, seis sculos antes deCristo, a teoria isolosta, segundo a qual a Terra um orga-nismo vivo dotado de alma. Mas o panpsiquismo de Geley

    tinha por objeto o esclarecimento do processo evolutivo. Eledesejava encontrar, nessa possvel dinmica interior dascoisas, a energia esquiva e secreta das metamorfoses univer-sais. H evidente afinidade dessa teoria com a do el vital deBergson, para explicar a dinmica da vida na matria e quenela gera espcies vivas, que vo dos chamados insetossociais at a espcie humana. Pesquisador esprita sucessorde Richet e companheiro de Eugne Osty no Instituto metap-

    squico Internacional de Paris, Geley buscava estabelecer em

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    33/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 33

    bases objetivas e pesquisveis a dinmica da evoluo.Remy Chauvin, entomlogo e diretor de pesquisas do labora-trio do Instituto de Cultura Superior de Paris, continua hojeessa tradio cientfica francesa iniciada por Kardec.

    A viso generalizada do processo evolutivo se confirmana sua prpria realidade material e nas pesquisas paleontol-gicas, mas o que interessa atualmente descobrir a mola

    oculta desse processo natural. A teoria de Geley uma con-tribuio sria e fecunda para essa busca cientfica. Aceitahoje a teoria da evoluo das espcies at mesmo pelasigrejas como se v no caso de Teilhard de Chardin , restaquase virgem o campo das conotaes, do modus faciendedesse processo. A simples idia de que uma espcie gera oupode gerar outra no esclarece o problema, apenas o impe.A teoria da mnada, que vem de Plato e encontrou em

    nosso tempo fecundo desenvolvimento em Leibniz, aceitaparticularmente no meio filosfico, mas cientificamente noconseguiu ainda passar do campo terico. Kardec chegou apropor que a distncia entre o animal e o homem to gran-de quanto a distncia entre o homem e Deus, sugerindoassim a existncia de uma possvel genealogia do espritohumano, que poder ser descoberta e definida cientificamen-

    te. Nesse sentido, Chauvin deu uma contribuio comoontomlogo, ao mostrar-se surpreso de que os insetos sociaisno tenham dado o salto para a humanizao e supondo queisso possa ter acontecido em outro planeta.

    Alguns etnlogos e mitlogos, como Antr Lang e MaxFreedom Long, citados por Ernesto Bozzano, chegaram aaceitar a possibilidade de traos e caractersticas animais emraas humanas. Essas suposies, de origem evidentemente

    totmicas, no passam do plano especulativo. O homem no

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    34/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 34

    se define pela sua aparncia corporal, onde as marcas daanimalidade ancestral podem aparecer de maneira generali-zada e no especfica. O esprito humano, que a essnciado homem e a nica ficha de sua identidade evolutiva, revelaem toda parte e em todos os tempos a sua unidade espiritual.Essa unidade no provm da forma corporal, mas da consci-ncia. A diferenciao das espcies, particularmente dassuperiores, torna-se pregnante nas suas caractersticas ps-quicas. A unidade do esprito humano perfeita e invarivelem todas as raas do passado e do presente. Porque as esp-cies superiores, tanto nos reinos mineral, vegetal, animal ehumano, revelam sempre a supremacia espiritual da espcie,que se despe das heranas da ganga das metamorfoses parase fixar no plano superior da vida. A animalidade humanarevela apenas a deficincia do progresso espiritual e da

    vitria do esprito no ser em desenvolvimento. As potencia-lidades do ser, suficientemente definido no processo evoluti-vo como desta ou daquela espcie, sofrem naturalmenteatrasos acidentais, dando aos observadores desprovidos dedados de observaes de pesquisas mais completas a impres-so de resduos das espcies superadas.

    Como ensinou Kardec, o ser que se define num plano

    superior mantm a sua unidade psico-afetiva sob controle eao iluminada pela conscincia. um produto acabado eperfeito da evoluo, que s continuar a modificar-se noambiente e nas condies do estgio evolutivo que atingiu.As experincias da domesticao animal dos hominidesprovaram que falta a estes a condio superior para exercerfunes correspondentes ao nvel em que se pretende incluir.Essa irredutibilidade do homem animal condio animal

    superior exclui toda possibilidade, tantas vezes tentada, de se

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    35/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 35

    empregar animais nas atividades especficas do homem. Ahierarquia natural da criao determinada pelas leis daevoluo e nela se encontra todo o edifcio da ordem Univer-sal.

    evidente que o homem pode se rebaixar e freqen-temente se rebaixa ao plano animal, em virtude de suasligaes sensoriais com o corpo. Mas sempre que isso acon-

    tece o homem abdica temporariamente de sua condiohumana e sofre a reao da conscincia, o que geralmentelhe acarreta situaes ntimas penosas. O instinto de conser-vao vigia as suas quedas e o ameaa com o perigo de suaprecipitao em planos inferiores, onde o seu desajustamentoo pune e o fora a voltar ao plano de que se afastou para umaexperincia temerria, usando indevidamente o seu livre-arbtrio. Por isso Kardec advertiu que no h arrastamentos

    irresistveis no plano das tentaes. O esprito preguiosov-se ento compelido, pelo seu prprio remorso da morte, asujeitar-se ao crculo vicioso das reencarnaes repetitivas.Como o ouvinte do Bolero de Ravel, que depois de repassaro bolero em toca-discos centena de vezes, acabou quebrandoem desespero os seus instrumentos, o esprito retorna aocaminho certo que abandonara.

    As Filosofias da Existncia estabeleceram a diferenaentre viver e existir, no s por necessidade de distino eclareza na abordagem dos problemas humanos, mas tambm,e principalmente, pela convenincia de se ver cada coisa emseu lugar e em sua funo. Enquanto isso, ao mesmo tempoem que se processava essa revoluo conceptual no planofilosfico, Kardec desenvolvia suas pesquisas audaciosassobre a separao real entre o vivente e o existente. Foi essa

    uma das maiores faanhas psicolgicas de todos os tempos,

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    36/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 36

    mas que s repercutiu com proveito no meio esprita. Essestrabalhos foram publicados na Revista Esprita. Atravs damediunidade dos mdiuns de sua confiana (que no sereferia honestidade do mdium, mas ao seu grau de sensi-bilidade medinica) ele recebia nas sesses da SociedadeParisiense as manifestaes de espritos de pessoas vivas.No empregava o magnetismo nem qualquer espcie deevocao ritual. Verificava no registro das pessoas que sedispunham a servir na experincia aquelas que, segundo oregistro, estariam naquele momento em disponibilidade. Aseguir consultava o esprito orientador (o controle comoGeley designava esse esprito) e este o autorizava a pensarou no nessa pessoa. Estabelecida a ligao silenciosa do seupensamento com a pessoa visada, logo esta se manifestava ese identificava, passando a responder pelo mdium inquiri-

    o do pesquisador. As verificaes posteriores comprova-vam a identificao do esprito manifestante, anteriormentedesconhecido dos participantes da experincia. Kardec obti-nha assim o existente separado do vivente, que naquelemomento dormia em sua casa. At mesmo o trajeto percorri-do pelo esprito do vivo para chegar sede da sociedade, naPassage Santane e os possveis percalos do caminho, eramlevados em considerao. Era assim que, enquanto o famosotelogo dinamarqus Kierkegaard realizava suas cogitaessobre a vida e a existncia, na Dinamarca, Kardec verificavaao vivo, em Paris, a possibilidade natural de exame isoladodesses dois aspectos do homem. O que mais importava nessapesquisa era o conhecimento das condies reais da situao.Claro que havia relao entre os propsitos, os mtodos e osobjetivos visados pelos dois investigadores. Kierkegaard no

    era filsofo nem cientista, mas telogo. Kardec era filsofo,

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    37/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 37

    cientista, psiclogo e mdico. Kierkegaard no desejavapenetrar no campo filosfico, mas dava, sem querer, comsuas cogitaes, incio s Filosofias da Existncia. Ele mes-mo declarou que no tivera propsitos filosficos, mas ape-nas interesse teolgico. Kardec objetivava somente descobrira mecnica, por assim dizer, da relao corpo-esprito, queinteressava s suas pesquisas medinicas.

    O desprezo voltado ao Espiritismo pelos filsofos e ci-entistas da poca, receosos de se meterem no campo perigo-so das bruxarias, no permitiu, at hoje, o aparecimento deum trabalho aprofundado sobre essa coincidncia distnciana investigao de ambos. Vemos assim o desinteresse comque os problemas fundamentais de uma cultura real do hu-mano, que surgia na segunda metade do nosso sculo, foramtratados naquela fase.

    O vivente, aquele que vive simplesmente, entregue sexigncias corporais do homem, permanece ainda no planoanimal. O existente, pelo contrrio, aquele que afirma o seuexistir na vida e luta por transcend-la. S esse conta naescala humana, pois os viventes ainda no se integraramnela.

    O corpo dorme, mas o esprito se liberta e se manifesta

    atravs da sensibilidade medinica de outra pessoa. Como seproduziu a prova cientfica desse fato, com os mtodos obje-tivos exigentes da Cincia Moderna? Kardec rompeu a bar-reira da sistemtica materialista, mostrando a necessidade deadequao do mtodo natureza especfica do objeto. Ametodologia que elaborou, excludo o aparelhamento tecno-lgico atual, praticamente a mesma que Rhine, Pratt e Mac

    Dougal empregaram no desenvolvimento das pesquisas

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    38/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 38

    parapsicolgicas atuais. A metodologia esprita de pesquisados fenmenos paranormais antecipou de muito os mtodosda psicologia experimental e aprofundou os seus objetivos,atingindo a sondagem do inconsciente quando Freud aindafreqentava a escola primria, vestido com a roupagem dainocncia.

    No mencionamos o problema das antecipaes cientfi-

    cas do Espiritismo para nossa vanglria, mas os leigos, emgeral, recorrem sempre s novidades atuais como superaodo trabalho modelar de Kardec. A bem da verdade histricae da colocao epistemolgica certa da Cincia Esprita, necessrio que tenhamos conscincia da anterioridade dasdescobertas espritas. Alm disso, justo que se d o mritoao seu dono, que se coloquem as fases cientficas no seudevido lugar. Os mais atrevidos adversrios gratuitos da

    doutrina, s vezes com a boa inteno de resguardar o patri-mnio cientfico, querem afastar do quadro das cincias avigorosa e decisiva contribuio dos pioneiros espritas.Colocar margem da histria das cincias o esforo persis-tente dos grandes cientistas que comprovaram as descobertasde Kardec, desde meados do sculo passado at este momen-to, no representa apenas uma injustia, mas tambm uma

    traio verdade dos fatos.Esquecer os fundamentos cientficos do Espiritismo, asgrandes batalhas solitrias de Kardec contra as foras cultu-rais dos dois ltimos sculos, tem sido um meio de negar ovalor e a influncia da doutrina no desenvolvimento cientfi-co da atualidade. E com que interesse se faz essa negao, seno o de se manter em vigor o prestgio de instituies arcai-cas, irremediavelmente peremptas, em detrimento evidente e

    interesseiro da evoluo espiritual do homem?

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    39/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 39

    Nas circunstncias atuais essa tentativa se torna ridcula,o analfabetismo das massas, apoiado e alimentado pelossabiches de que falava Richet, esses analfabetos ilustresque falam do que sabem e do que no sabem, favorecem amodorra doirada dos vivos na existncia em suas cadeirasacadmicas, em suas tribunas msticas e em seus plpitos emdecadncia. Por tudo isso, a posio dos espritas, no pano-rama atual do mundo, no pode ser o de acomodao sconvenincias, mas a de luta em favor do esclarecimento doshomens. Os tempos mudam rapidamente e para o espritaconvicto no h tempo a perder nesta hora de transio cul-tural.

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    40/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 40

    A fase intermediriada moralidade subjetiva

    Para se projetar na existncia o ser j desenvolveu em sias potencialidades vitais que antecedem, no plano racional-

    afetivo, o desenvolvimento da moralidade. A dialtica subje-tiva da racionalidade com a afetividade razo versus sen-timento produz no ser a sntese da moral subjetiva, queengloba e disciplina as experincias longamente desenvolvi-das nos planos inferiores de sua prpria ontognese, queestabelece nesta a realidade do em-si, esse piv da formaontica, que isola o ser nascituro de suas conotaes vitaiscom os reinos inferiores da Natureza, permitindo-lhe o de-

    senvolvimento do egocentrismo. Esse ego solitrio centralizaavaramente o progresso j realizado, despertando para cons-cincia de si mesmo. Sartre, que negligenciou toda essaanterioridade, apresentou o ser como uma coisa limbosa efechada em si mesma, que se projeta na existncia em virtu-de da necessidade ntica da comunicao. Essa parte metaf-sica de O Ser e o Nada, de Sartre, a primeira contradiode sua filosofia. O ser que se lana na existncia no nempode ser essa espcie de ovide espiritual inconsciente, poisdetermina por si mesmo essa projeo por sentir a necessi-dade de novas experincias. O ato de lanar-se na existnciaequivale ao nascimento do ser como criatura humana. Etanto assim que o ser se transforma numapaixo intil, que a paixo do homem na vida em busca da transcendncia queo fato da morte transforma em frustrao.

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    41/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 41

    A realidade viva e existencial do homem, entretanto, real e universalmente o contrrio disso. Lanada na existn-cia, a criatura humana amadurece nas experincias vitaispara resolver-se como existente, um ser que existe no planomaterial concreto e desenvolve a sua facticidade (a formahumana com que nasceu feito) num processo contnuo detranscendncia. Desde o seu primeiro grito, o ser se projetana transcendncia horizontal da conquista do meio, prosse-guindo na conquista do mundo e atingindo a transcendnciafinal sobre a morte atravs da ressurreio, hoje confirmadapelas pesquisas cientficas e tecnolgicas.

    Na famlia e na escola o ser pisa os primeiros degraus desua escalada transcendente na existncia. O egocentrismoinicial pode concentrar-se em egosmo no perodo infantil eda adolescncia, arrastando-se em certos casos mrbidos na

    idade madura, na forma de estagnao do infantilismo adultode natureza psquica. A moralidade se apresenta ento comorecurso natural de correo desse acidente. Forado pelasexigncias externas da moral social, o ser vai aos poucos seabrindo para a descoberta ntima da moral subjetiva ou en-dgena, que no pressiona de fora, mas de dentro, na suaprpria intimidade. So os dois tipos de moral classificados

    por Bergson: a Moral Fechada (porque fechada numa estru-tural social restrita) e aMoral Aberta, individual e endgena,pela qual a moralidade do ser se abre comunho humanairrestrita. Nesta moral o ser, a princpio biopsquico, atingeas dimenses da moralidade, transformando-se num sermoral. A Moral Social ou fechada est sempre ligada a umareligio esttica, tradicional, seguindo a proposio de Berg-son, e a Moral Aberta ou individual corresponde s religies

    dinmicas, antidogmticas e racionais. A Moral e a Religio

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    42/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 42

    livres constituem a fase de transio do ser moral para o serespiritual. Neste ser o homem atinge a transcendncia poss-vel naExistncia. Diante dele se abrem as vias da Espiritua-lidade Superior. A morte no existe para ele, pois v diantedele as perspectivas do Infinito, com os mundos felizes emque as atividades humanas so substitudas pelas atividadesdivinas. Nele se cumpre a destinao do homem no apsmorte, com a vida em abundncia a que se referiu o Cristo, oNirvana de Buda, o Tao de Lao Ts e assim por diante. Nopodemos conceber, em nossos crebros de origem animal, agrandeza ilimitada dessa transcendncia csmica, que odestino natural de todas as criaturas humanas.

    A Moralidade, que Pestalozzi considerava como a nicareligio verdadeira, colocando-a como o fim supremo daeducao, representa o acabamento do homem como um ser

    humano, o cidado universal. Esse homem formado parauniversalidade no tem ptria nem raa, mas no um ap-trida, por que todas as naes lhe servem de ptria. Noaceita nenhuma discriminao humana, pois a Humanidade a sua famlia e a sua raa. Ele v nos seus irmos humanos,de todas as condies, criaturas que avanam para a divinda-de, esse delta espiritual em que desguam todos os rios que

    se decantam nas corredeiras existenciais para atingirem overdadeiro Mar da Serenidade, que no est na Lua, masaqui mesmo na Terra dos Homens. E este no um sonho depoeta lrico, nem uma alucinao ou miragem, mas a reali-dade que Jesus de Nazar nos mostrou na face lquida doMar da Galilia. A pesca milagrosa dos Evangelhos se repetecontinuamente na viso espiritual dos que se entregam aofluxo existencial.

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    43/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 43

    A Moralidade, que a Moral na sua plena atualizao,transformada de potncia em ato, revela-se ento como osupremo ideal humano. Uma vez atingido esse ideal, o ho-mem se transforma em Divindade, como a flor que se trans-forma em fruto.

    Como se perdem na poeira da Terra os conceitos prag-mticos da moral que a reduzem raiz latina de mores, de

    usos e costumes mantidos segundo as convenincias! AMoral no um sistema de regras imediatistas, como quise-ram os socilogos materialistas. Como no , tambm, umaentidade mstica ou mitolgica. uma aspirao natural dohomem, no anseio de realizar toda a sua perfectibilidadepossvel, segundo essa expresso de Kant. E nesse sentido que ela paira acima da realidade perecvel, mantendo inc-lume atravs dos tempos a sua atrao de arqutipo sobre a

    conscincia humana. Sua eternidade, sustentada pelos meta-fsicos e negada pelos materialistas e pragmatistas, relativa durao da Humanidade no cosmos. A concepo existen-cial do homem, como um ser projetado contra o alvo damorte, uma flecha disparada no sentido de transcendncia,revelou-nos a natureza ntica da sua eternidade. O conceitobastardo da moral como normativa social agrada aos que

    desejam libertar-se dos compromissos morais para se entre-garem s atraes dos instintos animais e irresponsabilida-de das aventuras ilusrias. A falta de viso espiritual dospesquisadores levianos, apegados aos fenmenos e esqueci-dos do bmeno, ou seja, da causa, contribui negativamentepara a deformao da moral e a conturbao do nosso tempo.Os moralistas fanticos, e por isso mesmo incapazes decompreender a natureza verdadeira da moral, bem como as

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    44/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 44

    Ligas da Moral, respondem pelos surtos de imoralidade nossculos de racionalismo superficial.

    A moral social apia-se em pressupostos contraditrios,com o direito de matar para salvar a honra, tornando o ho-mem assassino, o dever de mentir para defender a verdade, odever de explorar e acumular fortunas com o suor alheio eengrandecer-se perante o meio social, o direito de matar por

    amor, o direito dos abastados explorarem a misria dos semrecursos e com isso os protegerem em sua misria e assimpor diante. As contradies da moral social devem ser fe-rozmente defendidas pelos guardies da ordem pblica, quedispem do direito de esmagar os que protestarem ou serebelarem. As condies da moral social revelam a precarie-dade das condies conscienciais do nosso tempo. O julga-mento tico mais superficial dessa estranha moral resultaria

    em sua condenao sumria pela Moral Aberta de Bergson.Precisamos ainda de muitos sculos de evoluo para ele-varmos a nossa humanidade condio do humanismo cris-to de que ela se vangloria. O desenvolvimento de umaconscincia esprita esclarecida, atravs da Educao, comoqueria Kardec, poderia apressar o nosso ajustamento reali-dade crist.

    A existncia vista pelos existencialistas como umasubjetividade pura. Enquanto a vida se complica nas funesbio-fisiolgicas do organismo corporal, entranhada no cam-po fenomnico, a existncia se liberta no plano sutil dosepifenmenos. No existimos como corpo, mas como umsistema de reflexos condicionados a exigncias vitais docorpo. H uma ntida distino entre os atos corporais e asatitudes, anseios e fabulaes da mente e as preocupaes,

    captaes e pr-percepes da mente. Descartes compreen-

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    45/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 45

    deu esse problema de maneira aguda e nos advertiu quantoao perigo de confuso da alma com o corpo. A alma asubjetividade que se oculta no corpo, como a orqudea nasramagens de uma rvore, e ali se entrana com as fibrasvegetais para, servindo-se da seiva como de um combustvelsutil, florir em expresses de sonho e beleza na primavera.Se no conhecssemos o processo parasitrio, certamenteconfundiramos puras parasitas com as flores gensicas darvore que se definiro em frutos. Hegel distinguiu o reinovegetal como um sistema de pura e permanente doao.Herdamos do mineral a estabilidade aparentemente fixa eresistente de nossas estruturas sseas, dos vegetais a sensibi-lidade perceptiva e dos animais e motilidade vibrante quesupera de muito a lenta movimentao dos tropismos. Nossocorpo possui as caractersticas desses trs reinos, mais a

    alma, que acrescenta a essas heranas a produo epifeno-mnica da nossa estrutura ntica, que no deriva da matria,mas do esprito. Vivemos como um ser espiritual e no comopedra, planta ou animal.

    As pesquisas parapsicolgicas levaram os pesquisadoresda Duke University a proclamar a natureza extrafsica damente e do pensamento. Os pesquisadores ingleses, como

    Soal, Price e Caringthon, das Universidades de Londres,Oxford e Cambridge, a confirmarem essa descoberta. Vassi-liev, da Universidade de Stalingrado, discordando comomaterialista, aventurou-se a uma srie de pesquisas paramostrar o contrrio e acabou reconhecendo a impossibilidadede faz-lo. Ultimamente, na Universidade de Kirov, a URSSteve o amargo desprazer de ver os seus pesquisadores desco-brirem o corpo bioplsmico dos animais e do homem, bem

    como o dos vegetais. Esse corpo constitudo pelo plasma

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    46/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 46

    fsico, quarto estado da matria, formado de sub-partculasatmicas. A Universidade norte-americana de Prentice Halldivulgou os trabalhos de suas pesquisadoras Sheila Ostandere Lynn Schroeder, que verificaram na URSS essa descobertae entrevistaram os pesquisadores russos. Desencadeou-seento a batalha contra esse fato, sintomaticamente promovi-da por materialistas e religiosos, na defesa conjunta dos seusdogmas.

    evidente que de tudo isso resulta a prova da subjetivi-dade existencial e da presena no mundo de um velho eirredutvel preconceito quanto natureza espiritual do serhumano. Os interesses em jogo so universais, abrangendoinstituies religiosas e ideologias ferozes e, por deduolgica, a tranqilidade de vastos e rendosos rebanhos desuaves ovelhas; o homem contra a realidade espiritual, o que

    vale dizer contra a sua prpria realidade como ser, vem dasprimeiras fases do seu desenvolvimento intelectual. Entre os judeus manifestou-se na seita dos saduceus, que Kardecconsiderou como os materialistas do tempo de Jesus. Entreos gregos definiu a fase histrica dos sofistas, que no acre-ditavam em nenhuma verdade possvel e s confiavam nopoder das plantas. Scrates destruiu suas pretenses exigindo

    que tirassem, de trs de cada palavra, o conceito em que arealidade do fato desfazia a iluso do flatus, do palavrearinconseqente. Como que embriagados com a vida materiale delirando com o poder recm-descoberto da razo, a lutacontra o esprito dominou os sculos exponenciais do desen-volvimento cultural, atingindo o auge a partir do sculo XVIat os meados do sculo XIX.

    A invaso organizada dos Espritos, como Conan Doyle

    a denominou, iniciou-se no sculo XVIII, paralelamente com

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    47/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 47

    o incio da tecnologia. As manifestaes espritas, precedidasdo caso Swedenborg na Sucia e do caso Jackson Davis nosEstados Unidos, s se formataram no sculo XVIII com asprimeiras tentativas de formulaes doutrinrias. Coube aKardec, em meados do sculo XIX, enfrentar corajosamenteo problema e responder com pesquisas cientficas e argu-mentao filosfica s pretenses vazias do materialismo,que tambm ento se definia em vrias tentativas de elabora-o doutrinria, como as do prprio Swedenborg e JacksonDavis. Karl Marx organizou em termos polticos e econmi-cos a primeira grande doutrina materialista de molde cient-fico.

    Antes disso no houve nenhuma escola, filosfica ou ci-entfica, materialista no mundo. As referncias materialistasatuais a vrias escolas gregas, como a dos fisilogos e dos

    jnicos so inteiramente foradas. Toda antigidade estevemergulhada e embriagada num religiosismo tradicionalistaingnuo, como o atestavam as grandes doutrinas de Pitgo-ras, Plato e Aristteles, bem como a filosofia moral deScrates e sua condenao pelo Tribunal de Atenas, pornegar a existncia dos deuses mitolgicos e, com isso, tentarcorromper a juventude. O materialismo surgiu como uma

    flor de estufa, artificialmente cultivada no recesso dos pe-quenos grupos intelectuais da Europa. Em nosso sculo, como desenvolvimento cientfico acelerado, Einstein lhe deu oatestado de bito, ao declarar, com sua autoridade cientficaincontestvel, que o materialismo morrera asfixiado porfalta de matria.

    O materialismo atual subsiste na forma de uma mmiaegpcia dos tempos faranicos. Seus cultores filosficos e

    cientficos o mantm cavalo com as estacas e as amarras de

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    48/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 48

    Cis Campeador, que depois de morto foi enviado contra osadversrios em forma de fantasma assustador. Essas escorasso atualmente a doutrina poltica e a doutrina econmica deMarx e Engels. Bertrand Roussel, inconformado com osrumos atuais do desenvolvimento cientfico, declarou emltima instncia: As leis fsicas continuam vlidas. Tristeconsolo, pois as leis fsicas pertencem ao plano material queo Espiritismo jamais negou. Pelo contrrio, como j vimos,Kardec sustentou sempre a teoria da relao constante euniversal de esprito e matria, como os dois elementosbsicos de toda a realidade. O grande equvoco dos advers-rios da sobrevivncia aps a morte justamente esse, deconfundir a verdade esprita com as fabulaes teolgicas eos lamentveis enganos das religies dogmticas na formu-lao de seus dogmas inteligveis.

    O Espiritismo no se apresenta no panorama cientficona posio de negador e destruidor das cincias, mas decontinuador natural e necessrio do desenvolvimento detodas as cincias reais. O que ele postula precisamente oaprofundamento das pesquisas cientficas para a descobertada face oculta da Terra, que no se esconde, como a da Lua,no outro hemisfrio, mas no avesso sensvel, em que mergu-

    lhamos com a morte no inteligvel; a descoberta da antimat-ria, cujos antitomos geram no Infinito novas formas deespao. A luta contra a existncia dessa realidade oculta simplesmente grotesca. A derrota sofrida pela Sociedadedialtica de Londres, quando convocou William Crookespara provar a inexistncia dos fenmenos espritas, queCrookes confirmou de maneira exaustiva, foi a Waterloocientfica do materialismo. Estamos em pleno Pshychic

    Boom, em plena exploso psquica, como o registrou recen-

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    49/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 49

    temente a Enciclopdia Britnica, em seu suplemento cient-fico tradicional. No pode mais restar aos cientistas sensatose fiis metodologia cientfica nenhuma possibilidade desustentar a luta contra o esprito. O real se impe, no obe-dece.

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    50/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 50

    Importncia dasmanifestaes medinicas

    Baseando-se nas manifestaes medinicas e em toda agama dos fenmenos hoje chamados paranormais, o Espiri-

    tismo despertou simpatias e provocou averses nos meioscientficos e culturais da Europa, na segunda metade dosculo XIX. De um lado, ele agradava o povo, que se inte-ressava naturalmente pelas manifestaes de seus mortosqueridos. Por outro lado, irritava os cientistas e homens decultura, que repudiavam as supersties populares e noviam como os mortos poderiam se manifestar, se j estavammortos. Brofrio chegou a propor a criao de um Espiritis-

    mo sem Espritos, pois reconhecia a realidade dos fenme-nos mas recusava-se a aceitar a interpretao de Kardec. Apoca era de problemas cruciantes, com o desenvolvimentodramtico das experincias magnticas, logo mais chamadasde hipnticas, e as invenes de processos teraputicos paraa cura de doenas mentais e psquicas.

    Luiz Vives conta que Charcot, numa de suas aulas, apre-

    sentou uma mulher inculta que recebeu em grego uma co-municao psicogrfica de Arago sobre os problemas dafisiologia humana. O fato era chocante, mas Charcot adver-tiu os discpulos de que no deviam tentar nenhuma explica-o a respeito. Prudentemente deviam pensar no que viram eesperar explicaes futuras. As Cincias temiam a morte e osespritos, estavam carregadas de misticismo religioso, sobameaas clericais, e problemas dessa espcie se tornavam

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    51/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 51

    perigosamente melindrosos. O que Kardec fazia era umatemeridade que poderia lev-lo loucura.

    Esse mesmo ambiente carregado de ameaas excitavaainda mais a curiosidade popular, podendo desencadearrepreslias de parte dos poderes eclesisticos, ainda muitovigilantes. A serenidade com que Kardec enfrentou esseambiente pode ser apreciada naRevista Esprita, obra indis-

    pensvel ao estudo da doutrina e que j temos em nossalngua, em seus doze volumes redigidos pelo mestre, natraduo do saudoso Julio Abreu Filho.

    O terror da morte e dos mortos, provindo das mais remo-tas civilizaes, e a introjeo desse terror, num processo dequase dois milnios, no esprito europeu, perdura at hoje emnossa cultura e responde pela maior parte das averses aoEspiritismo. As introjees psicanalticas produzem reflexoscondicionados no inconsciente, em forma de complexos,mais duradouros e profundos que os de Pavlov em suasexperincias no plano cortical. A morte, por si mesma trau-matizante, acrescida das cerimnias fnebres de grandepoder emocional e com razes longevas nas tradies dasraas, conta ainda com a influncia arquetpica no inconsci-ente coletivo. Basta um rudo semelhante a gemido, um

    sopro frio na noite ou o ranger de uma trave para desencade-ar nos espritos sensveis introspectivas de fantasmas apavo-rantes. Se o Espiritismo se interessasse por esses efeitos,como querem os seus adversrios interesseiros, poderiaaproveitar esse pavor em benefcio de sua propagao. MasKardec agiu em sentido contrrio, verificando e classifican-do os fatos reais, distinguindo-os das impresses ocasionaise explicando-os luz da razo e das conquistas cientficas.

    Recusou-se at mesmo a tratar dos fenmenos de materiali-

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    52/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 52

    zao de espritos na Sociedade Parisiense, deixando essecampo a cargo dos cientistas mais famosos da poca. Acolaborao desses cientistas foi muito alm do que elepodia esperar. Com exceo do casal Curie, que depois dealgumas experincias interrompeu suas tentativas, alegando,com razo, a necessidade de se entregar exclusivamente aoproblema do rdium, todos os demais foram ao extremo. ACincia Esprita formou a sua galeria de honra com nomesexponenciais do sculo provando a realidade da sobrevivn-cia do ser. Um desses momentos foi quando Richet, at entorenitente, procurando sempre uma via de escape, enviou suacarta famosa a Ernesto Bozzano como o fizera Lombrosorendido ante essa realidade inegvel e outra carta a CairbarSchutel, proclamando em latim: Mors janua vite, ou seja: Amorte a porta da vida.

    A estratgia de Kardec era perfeita e dera os resultadospor ele previstos. Limitando-se s pesquisas psicolgicas edeixando aos fsicos, qumicos, fisiologistas e especialistasem mecnica (como William Crawford, que descobriu eprovou a mecnica do ectoplasma) os fenmenos de materia-lizao, ele fechara a questo cientfica do Espiritismo demaneira decisiva. Em nossos dias as pesquisas tecnolgicas

    da Fsica atual e da Parapsicologia reverenciaram a conquis-ta da face oculta da Terra, antes mesmo da faanha astronu-tica da descoberta da face oculta da Lua.

    A importncia das comunicaes medinicas no estapenas no seu carter probante, como acentuou Bozzano,mas tambm e sobretudo na sua expresso de solidariedadehumana atravs da morte. A seo daRevista Esprita intitu-lada Palestras Familiares de Alm-Tmulo oferece provas

    inegveis da identidade espiritual dos comunicantes, mos-

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    53/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 53

    trando a naturalidade com que os chamados mortos se mani-festavam afirmando a sua sobrevivncia plena no mundoespiritual. Levado pelo entusiasmo natural da juventude, umjovem pesquisador parisiense encantou-se com os fenmenosde ordem fsica e props o reconhecimento do que chamavade mdiuns inertes. Lon Denis refutou essa tese absurda,lembrando ao jovem Paul Nord que Kardec j havia demons-trado que os efeitos fsicos da mediunidade eram produzidospor espritos manifestantes que movimentavam as mesas e osobjetos com seus fluxos de energia que davam aos objetosuma vida factcia e passageira.

    Se Kardec se prendesse fascinao dos fenmenos deefeitos fsicos, o Espiritismo no levaria a dana das mesasalm das conseqncias materiais que Galvani tirou da danadas rs. O fundamental da doutrina a mensagem dos mor-

    tos, que atravs dela provam a continuidade do ser em outrasdimenses da matria e desvendam o segredo doloroso dostmulos, das lpides frias que esmagaram para sempre vidaspreciosas e sonhos de beleza eterna.

    Alm disso, a mensagem dos mortos restabelece a uni-dade humana rompida pela diviso dos homens em doisplanos antagnicos, o dos que vivem uma vida efmera

    esperando a morte e o dos que morreram e se transformaramem cinzas para sempre. A vida humana seria apenas umlampejo ocasional de fogo ftuo sobre a terra, tragado pelosterrores de uma noite eterna. As teologias do absurdo, pseu-do-cincias de Deus como se Deus pudesse ser objeto depesquisas ou especulaes de laboratoristas de sacristia continuaram impunes na elaborao dos mitos terroristas doInferno, do Diabo e das condenaes eternas.

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    54/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 54

    Por outro lado, sem os estudos e pesquisas de Kardecsobre as comunicaes medinicas, as terrveis ocorrnciasde obsesses vingativas, de perturbaes psquicas incur-veis pelos recursos da psicoterapia insciente, continuariaminsolveis, pois sem a tcnica da doutrinao esprita, amo-rosa e eficaz, s restariam as prticas arcaicas dos exorcis-mos antiquados e perigosos, pois desprovidos do conheci-mento indispensvel das relaes dos homens com os espri-tos.

    To profundamente foram introjetados nas geraes dedois milnios de cristianismo sincrtico os terrores da morte,que a catarse curadora s est sendo possvel atualmenteatravs das pseudo-tcnicas de libertinagem de vrias corren-tes psiquitricas e pelo pseudo-socorro da toxicomania. Noprprio meio esprita surgem os resduos da averso milenar

    aos mortos e aos fantasmas, levando criaturas ingnuas einscientes a fazerem campanhas contra as prticas medini-cas, no insensato desejo de transformar as instituies dou-trinrias em simples escolas tericas, desprovidas da didticaobjetiva das prticas medinicas. a volta obsessiva daspretenses acadmicas de um Espiritismo sem Espritos. Asforas da contra evoluo do homem, e portanto da Cultura e

    da Civilizao, rondam sem cessar as mentes frgeis, inquie-tas e desprevenidas do meio doutrinrio, sugerindo-lhesmedidas retrgradas, disfaradas em forma de atualizaodoutrinria.

    Essas tentativas se tornam perigosas numa fase de tran-sio. Sem as relaes constantes com o mundo espiritual,atravs das sesses medinicas, estaremos desprovidos daorientao segura dos Espritos benevolentes e do Esprito da

    Verdade, que trouxe ao nosso mundo a Doutrina Esprita, a

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    55/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 55

    grande doutrina csmica de que recebemos at agora apenasa dosagem adequada ao nosso estgio atual de evoluo.Quando se extinguiu, no Cristianismo primitivo, o chamadoculto pneumtico, constitudo pelas reunies medinicas daera apostlica, as influncias romanas tomaram o lugar dasintuies espirituais e a Igreja de Cristo, no fundada peloSenhor, mas pelos seus discpulos, isolou-se orgulhosamenteem seu reino terreno e identificou-se com as religies mito-lgicas, idlatras e formalistas. Apagou-se a luz dos santu-rios ingnuos ante o esplendor fictcio do Imprio arrogantedos Csares. A expresso culto pneumtico provinha dapalavra gregapneuma, que sopro, e como sopro, esprito.

    O culto pneumtico era constantemente perturbado pelasmanifestaes de espritos perturbadores, contrrios ao Cris-to e apegados s religies mitolgicas das antigas civiliza-

    es. Esses espritos acusavam Jesus de farsante, combatiamos seus ensinos e ensinavam doutrinas inferiores. Enquantoos cristo suportaram essas entidades, procurando salv-lasda ignorncia por meio da doutrinao amorosa, os EspritosSuperiores apoiavam e estimulavam essas reunies. Mas,com a supresso desse trabalho de amor pelos espritosinfelizes, formados em moldes romanos, os cristos ficaram

    entregues a si mesmos e trocaram o Reino de Deus peloImprio simonaco do Vaticano. Em lugar dos Espritosbenevolentes, a Igreja passou a receber os enviados de Csarpara orient-la dentro das rgidas sistemticas do Imprio. Opreo da assistncia espiritual o amor e a dedicao aosmilhes de espritos necessitados que sobrevivem na errati-cidade.

    Se quisermos suprimir as sesses medinicas, particu-

    larmente as de doutrinao, em nossas instituies espritas,

  • 8/6/2019 Jose Herculano Pires - Evolucao Espiritual Do Homem

    56/58

    J. Herculano Pires Evoluo Espiritual do Homem 56

    poderemos faz-lo, pois o nosso livre-arbtrio ser respeita-do, mas convm, antes disso, consultarmos a doutrina elembrarmos os fatos histricos do Cristianismo, vendo quepreo teremos de pagar por essa pretensa atualizao. Cadaposio ou atitude que tomamos tem o seu preo na