IBET-DF - Alberto Frederico Teixeira Soares Carbonar - Análise Da Incidência Tributária Do ICMS Sobre as Operações Com Softwares Realizadas Mediante Streaming e Download

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    Instituto Brasileiro de Estudos Tributários – IBETTrabalho de Conclusão de Curso

    ALBERTO FREDERICO TEIXEIRA SOARES CARBONAR

    ANÁLISE DA INCIDÊNCIA TRIBUTÁRIA DO ICMS SOBRE AS OPERAÇÕES COM“SOFTWARES” REALIZADAS VIA “DOWNLOAD” E “STREAMING”

    BRASÍLIA1º Sem./2016

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    Instituto Brasileiro de Estudos Tributários – IBET

    ALBERTO FREDERICO TEIXEIRA SOARES CARBONAR

    ANÁLISE DA INCIDÊNCIA TRIBUTÁRIA DO ICMS SOBRE AS OPERAÇÕES COM“SOFTWARES” REALIZADAS VIA “DOWNLOAD” E “STREAMING”

    Trabalho de Conclusão de Curso paraobtenção de diploma de Pós-Graduação (latosensu) em Direito Tributário pelo InstitutoBrasileiro de Estudos Tributário – IBET.

    BRASÍLIA1º Sem./2016

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    “Bom mesmo é ir a luta com determinação,

    abraçar a vida e viver com paixão,

     perder com classe e vencer com ousadia,

     pois o triunfo pertence a quem se atreve

    e a vida é muito bela para ser insignificante”

     – Charles Chaplin

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    RESUMO

    O objetivo do presente trabalho é verificar a possibilidade ou não de incidência do Impostosobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e

    Intermunicipal e de Comunicação – ICMS sobre as operações com programas de computador(“softwares”), sem suporte físico, realizadas mediante transferência eletrônica de dados(“download”) e disponibilização eletrônica de conteúdo de imagens, áudio e vídeo(“streaming”), com base em uma análise preliminar quanto ao aspecto material da hipótese deincidência tributária do ICMS estabelecida pela Constituição Federal de 1988.

    Palavras-Chave: ICMS, “ICMS-Mercadorias”, “ICMS-Comunicação”, “softwares”,“download ”, “streaming”. 

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    ABSTRACT

    The purpose of this study is to verify whether or not the incidence of tax on circulation ofgoods and transportation and communication services (“ICMS”) over operations with

    software, without hardware, made through download or streaming, based on a preliminaryanalysis on the material aspect of the tax incidence of ICMS established by the BrazilianFederal Constitution of 1988.

    Key-words: ICMS, “softwares”, “download ”, “streaming”. 

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    Sumário

    I. INTRODUÇÃO ..................................................................................................................... 7 

    II. A REGRA-MATRIZ DE INCIDÊNCIA TRIBUTÁRIA (RMIT) COMO TÉCNICADE VERIFICAÇÃO DA VALIDADE DAS NORMAS JURÍDICAS ................................. 9 

    III. AS DISPOSIÇÕES CONSTITUCIONAIS RELATIVAS A HIPÓTESE DEINCIDÊNCIA TRIBUTÁRIA DA RMIT DO “ICMS” ...................................................... 15III.I. O núcleo material constitucional do “ICMS-Mercadorias” ...................................... 16III.II. O núcleo material constitucional do “ICMS-Comunicação” ................................... 20 

    IV. ANÁLISE DA INCIDÊNCIA DO ICMS SOBRE AS OPERAÇÕES COM“SOFTWARES” REALIZADAS MEDIANTE “DOWNLOAD” E “STREAMING” .... 25

    IV.I. Breves considerações acerca do conceito de “software”, suas espécies, do contratode licença de uso e dos termos “download” e “streaming” ................................................. 25IV.II. “ICMS-Mercadorias” sobre as operações com “softwares” realizadas mediante“download” e “streaming” ..................................................................................................... 31IV.III. “ICMS-Comunicação” sobre as operações com “softwares” realizadas mediante“download” e “streaming” ..................................................................................................... 34 

    V – CONCLUSÃO .................................................................................................................. 36 

    VI – BIBLIOGRAFIA ............................................................................................................ 38

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    I. Introdução

    Diante do atual cenário de crise política e grave recessão econômica instalada no

    país, os governos estaduais sofrem com a constante queda de arrecadação do Imposto sobre

    Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e

    Intermunicipal e de Comunicação  – ICMS (principal fonte de receita dos estados1), sendo

    necessária a busca de novos horizontes de tributação ainda não explorados ou alcançados

    pelas Secretarias de Fazenda Estaduais.

    Naturalmente, conforme se verifica da movimentação realizada pelo Conselho

    Nacional de Política Fazendária (CONFAZ) no final do ano passado, com a edição do

    Convênio ICMS n. 181/2015, o grande alvo das Fazendas Públicas Estaduais será o setor detecnologia no Brasil, setor este que vem avançando a passos largos nos últimos anos no

    Brasil, em razão do crescimento exponencial do comércio eletrônico.

    Com a edição do Convênio ICMS n. 181/20152, o CONFAZ autorizou diversas

    Unidades da Federação3, conforme se infere da cláusula primeira4, a conceder redução de base

    de cálculo do ICMS que corresponda ao percentual de, no mínimo, 5% (cinco por cento) do

    valor total da operação que envolva softwares, programas, jogos eletrônicos, aplicativos,

    arquivos eletrônicos e congêneres, padronizados, ainda que sejam ou possam ser adaptados,disponibilizados por qualquer meio, inclusive nas operações efetuadas por meio de

    transferência eletrônica de dados5.

    Na prática, a edição do Convênio possibilitou, por vias transversas, que determinados

    1  De acordo com Regina Helena Costa, “o ICMS é o imposto mais importante dos Estados-membros e doDistrito Federal, responsável que é pela maior parte da receita tributária desses entes”. (COSTA, Regina Helena.Curso de Direito Tributário: Constituição e Código Tributário Nacional. Ed. Saraiva. 5a Edição. São Paulo, 2015.p. 389)2 Publicado no Diário Oficial da União (D.O.U.) em 29 de dezembro de 2015. 3  Acre, Alagoas, Amapá, Amazonas, Bahia, Ceará, Goiás, Maranhão, Mato Grosso do Sul, Paraná, Paraíba,Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, São Paulo eTocantins.4 “Cláusula primeira. Ficam os Estados do Acre, Alagoas, Amapá, Amazonas, Bahia, Ceará, Goiás, Maranhão,Mato Grosso do Sul, Paraná, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rio Grande doSul, , Santa Catarina, São Paulo, Tocantins autorizados a conceder redução na base de cálculo do ICMS, deforma que a carga tributária corresponda ao percentual de, no mínimo, 5% (cinco por cento) do valor daoperação, relativo às operações com softwares, programas, jogos eletrônicos, aplicativos, arquivos eletrônicos econgêneres, padronizados, ainda que sejam ou possam ser adaptados, disponibilizados por qualquer meio,inclusive nas operações efetuadas por meio da transferência eletrônica de dados.”5  Destacamos que a cobrança de débitos do tributo sobre tais operações produz efeitos aos fatos geradoresocorridos a partir de 01.01.2016. Além disso, cumpre mencionar que o referido convênio autoriza os Estados a

    não exigir, total ou parcialmente, os débitos fiscais do ICMS, lançados ou não, inclusive juros e multas,relacionados com as operações previstas, ocorridas até a data de início da vigência deste convênio. Essa nãoexigência veda a restituição ou compensação de importâncias já pagas e deverá observar as condiçõesestabelecidas na legislação estadual.

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    II. A regra-matriz de incidência tributária (RMIT) como técnica de verificação da

    validade das normas jurídicas

    Paulo de Barros Carvalho (PBC) nos ensina que “as regras do direito juridicizam osfatos sociais, fazendo irromper relações jurídicas, no seio das quais aparecem os direitos

    subjetivos e os deveres correlatos.”6 

    Em decorrência desse pensamento, segundo o referido doutrinador, é possível

    afirmar que “a incidência da regra faz nascer o vínculo entre sujeitos de direito, por força da

    imputação normativa”7, sendo que a subsunção do fato à norma somente ocorrerá quando (i) 

    “o fato jurídico tributário guardar absoluta identidade com o desenho normativo da hipótese”8,

    desenho normativo esse conhecido como norma geral e abstrata (regra-matriz de incidência);e (ii)  o sujeito ativo da relação praticar ato administrativo (norma individual e concreta),

    mediante linguagem competente, transformando o fato social em fato jurídico.

    No que tange ao primeiro ponto do parágrafo anterior, nota-se que o posicionamento

    doutrinário de Geraldo Ataliba é semelhante ao de PBC, na medida em que afirma “enquanto

    não ocorrido o fato descrito na hipótese, o mandamento fica em suspenso, não incidindo”9.

    Para Geraldo Ataliba, a incidência “(...) é condicionada à ocorrência do fato previsto na

    respectiva hipótese. Averiguar-se em cada caso, se ocorreu fato subsumido à hipótese é

    fundamental, para apurar-se se houve ou não a incidência do mandamento.”10, sendo possível

    observar que “os comandos que nas normas jurídicas se contêm só incidem se e quando da

    ocorrência dos fatos previstos nas hipóteses a que são vinculados”.11 

    Não obstante, diferentemente de Geraldo Ataliba (que compreende pela incidência

    automática da norma quando ocorrido fato social descrito na hipótese), PBC sustenta que o

    fato social descrito na hipótese tributária somente será efetivamente concretizado em fato

     jurídico quando o sujeito ativo interpretar a norma geral e abstrata e, em seguida, praticar ato

    6 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. Ed. Noeses. 5a Edição. São Paulo,2013. p. 667.7 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. Ed. Noeses. 5a Edição. São Paulo,2013. p. 667.8 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. Ed. Noeses. 5a Edição. São Paulo,2013. p. 668-669.9 ATALIBA, Geraldo. Hipótese de Incidência Tributária. Malheiros Editores. 5a Edição. 8a Tiragem. São Paulo,1999. p. 39-40.10 ATALIBA, Geraldo. Hipótese de Incidência Tributária. Malheiros Editores. 5a Edição. 8a Tiragem. São Paulo,1999. p. 39-40.11 ATALIBA, Geraldo. Hipótese de Incidência Tributária. Malheiros Editores. 5a Edição. 8a Tiragem. São Paulo,1999. p. 39-40.

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    administrativo formal, mediante linguagem competente, convertendo o fato social em fato

     jurídico.

    Nesse sentido, cumpre observar as valiosas lições do referido doutrinador, transcritas

    abaixo: 

    “Em rigor não é o texto normativo que incide sobre o fato social, tornando-o jurídico. É o ser humano que, buscando fundamento de validade em norma geral eabstrata, constrói a norma jurídica individual e concreta, na sua bimembridadeconstitutiva, empregando para tanto, a linguagem que o sistema estabelece comoadequada, vale dizer, a linguagem competente. Instaura, desse modo, o fato erelata seus efeitos prescritivos, consubstanciados no laço obrigacional que vaiatrelar os sujeitos da relação. E tal atividade, que consiste na expedição denorma individual e concreta, somente será possível se houver outra norma,geral e abstrata, servindo-lhe de fundamento de validade.”12 (g.n.)

    Com efeito, “para que determinada ocorrência seja tida como fato jurídico tributário,  

    é imprescindível a satisfação de todos os critérios identificadores tipificados na hipótese geral

    e abstrata”13, sendo que, caso não haja a identificação de um critério previsto no antecedente,

    a concretização da incidência restará inteiramente prejudicada.

    Em outras palavras, verifica-se que “o fenômeno da incidência normativa opera,

    pois, com a descrição de um acontecimento no mundo físico-social, ocorrido em condições

    determinadas de espaço e de tempo, que guarda estreita consonância com os critérios

    estabelecidos na hipótese da norma geral e abstrata (regra-matriz de incidência)” (g.n.)14.

    Não é por outra razão que PBC nos ensina que a regra-matriz de incidência tributária

    (RMIT) é “um subproduto da teoria da norma jurídica” que se relaciona com um “instrumento

    metódico que organiza o texto bruto do direito positivo, propondo a compreensão da

    mensagem legislada num contexto comunicacional bem concebido e racionalmente

    estruturado”15.

    No mesmo sentido, Rosana Oleinik esclarece que a RMIT  é uma técnica utilizada

    por juristas “consistente em dirigir a atenção do intérprete à estrutura formal da norma, o

    que facilita seu controle e produção no posterior ingresso aos planos semântico e pragmático

    da linguagem jurídica”16. (g.n.) Segundo a referida doutrinadora, a RMIT “(...) nos permite

    12 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. Ed. Noeses. 5 a Edição. São Paulo,2013. p. 66813 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. Ed. Noeses. 5 a Edição. São Paulo,2013. p. 668-669.14 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. Ed. Noeses. 5 a Edição. São Paulo,2013. p. 142.15 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. Ed. Noeses. 5 a Edição. São Paulo,

    2013. p. 146.16 OLEINIK, Rosana. Teoria da norma jurídica e a regra-matriz de incidência como técnica de interpretação dodireito. In Constructivismo lógico-semântico, vol. I, CARVALHO, Paulo de Barros (coord.). Ed. Noeses. SãoPaulo. Maio, 2014. p. 311.

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    montar a estrutura lógica básica de toda e qualquer norma jurídica , isto é, nos oferece os

    elementos mínimos para sua existência”17. (g.n.)

    Com o mesmo raciocínio, Lucas Galvão de Brito nos lembra que a RMIT é um

    instrumento “para compreender o direito”18, de modo que não representa o fenômeno da

    incidência tributária em si, mas a estrutura do fenômeno, traduzindo-se em um meio para se

    enxergar o ordenamento jurídico.

    Por sua vez, Aurora Tomazini de Carvalho19 pontua que a RMIT possui duas funções

    operacionais que auxiliam os juristas a exercerem o seu magistério no direito positivo

    brasileiro, sendo elas: (i)  delimitar o âmbito da incidência normativa; e (ii)  controlar a

    constitucionalidade e legalidade normativa.

    Nesse sentido, conforme bem leciona PBC, com suporte nos ensinamentos deNoberto Bobbio20, “as regras jurídicas não existem isoladamente, mas sempre num contexto

    de normas com relações particulares entre si”21, de modo que: 

    “(...) Construir a norma aplicável é tomar os sentidos de enunciados prescritos nocontexto do sistema de que fazem parte . A norma é proposição prescritiva decorrente do todo que é o ordenamento jurídico. Enquanto corpo de linguagemvertido sobre o setor material das condutas intersubjetivas, o direito aparece comoconjunto coordenado de normas, de tal modo que uma regra jurídica jamais seencontra isolada, monadicamente só: está sempre ligada a outras normas, integrandodeterminado sistema do direito positivo.”22 (g.n.)

    Observados os posicionamentos doutrinários destacados acima, nota-se que a RMIT

    se relaciona diretamente com uma regra de conduta referente às relações jurídicas tributárias.

    É por meio da RMIT que se verifica a possibilidade de análise da estrutura da norma jurídica,

    sendo ela: o antecedente (também chamado de “hipótese”) e o consequente (“efeitos jurídicos

    do fato”). A relação entre o antecedente e o consequente é chamada de imputação deôntica.

    Nesse sentido, é o próprio magistério de PBC, transcrito abaixo:

    “Reduzindo complexidades, podemos representar a norma jurídica da seguinte

    forma: H--->C, onde a hipótese (H) alude à descrição de um fato e a consequência(C) prescreve os efeitos jurídicos que o acontecimento irá provocar, razão pela qual

    17 OLEINIK, Rosana. Teoria da norma jurídica e a regra-matriz de incidência como técnica de interpretação dodireito. In Constructivismo lógico-semântico, vol. I, CARVALHO, Paulo de Barros (coord.). Ed. Noeses. SãoPaulo. Maio, 2014. p. 312. 18 BRITTO, Lucas Galvão de. O Lugar e o Tributo: Ensaio sobre competência e definição do critério espacial naregra-matriz de incidência tributária. Ed. Noeses. São Paulo, 2014. p. 51.19 CARVALHO, Aurora Tomazini de. Curso de Teoria Geral do Direito (O constructivismo lógico-semântico).3ª Ed., Ed. Noeses, São Paulo, 2013.20  BOBBIO, Norberto. Teoria do Ordenamento Jurídico, Trad. Maria Celeste Cordeiro Leite dos Santos,Brasília/São Paulo, UNB/Polis, 1991, p. 19.21 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. Ed. Noeses. 5 a Edição. São Paulo,2013. p. 137.22 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. Ed. Noeses. 5 a Edição. São Paulo,2013. p. 137-138.

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    se fala em prescritor e descritor, sendo o primeiro para designar o antecedentenormativo e o segundo para indica o seu consequente (...).Assentemos a premissa, reconhecida unanimamente no seio da Filosofia do Direito,segundo a qual toda norma jurídica tem estrutura lógica de um juízo hipotético,em que o legislador (sentido amplo) enlaça uma consequência jurídica  (relação

    deôntica entre dois ou mais sujeitos), desde que acontecido o fato previsto noantecedente. Fala-se, por isso, em antecedente e consequente, suposto emandamento, hipótese e tese, prótase e apódose, pressuposto e estatuição, descritor eprescritor. A regulação da conduta se dá com a aplicação dos modais deônticos(permitido, proibido e obrigatório), mas sempre na dependência doacontecimento factual previsto na hipótese.”23 (g.n.).

    Em sentido semelhante, Rosana Oleinik sustenta que a relação entre o antecedente e

    o consequente resulta na imputação deôntica, também chamada de “causalidade normativa”,

    conforme se observa abaixo:

    “O antecedente se une ao consequente por um ato de vontade do legislador, queatribui o elo de natureza jurídica entre as duas proposições. É o que se denomina de“causalidade normativa” ou “imputação deôntica”. Se observarmos osfenômenos naturais concluiremos que causa e consequência se sãoindependentemente da vontade do ser humano. Assim, os objetos lançados ao ar sãoatraídos pela força da gravidade ao chão, ou ainda, os metais se dilatam caso sejamaquecidos à determinada temperatura. O mesmo não ocorre com os fenômenos deordem cultural, criados pelo ser humano para modificar o seu ambiente. É o caso dodireito, que visa implantar valores ao regular as condutas intersubjetivas de formaprescritiva. Para que a ação de circular mercadorias em específicas coordenadasde tempo e espaço gere a obrigação de pagar o tributo há, necessariamente, umato de vontade do legislador que une a hipótese a uma consequência.”24 

    Nessa esteira de pensamento, PBC afirma que o antecedente da norma se relacionacom “o núcleo do acontecimento fáctico e seus condicionantes no tempo”25, razão pela qual

    devem ser considerados os seguintes critérios em sua composição: (i)  critério material

    (verbo+complemento); (ii) critério espacial; e (iii) critério temporal. Em síntese, PBC estipula

    a seguinte fórmula quanto ao antecedente da RMIT: “Ht=Cm(v.c).Ce.Ct”, onde “Ht” é a

    hipótese tributária; “Cm” o critério material, “v” o verbo, “c” o complemento; “Ce” o critério

    espacial, “Ct” o critério temporal e “.” o símbolo do conjuntor. 

    Quanto aos critérios constantes no antecedente da RMIT e seus respectivossignificados, cumpre observar os valiosos ensinamentos de Rosana Oleinik:

    “O antecedente ou hipótese de incidência da regra-matriz é formado porcritérios que permitem ao intérprete compreender qual a atividade quepraticada poderá desencadear determinada obrigação, quando e onde,localizando-a, portanto, no tempo e no espaço. Tais coordenadas de ação, tempo eespaço são respectivamente denominadas de critério material, temporal e

    23 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. Ed. Noeses. 5 a Edição. São Paulo,2013. p. 137-147.24 OLEINIK, Rosana. Teoria da norma jurídica e a regra-matriz de incidência como técnica de interpretação do

    direito. In Constructivismo lógico-semântico, vol. I, CARVALHO, Paulo de Barros (coord.). Ed. Noeses. SãoPaulo. Maio, 2014. p. 312. 25 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. Ed. Noeses. 5 a Edição. São Paulo,2013. p. 148.

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    espacial. O critério material é composto de um verbo pessoal de predicaçãoincompleta que estabelece a ação a ser praticada, como circular mercadorias, auferirrenda, prestar serviços de qualquer natureza. O critério temporal nos diz quando, emque momento a ação deverá ocorrer e, por sua vez, o critério espacial nos diz o local,que pode ser todo o território nacional, parte dele ou um determinado ponto. A

    conjunção desses três elementos forma o antecedente da hipótese de incidênciada regra-matriz.”26 (g.n.)

    No mesmo sentido, PBC discorre da seguinte forma acerca dos critérios material,

    espacial e temporal:

    “O critério material  é o núcleo do conceito mencionado na hipótese normativa.Nele há referencia a um comportamento de pessoas físicas ou jurídicas,condicionado por circunstâncias de espaço e tempo, de tal sorte que o isolamentodesse critério, para fins cognoscitivos, é claro, antessupõe a abstração das condiçõesde lugar e de momento estipuladas para a realização do evento. Já o critérioespacial é o plexo de indicações, mesmo tácitas e latentes, que cumprem o objetivo

    de assinalar o lugar preciso em que a ação há de acontecer. O critério temporal, porfim, oferece elementos para saber, com exatidão, em que preciso instante ocorre ofato descrito.”27 (g.n.)

    No que tange ao consequente da RMIT, Lucas Galvão de Brito sustenta tal expressão

    “carrega a prescrição da relação jurídica tributária em sentido estrito, também chamada de

    obrigação tributária”28.

    Segundo ele, “trata-se de obrigação de pagar em que um sujeito ativo pode exigir, de

    outro, sujeito passivo, o pagamento de uma denominada quantia”29, sendo dois os critérios

    relevantes para o prescritor da norma, quais sejam: (i) o critério pessoal (sujeito ativo e sujeitopassivo); e (ii) o critério quantitativo (base de cálculo e alíquota); compondo, dessa forma, a

    seguinte fórmula: “Cst=Cp(sa.sp).Cq(bc.al)”. Destacamos que a referida formula se traduz da

    seguinte forma: “Cst” é o consequente tributário; “Cp” é o critério pessoal; “sa” o sujeito

    ativo; “sp” o sujeito passivo; “Cq” o critério quantitativo; “bc” a base de cálculo; “al” a

    alíquota; e “.” novamente o conjuntor ou multiplicador lógico.

    Nesse sentido, cumpre observar o magistério de PBC acerca do consequente da

    regra-matriz de incidência tributária (RMIT):

    “Em face de tais considerações é que se pode afirmar que o prescritor da regra-matriz de incidência tributária contém dois critérios: o pessoal (sujeito ativo epassivo) e o quantitativo (base de cálculo e alíquota). Nada mais é necessário paraque possamos identificar uma obrigação tributária, espécie do gênero relação

    26 OLEINIK, Rosana. Teoria da norma jurídica e a regra-matriz de incidência como técnica de interpretação dodireito. In Constructivismo lógico-semântico, vol. I, CARVALHO, Paulo de Barros (coord.). Ed. Noeses. SãoPaulo. Maio, 2014. p. 312. 27 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. Ed. Noeses. 5 a Edição. São Paulo,2013. p. 148.28 BRITTO, Lucas Galvão de. O Lugar e o Tributo: Ensaio sobre competência e definição do critério espacial naregra-matriz de incidência tributária. Ed. Noeses. São Paulo, 2014. p. 57.29 BRITTO, Lucas Galvão de. O Lugar e o Tributo: Ensaio sobre competência e definição do critério espacial naregra-matriz de incidência tributária. Ed. Noeses. São Paulo, 2014. p. 57.

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     jurídica. Sua representação lógica poderia ser expressa com a seguinte notaçãosimbólica: Cst”Cp(sa.sp).Cq(bc.al) . Em que “Cst” é o consequente tributário; “Cp”é o critério pessoal; “sa” o sujeito ativo; “sp” o sujeito passivo; “Cq” o critérioquantitativo; “bc” a base de cálculo; “al” a alíquota; e “.” novamente o conjuntor oumultiplicador lógico.”30 (g.n.)

    Em sentido semelhante, é o posicionamento de Oleinik, conforme se infere abaixo:

    “O consequente da regra-matriz de incidência nos traz elementos que possibilitamapurar quem é a pessoa legitimada a exigir o direito e quem deverá cumpri-lo.Portanto, sujeitos ativo e passivo compõem o critério pessoal do consequente, querevela as possíveis partes constituintes da relação jurídica, que se daráfuturamente, no plano concreto, com a incidência da norma-padrão. Não bastasaber quem deve adimplir e quem pode cobrar a satisfação de determinado direito.É preciso saber dimensionar a obrigação. No campo tributário, aplicamos umaalíquota à base de cálculo. As conjugações desses fatores formam o critérioquantitativo do tributo. Em outros campos, nem sempre será possível medir a exataquantia, objeto da prestação, mas certamente haverá uma obrigação prestacional

    que representa o dever a ser cumprido.”31

     (g.n.)

    Assim, como resultado da imputação deôntica entre o antecedente e o consequente,

    Lucas Galvão de Brito32 nos apresenta a seguinte fórmula que representa a regra-matriz de

    incidência tributária (RMIT): “D{Ht ! Cst}”; onde “D” representa a cópula deôntica; “Ht” é

    a hipótese tributária e “Cst” é o consequente tributário.

    Vale frisar que a fórmula “D{Ht ! Cst}” ainda pode ser decodificada da seguinte

    forma: “D {[Cm (v.c).Ct.Ce] ! [Cp(Sa.Sp).Cq(bc.al)]}”33; em que “D” representa a cópula

    deôntica; “Cm” o critério material, “v” o verbo, “c” o complemento; “Ce” o critério especial,“Ct” o critério temporal; “Cp” é o critério pessoal; “sa” o sujeito ativo; “sp” o sujeito passivo;

    “Cq” o critério quantitativo; “bc” a base de cálculo; “al” a alíquota;  e “.” o símbolo do

    conjuntor. 

    Diante das considerações tecidas, passaremos a discorrer, no próximo capítulo acerca

    das disposições constitucionais referentes ao ICMS, com o objetivo de identificar o núcleo

    material desse imposto, bem como verificar os limites estabelecidos pelo constituinte para

    definição da hipótese de incidência tributária.

    30 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. Ed. Noeses. 5 a Edição. São Paulo,2013. p. 150.31 OLEINIK, Rosana. Teoria da norma jurídica e a regra-matriz de incidência como técnica de interpretação dodireito. In Constructivismo lógico-semântico, vol. I, CARVALHO, Paulo de Barros (coord.). Ed. Noeses. SãoPaulo. Maio, 2014. p. 313. 32 BRITTO, Lucas Galvão de. O Lugar e o Tributo: Ensaio sobre competência e definição do critério espacial naregra-matriz de incidência tributária. Ed. Noeses. São Paulo, 2014. p. 50.33 BRITTO, Lucas Galvão de. O Lugar e o Tributo: Ensaio sobre competência e definição do critério espacial naregra-matriz de incidência tributária. Ed. Noeses. São Paulo, 2014. p. 50.

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    III. As disposições constitucionais relativas a hipótese de incidência tributária da RMIT

    do “ICMS”

    O Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços de

    Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS), foi estabelecido pelo

    art. 155, inciso II da Constituição Federal (CF/88)34, de modo a revelar, inicialmente, 5

    (cinco) cinco hipóteses tributárias distintas, conforme se infere da valiosa lição de Roque

    Antônio Carrazza:

    “A sigla “ICMS” alberga, pelo menos, cinco impostos diferentes, a saber: a) oimposto sobre operações mercantis (operações relativas à circulação de

    mercadorias), que compreende o que nasce da entrada, na Unidade Federada,de mercadorias ou bens importados do exterior; b) o imposto sobre serviços detransporte interestadual e intermunicipal; c) o imposto sobre serviços decomunicação; d) o imposto sobre produção, importação, circulação, distribuição ouconsumo de lubrificantes e combustíveis líquidos e gasosos e de energia elétrica; ee) o imposto sobre a extração, circulação, distribuição ou consumo de minerais.Dizemos diferentes, porque estes tributos têm hipóteses de incidência e bases decálculo diferentes. Há, pois, pelo menos cinco núcleos distintos de incidência doICMS”.35 (g.n.)

    No presente estudo, dada a complexidade das operações com softwares via

    download e streaming, analisaremos objetivamente o núcleo material constitucional das

    hipóteses de incidência tributária (antecedente) relacionadas ao imposto operações mercantis

    (“ICMS-Mercadorias”) e ao imposto sobre prestação de serviços de comunicação (“ICMS-

    Comunicação”), de modo a verificar como ocorre a incidência dos referidos tributos em nosso

    ordenamento jurídico36.

    Não obstante, cabe ressaltar desde já que o titular da competência impositiva do

    ICMS deve legislar, conforme bem pontua PBC, “consoante os traços que o constituinte

    esboçou”, sendo que “o comando da uniformização vem de cima para baixo, de tal sorte que

    as regras matrizes de incidência, expedidas pelos Estados e Distrito Federal, terão que manter

    os mesmos conteúdos semânticos [previstos na Constituição Federal de 1988]”37.

    34  Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: (...) II - operações relativas àcirculação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e decomunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior;"# CARRAZZA, Roque Antônio. ICMS. Ed. Malheiros Editores. 17ª Edição. São Paulo, 2015. p. 42-43.

    "$ Desde já, destacamos que não analisaremos no presente estudo o imposto sobre operações mercantis iniciadas

    no exterior (“ICMS-Importação”), haja vista que o seu fato imponível (“nacionalização de mercadoria mediantedesembaraço aduaneiro”), não se relaciona com o objeto do presente pesquisa."% CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. Ed. Noeses. 5a Edição. São Paulo,

    2013. p. 769.

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    Não é por outra razão que o referido doutrinador, argumenta, no sentido de que

    “não há como admitir legislações discrepantes, no que concerne ao núcleo de incidência”38,

    sendo que “uma vez fixados os limites do poder legiferante, pelo constituinte, a matéria se dá

    pronta e acabada, carecendo de sentido sua reabertura em nível infraconstitucional”39.

    Em sentido semelhante, é o magistério de Roque Antônio Carrazza ao argumentar

    que “o legislador, ao exercitar a competência tributária de sua pessoa política, deverá ser fiel à

    norma padrão de incidência do tributo, pré-traçada na Constituição”40  (g.n.). Segundo o

    referido doutrinador, “o legislador (federal, estadual, municipal ou do Distrito Federal)

    enquanto cria o tributo, não pode fugir deste arquétipo constitucional”41.

    III.I. O núcleo material constitucional do “ICMS-Mercadorias”Como dito anteriormente, o critério material da RMIT é o “núcleo” da hipótese

    tributária e se relaciona com um verbo e seu complemento. No caso do “ICMS-Mercadorias”,

    o critério material foi estabelecido pelo art. 155, inciso II da CF/88 e está relacionado à

    locução “circular (verbo) mercadorias (complemento)” que significa, em outros palavras,

    “vender mercadorias” ou “transferir a titularidade jurídica de mercadorias”. Nesse sentido, é o

    magistério de Hugo de Brito Machado, conforme se infere abaixo:

    “Operações relativas à circulação de mercadorias são quaisquer atos ou negócios,independentemente da natureza jurídica específica de cada um deles, que implicamcirculação de mercadorias, vale dizer, que implicam mudança de propriedade dasmercadorias, dentro da circulação econômica que as leva da fonte até oconsumidor”.42 (g.n.)

    PBC compartilha o mesmo entendimento de Hugo de Brito Machado nesse ponto

    ao afirmar que as operações de circulação de mercadorias são “atos jurídicos que promovem a

    transmissão de direito, in casu, a propriedade de mercadorias”43.

    Ainda, em sentido semelhante, Roque Antônio Carrazza leciona no sentido de que

    “o ICMS sobre operações mercantis só pode ser exigido quando o comerciante, industrial ou

    "& CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. Ed. Noeses. 5a Edição. São Paulo,

    2013. p. 769. "' CARVALHO, Paulo de Barros. Derivação e Positivação no Direito Tributário. Vol. II. Ed. Noeses. São Paulo,

    2013. p. 101. () CARRAZZA, Roque Antônio. ICMS. Ed. Malheiros Editores. 17ª Edição. São Paulo, 2015. p. 42-43.

    (*

     CARRAZZA, Roque Antônio. ICMS. Ed. Malheiros Editores. 17ª Edição. São Paulo, 2015. p. 42-43.(+ MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. Ed. Malheiros. 36a Edição. São Paulo, 2015. p. 375. 

    43 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. Ed. Noeses. 5 a Edição. São Paulo,2013. p. 736.

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    produtor pratica um negócio jurídico que transfere a titularidade  de uma

    mercadoria”44(g.n.).

    Não obstante, passaremos a observar os conceitos formulados pela doutrina

    especializada acerca dos três vocábulos presentes no art. 155, II da CF/88 referentes ao núcleo

    material do “ICMS-Mercadorias”, quais sejam: (i)  “operações”; (ii)  “circulação”; e (iii) 

    “mercadorias”; vocábulos estes essenciais para a caracterização da hipótese de incidência

    tributária do ICMS nas operações de circulação de mercadorias.

    Primeiramente, no que tange ao termo “operações”, para fins do “ICMS-

    Mercadorias”, PBC compreende que seu significado se relaciona diretamente com “o sentido

    de atos ou negócios jurídicos hábeis para provocar a circulação de mercadorias”45.

    José Eduardo Soares de Melo, por sua vez, esclarece que o termo “operações”caracteriza “o verdadeiro sentido do fato juridicizado, a prática de ato jurídico como a

    transmissão de um direito (posse ou propriedade)”46(g.n.).

    Para Aroldo Gomes de Mattos, o vocábulo “operações” é “um termo

    plurissignificativo, mas que foi empregado com nítido sentido de realização de atos ou

    negócios jurídicos  (a compra-e-venda, comissão, o escambo, a dação em pagamento, a

    importação, a exportação, etc.), (...) previstos nas leis civis ou comerciais”47 (g.n.).

    No que tange ao termo “circulação”, PBC sustenta que “é a passagem dasmercadorias de uma pessoa para outra, sob o manto de um título jurídico, com a consequente

    mudança de patrimônio”48. No mesmo sentido, José Eduardo Soares de Melo argumenta que

    o termo “circulação” reflete uma “movimentação com mudança de patrimônio”49 

    Aroldo Gomes de Mattos afirma que o vocábulo “circulação” trata de “um aspecto

    dinâmico das “operações”, que designa o processo de movimentação da mercadoria, com

    mudança de sua titularidade”50(g.n.). Ainda, o segundo o referido doutrinador, a “circulação

    econômica” (também conhecida como “circulação física”), por si só, não caracteriza o critériomaterial do ICMS, sendo necessária a ocorrência da circulação jurídica, “pois, nesse caso [da

    44 CARRAZZA, Roque Antônio. ICMS. Ed. Malheiros Editores. 17ª Edição. São Paulo, 2015. p. 51. 45 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. Ed. Noeses. 5 a Edição. São Paulo,2013. p. 736.46 MELO, José Eduardo Soares de. ICMS: Teoria e Prática. Ed. Dialética. 9a Edição. São Paulo, 2006. p. 11.47 MATTOS, Aroldo Gomes de. ICMS: Comentários à LC 87/96. Editora Dialética. 1a Edição. São Paulo, 1997.p. 27.48 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. Ed. Noeses. 5 a Edição. São Paulo,2013. p. 736.49 MELO, José Eduardo Soares de. ICMS: Teoria e Prática. Ed. Dialética. 9a Edição. São Paulo, 2006. p. 14.50 MATTOS, Aroldo Gomes de. ICMS: Comentários à LC 87/96. Ed. Dialética. 1a Ed. São Paulo, 1997. p. 27.  

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    “circulação econômica”], há simples transpasse de um ponto a outro, ou de um

    estabelecimento para outro da mesma empresa, sem mudança de titularidade”51 (g.n.).

    Em sentido semelhante, é o posicionamento de PBC ao tratar a circulação

    econômica como uma mera movimentação física, incapaz de caracterizar a incidência do

    ICMS, conforme se infere abaixo:

    “O minucioso exame da materialidade do ICMS, além de elucidar as situações emque tem o nascimento a obrigação tributária, permite vislumbrar a inexigibilidade,pela legislação desse imposto, da movimentação física das mercadorias. Acirculação corpórea de bens, além de insuficiente para a configuração damaterialidade do ICMS, não se apresenta como requisito essencial à incidênciado tributo.  O direito, ao criar suas próprias realidades, atribui à expressão“operações de circulação de mercadorias” o significado de “transferência desua titularidade”.  Do mesmo modo, ao tributar as “operações de importação demercadorias” refere-se à aquisição de tais bens por sujeito estabelecido ou

    domiciliado no país, não sendo seu ingresso físico bastante, em si mesmo, para acaracterização do fato tributário”52. (g.n.)

    Com efeito, José Souto Maior Borges argumenta que “não há identidade entre

    circulação física ou econômica (inapreensível juridicamente) e circulação jurídica. Tanto é

    assim que, juridicamente, os imóveis circulam e, no entanto, fisicamente não podem fazê-

    lo.”53 Por isso ressalta: “Uma coisa é a operação de que resulta a circulação de mercadoria.

    Outra bem diferente é a circulação dela resultante.”54 

    Por último, resta analisar o sentido do termo “mercadorias”. Hugo de Brito

    Machado leciona que o termo “mercadorias” possui o significado de “coisas móveis”.

    Segundo o referido doutrinador, “são coisas porque bens corpóreos, que valem por si, e não

    pelo que representam. Coisas, portanto, em sentido restrito, no qual não se incluem os bens

    tais como os créditos, as ações, o dinheiro, entre outros.”(g.n.)55 E continua: “E coisas móveis

    porque em nosso sistema jurídico os imóveis recebem disciplinamento legal diverso, o que os

    exclui do conceito de mercadorias”56.

    Hugo de Brito Machado conclui o seu raciocínio ao afirmar que “o que caracteriza

    uma coisa como mercadoria é a destinação. Mercadorias são aquelas coisas móveis destinadas

    51 MATTOS, Aroldo Gomes de. ICMS: Comentários à LC 87/96. Ed. Dialética. 1a Ed. São Paulo, 1997. p. 27.52 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. Ed. Noeses. 5 a Edição. São Paulo,2013. p. 736.53 BORGES, José Souto Maior. “O Fato Gerador do ICM e os Estabelecimentos Autônomos”. Revista de DireitoAdministrativo. Vol. 103, FGV, São Paulo. p. 36.54 BORGES, José Souto Maior. “O Fato Gerador do ICM e os Estabelecimentos Autônomos”. Revista de Direito

    Administrativo. Vol. 103, FGV, São Paulo. p. 36.55 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. Ed. Malheiros. 36a Edição. São Paulo, 2015. p. 377-378.56 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. Ed. Malheiros. 36a Edição. São Paulo, 2015. p. 378.

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    ao comércio. São coisas adquiridas pelos empresários para revenda, no estado em que as

    adquiriu, ou transformadas, e ainda aquelas produzidas para venda”(g.n.)57.

    Em sentido semelhante, são os valiosos ensinamentos de PBC acerca do conceito

    do termo mercadoria para fins de incidência do ICMS, conforme se infere abaixo:

    “O étimo do termo “mercadoria” está no latim mercatura, significando tudo aquilosusceptível de ser objeto de compra e venda, isto é, o que comprou para pôr à venda.Evoluiu de merx, mercis (sobretudo no plural: mercês, mercium), referindo-se aoque é objeto de comércio, adquirindo, na atualidade, o sentido de “qualquer objetonatural ou manufaturado que se possa trocar e que, além dos requisitos comuns aqualquer bem econômico, reúna outro requisito extrínseco, a destinação aocomércio”. Não se presta o vocábulo para designar, nas províncias do direito,senão coisa móvel, corpórea, que está no comércio. A natureza mercantil doproduto não está, absolutamente, entre os requisitos que lhe são intrínsecos,mas na destinação que lhe dê”58. (g.n.)

    Roque Antônio Carrazza, por sua vez, discorre acerca do conceito de mercadoria

    para fins de incidência do ICMS da seguinte forma:

    “É o caso de rememorarmos que mercadoria, nos patamares do Direito, é o bemmóvel, sujeito à mercancia. É se preferirmos, o objeto da atividade mercantil, queobedece, por isso mesmo, ao regime jurídico comercial. Não é qualquer bemmóvel que é mercadoria, mas tão somente o bem móvel corpóreo (bemmaterial) que se submete à mercancia. Podemos, pois, dizer que toda mercadoria ébem móvel que se destina à prática de operações mercantis é que assume a qualidadede mercadoria. (...) Para que um bem móvel seja havido por mercadoria, é misterque ele tenha por finalidade a venda ou revenda. Em suma, a qualidade distintivaentre bem móvel (gênero) e mercadoria (espécie) é extrínseca, consubstanciando-se

    no propósito de destinação comercial. (...) De fato, o ICMS sobre operaçõesmercantis só pode ser exigido quando comerciante, industrial ou produtor pratica umnegócio jurídico que transfere a titularidade de uma mercadoria. (...) Logo,mercadoria, para fins de tributação por via de ICMS, é o que a lei comercialassim considera (bem móvel corpóreo, que se submete à mercancia). Segue-seque não pode a lei dos Estados ou do Distrito Federal alterar este conceito, para finstributários. Por quê? Porque esta não é matéria sob reserva de lei tributária (hipóteseem que, aí, sim, seria modificável pela própria entidade tributante).”59 (g.n.)

    José Eduardo Soares de Melo conceitua “mercadoria” como “bem corpóreo, da

    atividade empresarial do produtor, industrial e comerciante, tendo por objeto a sua

    distribuição para consumo, compreendendo-se no estoque da empresa, distinguindo-se dascoisas que tenham qualificação diversa, segundo a ciência contábil, como é o caso do ativo

    permanente.”60(g.n.)

    57 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. Ed. Malheiros. 36a Edição. São Paulo, 2015. p. 378.58 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. Ed. Noeses. 5 a Edição. São Paulo,2013. p. 737.59 CARRAZZA, Roque Antônio. ICMS. Ed. Malheiros Editores. 17ª Edição. São Paulo, 2015. p. 50-53. 60 MELO, José Eduardo Soares de. ICMS: Teoria e Prática. Ed. Dialética. 9a Edição. São Paulo, 2006. p. 16.

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    Por último, cumpre ressaltar os ensinamentos de Regina Helena Costa no sentido de

    que o termo “mercadoria é o conceito extraído do Direito Comercial, a significar bem

    móvel sujeito a mercancia.”61 (g.n.) 

    Portanto, diante das considerações doutrinárias mencionadas acima, resta evidente

    que o núcleo material constitucional do “ICMS-Mercadorias” se relaciona com a circulação

     jurídica de mercadorias e não com a simples circulação econômica. Em outras palavras, o

    núcleo material constitucional do “ICMS-Mercadorias” se relaciona com o ato jurídico de

    transferência de titularidade de um bem corpóreo, móvel e com destinação comercial.

    Ainda, vale ressaltar que o critério material do “ICMS-Mercadorias” está

    devidamente explicitado na própria Constituição Federal de 1988 (art. 155, inciso II), sendo

    que o termo “mercadorias” foi utilizado para delimitar a competência tributária62 dos Estadose do Distrito Federal, razão pela qual o intérprete não pode alterar o conteúdo e o alcance do

    referido conceito, nos termos do art. 110 do CTN63, conforme bem pontua Aroldo Gomes de

    Mattos64.

    Observadas as considerações destacadas acima, passaremos a discorrer na próxima

    sessão acerca do critério material do “ICMS-Comunicação”.

    III.II. O núcleo material constitucional do “ICMS-Comunicação”

    De modo semelhante ao “ICMS-Mercadorias”, o núcleo material constitucional da

    hipótese de incidência do “ICMS-Comunicação”, está previsto no art. 155, inciso II da CF/88

    e é regido pela locução “prestar (verbo) serviços de comunicação (complemento)”, locução

    esta que segundo José Eduardo Soares de Melo, compreende “um negócio (jurídico)

    61 COSTA, Regina Helena. Curso de Direito Tributário: Constituição e Código Tributário Nacional. Ed. Saraiva.

    5a Edição. São Paulo, 2015. p. 396.62 Segundo Roque Antônio Carrazza, “competência tributária é a aptidão jurídica para criar, in abstracto,tributos. No Brasil, por injunção do princípio da legalidade, os tributos devem ser criados, in absctrato, pormeio de lei, que deve descrever todos os elementos essenciais da norma jurídica tributária. São elementosessenciais da norma jurídica tributária, os que, de algum modo, influem no an e no quantum do tributo; a saber: ahipótese de incidência do tributo, seu sujeito ativo, seu sujeito passivo, sua base de cálculo e sua alíquota.Portanto, competência tributária é a possibilidade jurídica de criar, in abstracto, tributos, descrevendo,legislativamente, suas hipóteses de incidência, seus sujeitos ativos, seus sujeitos passivos, suas bases decálculo e suas alíquotas. Como corolário disso, temos que exercitar a competência tributária é dar nascimento,no plano abstrato, a tributos”. (CARRAZZA, Roque Antônio. ICMS. Ed. Malheiros Editores. 17ª Edição. SãoPaulo, 2015. p. 34-35 – g.n.). 63 “Art. 110. A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formasde direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos

    Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competênciastributárias.” (g.n.)64 MATTOS, Aroldo Gomes de. ICMS: Comentários à LC 87/96. Editora Dialética. 1a Edição. São Paulo, 1997.

    p. 27. 

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    pertinente a uma obrigação “de fazer”, de conformidade com os postulados do direito

    privado”.65(g.n.)

    Com efeito, o termo “comunicação” e a locução “prestação de serviços de

    comunicação” tratam de realidades distintas, sendo notório que o núcleo material

    constitucional do “ICMS-Comunicação” não se relaciona com a comunicação propriamente

    dita, mas sim com a prestação onerosa de serviços de comunicação, sendo necessário

    delimitar, de forma detalhada, o conceito de ambos os termos, para fins de análise da hipótese

    de incidência tributária.

    Conforme leciona PBC, com apoio em doutrina especializada66, o conteúdo

    semântico do termo “comunicação” se relaciona com “a transmissão de uma mensagem,

    por meio de um canal, entre um emissor e um receptor , que possuem em comum, aomenos parcialmente, o repertório necessário para a decodificação da mensagem e que

    estão conectados psicologicamente.”67 (g.n.)

    Em sentido semelhante, é o magistério de Roque Antônio Carrazza ao argumentar

    que “há comunicação no sentido de transmissão de uma mensagem de uma pessoa a outra,

    que a compreende”68. E continua: “A comunicação envolve, pois, um ato de conhecimento e

    um ato de consciência do outro. Pressupõe a existência de um emissor (conhecedor e

    consciente do destinatário da mensagem) e de um receptor (certo, identificável e apto a figurarno polo oposto do processo comunicacional)”.69(g.n.)

    Por outro lado, a prestação de serviço de comunicação consiste “na atividade de

    colocar à disposição do usuário, os meios e modos necessários à transmissão e recepção de

    mensagens, diferindo, nessa medida, da singela realização do fato comunicacional”70. Nesse

    sentido são os ensinamentos de PBC:

    “(...) a prestação de serviço de comunicação só se verificará, portanto, quandohouver a junção simultânea dos elementos constitutivos da prestação de

    serviço, de um lado, e do processo comunicacional, de outro, de tal forma, que aatividade exercida pelo prestador tenha por escopo realizar a comunicação entre otomador do serviço e terceira pessoa, mediante pagamento de um valor. Pode

    65 MELO, José Eduardo Soares de. ICMS: Teoria e Prática. Ed. Dialética. 11a Edição. São Paulo, 2006. p. 138.66  DUROZOI, Gérard; ROUSSEL, André. Dicionário de Filosofia, Trad. Marinha Appenzeller, Campinas:Papirus, 1993, p. 95; JAKOBSON, Roman. Linguística e Comunicação. São Paulo: Cultrix. p. 123.; ECO,Umberto. Tratado Geral de Semiótica. 2a Ed., São Paulo: Perspectiva, 1991, p. 5; NETTO, J. Teixeira Coelho.Semiótica, informação e comunicação, 3a Ed., São Paulo: Perspectiva, 1990, p. 123; VILANOVA, Lourival. Asestruturas lógicas e o sistema do direito positivo, São Paulo: Noeses, 2008, p. 49.67 CARVALHO, Paulo de Barros. Derivação e Positivação no Direito Tributário. Vol. II. Ed. Noeses. São Paulo,2013. p. 105.68 CARRAZZA, Roque Antônio. ICMS. Ed. Malheiros Editores. 17ª Edição. São Paulo, 2015. p. 252-253. 69 CARRAZZA, Roque Antônio. ICMS. Ed. Malheiros Editores. 17ª Edição. São Paulo, 2015. p. 252-253. 70 CARVALHO, Paulo de Barros. Derivação e Positivação no Direito Tributário. Vol. II. Ed. Noeses. São Paulo,2013. p. 106.

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    falar-se em prestação de serviço de comunicação quando o emissor da mensagemaparece como tomador do serviço, que, mediante remuneração, contrata oprestador para que este exerça função de canal, proporcionando os meios quetornem possível a transmissão de mensagens ao destinatário.”71 (g.n.)

    Em sentido semelhante, é o magistério de Roque Antônio Carrazza72 ao lecioanr quea comunicação, por si só, não é apta a ensejar o recolhimento do “ICMS-Comunicação”,

    sendo que tal vocábulo (comunicação) apenas terá relevância jurídica caso se relacione

    diretamente a um contrato oneroso de prestação de serviços.

    Em outras palavras, por força do que restou estabelecido pela CF/88, o ICMS não

    alcança a comunicação propriamente dita, mas a prestação remunerada de serviço de

    comunicação realizada por uma terceira pessoa na relação comunicacional, que disponibiliza

    um canal ao emissor (tomador do serviço), permitindo, assim, que este possa se comunicarcom o receptor, ou então, transmitir-lhe, de maneira efetiva, uma mensagem. Nesse sentido,

    cumpre observar a valiosa lição de Roque Antônio Carrazza acerca da materialidade do

    “ICMS-Comunicação”:

    “Reafirmamos, portanto, que o tributo em estudo nasce do fato de uma pessoa,prestar a terceiros, mediante contraprestação econômica, serviços decomunicação. Ou se preferimos: seu fato imponível ocorre quando duas pessoas,valendo-se dos meios mecânicos, elétricos, eletrônicos, etc., diretamentepropiciados, em caráter negocial73, por terceiro, passam a interagir, trocandomensagens e informações74. Reduzindo a ideia à sua dimensão mais simples, o

    ICMS-Comunicação somente pode nascer quando, em razão de contratooneroso de Prestação de Serviços, A (o prestador), valendo-se de meiosmateriais próprios ou alheios, intermedeia comunicação entre B e C (fruidores). (...) Ainda a respeito, ressaltamos que o ICMS só pode incidir quando houverprestação onerosa do serviço de comunicação.  E tal se dá quando, uma vezestabelecida a relação comunicativa, ocorrer a transmissão de ideias, pensamentos,ou intenções, entre duas pessoas diversas do prestador. (...) Portanto, para quehaja comunicação basta que existam dois sujeitos: o emissor e o receptor.Todavia, para que a haja a prestação onerosa do serviço de comunicação – estasim tributável pelo ICMS – é mister que ambos sejam postos em contato porum terceiro, que, mediante contraprestação econômica, utilizando-se de meiospróprios ou alheios (v.g., da empresa que comercializa ou loca aparelhos aptos àcomunicação), permite-lhes troquem mensagens, passando a interatuar.”75. (g.n.)

    Em sentido semelhante, é o magistério de André Mendes Moreira acerca do aspecto

    material do “ICMS-Comunicação”, conforme se infere abaixo:

    71 CARVALHO, Paulo de Barros. Derivação e Positivação no Direito Tributário. Vol. II. Ed. Noeses. São Paulo,2013. p. 106.72 CARRAZZA, Roque Antônio. ICMS. Ed. Malheiros Editores. 17ª Edição. São Paulo, 2015. p. 240. 73  De acordo com Roque Antônio Carrazza, “Há de haver, pois, um contrato oneroso (escrito ou verbal)estipulando o serviço que possiblitará a comunicação entre pelo menos duas pessoas (diversas do prestador)”.(CARRAZZA, Roque Antônio. ICMS. Ed. Malheiros Editores. 17ª Edição. São Paulo, 2015. p. 253). 74 De acordo com Roque Antônio Carrazza, “Para fins de ICMS, mensagem que não é captada – e, portanto, nãoé passível de ensejar resposta pelo mesmo meio – não é comunicação”. (CARRAZZA, Roque Antônio. ICMS.Ed. Malheiros Editores. 17ª Edição. São Paulo, 2015. p. 253). 75 CARRAZZA, Roque Antônio. ICMS. Ed. Malheiros Editores. 17ª Edição. São Paulo, 2015. p. 253-255. 

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    “Para que haja a incidência do ICMS-Comunicação, é imperioso que exista umafonte emissora, uma fonte receptora e uma mensagem transmitida peloprestador de serviço. Sem esses elementos não há comunicação: sem comunicação,não há o ICMS-Comunicação. (...) O fato gerador do ICMS em tela na CR/88 é a

    efetiva prestação do serviço de comunicação. Para que este ocorra, é necessárioque um terceiro preste, mediante remuneração, serviço que possibilita aformação da relação comunicativa, composta por cinco elementos: emissor,receptor, mensagem, código e meio de transmissão.”76 (g.n.)

    Ainda, vale ressaltar que “os participantes do liame comunicativo (emissor e

    receptor) não prestam serviço de comunicação um para o outro, nem para terceiros”  77, pois,

    caso contrário, estariam, simplesmente, se comunicando, conforme sustenta PBC78.

    De fato, “se a comunicação for feita pelo próprio prestador (transmissão de

    mensagem própria) não haverá incidência do ICMS, porque restará configurado o

    autosserviço”79  que, segundo Roque Antônio Carrazza, “encerra verdadeira contradictio in

    terminis”, tendo em vista que não existe previsão em nosso ordenamento de prestação serviço

    em benefício próprio, mas tão-somente em benefício para terceiros:

    “Juridicamente, a prestação de serviços só pode ser efetuada em proveito deterceiros; nunca em proveito próprio. Sobremais, no caso do ICMS-Comunicação,como a prestação deve ter conteúdo econômico mensurável, este requisito só estápresente quando o esforço do prestador estiver endereçado a terceiros, certos eperfeitamente identificados: o emissor e o receptor.”80 

    Por último, cabe observar que “tendo sido a competência tributária minuciosamentetraçada na Constituição, não deve o interprete busca-la em leis complementares, leis

    ordinárias, e muito menos em convênios”81.

    76 MOREIRA, André Mendes. A tributação dos serviços de comunicação. Ed. Dialética. São Paulo, 2006. p. 158e 217. 77 CARVALHO, Paulo de Barros. Derivação e Positivação no Direito Tributário. Vol. II. Ed. Noeses. São Paulo,2013. p. 106.78  Segundo PBC, “Presta serviço de comunicação tão só a pessoa (física ou jurídica) que proporciona e

    mantém em funcionamento os meios físicos necessários à concretização do vínculo comunicacional  (ex.:terminais, centrais, linhas de transmissão, satélites, etc.), assim se alguém, por seus próprios meios, transmiteinformações a outrem, esse alguém não presta serviço, mas tão somente se comunica. Do que foi dito infere-se que a comunicação pode ocorrer de dois modos: (1) de forma pessoal, havendo transmissão de mensagemprópria; e (2) com intermediação, em que há transmissão de mensagem de terceiros. Apenas a segunda hipótesesujeita-se a incidência do ISSC [“ICMS-Comunicação”], pois como ninguém presta serviço a si mesmo, somentese o canal transmissor configurar pessoa diversa do emissor é que teremos a prestação de serviço decomunicação sujeita à incidência tributária. Enquanto na comunicação a mensagem é recebida diretamentedo emissor, na prestação de serviço de comunicação a mensagem, de propriedade do emissor, étransmitida por um indivíduo diverso (prestador de serviços). O simples fato de alguém possuir meiostecnológicos para distribuir sua própria mensagem, portanto, não implica prestação, por ele, de serviçosde comunicação.” (CARVALHO, Paulo de Barros. Derivação e Positivação no Direito Tributário. Vol. II. Ed.Noeses. São Paulo, 2013. p. 107).79 CARRAZZA, Roque Antônio. ICMS. Ed. Malheiros Editores. 17ª Edição. São Paulo, 2015. p. 259-260. 80 CARRAZZA, Roque Antônio. ICMS. Ed. Malheiros Editores. 17ª Edição. São Paulo, 2015. p. 259-260. 81 CARVALHO, Paulo de Barros. Derivação e Positivação no Direito Tributário. Vol. II. Ed. Noeses. São Paulo,2013. p. 109.

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    De fato, nota-se que a Lei Complementar n. 87/96, em seu art. 2o, inciso III82, prevê a

    incidência do “ICMS-Comunicação” sobre “as prestações onerosas de serviço de

    comunicação, por qualquer meio, inclusive a geração, a emissão, a recepção, a transmissão, a

    retransmissão, a repetição e a ampliação de comunicação de qualquer natureza”.

    Não obstante, não pode a lei complementar ampliar ou alterar o núcleo material

    constitucional do “ICMS-Comunicação”, núcleo este que revela o alcance da incidência

    tributária estabelecida pela Constituição Federal. Nesse sentido, cumpre ao intérprete verificar

    que o núcleo material constitucional se refere, sempre, como nos ensina PBC, “a situações

    caracterizadas como prestação de serviço de comunicação, ou seja, apenas e tão somente

    quando emissão, transmissão, retransmissão e recepção de mensagens forem efetuados por

    pessoa diversa do emissor e do receptor”83.Portanto, diante das considerações acima destacadas quanto ao núcleo material

    constitucional do “ICMS-Comunicação”, verifica-se que a incidência do imposto apenas

    ocorrerá quando houver “uma atividade em que, por força de remuneração, um indivíduo (A)

    forneça condições materiais a outro indivíduo (B) a fim de que este se comunique com outra

    pessoa (C), agindo como transmissor da mensagem na relação comunicacional”84, sendo

    imprescindível “a existência de um prestador de serviço tornando possível e intermediando a

    comunicação entre receptor”85

    .

    82 “Art. 2° O imposto incide sobre: (…) III - prestações onerosas de serviços de comunicação, por qualquer meio,inclusive a geração, a emissão, a recepção, a transmissão, a retransmissão, a repetição e a ampliação decomunicação de qualquer natureza;”83 CARVALHO, Paulo de Barros. Derivação e Positivação no Direito Tributário. Vol. II. Ed. Noeses. São Paulo,2013. p. 109-110.84 CARVALHO, Paulo de Barros. Derivação e Positivação no Direito Tributário. Vol. II. Ed. Noeses. São Paulo,2013. p. 109.85 CARVALHO, Paulo de Barros. Derivação e Positivação no Direito Tributário. Vol. II. Ed. Noeses. São Paulo,2013. p. 109. 

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    IV. Análise da incidência do ICMS sobre as operações com “softwares” realizadas

    mediante “download” e “streaming”

    Observadas as considerações acerca do núcleo material constitucional do “ICMS-

    Mercadorias” e do “ICMS-Comunicação”, analisaremos a possibilidade da incidência das

    referidas exações sobre as operações com “softwares”86  realizadas mediante “download ” e

    “streaming”.

    Não obstante, é necessário, primeiramente, tecer algumas considerações relevantes

    acerca do conceito do termo “software”, suas espécies e do contrato de licença de uso que

    rege as suas operações, para em seguida analisar as situações apontadas, conforme se

    demonstrará a seguir.

    IV.I. Breves considerações acerca do conceito de “software”, suas espécies, do contrato

    de licença de uso e dos termos “download” e “streaming”

    De acordo com o art. 1o da Lei n. 9.609/1998 (Lei do Software), o termo “programa

    de computador”, também conhecido como “software”, é definido como: 

    “(...) a expressão de um conjunto organizado de instruções de linguagem natural oucodificada, contida em suporte físico de qualquer natureza, de empregonecessário em máquinas automáticas de tratamento da informação, dispositivos,instrumentos ou equipamentos periféricos, baseados em técnica digital ou análoga,para fazê-los funcionar de modo e para fins de determinados” 87. (g.n.)

    Roque Antônio Carrazza, com suporte no dispositivo legal supramencionado,

    conceitua “software”  como um “bem intangível” que reflete “o conjunto de comandos,

    vertidos em linguagem codificada, que, uma vez dados ao computador88, possibilitam que esta

    máquina funcione e, assim, possa processar informações e realizar tarefas”89.

    Ainda, sustenta o referido doutrinador que o “software” se relaciona com “um bem

    imaterial (de existência abstrata), fruto de trabalho intelectual de pessoas altamente

    86 De acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ), os softwares são um “conjunto deoperações e procedimentos que permitem o processamento de dados de computador e que comandam o seufuncionamento”. (REsp 39.457/SP, Rel. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, PRIMEIRA TURMA,

     julgado em 13/08/1994, DJ 05/09/1994, p. 23040)87 BRASIL. Lei n. 9.609, de 19 de fevereiro de 1998. Dispõe sobre a proteção da propriedade intelectual de

     programa de computador, sua comercialização no País, e dá outras providências. Disponível em:http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L9609.htm. Acesso em: 20 fev 2016.88 No conceito utilizado pelo professor Roque Antônio Carrazza, a expressão “computador” é utilizada no seu

    sentido lato, com o objetivo de alcançar todos os aparelhos que necessitam de um software para funcionar.Assim, o termo “computador” alcança máquinas como elevador, central telefônica, o  personal computer   (PC),entre outros.89 CARRAZZA, Roque Antônio. ICMS. Ed. Malheiros Editores. 17ª Edição. São Paulo, 2015. p. 190. 

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    especializadas – ou seja, criação da inteligência humana”90, sendo possível tipificá-lo como

    “modalidade de direito intelectual”.

    Em sentido semelhante, Rui Saavedra leciona que:

    “O que individualiza o software em relação aos outros instrumentos a serviçoda informação é a sua natureza imaterial, na medida em que ele mesmo éconstituído por informação – a qual não tem substância tangível, e é, em si, um bemimaterial. O software apresenta-se, pois, como um produto, simultaneamente,utilitário e imaterial. Sendo o software um dos chamados ‘bens informacionais’ ou‘produtos de informação’, ele não pode ser objecto duma proteção eficaz contra osactos dos não proprietários. Tal proteção só poderá relevar do Direito Intelectual, ouseja, através da organização de ‘direito de exclusivo’ a favor daqueles que elaboramo software” [g.n.]91.

    Não seria por outra razão que o inciso XII do art. 7o da Lei n. 9.610/199892 (Lei dos

    Direitos Autorais) preceitua que os “softwares” são obras de propriedade intelectual, sendo-

    lhes aplicável a mesma proteção jurídica das obras literárias, nos termos do art. 2o da Lei n.

    9.609/199893. 

    Com efeito, verifica-se que a legislação brasileira atinente ao  “software”  não

    preceitua qualquer distinção acerca de suas espécies, razão pela qual coube à doutrina e à

     jurisprudência, com a finalidade de dirimir controvérsias jurídicas, definir objetivamente os

    diversos tipos existentes de “softwares”.

    De forma objetiva, Rui Saavedra94 classifica os programas de computador, em três

    categorias distintas, sendo elas: (i)  os programas “standard”  (também conhecidos como

    “softwares de prateleira”); (ii) os programas por encomenda (“softwares por encomenda”); e

    (iii) os programas adaptados (“softwares customizados”).

    Acerca dos programas standard (“softwares de prateleira”), Rui Saavedra discorre da

    seguinte forma:

    “Os programas standard constituem, em regra pacotes (packages) de programas bemdefinidos, estáveis, concebidos para serem dirigidos a uma pluralidade deutilizadores – e não a um utilizador particular -, com vista a uma mesma aplicação

    ou função. São, portanto, concebidos para tratamento das necessidades de umamesma categoria de utilizadores (por exemplo, a contabilidade dos escritórios paraadvogados). (...) São programas fabricados em massa e, como são vocacionadosa um vasto público, são até comercializados nos hipermercados – daí quetambém se fale aqui de software “off the shelf ”.”(g.n.)95 

    90 CARRAZZA, Roque Antônio. ICMS. Ed. Malheiros Editores. 17ª Edição. São Paulo, 2015. p. 190-191.91 SAAVEDRA, Rui. A proteção jurídica do software e a internet. Don Quixote. Lisboa, 1998. p. 106-107.92 “Art. 7º São obras intelectuais protegidas as criações do espírito, expressas por qualquer meio ou fixadas emqualquer suporte, tangível ou intangível, conhecido ou que se invente no futuro, tais como: (…) XII - osprogramas de computador;” (g.n.)93 “Art. 2º O regime de proteção à propriedade intelectual de programa de computador é o conferido às

    obras literárias pela legislação de direitos autorais e conexos vigentes no País, observado o disposto nestaLei.”94 SAAVEDRA, Rui. A proteção jurídica do software e a internet. Don Quixote. Lisboa, 1998. p. 29.95 SAAVEDRA, Rui. A proteção jurídica do software e a internet. Don Quixote. Lisboa, 1998. p. 29. 

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    Em situação diametralmente oposta aos “softwares de prateleira” que são elaborados

    em larga escala, verifica-se que os “softwares por encomenda” são criados com o objetivo

    exclusivo de solucionar uma necessidade específica e individual de seus utilizadores. Nessesentido, cabe destacar a doutrina de Saavedra, conforme se infere abaixo:

    “Em todo o mundo, os serviços informáticos das empresas desenvolvem programaspara atender às necessidades internas. Mas, paralelamente, há empresas produtorasde software (as chamadas softwares houses) que fazem programas para os seusclientes conforme o pedido e as solicitações destes, e que visam satisfazer asrespectivas necessidades específicas. Trata-se de “programas aplicacionais”, quegeralmente não se mantém estáveis e acabados como os “programas standard”; pelocontrário, são continuamente adaptados, corrigidos e melhorados pararesponder aos requisitos internos e externos das empresas”96.

    Por último, quanto aos “softwares customizados” (programas adaptados), verifica-se

    que se relacionam como um meio-termo entre os “softwares de prateleira” e os “softwares por

    encomenda”, conforme se observa das valiosas lições de Saavedra:

    “Os programas adaptados ao cliente (customized), constituem uma forma híbridaentre os programas standard e os programas à medida do cliente. Baseiam-se emprogramas standard  que são modificados para se adequarem às necessidades de umcliente particular (customization). Essa adaptação pode ser realizada tanto pelofornecedor do programa como pelo próprio utilizador”97 

    Diante das considerações acima destacadas, cumpre observar que a natureza jurídica

    dos contratos relativos às operações com softwares é regida pelo o art. 9o

      da Lei n.9.609/199898, o qual dispõe, expressamente, que o uso de  softwares  no Brasil,

    independentemente de suas espécies, serão sempre objeto de contrato de licença de uso.

    Isso porque, conforme dito alhures, a legislação brasileira considera o software como

    obra de propriedade intelectual para a qual devem ser aplicados todos direitos de proteção de

    autoria intelectual do produto.

    Dessa forma, a propriedade intelectual relativa a criação do software não será

    transferida, mas tão-somente autoriza-se/concede-se o uso e a fruição do produto.Nesse sentido, Henry Lummertz, com apoio no sólido posicionamento da doutrina

    especializada sobre o tema99, afirma que o contrato de licença de uso do “software”

    96 SAAVEDRA, Rui. A proteção jurídica do software e a internet. Don Quixote. Lisboa, 1998. p. 29-30.97 SAAVEDRA, Rui. A proteção jurídica do software e a internet. Don Quixote. Lisboa, 1998. p. 29-30.98 “Art. 9º O uso de programa de computador no País será objeto de contrato de licença.” (g.n.)99  BARRETO, Aires F. ISS na Constituição e na Lei. 2. ed. São Paulo: Dialética, 2005. p. 136, 137 e 138;CHIESA, Clélio. Competência para tributar operações com programas de computador ( softwares). RevistaTributária e de Finanças Públicas, a. 9, n. 36, jan./fev. 2001, p. 41-53, p. 43, 51 e 52; GONÇALVES, Renato

    Lacerda de Lima. ISS sobre licenciamento ou cessão de direito de uso de programas de computação. InMACHADO, Rodrigo Brunelli. ISS na Lei Complementar nº 116/2003. São Paulo: Quartier Latin, 2004. p. 143;REIS, Emerson Vieira. Não-incidência do ISS sobre licenciamento ou cessão de direito de uso de programas decomputador. Revista Dialética de Direito Tributário, n. 160, jan. 2009, p. 25-34, p. 27. 

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    “corresponde a uma simples cessão do uso, não envolvendo a transferência da titularidade dos

    direitos autorais relativos ao software”.100 

    Em outras palavras, os contratos de licença de uso possibilitam ao usuário

    (licenciado) o direito de uso do software criado pelo licenciador, sem, no entanto, ocorrer a

    transferência da propriedade intelectual referente aos direitos autorais do software.

    Inclusive, nesse sentido é o magistério de Roque Antônio Carrazza ao discorrer

    acerca dos contratos de licença de uso dos softwares, conforme se infere abaixo:

    “Convém acrescentar que nos negócios jurídicos (contratos) realizados comsoftwares não se dá a transferência da propriedade dos direitos imateriais (direitosautorais), mas, sim, a transferência da licença de uso destes mesmos direitos. (...)Portanto, por meio do contrato de licença (licensing) uma das partes transfere à

    outra, gratuita ou remuneradamente, o direito de uso do software do qual é titular.Noutras palavras: permite que terceiro use licitamente esse bem incorpóreo,desde que observados os termos e condições constantes da avença.  (...) Note-se,ainda, que o contrato de licença tanto pode ser celebrado diretamente entre o usuário(licenciado) e o criador do software (licenciador) como por intermédio de umrepresentante que tenha recebido poderes especiais deste último para negociar odireito de uso do referido bem imaterial. (...) É importante também deixarpatenteado que a licença de uso não translada a titularidade jurídica dapropriedade intelectual, vale dizer, dos direitos autorais do software. Insistimosem que o licenciado (ou o sublicenciado) não adquire a propriedade dosoftware, mas apenas o direito de vir a utilizá-lo. Em suma, o objeto da operação

     jurídica praticada com o software não é a venda nem deste bem imaterial nem dosuporte físico, mas o licenciamento dos direitos autorais inerentes ao programa

    de computador.”101

     (g.n.)

    Em sentido semelhante, é o posicionamento de Carlos Alberto Bittar em relação aos

    contratos de licença de uso, conforme se infere abaixo:

    “O contrato de licença (licensing) é aquele através do qual o titular de direitosconcede a outrem o uso do bem, nos fins e pelas condições convencionadas,podendo revestir-se, ou não de exclusividade. Pode, pois, ser celebradodiretamente entre o titular (ou seus representantes) e o interessado, mas também porintermédio de distribuidores, que atuam na colocação aos usuários. Cabe, ainda, narelação entre o criador do programa e a empresa autorizada a comercializá-lo.

    Normalmente, com esse contrato o autor recebe remuneração em função daconcessão de direitos a vários interessados, nos termos de ajustes celebrados comcada um, podendo formar-se, a partir daí redes de distribuição de software, inclusivede âmbito extranacional, mas permanecendo sob o sigilo da fórmula do programa.(...) O contrato deve indicar, com precisão, o bem envolvido, descrevendo-o deforma a individualizá-lo, e enunciar: os usos correspondentes e a respectiva extensãono tempo e no espaço; as finalidades da contratação; a remuneração do titular e omodo de pagamento; os mecanismos de prestação de contas; a possibilidade, ou não,de sublicenciamento e outras cláusulas próprias. (...) Mesmo quando negocia todosos direitos patrimoniais disponíveis, conserva o titular o controle de suacriação, podendo exercer fiscalização sobre os usos concedidos e tomar medidas

    100  LUMMERTZ, Henry. Cobrança de ICMS no download de softwares é prenúncio de conflitos. Consultor Jurídico, 06 jan 2016. Disponível em: http://www.conjur.com.br/2016-jan-06/henry-lummertz-icms-download-software-prenuncio-conflitos. Acesso em: 20 jan 2016. 101 CARRAZZA, Roque Antônio. ICMS. Ed. Malheiros Editores. 17ª Edição. São Paulo, 2015. p. 192-193. 

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    tendentes à proteção de seu interesse, em caso de violação a seus direitos.”(g.n.)102 

    Ainda, observa-se que Correa, Espeche, Zalzuendo e Batto, ao considerarem que o

    software standard (“software de prateleira”) é comercializado de distintas formas (física oueletrônica), também se posicionam no sentido de que, quando a operação é regida por um

    contrato de licença de uso, os direitos de propriedade sobre o software permanecem com o

    licenciador, não ocorrendo transferência de titularidade jurídica na operação, conforme se

    infere abaixo:

    “La naturaleza jurídica de los acuerdos contractuales puede variarconsiderablemente, según el tipo de software transferido, y conforme al alcance delas obligaciones del proveedor: 1) La venta, o más propiamente dicho, la cesión dederechos con respecto al software implica la transferencia de los derechos de

    propiedad que corresponden al proveedor; esta modalidad resulta infrecuente paralos paquetes de software, pero es normal en los contratos para el desarrollo desoftware a medida, conforme al cual el cliente se convierte en el propietario de losprogramas desarrollados; 2) El contrato de licencia es el acuerdo contractual mascomún, particularmente para los paquetes de software. Esta modalidad se basa enla existencia de un derecho de propiedad que es retenido por en el proveedor,mientras autoriza su uso.”103 (g.n.)

    Diante das considerações doutrinárias destacadas acima, nota-se que as operações

    comerciais com softwares podem se relacionar também com a distribuição de

    cópias/exemplares dos softwares mediante suporte físico (o que a doutrina especializada

    comumente denomina de “corpus mechanicum”). Todavia, tais situações não se relacionarem

    com objeto específico do presente estudo, não se confundem com as operações de

    licenciamento de uso do software. Nesse sentido, é a própria doutrina de Saavedra, transcrita

    abaixo:

    “(...) quando o software standard é licenciado - a licença é uma permissão para fazeralgo que de outro modo seria ilícito -, há na verdade dois contratos: por um lado,um contrato para que sejam fornecidas manifestações físicas do software; e poroutro, um contrato para atribuição de uma licença de uso do software. Ocontrato pelo qual o cliente é investido na posse do software será um contrato de

    compra e venda ou de doação se a propriedade sobre os meios físicos for transmitidaao licenciado; se não houver essa transmissão, tratar-se-á de um contrato de locaçãoou, por ventura, de comodato. Mas o contrato de licença subsiste paralelamente, eé importante porque – como veremos – os produtores de software, após aentrega do exemplar de software, continuam preocupados em proteger osdireitos de propriedade intelectual sobre o software por eles criado, e em imporrestrições ao uso do software entregue.”104 (g.n.)

    102 BITTAR, Carlos Alberto. Contratos de comercialização de softwares. In: “Novos Contratos Empresariais”.In: BITTAR, Carlos Alberto (Coord.). Novos Contratos Empresariais. Ed. Revista dos Tribunais (RT). São

    Paulo, 1990. p. 39.103 CORREA, NAZAR ESPECHE, CZAR DE ZALDUENDO Y BATTO. Derecho informático. Ed. Depalma.Buenos Aires, 2008. p. 184/185.104 SAAVEDRA, Rui. A proteção jurídica do software e a internet. Don Quixote. Lisboa, 1998. p. 79-80. 

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    De fato, quando um lojista ou comerciante adquire exemplares físicos de “softwares 

    de prateleira” para revenda, nota-se que ele não está negociando a licença de uso com o

    consumidor, mas tão-somente a venda do suporte físico no qual foi materializada a obra

    intelectual (software). Conforme dito acima, nessa situação deve-se considerar a existência de

    duas espécies de contratos: (i)  um contrato de compra e venda do suporte físico do 

    “software”; e (ii) um contrato de licença de uso do “software” em si.

    Contudo, conforme dito anteriormente, o presente estudo busca analisar a incidência

    do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços de Comunicação

    (ICMS) sobre as operações com softwares realizadas via download (transferência eletrônica

    de dados) e streaming (disponibilização eletrônica de conteúdo ao usuário), as quais, além de

    não envolverem suporte físico para os “softwares”, se relacionam objetivamente com oscontratos de licença de uso.

    De fato, cumpre esclarecer que o termo “download ”, além de se relacionar,

    objetivamente, com uma transferência eletrônica de dados, reflete um ato praticado por um

    indíviduo que consiste em “copiar” para seu próprio computador, de forma gratuita ou

    onerosa, as informações emitidas por um servidor remoto na rede mundial de computadores.

    Por outro lado, “a atividade consistente na transmissão de sinais de imagem e som

    pelo ambiente virtual é denominada streaming”105

    , como bem leciona PBC. Segundo oreferido doutrinador, o streaming “pode desdobrar-se na transmissão pura e simples de

    músicas ou obras televisivas (webcasting) a serem escolhidas pelo consumidor, ou na emissão

    simultânea e inalterada de um programa tradicional de rádio ou televisão (simulcasting)”106,

    sendo que “a diferença reside na possibilidade do usuário escolher a faixa musical ou a

    imagem que deseja ouvir ou ver. Ambas, no entanto, são espécies do gênero streaming,

    conotando todas as características do termo”107.

    Feitas tais considerações, passamos a verificar se as normas jurídicas que pretendeminstituir a tributação do ICMS nas operações com softwares  realizadas via download e

    streaming possuem validade jurídica face ao ordenamento jurídico existente. É o que se passa

    a demonstrar a seguir.

    105 CARVALHO, Paulo de Barros. Derivação e Positivação no Direito Tributário. Vol. II. Ed. Noeses. São Paulo,2013. p. 114.106 CARVALHO, Paulo de Barros. Derivação e Positivação no Direito Tributário. Vol. II. Ed. Noeses. São Paulo,2013. p. 114-115.107 CARVALHO, Paulo de Barros. Derivação e Positivação no Direito Tributário. Vol. II. Ed. Noeses. São Paulo,2013. p. 115. 

  • 8/18/2019 IBET-DF - Alberto Frederico Teixeira Soares Carbonar - Análise Da Incidência Tributária Do ICMS Sobre as Operaçõe…

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    IV.II. Análise da incidência do “ICMS-Mercadorias” sobre as operações com

    “softwares” realizadas mediante “download” e “streaming”

    Conforme demonstrado no item “III.I” do presente estudo, o núcleo material

    constitucional do “ICMS-Mercadorias” se relaciona com o ato jurídico de transferência de

    titularidade de um bem corpóreo, móvel e, principalmente, com destinação comercial.

    Em razão disso, verifica-se, desde já, que as operações com “softwares” via

    “download” e “streaming” não podem ser alvo de incidência do “ICMS-Mercadorias”, na

    medida que não concretizam o núcleo material constitucional da exação.

    Isso porque, conforme demonstrado, as operações com “softwares”, sejam aquelas

    realizadas via “download”  ou “streaming”, são regidas por contratos de licença de uso, as

    quais não transferem efetivamente a titularidade jurídica do bem digital, impossibilitando,assim, a incidência da exação. Nesse sentido é a valiosa lição de PBC, conforme se infere

    abaixo:

    “(...) para que o usuário tenha acesso às mensagens arquivadas no site, celebra-secontrato pelo qual ocorre a cessão de direito de uso das peças audiovisuais. Essacessão possibilita ao consumidor ouvir as músicas e visualizar as imagens na própriapágina (hipótese mais remota), bem como copiar para seu próprio computador asinformações emitidas (hipótese mais corrente). Seja como for, transparecenit