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I SIMPÓSIO BRASILEIRO DE TOXICOLOGIA VETERINÁRIA–
UEL, Londrina, PR
26 de outubro de 2019, 8-10h
Claudio Barros
PLANTAS HEPATOTÓXICAS E NEFROTÓXICAS DE INTERESSE À
PECUÁRIA BRASILEIRA
PLANTAS HEPATOTÓXICAS QUE CAUSAM LESÃO AGUDA
Plantas tóxicas são importantes causas de morte em animnais de
produção no Brasil (Rissi et al. 2007). Dados de vários laboratórios indicam
que aproximadamente 15% das mortes de bovinos no Sul do Brasil são
causadas pela ingestão de plantas tóxicas. Plantas que causam lesões
hepáticas agudas em herbívoros domésticos constituem um grupo
importante de plantas tóxicas. A insuficiência hepática aguda induzida por
essas plantas segue um curso com sinais clínicos, necropsia e achados
histopatológicos muito semelhantes, independentemente da planta
específica envolvida na causa. Assim, na maioria dos casos, é necessária
uma investigação minuciosa para estabelecer qual planta está causando as
mortes. Um conhecimento da distribuição e epidemiologia dessas plantas
ajuda no estabelecimento do diagnóstico.
Plantas tóxicas que causam lesões hepáticas agudas em animais de
produção no Brasil incluem Cestrum parqui, Cestrum corymbosum, Cestrum
intermedium, Cestrum laevigatum, Xanthium cavanillesii, Vernonia
molissima, V. rubricaulis, Sessea brasiliensis, Dodonea viscosa e Trema
micrantha (Quadro 1). A ingestão espontânea de Trema micanthra em
equinos resulta em uma doença neurológica (ver palestra de 27/10/19 às
8h neste evento, e também Lorenzett et al. 2017).
Esta apresentação pretende ser uma fonte de informação para ajudar
no diagnóstico diferencial de doenças hepáticas agudas causadas pela
ingestão de plantas hepatotóxicas em animais de produção.
Epidemiologia
Nas condições naturais, herbívoros de várias regiões do Brasil são
afetados por plantas desse grupo. Vernonia mollissima e Sessea brasiliensis
causam doenças em bovinos de áreas limitadas no Centro-Oeste e Sudeste,
respectivamente. Embora Vernonia mollissima seja observadoa no sul do
estado do Rio Grande do Sul (RS), a intoxicação em animais não é relatada
nessa região. As intoxicações por Cestrum corymbosum, Cestrum parqui,
Cestrum intemedium, Dodonea viscosa e Xanthium cavanillesii causam
doenças apenas em animais de produção nos estados do sul. A doença
causada pela ingestão de Vernonia rubricaulis é relatada na região
pantaneira de MT e MS. A intoxicação por Cestrum laevigatum ocorre no
sudeste, centro-oeste e nordeste, mas em locais diferentes de Sessea
brasiliensis, V. mollissima e V. rubricaulus. A intoxicação por Dodonea
viscosa é descrita apenas na região litorânea do RS.
As taxas de morbidade e mortalidade são variáveis (5-30%) e a
letalidade é próxima a 100%. Embora os surtos geralmente estejam
associados à escassez de forragem e fome, há exceções, já que foi relatada
a intoxicação por Cestrum parqui em boas pastagens. Trema micrantha é
palatável para bovinos e a intoxicação por Xanthium cavanillesii ocorre após
inundações de pastagens, o que induz a brotação da planta. Além disso,
restos de lavoura contendo frutos fragmentados de Xanthium cavanillesii
causam a toxicose quando misturadas com cereais (como soja e sorgo)
colhidos mecanicamente e fornecidos ao gado.
As condições que favorecem o aparecimento de surtos de intoxicação
por Vernonia rubricaulis em bovinos em MS são medidas de manejo
agrícolas que induzem o surgimento da planta (queima ou desmatamento
nos piquetes e transporte de gado de outras fazendas, mudando-os de um
piquete para outro na mesma fazenda), e uma alta taxa de lotação. É
relatado que bois de tração, após um dia de trabalho duro, são
especialmente propensos à intoxicação por Cestrum intermedium.
Quadro 1. Algumas hepatotoxinas que causam lesões hepáticas agudas em
animais de produção
Fonte da
hepatoxina
Espécies
afetadas
Princípio tóxico
Lesão hepática
principal
Comentários
Xanthium
spp.
.
Bovinos, ovinos,
suínos
Carboxatractilosídeo
Necrose
centrolobular ou
massiva
Ocorre depois de fortes
chuvas
Cestrum
parqui Bovinos
Carboxatractilosídeo
Necrose
centrolobular
Hemorragias nas serosas,
edema da parede da
vesícula biliar.
Cestrum
corymbosou
m
Bovinos Não determinado
Necrose
centrolobular
O mesmo que acima
Cestrum
intermedium Bovinos
Não determinado
Necrose
centrolobular
O mesmo que acima
Dodonea
viscosa Bovinos
Não determinado
Necrose
centrolobular
O mesmo que acima
Sessea
brasiliensis Bovinos Não determinado
Necrose
centrolobular
Experimentalmente pode
causar doença crônica
Cestrum
laevigatum Bovinos
Saponinas,
cestrumide
Necrose
centrolobular
Experimentalmente pode
causar doença crônica
Vernonia
molissima Bovinos e ovinos Não determinado
Necrose
centrolobular
Também ocorre degeneração
do epitélio tubular renal
Vernonia
rubricaulis Bovinos Não determinado
Necrose
centrolobular
Os surtos ocorrem na
temporada de chuvas
Perreyia
flavipes
(mosca-
serra)
Bovinos, ovinos e
suínos
Pergidina e
lofirotomina
Necrose
centrolobular ou
massiva
Intoxicação por larvas de
insetos
Sinais clínicos
Plantas que causam lesões hepáticas induzem sinais clínicos
semelhantes, independente da espécie de planta. Os sinais clínicos
aparecem logo (12 a 16 horas) após a ingestão e seguem um curso agudo
(Quadro 2) de 4-72 horas. Os principais achados incluem anorexia, apatia,
focinho seco, baba, taquicardia, taquipneia, redução ou parada dos
movimentos ruminais, tenesmo e desidratação; as fezes geralmente são
secas com estrias no sangue e recobertas por uma película de muco. Sinais
como tremores musculares generalizados, andar descoordenado,
hiperexcitabilidade, agressividade e paralisia de membros pélvicos têm sido
frequentemente relatados. Nos estágios terminais, podem ser observados
movimentos de pressão da cabeça contra objetos, convulsões, ranger de
dentes, cegueira, decúbito e movimento de pedalagem com os membros;
esses sinais são ocasionalmente interpretados erroneamente como parte de
uma doença primária do sistema nervoso central (SNC). Há elevação da
atividade sérica das enzimas hepáticas, -glutamil transferase (-GT),
fosfatase alcalina (FA) e alanina aminotransferase (ALT). Embora as taxas
de letalidade sejam geralmente próximas a 100%, animais menos
severamente afetados podem se recuperar.
Quadro 2. Início e evolução dos sinais clínicos (em horas) em bovinos nas intoxicações
agudas por plantas hepatotóxicas
Planta Aparecimento dos sinais
clínicos após ingestão
Evolução
Cestrum laevigatum 15-24 6-48
Cestrum parqui 4 48-52
Cestrum corymbosum 9-10 5-11
Cestrum intermedium 9-17 18-74
Sessea brasiliensis 12 12-36
Vernonia molíssima 15-29 20-34
Vernonia rubricaulis 24 24
Xanthium cavanillesii 12-22 24
Dodonea viscosa 13-45 3-19
Trema micrantha 16-67 37-72
Patologia
Os achados da necropsia incluem ascite, hemorragias subcapsulares no
fígado e na superfície serosa de várias vísceras; o conteúdo do cólon e do
reto está seco, coberto por uma fina película de muco e tingido por estrias
de sangue coagulado.
As lesões mais marcantes e típicas ocorrem no fígado, que está
aumentado de volume e com acentuação do padrão lobular. Esse padrão
pode ser observado na superfície capsular, mas é mais evidente na
superfície de corte como áreas pálidas alternando-se com áreas vermelhas
deprimidas. As áreas vermelhas deprimidas correspondem à necrose e
hemorragia. Outros achados significativos incluem vesícula biliar distendida
com parede edemacia e hidropericárdio.
Histologicamente, há graus variáveis de necrose coagulativa e
hemorrágica do centro lóbulo hepático. Os hepatócitos da região mediozonal
apresentam-se vacuolizados (degeneração hidrópica e gordurosa) e os da
periferia do lóbulo são mais ou menos preservados. Em outros casos,
dependendo da intensidade da dose tóxica, o lóbulo inteiro é afetado por
necrose coagulativa massiva. Embora o grau de necrose no lóbulo varie de
caso para caso (e pareça ser dose-dependente), todos os lóbulos de um
fígado tendem a estar envolvidos igualmente exceto na intoxicação por
Vernonia spp. em que a borda do lobo hepático esquerdo do bovino afetado
está macroscopicamente amarela de forma mais ou menos homogênea
(sem marcação lobular). No entanto, microscopicamente, nessas áreas, há
necrose centrolobular, mas faltam congestão e hemorragia.
O princípio ativo em Cestrum laevigatum, Sessea brasiliensis e
Cestrum corymbosum é cumulativo. Na toxicose produzida pela ingestão de
Vernonia mollissima e Vernonia rubricaulis, podem ocorrer lesões
degenerativas do epitélio tubular renal; necrose de neurônios do córtex
telencefálico foi relatada em bovinos intoxicados experimentalmente por
Trema micrantha.
Os motivos para a distribuição centrolobular de lesões causadas por
hepatotoxinas incluem: (1) oxigenação relativamente mais baixa no centro
do lóbulo hepático do que na periferia e (2) uma alta concentração de
enzimas do sistema oxidase de função mista do citocromo P450. Essas
enzimas fazem a biotransformação de substâncias não tóxicas em
metabólitos tóxicos. Susbstâncias que não necessitam essa
biotransformação tendem a produzir necrose periportal.
Os sinais nervosos apresentados pelos animais afetados são atribuídos
a alterações no ciclo da ureia (hiperamonemia) devido à insuficiência
hepática, uma condição conhecida como encefalopatia hepática. No entanto,
o edema intramielínico característico encontrado na encefalopatia hepática
em bovinos (Barros et al. 2006) não é encontrado nas hepatotoxicose
agudas em bovinos (Tessele et al. 2012).
Diagnóstico
O diagnóstico diferencial inclui doenças causadas por outras
hepatotoxinas e doenças primárias do SNC. A distribuição geográfica das
plantas tóxicas ajuda a determinar qual planta está envolvida.
A ingestão das larvas de Perreyia flavipes (mosca serra) causa doenças
clínicas e lesões em ruminates e suínos semelhantes àquelas produzidas
pela ingestão de plantas tóxicas que causam doença hepática tóxica aguda
(Tessele et al. 2012). Microcystis aeruginosa, a alga verde-azulada que
cresce em lagos e lagoas, produz microcistina, uma causa bem
documentada de lesões semelhantes em bovinos e outros herbívoros. Esse
tipo de intoxicação ainda não foi relatado em animais no Brasil, embora
tenha ocorrido um infeliz acidente com várias mortes devido à toxicose por
microcistina em seres humanos em tratamento por hemodiálise (Azevedo et
al. 2002).
As doenças primárias (raiva, meningoencefalite necrosante por herpes
bovino e babesiose cerebral por Babesia bovis) e secundárias do SNC
(encefalopatia hepática) também devem ser incluídas na lista de
diagnósticos diferenciais. A congestão centrolobular crônica (insuficiência
cardíaca congestiva) confere ao fígado um aspecto macroscópico de noz-
moscada. O fígado de noz-moscada é morfologicamente semelhante
(embora patogeneticamente bastante distinto) ao padrão de acentuação
lobular induzido por hepatotoxinas agudas e deve ser diferenciado dele.
Referências
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PLANTAS HEPATOTÓXICAS QUE CAUSAM LESÃO CRÔNICA
(FIBROSE)
Plantas que contêm Alcaloides pirrolizidínicos (APs)
Introdução
As hepatotoxicoses crônicas de interesse pecuário no Brasil
encontram-se resumidas no Quadro 3. Inicialmente trataremos das espécies
de Senecio, Crotalaria e Echium plantagineum, plantas que contêm APs.
Epidemiologia
No sul do Brasil Senecio spp. (Asteraceae) é responsável por cerca de
50% das mortes causadas por plantas tóxicas e por aproximadamente 7%
de todas as mortes em bovinos. A intoxicação é causada por muitas
espécies, incluindo Senecio brasiliensis, Senecio selloi, Senecio cisplatinus,
Senecio heterotrichius, Senecio leptolobus, Senecio oxyphyllus e Senecio
tweediei (Panziera et al. 2018). Episódios de intoxicação também ocorrem
nos estados de Santa Catarina, Paraná e São Paulo, causados
principalmente por Senecio brasiliensis (Gava & Barros 1997).
A ingestão de espécies de Senecio é mais provável durante o inverno,
de maio a agosto, quando a planta brota, com maior concentração de APs.
Os casos clínicos são principalmente observados na primavera,
provavelmente como conseqüência da ingestão da planta no final do outono
e inverno. No entanto, surtos da intoxicação também podem ocorrer no
verão ou no outono; isto, sem dúvida, está relacionado ao potencial longo
tempo decorrido entre a ingestão e o aparecimento de sinais clínicos.
A intoxicação geralmente não ocorre em áreas onde ovelhas pastam,
uma vez que ovelhas são menos suscetíveis e controlam a população de
plantas nas áreas infestadas do Rio Grande do Sul. Bovinos de diferentes
idades podem ser afetados, mas a intoxicação é observada com mais
frequência em vacas adultas.
A intoxicação pode ocorrer também pela ingestão de feno ou silagem
contaminada por Senecio spp. (Barros et al. 1992, Barros et al. 2017).
Apesar da maior resistência das ovelhas e do importante papel delas
no controle da planta, foram relatados surtos de intoxicação por Senecio em
ovinos transferidos para piquetes severamente infestados por Senecio spp.
(Giaretta et al. 2014b).
Os cavalos raramente são afetados pela intoxicação por Senecio spp.,
mas alguns poucos surtos foram relatados no sul do Brasil (Gava & Barros,
1997, Panziera et al. 2017).
Echium plantagineum (Boraginaceae) é uma planta que germina no
outono e floresce na primavera. Ocorre no Rio Grande do Sul em pastagens
cultivadas e culturas de inverno (por ex., aveia, trigo), principalmente no
primeiro ano após o plantio. A planta é palatável, principalmente quando
em brotação. A intoxicação é relatada em bovinos, mas é rara. Apesar da
ampla distribuição da planta, existe apenas um surto descrito no Brasil
(Méndez et al. 1985). A intoxicação ocorre com pouca frequência porque a
planta normalmente possui uma baixa concentração de APs.
Crotalaria retusa (Leguminoseae) é a planta tóxica mais importante
para equídeos no nordeste do Brasil. A intoxicação crônica em cavalos
também foi causada por sementes de Crotalaria juncea no estado de Minas
Gerais. Bovinos e ovinos também foram intoxicados por Crotalaria retusa no
estado da Paraíba, e a intoxicação em bovinos por Crotalaria incana foi
documenttada em MS (Leal et al. 2019)
A ingestão dessas plantas contendo APs causa doença hepática
progressiva com lesões e sinais clínicos característicos e, eventualmente,
morte, geralmente semanas ou meses após a ingestão. Mortes esporádicas
durante o ano inteiro também podem ocorrer. A morbidade é variável, entre
1% e 30%, e a taxa de letalidade é quase 100%.
Sinais clínicos
Os sinais clínicos em bovinos são variáveis. Um quadro clínico comum
inclui encefalopatia hepática com depressão ou excitação, marcha
descoordenada, agressividade, tenesmo, diarreia e ocasionalmente prolapso
retal. Os bovinos com esses sinais normalmente morrem em 24-96 horas
após o início dos sinais clínicos. Existe um curso clínico mais protraído, onde
o gado apresenta perda progressiva de peso, com ou sem diarreia. Os sinais
clínicos podem não aparecer por dois meses ou mais após a ingestão da
planta. Outros sinais são ascite, fotossensibilização, icterícia, edema
subcutâneo das pernas e pescoço e edema da conjuntiva (Giaretta et al.
2014a)
Os sinais clínicos em ovelhas são semelhantes aos do gado e a
fotossensibilização é frequentemente observada (Giaretta et al. 2014b).
Algumas ovelhas mostram sinais de intoxicação por cobre com icterícia,
anemia e hemoglobinúria.
Os sinais clínicos em cavalos são perda de peso, às vezes por 3-4
meses, depressão, icterícia fotossensibilização e sinais nervosos. Os sinais
nervosos são embotamento, hiperexcitabilidade, pressão da cabeça contra
objetos, andar compulsivo, andar em círculos, ataxia e dismetria,
convulsões e coma terminal. Alguns cavalos mostram comportamento
frenético e galope violento e incontrolável. Cavalos com sinais nervosos têm
um período de manifestação clínica de 7-15 dias. A maioria dos cavalos
perde peso por um período de 30-60 dias antes da observação dos sinais
nervosos.
Patologia
Na necropsia, bovinos e ovinos apresentam edema do mesentério e
das paredes do abomaso e do intestino e ascite. O fígado está firme
esbranquiçado ou amarelado. A vesícula biliar está distendida com parede
edemaciada e, em cerca de 30% dos casos, pólipos de 2-3 mm são
encontrados na mucosa.
Nos cavalos, o fígado é duro e esbranquiçado ou amarelado. O padrão
lobular aumentado é observado em alguns casos, enquanto noutros há
pequenos nódulos brancos na superfície de corte. O edema do mesentério e
cavidades é comum (Panziera et al. 2018).
As lesões histológicas do fígado, características da intoxicação por APs,
são hepatomegalocitose, fibrose difusa e proliferação de ductos biliares. Em
alguns animais são observados nódulos regenerativos constituídos por
hepatócitos aparentemente normais. Diferentes padrões de degeneração e
necrose de hepatócitos estão presentes. A degeneração esponjosa (status
spongiosus) é observada no SNC de bovinos e ovinos afetados. Essa lesão é
caracterizada pela vacuolização da substância branca, principalmente na
substância branca subcortical, cápsula interna, tálamo e colículos. Nos
cavalos, a encefalopatia hepática é caracterizada pela presença de
astrócitos aumentados de volume, com núcleos vesiculares, denominados
astrócitos Alzheimer tipo 2, encontrados principalmente no córtex cerebral e
núcleos basais (Panziera et al. 2017).
Os compostos tóxicos de Senecio spp., Echium plantagineum e
Crotalaria spp. são APs. APs são agentes alquilantes que causam
megalocitose, com grandes aumentos no tamanho do núcleo e citoplasma
da célula, o que provavelmente resulta de um efeito antimitótico com
síntese continuada de DNA, já que os hepatócitos tentam substituir aqueles
que sofreram necrose. A morte dos hepatócitos é seguida por fibroplasia e
proliferação de células do ducto biliar. A insuficiência hepática pode causar
icterícia, fotossensibilização, edema e encefalopatia hepática, causada pela
ação de amônia e outras substâncias no sistema nervoso central, causando
edema intramielínico.
Diagnóstico
O diagnóstico é baseado em informações epidemiológicas, sinais
clínicos e observação das lesões histológicas características do fígado.
O intervalo de tempo entre a ingestão e o aparecimento de sinais
clínicos deve ser levado em conta, pois a morte pode ocorrer semanas ou
meses após o término da exposição, quando não há mais planta no campo
ou depois que os animais foram movidos para um local onde não ocorrem
essas plantas tóxicas. A determinação da atividade sérica das enzimas
hepáticas, principalmente GGT, e as biópsias hepáticas, podem ajudar no
diagnóstico clínico. As biópsias hepáticas podem ser úteis para detectar e
abater animais afetados antes da ocorrência de sinais clínicos (Barros et al.
2007).
A intoxicação por plantas que contêm APs deve ser diferenciada de
outras doenças causadoras de sinais nervosos, diarreia, perda de peso,
edema, ascite, ou fotossensibilização.
Tephrosia cinerea
Epidemiologia
A ingestão de Tephrosia cinerea (Leguminosae-Faboideae) causa em
ovinos, e provavelmente em cabras, uma doença com ascite progressiva
conhecida como barriga d'água. Tephrosia cinerea é encontrada em todos
os estados brasileiros em solos secos e arenosos. Sua resistência à seca a
torna comum no semiárido brasileiro, onde permanece verde a maior parte
do ano. Não e palatável, mas as ovelhas são forçadas a pastar a planta
durante períodos secos, quando se torna a única forragem disponível.
A intoxicação foi observada durante a estação seca (junho a
dezembro) nos estados do CE, PB e RN, mas provavelmente também ocorra
no semiárido de outros estados do nordeste brasileiro. Quando a estação
seca está avançando, novos casos da doença afetam ovelhas de diferentes
idades, mas geralmente mais velhas que um ano. As taxas de morbidade e
letalidade variam respectivamente de 10%-70% e de 50%-100%. Grandes
quantidades de Tephrosia cinerea, representando 80%-100% da vegetação,
são observadas em todos os piquetes onde a doença ocorre. Se o rebanho é
retirado para outras áreas sem a planta logo que os primeiros sinais clínicos
são observados, a maioria dos ovinos se recupera e novos casos não são
observados (Santos et al. 2007).
Sinais clínicos
Os sinais clínicos são progressivos, com quantidades crescentes de
líquido na cavidade abdominal, anorexia, depressão, dispneia e intolerância
ao exercício. As atividades séricas de AST e GT aumentam e as proteínas
séricas diminuem.
Patologia
Achados de necropsia incluem marcada ascite, hidrotórax e
hidropericárdio. O fígado tem superfície nodular irregular brancacenta e sua
superfície de corte é firme A vesícula biliar está levemente distendida, com
edema discreto na parede e vasos linfáticos dilatados na superfície.
Histologicamente, há proliferação de tecido fibroso nas áreas
periportais hepáticas. A fibrose pode se estender a outras partes do lóbulo
ou conectar-se ao tecido fibroso de outros espaços periportais. Há
proliferação moderada de ductos biliares nas tríades portais, raramente se
estendendo para outras regiões do lóbulo. Nas áreas de fibrose e na parede
da vesícula biliar, os vasos linfáticos e veias estão marcadamente dilatados.
A cápsula hepática está espessada por fibrose com projeções de tecido
conjuntivo para o interior parênquima hepático.
O princípio ativo não foi ainda determinado, mas APs não estão
envolvidos. Grandes quantidades da planta são necessárias para produzir a
doença (Santos et al. 2007).
Diagnóstico
O diagnóstico é feito pelos sinais clínicos, pelas lesões características e
pela presença de grandes quantidades da planta nos piquetes. O
diagnóstico diferencial inclui a intoxicação crônica por Crotalaria retusa em
ovinos.
Quadro 3. Hepatotoxicoses crônicas de interesse pecuário no Brasil
Hepatotoxina
Especies
afetadas
Principio tóxico Lesão característica
Comentários
Plantas
Senecio spp. Bovinos,
equinos e
ovinos
Alcaloides
pirrolizidínicos
Fibrose,
hepatomegalocitose,
hiperplasia biliar
Asociado com
encefalopatía hepática e
ascite. Principal planta
tóxica do Sul do Brasil
Echium
plantagineum
Bovinos Alcaloides
pirrolizidínicos
Fibrose,
hepatomegalocitose,
hiperplasia biliar
Lesões semelhantes ás
da intox. por Senecio
spp. Somente um surto
descrito no Brasil.
Crotalaria spp. Equinos e
ovinos,
caprinos,
bovinos
Alcaloides
pirrolizidínicos
Fibrose,
hepatomegalocitose,
hiperplasia biliar
Especies envolvidas: C.
juncea y C. retusa. Nos
equinos ocorrem lesões
pulmonares.
Tephrosia
cinerea
Ovinos Indeterminado
Fibrose subcapsular e
periportal em ponte
Ocorre no semiárido do
Nordeste brasileiro
Micotoxinas
Aflatoxina Suínos,
cães,
aves,
bovinos
Bisfuranocumarinos
Fibrose,
hepatomegalocitose,
hiperplasia biliar
Também pode causar
enfermidade aguda
Aflatoxicose
Aflatoxicose é raramente relatada em herbívoros no Brasil. Um surto
de aflatoxicose crônica foi descrito em bezerros no RS, causando uma
mortalidade de 15% (Pierezan et al. 2010). Os sinais clínicos incluíam
diarreia, pelos ásperos, cólica, tenesmo e prolapso de reto. Os bezerros
afetados que sobreviveram, permaneceram subdesenvolvidos. Os achados
de necropsia e histopatologia eram muito semelhantes aos encontrados na
intoxicação por de Senecio spp. em bezerros.
A toxicose foi reproduzida em bezerros (Pierezan et al. 2012)
permitindo concluir que doses de aflatoxina B1 de 500 ± 100 na ração não
causam alterações patológicas ou diminuição da produtividade em bezerros
mantidos em condições experimentais, mas podem causar alterações
bioquímicas séricas mínimas. Doses de aflatoxina B1 de 1.250, 2.500 e
5.000 ppb na ração causam doença hepática crônica em bezerros mantidos
em condições experimentais (Pierezan et al. 2012).
Referências
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PLANTAS HEPATOTÓXICAS QUE CAUSAM FOTOSSENSIBILIZAÇÃO
Introdução
Plantas hepatotóxicas comumente associadas à
fotossensibilização incluem Lantana spp., Brachiaria spp., Panicum
spp., Myoporum laetum, Stryphnodendron spp., Enterolobium spp.
(Quadro 4)
Epidemiologia
No Brasil, a intoxicação por Lantana spp. (Verbenaceae) foi relatada
em bovinos pela ingestão de Lantana camara, Lantana tiliaefolia e Lantana
glutinosa (Riet-Correa et al. 1984). Ovelhas também são suscetíveis à
intoxicação que ocorre principalmente em animais transportados para áreas
invadidas pela planta, mas também pode ocorrer em animais famintos
(Riet-Correa et al. 1984). Nos surtos de intoxicação por Lantana spp., a
morbidade é variável, mas a taxa de letalidade é alta, próximo a 100%.
A intoxicação por Brachiaria spp. (Poaceae) está associada com as
espécies Brachiaria decumbens, Brachiaria humidicola, Brachiaria brizantha,
Brachiaria ruziziensis e afeta bovinos, ovinos, caprinos, búfalos e cavalos
em qualquer época do ano. Afeta principalmente cordeiros e bezerros antes
ou logo após desmame. Ovinos são mais suscetíveis que bovinos e animais
jovens (cordeiros e bezerros) são mais suscetíveis que adultos (Riet-Correa
et al. 2011). A intoxicação também pode ocorrer em animais lactentes com
menos de 15-30 dias de idade, sugerindo que a toxina possa ser eliminada
no leite. Os animais introduzidos pela primeira vez em pastagens de
Brachiaria spp. são mais suscetíveis do que os criados em pastagens
infestadas. Não está esclarecido se essa resistência é devida à adaptação do
animal à toxina ou à seleção genética devido à morte de animais
suscetíveis. O surgimento da planta após queima ou seca parece aumentar
a toxicidade. A intoxicação também é frequente em animais introduzidos em
pastagens não pastejadas por mais de 30 dias. Pastagens com talo de
grama curto por paastoreio continuado parecem ser menos tóxicas. O
conteúdo de saponina de Brachiaria spp. é maior durante a sementação do
que em outros estágios (Riet-Correa et al. 2011).
As taxas de morbidade e letalidade são variáveis, exceto em alguns
surtos em ovinos em que a letalidade pode chegar perto de 100%. Surtos
de fotossensibilização ocorrem frequentemente em cavalos em pastagens
de B. humidicola (Barbosa et al. 2006); as outras espécies de Brachiaria
não são normalmente pastejadas por cavalos.
Um surto de fotossensibilização foi descrito em ovinos jovens (com
menos de 1 ano de idade) num pasto de Panicum dichotomiflorum no
Nordeste brasileiro (Riet-Correa et al. 2009). Surtos de fotossensibilização
raramente são observados em bovinos em pastorieo de Panicum maximum.
Muitas espécies de Myoporum (Myoporaceae) são tóxicas para bovinos
e ovinos. Cavalos e porcos também são suscetíveis à intoxicação. A
intoxicação por Myoporum laetum ocorre quando bovinos ou ovinos ingerem
folhas de galhos ou árvores caídos após tempestades ou poda. A ingestão
pode ocorrer também pelo consumo de folhas de árvores, principalmente
durante tempestades quando o animal procura abrigo ou depois de ser
transportado para um novo local. No Brasil, a intoxicação por Myoporum
laetum foi relatada em ovinos no Rio Grande do Sul durante o inverno.
Stryphnodendron spp. são árvores da família Leguminosae-
Mimosoideae. Stryphnodendron coriaceum causa distúrbios digestivos e, em
alguns animais sobreviventes, fotossensibilização. A intoxicação foi relatada
em bovinos nos estados do PI, MA, TO e CE. Stryphnodendron obovatum
causa aborto, doenças digestivas e provavelmente fotossensibilização em
bovinos nos estados de SP, MS, MT, GO e MG. Os bovinos ingerem as
vagens dessas árvores quando elas caem durante o período seco.
As vagens de diferentes espécies de Enterolobium (Leguminosae),
incluindo Enterolobium gummiferum, Enterolobium contortisiliquum e
Enterolobium timbouva, causam distúrbios digestivos, aborto e
fotossensibilização em bovinos. No Brasil, a intoxicação por vagens de
Enterolobium contortisiliquum foi relatada nos estados da BA, RS, MS e SP.
A intoxicação por vagens de Enterolobium gummiferum foi relatada no
estado de MG, e a intoxicação por vagens de Enterolobium timbouva foi
relatada em SP e MS. A intoxicação ocorre quando os animais ingerem as
vagens caídas de agosto a novembro. A intoxicação também foi relatada em
cabras na PB, causando diarréia e aborto, mas não fotossensibilização.
Sinais clínicos
Nos ruminantes, os primeiros sinais clínicos são anorexia, hipotonia ou
atonia ruminal, depressão, fezes secas. Em alguns casos agudos, há edema
de declive no tecido subcutâneo. Os animais podem deitar-se por longos
períodos. Posteriormente, há fotossensibilização (Leal et al. 2017) com
dermatite da pele pouco pigmentada ou em áreas sem pelos, incluindo face,
orelhas e região perineal. Corrimento e salivação ocular e nasal também são
observados. Icterícia é comum. Alguns animais mostram irritabilidade,
coceira intensa nas regiões afetadas e movimentos contínuos da cabeça e
cauda. Opacidade da córnea e cegueira são observadas em casos
avançados. Nos casos agudos, principalmente em ovinos intoxicados por
Brachiaria spp., alguns animais morrem na fase aguda da doença, antes de
observarmos fotossensibilização. Após 4-5 dias, a pele fica seca, espessa e
com fissuras. As lesões cutâneas podem ser complicadas por miíase. A
superfície ventral da língua pode ulcerar devido à exposição ao sol durante
a lambedura frequente do nariz. O período de manitestação clínica é
variável; alguns animais morrem em 5-7 dias, mas outros sobrevivem até
60 dias ou se recuperam. A atividade sérica de GT e FA, e as
concentrações séricas de bilirrubina podem aumentar.
Um quadro clínico de perda progressiva de peso e morte após alguns
meses, sem fotossensibilização, foi relatado em bovinos intoxicados por
Brachiaria decumbens (Riet-Correa et al.2011).
Os cavalos intoxicados por Brachiaria humidicola apresentam
dermatite em partes da pele pouco pigmentada, opacidade da córnea,
conjuntivite e hiperemia do casco com separação da pele da coroa (Barbosa
et al. 2006).
Nas intoxicações por Stryphnodendron spp. e Enterolobium spp.,
também são observados abortos e distúrbios digestivos, principalmente
diarreia. Em um estudo experimental com ovinos alimentados por vagens
de Enterolobium contortisiliquum (Pupin et al. 2017), foi demonstrado que
os distúrbios digestivos foram causados por acidose láctica ruminal aguda
devido ao alto teor de carboidratos nas vagens.
Patologia
Achados de necropsia incluem graus variáveis de icterícia, edema
subcutâneo amarelo, principalmente nas pernas, ascite, hidropericárdio,
hidrotórax e fezes secas, às vezes cobertas por sangue ou muco.
Hemorragias podem ser observadas no tecido subcutâneo e nas serosas. O
fígado está aumentado de volume, amarelado ou laranja, às vezes com
padrão lobular acentuado, ou com consistência aumentada. A vesícula biliar
está distendida com a parede edematosa. O rim pode mostrar edema da
pelve e a urina pode ser amarela escura ou marrom (bilirrubinuria)
As lesões histológicas do fígado estão localizadas nos hepatócitos
periportais (necrose, degeneração) ou no sistema biliar (degeneração,
necrose, proliferação de células do ducto biliar (colangite, pericolangite,
fibrose periportal). Na intoxicação por Brachiaria spp e Panicum
dichotomiflorum, cristais ou imagens negativas desses cristais podem ser
encontrados no lúmen de alguns ductos biliares. Na intoxicaçãopor por
Brachiaria spp., macrófagos são frquentemente observados no fígado,
alguns deles também com imagens negativas de cristal em seu citoplasma.
Imagens aciculares de cristal, semelhantes a colesterol, também podem ser
observadas nos rins, em macrófagos espumosos nos linfonodos, baço e
intestino. Na microscopia eletrônica, tais cristais são observados no
citoplasma de macrófagos e hepatócitos (Driemeier et al. 1998)
Em cavalos intoxicados por Brachiaria humidicola, as lesões são
semelhantes às mencionadas anteriormente, mas há uma anisocariose
hepatocelular acentuada e também são observados hepatócitos com 2-3
núcleos (Barbosa et al. 2006).
No fígado de bovinos com fotossensibilização por Enterolobium spp.,
observam-se hepatócitos tumefeitos com citoplasma difusamente
vacuolizado.
Lantana spp. contém os triterpenos Lantadene A e Lantadene B, que
afetam os hepatócitos periportais e causam colestase.
Myoporum spp. contêm furanosesquiterpenos. O mais conhecido
desses compostos é a ngaione, a principal substância tóxica do Myoporum
laetum.
Brachiaria spp. e Panicum spp. contêm saponinas esteroides
litogênicas que causam a formação de cristais no sistema biliar. A hidrólise
das saponinas forma sapogeninas que são conjugadas com ácido
glucurônico, formando glucuronídeos que se conjugam com íons cálcio,
formando sais insolúveis que precipitam como cristais (Riet-Correa et
al.2011).
Diagnóstico
O diagnóstico é baseado nos sinais clínicos, patologia e presença da
planta.
Referências
Barbosa J.D., Oliveira C,M.C, Tokarnia C.H. & Peixoto P.V. 2006. Fotossensibilização
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Riet-Correa F., Mendez M.C., Schild AL., Riet-Correa F. & Silva Neto S.R. 1984.
Intoxicação por Lantana glutinosa em bovinos no Estado de Santa Catarina.
Pesq. Vet. Bras. 4:147-153
Quadro 4. Hepatotoxicoses asociadas a fotossensibilixação hepatógena
Hepatotoxina Espécies
afetadas
Princípio tóxico Lesão
característica
Comentários
Brachiaria spp. Ovinos,
bovinos,
equinos,
búfalos
Saponinas litogênicas
Inflamação e
obstrução do
sistema biliar,
formação de
cristais nos ductos
biliares, necrose
de hepatócitos
Espécies incluem B. decumbens, B.
humidicola, B. brizantha, B.
ruziziensis
Panicum spp. Ovinos Saponinas litogênicas Inflamação e
obstrução do
sistema biliar,
formação de
cristais nos ductos
biliares, necrose
de hepatócitos
Casos de intoxicação por P.
dichotomiflorum relatados em
ovelhas no Brasil
Lantana spp. Bovinos,
ovinos
Lantadene A e
Lantadene B
Hepatocitos
tumefeitos,
bilestase, leve
hiperplasia de
ductos biliares.
As especies incluem L. camara, L.
tiliaefolia, L. glutinosa. Poucos
surtos descritos no Brasil. Lesões
degenerativas também ocorrem no
epitélio dos túbulos renais.
Myoporum laetum Ovinos Furanossesquiterpen
os
Necrose
centrolobular ou
periportal
Só foi descrito um surto no Brasil
Stryphnodendrum
coriaceum
Ovinos Indeterminado Tumefação difusa
dos hepatocitos.
Necrose individual
de hepatócitos
Lesões degenerativas também
ocorrem no no epitélio dos túbulos
renais.
Enterolobium
gummiferum
Bovinos Indeterminado Leve tumefação
de hepatócitos
A intoxicação espontânea é pouco
frequente
Enterolobium
contortisiliquum
Bovinos Indeterminado Necrose
centrolobular de
intensidade
variável
Suspeita-se que saponinas sejam o
princíio ativo
Enterolobium
timbouva
Bovinos Indeterminado Leve tumefação
de hepatócitos
Poucos surtos descritos no Brasil
PLANTAS NEFROTÓXICAS
Introdução
Plantas nefrotóxicas de interesse pecuário incluem Amaranthus spp.,
Thiloa glaucocarpa, Setaria spp., and Metternichia princeps (Quadro 5).
Epidemiologia
Diferentes espécies de Amaranthus (Amaranthaceae) foram
documentadas como nefrotóxicas no Brasil, incluindo Amaranthus hybridus,
Amaranthus quitensis, Amaranthus blitum e Amaranthus retroflexus em
bovinos (Ferreira et al. 1991, Lemos et al. 1993); Amaranthus retroflexus,
Amaranthus quitensis e Amaranthus viridis, em suínos (Salles et al. 1991,
Kommers et al. 1996); e Amaranthus spinosus em ovinos (Peixoto et al.
2003). A planta é conhecida pelo nome comum de caruru.
Em bovinos, a intoxicação ocorre quando os animais são introduzidos
em piquetes intensamente invadidos pela planta, principalmente lavouras
colhidas de soja, sorgo ou melancia, onde grande quantidade da planta
tóxica cresce no piquete. A intoxicação ocorre no outono, quando
Amaranthus spp. está sementando (Ferreira et al. 1991, Lemos et al.
1993). Bovinos de todas as idades são afetados. A morbidade é de 5%-30%
e a taxa de letalidade é próxima a 100%. Os primeiros casos são
observados 5-25 dias após a introdução dos animais em áreas invadidas
pela planta. Novos casos podem ser observados até 7-10 dias após a
retirada do rebanho do pasto infestado por caruru (Ferreira et al. 1991,
Lemos et al. 1993).
Um surto foi registrado em ovelhas no estado do Rio de Janeiro, em
junho, quando o rebanho foi transferido para um piquete onde Amaranthus
spinosus era praticamente a única fonte de alimento para os animais
(Peixoto et al. 2003). Suínos também podem ser intoxicados se a planta for
consumida em grandes quantidades (Salles et al. 1991, Kommers et al.
1996).
Thiloa glaucocarpa (Combretaceae) é encontrada na caatinga de todos
os estados do Nordeste brasileiro e em Minas Gerais. Surtos da intoxicação
em bovinos ocorrem no início da estação das chuvas (10-25 dias após as
primeiras chuvas). Os bovinos ingerem as folhas de Thiloa glaucocarpa
apenas por alguns dias (5-8 dias) após o surgimento da planta. A incidência
da doença varia de ano para ano; se a estação chuvosa começa com chuvas
fortes e contínuas, a incidência da intoxicação é menor, mas se as chuvas
são escassas, a incidência é maior (Tokarnia et al. 1981).
Após chuvas intermitentes, Thiloa glaucocarpa brota mais rapidamente
do que outras plantas, ficando mais disponível para o pastoreio.
A queima e o desmatamento da caatinga são responsáveis por um
aumento na frequência da doença, porque Thiloa glaucocarpa desenvolve
raízes e renasce rapidamente após o corte e a queima (Tokarnia et al.
1981).
A intoxicação por Setaria spp. (Poaceae) ocorre quando animais
famintos não adaptados à ingestão de plantas contendo oxalato são
introduzidos em pastagens de Setaria spp. (Schenk et al. 1982). No Brasil,
a intoxicação foi relatada em vacas lactantes em um pasto de Setaria
anceps cv Kazungula (Schenk et al. 1982).
A intoxicação espotânea por Metternichia princeps (Solanaceae) só foi
descrita em caprinos (Caldas et al. 2011), mas foi reproduzida
experimentalmente em ovinos e bovinos (Caldas et al. 2012). Embora a
planta tenha ampla distribuição na mata atlântica, do RJ até a BA, casos da
intoxicação espontânea só foram descritos no RJ (Caldas et al. 2011).
Sinais clínicos
Os sinais clínicos em bovinos incluem depressão, anorexia, diminuição
ou ausência dos movimentos ruminais, secreção nasal sero-hemorrágica e
diarréia com sangue. Os animais se deitam por longos períodos e mostram
incoordenação quando movidos. Há emagrecimento, inquietação e decúbito,
e os animais morrem 3-10 dias após a observação dos primeiros sinais
clínicos (Ferreira et al. 1991, Lemos et al. 1993).
Na intoxicação por Thiloa glaucocarpa edemas subcutâneos são
observados, principalmente na região glútea, mas também nas regiões
perineal, supramamária, abdominal, escrotal e prepucial (Torres et al.
1997).
Na bioquímica sérica observam-se altos níveis de uréia e creatinina,
hipocalcemia, e hiperfosfatemia, alterações sugestivas de insuficiência
renal.
Patologia
Os achados da necropsia incluem hemorragias petequiais das
superfícies serosas e tecido subcutâneo, ascite, hidrotórax e lesões
ulcerativas no esôfago, laringe, traquéia, intestino e abomaso. Os rins são
pálidos, edematosos e amarelados. Edema perirrenal também é comumente
observado (Ferreira et al. 1991, Lemos et al. 1993, Torres et al. 1997).
Ao exame histológico, há necrose do epitélio tubular, cilindros hialinos
ou granulares e dilatação e regeneração tubulares (Ferreira et al. 1991,
Lemos et al. 1993, Torres et al. 1997). Na intoxicação por Setaria spp.,
numerosos cristais de oxalato são observados nos túbulos (Schenk et al.
1982).
As toxina responsável pela ação nefrotóxica de Amaranthus spp. e
Metternichia princeps são desconhecidas. Os compostos tóxicos de Thiloa
glaucocarpa são taninos (Itakura et al. 1987). Setaria spp. contêm altas
concentrações de oxalatos. Os oxalatos se ligam ao cálcio, formando
complexos insolúveis que se depositam nos rins, formando cristais
refringentes que causam nefrose. Bovinos que ingerem plantas contendo
oxalato tornam-se gradualmente resistentes ao efeito tóxico dessas
substâncias, provavelmente pela adaptação das bactérias ruminais (Schenk
et al. 1982).
Os achados de necropsia e histopatgológicos na intoxicação por
Metternichia princeps são semelhantes (Caldas et al. 2011, 2012) aos da
intoxicação por Amaranthus spp. e Thiloa glaucocarpa.
Diagnóstico
O diagnóstico é baseado em dados clínicos e epidemiológicos,
principalmente na presença da planta, e pela observação de necrose tóxica
aguda no exame histológico. Para o diagnóstico da intoxicação por Thiloa
glaucocarpa, a ocorrência após as primeiras chuvas na caatinga é uma
informação muito importante. A análise bioquímica ajuda no diagnóstico de
insuficiência renal.
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Pesq. Vet. Bras. 1:111-132.
Quadro 5. Plantas nefrotóxicas que afetam animais de produção no
Brasil
Planta Espécies
afetadas Princípio tóxico Lesão principal Comentários
Amaranthus
spp.
Bovinos,
ovinos, suínos Não determinado
Necrose tubular
tóxica aguda
Doses altas da planta são
necessárias para
intoxicação, que ocorre
no outono, na
sementação
Thiloa
glaucocarpa Bovinos Taninos
Necrose tubular
tóxica aguda
Surtos 10-25 dias após as
primeiras chuvas Os
bovinos ingerem as folhas
de da planta por apenas
5-8 dias após seu
aparecimento
Setaria spp. Bovinos Oxalatos
Necrose tubular
com deposição
de cristais de
oxalatos
Bovinos que ingerem
plantas contendo oxalato
tornam-se gradualmente
resistentes ao efeito
tóxico dessas substâncias
Metternichia
princeps Caprinos Não determinado
Necrose tubular
tóxica aguda
Intoxicação reproduzida
experimentalmente em
bovinos e ovinos