Em defesa de Sola Scriptura

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  • 8/9/2019 Em defesa de Sola Scriptura

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    Em defesa de Sola Scriptura

    Antes de referir-nos ao artigo traduzido e publicado em apologeticacatolica.org como ttulo "Bblia e Tradio...", convm resumir para evitar mal-entendidos - o queos evanglicos entendem por Sola Scriptura. Digo isto porque embora "SolaScriptura" somente a Bblia - possa tomar-se como uma declarao que nonecessita de comentrios, na realidade no assim. Ocorre mais ou menos comocom a teoria da Relatividade ... que no significa que "tudo relativo". SolaScriptura significa:

    1. Que a Bblia a nica regra infalvel da f (doutrina) e da prtica (costumes).

    2. Que o ensino da Bblia suficiente para que as pessoas aceitem Jesus Cristocomo Senhor e Salvador, e fazendo o que ela diz, alcancem a vida eterna.

    Corolrios:

    1. A Igreja de Jesus Cristo no necessita de revelaes que no se achemexplicitamente ou por lgica e clara implicao na Bblia.

    2. No h outra regra infalvel de f fora das Escrituras.

    Por outro lado, Sola Scriptura NO significa:

    1. Que a Bblia contenha absolutamente tudo o que Deus disse e fez.

    2. Que a Palavra de Deus no se tenha transmitido oralmente em muitas ocasies esituaes histricas.

    3. Que a Igreja carea de autoridade para interpretar, ensinar e defender a Palavrade Deus.

    4. Que toda a tradio no escrita deva ser rejeitada a priori e a fortiori.

    Os cristos evanglicos crem que a Igreja coluna e fundamento da verdade, quedeve ter mestres piedosos e conhecedores das Escrituras, e que muitas tradiesso expresses vlidas da f crist. Aceitam as expresses normativas dos Credosdos primeiros conclios ecumnicos, e tomam seriamente os ensinos dos Padres,assim como dos muitos e muito bons mestres, doutores e comentaristas que Deusdeu Igreja ao longo dos sculos. No crem que a Escritura seja de interpretao

    privada (livre interpretao), mas sustentam o princpio do Livre Exame.

    Se aceitam algumas coisas e rejeitam outras, o fazem com base no que consideramser os ensinos das Escrituras. O ensino da tradio sim, mesmo da suaprpria tradio - , dos conclios, dos Padres, etc, deve conformar-se s Escrituras,que so a Palavra final, inspirada e infalvel de Deus.

    Agora dirijamo-nos ao artigo em questo, e vejamos o quo firmemente estabelecea sua tese, e no final incluirei um resumo das razes bblicas que nos obrigam areafirmar o princpio de Sola Scriptura.

    O autor (Armstrong) reconhece que os Protestantes no ignoram "a importncia e

    validade da histria da Igreja, da Tradio, dos Conclios ecumnicos, ou daautoridade dos Padres da Igreja e destacados telogos. A diferena reside na

    http://www.apologeticacatolica.org/Tradicion/Tradicion01.htmhttp://www.apologeticacatolica.org/Tradicion/Tradicion01.htm
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    relativa posio de autoridade mantida pela Escritura e pelas instituies e decretosda Igreja."

    Note-se que o autor sabe perfeitamente que a diferena fundamental no arejeio de toda outra autoridade alm das Escrituras, ainda que aquela seconsidere subordinada a estas. Contudo, depois se afirma que "A prevalncia dosola Scriptura, de acordo ao pensamento catlico, facilitou uma estendidssimaignorncia e desprezo da histria da Igreja entre os protestantes comuns."

    Suponho que a obscura referncia aos protestantes "comuns" se referir quelesmais ignorantes. Deveria ser bvio que ainda que tal coisa seja verdade, no menos certo que os catlicos "comuns" so to ou mais ignorantes da histria, epor acrscimo das Escrituras. Limitam-se a assentir sem examinar tudo quanto asua Igreja diga que certo. Quanto ao conhecimento da histria entre os catlicos,pois, deve referir-se aos catlicos cultos, que ento deveriam comparar-se com osprotestantes instrudos; e neste caso o suposto desnvel desaparece ou inclusive seinverte.

    "O Catolicismo afirma que a sua Tradio nem mais nem menos que aconservao do ensino de Cristo tal e como foi revelado e proclamado pelosApstolos. Existe um desenvolvimento, mas apenas no sentido de um aumento doentendimento que no na essncia, desta Tradio apostlica. O Catolicismo afirmaser o guardio e custdio do depsito original da f a qual foi uma vez entregue aossantos (Judas 3)."

    Haver que tomar cuidadosa nota deste pargrafo, segundo o qual, e emconformidade com a doutrina catlica, se sustenta que a Tradio que a Igreja deRoma considera inspirada e portanto dotada de suprema autoridade no toda atradio que possa ter essa ou outras igrejas, mas aquelas que remontamdirectamente ao Senhor e aos Apstolos.

    "Deve anotar-se tambm que a palavra escrita e a massa enorme de literatura foipropagada amplamente apenas desde a inveno da imprensa por volta de 1440.Desse modo, essa palavra escrita no pde ter sido a principal transmissora doevangelho durante pelo menos catorze sculos. Os cristos anteriores no tempo Reforma Protestante aprenderam sobretudo atravs das homilias, dos sacramentos,da liturgia e seu calendrio anual, das festas crists, das prticas devocionais,instruo familiar, arquitectura eclesial e outro tipo de arte sacra que reflectiatemas bblicos. Para todos esses crentes, o sola Scriptura teria sido claramente umaabsurda abstraco de impossvel colocao em prtica."

    Eis aqui uma falcia repetida at exausto pelos apologistas catlicos. to bviaque deveria pelo menos dar-lhes vergonha de repeti-la. A existncia de milhares demanuscritos bblicos indica que, por muito tempo, os cristos puderam fazer para sicpias de parte ou de toda a Bblia, mas este no o ponto.

    Os protestantes no afirmam que a Palavra escrita tenha sido o principal veculo detransmisso, mas que a fonte definitiva da Verdade revelada. Por ela possvel

    julgar as homilias, os sacramentos, a liturgia, etc. A questo se a nossa pregaoe as nossas prticas so conformes s Escrituras, no se cada cristo que existiutinha uma Bblia. Portanto, o argumento alm de falacioso irrelevante.

    "Apenas um preconceito prvio contra tal noo ou uma indevida fixao na

    rejeio por parte de Cristo do corrupto, tradies humanas farisaicas, poderiacegar algum perante a considervel fora dos dados escriturais. Dito de outraforma, a Escritura no ensina o sola Scriptura, um conceito que se baseia no uso de

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    um documento (a Bblia) contrariamente ao que o prprio documento testemunhaexplcita e implicitamente."

    A isto se responde no final.

    " absurdo para qualquer cristo desdenhar o que Deus ensinou a milhes deoutros cristos ao longo dos sculos."

    No posso interpretar este pargrafo seno como um profundo preconceito contraos evanglicos. Quem ter dito a este bom senhor que em conjunto desprezamosos santos e os sbios do passado? A questo no essa, isto no o que sediscute. O que est em jogo a norma final de autoridade: Bblia ou Bblia maistradio apostlica.

    Note-se que aqui se contrape Sola Scriptura com "o que Deus ensinou a milhesde outros cristos ao longo dos sculos." Aqui deixa transparecer -involuntariamente, suponho - a verdadeira origem e natureza da tradio catlica,

    a saber, a religiosidade popular das massas. Porm, esta tradio secular NO aque nominalmente defende Roma, j que teoricamente esta ltima tradio no foidada s massas nem ao longo de sculos, mas proviria directamente do Senhor edos seus Apstolos, que a receberam num intervalo de dcadas. Contudo, naprtica Roma confunde uma com outra, e de facto atribui sano dominical eapostlica a coisas que provm da religiosidade popular.

    "No Novo Testamento, em primeiro lugar, encontramos um testemunho bem clarodo facto de que a Escritura no contm todo o ensino de Cristo. Presumivelmenteningum negaria isto, mas os Protestantes costumam negar que qualquer dos Seusensinos no recolhidos na Escritura poderiam ter sido fielmente transmitidosoralmente pela primitiva tradio apostlica."

    No existe razo a priori para negar que alguns ensinos do Senhor que no estonas Escrituras poderiam ter-se transmitido por tradio oral. Deus soberano, epode fazer as coisas como a Ele lhe aprouver. No corresponde a nenhum serhumano dizer a Deus como fazer melhor as coisas... O problema surge quandoqueremos determinar a este respeito qual foi a vontade de Deus.

    certo que a investigao histrica sugere que alguns ditos de Jesus poderiam ter-se conservado fora do Novo Testamento (por exemplo, Joachim Jeremias, "Palabrasdesconocidas de Jess", trad. cast., Salamanca: Sgueme, 1979). Mas isto porsua prpria natureza duvidoso, e em todo o caso no afecta as doutrinas centraisdo cristianismo.

    Por outro lado, a prpria Bblia d testemunho do pouco confivel que a tradiooral no mdio ou longo prazo. "Por isso o dito se propagou entre os irmos queaquele discpulo no morreria, mas Jesus no disse que no morreria..." (Joo21:23). Joo obviamente corrige aqui, por escrito, uma tradio oral errnea.

    Ora bem, segundo o dogma romano, o depsito da tradio apostlica oral ficoufixado no primeiro sculo, e no possvel tirar nem acrescentar nada a ele (aindaque se admita a noo de "desenvolvimento" to habilmente proposta pelo CardealNewman). Ainda que a Igreja de Roma tenha apelado a tal suposta Tradio oralapostlica (como ao duvidoso "consenso unnime dos Padres) para definir algunsdogmas, o protestante se pergunta e o catlico deveria perguntar-se - o

    seguinte: por que estranha razo nos sculos decorridos desde o tempo dosApstolos, a Igreja de Roma no determinou e enunciou os limites precisos da

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    tradio que diz zelosamente guardar? Por certo, as pretenses do romanismopoderiam tomar-se mais seriamente se o Papa por si ou mediante uma comissorealizasse tal tarefa. At que se demonstre o contrrio, cabe pensar que a tradioapostlica oral no mais real do que o traje novo do imperador.

    O nosso apologista romano apela depois aos seguintes "textos de prova":

    "Marcos 4:33 E lhes anunciava a Palavra com muitas parbolas como estas . . .

    Em outras palavras, como se entende, muitas parbolas no esto recolhidas naEscritura"

    O Evangelho de Marcos no apresenta seno nove do total de 46 parbolas deJesus que se acham nos Evangelhos. Portanto, lgico pensar que Marcos se referes outras 35, e portanto a afirmao que "muitas parbolas no esto recolhidas naEscritura" gratuita.

    "Marcos 6:34 . . . e comeou a ensinar-lhes muitas coisas.

    Nenhuma destas muitas coisas est reflectida a

    Joo 16:12Ainda tenho muito que vos dizer; mas vs no o podeis suportar agora.

    Talvez, este muito foi falado durante as suas aparies depois da Ressurreio, squais se alude em Actos 1:2-3 (ver mais abaixo). Muito poucos destes ensinos seguardaram por escrito, e aqueles que o foram, contm apenas mnimos detalhes."

    Se o Novo Testamento conclusse com os Evangelhos, o argumento baseado nestestextos e em Actos 1:2-3 teria algum mrito. Contudo, os Apstolos evidentementereceberam e ensinaram "muitas coisas" que no se acham nos Evangelhos masesto registadas nos Actos, nas Epstolas e no Apocalipse. Em outras palavras,cerca da metade do Novo Testamento est dedicada a estes ensinos. O romanistase v obrigado a ocultar este facto to evidente para buscar apoio para a sua tese.

    "Joo 20:30 Jesus realizou em presena dos discpulos muitos outros sinais queno esto escritos neste livro."

    Aqui se esqueceu do contexto, ao qual reconhece tanta importncia na hora derefutar os evanglicos. O versculo 31 continua: "Mas estes foram escritos para quecreiais que Jesus o Cristo, e para que, crendo, tenhais vida em seu nome." Nem opropsito de Joo nem o de nenhum dos Sinpticos parece ser proporcionar umregisto exaustivo. O mesmo vale para Joo 21:25. Ao que parece o Esprito Santono o considerou necessrio. Alm disso, a afirmao de Joo refere-se somente aoquarto Evangelho, que como bem sabido muito parco quanto aos milagres doSenhor, enquanto os sinpticos contm muitos outros sinais que fez Jesus.

    "Se a qualquer protestante evanglico instrudo se lhe pede que defina, segundo aBblia, qual a coluna e fundamento da verdade, seguramente responderia: "aprpria Bblia, claro". Mas no entanto a Escritura no se pronuncia assim; declara,em perfeito acordo com o Catolicismo e em oposio ao sola Scriptura:

    . . . a Igreja do Deus vivo, coluna e fundamento da verdade. (1 Timteo 3:15)

    Outras tradues da Bblia vertem fundamento como bastio, baluarte, ou pilar."

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    Os evanglicos instrudos conhecem certamente esta passagem, como tambmaquela de Efsios que diz que a Igreja se edifica sobre o fundamento dos apstolose dos profetas, sendo o prprio Jesus Cristo a sua pedra angular. De modo que noignoram que a Igreja de Deus coluna (stylos) e baluarte (edraioma) da verdade.Antes o afirmam. A igreja deve defender a Verdade, que se acha na Palavra deDeus. No h contradio alguma com o princpio de Sola Scriptura.

    " bastante evidente que esta passagem [2 Timteo 3:16] no fornece nenhumargumento acerca de que a Sagrada Escritura, sem a Tradio, a nica regra def; porque ainda que a Sagrada Escritura seja til para estes fins, no obstante nose diz que seja suficiente."

    Aqui o apologista romano se enreda com as suas palavras, pois ele j reconheceuque os protestantes em conjunto NO ensinam que as Escrituras sejam a nicaregra de f. Do contrrio, rejeitaramos todos os credos, conclios, catecismos, e defacto tudo o que no fosse o prprio texto da Escritura. O que afirmamos,sustentamos e defendemos que a regra suprema, final, inapelvel. Todas as

    demais devem conformar-se s Escrituras e subordinar-se a elas.

    "O Apstolo busca a ajuda da Tradio (2 Tessalonicenses 2:15)."

    Significativamente, este texto menciona-se mas no se cita: "Assim que, irmos,estai firmes e retende a doutrina que haveis aprendido, seja por palavra ou porcarta nossa."

    Paulo no busca aqui uma ajuda extra da tradio, mas exorta os tessalonicenses areter a doutrina que receberam oralmente ou por escrito. No h nenhuma razopara pensar que o que Paulo ensinava oralmente fosse diferente do que expressoupor escrito no conjunto das suas epstolas. Por exemplo, quando fala do homem dopecado uns versculos antes, no mesmo contexto, pergunta: "No vos lembrais quequando eu estava convosco vos dizia isto?" Em outros termos, est a colocar porescrito o que j tinha ensinado oralmente. Alm disso, naquelas coisas que noresultam bvias das epstolas por exemplo, o que detm o "mistrio dainiquidade", v. 5-7 os intrpretes catlicos no se acham em melhor posio doque os protestantes. Por exemplo, Lorenzo Turrado escreve: "Quanto aoobstculo a problemtica ainda maior. No possvel precisar a natureza desseobstculo ou impedimento que est a deter a manifestao do Anticristo"(Profesores de Salamanca - Biblia Comentada; Madrid: BAC, 2 Ed., 1975, vol. VIb, p. 360). Mas esta afirmao incompreensvel se, como afirma a Igreja Catlica,ela conservou os ensinos no escritos dos Apstolos!!! Bastaria olhar para odepsito da tradio apostlica em vez de fazer ociosas conjecturas. Mas a Tradiooral falha miseravelmente justamente onde seria mais necessria.

    "Mais ainda, o Apstolo faz aqui referncia s Escrituras que Timteo tinhaaprendido na sua infncia. Ora, uma boa parte do Novo Testamento no foi escritona sua meninice: algumas das Epstolas Catlicas nem sequer tinham sido escritasquando So Paulo escreveu isto, e nenhum dos livros do Novo Testamento estavampostos ento no cnon dos livros da Escritura. Ele se refere, ento, s Escrituras doAntigo Testamento, e se o argumento desta passagem prova alguma coisa, queas Escrituras do Novo Testamento no eram necessrias para a regra de f. necessrio sublinhar que esta passagem no fornece prova alguma da inspirao devrios dos livros da Sagrada Escritura, inclusive dos que so admitidos como tais..porque no se nos diz.. quais so os livros ou pores da Escritura inspirados."

    No h muita dvida de que Paulo se refere primariamente ao Antigo Testamento.No entanto, o nosso amigo catlico confunde as coisas suponho queinvoluntariamente com o seu argumento. A declarao de Paulo diz respeito

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    natureza das Escrituras. No uma declarao respeitante ao cnon, ou seja, lista dos livros que se consideram inspirados. semelhana de Jesus, quando disseaos judeus que esquadrinhavam as Escrituras, d-se por adquirido que existia umconjunto definido e conhecido de livros que eram inspirados. De novo, Paulo serefere ao valor da Escritura. Na medida em que aos livros que preservam o ensinoapostlico e hoje formam o nosso Novo Testamento se lhes reconhece o status de

    Escritura, se lhes aplica igualmente e sem nenhuma dificuldade o dito por Paulo aTimteo.

    Todo o resto do argumento, como o apelo a Efsios 4:11-15, se assanhainutilmente com uma noo alheia ao princpio de Sola Scriptura, a saber, que anorma nica e exclusiva e que o ministrio docente da Igreja carece de valor. Oapologista perde o seu tempo ao tentar convencer-nos do que j cremos... porqueo ensina a Escritura. Isso no significa, como injustificadamente conclui, que oministrio docente e a Escritura estejam ao mesmo nvel: aquele deve submeter-sea esta.

    "1 Corntios 4:6 . . . para que aprendais de ns mesmos a "no ir alm do que

    est escrito", e para que ningum se ensoberbea a favor de um contra outro.... o significado parece bastante claro quando se toma em considerao todo ocontexto (pelo menos os versculos 3-6). Este princpio bsico da interpretaobblica (o contexto) frequentemente abandonado, inclusive por bons eruditos,presumivelmente devido a preconceitos prvios.

    Tem-se simplesmente que ler a frase que se segue ao "texto de prova" para ver oque que So Paulo est a querer dizer. Toda a passagem uma exortao ticapara evitar o orgulho, a arrogncia e o favoritismo, e desta maneira, no tem nadaque ver com a ideia da Bblia e da palavra escrita como algum tipo de padro globalde autoridade acima da Igreja.

    ... Assumindo que ele se est referindo ao Antigo Testamento (tal a interpretaomais directa), isto no provaria, de novo, nada, porque ele no estaria incluindotodo o Novo Testamento, cujo cnon no foi determinado at 397 A.D."

    Sobre esta passagem comenta o P. Lorenzo Turrado:

    "Quanto a no ir alm do que est escrito parece ser uma expresso proverbialpara indicar que em nossas apreciaes no se deve ir alm da norma objectiva, e,neste caso, do que exige a natureza do ministrio apostlico. Alguns autores, noentanto, crem que se trata de uma citao bblica, aludindo a toda a Escritura emgeral, ou a algum dos textos citados anteriormente (cf. 1,19.31; 3,19). Cremosmais provvel a primeira explicao." (o.c, p. 42).

    O contexto da passagem est claramente relacionado com as faces existentes emCorinto, e Paulo estabelece aqui como princpio a validade superior do escrito sobreas opinies humanas ("carnais" segundo 3:1-4).

    Ao dirigir-se aos corntios a propsito das contendas entre faces, So Paulorecomenda que, "como est escrito, o que se gloria, glorie-se no Senhor" (1:31, cf.Jer 9: 23-24). E mais adiante, no mesmo contexto, aconselha "no ir alm do queest escrito." (4:6). Como quer que se veja este versculo, parece claro que paraSo Paulo o escrito tinha um carcter normativo que ia para l dos pareceresindividuais. O facto de que o NT estivesse ento em processo de escrita no nega asua autoridade quando dito processo se completou.

    "Apesar de nenhuma maneira ser evidente que toda a verdade religiosa est numnmero de obras, ainda que sejam sagradas, as quais foram escritas em diferentespocas, e nem sempre formaram um livro; de facto, essa uma doutrina muito

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    difcil de provar . . . uma presuno estabelecida to profundamente no sentirpopular dos protestantes, que um trabalho de grande dificuldade o obter delesum reconhecimento de que uma presuno."

    No h razo para pensar que a Bblia tem "tudo"; os evanglicos afirmam que temtudo o que necessitamos saber em ordem salvao. No existe inconveniente em

    reconhecer o que um facto histrico, a saber, que durante as suas primeirasdcadas desde o baptismo de Jesus at s primeiras epstolas, o cristianismo seproclamou de maneira predominantemente oral (ainda que com base no AntigoTestamento). Tambm evidente que "toda a verdade religiosa" (que incluiriagrandes mistrios sobre o ser de Deus, por exemplo) no se encontra em nenhuma"obra", nem sequer na Bblia, j que a est escrito "as coisas secretas pertencem aYahveh." A questo se realmente existe outra fonte igualmente confivel quesuplemente o que Bblia lhe falta. Os catlicos dizem que sim, mas na hora demostrar a evidncia de tais supostas tradies apostlicas, tudo fica em declaraesvagas e insubstanciais. difcil evitar a impresso de que estamos simplesmenteperante uma tentativa no de estabelecer a verdade, mas de sustentar a posioromana.

    Breve reafirmao do princpio de Sola Scriptura

    curioso que os nossos irmos catlicos, que frequentemente nos criticam quandorecorremos a "textos de prova", neste tema em particular utilizem precisamenteesse enfoque. No entanto, o conjunto do ensino do Novo Testamento nos mostraque:

    [1] Jesus advertiu muito seriamente contra invalidar as Escrituras obrigatrias einspiradas - por causa da tradio oral (Mar 7: 8-9 e par.). No estamos falandoaqui de quaisquer tradies, mas das tradies religiosas piedosamentetransmitidas e conservadas pelos mestres do seu tempo.

    [2] Alm da Sua prpria Palavra de plena autoridade, o Senhor recorreu sempre sEscrituras para decidir qualquer controvrsia.

    [3] Jesus Cristo nunca acusou os judeus de ignorar as tradies orais, mas de nocompreender que as Escrituras davam testemunho d`Ele (Joo 5:39).

    [4] Aos Saduceus, que rejeitavam a tradio oral dos fariseus, o Senhor no lhesreprovou isso, mas sim o desconhecer "as Escrituras e o poder de Deus" (Mar 12:24-27 e par.).

    [5] Os Apstolos e alguns dos seus condiscpulos (como Marcos ou Lucas)consideraram apropriado inspirados seguramente pelo Esprito Santo - pr por

    escrito os seus ensinamentos, como Moiss, Isaas e o resto dos autores humanosdo AT puseram por escrito os seus.

    [6] So Paulo afirma a natureza essencialmente inspirada das Escrituras e a suaabsoluta suficincia quando escreve a Timteo (2 Tim 3: 15-17); o facto de oApstolo se referir ao AT no modifica o seu juzo sobre a natureza da Escrituraquanto ao seu carcter normativo.

    [7] Os escritos apostlicos so considerados "Escritura" (2 Pedro 3: 15-16; 1 Tim5:18 comparado com Lucas 10:7).

    [8] Considera-se louvvel que os que ouviam os Apstolos vissem por si mesmosse a pregao era consistente com o j revelado por escrito no AT (Actos 17:11).

    [9] Ao dirigir-se aos Corntios a propsito das contendas entre faces, So Paulo

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    recomenda que, "como est escrito, o que se gloria, glorie-se no Senhor" (1:31, cf.Jer 9: 23-24). E mais adiante, no mesmo contexto, aconselha "a no ir alm do queest escrito" (4:6). Como quer que se veja este versculo, parece claro que paraSo Paulo o escrito tinha um carcter normativo que ia para l dos pareceresindividuais.

    [10] A prpria Bblia d testemunho do pouco confivel que a tradio oral nomdio ou longo prazo. "Por isso o dito se propagou entre os irmos que aquelediscpulo no morreria, mas Jesus no disse que no morreria..." (Joo 21:23). SoJoo obviamente corrige aqui, por escrito, uma tradio oral errnea.

    Durante um intervalo de cerca de mil anos, o tempo que demorou a formar-se oAntigo Testamento, Deus falou de muitas maneiras e em reiteradas oportunidades,mas foi inculcando no povo judeu o valor das Escrituras. No caso do NovoTestamento, o intervalo entre os ensinos divinos e a sua colocao por escrito foivinte vezes menor. A quantidade e qualidade de informao histrica, doutrinal eprtica do Novo Testamento no pode comparar-se com as tradies orais, muitasvezes duvidosas, que se acham nos escritos dos Padres. O apelo vlido tradio

    nos Padres refere-se compreenso e aplicao da doutrina estabelecidafirmemente nas Escrituras. E, naturalmente, sabemos hoje que apelaram a estatradio interpretativa ... porque eles prprios o puseram por escrito.

    Bnos em Cristo

    Fernando D. Sarav