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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS CURSO DE MESTRADO EM LETRAS Relma Lúcia Passos de Castro Mudo A CONSTITUIÇÃO DE SUJEITOS E SENTIDOS EM CONTEXTOS DE ENSINO-APRENDIZAGEM DE LÍNGUA INGLESA E SEUS REFLEXOS NA PROFISSIONALIZAÇÃO JOÃO PESSOA – PB 2009

Dissertação Ensino Língua Inglesa

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Dissertação Educação

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  • UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARABA

    CENTRO DE CINCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES

    PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM LETRAS

    CURSO DE MESTRADO EM LETRAS

    Relma Lcia Passos de Castro Mudo

    A CONSTITUIO DE SUJEITOS E SENTIDOS

    EM CONTEXTOS DE ENSINO-APRENDIZAGEM DE LNGUA

    INGLESA E SEUS REFLEXOS NA PROFISSIONALIZAO

    JOO PESSOA PB

    2009

  • Relma Lcia Passos de Castro Mudo

    A CONSTITUIO DE SUJEITOS E SENTIDOS

    EM CONTEXTOS DE ENSINO-APRENDIZAGEM DE LNGUA INGLESA E SEUS

    REFLEXOS NA PROFISSIONALIZAO

    Dissertao apresentada ao Programa de Ps-Graduao em Letras, da Universidade Federal da Paraba, para a obteno do Ttulo de Mestre em Letras, na rea Linguagens e Cultura, na linha de pesquisa Discurso e Cultura.

    Orientador: Prof. Dr. Jos Wanderley Alves de Sousa

    JOO PESSOA PB

    2009

  • Responsvel pela catalogao: Maria de Ftima dos Santos Alves-CRB -15/149

    M945c Mudo, Relma Lcia Passos de Castro. A constituio de sujeitos e sentidos em contextos de ensino-

    aprendizagem de lngua inglesa e seus reflexos na profissionalizao/ Relma Lcia Passos de Castro Mudo. Joo Pessoa, 2009.

    124f. :il. Orientador: Jos Wanderley Alves de Sousa. Dissertao (Mestrado) UFPb - CCHLA

    1. Discurso. 2. Ensino-aprendizagem Lngua inglesa. 3. Sujeito.

    UFPb/BC CDU: 82-5(043)

  • Relma Lcia Passos de Castro Mudo

    A CONSTITUIO DE SUJEITOS E SENTIDOS

    EM CONTEXTOS DE ENSINO-APRENDIZAGEM DE LNGUA INGLESA E SEUS

    REFLEXOS NA PROFISSIONALIZAO

    Dissertao apresentada ao Programa de Ps-Graduao em Letras, da Universidade Federal da Paraba, para a obteno do Ttulo de Mestre em Letras, na rea Linguagens e Cultura, na linha de pesquisa Discurso e Cultura.

    Aprovado em _____/_____/2009

    BANCA EXAMINADORA

    ______________________________________________________

    Prof. Dr. Jos Wanderley Alves de Sousa Orientador

    PPGL/UFPB

    ______________________________________________________

    Profa. Dra. ris Helena Guedes de Vasconcelos Examinadora

    UFCG

    ______________________________________________________

    Profa. Dra. Marli Morais de Lima - Examinadora

    UFPB

  • memria do meu pai, Ruy Jos de Castro, com quem

    gostaria de compartilhar este momento.

    minha me, Luiza, e s minhas irms, Regina e Dorinha,

    sempre presentes na minha vida;

    Aos meus filhos Lucas e Alana, razo do meu viver;

    A todos os que acreditam no meu trabalho.

    COM AMOR, DEDICO.

  • AGRADECIMENTOS

    A Deus, pela vida e fora para enfrentar os desafios.

    Ao Prof. Dr. Jos Wanderley Alves de Sousa, pelo interesse, orientao e dedicao sobre o

    tema do trabalho.

    coordenao e aos professores do Programa de Ps Graduao em Letras da UFPB, que

    sempre atenderam, com muita simpatia, aos nossos questionamentos e dvidas.

    Aos alunos e colegas Professores de Lngua Inglesa dos Cursos de Secretariado Executivo e

    Comrcio Exterior da FACAPE bem como aos representantes da VALEXPORT pelas

    informaes cedidas, as quais possibilitaram a realizao da minha pesquisa.

    Ao meu esposo Melquades Eugnio Mudo, pelo seu apoio;

    Aos meus amigos de Garanhuns, Isabel, Helena, Edilma e Gustavo, companheiros de viagens

    e discusses durante o curso.

    Ao meu amigo de todas as horas, Wilson Rolim dos Santos, pelos incentivos e orientaes.

    minha famlia, pela pacincia e aceitao das minhas ausncias necessrias ocorridas no

    perodo deste mestrado.

  • Todo sistema de educao uma maneira poltica

    de manter ou de modificar a apropriao dos

    discursos, com os saberes e os poderes que eles

    trazem consigo.

    (Michel Foucault)

  • RESUMO Em virtude do alargamento de fronteiras comerciais na regio do Vale do So Francisco, o aumento do nmero de escolas de idiomas na cidade de Petrolina-PE, a globalizao e sua repercusso no processo scio-histrico-cultural e o surgimento de empresas de exportao e importao de produtos e servios na regio, a presente dissertao tem como objetivo investigar a importncia do domnio da Lngua Inglesa e seus efeitos de sentido na prtica profissional junto aos alunos e professores de idiomas dos cursos de Secretariado Executivo e Comrcio Exterior da FACAPE no mercado de trabalho no que se refere ao processo de comunicao, seja falado ou escrito. O marco terico centra-se nos pressupostos da Anlise de Discurso, de orientao francesa, que refletem sobre os elementos que movimentam as relaes entre discurso, cultura, histria, sujeito e sentido, como tambm preconiza um quadro terico que os alie Lngua Inglesa e aprendizagem, a fim de que indiquem como o idioma tem influenciado na incluso ou excluso profissional dos sujeitos envolvidos. O corpus discursivo constitudo por um conjunto de sequncias discursivas, obtidas em entrevistas semiestruturadas. Para tanto, foram investigadas as concepes dos alunos e professores no que se referem ao ensino-aprendizagem da Lngua Inglesa e a prtica profissional nos cursos acima citados, bem como as expectativas empregatcias em relao s exigncias do mercado de trabalho de um representante da Empresa VALEXPORT. Cinco alunos dos cursos de Secretariado Executivo e Comrcio Exterior, trs professores da FACAPE que lecionam a disciplina Lngua Inglesa e dois representantes da empresa VALEXPORT foram colaboradores da pesquisa. O resultado apreendido prope, para os alunos, contribuies para uma reflexo crtica dos problemas abordados. Assim, ao compreenderem melhor a dinmica da sociedade em que vivem, podero perceber-se como elementos ativos de fora poltica e capacidade de transformar e, at mesmo, viabilizar mudanas estruturais que apontem para um modelo mais justo de sociedade.

    PALAVRAS-CHAVES: Discurso. Ensino-aprendizagem da Lngua Inglesa. Sujeito. Sentido.

  • ABSTRACT

    Because of the enlargement of commercial frontiers in the region of So Francisco valley, the crescent number of school idioms in Petrolina-PE city, the globalization and its repercussion in the socio-historical-cultural process and the appearance of exportation and importation companies of products and service in the region, the present dissertation has as objective to investigate the importance of English Language domain in Secretariado Executivo and Comrcio Exterior courses at FACAPE in the work market in reference to communication process, spoken or written one. The theoretic guide is centered in Discourse Analysis presupposes, of French orientation, that reflects about the elements which moves the relations among discourse, culture, history, subject and sense, and also it recommends a theoretic board which align them to the English language and the learning, for indicating how the idiom has influenced in the professional inclusion and exclusion of the involved subjects. The discursive corpus is constituted by a set of discursive sequences, obtained in semi-structured interviews. To this, the students and professors conceptions were investigated which refer to English Language teaching-learning and the professional practice in the courses mentioned above, and also the employment expectations in relation to the work market requirements of a VALEXPORT companys representative. Five students from Secretariado Executivo and Comrcio Exterior Courses, three professors from FACAPE who teach English Language and two employees from VALEXPORT Company contributed to the research. The caught result proposes, to the students, contributions to a critical reflection of the mentioned problems. So, by understanding better the society dynamism where they live, could notice themselves as life elements of political force and transforming capacity, and also make structured changes which point to a fairer society. KEY-WORDS: Discourse. English Language teaching-learning. Subject. Sense.

  • SUMRIO

    1 INTRODUO................................................................................................................ 10

    2 NO CERNE DOS ESTUDOS SOBRE A ANLISE DO DISCURSO .............................................................................................................................................15

    2.1 UM BREVE OLHAR DESCRITIVO DO PERCURSO DA ANLISE DO DISCURSO

    .................................................................................................................................................. 16

    2.1.1 Ideologia, sujeito e sentido ...........................................................................................23

    3 A CONSTITUIO DE SUJEITOS E SENTIDOS EM CONTEXTOS DE ENSINO-

    APRENDIZAGEM DE LNGUA INGLESA .................................................................... 29

    3.1 A LNGUA INGLESA NO MUNDO E NO BRASIL: RECORTES HISTRICOS

    ............................................................................................................................................ 35

    3.1.1 O lugar da Lngua Inglesa nos Cursos da FACAPE ................................................ 40

    3.1.1.1 Petrolina: a vocao para as relaes exteriores com os pases de Lngua Inglesa

    .................................................................................................................................................. 42

    3.2 A CARACTERIZAO DOS CURSOS DE SECRETARIADO EXECUTIVO E

    COMRCIO EXTERIOR ....................................................................................................44

    3.2.1 O lugar do Ingls Instrumental nos Cursos de Secretariado Executivo e Comrcio

    Exterior da FACAPE ................................................................................................ 47

    4 A CONSTITUIO DOS SENTIDOS E SUJEITOS: O QUE REVELAM DOS

    DISCURSOS....................................................................................................................... 51

    4.1 SUJEITO-ALUNO ........................................................................................................... 54

    4.2 SUJEITO-PROFESSOR .................................................................................................. 62

    4.3 SUJEITO-EMPRESA ...................................................................................................... 71

    5 CONSIDERAES FINAIS .......................................................................................... 77

    REFERNCIAS..................................................................................................................... 83

    ANEXOS................................................................................................................................ 87

  • 10

    1 - INTRODUO

    Partindo do pressuposto de que aprender uma lngua estrangeira no apenas

    desenvolver competncias lingusticas, mas desenvolver o saber, relacionando-o ao dia a dia e

    profissionalizao, como tambm que, para que se possa utiliz-la como instrumento de

    trabalho, preciso ter um conhecimento mais aprofundado de suas estruturas, vocabulrio e

    boa desenvoltura oral e escrita, que nos propusemos a investigar, pelo vis da Anlise do

    Discurso de linha francesa, a importncia do domnio da Lngua Inglesa e seus reflexos na

    prtica profissional, bem como averiguar at que ponto o idioma tem influenciado para a

    incluso ou excluso dos alunos dos cursos de Secretariado Executivo e Comrcio Exterior da

    Faculdade de Cincias Aplicadas e Sociais de Petrolina FACAPE no mercado de trabalho

    no que se refere ao processo de comunicao, seja falado ou escrito. De forma mais

    especfica, pretendemos:

    Verificar as concepes de alunos e professores sobre o ensino-aprendizagem

    da Lngua Inglesa nos Cursos de Secretariado Executivo e Comrcio Exterior

    da FACAPE, observando seus papis na formao de profissionais;

    Descrever as transformaes histricas no mundo do trabalho e o novo perfil

    de qualificao exigido, gerados por mudanas scio-histrico-culturais e pelo

    processo de estruturao da sociedade, mediante a exigncia do domnio da

    Lngua Inglesa;

    Analisar o papel da Lngua Inglesa como instrumento de comunicao,

    interao e trabalho.

    A escolha do corpus discursivo desta dissertao de Mestrado est relacionada nossa

    prtica de sala de aula. Tal iniciativa surgiu a partir de visitas realizadas s empresas da

    cidade pelos alunos da disciplina Lngua Inglesa IV do curso de Secretariado Executivo da

    FACAPE, que tinham como objetivo fazer um contraponto entre a teoria vivenciada pela

    disciplina em sala de aula e a prtica profissional, os quais revelavam facilidades e

    dificuldades de ascenso na empresa em funo do domnio e do no domnio do idioma, seja

    falado ou escrito. Em tempo e, ao longo da minha experincia na rea educacional como

    professora, pude perceber tambm, por diversas vezes, que a aprendizagem e a prtica da

    Lngua Inglesa tm sido concebidas apenas como uma utilizao de metodologias

  • 11

    audiovisuais, com seu enfoque sobre a lngua como um cdigo composto por um conjunto

    fixo e estvel de regras abstratas e usadas por falantes abstratos e idealizados (SOUZA, 2003

    p. 87). E diante desse novo cenrio global, assistimos cada vez mais os alunos em busca de

    identidade social e cultural em funo de heranas histricas que marcaram o crescimento do

    pas e da regio, como tambm pela introduo da tecnologia administrativa oriunda da era da

    industrializao e do processo da globalizao.

    Com base nas palavras de Orlandi (2002) de que sujeito e sentido se constituem, ao

    mesmo tempo, na articulao da lngua com a histria, em que entram o imaginrio e a

    ideologia, buscamos as respostas para as seguintes problematizaes:

    At que ponto os estudantes dos cursos de Secretariado Executivo e Comrcio

    Exterior da Faculdade de Cincias Aplicadas e Sociais de Petrolina FACAPE

    esto preparados para encarar este mercado de crescente necessidade lingstica.

    Que fatores contribuem para a incluso ou excluso dos mesmos na prtica

    profissional no que se refere ao uso da Lngua Inglesa.

    Que representaes os professores, os alunos e as empresas constroem sobre o

    ensino-aprendizagem do idioma e sua relao com a prtica.

    A Faculdade de Cincias Aplicadas e Sociais de Petrolina FACAPE foi escolhida

    para a nossa pesquisa por ser uma faculdade de mdio porte na regio, uma vez que atende

    um grande nmero de alunos distribudos em oito cursos: Administrao de Empresas,

    Cincias Contbeis, Cincia da Computao, Secretariado Executivo, Economia, Turismo,

    Comrcio Exterior e Direito.

    Participaram da pesquisa cinco alunos, escolhidos aleatoriamente, dos cursos de

    Secretariado Executivo e Comrcio Exterior - ingressantes e concluintes, trs professores da

    FACAPE que lecionam a disciplina Lngua Inglesa - sendo dois substitutos e um efetivo, e

    um representante da empresa VALEXPORT. A opo pelos nmeros acima citados remete ao

    fato de haver, nessa amostra, um quantitativo de depoimentos que contemplam a pesquisa

    proposta.

    O processo de busca e anlises dos dados foram realizados de forma qualitativa e

    descritiva, tendo como referncia os objetivos dessa pesquisa, levando em conta as

  • 12

    subjetividades dos sujeitos envolvidos na investigao e o contexto social no qual esto

    inseridos.

    Nas entrevistas foram investigadas as concepes dos sujeitos acima citados no que se

    referem ao ensino-aprendizagem da Lngua Inglesa e prtica profissional. Especificamente,

    com o sujeito-professor, buscamos informaes sobre sua formao acadmica, titulao,

    tempo de formao, experincia profissional, outras atividades profissionais, metodologia em

    sala de aula, recursos utilizados para o ensino, sistema de avaliao e interao com seus

    alunos. Com o sujeito-aluno, foram colhidos depoimentos, objetivando a coleta de

    informaes sobre dificuldades e receptividade dos mesmos em relao o ensino-

    aprendizagem da disciplina e a prtica profissional. J na entrevista com o sujeito-empresa

    foram investigados os critrios para a contratao de um Secretrio Executivo e/ou um

    bacharel em Comrcio Exterior, as diferenas salariais para quem domina um outro idioma, a

    percepo sobre a relao entre teoria e prtica da Lngua Inglesa e o mercado de trabalho,

    bem como a concepo do mesmo sobre o processo de globalizao.

    Os dados obtidos foram submetidos anlise, realizando operaes de snteses

    descritivas que esclaream os novos paradigmas de formao profissional, bem como de

    incluso e excluso profissional. Para tanto, utilizamos os pressupostos tericos da Anlise do

    Discurso de linha francesa, bem como os gneros discursivos de Bakhtin (2003). Segundo o

    autor, os gneros discursivos so como enunciados que se elaboram no interior de cada esfera

    da atividade humana e que todas essas esferas, por mais variadas que sejam, esto sempre

    relacionadas com o uso da lngua (enunciados orais e escritos), concretos e nicos. Bakhtin

    (2003) ressalta, ainda, que existem dois tipos de gneros: o primrio e o secundrio. Para o

    autor, os gneros primrios so aqueles que esto ligados s relaes cotidianas e que se

    constituem a partir de comunicaes verbais espontneas e mantm uma relao direta com o

    dia a dia. J os secundrios so aqueles que surgem a partir de comunicaes culturais mais

    desenvolvidas, como: atividades cientficas, artsticas, polticas, educacionais, dentre outras.

    Vale ressaltar que, para Bakhtin, tais gneros so interdependentes uma vez que h

    constantemente uma passagem do plano secundrio para o primrio e vice-versa. Segundo

    Bakhtin (2003 p.264), em qualquer corrente especial de estudo faz-se necessria uma noo

    precisa da natureza do enunciado em geral e das particularidades dos diversos tipos de

    enunciados (primrios e secundrios), isto , dos diversos gneros do discurso, pois a sua

    compreenso de fundamental importncia na locomoo das diversas formas de interao

  • 13

    verbal. Nessa perspectiva, o discurso e gneros constituem-se nas estruturas e processos

    sociais, ou seja, o discurso deriva das instituies e os gneros das ocasies sociais

    convencionais.

    O trabalho de pesquisa que aqui apresentamos foi dividido em trs partes abaixo

    descritas, o qual foi estruturado de forma a contemplar os objetivos traados, detendo o olhar

    sobre a bibliografia especfica para o tema escolhido.

    O primeiro captulo apresenta um breve olhar descritivo acerca dos conceitos

    constituintes da Anlise do Discurso de orientao francesa. Dentre outros, nossos

    pressupostos tericos so os conceitos de discurso, de Anlise de Discurso, suas bases

    fundadoras, seus precursores Michel Foucault e Michel Pcheux em suas respectivas fases,

    seu processo histrico, inscrio do sujeito na lngua, a ideologia e a constituio de sentidos.

    Para tanto, nos apoiamos nos estudos realizados por autores como Foucault (2007, 2008),

    Pcheux (1993), Orlandi (2002, 2007), Gregolin (2001, 2007), Veiga-Neto (2005), Brando

    (2004), dentre outros que, com seus olhares discursivos, levaram-nos ao fio condutor desta

    pesquisa.

    O segundo captulo objetiva apresentar uma reviso bibliogrfica sobre a constituio

    de sujeitos e sentidos em contextos de ensino-aprendizagem de Lngua Inglesa luz dos

    estudos culturais e da profissionalizao, abordando as relaes histricas do idioma com a

    educao no mundo e no Brasil, sua invaso no processo de comunicao, a lngua inglesa de

    um ponto de vista discursivo, a inscrio do sujeito nessa discursividade, a identidade, bem

    como o processo de globalizao e sua relao como idioma. Alm desses pressupostos

    tericos, apresentamos um breve olhar sobre a Lngua Inglesa nos cursos de Secretariado

    Executivo e Comrcio Exterior da Faculdade de Cincias Aplicadas e Sociais de Petrolina

    FACAPE uma vez que os mesmos no propem contrapontos e tm em suas matrizes

    curriculares a Lngua Inglesa como disciplinas curricularmente equivalentes, um panorama do

    idioma em Petrolina e no vale do So Francisco, a histria da FACAPE e da Associao dos

    Produtores e Derivados do Vale do So Francisco - VALEXPORT, bem como uma

    abordagem descritiva acerca do Ingls Instrumental na formao de alunos dos Cursos de

    Secretariado Executivo e Comrcio Exterior da FACAPE. Os escritos de alguns nomes

    relevantes, como Coracini (2003), Veiga-Neto (2005), Almeida Filho (2003, 2007), Bakhtin

    (2006), entre outros, enriqueceram a pesquisa e ampliaram o conhecimento sobre os assuntos

    tratados.

  • 14

    O terceiro e ltimo captulo volta-se para a transcrio das entrevistas dos alunos

    ingressantes e concluintes dos cursos de Secretariado Executivo e Comrcio Exterior,

    professores de Lngua Inglesa da FACAPE e representantes da VALEXPOT, bem como suas

    anlises, tendo como referencial as teorias da Anlise do Discurso, a fim de buscar os

    elementos que constituem os sujeitos e os sentidos no contexto da profissionalizao. Para a

    efetivao destas anlises nos baseamos, mais uma vez, nos pensamentos de Foucault (2008)

    Orlandi (2007), Gregolin (2001, 2007), Almeida Filho (2003, 2007), entre outros.

    O resultado da nossa pesquisa no pretende ser absoluto, mas prope um re-olhar

    sobre a questo do ensino-aprendizagem da Lngua Inglesa e sua prtica profissional. Para

    tanto, colocamos olhares discursivos, que propem um (re)pensar sobre a funo do ensino-

    aprendizagem da Lngua Inglesa, uma vez que a mesma constitui Sujeitos e Sentidos e se

    articula com outros campos do saber, da histria, do imaginrio e da ideologia. Com isso,

    esperamos que o resultado deste trabalho possa contribuir para uma maior reflexo sobre o

    processo de ensinar e de aprender uma Lngua estrangeira e que professores e alunos

    questionem e reconstruam suas prticas profissionais, recuperando os vazios tericos,

    propondo superaes e reconstruindo o conhecimento lingstico.

  • 15

    2 - NO CERNE DOS ESTUDOS SOBRE A ANLISE DO DISCURSO A Anlise de Discurso (AD) tem seu ponto inicial no fim dos anos 60, na Frana, por

    meio de uma integrao filosfica e lingustica, caracterizada no s por uma reorientao

    terica da relao entre o lingustico e o extralingstico, como tambm por uma mudana da

    postura do observador em face do objeto de pesquisa. Tem como propsito o debate terico e

    metodolgico do discurso, ou seja, a linguagem como prtica social. Segundo Orlandi (2007,

    p.15) a palavra discurso, etimologicamente, tem em si a ideia de curso, de percurso, de correr

    por, de movimento. Ela afirma ainda que com o estudo do discurso observa-se o homem

    falando (ibid). No ponto de vista de Brando (2004, p.46) o discurso uma das instncias

    em que a materialidade ideolgica se concretiza. O discurso o porta-voz dos

    acontecimentos scio-histrico-ideolgico porque ele veiculado pela linguagem, ou seja, o

    sujeito concebido como essencialmente histrico, pois sua fala sempre produzida a partir

    de um determinado lugar e de um determinado tempo. Nas palavras de Chau (2006):

    A histria o real e o real o movimento incessante pelo qual os homens, em condies que nem sempre foram escolhidas por eles, instauram um modo de sociabilidade e procuram fix-lo em instituies determinadas [...]. Alm de procurar fixar seu modo de sociabilidade atravs de instituies determinadas, os homens produzem ideias ou representaes pelas quais procuram explicar e compreender sua prpria vida individual, social, suas relaes com a natureza e com o sobrenatural. (CHAU, 2006, p. 23)

    A partir desse ponto de vista, podemos dizer que no devemos tomar a histria apenas como

    uma sucesso de acontecimentos, de fatos, nem tampouco como evoluo temporal, mas

    como uma forma dos homens, a partir de determinadas condies, criarem os meios e as

    formas de sua existncia social, econmica, poltica ou cultural. Segundo Fiorin (1990), a

    linguagem cria a imagem do mundo, mas tambm produto social e histrico. O autor diz

    ainda que, medida que os sistemas lingsticos vo se constituindo vo ganhando certa

    autonomia em relao s formaes ideolgicas, entretanto, o componente semntico do

    discurso continua sendo determinado por fatores sociais. Com isso, a formao ideolgica do

    sujeito tem como um de seus componentes uma ou vrias formaes discursivas interligadas e

    materializadas na/pela linguagem em forma de texto.

  • 16

    Para Brando (2004 p.10-11):

    O reconhecimento da dualidade constitutiva da linguagem, isto , do seu carter ao mesmo tempo formal e atravessado por entradas subjetivas e sociais, provoca um deslocamento nos estudos lingsticos at ento balizados pela problemtica colocada pela oposio lngua/fala que imps uma lingustica da lngua. Estudiosos passam a buscar uma compreenso do fenmeno da linguagem no mais centrado apenas na Lngua, sistema ideologicamente neutro, mas num nvel situado fora desse polo da dicotomia saussuriana. E essa instncia da linguagem a do discurso.

    Nessa perspectiva, surgem alguns conceitos. Para Fiorin (1990, p. 77), a Anlise do

    Discurso vai, medida que estuda os elementos discursivos, montando por inferncia a viso

    de mundo dos sujeitos inscritos no discurso. Lucena (2004, p.48) diz que, com o advento da

    AD francesa, o discurso passa a ser visto no s como produo lingustica, mas ainda como

    produo social, produo do imaginrio. Orlandi (2007) ressalta que a Anlise de Discurso

    visa compreenso de como um objeto simblico produz sentidos e que essa compreenso,

    por sua vez, implica em explicar como o texto organiza os gestos de interpretao que

    relacionam sujeito e sentido. Isto posto, podemos dizer que a articulao da lngua com a

    histria, e com ela a materialidade do processo enunciativo que o discurso. Portanto, a

    Anlise do Discurso no pretende instituir uma nova lingustica, mas consolidar uma nova

    alternativa de anlise, um alargamento terico originado de um olhar diferenciado que se

    lana sobre as prticas lingsticas; privilegia em seus estudos a noo de sujeito e de

    interdiscursividade, acrescentando s mesmas as noes de histria e de ideologia. E para dar

    conta de entendermos o processo de construo da Anlise do Discurso, vejamos os caminhos

    percorridos a partir de seus precursores bem como de sua leitura histrica.

    2.1 UM BREVE OLHAR DESCRITIVO DO PERCURSO DA ANLISE DO DISCURSO

    A AD tem como maiores precursores Foucault e Pcheux que desestabilizaram

    certezas sobre a lngua, discurso, sujeito e sentido. Com seus estudos, construram as bases

    para que possamos pensar, hoje, nas relaes entre lngua e discurso, na evidncia dos

    sentidos, nas articulaes da subjetividade com a alteridade no dilogo, na intertextualidade e

    na interdiscursividade.

  • 17

    Michel Foucault foi e continua sendo um dos pensadores mais famosos do Sculo XX

    e suas obras constituem referncia em diversos segmentos sociais, filosficos, esquerdistas,

    tnico-raciais, dentre outros. Pesquisadores desse grande pensador identificam trs fases

    histricas do seu pensamento: a arqueologia, a genealogia e a tica. Vale ressaltar que tais

    fases no so estanques, mas so, segundo Gregolin (2006), etapas que indicam

    predominncias de certos temas, de certas teorizaes. Gregolin (2006, p.53-54) relata

    tambm que:

    O projeto foucaultiano no tinha como objetivo imediato construir uma teoria do discurso suas temticas sempre foram amplas e envolveram as relaes entre os saberes e os poderes na histria da sociedade ocidental e, inserido em vastas problemticas, sua investigao abriu-se em vrias direes: buscou compreender a transformao histrica dos saberes que possibilitaram o surgimento das cincias humanas na sua fase chamada de arqueolgica; tentou compreender as articulaes entre os saberes e os poderes, na fase denominada de genealgica; investigou a construo histrica das subjetividades, em uma tica e esttica da existncia.

    Veiga-Neto (2005), em sua obra Foucault e a Educao, referenda essas fases de

    domnios foucaultianos e as chama de ser-saber, ser-poder e ser-consigo. Nas palavras

    desse autor, no domnio do ser-saber, Foucault faz uma arqueologia dos sistemas de

    procedimentos que tm como finalidade distribuir, fazer circular e regular os enunciados; no

    ser-poder, o poder visto como elemento capaz de explicar como os saberes so produzidos

    e como nos constitumos na relao entre eles. Diz, ainda, que Foucault no s repensa o

    poder como tambm resitua o saber contidos nos discursos, especificamente os das cincias

    humanas e os das disciplinas clnicas; e no ser-consigo trata da relao de cada um consigo

    prprio com o sexo ou por meio do sexo e de como se constitui e emerge a subjetividade,

    ou seja, trata da tica, entendida como a relao de si para consigo.

    Nas palavras de Gadelha (2007), em seu artigo na Revista Educao, Foucault tanto

    mapeia as estratgias de dominao, regulao e controle que substanciam as sociedades

    disciplinares de regulamentao e normalizao, como se esfora para pensar, como podemos

    nos lanar em experimentaes ticas de modos outros de subjetivao (de relao a si), que

    corporifiquem resistncias s tecnologias polticas de poder, inclusive s que caracterizam as

    emergentes sociedades de controle. Em relao educao, o referido autor diz, ainda, que

    Foucault mostra que a figura abstrata do Homem somente passou a existir a partir das

    relaes de Saber-Poder e que sua objetivao, subjetivao normalizao s foram possveis

  • 18

    por meio da disciplinarizao (adestramento, regulao e controle), tornando-o submisso

    governabilidade e til ao sistema capitalista. E pela ao de dispositivo da sexualidade,

    produzia subjetividades (identidades, personalidades, maneira de agir, pensar e sentir)

    enquadrando-o em normalidade ou anormalidade.

    J Michel Pcheux, como j foi referendado no incio deste captulo, funda a Anlise

    do Discurso por meio de sua obra Anlise Automtica do Discurso, na Frana, no final dos

    anos 60 juntamente com o lanamento da revista Langages organizada por Jean Debois.

    Maldidier (2003 p.19) relata que Anlise Automtica do Discurso um livro original que

    chocou lanando, a sua maneira, questes fundamentais sobre os textos, a leitura, o sentido.

    Gregolin (2007) diz que Pcheux constituiu um novo objeto o discurso que diferente de

    enunciado e de texto, que pe o lingustico em articulao com a Histria. Acrescenta ainda

    que a Anlise visa a apreender esse novo objeto, que ela chama de discurso como processo,

    questionando sobre suas condies de produo, a partir do pressuposto de que o discurso

    determinado pelos acontecimentos histricos e sociais que o constituem.

    Isso posto, podemos dizer que Pcheux coloca em cena o discurso como objeto de

    anlise e que esse elemento diferencia-se tanto da lngua, quanto da fala uma vez que o

    discurso evoca uma exterioridade ideolgica e social da linguagem. Orlandi (2007, p. 48) diz

    que a ideologia aparece como efeitos da relao necessria do sujeito com a lngua e com a

    histria para que haja sentido. Diz, tambm, que a ideologia intervm com seu modo de

    funcionamento imaginrio. Nessa perspectiva, a funo da ideologia produzir evidncias,

    pondo o homem na relao imaginria com suas condies materiais de existncia, ou seja, a

    ideologia a condio para a constituio do sujeito e dos sentidos, onde o sujeito

    interpelado por ela para que se produza o dizer. Porm, Orlandi (2007) ressalta que nem a

    linguagem, nem os sentidos e nem os sujeitos so transparentes, uma vez que os mesmos tm

    sua materialidade e se constituem em processos em que lngu, histria e ideologia concorrem

    conjuntamente.

    Orlandi (2007) destaca, ainda, que a proposta de Pcheux para a Anlise de Discurso

    estrutura-se sob trs grandes reas do conhecimento:

    1. Uma teoria da linguagem, fundamentada pelos estudos de Saussure, que se firmam

    no Estruturalismo A LINGUSTICA: interroga a Lingustica pela historicidade,

    que deixada de lado;

  • 19

    2. Uma teoria da sociedade, baseada no Materialismo histrico, atravs dos estudos de

    Marx, relidos por Althusser O MARXISMO: questiona o materialismo

    perguntando pelo simblico;

    3. Uma teoria psicanalista, atravs das ideias de Freud, relido por Lacan A

    PSICANLISE: demarca da Psicanlise pela forma como, levando em considerao

    a historicidade, trabalha a ideologia como materialismo relacionada ao inconsciente

    sem ser absorvida por ele.

    Ainda mais, a partir dos estudos de Pcheux, possvel delimitarmos, tambm, trs

    grandes momentos da AD:

    A AD1 (1969-1975) foi pensada como uma explorao terico-metodolgica de uma

    noo autodeterminada e encerrada em si. Essa noo resulta de uma posio estruturalista

    ps-saussureana e pode ser compreendida como um conjunto de discursos produzidos em um

    dado momento. Esses discursos eram considerados como homogneos e fechados em si.

    Nessa primeira poca, o sujeito foi tratado como assujeitado, mas com a iluso de ser a fonte

    do discurso. Como mostra Gregolin (2006), essa noo de sujeito foi formulada por Pcheux a

    partir de suas leituras das teses de Althusser. As teses althusserianas sobre os aparelhos

    ideolgicos e o assujeitamento propem um sujeito atravessado pela ideologia e pelo

    inconsciente (GREGOLIN, 2006). Dentro desse contexto, Maldidier (2003) afirma que o

    famoso artigo de Althusser foi decisivo para Michel Pcheux uma vez que suas reflexes

    sobre o discurso o levaram exatamente ao ponto de encontro da lngua com a ideologia.

    A lngua natural seria uma base invariante sobre a qual se desdobram os processos

    discursivos. O trabalho de anlise, segundo essa proposta, focalizava cada sequncia

    lingustica como um pr-requisito para a anlise do corpus. As sequncias lingusticas eram

    consideradas neutras. Imputava-se tambm, uma neutralidade sintaxe, considerando que as

    mquinas discursivas constituam unidades justapostas com comeo e fim predeterminados.

    A AD2 (1975-1980) apresenta a noo de Formao Discursiva tomada de

    emprstimo da obra de Michel Foucault em sua obra A Arquelogia do Saber. Nela, Foucault

    (2008, p.82) diz que os sistemas de formao no devem ser tomados como blocos de

    imobilidades, formas estticas, no so coaes originadas do pensamento dos homens ou de

    suas representaes uma vez que esses sistemas residem no prprio discurso. Assim, o autor

    ressalta:

  • 20

    Por sistema de formao preciso, pois, compreender um feixe de relaes que funcionam como regra: ele prescreve o que deve ser correlacionado em uma prtica discursiva, para que esta se refira a tal ou tal objeto, para que empregue tal ou tal obrigao, para que utilize tal ou tal conceito, para que organize tal ou tal estratgia. Definir em sua individualidade singular um sistema de formao , assim, caracterizar um discurso ou um grupo de enunciados pela singularidade de uma prtica. (FOUCAULT, 2008, p.82-83).

    Foucault (2008, p.83) fala, ainda, sobre o papel da formao discursiva:

    Uma formao discursiva no desempenha, pois, o papel de uma figura que para o tempo e o congela por dcadas ou sculos: ela determina uma regularidade prpria de processos temporais; coloca o princpio de articulao entre uma srie de acontecimentos discursivos e outras sries de acontecimentos, transformaes, mutaes e processos. No se trata de uma formao temporal, mas de um esquema de correspondncia entre diversas sries temporais.

    Orlandi (2007) assegura que a formao discursiva se define como aquilo que numa

    formao ideolgica dada - ou seja, a partir de uma posio dada em uma conjuntura scio-

    histrica dada - determina o que pode e deve ser dito. Diz ainda que (2007, p.43-44), a partir

    da, decorre a compreenso de dois pontos:

    A) O discurso se constitui em seus sentidos porque aquilo que o sujeito diz se inscreve em uma formao discursiva e no outra para ter um sentido e no outro. [...] As formaes discursivas, por sua vez, representam no discurso as formaes ideolgicas. Desse modo, os sentidos sempre so determinados ideologicamente. No h sentido que no o seja. Tudo que dizemos tem, pois, um trao ideolgico em relao a outros traos ideolgicos. E isto no est na essncia das palavras mas na discursividade, isto , na maneira como, no discurso, a ideologia produz seus efeitos, materializando-se nele. O estudo do discurso explicita a maneira como linguagem e ideologia se articulam, se afetam em sua relao recproca. As formaes discursivas podem ser vistas como regionalizaes do interdiscurso, configuraes especficas dos discursos em suas relaes. O interdiscurso disponibiliza dizeres, determinando, pelo j-dito, aquilo que constitui uma formao discursiva em relao a outra. B) pela referncia formao discursiva que podemos compreender, no funcionamento discursivo, os diferentes sentidos. Palavras iguais podem significar diferentemente porque se inscrevem em formaes discursivas diferentes.

    Assim, o discurso se constitui a partir de outros discursos determinado por outros

    dizeres, ou seja, pelo interdiscurso. As palavras derivam seus sentidos a partir das Formaes

    Discursivas que se inscrevem e a Formao Discursiva constitui-se de outras formaes

    discursivas, de elementos que vm de seu exterior, ao que Pcheux denominou de pr-

  • 21

    construdo. Nesse momento de formulao terica, aparece tambm no interior das reflexes a

    noo de interdiscurso. O interdiscurso designa o espao discursivo e ideolgico no qual se

    desenvolvem as formaes discursivas em funo de relaes de dominao, subordinao,

    contradio (GREGOLIN, 2001, p.18). Para Orlandi (2007) o interdiscurso significa a relao

    do discurso com a multiplicidade de discursos, representa a alteridade (o outro), a

    historicidade. Porm, a noo de sujeito discursivo permanece como efeito de assujeitamento

    formao discursiva com a qual ele se identifica.

    A AD3 (1980) a fase em que se opera a desconstruo da noo de maquinaria

    discursiva caracterizada pela heterogeneidade dos discursos e marcada pela noo de

    polifonia e de intertextualidade. Estabelece-se o primado terico do outro sobre o mesmo; a

    ideia de homogeneidade atribuda noo de condies de produo do discurso

    definitivamente abandonada; a ideia de estabilidade banida em funo do reconhecimento

    da desestabi1izao das garantias scio-histricas; h o reconhecimento da no neutralidade

    da sintaxe; a noo de enunciao passa a ser abordada e as reflexes sobre a heterogeneidade

    enunciativa levam discusso sobre o discurso do outro. Enfim, so colocadas vrias

    interrogaes sobre o sujeito do discurso, o espao de memria e sobre a Anlise do Discurso

    em si, enquanto procedimento de anlise e, at mesmo, sobre a possibilidade de redefinio de

    uma poltica da Anlise do Discurso.

    Todas essas indagaes, os conceitos acrescentados e os reformulados abriram

    caminho para que a formulao terica da Anlise do Discurso tivesse continuidade aps a

    morte de Pcheux, em 1983. A partir dos anos 80, portanto, a AD entra em uma nova fase. Os

    estudos desenvolvidos por Mikhail Bakhtin, acerca do dialogismo trazem para o seio da

    Anlise de Discurso, a noo de Heterogeneidade Enunciativa. A linguagem no mais

    concebida como homognea, mas stio de conflitos de vrias vozes, concordantes ou

    discordantes.

    O dialogismo, a partir dessa fase, constitui-se como um princpio, que se manifesta no

    discurso atravs do interdiscurso, no mbito do inconsciente, que se manifesta no discurso

    atravs da polifonia e no texto atravs da intertextualidade. Ele polifnico, uma vez que

    portador de vrias vozes enunciativas (CHARAUDEAU e MAINGUENEAU, 2004). Ou

    seja, o sujeito deixa de ser visto como voz unitria para ser heterogneo, disperso, plural.

  • 22

    A noo de heterogeneidade enunciativa traz para a AD novos questionamentos, novos

    rumos, novos olhares. Traz a noo de sujeito NO e DO discurso. Vale salientar a grande

    colaborao dos estudos de Benveniste nesta questo da subjetividade na linguagem. Foi ele,

    atravs dos estudos sobre pronomes, o primeiro a evidenciar a presena do sujeito na

    linguagem, ou melhor, a presena do eu. No entanto, o eu benvenistiano em muito difere

    do sujeito da AD, pois um eu localizvel na superfcie textual, o sujeito denominado de

    sujeito no discurso, o qual podemos encontrar atravs do uso da primeira pessoa do discurso.

    Um eu relacionado a um tu.

    O sujeito da AD est inscrito em todo o discurso, mesmo que no seja localizado

    atravs de marcas lingusticas, na superfcie textual. o sujeito do discurso, constitutivo da

    discursividade. Dentro dessa perspectiva Authier-Revuz (1990) apresenta uma diviso da

    heterogeneidade enunciativa:

    Heterogeneidade Constitutiva essa constitui o discurso. Est relacionada ao

    sujeito do discurso, que mesmo no sendo localizvel na superfcie textual,

    est l, uma vez que o discurso seja qual for, produzido por sujeitos histrico

    e ideologicamente marcados. A heterogeneidade constitutiva , pois,

    constitutiva da linguagem;

    Heterogeneidade Mostrada corresponde s possibilidades de localizao de

    marcas do outro no discurso, seja atravs de elementos marcados na superfcie

    textual (discurso direto, aspas, citao) ou atravs de elementos tidos como

    scio-culturais, como a ironia que pode ou no ser percebida, dependendo do

    conhecimento prvio do sujeito-leitor. A heterogeneidade mostrada pode estar

    relacionada noo de sujeito no discurso.

    Reafirmamos, ento, que a AD no trabalha com o texto nele mesmo, mas com o

    discurso, com o movimento dos sentidos. A partir desse olhar, o analista preocupa-se com as

    condies de produo de cada discurso, com a historicidade, a memria, os equvocos, as

    falhas, os esquecimentos e com os silncios constitutivos de sentidos. Essa forma de os

    sujeitos produzirem sentidos, em se filiando s formas discursivas que j esto a, faz parte do

    jogo discursivo que os sujeitos assumem, ao empregarem a lngua na vida social. As

    enunciaes dos sujeitos que, ao enunciarem, esto empenhados em significar os

    acontecimentos de sua existncia histrica, so sempre novas, sempre outras, mas somente

    so possveis se, em conformidade com as regras de uso da lngua que configuram campos,

  • 23

    gneros e tipos discursivos como formulaes discursivas atravs das quais se representam

    modos de organizao da sociedade.

    Atualmente, a AD se inscreve em uma renovao em nvel internacional. No Brasil, somente

    comeou a ter espao a partir da dcada de 80, em funo do fim da ditadura militar. A partir

    da, surgiram grandes pesquisadores brasileiros a exemplo de Eni Orlandi e Rosrio Gregolin

    que realizam consagrados trabalhos acadmicos. Sua origem difere da Frana, mas tem como

    premissa os estudos concebidos por seus precursores. Ferreira (2007) diz que, no incio, a

    Anlise do Discurso era criticada pela Lingustica e acusada de no dar importncia lngua

    uma vez que a mesma se fixava anlise de discursos polticos. No entanto, esse conceito

    mudou em virtude do grande leque de interesse dos objetos que os analistas brasileiros

    pesquisam na rea das cincias humanas e sociais. Ferreira (2007) assegura ainda que:

    Da matriz francesa ficou, o legado de Michel Pcheux, -a relao de nunca acabar que ganhou desdobramentos e deslocamentos importantes e decisivos para a manuteno ainda hoje desse campo terico com prestgio que desfruta entre ns. (FERREIRA, 2007, p.21)

    Nesse sentido, podemos afirmar que a problemtica da discursividade surgida com as

    contribuies da Anlise do Discurso prope o entendimento de um plano discursivo que

    articula linguagem e sociedade, entremeadas pelo contexto ideolgico e que a AD busca, em

    sua essncia, gestos de interpretao considerando o texto como ponto de chegada e de partida

    dos sentidos, buscando neste os vrios discursos que do texto fazem morada, no morada fixa,

    determinada, mas morada constituda em cada contexto scio-histrico-ideolgico.

    2.1.1 Ideologia, sujeito e sentido

    Nas palavras de Chau (2006), o termo Ideologia surge pela primeira vez em 1801 no

    livro de Destutt de Tracy, que pretendia elaborar uma cincia da gnese das idias, onde seus

    seguidores eram chamados por Napoleo Bonaparte de "idelogos" no sentido de

    deformadores da realidade. A autora diz que Karl Marx conservou o significado napolenico

    do termo e desenvolveu uma teoria da ideologia concebendo-a como uma forma de falsa

    conscincia cuja origem histrica ocorre com a emergncia da diviso entre trabalho

    intelectual e manual cujas transformaes constituem o solo real da histria real. a partir

    deste momento que surge a ideologia, derivada de agentes sociais concretos, ou seja, dos

  • 24

    intelectuais, resultado da luta de classes. Aps Marx e Engels, outros pensadores abordaram a

    temtica da ideologia, onde alguns mantiveram a concepo original de Marx e outros, como

    sinnimo de viso de mundo.

    Segundo Althusser (2007), a ideologia materializada nas prticas das instituies e o

    discurso, como prtica social, a ideologia materializada. No discurso, a ideologia possui

    uma dimenso que relaciona as marcas deixadas no texto com as suas condies de produo,

    e que se insere na formao ideolgica; essa dimenso tanto pode transformar como

    reproduzir as relaes de dominao. Assim, a ideologia constitutiva dos atos de dizer, se

    define como o mecanismo que naturaliza sentidos para o sujeito, tornando-os evidentes,

    bvios e naturais. Orlandi (2006) advoga de que, de acordo com a Anlise do Discurso, o

    sentido no existe em si, mas determinado pelas posies ideolgicas colocadas em jogo no

    processo scio-histrico em que as palavras so produzidas, podemos entender que a

    ideologia tem papel relevante para a AD, uma vez que a mesma implica valores, crenas,

    hbitos e rituais partilhados numa sociedade e, por serem partilhados, podem gerar certos

    efeitos de sentido.

    Para Fiorin (1990), ideologia a concepo de mundo que o sujeito tem. Chau (2006)

    ressalta que um dos traos fundamentais da ideologia consiste, exatamente, em tomar as ideias

    como independentes da realidade histrica e social, de modo a fazer com que tais ideias

    expliquem aquela realidade, quando, na verdade, essa realidade que torna compreensveis as

    ideias elaboradas. No ponto de vista de Bakhtin (2006) toda palavra carrega um ndice de

    valor, que produto das atividades avaliativas que os indivduos realizam apoiados nas

    referncias-chaves, isto , na ideologia. Partindo de tais pontos de vistas e considerando a

    ideologia uma mediao valorativa, podemos afirmar que os efeitos ideolgicos so os modos

    de enunciao, dos temas dos enunciados e das formas de discursividades. O sujeito

    interpelado pela ideologia e passa a ocupar um lugar social, visto que no h sujeito sem

    ideologia e, nesse processo de constituio do sujeito, a interpelao e o reconhecimento

    exercem papel importante no seu funcionamento. Seu reconhecimento se d no momento em

    que o sujeito se insere em prticas reguladas pelos aparelhos ideolgicos que regulam essas

    relaes, possibilitando captar as relaes de antagonismo, de aliana, de dissimulao, de

    absoro que se processam entre diferentes Formaes Discursivas. Althusser (2007, p.85)

    relata que a ideologia a representao imaginria que interpela os sujeitos a tomarem um

    determinado lugar na sociedade, mas que cria a iluso de liberdade do sujeito. Segundo o

  • 25

    autor, a ideologia reproduzida atravs de aparelhos ideolgicos como religioso, o poltico, o

    escolar, entre outros, nos quais as classes sociais so organizadas em um todo complexo de

    atitudes e representaes. Portanto, sujeito e ideologia so interdependentes, pois este tem sua

    posio enunciada e reconhecida por aquela, ao mesmo tempo em que a ideologia necessita

    do sujeito para manifestar-se e continuar seu movimento.

    Com vistas a analisar o sujeito, Veiga-Neto (2005, p.136) ressalta os trs modos que

    transformam os seres humanos em sujeitos, de acordo com o pensamento foucaultiano:

    [...] a objetivao de um sujeito no campo dos saberes que ele trabalhou no registro da arqueologia-, a objetivao de um sujeito nas prticas do poder que divide e classifica que ele trabalhou no registro da genealogia e a subjetivao de um indivduo que trabalha e pensa sobre si mesmo que ele trabalhou no registro da tica. Em outras palavras nos tornamos sujeitos pelos modos de investigao, pelas prticas divisrias e pelos modos de transformao que os outros aplicam e que ns aplicamos sobre ns mesmos.

    Em outras palavras, podemos dizer que conceituar sujeito no tarefa fcil, uma vez

    que o mesmo apresentado como fragmentado, dividido, onde sua subjetividade se manifesta

    atravs da formao discursiva que pode ser detectada no discurso, sua voz influenciada

    pelo que se espera a partir dessa posio.

    Constituindo o discurso um dos aspectos materiais de ideologia do sujeito, Brando

    (2004) afirma que o discursivo uma espcie pertencente ao gnero ideolgico, pois, segundo

    a autora, a formao ideolgica tem como um de seus componentes bsicos uma ou vrias

    formaes discursivas interligadas, o que resulta em dizer que os discursos so governados

    por formaes ideolgicas. No existe para a Anlise do Discurso um sentido literal, mas um

    sentido dominante, que tomado como natural por efeito ideolgico de evidncia.

    Pelo vis da Anlise do Discurso, o sujeito atravessado tanto pela ideologia como

    pelo inconsciente, o que produz um sujeito descentrado, ideolgico, atravessado por uma

    memria do dizer. Vale destacar que a memria discursiva difere da memria da psicologia,

    uma vez que a primeira diz respeito existncia histrica do enunciado e a segunda s

    informaes adquiridas ao longo do tempo. Dessa forma, o sujeito do discurso caracterizado

    por Pcheux como uma Forma Sujeito. Pcheux (1995) diz que Forma Sujeito caracteriza-se

    como realizando a incorporao, dissimulao dos elementos do interdiscurso, ou seja, a

  • 26

    unidade (imaginria) do sujeito, sua identidade presente, passado, futuro. O sujeito, ao usar o

    seu discurso, alm de marcar seu lugar social e temporal, tambm vem marcado por

    formaes discursivas, uma vez que, por meio delas, temos a constituio do sentido e a

    identificao do sujeito. por meio dessas formaes discursivas que se pode reconhecer, nos

    discursos, o cruzamento de vrios outros discursos e, ao mesmo tempo, a dominncia de um

    deles. , tambm, nesses espaos discursivos que se processam o que chamamos de

    assujeitamento, ou seja, o condicionamento do sujeito ideologia e ao inconsciente.

    Ainda no domnio discursivo, o processo de constituio do sujeito tambm supe um

    assujeitamento ordem significante. E esse assujeitamento ao jogo dos significantes se faz na

    relao da lngua com a histria. Pensando mais sobre o assujeitamento, vale refletir sobre a

    questo da criatividade na lngua. Isso porque no se pode conceber o sujeito produtor do

    discurso como um rob programado para dizer. H certa liberdade no mbito da

    organizao do discurso, pois, se assim no fosse, estaramos negando linguagem a

    possibilidade de criatividade, mas vale lembrar que essa liberdade direcionada por

    determinaes scio-histricas.

    O objetivo da AD no buscar o que o sujeito quer dizer com seus enunciados, mas o

    discurso como efeitos de sentido entre interlocutores, uma vez que ele determinado por suas

    condies de produo para significar. De acordo com Orlandi (2007), ao se defrontar com o

    texto, materialidade lingustica do discurso, o analista do discurso busca localizar o que o

    texto diz e o que no diz, o que o constitui significativamente e que, atravs de recortes da

    dessuperficializao, os discursos fazem do texto seu stio. O analista inscreve o texto num

    dado campo discursivo, e assim analisa os movimentos de sentidos, os gestos de

    interpretao, busca as formaes discursivas e suas respectivas formaes ideolgicas.

    Podemos, pois, dizer que, enquanto as formaes ideolgicas determinam o que

    somos, as formaes discursivas ditam o que dizer, ou seja, regulam os dizeres possveis em

    uma dada sociedade e a lngua a base de realizao dos efeitos de sentido que o discurso

    manifesta; a condio primeira da possibilidade de processos discursivos. Na viso de

    Orlandi (2007), todo dizer, na realidade, encontra-se na confluncia dos dois eixos: o da

    memria (constituio) e o da atualidade (formulao) e que desse jogo que tiram seus

    sentidos. Ressalta, ainda, que preciso no confundir interdiscurso com intertexto uma vez

    que ambos mobilizam o que denominamos relao de sentido. Para ela, o interdiscurso da

  • 27

    ordem do saber discursivo, memria afetada pelo esquecimento, ao longo do dizer, j o

    intertexto restringe-se s relaes de um texto com outros textos. Segundo Orlandi:

    Sujeito e sentido se constituem, ao mesmo tempo, na articulao da lngua com a histria, em que entram o imaginrio e a ideologia. Se, na psicanlise, temos a afirmao de que o inconsciente estruturado como linguagem, na Anlise do Discurso considera-se que o discurso materializa a ideologia, constituindo-se no lugar terico em que se pode observar a relao da lngua com a ideologia. (ORLANDI, 2002, p.66)

    Essa inscrio do sujeito na lngua nos leva a uma produo de sentidos que se

    encontra inscrita na rede de significantes, sofrendo os efeitos da tenso constitutiva do

    funcionamento da linguagem entre a parfrase e a polissemia. Segundo Orlandi (2007), a

    parfrase representa o retorno aos mesmos espaos do dizer, produzem-se diferentes

    formulaes do mesmo dizer sedimentado; est do lado da estabilizao. J, na polissemia, o

    que temos deslocamento, ruptura de processos de significao; a mesma joga com o

    equvoco. Partindo desse ponto de vista, podemos afirmar que as palavras mudam de sentido a

    partir das posies dos sujeitos que a empregam, onde as representaes verbais vinculam-se

    entre si em funo dos processos de reformulao parafrstica inerentes s formaes

    discursivas. E, como efeito de sentido, essas representaes produzem uma consistncia

    imaginria para o sujeito.

    O sentido constitudo pela interao entre os sujeitos, visto que regulado

    socialmente, de maneira que uma mesma expresso ou gestos podem produzir sentidos

    diferentes, a depender de quem enuncia e/ou da posio que o sujeito ocupa, uma vez que o

    sentido no se depreende da materialidade discursiva, mas de uma srie de relaes a serem

    estabelecidas entre o enunciado, o enunciador e o contexto que envolve a enunciao.

    Para a AD, o discurso uma prtica, uma ao do sujeito sobre o mundo, marcando

    posies e/ou selecionando sentidos; revela aquilo que constitui o cerne das aes e

    representaes humanas. Em funo disso, deve ser visto de forma contextualizada como um

    acontecimento, uma vez que gera interpretao, constri uma vontade de verdade e produz um

    recorte da realidade scio-histrica-ideolgica quando se pe algo em evidncia. Por outro

    lado, no momento em que essa realidade no abordada na sua totalidade, , apenas,

    compreendida por partes, o que significa admitir que o discurso tambm , muitas vezes,

    elaborado por lacunas, por aquilo que ele no diz, pelos aspectos sobre os quais silencia ou

  • 28

    apaga e, consequentemente a isso, a ideologia vai funcionar como reprodutora das relaes de

    produo.

  • 29

    3 - A CONSTITUIO DE SUJEITOS E SENTIDOS EM CONTEXTOS

    DE ENSINO-APRENDIZAGEM DE LNGUA INGLESA

    H quem diga no gostar de ingls e no saber nada dessa lngua. Entretanto, sua

    presena notria no cotidiano brasileiro, uma vez que lemos, ouvimos, falamos ou at

    escrevemos palavras e expresses sem nunca ter estudado o idioma. Segundo Steinberg

    (2003, p.11), uma lngua reflete uma sociedade que dela se utiliza como meio de

    comunicao. Assim, podemos afirmar que o sentido apreendido de uma lngua homologado

    pela/na cultura, uma vez que os sujeitos envolvidos sofrem influncias e so influenciados por

    diversos fatores externos (vale ressaltar que os sujeitos a quem nos referimos so os alunos

    dos cursos de Secretariado Executivo e Comrcio Exterior da Faculdade de Cincias

    Aplicadas e Sociais de Petrolina FACAPE). Esses sujeitos passam, tambm, por um

    processo de transformao scio-histrica onde o conhecimento no apenas a acumulao

    de teorias, mas a busca de certo domnio sobre o que abrangido e esse processo de

    mundializao adentra em nossas vidas locais e transformam a maneira como a gente v o

    mundo (Jovchelovich, 2001, p.46).

    Essas reflexes sobre o sujeito e a aprendizagem de lnguas nos levam a problematizar

    a questo da identidade. Para tanto, Coracini (2003) ressalta que, quando se fala de busca da

    identidade, pretende-se encontrar caractersticas capazes de definir o indivduo ou o grupo

    social por aquilo que ele tem de diferente com relao aos demais indivduos. No entanto, o

    domnio do idioma no comum a todos os sujeitos. Sobre o assunto Coracini (2003, p. 151),

    considera que:

    Embora o desejo identitrio do sujeito procure a todo o preo a sua individualidade, esse desejo, recalcado, depara-se com a presena do outro, ou melhor dizendo, de outros: todos aqueles que, de uma maneira ou de outra, tiveram e tm participao na sua formao, atravs de atitudes, textos (orais ou escritos), memria discursiva (valores, esteretipos, que so herdados...). So esses fragmentos que Bakhtin (1929/1978) denomina polifonia, pluralidade de vozes constitutivas da linguagem e do sujeito.

  • 30

    A identidade vista como um processo, em movimento e o ensino-aprendizagem de

    uma lngua estrangeira como um processo complexo, uma vez que o discurso construdo por

    algum que fala, por um enunciado que se pretende legtimo, abafando outras vozes. Essa

    enunciao, que se faz como independente do objeto e de suas condies de existncia

    manifesta a exterioridade ou relato do objeto segundo um modelo discursivo marcado pela

    seleo, incluso ou excluso de fatos.

    No tocante memria, vale destacar seu papel como elemento constituinte do

    sentimento de identidade, tanto individual como coletiva, uma vez que a identidade

    construda a partir de um fenmeno que se produz em referncia aos outros, observando os

    critrios de aceitabilidade e credibilidade. No ponto de vista Meihy (2005, p.63), memria so

    lembranas organizadas segundo uma lgica subjetiva que seleciona e articula elementos que

    nem sempre correspondem aos fatos concretos, objetivos e materiais. Com relao memria

    discursiva, Brando (2004, p.95) ressalta que ela que torna possvel a toda formao

    discursiva fazer circular formulaes anteriores, j enunciadas. Diz, tambm, que essa noo

    implica o estatuto histrico do enunciado inserido nas prticas discursivas reguladas pelos

    aparelhos ideolgicos de Estado. Assim, podemos afirmar que a memria da Lngua Inglesa

    construda a partir de uma herana de identidade cultural. Nesse sentido, Meihy (2005, p.70)

    tambm define memria cultural como o conjunto das manifestaes de grupos que guardam

    vises articuladas sobre si e sobre o mundo segundo critrios que do sentido e unidade ao

    conjunto.

    Nesse processo, a lngua inglesa adquire sua importncia ao enraizar-se na cultura

    brasileira e no cotidiano dos sujeitos. Agra (2004, p. 27) diz que todo e qualquer processo

    de enunciao, do mais simples ao mais complexo, representa apenas uma pequena

    parte de uma cadeia de comunicao, que evolui continuamente em variadas direes a

    partir de um determinado grupo social. J Fiorin (1990, p.72) advoga que a lngua em si

    no um fenmeno que tenha um carter de classe, uma vez que ela existia nas sociedades

    sem classes, existe nas formaes sociais com classe e continuar existindo quando as classes

    forem abolidas.

    Partindo desses pressupostos, podemos dizer que a Lngua Inglesa no somente

    instrumento de comunicao ou mesmo de conhecimento, mas um instrumento de poder.

    Moita Lopes (2005, p.54) acrescenta:

  • 31

    Tendo em vista o papel que representa na construo da nova ordem mundial, a lngua inglesa um instrumento essencial para operar no novo capitalismo, inclusive para ter acesso a modos contemporneos de produo de conhecimento, ou seja, em rede. Mas tambm um instrumento fundamental para construir futuros mais promissores ao se aprender em sala de aula como o discurso funciona na vida atual, ao mesmo tempo em que se compreende como os discursos veiculados nessa lngua do acesso multiplicidade da vida humana em vrias partes do mundo de modo que possamos nos questionar sobre quem somos, sobre como somos construdos e sobre como podemos reconstruir prticas sociais cristalizadas com base em princpios ticos.

    Pensando mais sobre a relao saber-poder, Veiga-Neto (2005) diz que Foucault, ao

    estudar as articulaes entre poder e saber, descobriu que os saberes se constituem com base

    em uma vontade de poder e acabam funcionando como correias transmissoras do prprio

    poder que a servem e que ambos se articulam com a produo, num corpo, que poltico.

    Acrescenta, ainda, que o poder se manifesta como resultado que cada um tem de atuar sobre a

    ao de outros, de govern-los. Com relao vontade de poder, o autor aponta que no

    subjetiva, neutra, mas intencional; que se produzem e se estabelecem nos jogos das prticas

    concretas, buscando satisfazer interesses e que acabam conferindo legitimidades. Relata,

    ainda, que Foucault aproxima saber e poder como dois lados de um mesmo processo.

    As relaes de fora constituem o poder, ao passo que as relaes de forma constituem o saber, mas aquele tem o primado sobre este. O poder se d numa relao flutuante [...], o poder fugaz, evanescente, singular, pontual. O saber, bem ao contrrio, se estabelece e se sustenta nas matrias/contedos e em elementos formais que lhe so exteriores: luz e linguagem, olhar e fala. bem por isso que o saber apreensvel, ensinvel, domesticvel, volumoso. E poder e saber se entrecruzam no sujeito [...] pelo discurso [...].(VEIGA-NETO, 2005, p.157)

    A democratizao do acesso e o conhecimento de uma lngua estrangeira est,

    tambm, intrinsecamente ligada ao tema da diversidade cultural, que vem adquirindo

    crescente importncia atualmente. Em torno da mesma, esto presentes: ideologias, tradies,

    conceitos polticos e sociais, que podem influenciar de forma positiva ou negativa indivduos

    de outras naes, dependendo da forma que esses se posicionem diante das informaes que

    lhes so apresentadas. De acordo com Santos, J. (2004), cultura uma construo histrica,

    seja como concepo, seja como dimenso do processo social, no algo natural, nem

    uma decorrncia de leis fsicas ou biolgicas. um produto coletivo da vida humana. O

    autor diz, ainda, que as vrias maneiras de entender o que cultura derivam de um conjunto

    comum de preocupaes, que podemos localizar em duas concepes bsicas: uma preocupa-

  • 32

    se com todos os aspectos de uma realidade social. Assim, cultura diz respeito a tudo aquilo

    que caracteriza a existncia social de um povo ou nao, ou de grupos no interior de uma

    sociedade; a outra, que quando falamos em cultura estamos nos referindo mais

    especificamente ao conhecimento, s ideias e crenas de um povo.

    Essas caractersticas culturais esto embutidas nos relacionamentos histricos de

    poder e autoridade, que garantem o status social, profissional, poltico e pedaggico dos

    sujeitos envolvidos. Santos, J. (2004) comenta, tambm, que as preocupaes com a cultura

    surgiram associadas tanto ao progresso da sociedade e do conhecimento quanto das novas

    formas de dominao. Correlacionando com as ideias de Veiga-Neto (2005) sobre a questo

    do saber-poder, Santos, J. (2004) fala que o conhecimento no s o contedo bsico das

    concepes da cultura; mas tambm as prprias preocupaes com cultura so instrumentos

    de conhecimento, respondem a necessidades de conhecimento da sociedade, as quais se

    desenvolveram claramente associadas com relaes de poder. Na sequncia, o autor afirma

    que existe relao entre linguagem e cultura e que isso pode justificar um idioma ser usado

    como forma de dominao de uma cultura sobre outra. Bakhtin (2006) conceitua a palavra

    estrangeira e tambm a relaciona ao poder.

    [...] Esse grandioso papel organizador da palavra estrangeira palavra que transporta consigo foras e estruturas estrangeiras e que algumas vezes encontrada por um jovem povo conquistador no territrio invadido de uma cultura antiga e poderosa (cultura que, ento, escraviza, por assim dizer, do seu tmulo, a conscincia ideolgica do povo invasor) fez com que, na conscincia histrica dos povos, a palavra estrangeira se fundisse com a ideia de poder, de fora, de santidade, de verdade, e obrigou a reflexo lingustica a voltar-se de maneira privilegiada para seu estudo. E, no entanto, a filosofia da linguagem e a lingustica at hoje ainda no se conscientizaram do imenso papel ideolgico da palavra estrangeira. (BAKHTIN, 2006, p.102-103)

    Assim, por trs de uma lngua estrangeira, existe uma cultura, um modo de vida, que

    , inevitavelmente, transmitido e, em certos aspectos, anexados por outros povos.

    Poderamos, pois, falar de enraizamento da Lngua Inglesa nas prticas culturais de outros

    povos? Segundo Bosi (1996), o enraizamento algo que vem automaticamente do lugar, do

    nascimento, da profisso, do ambiente e que tem como ponto fundamental a valorizao

    identitria do modo de vida social e cultural. Assim, podemos dizer que o enraizamento no

    nico, uma vez que sofre influncias e influenciado por diversos fatores externos como o

  • 33

    espiritual, moral, intelectual e cultural, os quais so necessrios para o desenvolvimento

    humano, local e social. Nesse sentido, a tradio cultural e a importncia comercial do Reino

    Unido, assim como a posio econmica dos Estados Unidos no cenrio mundial

    constituram a memria institucional da Lngua Inglesa, consolidando-a como um dos

    idiomas mais falados e a principal lngua para os contatos internacionais, a qual pertence a

    um dos ramos das lnguas indo-europias, o germnico ocidental.

    Em meio a essa memria construda, temos a ratificao do enraizamento do idioma

    atravs da atual constituio da organizao da sociedade brasileira, que tem propiciado o

    aparecimento de inmeros cursos livres, bem como a obrigatoriedade do idioma nas escolas e

    nas universidades. No entanto, esse enraizamento tem gerado uma dicotomia: de um lado,

    tem valor negativo, quando existe uma relao poltica, econmica e cultural com o pas de

    origem da lngua, que pressupe superioridade estrangeira e uma consequente gerao de

    complexo de inferioridade nacional; do outro, valor positivo, no momento em que contribui

    para superar essa relao, constituindo uma viso intercultural, a qual equilibra a valorao

    das mais diversas culturas.

    A Lngua Inglesa, de um ponto de vista discursivo, no pode apenas representar algo

    j dado, sendo parte de uma construo social que rompe com a iluso de naturalidade entre

    os limites do lingustico e os do extralingustico. Trata-se de uma transdisciplinaridade com

    um foco especfico sobre a relao entre o mundo social e a linguagem. nesse contexto que

    Orlandi (2007, p.60) destaca que os sentidos e os sujeitos se constituem em processos em

    que h transferncias, jogos simblicos dos quais no temos o controle e nos quais o

    equvoco - o trabalho da ideologia e do inconsciente esto largamente presentes. Podemos,

    pois, afirmar que o indivduo tem a necessidade de, pelo uso da linguagem, entender e ser

    entendido, uma vez que, no momento em que um sujeito aprende um novo idioma, abre-se

    um caminho de diferenas scio-histrico-culturais onde cada um tem seus valores, e, por

    conseguinte, sua linguagem e sua forma de expresso.

    Ao entrar em contato com a lngua inglesa, o sujeito-aluno inscreve-se em uma nova

    discursividade, o que provoca deslocamentos na sua subjetividade e, consequentemente,

    apropria-se uma nova interpretao do mundo em que vive. possvel afirmar, tambm, que

    lngua, cultura e histria so cacos de um mesmo vitral, cujos matizes revelam que o domnio

    sobre lnguas estrangeiras representa mais do que uma simples habilidade lingustica:

  • 34

    representa aptido multicultural, bem como versatilidade de estruturar o pensamento por

    diferentes vias e de interpretar realidades sob diferentes ticas.

    Quanto profissionalizao, qualidade, globalizao e atualizao so preocupaes

    constantes para quem pretende conquistar e manter elevada a empregabilidade onde diferentes

    fatores devem ser levados em considerao. Segundo Carvalho e Grisson (2002, p.190)

    A empregabilidade pode ser analisada como sendo uma caracterstica que espelha conhecimentos, habilidades e capacidades individuais. Em outras palavras, a empregabilidade definida pela utilidade dos valores culturais, morais e intelectuais que cada indivduo dispe para promover sua sobrevivncia. Desta forma, quanto maior seu nvel de conhecimentos, maiores sero suas possibilidades de se ajustar e se adaptar a evoluo tcnico-cientfica de um mundo globalizado.

    Globalizao um neologismo usado como um dos processos de aprofundamento de

    integrao econmica, social, cultural e poltica ocorrida em quase todos os pases do mundo

    no final do suculo XX incio do sculo XXI gerada pela necessidade da dinmica do

    capitalismo de expandir seus mercados. Segundo Magnoli (2004), um processo de

    integrao mundial, impulsionado por fluxos de mercadorias, capitais e informaes. Partindo

    desse ponto de vista, podemos dizer que esse processo afeta todas as reas da sociedade,

    principalmente a comunicao, o comrcio internacional e a liberdade de movimentao, com

    diferente intensidade dependendo do nvel de desenvolvimento e integrao das naes

    envolvidas.

    No discurso postulado pelo processo da globalizao, para o sujeito ser cidado

    globalizado, faz-se necessrio dominar uma lngua estrangeira. Sobre o assunto, Bolognini

    (2003, p.192) assegura:

    Ao falar em lngua estrangeira, o sujeito est se posicionando dentro de uma histria, de uma cultura estrangeira. E mesmo que a sua proficincia seja considerada boa pelos padres tradicionais de avaliao, a sua relao com essa lngua a de um estrangeiro. Ou seja, a relao a daquele que no tem a mesma intimidade com a histria, com a cultura que um falante nativo tem. E isso o coloca em uma posio menos privilegiada em relao a seu interlocutor, falante nativo, plenamente interpelado pela histria e cultura de sua lngua materna.

    Partindo desse ponto de vista, os sujeitos-alunos tm de se preparar para o desafio da

  • 35

    exigncia do mercado. A necessidade do domnio de uma lngua estrangeira faz tambm com

    que esses sujeitos-alunos tenham uma viso da linguagem. Brando (2004, p.8) diz que essa

    viso da linguagem como interao social, em que o Outro desempenha papel fundamental na

    constituio do significado integra todo ato de enunciao individual num contexto mais

    amplo, revelando as relaes intrnsecas entre o lingustico e o social. Brando (ibid) tambm

    assegura que atravs de cada ato de enunciao, se realiza a intersubjetividade humana, o

    processo de interao verbal passa a constituir, no bojo de sua teoria, uma realidade fun-

    damental da lngua.

    Dentro dessa perspectiva, entendemos, ento, que, medida que as vozes dos sujeitos

    entram em contato com outras vozes, nas situaes de comunicao de que participam, esses

    futuros profissionais constroem e reconstroem seus conhecimentos, suas concepes sobre a

    natureza social da linguagem e da aprendizagem e, em ltima anlise, constroem e

    reconstroem a si prprios como profissionais.

    3.1 - A LNGUA INGLESA NO MUNDO E NO BRASIL: RECORTES HISTRICOS

    As transformaes, impulsionadas pelas novas tecnologias de comunicao, bem

    como pela globalizao, tornaram-se notrias nas necessidades de aperfeioamento e

    especializao no mercado de trabalho, que, a cada ano, esto extremamente ligadas rea

    educacional, fazendo com que as pessoas busquem, alm da formao bsica, domnio de uma

    ou mais lnguas estrangeiras e como ocorre em outras reas da cincia, o estudo da linguagem

    tem sido afetado pelas inconsistncias e hesitaes originadas na pretenso filosfica de que o

    conhecimento deva ser justificado racionalmente. Assim, h muito tempo, teorias tm sido

    propostas a respeito da origem e da natureza da Lngua Inglesa.

    Nessa perspectiva, o discurso do ingls como lngua internacional postula sua

    disseminao positiva no mundo inteiro. Segundo Lacoste (2005),

    [...] de algumas dcadas para c, o ingls tambm se propaga no plano mundial como a lngua da globalizao, bem como a lngua da Unio Europia, que engloba cerca de trinta Estados de lnguas diferentes e que tem necessidade de uma lngua comum, ao menos em meio s categorias sociais mais "globalizadas" de sua populao. (LACOSTE, 2005, p.8)

  • 36

    Paiva (1996), fazendo uso das palavras do jornalista Ventura, diz que o Ingls uma

    epidemia que contamina 750 milhes de pessoas no planeta e que essa lngua sem fronteiras

    est na metade dos 10.000 jornais do mundo, em mais de 80% dos trabalhos cientficos e no

    jargo de inmeras profisses, como a informtica, a economia e a publicidade. Ao assumir

    esse papel de lngua global, a Lngua Inglesa torna-se uma das mais importantes ferramentas,

    tanto acadmicas quanto profissionais e hoje, inquestionavelmente, reconhecido como a

    lngua mais importante a ser adquirida na atual comunidade internacional. Partindo dessa

    premissa, verificamos que essa influncia vem de longa data. Almeida Filho (2003 p.21) diz

    que:

    Historicamente, o ensino de lnguas aps 1930 deu-se majoritariamente como oferta do currculo escolar regular, mesmo que, sob desencontrada legislao e desatenta superviso das autoridades de ensino e, no ensino superior desde ento nos cursos de licenciatura formadores de professores de lngua. Depois dos anos 1960 essa formao passou a se dar tambm em universidades confessionais em regime de pago, e nos anos 1980 e 1990 nas inmeras faculdades, centros universitrios e universidades particulares que brotaram por todo territrio nacional.

    Nas relaes cotidianas, no h como no sentir que as tecnologias transformam o

    modo de viver da maioria das pessoas e, sem perceber, o mundo tecnolgico invade as nossas

    vidas e ajuda a viver com as necessidades e exigncias da atualidade. E, em decorrncia e

    paralelamente a esse domnio comercial e tecnolgico, a cultura estrangeira chega ao nosso

    dia a dia por meio do cinema, da msica, dos programas de televiso, lazer, esportes,

    alimentao e, principalmente, atravs da informtica, onde grande parte de toda essa

    comunicao armazenada nos computadores do mundo est em Lngua Inglesa. Verificamos

    tambm que, depois do Portugus, o ingls a lngua mais ouvida, lida e falada no Brasil,

    embora sejamos cercados de pases de lngua espanhola e convivendo com imigrantes de

    vrias nacionalidades, cujas falas a maioria dos brasileiros tm dificuldade at mesmo de

    identificar a origem. Segundo Martinet (1978), as palavras de uma lngua no tm

    equivalentes exatos noutras, o que, naturalmente, acompanha a variedade dos dados da

    experincia.

    Uma lngua um instrumento de comunicao em que, de modo varivel de

    comunidade para comunidade, analisa-se a experincia humana em unidades providas de

    contedo semntico e de expresso fnica. Saber uma lngua no apenas uma questo

    relacionada ao acmulo de informaes sobre as estruturas lingusticas e o vocabulrio, mas

  • 37

    tambm criar novos enunciados a partir das conexes e do gerenciamento de interaes orais

    e escritas.

    Essa mediao cultural se constitui a partir da participao de outros no processo,

    onde os sujeitos envolvidos discutem, ampliam, e (re)constroem processos de significao,

    viabilizando a ocorrncia das interaes sociais e, principalmente, mediando as operaes

    abstratas do pensamento. Na viso de Brando (2004) A linguagem enquanto discurso no constitui um universo de signos que serve apenas como instrumento de comunicao ou suporte de pensamento; a linguagem enquanto discurso interao, e um modo de produo social; ela no neutra, inocente e nem natural, por isso o lugar privilegiado de manifestao da ideologia. (BRANDO, 2004, p. 11)

    Na perspectiva bakhtiniana (BAKHTIN, 2006), a linguagem entendida como um

    fenmeno social e histrico e, em funo disso, ideolgico. vista como tendo papel crucial

    na construo do homem como ser social. Diz, ainda, que, medida que as vozes dos

    interagentes de cada situao de comunicao verbal entram em contato constroem,

    reconstroem, ou traduzem em sentidos os significados que esto sendo negociados, sua

    conscincia, seu conhecimento do mundo, e, em ltima anlise, eles prprios se completam e

    se constroem continuamente, nas suas prticas discursivas e nas dos outros. Bakhtin v o

    sujeito imbricado em seu meio social, sendo permeado e constitudo pelos discursos que o

    circundam. Para o autor, a linguagem tambm vista como uma arena de conflitos,

    inseparvel da questo do poder; cada signo materialmente constitudo no sentido de ser

    produzido dialogicamente no contexto de todos os outros signos sociais.

    Partindo desse ponto de vista, podemos afirmar que a unidade bsica de anlise

    lingstica o enunciado, ou seja, elementos lingsticos produzidos em contextos sociais

    reais e concretos como participantes de uma dinmica comunicativa, onde o sujeito se

    constitui ouvindo e assimilando os discursos do outro, fazendo com que esses discursos sejam

    processados de forma que se tornem, parcialmente, as palavras do sujeito e, parcialmente, as

    palavras do outro. Esse fenmeno Bakhtin chama de dialogismo. Por outro lado, o que

    acontece com o indivduo enquanto ser social acontece tambm com a comunidade; ou seja,

    assim como um indivduo, a comunidade tambm se constitui em arena de conflito de

    discursos concorrentes, e esse fenmeno Bakhtin chama de polifonia. Segundo esses

  • 38

    conceitos, cada lngua e cada indivduo so formados por variantes conflitantes sujeitas

    questo do poder.

    Retomando o sentido da palavra estrangeira, Bakhtin (2006) diz que foi, efetivamente,

    o veculo da civilizao, da cultura, da religio e da organizao poltica e descreve oito

    categorias provenientes da mesma, que serviram de base ao objetivismo abstrato. Vamos

    resumir abaixo essas categorias.

    1. Nas formas lingusticas, o fator normativo e estvel prevalece sobre o carter

    mutvel: a construo de um sistema de formas submetidas a uma norma uma

    etapa indispensvel e importante no processo de deciframento e de transmisso de

    uma lngua estrangeira.

    2. O abstrato prevalece sobre o concreto: a concretizao da palavra s possvel

    com a incluso dessa palavra no contexto histrico real de sua realizao primitiva.

    3. O sistemtico abstrato prevalece sobre a verdade histrica: nesse ponto, o

    formalismo e o sistematismo constituem os traos tpicos de toda reflexo que se

    exerce sobre um objeto acabado, ou melhor, o pensamento alheio habitualmente,

    se no exclusivamente, sistematizado.

    4. As formas dos elementos prevalecem sobre as do conjunto: a lingustica est

    voltada para o estudo da enunciao monolgica isolada onde seu alcance mximo

    a frase complexa (o perodo). Existe um abismo entre a sintaxe e os problemas de

    composio do discurso, pois as formas que constituem uma enunciao completa

    s podem ser percebidas e compreendidas quando relacionadas com outras

    enunciaes completas pertencentes a um nico e mesmo domnio ideolgico.

    5. A reificao do elemento lingustico isolado substitui a dinmica da fala: a

    enunciao como um todo para a lingustica, apenas subsistem os elementos do

    sistema, isto , as formas lingusticas isoladas. Assim, a histria da lngua torna-se

    a histria das formas lingusticas separadas (fontica, morfologia, etc.) que se

    desenvolvem independentemente do sistema como um todo e sem qualquer

    referncia enunciao concreta.

    6. Univocidade da palavra mais do que polissemia e plurivalncia vivas: o sentido da

    palavra totalmente determinado por seu contexto. No entanto, h tantas

    significaes possveis quantos contextos, mas, nem por isso, a palavra deixa de

    ser una. Ela no se desagrega em tantas palavras quantos forem os contextos nos

  • 39

    quais ela pode se inserir. Essa unicidade da palavra no somente assegurada pela

    unicidade de sua composio fontica; h tambm uma unicidade inerente a todas

    as suas significaes. Toda enunciao efetiva, seja qual for a sua forma, contm

    sempre, com maior ou menor nitidez, a indicao de um acordo ou de um

    desacordo com alguma coisa. Os contextos no esto simplesmente justapostos,

    como se fossem indiferentes uns aos outros; encontram-se numa situao de

    interao e de conflito tenso e ininterrupto.

    7. Representao da linguagem como um produto acabado, que se transmite de

    gerao a gerao: a lngua no se transmite; ela dura e perdura sob a forma de um

    processo evolutivo contnuo. Os indivduos no recebem a lngua pronta para ser

    usada, pois somente quando mergulham nessa corrente que sua conscincia

    desperta e comea a operar. apenas no processo de aquisio de uma lngua

    estrangeira que a conscincia j constituda, graas lngua materna, confronta-se

    com uma lngua toda pronta, que s lhe resta assimilar.

    8. Incapacidade de compreender o processo gerativo interno da lngua: para a

    conscincia do locutor, a lngua existe como sistema de formas sujeitas a normas,

    s para o historiador que ela existe como processo evolutivo. O que exclui a

    possibilidade de associao ativa da conscincia do locutor com o processo de

    evoluo histrica.

    Assim, podemos assegurar, mais uma vez, que a aprendizagem de uma lngua

    estrangeira est intrinsecamente ligada ao tema da diversidade cultural que vem adquirindo

    crescente importncia na atualidade, cuja aprendizagem passa a ser uma experincia

    completamente nova e que a Lngua Inglesa, de um ponto de vista discursivo, no pode

    apenas representar algo j dado, uma vez que a linguagem constitui um elemento essencial de

    toda cultura, pois possibilita a transmisso oral ou escrita do passado de um sujeito ou de uma

    coletividade construda a partir de experincias pessoais, experincias dos outros, por

    discursos j constitudos ou a serem construdos pelos que o cercam.

    Nessa direo, vale ressaltar que a aprendizagem de uma lngua estrangeira no um

    sistema vazio de sentido, visto que ela traz consigo, revelia do aprendiz, uma carga

    ideolgica que o coloca em conflito permanente com a ideologia da lngua materna. Nesse

    processo esto em jogo valores, smbolos e imagens da lngua materna onde as representaes

    que habitam o imaginrio do sujeito so reveladoras de identidade. pela enunciao que o

  • 40

    sentido novo pode surgir, uma vez que representa interpretao historicizada pelo sujeito da

    linguagem.

    3.1.1 O lugar da Lngua Inglesa nos Cursos da FACAPE

    A educao escolar atua historicamente na vida do indivduo, constituindo-se no s

    como necessria para sua sobrevivncia, mas tambm como base de informao e cultura para

    enfrentar o mercado de trabalho e, principalmente, como formadora de agente criador e

    transformador da sociedade. Para Oliveira (1999), a crescente presso competitiva, movida

    pela globalizao e pelas inovaes tecnolgicas num ritmo sem precedentes no ambiente de

    trabalho tornou indiferenciados os limites entre educao e trabalho. Essa indiferena

    produziu o conceito vital de produo de conhecimento, transformado em uma meta

    educacional: aprendizagem permanente - lifelong learning. Partindo desse ponto de vista,

    pode-se afirmar que a ideia de que apenas um diploma no garante a sobrevivncia do

    indivduo no mercado de trabalho.

    As grandes transformaes, a globalizao econmica, a acelerao da inovao

    tecnolgica e a reduo do papel do Estado na sociedade formaram um conjunto de

    fenmenos que tm por consequncia um aumento geral da concorrncia em todo o mercado

    de trabalho, significando: profissionais cada vez mais qualificados, busca de habilidade e

    agilidade no uso do computador, iniciativa, criatividade, capacidade empreendedora e

    domnio de um ou mais idiomas. Desse ltimo, resulta um ponto muito importante, o de que a

    comunicao uma ferramenta imprescindvel no mundo moderno e est em consonncia

    com os avanos dos recursos tecnolgicos. Sem conhecer uma lngua estrangeira, torna-se

    extremamente difcil utilizar os modernos equipamentos de modo eficiente e produtivo. (PCN,

    1999, p.152). Nesse sentido, ao assumir este papel de lngua global, tanto para o curso de

    Secretariado Executivo como para o curso de Comrcio Exterior da FACAPE, a Lngua

    Inglesa torna-se uma importante ferramenta curricular para os alunos.

    De acordo com os Projetos Pedaggicos dos referidos cursos, as disciplinas de Lngua

    Inglesa possuem carga horria de 60 horas aula semestrais, so obrigatrias e equivalentes.

    Nesses cursos, vivenciam-se nas suas matrizes curriculares diversos nveis do idioma: em

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    Lngua Inglesa I: Nveis de compreenso texto; Estratgias de leitura; Estruturas bsicas da

    lngua inglesa; Lngua Inglesa II: Leitura e interpretao de textos especficos da rea de

    negcios; Elementos culturais de pases falantes de lngua inglesa; Elementos estruturais da