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0 BOLETIM CONTEÚDO JURÍDICO N. 651 (Ano VIII) (07/7/2016) ISSN - - BRASÍLIA 2016 Boletim Conteúdo Jurídico - ISSN – 1984-0454

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BOLETIM CONTEÚDO JURÍDICO N. 651

(Ano VIII)

(07/7/2016)

 

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BRASÍLIA ‐ 2016 

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–1984-0454

 

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ConselhoEditorial 

COORDENADOR GERAL (DF/GO/ESP) - VALDINEI CORDEIRO COIMBRA: Fundador do Conteúdo Jurídico. Mestre em Direito Penal Internacional Universidade Granda/Espanha.

Coordenador do Direito Internacional (AM/Montreal/Canadá): SERGIMAR MARTINS DE ARAÚJO - Advogado com mais de 10 anos de experiência. Especialista em Direito Processual Civil Internacional. Professor universitário

Coordenador de Dir. Administrativo: FRANCISCO DE SALLES ALMEIDA MAFRA FILHO (MT): Doutor em Direito Administrativo pela UFMG.

Coordenador de Direito Tributário e Financeiro - KIYOSHI HARADA (SP): Advogado em São Paulo (SP). Especialista em Direito Tributário e em Direito Financeiro pela FADUSP.

Coordenador de Direito Penal - RODRIGO LARIZZATTI (DF/Argentina): Doutor em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidad del Museo Social Argentino - UMSA.

País: Brasil. Cidade: Brasília – DF. Contato: [email protected] WWW.CONTEUDOJURIDICO.COM.BR

   

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SUMÁRIO

COLUNISTA DO DIA

 

07/07/2016 Carlos Eduardo Rios do Amaral 

» Da constitucionalidade do PLC 7/2016 que altera a Lei Maria da 

Penha

ARTIGOS  

07/07/2016 Dalmir Teixeira Rolim » Nacionalidade no Direito internacional e em nossa Constituição Federal 

07/07/2016 Marcella Gomes do Nascimento 

» Controle jurisdicional de políticas públicas 

07/07/2016 Priscila Helena Soares Piau 

» Direito Penal do Inimigo e as garantias penas do art. 5° da Constituição da República 

Federativa do Brasil 

07/07/2016 Marcus Vinicius da Costa Paiva 

» Reorganização de sociedades empresariais no Brasil: alternativa de economia fiscal 

07/07/2016 Hermeson Alves Nogueira 

» O Princípio da Insignificância 

07/07/2016 Jônitas Matos dos Santos Duarte 

» A Justiça Aristotélica 

07/07/2016 Tauã Lima Verdan Rangel 

» Apontamentos à Resolução/CD/FNDE nº 38/2009: O Programa Nacional de 

Alimentação Escolar como instrumento materializador do Direito Humano à 

Alimentação Adequada 

MONOGRAFIA 07/07/2016 Thiago Soares Gonçalves » Audiência de custódia cautelar: uma visão crítica a sua constitucionalidade 

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DA CONSTITUCIONALIDADE DO PLC 7/2016 QUE ALTERA A LEI MARIA DA PENHA

CARLOS  EDUARDO  RIOS  DO  AMARAL:  Defensor Público do Estado do Espírito Santo.

Na ciência do Direito existe uma fórmula argumentativa muito clara e inquestionável: quem pode o mais, pode o menos. É antiga a máxima latina de que “in eo quod plus est semper inest et minus”.

Pois bem. É tradição jurídica secular dos povos civilizados, inclusive do Brasil desde a era colonial portuguesa até os dias de hoje, que as Autoridades Policiais devem prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito.

Claro, trata-se de genuína restrição da liberdade do indivíduo, realizada pela Autoridade Policial, condicionada à pronta e imediata remessa de seu termo ao Poder Judiciário, que deverá relaxar a prisão ilegal ou convertê-la em prisão preventiva.

Seja como for, ninguém ousaria a duvidar que nesse ínterim, até decisão do Juiz, o Delegado de Polícia ancorado na Constituição e nas leis de processo restringiu o bem jurídico mais sagrado do cidadão depois de sua vida, qual seja, a sua liberdade.

Destarte, neste mesmo lapso, a lei processual penal poderá, assim, conferir ao Delegado de Polícia a tomada de outras providências acautelatórias que versem também sobre a garantia da ordem pública, como no caso de conferir célere e breve medida protetiva de urgência à mulher vítima de violência doméstica contra o seu agressor.

Sob a ótica da mulher vítima de violência doméstica, a possibilidade de concessão de algumas medidas protetivas de

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urgência pela Autoridade Policial representará, em última análise, fator sublime de sua própria sobrevivência.

O direito fundamental à vida da mulher é bem jurídico de quilate muito superior ao direito de ir e vir de seu carrasco. Noutras palavras, não há em nosso ordenamento jurídico a previsão do direito de matar por parte do marido ou companheiro agressor. Um funeral ostentoso ou um telegrama de condolências não aplacará o feminicídio e a orfandade de mãe ocasionados pelo vacilo legislativo.

O que temos hoje é um vácuo legislativo caracterizador de flagrante inconstitucionalidade por omissão do Congresso Nacional. Proclama a Constituição Federal em seu Art. 226, §8º, que o Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, “criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações”.

Ora, o Estado brasileiro garante ao Delegado de Polícia o poder de segregar a liberdade do cidadão (prisão em flagrante), mas deixa totalmente descoberta a possiblidade de deferimento por esta mesma Autoridade Policial de outras medidas acautelatórias menos drásticas, entretanto de envergadura salvífica inestimável para a vida da pobre e infeliz mulher vítima de violência doméstica.

Assim como acontece com a prisão em flagrante, o PLC 7/2016, de autoria do Deputado Sergio Vidigal (ES), exigirá que o Juiz seja comunicado no prazo de vinte e quatro horas, que poderá manter ou rever as medidas protetivas aplicadas em sede policial.

   

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NACIONALIDADE NO DIREITO INTERNACIONAL E EM NOSSA CONSTITUIÇÃO FEDERAL

DALMIR TEIXEIRA ROLIM: Acadêmico de Direito do Centro Universitário Luterano de Santarém. CEULS/ULBRA.

Resumo: O presente trabalho tem como principal objetivo abordar sobre o tema Nacionalidade na visão do direito internacional, utilizando-se também de entendimentos de ministros e ex ministros do Supremo Tribunal Federal, visando assim à diferenciação que os Estados fazem sobre os seus nacionais, como os jus soli, aqueles que nascem em determinado lugar e osjus sanguinis, ou seja, aquela proveniente da nacionalidade dos pais e os denominados estrangeiros, que são aqueles quem vem de outros Estados Nacionais e se estabelecem em determinado local seja com animus definitivo ou não.

Palavras-chaves: Nacionalidade, Direito internacional, Estrangeiro.

Abstract: This study aims to address on the topic Nationality in international law view, also using up understandings of ministers and former ministers of the Supreme Court, and in order to differentiate that States make on their national, as jus soli, those who are born in a certain place and jus sanguinis, meaning that from the nationality of the parents and foreign-denominated, which are those who come from other nation states and are established in a particular place with definitive or not animus.

Keywords: Nationality, international law, foreign.

Sumário: Introdução. 1. A diferença entre jus soli ejus sanguinis. 2. A nacionalidade presente na Constituição Federal. 3. Do

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estrangeiro. 4. Entendimento de alguns Ministros do Supremo Tribunal Federal quanto à nacionalidade. Conclusão. Referências.

Introdução:

Para o Direito Internacional, a nacionalidade vem a ser aquele vínculo jurídico que liga uma determinada pessoa a um Estado, é importante observar sempre a nacionalidade, pois ela nos molda a vários direitos, como os direitos de cidadania e da proteção que o Estado nos dá frente ao mundo jurídico internacional, sendo assim, como já foi explicado, há uma necessidade do Estado fazer uma diferenciação entre aqueles que são seus nacionais (jus soli e jus sanguinis), e os denominados estrangeiros, pessoas residentes nos Estados que possuem outra nacionalidade, o art. 15 da Declaração Universal dos direitos do Homem é claro quando diz que o Estado não pode privar arbitrariamente o indivíduo de sua nacionalidade, de forma expressa temos que a nacionalidade é um direito de todos, tão clara e tão necessária quanto qualquer outro direito.

1. A diferença entre jus soli e jus sanguinis.

Esses dois termos são importantes de serem tratados quando o tema é nacionalidade, ao menos como uma forma resumida, pois dependendo do Estado Soberano, ele pode dotar qualquer uma das formas de atribuição de nacionalidade originária.

A palavra jus soli deriva do latim e significa “direito do solo”, então usa como critério para atribuição de nacionalidade o lugar onde a pessoa nasceu, não importando qual a nacionalidade dos pais, mas sim o local de nascimento da pessoa, já a palavrajus sanguinis também deriva do latim significando “direito de sangue”, diferente do critério da jus soli, o direito de sangue leva em consideração o parentesco sanguíneo do indivíduo, em regra geral tanto do pai quanto da mãe, apenas alguns países separam, colocando que somente os pais e não as mães transmitem a nacionalidade.

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2. A nacionalidade presente na Constituição Federal.

A convenção de Haia, de abril de 1930 declara que, os Estados tem liberdade para determinar através de seu direito interno quem são aqueles considerados seus nacionais, dessa forma o Estado tem independência para legislar sobre tal matéria consoante a sua nacionalidade, sendo assim no Brasil não é diferente, ou seja, nossa Constituição traz elencados dispositivos a respeito da nacionalidade, distinguindo quem seja brasileiro nato, naturalizado e estrangeiro.

De acordo com nossa CF, o Brasil mescla para atribuição de nacionalidade originária, tanto o requisito jus soli quanto o jus sanguinis, no seu capítulo III a respeito da nacionalidade, art. 12, inc. I, alínea a, b e c estão considerados aqueles brasileiros natos, ou seja, define que são brasileiros natos os nascidos em território brasileiro, ainda que de pais estrangeiros, desde que nenhum deles esteja a serviço de seu País; e os nascidos no estrangeiro, de pais brasileiros, desde que qualquer um deles esteja a serviço da República Federativa do Brasil ou desde que a criança seja registrada em Embaixada ou Consulado brasileiro ou, ainda, desde que venha a residir no Brasil e opte depois de atingida a maioridade pela nacionalidade brasileira.

Quanto à nacionalidade derivada, ou seja, aquela que se adquire mediante o requerimento da naturalização, o Brasil vem favorecer aos imigrantes que estão aqui a mais de quinze anos ininterruptos e sem condenação penal, a possibilidade de adquirirem a nacionalidade brasileira mediante requerimento, assim como também aos nossos irmão de língua portuguesa na qual basta apenas residirem em nosso país por um ano ininterrupto e idoneidade moral, é claro que a esse brasileiros chamados de naturalizados possuem todos os direitos dos brasileiros natos, apenas se diferem em não poderem assumir algumas funções públicas que serão arroladas abaixo.

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§3º do art.12, CF. São privativos de brasileiro nato os cargos:

I- De Presidente e Vice-presidente da República.

II- De Presidente da Câmara dos Deputados. III- De presidente do Senado Federal. IV- De ministro do Supremo Tribunal Federal. V- Da carreira diplomática. VI- De oficial das Forças Armadas. VII- De Ministro de Estado da Defesa.

Ainda há também em nossa Constituição um dispositivo que trata da perda da nacionalidade, que pode atingir tanto o brasileiro nato quanto o naturalizado como no caso da aquisição de outra nacionalidade.

3. Do estrangeiro.

Para falar de nacionalidade, não podemos esquecer dessa figura conhecida como estrangeiro, aquele pertencente a outro Estado soberano, residente em outro país, seja de animus definitivos, ou apenas a passeio. É importante visar que nenhum Estado é obrigado a admitir estrangeiros em seu território, seja de forma definitiva ou temporária.

Mesmo a pessoa não sendo pertencente à nacionalidade a que reside, (o estrangeiro), ele tem diversos direitos que devem ser respeitados, direitos estes que são indispensáveis a qualquer ser humano como o direito a vida, a integridade física e o tratamento isonômico em relação a outras pessoas na mesma situação.

4. Entendimento de alguns Ministros do Supremo Tribunal Federal quanto à nacionalidade.

"As hipóteses de outorga da nacionalidade brasileira, quer se trate de nacionalidade primária ou originária (da qual emana a condição de brasileiro nato), quer se cuide de nacionalidade

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secundária ou derivada (da qual resulta o status de brasileiro naturalizado), decorrem, exclusivamente, em função de sua natureza mesma, do texto constitucional, pois a questão da nacionalidade traduz matéria que se sujeita, unicamente, quanto à sua definição, ao poder soberano do Estado brasileiro.” (HC 83.113-QO, rel. min. Celso de Mello, julgamento em 26-6-2003, Segunda Turma, DJ de 29-8-2003.)

“O requerimento de aquisição da nacionalidade brasileira, previsto na alínea b do inciso II do art. 12 da Carta de Outubro, é suficiente para viabilizar a posse no cargo triunfalmente disputado mediante concurso público. Isso quando a pessoa requerente contar com quinze anos ininterruptos de residência fixa no Brasil, sem condenação penal. A portaria de formal reconhecimento da naturalização, expedida pelo ministro de Estado da Justiça, é de caráter meramente declaratório. Pelo que seus efeitos hão de retroagir à data do requerimento do interessado." (RE 264.848, rel. min. Ayres Britto, julgamento em 29-6-2005, Primeira Turma, DJ de14-10-2005.) No mesmo sentido: RE 655.658-AgR, rel. min. Cármen Lúcia, julgamento em 25-9-2012, Segunda Turma, DJE de 11-10-2012.

"O brasileiro nato, quaisquer que sejam as circunstâncias e a natureza do delito, não pode ser extraditado, pelo Brasil, a pedido de Governo estrangeiro, pois a CR, em cláusula que não comporta exceção, impede, em caráter absoluto, a efetivação da entrega extradicional daquele que é titular, seja pelo critério do jus soli, seja pelo critério do jus sanguinis, de nacionalidade brasileira primária ou originária. Esse privilégio constitucional, que beneficia, sem exceção, o brasileiro nato (CF, art. 5º, LI), não se descaracteriza pelo fato de o Estado estrangeiro, por lei própria, haver-lhe reconhecido a condição de titular de nacionalidade originária pertinente a esse mesmo Estado (CF, art. 12, § 4º, II, a)." (HC 83.113-QO, rel. min. Celso de Mello, julgamento em 26-6-2003, Plenário, DJE de 29-8-2003.)

Conclusão:

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Com isso vemos o quanto é importante à nacionalidade para um país, e que o tema abordado serve como uma dimensão pessoal na qual o Estado não pode deixar de lado, sendo claro o artigo 15 da Declaração Universal dos Direitos do homem da ONU de 1948, fazendo com que cada indivíduo tenha direito a uma nacionalidade, seja brasileira ou estrangeira, dando até a possibilidade de uma pessoa possuir mais de uma nacionalidade, visando assim a proteção de direitos aos nacionais originários ou por aquisição, é importante lembrar também do estrangeiro, que apesar de não possuir alguns direitos reservados aos nacionais, como o voto, são também protegidos pelo ordenamento jurídico, tendo seu respaldo em direitos e garantias fundamentais como o direito a vida, direito esse que assim como todo direito não é absoluto, porém deve ser observado e principalmente preservado para que de forma injusta não haja uma quebra com os direitos humanos e também o direito a integridade física assim como outros direitos que englobam os mesmos.

Referências:

A Constituição e o Supremo. Disponível em:<http://www.stf.jus.br/portal/constituicao/artigobd.asp?item=%20188>.

Nacionalidade no Direito constitucional Brasileiro. Disponível em: <http://drluizfernandopereira.jusbrasil.com.br/artigos/111862710/nacionalidade-no-direito-constitucional-brasileiro>.

CURIA, Luiz Roberto; CÉSPEDES, Livia; NICOLETTI, Juliana. Vade Mecum Saraiva. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 2015.

VICENTE, Paulo; ALEXANDRINO, Marcelo.Direito constitucional Descomplicado. 3.ed. São Paulo: Atlas, 2014.

REZEK, José Francisco. Direito Internacional Público. 9.ed. São Paulo: Saraiva, 2002.

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CONTROLE JURISDICIONAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS

MARCELLA GOMES DO NASCIMENTO: Advogada. Graduada pelo Centro Universitário de João Pessoa - UNIPÊ. Pós-graduada em Direito Público pela Universidade Anhaguera - Uniderp.

RESUMO: O presente trabalho versa sobre o controle exercido pelo Poder Judiciário sobre as políticas públicas. Busca-se compreender a necessidade de investigar as condutas perpretadas pelos agentes públicos, em prol do bem comum, ressaltando sempre os direitos fundamentais dos indivíduos. A pesquisa é resultado do entendimento dos Tribunais Superiores, os quais defendem o mínimo existencial, não havendo qualquer violação ao princípio da separação dos poderes.

Palavras-chave: Controle. Administração Pública. Poder Judiciário. Políticas Públicas.

SUMÁRIO: 1 INTRODUÇÃO, 2 CONTROLE DA ADMINISTRAÇÃO, 2.1 CLASSIFICAÇÃO, 3 CONTROLE JUDICIAL, 3.1 CONTROLE JURISDICIONAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS, 3.1.1 Jurisprudência dos Tribunais Superiores, 4 CONCLUSÃO, 5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.

1 INTRODUÇÃO

A noção de controle não é disciplinada em uma lei específica, sua definição surge da ideia do Estado Democrático de Direito, onde todos os indivíduos devem observar as normas que regulam o Estado.

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A Carta Magna estabelece o princípio da separação dos poderes, visando definir funções típicas para cada poder, para que os anseios da sociedade sejam atendidos satisfatoriamente. . Impende frisar que ambos atuam, ainda, de forma atípica, o que não afeta a independência existente entre eles.

Desse modo, é através do controle que a população, direta ou indiretamente, consegue ter ciência dos atos praticados pelos agentes públicos, permitindo uma constante fiscalização.

2 CONTROLE DA ADMINISTRAÇÃO

O controle é um poder-dever atribuído à Administração, aos Poderes Legislativo e Judiciário, bem como ao povo. Trata-se de um instrumento por meio do qual é possível fiscalizar e revisar os atos administrativos.

Insta salientar a presença dos poderes que regem a organização política do Estado, como o poder Legislativo, o Executivo e o Judiciário. Essa divisão, no exercício das funções estatais, impede que o poder do Estado fique concentrado em um único órgão.

A Constituição Federal de 1988 prevê esse modelo de tripartição dos poderes ao estabelecer no art. 2º “que são Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário”.

As funções estatais desempenhadas são decorrentes de uma separação flexível de poderes. Em outros termos, é possível que as atividades possam ser exercidas de maneira típica e atípica. O Judiciário e o Legislativo realizam as atividades jurisdicional e legislativa, respectivamente, de forma típica, que corresponde a função própria de cada um, podendo também desempenhar funções administrativas, exercendo, portanto, uma atividade atípica. Da mesma forma acontece no Executivo, cuja atribuição precípua é de administrar a coisa pública, mas também pode realizar as funções essenciais dos demais poderes. Conforme se observa, a

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função administrativa, cuja finalidade é atender ao interesse público, está inserida nos três poderes.

2.1 CLASSIFICAÇÃO

No que concerne à origem, o controle pode ser interno e externo. O primeiro diz respeito a um controle efetuado no âmbito de um mesmo Poder ou mediante órgãos que o compõe. Quando um Poder realiza um controle sobre os atos pertencentes a um Poder diverso haverá um controle externo.

Conforme o momento de exercício, o controle se visualiza de forma prévia, concomitante e posterior. O controle será prévio à medida que for exercido em momento anterior a prática do ato. Diante disso, Alexandrino e Paulo (2008, p. 632) ressaltam que um “exemplo de controle prévio é a autorização do Senado Federal necessária para que a União, os Estados, o DF ou os Municípios possam contrair empréstimos externos”. O controle concomitante ocorre no decorrer da efetivação do ato. Por fim, o controle posterior como o próprio nome indica, consiste em uma fiscalização realizada após o término do ato.

O aspecto controlado vislumbra-se através de um controle de legalidade e de mérito. A legalidade é requisito essencial a ser analisado, pois permite observar se o ato foi exercido em consonância com os padrões legais. A Administração pode exercer o controle de legalidade sobre os seus atos em decorrência do poder de autotutela. Nesse sentido, as condutas poderão ser invalidadas, mas caso o vício seja sanável haverá a correção por meio do instituto de convalidação. Tal controle também poderá ser exercido pelos Poderes Judiciário e Legislativo. O controle de mérito consiste em aferir a conveniência e a oportunidade do ato administrativo, revogando-o quando constatada a ausência dos referidos elementos. A revogação dos atos administrativos deve ser procedida pela própria Administração, não sendo possível a realização por parte dos demais Poderes. Contudo, estes poderão fazer uso de tal instituto somente quando se referir aos atos instituídos por eles próprios.

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Quanto à amplitude, o controle poderá ser hierárquico e finalístico. O hierárquico reflete o controle exercido pelos superiores sobre os subordinados. Já o finalístico é aquele realizado em decorrência da descentralização, em que a Administração Direta fiscaliza as finalidades alcançadas pela Administração Indireta, havendo a incidência da vinculação e não da subordinação.

O controle administrativo é um meio de fiscalizar e regulamentar as atividades de acordo com os critérios de legalidade, conveniência e oportunidade. Trata-se de um controle efetuado tipicamente pelo Poder Executivo como também pelos órgãos administrativos dos poderes Legislativo e Judiciário.

Segundo Carvalho Filho (2009), o controle administrativo possui três objetivos: confirmação, correção e alteração. A confirmação vislumbra-se como um meio utilizado pela Administração para identificar o ato como legítimo ou adequado. Quanto à correção, é importante destacar que o administrador tem o poder de revogar atos inoportunos ou inconvenientes e invalidar atos manifestamente ilegais. Já a alteração consiste em uma forma da Administração modificar determinada parte do ato para melhor adequá-lo ao interesse público.

O controle administrativo pode ser exercido mediante os seguintes instrumentos: controle ministerial, hierarquia orgânica, direito de petição, revisão recursal e controle social. O controle ministerial é aquele realizado pelos Ministérios e pode ser exercido de modo interno e externo. Quando os Ministérios exercerem um controle sobre os departamentos administrativos que os integram estará havendo um controle interno. Contudo, se o controle dos Ministérios for realizado sobre pessoas da Administração Indireta incidirá o controle externo. Nesse sentido, Carvalho Filho (2009, p. 900) comenta:

Quando se exerce sobre as entidades da administração descentralizada recebe a denominação específica de supervisão ministerial, prevista no Decreto-lei nº 200/67,

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cujo art. 19 estampa a regra de que “todo e qualquer órgão da administração federal, direta ou indireta, está sujeito à supervisão do Ministério de Estado competente.

A hierarquia orgânica, fruto da organização da Administração Pública, é de suma importância para que os agentes públicos de grau superior possam exercer um controle de fiscalização sobre os subordinados, prezando pela legalidade e pelo bem comum. Trata-se de um controle por subordinação, que pode se dar de ofício ou mediante provocação de terceiro. Ademais, tal controle pode ser prévio, concomitante e posterior.

Quanto ao direito de petição, previsto constitucionalmente no art. 5º, XXXIV, “a”, vale registrar que todos têm o direito de pedir que determinados atos administrativos sejam fiscalizados, corrigidos, revisados, enfim, que a atividade administrativa possa ser controlada em consonância com os parâmetros legais.

Outro meio de exercer o controle administrativo é através da revisão recursal que, como o próprio nome diz, refere-se aos recursos administrativos que possibilitam o reexame das condutas praticadas no âmbito da Administração Pública. Por fim, o controle social é aquele exercido pelos cidadãos, cuja finalidade consiste em acompanhar de forma efetiva o exercício das práticas administrativas. O controle social pode ser visualizado através dos controles natural e institucional. O natural é feito pelas pessoas que compõem as comunidades bem como pelas entidades que a representam. Já o institucional é realizado através dos órgãos, como o Ministério Público, a Defensoria Pública, órgãos de ouvidoria, dentre outros. Sendo assim, o controle social é um instrumento por meio do qual a sociedade expressa a sua opinião e exerce a chamada democracia.

As condutas administrativas desenvolvidas pelos Poderes Legislativo e Executivo também estão sujeitas a um controle judicial

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que verifica a legitimidade dos atos, podendo determinar a anulação.

Há ainda o controle legislativo, conforme estabelecido no art. 49, X, da CF, que indica a competência do Congresso Nacional para “fiscalizar e controlar, diretamente, ou por qualquer de suas Casas, os atos do Poder Executivo, incluindo os da administração indireta”. O referido poder exerce um controle financeiro sobre as pessoas responsáveis pelo gerenciamento de bens e recursos públicos. É importante destacar a presença do Tribunal de Contas que é um importante órgão de controle. Nessa linha de pensamento, a Constituição da República, em seu art. 71, I e II, institui como atribuição do Tribunal de Contas da União, órgão auxiliar do Poder Legislativo no controle externo, apenas a apreciação das contas do Presidente da República, já que o julgamento destas cabe ao Congresso Nacional. Além disso, preceitua a função de julgar as contas daqueles que administram valores públicos.

3 CONTROLE JUDICIAL

O ordenamento jurídico brasileiro adotou o sistema de jurisdição única ou sistema inglês, que se contrapõe ao sistema do contencioso administrativo. Desse modo, predomina o entendimento de que todos os litígios podem ser submetidos ao Poder Judiciário, tendo aptidão para produzir a chamada coisa julgada material.

Vale destacar que a utilização do referido sistema não afasta a apreciação das questões pela esfera administrativa. Busca-se, na verdade, permitir que, esgotadas as instâncias administrativas, os fatos possam ser apreciados também no âmbito judiciário.

Nesse diapasão, é importante mencionar que o esgotamento na esfera administrativa não é pressuposto para que se possa ingressar no judiciário. Lado outro, a doutrina aponta uma exceção, qual seja, as ações referentes à justiça desportiva, as quais só podem ser objeto de análise do judiciário após esgotarem-se as instâncias da justiça desportiva, na forma do art. 217, §1º, da CF.

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O controle judicial das atividades administrativas só pode ser exercido através de provocação do interessado e só diz respeito aos aspectos de legalidade, uma vez que o poder judiciário não pode interferir na conveniência e oportunidade, elementos característicos da discricionariedade, inerentes à Administração Pública.

Não obstante deva ser observado rigorosamente o princípio da legalidade, faz-se mister apontar que, diante das peculiaridades do caso concreto, outros princípios também devem ser levados em consideração, havendo uma ponderação de interesses, pois, caso a retirada do ato do mundo jurídico acarrete mais prejuízos que sua manutenção, este deve ser mantido em razão da segurança jurídica.

O novo Código de Processo Civil preceitua que, nas ações judiciais, seja incentivada a mediação por todos os operadores do Direito.

O controle jurisdicional pode ser efetivado mediante vários instrumentos, dentre eles podemos citar o mandado de segurança, habeas data, mandado de injunção, ação popular e a ação civil pública.

O mandado de segurança é um remédio jurídico constitucional previsto no art.5º, LXIX e LXX, da CF, e regulamentado pela Lei 12.016/09. É utilizado quando há violação de direito líquido e certo, ou seja, direito cuja prova se encontra pré-constituída, não sendo permitida a dilação probatória. Trata-se de um instrumento muito importante para coibir atos omissivos do poder público.

O habeas data, previsto no art. 5º, LXXII, da CF, garante o direito à informação acerca da pessoa do impetrante. Impende frisar que a jurisprudência vem admitindo a propositura por sucessores, em defesa dode cujus. Nesse contexto, não é vedada a impetração do habeas data por pessoa jurídica que pretenda obter informações em relação a si.

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O mandado de injunção, nos termos do art. 5º, LXXI, da CF, é uma ação proposta mediante a existência de norma de eficácia limitada, isto é, a norma só produzirá efeitos se houver uma legislação infraconstitucional que regule a sua aplicação. Assim, trata-se de um meio utilizado para garantir o exercício dos direitos e liberdades constitucionais. Nesse sentido, Carvalho, Matheus (2016, p. 394) preceitua:

Desse modo, deve-se, portanto, considerar que o Poder Judiciário, no julgamento do Mandado de Injunção, não pode substituir-se ao legislador, editando normas para regulamentação da matéria constitucional, entretanto, poder-se-á valer de analogia em relação a leis existentes, como forma de suprir a omissão legislativa, no caso concreto, com efeitos inter partes ou erga omnes,dependendo da amplitude da matéria.

A ação popular, descrita no art. 5º, LXXIII, da CF, possibilita o controle dos atos administrativos pela sociedade, haja vista ser proposta apenas pelo cidadão. Ela tem como escopo a anulação de atos lesivos ao interesse público, sendo inviável a sua impetração para proteger direitos individuais.

A ação civil pública é muito importante para a proteção de direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos. Segundo a lei nº 7.347/85, o objeto da demanda deve buscar a defesa do meio ambiente, do direito do consumidor, da ordem econômica, dos direitos de grupos raciais, étnicos ou religiosos, dentre outros.

É importante mencionar a existência dos atosinterna corporis, que são atos exercidos na esfera interna dos poderes judiciário e legislativo. Tais atos não são objeto de análise da decisão jurisdicional, haja vista ser praticados no limite das competências dos poderes. Em contrapartida, é possível que exista um controle jurisdicional quando as normas internas violarem preceitos

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constitucionais, conforme se depreende do entendimento de Marinela, Fernanda (2013, p. 1065):

O STF já deixou bastante claro que a tese da incognoscibilidade da matéria não se aplica quando diz respeito à alegação de ofensa a direito ou garantia constitucional, o que, por si só, afasta o caráter interna corporis do comportamento. A hipótese é a mesma quando se está diante de matéria que ofenda direitos assegurados pela CF na iminência de serem transgredidos. Ou seja, só se pode falar de atointerna corporis, quando este se revela essencialmente insindicável, se presentes aspectos discricionários concernentes às questões políticas.

3.1 CONTROLE JURISDICIONAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS

Conforme explicitado, o controle jurisdicional pode ser realizado sobre atos omissivos, situações nas quais o Poder Público fica inerte, o que resulta em obrigação de fazer para que o interesse público seja protegido.

As políticas públicas são programas e ações desempenhados pelo Estado, de forma direta ou indireta, mediante a participação de entidades públicas ou privadas, cuja finalidade precípua é a garantia dos direitos fundamentais, tais como saúde, liberdade, cidadania e educação.

Durante muitos anos, o poder judiciário não poderia rever políticas públicas. A partir da ADPF 45, isso passou a ser possível no que tange à legalidade e aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

Tais princípios representam limites à liberdade do administrador. A razoabilidade visa à proibição de excessos, afastando as condutas arbitrárias. A proporcionalidade permite agir

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de forma equilibrada. Para a maioria dos autores, esse princípio está contido no da razoabilidade.

O STF, no julgamento da ADPF 45, decidiu que a atuação do poder público deve observar as normas legais:

Não obstante a formulação e a execução de políticas públicas dependam de opções políticas a cargo daqueles que, por delegação popular, receberam investidura em mandato eletivo, cumpre reconhecer que não se revela absoluta, nesse domínio, a liberdade de conformação do legislador, nem a de atuação do Poder Executivo.

Infere-se desse posicionamento que, apesar do Poder Judiciário, em regra, não poder intervir no mérito administrativo, ele deverá agir diante de uma violação evidente e arbitrária dos ditames constitucionais.

3.1.1. Jurisprudência dos Tribunais Superiores

O controle jurisprudencial sobre políticas públicas é tema recorrente na jurisprudência, devendo ser analisado de acordo com cada caso concreto.

O Supremo Tribunal Federal, em sede de recurso extraordinário, já se posicionou no sentido de obrigar a Administração a manter quantidade mínima de medicamento em estoque. O Estado alegou que essa decisão contraria o princípio da separação dos poderes. Todavia, esse fundamento não foi acolhido, uma vez que o Poder Judiciário não está interferindo nas competências do Estado, mas sim controlando atos que se apresentaram de forma ilegal e arbitrária, prejudicando a saúde da população. É o que se extrai do julgado abaixo:

Ementa: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO E MANUTENÇÃO EM ESTOQUE. DOENÇA DE

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GAUCHER. QUESTÃO DIVERSA DE TEMA COM REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. SOBRESTAMENTO. RECONSIDERAÇÃO. PREQUESTIONAMENTO. OCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE OFENSA AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES. CONSTITUCIONAL. DIREITO À SAÚDE. DEVER. PODER PÚBLICO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. I – A questão discutida no presente feito é diversa daquela que será apreciada no caso submetido à sistemática da repercussão geral no RE 566.471-RG/RN, Rel. Min. Marco Aurélio. II - No presente caso, o Estado do Rio de Janeiro, recorrente, não se opõe a fornecer o medicamento de alto custo a portadores da doença de Gaucher, buscando apenas eximir-se da obrigação, imposta por força de decisão judicial, de manter o remédio em estoque pelo prazo de dois meses. III – A jurisprudência e a doutrina são pacíficas em afirmar que não é necessário, para o prequestionamento, que o acórdão recorrido mencione expressamente a norma violada. Basta, para tanto, que o tema constitucional tenha sido objeto de debate na decisão recorrida. IV – O exame pelo Poder Judiciário de ato administrativo tido por ilegal ou abusivo não viola o princípio da separação dos poderes. Precedentes. V – O Poder Público não pode se mostrar indiferente ao problema da saúde da população, sob pena de incidir, ainda que por censurável omissão, em grave comportamento inconstitucional. Precedentes. VI – Recurso extraordinário a que se nega provimento.

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(RE 429903, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Primeira Turma, julgado em 25/06/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-156 DIVULG 13-08-2014 PUBLIC 14-08-2014)

Outro caso importante decidido pelo STF foi o direito à acessibilidade em prédios públicos. A Constituição Federal, em seus arts. 227, §2º e 244, garante esse direito:

Art. 227 [...] § 2º A lei disporá sobre normas de

construção dos logradouros e dos edifícios de uso público e de fabricação de veículos de transporte coletivo, a fim de garantir acesso adequado às pessoas portadoras de deficiência.

Art. 244. A lei disporá sobre a adaptação dos logradouros, dos edifícios de uso público e dos veículos de transporte coletivo atualmente existentes a fim de garantir acesso adequado às pessoas portadoras de deficiência, conforme o disposto no art. 227, § 2º.

O mencionado direito também se encontra previsto na Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, a qual possui status de emenda constitucional no ordenamento jurídico brasileiro.

No caso em apreço, uma determinada escola pública não possuía rampa de acesso para cadeirantes. O Estado justificou a ausência sob o argumento de que não havia estudantes portadores de necessidades especiais matriculados na escola, bem como não tinha disponibilidade orçamentária. Porém, o STF não considerou as justificativas e decidiu que “o Poder Judiciário, em situações excepcionais, pode determinar que a Administração Pública adote medidas assecuratórias de direitos constitucionalmente reconhecidos como essenciais, sem que isso configure violação do princípio da separação de poderes”, nos termos da seguinte decisão:

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PRÉDIO PÚBLICO – PORTADOR DE NECESSIDADE ESPECIAL – ACESSO. A Constituição de 1988, a Convenção Internacional sobre Direitos das Pessoas com Deficiência e as Leis nº 7.853/89 – federal –, nº 5.500/86 e nº 9.086/95 – estas duas do Estado de São Paulo – asseguram o direito dos portadores de necessidades especiais ao acesso a prédios públicos, devendo a Administração adotar providências que o viabilizem. (RE 440028, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Primeira Turma, julgado em 29/10/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-232 DIVULG 25-11-2013 PUBLIC 26-11-2013)

Superior Tribunal de Justiça comunga do mesmo entendimento do STF. Diante de irregularidades existentes em uma cadeia pública, tais como superlotação, celas sem ventilação e iluminação, desrespeito à integridade física e moral dos detentos, o STJ impôs obrigação de fazer ao Estado para que fosse feita uma reforma no estabelecimento, independentemente de haver previsão orçamentária. Nesse caso, não houve aplicação da teoria da reserva do possível, uma vez que se deve garantir, primeiramente, o mínimo existencial:

DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. CONTROLE JURISDICIONAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS RELACIONADO A INÚMERAS IRREGULARIDADES ESTRUTURAIS E SANITÁRIAS EM CADEIA PÚBLICA.Constatando-se inúmeras irregularidades em cadeia pública - superlotação, celas sem condições mínimas de salubridade para a permanência de presos, notadamente em razão de defeitos

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estruturais, de ausência de ventilação, de iluminação e de instalações sanitárias adequadas, desrespeito à integridade física e moral dos detentos, havendo, inclusive, relato de que as visitas íntimas seriam realizadas dentro das próprias celas e em grupos, e que existiriam detentas acomodadas improvisadamente -, a alegação de ausência de previsão orçamentária não impede que seja julgada procedente ação civil publica que, entre outras medidas, objetive obrigar o Estado a adotar providências administrativas e respectiva previsão orçamentária para reformar a referida cadeia pública ou construir nova unidade, mormente quando não houver comprovação objetiva da incapacidade econômico-financeira da pessoa estatal. De fato, evidencia-se, na hipótese em análise, clara situação de violação à garantia constitucional de respeito da integridade física e moral do preso (art. 5º, XLIX, da CF) e aos princípios da dignidade da pessoa humana e do mínimo existencial. Nessas circunstâncias - em que o exercício da discricionariedade administrativa pelo não desenvolvimento de determinadas políticas públicas acarreta grave vulneração a direitos e garantias fundamentais assegurados pela Constituição -, a intervenção do Poder Judiciário se justifica como forma de implementar, concreta e eficientemente, os valores que o constituinte elegeu como "supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos fundada na harmonia social", como apregoa o preâmbulo da CF. Há, inclusive, precedentes do STF (RE-AgR

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795.749, Segunda Turma, DJe 20/5/2014; e ARE-AgR 639.337, Segunda Turma, DJe 15/9/2011) e do STJ (AgRg no REsp 1.107.511-RS, Segunda Turma, DJe 6/12/2013) endossando a possibilidade de excepcional controle judicial de políticas públicas. Além disso, não há, na intervenção em análise, ofensa ao princípio da separação dos poderes. Isso porque a concretização dos direitos sociais não pode ficar condicionada à boa vontade do Administrador, sendo de suma importância que o Judiciário atue como órgão controlador da atividade administrativa. Seria distorção pensar que o princípio daseparação dos poderes, originalmente concebido com o escopo de garantia dos direitos fundamentais, pudesse ser utilizado como óbice à realização dos direitos sociais, igualmente importantes. Tratando-se de direito essencial, incluso no conceito de mínimo existencial, inexistirá empecilho jurídico para que o Judiciário estabeleça a inclusão de determinada política pública nos planos orçamentários do ente político, mormente quando não houver comprovação objetiva da incapacidade econômico-financeira da pessoa estatal. Ademais, também não há como falar em ofensa aos arts. 4º, 6º e 60 da Lei 4.320/1964 (que preveem a necessidade de previsão orçamentária para a realização das obras em apreço), na medida em que a ação civil pública analisada objetiva obrigar o Estado a realizar previsão orçamentária das obras solicitadas, não desconsiderando, portanto, a necessidade de previsão orçamentária das obras. Além do mais, tem-se visto, recorrentemente, a invocação da teoria da reserva do possível, importada do

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Direito alemão, como escudo para o Estado se escusar do cumprimento de suas obrigações prioritárias. Não se pode deixar de reconhecer que as limitações orçamentárias são um entrave para a efetivação dos direitos sociais. No entanto, é preciso ter em mente que o princípio da reserva do possível não pode ser utilizado de forma indiscriminada. Na verdade, o direito alemão construiu essa teoria no sentido de que o indivíduo só pode requerer do Estado uma prestação que se dê nos limites do razoável, ou seja, na qual o peticionante atenda aos requisitos objetivos para sua fruição. Informa a doutrina especializada que, de acordo com a jurisprudência da Corte Constitucional alemã, os direitos sociais prestacionais estão sujeitos à reserva do possível no sentido daquilo que o indivíduo, de maneira racional, pode esperar da sociedade. Ocorre que não se podem importar preceitos do direito comparado sem atentar para Estado brasileiro. Na Alemanha, os cidadãos já dispõem de um mínimo de prestações materiais capazes de assegurar existência digna. Por esse motivo, o indivíduo não pode exigir do Estado prestações supérfluas, pois isso escaparia do limite do razoável, não sendo exigível que a sociedade arque com esse ônus. Eis a correta compreensão do princípio da reserva do possível, tal como foi formulado pela jurisprudência germânica. Todavia, situação completamente diversa é a que se observa nos países periféricos, como é o caso do Brasil, país no qual ainda não foram asseguradas, para a maioria dos cidadãos, condições mínimas para uma vida digna. Nesse caso, qualquer pleito que vise a fomentar uma existência minimamente

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decente não pode ser encarado como sem razão, pois garantir a dignidade humana é um dos objetivos principais do Estado brasileiro. É por isso que o princípio da reserva do possível não pode ser oposto a um outro princípio, conhecido como princípio do mínimo existencial. Desse modo, somente depois de atingido esse mínimo existencial é que se poderá discutir, relativamente aos recursos remanescentes, em quais outros projetos se deve investir. Ou seja, não se nega que haja ausência de recursos suficientes para atender a todas as atribuições que a Constituição e a Lei impuseram ao estado. Todavia, se não se pode cumprir tudo, deve-se, ao menos, garantir aos cidadãos um mínimo de direitos que são essenciais a uma vida digna, entre os quais, sem a menor dúvida, podemos incluir um padrão mínimo de dignidade às pessoas encarceradas em estabelecimentos prisionais. Por esse motivo, não havendo comprovação objetiva da incapacidade econômico-financeira da pessoa estatal, inexistirá empecilho jurídico para que o Judiciário determine a inclusão de determinada política pública nos planos orçamentários do ente político. (REsp 1.389.952-MT, Relator (a): Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 3/6/2014).

Nesse diapasão, insta frisar a grave situação do sistema carcerário brasileiro, o qual resultou no chamado Estado de Coisas Inconstitucional que consiste na violação de direitos fundamentais dos detentos. Outrossim, o Supremo Tribunal Federal, em defesa da dignidade da pessoa humana, considerou como lícita a atuação do Poder Judiciário que determinou a promoção de obras emergenciais em estabelecimentos prisionais, na forma deste julgado:

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Ementa: REPERCUSSÃO GERAL. RECURSO DO MPE CONTRA ACÓRDÃO DO TJRS. REFORMA DE SENTENÇA QUE DETERMINAVA A EXECUÇÃO DE OBRAS NA CASA DO ALBERGADO DE URUGUAIANA. ALEGADA OFENSA AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES E DESBORDAMENTO DOS LIMITES DA RESERVA DO POSSÍVEL. INOCORRÊNCIA. DECISÃO QUE CONSIDEROU DIREITOS CONSTITUCIONAIS DE PRESOS MERAS NORMAS PROGRAMÁTICAS. INADMISSIBILIDADE. PRECEITOS QUE TÊM EFICÁCIA PLENA E APLICABIILIDADE IMEDIATA. INTERVENÇÃO JUDICIAL QUE SE MOSTRA NECESSÁRIA E ADEQUADA PARA PRESERVAR O VALOR FUNDAMENTAL DA PESSOA HUMANA. OBSERVÂNCIA, ADEMAIS, DO POSTULADO DA INAFASTABILIDADE DA JURISDIÇÃO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO PARA MANTER A SENTENÇA CASSADA PELO TRIBUNAL. I - É lícito ao Judiciário impor à Administração Pública obrigação de fazer, consistente na promoção de medidas ou na execução de obras emergenciais em estabelecimentos prisionais. II - Supremacia da dignidade da pessoa humana que legitima a intervenção judicial. III - Sentença reformada que, de forma correta, buscava assegurar o respeito à integridade física e moral dos detentos, em observância ao art. 5º, XLIX, da Constituição Federal. IV - Impossibilidade de opor-se à sentença de primeiro grau o argumento da reserva do possível ou princípio da separação dos poderes. V - Recurso

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conhecido e provido. (RE 592581, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Tribunal Pleno, julgado em 13/08/2015, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-018 DIVULG 29-01-2016 PUBLIC 01-02-2016)

Assim, é evidente a importância da intervenção do Poder Judiciário sobre os serviços prestados pela Administração Pública, porquanto permite uma efetiva garantia dos direitos pertencentes à coletividade.

4 CONCLUSÃO

Ante o exposto, nota-se que o controle é um instrumento de grande valia para a fiscalização dos atos praticados pelo poder público. A sociedade deve estar atenta às condutas praticadas por seus representantes, podendo fazer uso das ações judiciais quando verificarem abusos ou ilegalidades nos serviços prestados.

O controle está presente em todos os poderes políticos, o que não afeta o princípio da separação existente entre eles. Assim, o controle jurisdicional é amplamente aceito no que diz respeito às políticas públicas, uma vez que o poder judiciário não pode se omitir diante de atos ilegais e arbitrários. A intervenção é vedada apenas quando se tratar de elementos ligados à conveniência e oportunidade.

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DIREITO PENAL DO INIMIGO E AS GARANTIAS PENAS DO ART. 5° DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL

PRISCILA HELENA SOARES PIAU: Ensino Superior Completo - Universidade de Brasília (UnB). Cargo de Técnico Judiciário Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios.

RESUMO: Diante da onda de criminalidade que se opera sobre a sociedade brasileira, esta tem clamado por mais segurança, exigindo do Estado uma posição legiferante, de modo a alargar a punição penal, construindo o tipo inimigo. Essa ideia, idealizada pelo teórico Gunther Jakobs, apresenta uma dualidade penal, caracterizada pela presença do cidadão e do inimigo, presentes em um único regime político, que é o Democrático. Deve-se aceitar que é uma teoria coerente normativamente com a realidade de Jakobs, todavia, rompe com os ditames essenciais de um Estado Garantidor. Assim, mais que uma tese, essa teoria é apresentada no trabalho como uma política criminal expansionista, que contraria a ideia de ultima ratio da intervenção do Direito Penal. Logo, esta nova construção seria constitucional ou inconstitucional, dentro da vigência de um Estado que prima pelas garantias penais, trazidas essencialmente no artigo 5° da Constituição Federal?

Palavras chave: Direito Penal. Expansionismo penal. Direito Penal Mínimo. Inimigo e Cidadão.Garantias Penais.

INTRODUÇÃO

Este presente trabalho tem por escopo analisar criticamente a proposta idealizada por Gunther Jakobs, o Direito Penal do Inimigo, e diante desta apreciação explorar a incompatibilidade que existe entre essa teoria e a conjuntura do Estado Garantista.

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O tema analisado possui extrema relevância no debate jurídico que se opera hodiernamente. Sabe-se que diante da megacriminalidade que se vê realizada na sociedade brasileira, muito tem se discutido sobre a verdadeira finalidade que deve possuir o Direito Penal. Diversas são as soluções apresentadas, e entre essas, mostra-se o Direito Penal do Inimigo como uma política de contenção ao crime, resguardando a segurança clamada popularmente.

O método científico no qual se pauta este presente estudo é formulado sob a concepção da dedução, tendo em vista que se passará a analisar regras e teses que são gerais, formulando premissas, para se chegar a uma conclusão para o fato específico, que se concentra na definição da constitucionalidade ou não do direito penal do inimigo no Estado de Direito.

Por sua vez, a pesquisa bibliográfica deste estudo é proposta sobre três capítulos. O capítulo inicial propõe analisar as políticas criminais contemporâneas, de modo que se possa reconhecer o fim a que se destina o Direito Penal para cada política adotada.

No segundo capítulo, apresentar-se-ão os argumentos dogmático-jurídicos defendidos por Gunther Jakobs, para a construção da Teoria do Direito Penal do Inimigo. Esta se fundamenta na segregação entre cidadão e inimigo, de modo que este é reconhecido como não pessoa, perdendo todos os seus direitos quando viola a norma jurídica, e rompe com a fidelidade ao sistema penal.

Nos últimos capítulos buscar-se-á confrontar o que é inicialmente proposto por Jakobs com as garantias penais taxadas no texto constitucional, de modo que se possa verificar se há ou não compatibilidade entre a construção da Teoria do Direito Penal do Inimigo com a formulação do Estado Garantista. Para tanto, é imprescindível analisar qual a relação que se apresenta entre o Direito Penal e a Constituição Federal, bem como a existente entre as teorias de Jakobs e de Freud. Sendo assim, por fim, será traçada uma argumentação exponencial a respeito da constitucionalidade ou não das ideias do inimigo dentro deste Estado Democrático de

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Direito, de modo que se possa trazer a conclusão deste presente trabalho.

1. Visões a respeito do papel do Direito Penal.

Da necessidade de configuração de um direito penal, surge o paradigma do abolicionismo, o qual recusa a consistência científica a todas as premissas do direito penal, e propõe não apenas a extinção da pena ou do direito penal, mas a imediata abolição de todo o sistema de justiça penal.[1] Sob esse paradigma, o direito penal é um problema social em si mesmo, devendo ser abolido para dar vida às comunidades.

O direito penal, para o abolicionismo, é por si só incapaz de prevenir, por meio da cominação e execução de penas, seja pelo seu caráter geral ou especial de prevenção de novos delitos. Assim, utiliza-se do argumento de que o direito penal não é meio apto a motivar comportamentos que impeçam o indivíduo de praticar determinado delito, tendo em vista que o indivíduo não é neutralizado pelo mero temor decorrente da pena imposta.[2]

Baratta argumenta que o controle penal atua apenas quando as consequências das infrações penais já ocorreram, mas não com o objetivo de evitá-las ou preveni-las. Ademais, afirma que o sistema penal intervém apenas quando já se produziu uma vítima, e não na prevenção de que outras vítimas sejam geradas, isto porque, as consequências da violência não conseguem ser eliminadas efetivamente, mas tão somente simbolicamente. [3] Justifica que este sistema penal utiliza-se de penas, em forma de violência, para compensar simbolicamente um ato de violência realizado, e por ser assim, não é legitimado.

O movimento que ora se apresenta busca a todo tempo estabelecer a deslegitimação que se encontra o sistema penal, sendo constituído pela demonstração de que o sistema penal encontra-se repleto de incapacidades – a pena não consegue mais prevenir novos crimes; a segurança já não é mais levada à sociedade; não se consegue evitar a megacriminalização, e sendo

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assim, bens jurídicos essenciais deixam de ser tutelados - e que não consegue se reverberar novamente, gerando a efetividade clamada hodiernamente.

Ademais, compreender esta deslegitimação é ter capacidade de verificar que o sistema penal encontra-se desprotegido. Entretanto, cabe ainda reconhecer que é neste crucial ponto histórico que surge a necessidade de uma nova, e talvez, mais arriscada forma de relegitimação, que se opera em desenvolvimento, e que poderá modificar toda a histórica dogmática até então já construída, tendo em vista que o novo discurso constrói-se na ideia do medo do inimigo, conforme a criminalidade que cresce a níveis massivos.

Posteriormente, faz-se necessário apresentar o que propõe a política criminal do minimalismo, de modo que Luigi Ferrajoli a estabelece como o único fim que o Estado pode legitimamente perseguir para promover a aplicação da pena, diante de um ilícito penal praticado. Isto quer dizer que por meio da prevenção geral negativa, busca-se a prevenção futura de novos delitos, como também, e essencialmente, a prevenção de penas informais, de possíveis reações públicas, que podem ser resultantes da omissão do sistema penal.[4]

Este modelo traz em sua essência o garantismo, que somente permite a intervenção do Estado quando houver um prévio cometimento de um delito, sendo este previamente previsto em lei, com a estrita necessidade de punição e havendo a prova empírica trazida no processo. Ademais, este modelo pugna pela prevalência das garantias penais fundamentais, como a legalidade, a ofensividade do ato, entre outras.[5]

Por fim, surge a política criminal, que ganha relevância na aplicação do direito penal, que é o expansionismo penal. Assim, pois, enquanto que o estado neoliberal utiliza-se do minimalismo na economia e no mercado, e ainda no desenvolvimento de políticas sociais, o direito penal volta-se para uma visão totalmente oposta,

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que é definida pelo intervencionismo, na aplicação da pena de morte e da dureza da pena privativa de liberdade.[6]

O que se apresenta no mundo globalizado neoliberal, não é apenas a preeminência dos movimentos minimalistas ou abolicionistas, mas a expansão e a relegitimação do direito penal, que se dá por meio do eficientismo penal, que é fundado nos ditames da Lei e da Ordem. Assim, o sistema penal apresenta-se como uma crise de eficiência, decorrente da operacionalização do poder punitivo. [7]

O novo discurso estabelece que o sistema não funciona, e por ser assim, não combate a criminalidade, uma vez que não é repressivo o suficiente. A sociedade, demanda por criminalizar mais, penalizar mais, aumentar os aparatos judiciais, policiais e penitenciários. Torna necessário suprimir cada vez mais os direitos e garantias dos indivíduos, rompendo com os ditames constitucionais, por uma necessidade que se mostra pela ineficiência do sistema penal, na sua conjuntura social.[8]

Dessa sorte, há o surgimento do Direito Penal do Inimigo, por intermédio de Gunther Jakobs, o qual se propõe a trabalhar acerca da globalização e do terrorismo, com vistas a romper dados questionamentos e dificuldade que se mostram intrínsecas ao novo processo de controle penal globalizado.

2. Direito Penal do Inimigo segundo Gunther Jakobs.

Nas ultimas décadas ocorreu uma latente alteração no campo da política criminal, de modo que diante da celeuma entre as políticas abolicionistas e minimalistas, passou-se a verificar um debate sobre o expansionismo do poder punitivo. E é nele que o tema do inimigo da sociedade ganhou o primeiro plano de discussão. [9]

Diante do Direito Penal da contemporaneidade, que clama por uma maior eficiência na penalização ou punição, como forma de

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gerar uma resposta a todo custo à sociedade, surge uma das mais controversas teorizações da atualidade, que é o Direito Penal do Inimigo, devidamente formulada pelo penalista alemão Gunther Jakobs, que pode ser configurada como um instrumento a promover a tranquilidade social, voltado à megacriminalização da sociedade de risco. [10]

Defende Jakobs uma reedição da prevenção especial negativa trazida à baila por Rafaele Garófalo, o qual partia de uma visão de mundo em que os sujeitos que não se adequam à realidade deveriam ser dela eliminados. O grande desafio de toda essa teorização, calcada no reconhecimento da ideia de inimigo, está na definição de quem se enquadraria dentro dessa conceituação e, portanto, seria objeto de tutela de um direito excepcional, no qual não se garante qualquer direto ou garantia.

A ideia de inimigo é mutante, já que, com o perpassar dos tempos, o Estado vai adquirindo novos inimigos, e os anteriores deixam de lhe ser importantes, o que se efetiva a partir das premissas principilógicas de seletividade, fragmentariedade, intervenção mínimo, características do Direito Penal. A busca pela definição deste inimigo está centrada no ideal de dever ser este eliminado em sua completude das esferas sociais.

Diferentemente do cidadão, o inimigo é aquele que se afasta do ordenamento jurídico de modo permanente, rompendo com toda a tranquilidade social. Não oferece nenhuma garantia à fidelidade da norma, o que é imprescindível para ser tratado como pessoa pelo direito.[11] É por ser assim, que o Direito Penal do Inimigo concebe a ideia de um inimigo que age de modo habitual.

Cumpre asseverar que a noção de inimigo remonta à cultura romana, que promovia a distinção entre o inimicus e o hostis, de forma que o inimicus era o inimigo pessoal, ao passo que o inimigo político era ohostis. Assim, o estrangeiro, o hostis, o estranho e o inimigo, careciam de direitos em termos absolutos, pois encontravam-se fora da realidade social. [12]

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Não há que se pensar ser o conceito de inimigo privilégio da atualidade, mas, ao contrário, a presença de inimigos nos seios sociais é fato antigo nas comunidades de todo o mundo, destinando-se a eleição daqueles que devem figurar na categoria de inimigo a justificar e legitimar toda a ação coercitiva do Estado nesta luta interminável de combate à criminalidade.

O Direito Penal do Inimigo não busca, tão somente, compensar um dano causado à vigência da norma, como ocorre no Direito Penal do cidadão, mas prima essencialmente pela eliminação do perigo representado por indivíduos, tratados como não pessoas.

3. Direito Penal Do Inimigo v. Teorias Psicanalísticas de Freud frente às garantias constitucionais brasileiras

Há que se ter extrema cautela com a flexibilização de direitos e com a “despersonalização” de pessoas, pois o poder de punir de forma ilimitada poderá ensejar, em larga medida, uma atuação preventiva em toda a sociedade e não apenas contra os eleitos e rotulados inimigos do Estado, ou seja, corre-se o risco de generalizar as definições do inimigo.

Na medida em que o Direito Penal do Inimigo visa a eliminar do seio social os inimigos, como forma de resposta social à megacriminalização que assola a sociedade, Freud, por intermédio de suas teorias psicanalíticas, nega o princípio da legitimidade, na medida em que defende que a criminalidade não poderá ser eliminada, já que ela se faz necessária para manter a posição de honesto dos demais indivíduos.

A reação punitiva ao invés de promover a eliminação da criminalidade torna o desvio criminalizado como essencial e necessário à sociedade, na medida é necessário para manter a condição de honesta dos demais indivíduos; a sociedade não seria legítima para punir o delinquente para que transfere para os

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criminosos/repressão do mal as suas agressividades; com o fim de manter a sociedade na posição de íntegro.

É diante das teorias psicanalíticas da sociedade punitiva que Alessandro Baratta afirma que também o princípio da legitimidade é posto em causa, tendo em vista que:

A função psicossocial que atribuem à reação punitiva permite interpretar como mistificação racionalizante as pretensas funções preventivas, defensivas e éticas sobre as quais se baseia a ideologia da defesa social (princípio da legitimidade) e em geral toda ideologia penal. Segundo as teorias psicanalíticas da sociedade punitiva, a reação penal ao comportamento delituoso não tem a função de eliminar ou circunscrever a criminalidade, mas corresponde a mecanismos psicológicos em face dos quais o desvio criminalizado aparece como necessário e ineliminável da sociedade[13]

Em que pese a existências de entendimentos doutrinários dissonantes, a respeito do papel do direito penal na sociedade, todas as teorias convergem na busca pela redução da criminalidade e proteção de todo o corpo social. Contudo, tal objetivo não pode ser alcançado sem a busca por uma reforma profunda no sentido de que restabelecer as bases de aplicação da lei penal, a partir de estudos criminológicos a ser realizados em ambientes prisionais.

A busca pelo combate à criminalização deve se dar desde a sua origem e não apenas através de uma despersonalização do homem e, consequente, eleição de inimigos a serem tutelas por um Estado de exceção, até mesmo pelo fato de que tal prática já foi intentado por diversos países em épocas passadas, como, por exemplo, na Alemanha Nazista, não servindo para o efetivo controle da incidência criminal; mas, ao contrário, assolando ainda mais as diferenciações existentes entre os povos.

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As garantias fundamentais, como se sabe, só podem ser mitigadas se assim for devidamente previsto no texto constitucional, pois, consoante o artigo 60 da Constituição, estas são inseridas no arcabouço das cláusulas pétreas, que não permitem qualquer restrição aos direitos fundamentais.

Portanto, admitir um Direito Penal do Inimigo é romper drasticamente com a noção de um Estado Democrático de Direito, pois ao promover a distinção entre cidadãos e inimigos, reconhecendo direitos diferentes a ambos, infringe-se com a igualdade de tratamento formal e material dos indivíduos. Posteriormente, ao determinar a construção do inimigo, caminha-se para a formação de um Estado absolutista, pois todo o poder é dado àquele que possui capacidade para isso.

CONCLUSÃO

O presente artigo teve por escopo central promover uma análise crítica das propostas definidas na política criminal idealizada por Gunther Jakobs, que é o Direito Penal do Inimigo, de modo que se chegou à conclusão de que há incompatibilidade deste instituto com os ditames do atual Estado Garantista Brasileiro.

Hodiernamente, existem três grandes propostas de políticas criminais, sendo que uma propõe o abolicionismo do sistema penal como um todo; a outra é apresentada pelo minimalismo, que defende a intervenção ultima ratio do Direito Penal; e a última é a defesa do expansionismo, que quer controlar a megacriminalidade, e para isso, utiliza-se de instrumentos que ampliam a esfera de atuação e intervenção do Direito Penal na sociedade, de modo a punir mais, estando devidamente sintetizada na Teoria do Direito Penal do Inimigo.

Sendo assim, foi necessário apresentar, no iniciar deste trabalho, o estudo das políticas criminais contemporâneas. Sabe-se que foi devido à globalização e a crescente onda de criminalidade e de violência que surgiu a política criminal ligada ao expansionismo penal e ao seu endurecimento, criando condições para o

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nascimento do inimigo, como forma de resguardar a segurança clamada pela sociedade.

O modelo do expansionismo confronta-se diretamente com o Direito Penal Mínimo, pois viola os ditames constitucionais ao retirar a essência de um Estado Democrático de Direito, que são as garantias fundamentais e a flexibilização da legalidade. Assim, a adoção de uma política criminal só pode ocorrer quando for capaz de promover a inclusão do outro, partindo da premissa de que a criminalidade nasce com a comunidade, e com esta deve ser solucionada, sendo, portanto, um problema social.

Sob este paradigma, tem-se que o presente artigo optou pela análise das propostas da teoria do Direito Penal do inimigo, tendo como seu maior pressuposto a política criminal voltada para o endurecimento do Direito Penal, isto é, como surgimento do expansionismo penal. Assim, a teoria foi idealizada pelo penalista alemão Günther Jakobs catedrático emérito de Direito Penal e Filosofia do Direito pela Universidade de Bonn na Alemanha.

Na definição de sua Teoria, Gunther Jakobs sedimenta todo o seu estudo na premissa do funcionalismo radical sistêmico, que se faz extremamente necessário compreender para poder analisar os postulados da Teoria do Inimigo. Assim, na análise da visão funcionalista, todos os conceitos jurídicos devem ser reunidos de forma a satisfazer as funções do próprio sistema penal, que para Roxin, volta-se para a tutela constitucional subsidiária de bens jurídicos, que são essenciais à vida social.

Todavia, Jaboks estabelece que o Direito Penal só se legitimará quando atuar na defesa do ordenamento jurídico, valorando a norma penal em si. Assim, seu objeto de proteção não são os bens jurídicos, mas a norma penal que é violada. Atua sobre condutas que não são apenas relevantes para o direito, mas que produzem um risco permanente para o convívio social, que rompem com o pacto de fidelidade firmado entre o indivíduo e o Estado.

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Sendo assim, ao propor a dualidade do Direito, Jakobs definiu dois grandes grupos: os cidadãos, que são aqueles que cometem algum crime, mas que não rompem a barreira da permanência ou da habitualidade, podendo, portanto, receber a tutela de seus direitos e garantias, formando o Direito Penal do Cidadão; e os inimigos, que são aqueles que rompem drasticamente e permanentemente com a ordem jurídica, impondo um risco social em sua conduta, e que, por ser assim, não devem ter direitos e garantias penais a serem tutelados, devendo ser extirpados do convívio social, formando o que se denomina Direito Penal do Inimigo.

Para Jakobs, o inimigo deve ser tratado como não pessoa, sendo um sujeito que não possui direitos e garantias pelo simples fato de ter rompido com o ordenamento jurídico, ao cometer uma conduta que impôs risco a toda sociedade, e de forma habitual. Logo, o inimigo será punido pela sua periculosidade e não por um juízo de reprovação que pende sobre a sua conduta realizada – culpabilidade. Ademais, perderá a sua condição de cidadão, e terá o tratamento de ente daninho e perigoso, que deve ser eliminado da estrutura social.

Ainda sob este expansionismo penal, o legislativo vem atuando na feitura de normas que refletem imediatamente os postulados da teoria do inimigo, de modo que há restrição a garantias dos indivíduos, pelo simples fato de enquadrarem-se em certo tipo penal. Dessa forma, a lei 8.072/90 postula que os crimes hediondos (pelo simples fato de serem rotulados como hediondos ou crimes mais graves) são insuscetíveis de graça, indulto, anistia, fiança. Ademais, o Regime Disciplinar Diferenciado repercute a aplicação de uma pena injusta e desproporcional, pois pune o indivíduo não pelo fato cometido, mas por sua periculosidade, de modo que permite o seu isolamento celular por um período de até um ano, que pode ser prorrogado por um prazo igual a um sexto do que fora estabelecido anteriormente.

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São diversos os outros exemplos de infiltração do conceito de inimigo no ordenamento jurídico brasileiro, podendo acrescentar a Lei 9.614/98, chamada Lei do abate, que possibilita a derrubada de aeronaves consideradas hostis dentro do estado brasileiro, pelo simples fato de não serem reconhecidas pelas Forças Armadas. Assim, violam-se os direitos à vida, à liberdade, à ampla defesa e ao contraditório. Ainda é por oportuno apresentar a Lei 10.826/2003, o Estatuto do Desarmamento, que ampliou as figuras típicas, passando a penalizar mais severamente as condutas de perigo decorrentes da posse e do porte ilegal de armas.

Sendo assim, foi necessário apresentar a relação que prepondera entre o Direito Penal e a Constituição Federal. Dessa forma, o Direito Penal só será validamente legitimado se gerar a proteção de direitos constitucionais, isto é, de direitos fundamentais. É pela existência destes direitos, que oius puniendi do Estado encontra sua limitação, quando tiver que interferir na esfera da liberdade de cada indivíduo.

A dignidade penal está atrelada à identificação de bens passíveis de sofrerem tutela penal, e sendo assim, somente a Carta Magna pode determinar o que é a dignidade penal, ou seja, o conjunto de bens jurídicos relevantes para o Direito Penal. É esta noção que rompe imediatamente com o que apresenta a Teoria do Direito Penal do Inimigo, que não reconhece no inimigo a condição de sujeito de direitos, e conceber um Direito Penal fora dos ditames constitucionais, é formar um direito penal arbitrário, e consequentemente, inconstitucional.

Portanto, flexibilizar a legalidade, aplicar penas que são desproporcionais, alargar a punição penal, retirar garantias penais, antecipar a punição para os atos preparatórios, é romper com os dizeres de um Estado garantidor, infringindo a própria dignidade humana. Seguramente, somente com a implantação de um Direito Penal Mínimo e garantista, que esteja devidamente comprometido com os direitos fundamentais, é que se poderá produzir um sistema penal menos arbitrário, menos desigual, menos seletivo, mais justo e mais proporcional.

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Para toda a sociedade e diante das atuais atrocidades, é mais do que urgente uma profunda mudança na órbita penal, e o meio adequado encontrado por esta sociedade tem sido pedir por mais punição, por uma norma mais dura, que reconheça no indivíduo a construção de um inimigo da sociedade. Todavia, não se pode acreditar que a única solução para a megacriminalidade apresentada seja a atuação da legislação penal, tendo em vista que esta só deverá atuar quando os demais meios falharem e conjuntamente com estes.

A Constituição Federal consagra o Estado Democrático de Direito como seu princípio constitucional, coadunando com a dignidade da pessoa humana. Logo, admitir a possibilidade de um Direito Penal do Inimigo é romper com todos os ditames básicos do Estado escolhido pela Carta Magna, para preponderar na órbita estatal.

Neste diapasão, torna-se necessária a intervenção do Supremo Tribunal Federal, resguardado como guardião da Constituição Federal, para declarar a inconstitucionalidade das normas legais formuladas, que se demonstram como atos atentatórios aos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana – princípio matriz-, pois é este valor importante para tutela do Estado Democrático de Direito e para a promoção da validade do Direito Penal.

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NOTAS:

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[1] QUEIROZ, Paulo de Souza. Funções do Direito Penal. Belo Horizonte: Del Rey, 2001. p. 92.

[2] QUEIROZ, Paulo de Souza. Funções do Direito Penal. Belo Horizonte: Del Rey, 2001. p.93.

[3] BARATTA, A. Direitos humanos: entre a violência estrutural e a violência penal, Fascículos de Ciências Penais. Porto Alegre: Fabris, 1993. p. 60-61.

[4] QUEIROZ, Paulo de Souza. Funções do Direito Penal. Belo Horizonte: Del Rey, 2001. p. 72.

[5] QUEIROZ, Paulo de Souza. Funções do Direito Penal. Belo Horizonte: Del Rey, 2001. p.77.

[6] ZAFFARONI, Eugênio Raúl. Em busca das penas perdidas: a perda de legitimidade do sistema penal. Rio de Janeiro: Revan, 1991. p.35.

[7]ZAFFARONI, Eugenio Raúl; BATISTA, Nilo; ALAGIA, Alejandro; ALOKAR, Alejandro. Direito Penal Brasileiro: teoria geral do direito penal. Rio de Janeiro: Revan, 2003, v.1. p. 68.

[8]ZAFFARONI, Eugenio Raúl; BATISTA, Nilo; ALAGIA, Alejandro; ALOKAR, Alejandro. Direito Penal Brasileiro: teoria geral do direito penal. Rio de Janeiro: Revan, 2003, v.1, p. 27.

[9] FRANÇA, Leandro Ayres; BUSATO, Paulo César. TIPO: Inimigo. Curitiba: Grupo De Pesquisa Modernas Tendências Do Sistema Criminal, 2011. p. 145. p. 13.

[10] WERMUTH, Maiquel Ângelo Dezordi. Medo e direito penal: Reflexos da expansão punitiva na realidade brasileira. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2011. p. 62.

[11] JAKOBS, Gunther. Direito penal do inimigo: noções e críticas. 4. Ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009, p. 19-70.

[12] ZAFFARONI, Eugenio Raúl. O inimigo no direito penal. Trad. Sérgio Lamarão. Rio de Janeiro: Evan, 2007, p. 22.

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[13] BARATTA, Alessandro. Criminologia Crítica e Crítica do Direito Penal: Introduçao à Sociologia do Direito Penal. 6. ed. Rio de Janeiro: Editora Revan, 2011. 252 p.

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REORGANIZAÇÃO DE SOCIEDADES EMPRESARIAIS NO BRASIL: ALTERNATIVA DE ECONOMIA FISCAL

MARCUS VINICIUS DA COSTA PAIVA: Advogado. Procurador do Município de Jaçanã - RN. Graduado em Direito, na Universidade Federal da Paraíba (Campus I). Pós-Graduado em Direito Processual Civil no Centro Universitário de João Pessoa (Unipê).

ABSTRACT: This article aims to study the incorporation, fusion and division of companies that are forms of corporate reorganization that has the main purpose the concentration of capital and power, and this occurs in the unit (fusion and incorporation) or plurality (division of companies) that in some situations lead to gigantism companies. These modalities of corporate reorganization elapse, in short, of objectives predetermined, that is, the accomplishment of fiscal economy by means of a previous and minute planning tributary. This analysis guideline into possible ways, amongst the types of reorganization, choosing the least onerous for the company. Tributary planning is considered the activity that, made of exclusively preventive form, foresee, it co-ordinates and it projects acts and businesses with the purpose to determine which the direction less onerous for accomplishment of these same acts and businesses. Tax avoidance and the fiscal evasion, although the confusion by people, are distinct as for the legality of the used ways to reach the final objective, reducing the tax burden. The tax avoidance matters, necessarily, in the use of allowed ways and anticipation of the performance in relation to the occurrence it generating fact. The tax avoidance can elapse of gaps of the law or tax incentives. Thus, the incorporation, merger and division of companies as planning instrument tributary matter in the adoption of an alternative way that, although to represent a fiscal advantage of a side, represents fiscal and commercial disadvantages of another one, becoming necessity

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that has one deepened study before opting to certain form of planning tributary.

Keywords: incorporation, merger, division, corporate reorganization, tributary planning.

RESUMO: Este artigo visa o estudo sobre a incorporação, fusão e cisão das sociedades que são formas de reorganização societária cuja finalidade principal se desdobra em concentração de capitais e poder, sendo que esta se dá na unidade (incorporação e fusão) ou na pluralidade (cisão), levando, em algumas situações, empresas ao gigantismo. Essas modalidades de reorganização societária decorrem, em suma, de objetivos predeterminados, isto é, a realização de economia fiscal mediante um anterior e minucioso planejamento tributário. Tal análise se pauta nos caminhos possíveis, dentre os tipos de reorganização, escolhendo o menos oneroso para a empresa. Considera-se planejamento tributário a atividade que, feita de forma exclusivamente preventiva, antevê, coordena e projeta atos e negócios com a finalidade de determinar qual a direção menos onerosa para realização destes mesmos atos e negócios. A elisão e a evasão fiscal, apesar de muitos se confundirem, são distintas no que se refere à licitude dos meios utilizados para se alcançar o objetivo final, diminuindo a carga tributária. A elisão fiscal importa, necessariamente, na utilização de meios lícitos e na antecipação de atitudes em relação à ocorrência do fato gerador. Nessa toada, a elisão fiscal pode decorrer de lacunas da lei ou de incentivos fiscais. Assim, a fusão, cisão e incorporação de empresas como instrumento de planejamento tributário importam na adoção de um caminho alternativo que, apesar de representar uma vantagem fiscal de um lado, representa desvantagens fiscais e comerciais de outro, tornando-se mister que haja um aprofundado estudo antes de se optar por certa forma de planejamento tributário.

Palavras-chave: incorporação, fusão, cisão, reorganização societária, planejamento tributário.

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SUMÁRIO: 1 Introdução, 2 Modalidades de reorganização societária, 2.1 Transformação, 2.2 Incorporação, 2.3 Fusão, 2.4 Cisão, 3 Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), 4 Elisão e Evasão Fiscal, 5 Planejamento Tributário direcionado para a Reorganização Social, 6 Considerações Finais.

1 Introdução

As empresas societárias vêm sofrendo, na atualidade, um processo de reorganização com propósitos bem definidos e alicerçados pela concentração das atividades produtivas dos entes econômicos. Essa reestruturação encontra sua justificativa na concorrência empresarial vorazmente atuante no mundo globalizado, de maneira que ocorreria uma racionalização na produção dos grupos econômicos capaz de reduzir consideravelmente a carga tributária.

Os tipos de reorganização das sociedades se perfazem através da fusão, incorporação e cisão. Tais modalidades serão aplicadas a depender do porte e da situação fática da empresa. Hodiernamente, houve grande utilização desses métodos no cenário econômico nacional, principalmente com relação às instituições financeiras.

Em alguns setores da economia, a reorganização das sociedades se torna mais presente, havendo, inclusive, quem afirme ser essencial a fusão ou a incorporação em épocas críticas, com a nítida finalidade de fortalecimento empresarial e também de não serem devoradas pela concorrência praticante de meios ardis ao aniquilar os demais entes de determinado setor, a exemplo do que se exerce no dumping.

Essas táticas econômicas de reorganização implicam em ocorrências não apenas no Direito Empresarial, como também no Direito Tributário e nas Finanças Públicas, haja vista o intuito do contribuinte em praticar a denominada economia fiscal, quais sejam, a elisão fiscal (lícita) e a evasão fiscal (ilícita).

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Assim, nesse panorama, apresenta-se um ambiente de competição que favorece as empresas a buscarem uma maior porção do mercado, evitando serem incorporadas por outras, de forma que, estarão abarcando o mercado mais amplamente.

Logo, sob essa configuração, pode-se assegurar que o intuito maior da reorganização societária consiste no caráter econômico, isto é, busca-se dar uma crescente cobertura dos interesses mercadológicos dos entes que se interessam na fusão, incorporação ou cisão. Nessa linha, quando duas ou mais empresas se unem, o objetivo maior é tornar-se mais forte em relação à concorrência ou haver uma troca consistente de tecnologias. Já com relação à empresa incorporadora, apresenta-se a perspectiva de ingresso em determinado setor do mercado não atuante ou não plenamente conquistado.

Com efeito, segundo críticos e estudiosos, vários podem ser os fatores propulsores para haver essas operações societárias, não podendo relacioná-los diretamente a alguma forma de economia fiscal. Contudo, a tendência atual tem se direcionado para um planejamento tributário, em face ao confronto das empresas diminuírem seus custos e o sistema tributário ser tão oneroso no Brasil aos serviços e mercadorias. Tal planejamento tributário se traduz em um conjunto de medidas e atos dos contribuintes no que tange à organização da vida econômico-fiscal, com o intuito de proporcionar que os negócios, investimentos e lucros da empresa tenham o mínimo de carga tributária, dentro do que permite o ordenamento jurídico.

As figuras da fusão, incorporação e cisão, apresentadas como táticas de economia fiscal, não são, todavia, vistas de uma forma positiva pelo Fisco, tendo em vista, aliás, que sua contrariedade tem razão de ser, pois tais formas de reorganização societária poderão certamente ocasionar uma diminuição acentuada na arrecadação, sendo defendido, inclusive, pelo Fisco, que essas operações são baseadas em finalidades evasivas, ou seja, com o intuito de propalar a sonegação fiscal.

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É de extrema relevância distinguir quando essas operações societárias ocorrem de fato e quando elas são utilizadas de maneira fictícia, haja vista não ser difícil que essa reorganização se dê com o fim de fraudar credores das empresas mediante um negócio jurídico em que os contribuintes obstaculizam suas obrigações, sejam elas de qualquer sorte.

Sob essa configuração, pode-se afirmar que a fusão, incorporação e cisão das empresas são tidas como meios de planejamento tributário, aviltando-se para a questão tributária, tão onerosa no cenário brasileiro, e para a consequente redução de custos da empresa, confluindo, ainda, em uma maior competitividade dos entes envolvidos nesse processo.

Portanto, perfaz como grande escopo do presente artigo estabelecer as nuances das reorganizações societárias no Brasil e suas diretas implicações no ambiente fiscal, pois é tido pelos críticos e doutrinadores como o incentivador-chave desses tipos de operações. Ademais, será abordado também o caráter legal das fusões, cisões e incorporações, taxados por muitos como abusivas, ou seja, o viés da legalidade em vista do abuso de formas e do direito.

2. Modalidades de reorganização societária

2.1 Transformação

Não muito citada como forma de reorganização societária, a transformação aparece como modalidade nas doutrinas jurídicas. A lei das sociedades anônimas estabelece em seu art. 220 em que consiste: “A transformação é a operação pela qual a sociedade passa, independentemente de dissolução e liquidação, de um tipo para outro”.

Já o Código Civil, dispõe no art. 1113: "O ato de transformação independe de dissolução ou liquidação da sociedade, e obedecerá aos preceitos reguladores da constituição e inscrição próprios do tipo em que vai converter-se."

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A transformação é, pois, a mera mudança no tipo societário, que ocorre, por exemplo, quando uma sociedade limitada se transforma em uma sociedade anônima. Ressalte-se, porém, que a transformação não se dá apenas entre sociedades limitadas e anônimas. Usa-se sempre esse exemplo porque, conforme já destacamos mais de uma vez, trata-se dos dois tipos societários disparadamente mais usados na prática empresarial brasileira. No entanto, nada impede, por exemplo, que uma sociedade em nome coletivo se transforme numa sociedade limitada ou que uma sociedade em comandita simples se transforme numa sociedade em comandita por ações.[1]

O requisito para deliberação sobre a transformação é, em regra, a votação unânime, exceto nas situações em que o contrato social ou o estatuto da sociedade que vá se transformar preveja disposição expressa autorizadora da operação. Nessa última situação, em que previsto no ato constitutivo, o sócio dissidente terá direito de se retirar da sociedade. Da mesma forma prevê o Código Civil, em seu art. 1114. A LSA dispõe ainda que os sócios podem renunciar, no contrato social, ao direito de retirada no caso de transformação em companhia.

A legislação específica estipula ainda que a transformação não prejudicará, em nenhuma hipótese, os direitos dos credores, que, por sua vez, continuarão, até o pagamento integral dos seus créditos, com as mesmas garantias que o tipo anterior de sociedade lhes oferecia. Na mesma linha estabelece o Código Civil, ao prever que os direitos dos credores não serão modificados nem prejudicados quando ocorrer a transformação. Podemos observar, de início, que o estabelecido pelo ordenamento jurídico é apenas uma mudança do tipo societário, não havendo, por conseguinte, sua liquidação ou dissolução.

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Quanto à falência da sociedade transformada, os efeitos serão produzidos apenas com relação aos sócios que, no tipo anterior, a eles estariam sujeitos, se o pedirem os titulares de créditos anteriores à transformação, e somente a estes beneficiará.

2.2 Incorporação

O Código Civil estatui que, na incorporação, uma ou várias ou várias sociedades são absorvidas por outra, que lhes sucede em todos os direitos e obrigações, devendo todas aprová-la, na forma estabelecida para os respectivos tipos. Dessa forma, deflue-se do conceito acima que não haverá uma nova sociedade, ocorrendo apenas a extinção da sociedade incorporada, que, aliás, pode ser mais de uma.

Quando forem aprovados, pela assembléia-geral da incorporadora, o laudo de avaliação e a incorporação, a incorporadora será extinta, devendo a incorporadora promover o arquivamento e a publicação dos atos da incorporação.

2.3 Fusão

A Lei das sociedades anônimas prevê que a fusão é a operação pela qual se unem duas ou mais sociedades para formar sociedade nova, que lhes sucederá em todos os direitos e obrigações. Assim, ao passo que na incorporação não há o surgimento de uma nova sociedade, na fusão há uma nova sociedade decorrente da junção das sociedades fundidas, logo, as sociedades que se fundem desaparecem.

Contudo, a fusão não importa na dissolução das sociedades fundidas, mas apenas na extinção formal das sociedades que se fundiram. Dessa forma, não ocorrendo a dissolução, não haverá liquidação do patrimônio social, haja vista que a sociedade decorrente da fusão irá assumir todas as obrigações, sejam elas ativas ou passivas, das sociedades que desapareceram com o processo de fusão.

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O ilustre Waldírio Bulgarelli aborda o tema em análise em "A incorporação das Sociedades Anônimas", afirmando que a fusão se constitui em um instituto complexo, uno, sempre de natureza societária, perfazendo os seguintes elementos fundamentais: transmissão patrimonial integral e englobada, com sucessão universal; extinção (dissolução sem liquidação) de, pelo menos, uma das empresas fusionadas; "congeminação" dos sócios, isto é, ingresso dos sócios da sociedade ou das sociedades extintas na nova sociedade criada.

É interessante citar ainda que boa parte da doutrina, antigamente, considerava a fusão um instituto não muito utilizado na prática, em função da complexidade, tanto na seara jurídica, quanto em face das inúmeras consequências fiscais, sendo todos esses fatores os responsáveis pela rara utilização deste instituto antigamente.

2.4 Cisão

A legislação específica das sociedades anônimas dispõe em seu art. 229 que a cisão é a operação pela qual a companhia transfere parcelas do seu patrimônio para uma ou mais sociedades, constituídas para esse fim ou já existentes, extinguindo-se a companhia cindida, se houver versão de todo o seu patrimônio, ou dividindo-se o seu capital, se parcial a versão.

Percebe-se que a cisão pode se dar de duas maneiras: cisão parcial ou cisão total. A cisão parcial ocorre quando apenas alguma parte dos bens da sociedade cindida é transferida, ao passo que, na cisão total há a transferência de todos os bens da sociedade cindida, extinguindo-se a sociedade cindida.

Quanto aos direitos e obrigações, a sociedade que absorver parcela do patrimônio da companhia cindida sucederá nos direitos e obrigações que estiverem relacionados no ato de cisão. Na hipótese de cisão total, as sociedades que absorverem parcelas do patrimônio da companhia cindida sucederão a esta, na proporção

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dos patrimônios líquidos transferidos, nos direitos e obrigações não relacionados.

Pode haver a constituição de sociedades especificamente para receber os bens da sociedade cindida, assim como as sociedades já existentes também podem realizar tal operação. E, neste caso, com cisão com versão de parcela de patrimônio em sociedade já existente, aplicar-se-ão as disposições sobre incorporação.

3. Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE)

O CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) é uma autarquia federal especializada e atuante na defesa da economia e dos princípios que versam sobre a ordem econômica, em especial a livre-concorrência. Assim, serão submetidos à análise do CADE, os atos, que sob qualquer forma manifestados, possam limitar ou de qualquer forma prejudicar a livre concorrência, ou resultar na dominação de mercados relevantes de bens ou serviços. Os casos julgados na órbita do CADE envolvem, em suma, os interesses de grandes grupos estrangeiros que buscam alargar ainda mais os seus negócios no Brasil.

Após a aprovação da lei antitruste brasileira em 1994, passou a se constatar um período em que as decisões do CADE no setor de fusões e aquisições tornaram-se cada vez mais fundamentadas em abordagens consistentes. Assim, a maturidade técnica das decisões, portanto, vem contribuindo essencialmente para a solidez institucional do órgão.

Pode-se argumentar, depois da decisão do Ato de Concentração nº 16/1994, que determinou a desconstituição da compra da Pains pela Gerdau (Dutra, 1999, p. 217-454), que o CADE nunca mais seria o mesmo, em que pese à interferência esdrúxula e indevida do então ministro da Justiça, em relação à decisão do Conselho, contrariando o disposto no artigo

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50 da Lei nº 8.884/94, que define que "nas decisões do CADE não comportam revisão no âmbito do Poder Executivo". Torna-se possível especular, diante das evidências - decorridos dez anos daquela decisão emblemática do Colegiado do CADE -, que a lei antitruste foi aplicada de forma correta no referido caso. Além de preservar o interesse dos consumidores, ao garantir um mercado de produtos siderúrgico competitivo, a decisão foi a responsável por colocar o Brasil no elenco de países que, apesar das reconhecidas deficiências do sistema de defesa da concorrência, aplicava com independência a sua legislação antitruste. [2]

Seu fim maior é a definição se determinada operação entre agentes econômicos ou a prática limitativa da concorrência estão proporcionando efeitos indesejáveis ao mercado econômico.

O CADE tem como um dos objetivos barrar a concentração econômica, a formação de cartéis e de monopólio, evitando os desastrosos danos que acabam causando à economia e à própria concorrência. Seu fim maior é a definição se determinada operação entre agentes econômicos ou a prática limitativa da concorrência estão proporcionando efeitos indesejáveis ao mercado econômico.

Pode-se citar como exemplos de fusões e incorporações nos últimos tempos a compra da Painspela Gerdau, a compra da Kolynos pela Colgate e a fusão da Brahma e Antarctica. A alternativa oferecida àquelas empresas que se sentem prejudicadas em função de uma decisão do CADE foi a de utilizar-se do Judiciário. No entanto, é necessário lembrar que ainda não houve qualquer decisão judicial reformando contrariamente ao mérito total das decisões do Conselho Administrativo de Defesa Econômica, transparecendo a sensação de qualidade técnica das análises e decisões deste órgão.

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Sob tal panorama, chega-se à conclusão de que este Conselho vem buscando o cumprimento da legislação que se incumbe de regrar a concentração econômica brasileira, mormente quando se tem em mente o teor da decisão que contrariou a fusão daNestlé com a Garoto, o qual esteve sustentada em sólidas análises do abalo que a então aquisição provocaria na economia. O fim maior do CADE está na defesa da concorrência, a qual deverá ser continuada por instituições dessa linha. Logo, os órgãos políticos, em especial o Governo Federal, não poderão deixar-se influenciar por pressões políticas capazes de suspender a eficácia das decisões do Conselho, tendo em vista os altos custos econômicos e institucionais que retrocitada medida poderia representar para todo o meio social, pondo em perigo, inclusive, a credibilidade brasileira, no âmbito interno e internacional, quanto à concorrência. Desse modo, o Governo precisa publicizar para a sociedade o verdadeiro grau de relevância e os efeitos das decisões do CADE no cenário concorrencial, almejando uma economia harmônica.

4. Elisão e Evasão Fiscal

Já abordadas as modalidades de reorganização societária, torna-se de essencial importância dissertar sobre os institutos da evasão e elisão fiscal, sendo os mesmos tratados com maiores delongas no Direito Tributário. Passemos então à definição de evasão. Esse instituto é todo ato ou omissão que visa evitar, diminuir ou causar mora no pagamento de certo tributo.

Conceituada de maneira genérica, a evasão fiscal é dividida entre evasão omissiva e evasão comissiva, constituindo a intenção da ação o grande fator que as distingue. Assim, a evasão omissiva pode ou não ser intencional, ao passo que a evasão comissiva possui a todo instante a intencionalidade impregnada.

O professor Antônio Sampaio Dória prevê que a evasão omissiva divide-se em duas situações, a evasão imprópria e a evasão por inação. A evasão imprópria versa sobre a prática de

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evitar a tributação através da ausência de atos que façam com que ponham o agente em um fato gerador. Enquanto que a evasão imprópria atua nas hipóteses em que ocorre tributação excessiva. Nesse caso não existe propriamente uma modalidade de evasão fiscal em sentido estrito, pois aquela não se constitui de redução ou anulação de tributos, justificando-se na ausência de fato gerador.

De outro lado, a evasão por inação é uma forma de evasão tributária de forma estrita, incidindo uma falta do contribuinte com relação à carga tributária. Essa espécie pode ser ou não intencional. Quando intencional, essa evasão configura-se em sonegação fiscal, bastando lembrar que a ausência no recolhimento de algum tributo ocorre durante a efetiva consciência da obrigação fiscal, situação essa que traz grandes prejuízos ao erário, haja vista beneficiar apenas o contribuinte.

Na evasão omissiva não intencional, incide o desconhecimento da legislação tributária pelo então sujeito passiva da obrigação de pagar o tributo, configurando, no fim, em seu não pagamento. Aliás, nas duas situações de evasão não ocorre o cumprimento da obrigação fiscal, todavia, é mister destacar a diferenciação entre as duas, por guardar particularidades em cada caso, em especial a intenção empreendida. As penas mais duras serão aplicadas quando constar intenção no ato, e vice-versa.

Após a evasão omissiva, é imperioso abordar as evasões comissivas, que, por sinal, são sempre intencionais. Ela comporta duas formas, a evasão ilícita e a evasão lícita, sendo esta a famigerada elisão fiscal. Acerca da conceituação da elisão fiscal, Sampaio Dória constrói esplendorosamente a denominação deste instituto:

O primeiro problema a ser enfrentado nesta área é o referente à terminologia. Como chamaremos este fenômeno, de o contribuinte evitar, reduzir ou retardar o pagamento de um tributo, mediante fórmulas alternativas ou procedimentos lícitos. A maioria dos autores usa

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a expressão "evasão lícita ou legítima", em oposição à evasão ilícita ou fraude. Historicamente, digamos, a terminologia que predominou é esta, de evasão lícita e evasão ilícita.

Essa dualidade de nomenclatura, que se distingue apenas pelos adjetivos, parece-nos inteiramente inaceitável e inadequada, porque não se pode tomar o mesmo conceito sobre evasão e admitir que essa mesma realidade possa ser lícita ou ilícita. Do ponto de vista jurídico, um ato é ou não é lícito.

Isso criaria confusões, sem dúvida, a admitirmos que o mesmo fenômeno jurídico possa, dependendo das circunstâncias, ser lícito ou ilícito. Uma impropriedade no uso dessa expressão, evasão lícita, para diferenciá-la da evasão ilícita. Sentiremos melhor esse problema, se em vez do termo evasão usarmos o termo fraude, como alguns autores fizeram – denominaram evasão ilícita de fraude propriamente dita e a evasão lícita ou legítima de fraude lícita. Então seria o mesmo que disséssemos que a evasão ilícita é uma espécie de "fraude fraudulenta" e a evasão legítima de "fraude não fraudulenta", o que é, evidentemente, uma impropriedade total da linguagem.

O próprio termo evasão já conota uma certa irregularidade. O exemplo clássico é a chamada evasão de presos. Se dissermos evasão ilícita, estaremos mera ou pleonasticamente, qualificando um ato que por si só já é ilícito. E se dissermos evasão lícita estaríamos criando uma certa contradição nos termos, pois o núcleo

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desta locução, o termo "evasão" por si só já implica nessa idéia de ilicitude. Propõe-se, portanto, que se use a expressão evasão para significar a fraude fiscal e o termo elisão ou economia para exprimir essa chamada evasão fiscal lícita ou legítima.[3]

E concluindo seu pensamento sobre essas denominações:

A palavra elisão, que é a preferida, resulta do verbo elidir, que, fundamentalmente, significa evitar. O problema é que em português não temos substantivos eufônicos, derivados do verbo evitar. Existe o substantivo evitamento, ou evitação, mas, naturalmente, não são palavras de uso corrente. Então usamos o termo elisão, que, por falta de outros, preenche as necessidades terminológicas deste fenômeno.[4]

Após essa construção doutrinária, passa-se à classificação da elisão fiscal, podendo resultar da lei e também podendo decorrer de lacunas e brechas no ordenamento jurídico. Na primeira situação, a própria legislação dispõe ou direciona para a economia fiscal. Ante o exposto, é nítida que a mens legis está nos sentido de favorecer o contribuinte com benefícios fiscais. Observa-se como exemplo os incentivos ficais, natos casos de elisão prevista na lei, haja vista que é conferido aos destinatários benefícios desde que os mesmos se enquadrem em situações determinadas, tais como, construir uma filial em certo lugar, pagar sem atraso os tributos, dentre outra série de favorecimento legal.

As elisões previstas em lei são atinentes à política fiscal, não havendo grande necessidade de se esmiuçar detalhadamente este ponto. Já com relação à elisão baseada nas lacunas da lei, um estudo mais elaborado é requisitado pelos doutrinadores. Quanto à elisão sustentada por brechas encontradas na lei, muitos põem em dúvida sua legitimidade e inclusive a própria legalidade.

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Enfim, a diferença entre elisão e evasão fiscal se encontra quando identificamos os meios lícitos na elisão, ao passo que a evasão estará representada por utilizar-se de vias ilícitas.

Além disso, outro fator diferenciador é identificado no instante em que ocorre a utilização dos procedimentos, distinguindo-se também nesse momento. Quando há a utilização de algum meio ou instrumento no ato ou depois da ocorrência do fato gerador, pode-se afirmar a prática de evasão fiscal. O contribuinte irá executar meios ilícitos para reduzir ou aniquilar os tributos existentes sobre determinada operação, no instante do aparecimento do fato gerador ou posteriormente.

De outro lado, a elisão fiscal irá ocorrer quando forem utilizados meios lícitos antes da exteriorização do fato gerador. O procedimento utilizado para tal deverá sempre ser preventivo, caso contrário, guardará caracteres fraudulentos, típicos de evasão fiscal. Dessa forma, pode-se assegurar que, depois da prática de determinado ato ou negócio, enquadrando a norma tributária à situação concreta, não restará outra alternativa, a não ser quitar o tributo.

Como resultado da elisão fiscal, obtém-se a famigerada economia fiscal na consecução de certo ato ou negócio jurídico. Porém, o direito estrutura vários formatos para diversas hipóteses, que muitas vezes se traduzem em uma mesma operação, isto é, existem algumas operações que, apesar de homogênias, são tributadas diferentemente, incorrendo em uma carga tributária com diferenças bem consideráveis.

Assim, surge o então planejamento tributário, que possibilita o contribuinte planejar-se com certa antecedência, escolhendo uma forma menos onerosa para atingir o mesmo efeito tributário. A elisão fiscal, por vezes, é conceituada como uma forma de abstenção de incidência, ou seja, evita se posicionar em algo que produza o fato gerador.

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A abstenção em estrito senso e a elisão podem ser diferenciadas quando tem-se neste tipo de abstenção o contribuinte esquivando-se a todo custo de realizar alguma operação tributável e consequentemente atingir o resultado econômico, enquanto que na elisão o contribuinte alcança seu resultado, embora por um viés racionalmente econômico.

A elisão fiscal vem encontrando respaldo no Poder Judiciário. Nesse sentido, cito o seguinte precedente do Superior Tribunal de Justiça:

RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. DELITO MATERIAL. EXIGIBILIDADE DO TRIBUTO. CONDIÇÃO DE PUNIBILIDADE. COMPROVAÇÃO DA PENDÊNCIA DE DISCUSSÃO ADMINISTRATIVA ACERCA DO DÉBITO FISCAL. RECURSO PROVIDO. 1. Antes de constituído definitivamente o crédito tributário, não há justa causa para a instauração de Inquérito Policial com base no art. 1o. da Lei 8.137/90, tendo em vista que os delitos ali tipificados são materiais ou de resultado, isto é, somente se consumam com a ocorrência concreta do resultado previsto abstratamente (redução ou elisãodo tributo). 2. Devidamente comprovada nos autos a existência de discussão administrativa pendente a respeito da exigibilidade do débito, é de rigor o trancamento do Inquérito Penal, com a respectiva suspensão do prazo prescricional, haja vista a ausência de materialidade delitiva. 3. Tendo em vista que somente a Autoridade Fiscal pode realizar o lançamento tributário, impõe-se concluir que o trâmite de IPL em matéria tributária, quando ainda pendente a exigibilidade de crédito, constitui algo

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desnecessário ou mesmo incabível, já que à Autoridade Policial não compete realizar atividade alguma, no que tange à apuração de créditos tributários. 4. Recurso provido, em que pese o parecer ministerial, para determinar o trancamento da Ação Penal instaurada em relação ao recorrente, suspendendo-se o prazo prescricional, até julgamento definitivo do processo administrativo fiscal. (RHC 200702524603 RHC - RECURSO ORDINARIO EM HABEAS CORPUS - 22300, RELATOR NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, STJ, QUINTA TURMA, DJE DATA:05/05/2008)

Aliomar Baleeiro, quando Ministro do Supremo Tribunal Federal, na relatoria do Recurso Extraordinário nº 63.486, dissertou o seguinte sobre a elisão fiscal:

(...) Não houve, na espécie dos autos, qualquer tentativa de sonegação ou evasão ilícita. O contribuinte realizou, à luz do dia e do Fisco, o que os escritores de Direito Fiscal chamam de evasão lícita, aproveitando-se das lacunas da lei em matéria em que ela pode ser expressa e clara. Juristas como JEZE, aliás, doublé de financista, sustentou a licitude do contribuinte que busca adotar formas jurídicas mais favoráveis ao pagamento mais benigno, desde que não usem de fraude ou clandestinidade. Certo é que outros fiscalistas, ao contrário, defendem a predominância econômica do conteúdo econômico sobre a aparência do negócio jurídico formal.

(...)

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Conheço do recurso e dou-lhe provimento. Era lícito o contribuinte mobilizar as máquinas e equipamentos para vendê-los separadamente do imóvel como os vendeu. Dest’arte, o v. acórdão negou vigência ao artigo 45 do Código Civil. A evasão, no caso, foi lícita. Houve o que escritores ingleses chamam de "loop hole" ou lacuna da lei fiscal, aproveitável pelo contribuinte, dado que o crédito tributário é sempre uma obrigação ex lege. Segundo a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, os conceitos de Direito Civil servem de base à interpretação dos tributos que a eles se referem. A lei fiscal toma-os no sentido e no alcance que lhes dá o Direito Privado. (Recurso Extraordinário nº 63486/SP, publicado no Diário da Justiça no DOU do dia 08.03.1968).

É útil ainda diferenciar elisão fiscal de simulação fiscal, esta última relacionada com a evasão fiscal. A simulação fiscal consiste em praticar certo negócio que não representa de fato a verdadeira intenção e finalidade do sujeito. Porém, os doutrinadores costumam diferenciar simulação de fraude fiscal quanto a um ponto, haja vista que na fraude os meios ilícitos são nítidos e evidentes, enquanto que na simulação, o caráter ilícito dos atos é envolta por uma aparente licitude do negócio em questão.

Em se tratando de um tipo de evasão fiscal, o diferenciador inicial entre a simulação e a elisão fiscal consistiria na realização dos meios depois de ocorrer o fato gerador. Entretanto, como o ato está camuflado em uma aparente legalidade, fica dificultosa a percepção do instante em que se deu a realização do ato simulado, ou cientificar na realidade quais os verdadeiros intuitos e objetivos dos simuladores.

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Logo, a ideia de planejamento tributário versará obrigatoriamente sobre evasão e elisão fiscal, devendo estar antenado para não ultrapassar os limites da licitude, haja vista ser vital a utilização de meios lícitos e atuação preventiva quanto ao fato gerador. Dessa maneira, caso não seja respeitada a licitude dos procedimentos e a anterioridade do fato gerador, a economia fiscal perpetrada estará em vias de ser taxada de evasão fiscal, devendo submeter-se às premissas legais penais e ao que estipula a lei tributária nas situações específicas que ocorrerem.

5 Planejamento Tributário direcionado para a Reorganização Social

Na reorganização societária, existe primeiramente uma confluência de objetivos na realização do negócio, seguido da mútua sintonia de racionalizar a carga tributária, ou seja, diminuí-la exponencialmente com a realização do negócio. É fundamental, pois, estudar cartesianamente a maneira mais viável de se conseguir o resultado vislumbrado pelos envolvidos. Por isso, são realizados negócios indiretos, como a fusão, incorporação e cisão de empresas como via de planejar a tributação.

As reorganizações societárias, já vistas, nem sempre terão, segundo alguns estudiosos, o objetivo direto de realizar economia fiscal, isto é, de reduzir a carga tributária. Contudo, esse fim é quase que uma implicação querida durante o processo de reorganização, sendo pelo menos um motivador mediato, tendo em vista que a economia nos impostos proporcionará às empresas expandir sua competitividade e lucratividade. Há setor da doutrina e críticos que defende fervorosamente a economia de tributos como a causa imediata para se proceder às reorganizações sociais, induzindo que causa mediata será exatamente a competitividade mercadológica.

Existem alguns radicais nessa linha, chegando a declarar que aqueles com planejamento tributário, para se escolher uma forma de reorganização societária, tem o único interesse em pagar menos tributos, e não unir ou repartir empresar.

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Pode-se perceber que ao se fazer uma reorganização societária objetivada pela diminuição custosa de tributos, a economia fiscal deriva de uma gama de aspectos que merecem um estudo minucioso, haja vista que, mesmo com o planejamento tributário, a alternativa escolhida guardará suas desvantagens. Ao realizar esse planejamento, vislumbram-se vários caminhos possíveis, e será escolhido obviamente aquele menos oneroso. Também se torna óbvia que ao se escolher uma via, ela terá suas desvantagens, pois, caso não tivesse qualquer desvantagem (isento de tributo), não necessitaria de um estudo detalhado, porque seria ela a escolhida.

Ao incorporar, fundir e cindir, o contribuinte irá transmutar de uma faixa de tributação ou categoria, ou seja, apesar de ele sair do campo de incidência de um determinado tributo, o contribuinte terminará enquadrado em outra categoria de tributação. Por isso, é vital um estudo tributário, haja vista que só através desse planejamento poderá prever se a operação de fusão, incorporação ou cisão de empresas será realmente benéfica na seara fiscal.

Concluído o estudo esmiuçado, sendo positivas as constatações, deverá haver a realização de todo procedimento nas conformidades das legislações tributária e empresarial. Ademais, finda toda a operação, não poderá ser aplicada nenhuma simulação, impossibilitada a hipótese de não ocorrer de fato a extinção das empresas fusionadas, ou mesmo de, na cisão, não funcionar de fato a empresa que surgiu da cisão, situação em que apenas constaria o registro no órgão competente.

No que tange à tramitação legal, não haverá sonegação fiscal quando adotada uma forma prevista em lei, desde que não ocorra simulação de atos. Logo, caso o contribuinte encontre meios de não se submeter à tributação, diante da anterioridade do fato gerador, valendo-se do amparo na legislação, ou nas lacunas do ordenamento jurídico, será legítima, então, a economia fiscal proveniente desses artifícios utilizados pelo contribuinte.

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Algumas práticas denominadas de fiscalizadoras ao extremo, as quais atribuem tributação em situações não previstas na legislação, são absolutamente contrárias ao princípio da estrita legalidade tributária, regente do Direito Tributário, capaz de evitar a prática de atos abusivos pelo Fisco. Tais atitudes que distorcem e expandem os fatos geradores vulneram o sujeito passivo ao poder do Estado, que, por sinal , já está estruturado em ostensiva supremacia em relação ao contribuinte.

O planejamento envolve direitos do contribuinte, tais como a propriedade privada e o princípio da livre iniciativa, assim como da legalidade, previstas solidamente na Constituição Federal.

Sob toda essa configuração, é nítido que o contribuinte terá o direito de não ser forçado a utilizar caminhos mais custosos no âmbito fiscal, amenizando o pesado sistema tributário brasileiro, com o respaldo, inclusive, do Judiciário, desde que não adote atos ilícitos, simulados ou qualquer um que enverede nesse seguimento.

6. Considerações Finais

Diante de todo o exposto, podemos extrair que as modalidades de reorganização societária são utilizadas com o intuito de se buscar economia fiscal, reduzindo a carga tributária que pesa sobre as empresas, de maneira que as empresas passam a buscar reorganizar-se. Tais operações trazem consigo consequentemente o aumento da competitividade da empresa que utilizou alguma operação societária de reorganização. Muitas empresas fundem-se ou incorporam almejando adentrar em num nicho não atuante na atualidade, e também com o fim de especializar-se e abarcar maiores mercados.

Nos dias hodiernos, a tendência aponta para a concentração de capitais, visando o aumento da competitividade no mercado global e o consequente aumento exponencial dos lucros através da valorização das empresas e concentração do poder. Dessa forma, as espécies de reorganização societária vêm sendo utilizadas com

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uma maior freqüência pelas empresas, obstinadas a abraçar horizontes mais longínquos.

Constatou-se que a transformação somente se produz entre tipos diversos de sociedades, enquanto que nas outras modalidades de reorganização societária podem as sociedades envolvidas ser de um mesmo tipo. Então, como abordado, a mudança da organização da sociedade perante a transformação não implica sua extinção, diferentemente dos demais casos, que sempre acarretam a extinção ou a constituição de uma nova sociedade.

No instituto da cisão não existem duas vontades, mas apenas a da sociedade a ser cindida, e que aproxima um pouco mais esse instituto daquele da transformação. Ao passo que na fusão e na incorporação estão envolvidas duas vontades, a da sociedade incorporada e daquela que será incorporada. Já na transformação, a vontade social é apenas dela própria, cuja organização legal vai sofrer alteração com a permanência do mesmo patrimônio, quadro social e valor declarado do capital, como já abordado.

A reorganização societária decorre, em suma, de objetivos predeterminados, isto é, a realização de economia fiscal mediante um anterior e minucioso planejamento tributário. Essa análise se pauta nos caminhos possíveis, dentre os tipos de reorganização, escolhendo o menos oneroso para a empresa.

Assim, a fusão, cisão e incorporação de empresas como instrumento de planejamento tributário importam na adoção de um caminho alternativo que, apesar de representar uma vantagem fiscal de um lado, representa desvantagens fiscais e comerciais de outro, tornando-se mister que haja um aprofundado estudo antes de se optar por certa forma de planejamento tributário.

Com efeito, após o estudo detalhado da viabilidade na execução de alguma forma de reorganização, proceder-se-á à operacionalização da fusão, incorporação ou fusão. É importante rememorar, ainda, o papel de grande relevância do Conselho

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Administrativo de Defesa Econômica, que busca barrar a concentração econômica, a formação de cartéis e de monopólio, evitando os desastrosos danos que acabam causando à economia e à própria concorrência.

REFERÊNCIAS

BULGARELLI, Waldirio. Direito Comercial. São Paulo: Atlas, 2001.

COELHO, Fabio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. Vol. 2. 10 ed. São Paulo: Saraiva, 2007.

FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Fundamentos de Direito Comercial: empresário, sociedades comerciais, títulos de crédito. São Paulo: Atlas, 1999.

MAMEDE, Gladston. Direito Empresarial Brasileiro. 2 ed. São Paulo: Atlas, 2007. v.1.

MARTINS, Fran. Curso de Direito Comercial. Rio de Janeiro: Forense, 2005.

MATTOS, Cesar. (org.). A Revolução Antitruste no Brasil – A Teoria Econômica Aplicada a Casos Concretos. São Paulo: Singular, 2003.

RAMOS, André Luiz Santa Cruz. Curso de Direito Empresarial: o novo regime jurídico-empresarial brasileiro. 2 ed. Salvador: JusPodivm, 2008.

REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. Vol. 1. 27 ed. São Paulo: Saraiva, 2007

SAMPAIO DÓRIA, Antônio. Elementos de Direito Tributário. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1978.

NOTAS:

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[1] RAMOS, André Luiz Santa Cruz. Curso de Direito Empresarial: o novo regime jurídico-empresarial brasileiro. 2 ed. Salvador: JusPodivm, 2008. p. 467

[2] MATTOS, César (org.). A Revolução Antitruste no Brasil – A Teoria Econômica Aplicada a Casos Concretos. São Paulo: Singular, 2003. p. 131.

[3] SAMPAIO DÓRIA, Antônio. Elementos de Direito Tributário. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1978. p. 447-459.

[4] Ob. Cit. p. 459.

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O PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA

HERMESON ALVES NOGUEIRA: Analista Judiciário/Execução de Mandados do TJCE.

RESUMO: O presente estudo discorreu sobre o princípio da insignificância. Foi visto que os crimes de bagatela ou crimes insignificantes são delitos que, à primeira vista, se encaixam ao fato típico, mas que, num segundo momento, tem sua tipicidade desconsiderada, por estarem relacionados a ofensas a bens jurídicos que não causam reprovabilidade à sociedade, de forma que dispensa a intervenção do direito penal. Não se pode, simplesmente, negar os influxos da política criminal moderna no direito penal e processual penal, pois isto estaria na contramão dos anseios da sociedade ávidos por um Estado concomitantemente “menor” e com intervenções pontuais, corretas e justas à liberdade do indivíduo.

Palavras-chave: Crime; Princípio da insignificância.

O princípio da insignificância não é tão novo em nosso ordenamento jurídico. Mirabete, traz à citação a obra de Claus Roxin, denominada Política criminal y sistema dei Derecho Penal, do ano de 1972, na qual este último já apontava a estreita e imanente relação guardada entre o Direito Penal e a Política Criminal:

Sendo o crime uma ofensa a um interesse dirigido a um bem jurídico relevante, preocupa-se a doutrina em estabelecer um princípio para excluir do Direito Penal certas lesões

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insignificantes. Claus Roxin propôs o chamado princípio da insignificância, que permite na maioria dos tipos excluir, em princípio, os danos de pouca importância (MIRABETE, 2007, p. 115).

Segundo tal princípio, o Direito Penal não deve preocupar-se com bagatelas, do mesmo modo que não podem ser admitidos tipos incriminadores que descrevam condutas incapazes de lesar o bem jurídico.

A tipicidade penal exige um mínimo de lesividade ao bem jurídico protegido, pois é inconcebível que o legislador tenha imaginado inserir em um tipo penal condutas totalmente inofensivas ou incapazes de lesar o interesse protegido.

Como define ROXIN, o legislador não possui competência para, em absoluto, castigar pela sua imoralidade condutas não lesivas a bens jurídicos.

Com efeito, ROXIN reconhecia que a insignificância não era característica do tipo delitivo, mas sim um auxiliar interpretativo seu, a fim de restringir o teor literal do tipo formal, conformando-o a condutas socialmente admissíveis, em decorrência de suas ínfimas lesões aos bens juridicamente tutelados.

Como bem coloca Capez (2006, p. 14):

Se a finalidade do tipo penal é tutelar um bem jurídico, sempre que a lesão for insignificante, a ponto de se tornar incapaz de lesar o interesse protegido, não haverá adequação típica. É que no tipo não estão descritas condutas incapazes de ofender o bem tutelado, razão pela qual os danos de nenhuma monta devem ser considerados fatos atípicos.

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Para entender-se o princípio da insignificância - visto que sua aplicação se traduz em atipicidade da conduta - , há de ter-se em mente as noções de risco permitido e risco proibido.

Toda ação humana implica certo risco de dano ou lesão a outrem, como, dirigir um veículo por uma rua movimentada. Sabedor disso, o próprio Estado tolera certos riscos advindos de determinadas condutas, como, no exemplo dado, a possibilidade de haver um acidente (dever do cuidado objetivo), o que se denomina risco permitido, e pune, na esfera do Direito Penal, outros comportamentos, tais como o evento que decorreu de uma ultrapassagem perigosa, que decorreu da travessia de um cruzamento no sinal vermelho etc., para o que podemos chamar de risco proibido.

Segundo Ackel Filho apud Lopes, (1997, p. 75): O princípio da insignificância pode ser

conceituado como aquele que permite infirmar a tipicidade de fatos que, por sua inexpressividade constituem ações de bagatela, despidas de reprovabilidade, de modo a não merecerem valoração da norma penal, exsurgindo, pois como irrelevantes.

O Princípio da Insignificância tem sido referido pela Doutrina como “Princípio Bagatelar”. A este respeito, Luiz Cláudio Gomes ressalta que:

[...] a diferença fundamental entre os dois princípios seria que, a linha jurisprudencial mais tradicional reconhece o princípio da insignificância levando em conta apenas o desvalor do resultado, ou seja, considera suficiente, para caracterização da infração bagatelar, que o nível da lesão ao bem jurídico, ou do perigo concreto verificado, seja ínfimo. Já a outra corrente, a que aplica o princípio da

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irrelevância penal do fato, para a identificação do delito como bagatelar, não se contenta só com o desvalor do resultado, exigindo que sejam insignificantes cumulativamente o resultado, a ação e a culpabilidade do agente. Ou seja, para que o fato seja considerado penalmente irrelevante todas as circunstâncias judiciais - culpabilidade, antecedentes, conduta social, personalidade, motivos do crime, conseqüências etc. - precisam ser irrelevantes, favoráveis ao agente (GOMES, 2001, p. 440).

Zaffaroni (1997, p. 9), ao comentar sobre o Princípio da Insignificância, diz que:

[...] o fundamento do princípio reside na idéia da proporcionalidade que a pena deve guardar em relação à gravidade do crime; nos casos de ínfima afetação do bem jurídico, o conteúdo do injusto é tão pequeno que não subsiste qualquer razão para imposição da reprimenda e ainda a mínima pena aplicada seria desproporcional à significação social do fato.

De acordo com Carlos Vico Mañas (1994): O princípio da insignificância é um

instrumento de interpretação restritiva, fundado na concepção material do tipo penal, por intermédio do qual é possível alcançar, pela via judicial e sem macular a segurança jurídica do pensamento sistemático, a proposição político-criminal da necessidade de descriminalização de condutas que, embora formalmente típicas, não atingem de forma relevante os bens jurídicos protegidos pelo direito penal.

Embora compartilhamos do entendimento do autor, acrescentamos a ressalva de que não concordamos com a

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afirmação que diz que o princípio da insignificância descriminaliza condutas, haja vista que sua função é, segundo Maurício Macedo dos Santos e Viviane Amaral Sega (2007) “somente desconsiderar a tipicidade da conduta no caso concreto, enquanto a descriminalização já requer todo um processo legislativo” (Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto. asp?id=950>. Acesso em 07 abr. 2012).

Importante salientar que, ao lado do princípio da insignificância, existe o princípio da adequação social, onde a conduta formalmente inserida na descrição do tipo seria materialmente atípica, caso se situasse entre os comportamentos socialmente permitidos. A ação adequada socialmente estaria, desde o seu início, excluída do tipo, uma vez que se realizaria dentro do campo da normalidade social.

Saliente-se que, distintamente do princípio da insignificância, em que a conduta é relativamente tolerada pela sua escassa lesividade, no que tange ao princípio da adequação social ela absorve total aprovação da sociedade.

Feitas estas considerações, vê-se que, em tema de Direito Penal, somente as condutas relevantes, sob o prisma de sua estrutura e princípios informadores, devem sofrer a sanção jurídica emanada da jurisdição punitiva do Estado. Assim:

[...] se a conduta do agente não afronta a objetividade jurídica da norma, o ius puniendi nemsequer exsurge de seu estado dormente para a existência concreta da pretensão punitiva,devendo ser reputado que o comporta-mento insignificante do agente está dentro do chamadorisco permitido (MIRABETE, 2007, p. 116).

Neste sentido, merece destaque o sempre oportuno magistério do Prof. Damásio de Jesus (2000, p. 75) ao dizer que: “O

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tema tem recebido outras denominações, como crime de lesão mínima ou crime de bagatela”. Segundo ele:

[...] o Direito Penal só deve intervir nos casos de ataques muito graves aos bens jurídicos mais importantes, sendo que as perturbações mais leves da ordem jurídica são objeto de outros ramos do Direito. Recomenda, pois, que, pela limitação da tipicidade, a pretensão punitiva somente intervenha nos casos de lesão jurídica de certa gravidade, reconhecendo a atipicidade do fato nas hipóteses de perturbações jurídicas mais leves (pequeníssima relevância material). O Direito Penal é um recurso punitivo extremo, cumprindo ser exercido somente quando os outros ramos do Direito mostrem-se ineficientes. De modo que o Direito Repressivo não deve intervir quando a lesão jurídica é mínima, reservando-se para os ofensas graves.

O princípio da insignificância tem sido adotado na jurisprudência em casos de: 1) furto de bagatela; 2) lesões corporais mínimas; 3) maus-tratos; 4) porte mínimo de maconha; 5) delito tributário; 6) estelionato de bagatela; 7) contrabando e descaminho de pequena monta; 8) dano de pequena monta; 9) crime contra o meio ambiente (JESUS, 2000, ps. 75-76).

Fernando Capez também tem se mostrado favorável ao Princípio da Insignificância, se bem que, com a ressalva de que não pode ser invocado contra legem. Segundo ele:

Tem-se, pois, que cumpre ao membro do Ministério Público, na qualidade de dominus litis, e ao Magistrado, na qualidade de fiscal do cumprimento do princípio da obrigatoriedade da

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ação penal (cf. Frederico Marques), sopesar, em seu cotidiano profissional, oprincípio da ofensividade, de sorte a evitar, em casos tais, o ius persequendi in iudicio.

De notar-se que a análise da invocação do princípio da insignificância faz-se no resultado da conduta do agente e conduz, em sendo o caso, à atipicidade do fato, consoante adverte Damásio (CAPEZ, 2001, p. 76).

É importante assinalar que:

[...] o princípio da insignificância não pode ser invocado pela autoridade policial, para deixar de cumprir o seu dever de ofício, pois, mercê da hipotética ocorrência do delito, seja na forma consumada, seja na forma tentada, cumpre tomar todas as providências necessárias à opinio delicti. Sucede que, mercê da notitia criminis, a autoridade policial não tem o amparo legal necessário para invocar o princípio da insignificância e, com base nele, informar à vítima que a conduta do suposto autor não constituiu crime (CAPEZ, 2001, p. 77).

Assim, quem o pode fazer é o Ministério Público, porque - como dito - é o dono da ação penal e porque é a instituição incumbida, à luz da estrutura constitucional, de invocar a pretensão punitiva do Estado. Ao depois, o próprio Magistrado, a quem cabe receber (ou não) a peça acusatória, sob a análise do cumprimento do art. 41 do CPP.

De acordo com Luiz Flávio Gomes:

No que se relaciona com a admissibilidade do princípio da insignificância no Direito penal já não há o que se discutir. Dos fatos mínimos (dos

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delitos de bagatela) não deve cuidar o juiz (minina non curat praetor). Esse importante princípio, já aplicado no tempo do direito romano e recuperado depois da segunda guerra por Roxin [...], vem sendo reconhecido amplamente pelos juízes e tribunais, especialmente nos delitos de descaminho, furto etc.

Consequências práticas: ninguém pode ser preso em flagrante por fato absolutamente insignificante (por ser atípico). Ninguém pode ser processado por isso. O correto, portanto, em razão da atipicidade penal do fato, é arquivar o caso logo no princípio. O delegado faz um simples boletim de ocorrência e o promotor pede o arquivamento. E se o promotor denunciar? Cabe ao juiz rejeitar a denúncia, com base no art. 43, I, do CPP ("a denúncia ou queixa será rejeitada quando o fato narrado evidentemente não constituir crime") (Disponível em: <http:// jus2.uol.com.br/doutrina/texto. asp?id=3068>. Acesso em 29 mar. 2012).

Nos casos de ínfima afetação do bem jurídico, o conteúdo do injusto é tão pequeno que não subsiste nenhuma razão para o pathos ético da pena. É indispensável que o fato tenha acarretado uma ofensa de certa magnitude ao bem jurídico protegido para que se possa concluir por um juízo positivo de tipicidade.

De acordo com Sanguine (1990, p. 47):

Com base em um enfoque de modernização da Justiça Criminal, não mais se discute que os responsáveis por lesões aos bens jurídicos só devem ser submetidos à sanção criminal quando esta se torna indispensável à adequação da justiça e à segurança dos valores da sociedade.

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Ainda a mínima pena aplicada seria desproporcional à significação do fato.

A excludente da tipicidade (do injusto) pelo princípio da insignificância (ou da bagatela), que a doutrina e a jurisprudência vêm admitindo, não está inserta na lei brasileira. Mas é aceita por analogia, ou interpretação interativa, desde que não contra legem.

Não há como confundir, por exemplo, pequeno valor da coisa subtraída com valor insignificante ou ínfimo; no primeiro caso há somente um abrandamento da pena, no segundo há exclusão da tipicidade (RT nº. 605/368; RSTJ nº. 53/345). Somente uma quantidade de maconha totalmente inexpressiva, incapaz inclusive de permitir o “prazer de fumar”, poderá ter o condão de tornar atípica a ação de seu portador (RJTJERGS nº. 133/44).

No Estado do Rio Grande do Sul, já se absolveu réu acusado pelo crime de posse de entorpecente, por ser mínima (1 grama) a quantidade do tóxico (RJTJERGS nº. 149/220), mas o Tribunal de Justiça acabou não aceitando tal orientação, mantendo aquela dos tribunais superiores (RJTJERGS nº. 151/189).

Segundo Mirabete (2007, p. 119):

Para os adeptos da teoria social da ação também haveria nessas hipóteses uma conduta típica. A ação socialmente adequada não é necessariamente modelar, de um ponto de vista ético, dela se exigindo apenas que se situe dentro da moldura do comportamento socialmente permitido e não se pode castigar aquilo que a sociedade considera correto.

Para alguns, entretanto, o princípio da insignificância é uma espécie do gênero “ausência de perigosidade social e, embora o fato seja típico e antijurídico, a conduta pode deixar de ser considerada criminosa” (JESUS, 2000, p. 22).

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Assim, percebe-se em determinado caso, o acutíssimo choque de visão entre o Ministério Público e o Poder Judiciário frente ao princípio da insignificância, é de bom alvitre mencionar que, a par disso, hoje em dia, encontra-se assente no mundo jurídico nacional que o aludido princípio (também chamado da bagatela) elide a tipicidade; mais especificamente a tipicidade material, conforme ensinamento do Supremo Tribunal Federal (STF - HC nº. 84.412-0-SP, Celso de Mello.)

A divisão da tipicidade penal em formal e material, embora presente no mundo jurídico há longa data, ainda é uma grande novidade para muitos professores e estudantes. Assim, isso torna dificultosa uma maior compreensão e aceitação do princípio aqui em estudo. De qualquer sorte, partindo-se de um prisma constitucionalista da teoria do delito, esse desdobramento resulta absolutamente necessário.

Efetivamente, nessa linha de raciocínio, tem-se a lição de Luiz Flávio Gomes (2002, p. 30): “Com efeito, partindo-se de uma concepção personalista da Constituição, que tem como valor-síntese a dignidade da pessoa humana, nenhum dos direitos fundamentais constitucionalmente assegurados pode sofrer qualquer limitação ou restrição senão em função da tutela de outro interesse ou bem de igual ou equivalente magnitude”.

No entanto, na aplicação do princípio da insignificância, deve-se utilizá-lo com cautela, considerando insignificante apenas aquilo que realmente o é, sendo que há a necessidade de serem observadas as circunstâncias objetivas e subjetivas que envolvem o caso concreto, impedindo-se que seu conteúdo possa vir a ser uma porta aberta à impunidade.

A incidência da insignificância exclui a tipicidade, mas só pode ser estabelecida mediante consideração conglobada da norma. Em outras palavras, conforme Luiz Flávio Gomes, "o fato torna-se irrelevante, em virtude da presença de todos os requisitos bagatelares (resultado, conduta e culpabilidade bagatelares),

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tornando-se a pena desnecessária. Sua dispensa, nesse caso, não chega a afetar o seu aspecto preventivo geral”.

Portanto, ouvirem-se críticas à aplicabilidade do referido princípio, argumentando-se, em essência, ser o mesmo incompatível com o princípio da obrigatoriedade da ação penal. O artigo 98, I, da Carta Magna, contudo, permite, expressamente, o rompimento da regra tradicional de obrigatoriedade e de indisponibilidade da ação penal pública, abrindo espaço à discricionariedade regrada, permitindo-se certa dose de disponibilidade da ação penal pública.

Oportuno salientar que, em pesquisas jurisprudenciais, o princípio da insignificância vem sendo utilizado pelos tribunais superiores em todos os tipos de delito (formais/materiais, de dano/de perigo, dolosos/culposos) como instrumento de interpretação restritiva da norma penal, alcançando a descriminação de condutas que, conquanto aparentemente típicas, não lesam de forma significativa um bem juridicamente tutelado. O Min. Celso de Mello (HC 84.412-0/SP) idealizou quatro requisitos objetivos para a aplicação do princípio da insignificância, sendo eles adotados pela jurisprudência do STF e do STJ. Segundo a jurisprudência, somente se aplica o princípio da insignificância se estiverem presentes os seguintes requisitos cumulativos: a) mínima ofensividade da conduta; b) nenhuma periculosidade social da ação; c) reduzido grau de reprovabilidade do comportamento; e d) inexpressividade da lesão jurídica provocada.

CONCLUSÃO

O instituto do princípio da insignificância caracteriza-se como apoio eficaz para a descriminação, sendo claro seu valor na compreensão e interpretação das normas penais, avalizando a equiparação da lei penal à dinâmica social. Essa idéia proporciona gênese a uma modificação na nossa estrutura científico-penal atual.

A intervenção penal só será legítima, pois, se houver lesividade. Um método de interpretação puramente gramatical já

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não possui mais o condão de se promover justiça social. Maurício Antônio Ribeiro Lopes (1999, p. 79) corrobora esse raciocínio ao afirmar: “através do princípio da lesividade, só pode ser penalizado aquele comportamento que lesione direitos de outrem e que não seja apenas um comportamento pecaminoso ou imoral; o direito penal só pode assegurar a ordem pacífica externa da sociedade e além desse limite não está legitimado e nem é adequado para a educação moral dos cidadãos. As condutas puramente internas ou individuais, que se caracterizem por ser escandalosas, imorais, esdrúxulas ou pecaminosas, mas que não afetem nenhum bem jurídico tutelado pelo Estado, não possuem a lesividade necessária para legitimar a intervenção penal”.

Assim, a aplicabilidade do princípio da insignificância não gera impunidade, mas sim reflete a verdadeira garantia da função do Direito Penal , por intermédio do qual é possível alcançar, pela via judicial, a proposição político-criminal da imperatividade de descriminalização, em seu sentido amplo, de condutas que, não obstante formalmente típicas, não atingem de forma relevante os bens jurídicos protegidos pelo Direito Penal.

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CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal - parte geral. 5 ed., São Paulo: Saraiva, v. 1, 2006.

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FOUCAULT, Michel. A verdade e as formas jurídicas. 3 ed., Rio de Janeiro: Nau, 2005.

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JESUS, Damásio E. de. Imputação objetiva. São Paulo: Saraiva, 2000.

LOPES, Mauricio Antonio Ribeiro. Princípio da insignificância no direito penal: análise à luz da lei nº. 9.099/95 - juizados especiais criminais e da jurisprudência atual. São Paulo: RT, 1999.

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A JUSTIÇA ARISTOTÉLICA

JÔNITAS MATOS DOS SANTOS DUARTE: Bacharel em Direito pela Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, Funcionário Público desde 2011, Analista Técnico Jurídico do Ministério Público do Estado da Bahia.

RESUMO: A questão da justiça vem ganhando grande enfoque nos dias atuais. Aristóteles foi quem primeiro estabeleceu estes conceitos sobre a justiça e sua relação com a sociedade. Este artigo tem como objetivo mostrar a justiça segundo Aristóteles e sua forma de relação com a sociedade, buscando sempre mostrar o brilhantismo desse grande mestre grego.

Palavras chave: justiça, Aristóteles, direito.

ABSTRACT: The issue of justice has gained much focus on today. Aristotle, who first established these concepts of justice and its relationship with society. This article aims to show justice according to Aristotle and his way of relating to society, attempting to always show the brilliance of this great master Greek.

Keywords: justice, Aristotle, right.

INTRODUÇÃO

A questão da justiça é discutida por Aristóteles no seu livro V da Ética à Nicômaco, a justiça para ele é o principal fundamento da ordem do mundo, por sua vez, todas as virtudes estão subordinadas a justiça. Como veremos no presente artigo a justiça em Aristóteles é indissociável da polis, ou seja, da vida em

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sociedade. As relações com os cidadãos da polis que estabelecerão os conceitos de ética e justiça, que por sua vez, serão internalizados pelos indivíduos.

É em Aristóteles que conheceremos o conceito de equidade e sua importante utilização como meio de interpretação/aplicação das normas ao caso concreto no momento de deficiência da norma jurídica devido ao seu grau de universalidade.

Portanto conhecer um pouco mais desse importante mestre da filosofia olhando de um viés jurídico nos desperta bastante curiosidade para conhecer os conceitos de justiça e suas formas para esse grande mestre do saber.

A Ideia de Justiça para Aristóteles

Para Aristóteles o homem é um animal político, sendo assim, não vive separado da polis. A polis grega encarnada na figura do Estado é uma necessidade humana, cuidando da vida do homem como o organismo precisa cuidar de suas partes vitais. “O homem que vive completamente sozinho, não é humano: ou é um animal ou é um Deus”, diz Aristóteles.

Contudo para regular a vida em sociedade é necessário a lei, obedecendo aos critérios de justiça e equidade. Como dizia o Direito Romano, os preceitos jurídicos são viver honestamente, não lesar a ninguém e dar a cada um o que lhe pertence.

No âmbito jurídico, as primeiras noções de justiça são apresentadas por Aristóteles. Ele parte do contexto da polis, para definir e conceituar as relações do direito e da lei na vida social.

No seu livro “Ética a Nicômaco”, Aristóteles desenvolve uma madura teoria da Justiça, precisamente no Livro V, servindo de base e influencia para muitos juristas até os dias atuais. Ele correlaciona a justiça com a sua antítese, a injustiça, elaborando assim a eqüidade, que para ele é a melhor espécie de justiça.

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“A eqüidade, ao contrário, por sua própria natureza, visa a corrigir a lei quando esta se demonstra incompleta, para abarcar o caso especial e concreto, que foge à aplicação genérica”. (PAUPÉRIO, 2003)

Assim como,

“toda lei (nómos),tem um enunciado necessariamente geral, pois o legislador leva em consideração, tão-só, os casos mais freqüentes. Nesse sentido, a lei se distingue do decreto (psephisma), que atende a situações específicas e concretas. Ao surgir um caso não incluído de modo explícito no texto da lei, é de justiça interpretá-la num sentido mais preciso e concreto, a fim de estender a norma genérica à hipótese em questão, atendendo-se, assim, mais ao espírito do que a letra da lei”. (COMPARATO, 2006)

Aristóteles entende o princípio da igualdade, através de duas formas fundamentais: da Justiça como virtude geral e como virtude especial, a segunda originando a “Justiça distributiva” e a “Justiça Corretiva”, e essa por sua vez subdividida em “Justiça Comutativa” e “Justiça Judicial”.

Em Ética a Nicômaco, observa primeiramente a virtude da Justiça, sob um aspecto legal. A justiça é vista subjetivamente por cada um (moral) fazendo com que os indivíduos cumpram o que está na lei; essa é a sua primeira função. Dessa maneira, o meio-termo, é o que a legislação define entre a ação de fazer e a ação de não fazer.

A justiça e a justiça são relacionadas com o cumprimento e o não-cumprimento respectivo da lei. “O homem justo é aquele que se conforma à lei e respeita a igualdade; injusto é aquele que contraria a lei e a igualdade”.

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Segundo Aristóteles os atos de bondade estão prescritos na lei, por sua vez, os atos que vão de encontro a esta, os vícios, é o que se deve repudiar.

“Essa forma de Justiça é, portanto, uma virtude completa, não em sentido absoluto, mas nas nossas relações com os outros. É por isso que muitas vezes a Justiça é considerada como virtude mais perfeita e nem a estrela vespertina e nem a estrela matutina são mais admiradas que ela”. (PEGORARO, 1995)

Sendo assim, “o homem mais perfeito não é aquele que exerce sua virtude somente para si mesmo, mas aquele que a pratica também, em relação aos outros, e isso é uma obra difícil”.

O ilustre filósofo dizia que “a virtude da Justiça é a essência da Sociedade Civil”.

Em Ética a Nicômaco, Aristóteles explica o conceito de justiça distributiva, que é aquela aplica na repartição das honras e das posses na comunidade, tendo como preceito fundamental que cada um receba a proporção de acordo com o mérito individual.

O princípio é o da igualdade proporcional,

“a conjunção do primeiro termo de uma proporção com o terceiro, e do segundo com o quarto, e o justo nesta acepção é o meio-termo entre dois extremos desproporcionais, já que o proporcional é um meio termo, e o justo é o proporcional”. (SILVEIRA, 2001)

Com isso, o justo é o proporcional, aquilo que vai de encontro ao proporcional torna-se injusto.

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Observamos nos dias atuais essa justiça distributiva, na justa repartição de bens e no principio geral das igualdades das relações jurídicas, tendo como exemplo dispositivo constitucional:

“todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”. (Constituição da República Federativa do Brasil, Saraiva, 2000)

Esse tipo de justiça visa estabelecer as relações da sociedade com os membros que a compõem, enquanto que a corretiva estabelece as relações entre os membros.

No seu livro Ética a Nicômaco, Aristóteles também a cita a justiça correta, que consiste nas relações privadas, sejam elas voluntárias, característico pelas relações contratuais ou involuntárias, caracterizado pelas relações delituosas. Essa justiça fica centrada num ponto intermediário entre a vantagem e o dano. Todas as relações de troca, sejam elas no âmbito penal ou civil, são objetos dessa justiça corretiva.

Partindo dessa última justiça temos a Comulativa, do latim Comutare, que significa trocar. A justiça Comulativa regula as relações de troca para que estas sejam justas, para que uma prestação tenha a sua contraprestação proporcional, e a mesma é aplica nas relações voluntárias. Segundo Rafael Gondim essa justiça é “bilateral e sinalagmática, tem por finalidade estabelecer a igualdade das relações entre os particulares, de modo a adequar-se caso a caso, para a efetivação de uma real isonomia aritmética”.

Como bem disse Aristóteles, a manifestação mais clara dessa forma de Justiça, na atualidade, aparece no Direito Civil, na forma da Responsabilidade Civil e no Direito Contratual. Porém caberia acrescentar ainda o ramo das Obrigações também do Direito Civil.

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Outra subdivisão é a justiça judicial caracterizado pela aplicação em casos de violação. Exige-se um equilíbrio entre o dano e o ressarcimento, entre o delito e sua sanção penal, Aristóteles afirma que o homem é injusto quando este viola essa proporção de igualdade e equilíbrio.

Portanto, o justo para Aristóteles é o meio termo, não importando, por exemplo, se uma pessoa boa agride uma pessoa má ou vice-versa, mas a contraprestação, a resposta, o ressarcimento e a sanção sejam equivalente, correspondente ao ato que a gerou. Estabelecendo assim uma noção de justiça equitativa, ou seja, justa.

CONCLUSÃO

A justiça em Aristóteles é a busca do equilíbrio, do proporcional, buscando uma contraprestação justa ao agravo que a gerou. Mas nos dias atuais observa- se esse conceito de justiça tem ganhado forças apenas na última década. Com a constituição de 1988 muita coisa mudou, várias reformas no judiciário vêm sendo realizadas com o intuito de tornar o processo mais célere e que se estabeleça e se torne real este conceito de justiça. A tão sonhada justiça material, sendo aplicada no caso concreto, buscando sempre o justo e na falta de legislação ou as fontes do direito, agir usando a equidade, conceito difundido por Aristóteles que tão perfeitamente se encaixa com o conceito de justiça, é o que devemos propagar mais e mais. Assim Aristóteles que tanto contribuiu para os mais diversos ramos do saber, prestou de forma significante grande embasamento para o que conhecemos hoje do nosso direito e com certeza suas obras e teses servirão para as próximas gerações.

REFERENCIAS

A JUSTIÇA EM ARISTÓTELES. http://www.webartigos.com/articles/9125/1/A-Concepcao-Aristotelica-De-Justica/pagina1.html#ixzz14eV4WgjL: acesso em 08/11/10.

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ARISTÓTELES. Ética a Nicômacos. São Paulo: Editora Abril Cultural e Industrial S.A., 1973;

COMPARATO, F. K. “Ética”. S.Paulo: Cia. das Letras, 2006

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PEGORARO, Olinto A.. Ética é justiça. 9 ed Petrópolis: Vozes, 1995

SILVEIRA, Denis Coitinho. Os Sentidos da Justiça em Aristóteles. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2001

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APONTAMENTOS À RESOLUÇÃO/CD/FNDE Nº 38/2009: O PROGRAMA NACIONAL DE ALIMENTAÇÃO ESCOLAR COMO INSTRUMENTO MATERIALIZADOR DO DIREITO HUMANO À ALIMENTAÇÃO ADEQUADA

TAUÃ LIMA VERDAN RANGEL: Doutorando vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Direito da Universidade Federal Fluminense (UFF), linha de Pesquisa Conflitos Urbanos, Rurais e Socioambientais. Mestre em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Especializando em Práticas Processuais - Processo Civil, Processo Penal e Processo do Trabalho pelo Centro Universitário São Camilo-ES. Bacharel em Direito pelo Centro Universitário São Camilo-ES. Produziu diversos artigos, voltados principalmente para o Direito Penal, Direito Constitucional, Direito Civil, Direito do Consumidor, Direito Administrativo e Direito Ambiental.

Resumo: O presente está assentado em promover uma análise do Decreto nº 8.553, de 03 de novembro de 2015, como instrumento de concreção do Direito Humano à Alimentação Adequada por meio do Pacto Nacional para Alimentação Saudável. Imperioso se faz versar, de maneira maciça, acerca da evolução dos direitos humanos, os quais deram azo ao manancial de direitos e garantias fundamentais. Sobreleva salientar que os direitos humanos decorrem de uma construção paulatina, consistindo em uma afirmação e consolidação em determinado período histórico da humanidade. Os direitos de primeira geração ou direitos de liberdade têm por titular o indivíduo, são oponíveis ao Estado, traduzem-se como faculdades ou atributos da pessoa e ostentam subjetividade. Os direitos de segunda dimensão são os direitos sociais, culturais e econômicos bem como os direitos coletivos ou de coletividades, introduzidos no constitucionalismo das distintas formas do Estado social, depois que germinaram por ora de ideologia e da reflexão antiliberal. Dotados de altíssimo teor de

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humanismo e universalidade, os direitos de terceira geração tendem a cristalizar-se no fim do século XX enquanto direitos que não se destinam especificamente à proteção dos interesses de um indivíduo, de um grupo ou mesmo de um Ente Estatal especificamente.

Palavras-chaves: Direitos Humanos. Direito Humano à Alimentação Adequada. Programa Nacional de Alimentar Escolar.

Sumário: 1 Comentários Introdutórios: Ponderações ao Característico de Mutabilidade da Ciência Jurídica; 2 Prelúdio dos Direitos Humanos: Breve Retrospecto da Idade Antiga à Idade Moderna; 3 Direitos Humanos de Primeira Dimensão: A Consolidação dos Direitos de Liberdade; 4 Direitos Humanos de Segunda Dimensão: Os Anseios Sociais como substrato de edificação dos Direitos de Igualdade; 5 Direitos Humanos de Terceira Dimensão: A valoração dos aspectos transindividuais dos Direitos de Solidariedade; 6 Ponderações à Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional (Lei nº 11.346/2006): O Alargamento do rol dos Direitos Humanos no Território Brasileiro; 7 Apontamentos à Resolução/CD/FNDE nº 38/2009: O Programa Nacional de Alimentação Escolar como instrumento materializador do Direito Humano à Alimentação Adequada.

1 Comentários Introdutórios: Ponderações ao Característico de Mutabilidade da Ciência Jurídica

Em sede de comentários inaugurais, ao se dispensar uma análise robusta sobre o tema colocado em debate, mister se faz evidenciar que a Ciência Jurídica, enquanto conjunto plural e multifacetado de arcabouço doutrinário e técnico, assim como as pujantes ramificações que a integra, reclama uma interpretação alicerçada nos múltiplos peculiares característicos modificadores que passaram a influir em sua estruturação. Neste diapasão, trazendo a lume os aspectos de mutabilidade que passaram a

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orientar o Direito, tornou-se imperioso salientar, com ênfase, que não mais subsiste uma visão arrimada em preceitos estagnados e estanques, alheios às necessidades e às diversidades sociais que passaram a contornar os Ordenamentos Jurídicos. Ora, em razão do burilado, infere-se que não mais prospera a ótica de imutabilidade que outrora sedimentava a aplicação das leis, sendo, em decorrência dos anseios da população, suplantados em uma nova sistemática. É verificável, desta sorte, que os valores adotados pela coletividade, tal como os proeminentes cenários apresentados com a evolução da sociedade, passam a figurar como elementos que influenciam a confecção e aplicação das normas.

Com escora em tais premissas, cuida hastear como pavilhão de interpretação o “prisma de avaliação o brocardo jurídico 'Ubi societas, ibi jus', ou seja, 'Onde está a sociedade, está o Direito', tornando explícita e cristalina a relação de interdependência que esse binômio mantém”[1]. Deste modo, com clareza solar, denota-se que há uma interação consolidada na mútua dependência, já que o primeiro tem suas balizas fincadas no constante processo de evolução da sociedade, com o fito de que seus Diplomas Legislativos e institutos não fiquem inquinados de inaptidão e arcaísmo, em total descompasso com a realidade vigente. A segunda, por sua vez, apresenta estrutural dependência das regras consolidadas pelo Ordenamento Pátrio, cujo escopo fundamental está assentado em assegurar que inexista a difusão da prática da vingança privada, afastando, por extensão, qualquer ranço que rememore priscas eras, nas quais o homem valorizava os aspectos estruturantes da Lei de Talião (“Olho por olho, dente por dente”), bem como para evitar que se robusteça um cenário caótico no seio da coletividade.

Afora isso, volvendo a análise do tema para o cenário pátrio, é possível evidenciar que com a promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, imprescindível se fez adotá-la como maciço axioma de sustentação do Ordenamento Brasileiro, primacialmente quando se objetiva a amoldagem do texto legal, genérico e abstrato, aos complexos

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anseios e múltiplas necessidades que influenciam a realidade contemporânea. Ao lado disso, há que se citar o voto magistral voto proferido pelo Ministro Eros Grau, ao apreciar a Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental Nº. 46/DF, “o direito é um organismo vivo, peculiar porém porque não envelhece, nem permanece jovem, pois é contemporâneo à realidade. O direito é um dinamismo. Essa, a sua força, o seu fascínio, a sua beleza”[2].Como bem pontuado, o fascínio da Ciência Jurídica jaz justamente na constante e imprescindível mutabilidade que apresenta, decorrente do dinamismo que reverbera na sociedade e orienta a aplicação dos Diplomas Legais.

Ainda nesta senda de exame, pode-se evidenciar que a concepção pós-positivista que passou a permear o Direito, ofertou, por via de consequência, uma rotunda independência dos estudiosos e profissionais da Ciência Jurídica. Aliás, há que se citar o entendimento de Verdan, “esta doutrina é o ponto culminante de uma progressiva evolução acerca do valor atribuído aos princípios em face da legislação”[3]. Destarte, a partir de uma análise profunda de sustentáculos, infere-se que o ponto central da corrente pós-positivista cinge-se à valoração da robusta tábua principiológica que Direito e, por conseguinte, o arcabouço normativo passando a figurar, nesta tela, como normas de cunho vinculante, flâmulas hasteadas a serem adotadas na aplicação e interpretação do conteúdo das leis.

2 Prelúdio dos Direitos Humanos: Breve Retrospecto da Idade Antiga à Idade Moderna

Ao ter como substrato de edificação as ponderações estruturadas, imperioso se faz versar, de maneira maciça, acerca da evolução dos direitos humanos, os quais deram azo ao manancial de direitos e garantias fundamentais. Sobreleva salientar que os direitos humanos decorrem de uma construção paulatina, consistindo em uma afirmação e consolidação em determinado período histórico da humanidade. “A evolução histórica dos direitos inerentes à pessoa humana também é lenta e gradual. Não são

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reconhecidos ou construídos todos de uma vez, mas sim conforme a própria experiência da vida humana em sociedade”[4], como bem observam Silveira e Piccirillo. Quadra evidenciar que sobredita construção não se encontra finalizada, ao avesso, a marcha evolutiva rumo à conquista de direitos está em pleno desenvolvimento, fomentado, de maneira substancial, pela difusão das informações propiciada pelos atuais meios de tecnologia, os quais permitem o florescimento de novos direitos, alargando, com bastante substância a rubrica dos temas associados aos direitos humanos.

Nesta perspectiva, ao se estruturar uma análise histórica sobre a construção dos direitos humanos, é possível fazer menção ao terceiro milênio antes de Cristo, no Egito e Mesopotâmia, nos quais eram difundidos instrumentos que objetivavam a proteção individual em relação ao Estado. “O Código de Hammurabi (1690 a.C.) talvez seja a primeira codificação a consagrar um rol de direitos comuns a todos os homens, tais como a vida, a propriedade, a honra, a dignidade, a família, prevendo, igualmente, a supremacia das leis em relação aos governantes”, como bem afiança Alexandre de Moraes[5]. Em mesmo sedimento, proclama Rúbia Zanotelli de Alvarenga, ao abordar o tema, que:

Na antiguidade, o Código de Hamurabi (na Babilônia) foi a primeira codificação a relatar os direitos comuns aos homens e a mencionar leis de proteção aos mais fracos. O rei Hamurabi (1792 a 1750 a.C.), há mais de 3.800 anos, ao mandar redigir o famoso Código de Hamurabi, já fazia constar alguns Direitos Humanos, tais como o direito à vida, à família, à honra, à dignidade, proteção especial aos órfãos e aos mais fracos. O Código de Hamurabi também limitava o poder por um monarca absoluto. Nas disposições finais do Código, fez constar que aos súditos era proporcionada moradia, justiça,

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habitação adequada, segurança contra os perturbadores, saúde e paz[6].

Ainda nesta toada, nas polis gregas, notadamente na cidade-Estado de Atenas, é verificável, também, a edificação e o reconhecimento de direitos basilares ao cidadão, dentre os quais sobressai a liberdade e igualdade dos homens. Deste modo, é observável o surgimento, na Grécia, da concepção de um direito natural, superior ao direito positivo, “pela distinção entre lei particular sendo aquela que cada povo da a si mesmo e lei comum que consiste na possibilidade de distinguir entre o que é justo e o que é injusto pela própria natureza humana”[7], consoante evidenciam Siqueira e Piccirillo. Prima assinalar, doutra maneira, que os direitos reconhecidos não eram estendidos aos escravos e às mulheres, pois eram dotes destinados, exclusivamente, aos cidadãos homens[8], cuja acepção, na visão adotada, excluía aqueles. “É na Grécia antiga que surgem os primeiros resquícios do que passou a ser chamado Direito Natural, através da ideia de que os homens seriam possuidores de alguns direitos básicos à sua sobrevivência, estes direitos seriam invioláveis e fariam parte dos seres humanos a partir do momento que nascessem com vida”[9].

O período medieval, por sua vez, foi caracterizado pela maciça descentralização política, isto é, a coexistência de múltiplos centros de poder, influenciados pelo cristianismo e pelo modelo estrutural do feudalismo, motivado pela dificuldade de práticas atividade comercial. Subsiste, neste período, o esfacelamento do poder político e econômico. A sociedade, no medievo, estava dividida em três estamentos, quais sejam: o clero, cuja função primordial estava assentada na oração e pregação; os nobres, a quem incumbiam à proteção dos territórios; e, os servos, com a obrigação de trabalhar para o sustento de todos. “Durante a Idade Média, apesar da organização feudal e da rígida separação de classes, com a consequente relação de subordinação entre o suserano e os vassalos, diversos documentos jurídicos reconheciam a existência dos direitos humanos”[10], tendo como traço característico a limitação do poder estatal.

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Neste período, é observável a difusão de documentos escritos reconhecendo direitos a determinados estamentos, mormente por meio de forais ou cartas de franquia, tendo seus textos limitados à região em que vigiam. Dentre estes documentos, é possível mencionar a Magna Charta Libertati (Carta Magna), outorgada, na Inglaterra, por João Sem Terra, em 15 de junho de 1215, decorrente das pressões exercidas pelos barões em razão do aumento de exações fiscais para financiar a estruturação de campanhas bélicas, como bem explicita Comparato[11]. A Carta de João sem Terra acampou uma série de restrições ao poder do Estado, conferindo direitos e liberdades ao cidadão, como, por exemplo, restrições tributárias, proporcionalidade entre a pena e o delito[12], devido processo legal[13], acesso à Justiça[14], liberdade de locomoção[15] e livre entrada e saída do país[16].

Na Inglaterra, durante a Idade Moderna, outros documentos, com clara feição humanista, foram promulgados, dentre os quais é possível mencionar oPetition of Right, de 1628, que estabelecia limitações ao poder de instituir e cobrar tributos do Estado, tal como o julgamento pelos pares para a privação da liberdade e a proibição de detenções arbitrárias[17], reafirmando, deste modo, os princípios estruturadores do devido processo legal[18]. Com efeito, o diploma em comento foi confeccionado pelo Parlamento Inglês e buscava que o monarca reconhecesse o sucedâneo de direitos e liberdades insculpidos na Carta de João Sem Terra, os quais não eram, até então, respeitados. Cuida evidenciar, ainda, que o texto de 1.215 só passou a ser observado com o fortalecimento e afirmação das instituições parlamentares e judiciais, cenário no qual o absolutismo desmedido passa a ceder diante das imposições democráticas que floresciam.

Outro exemplo a ser citado, o Habeas Corpus Act, de 1679, lei que criou o habeas corpus, determinando que um indivíduo que estivesse preso poderia obter a liberdade através de um documento escrito que seria encaminhado ao lorde-chanceler ou ao juiz que lhe concederia a liberdade provisória, ficando o acusado, apenas, comprometido a apresentar-se em juízo quando solicitado.

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Prima pontuar que aludida norma foi considerada como axioma inspirador para maciça parte dos ordenamentos jurídicos contemporâneos, como bem enfoca Comparato[19]. Enfim, diversos foram os documentos surgidos no velho continente que trouxeram o refulgir de novos dias, estabelecendo, aos poucos, os marcos de uma transição entre o autoritarismo e o absolutismo estatal para uma época de reconhecimento dos direitos humanos fundamentais[20].

As treze colônias inglesas, instaladas no recém-descoberto continente americano, em busca de liberdade religiosa, organizaram-se e desenvolveram-se social, econômica e politicamente. Neste cenário, foram elaborados diversos textos que objetivavam definir os direitos pertencentes aos colonos, dentre os quais é possível realçar a Declaração do Bom Povo da Virgínia,de 1776. O mencionado texto é farto em estabelecer direitos e liberdade, pois limitou o poder estatal, reafirmou o poderio do povo, como seu verdadeiro detentor[21], e trouxe certas particularidades como a liberdade de impressa[22], por exemplo. Como bem destaca Comparato[23], a Declaração de Direitos do Bom Povo da Virgínia afirmava que os seres humanos são livres e independentes, possuindo direitos inatos, tais como a vida, a liberdade, a propriedade, a felicidade e a segurança, registrando o início do nascimento dos direitos humanos na história[24]. “Basicamente, a Declaração se preocupa com a estrutura de um governo democrático, com um sistema de limitação de poderes”[25], como bem anota José Afonso da Silva.

Diferente dos textos ingleses, que, até aquele momento preocupavam-se, essencialmente, em limitar o poder do soberano, proteger os indivíduos e exaltar a superioridade do Parlamento, esse documento, trouxe avanço e progresso marcante, pois estabeleceu a viés a ser alcançada naquele futuro, qual seja, a democracia. Em 1791, foi ratificada a Constituição dos Estados Unidos da América. Inicialmente, o documento não mencionava os direitos fundamentais, todavia, para que fosse aprovado, o texto necessitava da ratificação de, pelo menos, nove das treze colônias.

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Estas concordaram em abnegar de sua soberania, cedendo-a para formação da Federação, desde que constasse, no texto constitucional, a divisão e a limitação do poder e os direitos humanos fundamentais[26]. Assim, surgiram as primeiras dez emendas ao texto, acrescentando-se a ele os seguintes direitos fundamentais: igualdade, liberdade, propriedade, segurança, resistência à opressão, associação política, princípio da legalidade, princípio da reserva legal e anterioridade em matéria penal, princípio da presunção da inocência, da liberdade religiosa, da livre manifestação do pensamento[27].

3 Direitos Humanos de Primeira Dimensão: A Consolidação dos Direitos de Liberdade

No século XVIII, é verificável a instalação de um momento de crise no continente europeu, porquanto a classe burguesa que emergia, com grande poderio econômico, não participava da vida pública, pois inexistia, por parte dos governantes, a observância dos direitos fundamentais, até então construídos. Afora isso, apesar do esfacelamento do modelo feudal, permanecia o privilégio ao clero e à nobreza, ao passo que a camada mais pobre da sociedade era esmagada, porquanto, por meio da tributação, eram obrigados a sustentar os privilégios das minorias que detinham o poder. Com efeito, a disparidade existente, aliado ao achatamento da nova classe que surgia, em especial no que concerne aos tributos cobrados, produzia uma robusta insatisfação na órbita política[28]. O mesmo ocorria com a população pobre, que, vinda das regiões rurais, passa a ser, nos centros urbanos, explorada em fábricas, morava em subúrbios sem higiene, era mal alimentada e, do pouco que lhe sobejava, tinha que tributar à Corte para que esta gastasse com seus supérfluos interesses. Essas duas subclasses uniram-se e fomentaram o sentimento de contenda contra os detentores do poder, protestos e aclamações públicas tomaram conta da França.

Em meados de 1789, em meio a um cenário caótico de insatisfação por parte das classes sociais exploradas, notadamente para manterem os interesses dos detentores do poder, implode a

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Revolução Francesa, que culminou com a queda da Bastilha e a tomada do poder pelos revoltosos, os quais estabeleceram, pouco tempo depois, a Assembleia Nacional Constituinte. Esta suprimiu os direitos das minorias, as imunidades estatais e proclamou a Declaração dos Direitos dos Homens e Cidadão que, ao contrário da Declaração do Bom Povo da Virgínia, que tinha um enfoque regionalista, voltado, exclusivamente aos interesses de seu povo, foi tida com abstrata[29] e, por isso, universalista. Ressalta-se que a Declaração Francesa possuía três características: intelectualismo, mundialismo e individualismo.

A primeira pressupunha que as garantias de direito dos homens e a entrega do poder nas mãos da população era obra e graça do intelecto humano; a segunda característica referia-se ao alcance dos direitos conquistados, pois, apenas, eles não salvaguardariam o povo francês, mas se estenderiam a todos os povos. Por derradeiro, a terceira característica referia-se ao seu caráter, iminentemente individual, não se preocupando com direitos de natureza coletiva, tais como as liberdades associativas ou de reunião. No bojo da declaração, emergidos nos seus dezessete artigos, estão proclamados os corolários e cânones da liberdade[30], da igualdade, da propriedade, da legalidade e as demais garantias individuais. Ao lado disso, é denotável que o diploma em comento consagrou os princípios fundantes do direito penal, dentre os quais sobreleva destacar princípio da legalidade[31], da reserva legal[32] e anterioridade em matéria penal, da presunção de inocência[33], tal como liberdade religiosa e livre manifestação de pensamento[34].

Os direitos de primeira dimensão compreendem os direitos de liberdade, tal como os direitos civis e políticos, estando acampados em sua rubrica os direitos à vida, liberdade, segurança, não discriminação racial, propriedade privada, privacidade e sigilo de comunicações, ao devido processo legal, ao asilo em decorrência de perseguições políticas, bem como as liberdades de culto, crença, consciência, opinião, expressão, associação e reunião pacíficas, locomoção, residência, participação política,

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diretamente ou por meio de eleições. “Os direitos de primeira geração ou direitos de liberdade têm por titular o indivíduo, são oponíveis ao Estado, traduzem-se como faculdades ou atributos da pessoa e ostentam subjetividade”[35], aspecto este que passa a ser característico da dimensão em comento. Com realce, são direitos de resistência ou de oposição perante o Estado, refletindo um ideário de afastamento daquele das relações individuais e sociais.

4 Direitos Humanos de Segunda Dimensão: Os Anseios Sociais como substrato de edificação dos Direitos de Igualdade

Com o advento da Revolução Industrial, é verificável no continente europeu, precipuamente, a instalação de um cenário pautado na exploração do proletariado. O contingente de trabalhadores não estava restrito apenas a adultos, mas sim alcançava até mesmo crianças, os quais eram expostos a condições degradantes, em fábricas sem nenhuma, ou quase nenhuma, higiene, mal iluminadas e úmidas. Salienta-se que, além dessa conjuntura, os trabalhadores eram submetidos a cargas horárias extenuantes, compensadas, unicamente, por um salário miserável. O Estado Liberal absteve-se de se imiscuir na economia e, com o beneplácito de sua omissão, assistiu a classe burguesa explorar e “coisificar” a massa trabalhadora, reduzindo seres humanos a meros objetos sujeitos a lei da oferta e procura. O Capitalismo selvagem, que operava, nessa essa época, enriqueceu uns poucos, mas subjugou a maioria[36]. A massa de trabalhadores e desempregados vivia em situação de robusta penúria, ao passo que os burgueses ostentavam desmedida opulência.

Na vereda rumo à conquista dos direitos fundamentais, econômicos e sociais, surgiram alguns textos de grande relevância, os quais combatiam a exploração desmedida propiciada pelo capitalismo. É possível citar, em um primeiro momento, como proeminente documento elaborado durante este período, a Declaração de Direitos da Constituição Francesa de 1848, que apresentou uma ampliação em termos de direitos humanos

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fundamentais. “Além dos direitos humanos tradicionais, em seu art. 13 previa, como direitos dos cidadãos garantidos pela Constituição, a liberdade do trabalho e da indústria, a assistência aos desempregados”[37]. Posteriormente, em 1917, a Constituição Mexicana[38], refletindo os ideários decorrentes da consolidação dos direitos de segunda dimensão, em seu texto consagrou direitos individuais com maciça tendência social, a exemplo da limitação da carga horária diária do trabalho e disposições acerca dos contratos de trabalho, além de estabelecer a obrigatoriedade da educação primária básica, bem como gratuidade da educação prestada pelo Ente Estatal.

A Constituição Alemã de Weimar, datada de 1919, trouxe grandes avanços nos direitos socioeconômicos, pois previu a proteção do Estado ao trabalho, à liberdade de associação, melhores condições de trabalho e de vida e o sistema de seguridade social para a conservação da saúde, capacidade para o trabalho e para a proteção à maternidade. Além dos direitos sociais expressamente insculpidos, a Constituição de Weimar apresentou robusta moldura no que concerne à defesa dos direitos dos trabalhadores, primacialmente “ao instituir que o Império procuraria obter uma regulamentação internacional da situação jurídica dos trabalhadores que assegurasse ao conjunto da classe operária da humanidade, um mínimo de direitos sociais”[39], tal como estabelecer que os operários e empregados seriam chamados a colaborar com os patrões, na regulamentação dos salários e das condições de trabalho, bem como no desenvolvimento das forças produtivas.

No campo socialista, destaca-se a Constituição do Povo Trabalhador e Explorado[40], elaborada pela antiga União Soviética. Esse Diploma Legal possuía ideias revolucionárias e propagandistas, pois não enunciava, propriamente, direitos, mas princípios, tais como a abolição da propriedade privada, o confisco dos bancos, dentre outras. A Carta do Trabalho, elaborada pelo Estado Fascista Italiano, em 1927, trouxe inúmeras inovações na relação laboral. Dentre as inovações introduzidas, é possível

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destacar a liberdade sindical, magistratura do trabalho, possibilidade de contratos coletivos de trabalho, maior proporcionalidade de retribuição financeira em relação ao trabalho, remuneração especial ao trabalho noturno, garantia do repouso semanal remunerado, previsão de férias após um ano de serviço ininterrupto, indenização em virtude de dispensa arbitrária ou sem justa causa, previsão de previdência, assistência, educação e instrução sociais[41].

Nota-se, assim, que, aos poucos, o Estado saiu da apatia e envolveu-se nas relações de natureza econômica, a fim de garantir a efetivação dos direitos fundamentais econômicos e sociais. Sendo assim, o Estado adota uma postura de Estado-social, ou seja, tem como fito primordial assegurar aos indivíduos que o integram as condições materiais tidas por seus defensores como imprescindíveis para que, desta feita, possam ter o pleno gozo dos direitos oriundos da primeira geração. E, portanto, desenvolvem uma tendência de exigir do Ente Estatal intervenções na órbita social, mediante critérios de justiça distributiva. Opondo-se diretamente a posição de Estado liberal, isto é, o ente estatal alheio à vida da sociedade e que, por consequência, não intervinha na sociedade. Incluem os direitos a segurança social, ao trabalho e proteção contra o desemprego, ao repouso e ao lazer, incluindo férias remuneradas, a um padrão de vida que assegure a saúde e o bem-estar individual e da família, à educação, à propriedade intelectual, bem como as liberdades de escolha profissional e de sindicalização.

Bonavides, ao tratar do tema, destaca que os direitos de segunda dimensão “são os direitos sociais, culturais e econômicos bem como os direitos coletivos ou de coletividades, introduzidos no constitucionalismo das distintas formas do Estado social, depois que germinaram por ora de ideologia e da reflexão antiliberal”[42]. Os direitos alcançados pela rubrica em comento florescem umbilicalmente atrelados ao corolário da igualdade. Como se percebe, a marcha dos direitos humanos fundamentais rumo às sendas da História é paulatina e constante. Ademais, a doutrina dos

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direitos fundamentais apresenta uma ampla capacidade de incorporar desafios. “Sua primeira geração enfrentou problemas do arbítrio governamental, com as liberdades públicas, a segunda, o dos extremos desníveis sociais, com os direitos econômicos e sociais”[43], como bem evidencia Manoel Gonçalves Ferreira Filho.

5 Direitos Humanos de Terceira Dimensão: A valoração dos aspectos transindividuais dos Direitos de Solidariedade

Conforme fora visto no tópico anterior, os direitos humanos originaram-se ao longo da História e permanecem em constante evolução, haja vista o surgimento de novos interesses e carências da sociedade. Por esta razão, alguns doutrinadores, dentre eles Bobbio[44], os consideram direitos históricos, sendo divididos, tradicionalmente, em três gerações ou dimensões. A nomeada terceira dimensão encontra como fundamento o ideal da fraternidade (solidariedade) e tem como exemplos o direito ao meio ambiente equilibrado, à saudável qualidade de vida, ao progresso, à paz, à autodeterminação dos povos, a proteção e defesa do consumidor, além de outros direitos considerados como difusos. “Dotados de altíssimo teor de humanismo e universalidade, os direitos de terceira geração tendem a cristalizar-se no fim do século XX enquanto direitos que não se destinam especificamente à proteção dos interesses de um indivíduo, de um grupo”[45] ou mesmo de um Ente Estatal especificamente.

Ainda nesta esteira, é possível verificar que a construção dos direitos encampados sob a rubrica de terceira dimensão tende a identificar a existência de valores concernentes a uma determinada categoria de pessoas, consideradas enquanto unidade, não mais prosperando a típica fragmentação individual de seus componentes de maneira isolada, tal como ocorria em momento pretérito. Os direitos de terceira dimensão são considerados como difusos, porquanto não têm titular individual, sendo que o liame entre os seus vários titulares decorre de mera circunstância factual. Com o escopo de ilustrar, de maneira pertinente as ponderações vertidas, insta trazer à colação o robusto

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entendimento explicitado pelo Ministro Celso de Mello, ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade N°. 1.856/RJ, em especial quando destaca:

Cabe assinalar, Senhor Presidente, que os direitos de terceira geração (ou de novíssima dimensão), que materializam poderes de titularidade coletiva atribuídos, genericamente, e de modo difuso, a todos os integrantes dos agrupamentos sociais, consagram o princípio da solidariedade e constituem, por isso mesmo, ao lado dos denominados direitos de quarta geração (como o direito ao desenvolvimento e o direito à paz), um momento importante no processo de expansão e reconhecimento dos direitos humanos, qualificados estes, enquanto valores fundamentais indisponíveis, como prerrogativas impregnadas de uma natureza essencialmente inexaurível[46].

Nesta feita, importa acrescentar que os direitos de terceira dimensão possuem caráter transindividual, o que os faz abranger a toda a coletividade, sem quaisquer restrições a grupos específicos. Neste sentido, pautaram-se Motta e Motta e Barchet, ao afirmarem, em suas ponderações, que “os direitos de terceira geração possuem natureza essencialmente transindividual, porquanto não possuem destinatários especificados, como os de primeira e segunda geração, abrangendo a coletividade como um todo”[47]. Desta feita, são direitos de titularidade difusa ou coletiva, alcançando destinatários indeterminados ou, ainda, de difícil determinação. Os direitos em comento estão vinculados a valores de fraternidade ou solidariedade, sendo traduzidos de um ideal intergeracional, que liga as gerações presentes às futuras, a partir da percepção de que a qualidade de vida destas depende sobremaneira do modo de vida daquelas.

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Dos ensinamentos dos célebres doutrinadores, percebe-se que o caráter difuso de tais direitos permite a abrangência às gerações futuras, razão pela qual, a valorização destes é de extrema relevância. “Têm primeiro por destinatários o gênero humano mesmo, num momento expressivo de sua afirmação como valor supremo em termos de existencialidade concreta”[48]. A respeito do assunto, Motta e Barchet[49] ensinam que os direitos de terceira dimensão surgiram como “soluções” à degradação das liberdades, à deterioração dos direitos fundamentais em virtude do uso prejudicial das modernas tecnologias e desigualdade socioeconômica vigente entre as diferentes nações.

6 Ponderações à Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional (Lei nº 11.346/2006): O Alargamento do rol dos Direitos Humanos no Território Brasileiro

A Lei nº 11.346, de 15 de setembro de 2006[50], que cria o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional – SISAN com vistas em assegurar o direito humano à alimentação adequada e dá outras providências, foi responsável por, expressamente, alargar o rol de direitos humanos no território nacional, alçando, para tanto, o direito à alimentação adequada como direito fundamental, imprescindível ao desenvolvimento humano e à materialização do superprincípio da dignidade da pessoa humana. Nesse sentido, o artigo 2º esclarece que a alimentação adequada é direito fundamental do ser humano, inerente à dignidade da pessoa humana e indispensável à realização dos direitos consagrados na Constituição Federal, devendo o poder público adotar as políticas e ações que se façam necessárias para promover e garantir a segurança alimentar e nutricional da população. A adoção dessas políticas e ações deverá levar em conta as dimensões ambientais, culturais, econômicas, regionais e sociais. É dever do poder público respeitar, proteger, promover, prover, informar, monitorar, fiscalizar e avaliar a realização do direito humano à alimentação adequada, bem como garantir os mecanismos para sua exigibilidade.

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A segurança alimentar e nutricional consiste na realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras de saúde que respeitem a diversidade cultural e que sejam ambiental, cultural, econômica e socialmente sustentáveis. A segurança alimentar e nutricional abrange: I – a ampliação das condições de acesso aos alimentos por meio da produção, em especial da agricultura tradicional e familiar, do processamento, da industrialização, da comercialização, incluindo-se os acordos internacionais, do abastecimento e da distribuição dos alimentos, incluindo-se a água, bem como da geração de emprego e da redistribuição da renda; II – a conservação da biodiversidade e a utilização sustentável dos recursos; III – a promoção da saúde, da nutrição e da alimentação da população, incluindo-se grupos populacionais específicos e populações em situação de vulnerabilidade social; IV – a garantia da qualidade biológica, sanitária, nutricional e tecnológica dos alimentos, bem como seu aproveitamento, estimulando práticas alimentares e estilos de vida saudáveis que respeitem a diversidade étnica e racial e cultural da população; V – a produção de conhecimento e o acesso à informação; e VI – a implementação de políticas públicas e estratégias sustentáveis e participativas de produção, comercialização e consumo de alimentos, respeitando-se as múltiplas características culturais do País.

A consecução do direito humano à alimentação adequada e da segurança alimentar e nutricional requer o respeito à soberania, que confere aos países a primazia de suas decisões sobre a produção e o consumo de alimentos. O Estado brasileiro deve empenhar-se na promoção de cooperação técnica com países estrangeiros, contribuindo assim para a realização do direito humano à alimentação adequada no plano internacional. A consecução do direito humano à alimentação adequada e da segurança alimentar e nutricional da população far-se-á por meio do SISAN, integrado por um conjunto de órgãos e entidades da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios e pelas

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instituições privadas, com ou sem fins lucrativos, afetas à segurança alimentar e nutricional e que manifestem interesse em integrar o Sistema, respeitada a legislação aplicável. A participação no SISAN de que trata o artigo 7º[51] deverá obedecer aos princípios e diretrizes do Sistema e será definida a partir de critérios estabelecidos pelo Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional – CONSEA e pela Câmara Interministerial de Segurança Alimentar e Nutricional, a ser criada em ato do Poder Executivo Federal. Os órgãos responsáveis pela definição dos critérios de que trata o § 1o do artigo 7º poderão estabelecer requisitos distintos e específicos para os setores público e privado.

Os órgãos e entidades públicos ou privados que integram o SISAN o farão em caráter interdependente, assegurada a autonomia dos seus processos decisórios. O dever do poder público não exclui a responsabilidade das entidades da sociedade civil integrantes do SISAN. O SISAN reger-se-á pelos seguintes princípios: I – universalidade e equidade no acesso à alimentação adequada, sem qualquer espécie de discriminação; II – preservação da autonomia e respeito à dignidade das pessoas; III – participação social na formulação, execução, acompanhamento, monitoramento e controle das políticas e dos planos de segurança alimentar e nutricional em todas as esferas de governo; e IV – transparência dos programas, das ações e dos recursos públicos e privados e dos critérios para sua concessão. Ao lado disso, o SISAN tem como base as seguintes diretrizes: I – promoção da intersetorialidade das políticas, programas e ações governamentais e não-governamentais; II – descentralização das ações e articulação, em regime de colaboração, entre as esferas de governo; III – monitoramento da situação alimentar e nutricional, visando a subsidiar o ciclo de gestão das políticas para a área nas diferentes esferas de governo; IV – conjugação de medidas diretas e imediatas de garantia de acesso à alimentação adequada, com ações que ampliem a capacidade de subsistência autônoma da população; V – articulação entre orçamento e gestão; e VI – estímulo ao desenvolvimento de pesquisas e à capacitação de recursos humanos.

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O SISAN tem por objetivos formular e implementar políticas e planos de segurança alimentar e nutricional, estimular a integração dos esforços entre governo e sociedade civil, bem como promover o acompanhamento, o monitoramento e a avaliação da segurança alimentar e nutricional do País. Integram o SISAN: I – a Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, instância responsável pela indicação ao CONSEA das diretrizes e prioridades da Política e do Plano Nacional de Segurança Alimentar, bem como pela avaliação do SISAN; II – o CONSEA, órgão de assessoramento imediato ao Presidente da República, responsável pelas seguintes atribuições: a) convocar a Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, com periodicidade não superior a 4 (quatro) anos, bem como definir seus parâmetros de composição, organização e funcionamento, por meio de regulamento próprio; b) propor ao Poder Executivo Federal, considerando as deliberações da Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, as diretrizes e prioridades da Política e do Plano Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, incluindo-se requisitos orçamentários para sua consecução; c) articular, acompanhar e monitorar, em regime de colaboração com os demais integrantes do Sistema, a implementação e a convergência de ações inerentes à Política e ao Plano Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional; d) definir, em regime de colaboração com a Câmara Interministerial de Segurança Alimentar e Nutricional, os critérios e procedimentos de adesão ao SISAN; e) instituir mecanismos permanentes de articulação com órgãos e entidades congêneres de segurança alimentar e nutricional nos Estados, no Distrito Federal e nos Municípios, com a finalidade de promover o diálogo e a convergência das ações que integram o SISAN; f) mobilizar e apoiar entidades da sociedade civil na discussão e na implementação de ações públicas de segurança alimentar e nutricional.

Integra, ainda, o SISAN: III – a Câmara Interministerial de Segurança Alimentar e Nutricional, integrada por Ministros de Estado e Secretários Especiais responsáveis pelas pastas afetas à consecução da segurança alimentar e nutricional, com as seguintes

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atribuições, dentre outras: a) elaborar, a partir das diretrizes emanadas do CONSEA, a Política e o Plano Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, indicando diretrizes, metas, fontes de recursos e instrumentos de acompanhamento, monitoramento e avaliação de sua implementação; b) coordenar a execução da Política e do Plano; c) articular as políticas e planos de suas congêneres estaduais e do Distrito Federal; IV – os órgãos e entidades de segurança alimentar e nutricional da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios; e V – as instituições privadas, com ou sem fins lucrativos, que manifestem interesse na adesão e que respeitem os critérios, princípios e diretrizes do SISAN. A Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional será precedida de conferências estaduais, distrital e municipais, que deverão ser convocadas e organizadas pelos órgãos e entidades congêneres nos Estados, no Distrito Federal e nos Municípios, nas quais serão escolhidos os delegados à Conferência Nacional.

O CONSEA será composto a partir dos seguintes critérios: I – 1/3 (um terço) de representantes governamentais constituído pelos Ministros de Estado e Secretários Especiais responsáveis pelas pastas afetas à consecução da segurança alimentar e nutricional; II – 2/3 (dois terços) de representantes da sociedade civil escolhidos a partir de critérios de indicação aprovados na Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional; e III – observadores, incluindo-se representantes dos conselhos de âmbito federal afins, de organismos internacionais e do Ministério Público Federal. O CONSEA será presidido por um de seus integrantes, representante da sociedade civil, indicado pelo plenário do colegiado, na forma do regulamento, e designado pelo Presidente da República. A atuação dos conselheiros, efetivos e suplentes, no CONSEA, será considerada serviço de relevante interesse público e não remunerada.

7 Apontamentos à Resolução/CD/FNDE nº 38/2009: O Programa Nacional de Alimentação Escolar como instrumento materializador do Direito Humano à Alimentação Adequada

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Em um primeiro comentário, o artigo 2º da Resolução/CD/FNDE nº 38, de 16 de julho de 2009[52], que dispõe sobre o atendimento da alimentação escolar aos alunos da educação básica do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), vai estabelecer que são princípios do PNAE: (i) o direito humano à alimentação adequada, visando garantir a segurança alimentar e nutricional dos alunos; (ii) a universalidade do atendimento da alimentação escolar gratuita, a qual consiste na atenção aos alunos matriculados na rede pública de educação básica; (iii) a equidade, que compreende o direito constitucional à alimentação escolar, com vistas à garantia do acesso ao alimento de forma igualitária; (iv) a sustentabilidade e a continuidade, que visam ao acesso regular e permanente à alimentação saudável e adequada; (v) o respeito aos hábitos alimentares, considerados como tais, as práticas tradicionais que fazem parte da cultura e da preferência alimentar local saudáveis; (vi) o compartilhamento da responsabilidade pela oferta da alimentação escolar e das ações de educação alimentar e nutricional entre os entes federados, conforme disposto no art. 208 da Constituição Federal; e (vii) a participação da comunidade no controle social, no acompanhamento das ações realizadas pelos Estados, Distrito Federal e Municípios para garantir a execução do Programa.

Por sua vez, o artigo 3º estabelecer que são diretrizes do PNAE: (i) o emprego da alimentação saudável e adequada, que compreende o uso de alimentos variados, seguros, que respeitem a cultura, as tradições e os hábitos alimentares saudáveis, contribuindo para o crescimento e o desenvolvimento dos alunos e para a melhoria do rendimento escolar, em conformidade com a faixa etária, o sexo, a atividade física e o estado de saúde, inclusive dos que necessitam de atenção específica; (ii) a inclusão da educação alimentar e nutricional no processo de ensino e aprendizagem, que perpassa pelo currículo escolar, abordando o tema alimentação e nutrição e o desenvolvimento de práticas saudáveis de vida, na perspectiva da segurança alimentar e nutricional; (iii) a descentralização das ações e articulação, em regime de colaboração, entre as esferas de governo; (iv) o apoio ao

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desenvolvimento sustentável, com incentivos para a aquisição de gêneros alimentícios diversificados, produzidos em âmbito local e preferencialmente pela agricultura familiar e pelos empreendedores familiares, priorizando as comunidades tradicionais indígenas e de remanescentes de quilombos.

O PNAE tem por objetivo contribuir para o crescimento e o desenvolvimento biopsicossocial, a aprendizagem, o rendimento escolar e a formação de práticas alimentares saudáveis dos alunos, por meio de ações de educação alimentar e nutricional e da oferta de refeições que cubram as suas necessidades nutricionais durante o período letivo. Ao lado do exposto, para fins do PNAE, será considerada educação alimentar e nutricional o conjunto de ações formativas que objetivam estimular a adoção voluntária de práticas e escolhas alimentares saudáveis, que colaborem para a aprendizagem, o estado de saúde do escolar e a qualidade de vida do indivíduo. São consideradas, entre outras, estratégias de educação alimentar e nutricional: a oferta da alimentação saudável na escola, a implantação e manutenção de hortas escolares pedagógicas, a inserção do tema alimentação saudável no currículo escolar, a realização de oficinas culinárias experimentais com os alunos, a formação da comunidade escolar, bem como o desenvolvimento de tecnologias sociais que a beneficiem.

Referências:

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_____________. Lei Nº. 6.938, de 31 de Agosto de 1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 27 nov. 2015.

_____________. Lei nº 11.346, de 15 de setembro de 2006. Cria o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional – SISAN com vistas em assegurar o direito humano à alimentação adequada e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11346.htm>. Acesso em 27 nov. 2015.

_____________. Resolução/CD/FNDE nº 38, de 16 de julho de 2009. Dispõe sobre o atendimento da alimentação escolar aos alunos da educação básica do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). Disponível em: <www.fnde.gov.br>. Acesso em 27 nov. 2015.

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COTRIM, Gilberto. História Global – Brasil e Geral. 1 ed. vol. 2. São Paulo: Editora Saraiva, 2010.

FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves, Direitos Humanos Fundamentais. 6 ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2004.

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MORAES, Alexandre de. Direitos Humanos Fundamentais, Teoria Geral, Comentário dos art. 1º ao 5º da Constituição da Republica Federativa do Brasil de 1988, Doutrina e Jurisprudência. 9 ed. São Paulo: Editora Atlas, 2011.

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SANTOS, Enoque Ribeiro dos. O papel dos direitos humanos na valorização do direito coletivo do trabalho.Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 157, 10 dez. 2003. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/4609>. Acesso em: 27 nov. 2015.

SIQUEIRA, Dirceu Pereira; PICCIRILLO, Miguel Belinati. Direitos fundamentais: a evolução histórica dos direitos humanos, um longo caminho. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XII, n. 61, fev. 2009. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br>. Acesso em 27 nov. 2015.

TOVAR, Leonardo Zehuri. O Papel dos Princípios no Ordenamento Jurídico. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 696, 1 jun. 2005. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=6824>. Acesso em 27 nov. 2015.

VERDAN, Tauã Lima. Princípio da Legalidade: Corolário do Direito Penal. Jurid Publicações Eletrônicas, Bauru, 22 jun. 2009. Disponível em: <http://jornal.jurid.com.br>. Acesso em 27 nov. 2015.

VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. São Paulo: Editora Jurídica Brasileira, 1999.

NOTAS:

[1] VERDAN, Tauã Lima. Princípio da Legalidade: Corolário do Direito Penal. Jurid Publicações Eletrônicas, Bauru, 22 jun. 2009. Disponível em: <http://jornal.jurid.com.br>. Acesso em 27 nov. 2015.

[2] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acórdão em Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental Nº. 46/DF. Empresa Pública de Correios e Telégrafos. Privilégio de Entrega de Correspondências. Serviço Postal. Controvérsia referente à Lei Federal 6.538, de 22 de Junho de 1978. Ato Normativo que regula direitos e obrigações concernentes ao Serviço Postal. Previsão de Sanções nas Hipóteses de Violação do Privilégio Postal.

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Compatibilidade com o Sistema Constitucional Vigente. Alegação de afronta ao disposto nos artigos 1º, inciso IV; 5º, inciso XIII, 170, caput, inciso IV e parágrafo único, e 173 da Constituição do Brasil. Violação dos Princípios da Livre Concorrência e Livre Iniciativa. Não Caracterização. Arguição Julgada Improcedente. Interpretação conforme à Constituição conferida ao artigo 42 da Lei N. 6.538, que estabelece sanção, se configurada a violação do privilégio postal da União. Aplicação às atividades postais descritas no artigo 9º, da lei. Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Relator: Ministro Marcos Aurélio. Julgado em 05 ago. 2009. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em 27 nov. 2015.

[3] VERDAN, 2009, s.p.

[4] SIQUEIRA, Dirceu Pereira; PICCIRILLO, Miguel Belinati. Direitos fundamentais: a evolução histórica dos direitos humanos, um longo caminho. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XII, n. 61, fev. 2009. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br>. Acesso em 27 nov. 2015.

[5] MORAES, Alexandre de. Direitos Humanos Fundamentais, Teoria Geral, Comentário dos art. 1º ao 5º da Constituição da Republica Federativa do Brasil de 1988, Doutrina e Jurisprudência. 9 ed. São Paulo: Editora Atlas, 2011, p. 06.

[6] ALVARENGA, Rúbia Zanotelli de. Os Direitos Humanos na perspectiva social do trabalho. Disponível em: <http://www.faculdade.pioxii-es.com.br>. Acesso em 27 nov. 2015, p. 01.

[7] SIQUEIRA; PICCIRILLO, 2009. Acesso em 27 nov. 2015.

[8] MORAES, 2011, p. 06.

[9] CAMARGO, Caroline Leite de. Direitos humanos em face à história da humanidade. Revista Jus Vigilantibus. Disponível em: <http://jusvi.com/pecas/34357>. Acesso em 27 nov. 2015.

[10] MORAES, 2011, p. 06.

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[11] COMPARATO, Fábio Konder. A Afirmação Histórica dos Direitos Humanos. 3 ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2003, p.71-72.

[12] SÃO PAULO. Universidade de São Paulo (USP). Magna Carta (1.215). Disponível em: <http://www.direitoshumanos.usp.br>. Acesso em 27 nov. 2015: “Um homem livre será punido por um pequeno crime apenas, conforme a sua medida; para um grande crime ele será punido conforme a sua magnitude, conservando a sua posição; um mercador igualmente conservando o seu comércio, e um vilão conservando a sua cultura, se obtiverem a nossa mercê; e nenhuma das referidas punições será imposta excepto pelo juramento de homens honestos do distrito”.

[13] Ibid. “Nenhum homem livre será capturado ou aprisionado, ou desapropriado dos seus bens, ou declarado fora da lei, ou exilado, ou de algum modo lesado, nem nós iremos contra ele, nem enviaremos ninguém contra ele, excepto pelo julgamento legítimo dos seus pares ou pela lei do país”.

[14] Ibid. “A ninguém venderemos, a ninguém negaremos ou retardaremos direito ou justiça”.

[15] Ibid. “Será permitido, de hoje em diante, a qualquer um sair do nosso reino, e a ele retornar, salvo e seguro, por terra e por mar, salvaguardando a fidelidade a nós devida, excepto por um curto espaço em tempo de guerra, para o bem comum do reino, e excepto aqueles aprisionados e declarados fora da lei segundo a lei do país e pessoas de países hostis a nós e mercadores, os quais devem ser tratados como acima dito”.

[16] Ibid. “Todos os mercadores terão liberdade e segurança para sair, entrar, permanecer e viajar através da Inglaterra, tanto por terra como por mar, para comprar e vender, livres de todos os direitos de pedágio iníquos, segundo as antigas e justas taxas, excepto em tempo de guerra, caso sejam do país que está lutando contra nós. E se tais forem encontrados no nosso país no início da guerra serão capturados sem prejuízo dos seus corpos e mercadorias, até que seja sabido por nós, ou pelo nosso chefe de justiça, como os mercadores do nosso país são tratados, se foram encontrados no país em guerra contra nós; e se os nossos estiverem a salvo lá, estes estarão a salvo no nosso país”.

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Boletim Conteúdo Jurídico n. 651 de 07/07/2016 (ano VIII) ISSN

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[17] FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves,Direitos Humanos Fundamentais. 6 ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2004, p. 12.

[18] SÃO PAULO. Universidade de São Paulo (USP). Petição de Direito (1.628). Disponível em: <http://www.direitoshumanos.usp.br>. Acesso em 27 nov. 2015: “ninguém seja obrigado a contribuir com qualquer dádiva, empréstimo ou benevolence e a pagar qualquer taxa ou imposto, sem o consentimento de todos, manifestado por ato do Parlamento; e que ninguém seja chamado a responder ou prestar juramento, ou a executar algum serviço, ou encarcerado, ou, de uma forma ou de outra molestado ou inquietado, por causa destes tributos ou da recusa em os pagar; e que nenhum homem livre fique sob prisão ou detido por qualquer das formas acima indicadas”.

[19] COMPARATO, 2003, p. 89-90.

[20] MORAES, 2011, p. 08-09.

[21] SÃO PAULO. Universidade de São Paulo (USP). Declaração do Bom Povo da Virgínia (1.776). Disponível em: <http://www.direitoshumanos.usp.br>. Acesso em 27 nov. 2015: “Que todo poder é inerente ao povo e, consequentemente, dele procede; que os magistrados são seus mandatários e seus servidores e, em qualquer momento, perante ele responsáveis”.

[22] Ibid. “Que a liberdade de imprensa é um dos grandes baluartes da liberdade, não podendo ser restringida jamais, a não ser por governos despóticos”.

[23] COMPARATO, 2003, p. 49.

[24] SÃO PAULO. Universidade de São Paulo (USP). Declaração do Bom Povo da Virgínia (1.776). Disponível em: <http://www.direitoshumanos.usp.br>. Acesso em 27 nov. 2015: “Que todos os homens são, por natureza, igualmente livres e independentes, e têm certos direitos inatos, dos quais, quando entram em estado de sociedade, não podem por qualquer acordo privar ou despojar seus pósteros e que são: o gozo da vida e da liberdade com os meios de adquirir e de possuir a propriedade e de buscar e obter felicidade e segurança”.

[25] SILVA, 2004, p.155.

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        121 Disponível em: http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.56223  

Boletim Conteúdo Jurídico n. 651 de 07/07/2016 (ano VIII) ISSN

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[26] Ibid.

[27] MORAES, 2003, p. 28.

[28] COTRIM, Gilberto. História Global – Brasil e Geral. 1 ed. vol. 2. São Paulo: Editora Saraiva, 2010, p. 146-150.

[29] SILVA, 2004, p. 157.

[30] SÃO PAULO. Universidade de São Paulo (USP). Declaração dos Direitos dos Homens e Cidadão (1.789). Disponível em: <http://www.direitoshumanos.usp.br>. Acesso em 27 nov. 2015: “Art. 2º. A finalidade de toda associação política é a conservação dos direitos naturais e imprescritíveis do homem. Esses direitos são a liberdade, a propriedade a segurança e a resistência à opressão”.

[31] SÃO PAULO. Universidade de São Paulo (USP). Declaração dos Direitos dos Homens e Cidadão (1.789). Disponível em: <http://www.direitoshumanos.usp.br>. Acesso em 27 nov. 2015: “Art. 4º. A liberdade consiste em poder fazer tudo que não prejudique o próximo. Assim, o exercício dos direitos naturais de cada homem não tem por limites senão aqueles que asseguram aos outros membros da sociedade o gozo dos mesmos direitos. Estes limites apenas podem ser determinados pela lei”.

[32] Ibid. “Art. 8º. A lei apenas deve estabelecer penas estrita e evidentemente necessárias e ninguém pode ser punido senão por força de uma lei estabelecida e promulgada antes do delito e legalmente aplicada”.

[33] Ibid. “Art. 9º. Todo acusado é considerado inocente até ser declarado culpado e, se julgar indispensável prendê-lo, todo o rigor desnecessário à guarda da sua pessoa deverá ser severamente reprimido pela lei”.

[34] Ibid. “Art. 10º. Ninguém pode ser molestado por suas opiniões, incluindo opiniões religiosas, desde que sua manifestação não perturbe a ordem pública estabelecida pela lei. Art. 11º. A livre comunicação das ideias e das opiniões é um dos mais preciosos direitos do homem. Todo cidadão pode, portanto, falar, escrever, imprimir livremente, respondendo, todavia, pelos abusos desta liberdade nos termos previstos na lei”.

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[35] BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 21 ed. atual. São Paulo: Editora Malheiros Ltda., 2007, p. 563.

[36] COTRIM, 2010, p. 160.

[37] SANTOS, Enoque Ribeiro dos. O papel dos direitos humanos na valorização do direito coletivo do trabalho. Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 157, 10dez. 2003. Disponível em:<http://jus.com.br/revista/texto/4609>. Acesso em: 27 nov. 2015.

[38] MORAES, 2011, p. 11.

[39] SANTOS, 2003, s.p.

[40] FERREIRA FILHO, 2004, p. 46-47.

[41] SANTOS, 2003, s.p.

[42] BONAVIDES, 2007, p. 564.

[43] FERREIRA FILHO, 2004, p. 47.

[44] BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Rio de Janeiro: Editora Campus, 1997, p. 03.

[45] BONAVIDES, 2007, p. 569.

[46] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acórdão proferido em Ação Direta de Inconstitucionalidade N° 1.856/RJ. Ação Direta De Inconstitucionalidade - Briga de galos (Lei Fluminense Nº 2.895/98) - Legislação Estadual que, pertinente a exposições e a competições entre aves das raças combatentes, favorece essa prática criminosa - Diploma Legislativo que estimula o cometimento de atos de crueldade contra galos de briga - Crime Ambiental (Lei Nº 9.605/98, ART. 32) - Meio Ambiente - Direito à preservação de sua integridade (CF, Art. 225) - Prerrogativa qualificada por seu caráter de metaindividualidade - Direito de terceira geração (ou de novíssima dimensão) que consagra o postulado da solidariedade - Proteção constitucional da fauna (CF, Art. 225, § 1º, VII) - Descaracterização da briga de galo como manifestação cultural - Reconhecimento da inconstitucionalidade da Lei Estadual impugnada - Ação Direta procedente. Legislação Estadual que

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        123 Disponível em: http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.56223  

Boletim Conteúdo Jurídico n. 651 de 07/07/2016 (ano VIII) ISSN

 ‐ 1984‐0454 

autoriza a realização de exposições e competições entre aves das raças combatentes - Norma que institucionaliza a prática de crueldade contra a fauna – Inconstitucionalidade. . Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Relator: Ministro Celso de Mello. Julgado em 26 mai. 2011. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em 27 nov. 2015.

[47] MOTTA, Sylvio; BARCHET, Gustavo. Curso de Direito Constitucional. Rio de Janeiro: Editora Elsevier, 2007, p. 152.

[48] BONAVIDES, 2007, p. 569.

[49] MOTTA; BARCHET, 2007, p. 153. “[...] Duas são as origens básicas desses direitos: a degradação das liberdades ou a deterioração dos demais direitos fundamentais em virtude do uso nocivo das modernas tecnologias e o nível de desigualdade social e econômica existente entre as diferentes nações. A fim de superar tais realidades, que afetam a humanidade como um todo, impõe-se o reconhecimento de direitos que também tenham tal abrangência – a humanidade como um todo -, partindo-se da ideia de que não há como se solucionar problemas globais a não ser através de soluções também globais. Tais “soluções” são os direitos de terceira geração.[...]”

[50] BRASIL. Lei nº 11.346, de 15 de setembro de 2006. Cria o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional – SISAN com vistas em assegurar o direito humano à alimentação adequada e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11346.htm>. Acesso em 27 nov. 2015.

[51] BRASIL. Lei nº 11.346, de 15 de setembro de 2006. Cria o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional – SISAN com vistas em assegurar o direito humano à alimentação adequada e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11346.htm>. Acesso em 27 nov. 2015.

[52] BRASIL. Resolução/CD/FNDE nº 38, de 16 de julho de 2009. Dispõe sobre o atendimento da alimentação escolar aos alunos da educação básica do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). Disponível em: <www.fnde.gov.br>. Acesso em 27 nov. 2015.

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FACULDADE ESTÁCIO DE SÁ DE BELO HORIZONTE

Curso de Pós-Graduação em Direito

AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA CAUTELAR: uma visão crítica a sua

constitucionalidade.

Thiago Soares Gonçalves

Belo Horizonte

2016

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Thiago Soares Gonçalves

AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA CAUTELAR: uma visão crítica a sua

constitucionalidade.

Artigo científico apresentado ao Curso de Pós-

Graduação em Direito Penal e Processual

Penal da Universidade Estácio de Sá, como

requisito parcial para a obtenção do título de

Especialista.

Orientadora Prof.ª Dr.ª Mariana de Freitas

Rasga

Belo Horizonte

2016

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Thiago Soares Gonçalves

AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA CAUTELAR: uma visão crítica a sua

constitucionalidade.

Artigo científico apresentado ao Curso de Pós-

Graduação em Direito Penal e Processual

Penal da Universidade Estácio de Sá, como

requisito parcial para a obtenção do título de

Especialista.

Orientadora Prof.ª Dr.ª Mariana de Freitas

Rasga

Aprovado em ___/___/___

COMISSÃO EXAMINADORA

___________________________________________________________________________

Prof.ª Dr.ª Mariana de Freitas Rasga (Orientadora)

Belo Horizonte, 23 de maio de 2016

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO.....................................................................................................................2

2 AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA CAUTELAR SOB A ÓTICA CONSTITUCIONAL....3

3 AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA CAUTELAR E O CONSELHO NACIONAL DE

JUSTIÇA (CNJ)........................................................................................................................8

4 AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA CAUTELAR E O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

(STF).........................................................................................................................................16

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................................................22

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..................................................................................24

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1

AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA CAUTELAR: uma visão crítica a sua

constitucionalidade.

Thiago Soares Gonçalves1

RESUMO

A presente pesquisa tem a finalidade de compreender e discutir a audiência de

custódia cautelar sob o prisma constitucional, especialmente no tocante aos tratados

internacionais sobre direitos humanos, no qual, o Brasil é signatário. A audiência de custódia

foi criada através do Provimento Conjunto nº. 3/2015 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ)

em parceria com o Ministro da Justiça e o Tribunal de Justiça de São Paulo não respeitando as

formalidades para a sua criação, que a Constituição da República Federativa do Brasil de

1988 estabeleceu, ou seja, somente a União poderia criar através de Projeto de Lei a audiência

de custódia cautelar, na qual, seria inserida no Código de Processo Penal brasileiro tal

mudança (inconstitucionalidade formal).

Além disso, demonstrar a incompetência do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para

a sua implementação e a ofensa aos princípios da separação dos poderes e da legalidade.

Assim, investigar também os limites do Supremo Tribunal Federal (STF) na sua

atuação decidindo além da sua competência se transformando em legislador ordinário, através

de interpretação constitucional exercido no controle de constitucionalidade, o que revela uma

prática comum de decisões manipulativas, ativismo judicial e/ou judicialização.

Palavras-chave: A Audiência de Custódia Cautelar. Direito Constitucional. Tratados

Internacionais Ratificados pelo Brasil. Direito Processual Penal. Inconstitucionalidade

Formal. Princípio da Separação dos Poderes. Princípio da Legalidade. Provimento Conjunto

nº. 3/2015 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

1 Militar do Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais, Bacharel em Direito pela Faculdade Estácio de Sá de Belo Horizonte, Pós-Graduando em Direito Penal e Processual Penal pela Universidade Estácio de Sá.

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2

1. INTRODUÇÃO

No ano de 2015, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) juntamente com o Ministro da

Justiça e o Tribunal de Justiça de São Paulo deram origem ao projeto de implementação da

audiência de custódia cautelar através do Provimento Conjunto nº. 3/2015. Acontece que o

CNJ não tem competência para tal implementação que inegavelmente diz respeito ao direito

processual penal que, por sua vez, é de competência exclusiva do poder legislativo qualquer

modificação. Não observada esta previsão se caracteriza a inconstitucionalidade formal da

audiência de custódia cautelar.

O CNJ embasou a implementação da audiência de custódia cautelar em tratados

internacionais sobre direitos humanos, no qual, o Brasil é signatário, o que não justifica. Tal

justificativa perde a sua força quando se demonstra o status, no qual, tais tratados foram

recepcionados pela Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/88), isto

é, status de supralegalidade. O Supremo Tribunal Federal (STF) já decidiu que o mais correto

é colocar a supralegalidade dos tratados internacionais sobre direitos humanos acima das

demais leis mais abaixo da constituição.

Além disso, o CNJ ao implementá-la viola o princípio da separação dos poderes que

estabelece que os poderes são independentes, isto é, um não pode interferir na atuação do

outro para que se tenha um equilíbrio constitucional. Cabe ressaltar, que o CNJ é órgão do

poder judiciário.

Ademais, o CNJ é um órgão de competência administrativa que produz atos

administrativos. Como é sabido, ato administrativo não é lei, mas devem estar em sintonia

com a lei, o que não aconteceu. A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988

estabelece que qualquer modificação no Código de Processo Penal deve ser exercida através

do poder legislativo e de lei, e que somente a lei é capaz de obrigar alguém a fazer ou deixar

de fazer algo.

Diante do exposto, questiona-se a constitucionalidade da audiência de custódia

cautelar confirmada pelo STF, na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5240 (ADI nº

5240) que a julgou constitucional, contrariando os preceitos constitucionais, doutrinários e

jurisprudenciais. O STF estaria legislando, praticando decisões manipulativas, ativismo

judicial e/ou judicialização? Esta pergunta será respondida no decorrer da pesquisa e nas

considerações finais.

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3

2. AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA CAUTELAR SOB A ÓTICA CONSTITUCIONAL

A audiência de custódia cautelar tem por finalidade demandar que o delegado de

polícia, em todas as prisões em flagrante, apresente o detido ao juiz para que se ratifique a

prisão em flagrante convertendo-a em prisão preventiva ou, se tratando de prisão ilegal se

aplique o relaxamento de prisão ou se conceda a liberdade provisória. Acontece que a

audiência de custódia cautelar foi criada no ano de 2015 pelo Conselho Nacional de Justiça

(CNJ), através do Provimento Conjunto nº. 3/2015, que se embasou em tratados

internacionais sobre direitos humanos como a Convenção Americana sobre Direitos Humanos

(Pacto de San José da Costa Rica) no seu artigo 7º, item 5, que diz:

Toda pessoa presa, detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz ou outra autoridade autorizada por lei a exercer funções judiciais e tem o direito de ser julgada em prazo razoável ou de ser posta em liberdade, sem prejuízo de que prossiga o processo. Sua liberdade pode ser condicionada a garantias que assegurem o seu comparecimento em juízo.

Também se embasou no Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos no seu

artigo 9º, item 3, que menciona:

Qualquer pessoa presa ou encarcerada em virtude de infração penal deverá ser conduzida, sem demora, à presença do juiz ou de outra autoridade habilitada por lei a exercer funções judiciais e terá o direito de ser julgada em prazo razoável ou de ser posta em liberdade. A prisão preventiva de pessoas que aguardam julgamento não deverá constituir a regra geral, mas a soltura poderá estar condicionada a garantias que assegurem o comparecimento da pessoa em questão à audiência, a todos os atos do processo e, se necessário for, para a execução da sentença.

Como é sabido, os tratados internacionais sobre direitos humanos citados acima são

regras e princípios a serem inseridos dentro do paradigma constitucional de cada país, isto é,

Page 132: BOLETIM CONTEÚDO Boletim JURÍDICO N. 651 · 0 boletim conteÚdo

4

cada país irá recepcionar essas regras e princípios de acordo com o estabelecido na sua

constituição. Isso, não que dizer que os tratados internacionais sobre direitos humanos2 tem

uma posição de inferioridade em relação aos direitos fundamentais3 já inseridos na

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/88), pelo contrário o artigo

5º, § 2º, da CRFB/88, prevê que “os direitos e as garantias expressos no texto constitucional

não excluem outros decorrentes dos tratados de que seja parte a República Federativa do

Brasil”, ou seja, não existe hierarquia entre os direitos humanos ou fundamentais, pois eles

estão em planos diferentes.

Entretanto, existe uma regra estabelecida pela CRFB/88 em relação à recepção desses

tratados, ou seja, os tratados internacionais sobre direitos humanos que confirmado nos

moldes do artigo 5º, § 3º, da CRFB/88, acrescido pela EC nº 45/04, são idênticos às emendas

constitucionais, assim diz:

Os tratados e convenções internacionais sobre os direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais.

Cabe ressaltar, que os tratados que ensejaram a criação e implementação da audiência

de custódia cautelar não foram aprovados de acordo com o artigo 5º, § 3º, da CRFB/88, sendo

assim, o Supremo Tribunal Federal (STF) já decidiu de forma pacífica que os tratados e

convenções nesses casos terão status de supralegalidade, assim menciona Gilmar Mendes

(2016, p. 1207), dizendo:

Por fim, cabe ressaltar o encerramento do julgamento do Recurso Extraordinário n. 466.343 / SP, Rel. Min. Cezar Peluso, em 3-12-2008. Nesse julgado, o STF definiu a tese da supralegalidade dos tratados internacionais sobre direitos humanos que sejam internalizados pelo direito pátrio.

2 São direitos previstos em tratados e convenções internacionais essenciais para dignidade da pessoa humana; saúde, lazer, segurança, moradia, liberdade, igualdade e outros. 3 São os direitos humanos já positivados na CRFB/88.

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5

Segue a ementa citada acima do julgamento do Recurso Extraordinário nº 466.343/SP,

que menciona:

EMENTA: PRISÃO CIVIL. Depósito. Depositário infiel. Alienação fiduciária. Decretação da medida coercitiva. Inadmissibilidade absoluta. Insubsistência da previsão constitucional e das normas subalternas. Interpretação do art. 5º, inc. LXVII e §§ 1º, 2º e 3º, da CF, à luz do art. 7º, § 7, da Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica). Recurso improvido. Julgamento conjunto do RE nº 349.703 e dos HCs nº 87.585 e nº 92.566. É ilícita a prisão civil de depositário infiel, qualquer que seja a modalidade do depósito. (STF - RE: 466343 SP, Relator: Min. CEZAR PELUSO, Data de Julgamento: 03/12/2008, Tribunal Pleno, Data de Publicação: DJe-104 DIVULG 04-06-2009 PUBLIC 05-06-2009 EMENT VOL-02363-06 PP-01106 RDECTRAB v. 17, n. 186, 2010, p. 29-165)

Merece transcrição a ementa do julgamento do Habeas Corpus nº 94.013 / SP, que

também reafirma o status supralegal dos tratados internacionais de direitos humanos:

EMENTA: HABEAS CORPUS. SALVO-CONDUTO. PRISÃO CIVIL. DEPOSITÁRIO JUDICIAL. DÍVIDA DE CARÁTER NÃO ALIMENTAR. IMPOSSIBILIDADE. ORDEM CONCEDIDA. 1. O Plenário do Supremo Tribunal Federal firmou a orientação de que só é possível a prisão civil do "responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia" (inciso LXVII do art. 5º da CF/88). Precedentes: HCs 87.585 e 92.566, da relatoria do ministro Marco Aurélio. 2. A norma que se extrai do inciso LXVII do artigo 5º da Constituição Federal é de eficácia restringível. Pelo que as duas exceções nela contidas podem ser aportadas por lei, quebrantando, assim, a força protetora da proibição, como regra geral, da prisão civil por dívida. 3. O Pacto de San José da Costa Rica (ratificado pelo Brasil - Decreto 678 de 6 de novembro de 1992), para valer como norma jurídica interna do Brasil, há de ter como fundamento de validade o § 2º do artigo 5º da Magna Carta. A se contrapor, então, a qualquer norma ordinária originariamente brasileira que preveja a prisão civil por dívida. Noutros termos: o Pacto de San José da Costa Rica, passando a ter como fundamento de validade o § 2º do art. 5º da CF/88, prevalece como norma supralegal em nossa ordem jurídica interna e, assim, proíbe a prisão civil por dívida. Não é norma constitucional -- à falta do rito exigido pelo § 3º do art. 5º --, mas a sua hierarquia intermediária de norma supralegal autoriza afastar regra ordinária brasileira que possibilite a prisão civil por dívida. 4. No caso, o paciente corre o risco de ver contra si expedido mandado prisional por se encontrar na situação de infiel depositário judicial. 5. Ordem concedida.

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6

(HC 94013, Relator(a): Min. CARLOS BRITTO, Primeira Turma, julgado em 10/02/2009, DJe-048 DIVULG 12-03-2009 PUBLIC 13-03-2009 EMENT VOL-02352-02 PP-00267 RT v. 98, n. 885, 2009, p. 155-159 LEXSTF v. 31, n. 363, 2009, p. 390-396).

Novamente Gilmar Mendes (2009, p. 749): “Por conseguinte, é mais consistente a

interpretação que atribui a característica de supralegalidade aos tratados e convenções de

direitos humanos”.

O status de supralegalidade significa dizer que os tratados e convenções sobre direitos

humanos terão uma posição privilegiada acima das demais normas jurídicas (leis), mas nunca

acima da CRFB/88. Conforme menciona Gilmar Mendes (2009, p. 750): “Em outros termos,

os tratados sobre direitos humanos não poderiam afrontar a supremacia da Constituição, mas

teriam lugar especial reservado no ordenamento jurídico”.

Para melhor demonstrar o nosso escalonamento jurídico merece transcrição o artigo

59, da CRFB/88:

Art. 59. O processo legislativo compreende a elaboração de: I - emendas à Constituição; II - leis complementares; III - leis ordinárias; IV - leis delegadas; V - medidas provisórias; VI - decretos legislativos; VII - resoluções. Parágrafo único. Lei complementar disporá sobre a elaboração, redação, alteração e consolidação das leis.

Observa-se, que existe uma hierarquia entre as normas jurídicas e, que uma depende

da outra e todas dependem da constituição. Sendo assim, a CRFB/88 (Carta Magna) é a lei

suprema que dita e estabelece todas as regras a serem seguidas pelas demais normas jurídicas

(leis).

Isso não é novidade, pois diversos autores já reconheceram a hierarquia entre as

normas, sendo eles Bobbio (1999, p. 49), adotando a teoria escalonada do ordenamento

jurídico dos ensinamentos de Kelsen, dizendo que:

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7

Há normas superiores e normas inferiores. As inferiores dependem das superiores. Subindo das normas inferiores àquelas que se encontram mais acima, chega-se a uma norma suprema, que não depende de nenhuma outra norma superior, e sobre a qual repousa a unidade do ordenamento. Essa norma suprema é a norma fundamental.

Norberto Bobbio nos ensina também que:

Num dado ordenamento jurídico as normas são dispostas de forma escalonada hierarquicamente, de modo que, considerando-se a disposição das normas em uma pirâmide, vamos encontrar em seu ápice a norma suprema, fundamental, da qual todas as outras normas dependem e retiram sua eficácia e validade. Assim, pode-se afirmar que o sistema normativo está colocado em uma certa ordem, onde as normas são classificadas segundo um determinado grau de superioridade, indo-se desde a norma mais inferior até alcançar a norma suprema, ou seja, a norma que dá legitimidade ao comando normativo e da qual todo o ordenamento jurídico depende (BOBBIO, 1999, p. 48).

Também, de forma semelhante, Ferraz Junior (2001, p. 172), menciona:

Quando dizemos que as normas estão dispostas hierarquicamente, umas são superiores, outras inferiores, estamos pensando em estrutura. Hierarquia é um conjunto de relações, estabelecidas conforme regras de subordinação e de coordenação. Essas regras não são normas jurídicas nem são elementos não normativos, isto é, não fazem parte do repertório, mas da estrutura do ordenamento. Exemplo de regra estrutural é o princípio da lex superior (regra segundo a qual a norma que dispõe, formal e materialmente, sobre a edição de outras normas prevalece sobre estas em caso de contradição: as normas constitucionais prevalecem sobre as leis ordinárias), ou o da lex posterior (havendo normas do mesmo escalão em contradição, prevalece a que, no tempo, apareceu por último), ou a da lex especialis (a norma especial revoga a geral no que esta dispõe especificamente).

Sendo assim, o entendimento de Coelho (2009, p. 17), reafirma que “Como a

Constituição é hierarquicamente superior, pela sua posição, natureza e função no âmbito do

ordenamento jurídico, não existe outra alternativa: afasta-se a lei e aplica-se a Constituição”.

Cabe ressaltar, que não se pode inovar a ordem constitucional, modificando o status dos

tratados e convenções sobre direitos humanos e da Carta Magna, pois toda interpretação se

deve embasar na CRFB/88.

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3. AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA CAUTELAR E O CONSELHO NACIONAL DE

JUSTIÇA (CNJ)

Através do Provimento Conjunto nº. 3/2015, o CNJ no ano de 2015 deu origem à

audiência de custódia cautelar, com participação do Ministro da Justiça e do Tribunal de

Justiça de São Paulo, que tem como objetivo exigir que a autoridade policial providencie a

apresentação do flagranteado a audiência de custódia cautelar que será composta pelo juiz,

promotor de justiça e o defensor público ou particular. Após, a oitiva do detido o promotor de

justiça poderá pedir a conversão da prisão em flagrante em preventiva ou manifestar pelo

relaxamento da prisão, caso comprovado alguma ilegalidade na prisão em flagrante, ou pela

concessão de liberdade provisória com ou sem fiança. O juiz também ouvira o advogado do

detido e poderá converter a prisão preventiva pela domiciliar4 caso comprovado alguma

hipótese do artigo 3185, do Código de Processo Penal (CPP). Sendo assim, transcrevo o

conteúdo do Provimento Conjunto nº. 3/2015, que diz:

Art. 1º Determinar, em cumprimento ao disposto no artigo 7º, item 5, da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de San Jose da Costa Rica), a apresentação de pessoa detida em flagrante delito, até 24 horas após a sua prisão, para participar de audiência de custódia. Art. 2º A implantação da audiência de custódia no Estado de São Paulo será gradativa e obedecerá ao cronograma de afetação dos distritos policiais aos juízos competentes. Parágrafo único. A Corregedoria Geral da Justiça disciplinará por provimento a implantação da audiência de custódia no Estado de São Paulo e o cronograma de afetação dos distritos policiais aos juízos competentes.

4 De acordo com o Art. 317, do CPP, “A prisão domiciliar consiste no recolhimento do indiciado ou acusado em sua residência, só podendo dela ausentar-se com autorização judicial”. 5 Art. 318 do CPP, “Poderá o juiz substituir a prisão preventiva pela domiciliar quando o agente for: I - maior de 80 (oitenta) anos; II - extremamente debilitado por motivo de doença grave; III - imprescindível aos cuidados especiais de pessoa menor de 6 (seis) anos de idade ou com deficiência; IV - gestante; V - mulher com filho de até 12 (doze) anos de idade incompletos; VI - homem, caso seja o único responsável pelos cuidados do filho de até 12 (doze) anos de idade incompletos. Parágrafo único. Para a substituição, o juiz exigirá prova idônea dos requisitos estabelecidos neste artigo”.

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Art. 3º A autoridade policial providenciará a apresentação da pessoa detida, até 24 horas após a sua prisão, ao juiz competente, para participar da audiência de custódia. § 1º O auto de prisão em flagrante será encaminhado na forma do artigo 306, parágrafo 1º, do Código de Processo Penal, juntamente com a pessoa detida. § 2º Fica dispensada a apresentação do preso, na forma do parágrafo 1º, quando circunstâncias pessoais, descritas pela autoridade policial no auto de prisão em flagrante, assim justificarem. Art. 4º Incumbe à unidade vinculada ao juiz competente preparar o auto de prisão em flagrante para a audiência de custódia, realizando os atos de praxe previstos nas Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça, e juntar a folha de antecedentes da pessoa presa. Art. 5º O autuado, antes da audiência de custódia, terá contato prévio e por tempo razoável com seu advogado ou com Defensor Público. Art. 6º Na audiência de custódia, o juiz competente informará o autuado da sua possibilidade de não responder perguntas que lhe forem feitas, e o entrevistará sobre sua qualificação, condições pessoais, tais como estado civil, grau de alfabetização, meios de vida ou profissão, local da residência, lugar onde exerce sua atividade, e, ainda, sobre as circunstâncias objetivas da sua prisão. § lº Não serão feitas ou admitidas perguntas que antecipem instrução própria de eventual processo de conhecimento. § 2º Após a entrevista do autuado, o juiz ouvirá o Ministério Público que poderá se manifestar pelo relaxamento da prisão em flagrante, sua conversão em prisão preventiva, pela concessão de liberdade provisória com imposição, se for o caso, das medidas cautelares previstas no artigo 319 do Código de Processo Penal. § 3º A seguir, o juiz dará a palavra ao advogado ou ao Defensor Público para manifestação, e decidirá, na audiência, fundamentadamente, nos termos do artigo 310 do Código de Processo Penal, podendo, quando comprovada uma das hipóteses do artigo 318 do mesmo Diploma, substituir a prisão preventiva pela domiciliar. § 4º A audiência será gravada em mídia adequada, lavrando-se termo ou ata sucintos e que conterá o inteiro teor da decisão proferida pelo juiz, salvo se ele determinar a integral redução por escrito de todos os atos praticados. § 5º A gravação original será depositada na unidade judicial e uma cópia instruirá o auto de prisão em flagrante. § 6º As partes, dentro de 48 ([...]) horas, contadas do término da audiência, poderão requerer a reprodução dos atos gravados, desde que instruam a petição com mídia capaz de suportá-la. Art. 7º O juiz competente, diante das informações colhidas na audiência de custódia, requisitará o exame clínico e de corpo de delito do autuado, quando concluir que a perícia é necessária para a adoção de medidas, tais como: I – apurar possível abuso cometido durante a prisão em flagrante, ou a lavratura do auto; II – determinar o encaminhamento assistencial, que repute devido. Art. 8º O mandado de prisão, se convertido o flagrante em preventiva, e o alvará de soltura, na hipótese de relaxamento da prisão em flagrante ou concessão da liberdade provisória, serão expedidos com observância das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça, aplicando-se, ainda, e no que couber, o procedimento disciplinado no artigo 417 e seus parágrafos do mesmo Diploma.

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Art. 9º Será elaborado pela unidade vinculada ao juízo competente relatório mensal, que deverá conter: I – o número de audiências de custódia realizadas; II – o tipo penal imputado, nos autos de prisão em flagrante, à pessoa detida e que participou de audiência de custódia; III – o número e o tipo das decisões proferidas (relaxamento da prisão em flagrante, sua conversão em prisão preventiva, concessão de liberdade provisória com imposição, se for o caso, das medidas cautelares previstas no artigo 319 do Código de Processo Penal, conversão da prisão preventiva em domiciliar, nos termos do artigo 318 do mesmo Diploma) pelo juiz competente: IV – o número e espécie de encaminhamentos assistenciais determinados pelo juiz competente. Art. 10. Não será realizada a audiência de custódia durante o plantão judiciário ordinário (art. 1127, I, NSCGJ) e os finais de semana do plantão judiciário especial (art. 1127, II, NSCGJ). Parágrafo único. A regra do caput aplica-se até a efetiva implantação de rotina para transferência, aos finais de semana e feriados, de presos das unidades da Secretaria de Estado da Segurança Pública para os estabelecimentos da Secretaria de Estado da Administração Penitenciária. Art. 11. Este Provimento entra em vigor na data de sua publicação.

Cabe ressaltar, que o CNJ é um órgão do poder judiciário e não do poder legislativo,

assim menciona o artigo 92, da CRFB/88:

Art. 92. São órgãos do Poder Judiciário: I - o Supremo Tribunal Federal; I-A o Conselho Nacional de Justiça; II - o Superior Tribunal de Justiça; III - os Tribunais Regionais Federais e Juízes Federais; IV - os Tribunais e Juízes do Trabalho; V - os Tribunais e Juízes Eleitorais; VI - os Tribunais e Juízes Militares; VII - os Tribunais e Juízes dos Estados e do Distrito Federal e Territórios. § 1º O Supremo Tribunal Federal, o Conselho Nacional de Justiça e os Tribunais Superiores têm sede na Capital Federal. § 2º O Supremo Tribunal Federal e os Tribunais Superiores têm jurisdição em todo o território nacional (grifo nosso).

Além disso, o CNJ é um órgão do poder judiciário de competência meramente

administrativa e financeira dos juízes, sendo assim, merece transcrição o artigo 103-B da

CRFB/88, que demonstra de forma completa toda a estrutura e competência do Conselho

Nacional de Justiça:

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Art. 103-B. O Conselho Nacional de Justiça compõe-se de 15 (quinze) membros com mandato de 2 (dois) anos, admitida 1 (uma) recondução, sendo: I - o Presidente do Supremo Tribunal Federal; II um Ministro do Superior Tribunal de Justiça, indicado pelo respectivo tribunal; III um Ministro do Tribunal Superior do Trabalho, indicado pelo respectivo tribunal; IV um desembargador de Tribunal de Justiça, indicado pelo Supremo Tribunal Federal; V um juiz estadual, indicado pelo Supremo Tribunal Federal; VI um juiz de Tribunal Regional Federal, indicado pelo Superior Tribunal de Justiça; VII um juiz federal, indicado pelo Superior Tribunal de Justiça; VIII um juiz de Tribunal Regional do Trabalho, indicado pelo Tribunal Superior do Trabalho; IX um juiz do trabalho, indicado pelo Tribunal Superior do Trabalho; X um membro do Ministério Público da União, indicado pelo Procurador-Geral da República; XI um membro do Ministério Público estadual, escolhido pelo Procurador-Geral da República dentre os nomes indicados pelo órgão competente de cada instituição estadual; XII dois advogados, indicados pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; XIII dois cidadãos, de notável saber jurídico e reputação ilibada, indicados um pela Câmara dos Deputados e outro pelo Senado Federal. § 1º O Conselho será presidido pelo Presidente do Supremo Tribunal Federal e, nas suas ausências e impedimentos, pelo Vice-Presidente do Supremo Tribunal Federal. § 2º Os demais membros do Conselho serão nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado Federal. § 3º Não efetuadas, no prazo legal, as indicações previstas neste artigo, caberá a escolha ao Supremo Tribunal Federal. § 4º Compete ao Conselho o controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes, cabendo-lhe, além de outras atribuições que lhe forem conferidas pelo Estatuto da Magistratura: I - zelar pela autonomia do Poder Judiciário e pelo cumprimento do Estatuto da Magistratura, podendo expedir atos regulamentares, no âmbito de sua competência, ou recomendar providências; II - zelar pela observância do art. 37 e apreciar, de ofício ou mediante provocação, a legalidade dos atos administrativos praticados por membros ou órgãos do Poder Judiciário, podendo desconstituí-los, revê-los ou fixar prazo para que se adotem as providências necessárias ao exato cumprimento da lei, sem prejuízo da competência do Tribunal de Contas da União; III receber e conhecer das reclamações contra membros ou órgãos do Poder Judiciário, inclusive contra seus serviços auxiliares, serventias e órgãos prestadores de serviços notariais e de registro

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que atuem por delegação do poder público ou oficializados, sem prejuízo da competência disciplinar e correicional dos tribunais, podendo avocar processos disciplinares em curso e determinar a remoção, a disponibilidade ou a aposentadoria com subsídios ou proventos proporcionais ao tempo de serviço e aplicar outras sanções administrativas, assegurada ampla defesa; IV representar ao Ministério Público, no caso de crime contra a administração pública ou de abuso de autoridade; V rever, de ofício ou mediante provocação, os processos disciplinares de juízes e membros de tribunais julgados há menos de um ano; VI elaborar semestralmente relatório estatístico sobre processos e sentenças prolatadas, por unidade da Federação, nos diferentes órgãos do Poder Judiciário; VII elaborar relatório anual, propondo as providências que julgar necessárias, sobre a situação do Poder Judiciário no País e as atividades do Conselho, o qual deve integrar mensagem do Presidente do Supremo Tribunal Federal a ser remetida ao Congresso Nacional, por ocasião da abertura da sessão legislativa. § 5º O Ministro do Superior Tribunal de Justiça exercerá a função de Ministro-Corregedor e ficará excluído da distribuição de processos no Tribunal, competindo-lhe, além das atribuições que lhe forem conferidas pelo Estatuto da Magistratura, as seguintes: I receber as reclamações e denúncias, de qualquer interessado, relativas aos magistrados e aos serviços judiciários; II exercer funções executivas do Conselho, de inspeção e de correição geral; III requisitar e designar magistrados, delegando-lhes atribuições, e requisitar servidores de juízos ou tribunais, inclusive nos Estados, Distrito Federal e Territórios. § 6º Junto ao Conselho oficiarão o Procurador-Geral da República e o Presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil. § 7º A União, inclusive no Distrito Federal e nos Territórios, criará ouvidorias de justiça, competentes para receber reclamações e denúncias de qualquer interessado contra membros ou órgãos do Poder Judiciário, ou contra seus serviços auxiliares, representando diretamente ao Conselho Nacional de Justiça (grifo nosso).

Como é sabido, o CNJ é um órgão do poder judiciário, mas a sua competência se

restringe ao âmbito administrativo, não sendo o mesmo competente para legislar ou

implementar a audiência de custódia cautelar, assim menciona Pedro Lenza (2015, p. 940):

Dessa forma, por estarem as atribuições do CNJ restritas ao controle da atuação administrativa, financeira e disciplinar dos órgãos do Poder

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Judiciário a ele sujeitos, pode-se afirmar ser o CNJ um órgão meramente administrativo (do Judiciário) (grifo nosso).

Sendo o mesmo um órgão do poder judiciário, a audiência de custódia cautelar deveria

ser criada pelo Congresso Nacional conforme estabelece o artigo 22, inciso I, da CRFB/88,

que diz: “Compete privativamente à União legislar sobre: direito civil, comercial, penal,

processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho;” (grifo nosso).

Ademais, ao contrário do que se estabelece o artigo 22, inciso I, da CRFB/88, qualquer

forma de se implementar a audiência de custódia cautelar é inconstitucional, assim menciona

Pedro Lenza (2015, p. 298): “A inconstitucionalidade formal orgânica decorre da

inobservância da competência legislativa para a elaboração do ato”. (grifo nosso).

Assim, Gilmar Mendes cita os autores abaixo (2016, p. 1057) para demonstrar a

incompetência do CNJ para legislar, dizendo:

Lenio, Ingo e Clemerson anotam que “no Estado Democrático de Direito, é inconcebível permitir-se a um órgão administrativo expedir atos (resoluções, decretos, portarias, etc.) com força de lei, cujos reflexos possam avançar sobre direitos fundamentais”, e que “parece, de pronto, inconcebível que o constituinte derivado, ao aprovar a Reforma do Judiciário, tenha transformado os Conselhos em órgãos com poder equiparado aos do legislador. Ou seja, a menção ao poder de expedir ‘atos regulamentares’ tem o objetivo específico de controle externo, a partir de situações concretas que surjam no exercício das atividades de judicatura e de Ministério Público. Aliás, não se pode esquecer que é exatamente o controle externo que se constituiu na ‘ratio essend’ da criação de ambos os Conselhos” (Lenio Luiz Streck, Ingo Wolfgang Sarlet e Clemerson Merlin Clève, Os limites constitucionais das resoluções do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), Revista de Doutrina www.revistadoutrina.trf4.gov.br, acesso em 6-10-2006).

Sendo assim, o CNJ praticando atos normativos além da sua competência e

pertencendo ao poder judiciário, se verifica uma ofensa ao princípio da separação de poderes

que está explicito no artigo 2º, da CRFB/88, que diz “São Poderes da União, independentes e

harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário”. Como é sabido, o princípio da

separação de poderes também é cláusula pétrea, no qual, não pode ser objeto de proposta de

emendas constitucionais tendentes a restringi-lo ou aboli-lo, mas poderá ser ampliado. Assim

menciona o artigo 60, da CRFB/88, que diz “A Constituição poderá ser emendada mediante

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proposta:§ 4º Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: III - a

separação dos Poderes;”. Para melhor conceituar o princípio da separação de poderes Pedro

Lenza (2015, p. 1507), diz:

os “Poderes” (órgãos) são independentes entre si, cada qual atuando dentro de sua competência constitucionalmente estabelecida e assegurada quando da manifestação do poder constituinte originário, daí ser mais adequado falarmos em órgãos que exercem funções, típicas (inerentes à essência) e atípicas (do órgão, mas sem ser a sua essência).

Como é sabido, nenhum órgão ou poder pode transferir para outro órgão ou poder, a

função que lhe é típica ou prevista como típica, caso isso aconteça o princípio da

indelegabilidade de atribuições será desrespeitado.

Cabe ressaltar que o CNJ é um órgão de competência administrativa que pratica atos

administrativos6, como por exemplo, o provimento conjunto em discussão. A característica e a

competência dos atos normativos7 praticados pelo Conselho Nacional de Justiça é conceituado

por Gilmar Mendes (2016, p. 1057 e 1058), que diz:

A corte concluiu que o CNJ possui poder normativo voltado a uniformizar regras que alcancem todo o Judiciário, visto tratar-se de Poder de caráter nacional. Além disso, frisou que o poder normativo do CNJ possui como fonte primária a própria Constituição Federal, como a redação que lhe foi dada pela EC n. 45/2004, o qual deve ser levado a efeito, observando-se as normas constitucionais e as disposições contidas na LOMAN.

Ademais, todos os atos normativos praticados pelo CNJ são de fonte primária, isto é,

devem observar as normas constitucionais da CRFB/88 e concorrente com as demais

6 Di Pietro (2010, p. 196) é “a declaração do Estado ou de quem o represente, que produz efeitos jurídicos imediatos, com observância de lei, sob regime jurídico de direito público e sujeita a controle do Poder Judiciário”. 7 Segundo Hely Lopes Meirelles: “são aqueles que contém um comando geral do Executivo visando ao cumprimento de uma lei. Podem apresentar-se com a característica de generalidade e abstração (decreto geral que regulamenta uma lei), ou individualidade e concreção (decreto de nomeação de um servidor). Segundo Márcio Fernando Elias Rosa são exemplos: regulamento, decreto, regimento e resolução”. ATO ADMINISTRATIVO. In: WIKIPÉDIA, a enciclopédia livre. Flórida: Wikimedia Foundation, 2015. Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=Ato_administrativo&oldid=43613909>. Acesso em: 10 de maio de 2016.

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corregedorias e tribunais. Percebe-se que toda a competência do CNJ é voltada e limitada aos

assuntos disciplinares e de correção dos atos da magistratura, o que não vem acontecendo.

Assim, o Supremo Tribunal Federal, ao assentar a competência constitucional primária do CNJ, afirmou que esse órgão é detentor de poder normativo no âmbito da magistratura, bem como que a ele compete exercer atividade disciplinar e correcional concorrente às dos tribunais em geral.

Porém, o CNJ poderá expedir atos normativos mais abrangentes com o intuito de

uniformizar e aperfeiçoar o Poder Judiciário conforme menciona o artigo 8º do Regimento

Interno do Conselho Nacional de Justiça:

Art. 8º Compete ao Corregedor Nacional de Justiça, além de outras atribuições que lhe forem conferidas pelo Estatuto da Magistratura: X - expedir Recomendações, Provimentos, Instruções, Orientações e outros atos normativos destinados ao aperfeiçoamento das atividades dos órgãos do Poder Judiciário e de seus serviços auxiliares e dos serviços notariais e de registro, bem como dos demais órgãos correicionais, sobre matéria relacionada com a competência da Corregedoria Nacional de Justiça; (grifo nosso).

Todavia, todos os atos normativos deverão ter como ponto de partida as regras e os

princípios constitucionais respeitando o Princípio da Supremacia da Constituição8, além de

observar também as disposições contidas na Lei Orgânica da Magistratura Nacional

(LOMAN).

Entretanto, se observa que houve uma clara ofensa aos preceitos constitucionais, e

consequentemente, o princípio da legalidade também foi desrespeitado, pois se um ato

administrativo vai de encontro a CRFB/88 ele é ilegal. Assim, estabelece o artigo 37, “caput”,

da CRFB/88, dizendo:

8 Conforme menciona Gonet Branco (2016, p. 106): “O conflito de leis com a Constituição encontrará solução na prevalência desta, justamente por ser a Carta Magna produto do poder constituinte originário, ela própria elevando-se à condição de obra suprema, que inicia o ordenamento jurídico, impondo-se, por isso, ao diploma inferior com ela inconciliável. De acordo com a doutrina clássica, por isso mesmo, o ato contrário à Constituição sofre nulidade absoluta”.

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A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

Assim, estabelece também o artigo 5º, II, da CRFB/88, que diz:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;

Observa-se que todo ato normativo, que é uma espécie de ato administrativo, e toda

atuação da administração pública deve-se pautar pela legalidade, o próprio artigo 103-B, § 4º,

II, da CRFB/88, já citado acima, faz menção ao artigo 37, “caput”, da Carta Magna, para

enfatizar e estabelecer uma regra a ser cumprida pelo CNJ, o que não aconteceu. Cabe

ressaltar, que o particular, ou seja, o cidadão pode fazer tudo que a lei não proíbe, mas a

administração pública só pode fazer aquilo que a lei permitir, o que não é o caso. Pois,

nenhuma lei e muito menos a CRFB/88 permitiu que o CNJ criasse ou implementasse a

audiência de custódia cautelar, uma vez que, ato administrativo não é lei.

4. AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA CAUTELAR E O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

(STF)

Nota-se, que era possível o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) enxergar que o

Provimento Conjunto nº. 3/2015 era um ato normativo que apresentava um vicio de

legalidade, e consequentemente, anular esse ato. Assim, determina a Súmula nº 473 do

Supremo Tribunal Federal (STF) mencionando que “A administração pode anular seus

próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque dêles não se originam

direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos

adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial”.

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Ademais, o STF também poderia ter apreciado esse ato normativo conforme menciona

Pedro Lenza (2015, p. 940), que “Observa-se, portanto, que o CNJ não exerce função

jurisdicional e os seus atos poderão ser revistos pelo STF, orientação essa firmada no

julgamento da ADI 3.367:” (grifo do autor).

Merece transcrição a ementa do julgamento da ADI 3.367, também citada por Pedro

Lenza (2015, p. 940), que diz:

“PODER JUDICIÁRIO. Conselho Nacional de Justiça. Órgão de natureza exclusivamente administrativa. Atribuições de controle da atividade administrativa, financeira e disciplinar da magistratura. Competência relativa apenas aos órgãos e juízes situados, hierarquicamente, abaixo do STF. Preeminência deste, como órgão máximo do Poder Judiciário, sobre o Conselho, cujos atos e decisões estão sujeitos a seu controle jurisdicional. Inteligência dos art. 102, caput, inc. I, letra "r", e § 4º, da CF. O Conselho Nacional de Justiça não tem nenhuma competência sobre o Supremo Tribunal Federal e seus ministros, sendo esse o órgão máximo do Poder Judiciário nacional, a que aquele está sujeito” (ADI 3.367, Rel. Min. Cezar Peluso, j. 13.04.2005, DJ de 22.09.2006 – grifamos). (grifo do autor).

Como é sabido, o STF não pode se restringir ou se resumir numa instância revisora de

atos normativos do Conselho Nacional de Justiça, mas quando tais atos normativos

ultrapassam os limites da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, eficiência e da

razoabilidade, é seu dever rever esses atos.

Diante disso, ou seja, da omissão do STF em rever o provimento conjunto nº. 3/2015,

que deu origem a audiência de custódia cautelar, a Associação dos Delegados do Brasil

(ADEPOL-BRASIL) ajuizou a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5240 (ADI nº 5240)

tendo a repercussão geral reconhecida. Merece transcrição a ementa da ADI nº 5240, que diz:

Ementa: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. PROVIMENTO CONJUNTO 03/2015 DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO. AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA. 1. A Convenção Americana sobre Direitos do Homem, que dispõe, em seu artigo 7º, item 5, que “toda pessoa presa, detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz”, posto ostentar o status jurídico supralegal que os tratados internacionais sobre direitos humanos têm no ordenamento jurídico brasileiro, legitima a denominada “audiência de custódia”, cuja denominação sugere-se “audiência de apresentação”. 2. O direito convencional de

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apresentação do preso ao Juiz, consectariamente, deflagra o procedimento legal de habeas corpus, no qual o Juiz apreciará a legalidade da prisão, à vista do preso que lhe é apresentado, procedimento esse instituído pelo Código de Processo Penal, nos seus artigos 647 e seguintes. 3. O habeas corpus ad subjiciendum, em sua origem remota, consistia na determinação do juiz de apresentação do preso para aferição da legalidade da sua prisão, o que ainda se faz presente na legislação processual penal (artigo 656 do CPP). 4. O ato normativo sob o crivo da fiscalização abstrata de constitucionalidade contempla, em seus artigos 1º, 3º, 5º, 6º e 7º normas estritamente regulamentadoras do procedimento legal de habeas corpus instaurado perante o Juiz de primeira instância, em nada exorbitando ou contrariando a lei processual vigente, restando, assim, inexistência de conflito com a lei, o que torna inadmissível o ajuizamento de ação direta de inconstitucionalidade para a sua impugnação, porquanto o status do CPP não gera violação constitucional, posto legislação infraconstitucional. 5. As disposições administrativas do ato impugnado (artigos 2º, 4° 8°, 9º, 10 e 11), sobre a organização do funcionamento das unidades jurisdicionais do Tribunal de Justiça, situam-se dentro dos limites da sua autogestão (artigo 96, inciso I, alínea a, da CRFB). Fundada diretamente na Constituição Federal, admitindo ad argumentandum impugnação pela via da ação direta de inconstitucionalidade, mercê de materialmente inviável a demanda. 6. In casu, a parte do ato impugnado que versa sobre as rotinas cartorárias e providências administrativas ligadas à audiência de custódia em nada ofende a reserva de lei ou norma constitucional. 7. Os artigos 5º, inciso II, e 22, inciso I, da Constituição Federal não foram violados, na medida em que há legislação federal em sentido estrito legitimando a audiência de apresentação. 8. A Convenção Americana sobre Direitos do Homem e o Código de Processo Penal, posto ostentarem eficácia geral e erga omnes, atingem a esfera de atuação dos Delegados de Polícia, conjurando a alegação de violação da cláusula pétrea de separação de poderes. 9. A Associação Nacional dos Delegados de Polícia – ADEPOL, entidade de classe de âmbito nacional, que congrega a totalidade da categoria dos Delegados de Polícia (civis e federais), tem legitimidade para propor ação direta de inconstitucionalidade (artigo 103, inciso IX, da CRFB). Precedentes. 10. A pertinência temática entre os objetivos da associação autora e o objeto da ação direta de inconstitucionalidade é inequívoca, uma vez que a realização das audiências de custódia repercute na atividade dos Delegados de Polícia, encarregados da apresentação do preso em Juízo. 11. Ação direta de inconstitucionalidade PARCIALMENTE CONHECIDA e, nessa parte, JULGADA IMPROCEDENTE, indicando a adoção da referida prática da audiência de apresentação por todos os tribunais do país. (grifo nosso).

Percebe-se, que o STF julgou improcedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº

5240, e ainda, reafirmou que todos os tribunais do Brasil adotassem a audiência de custódia

cautelar. Sendo assim, não resta dúvida que o STF vem passando por cima da jurisprudência

firmada por ele mesmo, deixando de atuar como guardião da Constituição da República

Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/88) e passando, às vezes, por legislador ordinário.

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O STF se valendo de técnicas de interpretação constitucional, para suprir a falta de

atuação ou a omissão do poder legislativo, ultrapassa os seus limites, uma vez que, toda

interpretação constitucional não pode ir de encontro ao princípio da separação dos poderes

e/ou princípio da legalidade, não pode ser contrária aos tratados internacionais sobre direitos

humanos, não pode contrariar o princípio da interpretação conforme a constituição9 e o

princípio da unidade da constituição10, isto é, em toda interpretação se deve levar em

consideração a Constituição com um todo, um conjunto. Sendo assim, não respeitados tais

princípios, tratados e técnicas de interpretação, o STF se torna legislador ordinário através de

decisões manipuladoras, do ativismo judicial e da judicialização.

Contudo, não resta dúvida da intenção do STF em legislar através de controle de

constitucionalidade proferindo decisões manipuladoras conforme menciona Pedro Lenza

(2015, p. 187), que diz:

Conforme observou Coelho, as decisões manipuladoras (ou manipulativas) (ou normativas) podem ser caracterizadas como “... sentenças de aceitação em que a Corte Constitucional não se limita a declarar a inconstitucionalidade das normas que lhe são submetidas, mas, agindo como legislador positivo, modifica (= manipula) diretamente o ordenamento jurídico, adicionando-lhe ou substituindo-lhe normas, a pretexto ou com o propósito de adequá-lo à Constituição.

As decisões manipuladoras se dividem em duas espécies, ou seja, as decisões

(sentenças) aditivas11 e as substitutivas12. As sentenças aditivas, por sua vez, têm como

característica principal ampliar, estender a aplicação do direito aos que, por ora, não estavam

amparados. As sentenças substitutivas têm como característica declarar a

inconstitucionalidade em parte de determinada lei, ou seja, na parte que a mesma se refere a

determinado instituto ao invés de outro, para que se amolde a CRFB/88.

9 Diante de normas com mais de uma interpretação se deve escolher a que mais se aproxime com a constituição. 10 Pedro Lenza (2015, p. 181): “As normas deverão ser vistas como preceitos integrados em um sistema unitário de regras e princípios”. 11 Gilmar Mendes (2016, p. 1352 e 1353): “A primeira espécie, mais comum, verifica-se quando a corte constitucional declara inconstitucional certo dispositivo legal não pelo que expressa, mas pelo que omite, alargando o texto da lei ou seu âmbito de incidência”. 12 Gilmar Mendes (2016, p. 1353): “As manipulativas com efeitos substitutivos, por sua vez, são aquelas em que o juízo constitucional declara a inconstitucionalidade da parte em que a lei estabelece determinada disciplina ao invés de outra, substituindo a disciplina advinda do poder legislativo por outra, consentânea com o parâmetro constitucional”.

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Como é sabido, o motivo principal de existir a prática de decisões manipulativas é,

sem dúvida, a omissão do poder legislativo e a sua ineficácia para corresponder aos anseios da

evolução constitucional e da sociedade. Porém, essa prática coloca em risco o próprio Estado

Democrático de Direito, pois essas decisões são como ações ou atos do poder legislativo,

exercidos por pessoas, isto é, pelos ministros do STF, que não foram eleitos pelo povo para

assumirem esse papel.

Tais decisões manipuladoras se enquadram na prática do Ativismo judicial e/ou da

judicialização também praticados pelo STF, cabendo diferenciá-los, o que de forma muito

sábia Luís Roberto Barroso (2009, p. 6), assim o fez; “A judicialização e o ativismo judicial

são primos. Vêm, portanto, da mesma família, freqüentam os mesmos lugares, mas não têm as

mesmas origens. Não são gerados, a rigor, pelas mesmas causas imediatas”.

Sendo assim, Ativismo Judicial decorre de um caso concreto, no qual o STF, deve

fazer uma interpretação mais ampla da Constituição através das diversas formas de

interpretação constitucional, como por exemplo, o Relativismo ou a Ponderação dos

princípios fundamentais ou constitucionais que a norteiam. Geralmente tais interpretações

aparecem em forma de súmula vinculante, mas podem aparecer em forma de acórdão. Assim,

Luís Roberto Barroso (2009, p. 6), diz:

A ideia de ativismo judicial está associada a uma participação mais ampla e intensa do Judiciário na concretização dos valores e fins constitucionais, com maior interferência no espaço de atuação dos outros dois Poderes. A postura ativista se manifesta por meio de diferentes condutas, que incluem: (i) a aplicação direta da Constituição a situações não expressamente contempladas em seu texto e independentemente de manifestação do legislador ordinário; (ii) a declaração de inconstitucionalidade de atos normativos emanados do legislador, com base em critérios menos rígidos que os de patente e ostensiva violação da Constituição; (iii) a imposição de condutas ou de abstenções ao Poder Público, notadamente em matéria de políticas públicas.

Por sua vez, a Judicialização tem origem através de controle de constitucionalidade

que são; a ação direta de inconstitucionalidade (ADIn), a ação declaratória de

constitucionalidade (ADC) e a arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF),

como por exemplo, os exemplos citados por Luís Roberto Barroso (2009, p. 4 e 5):

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Supremo Tribunal Federal, no âmbito de ações diretas – que compreendem a ação direta de inconstitucionalidade (ADIn), a ação declaratória de constitucionalidade (ADC) e a arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF) – questões como: a) o pedido de declaração de inconstitucionalidade, pelo Procurador-Geral da República, do art. 5º da Lei de Biossegurança, que permitiu e disciplinou as pesquisas com células-tronco embrionárias (ADIn 3.150); (ii) o pedido de declaração da constitucionalidade da Resolução nº 7, de 2006, do Conselho Nacional de Justiça, que vedou o nepotismo no âmbito do Poder Judiciário (ADC 12); (iii) o pedido de suspensão dos dispositivos da Lei de Imprensa incompatíveis com a Constituição de 1988 (ADPF 130). No âmbito das ações individuais, a Corte se manifestou sobre temas como quebra de sigilo judicial por CPI, demarcação de terras indígenas na região conhecida como Raposa/Serra do Sol e uso de algemas, dentre milhares de outros.

Observa-se, as várias faces da justificativa de existir as decisões manipulativas, o

ativismo judicial e a judicialização, todas basicamente com o intuito de expandir preceitos

constitucionais, como os direitos fundamentais, trazendo uma solução ao caso concreto até

que o legislativo o faça. Porém, essa prática foi se tornando muito comum e deixando de

ampliar apenas os direitos fundamentais, passando a criar direitos desrespeitando a CRFB/88.

Assim menciona Oscar Valente Cardoso, que diz:

O ativismo judicial (ou judicialização da política) pode ser resumido na atitude dos juízes de interpretar as normas jurídicas sem se limitar às restrições formais e objetivas, e levando em conta que a aplicação das leis é variável, no tempo e em cada caso concreto. Isso pode causar a extensão de direitos não expressamente previstos em lei ou na Constituição, motivo pelo qual se afirma que essa postura judicial importa na “criação” de direitos, a partir de uma interpretação ampliativa de normas escritas, ou com fundamento em princípios jurídicos genéricos (igualdade, razoabilidade, dignidade da pessoa humana, etc.) (CARDOSO, 2011).

Cabe ressaltar, que estender não é criar, pois quando se cria algo se inova o

ordenamento jurídico e quando se estende não ocorre tal fenômeno. Segundo Luís Roberto

Barroso (2009, p. 10); “As críticas se concentram nos riscos para a legitimidade democrática,

na politização indevida da justiça e nos limites da capacidade institucional do Judiciário”.

Nota-se, claramente o risco que se corre, quando a CRFB/88 não é enxergada como limite

dessa prática.

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4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Cabe ressaltar, que a audiência de custódia cautelar foi embasada em tratados

internacionais sobre direitos humanos com status de supralegalidade, ou seja, que não foram

aprovados com quórum de emenda constitucional, sendo assim, não estão acima e nem em

igualdade com a CRFB/88, restando uma posição acima das demais leis, mas não acima da

Carta Magna.

Confirmada a supremacia da constituição, se entende que todo tratado internacional

sobre direitos humanos e atos administrativos devem se amoldar a mesma, mas não foi isso

que se observou, pois o Provimento Conjunto nº. 3/2015 é um ato normativo que

implementou a audiência de custódia cautelar em desrespeito a Carta Magna, sendo que, a

mesma deveria ser criada através de projeto de lei de iniciativa do poder legislativo. Com isso,

se demonstra inconstitucionalidade formal, uma vez que, não foi observada a regra

estabelecida na Constituição.

Além disso, se confirma a ofensa ao princípio da separação de poderes, pois o

Conselho Nacional de Justiça (CNJ) é um órgão do poder judiciário e a CRFB/88 estabelece

que cabe ao poder legislativo inovar o ordenamento jurídico. Ademais, se confirma também a

ofensa ao princípio da legalidade, uma vez que, a audiência de custódia cautelar deve ser

criada através de lei e não de ato normativo. Cabe ressaltar, que a lei irá determinar o que as

pessoas e a administração pública irão fazer ou não, mas se ato normativo não é lei, por que se

deve acatar tal provimento.

Como é sabido, o próprio CNJ além do Supremo Tribunal Federal (STF) poderiam ter

anulado o Provimento Conjunto nº. 3/2015, mas se observou o contrário, o CNJ e o STF se

omitiram, e com isso, a Associação dos Delegados do Brasil (ADEPOL-BRASIL) ajuizou a

Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5240 (ADI nº 5240) para levar ao STF a discussão

antes ignorada por eles. Com esperança do STF declarar a sua inconstitucionalidade, o que se

viu foi à suprema corte ignorar a Carta Magna e declará-la constitucional, se valendo de

técnicas de interpretação constitucional que não se amoldam a CRFB/88, ou seja, técnicas que

vão de encontro ao princípio da supremacia da constituição, ao princípio da unidade da

constituição e ao princípio da interpretação conforme a constituição.

Diante disso, se demonstra uma prática do STF em legislar, isto é, o STF se passa por

legislador ordinário, o que também viola o princípio da separação de poderes, através de

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técnicas de interpretação constitucional que fundamentam as decisões manipulativas, como no

caso da ADI nº 5240. As decisões manipulativas têm essa característica, isto é, deixar de

declarar a inconstitucionalidade da lei ou do ato normativo para modificá-los ou simplesmente

fundamentá-los de forma que fique travestido de constitucionalidade, e assim, inovando o

ordenamento jurídico.

Cabe ressaltar, que as decisões manipulativas tanto é uma espécie de ativismo judicial

quanto uma espécie de judicialização, pois se observa decisões manipulativas em ambos.

Como é sabido, o ativismo judicial e a judicialização são diferentes, porque vêm de

instrumentos diferentes, mas refletem a mesma a imagem, ou seja, a imagem do STF como

legislador, decidindo e inovando o ordenamento jurídico, além da sua competência

constitucional. Acontece que essa prática vem se tornando muito comum, uma vez que, o

poder legislativo é ineficaz, e diante disso, a prática de decisões manipulativas, ativismo

judicial e/ou judicialização se tornam aceitáveis pelos juristas e pela sociedade, devido à

carência de representatividade presenciada por eles.

Em suma, tais práticas devem ser enxergadas sob a ótica constitucional, isto é, o STF

deve agir sempre com cautela comunicando o poder legislativo, para que, se elabore a devida

lei, e quando for necessário ampliar direitos fundamentais que se faça, pois tais direitos são de

aplicação imediata, mas não criando direitos como vem fazendo.

Sendo assim, da forma que a audiência de custódia cautelar foi implementada se

conclui que a mesma é inconstitucional, além de colocar o Estado Democrático de Direito em

risco, pois a Constituição como sua guardiã não foi observada. A audiência de custódia

cautelar está prevista apenas em tratados internacionais sobre direitos humanos, mas não foi

positivada no rol dos direitos fundamentais da CRFB/88. Sendo assim, não se trata de um

direito fundamental, o que não impede que se torne, desde que, se observe os preceitos

constitucionais. Existem duas formas para que a audiência de custódia cautelar se torne uma

realidade dentro do paradigma constitucional, uma é através de emenda constitucional

inserindo-a no rol dos direitos fundamentais e posteriormente a regulamentando através de lei

e a outra é diretamente através de lei, pois em ambos os casos se faz necessário à lei para se

incluir e integralizar tal modificação no Código de Processo Penal brasileiro.

Cabe ressaltar, que a audiência de custódia cautelar já é uma realidade na maioria dos

Estados do Brasil, pois seguindo a orientação do STF no julgamento ADI nº 5240, todos os

tribunais devem colocá-la em prática o mais rápido possível, e assim, colocando também a

legitimidade da Constituição em perigo.

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