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Beer, Spector, Lawrence, Mills e Waltonbortolami.altervista.org/documents/cap1-2.pdf · pública exigem uma gestão estratégica de recursos humanos. 9 Idalberto Chiavenato - Recursos

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Assim, vejamos: para De Cenzo e Robbins2, o campo da gestão derecursos humanos centra-se em quatro domínios: aquisição, manutenção,motivação e desenvolvimento.

Storey e SissonJ definem um ciclo de gestão de recursos humanos emcinco passos: selecção, desempenho, avaliação, retribuições e desenvolvi­mento.

Beer, Spector, Lawrence, Mills e Walton4 escolhem quatro temas:influência dos empregados, fluxos de recursos humanos (de dentro parafora e de fora para dentro), sistema retributivo e sistema de trabalho.

Tichy Frombrun e Devanas consideram quatro grandes áreas: selecção,avaliação, retribuição (salários e beneficios complementares) e desenvol­vimento.

Schuleer e MacMillan6 incluem as seguintes áreas: planeamento derecursos humanos, apoio (recrutamento, selecção e socialização), avalia­ção, retribuição, treino e desenvolvimento e relações com os sindicatos.

Gomez Mejia7 compõe o seu manual da seguinte forma: introdução;contextos da gestão de recursos humanos; recrutamento; desenvolvimento;compensação; govemância.

Em França, PerettiS arruma as matérias da seguinte forma: Função pes­soal (desenvolvimento da função recursos humanos, a função recursoshumanos, a logística da função, a auditoria social), emprego (as pessoas,os empregos, políticas de emprego, recrutamento e integração, carreira na

2 De Cenzo; Robbins - PersonnellHuman Resources Management. New York: Wiley andSons, 1988.

l Storey (ed) - New Perspectives or Human Resources Management. London: Routiedge,1991.

4 Beer, Spector, Lawrence, Mills e Walton - Human Resources Management. New York: TheFree Press, 1985.

5 Tichy Frombrun, Devana - Strategic Human Resources Management. Sloan ManagementReview. 23 (2),47-61, 1982.

6 Schuleer e MacMillan - Gaining Competitive Advantage Through Human Resources Mana­gement Practices. Human Resources Management. 23 (3), (1984), p. 241-55.

7 Luíz Gomez Mejia - Man.aging Human Resources. London: Prentice Hall, 1998.8 Jean Marie Peretti - Recursos Humanos - Lisboa: Silabo, 1997

6

empresa), os salários (massa salarial, avaliação de funções e desempenho,política de remuneração) e desenvolvimento social (investimento em for­mação, investir na segurança e na melhoria das condições de trabalho, agestão do tempo, as relações sociais, informação e comunicação naempresa).

Chiavenat09 organiza as matérias da seguinte forma: interacção entrepessoas e organizações; sistema de administração de recursos humanos;subsistema de suprimentos de recursos humanos; subsistema de aplicaçãode recursos humanos; subsistema de manutenção de recursos humanos;subsistema de desenvolvimento de recursos humanos; subsistema de con­trolo de recursos humanos.

Em Portugal, Oliveira RochalO estrutura as matérias da forma seguinte:introdução; gestão de pessoal; procura de recursos humanos; integração derecursos humanos; avaliação de desempenho; desenvolvimento de recur­sos humanos; manutenção de recursos humanos; separação de recursoshumanos; avaliação e controlo de recursos humanos e gestão de recursoshumanos no futuro.

Nesta obra, tivemos em conta a necessidade de ensinar gestão de recur­sos humanos, numa perspectiva estratégica e, consequentemente, as maté­rias foram organizadas por forma a que respondessem a este objectivo. Osrecursos humanos hoje não constituem apenas mais um dos muitos recur­sos das organizações, mas antes, na sociedade da informação onde amudanç~ a constante, constituem o recurso estratégico. Representamaquele factor crítico sem o qual não há forma de competir e ter sucesso.

Os recursos humanos transformaram-se no activo mais valioso e ten­dem a ser encarados, desde os trabalhos pioneiros de Becker (prémioNobel da economia) e Schultz, como capital humano. Por isso, se estemanual em alguma coisa se distingue dos restantes, tal distinção tem a vercom a perspectiva adoptada, com a óptica assumida por nós no concursopara Professor Catedrático, de que a gestão privada e a administraçãopública exigem uma gestão estratégica de recursos humanos.

9 Idalberto Chiavenato - Recursos Humanos. São Paulo: Atlas, 1992.10 Oliveira Rocha - Gestão de Recursos Humanos. Lisboa: Presença, 1997.

7

De facto, o actual paradigma da gestão não vê os recursos financeiros,tecnológicos ou logísticos, como principais factores competitivos, mas simas pessoas, dado pressupor-se que quanto mais valorizadas estiverem, emtennos de competências estratégicas para garantir o sucesso da organi­zação, motivadas e empenhadas nas actividades, objectivos e missões,maior será a taxa de produtividade. Desta fonná, a gestão estratégica derecursos humanos (GERH) constitui, hoje, um factor detenninant~ dosucesso das organizações públicas ou privadas, por colocar as pessoas nocoração da organização.

Em virtude desta orientação estratégica, que obriga ao entrosamentoentre gestão de recursos humanos e estratégia organizacional, estruturá­mos este manual da seguinte fonna: introdução e abordagens teóricas;contextos de gestão e processos organizacionais; técnicas e práticas degestão de recursos humanos. Estas últimas são subdivididas em três gran­des dimensões: atracção de recursos humanos, avaliação e desenvolvi­mento, fidelização das pessoas à organização.

Esta organização das matérias liga-se ao que se nos afigura constituiras novas dimensões que tenderão a integrar a gestão de recursos humanos:gestão estratégica; atracção de pessoas para a organização; investimentonos activos mais importantes da organização - as pessoas; fidelização daspessoas à organização, evitando que este activo se perca ou vá alimentar aconcorrência.

A abordagem teórica subjacente ao manual situa-se dentro da aborda­gem técnica (sistémica) da sociologia da gestão, da abordagem contingen­cial, pelo lado da teoria organizacional e da abordagem de Edgar Schein, II

pelo lado do comportamento organizacional.

II Consultar: João Bilhim - Teoria Organizacional. 3." ed. rev. Lisboa: 2004.

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ÍNDICE

Apresentação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5

PARTE I - A FUNÇÃO RECURSOS HUMANOS

CAPÍTULO 1 - INTRODUÇÃO AOS PRINCIPAIS CONCEITOS. . . . . . . . . . . . 17

1.1. Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17

1.1.1. O problema. . ... .. . ... . .. . ... .. . .. . ... .. . .. . .... . .. . ... . .. . 17

1.1.2. Subsistema organizacional . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21

1.1.3. Subsistema comportamental. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 24

1.1.4. Sociologia da gestão. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27

1.2. Gestão de recursos humanos: definição e ciclo de vida . . . . . . . . . . . . . . . . . 29

1.2.1. Definição. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29

1.2.2. Passado e presente da gestão de recursos humanos . . . . . . . . . . . . . . . . . 32

1.2.3. Ciclo de vida da gestão de recursos humanos. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37

1.2.4. Gestão de recursos humanos no último quartel do século xx. . . . . . . . . . 40

CAPÍTULO 2 - GESTÃO ESTRATÉGICA DE RECURSOS HUMANOS. . . . . . 47

2.1. Gestão estratégica. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47

2.2. Desafios da envolvente. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 51

2.2.1. Económica. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 51

2.2.2. Tecnológica. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 53

2.2.3. Demográfica. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 54

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CAPÍTULO 1

- INTRODUÇÃO AOS PRINCIPAIS CONCEITOS

1.1. Introdução

1.1.1. O problema

A gestão de recursos humanos é, em geral, aceite como um tema centralno estudo das organizações e, de acordo com a HarvardBusiness School, eladiz respeito "a todas as decisões de gestão que afectam a relação entre aorganização e os empregados"'2. Todavia, o conhecimento disponível acercada influência das boas ou más práticas de gestão de recursos humanos sobrea produtividade e a eficácia organizacional é muito escasso.

A gestão de recursos humanos, pela sua dimensão prática (ciência-prá­tica), lembra frequentemente um receituário de boas práticas. Emborarecorra à teoria e ao comportamento organizacionais, a necessidade deresolver problemas muito concretos amarra-a de tal forma ao quotidianoque sobressaem, com mais frequência, os aspectos instrumentais de recei­tuário do que os aspectos doutrinais do corpo teórico.

Do ponto de vista epistemológico, as decisões de gestão são de umanatureza eminentemente prática e, em si, não são científicas. A ciência

12 M. Beer [et aI.] - Human Resource Management: A general manager's perspective.Nova York: Free Press, 1985.

17

ou o carácter científico da gestão relacionam-se com o tipo de conheci­mento usado a montante da decisão. Por exemplo, nesta perspectiva, adecisão médica de diagnóstico não constitui um acto científico, masantes de natureza técnica, embora tal decisão tenha sido tomada combase em informações científicas. Assim, também parece ocorrer naGRH. As decisões seriam de natureza técnica, mesmo que para tais deci­sões tenham concorrido informações de natureza científica. O concursodas diversas ciências estaria para a gestão de recursos humanos, como aquímica orgânica, a farmacopeia, ou a biologia, nomeadamente, para amedicina.

Do ponto de vista conceptual, a designação "gestão de recursoshumanos", que descende do conceito de gestão de pessoal, antes domi­nante na literatura, está longe de apresentar um campo estabilizado deconhecimentos 13 • Falta realmente uma teoria geral explicativa do papeldas pessoas na eficácia organizacional e no desempenho das empresas.Ferris, Barnum, Rosen, Holleran e Dulebohnl4 consideram que a ausên­cia de uma teoria geral explicativa do papel dos recursos humanos nodesempenho das organizações deve ser atribuída ao seu carácter empí­rico e prático.

A inexistência deste corpo teórico próprio constitui uma dificuldadeque não é fácil de contornar, sobretudo num contexto económico marcadopelo aumento crescente da competição entre as nações e as empresas.

Acresce que, pela globalização dos factores produtivos, as políticasnacionais de comércio externo, a gestão das pessoas, a tecnologia, a ino­vação e a educação assumem, progressivamente, um papel crítico para osucesso de qualquer país ou empresalS •

Na gestão de recursos humanos, encontramos conceitualizações psico­lógicas, sociológicas, económicas, jurídicas e até oriundas da ciência polí­tica, que lhe conferem um carácter ecléctico, não dispondo, deste modo, deuma base de conhecimentos fortemente integrada e consistente. Todavia,

13 Hendry, Pettigrew - Human Resource Management: an agenda for the 1990's. The Inter­national Journal or Human Resources Management. Vol. 19 (1990), p. 17-43.

14 Ferris [et aI.] - Handbook or Human Resource Management. Cambridge, Mass: Black­wel1 Publishers.

IS Dertouzof; Lester & Solow - Made in America. Cambridge, Mass: MIT Press, 1989.

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este eclectismo não enfraquece a sua posição actual onde todos, em geral,reconhecem, à gestão de recursos humanos, um papel estratégico. Esteeclectismo fica-se a dever, do nosso ponto de vista, ao carácter extrema­mente variado e complexo dos problemas que constituem a agenda deinvestigação e de trabalho do pesquisador e do gestor de recursos huma­nos.

o facto de a gestão de recursos humanos, do ponto de vista teórico,recorrer à teoria e ao comportamento organizacionais acarreta como con­sequência que se possa estabelecer diferenças significativas entre os diver­sos autores que têm abordado este tema. Confronta-se, assim, o investiga­dor e o prático de GRH com a existência de uma multiplicidade deabordagens teóricas que resultam da adopção de diferentes abordagenscientíficas. Isto significa que o que a GRH integra no seu seio ou rejeitatem directamente a ver com a abordagem teórica que lhe subjaz, circuns­tância que poderá eventualmente confundir quem não possua uma maiorbagagem conceptual.

A gestão de recursos humanos evoluiu, em certa medida, ao longo doséculo xx em articulação estreita com a teoria e o comportamento organi­zacionais, partilhando os pontos altos e baixos da evolução desta ciênciadedicada ao estudo das organizações l6 •

Fruto desta articulação, as pessoas que trabalham nas organizações têmsido encaradas de diversas e opostas maneiras. Assim, de engrenagemsujeita ao determinismo cego de uma máquina, passaram a ser cidadãos,parceiros activos, e são agora elevados a factor estratégico. Este carácterestratégico atribuído ao factor humano traduz o aspecto mais relevante dagestão de recursos humanos na actualidade.

As actividades de gestão de recursos humanos (GRH) possuem umimpacto muito significativo no desempenho e na realização (performance)individual e, por conseguinte, na produtividade e na realização global dequalquer organização. A sua capacidade de inovação depende da criaçãode um ambiente propício e de apoio que por sua vez depende da existên­cia de pessoas inovadoras. Por outro lado, a qualidade das decisões estra-

16 João Pereira Neto - Prefácio. ln João Bilhim - Questões Actuais de Gestão de RecursosHumanos. Lisboa: ISCSP, 2001.

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tégicas está ligada à qualidade dos recursos humanos existentes, bemcomo o sucesso da implementação dos objectivos estratégicos é função,em grande medida, do sistema de GRH (selecção, avaliação, compensaçãoe desenvolvimento de competências).

Dada a sua importância estratégica, hoje em dia, a disciplina deGRH trata da concepção e execução de estratégias de gestão de recur­sos humanos através de dois temas centrais: como pensar sistemática eestrategicamente a gestão dos activos humanos de uma organização; oque é preciso fazer para implementar estas políticas e obter vantagenscompetitivas.

Neste novo contexto de gestão estratégica, importa salientar que,ao contrário daquilo que prevaleceu até aos anos setenta do séculopassado, tal como constava ainda em Levitt, não há uma melhormaneira de gerir recursos humanos. À velha perspectiva one best waysucedeu a nova perspectiva contingencial da gestão dos recursoshumanos.

Justifica-se, assim, que cada organização analise a especificidade dosseus clientes e objectivos, articulando, de uma forma harmoniosa, as suascaracterísticas com as necessidades dos consumidores. Importa, conse­quentemente, salientar que a gestão de recursos humanos apresenta osseguintes factores de contingência: estratégia de negócio, ligação com oconsumidor, tecnologia, natureza da envolvente, tipo de pessoas17 • Estesfactores cruzam-se, por seu turno, com duas metáforas organizacionais(mecânica e orgânica), que correspondem aos dois extremos da grelha dosindicadores de medidal8 •

Por outro lado, é importante não esquecer que a gestão de recursoshumanos tem lugar no interior das organizações e estas podem ser vistasna perspectiva sistémica ou técnica. Ora, de acordo com esta perspectivateórica, as organizações são compostas por dois grandes subsistemas:organizacional e comportamental.

17 J. c. Chebat & P. Kollias - The lmpact of Empowerment on Customer Contact EmployeesRoles in Service Organizations. Journal or Service Research. Vol. 3, (2000), p. 66-81.

18 João Bilhim - Teoria Organizacional. Lisboa: ISCSP, 2004.

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1.1.2. Subsistema organizacional

As organizações são as unidades sociais dominantes das sociedadescomplexas, quer sejam industriais ou da informaçãol9 • Hoje, nascemos emhospitais, alimentamo-nos em restaurantes, trabalhamos em empresas,departamentos públicos, instituições sem fins lucrativos e, quando morre­mos, recorremos à igreja e à empresa funerária: tudo organizações, quepenetram em todos os aspectos da vida contemporânea.

o termo organização tem origem no grego "organon", que significainstrumento, utensílio. A noção de organização apresenta dois signi­ficados. Por um lado, designa unidades e entidades sociais, conjuntos prá­ticos, como, por exemplo, as fábricas, os bancos e a Administração Pública.Por outro, designa certas condutas e processos sociais: o acto de organizartais actividades, a disposição dos meios relativamente aos fins e a inte­gração dos diversos membros numa unidade coerente20

Na primeira acepção, a organização é uma entidade social, proposita­damente coordenada, gozando de fronteiras delimitadas, que funciona numabase relativamente contínua, tendo em vista a realização de objectivos.

A coordenação consciente exige a gestão formal. O facto de a organi­zação ser uma entidade ou unidade social significa que é integrada por pes­soas e grupos de pessoas que interagem. A existência de fronteiras distin­tivas do que é ou não é organização, mesmo que esta mude ao longo dotempo e os seus limites não sejam sempre muito claros, permite distinguiros membros dos não membros. A organização existe para realizar os seusobjectivos, os quais seriam inatingíveis se a sua concretização estivesse acargo de uma só pessoa.

Assim, as organizações: são constituídas por grupos de duas ou maispessoas; há, entre elas, relações de cooperação; exigem a coordenaçãoformal de acções; caracterizam-se pela prossecução de metas; pressu­põem a diferenciação de funções; possuem uma estrutura hierárquica;caracterizam-se pela existência de fronteiras.

19 Veja-se João Bilhim - Trabalho e Lazer na Sociedade da Informação. Lisboa: Instituto deEstudos Pós-Graduados da Universidade Internacional, 1995.

20 João Bilhim - Teoria Organizacional. Lisboa: ISCSP, 2004.

21

Nesta linha, Edgar Schein derme a organização como sendo: a coorde­nação racional de actividades de um certo número de pessoas, tendo emvista a realização de um objectivo ou intenção explícita e comum, atravésde uma divisão do trabalho e funções, de uma hierarquia de autoridade ede responsabilidade".

A estrutura organizacional constitui um conjunto de variáveis comple­xas, sobre as quais os administradores e gestores fazem escolhas e tomamdecisões. Define, pois, a forma como as tarefas devem estar destinadas,especifica quem depende de quem e estabelece os mecanismos formais.Mintzberg sintetiza os atributos organizacionais distinguindo três tipos devariáveis: contexto, estrutura, processo. As variáveis de contexto são: aidade e dimensão, a tecnologia, o meio envolvente, o poder. As variáveisde estrutura são: os mecanismos de coordenação e controlo, os elementosbase da estrutura, os parâmetros de concepção, as configurações organiza­cionais. As variáveis de processo, por seu turno, são: os processos decomunicação, os processos de liderança, os processos de decisão e os pro­cessos políticos.

Podemos considerar três características na estrutura organizacional: acomplexidade, a formalização e a centralização.

A complexidade inclui os múltiplos graus de especialização, a divisãode trabalho, os níveis hierárquicos, as extensões da organização e as filiaisque possa ter.

A formalização é constituída pelas regras e os procedimentos que asorganizações têm para prientar o comportamento dos seus membros, epelas suas normas escritas.

A centralização aponta o lugar onde está localizado o poder de decisão.A centralização e a descentralização representam os dois extremos dumalinha contínua. A localização da organização nessa linha é um factor impor­tante que nos pode informar sobre o tipo de estrutura da organização".

A atribuição de responsabilidades, a tomada de decisão, o agrupa­mento de funções, a coordenação e o controlo são requisitos fundamentais,que possibilitam a operação contínua da organização. A estrutura organi-

2J Edgar Scbein - A Psicologia na Organização. Tradução portuguesa de Maria Silva Bento.Lisboa: Livraria Clássica Editora, 1986.

22 João Bilhim - Teoria Organizacional. Lisboa: ISCSP, 2004.

22

zacional é profundamente influenciada por estes requisitos e auxilia a organização a alcançar os seus objectivos através de três maneiras:

• Como estrutura básica - tomando a forma de descrição do trabalho, de organogramas;

• Como mecanismo de operação - conformando os comportamentos dos indivíduos por meio de procedimentos, regras, rotinas de traba­lho, padrões de desempenho, sistemas de avaliação e recompensa, programações e sistemas de comunicação;

• Como mecanismo de decisão - processando informação com origem na envolvente externa e interna e cruzando, avaliando e disponibi­lizando as informações indispensáveis aos decisores.

o desenho organizacional tem a ver com o funcionamento e a mudança operada numa organização para atingir os fins propostos. Tal como na construção de uma casa, temos um objectivo a cumprir e seguimos um determinado plano (planta, maqueta). Na organização, o documento análogo será um gráfico organizacional (organograma, manuais de organização).

o desenho organizacional expressa, pois, a configuração estrutural da organização, o seu funcionamento, os órgãos que a integram e as suas rela­ções de interdependência.

Enquadra-se no desenho organizacional, por um lado, a definição da estrutura e a repartição das tarefas por departamentos, divisões, grupos e posições. Compreende, por outro, todos os aspectos tangíveis e regulado­res, destinados a conformar o comportamento dos indivíduos aos padrões organizacionais.

A estrutura de uma organização pode ser entendida como o total dos meios utilizados para dividir o trabalho em tarefas distintas e, em seguida, assegurar a necessária coordenação entre as mesmas". A estrutura organi­zacional deve compreender tanto os meios formais como os semiformais para dividir e coordenar o trabalho, de maneira a criar padrões estáveis de comportamento.

Para Alfred Chandler24 a estrutura de uma organização seguia a estraté­gia. Ele classificou as estratégias de crescimento organizacional que pro-

23 Henry Mintzberg - Estrutura e Dinâmica das Organizações. Lisboa: Dom Quixote, 1995. 24 Alfred Chandler - Strategy and Structure: Chapters in history of lhe american indus­

trial enterprise. Cambridge Mass: MIT Press, 1962.

23

vocaram alterações na estrutura como sendo de: expansão de volume, dis­persão geográfica, integração vertical e de diversificação de produtos. Para o autor à medida que as organizações crescem e se tornam mais complexas elas alteram a sua estrutura passando do tipo funcional para o de produtos e finalmente para o mutidivisional.

Em suma, para este autor as organizações que não alteraram as suas estruturas orgânicas à medida que alteraram as suas estratégias tornaram­se ineficientes e acabaram por casar a estrutura com a estratégia ou fali­ram. Na perspectiva da gestão estratégica de recursos humanos, a estrutura é o modo como a organização foi desenhada para atingir os seus objecti­vos, incluindo a divisão do trabalho e a descrição das funções ou do traba­lho a desenvolver, assim como o grau de centralização ou descentralização do controlo adoptado pelos gestores de topo".

1.1.3. Subsistema comportamental

o comportamento organizacional constitui um campo de ensino e investigação que trata da relação (impacto) que os indivíduos, grupos e estruturas organizacionais têm no comportamento humano dentro de uma determinada organização com o objectivo de usar tal conhecimento na melhoria da sua eficiência, eficácia e economia.

o estudo do comportamento do homem na organização enquadra-se numa perspectiva micro que dá mais atenção aos pequenos grupos, ao indivíduo, à motivação. Os tópicos centrados nos pequenos grupos incluem: estatuto social, poder, conflito, liderança e comunicação. Os temas relacionados com os indivíduos dizem respeito à percepção e deci­são individual, aos valores e atitudes de satisfação no trabalho e à motiva­ção e absentismo".

A distinção estabelecida entre os níveis micro e macro, aceite em sociologia, não deixa de criar algumas sobreposições parcelares. Por exemplo, os factores estruturais detêm certo impacto sobre o comporta­mento individual dentro da organização, assim como os assuntos do nível

2S Fombrun; Ichy; Devana - Strategic Humao Resource Management. NY: John Wiley, 1984.

26 João Bilhim; Isabel Mota de Castro - Comportamento Organizacional. Lisboa: Universi­dade Aberta, 1997.

24

micro são relevantes para o estudo do sistema organizacional. Importa, consequentemente, que as duas dimensões dos estudos organizacionais tenham em conta estas relações.

Todavia, estas sobreposições parcelares não apresentam igual ênfase e igual peso. Por exemplo, num tema como o conflito organizacional, a dimensão comportamental tenderá a acentuar os aspectos interpessoais e intra-grupais, cuja origem se encontra nas diferenças de personalidade. Ao invés, sobre o mesmo tema, a dimensão da teoria organizacional enfatizará os aspectos de relação interdepartamental. De um modo geral, poder-se-ia acrescentar que, enquanto o nível micro tenderá a analisar os conflitos como problemas de pessoas, o nível macro revelará a propensão para os encarar em termos estruturais, de fluxos e barreiras à informação.

Num domínio de estudo, investigação e ensino que ainda não tem um século, podemos afirmar que as Ciências Sociais - Antropologia, Sociolo­gia, Psicologia e Ciência Política - desde muito cedo se começaram a dedicar ao estudo das organizações.

A Antropologia tem estudado as culturas, tendo em vista uma melhor compreensão dos seres humanos e das suas actividades. Os seus trabalhos têm ajudado a compreender as diferenças de valores, atitudes e comporta­mentos, entre povos de diferentes países e organizações. Grande parte do nosso conhecimento actual sobre a cultura organizacional e, particular­mente, as relações inter e transculturais, são o resultado do trabalho de antro­pólogos, ou de investigadores que usaram a metodologia antropológica.

A Sociologia" coloca o acento no sistema social. As áreas que maior contributo receberam da Sociologia foram a dinâmica de grupos, a cultura organizacional, a teoria e estrutura formal das organizações, a tecnologia organizacional, as burocracias, a comunicação, o poder e o conflito.

A Psicologia Social e a Psicossociologia têm ajudado a compreender, particularmente, o problema da mudança organizacional, assim como a mudança de atitudes, os padrões de comunicação, a dinâmica de grupo e o processo de decisão em grupo.

27 Veja-se João Bilhim - Dos Estudos Organizacionais à Sociologia da Empresa: Algumas controvérsias. Lusíada: Revista de Ciência e Cultura, Série de Gestão, n.O 2 Abril (1994).

25

Em suma, todas estas ciências sociais têm estudado as organizações, à luz de diferentes tradições de ensino e pesquisa, por vezes salientando aspectos específicos e, não raras vezes, debruçando-se sobre o mesmo objecto e usando metodologias e técnicas de pesquisa idênticas.

Por outro lado, em resumo pode dizer-se que o comportamento organi­zacional diz respeito ao estudo do que as pessoas fazem e como o fazem dentro de uma organização e como o seu comportamento afecta o desempe­nho final de toda a organização. Assim, este subsistema liga comportamento e desempenho de funções, trabalho, saídas para o exterior, produtividade, absentismo, satisfação no trabalho etc, e integra os temas ligados a: motiva­ção, liderança, poder, comunicação interpessoal, estrutura e processos de grupo, aprendizagem, desenvolvimento de atitudes e percepção, processo de mudança, conflitos, concepção de postos de trabalho e stress.

Numa perspectiva de gestão estratégica, o padrão de comportamento organizacional tem de estar articulado com a estratégia". Isto significa que a organização precisa de se definir quanto aos seguintes dilemas:

• Natureza do contrato psicológico de emprego. Paga-se de acordo com o que cada um produz numa lógica de curto prazo ou atribui-se trabalho significante para o indivíduo em troca da sua lealdade para com a organização?

• Grau de participação na decisão na organização. As decisões são tomadas pelo topo da pirâmide e comunicadas posteriormente ou, há participação da base para o topo no processo de tomada de decisão?

• Mercado de trabalho interno ou externo. Prevalece na organização o recrutamento interno ou pelo contrário quando há necessidade recruta­se, por princípio, do exterior, sem dar oportunidades internas?

• Realização individual ou de grupo. A cultura organizacional está orientada para o trabalho cooperativo ou competitivo?

Se posicionarmos estes quatro dilemas da gestão de recursos humanos num contínuo que percorra uma escala de I a 10, a organização será obri­gada a optar ou pelos extremos ou por um ponto intermédio. A gestão tem de optar por uma filosofia acerca das pessoas. Ora, a opção feita com maior ou menor coerência irá afectar o clima e a cultura organizacionais e, consequentemente, o padrão de comportamento exigido.

28 Fombrun; Ichy; Devana ~ Strategic Human Resource Management. NY: John Wiley, 1984.

26

1.1.4. Sociologia da gestão

Mike Reed" caracteriza a gestão sob três perspectivas: técnica, política e crítica. A perspectiva técnica confunde-se com o paradigma positivista/funcionalista/sistémico/contingencial reactivo. Nesta perspec­tiva, a gestão é um mecanismo, um instrumento racional destinado à reali­zação de objectivos instrumentais ligados à eficiência, eficácia e econo­mia. A perspectiva política sobrepõe-se ao paradigma interpretativo, construtivista, pró-activo, ligado à teoria da acção, em que a gestão é nm­damentalmente negociação permanente. A perspectiva crítica, ligada ao paradigma estruturalista radical, valoriza fortemente o poder e apela à libertação de uma visão distorcida da realidade social, que muitos traba­lhadores possuem"

Nenhuma destas três perspectivas apresenta uma estrutura conceptual em que a visão parcelar, mas muito importante, de cada uma delas, é inte­grada de maneira sistemática e coerente. Contribuir para tal objectivo é um dos desafios actuais. Todavia, esta estruturação permite-nos entender melhor o que se passa com a gestão de recursos humanos. É, fundamental­mente, na perspectiva técnica que esta disciplina científica medrou, embora haja diversos estudos elaborados nas perspectivas política e crítica.

Em nosso entender, é necessário integrar as três perspectivas, ou seja, adoptar uma abordagem que valorize devidamente o problema do poder e do conflito/dicotomia, por um lado, e a necessidade de integração, por outro. A nossa abordagem teórica tenta limar os exageros de ambos os lados, contribuindo nomeadamente para o que se julga ser um instrumento de análise mais útil para a prática dos gestores de recursos humanos.

Os temas apresentados actualmente pela Sociologia da Gestão são: controlo de gestão; trabalho de gestão; conflito; gestão e classe. Natural­mente, as três perspectivas que acabámos de enumerar possuem visões diferentes sobre cada um destes temas.

29 Mike Reed - Sociology of Management4 London: Harvester Wheatsheaf, 1989. 30 G. Burrell; G. Morgan - Sociological Paradigms and Organizational Analysis. London:

Heinemann, 1979; S. Deetz - Describing the Differences in Approaches to Organization Science: rethinking Burrell and Morgan and their legacy. Organization Science. Vol. 7, (1996), p.191-207.

27

A análise sociológica sobre os processos de controlo contidos nas tare­fas de gestão revela a existência de um tensão entre uma lógica de mercado e de modernização - que exigiu a implementação de uma estratégia de relações laborais, reafirmando o controlo ao nível do posto de trabalho - e uma ideologia tradicionalista, realçando a primazia da ordem interna e da estabilidade. Esta tensão encontra-se equacionada, em termos de valores contrastantes, no pensamento de Quinn31 •

A necessidade de relacionar as formas de controlo exercidas pelas estruturas de gestão com a transformação das condições em que são prati­cadas tem sido um tema recorrente na sociologia da gestão. A sua expres­são mais clara situa-se no debate sobre o processo de trabalho avançado por Braverman".

Por outro lado, a sociologia tem reflectido sobre a representação das funções de gestão como uma tecnocracia neutra, isto é, uma profissão que controla as organizações complexas no interesse da sociedade como um todo. As teorias actuais, como a sistémica ou a da contingência, veiculam ainda a ideia segundo a qual as funções de gestão consistem numa prática social caracterizada pelo planeamento e controlo racionais, livre de pre­conceitos ideológicos ou de interesses materiais.

A análise sociológica da gestão sugere que a natureza da estrutura de gestão se caracteriza por uma ordem social altamente estratificada. A estrutura formal exige a rígida divisão do trabalho e a separação cultural entre os diferentes níveis de chefias, mas a complexidade das práticas obriga a uma certa cooperação. Assim, parece existir de forma implícita a ideia da ubiquidade do conflito organizacional nas práticas de gestão. Daí a gestão de recursos humanos ter um papel específico na gestão do conflito organizacional.

Outra questão pertinente que a sociologia da gestão nos traz relaciona­se com o papel do próprio gestor de recursos humanos. O debate à volta da separação entre propriedade e controlo na indústria moderna está asso­ciado às grandes mudanças económicas, políticas, organizacionais e tecno­lógicas que ocorreram no século xx. Acontece que, com a proliferação do

31 R. Quinn - Beyond Rational Management: Mastering lhe paradoxes and competing demands or high performance. San Francisco: Jossey-bass, 1988.

32 H. Bravennan - Labour and Monopoly Capital. NY: Monthly Review Press, 1974.

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capital por pequenos accionistas, o capitalista, o dono do capital e da empresa se encontra pulverizado e deixa de residir numa pessoa ou família fisica.

o controlo, ou seja, o indivíduo ou grupo que tem poder real para esco­lher o conselho de administração, não é influenciado pela propriedade, não depende dela, como aconteceu ao longo do século transacto. Tal poder pas­sou a estar nas mãos de um novo grupo, quiçá membro de um nova classe, o grupo dos gestores que dispõe agora de um poder arbitrário considerável.

o argumento é válido não só para uma empresa em concreto, como para o conjunto do sistema empresarial, implicando que a direcção da indústria seja feita por indivíduos que não arriscaram o seu capital. Este novo sistema caracteriza-se pela propriedade do capital sem controlo sig­nificativo do mesmo e pelo controlo do capital sem a sua propriedade". Esta nova situação, em que se encontra o gestor de recursos humanos, impele-o a assumir um papel muito mais activo na estratégia da organiza­ção e do negócio, abandonando totalmente a posição de controlador de comportamentos, à ordem do patrão.

1.2. Gestão de Recursos Humanos: Definição e Ciclo de Vida

1.2.1.Definição

A gestão de recursos humanos diz respeito a todas as decisões e acçõesde gestão que afectam a relação entre as organizações e os seus emprega­dos. Envolve, por isso mesmo, todas as acções relativas à selecção, forma­ção, desenvolvimento, recompensas e relações com os empregados:

Numa perspectiva dinâmica pode dizer-se que a gestão de recursoshumanos deve envolver todas as acções destinadas a assegurar a negocia­ção e a gestão dos equilíbrios precários que permanentemente emergementre actores sociais com interesses opostos, e, por vezes, irredutíveis.

É desejável que a gestão de recursos humanos se apresente como abor­dagem coerente e estratégica para a gestão do activo mais importante da

33 Mike Reed - Sociologia da Gestão. Lisboa: Celta, 1997.

29

1.2.2. Passado e presente da gestão de recursos humanos

De todas as funções organizacionais, a função recursos humanos é, tal­vez, aquela que sofreu a transformação progressivamente mais acentuada,ao longo dos últimos anos. Esta evolução vai continuar, integrando tanto oconteúdo da função, como o perfil técnico dos profissionais desta área.

No percurso da função recursos humanos, ao longo do século xx, veri­fica-se que, por exemplo, entre as seis funções de administração identifi­cadas por Fayol (administrativa, técnica, comercial, financeira, contabilís­tica, segurança) a função pessoal não é mencionada, embora algunsaspectos (segurança do trabalho, higiene) sejam integrados na funçãosegurança. De facto, é a partir de 1945 que, na Europa e, particularmente,em França, a função pessoal começa o seu período de afirmação e cresci­mento.

o período de 1945 a 1975 corresponde a uma fase gloriosa para a fun­ção, dado o impacto das teorias das relações humanas, do desenvolvi­mento organizacional e do sócio-técnico. O foco de atenção é a pessoa,mesmo que o capital continue a ser o recurso mais importante dos factoresprodutivos.

Já ficara para trás o modelo de gestão de pessoal caracterizado pelaexclamação do grande proprietário da indústria automóvel norte ameri­cana nascente, Henry Ford: "tudo quanto preciso são dois braços. Mas,infelizmente, com eles vem uma cabeça atrás". O trabalhador idealdeveria ser apenas como uma roldana de uma máquina ou um robot dosnossos dias. Não precisava de pensar; era pago para trabalhar; para pen­sar lá estava um punhado de colarinhos brancos que procediam aos estu­dos do trabalho, nomeadamente, ao desenho das funções. Ao trabalhadorsó lhe restava fornecer a sua força de trabalho, em troca de uma remune­ração.

Estes anos de crescimento são marcados pela evolução do quadro jus­laboral, regulamentar e das ideias relativas ao homem no trabalho. Os tra­balhos de Elton Mayo são o ponto de partida para numerosas transforma­ções das condições materiais de trabalho. No final dos anos cinquenta doséculo xx, outros trabalhos dos EUA sobre os estilos de gestão orientadospara a produção ou para as pessoas tomaram-se muito conhecidos no

32

mundo ocidental. Estes trabalhos foram retomados e sintetizados por Ren­sis Likert, Argyris, Douglas McGregor, Maslow e Herzberg34

Na Europa, a profissionalização da função de técnico e gestor de pes­soal tem lugar em França em 1947 (ANDCP) e em Portugal na década desessenta do século xx, com a criação das respectivas associações profis­sionais3s • A Associação Portuguesa de Técnicos e Gestores de RecursosHumanos foi fundada em Outubro de 1964, então com o nome de Associa­ção Portuguesa dos Directores e Chefes de Pessoal. A criação destas asso­ciações privadas sem fins lucrativos tem por objectivo a troca de informa­ções e experiências e a organização de meios de aperfeiçoamento sobrequestões de pessoal.

A proliferação, em quase todos os países europeus, de associações dedirectores e chefes de pessoal é sinal de que, no mundo industrial ociden­tal, as questões do pessoal tinham assumido um papel central, apelando anovas qualificações técnicas dos seus profissionais.

Qual o conteúdo da função durante este período? O conteúdo apontamais ou menos para os seguintes dez aspectos: gestão administrativa cor­rente; gestão dos recursos humanos; formação; desenvolvimento; gestãode custos com pessoal; informação e comunicação; envolvente e condi­ções de trabalho; relações sociais; consultoria à hierarquia na gestão daspessoas; relações externas.

Entretanto, nos anos setenta, instala-se a primeira grande crise petrolí­fera e as certezas dos gloriosos anos de prosperidade são postas em causa.Instalam-se a mudança permanente, a incerteza, os novos desafios das tec­nologias, a internacionalização e, mais tarde, os mercados globais, novosperfis profissionais e de formação, necessidade de ali$ar a gestão das pes­soas com a estratégia de negócio, enfim, a complexidade veio para ficar.

Neste contexto, a função pessoal transforma-se em gestão de recursoshumanos. A mudança de nome corresponde a uma mudança de perspectivae de práticas. A concepção tradicional do pessoal como fonte de custos

34 Sobre estes autores consultar: João Bilhim - Teoria Organizacional. 3." ed. rev. Lisboa:ISCSP, 2004.

35 Cf. www.apg.pt

33

cede lugar à visão dos trabalhadores como recursos cuja utilização é neces­sário optimizar. As pessoas que cooperam nos processos de transformaçãodas organizações são recursos que é necessário mobilizar e desenvolveradequadamente; são activos onde importa investir.

Estes recursos transformam-se nos primeiros recursos estratégicos daorganização, a própria função e o seu responsável assumem novas respon­sabilidades e prestígio no contexto organizacional, traduzido, entre outrossinais, no nível de vencimento que subiu relativamente aos restantes direc­tores. Ficou para trás o período do director e chefe de pessoal equivalentea burocrata, isto é, ao perito no jogo dos papeis administrativos.

Os desafios do futuro são: tecnológicos, sociais, regulamentares, eco­nómicos, de globalização e, em particular, de um novo paradigma organi­zacional e comportamental marcado pela pós-modernidade.

Deste ponto de vista, parece que actualmente há três tendências funda­mentais: mudança do nível micro para o macro; tendência para abrangernovas dimensões; tendência para produzir uma ciência prática com inves­tigação útil.

Com a mudança de enfoque do nível micro para o macro, acentua-se aintegração funcional da gestão de recursos humanos e a sua natureza sisté­mica, de um sistema geral integrado noutro mais vasto. Esta mudança decentro de atenção permite explicar a relação entre as características orga­nizacionais e as práticas de gestão, com recurso a dados qualitativos equantitativos. Assim, têm surgido diversos estudos acerca do impacto dasdiversas técnicas de gestão de recursos humanos sobre o desempenho glo­bal da organização36

O alargamento das dimensões associa-se à importância crescente dopapel estratégico da gestão de recursos humanos e da cultura organizacio­nal. Com este alargamento, as políticas de gestão de recursos humanosencontram-se integradas na estratégia geral da organização e a gestão derecursos humanos é avaliada pelo contributo que tenha dado para o sucessoda estratégia da organização.

36 Cr. Estevão de Moura - Gestão de Recursos Humanos. Lisboa: ISEG/UTL. Policopiado,Tese de doutoramento, 2000.

34

A terceira tendência baseia-se no pressuposto de que a ciência e a prá­tica da gestão de recursos humanos devem ser analisadas em conjunto,para que haja uma integração efectiva entre teoria, acção e investigação.

As três tendências marcam a natureza da gestão de recursos humanos.É que a gestão de recursos humanos situa-se no espaço criado entre a orga­nização, entendida como um processo tendencialmente harmónico e con­sensual e as relações potencialmente conflituosas entre grupos de actoressociais. Esta contradição pressiona a resolução de conflitos de interesses,percepcionados como disfuncionais pelos actores37

Deste ponto de vista, as diversas técnicas de gestão de recursos huma­nos visam assegurar a conformidade das pessoas aos objectivos considera­dos legítimos da organização. Todavia, as divergências de perspectiva e deactuação não são meramente um fenómeno passageiro, mas sim umacaracterística permanente e irredutível dos processos organizacionais;nenhuma das técnicas por si só assegura a estabilização almejada.

A estabilidade é sempre provisória, resultando do equilíbrio instável deforças entre os diferentes grupos e do impacto do contexto mais geral naorganização, nomeadamente, do contexto cultural, político, social e econó­mico. É, do meu ponto de vista, na manutenção de um equilíbrio instávele precário que a função recursos humanos tem procurado cimentar a sualegitimidade e a demonstração da sua importância organizacional.

A gestão de recursos humanos encontra-se, assim, dependente de pro­cessos imprevisíveis e impossíveis de estabilizar de forma definitiva,sendo a sua dimensão política tão importante como a sua competência téc­nica38

Pelo que fica dito, é legítimo concluir-se que a gestão de recursoshumanos não pode ser entregue apenas aos profissionais desta área. Todoo gestor é também gestor de recursos humanos e, em face disto, o que oprofissional da área tem a fazer é ser o consultor deste gestor operacional,seu colega. É que a gestão de recursos humanos lida com a intervenção no

37 Edgar Schein. Psicologia na Organização. Lisboa: Clássica Editora, 1968.38 Michael Armstrong - Handbook or Personnel Management Practices. London: Kogan

Page,1995.

35

Em Portugal, as questões ligadas à competitividade estão a influenciarde forma intensa as práticas de gestão de recursos humanos que vêm pro­gressivamente incluindo nos seus modelos as componentes estratégica ecultural dos recursos humanos.

A gestão de recursos humanos, no essencial, ainda hoj e integra asseguintes técnicas: recrutamento e selecção, formação e desenvolvi­mento, gestão do sistema de recompensas, relações de trabalho,higiene e segurança, análise de funções, gestão do desempenho, pla­neamento e gestão de carreiras, comunicação interna, e gestão admi­nistrativa.

A abordagem sistémica/contingencial é a base para o desenvolvimentoda gestão de recursos humanos. É, de facto, no contexto da metáfora orgâ­nica que a gestão de recursos humanos ganhou a projecção de que actual­mente desfruta. A gestão de recursos humanos é encarada como um sis­tema global, fazendo parte de um sistema mais amplo, no qual aenvolvente, a estratégia e a cultura organizacionais constituem as princi­pais condicionantes ao seu futuro.

1.2.3. Ciclo de vida da gestão de recursos humanos

A abordagem contingencial, que estamos a seguir, possui, como umdos seus instrumentos conceptuais, o conceito de ciclo de vida, herdado dametáfora orgânica. De acordo com este conceito, as organizações descre­vem percursos de vida semelhantes aos seres vivos e, consequentemente,as suas funções de gestão, nomeadamente a GRH, não se encontramalheias a este movimento. Por isso, parece-nos legítimo encarar o itinerá­rio da GRH na perspectiva de um ser vivo que nasce, desenvolve-se,enfrenta crises de crescimento, de identidade e de maturidade e, por fim,morre.

Por outro lado, pode encarar-se a GRH, ao longo do século xx, comoestando confrontada permanentemente com duas preocupações: a resolu­ção de problemas internos e de problemas externos, ou seja, voltada para ointerior ou, pelo contrário, voltada para o exterior.

Por isso mesmo, à luz desta perspectiva, pode afirmar-se que, duranteo século xx, a função recursos humanos passou por quatro grandes fases

37

de transformações: administrativa; das relações humanas; da integração/desenvolvimento; da estratégia.

As fases acabadas de descrever não se excluem, mas coexistem ecomplementam-se:

• Até 1945: fase administrativa, contabilística ou pré-história da fim-ção;

• De 1945 a 1973: fase das relações humanas, legal ou fase técnica;• De 1973 até 1985: fase da gestão integrada; -• A partir de 1985: fase da gestão estratégica.

Etapas do Ciclo de Vida da GRH

INTERIOR

Escola das relaçõeshumanas, (1945)

Gestão de pessoal(1945-1973)

Gestão estratégica deRH (1985)

Gestão integradade RH (1975-1985)

A fase administrativa liga-se à imagem mais tradicional. O técnico depessoal é, normalmente, um ex-militar, pessoa experiente na aplicação dadisciplina castrense e no domínio das técnicas de interpretação administra­tiva e regulamentar. O departamento de pessoal existe para manter e fazerrespeitar a ordem estabelecida, funciona como sistema fechado, para si epara os seus processos de controlo. Nesta fase pré-histórica da funçãorecursos humanos, que dura até aos anos trinta do século passado, os tra­balhadores são vistos sob o enfoque contabilístico: comprava-se a mão-de-obra e, portanto, as entradas e saídas provenientes dessa conta, como deuma outra matéria-prima qualquer, deveriam ser registadas contabilistica­mente. Nesta fase, procuram-se para integrarem o departamento de pessoalex-militares e juristas.

38

A fase das relações humanas corresponde ao apelo aos estudos deElton Mayo, na Western Electric (1924-1939)42 que, no final dos anos 40do século xx, reconhece o papel da pessoa no sistema organizacional.Trata-se de uma postura mais técnica, que procura propor políticas e ins­taurar processos de trabalho que coloquem o acento na pessoa e no sociale que sejam coerentes com a evolução da organização. Parte-se do pressu­posto de que trabalhadores satisfeitos serão sempre mais produtivos. Estafase ainda enferma do pressuposto do one best way, de que há uma receitade gestão melhor e preferível a todas as demais. Neste caso, a receita é:"satisfaçam as necessidades de quem trabalha e de forma linear terãomaior produtividade". Nesta fase, os departamentos de recursos humanosrecrutam essencialmente técnicos formados em ciências sociais, psicolo­gia e sociologia, designadamente.

A fase do desenvolvimentolintegração corresponde à necessidade deconjugar as necessidades individuais e as organizacionais. Alimentou-se,nos anos sessenta do século xx, das teorias do desenvolvimento organiza­cional, com origem nos EUA e, na Europa, no Tavistock Institute de Lon­dres,43 em particular com o que ficou conhecido por sistema sócio-técnico.Nesta fase, acentua-se o recrutamento de psicólogos para os departamen­tos de recursos humanos.

Os pioneiros da gestão integrada de recursos humanos foram PeterDrucker (1955) e McGregor (1960). Mas, nos anos sessenta do século xx,o movimento comportamentalista, representado por Maslow, Likert, Argy­ris e Herzberg, deu os fundamentos à modema gestão técnica de recursoshumanos. No final desta década e início da década de setenta, o movi­mento do desenvolvimento organizacional e, em particular, Edgar Scheinaprofundaram as raízes teóricas anteriores. Os investigadores da culturaorganizacional, em particular, Pettigrew, Athos e Pascale, Peters e Water­man, completaram esta nova moldura teórica.

Quanto à fase da gestão estratégica, pode dizer-se que a viragem dagestão de recursos humanos para a estratégia anda associada, por um lado,aos progressos anteriores até agora descritos e, por outro, ao novo pensa-

42 João Bilhim - Teoria Organizacional. Lisboa: ISCSP, 2004.43 Sobre o desenvolvimento organizacional e sistema sócio-técnico consultar: João Bilhim ­

Teoria Organizacional. 3." ed. Lisboa: ISCSP, 2004.

39

mento nascente na gestão e na sociologia da gestão, através de Porter e deRosabeth Kanter, ambos da HBS. Kanter, em 1984, salientou que a vanta­gem competitiva só se alcança através das pessoas; são as pessoas queimplementam o plano empresarial.

Os novos objectivos para a gestão de recursos humanos são: capacitara gestão para o cumprimento dos objectivos organizacionais, lançandomão da força de trabalho; utilizar as pessoas no máximo das suas capaci­dades e potencial; impulsionar o compromisso dos empregados no sucessoda organização; integrar as políticas de gestão de recursos humanos comos planos de negócio e reforçar a criação ou renovação de uma cultura vol­tada para os resultados; criar uma ambiente de trabalho capaz de libertar epôr ao serviço da organização a criatividade dos trabalhadores; criar con­dições em que a inovação, o trabalho de equipa, e a qualidade total possamdesabrochar; encorajar a vontade de actuar de forma flexível, em prol deuma organização flexível e na busca da excelência.

A fase da gestão estratégica corresponde ao desafio actual da gestãode recursos humanos. Traduz a crença nas pessoas como o recurso com­petitivo estratégico e o reconhecimento de que o capital e a terra deixa­ram de ocupar o lugar cimeiro dos factores de produção capitalista.A gestão tradicional de pessoal, baseada num modelo de organizaçãorígido e burocrático finda nos anos 70, dando progressivamente lugar auma função de recursos humanos integrada na estratégia da organização,onde se considera que o sucesso da empresa repousa na capacidade queesta tem de mobilizar os seus recursos humanos. Os profissionais quemais procurados são para integrar os actuais departamentos de recursoshumanos são os trabalhadores com formação específica em gestão derecursos humanos. Esta fase, para além de procurar alinhar as pessoascom a estratégia organizacional, valoriza os conhecimentos nas áreas dearticulação entre a gestão de recurso humanos, a gestão financeira e omarketing.

1.2.4. Gestão de recursos humanos no último quartel do século xx

No segundo quartel do século passado, a nova perspectiva da gestãoestratégica de recursos humanos foi impulsionada a partir dos trabalhos deduas grandes escolas de gestão dos EUA: Michigan e Harvard.

40

A abordagem da Michigan Business School (MBS), protagonizada porTichy, Frombrun e Devana44, é conhecida pela perspectiva da contingência.Esta perspectiva teórica realça a necessidade de desenvolver sistemas degestão de pessoas compatíveis com os grandes objectivos da organização,como o aumento da qualidade e a melhoria da produtividade.

o pressuposto teórico de onde parte é o seguinte: a eficácia organiza­cional encontra-se correlacionada com as práticas e políticas de gestão daspessoas e com o seu alinhamento com a estratégia de negócio. A maisimportante finalidade da estratégia de recursos humanos é a sua contribui­ção para o sucesso da estratégia organizacional onde se insere.

Para esta abordagem, o ciclo dos recursos humanos corresponde a umasequência de actividades que são desempenhadas por todos os gestores derecursos humanos em todas as organizações. O ciclo dos recursos humanos,uma vez que está articulado com a gestão e a filosofia de gestão de pessoas,vai condicionar o desenho do sistema de gestão de recursos humanos.

As áreas integradas neste ciclo são as seguintes: selecção, avaliação dodesempenho, retribuição e desenvolvimento. De entre as quatro activida­des, os autores destacam o papel da avaliação de desempenho como achave para um sistema eficaz de recursos humanos.

A obra, publicada em 1984, pela John Wiley &Sons, intitulada Strate­gic Human Resource Management por Charles Frombrun, Noel Tichy eMary Devanna, constitui a viragem, na gestão de recursos humanos, paraesta nova perspectiva da gestão estratégica. A obra está dividida em quatrograndes partes cujos títulos claramente mostram a novidade desta perspec­tiva: envolvente, estratégia e organização; papel estratégico do sistema degestão de recursos humanos; questões estratégicas na gestão de recursoshumanos; gestão de recursos humanos: a perspectiva do administradorexecutivo (CEO).

Frombrun, Tichy e Devana criaram um modelo de gestão estratégicade recursos humanos onde as principais técnicas são integradas de formacoerente e estratégica. Eles reconhecem que as novas alterações que ocor-

44 Tichy; Frombrun; Devanna - Strategic Human Resource Management. Sloan ManagementReview. VaI. 23, n.o 2, ( 1982), p. 47-61; Frombrun; Tichy; Devana- Strategic Human ResourcesManagement. N.Y.: John Wiley & Sons, 1984.

41

reram na envolvente estiveram na base desta nova evolução da gestão derecursos humanos, em particular por exigirem um repensar permanente damissão, visão e estratégia das organizações com consequências na estru­tura e nos processos de trabalho. A missão e a estratégia representam arazão de ser da organização e condicionam fortemente a escolha de meiosem matéria de recursos humanos, financeiros e tecnológicos.

Para aqueles autores, os sistemas de recursos humanos onde os seuscomponentes têm uma estreita ligação com a estratégia da organizaçãoenvolvem quatro elementos:

• Selecção, incluindo o planeamento de recursos humanos;• Avaliação de desempenho, de forma a oferecer uma remuneraçãojusta e estimulante, recompensando os desempenhos elevados;

• Sistema de recompensas em que o salário é decomposto em parte fixae variável;

• Desenvolvimento que compreende as actividades de formação ofere­cidas a todas as categorias de trabalhadores com vista a melhorar odesempenho actual.

Os componentes do modelo destes três autores e as relações estreitas deinterdependência entre eles, num ambiente onde as dimensões culturais, eco­nómicas e políticas são importantes são apresentados na Figura seguinte

Meio envolvente político. cultural e económico

42

Sistema de Gestão deRecursos Humanos

~---------

14-----1Estrutura Organizacional

Os três autores desta obra afinnam: "a gestão em tempo de turbulênciaexige que as organizações voltem às questões básicas ligadas à sua natu­reza e à razão de ser da sua existência. Isto exige a inclusão da GRH noprocesso estratégico de gestão". No mesmo sentido, Rosabeth Moss Kan­ter afinna a importância estratégica da GRH, acrescentando, na apresenta­ção da obra, "a excelência da estratégia de negócio não significa nada semas pessoas que desenvolvem isso". Aqui reside o ponto de viragem da novaperspectiva estratégica.

Quanto à escola de Harvard, esta é conhecida pelo destaque que dá aosmulti-interessados (stakeholders) e foi desenvolvida por Beer, Spector,Lawrence, Mills e Walton45

• No processo de gestão das pessoas, envol­vem-se todas as decisões e acções de gestão que afectam a natureza darelação entre a organização e os empregados, os seus recursos humanos.

Fiel a um tal princípio, esta filosofia central apenas pode ser imple­mentada pelo dirigente máximo para garantir que as actividades de gestãode recursos humanos não se transfonnam num simples conjunto de activi­dades desconexas, cada uma conduzida pelo hábito. O papel da gestão detopo é equilibrar e integrar os diversos interessados da empresa: accionis­tas, empregados, clientes, fornecedores, comunidades de inserção, sindi­catos, associações empresariais, governo. Assim, um dos aspectos maisdestacados desta abordagem é a existência de um conjunto de diferentesinteresses convergentes.

As quatro áreas operativas consideradas por Beer para a concretizaçãoda estratégia de recursos humanos são:

• Influência dos empregados;• Os fluxos de recursos humanos;• Os sistemas retributivos;• Os sistemas de trabalho.

O autor considera que há quatro grandes questões que são fundamen­tais para precisar em que medida a gestão de recursos humanos contribuipara aumentar o desempenho da organização, a saber:

45 M. Beer [et al.] - Human Resources Management. NY: The Free Press, 1985; M. Beer [etal.]- Managing Human Assets. NY: The Free Press, 1984.

43

• Compromisso: procura saber em que medida as políticas de gestão derecursos humanos aumentam o compromisso das pessoas com o seutrabalho e com a organização.

• Competência: indaga em que medida as políticas de gestão de recur­sos humanos atraem, conservam e/ou desenvolvem as pessoas comaptidões e conhecimentos necessários à organização, à sociedade,agora e no futuro.

• Custos / eficiência: inquire sobre qual é o custo efectivo de uma dadapolítica em termos salariais, de benefícios, rotação, absentismo, gre­ves, etc.

• Congruência: visa precisar que níveis de congruência as políticas degestão de recursos humanos criam ou conservam entre os gestores eos empregados, entre diferentes grupos de empregados, a organiza­ção e a comunidade, os empregados e as suas famílias e no próprioindivíduo.

A escola de Harvard (HBS) exerceu uma forte influência sobre o pen­samento britânico da Warwick Business School (WBS). Os investigadoresdo Centre for Corporate Strategy, presidido por Pettigrew46, partindo daperspectiva de Harvard, desenvolveram uma abordagem de formulação daestratégia nas organizações complexas relacionando-a com a capacidadepara transformar as práticas de gestão de recursos humanos.

A abordagem de Warwick parte do pressuposto de que as práticas degestão de recursos humanos exercem uma forte influência no desempenho.Por isso, apelam a novas concepções e aptidões destinadas a compreendera importância da gestão de recursos humanos e a gerir melhor o processode mudança.

46 Charles Hendry; Andrew Pettigrew - The Practice of Strategic Human ResourcesManagement. Personnel Review. Vol. 15, (1986),2-8; Charles Hendry; Andrew Pettigrew - HumanResources Management: an agenda for the 1990's. The lnternational Journal ofHuman Resour­ces Management. Vol. 1, n.o 1, (1990), p. 17-43; Charles Hendry; Andrew Pettigrew; Paul Sparrow- Linking Strategic Change, Competitive Perforrnance and Human Resource Management: Resultsof a UK empirical study . ln R. Mansfield (ed) - Frontiers of Management Research. London:Routledge, 1989.

44

Para além das quatro áreas de Harvard, Warwick promove a integra­ção da envolvente externa e da estratégia de negócio, considerandonecessária a compreensão do papel cultural único da função de recursoshumanos em termos de: definição de responsabilidades; competênciasnum leque diverso de actividades e modo como a função se encontraorganizada.

Uma distinção importante de Warwick, relativamente a Harvard, radicana importância atribuída ao sistema de relações de trabalho. Para a HBS,este sistema não possui uma importância que o diferencie de outras condi­cionantes contextuais. Para a WBS, ele possui um papel fundamental naconfiguração dos sistemas internos de recursos humanos. Neste ponto, adiferença cultural entre os EUA e a Europa não deixa de ser marcantequanto ao peso dos trabalhadores no equilíbrio dos poderes dos multi-inte­ressados.

Nesta abordagem, há cinco grandes contextos: externo (cultura, estru­tura, política liderança, tarefas/tecnologia, resultados do negócio); interno(socio-económico, técnico, político, legal, competitivo); estratégia denegócio (objectivos, produto/mercado, estratégia/táctica); gestão de recur­sos humanos (papel, definição, organização, saídas de recursos humanos);conteúdo da gestão de recursos humanos (fluxos de recursos humanos,sistema de trabalho, sistema retributivo).

45

CAPÍTULO 2

- GESTÃO ESTRATÉGICADE RECURSOS HUMANOS

2.1. Gestão Estratégica

A estratégia de uma organização corresponde aos padrões de compor­tamento reconhecidos, num longo período de tempo, como consequênciadas decisões dos seus gestores. As decisões estratégicas e as respectivasacções de concretização exercem uma fortíssima influência, no longoprazo, sobre a estrutura organizacional, bem como sobre a sua posiçãorelativamente aos clientes, concorrentes, fornecedores e reguladores.A forma e a posição da organização conelicionam decisivamente o seudesempenho. A estratégia transforma-se, deste modo, num padrão deacções e o seu resultado é traduzido através da forma e da posição apre­sentadas pela organização.

A gestão estratégica emerge como o processo de formulação eimplantação de planos que orientam a organização. Em bom rigor, a ges­tão estratégica integra o planeamento estratégico, as decisões operacio­nais e o funcionamento quotidiano da organização. Recomenda-se, emgeral, que o planeamento seja flexível e criativo, e não um exercícioburocrático, devendo o processo de planeamento ser contínuo e assumidopor todos os gestores, mas com particular incidência pelos gestores detopo.

47

A concorrência, a competitividade constituem os pontos críticos daactuação. O envolvimento de todos os níveis hierárquicos da organiza­ção permite a partilha do sistema de valores e o fomento do espírito decorpo necessário à integração interna, sem deixar de realçar os valoresda diferenciação externa com a atenção dada à envolvente geral e especí­fica.

A gestão estratégica envolve:• A identificação da missão, ou seja, o seu carácter, orientação global e

forma de estar;• A definição dos objectivos que concretizam a missão;• A análise da envolvente geral e específica, para identificar ameaças e

oportunidades;• O diagnóstico interno para evidenciar os pontos fortes e fracos;• Escolha estratégica que permitirá atingir as metas e os objectivos.

Porter'7 identificou cinco forças competitivas que determinam o inte­resse de qualquer sector de actividade, a saber:

• O grau de rivalidade - competição entre os actuais concorrentes. Estaforça exerce a sua acção ao nível dos preços, das práticas de inovaçãoe da capacidade instalada;

• O poder negocial dos clientes - esta força leva a baixar preços ou aofornecimento de serviços adicionais, caso seja relativamente elevado.

• O P9der negocial dos fornecedores (matérias-primas, máquinas,recursos humanos) - caso seja elevado, gera uma pressão sobre ospreços e, consequentemente, reduz a margem de lucro;

• A ameaça de novos concorrentes - a existência ou não de barreiras àentrada (tipo lei do condicionamento industrial) afectará a rendibili­dade do sector em causa;

• A ameaça de produtos substitutos - é o caso da substituição dos pro­dutos metálicos pelos de plástico, que vai limitar a política de preços,entre outras consequências.

Em qualquer empresa, as potencialidades de sucesso no longo prazosão função destas cinco forças.

47 M.Porter - Competitive Strategy. NY: Free Press, 1980.

48

Como conseguiram certas empresas manter crescimentos anuais de 20por cento, durante um período de dez anos, como conseguiram outrascolocar produtos no mercado mais depressa do que a concorrência, comoconseguiram ainda outras evitar a falência? Da leitura da literatura espe­cializada, tanto científica como profissional, fica-se com a ideia que foicolocando as pessoas no coração da organização. Há 15 anos a respostateria sido a de que o sucesso foi obtido através do capital financeiro que asfez expandir. Após a Segunda Guerra Mundial, a resposta poderia ter sido:devido às vantagens tecnológicas e às patentes que exploram.

Actualmente, vive-se um período em que o acesso ao capital dependedas boas ideias do promotor e a tecnologia quase pode dizer-se que estácomo a fruta nas árvores (disponível), pelo que as vantagens do passadoperderam significado. As novas fontes de vantagem competitiva sustentá­vel colocam as pessoas no centro, no coração da empresa. São os recursohumanos qualificados, dispondo das competências necessárias à competi­ção organizacional que se encontram na base do sucess048 • Os recursoshumanos são, actualmente, o factor estratégico produtivo.

Em bom rigor, pode dizer-se que a gestão estratégica de recursoshumanos está centrada no pressuposto de que os empregados são activosessenciais da organização e que o seu valor pode ser aumentado e atépotenciado através de uma abordagem sistemática e coerente de investi­mento na sua formação e desenvolvimento.

A actual pressão no sentido da redução dos custos e do aumento dovalor acrescentado por cada empregado, dada a feroz concorrência dosmercados e a constante procura de vantagens competitivas, conta com ototal empenhamento da gestão de recursos humanos, no sentido de se rein­ventar novos estilos de gestão das pessoas.

Tais exigências conduzem a gestão de recursos humanos a uma posturadinâmica, que facilite o envolvimento e a participação dos empregados, ouseja, fomente a implementação de um conjunto de actividades estratégicasde gestão de recursos humanos.

A gestão estratégica de recursos humanos envolve a concepção e aimplementação de um conjunto de políticas e práticas com coerência

48 Lynda Gratton - Estratégia Viva. Porto: Ambar, 2003.

49

interna, que garantam que as pessoas contribuam para alcançar os objecti­vos da organização.

De acordo com o estudo de terreno conduzido por Jeffrey Pfeffer9, sãodezasseis as práticas das empresas que basearam o seu sucesso na gestãodos recursos humanos:

Garantia de segurança no emprego

Selectividade no recrutamento

Salários mais elevados que os da concorrência

Incentivos

Trabalhador accionista

Partilha da informação

Descentralização de poderes de controlo do

processo de trabalho

Funcionamento baseado em equipa

Desenvolvimento das capacidades de cada um

Flexibilidade de funções

Eliminação dos simbolos de "status"

Compressão das diferenças salariais

Preenchimento dos lugares por promoção interna

Perspectiva de longo prazo

Medição de resultados

Filosofia global e mobilizadora ou visão da gestão

(saber onde se quer ir)

Por detrás de uma empresa de sucesso, existe sempre uma estratégia,quer a empresa a tenha desenvolvido com recurso à análise formal, queratravés da tentativa erro, ou lançando mão da intuição, ou ainda com aajuda da sorte. Até as estratégias baseadas na sorte possuem uma lógicasubjacente - uma espécie de princípios de suporte. Quando os gestoresadmitem que chegaram a certas estratégias através da intuição ou de umpalpite, pode descobrir-se retrospectivamente uma certa lógica subja­cente.

Todavia, apesar da importância da estratégia universalmente reconhe­cida e da pesquisa feita durante décadas por académicos, a estratégia con­tinua a encerrar muitos mistérios e não é possível, por enquanto, reunirgrande consenso sobre o que é e como se desenvolve uma boa estratégia.

Nesta matéria, quer no âmbito académico, quer no profissional, seriamilagre reunir dois autores com idêntico ponto de vista. Este será o casoapropriado para dizer que "cada cabeça, cada sentença". Da estratégiacomo "posição" à estratégia como "visão" muitas variantes se perfilhamno horizonte e numerosas definições são possíveis50

49 J. Pfeffer, - Competitive Advantage Through People. Boston: HBRP, 1994.so João Bilhim - Teoria Organizacional. Lisboa: ISCSP, 2004.

50

Se a confusão é grande quanto ao que é ou deve ser a estratégia, ela nãoé menor quanto ao modo como se poderá desenvolver uma boa estratégia.A grande questão dos últimos trinta anos anda à volta do seguinte: será quea empresa escolhe a sua estratégia a partir de um processo racional, formalou, pelo contrário, a estratégia "emerge" de um processo de experimentação?

A crença geral é a de que as empresas podem desenvolver boas estra­tégias a partir de perguntas inteligentes, explorando as respostas possíveis,experimentando possíveis soluções e, através do questionamento das res­postas encontradas no estádio anterior, recomeçando o processo.

A concepção de estratégias eficazes é um processo de permanentequestionamento e de pensamento criativo sobre as questões. Assim, a for­mulação das perguntas correctas é mais importante do que as soluçõesencontradas. Pensar sobre um assunto de diversos pontos de vista é, mui­tas vezes, mais compensador do que coligir e analisar um número enormede dados quantitativos; a experimentação de novas ideias é muitas vezesmais importante do que certas análises e discussões. Aliás, é aqui queradica a razão de ser da urgência actual na formação dos gestores e qua­dros em geral, em matérias ligadas à criatividade.

A concepção da estratégia é algo que tem de ser permanente. Não temum fim ou um ponto de chegada. O que hoje é uma estratégia ganhadora,pode não ser, e provavelmente não será, em breve. É preciso estar atento àlógica subjacente às estratégias de sucesso, aprender com elas e, em espe­cial, se foram concebidas por palpite, por tentativa erro ou por pura sorte.É muito provável que a sorte não venha bater à porta uma segunda vez.

A única fonte de vantagem competitiva é aprender mais depressa do quea concorrência. Se queremos chegar ao mercado um minuto mais cedo doque os nossos concorrentes, temos de aprender mais depressa do que eles.

2.2. Desafios da Envolvente

2.2.1. Económica

Os principais desafios económicos que influenciam actualmente a ges­tão de recursos humanos nas empresas são:

51

• Internacionalização;• Diminuição da taxa de crescimento económico;• Diminuição da taxa de inflação.As empresas competem não só com empresas europeias, mas com

empresas do mundo inteiro. Para fazer face à concorrência global asempresas deverão manter-se competitivas numa envolvente onde a inova­ção no processo e no produto e serviço ultrapassa as fronteiras dos estadosnacionais. O aumento da concorrência conduziu a uma espécie de guerraeconómica a que todas as empresas estão sujeitas.

Por outro lado, aumentou a incerteza nos negócios. A envolvente eco­nómica tomou-se mais turbulenta. As relações com a Europa de Leste ecom os países asiáticos suscitam novas interrogações, ao mesmo tempoque se acentua a instabilidade do sistema monetário internacional.

As alterações sucedem-se a um ritmo acelerado que leva a empresa ater de reagir aceleradamente, sob pena de perder contacto com a envol­vente e assim desaparecer. As empresas têm de alinhar permanentementeas suas estratégias num clima de turbulência e incerteza, o que obriga amaior flexibilidade e vivacidade.

Estas novas circunstâncias levam a empresa a ter de satisfazer novasexigências, entre as quais salientamos:

• Comparar a sua produtividade e o custo do trabalho com os dos seusconcorrentes;

• Analisar os impactos da redução da inflação sobre a sua política decompensações;

• Prestação de atenção aos custos ocultos com a gestão de recursoshumanos;

• Entrosar a estratégia de recursos humanos com a da organização.

Como já vimos em outro ponto, com a internacionalização dos merca­dos, as empresas para sobreviver têm de praticar uma gestão de recursoshumanos internacional que deverá abranger as diversas técnicas e práticas.

As organizações confrontadas com estes desafios económicos tomamconsciência de que os seus recursos humanos representam um trunfo con­correncial importante. São, deste modo, exercidas influências sobre aDRH para que se renove e crie qualificações e competências mais produti­vas, flexíveis e inovadoras.

52

2.2.2. Tecnológica

A tecnologia, ao influenciar as qualificações e os processos produtivos,acaba por afectar profundamente a GRH.

As alterações tecnológicas atingem o sector produtivo vertical e hori­zontalmente. O eixo vertical corresponde ao lançamento nos mercados denovos produtos e serviços e o horizontal relaciona-se com as melhoriastécnicas introduzidas nos processos de trabalho que permitem produzirmais e melhor os produtos já existentes. Acresce a tudo isto o facto dasalterações tecnológicas se processarem num ritmo de aceleração contínua.Por outro lado, as novas tecnologias, nomeadamente da informação ecomunicação, vêm influenciar a gestão e a gestão de recursos humanoscom a autonomização de processos de gestão.

As alterações tecnológicas tomam, por um lado, obsoletos certos per­fis profissionais e, por outro, fomentam novos perfis profissionais e de for­mação. Os seus efeitos no emprego são ao mesmo tempo de supressão e decriação. Acresce ainda que certos níveis intermédios de chefias parecemtender a serem eliminados, aproximando mais a coordenação e os colabo­radores, contribuindo para a criação do conceito de membro da organiza­ção, em vez do anterior conceito de empregado ou funcionário.

Há quem seja de opinião que o ritmo com que os anteriores empregosdesaparecem não corresponde igualmente ao ritmo com que os novosemergem51 • A evolução tecnológica exige novas qualificações que têm deser adquiridas antes e durante toda a vida profissional. Os cursos médios esuperiores apresentam hoje novas áreas disciplinares ligadas aos sistemasde informação e as organizações desenvolvem um esforço permanente deformação.

Um outro efeito da tecnologia na gestão de recursos humanos incidesobre a natureza do próprio trabalho. O trabalho está a ser invadido portecnologia mais complexa e o esforço tisico a ser substituido pelo mental.Os trabalhadores tendem a ocupar-se com actividades mais abstractas eanalíticas, mobilizadoras de esforços mentais, tais como a atenção, amemorização, o relacionamento de informação.

51 Besseyre des Horts - Vers une Gestion Stratégique des Ressources Humaines. Paris: LesEditions d'Organisation, 1989.

53

Assiste-se igualmente a alterações nas condições de trabalho. A difusão denovas tecnologias confere uma nova importância a quem as utiliza, há diferen­tes papeis e estatutos, e ocorrem alterações nas redes de poder, ao tornarem-se-detentores de informação que não tinham acesso anteriormente. As tecnolo­gias de informação têm acarretado a erosão dos níveis de chefia e a eliminaçãodos níveis intermédios e alterado as relações hierárquicas tradicionais.

A diminuição de níveis hierárquicos tem levado à contracção dos efec­tivos, predominando a lógica de que ao investimento em novas tecnologiasdeverá corresponder à redução em recursos humanos. Os ganhos de umlado compensarão com proveito os custos do investimento. Por outro lado,esta redução de chefias acarreta uma gestão mais participada, maior flexi­bilidade de gestão e, consequentemente, mais célere resposta às exigênciasda envolvente em geral e dos mercados em particular.

O impacto tecnológico na organização obriga a que a gestão de recur­sos humanos encontre as respostas adequadas para lhe fazer face, nomea­damente, através de:

• Formação e reconversão de perfis de formação e profissionais;• Gestão previsional em ambiente de incerteza, com recurso a cenários;• Outplacernent para facilitar a diminuição de efectivos;• Redesenhar das funções.

2.2.3. Demográfica

É sabido que as características da população influenciam as qualifica­ções e competências disponíveis no mercado. O nível de escolaridade, aidade, a taxa de actividade, a taxa de emprego feminino são característicasdemográficas que afectam a GRH.

Na União Europeia, a taxa de crescimento do emprego femininoera, na década de noventa do século passado, de 2,9 enquanto a taxa decrescimento masculina era de 0,9. Nos países da União Europeia, onúmero de homens empregados era sempre superior ao das mulheres,mas a taxa de feminização é em geral superior à masculina, em todos ospaíses. Em Portugal, a taxa de emprego feminino é de cerca de 2,5 e ado masculino de 1,8.

54

Há, entretanto, um outro desafio à GRH: a diminuição da populaçãopotencialmente activa. A tendência geral no grupo de idades dos 15 aos 64,dá-se no sentido da crescente diminuição do ritmo de expansão.

o último desafio colocado à GRH é o desemprego dos jovens e, emparticular, dos jovens portadores de habilitações superiores. A maioria dapopulação desempregada na Europa pertence à classe etária dos 15 aos24 anos, com uma taxa de desemprego de dois dígitos, enquanto que aclasse etária superior a 25 anos tem apenas um dígito. Estudos feitossobre este tema defendem que, se o desemprego de jovens durar cinco ouseis anos, diminuirá a capacidade de estes jovens conservarem umemprego mais tarde, por causa da dificuldade de se adaptarem à disci­plina dos empregos regulares e em desenvolverem hábitos de trabalh052

Para Guérin, o envelhecimento da população activa vai levantar pro­blemas de gestão de carreiras e de adaptação ao trabalho. A concentraçãode trabalhadores na organização com idades mais velhas pode colocar pro­blemas graves de motivação e de gestão de carreiras, para não falar doscustos do trabalho, dado que um quadro júnior, por norma, custa menos doque um sénior.

Para o autor, os postos de responsabilidade não responderão àsnecessidades de aspiração legítima de carreira destes trabalhadores,suscitando insatisfação. Estes trabalhadores menos móveis, bloquea­rão as fileiras profissionais e impedirão os empregados mais jovens deprogredir e de se desenvolverem. Para além destes, outros proble­mas se levantarão nomeadamente de recrutamento e selecção, concep­ção das funções, formação, avaliação de desempenho e de compensa­çã053 •

o crescimento da taxa de feminização obriga as organizações a altera­rem os seus pressupostos e estereótipos de homem e de mulher, elimi­nando a discriminação com base no género. As organizações terão decomeçar a ponderar as questões da qualidade de vida no trabalho, carreiras

S2 William Wether - La Gestion des Ressources Humaines: Québec: McGraw-HilI,1990.

S3 Gilles Guérin - Gestion des Ressources Humaines: du Modele Traditionnel au ModeleRenouvelé: Montréa1: Les Presses de la Université de Montréa1, 1992.

55

duplas, procurar a equidade no emprego e as equidades dos sistemas decompensação. Acresce a esta questão da feminização a necessidade deponderar os novos problemas do contacto de culturas e da diversidade cul­tural acarretados pela imigração, o que leva à necessidade da gestão dadiversidade cultural e multi-étnica que marca a presença dos trópicos naEuropa.

2.2.4. Valores

Guérin refere que há uma espécie de nova ética relacionada com otrabalho, para caracterizar a alteração de valores de base relacionadoscom o trabalho. Há uma evolução progressiva das mentalidades, dascrenças e hábitos que informam e comandam o pensamento de umacolectividade e se traduzem em alterações nas atitudes e comportamen­tos.

o trabalho que marcava o homo faber parece não ser mais o valor porexcelência, a pedra angular sobre a qual repousa a vida. Outras instituiçõescomo a família, o lazer, os amigos constituem valores actuais da vida dostrabalhadores. Reclama-se por maior compatibilização entre trabalho efamília, pelo aumento dos períodos de lazer, nomeadamente de férias,sabáticas de quadros, etc.

Por outro lado, os jovens mais qualificados tendem a admirar líderese a recusar obedecer a chefes. Os jovens têm tendência a desafiar a auto­ridade, eles já não estão prontos para se submeter a qualquer ordem, aformação ensinou-lhes a respeitar a autoridade baseada no conhecimentoe competência e a desconfiar da autoridade que repousa sobre um título,ou nomeação. Desenvolve-se o conceito de cidadania organizacional emque cada pessoa é portadora de direitos e de deveres, banindo-se a pos­tura tradicional marcada pela máxima: "eu pago-lhe para trabalhar, não épara pensar".

Deste modo, novas expectativas surgem, por parte das pessoas, rela­cionadas com o trabalho, como consequência da emergência destes novosvalores. E de entre tais expectativas salientam-se:

Maior necessidade de realização pessoal e profissional através do exer­cício de uma actividade interessante;

56

• Maior necessidade de reconhecimento psicológico, como pessoa decorpo inteiro e não apenas pela qualidade do cérebro ou pela forçados músculos que possua;

• Maior desejo de participação na organização e no seu processo detomada de decisão;

• Necessidades de carreiras construídas a partir das necessidades daspessoas e não das características da organização;

• Uma maior qualidade de vida no trabalho.

Naturalmente, a GRR não pode ser imune à pressão deste punhado deexpectativas e novas necessidades. Como resultado desta pressão, as práti­cas e as técnicas de GRH voltam-se para modelos mais personalizadosrelativamente à selecção, planeamento de carreiras, compensação e à ajudaespecífica a cada empregado.

Será indispensável reestruturar a organização do trabalho para que ostrabalhadores possam encontrar mais possibilidades de desenvolvimento erealização pessoal. A criação de grupos de trabalho semi-autónomos, gru­pos de progresso, círculos de qualidade entre outras novas formas de orga­nização do trabalho tenderão a proliferar para conferir maior responsabili­dade de gestão a todos54 •

2.2.5. Instituições

Por instituições entendem-se aqui as diferentes entidades públicas eprivadas com as quais a gestão de recursos humanos tem de interagir,nomeadamente: os sindicatos, as comissões de trabalhadores, o Estado, asassociações patronais entre outros.

Para Portugal, as instituições que jogam maior papel na GRH são ossindicatos, o Estado e a União Europeia e as associações patronais.

o Estado, através do poder legislativo especialmente a Assembleia daRepública, e através do poder executivo do Governo e também comrecurso ao poder judicial na vertente dos tribunais de trabalho.

54 Laurent Bélanger - Les Etfects de I'Environnement Externe et Interne sur les RessourcesHumaines. ln AAVV - Gestion Strategique et Operationnelle des Ressources Humaines.Quebec: Morin Editeur, 1993.

57

o ordenamento jus-laboral colectivo e individual exerce uma influênciadetenninante na GRH, favorecendo o desenvolvimento de detenninadaspráticas de gestão de recursos humanos, isto é, as que se encontram em har­monia com os valores sobre os quais as estratégias políticas são construídas.As leis representam instrumentos pelos quais os governos procuram implan­tar nas organizações as mudanças almejadas. Por vezes, nota-se uma certafalta de coerência entre a necessidade de flexibilidade e a tendência para aregulamentação excessiva. Por outro lado, verifica-se uma tendência naUnião Europeia para a uniformização do ordenamento jurídico-laboral.

Os sindicatos, por sua vez, também jogam um papel crítico na GRH,nomeadamente na contratação colectiva e em particular no momento danegociação salarial. A GRH é claramente a função organizacional onde ossindicatos, através da negociação e convenções colectivas de trabalho, têmmaior poder.

Na Europa, há quem sustente com fundamento que o sindicalismo seencontra em profunda crise. Devido a diversos factores, tais como:

• Evolução da situação económica geral da população;• Aumento da qualificação dos trabalhadores;• Gestão mais participada das organizações;• Maior cidadania no interior das organizações;• Desadaptação dos sindicatos à nova sociedade pós-modema;• Diversidade crescente das expectativas dos trabalhadores;• Crescente individualismo que dificulta a acção sindical colectiva.

O sindicalismo parece ter desenvolvido um conjunto de característicasbem ajustadas à primeira e segunda revoluções tecnológicas, mas desade­quadas à nova sociedade. Os seus pontos fortes passados constituem hoje,ao que tudo parece indicar, os seus maiores pontos fracos. Por outro lado,a matriz ideológica, que caracteriza algumas correntes sindicais, tambémnão parece ajudar os sindicatos a renovar-se.

Por último, importa salientar o papel da União Europeia nas transfor­mações da GRH em Portugal. Na estrutura jurídica da UE, no que diz res­peito ao trabalho, há dois temas fundamentais que são a livre circulação depessoas e a política social. Quanto ao primeiro, a União Europeia salva­guarda o princípio da não discriminação, através do qual visa a aplicaçãode um mesmo tratamento por cada Estado-Membro, quer aos seus cidadãos,

58

quer aos nacionais dos restantes países comunitários. Realça-se a liber­dade de movimentação dos trabalhadores e a procura de empregos queestes julguem mais convenientes.

Quanto à liberdade de circulação de trabalhadores, outros documentosforam publicados, nomeadamente respeitando a:

• Discriminação, em razão da nacionalidade, entre trabalhadores dosEstados-membros no que respeita a emprego, remuneração, condi­ções de trabalho, entre outros;

• Direito à permanência num Estado-membro depois de aí trabalha­rem;

• Igualdade de acesso aos empregos disponíveis.

Neste novo contexto, alguns problemas velhos emergem com maiorforça, nomeadamente a pressão para remunerar a um ritmo que se apro­xime da média da União Europeia. Com a europeização, o problema daequidade externa coloca-se em novos termos. A retribuição é apreciada emfunção dos diferentes níveis de vida e da variedade dos elementos que aconstituem.

2.3. Colocar a Vantagem Competitiva/Comparativa nas Pessoas

As alterações na envolvente despoletaram um enorme esforço porparte das organizações, com o objectivo de garantir a sua sobrevivência.Por isso, as organizações iniciaram novas formas de gestão que obrigarama repensar a actuação de todas as funções organizacionais, nomeadamente,a de recursos humanos.

Como consequência, a gestão de recursos humanos passou a tratar aarticulação e o ajustamento entre as pessoas que trabalham na organizaçãoe as necessidades estratégicas desta, assegurando a total utilização dosrecursos humanos disponíveis. Assim, a gestão de recursos humanos nãodiz respeito apenas às acções destinadas a atrair e seleccionar os futurosempregados na qualidade e quantidade estimável, mas também a todas asacções orientadas para a fidelização dos recursos humanos que melhor seadaptem à cultura organizacional, lançando mão de técnicas, tais como aavaliação do desempenho, a remuneração, a gestão da carreira, etc.

59

A gestão de recursos humanos valoriza muito mais, e dá mais ênfasedo que a tradicional gestão de pessoal, ao recrutamento e selecção das pes­soas cuja atitude e comportamento sejam mais susceptíveis de melhor con­tribuírem, dadas as crenças de gestão, para o sucesso organizaciona1.A gestão de recursos humanos dá mais ênfase aos aspectos ligados às ati­tudes, emoções e características comportamentais dos novos empregadosdo que a tradicional gestão de pessoa1.

A gestão de recursos humanos por oposição à gestão de pessoal, apoia­-se numa concepção radicalmente diferente do que representa a pessoapara a organização. Besseyre des Hortsss apresenta duas concepções depessoal na organização: pessoal/custo relacionada com a gestão de pessoale pessoal/recurso relacionada com a gestão de recursos humanos, atribuin­do-lhes um conjunto de características-chave que as distingue conforme seconstata na Figura...

Pessoal =Custo Pessoal = Recurso

Ameaça Oportunidade

Minimizar Optimizar

Curto prazo Longo prazo

Resultados Meios + Resultados

Quantitativo Qualitativo

Inadaptável Adaptável

Inflexível Flexível

Dependente Autónomo

Executante Empreendedor

Para o autor, a designação "direcção de recursos humanos", em simesma, é sintomática da vontade de conceber e difundir práticas que cor­respondem à perspectiva que figura na segunda coluna da tabela apresen­tada.

Para muitos autores não existem diferenças significativas entre gestãode pessoal e a gestão de recursos humanos. As poucas diferenças, porvezes, parecem ser mais ao nível da opinião do que dos factos e as seme-

55 Charles-Henri Besseyre des Horts - Vers une Gestion Stratégique des Ressources Humai­nes. Paris: Les Editions D'Organization, 1989.

60

lhanças parecem ser maiores do que as diferenças. Acresce que muitasorganizações mudaram o nome, sem que tal mudança tenha correspondidoa uma mudança de filosofia e de postura, correspondendo mais a umaquestão de evolução do que de revolução. Esta evolução começou nos EUAe só muito paulatinamente atingiu a Europa, revelando o Reino Unidouma persistente resistência à evolução vinda do outro lado do Atlântico.

A gestão de recursos humanos está mais centrada na procura (demand­driven) do que na oferta (suply-driven). A gestão de recursos humanos pro­curou a integração, centrando-se nas necessidades de recursos humanos euma das preocupações do gestor de recursos humanos é a resolução deproblemas com os outros gestores, ao contrário da gestão de pessoal que osresolve directamente com os empregados ou com os seus representanteslegais56•

Todavia, o aspecto mais crítico da gestão estratégica de recursos huma­nos situa-se ao nível da concepção e da implementação de um conjunto depolíticas e práticas com coerência interna, que garantam que as pessoascontribuam para alcançar os objectivos da organização.

Esta coerência e persistência internas são expressas e apoiadas pelacultura organizacional. Por isso, a gestão estratégica de recursos humanosdeve ser uma gestão de e pela cultura, vista esta como um conjunto de nor­mas, valores e crenças partilhadas pelos membros da comunidade organi­zacional. Por outro lado, as pessoas que integram a organização e a formacomo "as coisas são feitas ali" constituem o factor diferenciador em rela­ção à concorrência e constituem a sua vantagem competitiva.

A gestão estratégica de recursos humanos situa-se no cruzamento dequatro componentes: a organização (estruturas, procedimentos, funções ealinhamento hierárquico); as pessoas (competências, potencial e gestãodas suas capacidades); sistemas de recursos humanos (compensação,recrutamento, formação e comunicação); cultura organizacional (normas,valores e crenças).

Como fonte de vantagem competitiva, as pessoas, que integram aorganização com os seus saberes, têm de ser: mais-valias; únicas ou raras;

56 Derek Torrington; Laura Hall- Personnel Management. NY: Prentice-Hall, 1991.

61

dificeis de imitação pela concorrência; não substituíveis facilmente. Só,assim, é que, em nosso entender, a gestão de recursos humanos se distin­guirá da gestão de pessoal tradicional e caminhará na direcção da verda­deira gestão das pessoas, usando um conjunto integrado de técnicas cultu­rais, pessoais e estruturaisS7 •

Muitos gestores e organizações reconhecem que o ponto crítico davantagem competitiva não deriva da concepção engenhosa de um produto,da melhor estratégia de marketing ou do domínio do estado da arte da tec­nologia de produção, mas da posse de um sistema eficaz de obtenção,mobilização e gestão dos activos humanos da organização, as pessoas quea integram e formam a comunidade de trabalho.

Muitos desenvolvimentos recentes, incluindo mudanças demográficasna força de trabalho, as vertiginosas mudanças tecnológicas, os aumentosda competição global, as experiências de novos modelos organizacionais ea atenção renovada das políticas públicas sobre a força de trabalho toma­ram a gestão de recursos humanos indispensáveis para todos os gestores daorganização.

Os gestores da maior parte das grandes empresas em todo o mundoreconheceram a necessidade de fazer algumas alterações radicais e mesmotransformações nos seus enraizados modelos organizacionais e de gestão.No entanto, muito poucos vão ao ponto de se livrarem dos seus velhos pro­cedimentos habituais e muito poucos fazem algo mais do que limar asarestas.

O problema é que eles estão tão dominados pelos modelos estruturaise de engenharia assentes nas suas hierarquias tradicionais que tentam apro­ximar-se da mudança através da reconfiguração dos bens e da reengenha­ria dos processos, em vez de se centrarem na forma de mudar as motiva­ções individuais e o relacionamento interpessoal.

Aqueles que lideraram as empresas com sucesso, através do processode transformação, descobriram uma verdade universal: nada muda se aspessoas não mudarem.

S71. Pfeffer, - Competitive Advantage Through People. Boston: HBRP, 1994.

62

Mas, como o caso de muitas empresas ilustra, o processo demudança de urna hierarquia estrutural, mecanicista e altamente buro­cratizada para urna empresa auto-renovavel58 é normalmente longo edoloroso.

Para que haja mudança sustentavel, é preciso:• Implicaçào, neste processo, da gestào de topo e dos accionistas da

organizaçào;• Atençào particular à comunicaçào, nào apenas para informar sobre a

mudança, mas também e, sobretudo, para ouvir e agir sobre as reac­çòes suscitadas;

• Que a remuneraçào encoraje a inovaçào e reconheça o sucesso dosque contribuem para a mudança;

• Numa perspectiva de "organizaçào que aprende a aprender", deveser criada urna atmosfera de trabalho facilitadora e indutora damudança.

Lembramos urna frase da pioneira norte americana da gestào, MaryParker Follet: "Nào ha maior activo do que o orgulho de um homem no seutrabalho".

As pessoas estào no centro do sucesso da actividade. No coraçào demuitas empresas encontram-se as capacidades e comportamentos de gru­pos de pessoas de talento. Muitas investigaçòes levadas a cabo nos EVA ena Europa reconhecem que o comportamento dos empregados individuaistem impacto no desempenho financeiro.

Lynda Granton59 estabelece a seguinte relaçào entre o comportamentodas pessoas e os resultados financeiros da organizaçào

ObjectivosContexto

Comportamentos DesempenhoDesempenho

da f-----. ---+ eatitudes dos -.. da f-----.actividade

pessoalindividuos organizaçào

financeiro

58 Ghoshal Sumantra; Bartlet, Christopher - The Individualized. Corporations. London:Heineman, 1998.

59 Lynda Grantton - Estratégia Viva: Colocar as pessoas no coraçiio da empresa. Porto:Àmbar, 2003.

As empresas de elevada eficácia são criadas através da concentraçãonum certo número de objectivos empresariais que são traduzidos para umcontexto apropriado, no qual as pessoas trabalham. Os empregados com­portam-se de uma forma que vai ao encontro dos objectivos empresariaise isso tem impacto no desempenho da empresa e, por fim, no desempenhofinanceiro.

Quando as empresas adoptam determinadas práticas para com as pes­soas têm significativos acréscimos nos lucros dos accionistas. Por outrolado, um significativo número de mudanças de produtividade ao longo dotempo pode ser explicado através da cultura organizacional e do empenhoindividual de cada empregado em relação à actividade.

Fica claro que não é a quantidade de pessoas (o efectivo global)que se encontram na organização que constitui o activo mais impor­tante, mas as competências que as pessoas possuem e a cultura organi­zacional que constitui o seu ambiente de trabalho. No centro, encontra­se a noção de que as pessoas são únicas e diferentes do capital e datecnologia.

2.4. Alinhar Estratégia e Pessoas

Importa ter presente a ideia de que a estratégia é um conceito dinâ­mico. É um padrão sim, mas em mudança contínua ao longo dotempo. É um padrão de acções que provocam outras mudanças naenvolvente, da parte dos concorrentes, dos clientes e dos fornecedores.A estratégia transforma-se, em certo sentido, num circuito de retroali­mentação sem fim, que relaciona no tempo as acções, as consequên­cias e as reacções.

É a partir deste conceito dinâmico de estratégia que surge a necessi­dade de ligar a estratégia às pessoas, isto é, a urgência do forte alinhamentodas pessoas com a visão da organização. São as pessoas (gestores) quemtoma decisões estratégicas e são as pessoas (que trabalham na organiza­ção) quem vai praticar um conjunto de acções que, enquadradas numdeterminado período, poderão ou não configurar, através dos traços emer­gentes, a existência de uma estratégia, isto é, de uma visão/ideia acerca dofuturo.

64

Nesta perspectiva, sugere-se que as pessoas que integram as organiza­ções (os seus recursos humanos) sejam envolvidas na definição da estra­tégia e, em particular, no planeamento (planificação da estratégia), pordiversos tipos de razão. Em primeiro lugar, porque hoje planeia-semelhor a partir dos pontos de contacto com os clientes (indagar acerca dassuas preferências) do que a partir da fortaleza fechada do departa­mento de planeamento. Em segundo lugar, a dedicação, motivação e graude satisfação daqueles que implementarão a estratégia será tanto maior,quanto maior for a sua sensação, real ou psicológica, de que participaramna formulação daquela60 •

Não admira, pois, que longe vá o tempo da velha gestão de pes­soal - de carácter meramente administrativo - para quem as pessoasnão ultrapassavam a categoria de coisas, objectos destinados ao inven­tário contabilístico.

Não se trata de cosmética de nomenclatura, mas antes de verdadeiratransformação da postura tradicional. Com tal transformação, as pessoasdeixam de ser encaradas como um custo e passam a ser um activo e umactivo estratégico61 • A participação dos colaboradores na definição da visãoe na fixação das metas e objectivos permite-lhes não apenas conhecê-los,como atrair todos os indivíduos na sua concretização.

Tradicionalmente, a expressão gestão de pessoal aplicava-se à funçãodo especialista responsável pela administração de normas, procedimentose práticas respeitantes à relação entre os empregados e a entidade empre­gadora. Nesta função especializada, integravam-se as diversas técnicas deadministração de pessoal, desde o recrutamento e selecção, passando peloprocessamento de salários e terminando nos processos de aposentação.Esta abordagem tradicional levou à valorização exçessiva dos aspectosestandardizados, rotineiros e mecanicistas dos procedimentos administra­tivos, muitas vezes contra a vontade dos gestores que tinham a seu cargo agestão das pessoas62 •

60 C. Tuss; L. Gratton - Strategic Human Resource Management: A conceptual approach. TheInternational Journal of Human Resource Management, Vol. 5, n.O 3,663-689.

61 M. Beer [et aI.] - Human Resources Management. NY: The Free Press, 1985; M. Beer [etaI.] - Managing Human Assets. NY: The Free Press, 1984.

62 R. Amit; P. Schoemaker - Strategic Assets and Organizational Rent. Strategic ManagementJournal, vol. 14, p. 33-46.

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Se o factor humano é o recurso estratégico e o elemento diferenciadorrelativamente à concorrência, a questão da motivação e envolvimento daspessoas, que constituem as comunidades de trabalho, transforma-se napedra angular de toda a construção de uma nova gestão de recursos huma­nos. A motivação não é mais uma entre muitas, antes é a questão da gestãode recursos humanos no início deste milénio.

Gerir, tendo como preocupação central o envolvimento das pessoasque constituem as equipas e a comunidade de trabalho, significa ter aban­donado a expressão "gestão de pessoal" para passar a falar, e sobretudo aviver, a nova expressão "gestão de pessoas".

As pessoas, para além de atitudes, características pessoais, conheci­mentos e experiência, possuem um conjunto de competências pessoais quesão conhecidas como habilidades e capacidades.

Estes são os atributos que constituem normalmente os melhores indi­cadores do sucesso de um indivíduo, uma vez que têm tendência para estardirectamente ligados às funções chave e às tarefas centrais que caracteri­zam um determinado trabalho.

Por exemplo, para um gestor operacional, uma habilidade chave émuitas vezes a capacidade de reconhecer e aproveitar as oportunidades dealto potencial; numa função de desenvolvimento ao nível sénior, é acapacidade de delegar poderes de forma eficaz naqueles que estão na pri­meira linha, que é a vital; para os líderes de topo, por outro lado, a capa­cidade de criar um ambiente de trabalho que seja excitante e exigente aomesmo tempo é uma habilidade muito importante e que deve ser desen­volvida.

Mesmo entre aqueles que parecem ter as qualificações ideais, tanto aonível das qualidades pessoais, como através da formação e experiência,muitos provam não ter sido a escolha adequada para aquela função. Algunssão simplesmente incapazes de demonstrar as habilidades vitais, mas tãodificeis de reter, que separam os desempenhos meramente satisfatórios dosverdadeiramente brilhantes.

A razão para muitos destes fracassos é que as habilidades aplicadasdependem grandemente da compreensão tácita e de capacidades que

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advêm da interacção entre as atitudes e características próprias, pes­soais, intrínsecas dos indivíduos e o conhecimento e experiência acumu­lados.

A habilidade crítica de conseguir reconhecer o potencial das situa­ções de negócio não é uma característica própria nem é facilmentealcançável através de treino. No entanto, parece ser uma habilidade quepode ser alimentada e cultivada nos indivíduos que sejam curiosos eintuitivos por natureza, e que também tenham desenvolvido uma com­preensão estrutural rica relativamente à sua área de negócios e contextoorganizacional.

Linda Gratton63, na sua obra Estratégia Viva, refere seis etapas para acriação de uma estratégia viva destinada a colocar as pessoas no coraçãoda empresa.

Tais etapas são:• Criar grupos de orientação - Capacidade para envolver um vasto

número de indivíduos representando as diversas funções da organiza­ção. Envolver gestores executivos, profissionais de recursos huma­nos e pessoas ligadas ao sector comercial (contacto com os clientes).Capacidade para continuar a usar estes grupos de orientação, aolongo das etapas do processo.

• Imaginar o futuro - Capacidade para fazer participar todas as pes­soas da organização no diálogo sobre o futuro. Imaginar a activi­dade no futuro, qual a sua estrutura, cultura, pessoas, líderes e pro­cessos.

• Compreender a capacidade actual e identificar a lacuna. Capaci­dade para criar um quadro preciso do estado actual da organiza­ção. Em particular, do contexto em que as pessoas trabalham, doseu comportamento e das medidas-chave de desempenho. Issoconstrui-se ao longo do tempo, fazendo comparações com equiva­lentes do sector de actividade e partilhando com os gestores donegócio.

• Criar um mapa do sistema. Capacidade para compreender e desen­volver capacidades de pensamento sistémico em toda a organização.Garantir que as decisões são tomadas com base no seu impacto na

63 Linda Gartton - Estratégia Viva. Porto: Ambar, 2003.

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totalidade do sistema. Construir uma compreensão suficientementeprofunda da actividade para começar a compreender a ligação cau­sal.

• Criar um modelo da dinâmica. Capacidade para compreender a dinâ­mica dentro do sistema. Criar uma percepção partilhada das ligaçõesentre as alavancas de processo e os resultados e a forma como estesmudam ao longo do tempo.

• Ponte para a acção. Capacidade para interpretar e comunicar a neces­sidade de mudança, através do envolvimento de uma vasto grupo depessoas. Criar uma compreensão partilhada das medidas-chave dedesempenho que marcam o caminho da viagem.

Enraíza-se, progressivamente, a ideia da necessidade de alinhar as pes­soas com a estratégia. Todavia, permanece em aberto a tensão entre a moti­vação intrínseca e a extrínseca. De forma caricatural, pode dizer-se que,em certas épocas (modas passageiras), a imagem que prevalece na gestãode recursos humanos é a do condut,?r de automóvel. O condutor traça ofuturo e o trajecto e comanda a máquina, em ordem a que esta atinja a metapreviamente definida.

Aqui, os recursos humanos são a máquina já que, sem vontade e passi­vamente, obedecem. Se, eventualmente, alguma peça da máquina revelaqualquer disfunção, o condutor procurará rapidamente substituí-la, evi­tando, deste modo um estorvo à realização as sua estratégia (atingir ameta). Noutros períodos ou no mesmo, mas com outros gestores, a obten­ção da meta só tem lugar através da sedução das pessoas para o projecto,isto é, para a estratégia da organização.

Por último, salienta-se que a decisão de alinhar as pessoas com a estra­tégia se encontra ligada a uma outra, que consiste em alinhar a estratégiacom as pessoas. Na verdade, quer na metáfora mecânica (as pessoas e osprocessos são como máquinas), quer na metáfora orgânica (pessoas e pro­cessos são serem vivos), o alinhamento a estabelecer tem de ser nos doissentidos: a estratégia está condicionada pelo tipo de automóvel/pessoasdisponíveis. Esta tensão é equacionada através da gestão centrada na reali­zação dos objectivos e nos resultados e na correspondente gestão de com­pensações.

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2.5. Gestão Estratégica de ~ecursos Humanos

Actualmente, a gestão de recursos humanos trata fundamentalmente daarticulação e ajustamento entre as pessoas que trabalham na organização eas necessidades estratégicas desta, assegurando a total utilização dosrecursos humanos disponíveis.

Assim, a gestão de recursos humanos não diz respeito apenas às acçõesdestinadas a atrair e seleccionar os futuros empregados na qualidade equantidade estimável, mas também a todas as acções orientadas para afidelização dos recursos humanos que melhor se adaptem à cultura organi­zacional, lançando mão de técnicas, tais como a avaliação do desempenho,a remuneração, a gestão da carreira, etc.

Os objectivos da gestão de recursos humanos foram expressos porKeep64 da seguinte forma: obtenção do material básico certo, na forma deforça de trabalho, dotada das qualidades devidas, capacidades, conheci­mentos e potencial para a formação futura, bem como no recrutamento ena selecção dos trabalhadores melhor posicionados para satisfazer asnecessidades da organização.

A gestão de recursos humanos valoriza muito mais, e dá mais ênfasedo que a tradicional gestão de pessoal, ao recrutamento e selecção das pes­soas cuja atitude e comportamento sejam mais susceptíveis de melhor con­tribuírem, dadas as crenças de gestão, para o sucesso organizacional.A gestão de recursos humanos dá mais ênfase aos aspectos ligados às ati­tudes, emoções e características comportamentais dos novos empregadosdo que a tradicional gestão de pessoal.

Esta tendência não está isenta de riscos. Por um lado, as organizaçõesmais inovadoras precisam de empregados não conformistas que podem,por outro lado, bloquear o sistema. Se os gestores seleccionam pessoasapenas iguais a si mesmos, à sua imagem e semelhança, correm o risco deperpetuarem uma cultura desajustada às novas necessidades da envolvente,que, embora tenha obtido sucesso no passado, corre o risco de fracassar nofuturo próximo.

64 E. Keep - Corporate Training Strategies. ln Storey (ed) - New Perspectives on HumanResources Management. Oxford: Blackwell, 1989.

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