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I ÁBRACOR p Associação Brasileira de Conservadores Restauradores de Bens Culturais Anais do IX Congresso Salvador, Bahia, Brasil 25 a 30 de outubro de 1998

Anais Do Congresso de Abracor

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I

ÁBRACOR p Associação Brasileira de Conservadores

Restauradores de Bens Culturais

Anais do IX Congresso

Salvador, Bahia, Brasil 25 a 30 de outubro de 1998

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IX Congresso da ABRACOR

Associação Brasileira de Conservadores -Restauradores de Bens Culturais

Centro de Convenções Salvador - Bahia 25 a 30 de Outubro 1998

Conservação e Comunidade

ais ao IX v_-/ JL JL<L

Anais do IX Congresso

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ABRACOR

Associação Brasileira de Conservadores - Restauradores de Bens Culturais

Anais do IX Congresso Centro de Convenções Salvador - Bahia 25 a 30 de Outubro 1998

Esta publicação contou com o apoio de:

Construtora Norberto Odebrecht S/A

Prefeitura da Cidade de Salvador

Fundação Casa de Rui Barbosa

Fundação Vitae

Fundação Biblioteca Nacional

Contribuições:

A Arte de Encadernar - Luccas & Tuenze S/C Ltda

Maria de Los Angeles Fanta

Casa do Restaurador

Associação Paulista de Conservadores-Restauradores de Bens Culturais

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Foto - Benjamin R. Mulock - Ladeira da Conceição - Bahia - 1861 Coleção "Thereza Christina Maria" - FBN

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Diretoria Biênio 97/98

Presidente Maria Luisa Ramos de Oliveira Soares - F. Casa de Rui

Barbosa - RJ

Vice - Presidente Júlio Eduardo Correia de Moraes - Autônomo - SP

Primeiro Secretário Jayme Spinelli Jr. - Fundação Biblioteca Nacional - RJ

Segundo Secretário Denise de Oliveira - Autônoma - RJ

Primeiro Tesoureiro Ozanah Hannesh - Museu de Astronomia - RJ

Segunda Tesoureira Thais Helena Slaibi - Autônoma - RJ

Coordenador Técnico Luiz Antônio Cruz Souza - CECOR - MG

Conselho Administrativo Cleide Messi - Autônoma - RJ

Francisco da Costa - Centro Conservação / Preservação

Fotográfica / FUNARTE - RJ

Gilson Cruz - UFF / Fundação Biblioteca Nacional - RJ

Leonardo Cury Maroun Ciannella - Autônomo/FBN - RJ

Solange Zuniga - FUNARTE - RJ

Conselho Fiscal Edmar Moraes Gonçalves - F. Casa de Rui Barbosa / RJ

Sérgio Conde de Albite Süva - UNI-RIO - RJ

Regina Gierlemger - Associação Paulista de Conservadores

e Restauradores / APCR - SP

Suplentes Fátima Justiniano - Laboratório de Conservação e

Restauração / LACOR - UFF - RJ

Suely Deschemayer - Autônoma - PR

Sheila Campos Salewski - MNBA - RJ

Editoração, diagramação, fotolitos Leonardo Ciannella [email protected]

N o t a

Os trabalhos aqui publicados, são de

inteira responsabilidade dos respectivos

autores, não cabendo à ABRACOR

nenhum mérito na elaboração, partici

pação, assim como aplicação dos

mesmos.

Apresentação

Ao analisarmos os trabalhos aqui apresentados, somos levados a refletir sobre a conservação/restauração no Brasil, nos dias atuais. O papel social dos profissionais que atuam nesta área e fundamentalmente sobre as políticas culturais que em última instância, gerenciam este fazer. Nos últimos anos, os conservadores/restauradores foram chamados a participar de forma ativa em projetos voltados para políticas de preservação, com diretrizes centradas em diversos aspectos envolvendo problemas de conservação e comunidade. A recuperação de núcleos históricos, vertente principal nesta "nova política" de preservação patrimonial, criou um forte embate entre as formas de pensar e os critérios fundamentais de intervenção. Dentro deste processo, faz-se necessário a adequação do perfil deste profissional, agora solicitado. O olhar até então treinado para ver o micro, passa a envolver o macro. Nesta busca nos confrontamos com diversos elementos sociais e questões fundamentais foram sendo colocadas, até mesmo quanto a nossa capacidade de atuação técnica. Quem somos nós? É a pergunta angustiante que esta coletividade vem se fazendo nos últimos tempos. A procura de espelhos, buscamos parâmetros onde fosse possível refletir estas dicotomias. Foram de lutas os últimos tempos. Tentando ocupar um lugar no espaço social, fomos levados a criar diálogos, buscando soluções para o nosso cotidiano técnico e sobrevivendo dentro de malhas político-sociais, tentando resguardar a nossa dignidade profissional. Os trabalhos aqui apresentados, refletem esta situação. Muitos de nós, de forma participativa, buscamos soluções, tentando encontrar parceiros capacitados a ouvir e dialogar. As questões sociais prementes, nos defrontou com inquietações sobre a nossa "identidade cultural". A facilidade com que muitas vezes somos "conduzidos", fortifica a certeza que não podemos mais seguir sem o amparo legal do reconhecimento profissional. As dificuldades que sentimos em elaborar um diálogo acadêmico pertinente com os nossos pares de áreas afins, define nossa fragilidade enquanto formação sistemática acadêmica.Tanto realizado e tanto por fazer, estamos a meio de um caminho sem volta. A Ciência da Conservação vem apontando direções. Já não podemos elaborar soluções técnicas sem o amparo de métodos acadêmicos científicos, a interdisciplinaridade é um fato que temos que assumir como um dos aspectos da nossa formação profissional. A diretoria da ABRACOR neste momento, espera que este evento possibilite a sedimentação de bases definitivas para o estabelecimento de um código de ética e a elaboração de um programa nacional de formação profissional.

Maria Luisa Soares

*~rf%b

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Sumár io

Ciência da Conservação 13 Marilene Fragas Costa, Contaminação por Microorganismos (Fungos) no Acervo da

Biblioteca de Manguinhos FIOCRUZ

18 Richard E. Trucco - in memorian; José Amilton Santana; Claudia Regina

Nunes - Controle de Pragas: Preservação do Patrimônio Cultural com Atmosferas

Modificadas. A Desinfestação do Catetinho

22 João Carlos Ferreira; Regina Maria Macedo Costas Dantas; Richard Esteban

Trucco - in memorian; José Amilton Santana de Mello; Claudia Regina Nunes

- A Secagem da Múmia de Hori do Museu Nacional da Quinta da Boa Vista

28 Denise viana Regis; Luiz A. C. Souza - A Capela do Santíssimo da Igreja do

Mosteiro de São Bento do Rio de Janeiro: Aspectos Científicos do Estado de Conservação

32 Luiz A C Souza; Edson Motta Jr; João Cura D'Ars Figueiredo Jr; Marco

Elízio de Paiva - Verificação e Autenticação de Obras de Arte Através de Métodos

Físicos e Físico-Químicos de Análise

36 Saulo Güths; Luiz A. C. Souza; Fernando O. R. Pereira - Sistema de Gerenciamento

Térmico para Conservação de Coleções

Escultura 43 Eliane Monte - Escultura em Tela Encolada: Tecnologia e Restauração

48 Renata de Fátima da Costa Maués; Nireibi Deyanira Herrera-Romero; Maria

Regina Emery Quites - Restauração de uma Imagem Articulada do Senhor dos Passos

52 Gilca Flores de Medeiros; Luiz A. C. Souza - Tecnologia de Acabamento de

Douramento em Esculturas em Madeira Policromada do Período Barroco e Rococó em

Minas Gerais, Brasil

58 Ana MariaVillar; Álvaro Silva - Retábulo do Altar-Mor da Igreja de São Francisco

de São Cristóvão/SE

Formação Profissional 65 Teodora Camargo Carneiro; Valéria de Mendonça - ATELIÊ ABERTO DE

RESTAURO. Pinacoteca do Estado de São Paulo

71 Simone de Sousa Mesquita - Algumas Considerações Sobre a Formação Profissional

na Área De Conservação e Restauração de Cerâmica Arqueológica

73 Márcia Sartori de Toledo - Treinamento Profissional: Critérios e Técnicas de Inter

venção em Obras Raras e Especiais

11 Esteia Court - Color j Técnica de Reintegracion Pictorica

84 Maria Esteva; Magdalena Mieri; Patrícia Lissa; Patrício López Méndez - "Los

Seiíores dei Jaguar," Una exhibición modelo como resultado de una experiência de

entrenamiento

90 Rosina Trevisan M. Ribeiro - O Mestrado na Área de História e Preservação do

Patrimônio Cultural da FAU/UFRJ

94 Oliveira Silvio Luiz R. Oliveira - Programa de Formação de Auxiliar Técnico em

Conservação e Restauração de Obras de Arte. Projeto Canteiro Escola. Igreja de Nossa

Senhora do Rosário dos Pretos/Ouro Preto. Igreja de Nossa Senhora da Lapa dos Mer

cadores/ Rio de Janeiro

Fotografia 101 Francisco da Costa - Projeto de Conservação do Acervo Fotográfico de Pierre Verger

- Duplicação de Negativos

108 Mareia Mello - O daguerreótipo nas coleções brasileiras

114 Sandra Baruki; Ana Saramago - Projeto de Conservação do Acervo Fotográfico de

Pierre Verger

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Identidade Cultural

121 Zeny Duarte de Miranda Magalhães dos Santos - A Conservação e a Restauração

de Fotografias na França e em Portugal: estudo comparativo

129 Leila Beatriz Ribeiro; Judite dos Santos Rosário; Maria de Nazaré de Freitas

Francisco; Marize Souza Chicanei - A Construção de Quadros de Análise: Resgate

e Preservação da Memória no Baile de Charme

133 Maria Cristina Sobrinho Darriet - Os Atalhos da Criação: Barrosinho e a Recons

trução da Música Negra Instrumental Brasileira.

135 Jaime Migone R.; Antonino Pirozzi V. - Revalori^ación dei Conjunto de Ascensores

de Valparaíso

141 Angelita Berndt; M.Phil - Copiar Estilo Arquitetônico Dentro de Centros Históricos

é Válido?

147 Cláudia Philippi Scharf - Conservador-Restaurador Brasileiro: Quem Somos Nós?

152 Marlice Nazareth Soares de Azevedo - Patrimônio Urbano e Política de Preserva

ção - O Papel do Poder Local no Desenvolvimento da Identidade Cultural: 0 Caso de

Niterói

159 Silvio Luiz R. Vianna Oliveira - Conscientização do Patrimônio Cultural. No

ções Básicas Sobre Conservação de Bens Culturais

Papel

Pintura

163 Lygia Guimarães - Conservação e Restauração de Croqui em Papel Vegetal com os

Nomes dos Inconfidentes Inscritos em Bloco de Pedra no Museu da Inconfidência - Ouro

Preto - Mg

169 D'Almeida, M.L.O.; Auada, F M - A Influência dos Banhos de Limpeza e da

Reencolagem nas Propriedades do Papel - IPT - ABER

174 Maria Aparecida de Vries Mársico - Velatura e Planificação de Obras de Arte sobre

Papel: práticas do Ocidente e do Oriente

178 Edmar Moraes Gonçalves - Restauração de Álbuns Fotográficos (Uma Necessidade)

181 Maria Luisa R. O. Soares; Alma Grüner; Carla Veiga - Arte Contemporânea:

Criação e Implantação de um Nücleo de Pesquisa e Treinamento no Rio de janeiro.

191 Marilene Corrêa Maia - Objetivos de um Estudo Acerca da Estabilidade de Materiais

e Técnicas de Restauração de Pinturas Sobre Tela

194 Maria Beatriz Correia de Albuquerque - As Pinturas da Igreja de Vilarinho de

Cova de Tua - Restauro e Conservação Preventiva

199 José Dirson Argolo - Arte Funerária de Cachoeira. Lápides Tumulares da Ordem

3a. do Carmo

204 Claudia Regina Nunes; Richard E. Trucco - In Memorian - A Restauração da

Batalha de Campo Grande. PEDRO AMÉRICO - 1871

209 Lucimar Ventorin; Bethania Reis Veloso; Luiz Antônio Cruz Souza - Objetos

de Devoção: Pesquisa e Restauração

215 Claudina Maria Dutra Moresi; Anamaria Ruegger Almeida Neves; Marcos

César de Senna Hill - Retratos da Coleção de Pinturas "Memórias do Tribunal" -

Um Estudo Histórico Comparativo de Técnicas, Materiais e de sua Conservação

220 Maria João Nunes de Albuquerque - O Convento de Nossa Senhora da Visitação

de Vila Verde dos Francos - A conservação e o restauro da pintura mural do Convento de

Nossa Senhora da Visitação de Vila Verde dos Francos - Estremadura - Portugal

228 Ana MariaVillar; Álvaro Silva - Forro do Coro Alto do Convento do Dester-

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Política da Preservação

Restauração Arquitetônica

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245

252

257

265

270

Sérgio Conde de Albite Silva - Políticas Públicas de Preservação e Tecnologias de

Informação

Eneida da Cunha Parreira - Critérios e Procedimentos Adotados Pelo MASP no

Empréstimo de Obras e nas Exposições Temporárias

Lúcia Bastos - Novas Instalações do Laboratório de Restauração do Museu do índio:

Outras Possibilidades de Conservação de Acervo Etnográfico.

Yacy-Ara Froner; Gedley Belchior Braga; Cibele Aldrovandi - Acondicionamen-

to e Armazenamento das Coleções Etnográficas e Arqueológicas nas Áreas de Reserva

Técnica

Cássia Maria Mello da Silva - Conservação e documentação: áreas complementares

Regina Solís Jara - Conservación Mapoteca Colonial

277 Wallace Caldas Nelson Porto Ribeiro - A Restauração do Vitral da Cúpula do

Plenário do Palácio Tiradentes

282 Claudia S. Rodrigues de Carvalho - Preservação, Arquitetura e Clima

289 Rosina Trevisan M. Ribeiro - Avaliação Pós-Ocupação em Edifícios que são Tomba

dos como Patrimônio Cultural - Um Novo Enfoque

292 Maria Isabel Corrêa Kanan - Panorama dos Trabalhos de Restauração com

Materiais a Base de Cal em Santa Catarina

299 Andréa Marques Dal Grande; Susana Cardoso Fernandez - Projeto de Restaura

ção do Palácio Cru% e Sousa

Têxteis 309

314

318

321

324

327

Andréa Pedreira; Luciana da Silveira - A Preservação do Acervo de

Indumentária do Museu Casa da Hera: Um Enfoque Conservativo

Mônica Paixão; Manuel Fonseca dos Reis - Conservação Têxtil e Comunidade.

Vestes Utúrgicas

Eliane Monte; Gilca Flores de Medeiros - Tela Encolada Catalogação e Estudo

Sobre uma Tecnologia Incomum

Claudia Regina Nunes - A Restauração do Traje da Coroação do Imperador. D.

Pedro II: Uma Intervenção com Adesivo Beva 371

Claudia Regina Nunes - Uma Restauração de Têxteis Atípica: As Roupas de Car-

men Miranda

Claudina Maria Dutra Moresi; Maria da Conceição Fernandes Brito; Jan

Wouters - Estudo Preliminar do Acervo Têxtil do Museu de Arte Sacra de Mariana

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Ciência da Conservação

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Anais da ABRACOR - Ciência da Conservação IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

A.bstract

Relate of experience Manguinhos of Library/FIOCRUZ. Describes that providence and of metodology used for descontamination of microorganism (fungi) in their publicationes.

Contaminação por Microorganismos (Fungos) no Acervo da Biblioteca de Manguinhos/FIOCRUZ

Marilene Fragas Costa Bibliotecária/Fiocruz-Biblioteca de Manguinhos Av. Brasil, 4365 - Manguinhos/RJ Cep: 21.045-900 - Tel.290-1846/5984311 - Fax. 270-0914 E-mail: [email protected]

1. In trodução

Nota

1 - Certos gêneros de fungos do ar são responsáveis por alergias respiratórias e cutâneas e são capazes de permanecer vivos meses e até anos nos livros sem que se perceba, o que ocorre quando são criadas situações favoráveis para o aparecimento.

A Biblioteca de Manguinhos vinculada ao Centro de Informação Científica e Tecnológica/CICT unidade técnico-científica da Fundação Oswaldo Cruz / FIOCRUZ, detém um dos maiores acervos da área biomédica da América Latina. Atualmente possui 22.000 títulos de monografias, entre livros, teses e anais de congressos, 6.000 títulos de periódicos, aproximadamente 620.000 volumes.

Em agosto de 1995 ganhou novas instalações para abrigar este valioso acervo, contudo uma falha no sistema de ar condicionado central, e as condições naturais de localização da Biblioteca em um vale, área com pequena reserva florestal, e ainda a proximidade com o mar, favoreceu ao descontrole da temperatura e umidade relativa, o que ocasionou o aparecimento de microorganismos (fungos) (1) em seu acervo, exceto o de Obras Raras, que estão localizadas no 3o andar do prédio Mourisco (Castelo). As publicações encadernadas foram as primeiras a apresentarem a contaminação. Foi intensificado o processo de higienização de manutenção dos documentos, todavia sem resultado, pois a proliferação era muito rápida, limpava-se uma obra e no prazo de apenas uma semana, estava completamente recontaminada.

Após um ano de tentativa de solução do problema, foram muitas as dificuldades em encontrar metodologia adequada, sendo necessário realizar contratações emergenciais. Em janeiro de 1997, fez-se necessário tomar medida rigorosa de interdição da Biblioteca, na intenção de preservar o patrimônio, bem como a saúde de usuários e funcionários.

2. Temperatura e umidade relativa

O descontrole da temperatura e a umidade relativa excessiva, foram os responsáveis pelo acidente biológico ocorrido na Biblioteca de Manguinhos. São fatores climáticos identificados como contribuintes para a deterioração de material bibliográfico, principalmente quando ocorre variações dos índices adequados para preservação que é de 18 a 22°C de temperatura e 50 a 55% de umidade relativa. A oscilação desses parâmetros provoca a proliferação de microorganismos (fungos), além da contração e o alongamento da fibra do papel, e consequentemente sua fragilização.

Em alguns momentos a baixa temperatura atingiu a 15"C, o que causou grande desconforto às pessoas e em outros, a umidade relativa chegou 90%, assim, fez-se necessário o acompanhamento das variações de temperatura e umidade relativa, diariamente, às 9:00 e às 16:00 horas.

Com a contratação de uma firma especializada para realização da manutenção do equipamento de refrigeração, o procedimento da medição da temperatura e umidade relativa passou a ser realizado a cada duas horas ininterruptamente, durante 24 horas.

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ABRACOR - Associação Brasileira de Conservadores-Restauradores de Bens Culturais

3. Assessoria Técnica

A Biblioteca de Manguinhos estava vivenciando uma situação inédita, sua equipe não dispunha de experiência para tomada de decisões. Por isso, foi solicitado assessoria nas seguintes áreas: a) Preservação de acervo - Os especialistas do Arquivo Nacional e da Biblioteca Nacional, emitiram o mesmo laudo sobre a causa da contaminação, que foi o descontrole dos níveis de temperatura e umidade relativa. Recomendaram o desligamento do sistema ar condicionado, a abertura das janelas e portas para ocorrer ventilação no ambiente e a instalação de desumidificadores que haviam sido desaconselhados pelos técnicos de refrigeração, além da higienização mecânica a seco do acervo, levando-se em conta que a contaminação fúngica foi apenas superficial, ou seja, não houve migração para a fibra do papel.

b) Qualidade do ar - Foi contratada empresa especializada para analisar o nível de contaminação no ar interno da Biblioteca e orientar quanto às providências a serem tomadas para a descontaminação do ambiente.

c)Saúde do Trabalhador - A Coordenação de Saúde do Traba lhador /CoST/ FIOCRUZ, encarregou-se de realizar exames clínicos e patológicos em todos os funcionários que trabalham no prédio e analisou o comprometimento alergênico que poderia existir com as espécies de fungos encontradas.

4. Cultura de fungos

Em uma primeira análise em julho de 1996 no Laboratório de Micologia do INCQS (Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Saúde/FIOCRUZ), foi identificado os gêneros aspergillus e penicilium, comuns em atacar acervos documentais. Em outubro, nova análise feita no Laboratório de Micologia do IOC (Instituto Oswaldo Cruz/FIOCRUZ), constatou a proliferação de gêneros, que são encontrados normalmente no meio ambiente. Outra análise realizada em janeiro de 1997, pela empresa de assessoria técnica microbiológica em análise de qualidade do ar de interiores, também identificou gêneros de estrutura alergênica como Cladosporium, Alternaria, porém não foi encontrado fungos que possuísse ação toxigênica.

5. Treinamento

O quadro de pessoal existente anteriormente para realizar a higienização de manutenção, folha a folha, era composto de 04 (quatros) técnicos. Diante da nova realidade esse quadro tornou-se deficitário, pois teríamos que higienizar todo o acervo. Foi necessário então, ampliar a equipe e realizar treinamento específico de higienização para microorganismos. Selecionamos 12 (doze) técnicos, através da Cooperativa de Trabalhadores Autônomos do Complexo de Manguinhos(COOTRAM), 05(cinco) contratados pela Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos (FENEIS) e 03 (três) integrantes do quadro da Biblioteca de Manguinhos.

O treinamento foi realizado em duas etapas:

1) Técnicas de utilização, definições e importância do uso de Equipamentos de Proteção Individual/ EPI , fundamentais por serem materiais contaminados por microorganismos. Apesar de não serem tóxicos, porém alergênicos, não podíamos correr mais riscos, mesmo porque só a poluição ambiental (poeira) exije o uso desses equipamentos.

2) Apresentação das rotinas que deveriam ser seguidas no momento da higienização, como: técnicas de higienização mecânica de livros, tipos de publicações, retirada das estantes e transporte das obras, troca de amarras, arrumação nas estantes e recolhimento dos fragmentos, e orientações quanto a coleta de dados quantitativos.

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6. A distribuição do acervo.

6. / - Biblioteca de Manguinhos possui dois pavimentos: Io andar : Hall (recepção), salão de periódicos correntes de livre acesso (últimos 5 anos), sala de bases de dados (cd-rom), salão de referência (obras impressas), setor de livros, setor de comutação bibliográfica, livraria, setor de processamento técnico, administração e laboratório de conservação. 2o andar : Armazém A - acondiciona publicações periódicas anteriores aos últimos 05 (cinco) anos, em ordem alfabética da letra A até I. Armazém B - acondiciona publicações periódicas anteriores aos últimos 05(cinco) anos, em ordem alfabética da letra J até Z.

7. Metodologia

7.1 - A descontaminação do acervo foi realizada em duas fases: 1) Realizada no local, ou seja, sem a retirada das obras das estantes. Foi usado apenas aspirador especial com a potência reduzida que possui filtro de água, onde o excesso de fungos das partes externas da obra ficasse retido. Para que não houvesse nenhum comprometimento ao meio ambiente, o resíduo era armazenado em recipientes próprios para ser eliminado no autoclave no Laboratório de Micologia Instituto Oswaldo Cruz/FIOCRUZ, e só após este processo era liberado no esgoto. 2) Nesta momento as obras foram higienizadas volume por volume apenas nas partes externas, como: capa, bordas, lombada, folhas de guarda e de rosto. Utilizou-se escova e pincel macio, com movimentos leves, sem friccionar os documentos, no sentido de baixo para cima, em mesa própria de higienização de livros. Como não tratava-se apenas de poluição ambiental, mas também de microorganismos, foi adaptado à mesa, uma caixa filtrante que possui três lâmpadas de ultra-violetas dispostas em forma de labirinto. O ar era remanejado para a caixa, que processava a filtragem, eliminando assim, as impurezas, esta caixa possui um tubo flexível que permite a saída do ar filtrado para o meio ambiente.

Neste momento, aproveitando o manuseio de todo acervo, foi possível corrigir outras falhas como:

Troca de amarras - Efetuamos a troca de amarras de barbante para cadarços de algodão crú de 1,5cm de largura, mais indicado para preservar a obra. Folga entre os volumes - Ao repor as publicações nas estantes, foi respeitado a folga entre os volumes, para facilitar a retirada e favorecer a ventilação entre as obras, evitando assim, a superlotação nas estantes. Remanejamento das prateleiras - As prateleiras foram remontadas conforme o tamanho de cada publicação. Fragmentos - Todos os fragmentos foram recolhidos, para posterior identificação e pequenos reparos e assim resgatar às obras o maior número de informação possível.

Após o término da segunda fase, reiniciamos imediatamente a higienização mecânica de manutenção folha a folha, que será contínua.

7.2 - A descontaminação do ambiental também foi realizada em duas fases: 1) De imediato, retirou-se todo o excesso de sujidade do ambiente, com pano ume-decido com água pura e imediatamente com a mistura de água e álcool na proporção de 50%, para qse o álcool, com o poder de evaporação rápida que possui, impedisse mais umidade no ambiente. Em nenhum momento utilizou-se vassouras para varrer o ambiente, para que a sujidade não fosse dispersa e acabasse depositada em outro local.

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2) Após a segunda fase de higienização do acervo, foi iniciada a nova higienização do ambiente, desde de divisórias, pilastras, piso, mesas e cadeiras, que foram completamente higienizados com a mesma mistura, que tornou-se rotina para Biblioteca de Manguinhos para a área de acervo. Finalizando a higienização, utilizou-se também um processo de fumigação, de produto autocomburente atóxico, fungicida e bactericida, para atingir os locais de difícil acesso como frestas de portas e janelas.

8. Dados quantitativos das publicações higienizadas

Periódicos de livre acesso 36.910 Obras de referência 38.999 Livros 28.372 Periódicos (armazém A) 230.976 Periódicos (armazém B) 267.893 Proc. téc. e Duplicats 17.182 Total geral 620.332

9. Conclusão

Em 98 anos de existência, a Biblioteca de Manguinhos nunca vivenciou situação semelhante. Apesar de todas as dificuldades, a preocupação da equipe foi sempre não adotar medidas precipitadas ou duvidosas que pudessem comprometer ainda mais a integridade física do acervo. Mesmo com o transtorno de ser preciso manter fechada a Biblioteca de Manguinhos por 04 (quatro) meses, sentiu-se um certo alívio, por não se perder nenhuma publicação, devido a esse acidente ambiental, e não ter sido desenvolvido problema alergênico em nenhum funcionário. Após a segunda fase de higienização, a Biblioteca de Manguinhos conseguiu um excelente resultado, eliminando por completo o ataque de microorganismos. Os níveis de temperatura e umidade relativa estão mais controlados, porém ainda não atingimos o padrão ideal, atualmente estão em média 22°C de temperatura e 70% de umidade relativa, devido o sistema de refrigeração estar em reparos. A equipe da Biblioteca de Manguinhos acredita ser de vital importância que empresas de refrigeração, especializem-se em climatização de ambientes que abrigam acervos, para que situações idênticas não ocorram em outras instituições. Independente de ter ocorrido esse acidente, encontra-se em fase de implantação o Laboratório de Conservação Preventiva de Documentos da Biblioteca de Manguinhos, para podermos adotar procedimentos de diagnóstico e cuidados permanentes de conservação do acervo.

10. Bibliografia

BECK, Ingrid.(coord.) Caderno técnico : emergências com pragas em arquivos e bibliotecas. Rio de Janeiro : Arquivo Nacional , 1997. 40p. (Projeto conservação preventiva em bibliotecas e arquivos)

BECK, Ingrid.(coord.) Isopermas : uma ferramenta para o gerenciamento ambiental. Rio de Janeiro : Arquivo Nacional, 1997. 24p. (Projeto conservação preventiva em bibliotecas e arquivos)

BECK, Ingrid. Manual de preservação de documentos. Rio de Janeiro : Arquivo Nacional, 1991 75p.

GUARNIERI, Alice Camargo. Biodeterioração na biblioteca. In: SEMINÁRIO SOBRE PRESERVAÇÃO DE BENS CULTURAIS, 1989, São Paulo. Anais ... São Paulo : USP, Sistema Integrado de Bibliotecas, 1989 107p. p.1-15.

LUCCAS, L., SERIPIERRI, D. Conservar para não restaurar: uma proposta para preservação de documentos em bibliotecas. Brasília : Thesaurus, 1995 128p.

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Resumo da autora

Bacharel em Biblioteconomia e Documentação pela Universidade do Rio de Janeiro, 1992. Realizou os seguintes cursos na área de preservação de acervos bibliográficos e documentais: Curso Conservação, Restauração e Encadernação de Livros e Documentos na Fundação Biblioteca Nacional, 1995. Estágio em Conservação de Documentos no Arquivo Nacional, 1996. Curso de Restauração de Papel III no Museu Histórico do Exército, 1998.

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Abstract

This paper describes the desinfestation of the first residence of the Juscelino Kubitschek, who was the Brazilian president in 1956, during the construction of BraziPs capital — Brazilia. The building treatment was down using eight tons of carbon dioxide. It was the first that the gas technique was applied to fumigate a entire bujlding. The desinfestation occurred in June 1996.

Controle de Pragas: Preservação do Patrimônio Cultural

com Atmosferas Modificadas

A Desinfestação do Catetinho

Richard E. Trucco — in memorian Cientista/Restaurador - Museu Imperial, Petrópolis, RJ

José Amilton Santana White Martins

Claudia Regina Nunes Chefe do Lab. de Cons. e Restauração - Museu Imperial, RJ

Apenas nos últimos sete anos, as comunidades responsáveis pela Preservação e Conservação do Patrimônio Cultural vem apresentando uma diferente atitude e consciência ao respeito de combate a pragas que infestam os bens culturais móveis e imóveis. A questão não resume-se em fumigar uma coleção inteira cada 5 anos. A solução na realidade é um trabalho diário e contínuo de gerenciamento de pragas. Dos insetos, os térmitas, também conhecidos comumente como cupins, destacam-se pelo grande prejuízo ocasionado, atacando e destruindo edificações, florestas e até a agricultura. Existem mais de duas mil espécies de cupins no mundo, mas só algumas dúzias são prejudiciais ao homem, e destas as de maior estrago não são originárias do Brasil ' . Em particular, o cupim de solo asiático (Coptotermes havailandi) vem destruindo edificações em São Paulo e Rio de Janeiro, e os cupins de madeira seca (Criptotermes brevis) concentram-se mais em objetos e peças de madeira. Segunda a APRAG, Associação Paulista dos Controladores de Pragas Urbanas, devido à alarmante proliferação e ao arrasante poder destruidor destes insetos, o cupim será a praga do ano 2000.

As técnicas mais efetivas no combate as pragas são as que utilizam os meios gasosos, pois a diferença à técnica de extermínio baseado em aplicações líquidas (veneno dissolvido em solventes orgânicos)é de que o gás penetra na totalidade do material do objeto, sempre que se der o tempo necessário para obter uma difusão molecular completa e homogênea. Mas estas técnicas não deixam resíduos preventivos que possam proteger os objetos de futuros ataques de insetos e portanto quando for necessário e possível, esta técnica deve ser complementada com uma aplicação de um inseticida residual ( organofosforado ou piretróide) aplicado via líquida. Por outra parte, em poucas situações , as técnicas de fumigação gasosas conseguem atingir os cupins de solo, desta maneira outra metodologia deve ser utilizada usada.

As comunidades científicas voltadas à preservação de grãos e sementes oleosas começaram a procurar métodos de controle de ptagas que não tivessem resíduos tóxicos ou impacto no meio ambiente, devido aos severos danos ambientais derivados das práticas adotadas, os governos dos Estados Unidos e países da Europa começaram a restringir e proibir o uso de muitos fumigantes agrícolas e urbanos. Inúmeras pesquisas e trabalhos tem-se concentrado no uso de técnicas alternativas de fumigação2, nos últimos 20 anos. Verificou-se que alterando as condições vitais dos insetos, seja temperatura, composição química do ar, umidade relativa, pressão, etc, eles eram efetivamente eliminados sem o uso de tóxicos. É aqui onde surge a fumigação com Atmosferas Modificadas. A atmosfera que envolve o material infestado é modificada, fazendo tornando-a quimicamente diferente ao que nós e os insetos respiramos.

Os gases efetivos nesta prática de fumigação com atmosferas modificadas são o nitrogênio (N2), o argônio (Ar) e dióxido de carbono (CO)2 O nitrogênio e o argônio

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FIG 1 - Richard E. Trucco em frente ao Palácio do Catetinho embrulhado durante a desinfestação

FIG 2 - José Amilton Santana e Richard E. Trucco em frente ao Palácio do Catetinho embrulhado para a desinfestação

são usados para criar uma atmosfera sem oxigênio, matando assim os insetos por asfixia. Dependendo principalmente do percentual de oxigênio e da temperatura, os tempos necessários para obter 100% de mortalidade das espécies prejudiciais é de 8 a 28 dias de exposição. O gás carbônico, usado em concentrações entre 45 a 65% também é altamente eficaz, e acredita-se que elimina os insetos por um lento processo de intoxicação do sistema circulatório. A diferença entre as duas técnicasé de que a fumigação com C 0 2 é mais lenta, precisando de 2 a 10 dias a mais de exposição para as mesmas condições, porém,é bem mais econômico e tecnicamente viável em situações de grande escala.

A utilização de atmosferas modificadas vem sendo usada e aprovada por vários museus de alto calibre no mundo inteiro. Além de serem métodos sem perigo tóxico para o homem e o meio ambiente, o uso de atmosferas anóxicas e de dióxido de carbono não reagem químicamente com os objetos em tratamento. Alguns fumigantes gasosos usados convencionalmente (oxido de etileno, vikane, metil de bromido, timol) em várias situações danificam ou alteram o material do objeto histórico infestado.

Como muitas edificações históricas no Brasil, o Palácio do Catetinho, primeira residência presidencial do ex-presidente Juscelino Kubitschek de Brasília encontravam-se seriamente infestado por cupins de madeira seca e subterrâneo, e em menor escala, brocas de madeira. Após dez dias de construção, o Catetinho (palácio de tábuas) foi finalizado em 31 de outubro de 1956. A construção da nova capital do Brasil, Brasília, teve suas primeiras diretrizes desta provisória edificação em madeira. Os quatro prédios independentes que compõem o complexo do museu do Catetinho: o palácio do Catetinho, a casa do zelador, o bar Buriti e o refeitório, foram tombados pelo IPHAN em 1959.

Como parte do projeto de restauração e revitalização do museu do Catetinho, patrocinado pela Fundação Roberto marinho, o Governo do Estado, a empresa White Martins e a Federação de Comércio do DF, a fase de descupinização das edificações usou a inédita técnica com gás carbônico. Os quatro prédios foram "embrulhados" com plásticos de PVC flexível fabricados no tamanho de cada um, por um período 15 a 20 dias.

500 kg de plástico flexível foram usados para embrulhar os prédios do museu e vários cuidados foram realizados antes de colocar o plástico para diminuir ao máximo possíveis fontes de vazamento. Alias os prédios forem cobertos com papelão em cantos, pontas e áreas onde o plástico poderia ser danificado ou rasgado. O plástico foi colocado por inteiro, cobrindo os prédios com uma sobra para o chão. Esta sobra de PVC foi vedada no cimento na maioria dos casos com silicone.

Para criar uma concentração de aproximadamente 60% de gás carbônico num certo volume lacrado, requer um volume de gás igual ao volume que deseja-se ser tratado. Devido ao grande volume de C 0 2 , necessário para o tratamento, foi instalado um tanque de abastecimento (capacidade de 8 toneladas) com o respectivo sistema de vaporização( converte co2 líquido gasoso) e alimentação nos prédios. A distribuição homogênea do gás foi garantido com um sistema de alimentação com vários pontos de saída e circuladores de ar funcionando no interior das "bolhas". Vários pontos de monitoramento foram colocados para registrar a concentração percentual de dióxido de carbono e oxigênio, podendo assim manter a concentração desejada. Mais de 450 metros de mangueira cristal foram usados, e um painel com um sistema de válvulas e medidores de pressão permitiu um fácil controle de fornecimento do gás e monitoramento do sistema.

Segundo a média de temperatura que foi registrado durante este tratamento, os prédios precisaram de 18 a 20 dias de exposição a uma concentração de 45 a 65% de C 0 2 . Este tempo de exposição recomendado é para eliminar todas as fases (ovos, larvar, ninfas, adultos) dos insetos que atacam materiais orgânicos. Acredita-se que os cupins morram bem antes deste tempo. Foram adicionados três dias a mais para garantir uma boa penetração do gás no interior da madeira.

Após 24 horas de aplicação o gás carbônico em cada prédio, uma grande quantidade de formigas foram achadas mortas na superfície interna do plástico, também

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observou-se cupins alados, presos no plástico tentando fugir da ação do C 0 2 . Estes sinais anteciparam alta eficácia do método.

Conclusão

As dificuldades que surgiram durante a realização deste trabalho foram facilmente superadas por Richard e Santana. A desinfestação foi um sucesso e foram necessários 8 toneladas de dióxido de carbono.

A partir desta experiência, juntamente com técnicos da White Martins (José Amilton Santana e Marco Antônio) estamos desenvolvendo testes em vários materiais diferentes (ouro, prata, cobre, papel, pigmentos, madeira, tecido, e t c . ) com o objetivo de substituirmos o nitrogênio por dióxido de carbono na técnica de desinfestação de obras de arte, devido ao alto custo do nitrogênio.

A desinfestação do conjunto arquitetônico museu do Catetinho foi realizada no período de abril à junho de 1996 e foi o último trabalho de Richard E. Trucco, e sem dúvida o seu maior desafio.

Arte era a grande paixão de Richard , e embora tenha dedicado-se apenas uns poucos anos à área da Conservação/Restauração, deixou um imenso legado, o qual muitos não teriam conseguido realizar tanto em tão pouco tempo.

Agradecimentos

Claudia R. Nunes agradece a White Martins por Ter convidado Richard E. Trucco a executar este trabalho, e especialmente a José Amilton santana que acompanhou Richard nesta importante experiência e no tempo por ele dispensado para contribuir na redação deste trabalho, o qual foi baseado em anotações deixadas por Richard Trucco. Os autores agradecem também a ABRACOR pela oportunidade de publicação deste trabalho.

Notas de Referência

1 Menezes, 1995 2Jay 1971, 1984

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FIG 3 - Palácio do Catetinho com o tanque de oito tóoneladas que foi instalado pela White Martins

FIG 4 - Toda a equipe que participou da desinfestação do Palácio do Catetinho

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Anais da ABRACOR - Ciência da Conservação IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

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Autores

Richard E.Trucco graduou-se como mestre em Física da Universidad Nacional da Córdoba, Argentina (FaMAF) em 1987. Imediatamente, foi contratado por General Applied Science Laboratories, Ronkonkoma, New York, como Cientista Pesquisador. Ali desenvolveu trabalhos nas áreas de adquirição de dados, análises numérico, diagnóst ico da dinâmica e combus tão de fluxos hipersônicos com lasers, processamento de imagens, instrumentação e termometria infravermelha; sendo quase todos estes projetos realizados para a NASA Langley R.C. Possui mais de 27 publicações técnicas. Começou a dar consultoria com Fodera Fine Art Conservation, new York, desde 1990 e a estudar Conservação/Restauração com cursos de pós-graduação (NYU, MIT), etc). Em 1992, abriu uma firma de restauração com o mestre restaurador russo Valerian Yakimov. Em 1994, veio para o brasil com Cientista Pesquisador VisitanteEstangeiro através do CNPq, para desnvolver atividades no Museu Imperial na área de atmosfera controlada e dando assistóencia as atividades de restauração e conservação da instituição. Foi o idealizador e fundador da firma Maçarandubd Conservação e Restauração de Arte Ltda. Faleceu em fevereiro de 1997.

José Amilton Santana de Mello — é técnico especialista em gases e em combustão da White Martins.

Claudia R. Nunes é Bacharel em Pintura pela Escola de Belas Artes/UFRJ em 1985. Pós-Graduada em Conservação de bens Culturais Móveis pela Escola de Belas Ar tes /UFRJ em 1989, Mestre em Conservação e Restauração de Tecidos e Indumentárias pelo fashion Institute /State University of New York em 1991. Além de ter trabalhado três anos no He Metropolitana Museu of. At, onde ganhou duas Fellowships (Graduate Student-1992 e The Polaire Weissman- The Costume Institute-1992) e por último foi Assistent Conservator no Upholstery Lab /Ob jec t s Conservation Department —1993), trabalhou também no Museum of American Folk Ar t /New York, ATTATA Foundation/New York e Merchant's House/New York. Participou de cursos de especialização de Conservação de Têxteis organizados pela OEA e estagiou no Laboratório de Cons. e Restauração da Fundação casa de Rui Barbosa. Foi presidente da ABRACOR no biênio 92/94. Atualmente, é chefe do Lab. de Cons. e Restauração do Museu Imperial e consultora do Maçaranduba Conservação e Restauração de Arte Ltda.

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A Secagem da Múmia de Hori do Museu Nacional da Quin

ta da Boa Vista

João Carlos Ferreira Museólogo - Museu Nacional/UFRJ

Regina Maria Macedo Costas Dantas Historiadora - Museu Nacional/UFRJ

Richard Esteban Trucco — in memorian Cientista/Restaurador — Museu Imperial, Petrópolis, RJ

José Amilton Santana de Mello Técnico - White Martins

Claudia Regina Nunes Chefe do Lab. de Cons. e Restauração — Museu Imperial, Petrópolis, RJ

Durante o fim de semana de 19 e 20/08/1995 chovera muito forte no Rio de Janeiro. Foi dito na imprensa que o índice pluviométrico fora bastante superior ao normalmente registrado no período.

Ao chegar ao Museu Nacional no dia 21 de Agosto de 1995, na qualidade de responsável pelo SEMU-Serviço de Museologia do Museu Nacional, tomamos conhecimento de que alguma coisa errada havia se passado durante aquele fim de semana, com conseqüências desastrosas. Tendo sido contactada a Diretora da unidade, Prof. Janira Martins Costa, que lá teria comparecido no Domingo, a fim de inteirar-se da situação e tomar providências. Entretanto, os setores e departamentos permanecem fechados no fim-de-semana, não permitindo que se percebesse que haviam ocorrido danos também nestes locais. A parte visivelmente danificada era a exposição, mas a chuva havia atingido também o piso térreo, onde estavam localizados diversos setores e seus respectivos acervos. Os danos restringiam-se ao bloco dos fundos, onde estava em andamento a segunda parte da recuperação do telhado do Museu. Segundo os responsáveis no local pela firma PREMEN, encarregada das obras do telhado, o que teria acontecido é que a chuva, teria feito ceder uma parte do sobretelhado de proteção jogando toda a água acumulada de uma vez só sobre uma calha antiga de cobre, que também não resistiu, permitindo que a água penetrasse no piso do terceiro pavimento. Notoriamente dois Departamentos, o de Geologia e Paleontologia, quase que totalmente, e parte do Departamento de Antropologia, com seus diversos setores, incluindo o setor de arqueologia, onde estava guardada a Múmia que acabou ficando tão negativamente famosa.

No Setor de Arqueologia a água suja penetrou em dois armários de metal e vidro com três níveis, que achavam-se encostados pela parte traseira, e onde achavam-se guardadas grande quantidade de peças da Coleção Egípcia do Museu Nacional1 não expostas, incluindo aí a "múmia de Hori"2 que ficou parcialmente imersa em cerca de 10 cm de água suja, por pelo menos 24 horas. Além desta, havia um desenho realizado sobre cartonagem, representando uma deusa alada, uma múmia de gato, uma múmia de criança, estatuetas diversas em cerâmica vitrificada azul (imitando lápis-lazúli) e também em madeira policromada, vasos de cerâmica e alabastro, entre outras. A múmia, que estava colocada sobre um plástico e uma tábua, posicionada ao longo do corpo, foi assim retirada da vitrine onde se encontrava, e levada pelo próprio pessoal do Setor de Arqueologia, para uma grande mesa existente nos fundos do Setor. O encharcamento tornou a "peça" flexível, e havia o risco de esface-

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FIG 1 - João Medeiros, Regina Dantas e Cláudio Prado colocando a múmia de Hori no caixa logo após o encharcamento — Fotografia Olga Caldas

lamento e dano irreversível, caso fosse movida naquele estado. O restante das peças, de tamanho menor, foi

espalhado por sobre as mesas do Setor de Arqueologia. Naquele momento, apesar das mais diversas sugestões não se sabia o que decidir e fazer. Existia ainda o risco da chuva atingir novamente aquelas salas do bloco dos fundos, causando um novo encharcamento3. Partindo da certeza que, se nada fosse feito, as peças sofreriam dano irreversível, resolvemos tomar a frente dos trabalhos, mesmo sem esperar o investimento oficial, coordenando os esforços e tomando medidas para as providências mais imediatas: Foi oferecido ao Setor de Arqueologia para o armazenamento das peças a sala do Semu, pois esta não havia sido danificada pela chuva.

O material mais fragilizado, foi espalhado por sobre as três mesas existentes no setor, como também foi feita às pressas pela empresa Premem uma caixa de madeira, cujas medidas, determinadas por nós, eram de 2,00 m de comprimento, por 0,70 m de largura, no formato de uma espécie de "ataúde", para que a múmia pudesse ser transportada com o menor abalo possível para fora do local. Concluída a caixa, colocamos a múmia dentro da mesma, utilizando a tábua que havia por baixo, para movê-la com mais firmeza.

Uma das primeiras preocupações surgidas foi imaginar de que forma seria seco este fragilizado material. De forma um pouco intuitiva, pensamos que a secagem da múmia deveria ocorrer de forma gradual e lenta; mas também, não tão lenta que permitisse o aparecimento demasiado de microorganismos. Correríamos o risco de ver na peça, uma rápida proliferação de bactérias e fungos, que seria incrementada sob a ação de calor direto e intenso. Sendo a peça um material ideal para fomentar-se uma cultura de bactérias, devido à presença exclusiva de material orgânico4, o calor direto deveria ser evitado. Foi imaginado, para a parte de baixo que ficaria em contato com a caixa de madeira, uma espécie de "colchão" de espuma, coberta com papelão corrugado, de forma a começar a absorção da umidade superficial nesta parte baixa5. Para a parte superior, colocamos a caixa com a peça no chão, sob a ação de um ventilador de teto, que ficou ligado todo o tempo, na posição de aspirar, além de um outro ventilador de pé, acionado na direção longitudinal da caixa, dos pés da múmia para a cabeça. A idéia era de que, enquanto se discutisse qual seria a medida ideal a tomar, a peça começasse a perder umidade. O ventilador de pé sopraria ao longo da superfície da peça, retirando alguma umidade, que seria aspirada pelo ventilador de teto e jogada para fora da saleta através da abertura superior da divisória. A presença destes ventiladores foi um pouco menosprezada pela mídia, mas no dia seguinte, realmente a peça mostrou sinais de clareamento na superfície do tecido, demonstrando que a idéia da secagem superficial havia funcionado. Entretanto, era óbvio que para a remoção da umidade mais profunda da peça, simples ventiladores não seriam suficientes.

Uma vez que a sala inicialmente utilizada para abrigar o material fora da área de risco não era ideal, procedemos então, ao transporte de todo o material da coleção egípcia afetado, para uma sala no segundo piso.

Quanto à secagem da múmia, a primeira sugestão que ouvimos era a secagem com secador de cabelo, mas o calor intenso e direto só faria queimar e destruir definit ivamente as fibras de l inho e incrementar o rápido crescimento de microorganismos, além de não promover uma secagem interna. Surgiram depois as idéias mais estapafúrdias e bizarras; mas na ocasião, tudo era avaliado. Como destaque, haviam duas sugestões, que mostraram-se inexequíveis. Uma, seria a colocação da múmia e outras peças numa câmara Hiperbárica, como aquelas utilizadas para a descompressão de mergulhadores, criando ali, uma atmosfera inócua, beirando o vácuo total, ou com gás inerte, de forma a coibir a proliferação de microorganismos. A outra, seria levá-la à uma outra Câmara existente na Ilha do Fundão/UFRJ, que servia para conter experimentos como culturas de bactérias. N o primeiro caso, o deslocamento até a Base Naval em Niterói, implicaria nos riscos de abalo abrupto durante o transporte; e além disso, colocar uma peça tão frágil sob pressão ou vácuo não parecia uma boa idéia. No segundo caso, a câmara não teria espaço suficiente

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FIG 2 - Técnico da Munters, Mene2es, Richard Trucco , João Medeiros e Cláudio Prado, colocando termihigrografo na caixa. Fotografia Olga Caldas

para abrigar a peça dentro da caixa de madeira, o que implicaria em retirá-la. O abalo físico poderia esfacelar a peça. O Arqueólogo e Egiptólogo Cláudio Prado de Melo prontificou-se à contactar alguns pesquisadores estrangeiros e Museus internacionais, visando obter-se informações sobre qual seria o tratamento ou providência mais adequado.

De um modo geral, as diversas respostas que obtemos por Fax, mostravam não haver precedente mundial para tal tipo de encharcamento, pelo menos no grau elevado ocorrido no museu Nacional. A partir deste momento, ficou patente que, se nada fosse feito, a perda seria total. Como o tempo estava passando, partimos de uma premissa lógica: Sem providências, a perda seria certa. Portanto, qualquer grau de recuperação acima da perda total seria aceitável. Passamos então, a consultar desesperadamente a bibliografia trazida por Cláudio Prado, tentando obter alguma idéia ou procedimento técnico para este caso.

Apareceram representantes das firmas Munters e MacLan, que cederam seus equipamentos por empréstimo, sem ônus ao Museu Nacional. Como esta sala podia ser fechada, foram colocados dois desumidificadores, que ficaram ligados, de forma a diminuir a umidade relativa naquele ambiente, e consequentemente secar tanto a múmia, como as outras peças.

Após dois dias sob a ação dos desumidificadores, a peça apresentava sinais de haver perdido boa parte da sua umidade, mas outra preocupação nos abalava: a possibilidade de a múmia entrar em colapso. Segundo nos foi explicado por Cláudio Prado, durante o processo de mumificação, as múmias eram evisceradas, sendo alguns de seus órgãos conservados à parte, em vasos "canopos" ou "canópicos"6 . Para preencher a cavidade abdominal, os egípcios originalmente utilizavam diversos recursos, tais como bolotas de linho ou de argila, entre outros, de forma à conservar mais ou menos o volume original do corpo. Com a umidade, qualquer que fosse o material, também seria danificado. Realmente, a múmia já vinha apresentando sinais de perda de volume, e com a deterioração visível da pele, os ossos poderiam desarticular, o que parecia estar acontecendo7. O tórax e abdômen da múmia apresentavam-se a cada dia mais murchos, e temíamos que a peça deixasse de ser realmente uma múmia egípcia, para se transformar num reles "pacote" de ossos desarticulados.

Neste momento, como que "caídos do Céu", chegaram ao Museu Richard Trucco e Cláudia Nunes, dois técnicos do Museu Imperial. Os dois foram informados do caso pelo Dr. R. Fernandes - Chefe do Setor de Tecnologia da White Martins, que tomou conhecimento através da imprensa. A idéia principal era a utilização de Nitrogênio, para desinfestar as peças. Esta técnica, sobre a qual já tínhamos tomado conhecimento, vinha sendo utilizada no Museu Imperial para desinfestação dos móveis de madeira do acervo. Consistia basicamente, em envolver-se as peças afetadas com um plástico especial, com uma porosidade menor que a do plástico comum, e injetar Nitrogênio no invólucro, vedando-o, e deixando as peças envolvidas nesta atmosfera por algum tempo. Este tipo de trabalho caía como uma luva para nossas necessidades, primeiro, porque o invólucro poderia se adaptar à forma e tamanho da peça, ao contrário de uma Câmara; e também, porque poderia vir até o local da peça, sem que houvesse necessidade de transportá-la para fora do Museu. Concordamos prontamente com o oferecimento deste serviço, que seria executado pelos dois técnicos do Museu Imperial. Para sua realização, foram trazidos ao Museu diversos cilindros de nitrogênio e uma unidade de processamento de atmosferas controladas ( a mesma estação móvel utilizada para os trabalhos de desinfestação de obras de arte com ni trogênio) , cedidos pela firma White Martins, e dois termohigrografos cedidos pelo Museu Imperial.

Conforme a consulta à bibliografia existente, a faixa ideal de condições ambientais para objetos arqueológicos é de 20 a 25° a uma umidade relativa de 45 a 55% 8 , e que abaixo de 35% de UR os componentes dos tecidos começam a debilitar-se por ressecamento. Por outro lado, recentes estudos tem mostrado que o nitrogênio não só é fungiestático, mas também usando-se uma combinação com baixa umidade

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relativa, nas proximidades de 43%, esta atmosfera modificada reduz a colônia de fungos e bactérias a níveis depreciáveis após vinte e um dias de exposição ao nitrogênio. Foram colocados dois termohigrógrafos, que mediram as condições atmosféricas dentro do albergue da múmia. Estas resultaram ser extremas, 38%°C com 15% de umidade relativa.

Portanto, decidiu-se desligar imediatamente o desumidificador e conectar um fluxo contínuo de nitrogênio umidificado, entre 2 a 3 litros/min.. Desta maneira realizaram-se duas coisas simultaneamente, a secagem controlada sem riscos de ocorrer maior deterioração do frágil objeto e eliminar a possibilidade de proliferação de fungos. Depois de umas oito horas, a temperatura desceu a 28°c e a UR subiu a 40%. Estas condições mantiveram-se aproximadamente por meio da unidade de processamento de atmosferas constantes por uma semana. Uma exposição mais longa teria sido necessário para poder realizar um controle dos microorganismos hospedados na múmia, mas o tempo foi suficiente para realizar uma secagem controlada.

O contato direto que a diretora Janira M. Costa mantinha com o Consulado Francês, através de seu adido cultural, Sr. Romaric Sulger Buel, fez com que este providenciasse a vinda de uma química francesa, Sra. Marie Odile Kleitz no dia 30 / 08. Nos primeiros dias, tratamos de informar à Sra. Odile todos os detalhes do que havia se passado até aquele momento, e esta aprovou totalmente os procedimentos seguidos até aquela etapa, inclusive elogiando a presteza das medidas tomadas, diante das circunstâncias calamitosas. Neste momento, chegaram também os resultados da análise das amostras de tecido da múmia, realizados pelo Professor Francisco Portela, e que chamava a atenção para a "existência de inúmeras bactérias patogênicas, com risco grave para a saúde dos envolvidos ", recomendando um cuidado redobrado ao lidar com o material, que já estava contaminado.

Constatando que a múmia já se encontrava totalmente seca, os procedimentos da química francesa, diferiram neste item do executado pelo pessoal do Museu Imperial, que pretendiam manter a múmia constantemente em uma atmosfera controlada, tendo então, à partir daí, dois objetivos básicos: rehidratar um pouco a múmia, sobretudo as fibras do tecido; e garantir sua desinfecção, esterilizando a peça para evitar o ataque contínuo por microorganismos. O primeiro procedimento dizia respeito principalmente em relação ao tecido, que já vinha se esfacelando facilmente desde o primeiro dia, e que, ao secar tornava-se um pouco rígido e ainda mais frágil, como se estivesse engomado devido à água suja da chuva e ao próprio material utilizado para embeber as tiras de tecido durante o processo de mumificação. A rehidratação, de uma maneira gradual, poderia eventualmente devolver parte da elasticidade perdida às fibras. Para isto, foram colocados dois sachês embebidos em água filtrada, um em cada canto da caixa, permanecendo ali por alguns dias.

Em seguida, deveríamos desinfectar a peça. Para tanto, um dos primeiros procedimentos foi retirar a múmia da caixa de madeira, com todo cuidado, para cima da mesa de fórmica, envolvendo-a em uma embalagem plástica feita sob medida. Na continuação desta embalagem, próximo ao pé da múmia, improvisamos um banco de madeira, onde foi colocado o produto químico para criar uma atmosfera esterili-zante dentro da embalagem plástica, que foi depois fechada, permanecendo assim por cerca de dois dias e meio. Enquanto isso, realizamos uma intervenção na caixa de madeira que continha a múmia. Por instância de Odile, idealizamos uma espécie de maça suspensa, de forma à permitir a livre circulação do ar em todas as faces da peça. Dentro da caixa, foi feito um apoio à meia altura, de forma que esta "maça", contendo a múmia, ficasse ali fixada por encaixe. A vantagem desta disposição era a de que, se fosse necessário mover novamente a caixa com a peça, a rede de filo sob a múmia amorteceria parte dos abalos, além de permitir a circulação do ar também no dorso da múmia, que de outra forma ficaria em contato com o fundo da caixa. Isto feito, a caixa de madeira foi revestida internamente com um plástico especial microporoso transparente. Uma vez desinfestada, a múmia foi colocada sobre a "maça", e daí inserida novamente na caixa. Recolocamos as tampas de acrílico, que

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FIG 4 - Múmia dentro da caixa colocada sobre a maça, pronta para retornar ao setor de Arqueologia. Fotografia Olga Caldas

foram vedadas na borda da caixa com uma fita adesiva de alta adesão. Ainda segundo recomendação de Mme. Odile, de tempos em tempos deveriam ser trocados os saquinhos com sílica gel, instalados por baixo da múmia no momento do fechamento da caixa. Para isto, utilizamos os orifícios por onde entravam os tubos dos aparelhos de desumidificação, nos cantos das placas de acrílico, que foram lacrados por um outro tipo de plástico microporoso, de cor prateada e aparentemente mais espesso, e por onde poderia ser acessado o interior da caixa, sem a necessidade de remover as placas acrílicas. Esta manutenção posterior ficaria à cargo dos responsáveis pelo acervo, no próprio setor de origem, e não podemos dizer se foi seguido à risca.

Passados mais de um mês, desde a constatação da inundação, o material pôde voltar ao setor de origem. Concluída esta etapa, consideramos terminado nosso trabalho e responsabilidade em relação à Múmia de Hori.

Conclusão

Embora houvesse sofrido de fato, danos consideráveis e irreversíveis, as peças e não só a múmia, poderiam ter se perdido completamente, não fosse o trabalho realizado pelo SEMU. Considerando-se ainda, que não existe restauração satisfatória para múmias, uma vez que estas entrem em colapso, e que sua recuperação é praticamente impossível, conseguimos um resultado bastante satisfatório com este trabalho. Não pudemos fazer uma avaliação posterior do estado da múmia e das outras peças, pois seu cuidado ficou novamente à cargo do Setor de Arqueologia. Naqueles dias, até o final do tratamento, foi importante o espírito de equipe e boa-vontade, e há que se destacar o empenho de todos, que procuravam ajudar de alguma maneira. Os trabalhos prosseguiram por pouco mais de um mês, começando pela manhã, e prosseguiam ao longo do dia, até altas horas. Entretanto, existe o hábito em nosso país de achar que tudo o que é estrangeiro é melhor, o que nem sempre é verdade. A imprensa, que acudiu ao Museu desde o primeiro momento, viu na chegada da química francesa o seu ponto alto de interesse e importância. Entretanto, o trabalho de Mme. Marie Odile Kleitz, começou somente algumas semanas após o início da inundação, correspondendo de um modo geral, à segunda etapa de todo o trabalho realizado. No que pese o preparo técnico e a simpatia pessoal da química francesa, e sem querer diminuir sua importância, temos de ressaltar enfaticamente, o trabalho realizado antes de sua chegada, tanto as modestas iniciativas que tomamos, até o trabalho dos técnicos do Museu Imperial e da White Martins. Sem este trabalho fundamental, não haveria múmia para ser tratada por Odile.

Agradecimentos

Agradecemos à equipe montada às pressas pelo SEMU que não só teve a iniciativa e o discernimento necessários, num primeiro momento, como também, à partir da chegada do pessoal externo ao Museu, trazendo um conhecimento técnico mais aprimorado, foi capaz de responder à altura, realizando com muita inventividade, procedimentos técnicos para os quais ninguém estava preparado e para os quais não haviam precedentes. Foram bastante importantes as "dicas" em relação à condição geral da múmia, passadas a nós pelo Arqueólogo e Egiptólogo Cláudio Prado de Melo. Destacamos também, em vários momentos, a atuação de funcionários do Museu, como a de Luís Carlos de Menezes. Oficialmente lotado como vidraceiro, o "Menezes" na verdade ajudou em vários momentos, não só na sua especialidade, mas inclusive executando com agilidade e bom acabamento, a estrutura em madeira que sustentaria a "maça" no interior da caixa que continha a múmia. Além deste, devemos agradecer também, a Olga Caldas fotógrafa do Museu e aos 11 alunos do curso de graduação em Museologia, que procederam sempre com muito cuidado em relação ao acervo do

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Anais da ABRACOR - Ciência da Conservação IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

Setor de Arqueologia, sob nossos cuidados.

N o t a s de referência

1 A primitiva coleção Egípcia doMuseu Nacional foi comprada e doada ao Museu por D. Pedro I, em 1827, de um comerciante chamado Nicolau Fiengo, que pretendia originalmente vendê-la na Argentina. Como aquele país encontrava-se em Guer-ra(?), o navio deteve-se no porto do Rio de Janeiro. Sabendo que este acervo seria vendido em hasta pública, mandou D. Pedro I que fosse arrematada toda a coleção, passando à mesma, desde então, a integrar o acervo do então Museu Imperial, hoje Museu Nacional. 2 A múmia atingida tratava-se de um sacerdote egípcio, de nome "Hori" 3 As vitrines permaneciam abertas diariamente para serem ventiladas, sendo cober

tas diariamente, ao final do expediente, com um grande oleado preto. 4 Além do tecido que envolvia a múmia, composto de fibras de linho, o corpo ainda

apresentava tecidos sobre os ossos. 5 O Arqueólogo Cláudio Prado chamou nossa atenção para um plástico, que estava

sob a múmia, ao longo do corpo, e que reteria a umidade na parte de baixo da peça; então, achamos conveniente retirá-lo no mesmo instante, deixando-a em contato direto com o papelão. 6 São 4 vasos, onde são mumificados isoladamente o estômago, pulmões, intestinos

e fígado. O coração geralmente permanecia na cavidade. 7 A órbita ocular esquerda estava aparente, pois ali as faixas de tecido já estavam

corrompidas. Além disso, ao proceder ao exame de toque, notamos que o lado esquerdo estava completamente inconsistente. 8 Jedrzejewska, H . , The Damaging Influence of Disinfecting Agents on Sensitive Ancient

Materials, Conference on Museum Climatology (editor G. Thompson), IIC, London, 1968.

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ABRACOR - Associação Brasileira de Conservadores-Restauradores de Bens Culturais

A Capela do Santíssimo da Igreja do Mosteiro de São Bento do Rio de Janeiro: Aspectos Científicos do Estado de Conservação

FIG 1 - Vista parcial da frente da Igreja do Mosteiro de São Bento do Rio de Janeiro

FIG 2 - Capela do Santíssimo

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Denise viana Regis Museóloga - Especialista em Conservação de Bens Culturais Móveis - EBA/UFRJ Especialista em Conservação e Restauração de Bens Culturais - CECOR/UFMG (021) 463-1201 - Rio de Janeiro, RJ E-mail: [email protected]

Luiz A. C. Souza Cientista da Conservação Instituição: Laboratório de Ciências de Conservação/CECOR/EBA/UFMG Av. Antônio Carlos, 6627 - Belo Horizonte/MG, 31270-901 - Telefax : 499-5375 E-mail: [email protected], http://coremans.eba.ufmg.br

1. A Talha Atual da Igreja de São Bento

A construção da igreja do Mosteiro de São Bento do Rio de Janeiro data da I a

metade do séc. XVII e reúne hoje as principais tendências estéticas do final do séc. XVII e de todo o séc. XVIII em condições de profunda harmonia entre os estilos. Totalmente dourada, foi considerada por Germain Bazin um exemplo precoce de igreja toda coberta de ouro.

A talha atual inicialmente concebida em fins do séc. XVII, seguiu o estilo nacional português na nave central, com vocabulário decorativo mais reduzido, acanto espiralado como elemento principal, e os atributos da iconografia cristã. A partir de 1747 surge o joanino nas capelas laterais e em 1788, o rococó surge com a remodelação do arco cruzeiro e talha da Capela do Santíssimo Sacramento. Em todos os estilos, sofreu o mesmo tratamento policrômico, com douramento integral inclusive no rococó que segue a tradição do norte de Portugal, diferindo nos espaços rococós das igrejas mineiras que têm por característica suas rocalhas douradas sobre fundos claros (geralmente brancos ou azuis). A esta característica se deve a unidade e harmonia da igreja.

Construída entre 1795 e 1800, a Capela do Santíssimo teve suas paredes "renovadas e novamente douradas" no séc. XIX e sofreu grande restauração juntamente com todo o corpo da igreja na década de 70.

2. Monitoramento do Microclima Interno da Capela do Santíssimo

O microclima interno da Capela foi monitorado durante o mês de julho de 1998, usando para isto um termohigrógrafo Salmoiraghi, programado para fazer medidas semanais. Ao final do monitoramento, pudemos ver que existe uma inércia térmica no interior da capela. As variações diárias durante o período de medição não ultrapassam os dois graus centígrados, enquanto as variações de umidade relativa podem chegar a valores de até 25 por cento ao dia. A temperatura média girou em torno de 20°C, enquanto a média da umidade relativa se estabeleceu em 70%. Talvez a temperatura interna não sofra oscilações pela baixa troca de ar com o ambiente externo. Por outro lado, a enorme proximidade com o mar certamente facilita as trocas de umidade relativa através das paredes de pedra do edifício, além de interferir na qualidade do ar que entra no museu, pela presença de aerossol salino.

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FIG.3 - Friso deslocado e perdas de douramento

FIG.4 - Pregos oxidados, deslocamento de taboado , perdas de douramento e presença de betume sobre ornato

3. Estado de Conservação da Talha

Hoje, a capela se encontra com abrasões generalizadas no douramento. Em determinados locais dos painéis, têm-se a impressão de terem sido revestidos por tinta dourada. A policromia está em desprendimento a partir de camada intermediária da base de preparação (o que demostra ou incompatibilidade de materiais entre as duas camadas ou perda do poder de aglutinação do adesivo empregado na massa de preparação) e em alguns locais pode ser notado visualmente o estufamento da pintura. Em alguns poucos locais, as perdas de policromia vão até o suporte (geralmente em extremidades de ornatos).

As variações dimensionais ocasionadas pelas constantes variações de umidade relativa provocam o deslocamento dos blocos, deixando suas uniões aparentes. O taboado dos painéis e os ornatos e frisos encontram-se em deslocamento em algumas áreas. Alguns ornatos (raros) apresentam perdas de suporte. Um dos frisos, próximo ao altar-mor, perdeu um dos blocos deixando visível parte da emenda dos taboados, em cujo interstício encontram-se resíduos de prego oxidado, o que poderia também ter provocado a soltura do bloco.

Os pregos utilizados para fixar o taboado dos painéis oxidaram, ficando alguns à mostra, e outros - ainda recobertos por tinta dourada - alteraram a topografia da policromia. Os ornatos e frisos apresentam-se parcialmente recobertos por substância escura espessa, provavelmente inserida na última restauração para acentuar o relevo e provocar a ilusão de patina natural. A olho nú parecia betume, o que também justificaria a grande quantidade de partículas de poeira aderida durante seu longo tempo de secagem. Retiramos então amostra desta substância para análise.

Outro elemento que resolvemos identificar foi uma substância translúcida vermelha que se encontrava sobre o ouro, e ao que tudo indicava não seria a conhecida veladura colorida, usada durante o barroco para iludir os olhos e fazer pensar que houvesse diferentes tonalidades de ouro. Seu aspecto era irregular, apresentava sinais de escorrimento e parecia não haver tido um critério para a aplicação desta substância sobre a talha dourada.

Pudemos notar no altar-mor (área mais livre da degradação por ação humana por ser freqüentada apenas pelo padre nas horas das missas) a presença de douramento mais "frio", com bolo em tom de amarelo ocre e muitas perdas de douramento e bolo armênio. Acreditamos ser esta uma das possíveis áreas de douramento original, porque a textura da folha de ouro aplicada é mais requintada que no restante da capela.

Com relação ao douramento integral, resolvemos tirar a contra-prova para saber se fazia parte da tecnologia original ou se seria uma intervenção posterior (a irregularidade de brilho e textura do douramento dos painéis e ornatos passavam a impressão de intervenção) - isto sem contar com o tom vermelho escuro totalmente diferente do que seria um legítimo bolo armênio.

4. Remoção das Amostras

A impossibilidade de acesso à áreas mais altas e distantes devido à intensa movimentação de fiéis na Capela do Santíssimo, e à inexistência de material que possibilizasse o acesso, limitou a remoção de amostras à altura máxima de 1,70 m a partir do chão.

As amostras do douramento foram removidas com bisturi cirúrgico, acondicio-nadas em envelopes manufaturados de papel laminado duplo, colocados dentro de caixas de filme fotográfico com as respectivas indicações. As amostras foram levadas para serem analisadas no Laboratório de Ciência da Conservação do CECOR / UFMG.

Para análise das amostras de douramento, fizemos cortes estratigráficos para verificar as camadas existentes. Para analisar as substâncias escuras e vermelha respectivamente, foram preparadas dispersões para análise por microscopia de luz

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polarisada, além da obtenção de espectros infravermelho por transformada de Fourier (FTIR).

5. Resultados: Materiais Originais x Materiais Estranhos

Foi encontrada do decorrer da análises das micro-amostras uma série de materiais ou aplicações não tradicionis, os quais ou 1) não são característicos da tecnologia tradicional de policromia ou douramento; ou 2) são tradicionalmente utilizados em policromia e douramento, mas neste caso tendo sido completa e incorretamente aplicados. O betume é um exemplo do primeiro caso, e a goma arábica um exemplo do último. (Figuras 5 a 7)

- Betume — encontrado sobre superfície de douramento, completamente escurecido, carregado de poeira e perturbando em muito a leitura da peça. - Goma laça — substância tradicionalmente encontrada como veladura em douramen tos , en t r e t an to aqui encon t r ada em camada excess ivamente grossa.mudando completamente o aspecto dodouramento.

- Estratigrafia de douramento não tradicional, com elementos que não se assemelham à seqüência base de preparação, bolo e douramento. Note-se na figura 8 a seguir a repetição de três camadas de douramento.

Informações históricas

De acordo com a documentação pesquisada, a capela do Santíssimo teria sido dourada 3 (três) vezes durante sua existência:la - Fins do século XVIII, ao ser concluída a talha da capela;

2a - Século XIX "foi novamente dourada"; 3a - Restauração da década de 70.

Analisando os cortes estratigráficos (de acordo com esquema apresentado na Figura 8), encontramos estas três camadas juntas, comprovando o que a história contara: nos dois douramentos subjacentes, predominaram as mesmas técnicas tradicionais empregadas, respectivamente, nos séculos XVIII e XIX; na camada mais superior, a da intervenção da década de 70 do século XX, com tecnologia de douramento particularmente estranha à tecnologia tradicional.

Comprovamos também a existência de douramento original da área do altar-mor. Não sabemos se teria sido realmente necessário um redouramento em larga escala como foi feito na maior parte da capela.

6. Conclusão

Fite#2'0r?29801 MMe- í (uid-IR]

S ampla Destiipton AM S37T- Wotteiio de Sao Baniu- Camada Preta- Prov. Ba lume

3cans= 200 *6 3tansfmin Rcs=*tnH Apod=Cosire

FIG.5- Espectro de infravermelho característico de betume, obtido de amostra retirada sobre o douramento no Mosteiro de São Bento

Hlo # 1 - 07234602 Mcdfi- 2 (Mid-IR)

Sample Descnptloir PM 827T - Mosteiro de Sao Sento - Camada Vermelha translúcida sobre douramento

Sctv.g= 200 16 «ansfmin R e W tm-1 Apoa= Coglne

»-W»venm*9.(cm-1)

FIG.6 - Espectro de infravermelho característico de goma laça, obtido de amostra retirada sobre o douramento no Mosteiro de São Bento

FIG.8- Corte estratigráfico evidenciando a presença de douramento do séc. XX sobre douramento do séc. XIX, além do tradicional douramento característico do século XVIII.

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É compreensível a atitude de redouramento da capela na década de 70. A primeira notícia que se tem de reintegração de douramento com pontilhismo ou trattegio no Brasil se deu em 1979 no CECOR/UFMG. Desde então a prática da reintegração de douramento tem sido utilizada com grande sucesso.

Além de preservar a patina do tempo, a reintegração de douramento apenas nas lacunas de perdas permite que seja preservada a tecnologia original de douramento sem que haja Iterações na técnica.

Mas este fato nos leva a pensar acerca da necessidade de redouramento total nos dias de hoje. Se no altar-mor existe ainda atualmente douramento original em ótimas condições, será que teria havido realmente necessidade de se redourar todo o corpo da capela? É uma questão para ser discutida: o redouramento das igrejas históricas, prática ainda hoje adotada e aceita muitos profissionais.

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Abstract

The "faker" makes use of several strategies to give credibility to his work, as for example by copying of the artist's style, artificial and ageing techniques, etc. The characterization of artistics materiais, such as pigments, media, supports, through chemical and/or physico-chemical analysis, allied to the "estylistic analisis", and together with information from the History of Art, gives the possibility, in many cases, of recognising the autenticity of several works of art. In this paper, we describe our contribution in a judicial case with works atributted to artists such as Portinari, Di Cavalcanti, Matisse, Picasso, Jawlensky, Signac etc, besides another experience with sculptures made with ivory. We worked in both cases with Fourier Transform Infra-Red Spectrometry(FTIR) and with Polarized Light Microscope (PLM) as analitical methods.

Verificação e Autenticação de Obras de Arte Através de

Métodos Físicos e Físico-Químicos de Análise

Luiz A C Souza Cientista da Conservação - Instituição: Laboratório de Ciências da Conservação/ CECOR/EBA/UFMG Av. Antônio Carlos, 6627 Belo Horizonte/MG CEP: 31270-901 Telefax : (031) 499-5375 E-mail: [email protected] Homepage: http://coremans.eba.ufmg.br

Edson Mottajr Conservador/Restaurador, Historiador da Arte, Instituição: Escola de Belas Artes -UFRJ, Rio de Janeiro - RJ

João Cura D'Ars Figueiredo Jr Bolsista Iniciação Científica- CNPq - Laboratório de Ciências da Conservação/ CECOR/EBA/UFMG - Av. Antônio Carlos, 6627 Belo Horizonte/MG CEP: 31270-901 Telefax : (031) 499-5375 E-mail: [email protected]

Marco Elízio de Paiva Historiador da Arte Instituição : Escola de Belas Artes/ UFMG Av. Antônio Carlos, 6627 Belo Horizonte/MG CEP: 31270-901 -Telefax (031) 4995261

Introdução

A falsificação de obras de arte é comum no meio artístico e o falsificador utiliza de uma gama variada de recursos para falsificar uma obra. Falsificar uma obra é lhe dar valores os quais ela não possui e que, se possuísse, a tornaria valiosa economicamente. Entre estes valores está a autoria da obra, o período e estilo artístico ao qual ela pertence, o material empregado na sua confecção etc.

O falsificador escolhe um valor qualquer para atribuir a sua obra de acordo com a facilidade que ele encontre para poder vendê-la sem que a falsificação seja percebida. Uma destas facilidades é a indevida catalogação de obras1 que permite se criar uma obra falsa copiando o estilo do autor e então lhe dar a autoria, muitas vezes dizendo que se trata de um exemplar de uma coleção não catalogado, ou "uma obra perdida de uma fase tardia ou estudo para fazer uma obra-prima."3 Atribuir a uma obra um estilo de época também consiste em uma falsificação. Pode-se dizer que certa obra é originária do Barroco simplesmente criando-a com o mesmo estilo característico do Barroco e, para garantir a autenticidade, provoca-se um envelhecimento na mesma. "Para envelhecer artficialmente um quadro, colocam-no numa sauna seca, onde ele acaba trincando e adquirindo o efeito de craquelê para ficar semelhante às pinturas antigas.(...) Outra solução comum é aplicar sobre a tela uma camada de um verniz chamado "vieux chine", que causa o seu amarelecimento."3

A autenticação de uma obra é um trabalho interdisciplinar. A análise química em si não é capaz de julgar a autenticidade da obra. O trabalho de autenticação só é possível se forem utilizados conhecimentos de História da Arte. A partir do momento em que o historiador analisa uma obra e percebe nesta questões que permi-

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Anais da ABRACOR - Ciência da Conservação IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

FIG 1 - Uma das obras atribuídas a Cândido Portinari.

tam discordar de sua autoria e, se estas questões podem ser respondidas através do conhecimento dos materiais presentes na obra, então o químico atua como o responsável pela identificação destes materiais, desenvolvendo uma metodologia confiável, segura e específica para o caso em estudo.

A análise química se torna, então, essencial para se verificar a autenticidade de obras de arte em casos específicos. Analisamos dois casos nos quais foi possível verificar a falsidade das obras. No primeiro caso a caracterização de material sintético provou que a autoria dada a uma série de obras era falsa pois os supostos autores viveram em épocas anteriores à síntese do material. N o segundo caso a caracterização de marfim em esculturas permitiu garantir a autenticidade das obras, pois a premissa de falsificação se sustentava na hipótese de que as obras eram constituídas de material resinoso sintético e não de marfim, não havendo dúvidas quanto ao estilo.

Apresentamos a seguir os dois exemplos por nós trabalhados:

/

FIG 2 — Desenho esquemático de uma camada de tinta durante duas etapas de evaporação do solvente. N o primeiro quadro se encontra a tinta após sua aplicação pelo pincel e com uma seção reta transversal semelhante a uma pirâmide de vértices agudos. N o segundo quadro temos o material após a evaporação total do solvente, com seção reta transversal semelhante a uma parábola. O "perfil arredondado" é uma característica das resinas sintéticas.

1) Caracterização de materiais sintéticos em telas Neste primeiro caso analisamos vinte obras de um grupo de mais de cem obras de diferentes artistas de diferentes épocas. Todas estas faziam parte do acervo de um marcband do Rio de Janeiro (Processo 175/95, da Delegacia de Defraudações do Rio de Janeiro). No caso judicial, argumentos somente de história da arte ou de estilo não são suficientes para se provar a autenticidade ou não de determinada obra. A duas destas obras era dada a autoria de Cândido Portinari (FIG 1), porém ambas eram falsas o que foi comprovado tanto pela análise estética quanto por outras características utilizadas pelo falsificador, presentes nas obras, para assegurar suas au-tenticidades.

Estudos preliminares realizados nas obras permitiram observar que as camadas pictóricas superiores possuíam o que se chama "perfil arredondado" ou seja, a tinta possuía superfícies curvas. Esta primeira característica é um indício de que o material empregado como aglutinante nas tintas é uma resina sintética plástica ( como as resinas acrílicas e vinílicas ) pois estes materiais apresentam deformações durante o processo de evaporação do solvente. As tintas constituídas por estas resinas são deformadas pelo pincel ao serem aplicadas, o que lhes imprime uma forma que, num corte transversal de seção, é semelhante a uma pirâmide de vértices pontiagudos. Ao iniciar o processo de evaporação do solvente, os polímeros acrílicos e vinílicos se deformam ocupando as posições ocupadas pelas moléculas de solvente o que faz com que o novo corte transversal de seção seja semelhante a uma parábola(FIG 2).

A primeira etapa do trabalho consistiu em se retirar micro-amostras das telas. As amostras foram observadas em um microscópio estereoscópico para registro da seqüência de camadas pictóricas (estratigrafia). Observou-se que em todas as amostras havia uma camada pictórica branca ou uma camada branca como base de preparação. Como todas as telas pertenciam a um único marchand e, como uma delas já havia sido comprovadamente definida como falsa, decidiu-se por analisar as camadas brancas de cada amostra e procurar nelas a existência de um padrão em relação aos materiais empregados.

O primeiro método analítico empregado foi a Espectroscopia no Infra-Vermelho por Transformada de Fourier (Fourier Transform Infra-Red em Inglês, FTIR). O funcionamento do FTIR baseia-se em dois princípios: 1) a absorção de radiação do espectro eletromagnético na região do infra-vermelho ( De 4000 a 400 cm"1 ) pelos compostos devido a suas energias de ligação, ou seja, as energias que mantêm seus átomos unidos e 2) a utilização do interferômetro de Michelson, um equipamento que cria padrões de interferência das ondas eletromagnéticas construindo uma curva conhecida como interferograma. Os dados do interferograma são transformados em uma curva chamada espectro de infra-vermelho através de uma das operações matemáticas conhecidas como Transformada de Fourier.4

3 3

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• • • • ' ^ À l -

. . . . . ' . . « • - . • . . _ . . , * • _- _^'_ FIG 3 - Dispersão dos pigmentos presentes nas camadas brancas. Luz transmitida, aumento de 400x, polarizadores levemente cruzados. Observa-se o branco de titânio escurecido devido ao seu alto índice de refração impedir a transmissão de luz.

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ABRACOR - Associação Brasileira de Conservadores-Restauradores de Bens Culturais

Os espectros de Infra-Vermelho coletados das camadas brancas foram selecionados em grupos nos quais estes eram idênticos, obtendo-se, ao fim, 4 grupos distintos.

O grupo 1, constituído pelos espectros das bases de preparação branca das duas telas de Cândido Portinari, era semelhante ao espectro das amostras do grupo 3, diferindo destas na intensidade das bandas de absorção porém sendo semelhante na freqüência de absorção. Devido ao perfil arredondado das camadas pictóricas que já havia levantado o indício de que o aglutinante era provavelmente uma resina sintética, comparamos os espectros das amostras coletadas com uma biblioteca de espectros de resinas sintéticas. Descobrimos que os espectros das amostras do grupo 1 eram idênticas à marca comercial Branco de Titânio da Winsor & Newton. Além disso, as amostras de ambos os grupos, 1 e 3, apresentavam absorções idênticas à da resina PVA ( Poli-Acetato de Vinila)

A identificação dos pigmentos presentes nas camadas brancas foi realizada através da Microscopia de Luz Polarizada2 (Polarized Light Microscope em Inglês, PLM), técnica que consiste em se identificar substâncias através de suas propriedades físicas como cor, pleocroísmo, birrefrigência, extinção, granulometria, habitus, forma etc. Foram identificados nas amostras, tanto do grupo 1 quanto do grupo 3, caolim, carbonato de cálcio e branco de titânio (dióxido de titânio) (FIG 3).

Para confirmar os aglutinantes e pigmentos identificados, simulamos uma tinta com os materiais identificados. Misturamos PVA, caolim, carbonato de cálcio e branco de titânio de forma qualitativa em diferentes concentrações e coletamos um espectro de cada uma. Uma das misturas apresentou um espectro idêntico aos das amostras do grupo 3.

A autenticação pôde ser feita com estes resultados. Dentro do grupo 3 estava presente uma tela cuja autoria era dada a Pisarro, artista que faleceu em 1903 e Umberto Boccioni, falecido em 1916, períodos anteriores a qualquer utilização de resinas vinílicas como material artístico. A primeira citação do emprego das vinílicas como material artístico remonta a 1920, pelos trabalhos desenvolvidos pelos muralistas mexicanos, como Siqueiros e Orozco. Outro material identificado que não poderia ser utilizado por estes artistas é o branco de titânio, pigmento sintético que passa a ser utilizado como material artístico a partir de 19201 . As demais amostras eram atribuídas aos seguintes autores : Gomide, Pancetti, Matisse, Di Cavalcanti, Jawlensky, Picasso, Nolde, Signac e Volpi. Tivemos ao final, vários artistas, de diferentes países, épocas e estilos trabalhando com o mesmo material, sendo que alguns destes nem poderiam ter utilizado o material. Consideramos este fato como prova de que as obras eram falsas. (FIG 4)

2) Caracterização de marfim em esculturas Nesta investigação recebemos um grupo, de seis esculturas que eram supostamente de marfim. Havia uma suspeita de que elas não eram feitas de marfim pois o dono das mesmas as havia submetido a uma limpeza e observou um certo desprendimento do seu material externo que se solubilizou com água.

A primeira etapa do trabalho consistiu em se montar uma biblioteca de dados das características químicas, fisicas e físico-químicas que podem ser caracterizadas por PLM e FTIR dos materiais comumente utilizados na falsificação de marfim e do marfim puro. Foram coletados espectros de infra-vermelho de amostras de marfim e substituintes de marfim em falsificações como resina compósito, resina de dentista fotopolimerizável e resina de dentista autopolimerizável. Foram montadas também dispersões ( imobilização de material em meio resinoso para observação em microscopia ) destes materiais para estudo por Microscopia de Luz Polarizada.

O espectro de infra-vermelho do marfim mostrou bandas de absorção características de sulfatos e carbonates e de material proteico. Na microscopia de Luz Polarizada observou-se que o marfim é constituído por fibras longas, agregadas ( FIG 5) anisotrópicas com forte extinção. Os demais materiais apresentaram espectros e características a luz polarizada diferentes do marfim o suficiente para que não

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1735 1450 1000

FIG 4 - Quadro comparativo dos espectros de infra-vermelho das amostras analisadas

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FIG 5 - Santas Mães, uma das esculturas em marfim analisadas. Observe as rachaduras predominantemente numa direção, que surgem em áreas de clivagem devido ao formato fibroso do marfim.

haja nenhuma similariedade entre si. A próxima etapa consistiu na coleta de dados ( FTIR e PLM) dos materiais das

esculturas e comparação destes com a biblioteca de dados montada . Todas as esculturas eram constituídas por marfim. ( FIG 6)

Conclusão

Desenvolver uma metodologia analítica para julgar a autenticidade de uma obra é o fator mais importante para este tipo de tarefa. Somente a perfeita combinação de métodos analíticos químicos e estilísticos é capaz de chegar a uma resposta satisfatória. Cabe aos químicos e aos historiadores abrirem seu campo de atuação para uma troca mútua de conhecimentos, sabendo que ambos são importantes para a execução de uma autenticação e que ambos são, também, indispensáveis.

Bibliografia

GETTENS,R, STOUT.G., PaintingMaterials, A Short Encyclopaedia, Dover, New York, 1966

McCRONE, W.C., The Microscópica! Identification of Artists Pigmentsjoutnal of the International Institute for Conservation, Canadian Group,v.7,n, 1J&2 p.11-34, 1982.

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SILVERSTEIN,R.M.,BASSLER, G.C., & MORRIL .TC, Spectrometric Identification of Organic Compounds, 5th ed.John Wiley % Sons, New York, 1991.

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FIG 6 -Espectros de infra-vermelho de amostras de marfim falso, resinas utilizadas em falsificação e marfim verdadeiro

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Abstract

This paper describes a thermal monitoring system and thermal management tool for conservation of archives, libraries and museums. The system measures the air temperature, wall surface temperature and relative humidity. The Preservation Index (PI) and theTime-Weighted Preservation Index (TWPI) are calculated and registered in the hard disk of a computer PC, being able to be visualized remotely in real time. The system guides the opening of windows in order to minimize the costs with HVAC systems. The measurement of the surface temperature of the walls allows the system to beep for the occurrence of the condensation phenomenon, which is highly harmful for the collections. It is discussed the possibility of implementation of an index that considers the air velocity in the proliferation of microorganisms in hot and humid environments. This would allow a alliance between human comfort with adequate environment for the collections in tropical countries, with a minimum use of the air conditioning system.

Sistema de Gerenciamento Térmico para Conservação de Coleções

Saulo Güths Universidade Federal de Santa Catarina Departamento de Engenharia Mecânica - Fone: (048) 331 9851 Fax: (048) 234 1519 Laboratório de Meios Porosos e Propriedades Termofísicas de Materiais (LMPT) 88040-900 Florianópolis/SC e-mail: [email protected]

Luiz A. C. Souza Universidade Federal de Minas Gerais CECOR - Escola de Belas Artes Tel. 55 (31) 4995378 ou 75 - Fax 55 31 4995375 31270-901 - Belo Horizonte - MG e-mail: [email protected]

Fernando O. R. Pereira Universidade Federal de Santa Catarina Departamento de Arquitetura - Fone: (048) 331 9370 Laboratório de Conforto Ambiental (LABCON) 88040-900 Florianópolis/SC

Introdução

Um dos principais desafios no campo de preservação é estender a vida útil de materiais de acervo. Tanto a teoria básica quanto a prática concordam que a temperatura e a umidade relativa são os fatores primários que controlam as taxas de deterioração: decadência química, danos mecânicos e biodeterioração. A deterioração química é associada às reações de hidrólise e oxidação dos materiais orgânicos, que têm suas velocidades governadas pela temperatura e umidade relativa no ambiente de armazenamento. Sebera (1994) apresentou o método das isopermas (ou linhas de permanência), definido pela taxa relativa de deterioração da celulose, baseando-se nos efeitos combinados da temperatura e da umidade relativa.

Reilly et ai. (1995) apresentaram um método absoluto que relaciona a deterioração química em função da temperatura e umidade relativa. Trata-se do índice de Preservação (IP) e do índice do Efeito Tempo para Preservação (IETP). O IP é expresso em anos e fornece uma idéia geral de quanto tempo seria necessário para materiais orgânicos vulneráveis (tais como papéis de baixa qualidade) tornarem-se muito deteriorados, supondo que a temperatura e a umidade relativa não fossem variar muito a partir do momento de medição. Trata-se de um índice estático, que representa a condição naquele momento.

Já o IETP avalia o efeito cumulativo total ao longo do tempo, com condições variáveis de temperatura e umidade relativa, sobre a taxa de deterioração química. Trata-se de uma média ponderada dos valores do IP. Apesar desses índices serem apenas representativos do efeito da deterioração química de materiais orgânicos, eles podem ser muito úteis no auxílio de decisões da política de armazenamento de coleções.

Contudo a obtenção de tais índices está ligado à necessidade de medição sistemática da temperatura e umidade relativa nos diferentes ambientes onde as coleções estão expostas. Os instrumentos tradicionais, como termo-higrógrafos, apresentam como inconvenientes um custo relativamente elevado, necessidade de substituição

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FIG 1 - Sistema de Monitoramento CLIMUS

FIG 2 - Sensores de temperatura, umidade relativa e temperatura superficial

das folhas de registro, além da dificuldade de análise dos dados a longo prazo. Os registradores cronológicos hoje disponíveis na mercado poderiam superar

essas dificuldades, contudo exigem que sejam regularmente conectados a um computador utilizando um programa específico, para só então se ter disponível os valores de temperatura e umidade relativa ao qual estavam expostos.

O Sistema de Monitoramento Térmico para Conservação de Coleções CLIMUS foi desenvolvido com o intuito de superar essas dificuldades. Esse sistema permite monitorar e visualizar em tempo real a temperatura e a umidade relativa de cada ambiente, além dos índices IP e IETP. Os valores podem ainda ser visualizados a distância, em tempo real, via Internet ou conexão telefônica.

Trata-se de um sistema flexível onde outros sensores podem ser acoplados a posteriori (sensores de radiação ultra violeta e luz visível, poluição, velocidade do ar, estações meteorológicas, etc) , permitindo uma adequação às necessidades do acervo. O mesmo dispositivo pode ainda ser expandido permitindo o controle de sistemas de ar condicionado, desumidificadores e ventilação, visando não somente a conservação do acervo, mas a economia de energia.

Descrição do Dispositivo O Sistema de Monitoramento CLIMUS apresentado nesse trabalho foi instalado

no Museu Cruz e Souza de Florianópolis, sendo composto por 7 sensores de umidade relativa, 7 sensores de temperatura do ar e 2 sensores de temperatura superficial. Os sensores estão conectados em um microcomputador PC (486), munido de um sistema de condicionamento de sinais (Fig. 1).

Os sensores de temperatura são termoresistências do tipo PT100 e os sensores de umidade relativa do tipo capacitivo (Fig. 2). A precisão de medição é estimada em ± 0,5 °C para a temperatura e ± 1 % para a umidade relativa.

A cada 20 segundos o sistema realiza uma varredura dos 16 sensores apresentan-do-os na tela na posição da planta baixa onde os mesmos estão localizados. Os índices IP e IEPT são igualmente apresentados na tela. A cada 10 minutos os valores médios são registrados em um arquivo no disco rígido na forma "txt", podendo ser abertos por uma planilha eletrônica (p.ex. Microsoft Excel). Contudo para facilitar a análise dos dados desenvolveu-se um software chamado "MÁGICA", que permite a geração e impressão de gráficos de forma intuitiva. A Fig. 3 mostra um exemplo de gráfico gerado.

A curva com maior variação representa a temperatura do ar externo, e as curvas mais brandas as temperaturas do ar em duas salas distintas. Pode-se notar o efeito da inércia térmica da edificação, que "integra" as variações abruptas do meio ambiente.

Orientação de abertura/fechamento de janelas

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FIG 3 - Gráfico de temperaturas em função do tempo gerado pelo "MÁGICA"

Um dos sensores de temperatura e outro de umidade relativa foram instalados externamente com o intuito de auxiliar na decisão de abertura e fechamento das janelas, visando obter melhores condições climáticas no interior da edificação sem o emprego de sistemas de condicionamento de ar.

A decisão sobre a abertura/fechamento é baseada nos índices de Preservação (IP) internos e externos. Caso as condições externas estejam mais favoráveis que as internas (maior IP), o sistema orienta através de visualização na tela e sinal sonoro o(s) ambiente(s) no qual as janelas devem ser abertas. A Fig. 4 mostra valores calculados de IP externo e interno. Da mesma forma que anteriormente, os valores com maior variação correspondenl ao IP externo. A Fig. 5 mostra as telas onde pode ser observado a mudança de posição das janelas, indicando a abertura ou fechamento das mesmas.

Os recentes trabalhos de Valentin et ai. (1998) mostram a importância de circulação do ar na conservação de acervos. Seus estudos mostram que a circulação de ar dificulta a fixação dos esporos, reduzindo o desenvolvimento de micro organismos.

Essa perspectiva vem de encontro com a realidade dos países em desenvolvimento em regiões tropicais, visto que os sistemas de condicionamento de ar apre-

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Fig. 4 Valores de IP externo e interno em função do tempo

Fig. 5 Orientação de abertura / fechamento de janelas

Fig. 6 Carta psicrométrica e "iso-IP"

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Fig. 7 Registro de ocorrência de condensação nas paredes

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sentam não somente custos iniciais relativamente elevados, mas também representam um custo adicional no consumo de energia e na manutenção. Além disso as paradas programadas (ou não) para manutenção provocam variações abruptas e radicais na temperatura e umidade, podendo causar sérios danos no acervo por fenômenos de dilatação diferenciada de origem térmica e/ou higroscópica.

A definição de um índice de preservação incorporando a velocidade do ar poderia ser então eficaz no sentido de acrescentar o parâmetro biológico de proliferação de microorganismos, proporcionando assim um critério mais realista para decisão na abertura/fechamento de janelas e/ou acionamento de ventilação forçada.

O condicionamento do ambiente visando a preservação do acervo através de ventilação natural e/ou forçada pode ainda estar ligado a critérios de conforto dos ocupantes. A Figura 6 mostra uma carta psicrométrica onde estão assinaladas as regiões de conforto humano com e sem ventilação (Lamberts et ai., 1998) e a região de interseção com umidades relativas de 50 a 70 % (caso seja consideradas adequadas para preservação do acervo).

Nessa mesma carta foram traçadas linhas de "iso-IP". As temperaturas e umidades relativas medidas no acervo poderão assim representar pontos sobre a carta, facilitando a visualização das condições ambientais da edificação, tanto do ponto de vista de conservação do acervo como do conforto dos ocupantes.

A incorporação do parâmetro velocidade do ar em um eixo independente geraria superfícies de "iso-IP" secionando o sólido que definiria a zona de conforto humano. Um sistema de monitoramento, nos parâmetros do CLIMUS, poderia orientar e/ou controlar dispositivos de maneira a manter o ambiente dentro dos critérios de conforto humano e de preservação do acervo.

Condensação superficial

Através da medição das temperaturas superficiais tornou-se possível prever, via relações termodinâmicas (Van Wylen et ai.,1995), o aparecimento do fenômeno de condensação nas paredes, que contribui significativamente na deterioração do acervo. Esse fenômeno é comum nas regiões do sul do país, quando ocorre sucessão de frentes fria e quente: o ar quente e úmido condensa quando em contato com uma parede fria (com temperatura inferior à sua "temperatura de orvalho"). O sistema CLIMUS avisa via sinal sonoro e visualização em tela a eminência de aparecimento desse fenômeno, registrando em arquivo a ocorrência conforme pode ser visto na Fig.7. O acoplamento de um relê para ac ionamento de um disposit ivo de desumidificação pode ser imediato.

Conclusões

O Sistema de Monitoramento CLIMUS tem se mostrado uma ferramenta importante para o gerenciamento térmico de coleções. O sistema alia versatilidade e confiabilidade de uma base PC, possibilitando a expansão do número de sensores e o controle de dispositivos como aparelhos de ar condicionado e desumidificadores. O cálculo do índice de Preservação (IP) e do índice do Efeito Tempo para Preservação (IETP) coloca-o na vanguarda do desenvolvimento tecnológico mundial.

O estudo do efeito da velocidade do ar sobre a proliferação de microorganismos em ambientes quentes e úmidos vem de encontro com a realidade dos países em desenvolvimento em clima tropical. A incorporação do efeito velocidade sobre os índices de preservação possibil i tará definir cr i tér ios mais coerentes para implementação de mecanismos de economia de energia utilizando ventilação natural e forçada.

A medição da temperatura superficial das paredes permitiu prever o aparecimento do fenômeno de condensação, comum na região sul do Brasil. A incorporação de relês ao s is tema CLIMUS permi t i rá o con t ro l e au tomá t i co de

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desumidificadores, minimizando assim o efeito nefasto desse fenômeno.

Bibliografia

Lamberts, R.; Dutra, L. e Pereira, F.O.R, 1997, "Eficiência Energética na Arquitetura", PW Editores.

Nieves, V.; Gracia, G; De Luis, O. e Maekawa, S., 1998, "Microbial control in Archives, Libraries an Museums by Ventilation Systems", Restaurator, ISSN 0034-5806, pp. 85-107.

Reilly,J.M.; Nishimura, D.W. e Zinn, E., 1995, "NewTooIs for Preservaüon - Assessing Long-Term Environmental Effects on Library and Archives Collection", Prblicado pela Commission on Preservation and Access.

Sebera, D.K., 1994, "Isoperms: An Environmental Management Tool", The commission on Preservaüon and Access.

Van Wilen, D ; Sonntag, R. e Borgnakke, C ; 1995, "Fundamentos da Termodinâmica Clássica", Editora Edgard Blücher Ltda.

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Escultura

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Abstract

We will show the process of restauration of an incomon image from the brazilian cultural heritage. It is an image dated from the XVIII century that have the body in roca and the head made by canvas. It was found in advanced state of degradation, demanding several interventions. We will show the dificulties and the solutions found in the process of restauration.

Escultura em Tela Encolada: Tecnologia e Restauração

Eliane Monte Conservadora/ restauradora Instituição: UFMG- Escola de Belas Artes Atelier: Gal. Caldwell, 267 sala 201- Centro, RJ fone/fax: 242-8774

Introdução

Este trabalho foi realizado na conclusão do 12° Curso de Especialização em Conservação e Restauração da Escola de Belas Artes da Universidade Federal de Minas Gerais e apresentado como monografia final, orientado pela ProP. Marilene Corrêa Maia e co-orientado por Gilca Flores, ambas Especialistas em Conservação e Restauração.

A cidade de Tiradentes, Minas Gerais, preserva ainda hoje tradições religiosas e culturais que permitem ao visitante uma verdadeira viagem no tempo. Percorrendo suas ladeiras de pedras podemos apreciar a arquitetura colonial emoldurada pela bela Serra de São José. Em 1710 foi erguida no alto de um morro a suntuosa Matriz de Santo Antônio que abriga um diversificado e valioso acervo de arte sacra brasileira. No retábulo que pertenceu à Irmandade do Descendimento, encontra-se o grupo escultórico formado por uma imagem de Jesus crucificado, no seu lado direito, Nossa Senhora das Dores e, no esquerdo, São João Evangelista. Este grupo representa o momento em que Nossa Senhora encontra seu filho na cruz, acompanhada de seu discípulo amado, pouco antes dele morrer.

O tema do presente estudo é a imagem de São João Evangelista. Esta peça apresenta o corpo de roca, os braços articulados, as mãos e os pés são esculpidos em madeira e policromados. Este tipo de escultura, com a cabeça esculpida em madeira, é muito comum no Brasil, porém esta peça em particular apresenta uma peculiaridade: a cabeça foi feita em tecido encolado.2

Esta técnica é comum em alguns países da América Latina como Peru, México e Equador. No Brasil, na região de Tiradentes, São João Del Rei e Mariana foram encontradas cerca de quinze peças de vulto, medalhões e duas cabeças sem o corpo, todas em tecido encolado. Este número é muito pequeno se comparado com a quantidade de peças em madeira policromada existente no país. Acreditamos que seja uma manifestação regional, pois não temos notícia de imagens nessa técnica em outras partes do Brasil.

A imagem de São João Evangelista é a segunda com esta tecnologia restaurada na UFMG, a primeira, foi a Nossa Senhora do Parto,3 pertencente à Igreja das Mercês, também em Tiradentes. Sua restauração foi apresentada no VIII Congresso da ABRACOR pela restauradora Gilca Flores e nos serviu como referência para a realização deste trabalho.

2. Tecnologia Construtiva

A tecnologia construtiva da cabeça segue uma elaborada e complexa seqüência. Através de exames organolépticos e laboratoriais identificamos diversos materiais cons-

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FIG 01 - Esquema da Tecnologia Construtiva da Cabeça

Modelagem em argila

Aplicação dos oedacos de tecidos com cola

A peça modelada, depois de seca a cola, retira-se a argila

Aplicação da mistura de cera com resina 4 4

tituintes da peça, o que nos permitiu compreender sua tecnologia e dessa maneira intervimos com maior segurança.

Para a confecção da peça, originalmente, foi utilizado um molde de argila. Confirmamos a existência desse material que foi encontrado no interior da cabeça, colado na primeira camada de tecido (de dentro para fora). Sobre o molde de argila foram aplicadas cinco camadas de tecido de maneira a modelar a peça. As cinco camadas de tecidos, de Unho e de algodão, com diferentes espessuras, foram então embebidas em cola de origem animal. Aplicou-se ainda, o tecido em pedaços sobre a modelagem de argila, do mais grosso ao mais delgado, permitindo assim um acabamento fino e delicado na superfície. Depois de seca a cola, a argila teria sido então retirada deixando a cabeça oca. Para dar maior resistência à peça, foi aplicada uma grossa camada de mistura composta de cera e resina terpênica (ponto de fusão 774° C). A imagem de Nossa Senhora do Parto, citada anteriormente, foi construída do mesmo modo.

Os cabelos foram feitos com fibra de origem vegetal e cola proteíca, modelados formando cachos. Após essas etapas, a cabeça recebeu base de preparação com gesso e cola de origem animal. A policromia da carnação é oleosa e a peça ainda foi ornada com um halo,5 em metal prateado/'

O corpo da escultura possui dois gradeados, um superior e outro inferior, feitos de ripas de madeira, identificadas como cedro e pinho do Paraná. Esses gradeados encontram-se unidos na cintura por um parafuso que permite a rotação do tronco e são ainda fixados sobre a panturrilha. Os pés, assim como as mãos, são esculpidos em madeira (cedro) e policromados. A mão direita é a única que possui articulação permitindo sua rotação. Os braços possuem articulações do tipo esfera macho-fê-mea nos ombros e cotovelos em madeira identificada como cabriúva ou bálsamo.

3. Estado de Conservação

A cabeça e o corpo em roca apresentavam sérios danos estruturais que, conseqüentemente, ocasionaram vários problemas que comprometeram a obra, a saber:

Cabeça ' A leitura estética da obra; • Grande impregnação de sujidade; • Perda da rigidez e do poder de adesão da cola ocasionando o descolamento das camadas de tecido; • Perda de revestimento interno na região da face, pescoço, topo da cabeça e colo; • Afundamento do suporte nas regiões do olho direito, da bochecha, do nariz, topo da cabeça e parte do pescoço; • Perda de parte da fibra vegetal que formava o cabelo e desprendimento de cachos; • Craquelês e concheamento por toda a superfície ocasionando grandes des-prendimentos e perdas de policromia; • Repintura nas regiões do olho esquerdo, da testa e do pescoço.

Corpo • Sujidades por toda a superfície das carnações e também diretamente sobre o suporte; • Fratura na peça central de união de um dos gradeados; • Ataque de insetos coleópteros, podridão parda e apodrecimento da madeira por oxidação dos cravos; • Folga nas articulações dos ombros e cotovelos; • Na mão direita, perda de parte da articulação e na esquerda perda do dedo mínimo;

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FIG 2 - Esquema da Estrutura de Roca do Corpo

FIG 3 - Detalhe da Consolidação com Cola de Coelho

• Craquelês em toda extensão das mãos, desprendimento acentuado, grandes áreas de perda de policromia e três camadas de repintura. Essas camadas de repintura tornaram a carnação muito espessa e quebradiça;

Na base, perda de suporte, rachaduras, perda de policromia e repintura.

4. Tra tamento Realizado

Cabeça Limpeza com toluol e isopropanol (50:50) e pontualmente com sabão de

resina; Consolidação das camadas de tecido com cola de coelho à 10% aplicada à

pincel e com seringas de injeção para garantir que a cola alcançasse todas as camadas de tecido;

O revestimento da parte interna recebeu tratamento com calor para reativar a cera, promovendo novamente a união das placas que estavam soltas. As áreas de lacunas receberam complementação com uma mistura de cera microcristalina e resina de damar (7:1); • Na região do orifício para fixação do halo, foi aplicado um reforço pela parte interna com quatro camadas de tecido de linho e cola de coelho à 10% tornando, assim, a área mais resistente. • Na borda do colo, foi aplicado um reforço de tecido, a fim de evitar que as camadas que compõem a peça se desprendam novamente, devido a vulnerabilidade dessa região;

• O afundamento do suporte na região dos olhos foi resolvido utilizando-se um molde esculpido em Alginato7 no formato do olho. Este molde era apoiado no local, pela parte de dentro, por pedaços de isopor e espuma. A seguir, aplicamos cola de coelho à 10%. As demais áreas com afundamento foram pressionadas, de dentro para fora, com espuma e isopor até que a cabeça estivesse retornado a forma original. Este procedimento foi feito em cada área separadamente a fim de evitar o risco de tornar maleável uma área muito grandel. O suporte adquiriu o enrigecimento necessário somente após a secagem da cola; • A reposição da parte faltante do cabelo foi feita com tecido de linho desfiado e cola de coelho à 10%, completando apenas as lacunas. Para diferenciar o cabelo original da intervenção, foi feita a modelagem dos cabelos diretamente sobre a cabeça; porém a mesma foi coberta com um filme de plástico, para que não houvesse adesão , servindo apenas como molde. Após a secagem dos fios de linho retiramos o plástico e ficamos com a modelagem rígida no formato desejado. A fixação dos novos cabelos foi feita com adesivo acrílico 498 da Lascaux;

Remoção de repintura feita com toluol + dimetil formamida (75:25); • Refixação de toda a policromia com cola de coelho à 5%; • Nivelamento em todas as lacunas com gesso sottik e cola de coelho à 10%; • Verniz de proteção: paralóid B72 à 10% em xilol com cera microcristalina à 3%.

Corpo Substituição do suporte: ripas (intervenção), parte central dos gradeados e

articulação da mão direita, tudo com cedro; • Tratamento preventivo contra ataques de insetos com K-OTHEC; • Consolidação das áreas afetadas por podridão parda com paralóid B72 à 3%, 5% e 10% em xilol; • Consolidação das partes com perda de suporte com massa de serragem + PVA, (1:1) em água; • Complementação com couro na parte interna nas articulações dos ombros e cotovelos, permitindo assim a colocação dos braços na posição desejada, corrigindo a folga;

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Refixação da policromia das mãos com BEVA 371 diluído em xilol (1:3) e na base com cola de coelho à 3%; • Remoção de repintura das mãos e dos pés com diclorometano + formiato de etila + ácido fótmico ( 50:50:2 ); • Limpeza da base com toluol + isopropanol (50:50); • Nivelamento das mãos e pés, e nivelamento em chanfro da base com gesso sottile e cola de coelho à 10%;

Reintegração com pigmento e verniz paralóid B72 à 5% em xilol; Aplicação de camada de proteção no gradeado com Osmocolor e aplicação

de paralóid B72 à 10% em xilol com cera microcristalina à 3 % nas mãos, pés e base.

Obs: Os produtos utilisados para limpeza são das listas de Masschelein kleiner e de Richard Wolberts.

Conclusão

FIG 4 - Aplicação de cera com damar na área interna da cabeça já com o O 12° Curso de Especialização em Conservação e Restauração da Universidade reforço nas bordas do colo Fededal de Minas Gerais (UFMG) proporcionou um enriquecimento profissional

muito importate em minha vida. Durante a realização deste trabalho, foi possível praticar um verdadeiro exercício de habilidade e criatividade aliados aos conhecimentos e conceitos teóricos que norteiam a restauração, proporcionando ainda, o estudo e a compreensão de mais uma obra com essa tecnologia construtiva. Ressalto, porém a necessidade de estudos nesta área a fim de conhecermos melhor, mais um aspecto de nossa arte e nossa cultura.

Resumo da autora

Eliane Monte é Especialista em Conservação e Restauração de Pintura de Cavalete e Escultura Policromada, UFMG- Escola de Belas Artes, Especialista em Conservação de Bens Culturais Móveis e bacharel com especialização em Pintura, ambos pela Universidade Federal do Rio de Janeiro- Escola de Belas Artes. Trabalha como res-tauradora particular e em pesquisa sobre obras em tecido encolado.

Agradecimentos

A Marilene Corrêa Maia pelo empenho e atenção dedicados na orientação e à Gilca Flores pela valiosa contribuição e co-orientação. Às incansáveis amigas Lelena e Linianne, a toda a equipe do Centro de Conservação e Restauração da UFMG (CECOR) pelo apoio técnico; ao Instututo do Patrimônio Histórico e Astístico Nacional (IPHAN) pela contribuição na pesquisa sobre as peças em tela encolada, especialmente ao historidor Olinto Rodrigues, por sua grande disponibilidade, e à todos os que contribuíram para a realização deste trabalho.

Bibliografia Consultada

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co,! 942. 4 6

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Anais da ABRACOR - Escultura IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

Notas

1 É o nome dado às esculturas que possuem o corpo feito basicamente com grade-ado de madeira, tendo somente a cabeça, as mãos e, às vezes, os pés esculpidos e policromados. Essas esculturas também são denominadas imagem de vestir ou de bastidor. 2 A denominação foi encontrada no livro do autor NAVARRO, José Gabriel,

listado na bibliografia consultada ) 3 Esta imagem foi restaurada no projeto coordenado por Beatriz Coelho patroci

nado pela Fundação Vitae no CECOR em 1995. 4 5 O halo é um anel ou círculo ao redor da cabeça como sinal de santidade. 6 Metal identificado como latão com banho de prata., segundo o Laboratório de

Corrosão do Departamento de Engenharia Metalúrgica e de Materiais. 7 Produto utilizado na confecção de moldes dentários.

FIG 5 - Consolidação e complementação dos cabelos

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Abstrctct

Research aboüt the technology and the restoration of the articulated image, aims their processional and reügious functions.

Restauração de uma Imagem Articulada do Senhor dos Passos

Renata de Fátima da Costa Maués aluna do do 12° Curso de Especialização em Conservação/Restauração de Bens Culturais Móveis

Nireibi Deyanira Herrera-Romero aluna do do 12° Curso de Especialização em Conservação/Restauração de Bens Culturais Móveis

Maria Regina Emery Quites Professora de Restauração de Escultura Policromada em Madeira, do Curso de Especialização em Conservação Restauração de Bens Culturais Móveis- Escola de Belas Artes- CECOR- Universidade Federal de Minas Gerais- UFMG

FIG 1- Senhor dos Passos - detalhe das articulações antes da restauração

Introdução

Este trabalho foi realizado na disciplina de Restauração de Escultura Policromada I e II do Curso de Especialização em Conservação/ Restauração de Bens Culturais Móveis e teve como objetivo proporcionar às alunas uma experiência teórico- prática dentro do conteúdo programático das disciplinas, incentivando a pesquisa em tecnologia da escultura policromada e materiais e técnicas de conservação/ restauração.

A imagem do Senhor dos Passos pertence à Igreja Matriz de Santo Antônio da cidade de Santa Bárbara, Minas Gerais.

É uma imagem articulada que possui duas representações iconográficas: Ecce Homo (veste um manto vermelho sobre as costas) e Senhor dos Passos

(veste túnica e manto roxo). Esta imagem exerce sua função social e religiosa desde o século XVIII até os dias de hoje, participando da Procissão do Depósito e da Procissão do Encontro durante a Semana Santa.

A função primordial desta escultura é a social e religiosa, portanto a restauração estrutural e estética era fundamental para que ela continuasse exercendo seu papel na comunidade.

2- TECNOLOGIA DA IMAGEM ARTICULADA

A imagem em estudo é classificada como "Articulada", pois tem alto nível de elaboração da talha e da policromia como nas imagens de "Talha Inteira", porém possui articulações que permitem alterar sua iconografia.

As articulações são sete: ombro (duas); cotovelo (duas); joelho (duas) e junção da coxa com a área pélvica. As articulações foram denominadas de : "Esfera macho e fêmea", pois têm um sistema de conexão central macho/fêmea em forma de esfera e a união destas partes é realizada por um pino central. Neste modelo, as partes que compõem a articulação têm um prolongamento em forma de cilindro, com um entalhe na extremidade, o qual se insere nas partes anatômicas com a finalidade de permitir o movimento. (FIG.l).

A imagem foi confeccionada em cedro , sendo as articulações dos ombros de canela e as do joelho em jacarandá. A peça da articulação de jacarandá possui uma placa de metal aderida à madeira para aumentar sua resistência.

A escultura mede 1,80 X 0,61 X 0,25 cm , oca com dois tampos (um nas costas e outro no lado direito do perizônio às costas ). Possui olhos de vidro e o corte para

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Anais da ABRACOR - Escultura IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

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k FIG 2- Desenho da articulação "esfera macho/fêmea"

sua colocação é visível na face. No ombro esquerdo tem uma peça de metal (para fixar a cruz à imagem) con

tendo parafusos e podendo ser removida. Nas laterais das coxas se encontram peças de metal para a sustentação da figura em sua base.

A imagem possui vários blocos- o bloco principal: composto pela cabeça, tronco e coxa direita, e os blocos secundários: braço direito, antebraço direito, braço esquerdo, antebraço esquerdo, perna direita, perna esquerda e coxa esquerda e as peças que compõem as articulações.

A policromia da obra é a base de óleo, sendo o perizônio à tempera. As áreas mais simplificadas apresentaram a seguinte estratigrafia: suporte, encoiagem, base de preparação, encoiagem protéica e carnação. A cor predominante é o bege e nas áreas próximas às articulações encontramos pigmentos vermelho, verde e roxo. Na barba e cabeça, foram encontradas pintura de coloração marrom. A imagem apresenta em várias áreas os chamados "pingos de sangue"'

Nota-se ainda resquícios do couro original policromado em todas as articulações.

3- ESTADO D E CONSERVAÇÃO.

A escultura se encontrava com sujidades, perdas de policromia, algumas peças das articulações quebradas e com resquícios do couro policromado, o qual, tinha a função de recobrir as engrenagens das articulações e simular a pele humana (FIG.2).

4- RESTAURAÇÃO

As etapas do tratamento foram: limpeza superficial; desmontagem da obra; remo-. ção das intervenções inadequadas; consolidação do suporte e substituição das articulações quebradas; colocação do couro; nivelamento e reintegração cromática.

5- COURO

Antes de iniciarmos a restituição do couro, foi feita uma pesquisa relacionada ao tipo de couro a ser utilizado. Realizamos testes com couro de cabra e com couro de porco. Escolhemos o couro de porco, por este apresentar características similares à pele humana, como também, boa resistência, flexibilidade e elasticidade.

Foram realizados testes referentes aos tipos de adesivos a serem usados para aderir o couro à madeira. Trabalhamos com diferentes tipos de adesivos protéicos, vinílicos, acrílicos, entre eles Cola de Coelho, Plextol, PVA (Cascorez), Primai e Brascoplast.

No simulado, o procedimento foi executado em um protótipo articulado para obtermos maior segurança de atuação no original. Somente o adesivo não daria a segurança necessária para a fixação do couro, pois se trata de uma imagem processional que é manuseada por seus fiéis durante toda Semana Santa. Então pensamos em utilizar um tipo de costura com alguns pontos entre o couro e a madeira. O procedimento adotado foi o de fazer perfurações de 1,0 mm de largura diretamente na madeira para passar a linha de nylon usando uma agulha curva. O couro foi cortado segundo o molde estabelecido. Colocou-se adesivo direto na madeira e nas bordas do couro (este foi colado do lado da "flor"), a ser colado, deixando a linha por fora para fazer a costura no couro. O couro foi usado em dois pedaços para facilitar o manuseio na execução do trabalho. É importante ressaltar que o couro foi fixado à madeira pela parte interna da mesma, posto que, na peça original esta área era a única que não possuía restos de couro e policromia original.

Resolvemos utilizar o Brascoplast, adesivo próprio para couro encontrado no mercado. Este apresentou maior aderência, além de ser um adesivo de contato que é reversível com acetona e é de fácil aplicação.

Foram realizados testes para a reintegração do couro. Era necessário encolar o 49

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FIG 3- Colocação do couro no original

ABRACOR - Associação Brasileira de Conservadores-Restauradores de Bens Culturais

couro, para impermeabilizá-lo, portanto, testamos os adesivos: Cola de Coelho, Primai e PVA. A escolha foi pelo PVA + ÁGUA na proporção de 1:2, por permitir maior flexibilidade e não dar à superfície um brilho excessivo, assim como, não alterar a cor do couro, que tem um tom bastante próximo ao da carnação da obra. Após à encolagem, utilizamos o Maimeri para a reintegração cromática.

6- RESTITUIÇÃO D O COURO N A OBRA

As articulações dos cotovelos foram trabalhadas separadamente do restante da peça, porém, para restituir os ombros e os joelhos era preciso colocar a imagem em pé. O procedimento da colagem se pautou na confecção dos moldes, observando o maior ângulo de movimento de cada articulação. Para a restituição do couro na obra, apesar de termos utilizado no simulado o couro cortado em duas partes, no original resolvemos traçar apenas um molde que contornaria as articulações, evitando desse modo a presença de duas emendas, mas seguindo o padrão estabelecido. O couro foi cortado de acordo com os moldes encolados com PVA + Água (1:2). Uma vez seco, começamos a colagem aplicando o adesivo Brascoplast na borda do couro e da madeira, esperando de 5 a 10 minutos para efetivar o processo do contato. A fixação do couro à madeira foi feita pela parte interna da mesma garantindo a integridade do couro original da obra (FIG.3).

Algumas partes foram reforçadas com pontos de sutura pois apresentavam áreas de contato muito reduzidas (menor de 0,5mm), dessa forma reforçamos a aderência do couro sobre a madeira, visto que se tratava de uma área que estaria em movimentação. Nas articulações dos ombros, onde existia uma parte significativa do couro original, optamos por fixá-las sobre o novo couro. Este antes de ser aderido, recebeu uma encolagem preparando o material para ser policromado. A policromia original dessa área que estava em desprendimento foi refixada com BEVA (1:3) em Xilol para segurá-la ao couro já que esta apresentava muitos craquelês. O couro original foi fixado ao novo couro com PVA + ÁGUA (1:1). A reintegração foi realizada sobre o couro procurando o tom da carnação, porém sem restituir os hematomas e sangue das áreas de feridas (FIG.4).

7- CONCLUSÃO

Este trabalho propiciou aos participantes um bom aprendizado teórico- prático, desenvolvendo a prática da pesquisa e experimentação de técnicas e materiais, utilizando de simulados para conhecer melhor o funcionamento dos materiais e empregar e garantir maior segurança de tratamento no original.

A restauração buscou resolver os problemas estruturais e estéticos que a obra apresentava devolvendo o movimento para as articulações, respeitando sua originalidade e resgatando sua funcionalidade. Esta escultura processional foi criada com este objetivo e deve continuar exercendo esta função para que sua memória não desapareça.

AGRADECIMENTOS

Ao Prof. Luiz Souza e ao pessoal técnico do Laboratório de Ciências da Conservação pelas análises químicas, ao Beto Grossi, pela orientação no processo de perfuração e sutura, ao Cláudio Nadalin pela documentação fotográfica, à Ivê Madeira pela acessória na refixação da policromia, à Denise Camilo e Edmilson Barreto pelo trabalho de reintegração cromática. Aos nossos pais, pelo apoio e confiança.

FIG 4- Senhor dos Passos- após a restauração

MATERIAIS UTILIZADOS

Couro de porco bege, Brascoplast, Dremel, broca de 1,1 mm, agulha cirúrgica curva

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Anais da ABRACOR - Escultura IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

V2 cm cortante, linha de nylon transparente n.50, Maimeri "Vernice per Restauro", Xilol, PVA.

BIBLIOGRAFIA

QUITES, Maria Regina Emery. A IMAGINÁRIA PROCESSIONAL NA SEMANA SANTA EM MINAS GERAIS- Estudo realizado nas cidades de Santa Bárbara, Catas Altas, Santa Luzia e Sabará. Dissertação de mestrado apresentada ao Curso de Mestrado em Artes da Escola de Belas Artes da Universidade Federal de Minas Gerais em 26 de outubro de 1997.

NOTAS

'Esse material é composto de enxofre e arsênio, elementos químicos característicos do mineral conhecido como ouro- pigmento. Quando este composto é aquecido em tubo de vidro fechado, o ouro pigmento ao sublimar (transformação do estado sólido em gasoso) se transforma ao resfriar em uma substância com coloração vermelho com brilho resinoso. MORESI, Claudina Maria Dutra.Os "Rubis" das chagas dos Cristos. Revista Ciência Hoje: vol 22, n°127,1997, p.70-71.

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ABRÀCOR - Associação Brasileira de Conservadores-Restauradores de Bens Culturais

Abstract

Our research is focused on the finishing techniques of gilding in wooden polychrome sculptures. These techniques are not well known by conservators and restorers, mainly due to the lack of publications about this issue in particular. Based on manuais from the 15th through the 18th century, as well as other specific bibliographic sources about the theme, we have produced fac similes according to the techniques described, in order to do artificial ageing. In this paper we describe finishing techniques, their materiais, as well as we discuss about the deterioration processess, with the aim of objectively contributing to the decisions of the conservator, mainly in what concerns practical aspects of appearance and materiais in the finishing layers, in order to positively contribute for decision processes on the cleaning of sculptures.

Tecnologia de Acabamento de Douramento em Esculturas em Madeira Policromada do Período Barroco e Rococó em Minas Gerais, Brasil

Gilca Flores de Medeiros Mestranda em Artes / E B A / U F M G - Bolsista de Aperfeiçoamento FAPEMIG E-mail: [email protected]

Luiz A. C. Souza Cientista da Conservação Instituição: Laboratório de Ciências de Conservação/CECOR/EBA/UFMG Av. Antônio Carlos, 6627 - Belo Horizonte/MG, 31270-901 - Telefax : 499-5375 E-mail: [email protected], http://coremans.eba.ufmg.br

Introdução

Esse trabalho está sendo desenvolvido por Gilca F. Medeiros como tema de pesquisa para o Mestrado em Artes - Conservação/Resturação, na Escola de Belas Artes da UFMG, sob a orientação do Prof. Luiz A. C. Souza. Esse tema está inserido na linha pesquisa em desenvolvimento no Laboratório de Ciências da Conservação do C E C O R / E B A / U F M G , que investiga a policromia das esculturas em madeira policromada em Minas Gerais, nos séculos XVIII e XIX: os materiais, as técnicas de execução e os processos de deterioração.

Nas esculturas em madeira policromada em Minas Gerais um dos recursos mais freqüentes de ornamentação encontrado é a técnica do douramento, sobre a qual os artistas ainda se utilizavam de técnicas de ornamentação e camadas de acabamento, como vernizes, veladuras, e tc , para obter uma nova gama de variações no resultados final do douramento. Apesar de bastante freqüentes, essas técnicas são pouco conhecidas pelos profissionais, devido a escassez de publicações sobre este tema. Esse desconhecimento pode gerar equívocos ao se efetuar limpezas e remoções de vernizes dessas obras, com o risco de ser removida uma camada original que cumpria função específica no resultado final da policromia.

1. As técnicas de acabamento de douramento

Para execução desses douramentos, diversas técnicas podem ser empregadas, de acordo com o quadro 1 a seguir, já apresentado por um dos autores deste artigo (Souza, 1996).

Além dessa variedade técnica, os artistas se utilizaram ainda do recurso de aplicar sobre os douramentos diversas técnicas de ornamentação como esgrafiado, pun-ção, pastiglio, etc. e ainda, camadas de acabamento, que lhes conferiam outra gama de efeitos: camadas de proteção, vernizes, veladuras coloridas, etc.

Estudamos essas técnicas de douramento e suas camadas de acabamento, com o objetivo de ampliar nosso conhecimento, principalmente no que diz respeito à sua execução, gerando fac-similes sobre os quais alguns estudos puderam ser elaborados. Além de remoção de amostras para análises pontuais, alguns fac-similes foram submetidos ao processo de envelhecimento acelerado, numa câmara de envelhecimento acelerado, na qual simulamos condições diferenciadas de umidade relativa, temperatura, e iluminação pela radiação solar (Xenotest 150S).

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Anais da ABRACOR - Escultura IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

Metais

Au

Ligas de Au, Ag e Cu

Ligas de Cu/Zn

Folha de ouro

Ouro em pó

Douramento

acolá

a óleo ('ala mixtion)

Purpurina +• Imitação de douramento

/ Folha de prata recoberta com veladura amarela

Ag

/

Folha de prata

Prateamento

acolá

a óleo Cala mixtíon)

Sn Folha de estanho Brocado aplicado (Brocart appliquée)

Quadro 1 - Sumário dos tipos de decoração com folhas metálicas empregados em esculturas em madeira policromada. (Os termos 'a Ia mixtion e Brocart appliquée são termos franceses correntemente utilizados na literatura técnica da área).

2. Pesquisa de fontes primárias

Nossa pesquisa constituiu, inicialmente, na leitura de manuais artísticos antigos, onde buscamos conhecer os materiais sugeridos, suas formulações e modo de aplicação, segundo cada autor. Os principais manuais estudados foram:

1. Arte da pintura, simetria e perspectiva - Philippe Nunes (Portugal, 1615) 2. II libro delFarte - Cennino Cennini (Itália, séc.XV) 3. L'art du peintre, doreur, vernisseur - Watin (França, 5a edição - 1802/ Ia ed. 1772) 4. Segredos necessários para os officios, artes, e manufacturas (Lisboa, 1794) 5. Artists'techniques in golden age Spain - Six Treatises in Translation (Cambridge, 1986)

Outras fontes úteis para a compreensão das técnicas foram as seguintes: 6. Evolução da tecnologia de policromia nas esculturas em Minas Gerais no século XVIII: O interior inacabado da Igreja Matriz de Nossa Senhora da Conceição, em Catas Altas do Mato Dentro, um monumento exemplar - Luiz A. C. Souza

7. Les polychromies baroques et rococos du XVIIIème siècle: E tude et rescontituition de quelques techniques de polychromie - Cristine Cession, 1987/ 8. Art in the marking - Italian Painting before 1400 (Londres, 1992) 9. Tratado dei dorado, plateado y su policromia - tecnologia, conservación y restauración - Enriqueta Gonzáles-Alonso Martínez

Pudemos verificar, através do estudo das referências acima citadas, que as receitas apresentem diferenças na forma de preparo e de aplicação (modo e número de camadas), os autores concordam com respeito a necessidade de se preparar a ma-

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ABRACOR -Associação Brasileira de Conservadores-Restauradores de Bens Culturais

FIG. 1 - Exemplos de estratigraflas de douramentos, segundo as fontes consultadas

Douramento brunido: (Cennini)

4. Folha de ouro 3. Bolo: 4 camadas, 1a + liquida 2. Base de preparação: ia: gesso grosso + cola (3 a 4 camadas)

2a: gesso sottile + cola (+ 8 camadas)

1. Encolagem: 1 camada c/1/2 de cola de pergaminho em 1/3 de água Depois: camadas de cola sem diluição

Madeira

Douramento brunido e mate: (Watin)

Ouro Mate

8. Nova camada de cola sobre os mates 7. Vermeli (goma arábica, urucum, açafrão, sangue de dragão (camada fina) 6. Camada de cola sobre os mates 5. Folha de ouro 4. Asslette: + 3 cam. finas

+ 2 cam. finas onde ouro será brunido 3. Tinta amarela: ocre + cola 2. Base de preparação: branco de Bougival + cola. 1. Encolagem: cola de pergaminho Madeira

Douramento com estofamento: (Nunes)

— - H mEmt\ 6. Pigmento + gema de ovo (Esgrafiado) 5. Alvaiade + gema de ovo 4. Folha de ouro 3. Bolo: :2 camadas de bolo comum e 2 de bolo fino 2. Base de preparação: gesso comum + cola (1 cam. bem delgada)

gesso mate + cola ( 3 a 4 camadas) 1. Encolagem: cola de baldreu + alho (2 cam. não muito forte) Madeira

Douramento: (Pintura Italiana do século XV)

õ.Folha de ouro 4. Bolo Armênio 3. Base de preparação: 1o gesso grosso ( anidrita) + cola

2o* gesso sottile (gipsita ) + cola 2. Tecido de Unho: para junções dos painéiis 1. Encolagem : cola de pergaminho Madeira

* Policromia de um painel de madeira

3. Execução dos douramentos

Numa segunda etapa, executamos algumas receitas desses manuais, na forma de fac-similes (FIG. 2). Utilizamos como suporte o cedro - cedrella sp, em placas cujas dimensões eram de 12x4x0,4cml Para cada técnica, utilizamos três placas onde a policromia foi aplicada de forma integral nas duas primeiras e de forma escalonada na terceira, possibilitando a visualização das camadas aplicadas de modo didático.

A planificação das placas de cedro foi feita com lixas Nor ton T223 (80 - 220 -600). A encolagem foi feita com cola de coelho à 10%. Tínhamos a intenção de preparar a cola de pergaminho, muito citada nas receitas dos manuais como cola muito clara e freqüentemente utilizada pelos artistas da época, porém não conseguimos contato com nenhum curtume que trabalhasse com aparas de pergaminho, inviabilizando a reprodução da cola. Dessa forma, optamos pelo uso da cola de

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IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

FIG.2 TÉCNICAS DE DOURAMENTO, ORNAMENTAÇÃO E ACABAMENTO

CRUPON- CAMADAS .MCIAIS * C « ™ Q ^ ^ 0 | ^ Z I Z

Grupo 1

Grupo 2

Grupo 3

Grupo 4

Grupo 5

Grupo 6

Grupo 7

Encolagem

Gesso grosso e fino

Bolo armênio

Encolagem

Gesso grosso e fino

Relevo d gesso fino

Bolo armênio

Encolagem

Gesso grosso e fino

Goma laça

Mixtion

Encolagem

Gesso grosso e fino

Bolo armênio

Encolagem

Gesso grosso e fino

Bolo armênio

Encolagem

Gesso grosso e fino

Bolo armênio

Encolagem

Gesso grosso e fino

Bolo armênio

Ourobrunido

(brunimento com

espátula de ágata)

Ouro brunido e ouro

mate

(Relevos brunidos.

fundos mates)

Ouro mate

(à Ia mixtion)

Ouro mate

(sobre bolo)

Ouro brunido

(Brunimento com

espátula de ágata)

Ouro mate

Ouro brunido

(brunimento com

espátula de ágata)

Esgrafiado, vermelho

(tempera a ovò -

cinábrio)

Pastiglio

Nenhuma

Nenhuma

Esgrafiado, branco

Nenhuma

Esgrafiado, verde

l"alvaiade+ ovo

T acetado de cobre+

ovo

"Verniz para ouro"

-veladura amarela

(goma laca+açafrão,

urucum+sangue de

dragão)

Camada de cola e de

Vermeil (goma arábica

+ açafrão urucum +

sangue de dragão)

Nenhuma

Cola de coelho à 10%

Veladura mate

(Cola + caulim +

hematita)

Clara de ovo (pura)

Nenhuma

coelho, de natureza semelhante e também de boa qualidade. Essa mesma cola foi empregada em diversas outras camadas onde o uso de uma cola se fez necessário. A base de preparação foi realizada em duas fases, conforme indicações dos manuais, a primeira sendo conhecida como gesso grosso e a segunda, gesso fino (ou sottile). Para a primeira base o gesso (vendido no mercado como gesso rápido) foi peneirado. A cola de coelho à 10%,usada como aglutinante, foi aquecida em recipiente de vidro e o gesso foi sendo acrescentado aos poucos até saturar a cola. Depois de bem misturado, o gesso foi aplicado sobre a placa encolada com um pincel, sendo mantido aquecido em banho-maria. N o total aplicamos quatro camadas. O gêsso fino exige um preparo específico que consiste em misturá-lo em recipiente com bastante água, aos poucos, e deixando-o decantar 24 horas. Após esse tempo, a água é dispensada e colocada nova água, sendo esse procedimento'repetido por vários dias. N o nosso caso, o gesso foi tratado por 20 vinte dias. Depois o gesso foi coado e deixado secar na forma de "pães". N o momento da aplicação o pão de gesso é deixado em recipiente com água para uma diluição espontânea, após a qual ele é coado e misturado à cola aquecida. Aplicamos quatro camadas, sendo a primeira com os dedos (o que permite maior aderência ao gesso grosso) e as demais com pincel. O bolo armênio foi aplicado nas placas em que realizaríamos um douramento brunido. Não reprodizimos a receita do bolo, utilizando um bolo vendido comercialmente como Assiette a dorer - rouge (Lefranc Et Bourgeois). N o momento da aplicação esse bolo foi diluído com cola de coelho para obtermos consistência que permitisse a aplicação com pincel. Para feitura do esgrafiado, estendemos a tempera (a ovo) sobre todo o ouro, decalcamos sobre ela o motivo a ser esgrafiado2 e removemos a tempera nas áreas em que o ouro deveria aparecer, com auxílio de um palito de madeira (FIG. 3). Para as camadas de acabamento, os corantes utilizados (açafrão, urucum, sangue de dragão)

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ABRACOR - Associação Brasileira de Conservadores-Restauradores de Bens Culturais

F I G 4 - Materiais corantes

FIG. 5 - Camada de vermeil e cola sob luz U.V. (placa do Grupo 2)

FIG. 6 - Grupo 1 - Esgrafiado e veladura amarela (Placas do Grupo 1)

FIG. 7- Placas nos suportes da câmara de envelhecimento XENOTEST 150S

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foram extraídos numa solução de álcool etílico (FIG. 4).

4. Análise científica material dos facsimiles preparados — espectrometria no infravermelho por transformada de Fourier (FTIR) e microscopia ótica e de luz polarisada

Selecionamos uma placa de cada grupo para ser mantida como 'de referência e destas foram removidas amostras de cada policromia para montagem de cortes estratigráficos, dispersões e coleta do espectro de infravermelho por FTIR etc. (trabalho realizado por Lílian Cavalcante de Melo, Bolsista de Inciação Científica). A segunda placa de cada grupo foi levada à câmara do equipamento XENOTEST para passar por um processo de envelhecimento acelerado (FIG.7). A terceira de cada grupo, cujas camadas foram aplicadas de forma escalonada, foi guardada para uso didático (FIG. 6).

O equipamento XENOTEST possui uma câmara onde são simuladas determinadas condições de temperatura, umidade e iluminação e nos permite averiguar o comportamento das diferentes amostras sob as mesmas condições. N o momento o processo de envelhecimento foi iniciado, porém ainda não concluído. Ao seu término, realizaremos análises comparativas dos efeitos estéticos e estruturais, repetindo as análises feitas no início do processo, com remoção de amostras, dispersões, espectro de FTIR, etc. das policromias envelhecidas.

Conclusões

Nossos objetivos iniciais foram cumpridos na medida em que aprofundamos nossos conhecimentos sobre a policromia de esculturas em madeira e principalmente no que diz respeito as técnicas de acabamento de douramentos. Com esse trabalho temos a intenção de contribuir de forma objetiva, chamando a atenção dos profissionais de conservação e restauração para as várias possibilidades técnicas existentes no douramento, fazendo com que os procedimentos de limpeza e remoção de vernizes necessitem de um estudo preliminar mais aprofundado, para que não se remova camadas sem a real compreensão da policromia que se está tratando. Trata-se de um tema extenso e este trabalho não o esgota, sendo parte dos estudos que continuarão a ser desenvolvidos pelo Laboratório de Ciências da Conservação/ CECOR/ EBA/UFMG.

Agradecimentos

A equipe do Laboratório de Ciências da Conservação: Lílian Cavalcante de Melo, Selma Otília e João Cura D'Ars, pela contribuição direta ou indireta em todo o processo da pesquisa. À FAPEMIG - Principal agência Financiadora deste projeto, CNPq , VITAE -Apoio à Cultura, Educação e Promoção Social, IPHAN.The Getty Conservation Institute. As pessoas que de alguma forma contribuíram para o bom desempenho dessa pesquisa, em especial à Profa Beatriz Coelho, Profo José Luiz Pedersolli, Cristina Miranda, às alunas do 12o Curso de Especialização em Conservação e Restauração de Bens Culturais Móveis - CECOR/EBA/UFMG. A Cláudio Nadalin por toda a documentação fotográfica.

Bibliografia

ArtístsTechniques in Golden Age Spain - Six Treastises in Translation. Edited and translated by Zahira Veliz. Cambridge University Press, 1996.

BOMFORD, David . Art in the Marking - Italian Painting before 1400. With contributions from Jo Kirby. London: National Gallery Publications Ltd, 1992.

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Anais da ABRACOR - Escultura IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

CENNINI , Cennino. II libro dell'arte. Paris: Éditions Berger-Levrault, 1991. CESSION, Cristine. Les polychromies baroques et rococos du XVIII((( siècle: Etude

et reconstitution de quelques techniques de polychromie. Ecole Nationale Supérieure des Arts Visuels de Ia Cambre. Travail de fin d'etude - Cinquème année - Conservation et Restauration des Ouvre d'Art - Année académique 1987-1988.

MENEZES, Ivo Porto de. Manoel da Costa Athaide. Série: Biografias de artistas mineiros. Belo Horizonte: Edições Arquitetura, 1965.

NUNES, Felipe. Arte da Pintura, Simetria e Perspectiva (Fac-símile da edição de 1615 com um estudo introdutório de Leontina Ventura). Porto: Editorial Paisagem,! 982.

SOUZA, Luiz Antônio Cruz. Evolução da tecnologia de policromia nas esculturas em Minas Gerais no século XVIII: o interior inacabado da Igreja Matriz de Nossa Senhora da Conceição, em Catas Altas do Mato Dentro, um monumento exemplar. Belo Horizonte: Departamento de Química/UFMG, 1996. (Tese, Doutorado)

WATIN, Jean-Félix. L'art du peintre, doreur, vernisseur. Paris, 1802. 5a ed.

Notas

1 - Como submeteríamos posteriormente as placas ao processo de envelhecimento acelerado no XENOTEST, essas dimensões obedeciam as necessidades de encaixe ao suporte de corpos de prova do equipamento 2 - Para criação do motivo decorativo do esgrafiado nos baseamos em registros que nos foram cedidos pela Profa Beatriz Coelho, de esgrafiados de esculturas mineiras por ela estudadas em sua pesquisa.

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ABRACOR - Associação Brasileira de Conservadores-Restauradores de Bens Culturais

Retábulo do Altar-Mor da Igreja de São Francisco de São

Cristóvão/SE

Ana MariaVillar Especializada em Restauração de Bens Culturais Profissional Autônomo - CGA -119.865/001-03

Álvaro Silva Arquiteto - Restaurador de Bens Culturais CREA N° 26.280 D

1. In trodução

A cidade de São Cristóvão, no Estado de Sergipe, foi fundada em 1590 por Cristóvão de Barros. É considerada a quarta cidade mais antiga do Brasil e foi capital do estado até 1855, quando foi transferida a capital para Aracaju.

Cidade tombada como monumento nacional em 1967, possui várias construções religiosas civis e um belíssimo casario formando assim um dos mais belos conjuntos urbanos do país.

2. Igreja do Convento de São Francisco

A Igreja do Convento de São Francisco, antigo Convento de S. Cruz tem sua construção autorizada em 1667 no local onde primitivamente existia um recolhimento e uma igreja de taipa, porém, posteriormente foi construída pelos franciscanos, com esmolas do povo, durante a primeira metade do século XVIII.

Permaneceu esse convento abandonado por muitos anos; sofreu um incêndio de regulares proporções e foi restaurado no início do século XX - 1902.

A Igreja do Convento de São Cristóvão, de Sergipe e do Brasil, dado o seu valor histórico/artístico/documental e hoje, ao elaborarmos esse relatório de intervenção, em partes, do referido monumento, nos sentimos responsáveis pelo que iremos legar às gerações futuras.

2.1 Retábulo Chama-se Retábulo, as estruturas que se elevam na parte posterior do altar, desde os tempos antigos cristãos, com relicários, vem através da história sofrendo modificações como por exemplo no período medieval com grandes quadros, alguns com multiplicidades de representações (polípticas) e desde a renascença tomaram maiores dimensões; com nichos, imagens, colunas, camarins, tronos etc. sendo o seu clímax no barroco.

Os primeiros retábulos aqui no Brasil devem ter vindo à partir de 1550 de Portugal, e se tem notícias que nessa época veio também para a antiga Sé, em Salvador-Bahia, uma tábua pintada dedicada a Nossa Senhora, daí em diante outros vieram de Portugal e outros já entalhados aqui no Brasil.

Os profissionais que criavam os retábulos eram: 1. "Riscadores" 2. Entalhadores - entravam em concorrência ou arrematação (nome dado na época), era uma licitação pública, os "riscadores" entregavam os desenhos aos entalhadores e esses entalhavam. 3. Douradores - os que preparavam a madeira com gesso e cola várias demãos, muito finas e camadas de bolo também muito finas e a folha de ouro.

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Anais da ABRAÇOR - Escultura IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

4. Bate-folhas - os que transformavam os lingotes de ouro em folhas finíssimas para serem aplicados por cima do bolo. 5. Pintores - profissionais que elaboravam a policromia e a carnação.

2.2 Altar-Mor Estilo elegante, uma verdadeira versão francesa do barroco. Rococó-Hibrido

Cronologia - 21 metade do século XVIII. Características: • Decoração perde a exaltação do período barroco para detalhes mais minuciosos. • Volumetria bem menor que no estilo barroco. • Marcação dupla no horizontal e tripla na vertical. • Coluna salomônica com o fuste ainda torso, e 1/3 do mesmo com estrias em diagonal. • Assimetria nas talhas com detalhes mais minuciosos. • Guirlandas que se enroscam na parte mais profunda da coluna, com flores e folhas. • Dourado rosas e azuis. Imitação na madeira de outros materiais como o mármore e o jade.

3. Diagnóstico do estado de conservação

Ao diagnosticarmos o estado de conservação do Retábulo e da Mesa do Altar da Capela-Mor, da Igreja do Convento de São Francisco, só chegamos a uma conclusão mais verdadeira após desmontagem do altar-mor. Após exames preliminares, os elementos acima citados apresentavam os seguintes problemas a nível de conservação:

• Intervenções anteriores, que descaracterizaram as obras; • Grande penetração de umidade proveniente das infiltrações das águas fluviais que favoreceram a proliferação dos insetos xilófagos e desintegração física dos materiais; • Acúmulo de sujidades e fezes de morcegos; • Locais faltantes; • Perdas do douramento e da policromia, elementos faltantes do tabuado do forro, além de repinturas na mesa do altar-mor e das colunas torsas em número de 8 (oito) de estilo híbrido, ou seja, apesar de rococó, ainda torsa.

3.1 Estado de conservação do Retábulo e Mesa do Altar-Mor Retábulo em madeira entalhada com policromia e douramento, medindo cerca de 9,20m de altura por 8,40m de largura e 2,60m de profundidade. Encontra-se com perdas do entalhe, da base de preparação, da policromia, do douramento, atacado por insetos xilófagos, além da oxidação dos cravos usados para fixação da talha, sujidades generalizadas e repinturas.

O supor te em madeira sofreu dilatações, p rovocando fendas, fissuras, empenamentos e oxidação dos elementos metálicos de sustentação.

Após prospecções e cortes estratigráficos, verificou-se que o branco era uma repintura do século XX de má qualidade encobrindo a pintura original, imitação de mármore/jade em tons de azul ultramar, cabalto e cerúleo.

A mesa do altar-mor de estilo neo-clássico encontra-se com perdas de policromia, ataques de insetos xilófagos, com uma policromia imitando mármore em branco, preto e cinza.

Encontra-se com perdas de entalhe, da base de preparação, da policromia, do douramento; encontram-se atacados por insetos xilófagos, além da oxidação dos cravos usados para fixação da talha e sujidades generalizadas.

Camada espessa de verniz goma-laca.

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ABRACOR - Associação Brasileira de Conservadores-Restauradores de Bens Culturais

FIG 1 - Antes do tratamento

DEPOIS

FIG 2 - Depois do tratamento

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4. Intervenção de restauro

Considerando os problemas do estado de conservação e quantidade de documentação fotográfica, resolvemos elaborar esse relatório e outros específicos que se encontram em anexo.

4.1 Montagem dos Andaimes Foram armados nas áreas do altar mor, com muita resistência, para proteção do homem e da obra, e junto a estas foram colocados proteções de espuma.

4.2 Mapeamento gráfico e fotográfico

O mapeamento da obra foi acompanhado de documentação fotográfica e gráfica, fotos a cores e slides ou diapositivos, macro fotos, fotos de luz razante e exames sob a ação da luz ultra violeta, onde forem detectados alguns materiais corantes e retoques anteriores.

4.3 Higieni^ação A poeira transportada pelo ar foi se acumulando sobre as obras, aderindo à sua policromia e criaram uma camada de sujidades que impediram a boa visibilidade da obra e deterioraram vernizes e pigmentos ao reagiram com a umidade do ar.

A remoção dessas sujidades e de outras foram feitas com cuidados especiais, com trinchas macias, aspiradores, solventes adequados para esse tipo de intervenção, mesmo assim após um criterioso teste e quando aplicados trabalhava-se em pequenas áreas de cada vez.

Essa higienização só foi feita nas áreas que não estiveram frágeis ou em descolamento.

4.4 Desmontagem A desmontagem das peças que compunham as partes citadas onde houve intervenção foi total devido ao estado de conservação das mesmas.

Durante o desmonte das peças entalhadas, cuidados especiais com os cravos oxidados que foram retirados com estratores.

4.5 Imunização

As obras em madeira sofrem comumente ataque de elementos biológicos como fungos e insetos xilófagos e que contribuem de maneira acelerada para a destruição física/estética de muitos de nossos bens culturais.

A imunização dessa obra foi feita com Kotec, pelo seu poder imunizante e pelo limite de tolerância para o imunizador; é um piretróide de síntese, solúvel em aguarraz mineral e foi usado na dosagem de 4%, aplicado em pinceladas e injeções de acordo com a área danificada.

Todos os envolvidos nessa intervenção usaram luvas, máscaras e roupas apropriadas, além do uso de seringas hipodérmicas e a estocagem desse material foi obedecendo aos padrões definidos pelo fabricante.

4.6 Consolidação Estrutural Cada elemento individualizado paresenta problemas particulares. Assim, há muitas peças que apresentam degradações pela ação do cupim, outras pela ação dos fungos xilófagos e outras com fissuras, além de algumas áreas serem necesárias a substituição total do suporte.

As substituições e consolidações foram feitas de tal maneira que foi mantido o estrato de madeira original ainda capaz de sustentar o conjunto pictórico: base de preparação e camada pictórica.

Os matérias empregados nessa etapa de intervenção foram: Paraloid B 72 a 10% nas áreas de galerias causadas pelos insetos e preenchidos os espaços com parquetagem nas áreas mais comprometidas - tiras de cedro previamente imuniza-

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Anais da ABRACOR - Escultura IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

FIG 3 - Durante o tratamento

DEPOIS

FIG 4 - Depois do tratamento

das e acetato de ponivinila mais pó de serra de lixa 50/50 e 02% de formol, aplicados em camadas sucessivas, não superior a 3mm, sempre após a secagem de camada anterior.

As taliscas de madeira/cedro foram perfeitamente ajustadas ao suporte antigo, mantendo-se o mesmo sentido dos veios da madeira, sendo as emendas transversais unidas a 45° .

Entalhes feitos para substituir peças com cerca de 80 a 90% de comprometimento.

4.7 Limpeza da policromia/ Pintura e Douramento A limpeza da policromia e douramento é uma das etapas de maior responsabilidade numa interenção de restauro. Pensamos mais "criticamente" que no aspecto físico/ químico, respeitando a ação do tempo sobre os materiais e suas transformações.

Devemos nos basear nas pesquisas feitas com aparelhos de precisão, análises em laboratórios, para somente eliminar os elementos que deformam ou nalteram a leitura obra.

Foram feitos nessa obra rigorosos testes de solvência, tantos dos produtos utilizados pelo IRPA, pesquisados pela química Richard Wolbers.

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Diagrama Cromático dos Testes de Solvência Apresentados nas Fichas em Anexo

4.# Amassamento/Nivelamento Antes da reintegração estética que para tanto deve-se estudar os tipos de lacunas, estas devem ser emassadas e niveladas, e impermeabilizadas com verniz de Damar em porcentagem adequada no silol ou toluol.

Os emassamentos/nivelamentos foram feitos cuidadosamente pois dessa etapa dependerá a reintegração estética, ou seja, o retoque. Os materiais empregados nesta intervenção foram carbox metil celulose mais carbonato de cálcio e acetato de polivinila nas dosagens necessárias e gotas de formol.

4.9 Reintegração da Camada Pictórica Segundo Cesare Brandi "uma lacuna, no que se refere a Obra de Arte é fenomenologicamente uma interrupção no tecido figurativo, como também uma

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ABRACOR - Associação Brasileira de Conservadores-Restauradores de Bens Culturais

interrupção no texto de uma Obra, não tensmitida integralmente..." As lacunas podem ser de quatro tipos: irreversíveis, parciais, de superfície e de

profundidade. Havia no retábulo todos os tipos de lacunas e foram reintegradas de acordo

com a característica de cada uma.

5. Reintegração estética

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6. Verniz

O verniz de proteção foi aplicado com a técnica de aerosol com cuidados que requer este tipo de aplicação.

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7. Montagem

A montagem foi feita de acordo com a documentação gráfica e do verso das peças, após tratamento dos seus elementos estruturais, foram fixadas com parafusos de latão e com tarugos de madeira/cedro, previamente imunizados para fechamento dos furos provenientes da extração dos cravos.

8. Conclusão

Considerando o resultado da interenção a nível científico, o respeito pelas leis que regem as ações de restauro, o cumprimento das normas, estabelecidas no edital e do prazo de entrega, além da qualidade dos materiais empregados nesta intervenção, comprovados por diários de obra e fiscalização sistemática do órgão competente 8* Coordenação Regional do IPHAN, somadas às garantias dos nossos serviços executados, do aproveitamento parcial da mão de obra local e ter dado em aulas semanais visando uma educação patrimonial à comunidade de S. Cristóvão, encerramos nosso trabalho com uma demonstração pública da intervenção com uma palestra e projeção de slides. Mostramos as dificuldades na intervenção e a responsabilidade da comunidade em conservar este patrimônio.

Salvador, 26 de Agosto de 1998.

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Formação Profissional

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Anais da ABRACOR - Formação Profissional IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

Abstract

The Open Worksbop of Restoration was an enterprise undertaken altogether by the Pinacoteca do Estado of São Paulo and Instituto Paulista de Restauro. The worksbop 's aim was the restoration of 30 works from Pinacotecas collection and the whole work n/as coordinated by Prof. Domingo Te/lechea, with the aid of other 18 conservators-restorators. It was accomplisbed at Manoel da Nóbrega Hall (Ibirapuera Park), during the project called "Pinacoteca in the Park". It was deviced to make thepublic, as well the press, know the problems of conservating and restorating works of art. Through this iniciative the public could see activities usually performed only inside restricted áreas of museums. Besides its primary aim, another outcome of the Open Worksbop was an exhibition foliowed by the

publishing of a bulletin.

ATELIÊ ABERTO D E RESTAURO

Pinacoteca do Estado de São Paulo

Teodora Camargo Carneiro Valéria de Mendonça Conservadoras-Restauradoras Pinacoteca do Estado de São Paulo Praça da Luz, 02 01120-010 São Paulo, SP Brasil Fone: (011) 229 9844 Fax:(011)229 9272 [email protected]

Pela primeira vez, a Pinacoteca do Estado de São Paulo, órgão da Secretaria de Estado da Cultura, pode apresentar em um Congresso de Conservadores-Restaura-dores de Bens Culturais os resultados de um projeto inédito desenvolvido no museu.

Fundada em 1905, a Pinacoteca do Estado foi o primeiro museu de arte da cidade de São Paulo, instalando-se num grandioso edifício projetado pelo engenheiro-arquiteto Ramos de Azevedo em 1896 e inicialmente destinado a abrigar o Liceu de Artes e Ofícios. O prédio, que ocupa uma área de 12.000 m2, por seu inegável valor histórico e artístico, foi tombado pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado, o CONDEPHAAT, em 1982. Em suas dependências abriga-se um acervo composto de obras representativas dos séculos XIX e XX , e do qual constam cerca de 1.200 pinturas, 3.000 papéis, 500 esculturas e outros objetos diversos.

Tanto as instalações físicas da Pinacoteca do Estado quanto o acervo que nela se abriga foram durante muito tempo motivo de preocupação para os sucessivos diretores da instituição. Na gestão de seu atual diretor, Emanoel Araújo, o prédio pode enfim passar, ao longo de quase seis anos, por importantes obras de reforma há muito necessárias, visando adequar suas instalações às diversas funções a que deve responder um museu. Entretanto, esse trabalho não estaria completo se não fosse acompanhado por um esforço análogo de recuperação e preservação do seu acervo.

A situação em que se encontrava o acervo mostrava-se de fato preocupante. Assim, por iniciativa do diretor do museu, já no início de sua gestão, se realizaria em São Paulo em janeiro de 1993 o Primeiro Encontro Sobre a Arte de Restaurar Bens Culturais, nos espaços recém reconquistados pela Pinacoteca, com a desocupação dessas dependências pela Faculdade de Belas Artes. Por ocasião desse evento, teria lugar uma exposição com algumas obras do acervo em avançado processo de deterioração, chamando a atenção para seu estado de conservação. Desse encontro surgiria também a idéia da criação da Associação Paulista de Conservadores e Restaurado-tes, a APCR, que seria fundada no ano seguinte.

.Pela mesma época, com o apoio da Fundação Vitae, teria início o processo de adequação da reserva técnica e, paralelamente, a contratação de profissionais da área de restauração para integrar a equipe técnica do museu. A partir de então seria adaptado um espaço provisório para o laboratório de restauro, que só por ocasião da conclusão da reforma do edifício, em 1998, receberia uma grande área, com um projeto específico desenvolvido para o laboratório de restauro de papel e de pintura, concluindo-se ao mesmo tempo a instalação definitiva da reserva técnica.

Entretanto, na etapa final da reforma do edifício da Pinacoteca, em agosto de 1997, foi necessário deslocar toda a equipe técnica e administrativa do museu para o Parque Ibirapuera, instalando-se no pavilhão que originalmente abrigara a I Bienal de São Paulo e que, posteriormente ocupado pela administração municipal, foi recu-

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ABRACOR - Associação Brasileira de Conservadores-Restauradores de Bens Culturais

perado pela Secretaria de Estado da Cultura e restaurado em sua função cultural como Pavilhão das Artes Manoel da Nóbrega. Fora do espaço de sua sede, o museu ali desenvolveria o Projeto Pinacoteca no Parque, recebendo exposições temporárias e permitindo a exibição de parte do acervo, além de garantir a continuidade da ação de todos os departamentos funcionais da instituição.

Foi durante o processo de mudança do acervo, em dezembro daquele ano, que surgiu a idéia de instalar nas dependências do Pavilhão, como parte do Projeto Pinacoteca no Parque, um Ateliê Aberto de Restauro, de modo a permitir que algumas das obras mais danificadas pudessem ser restauradas e devolvidas ao público por ocasião da reabertura do museu em sua sede, após a conclusão dos trabalhos de reforma. Algumas das obras escolhidas para esse fim faziam parte da mostra paralela ao Encontro de 1993. Pretendia-se assim mostrar a evidente continuidade do trabalho ali iniciado, ao mesmo tempo em que se implantava um projeto inédito, dando ao público a oportunidade de acompanhar in loco, e no próprio ato de sua execução, um trabalho normalmente realizado em ateliês fechados, confinado aos bastidores de um museu. Assim, além de conseguir restaurar as obras, o projeto permitia divulgar junto ao público e à imprensa os problemas de má conservação de parte de um acervo

Para essa difícil empreitada, Emanoel Araújo convidou o Prof. Domingo Tellechea para formar e coordenar uma equipe de restauradores que, em conjunto com os técnicos do museu, iriam enfrentar um enorme desafio, que somava, além do estado precário das obras, a falta do equipamento necessário, de local adequado e o curto espaço de tempo para a execução do trabalho.

Inventariando o acervo deteriorado, os técnicos da Pinacoteca já haviam chegado a um total de 26 obras com dimensões consideráveis, que apresentavam problemas de antigas intervenções, grandes impregnações de cera, repintes, rasgos, craquelamentos, perdas e desprendimentos generalizados da camada pictórica, vernizes oxidados, furos, ataques de microrganismos e chassis inadequados, entre outros. Algumas destas obras possuíam molduras danificadas e outras eram inexistentes. Por outro lado, durante o desenvolvimento dos trabalhos, somaram-se às 26 obras inicialmente escolhidas mais outras 4, provenientes da Fundação Pierre Chalita, de Alagoas, em regime de comodato, completando o total de 30 obras que foram restauradas através do projeto desenvolvido de 25 de janeiro a 30 de abril de 1998.

Para sediar o Ateliê, o local escolhido dentro do Pavilhão foi uma área situada ao lado das instalações da administração, junto a um banheiro e em frente a um auditório provisoriamente adaptado como reserva técnica. Essa área recebia luz natural em toda sua extensão e permitia o livre acesso do público. O Prof. Domingo Tellechea surpreendeu a todos pela rapidez com que foi capaz de adequar e suprir esse local com todos os equipamentos necessários e colocados gentilmente à nossa disposição para a realização do Ateliê Aberto de Restauro. Para a aplicação de vernizes, adesivos e inseticidas foi utilizada a área externa do prédio.

A equipe por ele coordenada era formada por 18 conservadores-restauradores, dos quais 2 pertenciam aos quadros da Pinacoteca do Estado e 16 faziam parte do Instituto Paulista de Restauro. Essa equipe trabalhava das 8h às 18h, dividindo-se em dois turnos, de modo a cobrir o horário de funcionamento do museu, das lOh às 18h, de terça a domingo. A escolha desse regime de trabalho visava aproveitar a presença do público que visitava as exposições temporárias e que podia nessas ocasiões tomar conhecimento das atividades desenvolvidas no Ateliê.

Circulando livremente na área, o público podia contar também, como opção, com a visita guiada por um monitor, que lhe permitia acompanhar as etapas dê trabalho do ateliê. Dispunha igualmente de um painel de fotografias que mostravam os processos de intervenção em algumas das obras. Durante a realização do ateliê foram organizadas quatro visitações especiais para convidados da Associação dos Amigos da Pinacoteca. O Ateliê Aberto de Restauro recebeu um público estimado em 2.200 visitantes, compostos em sua maioria pelo público tradicional do museu -

6 6 g t U p O S o f g a n l z a d o s de escolas, de terceira idade, artistas plásticos, universitários e

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Anais da ABRACOR - Formação Profissional IX Congresso da ABfíACQR - Salvador/Bahia

profissionais da área. É inegável, porém, que a instalação do Ateliê despertou a atenção de outras pessoas além desse público-padrão, cujo interesse foi suscitado pelas matérias publicadas na mídia impressa e eletrônica. Na verdade, o Ateliê Aberto de Restauro contou com grande receptividade por parte da imprensa em geral, dando ocasião à publicação de matérias nos principais jornais diários, programas de rádio e televisão, além de jornais de bairro e revistas. Nas entrevistas, ressaltamos a importância da conservação preventiva, o caráter técnico e não artístico da profissão, o zelo pelo patrimônio público, bem como a formação e a ética profissional do restaurador.

Como resultado desse projeto, a Pinacoteca tomou a iniciativa, por ocasião da reabertura de sua sede, de expor em três das suas principais salas as obras restauradas no Ateliê Aberto de Restauro, dando continuidade ao trabalho de divulgação sobre a importância da conservação preventiva e da restauração dentro de uma instituição pública. A exposição, aberta ao público no dia 18 de maio e com duração prevista até 14 de junho, foi prorrogada até 15 de setembro graças à grande empatia e curiosidade despertada nos visitantes. A exibição também contou com visitas guiadas, por monitores que explicavam os processos de restauração e a importância da conservação preventiva do patrimônio artístico. A visitação pública da exposição foi de 40.000 pessoas.

Essa exposição permitiu uma segunda divulgação do projeto em toda aimprensa e ainda trouxe como resultado a publicação Obras Restauradas - Jornal do Ateliê Aberto de Restauro. Esse jornal, com 28 páginas impressas a quatro cores em papel couché e tiragem de 5.000 exemplares, é vendido por um valor simbólico na loja do Museu. Nele estão documentados, simplificadamente, os processos e técnicas de restauração utilizados em algumas obras. Tudo isso, a nosso ver, mostra a importância desse projeto, inédito em uma instituição pública, a qual se uniu a sensibilidade, dedicação e apoio do Prof. Domingo Tellechea. Tal iniciativa permitiu a comunidade, à qual se desuna seu trabalho, tomar conhecimento da importância da conservação preventiva e do trabalho de restauração que estão na base da preservação do patrimônio de que os museus são os guardiões.

Resumo dos autores

Teodora Camargo Carneiro e Valéria de Mendonça são formadas em restauração de pintura de cavalete pelo Instituto Paulista de Restauro e trabalham no setor de conservação e restauração da Pinacoteca do Estado de São Paulo desde 1994.

Todas as figuras. Área de exposição do Pavilhão no início da implantação do Ateliê Aberto de Restauro e algumas etapas de execução dos trabalhos

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ABRACOR - Associação Brasileira de Conservadores-Restauradores de Bens Culturais

Durante os trabalhos o público circulava livremente pelo Ateliê Aberto de Restauro e era recebido pelos restauradores. Exposição das Obras Restauradas. Público visitando a mostra e recebendo explicações através da monitora.

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R e l a ç ã o das obras Restauradas

IGNORADO Desembarque e Combate — sem data óleo s / tela — 40x76 cm

I G N O R A D O Chegada da Esquadra - sem data óleo s / tela — 40x77 cm

LOUIS MAILLE Paisagem — sem data — óleo s / madeira 40x51 cm - Doação da Família Silveira Cintra

SALINAS Y TERUEL Pedra dos Ladrões (Santos) — 1917 óleo s/ tela — 65,5x125cm

ALMEIDA JÚNIOR Ponte da Tabatinguera — sem data óleo s / tela - 46x60 cm

EDOARDO D E MARTINO Encouraçado São Paulo — sem data óleo s / tela — 35x60 cm

PEDRO A N T Ô N I O M. ESPOSITO Toureiro e Mulher — sem data óleo s / tela - 93,5x78 cm

NICOLO PETRILLI Retrato de Jovem — sem data óleo s / tela - 165x120 cm Doação da Sra. Leilah de Freitas Valle Oliveira

OSCAR PEREIRA DA SILVA Enlevement da Psyché (cópia de Pierre-Paul Prud'Hon) — sem data óleo s / tela - 171x148 cm

OSCAR PEREIRA DA SILVA Adoração dos Pastores (cópia da obra de Ribera , d i to Espanholeto) - 1914 óleo s-/ tela - 196x149 cm

CARLOS OSWALD Jovem Senhora Tomando seu Chá— 1916 óleo s/ tela — 172x125 cm Doação da Associação dos Amigos da Pinacoteca

CLAIRE MALIQUET Devant Ia Poudreuse - sem data óleo s/ tela - 181x147 cm Doação espólio do Sr. Horácio Belfort Sabino

LOUIS GALLET Última Nota - sem data óleo s / tela — 182x138 cm Doação da família Azevedo Marques

E. TABARY Le Pendentif — sem data óleo s / tela — 150x130 cm Doação espólio do Sr. Horácio Belfort Sabino

F. M U N O Z LUCENA Músicos — sem data óleo s / tela - 147 x 110 cm

VILA Y PRADES Retrato de Mulher - sem data óleo s/ tela - 110,5x115 cm

E. A. BOUARD Súplice du Dimanche - 1938 óleo s/ tela - 163x130 cm Doação espólio do Sr. Horácio Belfort Sabino

FRANÇOIS E. ZIER Ariane — sem data óleo s / t e l a - 161x114 cm Doação Galeria Jorge, Rio de Janeiro

JOSÉ MARQUES CAMPAO Rup tu re -1931 óleo s/ tela — 125x104 cm

MÁRIO VILLARES BARBOSA Jardim de Luxemburgo — sem data óleo s/ tela — 69,5x295 cm Doação da Família Azevedo Marques

SYLVIO ALVES Três Graças - 1955 óleo s / tela — 141x105,5 cm Prêmio Aperfeiçoamento Artístico. Artista Pensionista de arte executando obra para a Pinacoteca do Estado

PEDRO ALEXANDRINO Ganso e Ovos — 1898 óleo s / tela - 107x140 cm Oferecido pelo artista ao Governo do Estado

MANUEL PEREIRA MADRUGA FILHO Mãesinha — sem data óleo s / tela — 116x166,5 cm

ALMEIDA JÚNIOR Retrato do Dr. Manoel Lopes de Oliveira - 1 8 9 1 óleo s/ tela - 236x147 cm

PEDRO ALEXANDRINO Natureza - sem data óleo s/ tela - 127x87,5 cm Obra em comodato. Proprietário Nelson G. Planet

G. S. SPRINGAEL Paisagem (carneiros) - sem data óleo s/ tela - 104,5x154 cm Doação da Sra. Maria Renotte através da Sra. J. Louon

I G N O R A D O Retrato de D. João VI — sem data óleo s/ tela - 108,5x91 cm Obra em comodato. Fundação Pierre Chalita

I G N O R A D O Retrato de D. Pedro II - sem data óleo s/ t e l a - 128x104 cm Obra em comodato. Fundação Pierre Chalita

I G N O R A D O Retrato de D. Pedro II menino — sem data óleo s / tela — 107x88 cm Obra em comodato. Fundação Pierre Chalita

PROF. TOIR Retrato de D. Pedro 1 - 1 8 2 6 óleo s / tela - 106x91 cm Obra em comodato. Fundação Pierre Chalita.

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ABRACOR - Associação Brasileira de Conservadores-Restauradores de Bens Culturais

Ateliê Aberto de Restauro

Coordenação Prof. Domingo Tellechea

Equipe Instituto Paulista de Restauro Adriana Quilicio Barreto Ana Lúcia Nakandakare

Ana Maria Caires Scagliante Carlos Tripicchio Cristina Gonzaga Danilo Visitainer

Manuel Ley Rodrigues Maria de Fátima Faria Gomes

Maria José L. Arenas Mires E. Michelazzo Raul M. de Carvalho

Renato Félix Silvio José Pedro

Umbelina Ranzoni Viviane da Silva Maia Zizi Bandeira de Melo

Equipe da Pinacoteca do Estado Teodora Camargo Carneiro

Valéria de Mendonça Vanderlei Demeciano (molduras)

Conservação Antônio Carlos Tímaco

Humberto Licciardi Maria das Graças Rafael

Molduras João Alfredo Dutra

"Casa da Raposa" Nirceu A. Helena

"Nirceu Artes"

Agradecimentos Instituto Técnico do Restauro

Fundação Pierre Chalita Maria Lúcia Montes Nelson Gioia Planet

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Anais da ABRACQR - Formação Profissional IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

Abstract

When maintenance and restoration are mentioned, we immediately think of paintings and paper. Other materiais, like ceramics, seldom come to our minds. N o attention is given to them whatsoever. Ceramics was what mostly drew our attention on recount of a study of the collection brought to Brazil by Empress Tereza Cristina. Part of that asset is presently in exposition at Museu Nacional de Belas Artes, RJ, with a catalogue published in 1995. Realizing that no special courses can be found across the country, we have contacted Instituto Italiano de Cultura to reguest scholarships for italian institutions, specifically for Palazzo Spinelli in Florence. Since our request has been met, we are dealing with the possibity of widening the range to designing a laboratory for Museu Nacional, intensifying the interchange among people interested in the field, and training people. It is about this course and its evolution that we will be dealing.

Algumas Considerações Sobre a Formação Profissional na Área De Conservação e Restauração de Cerâmica Arqueológica

Simone de Sousa Mesquita Arqueóloga/Restauradora Instituição de trabalho: Museu Nacional da Quinta da Boa Vista - UFRJ Quinta da Boa Vista s/n - São Cristóvão - Rio de Janeiro. CEP: 20.940-040 Fones: 568-1314 e 568-1352 ramal: 229. Fax: 254-6695

D e s c r i ç ã o d o trabalho

A coleção trazida pela Imperatriz Teresa Cristina é de grande importância histórica e artística. Teresa Cristina nasceu em Nápoles em março de 1822. Filha de Francisco I, obteve educação que incluía belas artes, música e francês. Em 1842 é lavrado o seu contrato de casamento com o monarca brasileiro, D. Pedro II. Em 3 de setembro a frota imperial chega então à Baía de Guanabara . Por muitos anos governaram o país sempre com diretrizes progressistas. Entre 1879 e 1889, a Imperatriz passa a assistir a lenta degradação do Império, culminando com a proclamação da República.

A coleção em questão é composta de mais de 700 peças distribuídas entre vasos de cerâmica, lamparinas, estatuetas de terracota, objetos de bronze, pequenas esculturas em pedras, frascos de vidro, amuletos fálicos e painéis de pintura mural. Algumas destas peças fizeram parte da coleção da rainha Cartolina Murta, irmã de Napoleão Bonaparte, sendo esses objetos provenientes de escavação ou achados fortuitos de vários sítios arqueológicos da Itália. Essa coleção chegou ao Brasil a pedido de D. Pedro II, intermediada por Teresa Cristina ao rei de Nápoles, seu irmão Ferdinando. Na carta enviada, Teresa oferece ainda a possibilidade de permu-ta com objetos de nossos museus.

O trabalho sistemático de conservação e restauração teve seu início a partir do projeto "Tratamento das coleções cerâmicas arqueológicas do Museu Nacional", que atende exatamente essa parcela das coleções sob a guarda do Museu Nacional da Quinta da Boa Vista. Estendendo nossa atuação ampliamos esse projeto num convênio com o Museu Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro. A partir dessa parceria, inauguramos um espaço permanente no MNBA, a galeria de arqueologia e publicamos um catálogo com parte das peças da coleção trazida pela Imperatriz Teresa Cristina . Percebendo as dificuldades no campo de restauração de cerâmica , buscamos consultoria, cursos especializados e trabalhos na área. O resultado desse levantamento sobre o assunto, evidenciou o quadro bastante precário no qual se encontra a formação profissional no que tange a conservação e restauração de cerâmica.

Na tentativa de aperfeiçoar nosso recursos técnicos, contactamos o Instituto Italiano de Cultura afim de requerer bolsas de estudo no campo específico do restauro de cerâmica. Com nossos pedidos aceitos, fomos recebidos pelo Instituto Per L arte E II Restauro em Firehze. Esse centro é composto por cinco unidades, entre as quais o Palazzo Spinelli é sede central. O curso foi ministrado por três professores, sendo um deles especialista em cerâmica arqueológica. A direção do curso organizou ainda visitas a alguns museus e a outras unidades do instituto.

O resultado do curso foi significativo, o contato com esses profissionais e com as diferentes técnicas de restauro, levaram a revitalização de nossas diretrizes. No

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retorno, ratificamos nosso propósito de instalar um laboratório próprio no Museu Nacional da Quinta da Boa Vista - UFRJ. Nesse sentido, através da nova direção do museu na figura do Professor Luís Fernando Dias Duarte, foi definido o local para a instalação desse laboratório. O Museu do Forte Copacabana e mais recentemente o Museu do índio, serviram de referência ao nosso projeto. Representados pelo Professor Ivan Coelho de Sá e pela Museóloga Lúcia Bastos respectivamente, foram de enorme importância como suporte no resultado final.

Conclusões

Certamente o subtema que enfoca a formação profissional do restaurador merece ainda discussões mais profundas. Questões teóricas não foram suficientemente publicadas e debatidas. Nos Anais do VIII Congresso da ABRACOR, o trabalho entitulado "O desenvolvimento da restauração de bens culturais - uma abordagem histórica". Scharf (1996), trata do caráter do restaurador, sua subjetividade. N o nosso entender essa discussão deveria ter outros desdobramentos. Na prática, seria importante rever a posição dos órgãos de fomento e os requisitos pré-estabelecidos para aquisição de recursos. No momento somente a categoria "doutor" recebe auxílio para projetos e/ou passagens vinculadas a bolsas aprovadas por entidades estrangeiras. Esse procedimento limita sobremaneira a possibilidade de aperfeiçoamento dos profissionais de restauro. Acreditamos que esta seja a plenária adequada, neste momento, para nossas reflexões.

Bibliografia

COLACURCIO, Paola; GRILLO, Felicetta Wanda. Teresa Cristina Maria a Imperatriz silenciosa. Pontifício Santuário Di Pompei/ Istituto Italiano de Cultura, Rio de Janeiro, 1997.

KITCHEN, K. A.; BELTRÃO, Maria. Catalogue of the Egyption Collection in the National Museum. Rio de Janeiro. England: Aris e Phillips, 1990.

SCHARF, Claudia Philippi. O desenvolvimento da restauração de bens culturais -Uma abordagem histórica IN Anais do VIII Congresso da ABRACOR, Minas Gerais, 1996.

Resumo do autor:

Formada em Arqueologia é atualmente mestranda na Escola de Belas Artes no curso de História e Crítica da Arte com concentração em Antropologia da Arte. Lotada no Museu Nacional da Quinta da Boa Vista - UFRJ desde 1985, desenvolve Projeto de Curadoria das Coleções Cerâmicas Arqueológicas sob a guarda dessa unidade.

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Abstract

This paper describes a professional training program methodology directed to bookbinders and conservators who work in libraries. The main objective of this project is to develop the knowledge enabling judicious assessment of conservation conditions of rare works, therefore proposing an intervention in which technical and material used are in compliance with the ethic rules of conservation.

Treinamento Profissional: Critérios e Técnicas de Intervenção em Obras Raras e Especiais

Márcia Sartori de Toledo Encadernadora e Restauradora de livros Norma Cianflone Cassares

Conservadora/Restauradora de acervos em papel ABER- Associação Brasileira de Encadernação e Restauro Rua Machado de Assis 222, s/2 Vila Mariana. São Paulo , S.P. CEP: 04106-000 Fone / Fax : 5712892

D e s c r i ç ã o d o Trabalho

Da necessidade

Este projeto surgiu para suprir uma necessidade não prevista na execução de um projeto maior.

Atendendo a um pedido feito pela diretora da Biblioteca do Insti tuto de Biociências da Universidade de São Paulo, sra. Nelsita Ferraz de Campos Trimer , foi feito um estudo das condições de conservação das obras raras e especiais deste acervo.

Os resultados deste levantamento foram apresentados à Instituição sob forma de um relatório minucioso onde os dados das condições de conservação de cada obra foram acompanhados do tipo de intervenção necessária para a sua preservação , além de uma planilha de custos para a execução do plano preservação caso , um dia, a Instituição se decidisse por ele.

A diretora submeteu o projeto para avaliação da FAPESP e com a aprovação do Órgão , solicitou a verba para a sua execução.

A coleção é composta de aproximadamente 2230 livros e 1500 gravuras entre outras obras como mapas e obras de arte , em diferentes estágios de conservação.

Uma vez iniciado o trabalho e após a finalização da primeira etapa , que foi a higienizaçâo obra por obra de forma minuciosa , deu-se início ao trabalho de intervenção de conservação propriamente dita.

Baseados nos resultados das planilhas de levantamento do estado de conservação das obras , estabelecemos um critério de prioridades dentro do nosso plano de ação que foi previsto para ser executado em um ano.

Decidimos começar pelos livros , pois devido ao número e complexidade, exigiriam muito tempo.

Todas as intervenções previstas durante o levantamento do diagnóstico , foram baseadas no nosso conceito de critérios de intervenção, o qual segue as normas estabelecidas pelo código de ética na prática da conservação.

Como este trabalho foi programado para ser realizado por conservadores sob supervisão da ABER , no momento que iniciamos a execução desta 2a etapa , tivemos que reconsiderar todo o projeto , pois constatamos os desencontros de critérios nas tomadas de decisão nas intervenções.

Reformulamos o programa e decidimos aproveitar essa necessidade para por em andamento uma proposta que de há muito tempo nos propúnhamos a desenvolver , mas que nunca conseguíamos reunir todos os ingredientes necessários para tal.

Desta forma surgiu o curso de "Critérios e técnicas de intervenções em coleções

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especiais e raras", para treinamento dos profissionais da área , tanto nas técnicas de diagnóstico, como nas de intervenção , assim como no uso dos materiais adequados para a execução das intervenções.

O curso foi realizado na sede da ABER , com 2 turmas , onde os profissionais trabalharam nas obras raras deste acervo , ministrado pela professora Márcia Sartori Toledo e coordenado por Norma Cianflone Cassares .

Da Coleção

A maioria das obras já haviam sofrido algum tipo de intervenção . Em alguns casos , foram bem sucedidas. As características originais foram

mantidas e as encadernações corretamente efetuadas , evitando assim maiores danos nos livros.

Em outros casos , as intervenções anteriores foram a principal causa de deterioração da obra. A guilhotina , a serra , a cola , quando utilizadas de maneira indevida , são responsáveis por enormes estragos.

Livros que pertenciam a mesma coleção , foram guilhotinados em diferentes tamanhos e encadernados de modos variados. Muitas obras foram serrotadas diversas vezes, sem que a costura fosse desmanchada, páginas foram restauradas com adesivos e papéis inadequados etc.

D o Curso

Baseados nesses problemas que seriam nossa realidade de trabalho neste projeto , procuramos montar um curso de treinamento que tivesse como meta desenvolver no profissional, a capacidade de estabelecer critérios de intervenção que obedecessem as normas estabelecidas pelo código de ética na prática da conservação , assim como critérios na escolha de materiais adequados para o fim .

Este projeto foi também adequado para atender as prioridades do acervo , ao prazo estabelecido para a execução de trabalho , ao custo total do projeto , a disponibilidade e aptidões dos profissionais .

Desta forma , os materiais utilizados para a execução dos trabalhos foram selecionados de acordo com o padrão de qualidade , custo e viabilidade de aquisição ( quantidades e padrões disponíveis)

Para reparos do corpo do livro , foram escolhidos papéis japoneses de diversas gramaturas , para as guardas, papéis neutros e marmorizados. Quanto ao revestimento, optamos pelo couro, tecido importado próprio para encadernação e papéis marmorizados.

Muitos materiais importados foram apresentados para os profissionais para serem usados apropriadamente.

Metodologia do Treinamento

• Seleção das obras a serem submetidas a intervenção: Para o curso foram selecionadas obras que apresentassem diversos tipos de danos e principalmente os mais freqüentes ( Lombadas soltas, cantos deteriorados etc) o restante das obras foi distribuído entre profissionais , de acordo com suas especialidades. • Elaboração de ficha de documentação da obra: Com o objetivo de orientar e agilizar o trabalho de avaliação de cada obra , foi desenvolvida uma ficha de diagnóstico própria, que continha, basicamente, 5 itens: dados do livro, tipo de encadernação, estado de conservação do suporte e proposta de tratamento. • Proposta de intervenção: Coube a cada profissional, a I a proposta de intervenção, na qual descrevia todas as etapas da execução do trabalho, assim como os materiais a serem utilizados. Uma vez apresentada, a proposta era avaliada e discutida( discussão de critérios de intervenção). Quando necessário eram feitas alterações, sempre visando o melhor resultado dentro do quadro geral que en-

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globa desde critérios e técnicas nas intervenções, a disponibilidade de materiais adequados, condições de armazenamento etc. Cada profissional recebeu no mínimo 2 obras a serem trabalhadas simultanea

mente. Desta maneira, ele foi induzido a um melhor aproveitamento de sua hora de trabalho, utilizando as etapas que exigem uma pausa (secagem, prensagem, câmara de umectação etc.) para dar continuidade em uma outra etapa de outra obra. Este gerenciamento de tempo também faz parte importante na execução de um grande projeto.

Conclusão

Baseados nas dificuldades encontradas neste projeto com relação a mão-de-obra, a ABER reformulou o programa de aulas na formação de encadernadores.

A partir deste ano os alunos que vem para a ABER e que quiserem trabalhar na área como profissionais, submetem-se a cursos regulares programados. Estes cursos são organizados em módulos com conteúdo programático destinados à formação de encadernadores de forma gradual, desde o básico até o avançado. Estes alunos recebem o certificado de cada módulos, onde vem descrita a carga horária, freqüência e avaliação do aproveitamento do curso através de trabalhos realizados em classe e um trabalho final submetido a avaliação de um membro da ABER. Uma vez aprovado, o aluno estará apto a seguir num módulo mais avançado.

Ao mesmo tempo que ocorrem estes cursos regulares, oferecemos cursos paralelos de curta duração com conteúdos destinados a enriquecer o profissional, tanto nas técnicas da encadernação como nas noções de conservação e preservação.

Desta forma, o profissional pode visualizar as diversas áreas de atuação no mercado de trabalho e estará apto para escolher, de forma consciente , onde vai atuar. Sentimos que esta metodologia será de grande ajuda tanto para a orientação dos profissionais nas suas carreiras como para nós que saberemos onde buscar o profissional adequado para realizar determinada tarefa.

Na verdade não estamos inventando nada de novo , apenas estamos tentando colocar uma metodologia na formação de profissionais que por não terem sua profissão reconhecida , não encontram no ensino , cursos de formação programada.

Agradecimentos e Participações

Agradecemos muito especialmente a diretoria da Biblioteca do Instituto de Biociências da USP que com a aprovação de um projeto de conservação de suas coleções de obras raras e especiais nos permitiram desenvolver este outro projeto para treinamento profissional. Foram muitos os profissionais que colaboraram, direta ou indiretamente para a execução deste projeto. Agradecemos a ajuda na administração assim como o interesse e participação assídua dos integrantes dos grupos de treinamento Adriana Rocha , Alexandra Frangulis , Beatriz Cocco,Carlos Ernesto Triguis, Gabriela Lipkau, Illo Zemma Codognoto, Ingrid Alonso, Mareia Burgos , Maria Angela Machado , Maria do Socorro Freitas Silva , Maria Zenita Monteiro , Marisa Ferreira , Orieta Vaequez , Teresa Teruko Doi, Therezinha Nardy entre outros.

Os Fornecedores, que com muita paciência e competência esforçaram-se por conseguir materiais especiais e por desenvolveram outros com especificações diferenciadas para uso específico em intervenções em obras especiais.

Papel Japonês Couro Papéis Artesanais World Paper Orlando Okanishi (alcalinos) Rua Belmiro Braga, 49 Resumo dos autores Esteia Pozo São Paulo S.P. Rua Motuca, 40 R. Ascenso Ribeiro, 151 Fone: (011)212-6812 São Paulo SP São Paulo SP Fax : (011) 8527660 Fone : (011) 5714180 Fone: (011) 8429130

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Resumo dos Autores

Mareia Sartori Toledo - encadernadora e restauradora de livros. Leciona encadernação na sede da ABER e presta serviços em bibliotecas particulares e públicas desde 1989 assim como para empresas particulares. Membro da ABER

Norma Cianflone Cassares- especialista em conservação e restauro de obras sobre papel. Membro da ABER , com atuação na coordenação de cursos e assistência a instituições acadêmicas , públicas e particulares.

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Kesumen

Actualmente vemos aparecer cada vez con más enfasis dentro de los círculos de formación profesional Ia idea de adoptar ai estúdio dei Conservador -Restaurador una matéria de caracter interdisciplinario que contemple Ias distintas instâncias a Ias que ei Restaurador-Conservador se enfrenta a Ia hora de devolver a Ia obra su original sistema de lectura. Esta matéria que se piensa con aportes desde distintos aspectos como ei histórico, ei ético, ei técnico y condicionantes de Ia percepción entre otros se Io puede englobar con una denominación que es : " Color y Técnica de Reintegracion Pictórica". Los problemas dei color se estudian adoptando diferentes puntos de vista: físico- químico, fisiológico -psicológico, Ia realidad cromática es ei pigmento, matéria colorante que se determina y analiza desde ei punto de vista químico y físico, que asume su contenido y significado humano a través de Ia percepción de Ia retina y dei cérebro. La evaluación cromática, dei color constituye Ia realidad psico-física que se define como efecto cromático. Se ha comprobado que desde ei punto de vista fisiológico, un cuadrado rojo es Ia imagen sucesiva de uno verde despúes de haber sido mirado. Fenômeno de constraste de sucesión. Muchas veces ei retoque es concebido desde afuera e independientemente. Con Ia teoria de M.E. Chevreul (Ia dei rojo-amarillo-azul) quiero acercar una visión clara y precisa dei método que luego emplearemos para lograr Ia "unidad" de Ia obra. Complementos pigmentarios verdadero según ei americano Arthur Pope. Serán estudiadas en profundidad Ias leyes, teoria de Ia percepción, sintáxis cromática; así como Ia construcción plástica de Ias obras para que cada conservador-restaura-dor pueda seleccionar Ia técnica de reintegracion más idônea en cada caso.Para concluir Io que propone Baldini los métodos de reposición dei color por "Abstracción cromática" , " Selección dei color" y otros métodos que Ia actualidad exije. Centra su atención en Ia parte práctica dado que estas disciplinas tan complejas no pueden ser abordadas solo desde Ia teoria.

Color y Técnica de Reintegracion Pictórica

Esteia Court - Licenciada I .N.S.C.Ins t i tu to N ac i o n a l Super ior de Cerâmica

R.O.A.Res taurac ión de O b r a s de A r t e s

Área F o r m a c i ó n Profes iona l

Di recc ion : Marce lo T. de Alvear 2371 P b : B Capi tal Federal - Cp:1122

Aires - Argen t ina - T e l / F a x : 00 54 1 822-0428

B u e n o s

Introducción

H I S T O R I A O A N T E C E D E N T E S

"La tendênc ia de Ia H u m a n i d a d a p r o t e g e r y conse rva r Io que p o r diversos mot ivos

le era valioso, ha sufrido una serie d e t r ans fo rmac iones a Io largo de Ia His tor ia . La

Conse rvac ión-Res tau rac ión h a n e s t ado d e t e r m i n a d a p o r los d is t in tos significados

en c u a n t o a ideas religiosas, filosóficas, estéticas y polí t icas.(plano ideológico) y lo

g r o s científicos (plano técnico) .

Muchas obras ban sido muti ladas en su tamafio y f o r m a t o para acondic ionar las a

los nuevos usos y emplazamien tos o hien modif icada iconográf icamente . Repintadas

para lograr endu lzamien to de rasgos , anad idos decora t ivos ( câmbios de gustos

e té t icos) , h e c h o s poUticos e ideas rel igiosas."

F.l d e s c o n o c i m i e n t o de es tos avatares, h a l levado a e laborar teorias infundadas y

e r rôneas sobre art istas y escuelas c o m o en ei caso de Ia p in tu ra de Miguel Ange l de

Ia Capilla Sixtina, o d e Ia supues ta Santa Catal ina de Ia Galer ia Borghese cons iderada

una o b r a anôn ima de un p in tor manieris ta y que luego de u n levantamiento de repintes

resul tó nada m e n o s que "La D a m a dei Un ico rn io"de Rafael".1

C R I T É R I O S A C T U A L E S : Cualquier o b r a de ar te u ob je to s u p o n e dos instâncias

Ia Es té t ica (calidad de Io artíst ico) y Ia His tór ica , p r o d u c t o h u m a n o real izado en u n

t i e m p o y lugar in se r t ado en o t r o t i e m p o y lugar.

L o s ohjetivo.s son devolverle a lâ o b r a su legibilidad desde u n p u n t o de vista

es té t ico sa lvaguardando t o d o s sus valores documen ta l e s genu ínos e intactos .

E l afán d e i n t e r v e n i r " p i c t ó r i c a m e n t e " l a s " l a g u n a s " n o h a s i do s u p e r a d a ,

genera lmente "su re in tegracion pic tór ica" ocul ta da tos impor t an t í s imos q u e deb ie ron

ser r e spe t ados c o m o d o c u m e n t o .

La L A G U N A es Ia pe rd ida de Ia matér ia p ic tór ica que p rovoca una falta de

con t inu idad en Ia un idad estética de Ia ob ra .

La ins tância de Ia re in tegrac ion c romát i ca requie re u n t r a t amien to especial y

necesi ta ei apo r t e de varias disciplinas para su fo rmac ión tales c o m o His tor ia dei

A l i e , Tecnologia de los materiale.s y técnicas, Vis ión y fundamen ta lmen te una

Teor ia sólida de los colores . Sintáxis comple t a dei comple jo c o m p o r t a m i e n t o dei

color .

El color en una o b r a nunca se Io ve c o m o es en Ia realidad, induc ido p o r su

e n t o r n o modif ica su luminos idad , c romat ic idad , t empera tu ra , tamafio dei área que

ocupa y de aqui p o d e m o s dec ir q u e e s ei m é d i o m á s relat ivo q u e e m p l e a ei arte .

E s en este con t ex to d o n d e reside Ia comple j idad que d e b e cubrir ei es túdio de Ia

re in tegrac ion cromát ica .

Hay dos tendênc ias básicas de los cr i tér ios de res taurac ión que encuadran ai

r e toque pic tór ico. Se e n c u e n t r a n en opos ic ión .

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ABRACOR - Associação Brasileira de Conservadores-Restauradores de Bens Culturais

ILUSIONISMO INTKCÍR \< LOMSMO PURISMO MI'SEOI,CX;KX>

PtiNTEAbo TRATEGGIO

ILUSIONISMO: Critério que más responde ai gusto dei público. N o respeta ei hecho histórico y más de Ias veces ei estético. La laguna es disimulada mediante una reposición idêntica e imitativa y con ei peligro de caer en ei "repinte" . E n contraposición ai PURISMO donde Ia laguna no se elimina, se reintegra mediante un tinte neutro por abstracción en forma plana o trama pictórica.

Entre ambas posiciones se idearon otras soluciones haciendo Ia laguna distinguible. I N T E G R A C I O N I S M O Pun teado y Tra t teggio (técnicas italianas) ei retoque

se aprecia integrado a distancia pero identificable de cerca; recomposición óptica dei color, siendo ei PUNTEADO ei sistema más extendido de aspecto moderado. Basada en Ia teoria Divisionista de los post Impresionista, sólida teoria de color de Chevreul transmitida por ei americano Pope.

Para evitar médios competitivos e imitativos se aplican los métodos por: SELECCION D E L COLOR Y ABSTRACCIÓN CROMATICA referidos ai valor dei color.

SELECCION DKT, COLOR :. Encontrar Ias características y sus componentes a través de los cuales se puede recomponer en ei ojo ei efecto dei color mismo. Se logra identidad de efecto.

Unión formal y cromática. Técnica que utiliza aplicaciones de color mediante tratteggio: "pinceladas no yuxtapuestas, adyacentes, tampoco sobrepuestas" . Ejecutadas de manera tal que una parte de ellas quede siempre a Ia vista, y Ia otra parte se mezcle con los adyacentes y subyacentes. Sumando de una adición.

El ojo no captará solamente ei resultado de Ia suma, sino ei valor cromático de cada sumando que varia en intensidad y calidad justamente en función de aquella suma lograda parte por parte. Esta es Ia diferenciación.

ABSTRACCTON CROMATTCA: Capacidad dei ojo de distinguir cada color de una policromía y capacidad de reunirlos a cada uno independintemente de los demás. Unión cromática .La laguna no puede eliminarse, deberá asumir ei valor de unión conbexisKneyirxiemierrupcmmcaldadd^

N o crea un nuevo color monocromo, se une en forma pluricrómica con los colores existentes, en una suma realizada por ei ojo.

Tal tratamiento de unión "neutro"en ei contexto de Ia obra, no deberá realizarse en función de los colores adyacentes; ei tratamiento deberá ser único, igual para toda Ia obra en si.

La abstracción se realiza con un tejido pictórico obtenido de Ia sobreposición en pequenos trazos entrelazados. Se arma una trama pictórica de trazo homogêneo y ordenado.

Guia de or ientac ión para ei e s túd io de los factores cond ic ionan te s de Ia p e r c e p c i ó n y lenguaje p lás t i co de Ias obras p a r a p o d e r llevar a cabo Ia re iontegración cromát ica .

EL VALOR EN ACROMATICOS Y CLAVES TONALES La percepción es ei resultado de diferencias en ei campo visual, Ias diferencias de intervalos entre un valor y otro están demostradas en Ia escala de valores.

Valor es Ia cualidad pigmentaria constante, grado de claridad y obscuridad de los tonos. Cantidad de luz que puede reflejar una superfície. Altura lumínica.

i Las dimensiones dei tono acromático son: valor y luminos idad Puede ser cromático o acromático y pertenece a aquella superfície que refleje

más o menos luz. Luz máxima -blanco- u obscuridad absoluta-negro. Una clave tonai es un hecho decisivo por su clima dominante dentro de Ia

configuración de una obra. No solo como estructura sino como factor expresivo.

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Anais da ABRACOR - Formação Profissional IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

TONO CROMATICO Y ACROMATIOO

tNSIONlft

•CIOIIlílUCO

colorviihií sauiiHción

TEMPERATURA

•aeramntKe valor himinnsjíUid

•ciomaiico UIIUUJ tVí.-i

CONIIGURACION TONAI.

In a

•eroinaUcoratta, j media y haja

1 DIRKCCION

•acroinatieo: alia, media y haja

•munatico varias

direccioncs

•acrreiiatico una liireccitMi

VARIANTES PERCEPTIVAS D E LA SENSACION LUMINICA. EL VALOR EN CROMATICO, CÍRCULOS. SINTAXIS DEL COLOR

Las principales variantes perceptivas son: A- CROMATICIDAD: (cromático y acromática). B- TEMPERATURA: (colores cálidos y frios - concéntricos y excêntricos. C- T O N O : como sinônimo de color (monocromía, policromía). D- VALOR LUMINICO: altura lumínica. E- INTENSIDAD: saturación. F- D I R E C C I O N D E L T O N O C R O M A T I C O : - cual idades p igmen to . Conformación dei tono

Las dimensiones dei tono cromático son :- Color, Valor y Saturación El Círculo cromático dei americano Ross Pope es ei de doce colores Verdaderos Complemetarios Pigmentarios basándose en una T.ey Natural de Armonía Y amarillo B azul y R rojo. Siendo Ia realidad cromática ei pigmento con sus mezclas sustractivas. Se usa Ia nomenclatura inglesa porque es Ia única que no repite las iniciales. El Color Luz partiendo dei espectro lumínico y sus mezclas aditivas, tiene como

Primários

l u z índigo B V

R o j o R

Verde G

Secundár io

l u z índ igo B V + R = JM agenta

R-t-G= Amarillo

G + B V = C y a n

M e z c l a d o s r e c o m p o n e n Ia hiz H Ia rica

Los secundários dei color luz ( Magenta- Amarillo cromático y Cyan)- son los primários dei Círculo de los Colores Generativos usados para Ia reintegración en grabados y gráfica en general dado que las tintas parten de los primários de esta saturación. Encontramos las variantes perceptivas de temperatura, los cálidos a Ia izquierda excêntricos y expansibles y los frios a Ia derecha concétricos y nucleados según Kandinsky. Circulo de verdaderos complementos pigmentarios Circulo de los colores generativos

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ABRACOR - Associação Brasileira de Conservadores-Réstauradores de Bens Culturais

Chevreul crea en 1939 El arte de Ias Armonías dei color. Los colores individualmente eran bellos en si mismos, también los tonos dei mismo color, los distintos análogos, también los diferentes colores constantes.

ARMONÍAS D E POPE El círculo se descompone en unidades diferenciadas en cuanto a color - valor y saturación

a) Intervalo de tríadas (polares entres si) Primaria -Secundaria - Terciaria cálida y fria colores colocados a igual distancia perceptual y estructural. Se grafican con un triângulo equilatero. b) Intervalos de complemetario opuestos polares entre si- complementario verdaderos mayores y menores .aproximados, divididos,dobles mayores y mútuos. 3a2- 5a2 y 5a3. c) Intervalos de alternos (contíguos en ei círculo) três estructuras perceptuales distintas .Intervalo asimétrico, ei color central de Ia tríada es ei que da Ia denominación.

b)COLORES COMPLEMENTARIOS: opuestos que se atraen y se relacionan percibiendose en su plenitud, diferenciándose se integran y se compensan en oposición. Dan origen a una sensación de equilíbrio e integración. Esto se debe ai trasfondo psicológico dei efecto de postimagen retiniana que trabaja por pares de oposición cromática.

Complementar ios luz: cont ienen a todo ei espect ro pues mezclados reconstruyen Ia luz blanca (mezcla aditiva). Complementarios perceptuales o psicológicos: sustentados por Ia posimagen retiniana semejante a los dei círculo pigmentario. Complementarios pigmentarios: producen con su mezcla distintos neutros (quebramiento)

Yuxtapuestos producen ei efecto de contraste simultâneo.

M. E. Chervreul (1786 - 1889) Fué Director de teríidos en los trabajos de tapices Gobelinos en Paris, importante químico de su época. Una muestra verde en un campo azul puede parecer naranja amarillento. Y negro contra ei rojo puede parecer verde.

Chervreul ai investigar estos opuestos comprende que se debía a Ia influencia de un color sobre otro. Fenômeno ai que bautizo con ei nombre de CONTRASTE SIMULTÂNEO demostro ser ei resultado de efecto post imagen.

CONTRASTE SIMULTÂNEO: efecto óptico: Sensación de color que adquiere una superfície neutra ai estar rodeado con un color real.

Los colores reciben influencia de sus vecinos. Cuando se yuxtaponen, ei contraste intensifica Ias diferencias entre ambos, se dan diferencias de valor - color -temperatura e intensidad.

Los colores claros acentúan Ia profundidad y los oscuros tienden a acentuar ei brillo de los colores.

Todas estas imágenes inducidas que casi siempre se hallan en ei campo de los complemetarios se dan porque ei ojo necesita de los complementarios y esta necesidad tiene razones fisiológicas. FACTORES TONALES Hay vocablos como tinte, matiz y tono que son utilizados como sinônimos, estos vocablos, aparte de su analogia se les da una disposición exacta de sus funciones. El color puede estar SOBRESATURADO : reconocemos ei tono pero percibimos sobresaturación por transparência/ vidrio, fluorescencia, fosforescencia) SATURADO: máxima intensidad cromática pigmentaria. DESATURADO: incorporar a un color otros ajenos a él. Mezcla con acromático u SUBSATURADO: desaturación total donde reconocemos cromaticidad pero no su origen tonai.

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Anais da ABRACQR - Formação Profissional IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

Los distintos pasos de desaturación son: tinte, tono, matiz y quebramiento. Tinte:

Desaturar ei color original con blanco en pasos progresivos, hasta llegar a valores altos y como sinônimo de color.

Matiz: Cuando un color desde su saturación máxima va hacia los negros, es decir ai color original se le incorpora negro, valores bajos, pesados, sordos. Reconocimiento de un color en otro (ejemplo, turquesa, púrpura).

Tono: Con gris, ei color se matíene pero cambia su saturación, se hace terso, apasible, atmosférico. Tono A; tono que surge de incorporar gris dei valor dei color . Si es R su valor será gris 4. Tono B; desaturar ei color original con ei gris dei valor dei color complementario Se obtiene tono B dei R incorporándole gris dei valor 6 que es ei valor dei G su verdadero complemento y como color con su opuesto y acromático

Neutro: mezcla de opuestos. Los pasos sucesivos entre un color y o t ro se llama quebramiento.

Las distintas modalidades de Ia representación plástica de los objetos, se ve a través de las épocas. El claroscuro donde están distribuídas las luces y sombras con más o menos contraste. ( modelado, modelado con claroscuro, claroscurismo, y modulado) y ei ajuste tonai plano como modo propio de Ia representación bidimensional.

COLOR MODELADO: Pasaje que va dei valor alto de Ia luz ai valor bajo de Ia sombra con Io que provoca sugerencia de volumen en los objetos. Gradación a través de Ia mezcla con blanco o negro.

Color puro en Ia luz, y para llegar a Ia sombra mediante Ia mezcla con negro. Puede estar ei color puro en Ia sombra y para llegar a Ia luz mediante Ia mezcla con blanco. O ei color puro local en ei objeto y para Ia luz con blanco y Ia sombra con negro.

COLOR MODULADO: Sugerencia pictórica tridimensional que se puede obtener ai provocar sensación de luz y sombra basándose en ei valor dei color y su temperatura.

La sombra no es carência de luz sino de otra calidad. El color de Ia sombra es ei opuesto de aquel que se encuentra en Ia luz siendo este más cálido que ei otro. Ej: Y-V, amarilo luz y violeta sombra. Acepta ei blanco pero no ei negro

El Neoimpresionismo es Ia escuela pictórica que más tuvo en cuenta las relaciones dei color modulado.

MEZCLAS Y MANCHAS: Además de tener en cuenta ei claroscuro y ei ajuste tonai plano para ei análisis de obras las mezclas y las manchas también hacen su aporte, que deberán ser tenidas en cuenta.

MEZCLAS PIGMENTARIAS FUNDAMENTALES:

A)- mezcla íntima: cuandn dos tonos cromáticos o acromáticos dan por suma otro tono

EJ: R+Y= O El color y ei tono se perciben como tonos pigmentarios planos en forma local. Es posible lograr contornos definidos o fundidos según sea tratado ei tono. La definición o fundición es provocada por ei contraste entre tono y tono. B)- mezcla vibratória o mescla óptica :

Lograda no por mezcla pigmentaria, sino por Ia yuxtaposición de pinceladas cortas

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de matéria. Al cubrir por yuxtaposición de tonos cromáticos ( complementarios, alternos, adyacentes etc.) se producen nuevos tonos. Observadas Ias superfícies tratadas por vibración a una cierta distancia provoca sensaciones de color en Ia retina, esto es puramente óptico. Esta mezcla constituye un valioso médio de expresión plástica para impresionistas y divisionistas que perseguían Ia sensación de luz y atmosfera en Ia superfície.

r.)-mey.r.la iridiscente: Se producen cuando dos tonos se arrastran mutuamente apareciendo entre si mezclados con varias gradaciones (mancha fundida).

LA MANCHA

Esta relacionada con Ia terminación pictórica. Las manchas pueden provocar contornos definidos, vibrantes o fundidos. Tipos de manchas: A) estirada: se trasluce ei fondo dei soprte (tela o papel etc.) B)-separada: pequenas superfícies rectangulares. C)-en coma: acentos pequenos en forma de coma con un cierto ritmo. D)-dividida: es óptica; pequenos puntos o rayas yuxtapuestos fusionandose y provocando sensaciones diferentes de color. E)-fundida: mezcla iridiscente, arrastra ei color.

MEZCLAS MANCHAS CONTORNOS iridiscente — fundida — fundidos vibratória dividida vibrantes íntima estirada y separada — definitorio según

uniforme como sea tratada

METODOLOGIA El programa se desarrollará en forma teórica y práctica, con proyección de slides y visitas a un museo donde se puedan analizar las pinturas. El teórico en general es intensivo y Ia práctica abarca un 70% dei desarrollo. Critérios y tipos de reintegraciones, variantes perceptivas - sintaxis - cromática -mezclas ópticas. Introducción a Ia selección dei color y abstracción cromática. Práctica intensiva de color, Isovalencia, Desaturación, Inducción por contraste y ejercitación de punteado, trattegio en facsimilies, acuarelas, grabados, pinturas. Claroscuro modelado y modulado. Punteado, tratteggio. Y por selección y abstracción. Reposición de dorados. Orden de trama. Imprimaciones como base pictórica, pigmentos y aglutinantes sintéticos (Plextol, AYAF, (acetato de polivinilo) y pigmentos formulados para retoque.

CONCLUSION

Es Ia intención en este tema que se piensa como propuesta para ei perfeccionamiento profesional brindar a los mismos no solo una solvência en Io que a teoria refiere sino que también una metodologia fundamentada que otorgue ai trabajo de intervención en una obra de arte una lógica de funcionamiento cada vez más separado de aquellos tratamientos arbitrários que se suelen encontrar, que damnifican y desbirtúan enormemente nuestro Patrimônio

BIBLIOGRAFIA ESPECIFICA PARA COLOR

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Artes 1968 CENINO CENINI- El Libro dei Arte, Vicenza Ed. F Brunallo, 1971

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Anais da ABRACOR - Formação Profissional IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

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GARAU, Augusto , Las Armonías dei Color, Barcelona, Ed Paidos. 1986 G O E T H E - Teoria de los colores, Ed. Poseidón. 1968 HESSELGREN S, Los médios de expresión en Ia arquitectura, Buenos Aires, Ed.

Universitária. 1959. ITTEM J.- El arte dei color, Paris . Ed. Bouret 1975 KANDINSKY W.- De Io espiritual en ei arte, Buenos Aires, Ed. Galatea . Nueva

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N o t a

1 MACARRON,A., Historia de Ia Restauarción Conservación, PP 13, Ed. Tecnos,, Madrid, 1995

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Resumen

Veintitres becarios participaron de una experiência de entrenamiento en conservación preventiva y diseno de exhibiciones que como resultado produjo una exposición disenada y construída por los participantes. Además los participantes debían llevar a cabo proyectos de conservación y exhibición en sus respectivas instituciones.

"Los Senores dei Jaguar," Una exhibición modelo como

resultado de una experiência de entrenamiento

Maria Esteva Conservadora, Arenales 1174, 2do. 11, (1061) Buenos Aires, Argentina. Te : 812-8498

Magdalena Mieri Especialista de programas, Center for Museum Studies, Smithsonian Institution. SI, Arts and Industries Building, Suite 2235, MRC 427, Washington, DC 20560, USA. (202) 357-3101, Fax (202) 357-3346.

Patrícia Lissa Conservadora, Museo de Arte Hispanoamericano Isaac Fernández Blanco.

Patrício López Méndez Disenador de exhibiciones, Museo de Arte Hispanoamericano Isaac Fernández Blanco y Museo Etnográfico Juan B. Ambrosetti. Dirección Museo de Arte Hispanoamericano Isaác Fernández Blanco : Suipacha 1422 (1011) Buenos Aires, Argentina. Te 327-0272.

Fundación Antorchas, Museo Etnográfico J. B. Ambrosetti, Argentina Centre for Museum Studies, Smithsonian Institution, USA

Introducción

En noviembre de 1997 Ia exposición "Los Senores dei Jaguar" se abrió ai público en ei Museo Etnográfico Juan Bautista Ambrosetti de Ia Universidad de Buenos Aires. La muestra representa ei resultado dei trabajo desarrollado durante el primer Seminário de Ent renamien to en Conservación Preventiva y Exhibición de Colecciones Arqueológicas y Etnográficas en Argentina. El programa fue organizado por Ia Fundación Antorchas de Argentina y el Center for Museum Studies dei Smithsonian de Estados Unidos. El Museo Etnográfico Juan Bautista Ambrosetti de Ia Universidad de Buenos Aires fue seleccionado como museo sede. El objetivo dei programa era brindar entrenamiento teórico y práctico en conservación preventiva y exhibición, proveer de soluciones a problemas específicos que presentaran Ias instituciones participantes y aumentar Ia cooperación entre estudiantes e instructores.

La decisión de explorar un proyecto que involucraba el entrenamiento dei personal de museos se basó en un documento escrito por Bettina Raphael en 1989 en el que describía el estado de varias colecciones arqueológicas y antropológicas de Argentina, y en un viaje de evaluación por vários museos dei país realizado en septiembre de 1995 por Magdalena Mieri dei Center for Museum Studies (CMS)y Carolyn Rose, Vice Directora dei Departamento de Antropologia dei Museo Nacional de Historia Natural, ambas dei Smithsonian Institution. La conclusión fue que muchas veces los empleados de Ias instituciones no tienen Ia información apropiada y el conocimiento como para cumplir Ias tareas de cuidado de colecciones. El diagnóstico ayudó a identificar el tipo de entrenamiento necesario para que el personal de los museos mejore Ias condiciones de su colección.

Durante Ia etapa de planificación se desarrolló Ia idea de crear una exhibición como producto final de Ia experiência de aprendizaje. El proyecto de exhibición se

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realizaria con estándares de conservación preventiva y emplearía técnicas de exhibición innovadoras.

Para desarrollar los contenidos dei programa los especialistas dei Smithsonian trabajaron en conjunto con profesionales de Argentina que conocían los recursos y podían juzgar Ia posibilidad de implementación de los nuevos conocimientos. El equipo de instructores dei Smithsonian Institution fueron Carolyn Rose, conservadora (fig.l) y Jim Volkert, especialista en exhibiciones. Patricio López Méndez disenador de exhibiciones, Patrícia Lissa, conservadora y Maria Esteva, conservadora, formaron ei equipo argentino. Fotógrafos, técnicos en análisis de materiales, meteorólogos, ingenieros en climatización y especialistas en control de plagas fueron invitados a presentar temas particulares y aconducir demostraciones. La coordinación

FIG.l Carolyn Rose ensenando ei test dei programa estuvo a cargo de Magdalena Mieri, museóloga dei Center for Museum de Bilstein para determinar calidad de Studies dei SI. plásticos. Los participantes provinieron de 23 museos ubicados en distintas regiones de

Argentina más uno de Chile y otro de Brasil, y fueron seleccionados como becarios en base a sus antecedentes y funciones. La beca consistió en ei ofrecimiento de Ia oportunidad de capacitación, una ayuda para gastos de traslado y un subsidio para llevar adelante un proyecto en su museo de origen. Las autoridades de las instituciones participantes tenían dar las licencias de estúdio correspondientes, estar de acuerdo con las iniciativas de los becarios y apoyarlas economicamente en Ia medida de sus posibilidades.

Metodologia

El formato de entrenamiento implementado consistió en três seminários de dos semanas de talleres y clases intensivas con un intervalo de seis meses entre cada uno. Esto permitia que ei conocimiento se incrementara y profundizara en cada encuentro. La primer semana se dedicaba a conservación preventiva y Ia segunda ai diseno de exhibiciones. A través de los seminários se presentaban los princípios científicos y técnicos de Ia conservación preventiva en relación ai desarrollo y producción de Ia exhibición.

Todos los temas tuvieron prácticas y algunos se planteaban como ejercicios a resolver en los que los becarios trabajaban en grupo. Se proveía a los participantes de apuntes, bibliografia traducida ai castellano, muestrarios y directorios de materiales, y todas las herramientas y materiales necesarios para ei desarrollo de las prácticas.

Evaluación

En ei primer segmento los participantes fueron estimulados a desarrollar planes de conservación preventiva de corto, mediano y largo plazo para poner en práctica en sus museos. La Fundación Antorchas proveería de un subsidio de hasta $1.000 para dar impulso a estos programas. Los participantes presentaron proyectos con objetivos, metodologia, plazos y presupuesto. Estos fueron evaluados y supervisados por los instructores. Los proyectos se llevaban a cabo durante los intervalos y su resultado les permitia a los becarios pasar ai próximo segmento. En muchos museos se crearon nuevos depósitos, limpios y seguros. En otros mejoraron ei montaje de las exhibiciones y las condiciones ambientales.

Pr imer segmento : In t roducc ión a Ia conservación preventiva y ai d iseno de exhibiciones .

Conservación Preventiva

En primer lugar se instruyó a los alumnos sobre los agentes de deterioro y ei conocimiento de los materiales que componen las colecciones arqueológicas y etnográficas, su estructura básica y su comportamiento frente ai médio ambiente. Con estos datos y distribuídos en cuatro grupos que tomaron sectores diferentes,

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FIG.2 Caja para almacenamiento y soporte para pieza de cerâmica.

FIG.3 Los participantes dibujan esquemas, cortes y perspectivas.

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los becarios realizaron una evaluación de Ias condiciones edilicias, climáticas y dei estado de Ias colecciones dei museo sede que luego presentaron como informe.

Para determinar Ia calidad de los materiales utilizados en conservación y exhibición de colecciones se enseiiaron los tests de PH (papeles y cartones), Oddy modificado (telas, maderas y adhesivos) y Bilstein (plásticos). Otro de los ejercicios consistió en confeccionar cajas de polipropileno corrugado y diferentes tipos de soportes para almacenamiento y exhibición de piezas (fig.2). En cuanto a Ia metodologia para Ia conducción de prácticas, se crearon estaciones de trabajo en donde se hacían Ias demostraciones y por Ias que rotaban los equipos y llevaban a cabo los ejercicios.

Diseno de exhibiciones En Ias primeras clases se discutieron los princípios teóricos y prácticos de Ias exhibiciones. Los participantes aprendieron a medir espacios y dibujar planos, cortes y perspectivas simples, (fig.3)

Basados en Ia investigación realizada por ei Dr. José Pérez Gollán sobre Ia cultura dei valle de Ambato en Ia región Argentina dei Noreste alrededor dei siglo 200 DC, ei grupo se dividió en cuatro equipos. Con ei mismo número de piezas cada uno desarrolló una exhibición explorando cuatro ideas clave diferentes : belleza, vocês, tiempo e historia. Al final dei primer segmento los cuatro grupos presentaron cuatro exhibiciones completas con maquetas y diagramas.

Segundo Segmento Preparación de los objetos y plano final de Ia exhibición.

Preparación de piegas

Para realizar Ia documentación de Ias piezas que formarían parte de Ia muestra hubo sesiones de identificación de fibras naturales. Cada alumno confecciono una tabla control en Ia que se colocaron muestras identificadas de materiales con los que frecuentemente se reparan y consolidan Ias piezas arqueológicas y etnográficas. Esta sirve para observar con luz UV y por comparación de fluorescencias identificar agregados y reparaciones anteriores en Ias piezas originales. A través de Ia observación visual, y con toda Ia información obtenida se ensenó Ia metodologia de descripción escrita y fotográfica de piezas.

Para desarrollar ei tema de control de plagas se colocaron trampas que cada grupo por sector revisaba ai final de Ia semana. La planificación para Ia prevención de desastres formo parte de asignaciones a desarrollar por los becarios para sus museos.

Durante Ias prácticas de limpieza superficial de textiles, metales y cerâmicas hubo discusiones interesantes sobre Ias consideraciones éticas, estéticas, culturales y científicas para ei abordaje de estas intervenciones en piezas arqueológicas y etnográficas. Luego los alumnos confeccionaron cajas de polipropileno corrugado y soportes de espuma de poliester. En ei interior de algunas crearon micro-ambientes con sílica gel para guardar un número de piezas limpias y documentadas hasta ei próximo encuentro. Algunos participantes, basándose en los lineamientos de diseno y materiales para confección de soportes adecuados para piezas en exposición elaboraron los que luego serían utilizados.en Ia exposición.

Plano final de exhibición

Los participantes divididos en dos equipos ; diseno y guión, combinaron Ias cuatro exhibiciones en una en Ia que se introdujeron Ias ideas principales. Para cada vitrina y sector de Ia muestra se preparo un cuaderno de exhibiciones que contenía Ia documentación de Ias piezas, los esquemas de los soportes y los planos de Ias vitrinas.

En el plano final de exhibición se incorporaron los aspectos de iluminación, control pasivo dei clima y materiales de construcción que surgieron como conclusión de Io aprendido.

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Construcción

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FIG.4 Vitrinas. Detalles de iluminación y construcción. Dibujo de Patrício López Ménde2.

El último encuentro se dedico a Ia construcción de Ia exposición. Los alumnos se dividieron en diferentes grupos de trabajo, construcción de estructuras, construcción de soportes, preparación de piezas, gráfica, pintura, e iluminación. Los asistentes proveían de materiales y herramientas y había un encargado de realizar compras.

El interior de Ias vitrinas de madera se forraron con tyveck y luego con Ia tela previamente testeada y decatizada para evitar Ia emisión de gases y mantener un clima estable. Las aberturas se sellaron con cintas de espuma de poliester para minimizar ei intercâmbio con ei exterior. En los pasillos de Ia exposición se coloco un ventilador y un extractor para promover Ia circulación de aire. Las paredes exteriores y se pintaron con pintura látex acrílica.

La iluminación a través de spots incandescentes controlados con dimers se colocaron por encima y por fuera de las vitrinas. Esto permitió llegar a niveles de 50 luxes sin aumentar Ia temperatura en ei interior de las mismas y con nada de radiación ultravioleta.(fig.4)

Otro grupo se dedico a Ia confección de los soportes para cada una de las piezas teniendo en cuenta su condición y estabilidad física, (fig.5) Algunos se realizaron en acrílico y otros con espuma de poliester forrada con cartones libre de ácido y tela-. Los agarres metálicos para piezas se forraron con tubos de polipropileno que luego se pintaron con pintura acrílica para combinar con ei color de las piezas. Para los textiles se construyeron soportes acolchados. Se confecciono una caja de exhibición acondicionada con sílica gel hasta un 30% de humedad relativa para Ia exhibición de pequenas piezas de metal con que presentaban enfermedad de bronce. Las muestras de alimento desecado se congelaron preventivamente para evitar ei desarrollo de plagas.

FIG.5 Soporte para pieza de cerâmica

Preparación de las piegas En cuanto a Ia preparación de las piezas se aplicaron las técnicas aprendidas y ei critério de menor intervención y respeto por los materiales originales. La observación con luz UV permitió detectar restauraciones, patinas originales y agregadas. Esta información junto con Ia documentación y Ia observación de las piezas Ia lupa binocular antes, durante y después de Ia limpieza nos permitió establecer los limites de Ia misma.

Montaje de piegas Se formaron cuatro grupos asignados ai montaje de cada vitrina. Estos grupos ubicaron los soportes, transportaron las piezas, las montaron en coordinación con ei curador, midieron los niveles de iluminación sobre los distintos objetos, ubicaron los carteies y por último se encargaron de cerrar y sellar cada vitrina.

Monitoreo

Para evaluar los resultados de conservación durante Ia exhibición se están llevando a cabo una serie de monitoreos que finalizarán a fin dei afio 1998 cuando se desarme Ia muestra. Los efectos de iluminación sobre los textiles se evalúan comparándolos con estándares de lana azul que están colocados dentro de las vitrinas. La humedad relativa se registra controlando las cintas de humedad colocadas dentro de las vitrinas y por fuera con un termohigrómetro digital. La temperatura se mide con un sensor dei termohigrómetro digital dentro de una de las vitrinas.

Conclusión

El desarrollo de un programa de entrenamiento en conservación y exhibición de colecáones arqueológicas y etnográficas es Io que nos permitió presentar Ia exposición «Los SeuOíeS d d > g a « " 1 Sobre todo estimulo a H - se c o n ^ m . « m b i o s en las

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ABRACOR - Associação Brasileira de Conservadores-Restauradores de Bens Culturais instituciones participantes, (fig.6)

Como consecuencia de este seminário los participantes crearon una asociación profesional como herramienta para diseminar Io aprendido y apoyarse mutuamente. La asociación llamada Red Jaguar tuvo su primer reunión en Córdoba, Argentina los dias 27 y 28 de Junio de este ano. Muchos participantes ya han logrado implementar câmbios necesarios que identificaron durante ei programa. La mayoría de ellos han comenzado a buscar recursos para llevar a cabo proyectos especiales en sus museos.

Este fue ei primero de una serie de cursos. Desde septiembre de este ano en San José, província de Entre Rios, se está Uevando a cabo otro programa similar pero enfocado hacia colecciones históricas.

El personal de museos bien entrenado trae como resultado un buen museo. Un buen museo es aquel que cumple su misión, atrae visitantes, educa ai público y conserva sus colecciones para ei futuro y dei que Ia comunidad se enorgullece. A través de experiências de entrenamiento como Ia que describimos esto puede lograrse.

Participantes

Mercedes Bilbao de Galina Mirta Bonnin Silvia Calvo Marcelo Carignano Maria Rosa Espinoza Maria José Fernández Inés Maldonado Armando Mendoza Cláudio Muro Maria Inés Otaola Silvina Palácios Andréa Pegoraro Andrés Petric Maria Marta Reca Eduardo Ribotta Pedro Santülán Alfonso Udbe

8 8 Héctor Vázquez

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Fernando Veneroso Yolanda Velo Raul Visvequi Marília Xavier Cury Juan Carlos Olivares Toledo

Bibliografia

. 1997. "Los senores dei jaguar". Catálogo de Ia exposición, Museo Etnográfico de Ia Facultad de Filosofia y Letras, Universidad de Buenos Aires.

Autores

Maria Esteva ; conservadora de libros. RealÍ2Ó un internado en Ia Biblioteca dei Congreso de los Estados Unidos . Actuaimente coordina ei Curso de Conservación Preventiva de Ia Fundación Antorchas de Argentina.

Magdalena Mieri ; licenciada en antropologia y museóloga. Trabajó en ei Museo de Arte Hispanoamericano Isaac Fernández Blanco de Argentina. Hace 6 anos trabaja como especialista en programas en ei Center for Museum Studies dei Smithsonian Institute de los Estados Unidos.

Patrícia Lissa ; licenciada en museología, conservadora de textiles. Es conservadora dei Museo de Arte Hispanoamericano y desde hace três anos trabaja en proyectos relacionados con ei acondicionamiento de colecciones y ei diseno de depósitos . Actuaimente es becaria de Ia fundación Antorchas en ei Curso de Conservación Preventiva de Colecciones.

Patrício López Méndez ; licenciado en historia dei arte, decorador y artista plástico. Es disenador de exposiciones de los museos de Arte Hispanoamericano y Etnográfico. Obtuvo una beca de intercâmbio para entrenarse en ei Museo de Colônia WiUiamsburg en los Estados Unidos.

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Abstract

The Graduate Program in Architecture - PROARQ, of the School of Architecture & Urbanism, Federal University of Rio de Janeiro, offers a course towards a MSc. Degree in four different research áreas. One of them is in the History and Preservation of the Cultural Heritage, which started in 1994 under the name Consevation and Restoratiom of Cultural Heritage. In the past months, the Program is being restructured and the new students have been guided to join reseach being conducted by the professors, so that the diferen lines of interests may be strenghtened.

Presently there are two Research Groups in the History and Preservation área. The Architecture & Tourism Research Group - GEAT-sheiters dissertations and research projets on themes such as the impact of tourism on listed buildings and historie áreas. The Conservation and Restoration Research Group is still under organization and will cover themes such as the preservation of the built enviroment and the revitalization of preservation ares.

O Mestrado na Área de História e Preservação do

Patrimônio Cultural da FAU/UFRJ ]

Rosina Trevisan M. Ribeiro Arquiteta, Mestre em Arquitetura, doutoranda da COPPE/UFRJ, Professora Assistente da graduação e do Mestrado em Arquitetura da FAU/UFRJ - Rua Valparaíso, 80/306, Tijuca, Rio de Janeiro/RJ - 20261-130 - Tel.: (021) 204-2848. e-mail: [email protected]

1. Propos ta d o Programa ( P R O A R Q )

1.1. Apresentação e Objetivos

O PROARQ foi instituído a partir da evolução natural do curso de Mestrado em Arquitetura, segundo as direções traçadas para a pós-graduação pelas políticas do Ministério da Educação e as ações da CAPES e do CNPq, de modo a instalar uma maior amplitude nos esforços de pesquisa, ensino e extensão. Neste sentido, os principais objetivos do PROARQ são:

a. Propiciar o ensino de pós-graduação através da oferta de cursos stricto senso (mestrado e doutorado) e lato senso (atualização, aperfeiçoamento e especialização); b. Desenvolver a arquitetura enquanto área de conhecimento específico, através da pesquisa e da contribuição integrada de outras áreas do conhecimento; c. Promover a extensão universitária através da integração com a graduação, de serviços de consultoria técnico-profissional, da promoção de eventos públicos, da publicação e de outras atividades afins.

1.2. Evolução e Situação Atual

O Curso de Mestrado em Arquitetura abriu a sua primeira turma em 1987, oferecendo o ensino e a pesquisa com ênfase na área tecnológica. Verificava-se, à época e em nível nacional, uma real necessidade de desenvolver o campo da arquitetura no sentido de sua reaproximação com o estado-das-artes em ciência e tecnologia, face ao grande progresso de áreas tais como a engenharia civil, mecânica e de produção. Neste sentido, o Curso direcionou o seu ensino e a sua pesquisa através das áreas de concentração de Conforto Ambiental e Racionalização da Construção.

Estas duas áreas de concentração tiveram seu corpo docente e produção em pesquisas ampliados por docentes da Escola de Engenharia Civil e da COPPE (Engenharia Mecânica e de Produção). Fundamental também foi o acordo CAPES/ COFECUB, através do qual contou-se com a contribuição das escolas de arquitetura de Toulouse (Prof. Arq. Pierre Fernandez) e de Grenoble (Prof. Eng. Pierre Lavigne) e da Ecole de Mines de Paris (Prof. Eng. Paul Brejon, especialista em conforto térmico em edificações).

Desde então, as áreas de concentração em Conforto Ambiental e Racionalização da Construção tornaram-se tradicionais, atraindo maior demanda ao curso e concentrando a maior parte da produção científica.

A partir de março de 1994, o PROARQ passou a oferecer as áreas de concentração em História e Teoria da Arquitetura e Conservação a Restauração do Patrimônio Cultural, o que representou uma resposta correta às necessidades do ensino de pós-graduação no campo da arquitetura, assim como uma importante abertura nas possibilidades de pesquisa no Programa.

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Anais da ABRACOR - Formação Profissional IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

Entretanto, o oferecimento das novas áreas de concentração em História e Teoria da Arquitetura e Conservação e Restauração do Patrimônio Culturalacabou gerando alguns problemas para o programa. O pleno potencial destas áreas não se revelou, tendo se refletido em poucas pesquisas, publicações e dissertações defendidas. Isto gerou uma queda significativa nos índices quantitativos e qualitativos do mestrado como um todo, levando a uma série de críticas procedentes por parte dos comitês de avaliadores da CAPES e ao rebaixamento de nosso conceito para C na última avaliação.

Esta situação instalou uma crise relativa e precipitou o trabalho de reestruturação do curso e do PROARQ a partir de fins de 1996. Iniciou-se, então, a estudar a fusão das áreas de História e Teoria da Arquitetura e Conservação e Restauração do Patrimônio Cultural.

Diversos foram os motivos para a crise instalada nestas duas áreas, dentre os quais pode-se destacar:

• oferta de disciplinas prejudicada pela falta de docentes especialistas, situação agravada por aposentadorias e falecimento; • erro na avaliação inicial do potencial do quadro docente disponível; • fraco desenvolvimento de pesquisas e baixo índice de publicações por docente; • estrutura curricular inapropriada, com elevado número total de créditos (inicialmente 26, posteriormente diminuídos para 24) e de disciplinas obrigatórias; • excessivo tempo de permanência dos mestrandos e grande índice de desistências. Ao mesmo tempo, verificou-se uma forte necessidade, manifestada em nível na

cional através de seminários, eventos e publicações de arquitetura e de áreas afins, assim como em documentos da Associação Brasileira de Ensino de Arquitetura (ABEA), de que a pesquisa e a pós-graduação dessem maior atenção à teoria de arquitetura e, particularmente, a suas implicações conceituais e metodológicas para o processo projetual e para o ensino do projeto.

Observe-se que, com exceção da FAU/USP, não há mestrado no país que ofereça uma área de concentração em projeto, embora este seja o principal objetivo da formação profissional do arquiteto e matéria do tronco comum de todos os cursos de graduação do país.

Neste sentido, a área de concentração em História e Teoria da Arquitetura foi modificada para Teoria e Projeto da Arquitetura, através de uma redefinição de objetivos, linhas de pesquisa e disciplinas oferecidas.

Já a área de Conservação e Restauração do Patrimônio Cultural, foi reestruturada como História e Preservação do Patrimônio Cultural, concentrando os objetivos complementares do estudo da história e da intervenção sobre objetivos histórico-arquitetônicos e culturais.

Portanto, com a iniciativa deste projeto de reestruturação, o PROARQ busca, por um lado, continuar a manter-se sempre atualizado segundo os novos horizontes de pesquisa no campo da arquitetura, compreendidos a partir da experiência acumulada em seus dez anos de existência. Por outro lado, a necessidade de reestruturação do curso de mestrado, em particular das duas áreas de concentração em tela, também busca atender aos relatórios de avaliação da CAPES.

1.3. Características curriculares até 1997

Até 1997, o Curso de Mestrado em Arquitetura ofereceu as seguintes quatro áreas de concentração:

• Conforto Ambiental; • Racionalização da Construção; • História e Teoria da Arquitetura; • Conservação e Restauração do Patrimônio Cultural.

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ABRACOR - Associação Brasileira de Conservadores-Restauradores de Bens Culturais

1.4. Projeto de reestruturação do programa

1.4.1. Unhas de pesquisa O PROARQ está redefinindo suas linhas de pesquisa, fazendo com que reflitam os projetos de pesquisa em andamento ou em implantação, assim como o real potencial dos corpos docente e discente, reforçando a relação das pesquisas com a estrutura curricular. Neste sentido, em 1997 foi aprovada em Colegiado a recomendação de reduzir-se as linhas de pesquisa existentes por linhas mais abrangentes que traduzissem as áreas de pesquisa.

1.4.2. A Estrutura curricular proposta A partir de janeiro de 1998 e segundo o projeto aprovado pelo CEPEG (proc. 1161/ 98-62, aprovado em 30/01/1998), o Curso passa a apresentar a seguinte estrutura curricular: Novas Áreas de Concentração Aprovadas e em Implantação:

a. Conforto Ambiental b. Racionalização da Construção c. Teoria e Projeto d. História e Preservação do Patrimônio Cultural

Total de Créditos em Disciplinas: 24 (vinte e quatro), sendo: Em disciplinas obrigatórias comuns: 06 Em disciplinas obrigatórias específicas: 03 Em disciplinas eletivas da área de concentração: 06 Em disciplinas eletivas (que podem ser em outra área ou outro programa da UFRJ): 09

Regime Trimestral (períodos iniciando-se nos meses de Março, Junho e Setembro). Seguindo esta estrutura proposta e aprovada pelo CEPEG, a Comissão de Coordenação do Mestrado, visando maior flexibilidade e dinâmica das pesquisas ativas no PROARQ e a fim de compatibilizar com as novas políticas do Sistema CAPES, fez nova modificação, eliminando as Áreas de Concentração, e trabalhando apenas com "Linhas de Pesquisa" baseadas nas antigas Áreas. Disciplinas Obrigatórias Comuns a todas as Linhas de Pesquisa: Total de Créditos em Obrigatórias Comuns: 06 créditos

1) Metodologia da Pesquisa (3 créditos): a ser cursada, preferencialmente, no I o

ou 2o trimestre; 2) Projeto integrado (3 créditos): a ser cursada obrigatoriamente no último trimestre; 3) Seminários de Pesquisa para Dissertação (0 créditos): de matrícula obrigatória em todos os trimestres a partir da conclusão dos créditos em disciplinas.

2. Área de história e preservação do patrimônio cultural

Grupos de Pesquisa: - História da Arquitetura no Brasil - Preservação e Restauração do Patrimônio

- GEAT - Grupo de Estudos de Arquitetura e Turismo Total de Créditos em Disciplinas da Linha de Pesquisa e Eletivas: 18 créditos Disciplina Obrigatória Específica:

História da Arte no Brasil ou História e Teoria do Restauro (de acordo com o grupo de pesquisa que o aluno esteja desenvolvendo sua dissertação): 03 créditos

Disciplinas Eletivas na Linha: Devem ser cursadas pelo menos duas eletivas na área (existem 18 aprovadas): 06 créditos

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Anais da ABRACOR - Formação Profissional IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

Disciplinas Eletivas: Devem ser cursadas dentre as outras do PROARQ ou na UFRJ: 09 créditos

3. Medidas aprovadas pela comissão de coordenação, em implantação:

Exame de Qualificação: Nova exigência válida para alunos ingressados a partir de Março de 1998. N o máximo até dezoito meses do ingresso, o aluno deverá prestar um Exame de Qualificação para acesso formal ao período de dissertação. Dele consta defesa de Memorial de Atividades e de Projeto de Dissertação, perante banca composta de: Coordenador da Linha de Pesquisa, Orientador e Membro Convidado (aconselha-se manter este membro na banca final).

Fluxo de Curso: Alterou-se o tempo máximo para conclusão do curso, incluindo a defesa da dissertação, de 3 anos para 2 anos. A prorrogação máxima de doze meses, a critério da Comissão de Coordenação do Mestrado, perante a análise de Relatório justificativo e parecer do Professor Orientador, será reduzida para seis meses.

Seminários de Pesquisa para Dissertação: Disciplina sem valer créditos, de matrícula obrigatória em todos os trimestres após a conclusão dos créditos. Sob a responsabilidade do Coordenador do Programa e Coordenador da Linha de Pesquisa, possibilitará o intercâmbio de experiências entre os mestrandos e um maior controle de sua produção.

4. Considerações finais

A flexibilização do currículo, as novas disciplinas propostas e a redução do número de disciplinas obrigatórias vêm de encontro à recomendação da CAPES de que há "necessidade de vários programas repassarem suas estruturas curriculares e buscar uma maior flexibilização e uma maior concentração no tempo do período de meditação".

A ampliação da oferta de disciplinas eletivas, com a contribuição da COPPE, da COPPEAD e do IPPUR, deverá dinamizar a produção intelectual do corpo discente, ampliando o interesse dos alunos em relação a outras áreas do conhecimento e abrindo um novo leque de possibilidades em pesquisas.

Desde a criação da área de pesquisa em Preservação do Patrimônio Cultural, em 1994, foram aprovados 48 (quarenta e oito) alunos. Da turma de 1994, já encerrada, foram defendidas 6 (seis) dissertações e 4 (quatro) alunos tiveram suas matrículas canceladas por abandono ou por ultrapassagem de prazo de integralização do curso. Da turma de 1995 até hoje, tem-se 31 (trinta e um) alunos matriculados, sendo 4 (quatro) com matrículas trancadas. Pode-se avaliar, devido aos novos prazos estipulados pela CAPES para os cursos de mestrado, que até março de 2.000 o Programa terá mais 25 (vinte e cinco) dissertações defendidas nesta Linha de Pesquisa.

Nota do autor: 1 As informações contidas neste trabalho pertencem às Informações Complemen-tares do Relatório EXECAPES 97, acrescentadas das modificações que ocorreram posteriormente à elaboração do mesmo.

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Programa de Formação de Auxiliar Técnico em Conservação e Restauração de Obras de Arte - Programa de Formação de Auxiliar Técnico em Conservação e Restauração de Obras de Arte

Projeto Canteiro Escola Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos Ouro Preto Igreja de Nossa Senhora da Lapa dos Mercadores Rio de Janeiro

Oliveira Silvio Luiz R. Oliveira Conservador / Restaurador Coordenador do Curso de Conservação e Restauração Fundação de Arte de Ouro Preto Rua Getúlío Vargas,185 35.400 - 000 - Ouro Preto - Minas Gerais Fundação Roberto Marinho / Banco Nacional de Desenvolvimento Social / Central de Oportunidades / SENAI - Rio

Introdução

A formação de auxiliares técnicos surgiu através da necessidade de preparar jovens da comunidade com a finalidade de auxiliar os restauradores com uma mão de obra especializada e consciente do valor do patrimônio histórico e a importância de sua conservação, para atuarem na conservação de obras de arte.

Considerando-se que a carência dessa mão de obra dificulta a formação de equipes para atuarem nos projetos de restauração, muitas vezes, improvisando auxiliares, sem antes terem passado por um processo de formação teórico e prádco. O primeiro passo na formação profissional possibilita o desenvolvimento desses profissionais em outros níveis de formação, como técnico, graduado e pós - graduado. A ausência do curso de graduação prejudica a formação profissional e o reconhecimento da profissão de conservador / restaurador .

O programa do Canteiro Escola foi dividido em três módulos: • Módulo I - Formação teórica; • Módulo II - Atividades práticas, incluindo treinamento • Módulo III - Habilidade de Gestão O programa Canteiro Escola foi desenvolvido simultaneamente em Ouro Preto

e no Rio de Janeiro, durante o segundo semestre de 1997. Em Ouro Preto, o processo de seleção foi feito através da divulgação na rede pública estadual. Inscreveram-se noventa jovens com idade inferior a 18 anos com o primeiro grau completo, sendo selecionados vinte jovens, através de entrevista e interpretação de texto. Esta seleção foi supervisionada pela 25a Delegacia Regional de Ensino da Secretária Estadual de Educação. No Rio de Janeiro, a seleção foi conduzida pelo Serviço Nacional da Indústria - SENAI. Os monumentos escolhidos para as atividades do Canteiro Escola foram a Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, em Ouro Preto e a Igreja de Nossa Senhora da Lapa dos Mercadores, no Rio de Janeiro.

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Anais da ABRACOR - Formação Profissional IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

Canteiro Escola Rosário de Ouro Preto

FIG 1 - Canteiro Escola Rosário -Formação teórica: aula sobre Noções Gerais de preparação e acabamento decorativos em pinturas, ministrada pelo Prof. Sérgio Trópia.

FIG 2 - Canteiro Escola: Remoção das camadas de repintura. Retábulo-mor da Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos / Ouro Preto.

MÓDULO I - Formação teórica A parte teórica representou 27,3%, com uma carga horária de 76 horas. Contamos, nesta fase com a participação de 12 professores, que trabalharam com os alunos em aulas práticas e teóricas (FIG. 1). Esses professores pertencem a instituições ligadas à conservação, tais como: Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico -IEPHA, Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - IPHAN, Fundação de Arte de Ouro Preto - FAOP, Centro de Conservação e Restauração de Bens Culturais Móveis - CECOR/EBA/UFMG, Museu de Arte Sacra da Matriz de Nossa Senhora do Pilar, Museu Arquidiocesano de Mariana, Corpo de Bombeiros.

O programa básico desta etapa destacou os seguintes temas: • O Barroco no Brasil e em Minas Gerais;

Patrimônio Histórico e Cultural: Identificação e Caracterização; • A Importância da Comunidade na Conservação de Obras de Arte; • Administração de Acervo Cultural; • Análise e Estado de Conservação da Obra de Arte; • Prevenção e Combate a Incêndios; • A Importância da Conservação Preventiva; • Transporte / Embalagem / Acondicionamento de Obras de Arte; • Identificação e Tratamento de Madeira; • Noções Gerais de Preparação e Acabamentos Decorativos em Pinturas; • Métodos Físicos e Químicos de Análise em Obras de Arte.

MÓDULO II - Atividades práticas O projeto de restauração da Igreja de Nossa Senhora do Rosário foi elaborado por técnicos do IPHAN, orientando sobre a metodologia a ser executada. O trabalho prático consistiu na restauração do retábulo - mor, com carga horária total de 400 horas, contando com a participação de três monitores na orientação do trabalho (Márcia da Conceição Valadares, Maria Angela de Paula, Turinã Alves Inácio. As principais etapas de restauração foram a remoção das camadas de repinturas e fixação da pintura original.

A parte prática do Canteiro Escola Rosário de Ouro Preto foi dividida em duas etapas. A primeira etapa treinamento para a remoção de repinturas, os métodos e técnicas utilizados em restauração foram adequados à remoção das três camadas de pinturas provenientes de intervenções anteriores no retábulo-mor. A segunda etapa foi a fixação da pintura. Inicialmente, foram feitas remoções parciais nas tábuas do forro do consistório, repintadas ao redor de seu medalhão central, quando encontramos pintura original em suas extremidades, utilizando-se 12,7% do tempo total.

Após a constatação que vários aprendizes dominavam a técnica de remoção mecânica, o trabalho foi direcionado para o retábulo-mor (FIG. 2). Os aprendizes foram orientados como trabalhar com a espátula / bisturi na remoção mecânica e a metodologia a ser utilizada ( remover pequenos quadrados para melhor dominar a área da pintura). Nesta fase, contamos com dois monitores, que acompanharam a remoção de repinturas com os aprendizes do programa. Para a decapagem das repinturas, a metodologia adotada foi a remoção de uma camada de cada vez, objetivando, assim, um melhor monitoramento, a fim de evitar grandes perdas na pintura original.

Após a remoção da última repintura, surgiu a terceira em tons azul e bege claro, com frisos formando elementos decorativos. Essa repintura foi executada em princípios do século XX, bem ao gosto da época. Durante a remoção da terceira repintura, as áreas, que apresentavam maiores dificuldades de remoção, foram tratadas com o auxílio de espátula térmica.que amoleceu ligeiramente a repintura, facilitando a sua remoção. Encontrada a segunda repintura, definiu-se pela sua manutenção, principalmente pela sua qualidade, provavelmente feita em fins do séc. XVIII. Segundo

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ABRACOR - Associação Brasileira de Conservadores-Restauradores de Bens Culturais

FIG 3 - Detalhe da remoção de repintura, mostrando a pintura encontrada simbolizando a vida e a morte.

FIG 4 - Canteiro Escola Lapa dos Mercadores: Formação teórica: aula sobre Patrimônio Histórico e Cultural: Identificação e Caracterização, ministrada pela Profa. Anamaria Ruegger de Almeida Neves.

.anteiro Escola: Limpeza superficial de sujidades - Acervo de imaginária da Igreja de Nossa Senhora da Lapa dos Mercadores. Projeto Canteiro Escola

análise realizada pelo Padre José Feliciano Simões, Vigário da Matriz de Nossa Senhora do Pilar, a pintura representa, a simbologia da morte e da vida (FIG. 3).

Considerando-se as camadas de repinturas, o seu precário estado de conservação (em desprendimento), e as intervenções feitas indevidamente no passado, ocasionando grandes perdas, o resultado obtido nesta etapa do trabalho, foi bom. A remoção de repinturas apresentou dificuldades. Em determinadas áreas, foi possível remover as repinturas sem danificar a original, o mesmo não ocorrendo em outras , onde a aderência das camadas dificultou a remoção, ocasionando pequenas perdas, características da remoção mecânica e que não comprometeram a leitura estética da obra.

MÓDULO III - Habilidade de gestão Nesta etapa foi realizado treinamento de ética e qualidade profissional, ministrada por professores da Central de Oportunidades do Rio de Janeiro, com carga horária de 24 horas.

Canteiro Escola Lapa dos Mercadores do Rio de Janeiro

MÓDULO I - Formação teórica A proposta foi apresentar aos aprendizes o cenário barroco do Rio de Janeiro e do Brasil, identificando a sua cultura e o seu patrimônio histórico, ressaltando, então, a importância do cidadão e da comunidade na conservação dos bens culturais. Esta etapa foi desenvolvida no SENAI-RIO e contamos com a participação de seis professores da Universidade Federal de Minas Gerais, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Fundação de Arte de Ouro Preto e Museu da Arquidiocese de Mariana (FIG.4).

A turma inicial de 20 alunos foi dividida em dois programas: O primeiro de reforma predial, desenvolvido pelo SENAI - Rio e o segundo de auxiliar técnico em conservação, desenvolvido na Igreja de Nossa Senhora da Lapa dos Mercadores.

O programa básico desta etapa consistiu nos seguintes temas: • O Barroco, no Brasil e no Rio de Janeiro; • Patrimônio Histórico e Cultural: Identificação e Caracterização; • Análise e Estado de Conservação da Obra de Arte; • Consolidação de Suporte / Limpeza Superficial / Fixação da Camada Pictó-rica; • Introdução a Materiais e Métodos Físicos e Químicos de Análise em Obras de Arte; • A Importância da Conservação Preventiva.

MÓDULO II - Atividades práticas A primeira atividade do Canteiro / Escola foi a instalação do Atelier / Escola em uma sala do andar superior da Igreja Lapa dos Mercadores. Na parte prática do Projeto Canteiro Escola foi trabalhado o acervo da Igreja de Nossa Senhora da Lapa dos Mercadores, composto de 22 castiçais e 17 imagens policromadas, durante carga horária de 300 horas.

Os castiçais em madeira policromada apresentavam ataques de insetos xilófagos, desprendimento do douramento e sujeiras generalizadas. A intervenção proposta foi o tratamento do suporte de madeira, a limpeza das sujidades, a fixação do douramento em desprendimento, a recomposição de áreas danificadas pelos cupins e pequenas intervenções estéticas, possibilitando uma melhor apresentação.

Quanto ao conjunto de imagens policromadas, trabalhadas em madeira, terracota, e gesso, ficou estabelecido que as primeiras intervenções seriam nas imagens em gesso, em seguida, na de terracota e ,por último, nas esculturas em madeira policromada, possibilitando assim um acúmulo de experiência por parte dos aprendizes do Canteiro Escola (FIG 5).

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MÓDULO III - Habilidades de gestão Seguindo a mesma metodologia do Canteiro Escola de Ouro Preto, os alunos receberam treinamento de ética e qualidade profissional, ministrada por professores da Central de Oportunidades do Rio de Janeiro, com carga horária de 24 horas.

Conclusão

Acreditamos que o objetivo do Programa Canteiro Escola tenha sido alcançado, possibilitando a esses jovens valorizarem o Patrimônio Histórico/Cultural e iniciarem sua formação profissional. Com uma tarefa importante em auxiliar técnicos e restauradores, esta mão de obra é qualificada e capaz de identificar os primeiros problemas de conservação . Ficamos satisfeitos por sentirmos como é grande o potencial destes jovens que participaram ativamente, com tamanho interesse e dedicação, contribuindo para que o resultado deste trabalho fosse positivo. Formamos jovens conscientes sobre a importância do patrimônio cultural e a necessidade de sua conservação. Esperamos poder dar continuidade a este processo de formação profissional, processo este de grande importância social e tamanha importância para a conservação de nosso Patrimônio Cultural.

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Fotografia

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Abstract Pierre Verger's collection is basically comprised of nitrate and acetate based films, which results in problems concerning their conservation for these materiais bear deteriorating causes from the manufacturer. Over the time, they will be inevitably lost, faster or slower, according to processing and storing conditions, reasons why the duplication becomes mandatory. In this paper we intend to present and discuss a solution developed by CCPF's sector of photographs.

Projeto de Conservação do Acervo Fotográfico de Pierre Verger - Duplicação de Negativos

Francisco da Costa Fotógrafo e conservador de fotografia Centro de Conservação e Preservação Fotográfica da Fundação Nacional de Arte / Funarte Rua Monte Alegre, 255- Santa Teresa, Rio de Janeiro, RJ, 20240-190 telefax: (021) 297.6116 ramal 248 e 507.7436 E-mail: [email protected]

Introdução

A Funarte, através da equipe técnica do Centro de Conservação e Preservação da Fotografia, elaborou um projeto para tratamento da coleção Pierre Verger por se tratar de um acervo muito importante do ponto de vista fotográfico e antropológico. A coleção encontra-se guardada numa casa em Salvador, BA, onde o fotógrafo viveu seus últimos anos de vida. Nesta casa funciona hoje a Fundação que leva o seu nome.

Pierre Fatumbi Verger foi, com certeza, um dos maiores fotógrafos deste século e suas lentes registraram os rituais das religiões afro-brasileiras, as festas do povo baiano e viagens pela África. Com um olhar singular, suas fotografias são facilmente reconhecidas pela sua luz e forma muito própria de enquadrar. Suas cópias p&b tem uma tonalidade muito característica.

Os objetivos do projeto são:

• Identificação e quantificação das bases plástica dos filmes existentes no ar quivo

• Higienização, acondicionamento e armazenamento dos documentos fotográ ficos

• Criação de uma área de armazenamento com controle de temperatura, umi dade relativa e ventilação. Tratamento da informação

• Duplicação dos negativos originais em dois jogos um para manuseio e outro de segurança que deverá ser guardado separado

• Produção de contatos de todos os fotogramas • Escaneamento e disponibilização das imagens via digital • Cooperação interinstitucional com a finalidade de treinar mão de obra para

todas as etapas do projeto A coleção é composta por 69.692 documentos fotográficos sendo que deste total 64.150 são de fotogramas a serem duplicados, distribuídos da seguinte forma:

63.000 fotogramas 6x6 cm em filme de base plástica, negativo, preto e branco 1.059 fotogramas 6x6 em filme de base plástica, negativo, colorido 68 chapas de 9x6.5 cm, de vidro, negativo, preto e branco 23 fotogramas 35mm em filmes de base plástica, diapositivo, colorido

Existem contatos de aproximadamente 8310 fotogramas em 1385 folhas de papel p&b no formato 18x24cm.

A primeira etapa foi a elaboração de um diagnóstico e a pré identificação das bases plásticas dos filmes utilizados por Pierre Verger. Como este arquivo foi produzido entre 1930 e 1970, período que abrange o surgimento de todas as bases plásticas, qualquer uma delas pode ser encontrada nele. Através de testes de ignição

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e flutuação em amostras recolhidas do acervo, um primeiro levantamento da equipe do CCPF comprovou a existência dos três plásticos empregados para base. Considerando-se que os nitratos começaram a ser substituídos pelos diacetatos na década de 30, provavelmente estes aparecerão em menor quantidade que os diacetatos e deve haver mais ou menos a mesma quantidade de triacetatos. As quantificações exatas de cada tipo de base serão feitas durante a execução do projeto.

O estado de conservação, as quantidades dos objetos fotográficos e a forma em que se encontra guardado o acervo, são dados que constam no diagnóstico feito pelo setor de conservação do CCPF que serviu como base para todas as definições adotadas na elaboração do projeto.

Falaremos aqui apenas das etapas de duplicação dos negativos e da confecção das folhas de contato. Para elucidar a explanação deste trabalho na coleção Pierre Verger, faremos primeiro um histórico das bases plásticas, apresentando também as diferentes técnicas de duplicação.

Histórico das bases plásticas

Durante a evolução da fotografia vários materiais foram utilizados na a formação da imagem e para o suporte do positivo ou negativo. Na imagem positiva o papel assumiu uma posição definitiva desde o começo até os dias de hoje. Já para o negativo, que exige uma qualidade adicional de transparência, o papel começou como uma primeira tentativa de material, mas logo foi substituído pelo vidro, utilizado por aproximadamente 70 anos mas, a partir de 1890, foi sendo superado pelo plástico. Este tinha a vantagem de ser maleável e não quebrar, ser bem mais leve e principalmente, o plástico podia ser transparente. Estas características permitiram que a fotografia assumisse um novo papel dentro da sociedade: as câmeras diminuíram de tamanho, tornando-se portáteis e populares. O surgimento do filme também facilitou o desenvolvimento do cinema.

O primeiro plástico utilizado como suporte fotográfico foi uma piroxilina plástica, o nitrato de celulose que, de início, havia sido desenvolvido pelo inventor John W. Hyatt para substituir o marfim das bolas de bilhar e depois foi aplicado pela primeira vez na fotografia pelo fotógrafo John Carbutt e mais tarde aperfeiçoado no laboratório de química da Kodak. Trata-se de um polímero transparente com boa resistência mecânica e de fácil aderência da emulsão fotográfica. Porém, logo se percebeu o maior problema deste material que era o risco de incêndio, pois o nitrato de celulose é extremamente inflamável e colocava em risco os arquivos que se formavam. Outro problema do nitrato de celulose é o fato de ser um material instável que traz intrinsecamente os elementos para a sua degradação, deterioran-do-se de uma forma muito rápida e enérgica. O processo de deterioração inicia com o desprendimento de um dos grupamentos nitro da cadeia da celulose, que sofre uma hidrólise ácida, produzindo o ácido nítrico, muito agressivo e com um cheiro característico. A base assume uma coloração amarelada, começa a perder sua estabilidade dimensional e o negativo apresenta deformações, o que impede a sua copiagem; depois a emulsão fica pegajosa e por último vira um pó marrom.

Para substituir o nitrato, foi desenvolvido o acetato de celulose, um outro polímero formado por grupamentos acetila e celulose. Sua maior vantagem em relação ao nitrato é de não ser inflamável, por isso a palavra SAFETY passou a ser estampada em todos os filmes para diferenciá-los do nitrato. Mas o acetato apresentava as mesmas características de deterioração intrínsecas: a hidrólise ácida libera ácido acético, que no entanto é um ácido muito mais fraco e por isso menos agressivo que o ácido nítrico. As etapas de deterioração são primeiramente o forte cheiro de ácido acético (vinagre) - por isto este processo de deterioração é chamado de síndrome do vinagre, - e a perda da estabilidade dimensional da base, acarretando encolhimento e deformações que impedem o negativo de ser copiado. Pode ocorrer mudança de cor da base, tornando-se rosa ou azul dependendo do material utilizado na camada anti-halo (aplicada ao filme pelo fabricante no lado oposto ao da emulsão

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para reduzir a reflexão interna da base). Depois torna-se quebradiço e esfarelado e, por último, a gelatina fica pegajosa . O acetato de celulose foi utilizado como suporte para todos os filmes a partir de meados da década de 1930. Somente os filmes cinematográficos em 35mm utilizaram o nitrato de celulose até 1951, quando foram substituídos pelo triacetato de celulose. O triacetato de celulose e o poliester foram os últimos plásticos utilizados nas bases de filmes fotográficos, cinematográficos e microfilmes e são utilizados até hoje, sendo que a diferença entre eles está na estabilidade. O triacetato também sofre encolhimento e hidrólise ácida, porém numa proporção muito menor do que os outros acetatos . O poliester é atualmente o material mais estável utilizado para as bases dos filmes, sendo empregado em todos os filmes em chapa, microfilmes e alguns filmes cinematográficos. Os filmes em rolo para fotografia infelizmente são, na sua maioria, ainda em triacetato.

Os principais fatores que interferem na deterioração dos nitratos e dos acetatos são as condições de temperatura, umidade relativa, tipo de embalagem e ventilação do local onde se encontra guardado o arquivo. Um arquivo de filme fotográfico guarda materiais de alta tecnologia e de pouca durabilidade, comparado por exemplo a um arquivo de documentos em papel. A deterioração das bases plásticas dos filmes é um processo inevitável que pode ser bastante retardado ou catalisado conforme as condições ambientais e de armazenamento. É muito difícil se fazer uma previsão de quanto tempo levará para um negativo de nitrato que se encontra em perfeito estado de conservação iniciar o processo de decomposição. Podemos nos surpreender com o tempo que ele dura e a rapidez com que se deteriora. Já os acetatos são mais lentos em sua deterioração.

Para se detectar o grau de decomposição e fazer previsões de tratamento é importante a implantação de um programa de monitorização dos parâmetros ambientais e medição do índice de acidez espontânea das bases, utilizando o Guia do Image Permanence Institute IPI para armazenamento de filmes de acetato1.

As bases plásticas de nitrato, diacetato, triacetato de celulose e poliester devem ser identificadas e guardadas em ambientes separados. O nitrato de celulose deve ser guardado isoladamente pois representa um sério problema para os arquivos, não só pelo risco de incêndio, mas também porque o ácido nítrico liberado no seu processo de deterioração catalisa a decomposição dos acetatos que estiverem próximos e oxida a prata da emulsão, podendo levar à perda total do registro fotográfico. Os acetatos podem ser guardados junto com o poliester mas, se possível, os diacetatos também deveriam ser isolados devido aos fatores de deterioração já mencionados. Um procedimento importante é remover todas as bases em decomposição para áreas separadas do restante do arquivo.

A identificação das bases plásticas de negativos deve seguir um roteiro e trabalhar com fichas para anotações dos dados para facilitar um posterior cruzamento das informações recolhidas. Se ao final os resultados não forem conclusivos, então é preciso fazer testes químicos em amostras recolhidas dos filmes. Um roteiro de identificação e estes testes, que são destrutivos e devem ser feitos por um conservador, são discutidos no artigo "Indicações para o cuidado e a identificação da base de filmes fotográficos"2.

Uma vez que o controle ambiental e a utilização de materiais acessórios adequados apenas retardam o processo de deterioração, a única forma de preservar a informação contida nestes negativos é a sua duplicação para um outro filme fotográfico.

Existem várias técnicas para se duplicar um negativo, em todas elas teremos que transferir a informação do negativo original para outro duplicata. Isto pode ser feito por contato direto entre os filmes ou utilizando uma câmera fotográfica. A diferença entre as duas técnica é a resolução do negativo duplicata.

Transferência por contato

O negativo original é colocado em contato físico direto e até sob certa pressão com um filme virgem do mesmo tamanho, emulsão contra emulsão. Neste processo o

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ABRACOR - Associação Brasileira de Conservadores-Restauradores de Bens Culturais

negativo duplicata é necessariamente do tamanho do original. Por não envolver nenhum aparato ótico entre os filmes, a luz transfere a imagem do negativo original diretamente para o negativo duplicata, obtendo assim a melhor resolução possível.

Transferência por fotografia

O negativo original é fotografado com uma câmera. A luz atravessa o negativo original, passa pela lente e projeta a imagem no negativo duplicata. Toda vez que a luz muda de meio físico sofre uma alteração em sua trajetória, o que significa perda de informação. Por este procedimento o tamanho do negativo duplicata pode ser igual, reduzido ou ampliado em relação ao negativo original. Podemos listar cinco procedimentos possíveis para a geração de um negativo duplicata associando as técnicas de transferência da informação a diferentes materiais fotográficos:

/ -Interpositivo em filme: Esta técnica consiste em gerar um positivo intermediário em filme por contato ou fotografando. A partir deste positivo obtém-se o negativo duplicata novamente por contato ou utilizando uma câmera fotográfica.

2 - Interpositivo em papel: Por esta técnica produzimos um positivo intermediário em papel fotográfico para depois fazer uma reprodução deste positivo em filme, gerando assim o negativo duplicata. O positivo intermediário (cópia em papel) pode ser gerado por contato ou com ampliação do negativo original e o negativo duplicata é sempre obtido fotografando o positivo. Este procedimento é o que acarreta a maior perda de resolução, pois o papel fotográfico tem uma resolução menor que a de um filme, além de comprimir os tons de branco e preto do negativo original.

3 - Filme de duplicação direta: Nesta técnica o negativo duplicata pode ser gerado sem a passagem pelo interpositivo obtendo diretamente o negativo duplicata. Pode ser feito por contato ou fotografia, utilizando um filme diapositivo p&b especialmente desenvolvido para duplicação de negativos.

4 - Inversão química: Este procedimento é o mesmo da técnica anterior, a diferença é que utilizamos um filme convencional negativo p&b alterando o seu processamento químico para que trabalhe como um diapositivo. Após a revelação, a prata metálica formada pelo revelador é removida do filme por um banho de dicromato de potássio e ácido sulfúrico permanecendo somente os haletos de prata que não foram sensibilizados na primeira exposição. Estes haletos de prata então são submetidos a uma segunda exposição à luz durante o processamento e novamente revelados e finalmente fixados e lavados. A imagem resultante é o inverso da imagem que seria formada no filme se fosse revelado normalmente. Um exemplo deste processo são os diapositi-vos coloridos.

5 - Digital:

A tecnologia vem se desenvolvendo muito nos últimos anos nesta área por isso é importante pesquisar qual o procedimento mais adequado. Deve se levar em consideração que o acesso à informação vai depender sempre de equipamentos. Além disso sempre há perda de qualidade durante a transferência do processo analógico para o digital e a relação custo benefício é muitas vezes desproporcional. É importante ressaltar que a digitalização não exclui nem substitui os processos tradicionais e, em alguns casos, a combinação de técnicas digitais com tradicionais pode ser uma boa opção.

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Anais da ABRACOR - Fotografia IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

Coleção Pierre Verger

Para este trabalho de duplicação de negativos na coleção Pierre Verger, optamos por utilizar uma câmera fotográfica para fazer a transferência da informação do negativo original para o negativo duplicata associada a técnica de inversão química.

Como o processo de duplicação da informação sempre implica em perda de informação, é muito importante que o sistema utilizado se ajuste da melhor forma possível na relação de custo e benefício. É importante considerar questões técnicas, recursos humano, recursos financeiros, espaço para guarda do arquivo duplicata, disponibilidade de materiais e equipamentos.

A inversão química

Este acervo é composto quase na sua totalidade de filme 120 mm, em fotogramas 6x6 cm que estão cortados individualmente. Fotografar os fotogramas oferece mais rapidez e segurança no manuseio dos originais e reduz o custo de material sem comprometer a qualidade final. Utilizaremos o filme Kodak, TMAX ISO 100 120mm para produzir fotogramas do mesmo tamanho do original. N o caso da técnica de contato teríamos que trabalhar com o mesmo filme em chapa 4x5 polegadas a um custo duas vezes e meia maior, sendo que no Brasil são difíceis de encontrar. Fazer os contatos um a um levaria muito mais tempo e seria muito mais trabalhoso, possibilitando perda de material por erro e aumentando bastante o trabalho de laboratório.

A técnica de inversão química foi descrita pela primeira vez em 1862 e mais tarde aperfeiçoada no laboratório da Kodak por John Capstaff para viabilizar o cinema amador em lómmm. Durante os últimos 8 anos esta técnica foi retomada pelo setor de fotografia do CCPF, com algumas modificações no processamento como a substituição do primeiro revelador por um revelador de grão fino a base de metol e hidroquinona, o D76, variações nos tempos de revelação, modificações na quantidade de tiocianato, que funciona como um solvente dos haletos de prata e é responsável pela transparência do filme. Depois de determinar a exposição correta fotografamos uma escala de tons de cinza. Mantendo todas as variáveis do processamento constantes, variamos somente os tempos de revelação e estabelecemos 11 tempos com variações de meio em meio minuto no intervalo de 8 até 13 minutos. A partir destas tiras medimos suas densidades e plotamos uma família de 11 curvas características. Com estas curvas e o valor da variação entre a densidade máxima e mínima do negativo original, podemos escolher o tempo de revelação que vai gerar a mesma variação de densidade no negativo duplicata ou outro valor arbitrado previamente. Com este procedimento podemos padronizar as densidades finais do negativo duplicata, prevendo por exemplo o tempo de exposição deste negativo no ampliador. Manter estes valores muito próximos uns dos outros facilita a sua copiagem, dando mais qualidade e rapidez ao trabalho de ampliação. Com estes procedimentos estudados e controlados, a inversão química é a melhor relação custo benefício apresentando resultados surpreendentes do ponto de vista da resolução do filme e também pela sua capacidade de reproduzir os tons de cinza. Fizemos alguns testes comparativos entre um contato de um negativo de base de vidro no formato de 13xl8cm e a ampliação do negativo duplicata nas mesmas dimensões e só e possível observar a diferença na lupa com aumento de oito vezes. Esta comparação é a mais crítica que se poderia fazer, pois estamos comparando a melhor cópia por contato possível do negativo original com uma cópia feita por ampliação de um negativo duplicata. Outro fator importante é a facilidade de processamento, cada filme neste caso terá 12 fotogramas e podemos processar 9 filmes por vez na processadora do CCPF, o que dá 108 fotogramas por passagem. Além disso, o filme utilizado é fácil de ser encontrado no mercado brasileiro, o que ajuda a reduzir os custos totais. Outra consideração importante para optar pela inversão química é em relação ao arquivo de segurança, pois serão gerados dois jogos de negativos prontos para usar. No

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caso de trabalharmos com interpositivo, os positivos intermediários seriam o arquivo de segurança e os negativos duplicatas seriam o arquivo de consulta. Isto significa que, se por qualquer motivo fosse necessário mais um jogo de negativos, este teria que ser gerado a partir dos interpositivos o que representaria novos custos de material e mão de obra.

Metodologia de trabalho

Como o material a ser duplicado se encontra em Salvador e o CCPF no Rio de Janeiro, estamos sugerindo a divisão do trabalho em duas partes. Embora estejam previstas visitas regulares a Salvador, seria difícil fazer um acompanhamento eficaz realizando todo o trabalho no local pois, com uma produção média de 100 fotogramas por dia, ao final de quinze dias, um simples erro pode gerar mil fotogramas com problema. A divisão dos trabalhos em duas partes é a melhor solução para esta questão. A primeira parte que consiste em fazer a leitura das densidades e fotografar os negativos originais pode ser feito na própria Fundação Pierre Verger, evitando assim o deslocamento dos originais. Depois os filmes duplicata serão embalados e enviados por sedex para CCPF no Rio de Janeiro onde será realizada a segunda parte que consiste na montagem das fichas de exposição, processamento do filmes, confecção de contatos, embalagem e controle de qualidade. '

O primeiro passo será a leitura de densidades máxima e mínima dos originais com um densitômetro de luz transmitida tendo os valores anotados em uma tabela. Depois estes dados serão digitados e organizados em outra tabela em ordem crescente de densidade mínima para o cálculo da exposição. Então serão agrupados de 12 em 12 fotogramas formando um conjunto homogêneo quanto às suas densidades mínimas, velocidade de exposição, diafragma da lente e os dados de processamento do filme para aquele grupo. Estes dados constam em uma ficha desenvolvida pelo setor de fotografia do CCPF que acompanha cada filme durante o processo de geração dos negativos duplicata. Após o controle de qualidade, os negativos que não forem aprovados serão reprocessados e através das fichas eles serão recuperados no arquivo, podendo-se corrigir a exposição ou o processamento de acordo com os dados anotados. No final as fichas serão guardadas pois elas contem toda a memória de procedimentos adotados durante o trabalho de duplicação e poderão ser úteis caso mais tarde se necessite refazer alguma parte do trabalho.

Para o controle de qualidade final, será muito importante fazer também a medição rigorosa das densidades mínimas e máximas obtidas nos negativos duplicata para comparação com os valores das densidades dos negativos originais. Para isto utilizaremos um método de amostragem, lendo pelo menos 20% dos negativos produzidos. Os contatos que deverão apresentar uma impressão igual para todos os fotogramas servem como sinalizador para a visualização de qualquer erro.

O prazo previsto para a realização da duplicação dos negativos é de 3 anos com uma equipe de quatro técnicos a serem contratados além da equipe de consultoria. Em Salvador trabalharão um fotógrafo e um assistente fazendo as leituras de densidade e no Rio de Janeiro trabalharão dois técnicos com experiência em laboratório. As duas equipes serão inicialmente treinadas no CCPF, que também estará representado por um técnico durante a implantação do projeto acompanhando a equipe na Fundação Pierre Verger no início dos trabalhos.

Este projeto elaborado pelo Centro de Conservação e Preservação Fotográfica da Funarte representa um avanço para sua equipe técnica do ponto de vista da aplicação do conhecimento dos procedimentos de conservação fotográfica a problemas reais que se apresentam. O projeto é também um importante instrumento de transferência do conhecimento acumulado pela equipe do CCPF para os novos técnicos que serão treinados. Acreditamos estar realmente criando oportunidades para a difusão e discussão da conservação de fotografia no Brasil.

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Bibliografia

ADELSTEIN, Peter Z., REILLY, James M., NISHIMURA, D. W. and ERBLAND, C. J.. Stability cellulose ester base photographic film: part I -lahoratory testing procedures. SMPTE Journal, May 1992.

ADELSTEIN, Peter Z., REILLY, James M., NISHIMURA, D. W. and ERBLAND,

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Abstract

This paper aims at divulging a nationwide campaign to map the existing daguerreotypes in the public and private collections. The National Foundation of Art, through its Center of Conservation and Preservation of Photographs, has been setting up a series of technical procedures and action strategies in order to assure the participation of the greatest number of institutions. Furthermore, it intends to recover part of our history printed in reflected plates of this early photographic process, which is marketed worldwide. Technical information attached to the text.

O H H B

FIG. I - elementos componentes do daguerreótipo autoria não identificada Dom Pedro II em cadeira de pose Brasil, c. 1850 coleção: Arquivo Histórico do Museu

Histórico Nacional

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O daguerreótipo nas coleções brasileiras

Mareia Mello Conservadora de fotografia e coordenadora do projeto Centro de Conservação e Preservação Fotográfica da FUNARTE Rua Monte Alegre, 255 - Santa Teresa - 20240-190 - Rio de Janeiro Telefax: (021) 297-6116 r: 248 e 507-7436 - [email protected]

Descrição do trabalho

A Fundação Nacional de Arte (FUNARTE), através do seu Centro de Conservação e Preservação Fotográfica (CCPF), está iniciando um projeto de âmbito nacional que visa a identificação de daguerreótipos nas coleções públicas e privadas brasileiras. A exposição O daguerreótipo nas coleções cariocas, realizada no Paço Imperial (RJ) no período de 15 de julho a 23 de agosto de 1998, marcou o início desta campanha. N o levantamento inicial feito no Rio de Janeiro, cerca de quarenta instituições e colecionadores foram consultados, superando, já neste início, o número de daguerreótipos estimados nacionalmente: mais de duzentos exemplares foram catalogados, entre eles, imagens raras de grupo, "flagrantes" de bebês, menina morta, viúva com daguerreótipo do esposo estrategicamente localizado na mesa ao lado, nu feminino e imagens estereoscópicas.

Devido à abrangência do projeto, uma equipe de técnicos da FUNARTE foi mobilizada para atuar nas seguintes especialidades:

/. A conservação dos daguerreótipos

A equipe foi formada pelo Setor de Conservação do CCPF, integrada por Nazareth Coury, Sandra Baruki, Ana Saramago e por Mareia Mello. Os procedimentos de intervenção estabelecidos foram criteriosamente baseados nas experiências de cada componente da equipe que incluiu um treinamento com o especialista norte-americano Grant Romer (diretor do Conservation and Museum Studies da George Eastman House), realizado no Rio de Janeiro em outubro de 1997, por ocasião do II Seminário Internacional de Conservação e Preservação de Fotografia promovido pela FUNARTE. Dos setenta e três daguerreótipos integrantes da exposição, sessenta e seis foram submetidos a um tratamento de conservação, que abrangeu as seguintes etapas:

1.1 Documentação do objeto - preenchimento de fichas diagnóstico e registro fotográfico do objeto como um todo: frente, verso e detalhes de degradação; 1.2 Abertura do estojo ou moldura - em alguns casos não foi necessário desmembrar os elementos componentes do conjunto. Neste caso, a equipe realizou, apenas, uma higienização da parte externa do objeto (vidro e estojo), respeitando a integridade dos lacres originais; 1.3. Higienização - cada elemento componente do conjunto foi higienizado: vidro, lacre, passe-partout metálico, estojo ou moldura e a placa do daguerreótipo. Os produtos utilizados nesta atividade variaram de acordo com a natureza de cada um destes elementos. Devido à extrema fragilidade, a placa do daguerreótipo foi submetida, apenas, à ação de seringas de borracha (pera sopradora), que removeu as sujidades com o ar;

1.4 Remontagem do conjunto - os elementos componentes do conjunto foram mantidos. Optou-se, apenas, por acrescentar uma base de cartão alcalino no verso da placa do daguerreótipo para evitar que a fita adesiva (filmoplast P90), incorporada para lacrar o conjunto, ficasse em contato com ela. Alguns vidros foram substituídos por apresentarem degradações que atrapalhavam a visão da imagem, além de por em risco as placas dos daguerreótipos. Os conjuntos incompletos foram

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complementados, adaptando as partes que faltavam com material de qualidade arquivística (por exemplo, na ausência de passe-partout metálico, confeccionou-se um outro de cartão alcalino nas dimensões originais para suprir sua ausência); 1.5. Documentação fotográfica - a frente e o verso do estojo ou moldura do daguerreótipo foram registrados por Francisco da Costa, fotógrafo do CCPF.

2. Reprodução fotográfica Todos os daguerreótipos selecionados para compor a exposição foram documentados fotograficamente em diapositivo colorido no formato 35mm. Este trabalho foi realizado por Francisco da Costa, fotógrafo do CCPF. Nosso objetivo com este trabalho foi o de iniciar um banco de dados de daguerreótipos brasileiros, atividade que se estenderá por toda a campanha nacional. Alguns recursos foram utilizados como polarização, escurecimento total da área de trabalho, para impedir o reflexo da luz ou dos objetos do ambiente externo na superfície espelhada do daguerreótipo.

3. A daguerreotipia contemporânea Um dos grandes desafios do projeto foi a recuperação da técnica do daguerreótipo. Nelson Lopes, químico e fotógrafo, e Mauro Domingues, restaurador de filmes cinematográficos e fotógrafo, ambos do quadro funcional da FUNARTE, retomaram trabalho de pesquisa iniciado em 1989 por ocasião da comemoração dos 150 anos da fotografia. Nesta época, Nelson Lopes, João Carlos Horta e Sylvie Pénichon, produziram daguerreótipos em uma tenda montada no pátio principal do Paço Imperial, uma iniciativa do CCPF, coordenado, na época, por Sérgio Burgi.

O equipamento utilizado nas produções mais recentes foi um câmera 4x5 polegadas, Graphic View, com objetivas Scheneider 90mm/6.8 e Kodak Ektar 152mm/ 4.5. Os chassis da marca Graflex foram adaptados para receber as chapas de metal, que definiram o formato final dos daguerreótipos produzidos. Tanto o equipamento como os procedimentos foram adaptados às necessidades atuais, mas as etapas de trabalho foram rigorosamente cumpridas segundo os manuais oitocentistas:

3.1 Prateamento e polimento das chapas de cobre - a prata foi aplicada sobre a chapa de cobre por eletrodeposição. O polimento deve ser o mais perfeito possível para garantir a legibilidade da imagem; 3.2 Sensibilização - a placa foi sensibilizada com vapor de iodo e, em seguida, com bromo; 3.3 Exposição à luz natural - etapa realizada com o equipamento mencionado acima; 3.4 Revelação - realizada com vapor de mercúrio; 3.5 Fixação - a fixação da imagem foi feita com uma solução de hipossulfito de sódio. Após a lavagem em água corrente, foi realizada uma viragem a ouro para proteger a superfície de prata.

Todo o trabalho de sensibilização da placa e de revelação envolve a utilização de produtos extremamente tóxicos. Por isso, utilizou-se um laboratório químico com capela de exaustão para a proteção dos técnicos envolvidos. Este trabalho terá uma continuidade visando ao aprimoramento desta técnica perdida no tempo.

4. A montagem da exposição

O daguerreótipo nas coleções cariocas foi a primeira exposição composta exclusivamente de daguerreótipos realizada no Brasil. Ela significou, portanto, um outro grande desfio para a equipe. Marcelo Camargo, designer de exposições da FUNARTE, idealizou parte do mobiliário utilizado, assim como a ocupação do espaço de exposição. A iluminação ficou a cargo de Valmyr Ferreira. A sala de exposição foi ambientada com luzes baixas, valorizando a arquitetura do Paço Imperial. As peças receberam um foco de luz individual, baixo e pontual, buscando eliminar os reflexos do ambiente na placa espelhada do daguerreótipo.

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FIG. II - Detalhe da exposição Paço Imperial, jul./ago. 1998

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Equipamentos de monitoração ambiental foram localizados na sala de exposição (termohigrógrafo e termohigrômetro) visando a registrar os índices de temperatura e umidade relativa do ar. Câmeras de vídeo e alarme sonorizador também foram instalados para garantir a segurança das peças expostas.

Além das vitrines com os daguerreótipos históricos e os contemporâneos, duas vitrines didáticas foram idealizadas para introduzir os visitantes neste universo de detalhes do daguerreótipo. Uma réplica da câmera fotográfica idealizada por J. H. Mande Daguerre e reconstituída por Luiz Antônio Paracampo foi exibida na entrada da exposição.

A curadoria foi assinada por Mareia Mello.

5. A divulgação da campanha

Além da exposição O dague r reó t ipo nas coleções car iocas , a campanha de mapeamento de daguerreótipos nas coleções brasileiras está sendo divulgada através da internet (htpp://www.funarte.gov.br) com um texto didático elucidativo sobre este processo fotográfico. Uma ficha de registro, elaborada por Cássia Mello, cientista da informação e técnica da FUNARTE, acompanha este texto para que as instituições ou colecionadores possam cadastrar suas imagens (ver anexo II).

Um debate sobre o tema foi realizado no Rio de Janeiro, dia onze de agosto no auditório Gilberto Freyre da FUNARTE, com a participação de Solange Zúniga, diretora do Departamento de Artes da FUNARTE; Mareia Mello, coordenadora do projeto; Francisco da Costa, fotógrafo do CCPF, Lígia Segala, antropóloga e pesquisadora da Universidade Federal Fluminense; Abel Alexander, pesquisador da história da fotografia latino-americana, Argentina e Françoise Reynaud, conservadora de fotografia do Musée Carnavalet, Paris, França.

Um foIder informativo também está sendo distribuído para todas as instituições vinculadas à FUNARTE, chamando a atenção para este trabalho de resgate histórico.

6. Metas a serem atingidas

As instituições nacionais e estrangeiras possuidoras de daguerreótipos brasileiros que já inscreveram as suas obras, começam a receber atenção da equipe envolvida, seja com relação à conservação dos seus daguerreótipos, com a reprodução fotográfica, seja com o simples cadastramento de sua imagem. Posteriormente, visitas técnicas serão programadas para o registro dos daguerreótipos encontrados.

Oficinas, debates, publicações técnicas estão sendo programados para garantir a divulgação do projeto e assegurar a participação de todos.

Em meados do ano dois mil, a FUNARTE estará encerrando este projeto com uma exposição itinerante e a publicação de um catálogo listando as instituições detentoras de daguerreótipos e a reprodução das imagens mais significativas levantadas nas etapas precedentes.

Conclusão

Na maioria das vezes, a identificação da autoria e do retratado, a referência à data e ao local de tomada da fotografia não estão disponíveis no daguerreótipo, nem são de conhecimento do próprio colecionador ou instituição possuidora da imagem. Embora o nosso maior desafio seja o de identificar os daguerreótipos brasileiros nas coleções nacionais, vemos, nas fontes de pesquisa disponíveis, perspectivas para atingirmos este fim. Estamos certos de que este trabalho possibilitará o surgimento de uma série de outras investigações de áreas afins, por se afirmar como uma fonte de pesquisa valiosa dos anos 40 de 50 do século XIX.

Com esta iniciativa, a FUNARTE, mais uma vez, está resgatando parte de nossa história, trazendo novas questões técnicas e estéticas sobre a história da fotografia

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no Brasil.

Participação

Como coordenadora do projeto, gostaria de deixar registrado meu agradecimento a toda a equipe de trabalho que vem, apaixonadamente, se dedicando a cada uma das etapas propostas, à Solange Zúniga, diretora do Depar tamento de Artes da FUNARTE e Eridan Leão, chefe do Centro de Conservação e Preservação Fotográfica da FUNARTE.

FIG.III- superfície espelhada, x imagem nítida autoria não identificada coleção: Miguel Rio Branco

Anexo I - Informações técnicas

O daguerreótipo foi o primeiro processo fotográfico comercializado mundialmente. O francês Louis Jacques Mande Daguerre levou 15 anos pesquisando para, em 1839, ter sua invenção anunciada na Academia de Ciências de Paris por François Arago. Esta invenção significou na época uma verdadeira revolução no universo da representabilidade do mundo.

Trata-se de uma imagem impressa em uma placa de cobre revestida por uma camada de prata polida e sensibilizada por vapor de iodo. A revelação se faz através de vapor de mercúrio e a fixação com uma substância salina, o hipossulfito de sódio. Apresenta uma superfície espelhada, revelando uma imagem que oscila entre o positivo e o negativo.

Esta imagem única é formada através da utilização de uma câmara escura. Os daguerreótipos eram comercializados em ricos estojos de couro, baquelite, tecido e recebiam, como proteção, molduras douradas trabalhadas e vidro, devido à sua fragilidade. Além dos formatos padronizados mais populares (Vi placa - 14x11 cm; V* de placa - 10x8 cm; 1/6 de placa - 7x8cm; 1/9 de placa - 5x6 cm aproximadamente), encontramos daguerreótipos em formatos panorâmicos, miniaturizados e, ainda, imagens estereoscópicas. Estas verdadeiras jóias oferecem grande fineza de detalhes e delicadeza de sombras. A beleza mágica destas pequenas imagens fascinavam e, ainda hoje, continuam a exercer grande sedução nos espectadores.

O processo foi bastante utilizado na década de 1840, sendo substituído aos poucos por outros processos mais baratos e de fácil comercialização, como os ambrótipos, os ferrótipos e os negativos de colódio com imagens positivas sobre papel albuminado.

Idealizado para reproduzir fielmente a realidade, o daguerreótipo foi utilizado de início para documentar detalhes arquitetônicos e paisagens. O tempo de exposição era longo, impossibilitando a captação de um objeto em movimento. O tempo dispendido para a captação da imagem foi reduzido com o aprimoramento dos materiais sensíveis e do equipamento, que passou a ser utilizado sobretudo para retratar pessoas em estúdios e, mais raramente, pessoas em ambientes externos.

A difusão deste processo fotográfico foi rápida no mundo todo, inclusive no Brasil. Em janeiro de 1840, o abade Louis Compte desembarcou no Rio de Janeiro com uma aparelhagem completa de daguerreotipia. Ao fazer uma demonstração no Paço Imperial, o imperador Pedro II, maravilhado com a nova invenção, encomendou o equipamento necessário para que ele mesmo pudesse "daguerreotipar" o Brasil.

Dom Pedro II foi um grande entusiasta da daguerreotipia, chegando a atribuir títulos e honrarias a diversos fotógrafos e daguerreotipistas brasileiros e estrangeiros que se estabeleceram no Brasil. Por este motivo, julgamos haver muitos exemplares desta técnica fotográfica nos acervos públicos e privados brasileiros.

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Anexo II - Ficha de registro

FICHA DE REGISTRO

Instituição

Nome:

Endereço:

CEP:

Telefone: ( )

Cidade:

Fax: ( )

UF:

E-mail:

Responsável:

Pessoa física

Nome completo:

Endereço:

CEP:

Telefone: ( )

Cidade:

Fax: ( )

UF:

E-mail:

(Preencha 1 (uma) ficha para cada daguerreótipo.)

Vúmero de registro / identificação / acesso:

\utoria:

^.condicionamento original:

( ) estojo ( ) passe-partout ( ) nenhum

( ) moldura ( ) vidro original

Dimensões:

1. imagem: (h) x cm.

2. objeto fotográfico (considerando o estojo ou a moldura):

(h) x cm.

Estado de conservação:

( ) bom ( ) regular ( ) ruim

aparentemente já sofreu alguma intervenção para conservação?

( ) sim ( ) não

Breve descrição da imagem:

'Caso seja possível, envie-nos fotos da imagem e do estojo do daguerreótipo que facilitem a visuali

zação do mesmo.)

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Resumo do autor

Mareia Mello é conservadora de fotografia autônoma. Teve sua formação no Centro de Conservação e Preservação Fotográfica da FUNARTE e no Ateliê de Restauração de Fotografia da Cidade de Paris, em estágio realizado em 1994. Dentre as suas publicações destaca-se o Manua l de Acondic ionamento de Materiais Fotográficos, editado pela FUNARTE com o apoio da Fundação Vitae. Atualmente coordena a campanha O Daguerreótipo nas Coleções Brasileiras, entre outros projetos.

No ta

As fotografias que ilustram este trabalho foram realizadas por: FIG. I e FIG. II - Francisco da Costa FIG. III - Vicente Mello

Bibliografia

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Index.

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Abstract

The project Conservation and Organization of Pierre Verger's Photographic Collection was designed and written by the technical team of Funarte's Center of Photographic Conservation and Preservation (CCPF). This article points out the technical issues of the projecfs conservation field, which involves the following specific purposes: identifying the original photographic processes; cleaning, housing and storing photographic documents according to internationally recommended technical standards; starting both a safety and a handling file; setting up ways of cooperation among institutions in order to train personnel to work in ali phases of the project.

Projeto de Conservação do Acervo Fotográfico de Pierre Verger1

Sandra Baruki* e Ana Saramago Conservadoras de fotografia *Responsável pelo setor de conservação Centro de Conservação e Preservação Fotográfica da Fundação Nacional de Arte / Funarte Rua Monte Alegre, 255- Santa Teresa, Rio de Janeiro, RJ, 20240-190 telefax: (021) 297.6116 ramal 248 e 507.7436 E-mail: [email protected]

1 Este texto é adaptado do projeto original e apresenta a proposta de conservação. O projeto original citado na bibliografia foi elaborado no Centro de Conservação e Preservação Fotográfica da Funarte, pela equipe técnica em suas respectivas áreas: Cássia Maria Mello da Silva (Tratamento da informação), Sandra Cristina Serra Baruki e Ana Maria Saramago M. Pereira (Conservação fotográfica) e Francisco José S. da Costa (Duplicação e reprodução).

Introdução

A Fundação Pierre Verger, situada em Salvador, BA, local onde o fotógrafo viveu até o seu falecimento em fevereiro de 1996, é mantenedora de um dos mais importantes acervos fotográficos do país, que consiste em cerca de 69.692 documentos fotográficos produzidos entre as décadas de 1930 e 1970 pelo fotógrafo e etnólogo Pierre Edouard Leopold Verger ou Fatumbi, como preferia ser chamado. Grande parte do acervo é constituída de negativos de bases flexíveis instáveis, características desta época de produção no nosso século. Essas fotografias revelam a história da cidade de Salvador, do cotidiano e das festas do povo baiano, e rituais religiosos afro-brasileiros, além da diversidade cultural dos povos que conheceu em suas viagens em diferentes partes do mundo. Os negativos mais antigos do acervo, de nitrato' de celulose, têm como principal problema a auto-combustão e a deterioração ácida. Os negativos de diacetato de celulose trazem, intrinsecamente, agentes de deterioração, o que leva à perda dimensional da base. A indústria fotográfica só conseguiu sintetizar o triacetato de celulose e o poliéster - plásticos mais estáveis utilizados até hoje como base para os filmes fotográficos - no final da primeira metade do século XX. Portanto, a conservação e a duplicação destes negativos são etapas prioritárias para a preservação das imagens originais.

O projeto Conservação e Organização do Acervo Fotográfico de Pierre Verger foi elaborado e redigido pela equipe técnica do Centro de Conservação e Preservação Fotográfica (CCPF) da Funarte e está em fase de implantação (planejamento da Ia. etapa). Os técnicos do CCPF prestam assessoria à Fundação, coordenando a implantação e execução do projeto, através da supervisão das etapas de trabalho, do treinamento da equipe e do acompanhamento das atividades, com visitas técnicas periódicas, nas áreas de tratamento da informação, conservação fotográfica e duplicação/reprodução. Este artigo destaca as questões técnicas da área de conservação do projeto.

Diagnóstico da conservação

Os negativos flexíveis originais p&b estão acondicionados em papel manteiga, ácidos, de baixa qualidade, e guardados em singelas caixas de madeira. Foi constatada a presença de bases em nitrato e acetatos de celulose através de testes de flutuação e ignição para identificação destas bases, realizados no CCPF a partir das amostras

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recolhidas na Fundação Pierre Verger durante a segunda visita realizada. Observou-se, ainda, que a maioria dos negativos não possui marcações nas bordas, o que dificulta a sua identificação. Embora esteiam, de modo geral, em estado regular de conservação, diversas unidades já apresentam características de deterioração típicas dos negativos desse período: perda de estabilidade dimensional da base, coloração azulada, deformação, abaulamento, rachaduras, amarelecimento e espelhamento por oxida-ção da prata. Recomenda-se a duplicação urgente dos negativos, que é etapa fundamental, em desenvolvimento pelo setor de fotografia do projeto. O material da década de 1930, molhado durante uma inundação na França, conforme informação recolhida na Fundação Pierre Verger, é o mais deteriorado, apresentando perda de emulsão e invólucros aderidos à base. Os negativos de vidro estão acondicionados em envelopes de papel manteiga e guardados nas caixas de madeira junto aos outros negativos. Embora a maior parte esteja em boas condições, algumas unidades encontram-se quebradas e, em outras, o contato está colado no invólucro, que aderiu ao vidro. Os diapositivos encontram-se em bom estado de conservação, com problemas de sujidades características destes materiais.

As fotografias montadas em passe-partout e molduras estão em bom estado de conservação. Entretanto, algumas unidades apresentam resquícios e manchas de cola no verso, inscrições à caneta e, em alguns casos, estão aderidas a suportes inadequados. As fotografias que foram ampliadas por Pierre Verger, segundo as informações repassadas pela equipe, encontram-se acondicionadas em pastas plásticas do tipo Polionda, guardadas em estante de madeira. Elas estão muito contaminadas com produto químico (inseticidas). A higienização preliminar do material permitirá o acesso a toda documentação, que apresenta problemas de estabilidade, além da falta de segurança na manipulação. As fotografias sobre Pierre Verger, ou seja, os registros fotográficos de sua vida, feitos por outros fotógrafos, p&b e coloridos, estão acondicionadas em pastas plásticas do tipo Polionda, sem qualquer tratamento. As folhas de contato existentes necessitam de higienização, mas o material deve passar por uma avaliação que determine a sua importância em relação aos outros itens do acervo.

A casa que abriga o arquivo fotográfico está localizada em uma região de encosta e faz fronteira, nos fundos, com um terreno onde se encontra uma madeíreira, que acumula entulho, com perigo de deslizamento deste sobre o edifício. Para o acervo original, foi construída uma ala nova, com sala separada para o arquivo, muito limpa e bem controlada. Entretanto, a sala é usada também como local de trabalho, situação que será evitada na instalação definitiva do depósito.

Segundo informações da equipe da Fundação Pierre Verger, durante décadas os negativos foram mantidos dentro de armários de madeira muito precários, com lâmpadas de 15 w, conforme determinação do próprio fotógrafo. Após o seu falecimento, as lâmpadas foram desligadas considerando o perigo que estas ofereciam, ou seja, o superaquecimento e risco de incêndio. Os armários foram mantidos em uso e foi instalado um desumidificador Arsec (modelo 160, para 150m3, com dreno e umidostato), inicialmente calibrado a 20% de umidade relativa, que permanecia ligado diariamente, do meio dia até o dia seguinte pela manhã. Esta situação, encontrada pela equipe da Funarte na primeira visita técnica, era muito imprópria, pois o uso de desumidificadores em ambientes sem refrigeração produz altas temperaturas e o seu funcionamento descontínuo acarreta flutuações dos índices. Posteriormente, o desumidificador foi ajustado para 40% de UR, em função do ressecamento do ambiente, evidenciado pelo trabalho de retração da madeira do piso. Apesar de haver espaço previsto para colocação de ar condicionado, este não havia sido instalado, não havendo também a monitorização do ambiente, tornando-se urgente a instalação de uma área de guarda com ambiente controlado.

A iluminação é feita por luz fluorescente. Existe apenas uma pequena janela, com pouca entrada de luz natural. A área não possui extintores de incêndio, ou mesmo qualquer sistema de detecção e combate.

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O projeto de conservação - diagnóstico, identificação de bases, higienização e acondicionamento e mobiliário

São os objetivos específicos do projeto de conservação: identificar as bases flexíveis dos negativos originais (área de interseção com o setor de duplicação e reprodução); higienizar, acondicionar e armazenar os documentos fotográficos, de acordo com parâmetros técnicos recomendados internacionalmente; formar um arquivo de segurança e um de manuseio, através da produção de dois jogos de negativos de 2a geração dos negativos originais; e, estabelecer formas de cooperação interinstitucional com a finalidade de treinar mão-de-obra para atuar em todas as fases do projeto.

Para a execução do projeto, propõe-se a divisão dos documentos fotográficos em lotes a serem tratados segundo a seguinte ordem de prioridade: 1- Fotografias de Pierre Verger: 63.000 negativos flexíveis, p&b, 6x6; 1.059 negativos flexíveis, coloridos, 6x4; 68 negativos de vidro, p&b, 9x6,5; 23 diapositivos, p&b, 35 mm; fotografias montadas em passe-partout e molduras, no total de 330 fotos; 2- 3.600 fotografias ampliadas (o número é estimado) p&b, de dimensões diversas. 3- Fotografias sobre Pierre Verger: 112 unidades p&b e coloridas. 4- Folhas de contato: 1385 folhas de contato, p&b, 18x24 cm, que deverão passar, inicialmente, por um processo de avaliação que definirá o destino do material.

Para a conservação de documentos fotográficos serão adotados procedimentos preventivos, que estabilizam os processos de degradação, e a duplicação / reprodução dos documentos. Os casos que, de acordo com os consultores do projeto, necessitarem de intervenção mais direta (restauração), serão separados para tratamento posterior. As etapas de identificação e separação de material, limpeza mecânica, pequenos reparos e acondicionamento dos materiais originais e duplicados deverão ser realizadas em mesa provida de boa iluminação e instrumental básico. Os trabalhos que envolvem a utilização de produtos químicos exigem o uso de capela de exaustão e mesa própria para higienização. A manipulação dos documentos deverá ser feita de forma segura, com luvas de algodão e plásticas, de acordo com a tarefa que esteja sendo realizada.

A área destinada aos trabalhos de conservação deve ser clara, bem ventilada, permanentemente limpa, com espaço para guardar os documentos em tratamento e com garantia de segurança de trabalho. Deverá ser estabelecida pelos consultores da conservação uma rotina de supervisão de limpeza, de controle dos materiais e equipamentos e de monitorização do ambiente de guarda. Para abrigar o acervo de Verger foi construído um anexo, que será ocupado pelas atividades do projeto, assim como parte da outra ala da casa. Contudo, algumas etapas de trabalho necessitam de mais espaço do que está disponível hoje na Fundação, como é o caso da higienização dos negativos com o uso de solventes orgânicos tóxicos e do material que está contaminado por inseticidas e microorganismos. Não recomendamos que a execução destas etapas seja feita na Fundação, pois a casa está situada em área residencial e recebe muitos visitantes, entre eles, crianças. Sendo assim, sugere-se que esses trabalhos, que envolvem a aplicação de solventes, sejam realizados em colaboração com outra instituição.

A partir de testes de ignição e flutuação em solvente realizados no CCPF com as amostras recolhidas no arquivo foi constatada a presença de negativos com base de nitrato e acetatos de celulose, consideradas instáveis. Como a maioria dos negativos não possui marcação nas bordas, o que dificulta sua identificação, serão definidos os procedimentos para a identificação dessas bases, evitando-se, sempre que possível, os testes destrutivos. A partir da identificação preliminar das bases, cada lote de documentos fotográficos terá uma ficha de diagnóstico, especificamente elaborada para o projeto, na qual serão registradas as seguintes informações : tipo de suporte, formato, estado de conservação e proposta de tratamento.

Será feita a limpeza mecânica dos documentos para a retirada da poeira e da sujidade de leve adesão e, quando necessário, a higienização com produtos químicos para a remoção de manchas e microorganismos. Os adesivos e invólucros inadequa-

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dos deverão ser, também, retirados e, os últimos, substituídos. Os negativos e os diapositivos originais serão higienizados com pera sopradora e, quando necessário, com tricloroetano. Serão acondicionados, preliminarmente, em jaquetas de poliés-ter (embalagem de trânsito) e enviados ao laboratório para duplicação. Na volta do laboratório, será realizada uma revisão da higienização e, então, acondicionados de forma definitiva. As molduras dos diapositivos deverão ser trocadas para molduras plásticas.

A limpeza das fotografias será feita com pincel macio e pó de borracha no verso. Quando necessário, será usado álcool etílico e água e/ou acetona, conforme o diagnóstico do estado de conservação do documento. Os pequenos rasgos e dobraduras serão estabilizados. As fotografias montadas em passe-partout ou com moldura serão avaliadas e diagnosticadas para a remoção e substituição desses suportes secundários.

Cada tipo de material receberá um acondicionamento específico, de acordo com as suas características. As embalagens serão confeccionadas em desenho e material acessório (papel, polímeros e adesivos) de qualidade, que protegem a fotografia de interações químicas e danos físicos. Os fornecedores constam da lista de produtos e equipamentos para conservação que é atualizada e distribuída regularmente pelo Centro de Conservação e Preservação Fotográfica.

Os negativos flexíveis p&b e os negativos de vidro serão acondicionados em um conjunto de envelope de papel em cruz e envelope fechado. Os negativos flexíveis coloridos ficarão dentro de jaquetas de poliéster em envelope fechado. Todos serão guardados, em separado — nitrato, acetatos, coloridos e vidro —, com sinalização nas gavetas, dentro de caixas em arquivos para talonário. Após a quantificação definitiva dos negativos em nitrato, faremos recomendações específicas para este material, ou seja, planejamento de mobiliário e área independentes, já que estas bases flexíveis tem características de auto-combustão e requerem condições de segurança próprias. N o momento, é precipitado fazer o planejamento desta área específica, já que o material será identificado e sua presença dentro do acervo dimensionada somente após a implantação do projeto. Os diapositivos (pequena quantidade) serão guardados em carteia plástica própria para esse fim e armazenados em arquivo para pastas suspensas.

As fotografias montadas em passe-partout e molduras serão acondicionadas em jaquetas de poliéster e entrefolhadas com papel Salto Neutro. Serão guardadas em gavetas de mapoteca subdivididas internamente com espaçadores de poliestireno expandido. As fotografias ampliadas por Verger, por estarem muito contaminadas, serão higienizadas e acondicionadas preliminarmente emfolderde papel Salto Neutro. Após a identificação e avaliação, as fotografias serão acondicionadas definitivamente em um conjunto defo/derde papel Salto Neutro em envelope com aba, dentro de pasta suspensa e guardada em arquivo de aço. As fotografias p&b sobre Pierre Verger serão acondicionadas em um conjunto defo/derde papel Salto Neutro em envelope com aba e as fotografias coloridas, em jaquetas de poliéster. Ficarão dentro de pastas suspensas e guardadas em arquivo de aço.

O mobiliário para a guarda de documentos fotográficos deve ser de boa qualidade, em aço, com pintura polimerizada em fornos de alta temperatura. O fornecedor deve apresentar também a garantia e o laudo do tratamento do mobiliário, procedimento regular dos fornecedores de mobiliário de qualidade. Para guarda do acervo original serão necessários: quatro arquivos talonários, um arquivo de pastas suspensas e uma mapoteca (já existente). Para os arquivos de negativos de segunda geração, serão utilizados seis arquivos talonários, sendo três para o arquivo de manuseio e os outros três para o arquivo de segurança, a ser instalado em outro prédio.

Área de guarda

Os negativos originais e um dos conjuntos de negativos duplicados - o de manuseio - deverão permanecer na Fundação Pierre Verger, onde serão criadas as condições

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adequadas à instalação de uma área de guarda climatizada e monitorizada, com funcionamento dos equipamentos 24 horas (as condições ambientais recomendadas neste caso são de 20" C e 50% U.R, com oscilações máximas de 2°C e 5% de UR ao dia). O espaço disponível hoje, 13,50 m2, é suficiente para a ocupação com os sete arquivos talonários (cada um medindo 58 x 71,5 x 132,50 cm), o arquivo de pastas suspensas (medindo 47 x 71 x 134 cm) e a mapoteca existente, que estão previstos no projeto. O conjunto de novos negativos, que constitui o arquivo de segurança, deve ser guardado em outro prédio e, de preferência, em região diferente da Fundação. É essencial que o ambiente de guarda do arquivo de segurança seja, também, climatizado e monitorizado, nas mesmas condições citadas acima. A sala de consulta anexa ao depósito será também climatizada e monitorizada, evitando-se as flutuações climáticas com o trânsito do material na manipulação de rotina.

Os equipamentos necessários para a climatização e controle da área de guarda na Fundação Pierre Verger são: um condicionador de ar Split, com controle remoto e termostato, filtros de fácil acesso para a limpeza e timer 24 horas; um desumidificador (já existente) e esterilizadores de ar. Para a instalação da área adequada ao armazenamento de documentos fotográficos, será fundamental a consultoria prévia a um profissional especializado em controle ambiental, com experiência em projetos de áreas climatizadas ou controladas. A partir da consultoria especializada, outras recomendações serão listadas para o correto condicionamento higrotérmico do depósito (materiais construtivos, isolamentos, iluminação, controle de temperatura e umidade relativa e contaminação). Como a área destinada ao arquivo, no anexo, foi construída recentemente, recomenda-se a checagem da estimativa de carga da estrutura feita na construção e a avaliação da instalação elétrica, já planejadas e construídas, através da consulta aos responsáveis pelo projeto do anexo.

Deverá ser contratada uma empresa especializada, cadastrada no Corpo de Bombeiros e no Inmetro, para o planejamento e instalação do sistema de segurança com detectores de fumaça, alarmes e extintores e a sua respectiva manutenção. Sugere-se que o Corpo de Bombeiros realize vistoria ao local para dimensionamento e distribuição de extintores, orientação e treinamento da equipe da Fundação para situações de emergência. A vigilância do prédio deve ser permanente, 24 horas. Recomenda-se a elaboração de projeto de segurança global para toda a instituição.

Para monitorização do ambiente de armazenamento, serão utilizados um dispositivo de medição e registrador cronológico de dados (um datalogger), além dos tradicionais termohigrógrafo e psicrômetro. Antes da instalação da nova área de guarda, é fundamental que o ambiente seja monitorado para registro do projeto.

Conclusão

Durante o ano de 1997, na etapa de elaboração do projeto, foram realizadas visitas técnicas à Fundação Pierre Verger, com o objetivo de recolher informações para o diagnóstico e a proposta de tratamento do acervo. Nestas visitas, foram detectados, como já mencionado no texto acima, a situação precária e de risco em que se encontrava o acervo, ou seja, em ambiente sem equipamentos de segurança, sem moni tor ização e com tempera tura elevada, em função do uso isolado do desumidificador. Recomendou-se de imediato, como primeira etapa de projeto, em caráter de urgência, a instalação da área de guarda e a melhoria das condições da edificação. Entretanto, enquanto o projeto era elaborado, a Fundação adquiriu um equipamento de ar condicionado, por iniciativa própria. Os técnicos da Funarte, preocupados com a instalação do aparelho sem a correta monitorização do ambiente, a fim de evitar índices inadequados de temperatura e de umidade relativa, assim como flutuações, decidiram acompanhar em Salvador tal instalação, com o transporte de um termohigrógrafo para monitorar o ambiente. Durante uma semana o funcionamento do equipamento foi registrado, assim como a equipe da Fundação foi treinada para operar o termohigrógrafo e o psicrômetro e continuar as leituras dos índices.

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Constatou-se que, com os aparelhos desligados, a situação era de temperatura em torno de 29°C e 80% de UR, e enquanto o desumidificador estava ligado, 32°C e 54% UR, situação de alta temperatura e de bruscas oscilações de índices. Optamos por ligar o equipamento de ar condicionado e o desumidificador durante o dia inteiro, no período de trabalho da Fundação, e desligá-los no final da tarde, pois não existe sistema de segurança e extintores de incêndio no prédio, nem vigilância durante a noite. Julgamos conveniente mantê-los desligados nesse período da noite, uma vez que a sala em que se encontra o acervo fica fechada e a oscilação dos índices não é muito grande. Com o ar condicionado e o desumidificador ligados, a temperatura varia entre 26°C e 27°C e a umidade entre 55% e 60%. Com os aparelhos desligados no período da noite, a temperatura ficou em 28°C e a UR em 59%. As oscilações de temperatura e UR, com os aparelhos ligados, ocorrem em decorrência do compressor do ar, que liga e desliga em média de 8 minutos. Devemos esclarecer que estas decisões foram tomadas em caráter emergencial, considerando que o projeto, em fase de implantação, prevê a instalação de área de guarda com as condições ideais, funcionando 24 horas ininterruptas, assim como um arquivo de segurança, como também já mencionamos no texto, em função das especificidades do material do arquivo, ou seja, negativos de bases flexíveis instáveis.

Através de convite da Fundação Clemente Mariani, em iniciativa conjunta com a Funarte, realizamos no Museu de Arte Sacra, em Salvador, também em 1997, a oficina Ateliê de Conservação Fotográfica - noções básicas, cujo programa abordava o seguinte: a identificação de processos fotográficos; a estrutura dos materiais fotográficos processados e suas variações na história da fotografia; as causas de deterioração; o projeto de conservação; o diagnóstico de acervos fotográficos; o manuseio; os cuidados preliminares; técnicas de higienização e o sistema de acondicionamento de materiais fotográficos. A oficina foi dirigida a profissionais responsáveis por acervos fotográficos, vinculados a instituições de Salvador, com a participação também de dois funcionários da Fundação Pierre Verger. Nesta ocasião, iniciamos o treinamento da equipe da Fundação como preparação para o projeto, repassando conhecimentos que já poderiam ser aplicados de imediato no cotidiano destes técnicos, antes mesmo do projeto ser implantado, como o uso de luvas, o cuidado na manipulação e o conhecimento dos materiais e características de deterioração do acervo.

As visitas técnicas para a elaboração do projeto e o treinamento realizados fazem parte da rotina dos trabalhos do Centro de Conservação e Preservação Fotográfica da Funarte no atendimento às instituições públicas e privadas brasileiras interessadas em elaborar e implantar projetos na área de conservação. O CCPF busca através desta rotina estar cada vez mais aberto ao intercâmbio e cooperação interinstitucional para viabilizar os trabalhos planejados. N o caso deste projeto, temos procurado envolver outras instituições da região, quer seja em treinamentos, como o realizado, ou na instalação de arquivo de segurança, de laboratório de conservação, ou da consultoria especializada em arquitetura e controle ambiental.

Participação

Agradecemos à equipe da Fundação Pierre Verger, pelo interesse, disponibilidade e motivação demonstrados durante a elaboração do projeto.

Bibliografia

FISCHER, Monique C. e Andrew Robb. Indicação para o cuidado e a identificação da base de filmes fotográficos. Coordenação de Ingrid Beck. Rio de Janeiro, Projeto conservação preventiva em bibliotecas e arquivos: Arquivo Nacional, 1997.

REILLY, James M. Director, Image Permanence Institute. IPI Storage Guide for Acetate Film. Rochester, NY, 1993.

REILLY, James M. Director, Image Permanence Institute, Guia do Image Permanence Institute para armazenamento de filmes de acetato. Coordenação de Ingrid Beck. Rio

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de Janeiro, Projeto conservação preventiva em bibliotecas e arquivos: Arquivo Nacional, 1997.

SILVA, Cássia Maria Mello da; BARUKI, Sandra Cristina Serra Baruki; PEREIRA, Ana Maria Saramago M. e COSTA, Francisco José da. Projete de Conservação e Organização do Acervo Fotográfico de Pierre Verger. Rio de Janeiro, Centro de Conservação e Preservação Fotográfica da Fundação Nacional de Artes / Funarte, abril de 1998.

Resumo dos autores

Sandra Baruki - Conservadora responsável pelo setor de conservação/preservação do Centro de Conservação e Preservação Fotográfica da Funarte. Participou da implantação desse Centro, onde trabalha desde 1986. Graduada em Arquitetura (UFRJ) e Comunicação (UFF). Aperfeiçoamento em conservação e preservação fotográfica nos EUA, em 1989, com bolsa de estudos da Organização dos Estados Americanos - OEA: curso na Universidade de Columbia, School of Library Service, Conservation Education Programs e estágio no Laboratório de Conservação/Seção de Preservação do New York Municipal Archives, Nova York, NY; estágios no International Museum of Photography/ George Eastman House e no Image Permanence Institute, Rochester, NY. Ana Saramago - Conservadora de fotografia, integrante da equipe do Centro de Conservação e Preservação Fotográfica da Funarte, desde dezembro de 1994. Graduada em Arquivologia pela Universidade Federal Fluminense, com aperfeiçoamento na área de conservação e preservação através de cursos e estágios na Fundação Casa de Rui Barbosa, Arquivo Nacional e no CCPF.

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Abstract

The conservation and restoration of photographs in France and Portugal as a result of studies carried out - in loco et in genere - under the auspices of VITAE - Apoio a Cultura, Educação e Promoção Social and of Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - CAPES, at institutions dedicated to teaching, research, theoretical and practical studies on the preservation of photographic archives. From France, this paper presents the standard of the Atelier de Restauration des Phorographies de Ia Ville de Paris responsible for the safeguard of heaps of records belonging to some international well-known institutions, such as Musée Carnavalet, Musée d'Art Moderne, Musée de Ia Mode e da Costume, Maison de Victor Hugo, Bibliothèque Historique de Paris, Bibliothèque Administrative, Bibliothèque Marguerite Durand. A distinction is conferred on Maison Européenne de Ia Photographie, the most up-to-date example of Europe, among others. From Portugal, the exemples of the Arquivo Fotográfico da Câmara Municipal de Lisboa, of the Arquivo de Arte da Fundação Calouste Gulbenkian and of the Centro Português de Fotografia are presented. With regard to the first one of these institutions, the following aspects are focused: the conservation and restoration of photographs: the new archives fittings and the experience of the opening to the public consultation; the program of courses and trainings offered both to domestic and foreign studants; the organization and exhibit of photographic collections and the management of the service of supplyng pictures to the public by computational media.

A Conservação e a Restauração de Fotografias na França e em Portugal: estudo comparativo

Zeny Duarte de Miranda Magalhães dos Santos Restauradora de Fotografias com Pós-Graduação na França, Professora do Instituto de Ciência da Informação - ICI e Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Letras e Lingüística da Universidade Federal da Bahia - UFBA Av. Araújo Pinho, 503/1603 - Canela, 40.110-150 - Salvador/Bahia Tel./Fax - (071) 3368112, e-mail : [email protected]

A F R A N Ç A E A P R E S E R V A Ç Ã O D E F O T O G R A F I A S

A preservação do patrimônio cultural é uma preocupação da França antiga, mas a consciência de sua fragilidade se impõe a partir das últimas décadas. Desde 1970, a França divulga as primeiras informações sobre a matéria em forma de cursos, seminários e conferências. Primeiro, com o desenvolvimento das pesquisas do Centre de Recherche sur Ia Conservation de Documents Graphiques - CRCDG e depois, com a criação do Atelier de Restauration des Photographies de Paris - ARP.

CRCDG

Esse Centro foi criado em 1963, prevendo o desenvolvimento de estudos sobre os suportes tradicionais. O CRCDG é uma unidade ligada ao Centre National de Ia Recherche Scientifique - CNRS, ambos subordinados ao Ministère de Ia Culture et de Ia Comunication. O seu setor [do CRCDG] de estudos sobre a preservação de documentos fotográficos e cinematográficos foi criado em 1976, desenvolvendo, entre outras, as seguintes atividades: 1) conservação dos fototipos modernos e de outros suportes; 2) utilização de um fotocolorímetro e de um densitômetro conectado ao computador; 3) conservação de microformas em prata, diazóicas e fotoplásticas; 4) análise permanente para verificar a qualidade dos tratamentos do processo de revelação das imagens de prata; 5) restauração de fotografias antigas; 6) estudos sobre os mecanismos de deterioração das provas sobre papier salé e o processamento de revelação das imagens esmaecidas; 7) restauração de imagens em gelatina brometo de prata sobre placas de vidro, incluindo limpeza e restauração de placas quebradas ou com ranhu-ras provocadas pelo processo de colagem; 8) estudos sobre adesivos adaptáveis à reparação das placas dos clichês em vidros quebrados; 9) seleção de adesivos adaptáveis à restauração de placas de vidro fragilizadas ou quebradas; 10) restauração de negativos, utilizando o iodeto de mercúrio e ainda a transferência da emulsão para outro suporte.

Os pesquisadores do CRCDG têm acesso aos equipamentos dos laboratórios da Universidade, do CNRS, da Polícia Judiciária, do Museu Nacional da História Nacional e de outras instituições do País. Eles participam de cursos, divulgam estudos e pesquisas por meio de publicações especializadas nacionais e internacionais, elaboram monografias sobre os resultados de suas experiências, mantêm intercâmbio com outras equipes no país e no exterior e participam de eventos técnico-científicos.

A pesquisa aplicada ocupa um lugar de destaque nas realizações do CRCDG. Nesse prisma, vários estudos têm sido testados, a exemplo: prova no comportamento dos novos materiais empregados na restauração; técnicas apropriadas à eliminação dos problemas relativos a climatologia; estudos sobre a identificação dos diferentes componentes intrínsecos dos documentos; a natureza dos materiais que

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podem ou não ser utilizados na restauração; o desenvolvimento de experiências sobre a microbiologia tendo em vista técnicas de exterminação dos microrganis-mos, insetos e de outros agentes destruidores de acervos documentais, entre outros testes.

CNRS

O laboratório do CNRS foi criado em 1979, a partir de convênio entre o Ministère de Ia Culture, envolvendo a Bibliothèque Nationale e o Musée d'Histoire National. Possui o papel de articulador e promotor de pesquisas sobre as várias áreas e, entre elas, a conservação e a restauração de documentos gráficos e fotográficos de instituições culturais da França.

ARP

Esse Atelier foi criado pela Mairie de Paris em 1983. É subordinado à Direction des Affaires Culturelles e tem como objetivo principal preservar as coleções fotográficas da cidade, a partir das seguintes decisões: prevenir e eliminar as causas de alterações das imagens que se encontram em precárias condições de armazenamento; restaurar as fotografias mais fragilizadas, dando-lhes a estabilidade necessária para sua reintegração aos acervos.

Na qualidade de primeiro Atelier do gênero na França, a sua criação permitiu, logo de imediato, a disseminação de uma política de conservação dos fundos fotográficos pertencentes às instituições públicas de Paris. Para tanto, desenvolve projetos em conjunto com o CRCDG e o CNRS e realiza pesquisas teóricas e práticas com apoio de outras instituições governamentais do país. É responsável pela salvaguarda do patrimônio fotográfico pertencente a instituições parisienses de importância, como o Musée Carnavalet, Musée dArt Modem, Musée de Ia Mode et du Costume, Maison de Victor Hugo, Bibliothèque Historique de Paris, Bibliothèque Administrative e a Bibliothèque Marguerite Durand.

Para a história da fotografia, não se pode negar a ligação existente entre a origem da fotografia e a cidade de Paris. O seu patrimônio é composto de um conjunto de imagens positivas e negativas variadas e prestigiosas. Esses fundos fotográficos são de riqueza inegável, reportando, sobretudo, à história de Paris, sua arquitetura e seus habitantes. A diversidade desses processos fotográficos e as variantes de suas alterações fazem do Atelier a instituição responsável pelas análises das imagens antes de determinar qualquer que seja a intervenção. Com base em rigorosos critérios, o Atelier realiza intervenções de restauração, conservação e reprodução, observando o estado físico e o valor da obra. Para quaisquer níveis de intervenção sobre a obra, é feito relatório prévio, que descreverá suas características por meio de exames acerca dos materiais fotográficos, estrutura física, composição e de seu estado de conservação.

Com respeito a restauração, os tratamentos vão desde as técnicas convencionais até técnicas específicas aplicadas às emulsões sensíveis. As intervenções comportam essencialmente dois aspectos: a eliminação das causas de alteração e a consolidação dos materiais instáveis. Seguindo a deontologia da preservação de bens culturais, define sua polít ica de t ra tamento em consonância com a necessidade do restabelecimento e da integridade histórica, tecnológica, cultural e estética do original. E, ainda, considera a importância da reversibilidade, assim como da compatibilidade dos materiais de restauração com o original e sua estabilidade no tempo. A conservação preventiva representa para o Atelier a ação prioritária no atendimento ao controle e à proteção da grande maioria das coleções. Ela permite o freio das alterações instaladas no documento e oferece maior estabilidade para ele.

Quanto à reprodução das fotografias, trata-se de um processo que possibilita a diminuição da manipulação e exposição dos originais, na sua grande maioria, vulne-

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ráveis a ação do tempo e do homem. Uma política de reprodução de boa qualidade é efetuada no Atelier durante o processo e após restauração, obedecendo a normas técnicas de estabilidade. A reprodução dos negativos históricos pode salvar, para posteridade, as informações perdidas. Torna-se indispensável no caso dos documentos em vias de destruição ou que apresentam perigos para o restante do conjunto dos fundos. Este é o caso das provas em nitrato de celulose.

O Atelier promove atividades que o credenciam como a mais atuante instituição na formação e divulgação da área. Realiza pesquisas, atividades de ensino, cursos, seminários, palestras para alunos de cursos sobre o patrimônio cultural, além de possuir um programa geral de estágio para franceses e estrangeiros. Mantém política de informação, divulgando suas pesquisas em veículos nacionais e internacionais. É organizador e participante de colóquios e de outros eventos científicos. Discute as diferentes funções da conservação quanto às questões ligadas às exposições e ao acesso do público.

MEP

O ARP ganha um espaço na MEP, inaugurada em 1996 como a mais nova instituição em fotografia da França, pertencente ao departamento cultural da cidade de Paris. A Maison funciona como um verdadeiro Museu situado na Praça Saint-Antoine em le Marais, ocupando quatro andares do Hotel Henault de Cantorbe (1706). Casa de criação, de comunicação e de encontros, a Maison comporta, concomitantemente, um museu, uma biblioteca e um instituto de pesquisa de produção e de formação, uma escola aberta aos jovens e um ponto de encontros de artistas europeus, com fluxo contínuo de visitantes franceses e estrangeiros, pretendendo manter-se como um espaço de pesquisa e de intercâmbio entre os fotógrafos contemporâneos da Europa e do mundo. Tudo isso direcionado aos interesses da fotografia. Apresenta uma exposição permanente sobre a história da fotografia européia dos anos 60 aos nossos dias, num total de mais ou menos quatro mil imagens de autoria de fotógrafos de todas as nacionalidades. O funcionamento do Atelier nessa casa credencia-o a um status mais avançado com renovadas possibilidades. Amplia suas ações frente à gestão da preservação do patrimônio fotográfico da França, tornando-o ainda mais único e normativo.

A EXPERIÊNCIA D E PORTUGAL N A PRESERVAÇÃO D E FOTOGRAFIAS

Arquivo Fotográfico da Câmara Municipal de Lisboa

Em primeira instância, o Arquivo Fotográfico da Câmara Municipal de Lisboa encontra-se como uma instituição que se lança como modelo para a Europa na preservação de acervos fotográficos. O Arquivo vem realizando projetos de conservação e restauração de fotografias e tem como ponto de partida novas instalações físicas e o direcionamento para a eficácia do atendimento ao público. Desde a sua criação, em 1942, até a década de 90, Portugal ainda não tinha despertado para a implementação de um setor que disponibilizasse imagens a partir de formatos digitais.

A iniciativa da organização e preservação de documentos fotográficos é recente em Portugal e os primeiros exemplos surgem nos Estados Unidos, no Canadá e um pouco pela Europa, precisamente na França. O Arquivo Fotográfico de Lisboa foi o primeiro em Portugal a realizar um projeto no âmbito da conservação e da restauração do pa t r imônio fotográfico. Contou , desde o início, com uma equipe interdisciplinar, que desenvolve atividades na instituição desde as instalações físicas, informatização do acervo até aquelas que visam à conservação dos variados suportes fotográficos.

O Arquivo vem realizando as seguintes ações: levantamento/diagnóstico sobre o estado de conservação dos suportes fotográficos por ele custodiados; isolamento

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de casos particulares de deterioração (ex. negativos em suportes de nitrato de celulose e vidros partidos); seleção dos documentos por diferentes suportes e formatos. Numa segunda fase, e com objetivo de evitar o manuseio dos documentos, realizou-se a digitalização das imagens. Para isso, utilizaram-se as cópias existentes em papel. Por último, foram realizadas etapas de higienização, acondicionamento e restauração dos documentos em suporte vidro.

A reestruturação e a modernização dos serviços marcou uma nova fase para o Arquivo. Com relação à primeira, foram adquiridos equipamentos específicos para os serviços técnicos, ampliou-se o quadro de técnicos com grande investimento na formação de pessoal. De dezembro de 1997, as alterações do Arquivo estão ocorrendo ao nível do sistema informático. Todo o equipamento do arquivo foi substituído por computadores com maior capacidade de memória, novos scanners, adaptados para opacos e transparências e impressoras de maior resolução e qualidade fotográfica. A partir de março de 1994, o Arquivo passou a funcionar nas atuais instalações físicas, contribuindo para uma nova dinâmica modificada também por conta da funcionalidade do novo espaço, que dispõe de recepção, sala de leitura, biblioteca, setor de digitalização e operação da base de dados, setor de conservação e restauro, sala de armazenamento climatizada, três laboratórios, duas salas equipadas e modernizadas para exposições fotográficas e bar. Na área das exposições estabeleceu-se um protocolo entre o Arquivo e outras instituições culturais. Deste acordo, nasceu a possibilidade das exposições do Arquivo poderem ser apresentadas noutros países.

O projeto vem obedecendo aos critérios previstos: manter como prioridade as tomadas de decisões acerca da salvaguarda dos documentos; implementar a organização documental e divulgação do acervo iconográfico sob custódia; manter a qualidade dos serviços prestados ao público com o padrão eficaz de um atendimento preciso, personalizado, eficiente e inovador, com resultado na satisfação plena dos seus usuários. Para tanto, foi desenvolvido um sistema em rede à disposição do público interessado, passando pela consulta, visualização das imagens e sua aquisição. Além desses empreendimentos, desenvolve um programa de treinamento, oferecendo cursos e estágios para portugueses e estrangeiros.

Arquivo de Arte da Fundação Calouste Gulbenkian

Esse Arquivo foi criado no final da década de 70, numa iniciativa do Departamento de Belas-Artes. Considerando suas características, em Portugal ele é o único Arquivo e um dos poucos bancos de imagens não-comerciais direcionados para o estudo da História da Arte. As fotografias custodiadas vão desde os negativos de vidro e albumina do princípio do século aos nitratos de celulose. Na sua maioria, são ampliações em preto e branco e em cor, diapositivos em diversos formatos e os mais recentes negativos em safety film. Os problemas de conservação, restauração e armazenamento desses variados suportes são complexos e metecedores de ações específicas. Esse aspecto levou o Arquivo a constituir duas equipes especializadas: uma que realizasse o projeto de identificação e organização e outra voltada para a realização das etapas de conservação e classificação. O projeto maior envolve também as questões ligadas a instalações das salas de armazenamento e de atendimento ao público, com sofisticado equipamento para a conservação e monitoração da temperatura e umidade, atingindo condições ideais para a guarda dos documentos fotográficos.

A partir de outubro de 1994, o Arquivo de Arte passa a atender ao público em conjunto com a Biblioteca Geral de Arte e o Centro de Documentação. Possuidor de um manancial eficaz para pesquisas sobre a História, seja por meio do seu vasto e rico acervo bibliográfico, especializado, nacional e estrangeiro, seja por meio de seus a rquivos , que c o m p r e e n d e m desde a P ré -Hi s tó r i a a té a His tó r ia Contemporaneidade. Esse serviço representa um dos mais relevantes da Fundação Calouste Gulbenkian.

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Anais da ABRACOR - Fotografia IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

Centro Português de Fotografia - CPF

Esse Centro representa mais um exemplo em Portugal, destinado aos interesses da preservação e da disponibilização de acervos fotográficos do país. Trata-se de um projeto que demonstra resultados, desde setembro de 1997, objetivando o desempenho das seguintes funções: facilitar a produção de fotografia, arquivar, conservar e restaurar os acervos que se mantêm sob sua custódia e promover a divulgação da produção fotográfica nacional e estrangeira. Além dessas tomadas de decisão, visa à realização de processos técnicos arquivísticos, conservação e restauração das coleções. O CPF mantém uma política de preservação de acervos fotográficos, que se traduz na gestão e coordenação do patrimônio fotográfico, articulando a sua atividade com parceiros institucionais do país. Supervisiona técnicas e normas desenvolvidas pelos arquivos fotográficos de instituições ligadas ao Ministério da Cultura ou de arquivos privados de interesse público, integrando, assim, o patrimônio fotográfico nacional. Promove cursos de conservação e de técnicas de organização de bases de dados. Este último trata de treinamentos para o funcionamento da unidade de informação digital, criada a nível de rede nacional de Arquivos interligada via Internet. Objetiva, prioritariamente, sua adequação a um serviço público disponibilizado em rede nacional e internacional e prestar apoio na organização e no tratamento das coleções fotográficas do país. Preocupa-se com a reciclagem profissional da sua equipe, promovendo participação constante em cursos de especialização e em eventos técnico-científicos realizados em Portugal e no exterior.

CONCLUSÃO

O tema apresentado é inesgotável, considerando a quantidade de instituições francesas e portuguesas que despertaram, nestes últimos 27 anos, para os estudos teóricos e práticos sobre a preservação de documentos fotográficos. Entretanto, a comunicação não pretende esgotar o assunto. Muito pelo contrário: incentiva o prosseguimento e a descoberta de outras informações sobre resultados alcançados por instituições no exterior em projetos de preservação de acervos fotográficos, podendo somar com a ações desenvolvidas em nossos próprios projetos.

A signatária desta comunicação tem, como segunda etapa da sua pesquisa, o tema denominado "Restauração de Fotografias em Negativos Suporte de Vidro", pesquisa que foi iniciada no primeiro curso realizado no CRCDG na França, em 1992, com prosseguimento em Portugal, em 1998.

AGRADECIMENTOS

Agradecemos à instituição VITAE - Apoio a Cultura, Educação e Promoção Social, à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - CAPES e ao Instituto de Ciência da Informação - ICI da Universidade Federal da Bahia, que concederam apoio, possibilitando a realização da pesquisa na França e em Portugal. Aos responsáveis, conservadores e restauradores das instituições desses países, os quais franquearam o acesso, transmitindo seus conhecimentos e experiências e conduzindo o trilho da pesquisa. Foram tantas contribuições de especialistas da França e de Portugal. Agradecemos a: Anne Cartier-Bresson, Michel Quetin, Paule René-Bazin, Jocelyne Royan, Patrick Lamotte, Béatrice Liebard, Bertrand Lavedrine, Ragounathe Coridon, Christian Garoscio, Sabrina Esmeraldo, Sinome Argould, Françoise Flieder, Martine Gillet, Chantal Garnier, Bernard Marbot, Jeanne Beausoleil, John Batho, Luís Pavão, Isabel Silva, Luísa Costa Dias, Silvestre Lacerda, Jorge Rodrigues, entre outros.

Agradecimentos extensivos à ABRACOR, que possibilitou a apresentação deste trabalho no seu IX Congresso. A todos que, direta e/ou indiretamente, contribuíram para a realização deste trabalho, em especial aos professores Maria José Rabello de Freitas, José Lúcio de Farias, Marilene Abreu e Maria das Graças Teixeira, ao admi-

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ABRACOR - Associação Brasileira de Conservadores-Restauradores de Bens Culturais

nistrador Ariston Mascarenhas, ao restaurador e meu companheiro José João Magalhães e a meus filhos João Manoel e Davi João.

Bibliografia

E N C O N T R O S D E CONSERVAÇÃO D E FOTOGRAFIAS, 1997, Lisboa. Anais... Lisboa: Câmara Municipal de Lisboa / Departamento de Patrimônio Cultural / Divisão de Arquivos, 1997. s.p.

Informations Generales. Paris: Ecole Nationale du Patrimoine, 1992. 2p. LAMOTTE, Patrick. Restauration Conservation des Photographies de Ia Bibliothèque

des Arts Décoratifs. In: Le passe recowposé; photographies restaurées de Ia collection dela Bibliothèque des Axts Décoratifs 1850-1900. Paris: Musée des Arts Décoratifs, 1992. p . l l . (Catálogo de Exposição).

LAVEDRINE, Bertrand. La conservation des photographies. Paris: CNRS, 1990. 250p.

PAVÃO, Luís. Conservação de coleções de fotografias. Lisboa: Dinalivro, 1997. 355p.

POIVET, Michel. L'enseignement de Ia restauration et de Ia conservation des p h o t o g r a p h i e s en France . In: Histoire de l'Art. Paris : Pa t r imoine Photographique, 1991, p.93.

Portraits de Daguerre a Capitale William Klein. Paris : Centro National des Photographies / Editions Paris Musées Audiovisuel, 1992. p.10-15.

SANTOS, Zeny de Miranda Magalhães dos. Desenvolvimento dos estudos, a aplicação prática e a normalização sobre a conservação e a restauração de documentos fotográficos na França. COMUNICAÇÕES/ARQUIVOS. 5o Congresso Nacional de Bibliotecários, Arquivistas e Documentalistas, Lisboa: Associação Portuguesa de Bibliotecários, Arquivistas e Documentalistas, 1994. p. 351-372.

SEMINÁRIO INTERNACIONAL D E CONSERVAÇÃO E PRESERVAÇÃO D E FOTOGRAFIA, 2, 1997, Rio de Janeiro, Anais... Rio de Janeiro: Ministério da Cultural / FUNARTE, 1997. s.p.

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Identidade Cultural

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Abstract

Historically, black people have got the symbolic element of "being together" in spaces where they can live through different experiences in different cultural manifestations, which try to preserve their ethnic and social identities. One such spaces is the "Charm" ballroom, typical from the city of Rio de Janeiro, originating from Soul Music, dating back to the Black movement of the 70's, based on North American R'&'B. In order to provide an overview of the Brazilian black way of living, through Charm ballrooms, in their organization, communication and information, the piece of research A Charm Way of Being analysed interviews, field interviews, newspaper articles, printed documents, recorded radio programs, videos recorded in 70's, photographs and vinyl record covers. Such data enabled the construction of new coding categories which indicate classification models, originated from our corpus of analysis, such as: radio programs; DJ profiles; articles from newspapers; magazines; folders and ballroom information. Such models delimit Rio's dancing environment, building a series of actions aimed at: searching memorabilia connected to the history and culture of Charm; developing mechanisms which enable further discussion and exchange of information; making available several experiences which help, within the Charm environment, show the black man's self-esteem and to help people recognize the black man's identity and their insertion within Brazilian black culture taking Charm as a cultural manifestation.

A Construção de Quadros de Análise: Resgate e Preservação da Memória no Baile de Charme

Leila Beatriz Ribeiro Mestre em Ciência da Informação DPTD/CCH/UNI-Rio

Judite dos Santos Rosário Mestre em Ciência da Informação

Maria de Nazaré de Freitas Francisco Discente em Museologia/UNI-Rio

Marize Souza Chicanei Discente em Museologia/UNI-Rio

Introdução

O Rio de Janeiro é uma cidade que se destaca por oferecer uma gama considerável de espaços culturais os quais a elege uma metrópole peculiar. A realização de bailes, por exemplo, é uma constante em seu cotidiano. Esses bailes conseguem arregimentar um número expressivo de pessoas e têm como característica principal a presença de freqüentadores, oriundos das camadas de classe mais populares. Historicamente, esses agrupamentos têm como elemento simbólico o 'estar-junto' em espaços onde o negro, em sua maioria, vivEncia experiências lúdicas, através de diversas manifestações culturais que buscam a preservação de sua identidade étnica e social.

Os bailes de Charme não fogem da regra. Tipicamente carioca esses bailes acontecem em sua maioria na zona norte e no centro da cidade. Charme, denominação dada pelo DJ Corello na década de 80 se caracteriza por ser um estilo musical mais melódico e cadenciado do Sou/com coreografias em grupos e gestos mais sensuais. Assim como o Funk da época do movimento Black do Rio de Janeiro dos anos 70, o Charme é originário do segmento da Soul Music, baseado no ritmo de Khythm'n'Blues negro norte-americano.

Charm é charm só no Brasil. Em seu país de origem, os Estados Unidos, é chamado de rhythm'n'blues (ou r&b) (...). Musicalmente, é um soul mais lento, temperado com arranjos elegantes, vocais apurados e romantismo sexy. (ROMANHOLLI, L.H., O Globo/Rio Show: 1994.)

O interesse em aprofundar questões relativas a esse fenômeno fez surgir o projeto "Um Jeito 'Charm' de Ser". Durante o período de 1995 e 1996 coletou-se dados que proporcionaram uma massa documental significativa. Isso permitiu desenvolver condições a construir novos modelos de entendimento das relações de comunicação e de práticas de informação em um espaço social específico — o baile de Charme.

A relevância desses mode los possibi l i ta en t ende r como o f enômeno informacional/comunicacional se estabelece em áreas ainda pouco privilegiadas na Ciência da Informação. Ademais possibilita estudar questões relacionadas à problemática do negro e sua trajetória, através de manifestações culturais que privilegiam tanto a construção da auto-estima quanto os processos de construção identitária na

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sociedade brasileira como um todo. Esse trabalho se propõe a apresentar os elementos que compõem a configura

ção de quadros analíticos e descritivos dos espaços informacionais e comunicacionais em relação ao baile de Charme. Busca-se uma abordagem sobre esse baile em favor do seu reconhecimento, de sua preservação e assegurar historicamente o resgate da memória nesse espaço social, núcleo gerador de outros espaços.

Preservando a memória desse espaço dançante carioca

O Baile de Charme, núcleo gerador de espaços sociais - programas de rádio, por exemplo - congrega e/ou intermedia algumas relações e práticas, atuando como um referente espacial e temporal ao reconhecer e, ao mesmo tempo, fazer convergir para esses espaços canais formais e informais de comunicação e de transferência de informação. É nesse sentido que as práticas de comunicação são observadas, através das ações e interações entre os atores sociais (charmeiros) e os recursos (suportes/ meios/ veículos) utilizados por esses atores, cujo fim visa à geração/produção, transferência/transmissão e ao uso de informações.

Pode-se em princípio afirmar que no domínio sócio-histórico, a informação é sempre uma resposta que nos é dada por uma determinada tradição cultural (...). Ela é, nesse sentido, a expressão simbólica materializada em instituições, discursos e práticas, de uma verdade. É, ainda elemento de continuidade do passado, reelaborado e reinterpretado à luz do tempo presente que nos organiza e constitui o princípio da nossa identidade. (MARTELETO, s/d: 30).

Por sermos sociedades que constróem instituições, cujo objetivo é o de produzir, processar e disseminar informações, temos que, para isso, garantir a perpetuação histórica de preservação de nossa memória cultural (Idem:30). De que forma? A informação e os seus suportes, modernamente, podem ser representados sob diversos tipos de registros e veiculados através de práticas de comunicação, diferenciados e reconhecidos de acordo com a capacidade que cada cultura ou agente social tem ao re-produzir instrumentos ou meios de comunicação. Culturalmente, estamos falando das diversas formas manifestas do homem em materializar práticas sociais.

Ao apresentarmos um prospecto de um baile de Charme, um programa de rádio de Charme, recados dos charmeiros, veiculados nos programas ou durante os bailes, por exemplo, na realidade estamos de acordo com MARTELETO "preservando" e "assegurando" historicamente algumas formas modernas que determinados grupos dão significado e constróem interpretações a respeito do seu real (Idem: 31).

Mas é também a partir do fenômeno informacional que esses suportes serão reinterpretados, do contrário correm o risco de serem vistos somente como registros comunicacionais e/ou históricos. Analisando-se essas e outras formas de comunicação (bate-papo, por exemplo), sob o olhar antropológico o fenômeno informacional, permitirá que:

(...) se construa a idéia de práticas de informação como mecanismos de apropriação, rejeição, elaboração de significados e valores, não numa sociedade sincrônica, que guarda uma relação direta e cumulativa com a tradição, mas naquela onde os sujeitos elaboram representações e executam suas práticas através de dispositivos informacionais reinterpretados a partir das suas experiências, onde estão presentes os antagonismos e a pluralidade (Idem, s/d: 23).

No intuito de garantir o resgate, a preservação e a disseminação dos elementos constitutivos de reconhecimento e valorização da identidade do negro no baile de Charme, enquanto manifestação cultural, é necessário que se construa modelos de

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configuração, representação e de análise para que esses elementos não se percam.

Os quadros de análise

Na coleta de dados reuniu-se uma grande quantidade de informações que necessitavam de uma sistematização para serem trabalhadas/analisadas. Para isso foram construídos quadros analíticos e descritivos que dessem conta do tratamento e organização dessas informações, de modo a agilizar e facilitar sua recuperação. Foram então construídos os seguintes quadros:

• Quadro de Análise para Perfil de DJs = > Composto de dezesseis itens, este quadro foi montado em função de se historiar o perfil do DJ, dentro e fora do Charme, a partir do conhecimento de seus dados pessoais, sua escolaridade e sua atuação; • Quadro de Análise para Programas de Rádio => Propõe-se, neste quadro, estudar a estrutura dos programas de Charme, considerando os diversos padrões editoriais radiofônicos, privilegiando-se itens de descrição da comunicação e da informação; • Quadro de Análise para Recortes de Notícias Impressas = > Divide-se, este quadro, em duas partes: análise técnica e análise de conteúdo. Na parte técnica, são privilegiados os dados de referência da fonte. Na análise de conteúdo, dispõe-se de elementos qualitativos e classificatórios das notícias; • Quadro de Análise para Periódicos = > Apresentado em três partes, a função deste quadro visa a demonstrar o que é produzido no Charme considerando padrões jornalísticos, técnico-editoriais, conteúdos de comunicação e a inserção do Charme no mercado publicitário; • Quadro de Análise para Impressos = > Compõe-se este quadro de itens descritivos que obedecem aos padrões editoriais e aos padrões qualitativos e de classificação: tipologica, editorial e temática; • Quadro de Análise para Bailes = > Busca-se neste quadro descrever a estrutura do baile de charme, a partir de elementos que situem as especificidades e características do baile enquanto espaço social e de lazer, e ambiente gerador de outros núcleos.

Para a confecção desses quadros considerou-se o conjunto dos dados coletados pela pesquisa "Um Jeito 'Charm' de Ser", com a utilização de instrumentos de seleção, classificação e indexação, de acordo com parâmetros metodológicos convencionais. Nesse contexto foi criada uma política de definição e de preenchimento dos quadros, visando a uma padronização das informações extraídas de: entrevistas, depoimentos, diários de campo, periódicos (especializados e de grande circulação), zines, impressos (cartazes, folhetos, prospectos,/»/^™ etc) , gravações em fita cassete de programas de rádio, observações em bailes de Charme, além de vídeos de época, fotografias e capas de disco. Ressalta-se que todo esse material iconográfico/ documental, além de sofrer tratamento técnico especializado, está sendo organizado para fins de recuperação e disseminação da informação através da criação de uma base de dados acerca da história cultural do Charme.

Considerações finais

O desenvolvimento de uma visão sobre a realidade negro-brasileira, através do baile de Charme em suas formas de organização, de comunicação e de informação nos permite construir novas categorias de codificação. Essas categorias indicam modelos de classificação dos dados, originários dos quadros de análise. Através de regula-ridades e padrões, tais modelos estabelecem uma configuração desse espaço dançante carioca.

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O conjunto desses quadros possibilita a criação de uma base de informação com vistas a se analisar as relações de comunicação e as práticas de informação desse espaço dançante carioca, e a compor um acervo/coleção capaz de formar uma história documentada desse espaço, que auxiliará na preservação e resgate de sua memória.

Essa configuração enfim, se constitui em uma série de ações visando ao resgate da memória ligada à trajetória histórico-cultural do Charme; ao desenvolvimento dos mecanismos que permitam abrir canais de discussão e troca de informações; à difusão de realizações viveciadas no mundo do Charme em favor da valorização da auto-estima do negro e do reconhecimento de sua identidade; e à reflexão sobre a inserção do negro na cultura brasileira, como entendimento do Charme enquanto manifestação cultural.

Bibliografia

MARTELETO, Regina Maria. Cultura da Modernidade: discursos e práticas informacionais. s/n. mimeo. 37p.

RIBEIRO, Leila Beatriz (coord.). Um jeito 'Charm' de ser. as relações de comunicação e as práticas de informação no espaço dançante carioca. Rio de Janeiro: 1997, 61p. (Projeto de Pesquisa) DPTD/CCH/UNI-RIO.

ROMANHOLLI, Luiz Henrique. R & B, o filho mais charmoso do Soul. 0 Globo/ Segundo Caderno/ Rio Show: Rio de Janeiro, 25/março/1994.

Resumo dos Autores

Leila Beatriz Ribeiro: Professora Assistente do Departamento de Processos Técni-co-Documentais/Centro de Ciências Humanas/Universidade do Rio de Janeiro, Graduada em História e Mestre em Ciência da Informação Rua Riachuelo, 340 - 30 - Centro - Rio de Janeiro - RJ - CEP 20230-013 Tel.: (021)252-7398

Judite dos Santos Rosário: Graduada em Ciências Sociais e Mestre em Ciência da Informação Rua Correia Dutra, 9/203 - Flamengo - Rio de Janeiro - RJ - CEP 22210-050

Tel.: (021) 285-3963

Maria de Nazaré de Freitas Francisco Discente em Museologia na Universidade do Rio de Janeiro Rua Batista de Oliveira — Quadra 13 — Lote 25 — Vila Cocotá — Duque de Caxias — Rio de Janeiro - CEP 25266 - 330

Marize Souza Chicanei discente em Museologia na Universidade do Rio de Janeiro Rua Geraldo Moreira, 195 - N. Sra. da Conceição — Austin - Nova Iguaçu - Rio de Janeiro - CEP 26397-570 TEL: (021) 204-0982

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Abstract

Injuly 1997, Barrosinho said to a journalist from Backstage magazine: "Pixinguinha is not a museum, ali Brazilian musicians should listen to and study him. Pixinguinha's music was the first one I got in contact when I was performing at balls in Campos (Rio de Janeiro). Today I like to play those same songs with an additional jazz feeling". This comment about the most daring Brazilian instrumentalist shows us Barrosinho's deep Btazilian musical basis, and how they have always been present during the evolution of his art. Actually, we intend to study the professional career of this black trumpet player, who uses art and his music as a language, as a peace mediator, and as an element of socialization, organization and integration to other languages. These languages will be analyzed through two different but accurate viewpoints: Science of Information and Museology. From printed documents issued in newspapers ( news, editorial, interviews and cultural bookings), books, photographic pieces (records) and musical production (musical scores) we will use Science of Informatíon as a support to process ali this material with a concern to the analytical, comparative, historical and diffusion aspects, including the following questionings: artist's challenge for preservation of his cultural identity, reflection about integration of blacks in Brazilian instrumentalist music, searching for common aspects between the social and esthetically history of black Brazilian instrumentalist musicians and the Afro-American jazz musicians, the questioning of the media and how they cover black instrumentalist music contemporaneity, and finally the purê Brazilian character of this music attached to its cultural roots. Processing ali this informatíon will enable Museology -which has a fundamental position in being's studies - to work on preservation, recuperation, revitalization and diffusion of the artist's challenge in his search for cultural identity. So the objective of his work is to capture people's attention in order to enable them to feel that the real museum is inside each one of us, it is alive and active. And this artist shows us by his trajectory thar the music is not only a way, but an instrument for universal expression.

Os Atalhos da Criação:

Barrosinho e a Reconstrução da Música Negra Instrumental Brasileira.

Maria Cristina Sobrinho Darriet Instituição: UNI - R I O / Escola de Museologia Qualificação: graduando (3° período) Endereço: Rua Andrade Pertence, 28/701 Bairro: Catete Cidade: Rio de Janeiro - RJ CEP: 22210.020

Em julho de 1997, Barrosinho declarou para o jornalista da Backstage: "Pixinguinha não e museu, deveria ser ouvido e estudado por todos os músicos brasileiros. A música de Pixinguinha foi a primeira que conheci quando tocava nos bailes em Campos (RJ) hoje toco essas mesmas musicas com um sotaque de jazz." Através desse comentário a respeito do mais arrojado instrumentista nacional constata-se as bases musicais profundamente brasileiras de Barrosinho, bases essas que estas que estarão presentes no desenvolvimento da sua arte.

Nascido em Campos (RJ), desde cedo já ouvia através do saxofone do pai, e do bandolim da sua mãe, as primeiras melodias musicais. Aos sete anos após vários experimentos elege o trompete como seu instrumento de base, e nunca mais se separou dele nem mesmo para compor, ao contrario de outros trompetistas.

Da chegada ao Rio na década de cinqüenta, com o objetivo de estudar musica com músicos como: Ratinho e Jararaca, Pedroca e Jacob do Bandolim, à passagem por várias bandas das quais destacam-se Dom Salvador e Grupo Abolição (formada só por músicos negros) e a banda Black Rio (engajada no movimento negro dos anos setenta, com um trabalho musical onde se misturava o funk/soul aos ritmos genuinamente brasileiros); Barrosinho vai em busca de uma nova experiência sonora. Esta experimentação surge nos anos oitenta com o nome de "Maracatamba" uma verdadeira homenagem aos ritmos maracatu e samba, possuindo uma pulsação rítmica diferente, balançada e de fácil identificação pelo público.

Dentro desse contexto pretende-se estudar a trajetória profissional e de vida desse trompetista negro, que através da sua arte utiliza a música enquanto mediadora da paz, e como elemento de socialização, organização e integração com outras linguagens.

A abordagem teórica e conceituai para o entendimento da música enquanto linguagem será trabalhada através da Museologia e da Ciência da Informação.

Sob o ponto de vista da teoria museológica que estuda a relação do homem com o seu meio e suas manifestações, enfocar-se-á o conceito de preservação: na coleta, no armazenamento e na revitalização das informações provenientes dessas manifestações.

Através da Ciência da Informação, a documentação impressa nos jornais (noticias, editoriais, entrevistas, agendas culturais, etc), livros, material fonográfico (discos) e produção musical (partituras), servirá como suporte analítico e instrumental, observando-se que o documento é o registro material por excelência da história da sociedade. Essas marcas ou objetos materiais, são instrumentos de significações que (re)interpretados por agentes especializados passam a ter o caráter de Bem Cultural.

As formas de registrar, tratar, fazer circular e disseminar as informações contidas nessa massa documental abrira condições de se analisar a produção musical desse instrumentista sob aspectos analíticos, comparativos e históricos.

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Foto : José Caldas

A busca da identidade do artista se reflete nas suas composições e interpretações, no ritmo criado por ele, e na procura do timbre ideal do seu instrumento, uma preocupação presente a cada momento de sua vida

Uma vez evidenciado o Bem Cultural, ele passa a ter o caráter excepcional se transformando, ou melhor se legitimando enquanto objeto museológico carregando em si todo o " registro dos vestígios da Memória Social".(LIMA, 1997: 1)

Observa-se a partir daí que a documentação originada da produção do artista tem um duplo referencial analítico, tanto sob a ótica da Museologia como sob o olhar da Ciência da Informação ao se utilizar de alguns conceitos tais como: informação, documentação, disseminação da informação, bem cultural, etc, verifica-se que essas duas áreas se interpenetram e se interrelacionam.

O tratamento dos dados seguirão os pressupostos metodológicos das Ciências Sociais quando se utilizara de instrumentais pertinentes á pesquisa qualitativa no que tange ao uso de categorias analíticas e operacionais para a montagem de um arcabouço conceituai que dará suporte aos instrumentos da pesquisa de campo.

A trajetória profissional e de vida do instrumentista será trabalhada através dos métodos da história orare da história de vida, com a utilização de roteiros temáticos e biográficos para as entrevistas gravadas.

O tratamento da documentação impressa (jornais, produção musical, produção fonográfica, etc.) seguirá critérios técnico-metodológicos da Ciência da Informação e da Documentação no que concerne a coleta, seleção, organização e tratamento da documentação e informação utilizando-se de esquemas de representações para analise das informações tratadas.

Considerando essas duas grandes áreas do conhecimento (Museologia e Ciência In formação) num con tex to in terdisc ipl inar , p o d e m o s referenciar a ação comunicadora da produção musical deste artista enquanto objeto de análise, objeto que desdobrado pode ser reinterpretado como bem cultural; testemunho; vetor de comunicação e vetor de informação. Portanto, torna-se importante enfatizar a tríade bem-cultural, informação e documentação para analizar-se algumas questões: a luta desse artista pela preservação da sua identidade cultural; a reflexão sobre a inserção do negro na musica instrumental brasileira; a busca de paralelos entre a história social e estética do músico negro instrumentista brasileiro com a do músico afro-americano originário do jazz; o questionamento do papel da mídia no seu aspecto informacional acerca da contemporaneidade da música negra instrumental; e o caráter genuinamente brasileiro dessa musica ancorada nas suas raízes culturais.

Este trabalho em suma pretende chamar atenção das pessoas para que elas percebam que o museu esta dentro de cada um, ele está vivo, atuante. E esse artista nos revela através dos seus passos que a musica não é só um meio, mas um instrumento de expressão universal.

Bibliografia

FERREZ, Helena Dodd. Documentação museológica: teoria para uma boa prática. Estudos Museológicos. IPHAN: Rio de Janeiro, 1994, p. 65-74 (Cadernos de Ensaios

LIMA, Diana Farjalla Correia. Memória Sociale a Instituição Museu: reflexões acerca da herança cultural (re)interpretada.UNI-RIO: Rio de Janeiro,! 997.

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Anais da ABRACOR - Identidade Cultural IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

Abstract

The General Plan of Revaluation of the Group of Elevators of Valparaíso is born from the nomination of the W O R L D M O U N U M E N T S WATCH, program of the World Monuments Fund, of the Group of Elevators of Valparaíso in the "List od 100 Most Endangered Sitesl996", work recently published by CONPAL-Chile and titled "Elevators of Valparaíso, Value of a Forgotten Patrimony" During the second half of the XIX century the city of Valparaíso was constituted in the main pole of national development in diverse fronts, gíven their advantageous geopolitical location that led to it be converted in the main port of the South Pacific. Valparaíso was the center commercial and stronger financier of the country with the consequent transformation of the city in their urban aspect. The elevators made their appearance in the decade of 1880 like answer to the necessities of this m o d e m city. These revolutionary vehicles gave unit to the city connecting the small plane zone of the city, the "plan", to banks of the sea, with the hills that increased for those days quickly their population. Twentyseven elevators carne to facilitate the access to the hills of the port between 1883 and 1932. The funiculars allowed to develop better the life in the hills, increasing the price of the terrestrial bordering, improving their security and leading to these zones ali the improvements that before only concentrated in the "plan" of Valparaíso. To the time that Valparaíso decayed in international importance, isolating it because of the construction of the Channel from Panamá, of the First World War and of the great depression of 1929, was conclude the construction of these vital elevators. The growing inhabiting of the hills, that overcame the environment of reach of the elevators, the improvement of the streets and roads toward the high zones and the development of numerous lines of minibuses and buses, they subtracted public to the Valparaíso elevators, arriving at the present time to lend services in a 15% of their capacity of going up and in a 7% of their capacity in lowering, like general average.The permanent and global impoverishment of the city shows us plenty in their current crisis through their drop but still existent profitability, of the terrible state of conservation, given their almost nonexistent manteinance and null investment. In spite of the serious and dangerous state of situation of the system, the value and the meaning that the elevators possess inside of the city show plenty for their vocation of service to the community, being an only and singular element that characterizes and it identify the city to national and international levei. Valparaíso is at the present üme the only city in the world with 15 elevators working, being known internationally for this fact and one of the attractiveness and incentives that possess Chile in order to be visited for the foreigner tourism. From highlighting importance it is the repercussion that the elevators have had in the anistie cultural

Revalorización dei Conjunto de Ascensores de Valparaíso.

Arquitecto Jaime Migone R. Arquitecto Antonino Piro2zi V. CONPAL-Chile Centro para Ia Conservación dei Patrimônio Arquitectónico Latinoamericano -Delegación Chilena. Sánchez Fonteci l la 524, Sant iago, C H I L E / FonoFax 56 .2 .3342113 /e -mail:[email protected]

D e s c r i p c i ó n dei Trabajo.

Este plan se ha enmarcado en una primera acción estratégica que consistió en Ia gestión que realizamos para Ia obtención de Ia nominación dei conjunto como "patrimônio en riesgo" en Ia Lista Anual 1996-1997 de los 100 Sitios en Mayor Riesgo en ei Mundo, patrocinada por ei World Monuments Fund. Un segundo impulso a Ia gestión que habíamos iniciado se logro ai obtener una ayuda financiera dei programa World Monuments Watch, asociado a Ia nominación antes senalada, con cuyos recursos se realizaron los Estúdios y Propuestas Preliminares para ei conjunto.

Abordar ei estúdio de los ascensores implico acometer su análisis desde los más diversos enfoques, cruzar Ia información y obtener un diagnóstico síntesis que permitiera enfrentar una propuesta integral de recuperación. Así, se disenó una e s t rue tu ra de es túd io que abarcaba los s iguientes a spec tos : H i s tó r i cos , Arquitectónicos, Urbanos, Ingeniería, Diseno Industrial, Econômicos, Artísticos y culturales, Transporte y Turismo. Estúdios que se desarrollaron con profesionales de diversas disciplinas, como geógrafos, arquitectos, urbanistas, ingenieros, periodistas, historiadores, sociólogos, economistas, que en alrededor de 25, integraron ei equipo.

Valparaíso en Ia segunda mitad dei siglo XIX era una ciudad que irradiaba vida y actividad. El puerto que a inícios dei siglo aparecia como provinciano, para los viajeros que Ia visitaban hacia 1850 había cambiado por completo su fisonomía. Ello debido a Ia floreciente actividad de extranjeros vinculados a Ia minería y ai comercio y a Ia formación de un mercado de trânsito a partir dei cual se intensifico el comercio europeo, fundamentalmente inglês, ai âmbito dei Pacífico.

El inicio de esta época de oro de Valparaíso estuvo marcado por un decreto, de octubre de 1820, que sentaba Ias bases para el establecimiento dei puerto como entrepot (entrepuerto) para Ia costa sudamericana dei Pacífico, es decir, como centro de Uegada y almacenamiento de produetos de Europa y de redistribución de los mismos para toda América y Ia Polinesia. El tráfico de navios se incremento notablemente con esta medida, con Io cual Chile, su economia y sus exportaciones pudieron insertarse muy rapidamente en el comercio mundial.

Factor clave dei desarrollo empresarial, comercial y financiero de Valparaíso fue Ia influencia que en este tuvieron los extranjeros. Pese a que en 1854 de 53.390 habitantes de Ia ciudad solo 3.675 de ellos eran inmigrantes, el grupo foráneo tenía un inmenso peso en Ia actividad de Valparaíso. Ya en 1849 Ia comunidad de comerciantes extranjeros controlaba el 70 % dei comercio ai por mayor (los britânicos controlaban el 23.3 %) y el 32.3 % dei comercio minorista. Los extranjeros fueron, además, pioneros de adelantos materiales cruciales de Valparaíso como fueron el ferrocarril, el telégrafo, el servicio de água potable en 1852, el Banco de Valparaíso y el alumbrado de gas en 1856, el ferrocarril urbano en 1863, el telefono en 1890, el cable submarino en 1890 y el servicio de tranvías eléctricos en 1903. En el puerto,

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producüon of the more than 100 years of existence of the system, being their repercussion in expressions that they go from the literature to the plastic, goingby the photografy and the cinema, the music and the handcraft, being an inexhaustible source of inspiration for ali type of creators and trascendental part of our national identity. Our General plan of Revaluation consists of a series of measuring and punctual actions. These measures and actions will be implemented, promoted and coordinate by the public authorities of the region and of the commune and, developed and implemented for the different private agents of each one and of the total of the Elevators of Valparaíso. On this plan has wanted to distinguish two types of measuring or actions to implement, recommending it "measured of protection" and "actions and encouregement" that they consider objective "revalue" the group, giving them the self-financíng and

the dignity that they deserve, in order to face the arrival from the third millennium with lhe tools

and the necessary potential that they allow them to last and continue being the singular elements that are for the patrimony of the city, of the country and of the humanity.

FIG.l Valparaíso siglo XIX

FIG. 2 Proyecto de Ascensor

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paralelamente a su quehacer mercantil, se forjo una tradición literária e intelectual. En Valparaíso estuvo Ia primera librería, Ia "Librería de El Mercúrio" de Santos Tornero, y ei primer diário. En Valparaíso se instalo además, ei primer Liceo Fiscal femenino y esta fue Ia primera ciudad dei país en contar con iluminación a gas, telégrafo y telefono. Fue también Ia primera en tener un banco comercial como Io fue ei Banco de Valparaíso. Por último, en este puerto se instauro Ia Bolsa de Comercio antes que en Santiago, así como Ia primera companía de seguros dei país, Ia primera línea de navegación a vapor dei Pacífico (Pacific Steam Navegation Company) y ei primer cuerpo de bomberos chileno. (FIG.l)

El nacimiento de los funiculares o ascensores será precedido por una vital modernización de Ia ciudad portena que se realizo a partir de Ia década de 1860. En ese período se incorporo ei Ferrocarril de Sangre, un tranvía urbano para satisfacer Ias necesidades dei plan de Valparaíso. Este permitió ei transporte rápido y seguro de pasajeros de un extremo a otro, conectando a sus habitantes entre si. Este transporte con su ruido y velocidad imprimió una transformación en ei estilo de vida de Valparaíso que, en ei siglo XX, los autos, buses, camiones y otros médios de transpor te , reforzarán. E n síntesis, se habla que hacia 1860 Valparaíso inicio especificamente ei proceso de transición entre su viejo estilo de vida tradicional y ei nuevo que impuso Ia cultura europea mediante sus avances técnicos y sus nuevos estilos de ornato. Entre 1870 y 1880 Ia ciudad creció y Ia población se extendió en abanico construyendo sus viviendas hacia los cerros. En Ia década de 1880, afios en los que se comienzan a instalar los ascensores porterios, Valparaíso aun gozaba de una situación privilegiada pese a Ia crisis econômica chilena de Ia década anterior. Fue en médio de este empuje de Ia ciudad y de Ia extensión de su poblamiento hacia los cerros, ante Ia escasez y ei encarecimiento de los terrenos en ei plan porterio, que surgió Ia necesidad dei funicular.

Ya en Ia década de 1870 y alentados por Ias necesidades de comunicación entre Ia parte alta y ei plan de Ia ciudad, aparecieron los primeros proyectos de construcción de los funiculares. Desde Ia zona baja de Valparaíso estos cerros ascendían en forma vertical entre los 30 y 60 metros sobre ei nivel dei mar. El ascensor era aqui Ia respuesta más adecuada para facilitar su ascensión ya que de otro modo se hubiese requerido de caminos más largos para salvar una pendiente adecuada, o de escaleras agotadoras. El dia I o de diciembre de 1883 se inauguro ei ascensor dei cerro Concepción ei cual estaba dotado con un sistema que funcionaba por médio de estanques de água ubicados en ambos extremos dei recorrido, teniendo estos Ia función de contrapesar Ia carga de los con ei fin de producir ei ascenso y descenso de uno y otro. El êxito dei ascensor fue rotundo. El dia 29 de diciembre ya se contaban más de 23.000 personas que habían utilizado los servicios dei ascensor. El proyecto perteneció a don Liborio Brieba, quien fuera un destacado novelista y autor de Ias obras de ambiente colonial.

En Io sucesivo fueron apareciendo una serie de proyectos relativos a Ia instalación de funiculares. Muchos prosperaron, siendo Io importante de destacar que todos los proyectos de ascensores nacieron de Ia iniciativa privada. A Ia Companía de Ascensores Mecânicos de Valparaíso, Ia primera en establecerse ei 13 de diciembre de 1882, le siguieron varias companías más que se fueron haciendo cargo de Ia explotación y construcción de los diversos ascensores. Desde 1883 hasta 1932 se habrían construído, según los datos obtenidos, 29 ascensores, de los cuales se cuenta con Ia certeza de Ia efectiva existência de 27. La importância de los ascensores radico en muchos factores que llevaron en definitiva a un notório mejoramiento de Ia calidad de los médios de transporte entre ei sector dei plan de Valparaíso y los cerros aledanos, Uevando por consiguiente a un mejoramiento de Ia calidad de vida de los habitantes dei puerto. Los ascensores tienen en promedio 57 metros de altura. Algunos de ellos nacieron quebrada arriba sobre los treinta metros sobre ei nivel dei mar, ascendiendo hasta los 80 metros. (FIG. 2)

En Ia década de 1920 ei puerto de Valparaíso vivia una baja ostensible de Ia prosperidad que Io caracterizo durante Ia segunda mitad dei siglo XIX. La

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construcción dei Canal de Panamá disminuyó ei tráfico marítimo a través de Valparaíso y Ia Guerra Mundial de 1914, que minimizo ei comercio entre Europa y América. Más adelante, y a partir de 1930, en ei país se hizo sentir otro gran remezón que perjudicó en gran medida ai puerto de Valparaíso. Este fue Ia gran depresión mundial de 1929.

Los ascensores portenos, que habían sido de una imperiosa necesidad en Ia década de 1880, encontraron competência en Ia implementación de nuevos médios de transporte urbano. Aparece una nueva alternativa de transporte, "Ias góndolas" que trasladaban a los pasajeros a una mayor velocidad y a través de calles estrechas y mal pavimentadas. Este autobús colectivo fue Ia gran solución para Ia circulación desde y hacia los cerros. Las labores de mejoramiento de caminos hacia los cerros por parte de Ia Municipalidad portena lograron mejorar las vias de acceso, consiguiéndose que hacia 1937 se establecieran ya líneas de autobuses que condujesen a Ia mayoría de los barrios altos de Ia ciudad. El ascensor porteno se hizo insuficiente para

FIG. 3 Valparaíso actual satisfacer las necesidades de transporte de los habitantes de los cerros. Ello porque

ei poblamiento de estos se empinaba ya por sobre los 300 metros sobre ei nivel dei mar según informaciones dei ano 1964. (FIG. 3)

El colapso dei sistema de ascensores se produce a partir de los anos 40, pero con seriedad después de los anos 70. Disminuyó así su público y por tanto ei servicio de los mismos comenzó a ser maio y poço conveniente para ei habitante dei cerro. Algunos empresados duenos de ascensores cerraron los ascensores y ei Estado, con sus insuficientes recursos, hubo de hacerse cargo de unos cuantos.

Antes de 1870, los principales productos metalúrgicos de construcción eran ei fierro forjado y ei hierro fundido. El hierro forjado es un metal de gran dureza superficial, pero que soporta poça deformación y se quiebra de manera brusca; Ia rotura se denomina agria y tiene ei grave inconveniente de no pasar por una etapa de fluencia y, por Io tanto, no permite Ia redistribución o traspaso de cargas a otras partes de las estructuras y tampoco da senales anticipadas de deformación que alerten que las cargas han sobrepasado ei limite de fluencia, como sucede en los aceros actuales. En 1864 se conoció ei procedimiento de producción de acero mediante ei convertidor dei inglês Bessemer a Io que le siguió Ia invención dei proceso Siemens-Martín. En 1868, Williams Siemens y su hermano Friedrich levantaron en Birmingham Ia primera planta experimental para Ia producción de acero mediante su proceso de hogar abierto, con Io que fue posible, por primera vez, producir acero de alta calidad, duración y resistência. La producción total mundial de acero se incremento inmediatamente de 4.700.000 toneladas, en 1850, a 18.160.000 toneladas en 1880.

El cable de acero se comenzó a usar masivamente alrededor de 1875 y tuvo un impacto enorme en Ia ingeniería de transporte, por nombrar un campo técnico industrial afín con nuestro tema. Su producción industrializada bajó su costo y debido a su duración, reemplazó inmediatamente todas las funciones de sujeción y arrastre de cargas pesadas que se efectuaban con cordaje de fibras naturales, que eran las fabricadas entonces. De todos los elementos mecânicos dei ascensor, ei cable es ei único que hasta Ia fecha no ha sido sustituido; su diseno ha mejorado, pero basicamente es ei mismo puesto en uso a finales dei siglo pasado. (FIG 4)

El primer ascensor y que sirvió de modelo para los que siguieron, se proyectó FIG. 4 Maquinaria A. San Agustín s o b r e k b a s e d e c a r r o s d o t a d o s d e d o s p a r e s d e r u e d a s m o n t a i S O D re dos ejes

fijos, estos ejes van unidos, a su vez, a Ia plataforma que sirve de base dei carro mediante una estructura metálica reticulada. Está formado por un sistema de dos carros idênticos que se unen a través de un cable de suspensión que pasa por una polea muerta, en algunos casos, o por Ia misma polea de arrastre que cumple ambas funciones, en los disenos más modernos, cuya función es invertir ei movimiento dei cable de suspensión de manera de producir un movimiento de ascenso y descenso recíproco entre ambos carros por su via exclusiva.

El arte es expresión, en una de sus acepciones, dei pensar de los pueblos. Como tal, da significado y es significante para todo aquello que nos rodea y nos otorga identidad. Es así como una ciudad, ai ser interpretada por sus artistas, se incorpora

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ai acervo cultural de Ia nación, a Ia cual pertenece. Valparaíso adquiere su caracter por su particularidad, por esa magia que tienen Ias ciudades que no se parecen a ninguna ni a nada, pero son una mezcla de todo. Sus elementos son una suma mágica de escaleras, cerros, quebradas y ascensores que, ai convivir, transforman ai puerto en una inspiración. De estos, los ascensores son posiblemente los objetos que mayor atracción generan. Y como tales han sido tópicos de manifestaciones artísticas. Valparaíso sin ascensores no es ei mismo, pero lamentablemente ni ellos ni su influencia en ei arte se han valorado como merecen. La literatura, que con Ia palabra evoca y significa, Ia plástica, con su mezcla de técnicas y colores, perpetua en telas, planchas o papeles Ia imagen intensa y estética de estos transportes. La música y ei cine, con sus ritmos y secuencias, juegan con ei movimiento, sea musical o visual, otorgándole un sentido de identidad a los ascensores, quienes se transforman en entidades estéticas por si mismas, coherentes a Ia composición artística que testimonia a este importante puerto. (FIG. 5)

FIG. 5 A. Reina Victoria

FIG. 6 A. Monjas

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Conclusiones.

Nuestro diagnóstico Io hemos enfocado como un "juicio de valor" en ei estricto sentido de Ia palabra, centrándolo en determinar cuales son los valores que según nuestra opinión, serían argumentos determinantes que justifican un "Plan de Revalorización" dei sistema, ei cual debiera considerar Ia adecuada preservación, evolución y desarrollo dei conjunto de Ascensores de Valparaíso como un todo coherente e indisoluble para con su ciudad. Por otra parte en relación con nuestra postura de arquitectos restauradores y ante un conjunto patrimonial como los "Ascensores de Valparaíso", un objetivo adicional de este trabajo, ha sido dar cuenta de su estado actual de conservación, siendo ei diagnóstico ei punto donde hemos volcado y aglutinado todas Ias opiniones y conclusiones de los diferentes especialistas, respecto dei "valor" de los Ascensores de Valparaíso. (FIG. 6)

Desde ei punto de vista arquitectónico, ei valor de los Ascensores está presente a través de una amplia gama de niveles y grados de interés representada desde uno de ellos, ei Polanco, que es Monumento Histórico con protección legal conferida por ley, hasta algunos que prácticamente carecen de todo interés, siendo por ejemplo sus estaciones elementos que ocupan espacios residuales entre edifícios.

El valor histórico dei conjunto de Ascensores de Valparaíso está dado por ser un testimonio material de una forma de solución para un sistema de transporte particular implementado en esta ciudad hace más de cien anos, ei cual es trascendente por dos motivos: representa una forma de transporte ya prácticamente en desuso a nivel internacional y es un conjunto único a nivel mundial, ei cual se puede sintetizar como "valor de elemento único"; y por otra parte, es de tal fuerza y tradición para Ia ciudad, que se ha transformado en su símbolo y forma parte de su quehacer cotidiano y permanente.

Los Ascensores de Valparaíso forman parte indisoluble de Ia trama urbana de Ia ciudad donde tienen un doble valor. Por una parte se constituyen en hitos urbanos que son referencia dentro de Valparaíso, fundamentalmente por ser elementos volumétricos facilmente reconocibles y, por crear y conformar líneas o cortes dentro dei tejido urbano que también son muy identificables dentro de Ia caprichosa trama urbana que recorre ei cerro y se adapta a Ia cota y Ia gradiente dei mismo.

Un enfoque social de los Ascensores de Valparaíso en cuanto su valor, se encuentra en Ia memória colectiva de Ia ciudad, habiéndose constituído en elementos de identidad de Valparaíso. El ciudadano, ei vecino, ei habitante tiene clara conciencia de Ia existência de su respectivo ascensor en relación a su lugar de residência, convirtiéndose los ascensores en elementos que dan cuenta de formas de vida, de niveles sociales y de relaciones con sigo mismos y con Ia colectividad. No es menos importante, es ei hecho de que por formar parte de más de 100 anos de historia, los Ascensores de Valparaíso han sido una fuente estable de trabajo para una parte de su población. Cabe senalar que hoy en dia en que tenemos 15 ascensores en los

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FIG. 7 A. Artillería

I ,

FIG. 8 A. Villaseca

cuales trabajan en promedio 4 a 5 personas por cada uno de ellos, es decir 4 a 5 familias, Ias cuales además han ido heredando de padre a hijo los ofícios de maqui-nista, mecânico y cobrador, con 3 o más generaciones representadas a Io largo de su historia.

El gran valor artístico cultural de los ascensores está dado por haber sido y seguir siendo fuente de inspiración para una increíble cantidad de creadores en Ias más diversas disciplinas durante más de cien anos. Este hecho podemos encontrarlo en poemas de Pablo Neruda hasta desconocidos artesanos que se ganan Ia vida recreando a los ascensores en su quehacer diário. (FIG. 7)

Otro importante aspecto dei valor de los Ascensores de Valparaíso dice relación ai dise—o industrial centrándose en que son un testimonio vivo y latente de un proceso y de una solución tecnológica que ya tiene más de 100 anos de historia. La solución técnica representada mediante un diseno industrial específico en una gran cantidad de ascensores que ai dia de hoy siguen en pié y funcionando son en si mismo un valor vivo de una tecnologia ya casi olvidada, de Ia historia dei transporte urbano.

El estado de conservación actual de los ascensores desde ei punto de vista técnico dice relación con cada ascensor en particular. Cada ascensor posee un estado de conservación diferente para Io que es necesario remitirse a este estúdio en particular para poder sacar conclusiones específicas. Es importante senalar que existe una gran diferencia entre ei estado de conservación de los ascensores que son propiedad de Ia I. Municipalidad de Valparaíso y aquellos que son de propietarios particulares. Los municipales poseen un mejor estado de conservación que aquellos particulares.

El valor que conlleva este sistema como Médio de Transporte dice relación con su vigência actual. Su utilización promedio es de un 15% de subida y un 7% de bajada, sistema a pesar de estar subutilizado, está plenamente vigente y presta un servicio insustituible para sus habitantes.

El principal valor de los ascensores en ei aspecto econômico dice relación con su rentabilidad como médio de transporte. Esta rentabilidad es real y su grado de valor tiene relación con cada uno de ellos en especial. N o obstante Io anterior, ei sistema conformado por los 15 ascensores que están en pie, especialmente los 10 privados, siguen siendo un negocio rentable para sus duenos, Io cual queda demostrado solo por ei hecho de seguir con vida. (FIG. 8)

El Valor Turístico está dado por Ia singularidad urbano arquitectónica de estos elementos que caracteriza a Ia ciudad de Valparaíso, siendo ei principal atractivo para ei visitante tanto interno como extranjero, valor con que cuenta Ia ciudad como potencial de desarrollo futuro y sostenible.

El plan general de Revalorización de los Ascensores de Valparaíso consiste en una serie de medidas y acciones puntuales, que en su conjunto tienen como objetivo, ei rescate de estos importantes elementos patrimoniales de Ia ciudad. Estas medidas y acciones deberán ser implementadas, promovidas y coordinadas por Ias autoridades de Ia región y de Ia comuna y, desarrolladas, implementadas y potenciadas por los diferentes agentes privados de cada uno y dei total de los Ascensores de Valparaíso. El adecuado y serio apoyo ai conjunto de Ascensores de Valparaíso significaria sin duda, un impulso a Ia decaída actividad econômica de Ia ciudad, pudiéndose convertir inclusive en un nuevo y adicional norte que urgentemente necesita Valparaíso y su gente.

En este plan hemos querido distinguir dos tipos de mediadas o acciones a implementar a Ias que denominamos "medidas de protección" y "acciones y estímulos" que tienen por objetivo "revalorizar" ei conjunto Ascensores de Valparaíso, dándole ia auto sustentación y Ia dignidad que merecen, para enfrentar Ia llegada dei tercer milênio con Ias herramientas y ei potencial necesario que este desafio requiere.

Finalmente para CONPAL-Chile es deber senalar y destacar con gran fuerza que cualquier iniciativa de recuperación física de los Ascensores de Valparaíso será en vano si no se apoya ei sistema de manera integral y global. Todos los esfuerzos que se emprendan para recuperar y dignificar tal o cual ascensor será simplemente postergar, por un tiempo corto, su precária vida, sino se le da Ia auto-sustentación que

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ei sistema requiere. Nuestros ascensores son adultos mayores que necesitan independência y dignidad, para que sigan prestando una función útil e importante dentro de nuestra sociedad. (FIG. 9 Valparaíso y su puerto)

Bibliografia Consul tada.

M I G O N E , Jaime & Pirozzi, Antonino. Ascensores de Valparaíso. Valor de un Patrimônio

Olvidado Ediciones CONPAL-Chile. Santiago de Chile. 1998.

FIG. 9 Valparaíso y su puerto Curr iculum.

Jaime Migone R., Arquitecto especialista en Conservación y Restauración de Monumentos. Antonino Pirozzi V , Arquitecto especialista en Conservación y Restauración de Monumentos.

Los arquitectos Migone y Pirozzi son autores y coautores de diversos proyectos, investigaciones y publicaciones y han participado en diferentes encuentros internacionales sobre conservación, restauración y gestión dei patr imônio arquitectónico y urbano.

Su actividad profesional se ha orientado principalmente a Ia realización de diversos estúdios, diagnósticos, catastros, inventários y proyectos de restauración y conservación para Monumentos Históricos chilenos, entre los que se cuentan museos de sitio, museos de bellas artes, teatros y edifícios públicos y privados.

Las principales investigaciones realizadas por los arquitectos de CONPAL-Chile se han enfocado en las características, tipo y condición dei patrimônio arquitectónico y urbano chileno y sus resultados han sido expuestos en congresos, seminários y simpósios realizados en Estados Unidos, México, Espana, Cuba, Itália, Argentina, Paraguay, Bolívia, Brasil y Chile.

Los arquitectos Migone y Pirozzi ejercen también Ia docência universitária dictando cursos y seminários sobre conservación y restauración arquitectónica y gestión dei patrimônio cultural y han publicado, aparte de artículos en revistas y ediciones de difusión, los textos "Estado de Situación de Ia Conservación dei Patrimônio Construído en Chile - Informe Preliminar". Ediciones de Ia Universidad Internacional SEK. Santiago, Abril, 1996, ISBN 956-7137-12-9 y "Ascensores de Valparaíso - Valor de un Patrimônio olvidado". Ediciones CONPAL-Chile. Santiago, Mayo, 1998, ISBN 956-7792-00-3.

Los arquitectos Migone y Pirozzi han organizado importantes encuentros en Chile sobre Ia conservación dei patrimônio arquitectónico con Ia participación de destacados especialistas internacionales y han gestionado con organizaciones internacionales como Ia Comisión Europea, ei World Monuments Fund y Ia Fundación Getty diversos proyectos y apoyo financiero para trabajos de investigación, difusión y restauración dei patrimônio construído chileno.

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Abstract

This article analyses the question of copying an architectonic style within the historie centre of two English cities, Chester and Manchester (both located in the North of England). There are many questions to be answered by professionals that work with urban conservation and two of them are listed here: 1) The question if one should or should not copy an old style, and 2) the question if one should allow a new design within a conservation área. The conservation officers believe that the ideal situation is to maintain the original building, but there are situations where this is not possible. In this case, there is a big discussion between conservation officer, architects and the owners of the buildings. There is a tendency from the architects to copy the style of old buildings without much concern about a good design. There are some rules to be followed by architects when a new building is designed in a conservation área. There is in both cities an independem committee, which together with conservation officers decide about new projects in conservation áreas. This group is quite strong about new designs. They try to ensure that the new building will fit and respect the surrounding área. According to the conservation officers - to copy old style is falsifying the history of the city. To conserve does not mean stopping in time and creating a city for tourists. In the opinion of the conservation officers and the members of the civic groups, there is a difficulty in creating a new architectonic style following the conservation law. Thus, some architects prefer the easier way and do copy the old style instead of creating a new design, which would respect its surrounding.

Copiar Estilo Arquitetônico Dentro de Centros

Históricos é Válido?

Angelita Berndt, M.Phil. Professora/pesquisadora e Artista Plástica

1-Introdução

Este artigo tem como objetivo analisar as questões de cópia de estilos arquitetônicos e novos estilos {design) arquitetônicos dentro de áreas de preservação. Cópia neste contexto pode ser entendida como simulacro, ou seja, uma imitação imperfeita e grosseira do original. Este artigo descreve os resultados de uma pesquisa que teve como objeto as cidades Inglesas de Chester e Manchester. Foram efetuadas entrevistas com profissionais das prefeituras de ambas cidades, bem como dos membros das entidades civis que participam dos comitês de preservação do patrimônio histórico. Estes comitês são compostos pelos profissionais de preservação das prefeituras e de representantes de entidades civis relacionadas com patrimônio histórico. Estes comitês se reúnem a cada mês para discutir e analisar novos projetos nas áreas de preservação. Além das entrevistas, o estudo baseou-se em pesquisa documental, bem como em observação direta pela própria pesquisadora.

As cidades de Manchester e Chester são localizadas ao norte da Inglaterra. Chester situa-se na divisa da Inglaterra com o País de Gales. A economia das duas cidades diverge um pouco. Manchester possui como maior fonte de renda a atividade industrial, o setor da educação (possui 3 universidades e diversos colégios, que também oferecem curso superior), o comércio e o turismo. Chester, por sua vez, possui como maior fonte de renda o comércio e o turismo. É neste contexto econômico que há pressão para novos empreendimentos arquitetônicos em ambas as cidades.

2-História Arquitetônica de Chester e Manchester

Para podermos ter um melhor entendimento da situação atual da preservação urbana em cada cidade, um breve resumo da história arquitetônica é feito. A história de Manchester e Chester tem bastante em comum em termos de estilos arquitetônicos. Podemos dividir a história de ambas cidades em 5 períodos: dominação Romana, dominação pelos Anglo-Saxônicos (Idade das Trevas), Período Medieval, Revolução Industrial e Século XX. No entanto, os estilos arquitetônicos que sobreviveram ao tempo em cada cidade são diferentes.

Manchester quase nada retém do período Romano. Os historiadores fizeram escavações e descobriram o local do forte romano na cidade de Manchester, uma área atualmente chamada Castlefield. Esta área possui uma reconstrução do antigo forte e é atualmente tombada como "Parque Industrial" por sua importância na época da Revolução Industrial. Da época dos Anglo-Saxônicos nada restou e existem poucos registros do período considerado pelos historiadores como "Idade das Trevas". A história arquitetônica de Manchester começa de fato no período Medieval. Existem poucos exemplos arquitetônicos desta época: a catedral, o colégio localizado ao lado da catedral, a igreja de St. Ann e um Hotel Bar. A maior parte da arquitetura de Manchester data da Revolução Industrial (Archer, 1985). Manchester é considerada por muitos historiadores como o berço da Revolução Industrial e este é o período que melhor define esta cidade (Atkins, 1987). Neste período temos dois estilos predominantes, o Neoclássico (conhecido pelos ingleses como Georgian Style) e o Neo-Gótico (conhecido pelos ingleses como Victorian Style). A grande parte dos prédios tombados em Manchester são deste período devido à importância da Revolução Industrial. No período da Revolução Industrial muitos dos prédios do

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período Medieval foram destruídos para abrigar a nova cidade. Manchester sofreu bombardeios durante a 2a Guerra Mundial e parte do centro foi destruído. Sendo assim, a cidade sofreu novamente uma restruturação após a guerra (Burton, 1990; Blacknicki et ali, 1988). O estilo internacional é o predominante no período pós-guerra.

De acordo com o Plano Diretor da cidade de Manchester, datado de 1945, a cidade teria seu centro totalmente reestruturado. Os prédios antigos seriam demolidos, ficando apenas os prédios do período Medieval. Todos os prédios que são datados do período da Revolução Industrial não possuíam maior valor na época do Plano Diretor, pois não eram considerados como de "boa arquitetura". Devido aos problemas econômicos do pós-guerra enfrentados pela Inglaterra, o Plano foi executado parcialmente. Desta forma, muitos dos prédios do período da Revolução Industrial foram salvos. Atualmente existe uma tentativa de integrar os novos prédios com os antigos estilos.

A cidade de Chester, assim como Manchester, tem o início de sua história com a dominação dos Romanos. Chester era uma importante localização para os Romanos, tendo sido o quartel general dos romanos no norte da Inglaterra. Chester possuía uma estrutura de cidade já no período dos Romanos. Era em Chester que os romanos passavam a maior parte do tempo e a cidade era tida como o centro de lazer e comércio para os romanos no norte da Inglaterra. A estrutura da cidade Romana sobrevive até os dias de hoje. As ruas principais da cidade de Chester são as mesmas ruas romanas e parte do muro que rodeia a cidade é original do período romano. Chester possuía, fora do forte, uma casa de banho, um anfiteatro, residências de civis e um cemitério. Escavações feitas na década de 30 possibilitaram mostrar o anfiteatro e a casa de banho dos romanos fora dos muros de Chester.

D o per íodo Anglo-Saxônico nada sobreviveu em te rmos de es t ru tura arquitetônica. Entretanto, sabe-se que Chester foi de suma importância para os Vikings devido ao porto, que ficava às margens do Rio Dee. Este porto ligava Chester ao Mar Irlandês, que era de vital importância econômica para os Vikings, pois lhes permitia transportar via mar suas mercadorias. No período Medieval Chester era um centro importante, sendo por algum tempo até independente do reinado inglês. Houve uma extensão dos muros Romanos e torres foram criadas para melhor defesa da cidade. Deste período Chester tem diversos prédios sobreviventes, como a catedral, as ruínas do Castelo Medieval, a igreja St. John's e alguns exemplos de arquitetura doméstica (Beck, 1969; Bu'lock, 1972).

A arquitetura do período Medieval é conhecida como "Tudor" ou "Timber Frame". Uma boa parte dos prédios em Chester é do período Medieval, sendo que a cidade é conhecida por este estilo arquitetônico. A cidade de Chester não teve grandes mudanças durante a Revolução Industrial em comparação com a cidade de Manchester. O estilo predominante deste período é o Neoclássico (Georgian Style) e o Neo-Gótico (Victorian Style).

Na virada do século XIX para o XX ocorreu uma renascença do estilo Tudor e muitos dos prédios no centro histórico são desta época. Existe um exemplo interessante deste "reviva?' na cidade. Em 1910 o "St. Michael Arcade" (galeria com lojas) foi construído no estilo barroco, mas logo após sua construção a fachada do prédio foi mudada para o estilo Tudor. Isto ocorreu devido a não aceitação do prédio com fachada de cerâmica branca por parte dos moradores da cidade.

Existem alguns importantes prédios do começo dq século XX, como é o caso do cinema Odeon, construído em 1936. Este prédio é tombado. No Plano Diretor da cidade de Chester de 1945, a preservação do centro histórico já era uma preocupação no documento. Havia uma área fora da cidade destinada a novos desenvolvimentos. Esta área também já era construída, porém devido a problemas econômicos pouco foi executado do Plano Diretor de 1945.

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3-Processo de Tombamento na Inglaterra

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Antes de começar a escrever especificamente sobre a prática de preservação nas cidades de Manchester e Chester é importante salientar como se processam os tom-bamentos de prédios históricos e áreas de preservação na Inglaterra. Na Inglaterra o tombamento é feito pelo governo central, sendo que os pedidos de tombamento podem ser feitos tanto pela prefeitura como por entidades civis. As prefeituras têm autonomia de administrar os prédios tombados e áreas de preservação, tendo como base as leis criadas pelo governo central.

Existe uma diferença entre os tombamentos feitos pelo governo central na cidade de Manchester e Chester. Manchester possui uma diversidade de estilos no centro e nem todo o centro é tombado. Existem áreas de preservação onde procurou-se manter alguns estilos arquitetônicos, porém muitos locais do centro estão perdendo suas características, por uma falta de controle. O centro histórico de Chester é todo tombado, então todo prédio novo dentro do centro histórico tem que passar pela análise do comitê que analisa os novos projetos.

Manchester sofre uma pressão econômica para novos desenvolvimentos, ou seja, novos prédios surgem mais freqüentemente no centro da cidade. A cidade não depende do turismo como sua principal fonte de renda. Manchester tem como fonte de renda a industria, o comércio, a educação e o setor administrativo. Chester, por sua vez, é uma cidade menor e o turismo é sua principal fonte de receita. A pressão para construção de novos prédios em Chester é bem menor que em Manchester, pois toda a cidade de Chester é tombada. Existe um controle bem maior em Chester com relação aos novos prédios. No passado alguns prédios novos (década de 80) na área histórica foram projetados tornando o estilo arquitetônico predominante (Tudor e Georgian Style) como modelo. Criaram-se, assim, cópias dos estilos passados sem uma maior preocupação com o design moderno.

Hoje em dia os profissionais da autoridade local, que trabalham no setor de preservação, primam por projetos que reflitam o momento atual. Ou seja, um bom design que seja ao mesmo tempo moderno e respeite o entorno da área de preservação. Chester foi objeto de estudo, junto com mais 3 cidades Inglesas (Bath, York and Chichester), em 1966, sobre pressão de grupos de preservação. O governo criou uma comissão para estudar estas 4 cidades e fazer recomendações sobre políticas de preservação para as cidades históricas em geral. Desde então, Chester tem sido objeto de pesquisa quando o governo quer criar outras políticas de preservação (Berndt, 1995).

4-Processo de análise de novos projetos em Chester e Manchester

Manchester tem alguns folhetos explicativos para a área de preservação no centro da cidade e nos bairros. Estes folhetos descrevem o porquê do tombamento da área, seu desenvolvimento e os prédios que são tombados. Os folhetos também descrevem políticas de controle de futuros desenvolvimentos e melhorias nas áreas. Além destes folhetos existe um guia com relação aos novos "designs" produzidos pela prefeitura, que é restrito ao uso interno. Tanto os folhetos das áreas de preservação quanto este guia são considerados muito importantes para um melhor entendimento entre os profissionais das prefeituras, arquitetos e proprietários. Existe um comitê na cidade de Manchester chamado Panei1, que é composto por diversos representantes de associações civis, tais como The Bristish Architects, The Georgian Group, The Victorian Society, etc. Estes grupos se reúnem uma vez por mês na prefeitura de Manchester com os profissionais do setor de preservação para discutir e analisar os novos projetos e reformas nas áreas de preservação. Na pesquisa feita com os profissionais e membros do Panei foi dectado que os novos prédios deveriam complementar a caraterística existente na área.

Na cidade de Chester existe um comitê chamado "Conservation Aréa Advisory Committee" (CAAC)2. Este comitê tem a mesma função que o Panei na cidade de Manchester e é composto por representantes de diversos grupos, da mesma forma que o comitê de Manchester. Chester também produz alguns folhetos informativos

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ABRACOR - Associação Brasileira de Conservadores-Restauradores de Bens Culturais

sobre o centro histórico, um guia para novos designs e existem livros produzidos pelo governo central usando a cidade como estudo de caso. Desta forma, a questão de quantidade de informação dirigida à população e aos profissionais é bem maior do que a oferecida por Manchester.

Em termos de novos designs em áreas de preservação, os profissionais de Chester tem a mesma opinião dos profissionais de Manchester, ou seja, o novo prédio dever possuir um estilo atual (contemporâneo). O novo prédio dever representar o século XX e não imitar o estilo antigo. Os profissionais de ambas prefeituras concordam que alguns aspectos devem ser respeitados quando da reforma ou execução de um novo prédio. Segundo eles, o aspecto mais importante não é o estilo arquitetônico, mais sim se os materiais são apropriados para a área, se a altura e escala do novo prédio se encaixam simpaticamente com a área tombada.

Uma das maiores preocupações dos profissionais da prefeitura de Chester é referente ao material usado em reformas e prédios novos. "Hoje nós temos uma grande variedade de materiais de construção para escolher, muitos vezes sintéticos e diferentes dos materiais tradicionais usados nas construções antigas. A menos que exercitamos cuidados com os materiais a serem usados para reformar ou alterar e quando da construção de novos prédios ou extensões, as características de muitas áreas de interesse especial serão apagadas e perdidas para futuras gerações" (Chester's Conservation officer).

5-Exemplos de bons design em Chester e Manchester

Segundo os especialistas que trabalham na prefeitura de Chester, os novos revivalsão versões pobres dos estilos antigos. Isto ocorre por causa de "falta de imaginação" por parte dos arquitetos e por se acreditar que copiando o estilo antigo se teria mais chance do projeto ser aprovado pela prefeitura. Existe uma tendência em Chester para os arquitetos imitarem o estilo Tudor (período Medieval), porém segundo os especialista estes novos revival apresentam qualidade de projeto e de material inferior aos originais. Segundo os especialistas, existem um ou dois prédios novos em Chester que tiveram sucesso no revival. Um deles é localizado na City Road, uma região que foi separada do centro por uma nova rua. O novo prédio possui uma fachada que dá a impressão de um grupo de prédios. Apesar do prédio não possuir um design ambicioso, ele uni as duas áreas da cidade que foram separadas pela construção de uma nova rua, a "Ring Road".

Em Manchester existem alguns exemplos de bons designs em área de preservação como o prédio do British Council, construído em 1992, e o prédio de escritórios na Peter Street no. 49. Segundo os profissionais da prefeitura de Manchester e os membros do Panei, estes dois projetos foram aceitos depois de um bom período de discussão entre o comitê, os arquitetos e os proprietários dos imóveis.

Com relação à manutenção apenas da fachada e a destruição do interior dos prédios os especialistas são definitivamente contra este procedimento. Segundo os especialistas, a importância de um prédio não está apenas no aspecto externo. O interior do prédio marca um tipo de design que também é de fundamental importância, pois através dele podemos estudar comportamentos e fatores econômicos de uma época. Na parte histórica de Chester, ou seja, dentro dos murros que rodeiam a cidade, mais especificamente nas 4 ruas principais que são oriundas do período romano, não é permitido manter apenas a fachada. Entretanto, nem sempre se pode manter o design do interior original. Em ambas as cidades existem casos de prédios dos quais foram mantidos apenas as fachadas. Quando a pressão econômica é muito grande, a prefeitura acaba aprovando projetos que mantém apenas a fachada. Isto ocorre mais nas áreas de preservação da cidade de Manchester.

6-Conclusão

144 Os especialista do setor de patrimônio acreditam que produzir prédios que pareçam

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antigos é muito artificial. Novos prédios não deveriam ser cópias (simulacros) dos estilos antigos, mais muitas vezes o são. Referindo-se às copias de estilos antigos, um especialista expressou-se desta forma "Eu acho isto muito triste, porém não existem mais projetos de prédios modernos com boa qualidade de design". É sentido pelos especialistas que a prefeitura e as pessoas em geral estão contentes com prédios que imitam os "históricos".

Comparando as duas cidades, percebe-se uma dificuldade maior com relação a novos prédios em Chester. Isto deve-se ao fato da cidade ter um controle maior do centro histórico e da proximidade dos prédios. Em Chester existe menos pressão para novos prédios. Entretanto, quando isto ocorre existe uma dificuldade muito grande por parte dos arquitetos para criar um projeto novo que respeite os prédios de seu entorno.

Segundo os especialistas, ocorreram casos de alguns projetos ficarem muito tempo para serem analisados sem chegarem a um comum acordo. Depois de algum tempo estes projetos foram aprovados sem grandes modificações, ou seja, acabaram ficando mais ou menos uma copia dos prédios (estilo Tudor) em sua volta. Isto ocorreu devido à pressão que existiu para os projetos serem aprovados. Os especialistas procuram fazer é falar com os arquitetos e proprietários antes mesmo do projeto começar, mostrando os folhetos explicativos e a importância da preservação. Este procedimento também é usual na prefeitura de Manchester. Segundo os especialistas da prefeitura de ambas as cidades, este contato anterior ao projeto é de fundamental importância, pois desta forma tem-se conseguido melhores resultados. Quando o projeto chega pronto para ser analisado existe uma resistência por parte do arquiteto e dos proprietários para mudanças e, quando estas ocorrem, não chegam a ser significativas.

Na opinião dos especialistas de ambas as cidades, a cópia nunca foi bem vinda nos centros históricos e áreas de preservação. No entanto, existe uma crença por parte dos arquitetos e da população em geral que criar algo muito parecido com o antigo, ou seja, um simulacro, é menos danoso que um prédio com estilo contemporâneo. Existem casos onde a reconstrução de um prédio histórico pode ser válida, no entanto, este tem que ser feito seguindo critérios de construção e materiais do prédio original. Este tipo de reconstrução está se tornando menos usual. Entretanto, esta foi uma pratica comum em cidades históricas no passado, como é o caso da cidade inglesa de Stratford-Upon-Avon, cidade onde Shakespeare nasceu. Nesta cidade alguns prédios referentes à história de vida de Shakespeare foram reconstruídos.

7-Bibliografia

ARCHER, J.H.G. (1985) A Classic of Its Age. In: Art and Architecture in Victorian Manchester (edited by J.H.G. Archer, J.H.G.), 127-161

ATKINS, P. (1987) Guide Across Manchester. North West Civic Trust, Manchester BARNETT,W. & Winskell,C. A. (1977) Study in Conservation. Oriel Press, London BECK, J. (1969) Tudor Cheshire. Cheshire Community Council, Chester. BERNDT, A. (1995) Urban Conservation: Comparison Between Brazil and England,

University of Manchester, UK BILSBOROUGH, N. (1983) The Treasures of Cheshire. North West Civic Trust,

Manchester, England BLACKNICKI, H. & Shawcross, W. (1988) City Trai/: Manchester Architecturai Heritage.

Manchester City Council, Manchester BU'LOCK, J.D. (1972) Pre-Conquest Cheshire 383-1066. The Cheshire Community

Council, Chester BURTON, A. (1990) Cityscape: A Tour Around the GreatBritísh Cities. André Deutsch,

London Chester City Council (1945) Greater Chester Locai P/an. Chester City Council, Chester Chester City Council (1975) Chester Heritage City: Heritage Walk /,Chester City Council

& Chester Society of Architects, Chester

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ABRACOR - Associação Brasileira de Conservadores-Restauradores de Bens Culturais

Chester City Council (1988) Conservation in Chester, Chester City Council, Chestet Chester City Council (1988) Greater Chester Loca/ P/an. Chester City Council, Chester Chester City Council (1989) Chester Offtcial Guide Book. Chester City Council, Chester Chester City Council.(1988) Conservation in Chester; Conservation Review Study 1986.

Chester City Council, Chester Manchester City Council (1945). Manchester Local Plan of 1945. Manchester City

Council, Manchester.

N o t a s

1 O Conservation Áreas and Historie Buildings Panei (Panei) é constituído por: The Royal Institute of British Architects, The Landscape Institute, The Royal Town Planning Institute, The Georgian Group, The Council for British Archaeology, The Society for Protection of Ancient Monuments Society, TheVictorian Society, The Civic Trust in the North West, The Lancashire and Cheshire Antiquarian Society, The Royal Instituion of Chartered Surveyors, Manchester Literary and Philosophical Society, The North-west Buildings Preservation Trust, e a South Manchester Civic Society.

2 O Conservation Área Advisory Committee (CAAC) é composto por: The Archaeological Society; The Building Employers Confederation; Chester Júnior Chamber; Chamber of Trade; Chester Civic Trust, Council for Protection of Rural England; Freeman & Guilds; Historical Association; Chester Society of Architects; Society of Nature, Science, Literature and Arts; e a Chester Association of Estate Auctioneers, Surveyors and Valuers

Resumo do autor

Angelita Berndt. Graduação em Artes Plásticas pela Universidade Estadual de Santa Catarina. Mestrado (M. Phil.) pela Universidade de Manchester na Inglaterra. Atualmente cursando disciplinas isoladas em programas de doutorado da UFMG.

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Abstract Conservador-Restaurador Brasileiro: Quem Somos Nós?

Since 1937 the brazilian restorer is looking for his identity. Recent as profession not only in Bra2Íl, the preservation of cultural property has been used for many purposes. Due some historical factors, brazilian restores have not exercised one of their most importam task: the discussion of preservation criteria. We have almost always worked as preservation agents of cultural property previously determined and servjng to political interests. This happens because we don't have a preservation policy that can guarantee the necessary autonomy of the restorers' work. This moment of fight for recognition of the profession is also the moment to discuss our own identity and our commitment with the maintenance of national memory.

The profissional recognition points to a « look at ourselves » and remember us of our responsability with the establishment of preservation criteria. If we, experts worried on conservation conditions of brazilian cultural property, don't take the task to propose an objective, selective and hierarchical policy on what is priority in the field of conservation, who will?

Cláudia Philippi Scharf Especialista em conservaçao-restauraçao de bens culturais móveis Mestre em Artes Universidade do Estado de Santa Catarina - UDESC Rua Pau de Canela, 68 - 88048-330 Florianópolis-SC - Fone: (048) 9822518

O primeiro m o m e n t o da restauração n o Brasil: a ident i f icação d o res-

taurador brasileiro c o m a recuperação das obras do Barroco Mine iro

Se o introdutor da profissão de restaurador no Brasil, Edson Motta, teve uma formação acadêmica e científica, incluindo um estágio num dos mais recentes e completos laboratórios de restauração de sua época, o mesmo nao se deu com a maioria de seus seguidores.

Obrigado pelas contingências, Edson Motta formou grande número de profissionais com baixo nível de instrução acadêmica que, apesar de grande desenvoltura e experiência ao lidar com dificuldades cotidianas no universo das verbas reduzidas ou inexistentes, nao tiveram oportunidade de um aprimoramento continuado de suas técnicas e procedimentos, nem de cursos de aperfeiçoamento.

Isto nos remete a um quadro onde, apesar da erudição e excelente formação do iniciador desta profissão no país, a grande maioria dos profissionais atuantes até os dias de hoje nao têm a oportunidade de investir em seu aperfeiçoamento profissional, dando margem, muitas vezes, à exclusão do profissional de restauração da tomada de decisões, de posições críticas ou da definição de critérios de preservação.

Oficializada em 1937 com a criação do SPHAN, a profissão de conservador-restaurador no Brasil serviu, nas suas duas primeiras décadas de legitimação, para recuperar obras e bens culturais cuja existência era necessária para fundamentar a ideologia vigente.

As obras então restauradas sao sobretudo as que simbolizam nossa identidade nacional. Edson Motta, desde quando aluno da Escola Nacional de Belas-Artes, mostra uma afinidade com o pensamento que dominará toda a elite de intelectuais no Brasil: o modernismo. Através do Núcleo Bernadelü, seus membros e atividades, ele conhece artistas, intelectuais e políticos - entre eles, Rodrigo Melo Franco de Andrade, Gustavo Capanema e Getúlio Vargas - que se tornarão personalidades do mundo político da Nova República.

A época é de nacionalismo, tanto no contexto internacional quanto nacional. É o momento da « redescoberta do Brasil »: Mário de Andrade escreve sobre os costumes e a maneira de ser dos brasileiros e chega mesmo a criar um personagem que incarna seu caráter - Macunaíma, o herói sem moral. Oswald de Andrade redige o Manifesto An tropo fágico, Tarsila do Amaral pinta com as cores e o ambiente dos trópicos e Villa-Lobos compõe se inspirando na música popular. Tudo converge para a definição de uma « identidade brasileira », explicação deste « inconsciente nacional » cujo povo é portador. Há mesmo o reconhecimento, pelo regime do Estado Novo, do papel dos intelectuais e dos artistas nesta redescoberta do Brasil e na construção científica da identidade brasileira, fundamento necessário para a ideologia nacionalista.

A nível artístico, o que sustenta o conceito de identidade nacional é sobretudo a arte e a arquitetura do século XVIII de Minas Gerais, o « Barroco Mineiro », considerado primeiro produto cultural genuinamente brasileiro. A viagem dos modernistas às cidades coloniais de Minas Gerais em 1924 marca a « descoberta » de valores

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nacionais e sua apropriação pelo discurso nacionalista. Myriam Andrade Ribeiro de Oliveira explica este momento decisivo para o desenvolvimento de uma consciência nacional em relação ao patrimônio cultural. O nacionalismo se alastra, apoiado no caráter original e nacional das manifestações artísticas defendidas pelos intelectuais da época:

« Considerando-se o surto de nacionalismo emergente que caracterizava o contexto político e cultural do país nas vésperas de celebrar o primeiro centenário da Independência, justificava-se plenamente esta busca de um 'caráter nacional' na arte do passado levada a efeito pelos modernistas, paralelamente aos ideais de 'retorno ao nacional' ou 'valorização do nacional' na arte do presente, que constituíam preocupações fundamentais dos promotores da 'Semana de 1922'. A tese nacional de Mário de Andrade filia-se portanto, em última instância, a quase totalidade dos autores brasileiros (principalmente mineiros e paulistas) que nos sessenta anos seguintes dedicaram-se à pesquisa da arte colonial mineira, de Lourival Gomes Machado a Affonso Ávila, incluindo mesmo especialistas do estudo da arquitetura e das artes plásticas como o arquiteto Sylvio de Vasconcellos e o museólogo Orlandino Seitas Fernandes ». '

Do mesmo modo, a primeira geração de arquitetos modernistas vem do movimento neo-colonial que busca um estilo original na arquitetura de estilo português erigida - e reinterpretada - no Brasil sobretudo no século XVIII e começo do século XIX. Este movimento se caracteriza pela busca consciente de um estilo brasileiro e revela um forte compromisso com o momento político da vida nacional, caracterizado também pela defesa do patrimônio cultural brasileiro, em particular, os edifícios e seus entornos.

A criação de um organismo oficial para da proteção do patrimônio cultural e a indefinição de uma política preservacionista

Criado em 1937, o Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - SPHAN - é destinado a uma atividade fundamental na preservação e restauração de bens culturais, estando à sua frente o jornalista, escritor e historiador de arte, Rodrigo Melo Franco de Andrade, que define assim o patrimônio histórico e artístico nacional:

« Espólio dos bens materiais móveis e imóveis aqui produzidos por nossos antepassados, como valor de obras de arte erudita e popular, ou vinculados a personagens e fatos memoráveis da história do país. Sao documentos de identidade da nação brasileira. A substância deles é que comprova, melhor do que qualquer outra coisa, nosso direito de propriedade sobre o território que habitamos. » 2

Os primeiros trinta anos de existência do SPHAN, chamados de « fase heróica » se caracterizam pela recuperação sobretudo de edifícios isolados, com uma ênfase nos bens imóveis. Nao podemos esquecer que, nesta época, quase todos os monumentos considerados como fundamentais para a afirmação de uma identidade artística brasileira, como os monumentos do século XVIII de Minas Gerais, haviam sido modificados por alterações ou adições de elementos construtivos, assim como por camadas sucessivas de pintura posteriores à época de sua construção. Segundo o pensamento vigente, é absolutamente necessário remover tudo que nao pertence a este período de ouro de nossa história (sobretudo o século XVIII) para devolver à vista a engenhosidade dos artistas e os tesouros de uma arte tipicamente nacional.

O respeito por tudo que é original é uma questão essencial. A obra, mais que sujeito e fato estético, é vista como realidade material, como peça de estudo. Tudo que nao é original deve ser removido, independentemente da época da intervenção e toda intervenção de restauração deve ficar muito bem visível. Grandes lacunas nao

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devem ser completadas, utilizando-se uma cor neutra para reintegrá-las e equilibrá-las com o restante da composição.

Segue-se à fase heróica do SPHAN um período de estagnação, marcado sobretudo pela carência de profissionais especializados e dificuldade de formação. Numa entrevista ao jornal « O Globo » de 13 de maio de 1974, Edson Motta comenta:

« Em relação ao acervo a ser protegido, e considerando a diversidade de climas, regiões e a dimensão do território brasileiro, o número de profissionais é ridículo: 42 pessoas distribuídas em equipes no Rio de Janeiro, Belém, Recife, Bahia, Ouro Preto e Congonhas do Campo. Estas pessoas ganham, no máximo, como funcionários do IPHAN, Cr§ 1200,00 por mês, salário nada atraente. Vários alunos da Escola Nacional de Belas-Artes recentemente formados, largam a profissão para ganhar Cr$ 2000,00 como datilógrafos ».

Pouco interessados numa política de recuperação de uma memória nacional abrangente e representativa dos mais variados extratos da sociedade brasileira, os sucessivos governos pouco ou nada investiram na formação de uma massa crítica de agentes culturais, tais como os conservadores-restauradores.

O SPHAN é criado com o objetivo de assegurar materialmente uma identidade brasileira, forgada sobretudo na herança de monumentos erguidos pelas classes dirigentes, isto é, edifícios civis, militares, religiosos e outros que pudessem servir de suporte ideológico ao estabelecimento de uma nova ordem econômico-política.

As classes dirigentes do Brasil nao têm considerado, de modo sério, a questão da proteção do patrimônio nacional, em particular da proteção dos bens móveis. Todas as medidas adotadas neste sentido têm privilegiado interesses diversos em detrimento do estabelecimento de uma política cultural a longo prazo para a preservação, em grande escala, da memória nacional. Segundo Miceli3, a política do patrimônio no Brasil faz uma opção pelos bens chamados « clássicos ». Consultando-se a lista de bens tombados pelo IPHAN, encontraremos representados todas os domínios da classe dirigente brasileira, em seus ramos público e privado, profano e eclesiástico, rural e urbano, ascendente e decadente. O inverso deste tesouro tao apreciado é a desconsideração com a experiência de grupos populares, das populações negras e indígenas, apenas citando aqueles a quem Mário de Andrade faz referencia no seu projeto, posteriormente alterado, que dá origem à lei de criação do SPHAN.

Nas três décadas de ditadura militar muito foi investido no avanço tecnológico e mais uma vez, nós restauradores, fomos chamados a garantir os fundamentos materiais de uma ideologia baseada no desenvolvimento econômico-tecnológico. Mas, quase sempre, temos participado como agentes de recuperação de bens culturais determinados de antemão e servindo aos interesses de determinada ideologia que se encontra no poder.

Em 1973 é criado o Programa Integrado de Reconstrução de Cidades Históricas do Nordeste. Em 1976 o IPHAN recebe uma nova estrutura, com uma nova política de tombamentos, dirigida sobretudo para a preservação de conjuntos, fato explicado, entre outros fatores, pelo desenvolvimento urbano do país e pelo crescimento do turismo. A formação de recursos humanos e a criação de empregos sao considerados necessários face às ações em desenvolvimento. Nao esqueçamos a ideologia de « ordem e progresso » assim como uma nova onda de recuperação de valores nacionais.

As sucessivas transformações institucionais do SPHAN - serviço, direção, instituto, sub-secretaria - nao alteraram substancialmente o conteúdo das atribuições do organismo que, na prática, se orientou sobretudo para a preservação de bens imóveis enquanto que os museus se orientaram para a preservação de seus acervos.

Também durante os anos 70 começam a ser criados os organismos estaduais de proteção do patrimônio. Nesta época o restaurador é visto como um trabalhador especializado, chamado para executar tarefas artesanais, sem participação na definição de posturas teóricas. 4

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Ainda durante os anos 70 a especialização se apresenta como um caminho interessante para o restaurador brasileiro. Segundo uma tendência nacional e internacional, o profissional da restauração começa a se consagrar a um ramo específico de sua área em vez de ser um trabalhador que faz um pouco de tudo. Esta posição se insere muito bem no momento político no qual o país está mergulhado:

« Um regime que se apoia sobre dois imperativos, a segurança nacional e o desenvolvimento econômico, como o que sobe ao poder em 1964, nao pode se desinteressar da política científica. O 'milagre econômico' autoriza as maiores ambições. Tanto o governo do general Mediei quanto o do general Geisel procuram aumentar o potencial científico e técnico do Brasil financiando tanto centros de pesquisa quanto a formação de cientistas. (...) Nao somente se produz um aumento massivo do número de estudantes, mas cresce também o peso dos setores técnicos, científicos e administrativos de qualificação elevada. Correlativamente, o tema da 'profissionalização' torna-se mais e mais presente. (...) O tema da 'profissionalização' tem, entretanto, uma significação mais profunda. Ele traduz a ascençao de um conjunto de camadas técnicas. »5

A ABRACOR: tentativa de posicionamento dos conservadores-restauradores brasileiros

Em 1980, os conservadores-restauradores brasileiros se reúnem em uma associação: a ABRACOR. Eles buscam, através de uma associação específica e legal, um posição ativa e política nas questões relativas à preservação dos bens culturais nacionais.

« No momento onde a ciência e a tecnologia tornam-se componentes centrais de toda política de desenvolvimento, a refência profissional se constitui em uma maneira de se organizar como ator político suscetível, em nome de sua função na produção de conhecimentos, de chamar à uma racionalidade própria contra as opções de uma tecno-burocracia que deseja colocar o uso da ciência em benefício de seus próprios projetos »/'

Uma das preocupaçaoes atuais da ABRACOR concerne a regulamentação da profissão de conservador-restaurador e as diversas implicaçaçoes que tal fato acarreta, tal como a criação de um Conselho de Classe que fiscalizaria a atuação dos profissionais da área. Este assunto foi tema do Fórum da ABRACOR para reconhecimento da profissão, realizado em novembro de 96, em Sao Paulo, onde questões como a dificuldade de formação, critérios de atuação e controle de qualidade do trabalho foram debatidas.

No entanto, este debate sobre a regulamentação da profissão pode ainda nos conduzir a um saudável « olhar para nós mesmos » e nos remeter à nossa responsabilidade enquanto agentes preservacionistas, comprometidos com a manuntençao de uma memória mais abrangente, nao-necessariamente aquela representativa de uma minoria. Até onde vai nossa responsabilidade pelo que já se perdeu e continua se perdendo?

Isto poderia ser diferente? Afinal, quem somos nós, enquanto profissionais, enquanto classe?

Apenas técnicos que aplicam procedimentos seguindo um script previamento traçado por uma política ou falta de uma política preservacionista?

Supoe-se por restaurador um profissional com formação, acadêmica ou prática, cujo discernimento e julgamento crítico sao essenciais no processo de restauração:

« A conservação do patrimônio é um problema essencialmente cultural. Consequentemente, se nao definirmos claramente os objetivos culturais da intervenção, as considerações técnicas carecerão de um suporte crítico-cultural necessário ».7

Esse suporte crítico-cultural orienta a prática profissional, visando uma conduta ética satisfatória e contribuindo para a preservação de uma memória.

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Conclusão

GuiUaume8 afirma que desde 1793 é inaugurada uma verdadeira « política » na área da proteção do patrimônio, justificando seus objetivos através de termos vagos como « interesse nacional do ponto de vista da arte ou da história », sem jamais precisar mais. Entretanto, nós nao conservamos, por acaso, esta ou aquela obra. Ao contrário, nós respeitamos estruturas mais ou menos subterrâneas.

Em que medida podemos nos organizar como grupo e defender a elaboração de uma política preservacionista sólida e fundamentada em interesses comunitários, isenta o máximo possível de interferências político-eleitoreiras?

Seria muito mais fácil e cômodo nos lamentarmos, entre outras coisas, pela falta de verbas e dificuldade de formação. Mas, se nao formos nós, conhecedores inquietos da realidade do estado de conservação do patrimônio brasileiro, a propor a elaboração de uma política objetiva, seletiva e hierárquica quanto ao que é prioritário no campo da conservação, quem o fará?

Se nós restauradores, enquanto grupo organizado em uma associação nacional, nao nos sentimos competentes e capazes de definir critérios para uma política preservacionista a nível nacional, quem o será? Qual segmento da sociedade brasileira seria mais indicado que esta associação para tal tarefa?

Mais uma vez, em função de problemas de formação, de organização e de reconhecimento da profissão, vamos nos deixar servir aos mais variados interesses, ou podemos assumir nosso compromisso com a sociedade atual, com as gerações futuras e, mais que tudo, conosco mesmos, de garantir a perpetuação de nossa cultura material?

Bibliografia

SCHARF, Cláudia Philippi. Le développement de Ia restauration au Brésil de 1937 a 1980: les approcbes contradictoires de Ia politique culturelle par rapport à Ia protection du patrimoine. Montreal: UQAM, 1997.

Resumo do autor

Cláudia Philippi Scharf é Arquiteta, Especialista em Conservaçao-Restauraçao de Bens Culturais Móveis pelo Cecor-UFMG e Mestre em Artes pela Université du Quebec à Montreal, Canadá. Atualmente trabalha como conservadora-restauradora e professora na Universidade do Estado de Santa Catarina-UDESC.

N o t a s

1 OLIVEIRA, Myriam Andrade Ribeiro de. « O Conceito de Identidade Nacional na Arte Mineira do Período Colonial». In Rev. Inst. Est. Brás. Sao Paulo, 1989, p. 118. 2 ANDRADE, Rodrigo M. F. « Patrimônio Histórico e Artístico Nacional ». Conferência de 29.11.61. In Revista do Instituto Histórico e Geográfico. Guarujá, 1971, pp. 53. 3 MICELI, Sérgio. « SPHAN: refrigério da cultura oficial». In Revista do Patrimônio

Histórico e Artístico Nacional, no 22, 1987, p. 44. 4 RAMOS FILHO, Orlando. « Restauração de bens móveis e integrados: 40 anos ».

In Revista do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, no 22, 1987, p. 155. 5 PÉCAULT, Daniel. Entre le peuple et Ia nation: les intellectuels et Ia politique au Brésil.

Paris: Éditions de Ia Maison des Sciences de 1'Homme, 1989, pp. 175, 246 e 252. 6 Ibidem, p. 254. 7 J O K I L E H T O , Jukka. « Les fondementes des pr ínc ipes modernes en

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Patrimônio Urbano e Política de Preservação - O Papel do Poder Local no Desenvolvimento da Identidade Cultural: O Caso de Niterói

Marlice Nazareth Soares de Azevedo Professora Titular - Departamento de Urbanismo - Escola de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal Fluminense Rua Pio Corrêa, 80/205, bloco 1 Lagoa, Rio de Janeiro - Cep: 22461 -240 , RJ, Brasil tel: (21) 2865980, fax: (21) 6208854 email: [email protected]

Introdução

O texto é resultado de observações acumuladas pela atuação junto à Secretaria Municipal de Cultura, como representante da Universidade Federal Fluminense no Conselho Municipal de Proteção ao Patrimônio Cultural, desde a sua Instituição pela lei n ° 827 de 25 de junho de 1990, assim como pelos resultados das pesquisas denominadas "Niterói : Preservação e Valorização do Ambiente Construído. Um Novo Enfoque"1 , desenvolvida por professores do Departamento de Urbanismo, com a participação de representantes da municipalidade e "Levantamento Documental do Urbanismo no Brasil, 1900-1965. Sub- projeto Niterói",2 em andamento.

A ação municipal de um lado e a compreensão e o envolvimento do morador do outro mostram a pouca articulação entre governo e população, e esse encontro quando se dá , restringe-se a uma elite já privilegiada pela sua representatividade social e política. Partindo dessa premissa, a pesquisa se estendeu a atores menos comprometidos com uma participação direta nas decisões locais, entrevistando-se representações de associações profissionais e de bairros e de forma aleatória freqüentadores das áreas objeto de estudo, assim como alunos de escolas do I o grau desses mesmos locais.

O confronto entre a ação institucional e a visão desses atores aponta para o distanciamento histórico, ainda existente, entre governo e população, apesar dos movimentos associativos que se tornaram mais ativos na década de 1980, nos primeiros anos de abertura política.

Patr imônio Cultural e Ação Governamental

O patrimônio pode ser classificado em três grandes categorias: o que arrola os bens da natureza, constituindo o patrimônio natural; o que se refere ao conhecimento, técnicas e o saber fazer, assim como a sua produção, onde está inscrito o patrimônio construído e documental e, finalmente o que compõe a memória social, isto é, o patrimônio cultural. De uma maneira geral, as instituições se preocupam mais com os bens naturais e os produzidos em períodos ou usos socialmente valorizados, e neste caso, se inserem os bens construídos em estilos arquitetônicos específicos (colonial, neo-clássico, eclético, dentre outros), de uso militar, religioso/católico ou de moradia da elite (sedes de fazenda dos barões do café, palácios e solares da nobreza e da elite governante). A partir do final da década de 1970, com a organização da sociedade civil e a abertura política teve início o movimento de ampliação do conceito de patrimônio para bem cultural, constituindo um marco o tombamento da área de Canudos (palco de uma guerra civil de origem popular e mística) e de um

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Terreiro de Candomblé (valores étnicos e religiosos da cultura negra). " O conceito de bem cultural no Brasil continua restrito aos bens

móveis e imóveis, contendo ou não valor criativo próprio, impregnados de valor histórico (essencialmente voltados para o passado), ou os bens da criação individual espontânea, obras que constituem o nosso acervo artístico (música, literatura, cinema, artes plásticas, arquitetura, teatro), quase sempre de apreciação elitista .... Permeando essas duas categorias, existe vasta gama de bens - procedentes sobretudo do saber popular - que por estarem inseridos na dinâmica viva do cotidiano não são considerados como bens culturais nem utilizados na formulação de políticas econômica e tecnológica." (Magalhães, 1984)3.

Como conseqüência das mudanças políticas e sociais, a questão da preservação do patrimônio, que estava restrito à atuação solitária de uma única instituição federal o IPHAN - Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional -, voltado para a preservação arquitetônica de monumentos de pedra e cal da elite brasileira ou para conjuntos e cidades históricas , com visão mais globalizante, incluindo a arquitetura popular, passa a constituir um "sistema", com a criação de órgãos estaduais e municipais de preservação.

Ainda no final da década de 1970, o Estado do Rio de Janeiro cria o INEPAC -Instituto Estadual de Patrimônio Artístico e Cultural e as iniciativas municipais nesse sentido se sucederam.. O município de Niterói cria o Conselho Municipal de Proteção ao Patrimônio Cultural , em 1990, e o Departamento de Preservação e Reabilitação do Patrimônio Cultural como órgão executivo de implementação da política local. Ao instituir a lei de preservação cultural c caracterizar os princípios desse patrimônio, definiu de forma ampla esses bens: "históricos, arquitetônicos, ambientais naturais, paisagísticos, arqueológicos , museológicos, etnográficos, arquivísticos, bibliográficos, documentais, ou quaisquer outros de interesse das demais artes e ciências." A lei 827 instituiu também o Conselho Municipal de Proteção ao Patrimônio Cultural de Niterói, sob a presidência do Secretário Municipal de Cultura, com a representação de órgãos de classe, de órgãos da educação e da cultura, do Poder Legislativo e Executivo e da Federação de Associações de Moradores da Cidade.

A Ata da primeira reunião do Conselho, realizada no ano de sua criação, denota as suas principais preocupações : estabelecer diretrizes de uma política de proteção do patrimônio cultural local, inserir princípios e áreas de proteção no Plano Diretor da Cidade, definir instrumentos de incentivos fiscais nessas áreas de interesse patrimonial e ainda foi ressaltada "a importância da preservação cultural na formação da identidade e das referência urbanas".

Essas iniciativas também podem ser atribuídas a um momento de transformação das relações entre os poderes constituídos e uma "virada política"- um governo socialista identificado com a cidade -, associado à reforma constitucional que colocava em relevo o poder local e ao próprio movimento reivindicatório das associações de bairro e das organizações de defesa do meio ambiente, que exigiam maior participação nas decisões municipais.

Até este momento, a proteção dos bens do município era dada pelo órgão federal, que, em Niterói se limitara, prioritariamente, desde a sua criação em 19374 a bens edificados, religiosos e militares, totalizando 10 tombamentos , com apenas 3 de edificações civis. Nos primeiros dois anos de atuação do SPHAN (somente em 1970 transforma-se em IPHAN), nacionalmente existiam 279 monumentos tombados, 261 edifícios e obras de arte, 6 logradouros e 9 conjuntos urbanísticos. Em Niterói, neste período, 5 monumentos foram tombados: a Capela do Maruí e Cemitério, a Igreja de São Francisco Xavier, a Ilha e Igreja da Boa Viagem, o Forte do Gragoatá e a Fortaleza de Santa Cruz. A Igreja de São Lourenço dos índios, marco ligado à fundação da cidade, especialmente pelo seu retábulo foi tombada em 1948. O fato indica que nesses primeiros anos de atuação, o tombamento era ditado por conceitos de qualidade ditados nacionalmente, pouco vinculados à memória local.5

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O órgão estadual de proteção ao patr imônio exerceu uma atuação mais diversificada, voltando-se para edificações públicas civis, algumas de propriedade do próprio estado, antigas sedes de instituições estaduais do período em que Niterói tinha o estatuto de capital , assim como bens naturais. Os debates sobre o tomba-mento de bens culturais já tinham se ampliado, identificando-se no órgão estadual a atenção para a arquitetura do início do século (eclética) c para a paisagem natural. Dos 19 bens tombados pelo Estado, no município, apenas uma Igreja - São Sebastião do Itaipu , 4 bens naturais - Pedra do Itapuca, Pedra do índio, Praia de Itaipu e Ilha dos Cardos, 2 residências - Casa de Norival de Freitas (Nôtre Rêve) e Casa da Quina, 9 prédios de instituições públicas - Escola de Arquitetura e Urbanismo (UFF), Correios e Telégrafos, Biblioteca Estadual, Câmara Municipal (antiga Assembléia Estadual), Palácio e Museu do Ingá (antigo Palácio do Governo Estadual), Palácio Euclides da Cunha (antiga Secretaria Estadual da Agricultura), Palácio São Domingos (antiga Secretaria Estadual da Fazenda), Paço Municipal de Niterói e Teatro Municipal João Caetano, e também o Coreto do Campo de São Bento, a Praça e o Monumento da República. A maioria desses bens (10) foram tombados na década de 1980 , 2 no final da década de 1970, e os sete restantes no início dos anos de 1990. Analisando-se as características dos bens tombados pelo órgão estadual parece que havia uma preocupação dos profissionais da área do patrimônio em garantir a permanência e evitar a descaracterização dos próprios do governo, que sofreram no período anterior (década de 1970) demolições traumáticas (Praça da República de Niterói, Senado Federal, Ministério da Agricultura, Faculdade de Medicina da Praia Vermelha), assim como já se vislumbrava o início de uma consciência ecológica.

Nesse contexto de mudança de ótica com relação ao patrimônio e com uma agenda de atividades ditada pela Secretaria de Cultura inicia-se a atuação Conselho Municipal de Proteção ao Patrimônio Cultural de Niterói, com ampla representação da sociedade civil responsável pela recuperação da identidade da cidade, sombreada historicamente pela importância do Rio de Janeiro, que mantém o papel de capital cultural do Brasil. Utilizando os mesmos parâmetros (tipo e época do tombamento dos bens) observou.-se algumas inovações na atuação municipal. Em primeiro lugar é importante assinalar que nesse período de 8 anos de existência foram tombados 40 bens, alguns já tombados pelo órgão federal ou estadual, o que dá ao município um número total de 65 bens tombados atualmente. Dos 40 bens, 12 tem tombamento provisório, em sua maioria estão localizados no Centro e na sua extensão imediata (bairros de São Lourenço, Ponta d'Areia, São Domingos, Gragoatá, Boa Viagem ), ou se situam nos caminhos de penetração da zona sul e oceânica, e quase nenhum na zona norte (zona operária, com conjuntos industriais fechados , ou em decadência). O primeiro, com tombamento definitivo foi o Campo de São Bento (1990), mas foi no período 1992/1996, que se verifica o maior número de bens tombados ( 33 bens, 24 definitivos e 9 provisórios), com uma diversificação maior do que se observava até então. As instituições públicas ou as que prestavam serviços de interesse público predominaram (15), incluindo o palácio Araribóia (antiga sede da Prefeitura), Corpo de Bombeiros, Cassino Icaraí (atual Reitoria da Universidade), presídio, ruínas ( portal dos estaleiros da Cantareira e da capela de Nossa Senhora da Conceição) e locais de prestação de serviços de interesse público (Casa de Oliveira Viana, Casa da Criança, Casa do Estudante Fluminense, Centro de Estimulação Precoce - CRACEF , Conservatório de Música). A seguir, vinham os bens de caráter religioso (10), templos, seminário, irmandades religiosas, onde aparecem um templo da Igreja Anglicana e uma Loja Maçônica. Observa-se também conjunto de casas no bairro de São Domingos, o castelinho do Gragoatá, , casa e cortiço em Portugal Pequeno (associado ao projeto de reabilitação do bairro). Quanto aos bens naturais, a ação restringiu-se às Praias de Adão e Eva e do Sossego. Ainda há monumentos (D. Pedro II), baleeira Alpha e nome e estrutura do antigo restaurante Lido. A marca do Conselho pode ser observada pela ampliação e variedade dos bens tomba-

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dos, cujos pedidos tiverem origem, em sua maioria, no poder legislativo (vereadores representantes de diversas comunidades - de bairro ou religiosa), um de morador -ruínas da capela de Nossa Senhora da Conceição no Condomínio Jardim Ubá, ou ainda de associações ecológicas - o "grupo caminhante independente", no caso da Praia do Sossego.

Como já foi citado anteriormente, a formação do Conselho vinha no bojo da reforma constitucional que colocava em relevo o poder local e reconhecia o movimento participativo das associações de bairro , tomando expressão a defesa do meio ambiente. Os representantes do poder legislativo que tiveram um papel importante na elaboração da lei orgânica municipal se engajaram nesses movimentos e era natural que engrossassem as solicitações feitas ao Conselho. Importante ressaltar a crise política gerada pela construção de um prédio na Pedra de Itapuca, que teve sua obra embargada . Praias, árvores, instalações e nomes como o do restaurante Lido passaram a constituir referências importantes e significativas na luta para defender identidades urbanas. Ainda que a Lei previsse um amplo espectro de bens a serem preservados, a ação do Conselho, num primeiro momento, não escapou a tradição de privilegiar o bem construído, ampliando timidamente para os bens naturais e paisagísticos.

Quanto a esses bens, valorizava-se aqueles que guardavam uma visão bucólica do "paraíso" perdido (Holanda, 1992), como se verifica do texto oficial sobre a Praia do Sossego "ao final da cadeia montanhosa que separa Piratininga de Itaipu/ Camboinhas, a natureza abriu para o Atlântico um pequeno e recôndito anfiteatro verde (...) Ali estão guardadas espécies remanescentes da mata Atlântica que vicejavam naquele lugar até a chegada dos colonizadores" (Press Re/ease, Secretaria Municipal de Cultura).

A introdução de áreas de proteção urbana (APAU), no Plano Diretor da Cidade, mantendo a volumetria de conjuntos arquitetônicos descaracterizados, remanescentes das primeiras décadas do século, localizados principalmente no centro e áreas adjacentes, assim como os incentivos fiscais que estimulavam a sua reabilitação, constituíram um instrumento alternativo, fora do tombamento, com perspectivas de promover a preservação da memória da cidade.

Patrimônio Cultural e usuário da cidade

Com relação aos resultados da pesquisa citada anteriormente, em primeiro lugar temos que chamar a atenção sobre os diferentes significados que assume o conceito de "Patrimônio" para o cidadão comum. Na interpretação dos moradores, numa primeira dimensão, o conceito foi referido basicamente como "propriedade", quer de forma mais individual (patrimônio "é uma casa nossa"), quer num sentido mais coletivo ("aquilo que é próprio da nação"). Numa outra vertente, acentua-se a identificação do patrimônio como um "bem" (não só a "casa" como o "dinheiro"), ou ainda relacionando com a noção de espaço urbano ("a nossa rua").Também se observa a associação com o "antigo" ou está relacionado com o que representa "tradição" e "cultura". Obteve-se respostas mais amplas relacionando patrimônio "as escolas", "as bibliotecas", aliando os sentidos do cultural e do coletivo como dominantes no conceito. Percebe-se também que o sentido dado ao conceito é sempre positivo, associando-o também a eficiência ou a afetividade ("é você gostar de um lugar, né?") . Essas diferenciações ocorreram independentemente dos bairros pesquisados, o que levou a constatação da grande diversidade de significados do conceito de patrimônio e do seu sentido positivo.

No que se refere a escolha do bem a ser preservado, as reações foram diferentes se considerados o centro e os bairros pesquisados. No centro as referências foram diversificadas e concretas. Dois espaços foram considerados de singular importância : a Praça da República e as barcas. O primeiro como referência pelo significado que tem na cidade, pelo monumento e conjunto de edificações cívicas que a cercam (Biblioteca, Palácio da Justiça, Liceu e Câmara Municipal) e o segundo como ele-

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mento importante da cidade, de ligação com o Rio de Janeiro (o edifício das barcas foi destruído por uma revolta popular em 1959, substituído por uma construção provisória, sem valor estético ou arquitetônico). Os demais elementos citados são pontuais, como os prédios da prefeitura "velha", da catedral São João Batista, dos Correios e do Teatro Municipal. As outras referências, não estavam necessariamente associadas à questão da preservação e diziam respeito a sua função : Prefeitura "nova", "escolas" e " faculdades da UFF", e tc .

As respostas obtidas nos bairros foram bastante associadas a sua trajetória, sua função e a sua condição sócio-econômica. No bairro Ponta d'Areia, de tradição operária (estaleiros navais), incluindo a Vila Pereira Carneiro (Vila Operária do início do século) e Portugal Pequeno (local de acolhida de imigrantes portugueses), a relação com o antigo foi associado as Igrejas (Nossa Senhora de Fátima, Nossa Senhora da Penha e Sagrado Coração de Jesus). Também registrou-se a importância dada a "Banda Portuguesa", a "pracinha", a "Escola dos Padres", o "Mirante" e o "Castelinho". O que foi considerado importante no bairro indicavam 3 categorias principais: a relacionada ao trabalho ("as oficinas", "os estaleiros") e o movimento que propiciam; as respostas que indicavam uma vida social e familiar, um clima de tranqüilidade e os equipamentos que deviam ser preservados ( a praça, a Vila Pereira Carneiro, a Rodoviária e o Mirante). No caso de São Lourenço, origem da cidade, o "antigo" domina, consubstanciado na referência a Igreja de São Lourenço dos índios, a Casa da Baronesa, o Seminário São José, a Igreja de Santana, assim como referências bastante genéricas como "os colégios", " praças e jardins". Como se trata de um "bairro pobre", desprovido de serviços , as intervenções que sofreu para dar acesso a ponte, é indicada como positiva porque "melhoraram a iluminação pública". Em São Domingos, bairro de elite do século XIX, a ênfase para preservação é dada "as casas antigas", "os casarões" e "a tudo que é antigo". Quando interrogados sobre o que era importante no bairro surgiram considerações sobre o local histórico, a arquitetura dos casarões e ainda os clubes e a recente concha acústica.

No que se refere a responsabilidade de preservação, de um lado colocavam a Prefeitura e de outro a sociedade civil ("o povo", "o pessoal", "as pessoas que habitam", 'nós mesmos"). Também responderam sugerindo parcerias, "cada um de nós e os órgãos públicos". Outro conjunto de respostas especificaram categorias como "a empresa privada", "os comerciantes", "os proprietários", "a elite", dentre outras.

Algumas reflexões sobre a questão

O desenvolvimento do trabalho , partindo da ação federal na área do patrimônio e chegando ao poder local, com a passagem pelo poder estadual, mostra a aproximação paulatina e tímida dos detentores do poder com os valores defendidos pelos mais implicados na questão - os usuários da cidade. Numa perspectiva nacional são significativos os bens associados ao poder (militar, religioso e civil), aos ciclos de riqueza econômica (ouro, cana de açúcar, café) e às elites dirigentes (casas e solares de príncipes, barões, marqueses, etc) . O Estado já se aproxima mais da memória local, especialmente numa cidade ex-capital , defendendo a preservação de bens associados ao pode r de cidade capi tal . O munic íp io , apesar da ampla representatividade do Conselho, ainda reconhece esses bens através da lente de uma elite privilegiada, representativa de vários segmentos sociais e políticos, nem sempre em sintonia com o usuário padrão da cidade, que defende uma cidade eficiente, com infra-estrutura e segurança . Enquanto a visão técnica privilegia os valores arquitetônicos e urbanos, para os moradores , assume primazia valores de uso mais cotidianos, nem sempre associados à qualidade arquitetônica ou urbanística. Os bairros mais reconhecidos como históricos constituem exceção (caso de São Lourenço e São Domingos), onde ocorrem várias menções a igrejas e casarões antigos. Por outro lado, certos espaços da cidade, especialmente no Centro se distinguem pela sua simbologia e arquitetura. O caso da Praça da República é exemplar, especialmen-

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te por ter sido um espaço resgatado recentemente (1989), com ampla repercussão nos movimentos sociais e na mídia1". Ainda com relação ao Centro, a estação das barcas constitui historicamente uma marca da cidade, hoje totalmente desvinculada de qualquer significado arquitetônico.7 Observe-se que, apesar da construção da ponte Presidente Costa e Silva ( Ponte Rio-Niterói), a estação das Barcas continua representando o "core" do Centro, com elevada carga simbólica: "ir as barcas" ou "ir a Niterói" são sinônimos de "ir ao Centro", substituindo a antiga expressão "ir a Ponte", isto é, ir a ponte das barcas. Cabe assinalar que esta área ainda detém uma forte marca de identidade da cidade, sendo objeto de constantes intervenções das administrações locais. Esta postura retomou após a fusão e a construção da ponte Rio-Niterói, registrando-se, a partir dos anos 1980, sucessivos projetos e duas principais intervenções sobre a mesma área : o projeto Cura e a reurbanização da Avenida Visconde Rio Branco e de parte do aterrado Praia Grande. A Avenida Amaral Peixoto, aberta a partir da Praça Araribóia (praça das Barcas), que representou o marco de modernização arquitetônica e urbanística do início da década de 1940, também merece uma importante referência dos moradores, enquanto centralidade interna e como um dos símbolos da cidade. Interessante observar que nem sempre a presença de favelas na vizinhança propicia o surgimento de um estigma na resposta dos moradores. Enquanto os moradores de São Domingos na sua leitura acentuam de forma negativa a presença de favelas no bairro, esta questão não se colocou nos demais bairros estudados. Os entrevistados de São Lourenço, por exemplo, apesar de morarem num bairro caracterizado por acentuada favelização, não indicaram o fato como problema nas entrevistas. Nota-se que esses moradores assinalaram como principal problema, as precárias condições de infra-estrutura e serviços no bairro, de uma forma geral.

Com relação às experiências desenvolvidas na comunidade estudantil do Io grau, observou-se que a visão da cidade está mais vinculada aos problemas veiculados pelos meios de comunicação (trânsito, segurança) ou ainda aos problemas cotidianos (lixo, camelô), do que à vivência da cidade. Esta é assinalada pela importância dada aos Shoppings, prédios altos e "as luzes da cidade". Quanto ao busto do fundador da cidade , o índio Araribóia, foi desenhado com os braços abertos numa clara identificação com o Cristo Redentor do Rio de Janeiro. O fato sugere um programa de educação patrimonial, capaz , a longo prazo, de aproximar as duas visões: do técnico e do usuário.

No que se refere ao morador a sua ótica deve ser considerada, guardando sua especificidade, na medida em que é alimentada por outras experiências e interesses. O poder local, por sua vez, necessita desenvolver e aprimorar os mecanismos de participação e divulgação sobre a cidade, inclusive sobre as intervenções propostas e realizadas, especialmente pelo fato de ter sido apontado pelos entrevistados como "o principal responsável na política de preservação do patrimônio".

Bibliografia

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WEHRS, Carlos. Capítulos da Memória Niteroiense. Rio de Janeiro, 1989.

Notas

1 A pesquisa, concluída em 1997, foi realizada com financiamento da FINEP e apoio do programa PIBIC/CNPq/UFF. A coordenação do projeto coube a autora deste artigo. 2 A pesquisa, financiada pelo CNPq, tem também apoio do programa PIBIC/CNPq/

UFF, faz parte de uma rede, coordenada pela Professora Maria Cristina Leme (FAU/ USP), envolvendo as cidades de São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador, Recife, Porto Alegre, Belo Horizonte, Niterói e Vitória. A coordenação do Sub-projeto Niterói é da autora deste artigo.

3 Aloísio Magalhães (1927-1982), artista plástico e designer, foi o criador da Fundação Nacional Pró-Memória (Lei n° 6757,de 17/12/1979) e como Secretário da Cultura do MEC liderou o reordenamento das instituições federais da cultura, no início dos anos de 1980.

4 Após diversas iniciativas isoladas que datam da década de 1920, o Estado Novo, através do Decreto-Lei n° 25 de 30 de novembro de 1937, organiza a proteção do patrimônio artístico nacional, como serviço (SPHAN) ligado ao Ministério de Educação e Saúde Pública. 5 Os demais monumentos tombados pelo órgão nacional, em Niterói, foram os

seguintes: Recolhimento de Santa Teresa, em Itaipu (1955), Casarão de Charitas (1962), Museu Antônio Parreiras (1967) e Solar do Jambeiro (1974). 6 A comemoração do centenário da República deu margem ao movimento de

implosão do esqueleto do futuro Palácio da Justiça, reconstituição do desenho original da praça e recuperação do monumento da República, depois de quase 20 anos de destruição e abandono.

7 A edificação anterior foi destruída na revolta popular de 1959, contra os proprietários da Companhia Cantareira , a família Carreteiro, que teve seus bens incendiados, o que provocou a estatização dos serviços ( privatizados neste ano de 1998).

Resumo da Autora

Doutora em Urbanismo pelo Instituto de Urbanismo de Paris (IUP - Paris XII), Professora Titular do Departamento de Urbanismo da EAU/UFF. Vice-Coordena-dora do Curso, Representante da UFF no Conselho Municipal de Proteção ao Patrimônio Cultural de Niterói. . Professora de Teoria e História do Urbanismo, desenvolvendo pesquisas na área de patrimônio urbano, documentação urbana e avaliação de programas governamentais.

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Conscientização do Patrimônio Cultural

Noções Básicas Sobre Conservação de Bens Culturais

Silvio Luiz R. Vianna Oliveira Conservador / Restaurador Coordenador do Curso de Conservação e Restauração Fundação de Arte de Ouro Preto

Rua Getúlio Vargas,185 35.400-000 - Ouro Preto - Minas Gerais

Introdução

A possibilidade de desenvolver um programa de conscientização para a valorização do patrimônio histórico e cultural surgiu a partir da necessidade de formar grupos, que, de alguma forma, pudessem colaborar na proteção do acervo artístico de suas comunidades, seja com pequenas medidas, seja com soluções definitivas com profissionais especializados . Considerando o valioso acervo, encontrado, principalmente na região mineradora de Minas Gerais, a formação dessa consciência de conservação dos bens culturais visa solucionar pequenos problemas, evitando grandes perdas de nosso acervo. São várias as comunidades que têm importantes obras artísticas, e a responsabilidade de preservá-las das degradações naturais , visto que a primeira ação da conservação deve partir da comunidade que está próxima de seu patrimônio cultural.

O programa do curso é desenvolvido, através de palestras e workshop, com carga horária de 64 horas . O corpo docente pertence às instituições culturais que trabalham na conservação de bens culturais.

Programa Básico

• Patrimônio Histórico e Cultural: Identificação e Caracterização - Visita a Monumentos Históricos, destacando os valores artísticos.

Administração de Patrimônio Cultural: acervo da Matriz de Nossa Senhora do Pilar. • Análise e Estado de Conservação da Obra de Arte / Causas de Degradação • A Importância da Conservação Preventiva • Meios de Proteção Contra Incêndios. • Transporte, Embalagem, Acondicionamento de Pinturas e Esculturas (Fig. I)

Métodos Físicos e Químicos de Análise • Materiais e Técnicas de Pintura

Intervenções de conservação: Desinfestação / Limpeza superficial / Fixação • Visita a Monumentos Históricos: Identificação e Avaliação do estado de conservação.

Este curso é desenvolvido desde 1985 e foi apresentado pela Fundação de Arte de Ouro Preto / FAOP e Universidade Federal de Ouro Preto / UFOP, na programação do Festival de Inverno da Universidade Federal de Minas Gerais / UFMG, de que quatorze alunos participaram (Fig. II). Atualmente, faz parte do programa da FAOP foi oferecido, de dois em dois anos, por um período de dois meses, quando teve a participação de 40 alunos.

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Conclusão

FIG 1 - Aula de Transporte, Embalagem, Acondicionamento de Pinturas e Esculturas ministrada pelo Professor Adriano Ramos.

É grande o interesse dos participantes pela conservação dos monumentos. Eles aprendem a identificar problemas de conservação que afetam a obra de arte, prestando relevantes serviços com pequenas intervenções que solucionam problemas emergenciais, evitando, desta maneira, o agravamento da situação. Quando a sociedade está organizada em irmandades religiosas, a proteção torna-se bem mais fácil de ser realizada, os primeiros problemas de conservação nas igrejas são solucionadas pelos profissionais locais, que são preparados para conservar o monumento, evitando maiores danos. Observamos que vários alunos continuam seus estudos em outros cursos de maior duração. Conseguimos formar uma consciência sobre os cuidados necessários à conservação de nossa identidade cultural. Em um país onde a falta de recursos financeiros é um grande obstáculo para a conservação dos monumentos, que, em muitos casos, se encontram degradados, a conscientização objetiva a prevenção para evitar maiores danos às obras que se acham, ainda, em bom estado de conservação.

FIG 2 - Turma de alunos participantes do primeiro curso de Conscientização do Patrimônio Cultural.

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Papel

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Abstract

This paper presents the conservation treatment carried on a sketch made on tracing paper with índia ink. Using the facing technique, a backing paper which were stuck on the back of the document, possibly, with gum arabic, was removed safely. That caused severe conservation problems as, crackling, creases, stains, losses, tears and brittleness. To give back the stability of the document a new lining, with paper made from banana tree pulp, was placed onto the back and in the front with Tylose adhesive and it was mounted on an alkaline paper and encapsulated with poliester film.

FIG 1. Desenho aquarelado, possivelmente do arquiteto José de Sousa Reis, com a proposta museográfica do espaço reservado para o mausoléu dos inconfidentes, mostrando a mesma composição do croqui.

Conservação e Restauração de Croqui em Papel Vegetal com os Nomes dos Inconfidentes Inscritos em Bloco de Pedra no Museu da Inconfidência - Ouro Preto - Mg

Lygia Guimarães Conservadora/Restauradora Setor de Conservação/Restauração de Material Arquivístico e Bibliográfico -

SECORE Departamento de Identificação e Documentação/IPHAN/RJ Rua da Imprensa - 16, sala 810 - Palácio Gustavo Capanema Rio de Janeiro - RJ - 20030-120 Telefones: (021)220-0090/220-4590; Fax: (021)240-7667 email: [email protected]

l . I n t r o d u ç ã o

Esse trabalho tem como objetivo apresentar o tratamento de conservação e restauração realizado em um croqui de papel vegetal pertencente ao acervo iconográfico do Arquivo Noronha San tos /DID/IPHAN/RJ ' .

Esse croqui, produzido em 1941, mostra uma composição em letra de fôrma com os nomes de todos os Inconfidentes inscritos em um bloco de pedra, que fora confeccionado exclusivamente, para compor o Panteão dos Inconfidentes. A sala criada "In Memorian" no Museu da Inconfidência, em Ouro Preto, Minas Gerais, foi inaugurada em 21 de abril de 1942, quando cumpriam-se 150 anos da sentença lavrada contra os inconfidentes. O projeto museográfico do espaço, desenvolvido pelo arquiteto, do então Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional — SPHAN, Dr. José de Sousa Reis, apresentava na época da inauguração uma réplica da bandeira a ser criada pelos inconfidentes e o bloco de pedra, em itacolomito, de tonalidade muito rara, com os nomes dos inconfidentes. (Fig. 1)

2. Apresentação do documento

O referido documento foi produzido, em papel do tipo Vegetal2 e tinta Nanquim3 e mede 41x43,5 cm. Além da tinta Nanquim foram encontrados no documento grafite, tinta para caneta tinteiro não lavável e outra sensível à água. O documento apresenta também um carimbo do Arquivo, o qual mostrou-se solúvel em água.

Talvez para dar maior rigidez ao papel e pudesse ser melhor manuseado durante a execução do projeto, foi colado no verso do documento outro papel Vegetal, do mesmo tamanho, com cola, possivelmente, do tipo arábica4, cuja a facilidade de solubilização em água fria nos leva a crer ser esse o adesivo utilizado. (Fig. 2)

WÈÈÊÈÉÈmÊÊÊÊÈmm

FIG 2. Frente e verso do documento antes do tratamento.

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3. Condições do documento antes do tratamento

As condições de conservação do croqui eram muito precárias principalmente devido à degradação do adesivo usado para colar o papel suporte no seu verso. O papel do desenho apresentava-se bastante escurecido, cor marrom escuro e em algumas áreas de maior concentração o adesivo mostrava-se enegrecido.

As rugas visíveis em maior quantidade em toda superfície do verso do desenho, devem ter sido geradas no momento da colagem do novo suporte, uma vez que a lisura do papel não comprometia o uso do documento. A ausência de cola em algumas áreas do verso do croqui comprova a não uniformidade e até mesmo a displicência na aplicação do adesivo. N o entanto, sabemos que o papel vegetal é sensível à mudanças drásticas de umidade relativa, podendo expandir e contrair diversas vezes. Os adesivos a base d'água também sofrem alterações em climas úmidos, ajudando a criar tensão nas áreas de maior adesão, podendo provocar rugas e/ou rupturas no suporte.

O papel vegetal do croqui apresentava-se muito amarelecido, ressecado e que-bradiço, formando craquelês. Em vários pontos havia perda do suporte, sem trazer, no entanto, grandes prejuízos para a informação. (Fig.3)

Ao longo do trabalho pudemos concluir que tanto a instabilidade do papel vegetal como a da goma arábica são inerentes aos materiais que compõem sua estrutura.

4. Tratamento realizado

A escolha de um documento em papel vegetal como objeto para apresentação nesse Congresso, visou desmistificar a idéia de impossibilidade de tratamento desse tipo de papel pela dificuldade de manuseio do papel vegetal quando umedecido, que na maioria dos casos, dependendo da gramatura e das substâncias utilizadas na impregnação, em contato com umidade, torna-se enrugado e frágil. Por isso, banhos de imersão ou de flutuação são normalmente descartados. No entanto.vários outros métodos podem ser aplicados na conservação de papel Vegetal de forma segura.

Um trabalho desenvolvido pela conservadora inglesa, Sally Ann Yates5 no National Maritime Museum, de Londres, propõe dez métodos de tratamento para a conservação e restauração de papel vegetal. Nesse trabalho, a Sra. S.A. Yates apresenta apenas um método sem utilização de umidade, que é o uso do adesivo BEVA 371fl

em mesa de sucção. Esse método é mais recomendado para documentos que possuem tintas completamente sensíveis à umidade. Além desse, dois outros trabalhos de conservadores ingleses descrevem métodos de tratamento de conservação em papel vegetal. (Ver bibliografia anexa).

O tratamento realizado no croqui considerou a função do documento no contexto do acervo do Arquivo Noronha Santos. Ele é um registro do desenvolvimento de um projeto realizado pelo então SPHAN, que vinha se firmando como o órgão responsável pela preservação da memória histórica, artística e cultural brasileira.

Dessa forma, o objetivo do tratamento foi o da manutenção da informação, ameaçada pela degradação do suporte. Para tanto, a remoção do suporte colado no verso do documento foi a melhor opção para devolver a estabilidade ao objeto.

A fragilidade do documento, completamente quebradiço, nos obrigou a realização de velatura dupla, ou seja, frente e verso. Esse processo, ou laminação como alguns conservadores se referem, permitiu que os danos existentes no papel fossem consolidados.

Para completar a proposta de devolver a estabilidade e facilitar o manuseio, foi adotado o acondicionamento em invólucro confeccionado em filme de poliéster, tendo como suporte papel alcalino.

FIG 3. Danos no documento como rasgos, escurecimento, craquelês, etc.

Abaixo descrevemos as etapas do tratamento realizado.

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FIG 4. Faceamento do documento com papel Mino.

FIG 5. Remoção do papel suporte colado no verso do documento.

FIG 6. Velatura com papel de polpa de bananeira.

4.1. Umpe^a do suporte para retirada da poeira superficial Na execução dessa etapa foi utilizado um pequeno pincel, tipo japonês, com cerdas macias. O uso de pó de borracha não estava indicado, pelo fato de ter sido utilizado grafite em grandes áreas do documento.

4.2. Testes de so/ubi/idade e fixação das tintas Foram feitos testes com a água e o álcool etílico e apenas a tinta Nanquim apresentou-se segura no contato com esses dois líquidos.

Para fixar as tintas solúveis encontradas no documento, foi utilizado o Paraloid B-72 7, diluído no solvente Xilol8, na proporção de 5%. Foram necessárias três aplicações da solução do verniz para que as tintas ficassem completamente fixadas. Por ser um solução muito diluída não houve alteração na cor da tinta do carimbo e das anotações complementares, ambas pretas.

4.3. Faceamento e remoção do suporte do verso do documento A decisão de facear o croqui fez-se necessária devido a grande fragilidade do suporte e aos craquelês gerados em toda a sua superfície com o ressecamento do papel.

Nessa etapa do tratamento foram utilizados papel do tipo Mino9 e cola Metilcelulose10, cuja a viscosidade foi sendo testada, até que fosse encontrado o ponto ideal para o trabalho a ser realizado. Esse adesivo deve ser o mais fino possível para que possa "correr" facilmente sobre a superfície dos materiais a serem utilizados tanto no faceamento como posteriormente na velatura. Em nenhuma das duas etapas o adesivo foi aplicado diretamente no documento e sim sobre tela de Nylon.

Na escolha do papel tipo Mino para o faceamento considerou-se o fato desse papel possuir fibras curtas, portanto, mais próximas daquelas utilizadas na produção do papel Vegetal, como também, o fato de ser um papel mais barato do que o papel japonês para ser descartado.

No desenvolvimento dessa etapa, o papel Mino foi colado na parte da frente do croqui utilizando-se sobre aquele uma tela, para evitar o contato direto do pincel com papel do faceamento, que torna-se muito frágil em contato com meio aquoso.lívg.^

O documento já com a tela e o papel Mino a ele aderidos foi fixado em uma tábua forrada de Fórmica, tendo a tela em contato direto com a tábua e o verso do documento voltado para cima. Com a estrutura do documento estabilizada, iniciou-se a remoção do suporte.

A utilização do adesivo de baixa viscosidade, ajudou na tarefa de solubilizar a cola utilizada no verso do documento. Essa, portanto, não foi uma tarefa árdua, mas porém muito delicada. Após a retirada do suporte, com o auxílio de um bisturi, foi feita a remoção do adesivo, que mostrou-se bastante solubilizado.fTTg.J',)

4.4. Velatura dupla Essa etapa do trabalho foi realizada seguindo o método tradicional de velatura presa.

Após várias tentativas com papel tipo japonês, 10g/m2, que apresentou-se muito frágil para o tratamento, optamos pelo papel produzido com o pseudo caule da bananeira", 10g/m2, o qual é produzido e utilizado no processo de reintegração no Arquivo Nacional, sendo por isso mais resistente à água.

Primeiro foi colado o papel no verso do documento que ainda estava faceado e preso à tábua de Fórmica. Logo em seguida, mantendo a tela montada sobre o documento, este foi removido da tábua e a parte voltada para cima, no caso o verso do documento, foi então preso à tábua. Aproveitando a umidade, o faceamento foi retirado. Antes da aplicação do novo suporte na parte da frente, as rugas foram desfeitas manualmente e as áreas faltantes enxertadas. O adesivo foi aplicado sobre a tela de Nylon tendo o novo papel da velatura sob ela. Nessa etapa foi utilizada a cola Tylose12. (Fig.6).

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Para evitar a secagem rápida, que poderia gerar um estiramento descontrolado do papel do croqui e produzir mais rasgos, optamos pela cobertura da velatura com mata-borrão por uma noite.

Após a secagem completa, a velatura foi redrada da tábua e consequentemente da tela e as bordas aparadas.

4.5. Acondicionamento

Para o acondicionamento foi adotado o encapsulamento com filme de poliéster, 0,005mm13, fechado em apenas três lados com fita dupla face, 12mm de largura, da 3M, montado em papel alcalino Filifold 85g/m2 (14). (Fig. 7)

6. Conclusão

Ao longo do tratamento várias decisões foram tomadas para que a integridade do documento fosse preservada, mesmo que algumas características originais do papel fossem modificadas.

Nesse caso, apesar da mudança da textura do papel do croqui, o tratamento realizado foi bastante eficaz no diz respeito à preservação da informação e à estabilização do processo de degradação do suporte.

Entretanto, tanto o papel quanto o adesivo utilizados no tratamento têm a sua estabilidade cientificamente comprovada o que significa dizer que o documento está com a sua estrutura externa

preservada. Quanto à estrutura interna, sabemos que o processo contínuo de degradação do papel vegetal está diretamente ligado à sua produção, quando substâncias diversas são adicionadas para a aglomeração das pequenas fibras e para dar as características necessárias a esse tipo de papel.

N o t a s e Referências:

1. O Arquivo Noronha Santos hoje vinculado ao D I D - Departamento de Identificação e Documentação do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - IPHAN, iniciou suas atividades em abril de 1936 juntamente com o SPHAN, Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, através de portaria do então ministro Gustavo Capanema. Amparado pelo decreto-lei n° 25 de 30/11/37, que regulamenta a proteção ao patrimônio histórico e artístico nacional, o SPHAN delegou ao então Arquivo Central a responsabilidade de preservar toda a documentação produzida pela instituição. Deve-se à organização inicial do arquivo ao beneditino D. Clemente da Silva Nigra, substituído posteriormente pelo poeta Carlos Drummond de Andrade.

O acervo histórico-permanente do Arquivo Noronha Santos tem valor probatório e constitui a maior fonte de informação sobre o patrimônio histórico-cultural edificado do país. É composto por de 450 metros lineares de documentos textuais em suporte-papel e importante documentação iconográfica referente aos monumentos históricos tombados, como plantas, mapas, diapositivos, negativos e fotografias, essas de autoria de fotógrafos importantes como Marc Ferrez, Victor Frond, Augusto Malta, Herman Graeser, Mareei Gautherot e outros.

2. O papel vegetal que conhecemos hoje foi introduzido no século passado e em geral é produzido através do batimento intensivo da polpa, até esta ficar desfibrada em pequenos pedaços. Essas pequenas fibras são então unidas entre si fisica e qui-micamente na máquina. Para dar transparência ao papel várias substâncias foram utilizadas na impregnação, como o óleo de linhaça, oxido de zinco, terebentina, gomas, resinas e ceras.

3. Produzida com carbono e goma arábica, a tinta Nanquim é conhecida desde 2500 a.C. e é considerada uma das mais permanentes e seguras para o papel.

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FIG 7. Documento acondicionado em envelopes defilme de poliéster e montado em papel Filifold.

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1. A cola do tipo arábica, também conhecida como goma arábica, é derivada de uma árvore muito comum na índia e na Arábia chamada "Acácia arábica". A goma branca que escorre da árvore contem óleos e resinas naturais impuras que amarelecem a goma com o tempo. Ver também "Materiais Empregados em Conservação/Restauração de Bens Culturais"- UFRJ/ABRACOR/VITAE, 1990. p.28.

2. YATES, Sally Ann — The Conservation of Nineteenh-Century Tracing Papers. The Paper Conservator. Journal of the Institute of Paper Conservation. Sussex, Inglaterra. 1984. V.8.,p.20-39.

3. Ver "Materiais Empregados em Conservação /Restauração de Bens Culturais" - Projeto Banco de Dados. UFRJ/ABRACOR/ERA/VITAE. 1990. p.11.

4. Idem. p. 43.

5. Idem. p. 96.

6. Idem. p. 159.

7. Idem. p. 35.

8. O papel produzido a partir do pseudocaule da bananeira, possui fibras longas e é resultado do projeto de tese de Mestrado defendido pelo químico do Arquivo Nacional, Antônio Gonçalves da Silva, na Universidade Federal de Viçosa, MG, em Janeiro desse ano. Esse trabalho está disponível na biblioteca da Universidade ou no Arquivo Nacional.

Após pesquisa para definir a coloração do papel ideal para os trabalhos do AN a polpa é tingida utilizando-se corantes da SANDOZ.

9. O adesivo Tylose — CB200 é uma Meticelulose que difere apenas de fornecedor e tem sido mais indicada recentemente pelo seu grau de polimerização ser diferente daquela produzida pela Henkel.

10. Ver especificações em "Materiais Empregados. "p.32-34.

11. O papel alcalino Filifold 85g/m2 é produzido a partir de polpa de Eucalipto, pela Füiperson Papéis Especiais, possuindo entre 10 e 25% de fibras de algodão para dar-lhe características de permanência.

Bibliografia

BUSH, Andrew - Conservation of 19th Century Tracing Papers in the National Maritime Museum. New Directions in Paper Conservation, 10'h Anniversary Conference of The Institute of Paper Conservation, 14 a 18 de abril de 1986, Oxford, Inglaterra. Notas n°D61-62.

COOK, Paul e D E N N I N Julie. Ships Plans and Resin Impregnated Tracing Paper: A Praticai Repair Procedure . The Paper Conservator. The Journal of the Institute of Paper Conservation. Sussex. Inglaterra. 1994.V18.

CUNHA, Martin George e CUNHA, Dorothy Grant. Conservation of Library Materials - A manual and Bibliography on the Care, Repair and Restoration of Library Materials. Metuchen, N.J.: The Scarecrow Press, Inc. 1971.V.1, 2a edição, p.41 e 45.

YATES, Sally Ann - Conservation Research into 19th Century Tracing Papers. National Maritime Museum, Londres, 1983 (Estudo produzido internamente e não publicado).

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Resumo do Autor

Licenciada e Bacharel em História pela Universidade Federal Fluminense, diplomou-se em Conservação de Material Arquivístico e Bibliográfico no curso de especialização da Camberwell School of Arts and Crafts, em Londres. Trabalha como conservadora/restauradora desde 1981 e desde de 1986 vem desenvolvendo projetos de conservação preventiva no IPHAN, onde hoje ocupa o cargo de Chefe do Setor de Conservação e Restauração do Departamento de Identificação e Documentação/ IPHAN/RJ.

Agradecimentos

Meus sinceros agradecimentos vão para a Diretora do DID, Sra. Célia Corsino que tem dado todo apoio às atividades de preservação de acervos arquivísticos e bibliográficos dentro do IPHAN, proporcionando inclusive a minha participação nesse Congresso; para os meus queridos amigos do Arquivo Nacional, os químicos Antônio Gonçalves da Silva e Anivaldo dos Santos Gonçalve, Chefe da Seção de Restauração da Coordenadoria de Conservação, que me socorreram na hora mais difícil, doando o papel de polpa de bananeira para a realização do trabalho; e para a técnica contratada, Maria Silvina Monteiro que no momento desenvolve o projeto de preservação das plantas do Arquivo Noronha Santos sob minha orientação e sem ela seria mais árdua a realização desse trabalho.

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Abstract

This paper consists in a study about the influence of bath/deacidification and resizing/flattening in the properties of sheets of acid and alkaline offset paper. The influence of these treatments in the microbiological degradation of the referred types of paper was also verified.

A Influência dos Banhos de Limpeza e da Reencolagem nas Propriedades do Papel

IPT Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo S.A Agrupamento de Celulose e Papel Av. Prof. Almeida Prado, 532 - C. Universitária "ASO" - 05508-901 - São Paulo - SP Tel.: (011) 3767-4400 - Fax: (011) 3767-4098 Equipe: Hirayama, R.T.; Monteiro, M.B.B.; Koga, M.E.T.; Takahashi, R.C.T.; Barillari, C.T.

Coordenação: D'Almeida, M.L.O.

ABER Associação Brasileira de Encadernação e Restauro Núcleo Edson Motta Rua Bresser, 2315 - Moóca - 03162-030 - São Paulo - SP Tel: (011) 292-3611 - r. 246 - Fax: (011) 292-3611 - r. 214 Equipe: Daguer, A.M.; Silva, P.S.

Coordenação: Auada, EM

Introdução

O banho seguido de reencolagem é um processo bastante utilizado por restaurado-res. Porém, pouco se sabe sobre a influência destas operações nas propriedades do papel em si.

O objetivo deste estudo foi justamente o de verificar as alterações ocorridas nas propriedades de resistência , ópticas e gerais do papel e na sua suscetibilidade ao ataque microbiológico após os tratamentos: banhos de limpeza/desacidificação e banhos de limpeza/'desacidificação seguido de reencolagem/planifícação.

Para realização deste estudo foram utilizados duas amostras de papel procedentes, respectivamente, de fabricantes nacionais distintos: papel ácido do tipo offset composto por fibras de eucalipto e papel alcalino do tipo offset composto por fibras de eucalipto.

A escolha destes tipos de papéis deveu-se aos seguintes fatos: • A natureza do estudo exigia papéis que não tivessem sido deteriorados pela ação do tempo • N o Brasil 70 % da produção de papel para imprimir é do tipo offset / fibras de eucalipto. Certamente estes serão no futuro alvo de restauração. • Hoje os papéis com colagem alcalina e com colagem ácida, ambos destinados à impressão, convivem lado a lado, com tendência do primeiro sobrepujar o segundo.

2. Metodologia

Cada amostra de papel, ácida e alcalina, composta por folhas de tamanho A4, foi dividida em três lotes, sendo dois deles submetidos a tratamentos: um a banhos de limpeza/desacidificação e outro a banhos de limpeza/desacidificação e reencolagem/ planificação. Os papéis resultantes foram denominados como segue:

PA - Papel ácido PAB - Papel ácido submetido a banhos de limpeza PABR — Papel ácido submetido a banhos de limpeza e reencolagem PAL - Papel alcalino

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PALB — Papel alcalino submetido a banhos de limpeza PALBR — Papel alcalino submetido a banhos de limpeza e reencolagem

Os banhos foram realizados em cubas plásticas com água filtrada e deionizada e nas condições especificadas na Tabela 1. O pH e a temperatura do banho foram ajustados, respectivamente, através da adição de solução saturada de hidróxido de cálcio e de água quente.

Nos banhos as folhas foram acondicionadas entre telas de náilon e após estes colocadas sobre telas para secarem ao ar livre.

Depois de secas as folhas destinadas à reencolagem foram aspergidas em ambas as faces com uma solução a 5 % de "tylose".

Tabela 1: Condições dos banhos de limpeza / desacidificação

Papel

Ácido

Alcalino

Banho

1°banho 2°banho 3°banho

Desacidificação 1° banho 2°banho 3°banho

Desacidificação

Tempo (min)

10 10 10 15 10 10 10 15

PH inicial

7,0 7,5 8,0 9,0 7,0 7,5 8,0 9,0

PH final

5,5 5,0 6,0 6,0 6,0 6,5 7,5 7,5

Temperatura inicial (°C)

36,0 31,0

22,0 (ambiente) 22,0 (ambiente)

36,5 31,0

22,0 (ambiente) 22,0 (ambiente)

Temperatura final (°C)

30,0 28,0 22,0 22,0 31,0 28,0 22,0 22,0

Após os tratamentos, as folhas passaram por um processo de planificação, que consistiu em umidecê-las (com água de mesmo pH do banho de desacidificação) e dispô-las em camadas de folha/ entretela/ papel mata-borrão, tudo isso entre duas tábuas de madeira e aplicar uma pressão de 10 kgf à pilha formada, até as folhas se apresentarem secas. Durante este processo o mata-borrão foi trocado algumas vezes.

Os papéis tratados e não tratados foram submetidos aos ensaios relacionados na Tabela 2.

Tabela 2: Relação dos ensaios realizados e as respectivas normas

E n s a i o Dimensões da folha (comprimento e largura)

Espessura da folha Gramatura

Resistência à tração Resistência ao arrebentamento

Resistência ao rasgo pH de extrato aquoso Aspereza, Bendtsen

Alvura difusa - fator de reflectância no azul Cor CIE L a b

Determinação da resistência a ataque de fungos

P r o c e d i m e n t o Medida com régua milimetrada

ISO 534-1988 ISO 536:1995

ISO 1924-1:1992 ISO 2758:1983 ISO 1974:1990 ISO 6588:1981

ISO 8791-2:1990 ISO 2470:1977

TAPPI T527om-94 TAPPI T487cm-93

ISO - International Organization for Standardization TAPPI - Technical Association of Pulp and Paper Induatry

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Como as condições em arquivos e bibliotecas são mais favoráveis ao desenvolvimento de fungos do que de bactérias, optou-se para verificar a suscetibilidade dos papéis tratados e não tratados ao ataque microbiológico pela aplicação do procedimento descrito na norma TAPPI referida na Tabela 2, que emprega três espécies de fungos: Aspergillus niger, A.spergillus terreus e Chaetomium globosum.

Os papéis tratados e não tratados foram inoculados , de modo separado com cada uma das espécies de fungo considerada, através de suspensões devidamente preparadas, contendo (10 ± 2) 10f' esporos do fungo específico por mililitro. Após foram incubadas por 14 dias, numa temperatura de (28 ± 1)°C e numa umidade relativa do ar de aproximadamente 78%. Avaliações foram efetuadas no sétimo e décimo quarto dias.

3. Resultados

A Tabela 3 apresenta os resultados obtidos nas análises dos papéis com e sem tratamento. Estes resultados são médias de 3 a 10 determinações, sendo os valores entre parênteses referentes ao desvio-padrão (medida do grau de dispersão das determinações em torno da média).

A Tabela 3 também mostra a influência dos banhos e reecolagem nas propriedades dos papéis estudados. Deve ser ressaltado que os tratamentos "banhos" e "banhos e reencolagem" foram aplicados de modo separado, ou seja não consistiram em uma seqüência. Assim os papéis resultantes destes tratamentos não devem ser comparados entre si, mas apenas ao papel sem tratamento: PAB (PALB) com PA(PAL) e PABR(PALBR) com PA(PAL).

Tabela 3: Sumário dos resultados obtidos

Ensaio

Dimensões das folhas Comprimento (mm)

Largura (mm)

Espessura (mm)

Gramatura (g/m2)

pH do extrato aquoso

Aspereza (mL/min) Lado tela do papel

Lado feltro do papel

Tração (kN/m) Sentido longitudinal da fibra

Sentido transversal da fibra

Arrebentamento (kPa)

Rasgo (mN) Sentido longitudinal da fibra

Sentido transversal da fibra

Alvura (%)

Cor L* a* b*

Alvura após envelhecimento em estufa a 100°C, por 4 horas (%) Alvura após envelhecimento com lâmpada de UV, 365 nm, por 4 horas (%)

Papéis ácidos

PA

297 (0) 210 (0)

0,112 (0,004)

86,3 (0.3) 5,6

(0,1)

183 (21) 150 (14)

6,0 (0,6) 2,3

(0,2) 226 (21)

424 (31) 521 (28) 83 (0)

92,3 3,2

-11,9 81 (0) 77 (0)

PAB

295 (0) 209 (1)

0,125 (0,001)

87,6 (0,1) 6,0

(0,1)

793 (170) 625

(124)

6,8 (0,4) 2.6

(0,1) 245 (28)

483 (36) 565 (22) 82 (0)

92,3 2,1 -7,5 79 (0) 76 (0)

PABR

295 (0) 208 (0)

0,126 (0,003)

88,4 (0.4) 6,4

(0.0)

600 (71) 524 (87)

6,4 (0,5) 2,6

(0,1) 237 (24)

452 (17) 565 (22) 81 (0)

92,3 2,3 -7,7 78 (0) 74 (0)

Tendência A

com o tratamento

4-

l

T

t

t

Tt

tf

-

-

t

t

i

i t 4.

4-

Papeis alcalinos

PAL

297 (0) 210 (0)

0,126 (0,001)

90,2 (0.3) 8,9

(0.1)

281 (17) 167 (8)

4.3 (0,2) 2,6

(0,2) 151 (11)

490 (17) 515 (36) 93 (0)

95,9 4,0

-14,3 90 (0) 88 (0)

PALB

295 (0) 208 (0)

0,132 (0,001)

90,1 (0,4) 9,1

(0,1)

530 (88) 335 (13)

4,1 (0,2) 2,0

(0.2) 154 (8)

496 (14) 584 (28) 93 (0)

95.8 3,5

-12,2 89 (0) 90 (0)

PALBR

295 (0) 208 (0)

0,133 (0,002)

89,8 (0,4) 9,0

(0,1)

558 (16) 344 (16)

4.5 (0.1) 2,3

(0,1) 163 (7)

515 (17) 603 (52) 93 (0)

95,8 3,6

-12,4 89 (0) 81 (0)

Tendência A

com o tratamento

i

4-

T

-

-

Tt

tt

-

-

t

t t

-

4-t 4.

i

A - não apresenta modificações consideráveis T aumenta levemente i diminui levemente

TT aumenta consideravelmente li diminui consideravelmente

171

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ABRACOR - Associação Brasileira de Conservadores-Restauradores de Bens Culturais

FIG 1. PA (Rpl) e PABC (Rp2) atacados pelo fungo Chaetomium globosum.

Os banhos de limpeza são mais responsáveis do que a reencolagem por modificações no papel, sendo que a influência maior destes ocorre na espessura da folha e na sua aspereza.

Após os banhos os papéis ficam, visualmente, bastante amarelecidos, embora a medição em aparelho tenha apresentado uma queda pouco acentuada da alvura. N o entanto, quando se considera a cor verifica-se que esta passa por modificação, tendendo para a região do amarelo.

Quanto ao ensaio de resistência ao ataque microbiológico verificou-se que todas as amostras foram, para os três tipos de fungos empregados, atacadas de modo intenso, com forte esporulação, indiferentemente do tratamento realizado ou da acidez do papel. As figuras de 1 a 4 mostram, respectivamente, as superfícies dos papéis PA, PAL, PAB e PALB atacadas pelo fungo Chaetomium globosum.

Cabe ressaltar que os fungos são organismos que se reproduzem por meio de esporos. A germinação de um esporo resulta em filamentos denominados hifas, com crescimento apical. O conjunto de hifas recebe o nome de micélio, que em determinado estágio de maturação, produz novamente uma grande quantidade de esporos . São estas es t ru turas (micélio e esporos) que podem ser vistas macroscopicamente.

4. Comentários Finais

FIG 2. PAL (Rcl) e PALBC (Rc2) atacados pelo fungo Chaetomium globosum.

O estudo em questão aponta que os banhos de limpeza e a reencolagem não causam modificações nas propriedades do papel a ponto de desclassificá-los como técnica a ser usada na restauração de papel.

A espessura e a aspereza do papel foram as propriedades mais influenciadas, porém fato que pode ser contornado através de modificações no processo de plani-ficação das folhas.

Cabe lembrar que uma maior aspereza pode acarretar num acúmulo maior de pó na superfície do papel e, consequen temen te , numa maior quant idade de microorganismos em contato com o mesmo. Por outro lado um aumento de espessura, no caso da montagem de um livro a um aumento de sua lombada.

5. Bibliografia

ARNOLD, R.B. Update: ASTM/ISR paper aging research program. Alkaline Paper Advocate, v. 9, n°2, jul. 1996.

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GURNAGUL, N.; ZOU, X. The effect of atmospheric pollutants on paper permanence: a literature review. TAPPI Journal, v. 77, n.7, p. 199-204, july 1994.

HERNADI, S. Thermal ageing in oxygen of paper made from cellulose at different degrees of beating. Svensk. Papperstidning, nr 13, 1976.

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172

Page 174: Anais Do Congresso de Abracor

Anais da ABRACOR - Papel IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

REED, G ; REHM. H. J. Bioiechnology. VCH, v. 8. ZOU, X.; GURNAGUL, N.; UESAKA, T. The role of lignin in the mechanical permanence

of paper; Part I (Effect of lignin content). Pulp and Paper Research Institute of Canada.

173

Page 175: Anais Do Congresso de Abracor

ABRACOR - Associação Brasileira de Conservadores-Restauradores de Bens Culturais

Abstract

The purpose of this work is to present the techinical procedures of lining and flattening documents in the oriental and ocidental ways. This approach is the result of a training course in the Northeast Document Conservation Center/ NEDCC (USA) and in the course Japanese Paper Conservartion Course (Japan). This work is divided in three parts: lining and flattening in the ocidental and oriental methods; construction of karibari; adaptation and use of the tecniques.

Velatura e Planificação de Obras de Arte sobre Papel: práticas do Ocidente e do Oriente

Maria Aparecida de Vries Mársico Conservadora e Restauradora Fundação Biblioteca Nacional Av. Rio Branco, 219/239 20040-008 - Rio de Janeiro - RJ E-mail : cida@bn. br tel.: (021) 262-8255 ramal 205

1. Velatura

A velatura, umas das técnicas mais utilizadas na restauração de documentos planos, consiste na colagem, no verso do documento danificado, de uma nova folha de papel, reestruturando o suporte e atribuindo-lhe maior resistência. Essa técnica é adotada quando o manuseio do documento é inviabilizado pelo riscos de danos ou perdas de suporte, em face da fragilidade ou fragmentação do material. Em resumo, o material não admite o manuseio, para o qual foi concebido, como suporte de registro de informação, requer uma estrutura de sustentação, que o recomponha, atribuindo-lhe, novamente, autonomia, flexibilidade e inteireza. A velatura oferece um novo corpo ao documento degradado.

A eleição do papel, para a velatura, no âmbito de suas característica (resistência, gramatura e transparência), deve observar os seguintes critérios:

a) nível e volume dos danos, no suporte; b) dimensão do documento; c) incidência de marcas dágua (filigrana, vergaturas e pontusais), no suporte; d) a raridade da obra registrada no suporte; e) tonalidade do suporte original.

2 Velatura e planificação pelo método ocidental

A velatura praticada nos centros de conservação do ocidente efetua a colagem do papel da velatura basicamente por dois métodos:

a) velatura presa b) velatura solta. Na velatura presa é assim denominada, pelo fato de o documento danificado

secar colado (preso) a uma tela de njlon sobre uma placa de acrílico. Sua implementação considera os seguintes procedimento:

1) colagem de tela de nylon previamente umedecida sobre uma placa de acrílico; 2) distenção da tela de nylon para eliminar as bolhas de ar; 3) colagem do papel da velatura sobre a tela de nylon; 4) transporte do documento danificado para a superfície do papel da velatura 5) secagem da velatura por tensão A velatura solta é aquela em que o documento danificado é seco sob pressão, de

pesos ou prensa. Trata-se de procedimento bastante utilizado em documentos manuscritos com tinta ferrogálica em avançado estado de degradação, e implica nos seguintes procedimentos:

174

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Anais da ABRACOR - Papel IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

FIG 1 - Aplicação de falsa margem

FIG 2 - Aplicação de falsa margem

•í-M;-\. *^$0& 7

FIG 3 - Transferência do papel da velatura

1) colocação do documento sobre uma tela de nylon; 2) umedecimento do documento em sua totalidade; 3) colagem da folha de papel da velatura, em outra tela de nylon; 4) transporte da folha de papel da velatura, colada à tela de nylon, para a superfície do documento a ser restaurado; estabelecendo um conjunto de acordo com o esquema: tela com papel da velatura x documento x tela; 5) proteção externa, do conjunto, com folhas de papel mata-borrão, formando uma espécie de "sanduíche": papel mata-borrão x tela x documento x tela x papel mata-borrão; 6) prensagem rápida do conjuto; 7) substituição dos papéis mata-borrão (proteção externa); 8) secagem do material, sob pressão leve ou sob pesos; A velatura solta oferece vantagem por ser uma técnica de mais rápida realização,

sendo usada para documentos de pequena dimensão. No entanto, deve ser evitada para obras de arte sobre papel, por exigir prensagem, ou seja, contato direto da superfície do documento com a prensa, oferecendo riscos de perda da textura do papel original, subtração do testemunho, marca de autentidade das gravuras, e outros danos de caráter estético

Na velatura presa, a obra seca sob tensão e a planificação é o resultado da secagem do documento sobre a placa de acrílico. Na velatura solta, a obra seca sob pressão e a planficação é o resultado da secagem sob prensa ou pesos.

3 Velatura e planificação pelo método oriental.

A velatura pelo método ocidental tem a mesma finalidade e função daquela praticada no ocidente. A diferença ocorre nos modos de operação e de planificação da obra restaurada. O uso de karibari, típico do método oriental, no processo de secagem da velatura introduz modificações que implicam nas seguintes etapas:

1) aplicação de uma falsa margem em torno do documento. A produção dessa falsa margem é feita da seguinte forma: a) corta-se com filete d'água uma tira de papel de cerca de 4 centímetros, deixando as fibrilas longas; b) dobra-se essa tira de papel como se fosse uma sanfona; c) cola-se as fibrilas nas beiradas (ao redor) do documento. O papel dobrado como uma sanfona deve permanecer enrugado, ao ser colado sobre as beiras do documento, não se pode planificar esse enrugamento artificial, pois ele tem a finalidade de compesar a distensão do papel do documento, quando for molhado, e a falsa margem. Os dois materiais (falsa margem e documento) devem "trabalhar" juntos ao serem umedecidos (fotos n° 1 e 2) 2) umedecimento leve de um pedaço de entretela sem goma 3) superposição da face do documento em contato direto com a entretala 4) distribuição de cola na superfície do papel utilizado para a velatura; 5) transferência, com o auxílio de uma régua de madeira chanfrada, do papel com cola para a superfície do verso do documento (foto n° 3); 6) acomodação do papel da velatura sobre o documento. À margem da velatura deve-se colocar uma pequena tira de papel, para auxiliará a remoção futura da velatura (foto n° 4); 7) transferir a veltura para a superfície do karibari; 8) fixação da velatura no karibari, para secagem e planficação. Essa fixação deve ser feita apenas nas metades das margens externas das falsas margens. O documento fica "solto" sobre o karibari, não é colado sobre a superfície do karibari. Esse detalhe é de extrema inportância, pois cria uma área de ar entre a velatura e a superfície do karibari, possibilitando a tensão necessária para a secagem da velatura (foto n° 5);

9) secagem no karibari por no mínimo 48 horas.

175

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ABRACOR - Associação Brasileira de Conservadores-Restauradores de Bens Culturais

3< J FIG 4 - Acomodação do papel da velatura

4. Contrução de karibari

O karibari, uma estrutura de madeira coberta por dez camadas de papel japonês, é usado para a secagem e planificação de obras de arte sobre papel, de rolos e de seda. (fig n° 1 Processo de karibari). A última camada de papel japonês que cobre o karibari é impermeabilizada com suco de caqui verde, para impedir que o karibari seja afetado pela umidade.

A estrutura de madeira do karibari é construída por dois tipos de madeira cedro e ciprés (foto n° 6). A estrutura das bordas é de cedro, a estrutura do interior é de ciprés. Os papéis japonês utilizados para a cobertura do karibiari são Sekishu-shi, Hosakawa e Minogami. As camadas de papel japonês, que cobrem o karibari, obe-

Eitwdiu) (grosso) (médio) (médio) (grosso) (médio) (grosso) (grosso)

too 90 80 Ifi 6o 3 - 50 ' » 10

-d

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FIG 7 - Processo do karibari

decem a posicionamentos e junções específicos (fig n° 7 Processo de karibari). Para melhor entendimento da seqüência das cobertura das camadas, ver explica

ção na figura Processo de karibari. As linha desenhadas como pontilhado representam junção de papel por sobreposição. As linhas em forma de ziz-zaz representam junções de papel por corte com filete d'água, isto é, por junção das fibrilas dos papéis. As espessuras dos papéis são três: grosso, médio e fino. Observar com atenção, no diagrama, o posição da direção do fio do papel

5 Conclusão: adaptação e aplicabilidade das técnicas

A velatura e a planificação pelo método oriental são técnicas de ampla aplicabilidade nos trabalhos rotineiros de conservação de documentos em suporte papel. A utilização do karibari elimina o uso de prensas e de pesos para a planificação de obras de arte sobre papel. Esse método tem a vantagem de não modificar a estrutura original das fibras do papel, evitando a expansão da dimensão do documento pela prensagem e preservando os motivos impressos ou pintados.

A aplicação de falsas margens possibilita a planificação de obras de arte sobre papel no kariban, eliminando-se o uso de prensas.

Um método alternativo para a substituição do karibari, é a utilização de uma placa de madeira de lei sem verniz e sem polimento, com uma espessura de cerca de cinco centímetros.

FIG 5 - Fixação das metades das falsas margens

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Anais da ABRACOR - Papel IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

Bibliografia

ICCROM/ TNRICP Japanese Paper Conservation Course: course notes. ICCROM (International centre for study of the preservation and restoration of cultural properties), Itália, 1998.

FIGS 6 - Estrutura do karibari

177

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ABRACOR - Associação Brasileira de Conservadores-Restauradores de Bens Culturais

Abstract Restauração de Álbuns Fotográficos (Uma Necessidade)

Brazil have so many dispersed photografic álbuns en public instituitions, associations and most important, priveted collectores. During many years, this material was exposed a very strong handling and stored under bad conditions. Fortunately, conservators/restaurators, have the conscience today that how importante is to preserve this material.

Edmar Moraes Gonçalves Conservador - Restaurador Fundação Casa de Rui Barbosa Centro de Memória e Documentação Laboratório de Conservação e Restauração Rua São Clemente, 134 - Botafogo 22260-000 - Rio de Janeiro - Brasil Telefax: 5370036 r. 127-fax: 5371114 e-mail: [email protected]

FIG 1 - Antes do tratamento com Estrutura Rompida

FIG 2 - Após Tratamento

FIG 3 - Antes do Tratamento

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Introdução

Os álbuns são utilizados para preservar fotografias, que por si mesmas possuem uma importância histórica. Por tanto temos a obrigação de dar o mesmo valor e um tratamento adequado a todo o conjunto.

O revestimento desses álbuns apresenta variações diversificadas, tais como: papel, tecido plástico ou couro e, em alguns casos, uma grande riqueza de detalhes como brasões, dourações, fechos em metal ou bronze e outros. As estruturas também são variadas, como: união das folhas e capas por cordões, carcelas de papelão e tecidos, grampos, parafusos, etc. Infelizmente grande parte desses álbuns foi confeccionada com materiais de baixa qualidade, o que vem ocasionar danos quase sempre irrecuperáveis. Por isso devemos adotar uma política de conservação e estimular projetos de recuperação desse tipo de obra.

2 Álbuns fotográficos da coleção Rui Barbosa

Trata-se de uma coleção de 15 álbuns, datada de meados do século XIX, que se encontrava com graves problemas de conservação: capas soltas, perdas parciais e em alguns casos totais dos elementos de estruturas, ataque biológico, rasgos, perdas consideráveis nas folhas, ressecamento dos revestimentos em couro e perdas de alguns fechos de metal. Devo salientar que foram adotados no tratamento de restauração dos álbuns fotográficos os mesmos critérios que utilizamos nas intervenções de restaurações de livros raros.

2.1 Ficha técnica (3o álbum restaurado ) Código da coleção: CRB n° 29.05 A Ano: 1897 Procedência: família Rui Barbosa Incorporação ao acervo: 1929 Técnica: Suporte: cartão Dimensões: 0,285x0,235x0,06m N° de folhas: 16 Estado de conservação: 3 (péssimo)

2.2 "Estrutura Obra constituída originalmente de capa de madeira, acolchoada, revestida em couro de ovelha de cor vinho, estrutura em carcelas de cartão revestida com tecido de algodão unindo as 16 folhas com molduras de diferentes formatos de ambos os lados.

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FIG 4 - Durante o Tratamento

FIG 5 - Após Tratamento

FIG 6 - Detalhe da Estrutura Antes do Tratamento

2.3 Características de deterioração Apresenta-se em péssimo estado de conservação, com rompimento total das carcelas que uniam as folhas à capa, ataque biológico, rasgos nas folhas, fitas adesivas, manchas e escurecimento no escudo e fechos de bronze, perdas e ressecamento do couro de revestimento.

2.4 Processo de restauração - Documentação fotográfica: Uso de filmes cromo (slides) Ektachrome E100 e E200,

que dá uma boa qualidade e nitidez de imagem, e uso de escala de cores da Kodak, para se conseguir um melhor controle de tons. Foram feitas fotos detalhadas de todos os problemas de conservação e danos existentes, antes de se fazer qualquer tipo de intervenção na obra. Obs: Estamos substituindo o uso de documentação fotográfica em papel pelo de cromo (slides), devido à dificuldade de se conseguir junto aos laboratórios fotográficos uma boa qualidade no processo de revelação e cópias. Ou seja, o processo de cópia em papel vem acarretando diferenças muito grandes de tons entre a imagem real do original e a fotografia.

-Fichamento detalhado da obra, observando todos os problemas com anotações precisas sobre os tipos de materiais utilizados em suas estruturas e revestimentos, e com a preocupação de guardar todos os fragmentos existentes, para que possamos reconstituí-los recuperando a originalidade da obra.

-Dismonte das carcelas tomando o cuidado de numerá-las, respeitando a posição de cada uma na ordem em que se apresentava, removendo todo o resto de tecido de união das carcelas às folhas.

-Limpeza mecânica com bisturi, trincha e pó de borracha. -Remoção de fitas adesivas. -Enxertos utilizando papel ingres nas folhas do álbum no tom próximo do original. -Pigmentação do dourado nas molduras das folhas. -Tratamento de desacidificação e tingimento de tecido de algodão (cós de calça) no

tom .original para ser utilizado na união das carcelas e folhas substituindo o original que se encontrava em adiantado estado de decomposição.

-Montagem dos elementos estruturais (carcelas, união das folhas e lombada). -Enxertos do revestimento da capa com couro de cabra similar ao original. -Lombada nova de couro para receber por adesão as partes aproveitáveis da lomba

da original. -Montagem da capa e hidratação do couro com cera 213 - CNRS-Bibl. Nac. de

Paris. -Confecção de uma caixa de conservação para a guarda e proteção da obra.

Obs: Devido à semelhança de tons do couro utilizado nos enxertos do revestimento original, optou-se por sua não-pigmentação.

3 Materiais utilizados

FIG 7 - Após Tratamento

Adesivos: Amido de milho ph7 com bactericida. A 44 E D a 10% misturada com amido; Tylose c 6000

Tecido de algodão (cós de calça branco) Papel ingres

Lápis aquarela Caran dAche Pen-touch dourado Tinta para tecido Guarany Cera 213 - CNRS - Biblioteca Nacional de Paris Entretela leve (tipo cânhamo) desacidificada, utilizada no revestimento da caixa de

conservação Cartão Paraná para confecção da caixa de conservação

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ABRACOR - Associação Brasileira de Conservadores-Restauradores de Bens Culturais

4 Conclusão

m> -.1

1

FIG 8 - Capa Antes do Tratamento

FIG 9 - Após Tratamento

FIG 10 - Álbuns já restaurados

Na recuperação desta coleção, adotamos o critério padrão de conservação/restauração de livros raros, onde procuramos aproveitar o máximo do material original e manter a integridade física da obra após o tratamento de intervenção. Devido à dificuldade de encontrar os materiais adequados para este trabalho, fomos compelidos a substituir alguns deles: o couro original de revestimento, que é de ovelha, teve que ser enxertado utilizando couro de cabra, que no meu entender tem características bem similares; a união e revestimento das carcelas eram de uma tela do tipo francesa, e devido ao mau estado de conservação foi substituída por tecido de algodão desacidificado e, tingido no tom original. Ou seja, procurou-se manter a originalidade da obra o mais fielmente possível e, quando não houve condições, substituiu-se por materiais similares, utilizando materiais de boa qualidade, resistência física, durabilidade, compatíveis com o original. E o mais importante é que todas estas intervenções possam ser reversíveis.

Levando-se em consideração a característica de cada álbum, estamos dando prosseguimento ao trabalho de recuperação seguindo os mesmos padrões estabelecidos.

Bibliografia

Cadernos técnicos: procedimentos de conservação/ coordenação de Ingrid Beck; tradução de Elizabeth Larkin [e] Francisco de Castro. Conteúdo: preservação de livros de recortes e álbuns. Rio de Janeiro, 1997.

IPERT, Stéphane, ROME-HAYCINTHE, Michèle. Restauración de lihros. Tradução de Esther Garcia Regalado. Madrid: Fundación Germán Sánchez Ruipérez, 1992.

SAN MILLÁN, Pedro Barbáchano, BENY, Ana, BANOS, Manuel Merino. La conse rvac ión de l ibros In : C O N G R E S O D E C O N S E R V A C I Ó N Y RESTAURACIÓN D E BIENES CULTURALES, 9., 1992, Sevilla. Anais... p-575-583.

Resumo do autor

Edmar Moraes Gonçalves. Conservador-restaurador, graduado em Biblioteconomia e Documentação pela USU (Universidade Santa Ürsula) — Rio de Janeiro, 1989. Aperfeiçoamento em restauração de livros raros e de encadernações, em Barbáchano & Beny Patologia y Restauración dei Papel - Madrid — Espanha, 1996. Realizou curso de conservação e restauração de documentos gráficos na FCRB/RJ, 1993. Cursos de encadernações no Brasil e na Espanha . Lotado no LACRE (Laboratório de Conservação-Restauração de Documentos Gráficos) da FCRB/RJ desde 1991, desenvolvendo atividades de coservação/restauração de documentos gráficos e obras de arte sobre papel e é o responsável pelo núcleo de conservação/restauração de livros raros, orientando estagiários e desenvolvendo pesquisas de materiais utizados nessas áreas disponíveis no nosso mercado.

Nota

As fotografias pertencentes aos álbuns, foram desmembradas dos mesmos e acon-dicionadas individualmente, recebendo um tratamento técnico, seguindo padrões modernos de conservação de fotografias, utilizando invólucros de cartão neutro e filme de poliéster.

FIG 11 - Coleção de álbuns

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Abstract

The project of conservation and restoration of art contemporary is product of analysis of a situation in which ,we, as conservatornists and restourers, weet constantly. We usually notice and new proposal of paradigm originated by contemporary artists, from the comseption of the work, the usu new synthetic material and the diversity of technique used to the velop the work as well.

Arte Contemporânea: Criação e Implantação de um Nücleo

de Pesquisa e Treinamento no Rio de Janeiro.

Maria Luisa R. O. Soares* Coordenadora do projeto: Conservadora/Restauradora

Alma Grüner * Conservadora/Restauradora

Carla Veiga* Conservadora/Restauradora

* Fundação Casa de rui Barbosa Rua São Clemente, 134 Botafogo — Rio de Janeiro CEP: 22260-000 telfax: (021) 537-0036 r.127 e-mail: [email protected]

Introdução

Podemos considerar que a obra de arte contemporânea inicia o seu processo de degradação no ato criador, tendo em vista a multiplicidade de materiais envolvidos em sua concepção.

Para a realização de intervenções de restauro, faz-se necessário pesquisas específicas onde os estudos empíricos e analíticos da estrutura, a morfologia e as relações de propriedade, irão influir diretamente nos procedimentos técnicos estabelecidos.

Entendemos a pesquisa nesta nova área do conhecimento comprometida no papel fundamental da restauração, que nas palavras de Brandi, "constitui um momento metodológico de reconhecimento da obra de arte em seu aspecto físico e em sua dupla polaridade estética e histórica" a qual deve ser salvaguardada para futuras gerações.

Desenvolver a idéia de Brandi, nos leva à passagem do tempo quanto aos aspectos físicos de degradação da obra. Através de estudos comparativos, observou-se que os materiais contemporâneos, por motivos vários a serem pesquisados, apresentam processos acelerados de degradação em relação aos materiais tradicionais, que poderiam ser melhor diagnosticados através de análises químicas e físicas de suas estruturas.

Com esta linha de pensamento debruçamo-nos frente à contextualização do objeto quanto a sua quintessência. W. Benjamin entende como "o aqui e agora do original" que considera autenticidade, tudo aquilo transmitido pela tradição, entendida como algo vivo e variável através da história.

O problema dos objetos a serem tratados, já não envolve tão somente os aspectos estéticos e históricos, todo o processo torna-se fonte inesgotável de informações autênticas. Desta forma somos levados a considerar todas as fontes de informações inerentes ao bem cultural especificamente as de aspectos religiosos, antropológicos, documental, social, funcional e técnico. Ao reformular a metodologia de intervenção, deve-se também questionar o papel do restaurador "tradicional".

Estará ele preparado para os novos conceitos estabelecidos através dos movimentos artísticos contemporâneos?

Consideramos que ele não deverá intervir no objeto cultural apenas estruturalmente. Entre seus objetivos deverá estar também o aprofundamento das questões

181

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ABRACOR - Associação Brasileira de Conservadores-Restauradores de Bens Culturais

que o leve a obter uma maior compreensão do sentido cultural e estrutural do objeto.O diálogo entre o processo de reconstrução de bens culturais degradados e o seu momento de autenticidade (ato criador), não poderá ser interrompido pela utilização de procedimentos não apropriados aos novos padrões estéticos estabelecidos.

2. Objetivos

Visando a criação e implantação de um Núcleo de Pesquisa e treinamento de Profissionais no tratamento de obras de Arte Contemporânea no Rio de Janeiro, foram propostos os seguintes objetivos:

Promover convênios com instituições nacionais e internacionais que possibilitem o devido apoio científico.

Implantação de um núcleo de capacitação profissional de restauro voltado fundamentalmente para atuar com acervos de arte contemporânea; • Prestar serviços e assistência técnicas a terceiros através de convênios e cooperação com instituições que possuam acervos afins; • Divulgação das pesquisas através de treinamentos, seminários, workshops e publicações.

3. Metodologia

3.1 - Levantamento de núcleos organizados de pesquisas no campo da arte contemporânea. Como por exemplo: Foundation for the Conservation of Modem Ari em Amsterdan - Holanda; Canadian Conservation Institute — CCI - Ottawa/Ontario, Canadá.Armagem (Papel e Acrílico Lei-toso)

3.2 - Levantamento bibliográfico por áreas especificas. 3.2.1 - Ciência da Conservação 3.2.2 - Arte Contemporânea 3.2.3 - Conservação / Restauração

3.3 -Adoção dos limites da Região do Rio de Janeiro como base desta pesquisa. Hoje depois de meio século de pesquisas na restauração pode-se finalmente afirmar a necessidade de cientistas e restauradores de desenvolverem trabalhos em conjunto, ou seja, a prática da conservação/restauração com apoio científico e tecnológico. Como as instituições culturais não possuem facilidades para a realização de tais pesquisas, deve-se promover convênios com instituições que tenham o pessoal e equipamentos necessários para a realização destes trabalhos, estimulando a atividade multidisciplinar entre as várias áreas do conhecimento.

Para início deste trabalho, buscamos nomes significativos de "artistas cariocas" que pudessem servir de referência para o início destes trabalhos. Através de similitudes no processo criador e na utilização múltipla de materiais chegamos a alguns nomes: Hélio Oiticica; Daniel Senise; Ângelo Venosa; Paulo Roberto Leal entre outros.

3.4 - Estudo de Caso: Paulo Roberto Leal. 3.4.1 - Histórico Nosso encontro com a obra de Paulo Roberto Leal surge da solicitação encaminhada pelo curador do acervo, Sr. Armando Mattos, o qual em carta datada de 13 de maio de 1997, solicitou ao laboratório da Fundação Casa de Rui Barbosa, por intermédio de sua coordenadora~Maria Luiza Soares, a análise e diagnóstico do acervo visando principalmente o acondicionamento e restauração destes objetos.

Tratando-se especificamente de arte contemporânea, precisamos interpretar o percurso do pensamento do artista, a idéia criadora, que nos permitisse defi-

182

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Anais da ABRACOR - Papel IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

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Regatas, 1986/Foto: César Dantas

nir uma coerência na intervenção do acervo. Nesse sentido é que apresentamos o trabalho de conservação/restauração da obra de Paulo Roberto Leal, artista contemporâneo, sua tarefa foi a releitura da arte construtiva. Construtor por geometria, interessava-lhe a multiplicidade, o agrupamento, a articulação, a participação e o lúdico do objeto. Seu trabalho baseia-se no aproveitamento de materiais escolhidos ainda em estado de matéria prima, papéis, plástico, fotografia, padrões gráficos e recortes de folhas metalizadas.

3.4.2 - Seleção das obras Com Leal a arte neo-concreta reformula-se vinte anos depois num novo espaço expressivo. A utilização do papel e do acrílico reduzidos ao estado mínimo de ordem e complexidade, lembra-nos as produções de arte povera e de arte minimal. Procurando a simplificação da forma através da resistência do papel, chega a poesia da curva, do volume que articulam e desmancham diante de nosso olhar num construir lúdico. Mas como para Leal arte é vida, e vida é movimento e participação, a pesquisa chegou às Armagens e Des-mov-em, obras dos anos 70 escolhidas para dar início a nossa pesquisa.

Paulo Roberto Leal e Des-Mov-Em Foto : Arquivo PRL

3.4.3 - Documentação, Diagnóstico (Registro fotográfico e Ficha Técnica) Foi realizado o registro fotográfico das obras selecionadas previamente, visando principalmente manter uma relação entre o diagnóstico estabelecido e as diferentes etapas de interferência sofridas pelo objeto. A análise estrutural e os estudos da morfologia do objeto, geraram a criação de uma ficha específica que será cotejada com outras de levantadas de diferentes centros, para finalmente definirmos uma que seja mais compatível com o tipo de acervo que estamos trabalhando.

Detalhe Armagem (Papel e Acrílico Leitoso)!

Armagem (Papel e Acrílico Leitoso Fotos : LACRE/FCR

183

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ABRACOR - Associação Brasileira de Conservadores-Restauradores de Bens Culturais

4. Conclusão

Um dos grandes desafios encontrados pelos restauradores/pesquisadores atualmente é como lidar com os problemas de degradação dos "novos-materiais".

Nos últimos anos, com o crescimento das relações interdisciplinares, a ciência da conservação vem contribuindo para elevar o nível da qualidade na guarda e na exposição destes materiais, o que contribui para a sua conservação em sentido mais amplo.

Uma preparação crítica e científica dos profissionais, torna-se necessária, para conduzir intervenções dentro de padrões técnicos/éticos internacionais. Não basta um exame crítico da obra, mas também uma série de estudos técnicos e análises científicas. A ciência moderna hoje, oferece contribuições importantíssimas como, análises microscópicas, raio-x, absorção atômica, medidas de grau de polimerização, análises espectroscópicas entre outras.

Com essas aplicações garante-se o nível de cuidados na intervenção da obra de arte, visando principalmente a integridade da obra.

Analisando nossas limitações e necessidades concluímos que o profissional restaurador, que fosse levado a trabalhar com arte contemporânea necessitaria de uma especialização além da sua formação tradicional. A nossa realidade nos poss ibilita sugerir um currículo mínimo em aberto para contribuições de colegas que estejam atuando nesta área de trabalho e que possa atender estas necessidades. '

4.1 — Currículo

Arte Contemporânea

Ciência da Conservação

Técnica da Restauração

Historia

Sistemas de Composição (Teoria, Morfologia)

Filosifia Critica da Arte (Processo Criador)

Química (Orgânica e Inorgânica, Historia, Métodos Analíticos)

Conservação Preventiva e Ética Professional

Biologia

Documentação

Novos Materiais (Histórico, Química, Fisica)

Critérios de Intervenção

Bibliografia

3.2.1 - Ciência da Conservação (novos materiais) PULLEN, D. And J. HEUMANN, "Cellulose Acetate Deterioration in Sculptures of Naum

Gabo", Modem Organic Materials, The Scottish Society for Conservation and Restoration, Edinburgh, 1988, pp.57-66.

184

Page 186: Anais Do Congresso de Abracor

Anais da ABRACOR - Papel IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

EDGE, M. Et ai., "CeUulose Acetate: An Archival Polymer Falls Apart", Modem Organic Materials, The Scottish Society for Conservation and Restoration, Edinburgh, 1988, pp.67-79.

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Durability of Macromolecular Materials, American Chemical Society Symposium Series No. 95,1979.

Ultraviolet Light-induced Reactions in Polymers, American Chemical Society Symposium Series No. 25,1976.

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ADLER, E., "Lignin Chemistry. Past, present and future", Wood Science & Technology, 11:169,1977.

BAKER, S.A., E.J. BOURNE, M. STACEY and D. H. WHIFFEN, "Infra-red Absorption

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Page 187: Anais Do Congresso de Abracor

ABRACOR - Associação Brasileira de Conservadores-Restauradores de Bens Culturais

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HUSEK, P., "Rapid derivatization and gas chromatographic determination of amino acids", journal of Chromafography, vol. 552,1991, pp. 289-299.

3.2.2 -Arte Contemporânea (História / materiais) PONTUAL, Roberto, (coordenação) America Latina Geometri Sensível. Rio de Ja

neiro: Jornal do Brasil, 1978. ECO, Umberto. A Definição da Arte. Rio de Janeiro: Elfos , 1995. BENJAMIN, W A Obra de Arte na era de sua Reproductibilidade Técnica. Brasiliense BARR Jr. , Alfred H.La Definicion dei Arte Moderno. Madrid : Alinza,1989. ARGAN, Giulio Carlos. Arte Moderna. São Paulo: Companhia das Letras ,1995. MORAIS, Frederico. Cronologia das Artes Plásticas no Rio de Janeiro 1816-

1994.Topbooks, 1995. NAVES, Rodrigo. A Forma Difícil: ensaios sobre arte brasileira.São Paulo: Atica,

1997. SMITH, Edward Lucie. Movimientos en ei Arte desde 1945. Buenos Aires, Emecé,

1979. RIO ARTE "Projeto Hélio Oiticica". DAVID Catherine e BRETT Guy e DERCOM

Chris e FIGUEIREDO Luciano e PEPE Lygia. ( curadores). Rio de Janeiro, Centro de Arte Hélio Oiticica, 1997.

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REVISTA DE CONSERVACIÓN DEL PAPEL n 2 ,Buenos Aires,Biblioteca dei Congreso de Ia Nación,1998.

OPINIÃO 65: 30 Anos ,Rio de Janeiro.Centro Cultural Banco do Brasil, 1995 EGON, Albisser. Hablando con Franqueza, La Restauración , El Pisicoanalisis dei

Restaurador. Museum (UNESCO, Paris) n° 174 (vol.XLIV, n° 2, 1992). REVISTA D O ICOMS - Brasil: Aspectos urbanos, históricos e legais da preserva

ção no Brasil, São Paulo 1998. LONDRES, C. F. M., Da Modernização à Participação: A Política Federal de

PreservaçÂo nos anos 70 e 80. Revista do Patrimônio n° 24, Rio de Janeiro — IPHAN 1996.

CHENIAUX, Violeta. A Ação Destruidora da Umidade em Acervos Museológicos, Cadernos de Ensaios n° 2, Estudos de Museologia — IPHAN, 1997.

AMARAL, Aracy, A., Arte para quê? A Preocupação Social na Arte Brasileira 1930-1970. São Paulo, Nobel, 1987.

BRANDI, Cesare. Teoria do Restauro. Venezia, Ed. Einaudi, 1981. 186

Page 188: Anais Do Congresso de Abracor

Anais da ABRACOR - Papel IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

Resumo das autoras

SOARES, Maria Luisa (Kuka). Mestre em Administração e Preservação pela Universidade de Columbia —USA (1991). Especialista em Conservação/Restauração de Papel pelo ICCROM - Roma/Itália (1987). Implantou e coordena os trabalhos de Preservação da FCRB desde 1979. Participa das comissões de Formação e Treinamento e Arte Contemporânea do ICCOM. Atualmente preside a ABRACOR.

VEIGA, Carla. Formada em Química pela Universidade Federal do Rio de Janeiro Dezembro 1992. No período de 1994 a 1996, a autora presta seviço no Centro de Conservação e Preservação Fotográfica - CCPF/FUNARTE Em janeiro de 1996 até a presente data, ela inicia prestação de serviço na Fundação Casa de Rui Barbosa LACRE, laboratório de Conservação/Restauração de Documentos Gráficos sob a orientação de Maria Luisa R.O.Soares. Durante este período em agosto de 1997, ela ingressa no Curso de Mestrado em Química Orgânica na Universidade Federal Fluminense - Niterói/RJ, devendo concluir em agosto de 1999.

GRÜNER, Alma . Formada na Escola de Bellas Artes de Buenos Aires, Argentina, diciembro 1982. Atua na área de restauração desde 1997, como estagiaria, na fundação Casa Rui Barbosa —LACRE, laboratório de Conservação/Restauração de Documentos Gráficos sob a orientação de Maria Luisa R. O. Soares. Cursa a Escola de Museológia do Rio de Janeiro UNI-RIO, deviendo se formar em dicembro de 1998

Nota

O levantamento bibliográfico está sendo desenvolvido paralelamente com o corpo do trabalho. Bem como estão sendo realizados convênios com universidades e instituições culturais.

187

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Pintura

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Anais da ABRACOR - Pintura IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

Abstract

In this paper, we relate the objectives of one research about the stability of materiais and methods used in restauration works of canvas paintings.

Objetivos de um Estudo Acerca da Estabilidade de Materi

ais e Técnicas de Restauração de Pinturas Sobre Tela1

Marilene Corrêa Maia Professora de Conservação e Restauração no Curso de Especialização em Conser

vação e Restauração de Bens Culturais Móveis

Escola de Belas Artes — CECOR (Centro de Conservação e Restauração)

Universidade Federal de Minas Gerais — UFMG

Av. Antônio Carlos, 6627 - Belo Horizonte - MG - CEP: 31270-901

fone: 55 31 4995377-fax: 55 31 4995375

e.mail: [email protected]

Descrição

Um dos princípios básicos da restauração, é a utilização de materiais reversíveis, ou

seja, que possam ser removidos futuramente. E importante também que os mesmos

sejam estáveis e portanto, não sofram alterações em curto espaço de tempo para

não comprometer a leitura da obra e sua integridade material. Desta forma, conhe

cer as propriedades e potencialidades de materiais aplicados em intervenções de

restauração, assim como as possíveis alterações desses produtos no transcurso do

tempo, pode contribuir sobremaneira para o melhor desempenho das atividades

dos restauradores.

A proposta de analisar e estudar obras que já passaram por processos de restau

ração, justifica-se pela necessidade de reavaliarmos constantemente os diversos mé

todos e técnicas já utilizados em intervenções anteriores, de aprimorar os mesmos e

desenvolver novas soluções. Trata-se também de uma oportunidade para analisar

mos o nível de comprometimento e empenho, além das dificuldades dos proprietá

rios de obras já restauradas, em cuidar da conservação destas.

Para tanto, selecionamos um grupo de 15 pinturas sobre tela, pertencentes ao

acervo do Colégio Caraça, que foram restauradas no CECOR — Centro de Conser

vação e Restauração da Escola de Belas Artes da Universidade Federal de Minas

Gerais, no início dos anos 80. Tais peças estão entre os primeiros trabalhos executa

dos nesta instituição.

No estudo em questão, definimos os seguintes objetivos:

• Conhecer as técnicas de restauração de pintura sobre tela já utilizadas no

CECOR;

• Relacionar e estudar as características e propriedades dos materiais utilizados

nas referidas intervenções;

• Analisar o estado de conservação das obras em contraposição ao tempo já

decorrido;

• Estudar alterações existentes nas pinturas tendo em vista os processos e ma

teriais empregados nos trabalhos de restauração.

Como procedimentos metodológicos de pesquisa, estamos investigando, inicial

mente, os arquivos do CECOR - Centro de Conservação e Restauração da Escola de

Belas Artes. Neste, estão "armazenadas" informações sobre as obras em estudo,

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ABRACOR - Associação Brasileira de Conservadores-Restauradores de Bens Culturais

incluindo relatórios dos procedimentos de intervenção. Analisá-los, significa uma

possibilidade de realizar um levantamento de dados acerca de técnicas e produtos

utilizados na restauração dessas peças. Na mesma medida, a documentação fotográ

fica (slides e fotos) é outro material importante, pois como registros em imagem,

nos permitem conhecer o estado das peças durante todo o processo de intervenção,

desde a chegada à instituição, passando pelos procedimentos, até a finalização dos

trabalhos.

Outra estratégia são as visitas à Pinacoteca do Colégio Caraça para analisar as

condições de conservação desse acervo e o estado de cada obra. Assim, poderemos

estabelecer um confronto com os dados de arquivos na tentativa de averiguar e

refletir sobre a estabilidade dos materiais e das técnicas aplicadas na restauração das

referidas pinturas.

Estudaremos também os materiais e os procedimentos utilizados nessas inter

venções, visando conhecê-los melhor, identificar as fontes de obtenção dessas in

formações, bem como, delinear a apreensão e consolidação do conhecimento teóri-

co-técnico no CECOR.

Para este estudo, ressaltamos que é fundamental a contribuição das informações

obtidas em entrevistas com profissionais2 que trabalharam nessa época e em parti

cular, nas peças mencionadas.

Conclusão

Este estudo, constitui uma oportunidade de rever e repensar métodos de restaura

ção de pinturas sobre tela, bem como de analisar as potencialidades de materiais

utilizados em intervenções dessa natureza. Pretendemos com o mesmo, delinear,

em certo sentido, um histórico de procedimentos já experimentados.

Participação

calaboradnrti: Beatriz R. V. Coelho - Professora Emérita da UFMG

bolsista de iniciação científica: Carla Gomes de Carvalho

Bibliografia

BERGEON, Ségolene. Restauration de peintures. Paris, Musées Nationaux, 1980.

. Science et patience ou Ia restauration des peintures. Paris, Musées

Nationaux, 1990.

MARTOS, Arturo Diaz. Resturación y conservación dei arte pictórico. Madrid, Arte

Restauro, 1975.

STOUT, George L. Restauración y conservación de pinturas. Madrid, Editorial

Tecnos, 1960.

Resumo do autor

Licenciada e Bacharel em História pela Universidade Federal de Minas Gerais

Especialista em Conservação e Restauração de Bens Culturais Móveis pela Escola de Belas

Artes de Universidade Federal de Minas Gerais

Foi estagiaria no atelier de restauração da Superintendência de Museus do Estado de

Minas Gerais, conservador /restauradora do Museu de Arte da Pampulha.

Atualmente é professora de conservação/restauração no Curso de Especializa

ção em Conservação e Restauração de Bens Culturais Móveis da Escola de Belas

Artes da Universidade Federal de Minas Gerais.

1 9 2

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Anais da ABRACOR - Pintura IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

Notas

1 — Esta pesquisa, entitulada "A estabilidade dos materiais e técnicas aplicadas em

restauração: o caso da pinturas de cavalete do Colégio Caraça", está sendo desenvol

vida no Departamento de Artes Plásticas da Escola de Belas Artes da Universidade

Federal de Minas Gerais com financiamento da Pró-Reitoria de pesquisa da referida

instituição.

2 - É importante mencionar a gentileza da cooperação de Ivê Madeira (técnica em

restauração ) e de Gislaine R. T. Moura ( diretora do CECOR ).

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ABRACOR - Associação Brasileira de Conservadores-Restauradores de Bens Culturais

As Pinturas da Igreja de Vilarinho de Cova de Lua - Restau

ro e Conservação Preventiva

Dra. Maria Beatriz Correia de Albuquerque Conservadora Restauradora - Sócia Gerente da Empresa BonsOfícios Restauro e Conservação Lda. Rua Carvalho Araújo, n° 41, 1900 Lisboa Portugal Telf. 01-3538543 - Fax:01-3520569

D e s c r i ç ã o

Durante a Década de 40 a igreja sofreu intervenções de vulto, tendo sido o altar-mor totalmente desmontado, e remontado posteriormente de forma completamente diferente do original, uma vez que muitas peças estavam em muito mau estado. Ao ser aberta uma tribuna no altar foi retirada a tábua de S. Cipriano. Por sua vez, a de S. Pedro e de S. Paulo, voltaram para o mesmo lugar, mas, sofreram uma intervenção desastrosa, tendo sido totalmente repintadas.

Estudo Técnico - Suporte

O material que serve de suporte a estas três pinturas, é de madeira de castanho. Cada uma delas é executada numa só tábua, com as seguintes dimensões : S. Cipriano 68 cm x 126 cm, S. Pedro 62,5 cm x 14 cm e S. Paulo 61 cm x 113 cm, a espessura varia entre 2 cm a 2,5 cm. No reverso dos painéis é visível, à excepção do topo e da base, rebaixos na periferia, provavelmente para o seu encaixe no retábulo ou molduras. O topo superior do painel de S. Cipriano foi cortado em alguns centímetros, e os extremos arredondados, possivelmente para ser adaptado a um novo retábulo. No caso do S. Pedro e S. Paulo, o topo e a base foram também cortados em alguns centímetros, talvez por necessidade de uma nova disposição.

Foi utilizado no corte das tábuas a serra manual, sendo bem visível as marcas (dentes da serra). No painel de S. Pedro e S. Paulo é utilizada, também, a enxó.

A pintura foi executada nos painéis, seguindo a orientação em altura, em que o fio da madeira está colocado verticalmente.

Estudo Analítico -Exame das Preparações e Camada de Impressão , pigmen-tos e vernizes

Face aos meios disponibilizados para se proceder à recuperação destas tábuas, foram criadas condições para que esta, fosse uma intervenção interdisciplinar, visando um estudo mais alargado e completo dos quadros. Do ponto de vista do restau-rador , o conhecimento histórico, dos materiais e do estado de conservação permitiu intervir de forma mais segura e precisa.

As análises que realizamos foram feitas no laboratório R-VCB Conservacion y Restaracion: análises de Materiales, em Madrid.

Procedemos a duas estratigrafias uma realizada no quadro de S. Cipriano e outra no de S. Paulo. A preparação em, ambos os quadros, é constituída à base de Sulfato de Cálcio ( CaS04) (gesso) e numa percentagem mínima por Carbonato de Cálcio (CaC03) (cré), o aglutinante é proteico, não tendo sido determinado qual. Apresenta uma cor castanha clara. A espessura da preparação varia nos dois quadros; no de S. Cipriano é de 160mm e no de S. Paulo é de 153mm. Quanto à camada de impressão, esta é de cor branca à base de branco de chumbo e negro carvão, na pintura de S. Paulo , com 41 mm de espessura, e de branco de chumbo com pontos

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Anais da ABRACOR - Pintura IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

de vermelho de tipo orgânico, no de S. Cipriano, com 40mm.. Quanto aos aglutinantes utilizados, no S. Paulo este é de origem proteica e oleica e no de S. Cipriano é apenas oleica.

Recolhemos três amostras dos seguintes pigmentos: branco, vermelho (pintura de S. Cipriano) e azul (pintura de S. Paulo). O branco não é puro; encontra-se misturado com negro, e é constituído á base de pigmentos de branco de chumbo e negro carvão, de tipo mineral; a espessura é de 17 mm; o aglutinante é de origem proteica não tendo sido determinado qual. O pigmento vermelho, de tipo orgânico, é provavelmente carmim. É um pigmento de origem natural proveniente de certos insectos. A sua espessura é aproximadamente de 9 mm. Por último o azul, à base de pigmento de azurite (CuCo3. Cu (OH)2. é um pigmento cristalino de origem mineral natural. O aglutinante utilizado é de origem proteica.

Fotografia

Toda a documentação fotografia realizado, foi executada na Escola de Tecnologia e Gestão de Tomar sobre a responsabilidade do Dr. Antônio Ventura e Dr. Victor Gaspar .Nas de luz visível realizamos; fotografia a preto e branco e a cores e de luz rasante. As duas primeiras tiveram como objectivo documentar fotograficamente os quadros, a de luz rasante também chamada de luz tangencial, Realizou-se este tipo de fotografia nas três tábuas, tanto pela frente (zona polícroma) como pela parte de trás, onde se pode observar na parte policromada, destacamentos bem mais extensos do que aqueles que aparentava, com especial destaque para a tábua de S. Cipriano, e na parte anterior, tornaram-se mais visíveis as marcas da serra utilizada no corte das tábuas bem como da enxó.

No caso das três tábuas em estudo sabíamos que duas delas tinham sido repintadas na totalidade, a de S. Pedro e S. Paulo, quanto à de S. Cipriano, não sabíamos se teria havido algum repinte ou alteração. Após a exposição aos ultravioletas constatámos que esta última tábua, não tinha repintes nem qualquer outro tipo de alteração, nem se detectou nenhuma inscrição oculta. No quadro de S. Cipriano pretendíamos observar o desenho subjacente e a existência, eventual, de algum repinte, só que através deste processo (Infra vermelho) isso não se verificou.

Nos quadros de S. Pedro e S. Paulo, ao realizarmos a fotografia de infravermelho, e uma vez que eles estavam repintados, procurávamos poder vislumbrar a pintura original, o que se veio a concretizar apenas no ladrilhado do chão, e nos lados esquerdo e direito de ambos os quadros.

Fotografia de Raio X

No caso das tábuas de S. Pedro e S. Paulo (foram apenas estas radiografadas, no caso de S. Cipriano não se justificava), o objectivo não foi o estudo do suporte, uma vez que este era constituído por uma tábua apenas , sem uniões, nem problemas de maior. Neste caso, utilizou-se a radiografia com o intuito de poder observar a pintura original uma vez que os infravermelhos se tinham revelado infrutíferos, tendo sido este o processo mais revelador. A radiografia não foi total, realizaram-se seis, três em cada um dos quadros, pelo que se escolheram as zonas mais significativas, os rostos, as mãos e os pés. Através deste processo foi possível visualizar a pintura original de excelente qualidade, e as zonas de lacunas, que terão dado origem ao repinte das tábuas uma vez que são bastante extensas. As radiografias permitiram ao restaurador intervir com mais precisão quando se procedeu ao levantamento dos repintes.

Conservação e Restauro dos Quadros

Após a conclusão de todos os exames atrás referidos iniciou-se o processo de conservação e restauro dos quadros pelo suporte, seguindo-se a estabilização das

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ABRACOR - Associação Brasileira de Conservadores-Restauradores de Bens Culturais

policromias, limpeza, colocação de massas e integração das mesmas. A recuperação do suporte esteve a cargo de Luís Carvalho e Miguel Ângelo, e a parte da policromia foi da responsabilidade da técnica de conservação e restauro Eunice Coelho.

O suporte apresentava-se ligeiramente empenado, com algumas fissuras e desagregação do lenho nas extremidades, pouco acentuada nos quadros de S. Pedro e S. Paulo e mais extenso no de S. Cipriano. Este facto deveu-se à acção dos insectos xilófagos. A intervenção pautou-se por um tratamento de desinfestação e prevenção das madeiras. O método utilizado foi o da aplicação através de pincelada, de um produto fungicida- insecticida.

No quadro de S. Cipriano, procedeu-se à consolidação das zonas em que o lenho estava mais fragilizado. Pretendia-se com este processo aumentar a resistência do suporte, uma vez que os insectos xilófagos abriram galerias tornando a madeira pouco resistente e quebradiça. A consolidação consistiu na aplicação de Paraloyd B 72 + solvente (Xilol), na percentagem de 6%, 12% e !8%

Como os quadros de S. Pedro e S. Paulo, haviam sido pregados ao retábulo, na intervenção dos anos quarenta, com pregos de grandes dimensões, estes, foram retirados, uma vez que estavam a provocar a abertura das madeiras e a oxidar. Retiraram-se, também os acrescentos de madeira, de pinho, que se encontravam nos extremos inferiores dos quadros de S. Pedro e S. Paulo que teriam sido colocados a quando da reforma do retábulo.

Quanto ao empeno que se verificava nos três quadros, este foi corregido no quadro de S. Paulo, aquele que apresentava maiores problemas de empeno, foi-lhe feita uma placagem na zona próxima à medula, local onde o empeno se acentuava encontrando-se toda ela fendilhada. Através deste processo, foi possível criar uma zona estável neste local. Nos restantes não houve uma intervenção nesse sentido dado que o empeno não era considerável.

Como referimos anteriormente, este quadro (S. Cipriano), devido ao facto de se encontrar fora do retábulo, numa arrecadação e mal acondicionado, sofreu alguns danos, nomeadamente, destacamentos, lacunas, oxidação de vernizes e sujidades várias. Principiou-se por fixar os destacamentos em todo o quadro com uma coleta (cola animal + água + mel + fel de boi + fenol) através de pincel, seringa e espátula quente. Após a qual procedeu-se à limpeza mecânica com cotonete embebido numa mistura de água destilada + álcool enzimático, que visava remover os vernizes oxidados e sujidades. A limpeza foi controlada através de uma lupa, que permitiu uma limpeza homogénica da camada de protecção e sujidades.

Os dois quadros (S.Pedro e S.Paulo) apresentavam-se repintados na sua quase totalidade, devido aos "restauros" dos anos 40. Através da radiografia foi possível verificar que a pintura original tinha lacunas consideráveis e que estava muito fragilizada e gasta, tendo sido necessário um redobrado cuidado com a remoção dos repintes. O produto utilizado foi uma mistura de tolueno + D.M.F. (75% : 25%). Após cada passagem (desta mistura), aplicou-se Isoctano. Todo o processo de levantamento foi observado através de uma lupa para assegurar o sucesso da operação. A fase seguinte consistiu na fixação das policromias segundo o processo já referido no caso do quadro de S. Cipriano.

Iniciou-se a fase de colocação de massas nas lacunas, grandes e em algumas pequenas, visando obter uma altura igual à existente. Procedeu-se ao desengorduramento das faltas com fel de boi, aplicou-se uma primeira camada de massa de caulino líquido (Coleta + Caulino), e após a secagem foram sendo colocadas sucessivas camadas até atingir o nível da restante policromia. O alisamento ou nivelamento das massas foi feito com bisturi e lixa fina, e a eliminação dos excessos foi feita com um algodão embebido em água. Foi um processo difícil e moroso dada a quantidade de lacunas existentes.

A integração tem como objectivo o restabelecimento da leitura e unidade da obra, utilizando uma tonalidade cromática. Obtiveram-se manchas de cor e não a reconstrução da pintura, devido à grande extensão das faltas. Foram utilizadas aguarelas e pigmentos em pó, holandeses, aglutinados em verniz mate. Por fim foi

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aplicado um verniz em spray, para acabamento e protecção da camada cromática

dos agentes de deterioração externos.

A colocação de obras de Arte em espaços não museologicos - Manutenção e Salvaguarda

Ao iniciarmos o processo da recuperação destes quadros, e após a conclusão do mesmo, levantou-se-nos um problema, onde os colocar e em que condições. Certamente que o ideal seria colocá-los num espaço museológico onde as condições fossem as ideais. Contudo foi nossa opinião criar na igreja condições razoáveis para que eles pudessem voltar ao seu local de origem e desta forma não privar a população local do seu patrimônio..

Optou-se por não voltar a colocaálas no lugar uma vez que na zona do altar mor existe uma janela que permite uma incidência de luz directa sobre os quadros. Por sua vez, é habitual colocarem num suporte por baixo dos quadros, vasos de flores, o que iria provocar derrames acidentais de água sobre os quadros e riscos originados pelos vasos, etc. A melhor solução encontrada foi recolocá-los na nave da igreja, numa parede onde não se verificam problemas de humidades, sendo que a dita parede não dá directamente para o exterior, e não havia nenhuma janela de frente. Por sua vez , as pinturas ficaram num local bem visível. Para evitar o contacto directo das pinturas com a parede e salvaguardar que as tábuas sofressem empenos graves, foram feitas molduras para os quadros, criando assim uma caixa de ar entre as tábuas e a parede, uma vez que, o que fica em contacto directo com a parede são as moduras. Na zona de caixa de ar foi colocado lã de rocha, e esta (caixa) foi fechada com aglomedado marítimo, a parafusos, sendo esta furada em diversas zonas, para permitir a respiração das madeiras.

Os quadros foram colocados a uma altura de 1,90 m do chão, evitando, uma vez que a igreja está aberta ao cullto, que as pessoas pudessem tocar nos quadros e danifica-los. Por sua vez, a esta altura seria bem mais difícil qualquer tentativa de roubo.

Apesar de a igreja ter sido totalmente remodelada, desde o telhado paredes interiores e exteriores, forro, chão e portas, aconselhámos a que se procedessem a algumas medidas cautelares visando a salvaguarda deste patrimônio, que foram: a existência de extintores portáteis dentro da igreja, reforço suplementar das portas e janelas, colocação de detector de incêncios e alarme contra intrusos, fechamento a igreja fora das horas de culto, e verificar se não ficou ninguém no seu interior a quando do seu fecho.

Este tipo de medidas não são onorosos, são fáceis de instalar e de realizar, evitam roubos e gastos excessivos em restauros. Permitem também que as populações tenham uma maior consciência sobre o seu patrimônio, e permite-lhes uma intervenção mais directa na sua manutenção.

Conclusão

Foram apontados aqui alguns aspectos que consideramos pertinentes e que embora descritos de forma sumária, travaram a degradação das tábuas pintadas. As medidas de conservação preventiva enunciadas podem vir a prolongar a longevidade das pinturas de Vilarinho de Cova de Lua, se forem correctamente cumpridas.

O nosso intento foi, com os escassos recursos técnicos econômicos e humanos de que podemos dispor, coligir e procurar fazer uma localização sistematizada das agressões e a descrição dos tratamentos e medidas de prevenção, alertando sobretudo, para a precaridade destas obras de arte que têm a necessidade de serem sistemática e regularmente tratadas e controladas.

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ABRACOR - Associação Brasileira de Consen/adores-Restauradores de Bens Culturais

Bibliografia

CALVO, Ana, Conservación j restauración, Materiales, técnicas y procedimientos, Ediciones dei Serbal, Barcelona 1997

INSTITUTO, José de Figueiredo, Estudo e Tratamento de Obras de Arte, Exposição Organizada por ocasião do Congresso do I.I.C., Lisboa 1972

ORTI, M. Angustias Cabrera, Los Métodos de Análises Físico-Químicos Ia Historia dei Arte, Universidade Granada, Colección Monográfica, Arte y Arqueologia, Granada 1994

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Abstract

This work aims at showing the delicate process of restoration gone throught by the important and precious collection of gravestones of the Ordem 3a. do Carmo, in Cachoeira, State of Bahia, and also emphasizing the important role played by the community of that city, whose tourist vocation gives priority to the restoration of its valuable historie patrimony which is itself the main motivation of the visitors to that city.

Arte Funerária de Cachoeira Lápides Tumulares da Ordem 3a. do Carmo

José Dirson Argolo Professor e restaurador Instituições de trabalho: Escola de Belas Artes da UFBA e Studio Argolo Antigüidades e Restaurações Ltda. Endereço: Praça Alexandre Fernandes, 26 - Garcia 40100-130 - Salvador (BA) Fone/fax (071) 2376733 E-mail: [email protected]

Antecedentes

FIG.l : Fachada da Igreja da Ordem 3a. do Carmode Cachoeira. A esquerda nota-se compartimentoinferior com o arco fechado, onde se situa o cemitério

FIG.2: Vista lateral do cemitério, antes da remoção daslápides de 1 a 6

A cidade de Cachoeira, tombada, em 1971, pela Secretaria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - SPHAN, quando recebeu o título de cidade histórica, possui um dos mais expressivos acervos artísticos do estado da Bahia. Localizada no coração do Recôncavo Baiano e banhada pelo rio Paraguaçu, tem vista privilegiada, já que do outro lado fica a cidade de São Félix, também possuidora de gracioso casario colonial.

Cachoeira vem, nos últimos 30 anos, investindo maciçamente em seu potencial turístico, como forma de resgatar sua autonomia econômica e de fugir ao melancólico destino a que foram relegadas regiões outrora detentoras de uma rica economia propiciada, então, pela cana de açúcar dos senhores de engenho.

Por outro lado, apresentando um patrimônio artístico-arquitetônico invejável, o êxito dessa empreitada está dramaticamente dependente de ações governamentais e da iniciativa privada, que restaurem suas igrejas, monumentos, casarios e obras sacras, que tanto atraem visitantes e técnicos do país e do exterior.

É estarrecedor o grau de deterioração do patrimônio arquitetônico e o desgaste do monumental acervo sacro de Cachoeira, representado por um grande número de imagens, pinturas, tetos, retábulos, móveis, objetos de ourivesaria, e tc . Entre os monumentos de seu acervo, naturalmente se destaca a Igreja da Ordem 3a. do Carmo, com seu precioso cemitério.

Monumento dos mais primorosos que nos legou a colonização portuguesa, a igreja da referida Ordem é, sem sombra de dúvida, uma das jóias mais raras do barroco brasileiro. Concebida em estilo joanino, correspondente à segunda fase do barroco, engloba também elementos decorativos, típicos do rococó, principalmente os altares laterais da nave e as tampas das carneiras dos irmãos da Ordem Terceira.

Apesar de sua imponência e de seu valor histórico e artístico, é preocupante o estado de conservação de todo o conjunto arquitetônico. São conhecidos os esforços da Irmandade e de toda a comunidade de Cachoeira, incansáveis na reivindicação de recursos de organismos governamentais e privados, para salvar esse magnífico templo.

Com relação às lápides tumulares, objeto deste trabalho, afortunadamente o problema chegou ao conhecimento de Gina Machado, responsável pelo setor de projetos da Fundação Vitae, cuja direção, sensibilizada pela situação daquela coleção, aprovou, em processo de licitação levada a efeito pelo SPHAN, nossa proposta de restauração.

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Sinopse histórica

FIG.3: Vista parcial do cemitério após a remoção das lápides

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FIG.4: Estado de degradação da madeira atacada por fungos. Lápide 3

FIG.5: Processo de parquetagem

O movimento expansionista dos carmelitas na Bahia deve muito ao Frei Manoel de Assunção, que, em 1688, era o vigário provincial da Ordem na Bahia. Em terreno doado pelo capitão João Rodrigues Adorno é iniciada, em 1688, a construção de um convento carmelita em Cachoeira. Devido ao intenso trabalho missionário desenvolvido pelos carmelitas naquela comunidade, angariando, com o passar dos anos, respeito e afeto, não tardou a ser criada a Venerável Ordem Terceira do Carmo, anexa ao convento, tal e qual acontecera em Salvador. Aliás, esse desejo de união em torno de uma agremiação religiosa foi muito comum no Brasil nos primeiros séculos de colonização: era nas ordens terceiras e irmandades que a população buscava ascensão social, além do encaminhamento de suas demandas espirituais. Outro forte apelo eram os sufrágios, que consistiam na celebração de missas que eram rezadas em memória dos irmãos falecidos; numa época em que o medo do inferno era motivo de pavor, a celebração de dezenas de missas era uma espécie de passaporte para o céu.

Além das missas, celebradas com toda a pompa por vários sacerdotes ao som de órgãos, cânticos e muito incenso, diversas instituições, como a Ordem 3a. do Carmo de Cachoeira, garantiam aos irmãos uma sepultura condigna no próprio corpo da igreja. Além de estar "próximo do céu", o sepultamento no interior da igreja era símbolo de status social de que desfrutava a família do falecido. Somente na segunda metade do século XIX, com a propagação da epidemia da febre amarela e da cólera, a saúde pública proibiria o sepultamento no interior das igrejas.

O cemitério da Ordem Terceira foi construído em 1768, na ala lateral direita da igreja, do lado do evangelho, ficando as obras concluídas um ano depois.

O cemitério carmelita e a raridade de suas lápides

O cemitério da Ordem Terceira do Carmo de Cachoeira compõe-se atualmente de 30 carneiras localizadas num compartimento estreito e comprido, sob um teto de forma abobadada. As carneiras são dispostas perpendicularmente à parede, sendo que as mais antigas, em número de 24, estão distribuídas nos dois lados mais compridos do cômodo, cada um com 12 túmulos sobrepostos em 3 fileiras de grupos de 4. As carneiras são coroadas por ricas cornijas de estuque, onde os concheados, bem ao gosto rococó, estão discretamente representados. Em época posterior, segundo o prof. Valentim Calderón, foram acrescentadas mais 6 sepulturas, com o fechamento da grande arcada então existente num dos lados menores do cômodo e que funcionava como fachada e hoje ostentando apenas 2 óculos ovalados. Estas últimas carneiras também são coroadas por cornijas, porém mais bem mais elaboradas, com decoração nitidamente rococó, sobressaindo-se os concheados.

De grande interesse, pela sua beleza e raridade, são as tampas de madeira que cobrem as sepulturas, possivelmente únicas em seu gênero no Brasil, em número de 29 (uma desapareceu), confeccionadas em vinhático e ricamente pintadas a tempera. A decoração das lápides é bem ao gosto rococó, com curvas e concheados de vários modelos, apresentando, na parte central de cada uma, ondem existem alegorias funerárias, uma frase latina escrita em letra negra sobre fundo claro. Graças à colaboração de D. Gregório, do Mosteiro de São Bento da Bahia, obtivemos a tradução das frases latinas, das quais selecionamos as seguintes:

Todos morremos, como as ondas da praia Apenas nasceu o feno, secou e a flor logo caiu Foi nas trevas que armei a minha cama O sol nasce e morre Não te alegres por que caí, surgirei mesmo sentado nas trevas Vão para o mesmo lugar o rico e o pobre Hoje sou, amanhã não

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FIG.6: Camada pictórica apresentando sujidades e manchas provocadas por umidade descendente. Lápide 6

FIG.7: Processo de limpeza da camada pictórica, vendo-se a parte central e extremidades já limpas.Lápide 6

As alegorias necessitam de pesquisa apropriada, para serem perfeitamente interpretadas, e vão desde figuras humanas, como Adão e Eva comendo o fruto proibido, a fênix ressurgindo das cinzas, árvores decepadas por raios, esqueletos humanos, astros, e tc . Chama a atenção a ausência dos nomes dos mortos, acreditando o prof. Valentim Calderón que eram destinadas unicamente a conter corpos por pouco tempo, até o desaparecimento das partes moles, quando os ossos eram retirados para um local definitivo.

Em madeira pintada, quando o normal era serem feitas de pedra ou mármore, essas lápides tumulares representam - repetimos - uma parte importante de nosso patrimônio cultural e artístico e são, sem dúvida, a mais importante coleção de arte funerária de nosso estado e, quiçá, brasileira.

Identificação

. Título: Lápides tumulares

. Quantidade: 29

. Autoria: Desconhecida

. Época: 1768

. Suporte: Vinhático

. Técnica: Tempera

. Dimensões: 60 cm x 168 cm x 2 cm

. Localização: Sepulturas do cemitério da Ordem Terceira do Carmo de Cachoeira

. Propriedade: Ordem Terceira

. Endereço: Praça da Aclamação - Cachoeira (BA)

Análise técnica

As 29 lápides apresentam as seguintes características:

Suporte: Madeira plana, contendo na parte inferior dois ou três contrafortes embutidos. A moldura que lhe serve de arremate é do mesmo material, com largura de 9 cm, pintada de verde, presa diretamente à parede da sepultura. A lápide é presa à moldura através de 4 tranquetas de ferro batido.

FIG.8: Detalhe da parte central já limpa. Lápide 6

Base: Fina, de tonalidade ocre, possivelmente executada com gesso cré e cola de cartila-gem animal.

Policromia:

Tempera e óleo, aplicados a pincel, com predominância das cores marrom, ocre e branco, na parte central. Nas cenas alegóricas surgem os tons vermelho, azul, amarelo e verde. Frisos verdes nas extremidades das lápides, que lhes servem de moldura.

Estado de conservação

Era péssimo o estado de conservação das 29 lápides, todas apresentando problemas semelhantes:

Suporte: O verso das peças apresentava-se inteiramente atacado por fungos, que destruíram boa parte da madeira, reduzindo o seu suporte à metade de sua espessura. A madeira mostrava um aspecto esponjoso e irregular. Esse estado somente foi constatado durante o desmonte das lápides de seus lugares de origem, quando boa parte do suporte se desfez ao removê-las da parede, deixando no chão uma grande quantida-

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FIG.9: Após a obturação das lacunas. Lápide 29

de de pó negro, tipo terra vegetal. Esse pó era proveniente da celulose, lignina e outros componentes da madeira que foi destruída pelos fungos, favorecidos pela umidade ascendente e descendente do local. Quase 50% das lápides estavam comprometidas pelo ataque desses xilófagos. Apresentavam ainda as lápides: Ataques de térmitas em 10% das lápides; empenamentos; contrafortes comprometidos por fungos, necessitando substituição; rachaduras, fissuras esparsas e algumas perfurações; lacunas materiais (perdas de parte da madeira), principalmente nos frisos.

Base: Com boa aglutinação, apresentando, entretanto, lacunas generalizadas de pequeno e médio porte.

Policromia: A camada pictórica encontrava-se totalmente comprometida, principalmente devido ao enegrecimento dos tons, impedindo sua completa leitura. Esse enegrecimento foi provocado pelo acúmulo de sujidades, ataques de fungos e fuligem, uma vez que o local foi utilizado como cozinha durante alguns anos, quando o fogão usado era a lenha. Várias lápides apresentavam manchas provocadas pelo escorrimento de águas pluviais, sendo que, em alguns casos, houve comprometimento da camada pictórica, descolorindo os tons e atingindo a base de preparação. Além desses danos, foram detectadas manchas negras provocadas por fezes de morcegos, excrementos de insetos, arranhões e lacunas generalizadas de pequeno e médio porte.

Ferragens: Totalmente oxidadas, empenadas e com várias peças faltantes.

Intervenções realizadas

FIG.10: Após a restauração. Lápide 29

Supor/?: Foi realizada a imunização preventiva e curativa com a aplicação de K-otrine a 5% no toluoi ou penetrol, através de pincelamento e de seringa hipodérmica. O método foi repetido mais de uma vez, usando-se, em alguns casos, o imunizante associado ao consolidante Paraloid B72. Em seguida, utilizaram-se várias técnicas de consolidação de madeira, dependendo do estado de degradação que cada lápide apresentava. As muito atacadas pelos fungos necessitaram de várias aplicações de Paraloid B72 nas seguintes proporções: 10%, 15% e 18%, para enrigecimento do material lenhoso, que apresentava aspecto frágil e aparência esponjosa. Depois essas peças foram submetidas a uma segunda fase de consolidamento, pelo processo de parquetagem ou preenchimento das galerias com taliscas de madeira de lei e massa feita com pó-de-serra e cola à base de pva ou Paraloid B72 a 20%. Na parquetagem usou-se madeira de cedro em pedaços bem pequenos para evitar o empenamento das lápides. As peças que não apresentavam galerias profundas receberam apenas aplicação do Paraloid, não havendo necessidade de parquetagem. As que apresentavam apenas pequenas perfurações foram consolidadas com massa de pó-de-serra e cera-resina ou pó-de-serra e cola à base de pva. As perdas materiais foram completadas com cedro, tanto as internas com as externas (frisos). Os contrafortes, em sua quase totalidade, foram substituídos por outros, confeccionados em cedro.

Policromia: O tratamento da policromia observou as fases a seguir descritas. 1) A limpeza da camada pictórica, pela sua delicadeza e fragilidade, constituiu-se na fase mais trabalhosa do processo de restauração. Para iniciar a limpeza, foi feito o teste de solubi-lidade da camada pictórica. Depois de testados diversos produtos químicos, puros ou mesclados, foram aprovadas as seguintes fórmulas:

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FIG. l l : Após o restauro. Lápide 15

Fórmula I Isopropanol 90% Amoníaco 10% Água 10%

Fórmula II Isopropanol 50% Amoníaco 25% Água 25%

Fórmula III Diclorometano 50% Formiato de etila 50% Ácido fórmico 2%

2) A fixação da policromia foi feita exclusivamente com Paraloid B72, uma vez que não apresentava sérios problemas de descolamento. 3) Na obturação das lacunas, usou-se massa artesanal feita com gesso cré e cola de coelho. 4) Houve necessidade de aplicação, com pincel e pistola, de fina camada de verniz à base da resina de Dammar, já que a policromia apresentava aspecto bastante fosco, impedindo a leitura estética dos temas representados. 5) Para a reintegração cromática, deu-se preferência à tinta maimeri, diluída com toluol. O desenho de fundo, por ser repetitivo em todas as lápides, foi totalmente reintegrado. As alegorias, por serem individualizadas, somente foram plenamente reintegradas, quando havia uma completa leitura da obra. 6) Finalmente, uma fina camada à base de Paraloid B72 foi aplicada com pistola.

Moldura e friso externo: Foram repintados com tina a óleo, esmalte sintético semifosco, na cor verde colonial.

Ferragens: Foi feita a sua limpeza, para a remoção da oxidação, efetuado t ra tamento antiferruginoso e aplicado verniz protetor à base de resina acrílica.

Conclusão

FIG.12. Após o restauro. Detalhe da lápide 15

A recuperação das lápides tumulares da Ordem 3a. de Cachoeira - únicos exemplares, talvez, da arte funerária do século XVIII, no Brasil - teve como mola propulsora a consciente postura assumida pela comunidade cachoeirense, que vem movimentando suas lideranças para uma atitude mais proativa em busca da proteção de seu singular patrimônio, e que encontrou eco na alta administração da Fundação Vitae, cujo oportuno patrocínio sustou o processo de destruição a que estava submetida aquela preciosidade.

As peças ainda não foram reintegradas ao seu local de origem, o que deverá ocorrer brevemente, e estiveram recentemente expostas no SPHAN/BA, por ocasião da celebração de seu cinqüentenário de fundação. Retornaram à cidade de Cachoeira em junho de 1998, tendo sido expostas à visitação pública no salão do consistório da Igreja da Ordem Terceira , oportunidade em que relatamos à comunidade cochoeirense todas as fases do trabalho de restauração e ressaltamos a necessidade de que a importante e rara coleção conte, doravante, com as salvaguardas conducentes à sua melhor conservação e manutenção.

Participação

As lápides foram restauradas pela seguinte equipe do Studio Argolo - Antigüidades e Restaurações Ltda.: José Dirson Argolo, Cláudia Maria Cerqueira Barbosa, Shirley Santos Alcântara, Jayme Leopoldo Santana, Raimundo Tanajura Machado, Sérgio Luiz Silva Santos e Adailton Conceição Argolo. Os trabalhos foram acompanhados pelos seguintes técnicos do SPHAN/BA: Francisco Santana e Antônio Rangel.

Bibliografia

CALDERÓN, Valentin. O Convento e a Ordem Terceira do Carmo de Cachoeira. Gráfica Universitária da UFBA. 1976.

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Abstract

The oil painting entitled Batalha de Campo Grande (Campo Grande Batde) was the last of Brazilians big dimensions painting 3.31cm x 5.29 cm to be conserved. Pedro Américo, who was one of the famous XIX century Brazilian painters, made the painting in 1871. The problems of conserving a big dimensions painting are always more concerned. This paper intention is to show how a hot plate built for the conservation work of the painting accelerated the conservation process and how the reusing of the old conservation techniques done before in the painting helped to lower the cost of conservation work.

A Restauração da Batalha de Campo Grande P E D R O AMÉRICO -1871

Claudia Regina Nunes Chefe do Laboratório de Conservação e Restauração Museu Imperial, Petrópolis, RJ

Richard E. Trucco - In Memorian Cientista/Restaurador Museu Imperial, Petrópolis, RJ

Em 1993 quando realizamos o grande trabalho de desinfestação do Museu Imperial (Acervo, Palácio e Anexos), retiramos a tela intitulada a Batalha de Campo Grande da parede a fim de verificarmos as condições de seu chassis e de sua moldura, constatamos a necessidade de restaurá-la. A tela foi pintada por Pedro Américo em 1871, é datada e assinada. Aparentemente já havia sofrido várias intervenções e a última delas possivelmente foi realizada» no Museu Imperial em 1949, pois encontramos uma inscrição à lápis no verso do chassis: este quadro foi colocado na parede em setembro de 1949. Além desta inscrição, outros subsídios que conseguimos coletar foram: a informação de que a obra teria sido restaurada por um francês e uma foto preto e branco, na qual os problemas existentes na camada pictórica aparecem com bastante evidência.

A tela teve as bordas laterais e a borda inferior cortadas em uma dessas intervenções. Havia um reentelamento à cola, o qual estava soltando em algumas partes. Apresentava verniz de resina DAMAR muito oxidado, grande presença de fungo, ondulações, pequenas áreas de craquele, vários rasgos e dois cortes com picotes. Um dos cortes possui 70 cm de comprimento e é bem no centro, comprometendo em muito a composição da obra. A única explicação plausível para a realização de tais cortes a nosso ver seria a de que durante o reentelamento surgiram problemas como bolhas e estes forem solucionados através dos cortes e picotes no suporte.

Os cortes possuíam um emassamento o qual estava rachando e soltando. O exame com lâmpada ultravioleta mostrou que o céu havia sido praticamente todo repintado, fato que causou uma grande surpresa para toda a equipe. Entretanto quando a foto preto e branco de 1949 foi encontrada, era visível as áreas de repinturas no céu.

A tela apresentava ainda grandes áreas de perda da camada pictórica, as quais haviam sido retocadas sem serem preenchidas, e as bordas lateral própria direita e inferior própria esquerda foram cortadas. O tecido usado para o reentelamento tinha um corte na forma de um T, o que também marcava a pintura pela frente.

Antes de iniciarmos qualquer intervenção visitamos o Museu Nacional de Belas Artes e o Museu Histórico Nacional, para podermos discutir com os seus respectivos restauradores a restauração que havia sido realizada nas grandes pinturas que os dois museus possuem.

Tra tamento

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Primeiramente a obra foi higienizada com um gel de metil celulose, para removermos a grossa camada de poeira e sujidades que encobria a tela. Iniciou-se então a remoção do verniz utilizando-se acetona e para as áreas de repinturas foi empregado gel de xilol e isopropanol. Após a remoção do verniz oxidado, foi aplicado um verniz de proteção para podermos prosseguir ao faceamento. Verificamos também,

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Anais da ABRACOR - Pintura IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

FIG 1 - Vista gera da tela : A Batalha de Campo Grande (3,31 cm X 5,29 cm)

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FIG 2 - Detalhe do corte central com picotes, emassamento soltando (antes da restauração)

que a infestação dos fungos era maior do que se pensava, e estava concentrada na parte inferior da tela. O surgimento de fungos foi oriundo da umidade existente na sala em que se encontrava a pintura, proveniente de um piso feito com cerâmica sem vitrificação, por onde a infiltração era grande.

Durante toda a fase inicial foram realizadas aferições das condições ambientais da sala com o auxílio de termohigrográfo e dois termômetros e dois higrômetros em diferentes pontos da sala. Para a aferição destes foi elaborada uma ficha e anotações eram feitas durante quatro horários previamente determinados ao dia. O resultado dos gráficos realizados demonstrou o que já era visível na obra, uma UR muito alta além de flutuações muito bruscas durante o dia. A variação da temperatura era sempre mais constante.

A tela foi faceada com metil celulose e papel Wet Strenght, o qual facilitou e agilizou em muito esta etapa, pois pode ser adquirido em metros e possui 1,20 cm de largura. A tela foi deitada em uma cama, e o chassis foi retirado afim de iniciarmos o tratamento do verso, o qual foi completamente higienizado com aspirador de pó; em seguida removemos o reforço de borda que também tinha sido feito com cola, e estava em péssimas condições. O excesso de cola que havia nas bordas foi removido com água deionizada morna e o auxílio de uma escovinha. A princípio, pensamos em remover todo o reentelamento feito à cola. Entretanto, com a vinda de Peter Fodera e Kenneth Needleman ao Brasil por ocasião do sétimo congresso da ABRACOR, e conhecendo suas experiências com pinturas de grandes dimensões, pedimos que assessorassem o trabalho. Após várias análises do tecido usado no reentelamento, inclusive teste de resistência, concluímos que o mesmo estava muito bom e que a camada de cola era tão fina, que não valeria a pena a remoção do reentelamento. Aplicamos adesivo Beva 371, e neste momento o trabalho foi paralisado por um ano e meio, pois a sala aonde a tela estava entrou em obras e não tínhamos outro local disponível para trabalharmos, devido às grandes dimensões da obra.

Construímos um rolo, no qual a tela foi enrolada para ser guardada, o piso foi acolchoado com cobertores, e mensalmente mudávamos a posição do rolo sobre os cobertores a fim de evitar que a tela ficasse com marcas ou rachaduras. Apesar de ter ficado tanto tempo enrolada, a tela apresentou apenas pequenas ondulações.

A planificação, a consolidação do reentelamento e das áreas de rasgos e cortes, e a ativação do adesivo Beva 371 foram realizadas ao mesmo tempo com a placa tér-

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FIG 3 - Borda inferior com retoques diretamente no suporte, não havia emassamento para nivelar a camada pictórica (antes da restauração)

FIG 4 - Detalhe do rasgo que existe na borda própria direita da tela (antes da restauração)

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mica ( lm x lm) construída por Richard Trucco especialmente para estas finalidades. A vantagem da placa é que esta não atinge uma temperatura acima de 750 C ( medidos com termômetro de superfície) e distribui calor por igual além de também possuir um peso único em toda a sua superfície. Começamos a colocar a placa do centro para as bordas e aonde retirávamos a placa, colocávamos peso, permitindo que o local esfriasse sob pressão. A idéia inicial era de usarmos um envelope de mylar e bomba de vácuo para a sucção. Mas não possuíamos mylar o suficiente para cobrir a tela. Esta etapa foi executada em apenas três dias, o que normalmente levaria um a dois meses aproximadamente se fosse realizado com o ferro de reentelar. E ainda correríamos o risco de que em algumas áreas a planificação não ficaria tão perfeita.

O resultado foi estupendo, pois a planificação e consolidação foram perfeitas. Richard Trucco também havia confeccionado para as quais havia confeccionado uma placa de sucção para a planificação das áreas de corte, e não precisamos usá-la. Foi colocado um novo reforço de borda utilizando-se tecido sintético, e o chassi antigo foi tratado e reaproveitado.

O verniz é certamente um dos aspectos mais importantes no acabamento final de pinturas, e os vernizes provenientes de resinas naturais alteram rapidamente através dos anos, requerendo remoções freqüentes, colocando em risco a camada pictórica. Entretanto, o uso de resinas sintéticas estáveis até aproximadamente 100 anos deve ser escolhido com cuidado, porque estas não reproduzem fielmente as propriedades óticas das resinas tradicionais usadas no século XIX. E em uma tela tão grande é muito fácil evidenciar qualquer problema no verniz, tais como: escorridos e excesso de brilho. O verniz de base utilizado foi o verniz ARKON P-90 que possui um índice de refração muito próximo do DAMAR. O verniz Arkon P-90 é um verniz de difícil aplicação e é preciso ter um controle muito grande da pistola. Não sabemos se foi devido a um excesso de cola do reentelamento que possa ter atravessado a camada pictórica, mas houve uma área no centro do quadro em que o verniz ficou totalmente fosco. Resolvemos então aplicar por uma camada fina de paralóide B-72 por cima do verniz de base para equilibrarmos a questão do brilho. O que funcionou muito bem.

Foram feitos enxertos nas bordas e no corte central com linho, o emassamento escolhido após vários testes foi uma mistura de carbonato de cálcio e Beva 371, porque devido a alta umidade relativa em Petrópolis ( 90% a 100% UR em média ) foram os materiais que não demostraram alteração, rapidamente. Com outros materiais que enrijecem rápido, não conseguíamos marcar a textura do linho nas áreas emassadas e além disto rachavam devido a oscilações de temperatura e umidade agindo sobre o suporte. Mais uma vez a restauração foi paralizada durante sete meses por problemas orçamentários.

A reintegração cromática foi realizada com pigmentos, médium para retoque Lascaux, e verniz para retoque da Maimeri. Como verniz final também empregamos uma camada de Arkon P-90 e por último uma camada de paralóide B-72. O chassis "original" apresentou infestação de cupim de madeira seca e resolvemos trocá-lo por um novo. Nesta fase convidamos Edson Motta Júnior para dar assesso-ria do trabalho.

Conclusão

Foi a primeira vez que utilizamos a placa térmica no dorso de uma pintura e realmente o resultado nos surpreendeu, pois além de trabalharmos com muita segurança em relação à temperatura da placa, a infestação de fungos também foi completamente eliminada com a aplicação de calor. O reaproveitamento do reentelamento antigo, foi sem dúvida , um grande ganho não só para a equipe que poupou tempo de trabalho, mas principalmente para a tela que não teve a sua camada pictórica demasiadamente exposta , pois esta já estava bastante fragilizada e talvez a remoção do reentelamento e a raspagem da cola poderiam danificá-la ainda mais. Outro aspecto que nos impressionou foi a versatilidade do adesivo Beva 371 que

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Anais da ABRACOR - Pintura IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

havia sido aplicado há um ano e meio antes e pode ser totalmente ativado, sem prejuízo de suas propriedades. Abstract

Ao todo o trabalho foi realizado em 14 meses, sendo cinco meses de reintegração cromática.. A Geralmente tínhamos apenas duas pessoas trabalharam em cada fase. As maiores dificuldades encontradas ao longo deste período foi o de obter uma equipe coesa, que possuísse o mesmo objetivo: o de realizar o trabalho.

Equipe Técnica

Coordenação Claudia R. Nunes Richard E. Trucco

Asses soria Peter Fodera e Kenneth Needleman Edson Motta Júnior

Restauradores Andréa Pedreira Lucinere Teles

Assistentes Eli Amaral Fernanda Blatt Machado Marco Rezende Sandro Vieira Gomes Silvanir Cândido da Silva

AudioVisual Antônio César Pereira Costa Claudia Regina Nunes

Agradecimentos

Em primeiro lugar, a autora agradece à direção do Museu Imperial nas pessoas das Sras. Maria de Lourdes Parreiras Horta, diretora do Museu Imperial, à Sra. Evelina Grumberg, então Coordenadora Técnica e a Sra. Dora do Rego Correia, pelo apoio fornecido durante a execução do trabalho, e Coordenadora Administrativa, por seus incansáveis esforços em capitação de recursos para a realização deste trabalho. A toda equipe de trabalho, que dedicou-se com todo o carinho, especialmente a Silvanir Cândido da Silva e a Marco Rezende. Aos amigos de todas as horas Peter Fodera e Kenneth Needleman, e Edson Motta Júnior.

Agradecemos à paciência de Antônio César Pereira Costa em documentar todas as etapas do trabalho. E por últímo à memória de Richard E. Trucco, que possuía um intelecto, conhecimentos e criatividade privilegiados, e que sem a sua contribuição possivelmente os resultados não teriam sido os mesmos.

Notas de Referência

1 Peter Fodera e Kenneth Needleman são restauradores norte-americanos proprietários da firma Fodera Fine Arts Conservation em Nova Iorque, e foram discípulos de Gustav Berger. 2 Possivelmente o chassis que o a tela possuía não era mais o original, pois os cortes

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ABRACOR - Associação Brasileira de Conservadores-Restauradores de Bens Culturais

nas bordas laterais são visíveis. Acreditamos que a tela tenha perdido pelo menos 30 cm em cada borda, devido ao comprometimento de alguns personagens.

Bibliografia

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Autores

Claudia R. Nunes é Bacharel em Pintura pela Escola de Belas Artes/UFRJ em 1985. Pós-Graduada em Conservação de bens Culturais Móveis pela Escola de Belas Art e s /UFRJ em 1989, Mestre em Conservação e Restauração de Tecidos e Indumentárias pelo fashion Institute /State University of New York em 1991. Além de ter trabalhado três anos no He Metropolitana Museu of. At, onde ganhou duas Fellowships (Graduate Student-1992 e The Polaire Weissman- The Costume Institute-1992) e por último foi Assis tem Conservator no Upholstery Lab /Objec t s Conservation Department-1993), trabalhou também no Museum of American Folk Art /New York, ATTATA Foundation/New York e Merchant's House/New York. Participou de cursos de especialização de Conservação de Têxteis organizados pela OEA e estagiou no Laboratório de Cons. e Restauração da Fundação casa de Rui Barbosa. Foi presidente da ABRACOR no biênio 92/94. Atualmente, é chefe do Lab. de Cons. e Restauração do Museu Imperial e consultora do Maçaranduba Conservação e Restauração de Arte Ltda.

Richard E.Trucco graduou-se como mestre em Física da Universidad Nacional da Córdoba, Argentina (FaMAF) em 1987. Imediatamente, foi contratado por General Applied Science Laboratories, Ronkonkoma, New York, como Cientista Pesquisador. Ali desenvolveu trabalhos nas áreas de adquirição de dados, análises numérico, diagnóstico da dinâmica e combus tão de fluxos hipersônicos com lasers, processamento de imagens, instrumentação e termometria infravermelha; sendo quase todos estes projetos realizados para a NASA Langley R.C. Possui mais de 27 publicações técnicas. Começou a dar consultoria com Fodera Fine Art Conservation, new York, desde 1990 e a estudar Conservação/Restauração com cursos de pós-graduação (NYU, MIT), etc). Em 1992, abriu uma firma de restauração com o mestre restaurador russo Valerian Yakimov. Em 1994, veio para o brasil com Cientista Pesquisador VisitanteEstangeiro através do CNPq, para desnvolver atividades no Museu Imperial na área de atmosfera controlada e dando assistóencia as atividades de restauração e conservação da instituição. Foi o idealizador e fundador da firma Maçaranduba Conservação e Restauração de Arte Ltda. Faleceu em fevereiro de 1997.

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Abstract Objetos de Devoção: Pesquisa e Restauração

The present work referes to research and restoration of two objects of devotion denominated Conventual oratories with Registo of Saints, belonging to the Museum of the Diamond in the city of Diamantina/ Minas Gerais. The oratories were made by nuns and monks in the century XV and brought to Brazil, especially for Minas Gerais, in the beginning of the century XIX. The research involves the study of the building technology, analysis of the conservation state and the treatament accomplished in the works. It is quite a complicate work, due to complexity of the constituent materiais as wood, paper of the gravura, quills and glass.

±. _ _ 3 4

iÉãl FIG 1 - Oratórios Conventuais antes da restauração

Lucimar Ventorin Bethania Reis Veloso Luiz Antônio Cruz Souza Universidade Federal de Minas Gerais - Escola de Belas Artes Centro de Conservação e Restauração de Bens Móveis — CECOR Av. Antônio Carlos 6627 - 331.270-901 - Belo Horizonte Minas Gerais- Brasil - Tel. / Fax.: (031) 4995375

Introdução

O Oratório Conventual é um objeto artístico de devoção religiosa desenvolvido no interior de conventos por freiras e monges desde o século XV onde imitavam a técnica do filigrana. Sua aparição em Minas Gerais se deu por volta de 1818, quando o Arcebispo de Mariana, Dom João Antônio dos Santos, convidou freiras de Portugal e da França para lecionarem na Escola e Educandário Nossa Senhora da Glória, atual Centro de Geologia da Universidade Federal de Minas Gerais/ESCHWEGE em Diamantina, MG. (FIG.l)

A palavra Oratório, vem do latim "oratorium", que é um lugar para rezar fazendo uma aproximação do desejo do ser humano de pertencer ao Reino Sagrado de Deus. Independente da classe social, todos querem ter junto de si os santos de sua devoção, vendo neles, um prolongamento dos cultos religiosos das igrejas em seus lares. Isto resgata o desejo de miniaturizar o lugar onde ocorre um diálogo secreto entre duas pessoas ou é um momento de confraternização de grupos. Assim, os oratórios surgem como objetos de devoção para os fiéis. A decoração dos oratórios está intimamente relacionada aos estilos das construções religiosas da época. Na ausência de escultura, a gravura cumpria bem o papel de instigar a devoção através da imagem representada por Registo de Santo, que encontramos nas obras em estudo. (FIG.2)

FIG 2-Oratório barroco do Século XVIII resentando características de um ap frontispício barroco.

Tecnologia de Construção

Os Oratórios Conventuais com Registo de Santos são constituídos de moldura, caixa de madeira, papel (gravuras, quills e papel de fundo) e vidro. As duas obras apresentam-se semelhantes na tecnologia construtiva. O que as diferenciam são as representações das gravuras, uma é de São João Batista no Deserto e outra é a Apresentação da Virgem no Templo.

As obras possuem uma moldura de estilo Rococó de cor azul da prússia e suas bordas são em ouro. No interior da moldura encontramos uma caixa de madeira pinus sp., Pinaceae e recoberta de papel pintado com pigmento azul verde terra fixado com cola protéica.

Sobre este papel encontramos a gravura cujo suporte é de fibra de algodão. A técnica da gravura em metal utilizada foi água-forte/buril. A gravura tem as bordas cortadas e emoldurada com "passe partout" de papel com camada pictórica de ouro, que se abrem nos quatro vértices em forma de cantoneiras. Possui um chassi de papel para sustentação fazendo que as gravuras fiquem em alto relevo fixadas no papel de fundo.

Os quills que fazem a decoração do interior da caixa são de papel de algodão e as bordas em ouro. Os quills ficam em redor da gravura. (FIG 3) Esta técnica utilizada na construção das formas de papéis enrolados dos oratórios é muito pouco conhe-

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cida por nós.. Consiste em finas tiras de papel enroladas, com palitos de madeira ou metal proporcionando várias formas como pétalas, olhos, pêras, etc. Essas coladas entre si, formam uma linda renda com 135 formas imitando flores, borboletas e outros desenhos. As obras são fechadas à frente por vidro confeccionado de forma artesanal. No verso de uma das obras possui papéis com referências da obra. As medidas das obras são: 33 x 28 x 3,7cm.

Estado de Conservação

Após exames organolépticos e laboratoriais, determinamos o estado de conservação das obras, através das degradações sofridas causadas por danos biológicos, físicos, químicos e pelo próprio processo de envelhecimento intrínseco aos materiais constitutivos.

"São João Batista no Deserto" (FIG.4): apresentou moldura repintada com apenas sujidades e manchas na camada de ouro. A caixa de madeira estava em bom estado, com pequenas perdas nas bordas posteriores. O papel de fundo apresentava ondulações generalizadas, respingo de material protéico, provavelmente de verniz, com descolamentos e fissuras que acompanham as laterais da caixa. O papel e a camada pictórica da gravura apresentavam ondulações e perdas acompanhando as do suporte que são furos causado por ataque de anobium. O passe partout de ouro da gravura possuía excrementos de insetos, oxidação, rachaduras, perdas e esfoliações. O chassi da gravura se apresentava completamente deteriorado com excrementos de insetos, sujidades, orifícios generalizados e manchas amarelecidas nos quatro cantos posteriores. O papel do quills apresentava-se em bom estado de conservação, com as peças em desprendimentos parcial e apenas três formas de pétalas soltas. Alguns foram atacados por anobium. O vidro estava em bom estado de conservação com apenas sujidades.

"Apresentação da Virgem no Templo" (FIG.5): esta obra apresentou-se totalmente deteriorada principalmente por ataque de microorganismos e insetos. A moldura e a caixa de madeira apresentavam o mesmo estado de conservação da obra

FIG 3 - Disposição dos quills FIG 4 - Gravura de São João FIG 5 - Gravura da Apresentação Batista da Virgem no Templo

2 1 0

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FIG 6 - Todas acima - Estado de conservação dos quills

FIG 7- Estado de conservação da gravura

anterior. A caixa de madeira possuía um orifício posterior pela perda de um nó da madeira. O papel de fundo da caixa apresentou sujidades, alteração cromática causada pela oxidação da tinta, respingos de material protéico, manchas da cola de fixação dos quills, rasgos, abaulamentos, desprendimentos das bordas acompanhando as laterais da caixa e incisões produzidas por objeto cortante provavelmente para demarcação do local de fixação da gravura. Na gravura verificamos excrementos de insetos, principalmente na parte posterior, orifícios generalizados em toda superfície, esfoliações generalizadas, manchas amarelecidas nos vértices, provavelmente por migração da cola pela fixação do passe partout dourado. A camada pictórica da gravura apresentou perdas acompanhando as do suporte, oxidação e manchas. O passe partout dourado apresentava-se com bastante área de perdas, rachaduras, oxidação, orifícios e desprendimentos. O chassi da gravura estava completamente deteriorado. Os papéis dos quills apresentavam-se em péssimo estado de conservação sendo que 85% soltos e atacados por insetos e microorganismos.(FIG 6). Mostravam-se assim friáveis, rasgados, com perdas e manchas amarelecidas, amarronzadas e cinzas. Os tipos de microorganismos encontrados foram: Botrytis sp; Cumularia sp; Botrytis sp, cladosporium sp; Botyitis sp, Penicilium sp. Os clasporium sp são mancharam o papel proporcionando manchas escuras, e os Botrytis Penicilium sp produziram manchas brancas e amareladas. O vidro estava em bom estado de conservação, apenas com sujidades. O papel do verso encontrava-se deteriorado.

Tratamento Realizado

" São João Batista no Deserto " Moldura: Inicialmente foi realizado uma limpeza mecânica com pincel, trincha e metil-celulose. Após esta etapa foi removido mecanicamente a oxidação dos pregos e das áreas enferrujadas. Para evitar continuidade do processo de oxidação foi aplicada uma camada de Paralóide B72 a 10% em xilol,. Foi realizada então, a consolidação das perdas com pó de serragem+PVA : água(l:l). Realizamos exames topográficos, estratigráficos, e verificamos que a pintura original estava conservada, fina e com muitas áreas descobertas possibilitando-nos maior segurança na remoção. A remoção da repintura foi realizada com Tolueno+DMF 75:25 (Masch.Kleiner) e gel de lipase (R.Wolberes). Para a limpeza do dourado usamos Tolueno: + DMF-75:25 (Masch.Kleiner). Em seguida foi realizado nivelamento com carbonato de cálcio + metil-celulose + pva + água. Para a reintegração utilizamos técnica pontilhismo para o dourado e ilusionista para resto da moldura com tinta Maimere per restauro + xilol.

Na caixa de madeira foi realizada limpeza mecânica com trincha, remoção de manchas com metil-celulose, consolidação de perdas do suporte com pó de serragem+pva+agua: 1:1 nas laterais.

No papel do fundo realizamos limpeza mecânica com pincel, fixamos as bordas com as laterais da caixa de madeira usando metil-celulose.

Realizamos a remoção da gravura da caixa. (FIG7) Fizemos a limpeza mecânica com pincel macio e bisturi para remoção, principalmente, dos vestígios do chassi de papel Foram realizados remoção das manchas com metil-celulose, planificação e

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ABRACOR - Associação Brasileira de Conservadores-Restauradores de Bens Culturais

FIG 9

nivelamento dos orifícios com pasta de papel com metil-celulose. Foram confeccionados um chassi e bordas de papel para suporte com 4mm de largura para refixar e nivelar a gravura com os quills, acompanhando a tecnologia construtiva original. A reintegração foi realizada com aquarela e grafite na gravura e no passe partout.

No quills foi realizado limpeza mecânica com pincel e refixação com metil-celulose

No vidro realizamos uma limpeza utilizando água, sabão e álcool.

"Apresentação da Virgem no Templo" O tratamento da moldura, chassi de papel e do vidro foi idêntico ao da obra de São João Batista no Deserto.

O primeira etapa foi a remoção da gravura e dos quills que estavam totalmente atacados por microorganismos e insetos.

Removemos, então, o papel de fundo a vapor quente. Realizamos limpeza mecânica, enxertos, velatura e apresentação estética. Em seguida confeccionamos uma

FIG 10 - Duas Acima - Quills restaurados

FIG. 11 - Obras após a restauração

2 1 2

FIG. 8 - Bordas e chassi de papel fixadas ao papel de fundo para nivelar com a altura dos quills

borda e um chassi de papel para sustentação, fazendo com que as gravuras ficassem niveladas com os quills. (FIG 8)

Na gravura realizamos limpeza mecânica e removemos o passe partout dourado. Executamos limpeza do verso da gravura com metil-celulose e bisturi. Nivelamos os orifícios com pasta de papel de fibras de algodão com metil-celulose. A reintegração foi realizada com aquarela

N o quills realizamos tratamento mecânico para remoção de microorganismos. Utilizamos aspirador de pó elétrico, bisturi, agulha de insulina e pincel. Atuamos com o microscópio esteroscópico. Após a remoção dos microorganismos foi feita uma reencolagem com metil-celulose. Depois desta completamente seca, foi feito nivelamento com pasta de papel de fibra de celulose e metil-celulose. Finalmente a apresentação estética com aquarela.(FIG. 9 e FIG.10)

Na montagem do objeto, após o encaixe de cada parte, utilizamos papel neutro no verso da caixa de madeira e selamos com plástico Poliondas.

Cada fragmento desta obra consumiu uma obra de arte independente. Depois de montada, a moldura, caixa de madeira, papel (gravuras, quills e papel de fundo) e vidro surgiu o Oratório conventual com Registo de Santo objeto de pesquisa e

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Anais da ABRACOR - Pintura IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

restauração. (FIG. 11)

Conclusão

O que verificamos hoje é que Oratórios com Registos de Santos estão de posse das coleções particulares, sendo encontrados poucos exemplares nos Museus. Com a restauração dos Oratórios Conventuais com registo de Santos do Museu do Diamante, conseguimos resgatar a integridade física, estrutural e estética das obras e, principalmente, a divulgação do nosso patrimônio. A obra de São João Batista no Deserto e Apresentação da Virgem no Templo foram submetidas a processos de restauração de acordo com a metodologia atualmente usada pelo CECOR. Assim sendo, as obras poderão novamente exercer suas funções atuais no Museu do Diamante de Diamantina, como obras de arte, com todo seu potencial estético.

Agradecimentos

Agradecemos a Professora Beatriz Ramos de Vasconcelos Coelho, Cristina Ávila, Myriam Ribeiro de Oliveira, Alan Derbyshire, Maria de Fátima Rodriques, Olinto Rodriques dos Santos Filho, Helena Marfiza Ventorim, Antônio Fernando Batista dos Santos, Clébio Maduro, João Cura D'ars, Blanche Thais Porto de Matos, Cláudio Nadalim, IPHAN que contribuíram de forma importante para a realização desta pesquisa.

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Anais da ABRACOR - Pintura IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

Retratos da Coleção de Pinturas "Memórias do Tribunal" -Um Estudo Histórico Comparativo de Técnicas, Materiais e de sua Conservação

Claudina Maria Dutra Moresi Química, Centro de Conservação e Restauração de Bens Culturais Móveis / Escola de Belas Artes / Universidade Federal de Minas Gerais Av. Antônio Carlos 6627, Campus Pampulha 31270-901 Belo Horizonte, MG, Brasil Telefax: (031) 499-5375

Anamaria Ruegger Almeida Neves Conservadora e Restauradora, Centro de Conservação e Restauração de Bens Culturais Móveis / Escola de Belas Artes / Universidade Federal de Minas Gerais

Marcos César de Senna Hül Historiador de Arte, Escola de Belas Artes / Universidade Federal de Minas Gerais

Introdução

Tendo a mencionada coleção merecido um determinante processo de conservação e restauração, seu estudo mais aprofundado tornou-se possível, sendo desenvolvida dentro das atividades didáticas e técnicas do CECOR - Centro de Conservação e Restauração de Bens Culturais Móveis da Escola de Belas Artes da Universidade Federal de Minas Gerais.

A quantidade e a homogeneidade da coleção permitiram estudos comparativos artísticos e técnicos, sempre relacionados à sua conservação. As pinturas estudadas estão indicadas na Tabela I, e são dos pintores Giuseppe Boscagli, Auguste Petit, Carlos Oswald, Gentil Carcez.

Nesta comunicação, o nosso principal propósito é demonstrar, a partir da publicação de alguns dos vários resultados obtidos, a eficácia dessa interdisciplinaridade que promoveu um maior conhecimento da evolução de técnicas pictóricas servindo, inclusive, como material inicial para a formação de um banco de dados referente à História da Pintura Brasileira, no século XX.

Tabela I - P i n t u r a s e s t u d a d a s da coleção " M e m ó r i a do Tr ibuna l " R E G I S T R O *

9 0 4 8 - E 9 0 4 7 - E 9 0 5 0 - E 9 0 5 1 - E 9 0 5 6 - E 9 2 0 4 - E

9 2 0 8 - E 9 2 0 9 - E 9 5 2 8 - E

9 5 2 9 - E

9 0 5 8 - E

9 2 1 1 - E

9 5 2 4 - E

9 0 5 7 - E

9 2 1 0 - E 9 5 2 5 - E

9 0 4 9 - E

9 0 5 2 - E

9 0 5 3 - E 9 0 5 4 - E

9 0 5 5 - E

9 5 2 6 - E

T 1 T U L O

A m a d o r A I v a r c s A r t u r S o a r e s d e M o u r a

F e r n a n d e s R a b e l o A z e v e d o B a e t a J o s é de M a g a l h ã e s A u g u s t o V e l o s o

C a r v a l h o D r u m o n d

O l a v o d e A n d r a d e D a m a s c o B r o c h a d o

C é s a r F r a n c o

E u s t á q u i o P e i x o t o

A l b e r t o L u z

C a r l o s T i n o c o

R e t r a t o

A r q u i m e d e s F a r i a

L i n c o l n P r a t e s F e r n a n d e s T o r r e s

F e r r e i r a T i n o c o G a m a C e r q u e i r a

P a u l a F e r r e i r a

J ú l i o d a V e i g a

A m i n t h a s M a c h a d o A z

A U T O R

A ufiu s te P e t i t G i u s e p p e B o s c a g l i G i u s e p p e B o s c a g l i G i u s e p p e B o s c a g l i G i u s e p p e B o s c a g l i G i u s e p p e B o s c a g l i G i u s e p p e B o s c a g l i

G i u s e p p e B o s c a g l i G i u s e p p e B o s c a g l i

G i u s e p p e B o s c a g l i

C a r l o s O s w a l d

C a r l o s O s w a l d C a r l o s O s w a l d

G e n t i l G a r c e z

G e n t i l G a r c e z G e n t i l G a r c e z A n ô n i m o A n ô n i m o

A n ô n i m o

A n ô n i m o

A n ô n i m o

A n ô n i m o

• N - de Registro no C E C O R

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Análise histórica e estilística

FIG I — Retrato de Fernandes Torres (Anônimo). Frente, antes da restauração. Coleção "Memórias do Tribunal", Belo Horizonte, MG.

FIG II - Retrato (Gentil Garcez). Frente, antes da restauração. Coleção "Memórias do Tribunal", Belo Horizonte, MG.

Desde que a Fotografia foi inventada, na primeira metade do século XIX, a Pintura perdeu definitivamente a exclusividade de representar a natureza a partir de regras e padrões que produzissem um sentido de verdade garantido pela beleza. Entretanto, desde sua reabilitação no século XV, o culto à individualidade permanece, avançando inclusive pelo século XX, em diversos setores da sociedade ocidental.

Enquanto gênero específico da Pintura, o retrato definiu, durante cinco séculos, um espaço de representação simbólica e política exclusivamente endereçado a príncipes, aristocratas em geral, dignatários do clero assim como a ricos comerciantes, banqueiros, intelectuais e artistas, imortalizando pessoas privilegiadas ou tidas em alta estima pelas comunidades.

De todo modo, o gênero em si serviu sempre como dispositivo de afirmação na esfera pública, onde seus protagonistas se fazem retratar, desejosos de explicitar seu elevado nível social como valor individual autônomo, consolidando, desta forma, o culto à aparência condicionada ao "olhar público". Entre os vários tipos, o retrato de meio busto tornou-se o mais freqüente, sendo a vista de três quartos o sub-tipo historicamente mais celebrizado.

No caso da coleção aqui estudada, além de confirmarmos a recorrência deste sub-tipo em exemplos como os de Ferreira Tinoco e Fernandes Torres (Fig. I), podemos constatar em alguns a presença da vista frontal que apresenta o olhar do retratado dirigido ao observador, como nos casos de Amador Alvares e Eustáquio Peixoto (Fig. III).

A coleção obedece a uma fórmula invariável na construção da digna e circunspecta imagem, própria aos juizes. Além da sistemática utilização de meio busto, o fundo neutro e indefinido é recurso padronizado desde os tempos de Ticiano e Anthonius Mor.

Sendo obras produzidas entre o final do século XIX e o início do XX, é curioso notar a contaminação figurativa desses retratos pela imagem fotográfica, o que confirma a prática, difundida desde os Impressionistas, de se utilizar a Fotografia como fonte para a Pintura.

Apesar desta conformidade, na análise da fatura pictórica pode ser inventariada uma sutil diversidade estilística através da qual poderíamos esboçar uma primeira ordenação cronológica determinada a partir da forma.

Começamos com os retratos de Ferreira Tinoco e Fernandes Torres (Fig. I) que, através de uma pincelada mais condicionada ao desenho indica uma filiação com a Academia do século XIX. Já na pintura feita por Gentil Garcez (Fig. II), a naturalidade se impõe como elemento iconográfico, refletindo uma maior informalidade da pincelada que se amplia no retrato de Aminthas Machado, tornando-se finalmente a principal característica no de Eustáquio Peixoto (Fig. III), onde a fatura modernista é uma evidência.

É importante ressaltar o valor de coleções desta natureza já que, a partir de parâmetros fixos de padronização, o historiador de arte, o restaurador e o químico podem desenvolver pesquisas não apenas ligadas à materialidade física e técnica do objeto artístico. Este conjunto nos apresenta uma grande riqueza de resíduos que desvelam questões históricas, políticas e sociais inerentes à mentalidade que engendrou e geriu este específico espaço da representação.

Restauração das pinturas "Memórias do Tribunal"

O objetivo deste trabalho é apresentar a restauração de vinte e duas pinturas, retratos pintados em diferentes épocas e por diferentes artistas mas, que fazem parte de uma coleção. Nesse conjunto de obras foi possível fazer as restaurações, desenvolver atividades didáticas que permitiram comparações e, consequentemente, análises e conclusões. As obras foram restauradas durante os anos de 1990 até 1995.

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FIG III - Retrato de Eustáquio Peixoto ( Carlos Oswald). Frente, antes da restauração. Coleção "Memórias do Tribunal", Belo Horizonte, MG.

a) Identificação das obras como um todo. As obras são retratos de Juizes do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais que abrangem um período do final do século passado até a década de 50 do atual. Os pintores são os seguintes:

Auguste Petit — final do século passado até primeira década do atual. Giuseppe Boscagli - décadas de 20 e 30. Carlos Oswald (Fig. III) - década de 40. Gentil Garcez (Fig. II) - década de 50. Todas têm em comum a técnica óleo sobre tela. Os tamanhos são padronizados,

dependendo da época, diminuindo quando mais recentes. O formato das telas é retangular (Fig. I e II) mas, é nítido ter havido uma moldura que apresentava o retrato em forma oval (Fig. III).

b) Análise do estado de conservação. Todas as pinturas foram retiradas de suas respectivas molduras e foram guardadas diretamente sobre o chão, em local inadequado. Isso provocou intensa deterioração das bordas inferiores, inclusive muitas pinturas foram catalogadas como anônimas pois, o local onde provavelmente estariam as assinaturas, estava com várias perdas da camada pictórica (Fig. I).

Outra deterioração comum das obras, como um todo, foi o vandalismo. Várias apresentavam rasgos provocados por golpes e furos nos olhos das pessoas retratadas. Sabendo-se que os retratos são de Juizes, acredita-se que as agressões foram feitas por pessoas julgadas por eles.

Cada uma delas apresentava também deteriorações específicas, como craquelês, desprendimentos da camada pictórica, vernizes oxidados.

Mas foi a má conservação a causa principal do estado em que se encontravam as pinturas, pois permitiu a retirada indevida das molduras (não foi possível encontrá-las), os atos de vandalismo e as fortes deteriorações nas bordas inferiores.

c) Tratamento realizado. A maioria das pinturas necessitou de consolidação do suporte (tela) através de reentelamentos. Esses foram realizados com diferentes técnicas e materiais, de acordo com a pintura e, também servindo de material didático para os alunos do Curso de Especialização. Foram portanto realizados reentelamentos com pasta de farinha, cera/resina, emulsão acrílica (Primai ou Plextol) e BEVA.

Muitas pinturas apresentavam problemas de perdas e desprendimentos da camada pictórica e da base de preparação sendo, portanto, necessário fazer a consolidação através da refixação, onde teve-se, também, a oportunidade da utilização de vários adesivos. Esta atividade permitiu uma avaliação de técnicas e materiais.

Como material didático as pinturas foram restauradas pelos alunos do Curso de Especialização, sob a coordenação da Profa. Beatriz Coelho, como responsável pela disciplina "Res tauração de p in tura I" , quan to às etapas de consol idação (reetelamentos, refixações), e por mim, como responsável pela disciplina "Restauração de pintura II", onde os aspectos relativos à apresentação estética como, remoção de verniz oxidado, nivelamentos, reintegrações pictóricas, foram realizados.

Durante essa etapa da restauração foi possível desenvolver um estudo sobre o tão desejado equilíbrio entre a apresentação estética de uma obra de arte e a sua história. Enunciado de Brandi: "ei momento metodológico dei reconocimiento de Ia obra de arte, en su consistência física y su doble polaridad estética y histórica en orden a su transmision ai futuro", que todos nós restauradores temos conscientemente em nosso conhecimento teórico, facilmente absorvido e compreendido mas, que se torna difícil quando se está com o pincel na mão. Momento esse em que imagem e objeto se fundem.

Enfim essa série de pinturas permitiu estudos variados, inclusive de seus materiais constitutivos, permitindo iniciar um tão desejado banco de dados sobre a pintura brasileira na primeira metade desse século.

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Materiais e técnicas das pinturas "Memórias do Tribunal"

A análise científica dos materiais constitutivos da obra de arte vem contribuir na caracterização dos suportes, tintas e técnicas utilizadas em uma determinada época, por uma escola e /ou em uma região específica. Este estudo vem a proporcionar informações sobre uma possível origem e evolução destes materiais e comparar com aqueles disponíveis na época. Na coleção "Memória do Tribunal", as pinturas apresentam técnica a óleo sobre suporte de tecido, técnica característica da época de sua feitura - final do século XIX e século XX. Considerando a época das pinturas, preocupamos em analisar a preparação e o suporte, na tentativa de verificar a substituição de materiais tradicionais por aqueles novos disponíveis no mercado para artistas.

Amostras de tecidos, removidas nas bordas da pintura (cerca de lcm) foram limpas. Após separação da trama e urdidura do tecido, foram montados cortes logitudinais das fibras e suas características morfológicas foram observadas ao microscópio (aumento 100 a 400X). Em algumas fibras foram realizados testes físicos para confirmação de sua natureza. A encolagem, camada geralmente de cola aplicada sobre o tecido com a função de impermeabilizá-lo, foi estudada através da análise por microscopia ótica da pintura (aumento 10 a 40X) e do corte estratigráfico (aumento 100 a 400X). O corte estratigráfico contém um pequeno fragmento com todas as camadas da pintura. A constituição da cola usada como encolagem foi determinada através da microquímica, técnica de análise que utiliza pequena quantidade de amostra para testes químicos. A preparação é a camada responsável em preparar o suporte e proporcionar luminosidade à pintura. A sua constituição foi determinada através da análise de micro-amostras por microscopia ótica e microquímica. Amostras montadas em cortes estratigráficos foram analisadas por microscopia eletrônica acoplada ao detetor de energia dispersiva de raios-X, técnica que permite identificar em cada camada de pintura, os elementos químicos presentes e quantificá-los por análise semi-quantitativa. A difração de raios-X, técnica que identifica a forma cristalina dos materiais usados como pigmentos foi usada nas amostras de preparação coletadas em maior quantidade. Os resultados da análise da preparação encontra-se na Tabela II.

Tabela ü -CODIGO 9048-E 9047-E 9050-E 9051-E 9056-E 9204-E 9208-E 9209-E 9528-E 9529-E 9058-E 9211-E 9524-E 9057-E 9210-E 9525-E 9049-E 9052-E 9053-E 9054-E 9055-E 9526-E

- Resultados das análises do suporte AUTOR Auguste Petit Giuseppe Boscagli Giuseppe Boscagli Giuseppe Boscagli Giuseppe Boscagli Giuseppe Boscagli Giuseppe Boscagli Giuseppe Boscagli Giuseppe Boscagli Giuseppe Boscagli Carlos Oswald Carlos Oswald Carlos Oswald Gentil Garcez Gentil Garcez Gentil Garcez Anônimo Anônimo Anônimo Anônimo Anônimo Anônimo

SUPORTE Linho Linho Linho Linho Linho Linho Linho Linho Linho Linho Algodão Juta/algodão Linho Algodão Algodão Algodão Linho Linho Linho Linho Linho Algodão

e da preparação PREPARAÇÃO Branco de chumbo e litopônio * Branco de chumbo, zinco, carbonato de cálcio Branco de bário, zinco, carbonato de cálcio Branco de chumbo, bário, carbonato de cálcio Branco de chumbo, zinco, carbonato de cálcio Branco de zinco, carbonato de cálcio Branco de chumbo, carbonato de cálcio Branco de zinco, carbonato de cálcio Branco de chumbo, zinco, carbonato de cálcio Branco de zinco, carbonato de cálcio Litopônio, carbonato de cálcio Branco de zinco, carbonato de cálcio Branco de titânio, chumbo e carbonato de cálcio Branco de zinco, carbonato de cálcio Litopônio, carbonato de cálcio Litopônio, carbonato de cálcio, branco de titânio Branco de chumbo, carbonato cálcio Branco de chumbo, litopônio e gesso Branco de chumbo, litopônio e gesso Branco de chumbo, litopônio e gesso Branco de chumbo, litopônio e gesso Branco de zinco, carbonato cálcio

! preparação de cor cinza

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As pinturas de August Petit e Giuseppe Boscagli, do final do século XIX e início do XX, usam como suporte o tecido em linho impermeabilizado com cola protéica para receber a camada de preparação oleosa. Nas pinturas de Carlos Oswald (Fig. III) e Gentil Garcez (Fig. II), das décadas de 40 e 50, o suporte utilizado é o tecido de algodão, sem camada de encolagem e preparação oleosa. Em uma das pinturas de Carlos Oswald, ele usou o tecido com trama e urdidura diferentes: algodão e juta.

A preparação de todas as pinturas estudadas é oleosa sendo que sua constituição varia de acordo com a época. O branco de chumbo, pigmento usado desde a antigüidade e de grande importância na história dos materiais artísticos, é ainda encontrado na preparação ou em camada branca sobre a preparação nas pinturas do século XIX e início do XX. O carbonato de cálcio e o gesso são cargas comumente usadas em bases de preparações. Nas pinturas das décadas de 40 e 50 o branco de chumbo foi substituído pelos pigmentos (Gettens & Stout, 1942):

branco de zinco, descoberto em 1782 e usado na Europa e EUA no final do século XVIII e XIX;

litopônio, pigmento artificial constituído de sulfeto de zinco e sulfato de bário, descoberto em 1874;

branco de titânio, usado em pinturas a partir de 1919. Considerando os resultados obtidos, concluímos que as pinturas anônimas (Fig.

I) que apresentam o linho como suporte e o branco de chumbo como preparação são do final do século XIX e inicio do XX. A pintura anônima em algodão e branco de zinco foi pintada a partir da década de 40.

Nas pinturas das décadas de 40 e 50 encontramos o uso do suporte em algodão, em substituição ao tecido de linho impregnado com encolagem protéica para receber a preparação oleosa.O branco de chumbo foi utilizado como preparação até o início do século XX, sendo substituído pelo litopônio e branco de zinco.

O estudo dos materiais constitutivos das pinturas da coleção "Memórias do Tribunal" permitiu estabelecer a época de substituição de materiais usados como tecido e preparações nas pinturas, contribuindo para datação, e fornecendo informações para as análises histórica e estilística e estudos de conservação e restauração.

Bibliografia

BRANDI, C , 1989. Teoria de Ia restauration. Madrid, Alianza Editorial. GETTENS, RJ. & STOUT, G L . 1942. Painting materiais; a short encjclopaedia. New

York: D. Van Nostrand.

Resumo dos autores

Claudina Maria Dutra Moresi — Doutoranda em química pela Universidade Federal de Minas Gerais, Brasil. Estágio de aperfeiçoamento (1986/87) e trabalho de pesquisa (1991 e 1996) nos laboratórios científicos do Institut Royal du Patrimoine Artistique, Bélgica. Envolvida na análise de materiais têxteis, técnicas e materiais pictóricos de pinturas e esculturas policromadas no Centro de Conservação e Restauração de Bens Culturais Móveis da Escola de Belas Artes da Universidade Federal de Minas Gerais, desde 1981. Anamaria Ruegger Almeida Neves - Professora do Departamento de Artes Plásticas e do Curso de Especialização em Conservação/Restauração de Bens Culturais Móveis da Escola de Belas Artes da UFMG, desde 1988. Coordenadora de trabalhos de restauração no CECOR/EBA/UFMG. Especialista em Conservação/Restauração pela UFMG. Estágio no exterior nos atelieres do "Los Angeles County Museum of Art" de janeiro a setembro de 1998.

Marcos César de Senna Hill - Professor do Departamento de Artes Plásticas e do Curso de Especialização em Conservação/Restauração de Bens Culturais Móveis da Escola de Belas Artes da UFMG, desde 1994. Mestre e doutorando em História da Arte pela Universidade Católica de Louvain - Bélgica.

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O Convento de Nossa Senhora da Visitação de Vila Verde dos Francos - A conservação e o restauro da pintura mural do Convento de Nossa Senhora da Visitação de Vila Verde dos Francos - Estremadura - Portugal

Dra Maria João Nunes de Albuquerque Mestranda da Faculdade de Letras de Lisboa Instituto de História - Departamento de História da Arte Rua Tristão Vaz, n° 12, 2o Esq. 1400 Lisboa Portugal Telefone: 01- 3010458 Fax:01-3520569

1 - Metodologia a utilizar em intervenções no Edifício

Na concepção e elaboração deste projecto foram considerados três princípios que, a nosso ver, são o fundamento de qualquer projecto de intervenção de conservação, restauro e reabilitação do edifício: o princípio da interdisciplinaridade, da veracidade histórica e do projecto aberto. O diagnóstico minucioso das necessidades do Edifício deve contar com o trabalho de pesquisa e estudo de vários especialistas em diferentes áreas do saber, nomeadamente historiadores da arte, engenheiros civis, químicos e físicos, arquitectos, arqueólogos e técnicos de conservação e restauro, entre outros. A reabilitação do edifício passará, como está definido na Carta de Veneza de 1964, pela reposição da autenticidade dos espaços e dos elementos arquitectónicos originais, através da clarificação destes com as várias épocas de construção, eliminando todos os anexos que não tenham valor histórico ou formal. Quando se apresentem, na estrutura do edifício, vários momentos de intervenção sobrepostos, deve prevalecer sempre o elemento com maior valor. A intervenção não deve cingir-se apenas às propostas definidas no projecto, devendo este alterar-se sempre que surjam novos elementos a ser conservados, pelo que o projecto iniciado é um projecto aberto até à conclusão da intervenção/intervenções a realizar.

2 - Levantamento dos factores de risco e análise do enquadramento ambiental do edifício

Como qualquer outro ser vivo, o Edifício inicia o seu processo de degradação no próprio momento em que é construído. Torna-se assim fundamental fazer o levantamento e gestão de todos os factores de risco, sejam eles naturais ou antropogénicos, intrínsecos ou extrínsecos ao objecto, de acção rápida ou lenta. A análise do ambiente em que o Convento de Nossa Senhora da Visitação está implantado, levou-nos a considerar os seguintes aspectos:

a)- Factores de relevo

O Convento está situado na Cordilheira de Montejunto, limitada a NW pela bordura calcária meridional do vale tifónico de Óbidos e da serra d' El Rei, a W NW uma larga faixa de jurássico superior e de crestácio inferior. No centro e com orientação NE-SW, a dobra anticlinal da serra de Montejunto com os seus prolongamentos laterais e na parte oriental pelo bordo ocidental da bacia terciária do Tejo. O solo é constituído por argilas cinzentas muito arenosas, com delgadas intercalações de grês calcário, passando, para leste, a um conglomerado de calhaus rolados com cerca de

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0,30m de diâmetro. A ESE do Convento, os grês passam gradualmente para recifes calcários. A identificação de alguns tipos litológicos utilizados na construção do edifício, com os descritos na carta geológica do Bombarral, sobretudo em relação à construção das paredes exteriores parece indicar-nos que, pelo menos as zonas menos nobres do edifício, foram construídas com rochas vindas de pedreiras situadas na região.

bj-Clima 1 - A pluviosidade A pluviosidade influencia grandemente o clima da serra de Montejunto e área envolvente do Convento. A análise do quadro apresentado sobre a variabilidade pluviométrica mensal da estação metereológica mais próxima, o Cabo Carvoeiro revela que a fraca variabilidade de precipitações inter-mensal vai originar uma larga faixa de uma ambiência húmida quase constante. Apenas o mês de Julho é um mês seco.

2 - O vento O vento vai contribuir como um dos factores abrasivos mais importantes na modificação do relevo, vegetação e patrimônio edificado. Foram considerados os períodos de Novembro a Junho e de Junho a Outubro. A medição da observação foi realizada às sete horas da manhã e às treze horas. A leitura dos quadros evidencia os rumos W, NW e N, com uma percentagem que, na maior parte dos meses, atinge velocidades médias entre os 20 e 30 km/h . As influências orográfica e topográfica influenciam directamente a direcção dos ventos. A orientação e altura das arribas onde se situa o Convento vai contribuir directamente para os fenômenos físicos de degradação do edifício.

3 - As gotas de ar frio no ritmo e repartição das chuvas e humidade relativa Os índices de pressão atmosférica são muitas vezes condicionados pela influência de circulação das massas de ar polar perturbada de Oeste e a dos anticiclones tropicais. No recenciamento das gotas de ar frio, originadas pela variação da humidade com a altitude, analisadas pelos mapas sinópticos diários do Boletim Metereológico Português, levam-nos a concluir que são elas as grandes responsáveis por factores como a condensação e a humidade relativa.

4- Regime de insolação e radiação solar Existe uma relação muito estreita entre os factores acima referidos, a ocorrência de nevoeiro ou de nebulosidade e o número diário de horas de sol, valores que são factores importantes a considerar na medição das oscilações bruscas de humidade relativa que degradam a matéria. A quantidade e a qualidade da luz e sobretudo das radiações ultravioletas e infravermelhas é também um factor de degradação importante e irreversível, com efeitos de incidência cumulativos.

5 - A temperatura Verifica-se, depois de analisados e tratados os dados sobre a temperatura máxima média, média e mínima média mensal e anual do ar das estações citadas, que há fraca amplitude térmica durante o ano na zona envolvente do Convento. A amplitude entre as temperaturas máximas e médias é causa de processos de mudanças de estado dos sais que se encontram dissolvidos nas rochas, provocando a sua degradação ou até destruição. Pela mesma razão é relevante ter em conta os dados relativos à formação de geada e o ponto de orvalho que, nesta região não têm expressão.

3 . Pressupostos constituintes do edifício

O exame a olho nu dos materiais de construção e a forma arquitectónica do edifício são dos primeiros exames a ser feitos ao Edifício. As condições térmico-dinâmicas

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apresentadas vão criar nanoclimas, quer no eixo vertical quer no eixo horizontal na área construída e alterar a estrutura física e química do mesmo.

a)- Os nanoclimas da sala do capítulo

A sala do capítulo do Convento implantada numa área de 11 m2 apresenta patologias diferenciadas que passamos a enumerar. O seu interior, à sombra durante quase todo o ano, está sujeito à água da chuva e à ascensão da água subterrânea, factores que vão acelerar o processo de lascagem, esfoliação e meteorização da pedra calcária. Os ângulos das paredes têm a cerca de l,5m do solo, um trabalho em baixo-relevo maneirista em forma de concha. Pela exposição que têm às condições climatéricas, atmosféricas e ambientais, apresentam patologias diferentes. Os concheados situados nos ângulos virados a N e S não sofreram muita erosão dos ventos que têm uma direcção N-S. A vegetação quebra também a força do vento. No Inverno, a evaporação não se faz, provocando o aparecimento de fungos, algas, bactérias e líquenes. Os cantos W e E que são permanentemente fustigados pelos ventos NW e N, devido ao fenômeno de evaporação não apresentam actividade biológica. É curioso reparar que aqui é a erosão o fenômeno que mais se evidencia.

4. A importância da reversibilidade das técnicas e materiais utilizados na conservação do patrimônio

0 conhecimento dos materiais e técnicas empregues conservação e restauro de bens patrimoniais, móveis ou imóveis, bem como das transformações que ocorrem depois da sua concepção, quer por envelhecimento, quer por degradação, alterações ou restauros é de grande importância para os responsáveis ou paa os técnicos que nele vão intervir. É nossa intenção, no entanto, deixar bem claro que se devem utilizar prioritariamente métodos e tratamentos que sejam reversíveis, preferindo, em casos em que a degradação imponha outros, aqueles que não alterem a composição química da estrutura dos materiais.

1 .Factores de deterioração

A água Dos factores que mais contribuem para a degradação da pintura mural, a água é certamente o mais importante. O fenômeno concretiza-se pela infiltração de águas meteóricas. Uma outra forma é a ascensão da água por capilaridade ao longo da estrutura da parede até uma certa altura, fenômeno que varia ao ritmo e sucessão das estações do ano, dando origem ao fenômeno visível de erosão. Menos facilmente individualizável, é o fenômeno de condensação, porque tem características muito semelhantes às das infiltrações. Esta verifica-se quando a parede pintada está mais fria do que o ar que circula naquele espaço e que, com certas condições de luz, leva ao aparecimento de pingos dispersos na superfície. A água produz, a longo prazo, danos irreversíveis na pintura mural, alteração dos pigmentos e camadas de protecção, formação de sais com características pulverulentas ou estratiformes, destacamentos da camada pictórica, desagregação do reboco, ataque dos agentes biológicos.

1 .Precipitação, evapotranspiração e condensação atmosféricas

A quantidade de precipitação que efectivamente atinge a superfície do solo depende em grande parte da natureza e densidade da cobertura vegetal ou da existência de cobertura artificial, caso dos edifícios, estradas, etc. Esta cobertura, natural ou artificial, intercepta parte da água precipitada e armazena-a temporariamente na superfície. A vegetação constitui o primeiro nível de armazenamento encontrado pela precipitação que caiu sobre a bacia hidrográfica predominantemente agrícola, como se apresenta na figura. A quantidade de água interceptada depende das características da precipitação, das espécies, idade e densidade da cobertura vegetal e da estação do ano. A maior parte das perdas por intercepção ocorrem no início da chuva, quando as superfícies vegetais estão secas e a capacidade de intercepção é grande.

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Deste modo, mais importante do que a duração das chuvadas e a quantidade de água precipitada é a freqüência com que elas ocorrem. (Ward, 1975). A velocidade do vento durante a queda de precipitação afecta a intercepção de dois modos distintos. Por um lado, reduz o volume da armazenamento máximo disponível, por outro lado, favorece a evaporação da água retida. Parte da precipitação que atinge a superfície do solo pode escoar-se sobre o terreno sob a forma de escoamento superficial, atingindo rapidamente a rede de drenagem da bacia hidrográfica. Grande parte é, no entanto, absorvida pelas camadas superficiais do solo, podendo escoar-se para baixo através do solo, subsolo e camadas rochosas, eventualmente passando a fazer parte de uma ou mais zonas de humidade relativa. Devido à diversidade de situações possíveis de ocorrer na bacia hidrográfica, designa-se por água no solo toda a água sub-superficial na zona insaturada, incluindo solo e sub-solo acima da toalha freática que marca assim o limite superior da zona permanentemente saturada. Neste ponto trata-se da água do solo ou seja da zona freqüentemente designada por zona insaturada. Esta zona insaturada tem, para o estudo que efectuamos especial relevância porque é aqui que se armazenam a água e nutrientes que, por ascensão e devido à higrospicidade do solo e das paredes calcárias do edifício, vão degradar a pedra e criar reservas para o desenvolvimento das colônias biológicas.

2 - Águas residuais

As águas residuais contém em regra quantidades importantes de sólidos dissolvidos e em suspensão. Uma fracção importante dos sólidos em suspensão são de natureza orgânica e apresentam, geralmente, densidades pouco superiores às da água. A outra fracção, menor, é constituída por sólidos em suspensão de natureza inorgânica, nomeadamente partículas arenosas e sais metálicos. As partículas de origem inorgânica têm densidades relativamente altas, compreendidas entre 1,4 e 1,6, e sedimentam mais facilmente que as partículas em suspensão de natureza orgânica. Um colector de águas residuais pode ser considerado um reactor heterogêneo de três fases: sólida, (biofilme); líquida (águas residuais); gasosa (ar ventilado).

3 - Influência da humidade, temperatura e disponibilidade dos nutrientes Para teores de humidade relativa dos colectores inferiores a 85%, o processo de oxidação é condicionado por esse factor, anulando-se quando a superfície se torna seca. O aumento da temperatura, no intervalo entre 4 e 30°C, parece acelerar a formação de ácido sulfídrico, e assim, os processos de corrosão. Esse efeito torna-se particularmente evidente entre os 20 e os 30°C. As bactérias autotróficas que promovem as reacções de oxidação necessitam para o seu metabolismo de diversos nutrientes, entre os quais se incluem o enxofre, o azoto e o carbono. As fontes do enxofre são, respectivamente, o gás sulfídrico, a amónia e o dióxido de carbono comuns de atmosferas de sistemas de drenagem residuais e, menos freqüentemente, naturais. O magnésio, ferro, potássio, manganês e fósforo são também, alguns dos elementos cuja importância é relevante para o desenvolvimento dos processos de oxidação. Em cursos de água, a descarga de partículas decantáveis provenientes, nomeadamente de emissários de águas residuais, pode originar acumulação de matéria orgânica em locais hidrodinamicamente favoráveis. A acumulação pode manter-se durante períodos mais ou menos longos, desde que as velocidades e as tensões de arrastamento o permitam. A decomposição bentónica pode ser definida como a estabilização de sólidos suspensos voláteis, que previamente sedimentaram, e pode ser levada a cabo em condições aeróbicas ou anaeróbicas. A extensão da penetração do oxigênio depende das condições de consumo e de difusidade do meio. Nas camadas interiores dos sedimentos processa-se a degradação em condições anaeróbicas. Os produtos solúveis difundem-se para o exterior, onde são oxidados em condições aeróbicas. O estágio inicial da decomposição é caracterizado pela formação dos ácidos orgânicos e redução do pH, podendo libertar-se para o exterior gás sulfídrico e gás metano. Nos últimos estágios do processo de estabilização, verifica-se a libertação de amónia e material dissolvido azotado (Thomann e Mueller, 1989).

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2. A biodeterioração do edifício e da pintura mural

1.Locais deformação A formação de sulfuretos pode dar-se nos seguintes locais:

• interior da massa líquida • interior dos sedimentos • interior do filme biológico A formação no interior da massa líquida só ocorre,em casos fora do comum,

correspondentes a águas residuais muito sépticas, com tempos de percurso muito elevados, talvez superiores a 10 horas, e em condutas sob pressão. No interior dos sedimentos, quando não se verifiquem condições de auto-limpeza, e no interior do filme biológico, pelo contrário, é freqüente a conjugação de factores favoráveis à formação de sulfuretos. D o filme biológico fazem parte bactérias e outros microorganismos, com intervenção relevante nas transformações bioquímicas decorrentes. No entanto, as maiores transformações são induzidas por certas bactérias, as quais têm um papel significativo na oxidação da matéria orgânica devido ao seu elevado número e minúscula dimensão (elevada área de contacto). Estas bactérias têm a capacidade de produzir catalizadores orgânicos, as enzimas, as quais apresentam a característica de poder iniciar e controlar reacções bioquímicas. O processo de formação no interior do filme biológico inicia-se quando as colônias de bactérias se depositam em zonas favoráveis, crescendo junto com sólidos em suspensão imobilizados no seu movimento. A evolução do crescimento é contínua até que os diversos núcleos dispersos se desenvolvam num filme contínuo. O filme biológico desenvolve-se ao longo do perímetro molhado. Os sulfuretos resultantes do metabolismo bacteriano reagem ao ião ferro e outros metais, formando precipitados. São estes precipitados que, por vezes, dão a cor negra ao filme biológico. Por sua vez, a p resença do sulfureto de h id rogên io favorece a prol i feração de microorganismos, incluindo as bactérias.

2 - Formação, libertação e oxidação do sulfureto de hidrogênio

Para que a concentração de sulfuretos na massa líquida se mantenha positiva ao longo do perímetro considerado, torna-se necessário que a taxa de formação seja, em princípio, igual ou superior à taxa de remoção dos sulfuretos da solução. A formação de sulfuretos pode resultar das seguintes reacções:

• decomposição de compostos orgânicos, contendo enxofre, nomeadamente alguns aminoácidos; • redução do ião sulfato, ou mais ou menos freqüente, redução de outras substâncias inorgânicas, como os iões tiosulfato e sulfito ou do enxofre elementar; • Para o decréscimo das concentrações de sulfuretos dissolvidos contribuem os seguintes factores: • reacções de oxidação, em condições aeróbicas, donde podem resultar, teoricamente, enxofre elementar, tiosulfato e sulfato (Chen e Morris, 1972); • precipitação por reacção com elementos metálicos usualmente presentes em águas residuais, como o ião ferro (II) e o zinco; • libertação de gás sulfrídrico para a atmosfera, a qual ocorre, com mais significado, em meio ácido, e quando as condições de turbulência são elevadas.

A contribuição dominante para a formação de sulfuretos de hidrogênio provém da redução química do ião sulfato, levada a cabo pela redução do oxigênio. Na oxidação bioquímica da matéria orgânica, as bactérias removem átomos de hidrogênio das moléculas orgânicas, adquirindo, no processo, energia. Após uma série de reacções, os átomos de hidrogênio são transferidos para um receptor. Tal receptor pode ser um composto orgânico e inorgânico. Em condições aeróbicas, o oxigênio livre é o receptor final do hidrogênio, sendo a água o produto final da reacção. As reacções anaeróbicas desenvolvem-se na ausência de oxigênio livre, ut i l izando os microorganismos intervenientes os receptores de hidrogênio. Na ausência de oxigênio dissolvido e de nitratos, as bactérias anaeróbicas podem promover a reacção bioquí-

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mica do ião sulfato. Os substratos que podem servir como fonte de carbono e de dador de electrões entre os quais se incluem os ácidos láctico, acético e butírico, o etanol e o metanol, são limitados, e a sua utilização varia com os microorganismos presentes. Alguns microrganismos anaeróbicos são capazes de utilizar o hidrogênio como dador de electrões. O principal grupo de organismos envolvido nas transformações incluem as espécies Desulfovibrio, Desuljomonas e Desulfotomaculum. enquanto os organismos envolvidos na reacção [referida] incluem as espécies Desulfobullus, Desulfobacter e outras. Outras bactérias anaeróbicas foram já referenciadas como re-dutoras do ião sulfato, entre as quais Desulfovibrio desulfuricans, Vibro thermodesulfuricans e Spinovibrio desulfuricans. As bactérias sulfato-redutoras têm origem fecal e existem, na natureza, em solos contendo matéria orgânica e, em praticamente todos os meios hídricos, respecdvamente em águas residuais não tratadas, em águas naturais e em águas de abastecimento. As transformações biológicas que fazem parte do ciclo do enxofre são bastante complexas. Além da redução bacteriana e oxidaçâo, fazem parte do ciclo do enxofre a imobilização, processo pelo qual se dá a incorporação do enxofre inorgânico em material celular, e que envolve prévia redução do sulfato a sulfuretos, e a mineralização. N o processo de mineralização, compostos orgânicos sulfurosos são decompostos por organismos heterotróficos. Quando aqueles compostos entram em decomposição, parte do enxofre disponível é usado para síntese celular. A parte restante é, muitas vezes, libertada como sulfureto de hidrogênio. A composição anaeróbica pode ser levada a cabo por várias espécies de bactérias incluindo a Veillonella, a Clostridia, a Proteus. (Environmental Protection Agency, 1985)".

3 - Os métodos de análise química dos materiais

Destacamos como processos de análise, em laboratório, o exame das amostras a realizar no microscópio electrónico, no microscópio electrónico de varrimento (SEM), no microscópio óptico e estudo das várias espécies a partir do seu isolamento e cultura das mesmas espécies em ambiente artificial.

4 - A remoção dos metais das soluções aquosas por biomassa

Uma grande diversidade de mecanismos parecem estar envolvidos na remoção de metais de soluções aquosas por biomassa, desde a adsorção às paredes celulares a fenômenos do metabolismo como a compartimentação interna e a precipitação extracelular causada por metabolitos excretados (Gadd, 1990).

/ - Os processos de remoção dos iões metálicos por biomassa A biossorção de metais apresenta-se como um fenômeno físico-químico complexo, relativamente rápido podendo ser reversível e envolvendo adsorção, troca iónica, complexação e microprecipitação em certos locais da parede (Kuyuak e Volesky, 1988; Guibal et ai, 1992, Leusch et ai, 1995). Alguns metais como o cobre, o ferro e o zinco sao essenciais ao crescimento e muitos organismos desenvolveram a capacidade de os acumular intracelularmente a partir de meios onde existem baixas concentrações. Esses processos de influxo intracelular estão no entanto muitas vezes associados à acumulação independente do metabolismo (biossorção), que ocorrendo numa maior proporção pode os desmascarar (Gadd, 1990). Verifica-se, no entanto, que nas leveduras prevalece muitas vezes a remoção intracelular sobre a biossorção. Freqüentemente estes organismos precipitam os metais ao redor das células e do próprio citoplasma, segregando proteínas específicas que a eles se ligam (Gadd, 1990). Foram identificados vários tipos de proteínas com esta função.: as metalotionéinas, por exemplo. Outro tipo são as fitoquelatinas que existem em certas plantas, algas e fungos.

2 - Os mecanismos de acumulação intracelular de metais nos microorganismos Os mecanismos de acumulação intracelular de metais são complexos e, tal como na

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biossorção, não estão completamente esclarecidos. Também os mecanismos de transporte estão mal esclarecidos em numerosos microorganismos. Pensa-se que os iões metálicos atravessam a membrana plasmática por transporte activo e que todo o processo de acumulação seja dependente do metabolismo (Gadd, 1990) ou por difusão passiva facilitada através de quelantes, possivelmente simportas de iões e /ou componentes que a eles se ligam, com constantes de estabilidade superiores aos complexos formados na membrana plasmática (Callander e Barford, 1983). Apesar da íntima relação entre a acumulação de metais e certos aspectos ligados à toxicidade, por vezes a existência de elevada tolerância a um dado metal, pode ter como conseqüência a impermeabilidade da célula a esse metal, impedindo assim a sua acumulação. A sensibilidade, por outro lado, pode em certos casos conduzir à acumulação intracelular por difusão passiva, mesmo que os metais pesados ao atravessar a membrana a danifiquem (Gadd, 1990). Uma vez no interior da célula viva, os metais são armazenados nos vacúolos, precipitados em grânulos após a sua ligação a polifosfatos, ou ligados a proteínas específicas (Gadd, 1990).

Resumo e Conclusão

As características atmosféricas, climatéricas e geográficas determinam a criação de uma atmosfera com mais de 70% de humidade relativa durante a maior parte do ano e cerca de 80% de humidade relativa durante os meses de Inverno mais húmidos. A deposição de sais marinhos e de agentes biológicos marinhos, trazidos pelos ventos dominantes de N e NW ou, embora menos importantes de SW vão possibilitar o desenvolvimento de algas, fungos e líquenes que se desenvolvem em regiões em que a salinidade é um factor determinante para o seu aparecimento e crescimento. Devido às características do solo e, sobretudo, à grande higroscopicidade do calcário que é o principal material de construção o edifício, a água das chuvas e do nível freático que percorrem todo o terreno onde está implantado o edifício, vai facultar o desenvolvimento de outros microorganismos que se desenvolvem nas águas doces, e, neste caso específico, em águas termais. A deposição e a fixação dos metais pesados e dos sais que, quer trazidos pelo vento, quer pela água, nas paredes da Sala do Capítulo do Convento vão modificar e transformar a composição química da rocha, argamassas e pigmentos da pintura mural que compõem este monumento. Uma vez que esta sala se encontra a céu aberto, como já foi referido, a luz natural, embora seja de longe a mais agradável, não segue os parâmetros ideais de luz, para a conservação da obra de arte, contribuindo fortemente para a sua degradação. É essencial que o tempo de exposição seja controlado para minimizar os efeitos nocivos da luz. A Sala do Capítulo encontra-se exposta a todas as condições climatéricas já mencionadas há pelo menos cem anos e a intervenção a realizar terá que estudar e ponderar todos os factores que interactuam no ambiente e estado de conservação do objecto, para que se possa prolongar o seu tempo de vida. A análise aprofundada dos efeitos da luz natural nesta pintura e na proliferação ou diminuição das colônias de microorganismos que interagem na degradação da mesma parece ser um dos aspectos mais relevantes deste estudo. As diferenças de natureza física entre os infravermelhos -espectro visível - e as ondas curtas - espectro invisível - referem-se à intensidade e freqüência da energia que emitem. Se, como foi referido, os pigmentos que se encontram nos plastos de muitos microorganismos como a clorofila, a xantofila, a ficoetrina, a ficocianina, com cores respectivamente verde, amarela, vermelha e azul, têm como função aproveitar os vários comprimentos de luz do espectro da luz natural que incide nas paredes da sala, de que modo a sua existência terá contribuído para conservar os pigmentos da parede, uma vez que está cientificamente provado que esses organismos, nomeadamente as algas, absorvem as cores complementares do espectro solar, transformando até, em muitos casos, e modificando a sua estrutura celular? Os microorganismos podem ter minimizado os efeitos que a luz solar pudessem ter provocado se incidissem directamente na pintura mural. E quais as modificações que se operaram e operam nos vários elementos

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Anais da ABRACOR - Pintura IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

existentes da composição dos pigmentos e aglutinantes das várias camadas de preparação e na camada cromática da pintura pela existência deste filme biológico que cobre a pintura mural? Parece-nos óbvio poder afirmar que as principais causas de degradação se devem, portanto, aos elevados índices de humidade que alteram as camadas mais profundas da estrutura dos vários materiais que foram empregues na construção e decoração do edifício. Esta lista de microorganismos pigmentados tem como principais objectivos:

• evidenciar que a análise do filme biológico que reveste grande parte do suporte murário da Sala do Capítulo é um dos primeiros passos a realizar para o restauro e conservação da pintura mural; • evidenciar a relevância que a superfície destes microrganismos têm na remoção e oxidação de metais a que nos referiremos posteriormente; • evidenciar a pertinência da selecção dos processos de identificação das causas de degradação, tratamento e restauro eficazes e não destrutivas.

Bibliografia

AIRES-BARROS, Alteração e Alteração de Rochas, INIC, Lisboa, 1991 FIGUEIRA, José Manuel, drenagem e defesa contra as águas subterrâneas, Separata do

Curso de Mecânica dos solos de Lisboa, 1955 RAMALHO, Miguel Magalhães, Note Préliminaire sur le microfaciès dujuassique supérieur

portugais, Separata do Tomo 67, fase. 1, das Comunicações das Comunicações dos Serviços Geológicos de Portugal, Lisboa, 1981

ROCHA, Manuel, nascimento, Ulpio, castro, Elda, Determination of moisturecontent in porous materiais by means of relative humidity inside a cavity, Ministério das Obras Publicas, LNEC, Lisboa, 1958

SILVA, Carlos Manuel Gomes da, Patologia das rochas do Patrimônio construído, IST, UTL, 1989

VENTURA, José, Influência das gotas de ar frio no ritmo de repartição espacial das chuvas em Portugal, FLL, Lisboa, 1985

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Forro do Coro Alto do Convento do Desterro

Ana MariaVillar Especializada em Restauração de Bens Culturais Profissional Autônomo - CGA - 119.865/001-03

Álvaro Silva Arquiteto - Restaurador de Bens Culturais CREA N° 26.280 D

1. In trodução

A Igreja e Convento do Desterro, situada em Salvador/Ba., distrito de Nazaré, foi o primeiro Mosteiro de Religiosas do Brasil, e à semelhança dos Conventos medievais de Lisboa e Évora, esses construídos no século XVI, com mirante e coros baixo e alto.

A construção desse monumento data dos fins do século XVII, finalizado também em fins do século XVIII e reformado no XIX, com intervenções no século XX, algumas sem autorização do IPHAN.

Em 1907 só restavam 3 das 90 religiosas Clarissas e logo após as Franciscanas ingressaram no Mosteiro até os dias de hoje. É o mais antigo Mosteiro de religiosas do Brasil, criado pelo Rei de Portugal D. Afonso VI para que "nele fossem acomodadas as pretensões de toda a Colônia" veio mais tarde dar origem a outros dois conventos, o da Lapa também na Bahia e o da Ajuda no Rio de Janeiro.

2. Forro do Coro

O forro do Coro alto é decorado com pintura de boa qualidade, medindo cerca de 166 m2 e é atribuído a Antônio Simões Ribeiro, artista Português que atuou na Bahia em 1745.

Forro em forma de caixotões, com 14 painéis contornados por molduras entalhadas, fazendo um conjunto dos mais bonitos e importantes do Brasil. Os painéis estão distribuídos em 2 grupos - o primeiro que são os 4 painéis centrais representando Santa Clara, a Sagrada Família, N. Senhora com o Menino, São Francisco e o segundo composto de 10 painéis laterais com motivos de anjos, guirlandas e elementos arquitetônicos, com as intenções religiosas da Irmandade: Rezam, Inocência, Obediência, Temperança, Felicidade Celestial e Erese, Prudência, Fidelidade, União, Concórdia e Paz.

3. Diagnóstico do Estado de Conservação

3.1. Forro do Coro Alto apresentou a nível de conservação: Grande penetração de umidade proveniente das infiltrações das águas pluviais, favorecendo a proliferação de fungos, insetos xilófagos e desintegração física dos materiais.

• Áreas faltantes do suporte. • Muitas peças completamente carcomidas pelos cupins. • Perdas da policromia. • Repinturas na parte azul lisa, no branco e no ocre entre os caixotões emoldurados. • Empenamento do suporte em muitas áreas. • Cravos e pregos oxidados.

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• Escoramento em madeira feito pelo IPAC sem obedecer as normas de conservação, sem espumas nas extremidades das madeiras e escorando nas áreas com elementos importantes para a leitura dos painéis.

4. Proposta Inicial de Tratamento

• Documentação fotográfica antes, durante e após restauro, respeitando as exigências do IPHAN. • Higienização superficial. • Teste de solvência com cuidados especiais escolhendo o produto adequado para : • Remoção das sujidades. • Remoção do verniz oxidado. • Imunização com produto adequado, nesse item "negociamos" com o órgão fiscalizador para a utilização de um produto mais moderno, mais eficaz e de menor teor de toxidade para o homem e um poder residual maior, que foi o DURSBAN - 4E BR . • Extração de cravos e pregos oxidados, substituindo-os por tarugos de madeira e parafusos de latão. • Consolidação estrutural - nesse item muitas substituições foram feitas, necessitando de novos entalhes. • Remoção do verniz oxidado nos 14 painéis. • Limpeza e fixação da policromia nas áreas necessárias.

5. Equipe de Trabalho

Nossa equipe técnica foi composta de profissionais de nível universitário com especialização em restauro e os auxiliares com experiência comprovada, como também os carpinteiros e entalhadores. Coordenadores / Restauradores Álvaro Augusto da Silva Neto. Ana Maria Villar Leite Augusto da Silva. Restauradores Antônio Cabral de Farias Filho. Dilberto de Assis. Marceneiro / Entalhador José Lucivaldo Lima Dórea . Carpinteiro Joselito Fernandes Serra. Auxiliares de Restauro Júlio Cezar Borges dos Santos. Bruno Fernandes Borges dos Santos. Auxiliar de Carpintaria Paulo Roberto Espinheira Santos.

6. Intervenção de Restauro

6.1 Andaimes Os andaimes foram montados e desmontados pela firma JLC Construções, com a nossa supervisão.

6.2 Higienização Superficial A higienização foi feita com trinchas macias e aspirador de pó de baixa sucção, de acordo com os espaços higienizados e o estado de conservação da superfície.

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FIG 1 - Antes

6.3 Teste de Solvência Os testes de solvência dos 14 painéis foram feitos antes de qualquer limpeza e pensamos mais em relação ao aspecto físico/químico e, em relação às ações do tempo sobre os materiais e suas transformações.

O forro do Desterro é um documento que desde a sua criação até o momento atual tem sua historicidade cuja eliminação é inconcebível.

Iniciamos os testes, com auxílio de lentes, após examinarmos as obras com aparelho de luz ultravioleta, para detectar prováveis intervenções anteriores. Foram usados primeiramente os solventes mais fracos para depois os mais fortes, usando o Swab uma só vez, sem fazer pressão e anotando todas as reações. Cada painel necessitou de um teste específico com dosagens diferentes dos produtos.

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FIG 2 - Durante

6.4 D eeapagem / Remoção das Repinturas Após vários testes, chegamos a conclusão que nos 14 painéis não havia repinturas, porém nas molduras várias camadas foram encontradas, resquícios de ouro nos frisos, de azul em outros frisos e as repinturas em torno de 3 foram feitas com pig-mento xadrez e um adesivo aquoso de baixa viscosidade perdendo através dos tempos todo o poder aglutinante - foram decapados na sua totalidade todas as molduras com cuidados especiais para não perder algumas referencias da pintura original.

6.5 Imunização As peças de madeira foram imunizadas com produto letal para os atacantes e o menos tóxico possível para o homem; além da imunização das partes contaminadas e verificadas cuidadosamente, foi imunizado o verso de todo a área do forro, como também todas as madeiras novas em substituição as com cerca de 90% de contaminação, muito carcomidas.

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6.6 Parafusos e Tarugos de Madeira Foram utilizados parafusos de latão e tarugos de madeira para fixação de peças do forro, cerca de 2.000 Un. ; nas áreas onde foram extraídos os cravos oxidados, houve tratamento com Paraloid B 72 e obturações com tarugos, acetato + pó de serra e formol.

6.7 Faceamento e Fixação da Poiicromia O faceamento e a fixação da poiicromia foram feitos com papel de seda branco e papel japonês de gramatura - 09 com os adesivos abaixo relacionados, escolhidos de acordo com a degradação, nas peças em que houveram necessidade.

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6.8 Consolidação do Suporte A madeira é um material utilizado pelo homem como suporte de obras de arte desde os tempos mais remotos.

FIG 4 - Durante

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As madeiras das molduras do forro do Coro Alto de Desterro, foram de 3 tipos: cedro, sucupira e vinhático, todas madeiras de árvores frondosas e com vantagens na trabalhabilidade, beleza e resistência, porém não resistiram as ações inclementes do tempo, do ataque dos insetos xilófagos e da negligência dos envolvidos na preservação dos bens culturais.

O Cedro, Cedrela S. P. tem cheiro e cor característicos, superfície lustrosa com reflexos dourados e foi utilizado em cerca de 90% do madeiramento do forro.

O Vinhático, Plathymenia Reticulada é de cor castanha lustrosa com textura mais grosseira que o cedro e foi utilizado cerca de 6% no forro do Desterro.

A Sucupira, Bowdichia virgílio é de cor parda, irregularmente lustrosa com textura mais grosseira que as anteriores citadas, foram aplicadas cerca de 4% nos frisos e molduras do forro.

Apesar de reconhecermos que a I a lei da restauração é a menor intervenção possível no objeto, no caso do forro do Coro Alto do Desterro fizemos o possível e o impossível para esta lei ser respeitada, porém, cerca de 40% dos frisos, cimalhas e bites das molduras dos painéis estavam em lastimável estado de conservação, mais de 90% de inúmeras peças contaminadas irreversivelmente pelos insetos xilófagos, o que necessitou de substituição total de várias peças.

As peças que estavam aproveitáveis foram consolidadas e parcialmente substituídas com novos entalhes.

A consolidação tem como objeto estabiizar o suporte e atender aos seguintes objetivos:

• Estabilizar as dimensões. • Preservar as formas e os aspectos. • Minimizar os efeitos devido as variações climáticas. • Maximinizar a proteção contra os agentes biológicos.

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• Ser reversível. • Os consolidantes foram aplicados com: • Injeções - o Paraloid B 72 para a Ia penetração. • Aplicação com espátulas odontológicas do acetato de polivinila pó de serra de lixa de cedro, mais formol, para fechar as lacunas carcomidas de pequenas dimensões. • Aplicação de tasselos de madeira, cedro, intremeados com a massa acima, nas lacunas de dimensões médias. • Parquetagem em 2 camadas superpostas nas grandes lacunas.

6.9 Emassamento/'Nivelamento Os emassamentos/nivelamentos das lacunas foram feitos cuidadosamente pois dessa etapa depende um retoque de qualidade. Os matérias empregados foram Carbox Metil Celulose mais carbonato de cálcio e acetado de polivinila nas dosagens necessárias e massa PVA mais Metil Celulose - Em ambos os casos foram acrescentados gotas de formol para evitar os fungos.

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6.10 Reintegração Estética A reintegração estética das molduras foram feitas com tinta látex da suvinil nas cores aprovadas pelo IPHAN apesar de sermos contra a aplicação desse material e sim de pigmentos da Maimerie com Mowiol 8.88, há um documento nosso enviado em 12/01/98 que comprova a nossa contestação.

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6.11 Verni^ O Verniz de proteção foi aplicado com a técnica de aerosol com cuidados que requer este tipo de aplicação.

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7. Especificações dos Materiais

Todos os materiais acima relacionados constam em um Banco de Dados - Materiais Empregados em Conservação e Restauração de Bens Culturais, publicação patrocinada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro - ABRACOR - Fundação Vitae -1990. Essa publicação encontra-se a disposição da Instituição para consulta ou comprovação.

8. Observações

A fase operativa é da maior importância e responsabilidade, pois com ela concluímos o processo de intervenção e, os critérios adotados, foram avaliados visando uma boa apresentação estética, estrutural, o momento histórico da obra, sua função e sua historicidade. Obedecemos as leis da legibilidade, estabilidade e reversibilidade que regem as intervenções modernas de restauro, a nível científico; foram tiradas cerca de 345 fotos e macro fotos de toda a intervenção e a pintura das molduras foi 2 /3 por nossa conta, por não constar do edital e do orçamento, tanto a remoção da policromia como a pintura total das molduras, apesar de vários pedidos de aditivos que nos foram negados. Houve porem exigência da Instituição para que a pintura das molduras fosse feita.

9. Conclusões

Considerando o resultado da intervenção a nível científico, o respeito pelas leis que regem as ações de restauro, o cumprimento das normas estabelecidas no edital e, do prazo de entrega, além da qualidade dos materiais empregados nessa intervenção, comprovados por diários de obra e fiscalização sistemática do órgão competente -7o Coordenação Regional do IPHAN, somadas às garantias dos nossos serviços executados, encerramos os nossos trabalhos no sábado dia 14 de fevereiro/98, acompanhando a desmontagem dos andaimes, completando um tempo de 79 dias de obra.

Apesar de reconhecermos a falta de verbas federais e a luta constante da área cultural para manter conservado nosso patrimônio, estamos cientes dos constantes

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investimentos, em etapas, que o IPHAN vem fazendo nos monumentos; urge porém que novas concorrências surjam para a restauração de outras áreas inclusive no próprio Convento do Desterro como os altares laterais, púlpito, sacristia, forro do Coro baixo, e tc .

Deixamos claro também, que entregamos a obra antes do prazo estabelecido pelo edital.

Para finalizar, devemos cada vez mais nos unir trocando informações, num propósito maior da conservação e resgate da nossa memória, não uma memória considerada como passado histórico, mas sim como presente, como ato pensante que servirá para construir nosso futuro. É a nossa história que estamos construindo hoje e temos compromisso com ela.

Salvador, 26 de Agosto de 1998.

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Política da Preservação

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Abstract

Analysis of the Public Preservation Policies in Brazil in the 'Seventies and 'Eighties, considering the use of information technologies in preserving cultural assets. Exchange and reciprocai influences arising from Public Policies of Preservation and the technological means available at a given moment, point at the need to chose. This structure has been foreseen by the National Plan for the Microfilming of the Brazilian Periodical Publications. The PLAN is not only the result of technological options but also of political choices. To the technological difficulties in the continuous use of the microfilm as the technology to preserve, we must add the structural and political frailty of the Brazilian cultural institutions and memory.

Políticas Públicas de Preservação e Tecnologias de Informação

Sérgio Conde de Albite Silva UNIRIO: Av. Pasteur, 458, sala 408, 4o andar. Urca. 22290-240 Rio de Janeiro, RJ. Tel.: (021) 541.1839 - Fax: (021) 542.2242

Introdução

Este trabalho é resultado e parte da dissertação defendida no Mestrado em Memória Social e Documento/UNIRIO, e está centrado nas políticas públicas que tiveram por finalidade a preservação de acervos sob guarda de instituições governamentais brasileiras nos anos 70 e 80. As políticas públicas de preservação foram consideradas do ponto de vista das tecnologias de informação aplicadas à preservação. Foram escolhidos a microfilmagem como tecnologia de informação/preservação e o Plano Nacional de Microfilmagem de Periódicos Brasileiros - PLANO (1979), como principais referências e recortes.

Entende-se, hoje, que as exigências de um sistema de preservação e acesso são atendidas da melhor forma por uma combinação de tecnologias. A microfilmagem deve ser percebida como tecnologia de informação adequada ao tratamento de acervos arquivísticos e biblioteconômicos, levando-se em conta garantias de preservação, e a digitalização, garantias de transferência da informação. A partir da preservação de um acervo que inexoravelmente se deteriora - o papel jornal é feito para durar um dia, por exemplo - é que pode-se fornecer acesso ao público, através de migração da informação para suportes digitais, reconhecidamente ágeis para disponibilizar informação, seja através de rede ou não.

Nos anos 70, o PLANO reuniu duas mais importantes instituições governamentais responsáveis pela preservação de parcela significativa da memória nacional: a Biblioteca Nacional e a Fundação Casa de Rui Barbosa. Apesar do PLANO ter apresentado uma série de resultados que permitem considerá-lo como um bom exemplo de aplicação de políticas públicas de preservação no Brasil, a partir de 1990 entra em processo de decadência. A identificação e o esclarecimento desse episódio apresentam-se como o cerne deste trabalho. Isto é, a partir de um exemplo concreto, aplicado e conhecido é que se pode explicar e entender o alcance de uma política pública de preservação para a comunidade brasileira. Questões daí decorrentes compuseram o quadro investigativo necessário.

O que significou o PLANO para as políticas públicas de preservação no Brasil nas décadas de 70 e 80? Qual o conceito de preservação usado na formulação dessas políticas de preservação que levou à escolha da microfilmagem como a opção tecnológica adequada para os objetivos do PLANO? No caso analisado, até que ponto a opção por uma tecnologia foi uma opção meramente tecnológica? Em que medida a configuração de uma política de preservação teria prescindido das determinações da plataforma tecnológica disponível à época?

Dois p res supos tos apresentaram-se : o pr imeiro , de que a definição e implementação de políticas públicas de preservação tem como um dos seus condicionantes fundamentais a opção por uma ou mais tecnologias de informação. E, o segundo, de que a escolha de uma ou mais tecnologias sobre as quais se baseia uma política de preservação resulta de opções não só tecnológicas como políticas. Reconhece-se tais pressupostos, tendo em vista a existência de uma relação dialética envolvendo ambas dimensões: a tecnológica e a política. Assim teve-se a oportunidade de discutir como uma tecnologia se apresenta no âmbito de uma política de preservação e como se estabelece esta relação entre tecnologia e políticas de preservação.

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Quadro conceituai

Na tentativa de conciliar os limites de espaço e o entendimento pretendido em um texto para publicação nos Anais de um Congresso, como ora acontece, optou-se por apresentar as principais referências que forneceram o lastro teórico-conceitual para esta pesquisa.

Estado é aqui entendido como uma organização das relações sociais (poder) através de procedimentos técnicos preestabelecidos (instituições, administração), úteis para a prevenção e neutralização dos casos de conflito e para o alcance dos fins terrenos que as forças dominadoras na estrutura social reconhecem como próprias e impõem como gerais a to.do o país. Uma empresa institucional de caráter político onde o aparelho administrativo leva avante, em certa medida e com êxito, a pretensão do monopólio da legítima coerção física, com vistas ao cumprimento das leis. (BOBBIO, 1997 e WEBER apud BOBBIO, 1997)

Entre os brasileiros do Estado identificou-se um certo quadro psicológico e cultural que pode demonstrar o peso de aspectos privados e particulares nos assuntos do Estado brasileiro. Um limite muito frágil entre forma e conteúdo, família e Estado, indivíduo e sociedade, anarquia e organização, informalidade e rito. Esta noção é explorada por H O L A N D A (1997) no que C Â N D I D O chama de "admirável metodologia dos contrários" da elite governante brasileira.

Neste contexto, deve ser salientado que as Políticas Públicas de Preservação no Brasil estão contempladas, principalmente, na esfera cultural da administração pública. No caso específico do PLANO, essa circunstância política estava vinculada às Políticas Culturais e à Política Nacional de Cultura, isto é, MEC, e depois, MinC.

Caracterizou-se Políticas Públicas como aquelas que possuem: • uma ideologia que a gere e a sustente; • diretrizes e limites de intervenção do Estado; • planejamento orçamentário; • organograma e estrutura organizacional hierárquica; • integração e inter-relacionamento entre seus vários aspectos e níveis (federal, estadual e municipal); • programas e projetos específicos; • dinamismo para as necessárias atualizações; • participação efetiva e constante dos setores interessados; • representação democrática da sociedade na sua implementação e formulação; • atendimento equilibrado das diferentes demandas; • critérios de aferição e avaliação de seus resultados; • constante atenção para as correções necessárias ao longo de sua trajetória.

Ou seja, um conjunto articulado e fundamentado de decisões, programas e instituições. (FALCÃO, 1984)

A preservação é entendida por seu sentido geral e abrangente. Seria, então, toda a ação que se direciona a salvaguardar ou a recuperar as condições físicas e proporcionar permanência aos materiais dos suportes da informação. É o "guarda-chuva", sob o qual se "abrigam" a conservação, a restauração e a conservação preventiva. A preservação cabe ainda, a responsabilidade de determinar as escolhas mais adequadas de reformatação de suporte para a transferência da informação. Freqüentemente entendida como sinônimo de restauração, ao contrário, a preservação, neste trabalho, aproxima-se de escolhas éticas, filosóficas, conceituais e políticas a serem aplicadas na permanência dos acervos.

Por Políticas de Preservação entende-se um progressivo processo reiterativo de escolhas, planejamento e implementação de atividades de prevenção. Junta conhecimento e financiamento.

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Tecnologia, - etimologicamente, thekné (arte) e logos (conhecimento) - é todo produto da ciência, algo resultante do conhecimento em qualquer das áreas sob investigação científica ou empírica. Um rol de conhecimentos e procedimentos construídos pelo homem ao longo da história da civilização, inicialmente de forma empírica, nas tentativas de dominar e tirar proveito dos recursos naturais. Assim , tecnologia de informação são as tecnologias que tratam dos amplos aspectos exigidos pelo registro e transferência da informação, independentemente de seu tempo e espaço histórico. (BARRETO, 1992) Por extensão, tecnologia de preservação é o conjunto de conhecimentos, procedimentos e equipamentos necessários ao tratamento dos documentos e ao controle de seu ambiente de guarda, acondicionamen-to e uso para a prorrogação da vida útil dos registros produzidos ao longo da história, possibilitando acesso quanto à forma e/ou conteúdo.

Dimensão política da tecnologia

Na relação dialética proposta foi possível, enfim, perceber uma dimensão política das escolhas tecnológicas. Uma vez que tenha-se considerado as estruturas de tomada de decisão respectivas, poderemos olhar mais de per to para os critérios [tecnológicos] que afetam as substâncias das decisões. Uma variável crucial para a estrutura de tomada de decisões para preservação é a escala de atividade. Políticas que afetam massas de materiais eliminam a necessidade de escolha entre itens específicos e são, portanto, relativamente fáceis de se formular e executar. (HAZEN, 1997)

Uma segunda variável a ser considerada para a escolha de um programa de preservação, do ponto de vista da dimensão política da tecnologia, é a que se refere às escolhas entre os diferentes tipos de acervo em detrimento de outros. Escolha essa feita de acordo com os interesses, usos, função social, valoração do momento por aqueles que detém a instância das decisões.

Para ATKINSON (1997), a tomada de decisão é que acaba definindo o que deve sobreviver e o que não deve. A isso ele chama de "sistema de deterioração planejada". Reflete uma decisão tomada com base em circunstâncias contemporâneas (atuais) e reflexos, necessariamente, no futuro. Como decidir com segurança o que preservar agora, para uso no futuro?

Uma política que opta pela preservação da totalidade dos registros pode ser uma séria ameaça a essa mesma preservação. O gerenciamento no desenvolvimento das coleções deve fazer parte dos planejamentos de preservação. A escolha política e tecnológica que é feita agora, apenas para atender uma possibilidade futura, é determinada por valores de relativismo ético, humanístico e epistemológico vigentes. Assim, a decisão do quê preservar hoje estará necessariamente refletida na permanência dos acervos a serem consultados no futuro.

O PLANO

A idéia do PLANO tem origem no Grupo de Documentação em Ciências Sociais em 1973 e é estabelecido, quase seis anos depois, através da Portaria n° 31 de 29 / 01/1979.

A concepção do PLANO encontra respaldo nas diretrizes estabelecidas pela administração federal e pela política cultural de então, mas a sua implementação e sua viabilização exigem, desde suas origens, atributos pessoais de seus dirigentes e executores para que estes pudessem caminhar com desenvoltura no labirinto da administração federal e nos reduzidíssimos orçamentos destinados. A realização do PLAN O como "projeto autônomo" é sinalizado como condição sine qua non para sua efetivação. Ainda assim, o PLANO estabelece-se na esfera administrativa e política do Ministério da Educação e Cultura (MEC), nos objetivos de uma Política Nacional de Cultura formulada e implementada então. O PLANO nasce, assim, de uma decisão política, mas se concretiza a partir de muitas particularidades. O ambiente

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político e cultural era propício e a circunstância o exigia. O PLANO reúne, através de convênios estaduais, um série de instituições de

caráter público espalhadas pelo país que funcionarão com núcleos de microfilmagem da documentação local sob orientação técnica da Biblioteca Nacional (BN) e da Fundação Casa de Rui Barbosa (FCRB). O microfilme negativo matriz da documentação microfilmada deveria ser arquivado na BN ou na FCRB, que possibilitariam acesso a essa documentação em filme.

Constam como objetivos do PLANO: • preservação da documentação original histórica brasileira - principalmente periódicos - fontes de pesquisa histórica; • divulgação e facilidade de acesso aos pesquisadores de todo o país; • recuperação da documentação histórica local, fazendo-a voltar aos estados, em microforma; • complementação das coleções existentes na Biblioteca Nacional (que representa ou deveria representar - por força do Decreto n° 1825 de 1907 o acervo bibliográfico brasileiro) e nas demais instituições estaduais;

No início da década de 90, são 25.000 matrizes de rolos de microfilmes de periódicos brasileiros preservados através do PLANO, com mais de 8.000 títulos e convênios realizados com mais de 60 instituições nacionais e estrangeiras.

Ao aceitar que o PLANO é fruto de um planejamento administrativo, que tem como conseqüência uma ação promovida por instituições estatais, decorrentes de decisões ideológicas que o sustentam, com pretensões de alcance nacional, contemplado com recursos orçamentários da União, o PLANO ganha extensão, erigindo-se em política cultural.

A retração do mercado de microfilmagem, o fascínio com surgimento da informática e a impossibilidade de completar os cargos públicos na equipe executora do PLANO é entendido, pelo staff do PLANO, como uma opção estratégica desfavorável, por parte da administração pública federal brasileira e que contribui para sua desmobilização.

Hoje, 1998, o PLANO, atuando exclusivamente a partir da BN, desenvolve suas atividades em 3 núcleos estaduais, além do Rio de Janeiro.

Dimensão tecnológica da política

Economia de espaço com a redução dos custos eram os principais motivos que levavam empresas estatais e privadas a adotarem a microfilmagem como a tecnologia capaz de substituir sua massa documental. O uso para preservação ficava restrito a instituições públicas da cultura.

N o PLANO, quatro critérios norteavam a escolha dos jornais a serem microfilmados:

• Títulos mais consultados • Títulos mais estragados • Coleções mais desfalcadas • Coleções inexistentes na BN Eram critérios paralelos, não havia hierarquia, reproduziam os critérios de esco

lha aceitos e praticados internacionalmente. Tais idéias vêm impregnadas de uma opção política praticada, naquele momento, e que iriam definir possibilidades futuras de interpretação histórica.

Com referência às coleções mais desfalcadas e às coleções de periódicos inexistentes na BN, o PLANO recorreu à "microfilmagem sistêmica", que passou a ocupar um lugar de des taque na execução do P L A N O . Para o P L A N O , "microfilmagem sistêmica" consiste não só a complementação das coleções em suas faltas e falhas, mas também a localização dos melhores exemplares disponíveis capazes de permitir a melhor e mais perfeita recuperação do texto original. É um esforço de complementar a coleção nacional depositada na Biblioteca Nacional por força

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da lei do Depósito Legal, de 1907, como também, completar os acervos dos títulos editados em cada um dos estados brasileiros.

A noção de "microfilmagem sistêmica", algumas vezes também chamada de "microfilmagem de falhas", foi a via concebida e aplicada de maneira a satisfazer, simultaneamente, as expectativas e os objetivos do PLANO. Essa noção não foi encontrada teoricamente verticalizada na bibliografia consultada. De qualquer forma, cabe assinalar que esta noção apresenta-se corrente na implementação do PLAN O e ocupa, com evidência, parte central e referencial para decisões políticas e tecnológicas tomadas no âmbito PLANO.

Conclusão

Políticas de Preservação e tecnologias de informação afetam-se mutuamente e de maneiras múltiplas. Essa relação depende e é estabelecida por características específicas dos dois lados, isto é, depende das possibilidades da plataforma tecnológica disponível e da forma e orientação ideológica das decisões políticas. Neste sentido, é fundamental entender que a escolha de determinada tecnologia para a solução de um problema específico não significa que esta pode ser automaticamente estendida a uma estratégia política. A simples escolha e aquisição de um complexo tecnológico não garante o êxito na implementação de uma política de preservação.

Uma política de preservação depende mais de parâmetros que sinalizem para ações de continuidade e amplitude através de programas, projetos ou planos de preservação sistemáticos do que da escolha de determinada tecnologia. A capacidade das instituições envolvidas, a confirmação das possibilidades orçamentárias, a definição filosófica e ideológica dos objetivos e fundamentos das políticas e diretrizes compõem o quadro de prioridades no trabalho para a preservação. Estas características poderão indicar de onde e como se começou, o que deve ser feito e porque, e para onde se pretende seguir e chegar. A preocupação de preservar o já existente, o que passou, o que se deteriora, deve ser complementada pela atenção de preservar o que é produzido hoje.

O desenvolvimento das coleções e dos conjuntos documentais apresentam-se como referências importantes a .serem consideradas na composição das políticas de preservação. Devem também influenciar nas escolhas das tecnologias de preservação. Parece ser impossível a definição e a implementação de uma política de preservação bem sucedida sem que uma gestão de documentos e o estabelecimento de diretrizes para o desenvolvimento de coleções estejam nitidamente contempladas. As grandes dimensões e o crescimento contínuo dos acervos de bibliotecas e arquivos são aspectos a serem considerados na definição das políticas de preservação. Da mesma maneira que não devem ser desconsideradas as limitações financeiras e de recursos humanos.

A visão do conjunto do acervo de uma biblioteca ou arquivo e o respeito à sua função social fazem parte indissociável da formulação dessas políticas públicas de preservação. Pteservação e acesso são os elementos mais evidentes dessa função social. O estabelecimento das prioridades institucionais internas não podem ser feitas sem o "olhar para fora".

O caráter imperativo da preservação dos acervos de documentais públicos determinam essa plataforma complexa. É neste contexto que os profissionais da informação podem, cada vez mais, agir e influenciar no momento da concepção e determinação das políticas de preservação brasileiras. A estes cabe a educação em relação às tecnologias, o que deverá possibilitar desenvolvimento sólido do conhecimento específico para a sintonia entre a opção tecnológica e a decisão política.

A opção tecnológica para a preservação, uma das condições fundamentais para a definição das políticas públicas de preservação, deve nitidamente indicar capacidade de atender as inúmeras necessidades de preservação dos acervos. Não apenas no que se refere a reformatação dos acervos, mas fla complementação das coleções, nas garantias de acesso, nas possibiüdades de uso democrático, na transferência da in-

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formação. Uma opção tecnológica corre riscos importantes ao excluir de suas considerações a evolução da própria tecnologia.

As escolhas feitas para a definição das políticas públicas de preservação carregam consigo fortes influências de outras "escolhas", estabelecidas fora das circunstâncias específicas da área da preservação. São as escolhas econômicas, as escolhas ideológicas, administrativas. E delas são dependentes e por elas condicionadas. A transformação das diretrizes e opções políticas em realização tecnológica de sucesso só acontece quando essa circunstância histórica e política é favorável. A continuidade e descontinuidade das ações, planos e projetos do Estado estão aí inseridas. Os interesses e as necessidades de determinado momento político propiciam altos e baixos nas atividades em execução.

Reconhece-se a complexidade do contexto apresentado, considerando-se as dificuldades estruturais do Brasil. Mas é exatamente este quadro complexo e indefinido no campo da preservação dos acervos documentais brasileiros que deve dar, nas palavras de ATKINSON (1997), "o imperativo moral e epistemológico para assegurar ao futuro" a integridade das coleções que tiveram o privilégio da escolha para a preservação.

Esse imperativo deve estar presente também nos valores determinantes das definições políticas, das opções tecnológicas e na relação dialética que envolve tecnologia e política de preservação. O Plano Nacional de Microfilmagem de Periódicos Brasileiros, os acervos documentais, impressos ou não, as instituições de memória brasileiras, a preservação no Brasil, as políticas públicas de cultura, a sociedade e o cidadão estão aí envolvidos.

Ainda que o conceito de preservação estivesse apenas secundariamente embutido na aplicação da tecnologia de microfilmagem escolhida para o PLANO, a concepção e a implementação do PLANO apresentaram-se, no decorrer desta pesquisa, como se tivessem sido adotadas, quase que exclusivamente, numa tentativa de preencher as lacunas deixadas pelo desrespeito à lei do Depósito Legal nos acervos hemerográficos da Biblioteca Nacional. Aparentemente, foi decisivo, pelo menos nos momentos iniciais do PLANO, a preocupação em prover acesso aos pesquisadores nacionais e estrangeiros ao conjunto hemerográfico brasileiro. Foi uma opção política baseada em uma opção tecnológica de reformatação e em um noção batizada de "microfilmagem sistêmica.

A Política Nacional de Cultura, o Ministério da Educação, o Conselho Federal de Cultura, o Departamento de Assuntos Culturais, a Secretaria de Cultura, a Pró-Me-mória, o Pró-Documento, a Biblioteca Nacional e a Fundação Casa de Rui Barbosa não ofereceram estrutura política suficiente para a consolidação do PLANO e para uma preservação contínua da hemerografia brasileira. Decorrência, muito provavelmente, das fragilidades estruturais próprias da maioria dos órgãos públicos brasileiros, como carência de recursos financeiros, entraves burocráticos/administrativos, falta de amparo legal, desconhecimento ou descumprimento das leis etc.

De outra parte, o PLANO nunca conseguiu se consolidar institucionalmente. Apesar de ter chegado a ser bastante produtivo em determinados momentos de sua história, e de ter concretizado parte de seus objetivos com a microfilmagem de uma parcela importante dos jornais brasileiros, o PLANO não soube fazer-se reconhe cer no seu locus institucional, a Biblioteca Nacional, o que foi decisivo para sua desmobilizaçao. Inicialmente, entraves burocráticos/administrativos impossibilita ram que a BN gerenciasse, dentro de seu orçamento, as verbas externas d o s c o s mos. Para isso o PLANO recorreu, então, à Fundação Casa de Rui Barbosa. Quando retorna, por inteiro, à Biblioteca Nacional, aí então já uma fundação, esta parece não reconhecê-lo em sua estrutura hierárquica e funcional. Gradativamente diretrizes políticas da BN deslocam o PLANO para longe de suas prioridades (da' BN)

n 9^"- " P°nm\T e S t a b d e C e ° P L A N ° ( 1 9 7 9 ) e °início d e « desmobilizado (1989) sao apenas 10 anos. Muito oouco terrmn ™tò „ , wuuDuizaçao

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AflãlS da ABRACOR - POlítiCa da Preservação IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

rentes e com uma ampla plataforma tecnológica disponível, identificar alternativas tanto tecnológicas como políticas que apontem possibüiàaàes de redefinição na sua concepção, identificação de sua verdadeira função social, garantias de planejamento e execução contínuas, novos parâmetros de preservação e acesso e o estabelecimento de um diálogo com a comunidade técnica e com a sociedade civil.

Os formuladores de políticas de preservação no Brasil devem reconhecer que a identificação de possibilidades e características próprias e bem definidas em uma determinada tecnologia e sua utilização com sucesso numa situação, podem ser contraproducentes e desastrosas em outra. Uma concepção integrada entre a definição e implementação de políticas públicas de preservação e as escolhas tecnológicas envolve conhecimento específico de causa, ciência, cultura e democracia. De tal modo que abordar apenas um desses aspectos, implica em comprometer estruturalmente o todo. Tais esforços, considerados em conjunto, acenam para a possibilidade de que, assim, os acervos documentais desempenhem, cada vez mais, seu papel de informar e irradiar cultura ao preservarem os registros da memória social brasileira.

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Resumo do Autor

Arquivista/Conservador, Mestre em Memória Social e Documento, Professor do Departamento de Estudos e Processos Arquivísticos da Universidade do Rio de Janeiro e Consultor em Arquivologia e Conservação do Centro de Memória da Academia Brasileira de Letras.

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Abstract: Critérios e Procedimentos Adotados Pelo MASP no Empréstimo de Obras e nas Exposições Temporárias

This paper describes the procedures adopted by MASP regarding the

preventive conservation of works of Eneida da Cunha Parreira art ín transit. Conservadora/Restauradora de Pinturas

Coordenadora do Departamento de Conservação e Restauro do Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand. Av. Paulista 1578, São Paulo, São Paulo, 01310-200. Telefone: 011 251 5644 - Fax: 011 2840574

Obras do acervo do Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand são freqüentemente requisitadas para participação em exposições no Brasil e no exterior. Nos últimos anos, o museu começou a receber grandes exposições com mais assiduidade e também a organizar suas próprias exposições, planejadas por curadores convidados. Consequentemente, o museu não só empresta como pede em empréstimo obras de colecionadores privados e de museus do Brasil e do exterior.

Desde o pedido de empréstimo até a montagem da exposição há uma complicada seqüência de negociações e procedimentos. Geralmente, os organizadores das mostras e os emprestadores preocupam-se muito com detalhes burocráticos e financeiros, e pouco com o mais importante: planejar para oferecer aos técnicos envolvidos na manipulação das obras, todas as condições necessárias para que os objetos da mostra possam ser transportados, e posteriormente devolvidos no mesmo estado em que se encontravam quando recebidos.

Enquanto exposições nos grandes museus do exterior são planejadas com anos de antecedência, no Brasil há a tendência de organizar-se tudo em poucos meses. O fator que geralmente determina o prazo de tempo disponível é sempre o financeiro. Nunca se sabe se a exposição poderá realizar-se até que os patrocinadores sejam encontrados e isto poderá acontecer somente às vésperas da inauguração. O MASP, como entidade que empresta e pede emprestado para o Brasil e para o extarior, está exposto a essas duas contingências e achamos importante compartilhar com profissionais da área os critérios que estabelecemos para que a movimentação de todas as obras, indo ou vindo, seja feita com a maior segurança possível.

Este trabalho enfocará a conservação preventiva das obras em trânsito e durante exposições temporárias, dando ênfase à manipulação de pinturas. A parte burocrática seria assunto para outro longo trabalho e não será abordada aqui.

Pedidos de Empréstimo

Quando uma obra do acervo do MASP está sendo considerada para empréstimo, o pedido é encaminhado ao departamento de conservação e restauro para que ela seja examinada. O seu exame é sempre feito nas dependências do departamento ou em local muito bem iluminado e com a obra fora da parede. São utilizados ainda uma lupa e uma lanterna que projeta luz rasante de maneira metódica sobre cada centímetro da pintura. O que determina a possibilidade, ou não, do empréstimo é o estado físico da obra: a estabilidade da estrutura da camada pictórica, a resistência do suporte original e do suporte secundário. Eventualmente, se a obra estiver esteticamente em estado que comprometa a sua leitura, o empréstimo não será concedido. Também são verificados o estado de conservação das molduras e a forma de emolduramento. Molduras antigas e frágeis são substituídas por molduras de viagem. Uma obra com a superfície muito frágil poderá receber proteção de vidro ou acrílico durante o empréstimo.

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É norma do museu:

• que todas as molduras tenham seus encaixes forrados com feltro preto (1); • que as obras estejam presas com placas de metal aparafusadas à moldura (2); • que as cunhas dos chassis sejam perfuradas, amarradas com fio de cobre ou nylon, e aparafusadas no chassis por meio de pequenos parafusos(3). • que obras protegidas por vidro tenham espaçadores entre o vidro e o suporte da obra, para evitar contato entre eles. Todos esses itens deverão ser obedecidos caso a obra em questão ainda não

tenha sido tratada dessa forma (4). Todas as pinturas sobre tela, que saiam do museu por qualquer motivo, são protegidas pelo verso com uma placa de poliondas apara-fusada ao chassis com pequenos parafusos (5) (6). Dependendo do tamanho da tela e do seu estado de conservação, medidas mais específicas são adotadas. Dois lacres de papel auto-adesivo informando que a placa de poliondas não poderá ser removida sem autorização do museu, são coladas em duas laterais opostas atravessando a beira da placa e o chassis.

O museu tem como norma não emprestar:

• pinturas sobre suporte de madeira (7). Apesar de todos estudos recentes indicarem que obras sobre madeira sofrem menos os efeitos da movimentação e de mudanças de ambiente, desde que acondicionadas em vitrines climatizadas, o MASP não empresta esse tipo de pintura pelo simples fato de não estarmos preparados para restaurar suportes de madeira, caso a obra retorne com problemas. • pinturas sobre telas que tenham em torno de 100 anos e não sejam reenteladas. Mesmo que a tela esteja aparentemente em bom estado, uma pintura que atingiu aquela idade sem ter sido reentelada é considerada rara e frágil, e faremos o possível para evitar que sofra movimentações intensas, já que também é norma evitar novos reentelamentos a não ser por motivo imperioso.

• obras com dimensões que impeçam seu transporte na posição vertical; em hipótese alguma uma pintura é transportada inclinada ou deitada. • obras sobre papel que tenham como técnica o emprego de pastel, carvão, etc. Essas técnicas são baseadas na aplicação de pigmento seco, sem aglutinante, e portanto passíveis de desprendimento quando submetidas à vibrações. • como parte da negociação de empréstimo o MASP fará exigências com relação ao seguro, transporte, segurança e climatização das áreas de exposição da entidade que requisita a obra.

Laudo Técnico:

Caso a obra seja considerada apta a ser emprestada e o empréstimo tenha sido concedido, é elaborado um laudo técnico. O laudo é um mapeamento de todos os detalhes que possam ser considerados danos causados durante o empréstimo; por exemplo: manchas, perdas antigas, alterações no verniz. Ao laudo são acrescentadas informações úteis em caso de dúvidas ou de decisões a serem tomadas em conseqüência de acidente; como por exemplo, o tipo de reentelmento presente,restauração recente da obra, etc. Nosso laudo é feito em duas partes: uma parte escrita contendo as informações básicas sobre a pintura: nome, autor, dimensões, as informações técnicas e recomendações sobre cuidados especiais que possam ser necessários; a outra, anexa, é uma foto, xerox preto e branco ou colorido da pintura coberto por um acetato onde são marcadas e descritas todas as alterações encontradas. Esse laudo, que acompanha a obra durante toda a sua movimentação fora do museu, será verificado junto com a obra ao chegar ao local do destino, no término da exposição e no retorno ao MASP.

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Embalagem:

É bom lembrar que todos os gastos envolvidos no empréstimo da obra serão de responsabilidade da entidade requisitante, portanto, não há necessidade de tentar-se economizar comprando materiais de menor qualidade, ou se deixando de fazer as exigências necessárias.

Obras do acervo são sempre embaladas por técnicos do museu, mesmo quando a entidade que requisitou a obra contrata empresa especializada em embalagem e transporte de obras. Se o objeto a ser embalado for pintura e ficar constatado que, ao ser embrulhado, o papel tocará a superfície da camada pictórica, tantas fitas de cetim ou algodão quanto necessárias serão amarradas em volta da pintura, nas duas direções, formando uma grade (uma fita em cada direção, em cruz, será suficiente para uma pintura menor) que manterá o papel à distância. Se a obra for protegida por vidro, fita crepe será colada formando uma grade sobre o vidro evitando que, caso se quebre, os pedaços caiam sobre a superfície da obra causando danos. A proteção de fita não é necessária se a obra estiver protegida por acrílico. Primeiramente a obra é embalada em papel glassine preso com fita crepe. A seguir, a Ia

embalagem é envolvida em uma manta de ethafoam e selada com fita de polipropileno. Tentamos selar a obra nesse invólucro para ficar protegida caso a caixa seja molhada por líquido.

As caixas normalmente são fabricadas na marcenaria do museu. São feitas com compensado naval de l,5cm, forradas, inclusive a tampa, com isopor de 5 cm de espessura e espuma de alta densidade com 5 cm de espessura. Todas as emendas da madeira são seladas com silicone e a borda da caixa que recebe a tampa tem um fita de neoprene autoadesiva que sela o encaixe caixa/tampa.

A pintura é então colocada, com a face para baixo(8), na caixa, que estará deitada no chão. Caso haja espaço entre as bordas externas da moldura da obra, já selada no seu invólucro, e a espuma que forra a caixa, tiras de espuma ou rolinhos de manta de ethafoam são colocados preenchendo o vão. É importante verificar se o espaço entre as partes mais altas da moldura e as bordas da abertura da caixa será preenchido pelo forro de isopor e a espuma da tampa da caixa. A obra não deve ficar apertada dentro da caixa mas também não deve haver espaço para que ela se movimente.

O forro da caixa com isopor e espuma será suficiente para manter a temperatura e umidade relativa constante dentro desse ambiente por bastante tempo. Deve-se considerar que a caixa poderá ficar exposta ao sol durante o tempo necessário para o pallet ou container ser carregado no avião, ou durante a viagem de caminhão, que não será necessariamente refrigerado. Também por este motivo, tentamos selar todas as emendas por onde possa haver troca de ar interno com ar externo.

Nossa caixas são fabricadas sem salto para que a empühadeira do aeroporto não possa levantá-la sem o auxílio de funcionários que terão que colocar a caixa sobre o garfo da mesma. Caso contrário, o operador da empühadeira poderá tentar posicionar o garfo sob a caixa sem que esta esteja sendo segurada e derrubá-la, ou, pior ainda, atravessar a caixa com o garfo.

Seguro.

Uma obra do acervo do MASP só sairá do museu após o recebimento de uma cópia da apólice do seguro. Seguro, principalmente no Brasil, é assunto complexo e também foge ao escopo deste trabalho.

Transporte e Courier.

Um courier é sempre designado para acompanhar a obra desde a saída do museu até a mesma ser pendurada na parede da entidade requisitante e vice-versa. Mais uma vez, todas as despesas de transporte, estadia e gastos do courier são responsabilidade do requisitante e devem ser previstas no contrato de empréstimo. O courier não

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ABRACOR - Associação Brasileira de Conservadores-Restauradores de Bens Culturais

é necessariamente um profissional da área de conservação mas sempre um funcionário do museu que será instruído sobre todos os procedimentos a serem seguidos. A partir do momento que a obra deixa o museu, o courier terá trabalho duro e cansativo pela frente. A pessoa escolhida deverá estar bem preparada e em condições de desempenhar este trabalho. Ela será completamente responsável pela obra, e portanto, terá poderes para decidir e exigir o necessário para proteger a sua integridade física. Em qualquer viagem, o courier acompanha o carregamento do caminhão, certifica-se que a caixa está bem amarrada e acompanha a obra até o destino final. Se a viagem for de avião, o courier seguirá dentro do caminhão ou atrás, em um automóvel, até o aeroporto. N o Brasil as áreas de importação e exportação dos aeroportos são consideradas de segurança e é extremamente difícil o acesso sem credenciamento a essas áreas. O MASP tem esquema organizado para que seus couriers possam acompanhar as obras durante todo o processo de alfândega, palletização e carregamento no avião. Qualquer pessoa que já tenha entrado em um armazém alfandegário sabe da movimentação intensa de empilhadeiras e máquinas motorizadas indo e vindo. É por esse motivo que o courier tem que estar ao lado, protegendo e informando o conteúdo da caixa para que todos tenham atenção e cuidado ao se aproximarem dela. No exterior não há nenhuma dificuldade para acompanhar-se a obra, tanto na chegada quanto na saída do aeroporto. O courier, tanto aqui como no exterior, estará acompanhado do despachante responsável pela parte burocrática do despacho ou recebimento da obra.

Em qualquer viagem de avião é importantíssimo certificar-se que as caixas foram carregadas e permanecem dentro do avião na decolagem. Será uma surpresa muito desagradável chegar ao país de destino e descobrir que as caixas foram removidas para ceder lugar a uma carga "mais importante".

Todos os envolvidos no aeroporto e na companhia aérea deverão estar avisados de que haverá o envio ou chegada de obra de arte de grande valor, que deverá ser tratada como carga perecível e que estará acompanhada por courier. Geralmente, os funcionários do aeroporto não fazem distinção entre uma caixa de tomates e uma caixa contendo obras de arte. Eles ficarão intrigados com o fato da caixa estar acompanhada e esta é a deixa para interessá-los no que está sendo transportado. É sempre conveniente ter em mãos uma foto da obra para mostrá-la e a simpatia pessoal será nessa hora, de grande valia para conseguir auxílio e boa vontade. O courier terá que dar instruções de como a carga deve ser posicionada no pallet caso viaje entre outros tipos de carga, ou caso seja um pallet só de obras de arte. É muito importante que toda a carga esteja muito bem amarrada no pallet ou container, e que outras cargas no mesmo pallet não contenham líquido ou qualquer material que possam de alguma forma vir a danificar o conteúdo da caixa sendo acompanhada. A obra deve viajar na direção do vôo, ou seja, paralela às paredes do avião. Caso as dimensões da caixa não permitam seu transporte em avião de passageiros, a viagem poderá ser feita em avião cargueiro com acompanhamento do courier. Todo cargueiro tem algumas poltronas para passageiros e a viagem geralmente é até mais confortável que em aviões normais.

As mesmas regras são válidas no acompanhamento de obras em viagem de caminhão. N o Brasil é muito difícil despachar carga aérea e a maior parte das viagens é feita em caminhões. Nossas obras, de maneira geral, mesmo em longas viagens terrestres, são acompanhadas por courier, viajando no caminhão, ou seguindas atrás em um automóvel. Caso a viagem seja muito longa, e haja necessidade de pernoite, o empréstimo que necessite viagem terrestre no Brasil será negado.

Algumas viagens para o exterior incluem transporte aéreo e terrestre de longa distância. Lá existem transportadoras especializadas em transporte de arte, que estão totalmente preparadas para longas viagens acompanhadas de courier. Nesses casos não encontramos inconvenientes no empréstimo.

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Alfândega.

Toda remessa de obras que envolva alfândega, no Brasil, é extremamente difícil. Como expliquei no princípio, este trabalho só enfocará a manipulação e transporte de obras mas gostaria de enfatizar que a parte burocrática é tão importante quanto os procedimentos descritos aqui. Um documento preenchido errado, um peso de caixa mal calculado, qualquer falha e a obra poderá ficar retida na alfândega e, em conseqüência, grande parte do trabalho de conservação preventiva realizado, poderá ser perdido, e a obra submetida a riscos desnecessários.

O MASP conseguiu que os fiscais da alfândega venham até o museu para conferir o conteúdo das caixas durante a embalagem das obras. Esse procedimento evita que elas sejam abertas no aeroporto. Da mesma forma, quando as obras retornam, o despacho é feito no aeroporto e a caixas só são abertas dentro do museu, com a presença do fiscal da alfândega.

Recebimento e Devolução de Obras.

Chegando ao local de destino, na ida ou na volta, a caixa contendo obras deverá permanecer, de 24 a 48 horas, climatizando, antes de ser aberta. Normalmente as caixas, após recebimento, são colocadas na galeria onde será realizada a exposição, mas também podem ser guardadas na reserva técnica ou outro local preparado para a armazenagem. Seja qual for o local, o courier deve certificar-se que o mesmo é seguro. A caixa não deverá ser aberta em hipótese alguma sem a presença do courier. O local onde finalmente a obra será desembalada deve estar limpo e livre da circulação de pessoas que não estejam envolvidas na montagem da exposição. Se a caixa for aberta na galeria onde a exposição será realizada, o local deve estar pronto, as paredes pintadas, o chão limpo e a climatização adequada. Todas as possibilidades de acidentes devem ser calculadas e eliminadas. Nesse momento a obra deverá ser conferida com o laudo técnico na presença, geralmente, de um restaurador da instituição, ou contratado para esta função. Qualquer detalhe não anotado no laudo e que o restaurador achar relevante, deverá ser acrescentado ao mapeamento do acetato. No final do exame o laudo deverá ser assinado pelo courier e pelo responsável da outra instituição. Uma cópia do laudo é deixada, caso haja dúvidas durante a exposição, e o original deverá ser levado de volta, retornando com o courier que for buscar a obra. O ideal é que a obra seja pendurada ou colocada em vitrine na presença do courier, mas caso isto não seja possível ( o curador poderá estar planejando montar a sala quando todas as obras tiverem chegado e nem sempre o courier pode esperar), a instituição responsável deve oferecer todas as garantias para que o courier possa partir tranqüilo, confiando que a obra será tratada com todo o cuidado. De qualquer maneira, o courier necessita procurar saber se a obra será pendurada de forma conveniente (ganchos, pítons, fios de aço, etc.) e caso tenha de partir antes da colocação da mesma na parede, deverá tentar acompanhar outras obras sendo penduradas para certificar-se que a equipe responsável é competente. O nível da iluminação também precisará ser verificado antes da partida do courier.

Na retirada da obra, todas esses procedimentos deverão ser repetidos. A obra só deve ser removida da parede na presença do courier; o laudo técnico mais uma vez será conferido e assinado e a obra embalada, desta vez pela transportadora especializada contratada pela instituição que organizou a exposição.

Algumas vezes as exposições são itinerantes e, portanto, são transferidas para outras cidades ou países. Dependendo das entidades envolvidas e do estado de conservação da obra, a concessão do empréstimo pode ser feita somente para uma das etapas ou para todas. As -entidades apresentando a exposição podem, com a intenção de cortar custos e facilitar a sua organização, pedir que a obra seja transportada entre uma exposição e outra sem a presença do courier representante do proprietário da obra. Nessa situação, avaliamos a importância da obra, a confiança que temos nos responsáveis pela exposição e tomamos a decisão de enviar ou não um courier.

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De maneira geral, fazemos sempre a exigência da presença de nosso courier.

Quando o MASP Recebe ou Organiza Exposições Temporárias.

Se a exposição for organizada pelo MASP e desde que a entidade ou colecionador proprietário da obra sendo requisitada assim exigir, o museu cumprirá as mesmas exigências que faz ao emprestar uma obra do seu acervo. No caso de um colecionador particular, antes do pedido de empréstimo ser efetivado, o museu enviará um especialista para examinar a obra e verificar se o estado de conservação permite o empréstimo. Um museu, geralmente, tem condições de avaliar quais obras do seu acervo têm condições de ser emprestadas. Quando a exposição envolve muitos colecionadores particulares, no dia da retirada da obra, um especialista do MASP irá junto com a transportadora para elaborar um laudo técnico, supervisionar a embalagem e retirada da obra em qualquer lugar do país. As caixas para uma grande exposição não são fabricadas no MASP, que, geralmente, contrata o serviço da transportadora escolhida para a exposição.

No dia da abertura de caixas, procuramos preparar com antecedência um espaço limpo, com iluminação adequada, mesas acolchoadas com plástico bolha coberto por capas de malha de algodão. Pedaços de espuma de 5cm de espessura, por 5cm de largura, por 30 cm de comprimento são trazidos para que as obras sejam apoiadas sobre eles ao serem preparadas para a montagem. As obras nunca são colocadas diretamente no chão para evitar que escorreguem ou que tenham as molduras danificadas. Pedaços menores de espuma, ou de manta de ethafoam, são colocadas entre o alto da moldura e a parede para evitar arranhar a pintura da galeria que deverá estar pronta para pendurar a exposição. As peças são desembaladas na presença dos couriers que trouxeram as obras, ou no caso de obras desacompanhadas, na presença de responsáveis do setor de montagem do museu, ou do departamento de acervo, ou do setor de conservação e restauro. Todos os laudos são conferidos depois da desembalagem. As caixas vazias recebem etiquetas com a inscrição -va^ia-para que, durante a intensa atividade da desembalagem, uma caixa contendo obras não seja recolhida ao depósito junto com caixas vazias.

É comum que exposições itinerantes cheguem ao MASP sem o acompanhamento de laudos técnicos. Nestes casos, laudos são elaborados pela equipe técnica do museu para cada uma das obras recebidas. Na partida, se os responsáveis pela exposição mostrarem interesse, cópias de todos os laudos lhes serão fornecidas.

Conclusão.

Neste momento em que o Brasil entra no circuito das grandes exposições, é imperioso que todas as instituições que tenham intenção de acolher estas exposições, preparem-se para tal. Como foi descrito acima, a operação de recebimento de uma grande exposição é complexa, laboriosa e envolve grande número de profissionais de diversas áreas. A boa comunicação entre todas as partes envolvidas é de extrema importância. Exigências que não tiverem sido feitas durante as negociações, dificilmente poderão ser satisfeitas depois. A primeira impressão conta muito e quando a negociação com a outra parte encontra problemas por falta de conhecimento, competência ou indecisão, é bem provável que o restante dos procedimentos enfrentem o mesmo tipo de dificuldade. Provavelmente se o museu ou colecionador que empresta tiver dificuldades em ter as exigências já negociadas atendidas, recusar-se-á no futuro a emprestar obras para a mesma instituição. A nossa experiência diz que tudo que puder dar errado durante a movimentação e montagem de uma grande exposição, dá errado. Portanto, o bom planejamento de todas as etapas evitará problemas inesperados.

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Notas:

1- O encaixe da moldura é forrado para evitar danos ao redor das bordas da pintura. 2- Pregos não são utilizados para que a obra não sofra o efeito de golpes de martelo no seu verso e também porque pregos podem enferrujar, cair e movimentar-se. 3- Cunhas soltas podem desprender-se e alojar-se entre a parte inferior do chassis e da tela causando deformação desta e eventualmente desprendimento da camada pictórica. 4- O museu possui 1300 pinturas e esses procedimentos não foram executados sistematicamente. A medida em que as obras do acervo são manipuladas por qualquer motivo, os trabalhos descritos acima são executados. 5- A climatizaçâo do MASP ainda não atingiu a qualidade desejada. Somente por esse motivo as placas de proteção do verso são removidas quando a obra retorna evitando que o micro clima criado entre o verso da tela e a placa favoreça o desenvolvimento de fungo. 6- Fechando o verso do chassis cria-se uma espécie de colchão de ar que diminui as vibrações, além de proteger a tela de golpes pelo verso. 7- Existem exceções e em 1991 o MASP emprestou a obra São Jeronimo para a exposição de Mantegna na Royal Academy de Londres e no Metropolitan Museum de Nova York. O empréstimo foi concedido porque até então atribuída a Mantegna, a obra foi considerada e assim apresentada por Keith Christensen, curador da exposição, como sendo a única obra sobrevivente do Mantegna jovem. Portanto, por motivos históricos foi importante a participação da obra nesta exposição. Para tal foi importada uma vitrine climatizada feita sob medida para acondicionar a obra e a moldura durante as viagens e exposição.

8- É comum as pessoas terem maços de cigarro ou canetas no bolso da camisa. Ao se debruçarem para colocar a pintura na caixa, os objetos podem tombar sobre a face da pintura que, mesmo estando embalada, pode ser danificada. Por este motivo, adotamos o critério de colocar a pintura na caixa com a face para baixo.

Bibliografia

Art in Transit: studies in the transport ofpaintings. Washington, National Gallery of Art, 1991.

SHELLEY, Marjorie. The Care and Handling of Art Objects: practices in the Metropolian Museum of Art.

Nova York, Metropolitan Museum of Art, 1987. STOLOW, Nathan. Conservation andExhibition:packing, transport, storage and environmental

considerations. Londres, Butterworths, 1987.

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A.bstract

This paper emphasizes the necessity of adaptations on the equipament traditionally used for paper conservation, aimming ethnographics heaps. The objective was the reaplication of technics to obtain the preservation of objects phisical integrity and consequently reducing their degradation. It was necessary the adoption of a conservation policy, implemented through modernization of equipment and procedures , resulting on a new structure for the Restoration Laboratory.

Novas Instalações do Laboratório de Restauração do Museu do índio: Outras Possibilidades de Conservação de Acervo Etnográfico.

Lúcia Bastos Museóloga, Restauradora. Museu do Índio/FUNAI. Rua das Palmeiras, 55, Botafogo, RJ-Brasil Telefax: 286-8899 e-mail: [email protected]

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O Museu do índio foi criado em 19 abril de 1953, como parte da Seção de Estudos do Serviço de Proteção aos índios (SPI), o antigo órgão encarregado de desenvolver a política indigenista do governo brasileiro. Funcionando num prédio pertencente ao Ministério da Agricultura, no bairro do Maracanã (Rio de Janeiro), o Museu foi fundado com o objetivo de divulgar informações corretas, atualizadas e sem preconceitos sobre as populações indígenas que vivem no Brasil, despertando o interesse do público pelo que se convencionou chamar "questão indígena".

Seu acervo inicial foi formado pelos objetos coletados e pelos registros fílmicos e fotográficos oriundos dos trabalhos de campo da Comissão Rondon(l890-1915) e dos próprios técnicos e pesquisadores da Seção de Estudos do SPI(1910-1967).

Em 1978, o Museu do índio foi transferido para um prédio histórico, tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional(IPHAN) e pertencente ao Ministério do Interior, ao qual a FUNAI- Fundação Nacional do índio estava subordinada, à época.

Hoje, o Museu continua pertencendo à FUNAI que, por sua vez, está ligada ao Ministério da Justiça desde 1990. A partir de 1993, o Museu vem passando por diversas obras de reforma, restauração de seu espaço e valorização de seu acervo, dando prioridade aos Serviços de Museologia, Biblioteca, Arquivo e Registro Audiovisual. A criação do Laboratório de Restauração ocorreu naquele ano, mas o projeto original de sua instalação data de 1986. Por ocasião de sua inauguração, constaram apenas os itens básicos para seu funcionamento, proporcionando, assim, um atendimento limitado ao acervo.

Em 1997, a atual Direção incrementou a política de preservação e priorização dos acervos, e em conjunto com a equipe técnica, iniciou a reestruturação do atual Laboratório. Norteados pela importância da modernização de equipamentos e procedimentos, elaboramos o projeto de reforma do espaço físico e suas instalações. Para isso, foi necessário uma intervenção na planta original, visando atender às novas instalações hidráulicas, elétricas, de segurança e mesmo uma duplicação da área, com o objetivo de adaptar mobiliário, equipamentos e materiais.

Após observação do espaço físico (18,30m2) e a lista das necessidades, redefinimos as dimensões e localização do banheiro, minimizado para instalação da Câmara de Fumigação; da bancada retirada das paredes para ocupar o centro do espaço; da pia substituída por uma mais adequada; dos pontos de luz e tomadas, para que não houvesse sobrecarga de energia; e até mesmo das janelas, proporcionando maior aeração. As outras modificações importantes, foram a duplicação de parte do espaço, com um mesganino de aço e a instalação de um sistema de alarmes para detecção

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FIG 1. Abertura da Câmara de Fumiga-ção para Retirada dos Têxteis Foto : Goretti Moreira

Higienização de parte da rede de algodão na Mesa de Sucção. Foto : Rogério Martins

de fumaça e de presenças estranhas ao ambiente(infravermelho). A necessidade da aplicação de novos procedimentos de conservação foi calcada

na principal função de um Museu, que é a de preservar os bens culturais que estão sob sua guarda. O acervo etnográfico é composto de objetos confeccionados por materiais orgânicos, contendo o elemento carbono em sua composição e, por isso, são mais sensíveis às agressões e degradações. A complexidade de sua conservação, a carência de bibliografia e estudos que fundamentem e comprovem técnicas e métodos mais adequados, nos levaram a adquirir e utilizar equipamentos que tradicionalmente são usados na preservação de documentos e livros. Constatamos, após algumas observações relativas ao seu funcionamento, que estes poderiam ser adaptados ao acervo.

O primeiro equipamento trata-se da Câmara de FumigaçãoÇFlG.l), utilizada na desinfestação de fungos, que se desenvolvem em têxteis, fibras, penas e adornos de materiais ecléticos (sementes, frutos, dentes, unhas etc). Assim como na desinfestação de cupins e brocas, que atingem as peças acima citadas. Com a utilização deste equipamento, evitamos que uma série de procedimentos continuassem a comprometer a integridade estrutural das peças e dos profissionais que trabalham em sua conservação.

É necessário esclarecer que peças de madeira e argila, que também são atingidas por fungos, brocas, cupins e lyctus, não estão sendo colocadas na câmara, por observarmos que o método não confere uma proteção eficaz a longo prazo, devido à natureza do material. A forma gasosa proporciona uma penetração fácil em objetos porosos, porém pouco duradoura. Optamos por utilizar outros métodos curativos, por meio mecânico e por congelamento. A higienização aplicada obedece a critérios previamente estabelecidos.

Quanto à Mesa de Sucção{¥\G%.2,l> e 5), estão sendo higienizadas peças compostas de penas, fibras e têxteis. Este equipamento adequou-se aos objetos planos do acervo, proporcionando a eliminação de grande parte da sujidade neles contidos, preservando, assim, sua integridade estrutural e estética. A redução do manuseio e a sucção constante evitam os possíveis encharques desnecessários ao objeto. As categorias beneficiadas são as coleções de plumária, como: diademas, pulseiras, braçadeiras, faixas, testeiras, brincos, cintos, cintas, colares, pingentes, narigueiras, grampos, penachos e labretes emplumados; têxteis como: redes, bolsas, testeiras, tornozeleiras, braçadeiras, mantos, pulseiras, tipóias, saias, tangas, cintos e cintas; trançados de fibra, como: abanos, peneiras, bolsas, jarreteiras, braçadeiras, cintos, esteiras, tapetes, pulseiras, colares, tangas, puçás e tipóias; além de alguns adornos confeccionados com materiais ecléticos, como: tanga de sementes e miçangas, colares, pulseiras de sementes e miçangas, braçadeiras, fitas frontais de couro e fibra, cintos, cintas, sobrecintos de sementes e miçangas, escabelos, aventais e tipóias de líber (entrecasca de árvore).

Foram executados uma série de testes para confirmar a impossibilidade do comprometimento estrutural da peça a curto, médio e longo prazo. Selecionamos, assim, seis testes, com três categorias materiais, para fins comparativos. Passamos, então, a descrever os procedimentos, técnicas e produtos utilizados em sua higienização e desinfestação.

Com a Câmara de Fumigação

TESTE 1 Eeçai Diadema horizontal NZ:225 Procedência: Mehinako, Alto Xingu, Mato Grosso Descrição: Diadema composto de fieira de penas amarelas, com detalhe em penas vermelhas costurado às penas amarelas no lado direito da peça. Apresenta, ao centro, duas penas caudais de arara na cor azul. Diagnóstico: Infestação por broca e desidratação

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FIG 3. Higienização do diadema horizontal emplumado. Foto : Goretti Moreira

FIG 4. A mesma figura higienizada e reidatrada Foto : Goretti Moreira

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Tratamento realizado: Desinfestação através da câmara de fumigação, utilizando Formol na proporção de 15 pastilhas de lgr. para 0,42 m \ Volatilização durante 45 minutos, permanecendo em seu interior por 72 horas. Expurgo com água por 15 minutos e 'a seco por 30 minutos.. Permanência na secadora por 24 horas Comentário: Observamos que além da exterminação do inseto, proporcionou uma reidratação favorável às penas

TESTE 2 (FIG. 1) Eeçai Bolsa tecida N i 8573 Procedência: Botocudo, Espírito Santo Descrição: Saco raso com alça tecida, segundo a técnica do trabalho em malha; utilizada para o transporte de objetos Diagnóstico: Infestação por fungos Tratamento realizado: Desinfestação através da câmara de fumigação, utilizando Timol na proporção de 20 gramas para 0,42 m \ Volatilização durante 30 minutos, permanecendo por 72 horas no interior. Expurgo com água durante 15 minutos e à seco por 30 minutos. Permanência na secadora por 24 horas. Comentário: Como no caso da plumária, verificamos uma mudança na textura da fibra, proporcionando maleabilidade à peça. Talvez o expurgo com água tenha proporcionado um tipo de reidratação. Pode ser utilizado, também, 15 gr de Timol

TESTE 3 (FIG. 1) Eeçai Rede de algodão N i 6822 Procedência: Terena, Mato Grosso do Sul Diagnóstico: Infestação por fungo. Apresenta áreas fragmentadas devido à baixa resistência mecânica, provocada pelo excesso de fungos. Tratamento realizado: Desinfestação através da câmara de fumigação, utilizando Timol na proporção de 20 gramas para 0,42 m3. Volatilização durante 30 minutos, permanecendo por 72 horas em seu interior. Expurgo com água por 15 minutos e a seco por 30 minutos. Permanência na secadora por 24 horas. Comentár io : Verificamos uma mudança na textura da fibra, readquir indo maleabilidade. Talvez o expurgo com água tenha proporcionado um tipo de reidratação. Pode ser utilizado, também, 15 gr de Timol.

Com a Mesa de Sucção

TESTE 4 (FIG.3 e 4) Eeçai Diadema horizontal N i 225 Procedência: Mehinako, Alto Xingu, Mato Grosso Descrição: Diadema composto de fieira de penas amarelas, com detalhe em penas vermelhas costurado às penas amarelas no lado direito da peça. Apresenta, ao centro, duas penas caudais de arara na cor azul

Diagnóstico: Alto grau de sujidade provocada, provavelmente, pelo excesso de umidade relativa, associada á poeira que umedece e penetra na pena. Desidratação Tratamento realizado: Higienização mecânica, através da Mesa de Higienização, para remoção do excesso de sujidade generalizada. Higienização na Mesa de Sucção, utilizando três borrifadores com solução de 450ml de água deionizada na proporção de 20ml de Detertec 7 neutro, na primeira etapa. Dois borrifadores com 450ml de água deionizada pura, na etapa de enxagüe. Utilizamos um borrifador com solução de 450ml de água deionizada na proporção delOml de vaselina líquida pura, para reidratação. Após secagem aplicamos, mecanicamente, vaselina, no sentido natural da pena Comentário: Observamos que poderíamos ter intercalado água deionizada pura com

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FIG 5. Higienização da bolsa tecida em fibra vegetal Foto : Goretti Moreira

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FIG 6. A mesma bolsa higienizada Foto : Rogério Martins

as de solução de água com Detertec, proporcionando um enxágüe mais eficiente, pois percebemos que as penas após secagem, sem a reidratação mecânica, apresentaram grande ressecamento. É necessário que a medida de 20ml de Detertec seja reduzida para lOml, neste caso

TESTE 5 (FIG.S e 6) Peça: Bolsa tecida de fibra Í Ü 8 5 7 3 Procedência: Botocudo, Espírito Santo Descrição: Saco raso com alça, tecida segundo a técnica do trabalho em malha; utilizada para o transporte de objetos Diagnóstico: Alto grau de sujidade, com concentração aparente de fungos inativos, pois foi submetida a fumigação com Timol,. Apresenta manchas provocadas por esta infestação Tratamento realizado: Higienização mecânica através da Mesa de Higienização, para remoção do excesso de fungos e de sujidade generalizada. Higienização na Mesa de Sucção, utilizando dois borrifadores com solução de 450 ml de água deionizada na proporção de 20ml de Detertec 7, na primeira etapa e três borrifadores com 450ml de água deionizada pura, na etapa de enxagüe. Utilizamos higienização mecânica nas partes mais afetadas Comentário: Observamos que poderíamos ter intercalado água deionizada pura com as de solução de água com Detertec, proporcionando um enxágüe mais eficiente, pois percebemos que, após a secagem, a peça apresentou um certo grau de ressecamento. É necessário que a medida de 20ml de Detertec seja reduzida para lOml, como no caso anterior. Percebemos, também, que apesar de uma remoção satisfatória de sujidade e fungos, a peça apresentou manchas nos locais mais afetados

TESTE 6 (FIG.2) Peça: Rede de dormir de algodão R i 6822 Procedência: Terena, Mato Grosso do Sul Descrição: Leito balouçante, confeccionado em algodão, suspenso pelas extremidades, que são terminadas em argolas do mesmo material Diagnóstico: Alto grau de sujidade, com concentração aparente de fungos inativos, pois foi submetida à fumigação com Timol. Apresenta manchas generalizadas e áreas fragmentadas, devido à baixa resistência mecânica provocada pelo excesso de fungos Tratamento realizada: Higienização mecânica, através da Mesa de Higienização, para remoção do excesso de fungos e de sujidade generalizada. Higienização na Mesa de Sucção, utilizando dois borrifadores com a solução de 450 ml de água deionizada na proporção de 20ml de Detertec, na primeira etapa e três borrifadores com 450ml de água deionizada pura para a etapa de enxagüe. Utilizamos higienização mecânica nas partes mais afetadas Comentário: Optamos pela higienização por áreas, devido à grande dimensão da peça e ao alto grau de sujidade. Observamos, que por apresentar uma trama densa e uma grande espessura, o método de higienização até então aplicado não produzia uma limpeza eficiente. Foi necessário reduzir a janela anteriormente definida para este trabalho, aumentando o poder de sucção.

Conclusão

Os testes realizados permitem concluir que:

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• A Câmara de Fumigação, atendeu as necessidades do acervo nas categorias citadas, por minimizar as aplicações mecânicas de métodos curativos; • Atendeu, também, as necessidades dos profissionais de conservação, preservando-os de exposições desnecessárias a produtos químicos e infestações variadas; • O expurgo com água proporcionou uma boa reidratação às peças de plumária, fibra e algodão; • A Mesa de Sucção atendeu completamente a necessidade de minimizar as intervenções mecânicas de higienização, evitando a degradação estética e estrutural do objeto; • As proporções de Detertec 7, utilizadas nas soluções para higienização, devem ser equilibradas para evitar uma possível desidratação excessiva do objeto; • Devem ser reavaliadas, sempre que necessário, as etapas de aplicação de qualquer tipo de técnica, utilizando sempre a observação e o bom senso, no momento de definição da seleção.

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Abstract

We present the results of two stages of the project "Packing and Storing Archaelogical and Ethnographic Collections in Storage Área", sponsored by VITAE and with specially-designed storage system suported by FAPESP. Thirty thousand objects have been stored as of now. To pack and store such a large and diversified collection, several researches and special solutions were needed, from the design of storage system for specific objects up to the selection of ali materiais which would be in close contact with museum objects. We have been taking ali the available precautions to guarantee the collection safety according to the principies of preventive conservation.

Acondicionamento e Armazenamento das Coleções Etnográficas e Arqueológicas nas Áreas de Reserva Técnica

Yacy-Ara Froner; Gedley Belchior Braga & Cibele Aldrovandi Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de São Paulo Av. Prof. Almeida Prado, 1466 - Cidade Universitária - São Paulo - SP -CEP: 05508-900. Fone (011) 818 4695/8184897; Fax: (011) 8184888 E-mail: [email protected]

Introdução

A área de Reserva Técnica do Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de São Paulo compreende aproximadamente quinhentos metros quadrados, atualmente divididos em seis salas, das quais quatro estão interligadas. As outras duas salas foram separadas da seguinte forma: uma delas será adaptada para receber um mobiliário especial para armazenamento de objetos etnográficos de dimensões variadas, como máscaras e vestimentas, que não podem ser armazenadas nos mobiliários existentes; pequena sala para estudos e triagem de acervo armazenado, onde trabalharão pesquisadores desta e de outras instituições. Cabe lembrar que há pesquisas em andamento de profissionais oriundos de várias partes do Brasil, como também pesquisadores estrangeiros. Ainda possuímos uma sala externa para armazenamento de objetos de grande porte, com um acesso independente, facilitando a aproximação de veículos, onde estão armazenadas canoas etnográficas e urnas cerâmicas funerárias arqueológicas. Esta última sala acabou de receber um mobiliário de aço financiado pela VITAE, especificamente desenhado para guardar aqueles objetos de dimensões especiais.

A diversidade das coleções e o número elevado de artefatos existentes no acervo têm exigido do Serviço Técnico de Curadoria um maior empenho no planejamento racional das atividades relacionadas ao armazenamento e à própria documentação, considerando que grande parte desse patrimônio estava localizado em outras unidades da Universidade de São Paulo. Nesse momento, estamos concluindo a transferência do Acervo Plínio Ayrosa, que estava provisoriamente alojado nas dependências do Departamento de Antropologia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas.

Na Reserva Técnica do MAE está instalado o coração do Museu: nela encontramos mais de 90% de todo acervo, disponível às pesquisas e à montagem de exposições temporárias.

Ao planejar a adequação da Reserva, levamos em consideração as seguintes questões:

1 O volume do acervo, estimado em cerca de cem mil artefatos; 2 O caráter científico do Museu, implicando em uma probabilidade muito grande de acréscimo constante no número das coleções; 3 O caráter da Divisão Científica do MAE, responsável pelo gerenciamento curatorial do acervo, voltado para a pesquisa científica e para o ensino acadêmico; 4 O apoio técnico à Divisão de Difusão Cultural, responsável pela extroversão e pelas atividades expositivas. A FAPESP financiou todo o mobiliário da Reserva Técnica, equipamentos de

monitoramento ambiental, melhorias e equipamentos do Laboratório de Conservação e Restauro além de uma sala de imunização especial que também tem servido de

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sala de quarentena para objetos com suspeita de contaminação por insetos xilófagos. Esta mesma agência financiou a implantação de um sistema de proteção contra incêndio, a troca do piso, da rede elétrica e iluminação de toda área da curadoria.

A VITAE está financiando este projeto de acondicionamento e armazenamento das coleções etnográficas e arqueológicas, além do mobiliário, já citado anteriormente, para a guarda dos objetos de grande porte. Duas etapas deste projeto já foram cumpridas: 1 - o acondicionamento do acervo etnográfico brasileiro que pertencia ao Museu Paulista; 2 - o acondicionamento do acervo etnográfico africano, de arqueologia americana (incluindo a Coleção Tapajônica e a Coleção Max Uhle) e mediterrâneo e médio oriental (MMO). A terceira etapa seria o acondicionamento do acervo de pré-história brasileira, mas, com a transferência para o MAE do Acervo Plínio Ayrosa - constituído, em sua maioria, por artefatos etnográficos brasileiros, de matérias-primas orgânicas, muito mais vulneráveis à biodeterioração e alterações formais, decidimos solicitar à VITAE uma alteração do projeto inicial, privilegiando este último por razões emergenciais. A nossa solicitação foi prontamente aceita.

Descr ição das at ividades

/ - 0 mobiliário O mobiliário foi desenhado de acordo com as características do acervo a ser acon-dicionado. Escolhemos o sistema de estantes de aço deslizantes sobre trilhos por ser o melhor meio de aproveitamento do espaço disponível (com aproximadamente 50% de economia de espaço em relação aos móveis convencionais) e atender aos critérios da Visible Storage (armazenamento visível), utilizados em museus científicos como forma de facilitar a visualização dos objetos nos processos seletivos de pesquisa e exposição. Neste sistema, foram separados módulos especiais para objetos que necessitavam de um acondicionamento diferenciado. Foi o caso dos têxteis, das flechas, arcos, bordunas, máscaras, vestimentas de entrecasca e cestaria. Para os outros objetos, que poderiam ser armazenados normalmente, foram projetadas prateleiras comuns e gavetas deslizantes - nesse contexto, o cuidado maior seria na confecção das embalagens para o acondicionamento.

A atenção ao selecionar o mobiliário e todos os materiais que estariam em contato com o acervo estava voltada para a adequação dos princípios da Conservação Preventiva à nossa realidade. O espaço de nossa Reserva Técnica não é climatizado. Temos circuladores de ar dotados de filtros para impedir a entrada de partículas indesejáveis. N o entanto, se ainda não podemos impedir a entrada de gases prejudiciais, podemos utilizar materiais de acondicionamento e armazenamento que não emitam estes agentes nocivos e que não possam atuar na aceleração dos fatores de degradação.

2 - Pesquisa e aquisição de materiais Os materiais selecionados e métodos utilizados são, em grande parte, frutos de conhecimentos adquiridos com o livro Storage of Natural Historj Collections: Ideas and Praticai Solutions, de Carolyn L. Rose e Amparo R. Torres (1985). Também auxiliou muito o curso "Conservación Preventiva: Colecciones dei Museo y su Médio Ambiente" (México - 1995), freqüentado pela conservadora Yacy-Ara Froner (cuja viagem foi subsidiada pela VITAE), e organizado pelo The Getty Conservation Institute. Na maior parte dos sistemas de acondicionamento decidimos utilizar a espuma de polietileno - Ethafoam -, encontrada sob diversas formas no mercado externo. Este material além de ser inerte pode ser recortado de acordo com as formas dos objetos, colado com cola de silicone na construção de caixas e divisórias internas, ou, simplesmente, servir de apoio para objetos pesados, tudo isso sem oferecer riscos para o acervo, acomodando as peças confortavelmente, protegendo-as de deslocamentos e impactos ao movimentar as estantes, os flecheiros, gavetas etc. O mais difícil foi achar um fornecedor brasileiro para este material.

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As placas de Ethafoam são vendidas com espessura de 50mm e medidas de 900 x 600mm. Para um maior aproveitamento, solicitamos um corte industrial, executado pelo mesmo fornecedor, Termoservice Comercial Ltda (SP), com três dimensões diferentes: 25mm de espessura para caixas com objetos mais pesados, como cerâmicas, esculturas e líticos; 18mm de espessura para as paredes externas (ou divisões internas de caixas de objetos pesados) e base para objetos leves; l l m m de espessura para paredes internas de caixas de peças pequenas e médias (estas últimas placas ainda foram, muitas vezes, cortadas ao meio manualmente para dividir caixas de minúsculos objetos, aproveitando melhor o espaço e economizando materi-ai).

Com o mesmo fornecedor, conseguimos tubos do mesmo material (de diversos diâmetros e espessuras, utilizados originariamente como isolamento térmico para tubulação de equipamentos de saunas e de refrigeração industrial), que foram muito úteis no armazenamento de têxteis, flechas, arcos e bordunas.

A cola de silicone em bastão é um adesivo termoplástico utilizado com pistolas elétricas, sendo esta associação muito eficiente no trabalho com o Ethafoam. O refil é vendido em embalagens contendo seis ou mais bastões. E necessário uma certa rapidez para lidar com este material, uma vez que ele só está ativo como adesivo enquanto aquecido. Outro detalhe importante é que na construção das caixas, divisórias e proteção para os objetos, o consumo de silicone é muito grande.

Na primeira etapa deste projeto, a equipe do Laboratório de Conservação e Restauro do MAE adquiriu uma grande experiência em construir as caixas com espuma de polietileno expandido (Ethafoam), adequando as divisões internas ao tamanho e desenho das peças, dando mais segurança e estabilidade aos objetos acondiciona-dos. Isto foi fundamental para a execução da segunda etapa, em que a maioria das coleções a ser armazenada era constituída por objetos de cerâmica. Com a construção de nossas próprias caixas pudemos adaptá-las ao formato das prateleiras e gavetas, havendo uma otimização dos espaços internos dos armários de aço. Até este momento, não havia no mercado caixas de polietileno prontas que atendessem nossas necessidades e nos garantissem a mesma eficácia no acondicionamento e armazenamento do acervo

O restante dos materiais utilizados foi adquirido em casas de material para embalagens, armarinhos e Casa do Restaurador (SP).

3 - Imunização Os artefatos etnográficos, por excelência, são perecíveis em sua maioria. Sua perenidade está associada à constituição orgânica dos suportes materiais dessas peças, geralmente confeccionadas em fibras vegetais e animais; plumas; couros; cascas; sementes; madeira; resinas vegetais; pigmentos naturais; ossos; unhas; cascos; presas; dentes etc.

Além da degradação natural de cada tipo específico de matéria orgânica, a maior parte dos artefatos é construída a partir da associação de um ou mais elementos distintos - plumas e madeiras; fibras e dentes; resinas e madeiras... - em uma combinação infinita, de acordo com as técnicas particulares de cada etnia; do uso determinado dos objetos; da arte e da imaginação de cada cultura individual.

Uma das maiores causas de deterioração desse tipo de acervo é decorrente de ataques biológicos, uma vez que estes produtos orgânicos são as principais fontes de alimentação de várias espécies de insetos e fungos. Os agentes biológicos geralmente são introduzidos nas coleções, arquivos e museus através do ambiente externo ou a partir do contato com outros materiais infestados, trazidos de outros edifícios. Assim, o ataque por insetos xilófagos é comum nesse tipo de coleção, causando estragos, muitas vezes, irreversíveis. Os insetos mais encontrados em nosso acervo são os da ordem Isoptera (térmitas ou cupins) e Coleóptera (besouros ou brocas).

A detecção e o extermínio de pragas sobre todos os objetos a serem armazenados são atividades prioritárias. Com o intuito de proteger acervos suscetíveis a esse tipo de ataque e tratar peças com indícios de contaminação, utilizamos dois tipos de

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tratamento: congelamento e controle químico em sala de imunização. Estes dois métodos de controle foram escolhidos, basicamente, por não deixarem resíduos no material tratado.

A prática de congelamento tem demonstrado eficiência no tratamento de erradicação de pragas em artefatos etnográficos de origem vegetal. Esta técnica consiste em uma alteração brusca da temperatura no ambiente em que o objeto se encontra - abaixo de 20 graus centígrados negativos - promovendo a morte imediata dos insetos adultos. Para o controle das larvas, pupas e ovos, o objeto deve ficar exposto por, no mínimo, 48 horas nesse ambiente resfriado, sendo utilizado, no MAE, um freezer convencional. Para evitar a condensação de umidade nas peças tratadas, foram utilizados sacos plásticos zipados, próprios para o congelamento de alimentos, fechados a vácuo através de dispositivo manual. Observamos a qualidade do tratamento a partir dos insetos mortos encontrados e pelo fato de nos objetos que evidenciavam ataque ativo o processo ter sido estancado. A inconveniência desse método reside no fato de que o tamanho do freezer convencional impossibilita a imunização de objetos de grande porte; além de esse tipo de tratamento não ser indicado para materiais vítreos, cerâmica, metais e líticos, encontrados, algumas vezes, associados às fibras vegetais.

Em casos de contaminação muito grave de grande parte do acervo etnográfico, fomos obrigados a recorrer ao uso do Gastoxin, nome comercial do fosfeto de alumínio. Apesar de o uso desse tipo de tratamento estar sendo evitado na maioria dos museus, a infestação detectada em larga quantidade de objetos de grande e médio porte nos obrigou a utilizar este método mais rápido e radical. Este produto -AIP - reage com a umidade atmosférica - 3 H 2 0 - liberando o gás fosfeto de hidrogênio ou fosfina - PH3 - e resíduo restante de hidróxido de alumínio - AI(OH)3. Esta reação química pode ser acelerada pelo calor e umidade e retardada pelo frio e ar seco. Por apresentar efeitos colaterais perigosos aos seres humanos, seu uso é controlado e merece um rigoroso cuidado com equipamentos de proteção e segurança. O MAE possui uma câmara especial para realizar este tipo de trabalho, estando equipada com sistema de exaustão, janelas blindadas, porta de segurança, timer e controle externo de todo o equipamento.

Este gás é muito usado na agricultura para conservar grãos, sementes e afins, sem deixar resíduos químicos. É por isso que o utilizamos na conservação de objetos atacados por insetos.

No entanto, a pastilha que libera o gás tóxico deixa um resíduo que, antes de desativado, ainda é bastante perigoso. Com a larga utilização deste produto, obtive-mos uma experiência quanto à desativação deste resíduo após um pequeno incidente. O lixo químico estava sendo acumulado no sótão do Museu há vários anos. O problema é que esse resíduo ainda contém fosfeto de alumínio. Este não pode estar em uma concentração acima do limite de explosividade, que é de 27,lg por metro cúbico. E foi exatamente isso o que ocorreu. O produto acumulado começou a se inflamar espontaneamente. Entramos em contato com diversas unidades dentro da universidade e nada de concreto foi feito. Uma firma de Sorocaba se dispôs a fazer o descarte para nós. Entretanto, o que era um grande problema para o MAE (dois vidros contendo o resíduo), era pouco para aquela empresa acostumada a lidar com toneladas de lixo tóxico. Mas, ao mesmo tempo, também entramos em contato com a firma que produz o agente fumigante, Casa Bernardo Ltda, e eles se interessaram em nos ensinar como desativar o resíduo. Um técnico desta indústria de São Vicente (SP) foi deslocado para o Museu, e, em uma manobra mais simples do que se pensava, desativou o produto com um procedimento envolvendo água e detergente industrial neutro em uma forte concentração. O agente nocivo foi transformado em hidróxido de alumínio, que não oferece mais riscos ambientais e pode ser descartado normalmente.

4 - Higieni^afão e intervenções no acervo A maior parte do acervo, principalmente a cestaria e o material cerâmico, recebeu

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uma limpeza superficial com trincha, em mesa de higienização. Esta mesa, com sistema de sucção da poeira removida por trincha, facilitou a remoção da sujidade superficial dos artefatos, agilizando nossos trabalhos.

Além dos tratamentos de imunização e higienização, algumas peças receberam intervenções de restauro. Dentre estas peças, as bonecas Karajás, confeccionadas em cerâmica, sofreram muito com o processo de mudança além de muitas delas já se encontrarem quebradas bem antes da transferência. A maioria delas foi levada para o Laboratório onde foram tratadas emergencialmente, ou seja, apenas unimos os fragmentos com adesivo PVA neutro e registramos a intervenção para, no futuro, podermos completar a restauração. Durante a execução da segunda etapa, quando todas as bonecas já estavam armazenadas, foi constatada uma infestação por coleópteros nos adereços de palha e massa de resina orgânica das mesmas. Imediatamente tivemos que tratá-las cem agente imunizante, no caso, um piretróide (K-Othrine CE 25 dissolvido a 1% em álcool etílico) aplicado através de pincelamento ou injetados com agulha e seringa descartável.

Muitas peças de cerâmica da Coleção Tapajônica também estavam fragmentadas. Contamos com a ajuda da mestranda Denise Maria Cavalcante Gomes, que pesquisa este material, tendo-o identificado e realizado trabalhos voluntários de limpeza e até de fixação de peças fragmentadas em Laboratório. Seu projeto de mestrado é "Análise iconográfica dos vasos cerâmicos de Santarém: a Coleção MAE/USP". A pesquisa engloba os vasos inteiros e apêndices de vasos e tem se beneficiado do novo sistema de acondicionamento, o que já permitiu a verificação de que não se trata de uma coleção típica somente de Santarém, como se acreditava, mas também inclui materiais provavelmente próximos do Baixo Amazonas.

Outro caso digno de nota foi uma ânfora de figuras vermelhas que estava completamente esquecida, e sem registro de entrada na documentação do Museu. Acreditando que se tratasse de cópia antiga de uma ânfora grega, ela era guardada junto com algumas cópias clássicas. Devido ao trabalho de acondicionamento, a peça foi "notada" pela pesquisadora Prof. Dra. Haiganuch Sarian, que pediu para que se efetuasse uma limpeza mais profunda na peça. N o momento, vem-se considerando a hipótese de ser um possível original do século IV a.C, se não ático, do sul da Itália ou da Sicília. A cerâmica se encontra no Laboratório e vários testes têm sido feitos com solventes e outros exames especiais, constatando que a peça já sofreu algumas intervenções anteriores; amostras da argila já foram retiradas para análises químicas e comparações com outras amostras do material da região. É uma pesquisa que demandará um certo tempo para termos conclusões efetivas.

Houve também o caso de uma peça afro-brasileira de madeira com uma contaminação muito grave por fungos, que foi removida para o Laboratório. Verificou-se a necessidade de remoção de uma camada de cera que a recobria, praticamente toda atacada por micro-organismos. Fomos informados que esta cera não era original, se tratava de consolidações de tratamentos anteriores, e sua remoção foi feita com o uso de xileno. Este ataque talvez tenha acontecido pelo fato de esta peça ter ficado fechada em embalagem de plástico com alto índice de umidade por muito tempo, sem possibilidade de ventilação e no escuro, o que favoreceu a proliferação dos fungos. Esta peça ainda se encont ra em t ra tamento , mas seu espaço de armazenamento já foi devidamente reservado.

Percebemos, durante o procedimento de armazenagem, a impossibilidade de restaurar todo o acervo que apresenta problemas de degradação, portanto, selecionamos aqueles casos mais urgentes e algumas solicitações especiais de pesquisadores. Mas a maior parte dos objetos foram armazenados com uma separação, em sacos zipados, e com observação em ficha de registro de entrada de acervo, para localização e tratamento assim que for possível.

5 - Documentação O gerenciamento documental dos artefatos armazenados foi realizado, efetivamente, por toda a equipe de trabalho. A ficha de acompanhamento de entrada de acervo,

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idealizada em conjunto pela equipe técnica, foi utilizada na maior parte do mobiliário, sendo desenvolvida uma ficha específica para os módulos destinados aos flecheiros. O método de classificação do mobiliário respeitou a seguinte orientação:

• M - Módulo - referente aos módulos 1 a 42. Os módulos de números 1 ao 20 receberam a identificação de CE - Conjunto Etnográfico - e armazenam a maior parte da coleção etnográfica transferida do Museu Paulista. São cerca de quinze mil objetos. Na segunda etapa, iniciamos o armazenamento a partir do módulo 42, pois, dessa forma, o espaço restante que será utilizado com acervo etnográfico (Acervo Plínio Ayrosa, em processo de transferência do Departamento de Antropologia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas / USP) ficará geograficamente já próximo do seu conjunto semelhante.

• E - Estante - nos módulos de números 1 ao 20, que possuem cinco estantes por módulo, desenhadas conforme seu uso, sendo que sua numeração, seqüencial, respeitou os conjuntos específicos. Nos módulos de números 21 ao 42, numeramos sempre a estante externa, a mais próxima da manivela de controle do mobiliário, como a número 1. Como cada módulo deste conjunto possui apenas duas estantes, teremos sempre, por exemplo, M42 - E l ou E2;

• P - Prateleira - as prateleiras foram sendo numeradas de cima para baixo, de acordo com a quantidade. As prateleiras foram deslocadas de acordo com os objetos a serem armazenados a fim de obtermos um maior aproveitamento do espaço das estantes. • F - Flecheiro - numerados de 1 a 30, seqüencialmente; entre os módulos 2 e 7 ; • A - Aramados - numerados de 1 a 20, seqüencialmente, entre os módulos 8 e 11: • G - Gavetas - numeradas de 1 a 8, seqüencialmente, sendo que cada módulo entre os números 16 e 20 possui cinco estantes com oito gavetas. A partir do módulo 21, as gavetas recebem o número seqüencial das prateleiras que estão acima delas devido ao fato de estarmos remanejando o espaço interno das estantes de acordo com as necessidades de armazenamento.

6 - Acondicionamento e armazenamento Designamos como acondicionamento o trabalho de acomodação dos artefatos em embalagens ou sistemas que lhes forneçam estabil idade física e química. Armazenamento é a guarda e organização desses objetos nos mobiliários. A maior parte destes trabalhos já foi elucidada ao descrevermos os processos preliminares deste projeto. O critério utilizado, em primeiro lugar, foi a semelhança entre matérias-primas. Quando houve possibilidade, reunimos objetos similares e tentamos agrupar etnias para facilitar trabalhos de pesquisa. Durante o período anterior ao início do projeto, verificamos que vários pesquisadores realizavam suas observações preliminares sobre seus objetos de pesquisa diretamente na Reserva Técnica, localizando peças nas prateleiras e gavetas. Nesse trabalho, notamos que as gavetas eram mais práticas, mais eficazes e ofereciam mais segurança e conforto ao acervo e aos pesquisadores, portanto, utilizamos verba da VITAE para adquirir mais gavetas de aço para o nosso mobiüário.

Separamos os objetos por matéria prima e tamanho. A maioria dos objetos (tanto etnográficos quanto arqueológicos) foi acondicionada em caixas de polietileno. Há caixas contendo cerâmicas, outras com terracotas, bonecas Karajá, ornamentos de várias etnias e muitas matérias-primas orgânicas e inorgânicas, vidros, líticos etc. As peças menores e médias foram acondicionadas em caixas com divisórias em Ethafoam e cobertas com non woven (intertela não gomada) e fechadas com velcro. Em algumas peças específicas, muito frágeis ou de pouca firmeza no posicionamento, recortamos a placa de polietileno acompanhando o desenho, objetivando uma maior estabilidade. Cerâmicas de médio e grande porte, com bases arredondadas, foram acondicionadas em placas de polietileno com anéis deste mesmo material para dar

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maior estabilidade. No caso de objetos muito grandes e pesados, como ânforas, vasos, moldes e esculturas, construímos uma plataforma de Ethafoam com suportes acompanhando o formato da peça e com capa de non woven individual ou para o conjunto armazenado sobre a mesma prateleira. Para evitar possíveis e indesejáveis deslocamentos das caixas e objetos no interior dos mobiliários, travamos todas as estantes com cordões de algodão e ganchos niquelados

Os têxteis foram armazenados sem sobreposição, enrolados em canos de PVC recobertos com tubo de polietileno para evitar o contato do tecido com o PVC, e, em seguida, protegidos com capa de intertela de algodão não gomada. Estes tubos foram encaixados nos dispositivos próprios do mobiliário, em posição horizontal.

As flechas, lanças, arcos e similares foram armazenados no mobiliário desenvolvido especificamente para este fim. Utilizamos retalhos de tubos e calços de polietileno para dar firmeza aos objetos armazenados verticalmente em aramados que se deslocam como gavetas corrediças.

As máscaras, bordunas, saias, coroas verticais e similares foram penduradas nos aramados. Alguns destes objetos foram presos com cordão ou fita de algodão e ganchos niquelados. Outros, dispostos em cabides cobertos de lençol de polietileno e intertela não gomada. As coroas verticais de plumária foram ajustadas em placas de polietileno e cobertas com intertela.

A cestaria foi, simplesmente, armazenada nas prateleiras e, de acordo com o peso, as peças encaixadas umas dentro de outras, separadas por intertela ou lençol de polietileno (2mm).

Conclusão

Foram armazenados cerca de trinta mil objetos nos módulos 1 a 42. Verificamos que este processo tem sido a melhor maneira de se travar um contato mais próximo com todas as questões que envolvem a conservação preventiva de um acervo. Temos uma noção ampla de quais serão as coleções que vão necessitar de tratamentos e cuidados mais imediatos. Estamos também atentos a eventuais ajustes no sistema de acondicionamento e armazenamento a partir do momento em que verificamos, na realidade do dia-a-dia, a praticidade ou não dos sistemas propostos e executados.

Os metais têm sido uma preocupação à parte e está sendo projetado um espaço especial dentro da Reserva Técnica onde poderemos controlar a umidade em níveis próprios para o seu armazenamento. Constatamos que o uso de caixas de polietileno e sílica gel não seriam os meios mais adequados para a quantidade de metais do acervo, uma vez que não achamos caixas com uma vedação hermética perfeita (uma necessidade intrínseca do uso da sílica gel como material tampão), acrescentando-se que os custos de material e manutenção seriam bem mais elevados do que o isolamento de uma área especial e seu controle através de desumidificadores.

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Resumo dos Autores

FRONER, Yacy-Ara: Museu de Arqueologia e Etnologia/USP; Serviço de Curadoria; Laboratório de Conservação e Restauro

*BRAGA, Gedley Belchior: Museu de Arqueologia e Etnologia/USP; Serviço de Curadoria; Laboratório de Conservação e Restauro

ALDROVANDI, Cibele: Conservadora do Museu de Arte Sacra de São Paulo; Museu de Arqueologia e Etnologia/USP; Serviço de Curadoria; Laboratório de Conservação e Restauro ( junho de 1996 a julho de 1997)

Ficha Técnica

Coordenação Científica: Profa. Dra. Elaine Hirata (primeira etapa do projeto) Profa. Dra. Maria Isabel D'Agostino Fleming

Diretoria Curatorial: Sandra M.C. T. Lacerda Campos

Coordenação Técnica: Yacy-Ara Froner (primeira etapa) Gedley Belchior Braga (segunda etapa)

Equipe Técnica: Luiz Carlos Borges Pinto Regivaldo Pereira da Silva Clementino V. da Silva Aparecida de Fátima de Souza

Agradecimentos

Agradecimento especial à Profa. Dra. Maria Isabel D'Agostino Fleming pela revisão final do texto deste artigo e sugestões durante sua realização.

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Abstract

Projects for organizing archives take for granted the participation of an interdisciplinary team since a broad policy of document treatment must be set up with priorities. This policy involves micro-policies of conservation and of information processing and management. The unequivocal linkage between conservation and information activities shows the complementary feature of these subjects: some stages of work depend on knowledge developed in both áreas. This presentation focus on the demonstration of the above statements for the particular case of photographic collections and makes use of the project Conservation and Organization of Pierre Verger's Photographic Collection as an example, designed and written by the technical team of Funarte's Center of Conservation and Preservation of Photographs for the Pierre Verger Foundation.

Conservação e documentação: áreas complementares

Cássia Maria Mello da Silva Cientista da informação Responsável pelo setor de Documentação e Informação Centro de Conservação e Preservação Fotográfica - CCPF Fundação Nacional de Arte - Funarte Rua Monte Alegre, 255 - Santa Teresa CEP20240-190 Rio de Janeiro RJ Telefax (021) 297-6116 ramal 248 e 507-7436 E-mail [email protected]

Introdução

Os projetos de preservação de acervos documentais devem estabelecer políticas que definam parâmetros e procedimentos para o gerenciamento, a conservação, o tratamento da informação e a divulgação desses acervos. Para realizá-las, é necessário reunir os conhecimentos de especialistas em diversas áreas do conhecimento, formando equipes interdisciplinares, nas quais terão papel destacado o documentalista1

e o conservador. O objetivo dessa comunicação é destacar a importância de equipes interdisciplinares durante a elaboração e a execução de projetos de preservação fotográfica. O projeto Conservação e Organização do Acervo Fotográfico de Pierre Verger, elaborado e redigido pela equipe técnica do Centro de Conservação e Preservação Fotográfica (CCPF), da Funarte, é uma interessante experiência de trabalho interdisciplinar.

Documentalistas e conservadores: etapas de um trabalho conjunto

As etapas de trabalho de um projeto de organização e conservação de acervos fotográficos são, de modo geral: recepção, identificação do conteúdo das imagens, identificação dos processos fotográficos, higienização e acondicionamento dos documentos, duplicação/reprodução das imagens, codificação dos documentos originais e daqueles produzidos durante a etapa anterior, catalogação e indexação dos documentos originais, digitalização das imagens e inclusão no sistema de recuperação da informação. Além disso, o controle do andamento dos trabalhos técnicos, a definição das normas para consulta ao acervo e as formas possíveis de reprodução do material para o público são atividades que devem ser executadas em conjunto pelos profissionais ligados às áreas de conservação e documentação.

Os arquivos ou as coleções fotográficas podem ser adquiridos — através de compra, doação ou permuta — ou terem sido produzidos e acumulados pela empresa ou instituição que os mantêm. Em todos os casos, é necessário que se conheça o conteúdo e as características físicas do conjunto de documentos a ser tratado. A avaliação conjunta de conservadores e documentalistas permite que, já em um primeiro momento, sejam conhecidos o valor informacional e o estado de conservação dos documentos.

O instrumento que possibilitará esse conhecimento é o inventário, base para a definição dos procedimentos a serem adotados. Dele deve constar as informações essenciais para elaboração do projeto: quantidade dos documentos que compõem a coleção/arquivo; identificação dos processos fotográficos e das bases (no caso de negativos flexíveis); dimensões e cromia; estado de conservação; identificação das

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fotografias que não possuem negativos originais e /ou de segunda geração e dos negativos originais que não possuam formas positivas (ampliação ou contato); e, o conteúdo das imagens.

A identificação dos processos e das bases dos negativos ajudam na identificação do período de produção da imagem e vice-versa. A tarefa de identificação do documento fotográfico é, muitas vezes, árdua. Grande parte desses documentos não possuem dados suficientes sobre autoria, evento, pessoas retratadas, local e data de registro da cena fotografada. Essas informações são fundamentais para localizar cada registro no tempo e no espaço e estabelecer relações que os contextualizem.

Os procedimentos de higienização e acondicionamento dos originais também merecem a atenção do documentalista. As embalagens nas quais o acervo esteve guardado, só devem ser retirados depois de passarem pelo seu exame. Todas as informações registradas nos materiais antigos de acondicionamento devem ser recuperadas, bem como uma possível lógica existente na forma de acumulação desses documentos. Esses dados são úteis para sua identificação.

As embalagens utilizadas para o acondicionamento dos originais e dos novos materiais (negativos de segunda geração, reproduções fotográficas, diapositivos duplicados) também devem ser discutidas conjuntamente. É fundamental que elas sejam de boa qualidade, adequadas e de fácil manuseio.

Ao estabelecer uma política para reprodução de fotografias e/ou de duplicação dos negativos, o documentalista pode colaborar com o conhecimento de quais imagens são as mais significativas naquele grupo, quais são as mais consultadas e /ou usadas, quais serão utilizadas se forem copiadas. Enfim, além dos elementos técnicos de que dispõe o fotógrafo-conservador, outros aspectos devem ser levados em conta para uma tomada de decisão mais apurada.

Com relação à informatização do acervo, a participação dos conservadores nas decisões a serem tomadas, sobretudo no que concerne à digitalização, é necessária. As decisões sobre a digitalização ou não de originais e o trabalho de restauração digital de reproduções de imagens requerem ampla discussão. Essa última questão, em especial, vem sendo objeto de reflexão de especialistas em diversas áreas e merece ser encarada com muita seriedade, pois envolve relevantes limites éticos.

O projeto Conservação e Organização do Acervo Fotográfico de Pierre Verger

A proposta do projeto Conservação e Organização do Acervo Fotográfico de Pierre Verger abrange todas as áreas de tratamento técnico do acervo e inclui a assessoria da equipe do CCPF à Fundação Pierre Verger na coordenação da execução do projeto, através da supervisão das etapas de trabalho, com visitas periódicas, e do treinamento da equipe executora. Os objetivos gerais são possibilitar a organização e conservação do acervo fotográfico de Pierre Verger e o acesso aos documentos fotográficos através da criação de um Banco de Imagens.

O arquivo fotográfico produzido pelo fotógrafo e etnólogo Pierre Fatumbi Verger é composto por cerca de 69.692 documentos fotográficos, produzidos entre as décadas de 1930 e 1970, além das fotografias que registram sua trajetória. As imagens de Verger apresentam um precioso painel da diversidade cultural dos povos nas diferentes regiões do mundo. As fotografias feitas no Brasil, sobretudo na Bahia, ao longo de cinqüenta anos, revelam muito da história da cidade de Salvador e do povo baiano. Trata-se de um dos mais expressivos conjuntos de registros fotográficos sobre o homem e suas relações com o cotidiano e com seus sistemas simbólicos reunidos em acervo no Brasil. Essas imagens revelam elevada qualidade estética, além de constituir uma importante fonte de pesquisa para a Antropologia e disciplinas afins, o que torna ainda mais urgente a necessidade de conservá-lo, preservá-lo e divulgá-lo.

O setor de Documentação e Informação propõe a execução das seguintes etapas de trabalho:

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1. Identificação Será dada continuidade ao processo de identificação das imagens produzidas por Verger, buscando as informações através de pesquisa em fontes primárias e secundárias e do conhecimento acumulado pela própria equipe da Fundação. Esse trabalho já vem sendo realizado, sob a orientação da antropóloga Angela Lühning , pesquisadora e diretora de projetos da Fundação Pierre Verger, que definiu uma metodologia para a execução dessa etapa. Nas fotografias sobre ele, serão identificados: autoria ( no caso das fotos pessoais), evento, local e data da imagem e as pessoas fotografadas. 2. Plano de arranjo arquivístico e codificação Para os documentos fotográficos produzidos por Pierre Verger será mantido o plano de arranjo definido por ele, pois é adequado às imagens que compõem o acervo, bem como às características das pesquisas nele realizadas. Uma revisão definirá os ajustes para a otimização do plano de arranjo, caso seja necessário. O acervo está dividido em séries geográficas e temáticas, devendo ser estabelecidas subséries e dossiês, de acordo com as necessidades de recuperação da informação. Cada documento ou conjunto de documentos (dossiês) possui um código alfa-numérico que o identifica dentro da organização dada ao arquivo. Após a revisão do arranjo, o código poderá ser modificado. As fotografias sobre Verger, de cunho pessoal, não estão organizadas. Para elas, será adotado um arranjo principal cronológico com séries temáticas. Receberão, também, um código alfa-numérico. 3. Catalogação Será utilizado o Manual para catalogação de documentos fotográfico? — elaborado por especialistas da Funarte, Biblioteca Nacional, CPDOC da Fundação Getúlio Vargas, Museu Histórico Nacional e Museu Imperial — que tem por base o Código de Catalogação Anglo-Americano (AACR-2), 2a edição, internacionalmente usado para a catalogação de diversos tipos de documentos. O Manual estabelece regras para o registro das informações e garante uma catalogação padronizada, o que assegura a relação entre as diferentes partes constituintes do acervo e o controle único para todos os documentos. 4. Recuperação da informação O processo de indexação requer a construção de um vocabulário controlado, que não permita a existência de sinonímia e de polissemia na lista de assuntos que será utilizada para representar o conteúdo das imagens Trata-se de uma operação complexa, de síntese, onde estamos lidando com duas diferentes formas de expressão: a palavra e a imagem. As listas de cabeçalhos de assuntos ou os tesauros são conjuntos de termos (descritores, palavras-chave) que servem como referência do conteúdo da imagem. Para os documentos fotográficos produzidos por Pierre Verger, a linguagem de indexação deverá ser construída ao longo do processo de indexação, a partir dos conteúdos dos próprios documentos, uma vez que os assuntos contidos nas imagens de Verger não aparecem nos tesauros disponíveis. As fotografias sobre Verger poderão ser recuperadas por autor, local e data da cena fotografada e pessoas retratadas. 5. Banco de imagens da Fundação Pierre Verger Para implementar um projeto de automação em um acervo, é fundamental que se tenha claro as características dos documentos que o compõem, bem como as necessidades de informação expressas por seus usuários. É necessário, também, que as etapas anteriores do tratamento da informação estejam definidas. Será criada, inicialmente, uma base de dados textuais, para em um estágio posterior, as imagens serem digitalizadas e o Banco de Imagens implantado. A digitalização das imagens se dará a partir dos negativos duplicados, conforme recomendação da equipe do CCPF

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O estudo para a tomada de decisão sobre quais os equipamentos e programas a serem adotados deve ser acompanhado da consultoria de um especialista em informática com larga experiência em bancos de dados para acervos culturais, que possuem questões específicas. Em linhas gerais, as etapas de trabalho para a implantação de um Banco de Imagens são : análise das necessidades de manipulação e de recuperação das informações; definição das informações a serem recuperadas; modelagem dos dados; implantação do sistema textual; desenvolvimento do aplicativo para auxílio da digitalização e arquivamento das imagens e a construção do Banco de Imagens.

Para sistematização das etapas de trabalho nas três áreas, a equipe desenvolveu dois fluxogramas (Fig.l e 2).

Conclusão

O objetivo do trabalho de um documentalista é, sempre e em qualquer situação, suprir as necessidades de informação do usuário com a maior relevância e precisão possível. Do conservador é assegurar que os documentos originais sejam preservados para as gerações futuras.

O trabalho de equipes interdisciplinares permite a reunião e a discussão dos diversos pontos de vista, a partir dos diferentes olhares que se deitam sobre determinada questão, e resulta mais rico e mais completo. A elaboração desse trabalho possibilitou grande interação entre os técnicos do CCPF. A discussão de cada um dos poritqs, de cada procedimento recomendado, por todos, resultou em uma convivência saudável, solidária e, sobretudo, instrutiva.

Nunca é demais ressaltar que uma instituição que mantenha um acervo higienizado, bem armazenado e acondicionado, reproduzido e /ou reformatado (através da microfilmagem e /ou da digitalização), mas que não esteja acessível aos usuários, não cumpre a sua função social. Por outro lado, se o acervo estiver inserido em um sistema de recuperação da informação sofisticado, mas sem soluções para seus problemas de conservação, também não estará cumprindo uma de suas principais funções: a preservação de seus documentos originais.

Finalmente, torcemos para que o projeto Conservação e Organização do Acervo Fotográfico de Pierre Verger se torne uma realidade, tal como foi concebido, sem restrições.

Participação

Agradeço à equipe da Fundação Pierre Verger pelo apoio irrestrito que recebemos durante a elaboração do projeto e, em especial, a Carlos Pereira dos Santos (Negrizu) e a Nancy de Sousa e Silva (Dona Cicy), por me lembrarem que a paixão é a condição que transforma um trabalho bem feito em um trabalho importante.

Bibliografia

BARUKI, Sandra e COURY, Nazareth. Treinamento em conservação fotográfica : a orientação do Centro de Conservação e Preservação Fotográfica da Funarte, Cadernos técnicos de conservação fotográfica, n . l , 1-8, Rio de Janeiro, Funarte, 1997.

. Imagem x palavra : questões da recuperação da informação imagética. Rio de Janeiro, 1996. 102 p. Dissertação (mestrado em Ciência da Informação). CNPq / IBICT, UFRJ / ECO.

; BARUKI, Sandra Cristina Serra ; PEREIRA, Ana Maria Saramago M.; Costa, Francisco José da. Projeto de conservação e organização do acervo fotográfico de Pierre Verger. Rio de Janeiro, Funarte / Centro de Conservação e Preservação Fotográfica, abril 1998.

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Resumo da autora

Cássia Maria Mello da Silva é mestra em Ciência da Informação pelo convênio CNPq/IBICT - UFRJ/ECO. Graduada em Ciências Sociais pela UFRJ, trabalhou entre 1981 e 1987 no Subsetor de Audiovisual do CPDOC, da Fundação Getúlio Vargas. Desde 1987, está na Funarte, onde foi responsável pelo Programa Nacional de Preservação e Pesquisa da Fotografia (1988-1990) e chefe da Divisão de Preservação e Pesquisa da Fotografia (1990-1991). Atualmente, responde pelo setor de documentação e informação do Centro de Conservação e Preservação Fotográfica.

Notas

1 O termo documentalista é utilizado aqui para designar os profissionais responsáveis pelas atividades de documentação e informação em um acervo, quais sejam bibliotecários, arquivistas, museólogos e cientistas da informação. 2 MANUAL para catalogação de documentos fotográficos. Versão preliminar 2. ed. Rio de Janeiro, Fundação Biblioteca Nacional: Funarte, 1996.

1. Fluxograma para tratamento dos negativos originais

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ABRACOR - Associação Brasileira de Conservadores-Restauradores de Bens Culturais

A.bstract

During 1994 - 1996 the Archivo Nacional of Chile developed and importam project concerning the restoration and conservation of the Colonial Map Collection. This valuable collection of approximately 1,500 pieces includes maps, charts, plans and drawings. Dating from the XVII century until today it includes topographic, historical, demographic, religious and cartographic information of great interest both culturally and nationally, and essential in reconstructing the historical memory of the country. Conservation deflciencies in these works resulted from the absence of adequate precautions over many years. The works presented various challenges in terms of damage: humidity stains, multiple ripping, missing backing sections and a heavy coats of varnish that sometimes produced cracking and ripping away from the supports. The maps were also poorly stored in limited and insufficient space, causing further damage each time that they were removed for consultation. Three experts under the technical supervision of Regina Solís Jara undertook this conservation work. After treatment the pieces were placed in boxes and other containers made with permanent materiais and were finally stored in filing drawers with proper identification and descriptive codes.

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FIG 1 - El documento cartográfico más antiguo, 1610

Conservación Mapoteca Colonial

Regina Solís Jara Coordinadora dei Servicio Nacional de Conservación de Documentos Bibliotecária y Conservadora de Documentos Archivo Nacional Dirección : Agustinas #3250, Santiago - Chile Fono Fax : (56 - 2) 6822378

I n t r o d u c c i o n

Dentro dei Programa de Conservación que ha mantcnido ei Archivo Nacional desde ei afio 1990, dirigido principalmente ai rescate y preservación dei acervo documental de importância patrimonial que se encontraba en riesgo de destrucción debido a su avanzado estado de deterioro, destacan por su relevância los proyectos "Conservación de los Fondos Históricos dei Archivo Nacional", que han permitido Ia microfilmación de 21.800 volúmenes, Ia restauración de otros 200, y en forma especial, Ia conservación y puesta en valor de Ia colección de mapas y planos antiguos. Estos proyectos estuvieron financiados conjuntamente por ei Ministério de Educación y Ia Fundación Andes.

Antecedentes de Ia Mapoteca Colonial

La Mapoteca Colonial dei Archivo Nacional empezó a formarse cuando en el afio 1974, cl entonces Dircctor de Ia institución, el acadêmico senor Patrício Estellé, actualmente fallecido, tomo Ia iniciativa de organizar esta sección, contribuyendo así ai rescate y recopilación de mapas, planos y dibujos que se encontraban diseminados en diferentes volúmenes y legajos de los fondos dei Archivo, conformando anos más tarde, un significativo conjunto documental de aproximadamente 1.500 piezas.

Todas Ias obras contenidas en esta colección corresponden a material original, único y riquísimo en su diversidad y prácticamente inéditos puesto que poços historiadores Ia han aprovechado. Sus imágenes constituyen fuente de información cartográfica, histórica, religiosa y demográfica, insustituible para reconstruir nuestra memória histórica.

El documento cartográfico más antiguo hasta ahora encontrado data dei ano 1610. (fig. 1).

El atractivo de esta mapoteca obedece ai hecho de que sus 1.500 piezas corresponden en su mayoría a mapas y planos de procedência particular, que formaron par te de expedientes judiciales de Ia Real Audiência, aunque también hay documentación relativa a distribución de águas, diseno de fortificaciones y fundación de ciudades y villas. La mapoteca colonial dei Archivo Nacional de Chile es especial porque emerge de Ia vida cotidiana, de los requerimientos de Ia expansión dei território, dei poblamiento y de Ia consolidación de Ias ciudades. Se trataba de levantar una iglesia, proyectar un canal de regadío, hacer un puente, medir un campo, etc,.

El hombre, independientemente de su grado de cultura, ha necesitado representar, aunque sea con trazos elementales, datos que, comunicados de generación en generación, precisaba Ia navegación, el reparto de territórios, el establecimientos de caminos, Ia fabricación de objetos y construeción de edifícios.

El estilo de Ia antigua cartografia, no solo de nuestro país, sino de todo el universo, sobrepasa generalmente el rigor científico y hacen de Ia especialidad un verdadero

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arte. Los primeros mapas que se conservan, originários dei siglo XVII, poseen una

gran rusticidad y fueron elaborados a mano alzada por particulares interesados en resolver algún litígio de tierras o águas, que presentaban los planos ante Ia Real Audiência para defender sus argumentos. Muchos de ellos están coloreados a Ia acuarela e incluyen ingênuos dibujos de iglesias, casas e hitos geográficos, los únicos elementos delimitadores disponibles en esa época, por Io que graficados era fundamental para asegurar ei domínio.

Este tipo de cartografia experimenta un gran avance durante ei siglo XVIII, cuando se incorporan algunos critérios de codificación. Aparecen los puntos cardinales y Ias claves de interpretación se suelen incluir en un cuadro especial, donde también figura Ia escala, Ia firma dei autor dei mapa y Ia fecha de confección. También presentan signos de índole tan técnica como ei Norte o Ia rosa de los vientos, que pasan a ser temas de adorno y decoración. Contribuye a este progreso Ia fundación de Ia Academia de San Luis de donde egresan los primeros cartógrafos criollos. Más adelante, ei surgimiento de Ia República en ei siglo XIX genera Ia necesidad de afirmar Ia nacionalidad. Estudiosos como Cláudio Gay y Amadeo Pissis reciben ei encargo de crear conciencia dei território y dei paisaje, a través de Ia elaboración de dibujo y mapas de mayor sofistificación.

Además de Io funtamentalmente cartográfico, se debe citar Io relativo a minas, como a Ia mejora de su explotación mediante Ia aplicación de nuevas técnicas, tanto de extracción como de fundición.

También se encuentran planos de diversas maquinarias, ingenios e inventos, antecesores de Ia revolución industrial.

El mapa, según Ia archivística, tiene una dimensión documental respecto dei origen de procedência, su vinculación a un expediente y a una serie documental. El mapa en ei archivo no es un documento único, sino que su información se completa o es complementada por Ia información textual dei resto dei expediente, junto ai que ha sido generado.

El proceso de recolección de mapas y planos consistió en separar Ias piezas dei legajo de origen, luego se confecciono una doble referencia, una para dejar constância en ei documento mismo de su procedência, y Ia otra, en ei legajo que perteneció, indicar Ia separación de su material gráfico, dando ai mismo tiempo Ia información de su nueva signatura topográfica en Ia mapoteca, Uamada comúnmente "testigo".

Estado de Conservación y Tratamiento

El estado de conservación de Ia mapoteca era deficiente, como consecuencia de Ias insuficientes medidas de conservación a que había estado sometida á través de los siglos y por esto Ias obras presentaban importantes y variados desafios. Por una parte, había piezas de grandes formatos, en soportes de papel hecho a mano, principalmente, y algunos de ellos adheridos a telas o cartones con adhesivos no apropiados. En cuanto a los elementos sustentados habían de diferentes tipos : lápiz gráfito, carboncillo, tinta china, acuarela y gouache, y también algunos se encontraban cubiertos por una gruesa capa de barniz.

Por otro lado, los deterioros que presentaban Ias piezas eran de todo tipo, prácticamente se encontraban presentes todos los deterioros que pueden afectar a Ia documentación en papel : manchas de humedad y aureolas, múltiples rasgados, grandes faltantes, parches por ei reverso, y algunas piezas tenían además una capa de barniz oscurecido, ei que a su vez había ocasionado resquebrajamientos y roturas en ei soporte.

Dado que muchos mapas y planos originalmente estaban formando parte dei legajos y volúmenes y se encontraban cosidos a ellos, Ia frecuente consulta y reproducción de Ias obras había ocasionado roturas en los márgenes dei documento, en los lugares correspondientes a Ia costura.

Por otra parte, Ias condiciones de almacenamiento en que se encontraba Ia colección no eran Ias más apropiadas, puesto que se había conservado conforme a

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ABRACOR - Associação Brasileira de Conservadores-Restauradores de Bens Culturais

FIG 2 - Estado de conservación en que se encontraba Ia mapoteca antes de su tratamiento

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FIG 3 - El material instalado en muebles especiales, distribuído de acuerdo a su tamano

los escasos médios materiales y humanos con que contaba ei Archivo Nacional. Su mobiliário era insuficiente y los contenedores eran poços y de mala calidad, por Io que Ias piezas se encontraban amontonadas y apretadas y ei tratar de sacarlas y ponerlas para Ia consulta de los usuários significaba un gran riesgo para su integridad y una seria amenaza para Ia sobrevivência de cada una de ellas. (fig. 2)

Las actividades correspondientes a este proyecto se iniciaron en 1994 y para Ia ejecución de las tareas se conto con 3 restauradores profesionales y especializados en ei área, bajo Ia dirección técnica de quién suscribe.

Luego de las intervenciones de conservación y restauración, las piezas fueron almacenadas en estuches y otros contenedores que se disenaron y confeccionaron especialmente, con materiales permanentes por ei personal contratado.

Para muchas de las obras se estimo conveniente su encapsulado con mylar (tereftalato de polietileno), que como se sabe resguarda dei deterioro que puede causar ei manejo, Ia exposición, ei almacenamiento y traslado de las obras y, en general, impide o previene Ia acción de agentes externos.

Luego, tanto las obras encapsuladas como las que no Io fueron , se almacenaron de a 10 unidades en los estuches especiales, y para proteger dei roce los pigmentos y tintas se coloco una hoja de papel alcalino entre ellas.

Finalmente, ei material fué instalado en muebles archivadores de planos, distribuído de acuerdo a su tamano, indicando en cada una de las piezas los códigos correspondientes a su indentificación y descripción. (fig. 3)

De todo ei proceso de restauración y conservación de Ia Mapoteca Colonial se hizo un completo registro fotográfico, que puede testimoniar sobre las diferentes etapas de intervención de este valioso patrimônio cartográfico, de interés nacional y cultural.

Como culminación de las tareas correspondientes a este proyecto ei Archivo Nacional hizo una exposición de las obras, Ia que permaneció abierta ai público por espacio de 2 meses.

Conclusiones

Con ei rescate y puesta en valor de este importante conjunto documental, único en ei país, los investigadores podrán acceder a él en forma más expedita y, para muchos de ellos, será como redescubrir Chile por médio de Ia imagen.

Bibliografia

Adas cartográfico dei reino de Chile, siglos XVII-XIX. Santiago: Instituto Geográfico Militar, 1981. 268 p.

Mapas y planos antiguos dei Archivo Nacional. Santiago de Chile: Dirección de Bibliotecas Archivos, y Museos, 1976, 47 p.

Resumen de Ia Autora

Antecedentes personales

Nombre REGINA NANCY SOLIS JARA Profesión : Bibliotecária, Archivista y Conservadora de Papel. Cédula de Identidad : 4.562.828-0 Domicilio Particular: Av. Francisco Bilbao No. 209, Depto. 46, Providencia. Domicilio Laborai : Archivo Nacional de Ia Administración, Agustinas 3250, SAN-TIAGO-CHILE. Teléfonos (oficina) : (56-2) 6817979 - 6813068, anexo 27. Fax : (56-2) 6822378-6816318. Telefono (residência) : (56-2)6341301

Cargo : Coordinadora dei Servicio Nacional de Conservación de Documentos.

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pontica aa preservação IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

FIG 4 - Plano de tierras de Bartolé de Jorquera y de Bartolomé de Cepeda, 1636 (antes de su restauración)

Antecedentes Labora/es 1960 - 1980 Archivista, dei Archivo Nacional. 1980 - Conservadora, Restauradora de Documentos, Archivo Nacional. 1987 - 1988 Profesora de Conse rvac ión de Libros y D o c u m e n t o s , Universidad Tecnológica Metropolitana. 1990 - Coordinadora de Proyectos de Conservación y Restauración, Archivo Nacional. 1993 Asesora en Proyecto "Rescate y Preservación dei Archivo Iglesia La Matriz de Valparaiso" 1995 - 1996 Asesora en ei Proyecto "Rescate y Preservación Archivo Obispado de Iquique". 1997 - Coordinadora dei Servicio Nacional de Conservación de Documentos, Subdirección de Archivos.

Antecedentes acadêmicos 1967 Curso Capacitación Archivística, Universidad Nacional de Cór

doba, Argentina. 1980 - 1981 Curso General sobre Técnicas de Restauración dei Documen

to Gráfico. Madrid, Espana. 1989 Curso Preservación y Conservación de Archivos

Latinoamericanos. Universidad de Texas, Austin, U.S.A. 1993 Seminário Conservación Preventiva en Latinoamérica. Washing

ton, D.C., U.S.A.

FIG 5 - El plano después de su restauración

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FIG 6 - Plano y punto de vista de Ia obra de ingenio para mineral de plata, 1775. (antes de su restauración)

Publicaciones Noviembre 1991

1997

"Rescate y Preservación de Ia Memória Documental dei País, Archivo Nacional" en: El Mercúrio, Artes y Letras, Santiago. Primer Seminário Políticas de Microfilmación y Digitalización. "Ley de Microfilmación y Responsabilidad dei Archivo Nacio nal Frente a ella".

FIG 7 - El mismo plano después de su restauración.

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FIG 8 - Planos particulares de Ias plazas y fortalezas de Arauco en ei Reino de Chile, 1835. (antes de su restauración)

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FIG 10 - La misma obra después de su restauración.

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Restauração Arquitetônica

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Anais da ABRACQR - Restauração Arquitetônica IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

Abstract

This paper describes the restoration process of a 120-square-meter dome-shaped stained-glass ceiling placed over the assembly room of an eclectic-style offlcial building: a step-by-step description of the initial problems related to the dismounting/ disassembling procedures for a structure of such proportions and the spotting of a number of probable agents of deterioration such as the recent installation of a central air conditioning system.

A Restauração do Vi trai da Cúpula do Plenário do Palácio Tiradentes

Wallace Caldas Arquiteto-restaurador. Instituição: Ópera Prima Arquitetura e Restauro Ltda.

Nelson Porto Ribeiro Arquiteto-restaurador, doutorando em história. Instituição: Ópera Prima Arquitetura e Restauro Ltda. Rua Barão de Mesquita 125, sobrado - Tijuca - Rio de Janeiro. 20.540-004 Tel(Fax): (021) 264-5513 * E-mail: [email protected]

Histórico

O Palácio Tiradentes tem duplo papel de relevância: histórica e artística. Trata-se do primeiro prédio construído pela República brasileira especialmente para abrigar o Congresso Nacional (que antes instalara-se provisoriamente no Palácio da Quinta da Boa Vista e depois no prédio da Biblioteca Nacional). Evidentemente um prédio com tal perspectiva concentrou recursos econômicos de tal monta que permitiu sobre o ponto de vista artístico um acabamento tanto interno quanto externo de qualidade excepcional.

Construído na década de 20, o Palácio Tiradentes envolveu na sua factura os artistas acadêmicos mais importantes do período. Felizmente a história da arte atual já não olha com o ranço da modernidade para a produção artística eclética, mesmo o IPHAN, que até então só tinha olhos para o colonial (muito valorizado pêlos modernistas) concluiu recentemente pela importância histórico/artística deste prédio tombando-o.

O Palácio Tiradentes, tal como os prédios do Renascimento que seguiam uma teoria do decorum estrita, tem um programa iconográfico complexo que envolve os elementos propriamente arquitetônicos com os artísticos; desde a cúpula central do prédio coroando o plenário, passando pelas estátuas monumentais que ornam o topo da fachada principal do prédio como também os elementos artísticos do seu interior, tais como vitrais e pinturas murais. Por se tratar de um artigo técnico de restauração não cabe aqui uma análise deste programa, mas pode-se dizer que em termos gerais ele pretende ser uma glorificação da República e de seus heróis e momentos constitutivos.

O grande vitral abobadado situa-se exatamente por cima do plenário da Assembléia e pretende representar o " aspecto faustoso da abóbada celeste brasileira no instante do memorável advento republicano, às 9 horas da manhã do dia 15 de novembro". Compõe um desenho harmonioso do céu, com nuvens e estrelas, nuances róseas na base (horizonte) e infinitos azuis na medida em que se aproxima do centro ganhando profundidade luminosa.

Considera-se este vitral como o primeiro executado 100% no Brasil; a data na assinatura é 1926 e a sua autoria pertence ao artista brasileiro de ascendência italiana Gastão Formentti, o qual trabalhou como vitralista até meados de 1956. A partir desta data Formentti se dedicou integralmente ao trabalho de pintura sobre tela e em alguns momentos também como compositor, tendo inclusive parceria em algumas obras de Noel Rosa.

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Estado de conservação do vitral

A estrutura do vitral é uma calota em ferro vazada, formada por uma malha de círculos concêntricos e raios, sendo que estes últimos são curvos e definem a curva-tura da calota. Tal como uma geodésica, esta estrutura é dividida em módulos trapezoidais que a medida em que se aproximam do centro vão diminuindo. Em projeção horizontal a calota do vitral tem 12 m de diâmetro e aproximadamente 120 m2 e é subdividida em 132 módulos com medidas variadas e 01 módulo central (chave da abóbada) com diâmetro aproximado de lm. Cada um dos módulos trapezoidais da calota de ferro suporta um pedaço do vitral; vidros recortados artisticamente e unidos entre si com perfis H de chumbo. Estes panos de vidro obtém estruturação através de barras redondas de ferro que são ligadas em alguns pontos ao chumbo de ligação e as quais por sua vez descarregam o peso da seção nas bordas do trapézio da estrutura executado em duplo perfil "L", formando um "T". Estes panos de vidro são vedados cuidadosamente nas extremidades com massa de vidra-ceiro.

Esta estrutura metálica abobadada do vitral é atirantada a estrutura de uma enorme cúpula de concreto e vidro que coroa o Palácio Tiradentes e permite a proteção do vitral contra as intempéries, ao mesmo tempo em que possibilita filtragem da luz natural que ilumina o plenário através do vitral. A estrutura metálica assim como os seus tirantes de sustentação apresentavam bom estado de conservação.

Infiltrações que ocorreram a nível da cúpula possibilitaram a oxidação de ferragens periféricas do concreto armado e a conseqüente expulsão de pedaços de concreto que caíram por cima do vitral danificando-o e ameaçando a segurança dos ocupantes do Plenário. Um levantamento inicial constatou quinze panos danificados.

Os danos ao vitral não resumiam-se entretanto apenas os ocasionados pelo desprendimento de concreto da estrutura da cúpula. Em inúmeros pontos, onde os trapézios eram maiores, os panos de vidro tinham se deformado, abaulando com o próprio peso. Embora mais raro verificou-se também que em um ou outro ponto a deformação do pano de vidro ocasionou ruptura em alguns vidros. Observou-se também, que em diversos pontos, o vitral sofrerá no passado recente restaurações mal executadas que deveriam ser corrigidas.

Diagnóstico e terapia proposta

A ameaça mais séria que o vitral sofrerá não dizia respeito diretamente a problemas dele mesmo e sim ao estado de degradação em que se encontrara a estrutura em concreto armado da cúpula que o recobre. Entretanto à época da restauração do vitral esse problema já havia sido resolvido pois a ALERJ tinha realizado uma obra de completa recuperação da estrutura em questão, tratava-se agora apenas de restaurar os danos causados ao vitral.

Entretanto existia um outro problema que embora não tão grave, necessitava igualmente ser resolvido, que era o fato dos panos maiores do vitral terem cedido, criando barriga. Excluímos a hipótese de que houvera erro de cálculo por parte do artista no número de pontos de solda entre o chumbo e as varetas de sustentação destes grandes panos, devido mesmo ao cuidado que toda esta grande obra de vitralismo denotava. Por outro lado é comum observar-se com o tempo um trabalho que naturalmente os vitrais realizam e que junto com o envelhecimento do chumbo que faz a ligação entre os vidros poderia ocasionar o efeito observado. Leve-se em consideração como agente intensificador deste trabalho do vitral, provocando contrações e dilatações indesejáveis, o fato do incremento recente da variação térmica entre a face interna do vitral (o plenário do Palácio) e a face externa (protegida pela cúpula de concreto e vidro que possibilita a entrada de luz e que transforma o ambiente no verão, numa verdadeira estufa) ocasionado pela instalação de um serviço de refrigeração central bastante eficiente no plenário do Palácio. Foi constatado tam-

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bém que alguns pontos de solda, com o trabalho do vitral, tinham se rompido e que embora não fossem suficientes para serem responsabilizados sozinhos pelo problema constatado, com toda certeza tinham dado a sua colaboração na intensificação do problema.

Foi realizado metalografia de amostras do chumbo no laboratório do Instituto de Física da UFRJ (COPPE) que constataram que o metal encontrava-se homogêneo e sem inclusões, sendo portanto de boa qualidade e mantendo suas propriedades físico-químicas originais. A metalografia entretanto não revelou se as características mecânicas do material estavam ou não alteradas.

Evidentemente não se poderia propor aos parlamentares da casa que passassem a dispensar o uso de ar condicionado argumentando-se que quando o vitral fora criado este conforto ambiental não existia e a sua recente instalação, presumia-se, era-lhe prejudicial. Dessa forma a solução encontrada foi: 1. A troca de todos os perfis de chumbo por novos de qualidade similar, pois ainda que as características físico-químicas desse material mantivessem-se boas, garantia-se assim a eliminação de uma provável fadiga ou comprometimento mecânico do material original. A troca, aumentava também a vida útil da restauração; 2. Levando-se em conta que o mastique original que dava rigidez e impermeabilidade a peça, provavelmente orgânico a base de cola animal e serragem, devido as condições climáticas deteriorara-se, a aplicação de novo mastique quando da colocação dos novos perfis colaboraria também para a reestruturação geral do vitral; 3. Aumento e recomposição dos pontos de solda que se soltaram entre o chumbo e as varas de sustentação.

A desmontagem do vitral

Definido as causas do problema e a terapia a ser adotada, passamos imediatamente a fase de desmontagem do vitral e ao seu transporte até o atelier de restauração.

Com acesso fácil pelo interior da cúpula pudemos acessar o plano do vitral e foi neste compartimento que foram montadas as plataformas de trabalho que possibilitaram a remoção das vidraças e recuperação das estruturas metálicas que as sustentam, porém, para aumentarmos o coeficiente de segurança, utilizamos telas de proteção de alta performance (geogrelha de polietileno extrudado, fabricação da Nortene) e de tramas variadas, fixadas no plano imediatamente abaixo da calota e que eram capazes de reter não apenas objetos diminutos como fragmentos de vidro e pontu-dos como ferramentas, mas também suficientemente resistentes para suportarem o peso de todo um painel grande de vidro que por acidente caísse. Garantimos assim que a desmontagem pudesse ser executada sem a paralisação dos trabalhos parlamentares.

Para a retirada das vidraças, toda a massa de vidraceiro teve que ser removida com espátulas e em seguida os painéis foram retirados um a um e embalados em pastas executadas em compensado de 15mm de espessura, revestido com feltro fixado ao suporte por grampos. As duas bandejas de madeirit que ensanduichavam o painel de vidro foram cortadas em tamanho maior que os painéis, de forma a proteger as bordas dos mesmos. Sua fixação se deu através do uso de tramelas de madeira que ajustavam o vitral às bandejas. Só depois de adequadamente embalados in loco eram os vitrais transportados para o atelier de restauração.

É importante observar que um diagrama do vitral em projeção foi feito como mapeamento, em seguida todos os segmentos trapezoidais foram numerados no diagrama e no painel de vidro (através de etiquetas adesivas), de forma a facilitar a remontagem do vitral. Cada uma das peças, antes de ser devidamente embalada, foi fotografada de forma a possibilitar no caso de um acidente de percurso a reconstituição de uma peça nova. Com o intuito de minimizar possíveis acidentes de percurso o vitral foi transportado para o atelier de restauro, aos poucos.

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A conservação da estrutura

Enquanto o vitral era restaurado em atelier, aproveitou-se os andaimes utilizados para a retirada dos painéis de vidro para se fazerem as obras de conservação da estrutura metálica.

Após limpeza mecânica que utilizou escovas de aço, seguido da aplicação de martelo de soldador que eliminou as carapas de ferrugem não removidas com a escovação, foi utilizado de maneira localizada lixadeira rotativa com lixas de ferro com granulometria que variaram de 36 a 50. Conjuntamente à limpeza mecânica aplicou-se removedor pastoso da Wanda para retirada da pintura velha existente nos perfis, seguido da aplicação de GTA 007 que elimina o resíduo de parafina deixada pelo removedor permitindo assim total aderência da nova camada de tinta de proteção a ser aplicada.

Em seguida decidiu-se por aplicar o sistema de pintura por Ferrugem Protetora desenvolvido pela COPPE/UFRJ e distribuído comercialmente pela PRODIN Ltda. A filosofia desse sistema de pintura parte do fato de que cada ambiente corrosivo promove uma ferrugem específica e que procurando-se evitar o tão propalado efeito pilha, incrementador ele mesmo de oxidação e causado comumente pelos pig-mentos formadores dos outros protetivos, de promover-se a constituição de um material composto basicamente de uma resina com boas características de proteção, agregada, como pigmento, ao tipo de ferrugem naturalque se constitui no material a ser protegido. Para tanto foi necessário que se recolhesse mostragens da ferrugem existente em diversos pontos da estrutura e que eles fossem mandados a laboratório para que através de uma análise por difração de Raios-x ficasse caracterizado um oxido preponderantemente constituído por magnetita (Fe304), que foi assim a base da pintura por Ferrugem Protetora utilizada na estrutura.

Após 72 horas foram aplicadas 2 demãos de esmalte sintético como acabamento cuja cor escolhida foi a verde floresta e que em muito se assemelhava a tonalidade da pintura original obtida através de estratigrafia.

O restauro dos panos de vidro

Todo o vitral passou por uma limpeza prévia utilizando-se para isso solução de água/Detertec 7. A escovação foi feita utilizando-se escovas de cerdas macias de nylon.

Em alguns casos encontramos a ausência de pequenas peças de vidro. O procedimento para substituição das peças ausentes foi a sua reposição utilizando-se vidros idênticos em coloração e textura, que foram fornecidas pelas peças do entorno semelhantes às perdidas (sempre fica no chumbo de ligação um resíduo do vidro perdido que servirá de indicativo). Os vidros novos usados na substituição foram importados e do tipo Sifecht antique, utilizados em cores compatíveis, dependendo do motivo e textura de fundo que se quis recompor.

O mapeamento das fiadas do vitral, feito quando da retirada do mesmo nos mostrou que existiam peças não originais que destoavam do conjunto. Essas peças foram trocadas por vidros de mesma coloração, garantindo-se assim maior homogeneidade cromática das partes.

Em alguns vidros distinguimos o trabalho de grisaille na face posterior do mesmo, executado originalmente pelo autor. Essa técnica permite, através de uma pintura reticulada, que se varie a tonalidade do vidro deixando-o mais claro/escuro dependendo do efeito desejado, e aumentando assim a paleta de cores e tons à disposição do artista para as suas composições.

Quando nos utilizamos da mesma técnica para obter os mesmos efeitos sobre vidros novos de reposição, após a pintura a esmalte, estes foram queimados a uma temperatura de 500-700° C, aumentando assim sua resistência e durabilidade. Para que as peças quando de sua colocação no forno não sofressem nenhum tipo de deformação que as irregularidades das bandejas metálicas poderiam proporcionar,

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foram assentadas sobre uma camada de gesso crê devidamente nivelada. As peças originais de vidro que encontravam-se danificadas foram substituídas,

considerou-se que a restauração dessas peças com algum tipo de resina não se justificava pois seria insuficiente para recuperar a rigidez estrutural necessária que o vidro íntegro oferece. Evidentemente essas peças quando em tamanhos adequados e que pudessem ser cortadas, foram utilizadas para substituição de peças ausentes em outros locais, dessa forma procurou-se garantir que o vitral não possuísse nenhuma peça rachada e mantivesse o maior número possível de peças originais.

Depois de assentado em bancadas devidamente protegidas por feltro, os panos do vitral tiveram os seus perfis de chumbo retirados, fundidos e trefilados novamente em máquina adequada para tanto (técnica do sec. XII). A fundição do chumbo original (que a metalografia revelara de boa qualidade) é suficiente para devolver ao mesmo as propriedades mecânicas perdidas. Após a colocação dos novos perfis, foi feita a soldagem dos mesmos nos pontos de cruzamento utilizando-se maçarico de contato (à gás) e solda com alto teor de estanho, e esterina pura como fluxo. O próximo passo foi a produção do mastique que proporcionou a rigidez necessária ao vitral, desta vez feito à base de óleo sicativo e gesso tipo crê, onde adicionou-se corante preto. Essa massa foi devidamente espalhada sobre o pano do vitral, e com uma escova esfregada de forma a forçar a sua entrada nos interstícios entre o vidro e os perfis de chumbo. Em seguida executou-se limpeza com estopas e solventes (thinner) deixando os vidros limpos e desembaçados.

Recolocação dos vitrais

A fixação dos vitrais às esquadrias de ferro foi feita utilizando-se borracha de silicone da Daw Corning, material que tem mostrado manter a sua coesão e flexibilidade por mais tempo que a massa de vidraceiro, qualidades altamente desejáveis em um microclima úmido e quente como é a estufa em que se transforma no verão o interior da cúpula do Palácio.

Colaboradores

Prof. Dr. Luiz Roberto Miranda (COPPE/UFRJ): Desenvolve trabalhos no laboratório de metalografia do Instituto de Física da UFRJ que tem prestado serviços relevantes na área de restauração de metais, entre eles Biblioteca Nacional do RJ e a estátua do Cristo Redentor.

Luidi Nunes ÇLuidi Atelier de Vitrais): Trabalha com restauração de vitrais desde 1973. Dentre as obras mais significativas estão o Palácio Laranjeiras e o Palácio Pedro Ernesto.

Resumo dos autores

WALLACE CALDAS é arquiteto formado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro desde 1985. Tem larga experiência enquanto arquiteto-restaurador, pois trabalhou na Aresta Arquitetura primeiro na equipe de arquitetos e depois como arquiteto responsável pela filial da empresa no Rio de Janeiro. No início de 1992 fundou a empresa Opera Prima Arquitetura e Restauro Ltda. onde exerce a função de arquiteto coordenador de projetos e obras de restauração.

NELSON PORTO RIBEIRO é arquiteto formado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro desde 1985, Mestre em história da arte pela mesma Universidade e atualmente conclui doutorado em história social da cultura também na UFRJ. No início de 1992 fundou a empresa Opera Prima Arquitetura e Restauro Ltda. onde exerce a função de historiador e arquiteto coordenador de projetos e obras de restauração.

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Abstract Preservação, Arquitetura e Clima

The conservation of objects, especially organic, relies above ali, on the environment in which they are stored and displayed. The environmental control, that means the maintenance of apropriated leveis of temperature, relative humidity, ligth and atmospheric pollutants; often requires, in tropical humid climate, mechanical equipments anda air- conditioning, which envolves high instalation and running costs. A research was done bringing together paper conservation and architecture, relating environmental control with a re-examination of the concepts of bioclimatic building design and defining elements that must be considered in the design conception to guarantee the correct climatic performance of the libraries and archives buildings, in tropical humid climate.

Palavras-Chave

Controle Ambiental, Arquivos e Bibliotecas, Preservação de Acervos

Claudia S. Rodrigues de Carvalho Arquiteta, M.Sc. Ministério da Cultura — Fundação Casa de Rui Barbosa Rua São Clemente, 134 - Botafogo - Rio de Janeiro — RJ CEP: 22.260-000 Tel: 537-0036 Fax: 537-8424 E-mail: [email protected]

1.Introdução

O ambiente, ou seja, os efeitos produzidos pela luz, pela temperatura, pela umidade e pela contaminação atmosférica isoladamente ou conjugados, estão sistematicamente identificados como agentes de deterioração dos acervos, e, o controle ambiental é uma das principais medidas de conservação preventiva das coleções. O controle ambiental, em clima tropical úmido, envolve, quase sempre, sistemas mecânicos de climatização. O alto custo da energia, além dos gastos financeiros de instalação e manutenção envolvidos, vem fazendo com que arquitetos e cientistas voltem cada vez mais a sua atenção para o estudo de soluções e técnicas alternativas de preservação, através do bom senso e simplicidade econômica e tecnológica.

Principalmente depois do auge da crise energética mundial, na década de 70, a utilização de sistemas passivos para o controle climático dos edifícios, vem sendo largamente pesquisada, buscando a redução do consumo energético e o conforto dos usuários, dentro do que se convencionou chamar arquitetura bioclimática.

Este trabalho reúne conservação de acervos e arquitetura, relacionando controle ambiental com um re-exame dos conceitos da arquitetura bioclimática, apresentando elementos que devem ser considerados para garantir o correto comportamento climático dos edifícios de arquivos e bibliotecas. A avaliação das trocas que se estabelecem entre o acervo e o meio através do edifício, possibilita a escolha de soluções de projeto que contribuam para o controle da umidade e da temperatura, bem como da iluminação e contaminação atmosférica, favorecendo a preservação de acervos e a redução do consumo de energia com sistemas de condicionamento.

O texto a seguir apresenta, em síntese, os conceitos fundamentais que devem ser confrontados com os critérios de projetos para garantir o correto comportamento térmico das edificações destinadas a guarda dos acervos com suporte em papel.

2- Arquitetura e Controle Ambiental

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O clima tropical úmido apresenta níveis de umidade e temperatura muito distantes daqueles recomendados para a preservação dos acervos com suporte em papel1, e, desta forma, os elementos arquitetônicos tradicionais, tais como as paredes, os vãos, a compartimentação interna e, ainda, aqueles que agem especificamente na modificação dos efeitos do clima, como beirais, brise-soleils, isolamentos e sistemas de ventilação, podem não ser suficientes para atingir, em todas as situações, as condições ideais requeridas, sendo necessários dispositivos mecânicos para o controle ambiental.

Por outro lado as recomendações da arquitetura bioclimática para minimizar o desconforto humano e reduzir o consumo energético tem uma aplicação limitada para manutenção de ambientes adequados a conservação de objetos, principalmente porque os seres humanos podem se adaptar às zonas de conforto, dentro de limites muito amplos, e o desconforto causado por uma variável que exceda os padrões estabelecidos pode ser compensado pela atuação de outras variáveis. No en-

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tanto algumas técnicas de condicionamento térmico natural podem ser adotadas para minimizar o consumo de energia e favorecer a correta adequação das condições de temperatura, umidade e iluminação.

No entanto, dentro do universo dos temas que buscam o conforto humano e a redução do consumo de energia, algumas recomendações referentes ao condicionamento térmico natural podem ser adotadas nos edifícios que constituem nosso ponto de interesse. As relações entre o meio e o edifício, e entre o edifício e o acervo, baseadas nos princípios de transmissão de calor, são de grande importância para a definição da orientação, da forma, do volume e da escolha racional dos materiais de construção que deverão resultar num melhor comportamento térmico da edificação, possibilitando a redução do uso dos aparelhos mecânicos de climatização.

Estes conceitos devem ser considerados desde a fase inicial do projeto, pois.esta é a única maneira de evitar problemas decorrentes de soluções inicialmente mal formuladas, problemas que, nos climas quentes em particular, podem ser insolúveis e causar danos irreparáveis ao acervo.

Os efeitos causados pela umidade, pela radiação ultravioleta e pela poluição atmosférica são muito mais danosos para os acervos do que aqueles diretamente causados pelo aumento de temperatura, isto porque, os principais danos devidos ao aquecimento referem-se a exposição direta a radiação solar e não ao aumento da temperatura do ambiente. Desta forma deve existir uma hierarquia entre os dispositivos utilizados para o controle destes fatores.

O controle da umidade relativa é considerado importante porque a umidade além de atuar nas reações químicas de deterioração, afeta diretamente o teor de umidade dos materiais porosos e higroscópicos ocasionando mudanças dimensionais significativas e favorece o desenvolvimento de microorganismos. Por outro lado a temperatura embora produza efeitos diretos de menor magnitude devido a sua interrelação com a umidade relativa determina que o seu controle seja corretamente equacionado, favorecendo o controle da umidade.

Cabe frisar que a correta utilização das técnicas de condicionamento térmico natural para a preservação dos acervos torna indispensável uma análise da evolução anual dos dados climáticos, tais como as temperaturas médias, médias máximas e médias mínimas, os níveis de umidade, os índices pluviométricos, o regime de ventos e a insolação, assim como as interferências provocadas pela topografia local, pela altitude, pela superfície do solo, pela presença de rios, mares, lagoas, pela proximidade com outros edifícios e a vegetação, de modo que os recursos utilizados para o controle ambiental dos edifícios de arquivos e bibliotecas possam ser ajustáveis a todas as épocas do ano.

Desta forma destacamos os conceitos envolvidos na redução dos efeitos da energia solar com ênfase no controle da temperatura, baseados nas estratégias de projeto para condicionamento térmico natural das edificações e nas recomendações da arquitetura bioclimática para adaptação da arquitetura ao meio ambiente, que podem ser aplicados na preservação de acervos.

2.1- Controle da Temperatura O controle da temperatura pressupõe um conhecimento do comportamento térmico da edificação que está relacionado com os mecanismos de transmissão de calor e as características dos materiais de construção. No âmbito do presente estudo o problema consiste em reduzir a temperatura interna, uma vez que as temperaturas externas médias estão acima daquelas indicadas para preservação.

A redução da temperatura obtém-se de duas formas: evitando o aquecimento e favorecendo o resfriamento. Evitar o aquecimento implica, principalmente, na redução da captação solar pelas partes opacas e pelas aberturas da edificação. A redução da captação solar é obtida por meio da implantação, da orientação, da utilização de dispositivos de proteção contra a radiação solar, da resistência dos materiais, da limitação das aberturas e dos fechamentos transparentes e da redução dos ganhos

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internos como, por exemplo, sistemas de iluminação. Nem todas as medidas podem ser utilizadas simultaneamente, cabendo ao arquiteto avaliar quais são as mais adequadas à especificidade de cada projeto.

Favorecer o resfriamento significa favorecer as perdas térmicas. As perdas térmicas através do envoltório dos edifícios são muito pequenas, e depois de utilizados os mecanismos de redução da captação solar, a ventilação é a forma mais eficiente para extrair o calor acumulado, seja através da penetração da radiação, seja pelos ganhos internos. N o entanto em climas úmidos a ventilação natural em edifícios de arquivos de bibliotecas deve ser criteriosamente estudada em função dos níveis de umidade do ar e da contaminação atmosférica.

a) Implan tação Dentro de uma zona abrangida pela mesma classificação genérica do clima existem inúmeras variações - microclimas, decorrentes entre outros da topografia, das características da cobertura do solo, da proximidade de massas de água e de centos urbanos. Desta forma é que a escolha do sítio para implantação de um edifício de arquivos e bibliotecas é fundamental, e deve contemplar além das condições climáticas mais favoráveis , os aspectos de acessibilidade e segurança. Além das recomendações já estabelecidas para escolha do sítio para implantação de um edifício de arquivos e bibliotecas deve-se considerar:

• a temperatura do ar diminui com a altura • as principais fontes de umidade para a edificação consistem na umidade do solo na qual interfere o nível do lençol freático, e na presença de massas de água, como mares, rios, lagoas e tc . • a topografia influencia o regime de ventos, os efeitos da radiação solar e o regime de chuvas.

Existem dispositivos para melhorar a qualidade de um terrreno não muito bom como por exemplo o lay-out da massa edificada, a utilização de elementos para controlar a velocidade do vento e favorecer o sombreamento das edificações, reduzir os índices de radiação solar refletida do solo. A utilização da vegetação pode contribuir muito para melhorar o ambiente físico. Ela reduz a transmissão dos ruidos com grande eficácia se densamente plantadas, a superfície viscosa das folhas retém a poeira e filtram o ar , funcionando também como elemento direcionador do vento. Mas o seu efeito térmico é da maior importância, em função da absorção da radiação solar que atinge o edifício, do resfriamento do ar por evaporação, do dispositivo de sombreamento que constituem. A forma das árvores, por exemplo, é um importante elemento quando da sua utilização para o sombreamento. Os raios solares de baixa altura proporcionam sombras longas que podem ser manejadas para proteger fachadas cuja proteção da radiação por outros meios se torna mais difícil. Os raios do nascer e do por do sol são baixos, as fachadas voltadas para o leste e para o oeste podem se beneficiar do sombreamento produzido pelas árvores.

b .Orientação: O problema da orientação em edifícios de arquivos e bibliotecas é composto por muitos fatores: requisitos de acessibilidade, o conforto assegurado por uma boa vista para a comunicação do objeto com o leitor, redução do barulho, mas para redução da temperatura não deve negligenciar a radiação solar e o vento. É importante ter presente que a radiação solar atua nas edificações em conjunto com a temperatura do ar, isto quer dizer que aos efeitos da radiação incidente sobre um fechamento deve se somar os efeitos das trocas por convecção, resultando nas fachadas onde a radiação incide na parte da tarde um efeito térmico integrado maior. Por outro lado a radiação solar direta estando, a maior parte do tempo, durante o dia, próximo a vertical, faz com que a captação solar das superfícies próximas a horizontal.seja maior que as verticais. E que as a superfícies verticais envidraçadas ou opacas tem captação solar superior no oeste e no leste do que no sul ou norte.

Nas áreas tropicais recomenda-se que o eixo longitudinal da construções esteja disposto no sentido leste-oeste, porque as áreas menos atingidas pela radiação solar no verão quente é o norte e o sul, sendo que o norte possibilita um melhor controle

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através de dispositivos de proteção. Evidentemente nem todos os compartimento num edifício de arquivos e bibliotecas podem ficar com a melhor orientação deve-se portanto dividir as necessidades em dois tipos:melhor orientação do ponto de vista

Os efeitos da radiação devem também nortear a localização das aberturas e o * tratamento dos fechamentos através dos dipositivos de sombra e da isolamento e

capacidade térmica.

c- limitação da penetração solar pelas aberturas e pelos fechamentos transparentes: A maior parte do aporte calorífico que penetra na edificação entra pelas aberturas mesmo que envidraçadas. Os vidros são transparentes a radiação solar, deixando que esta penetre quase que totalmente para o interior da edificação, e o efeito estufa que ele provoca ainda torna o seu desempenho térmico pior nas situações de verão. A redução pode ser efetuada através dos seguintes dispositivos:

• as superfícies abertas devem se restringir as necessidades de iluminação natural, que deve ser difusa evitando a radiação direta sobre o acervo bem como reduzindo o índice de radiação ultravioleta através da reflexão sobre uma superfície branca e as necessidades de ventilação, que no caso dos edifícios de arquivos e bibliotecas sofrem sérias restrições.

• a orientação favorável é a orientação ao norte e ao sul em função da energia incidente nestes planos e da facilidade de proteção • utilização de dispositivos de proteção ,vidros especiais, e filtros ultravioleta.

d- Dispositivos de Proteção : os dispositivos de proteção ou sombreamento integrado são elementos capazes de impedir a radiação solar direta, no todo ou em parte, sobre uma superfície ou abertura, no período em que esta seja mais desfavorável. Podem ser exteriores e interiores. Os dispositivos de proteção podem desempenhar um papel muito importante nos edifícios de arquivos e bibliotecas onde a incidência da radiação solar direta sobre o acervo deve ser totalmente evitada. Podem ser tratados de forma conveniente para as necessidades apresentadas durante o ano todo, podem inclusive constituir elementos de composição da arquitetura provendo ritmo, luz, cor e textura. As janelas contribuem para o maior aporte energético da edificação, portanto sombreá-las é muito importante. A efetiva proteção de uma superfície envidraçada depende de muitos fatores: a reflexividade e a cor do material do dispositivo de proteção, a localização do dispositivo influencia os ganhos por reirradiação e convecção, e suas características específicas.

As cores claras em função da sua capacidade de reflexão melhoram o desempenho dos dispositivos de proteção, embora menos acentuada nos dispositivos internos. Os dispositivos internos tem seu desempenho limitado pela sua capacidade de reflexão , isto porque a radiação absorvida é restituída para o ambiente e tem difuldade de atravessar o vidro novamente para o exterior. A efetividade do dispositivo de proteção solar aumenta 35% se este é exterior.

e)- limitação da captação solar pelas partes opacas: A absorção, a resistência térmica e a capacidade térmica são as principais características dos materiais que devem ser utilizadas com propriedade para reduzir o aporte de calor dentro das edificações, em climas tropicais úmidos. A diminuição do coeficiente de absorção da superfície pode ser obtido através de uma cor clara, sendo este mais eficiente nos fechamentos leves e nas superfícies horizontais.O efeito da diminuição do coeficiente de absorção pode ser compensado e até superado por um aumento da resistência e da capacidade de amortecimento do fechamento, ou inércia, e devem ser utilizados de forma racional porque a inércia acumula o calor, e depois o restitui ao ambiente, o que é diferente do isolamento que constitui uma barreira que impede a entrada e saída de calor.

O isolamento é indicado para superfícies horizontais e paredes voltadas a leste ou oeste e em áreas onde há climatização. O seu melhor desempenho depende do correto controle da umidade. As superfícies horizontais , conforme dito anterior-

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mente são as mais atingidas pela radiação sendo portanto recomendado criar uma superfície sobre o fechamento superior para deter a radiação solar, criando uma câmara de ar e mantendo-a ventilada, já que a temperatura do ar será sempre superior a temperatura do ar exterior. As lâminas metálicas tem uma emissividade baixa para as ondas longas e a sua utilização pode duplicar a resistência térmica de uma câmara de ar não ventilada se aplicada em pelo menos uma das superfícies.

A estas recomendações pode-se ainda somar a previsão da menor área possível para os fechamentos exteriores e o desenvolvimento da edificação em altura.

f) sistemas de resfriamento — ventilação natural: favorecer o resfriamento implica em favorecer as perdas térmicas. As perdas térmicas através do envoltório dos edifícios são muito pequenas, e depois de se utilizar os mecanismos de redução de captação solar, a ventilação é a forma mais indicada para extrair o calor acumulado, seja através da penetração da radiação, seja pelos ganhos internos. N o entanto em climas úmidos a ventilação natural em edifícios de arquivos e bibliotecas deve ser utilizada para resfriar a estrutura, evitando a penetração de umidade e poluição atmosférica principalmente nos compartimentos de guarda e tratamento dos acervos, e deve propiciar uma ventilação seletiva nas áreas de trabalho e consulta, com objetivo de melhorar os índices de conforto.

A movimentação do ar deve ser utilizada para esfriar nos períodos quentes e como um alívio da pressão de vapor nas horas de umidade relativa alta. A orientação em função da ventilação é muito mais importante nas áreas mais altas. A velocidade do vento é maior quando a edificação é perpendicular a direção do vento, a velocidade cai 50% numa posição da 45°. A ventilação natural pode ser provida através:

• da orientação do edifício • da utilização do entorno para criar zonas de baixa ou alta pressão, • da localização das entradas de as nas zonas de alta pressão e das saída nas zonas de baixa pressão • as entrada de ar devem ser menores do que as saídas para aumentar a velocidade do vento e favorecer o conforto humano • projetar entradas que direcionem os ventos para áreas desejadas Nos edifícios de arquivos e bibliotecas em clima tropical úmido a ventilação

natural deve ser avaliada ao menos de duas formas: de um lado pode ser um dispositivo eficaz para favorecer as perdas térmicas, reduzindo a temperatura superficial dos elementos de construção e consequentemente a temperatura do ar, e do outro pode se constituir num sério inconveniente quando o ar é carregado de umidade, sais, poeira ou poluição.

3. Conclusão

Para considerar a componente energética e o comportamento climático das edificações é necessário conhecer todos os elementos envolvidos para formar um juizo, um encadeamento de idéias durante o processo de concepção que propicie através do confronto com outros parâmetros tais como custo, materiais disponíveis eleger uma determinada solução afastando as fórmulas prontas e as receitas. Existem formas de avaliar o desempenho de cada solução, através ferramentas da informática, mas que são úteis principalmente em fase adiantada do projeto já que muitos requerem um nível preciso de definição. No entanto sua utilidade não será efetiva se o arquiteto não um domínio sobre os parâmetros que o permita fazer as escolhas pertinentes. E ainda muitos desses programas apresentam limitações que devem ser consideradas e compensadas pelo conhecimento do usuário.

Os parâmetros para preservação dos acervos com suporte em papel aliados aos princípios de conservação da energia requerem que dispositivos arquitetônicos sejam projetados para minimizar os efeitos da energia radianteduz e calor, para controlar a umidade e a contaminação atmosférica

Estes dispositivos sistuam-se no cruzamento entre o conhecimento técnico e o

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Anais da ABRACOR - Restauração Arquitetônica IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia savoirfaire arquitetônico devendo ser analisados em conjunto desde o início do processo de concepção, desde a implantação até a definição dos materiais. Conduzir o processo de concepção levando em conta o desempenho climático da edificação desde sua fase inicial permite evitar problemas e erros.

O desenvolvimento de estratégias de projetos e alternativas tecnológicas para preservação das coleções, nos climas tropicais, é objeto de estudos e pesquisas, e o sucesso deste esforço só poderá ser alcançado, a nosso ver, com um trabalho interdisciplinar nas áreas de conservação, biblioteconomia e arquivologia, arquitetura, química, etc. Sem fórmulas mágicas ou receitas adaptadas de regiões com outras condicionantes, é imprescindível a discussão e a prática para que sejam encontradas as soluções adequadas cada caso e cada problema.

Notas

1 - Nas regiões de clima tropical úmido a temperatura média máxima do ar, durante o dia, na sombra, está acima de 27°C, e a temperatura média mínima do ar, durante a noite, está entre 21°C e 27°C, resultando uma amplitude térmica do ar bem pequena. A umidade relativa do ar é alta durante a maior parte do tempo, em torno de 75%, variando de 65% ai00%. As precipitações são elevadas durante o ano todo. O céu é freqüentemente nublado e a cobertura nebulosa varia entre 60% a 90%. A radiação solar, em parte refletida, e em parte dispersada pela cobertura nebulosa e pelo alto conteúdo de vapor d'água na atmosfera, tem a parcela difusa muito intensa. O conteúdo de vapor diminui também a perda de calor pelas camadas mais altas da atmosfera durante a noite. O vento se move com velocidades normalmente baixas. A alta umidade acelera o crescimento do mofo e a desintegração dos materiais orgânicos. KOENIGSBERGER, O .et. ai. Viviendasj edifícios en %onas cálidasj tropicales. Madri: Paraninfo, 1977.p.43.

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Participação Este trabalho foi desenvolvido junto ao programa de pós-graduação em arquitetura da FAU-UFRJ, área de concentração Conforto Ambiental, na elaboração da dissertação de mestrado: "O controle ambiental para preservação de acervos com suporte em papel na concepção dos edifícios de arquivos e bibliotecas em clima tropical úmido:; que teve como orientador o Prof. Dr. Carlos Alberto Nunes Cosenza e a Profa Dra. Maria Maia Porto como co-orientadora, aprovada em julho de 1997.

Resumo do Autor

Claudia S. Rodrigues de Carvalho Arquiteta, graduada pela FAU-UFRJ,1985. Mestra em Conforto Ambiental, FAU-UFRJ,! 997. Trabalhou como técnica de preservação arquitetônica no IPHAN, de 1985 a 1992, no Projeto de Recuperação e Preservação do Palácio Gustavo Capanema. Arquiteta da Fundação Casa de Rui Barbosa desde 1992, onde realiza estudos, projetos e obras para restauração e conservação do Museu Casa de Rui Barbosa e preservação do acervo da Instituição.

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Anais da ABRACOR - Restauração Arquitetônica IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

Avaliação Pós-Ocupação em Edifícios que são Tombados como Patrimônio Cultural - Um Novo Enfoque

RIBEIRO, Rosina Trevisan M. Arquiteta, Mestre em Arquitetura, doutoranda da COPPE/UFRJ, Professora Assistente da graduação e do Mestrado em Arquitetura da FAU/UFRJ - Rua Valparaíso, 80/306, Tijuca, Rio de Janeiro/RJ - 20261-130 - Tel.: (021) 204-2848. e-mail: [email protected]

1CARTA DE VENEZA, (1964) art. 3.

1. R E S T A U R A Ç Ã O

Para se entender o que é restauração, necessita-se, primeiramente, entender o que seja Patrimônio Cultural. Ao primeiro instante tem-se a idéia de tratar-se de grandes obras artísticas, grandes monumentos ou outros bens de reconhecido valor material. No entanto, o patrimônio cultural tem um significado muito mais amplo, que vem se desenvolvendo ao longo dos anos.

Hoje, segundo a Constituição Federal vigente, considera-se como patrimônio cultural todos os bens material e imaterial, como por exemplo, as formas de expressão; os modos de criar, fazer e viver; as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais; os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico. O que traduz um aspecto bem amplo ao conceito.

Este trabalho refere-se a monumentos, enquanto edificações. Para tanto é necessário que o conceito de monumento também seja conhecido. A noção de monumento, segundo a Carta de Veneza (1964):

compreende a criação arquitetônica isolada bem como o sítio urbano ou rural que dá testemunho de uma civilização particular, de uma evolução significativa ou de um acontecimento histórico. Estende-se não só às grandes criações mas também às obras modestas que adquirem com o tempo uma significação cultural (art. 1 °).

Só a partir destes conceitos pode-se entender o que seja restauração. O conceito de restauração vem evoluindo ao longo dos anos, sendo que as primeiras teorias a respeito do assunto surgiram por volta do ano de 1860, através do arquiteto francês Viollet Le Duc e do inglês John Ruskin, que tinham opiniões divergentes sobre o que seria uma restauração. Enquanto para VioUete LE DUC (1868) "restaurar um edifício não é mantê-lo, repará-lo ou refa^ê-lo: é restabelecê-lo num estado completo que pode não haver existido em um momento determinado", para Ruskin era de apenas a simples conservação do monumento, sem nenhuma intervenção.

A partir destas duas teorias, diversas outras surgiram através de congressos e seminários internacionais de especialistas em restauração, até que em 1964, realizou-se na Itália, no período de 25 a 31 de maio, o II Congresso Internacional de Arquitetos e Técnicos de Monumentos Históricos que deu origem à Carta de Veneza, um dos principais documentos sobre restauração, que serviu de base para todos os outros Congressos e todos os estudos a respeito da matéria até os dias de hoje. Baseia-se em que "a conservação e restauração dos monumentos têm por finalidade preservá-los ao mesmo tempo como obras de arte e testemunho histórico"'.

Em seu artigo 9 a Carta de Veneza (1964) preconiza que: a restauração é uma operação que deve ter caráter excepcional. Tem

por objetivo conservar e revelar os valores estéticos e históricos do monumento e fundamenta-se no respeito pelo material original e pelos documentos autênticos. Termina onde começa a hipótese; daí por diante todo trabalho de complementarão reconhecido como indispensável deverá destacar-se da composição arquitetônica e ostentar a marca de sua

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ABRACOR - Associação Brasileira de Conservadores-Restauradores de Bens Culturais

época (art. 9). Ainda dentro desta linha de pensamento, no artigo 12 é dito que "os elementos

destinados a substituir as partes faltantes devem integrar-se harmonicamente ao conjunto, distin-guindo-se todavia das partes originais, afim de que a restauração não falsifique o documento de arte e de história"

A partir de então surge o teórico italiano Césari BRANDI (1977), para o qual "a restauração constitui o momento metodológico do reconhecimento da obra de arte em sua consistência física e em sua dupla polaridade estético histórica, com objetivo de transmiti-la ao futuro"'(p. 2). Se em algum momento as condições da obra de arte necessitam, com o fim He conservá-la, o sacrifício ou a substituição de uma certa parte dos meios físicos com os quais foi executada, a intervenção deverá ser levada a cabo segundo as exigências do aspecto estético mas sem menosprezar o aspecto histórico. Segundo BRANDI:

A restauração deve obter o restabelecimento da unidade potencial da obra de arte, enquanto seja possível alcançá-la, sem cometer uma falsificação artística nem uma falsificação histórica e sem apagar as marcas da passagem da obra através do tempo (p. 3).

Este é um ponto importante, que contradiz Viollet Le Duc e Ruskin, e que guia os trabalhos hoje existentes em se tratando da restauração de um monumento.

A integração que se faça necessária deverá ser facilmente reconhecível, mas deverá permanecer invisível a uma distância normal do observador, só sendo reconhecida com a aproximação, sem necessidade de instrumentos especiais para este fim.

As intervenções num monumento restaurado devem ser as mínimas possíveis, visando somente a consolidação das partes faltantes e aquelas realmente necessárias para que o edifício se adapte à sua nova função de uso, sendo estas facilmente reconhecíveis e de caráter removível, caso se queira, no futuro, retornar o edifício ao seu aspecto original.

Todo projeto de restauração deve ser realizado visando o uso futuro do monumento, pois um edifício restaurado e sem uso adequado ou mesmo ficando fechado, acabará se deteriorando com o tempo, o que acarretará em mais obras posteriormente.

2. A APO E O M O N U M E N T O RESTAURADO

A Avaliação Pós-Ocupação é uma metodologia para avaliação de desempenho do ambiente construído que se apoia no ponto de vista dos usuários para garantir a satisfação das necessidades destes, e visa propor recomendações para novos projetos com características semelhantes , e pr inc ipa lmente , para adaptações e reformulações nos próprios ambientes estudados.

Segundo PREISER et ai (1988), a APO é um processo sistematizado e rigoroso de avaliação de edifícios, passado algum tempo de sua construção e ocupação.

É necessário que se façam avaliações sistemáticas, como meio para se investigar os problemas decorrentes do novo uso da edificação, se testar novas hipóteses e se p ropor recomendações sobre problemas técnico-construt ivos, funcionais e comportamentais para o monumento.

Através das APOs, se evidenciam erros e acertos encontrados nos ambientes construídos, no decorrer de seu uso. A APO do monumento restaurado, vai servir de meio, a partir do qual se poderá conhecer as variáveis prioritárias que interagem no ambiente em cada estudo de caso, e se definir critérios para "gerir" o controle de qualidade do ambiente construído.

É extremamente importante avaliar os padrões do ambiente construído principalmente quando se trata de projetos em edifícios públicos e, mais ainda, em se tratando de obras de restauração.

No Brasil, os monumentos tombados a nível nacional, excetuando-se as igrejas, quando restaurados são, em sua maioria, utilizados como Centros Culturais. Estes edifícios geralmente são de propriedade do poder público e logicamente para suas obras de restauração e adaptação ao novo uso, é, em sua maioria, utilizado o dinhei-

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ro público. Daí vem a maior responsabilidade com o gasto advindo desta restauração, e consequentemente, a importância da realização de uma avaliação de monumentos já restaurados que funcionam como centros culturais, a fim de se obter insumos para os novos projetos, e não se cometer repetições de erros de projetos e adaptações que demandam um retrabalho e um gasto suplementar de verba pública.

Um aspecto que tem que ser levado em consideração é toda a filosofia do restauro que está resumida no item 2, acima. Ou seja, a restauração deve ter um caráter duradouro, deve-se evitar que sejam feitas adaptações e modificações no edifício a todo instante. Qualquer trabalho de restauração é um esforço muito grande que o edifício sofre, devido aos andaimes, às prospecções, etc. Estas perdas provocam uma acomodação das partes restantes, fazendo com que o edifício perca parte de sua força, por isto é necessário que se intervenha o mínimo possível com a edificação. Este é outro fator que valoriza ainda mais a importância de uma APO criteriosa, para que a obra de restauração possa ter como base um projeto sólido e bem estruturado, a fim de se evitar grandes modificações posteriores.

3. CONCLUSÃO

Existe uma certa contradição entre a teoria do restauro e a metodologia da APO, como pôde ser visto acima: • segundo a teoria do restauro, as modificações a serem introduzidas num monumento, a fim de adaptação a um novo uso, devem ser as mínimas possíveis, se possível até nenhuma;

• segundo a metodologia da APO, as modificações devem ser tantas quantas possíveis para satisfazer as necessidades dos usuários. Em vista destes aspectos é que se torna de vital importância a Avaliação Pós-Ocupa-ção em casos de edificações de valor cultural, para que os resultados sirvam de base para os futuros projetos de características semelhantes. A análise dos resultados encontrados deverá objetivar o problema de ser o edifício um patrimônio cultural, a fim de minimizar as intervenções necessárias ao ambiente construído.

4. BIBLIOGRAFIA

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VIOLLET LE DUC, E. Dictionnaire Raisonné de 1'Architecture. Paris: A. Morei, 1868, tomo VIII.

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ABRACOR - Associação Brasileira de Conservadores-Restauradores de Bens Culturais

Abstract

This article aims to give a view of the work that developed during the last two years (1997/1998) in Santa Catarina, Brazil, where the methodology of IPHAN/TERRACAL was applied to the conservation and restoration of historical structures. A selection of procedures used in study cases such as "Antiga Alfândega - the Old Customer House of Florianópolis 1866, "Palácio Cruz e Sousa - the Eclectic Palace of 1895 in Florianópolis, "Casa do Vigário" - the Vicar's House of late XVII century in Florianópolis and "Casa Candemil" - the Candemil House of XIX century in Laguna is reported. As a conclusion there is an evaluation of this methodology for architectural conservation.

FIG 1. Edifício da Antiga Alfândega Degradação dos revestimentos.

Panorama dos Trabalhos de Restauração com Materiais a

Base de Cal em Santa Catarina

Maria Isabel Corrêa Kanan Arquiteta Conservadora (MA PhD) Instituição de Trabalho: I P H A N / l laCR Rua Conselheiro Mafra 141 88010-100 Florianópolis, SC Fone/ Fax: (048) 2230883 E-mail: [email protected]

A p r e s e n t a ç ã o

Recentemente tem crescido o interesse a respeito das características das argamassas, rebocos e tintas apropriadas para uso em trabalhos de conservação e restauração de edificações históricas. Estas solicitações ocorrem tanto em função da necessidade de restauração de áreas deterioradas de rebocos antigos, como da necessidade de substituição de rebocos e pinturas executados com materiais e técnicas incompatíveis com as do passado, os quais tem apresentado resultados insatisfatórios.

As argamassas e rebocos históricos carregam importantes informações, devendo sempre que possível serem preservados com o mínimo de renovação. Apesar disto, ao perderem sua função de proteção e sacrifício pela ação danosa do meio ambiente, devem ser substituídos com certa freqüência. Estes novos rebocos que irão substituir os antigos de forma parcial ou total devem apresentar certas características como boa porosidade e permeabilidade, resistência igual ou menor a dos materiais da edificação, processo de envelhecimento conhecido.

Em 1995, foram elaboradas recomendações dos componentes e das técnicas de uso dos materiais a base de cal para aplicação no campo da conservação e restauração no Brasil na tese de doutorado "An Analytical Study of Earth and Lime Based Materials in the Blumenau Region, Brazil. Como conseqüência destes estudos foi criado em 1997, pelo IPHAN/SC, o TERRACAL - tecnologias de pesquisa, treinamento e aplicação de materiais de conservação e restauração arquitetônica. O TERRACAL/IPHAN/SC tem realizado várias atividades que vão desde cursos práticos, visando o treinamento de profissionais e a difusão das técnicas de conservação e restauração com cal bem como trabalhos de conservação e restauração com rebocos e tintas a base de cal.

Em 1997/ 98, ocorreram oportunidades para aplicação da cal para a conservação e restauração arquitetônica. Entre estes trabalhos foram selecionados para relatar os casos descritos abaixo.

2. Aplicação da Cal como Tratamento e Conservação de Edifícios

A Antiga Alfândega de Florianópolis e o Palácio Cruz e Sousa são exemplos de edificações históricas que sofreram intervenções drásticas durante as décadas de setenta e oitenta nos revestimentos originais como rebocos, pinturas murais e estu-ques, alterando as condições iniciais e provocando o início de uma problemática de conservação de difícil diagnóstico e tratamento.

2.1 Estudo de Caso Antiga Alfândega Florianópolis A Alfândega de Florianópolis foi construída em 1886 em substituição a primeira que queimou. O edifício de linhas neoclássicas está situado fronteiro a Baía Sul originalmente sobre área muito próxima ao mar e atualmente distante do mar, em conse-

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IX Congresso dá ABRACOR - Salvador/Bahia

qüência do aterro realizado na década de setenta. A construção original é em alvenaria de pedra argamassada com saibro e cal e guarnecida com reboco de cal e caiação. Durante a década de setenta a maior parte das superfícies de reboco de cal foram substituídas e os materiais empregados, na época e posteriormente, em trabalhos menores de manutenção foram o cimento e as tintas plásticas. Em 1985 parte da edificação foi ocupada pelo IPHAN/SC e repetidamente determinados setores apresentaram sinal de degradação pela cristalização de sais.1 Nestes setores a manutenção destas áreas foi feita cada vez mais com a aplicação de materiais mais resistentes e impermeáveis, os quais degradavam em pouco espaço de tempo e resultavam em aparência danificada.

Em 1997 após alguns ensaios da qualidade e quantidade de sais, observou-se que determinadas áreas, dos compartimentos de acesso ao IPHAN, apresentavam quantidades excessivas de cloretos (0, 39 a 2,30(%M)g) em amostras coletadas na zona de degradação, em diversas profundidades (0,0 a 6,0cm). O acesso principal do IPHAN foi o primeiro setor da Alfândega objeto de intervenção e na seqüência estão sendo realizados trabalhos na elevação junto à rua Conselheiro Mafra. 2

O principal objetivo dos trabalhos foi a remoção de camadas impermeáveis, visando a redução da umidade e dessalinisação bem como a restauração da textura e cor dos acabamentos. Os trabalhos de intervenção seguiram a seguinte metodologia:

1. Preparação de mão-de-obra. 2. Preparação da superfície:

Retirada de rebocos e limpeza do entulho. • Aprofundamento das fugas. • Secagem da parede por período mínimo de três semanas. 3. Preparação das Argamassas: • Hidratação de cal virgem calcítica alta pureza e reatividade.

Maturação em tanques plásticos por período mínimo de três semanas. • Traço das argamassas de emboço.

• 1: pasta de cal. 1,5: areia grossa, limpa e com granulometria variada.

• 1: concha moída média lavada proveniente de concheiros naturais. • Traço argamassa de acabamento.

1: pasta de cal. • 1: areia peneirada granulometria inferior a l,19mm.

1: concha moída fina lavada proveniente de concheiros naturais. 4. Aplicação das argamassas:

Umedecimento da parede. Aplicação de camadas de emboço com colher (máximo 12mm).

• Regularização das camadas com régua. Aplicação do acabamento com desempenadeira de ferro.

• Acabamento final com desempenadeira de feltro. 5. Controle de cura:

Umedecimento freqüente. Proteção das paredes externas com painéis de panos freqüentemente umede-

cidos por gotejamento. 6. Aplicação de pintura a base de cal e caseína diluída em no mínimo 10 camadas. O reboco do acesso principal foi finalizado em julho de 1997 e apresentou as seguintes dificuldades:

• Falta de experiência da mão-de-obra na manipulação dos materiais. • Aparecimento de algumas micro fissuras, posteriormente consolidadas com

a aplicação de caiação. • Longo período de tempo para secar as superfícies. Passaram-se meses até que a secagem das superfícies apresentassem sinais posi

tivos. Algumas áreas onde a situação é crítica, nos níveis de umidade e sal, ainda agravada pela impermeabilização com azulejos do lado oposto da intervenção, tinham a expectativa de seis meses de durabilidade e já completaram um período de

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ABRACOR - Associação Brasileira de Conservadores-Restauradores de Bens Culturais

FIG 3. Palácio Cruz e Sousa - Execução reboco rico em pó de tijolo, procedimento de acabamento com desempenadeira de feltro.

FIG 4. Palácio Cruz e Sousa - Acabamento final do reboco rico em pó de tijolo.

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doze meses, sem apresentarem sinais de degradação. Observa-se, no entanto, durante o processo de secagem, o aparecimento de grandes quantidades de sal sob a forma de eflorescência que estão sendo recolhidos a seco com escova macia ou através de aspiração a vácuo. Segundo Nicola Ashurst a eflorescência em tratamentos de dessalinisação pode ser vista positivamente.3

Estas áreas devem ser, dentro das possibilidades do projeto junto ao I P H A N / SC, monitoradas para controle dos teores e absorção de sais e planejamento de possíveis renovações e manutenções. O reboco externo está sendo concluído e apresenta características físicas de aplicação bem melhores que as do setor de acesso principal, já que muitos dos problemas do primeiro setor serviu de experiência e foram melhorados ou corrigidos na segunda etapa.

2.2 Estado de Caso do Palácio Cru% e Sousa Palácio Cruz e Sousa é um dos monumentos ecléticos mais importantes de Santa Catarina. Parte da edificação de hoje foi construída de 1739 a 1749 para Casa do Governo. Mais tarde, transformou-se em Palácio do Governo quando foram feitas grandes reformas e ampliações que lhe conferiram a feição eclética. Durante os anos de 1977/79 e 1984/86 foram realizadas intervenções com o objetivo de abrigar o Museu Histórico de Santa Catarina e o Instituto Histórico e Geográfico de Santa Catarina. Estas intervenções, alteraram significativamente os revestimentos originais incluindo as pinturas murais. O uso de materiais incompatíveis como cimento, tintas acrílicas e vernizes foi a diretriz da época para os trabalhos de restauração, incluindo a substituição de extensas áreas de reboco simples, estuques, adornos e pintura mural em vez da conservação destes elementos. A presença evidente da degradação destas áreas indicam a grande perda do material histórico, bem com o alto grau de incompatibilidade destes materiais.

Hoje, o Palácio evidencia uma complexidade do processo de deterioração de difícil diagnóstico, exigindo estudos e pesquisas para a formulação de tratamentos e restaurações. Entre este conjunto de necessidades foi solicitado ao I P H A N / SC a elaboração de procedimentos do TERRACAL de preparação e aplicação de painéis de reboco de cal, visando definir o suporte para as reintegrações e restaurações das pinturas murais bem como testar tipologias de rebocos de cal e pintura para avaliação de comportamento, durante período de três anos, em relação ao ambiente -umidade e sais.

Foram aplicadas no Palácio as seguintes tipologias de painéis TERRACAL:

1. Painel Reboco de Sacrifício: O reboco de sacrifício é um revestimento temporário com a função de absorver quantidades de sal da parede durante o processo de evaporação e assim proteger a parede da deterioração. O reboco é composto de pasta de cal e areia na granulometria (0,500mm a l,00mm) e traço 1:4. A inclusão de materiais como tijolo e concha moída é indicada e foi utilizada no painel teste do Palácio. 4

2. Painel Reboco Rico em Carbonatos: O reboco de cal rico em carbonatos é um revestimento a base de cal que tem a função de guarnecer alvenarias antigas, permitindo a evaporação da umidade e a restauração da textura e cor do monumento. A inclusão de concha moída em substituição a parte da areia comum aumenta a porosidade e o crescimento de cristais de cal, promovendo a carbonatação e resistência ao meio ambiente.

3. Painel Reboco Rico em Pó de Tijolo: O reboco de cal rico em pó de tijolo é um revestimento a base de cal que tem função similar ao reboco rico em carbonatos, sendo mais utilizado para situações excessiva umidade. A inclusão de pó de tijolo além de ser favorável ao processo de carbonatação pode facilitar a reação de endurecimento se contiver sílica reativa, componente hidráulico. 4. Painel Suporte Pintura Mural e Reintegração: A técnica do suporte constitui-se na aplicação de várias camadas de argamassas

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FIG 5. Casa Candemil - Procedimento de regularização do emboço.

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FIG 6. Casa candemil - Elevação lateral com restauração de rebocos, frisos e platibanda.

a base de cal, variando a granulometria da areia até chegar no acabamento final -superfície bastante fina e polida. As camadas de acabamento final, pelo menos, as duas finais, devem ser aplicadas com a técnica da ligação química, isto é, cada camada deve ser aplicada antes da anterior secar, desta forma, as duas se fundem, permitindo melhor aderência e acabamento final. A textura final deve ser alisada ou polida.

3. Aplicação da Cal na Conservação de Casario

Laguna, como várias outras cidades e conjuntos de patrimônio edificado, apresenta a problemática atual da conservação do seu casario onde uma das questões de grande importância para sua caracterização e valorização é a dos revestimentos e cor.

Durante séculos as paredes e estruturas dos casarios foram erguidas, mantidas e conservadas com argamassas de barro, fibras, cal e guarnecidas com aguadas brancas delineadas por variados tons de pigmentos, muito provavelmente naturais de origem mineral 5 (derivados dos minerais naturais da terra), como o pigmento ocre - terra natural de grande estabilidade, que consiste de sílica e argila e ganha a sua cor do oxido de ferro (amarelo ocre, vermelho ocre e marrom ocre) e a umbra (castanho, cor de ferrugem). Mais recentemente, foi possível, também a utilização de pigmentos inorgânicos sintéticos, nestas e em outras cores, como o azul e o verde/'

O que importa relatar aqui é que, tanto os rebocos como as tintas e cores utilizadas hoje na conservação do nosso casario, estão sendo realizadas sem o critério científico da conservação. Não há um estudo sistemático da relação entre composição, cor das tintas e o tipo, estilo e data das edificações através de prospecções e coleta de amostras. A definição destes elementos de conservação tem sido baseados, no gosto dos usuários, em palheta de cor que melhor se "harmoniza" com as linhas arquitetônicas, muitas vezes buscadas com o auxílio do computador.

Mas, pior que isto, é a natureza destes materiais - cimento para o reboco e tintas plásticas para as tintas, ambos já definitivamente abolidos como materiais de conservação, devido a grande incompatibilidade destes materiais às estruturas antigas, causando danos e acelerando problemas de retenção de umidade, condensação e cristalização de sais.

A Casa Candemil em Laguna e a Casa do Vigário em Florianópolis, representam um esforço do TERRACAL/IPHAN/SC de resgatar uma prática milenar de uso da cal, que tem nos últimos quinze anos sido desenvolvida a nível da ciência da conservação e avaliar o resultado desta aplicação do ponto de vista da conservação urbana e arquitetônica.

3.1 Casa Candemil

A casa Candemil faz parte do conjunto arquitetônico da cidade de Laguna. Devido a falta de conservação durante os últimos quinze anos, a casa foi totalmente arruinada, restando apenas parte das suas paredes externas. Doada ao IPHAN/SC, foi reconstituída com o objetivo de restaurar este elemento ao conjunto da cidade. Representa um esforço do I P H A N / SC de realizar uma reconstituição utilizando técnicas de restauração baseadas no TERRACAL.

Neste edifício todas as argamassas de assentamento, consolidação e reboco não utilizaram o cimento, nem em pequenas proporções. A base da argamassa - pasta de cal foi produzida no canteiro da obra e seguiu as especificações de qualidade e controle elaboradas pelo TERRACAL/IPHAN. Da mesma forma os demais componentes e métodos de preparação e aplicação observaram as recomendações de uso da cal em conservação cujos procedimentos estão sintetizados abaixo:

Pasta de cal de origem calcítica produzida no canteiro da obra, em descanso mínimo três semanas. • Areia angular de granulometria variada sem finos, limpa, isenta de sais e material orgânico.

Inclusão de concha moída. 295

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• Consistência plástica seca. • Aplicação em camadas de 12mm sobre suporte umedecido sem alisar. • Acabamento em 2 camadas de argamassa fina de 3mm, fundidas e desempe-nadas a feltro. • Controle de cura por umedecimento periódico.

Pintura produzida no local, diluindo pasta de cal e caseína, aplicando em várias camadas muito finas. Vestígios de uma faixa de argamassa pigmentada em vermelho foi encontrada e

reconstituída. A cor dos detalhes externos não foi encontrada, optou-se então, por um tom pálido de ocre, testado em grupo de amostras pela combinação de proporções diferentes dos pigmentos inorgânicos artificiais nas cores marrom, amarelo e vermelho.

O resultado da obra diverge do casario restante, pela sua qualidade de material compatível, pela plasticidade e ondulação natural das linhas reconstituídas das paredes, cimalhas e demais frisos. A visita constante ao local pela população de Laguna e a conscientização destes das possibilidades de uso e credibilidade deste material, terá grande efeito no resgate e continuidade deste material na conservação da cida-

FIG 7. Casa do Vigário - Elevação de. Além disto, a obra possibilitou o treinamento desta técnica, pela equipe da obra, antes dos trabalhos de conservação e os quais adquiriram mais experiência e mais condições de repassar seu conhecimen-restauração do reboco to a outros.

3.2 Casa do Vigário A Casa do Vigário é, conforme suas características arquitetônicas, uma das edificações mais antigas da Ilha de Santa Catarina. Conforme a história local, a casa foi construída antes da Igreja Nossa Senhora da Conceição de 1751, para abrigar os construtores da Igreja, passando depois a ser Casa do Vigário. Abandonada ha cerca de trinta anos, apresentava problemas de ruptura das estruturas da cobertura, infiltrações, desagregação e deformação de partes da alvenaria. O I P H A N / SC, com o objetivo de interromper a degradação acelerada da edificação, iniciou através do TERRACAL um processo de conservação da mesma, adotando técnicas similares as existentes e com o mínimo de intervenção. Para a conservação estrutural, foram sanadas as infiltrações fazendo restaurações parciais nas estruturas de madeira, consolidando e reintegrando a estrutura com argamassas de cal, fixando o reboco existente com aguadas de cal e logo após aplicando diversas demãos de cal diluída com caseína.

4. Conclusão

Conforme as recomendações atuais, não há dúvidas com relação a tecnologia do TERRACAL, utilizando cal como material de conservação arquitetônica, mantendo o caráter histórico dos monumentos e ajudando na conservação dos mesmos. As dificuldades de uso desta tecnologia em relação a sua manipulação e suporte para pesquisa transformam estas primeiras experiências em dados importantíssimos para a continuidade destes trabalhos.

O caso da Alfândega constitui-se em pesquisa importantíssima para o campo do restauro no Brasil e no exterior, já que apresenta condições físicas de contaminação de sal e umidade em níveis totalmente desfavoráveis à sua conservação e optou-se pela aplicação de rebocos de cal, sem termos ainda experiência prática e suporte para sua execução.

A falta de uma postura de conservação arquitetônica e urbana com materiais e cores apropriadas tem contribuído para a perda da autenticidade e valorização dos conjuntos urbanos e causa da degradação e descaracterização dos mesmos. Experiências pontuais podem transformarem-se em exemplos para ações futuras.

Estamos no início do TERRACAL, há a necessidade de avançarmos na pesquisa e no ensaio de práticas de conservação e restauração baseadas no resgate das tecnologias patrimoniais e na ciência.

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FIG 8. Casa do Vigário - Elevação depois dos trabalhos de conservação e restauração do reboco

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Participação

Os resultados positivos deste projeto se devem muito a participação efetiva das equipes de mão-de-obra e o suporte financeiro do IPHAN.

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Resumo da Autora

A autora é arquiteta e trabalha há mais de dez anos no IPHAN - Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, em Santa Catarina. Dedicou-se a projeto de doutorado entre 1992 e 1995 sobre conservação e restauração de adobes, taipas, argamassas, rebocos e pinturas a base de cal e terra. Criou junto ao IPHAN/SC o TERRACAL linha de pesquisa das tecnologias de conservação e restauração com cal e terra.

Notas

1 Os danos provocados por sais localizados dentro da alvenaria fazem com que estes devam ser retirados. Os sais principalmente (cloretos, sulfatos e nitratos) entram na alvenaria como resultado da umidade ascendente, ar marinho, ar poluído, bem como podem vir dos materiais de construção (cal, cimento, areia). (Nicola Ashurst, pp. 102-3)

2 Geralmente falando, 0.5 % (por volume) é reconhecido como o nível de sal acima do qual apreciáveis danos ocorrerão. Os maiores níveis serão encontrados logo abaixo da superfície e a profundidades de aproximadamente 12-25mm, onde os sais foram depositados pela evaporação que os transporta. A faciüdade com que os sais são removidos dependerá das características da alvenaria e da solubilidade dos mesmos. (Nicola Ashurst, ibidem.)

3 Eflorescência é uma boa notícia já que significa que os sais solúveis que poderiam ter permanecido dentro da alvenaria, causando danos lá, vieram para a superfície onde o efeito de se solubilisar e recristalizar é muito menor e onde eles podem ser removidos. Se a decisão é feita para remover pesadas quantidades de eflorescência,

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esta grande quantidade deve ser removida escovando ou aspirando a seco com uma escova macia. Água com pressão para enxaguar, se for usada, umedecerá parcialmente a superfície da alvenaria e alguns sais serão absorvidos. Mais eflorescência, não obstante, em um menor nível, deve ser esperada enquanto acontece o processo de secagem. Este procedimento de aspirar os sais tem comprovado sua eficiência. A eflorescência continuará a aflorar durante o tempo que levar para a alvenaria secar até o ponto de estabilização com as condições do ambiente. O procedimento de remoção de sais deverá continuar durante este processo. (Nicola Ashurst v.2, p. 75; p.104) 4 O método é recomendado por vários arquitetos e restauradores como uma ma

neira de minimizar os problemas de salinidade onde não é possível eliminar a umidade ascendente. (John Ashurst v. 1, pp. 68-72) 5 Os pigmentos naturais foram os mais usados na história antiga da pintura. Os

pigmentos naturais minerais são freqüentemente caracterizados pela sua textura mais grosseira, irregularidade do tamanho da partícula e também pela presença de impuridades. Pigmentos, nesta forma bruta, podem apresentar certas qualidades desejáveis a textura e ao tom das superfícies, não atingíveis com pigmentos artificiais e precipitados. (Gettens, Stout, 1966, p.133) 6 As caiações baseadas no carbonato de cálcio são baratas e quimicamente muito

compatíveis com rebocos de cal. Os pigmentos baratos como os terrosos minerais bem como os óxidos de ferro artificiais estáveis a luz e a alcalinidade tornaram-se escolhas apropriadas para pintura das alvenarias. (Matero & Snodgrass p. 48)

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Abstract

This paper focuses the studies and researchs made to prepare the Restoration Cruz e Sousa's Project.

Projeto de Restauração do Palácio Cruz e Sousa

Andréa Marques Dal Grande Arquiteta coordenadora do projeto Fundação Catarinense de Cultura Av. Irineu Bornhausen, 5600, Florianópolis SC CEP: 88025-202 Fone (048) 3330848 h t t p / / : www.fcc. sc.gov.br

Susana Cardoso Fernandez Especialista em Conservação-Restauração de Bens Culturais Ateliê Particular Rua Arcipreste Paiva, 85 - sala 301 Florianópolis SC CEP: 88010-530 - Fone : 223.7762 e-mail: [email protected]

Introdução

O Palácio Cruz e Sousa tem origem na segunda metade do séc. XVIII, como sobrado colonial, para abrigar a Casa de Governo. Desta época restaram apenas as paredes de pedra do corpo principal do atual edifício. No final do séc. XIX, uma grande reforma conferiu-lhe características ecléticas. O desgaste implacável da ação do tempo, associado a novas necessidades de uso levaram o edifício a sua primeira restauração em 1977. Até então, as obras realizadas no palácio eram isoladas, limitando-se a ações pontuais. Como exemplo, temos a instalação de força e luz no início do século, a instalação de um elevador na década de 50. Em 1961 as paredes internas do andar superior, todas dotadas de pintura decorativa mural, foram repintadas na cor branca.

Uma restauração de 1977 buscou resgatar a suntuosidade do edifício conforme seu aspecto no início do século, sem contudo dar o valor suficiente ao material original. Nesta ocasião, o prédio ainda abrigava as funções administrativas do governo do Estado. Foi proposta uma reformulação nas alas laterais provocando a demolição de suas paredes internas e a reconstrução do espaço de acordo com as necessidades do momento. Além disso, todas as instalações prediais foram refeitas, foi recuperada a cobertura e repintada a pintura decorativa mural dos principais salões do palácio. Após dez anos, o prédio necessitava novamente ser restaurado, não somente pelo desgaste do tempo, mas porque pretendiam completar a pintura mural de outras saletas menores que não puderam ser realizadas na obra de 1977. Nesta época o palácio não comportava mais a estrutura governamental. Assim em 1986, foi destinado a abrigar o Museu Histórico de Santa Catarina. Nesta ocasião a edificação foi tombado como Patrimônio Municipal e Estadual. A nova restauração, realizada no período 84/86, foi mais intervencionista especialmente, sobre os rebocos e as pinturas decorativas.

A falta de documentação que registre as intervenções realizadas é comum a ambas restaurações. Encontramos sim, amplo material fotográfico por vezes com legenda e relatório de obra, porém com mensagens telegráficas. Em 1997, quando iniciamos efetivamente os estudos para preservação do Palácio Cruz e Sousa, estabelecemos como premissa o desenvolvimento dos trabalhos embasados em princípios científicos de conservação/ restauração e critérios técnicos das diversas áreas necessárias para que garantíssemos uma atuação globalizada no edifício. Só assim poderíamos devolver-lhe sua integridade física, estética, e histórica, a fim de estabelecermos um

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planejamento adequado ao seu uso, visando a conservação preventiva do monumento.

Plano de trabalho

O plano de trabalho proposto abrange diversas áreas de investigação:

/. Pesquisa histórica Os trabalhos desenvolvidos para a reconstituição histórica abrangeram as seguintes ações: pesquisa documental no Arquivo Público e Biblioteca Pública Estaduais; pesquisa oral com pessoas que moraram ou trabalharam no palácio; pesquisa iconográfica ; organização do acervo fotográfico das restaurações anteriores e campanha em jornal para reprodução de documentos e fotografias referentes ao tema. A campanha não alcançou resultado prático em virtude da quase inexistente veiculação da notícia. Acreditamos haver registros valiosos em posse de particulares.

2. Investigação física Foram revisados os dados referentes ao levantamento arquitetônico (fig.l), realiza-

FIG 1 - Planta baixa - pavimento térreo; planta baixa pavimento superior

do o levantamento planialtimétrico dos jardins e o mapeamento do estado de conservação, cujas patologias aparentes, foram registradas nas elevações das paredes internas e externas (fig-2). Estes dados encontram-se informatizados em autoCAD).

FIG 2 - Elevação Sudeste

Foram elaboradas fichas documentais de cada cômodo do palácio, com registro fotográfico do ambiente, do piso e do forro, bem como de detalhes construtivos e/ou patologias apresentadas (fig.3);

Uma investigação mais acurada dos processos de degradação exigiu-nos análise laboratorial de amostras de materiais. Foram realizados cortes extratigráficos nos principais salões, para observar as camadas de pinturas sobrepostas, verificar a existência de pintura original e identificar a natureza de seu componente básico. ( executado pelo CECOR - UFMG)

Nas áreas degradadas das alvenarias, foram pesquisados os índices de umidade e

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FIG 3 - Fichas de identificação

salinidade, com o objetivo de verificar as causas desse processo. Constatamos alto índice de umidade no térreo e a existência de sais localizados em determinados segmentos. É relevante os índices de nitrato encontrados no térreo da elevação principal, em área que coincide com a provável localização da cavalariça no prédio colonial. A desagregação detectada nas cimalhas revelou-nos a presença de sulfato de fora para dentro da alvenaria. A causa provável seria a ação de poluentes sobre o material. N o entanto, Florianópolis não apresenta níveis de poluição que justifiquem a intensidade do processo. Daremos prosseguimento às investigações. Foi verificada a composição do material de argamassa de um console que se caracteriza pela sua dureza e homogeneidade, diferindo significativamente de outros ornatos. A conclusão das análises indicam como componentes prováveis o carbonato de cálcio e pozolana. De fato, na pesquisa histórica encontramos o registro de importação de terra romana (material pozolânico) para as obras de 1895. Foi checado também a presença de algum tipo de cimento portland num fragmento de reboco com indícios de ser do mesmo período. Havia a suposição de que àquela época já se poderia ter usado material hidráulico como componente da argamassa. O resultado apontou uma argamassa somente à base de cal. Estas análises foram realizadas através de teste de difração de raio x, análise térmica diferencial e microscopia eletrônica. Outro teste realizado foi análise granulométrica da massa da parede de estuque para que se proceda o preenchimento de lacunas com material de características semelhantes (Laboratório de Tecnologia do Restauro / Laboratório de Mecânica dos Solos e Núcleo de Pesquisa em Construção- UFSC)Laboratório de Tecnologia do Restauro - UFSC);

Visando a conservação preventiva foi instalado um sistema de monitoramento das variáveis climáticas (umidade relativa e temperatura) no interior e exterior do edifício, bem como desenvolvido o software CLIMUS para interpretação dos dados e indicação de procedimentos que mantenham o clima no interior do museu o mais estável possível. Tal instrumento, dar-nos-á subsídios tanto para um melhor controle das condições ambientais do museu a um baixo custo, como também nos trará elementos para o encaminhamento do projeto museológico. (Lab. de Meios Porosos e Propriedades Termofísicas / Lab. Conforto Ambiental - UFSC)

3. experimentação prática de técnica e treinamento de mão-de-obra

Consiste na aplicação de testes objetivando investigação de técnicas que deverão ser aplicadas em obra e treinamento de mão-de-obra para execução destes serviços. Os testes aplicados estão abaixo relacionados .

Remoção de pintura acrílica em superfícies de parede e ornato: a ancoragem da pintura acrílica sobre o suporte é demasiada forte. Foram testados sua remoção com: soprador térmico, maçarico, jato de água, removedor e jato de areia, sendo este dois últimos os que melhor resultado apresentaram (FCC);

Aplicações de tintas minerais à base de silicato e cal: a escolha deste tipo de tinta foi devido a sua permeabilidade, buscando reduzir o grau de umidade interno nas paredes. A tinta à base de silicato foi testada inicialmente sobre o reboco existente, após a remoção completa da camada pictórica, sendo este último o procedimento mais difícil (FCC);

Aplicação de rebocos porosos à base de cal: foram designadas quatro áreas para teste. A primeira, interna para checar repinturas que permitam a transpiração da parede. A Segunda, como reboco de sacrifício em área com alto teor de sal. As duas últimas, em parede externa (face interna e externa), utilizando traços diferentes. Sobre o reboco à cal foram testadas tintas de silicato e caiação. Associadas ao reboco, ambas as situações tiveram um bom resultado, quanto à permeabilidade e ancoragem, (Terracal-IPHAN 11.CR)

Pinturas internas: exigiram uma série de testes, tais como, fixação das pinturas murais, amostragem de pintura original, reintegração do suporte em parede de estu-

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que, experimentação de repintura com materiais e técnicas diversas, (Ateliê de Restauração SCF).

Fixação da camada pictórica: embora seja um tratamento emergencial para evitar a perda imediata de todas as pinturas murais, especialmente aquelas que apresentam pintura original, é uma solução paliativa. Não podemos determinar com exatidão sua durabilidade, pois é certo que haverá uma continuidade dos problemas apresentados, teste realizado na sala CS7; (Ateliê de Restauração SCF).

Amostragem de pintura original: identificados os panos de parede onde ainda há pintura original, foi eleita uma pequena área na sala CS 10, sobre parede, para investigá-la. Os procedimentos foram a remoção da repintura em área delimitada, fixação da camada pictórica, nivelamento e reintegração das lacunas, deixando uma janela para identificação da pintura original; (Ateliê de Restauração SCF).

Experimentação de repintura: escolhemos um segmento de parede, que apresentava a camada pictórica completamente degradada, cujo reboco era em cimento, portanto sem pintura original, para avaliarmos o comportamento do uso de suporte e camada pictórica permeáveis. Assim procedemos a remoção do reboco atual, reaplicação de reboco à base de cal e repintura com materiais adequados de acordo com as indicações técnicas apresentadas;(Ateliê de Restauração SCF).

Recuperação dos consoles degradados pela expansão da armadura: optamos por testar a remoção do aço após verificar que o mesmo não possuía função estrutural. O uso de disco de corte diamantado abriu a fenda sem causar danos à peça. Testamos o preenchimento com argamassa de cal e fibras. Houve alguns pontos de retração e a argamassa de cal apresentou certa dificuldade para trabalhar os recortes do ornato, não obstante o resultado foi satisfatório (FCC, IPHAN, SCF, UFSC)

4. Projetos complementam Os projetos de instalações prediais estão sendo desenvolvidos pelo Departamento de Edificações e Obras Hidráulicas (DEOH).

O projeto de paisagismo e instalação de cafeteria foi realizado a partir de um concurso interno entre os alunos do curso de Arquitetura e Urbanismo (UFSC), com a assessoria de uma equipe formada por um representante das instituições envolvidas UFSC, IPHAN e FCC.

5. Projeto museológico e museográfico Está sendo desenvolvido com base em pesquisa histórica do prédio e da vida que ali se desenvolveu. Redefinimos seu perfil museológico com a proposta de aprofundar a história política do Estado nos aspectos de Museu-Palácio e através de exposições temporárias de média duração, privilegiando temas importantes dos diversos períodos políticos. O projeto museográfico atenderá as necessidades desta nova concepção museológica.

Diagnósticos e critérios

O diagnóstico do Palácio Cruz e Sousa apontou-nos uma situação bastante complexa diante da conduta a ser adotada na proposta de restauração. Deparamo-nos com um edifício, cujas intervenções anteriores provocaram perda significativa de material original. Alguns elementos, como a pintura mural apresenta-se em franco processo de degradação, ora pela rigidez do filme da camada pictórica, ora pelo grau de umidade contido nas paredes ou incompatibilidade com o suporte, quando não, pela associação destes fatores. Há situações na qual, esta degradação ocorre sobre áreas onde ainda há pintura original e outras, cujo suporte foi todo substituído. Situações deste tipo exigem uma postura diferenciada de tratamento para cada painel de parede.

Os princípios de soluções particularizadas, compatibilidade entre os materiais utilizados, associado a intervenções mínimas e reversíveis, constituem o paradigma

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de nossa proposta. Assim, as atitudes a serem tomadas são submetidas a estes questionamentos para verificar se atendem estas premissas. Novas restaurações serão realizadas somente em áreas já degradadas ou cujo o processo de degradação é previsível e inevitável à curto prazo, como no caso da oxidaçâo da armadura dos ornatos. Pretendemos avançar com muita parcimônia, uma vez que o prédio já foi submetido a sucessivas obras, que se por um lado nos trouxeram a riqueza do passado, a pronta recuperação do edifício, por outro atuou também como agente mutilador.

A questão da compatibilidade entre materiais é fator preponderante. A garantia de que os materiais a serem aplicados hajam conjuntamente, como um sistema que beneficie a saúde do prédio, levou-nos a optar preferencialmente por tecnologias e materiais "patrimoniais", ou seja, aproximar o possível os novos materiais das características do material original, desde que averiguada sua resistência às condições ambientais atuais. Há situações, nas quais, preferimos adotar a postura de mero observador de um determinado problema, através de seu monitoramento para identificar possíveis manifestações de agravação dos mesmos. Exemplo disto, são os tratamentos dados às lacunas de paredes de estuque com argamassas à base de cimento. A sua simples remoção pode ser mais prejudicial do que a sua permanência, devido a rigidez do material. Ainda como exemplo, temos os segmentos da pintura mural, que de igual modo, se procedermos a remoção da repintura podemos provocar a perda do material original, já tão debilitado. Aguardemos pois, que o tempo e atenção constantes nos mostre a conduta necessária e suficiente para sua conservação.

A revitalização do monumento como um todo, certamente nos obriga a atuarmos em seu exterior nos jardins do palácio, hoje uma área fechada ao público e com o uso de estacionamento exclusivo à autoridades de secretárias de governo instaladas nas proximidades. Inicialmente buscamos referências históricas como condicionantes para o projeto. Infelizmente a falta de documentação sobre o assunto, levou-nos a desenvolvê-lo numa linguagem atual, porém compatível com o edifício histórico. A proposta visa oferecer mais um espaço de estar ao público, no centro de Florianópolis. Para tanto prevê a instalação de uma pequena cafeteria em seus jardins. O projeto contempla também uma prospecção arqueológica nas fundações da antiga edificação do corpo da guarda, demolido na década de 50.

Conclusão

A compreensão da ação dos agentes que promovem a degradação do edifício é nosso maior objetivo, para podermos assim, intervir de maneira criteriosa e conhecendo os limites de segurança de nossa atuação. O palácio já sofreu sobremaneira com intervenções inadequadas anteriormente. Nossa responsabilidade é de agirmos de forma criteriosa e investigativa para minimizar o impacto de tratamentos inadequados. Temos nos deparado com alguns desafios, tais como, remoção do material utilizado nas restaurações anteriores ou a sua permanência. A linha de conduta para o desenvolvimento dos trabalhos tem sido a de intervir onde os danos são visíveis e/ ou previsíveis cientificamente, conforme prioridades estabelecidas e monitorar a evolução das patologias consideradas sem gravidade no momento. Afinal, restauração é um processo e não um fim.

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Arquivo Nacional, 1997. GOMES, Manoel. Do Palácio Rosado ao Palácio Cru?, e Sousa. Florianópolis, IOESC,

1979.

Equ ipe técnica

COORDENAÇÃO: Andréa Marques Dal Grande/FCC PESQUISA HISTÓRICA: João Klug/UFSC EQUIPE TÉCNICA: Edson Francisco Mendonça/FCC Fátima Regina Althoff/FCC Isabel Kanan/IPHAN Rafael João Rodrigues/Ateliê Particular Sérgio C. B. Nappi/UFSC Susana Cardoso Fernande2/Ateliê Particular EXPERIMENTAÇÃO PRÁTICA D E TÉCNICA: Flásio Schürhaus/DEOH CLIMATIZAÇÂO:. Saulo Güths/UFSC Fernando Oscar Ruttkay Pereira/UFSC PAISAGISMO: Cintia C. Chamas/IPHAN Alina G. Santiago/UFSC PROJETO MUSEOLÓGICO: Mary Elizabeth Benedet Garcia/FCC Fernando Antônio Romero/FCC CONSULTORES: Luiz Antônio Cruz Sousa/CECOR/UFMG Diná C. Queiroz Jobs t /DEMA - Secretaria de Estado da Cultura - SP Adrian Neus /ZHB - Fulda/Alemanha DOCUMENTAÇÃO FOTOGRÁFICA: Márcio Martins/FCC ESTAGIÁRIOS: Alessandro Espíndola/UFSC.Anelone Siewert/UFSC.Luciane Zanenga Scherer/ USFC, Carlos Matsuo/UFSC, Cibelli Assmann/UFSC, Daniel Carlos Stange/FCC, Débora Cristina Barreto/FCC, Fábio Adriano Hering/UFSC, Luciane Lima Boeno/ UFSC, Maurício Pontes Holler/UFSC, Rafael Bernard Alschinger/UFSC, Stela Maris Medeiros/FCC, Taiana Kadletz/FCC, Tatiana Nádia Pretto/UFSC, Vanilde Guizoni/ Ateliê Particular

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Anais da ABRACOR - Restauração Arquitetônica IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

Resumo dos autores

ANDRÉA MARQUES DAL GRANDE é arquiteta, graduada pela UFSC / 1985. Trabalha há treze anos na Fundação Catarinense de Cultura - Museu Histórico de Santa Catarina.

SUSANA CARDOSO FERNANDEZ é especialista em pintura de cavalete e escultura policromada - CECOR - UFMG / 1986. Trabalhou durante dez anos no Ateliê de Conservação e Restauração - ATECOR / FCC e atualmente desenvolve atividade profissional e ateliê particular.

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Têxteis

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Anais da ABRACOR - Têxteis IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

Absira et This paper describes a preventive conservation project carried out on the

•19th-century costume collection belonging to the Museu Casa da Hera in Vassouras, Brazil. The type of treatment undertaken optimized the conditions of preservation of the entire collection, at a cost lower than the restoration of a few objects. The focus on prevention also made it possible to extend benefits beyond the initial scope of the project, contributing to a broader improvement in the museum's environment.

A Preservação do Acervo de Indumentária do Museu Casa

da Hera: Um Enfoque Conservativo

Andréa Pedreira Restauradora-Conservadora - 6 aCR/IPHAN Av.Rio Branco n°46, RJ, 20 090-002 Tel. 021 253 9763 - Fax 021 233 1209 E.mail : [email protected]

Luciana da Silveira Restauradora-Conservadora Têxtil Autônoma Rua da Lapa n° 276, RJ, 20021-180 Telefax : 021 252 5619

l . In trodução

O projeto para a preservação do acervo de indumentária do século XIX pertencente ao Museu Casa da Hera em Vassouras, RJ, surgiu da necessidade de se fazer um levantamento aprofundado do estado de conservação em que se encontravam as peças. Os objetos, em sua maioria, haviam ficado expostos por um período maior do que o aconselhável e em condições nem sempre as mais adequadas. Buscou-se, através de um enfoque global e uma diretriz conservativa, preservar a coleção ao invés de se restaurar umas poucas peças. Todo o projeto baseou-se no uso de materiais que atendem a padrões conservativos e, no entanto, disponíveis no mercado brasileiro. O desenvolvimento desse projeto se encontra descrito a seguir.

2. Contexto Histórico

A Casa da Hera é um exemplar de edificação urbana dentro de um núcleo rural. Construída por volta de 1830 durante o período áureo do ciclo do café, a casa é ampla com as fachadas revestidas em hera que lhe deram o nome. Contrastando com seu aspecto externo de uma simplicidade austera, seu interior é requintado mostrando as influências europeizantes da corte, sendo um dos mais representativos documentos existentes de moradia senhorial do período. A herdeira Eufrásia Teixeira Leite a deixa em testamento, no ano de 1930, para o Instituto do Sagrado Coração de Jesus, sob a condição de que fosse mantida intacta, condição esta reforçada com seu tombamento em 1952 pelo IPHAN.

Como parte integrante do seu acervo encontra-se uma rara coleção de indumentária familiar feminina da virada do século XIX para o século XX com peças assinadas por mestres da alta costura francesa. Em fins da década de 1970, é feito um registro sobre a condição precária das peças com tratamento restaurativo de algumas.

3.Objetivos Gerais

Os objetivos do projeto visaram não somente minorar o processo de deterioração como também estabilizar o estado de conservação de 56 peças. A seguir, uma relação dos principais objetivos:

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- Verificação das fichas existentes e complementação com diagnóstico do estado de conservação, condições para exposição e proposta de tratamento restaurativo. - Higienização das peças. - Adequação de algumas peças para exposição com suporte apto para guarda e exposição, minimizando o manuseio direto, talvez a causa menos conhecida e uma das mais destrutivas em se tratando de têxteis. - Desmonte de cinco trajes em exposição prolongada em manequins inadequados. - Acondicionamento das peças em materiais adequados à conservação de objetos históricos. - Possível adaptação das caixas existentes ou confecção de novas. - Otimização da relação do pessoal com o acervo.

4.Desenvolvimento do Projeto

O trabalho foi executado em etapas pela restauradora têxtil contratada e foram realizadas, durante o decorrer do projeto, diversas visitas ao Museu. Os objetivos dessas visitas foram, respectivamente: 1) acondicionar as peças para transporte; 2) escolher e discutir com a diretora e profissionais do Museu as peças que seriam tratadas em cada etapa; 3) discutir e orientar sobre formas de exposição futura e mudanças da reserva técnica para melhor adequação das peças acondicionadas. A execução foi acompanhada pela restauradora do IPHAN responsável pela idealização do projeto.

4.1 Documentação O fichamento já existente do acervo, desenvolvido pela diretora, foi usado como apoio no início do tratamento de cada objeto. As fichas enfatizam descrição, medição, fabricante, e tc , e ainda contam com o desenho da peça em questão. Cada uma foi revista conforme estipulado pelo projeto e quando houve alguma divergência, seja na descrição ou em outros itens, esta foi devidamente anotada na ficha realizada pela restauradora, a qual foi anexada à ficha do Museu. Em geral as divergências foram mais relacionadas às nomenclaturas usadas nas descrições, muitas das quais são de uso corrente mas não necessariamente exatas ou, mesmo, adequadas para fins museológicos. Sendo que não foi encontrado em português literatura especializada para a unificação da aplicação de termos na descrição de trajes, ornamentos e acessórios; foi necessário o uso constante de um bom dicionário assim como livros de costura e de trabalhos manuais como suporte. A ficha realizada pela restauradora têxtil enfatizou o estado de conservação das peças, condições para exposição, tratamentos conservativos/restaurativos realizados e proposta para intervenções futuras. Cada objeto foi fotografado e essa documentação também foi anexada, ficando devidamente documentado o seu estado anterior e posterior ao processo. Todas as fichas indicaram os materiais utilizados.

4.2.Avaliação do Estado de Conservação

A coleção se encontra em estado de conservação geral ruim, em especial os objetos em seda. Muitas dessas peças apresentam danos possivelmente causados por questões intrínsecas à manufatura da seda, como por exemplo a adição de sais de chumbo à fibra e/ou clareamento do tecido, práticas muito comuns no s.XIX. Esse tipo de dano é encontrado em especial nos tecidos de forro. Outro grande problema encontrado foi a fragilização da seda e a perda da cor original devido à ação da luz, seja natural ou artificial. Os tecidos em lã e veludo se encontram em estado razoável, embora com profundo descoloramento. Os manequins em uso são antigos e impróprios para a,exposição de trajes históricos, o que implicou na adequação indevida das peças aos manequins.

Tanto a reserva técnica quanto as salas de exposição possuem janelas e algumas destas são mantidas abertas durante o dia para proporcionar a troca e circulação do ar. Por ser o Museu localizado em área rural e arborizada, o ambiente é muito úmi-

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do, embora deva ser menor a umidade durante o inverno. Apesar de haver monitoramento, inexiste a sistematização desses dados e medidas para o controle dessa situação climática, podendo haver flutuações excessivas e indesejadas de umidade relativa. Sendo que as janelas são mantidas abertas, a luz natural é constante, acrescida ainda de iluminação artificial, em geral com lâmpadas fluorescentes. Embora não tenham sido feitas medições, presume-se que os níveis de raios ultra-viole-ta (U.V.) e infra-vermelho (I.V.) sejam altos: os danos característicos dessa situação podem ser constatados pela descoloração e fragilização dos tecidos. Os efeitos da exposição à luz, seja natural ou artificial, são cumulativos e irreversíveis. A abertura das janelas também propicia a entrada de sujidades e o ataque potencial de insetos. Este último pode ocorrer subitamente, causando danos irreversíveis em muito pouco tempo. Problemas desta ordem foram detectados em várias peças.

4.3.Tratamento O objetivo específico do tratamento conservativo e do acondicionamento foi o de interferir de forma passiva e preventiva no objeto, minimizando os danos causados pelos processos de deterioração externos. Visando esta finalidade, empregou-se práticas e materiais adequados, que não só visassem o 'bem estar' do objeto mas que também diminuíssem e melhorassem a interação das pessoas com a peça: por exemplo, diminuindo a necessidade de manuseio direto da mesma.

Todas as peças passaram por tratamento conservativo, sendo higienizadas para a remoção de sujidades não aderidas. N o caso dos objetos que apresentavam vincos e amassamentos que dificultavam a colocação de estofamento e/ou suportes e comprometiam a integridade física do objeto, estes foram relaxados e minimizados por umidifícação. Métodos diferentes de umidificação foram usados, de acordo com a característica da peça e seu estado de conservação. Dois trajes que se encontravam em exposição, apresentavam estofo interno em espuma de poliuretano fragmentada, em estado de deterioração. Este foi retirado e os resíduos aderidos removidos por processo químico e mecânico.

As cinqüenta e seis peças foram acondicionadas em caixas com tampas, confeccionadas com placas de polipropileno com centro corrugado, material estável, rígido e leve. Nenhuma das caixas em papelão existentes foi aproveitada, pois foram consideradas inadequadas para a preservação dos objetos. As caixas dos costumes e vestidos seguiram tamanhos similares, respeitando sempre o comprimento total dos mesmos e o local designado na reserva técnica, para facilitar a guarda. Cada um foi acondicionado individualmente. Os trajes foram acolchoados com papel fino, 20g, de pH neutro e isento de alumínio. Foram feitos estofos removíveis para cada um, confeccionados com um tecido fino, não texturizado, de poliéster acolchoado com manta também de poliéster coberta com algodão de textura fina e lisa. A função do estofo foi, não só a de isolar e minimizar o impacto do costume com a superfície rígida da placa, como também a de servir como suporte na necessidade de se retirar o traje da caixa. Os acessórios também foram acondicionados em caixas individuais sendo que os sapatos foram acondicionados em duas caixas, com divisórias internas, contendo três pares cada.

Todos os acessórios receberam suportes que atendessem às suas necessidades específicas, de forma que os mesmos servissem tanto para guarda quanto para exposição. Os materiais usados foram: acrílico (como elemento de suporte externo); polietileno expandido (utilizado nos suportes internos); manta de poliéster (usada para acolchoamento); jérsei de seda e de algodão (usado como cobertura externa dos suportes); placas de polipropileno (como elemento de suporte rígido); filme de poliéster (usado como elemento de sustentação e isolamento).

Apesar de grande parte do acervo se encontrar em estado de conservação geral ruim, exigindo a médio prazo intervenções mais profundas do que a conservação preventiva, somente quatro sapatos e dois casacos sofreram tratamento restaurativo com fins expositivos. Estas peças foram selecionadas para substituir e suprir as necessidades do Museu já que toda a exposição seria desmontada para tratamento

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4.4. Recomendações A partir de discussões com a diretora e profissionais do museu feitas durante o decorrer do projeto, mudanças começaram a ser realizadas como, por exemplo, diminuição da iluminação, reestruturação da exposição e adaptações na reserva técnica. Com o relatório final do trabalho foram feitas recomendações e sugestões práticas para melhor conservação do acervo incluindo a melhoria do mobiliário usado para a guarda e exposição e do material de acondicionamento. Foi enfatizada a necessidade do monitoramento sistemático das condições ambientais do Museu antes de haver qualquer interferência. A coleção não é extensa e grande parte já permaneceu em exposição por tempo excessivamente prolongado, diminuindo consideravelmente o seu tempo útil de exposição futura. A confecção de cópias, como alternativa expositiva - idéia mencionada pela diretora - foi encorajada, devendo ser resguardadas as normas conservativas na manufatura das cópias.

5.Conclusão

O projeto atuou nas áreas diretamente relacionadas ao acervo, gerando transformações nas condições gerais e não somente nas específicas, tendo em vista que não adianta apenas tratar o objeto se o mesmo retorna para uma situação responsável em grande parte por sua deterioração anterior. Como resultado, por exemplo, efetuaram-se mudanças no ambiente museológico, principalmente no que diz respeito à iluminação e exposição.

O fato de se optar por um projeto conservativo em vez de um projeto de restauração, permitiu que um número maior de peças fossem tratadas, o que seria inviável no que se refere a processos restaurativos, devido ao alto custo.

Durante o processo, desenvolveu-se um bom entrosamento com o pessoal do Museu, o qual estimulou melhorias concretas em termos de exposição e guarda das peças, para além dos objetivos específicos do projeto. Pode-se dizer, portanto, que foram superadas as expectativas iniciais. Com essa etapa inicial de conservação cumprida, tornou-se possível ter uma maior compreensão das necessidades do acervo, reunindo-se dados que servirão como embasamento para ações futuras.

Participação

Assistentes de Conservação : Margareth Matos e Mariana Christoph.

Agradecimentos

Ao corpo técnico do Museu da Casa da Hera e, em especial, à sua diretora Isabel Rocha Ferreira e à técnica Tânia Ribeiro.

Bibliografia

AIC. Humidification in Textile Conservation Catalog, The Textile Specialty Group of AIC. EUA, 1993, pp.I-II

ARQUIVO da 6a CR/IPHAN BACHMANN, K. & RUSHFIELD.R.A. Principies of Storage in BACHMANN,

K .Conse rva t i on Conce rns - A Guide for Col lec tors and Cura to rs . Washington,D.C.,Smithsonian Institution Press, 1992

BROOKS, M.M., The Application of Low-Energy X Radiography in the Examination and Investigation of Degraded Historie Silk Textiles : Preliminary Report in Preprints of ICOM-CC 11* Triennial Meeting, Edinburgh, 1996, pp. 670-679

CASSAR, May. Environmental Management - Guidelines for Museums and Galleries. Londres, Routledge, 1995

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Abstract

In Minas Gerais state we find one of the greatest historical centres of the country (colonial period) , where small communities are directly involved with its cultural identity trough its liturgical cults which are part of the routine and most of the times those people forget their history and identity inside old trunks in their parishes. Not rarely we can find out costumes of great historical value left in a bad storage and they get spoilt within a short period of time because of the lack of information, technique and resources of the people who handle with them. Since there are few professionals working in this área, one of the goals of the project is to spread the Textile Conservation and Preservation Tradition of the country and besides that it aims to estimulate and to arouse interest of small communities about the importance of this cultural identity. The execution of the project develops through a social-educational process divided in parts such as:

• Definition of the city profile according to the project (textile collection survey); • Community profile study (education levei, etc); • Short workshop about Basic Notions of Textiles Conservation (theorical and practical classes); • Practice whit a piece which is interesting for the community participants of the course; • Exhibition of the final work for ali members of the community. As this experience is valid, the proposal is to make this project the first of future implements in other states of Brazil, aiming to make professionals to save their own heritage.

Conse rvação Têxti l e C o m u n i d a d e

Vestes Litúrgicas

Mônica Paixão Conservadora Têxtil - Privada Rua Ipê Roxo, 12 - Cond. Retiro das Pedras CEP: 301 70 902 Belo Horizonte - MG Tel: (031) 547-2165 E-mail:ampaixao@bhnet. com.br

Colaborador :

Manuel Fonseca dos Reis Folclorísta Rua Boa Ventura, 2118 - Jaraguá CEP: 31 270 310 Belo Horizonte - MG Tel: (031) 979-8006 E-Mail : [email protected]

1. Uma Coisa Leva a outra

Atualmente no Brasil, o conceito de preservação do Patrimônio Histórico Cultural é bastante difundido, mas quando falamos de Bens Móveis e Imóveis, o que concerne a área têxtil, quase não se tem notícias. A falta de atenção para o patrimônio têxtil, prevalece tanto no âmbito de coleções particulares quanto pública; a falta de atenção e pessoas capacitadas se perpetuam em um ciclo vicioso.

Partindo desse princípio, este projeto surgiu da necessidade de incentivar e divulgar a Conservação e Preservação Têxtil , não só no Estado de Minas Gerais, mas futuramente em todo o país, através de um programa educacional orientado à comunidades onde elas passem a compreender melhor o significado de Patrimônio, Cultura Material e consequentemente sua identidade.

Esperando que envolvendo as comunidades, elas contribuam com o desenvolvimento de um argumento - que leva a criar um argumento autentico - para desenvolver mais trabalhos nessa área.

Como a elaboração de um programa não é um processo simples, o projeto está em andamento e vem sendo desenvolvido em etapas. A primeira etapa já está sendo executada junto a uma corporação religiosa, a Ordem Templária da Cruz de Santo Antônio de Pádua, a qual em seu acervo possui as vestes litúrgicas ( Casulas e Dalmáticas ) ' do primeiro Arcebispo de Belo Horizonte, Dom Antônio dos Santos Cabral.

Depois de sua morte, com o passar dos anos suas vestes aparentemente foram esquecidas e ou abandonadas, sem nenhum registro. Ao menos assim foram encontradas quando passaram para as mãos do Sr. Manuel dos Reis ( um dos diretores da ordem ) que as aceitou como doação e que hoje fazem parte do acervo.

A decisão de construir o projeto junto a Ordem Templária, foi porque em Belo Horizonte e Minas, em geral, é uma entidade com uma vida muito ativa: tendo tido a oportunidade de participar como observadora em algumas festas e comemorações da ordem, é entusiasmante a dedicação e identificação dos membros com suas atividades, tendo também o culto componentes de cultura material , como traje, estandarte, bandeira, etc.

Esta convivência de identificação com manifestações cuja a cultura material é

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COMMONER, Lucy A.. Warning Signs : When Textiles Need Conservation in BACHMANN, K.Conservation Concerns - A Guide for Collectors and Curators. Washington,D.C.,Smithsonian Institution Press, 1992, pp 85-90

COMMONER, Lucy A.. Storage Containers For Textile Collections in BACHMANN, K .Conse rva t ion Conce rns - A Guide for Col lec tors and Cura to rs . Washington,D.C.,Smithsonian Institution Press, 1992, pp 91-96

KITE, M. Gloves in ICOM 11* Triennial Meeting, Edinburgh, 1996 LISTER, Alison, Making the Most of Mounts : Expanding the Role of Display

Mounts in the Preservation and Interpretation of Historie Textiles in Preprints of Textile Symposium 97 - Fabric of an Exhibition : an Interdisciplinary Approach.Ottawa, Canadian Conservation Institute, 1997

SHLICHTING, Carl. Boxes and Trays Fabricated from Fluted Plastic Using Hot Melts Rivets in ROSE, Carolyn L.& TORRES, Amparo R. de. Storage of Natural History Collection : Ideas and Practical Solutions. EUA, Society for the Preservation of Natural History Collections, 1992

TETREAUT, Jean. Materials of Construction, Materials of Destruction in Postprint of 3° Colloque International de 1'Association des Restaurateurs d'Art et d'Archéologie de Formation Universitaire : La Conservation Préventive, Paris, 1992, pp. 163-176

WILLIAMS, R. Sott. Concerns About Plastics During Exhibition and Transport of Textile Objects in the Preservation and Interpretation of Historie Textiles in Prepr in t s of Texti le Symposium 97 - Fabr ic of an Exhib i t ion : an Interdisciplinary Approach.Ottawa, Canadian Conservation Institute, 1997, pp.91-96

Resumo dos Autores

Andréa Pedreira é formada em pintura pela EBA/UFRJ, 1985. Freqèntou em 1982, na qualidade de eleve libre , o curso de restauração de tela da Ecole des Beaux Arts de Toulouse, França. Trabalhou de 1985 a 1994 no laboratório de restauração de pintura do Museu Nacional de Belas Artes no Rio de Janeiro. Desde 1994 é conservadora /restauradora de bens móveis e integrados da 6 aCR/IPHAN.

Luciana da Silveira é formada em conservação têxtil, em nível de mestrado, no Textile Conservation Centre / Courtauld Institute of Art (Inglaterra) em 1995. Possui também o grau de especialização em conservação de bens culturais móveis pela EBA/ UFRJ ,1989. Trabalhou junto ao British Museum e ao Victoria and Albert Museum. Com ateliê no Rio de Janeiro, presta serviços a instituições e particulares.

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evidente, nos deu esperança que os membros da Ordem estariam abertos e motivados a explorar o trabalho de preservação.

Sobre a Ordem :

A Ordem Templária da Cruz de Santo Antônio de Pádua, é uma entidade cultural de caráter religioso-ecumênico, sem fins lucrativos e que tem como um de seus objetivos principais, a divulgação das tradições religiosas de caráter espontâneo do povo brasileiro, de modo particular o de Minas Gerais. Os membros representam todos os extratos da nossa sociedade, e os cargos dentro da ordem não são determinados por status social, e sim por regras internas.

Também presta vários tipos de trabalhos assistênciais junto a outras irmandades e diversas paróquias; organizando grandes festas do tipo "Jubileu " onde são reunidos centenas de devotos, Congadeiros e Moçambiqueiros, em honra a seus padroeiros; tendo ainda um departamento cultural, o Centro de Tradições Chico Rei, composto por dois núcleos (Belo Horizonte e Ouro Preto), onde através de espetáculos, divulgam o nosso folclore e danças ritualísticas.

Reconhecida oficialmente como de utilidade pública tanto no município de Belo Horizonte, quanto no Estado de Minas Gerais, sua sede está situada a Rua Boa Ventura, 2118 - Jaraguá- BH/MG, onde está ereta a Capela de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Livres.

1 Casula : veste de seda superior do sacerdote na celebração da missa. Tem sua origem na antiga paénula profana, um manto sem manga em forma de sino. Simboliza a inocência, a caridade e o doce e suave jugo de cristo. 2 Dalmática : veste própria do diácono e do subdiácono, nas missas solenes. São de seda e da cor igual à da casula do celebrante. Era um traje originário da Dalmácia de onde vem seu nome. Simboliza a salvação, a justiça, a alegria espiritual, o que explica sua proibição em dias de penitência.

Além disso, seu acervo é composto de instrumentos musicais, vestes litúrgicas, fardamentos originais, fotografias, fita de vídeo e todo o equipamento destinado a realização de festas religiosas.

Sobre D o m Cabral:

Falar de Dom Cabral não é só evidenciar seus feitos e relevância política no estado de Minas Gerais, mas também justificar o porque da escolha de suas vestes, que o acompanharam durante boa parte de sua vida religiosa.

Nascendo em Sergipe no ano de 1884, terminou seus estudos como seminarista na capital onde logo começou a ser notado por suas devoção eclesiástica e capacidade administrativa, tornando-se Bispo de Natal no ano de 1917,durante o qual fundou várias instituições e periódicos, entre eles o "Boletim de Natal " órgão oficial.

Em novembro de 1921 foi transferido par a Diocese de Belo Horizonte, onde nos primeiros anos de sua gestão, realizou vários trabalhos de caráter administrativo criando ordens religiosas não só na região como em outros estados.

A Partir de 1922 quando da instalação do bispado, o Brasil estava dividido em 13 províncias eclesiásticas, contando com um total de 63 circunscrições , a saber:

13 arcebispados, 40 bispados, 7 prelarias e 3 prefeituras apostólicas. Sendo que a idéia da criação de um bispado em Belo Horizonte começou em 1914, com a crescente importância política da cidade e seu espantoso desenvolvimento material.

Em fevereiro de 1924 recebeu carta de Roma com a promoção para Arcebispo, tendo sido a sua cerimonia de imposição do pallium na Igreja de São José em Belo Horizonte.

Em novembro de 1932 foi celebrada as suas Bodas de Prata Sacerdotais, onde completou 25 anos de sacerdócio.

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ABRACOR - Associação Brasileira de Conservadores-Restauradores de Bens Culturais

Em 1936 celebrou o 2° Congresso Eucarístico Nacional e no ano seguinte o Congresso de 31 de outubro de 1937 onde foi iniciada a Primeira Adoração Perpetua na Capital de Minas Gerais.

Durante seu governo como Arcebispo participou de movimentos operários, criou novas paroquias, instituições e o jornal católico "O Diário ", além de várias publicações de livros e artigos. Falece no ano de 1954.

2. O Projeto

Na realidade este projeto tem mais de um objetivo, pois além de divulgar a conservação e preservação têxtil, tem a função de introduzir à comunidade em evidência o conceito de patrimônio e a preservação de sua identidade e criar um programa onde se possa dar continuidade a esse processo de capacitação.

Quanto a parte estrutural até o presente momento já foram feitos alguns avanços como: Já temos

local para execução dos trabalhos que é a sede da própria Ordem; temos dez voluntários com disponibilidade e interesse para colaborar na execução do projeto, sendo ainda que os mesmos têm a função de divulgar para toda comunidade os avanços do projeto; já estamos preparando um trabalho de acondicionamento e valorização das vestes e também iniciando assim um dos objetivos que é o de introdução ao conceito de preservação e patrimônio; documentação fotográfica; busca de recursos.

Etapas :

Esperando que esse projeto possa oferecer orientação para futuras iniciativas semelhantes, alguns aspectos a ser considerados para armar um projeto como este seriam

Definição da cidade ou região dentro da adequação do projeto (levantamento do acervo têxtil através de paroquias, igrejas, museus e ou outras instituições), com questões como :

Aonde estão os têxteis? Quais são as comunidades, lugares, entidades, como sabemos aonde estão? Alguém está trabalhando com iniciativas de preservação do patrimônio? Quem? Aonde os perigos, ameaças e riscos são maiores - algo especialmente valioso está se perdendo por esquecimento -fechamento de alguma instituição, demolição de algo?

Definição do perfil da comunidade ( estudo das características sociais, grau de escolaridade, tipo de atividades desenvolvidas, etc. ), como :

Quem vive na comunidade? Qual é a composição social da comunidade? Quais são os agentes encarregados da vida da comunidade -formalmente (igrejas, municípios, escolas, etc.) e informalmente (clubes de futebol, políticos, alguma família especialmente importante) ?

Recursos ( através de secretárias de cultura, prefeituras, impresas privadas através de incentivos fiscais).

Local onde o trabalho possa ser desenvolvido, como por exemplo : A própria sede da comunidade? A paroquia local ? A casa de alguém da comunidade?

Introdução da comunidade ao conceito de patrimônio e preservação ( palestras, jogos, questionários, visita a museus etc) , com questionamentos tipo:

Quais são os agentes que ameaçam o patrimônio têxtil e quem influi nessa área? Quem tem vínculo com os têxteis, alguém com um cargo honorário, como por exemplo em uma igreja?

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Anais da ABRACOR - Têxteis IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

Quais são as plataformas disponíveis para incentivar/motivar os membros da comunidade? Tem alguma parte de seu patrimônio que querem/ respeitam especialmente? Com que se identificam?

Curso de curta duração de Noções Básicas da Conservação Têxtil ( com programa voltado para a preservação, aulas teóricas e práticas), visando :

O que é necessário para a preservação de um acervo têxtil? Como assegurar sua continuidade? Onde montar o curso? Como criar uma estrutura de adequação a nível de escolaridade e necessidades do acervo?

Prática sobre uma peça de ineteresse da comunidade, voltado para: Como motivar nas pessoas o espírito de cuidado? Como registrar o trabalho de uma maneira acessível as pessoas que têm que "viver"com ele? Como facilitar que no final as pessoas sintam "donos"de sua peça e com confiança em sua capacidade de cuidar delas?

Exposição do trabalho final para toda a comunidade:

Aonde e como explicar o trabalho sem "predicar"mas inspirando um respeito saudável para com a fragilidade e complexidade do patrimônio têxtil?

Conclusões

O trabalho a nível de comunidades não só é necessário para a salvaguarda do patrimônio, mas sobretudo é uma área de trabalho inspirador para a profissão dos conservadores. Quando temos de sair dos habituais contextos institucionais do nosso trabalho, nos deparamos com um campo de comunicação muito sincero e exigente, de troca de idéias e motivações de uma maneira muito nova e entusiasmante - não a linguagem dos formulários.

Os têxteis através de suas técnicas, formas e conteúdo, são objetos extremamente expressivos (de tendências, pensamentos, simbolísmo e crenças ) de comunidades e culturas.

Trabalhar com eles no contexto das comunidades acredito que combina muito bem com a essência da profissão.

Bibliografia :

LANDI, Sheila. The Textile Conservator's Manual. London, Butterworth, 1985. VASCONCELOS, Irmã Maria de S. João. Op. Vestes Litúrgicas e Linhos do Altar.

Rio de Janeiro, Agir Editora, 1956. Dom Cabral e suas obras. Resenha organizada por um grupo de admiradores, no

25° aniversário da Sagração Episcopal de sua Reverendíssima. Belo Horizonte, Imprensa Oficial, 1943.

Resumo do Autor :

Monica Paixão é formada em Educação Artística pela Faculdade Bennett, Rio de Janeiro (1985), com especialização em Conservação Têxtil (OEA/Metropolitan Museum of Art/Pró-Memória/Cetiq). Trabalhou junto aos museus: Museu Histórico Nacional do Rio de Janeiro como responsável pelo departamento de têxteis, (1985/90); Museu Nacional da Finlândia, junto ao Laboratório de Materiais Arqueológicos, (1990/91); Museu Etnográfico Luigi Pigorini, junto ao Laboratório de Matérias Etnográficos, Roma (1995/96). Participou de vários cursos entre os quais o de Princípios Científicos da Conservação - SPC/95 (Iccrom/Cecor/Eba/Ufmg). Assistente do curso no Curso de Princípios Científicos da Conservação - SPC/98. Desde 1997 de volta ao Brasil trabalha com prestações de serviços para instituições públicas e privadas, além de estar desenvolvendo projeto junto a comunidade.

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ABRACOR - Associação Brasileira de Conservadores-Restauradores de Bens Culturais

Abstract

Our work consists of the cataloguing of the sculptural pieces found in Minas Gerais, Brazil, using the fabric as support. We have as objective to bring the community the knowledge of that group of images

Tela Encolada Catalogação e Estudo Sobre uma Tecnologia Incomum

Eliane Monte Conservadora/Restauradora Instituição: UFMG - Escola de Belas Artes Atelier: Rua Gal. Caldwel, 267/sala 201 - Rio de Janeiro - RJ fone/fax: 242-8774

Gilca Flores de Medeiros Conservadora/Restauradora Rua Cel. Jucá Ferraz, 62 / 2 - Belo Horizonte - MG CEP 30.270-350 fone: 283-2611

Introdução

F I G 1 - São Sebastião Dimensões: 86 x 40,5 x 32,5

Em vários países da América Latina são encontradas obras que se utilizam do tecido como suporte para confecção da imaginária, esta técnica é denominada tela encolada. Em países como Peru, Bolívia, Equador e México essa técnica é freqüente.

"Vero de todos estos expedientes a que supieron los escultores quitenos en sus imágenes, ninguno hay más curioso que ei de los vestidos, ejecutados en tela endurecida. Principalmente en Ia época en que ei barroquismo invadío ei sentimiento dei escultor quiteno, este (...) recurrió ai expediente de cubrir Ia estatua de tela gruesa engomada o encolada con Ia cual conseguia mediante poço trabajo, efectos maravillosamente pintorescos en los mantos j vestidos. Luego que Ia tela endurecia completamente, con Ia sequedad de Ia cola, iba ei artista cubriéndola de yeso y de pintura en cantidad suficiente para dar Ia apariencia de madera." (NAVARRO, 1960)

No Brasil, porém, a grande maioria da imaginária até o século XIX tinham como suporte a madeira. O tecido empregado como suporte para feitura de obras escultóricas é um caso raro em nosso país. Em Minas Gerais, Brasil, encontramos alguns exemplares com tecnologia semelhante, principalmente nas regiões de São João Del Rei, Tiradentes. Mas, apesar de partirem do mesmo princípio, a utilização do tecido encolado como suporte, os artistas brasileiros criaram uma nova maneira de trabalhar a técnica.

Com a exceção de duas peças já restauradas (Nossa Senhora do Parto e São João Evangelista), esse grupo de obras mineiras não havia recebido até o momento nenhum tipo de estudo, sendo mesmo desconhecido pela maioria das pessoas, inclusive profissionais da área de conservação e restauração ou historiadores da arte. Nosso trabalho de pesquisa visa conhecer as imagens existentes em Minas Gerais, seus materiais e técnica construtiva, sua localização na história da arte, visando estabelecer meios mais adequados para a conservação das mesmas. Apresentamos aqui a primeira parte do projeto, que consiste na catalogação das obras. A segunda parte consiste na restauração e estudo dessas obras.

Identificação e localização das obras

Em nossa pesquisa já localizamos um grupo de dezessete peças com a tecnologia estudada, conforme o quadro abaixo. Essas peças estão distribuídas nas seguintes cidades: oito peças em Tiradentes, cinco peças em São João Del Rei, dois medalhões em Camargos, um medalhão em Mariana e uma peça em Itaverava.

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IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

Quadro 1 Título da obra

São João Evangelista São Joaquim São Sebastião São Jorge Dois crucifixos Nossa Senhora do Parto São Sebastião

Santo Antônio Duas cabeças Duas imagens

Sagrada Família (medalhão) Santa Bárbara (medalhão)

São José

Medalhão

Localização

Igreja Matriz de Santo Antônio

Igreja das Mercês Capela do Elvas

Igreja de São Miguel do Cajurú Museu de Arte Sacra

Capela do Saco

Igreja de Nossa Senhora da Conceição

Igreja Matriz de Santo Antônio

Museu de Arte Sacra

Cidade

Tiradentes

São João Del Rei

Camargos

Itaverava

Mariana

Tecnologia

O conhecimento desse tipo de tecnologia nos chegou através de restaurações realizadas no CECOR- Centro de Conservação e Restauração de Bens Culturais Mó-veis/EBA/UFMG. A imagem de Nossa Senhora do Parto foi restaurada por Gilca Medeiros em 1994/95, e seu estudo e tratamento foi publicado nos Anais da ABRACOR de 1996. A imagem de São João Evangelista foi restaurada neste ano, 1998, por Eliane Monte , que descreve o tratamento nesta mesma publicação de 1998. As obras já restauradas nos dão informações bastante interessantes a respeito da tecnologia empregada.

O grupo de imagens estudadas tem como característica em comum o uso do tecido como suporte. Porém, quanto à forma há diferenças entre essas obras que nos permite dividi-las em subgrupos: imagem de vulto, cabeças e medalhões. Foi possível observar as peça de tecido através de suas áreas degradadas, onde podemos constatar a presença das camadas de tecido. Análises mais aprofundadas para identificação de materiais, conhecimento do tipo de estrutura interna e a policromia serão feitas no momento da restauração, quando poderemos realizar um estudo comparativo das obras.

A literatura apresenta as imagens em tela encolada de outros países latinos sendo confeccionadas a partir de um suporte rígido, como o Cristo de San Francisco de Tlaxcala, no México, feito "com Ia medula de Ia cana de maí^ según uso indígena, revistiendo luego esa pasta com telajpintándold" (VILLA, 1942). Já as duas imagens trabalhadas, tinham o interior oco, com a forma sendo constituída apenas pelos tecidos sobrepostos e encolados. Pelos resquícios de argila encontrados no interior de ambas as imagens, supomos ter sido este o material inicialmente usado como base para a moldagem dos tecidos, sendo retirado após o enrijecimento resultante da encolagem, ficando oca a forma moldada em tecido. Na parte interna foi aplicada uma mistura de cera-resina proporcionando maior resistência à peça. Os cabelos foram modelados com fibra vegetal e cola.

Estado de Conservação

As imagens apresentam base de preparação, seguida de policromia. Uma vez que a policromia esteja íntegra, torna-se difícil notar tratar-se de uma obra em tecido. Essa provavelmente foi uma das razões que provocaram as deteriorações apresentadas por quase todas as peças: não sendo reconhecidas como obras em tecido policromado, receberam o mesmo tratamento que as obras em madeira. É evidente que cada um desses suportes - madeira e tela - se diferenciam na resistência às condições climáticas, impactos, manuseios e transportes. Uma vez tratadas sob a mes-

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ABRACOR - Associação Brasileira de Conservadores-Restauradores de Bens Culturais

FIG. 4 - Cristo Dimensões: 91 x 55 cm

FIG. 5 -Sagrada Família (medalhão)

ma forma, as imagens em tecido tendem a ser danificadas mais rápida e drasticamente, por serem mais delicadas.

Das dezessete imagens encontradas, podemos dizer que quase a totalidade delas está em lamentável estado de conservação. Muitas apresentam fraturas, perdas de policromia e suporte, afundamentos e algumas estão repintadas.

Conclusão

Algumas obras encontradas, constam no inventário de 1854., segundo as fichas de inventário do IPHAN-MG de 1994. Apenas duas obras apresentam documentos que atestam sua autoria, são elas: São Joaquim - cuja feitura foi realizada por Rodrigo Francisco em 1753 e Nossa Senhora do Parto - policromada por Jerônimo José de Vasconcelos em 1830. Nossa investigação histórica da tecnologia dessas imagens partem desses registros.

Estamos diante de obras significativas dentro do contexto histórico e artístico brasileiro que nos foram legadas possivelmente por mãos habilidosas, tamanha a qualidade da fatura de algumas peças.

Gostaríamos de ressaltar aqui a necessidade de uma rápida atuação no sentido de preservar esse grupo de imagens tão raro no Brasil. A segunda fase de nosso projeto consiste em duas etapas: o estudo, não só da tecnologia, mas um estudo formal e estilístico e histórico desse grupo, promovendo sua divulgação e valorização. A outra etapa é a restauração e a definição das condições ideais para a conservação das mesmas. A execução desse projetos envolverá profissionais de diversas áreas.

Agradecimentos

Agradecemos a colaboração do CECOR, IPHAN, da ProP Beatriz Coelho, Renata Maués, Edimilson Barreto, Carlos Magno, Olinto Rodrigues dos Santos e Cláudio Nadalin.

Resumo dos autores

Gilca Flores de Medeiros. Especialista em Conservação e Restauração. Mestranda em Artes - Área: Conservação/Restauração, na Escola de Belas Artes da UFMG. Bolsista de Aperfeiçoamento FAPEMIG/Laboratório de Ciências da Conservação/ CECOR/EBA/UFMG.

Eliane Monte. Especialista em Conservação e Restauração de Pintura de Cavalete e Escultura Policromada, UFMG- Escola de Belas Artes, Especialista em Conservação de Bens Culturais Móveis e bacharel comespecialização em Pintura, ambos pela UFRJ - Escola de Belas Artes. Trabalha como restauradora particular.

Referências bibliográficas

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MEDEIROS, Gilca. "Restauração de escultura em tecido policromado". In: Semiz nário da ABRACOR, 1996, Anais™ Rio de Janeiro: ABRACOR, 1996.p.l63 -167.

NAVARRO, José Gabriel. El arte en Ia província de Quito. México: Plan Piloto dei Equador, 1960.

TERAN, Célia, CAZZANIGA, Beatriz. Técnicas de Ia imagineria en ei arte hispanoamericano. Buenos Aires, Ed dei Gabinete, Secretaria de Post-Grado, Universidad Nacional de Tucumán, 1993.

VILLA, José Moreno. La escultura colonial mexicana. México: El Colégio de México, 1942.

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Anais da ABRACOR - Têxteis IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

Abstract

Peter the Second's Coronation was in July 18th 1841, the Emperor at that time was fourteen years old. A yellow velvet robe, a silk waistband, and silk shoes ali embroidered with gold thread formed his coronation gown. The pieces were in poor condition, very brittle and worn and only an intervention applying adhesive could save the pieces. In Brazil there is no tradition in textile conservation field, and adhesive techniques are still practically unknown in the field.

ANTES FIG 1 - Par de sapatos, antes da restauração

A Restauração do Traje da Coroação do Imperador D. Pedro II: Uma Intervenção com Adesivo Beva 371

Claudia Regina Nunes Chefe do Laboratório de Conservação e Restauração Museu Imperial, Petrópolis, RJ

As peças que formam o traje da coroação de D. Pedro II ficaram durante anos expostas em uma vitrine-mesa, na qual a veste foi colocada aberta com à parte das costas voltada para o observador. A fim de criar uma ligeira inclinação e preencher as áreas nas quais a veste não podia ficar apoiada na vitrine (por ser uma peça tridimensional e não um tecido plano) foi feito um forro com jornais e outros papéis, criando um ambiente propício para os insetos, além da acidez destes papéis que passaram gradativamente para o tecido.

A veste, os laços dos punhos, a faixa da cintura foram muito danificada por baratas e apresentavam também infestação de fungos. A gola da veste possuía excrementos de cupim provenientes da vitrine. O veludo estava muito ressecado e perdendo pelo. O lado próprio esquerdo da veste possuía uma enorme perda do veludo que foi destruído por baratas. O bordado de fios metálicos encontrava-se escurecido e soltando em várias partes. As áreas de bordado possuíam uma entretela de reforço interno, que em algumas partes também foram atingidas pelos insetos. O forro de seda da veste foi o mais danificado por baratas e por térmitas. A veste possuía costuras feitas à máquina e à mão. A linha de seda utilizada nas costuras estava completamente podre. Foi elaborado um mapeamento de todos os tipos de costuras.

A seda dos laços do punho da veste estava praticamente destruída, e o que sustentava a forma dos mesmos era o bordado. O mesmo ocorria com a seda da faixa da cintura que estava completamente ressecada e quebradiça. O par de sapatos era a peça em piores condições, havendo apenas pequenos resquícios da seda original. O bordado estava completamente desmontado e soltando dos sapatos e estes estavam muito deformados.

Tra tamento

FIG 2 - Par de sapatos, após a restauração

As peças foram higienizadas e desinfetadas, devido ao problema de fungos. A veste foi completamente desmontada, sendo a seguir elaborado um molde de cada uma de suas partes. Após a remoção do forro de seda este foi lavado e quanto ao veludo foi feita lavagem à seco. Na gola foi necessário utilizar ação mecânica de bisturi e tricloroetano para remover os excrementos de térmitas que formavam uma placa dura.

Em todas as peças era impossível utilizarmos técnicas de costura, pois tanto a seda como o veludo partiam ao serem tocados. O manuseio das peças foi muito difícil devido ao estado de deterioração das mesmas.

Depois de várias análises e pesquisa sobre qual seria o melhor tecido para o suporte do veludo da veste, escolhemos a organza de seda devido a sua flexibilidade e resistência. A organza também serviu de base para as novas costuras laterais que seriam necessárias para montar a peça. Todas as partes foram aderidas utilizando-se o adesivo Beva 371 em spray. Este adesivo foi o escolhido entre as diversos tipos, porque é possível obtermos apenas uma camada muito fina, o suficiente para manter a coesão dos tecidos. A aplicação do adesivo deve ser muito bem elaborada para que este não manche e nem enrijeça o tecido original após ativado. Um veludo de seda branco foi tingido na cor do original para preencher as áreas de seda.

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ABRACOR - Associação Brasileira de Conservadores-Restauradores de Bens Culturais

FIG 3 - Forro da veste da coroação do Imperador D. Pedro II, antes da restauração

O forro da veste também precisou ser desmontado, tendo cada parte recebido uma seda nova, manualmente tingida para obter a tonalidade da original.

Utilizando-se o molde feito, realizamos uma réplica da veste em tecido de algodão cru, para que durante a montagem final da original não ocorresse nenhum problema. O bordado foi limpo e fixado nas áreas soltas. A entretela interna dos bordados também foi restaurada. Com a veste e o forro totalmente restaurados, utilizamos linha de poliester para refazer as costuras laterais por ser uma linha mais resistente do que as laterais, e finalmente unimos as duas partes.

A seda dos laços e das faixas foram planificadas e colocadas num novo suporte de seda utilizando-se adesivo Beva 371. A faixa da cintura também estava muito suja, com manchas, e necessitou ser lavada. Ambas as peças tiveram os bordados limpos e fixados.

Os sapatos foram as peças que requereram grande habilidade, pois o bordado estava totalmente fragilizado e os fragmentos da seda original estavam completamente quebradiços. Os bordados foram removidos de cada sapato e fixados em um suporte feito de ethafoam e fixados. Após este procedimento foram transferidos, juntamente com os fragmentos de seda original para uma nova seda de suporte.

A base dos sapatos, que é feita de tecido de algodão foi higienizada e novamente moldada para retornar à forma original. A nova seda com o bordado foi aplicada sobre os sapatos, também utilizando-se o adesivo, pois a base de tecido de algodão também não agüentaria ser costurada.

Conclusão

Esta restauração foi realizado em 1996 e executado com a ajuda de quatro assistentes, totalizando oito meses de trabalho. Após a finalização do trabalho, as peças permaneceram acondicionadas nem reserva técnica por um período de um ano e três meses, até que a quando a vitrine com as especificações técnicas necessárias fosse construída. Atualmente, elas encontram-se em excelente estado de conservação e podem ser admiradas no Museu Mariano Procópio, Juiz de Fora -MG.

Agradecimentos

FIG 4 - Veste da coroação do Imperador D. Pedro II, antes da restauração

Agradeço aos colegas do Museu Mariano Procópio, Angela, Nanei e Alyuísio, pelo respeito e carinho que tiveram com as peças restauradas, evitando que a má exposição das mesmas pudesse novamente a danificá-las.

Gostaria também de agradecer a Fernanda Maria Blatt Machado pela colaboração e apoio na redação deste trabalho.

Agradecimentos especiais vão para a memória de Richard E.Trucco, meu marido, por toda pesquisa, apoio e encorajamento durante a execução deste trabalho, o qual ele não pode ver finalizado.

Notas de Referência

1 O manto do Cruzeiro que também faz parte do traje pertence ao Museu Imperial, Petrópolis, RJ.

Bibliografia

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BACHMANN, Konstangze. Conservation Concerns: A Guidefor Colkctors and Curators. Smithsonian press, Washington and London, 1989.

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MATTEINI, Mauro & MOLES, Arcangelo. Setenta e Restauro - Metodi Indagine. Quarta edizione, 1993.

MILLS, John S. & WHITE, Raymond. The Organic Chemistry of Museum Objects

Page 324: Anais Do Congresso de Abracor

Anais da ABRACOR - Têxteis IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

Second edition. Butterworth — Heinemann, 1994.

Autora

FIG 5 - Faixa da cintura da veste de coroação do Imperador D. Pedro II, antes da restauração

Claudia R. Nunes é Bacharel em Pintura pela Escola de Belas Artes/UFRJ em 1985. Pós-Graduada em Conservação de bens Culturais Móveis pela Escola de Belas Art e s /UFRJ em 1989, Mestre em Conservação e Restauração de Tecidos e Indumentárias pelo fashion Institute /State University of New York em 1991. Além de ter trabalhado três anos no He Metropolitana Museu of. At, onde ganhou duas Fellowships (Graduate Student-1992 e The Polaire Weissman- The Costume Institute -1992) e por último foi Assistent Conservator no Upholstery Lab /Objec t s Conservation Department —1993), trabalhou também no Museum of American Folk Art /New York, ATTATA Foundation/New York e Merchant's House/New York. Participou de cursos de especialização de Conservação de Têxteis organizados pela OEA e estagiou no Laboratório de Cons. e Restauração da Fundação casa de Rui Barbosa. Foi presidente da ABRACOR no biênio 92/94. Atualmente, é chefe do Lab. de Cons. e Restauração do Museu Imperial e consultora do Maçaranduba Conservação e Restauração de Arte Ltda.

FIG 6 - Traje completo da Coroação do Imperador depois de restaurado

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ABRACOR - Associação Brasileira de Conservadores-Restauradores de Bens Culturais

Abstract

Carmen Miranda was a famous Portuguese singer, who grown up in Brazil , and during the 40's became very famous in Hollywood. Carmen miranda became internationally known as a Brazilian singer. Her clothes were made to be worn on her shows and movies. Consequendy, there were not any concern about materiais, the main point was only that the final appearance of those pieces. Overall the clothes and accessories were in very poor condition, due to the materiais variety and during many years before they became a Museum collection was badly storage. This paper shows how interdisciplinary knowledge and approach are importants to develop complex conservation work. The clothes belong to Museu Carmen Miranda, Funarj, RJ.

FIG 1 - Turbante do traje Palledium. Antes da restauração

FIG 2 - Turbante do traje Palledium.

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Uma Restauração de Têxteis Atípica: As Roupas de Carmen Miranda

Claudia Regina Nunes Chefe do Laboratório de Conservação e Restauração Museu Imperial, Petrópolis, RJ

Para restaurar as roupas e acessórios de Carmen Miranda ( Traje usado no show Palledium em Londres, traje do filme Copacabana 1947, e trajes do filme Uma noite no Rio), enveredamo-nos por uma pesquisa intensa de materiais. Esta restauração não se poderia caracterizar como uma simples restauração de indumentárias. A grande mistura de materiais existentes nos trajes ( tecidos, metal, acrílico, paetês de gelatina e nitrato de celulose, vidro, nylon), o mau acondicionamento, além do suor e a poeira acumulada de anos, contribuíram em muito para o péssimo estado de conservação destas peças. Cabe destacar que a perecibilidade e a vulnerabilidade, além da incompatibilidade dos materiais modernos entre si, acrescentam novas dificuldades durante a restauração.

Uma das peças, uma saia do filme "Uma Noite no Rio" já havia sido dada como totalmente perdida pelo museólogo do museu. É preciso ressalvar, que foi preciso muita pesquisa, talento, comprometimento e acima de tudo muita coragem, para realizarmos este trabalho devido ~a sua complexidade.

Carmen Miranda era uma artista cheia de vida e alegria, e era necessário fazer renascer aa sua vivacidade através da restauração, para que as peças pudessem novamente transmitir toda a energia positiva da "pequena notável".

Este trabalho descorrerá especificamente sobre a restauração do traje usado por carmen miranda no show do Palledium em Londres em 1943. Como restaurar um turbante, uma cesta de frutas, que praticamente não possuía quase nada de original e a única referência eram fotografias em preto e branco. Quando nos deparamos com estes desafios, como agir, qual o primeiro passo a ser tomado?

Neste momento, a ética dos conservadores/ restauradores de "não intervenção ou mínima intervenção" não pode ser seguida com a mesma interpretação clássica. Optamos por uma intervenção total do objeto, ou não teríamos como salvá-lo.

Iniciamos o trabalho com a documentação escrita e fotográfica, passamos a mapear e a desmontar o que restava do turbante. A parte da cabeça elaborada em tecido, quando separada da parte de cima ( a cesta) mostrou a coloração dos paetês que a recobria e não existiam mais. A armação de arame da cesta estava completamente amassada e oxidada, a alça da cesta caída por dentro, e somente alguns dias depois do inicio do trabalho conseguimos definir o que fragmento era aquele. As folhas de armação em arame , também estavam no mesmo estado da cesta. Com a ajuda das fotografias existentes, fomos aos poucos decodificando como arqueólogos os nossos "sambaquis".

Cada pequena peça que existia no turbante, foi tratada separadamente de acordo com o seu material e recolocada no lugar, mas mesmo assim, ainda não tínhamos a solução do problema. Apesar do turbante ter sido remontado, havia ainda uma grande lacuna. A fotografia original mostrava um turbante exuberante, e o que sobrou.foi apenas 40% da peça. Utilizando técnica de restauração de pintura "retocamos"paetês de plástico na cor dos originais para serem bordados na base da cabeça aonde não existiam mais, apenas as linhas de onde ficavam os paetóes existiam. Em seguida, iniciamos a reprodução das frutas que ainda faltavam, usando como referência para o colorido que não possuíamos a coloração das frutas originais e como estas apareciam nas fotografias. Desta forma, conseguimos montar as frutas e flores que faltavam, baseando-se em uma coloração de cinzas para o colorido. Embora as cores não tenham ficado totalmente fiéis ao original, as formas das frutas e flores foram

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Anais da ABRACOR - Têxteis IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

FIG 3 — Saia do traje Palledium confeccionada em crepe de algodão com babados de gaze de seda e em nylon, ornamentada com paetês de gelatina oval em dois tamanhos diferentes e na forma de estrelas. Antes da restauração

FIG 4 — Edna Lúcia Antunes segurando a saia do traje Palledium, após a restauração

FIG 5 - Bustiê do traje Palledium ornamentado com paetês de gelatina em forma de estrelas, antes da restauração

FIG 6 — Bustiê do traje Palledium ornamentado com paetês de gelatina em forma de estrelas, após restauração

reproduzidas fielmente, com materiais inertes usados em restauração. E sem dúvida o turbante é hoje um conjunto harmoniosa de forma e colorido. Todo o processo foi exaustivamente documentado, sendo facilmente identificado o que é original e o que é reprodução.

A saia , dois bustiês, uma echarpe de ombro e um pano de costa que também compõem o traje foram desafios constantes. As peças estavam completamente ressecadas e enrijecidas, com grande quantidade de poeira e sujidades, que colocavam ainda mais em risco a integridade dos tecidos. O babado da saia e a echarpe de ombro, foram confeccionados em gaze de seda, a qual estava totalmente deteriorada.

Todos estas peças eram ornamentadas com paetês de gelatina1, que na sua maioria, já haviam perdido a coloração ou estavam deformados. Este fato, alterou toda a intervenção que iria ser realizada. Um bustiê e a saia também tinham paetês de plástico. Testamos minuciosamente cada paetê para detectarmos os que eram sensíveis à água, alguns devido à deformações e descoloração eram visivelmente feitos de gelatina. Durante o nosso treinamento realizado nos E.UA., tivemos oportunidade de trabalharmos com indumentárias que possuíam este tipo de ornamentação.

Os primeiros paetês e lantejoulas eram2 pequenos anéis de ouro planificados com um martelo de polir. Uma fina folha de prata ou ouro era colocada sobre uma mesa de cobre marcada com uma ferramenta de ferro cortante. Com um sopro os paetês eram retirados da placa. Havia um pequeno furo por onde eles eram bordados à roupa. Os paetês eram utilizados para ornamentar roupas de noite e de festas, indumentárias eclesiásticas, bordados e trabalhos de estampa.

Embora exista muita informação sobre paetês metálicos, pouco se sabe sobre paetês de gelatina, que possivelmente começaram a substituir os de metal por fins econômicos no século XIX, por ser um material barato e fácil de ser obtido e manuseado. Os paetês de gelatina também são leves, ao contrário dos metálicos, que muitas vezes ocasionavam a deterioração dos tecidos devido ao peso. Entretanto, os paetês continuaram a ser ornamentos caros que apenas a alta sociedade tinha acesso. Eram elaborados manualmente e cortados um à um, e as roupas ornamentadas com eles só podiam ser usadas nos dias de sol e por mulheres que não fizessem muito esforço físico, pois estes também tinham a forma alterada com o suor.

Os paetês e/ou lantejoulas quando em contato com a água incham até 10 vezes o seu tamanho natural, ficam com aspecto de borracha, e se tiverem costurados, aonde a linha se encontra deformam e rompem.. Com apenas dois minutos de imersão em água já apresentam deformações. Se uma peça foi imersa em água acidentalmente contendo paetês de gelatina, mesmo que esta seja removida dois minutos depois, ocorrerá uma deformação nos paetês durante a secagem, pois aparentemente estes incham isotrópicamene.

Também são totalmente sensíveis ao calor, e especialmente em combinação com uma umidade relativa alta, eles amolecem e deformam-se permanentemente. O que explica as deformações encontradas nos que estavam no traje.

As peças necessitavam de tratamento aquoso, e foi necessário removermos um a um os paetês de gelatina , e tratá-los separadamente. Os tecidos das peças foram higienizados e lavados. O babado da saia e o pano da costa não agüentavam uma intervenção com costura, e optamos por usar uma técncia com adesivo.

Uma saia toda bordada com paetês preto e que fez parte do filme "Uma Noite no Rio", possuía uma faixa na parte detrás toda em paetóes de nitrato de celulose, que também se deterioram não tão rapidamente como os de gelatina, mas incham e deformam da mesma maneira ( a deformação inicia após 30 minutos na água). Aparentemente estes paetês são idênticos aos de plástico.

Conclusão

Este trabalho foi exaustivo devido a todos os paetês que foram repregados um a um da mesma maneira que eram presos originalmente. O traje completo levou seis

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ABRACOR - Associação Brasileira de Conservadores-Restauradores de Bens Culturais

FIG 7 — Pano de costa do traje Palledium confeccionado em gaze de seda e ornamentado com paetês de gelatina, antes da restauração

FIG 8 - O mesmo pano após restauração

FIG 9 - Saia do filme Uma Noite no Rio, que possui uma faixa inteira de paetês de Nitrato de Celulose

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meses para ser restaurado, mas o resultado foi gratificante, embora como já dito no início foi necessário realizarmos uma intervenção total nas peças. Acreditamos, porém, que conseguimos devolver pelo menos parte do fascínio que Carmen Miranda exercia com seus trajes deslumbrantes.

Agradecimentos

Agradeço a toda equipe do Maçaranduba Conservação e Restauração de Arte, principalmente à Ladislas Szarvas Júnior por todo apoio e valorização do trabalho de restauração realizado sob minha coordenação, e também à Edna Lúcia Antunes e Paulo Alves pela dedicação, empenho e carinho com que realizaram o trabalho.

Agradecimentos especiais vão para Fernanda Maria Blatt Machado pela colaboração e apoio na redação deste trabalho.

Notas de referência

1 The Art of the Embroidere , Charles Germin de Saint-Aubin. 1770 2 Gelatina é um colageno glutinoso derivado geralmente da pele ou de ossos.

Gelatina é solúvel em água e pode ser usada com cola, suas aplicações varaiam desde a culinária até a fotografia. Para a confeccção de paetês deve ser preparada na forma de folhas finas previamente coloridas, que podem ser pintadas depois de secas.

Bibliografia

BLANK, Sharon. An Introduction to Plastics and Rubbers in Collection. Studies in Conservation 35, p.53, 1990.

HILLMAN, David. "A ShortHistory of Early Consumer Plastics". Conservation Division, British Columbia Provincial Museum, Canada, Vol 10 & 11. JIIC- CG.

LEMBERG, Mecthild Flury. Textile Conservation and Research. Benziger AG, Einsiedeln Print, 1988

MALTBY, Susan L. Rubber - The problem that becomes a solution. The Scotish

Society for Conservation & restauration. Modern Organic Materials/preprints of the meeting, Edinbrough, 1988.

MILLS, John S. & WHITE, Raymond. The Organic Chemistry of Museum Objects. Second edition. Butterworth- Heinemann, 1994.

SAINT-Aubin, Charles Germin de. The Art of the Embroidere. 1770 . Los Angeles County Museum of Art. Facsimile 1983

WILLIAM, R.Scott. The Chemical Composition of Sequins. CCI Analytical Report. ARS Report N" 2757, October 25, 1988.

Autora

Claudia R. Nunes é Bacharel em Pintura pela Escola de Belas Artes/UFRJ em 1985. Pós-Graduada em Conservação de bens Culturais Móveis pela Escola de Belas Art e s /UFRJ em 1989, Mestre em Conservação e Restauração de Tecidos e Indumentárias pelo Fashion Institute /State University of New York em 1991. Além de ter trabalhado três anos no He Metropolitana Museu of. At, onde ganhou duas Fellowships (Graduate Student-1992 e The Polaire Weissman- The Costume Institute-1992) e por último foi Assistent Conservator no Uphols tery Lab /Objec t s Conservation Department -1993), trabalhou também no Museum of American Folk Art /New York, ATTATA Foundation/New York e Merchant's House/New York. Participou de cursos de especialização de Conservação de Têxteis organizados pela OEA e estagiou no Laboratório de Cons. e Restauração da Fundação casa de Rui Barbosa. Foi presidente da ABRACOR no biênio 92/94. Atualmente, é chefe do Lab. de Cons. e Restauração do Museu Imperial e consultora do Maçaranduba Conservação e Restauração de Arte Ltda.

Page 328: Anais Do Congresso de Abracor

Anais da ABRACOR - Têxteis IX Congresso da ABRACOR - Salvador/Bahia

Estudo Preliminar do Acervo Têxtil do Museu de Arte

Sacra de Mariana

Claudina Maria Dutra Moresi Química, Centro de Conservação e Restauração de Bens Culturais Móveis / Escola de Belas Artes / Universidade Federal de Minas Gerais Av. Antônio Carlos 6627, Campus Pampulha 31270-901 Belo Horizonte, MG, Brasil Telefax: (031) 499-5375

Maria da Conceição Fernandes Brito Museóloga e Conservadora, Museu de Arte Sacra da Arquidiocese de Mariana Rua Frei Durão, 49 35420-000 Mariana, MG, Brasil (031) 557-2516

Jan Wouters Institut Royal du Patrimoine Artistique, Pare du Cinquantenaire 1 B-1040 Brussel, Belgium Tel.: 00-32-2-7396711/ Fax: 00-32-2-7320105

Introdução

O acervo têxtil do Museu de Arte Sacra de Mariana, cidade episcopal, é muito rico e valioso, destacando-se o vestuário litúrgico que ainda é utilizado nas cerimônias religiosas da Igreja Católica. Neste trabalho serão discutidos a origem, evolução, função, material e simbolismo destas peças. A fixação das cores litúrgicas bem como a introdução de ricos estofos, tecidos adamascados franjados de ouro e brocados com bordadura de pedrarias, transformam a representação da veste sagrada. Neste trabalho foram estudados quatro têxteis históricos, pertencentes ao Museu de Arte Sacra de Mariana. O material têxtil foi identificado através de métodos científicos de análise. Este trabalho tem a preocupação em valorizar o nosso acervo têxtil que merece ser estudado e conservado.

Vestuário litúrgico

A Sagrada Escritura, no Capítulo XXVIII do livro do Êxodo, descreve a magnificência e dignidade que deveriam cobrir os ministros do culto, os sacerdotes e levitas, nas funções sagradas. Quando Clemente de Alexandria aconselha uma melhor veste para se assistir às cerimônias religiosas, exprime uma tendência natural que todo o homem tem para com o sagrado. Este mesmo sentimento de respeito pelas coisas sagradas, levaram o sacerdote a adotar a veste litúrgica especial; por serem o sinal de uma dignidade divina que reveste os ministros e os faz expoentes da assembléia cristã. Na missa, o sacerdote está no lugar de Jesus, ele está fazendo, oficialmente, o que Cristo fez na Ceia. É por isso que o Celebrante tem uma veste própria para o culto divino: para ser sinal de algo diferente. No princípio, não diferia da indumentária de festa de um simples cidadão senão pela riqueza. Depois, então, começaram a distinguir-se o traje civil e o eclesiástico. A evolução da veste terminou, praticamente, na época Carolíngea (século XII); com a reforma desta época, as vestes atribuídas a cada grau de ordem, Bispos, Presbíteros, Diáconos, e tc , tornaram-se definitivos.

No século XII, em Roma, já haviam sido fixadas as cinco cores atuais, e o uso romano acabou se estendendo a todos:

a branca indica ressurreição, pureza, alegria; • a vermelha lembra o fogo do Espírito Santo, o sangue;

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Figura I — Capa de asperge, costas. Detalhe da grega.

Figura II - Estola, veste litúrgica.

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a verde é a cor da esperança; a roxa simboliza a penitência e a mortificação; a preta indica luto e morte.

Por volta dos séculos XII-XIII, temos a introdução de ricos estofos e bordados com símbolos cristãos, que representam o poder sacerdotal. O século marcado pelo esplendor do barroco, mostra as riquíssimas vestes litúrgicas das dalmáticas, casulas, capas de asperges e estolas, etc.

Têxteis históricos estudados

Foram estudadas as seguintes peças (Figuras I a IV), pertencentes à arquidiocese da cidade de Mariana:

grega (MAM-0917) - arremate de capa de asperge, em cetim branco. Ao centro motivos florais e estilizados, bordados em fios de seda matizados e fios de ouro. Nas laterais uma grega dourada;

capa de asperge (MAM-0966) - manto aberto na frente, mais curto, permitindo maior liberdade de movimentos. Esta capa apresenta tecido em brocado de seda e bordas em passamanaria dourada e franjas em espiral dourada. Nos ombros, as decorações são ramagens, entremeadas por motivos florais, trigo, uva e folhas de parreiras em lâmina e fios metálicos bordados. No verso, uma grega está presa à capa. A grega é circundada com passamanaria e franjas em espiral dourada, no mesmo material da capa. Ao centro motivo floral em relevo envolvendo a inscrição IHS de onde saem raios, confeccionados em fios de ouro;

• estola (MAM-0920) - veste litúrgica usada suspensa ao pescoço como os pesos que se carregam e, cruzadas ao peito, reforça esta mesma idéia. Estola com motivos em ramagens e florais, bordados em fios de ouro e franjas em espiral dourada; • toalha de altar - tecido valioso, coberto com preciosos fios metálicos , constituindo-se de verdadeiros "vestidos de altar". Apresenta ramagens , uvas em fios dourados. Ao centro o Cordeiro de Deus em fios de prata.

Metodologia

Amostras representativas das cores e tipos de fibras usadas nos têxteis foram removidas para análise dos corantes e identificação das fibras. Menos do que lcm do fio é cortado no verso da peça, e /ou em locais de fibras já rompidas, não interferindo na leitura estética da obra. As amostras de cada obra estão descritas na Tabela I.

O estudo de cada amostra inicia-se ao microscópio estereoscópico, aumento de 10 a 40X, permitindo classificar o tipo de fibra utilizada: fibra têxtil, metálica ou fio com alma de seda. Informações sobre a morfologia das fibras é obtida através da análise ao microscópio ótico com luz polarizada, em aumento 100 a 200X. Ao microscópio as fibras têxteis foram identificadas através da análise do seu corte longitudinal.

Os fios metálicos foram identificados por microscopia eletrônica de varredura (SEM), técnica que permite observar técnicas de manufaturas, o estado de conservação do metal e corrosões ocorridas. O detetor de energia dispersiva de raios-X (EDX) acoplado ao microscópio eletrônico identifica os elementos metálicos constitutivos, permitindo análise semi-quantitativa. Examinando o metal frente e verso podemos determinar a sua pureza, se é uma liga ou está revestido por outro metal. O resultado da análise está apresentado na Tabela II.

Os corantes usados nas fibras coloridas foram identificados por cromatografia líquida de alta eficiência (CLAE) com detetor de múltiplos canais no ultravioleta/ visível, técnica que permite identificar substâncias orgânicas coloridas, isto é, que absorvem na região visível do espectro eletromagnético. Os corantes são hidrolisados em solução ácida a quente (Moresi and Wouters, 1997), para serem descomplexados das fibras tingidas e analisados por CLAE. A Tabela III mostra o resultado da análise por CLAE.

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Tabela I - Amostras das quatro indumentárias religiosas do Museu de Arte Sacra de Mariana.

Figura III — Grega, arremate da capa de asperge.

Título da obra Capa de asperge

Estola

Toalha de altar

Grega

N 2 Amostra 1 - fio vermelho escuro 2 - fio dourado com alma de seda 3 - lâmina dourada 4 - fio vermelho escuro 5 - fio dourado com alma de seda 6 - lâmina dourada 7 - fio vermelho escuro 8 - fio dourado com alma de seda 9 - fio prateado com alma de seda 10 - fio vermelho escuro 11 - fio vermelho 12 - fio amarelo 13 - fio verde 14 - fio azul 15 - fio lilás 16 - lâmina dourada 17 - fio dourado com alma de seda

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Figura IV — Toalha de altar.

Tabela II - Resultado da análise por microscopia eletrônica de varredura acoplada ao detetor de energia dispersiva de raios-X (EDX) das amostras de fios metálicos. Título obra Capa asperge

Estola

Toalha altar

Grega

Amostras fio dourado, alma de seda lâmina dourada fio dourado, alma de seda lâmina dourada fio dourado, alma de seda fio prateado, alma de seda fio dourado, alma de seda lâmina dourada

Resultado (%) / Frente n.a. Ag(73) Au (23) Cu (3) n.a. Ag(82)Au(12)Cu(2)Cl(4) Ag(61)Au(33)Cu(2)Cl(3) Ag(98)S(l) Ag(80)Au(18)Cl(l) Ag(67)Au(32)

Resultado (%) / Verso n.a. Ag(82) Au(14) Cu(3) n.a. Ag(84)Au(13)Cu(2)Cl(2) Ag(78)Au(19)Cu(2)Cl(l) Ag(81)S(2)Cl(16) Ag(82)Au(16)Cl(l) Ag(70) Au(28)

n.a.- não analisado, Ag -prata, Au - ouro, Cu - cobre, S - enxofre, Cl - cloro

Tabela OI - Fibras provenientes de indumentária religiosa do Museu de Arte Sacra de Mariana.

N* 01 02 03

04

05 06 07 08 09

10

Título da obra Capa de asperge Capa de asperge Estola

Grega

Grega Grega Grega Grega Grega

Toalha de altar

Amostras vermelho escuro amarelo fio ouro vermelho escuro

vermelho escuro

vermelho amarelo verde azul lilás

vermelho escuro

Resultado (%) Fast red AV, Cl n 15620 (1877) 841u,7ap, 81u', lap' +dcll, 72ca, 19ea, 2ea', 2dcIV, 1.5dcVE, 2.5fk, lka Fast red AV, Cl n 15620 (1877) + outros sintéticos, não identificados Fast red AV, Cl n 15620(1877) 40 ge, 431u, 17ap 15 lu, 3ap, 82 in azul sintético, não identificado sintético complexo, provavelmente composto de vários corantes sintéticos 0.5dcn, 48ca, 47ea, 2ea',1.5dcIV,ldcVII

Os resultados estão em porcentagem relativa dos constituintes presentes, calculados no comprimento de onda de deteção e integração a 255nm.

(lu): luteolina, (ap): apigenina; (ca): ácido carmínico (fk): ácido flavoquermésico. (de): Dactylopius coecus (Costa) - corantes não identificados (Wouters and Verhecken, 1989). (ka): ácido quermésico. (ge): genistína. (in): índigo. (ea):ácido elágico

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Tecnologia têxtil

Figura V - Microfotografia da lâmina dourada usada na decoração da capa de asperge, largura 0,24mm, aumento 10X.

Figura VI — Microfotografia dos fios metálicos com alma de seda usados na toalha de altar ao microscópio eletrônico, aumento 100X. a) Fio prateado com forma arredondada, largura 0,09mm. b) Fio dourado com forma plana, largura 0,30mm.

O brocado de seda com fio metálico dourado foi usado na capa de asperge e estola. O cetim vermelho foi usado na toalha de altar e o cetim branco na grega. O brocado é um rico tecido de seda com desenhos em relevo realçados por fios de ouro ou de prata (Ferreira, 1986). Nos têxteis estudado foi encontrado o uso de passamanaria, designação comum a certos tipos de tecido trabalhado ou entrançado com fio grosso, em geral de seda e destinado ao acabamento ou adorno de roupas (Ferreira, 1986).

Na capa de asperge, a seda foi utilizada tingida de vinho, com o corante sintético Fast Red AV (Cl n° 15620). O fio dourado com alma de seda amarela. O amarelo é o corante Resedá (Reseda luteola). A lâmina dourada (Fig V) é em prata revestida de camada dourada, sendo uma liga de ouro e cobre.

Na estola, o tecido vinho constitui-se de fio de seda tingido com Cochonila Americana (Dactylopius coccus). O fio dourado com alma de seda, fibra confirmada por microscopia ótica é em prata revestida de camada dourada. O dourado é uma liga de ouro e cobre. A prata apresenta-se enegrecida.

Na toalha de altar, o tecido vinho constitui-se de fio de seda tingido com Cochonila Americana {Dactylopius coccus) ou ácido carmínico sintético. A natureza das fibras dos fios prateado e dourado com alma de seda foi confirmada por microscopia ótica. A lâmina dourada é em prata folheada de camada dourada (liga de ouro e cobre). A prata, também, apresenta-se enegrecida. O fio prateado é em prata (Fig. VI), sendo que a frente do fio, exposta ao ar apresenta-se enegrecida.

Na grega os fios são em seda tingidos com os seguintes corantes: • vermelho-Fas t Red AV (Cl n° 15620); • amarelo - Genestrola (Genista tinctorum); • verde - Resedá (Reseda luteola) + indigoíde (provavelmente índigo sintético); • azul - Azul sintético não identificado;

lilás — Sintético complexo, provavelmente vários sintéticos. A lâmina e o fio dourado (Fig.VI) são em folha de prata folheada a ouro. A

lâmina dourada apresenta partes enegrecidas. O fio metálico apresenta alma de seda. A lâmina metálica é retangular apresentando larguras de 0,24mm e 0,83mm. O

fio metálico é retangular, larguras de 0,10mm e 0,30mm, torcido cobrindo o fio de seda. Foram analisados fios metálicos retangulares com formas plana e arredondada. A presença do elemento cloro em todas as pratas enegrecidas confirma o processo de alteração da prata.

A maioria dos tecidos estudados contém corantes sintéticos. Apenas o corante Fast Red AV foi identificado. A data de descoberta deste corante sintético (1877) e a presença de corantes naturais nos têxteis indica que os objetos foram fabricados num período de transição de utilização de corantes naturais e sintéticos: fim do século XIX e início do século XX. O uso também de lâminas e fios em prata dourada, imitando fios de ouro, confirma esta afirmação.

Conclusões

Os resultados mostram o uso de passamanaria, brocado e cetim. Nos têxteis em estudo foi utilizada a seda, fios dourados, fios prateados e fios metálicos com alma de seda. Os "fios de ouro" são em prata dourada revestida de liga de ouro e cobre. A presença dos corantes naturais e sintéticos indica que os objetos foram fabricados num período de transição: fim do século XIX, início do XX. Estes estudos iniciais contribuem para um maior conhecimento da tecnologia têxtil do nosso patrimônio cultural.

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Bibliografia

FERREIRA, A.B.H., 1986. Dicionário da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro, Nova Fronteira.

1997 - MORESI, C.M.D. & WOUTERS, J. HPLC analysis of extracts, dyeings and lakes, prepared with 21 species of the genus Re/bunium. Dyes in History and Archaeology, 15, Textile Research Associates, York.

1989 - WOUTERS, J. and VERJECKEN, A. The coccid insect dyes: HPLC and computerized diode-array analysis of dyed yarns. Studies in Conservation, London, v.34, p. 189-200.

Resumo dos autores

Claudina Maria Dutra Moresi — Doutoranda em química pela Universidade Federal de Minas Gerais, Brasil. Estágio de aperfeiçoamento (1986/87) e trabalho de pesquisa (1991 e 1996) nos laboratórios científicos do Institut Royal du Patrimoine Artistique, Bélgica. Especialista em análise de materiais têxteis, técnicas e materiais pictóricos de pinturas e esculturas policromadas no Centro de Conservação e Restauração de Bens Culturais Móveis da Escola de Belas Artes da Universidade Federal de Minas Gerais, desde 1981.

Maria da Conceição Fernandes Brito — Graduada em Museologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Técnica em Conservação e Restauração de Bens Culturais Móveis pela Fundação de Arte de Ouro Preto, Minas Gerais, em 1995. Museóloga chefe, responsável pelos Museus da Arquidiocese de Mariana, Minas Gerais. Professora da disciplina de Conservação Preventiva do curso de Restauração e Conservação de Bens Móveis da Fundação de Arte de Ouro Preto.

Jan Wouters — Ph.D. em química com especialidade em bioquímica pela Universidade Estadual de Gent, Bélgica, em 1978. Desde 1982 está envolvido na análise química de materiais orgânicos naturais no Institut Royal du Patrimoine Artistique - IRPA. Chefe de trabalho do IRPA.

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