Acolhendo Adolescentes Em Situacao de Risco

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  • 8/18/2019 Acolhendo Adolescentes Em Situacao de Risco

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    Acolhendo adolescentes em situação de risco

    Ao final desta aula, você deverá ser capaz de:

      Compreender as possíveis relações entre o uso de drogas, pobreza e

    exclusão social.

      Entender o significado do processo de dupla exclusão e a importância de

    seu enfrentamento com a metodologia das redes sociais.

      Conhecer a prática de redes sociais como uma metodologia de

    intervenção comunitária preventiva.

      Identificar os sinais de maus-tratos contra crianças e adolescentes e saber

    como proceder nesses casos.

      Compreender a importância da Intervenção Breve para a atenção aos

    usuários de álcool e outras drogas.

    Aula 11

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      Aula 11 Acolhendo adolescentes em situação de risco

    Assista ao filme 11 – Como fazer? 

    O filme destaca alguns modelos de prevenção do uso de drogas na escola, e, também, de que forma essespodem ser integrados em um projeto maior. Adotar um modelo integrado de prevenção na escola é bemmais complexo do que usar um modelo isolado.

    Resumo do filme 11 – Como fazer?  Nesse filme, destaca-se a empolgação do professor Marco Antônio com a realização de atividades que ajudem na prevenção do uso de drogas. No entanto, fica em dúvida quanto à efetividade das diferentes formas de tra- balho preventivo. Ele debate com a professora Luíza sobre um projeto para a escola e juntos procuram a diretora Dagmar. Esta aproveita as dúvidas dos professores sobre o melhor tipo de atividade para propor que utilizemde modo integrado os diferentes modelos de prevenção. Marco Antônio destaca a importância de envolver as famílias e a comunidade, enfocando a diversidade de possibilidades quando se trabalha com o modelo de promoção à saúde.

    Uma notícia sobre as drogas divulgada nos jornais despertou nos pais, adolescentes, professores e funcionáriosde uma escola a necessidade de avaliar o papel de cada um nessa situação.

    Aproveite este momento e discuta com seus colegas sobre estas questões:

      Sua escola já fez atividades de prevenção do uso de drogas? Quais?

     Quais objetivos procurava-se alcançar?

      Quais foram as que deram melhores resultados?

    Aprofunde seus conhecimentos lendo os textos a seguir.

    ACOLHENDO ADOLESCENTES EM SITUAÇÃO DE RISCO PELO ENVOLVIMENTO

    COM DROGAS NO CONTEXTO DE VULNERABILIDADE SOCIAL Maria Fátima Olivier Sudbrack O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA, 1990) resga-ta o reconhecimento da criança e do adolescente enquantocidadãos que devem ser respeitados em sua condição deseres em desenvolvimento que exigem situações especiaisde proteção para a garantia da saúde integral, ou seja, deum crescimento saudável de suas potencialidades físicas,psíquicas e de socialização de uma forma ampla.

    Partindo-se deste pressuposto, considera-se situação de

    risco à criança e ao adolescente, toda e qualquer condição,ou contexto de vida, que coloque em jogo a satisfação dassuas necessidades básicas atuais e do desenvolvimentode suas respectivas potencialidades.

    A realidade epidemiológica aponta para o crescente aumento de crianças e adolescentes em condições derisco, tanto pelo consumo precoce de drogas lícitas e ilícitas, como pelo aliciamento para o mercado do nar-cotráfico o qual, por sua vez, aperfeiçoa, cada vez mais, suas estratégias de atração da mão de obra infanto- juvenil, recrutada, em sua maioria, nas periferias dos grandes centros urbanos e explorada de forma insana eperversa. Resulta desse cenário o fenômeno da mortalidade juvenil que é o nível mais extremo da violênciasofrida pelos nossos jovens.

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    Em face de tantos desafios, a escola é, sem dúvida, importante contexto protetivo para ações preventivas,porque abriga muitas das crianças e jovens como seus alunos e eles confiam e podem contar com seus edu-cadores. No entanto, as escolas também se tornam vulneráveis à medida que se envolvem e são envolvidascom situações limites em contextos de violência que fogem de sua alçada. Contudo, faz-se mister assumir aproteção das crianças e jovens na medida do possível, com ações sempre inclusivas e evitando, ao máximo, oafastamento dessas crianças da escola.

    É preciso destacar que o vínculo dos educandos com os educadores constitui, por vezes, os únicos referenciaisdos alunos para resistirem às pressões e atrativos do mundo do tráfico. Se permanecem na escola, sentemque são reconhecidos como cidadãos. Percebem que fazem parte da sociedade que lhes reserva um lugardigno, garantindo-lhes a educação de que necessitam para se afirmarem.

    A inclusão escolar representa a inclusão na sociedade que acredita no potencial da criança e, por isso, investeem sua formação. Nessa perspectiva de garantia da cidadania, por meio da escola, estamos propondo o aco-lhimento como ação inclusiva a ser desenvolvida pelos educadores que, para tanto, precisam ser preparadose orientados.

    Quando a escola acolhe o adolescente em situação de risco, está desenvolvendo uma ação que extrapola aprevenção universal. Esse acolhimento se torna uma estratégia de prevenção indicada, à medida que se des-tina a uma população específica, no caso, os adolescentes que podem estar em situação de vulnerabilidadesocial.As atuais Política Nacional de Educação e Política Nacional sobre Drogas, do Brasil, consideram a escola comoum espaço fundamental para acolher crianças e adolescentes vulneráveis, por meio da criação de espaço quepossibilite a garantia de direitos e o desenvolvimento integral dos alunos, oferecendo recursos pedagógicos,assistenciais, culturais e de promoção de saúde, com vistas à prevenção do uso de álcool e outras drogas ede comportamentos de risco associados.

    Mas, o que significa ACOLHER?

    Na prevenção do uso de drogas no contexto da escola, acolher significa preservar e aprofun-dar o vínculo com adolescentes vulneráveis, fragilizados ou em sofrimento pelo uso de álcoole outras drogas, podendo ou não estar vinculados a situações de violências.

    A principal ferramenta do acolhimento é a escuta sensível e compromissada do educando,identificando suas reais demandas, ou seja, descobrindo do que ele precisa e o que ele espera como ajuda.

    A presença do educador ao lado dos adolescentes pode funcionar como uma referência positiva, que ajuda oadolescente a reconhecer seus potenciais e voltar a acreditar em si mesmo. O educador que transmite con-fiança promove o resgate da autoestima e cria condições para os jovens superarem suas dificuldades.

    Acolher é, antes de tudo, demonstrar interesse em conhecer mais sobre o que seu aluno está vivendo e comoenfrenta as situações de risco que fazem parte do seu cotidiano. É sair da sala de aula e promover um mo-mento de conversa em um ambiente de tranquilidade e confiança mútua. Essa conversa pode ser espontâneaquando o adolescente procura seu educador. Também pode ser provocada quando o educador percebe que o

    aluno está em situação de risco e precisa de uma ajuda especial.A realidade dos alunos de escola pública na atualidade traz desafios específicos à pre-venção do uso de álcool e outras drogas que são relativos à condição de vulnerabilidadepela pobreza e exclusão social. Este tema será aprofundado no item a seguir.

    Adolescentes, drogas e pobreza: a dupla exclusão

    O uso de drogas entre adolescentes de baixa renda envolve um processo comple-xo que denominamos dupla exclusão. A estratégia para enfrentar esse processoé a prática de redes sociais como uma metodologia de intervenção comunitáriapreventiva, pois só assim os vínculos afetivos e sociais são recuperados.

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      Aula 11 Acolhendo adolescentes em situação de risco

    A demanda de drogas por esses jovens pode representar uma busca de solução para as tantas dificuldadesvividas em sua condição de excluídos. Não podemos considerar apenas a dimensão do prazer na procura pordrogas nesse contexto de pobreza e exclusão social.

    No contexto de pobreza, além dos aspectos presentes na vida do adolescente como curiosidade, aventura,afirmação junto aos pares, baixa autoestima, insucesso na escola, diversos fracassos nas tentativas de melho-ria social, conflitos nas relações familiares, falta de apoio e de compreensão dos pais de suas necessidades de

    adolescente, o consumo de drogas representa também uma busca de alívio para um sofrimento psíquico.As diversas carências vividas agravam as angústias naturais em relação ao futuro, às tarefas sociais e às suasresponsabilidades como membros de uma comunidade. Desse modo, é muito difícil para esses jovens imagi-nar a construção de um projeto de vida.

    Diante disso, há uma dificuldade fundamental vivenciada no processo de construção da identidade, pois o ado-lescente acha uma resposta ou solução momentânea e falsa provocada pelos efeitos encontrados nas drogas.O jovem está se confrontando com as questões existenciais próprias de sua fase adolescente: Quem sou eu?Quem serei? O que posso fazer de minha vida? Parecido com quem quero ser?

    O fracasso repetido pela busca de uma identidade social, familiar e sexual leva o adolescente por um caminhoequivocado, que lhe permite a satisfação imediata de suas necessidades, mas o prejudica profundamente.

    Nesse sentido, a droga é eleita como uma verdadeira estratégia de sobrevivência; além de reduzir as sensa-ções de frio e de fome, provoca estados de sonolência que permitem ficar indiferente a uma realidade depri-mente, dando-lhe preenchimento de um tempo que é interminável em razão da falta de atividades. A drogaproporciona, assim, uma falta de consciência da própria condição de vida.

    O envolvimento com drogas constrange e agride a comunidade e a própria família. O adolescente reage comrebeldia em um ciclo de conflitos que se repete. Paralelamente, a relação com os pares se fortalece, uma vezque ele encontra companhia e adquire um sentimento essencial para resolver a sua identidade social, que é ode pertencer a um grupo.

    O grupo adquire harmonia pela comunhão de interesses e necessidades, praticando as mesmas atividades epadecendo dos mesmos problemas. A participação no grupo lhes dá segurança, bem como permite se prote-

    gerem do abandono, da repressão e das precariedades econômicas.A possibilidade de as drogas amenizarem a tristeza e provocarem a desinibição faz com que a comunicaçãoseja mais fácil e que nasça um sentimento de cumplicidade no uso de drogas, produzindo bem-estar artificialque se converte em um remédio contra a tristeza.

     O uso de drogas entre adolescentes em situação de rua revela uma condição paradoxal, porque a drogaserve, ao mesmo tempo, como: referência de identidade por pertencer ao grupo ao adotar esse compor-tamento.

     Alienação ou afastamento do adolescente de sua própria origem e das referências que lhe conferem osentimento de identidade e pertencimento familiaR.

    Uma das questões importantes a considerar no acolhimento de crianças e adolescentes envolvidos com dro-gas no contexto da escola diz respeito à exploração do trabalho infantil. Essa temática está destacada comoum fator de risco do uso de álcool e outras drogas por diversas implicações que são desenvolvidas no textoque segue.

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    O TRABALHO INFANTIL: FATOR DE RISCO DO USO DE ÁLCOOL E OUTRAS DROGAS Alissandra Alves Rodrigues

     Deuzinéa Nogueira da Silva

     Joaquim Travassos Leite

     A legislação brasileira, ao proibir a realização do trabalho infantil, levou em consideração as disposições con-tidas nas convenções internacionais que tratam da luta contra o trabalho infantil e estabeleceu as seguintescondições:

     Até 14 anos, a criança e o adolescente não podem trabalhar, independentemente do local de trabalho ou tipode atividade.

     De 14 a 16 anos, o adolescente pode ter Carteira de Trabalho, porém, só poderá trabalhar na condição deaprendiz, experiência que deve ser devidamente registrada na carteira. Esse é o único tipo de registro detrabalho admitido nesse documento até os 16 anos de idade.

     De 16 a 18 anos, o adolescente, além de poder ter Carteira de Trabalho, poderá exercer atividade remunerada,não mais limitada apenas à aprendizagem, desde que esta não comprometa seu processo de formação e de-

    senvolvimento físico, psíquico, moral e social. Sendo assim, são proibidos trabalhos noturnos ou que envolvamo manejo de cargas pesadas ou com longas jornadas, e atividades insalubres, perigosas ou penosas.

     

    Contrariando os dispositivos legais, a mão-de-obra infantil ainda é utilizada no campo e na cidade das diferen-tes regiões do país. Na cultura da cana-de-açúcar, do fumo, da laranja, do sisal, nas carvoarias, madeireiras,olarias, pedreiras, lixões, casas de farinhas, feiras livres, como engraxates ou vendedores ambulantes, em ser-viços domésticos ou em atividades ainda mais aviltantes, como a exploração sexual comercial, a pornografiaou em outras atividades ilícitas, como o tráfico de drogas. Ficam expostos, cotidianamente, aos mais diversosriscos, comprometendo a formação e o desenvolvimento físico, cognitivo e psicológico.

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    Essas crianças e adolescentes, excluídos das atividades próprias da sua fase de desenvolvimento, apresen-tam diversos problemas de saúde física e emocional. O cenário é de tristeza, insegurança e insatisfação coma vida, que aumenta à medida que as expectativas de superação dessa condição diminuem, aumentandotambém a vulnerabilidade dessas crianças e adolescentes, inclusive aos vários fatores de risco do uso deálcool e outras drogas.

    Crianças e adolescentes em situação de pobreza, com vínculos afetivos e familiares fragilizados, convivendocom adultos de vários segmentos da sociedade que não possuem o compromisso de protegê-los e mantê-losa salvo de situações aviltantes, podem buscar no uso de álcool ou de outras drogas o alívio para suas angús-tias, carências e dificuldades de superação dos seus problemas. É nesse contexto que se insere o trabalhoinfantil e, por isso, conhecer sua realidade e firmar o compromisso de assegurar os direitos garantidos a essapopulação constitui um importante passo para a sua erradicação e também para a prevenção do uso de álcoole outras drogas nesta faixa etária.

    A Rede de Proteção da Criança e do Adolescente e o Trabalho Infantil

    As condições legais para a proteção integral da criança e do adolescente no Brasil surgiram com a promul-gação da Constituição Federal, em 1988, e em seguida com a Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990, mais

    conhecida como Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que instituiu o Sistema de Garantia de Direi-tos, organizado em um conjunto de ações governamentais e não-governamentais da União, dos estados, doDistrito Federal e dos municípios.

    Este Sistema pode ser facilmente identificado como uma rede de garantias e direitos, que deve ser articuladae integrada por: instituições governamentais; não-governamentais; conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente; conselhos Tutelares

    Cada uma dessas instituições atua conforme a sua competência legal, com o apoio dos seus profissionais e

    de toda a população.Situações identificadas como exploração de trabalho infantil devem ser encaminhadas para a autoridade maispróxima componente da Rede, que conta com agentes que poderão tomar medidas de identificação e respon-sabilização do empregador e/ou explorador; de encaminhamento da criança, do adolescente e de sua família aprogramas de inclusão social ou de profissionalização; encaminhamento para estabelecimentos de saúde noscasos necessários e para estabelecimentos de ensino.

    Se o adolescente tiver mais de 16 anos e se o seu trabalho não for proibido, as autoridades deverão exigir aemissão da Carteira de Trabalho e o respectivo registro do contrato de trabalho no documento, assim como oregistro do trabalhador em livro, ficha ou sistema informatizado competentes.

    É importante conhecer as atribuições dos principais componentes deste Sistema ou Rede de Garantia de Direitos:a) Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente: são órgãos autônomos, intersetoriais e deliberativos,

    com funções de controlar e monitorar a execução das ações previstas na política de atendimento a crianças eadolescentes nas três esferas de governo – municipal, estadual e federal, visto que existem nesses três níveis.

    b) Conselhos Tutelares: são órgãos públicos municipais de caráter autônomo e permanente, não jurisdicio-nais, encarregados de zelar pelo cumprimento dos direitos das crianças e dos adolescentes. Recebemdenúncias de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão que tenham comovítimas crianças e adolescentes. Após a denúncia, executam suas atribuições executivas de atendimentoe acompanhamento de cada caso para definir a melhor forma de resolução do problema. Realizam encami-nhamentos diversos a serviços, programas ou instituições, requisitando o atendimento devido. Caso essasrequisições não sejam atendidas, o Conselho pode encaminhar o caso ao Ministério Público para que sejamtomadas as providências jurídicas necessárias.

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    c) Delegacias Regionais de Trabalho: são os órgãos do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) existentesem cada Unidade da Federação, inclusive no Distrito Federal. Nessas unidades, são lotados os auditores-fiscais do trabalho, servidores públicos responsáveis pelas seguintes atribuições legais:

     realizar as ações de fiscalização em locais onde haja a utilização mão-de-obra de crianças e adolescentesabaixo da idade mínima permitida pela legislação, em atividades que exijam ou não vínculo empregatício, nomeio urbano e rural;

     promover o afastamento imediato de crianças e adolescentes dos locais de trabalho prejudiciais e proibidos

    nos quais estejam sendo explorados e o consequente acionamento das entidades que compõem a Rede deGarantia de Direitos, a fim de assegurar a inserção dessas crianças e adolescentes em programas sociais; realizar a inspeção das condições e dos ambientes de trabalho visando promover os direitos trabalhistas dos

    adolescentes oriundos de relações de emprego sem a proteção prevista na legislação; fiscalizar o cumprimento da obrigatoriedade de contratação de aprendizes pelas empresas, propiciando a

    garantia do direito à profissionalização de adolescentes.d) Órgãos executores da Política de Assistência Social: Compõe o Sistema Único de Assistência Social e

    geralmente são constituídos por Secretarias de Assistência Social ou de Ação Social nos estados e muni-cípios, as quais executam suas ações por meio dos Centros de Referência em Assistência Social (CRAS) eCentro de Referência Especializado em Assistência Social (CREAS). No contexto do trabalho infantil, suasações visam garantir a proteção da infância, da adolescência e da família, que necessitam de algum amparo

    assistencial, com o objetivo de assegurar a não inserção no trabalho infantil de crianças e adolescentesou o não retorno às atividades laborais proibidas. Podem, ainda, viabilizar o acesso dos adultos (pais e/ouresponsáveis) aos programas de profissionalização e de inclusão social. São ações comuns a estas Secre-tarias a inserção da criança ou do adolescente afastados do trabalho proibido no Programa de Erradicaçãodo Trabalho Infantil (PETI) e de sua família no Programa Bolsa Família.

    Crianças e adolescentes encontradas em situação de trabalho infantil pela Inspeção do Trabalho possuemprioridade de inclusão no PETI. Caso o município não seja atendido pelo PETI ou não possua meta (ou vaga)disponível para a inclusão da criança ou adolescente, o Conselho Tutelar deverá oficiar o Órgão GestorMunicipal ou a Coordenação Nacional do PETI no Ministério do Desenvolvimento Social e Combate a Fome(MDS), para as providências cabíveis.

    e) Ministério Público do Trabalho (MPT): trata-se de um dos ramos do Ministério Público da União, institui-ção permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, responsável pela defesa da ordem jurídica, doregime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.

    A atuação do Ministério Público do Trabalho envolve o recebimento de denúncias, a instauração de procedi-mentos investigatórios, inquéritos civis públicos e outras medidas administrativas, até o ajuizamento de ações judiciais, quando comprovada a irregularidade.f) Justiça da Infância e da Juventude: composta por Varas especializadas do Poder Judiciário, encarregadas

    de aplicar a lei para a solução de conflitos relacionados aos direitos da criança e do adolescente. Nos mu-nicípios onde não há esta Vara especializada, suas funções são destinadas ao Juiz de outra Vara, conformea organização judiciária local.

    g) Escola: A grande capilaridade e a penetração social da escola são fortes atributos de um aliado imprescin-dível no combate ao trabalho infantil.

    Uma de suas funções é comunicar aos Conselhos Tutelares a ocorrência de evasão escolar e de faltas injus-tificadas, que constituem, geralmente, fortes indícios da ocorrência de trabalho infantil.

    Importante também é o papel da escola para a divulgação de informações sobre o tema, discutindo com toda acomunidade escolar tópicos da legislação que prevê a proteção das crianças e adolescentes, os sérios prejuízosfísicos, intelectuais e emocionais que o trabalho infantil pode causar, dentre outros assuntos a ele relacionados.h) Estabelecimentos de Saúde: compõem o Sistema Único de Saúde, que possui papel de extrema relevância

    na atenção integral à saúde das crianças e adolescentes trabalhadores. Podem atuar de forma articuladacom outros setores governamentais e não-governamentais da sociedade na erradicação do trabalho infan-til, promovendo ações como: identificação de crianças e adolescentes explorados em atividades laborais,

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    prestando o atendimento necessário; encaminhamentos aos demais agentes da Rede deGarantia de Direitos; avaliação da associação entre o trabalho e os problemas de saúdeapresentados; promoção de ações de educação, vigilância em saúde e de segurança notrabalho.

    Os Agentes de Saúde da Família são grandes aliados da Rede de Garantia de Direitos nocombate ao trabalho infantil. Possuem importante atuação e penetração na comunidade,chegando a locais que poucos agentes alcançam. Isso favorece a denúncia de violação dedireitos, fator vital para o acionamento e atuação dos demais órgãos responsáveis pela pro-teção da criança e do adolescente.

    O Ministério da Saúde elaborou e vem implementando uma Política Nacional de Saúde paraa Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção do Trabalhador Adolescente e como desdobra-mento dessa Política, destaca-se a elegibilidade de crianças e adolescentes acidentados notrabalho como evento passível de notificação compulsória.

    Situações de confirmação ou suspeita de maus-tratos contra crianças e adolescentes, dentre as quais estãoos acidentes de trabalho e os acidentes domésticos, indicativos de exploração da mão-de-obra infantil, devemser obrigatoriamente comunicados ao Conselho Tutelar. A não comunicação constitui uma infração adminis-trativa a ser apurada, cabendo a aplicação de multa pelo Juiz, nos termos do artigo 245 do ECA. Da mesmaforma, a escola deverá observar e denunciar estes casos. 

    Art. 245. Deixar o médico, professor ou responsável por estabelecimento de atenção à saúde e de ensinofundamental, pré-escola ou creche, de comunicar à autoridade competente os casos de que tenha conheci-mento, envolvendo suspeita ou confirmação de maus-tratos contra criança ou adolescente:

    Pena – multa de três a vinte salários de referência, aplicando-se o dobro em caso de reincidência

     

    As principais modalidades de trabalho infantil verificadas no BrasilA localização, a identificação, o diagnóstico e o afastamento de crianças ou adolescentes de um local ou deuma atividade laboral proibida constituem o primeiro passo ou primeiro estágio de uma série de ações queprecisam ser deflagradas pelos órgãos componentes da rede para o resgate dos direitos violados.

    Dentre as diversas atividades em que se empregam a mão de obra infantil no Brasil, destacamos as seguintes:

     Crianças e adolescentes em trabalho doméstico

    Existem quatro modalidades bem distintas de trabalho infantil doméstico e, em todas elas, os casos de sus-peita ou de confirmação da exploração da mão de obra infantil, devem ser encaminhados ao Conselho Tutelar

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    do município e/ou ao Ministério Público do Trabalho para que sejam realizadas as ações cabíveis tanto para aproteção das crianças e adolescentes envolvidos como para a atenção aos pais ou responsáveis e a respon-sabilização dos empregadores.

    O trabalho infantil doméstico deve ser combatido porque além de prejudicar a frequência à escola, os estu-dos, o lazer e a própria convivência familiar e comunitária, causa amadurecimento precoce associado, ge-

    ralmente, a um entristecimento da criança e do adolescente privados das atividades típicas de sua condiçãode desenvolvimento como brincar, conviver com outras crianças, estudar e descansar adequadamente.

    a) Trabalho infantil doméstico em casa de terceiros, sem residir no domicílio do empregador: trabalham espe-cialmente como babás, jardineiros e tratadores de animais. Normalmente, residem com seus familiares e sedeslocam para o trabalho, onde não raro são expostos a jornadas excessivas que lhes impede a frequênciaescolar e, em muitos casos, os expõem a agentes insalubres.

    b) Trabalho infantil doméstico para terceiros em sua própria residência: trabalham para terceiros em sua pró-pria casa, predominantemente como babás de crianças.

    c) Trabalho infantil doméstico em casa de terceiros, quando a criança/adolescente reside no domicílio do em-pregador: constitui uma das modalidades mais perversas, complexas e de difícil enfrentamento, pois famílias

    muito carentes entregam seus filhos para o empregador com a esperança de que este oportunize melhorescondições de vida e de escolaridade. Em muitos casos, esta expectativa inicial é quebrada pela realidade deexploração do trabalho, de maus-tratos e até de abusos sexuais.

    d) Trabalho infantil doméstico para a própria família: a família exige o exercício de responsabilidades, tarefas eatividades que são peculiares aos adultos, como cuidar dos irmãos menores, limpar e arrumar a casa, cozi-nhar, lavar e passar roupas, impróprias e desproporcionais à sua condição física, mental e emocional e queextrapolam as obrigações razoáveis destinadas a eles na organização familiar.

     Trabalho infantil em regime de economia familiar

    Consiste na utilização da mão de obra de crianças e adolescentes em atividades econômicas direcionadas

    à sobrevivência e manutenção da própria família. O produto do trabalho é revertido para seu autoconsumo esustento da família, não existindo, portanto, relação de emprego. São atividades desenvolvidas em sua maioriana zona rural, onde, por questões culturais e também por necessidade de sobrevivência, são toleradas e atéincentivadas pela sociedade. Nas cidades, também é muito comum encontrar pais com seus filhos vendendoprodutos nas ruas, muitas vezes produzidos por eles mesmos.

    Nesses casos, cabe denúncia ao Conselho Tutelar do município e/ou ao Ministério Público no Estado.

    Caso seja possível identificar a existência de beneficiários diretos do trabalho realizado pelos membros dafamília, caracterizando uma relação de emprego, devem-se encaminhar as denúncias às Delegacias Regionaisdo Trabalho e /ou ao Ministério Público do Trabalho.

     Trabalho de crianças e adolescentes em lixões

    Esta modalidade não se restringe aos grandes centros urbanos. Está presente em muitos municípios que nãopossuem destino adequado para os resíduos sólidos, com locais para depósito e armazenamento altamenteinsalubres. Relatos apontam inúmeros casos de crianças e adolescentes intoxicados por consumirem alimen-tos deteriorados encontrados nos lixões.

    Cabe ao Conselho Tutelar do município diligenciar junto aos lixões e aterros sanitários para verificar a presençade crianças ou de adolescentes trabalhando e proceder sua imediata retirada e aplicação das medidas deproteção cabíveis a cada caso. As denúncias também podem ser encaminhadas ao Ministério Público doTrabalho.

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     Trabalho de crianças e adolescentes no narcotráfico

    A mão de obra infantil é utilizada por traficantes, que se aproveitam da sua condição peculiar de pessoa em de-senvolvimento, bem como das suas garantias legais. Contudo, crianças e adolescentes envolvidos na entregae venda de drogas ou na segurança armada do tráfico, cometem ato infracional e podem também responderpor isso, conforme previsto no ECA, que estabelece medidas judiciais diferenciadas, conforme sua faixa etária.A criança fica sujeita a medidas de proteção previstas no artigo 101 e, o adolescente, a medidas socioeduca-

    tivas do seu artigo 112, que prevê como medida mais severa a internação em estabelecimento educacional,por um período máximo de três anos.

    As denúncias de envolvimento de crianças e adolescentes com o narcotráfico devem ser encaminhadas àsautoridades policiais e ao Ministério Público para apuração, repressão e persecução criminal de adultos envol-vidos. Além disso, deve-se providenciar a apresentação à autoridade judiciária (Juiz da Infância e Juventude),das crianças e dos adolescentes encontrados em flagrante de ato infracional.

    O envolvimento de crianças e adolescentes em atividades relacionadas ao tráfico de drogas ocorre em umcontexto de violência e exposição a inúmeras situações de risco, tornando-os extremamente vulneráveis aouso de drogas pelo acesso direto às mais variadas substâncias. Muitos se tornam dependentes e necessi-tam de tratamento especializado, o que requer o acionamento das instituições de saúde.

     Exploração sexual comercial de crianças e adolescentes

    O termo PROSTITUIÇÃO INFANTIL é utilizado de forma incorreta para se referir às práticas de exploraçãosexual. A prostituição ocorre quando a pessoa vende seu corpo por decisão própria, mesmo conhecendoas consequências do ato. Uma criança não tem poder de decisão para se prostituir, mas tem seu corpoexplorado por terceiros.

    Trata-se de uma atividade econômica com alto grau de degradação física, psicológica e moral, caracterizadapela relação sexual de crianças e/ou de adolescentes com adultos, retribuída por dinheiro ou mesmo “troca

    de favores”. As vítimas dessa exploração criminosa são tratadas como objetos sexuais e mercadorias, parasatisfação sexual ou obtenção de lucros pelos adultos. Em algumas situações, são recrutados sob forte co-erção e violência, implicando em trabalho forçado e formas contemporâneas de escravidão, com exposiçãoa dolorosas experiências sexuais. Em outras, as próprias crianças e adolescentes oferecem relações sexuaiscomo estratégia de sobrevivência e até mesmo como uma maneira de custear a dependência de álcool ou deoutras drogas.

    Nessa modalidade estão incluídas também as práticas de produção de material ou espetáculos pornográficose as situações de tráfico e o turismo sexual, em que são comuns os “contratos” de trabalho vinculados a “dí-vidas”, contraídas pelos trabalhadores com o explorador, submetendo-os à servidão, um dos mais odiosos eeficazes instrumentos de exploração.

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    Este contexto representa um sério fator de risco ao uso de álcool e outras drogas, em que crianças e ado-lescentes convivem com adultos descomprometidos com a garantia dos seus direitos e que muitas vezesestimulam o uso de substâncias psicoativas para extrair maiores quantias dos clientes. Além disso, valeressaltar que muitas vezes há a participação ativa da família da criança ou adolescente explorado na manu-tenção dessa situação, o que requer uma intervenção que leve em consideração todos os envolvidos nestecontexto, tanto no sentido de culpar os responsáveis pela exploração quanto de oferecer ajuda à família

    para que o ciclo de violência seja interrompido e superado.

    As denúncias de exploração sexual devem ser dirigidas às autoridades policiais ou ao Ministério Público,além do disque-denúncia (ligação gratuita), que atende pelo número 100. Por meio desse número, qualquerpessoa poderá denunciar violência, abuso e exploração sexual de crianças e adolescentes. O número 100 funciona em todo o país, todos os dias, inclusive feriados, das 8 às 22 horas. A Secretaria Especial de Direi-tos Humanos (SEDH) da Presidência da República registra a denúncia e encaminha aos órgãos da Rede deGarantia de Direitos responsáveis pelas ações de repressão e persecução criminal, bem como pelas açõesde encaminhamentos e atendimentos necessários às vítimas.

    As piores formas de trabalho infantil

    A Organização Internacional do Trabalho (OIT) definiu, dentre as diversas atividades labo-rais, as piores formas de trabalho infantil, que constituem graves violações de direitos.São elas:

    a) todas as formas de escravidão ou práticas análogas à escravidão, tais como a venda eo tráfico de crianças, a servidão por dívida e a condição de servo, e o trabalho forçado ouobrigatório de crianças e seu recrutamento para serem utilizadas em conflitos armados;b) a utilização, o recrutamento ou a oferta de crianças para a prostituição, a produção depornografia ou atuações pornográficas;c) a utilização, o recrutamento ou a oferta de crianças para a realização de atividades

    ilícitas, em particular a produção e o tráfico de drogas, tais como definidos nos tratadosinternacionais pertinentes;d) o trabalho que, por sua natureza ou pelas condições em que é realizado, é suscetívelde prejudicar a saúde, a segurança ou a moral das crianças.

    Para o fim da aplicação desta Convenção, considera-se infantil todo trabalhador com idade inferior a 18 anos.

    Considerações finaisDiante da falta de alternativas de subsistência das famílias de baixa renda, crianças e adolescentes são muitasvezes empurrados para o mercado de trabalho, em que as condições e circunstâncias em que são desenvolvidassuas tarefas comprometem o desempenho escolar, exigem esforços superiores à sua condição específica de

    desenvolvimento e, sobretudo, os expõem a ambientes e pessoas que violam o seu bem-estar e segurança.As dificuldades associadas à condição de exclusão e os sofrimentos vividos, relacionados à baixa auto-estima, aos reiterados fracassos nas tentativas de reinserção social, escolar e até mesmo familiar, e àsangústias relacionadas ao futuro, configuram situações em que o álcool e as outras drogas podem assumiruma dimensão relevante.

    Por isso, as ações implementadas pelos agentes componentes da Rede de Garantia de Direitos das crian-ças e adolescentes devem abranger não apenas as vítimas diretas, mas seus familiares, visando ampliar aproteção à família.

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      Aula 11 Acolhendo adolescentes em situação de risco

    INTERVENÇÃO BREVE PARA USUÁRIOS DE ÁLCOOL E OUTRAS DROGAS Denise de Michelli 

    A dependência de álcool ou outras drogas é um problema de saúde que afeta nãosomente o usuário, mas também seus familiares, amigos e pessoas relacionadas.Sabe-se que, quanto mais cedo se iniciar um tratamento ou intervenção, maior a

    chance de sucesso.Talvez você conheça ou mesmo já tenha sido procurado por alguém que tenha pro-blemas com o uso de álcool e/ou outras drogas. Embora o consumo dessas subs-tâncias seja um problema relativamente frequente nos dias de hoje, as pessoas,em geral, só buscam ajuda quando muitas áreas de sua vida já foram afetadaspelo consumo de drogas.

    O que fazer para reduzir o problema com o uso das drogas?

    Nas últimas décadas, múltiplas estratégias de intervenção têm sido propostasdiante do crescente consumo de substâncias.

    Uma modalidade de intervenção que tem despertado crescente interesse de clínicos e demais profissionais dasaúde é a Intervenção Breve (IB), em razão de os resultados obtidos com tratamentos intensivos não teremdemonstrado superioridade quando comparados com as abordagens breves.

    Além disso, considera-se que os custos de um tratamento devem ser justificados pelos benefícios que trazem.Os altos custos de tratamentos intensivos justificam a procura de novas formas de tratamento menos custo-sas e mais efetivas, como as intervenções breves.

    Uma das razões desse baixo custo é que a IB é uma técnica que pode ser utilizada por profissionais comdiferentes tipos de formação (médicos, psicólogos, enfermeiras, auxiliares de enfermagem, nutricionistas,assistentes sociais, agentes comunitários, educadores e demais profissionais); basta apenas que recebam umrápido treinamento.

    Vamos abordar mais detalhadamente a técnica Intervenção Breve.

     Trata-se de uma estratégia de intervenção bem estruturada, focal e objetiva, que utiliza procedimentos técni-cos específicos, o que permite estudos sobre sua efetividade.

     A quem melhor se aplica Intervenção Breve? 

    A Intervenção Breve se refere a uma modalidade de atendimento com tempo limitado cujo foco é a mudançade comportamento do usuário.

    É indicada a pessoas que fazem uso nocivo ou abusivo de substâncias. O uso é considerado nocivo ou abusivoquando começa a causar problemas importantes em diferentes áreas da vida do indivíduo.

    O termo “nocivo” é utilizado pela Classificação Internacional de Doenças (CID-10) e indica um uso que resultaem danos físicos ou mentais ao usuário. Já o termo “abuso” é utilizado pela Associação Psiquiátrica Americanae considera não só o dano físico ou mental, mas também as consequências sociais relacionadas ao uso.

     A quem é desaconselhada a Intervenção Breve? 

    Em razão da brevidade desse tipo de intervenção, não se indica essa modalidade para pessoas com problemasgraves relacionados à dependência de substâncias, porque, em geral, essas pessoas apresentam inúmeros

    Origem Objetivos

    Foi proposta em 1972, por pesquisadores canadenses, comouma abordagem terapêutica para usuários de álcool.

    Um dos principais objetivos da IB é promover o desenvolvimento daautonomia das pessoas, atribuindo-lhes a capacidade de assumir ainiciativa e a responsabilidade por suas escolhas.

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    comprometimentos relacionados ao uso de drogas e, nesse caso, uma intervenção breve não seria capaz deatingir todos os problemas em um curto espaço de tempo. Entretanto, pode ser útil para sensibilizar usuáriosmais resistentes a aceitar o tratamento.

    Nesse sentido, a ideia é mostrar ao usuário que o uso que faz de álcool ou outras drogas o coloca em situaçõesde risco. Então, após identificar a presença do problema e mostrar os efeitos e consequências do consumoabusivo, o passo seguinte é motivar a pessoa a mudar seu hábito de uso.

    A proposta é que a intervenção seja, de fato, breve, objetiva e dirigida à mudança da forma como a pessoa usa adroga. O tempo utilizado na IB pode variar de 5 a 30 minutos de intervenção – depende do tempo disponível.

     Mas, afinal, como podemos ajudar alguém a mudar seu comportamento usando intervenção breve? 

    A ajuda a alguém que faz uso de substâncias psicoativas só pode ter início a partir do momento que se co-nhece o “real” uso que essa pessoa faz de álcool e/ou outras drogas e qual a sua verdadeira disposição (oumotivação) para mudar esse comportamento.

    Assim, primeiramente, é importante realizar a triagem ou rastreamento do uso de substância, o que pode serfeito mediante a utilização de instrumentos de triagem ou escalas de avaliação.

    Triagem do uso de drogas e identificação da motivação para mudança de comportamento

    A triagem ou rastreamento do uso de álcool e/ou outras drogas é uma maneira simples de identificação dosdiferentes níveis de consumo, desde uso social até uso de risco.

    Recomenda-se que essa triagem seja feita de modo sistemático, pela utilização de instrumentos ou questio-nários específicos, chamados de instrumentos de triagem.

    Instrumentos de triagem

    No Brasil, há alguns instrumentos ou questionários que foram adaptados e validados para uso em nossa popu-lação e encontram-se disponíveis para o uso.

    Estes instrumentos são:

     CAGE (Cut-down, Annoyed, Guilty e Eye-opener ).

      AUDIT  (Alcohol Use Disorders Identification Test), em português significa “Teste para Identificação de Proble-mas Relacionados ao Uso de Álcool”).

    Ambos foram desenvolvidos pela Organização Mundial de Saúde (OMS) com o objetivo de identificar a depen-dência de álcool.

    Há também o ASSIST  (Alcohol, Smoking and Substance Involvement Screening Test), que, em português, sig-nifica teste de triagem do envolvimento com álcool, cigarro e outras substâncias, também desenvolvido pelaOMS e que avalia o uso de álcool e outras drogas, bem como problemas relacionados.

    Para a triagem da população adolescente, os instrumentos são:

      DUSI (Drug Use Screening Inventory), em português, inventário de triagem do uso de drogas.

     Teen-ASI (Addiction Substance Index), em português, índice de gravidade de drogadição na adolescência.

    Ambos são validados por pesquisadores brasileiros e avaliam o uso de álcool e outras drogas.

    Importância da Triagem

    A triagem é o primeiro passo para a avaliação do consumo de álcool ou outras drogas e dos problemas a elesrelacionados. Além disso, vários estudos mostram que a triagem pode representar uma grande oportunidade

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      Aula 11 Acolhendo adolescentes em situação de risco

    para abordar, junto ao usuário, os diferentes aspectos do consumo. Pode servir também para aumentar a mo-tivação para mudança de comportamento do usuário.

    Como fazer a triagem? 

    Durante essa etapa de avaliação do consumo de álcool e/ou drogas, é importante procurar identificar tambéma disposição ou motivação da pessoa para o tratamento ou intervenção.

    Deve-se deixá-la à vontade para falar sobre si mesma e então perguntar sobre o seu uso de drogas, sobrepossíveis problemas que possa estar vivendo.

    Por fim, verifique se ela acha que a(s) droga(s) pode(m) ser a(s) causadora(s) de seus problemas. Será possívelobservar que muitos usuários não acham que o uso que fazem de álcool e/ou outras drogas lhes cause proble-mas e, por essa razão, podem se mostrar pouco ou mesmo nada motivados a receber alguma intervenção.

    Alguns usuários poderão demonstrar percepção sobre os problemas que apresentam e a relação deles como uso de substâncias e revelar-se motivados a receber alguma intervenção, o que evidencia um estado deprontidão ou disposição para a mudança.

    De acordo com pesquisadores que trabalham com a técnica da Entrevista Motivacional, a motivação é umestado de prontidão ou disposição para mudança, que pode variar de tempos em tempos ou de uma situação

    para outra. Esse é um estado interno, mas pode ser influenciado (positiva ou negativamente) por fatores ex-ternos (pessoas ou circunstâncias).

    Essa prontidão ou disposição para mudança foi descrita pelos psicólogos James Prochaska e Carlo Di Clemen-te, por meio dos estágios chamados ESTÁGIOS DE MUDANÇA.

    A identificação do estágio em que o usuário se encontra permitirá que você avalie quanto ele está disposto amudar o comportamento de uso de substâncias ou o estilo de vida.

    O modelo mostrado na Figura 1 inclui quatro estágios:

    Figura 1 Modelo de mudança

    PRÉ-CONTEMPLAÇÃO

    MANUTENÇÃO PREPARAÇÃO

    AÇÃO

    RECAÍDA

    CONTEMPLAÇÃO

      SAÍDA(sucesso a longo prazo)

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    A partir dessa identificação, será possível saber como se posicionar durante a intervenção.

    Vamos examinar cada estágio:

    1. Estágio de Pré-contemplação: o usuário não encara o seu uso como problemático ou causador de proble-mas. Tampouco considera algum tipo de mudança em seu comportamento. Em geral, indivíduos neste estágionão buscam tratamento voluntariamente e sim por causa dos pais, da família, da escola, do trabalho ou porencaminhamento judiciário. Os indivíduos neste estágio:

     não estão conscientes de que seu comportamento está causando problemas a si ou a outros;

     acreditam estar imunes às consequências adversas do uso (exemplo: acreditam que não se tornarão depen-dentes ou que têm controle sobre o uso);

     resistem ou negam as consequências trazidas pelo uso de drogas;

     não manifestam intenção de parar ou reduzir o consumo.

    2. Estágio de Contemplação: o indivíduo se mostra ambivalente em relação ao seu uso. Em geral, reco-nhece o problema, mas procura justificar ou minimizar seu comportamento. Exemplo: “Você percebe que seuconsumo está bastante elevado e que isso pode estar relacionado aos problemas que vem apresentando notrabalho?” –“Sim, percebo, mas não é sempre que isso acontece, ou, não é bem assim”.

    A resposta reflete que parte dele quer mudar e parte não. Muitos usuários ficam muito tempo nesse estágio.

    3. Estágio de Ação: para atingir este estágio, é necessário que o indivíduo:

     perceba que seus problemas têm solução;

     acredite que é capaz de mudar;

     desenvolva um plano de ação.

    Essa ação pode significar reduzir ou parar o consumo.

    4. Estágio de Manutenção: é o mais importante e difícil estágio de mudança. Para que permaneça neste

    estágio, muitas vezes o indivíduo tem que fazer uma reorganização de seu estilo de vida e desenvolver habilida-des de enfrentamento de dificuldades e procurar se engajar em outras atividades sociais e recreacionais. Issomuitas vezes acaba sendo muito difícil, pois requer que o indivíduo parta para outro grupo de amigos, outromodo de vida, ou seja, comece tudo de novo.

    5. Recaída: retorno a um comportamento de consumo (que pode ser problemático ou não). As recaídas sãofrequentemente acionadas por emoções, conflitos com outras pessoas, pressão dos amigos ou por outrosestímulos, como, por exemplo, voltar a um lugar no qual costumava usar a droga ou encontrar com alguémcom quem costumava usar. Muitas vezes, a recaída acontece porque a pessoa está confiante e acha que jápode “controlar” o uso. Ao tentar fazer esse “uso controlado” é comum perder o controle e recair. É importantesalientar que alguns deslizes e recaídas são normais, e até esperados quando o usuário está tentando mudarseu padrão de comportamento.

    Vontade de mudar e autoconfiança

    Para as pessoas mudarem seu comportamento, precisam estar prontas, dispostas e sentir-se capazes paraa realização dessa mudança. Estar pronto e disposto a diminuir ou parar o uso depende muito da importânciadada pelo usuário à necessidade de mudar.

    Pensar em mudar é importante, mas nem sempre é suficiente para que uma pessoa coloque a mudança emprática. Algumas vezes, uma pessoa está disposta a mudar, mas não acredita ser capaz. Por isso, mostre aousuário a importância e os ganhos com essa mudança e demonstre a ele quanto você acredita em sua capa-cidade de mudar.

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      Aula 11 Acolhendo adolescentes em situação de risco

     Princípios da Intervenção Breve

    Miller e Sanchez propuseram alguns elementos essenciais ao processo de Intervenção Breve. Esses elemen-tos reunidos formam a abreviação FRAMES:

    F ( feedback ):Triagem ou Avaliação do uso de substância e devolutiva ao usuário

    Avalia-se o consumo de álcool e/ou outras drogas e problemas relacionados a esse consumo por meio de

    instrumentos padronizados. Após essa avaliação, é dado um retorno ou feedback  ao usuário sobre os riscospresentes em seu padrão de consumo. Isso poderá servir também de ponto de partida para convidá-lo a rece-ber uma intervenção.

    R ( responsibility ): Responsabilidade e metas

    Nessa etapa, procura-se realizar uma “negociação” com o usuário sobre as metas a serem atingidas, seja ainterrupção do consumo seja o uso moderado. Enfatiza-se aqui a responsabilidade do usuário para atingir ameta estabelecida, mostrando que ele é o responsável por seu comportamento e por suas escolhas sobre usarou não drogas.

    Vários autores relatam que essa percepção de “responsabilidade” e “controle da situação” pelo usuário podeser um elemento motivador para a mudança de comportamento e quebra de resistência.

    A ( advice): Aconselhamento

    Vários estudos revelam que orientações claras sobre a diminuição ou interrupção do uso de drogas reduzemo risco de problemas futuros, aumentam a percepção do risco pessoal e servem de motivo para o usuárioconsiderar a possibilidade de mudança de comportamento.

    Procure relacionar os problemas relatados pelo usuário ao uso que ele faz de substâncias. Ajude-o a refletirsobre a relação entre seu uso de drogas e os problemas que apresenta, pois algumas vezes o usuário nãopercebe que é o uso de álcool e/ou outras drogas que está interferindo na sua saúde, na sua vida familiar ouprofissional. Exemplo: úlceras gástricas com uso de álcool, enfisema pulmonar com uso de tabaco, maconhacom problemas de memória etc.

    Procure mostrar que, se ele diminuir ou parar com o uso de drogas, suas chances de problemas futuros, rela-cionados ao uso, também diminuirão. Isso pode ajudá-lo a perceber os riscos que envolvem seu uso de drogase servir como um motivo para considerar a mudança de comportamento.

    Peça ao usuário que liste as vantagens e desvantagens do uso de drogas, e as comente. É importante fornecerorientações claras, livres de qualquer preconceito e, sempre que for possível, ter em mãos materiais informa-tivos sobre drogas para dar ao usuário.

    M ( menu of options): Menu de opções de estratégias para modificação do comportamento (reduzirou parar o consumo)

    Nesta etapa, busca-se identificar com o usuário as situações de risco que favorecem o consumo de substân-cias, como:

     onde ocorre o uso;

     em companhia de quem ou

     em quais situações (sociais ou de sentimentos pessoais).

    Por meio dessa identificação, é possível orientá-lo no desenvolvimento de habilidades e estratégias para evitarou lidar de outra forma com essas situações de risco.

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    Você pode proceder assim:

     Pergunte ao usuário onde ocorria o uso e em companhia de quem.

     Evite perguntar os nomes das pessoas que faziam uso com ele.

     Pergunte apenas pelo tipo de relacionamento que ele tem (ou tinha) com essas pessoas: amigos, namora-dos, primos etc.

     Peça que ele conte em que situações usava (onde estava, com quem e o que estava sentindo antes de usar). Procure entender se as situações de maior risco eram situações sociais (exemplo: estar com amigos no

    bar, em festas, na saída da escola) ou se eram situações em que ele se sentia triste, aborrecido, deprimido,contrariado (sentimentos pessoais).

    Desse modo, será possível identificar algumas das situações de risco que o levaram (ou levam) a usar drogase, então, você poderá orientá-lo sobre O QUE fazer para evitar essas situações.

    Lembre-se que fornecer alternativas de estratégias e escolhas pode ajudá-lo a sentir que tem o controle e aresponsabilidade de realizar a mudança, o que aumenta sua motivação.

    É importante tentar fazer com que o próprio usuário pense nas estratégias, mas, caso ele tenha dificuldades,

    você pode sugerir algumas.Veja alguns exemplos de opções e estratégias:

     Sugira a ele que faça um diário sobre seu uso de substância, registrando, por exemplo, onde costuma (oucostumava) usar, em que quantidade, em companhia de quem, por qual razão etc. Isso ajudará a identificar as possíveis situações de risco.

      Identifique com o usuário algumas atividades que possam lhe trazer algum prazer, por exemplo, alguma ati-vidade física, tocar um instrumento, ler um livro, sair com pessoas não usuárias etc. Após essa identificação, proponha a ele que substitua o uso de drogas por esta(s) atividade(s).

      Forneça informações sobre onde buscar ajuda especializada, se for o caso, ou tente fazê-lo refletir sobre o

    que ele gosta, além do uso da substância. Se ele não souber, use isso para estimulá-lo a se conhecer melhor,descobrir coisas novas, novos interesses. 

      Procure ter sempre em mão opções gratuitas de lazer, dos mais diferentes tipos (atividades esportivas, apre- sentações de música, oficinas de artesanato etc.) para sugerir a ele.

      Descubra algo que o usuário gostaria de ter e sugira a ele que economize o dinheiro que normalmente gastariacom drogas para adquirir aquele bem. Faça as contas com ele sobre quanto ele gasta. Por exemplo, um fu- mante que gaste R$ 3,00 por dia com cigarros, em um mês economizaria R$ 90,00, e em 6 meses R$ 540,00 – daria para ele comprar uma TV nova, por exemplo, ou pagar mais da metade de um computador completo.Contas simples como essa podem ajudá-lo a perceber o prejuízo financeiro, além dos problemas de saúde.

    E (empathy ): Empatia

    É fundamental evitar comportamento confrontador ou agressivo. É importante que o usuário se sinta à vontadepara falar de seus problemas e dificuldades. Demonstre a ele que você está disposto a ouvi-lo e que entendeseus problemas, até mesmo a dificuldade de mudar.

    S ( self-efficacy ): Autoeficácia

    O objetivo é aumentar a motivação do usuário para o processo de mudança, auxiliando-o a ponderar os “prós”e “contras” associados ao uso de substâncias. Deve-se encorajar o usuário a confiar em seus próprios recur-sos e a ser otimista em relação à sua habilidade para mudar o comportamento, reforçando os aspectos posi-tivos da mudança. Estimule-o a confiar em sua capacidade de mudar seu comportamento de uso de drogas.

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      Aula 11 Acolhendo adolescentes em situação de risco

    Quando a pessoa acredita que pode, verdadeiramente, realizar a mudança, esta acontece com mais facilidade.Elogie cada dificuldade vencida.

    Utilização de técnicas da Entrevista Motivacional para a realização de uma boa in-tervenção breve

    Não é difícil imaginar a origem da Entrevista Motivacional (EM). Ela foi desenvolvida a partir do conceito de

    motivação, o qual pode ser definido como conjunto de fatores psicológicos, conscientes ou não, de ordemfisiológica, intelectual ou afetiva, que determinam certo tipo de conduta em alguém.

    A motivação não deve ser encarada como um traço de personalidade inerente ao caráter da pessoa, mas simcomo um estado de prontidão ou vontade de mudar, que pode flutuar de um momento para outro e de umasituação para outra, isto é, a motivação tem uma característica dinâmica. Nesse sentido, aumentar a moti-vação significa aumentar a probabilidade de que o indivíduo siga numa linha de ação que gere algum tipo demudança. Esse é o foco da ENTREVISTA MOTIVACIONAL.

    São cinco os princípios básicos da Entrevista Motivacional (EM):

    1. Expressar empatiaA atitude que fundamenta o princípio da empatia pode ser chamada de aceitação. É importante observar que

    a aceitação não é a mesma coisa que concordância ou aprovação. É possível aceitar e compreender o pontode vista do usuário sem necessariamente concordar com ele. Isso significa acolher, aceitar e entender o queele diz, sem fazer julgamentos a seu respeito. Utilizando a “escuta reflexiva”, busca-se compreender os senti-mentos e as perspectivas do usuário, sem julgá-lo, criticá-lo ou culpá-lo. Por exemplo: “você está querendo medizer que o seu consumo está causando problemas em seus estudos?” ou “se eu entendi bem, você disse quecostuma beber grandes quantidades quando está com seus amigos da escola...” . Isso evita que o usuário neguealguma afirmação já feita, mencionando que não foi isso que ele quis dizer, ou que você entendeu errado. Aempatia do profissional está associada à boa resposta do usuário à intervenção ou orientação realizada.

    2. Desenvolver discrepânciaUm dos princípios da entrevista motivacional é mostrar para o usuário a discrepância entre o comportamentoque ele tem, suas metas pessoais e o que ele pensa que deveria fazer. Um bom modo de ajudá-lo a compre-

    ender esse processo é fazer uma comparação, exemplificando com a discrepância, que, muitas vezes, existeentre ONDE SE ESTÁ E ONDE SE QUER OU GOSTARIA DE ESTAR. Muitas vezes, perguntar ao usuário comoele se imagina daqui a algum tempo (2 ou 3 anos, por exemplo) e o que ele está fazendo para atingir sua metapoderá ajudá-lo a entender essa discrepância.

    3. Evitar a confrontação diretaDurante todo momento, você deve evitar confrontar diretamente o usuário. Abordagens desse tipo nada maisfazem do que tornar o usuário resistente à intervenção. Coloque seus argumentos de modo claro, mas sempreconvidando-o a pensar sobre o assunto.

    4. Lidar com a resistênciaMuitos usuários podem se mostrar resistentes às sugestões e propostas de mudanças feitas. Mas, lembre-se

    de que o usuário não é um adversário a ser derrotado, ou seja, o que fazer quanto a um problema é, em últimainstância, uma decisão dele e não sua. Entenda que a ambivalência e a resistência para a mudança de com-portamento são normais em todas as pessoas, e sua atitude, como profissional, deve ser para levar o usuárioa considerar novas informações e alternativas em relação ao uso da substância.

    5. Fortalecer a autoeficáciaAutoeficácia refere-se à crença de uma pessoa em sua capacidade de realizar e de ter sucesso em uma tarefa espe-cífica. Existem várias mensagens que promovem a autoeficácia. Uma delas é a ênfase na responsabilidade pessoal,ou seja, devemos mostrar ao usuário que ele não somente pode, mas deve fazer a mudança, pois ninguém poderáfazer isso por ele. Encoraje e estimule a pessoa a cada etapa vencida. Ele se sentirá fortalecido.

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    Esses princípios de Entrevista Motivacional associados aos princípios de Intervenção Breve favorecem umamelhor resposta do usuário.

    Lembre-se: Uma intervenção breve eficiente não consiste somente em utilizar as técnicas propostas, mastambém em criar um ambiente de APOIO para o usuário.

    Comportamentos a serem evitados ao realizar a IB 1. Perguntar e responder

    Muitas vezes, a ansiedade do profissional não permite dar “tempo” para que o indivíduo responda às perguntasfeitas. O profissional “metralha” o usuário com perguntas a que ele mesmo responde:

    Exemplo: “Quando você bebe, em geral que tipo de bebida é – cerveja, cachaça, vinho...? E você bebe na suacasa ou na rua com amigos?”

    2. Agir como técnico

    O profissional passa a imagem de que tem todas as respostas. Não propicia um ambiente de APOIO ao indivíduo.

    3. Culpa e responsabilidadeMuitas vezes, o indivíduo quer discutir sobre “de quem é a culpa” pelo seu consumo. O profissional deve terclaro e esclarecer ao indivíduo que “eles” não estão ali para decidir quem é o culpado e sim o que pode sermudado e os benefícios dessa mudança.

    Para finalizar, é importante ter em mente que usuários de substâncias apresentam maiores chances de mu-dança de comportamento quando: percebem que o uso de substância é responsável por seus problemas; acreditam que as coisas podem melhorar; acreditam que podem ou conseguem mudar;

     relacionam seus problemas ao uso de substâncias.Aproveite tudo o que você aprendeu sobre como conversar e aconselhar pessoas para orientar as pessoas desua escola.

    É importante ter uma atitude de acolhimento e compreensão, sem preconceitos. Ouça quem está com esseproblema e ajude essas pessoas a perceberem a real gravidade do problema.

    Se um familiar procurar você, preocupado com um filho que começou a usar drogas:

     mostre que é preciso fazer alguma coisa, mas que, provavelmente, não é um caso para desespero e que umtratamento por internação não é aconselhável para esse tipo de caso;

     oriente a pessoa, por meio dos vários materiais que a SENAD oferece, em linguagem adequada para pessoasde diferentes idades;

     mostre a ela que há vários recursos na comunidade a que ela pode ter acesso.

    Se o caso for mais grave, recomende que ela procure a ajuda de um profissional de saúde. Em todos os casos,procure motivá-la e passe as informações que você tem sobre o assunto.

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      Aula 11 Acolhendo adolescentes em situação de risco

     Dupla exclusão é um processo complexo que caracteriza o envolvimento de adolescentes de baixarenda com o consumo de drogas.

     No contexto de pobreza e exclusão social, o uso de drogas entre adolescentes pode significar umatentativa de resolução de seus problemas e dificuldades vivenciadas e, neste sentido, uma busca dealívio para um sofrimento psíquico.

     Os efeitos promovidos pelo uso de drogas se tornam respostas momentâneas para as angústias edúvidas naturais na vida deste adolescente que procura construir sua identidade.

     O contínuo fracasso em ter sucesso em estabelecer sua identidade social, familiar e sexual reforça ofalso caminho do uso de drogas como solução para seu sofrimento.

     O uso de drogas fragiliza os laços com a comunidade e com a família. Ao mesmo tempo, promove ofortalecimento dos laços afetivos com o grupo com o qual se identifica em interesses e necessidades,com os pares que consolidam no adolescente um sentimento de identidade e pertencimento, corrobo-rando para o nascimento de uma cumplicidade no uso de drogas.

     A integração da escola às Redes de Proteção é uma forma de contribuir para o fortalecimento e para aampliação das ações de enfrentamento à violência contra crianças e adolescentes, a partir do envolvi-mento das comunidades em torno dessa questão.

     Para essa integração acontecer, é preciso que os gestores, professores e demais profissionais queatuam na educação estejam preparados para o reconhecimento, a prevenção e o enfrentamento dasdiferentes situações de violência a que está exposta a população infantojuvenil.

     É fundamental que as famílias e as comunidades sejam incluídas nesse debate, a fim de que elas par-ticipem do processo, tanto na condição de sujeitos passíveis de proteção quanto na de parceiros nagarantia e promoção dos direitos dessa população.

     A Intervenção Breve para usuários de drogas é uma técnica caracterizada por ser breve, objetiva e dirigida àmudança da maneira como a pessoa usa a droga, tendo como foco a mudança de comportamento do usuário.

     Um dos seus principais objetivos é favorecer o desenvolvimento da autonomia dos usuários, atribuindo-lhes a capacidade de assumir a iniciativa e a responsabilidade por suas escolhas.

     É indicada a pessoas que fazem uso nocivo ou abusivo de substâncias. Contudo, devido a sua brevida-

    de, não é indicada para pessoas com problemas graves relacionados à dependência de substâncias. A motivação pode ser avaliada por meio dos Estágios de Mudança, em que se identifica esta disposição

    do usuário para modificar seu comportamento de uso de substâncias ou seu estilo de vida. São quatro os Estágios de Mudança: pré-contemplação, contemplação, ação e manutenção.

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    200  Módulo 3  A prevenção do uso de drogas no modelo da educação para a saúde e das redes sociais

     

    Agora que finalizou esta aula, poderá aprofundar este conteúdo com o tutor da sua escola e depoisconferir o aprendizado por meio dos exercícios de fixação disponíveis na plataforma.

    Vamos transferir os conhecimentos deste módulo para a prática?

    Tarefa 3

    Você conheceu, no módulo 3, o modelo sistêmico e da educação para a saúde aplicado na prevenção douso de álcool e outras drogas no contexto da escola. Neste modelo, destacamos, como opção metodo-lógica, a prática das redes sociais, bem como o acolhimento de adolescentes em situação de risco.

    Com base nas instruções do Caderno de Tarefas do curso, você poderá revisar questões integrandoteoria e prática, numa postura reflexiva sobre os conteúdos apresentados neste mó-dulo.

     Importante:

    Não se esqueça de enviar por meio da plataforma os resultados de sua reflexão sobre a realização destatarefa.

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      Aula 11 Acolhendo adolescentes em situação de risco

    ReferênciasALMEIDA, T. M. C.; PENSO, M. A.; COSTA, L. F. Abuso sexual infantil : o gênero configura o sofrimento e o des-tino?. Estilos da Clínica, XIV, p. 46-67, Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo, 2009.

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    202  Módulo 3  A prevenção do uso de drogas no modelo da educação para a saúde e das redes sociais

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