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Indígena coloca cocar de Raposa Serra do Sol em estátua da Justiça, em frente ao STF. Montagem sob fotos de Clarissa Tavares ISSN 0102-0625 Ano XXX N 0 305 Brasília-DF Maio-2008 R$ 3,00 ABRIL INDÍGENA 2008 Manifestação na Praça dos Três Poderes encerra as atividades Criança Guajajara de 6 anos é assassinada por invasor de terra indígena no Maranhão Página 4 Elite brasileira constrói falsos argumentos contra a demarcação contínua da terra indígena RAPOSA SERRA DO SOL Páginas 2 e 3 Lideranças Guarani Kaiowá vão a São Paulo denunciar situação de violência em que vivem Página 6 Páginas 8 a 14

Abril indígenA 2008 Manifestação na Praça dos …cimi.org.br/pub/publicacoes/1210700400_Porantim 305-final...Abril indígenA 2008 Manifestação na Praça dos Três Poderes encerra

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Ano XXX • N0 305 • Brasília-DF • Maio-2008R$ 3,00

Abril indígenA 2008Manifestação na

Praça dos Três Poderes encerra as atividades

Em defesa da causa indígena

Criança Guajajara de 6 anos é assassinada

por invasor de terra indígena no

MaranhãoPágina 4

Elite brasileira constrói falsos argumentos contra a demarcação

contínua da terra indígena

Raposa seRRa do sol

Páginas 2 e 3

Lideranças Guarani Kaiowá vão a São Paulo denunciar

situação de violência em que vivem

Página 6

Páginas 8 a 14

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2Maio-2008

Opinião

Estado brasileiro, inclusive chegaram a propor a anexação de Roraima à Venezuela.

No entanto, são os povos in-dígenas tratados como “ameaça à soberania nacional”, nos argumentos de quem defende a demarcação em ilhas da Terra Indígena Raposa Serra do Sol!

Por que essa espécie de insanidade acomete políticos, militares e jorna-listas, cegos à realidade e agarrados ao preconceito antiindígena? Um dis-curso inflamado, anunciando “banhos de sangue”, emerge dos arrozeiros invasores, é sustentado por setores militares e vai servir de propaganda antiindígena, nas “análises” dos arti-culistas da mídia, sempre na busca de influência sobre a futura decisão do Supremo Tribunal Federal.

Militares da reserva têm sido viru-lentos, com um discurso raivoso com relação ao governo federal; irado com relação à ONU, devido à aprovação da Declaração dos Direitos Indígenas; bradando conceitos pré-Constituição de 1988, tais como “índios primitivos”, “população do neolítico”, “índios acul-turados”, “necessidade da integração dos índios à sociedade” etc.

Voltamos à pergunta: por que isso está acontecendo? De onde vem, por que vem essa onda de racismo, neste momento da vida nacional? A que in-teresses serve essa verborragia radical, sobre que bases se sustenta?

o início deste ano, um depu-tado federal falou na tribuna da Câmara denunciando as violências contra os povos

indígenas e solicitando providências das autoridades. Quando desceu da tribuna, foi abordado por outro de-putado, que lhe disse: “tenho certeza de que você não acredita no que falou agora. Você, um descendente de ita-lianos como eu, sabe que esses índios não passam de bandidos, que o melhor é matar todos eles”.

O que vem acontecendo na Terra Indígena Raposa Serra do Sol nos faz lembrar desse episódio, que resume toda a violência da onda antiindígena que perpassa a sociedade brasileira, a mídia nacional e nossas instituições.

Os povos indígenas Macuxi, Wa-pichana, Ingarikó, Patamona e Taure-pang vivem há milhares de anos na-quela região; os invasores chegaram lá há poucos anos, depois que a área já havia sido declarada de ocupação tradicional. Os índios vêm lutando de forma pacífica, respeitando as instituições da sociedade brasileira e seus procedimentos, prazos e regras burocráticas; os invasores sempre lidaram com violência, ameaças e armas. Os índios foram os responsá-veis por aquela região ser parte do território nacional, tendo participado de batalhas históricas contra os in-gleses para defendê-lo; os invasores vêm fazendo luta armada contra o

De onde vêm as invasões bárbaras?

MARIOSAN

Nos parece que esta onda serve a diferentes interesses, que se articulam neste momento: aos interesses priva-dos do agronegócio; aos interesses de agitação de uma ultradireita civil e militar; aos interesses eleitorais da direita expressos no PSDB e nos Demos e aos interesses da mídia em servi-los a todos.

Mas, o que se passa com a nossa sociedade para que tais brados, re-ferentes a ameaças e inseguranças, encontrem certo eco, perceptível nas “páginas dos leitores” dos grandes jornais?

Nos parece que a sociedade bra-sileira se sente atualmente ameaçada pelo fantasma de um “outro”, primiti-vo, irracional, ameaçador, regressivo, que pode irromper na vida social, de-sestruturando a “lei e a ordem”, corro-endo o Estado por dentro. Projetar tais inseguranças contra os povos indíge-nas não é tarefa difícil; são recorrentes na História os mecanismos de criação de “ameaças externas”, freqüentes durante a ascensão do nazi-fascismo na Europa, no século passado.

É importante que a sociedade brasileira não se torne refém de tais mecanismos, não olhe para os povos indígenas como esse “outro” a ser controlado. Ao invés disso, é essencial que olhe para si própria, para a ver-dadeira origem de suas inseguranças, afloradas com o terrível assassinato da menina Isabella.

Ficou claro que a exposição na mídia, durante semanas seguidas, daquele crime hediondo, num angus-tiante espetáculo de suspeitas familia-res, com seus detalhes de assustadora perversidade, vem fragilizando a socie-dade brasileira com relação à imagem construída de si própria.

Aí reside o verdadeiro “outro”, tão terrivelmente ameaçador, um “outro” que não se encontra fora, distante, nas fronteiras do país, mas no interior mesmo de nossa sociedade, surpreen-dida pela própria barbárie.

Paulo MaldosAssessor político do Cimi

Porantinadas

Edição fechada em 12/05/2008

Permitimos a reprodução de nossas matérias e artigos, desde que citada a fonte. As matérias assinadas são de responsabilidade de seus autores.

ISS

N 0

102-

0625

APOIADORES

UNIÃO EUROPÉIA

Permitimos a reprodução de nossas matérias e artigos, desde que citada a fonte. As matérias assinadas são de responsabilidade de seus autores.

Publicação do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), organismo vinculado à Conferência

Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).

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Na língua da nação indígena sateré-Mawé, PorANTIM

significa remo, arma, memória.

Dom Erwin Kräutler PresIDeNTe

Paulo Maldos Assessor PolíTIco

editoração eletrônica:licurgo s. Botelho

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Administração:Dadir de Jesus costa

redação e Administração:sDs - ed. Venâncio III, sala 310 ceP 70.393-902 - Brasília-DF

Tel: (61) 2106-1650Fax: (61) 2106-1651caixa Postal 03.679

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cimi Internet: www.cimi.org.brregistro nº 4, Port. 48.920,

cartório do 2º ofício de registro civil - Brasília

Clarissa TavareseDITorA - rP 01580JP/ce

Marcy PicançoeDITorA - rP: 4604/02 sP

coNselho De reDAçÃoAntônio C. Queiroz

Benedito PreziaEgon D. HeckNello Ruffaldi

Paulo GuimarãesPaulo MaldosPaulo Suess

Cana a todo vaporO Brasil fará neste ano a maior

colheita de cana-de-açúcar de sua história. O setor comemora o aumento que deve variar entre 607,8 milhões e 631,5 milhões de toneladas, ou seja, de 8,8% e 13,1% acima da do ano pas-sado de 558,5 milhões de toneladas. Já a área plantada aumentou de 7 milhões para 7,8 milhões de hectares e mais da metade do montante será destinado ao setor de agrocombustí-veis. O que não se diz é às custas de quem se chega a esse crescimento. Apenas no ano passado, mais de 80% dos casos de uso de mão-de-obra escrava estavam relacionados com o setor sucroalcooleiro.

Algoz justiceiroO senador Jayme Campos (DEM-

MT) possui grandes propriedades de terras no Mato Grosso, onde já foi autuado por ato danoso ao meio am-biente. Como é costume na política brasileira os algozes se passarem por justiceiros, Campos vai presidir os tra-balhos da Comissão Externa de Riscos Ambientais do Senado, responsável por apurar o desmatamento na Ama-zônia. Com certeza os madeireiros, grileiros, exploradores dos recursos naturais em geral devem estar come-morando.

Reajuste parlamentarOs parlamentares brasileiros têm

o que comemorar. O presidente da Câmara dos Deputados, Arlindo China-glia, anunciou, em abril, o aumento da verba de gabinete, que passou de 50 mil 815 reais para 60 mil. Ele declarou ser justo tal reajuste, já que o último havia sido em 2005. Cada deputado tem direito a contratar entre 5 e 25 assessores com o recurso. Atualmente, existem 9.500 assessores na Câmara, com salários que variam de 420 reais a 8 mil e 40 reais. O que os trabalhadores querem saber é quando terão direito a um reajuste justo como esse.

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3 Maio-2008

Francisco LoebensCimi Norte I

utilização de bombas de fa-bricação caseira, a queima de pontes, os atentados e as ameaças a lideranças e comuni-

dades indígenas pelos fazendeiros para se manterem ilegalmente em Raposa Serra do Sol, numa clara afronta ao Estado Democrático de Direito, curio-samente não mereceram a condenação de muitos comentaristas e articulistas da grande imprensa. Pelo contrário, passaram a justificar esses atos de in-subordinação, repetindo à exaustão os argumentos, completamente vazios e eivados de preconceito, de uma pequena elite de privilegiados contra a demarca-ção dessa terra indígena.

De forma tendenciosa e através da insistência tentaram conseguir a adesão da opinião pública para a cau-sa mesquinha daqueles que às custas da exploração, da intimidação e da violência querem continuar exercendo a dominação econômica e política em Roraima.

Um desses argumentos é o de que a demarcação de terras indígenas nas regiões de fronteira significaria um risco à soberania, porque os índios aliando-se a interesses externos poderiam dar um golpe no país, declarando a independên-cia sobre esses territórios.

Quem repete esse argumento, se não estiver usando de má-fé, certamente está mal informado, porque essa hipóte-se não passa pelo imaginário de nenhum povo indígena, mesmo daqueles mais abandonados, onde a presença do Esta-do é tímida ou inexistente.

Também os generais sabem disso. Trata-se, por isso, de uma estratégia ardilosa de condenação dos índios, para confiscar suas terras. Não difere muito da forma utilizada durante o período co-lonial, quando, para justificar a chamada “guerra justa”, acusavam os índios de praticarem delitos, toda vez que existia o interesse de avançar sobre suas terras e de buscar mão-de-obra escrava.

Outro argumento é o de que as terras indígenas inviabilizariam o de-senvolvimento do estado de Roraima. Associada a esse argumento afirma-se que o estado perderia 50% de suas terras. A pergunta óbvia que se deve fazer é de qual desenvolvimento estão falando e quem se beneficia dele?

É o desenvolvimento em função de seis fazendeiros que se instalaram de má- fé em Raposa Serra do Sol, a partir de 1994, quando os limites dessa terra indígena já tinham sido publicados e que tem como base o monocultivo do arroz produzido às custas do envenenamento dos rios por agrotóxicos? Ou do desen-volvimento que assegura o direito origi-nário da terra e a perspectiva de futuro de nove povos indígenas que constituem mais da metade da população rural do estado de Roraima?

Que tal se os comentaristas e arti-culistas da grande imprensa deixassem de ser tão óbvios nas suas tentativas de respaldar ideologicamente os grandes interesses econômicos apátridas e co-meçassem a afirmar em relação a Raposa Serra do Sol que:

u os povos indígenas, como sua presença é anterior à criação do Estado brasileiro, têm o direito originário às suas terras e que esse direito é reconhe-

cido pela Constituição Federal, estando essas terras localizadas no centro ou nas fronteiras do país;

u as terras dos povos Macuxi, Wapi-xana, Ingaricó, Taurepang, Patamona da Raposa Serra do Sol foram invadidas e os índios submetidos à situação de escra-vos nas fazendas de gado, alvos de toda sorte de violência e discriminação;

u os povos indígenas de Roraima, a partir da década de 1970, iniciaram um movimento legítimo de retomada de suas terras com o apoio da Igreja Católica, somando-se a ele o apoio de outros setores da sociedade brasileira e da comunidade internacional;

u as autoridades do estado de Rorai-ma sistematicamente tentaram inviabi-lizar a demarcação das terras indígenas e não fizeram isso somente através de discursos inflamados nas tribunas do Congresso Nacional e da Assembléia Legislativa do estado. Foram mais longe. Apoiaram a invasão dos arrozeiros, que a partir de 1994 se instalaram na área, premiando-os com a isenção de impos-tos e buscando respaldar seu lucrativo negócio com ações na justiça contra os direitos indígenas, como fazem até hoje. Em 1995, criaram artificialmente o mu-nicípio de Uiramutã totalmente situado dentro da Raposa Serra do Sol, com sede na aldeia Uiramutã, invadida por uma currutela de garimpo. Na tentativa de consolidar esse município, os militares construíram um quartel inaugurado em 2002. Uma vez instalado o município começaram a espalhar a notícia men-tirosa de que a demarcação da Raposa Serra do Sol criaria um grave problema social, pois milhares de pessoas seriam desalojadas da sede municipal quando

não passavam de 115 não-índios, na maioria funcionários municipais.

u 53,07% da população rural de Ro-raima é indígena. Segundo a contagem do IBGE de 2007, a população total de Roraima é de 395.725 pessoas, sendo que destas 88.736 (22,42%) vivem na área rural. Considerando que a população in-dígena no interior é de 47.091 pessoas, de acordo com os dados dos Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEI Les-te/RR e DSEI Yanomami) e do Programa Waimiri Atroari1, chega-se à conclusão de que ela soma mais da metade da população rural de Roraima.

u com base nos mesmos dados pode-se afirmar também que a terra in-dígena Raposa Serra do Sol, que abrange 7,79% de Roraima e onde vivem 18.992 índios em 194 comunidades, além de assegurar as condições de existência futura a cinco povos indígenas, garante terra a 21,4% população de Roraima que nela vive e trabalha.

Está nas mãos do STF o poder de decidir a favor ou contra os povos indígenas; a favor da maioria da popu-lação que vive da terra em Roraima ou para beneficiar seis fazendeiros; pela manutenção de relações de dominação colonialista que persistem ao longo do tempo ou por um novo Brasil, justo e plural, onde o Estado assegura o cum-primento das leis também quando estas beneficiam os indígenas e limitam o alcance do latifúndio. n

A elite brasileira sem argumentos

1 Dados de 2007 – População indígena no DSEI/Leste/RR = 35.750; População DSEI/Yanomai = 16.915, dos quais 10.598 moram em Roraima; População Waimiri-Atroari = 1252, dos quais 743 moram em Roraima.

População sofre com constantes ataques dos invasores. No dia 5 de maio, eles lançaram bombas contra indígenas que construíam barracões, deixando 10 pessoas feridas

Raposa Serra do Sol

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4Maio-2008

Violência

o dia 5 de maio, dois homens mataram uma menina de seis anos do povo Guajajara. De moto, eles invadiram a aldeia

Anajá, na terra indígena Araribóia, próxima ao município de Arame, no centro-oeste do Maranhão. Os cri-minosos atiraram contra uma família que estava num centro comunitário,

Invasores matam menina Guajajara de seis anos

Humberto Rezende CapucciCimi MA

m 2007, o estado onde foi regis-trado o segundo maior número de assassinatos no Brasil foi

o Maranhão, ficando atrás apenas do Mato Grosso do Sul. Foram 10 vítimas. Destes casos, três estão relacionados diretamente ao problema da exploração ilegal de madeira na terra Araribóia, do povo Guajajara.

A presença constante dos madeirei-ros e o desmatamento também amea-çam um grupo de pelo menos 60 pes-soas do povo Awá Guajá que vive nesta terra, sem contato com a sociedade envolvente. A população maranhense necessita refletir sobre o modo como tem tratado os povos indígenas no estado. Intolerância e preconceito têm sido a tônica nessas relações.

Se três dos dez assassinatos come-tidos no estado contra indígenas foram motivados por conflitos decorrentes da exploração madeireira por não índios dentro das terras indígenas, os outros sete assassinatos a que se devem? É preciso atenção sobre esse tema, pois em muitas cidades do Maranhão a po-pulação tem uma visão extremamente equivocada e preconceituosa em re-lação aos indígenas. Preconceito que

explica os sete casos de assassinatos e tantas outras formas de agressão aos indígenas maranhenses.

Nesse contesto de violência, mais uma vez a situação vivida pelas comu-nidades indígenas da terra Araribóia, sobretudo as que estão localizadas nas aldeias próximas ao município de Arame e nas margens da rodovia MA 006, merece destaque. Essas comunidades vivem em um clima de constante tensão. Cinco assassinatos que ocorreram no ano passado foram nessa região.

Já este ano, dois casos gravíssimos de morte violenta de indígenas foram registrados. Um deles ocorreu em feve-reiro, quando dois Guajajara que saiam de uma seresta na cidade de Arame foram atacados por vários homens a pauladas. Um deles morreu e outro ficou gravemente ferido.

O outro caso foi ainda mais cruel. O assassinato da indiazinha de 6 anos, com um tiro na cabeça, disparado por invasores da terra indígena, no dia 5 de maio. O irmão dela, de 12 anos, também foi atingido na perna, mas passa bem.

Nos dois casos citados não encon-tramos outra motivação para os crimes que não seja o preconceito que impera na região. No caso da indiazinha de 6

anos é difícil aceitar que uma pessoa possa ser tão fria a ponto de cometer um ato desses. Ato que, em crueldade, não difere em nada do midiático caso da menina Isabela Nardoni que mobi-liza e comove todo o Brasil. Mas para boa parte da população maranhense, em especial a do município de Arame, parece que a morte da menina indígena pouco importa.

Segundo relatos de moradores daquele município, não se percebe nenhum clima de comoção em relação à morte da menina. Trata-se de um fato normal. Em conversa com lideranças indígenas das comunidades próximas à rodovia, ficamos ainda mais estarre-cidos. Disseram que a prática de passar pela estrada atirando em direção às aldeias é comum. Informaram ainda que a polícia e a Fundação Nacional do Índio (Funai) têm conhecimento disso, mas nada é feito para proteger os indígenas.

De acordo com Geraldo Abdias, missionário do Cimi na região, o clima na aldeia é de muita dor e desolação. Os indígenas não acreditam na Justiça, dizem que “matar índios por aqui é igual a matar um cachorro, pois não acontece nada”. Diante dessa situação me pergunto o que pensam e sentem as pessoas que praticaram esses crimes? E

No estado do Maranhão foi registrado o segundo maior número de assassinatos de indígenas em 2007

na correria, a menina levou um tiro na cabeça e morreu na hora.

Segundo os Guajajara, os assassi-nos, moradores da região, seriam os mesmos que, no início de 2007, assas-sinaram Timóteo Guajajara. É sempre tensa a relação entre os Guajajara e os moradores de Arame e dos povoados da região. Com medo, muitas famílias

indígenas se mudaram para o interior da terra indígena para ficar longe da estrada que limita a terra indígena.

“Há um preconceito e uma raiva muito forte contra os indígenas, pois a cidade fica rodeada de terras de-marcadas. Além disso, a exploração de madeira na região fez aumentar a população dos povoados vizinhos

à terra indígena”, explica Rosimeire Diniz, coordenadora do Cimi no Maranhão. Segundo os missionários que atuam na área, é comum pessoas passarem de carro ou moto atirando nos indígenas. A Polícia Federal foi à terra Araribóia coletar informações sobre o crime para abrir o inquérito. (Marcy Picanço)

N

Preconceito e discriminação contra povos indígenasquanto às autoridades “responsáveis”, o que justifica assistirem inertes o agra-vamento desse quadro sem esboçarem nenhuma reação?

Talvez as respostas possam estar na compreensão que se têm dos povos indígenas e de seus direitos. O artigo 231 da Constituição Federal que é fru-to de muita luta dos povos indígenas e de seus aliados durante o período constituinte parece não valer. Termos importantes contidos nesse artigo, que expressam claramente o reconhe-cimento do povo brasileiro em relação ao direito sagrado dos indígenas de existirem como povos culturalmente diferenciados, passam longe da forma como agem parte dos brasileiros.

A impressão que se têm é que boa parte dos cidadãos brasileiros gostaria que os indígenas deixassem de ser índios. Felizmente, os povos indígenas que resistem há mais de 500 anos não parecem dispostos a se renderem. Mesmo frente a tantas dificuldades, não desanimam e seguem unidos na luta por seus direitos. Esperamos que essa resistência sirva não só para garantir a sobrevivência destes povos que muito tem a nos ensinar, mas que também sirva de exemplo para a sociedade brasileira que em tempos de barbárie vive sob apatia. n

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Aldeias próximas ao

município de Arame,

na terra indígena

Araribóia, vivem em clima de

tensão. Ano passado,

ocorreram cinco

assassinatos na região

Foto: Cimi MA

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Grandes Projetos

Relatoria Nacional para o Direito Humano ao Meio Ambiente, da Plataforma Brasileira de Direitos Humanos Econômicos, Sociais,

Culturais e Ambientais recomenda que o governo federal anule a licença prévia concedida para a construção das usinas hidrelétricas de Santo Antonio e Jirau, no rio Madeira, em Rondônia. O relatório preliminar, que também recomenda a anulação do leilão para construção da usina Santo Antônio, foi apresentado, no dia 23 de abril, a diversos órgãos do governo em Brasília.

O documento aponta algumas ilega-lidades e desrespeito aos direitos huma-nos fundamentais ocorridos durante o licenciamento das usinas. Dentre estes, a exclusão da bacia do Madeira dos es-tudos sobre impactos ambientais. Com isso, não foram avaliados os impactos que a obra pode causar a outros estados brasileiros e ao território boliviano.

entre 15 e 19 de novembro de 2007. Neste período, a relatora Marijane Lisboa se reuniu com ribeirinhos que podem ser afetados pela obra, com organizações indigenistas, com co-munidades afetadas por outras hidre-létricas construídas na região e com órgãos públicos estaduais, federais e municipais. Ela também se encontrou com uma delegação de camponeses e indígenas bolivianos que temem os danos que as futuras represas podem levar às suas terras.

Representantes do Ministério de Minas e Energia (MME), do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) também se reuniram com a relatora. Eles se compro-meteram a enviar considerações sobre as recomendações propostas. A partir deste retorno, a Relatoria deve concluir o relatório final. (Marcy Picanço) n

Marcy PicançoRepórter

preciso desfazer a idéia de que os grandes empreendimentos sempre melhoram a vida ou aumentam renda do povo”,

disse a sup-procuradora do Ministério Público Federal, Débora Duprat, duran-te audiência pública realizada no dia 7 de maio, no Senado Federal, sobre os impactos da construção da Usina Hidre-létrica de Estreito, no rio Tocantins, na divisa do Tocantins com o Maranhão. Cerca de 70 indígenas e ribeirinhos participaram do evento, explicando como a obra os afetará.

A sub-procuradora e as comunida-des afetadas também falaram sobre as falhas ocorridas durante o licenciamen-to da obra. Duprat apontou diversos problemas nos Estudos de Impacto Am-biental da obra, por exemplo, a ausência de uma avaliação da bacia inteira do rio Tocantins, a falta de estudos sobre a viabilidade de construir a obra em outro lugar e a falta de estudos sobre os impactos aos povos indígenas.

Em relação a isso, o assessor ju-rídico do Cimi, Cláudio Luiz Beirão, presente à audiência lembrou que outros grandes projetos no Brasil tam-bém omitem a presença de populações

O relatório também destaca que não foram feitas análises sobre alternativas de produção energética de menor im-pacto. Além disso, o direito à saúde foi desrespeitado, por conta do risco de contaminação de mercúrio e de prolife-ração de malária que podem aumentar com o empreendimento.

Povos isolados ameaçados

A violação dos direitos indígenas foi uma das questões destacadas pela Rela-toria. O documento preliminar lembra que os Estudos de Impacto Ambiental (EIA) da obra apontam para o possível aumento de conflitos e invasões em territórios indígenas. Segundo o EIA, 1089 indígenas de sete terras serão afetados. Uma das críticas lembradas no relatório é que a análise apenas diagnosticou a situação das terras, mas não aprofundou a discussão dos impac-

tos. Além disso, o EIA não considerou a situação dos povos sem contato que podem ser afetados. Devem viver na área atingida pela obra 3 ou 4 grupos sem contato.

Durante a apresentação do relatório preliminar, a diretora de assuntos fun-diários da Fundação Nacional do Índio (Funai), Maria Auxiliadora, disse que a Fundação está articulando frentes de identificação desses povos, pois o órgão considera possível a presença deles na região.

Também foi lembrado que, ainda no processo de licenciamento, o direito dos povos indígenas à consulta prévia bem informada foi desrespeitado. A Convenção 169 da Organização Inter-nacional do Trabalho (OIT) recomenda a forma de consulta aos povos, que não foi obedecida.

Para preparar o documento preli-minar, a Relatoria esteve em Rondônia

indígenas nas regiões afetadas, para não precisarem de uma autorização específica do Congresso Nacional para a construção. Beirão também concorda que o licenciamento não foi rigoroso. “Tanto que há seis ações civis públicas contestando o processo”, lembrou.

Os indígenas presentes questio-naram o fato do Consórcio Ceste – responsável pelo projeto - não os ter consultado sobre a obra e a ausência de referência a eles nos estudos de impac-to. “Dizem que nós não existimos por lá. Se eu não existisse, não estava aqui”, afirmou Gercília Krahô. Ela também lembrou que a energia a ser gerada pela

hidrelétrica não será destinada para as comunidades indígenas e ribeirinhas.

Para Antônio Veríssimo, do povo Apinajé, as promessas de desenvolvi-mento não podem justificar uma obra com tão grande impacto: “As guerras também geram muito emprego. Isso não pode justificar tudo. Preservar o rio também gera emprego e a exploração do nosso rio tem limite. Não podemos colocar tudo para virar mercadoria. A gente não é contra um desenvolvimen-to. Queremos um desenvolvimento humano para todo mundo”.

Em sua exposição, Débora Duprat, lembrou casos de grandes projetos,

como o complexo militar de Alcântara (Maranhão), onde o Índice de Desenvol-vimento Humano do município piorou depois da obra.

Compensações e debatesUma das principais questões deba-

tidas foi o espaço em que as comunida-des afetadas e o consórcio construtor discutirão as compensações. Diversos grupos querem a criação de um Fórum de Negociação em que todos partici-pem juntos, incluindo Ministério Públi-co Federal e órgãos federais e estaduais. A proposta da Ceste, aceita por alguns locais afetados, é uma co-gestão em que o consórcio dialoga separadamente com cada grupo afetado.

Duprat lembrou, no entanto, que ainda não se está na fase de discutir compensações, pois há questionamen-tos às licença concedidas. “Com serie-dade e responsabilidade, tudo pode ser reversível”, afirmou.

Também participaram da audiência representantes do Consórcio Ceste, do Ministério do Meio Ambiente, do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis, da Fundação Nacional do Índio, do Ministério de Minas e Energia, além de parlamentares e prefeitos dos municí-pios afetados. n

Ribeirinhos e indígenas questionam licenciamento de Hidrelétrica de Estreito

5 Maio-2008

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Relatório recomenda que governo anule licença e leilão do projeto

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Gercília Krahô durante audiência pública no Senado. Ela questionou o fato de a energia gerada pela hidroelétrica não ser destinada aos povos indígenas e ribeirinhos

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6Maio-2008

Direitos indígenas

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Egon D. HeckCimi MS

nquanto houver inconstitu-cionalidade estaremos juntos nessa luta. Cumpra-se a Cons-tituição”. Minutos de aplauso.

No salão nobre da Faculdade de Direito de São Paulo, Dalmo Dallari, renomado professor da instituição, acabara de fazer uma palestra magistral sobre os direitos indígenas, em particular sobre a violência contra os Guarani Kaiowá, do Mato Grosso do Sul, e a decisão do Su-premo Tribunal Federal (STF) de paralisar a desintrusão da terra indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima.

Participavam do evento cerca de cem indígenas do povo Guarani Kaiowá. Dallari foi duro ao afirmar que, muitas vezes, as autoridades judiciais são cúm-plices da violação dos direitos indígenas. Irônico ao comentar as palavras do ge-neral Augusto Heleno de que “o nobre Exército de Caxias está sendo usado para defender criminosos, para defender um ato inconstitucional”, referindo-se à de-marcação em área contínua de Raposa.

“Os índios não vieram aqui para pedir caridade, mas para exigir direitos que estão na Constituição. Esse é o nos-so patamar”, afirmou. Depois de fazer uma análise das lutas e conquistas dos direitos indígenas na Constituição de 1988, especialmente à terra “aos expul-sos da terra”, e do quadro dramático de negação da terra aos Guarani Kaiowá foi enfático: “O direito do índio à terra não depende de demarcação, depende apenas da ocupação. Mesmo que dali te-

nham sido expulsos por diversas razões e forças, a terra lhes pertence constitu-cionalmente”. O professor comentou a lentidão do governo em demarcar as ter-ras indígenas. “As demarcações andam lentas. Intencionalmente lentas”.

Comentou também os lamentáveis fatos com relação à terra indígena Raposa Serra do Sol, falando de cumplicidade de autoridades judiciais. “A resistência armada dos arrozeiros é crime. E por que não se faz nada? Isso configura formação de quadrilha. Onde estão as instituições jurídicas? Onde está o Ministério Público? Surpreendentemente o STF impediu a Polícia Federal de cumprir a missão, ao invés de dizer, ‘faça-se a desocupação’”. Lembrou também a situação no Mato Grosso onde “o governador Maggi é o maior produtor de soja do país e também o maior invasor de terras indígenas”.

Lideranças Guarani Kaiowá denunciam violênciasO salão nobre da Faculdade de Direito de São Paulo abre suas portas para, num momento histórico, testemunhar a opressão por que passam os povos indígenas

Em outra mesa, antropólogos, historiadores, cientistas po-líticos e juristas procuraram trazer elementos de compreensão da dura realidade vivenciada por esse povo hoje.

Foi ressaltada a história secular de violência que atinge hoje o nível de genocídio. Também foi lembrado que, apesar do momento ser tão difícil e ameaçador, os Guarani Kaiowá já resistiram há mais de 500 anos de espoliação e invasão. Portan-to, é um povo com enorme capacidade de enfrentar realidades adversas, de cultura, espiritualidade e sabedoria que lhes têm permitido sobreviver e afirmar seus projetos de vida.

No documento final do seminário, os participantes deci-diram “repudiar qualquer iniciativa de impedir ou suspender os procedimentos de demarcação das terras indígenas dos Guarani Kaiowá do Mato Grosso do Sul”.

Na avaliação dos participantes, esse foi um momento forte, tanto pelo que representa o espaço em que foi realizado, quanto pelos debates, esclarecimentos e posicionamento tomado pelo conjunto dos participantes. Os representantes indígenas Guara-ni Kaiowá se sentiram fortalecidos e animados para continuar sua árdua luta pela terra e seus direitos. n

Colaboração dos estudiosos

O ar nobre e suntuoso do auditório no Largo de São Francisco foi palco de inúmeros depoimentos-denúncia dos Guarani Kaiowá e de suas danças rituais – jeroki. Pediram que aquele espaço se transformasse em espaço de corações sensíveis e firmes aliados da causa indígena e das lutas por direitos e pela vida.

Em um dos painéis, falaram cinco representantes dos Kaiowá Guarani, dentre os quais a viúva de Ortiz Lopes, assassinado na terra indígena Kurussu Ambá, no município mais violento do país, Coronel Sapucaia.

Os representantes de Nhanderu Marangatu relataram o sofrimento e as violências constantes de que são vítimas. Em vários momentos exclamaram “Cadê a Justiça?”.

Depoimentos indígenasSobre Dourados (MS) falou-se da cala-

mitosa situação a que estão submetidos os mais de 12 mil índios, expremidos e con fi nados em um pouco mais de 3 mil hectares de terra. “A gente está amon toada. Somos vistos e acusados de bandidos e criminosos. Que país é esse? Somos espoliados em nossos direitos. Por que toda essa ganância? A sociedade e o Estado brasileiro não estão reagindo. Será que é tão caro restituir nossas terras? Morrem nossos lutadores, mas nascem outros mais”.

A tônica do discurso indígena foi a exigência da terra para diminuir a violên-cia, a fome, a dependência, a desnutrição e o trabalho escravo nas usinas. “Os índios são jogados que nem cachorro na beira da estrada. Mas enfrentamos as armas de fogo com nossas mãos limpas”.

O ar nobre e suntuoso do auditório no Lago de São

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Ameaças

Clarissa TavaresEditora do Porantim

pós seis anos e oito meses vivendo em Cuba, Edvaldo e Maria da Glória, indígenas do povo Pataxó Hã-hã-hãe, do sul

da Bahia, retornaram ao Brasil em setem-bro do ano passado. Eles embarcaram a convite do governo cubano para estudar medicina na Escola Latino-Americana de Ciências Médicas (Elam). Partiram em 2001 com a bagagem cheia de ex-pectativas, mas ao voltarem ao Brasil se depararam com a falta de perspectiva para começar a trabalhar. Aqui o diploma cubano não tem validade.

Em conversa durante o V Acampa-mento Terra Livre, Edvaldo explicou que uma das “maiores dificuldades é a resis-tência do Conselho Federal de Medicina para reconhecer o diploma cubano”. Sobre a formação que receberam em

cursando medicina na escola cubana. O número chega a aproximadamente mil alunos e, somente em 2007, cerca de 30 indígenas foram selecionados.

A preocupação com a revalidação do diploma destes estudantes é com-partilhada pelas comunidades indíge-nas. Tanto que, no documento final do Acampamento Terra Livre 2008, uma das reivindicações foi o “reconhecimento dos títulos de estudantes indígenas for-mados no exterior”, com a esperança de que se possa fazer valer o direito cons-titucional de atendimento diferenciado à saúde indígena. n

Clarissa TavaresEditora do Porantim

presidente do Conselho Indige-nista Missionário (Cimi) e bispo da Prelazia do Xingu, Dom Erwin Krautler, falou sobre as

ameaças de morte que vem recebendo. Ele participou de audiência pública, na Comissão Amazônia, Integração Nacional e Desenvolvimento Regional da Câmara dos Deputados, em Brasília, no dia 6 de maio.

O bispo explicou que as ameaças são decorrentes da insatisfação de fazendeiros, madeireiros e políticos do Pará às denúncias que vem fazen-do. Dom Kräutler está sob proteção policial desde meados de 2006. Ele identifica três causas que podem ser apontadas como principais para as ameaças: sua posição contrária à construção da hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu; a denúncia contra a rede de exploração sexual de meni-nas no município de Altamira (PA); e a pressão que ele vem fazendo para que se aprofundem as investigações do assassinato da missionária Dorothy Stang, morta em 2005.

“Nós exigimos justiça aos respon-sáveis pela morte de Irmã Dorothy na forma da lei”, declarou o bispo. Porém,

na tarde do mesmo dia, o acusado de ser o mandante da morte de Dorothy, o fazendeiro Vitalmiro Bastos Moura (o Bida) e condenado num primeiro julga-mento, foi absolvido. No mesmo julga-mento, que durou dois dias, Rayfran das Neves Sales, acusado de ser o autor dos disparos, foi condenado a 28 anos de prisão em regime fechado.

A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) divulgou em que ma-nifesta indignação ética pelo resultado do Tribunal do Júri. “O fato aumenta a preocupação da CNBB com a Vida de to-dos os ameaçados/as de morte no Pará, entre os quais estão nossos três Bispos:

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Dom Erwin fala sobre ameaças de morte que vem recebendoAs ameaças são decorrentes da insatisfação de fazendeiros, madeireiros e políticos do Pará às denúncias que vem fazendo

Dom José Luiz Azcona, Dom Erwin Kräu-tler e Dom Flávio Giovenale”.

Ainda participaram da audiência pública na Câmara Dom José Luís Azco-na, bispo de Marajó (PA), e Dom Flávio Giovenale, bispo de Abaetetuba (PA). Assim com Dom Erwin, eles também têm enfrentado ameaças de morte por denunciarem crimes em suas regiões. Segundo Azcona existe uma lista públi-ca de 300 pessoas marcadas para mor-rer no estado do Pará. “Em Marajó, há 300 km de água [com acesso ao oceano] que não tem um só barco da Marinha fiscalizando. Por ali passa narcotráfico, tráfico de armas, biopirataria, barcos

estrangeiros, prostituição infantil...”, declarou.

Dom Flávio Giovenale contou que vem sofrendo ameaças de morte desde que se envolveu no combate ao narco-tráfico. O bispo denunciou a falta de es-trutura policial da cidade, que, segundo ele, piorou depois que foi divulgada a prisão de uma menor de idade em uma cela masculina.

Os bispos exigiram a responsabi-lidade das autoridades policiais, do Ministério Público e da Justiça para que investiguem as denúncias e solucionem as graves violações aos direitos humanos e ambientais no estado do Pará. n

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Cuba, Maria da Glória relatou que “a gente vem com outra visão da medici-na. Uma visão voltada para a medicina preventiva”, bem diferente da prática brasileira. “A medicina cubana vê o ser humano. Trata as pessoas independente-mente da condição social do paciente. E nós passamos a ver a medicina de outra forma, voltada ao compromisso com o povo”, acrescentou Edvaldo.

Esse compromisso é o diferencial dos médicos indígenas. “Voltar para a aldeia é um compromisso que assumi-mos antes de viajar. Assumimos respon-sabilidades com nossa comunidade”, dizia Maria da Glória. Responsabilidade que falta em muitas regiões do país. A dificuldade de conseguir médicos dis-postos a trabalhar em áreas distantes tem levado muitos povos a situações desumanas.

Apenas em 2007, foram registradas pelo Cimi 32 mortes de indígenas por

desassistência à saúde. No Vale do Javari, no Amazonas, morreram pelo menos 19 indígenas por hepatite, malária e suspeita de febre amarela.

“Contratar médicos que convivem com o povo é uma vantagem, pois eles entendem as características específicas dos povos indígenas. Por estarem na comunidade, isso diminui o tempo de atendimento, o diálogo é mais acessível e o acompanhamento mais próximo”, explicava Edvaldo.

Assim como Edvaldo e Maria da Gló-ria, outros estudantes brasileiros indíge-nas e não indígenas cursaram ou estão

Médicos indígenas formados em Cuba não podem exercer a profissão no Brasil

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7 Maio-2008

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Os bispos Erwin Krautler, Luis Azcona e Flávio Giovenale são ameaçados de morte por denunciarem violações aos direitos humanos e ambientais no Pará

Edvaldo e Maria da Glória, do povo Pataxó Hã-hã-hãe, assumiram o compromisso de prestar atendimento a suas comunidades

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Clarissa TavaresEditora do P orantim

dia ainda não se havia erguido e a imagem da Esplanada dos Ministérios, em Brasília, já denunciava algo de novo na paisagem. Na terça-feira, 15 de abril, 800 indígenas presen-ciavam os primeiros reflexos

do sol sobre os concretos idealizados por Niemayer que dão forma à “casa do povo”. Abrigados em uma lona de circo, chegavam para o 5º Acampamento Terra Livre. Vindos de todas as regiões do país, eles iam em grupos armando suas barracas de bambu e sacos plásticos. Morada para uma jornada de três dias.

Os indígenas acampados, represen-tando os mais de 230 povos do Brasil, discutiram a situação política e das po-líticas voltadas aos direitos indígenas; denunciaram as graves violações que sofrem os diversos povos; reivindicaram o direito a seus territórios, à saúde e educação diferenciadas; contestaram as atitudes arbitrárias de representares dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário; trocaram vivências e experiências.

Logo na abertura do evento, Jecinaldo Sateré Mawé, da Coordenação das Organi-zações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), constatou que “a questão indíge-na no Congresso não recebe prioridade”. Quanto à postura do governo federal, questionou o fato de o movimento indí-gena reivindicar a criação do Conselho Nacional de Política Indigenista (CNPI) “e ele sinalizou apenas com a criação de uma comissão”. Ressaltou a grave situação da saúde indígena. “As crianças é que pagam o preço pelo descaso e pela politicagem permitida pelo governo. Muitas crianças morrem de desnutrição”. Em recente relatório divulgado pelo Cimi, apenas em 2007 foram registrados 491 casos de desnutrição de crianças indígenas.

Jaci Makuxi, do Conselho Indígena de Roraima (CIR), relatou a situação na terra

indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima. A terra homologada há três anos continua invadida por arrozeiros. No dia 9 de abril, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu suspender a desintrusão da área iniciada pela Polícia Federal. “Os arrozeiros des-truíram pontes, queimaram 12 casas na aldeia do Mutum, nos impede de navegar em balsas. Ficamos ilhados. A situação é triste. Esperávamos que dessa vez a lei fosse ser respeitada, mas eles [arrozeiros] derrubaram tudo”.

Já Marcos Xukuru, da Articulação dos Povos Indígenas do Nordeste, Minas Ge-rais e Espírito Santo (Apoinme) reforçou a necessidade de se garantir a instalação do Conselho, instância formada por re-presentantes indígenas e governamentais com poder de deliberação das políticas públicas. “Assim seremos protagonistas de nossa própria história, definindo os rumos dos assuntos que dizem respeito aos povos indígenas”. Ele ainda denunciou o forte processo de criminalização das lideranças indígenas em diversas partes do Brasil. “Apenas entre os Xukuru [em Pernambu-co], 60 pessoas têm sido criminalizadas”, afirmou.

Violência do Poder Judiciário

A preocupação com o crescimento das ações de violência e de criminalização de lideranças praticadas contra os povos in-dígenas foi colocada em diversas ocasiões. O cacique Aniel Priprá do povo Xokleng, de Santa Catarina, relatou emocionado as ameaças que vem recebendo.

Em 2007, o Conselho Indigenista Mis-sionário (Cimi) registrou 92 assassinatos de indígenas, sendo 53 apenas no Mato Grosso do Sul, e a maioria deles entre os Guarani Kaiowá.

Os povos indígenas vêm sendo viti-mados ao longo dos anos por pistoleiros, agentes do poder público, brigas internas decorrentes das situações de confina-mento e consumo de bebidas alcoólicas,

conseqüências da não demarcação das terras indígenas.

Nesse sentido, Saulo Feitosa, secretá-rio-adjunto do Cimi, ressaltou a preocu-pação da entidade com, além da violência física, a violência do Poder Judiciário que vitima os povos indígenas por meio de ações de criminalização. São alarmantes os números de índios presos. Apenas no Mato Grosso do Sul existem 300 para uma população de 60 mil indígenas.

Outro caso bastante discutido durante o Acampamento foi a responsabilidade do Poder Judiciário sobre o caso da terra indígena Raposa Serra do Sol, após a decisão do STF. “A violência que sempre se presenciou nas primeiras instâncias, agora vemos na Suprema Corte do país”, ressaltou Saulo.

Outra situação emblemática no STF é a demora em julgar processos como o da terra indígena do povo Pataxó Hã-hã-hãe, do sul da Bahia, que há mais de 25 anos espera decisão de um processo de nulidade de títulos sobre o território indígena, assim como o caso da terra Ñhanderu Marangatu, do povo Guarani Kaiowá, no Mato Grosso do Sul. Desde 2005, o povo aguarda o julgamento do mérito de uma ação que questiona a homologação da terra.

Chinaglia promete colocar Estatuto em pauta

A principal reivindicação dos indígenas durante o Terra Livre 2008 foi pedir que o Congresso retome as discussões do Esta-tuto dos Povos Indígenas, cuja tramitação está parada há 13 anos. Na quarta-feira, dia 16, os participantes do Acampamento fo-ram recebidos, no Salão Negro do Senado, pelo presidente da Câmara dos Deputados, Arlindo Chinaglia (PT-SP) e por outros par-lamentares. Chinaglia se comprometeu a colocar na pauta de votação do Congresso o Estatuto dos Povos Indígenas. Além dis-so, os indígenas solicitaram a aprovação do projeto de lei que cria o Conselho Nacional de Política Indigenista.

Ato político marca último dia

Na manhã do dia 17, quinta-feira, representantes da Fundação Nacional do Índio (Funai), Fundação Nacional de Saúde (Funasa), Advocacia Geral da União (AGU), dos Ministérios da Educação e do Meio Ambiente e a procuradora da 6ª Câmara da República, Deborah Duprat, estiveram no Acampamento para ouvir as demandas das lideranças indígenas.

ACAMPAMENto tERRA LIvRE:5 anos de luta e resistência

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Abril Indígena 2008

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À tarde, um ato em repúdio a ações do Exército brasileiro, do Ministério da Saúde e do Supremo Tribunal Federal (STF) marcou o encerramento do Acampamento Terra Livre 2008. Os indígenas protestaram diante das atitudes contrárias e das omis-sões aos direitos dos povos praticadas por representantes desses órgãos.

Em marcha, os indígenas saíram do Acampamento em direção ao Ministério da Defesa, onde protestaram contra a postura do Exército brasileiro quanto aos direitos territoriais indígenas. Diante da situação de calamidade das ações de saúde indíge-na, eles realizaram um ato em frente ao Ministério da Saúde. A frase “Funasa mata povos indígenas” estampava um caixão que foi levado ao prédio para o enterro simbó-lico do órgão. Na Praça dos Três Poderes, um cocar utilizado pelos povos de Raposa foi colocado na estátua que simboliza a Justiça, em frente ao STF.

Apesar de desmontado o Acampamen-to, as atividades se prolongaram pela noite com a visita de uma comissão ao vice-presi-dente do STF, ministro Gilmar Mendes, que os recebeu por alguns minutos. A respeito de Raposa, o ministro declarou que vai

Egon D.HeckCimi MS

Madrugada de 15 de abril. Abril In-dígena 2008. Uma penumbra encobre o amplo gramado da Esplanada dos Minis-térios, em Brasília. A lua apenas dá umas espiadas entre as nuvens e volta pro seu esconderijo. Montes de armações de ferro estão amontoadas sob os olhares curiosos de algumas centenas de indígenas vindos dos quatro cantos do país.

As cavadeiras começam a ser agitadas. Os lugares dos abrigos começam a ser marcados, por povos, regiões, grupos. Daqui a pouco chega o caminhão carre-

gado de taquaras. Começa a correria. Em breve as taquaras vão sendo distribuídas pelos diversos marcos do acampamento que vão surgindo.

Uma espécie de “festa da taquara”, entre risos e piadas vai fazendo brotar os barracos. Os engenheiros, arquitetos, pai-sagistas de improviso vão, todos, agindo rapidamente. Apesar dos contratempos, nem a falta do barbante, ou de facões ou cavadeiras impediu que algumas dezenas de barracos fossem erguidos. Ainda deu tempo para dormir um pouco até clarear o dia. A taquara revestida de sacos pre-tos tornou possível abrigar mais de 800 pessoas em poucas horas.

Enquanto isso, os montes de ferro inertes dormiam amontoados ao lado de pesadas estruturas que serviriam à festa dos 48 anos de Brasília. Uma festa do “tamanho do céu de Brasília”, anunciavam enormes painéis. As caras estruturas de ferro povoando o gramado em descom-passo com os barracos de taquara.

Festa e luta. Parece que a história se repete. Há mais de 500 anos chegavam à costa as espadas e os canhões. Os arcos e as flechas foram sendo quebrados. A curiosidade e a exploração colocaram conquistados e conquistadores lado a lado. Os combates e os diálogos de absurdos tiveram início. A enganação

dos espelhos trocados pelo pau brasil não tardou. E continua. Atualiza-se. As violências, as mortes, as explorações ganharam no tempo. A história é outra, mas a mesma.

O Acampamento Terra Livre dá visibili-dade a esses contrastes, a essas lutas, que continuam há mais de 500 anos. Quando, na noite seguinte, as lonas e os bambus foram recolhidos e os participantes in-dígenas voltaram às suas aldeias, mais um momento forte se encerrou e Brasília iniciou sua festa, do tamanho do céu e do véu que encobre 500 anos de massacre e resistência heróica dos mais de 230 povos indígenas do Brasil. n

“ouvir todos os envolvidos”. No entanto, o ministro já anunciou, no dia 14 de abril, que defende a revisão da demarcação de terras indígenas em áreas contínuas. Sobre a situação dos Pataxó Hã-hã-hãe e dos Guarani Kaiowá ele apenas afirmou já ter conhecimento dos casos.

Indígenas são recebidos por Lula

No dia 18, após o encerramento do Acampamento Terra Livre, 35 indígenas tiveram uma audiência com o presidente Luíz Inácio Lula da Silva. Lula prometeu agir, junto ao ministro da Justiça e ao presidente da Funai, para sensibilizar os ministros do STF em relação à importância de manter a demarcação de Raposa em área contínua. Nesta audiência, os indígenas entregaram a Lula o documento final do Acampamento Terra Livre 2008. (ver páginas 13 e 14)

O presidente ouviu as reivindicações das lideranças e prometeu participar da próxima reunião da Comissão Nacional de Política Indigenista. Ele ainda destacou como uma das prioridades a solução do problema da falta de terra do povo Guarani Kaiowá, no Mato Grosso do Sul. n

9 Maio-2008

o ferro e o bambu: a luta continua

Representando os mais de 230 povos do Brasil, os indígenas acampados na Esplanada dos Ministérios discutiram a situação das políticas voltadas aos direitos indígenas; denunciaram as violações que sofrem; reivindicaram o direito a seus territórios; trocaram experiências

Fotos: Verena Glass Foto: Clarissa Tavares

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10Maio-2008

Abril Indígena 2008

Aprovação do Estatuto dos Povos Indígenas pode diminuir desigualdades e situações de violênciaDurante o Acampamento Terra Livre, lideranças indígenas falaram sobre a dura realidade de suas comunidades

Por Clarissa TavaresEditora do Porantim

rincipal reivindicação do Acampamento Terra Livre 2008, a aprovação do Estatuto dos Povos Indígenas visa regulamentar os direitos indígenas presentes na Constituição de 1988. Em tramitação no Congresso Nacio-nal desde dezembro de 1994, portanto paralisada há mais de 13 anos, a

proposta de Estatuto tem sofrido sucessivas ameaças de retrocesso.Enquanto parlamentares se omitem de deliberar sobre uma legislação especí-

fica que garanta os direitos dos povos indígenas, estes seguem sendo vitimados pelo Estado, por setores privados e da sociedade. Durante o Terra Livre 2008, pudemos conversar com algumas lideranças sobre a situação em que vivem suas comunidades. Em todos os depoimentos, a negligência do Estado se torna uma constante.

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Nesse Acampamento nós vimos que a situação é em geral ruim para todos os índios. Que a Funasa tem uma política destruidora da saúde indígena. Que a Funai com a saída de setores para o Ministério da Saúde, da Justiça e do Meio Ambiente perdeu muita força com isso.

Esperamos do governo um projeto de auto-sustentação, que dê suporte pra que possamos produzir. Agora, se a gente for pensar em produzir na base da enxada fica muito difícil da gente competir hoje com quem tem máquinas que plantam e colhem. Então, nossa ex-pectativa é que a gente produza nosso alimento e possa comercializar.”

Akanawan Baênan – Cacique

a aldeia a situação é de conflito. O clima é tenso. Recentemente tivemos lideranças sofrendo

várias emboscadas por parte de fazen-deiros. Os posseiros são mais poderosos economicamente na região e têm o apoio tanto da área jurídica como da po-lítica por trás deles. Isso tem dificultado bastante a questão da posse da terra dos Pataxó Hã-hã-hãe.

A morosidade do Supremo em julgar a ação tem ocasionado vários conflitos. Foram 20 lideranças que já morreram nesses mais de 25 anos de processo no STF. Não é uma luta que se iniciou em 1982, quando foi ajuizada a ação de nulidade de títulos no Supremo. O povo Pataxó-hã-hã-hãe vem defendendo a terra milenarmente até o ponto de ser retirado do território. Hoje a comuni-dade ocupa parte deste território, mas precisa conquistar o direito de viver em

todo seu território para que possa viver com tranqüilidade.

O que nós queremos é que o Su-premo julgue procedente a nulidade de título dessas áreas que estão em poder dos invasores para que nosso povo possa viver bem, com dignidade e respeito, e isso só se faz com a decisão da justiça,

Sul da Bahia Povo Pataxó Hã-hã-hãe

comunidade recebeu a notícia de que a questão dos Pataxó Hã-hã-hãe foi indicada para a

pauta do Supremo com muita alegria, porque se a gente imagina que a ação vai ser julgada pela instância maior do país, que é o Supremo, considerado o guardião da ordem do Brasil, e mesmo assim ela está há mais de 25 anos es-perando, então, pra nós, é uma grande alegria. Mas a gente só vai realizar esse sonho quando a ação for julgada. A gente sabe que, de dois em dois anos, muda a presidência do Supremo e, quando muda, começa outro processo. Há anos a gente vem vivendo com isso. A gente sabe que por trás disso tem um poder econômico muito forte e também pressão da bancada ruralista que é muito forte na Câmara e no Senado e, infelizmente, nós indígenas não temos esse apoio. Temos uma Frente Parla-mentar Indígena, mas que não funciona como a gente gostaria.

Mas a gente acredita que com essa decisão do ministro Eros Grau de colocar em pauta a questão da nulidade a gente vai ter um novo avanço, até porque vai diminuir a perda de liderança. A gente vai ter felicidade, nossos filhos vão po-der crescer com liberdade, sem estar na mira de uma arma como é constante em nossa aldeia. Vamos lutar por projetos de auto-sustentabilidade e vamos poder ser índios com respeito e dignidade com valor, o que a gente não é.

Hoje, em nosso município, quando chega o caminhão de cestas básicas para os índios, que não dá 10 quilos pra cada, o povo da cidade fica dizendo que a gen-te tem boa vida, que o governo dá tudo, dá dinheiro, dá comida, dá remédio.

do STF, que é quem tem o poder de decidir.

Sobre Raposa Serra do Sol, a decisão do Supremo causa insegurança jurídica para o nosso povo e outros que têm a mesma demanda. A gente tem um certo receio que esta decisão esteja trazendo mais prejuízos para os povos indígenas do Brasil. A gente sempre batalhou para que a nulidade de títulos da nossa terra fosse julgada, mas, diante do que acon-teceu com nossos parentes Macuxi, a gente fica insegura pro julgamento nesse momento. A gente teme diante dessa dis-crepância do STF em suas decisões.”

Ãpoha Pataxó Hã-hã-hãe

situação pra nós não está muito boa. A terra já está demarcada e homologada e desde 2005 não

podemos usar nada. Estamos abando-nados pela assistência da Funai tam-bém. Estamos sem lavoura, sem poder pescar, nem caçar e abandonados pelas autoridades.

Sofremos ameaças dos jagunços das fazendas que continuamente vivem ao redor do nosso acampamento. Essa condição é ruim porque não podemos sustentar nossos filhos. A única coisa que tem sustentado a gente é a cesta básica que não agüenta nem dez dias, pra algumas famílias. É uma situação difícil pra nós.

O tamanho da terra que estamos agora é de 126 hectares e somos muitos. Somos 210 pais de família, com cerca de 1000 pessoas. Dá muita gurizada. No dia a dia nosso é difícil sair de lá [da aldeia]. O único acesso que temos pra buscar algum recurso é a saída pra Antônio João ou pra Bela Vista. Não podemos ir

“AMato Grosso do Sul

Guarani Kaiowá

Vivem no território retomado pelos Pataxó Hã-hã-hãe 4 mil indígenas. A terra indígena é de 54 mil hectares, dos quais eles ocupam hoje aproximadamente 18 mil. O restante da área está invadida por 22 posseiros.

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R Os Xakriabá vivem em 54 mil hectares de terra homologada. São 39 aldeias com mais de 8 mil índios. Existem atualmente três frentes de retomada que reivindicam a ampliação da área para um total de 78 mil hectares.

Minas Gerais

Povo Xakriabáia dois de maio faz dois anos que fizemos a retomada da aldeia. Lá já sofremos várias

ameaças por parte dos fazendeiros e enfrentamos inclusive uma liminar de reintegração de posse. A gente recor-reu e não conseguiu derrubar. Ela se encontra na 2ª Vara Federal em Belo Horizonte. Pelo que os fazendeiros falam a gente vai ter que cumprir e eles ficam nos ameaçando com isso. Nosso povo vem sendo ameaçado e tem que suportar tudo isso.

Há um esquecimento da nossa aldeia por parte da Funasa e da Funai que alegam que não pode ter acom-panhamento lá porque a nossa terra é uma área retomada, que a terra ainda precisa de um estudo. Já foi criado o GT, mas ainda não foi concluído, foi só a primeira etapa. Ficaram de voltar em fevereiro para fazer a segunda etapa, mas até agora não retornaram.

A Funai esquece da lei [Constitui-ção], artigos 231 e 232. Não é justo o que a Funai está fazendo. Uma lei maior nos garante [esse direito] e por que a Funai não usa isso para fazer o acompanhamento dos índios nas aldeias?

Nós conhecemos nossas terras pelo documento único que foi o documento de doação que a gente tem. Então, a gente reivindica os limites reconhecidos pelos nossos antepassados que são às margens rio São Francisco, rio Tacarambizim, Serra Geral e Alto da Boa Vista.

Hoje nós vivemos da roça e de pe-quenos animais que a gente cria. A vida é bem difícil, principalmente pra nós que vivemos na área da retomada. Nós temos uma certa rejeição da população não índia, que diz que a gente não está numa terra legal pra ter certos benefícios. Eles cortam projetos que vêm pro município. O prefeito do município [São João das Missões] é indígena, porque nós somos maioria lá, 73% da população.

Muitos dos índios saíram da aldeia e migraram para a cidade por falta de espaço, falta de trabalho. A Funai já fez duas demarcações, mas não contempla-ram a área. Mesmo com a maioria da população sendo indígena a gente sofre muito preconceito porque eles convivem com os brancos. Por isso a gente tá rei-vindicando todo nosso limite.”

Cacique Santo Caetano BarbosaAldeia Morro Vermelho

Mato Grosso

Povo Bororou tenho até vergonha de ficar falando da situação na nossa aldeia, porque já faz dois anos

que venho falando, repetindo sempre a mesma coisa. O pessoal da Funai, a falta de alimentação... tudo o que você pensar de dificuldade a gente tá passando.

Há dois anos, no Natal de 2006, os fazendeiros queimaram nosso caminhão. Eu recorri à Polícia Federal, mas ninguém nunca apareceu. Até hoje ninguém nunca deu satisfação. Quando foi na Páscoa, em 2007, mataram um Bororo. Eu fiquei muito assustada com a morte dele porque ele era um Bororo que foi criado fora da aldeia, mas passava infor-mações pra gente.

Na nossa terra vivem oito famílias, com 18 crianças e 26 adultos. A gente tava sobrevivendo só do Bolsa Família porque as mães lá tinham o cartão e agora alguns foram cancelados. A gente tem só três cartões agora. Então, a gente compra alimentação e divide pra todo mundo e também um senhor que faz um trabalho com a gente, quando vê que a gente tá passando por dificuldade, vai lá, compra e dá pra gente.

A Funai deu R$ 200 por mês pra gen-te pegar de compras no mercado. Agora R$ 200 pra dividir pra oito famílias não dá nada. Eu fui falar com eles e disseram “mas isso aí é só pra você, não é pra dividir com ninguém”. E como é que eu vou comer sozinha? E o resto? Os outros dependem de mim também.

Nossa terra é reconhecida. Foi de-marcada em 1912 e em 1945 teve uma

redução e quando foi no título definitivo teve outra redução. De 100 mil hectares, nossa terra passou pra 7000 e depois pra 4706. E hoje nós vivemos num pedaci-nho que não sei nem dizer o tamanho. O resto foi todo invadido. A Funai fala que não é culpa dela é do Incra e o Incra fala que é da Funai... a gente não sabe mais nem a quem recorrer, porque já recorre-mos a tudo que a gente pensava.”

Cacica Maria BororoAldeia Jarudóri, município de Poxoréu

pra lado nenhum das fazendas porque estamos cercados mesmo. E também não podemos ir do outro lado porque estamos cercados pela rodovia.

Nem lenha podemos ir buscar. De um outro lado, que não tem nada também, é lugar de conflito e eles [os fazendei-ros] nos proíbem. São fazendas de soja de um lado e de outro são pastos para criação de gado. Eles colocam vigias lá pra ninguém entrar no meio. Alegam que nós não podemos entrar porque fazemos correr o gado deles que não engordam rápido.

É cheio de jagunço nas fazendas. Sofremos muitas ameaças e já denun-ciamos várias vezes para o Ministério Público em Ponta Porá, mas nunca tivemos sucesso. De 6 a 13 outubro do ano passado, começaram estas ameaças tão grandes. Deram tiros em cima dos barracos da gente, até mesmo furou a casa do cacique Lauretito e não foi tomada providência. Foram violentadas mulheres de 60 anos e não foi tomada

providência até hoje. Mandamos denún-cias para todos os lugares e também pra ONU e continuam sempre nos ameaçan-do esses jagunços.

Sobre a questão da educação, não está cem por cento, mas antes estáva-mos debaixo da casa de capim e hoje temos uma escola com 380 alunos ma-triculados. Com relação ao transporte de alunos agora complicou pra nós. Es-tamos na época do inverno e a criançada não tem agasalho suficiente. Muitos não têm calçados e no frio não dá pra mandar

as crianças pra escola andando. É uma dificuldade que nós temos, [a falta de] transporte escolar.

E sobre a nossa saúde, o pessoal da Funasa dá remédio pra nós, mas só com remédio, sem alimentação, a gente não tem uma saúde legal. Não temos alimen-tação. Não temos mais remédio natural, agora só remédio da farmácia mesmo. Então, não temos como dizer que nós estamos bem de saúde. Eles cuidam da saúde da gente com relação a levar pro hospital, mas o que complica no hospital

é com relação à documentação indígena. Criança sem documentação não faz mais exame. Consultar, consulta, mas exame não faz. Os médicos falam pra nós que o computador recusa sem documento.

A gente vive de pequenas plantações de mandioca e milho e ajuda da cesta básica. Algumas pessoas procuram ajuda na cidade, mas a maioria está resistindo. Os que vêm procurar morada junto a nós a gente avisa que por aqui as coisas não tão boas...

Na nossa comunidade não tem muito perigo lá dentro. Todo mundo fala com todo mundo, é tranqüilo andar à noite. O ruim mesmo é a busca de coisa pra nós comermos, alimentação em geral. Nós não temos alimentação. Sem carne a gente não vive. É só arroz e feijão. Agora a Funai tá levando cestas com muito mais farinha e enjoa todo mundo. Aí fica aquelas montoeiras de farinha e o povo com fome...”

Amilton LopesTerra indígena Ñhanderu Marangatu

A terra Ñhanderu Marangatu foi homologada em março de 2005, com 9.316 hectares. Em julho de 2005, o então presidente do STF, Nelson Jobim, decidiu liminarmente suspender os efeitos da homologação atendendo a mandado de segurança dos fazendeiros. Em 15 de dezembro de 2005, mais de 200 polícias federais, usando helicópteros e muitas armas, tiraram cerca de 700 indígenas que viviam em 500 hectares. Os indígenas montaram acampamento na estrada ao lado da terra e lá ficaram por seis meses. Desde o despejo, os Guarani têm pedido ao STF que julgue o mérito do mandado de segurança e mantenha o direito do povo à terra homologada.

11 Maio-2008

Jarudóri foi totalmente invadida nos anos 50 e é objeto de uma ação civil pública desde julho de 2006. Em dezembro de 2006 foi feita uma denúncia oficial ao procurador da República de Cuiabá – Mário Lúcio Avelar – das várias ameaças de morte feitas por posseiros contra a comunidade indígena. Em 26 de dezembro, o genro da cacica, João Osmar, sofreu tentativa de homicídio e teve seu caminhão incendiado, ao sair da área indígena, por dois homens. O MPF requereu abertura de inquérito, instaurado janeiro de 2007.

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Nós, 800 lideranças representando os mais de 230 povos indígenas das distintas regiões do Brasil, nos reunimos em Brasília, de 15 a 17 de abril, por ocasião da mobilização indígena

nacional, o Abril Indígena – Acampamento Terra Livre 2008, para analisar a situação dos nossos direitos, partilhar as nossas realidades, demandas e aspirações, bem como para unificar as nossas reivindicações e exi-gir, mais uma vez, do Poder Público a efetivação dos nossos direitos, justamente no vigésimo aniversário da Constituição Federal.

A nossa Carta Magna reconhece o caráter multi-étnico e pluricultural do Estado brasileiro, portanto, o nosso direito ao tratamento diferenciado, na pers-pectiva da autonomia dos nossos povos.

Depois de analisarmos a situação dos nossos di-reitos e da política indigenista nacional constatamos que continuamos a ser vítimas da discriminação, do preconceito e da intenção, explícita ou velada, de nos extinguir enquanto povos, com uma identidade diferenciada, fincada em espaços territoriais necessá-rios para a nossa sobrevivência física e cultural, com organização social própria.

Contudo, fazemos parte do Estado Nacional, que depois da colonização européia se implantou sobre os territórios ocupados milenarmente por nossos povos e ancestrais.

O Estado brasileiro tem se mostrado incapaz de conviver e oferecer tratamento diferenciado aos nossos povos. O Governo tem feito esforços significa-tivos, mas continua submetido à pressão de interesses econômicos e políticos que sempre mandaram neste país, criando situações que acarretam a grave crise no atendimento da saúde indígena e da violência contra os povos indígenas.

O Legislativo, dominado por esses setores, ao invés de regulamentar os nossos direitos, reconheci-dos há 20 anos pela Constituição Federal, tem sido palco de intensa disputa com o propósito de restringir nossos direitos.

No Judiciário, embora tenham sido registradas importantes decisões de mérito favoráveis aos nos-sos direitos, tais como a prioridade assegurada para

apreciação dos processos de interesses indígenas, adotada pela primeira vez, em 2006, na gestão da Ministra Ellen Gracie, várias decisões liminares têm revelado compreensões limitadas sobre a aplicação das normas constitucionais, processuais e de proteção e promoção dos nossos direitos estabelecidos pela comunidade internacional, no âmbito da Organização das Nações Unidas.

Após 25 anos de tramitação reconhece-se o esfor-ço do Ministro Eros Grau indicar para o julgamento definitivo o caso envolvendo a nulidade dos títulos imobiliários incidentes na terra tradicionalmente ocupada pelo povo Pataxó Hã-hã-hãe, no estado da Bahia. Esperamos que na gestão do futuro ministro Gilmar Mendes na presidência do Supremo atenções dessa natureza, que denotam sensibilidade para os direitos indígenas, prossigam e sejam ampliadas para os demais órgãos do Poder Judiciário por intermédio do Conselho Nacional de Justiça.

Contudo, nos surpreende e deixa preocupados a recente decisão liminar do Supremo Tribunal Federal (STF) em medida cautelar requerida pelo estado de Roraima, de acordo com o voto do Ministro Carlos Ayres Brito, suspendendo atividade da administração pública federal destinada a garantir os direitos cons-titucionais dos povos Macuxi, Wapichana, Taurepang, Ingarikó e Patamona, na terra indígena Raposa Serra do Sol. Esta decisão liminar do Supremo é inédita, por possibilitar que os invasores continuem usurpando o direito territorial dos povos indígenas, agindo com violência e com atos flagrantemente criminosos, que colocam em questão a convivência social, o Estado de Direito e a autoridade do Governo brasileiro.

Além destes casos e tantos outros que tramitam na justiça brasileira, destaca-se mais uma vez a neces-sidade do STF julgar o mandado de segurança contra a homologação da demarcação da terra indígena Ñanderu Marangatú, no estado do Mato Grosso do Sul, tradicionalmente ocupada pelo povo Kaiowá Guarani, cujo relator é o Ministro Cezar Peluso. Lembramos ainda da ação originária nº 442, da terra indígena Nonoai, no Rio Grande do Sul, que há 22 anos encontra-se para julgamento.

Diante deste quadro, os nossos povos mostram-se indignados e dispostos a lutar, se necessário sacri-ficando a própria vida, para termos garantidos os nossos direitos. Dessa forma, exigimos do Governo brasileiro respostas urgentes e de relevante impacto, de caráter emergencial, mas sobretudo permanente e estruturante, às demandas apresentadas por nós nos últimos cinco anos e que pouco foram atendidas. Reafirmamos, porém, atenção especial às seguintes reivindicações e propostas.

1 Empenho na criação do Conselho Nacional de Política Indigenista (CNPI), envolvendo a sua

base parlamentar na urgente tramitação e aprovação do Anteprojeto de Lei acordado entre o Governo e o movimento indígena no âmbito da Comissão Nacional de Política Indigenista.

2 Comprometimento na tramitação e apro-vação do Estatuto dos Povos Indígenas,

mantendo coerência com o acordado na Comissão Nacional de Política Indigenista, no sentido de ga-rantir a participação plena dos povos e organizações indígenas na discussão do mérito do Projeto corres-pondente, impedindo que temas contemplados no Substitutivo aos PLs 2057/91, 2160/91 e 2169/92 e seus apensos sejam tratados em leis específicas, como se pretende em relação ao Projeto de Lei nº 1.610, de 1996, cujo inteiro teor foi extraído do Capítulo sobre pesquisa e lavra de minérios em terras indígenas, já aprovado pelo Senado Federal e ora submetido à apreciação de uma Comissão Especial na Câmara dos Deputados.

3 Reformulação urgente da política de saúde voltada aos povos indígenas, garantindo

o fim da dizimação em curso que vitima os povos indígenas no Mato Grosso do Sul e Vale do Javari, dentre tantos, aonde são registrados altos índices de doenças endêmicas e epidêmicas como a den-gue, desnutrição, malária, tuberculose, hepatite, hanseníase e conseqüente alta mortalidade infantil. Este quadro, onde é clara a precariedade ou falta total

O Acampamento Terra Livre 2008, evento central do Abril Indígena, foi instalado na Esplanada dos Ministérios, de 15 a 17 de abril. Por três dias, os cerca de 800 indígenas presentes realizaram um balanço da situação dos direitos indígenas e da política indigenista no Brasil. O Porantim reproduziu o documento final do evento que contêm as principais constatações e reivindicações dos povos indígenas.

Documento Final do v Acampamento terra Livre

Abril Indígena 2008

12Maio-2008

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de atendimento, tem provocado elevados índices de morte por desassistência.

A Funasa, órgão responsável pela saúde indíge-na, até hoje não tem se estruturado para oferecer um serviço à altura das nossas necessidades. São crônicos os problemas de demora na liberação de recursos e de medicamentos, por si já escassos, a falta de profissionais, de infraestrutura e condições de trabalho nos pólos-base, postos de saúde e Ca-sas do Índio, para as ações preventivas e curativas. A centralização retirou autonomia financeira e de gestão aos Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEI`s) e os índios são discriminados na rede do Sistema Único de Saúde (SUS). Este quadro tende a se agravar com a partidarização da saúde indígena, a terceirização e municipalização do atendimento e o desrespeito ao controle social exercido pelos Conse-lhos Distritais. Diante tudo isso reivindicamos:• RevogaçãodaPortaria70,queinstituia

centralização da aquisição de insumos em Brasília e da Portaria 2656 que normatiza a municipalização da saúde indígena;

• Garantiadaautonomiapolítica,administrativa e financeira dos DSEIS;

• Permanênciadasaúdeindígenanoâmbitofederal;

• Criaçãodeumfundodistrital;• Reconhecimentoelegalizaçãodascategorias

de Agentes Indígenas de Saúde (AIS) e Agentes Indígenas de Saneamento (AISANS);

• Valorizaçãodospajés,parteirasedamedicinatradicional indígena;

• HumanizaçãodasCasasdoÍndio(CASAIs);• Aprimoramentodocontrolesocialatravés

da formação e capacitação dos conselheiros indígenas;

• Garantiadareferênciaecontra-referêncianamédia e alta complexidade.

4 Demarcação e regularização de todas as terras indígenas, garantindo a sua devida

desintrusão e proteção, para conter quaisquer tipos de invasões que ameaçam a integridade física e cul-tural dos nossos povos bem como a riqueza natural e a biodiversidade existentes nos nossos territórios. Esses atos formais de reconhecimento dos nossos direitos territoriais devem ser necessariamente acompanhados de políticas de sustentabilidade dos nossos povos.

Destacamos as graves ameaças contidas no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), do governo federal, principalmente através de projetos de infraestrutura como usinas siderúrgicas, grandes empreendimentos industriais e comerciais e a trans-posição das águas do rio São Francisco que atinge cerca de 26 territórios indígenas da região Nordeste, as Usinas do rio Madeira, do Estreito e Belo Monte, na região Norte, o Complexo Hidrelétrico do rio Tibagi, que atinge várias terras indígenas no Sul do país e as pequenas e grandes hidrelétricas nos rios Juluena e Kuluene, no Mato Grosso, que afetarão mais de 20 comunidades indígenas.

Destacamos a urgente necessidade da garantia da integridade das terras Guarani, particularmente do Morro dos Cavalos, e dos povos Kaingang, Guarani, Xetá e Xokleng, também no Sul do país.

Destacamos o impacto ambiental e social que a construção de usinas de álcool trará para as comuni-dades indígenas no Pantanal, Mato Grosso do Sul.

Destacamos ainda a necessária e urgente conclu-são da desintrusão da terra indígena Raposa Serra do Sol, observando que não existe divisão entre as comunidades, tratando-se de uma falsidade fabricada principalmente por seis arrozeiros invasores, bene-ficiários de isenção tributária do Estado de Roraima até 2018, em detrimento dos direitos de 18.992 cidadãos indígenas. É também urgente a desintrusão da terra indígena Maraiwatsedé, para o retorno do povo Xavante a seu território tradicional.

Ressaltamos que a demarcação e regularização das terras indígenas na faixa de fronteira em nada comprometem a integridade e soberania do Brasil, pelo contrário é a extrema violência dos invasores que ameaça e compromete a segurança do país nessas re-giões, como ficou demonstrado nas últimas semanas, na terra indígena Raposa Serra do Sol.

Constatada a morosidade do Estado no atendi-mento destas demandas, reafirmamos a nossa dispo-sição de proceder a ocupar os nossos territórios.

5 Adoção de medidas urgentes para conter o processo de violência e criminalização a

que estão sendo submetidos os nossos povos, orga-nizações e lideranças, muitas das quais são presas de forma arbitrária ou assassinadas a mando de fazen-deiros e outros invasores das terras indígenas, como acontece com freqüência na região Nordeste e no Mato Grosso do Sul. Só em 2007 foram assassinados 92 líderes indígenas. Destacamos a impunidade dos envolvidos nos assassinatos do líder Truká Adenilson e seu filho Jorge, em Pernambuco, do líder Ortiz Lopes Kaiowá Guarani e da rezadeira Xureté Kaiowá Guarani, e de lideranças nos Estados do Ceará e Maranhão, casos até hoje não esclarecidos. Repudiamos e exigi-mos o fim da violência policial, do confinamento e da criminalização do povo Cinta Larga. É preciso punir os responsáveis pelos crimes cometidos contra os povos indígenas.

6 Implementação de uma política de educação escolar indígena de qualidade, específica e

diferenciada, que garanta condições para o ensino fundamental e médio completo nas nossas aldeias, e o acesso dos jovens indígenas ao ensino superior, considerando os nossos reais interesses e aspirações, em áreas como a saúde, direito e educação. Concre-tamente reivindicamos:•CriaçãodeumFórumPermanentede

Educação Indígena;• CriaçãodoConselhodeEducação

Escolar Indígena;• Criaçãodeumasecretariaespecíficade

educação escolar indígena para tratar dos recursos destinados à educação escolar indígena;

• Formaçãodeprofessoresindígenasnasuniversidades federais e estaduais;

• Apoioaosestudantesdoensinosuperior,através de bolsas de estudo, garantia de casas de estudantes indígenas, programas específicos e diferenciados, além do sistema de cotas;

• QueoMECrestabeleçaconvênioscom as organizações indígenas e não governamentais, ouvidos previamente os povos e comunidades indígenas;

• CriaçãodeumSubsistemadeEducaçãoEscolar Indígena;

• RealizaçãodaConferênciaNacionaldeEducação Escolar Indígena;

• Reconhecimentodostítulosdeestudantesindígenas formados no exterior;

• Efetivaçãodosprofessoresindígenaspelo Estado.Conquistamos com muita luta nossos direitos

na Constituição que agora completa 20 anos, mas o Estado brasileiro não está cumprindo com seu dever de torná-los realidade.

Contra as falsas acusações de que atrapalhamos o projeto econômico em curso, afirmamos claramen-te que nós, povos indígenas, com base em nossas próprias histórias, valores e culturas, temos muito a contribuir com o desenvolvimento sustentável do país, na perspectiva da construção de uma sociedade justa e de um Estado verdadeiramente pluriétnico e democrático no Brasil.

Brasília, 17 de abril de 2008

Reunidos sob uma lona de circo, indígenas das mais variadas regiões do Brasil mostraram a força dos povos e contestaram atitudes arbitrárias de representantes do Executivo, Legislativo e Judiciário

13 Maio-2008

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14Maio-2008

Rondônia

Luta pela terra

Emília Altini e Volmir Bavaresco

Cimi RO

Abril indígena 2008 foi realizado em duas etapas pelo regional do Cimi em Rondônia, sendo a

primeira em Porto Velho (RO) e a segunda em Brasília (DF). Em Porto Velho, aconteceu de 10 a 12 de abril e contou com a parti-cipação de mais de 60 lideranças de 24 etnias.

O tema “Terra é vida” foi o eixo principal das atividades. No primeiro dia foi realizada uma audiência pública na Assembléia Legislativa, que contou com a participação do Ministério Público Federal (MPF), Funai, Secretaria da Educação do Es-tado (Seduc) e representantes de movimentos e organizações indígenas. O destaque foi a dis-cussão sobre educação escolar indígena, articulada ao direito à saúde e à terra.

Diante da ausência do secre-tário da Educação, uma comissão de lideranças indígenas decidiu ocupar a Seduc e apresentar suas reivindicações. Em reunião, foi decidido que estas devem ser atendidas em 30 dias. A comissão também entregou o documento ao procurador Francisco Mari-nho, em visita ao MPF.

Um destaque do encontro foi a socialização das realidades indígenas. Ao final, foi assumido um compromisso pela luta e defesa dos direitos indígenas apresentado no Acampamento em Brasília. Ficou evidente o compromisso de todos os parti-cipantes na luta pela terra como disse Hosana Puruborá “a luta pela terra é uma luta que não é fácil. Os fazendeiros estão plantando a divisão dentro de nossa luta. Nem por isso se vai desanimar, pelo contrário, se vai até o fim. Enquanto, não tiver as nossas terras demarcadas e fora da mão dos fazendeiros não vou sossegar. Não vou abrir mão dos meus direitos e nem vou abrir mão da nossa terra mais uma vez”. n

Beatriz Catarina MaestriCimi Sul/ Equipe SP

om o objetivo de dar maior visibilidade aos indígenas que vivem na cidade, promover sua cultura diferenciada e sensibili-

zar a sociedade e os órgãos públicos so-bre a realidade em que vivem é que foi realizada a Semana dos Povos Indígenas na cidade de Osasco, na grande São Paulo. Lá vivem 38 famílias Pankararé, provenientes de Pernambuco e estabe-lecidas em várias regiões da metrópole paulista, além de outros povos.

Janaína K. DomingosCimi Sul/ Equipe Registro

s Guarani das comu-nidades do Vale do Ribeira estiveram no município de Ca-

nanéia (SP) para participar da Semana dos Povos Indí-genas, entre os dias 17 e 19 de abril.

Na Câmara Municipal fo-ram denunciados problemas quanto à merenda escolar, ao saneamento básico nas aldeias e à omissão da Funai para a criação da Adminis-tração Executiva Regional em Itanhaém, reivindicação antiga das comunidades indígenas do litoral de São Paulo e do Rio de Janeiro.

Problemas de saneamento, princi-palmente quanto à qualidade da água, têm acarretado doenças como diarréia na população. O caso mais preocupante acontece com a comunidade de Guavira ty (Subaúma – Iguape). As águas do cór-rego que atravessam o centro da aldeia

Abril Indígena 2008São Paulo

Comunidades denunciam descaso no interior

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De 14 a 20 de abril, foram realiza-dos três seminários sobre educação e economia solidária, com a participação de mais de 300 pessoas em cada um deles. Em todos, as lideranças indíge-nas estiveram partilhando anseios e reivindicações.

Em um shopping, no centro da cidade, os indígenas expuseram e comercializaram produtos artesanais. Estima-se que mais de quatro mil pes-soas tenham visitado o local e conver-sado com os vários povos ali presentes: Guarani, Pankararé e Tupi-Guarani, Fulni-ô e Pataxó. Neste espaço, foram

realizadas oficinas de artesanato com crianças e adolescentes e exibições da dança do Toré, sempre com muita animação, pelos Pankararé, em sua maioria mulheres.

O ponto alto da semana foi o en-contro Pankararé, no dia 20 de abril, na Casa de Angola, que reuniu as famílias provenientes de várias regiões. Não faltou mugunzá, garapa, mandioca, canjica e frutas para tornar ainda mais saborosa a confraternização. As lideran-ças, novamente, puderam expor suas reivindicações para os representantes públicos e secretários ali presentes. n

visibilidade aos povos na grande São Paulo

estão contaminadas com o esgoto de um porto de areia.

A Funasa viabilizou uma caixa d’água que é abastecida por um cami-nhão pipa. No entanto, como ela fica distante, mais da metade da população termina ingerindo a água contaminada, o que vem ocasionando diarréia, desnu-trição e outras doenças.

A atividade possibilitou que os Gua-rani refletissem sobre o impacto nega-tivo, especialmente sobre a juventude, do “juruá-reko” (sistema do branco) sobre o “teké-reko” Guarani (sistema de vida). Lideranças religiosas, políti-cas e jovens falaram sobre o assunto, buscando alternativas para trabalhar a problemática. n

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Problemas de saneamento,

principalmente quanto à

qualidade da água, têm

acarretado doenças como

diarréia na população

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Comunidades indígenas

realizaram apresentações

de dança e expuseram

artesanatos em shopping

de Osasco (SP)

Foto: Janaína K. Domingos

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delegação indígena brasileira, da qual faz parte a assessora jurídica do Conselho Indígena de Roraima (CIR), Joênia Wapi-

chana, reuniu-se no dia 22 de abril com Julian Burger, responsável pelo progra-ma para povos indígenas e minorias do Alto Comissariado da ONU para os Direitos Humanos.

A reunião aconteceu na sede da ONU em Nova Iorque, na sétima ses-são do Fórum Permanente da ONU para Assuntos Indígenas. Burger ou-viu com atenção as denúncias sobre discriminação e ameaça de reversão de direitos indígenas por que passa o Brasil hoje.

Foram entregues documentos preparados pelas lideranças indígenas sobre a situação de violação de direitos humanos dos povos da terra indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, a crítica situação da saúde indígena no Vale do Javari, no Amazonas, e o caso do povo Cinta Larga, em Rondônia. O caso da Raposa Serra do Sol tem sido acompanhado pelo Comitê para a Eliminação da Discriminação Racial da ONU, que já enviou três cartas ao Governo brasileiro.

specialistas em trabalho infan-til, organizações indígenas e representantes do fundo das Nações Unidas para a Infância

(Unicef) e da Organização Internacional do Trabalho (OIT) estiveram reunidos, durante o mês de abril, em Lima (Peru), durante a Oficina Sub-Regional de Especialistas em Trabalho Infantil Indígena, para debater a problemática desse tema na Bolívia, no Equador e no Peru.

Os participantes do encontro fi-zeram estudos preliminares nos três países e constataram que os “povos indígenas estão mais preocupados com a educação das crianças e adolescentes do que com os envolvidos em atividades de trabalho infantil”. Após a análise da situação do trabalho infantil, o grupo concordou que é necessária uma estra-tégia para contribuir com a erradicação dessa prática.

Os especialistas querem buscar da-dos mais detalhados sobre a população indígena e definir linhas prioritárias de investigação, que lhes permitam

O representante do Alto Comissa-riado cumprimen-tou as lideranças i n d í g e n a s p e l a participação dessa grande delegação brasileira no Fórum Permanente 2008. Ele relembrou que há muito tempo não via um grupo de li-deranças indígenas do Brasil participan-do de uma reunião na ONU.

Julian Burger ressaltou a impor-tância dessa par-ticipação esclare-cendo que a ONU está buscando informações sobre o dia-a-dia das comunidades indígenas porque, segundo ele, sem a voz indí-gena no âmbito da ONU, o que mais se tem ouvido sobre o Brasil é que 12% do território estão demarcados para os povos indígenas.

Essa boa notícia, contudo, não corresponde a uma verdade totali-

ter informações, em quantidade e quali-dade suficientes, para abolir o trabalho das crianças indígenas. Também querem fa-zer um levantamen-to quanto ao gênero e à faixa etária dos mais afetados pelo trabalho precoce e conhecer a visão dos povos indígenas e das autoridades sobre esse problema.

Os três países devem ainda desen-volver um plano de trabalho “cujos re-sultados permitirão desenhar uma estra-tégia e um plano de ação que possa ser assumido por tais Comissões Nacio-nais”. A partir dos resultados obtidos serão desenvolvidas as estratégias de intervenção.

Delegação indígena brasileira se reúne com Alto Comissariado da oNU

zante e não é entendida como sufi-ciente para o Alto Comissariado que tem buscado conhecer a situação de fato dos povos indígenas dentro de suas terras, enviando observadores e,agora, dialogando com as lideranças indígenas através da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab).

Para tratar das denúncias de violação de direitos humanos, o representante do Alto Comissariado comprometeu-se a marcar reunião da delegação indígena brasileira com o relator especial da ONU sobre Direitos Humanos e Liberdades Fundamentais já na próxima semana em Nova Iorque. (Conselho Indígena de Ro-raima - CIR) n

Especialistas discutem o trabalho infantil indígena

As famílias indígenas vêem na educação uma forma de dar fim a essa exploração infantil. O levanta-mento prévio destaca que o conceito

de trabalho infantil indígena não se refere ao desenvolvimento de ativi-dades culturalmente aceitas, e sim às situações de exploração econômica, que atingem a educação, o desen-volvimento, a saúde, a segurança e a moral das crianças.

No Peru, onde a população indíge-na – que corresponde a entre 25 e 48% do total – é 50% mais pobre do que o restante da sociedade, fica evidente a relação entre pobreza e trabalho infantil.

Nas regiões da serra e da selva, onde mora a maioria da população indígena, estão 70% do trabalho infantil realizado no país.

Segundo a OIT, na América Latina, pelas condições de marginalização e exclusão dos povos indígenas, as crianças indígenas são mais afetadas pelas piores formas de trabalho infantil. Assim, é necessário “dar um enfoque específico para combater tais situações de exploração econômica em que se encontra esse setor da população”. (Fonte: Adital) n

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15 Maio-2008

Ameríndia

Joênia Wapichana, advogada do CIR, compôs a delegação que participou da sétima sessão do Fórum Permanente da ONU para Assuntos Indígenas

Menina peruana trabalha vendendo artesanatos para turistas em Cusco, no Peru

Foto: Clarissa Tavares

Foto: Clarissa Tavares

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16Maio-2008

APOIADORES

UNIÃO EUROPÉIA

Terra é lugar sagrado. É morada do presente,

dos antepassados e dos filhos que virão.

Provedora de alimento para a alma e o

corpo. Sinônimo de abundância, proteção,

compartilhamento. Terra é vida!

Fotos: Arquivo Cimi