141
Universidade Federal do Rio de Janeiro A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA CARIOCA: FALA ESPONTÂNEA VERSUS LEITURA Vivian Borges Paixão 2014

A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

  • Upload
    others

  • View
    2

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

Universidade Federal do Rio de Janeiro

A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA CARIOCA:

FALA ESPONTÂNEA VERSUS LEITURA

Vivian Borges Paixão

2014

Page 2: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

UFRJ

A prosódia das interrogativas totais na fala carioca:

fala espontânea versus leitura

Vivian Borges Paixão

Dissertação de Mestrado apresentada ao

Programa de Pós-Graduação em Letras

Vernáculas da Faculdade de Letras da

Universidade Federal do Rio de Janeiro,

como parte dos requisitos necessários à

obtenção do título de Mestre em Letras

Vernáculas, na Área de Concentração

Língua Portuguesa.

Orientador: Dinah Callou

Co-orientadora: Dolors Font-Rotchés

Rio de Janeiro

Fevereiro de 2014

Page 3: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

A prosódia das interrogativas totais na fala carioca:

fala espontânea versus leitura

Vivian Borges Paixão

Orientadora: Professora Doutora Dinah Maria Isensee Callou (UFRJ)

Co-orientadora: Professora Doutora Dolors Font-Rotchés (Universidad de Barcelona)

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Letras

(Letras Vernáculas), Faculdade de Letras, da Universidade Federal do Rio de Janeiro,

como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Letras

Vernáculas, na Área de Concentração Língua Portuguesa.

Examinada por:

______________________________________________________________

Presidente, Professora Doutora Dinah Maria Isensee Callou (UFRJ) – Orientadora

_______________________________________________________________

Professora Doutora Carolina Ribeiro Serra (UFRJ)

_______________________________________________________________

Professora Doutora Flaviane Romani Fernandes Svartman (USP)

_______________________________________________________________

Professor Doutor João Antonio de Moraes (UFRJ) – Suplente

_______________________________________________________________

Professora Letícia Rebollo Couto (UFRJ) – Suplente

_______________________________________________________________

Rio de Janeiro

Fevereiro de 2014

Page 4: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

Paixão, Vivian Borges.

A prosódia das interrogativas totais na fala carioca – fala

espontânea versus leitura/ Vivian Borges Paixão- Rio de Janeiro: UFRJ/

FL, 2014.

xiv, 141f.

Orientador: Dinah Callou

Dissertação (Mestrado) – UFRJ / Faculdade de Letras /

Programa de Pós-Graduação em Letras Vernáculas, 2014.

Referências Bibliográficas: f. 93-98.

1. Prosódia. 2. Interrogativas. 3. Fala espontânea e leitura. I.

Callou, Dinah. II. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Faculdade de

Letras, Programa de Pós-Graduação em Letras Vernáculas. III. A

prosódia das interrogativas totais na fala carioca – fala espontânea versus

leitura.

Page 5: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

"Há aqueles que se condenam ao cinzento da vida

mais medíocre porque tiveram alguma dor, alguma

desgraça; mas há também aqueles que o fazem

porque tiveram mais sorte do que podiam suportar."

Ítalo Calvino

Page 6: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

Agradecimentos

Uma dissertação de Mestrado pode, muitas vezes, passar a impressão de ser um trabalho

solitário. Para que esta dissertação fosse concluída, no entanto, muitos foram aqueles

que colaboraram comigo, e a quem dedico aqui alguns agradecimentos:

À Professora Dinah Callou, que desde a iniciação científica me deu motivação para

prosseguir com a pesquisa acadêmica.

À Professora Dolors Font-Rotchés, que acreditou em minha capacidade e me auxiliou

desde a construção do projeto desta pesquisa de Mestrado.

Aos membros da banca examinadora desta dissertação por terem aceitado o convite,

pela leitura e avaliação do trabalho, bem como pelos comentários e contribuições

vindouros. Além disso, agradeço à Professora Carolina Serra também por toda a

orientação e apoio que me deu ao longo do mestrado; e à Professora Flaviane Svartman

pela confiança depositada ao aceitar prontamente o convite mesmo sem ter

conhecimento prévio de meu trabalho.

Aos informantes e ouvintes-juízes que gentilmente aceitaram “ceder um tostão de sua

voz” (ou de seus ouvidos) para a pesquisa científica, pela disponibilidade e boa vontade

em participar das gravações e testes de percepção.

À Capes, pelo importantíssimo incentivo financeiro, já que nem só de conhecimento

vive um estudante de pós-graduação.

À Professora Silvia Brandão, minha primeira orientadora de iniciação científica,

responsável por me encaminhar no campo da pesquisa em fonética; aos professores João

Moraes e Cláudia Cunha pelas fundamentais contribuições e estímulo.

À secretária do Programa de Pós-Graduação em Letras Vernáculas, Urânia Marinho,

pela infinita paciência, e à Professora Célia Lopes, incrível como docente, como

coordenadora do PPG e como ser humano.

A meu tio José Antonio Borges, pesquisador do NCE/UFRJ, verdadeiro ídolo para mim.

Aos amigos frequentadores da sala F-312, cuja participação neste trabalho é inegável: à

minha amiga, confidente e eterna companheira de aventuras Priscila Guimarães Batista;

à amiga e parceira de empreitadas Erica Almeida; à pessoa que primeiro me apresentou

Page 7: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

ao fantástico mundo da Fonética Acústica, Luana Machado; às bolsistas de iniciação

científica Aline Farias e Ingrid Oliveira, que me prestaram tão valiosa ajuda; enfim, a

todos os professores e colegas com quem convivi no dia-a-dia da pesquisa ou no

tradicional amigo oculto de final de ano.

À querida Aline Ponciano, sempre tão prestativa e disponível nos momentos de dúvidas

– fossem elas de cunho científico ou existencial.

À amiga e colega de faculdade Thaís Seabra e ao amigo Paulo Nascimento, o Pirula

(“um sujeito chamado Pirula!”), com quem compartilhei tantos dramas de pós-

graduando; aos amigos e companheiros de mestrado Camila Duarte, Carolina Medeiros

e Thiago Laurentino; ao meu “migs” Guilherme Gonçalves, às amigas de infância

Amanda Freitas e Natália Fontam; ao querido Erick Castillo, por todo o

companheirismo; ao Gustavo Betoni, pela leitura; e à amiga de longe (mas sempre perto

do coração) Juliane Venturelli, principalmente pela atenciosa revisão do texto e

sugestões.

À Liliane Machado, minha professora, “tutora” e maior responsável pelo meu ingresso

na Faculdade de Letras.

Aos amigos e colegas do Google, por todo o aprendizado (e diversão!) que me

proporcionaram durante os seis meses em que trabalhamos no projeto Speech Data Ops:

Andréia Rauber, Carolina Souza, Felipe Iszlaji, Larissa Rinaldi, Melanie Angelo e

Vinícius Castro.

À minha família – em especial, a meus pais, Marta e Roberto, e a meu irmão, Rodrigo,

que sempre incentivaram em meus planos e projetos de vida.

A todos que me auxiliaram, no âmbito acadêmico, prático, técnico, burocrático,

financeiro ou emocional, deixo aqui meu mais sincero afeto e minha profunda gratidão.

Page 8: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

Sinopse

Análise acústica e perceptiva de interrogativas totais

na variedade carioca do português brasileiro a partir

do Método de Análise Melódica da Fala (MAS).

Comparação entre as modalidades de fala

espontânea e leitura.

Page 9: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ...................................................................................................

1. APRESENTAÇÃO DO TEMA ......................................................................

1.1. Os estudos em prosódia e suas aplicações ..................................................

1.1.1. Conceitos de prosódia e entoação ...................................................

1.1.2. A aplicabilidade dos estudos em prosódia ......................................

1.2. Estudos sobre o tema ....................................................................................

2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICO-METODOLÓGICA .............................

2.1. Pressupostos teóricos .................................................................................

2.2. O corpus ....................................................................................................

2.2.1. Seleção dos informantes ..................................................................

2.2.2. Gravação de fala espontânea ...........................................................

2.2.3. Gravação de leitura ..........................................................................

2.2.4. Seleção dos enunciados ...................................................................

2.3. Metodologia de análise ...............................................................................

2.3.1. Fase acústica ....................................................................................

2.3.1.1. Classificação dos enunciados de acordo com a inflexão final.

i. Inflexão final ascendente-descendente .........................................

ii. Inflexão final ascendente .............................................................

iii. Inflexão final de núcleo elevado (high nucleous) .......................

iv. Inflexão final descendente ..........................................................

2.3.2. Fase perceptiva ..........................................................................

3. ANÁLISE DOS DADOS .................................................................................

3.1. Análise acústica ...........................................................................................

15

18

18

18

20

22

38

38

40

42

43

44

45

46

47

51

52

53

53

54

55

60

60

Page 10: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

3.1.1. Resultados referentes à fala espontânea ..........................................

3.1.2. Resultados referentes à leitura .........................................................

3.2. Testes de percepção ....................................................................................

4. DISCUSSÃO ....................................................................................................

4.1. O predomínio da IF circunflexa e a maior nitidez de padrões na leitura .....

4.2. A influência da expressão de atitudes ..........................................................

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS .........................................................................

REFERÊNCIAS ..................................................................................................

RESUMO .............................................................................................................

ABSTRACT .........................................................................................................

Anexo 1: Ficha do informante ..............................................................................

Anexo 2: Transcrição das gravações dos jogos na íntegra ....................................

i. Informante T.S. (sexo feminino) ............................................................

ii. Informante T.M. (sexo feminino) .........................................................

iii. Informante I.O. (sexo feminino) ..........................................................

iv. Informante P.B. (sexo feminino) ..........................................................

v. Informante R.M. (sexo masculino) .......................................................

vi. Informante C.F. (sexo masculino) ........................................................

vii. Informante G.G (sexo masculino) .......................................................

viii. Informante T.A. (sexo masculino) .....................................................

Anexo 3: Formulário do teste de percepção ..........................................................

70

73

76

81

81

87

90

93

99

100

101

102

102

107

110

114

122

127

130

135

139

Page 11: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

LISTA DE FIGURAS, GRÁFICOS E TABELAS

FIGURAS

Figura 1: Padrão de final ascendente – curva de pitch e notação do enunciado

“Os garotos não se esforçam?” pronunciado como pergunta neutra (MORAES,

2006. p. 2) .............................................................................................................

Figura 2: Padrão de subida interna – curva de pitch e notação do enunciado “Os

garotos não se esforçam?” pronunciado como pergunta confirmativa

(MORAES, 2006. p. 2) .........................................................................................

Figura 3: Padrão de subida tardia – curva de pitch e notação do enunciado “Os

garotos não se esforçam?” pronunciado com atitude de descrédito (MORAES,

2006. p. 2) .............................................................................................................

Figura 4: Padrão de dupla subida – curva de pitch e notação do enunciado “Os

garotos não se esforçam?” pronunciado como pergunta retórica (MORAES,

2006. p. 2) .............................................................................................................

Figura 5: Enunciado “Renata jogava?” pronunciado como pergunta neutra

(MORAES, 2008, p. 5) .........................................................................................

Figura 6: Enunciado “Renata jogava?” pronunciado como pergunta retórica

(MORAES, 2008, p. 5) .........................................................................................

Figura 7: Enunciado “Renata jogava?” pronunciado como pergunta incrédula

(MORAES, 2008, p. 5) .........................................................................................

Figura 8: Mapa de macrorregiões dos falares brasileiros por Silva (2011) ..........

Figura 9: Frase “A pessoa que tá internada vai sair hoje?” dita por informante

jovem do sexo masculino natural do Rio de Janeiro (Silva, 2011, p. 102) ...........

Figura 10: Frase “A minha alta vai ser hoje?” dita por informante jovem do

sexo feminino natural do Rio de Janeiro (Silva, 2011, p. 102) .............................

Figura 11: Forma de onda do enunciado “Você é de, sei lá, de uma história

inventada?”, excluído da análise devido à hesitação (FE) ....................................

Figura 12: Imagem do Praat de curva de melodia sintetizada (subida de 100 a

24

24

25

26

27

28

29

34

35

36

45

Page 12: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

200 Hz) ..................................................................................................................

Figura 13: Curva estandardizada de melodia sintetizada (subida de 100 a 200

Hz) .........................................................................................................................

Figura 14: Imagem do Praat de curva de melodia sintetizada (subida de 200 a

400 Hz) ..................................................................................................................

Figura 15: Curva estandardizada de melodia sintetizada (subida de 200 a 400

Hz) .........................................................................................................................

Figura 16: Diagrama das três partes do contorno melódico segundo o MAS .......

Figura 17: Modelo de inflexão final ascendente-descendente ..............................

Figura 18: Modelo de inflexão final ascendente ...................................................

Figura 19: Modelo de inflexão final de núcleo elevado (high nucleous) ..............

Figura 20: Modelo de inflexão final descendente .................................................

Figura 21a: Imagem do Praat do enunciado original “É de uma novela?” (FE) –

forma de onda, espectrograma e curva de pitch ....................................................

Figura 21b: Imagem do Praat do enunciado original “É de uma novela?” (FE) –

forma de onda e pontos de pitch para manipulação acústica ................................

Figura 22a: Imagem do Praat do enunciado acusticamente manipulado /

ressintetizado “É de uma novela?” (FE) – forma de onda, espectrograma e

curva de pitch ........................................................................................................

Figura 22b: Imagem do Praat do enunciado acusticamente manipulado /

ressintetizado “É de uma novela?” (FE) – forma de onda e pontos de pitch

selecionados no centro de cada sílaba ...................................................................

Figura 23: Curva de pitch do enunciado “Esse personagem virou, por exemplo,

personagem de um filme?” (FE) ...........................................................................

Figura 24: Curva de pitch do enunciado “Esse personagem virou, por exemplo,

personagem de um filme?” (LE) ...........................................................................

49

50

50

50

51

52

53

54

54

56

56

57

57

85

85

Page 13: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

GRÁFICOS

Gráfico 1: Curva estandardizada do enunciado “Ele é o protagonista” (LE) .......

Gráfico 2: Classificação dos dados de fala espontânea e leitura ...........................

Gráfico 3: Enunciado “Ele envelhece no filme?” (FE) .........................................

Gráfico 4: Enunciado “As mulheres acham ele bonito?” (LE) .............................

Gráfico 5: Enunciado “Tem direito a dica?” (FE) – IF ascendente-descendente .

Gráfico 6: Enunciado “É de uma novela?” (FE) – IF ascendente .........................

Gráfico 7: Enunciado “É famoso?” (FE) – IF de núcleo elevado .........................

Gráfico 8: Enunciado “Idade Moderna?” (FE) – IF descendente .........................

Gráfico 9: Enunciado “Você é de desenho animado?” (LE) – IF ascendente-

descendente ...........................................................................................................

Gráfico 10: Enunciado “Ele é um mágico?” (LE) – IF ascendente ......................

Gráfico 11: “Ele tem vida eterna?” (LE) – IF de núcleo elevado …..................

Gráfico 12: Enunciado “Uma personagem real?” (LE) – IF descendente ............

Gráfico 13: Enunciado “Ele usa terno?” (FE) .......................................................

Gráfico 14: Enunciado “Ele usa terno?” (LE) ......................................................

Gráfico 15: Enunciado “Do nosso país?” (FE) .....................................................

TABELAS

Tabela 1: Padrões entoacionais das interrogativas do português do estado de

São Paulo (adaptado de Mendes, 2013, p. 96) ......................................................

Tabela 2: Relação dos enunciados analisados .......................................................

Tabela 3: Resultado da análise acústica – classificação dos enunciados de FE e

LE de acordo com a inflexão final ........................................................................

Tabela 4: Resultado do teste de percepção para enunciados de IF ascendente .....

Tabela 5: Resultado do teste de percepção para enunciados de IF ascendente-

descendente e de núcleo elevado ..........................................................................

48

68

69

69

71

71

72

72

74

74

75

75

83

84

89

31

61

67

77

78

Page 14: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

Tabela 6: Resultado do teste de percepção para enunciados de IF descendente ...

Tabela 7: Relação de enunciados utilizados como grupo controle .......................

Tabela 8: Média de subida da F0 na vogal tônica final por modalidade de fala e

sexo do informante ................................................................................................

79

80

86

LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

ASR – Automatic Speech Recognition (Reconhecimento Automático de Fala)

dB – decibéis

F0 – frequência fundamental

FE – fala espontânea

IPO – Institute for Perception Research (Instituto de Pesquisa em Percepção)

Hz – Hertz

IF – inflexão final

L2 – língua estrangeira

LE – leitura

MAS – Melodic Analysis of Speech Method (Método de Análise Melódica da Fala)

ms – milissegundos

PB – português do Brasil / português brasileiro

TTS – Text-to-Speech (Síntese de Fala)

s – segundos

Page 15: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

15

INTRODUÇÃO

As chamadas interrogativas totais ou questões totais são aquelas que, em termos

de estrutura sintática, se assemelham às declarativas, diferenciando-se delas apenas

através da prosódia, e podendo ser respondidas com um “sim” ou um “não”. Outros

autores referem-se a esse tipo de sentença como interrogativas absolutas (FONT-

ROTCHÉS & MATEO-RUIZ, 2011), interrogativas globais (MATA, 1992) ou

perguntas sim/não (REINECKE, 2007).

Este trabalho tem como objetivo apresentar uma análise acústica e perceptiva da

entoação das interrogativas totais na fala carioca, confrontando dados de leitura (LE)

com dados de fala espontânea (FE). Tenciona-se estabelecer padrões fonológicos para

as interrogativas totais na fala carioca, observando as diferenças (no nível fonético ou

fonológico) entre os estilos de fala aqui referidos como FE e LE, e traçar comparações

com outros trabalhos realizados sobre a prosódia no português e em outras línguas

românicas, colaborando assim para a descrição de uma gramática entoacional do

português brasileiro.

O principal aspecto que diferencia o presente trabalho de outros já realizados

sobre a prosódia das interrogativas no português brasileiro, e, mais especificamente, na

variedade do Rio de Janeiro, é a comparação sistemática entre esses dois estilos de fala

(FE e LE) e o emprego de um método diferenciado (MAS, explicitado mais adiante).

Para a pesquisa, foi utilizado um corpus elaborado com a finalidade específica de obter

interrogativas espontâneas e lidas que contivessem exatamente o mesmo conteúdo

estrutural, podendo assim ser comparadas.

Page 16: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

16

Nesse ponto, é importante fazer uma consideração sobre o uso do termo “fala

espontânea” neste trabalho. Chamamos aqui de fala espontânea uma amostra, composta

especificamente para esta pesquisa, em que os informantes são induzidos,

indiretamente, a produzir determinado tipo de enunciado (interrogativas). É possível

questionar o grau de espontaneidade desse corpus, que poderia também ser definido

como de fala semiespontânea – por não ser tão espontâneo quanto, por exemplo, uma

conversação livre. No entanto, entende-se que o grau de espontaneidade /

monitoramento da fala não é uma categoria dicotômica, e sim um continuum, havendo,

nas diversas situações de fala, inumeráveis gradações nesse aspecto. Sabe-se, por

exemplo, que nem mesmo na entrevista sociolinguística típica a espontaneidade da fala

é total, como salienta Labov (1972) ao tratar do paradoxo do observador. Tendo em

mente esse continuum e levando em conta outros trabalhos que estudaram a entoação

em dados de fala semiespontânea, como o de Silva (2011), optou-se, por comparação,

por chamar de espontânea a fala dos participantes do jogo de adivinhação.

A dissertação está organizada da seguinte maneira: no primeiro capítulo, faz-se

uma breve apresentação do tema: na seção 1.1, são revistos os conceitos de prosódia e

entoação (1.1.1) e discorre-se sobre as possibilidades de aplicação prática dos estudos

na área de prosódia (1.1.2). Já na seção 1.2, é feita uma revisão dos trabalhos acerca da

prosódia das interrogativas e da comparação entre FE e LE no português do Brasil

utilizados como fonte de estudo para a realização desta pesquisa.

No segundo capítulo, apresenta-se a fundamentação teórico-metodológica do

trabalho. Incluem-se aqui os pressupostos teóricos que fundamentam a pesquisa (seção

2.1), a descrição detalhada do corpus (seção 2.2) e da metodologia empregada – O

Método de Análise Melódica da Fala (seção 2.3). Esse método divide-se nas fases de

Page 17: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

17

análise acústica e perceptiva dos dados, cujos procedimentos são descritos nas

subseções 2.3.1 e 2.3.2, respectivamente.

Em seguida, no capítulo 3, apresentam-se os resultados das análises dos dados,

tanto de FE quanto de LE: os resultados da etapa acústica da análise encontram-se na

seção 3.1 e os resultados do teste de percepção estão na seção 3.2.

No quarto capítulo, discutem-se os resultados da análise, comparando-se as duas

modalidades estudadas. Ainda neste capítulo, na seção 4.2, são feitas considerações

sobre a influência da expressão de atitudes motivadas por situações pragmático-

discursivas muito específicas no contorno melódico dos enunciados analisados.

Por fim, no capítulo 5, são apresentadas algumas considerações finais sobre a

pesquisa e os resultados obtidos.

Page 18: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

18

1. APRESENTAÇÃO DO TEMA

1.1. Os estudos em prosódia e suas aplicações

1.1.1. Conceitos de prosódia e entoação

Em seu livro, em preparação, Introdução à Prosódia, Moraes esclarece que o

termo “prosódia” surge na língua portuguesa em fins do século XVIII, com um sentido

bastante amplo que engloba todos os meios fônicos usados para a acentuação na

linguagem, bem como a representação gráfica dessas características na escrita. O termo

adquiriu também uma acepção mais específica, referente à métrica do verso, ou seja, à

musicalidade da linguagem poética (metrificada). Atualmente, nos estudos em

linguística, a prosódia é a parte da fonética / fonologia que diz respeito aos aspectos

suprassegmentais, isto é, os elementos da fala que não podem ser submetidos à

segmentação em fones ou fonemas, representados na escrita pelos grafemas ou letras.

O aspecto segmental da fala depende da diferenciação dos fonemas de uma

língua entre si. Já a prosódia diz respeito a questões como melodia, ritmo, velocidade e

volume, ou seja, à configuração “musical” que se dá à cadeia de fones. Embora os

aspectos segmental e suprassegmental da linguagem possam ser estudados

separadamente, estão intrinsecamente relacionados, sendo elementos constitutivos de

todos os enunciados das línguas naturais.

Tanto os aspectos segmentais quanto os suprassegmentais da fonética e

fonologia de uma língua podem ser estudados através da observação precisa, por meio

de ferramentas computacionais, das ondas sonoras. Em termos físicos, isto é, no que

Page 19: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

19

concerne às ondas acústicas, são quatro os parâmetros que se podem analisar para

estudar os sons da fala: a altura melódica, auferida através da frequência fundamental

(F0) e cuja unidade de medida são os Hertz (Hz); a intensidade ou volume, que consiste

na amplitude da onda e é medida em decibéis (dB); a duração, medida em unidades de

tempo como segundos (s) ou milissegundos (ms); e o timbre, de verificação um pouco

mais complexa, uma vez que se refere à qualidade ou textura de cada som e depende da

configuração das várias frequências simples que formam uma onda complexa (por isso

mesmo chamadas frequências formantes, ou simplesmente formantes). Este último

parâmetro é mais utilizado na fonética para o estudo das vogais, que diferem entre si

pelas frequências formantes. Já para o estudo dos fenômenos prosódicos, observam-se

os parâmetros de altura, intensidade e duração.

Se o termo “prosódia” engloba todos os aspectos não segmentáveis dos sons da

fala, o termo “entoação” diz respeito, mais especificamente, às modulações da altura

melódica ao longo dos enunciados. Desde o início do século XX, diversos estudiosos já

teorizaram acerca das funções que a entoação desempenha na linguagem. Em seu Traité

de phonetique, Grammont (1946) estipula três funções básicas para a entoação: a função

idiossincrática, que diferencia línguas; a função expressiva, que expressa emoções do

falante; e a função modal, que diferencia tipos de frases (afirmações de perguntas, por

exemplo). Posteriormente, vários outros autores como Frantiseck Danes (1960), Hist &

DiCristo (1998), Couper-Khulen (1986), Fónagy (1981, 1993), Ladd (1996) e

Hirschberg (2002), estipularam funções para a prosódia, com maior ou menor grau de

especificidade em suas categorizações, mas sempre abarcando uma face linguística

(relacionada ao significado do enunciado propriamente dito) e uma face não linguística

(relacionada a questões pragmático-situacionais e a características individuais do

falante) da entoação.

Page 20: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

20

Vale observar que nos ativemos, aqui, a uma conceituação de prosódia calcada

nos correlatos acústicos. Dentro de uma perspectiva fonológica, autores como Selkirk

(1984) e Nespor & Vogel (1986; 1994) estudam a prosódia do ponto de vista de seus

domínios, isto é, da hierarquização da estrutura fonológica, caracterizando uma

abordagem mais abstrata dos fenômenos prosódicos.

1.1.2. A aplicabilidade dos estudos em prosódia

Tendo em vista o papel fundamental desempenhado pela entoação na

comunicação humana – seja determinando diretamente a modalidade da frase ou

agregando nuances expressivas a ela –, é possível afirmar que, dentre os quatro

parâmetros acústicos, a altura, mensurada através da frequência fundamental (F0), é

aquele mais comumente observado nos estudos sobre a prosódia da fala.

A grande importância da entoação na construção de sentido dos enunciados faz

com que os estudos na área da prosódia tenham aplicabilidade prática em diferentes

âmbitos. No ensino de língua estrangeira (L2), esse é um aspecto frequentemente

negligenciado, embora o valor da contribuição desses estudos para o processo de

ensino-aprendizagem de L2 já tenha sido estudado em várias línguas, como mostram,

por exemplo, Gilbert (2008) e Miller (2002), no caso do inglês. Mendes (2013, p.14)

assim justifica a necessidade de um olhar mais atento à entoação pelos professores de

língua estrangeira:

“[...] ainda que o aluno de LE acredite que sua identidade como estrangeiro

esteja expressa em sua fala e, por uma questão patriótica, não queira

utilizar a mesma entonação que um nativo da língua, os problemas

Page 21: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

21

relacionados à entonação e/ou à pronunciação de determinada frase são

reais e afetam as relações interpessoais na relação cotidiana da língua.

Assim, mesmo que o aluno tenha um bom desempenho na gramática e

saiba utilizar bem o léxico da língua-alvo, sem a entonação correta, seu

interlocutor nativo pode não conseguir identificar sua real intenção

comunicativa, o que irá gerar inúmeros mal-entendidos.”

Dentre os inúmeros trabalhos sobre prosódia que visam a melhorias no ensino de

línguas, estão aqueles vinculados ao projeto Modelos de Entonação de Espanhol e

Português para o Ensino de Língua, ao qual se relaciona o presente trabalho, na medida

em que utiliza a mesma metodologia de pesquisa e colabora para uma descrição acústica

do português do Brasil. Esse projeto foi desenvolvido em três países, Brasil, Espanha e

Cuba, sob a coordenação geral do Professor Doutor Francisco José Cantero Serena, da

Universidade de Barcelona, e tendo como coordenador íbero-americano e brasileiro o

Professor Doutor Enrique Huelva Unternbäumen, da Universidade de Brasília.

O caráter interseccional entre a linguística e a música que se faz notar na própria

etimologia do termo “prosódia” faz com que os estudos nessa área tenham também

aplicações no campo das artes – tanto como instrumento de interpretação da obra pelo

ouvinte quanto como ferramenta de aprimoramento de performance, como mostra

Mattos (2006) em estudo sobre a música popular brasileira. No que tange à prosódia da

fala, a linguística conversa também com as ciências da saúde, na medida em que os

estudos nessa área também são aplicados à reeducação de voz e terapia fonoaudiológica.

Um bom panorama geral sobre o tema está em Levitt (1993), que estuda a aquisição de

padrões prosódicos em crianças com transtorno de fala a partir da análise dos

parâmetros de frequência, duração e intensidade.

Além disso, é notável a aplicabilidade dos estudos sobre a entoação no

desenvolvimento de novas tecnologias de fala, como os sistemas de síntese – Text-to-

Page 22: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

22

Speech (TTS) – e os de reconhecimento automático de fala – Automatic Speech

Recognition (ASR) –, revelando um ponto de diálogo entre a ciência linguística e as

ciências da computação / engenharia de software. O desenvolvimento desse tipo de

sistema envolve diferentes áreas da linguística, como a fonologia (inclusive no nível

segmental), a sintaxe e a lexicologia; mas destaca-se o aspecto prosódico, uma vez que

o reconhecimento e reprodução automáticos dos diferentes padrões prosódicos de uma

língua ainda são um grande desafio. A literatura sobre o tema não se restringe às

publicações oriundas da pesquisa acadêmica em linguística, mas também inclui diversos

artigos resultantes do trabalho de desenvolvimento desse tipo de sistemas. Dentre outros

autores importantes, pode-se citar Hirschberg, que já estudou a automatização de

realização de fronteiras prosódicas em sistemas de TTS (HIRSCHBERG, 1991;

HIRSCHBERG & PIETRO, 1994); e mais recentemente a percepção e produção de

emoções humanas aplicadas às tecnologias de fala (HIRSCHBERG, 2002; 2003). Vale

mencionar também os trabalhos de Stergar & Erdem (2010) que apresentam uma

proposta de adaptação e aplicação de padrões prosódicos das línguas naturais para TTS;

e Ostendorf et al (2003), que sugerem a aplicação de modelos prosódicos nos sistemas

de ASR no sentido de tentar aumentar sua acurácia com inputs de fala espontânea.

1.2. Estudos sobre o tema

A literatura sobre a prosódia do português brasileiro vem crescendo bastante

desde a década de 70, já contando com um volume considerável de pesquisas sobre

diversas variedades e sob diferentes escopos teóricos. Essa diversidade de abordagens,

notações e terminologias é justamente o que Tenani (2002) ressalta como sendo uma

Page 23: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

23

“dificuldade em se constituir urna descrição do que possa ser denominado de 'gramática

entoacional' do PB” (p. 14).

Há um conjunto de trabalhos ligado à tradição britânica de modelos entoacionais

preconizada por Halliday (1970), dentre os quais pode-se mencionar, principalmente, os

de Geabra (1976), Cagliari (1981) e Rizzo (1981). Já os trabalhos de Moraes (1982;

1984; 2006; 2008) e seus orientandos, como Cunha (2000), representam outro conjunto

importante de análises, que se relacionam com a escola francesa de análise entoacional

proposta por Fónagy (1981; 1993). Mais recentemente, trabalhos que utilizam o modelo

de hierarquia prosódica de Nespor & Vogel (1986; 1993), relacionados à percepção de

fronteiras prosódicas e a interface sintaxe-prosódia vêm sido desenvolvidos, como os de

Freitas (1995), Frota & Vigário (1999; 2000), Frota (2011), Tenani (2002), Fernandes

(2007) e Serra (2009).

Diversos trabalhos já foram realizados acerca da prosódia das interrogativas no

português brasileiro, com enfoques teóricos e tipos de corpus diferentes.

Cagliari (1981), ao analisar os contornos entoacionais do português brasileiro,

classifica-os como simples (descendente, ascendente, nivelado) ou complexos, isto é,

quando combinam mais de uma característica dos contornos simples. O autor estabelece

o padrão ascendente como típico das interrogativas totais, caracterizadas por um ataque

e corpo em nível médio e um ascenso final. Há ainda um padrão para a interrogativa

com expressão de surpresa, que conta com uma subida antes da última sílaba tônica,

mas, ainda assim, conserva a inflexão final ascendente.

O trabalho de Moraes (2006), cujo corpus consiste em enunciados isolados

gravados em laboratório, é uma importante referência na área, e revela quatro padrões

diferentes para as questões totais no PB, a saber:

Page 24: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

24

(i) padrão de final ascendente, tipicamente associado com interrogativas totais neutras,

isto é, perguntas para as quais o falante não tem uma resposta esperada. Esse padrão

caracteriza-se por um onset de nível médio sobre a última sílaba tônica (Figura 1).

Figura 1: Padrão de final ascendente – curva de pitch e notação do enunciado “Os garotos

não se esforçam?” pronunciado como pergunta neutra (MORAES, 2006. p. 2)

(ii) padrão de subida interna, associado a perguntas confirmativas, isto é, para as quais

se espera uma resposta positiva do falante (concordando com o conteúdo proposicional

da sentença). Esse padrão caracteriza-se por uma subida em um nível melódico alto na

primeira sílaba tônica, com uma subida contínua ao longo do enunciado, incluindo a

sílaba pré-tônica final, com queda na sílaba tônica final (Figura 2).

Figura 2: Padrão de subida interna – curva de pitch e notação do enunciado “Os garotos

não se esforçam?” pronunciado como pergunta confirmativa (MORAES, 2006. p. 2)

Page 25: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

25

(iii) padrão de subida tardia, associado à atitude de descrédito ou dúvida em relação ao

que foi dito pelo interlocutor, e, portanto, sugerindo discordância com conteúdo

proposicional da sentença. O que distingue esse padrão é o fato de que a subida

melódica na última sílaba tônica só se inicia no seu segundo terço, criando uma subida

de formato ligeiramente côncavo (Figura 3). Embora o autor categorize os padrões (i) e

(iii) separadamente, devido à expressão de atitude, é possível questionar se a diferença

entre essas duas melodias está no nível fonético ou fonológico, uma vez que os padrões

são bastante parecidos.

Figura 3: Padrão de subida tardia – curva de pitch e notação do enunciado “Os garotos

não se esforçam?” pronunciado com atitude de descrédito (MORAES, 2006. p. 2)

(iv) padrão de dupla subida, que ocorre em diversas situações discursivas, dentre as

quais estão pedidos e perguntas que carregam uma intenção retórica com uma resposta

esperada no sentido oposto do conteúdo proposicional da sentença. Esse padrão é

caracterizado por uma subida na primeira sílaba tônica e uma segunda subida, mais

fraca, antes da última sílaba tônica, onde se inicia o descenso final (Figura 4).

Page 26: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

26

Figura 4: Padrão de dupla subida – curva de pitch e notação do enunciado “Os garotos

não se esforçam?” pronunciado como pergunta retórica (MORAES, 2006. p. 2)

No tocante à metodologia de pesquisa, é importante mencionar que Moraes

(2006; 2008) utiliza também o recurso da ressíntese para fazer uma descrição fonética e

análise fonológica de alguns contornos melódicos relacionados a expressões de atitude

no português do Brasil (PB). A partir dos resultados obtidos na análise dos dados,

sentenças originalmente pronunciadas como declarativas são manipuladas

acusticamente a fim de se encaixarem nos padrões estabelecidos para os diferentes tipos

de perguntas, e posteriormente submetidas a testes de percepção no intuito de confirmar

a validade dos resultados.

O autor mostra que o contorno prosódico do enunciado varia significativamente

de acordo com a intenção comunicativa do falante, ou seja, a expressão de atitudes e a

polaridade da pergunta, isto é, a expectativa por uma resposta positiva ou negativa. Em

trabalho posterior (MORAES, 2008), em que analisa uma grande variedade de

contornos melódicos do PB, o autor enquadra todos os tipos de perguntas sim/não

estudadas (neutra, retórica e incrédula) em um mesmo grupo geral, o de contornos

ascendentes, e distinguindo-as a partir da sua configuração interna, como detalhado a

seguir:

Page 27: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

27

(i) pergunta sim/não neutra: caracterizada por uma subida melódica na primeira sílaba

tônica, situada em nível médio, ligeiramente mais alto do que o observado em

afirmativas. Essa subida costuma atingir a sílaba pós-tônica e é seguida por uma queda

contínua até a sílaba pré-tônica final, situada em nível baixo, e por uma subida na sílaba

tônica final, caindo novamente nas eventuais sílabas pós-tônicas (Figura 5).

Figura 5: Enunciado “Renata jogava?” pronunciado como pergunta neutra (MORAES,

2008, p. 5)

Os testes perceptivos revelaram que, fonologicamente, o acento nuclear é que determina

o contraste entre este tipo de sentença e as assertivas, de forma que a tendência a um

nível mais alto no acento pré-nuclear das perguntas é considerada uma variação do

contorno padrão. Por outro lado, o que diferencia este tipo de contorno do das perguntas

retóricas ou pedidos, como será visto seguir, é a subida melódica entre a sílaba pré-

tônica e a tônica finais, alinhada tardiamente, à margem direita da vogal tônica.

(ii) pergunta sim/não retórica: foneticamente, tem comportamento similar ao dos

pedidos, apresentando a sílaba pré-tônica em nível baixo, subida na sílaba tônica final e

queda na(s) sílaba(s) pós-tônicas. O que diferencia esse contorno daquele das perguntas

Page 28: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

28

totais neutras é que o pico de F0 na última sílaba tônica está localizado no começo da

vogal, e não no final, o que faz com que sua configuração intrassilábica seja

descendente, em vez de ascendente. Além disso, outros dois pontos distinguem os

padrões de pergunta neutra e retórica: a subida final atinge um nível mais alto na

pergunta neutra, e a primeira sílaba tônica está em nível muito mais alto na pergunta

retórica ou pedido, revelando similaridade com as perguntas parciais (Qu-) (Figura 6).

Figura 6: Enunciado “Renata jogava?” pronunciado como pergunta retórica (MORAES,

2008, p. 5)

Os testes de percepção mostraram que a forma descendente da última sílaba tônica é que

distingue este padrão daquele das perguntas neutras. O alinhamento do pico de F0 é,

portanto, relevante para a caracterização desse padrão melódico, bem como o acento

pré-nuclear em nível alto, similar ao das perguntas Qu-.

(iii) pergunta sim/não incrédula: distingue-se da pergunta neutra por quatro aspectos: (a)

a sílaba pré-tônica final em nível mais alto, (b) uma subida tardia na sílaba tônica final,

que começa na segunda metade da vogal, (c) um nível mais baixo no final da última

sílaba tônica e (d) um maior prolongamento dessa sílaba. Em ambos os padrões, o pico

de F0 na sílaba tônica final está alinhado à margem direita da vogal tônica (Figura 7).

Page 29: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

29

Figura 7: Enunciado “Renata jogava?” pronunciado como pergunta incrédula

(MORAES, 2008, p. 5)

Os testes de percepção revelaram que nem o prolongamento nem o nível melódico mais

baixo na vogal tônica são relevantes para a identificação fonológica deste padrão. O que

de fato o diferencia dos outros padrões é a presença de um vale na primeira metade da

vogal tônica final, e secundariamente pela vogal pré-tônica final em nível alto.

Ainda no que concerne a trabalhos sobre a entoação das interrogativas totais, é

importante mencionar aqueles que utilizam o mesmo método aqui empregado. Os

autores Cantero & Font-Rotchés, desenvolvedores do Método de Análise Melódica da

Fala (MAS, cf. seção 2.3), bem como outros professores e estudantes ligados ao mesmo

grupo de pesquisa, têm publicados trabalhos acerca dos padrões prosódicos de diversos

tipos de sentenças em diferentes línguas; visando, principalmente, à aplicação dos

estudos no aprimoramento do ensino de línguas estrangeiras. No catalão, Font-Rotchés

(2008) utiliza corpus extraído de programas de debate na televisão, e estabelece três

padrões diferentes para as interrogativas absolutas. No espanhol, Font-Rotchés &

Mateo-Ruiz (2011) utilizam a mesma metodologia, e fazem uma análise detalhada das

interrogativas totais (absolutas), estabelecendo cinco diferentes padrões para esse tipo

de pergunta.

Page 30: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

30

Em trabalho recente, Cantero & Font-Rotchés (2013) descrevem, de um ponto

de vista fonético, três padrões de interrogativas totais (absolutas) obtidas de um corpus

do estado de Goiás. Os padrões observados foram os de inflexão final (IF) ascendente,

IF ascendente-descendente e IF de núcleo elevado (high nucleous final inflection) –

todos encontrados também nos dados desta pesquisa, e descritos mais detalhadamente

na subseção 2.3.1.1. No trabalho sobre as interrogativas no estado de Goiás, foi

realizada a análise e estandardização de 55 enunciados, além da verificação da validade

dos resultados com um teste de percepção.

De todos os 55 enunciados analisadas, 45 se enquadraram nos padrões acima

relacionados. Os outros dez dados fazem parte do grupo de sentenças que, na segunda

fase da pesquisa, não foram reconhecidas pelos juízes como interrogativas quando

ouvidas de forma descontextualizada. Assim, foram contabilizadas na análise dos três

tipos de contorno apenas 45 enunciados. Dentre estas, 37,8% apresentaram o contorno

de IF ascendente, 33,3% o de IF ascendente-descendente e 28,9% o de IF de núcleo

elevado.

Mendes (2013), pertencente ao mesmo grupo de pesquisa de Cantero & Font-

Rotchés, estudou as interrogativas no estado de São Paulo a partir de um corpus de fala

espontânea retirado de programas de televisão do tipo reality show, como o Big Brother

Brasil. A autora encontrou cinco padrões diferentes para os 140 enunciados analisados,

sendo três deles classificados como padrões /+ interrogativos/ e dois como /-

interrogativos/, isto é, perguntas relativas, que necessitam de outros elementos da língua

para serem reconhecidas como interrogativas. Os padrões /+ interrogativos/ são os de IF

ascendente, IF com núcleo elevado (podendo ser de corpo plano ou corpo ascendente) e

IF ascendente-descendente. Os padrões /- interrogativos/ são os de IF ascendente e IF

plana. A autora sintetiza os padrões encontrados para a variedade paulista no quadro a

Page 31: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

31

seguir (Tabela 1), e ressalta que “seis enunciados analisados (4,3%) não comportavam

características de nenhum dos padrões apresentados nesse trabalho, porém, sua análise

tampouco incorreu em um novo padrão” (p. 97).

Padrões Representação Enunciados %

/+I/

(1) IF

ascendente

(+20% ~

+30%)

35 25%

(2a) IF com

núcleo

elevado e

corpo plano

28 20%

(2b) IF com

núcleo

elevado e

corpo

ascendente

5 3,6%

(3) IF

ascendente-

descendente

15 10,7%

/-I/

(4) IF

descendente

(-20% ~ -

40%)

20 14,3%

Page 32: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

32

(5) IF plana

(-15% ~

+15%)

31 22,1%

Tabela 1: Padrões entoacionais das interrogativas do português do estado de São Paulo

(adaptado de Mendes, 2013, p. 96)

No escopo da geolinguística, há trabalhos que trazem importantes contribuições

para o estudo da entoação das interrogativas no PB. São importantes referências os

trabalhos de Cunha (2000, 2006), utilizando o corpus de fala espontânea do projeto

Norma Urbana Culta (NURC) e um corpus de leitura complementar; e, posteriormente,

utilizando o corpus de fala semiespontânea do projeto Atlas Linguístico Brasileiro

(ALiB), coletado a partir de um questionário realizado em diversas cidades brasileiras.

A autora faz uma descrição geral dos diferentes padrões frasais do PB, incluindo todos

os tipos de sentença, e, assim como no presente trabalho, realiza uma comparação entre

fala espontânea e leitura. A autora encontra diferenças significativas nos movimentos

tonais que ocorrem no interior dos enunciados nas diferentes regiões do Brasil,

estabelecendo uma clara oposição entre as capitais do nordeste e as do sul. Além disso,

mostraram-se interessantes as diferenças observadas entre fala espontânea e leitura, em

especial no Rio de Janeiro: nessa cidade, a análise dos dados de FE teve resultados

similares àqueles obtidos para São Paulo, enquanto os dados de LE aproximaram-se

mais da fala das capitais nordestinas.

A tese de Lira (2009) também é uma importante referência no que diz respeito à

entoação regional do PB, e, em especial, das interrogativas. A autora faz uso de outro

corpus de fala semiespontânea, o do Projeto Internacional AMPER, e descreve o

Page 33: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

33

comportamento da frequência fundamental em enunciados assertivos, questões parciais,

disjuntivas e totais em cinco localidades do nordeste brasileiro. Com relação às questões

totais nas cinco localidades estudadas (Recife, Fortaleza, Salvador, João Pessoa e São

Luís), a autora encontra algumas diferenças nos movimentos tonais da segunda parte do

enunciado (a partir do acento nuclear até o final do enunciado). Essas diferenças, no

entanto, não podem ser muito claramente atribuídas à variação regional, já que as

diferentes variações do padrão interrogativo total se alternam em uma mesma cidade.

As duas possibilidades de realização do contorno melódico final encontradas são (i)

sílaba tônica final alta seguida de postônica baixa e (ii) sílaba tônica baixa seguida de

postônica alta., sendo este último desdobrado em duas subvariações, que se apresentam

em proporções diferentes nas cidades estudadas: o início da subida final pode estar na

tônica (alinhado mais à esquerda) ou na postônica (alinhado mais à direita).

Tendo em vista o objeto de estudo desta pesquisa, dentre os trabalhos realizados

sobre a prosódia na perspectiva da variação regional, destaca-se o de Silva (2011), que

integra o projeto ALiB e descreve, a partir do corpus do referido projeto, a entoação das

interrogativas totais em 25 capitais brasileiras. A autora estabelece padrões específicos

para cada uma das capitais estudadas e traça uma linha imaginária que divide o mapa do

Brasil em duas grandes macrorregiões dialetais no que concerne à entoação das

interrogativas totais. Essa divisão corresponde em parte àquela estabelecida por Antenor

Nascentes no início do século XX, e consiste em dois grandes grupos de falares: a

região que engloba o norte e nordeste do país, caracterizada por um contorno de acento

nuclear ascendente, e a região que engloba o centro-oeste, sudeste e sul do Brasil, de

acento nuclear descendente e padrão circunflexo (cf. Figura 8).

Page 34: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

34

■ Regiões norte e nordeste:

Acento nuclear ascendente

■ Regiões centro-oeste, sudeste e sul:

Acento nuclear descendente

Padrão ascendente Padrão circunflexo

L+H* ___L+!H*H L+!H*___L+H*L

Figura 8: Mapa de macrorregiões dos falares brasileiros por Silva (2011, p. 126)

No que se refere especificamente à fala do Rio de Janeiro, a autora encontrou a

seguinte configuração para as questões totais: pico inicial na primeira sílaba tônica

seguido de uma descida ao longo do enunciado e uma inflexão final circunflexa. Essa IF

é subdividida pela autora em dois tipos, podendo contar com um pico melódico

antecipado seguido de uma descida ou com um movimento de subida seguido de pico

melódico atrasado. Em ambos os casos, o que caracteriza o segundo pico (aquele

Page 35: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

35

referente ao acento nuclear) é que este alcança valores de F0 mais altos do que os do

primeiro pico.

Os dois tipos de contornos encontrados para o dialeto carioca estão ilustrados

nas figuras 9 e 10, a seguir, que representam a curva melódica das sentenças “A pessoa

que tá internada vai sair hoje?” e “A minha alta vai ser hoje?”. Ambos os enunciados

possuem o pico inicial na primeira sílaba tônica e o pico da última sílaba tônica mais

proeminente que o primeiro. A diferença é que, na primeira frase, há um movimento de

subida com o pico melódico à direita dessa sílaba (pico atrasado), e na segunda o pico

ocorre no início da tônica, seguido por um movimento de descida.

Figura 9: Frase “A pessoa que tá internada vai sair hoje?” dita por informante jovem do

sexo masculino natural do Rio de Janeiro (Silva, 2011, p. 102)

Page 36: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

36

Figura 10: Frase “A minha alta vai ser hoje?” dita por informante jovem do sexo feminino

natural do Rio de Janeiro (Silva, 2011, p. 102)

Podem-se citar ainda outros trabalhos que contribuem para uma visão geral

sobre o tema da prosódia das interrogativas. No português europeu, Mata (1992)

descreve três tipos de contornos (descendente, ascendente e estacionário), registrados

em proporções diferentes entre as interrogativas – estas se dividem em perguntas

globais, parciais, alternativas e confirmativas. O trabalho, que se dá no escopo da

Fonologia Prosódica, demonstra que há uma significativa variedade de contornos entre

as interrogativas. Há ainda trabalhos que tratam da prosódia (inclusive das

interrogativas) do ponto de vista da aprendizagem e transferência linguística em língua

estrangeira (Pinto, 2009) e do contato entre línguas (Santos, 2008).

No que se refere especificamente às interrogativas na fala espontânea do Rio de

Janeiro, encontramos apenas o trabalho resultante de pesquisa de iniciação científica de

Souza (1995), que utiliza o corpus do projeto NURC para analisar três tipos de

perguntas (totais, disjuntivas e parciais). Quanto às perguntas totais, os resultados

Page 37: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

37

obtidos apontam diferenças em relação àquelas produzidas em contexto de leitura,

analisadas por Moraes (1984). O trabalho de Souza mostra que, no contexto de FE, as

interrogativas não seguem um padrão melódico tão regular quanto as produzidas em

contexto de LE, e dá margem a uma investigação mais aprofundada acerca de quais

seriam os fatores determinantes dessas diferenças.

Page 38: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

38

2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICO-METODOLÓGICA

2.1. Pressupostos teóricos

A partir de enfoques teóricos como o da escola holandesa – a teoria conhecida

como IPO (sigla para Institute for Perception Research), apresentada em t’Hart, Collier

& Cohen (1990) –, desenvolveu-se toda uma linha de análise da entoação a partir de

uma perspectiva instrumental e perceptiva que visa à objetividade da descrição. De

acordo com a IPO, os contornos melódicos são idealizados como sequências de

movimentos de pitch e conexões entre segmentos pontuais na linha melódica. O modelo

assume que alguns movimentos de pitch são interpretados como relevantes pelo

ouvinte, e que tais movimentos são gerados por comandos discretos que o cérebro do

falante envia às cordas vocais e que, portanto, devem ser recuperáveis pelo ouvinte a

partir de eventos discretos no contorno melódico. Assim, de acordo com a teoria, a

variação que ocorre na linha melódica ao longo de um enunciado consiste basicamente

na diferença entre tons relativamente baixos e tons relativamente altos. Essa noção de

distinção básica entre tons altos e baixos é que sustenta o sistema binário de análise de

tons melódicos defendido por Pierrehumbert (1980) na Teoria Autossegmental.

O arcabouço teórico em que se constrói a IPO inspira um método cujos

pormenores procedimentais podem variar, mas que consiste essencialmente em aferir a

F0 do sinal acústico e reduzir a curva tonal resultante aos movimentos essenciais,

aqueles que dão origem a uma curva estilizada, que deve passar por testes de percepção

para que seja validada como um padrão fonológico de entoação.

Page 39: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

39

O presente trabalho toma por base Método de Análise Melódica da Fala (MAS),

cujos procedimentos se enquadram nessa descrição geral, e serão abordados de forma

mais detalhada na seção 2.3. Essa metodologia de trabalho constitui-se a partir de

alguns pressupostos teóricos básicos que se aproximam da Teoria Autossegmental e

Métrica formalizada por Ladd (1996), na medida em que enxergam os sons da fala

como uma cadeia hierarquicamente organizada. O elemento central dessa hierarquia,

núcleo da fonação e do discurso, sempre é uma vogal, o único som cuja F0 é controlada

conscientemente pelo falante e ao redor do qual se organizam os demais sons da fala

(consoantes e glides). A vogal (tônica ou átona) é o núcleo da sílaba, a vogal tônica é o

núcleo da palavra e a vogal tônica em que se identifica a inflexão final é o núcleo do

enunciado, tendo papel definitivo na caracterização dos padrões melódicos.

A pressuposição dessas ideias acerca da hierarquia fônica fica clara na

metodologia empregada para análise dos dados no MAS, que se utiliza do conceito de

segmento tonal. Segmento tonal é cada valor de F0 considerado relevante para a

melodia. Uma vez que o som mais importante do discurso é sempre a vogal, núcleo de

cada unidade fônica (sílaba, grupo rítmico, grupo fônico), é evidente que o valor de F0

da vogal será mais relevante que o de qualquer outro som, como um glide ou consoante

sonora. Isso é ainda mais evidente no caso das vogais tônicas, que conservam sua

identidade tímbrica, enquanto as átonas são muitas vezes neutralizadas.

Assim, na análise melódica de um enunciado segundo o MAS, o que interessa

são os valores vocálicos, exclusivamente, cada um dos quais constitui um segmento

tonal da melodia. Somente em casos em que a duração da vogal é significativamente

maior, permitindo a percepção de um movimento de subida ou descida melódica que

também deve ser significativo, é que se considera que a vogal constitui não um, mas

dois segmentos tonais.

Page 40: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

40

Outro pressuposto teórico que alicerça o método é a distinção fundamental entre

F0, melodia e entoação: a F0 é o parâmetro físico em que se baseia a percepção do tom,

e por tanto informa os variados fenômenos linguísticos como o acento e a entoação. A

sucessão de valores de F0 em um enunciado ou discurso constitui uma melodia na qual

devem estar incluídos os traços tonais que formam tanto o acento quanto a entoação. A

melodia, desse modo, não equivale diretamente à entoação: esta última é um fenômeno

linguístico, enquanto a primeira é um fenômeno físico – uma relação paralela àquela

existente entre fonema e fone: um é uma unidade abstrata e funcional, enquanto o outro

é uma unidade física. Assim, pode-se afirmar que a entoação é a interpretação

linguística na melodia. Em outras palavras, a análise da melodia é uma análise fonética,

enquanto a análise da entoação é uma análise fonológica. Embora a diferença entre

fonética e fonologia não resida na dicotomia da produção (e realização física da fala) e

percepção; no método, essa diferenciação acaba coincidindo com as duas etapas de

trabalho: a primeira, de análise acústica (física) dos enunciados e a segunda, de análise

da percepção dos ouvintes quanto aos enunciados estudados, que determina a relevância

fonológica das diferenças entre os contornos melódicos.

2.2. O corpus

As pesquisas na área da prosódia costumam enfrentar algumas dificuldades no

que concerne à coleta de dados, em especial quando se deseja analisar a fala espontânea.

Para que a análise acústica, feita através de software especializado, seja satisfatória, a

qualidade das gravações deve atender a um padrão técnico relativamente alto.

Infelizmente, a maior parte das gravações dos grandes corpora de fala disponíveis,

como as do projeto Norma Urbana Culta (NURC), apresenta ruídos e sobreposição de

Page 41: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

41

falas que comprometeriam a análise, e, portanto, não pode ser aproveitada para esse tipo

de estudo.

Levando-se em conta o objetivo desta pesquisa específica, há outro problema

que impede o uso dos corpora de fala gerais: em geral, estes são compostos por

entrevistas entre informante e documentador, e dificilmente ocorrem interrogativas, e

ainda menos frequentemente interrogativas totais. Além disso, o objetivo de se

comparar fala espontânea (FE) com leitura (LE) exige que se disponha de duas amostras

similares – ou seja, cujos dados sejam estruturalmente idênticos – mas que difiram

quanto à modalidade de fala (FE e LE). Em virtude dessas particularidades, fez-se

necessária a coleta de uma nova amostra.

Para a obtenção das interrogativas na modalidade de fala espontânea, é preciso

que os informantes estejam inseridos em uma situação comunicativa particular que

favoreça o aparecimento de perguntas. Elaborou-se, para tanto, um jogo de adivinhação

em que os participantes interagem fazendo perguntas um ao outro, como explicaremos

com mais detalhes adiante. A ideia é inspirada na estratégia adotada por Pinto (2009),

de sugerir aos informantes um “jogo da verdade”. O método chamou atenção por se

tratar de uma situação lúdica, que propicia uma fala mais descontraída e menos

monitorada por parte dos informantes e ao mesmo tempo os impele a produzir o tipo de

enunciado desejado para a análise.

A proposta de um jogo permitiu a obtenção dos dados de fala espontânea. Para a

obtenção dos dados de leitura, adotou-se uma estratégia similar à de Serra (2009) em

estudo sobre o fraseamento prosódico na fala espontânea e na leitura do PB. A

pesquisadora preocupou-se em construir um corpus de LE com base no corpus de FE,

solicitando aos mesmos informantes que fizessem a leitura daqueles dados que

produziram espontaneamente. Assim, as amostras são comparáveis entre si, isto é,

Page 42: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

42

elimina-se a possibilidade de outros fatores que não a modalidade (FE / LE)

influenciassem na prosódia das sentenças.

Foi construído, portanto, um corpus específico, constituído de um total de 256

enunciados. A amostra conta com dados de FE e LE com conteúdo estrutural idêntico e

informados pelos mesmos indivíduos: são, portanto, 128 interrogativas espontâneas e

128 enunciados lidos. As gravações foram realizadas por um gravador de alta

performance, modelo Sony PCM-D50 com capacidade de 96KHz/24bit, em uma sala

com isolamento acústico adequado.

2.2.1. Seleção dos informantes

A pesquisa contou com um total de oito informantes, todos jovens na faixa etária

de 20 e 25 anos, estudantes de diversos cursos de graduação da Universidade Federal do

Rio de Janeiro. Uma vez que o objeto de estudo é a fala carioca, todos os participantes

são nascidos e passaram a maior parte da vida na cidade do Rio de Janeiro. Embora não

haja, na literatura, indícios de que o grau de escolarização seja fator determinante para a

prosódia, eliminou-se a possibilidade de a diferença de grau de escolarização

estabelecer diferenças nos resultados, já que todos os indivíduos eram estudantes

universitários. Além da origem regional e da escolarização, controlou-se também o sexo

dos informantes: foram quatro participantes homens e quatro mulheres, a fim de

verificar diferenças no nível fonético entre os gêneros, uma vez que já se sabe que todos

os falantes de uma língua seguem os mesmos padrões fonológicos.

Page 43: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

43

Todos os participantes da pesquisa preencheram uma ficha com suas

informações pessoais e assinaram um termo concordando com a utilização das

gravações para fins acadêmicos (cf. Anexo 1).

2.2.2. Gravação de fala espontânea

Para a gravação da amostra de fala espontânea, os informantes participaram de

um jogo de adivinhação em duplas, elaborado com a intenção de obter interrogativas

com a maior espontaneidade possível. Conforme já se observou na seção de introdução

deste trabalho, é fato que o grau de espontaneidade desse corpus não é tão alto quanto o

de uma conversação livre prototípica, mas a denominação “fala espontânea” é

empregada aqui devido ao fato de a amostra revelar um grau bastante razoável de

espontaneidade se comparada a corpora de fala semiespontânea como o do ALiB, bem

como em oposição à leitura.

Cada jogador escolheu livremente uma personagem (real ou fictícia), cuja

identidade deveria ser descoberta pelo outro participante. Foram oferecidos também

alguns perfis de personagens previamente descritos em forma de fichas de informações

pela pesquisadora.

Para descobrir quem é a personagem da vez, o jogador “B” deve fazer perguntas

ao jogador “A”, mas este último só pode responder “sim” ou “não” – ou ainda, em caso

de perguntas inesperadas, pode dizer que não sabe ou que aquela informação é

irrelevante. A título de ilustração, segue um diálogo hipotético em que Marilyn Monroe

é a personagem que “B” está tentando adivinhar.

B: Você é um homem?

Page 44: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

44

A: Não.

B: Você é loira?

A: Sim.

B: Você tem irmãos?

A: Irrelevante.

B: Você é brasileira?

A: Não.

(E assim sucessivamente, até que “B” descubra quem é a personagem de “A”.)

Vale observar que nem todos os participantes dos jogos forneceram,

efetivamente, dados para a análise. Alguns colaboraram apenas respondendo às

perguntas do colega, ou seja, desempenhando papel do jogador “A” na situação acima.

2.2.3. Gravação de leitura

Para obtenção dos dados de leitura, primeiramente foi realizada a transcrição

grafemática dos diálogos obtidos com o jogo de adivinhação (cf. Anexo 2). Dias depois,

solicitou-se aos mesmos informantes que lessem as transcrições, reproduzindo as

mesmas sentenças que haviam dito espontaneamente. Dessa maneira, evitam-se as

interferências de fatores estruturais e das características idioletais nos resultados da

pesquisa no que se refere à comparação entre fala espontânea e leitura.

Page 45: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

45

2.2.4. Seleção dos enunciados

A gravação do jogo de adivinhação resultou em um número bem maior de

enunciados do que aqueles que de fato passaram à fase de análise acústica

(aproximadamente 600, somando-se FE e LE). Muitos desses dados, porém,

apresentavam problemas que poderiam interferir na análise, como, por exemplo, falas

sobrepostas, ruídos diversos e, principalmente, risadas. Essas sentenças foram, portanto,

excluídas da análise, bem como aquelas em que havia muita hesitação, com prolongadas

pausas ao longo do enunciado. Nesses casos, em que o informante pensava muito para

formular uma pergunta, considerou-se que o enunciado não possuía o grau de fluidez

desejado, havendo rupturas na linha melódica que poderiam atrapalhar a análise. Na

figura 11, a seguir, está ilustrado um exemplo de dado excluído da análise devido à

hesitação do falante.

Figura 11: Forma de onda do enunciado “Você é de, sei lá, de uma história inventada?”,

excluída da análise devido à hesitação (FE)

Page 46: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

46

2.3. Metodologia de análise

A metodologia empregada na análise dos dados baseia-se no Método de Análise

Melódica da Fala (MAS) desenvolvido pelos professores Francisco José Cantero e

Dolors Font-Rotchés, da Universidade de Barcelona e aplicado em diversos trabalhos

(CANTERO, 2002; FONT-ROTCHÉS, 2007; CANTERO & FONT- ROTCHÉS, 2009,

2013, entre outros).

O método permite analisar com bastante rigor os enunciados no nível acústico, e

utiliza-se dos testes de percepção para confirmar o estatuto fonológico dos padrões

melódicos. Oferece um critério de segmentação das melodias da fala exclusivamente

fônico, desenvolvido com o objetivo de analisar dados de fala espontânea, e apresenta

um sistema de processamento dos dados que permite obter valores acústicos relativos

em porcentagem para classificar, analisar e submeter os dados a experimentos com

síntese melódica, sendo ao mesmo tempo uma medida mais intuitiva que o semitom

musical.

O método, cujo protocolo está detalhadamente descrito em Cantero & Font-

Rotchés (2009), é dividido em duas fases: a fase acústica, que consiste na preparação e

análise acústica dos dados; e a fase perceptiva, em que os resultados obtidos na fase

acústica são validados a partir de testes de percepção com ouvintes-juízes nativos da

mesma variedade linguística estudada.

Page 47: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

47

2.3.1. Fase acústica

Na fase acústica da análise, é feita, primeiramente, a preparação dos dados: os

enunciados a ser estudados são recortados, a partir das gravações originais, em

pequenos arquivos de áudio; e organizados em uma tabela em que constam o número do

dado, a transcrição do enunciado, iniciais e sexo do informante. A essa mesma tabela

foram acrescidas, mais tarde, as classificações quanto à inflexão final (cf. Tabela 2, p.

57).

Em seguida, para a análise propriamente dita, foi realizada a segmentação das

frases em sílabas e a medição da F0 das vogais de cada sílaba, isto é, aferição dos

valores absolutos em Hz de um ponto central da vogal. Naqueles casos em que, dentro

da mesma sílaba, havia um aumento ou diminuição de mais de 10% no valor de F0,

considerou-se a diferença como significativa e mediram-se dois pontos dentro da

mesma sílaba, de acordo com o protocolo estabelecido para o MAS. Nesses casos, a

sílaba em questão é representada, no gráfico, de forma “prolongada”, marcada com um

asterisco no segundo ponto de medição da F0, como se pode conferir na sílaba tônica de

“protagonista” no enunciado “Ele é o protagonista?”, representado no Gráfico 1.

Após a medição em Hz da F0 de um ponto central de cada sílaba, foi feita a

estandardização – construção de um gráfico a partir da distância tonal em porcentagens

entre uma vogal e a seguinte, começando pelo número arbitrário 100 (cf. Gráfico 1).

Page 48: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

48

Gráfico 1: Curva estandardizada do enunciado “Ele é o protagonista” (LE)

Na linha dos valores de Hz, logo abaixo da transcrição do enunciado, temos os

valores absolutos de F0. Logo abaixo, na linha intitulada “Perc.”, estão os valores de

diferença percentual entre sílabas vizinhas. O ponto de partida é a sílaba inicial do

enunciado, para a qual é sempre atribuído o valor de 100%. Na segunda sílaba, a

porcentagem refere-se à diferença proporcional do valor de F0 em relação à primeira

sílaba (no caso do gráfico 2, esse valor é de zero por cento na sílaba “le é o” pois não há

diferença de F0 entre as duas primeiras sílabas). Na terceira sílaba, o valor em

porcentagem refere-se à diferença entre esta e a segunda sílaba, e assim por diante – o

cálculo é sempre feito com base na diferença entre o valor de F0 de uma sílaba e a

sílaba imediatamente anterior a ela. Assim, se o movimento entre uma sílaba e outra for

ascendente, o valor fica positivo; se for descendente, fica negativo.

Finalmente, na última linha (“C. Est.”), encontram-se os valores que servem de

base para a construção da curva estandardizada. A primeira sílaba do enunciado sempre

corresponde ao número 100, escolhido arbitrariamente e, a partir dele, são descritos os

movimentos de subida ou descida da curva: por exemplo, entre a segunda e a terceira

E le é o pro ta go nis nis* ta?

Hz 203 203 193 189 184 190 232 184

Perc. 100,0 0,0% -4,9% -2,1% -2,6% 3,3% 22,1%-20,7%

C. Est. 100 100 95 93 91 94 114 91

50

100

150

Page 49: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

49

sílabas do enunciado “Ele é o / protagonista?”, houve um decréscimo de 4,9% no valor

de F0. O valor da curva, portanto, passa de 100 para 95, depois de 95 para 93, e assim

sucessivamente, permitindo gerar um gráfico padronizado.

O procedimento de estandardização é um ponto chave na metodologia: uma vez

que a utilização de medidas relativas é o que permite a comparação de dados de

diferentes informantes, independentemente do sexo, idade ou altura média da voz, além

de permitir a comparação de enunciados de durações distintas.

Esse passo se faz necessário porque a percepção da entoação se dá de maneira

proporcional, e não absoluta. Por exemplo, se um homem de voz grave fala na faixa dos

100 Hz e produz uma subida para 200 Hz, essa subida representa uma diferença de

100% na F0. No caso de uma mulher cuja voz esteja na faixa dos 200 Hz, seria

necessária uma subida para 400 Hz para resultar no mesmo efeito perceptivo, isto é, em

uma diferença tonal de 100% na linha melódica. Essa equivalência está ilustrada, a

seguir, a partir da reprodução da linha de pitch vista no programa Praat (Figuras 12 e

14) e da curva estandardizada (Figuras 13 e 15) de duas subidas melódicas: uma de 100

para 200 Hz e outra de 200 para 400 Hz. Embora a inclinação da linha de pitch seja

visivelmente maior na subida de 200 para 400 Hz, o gráfico estandardizado é idêntico

nos dois casos, mostrando que as duas subidas correspondem fonologicamente à mesma

entoação.

Page 50: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

50

Figura 12: Imagem do Praat de curva de melodia sintetizada (subida de 100 a 200 Hz)

Figura 13: Curva estandardizada de melodia sintetizada (subida de 100 a 200 Hz)

Figura 14: Imagem do Praat de curva de melodia sintetizada (subida de 200 a 400 Hz)

Figura 15: Curva estandardizada de melodia sintetizada (subida de 200 a 400 Hz)

Page 51: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

51

2.3.1.1. Classificação dos enunciados de acordo com a inflexão final

Segundo a metodologia adotada, a sentença se divide em três partes, conforme

se observa na figura 16, abaixo: a anacruse, isto é, “sílaba ou conjunto de sílabas que

[...] precedem a sílaba forte que marca o acento métrico” (Dicionário Aulete Digital); o

primeiro pico, o corpo e a inflexão final, que corresponde ao acento nuclear do

enunciado.

É importante mencionar que nem todos os enunciados possuem anacruse e o

pico inicial. Nesses casos, o chamado “corpo” inclui desde a primeira sílaba até a sílaba

tônica final. A parte mais importante do contorno é justamente a sílaba tônica final

(núcleo) e aquelas que se seguem a ela; já que a direção da inflexão final e os valores

percentuais dos movimentos tonais associados a ela é que são os critérios básicos para

estabelecer os diferentes tipos de padrões melódicos.

Figura 16: Diagrama das três partes do contorno melódico segundo o MAS

Trabalhos anteriores que utilizam o MAS, como o já mencionado trabalho de

Cantero & Font-Rotchés (2013), apontam três padrões melódicos para as interrogativas,

os quais também foram encontrados por Mendes (2013) para o português São Paulo e

Page 52: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

52

Araújo (2014) para Minas Gerais. Ocorre, ainda, um quarto padrão, característico de

assertivas e, portanto, de traço /-interrogativo/; mas que pode aparecer em perguntas

quando o contexto permite identificá-las, tornando o contorno melódico interrogativo

prescindível. Na análise acústica dos 256 dados desta pesquisa, foram encontrados

dados compatíveis com os quatro padrões previstos no método, e, portanto, os

enunciados analisados foram classificados de acordo com sua IF em três tipos:

i. Inflexão final ascendente-descendente

Neste tipo de contorno, também chamado de contorno final circunflexo, não há

necessariamente um primeiro pico, o corpo é plano ou levemente descendente. A iflexão

final começa na última sílaba tônica, o núcleo, e tem dois movimentos, um ascendente

e outro descendente (entre 15% e 75%), com retorno da curva para um ponto próximo

de onde começou (cf. Figura 17);

Figura 17: Modelo de inflexão final ascendente-descendente

Page 53: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

53

ii. Inflexão final ascendente:

Este padrão caracteriza-se pela presença de um primeiro pico, corpo

ligeiramente descendente e inflexão final com subida entre 30% e 50%,

aproximadamente, podendo ser ainda maior nos casos em que há ênfase (cf. Figura 18).

Figura 18: Modelo de inflexão final ascendente

iii. Inflexão final de núcleo elevado (high nucleous):

Este contorno é caracterizado por uma anacruse opcional, com uma subida entre

30% e 40% até o primeiro pico, uma queda suave até a sílaba pré-tônica final e outra

subida, de amplitude bastante variável (entre 10% e 50%), até chegar ao núcleo na

última sílaba tônica. Em seguida, há uma descida até o ponto mais baixo da curva

melódica no final do enunciado, após o acento nuclear. A principal característica deste

contorno, e que o distingue da IF ascendente-descendente ou circunflexa é que, neste

caso, o pico melódico se encontra em um ponto elevado e a linha melódica tem direção

descendente. (cf. Figura 19).

Page 54: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

54

Figura 19: Modelo de inflexão final de núcleo elevado (high nucleous)

iv. Inflexão final descendente:

O contorno descendente é típico das assertivas ou de perguntas parciais

(iniciadas por um pronome interrogativo), e por isso é caracterizado pelo traço /-

interrogativo/, ou seja, não imprime à frase o status pragmático de pergunta. Apesar

disso, alguns dados do corpus apresentaram esse tipo de IF, como veremos mais

adiante. Nos dados de Mendes (2013) e Araújo (2014), este contorno também aparece,

mas em pouquíssimos casos ele se refere a questões totais. Quando isso ocorre, as

autoras justificam a ocorrência dessa IF pelo contexto pragmático, em que ficava muito

claro que o enunciado só poderia ser uma pergunta.

Figura 20: Modelo de inflexão final descendente

Page 55: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

55

2.3.2. Fase perceptiva

Após a análise acústica dos enunciados, deu-se início aos testes de percepção

para validar os resultados obtidos na primeira etapa da pesquisa. Para a realização

desses testes, foram produzidas cópias ressintetizadas dos enunciados utilizando o

método PSOLA (Pitch Sincronous OverLap Add), que elimina variações

micromelódicas dos enunciados.

De acordo com o procedimento padrão desse método, os valores de pitch de um

enunciado são apagados e substituídos por valores estandardizados, por meio da

manipulação da melodia original pelo programa Praat. Utilizando a função “To

Manipulation” do programa, edita-se a melodia do enunciado original (cf. Figuras 21a e

21b), removendo-se todos os pontos na curva de pitch que não aqueles pontos centrais

de cada sílaba, considerados para a formulação dos gráficos na fase de análise acústica.

Obtém-se, dessa maneira, uma melodia ressintetizada, que corresponde precisamente

aos gráficos elaborados para a classificação dos contornos a partir da estandardização

dos valores percentuais de variação de F0 (cf. Figuras 22a e 22b).

Page 56: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

56

Figura 21a: Imagem do Praat do enunciado original “É de uma novela?” (FE) – forma de

onda, espectrograma e curva de pitch

Figura 21b: Imagem do Praat do enunciado original “É de uma novela?” (FE) – forma de

onda e pontos de pitch para manipulação acústica

Page 57: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

57

Figura 22a: Imagem do Praat do enunciado acusticamente manipulado / ressintetizado “É

de uma novela?” (FE) – forma de onda, espectrograma e curva de pitch

Figura 22b: Imagem do Praat do enunciado acusticamente manipulado / ressintetizado “É

de uma novela?” (FE) – forma de onda e pontos de pitch selecionados no centro de cada

sílaba

Dessa maneira é possível verificar se a análise melódica está correta e se reflete

a melodia original sem variações micromelódicas e com os valores normalizados. A

Page 58: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

58

partir dessa padronização, podem-se distinguir os traços melódicos dos contornos, no

nível fonético, dos traços fonológicos, que permitem estabelecer diferenças modais

entre as sentenças, diferenciando, por exemplo, perguntas e declarativas. Os traços

fonológicos são /± interrogativo/, /± enfático/ e /± suspenso/. Outros trabalhos que

utilizaram o MAS mostraram que esses três traços, combinados, foram suficientes para

classificar todos os contornos de um corpus de 2500 enunciados do espanhol peninsular

produzidos por mais de 600 informantes (Ballesteros, 2011, Mateo, 2014) e 580

enunciados do catalão produzidos por 160 informantes (Font-Rotchés, 2007).

Participaram do teste de percepção seis indivíduos de ambos os sexos, todos

falantes nativos da variedade carioca do português brasileiro e que não haviam

participado de nenhuma das gravações. Um grupo de frases foi escutado pelos juízes,

que avaliaram se aqueles enunciados lhes pareciam como perguntas autênticas do

português (traço /± interrogativo/), se estavam terminados ou não (traço /± suspenso/) e

se eram exclamações ou não (traço /± enfático/). Ao classificar como interrogativos,

enfáticos ou suspensos enunciados acusticamente manipulados e com diferentes valores

de movimento de F0, os ouvintes determinaram onde se encontravam as mudanças

significativas nos traços melódicos. Os traços melódicos são, por sua vez, as

características dos elementos funcionais do contorno: a anacruse, o primeiro pico, o

corpo e a inflexão final. A descrição desses elementos, e especialmente da IF, permite

definir o contorno melódico e margens de dispersão, isto é, os valores mínimo e

máximo dos movimentos tonais referentes a cada padrão melódico.

Foram selecionadas, para o teste, 30 interrogativas totais, sendo 15 de FE e 15 de

LE, as quais foram aleatoriamente misturadas a outros enunciados retirados das próprias

gravações do corpus, que serviram de grupo controle. Foi tomado o cuidado de

selecionar apenas enunciados cujo conteúdo proposicional não permitisse a

Page 59: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

59

identificação da modalidade da frase de forma descontextualizada. Ou seja, sem a

entoação ou a presença de sinais de pontuação, todos os enunciados poderiam ser

interpretados como perguntas, exclamações ou enunciados em suspenso (cf. exemplos 1

e 2).

(1) “ mas tem tanto rock brasileiro conhecido” (enunciado do grupo controle)

(2) “ele canta música sertaneja” (enunciado interrogativo)

Também foi observado o tipo de inflexão final e o percentual de subida no

acento nuclear: foram selecionadas 18 enunciados de IF ascendente-descendente, quatro

de IF ascendente, quatro de IF de núcleo elevado e quatro de IF descendente, com

diferentes graus de inclinação da curva no acento nuclear. Cada ouvinte escutou um

total de 40 enunciados, entre interrogativas e enunciados-controle, podendo ouvir cada

gravação até no máximo três vezes.

Para cada enunciado ouvido, os juízes eram questionados, a partir de um

formulário (cf. Anexo 3) quanto a dois dos traços fonológicos em questão, solicitando-

se que marcasse um “X” naquela opção que correspondesse, na sua opinião, ao

enunciado. Quando não soubesse responder, o ouvinte podia deixar em branco. Para as

perguntas de IF ascendente, eram colocadas as possibilidades de “pergunta” e

“enunciado incompleto”, a fim de averiguar as margens de dispersão entre enunciados

interrogativos e suspensos. Para os enunciados de IF ascendente-descendente e de

núcleo elevado, as possibilidades eram de pergunta ou exclamação; e para os

enunciados de IF descendente, pergunta ou enunciado neutro.

Page 60: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

60

3. ANÁLISE DOS DADOS

Conforme foi esclarecido na seção 2.3, a análise dos dados se dividiu em duas

etapas: a análise acústica propriamente dita e a realização de testes de percepção. Neste

capítulo, apresentam-se os resultados de ambas as fases da pesquisa, para as

modalidades de fala espontânea e leitura.

3.1. Análise acústica

Todos os enunciados analisadas foram classificadas de acordo com os quatro

padrões de IF apresentados na seção 2.3.1.1. A relação completa de enunciados com

suas respectivas classificações está na Tabela 2, a seguir.

Page 61: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

61

Dado # Transcrição do enunciado Inf. Sexo FE LE

001 Ele é o protagonista? T.S. F AD AD

002 Ele contracena com outro ator famoso? T.S. F AD AD

003 O ator é bonito? T.S. F AD AD

004 As mulheres acham ele bonito? T.S. F AD A

005 O ator é americano? T.S. F AD AD

006 Ele contracena com alguma criança? T.S. F AD AD

007 O personagem fica velho? T.S. F AD AD

008 O personagem é criança? T.S. F D AD

009 O ator tem cabelo loiro? T.S. F AD AD

010 Ah ele é um personagem tipo desenho? T.S. F AD AD

011 O personagem tem filho? T.S. F AD AD

012 O personagem é casado? T.S. F AD AD

013 O personagem morre no filme? T.S. F AD AD

014 O personagem se fantasia? T.S. F AD AD

015 Ele tem um cavalo? T.S. F AD AD

016 Ele usa terno? T.S. F AD AD

017 Eu já vi o filme? T.S. F AD N

018 Ele tem cabelo grande? T.S. F AD AD

019 O filme é americano? T.S. F AD AD

Page 62: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

62

020 A roupa preta é um uniforme? T.S. F AD N

021 O personagem é um super-herói? T.S. F A A

022 O personagem é um conquistador? T.S. F A A

023 Ele envelhece no filme? T.S. F AD AD

024 Ele tem vida eterna? T.S. F AD N

025 Ele é um mágico? T.S. F AD A

026 Ele é um pirata? T.S. F AD N

027 É mulher? T.M. F A A

028 É homem? T.M. F D D

029 É famoso? T.M. F N AD

030 É real? T.M. F A A

031 É histórico? T.M. F AD AD

032 Faz fez parte da história? T.M. F AD AD

033 É um herói? T.M. F A A

034 É, é cabeludo? T.M. F AD AD

035 É político? T.M. F AD AD

036 Posso repetir pergunta? T.M. F AD AD

037 É desenho? T.M. F AD AD

038 É político? T.M. F AD AD

039 É importante? T.M. F AD AD

040 É cantor? T.M. F A A

041 Ele canta música sertaneja? T.M. F AD AD

042 Posso chutar? T.M. F A A

043 É homem? I.O. F AD N

044 É real? I.O. F A A

045 É um personagem? I.O. F AD N

Page 63: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

63

046 De um livro? I.O. F AD AD

047 De um filme? I.O. F AD D

048 Quadrinho? I.O. F AD AD

049 Folclore? I.O. F AD AD

050 É criança? I.O. F AD AD

051 É de uma novela? I.O. F A AD

052 Tem a ver com a televisão? I.O. F A A

053 É antigo? I.O. F AD AD

054 Muito antigo? I.O. F AD AD

055 De desenho? I.O. F AD AD

056 É um homem normal? I.O. F AD AD

057 É sobrenatural o personagem? I.O. F D N

058 Tem poder? I.O. F A A

059 Seu personagem é real? P.B. F A A

060 Seu personagem é do sexo feminino? P.B. F AD AD

061 Ele participa de desenho animado? P.B. F AD AD

062 Esse desenho animado é antigo? P.B. F AD AD

063 Esse desenho animado passa na Globo? P.B. F AD AD

064 Esse personagem é um animal? P.B. F A A

065 Um desenho animado da televisão? P.B. F A A

066 É de gibi? P.B. F A A

067 É um personagem da literatura? P.B. F AD AD

068 É um personagem… folclórico? P.B. F AD AD

069 Tem direito a dica? P.B. F AD AD

070 Esse personagem é bem famoso? P.B. F AD AD

071 Mas esse personagem passa em algum P.B. F A N

Page 64: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

64

programa de televisão?

072 Esse personagem é um super-herói? P.B. F A A

073 É um personagem de revista? P.B. F AD AD

074 É uma animação infantil? P.B. F AD A

075 Você é mulher? R.M. M A A

076 Você é homem? R.M. M AD AD

077 Você tem uma profissão? R.M. M AD AD

078 Eu posso desistir? R.M. M A A

079 O intérprete desse personagem é famoso? R.M. M AD AD

080 Isso se refere à família? R.M. M AD AD

081 Você é de desenho animado? C.F. M AD AD

082 Você é de filme? C.F. M AD N

083 Você é de série? C.F. M AD AD

084 Você é de videogame? C.F. M AD AD

085 Você é de livro? C.F. M AD AD

086 Você é de novela? C.F. M AD AD

087 Você é da história? C.F. M AD AD

088 Você é de uma história real então? C.F. M D A

089 Você nasceu na Idade Média? C.F. M AD AD

090 Idade Moderna? C.F. M D AD

091 E você tava na Revolução Industrial? C.F. M AD AD

092 Você tava na Revolução Francesa? C.F. M AD AD

093 Você tava… na Independência? C.F. M AD AD

094 Você tava na Independência do Brasil? C.F. M D AD

095 Você é um filósofo? C.F. M AD AD

096 Você pensou a sociedade de alguma C.F. M D AD

Page 65: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

65

maneira?

097 É um personagem? G.G. M AD AD

098 É um personagem real? G.G. M N D

099 É um personagem brasileiro? G.G. M AD AD

100 Americano? G.G. M AD AD

101 Europeu? G.G. M A N

102 Asiático? G.G. M AD N

103 Da selva? G.G. M AD AD

104 É um personagem de filme? G.G. M AD AD

105 Da literatura? G.G. M AD N

106 Do teatro? G.G. M AD AD

107 É um personagem real? G.G. M A A

108 É um personagem real que foi ficcionalizado

em alguma manifestação artística?

G.G. M N N

109 Esse personagem virou por exemplo

personagem de um filme?

G.G. M AD AD

110 É um político? G.G. M AD N

111 É um artista? G.G. M AD N

112 É um personagem fictício? G.G. M AD AD

113 É homem? T.A. M AD AD

114 É um personagem histórico? T.A. M AD AD

115 É de ficção? T.A. M A A

116 Em termos de aparência física tem é, é

negro?

T.A. M AD N

117 É branco? T.A. M AD N

118 É loiro? T.A. M AD AD

119 Não tem cabelo? T.A. M D AD

Page 66: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

66

120 Tem cabelo? T.A. M AD AD

121 De alguma forma marcou a história do país? T.A. M D D

122 Do país? T.A. M A A

123 Do nosso país? T.A. M D D

124 Tem cabelo… cabelo preto? T.A. M AD AD

125 É algum personagem assim tipo

revolucionário?

T.A. M N AD

126 Fez algum feito revolucionário? T.A. M AD AD

127 Foi presidente? T.A. M N AD

128 Tá ligado à política? T.A. M AD N

Tabela 2: Relação dos enunciados analisadas

Conforme se pode observar na tabela 3 abaixo, o contorno de inflexão final

ascendente-descendente foi claramente predominante, correspondendo a 70,3% dos

dados de fala espontânea e 63,3% dos dados de leitura. O padrão de IF ascendente foi

encontrado em 18% dos dados de FE e 18,8% dos dados de LE, e o de IF de núcleo

elevado em 3,9% dos dados de FE e 14% dos dados de LE. Já o padrão descendente,

típico das assertivas, foi encontrado em 7,8% dos dados de FE e 3,9% dos de LE. Ao

contrário do que se esperava, houve maior discrepância do padrão na modalidade de LE,

embora a regularidade tenha sido grande em ambos os corpora.

Page 67: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

67

Inflexão Final Fala espontânea Leitura

/+ int./

Ascendente-

Descendente

n 90 81

% 70,3% 63,3%

Ascendente

n 23 24

% 18,0% 18,8%

Núcleo Elevado

n 5 18

% 3,9% 14,0%

/- int./ Descendente

n 10 5

% 7,8% 3,9%

Tabela 3: Resultado da análise acústica – classificação dos enunciados de FE e LE de

acordo com a inflexão final

No gráfico 2, a seguir, é possível visualizar a proporção em que cada um dos

contornos aparece no corpus como um todo (incluindo os dados de FE e LE). As barras

estão divididas em blocos que representam cada um dos quatro tipos de inflexão final

encontrados nos dados, sendo as barras de cor azul referentes aos dados de fala

espontânea e as de cor vermelha referentes aos dados de leitura.

Legenda:

n = número de enunciados

Page 68: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

68

Gráfico 2: Classificação dos dados de fala espontânea e leitura

Apenas dois dados chamaram especialmente a atenção por apresentarem grande

variação na curva de F0 ao longo do corpo do enunciado. Esses dois enunciados,

ilustradas nos gráficos 3 e 4, não foram, no entanto, consideradas fora dos padrões

estipulados. Apesar de seus gráficos serem visualmente discrepantes dos demais, ainda

preservam a característica fundamental do contorno ascendente-descendente (no caso do

enunciado no gráfico 3), que é o retorno, após o pico melódico alinhado à direita da

última tônica, da linha de F0 a um ponto próximo daquele do início da frase; e do

contorno ascendente (no enunciado do gráfico 4), que é a presença de um primeiro pico

e subida final com valor próximo a 30%.

90

23

5 10

81

24 18

5

Asc-Desc Asc N Elev Desc

FE

LE

Page 69: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

69

Gráfico 3: Enunciado “Ele envelhece no filme?” (FE)

Gráfico 4: Enunciado “As mulheres acham ele bonito?” (LE)

Em ambos os casos, a peculiaridade dos contornos parece se dever à ênfase dada

às palavras “envelhece”, no primeiro caso, e “acham”, no segundo. Essa ênfase, no

entanto, não alterou o reconhecimento das sentenças como pertencentes ao padrão

fonológico das interrogativas, como foi verificado mais tarde com o teste de percepção.

Eleen

ve lhelhe*

ce no fil fil*me?

Hz 198 226 277 213 264 173 241 198 232 172

Perc. 100, 14,1 22,6 -23, 23,9 -34, 39,3 -17, 17,2 -25,

C. Est. 100 114 140 108 133 87 122 100 117 87

50

100

150

As mu lhe res a a*cham

e(le)

bo nini*(to)?

Hz 183 185 196 206 186 236 206 173 181 195 232

Perc. 100,1,1%5,9%5,1% -9,7 26,9 -12, -16,4,6%7,7%19,0

C. Est. 100 101 107 113 102 129 113 95 99 107 127

50

100

150

Page 70: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

70

3.1.1. Resultados referentes à fala espontânea

Nos dados de fala espontânea, os enunciados classificados como IF ascendente-

descendente representaram a grande maioria: 70,3% (total de 90 ocorrências). Em

segundo lugar, estão os de IF ascendente, que correspondem a 18% dos dados (23

ocorrências); seguidas pelos de contorno /-interrogativo/, isto é, IF descendente, que

representaram 7,8% dos dados (dez ocorrências). Os enunciados de IF de núcleo

elevado corresponderam a apenas 3,9% dos dados (cinco ocorrências).

Aferiu-se ainda a média da subida melódica da tônica final em relação à sílaba

imediatamente anterior, por ser um evento fonético muito relevante no enunciado,

relacionado ao acento nuclear. Considerou-se, para isso, a medida percentual

(apresentada na segunda linha dos gráficos) correspondente à sílaba tônica final, e fez-

se uma média aritmética simples desses valores em todos os enunciados. Nos dados de

FE, essa subida foi de, em média, 24%. Nas informantes mulheres, a média foi de 27%,

enquanto nos homens foi de 21%.

Os gráficos de 5 a 8, a seguir, exemplificam cada um dos contornos encontrados no

corpus de fala espontânea.

Page 71: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

71

Gráfico 5: Enunciado “Tem direito a dica?” (FE) – IF ascendente-descendente

Gráfico 6: Enunciado “É de uma novela?” (FE) – IF ascendente

Tem di rei to a di di* ca?

Hz 215 212 212 204 198 222 268 213

Perc. 100,0 -1,4% 0,0% -3,8% -2,9% 12,1%20,7% -20,5

C. Est. 100 99 99 95 92 103 125 99

50

100

150

É de u ma no ve ve* la?

Hz 193 193 190 188 201 246 284

Perc. 100,0 0,0% -1,6% -1,1% 6,9% 22,4% 15,4%

C. Est. 100 100 98 97 104 127 147

50

100

150

Page 72: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

72

Gráfico 7: Enunciado “É famoso?” (FE) – IF de núcleo elevado

Gráfico 8: Enunciado “Idade Moderna?” (FE) – IF descendente

É fa mo so?

Hz 184 196 221 190

Perc. 100,0% 6,5% 12,8% -14,0%

C. Est. 100 107 120 103

50

100

150

I da de Mo der na?

Hz 132 137 130 137 132 118

Perc. 100,0% 3,8% -5,1% 5,4% -3,6% -10,6%

C. Est. 100 104 98 104 100 89

50

100

150

Page 73: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

73

3.1.2. Resultados referentes à leitura

Os enunciados de IF ascendente-descendente também foram maioria nos dados

de leitura, embora com uma representatividade um pouco menor do que no caso da fala

espontânea: foram 63,3% dos dados, totalizando 81 enunciados. Os enunciados de IF

ascendente, por sua vez, foram encontrados em número praticamente igual nas duas

modalidades: na LE representaram 18,8% dos dados ou 24 enunciados, contra os 18%

(23 dados) da FE. Nos dados de leitura, porém, o contorno de IF de núcleo elevado foi

encontrado em maior proporção, correspondendo a 14% dos dados (18 ocorrências). Já

o contorno de IF descendente e traço /-interrogativo/, mais recorrente na FE,

representou na LE apenas 3,9% dos dados (cinco ocorrências).

Nos dados de LE, a média de subida da tônica final em relação à sílaba anterior foi

de 29%, sendo 32% entre as mulheres e 26% entre os homens. A diferença não é tão

grande em relação aos dados de FE (24%), mas já revela uma subida melódica típica do

padrão interrogativo mais saliente na leitura.

Nos gráficos 9 a 12, abaixo, estão ilustrados com exemplos retirados do corpus de

leitura os quatro tipos de contornos.

Page 74: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

74

Gráfico 9: Enunciado “Você é de desenho animado?” (LE) – IF ascendente-

descendente

Gráfico 10: Enunciado “Ele é um mágico?” (LE) – IF ascendente

Vo cê é de de senho a

ni mama*

do?

Hz 158 174 168 166 143 129 130 128 143 170 147

Perc. 100 10, -3, -1, -13 -9, 0,8 -1, 11, 18, -13

C. Est. 100 110 106 105 91 82 82 81 91 108 93

50

100

150

E (le) é um má má* gi(co)?

Hz 195 191 189 182 224 268

Perc. 100,0% -2,1% -1,0% -3,7% 23,1% 19,6%

C. Est. 100 98 97 93 115 137

50

100

150

Page 75: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

75

Gráfico 11: “Ele tem vida eterna?” (LE) – IF de núcleo elevado

Gráfico 12: Enunciado “Uma personagem real?” (LE) – IF descendente

E le tem vi da e ter ter* na?

Hz 204 205 212 195 194 217 178 163

Perc. 100,0 0,5% 3,4% -8,0% -0,5% 11,9% -18,0 -8,4%

C. Est. 100 100 104 96 95 106 87 80

50

100

150

U ma per so na gem re al?

Hz 144 144 147 143 143 142 144 127

Perc. 100,0 0,0% 2,1% -2,7% 0,0% -0,7% 1,4% -11,8

C. Est. 100 100 102 99 99 99 100 88

50

100

150

Page 76: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

76

3.2. Testes de percepção

As respostas fornecidas pelos ouvintes que participaram dos testes de percepção

foram contabilizadas nas tabelas 4, 5 e 6 abaixo, em que está relacionado também o

percentual de subida (ou descida) do acento nuclear na cópia ressintetizada de cada

enunciado.

Nos enunciados de IF ascendente, o reconhecimento do traço /+interrogativo/ foi

categórico nos dados cujo percentual de subida no acento nuclear era maior que 30%.

Nos dados em que o ascenso era menos evidente, houve maior dúvida da parte dos

juízes, que reconheceram o padrão de pergunta em metade dos casos (cf. Tabela 4).

Page 77: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

77

Enunciado Inf. Sexo IF Mod. % subida ? ...

as mulheres acham ele bonito T.S. F A LE 19% 3 3

um desenho animado da

televisão

P.B. F A LE 24% 3 2

posso chutar T.M. F A LE 32% 6 0

europeu G.G. M A FE 38% 6 0

eu posso desistir R.M. M A FE 40% 6 0

Tabela 4: Resultado do teste de percepção para enunciados de IF ascendente

Nos enunciados de contorno circunflexo, isto é, de IF ascendente-descendente

ou de núcleo elevado, o reconhecimento das perguntas foi ainda maior. Apenas alguns

poucos dados que possuíam um ascenso muito baixo (menor que 20%) não foram

reconhecidos por todos os juízes, sendo confundido algumas vezes com o padrão

enfático (cf. Tabela 5).

Legenda referente às tabelas 4, 5 e 6:

Mod. = modalidade (FE ou LE)

“?” = número de juízes que marcaram a opção “Isto é uma pergunta.”

“...” = número de juízes que marcaram a opção “Esta frase está inacabada.”

“!” = número de juízes que marcaram a opção “Isto é uma exclamação.”

“Ø” = número de juízes que marcaram a opção “Isto é uma declaração neutra.”

Page 78: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

78

Enunciado Inf. Sexo IF Mod. % subida ? !

é histórico T.M. F AD FE 16% 5 1

é político T.M. F AD FE 18% 6 0

é branco T.A. M AD FE 18% 5 1

o ator é bonito T.S. F AD LE 20% 6 0

é desenho T.M. F AD FE 20% 6 0

é uma animação infantil P.B. F AD FE 20% 6 0

tem direito a dica P.B. F AD LE 21% 6 0

ele canta música sertaneja T.M. F AD FE 22% 6 0

ele é o protagonista T.S. F AD LE 23% 6 0

é um personagem de filme G.G. M AD FE 24% 6 0

o ator é americano T.S. F AD LE 25% 6 0

americano G.G. M AD LE 25% 6 0

da selva G.G. M AD FE 27% 6 0

da literatura G.G. M N LE 27% 6 0

é criança I.O. F AD LE 28% 6 0

é um personagem real G.G. M N FE 29% 6 0

folclore I.O. F AD LE 30% 6 0

foi presidente T.A. M N FE 33% 6 0

quadrinho I.O. F AD FE 35% 6 0

é um artista G.G. M N LE 40% 6 0

isso se refere à família R.M. M AD LE 43% 6 0

Tabela 5: Resultado do teste de percepção para enunciados de IF ascendente-descendente

e de núcleo elevado

Page 79: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

79

Nos enunciados de IF descendente, que fogem ao padrão interrogativo, a identificação

dos dados como perguntas não foi tão alta: os juízes ficaram bastante divididos entre os

padrões interrogativo e neutro, havendo ainda algumas abstenções. Vale observar que o

descenso, nos dados manipulados, era bem sutil, chegando a um máximo de 4% (cf.

Tabela 6).

Enunciado Inf. Sexo IF Mod. % descida ? Ø

o personagem é criança T.S. F D FE 2% 4 2

Idade Moderna C.F. M D FE 4% 2 4

de alguma forma marcou a

história do país

T.A. M D LE 1% 3 2

do nosso país T.A. M D LE 2% 2 2

Tabela 6: Resultado do teste de percepção para enunciados de IF descendente

Além das cópias ressintetizadas de perguntas genuínas, foram incluídas no teste

algumas cópias de outras frases, retiradas da própria gravação dos jogos de adivinhação,

que funcionaram como grupo controle. Esses enunciados foram manipulados

acusticamente para se enquadrar nos padrões prototípicos de sentenças enfáticas,

suspensas ou afirmações neutras, e tiveram 100% de reconhecimento do padrão

esperado.

Page 80: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

80

Enunciado Inf. Sexo

mas tem tanto rock brasileiro conhecido T.A. F

é irrelevante T.S. F

e usa um capacete T.S. F

você é um líder C.F. M

não é Dom Pedro I C.F. M

ela mora com o pai G.G. M

a mãe dela não existe G.G. M

tem mais de quinze P.B. F

alguma coisa diferente I.O. F

o meu é mais difícil I.O. F

Tabela 7: Relação de enunciados utilizados como grupo controle

Page 81: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

81

4. DISCUSSÃO

A partir dos resultados apresentados no capítulo anterior, discutiremos aqui o

que os dados indicam sobre os padrões melódicos das interrogativas totais na fala do

Rio de Janeiro.

4.1. O predomínio da IF circunflexa e a maior nitidez de padrões na leitura

A curva de inflexão final circunflexa, isto é, que conta com uma subida e uma

descida da F0 no final do enunciado, engloba os padrões aqui referidos como de IF

ascendente-descendente e de IF de núcleo elevado. Na metodologia adotada, esses dois

padrões são separados por poderem apresentar diferença fonológica em algumas línguas

ou variedades, como no espanhol peninsular estudado por Cantero & Font-Rotchés

(2008). Dessa forma, a observarção dos resultados, em termos quantitativos, para FE e

LE (cf. Tabela 3, p. 63 e Gráfico 2, p. 64), sugere que a fala espontânea apresenta maior

regularidade, uma vez que há menos ocorrências de padrões alternativos ao de IF

ascendente-descendente.

No corpus aqui estudado, no entanto, as diferenças entre esses dois tipos de

contornos parece estar apenas no nível fonético, como foi demonstrado a partir do teste

de percepção: ambos os padrões foram igualmente reconhecidos como possuidores de

traço /+ interrogativo/. Assim, ainda que tenham sido classificados sob rótulos

diferentes, os enunciados de IF ascendente-descendente e de núcleo elevado compõem

um mesmo grupo de contornos de IF circunflexa.

Page 82: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

82

Apesar disso, não se pode ignorar que houve um número maior de ocorrências

de IF de núcleo elevado na leitura (18 dados contra apenas cinco na FE). Como, ao que

parece, esse tipo de contorno não se diferencia do ascendente-descendente em termos

fonológicos, pode-se dizer que uma sutil tendência a um alinhamento mais atrasado do

acento na última tônica das interrogativas totais é uma das características que diferencia

a LE da FE no corpus estudado.

É preciso observar também que a quase totalidade dos dados classificados como

sendo de IF ascendente se referem a frases terminadas em palavras oxítonas, quando

não há mais conteúdo segmental após a última sílaba tônica para que ocorra a queda na

linha de F0. Apenas três ocorrências fogem a essa regra: os enunciados “As mulheres

acham ele bonito?” e “Ele é um mágico?” lidos e o enunciado “É de uma novela?” dito

espontaneamente. Dessa forma, percebe-se que, no corpus estudado, o contorno de

inflexão circunflexa é maioria absoluta, sendo encontrado em quase todos os dados de

contorno /+interrogativo/ que possuem uma ou mais sílabas pós-tônicas finais. É fato

que alguns enunciados, independentemente da tonicidade da última palavra que os

compõe, apresentaram contorno descendente (total de dez dados na FE e cinco na LE).

Esses enunciados, no entanto, não foram amplamente reconhecidos como perguntas nos

testes de percepção, o que confirma o caráter /- interrogativo/ do contorno descendente,

e nos leva a analisar estes casos de maneira diferenciada, como se discutirá adiante, na

seção 4.2.

Também é notável que, embora o padrão circunflexo seja majoritário em ambas

as amostras, a média da subida no acento nuclear, mais alta nos dados de LE (29%) do

que nos de FE (24%), nos mostra que há, na leitura, uma tendência à realização mais

nítida dos padrões interrogativos. Corrobora para essa afirmação o fato de que, no caso

do contorno de IF ascendente-descendente, em que o primeiro pico não está

Page 83: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

83

necessariamente presente, ele aparece com maior frequência nos dados de LE do que

nos de FE. Nos gráficos abaixo temos este fato exemplificado na comparação entre os

enunciados “Ele usa terno?” proferidos nas duas modalidades: na FE (Gráfico 13), não

há subida de F0 na primeira sílaba tônica e a subida no acento nuclear é mais sutil,

enquanto na LE (Gráfico 14) o primeiro pico aparece, além de o acento nuclear ser bem

mais saliente.

Gráfico 13: Enunciado “Ele usa terno?” (FE)

E le u sa ter ter* no?

Hz 211 205 197 211 248 195

Perc. 100,0% -2,8% -3,9% 7,1% 17,5% -21,4%

C. Est. 100 97 93 100 118 92

50

100

150

E le u sa ter ter* no?

Hz 211 230 201 195 284 182

Perc. 100,0% 9,0% -12,6% -3,0% 45,6% -35,9%

C. Est. 100 109 95 92 135 86

50

100

150

Page 84: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

84

Gráfico 14: Enunciado “Ele usa terno?” (LE)

A observação das curvas de pitch e dos gráficos estandardizados dos enunciados

de FE e LE revela que, por vezes, há uma diferença na configuração interna dos

contornos. Nos dados de FE, especialmente em enunciados mais longos, há menor

variação da F0 no nível micromelódico: a leitura conta com mais oscilações, de maneira

que a curva faz pequenos movimentos de subida e descida ao longo do enunciado. Esses

movimentos, no entanto, são sutis, e não interferem nos acentos pré-nuclear e nuclear.

Nas figuras 23 e 24 é possível observar essa diferença na modulação da voz, que oscila

de forma um pouco mais visível na leitura.

Figura 23: Curva de pitch do enunciado “Esse personagem virou, por exemplo,

personagem de um filme?” (FE)

Page 85: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

85

Figura 24: Curva de pitch do enunciado “Esse personagem virou, por exemplo,

personagem de um filme?” (LE)

Uma possível explicação para essa tendência é o fato de que os enunciados de

LE são, no geral, mais longos que na FE, dando ao falante mais tempo para articular os

sons e produzir tais oscilações melódicas. Aferindo-se a medida da druação total de

cada enunciado e fazendo, em seguida, uma média aritmética simples, obteve-se uma

média de duração dos dados de FE de 665 ms, enquanto para LE foi de 1025 ms. Isso

significa que os enunciados lidos são, em média, 54% mais longos do que aqueles ditos

espontaneamente.

Com relação às diferenças entre os dados produzidos entre informantes homens

e mulheres, é preciso observar o seguinte: sabe-se que a língua falada por homens e

mulheres é a mesma, e, portanto, falantes de ambos os sexos compartilham dos mesmos

padrões fonológicos para os diferentes tipos de frases. Apesar disso, foi feita uma

análise, em separado, dos dados produzidos por homens e mulheres, na intenção de

Page 86: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

86

observar possíveis diferenças no nível fonético. Conforme já se esperava, não houve

diferença expressiva entre os sexos: as mulheres produziram, na média, subidas na

última tônica um pouco mais salientes que os homens, como se pode conferir na tabela

8, abaixo. Essa diferença, no entanto, não parece relevante do ponto de vista fonológico,

já que tanto mulheres quanto homens produziram enunciados com inflexões finais

dentro das margens de dispersão estabelecidas para cada padrão.

Média Homens Média Mulheres Média Geral

Fala Espontânea 21% 27% 24%

Leitura 26% 32% 29%

23,5% 29,5% 26,5%

Tabela 8: Média de subida da F0 na vogal tônica final por modalidade de fala e sexo do

informante

Além disso, uma comparação entre os padrões descritos pela literatura para as

diversas expressões de atitudes e emoções, somada a uma análise holística dos dados,

possibilita atribuir a pequena diferença entre os dados produzidos por homens e

mulheres a questões outras que não o sexo dos informantes em si. A maior variação da

F0 entre as informantes do sexo feminino parece se dever a características individuais

dos informantes desta pesquisa: as mulheres que participaram do jogo tiveram, em

geral, uma postura muito mais expansiva do que os homens, sendo responsáveis pela

maioria dos enunciados com expressão de atitudes como interesse ou empolgação. Os

homens, por sua vez, foram responsáveis pela maioria dos enunciados de contorno /-

interrogativo/: dos 15 enunciados de IF descendente encontrados no corpus, dez foram

produzidos por homens (sete em FE e três em LE). Essa questão, porém, está

relacionada a características de personalidade dos informantes e, consequentemente, à

Page 87: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

87

expressão de atitudes e emoções, e não ao sexo propriamente dito do indivíduo. A

diferença encontrada entre os dados de informantes homens e mulheres, dessa forma,

não permite afirmar que haja distinção entre os padrões produzidos pelos dois sexos

para as interrogativas totais no português; mas colabora para a discussão acerca da

influência de atitudes e emoções nesses contornos, como se verá na seção 4.2, a seguir.

4.2. A influência da expressão de atitudes

Moraes (2006, 2008) já demonstrou a importância da expressão de atitudes na

prosódia das interrogativas do português em experimentos com fala controlada,

mostrando que o contorno da sentença pode ser totalmente alterado a depender da

intenção comunicativa do falante: uma pergunta retórica, por exemplo, tem

configuração descendente, similar à das assertivas.

Antunes (2007) também estuda a expressão de atitudes em perguntas no

português, com um corpus de gravações de televisão do dialeto de Belo Horizonte, e

divide as questões totais em três grupos: perguntas retóricas, pedidos de confirmação e

questões totais propriamente ditas ou verdadeiras. Dentro dessas categorias, a autora

identifica valores diferenciados para o movimento da linha de F0 de acordo com

expressão de atitudes, distinguindo perguntas neutras, com interesse, dúvida, crítica,

indutiva, com provocação e com incredulidade.

A observação do contexto pragmático de produção dos enunciados que fogem ao

padrão ascendente-descendente no corpus aqui estudado leva a crer que o principal fator

Page 88: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

88

determinante dessa diferenciação é justamente a expressão de atitudes, que, já se sabe,

pode influenciar totalmente a prosódia de uma sentença.

Fónagy (1993) apresenta crítica a uma metodologia de coleta de dados similar à

nossa – a do jogo da verdade – por resultar em muitos dados de perguntas do tipo

“questionário”. Ao fazer muitas perguntas repetidas, o caráter interrogativo dos

enunciados poderia ficar subentendido na própria situação, levando o inquiridor a

pronunciá-los de forma mais “desleixada”, isto é, sem se preocupar em dar à pergunta a

entoação que seria necessária, em outro contexto comunicativo, ao entendimento por

parte do interlocutor de que aquele enunciado se trata de uma interrogativa.

Embora a situação do jogo tenha permitido obter bastantes interrogativas

espontâneas, constatou-se que os falantes acabavam, em alguns momentos, produzindo

padrões melódicos que se afastavam daqueles de traço /+ interrogativo/. Observando o

contexto de produção desses enunciados, percebeu-se que os enunciados estavam,

geralmente, inseridos em contextos pragmáticos específicos que favoreciam o

entendimento do caráter interrogativo da sentença independentemente de sua entoação,

como, por exemplo, no enunciado “Você pensou a sociedade de alguma maneira?”.

A maioria dos enunciados classificados como sendo de IF descendente – em

outras palavras, cujo contorno melódico possui traço /- interrogativo/ – possuía

respostas óbvias, aproximando-se das perguntas confirmativas descritas pela literatura.

Essas perguntas ocorrem, geralmente, quando o participante já tem quase certeza de

quem é a personagem, ou quando já deduziu a resposta a partir da exclusão prévia de

outras possibilidades. Por exemplo, se ele já perguntou “Você é mulher?” e a resposta

foi “não”, sabe que a resposta para a pergunta “Você é homem?” muito provavelmente

será “sim”. Esse é o caso, por exemplo, do enunciado representada no gráfico 12 (p. 71)

Page 89: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

89

– “Uma personagem real?” – já que, tendo excluído anteriormente a possibilidade de a

personagem ser fictícia, a resposta para essa pergunta era bastante previsível. Outro

exemplo está no gráfico 15, abaixo, em que o jogador, após perguntar se a personagem

“marcou a história do país”, receia não ter sido claro quanto ao país a que se referia, e

pergunta, a título de confirmação: “Do nosso país?”.

Gráfico 15: Enunciado “Do nosso país?” (FE)

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Neste trabalho, buscou-se descrever a prosódia das interrogativas totais na

variedade carioca do português brasileiro, fazendo ainda uma distinção entre as

modalidades de fala espontânea e leitura e verificando a relevância fonológica das

diferenças observadas entre os padrões encontrados. Tenciona-se, assim, contribuir para

uma descrição acústica acurada do PB, que se acredita ser necessária para a aplicação

dos conhecimentos linguísticos – e, mais especificamente, prosódicos – em áreas

diversas, como o ensino de línguas, a terapia fonoaudiológica e o desenvolvimento de

tecnologia de fala.

Do nos so pa ís?

Hz 103 115 115 113 100

Perc. 100,0% 11,7% 0,0% -1,7% -11,5%

C. Est. 100 112 112 110 97

50

100

150

Page 90: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

90

Os resultados da pesquisa mostram que, nos dados estudados, há prevalência de

um contorno de final circunflexo para as interrogativas no Rio de Janeiro. O trabalho

corrobora, assim, os padrões obtidos por Silva (2011), com dados de fala

semiespontânea, para as cidades Rio de Janeiro e Florianópolis, diferindo dos padrões

encontrados por essa autora para outras capitais brasileiras.

A comparação com os trabalhos dos autores responsáveis pelo desenvolvimento

do MAS, Cantero & Font-Rotchés (2007, 2013), bem como com o trabalho de Mendes

(2013) para o português do estado de São Paulo, revela uma diferença significativa: os

autores defendem a prevalência do contorno de IF ascendente, enquanto nesta pesquisa

encontrou-se prevalência do contorno de IF circunflexo. Essa diferença, no entanto,

pode ser devida à diferença no grau de espontaneidade das amostras utilizadas em cada

um dos estudos. Conforme já foi observado, o corpus utilizado neste trabalho, embora

receba a denominação de fala espontânea, refere-se a uma situação de fala bastante

diferente dos programas de televisão utilizados por Cantero & Font e Mendes.

É possível, portanto, pensar que a diferença na prevalência de um ou outro

padrão deve-se ao estilo e grau de espontaneidade / monitoramento de fala; mas que os

padrões encontrados para as interrogativas são, no geral, similares nos trabalhos sobre o

português. É interessante também ressaltar que padrões similares são encontrados no

espanhol e catalão, porém com valores diferentes para as margens de dispersão. Isso

significa que os padrões apresentam configuração semelhantes, mas com valores

diferentes de movimentos tonais. Para que um falante do espanhol compreenda, por

exemplo, um enunciado de IF ascendente como uma pergunta, é necessário que esta

apresente um ascenso final de mais de 70%. Uma subida tão acentuada seria,

provavelmente, interpretada por um falante do português brasileiro como pertencente a

Page 91: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

91

um enunciado enfático, uma vez que o padrão de IF ascendente, no PB, conta com um

ascenso final entre 30% e 50%.

Com relação aos estudos feitos com dados de fala controlada, os resultados

diferem, em parte, daqueles obtidos por Moraes (2006), já que o autor encontra

predomínio do padrão final ascendente. Por outro lado, a observação do contexto

pragmático dos enunciados de contorno descendente confirma o que o autor revela

sobre a influência da expressão de atitudes na prosódia das interrogativas, mais

especificamente no tocante às perguntas confirmativas.

A comparação entre fala espontânea e leitura mostra que os padrões são os

mesmos nas duas modalidades, mas os falantes tendem a produzir um contorno nuclear

ligeiramente mais acentuado em LE, revelando uma maior preocupação em produzir a

melodia característica de uma pergunta quando lendo um texto. Algumas vezes, os

informantes chegavam a interpretar o texto de forma um pouco teatral. Além disso, a

leitura também foi mais suscetível a variações micromelódicas ao longo dos

enunciados, fato que pode ser explicado pela maior duração dos enunciados nessa

modalidade, proferidas mais lentamente.

Page 92: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

92

REFERÊNCIAS

ANTUNES, L.B. O papel da prosódia na expressão de atitudes do locutor em questões.

Tese de doutoramento. Programa de Pós-Graduação em Estudos Linguísticos da

UFMG. Belo Horizonte, 2007.

ARAÚJO, M. L. Entonação das interrogativas e das declarativas do português

brasileiro falado em Minas Gerais: Modelos para o Ensino de Línguas. Dissertação de

Mestrado. Brasília, Instituto de Letras da UNB, 2014.

BALLESTEROS, M.P. La entonación del español del norte. Tese de doutoramento.

Departamento de Filologia hispânica da Universidade de Barcelona, 2011.

BOERSMA, P. & WEENINK, P. (1992-2008): PRAAT. Doing phonetics by computer.

Institute of Phonetic Sciences, Univerty of Amsterdam. http://www.praat.org.

CAGLIARI, L. C. Elementos de fonética do Português Brasileiro. Tese de Livre

Docência, Campinas: Universidade Estadual de Campinas, 1981.

CANTERO, F.J. Teoría y análisis de la entonación. Barcelona: Ed. de la Universitat de

Barcelona, 2002.

CANTERO, F.J. & FONT-ROTCHÉS, D. “Entonación del español peninsular en habla

espontánea: patrones melódicos y márgenes de dispersión”. In: Moenia, núm. 13, pp.

69-92, 2007.

____________. “Protocolo para el análisis melódico del habla”. In: Estudios de

Fonética Experimental, núm. XVIII, pp. 17-32, 2009.

_____________. “The Intonation of Absolute Questions of Brazilian Portuguese”.

In: Linguistics and Literature Studies, 1. 2013. pp. 142-149

COOPER-KUHLEN, E. Introduction to English Prosody. Edward Arnold: 1986.

CUNHA, C. S. Entoação regional no português do Brasil. Tese de doutoramento em

língua portuguesa. Rio de Janeiro, Faculdade de Letras, UFRJ, 2000.

Page 93: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

93

_____________. “Atlas Lingüístico do Brasil: uma análise das questões de prosódia”.

In: MOTA, J. A.; CARDOSO, S. M.. (Org.). Documentos 2: Projeto Atlas Linguístico

do Brasil. 1 ed., v.1. Salvador: Editora Quarteto, 2006.

DANES, F. Sentence intonation from a functional point of view. Word 16: 34-35. 1960.

FERNANDES, F. R. Ordem, focalização e preenchimento em português: sintaxe e

prosódia. Tese de Doutorado. Campinas: Universidade Estadual de Campinas, 2007.

FÓNAGY, I. La fonction prédictive de l'intonation. In: LÉON, P & ROSSI, M. (Eds.)

Problerns de Prosodie 11. Ottawa: Didier, 1981, p. 113-120.

____________. “As funções modais da entoação”. Trad. de João Antonio de Moraes.

In: Caderno de Estudos Linguísticos. Campinas: 1993.

FONT-ROTCHÉS, Dolors. L'entonació Del català. Biblioteca Milà i Fontanals, 53.

Barcelona: Publicacions de l'Abadia de Montserrat. 2007.

____________. “Els patrons entonatius de les interrogatives absolutes del català

central”. In: Llengua i Literatura, núm. 19, 2008, pp.299-329.

FONT-ROTCHÉS, D. & MATEO-RUIZ,M. Absolute interrogatives in Spanish, a new

melodic pattern. Anais do VII Congresso Internacional da Abralin. Curitiba, 2011.

FREITAS, M. A. Prosódia e sintaxe: delimitação e contraste de estruturas. Tese de

Doutorado. Rio de Janeiro: Universidade Federal do Rio de Janeiro, 1995.

FROTA, S. et alii. Labelling intonational variation across varieties of European and

Brazilian Portuguese. Workshop on Romance ToBI. Universitat Rovira i Virgili, June,

2011.

FROTA, S.; VIGÁRIO, M. Aspectos de prosódica comparada: ritmo e entoação no PE

e no PB. Lisboa: Universidade de Lisboa, ms. 1999.

____________. Aspectos de prosódia comparada: ritmo e entoação no

PE e no PB. In: Actas do XV Encontro da Associação Portuguesa de Linguística, 533-

555. Braga: APL, 2000.

Page 94: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

94

GEBARA, E. S. Alguns aspectos da intonação no Português. Dissertação de Mestrado.

Campinas: Universidade Estadual de Campinas, 1976.

GILBERT, J. B. Teaching pronunciation. Using the prosody pyramid. New York:

Cambridge University Press, 2008.

GRAMMONT, M. Traité de phonétique. Paris: Librairie Delagrave, 1946.

HALLIDAY, M. A. K. A course in Spoken English: intonation. Oxford: Oxford

University Press, 1970.

HIRSCHBERG, J. “Using text analysis to predict intonational boundaries”. In:

Proceedings of the European Conference on Speech Communication and Technology.

Gênova, 1991.

____________."Communication and Prosody: Functional Aspects of Prosody". In:

Speech Communication36. 2002. pp. 31-46

____________. “Experiments in Emotional Speech”.In: Proceedings of ISCA & IEEE

Workshop on Spontaneous Speech Processing and Recognition. Tokyo Institute of

Technology, Tokyo, 2003. Disponível em: http://www.isca-

speech.org/archive_open/archive_papers/sspr2003/sspr_tmo1.pdf. Acesso em 10Jul13.

HIRSCHBERG, J. & PIETRO, P. “Training intonational phrasing rules automatically

for English and Spanish text-to-speech”. In: ECSA Workshop in Speech Synthesis. Nova

Iorque, 1994. pp. 159-162.

HIRST, D.J. & DI CRISTO, A. (eds.) 1998. Intonation Systems. A survey of Twenty

Languages. Cambridge, Cambridge University Press, 1998.

LABOV, William. Sociolinguistic patterns. Philadelphia: University of Philadelphia

Press, 1972.

LADD, D. R. Intonational Phonology. Cambridge: Cambridge University Press, 1996.

LEVITT, A.G. The Acquisition of Prosody: Evidence from French- and English-

learning Infants. Haskins Laboratories Status Reporton Speech Research. 1993.

Page 95: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

95

Disponível em: http://www.haskins.yale.edu/sr/sr113/SR113_03.pdf. Acesso em

10Set13.

LIRA, Z. A entoação modal em cinco falares do nordeste brasileiro. Tese de

Doutorado. Programa de Pós-graduação em Linguística da Universidade Federal da

Paraíba. João Pessoa, 2009.

MATA, A.I. “A questão da entoação nainterrogação em português – ‘Isso é uma

pergunta?’”. In: PEREIRA, I., MATA, A. I., FREITAS, M. J. Estudos em Prosódia.

Coleção Estudos Linguísticos. Coimbra: Edições Colibri,1992.

MATEO, M. La entonación del español meridional. Tese de doutoramento.

Departamento de Didáctica da Língua e da Literatura da Universitat de Barcelona, 2014.

MATTOS, W. F. C. Análise Prosódica como ferramenta para a performance da

canção: um estudo sobre as canções de câmara de Cláudio Santoro e Vinícius de

Moraes; São Paulo: Instituto de Artes da UNESP, 2006.

MENDES, R. S. A entonação no processo de ensino-aprendizagem de PLE: Proposta

didática para o ensino de modelos de entonação interrogativa do português do Brasil –

Estado de São Paulo. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-graduaçao em

Linguística Aplicada da Universidade de Brasilia, 2013.

MILLER, G. V. Reflective Practice in Pronunciation Learning. The Internet TESL

Journal, Vol. VIII, No. 1. 2002. Disponível em: http://www.usingenglish.com. Acesso

em 10Set13.

MORAES, J. A. Em tomo da entoação: alguns problemas teóricos. In: Cultura

Lingüística, n. 1, p. 63-78, 1982

____________. Recherches sur l’intonation modale du portugais brèsilien parlé à Rio

de Janeiro. Tese de Doutorado, Université de la Sorbonne Nouvelle. Paris, 1984.

____________. “Melodic contours of yes/no questions in Brazilian Portuguese”, In:

BOTINIS, Antonis (ed.) Proceedings of ISCA Tutorial and Research Workshop on

Experimental Linguistics, Athens: University of Athens, 2006, pp. 117-120.

Page 96: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

96

____________. “The Pitch Accents in Brazilian Portuguese: analysis by synthesis”. In:

BARBOSA, P., MADUREIRA, S. and REIS, C. (eds.) Proceedings of the Speech

Prosody 2008: Fourth Conference on Speech Prosody,Campinas, 2008, pp. 389-397.

NESPOR, M.; VOGEL, I. Prosodic Phonology. Dordrecht-Holland: Foris Publications,

1986.

____________. La prosodia. Madrid: Visor Distribuciones, 1994.

OSTENDORF, M., SHAFFRAN, I., BATES, R. "Prosody models for conversational

speech recognition". In:Proc. of the 2nd Plenary Meeting and Symposium on Prosody

and Speech Processing, 2003. pp. 147-154.

PAIXÃO, V.Padrões entonacionais da interrogativa na fala carioca. Trabalho

apresentado na XXXIII Jornada Giulio Massarani de Iniciação Científica, Artística e

Cultural. Rio de Janeiro: UFRJ, 2011.

PAIXÃO, V.; CALLOU, D. A entonação das interrogativas absolutas neutras no

português do Rio de Janeiro. Anais do III Colóquio Brasileiro de Prosódia da Fala. Belo

Horizonte. Jun 6-8, 2011.

PIERREHUMBERT, J. The Phonology and Phonetics of English Intonation. Ph.D

thesis, MIT. 1980.

PINTO, M. S. Transferências prosódicas do português do Brasil/LM na aprendizagem

do Espanhol/LE: enunciados assertivos e interrogativos totais. Tese de Doutorado,

Programa de Pós-graduação em Letras Neolatinas da Universidade Federal do Rio de

Janeiro. Rio de Janeiro, 2009.

REINECKE, K. Parâmetros Acústicos de Perguntas Sim-Não e Wh- no Alemão e no

Português Brasileiro. Revista Letras, Curitiba,n. 73, pp. 47-71, set./dez. 2007. Editora

UFPR.

RIZZO, J. O papel da entonação do Português Brasileiro na descrição dos Atos de

Fala. Dissertação de Mestrado. Campinas: Universidade Estadual de Campinas, 1981.

SANTOS, G. F. Contato linguístico na região de fronteira Brasil/Uruguai: aentoação

dialetal em enunciados interrogativos do português e do espanhol. Dissertação de

Page 97: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

97

Mestrado, Programa de Pós-graduação em Letras Neolatinas da Universidade Federal

do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2008.

SELIKIRK, E. Phonology and Syntax. The relation between sound and structure.

Cambridge: MIT Press, 1984.

SERRA, C. R. Realização e percepção de fronteiras prosódicas no Português do

Brasil: fala espontânea e leitura. Tese de Doutorado. Programa de Pós-graduação em

Letras Vernáculas da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2009.

SILVA, J. C. B. Caracterização prosódica dos falares brasileiros: as orações

interrogativas totais. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-graduação em Letras

Vernáculas da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2011.

SOUZA, M. L. M. Padrões Entoacionais da Interrogação na Fala Espontânea

Carioca. Trabalho apresentado no II Encontro de Língua Falada e Escrita. Universidade

Federal do Alagoas, 20-24 set. 1995.

STERGAR, J. & ERDEM, C. Adapting Prosody in a Text-to-Speech System, Products

and Services; from R&D to Final Solutions. Igor Fuerstner (Ed.), 2010. Disponível em:

http://www.intechopen.com/books/products-and-services--from-r-d-to-final-

solutions/adapting-prosody-in-a-text-to-speech-system

T’HART, J., COLLIER, R. & COHEN, A. A perceptual study of intonation: an

experimental-phonetic approach to speech melody. Cambridge: Cambridge University

Press, 1990.

TENANI, L. Domínios prosódicos no Português do brasil: implicações para a prosódia

e para a aplicação de processos fonológicos. Tese de Doutorado. Campinas:

UEL/UNICAMP, 2002.

Page 98: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

98

RESUMO

O trabalho tem por objetivo analisar a prosódia das interrogativas totais – perguntas cuja

estrutura assemelha-se à de declarativas, que podem ser respondidas com “sim” ou

“não” –, comparando duas amostras de fala do Rio de Janeiro: uma de fala espontânea

(FE) e uma de leitura (LE). O corpus consiste em (i) gravações de um jogo das

personagens e (ii) na leitura, dias depois, dos diálogos entre os participantes do jogo

pelos mesmos indivíduos. Os enunciados que compõem as duas partes do corpus

contêm, portanto, o mesmo conteúdo proposicional, de maneira que qualquer diferença

prosódica existente entre eles se deve unicamente à diferença entre FE e LE. A análise

acústica e realização de testes de percepção baseou-se no Método de Análise Melódica

da Fala de Cantero & Font-Rotchés (2009). Na pesquisa, observou-se que tanto as

interrogativas espontâneas quanto as lidas confirmam a tendência geral de um padrão

circunflexo para as perguntas no Rio de Janeiro, conforme descreve a literatura, embora

na LE haja mais oscilações micromelódicas ao longo do contorno. Verificou-se que na

FE houve maior predomínio do padrão de inflexão final ascendente-descendente, com

menor ocorrência dos padrões alternativos. Além disso, nos dados de LE, a média de

subida no acento nuclear foi maior do que na FE, revelando uma subida melódica mais

saliente na leitura; e o padrão descendente, característico de assertivas ou perguntas

parciais, minoritário em ambas as amostras, é um pouco mais recorrente na FE.

Observou-se ainda que a ocorrência de contornos que fogem ao padrão estabelecido

para as interrogativas está relacionada, geralmente, à expressão de atitudes ou situações

pragmático-discursivas bastante específicas.

Palavras-chave: interrogativas, prosódia, comparação entre fala espontânea e leitura

Page 99: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

99

ABSTRACT

The work aims to analyze the prosody of yes/no questions, the structure of which

resembles that of declarative sentences and may be answered with "yes " or "no",

comparing two samples of speech from Rio de Janeiro: one of spontaneous speech and

one of reading. The corpus consists of (i) recordings of a “characters game” and (ii) the

reading of the dialogues between the participants of the game by the same individuals,

days later. The sentences that compose the two parts of the corpus, therefore, contain

the same propositional content, so that any prosodic difference between them is

probably due to the difference between spontaneous speech and reading. Acoustic

analysis and perception tests were done based on the Melodic Analysis of Speech

method, from Cantero & Font-Rotchés (2009). It was observed that, in both speech

styles, interrogatives confirm the general trend of a circumflex pattern for questions in

Rio de Janeiro, as described in the literature, although, in the reading style, they show

more micromelodic oscillations along the contour. Also in spontaneous speech there

was a higher prevalence of the rising-falling final inflexion pattern, with fewer

occurrences of alternative patterns. Furthermore, in reading data, the average increasing

in the nuclear accent was higher than in spontaneous speech, revealing a more salient

melodic rising for reading; and the descending pattern, typical of assertions or partial

questions, is a little more recurrent in spontaneous speech. We also observed that the

occurrence of non-interrogative patterns is often related to the expression of attitudes or

to very specific pragmatic-discursive situations.

Keywords: prosody, interrogatives, questions, spontaneous speech versus reading

Page 100: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

100

ANEXO 1:

Ficha do informante e termo de aceitação

Page 101: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

101

ANEXO 2:

Transcrição das gravações dos jogos na íntegra

i. Informante T.S. (sexo feminino):

T.S.: É homem?

R.M.: Sim.

T.S.: É famoso?

R.M.: Sim.

T.S.: É velho?

R.M.: Irrelevante.

T.S.: É um personagem?

R.M.: Sim.

T.S.: De desenho animado?

R.M.: Não.

T.S.: Da novela?

R.M.: Não

T.S.: De uma campanha publicitária?

R.M.: Não

T.S.: De um livro?

R.M.: Não.

T.S.: De uma série?

R.M.: Não.

T.S.: De um filme?

R.M.: Sim.

T.S.: É um filme sobre guerra?

R.M.: Sim.

T.S.: É um filme famoso?

R.M.: Sim

T.S.: É... peraí. Não é famoso o filme?

R.M.: Não. Sim, sim, sim!

T.S.: Deixa eu pensar num filme. Tem guerra né? Tá. Tem uma história de amor no filme?

Page 102: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

102

R.M.: Sim

T.S.: Ele é o protagonista?

R.M.: Não, mas depois a gente discute a questão.

T.S.: Ele contracena com outro ator famoso?

R.M.: Sim.

T.S.: É um filme sobre a vida de alguém?

R.M.: Não.

T.S.: Não é sobre guerra, não é sobre alguém famoso. É ficção científica, o filme?

R.M.: Sim.

T.S.: O ator é bonito? Dizem que ele é bonito? Assim, as mulheres acham ele bonito?

R.M.: Não sei.

T.S.: Não sabe. Brincadeira. Essa pergunta era fundamental. Ele é americano?

R.M.: Sim

T.S.: Faz diferença pra mim, na verdade, se eu não sei a nacionalidade?

PESQUISADORA: O ator ou o personagem?

T.S.: Ah, isso é complicado, né?

R.M.: Eu já tinha esquecido dessa questão.

T.S.: O ator é americano?

R.M.: Sim.

T.S.: E o personagem?

R.M.: Não.

T.S.: Peraí. Ele contracena com alguma criança?

R.M.: Não.

T.S.: Não? Ele é alguém mais velho? Ele foi criança no filme e depois vira alguém mais

velho ou...?

R.M.: Sim.

T.S.: Pô, ele não é bonito? (risos) Ele foi criança e aí depois vira adulto. Mas, eu vou

perguntar agora outro personagem. O personagem fica velho?

R.M.: Sim

T.S.: E o personagem é criança?

R.M.: Sim.

T.S.: Eu quero saber se ele envelhece. Eu quero saber se o personagem envelhece ao longo

do filme, se ele era criança e ele fica velho ou ao contrário, era criança, sei lá, era velho,

virou criança. Ficção científica né?

Page 103: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

103

R.M.: Não, não fez isso.

T.S.: O ator tem cabelo loiro?

R.M.: Não sei.

T.S.: Ah, ele é um personagem tipo desenho?

R.M.: Não.

T.S.: Não. É um personagem de história em quadrinho?

R.M.: Não.

T.S.: Não? O personagem tem filho?

R.M.: Sim.

T.S.: Personagem é casado? Eu tô falando do personagem porque eu sei, já entendi que

existe uma diferença. É irrelevante. Tá.

R.M.: É irrelevante.

T.S.: O personagem morre no filme?

R.M.: Sim.

T.S.: Peraí, rapidinho.

PESQUISADORA: Há controvérsias.

R.M.: É muito complexo.

T.S.: O personagem se fantasia?

R.M.: Sim

T.S.: Se fantasia de preto?

R.M.: Sim

T.S.: Ele tem um carro? Ai, meu Deus! Eu perguntei se ele tem um carro especial.

R.M.: Não

T.S.: Ele tem um cavalo?

R.M.: Não.

T.S.: O personagem se fantasia de preto. Calma aí, é um filme, envelhece, se fantasia de

preto.

T.S.: Ele usa terno?

R.M.: Não.

T.S.: Peraí. O ator que interpreta ele não é famoso?

R.M.: Não.

T.S.: Eu já vi o filme? Brincadeira.

R.M.: Não sei.

T.S.: Ele se veste de preto, certo? Ele tem cabelo grande?

Page 104: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

104

R.M.: É irrelevante.

T.S.: É um filme de vampiro?

R.M.: Não.

T.S.: Nunca se sabe né? O filme é de ficção científica?

R.M.: Sim.

T.S.: E esse personagem é uma pessoa, representa uma pessoa no filme?

R.M.: Sim.

T.S.: Representa um cantor?

R.M.: Não.

T.S.: Outro ator?

R.M.: Não.

T.S.: O filme é americano?

R.M.: Sim.

T.S.: É sobre um escrito?

R.M.: Não.

T.S.: Sobre um político?

R.M.: Não.

T.S.: A roupa preta é um uniforme?

R.M.: Sim.

T.S.: O personagem é um super-herói?

R.M.: Não

T.S.: Aí é que dificulta. O personagem é um conquistador?

R.M.: Não.

T.S.: Conquistador de mulheres?

R.M.: Não.

T.S.: O personagem, o filme desse personagem tem, narra uma história real?

R.M.: Não.

T.S.: É ficção científica?

R.M.: Sim.

T.S.: E esse personagem entra numa aventura, no filme?

R.M.: Sim.

T.S.: Assim, uma aventura, não sei, vou dar um exemplo: pro futuro? Não?

R.M.: Como assim?

T.S.: Ué, não sei. Ele envelhece no filme?

Page 105: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

105

R.M.: Sim.

T.S.: Mas o personagem aparece criança, mesmo que interpretado por outro ator?

R.M.: Sim.

T.S.: O filme que ele aparece é a interpretação de algum romance?

R.M.: Não.

T.S.: Deixa eu pensar. No filme o personagem morre jovem?

R.M.: Não.

T.S.: Ele tem vida eterna?

R.M.: Não.

T.S.: Ele é um mágico?

R.M.: Não.

T.S.: Ele é um pirata?

R.M.: Não.

T.S.: Um personagem histórico?

R.M.: Não.

T.S.: Ele faz uma descoberta?

R.M.: Não.

T.S.: Ele constrói uma casa?

R.M.: Não.

T.S.: Esse personagem, a profissão do personagem é ator?

R.M.: Não.

T.S.: O personagem é contador de histórias?

R.M.: Não.

T.S.: O personagem é cozinheiro?

R.M.: Não.

T.S.: O personagem tem uma arma?

R.M.: Sim.

T.S.: A arma é uma espada?

R.M.: Sim.

T.S.: Peraí. Tem outros personagens famosos no mesmo filme?

R.M.: Sim.

T.S.: É um filme?

R.M.: Sim.

Page 106: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

106

T.S.: Peraí. Ele tem uma espada né? E se veste de preto. Peraí, se veste de preto, tem uma

espada. Ele virou vídeo game depois?

R.M.: Sim.

T.S.: Então ferrou.

PESQUISADORA: O que é que não virou vídeo game?

T.S.: É verdade, tudo vira vídeo game. A história se passa nos Estados Unidos?

R.M.: Não.

T.S.: O filme se passa, o filme que eu digo não o filme, a história mesmo onde o

personagem está inserido se passa na Espanha?

R.M.: Não.

T.S.: Se passa no deserto?

R.M.: Não.

T.S.: No espaço?

R.M.: Sim!

T.S.: O personagem é mau?

R.M.: Sim!

T.S.: A espada dele é um negócio que tem uma luz?

R.M.: Sim.

T.S.: Peraí. Meu Deus, e agora que eu sei mas não sei qual o nome dele. Peraí. É daquele

negócio das estrelas, é?

R.M.: Sim.

T.S.: Peraí. Caraca, eu não via isso. Peraí. Sei que ele é mau né? E usa um capacete.

R.M.: Sim.

T.S.: Não adiantava. Eu não sei se o nome que eu vou dizer, eu vou chutar, mas eu não sei se

esse nome corresponde ao personagem porque eu não, não vi. É o Darth Vader.

R.M.: Sim.

ii. Informante T.M. (sexo feminino):

T.M.: É uma mulher ou um homem?

A.S.: É sim ou não.

T.M.: Ué, não entendi.

Page 107: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

107

A.S.: Só pode ter uma resposta ‘sim’ ou ‘não’.

T.M.: Entendi. É mulher?

A.S.: Não.

T.M.: É homem?

A.S.: Sim.

T.M.: É... famoso?

A.S.: Sim.

T.M.: É de desenho animado?

A.S.: Não.

T.M.: É real?

A.S.: Sim.

T.M.: É histórico?

A.S.: Depende de que ponto de vista, não sei.

T.M.: Fez parte da história?

A.S.: Não.

T.M.: É um herói?

A.S.: Não.

T.M.: É cabeludo?

A.S.: Sim.

T.M.: Gente, eu não sei mais o que perguntar... É de... age em conjunto?

A.S.: Sim...

T.M.: É político?

A.S.: Não.

T.M.: Eu já, eu já esqueci todas as perguntas que eu fiz! (risos) É... posso repetir pergunta?

PESQUISADORA: Pode.

T.M.: É desenho?

A.S.: Não.

T.M.: É histórico, né?

A.S.: Não, não é histórico.

T.M.: Não? É... É real, né?

A.S.: É real, sim.

T.M.: É político?

A.S.: Não! (risos)

T.M.: É porque... real, hist-, real assim... É importante? Ele...

Page 108: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

108

A.S.: Pra mim é.

T.M.: É cantor?

A.S.: Sim.

T.M.: Aaah, já mudei um pouquinho a minha, meu pensamento! Ele canta música sertaneja?

A.S.: Não.

T.M.: Olha, eu sou péssima com, com música, hein! (risos) Ele canta?

A.S.: Sim.

T.M.: Ele faz carreira solo?

A.S.: Não e depois sim.

T.M.: Tem uma banda?

A.S.: Não.

T.M.: Não? É só o nome dele?

A.S.: Não e depois sim. Tô te dando dica ainda, né.

T.M.: É nome composto?

A.S.: Não.

T.M.: Gente... Não é sertanejo?

A.S.: Não.

T.M.: É... rock?

A.S.: Sim.

T.M.: É brasileiro?

A.S.: Sim.

T.M.: É famoso?

A.S.: Sim.

T.M.: Conhecido?

A.S.: Sim.

T.M.: Toca em novela?

A.S.: Sim.

T.M.: Gente, mas tem tanto rock brasileiro conhecido. Eu posso chutar os nomes ou eu

tenho que continuar até chegar o final?

PESQUISADORA: Pode, mas eu acho que é mais difícil, né, você tentar chutar os nomes.

T.M.: É porque tem muitas bandas assim, sei lá, que são muito parecidas, aí pode ter várias,

as respostas vão ser as mesmas.

A.S.: Não.

T.M.: Não? Tem diferencial?

Page 109: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

109

A.S.: Sim.

T.M.: Ele tá vivo?

A.S.: Não.

T.M.: Humm... É, é um só? Não é uma banda.

A.S.: Sim.

T.M.: Posso chutar?

PESQUISADORA: Uhum.

T.M.: Charlie Brown Jr.?

A.S.: Não.

T.M.: É antigo?

A.S.: Sim.

T.M.: Tá vivo? Não, né.

A.S.: Não.

T.M.: Ai, tem tantos... Toca... rock, né? Não MPB.

A.S.: Sim, também.

T.M.: É... Ele... morreu... de, sei lá, alguma doença, algo trágico?

A.S.: Sim.

T.M.: Posso continuar chutando? Cazuza?

A.S.: Sim!

T.M.: Aaaah!

A.S.: Não foi difícil!

iii. Informante I.O. (sexo feminino):

I.O.: É homem?

S.S.: É.

I.O.: É real?

S.S.: Não.

I.O.: É um personagem?

S.S.: Sim.

I.O.: De um livro?

S.S.: Não.

Page 110: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

110

I.O.: De um filme?

S.S.: Não.

I.O.: Quadrinho?

S.S.: Não.

I.O.: Folclore?

S.S.: Não.

I.O.: É um bicho, não?

S.S.: Não.

I.O.: É criança?

S.S.: Não.

I.O.: É duma novela?

S.S.: Não.

I.O.: Tem a ver com a televisão?

S.S.: Tem, tem. Tem a...

I.O.: É antigo?

S.S.: Sim, sim.

I.O.: Muito antigo?

S.S.: Sim. Muito.

I.O.: De desenho?

S.S.: Não.

I.O.: É um homem normal?

S.S.: Não.

I.O.: É sobrenatural o personagem?

S.S.: Não, não é sobrenatural.

I.O.: Tem poder?

S.S.: Não.

I.O.: Não é normal... É um objeto?

S.S.: Não.

I.O.: É uma pessoa?

S.S.: Sim.

I.O.: É um E.T.?

S.S.: Não.

I.O.: Então é uma pessoa. Mas tem alguma coisa de diferente. Alguma coisa diferente.

S.S.: Sim.

Page 111: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

111

I.O.: Personagem... da TV? Aparece na TV?

S.S.: Sim.

PESQUISADORA: Também. Mas não surgiu na TV.

S.S.: É... é.

PESQUISADORA: Não é exclusivamente da TV.

I.O.: Aparece em livros?

S.S.: É menos, é menos da TV... pode fa-, é menos da TV, tem mais a ver com outra coisa

que TV.

I.O.: É de livros?

S.S.: Não.

I.O.: Aparece o quê, nas ruas?

S.S.: Sim.

I.O.: Um personagem antigo que aparece nas ruas...

S.S.: Sim.

I.O.: Não entendi agora a definição de personagem... Ele é, ele é tipo um personagem único

ou é tipo uma definição de alguma coisa?

S.S.: Não tem como eu dizer isso...

I.O.: É um personagem? É um, um mesmo...

S.S.: Sim, sim.

I.O.: É uma coisinha, não é tipo “ah, a pessoa que faz isso”, é UM personagem?

S.S.: Sim, sim.

I.O.: Que existe há muitos e muitos anos.

PESQUISADORA: Tem até nome.

S.S.: É.

I.O.: Ok. Então, não é do folclore, gente?

S.S.: Não.

I.O.: É o Papai Noel?

S.S.: Não. (risos)

I.O.: Tem a ver com Papai Noel?

S.S.: Não.

I.O.: O meu é mais difícil...

PESQUISADORA: É, eu acho que o seu é mais difícil mesmo.

I.O.: Eu não tô conseguindo imaginar que tipo de criatura que é... Na TV, tá, ele aparece em,

em algum filme?

Page 112: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

112

S.S.: Não.

I.O.: Tá, então ele aparece numa novela?

S.S.: Não.

I.O.: Nos, nos programas de televisão?

S.S.: Não.

I.O.: Então aparece... nos comerciais?

S.S.: Sim.

I.O.: Ah, tá bom, melhorou. Tá. Existe um ator por trás do personagem?

S.S.: Sim.

I.O.: Ah, podia ser desenho.

S.S.: Não.

PESQUISADORA: É, acho que existem as duas coisas.

S.S.: E, é, sim.

PESQUISADORA: Acho que existem as duas versões.

I.O.: Aparece nos comerciais... Um comercial só?

S.S.: Sim.

I.O.: De uma marca?

S.S.: Sim.

I.O.: Aah, tá. É aquele cara do comercial da C&A?

S.S.: Não. (risos)

I.O.: Esse não é tão velho assim... Muito, muito antigo, tipo, já morreu? O ator?

S.S.: Não.

I.O.: O ator morreu?

S.S.: Não. Não. É, como é que...

I.O.: Vários atores fizeram esse personagem?

S.S.: Não sei.

PESQUISADORA: Creio que sim, não sei.

I.O.: Quando foi criado, vê aí.

S.S.: Já vi, só não posso falar.

PESQUISADORA: É, ela não pode falar.

I.O.: Tá, mas... uma pessoa pode tá viva com esse tempo aí?

S.S.: Sim.

I.O.: De uma marca de... De uma marca específica, né?

S.S.: Sim.

Page 113: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

113

I.O.: É uma marca de um produto... É um produto? Pra vender, pra consumo?

S.S.: Sim.

I.O.: Roupa?

S.S.: Não.

I.O.: Algum produto doméstico?

S.S.: Não.

I.O.: Livros?

S.S.: Não.

I.O.: Vende plano de saúde?

S.S.: Não...

PESQUISADORA: É algo tão corriqueiro...

I.O.: Luz? Água? Telefone? Internet?

S.S.: Não, não, não...

PESQUISADORA: É muito mais corriqueiro que tudo isso.

I.O.: Pra vender uma coisa...

S.S.: Pra, pra ela então...

I.O.: Comida?!

S.S.: Sim. (risos)

I.O.: Vende comida... É o Ronald?!

S.S.: É!

I.O.: Aaaai! Ah, não foi tão... Né? Foi rapidinho!

iv. Informante P.B. (sexo feminino):

P.B.: Seu personagem é real?

G.G.: Não.

P.B.: Seu personagem é do sexo feminino?

G.G.: Sim.

P.B.: Ele participa de desenho animado?

G.G.: Sim.

P.B.: Esse desenho animado é antigo?

G.G.: Não.

Page 114: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

114

P.B.: Esse desenho animado passa na Globo?

G.G.: Não.

P.B.: É... Esse personagem é um animal?

G.G.: Não.

P.B.: É... Esse personagem... Não sei mais, gente.

G.G.: Que nervoso.

P.B.: Ele não passa na Globo, eu não vejo televisão... É... Ele é um personagem, ele é, de

desenho animado, né?

G.G.: Isso, sim.

P.B.: Um desenho animado da televisão?

G.G.: Não.

P.B.: É de gibi?

G.G.: Não.

P.B.: É um personagem da literatura?

G.G.: Não.

P.B.: É... Não é de gibi, não é da literatura, não passa na televisão... (risos) É um...

personagem... folclórico?

G.G.: (risos) Não!

P.B.: O que acontece se eu não adivinhar?

PESQUISADORA: Eu pego o Bis de volta! (risos)

P.B.: Esse personagem... Tem direito a dica?

PESQUISADORA: Só se estiver muito difícil.

G.G.: Tá indo pelo caminho errado.

P.B.: Esse personagem é bem famoso?

G.G.: Sim.

P.B.: Mas esse personagem passa em algum programa de televisão?

G.G.: Não, não.

P.B.: Gente, eu não sei brincar... É... Esse personagem é um super-herói?

G.G.: Não.

P.B.: Gente, eu não conheço esse personagem, não é da televisão, nem de revis-, nem de

livro, nem de gibi.

G.G.: Tem uma coisa que você não falou.

P.B.: É um personagem de revista?

G.G.: Não. (risos)

Page 115: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

115

P.B.: De filme?

G.G.: Siiim. (risos)

P.B.: É uma animação infantil?

G.G.: Siiim!

P.B.: É... Esse personagem... é... verde?

G.G.: Não.

P.B.: Não? Esse personagem é... Essa animação é recente?

G.G.: Não.

P.B.: É, ele não é um animal?

G.G.: Não.

P.B.: Esse... Esse personagem... Dá uma dica.

G.G.: Continua nessa linha.

P.B.: Então ele é de fi, de animação, antiga... Esse personagem... é... luta nessa animação?

G.G.: Não.

P.B.: Você conhece essa animação?

G.G.: Sim. (risos)

PESQUISADORA: Ele conhece todas as animações! (risos)

P.B.: É uma menina, né?

G.G.: Siiim. Ai, é muito fácil.

P.B.: Esse filme... É um filme, né?

G.G.: Sim.

P.B.: Esse filme ganhou algum Oscar?

G.G.: Não sei agora! (risos)

PESQUISADORA: Acho que não.

G.G.: Acho que não também.

P.B.: Então eu não conheço a animação. É bem conhecida a animação?

G.G.: Sim.

P.B.: É, esse personagem... come macarrão no filme, nessa animação?

G.G.: Não. (risos)

P.B.: Esse personagem usa vestido vermelho?

G.G.: Não.

P.B.: Esse personagem... Não é antigo, né?

G.G.: Não.

P.B.: Ah, não! Peraí, é antigo ou não é?

Page 116: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

116

G.G.: Não.

P.B.: Não é antigo.

PESQUISADORA: É melhor você fazer uma pergunta mais precisa...

G.G.: É! (risos)

PESQUISADORA: “Antigo” pode ser um pouco subjetivo...

P.B.: Ah, é. Antigo pra mim não é antigo pra D. Né?

G.G.: (gargalhando)

P.B.: Esse personagem... Essa animação tem mais de dez anos?

G.G.: Sim. Sim.

P.B.: Tem mais de quinze?

G.G.: Sim.

P.B.: É um clássico?

G.G.: Sim.

P.B.: É... Esse personagem participa do... De “Alice no País das Maravilhas”?

G.G.: Não.

P.B.: Esse personagem participa do Mágico de Oz?

G.G.: Não.

P.B.: Esse personagem... participa de... Esse personagem deve ser da minha infância?

G.G.: Sim.

P.B.: Esse personagem usa sapato rosa?

G.G.: Não.

P.B.: Gente, eu não...

PESQUISADORA: Continua nessa linha.

P.B.: Esse personagem usa sapato vermelho?

G.G.: Não.

P.B.: Então não é a Dorothy. Esse personagem... Esse personagem é loiro?

G.G.: Não.

P.B.: Não? Esse personagem é da Disney, essa animação é da Disney?

G.G.: Sim.

P.B.: Esse personagem é uma das Princesas?

G.G.: Sim.

P.B.: Esse personagem namora uma Fera?

G.G.: Não.

P.B.: Esse personagem... é... tem uma madrasta má?

Page 117: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

117

G.G.: Não.

P.B.: Esse personagem... vive... namora o... Aladdin?

G.G.: Não.

P.B.: Esse personagem usa vestido amarelo?

G.G.: Não.

P.B.: Esse personagem é uma sereia?

G.G.: Não.

P.B.: É uma das Princesas?

G.G.: Sim.

PESQUISADORA: É? Não sei, é?

G.G.: Sim!

P.B.: Esse personagem dorme muito? (risos)

G.G.: (gargalhando) Não. Tá faltando uma.

P.B.: Esse personagem... peraí. Esse personagem tem trança grande? Não, ela não é uma

princesa.

G.G.: Não.

P.B.: É... Aurora... O nome desse personagem não começa com C?

G.G.: Não.

P.B.: O nome desse personagem começa com A?

G.G.: Não.

P.B.: O nome desse personagem começa com B?

G.G.: N ão.

P.B.: O personagem é principal na animação?

G.G.: Sim.

P.B.: Ah é, porque é uma das Princesas. Não começa com A, não começa com B. Não

começa com A. Não começa com R?

G.G.: Não.

P.B.: Não começa com... A?

G.G.: Não. (risos) Não começa com A?

P.B.: Porra... Acabaram as minhas...

PESQUISADORA: Tá faltando alguma...

G.G.: Faltou a única.

PESQUISADORA: Tem certeza que ela é uma das Princesas?

G.G.: Tenho.

Page 118: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

118

P.B.: Pô, as Princesas que eu conheço são: a Aurora, a Branca de Neve, a Cinderela, a

Bela... A Bela namorou a Fera, então... a Ariel... Acabou.

PESQUISADORA: É, eu não sei, assim, eu não sei se é uma das Princesas pelo menos

desses produtos que tem agora das Princesas...

G.G.: É.

PESQUISADORA: Mas é uma dessas personagens aí.

PESQUISADORA: Tem até uma outra também que você não falou, que não é a resposta

mas que você também não lembrou.

G.G.: Ah, é verdade. Já sei qual você tá falando... Você esqueceu as duas na verdade. E as

duas tem uma característica em comum.

P.B.: Essa princesa...

PESQUISADORA: Ela tem algo de bem diferente das outras.

G.G.: Exatamente.

P.B.: É feia?

G.G.: Não.

P.B.: Essa princesa é negra?

G.G.: Não... Mas vai por aí.

P.B.: Essa princesa não é a do Aladdin, não é a Jasmin.

G.G.: Não.

PESQUISADORA: Pergunta sobre as características físicas dela.

P.B.: Essa princesa é gorda?

G.G.: Não. (risos)

P.B.: Essa princesa é... não é preta.

G.G.: Não. (risos)

P.B.: Essa princesa... tem cabelo curto?

G.G.: Não.

P.B.: Essa princesa... foi transformada em um brinquedo?

G.G.: Não.

P.B.: Não? Ó... Essa princesa... não é feia?

G.G.: Não.

P.B.: Gente, me mata, porque... Essa princesa é má?

G.G.: Não.

PESQUISADORA: O problema é que você tá pensando nas opções que você já lembrou. Só

que você ainda não lembrou dela...

Page 119: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

119

G.G.: Você esqueceu duas, na verdade.

PESQUISADORA: Você tem que ir fazendo perguntas pra você lembrar dessa. Você ta

tentando perguntar já direcionado pras que cê tem na cabeça.

P.B.: Eu sou muito ruim nisso.

G.G.: Eu vou demorar uma hora também.

P.B.: Essa princesa tem cabelo laranja?

G.G.: Não.

P.B.: Essa princesa tem cabelo verde?

G.G.: Não.

P.B.: Essa princesa tem o cabelo colorido?

G.G.: Não. (risos)

P.B.: Tem certeza que ela não pinta o cabelo?

PESQUISADORA: Tenho certeza que ela não pinta o cabelo!

G.G.: Absolutíssima!

P.B.: Essa princesa tem cabelo branco?!

G.G.: (risos) Não.

P.B.: Essa princesa tem cabelo preto?

G.G.: Sim.

P.B.: Essa princesa é morena?

G.G.: Sim.

P.B.: Mas não é negra?

G.G.: Não.

P.B.: Essa princesa beija um sapo?

G.G.: Não.

P.B.: Essa princesa... é morena...Essa princesa tem um namorado?

G.G.: Sim.

P.B.: O namorado dessa princesa... Essa princesa trabalha?

G.G.: Não... Sim, na verdade sim.

P.B.: Trabalha? Essa princesa...

G.G.: Trabalha ela?

PESQUISADORA: É... Trabalha.

P.B.: Essa princesa é prostituta? (risos) Sei lá, vocês tão duvidando do trabalho dela... É uma

princesa diferente.

G.G.: Princesa da rua!

Page 120: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

120

PESQUISADORA: Ela trabalha, ela só não ganha dinheiro em troca.

G.G.: É, exatamente.

P.B.: Ela não limpa o chão?

G.G.: Não.

P.B.: Essa princesa é cozinheira?

G.G.: Não. Continua no namorado.

PESQUISADORA: Ou na, ou no trabalho.

G.G.: É.

P.B.: Essa princesa... tem um namorado pobre, não?

G.G.: Não.

P.B.: Essa princesa se torna princesa porque casa com o namorado rico?

G.G.: Não.

P.B.: Cara, eu sou muito idiota... A gente tem que ficar perguntando até adivinhar?

PESQUISADORA: Não, se você quiser desistir... Mas é que ta tão perto!

G.G.: Quando conseguir adivinhar você vai ficar muito puta.

P.B.: Essa princesa É da Disney?

PESQUISADORA: Pára de pensar que ela é uma princesa, porque... Acho que ela não é, ela

não se torna princesa exatamente,né?

G.G.: Não, ela já é.

PESQUISADORA: Ah, é, ela já é princesa... Ce sabe, vê que de animação ele entende, as

histórias ele sabe de cabo a rabo.

P.B.: Mas eu não sei. Vou até mudar meu personagem pra ficar mais difícil. É, essa

princesa... hum... deixa eu pensar...

G.G.: Eu acho que pelo príncipe tava mais fácil. Pelo namorado. Pelo namorado não é mais

fácil?

PESQUISADORA: Talvez... Tanta coisa que ela pode perguntar... Sobre o local onde ela

mora, por exemplo.

G.G.: É, acho que esse mataria, talvez.

P.B.: Mataria se eu tivesse ideia de quem seja a princesa. Essa princesa é brasileira?

G.G.: Não.

P.B.: Essa princesa mora na selva?

G.G.: Sim.

P.B.: Essa princesa... essa, o namorado dessa princesa faz “Ô-ô-ôôôô”?

(gargalhadas)

Page 121: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

121

G.G.: Não...

P.B.: Porra, essa princesa não... Essa princesa não é a Jane? A Jane não é uma princesa. Mas

ela mora na selva?

G.G.: Sim.

P.B.: Essa princesa vai à luta?

G.G.: Sim.

P.B.: Se faz de homem pra ir à luta?

G.G.: Não.

PESQUISADORA: Não, agora você lembrou da outra!

G.G.: Lembrou da outra!

P.B.: Essa, o nome dessa princesa começa com P?

G.G.: Sim!

P.B.: Com “Po”?

G.G.: Sim.

P.B.: É a Pocahontas?!

G.G.: Graças a Deus!

v. Informante R.M. (sexo masculino):

R.M.: Você é mulher?

D.G.: Não.

R.M.: Você é homem?

D.G.: Sim.

R.M.: Uma pessoa?

D.G.: Não.

R.M.: Um personagem?

D.G.: Sim.

R.M.: De filme?

D.G.: Não

R.M.: Desenho animado?

D.G.: Não.

R.M.: Literatura?

Page 122: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

122

D.G.: Não.

R.M.: Quadrinhos?

D.G.: Não.

R.M.: É um animal?

D.G.: Não.

R.M.: É uma coisa?

D.G.: Não.

R.M.: Eu não faço ideia do que você é?

D.G.: Sim! (risos)

R.M.: Teatro?

D.G.: Não.

R.M.: Não faço ideia. Homem já perguntei, né? Qual sua profissão, se tiver?

PESQUISADORA: Ele só pode responder “sim ou não”.

R.M.: Ah, tá! É verdade. Esqueci. Você tem uma profissão? Uma ocupação?

D.G.: Sim.

R.M.: Esquisito. É um personagem de ficção?

D.G.: Sim.

R.M.: É um personagem bíblico?

D.G.: Não.

R.M.: Isso é horrível.

PESQUISADORA: Tenta fazer outras perguntas, sobre outras coisas, pra ver se de repente

não...

R.M.: Tô tentando. É um personagem, não sei, da televisão?

D.G.: Sim.

R.M.: Seriado?

D.G.: Não.

R.M.: Algum programa?

D.G.: Não.

R.M.: Minissérie?

D.G.: Não.

R.M.: Baseado num personagem real? Eu tô olhando...

D.G.: Não.

R.M.: Tem algum bordão famoso?

D.G.: Não.

Page 123: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

123

R.M.: Você fala?

D.G.: Sim.

R.M.: Nacional?

D.G.: Não.

R.M.: Americano?

D.G.: Sim.

R.M.: É humorístico?

D.G.: Sim.

R.M.: Tem parentes?

D.G.: Não sei.

R.M.: Que bom. Você acabou de se inventar?

D.G.: Não.

R.M.: Eu posso desistir?

PESQUISADORA: Pode, mas não é tão difícil assim né?

R.M.: Não tá parecendo.

PESQUISADORA: É famoso, é famoso. A gente pode dar essa dica.

D.G.: Era essa pergunta que eu queria que você fizesse.

R.M.: Eu imaginei.

PESQUISADORA: Já te dei uma dica, é famoso.

R.M.: É de novela? Não, claro que não. Nem filme, nem seriado.

PESQUISADORA: Nossa, o Rafael tá tão nervoso que parece que tá valendo a vida dele.

R.M.: Questão de honra agora.

R.M.: É um personagem antigo?

D.G.: Sim.

R.M.: Século XX?

D.G.: Sim.

PESQUISADORA: Desiste?

D.G.: Faz perguntas.

PESQUISADORA: É, não desiste não. Não é tão difícil assim.

R.M.: Isso não é de filme, isso não é de série...

PESQUISADORA: Tenta fazer...

D.G.: Então, você já excluiu tudo, falta só uma coisa que você não falou.

R.M.: Eu não tô lembrando. Já perguntei teatro...

PESQUISADORA: Tenta fazer outras perguntas aleatórias assim.

Page 124: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

124

R.M.: É difícil fazer perguntas aleatórias sobre uma coisa que eu não sei bem o que que é.

PESQUISADORA: Pergunta sobre a aparência física.

R.M.: É alto?

D.G.: Sim.

R.M.: Uma pessoa, né? Morena?

D.G.: Não.

R.M.: Tem cabelo?

D.G.: Sim.

R.M.: Loiro?

D.G.: Não.

R.M.: Ruivo?

D.G.: Sim.

R.M.: O intérprete desse personagem é famoso?

D.G.: Não.

R.M.: Eu devia ter almoçado antes. Tô me sentindo mal.

D.G.: Esse tá mais divertido, né, que o anterior?

R.M.: Eu também tô achando. Tem alguma outra característica bastante específica além do

cabelo ruivo?

D.G.: Sim.

R.M.: Se refere ao vestuário?

D.G.: Sim.

R.M.: Em termos de vestuário, usa cores vivas?

D.G.: Sim.

R.M.: Algo como um terno?

D.G.: Não.

R.M.: Cobre o corpo todo?

D.G.: Sim

R.M.: Preferia fazer prova de Port. Interage com algum outro personagem tão famoso

quanto?

D.G.: Não.

PESQUISADORA: Uma dica? Deixa ver uma dica que não logo entregue tudo.

R.M.: Vai pensando aí.

PESQUISADORA: Ele interage com outros personagens sim, mas não tão famosos quanto.

R.M.: Alguma parte do seu corpo é, não sei, maior que as demais, chama a atenção?

Page 125: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

125

D.G.: Sim.

R.M.: Não é de desenho animado?

D.G.: Não.

R.M.: Não é? Tá. Deixa eu desistir, não aguento mais.

PESQUISADORA: Tá bom, pode desistir se quiser.

D.G.: Dá a dica pra ele de onde ele aparece.

PESQUISADORA: Tá, ele é um personagem fictício que é garoto propaganda de uma

empresa.

D.G.: Era isso: propaganda.

R.M.: Jamais ia pensar nisso.

D.G.: Mas é muito famoso.

R.M.: Personagem americano?

D.G.: Isso.

R.M.: Vende um produto americano?

D.G.: Isso

R.M.: É um produto doméstico?

D.G.: Não.

R.M.: É um produto físico?

D.G.: Sim.

PESQUISADORA: Pergunta mais sobre o produto que você chega lá. Não, tô ajudando

porque se não a gente não sai daqui hoje.

R.M.: Já falei?

PESQUISADORA: Não, é importante assim, é que sabendo o produto ele descobre rápido

quem é o garoto propaganda.

R.M.: É eletrodoméstico? Ou algo do tipo?

D.G.: Não.

R.M.: Roupa?

D.G.: Não. Vou dar uma dica: é o que a gente mais deseja.

R.M.: Comida?

D.G.: Isso! Sim!

PESQUISADORA: R. não tá com fome.

R.M.: É um restaurante?

D.G.: Sim.

R.M.: Uma lanchonete?

Page 126: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

126

D.G.: Sim.

R.M.: É o Ronald Mcdonald.

D.G.: É! (risos)

vi. Informante C.F. (sexo masculino):

C.F.: Você é de desenho animado?

P.C.: Não.

C.F.: Você é de filme?

P.C.: Não.

C.F.: Você é de série?

P.C.: Não.

C.F.: Você é de videogame?

P.C.: Não.

C.F.: Você é de livro?

P.C.: Não.

C.F.: Você é de novela?

P.C.: Não.

C.F.: Você é... da História?

P.C.: Também.

C.F.: Você é de... sei lá, de uma história... inventada?

P.C.: Não.

C.F.: Você é de uma história real então?

P.C.: Sim.

C.F.: Você nasceu na Idade Média?

P.C.: Não.

C.F.: Idade Moderna?

P.C.: Sim.

C.F.: Você tava na Revolução Industrial?

P.C.: Não.

C.F.: Você tava na Revolução Francesa?

P.C.: Não.

Page 127: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

127

C.F.: Você tava... hum... na Independência?

P.C.: Não.

C.F.: Você tava na Independência do Brasil?

P.C.: Não.

C.F.: Você tava na... você é um autor de livro?

P.C.: Não. Não sou nenhum escritor.

C.F.: Você... É um filósofo?

P.C.: Não.

C.F.: Você é... você pensou a sociedade de alguma maneira?

P.C.: Sim.

C.F.: Você... escreveu algum livro?

P.C.: Não.

C.F.: Você fez algum ato?

P.C.: Não.

C.F.: Você fez... Você viajou?

P.C.: Não.

C.F.: Você é da Europa?

P.C.: Não.

C.F.: Você é da América Latina?

P.C.: Sim.

C.F.: Você é da América Latina da parte dominada pelos espanhóis?

P.C.: Não.

C.F.: Você é da América Latina, do Brasil?

P.C.: Sim.

C.F.: Você é da região sul?

P.C.: Sim.

C.F.: Você... Você é Anita Garibaldi?

P.C.: Não.

C.F.: Você... Você é homem?

P.C.: Sim.

C.F.: Você lutou em alguma causa?

P.C.: Não.

C.F.: Eu não sei se eu to indo bem... (risos) Você... tá, você não lutou em nenhuma causa,

você... Você não participou de nenhum movimento de revolução?

Page 128: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

128

P.C.: Sim.

C.F.: Você... fez uma, você participou de um movimento cultural, econômico... Cultural?

P.C.: Não.

C.F.: Econômico?

P.C.: Sim.

C.F.: Tá. Você inventou algum produto útil?

P.C.: Não.

C.F.: Você... Você era de algum movimento separatista?

P.C.: Não.

C.F.: Você... Você não era de um movimento separatista, você era do sul do Brasil... Idade

Moderna, mais de mil e oitocentos?

P.C.: Sim.

C.F.: Mil oitocentos e... setenta?

P.C.: Não.

C.F.: Mil e novecentos?

P.C.: Por aí.

C.F.: Mil e novecentos... Você foi presidente?

P.C.: Sim.

C.F.: Você... Você é o Juscelino?

P.C.: Não. (risos)

C.F.: Você foi presidente do Brasil?

P.C.: Sim.

C.F.: Você... foi o... Você só teve um mandato?

P.C.: Não.

C.F.: Você teve dois mandatos?

P.C.: Não.

C.F.: Você teve mais de dois mandatos?

P.C.: Sim.

C.F.: Você teve três mandatos?

P.C.: Sim.

C.F.: E você fazia parte de alguma oligarquia?

P.C.: Sim.

C.F.: Você... Você... Você fez algum plano? Econômico, com o dinheiro...? Com moeda?

P.C.: Não, não.

Page 129: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

129

C.F.: Você... É homem, você foi presidente da nação, você é sulista... Gente, não sei. Você é

um líder. Você foi importante pra história do Brasil?

P.C.: Muito.

C.F.: Foi muito importante pra história do Brasil. Tá. Você... Você foi presidente do Brasil?

P.C.: Sim.

C.F.: Tá. (risos) Você... Você não foi Tancredo Neves?

P.C.: Não.

C.F.: Tá. Você... Você é da República?

P.C.: Sim.

C.F.: Tá. Você... não é D. Pedro I...

P.C.: Não.

C.F.: Você não é D. Pedro II...

P.C.: Não.

C.F.: Você... Você não foi um ditador?

P.C.: Sim.

C.F.: Ah, você é Getúlio?

P.C.: Sim!

C.F.: Getúlio é mais de 1900, Pedro!

P.C.: Eu falei sim! Eu falei POR AÍ!

C.F.: Ah, eu pensei menos...

vii. Informante G.G. (sexo masculino):

G.G.: É um personagem?

P.B.: Sim.

G.G.: Personagem real?

P.B.: Real.

G.G.: É um personagem brasileiro?

P.B.: Não.

G.G.: Americano?

P.B.: Não.

G.G.: Europeu?

Page 130: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

130

P.B.: Não.

G.G.: Asiático?

P.B.: Não.

G.G.: Da selva?

P.B.: Não.

G.G.: Da Oceania não é, né?

P.B.: Não.

G.G.: É um personagem de um filme?

P.B.: Não.

G.G.: Da literatura?

P.B.: Não.

G.G.: Pô... É... Do teatro?

P.B.: Não.

G.G.: Uma personagem real?

P.B.: Como é que a gente vai definir o real? (risos)

G.G.: A teoria do real! (risos)

P.B.: É, é um real, é um real.

G.G.: É um personagem real que foi... ficcionalizado em alguma manifestação artística?

P.B.: Faz pergunta mais fácil por favor? (risos)

G.G.: Esse personagem virou, por exemplo, personagem de um filme?

P.B.: Não.

G.G.: É um político?

P.B.: Não.

G.G.: É um artista?

P.B.: Não. Ah, então, é fictício, fictício. (risos)

G.G.: (risos) É um personagem fictício?

P.B.: É.

G.G.: Não é da literatura...

P.B.: Não.

G.G.: Não é do cinema...

P.B.: Não.

G.G.: Não é do teatro?

P.B.: Não.

G.G.: Novela?

Page 131: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

131

P.B.: Não.

G.G.: É um, esse personagem tem nacionalidade?

P.B.: Hum?

G.G.: Tem nacionalidade esse personagem?

P.B.: Tem.

G.G.: É homem?

P.B.: Não.

G.G.: É mulher?

P.B.: Sim.

G.G.: Ela é alta?

P.B.: Não.

G.G.: Ela é baixa?

P.B.: Sim.

G.G.: Loira?

P.B.: Não.

G.G.: Morena?

P.B.: Sim.

G.G.: Bonita?

P.B.: Isso é subjetivo.

G.G.: Não é a Dorothy não, né?

P.B.: Não.

G.G.: Você falou da Dorothy... Deixa eu pensar... Ela mora com alguém?

P.B.: Mora.

G.G.: Com marido?

P.B.: Não.

G.G.: Filhos?

P.B.: Não.

G.G.: Animais?

P.B.: Não.

G.G.: Mãe, pai?

P.B.: Peraí, faz uma pergunta de cada vez.

G.G.: Com a mãe?

P.B.: Não.

G.G.: Com o pai?

Page 132: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

132

P.B.: Sim.

G.G.: Cinderela? Não, não é do filme.

P.B.: É, ela não é de um filme.

G.G.: Ah é, desculpa. Ela mora com o pai. Personagem fictício e mora com o pai. E a casa

dela é grande?

P.B.: Não.

G.G.: Ela é pobre?

P.B.: É.

G.G.: Ela mora com o pai, uma mulher morena que mora com o pai e é pequena. E é pobre.

P.B.: É.

G.G.: Classe C, né?

P.B.: É. Talvez. (risos)

G.G.: Não é brasileira?

P.B.: Não.

G.G.: Africana?

P.B.: Não.

G.G.: Mas ela tem uma nacionalidade?

P.B.: Sim. Todo mundo tem uma nacionalidade.

G.G.: Mas essa nacionalidade é... real? De um país que existe?

P.B.: Sim.

G.G.: Esse país tá na Europa?

P.B.: Não.

G.G.: Vou voltar aos continentes. Na América?

P.B.: Sim.

G.G.: Do Sul?

P.B.: Sim.

G.G.: É uma personagem argentina?

P.B.: Sim.

G.G.: É a Mafalda.

P.B.: Não. A Mafalda mora com o pai?

G.G.: Sei lá. (risos) É...

P.B.: Você faz umas perguntas muito difíceis.

G.G.: Mais simples, tem que simplificar?

P.B.: Uhum.

Page 133: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

133

G.G.: Tá... Ela fala, essa personagem?

P.B.: Sim.

G.G.: E ela tem amigos?

P.B.: Tem.

G.G.: Ela é jovem?

P.B.: É.

G.G.: Estuda?

P.B.: Sim.

G.G.: É a Mônica?

P.B.: Não.

G.G.: Magali, não, né?

P.B.: Não.

G.G.: Ela tem algum animal de estimação?

P.B.: Não.

G.G.: A mãe dela morreu?

P.B.: (silêncio)

G.G.: A mãe dela não existe.

P.B.: É.

G.G.: E ela tem outros parentes?

P.B.: Não.

G.G.: Não é um personagem de... televisão?

P.B.: É.

G.G.: Ah, é de televisão?

P.B.: É. Você não tinha perguntado se era de televisão.

G.G.: É. Não é de novela?

P.B.: Não.

G.G.: É de desenho?

P.B.: Não.

G.G.: De uma série?

P.B.: Sim.

G.G.: De uma série brasileira?

P.B.: Não.

G.G.: É do Chaves, é um personagem do Chaves?

P.B.: Sim.

Page 134: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

134

G.G.: É a Chiquinha! (risos)

viii. Informante T.A. (sexo masculino):

T.A.: É... É homem?

W.M.: Sim.

T.A.: É um personagem histórico?

W.M.: Sim.

T.A.: Bom, a sua pergun-, a sua resposta não foi... foi uma coisa, mas sua cara fez outra,

então... (risos) É... é de ficção?

W.M.: Não.

T.A.: Tá. Ficou claro. É... Em termos de aparência física, tem é... é negro?

W.M.: Não.

T.A.: É branco?

W.M.: Sim.

T.A.: É loiro?

W.M.: Essa eu não sei responder.

T.A.: Não tem cabelo? Tem cabelo?

W.M.: Sim.

T.A.: De alguma forma marcou a história?

W.M.: Sim.

T.A.: Do país? (...) Do país?

W.M.: Sim.

T.A.: Do nosso país?

W.M.: Não.

T.A.: Tem limite de perguntas ou...

PESQUISADORA: Não, pode perguntar o quanto você quiser.

T.A.: O problema são as perguntas.

W.M.: Uhum.

T.A.: Que não tá me dando dica boa.

W.M.: Por isso que eu deixei você primeiro.

Page 135: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

135

T.A.: Ah-ah, esperto! É... Meu Deus. Você disse que é branco mas que não é loiro, tem

cabelo. Cabelo preto?

W.M.: Não sei.

T.A.: Esse personagem é histórico... É... Alguma coisa a ver com, é algum personagem

assim tipo revolucionário, fez algum feito revolucionário...?

W.M.: Sim.

T.A.: Foi... presidente?

W.M.: Não.

T.A.: Tá ligado à política?

W.M.: Não.

T.A.: Tá ligado à... à arte?

W.M.: Sim.

T.A.: À arte literatura?

W.M.: Não.

T.A.: Não? À arte... era pintor?

W.M.: Sim.

T.A.: Era... francês?

W.M.: Não.

T.A.: Era... quer dizer, ou é, né, não sei. Ele tá vivo?

W.M.: Não.

T.A.: É americano?

W.M.: Não.

T.A.: É brasileiro?

W.M.: Não.

T.A.: (risos) É alemão?

W.M.: Não.

T.A.: É... espanhol?

W.M.: Sim.

T.A.: Espanhol? O negócio é eu não conhecer nenhum pintor espanhol (risos). (...) É um

pintor espanhol. Agora é o problema, quem é? (...) É... Não vou tentar fazer perguntas de, da

arte dele porque não adianta que eu não vou saber.

PESQUISADORA: Talvez você até saiba.

T.A.: Tipo se era...

PESQUISADORA: É que você não tá lembrando, porque agora ficou fácil.

Page 136: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

136

T.A.: É, eu não tô, não me vem à mente nenhum.

PESQUISADORA: Quando você descobrir você vai ficar assim “Ah, tava muito fácil!”

T.A.: (risos) Meu Deus...

W.M.: Você perguntou se tinha a ver com política, né?

T.A.: Isso.

W.M.: Sim.

T.A.: Ele é espanhol? Sim, né. Espanhol de, tipo, da Espanha, mesmo?

W.M.: Sim.

T.A.: Nossa. (...) Eu não sei, acho que não vou conseguir daqui pra frente, não vou lembrar

de nenhum nome aqui. Não dá nem pra chutar. Não vai adiantar se eu perguntar várias

coisas que eu não vou conseguir ir lembrando. Então se não for...

PESQUISADORA: Bom, eu acho que você consegue acertar, agora, se você também não

quiser de-, achar que quer desistir, não tem problema. Mas eu se fosse você tentava mais um

pouquinho, porque já tá, já chegou perto da resposta.

T.A.: Então eu vou, vou começar já a apelar, no caso, pra... É... A letra do nome dele

começa com A? (risos) Eu vou o alfabeto inteiro. (risos) Pra ver se me dá uma pista.

W.M.: Não.

T.A.: B?

W.M.: Não.

T.A.: Não, tô zoando, não vou fazer isso, o alfabeto inteiro. Mas aleatório eu vou. É... F?

W.M.: Não.

T.A.: É... Ele é conhecido só pelo primeiro nome?

W.M.: Não.

T.A.: Nome e sobrenome?

W.M.: Sim.

T.A.: É... Pintou algum quadro assim, famoso, importante?

W.M.: Sim.

T.A.: Ele é espanhol mesmo?

W.M.: Sim.

PESQUISADORA: Pergunta sobre a época em que ele viveu.

T.A.: Então... Eu faço a pergunta dela (risos). Que é, é, ele viveu na... Eu não lembro se você

falou, ele tá vivo?

W.M.: Não.

T.A.: Não, né? Mas já... faleceu há muito tempo?

Page 137: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

137

W.M.: Sim.

T.A.: Tipo, é bem... Não sei, eu não vou conseguir lembrar, lembrar. Se ficar perguntando

eu não vou... lembrar o nome, nem o nome. Vou ficar fazendo perguntas e vou acabar não

lembrando.

PESQUISADORA: Bom, você que sabe. Se você quiser desistir, pode desistir. Imagina, vou

obrigar ele a ficar aqui até ele acertar! Até amanhã.

T.A.: Peraí, eu vou tentar mais um... mais um pouquinho.

PESQUISADORA: Tá.

T.A.: Só mais um pouquinho. É... tô, sei lá, vou... vou jogar o alfabeto de novo, não sei. Pra

ver se ele tipo, me lembra. É, com... com D?

W.M.: Não.

T.A.: F?

W.M.: Não.

T.A.: G?

W.M.: Não.

T.A.: H?

W.M.: Não.

T.A.: I?

W.M.: Não.

T.A.: J? L?

W.M.: Não.

T.A.: M? N?

W.M.: Não.

T.A.: O?

W.M.: Não.

T.A.: P?

W.M.: Sim.

T.A.: Espanhol... Com P... Picasso?

W.M.: Sim.

T.A.: (risos) Pablo Picasso!

Page 138: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

138

ANEXO 3:

Formulário de respostas do teste de percepção

01. é irrelevante

( ) Isto é uma pergunta.

( ) Isto é uma declaração neutra.

02. um desenho animado da televisão

( ) Isto é uma pergunta.

( ) Esta frase está inacabada.

03. eu posso desistir

( ) Isto é uma pergunta.

( ) Esta frase está inacabada.

04. é criança

( ) Isto é uma pergunta.

( ) Isto é uma exclamação.

05. é histórico

( ) Isto é uma pergunta.

( ) Isto é uma exclamação.

06. é político

( ) Isto é uma pergunta.

( ) Isto é uma exclamação.

07. ela mora com o pai

( ) Isto é uma pergunta.

( ) Esta frase está inacabada.

08. o ator é bonito

( ) Isto é uma pergunta.

( ) Isto é uma exclamação.

09. tem direito a dica

( ) Isto é uma pergunta.

( ) Isto é uma exclamação.

10. ele é o protagonista

( ) Isto é uma pergunta.

( ) Isto é uma exclamação.

11. da selva

( ) Isto é uma pergunta.

( ) Isto é uma exclamação.

12. é um personagem de filme

( ) Isto é uma pergunta.

( ) Isto é uma exclamação.

13. o ator é americano

( ) Isto é uma pergunta.

( ) Isto é uma exclamação.

14. americano

( ) Isto é uma pergunta.

( ) Isto é uma exclamação.

Page 139: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

139

15. da literatura

( ) Isto é uma pergunta.

( ) Ito é uma exclamação.

16. é um personagem real

( ) Isto é uma pergunta.

( ) Isto é uma exclamação.

17. folclore

( ) Isto é uma pergunta.

( ) Isto é uma exclamação.

18. tem mais de quinze

( ) Isto é uma pergunta.

( ) Esta frase está inacabada.

19. foi presidente

( ) Isto é uma pergunta.

( ) Isto é uma exclamação.

20. quadrinho

( ) Isto é uma pergunta.

( ) Isto é uma exclamação.

21. é um artista

( ) Isto é uma pergunta.

( ) Isto é uma exclamação.

22. isso se refere à família

( ) Isto é uma pergunta.

( ) Isto é uma exclamação.

23. as mulheres acham ele bonito

( ) Isto é uma pergunta.

( ) Esta frase está inacabada.

24. o personagem é criança

( ) Isto é uma pergunta.

( ) Isto é uma declaração neutra.

25. europeu

( ) Isto é uma pergunta.

( ) Esta frase está inacabada.

26. de alguma forma marcou a

história do país

( ) Isto é uma pergunta.

( ) Isto é uma declaração neutra.

27. ele canta música sertaneja

( ) Isto é uma pergunta.

( ) Isto é uma exclamação.

28. do nosso país

( ) Isto é uma pergunta.

( ) Isto é uma declaração neutra.

29. mas tem tanto rock brasileiro

conhecido

( ) Isto é uma pergunta.

( ) Isto é uma declaração neutra.

30. e usa um capacete

( ) Isto é uma pergunta.

( ) Isto é uma declaração neutra.

Page 140: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

140

31. é branco

( ) Isto é uma pergunta.

( ) Isto é uma exclamação.

32. você é um líder

( ) Isto é uma pergunta.

( ) Isto é uma declaração neutra.

33. não é Dom Pedro I

( ) Isto é uma pergunta.

( ) Isto é uma declaração neutra.

34. posso chutar

( ) Isto é uma pergunta.

( ) Esta frase está inacabada.

35. Idade Moderna

( ) Isto é uma pergunta.

( ) Isto é uma declaração neutra.

36. é uma animação infantil

( ) Isto é uma pergunta.

( ) Isto é uma exclamação.

37. é desenho

( ) Isto é uma pergunta.

( ) Isto é uma exclamação.

38. a mãe dela não existe

( ) Isto é uma pergunta.

( ) Esta frase está inacabada.

39. alguma coisa diferente

( ) Isto é uma pergunta.

( ) Esta frase está inacabada.

40. o meu é mais difícil

( ) Isto é uma pergunta.

( ) Esta frase está inacabada.

Page 141: A PROSÓDIA DAS INTERROGATIVAS TOTAIS NA FALA ...objdig.ufrj.br/25/teses/832862.pdfUFRJ A prosódia das interrogativas totais na fala carioca: fala espontânea versus leitura Vivian

141