72
COLEÇÃO PROINFANTIL

Proinfantil MOD II Unid4 Vol2

Embed Size (px)

Citation preview

COLEO PROINFANTIL

PRESIDNCIA DA REPBLICA MINISTRIO DA EDUCAO SECRETARIA DE EDUCAO A DISTNCIA

Ministrio da Educao Secretaria de Educao a Distncia Programa de Formao Inicial para Professores em Exerccio na Educao Infantil

COLEO PROINFANTILMDULO II unidade 4 livro de estudo - vol. 2Karina Rizek Lopes (Org.) Roseana Pereira Mendes (Org.) Vitria Lbia Barreto de Faria (Org.) Braslia 2005

Ficha Catalogrfica Maria Aparecida Duarte CRB 6/1047

L788

Livro de estudo: Mdulo II / Karina Rizek Lopes, Roseana Pereira Mendes, Vitria Lbia Barreto de Faria, organizadoras. Braslia: MEC. Secretaria de Educao Bsica. Secretaria de Educao a Distncia, 2005. 72p. (Coleo PROINFANTIL; Unidade 4) 1. Educao de crianas. 2. Programa de Formao de Professores de Educao Infantil. I. Lopes, Karina Rizek. II. Mendes, Roseana Pereira. III. Faria, Vitria Lbia Barreto de. CDD: 372.2 CDU: 372.4

MDULO II unidade 4 livro de estudo - vol. 2

SUMRIOB - ESTUDO DE TEMAS ESPECFICOS 8 FUNDAMENTOS DA EDUCAO

AS CRIANAS E SEUS PARCEIROS DESCOBREM O MUNDO.............. Seo 1 No se aprende sozinho...................................................

911

Seo 2 Motricidade, afetividade, pensamento e linguagem na aprendizagem. ........................................... 18 Seo 3 A construo de significados e a formao de conceitos pela criana....................................................... 27

ORGANIZAO DO TRABALHO PEDAGGICOPROMOVENDO UM AMBIENTE LDICO

39

DE APRENDIZADO E DESENVOLVIMENTO..........................................

Seo 1 A criana pensa o mundo................................................. 41 Seo 2 O adulto: um parceiro especial. ........................................ 48 Seo 3 As instituies de Educao Infantil e sua ao na mediao da criana com o mundo............................ 57

c ATIVIDADES INTEGRADoraS70

b - ESTUDO DE TEMAS ESPECFICOS

8

Fundamentos da EducaoAs crianas e seus parceiros descobrem o mundoComo eu vou saber da terra, se eu nunca me sujar? Como eu vou saber das gentes, sem aprender a gostar? Quero ver com os meus olhos, quero a vida at o fundo. Quero ter barro nos ps, eu quero aprender o mundo!Pedro Bandeira1

1 BANDEIRA, Pedro. Vai j pra dentro menino! In: BANDEIRA, Pedro. Mais respeito, eu sou criana. So Paulo: Moderna, 2002. p. 14-15.

9

Abrindo nosso dilogo Ol, professor(a)! Estamos iniciando a Unidade 4 de Fundamentos da Educao do Mdulo II. Muitos conceitos importantes foram tratados nas unidades anteriores. Sabemos como dinmico o trabalho com crianas e o quanto necessrio uma formao permanente. Por isso, nesta unidade, convidamos voc a pensar sobre as interaes que envolvem as crianas no espao escolar. Queremos com este estudo discutir a importncia do outro nas aprendizagens individuais. Ao longo desta unidade, sempre que nos referirmos a esse termo, o outro, estaremos pensando em todas aquelas pessoas com as quais nos relacionamos adultos, jovens e crianas que influenciam nosso modo de ser, interferindo na construo da nossa identidade. Definindo nosso ponto de chegada Objetivos especficos desta rea temtica: 1. Reconhecer que o desenvolvimento humano uma tarefa conjunta e recproca, alm de identificar a importncia dos vnculos no desenvolvimento infantil. 2. Perceber que o desenvolvimento um processo que envolve diferentes reas do comportamento humano. 3. Identificar que a construo de significados algo que se processa desde o nascimento. Construindo nossa aprendizagem Esta rea temtica est organizada em trs sees. Na primeira No se aprende sozinho discutiremos o conceito de desenvolvimento humano como tarefa conjunta e recproca e a importncia da construo de vnculos no desenvolvimento infantil. Na segunda seo Motricidade, afetividade, pensamento e linguagem na aprendizagem apresentaremos situaes cotidianas envolvendo crianas pequenas, destacando a necessidade de uma viso de desenvolvimento enquanto um processo que envolve diferentes reas do comportamento humano. Na terceira e ltima seo A construo de significados e a formao de conceitos pela criana discutiremos a construo de significaes como algo que se processa desde o nascimento. Sugerimos uma ateno especial ao seu trabalho cotidiano com as crianas, observando como as crianas aprendem e como significam o mundo em que vivem.

Bom estudo!10

Seo 1 No se aprende sozinho Objetivo a ser alcanado nesta seo: Reconhecer que o desenvolvimento humano uma tarefa conjunta e recproca, alm de identificar a importncia dos vnculos no desenvolvimento infantil.Professor(a), se olharmos nossa histria de vida, perceberemos que, desde o nascimento, estamos envolvidos em uma teia de relaes. Veja um trecho da msica Para Todos, do compositor e cantor Chico Buarque: O meu pai era paulista, meu av pernambucano, meu bisav mineiro, meu tatarav baiano, meu maestro soberano Antnio brasileiro...

Cada um de ns possui uma histria. A nossa histria de vida marcada por experincias e relaes que estabelecemos com as pessoas ao nosso redor, pois: Enquanto sujeito social e histrico que , a criana no pode ser jamais confundida, identificada ou reduzida a uma etapa de desenvolvimento; ela no pode ser percebida apenas como um sujeito em crescimento, em processo, que ir se tornar algum um dia (quando deixar de ser criana e virar adulto...). Ela algum hoje, em sua casa, na rua, no trabalho, no clube, na igreja, na creche, na pr-escola ou na escola, construindo-se a partir das relaes que estabelece em cada uma dessas instncias e em todas elas. (JOBIM, SOUZA e KRAMER, 1991) Nesse processo de desenvolvimento, a famlia ou os adultos que destinaram cuidados a ns nos primeiros meses de vida so responsveis por aprendizagens fundamentais para a vida em sociedade. Voc sabe quais foram as pessoas que cuidaram de voc quando beb? A criana como um ser social e histrico, ou seja, a criana que algum hoje e se relaciona com

11

diferentes instncias sociais (em sua casa, na rua, na igreja, no clube, no trabalho, na creche, na pr-escola, na escola), vai se constituindo como sujeito a partir dessas relaes. De um modo especial, as pessoas com as quais voc conviveu em seus primeiros anos de vida so muito importantes na sua constituio (que inclui tanto os familiares quanto pessoas de outras instituies, como o caso dos bebs que passam a maior parte do tempo na creche). atravs do contato com esse grupo de pessoas que desenvolvemos as primeiras aprendizagens: os primeiros passos, as primeiras palavras, a comer com talheres ou no, a nos vestir desta ou daquela forma. Vale a pena lembrar que essas aprendizagens esto interligadas diversidade cultural na qual a criana est inserida.

Atividade 1Quando olhamos o passado, ressignificamos a nossa histria. Assim, sugerimos que, numa folha parte, voc monte um lbum de recordaes com fotos e objetos que falem da sua origem, registrando em especial os nomes das pessoas que foram responsveis por receber e apresentar voc ao mundo. Se no tiver fotos ou objetos, registre no seu caderno o nome dessas pessoas e fatos significativos. O encontro quinzenal ser uma boa oportunidade para compartilhar essas lembranas com seus colegas de formao. Conforme crescemos, ampliamos as possibilidades de interao para outros grupos, como vimos acima: a escola, as igrejas, as associaes, o trabalho etc. Essas instncias sociais so to importantes em nossa vida quanto o(s) grupo(s) com o(s) qual(is) estabelecemos as primeiras interaes. Ao estabelecer relaes com diferentes grupos, temos a oportunidade de ampliar nossos conceitos sobre o mundo, alm de praticarmos a vida em sociedade.

12

O trecho que leremos a seguir conta a entrada de uma criana na escola: A notcia veio de sopeto: iam meter-me na escola. J me haviam falado nisso, em horas de zanga, mas nunca me convencera de que realizassem a ameaa. Aescola, segundo informaes dignas de crdito, era um lugar para onde se enviavam as crianas rebeldes. Eu me comportava direito: encolhido e morno, deslizava como sombra. As minhas brincadeiras eram silenciosas. E nem me afoitava a incomodar as pessoas grandes com perguntas. Este trecho faz parte do livro Infncia, que foi escrito pelo autor brasileiro Graciliano Ramos. Nesta obra, o autor conta suas memrias de menino e narra seus medos ao entrar em um novo grupo.

Atividade 2Para o menino Graciliano, segundo informaes dignas de crdito, a escola era um lugar para onde se enviavam crianas rebeldes. E voc, como foi a sua entrada na escola? Freqentou a creche? Pr-escola? Entrou numa turma de Educao Infantil (ou num antigo jardim-de-infncia)? Comeou na classe de alfabetizao, no Ensino Fundamental ou no antigo primrio? Que sentimentos marcaram esse primeiro contato com a escola? Voc pode continuar seu lbum de recordaes com fotos e objetos que marcaram esse tempo ou continuar seu registro falando de pessoas ou fatos significativos. por meio das interaes com os diferentes grupos que nos apropriamos dos diversos modos de comportamento e da cultura. Alguns estudiosos vm se dedicando a esse tema. Entre eles podemos destacar a educadora Madalena Freire. No texto O que um grupo?, a autora fala sobre a formao dos grupos, suas caractersticas e estrutura, e diz que cada pessoa tem um papel no grupo.

13

No texto abaixo, Madalena Freire fala dos acontecimentos e sentimentos que envolvem a nossa relao com o grupo.

Grupo ... grupoA cada encontro: imprevisvel. A cada interrupo da rotina: algo inusitado. A cada elemento novo: surpresa. A cada elemento j parecidamente conhecido: aspectos desconhecidos. A cada encontro: um novo desafio, mesmo que supostamente j vivido. A cada tempo: novo parto, novo compromisso fazendo histria. A cada conflito: rompimento do estabelecido para a construo da mudana. A cada emoo: faceta insuspeitvel. A cada encontro: descobrimento de terras ainda no desbravadas... Grupo grupo.Madalena Freire

Existem formas prprias para estarmos em cada um dos grupos que ocupamos socialmente. Nosso comportamento no trabalho normalmente diferente daquele que temos em casa, como tambm, muitas vezes, o modo de falar muda em funo do grupo em que estamos. Assim, nossa identidade fruto das relaes que estabelecemos com os outros. Em cada grupo assumimos um lugar, desempenhamos um papel, encontramos uma forma de estar que constitui nossa maneira de ser. Um grupo se rene em funo de objetivos e se constri na constncia, na permanncia.

Ciranda mista, Cenas infantis. Sandra Guinle

14

Atividade 3No trecho do livro da educadora brasileira Madalena Freire, que lemos anteriormente, identificamos algumas caractersticas do grupo. O encontro, a surpresa, o imprevisvel, o compromisso, entre outras coisas, fazem parte desse universo. Lembrando dos grupos com os quais se relaciona, voc se reconhece em alguma dessas situaes? Os grupos sociais, dos quais fazemos parte ao longo de nossas vidas, so de grande importncia para nossa formao. Dentre esses grupos, a escola tem um papel destacado, pois um espao de formao sistemtica que contribui diretamente para a vida em sociedade. Devemos considerar que, para muitas crianas, a entrada na escola representa os primeiros passos fora dos cuidados e da ateno familiar. Desse modo, dentro do processo de aprendizagem sobre o mundo, podemos dizer que a escola (e para criana de 0 a 6 anos, em especial a creche e a pr-escola) tem um papel fundamental. Ela um local privilegiado de trocas e aprendizagens. A forma de organizao da escola favorece a convivncia em grupo, onde a criana permanecer durante um tempo significativo da sua vida. Assim, podemos concluir que, em famlia ou em outros espaos, no estamos sozinhos! Como nos mostra o poeta Carlos Drummond de Andrade:

Mos dadasNo serei o poeta de um mundo caduco. Tambm no cantarei o mundo do futuro. Estou preso vida e olho meus companheiros. Esto taciturnos mas nutrem grande esperana. Entre eles, considero a enorme realidade. O presente to grande, no nos afastemos. No nos afastemos muito, vamos de mos dadas. No serei o cantor de uma mulher, de uma histria, no direi os suspiros ao anoitecer, a paisagem vista da janela, no distribuirei entorpecentes ou cartas de suicidas, no fugirei para as ilhas nem serei raptado por serafins. O tempo a minha matria, o tempo presente, os homens presentes, a vida presente.Carlos Drummond de Andrade

15

O poeta chama de companheiros aqueles que esto vivendo com ele o momento presente e os convida a andarem de mos dadas. Isto quer dizer que no estamos sozinhos. H sempre algum que eu vejo que diferente de mim, mas que se volta para mim para me dizer quem eu sou. O outro, ou seja, os adultos e as crianas com quem convivemos, tem um importante papel na nossa formao. Podemos perceber isso de diferentes maneiras. Vamos fazer um exerccio?

Atividade 4Como voc aprendeu a ler, a escrever, a cozinhar, a andar de bicicleta, a costurar ou a fazer uma outra atividade do cotidiano? Voc estava sozinho(a) nesse momento? Como foi? Quem lhe ensinou? Sugerimos que voc escreva no seu caderno uma dessas experincias para compartilhar com os(a) seus(suas) colegas no encontro quinzenal. Ao longo da nossa vida, nos acontecimentos cotidianos, realizamos vrias aprendizagens ao nos relacionarmos com o outro (criana, jovem, adulto). Pensando no desenvolvimento da criana dentro do ambiente escolar, podemos dizer que a aprendizagem no ocorre somente nas interaes entre crianas e adultos. As crianas tambm so produtoras de conhecimento e de cultura e, ao partilharem vivncias, contribuem para aprendizagens diversas. Uma importante contribuio neste sentido veio do trabalho do psiclogo russo Vygotsky, que conhecemos nas Unidades 1 e 2 de FE deste mdulo. Esse autor considera que o homem um ser essencialmente social e, por isso, no pode estar isolado na hora da aprendizagem. O outro , para Vygotsky, um todo universal que pode estar interagindo comigo. Essa troca de culturas e informaes gera conhecimentos e faz a criana ter mais conscincia das suas potencialidades. De acordo com as idias do autor, as interaes so fundamentais para o desenvolvimento humano. Na relao com o outro, adquirimos informaes que no faziam parte dos nossos conhecimentos. Essas trocas so a marca dos seres humanos, seres em constante transformao. Essas trocas acontecem nos espaos das creches, pr-escolas e turmas de Educao Infantil que funcionam em escolas de Ensino Fundamental com as quais trabalhamos. Observe a situao ocorrida em uma turma de crianas de 5 anos descrita a seguir:

16

Numa turma de 25 crianas de 5 anos a professora est aguardando algumas terminarem um desenho que havia solicitado. Quando a professora diz que ser atividade livre, todos terminam rapidamente o que esto fazendo. H uma diversificao de grupos. Vrias brincadeiras surgem na sala.

Rodando peo, Cenas infantis. Sandra Guinle

Num espao aberto, onde normalmente fazem a rodinha, cinco meninos brincam de jogar pio. Eles fazem uma fila para organizar a brincadeira. O menino que est na vez de jogar joga o pio e todos ficam observando. O prximo no sabe jogar e o amigo ensina como enrolar o pio e como jogar. O outro tenta. No consegue muito bem da primeira vez e tenta novamente, e os amigos vo incentivando e os que esto na fila aguardam a sua vez. (Barbosa, 2004)

Atividade 5Vamos pensar na sua turma de Educao Infantil. Voc seria capaz de identificar alguma situao onde as crianas estejam compartilhando conhecimentos? Sem dvida deve haver vrias propostas onde as crianas troquem conhecimentos e aprendam umas com as outras. Sugerimos que voc observe as interaes delas e registre uma dessas situaes onde elas estejam aprendendo umas com as outras. Com as questes que tratamos at aqui e lembrando do que estudamos na Unidade 2, sobre Lev Vygotsky e a zona de desenvolvimento proximal, podemos afirmar que o desenvolvimento ocorre a partir da troca. Portanto, importante um ambiente que favorea a interao. Sempre que h possibilidade de troca e cooperao entre as crianas, conhecimentos so compartilhados.

17

Agora que conversamos sobre a importncia do grupo no desenvolvimento pessoal, vamos passar para a Seo 2, onde continuaremos o debate.

Seo 2 Motricidade, afetividade, pensamento e linguagem na aprendizagem Objetivo a ser alcanado nesta seo: Perceber que o desenvolvimento um processo que envolve diferentes reas do comportamento humano.Professor(a), na seo anterior vimos que o ser humano, desde que nasce, faz parte de um grupo e que esse grupo fundamental para seu desenvolvimento. Vimos tambm que as relaes que estabelecemos so responsveis por nossas aprendizagens. Desse modo, no cotidiano da Educao Infantil, a aprendizagem no ocorre somente quando o(a) professor(a) est interagindo com a criana. Estamos aprendendo a todo momento e, como a criana j traz inmeras informaes sobre o mundo quando entra na escola, temos muito o que compartilhar. Essa reflexo muito importante, porque mostra que ns, professores(as), no somos os(as) nicos(as) responsveis pelas aprendizagens das crianas com as quais trabalhamos. As crianas tambm podem ensinar coisas umas s outras, elas podem ser mediadoras do conhecimento. Assim, fica o desafio de tornarmos um lugar de encontro os espaos das creches, prescolas e turmas de Educao Infantil que funcionam em escolas de Ensino Fundamental com as quais trabalhamos. Voc muito importante nesse processo: sua experincia, conhecimento e sensibilidade podem auxiliar as crianas a descobrirem suas potencialidades e a terem uma relao curiosa e dinmica com o conhecimento. Como est no objetivo desta seo, apresentaremos a idia de que o desenvolvimento um processo que envolve diferentes reas do comportamento humano. Veja o trecho da msica a seguir:

LoadeandoO jogo comeou aperte o start. Na vida voc ganha, c perde, meu filho, faz parte. Ih! ruim, eu no gosto de perder, Nem me lembro h quanto tempo que eu no perco pra voc. Calma filho, c ainda tem que crescer,

18

O jogo apenas est comeando e c tem muito pra aprender. , eu sei, eu tava s zoando. Foi voc que loadeou e eu t jogando. Eu me desenvolvo e evoluo com meu filho. Eu me desenvolvo e evoluo com o meu pai Ah, moleque! Se o papo for futebol Ah, esse com igo! E se o assunto playstation Tudo bem, comigo! A evoluo aqui de pai pra filho. A famlia Peixoto e representa o Rio. Eu me desenvolvo e evoluo com o meu pai... Este um trecho da msica Loadeando, escrita por Marcelo D2. um rap cantado pelo autor e por seu filho. As frases esto organizadas como uma conversa entre os dois. Em sua letra, vemos como pai e filho, apesar de possurem idades diferentes, evoluem e se desenvolvem juntos. Essa msica mostra que no s o adulto que tem coisas a ensinar para a criana, a criana tambm possui conhecimentos e uma maneira prpria de ver o mundo que est ao seu redor. Os dois, pai e filho, realizam aprendizagens na relao entre eles. Na letra da msica o pai diz: Se o papo for futebol Ah, esse comigo!, e o filho: Ese o assunto playstation Tudo bem, comigo!. Falam sobre conhecimentos diferentes, mas um conhecimento no mais valorizado do que o outro. O adulto sabe sobre futebol e a criana tem habilidades com jogos eletrnicos.

Atividade 6Vamos ler esta situao numa turma de crianas de 4 anos:

19

(Na hora do caf da manh, numa mesa retangular, esto seis meninas.) Durante a refeio esto brincando e se levantam. Uma menina levanta a mo e diz quem quer ir na padaria comigo? (meio cantando) e as outras encostam o indicador na palma da mo e dizem eu, eu, eu. Cada vez a menina muda o lugar (na padaria, no mercado, na piscina). As meninas se levantam para colocar o dedo na palma da mo da amiga e depois voltam para o seu lugar.(Barbosa, 2004, p. 97)

Provavelmente voc tem oportunidade de observar situaes semelhantes a esta em sua turma. Procure lembrar de algum conhecimento que seja prprio desse universo infantil. Pense nas conversas que ouve entre as crianas, nas cenas que observa. Essas observaes podem ser tema de discusso no encontro quinzenal do seu grupo de estudo. A msica de Marcelo D2 fala sobre desenvolvimento e evoluo. O que desenvol vimento? Vamos ver o que diz o dicionrio? Segundo o dicionrio Aurlio Buarque de Holanda, desenvolvimento 1. Fazer crescer, medrar, prosperar. 2. Pr em prtica, exercer. 3. Gerar, produzir. 4.Expor extensamente ou com mincia. 5. Crescer, aumentar, progredir. Esta palavra muito utilizada quando fazemos referncia s conquistas realizadas pelas crianas durante a vida escolar. No entanto, diferentes teorias tentam explicar o desenvolvimento humano, como estudamos nas Unidades 1 e 2 de Fundamentos da Educao deste mdulo. Vamos rever as trs abordagens tericas apresentadas nessas unidades: Inatismo Nessa abordagem, os fatores hereditrios o que herdamos geneticamente dos pais e o amadurecimento biolgico so considerados os principais responsveis pelo desenvolvimento. Os estudiosos que defendiam essa hiptese no consideravam que os fatores externos como as relaes sociais influenciassem no desenvolvimento. Ambientalismo O ambientalismo, que alguns autores chamam de behaviorismo ou comportamentalismo, entende que o desenvolvimento conseqncia da ao que os objetos exteriores exercem sobre os mecanismos nervosos e cerebrais, dando um valor

20

muito grande ao ambiente externo. Acredita que o homem capaz de adaptar-se a diferentes situaes de existncia, aprendendo novos comportamentos. Dentro desse enfoque, a criana um ser passivo. Essa abordagem no considera que, muitas vezes, expostos ao mesmo meio social, nossas respostas so diferentes. Interacionismo Ao contrrio da teoria anterior, o interacionismo, que tem em Piaget e Vygotsky seus principais exemplos, considera tanto os fatores biolgicos quanto o ambiente. Piaget entende a criana como um ser ativo e inteligente, e que constri o conhecimento a partir da interao com o ambiente. Como j vimos nas Unidades 1 e 2 deste mdulo, atravs dos processos mentais de assimilao e acomodao, o sujeito vai construindo esquemas, vai se modificando, para se adaptar ao meio. De acordo com essa abordagem, a aprendizagem depende do desenvolvimento. Ou seja, a criana ser capaz de aprender aquilo que o seu estgio de desenvolvimento permitir. Vygotsky e outros tericos consideram os fatores biolgicos que envolvem o homem, mas concentram suas pesquisas na relao estabelecida entre a pessoa e seu meio social. Acreditam que o desenvolvimento determinado pelas relaes que se estabelecem entre as pessoas e o meio fsico e social. Dentro dessa viso, o desenvolvimento no acontece de forma isolada: esto envolvidos os fatores genticos que seriam responsveis pelo amadurecimento as relaes com o outro e a cultura. A criana vista como um sujeito criador e recriador de cultura. Vygotsky o principal exemplo dessa viso chamada socio-interacionismo (tambm chamada socio-histrica). O desenvolvimento envolve processos de imerso na cultura e emergncia na individualidade que se constituem mutuamente.

Atividade 7A seguir, so apresentadas algumas questes para serem respondidas por voc em seu caderno. a) Que papel tem o meio social para a corrente inatista? b)Como a criana vista na corrente ambientalista? Por qu? c) Qual a relao entre desenvolvimento e aprendizagem na abordagem piagetiana? d)Qual o principal fator responsvel pelo desenvolvimento na teoria sociointeracionista?

21

Como voc tem estudado ao longo deste mdulo, uma grande contribuio sobre este tema est nas pesquisas de Vygotysky. Falando sobre a relao entre aprendizagem e desenvolvimento, esse autor acredita que existe uma ntima conjugao entre esses dois fatores, e considera que a aprendizagem capaz de acelerar o desenvolvimento. Vygotsky (2000, p. 118) cita, como exemplo, o domnio inicial das quatro operaes aritmticas. O domnio desse conhecimento fornece a base para o desenvolvimento posterior de vrios processos internos altamente complexos no pensamento das crianas. Podemos citar ainda a aquisio da leitura como exemplo de uma aprendizagem significativa. O domnio inicial da leitura amplia as possibilidades de interao da criana com o mundo, interferindo no seu desenvolvimento. O desenvolvimento um processo amplo que envolve diferentes reas do comportamento humano. Abordaremos a seguir quatro reas especficas: motricidade, afetividade, pensamento e linguagem. Motricidade Ao nascermos, iniciamos um complexo exerccio de domnio sobre o nosso corpo. odesejo de possuir algum objeto, de ir a algum lugar, que faz com que o beb busque formas de deslocamento. comum vermos bebs apontando para os objetos e, na resposta que recebe do adulto que lhe entrega o objeto apontado, vai percebendo que seus gestos tm significados, passando a utilizlos para se comunicar. A manipulao de objetos de diferentes formas e tamanhos possibilita o desenvolvimento motor. A criana vai percebendo o mundo ao seu redor atravs dos objetos que lhe so oferecidos. Morde-os, joga-os no cho, encaixa e, quanto mais vivncias ela adquire, mais elaboradas tornam-se suas aes. Na interao com esses objetos tenta encaix-los, ou empilh-los, ampliando suas possibilidades de agir sobre o mundo que a cerca.Valria Mourth de Oliveira

22

Talvez as crianas com quem trabalhamos sejam maiores e possuam um desenvolvimento motor mais elaborado, mas importante lembrar que, atravs do corpo, aprendemos e nos relacionamos com o mundo, sendo esta relao fundamental para o desenvol vimento. Afetividade A afetividade uma outra rea a ser levada em considerao tanto para o desenvolvimento quanto para o processo de aprendizagem. Vejamos a seguinte situao, descrita por uma professora, numa turma de crianas de 4 e 5 anos: o primeiro dia do ano, a escola est preparada para receber as crianas para mais um ano letivo. Para algumas crianas, esta j uma rotina conhecida, mas para Luiza, que est indo para a escola pela primeira vez, no. Em seus olhos possvel notar um misto de medo e desejo. Ela chega acompanhada por sua me. Mariza acredita que, aos 4 anos, est na hora da sua filha ir para a escola. A sineta toca e todos se dirigem para as salas. Mariza acompanha Luiza at o encontro com a professora. A escola parece enorme aos olhos de Luiza. Ao encontrar com a professora, esta lhe dirige a palavra, abaixa, ficando da sua altura e diz: Oi Luiza, eu estava te esperando. Sabe, podemos fazer muitas coisas diferentes aqui na escola. Eu vou ser sua professora e ns vamos brincar muito, juntas. A me passa a participar do dilogo dizendo que esperar pela filha fora da escola e que ela poder pedir ajuda professora para o que precisar. A me se despede e a professora comea a mostrar para Luiza o que h na escola.Valria Mourth de Oliveira

23

O perodo de adaptao , para crianas, professores(as) e suas famlias, um perodo de tenso. Na situao descrita anteriormente, a professora utilizou sua afetivi dade para ajudar a criana em seus primeiros momentos na escola. Quando recebeu Luiza, chamou-a pelo seu nome. Isso mostrou que ela estava sendo esperada e que existia um lugar para ela naquela escola. Conseqentemente, a me sentiu-se segura com a atitude da professora, demonstrando isso na maneira como falou com a filha. Vejamos um outro exemplo, ainda da mesma professora: Numa turma de Educao Infantil, uma criana possui dificuldades fsicas para se locomover. Ento, os professores, junto com as outras crianas, buscam meios para que ela possa ter mais autonomia: fazem rampas, reorganizam os mveis e as crianas ficam responsveis por serem suas acompanhantes, dividindo com a professora o cuidado com esse amigo a fim de ajud-lo a superar suas dificuldades. Nos dois casos a afetividade esteve presente e, sem dvida, foi determinante para o desenvolvimento das crianas envolvidas. O afeto um grande regulador das aes, influenciando nossas escolhas e rejeies. As crianas so boas observadoras e percebem nossas reaes. O afeto permite criana construir noes sobre os objetos, pessoas e situaes. Essas noes que a criana constri a partir dessa relao afetiva vo permitir que ela atribua diferentes valores e significados a esses mesmos objetos, pessoas e situaes. Quantas vezes no passamos a gostar de algum somente porque ela faz bem a quem amamos? Assim tambm acontece na escola: se a professora parte do princpio de que as crianas sero capazes, elas tero estmulo para tentar. O contrrio tambm acontece: se partirmos do princpio de que a criana no capaz de aprender, ela poder sentir-se desestimulada a tentar. Caso o(a) professor(a) discrimine uma entre as demais crianas do grupo, abre espao para que os outros tambm o faam. s vezes, necessrio um colo, um carinho, um afago, para que as crianas se sintam seguras e confiantes. Pensamento e Linguagem Vygotsky deu uma grande importncia para a relao entre o pensamento e a linguagem nos seus estudos. Ele reconhece que o pensamento e a linguagem so dois processos com origens distintas, mas que mantm uma relao dinmica, em constante movimento dialtico ao longo do desenvolvimento humano:

24

A relao entre o pensamento e a palavra um processo vivo (...) uma palavra desprovida de pensamento uma coisa morta, e um pensamento no expresso por palavras permanece uma sombra. A relao entre eles no , no entanto, algo j formado e constante; surge ao longo do desenvolvimento e tambm se modifica. (VYGOTSKY, 1987) O pensamento algo que acontece no interior do sujeito e est em ntima relao com a linguagem. medida que o pensamento e a linguagem estabelecem essa relao dinmica e constante, a criana vai se desenvolvendo. Se o pensamento tem sua origem no sistema cognitivo, ou seja, na estrutura interna do sujeito que possibilita conhecer e compreender o mundo que o cerca, bem como agir sobre essa realidade, a linguagem tem sua origem nas interaes que se estabelecem com outros seres humanos. Para Vygotsky, como vimos na Unidade 2 de Fundamentos da Educao deste mdulo, inicialmente a criana tenta atrair a ateno dos adultos a partir de sons variados que mostram o seu prazer e desprazer. Ainda, a criana se move em direo aos objetos que esto sua volta e que despertam o seu desejo. Esses sons e movimentos so interpretados pela me, adulto significativo, ou parceiros mais experientes do seu relacionamento. No momento em que esse movimento de apontar da criana bem pequena interpretado por outra pessoa, deixa de ser apenas um movimento, tornando-se um gesto com significado.

25

Dessa forma, aquele movimento da criana que originalmente era dirigido ao objeto, a partir da interpretao do adulto, torna-se um meio de estabelecer relaes. Antes de se tornar um gesto significativo para a criana, foi significativo para essa outra pessoa, ou outras pessoas com as quais a criana interagiu. Diante disso, podemos refletir, ainda com a ajuda de Vygotsky: todo aprendizado, antes de se tornar algo intra-subjetivo (que est dentro do sujeito), foi uma experincia intersubjetiva (que aconteceu entre as pessoas). Isto reafirma como so fundamentais, tanto para o desenvolvimento quanto para a aprendizagem, as relaes que a criana estabelece com as outras pessoas, sejam estas crianas ou adultos. Aos poucos, a criana descobre que cada coisa tem o seu nome e vai adquirindo a capacidade de no s apontar, mas de significar os seus gestos, que, ao estabelecerem um elo de comunicao, tambm so linguagem. Com a aquisio da linguagem, os pensamentos passam a ser verbalizados, e esses dois processos (pensamento e linguagem), que, como dissemos, tm origens diferentes, passam a estabelecer uma relao dinmica entre eles. A linguagem, sendo aquilo que marca, que caracteriza o homem, a possibilidade de construir significados, imprimir sentidos, mas, acima de tudo, um meio de contato social com outras pessoas. A criana, inserida nesse contexto social, vai tomando para si as palavras, os gestos, a prpria linguagem. Com isso, entendemos tambm que, antes de ser algo individual, toda linguagem foi antes um produto coletivo, social. Isto quer dizer que a linguagem determinada por um processo histrico-cultural. Na Unidade 6 de Fundamentos da Educao deste mdulo, voc vai poder entender mais um pouco sobre como a criana desenvolve a linguagem. Deste modo, vemos que o desenvolvimento envolve a motricidade, a afetividade, opensamento, a linguagem e as relaes sociais. Para Zilma de Oliveira, autora de vrios livros sobre Educao Infantil: A motricidade, a afetividade, a inteligncia e a cognio so faces de um mesmo processo de construo coletiva. De acordo com as novas concepes, as instituies de Educao Infantil devem privilegiar a organizao de contextos de atividades que levem todas as crianas ao desenvolvimento da inteligncia e da capacidade de criar expectativas, esperanas, fatos, artefatos, princpios, conceitos etc. (OLIVEIRA, 2002. p. 140.)

26

Atividade 8a) Para voc, que papel tem a afetividade no desenvolvimento? Procure pensar na sua prpria trajetria de aprendizagem. Voc pode usar o seu caderno para registrar essas experincias e depois compartilh-las com o seu grupo de estudos no encontro quinzenal. b)Voc tambm poderia registrar uma situao na qual a afetividade tenha ajudado o desenvolvimento ou a aprendizagem das crianas com as quais voc trabalha.

Seo 3 A construo de significados e a formao de conceitos pela criana Objetivo a ser alcanado nesta seo: Perceber que a construo de significados algo que se processa desde o nascimento.Professor(a), na seo anterior, vimos que o desenvolvimento um processo contnuo que envolve o ser humano como um todo. O corpo e as aes, os sentimentos, o pensamento e a linguagem, alm das condies e situaes oferecidas pelo meio, esto envolvidos em nosso desenvolvimento. Nesta seo, ampliaremos o debate que estamos estabelecendo nesta unidade, discutindo os diferentes significados construdos ao longo da vida.Eugnio Svio

Um dos atributos mais interessantes do ser humano a possibilidades de criar inmeros significados. Podemos perceber isso na poesia de Manoel de Barros que transcrevemos a seguir:

27

O apanhador de desperdciosUso a palavra para compor meus silncios. No gosto das palavras fatigadas de informar. Dou mais respeito s que vivem de barriga no cho tipo gua pedra sapo. Entendo bem o sotaque das guas. Dou respeito s coisas desimportantes e aos seres desimportantes. Prezo insetos mais que avies. Prezo a velocidade das tartarugas mais que a dos msseis. Tenho em mim esse atraso de nascena. Eu fui aparelhado para gostar de passarinhos. Tenho abundncia de ser feliz por isso. Meu quintal maior do que o mundo. Sou um apanhador de desperdcios: Amo os restos como as boas moscas. Queria que a minha voz tivesse um formato de canto. Porque eu no sou da informtica: eu sou da invenciontica. S uso palavras para compor meus silncios.(BARROS, Manoel de, 2003)

28

O poeta brinca com as palavras e vai buscando diferentes significados, escondidos em seus silncios. Algumas coisas so capazes de nos lembrar um lugar distante, uma situao j vivida. Um brinquedo, por exemplo, pode nos lembrar a infncia, uma comida, um dia especial, um perfume, uma pessoa querida. Vejamos o caso da palavra nascimento e da palavra morte: cada um de ns tem um significado nico e ntimo para elas. Os significados tambm so construdos nas relaes sociais que nos envolvem, como vemos ainda na poesia de Carlos Drummond de Andrade:

InfnciaMeu pai montava a cavalo, ia para o campo. Minha me ficava sentada cosendo. Meu irmo pequeno dormia. Eu sozinho menino entre mangueiras lia a histria de Robinson Cruso. Comprida histria que no acaba mais. No meio-dia branco de luz uma voz que aprendeu a ninar nos longes da senzala e nunca se esqueceu chamava para o caf. Caf preto que nem a preta velha caf gostoso caf bom. Minha me ficava sentada cosendo olhando para mim: Psiu... No acorde o menino. Para o bero onde pousou um mosquito. E dava um suspiro... que fundo! L longe meu pai campeava no mato do fim da fazenda. E eu no sabia que a minha histria era mais bonita que a de Robinson Cruso.Carlos Drummond de Andrade

29

Robinson Cruso: personagem do romance escrito por Daniel Defoe. Daniel Defoe nasceu em 1660, na Inglaterra, e morreu em 1731. Em 1719, editou seu romance mais conhecido, As aventuras de Robinson Cruso. O romance conta a histria do naufrgio de um navio que levou Robinson, o nico sobrevivente, para uma ilha desconhecida onde ele, solitrio, reconstruiu a vida longe da civilizao. Com suas prprias mos, fez uma casa, teceu roupas, preparou seus alimentos e enfrentou muitos desafios para sobreviver na ilha. Esteve completamente s at o momento em que libertou dos antropfagos um nativo que apelidou de Sexta-feira, ao qual educou, ensinando-lhe costumes civilizados. O cheiro de caf, a preta velha, a histria de Robinson Cruso, o cuidado da me e o pai ao longe so imagens significadas pelo poeta que deixaram marcas ao longo da sua vida. A todo momento criamos significados para as coisas que esto ao nosso redor. O beb que ao chorar acolhido pela me, ou outro adulto, tambm responsvel por essas primeiras interaes, comea logo a perceber que seu choro possui um significado e passa a recorrer a ele sempre que quer colo. J maiores, as crianas demonstram perceber o significado do mundo que est ao seu redor brincando com as palavras (ou como o poeta Manoel de Barros, alguns continuam brincando e descobrindo significados a vida toda). como conservar em ns a possibilidade de ver o mundo com novas lentes cada vez que abrimos os olhos. Muitas vezes achamos graa quando uma criana fala uma palavra de que ela mesma no sabe o significado. s vezes at perguntamos: Onde voc ouviu isso menino?. Na realidade, a criana est repetindo o que ouviu. As crianas esto atentas s conversas, ao rdio, televiso e vo trazendo as informaes que coletam sobre o mundo. Esto imitando os adultos ou parceiros mais velhos. E nesse exerccio que percebem que as palavras tm sentidos, significados. Vale pena ressaltar: ao observarmos as crianas no seu dia-a-dia, percebemos que elas estabelecem relaes sociais produzindo significados que, muitas vezes, apresentam uma lgica diferente daquela que j est posta. A criana brinca, inventa, sonha, invertendo a ordem das coisas. Ou seja, criando novos significados. A histria Marcelo, marmelo, martelo de Ruth Rocha, escritora brasileira de literatura infanto-juvenil, mostra que o menino Marcelo usa os elementos da lngua, que aprendeu na prpria cultura, para pensar em outros significados:

30

E Marcelo continuou pensando: Pois , est tudo errado! Bola bola, porque redonda. Mas bolo nem sempre redondo. E por que ser que a bola no a mulher do bolo? E bule? E belo? E bala? Eu acho que as coisas deviam ter nome mais apropriado. Cadeira, por exemplo. Devia chamar sentador, no cadeira, que no quer dizer nada. E travesseiro? Devia chamar cabeceiro, lgico! Tambm, agora eu s vou falar assim. Os significados que damos s coisas se constroem no coletivo, na interao, na atuao em diferentes grupos sociais. Temos experincias coletivas, mas nossa interpretao sobre o que vivemos nica. Essa compreenso do mundo afetada pelo social, pelo que os outros falam para e sobre ns, sobre nossas escolhas, pelos conceitos e pr-conceitos que nos cercam. Os significados tambm esto nas entrelinhas, e a criana apreende os significados nas palavras que desdizem, nos silncios, nos olhares, nos toques. Pensando em como so construdos os significados, podemos usar como exemplo o Brasil. Nosso pas possui grandes distncias geogrficas e uma imensa diversidade cultural. Existem palavras utilizadas no sul do pas que podem parecer outra lngua ao serem pronunciadas no centro-oeste. Nossa diversidade to grande que s vezes utilizamos diferentes nomes para a mesma coisa em cada regio do pas. o caso do aipim, uma raiz muito conhecida por ns que em alguns lugares chamada de mandioca e, em outros, de macaxeira.

Atividade 9Voc conhece algum outro alimento, ou objeto, que tenha diferentes nomes nas diversas regies do Brasil? Pode ser um momento interessante descobrir, no seu grupo de estudos, diferentes palavras para descrever a mesma situao, ou objeto, da nossa diversidade cultural. medida que vamos construindo os significados para o mundo, os significados que compem o cotidiano so determinantes para a formao da subjetividade. Existe uma relao em que, medida que produzimos cultura, significando nossas aes no mundo, somos produzidos por ela nas trocas e nos sentidos que nos constituem como sujeitos. A construo desses significados se faz graas s interaes constitudas no interior dos grupos, com os parceiros, nas prticas sociais. Ao incorporarmos os signos, que esto presentes dentro dos grupos sociais como forma de registrar ou transmitir informaes, vamos nos envolvendo em uma teia maior, onde as aes humanas se tornam cada vez mais complexas.

31

Outra questo interessante quanto construo de significados a noo de pertencimento. medida que dominamos determinados costumes, prticas ou hbitos, fazemos parte de um grupo, compartilhando significados e informaes. Pensemos em uma criana que se muda de Chapec, oeste de Santa Catarina, para Santa Rita, na Bahia. O sotaque, os conhecimentos, as vivncias so diferentes, possvel at que as brincadeiras no sejam as mesmas. A criana que chegou vai ter que iniciar um processo de aprendizagem de uma outra cultura, mas, medida que vai interagindo, vai se apropriando dos cdigos, da cultura e dos significados daquele grupo. Que alegria sentimos quando reencontramos uma pessoa querida que no vemos h muito tempo? Logo comea a conversa: Voc se lembra?.... Imediatamente so revividas histrias cheias de significados de um tempo que marcou a nossa vida. Este encontro com algum que compartilha os mesmos significados, contribui para nossa constituio, para a construo da nossa histria. Agora mesmo possvel que voc esteja se lembrando de fatos significativos ocorridos ao longo da sua vida ou das histrias contadas pelos seus familiares. Como dissemos anteriormente, embora sejam construdos de forma coletiva, os significados, presentes nas formas de organizar a realidade, vo sendo transformados pelas pessoas, que atribuem a eles suas histrias e experincias. Somos seres nicos e, mesmo compartilhando experincias, cada um tem uma forma prpria, singular, de ver e se relacionar com o mundo. Um modo que resultado da relao entre o meio, a(s) cultura(s), nossos processos internos, nossa subjetividade. Os significados so construdos na interao. Assim, as creches, pr-escolas, turmas de Educao Infantil que funcionam em escolas de Ensino Fundamental e a escola so espaos fundamentais e atuantes nesse processo. Ao brincarem, as crianas criam um mundo prprio dentro de um mundo maior, um mundo rico em possibilidades e interaes.Valria Mourth de Oliveira

32

Observe a conversa relatada abaixo, numa turma de crianas de quatro anos: (As crianas esto nas mesas desenhando...) Numa das mesas as crianas falam sobre o Hulk. Gabriela pergunta: Tia, o Hulk pega a gente?. A professora responde: Gabriela, isso no hora de falar sobre o Hulk, hora de pintar o desenho. Mas sobre isso que esto falando e continuam trazendo suas hipteses e conhecimentos sobre o Hulk: ele verde, ele grande, ele pega, eu tenho medo.... (Barbosa, 2004. p. 84) Pense na sua turma. Nela acontecem muitas interaes, muitas conversas que so um rico material para o trabalho que realizamos com as crianas.

Atividade 10Sugerimos que voc possa descrever duas situaes em que as crianas tenham interagido e dado significados ao que est ao redor delas. Como nas outras atividades, acreditamos que pode ser muito proveitoso compartilhar essas observaes com o seu grupo de estudos do PROINFANTIL. Professor(a), a construo de significados um processo que envolve seres humanos ao longo de toda a vida. Como somos seres em constante transformao, medida que vivemos, vamos ampliando nosso conhecimento sobre o mundo, trocando e adquirindo experincias.

PARA RELEMBRARVimos que, desde que nascemos, fazemos parte de um ou mais grupos. atravs da nossa atuao em diferentes grupos que nos apropriamos dos modos de comportamento e da cultura. As trocas na aprendizagem so fundamentais para o desenvolvimento da criana. Sempre que h possibilidade de troca e cooperao entre as crianas, conhecimentos so compartilhados. Conhecemos um pouco mais de Vygotsky e de seus estudos. Vimos que o desenvolvimento um processo que envolve diferentes reas do ser humano.

33

De acordo com Vygotsky, na abordagem socio-interacionista, as interaes so fundamentais para o desenvolvimento humano. Na relao com o outro, adquirimos informaes que no faziam parte dos nossos conhecimentos. Essas trocas so a marca dos seres humanos, seres em constante transformao. Dentro dessa viso, o desenvolvimento no acontece de forma isolada: esto envolvidos os fatores genticos que seriam responsveis pelo amadureci mento , as relaes com o outro e a cultura. A criana vista como um sujeito produtor de cultura, sendo ao mesmo tempo produzido por ela. O afeto um grande regulador das aes, influenciando nossas escolhas e rejeies. As crianas so boas observadoras e percebem nossas reaes. Oafeto permite criana construir noes sobre os objetos, as pessoas e as situaes. Os significados que damos s coisas tambm se constroem no coletivo, na interao, na atuao em diferentes grupos sociais. Temos experincias coletivas, mas nossa interpretao sobre o que vivemos nica. ABRINDO NOSSOS HORIZONTES Professor(a), vamos pensar sobre os assuntos aqui tratados quando formos realizar nossos planejamentos? importante procurar fazer da Educao Infantil um espao rico de trocas e interaes. A observao dessas interaes fundamental para o trabalho com as crianas no cotidiano. Devemos ter sempre em mente que as crianas so produtoras de cultura e tm muito a ensinar umas s outras. Deste modo, importante criar estratgias para que elas interajam e compartilhem os significados que esto descobrindo no mundo. Voc tambm parte integrante desse processo. Como professor(a) da Educao Infantil, voc pode ser mediador(a) entre a criana e a cultura (e neste sentido est o cinema, a literatura, a arte, a msica, a brincadeira, os museus).

34

JOBIM e SOUZA, Solange, KRAMER, Sonia. O debate Piaget/Vygotsky e as polticas educacionais. In: Cadernos de pesquisa. n 77. So Paulo: Fundao Carlos Chagas, 1991. OLIVEIRA, Zilma Ramos de. Educao Infantil: fundamentos e mtodos. So Paulo: Cortez, 2002. RAMOS, Graciliano. Infncia. Rio de Janeiro: Record, 1978. ROCHA, Ruth. Marcelo, marmelo, martelo e outras histrias. So Paulo: Moderna, 1987. VYGOTSKY, L. S.Pensamento e linguagem. So Paulo: Martins Fontes, 1987. ______________.A formao social da mente. So Paulo: Martins Fontes, 2000.

36

37

38

Organizao do trabalho pedaggicopromovendo um ambiente ldico de aprendizado e desenvolvimentoBranca: (com certo orgulho) Eu aprendi. Sei ler e escrever. E Augusto diz que fao ambas as coisas melhor do que qualquer escrivo de ofcio. Padre: Quem Augusto? Branca: Meu noivo. Foi ele que me ensinou. Mas foi preciso que eu insistisse e brigasse com meu pai. to bom! Padre: Ler? Branca: Sim. Sabe as coisas que mais me divertem? Ler estrias e acompanhar procisso de formigas (O Padre ri). Srio. Tanto nos livros como nas formigas a gente descobre o mundo.Dias Gomes.1

1

Branca Dias e Padre Bernardo so personagens da pea O Santo Inqurito, escrita por Dias Gomes. Escritor baiano, nascido em 1922, escreveu inmeras peas para o teatro e novelas para televiso. GOMES, Dias. O Santo Inqurito. Rio de Janeiro: Ediouro, 2003. p. 37.

39

ABRINDO NOSSO DILOGO Nesta rea temtica, vamos tratar do ambiente ldico de aprendizado e desenvolvimento das crianas. Esse ambiente o da creche, da pr-escola ou da escola de Educao Infantil na qual voc atua. No dia-a-dia com as crianas, provavelmente voc j viveu situaes as mais diferentes e inesperadas. Meninos e meninas que se apropriam do que voc diz (palavras e expresses) e do a elas outro sentido. Brincam com as palavras num constante jogo que, por vezes, parece no ter fim. Qual a reao das crianas s palavras e expresses que voc usa? E quando voc brinca com algum objeto, um pequeno graveto ou uma boneca? Como as crianas da sua turma interagem com voc e entre elas nesses momentos? Voc canta e faz mmicas e gestos quando conta histrias? Como as crianas reagem a isso? Elas imitam seus movimentos? Reinventam os movimentos nas brincadeiras entre elas? J percebeu a importncia que voc tem para a vida de cada uma das crianas com as quais voc trabalha? Na Unidade 4 de Fundamentos da Educao, deste mdulo, estudamos a importncia das interaes que as crianas estabelecem entre si e com os adultos, lembrando que: - Existem formas prprias para estarmos em cada um dos grupos que ocupamos socialmente (...). Assim, nossa identidade fruto das relaes que estabelecemos com os outros. Em cada grupo assumimos um lugar, desempenhamos um papel, encontramos uma forma de estar, que constitui nossa maneira de ser. - Os grupos sociais, dos quais fazemos parte ao longo de nossas vidas, so de grande importncia para nossa formao. Dentre esses grupos a escola tem um papel destacado, pois um espao de formao sistemtica que contribui diretamente para a vida em sociedade. - Devemos considerar que, para muitas crianas, a entrada na escola representa os primeiros passos fora dos cuidados e da ateno familiar. Desse modo, dentro do processo de aprendizagem do mundo, podemos dizer que a escola (e para criana de 0 a 6 anos, em especial, a creche e a pr-escola) tem um papel fundamental. Ela um local privilegiado de trocas e de aprendizagens. A forma de organizao da escola favorece a convivncia em grupo, onde a criana permanecer durante um tempo significativo da sua vida (Unidade 4, FE, Mdulo II). Vamos pensar um pouco mais em tudo isso?

40

DEFININDO NOSSO PONTO DE CHEGADA Nas unidades anteriores deste mdulo estudamos e refletimos sobre a importncia da interao das crianas com os adultos, com outras crianas e com o ambiente que as cerca. Vamos continuar esse estudo, pensando nos ambientes que podemos proporcionar s crianas, na expresso oral, nos dilogos criados por elas e na presena dos adultos em suas vidas. Faremos tambm uma reflexo sobre a importncia do papel das instituies de Educao Infantil para o desenvolvimento das crianas e para uma aprendizagem significativa. Ao final desta rea temtica, portanto, esperamos que voc tenha conseguido alcanar os seguintes objetivos: 1. Promover oportunidades para as crianas explorarem as suas falas e os dilogos que elas criam ao interagirem. 2. Entender a relao adulto-criana como fundamental na relao/construo da criana com o mundo que a cerca. 3. Compreender o papel das instituies de Educao Infantil como fundamental na relao/construo da criana com o mundo que a cerca. CONSTRUINDO NOSSA APRENDIZAGEM Esta rea temtica est dividida em trs sees. Na primeira, vamos pensar juntos sobre a importncia de estarmos sempre atentos s falas das crianas, s formas como elas se expressam e aos dilogos que inventam enquanto esto brincando. Na segunda seo, vamos refletir sobre a presena dos adultos junto s crianas, a sua importncia no desenvolvimento delas e como uma interao afetiva, respeitosa e ldica contribui para o relacionamento da criana com o mundo que a cerca. Na terceira seo, vamos analisar o papel das instituies de Educao Infantil nesse momento da vida das crianas, de como o ambiente que ela freqenta diariamente pode propiciar desafios interessantes para o seu desenvolvimento.

Seo 1 A criana pensa o mundo Objetivo a ser alcanado nesta seo: Promover oportunidades para as crianas explorarem os dilogos que elas criam ao interagirem.

41

Voc j reparou que as crianas por volta de um ano, comeando a falar, brincam com palavras ditas por voc, do a essas palavras outros significados? Voc j entrou nessa brincadeira com as crianas? Um objeto at ento desconhecido, um brinquedo novo ou mesmo uma boneca de plstico pode servir de excelente motivo para compartilhar jogos e brincadeiras com as crianas, incentivar a interao com os(as) colegas e a ampliao do seu vocabulrio.

Como vimos na Unidade 4 de FE deste mdulo, as interaes que a criana estabelece com os diferentes grupos com os quais ela convive so fundamentais para o seu desenvolvimento. Dentre esses grupos, a creche, a pr-escola e as escolas de Educao Infantil so espaos privilegiados. Isto porque nem sempre as crianas tm, no seu dia-a-dia, oportunidade de ouvirem histrias, participarem de conversas, terem contato com livros de literatura infantil etc. Vimos tambm, nessa e nas outras unidades de Fundamentos da Educao, a relao entre linguagem e desenvolvimento. A linguagem ocupando um lugar central para o desenvolvimento e as interaes das crianas com o mundo. Dessa forma, as rotinas da Educao Infantil que favorecem o aparecimento da linguagem so momentos preciosos. Dentre esses podemos citar, alm dos que j citamos, as dramatizaes, o jogo do faz-de-conta, as rodas de conversa e os horrios de refeio e brincadeiras, quando surgem muitas conversas entre as crianas. Tambm os momentos de banho, higiene ou cuidados com um machucado, quando o adulto pode estabelecer os mais diferentes dilogos com as crianas.

42

A preocupao constante em proporcionar essas experincias s crianas, em tomar parte do seu universo, respeitar e utilizar suas expresses, seus gestos e reaes, do sua presena, junto a elas, um significado especial de confiana, tranqilidade e respeito. Ao realizar as atividades que se seguem, pense sempre no cotidiano com seu grupo atual e com as crianas que j dividiram com voc os espaos da Educao Infantil, seja na creche, na pr-escola ou em turmas de Educao Infantil que funcionam em escolas de Ensino Fundamental. Procure se lembrar de acontecimentos semelhantes e de como os mesmos poderiam ser mais bem explorados. As atividades que se seguem exemplificam situaes que podem favorecer o dilogo com as crianas do seu grupo.

Atividade 1O momento da histria muito apreciado pelas crianas e, porque no dizer, pelos adultos tambm. Voc poderia organizar um momento com o seu grupo para contar histrias e observar as reaes das crianas diante dessa experincia. a) uma histria conhecida delas? b) uma histria nova? c) Qual a reao das crianas diante da histria? d)Essa histria proporcionou o aparecimento da linguagem, da expresso e da interao entre as crianas? e) Quando tem uma palavra desconhecida no meio da histria, as crianas demonstram interesse em saber o seu significado? Caso as crianas demonstrem interesse pela histria, voc pode explor-la em outras situaes, por exemplo: conversando sobre ela, ouvindo os comentrios das crianas, fazendo perguntas e chamando ateno para o enredo da histria, seus personagens e situaes vividas por eles. Se o grupo se interessa por palavras novas, tentem descobrir no texto o significado de algumas delas. Voc pode propor uma brincadeira de representao em torno dessas palavras, com as crianas fazendo gestos e caretas para mostrar o que entenderam. Podemos ver, no relato que se segue, uma experincia em que a professora desenvolveu, por vrios dias, atividades em torno de uma mesma histria, que interessaram ao seu grupo de crianas de 1 a 2 anos:

43

A professora percebeu que o seu grupo estava interessado em brincadeiras de esconder. A partir da sua observao, trouxe para as crianas a histria Onde est o Bolinha? de Eric Hill. A histria voltou a ser o centro das atenes durante os dias que se seguiram. As crianas iam se familiarizando com os personagens. A histria fala do cachorro Bolinha que est escondido em algum lugar. Cada pgina virada aparecia um possvel lugar para o Bolinha estar escondido. Finalmente o Bolinha apareceu na ltima pgina e as crianas vibraram. No terceiro dia de contato com o livro, um menino chegou perguntando pelo Bolinha. A professora aproveitou a idia, escondeu o livro e perguntou para o grupo: Gente, o amigo est querendo saber onde est o Bolinha. Algum viu o Bolinha?. As crianas se voltaram para a professora e ela repetiu: E a, gente, quem viu o Bolinha?. Vrios sons se ouviram na sala das crianas tentando falar o nome do Bolinha. A professora comeou a olhar nos cantos, debaixo das caixas e as crianas iam acompanhando seu movimento. De repente, uma menina achou o livro do Bolinha debaixo da estante e comeou a repetir: Bolinha! Bolinha!. As crianas foram convidadas a ouvir mais uma vez a histria do Bolinha. A brincadeira de achar o Bolinha foi repetida por alguns dias, sempre seguida da histria. Que outras atividades a professora poderia propor a partir dessa histria, favorecendo o aparecimento da linguagem? Anote suas idias no seu caderno.

Atividade 2E se voc cantar uma msica conhecida como, por exemplo: Ciranda cirandinha, Atirei o pau no gato? a) Qual a reao das crianas? b)Voc pode observar se esta ou outras canes semelhantes proporcionam o aparecimento da linguagem, da expresso e da interao entre as crianas. c) Diante da cantiga de roda, as crianas se mobilizam para cantar ou para brincar? Com a msica, voc tambm pode fazer a mesma coisa, ou seja, criar e incentivar gestos ou uma pequena representao da cena da msica. Pode tambm trocar palavras da msica, mantendo a rima original (caso haja rima) e testar o efeito que isso causa no grupo. Se eles gostarem, repita com outra palavra. Proponha tambm, se voc trabalha com crianas maiores, que elas faam as substituies.

44

Dessa forma ldica, as crianas vo se apropriando de termos desconhecidos e fazendo relaes com o seu universo e suas experincias. Que atividades voc j fez, ou pretende fazer, com o seu grupo que partiram de uma histria contada, ou de uma msica cantada, junto com as crianas? Anote suas idias e observaes no caderno. Seja qual for o caminho escolhido, o importante aproveitar a disponibilidade e as dicas das crianas, entrar no jogo que elas esto propondo e jog-lo tambm, ampliar as possibilidades do jogo e desafiar as crianas a fazerem o mesmo. A entonao da voz tambm pode ser alterada para dar alternativas expressivas a esse mesmo jogo. As brincadeiras com as palavras sero muito bem-vindas durante todas as fases da Educao Infantil e vo se tornando mais complexas conforme as crianas vo crescendo. Podem envolver todo o universo vocabular das crianas e ampli-lo consideravelmente.

Na Educao Infantil, podemos visualizar prticas delineadas apenas a partir das propostas dos adultos ou prticas que levam em considerao as manifestaes das crianas. No exemplo citado anteriormente, e nas sugestes das atividades, o importante aproveitar as manifestaes das crianas para propor e/ou ampliar as propostas. Quando levamos em conta as manifestaes infantis, o cotidiano do trabalho com a criana de 0 a 6 anos se define de um modo vivo. Isto porque considera-se a criana como um sujeito social, com idias e movimentos que contribuem na organizao da vida coletiva, participante de relacionamentos de trocas com adultos e com outras crianas. (GUIMARES, 2004. p. 2.)

45

Para que isto acontea, a escuta fundamental. Ou seja, a observao dessas interaes, das manifestaes das crianas nas suas mais diferentes linguagens, torna-se um instrumento precioso para o(a) professor(a) intervir e propor atividades que sejam do interesse das crianas, como na situao que descrevemos na Atividade 3.

Atividade 3Imagine uma situao em que as crianas esto divididas em pequenos grupos, fazendo desenhos. Voc as acompanha e, ao passar por uma das mesas, escuta: A folha tem que ser verde! No tem nada! Voc se aproxima e pergunta: O que est havendo? A folha dele amarela! Fala uma delas. Como assim? Voc pergunta. A criana aponta para o desenho do colega que est com uma rvore com folhas amarelas. Como voc pode aproveitar esse pequeno dilogo para extrair dele uma aprendizagem para as crianas? Voc pode anotar suas idias no caderno. Poderia optar por lanar um desafio em forma de pesquisa, usando folhas cadas de rvores catadas por eles e observarem juntos que as folhas mudam de cor. Isso pode estimular muitas conversas com o grupo todo. O registro dessa descoberta tambm importante e pode ser feito tanto atravs de desenhos quanto de frases criadas pelas crianas. Voc pode tambm conversar com elas sobre o desenho de cada uma. Hoje posso desenhar a folha vermelha, amanh, marrom, e assim por diante. No desenho de cada uma, as cores so de uso livre. Voc pode trazer gravuras ou reprodues de quadros em fotos de revistas ou jornais para discutir o assunto. Se voc tem acesso internet, pode consultar sites de obras de arte com rvores com folhas amarelas, verdes, vermelhas, como as pintadas pelos artistas, Monet, Van Gogh e Kandinsky, que vemos a seguir:

46

Van Gogh, Castanheiro em Blosson 1890 Monet, lamos em Epte 1891

Kandinsky, Outono na Bavria 1908.

Em qualquer uma dessas solues podemos valorizar o que as crianas esto pensando e dizendo. Podemos partir de uma determinada situao e conversar com as crianas, dando oportunidade para que digam o que esto pensando. Registrar com elas as descobertas e as histrias que proporcionaram essas descobertas.

47

Seo 2 O adulto: um parceiro especial Objetivo a ser alcanado nesta seo: - Entender a relao adulto-criana como fundamental na relao/construo da criana com o mundo que a cerca.Voc j reparou como as crianas, desde bebs, respondem s brincadeiras que voc faz com elas? Seja na hora de trocar a fralda, na hora de se alimentar ou quando voc est cercada por algumas delas.

Na seo anterior, falamos sobre a interao entre as crianas e de como podemos valorizar o que elas falam nesses momentos para desenvolver a sua linguagem e conhecimento. Atravs dessas trocas, as crianas aprendem a conviver com seus sentimentos, a conviver com adultos e crianas e a descobrir formas variadas de lidar com as adversidades. O fato de voc tomar parte nessas brincadeiras e garantir a elas essa possibilidade fundamental para que as crianas se sintam vontade para expressarem suas idias e sentimentos. Alm disso, a referncia que voc representa para elas as ajuda a se conhecerem melhor.

Ao retornar para si o olhar e as palavras impregnadas de sentidos que o outro lhe transmite, a criana acaba por construir sua subjetividade a partir dos contedos sociais e afetivos que este olhar e estas palavras lhe revelam. (JOBIM e SOUZA. 2000. p.27.)

48

Na Educao Infantil, o(a) professor(a) o adulto que convive mais de perto com as crianas. Por isso, torna-se fundamental para o seu trabalho observar o que as crianas dizem, de modo a captar uma idia e devolv-la ao grupo em forma de desafio, provocao. Tanto as idias de uma criana em particular como as idias do grupo podem ser transformadas em propostas para a sua turma. Com a sua ajuda, professor(a), as observaes de uma criana, as dvidas e hipteses que as crianas trazem se transformam em conquistas do grupo, descobrindo caminhos que muitas vezes nem imaginamos percorrer. medida que a criana sente que o adulto valoriza suas idias, seus interesses, suas brincadeiras, suas hipteses, ela vai fortalecendo o seu vnculo, ou seja, a sua ligao com os adultos e com o espao. A criana passa a olhar para si mesma como algum que capaz, que pode fazer a diferena no seu meio. Como isso acontece no seu dia-a-dia? Como as crianas so desafiadas a construir o seu conhecimento e a superar os seus impasses? Como sua rotina de trabalho com as crianas? Vamos pensar sobre essas questes. Se voc trabalha com crianas bem pequenas, talvez j tenha passado por uma situao como esta: Na hora da refeio, no berrio, bebs de 6 a 8 meses esto sentados nas cadeiras. Nesse momento, uma das crianas comea a choramingar, talvez fazendo um pouco de manha. Voc chega com a comida e ela no se mostra interessada. O que fazer? Como proceder para que esse choramingo no cresa e ela se alimente satisfatoriamente? Esse um momento de extrema importncia no cotidiano dos bebs e, antes de tudo, preciso reconhecer que as crianas so diferentes entre si, cada uma uma. Por isso fundamental compreender o que significa esse choramingo para essa criana em particular. O que fazemos com uma criana pode gerar uma reao totalmente diferente em outra criana. Isso quer dizer que o choro de uma criana no se tranqiliza da mesma forma que o de outra. A troca da fralda e o momento das refeies ajudam muito em todas as demais relaes desse beb com o adulto que o est atendendo. - Como voc procede nesses momentos? - Voc costuma cantar alguma msica que o beb goste?

49

- Voc conversa com ele falando baixo e mantendo a tranqilidade? - Voc usa algum objeto para distrair a criana enquanto conversa e a acalma? Mostrar tranqilidade fundamental para as crianas. A partir do seu comportamento, o beb percebe, desde cedo, e principalmente nessas horas, como os adultos reagem. importante tambm ter cuidado para no desviar a ateno da preocupao principal, que a alimentao. Esses momentos da rotina diria, do cuidado necessrio, permitem criana ficar vontade na sua presena e, atravs dessa relao, arriscar-se a ampliar esse contato com outras pessoas, adultos e crianas. Este tambm pode ser um momento de muitas aprendizagens, como na situao registrada a seguir por uma professora de crianas de 1 ano e meio a 2 anos e meio: Era dia de banana! Assim que o lanche chegou, as crianas vieram e se dirigiram para a mesa (...). Cada criana ganhou um guardanapo de papel e algumas j os foram abrindo na mesa. Por imitao, outros tambm tentaram abri-los. Coloquei o prato com as bananas na mesa e deixei que elas mesmas se servissem. Algumas tentavam pegar mais de uma. Nesse momento intervi, explicando que havia vrias bananas na bandeja e que poderiam comer mais uma, depois, se quisessem. Um dos momentos da rotina do maternalzinho a hora das refeies. Aproveitamos, ento, esse espao para desenvolver a autonomia das crianas, deixando-as servirem os alimentos, comerem sozinhas, limparem a mesa, colocarem cascas e restos no lixo, pratos e canecas nas bandejas. preciso conversar muito com elas sobre os alimentos e sobre os hbitos mesa de refeies. Desafiei-as a descascarem as bananas, ajudando um pouco, quando pediam. Para isso, abria um pouco da casca para que elas puxassem as pontas at descascar toda a fruta. Quando conseguiam, riam de satisfao. As crianas iam colocando a casca em cima do guardanapo e, quando acabavam de comer, eu passava a lixeira para jogarem a casca fora. Na hora das refeies, tenho procurado deixar as crianas fazerem a coisa do seu jeito, mesmo sabendo que elas podem sujar-se mais, demorar mais ou fazer diferente do adulto. Essas experincias tornam-se gratificantes para elas e para ns, pois vemos as crianas cada vez mais independentes, embora confiantes no nosso auxlio quando necessrio. (Lisiane Valente Selistre, 1995)

50

Atividade 4Seria interessante lembrar de alguma experincia na qual, apesar de uma resistncia inicial, voc tenha ajudado as crianas a vencerem alguma dificuldade em relao alimentao, ou outra situao do cotidiano. Voc pode registrar essa situao no seu caderno. Uma outra atividade do cotidiano que pode promover momentos de interao entre as crianas e entre estas e os adultos a msica. Como a msica est presente no dia-a-dia das crianas com as quais voc trabalha? Elas cantam apenas msicas que treinem algum tipo de comportamento (msica para sentar na roda, para ficar em silncio, para lanchar etc.)? A msica est presente em diversas situaes da vida humana. Voc se lembra de alguma cano de ninar cantada para voc ou que voc tenha cantado para alguma criana adormecer? E as msicas para danar? Em muitas culturas, existem msicas para chorar os mortos, para conclamar o povo a lutar, msicas para a colheita etc. Voc se lembra de alguma msica que esteja relacionada a alguma comemorao na sua regio? Pensamos que muito importante que a msica esteja presente como forma de expresso, de ao coletiva, como uma relao constante com a cultura. Ouvir msica, aprender uma cano, brincar de roda, realizar brinquedos com ritmo e jogos de mos so atividades que despertam na criana o interesse pela msica e possibilitam a expresso dos sentimentos.Eugnio Svio

51

Curiosidade Os jogos de mo so tradicionais e esto presentes em todas as culturas. So brincadeiras com ritmo e melodias caractersticas que integram texto e batimentos com as mos. As crianas trazem muitas dessas brincadeiras para o cotidiano da Educao Infantil e com certeza gostaro de aprender novas brincadeiras. Entre elas podemos citar: L-peti-poti-pola, Eu e as quatro, Uni duni t-salam-ming, P-de-chul troca-de-p.

Atividade 5Vamos voltar ao seu planejamento. Analise as duas ltimas semanas de atividades com as crianas. Em que momentos a msica aparece? O que as crianas cantam? Elas cantam msicas do folclore? De cantores da atualidade? No seu municpio h professores de msica trabalhando na Educao Infantil? E no Ensino Fundamental da rede pblica? Em que situaes as crianas aprendem msicas na sua creche ou pr-escola? Como voc utiliza a msica no trabalho com as crianas? Seria importante registrar essas observaes no seu caderno e discuti-las com o seu grupo do PROINFANTIL no encontro quinzenal. O ser humano tem a capacidade de apreciar a arte e sentir prazer com o belo. A boa msica, acom panhada ou no da expresso corporal, uma maneira de nos aproximarmos da realidade, de compreender melhor a ns mesmos e o mundo que nos cerca, sendo um auxlio poderoso para deixar as crianas vontade. Muitas crianas tm uma sensibilidade aguada para essa forma de expresso. Alm disso, muitos momentos de alegria podem ser proporcionados atravs da msica. No entanto, muitas vezes a msica aparece no cotidiano da Educao Infantil apenas para conduzir as rotinas. Voc ter oportunidade de ver este assunto mais de perto na Unidade 4 de FE e OTP do Mdulo IV. Pensando na msica como uma manifestao cultural, seria interessante fazer uma relao de msicas da sua regio que voc considera ser de interesse das crianas de seu grupo (brinquedos cantados ou msicas do folclore brasileiro de modo geral).

52

A maneira como voc vivencia esses momentos com as crianas importante para estabelecer novas interaes e para reforar o seu papel de liderana junto ao grupo. Alm disso, fundamental que as crianas vejam os adultos como uma referncia tambm nos momentos de descontrao e alegria. As crianas pequenas interagem constantemente com os objetos do ambiente e a partir dessas exploraes vo obtendo informaes sobre os mesmos. O(a) professor(a) tem um papel importante na organizao desses objetos e desse espao, de modo a favorecer essas interaes. Vejamos o registro que se segue, de uma professora de crianas de 1 ano e meio a 2 anos e meio: Levei para a sala um grande saco de lixo com garrafas, tubos de shampoo, latas vazias (algumas enfeitadas), retalhos de tecido, bolas de meia, pedaos de corda e lenos coloridos. Em algumas das garrafas coloquei lquido colorido, bolinhas de isopor, papis picados de vrias cores e formas. Deixei que todo aquele material fosse manipulado pelas crianas livremente por um longo tempo. Nesse primeiro momento, as crianas familiarizaramse com os objetos, realizando atividades de conhecimento fsico: olhando, manuseando, batendo, rolando, jogando. Eduardo, depois de bater algumas garrafas no cho e sobre o carpete vrias vezes, experimentando o som que faziam, passou a tentar colocar, dentro das garrafas, retalhos de tecido, para depois retir-los. Pela profundidade e pequena abertura do gargalo, ele precisou fazer vrias tentativas para retirar o tecido e, por fim, buscou meu auxlio. Como percebi que ele no conseguiria, pela dificuldade de sua proeza, fiz um furo no fundo da garrafa, enfiei uma corda grossa pelo gargalo e forcei a sada do retalho com o auxlio da corda. Eduardo, que ento me observava, tomou a corda e a garrafa de minhas mos, repetiu o que eu havia feito com a corda e saiu puxando a corda com a garrafa pela sala. Observando sua reao, furei outras garrafas vazias e deixei disposio das crianas. Eduardo enfiou vrias garrafas em sua corda e realizou muitas peripcias com aquele brinquedo que criou. Aline, provocada pela inveno do Eduardo, tambm montou seu brinquedo. Em uma corda de, aproximadamente, 1 metro, enfiou cinco garrafas e pendurou-as no encosto de uma cadeira. (Orizabete Aquino da Silva, 1995)

53

Atividade 6a) Que atitudes da professora favoreceram a interao das crianas com o seu meio e entre si? b)Voc j vivenciou uma experincia semelhante com o seu grupo? Voc pode registrar sua experincia no caderno, para compartilh-la com o grupo no encontro quinzenal. No cotidiano, qualquer soluo que mostre a possibilidade de interagir com a criana e ampliar essa interao para as outras crianas bem-vinda, desde que mantenha o interesse da criana pela brincadeira. No exemplo anterior, como em outras brincadeiras, importante valorizar o que a criana est criando, no interrompendo essa explorao ou fantasia, a no ser que esteja trazendo risco para as crianas. Outro fato a ser observado a possibilidade de voc, em determinados momentos, poder ocupar o lugar de lder da brincadeira, permitindo que as crianas tambm ocupem esse lugar em outros momentos. Isso fortalece sua presena entre elas de forma natural, como vemos no relato que se segue, de uma professora de crianas entre 1 ano e meio e 2 anos e meio: Havia algumas bonecas espalhadas pela sala. Num determinado momento, peguei uma delas e comecei a fazer de conta que estava nanando a boneca. Cantei cantigas de ninar e depois coloquei-a para dormir. As crianas ficaram me olhando. Perguntei-lhes quem gostaria de ser o meu nen. Gregori correu para o meu colo e, ento, comeamos uma brincadeira de nanar. Cada criana brincava de dormir no meu colo e acordava ao trmino da msica e ao som de belas risadas dos demais que aguardavam a sua vez. Quando colocava a criana para dormir com a cabecinha na almofada, outras crianas faziam-lhe carinhos nos cabelos e no corpo. (Gilsone Mttola, 1995) Outras vezes, a interveno do adulto se faz necessria para a resoluo de algum conflito, disputa de um brinquedo, de um lugar, de um lpis:

54

Voc est no ptio com uma turma de crianas de 2 anos, quando percebe um menino e uma menina disputando um brinquedo. meu! meu! Voc se aproxima, pergunta o que ouve, mas as crianas continuam na mesma: meu! meu!

Qual a sua reao nesse momento? Como voc tentaria resolver esse pequeno conflito? Seria importante identificar de quem o brinquedo. Se for da instituio, explique que o brinquedo para todos brincarem. Se o brinquedo for de uma das crianas, converse sobre como podem brincar juntas. Quem sabe poderamos propor um jogo, usando esse mesmo brinquedo, que envolvesse as crianas e que voc tambm esteja junto. Poderia tambm sugerir que a turma se junte para brincar com o brinquedo, e que um dos dois, ou os dois juntos, sugiram a atividade. O importante nessa situao valorizar as sugestes das prprias crianas, ajudando-as a encontrarem solues para os seus conflitos.

55

Isto pode ser visto no relato da situao abaixo, vivenciada por uma turma de crianas de 5 anos: Dois meninos esto disputando o mesmo carro. um carro grande e verde. A professora observa para ver o desfecho da situao. Como no conseguem chegar a um consenso, a professora intervm perguntando o que est acontecendo. Cada um dos meninos afirma ter pego o brinquedo primeiro. A professora pergunta de quem o carro. Os meninos se olham e dizem que o carro do outro amigo. A professora chama o amigo, explica o que est acontecendo e pergunta se ele tem uma soluo: U, cada um brinca um pouquinho. A professora aproveita a sugesto e encaminha a questo: Muito bem. Vamos fazer assim ento, cada um brinca um pouquinho. Quem vai brincar primeiro? Os meninos resolvem a questo entre si, chegando a um acordo. Voc lembra de algum momento em que foi possvel viver um momento semelhante? Registre essa experincia no seu caderno. Seria interessante compartilhla com os(as) colegas do curso, verificando que outras solues podem ajudar num momento como esse. O que h de comum em todas as atividades desta seo? Em todas essas situaes o papel do adulto foi fundamental na criao e na manuteno de um ambiente de respeito e tranqilidade entre as crianas e destas com os adultos. Cremos que seria oportuno salientar a importncia do dirio como instrumento de reflexo constante da prtica do professor. Atravs dessa reflexo diria ele avalia e planeja a sua prtica. (FREIRE, 2002. p.77.) Assim, para encerrar esta seo, deixamos algumas perguntas para voc refletir sobre a sua prtica: - Voc considera que as crianas de seu grupo tm em voc uma referncia importante do dia-a-dia delas? - As crianas se sentem seguras e o(a) procuram em caso de necessidade? - O grupo se une ao seu redor com facilidade nos momentos de organizar os trabalhos e as brincadeiras? - Qual o lugar que voc tem dado para as descobertas, hipteses e tentativas das crianas?

56

Como dissemos, em alguns momentos, o(a) professor(a) pode coordenar as atividades com as crianas, assumindo a liderana da situao, exercendo uma influncia mais direta sobre a ao das crianas. Em outros, o(a) professor(a) atua como observador(a). No entanto, as interaes do cotidiano da Educao Infantil supem uma participao ativa do adulto, seja observando, seja intervindo, propondo ou perguntando. Podemos dizer, ainda, que a palavra do adulto importante para ajudar a organizar o mundo das crianas. Ao fazer perguntas que auxiliem a criana a expressar seus sentimentos e pensamentos, o(a) professor(a) torna-se mediador(a) no processo da criana de assimilar e dar sentido realidade.

Seo 3 As instituies de Educao Infantil e sua ao na mediao da criana com o mundo Objetivo desta seo: - Analisar o cotidiano da sua escola em relao s possibilidades do desenvolvimento sensorial das crianas.Nas sees anteriores, foi possvel refletir sobre a importncia da explorao das falas das crianas, bem como do seu papel de professor(a) no cotidiano e na vida delas. Para fechar esta unidade, vamos pensar sobre o ambiente da instituio e o papel dela no desenvolvimento das crianas. Como vimos em unidades anteriores deste mdulo, atravs das interaes com o ambiente, com os adultos e com outras crianas, a criana vai formando idias sobre os objetos e as pessoas que a cercam. Por isso a importncia de se estabelecer relaes respeitosas e afetivas com cada criana, para que aceitem e se interessem pelos desafios que voc ir propor. Da mesma maneira, a criao de um ambiente que favorea a expresso fundamental. Poder expressar-se livremente faz com que a criana avance na compreenso do mundo e amplie essa capacidade, que ser importante ao longo de toda a sua vida. Assegurar essas caractersticas ao ambiente da creche, pr-escola ou turma de Educao Infantil com a qual voc trabalha, promover trocas de experincias entre os(as) professores(as) e permitir que todos trabalhem com tranqilidade so questes que analisaremos em seguida. A organizao dos espaos e da rotina Como so organizados os espaos na instituio na qual voc trabalha?

57

Refletir sobre a organizao desses espaos um exerccio fundamental para o desenvolvimento do trabalho na Educao Infantil. A educadora italiana Lella Gandini afirma que o espao reflete a cultura das pessoas que nele vivem e que, acima de tudo, os espaos devem favorecer a interao entre as crianas. (GANDINI, 1999)

Atividade 7Como est organizado o espao da sua sala? Para esta reflexo, seria importante voc fazer uma pequena descrio do local onde voc recebe as crianas. Conte como so os murais, que jogos existem, que materiais ficam ao alcance das crianas e como so as mesas, cadeiras e outros mveis existentes. H um espao destinado s mochilas e/ou sacolas das crianas? Existe algum canto com roupas emprestadas de adultos para dramatizaes? Voc pode anotar suas idias no caderno ou mesmo fazer uma planta baixa (um desenho) dessa organizao. Esse espao fundamental para as crianas. Os espaos onde as crianas passam a maior parte do dia, convivendo com voc e com os colegas devem ser locais onde elas se sintam vontade e possam desenvolver o esprito de cooperao. Os materiais de uso cotidiano devem estar ao alcance delas para serem manipulados livremente e com responsabilidade. Os murais podem ser organizados a partir de trabalhos feitos pelas crianas ou resultados de propostas desenvolvidas por voc, por outro(a) professor(a), ou pelas prprias crianas, e que tenham um significado para elas. importante que o espao de referncia das crianas seja o reflexo do trabalho que realizado com e por elas.Valria Mourth de Oliveira

58

Alm da maneira como o espao est organizado, a qualidade das interaes que acontecem nesse cotidiano fundamental. Assim, propomos ainda algumas outras observaes. Ao receber as crianas no incio do dia, elas tm um tempo para arrumar a mochila e/ou sacola que trazem de casa? Elas so sempre recebidas no mesmo local? Como a chegada delas na instituio? Elas vo direto para onde voc se encontra? Elas ficam algum tempo conversando entre elas ou em atividade livre? Como voc descreveria esse momento e a maneira como esse espao est organizado? O que pode ser modificado para permitir a melhoria do bem-estar das crianas? O primeiro momento em que as crianas chegam instituio um tempo a ser pensado e observado pelo(a) professor(a) com muita ateno. Parar agora e refletir sobre esse processo pode ajudar voc a repensar esse momento. - Como essa rotina de chegada das crianas na instituio e como voc orga niza o dia com elas? - No seu planejamento existe uma previso para uma conversa com elas em grupo? - Nessas conversas elas so estimuladas a falar e a contar casos? Ao longo do dia, mas principalmente na hora em que chegam na instituio, muito comum as crianas terem vontade de contar algo que se passou com elas ou que as aflige de alguma forma. importante que esse momento seja vivido com intensidade, ou seja, que as crianas possam se colocar, que possam escutar o colega e que se sintam vontade para isso. Valorizar o que a sua turma traz e diz a base para uma prtica centrada na criana. possvel abrir espaos no planejamento para as informaes trazidas pelas crianas. Isso as estimula a trazer novidades e a contribuir para o grupo. Como diz Madalena Freire no seu livro A paixo de conhecer o mundo, uma das sugestes de leitura do PROINFANTIL, fundamental que as crianas tomem conscincia de que elas esto fazendo, conquistando, esto se apoderando do seu processo de conhecimento. (FREIRE, 2002. p. 45.)

59

Esse livro de Madalena Freire traz relatos de muitas experincias da autora como professora de Educao Infantil, bem como de algumas colegas da escola em que trabalhava. Leva-nos a pensar junto com ela na importncia de cada atividade e das muitas possibilidades que podemos proporcionar s crianas de maneira simples. Alm disso, a responsabilidade coletiva com a organizao do espao fundamental para que as crianas sintam-se vontade no mesmo, como na situao que vemos a seguir: Numa turma de crianas de 5 anos, uma menina tomou a iniciativa de fazer a chamada por sua conta. Cada criana tinha um carto, com um im atrs, com o seu nome escrito pela professora e um desenho feito pelas crianas, representando o retrato de cada uma. As crianas estavam sentadas na rodinha e a professora disse que iriam fazer a chamadinha. A menina voltou-se para a professora dizendo j ter feito, ou seja, j fixara num armrio grande de ao os cartes das crianas presentes e num armrio menor os cartes dos que estavam ausentes. A professora voltou-se para o grupo e disse que a amiga j havia feito a chamadinha. Amenina sentiu-se com liberdade para lidar com os cartes e organiz-los. Se o objetivo era registrar quem veio e quem faltou, a tarefa estava perfeita. E a professora respeitou a iniciativa da menina. (BARBOSA, 2004. p. 82.)

Atividade 8Para que voc possa refletir sobre essas questes que acabamos de trazer, seria bom rever o seu planejamento das ltimas duas semanas e fazer uma anlise da rotina de chegada. Ao anotar suas idias no caderno, voc pode ter um material interessante para discutir essas questes com os seus colegas de formao. Vemos, ento, que tanto o(a) professor(a) quanto as crianas podem estar envolvidos com as solues e propostas do cotidiano. Essas atitudes so incentivadas pela instituio na qual voc trabalha? Voc tem autonomia para organizar o espao de trabalho e os murais com as crianas? As crianas so valorizadas nas suas iniciativas e descobertas? Vejamos uma sugesto:

60

Aproveitando o espao externo da escola, se for possvel, voc poderia recolher, junto com as crianas, folhas de rvores frutferas, de preferncia as que sejam tpicas de sua regio, (pedrinhas, gravetos, flores etc.) e que ainda estejam com odor caracterstico. Durante a coleta, registre as observaes, descobertas e indagaes das crianas. Lembre-se de que, quanto menores forem as crianas, mais dificuldades tero para estabelecer diferenas entre aromas semelhantes. Essas atividades envolvem as crianas com o universo de possibilidades que as cerca, podendo ser dentro da creche ou pr-escola ou com objetos de casa. Uma pesquisa sobre os cheiros que sentem em locais diferentes pode gerar muita polmica entre elas, alm de gerar registros interessantes que podem ser expostos em um mural organizado junto com as crianas, de modo a compartilharem com a comunidade escolar as suas descobertas e indagaes. No prximo mdulo, estaremos abordando mais especificamente a organizao dos ambientes, espaos, materiais e tempos do trabalho cotidiano com as crianas na Educao Infantil. A relao com a famlia A relao com a famlia fundamental para o desenvolvimento do trabalho nas instituies de Educao Infantil, pois, como estudamos no Mdulo I, a nossa proposta de um trabalho em parceria com as famlias. Criar um bom ambiente de aproximao com as famlias e manter um dilogo aberto e construtivo com elas interfere positivamente no desenvolvimento das crianas. Voc ter oportunidade de estudar com mais profundidade o trabalho com as famlias no prximo mdulo. Entretanto, podemos comear a refletir sobre isso.

61

Desde o processo de insero e acolhimento (que ser estudado na Unidade 1 de FE e OTP do Mdulo IV) at a relao que se estabelece cotidianamente, importante a participao do(a) professor(a) na construo desse vnculo com as famlias. Podemos comear com indagaes simples, mas que fazem diferena: - Como acontece a entrada das crianas na instituio onde voc trabalha? Existe alguma conversa entre os responsveis pela criana e a direo da instituio? Quando voc recebe um grupo de crianas, as informaes sobre elas so passadas a voc? Ainstituio na qual voc trabalha costuma realizar reunies peridicas com as famlias? Voc participa desses encontros? Qual o seu papel nos mesmos: voc lidera as reunies ou existe outro profissional encarregado desse papel? Essas questes ajudam a construir e manter um elo de confiana entre as famlias e voc, professor(a) das crianas. O contato com as famlias, seja no cotidiano ou em reunies especficas, so oportunidades para estabelecer um dilogo com os responsveis, ter um retorno de como as crianas esto interagindo com as propostas, como tambm esclarecer essas propostas para as famlias, naquilo que a famlia pode ajudar quando, por exemplo, solicitamos s crianas que tragam algo de casa. Essas questes, que so de responsabilidade da instituio, tambm podem fazer parte do seu cotidiano.

Atividade 9A partir dessas consideraes, duas perguntas podem ajudar a refletir sobre essa relao famlia-instituio: a) Voc considera que o contato com os responsveis satisfatrio na creche, pr-escola ou escola de Educao Infantil onde voc trabalha? b)O que voc acha que poderia ser feito para estreitar esse contato? Seria importante voc registrar suas reflexes no caderno de atividades e compartilh-las com o seu grupo de estudo no encontro quinzenal. Finalmente, para encerrarmos esta seo, destacamos ainda mais uma questo, dentre tantas outras implicadas no cotidiano da Educao Infantil, que pode ser favorecida pela estrutura administrativa e pedaggica da instituio: o espao e o investimento que a instituio faz no favorecimento da expresso plstica das crianas.

62

Dentre as muitas linguagens da criana, a possibilidade de se expressar plasticamente, seja pelo desenho, seja pela modelagem, seja pela pintura, algo muito apreciado pelas crianas. No Mdulo IV, voc ter a oportunidade de estudar as mltiplas linguagens das crianas. Neste momento, queremos destacar a possibilidade de a criana expressar plasticamente seus sentimentos e pensamentos.

A livre expresso plstica das crianas item fundamental para o amadurecimento delas. Alm da contribuio para a coordenao motora, o trao livre e os desenhos originais representam o universo interior da criana. Atravs desses desenhos, e tambm do que as crianas falam sobre estes, podemos acompanhar a evoluo do pensamento delas e verificar como esto se sentindo em relao s pessoas e ao mundo que as cerca, podemos identificar seu trao, formas como gosta mais de trabalhar (sozinho, com um parceiro em especial, com determinadas cores ou materiais como argila, tinta, lpis de cor, caneta hidrocor etc.), mas principalmente compreender o desenho, a pintura, a modelagem, como um instrumento de fruio da imaginao e da fantasia da criana, ou seja, um espao de criao. O quadro a seguir mostra a experincia da professora Viviane Bonfim de Souza numa turma de crianas de 4 anos da Educao Infantil do municpio do Rio de Janeiro.Priscila Silva Nogueira

63

Assim, olhei para a minha prpria prtica e pude refletir sobre o trabalho que estava realizando. As crianas, na sua